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Indice
Prefácio à edição brasileira
9
Prefácio à última edição norte-americana (1990)
11
Prefácio
13
1 A história da alta crítica
15
CANON D YSON H AGUE, M. A.,
2 A autoria do pentateuco
23
“A AUTORIA MOSAICA DO PENTATEUCO”
PROF. GEORGE F. WRIGHT, D.D., LL. D.
“TRÊS PECULIARIDADES DO PENTATEUCO INCOMPATÍVEIS COM AS TEORIAS
DE GRAF -WELLHAUSEN REFERENTES À COMPOSIÇÃO DESSE LIVRO”
A NDREW C. ROBINSON, M.A.
3 A Bíblia e a crítica moderna
31
DAVID HEAGLE, D.D.
4 As sagradas escrituras e as negações modernas
37
PROF. JAMES ORR, D.D.
5 Crítica ao antigo testamento
e ao cristianismo do novo testamento.
49
PROF. W. H. GRIFFITH THOMAS D.D.
6 O testemunho de Cristo ao Antigo Testamento
63
WILLIAM CAVEN, D.D., LL.D.
7 A evidência interna do quarto evangelho.
73
CANON G. OSBORNE TROOP, M.A.
8 As primeiras narrativas de Gênesis
81
PROF. JAMES ORR, D.D.
9 Um Isaías
89
PROF. GEORGE L. ROBINSON, D.D.
10 O livro de Daniel
97
PROF. JOSEPH D. WILSON, D.D.
11 O valor doutrinal dos primeiros capítulos de Gênesis
105
R EV. D YSON H AGUE, M.A.
12 O testemunho arqueológico para as escrituras
121
“O TESTEMUNHO DOS MONUMENTOS PARA A VERDADE DAS ESCRITURAS”
PROF. GEORGE F. WRIGHT, D.D., LL.D.
“O TESTEMUNHO RECENTE DA ARQUEOLOGIA PARA AS ESCRITURAS”
M. G. KYLE, D.D., LL.D.
13 Ciência e fé cristã
129
PROF. JAMES ORR, D.D.
14 A inspiração da Bíblia —defi nição, extensão e prova
141
R EV. JAMES M. GRAY, D.D.
15 Inspiração
165
L. W. MUNHALL , M. A., D.D.
16 A glória moral de Jesus Cristo, uma prova da inspiração
177
R EV. WM. G. MOOREHEAD, D.D.
17 O testamento da escritura em relação a si mesma.
191
R EV. GEORGE S. BISHOP, D.D.
18 O testemunho da unidade orgânica da Bíblia à sua inspiração199
A RTHUR T. PIERSON, D.D.
19 A profecia cumprida, um forte argumento para a Bíblia
209
A RNO C. GAEBELEIN, D.D.
20 Vida na palavra
217
PHILIP M AURO
21 Existe um Deus?
241
R EV. THOMAS WHITELAW, M.A., D.D.
22 Deus em Cristo, a única revelação da paternidade de Deus 251
ROBERT E. SPEER
23 A divindade de Cristo
263
PROF. BENJAMIM B. WARFIELD, D.D., LL.D
24 O nascimento virginal de Cristo
271
PROF. JAMES ORR, D.D.
25 O Deus-Homem
281
JOHN STOCK
26 A certeza e a importância da ressurreição
corporal de Jesus Cristo dentre os mortos
297
R EV. R. A. TORREY, D.D.
27 A personalidade e a divindade do Espírito Santo
313
R EV. R. A. TORREY, D.D.
28 O Espírito Santo e os filhos de Deus
319
R EV. W. J. ERDMAN, D.D.
29 O cristianismo não é fábula
327
R EV. THOMAS WHITELAW, M.A., D.D.
6
30 A concepção bíblica de pecado
R EV. THOMAS WHITELAW M.A., D.D.
31 O testemunho de Paulo quanto à doutrina do pecado
PROF. CHARLES B. WILLIAMS, B.D., PH.D.
32 Pecado e julgamento futuro
SIR ROBERT A NDERSON, K.C.B., LL.D.
