Estimulação magnética transcraniana na depressão Resumo Abstract

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Estimulação magnética transcraniana na depressão Resumo Abstract
Estimulação magnética transcraniana na depressão
Moacyr Alexandro Rosa1
Marco Antônio Marcolin1
Saxby Pridmore2
1
2
Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas da Universidade de São Paulo, São Paulo, Brasil.
Director, Department of Psychological Medicine, Royal Hobart Hospital – University of Tasmania, Hobart, Australia.
Endereço para correspondência:
Moacyr Alexandro Rosa
Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas da FMUSP – Serviço de Tratamento Biológico – ECT
Rua Dr. Ovídio Pires de Campos, s/n – São Paulo, SP – CEP 05403-010
Telefax: (0xx11) 3069-6525
E-mail: [email protected]
Resumo
A estimulação magnética transcraniana (TMS) é uma nova tecnologia que promete ser um tratamento
para transtornos psiquiátricos. Ela foi aplicada de uma forma experimental em uma vasta gama de
condições. A evidência atual sugere um efeito antidepressivo importante. Neste artigo são revistos e
comentados os principais estudos nos quais foi utilizada a TMS para depressão. Um grande número de
estudos em animais e estudos clínicos introdutórios sugere que a TMS de repetição com alta freqüência
(FF-rTMS) tem uma ação antidepressiva. Houve oito estudos cegos controlados com simulação. Dois
destes estudos não mostraram evidência de efeito antidepressivo. Em um deles, poucos pulsos podem
ter sido fornecidos, de tal forma que o estímulo ativo eventualmente foi inadequado. Em outro, a
estimulação simulada possivelmente foi ativa. Todos os outros seis estudos demonstraram uma ação
antidepressiva para o tratamento ativo. Houve duas comparações cegas entre FF-rTMS e
eletroconvulsoterapia (ECT). Em uma delas, a FF-rTMS demonstrou ter um efeito antidepressivo
próximo ao da ECT. Em outra, apesar de ser o resultado derivado de uma subanálise, a FFrTMS teve
um efeito antidepressivo igual àquele da ECT, para depressão maior não-delirante.
Unitermos: Estimulação magnética transcraniana; Depressão; Tratamento.
Abstract
Transcranial magnetic stimulation (TMS) is a new technology which holds promise as a treatment of
psychiatric disorders. It has been applied on an experimental basis in range conditions. Current
evidence reveals an important antidepressant effect. This paper reviews and comments the main
publications where TMS was used for depression. A large number of animal studies and introductory
clinical studies suggests that fast frequency repetitive TMS (FF-rTMS) has an antidepressant action.
There have been eight blind sham controlled studies. In one too few pulses may have been provided,
such that the active stimulus may have been inadequate. In another, the sham may have been active.
All of the remaining six studies showed a significant antidepressant action for the active treatment.
There have been two blind
comparisons of FF-rTMS and electroconvulsive therapy (ECT). In one, FF-rTMS was shown to have an
antidepressant effect approaching that of ECT. In the other, in non-delusional major depression,
although a sub analysis result, FFrTMS had an antidepressant effect the same at that of ECT.
Keywords: Transcranial magnetic stimulation; Depression; Treatment.
As bases da estimulação magnética
O eletromagnetismo, que consiste na produção de campos magnéticos através da movimentação de
cargas elétricas, é um fenômeno familiar conhecido por todos por meio da física do colégio. A sua
contrapartida, a indução de correntes elétricas através da variação de campos magnéticos, é somente
um pouco menos familiar. Estes princípios são o ponto central da estimu-lação magnética transcraniana
(TMS, em inglês: trans-cranial magnetic stimulation), uma nova e promissora técnica para o
tratamento de transtornos psiquiátricos.
