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D8 C2+música %HermesFileInfo:D-8:20130202: O ESTADO DE S. PAULO SÁBADO, 2 DE FEVEREIRO DE 2013 C2+m/Rock e Blues DIVULGAÇÃO NAS MÃOS DO Marcelo Moreira ESPECIAL PARA O ESTADO O guitarrista norte-americano DukeRobillardmantinhaumarotina de trabalho em seu estúdio até o final de 2012. Músico e produtorrequisitado,imaginavaque teria um início de 2013 não tão agitado. Ele adora estar por perto para supervisionar os artistas que o procuram para gravar. Mas eis então que surgiu (de novo) umBobDylanem sua vida. Robillard nem teve tempo de pensar em recusar (jamais o faria, é verdade): foi “intimado” a se tornar o diretor musical da próxima turnê mundial de Dylan neste ano, coisa de 130 shows... Mas o produtor fez questão de uma coisa: produzir o novo CD do brasileiro Nuno Mindelis. “Ele fez questão disso, mas tivemos de antecipar todo o cronograma, senão eu perderia a oportunidade. Os planos mudaram, mas nem por um momento pensei em não realizar esse projeto”, afirmou o guitarrista brasileiro, um dos pioneiros do blues brasileiro, antes de embarcar para os Estados Unidos. Mindelis passou o a virada de anonosarredoresdagélidaProvidence, a principal cidade de Rhode Island, estado norte-americano onde mora Robillard. Foram 20 dias de muito trabalho, com resultados satisfatórios e eletrizantes, nas palavras do próprio músico brasileiro em pequenos Chamado de ‘A Fera’ pela crítica dos EUA, Nuno Mindelis grava CD com produção de Duke Robillard textos publicados no Facebook – hilários, por sinal. Mais do que reconhecimento por seu trabalho de qualidade, a chancedegravarcomDukeRobillard é a consolidação de seu nome no fechado circuito de blues dos Estados Unidos. Não que isso seja novidade para o guitarrista de 55 anos, nascido em Angola e criado no Canadá e no Brasil. Sua presença em festivais e jams emcidadescomoChicago, Memphis e Nova York é frequente, assim como sua legião de contatos “pouco” influentes, como Chris Layton e Tommy Shannon, que formavam a Double Trouble de Stevie Ray Vaughan. “A situação agora foi diferente. Já gravei e toquei com a Double Trouble, já fiz jams com alguns dos melhores músicos que existem, mas fazer um álbum com uma lenda como Robillard é algo quetemdeseraproveitadoaomáximo.Éumaoportunidadededar uma cara diferente ao meu traba- E K DU lho em todos os aspectos”, diz Mindelis. O músico tem consciência de seu status nacional e internacional, mas a serenidade e a modéstiacomquetratadoassuntoexplicam em parte o porquê de ser tão requisitado nos Estados Unidos e no Canadá. A própria relação com Duke Robillard é um exemplo de como Mindelis conduz de formainteressanteasuacarreira. Surpreendido por um fã norteamericano por e-mail, manteve contato com ele por algum tempo. O fã queria saber quando se ele tocaria na Filadélfia, uma das grandes cidades da Costa Leste americana. “Irei quando me convidarem”, respondeu o brasileiro diretamente – o fã achou que o e-mail iria parar na caixa de algum “assessor”. Eeisqueestefã,quesetornaria umparceirocomercialimportante do guitarrista, conseguiu que Mindelis fosse uma das atrações do W. C. Handy Award, o Oscar do blues norte-americano em Memphis. Isso ocorreu há alguns anos. “Foi maravilhoso participar do evento, conversei e toquei com muita gente. Mas a surpresa veioquandoeuestavanoaeroporto de Memphis. Indo para a Filadélfia, senti um toque no ombro e uma voz: “Hey beast”. Quando olhei pra trás era o Duke, aí eu perguntei como ele sabia o meu apelido lá e ele disse que tinha um disco meu. Só aí eu descobri que o cara que me levou para o DIVULGAÇÃO Wilko Johnson recebeu a notícia de que não terá muitos anos de vida. Sua resposta: tocar, tocar e tocar Bento Araujo ESPECIAL PARA O ESTADO Receber a notícia que você tem poucos dias, ou talvez meses de vida,porcausade umcâncer pancreático,nãodeveseracoisamais fácildomundo.Foiissoqueoguitarrista Wilko Johnson escutou da boca de seu médico, um pouco antes do Natal. Só mesmo sendo um “patife miserável”, como ele mesmo se auto-denominou, para encarar esse estado terminal não com desespero e tristeza, mas com a mais pura euforia. Wilko, de 65 anos, recusou a quimioterapia em troca de apenasalgunsmesesextrasporesses lados. Caiu de cabeça no trabalho e partiu, no início do mês, para shows no Japão. As apresenta- TRATAMENTO DE CHOQUE FICHA DE ROBILLARD É DE IMPRESSIONAR ● Duke Robillard é um session bluesman por excelência. Aos 64 anos, já tocou e produziu muitos dos mais importantes músicos do nosso tempo. Suas digitais estão em diversos trabalhos de Bob Dylan, Tom Waits, feras do blues e até mesmo o duo inglês Wham!, que projetou George Michael. Nuno Mindelis comenta, em tom de brincadeira, que talvez somente o genial Steve Cropper (Booker T and the MG,s) tenha gravado e tocado mais do que ele. Entre outras coisas, a reputação de Robillard ganha um selo de alta qualidade por ter