33 O que Cristo ensina sobre retribuição futura
R EV. WILLIAM. C. PROCTER, F.PH.
34 A expiação
PROF. F RANKLIN JOHNSON, D.D., LL.D.
35 Expiação por meio da propiciação
D YSON H AGUE, M.A.
36 A graça de Deus
C. I. SCOFIELD, D.D.
37 Salvação pela graça
R EV. THOMAS SPURGEON
38 A natureza da regeneração
THOMAS BOSTON (1676-1732)
39 Regeneração, conversão, transformação
R EV. GEORGE W. L ASHER, D.D., LL.D.
40 Justificação pela fé
H. C. G. MOULE, D.D.
41 As doutrinas que devem ser enfatizadas
no evangelismo bem sucedido
L. W. MUNHALL , M.A., D.D.
42 Prega a palavra
HOWARD CROSBY
43 Evangelismo pastoral e pessoal,
ou ganhar homens para Cristo um a um
R EV. JOHN TIMOTHY STONE, D.D.
44 O verdadeiro evangelismo da escola dominical
CHARLES GALLAUDET TRUMBUL
45 O lugar da oração no evangelismo
R EV. R. A. TORREY, D.D.
46 Missões estrangeiras ou evangelismo mundial
ROBERT E. SPEER
47 Quais motivos missionários devem prevalecer?
R EV. HENRY W. F ROST
48 Consagração(Êxodo 28.40-43)
R EV. HENRY W. F ROST
339
349
361
369
377
387
399
409
425
431
439
449
459
467
477
487
495
513
521
7
49 O romanismo é cristianismo?
T. W. MEDHURST
50 Roma, a antagonista da nação
R EV. J. M. FOSTER
51 A Igreja verdadeira
JOHN C. R YLE, D.D.
52 Os propósitos da encarnação
R EV. G. CAMPBELL MORGAN, D.D.
53 A filosofia moderna
PHILIP M AURO
54 O conhecimento de Deus
R EV. DAVID JAMES BURRELL , D.D., LL.D.
55 A ciência da conversão
R EV. H. M. SYDENSTRICKER, PH.D.,
56 O transcurso da evolução
PROF. GEORGE F. WRIGHT, D.D., L.L.D.
57 O valor apologético das epístolas de Paulo
R EV. E. J. STOBO, JR., B.A., S.T.D.
58 A eficácia divina da oração
A RTHUR T. PIERSON, D.D.
59 O ensino de nosso Senhor a respeito do dinheiro
A RTHUR T. PIERSON, D.D.
60 “As escrituras”
R EV. A. C. DIXON, D.D.
61 O que a Bíblia possui para o crente
R EV. GEORGE F. PENTECOST, D.D.
62 A esperança da igreja
R EV. JOHN MCNICHOL , BA., B.D.
63 A vinda de Cristo
PROF. CHARLES R. ERDMAN, D.D.
64 O testemunho da experiência cristã
PRES. E. Y. MULLINS, D.D., LL.D.
Índice remissivo
Notas
531
543
553
559
575
591
601
611
625
633
649
657
665
677
689
699
705
710
9
Prefácio
à edição brasileira
s Fundamentos é uma famosa coletânea teológica de perfil
apologético que foi originalmente publicada nos EUA, em
1909. A obra resume em grande parte o perfil teológico
evangelical norte-americano do final do século dezenove e começo
do século vinte. A validade de tal obra no contexto brasileiro contemporâneo pode ser detectada por meio de diversos enfoques.
Em primeiro lugar, a obra traz nomes de grande expressão do
mundo evangélico de fala inglesa. Estudiosos destacados como B.
B. Warfield, James Orr, Charles Erdman, G. Campbell Morgan,
James M. Gray, A. T. Pierson, Philip Mauro, C. I. Scofield, C. G.
Moule. Tal empreendimento acentuará nosso frutífero diálogo com
a história do pensamento evangélico, mormente quando compreendemos que nossas raízes evangelicais devem muito à contribuição
de missionários da outra América que, sob severas dificuldades e
fatores limitantes, vieram ao Brasil para proclamar o evangelho.