Campos magnéticos alternados são facilmente produzidos através de uma corrente elétrica variável,
sendo a bobina primária de um transformador um bom exemplo. A corrente primária na bobina induz
uma corrente secundária no meio que atinge. Esta corrente secundária é paralela, mas oposta à
primária. O grau de indução vai depender da taxa de alternância do campo e das propriedades elétricas
do meio secundário. Os campos magnéticos passam facilmente através de isoladores como, por
exemplo, os ossos, de tal forma que a corrente induzida dentro do crânio por um eletromagneto pode
ser restringida a uma pequena área. Esta possibilidade contrasta com a estimulação global induzida
pela eletroconvulsoterapia (ECT), que possui efeitos colaterais que surgem principalmente pela
dificuldade de induzir uma corrente dentro do crânio através de eletrodos cutâneos. A técnica da
indução de pequenas correntes corticais utilizando um eletromagneto de pulso é chamada de TMS.
A TMS é implementada passando-se uma corrente elétrica variável no tempo através de uma bobina
mantida em contato com a cabeça. O campo magnético resultante passa através do crânio e induz uma
pequena corrente secundária no córtex, que pode despolarizar os neurônios corticais (dependendo da
força da corrente induzida) (Barker et al., 1985). A forma da bobina determina as características do
campo magnético, que influencia a distribuição da corrente secundária. Uma corrente cortical
amplamente distribuída é produzida por uma bobina plana; um foco mais localizado pode ser
conseguido com uma bobina em forma de oito (Cohen et al., 1990). A estimulação utilizando os
equipamentos atualmente disponíveis causa uma despolarização entre 19 e 23 mm abaixo da face da
bobina, na junção da matéria branca com a matéria cinzenta do cérebro (Epstein et al., 1990).
Além da proximidade da bobina e do tipo de tecido envolvido, a corrente secundária depende da taxa
de alternância da corrente primária, que é limitada pelos componentes utilizados em um dado
estimulador. O tempo requerido para acumular uma carga suficiente limitava a taxa dos primeiros
aparelhos a menos de 1 Hz. Os aparelhos mais recentes de estimulação magnética de repetição com
alta freqüência (rTMS, em inglês: repetitive TMS) têm sistemas de suprimento com maior poder que
permitem freqüências de até 50 Hz, produzindo diferenças qualitativas nos efeitos que podem ser
obtidos.
Quando a estimulação é aplicada com freqüência de 1 Hz ou mais lenta, o termo baixa freqüência (SFrTMS, em inglês: slow frequency rTMS) pode ser aplicado. Acima de 1 Hz, o termo alta freqüência (FFrTMS, em inglês: fast frequency rTMS) tem sido utilizado (Menkes et al., 1999).
Estimulação com FF-rTMS aumenta a atividade do tecido cortical (Pascual-Leone et al., 1994a),
enquanto LF-rTMS diminui a atividade cortical (Chen et al., 1997). Assim, a TMS pode ser capaz de
permitir estimulação de diferentes partes do córtex e talvez até do cerebelo, com efeitos tanto
facilitatórios como inibitórios. Existe a possibilidade de, no futuro, adequar os tratamentos psiquiátricos
de acordo com os resultados dos estudos de imagem.
A determinação da carga apropriada para estimular um indivíduo é um pouco arbitrária até o presente.
O nível de referência geralmente empregado é o limiar motor (LM, em inglês: motor threshold – MT).
Uma bobina é colocada sobre o córtex motor e são aplicados estímulos em porcentagens crescentes da
carga do aparelho, até que um movimento contralateral dos dedos ou do polegar seja detectado
(Pridmore et al., 1998). A bobina é movida para encontrar a posição na qual a menor carga possível de
estímulo produza movimento: a menor carga do aparelho que produz movimento é denominada limiar
motor. Estimulações subseqüentes podem ser feitas em outros locais, tais como o córtex pré-frontal
dorsolateral, em alguma proporção do LM, em geral na faixa de 80%-110% do LM. O quanto o limiar
do córtex em outros locais corresponde ao limiar do córtex motor está ainda por ser determinado.