substituído Jimmie Vaughan (irmão mais velho de Stevie) no excelente banda The Fabulous Thunderbirds nos anos 70. Nuno Mindelis, não há dúvidas, está em boas mãos. show do W.C. Handy tem um selo de blues e é sócio do Duke. Mantivemos contato e o cara fez questão de que eu gravasse um disco com ele.” “TheBeast”(AFera)foioapelido que Nuno ganhou no Texas anos atrás, quando um jornalista çõesterminaramcomelecantando e tocando Bye Bye Johnny, acenandoparaaplateia,que,emocionada, acenou de volta. Era para ser triste, mas não foi. Pro guitarrista, seu estado terminal foi uma ótima maneira de sair de cena. Wilko Johnson é o pai do punk rock britânico. Foi por volta de 1971 que sacou uma Fender Telecaster detonada e fundou o Dr. Feelgoodaoladodovocalista/gaitista Lee Brilleaux, uma banda tãodistintadoqueexistianocenárioqueacabousendocaracterizada como pub rock, o subgênero que recusou o virtuosismo do rock progressivo e o exibicionismo do glam, os dois estilos musicais mais em alta naqueles tempos. O intuito do Dr. Feelgood era resgatar a rusticidade do blues negro norte-americano e do rock básico dos anos 1950. Se tivessem surgido cinco anos depois,nãoseriamapenas osreisdo rock de boteco. Provavelmente seriam maiores ainda que os PistolseoClash.Pergunteaocineasta Julian Temple, que dirigiu filmes sobre as três bandas. O que Wilko fez foi vestir um terno preto e cunhar um estilo de tocar que mais tarde influenciaria toda uma geração. Sem usar palheta,suapegadaémuitopeculiar. Suas frases são rudes, mas com a malandragem do ska, co- de um importante jornal de Austin o chamou que “a fera sulamericana do blues que invadiu a cidade”. Entretanto, apesar da amizade que surgiu, Mindelis conta que o novo álbum correu o risco de não ter Robillard como produtor. Sem muita inspiração e sem planejamento adequado, enrolou o quanto pôde – na verdade, não foi enrolação, mas excesso de trabalho e atividades que teve no final de 2012. “Mas aí não teve jeito,fui‘enquadrado’,comoDuke me dizendo que já tinha reservado um espaço na agenda para eu gravar. Pouco tempo depois, ele me avisa que ia ser o diretor de turnê de Bob Dylan em 2013, só isso... Não tive escolha: mandei os rascunhos que eu tinha e esperei a resposta. Ele gostou e antecipou minhas gravações para janeiro.” A única coisa que o brasileiro sabe é que o novo álbum será bem diferente de Free Blues, lançado em 2010 com elementos de música eletrônica, como as levadas de bateria. Ele reluta em caracterizar o som que pretende fazer como “blues tradicional” ou “blues moderno”. “Quero fazer algo diferente, com toques modernos e timbres que remetam a uma coisa que ainda não fiz. Não quero rotular de moderno, mas quero sentir o que o estúdio e os músicos que trabalham com Duke podem me sugerir e me oferecer.” monoclássicoRoxette,doprimei- seguinte montou sua Wilko Johnro disco do Dr. Feelgood, Down son Band, por onde soltou vários By The Jetty (1975). O guitarrista discos nas décadas seguintes. Em participou de mais três álbuns do 1980 chegou a gravar um álbum grupo,ostambémessenciaisMal- com Ian Dury & The Blockheads, practice (1975), Stupidity (ao vivo, Laughter, a despedida de Dury do 1976) e Sneakin’ Suspicion (1977). lendário selo Stiff Records. Stupidity é uma boa prova da forNo ano passado, Wilko finalçadogrupo,queao vivoeraimba- mentelançousuaaguardadaautotível. Brilleaux, estático em seu biografia, Looking Back At Me, em impecável terno branco encardi- que deixa claro que não acredita do, encarava todos nos olhos, so- emvidaapósamorte.Maisummoprava sua gaita com raiva e entre- tivoparaaproveitarintensamente ga poucas vezes vistas num palco seu pouco tempo por aqui e suas inglês. A seção rítmica, com John duas turnês de despedida marcaB. Sparks (baixo) das às pressas pela e The Big Figure França e Inglater(bateria), impulra, agora em feveTROCOU QUIMIO sionavaaengrenareiroemarço.NesPOR SHOWS NO gem e os passos se meio tempo, o frenéticos de Wilguitarrista ainda JAPÃO, UM CD, ko Johnson pelo planeja finalizar UM DVD... palco. Antes messeunovoCDe deimo de Ian Curtis xar um DVD pronaparecer, Wilko já parecia estar to para um lançamento futuro, no meio de um ataque epilético, possivelmente póstumo. disparando e cuspindo frases de As datas foram anunciadas esta guitarra em direção ao público. semana em seu website oficial, no Erarock urgentegerado pelasan- qual surgiu também a seguinte fetaminas. Se Wilko tivesse pedi- mensagem:“Essasdatasrepresendo para Lemmy o nome Mo- tam uma oportunidade para Wiltörhead, uma gíria para o usuário koagradeceraseusfãs,demaneira de anfetaminas, ele dava. sincera,portodooapoioquereceJohnsondeixou oDr.Feelgood beu durante sua longa carreira”. paramontarumnovogrupo,Solid A imprensa musical britâniSenders,quelançouumúnicotra- ca não vive uma euforia desse balho em 1977, pela poderosa Vir- tipo desde a despedida de gin, a mesma dos Pistols. No ano Ziggy Stardust.