Outro fator que valoriza em muito esta obra é o fato de que seu
editor e idealizador foi um homem extraordinário. Além de possuir
vasta erudição, garimpada tanto nos EUA como na Alemanha, R.
A. Torrey ficou conhecido por sua paixão evangelística e por sua
espiritualidade. Com maestria combinou intelectualidade e vida de
oração. Um dos seus principais temas foi avivamento espiritual. Em
nossa terra, acostumada aos dualismos pós-platônicos, marcada
pela polarização entre razão e espiritualidade, o exemplo de R. A.
Torrey tem muito a ensinar.
O
Por outro lado, não tenho dúvidas de que alguns círculos
teológicos duvidarão do valor de uma obra como os Fundamentos,
principalmente por aquilo que pode ser chamado de seu perfil
apologético. A verdade é que o cenário iluminista europeu trouxe
uma difícil relação entre “o mundo científico” e o “mundo da fé”. Tal
relação mostrou-se problemática e dolorida no contexto teológico
e religioso protestante, particularmente quando enfoques acentuadamente racionalistas do texto bíblico surgiram iluminados pelo
alvorecer do “Aufklärung” europeu. A obra de Torrey representa
uma reação a tal vertente, procurando de todas as formas, destacar
a confiabilidade, a razoabilidade e a afirmação das Escrituras. Naturalmente, toda empreitada apaixonada costuma exceder certos
limites e corre até mesmo o risco de uma polarização completa. É
bem provável que muitas críticas ao cenário teológico evangelical
norte-americano do primeiro quarto do século XX, para o qual esta
obra contribuiu, mereçam ser ouvidas e consideradas com bom
senso. Apesar destes fatores, há grande vantagem de ter esta obra
em português, no Brasil, hoje. Primeiro, porque os tempos são
outros. A própria história da filosofia nos mostrará que a maneira
de interagir com uma obra assim tão definida hoje acabará sendo
muito distinta da do cenário americano de cem anos atrás. O amadurecimento histórico e teológico permitirá um grande proveito de
quem souber utilizá-la. Além disso, a terra do “deixa disso”, da tolerância e do “futebol-arte”, possui suficiente “jogo de cintura” e sabe
processar com eficiência máxima tudo que lhe parece edificante
e construtivo a partir de qualquer cenário teológico, diminuindo
exponencialmente um possível coeficiente de atrito nada desejável.
Aqueles que facilmente polarizam e radicalizam certas questões de
certo carecem de suficiente brasilidade.
Que o respeito pela Palavra de Deus, e o equilíbrio entre razão
e espiritualidade de R. A. Torrey e a fértil terra cada vez mais de
“Nosso Senhor” permitam que esta obra seja uma bênção para
todos que dela utilizarem.
LUIZ SAYÃO
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11
Prefácio
à última edição norte-americana
(1990)
E
m 1909, Deus levou dois Cristãos leigos, Lyman e Milton
Stewart, a comprometerem-se com os gastos da publicação
de uma série de doze volumes que deveriam apresentar os
fundamentos da fé cristã. Como tinham o desejo de combater as
incursões do liberalismo, esses volumes foram enviados gratuitamente a ministros do evangelho, missionários, supervisores da
escola dominical e a outros que se empenhavam em obras cristãs
de campo por intermédio do mundo de fala inglesa. A supervisão
da seleção dos artigos a ser incluídos em Os Fundamentos foi
entregue a um comitê de homens, conhecidos por ser dignos de
confiança quanto à fé. A liderança desse comitê incluía homens
resolutos como A. C. Dixon e R. A. Torrey.
Mais tarde, em 1917, sob o patrocínio do Bible Institute of Los
Angeles (hoje Biola University), foi publicada uma edição em quatro volumes que incluía apenas alguns dos artigos originais.
Para celebrar o Ano de Jubileu, em 1958, o Bible Institute, em
cooperação com a Kregel Publications, patrocinou a emissão de
uma nova edição de Os Fundamentos. Sob a supervisão geral do
Dr. Charles L. Feinberg, um comitê de professores do Talbot Theological Seminary selecionou os artigos mais relevantes teológica e
culturalmente do original de Os Fundamentos e os atualizou cuidadosamente para o leitor contemporâneo. Essa coleção foi publicada
como Os Fundamentos para Hoje e foram feitas diversas tiragens.