Além da freqüência (medida em Hertz), da carga (medida em porcentagem do limiar motor) e da
localização anatômica do estímulo, outros parâmetros são importantes e variam de estudo para estudo.
Esses parâmetros incluem o número de estímulos na mesma sessão, a duração de cada estímulo e os
intervalos entre os eles. Também são variáveis o número total de dias de tratamento (em geral, os
estudos utilizam 10 a 20 dias).
Perspectivas celulares nos transtornos mentais e nos tratamentos
Os transtornos mentais são cada vez mais des-critos em termos de disfunções nos níveis celular ou
molecular (Hyman e Nestler, 1993); os tratamentos oca-sionam alterações na estrutura, na fisiologia e
no com-portamento, a longo prazo, dos neurônios. Tradicio-nal-mente, os psiquiatras utilizaram
técnicas incluindo psicoterapia, medicações, fototerapia e ECT, com a finalidade de alterar
indiretamente os padrões de expressão genética (Hyman e Nestler, 1996) para alcançar este fim. A
rTMS oferece um novo caminho para influenciar de forma não-invasiva a atividade de regiões corticais,
o que pode torná-la clinicamente útil. A habilidade da TMS de modificar a expressão genética em
tecidos neuronais (Ji et al., 1998) e tecidos da glia (Fujiki et al., 1997) foi demonstrada em roedores.
Comparação com ECT
Alguns pontos de comparação com a eletroconvul-soterapia (ECT) merecem menção. A ECT tem uma
imagem negativa diante do público, induz convulsões e pode estar associada com dificuldades
mnêmicas temporárias, rigidez muscular e cefaléias. Além disso, necessita de anestesia, pessoal para
recuperação e espaço físico. Essas características derivam do fato de o crânio ser altamente resistente
à passagem da eletricidade (Lorimer et al., 1949). Por este motivo, a carga não pode ser
acuradamente focalizada através de eletrodos colocados externamente (Hayes, 1950). Acredita-se que,
para que a ECT produza um efeito antidepressivo, seja necessária uma convulsão generalizada
(Ottosson, 1960). Contudo, uma outra possibilidade é que a convul-são tenha que acompanhar uma
ECT efetiva porque a estimulação suficiente de estruturas cerebrais críticas requer altas doses de
eletricidade, que se tornam difusas e fazem com que uma convulsão generalizada seja inevitável
(George e Wassermann, 1994).
As correntes elétricas resultantes da TMS podem ser localizadas. Um alfinete colocado em uma mesa
de madeira pode ser movido com precisão por um magneto segurado sob a mesa. Isto mostra que os
campos mag-né-ticos passam diretamente através de materiais não-con-dutores de eletricidade e que
eles são mais fortes no espaço imediatamente adjacente ao magneto. Estas características permitem
que pequenas correntes secun-dárias possam ser aplicadas com precisão no córtex. Assim, o
eletromagnetismo permite um salto através do crânio. (Uma bobina em forma de oito, que se com-põe
de duas bobinas circulares separadas, colocadas lado a lado, aumenta ainda mais a habilidade de
localizar o estímulo; ao redor do ponto onde as bobinas se juntam, a força do campo magnético é
duplicada).
Efeitos adversos
Nos primeiros anos de pesquisa com TMS havia muita preocupação a respeito dos potenciais efeitos
adversos. Counter et al. (1990) relataram uma alteração permanente do limiar de audição em animais
devido ao artefato acústico da descarga da bobina do aparelho Cadwell MES-10. Contudo, PascualLeone et al. (1992) não encontraram tais déficits em seres humanos. Matsumiya et al. (1992)
relataram alterações microva-cuolares na região cortical em metade dos 24 animais expostos a mais de
100 estímulos de alta intensidade. Todavia, Gates et al. (1992) não encontraram lesões orgânicas em
nível microscópico no tecido cerebral de dois indivíduos que receberam mais de 2.000 estímulos antes
da lobectomia ântero-temporal para epilepsia, e as alterações descritas no estudo de animais são
atual-mente consideradas artefatos.