A Kregel Publications, reconhecendo a enorme importância que
esta coleção clássica das verdades bíblicas fundamentais tem hoje,
tanto quanto quando foi publicada pela primeira vez, põe agora à
disposição esta nova edição em um único volume, como a de 1958,
para a qual o Dr. Warren W. Wiersbe graciosamente providenciou
Introduções Biográficas e um proveitoso Prefácio.
Esta é a oração de todos os envolvidos: que o Autor da Verdade
que auxiliou nestes Fundamentos — o próprio Senhor Deus — possa, mediante estes escritos, vir a abençoar e edificar Seu povo em
toda parte.
OS EDITORES
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13
Prefácio
O
s doze volumes compreendendo Os Fundamentos, editado
por A. C. Dixon, que foi posteriormente assistido por Louis
Meyer e R. A. Torrey, foram publicados de 1910 a 1915 e
enviados gratuitamente a pastores, missionários e a outros obreiros cristãos. Financiados pela riqueza dos magnatas do petróleo
da Califórnia, os irmãos Lyman e Milton Stewart, três milhões de
volumes foram distribuídos no mundo de fala inglesa.
Naquele momento da história, o Fundamentalismo tornava-se
uma força que contava, graças a pregadores efetivos, com conferências bíblicas populares e com publicações que ensinavam “os
fundamentos”, assim como também expunham a crescente apostasia daqueles dias. A Scofield Reference Bible foi publicada em 1909
e tornou-se o texto padrão para os estudiosos da Bíblia da escola
dispensacional. Era um tempo de mudanças e desafios.
De 25 de maio a 1o de junho de 1919, seis mil pessoas se encontraram na Filadélfia para “A Conferência Mundial sobre os Fundamentos Cristãos”. W. H. Griffith Thomas presidiu o Comitê das
Resoluções e entre os quinze oradores de melhor conhecimento do
programa estavam W. B. Riley, R. A. Torrey, Lewis Sperry Chafer,
James M. Gray e William L. Pettingill. Estavam ali presentes
delegados de quarenta e dois estados dos EUA e da maioria das
províncias canadenses, como também de mais sete países.
W. B. Riley disse em seu primeiro discurso: “O futuro olhará de
volta para a Conferência Mundial sobre os Fundamentos Cristãos...
como um evento mais histórico do que a fi xação, em Wütenberg,
das noventa e cinco teses de Martinho Lutero. Chegou a hora do
surgimento de um novo Protestantismo”.
Nestes dias de comunhões fragmentadas e doutrinas diluídas,
a igreja deve descobrir novamente a ampla base que os “Pais
Fundamentalistas” construíram e da qual eles ministraram.
Nossa moderna sociedade pluralista faz com que seja fácil para
nós ser tão tolerantes, que quase deixamos de ter convicções, ou
tão intolerantes, que pensamos que nosso grupo particular é o
único guardião da verdade. É bom ter Os Fundamentos novamente
impresso, e acredito que a nova geração de estudiosos da Bíblia se
identificará com esta plêiade de grandes líderes e aprenderá com
eles os elementos fundamentais da doutrina e da prática.
WARREN W. WIERSBE
14
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1
A história da alta crítica
CANON D YSON H AGUE, M. A.,
Diretor da Memorial Church, Londres e Ontário. Prof.
de Liturgia e Eclesiologia no Wycliffe College, Toronto,
Canadá
Original em inglês revisado por Charles L. Feinberg, Th.D., Ph. D.
O que significa a expressão “Alta Crítica”? De imediato, deve-se
dizer que a palavra “alta” é um termo acadêmico, utilizado em um
sentido puramente particular e técnico. É utilizado em contraste
à “Baixa Crítica”. A alta crítica não significa nada mais do que
o estudo da estrutura literária dos vários livros que compõem a
Bíblia. Tal estudo é indispensável para se averiguar o autor, data,
circunstâncias e propósito de um escrito.
Porque a alta crítica
é identificada com a descrença?
É preciso dizer que existe uma alta crítica que é reverente no
tom e erudita na obra. Contudo, a pesquisa da alta crítica nem
CANON DYSON HAGUE (1857- 1935) foi ordenado em 1883 após
estudar artes e teologia na Universidade de Toronto. Serviu como
coadjutor na Catedral de St. James, também em Toronto, e como
diretor da Catedral de St. Paul, em Brockville, Ontário, e na de St.
Paul, em Halifax, Nova Escócia. De 1897 a 1901, Hague lecionou
apologética, liturgia e homilética no Wycliffe College, em Toronto. Seus
escritos incluem vários livros sobre liturgia anglicana.
Os fundamentos
sempre foi realizada com um espírito reverente, nem respeitando o
espírito científico e a erudição cristã. Em primeiro lugar, os líderes
desse movimento baseiam suas teorias amplamente em suas
próprias conclusões. Eles fundamentaram suas conclusões, em
grande escala, sobre uma base bastante dúbia, a do estilo do autor
e suas supostas qualificações literárias. O estilo não é uma base
segura para a determinação de uma obra literária. Não é possível
garantir que um homem, por ser perito em filologia, seja capaz de
compreender a integridade ou credibilidade de uma passagem
qualquer das Escrituras, assim como não é possível assegurar
que tenha compreendido a beleza ou o espírito dela melhor do que
outras pessoas. A qualificação para a percepção da verdade Bíblica
é a compreensão espiritual.
Em segundo lugar, as teorias da alta crítica estão nas mãos daqueles
que extrapolam no domínio das conjecturas. Foi Newton quem alertou
que nenhuma consideração, seja ela qual for, deveria ser dada às meras
conjecturas ou hipóteses de pensadores. Em terceiro lugar, aqueles que
dominam o movimento são homens que possuem uma forte tendência
a negar o sobrenatural. Alguns dos homens que se destacaram no
movimento da alta crítica são homens que não possuem nenhuma fé
tanto no Deus da Bíblia, como na necessidade ou na possibilidade de
uma revelação sobrenatural pessoal. Não é nossa posição afirmar que
todos os críticos foram ou são super antinaturalistas, mas as figuras dominantes o foram e o são. É triste, mas a alta crítica se identifica com um
sistema de crítica que está baseado sobre hipóteses e suposições que
têm por seu objeto o repúdio à teoria tradicional, assim como, aparentemente, tem investigado as origens, formas, estilos e conteúdos não para
confirmar a autenticidade, credibilidade e a dignidade das Escrituras,
mas para, na maioria dos casos, desacreditar sua autenticidade, para
descobrir discrepâncias e lançar dúvidas sobre sua autoridade.
A origem do movimento
Quem eram os homens cujas perspectivas moldaram o
pensamento dos principais escritores da escola da alta crítica de
hoje? Neste desenvolvimento podemos discernir três estágios:
(1) O franco-holandês; (2) o alemão; e (3) o anglo-americano.
As perspectivas que hoje são aceitas como axiomáticas parecem
ter sido primeiramente sugeridas por Carlstadt em 1521. Pode-se
dizer com certeza que a alta crítica teve sua origem com Spinoza,
16
A história da alta crítica
o filósofo racionalista holandês. Em 1670 ele, de forma ousada,
revelou e impugnou as datas tradicionais e a autoria Mosaica do
Pentateuco, atribuindo o mesmo a Esdras ou a algum outro compilador posterior. Em 1753, o físico francês, Jean Astruc, segundo
opinião geral, um livre pensador de caráter libertino, expôs pela
primeira vez a hipótese divisora dos elementos Javistas e Eloístas,
dando assim início a uma nova era. Ele reivindicava que o uso dos
dois nomes, Iavé e Elohim, mostravam que o livro de Gênesis fora
composto por diferentes documentos. Astruc pode ser chamado o
pai das teorias documentais. Ele afi rmava haver vestígios de pelo
menos dez ou doze pequenas biografias no livro de Gênesis. Ele
negou a autoridade divina desse livro, pois o considerava um livro
desfigurado pelas repetições sem utilidade, pela desordem e pela
contradição.