Menos de um terço das pessoas tratadas com TMS ou rTMS desenvolve cefaléia transitória, que usualmente não requer tratamento. Um analgésico comum é suficiente para a maioria. A questão mais
preocupante tem sido se a rTMS vai resultar em uma convulsão. Em um encontro internacional em
1996, foram dados detalhes de sete convulsões que pensava-se terem sido induzidas pela TMS ou
rTMS (Wassermann, 1998). Naquele encontro foi promulgado um guia de parâ-metros de tratamento.
Não houve relatos de convulsões nos anos subseqüentes.
Contudo, ainda é cedo para saber acuradamente todos os possíveis efeitos colaterais e os limites de
uma exposição segura. Efeitos cognitivos, por exemplo, foram observados, e alterações a longo prazo
na função cerebral são teoricamente possíveis (Wasserman, 2000).
Aplicação clínica
A TMS tem sido amplamente utilizada como uma ferramenta de investigação na neurofisiologia clínica.
Também é utilizada como uma sonda para exploração da fisiologia e psicologia normais. Para uma
revisão da utilização da TMS no estudo da função cerebral normal, ver Cracco et al. (1999); e para
uma revisão da TMS na modulação da aprendizagem e memória, ver Grafman e Wassermann (1999).
Estudos iniciais sugeriram que a TMS poderia ter um lugar no tratamento de uma gama de condições,
incluindo a doença de Parkinson (Pascual-Leone et al., 1994b; Mallory e Stone, 1998), câimbra do
escrivão (Siebner et al., 1999) e a epilepsia (Tergau et al., 1999).
Também há estudos sugerindo que a TMS possa ter um lugar no tratamento de vários transtornos psiquiátricos, incluindo transtorno obsessivo-compul-sivo (Greenberg et al., 1997), transtorno do estresse
pós-traumático (McCann et al., 1998) e mania (Grisaru et al., 1998). Contudo, é ainda muito cedo para
que se possa tirar conclusões sobre o uso da TMS no manejo desses transtornos.
TMS na depressão
Estudos em animais
Uma vasta gama de estudos em animais, relevantes para o tratamento da depressão, tem sido
realizada. Fleischmann et al.(1995) compararam os efeitos da TMS e do choque eletroconvulsivo (em
inglês: electroconvul-sive shock – ECS) em modelos animais de depressão em camundongos, incluindo
o teste de natação de Porsolt. Este teste mede a flutuação e o comportamento ativo de ratos colocados
em uma piscina. A redução da imobilidade sugere efeito desinibitório e atividade do tipo antidepressiva
(Bruhwyler et al., 1995). Eles encontra-ram que a TMS e o ECS tinham efeitos similares. Outros
estudos em roedores produziram efeitos similares nas monoaminas cerebrais, em receptores betaadrenérgicos e no AMP cíclico. A TMS também mostrou-se capaz de influenciar os receptores de
serotonina e N-metil-D-aspartato (NMDA). Para revisões, ver Belmaker e Grisaru (1998) e Lisanby e
Belmaker (2000).
Recentemente, um grupo alemão (Post et al., 1999) demonstrou que a TMS mediava um efeito
neuroprotetor contra a morte neuronal oxidativa em camundongos. Eles demonstraram que a TMS
aumen-tava o fator neurotrófico derivado do cérebro e o RNA mensageiro (Muller et al., 2000). Mais
recen-temente, eles demons-traram que a TMS produzia mu-danças comportamentais e
neuroendócrinas em uma linhagem de camundongos cultivada para compor-ta-mento alta-mente
relacionado com ansiedade, que são compa-ráveis àquelas induzidas pelo tratamento com drogas
antidepressivas (Keck et al., 2001). Assim, os estudos com animais indicam que a TMS tem a
capacidade de influenciar o comporta-mento e a bio-química, incluindo a regulação da expressão
genética, de uma forma similar àquela do ECS e de medicações antidepressivas.
Estudos clínicos preliminares
A TMS atrasa o início do sono REM em sujeitos normais (Cohrs et al., 1998); isto é encorajador, pois a
redução da latência do sono REM é um dos mais robustos marcadores da depressão. A TMS aumenta
significativamente o fluxo sangüíneo cerebral regional (rCBF, em inglês: regional cerebral blood flow)
do giro cingulado anterior esquerdo em indivíduos deprimidos, quando a bobina é colocada sobre o
córtex pré-frontal (Zheng, 2000); isto também é encorajador, pois o rCBF reduzido no cingulado e nas
estruturas límbicas asso-ciadas é uma característica da depressão.
A TMS em intensidades maiores que o limiar motor elevou o hormônio estimulante da tiróide (TSH) em
homens saudáveis em um ensaio controlado com placebo (Cohrs et al., 2001). Isto é importante, pois
o TSH é elevado pela privação do sono que, por sua vez, tem um efeito antidepressivo. Mais
recentemente, em um estudo controlado com placebo em pacientes com depressão maior, uma única
sessão de TMS produziu aumento significativo de TSH e melhora do humor (Szuba et al., 2001).
Evidência de uma ação antidepressiva para FF-rTMS vem de um número considerável de estudos
abertos (Figiel et al., 1998; Lyndon, 2001). Houve relatos de casos de excelentes melhoras de
indivíduos (Avery et al., 1999). Existe a possibilidade de que a TMS possa induzir mania (Dolberg et al.,
2001). A habilidade da TMS de normalizar os resultados alterados do teste de supressão da
dexametasona, uma medida objetiva de remissão clínica, foi demonstrada (Pridmore, 1999). Em outro
estudo, as aplicações de TMS foram subs-ti-tuídas por aplicações de ECT, sem perda dos efeitos
antidepressivos (Pridmore, 2000).
Em uma pesquisa sobre a experiência e as atitudes de 48 pacientes que receberam FF-rTMS para
depres-são maior, tanto como uma opção de tratamento quanto como um assunto de estudo, 63%
acreditavam que a TMS tinha sido útil, 87% estariam dispostos a reco-mendá-la para um membro da
família, e 90% afirmavam que a TMS era preferível, quando comparada a possibi-lidade de tratamento
com ECT (Walter et al., 2001).
Estudos cegos controlados com simulação
Estudos duplo-cegos, controlados, com alocação aleatória são o principal modo de se comprovar a
eficácia de um tratamento em psiquiatria. George et al. (1995) relataram o primeiro uso de FF-rTMS no
tratamento da depressão em seres humanos. Este foi um estudo aberto não-controlado. Contudo, foi
um artigo considerado ponto de referência e estabeleceu algumas características metodológicas. Uma
bobina em forma de oito foi uti-lizada. Quase todos os estudos subseqüentes de FF-rTMS utilizaram
este tipo de bobina. Eles aplicaram o estímulo no córtex pré-frontal esquerdo. Isto foi baseado em três
observações: 1) que a FF-rTMS aumenta a exci-tabilidade dos neurônios; 2) que a depressão maior
está freqüentemente associada com uma diminuição da atividade do córtex pré-frontal esquerdo; e 3)
estudos-piloto não publicados indicavam que esta localização fornecia os melhores resultados. É
provável que no futuro a freqüência e o lugar da estimulação utilizados no tratamento da depressão
sejam ajustados para cada indivíduo, com base nos estudos de imagem. Até o pre-sente, todos os
estudos de FF-rTMS utilizaram a esti-mulação pré-frontal esquerda. Eles trataram pacientes refratários
às medicações; isto também se tornou uma característica de todos os estudos subseqüentes com FFrTMS. Eles estimularam o córtex pré-frontal com uma intensidade de estímulo de 80% do LM por cinco
dias. Estudos subseqüentes variaram a intensidade e o número de dias de tratamento. George et al.