Eichhorn publicou em 1780 sua obra, uma introdução sobre
o Antigo Testamento. Ele desenvolveu a teoria documental de
Astruc, foi seguido por Vater e, posteriormente, por Hartmann.
Por fi m, eles fi zeram do Pentateuco um amontoado de fragmentos
reunidos por um editor ou redator. Em 1806, De Wette propôs
o ponto de vista de que o livro de Deuteronômio fora escrito na
época de Josias (2Rs 22.8). Não demorou muito para Vatke declarar, sem ressalvas, a origem pós-Mosaica e pós-profética dos
primeiros quatro livros da Bíblia. Os estudiosos subseqüentes
foram Bleek, Ewald, Hupfeld, Graf, Kuenen e Wellhausen, com
seus respectivos pontos de vista sobre a autoria não-mosaica do
Pentateuco.
Após o estágio alemão da crítica veio o anglo-americano.
Davidson, Robertson Smith, G. A. Smith, Driver e Briggs seguiram
o caminho traçado pelos escritores racionalistas alemães. A lista,
incontestavelmente, é bastante parcial, mas esses são os nomes
proeminentes em relação ao movimento.
Os pontos de vista da crítica
Com certeza, três coisas podem ser afirmadas sobre quase todos os líderes, se não todos eles: eles negam a validade do milagre
e qualquer narrativa miraculosa; os milagres foram considerados
legendários ou míticos; negaram, portanto, a realidade da profecia.
A profecia foi chamada de conjectura ou coincidência, quando não
de embuste. Eles negaram a realidade da revelação; manifestaram-se
17
Os fundamentos
descrentes no sobrenatural. A religião do Antigo Testamento é,
para eles, apenas uma religião humana. As forças formadoras do
movimento da alta crítica, portanto, eram forças racionalistas. A
descrença antecedeu a crítica, não foi conseqüência dela.
O ponto crucial
De acordo com a fé da Igreja universal, o Pentateuco é uma
composição consistente, coerente, autêntica e genuína, inspirada
por Deus, e escrita por Moisés uns quatorze séculos antes de
Cristo. Além disso, é uma parte da Bíblia de suma importância,
pois é tanto o substrato básico de toda revelação de Deus como a
seção introdutória do Palavra de Deus, que sustenta Sua autoridade
e a qual foi concedida mediante inspiração por intermédio de Seu
servo Moisés. Esta é a fé da Igreja.
A teoria da crítica
De acordo com os críticos, o Pentateuco consiste de quatro
documentos completamente diferentes. São eles (1) o Javista,
(2) o Eloísta, (3) o Deuteronomista, e (4) os documentos do Código
Sacerdotal, em geral designados como J, E, D e S. Essas diferentes
obras foram compostas em vários períodos históricos, que se estendem do nono ao quinto séculos. Tais documentos representam
diferentes tradições dos Hebreus e variações em relação às questões mais importantes. Esses documentos, com certeza, não foram
compilados e escritos por Moisés. No processo editorial, aparentemente, nenhum limite foi atribuído à obra dos redatores. Os críticos
dessa linha de pensamento concluem que os documentos contêm
três tipos de material: a probabilidade verdadeira, a certeza dúbia e
a definitivamente espúria.
O antigo testamento desacreditado
Não é apenas o Pentateuco que é desacreditado, mas o restante
do Antigo Testamento também é tratado de modo similar. Os
Salmos não são da época de Davi, mas da época dos Macabeus.
Isaías foi escrito por um sem número de autores. Daniel foi apenas
um pseudônimo da obra, escrita no segundo século a. C., no tempo
de Antíoco Epifânio.
18
A história da alta crítica
A Bíblia desacreditada
Não pode haver dúvida de que Cristo e Seus apóstolos aceitaram
na íntegra o Antigo Testamento, como um texto totalmente inspirado do primeiro capítulo do Gênesis ao último capítulo de Malaquias.