(1995) trataram seis pacientes e os escores de depressão para o grupo melhoraram
"significativamente", segundo os autores (média de decréscimo de 23,8 para 17,5 na escala de
depressão de Hamilton). Dois pacientes apre-sentaram uma melhora que chamaram de "robusta", dois
apresentaram uma melhora "leve" e dois não apre-sentaram nenhuma melhora. Estes resultados são
enco-rajadores. Argumenta-se que este foi um estudo aberto e estas podem ter sido respostasplacebo; contudo, deve-se registrar que estes pacientes sofriam de de-pressão refratária à medicação,
que são relativamente pouco prováveis de exibir uma resposta-placebo.
Pascual-Leone et al.(1996) publicaram o primeiro estudo cego com placebo de FF-rTMS em depressão.
Este foi um estudo crossover. A estimulação foi feita com 90% do LM. Dezessete pacientes receberam
esti-mulação ativa ou simulada sobre o córtex pré-frontal esquerdo e o direito. Todos os pacientes
receberam cada condição experimental por uma semana, seguida por três semanas de observação, de
tal forma que cada paciente per-manecia no estudo por cinco meses. A FF-rTMS ativa sobre o córtex
pré-frontal esquerdo (mas nenhuma outra condição de tratamento) resultou em uma redução significativa nos escores de depressão (45% na escala de Hamilton). Onze pacientes apre-sentaram
melhora pro-nun-ciada, mas isto se desfez ao longo de duas se-manas.
George et al.(1997) conduziram um estudo duplo-cego crossover. Doze pacientes deprimidos
receberam FF-rTMS ativa e simulada a 80% do LM por duas semanas. Comparado com o tratamento
simulado, o ativo melhorou significativamente os escores de depres-são. Contudo, em nível individual,
o tratamento ativo levou à redução de 25% ou mais nos escores de depres-são em apenas cinco
pacientes. Estes resultados indicam que a FF-rTMS poderia reduzir os sintomas da depres-são, mas
levanta dúvidas sobre a sua utilidade clínica.
Padberg et al. (1999) conduziram uma compa-ração cega de SF-rTMS, FF-rTMS e estimulação simulada em 18 pacientes deprimidos que foram divi-didos em três grupos. Eles utilizaram 90% do LM e
250 estímulos por dia, por cinco dias. Não houve diferença significativa nos efeitos da FF-rTMS e
simulada. Con-tudo, este estudo tem uma limitação metodológica. O número de estímulos em cada
sessão (250) foi apenas 25% e 32% do estímulo diário fornecido pelos estudos prévios (Pascual-Leone
et al., 1996; George et al., 1997) e tão pouco quanto 12,5% das estimulações diárias de alguns
estudos subse-qüen-tes (George et al., 2000). Em resumo, não foi fornecida estimulação adequada e
concordante com outros es-tudos.
Loo et al. (1999) compararam a FF-rTMS e estimulação simulada em dois grupos de nove pacientes
sofrendo de depressão. Ambos os grupos melhoraram significativamente (decréscimo de 23% nos
escores), mas não houve diferença significativa entre eles. Assim, a FF-rTMS não foi mais eficaz que a
estimulação si-mulada. A melhora nos pacientes com estimulação simulada foi surpreendente, dado
que todos sofriam de depressão refratária às medicações e tais condições não costumam responder ao
placebo. Recentemente, Lisanby et al. (2001), utilizando pulsos simples e eletrodos colocados no
córtex pré-frontal de macacos Rhesus, demonstraram que a simulação utilizada por Loo et al. cria uma
voltagem ao redor dos locais de contato com 76% da estimulação ativa. Isto pode ter sido maior no
estudo de Loo et al., pois a estimulação foi aplicada a 20 Hz, e o somatório da resposta neuronal à FFrTMS foi demonstrado (Pascual-Leone et al., 1994b). Loo et al. utilizaram 110% do LM e George et al.
(1997) demons-traram um efeito antidepressivo com 80% do LM. Assim, a simulação utilizada por Loo
et al. pode ter sido ativa, o que poderia explicar porque os seus pacientes refratários às medicações
tratados com estimulação "simulada" melhoraram.
Berman et al. (2000) relataram uma comparação de FF-rTMS ativa e simulada em dois grupos de dez
pacientes. Estes pacientes haviam falhado em responder a uma média de quatro ensaios
medicamentosos e estavam sem medicação durante o estudo. A estimulação foi com 80% do LM, e dez
sessões de tratamento eram fornecidas. O decréscimo nos escores de depressão foi significativamente
maior para o tratamento ativo comparado com a estimulação simulada. Quatro pacientes recebendo
FF-rTMS e nenhum do grupo simulado obtiveram reduções clinicamente úteis. Os autores descrevem
esses resultados como "clinicamente modestos" (redução de 34% nos escores). Contudo, deve-se
lembrar que estes pacientes tinham falhado em responder a vários antidepressivos, e a resposta em
qua-tro de dez pacientes não é algo que possa ser des-prezado.
Eschweiler et al. (2000) relataram um estudo cego, abrangente, do efeito da FF-rTMS e estimulação
simu-lada no humor e na função hemodinâmica em doze pacientes com depressão maior que estavam
tomando medicações antidepressivas. Eles encontraram que a FF-rTMS resultava em redução
significativa nos escores de depressão. Além disso, eles definiram a resposta como uma redução de
30% nos escores de depressão e, utilizando este critério, cinco de 12 pacientes rece-bendo FF-rTMS,
mas apenas um de dez recebendo a esti-mulação simulada, atingiram este estado.
George et al. (2000) relataram um estudo contro-lado com placebo, duplo-cego, de FF-rTMS a 100%
do LM. O tratamento ativo foi a 5 Hz para a metade e 20 Hz para a outra metade do grupo, mas ambos
serão considerados juntos. A resposta foi definida como uma redução de 50% nos escores de
depressão. A FF-rTMS resultou em um número significativamente maior de respondedores (9/20) que a
estimulação simulada (0/10). Considerando a mudança nas médias dos grupos, com-parado com o
grupo simulado, o tratamento ativo resultou em uma redução significativamente maior no Inventário
de Depressão de Beck e na Escala de Hamilton para Ansiedade, mas não na Escala de Depressão de
Hamilton.
Garcia-Toro et al. (2001) relataram um ensaio de FF-rTMS e estimulação simulada em 40 pacientes
sofrendo de depressão refratária às medicações. A estimulação era com 90% do LM, aplicada em 10
dias. A FF-rTMS induziu uma diminuição significa-tivamente maior nos escores das escalas de
depressão que a estimulação simulada. Cinco daqueles rece-bendo FF-rTMS, mas apenas um dos que
rece-beram estimulação simulada, apresentaram uma diminuição de 50% nos escores de depressão.
Em uma conti-nuação aberta, nove pacientes que tinham recebido, mas falharam em responder à FFrTMS, aceitaram receber mais 10 sessões com 110% do LM, e três deles atingiram uma diminuição de
50% nos escores de depressão.
Estes estudos estão sumarizados na tabela 1. Houve oito estudos cegos controlados com simulação.