Tudo era implicitamente crido como a Palavra do próprio Deus. E,
desde aqueles dias, o ponto de vista da Igreja cristã universal é o
de que a Bíblia é a Palavra de Deus. A Bíblia, segundo os críticos,
não pode mais ser vista desse ângulo. Não é mais a Palavra, no
velho sentido desse termo. Ela apenas contém a Palavra de Deus, e,
em muitas de suas partes, ela é tão incerta quanto qualquer outro
livro humano. Não é nem mesmo história digna de confiança. Seus
relatos da história comum estão cheios de falsificações e erros
crassos.
Uma teoria revolucionária
A alta crítica tem estado nas mãos de homens que repudiam
a crença em Deus e em Jesus Cristo, portanto, essa teoria é, na
verdade, uma teoria revolucionária. É uma teoria de inspiração que
procura desbaratar as idéias aceitas da Bíblia e seu inquestionável
padrão de autoridade e verdade. Pois o que quer que esse assim
chamado elemento divino seja, parece ser inteiramente consistente
com o argumento imperfeito, com a interpretação incorreta ou
aquilo que o homem mediano chamaria falsificação ou fraude.
Para aceitá-la, o cristão terá que reajustar completamente suas
idéias acerca de honra e honestidade, de falsidade e representação
errônea. Os homens costumavam pensar que a falsificação era um
crime e a fraude um pecado. Eles costumavam pensar que o descuido afetaria a confiabilidade e que inconsistências comprovadas
colocariam em risco a credibilidade. Hoje, no entanto, parece que
tudo isso pode existir e, mesmo assim, uma constatação maravilhosa, a fé não será destruída, mas colocada sobre um fundamento
mais firme.
Se não Moisés, quem?
Se Moisés não escreveu os livros de Moisés, quem o fez? Se
houve três, quatro, seis ou nove escritores autorizados, porque não
quatorze, dezesseis ou dezenove? E o que dizer do número indeterminado de redatores? De onde veio a autoridade deles? Moisés, nós
19
Os fundamentos
conhecemos; Samuel; nós conhecemos; Daniel, nós conhecemos;
mas vós anônimos e pseudônimos, quem sois? O Pentateuco com
autoria mosaica, como Escritura divinamente creditada, é sustentado pela tradição e erudição e satisfaz à razão. No entanto, um livro
recortado de compilações anônimas, cujos redatores e redações
são pré e pós-exílio, significa uma enorme confusão.
Nenhuma autoridade final
Um outro sério resultado da alta crítica consiste em ameaçar o
sistema de doutrina cristão e toda produção de teologia sistemática.
Antes de mais nada, qualquer texto de qualquer parte da Bíblia
era aceito como um texto-prova para o estabelecimento de alguma
verdade do ensino cristão, e uma declaração da Bíblia punha fi m
às controvérsias. Mas agora os críticos pensam ter mudado tudo
isso. Eles proclamam que a ciência da crítica despojou a ciência da
teologia sistemática.
Obscurantistas não
Há, portanto, duas questões com as quais o estudioso da Bíblia
deve se defrontar. A primeira é: acaso não seria a recusa do sistema
da alta crítica uma simples oposição à luz e ao progresso, uma
posição de alarmistas ignorantes e obscurantistas? O desejo de
receber toda luz que a busca mais destemida pela verdade que
a erudição puder alcançar é o desejo de todo aquele que crê na
Bíblia. Nenhuma mente cristã realmente saudável pode advogar o
obscurantismo. No entanto, é dever de todo cristão testar todas as
coisas e reter o que for bom. O leitor mais comum da Bíblia conhece o suficiente para saber que a investigação do Livro, que afi rma
ser sobrenatural, quando realizada por homens que são inimigos
declarados do sobrenatural e, indiscutivelmente, têm espírito irreverente, sabendo-se que os estudos desses assuntos que só podem
ser compreendidos pelos homens de coração contrito e humilde,
deve ser recebida com cautela.
O argumento da erudição
A segunda questão também é séria: não somos impelidos a
aceitar esses pontos de vista quando propostos não apenas por
racionalistas, mas por cristãos; e não por cristãos comuns, mas
20

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