Seis estudos, envolvendo 131 pacientes, mostraram que a FF-rTMS tem uma ação antidepressiva. Um
estudo não demonstrou ação antidepressiva para a FF-rTMS e para a estimulação simulada, mas
utilizou um número de estímulos muito pequeno e, por isso, deve ser des-contado. O estudo final
mostrou uma ação antidepressiva tanto para a FF-rTMS ativa como para a estimulação simulada. A
estimulação simulada utilizada neste estudo pode ter sido ativa. Assim, todos os estudos com metodologia adequada, controlados com estimula-ção simu-lada, até o momento, indicam uma ação antidepressiva para a FF-rTMS.
Comparações cegas com ECT
Houve três comparações entre FF-rTMS e ECT. Grunhaus et al. (2000), em um estudo aberto, dividiram
randomicamente 40 pacientes em dois grupos e trataram um com ECT unilateral e o outro com FFrTMS a 90% do LM por até 20 sessões de tratamento. No geral, os pacientes responderam
significativamente melhor à ECT. Contudo, quando os pacientes foram divididos em grupos de acordo
com a presença ou ausência de psi-cose, aqueles com psicose (19 pacientes) respon-deram
significativamente melhor à ECT, mas aqueles sem psicose (21 paciente) responderam igualmente à
FF-rTMS.
Pridmore et al. (2000) relataram um estudo cego de 32 pacientes divididos randomicamente para
receber FF-rTMS ou ECT unilateral. A FF-rTMS era a 100% do LM e foi continuada enquanto houvesse
melhora. Aqueles que atingiram remissão receberam, em média, 13,1 (DP = 3,1) tratamentos. Três
medidas de depressão foram utilizadas e, no geral, a ECT demonstrou uma vantagem significativa.
Contudo, o número que atingiu a remissão (escores < 8 na Escala de Depressão de Hamilton) foi o
mesmo (11 de 16 pacientes). A média de melhora na Escala favoreceu a ECT, mas não foi
significativamente diferente da FF-rTMS.
Grunhaus et al. (em estudo submetido para publi-cação) rela-tam uma comparação cega entre FF-rTMS
e ECT no tratamento de depressão maior não-delirante. A FF-rTMS foi aplicada a 90% do LM e continuada por 20 sessões. A resposta foi definida como uma diminuição de 50% nos escores de depressão,
e a remissão foi definida como um escore < 10 na Escala de Depressão de Hamilton. A taxa de
resposta não foi signi-ficativamente di-ferente (12 para ECT; 11 para FF-rTMS) e a taxa de re-missão
foi a mesma (6 para ambos os grupos).
Estes estudos cegos estão sumarizados na tabela 2. Em um estudo cego, a FF-rTMS demonstrou ter um
efeito antidepressivo que se aproximou do efeito da ECT. Em outro estudo, em depressão maior nãodelirante, a FF-rTMS teve um efeito antidepressivo igual àquele da ECT. Setenta e dois pacientes
estavam envolvidos nestes estudos.
Conclusão
Até o momento, os estudos sugerem um efeito antidepressivo da FF-rTMS. Contudo, muitas questões
ficam ainda por responder.
Devido ao fato de não ter sido comprovada a efi-cácia da TMS em quadros depressivos psicóticos,
pare-ce pouco provável que possa substituir, ao menos total-mente, a ECT.
Por outro lado, os parâmetros mais eficazes ainda estão pouco definidos e são necessários ainda
muitos estudos para que haja um consenso a respeito disso. A evidência sugere que doses mais altas
(intensidade do estímulo e número de estímulos por dia) e um maior número de sessões de tratamento
deveriam ser inves-tigados.
Dentro do arsenal terapêutico moderno, a TMS pode vir a ser uma opção para pacientes que não
supor-tem os efeitos colaterais das medicações antidepressivas, em regime de monoterapia ou em
associação.
Outra questão que ainda não foi resolvida diz respeito à continuação e à manutenção do tratamento.
Não existem trabalhos demonstrando a eficácia a longo prazo, nem a respeito da taxa de recaída após
a resposta à TMS.
Resolver essas questões e maximizar o efeito desta técnica é uma tarefa para o futuro.

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