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Indice Prefácio à edição brasileira 9 Prefácio à última edição norte-americana (1990) 11 Prefácio 13 1 A história da alta crítica 15 CANON D YSON H AGUE, M. A., 2 A autoria do pentateuco 23 “A AUTORIA MOSAICA DO PENTATEUCO” PROF. GEORGE F. WRIGHT, D.D., LL. D. “TRÊS PECULIARIDADES DO PENTATEUCO INCOMPATÍVEIS COM AS TEORIAS DE GRAF -WELLHAUSEN REFERENTES À COMPOSIÇÃO DESSE LIVRO” A NDREW C. ROBINSON, M.A. 3 A Bíblia e a crítica moderna 31 DAVID HEAGLE, D.D. 4 As sagradas escrituras e as negações modernas 37 PROF. JAMES ORR, D.D. 5 Crítica ao antigo testamento e ao cristianismo do novo testamento. 49 PROF. W. H. GRIFFITH THOMAS D.D. 6 O testemunho de Cristo ao Antigo Testamento 63 WILLIAM CAVEN, D.D., LL.D. 7 A evidência interna do quarto evangelho. 73 CANON G. OSBORNE TROOP, M.A. 8 As primeiras narrativas de Gênesis 81 PROF. JAMES ORR, D.D. 9 Um Isaías 89 PROF. GEORGE L. ROBINSON, D.D. 10 O livro de Daniel 97 PROF. JOSEPH D. WILSON, D.D. 11 O valor doutrinal dos primeiros capítulos de Gênesis 105 R EV. D YSON H AGUE, M.A. 12 O testemunho arqueológico para as escrituras 121 “O TESTEMUNHO DOS MONUMENTOS PARA A VERDADE DAS ESCRITURAS” PROF. GEORGE F. WRIGHT, D.D., LL.D. “O TESTEMUNHO RECENTE DA ARQUEOLOGIA PARA AS ESCRITURAS” M. G. KYLE, D.D., LL.D. 13 Ciência e fé cristã 129 PROF. JAMES ORR, D.D. 14 A inspiração da Bíblia —defi nição, extensão e prova 141 R EV. JAMES M. GRAY, D.D. 15 Inspiração 165 L. W. MUNHALL , M. A., D.D. 16 A glória moral de Jesus Cristo, uma prova da inspiração 177 R EV. WM. G. MOOREHEAD, D.D. 17 O testamento da escritura em relação a si mesma. 191 R EV. GEORGE S. BISHOP, D.D. 18 O testemunho da unidade orgânica da Bíblia à sua inspiração199 A RTHUR T. PIERSON, D.D. 19 A profecia cumprida, um forte argumento para a Bíblia 209 A RNO C. GAEBELEIN, D.D. 20 Vida na palavra 217 PHILIP M AURO 21 Existe um Deus? 241 R EV. THOMAS WHITELAW, M.A., D.D. 22 Deus em Cristo, a única revelação da paternidade de Deus 251 ROBERT E. SPEER 23 A divindade de Cristo 263 PROF. BENJAMIM B. WARFIELD, D.D., LL.D 24 O nascimento virginal de Cristo 271 PROF. JAMES ORR, D.D. 25 O Deus-Homem 281 JOHN STOCK 26 A certeza e a importância da ressurreição corporal de Jesus Cristo dentre os mortos 297 R EV. R. A. TORREY, D.D. 27 A personalidade e a divindade do Espírito Santo 313 R EV. R. A. TORREY, D.D. 28 O Espírito Santo e os filhos de Deus 319 R EV. W. J. ERDMAN, D.D. 29 O cristianismo não é fábula 327 R EV. THOMAS WHITELAW, M.A., D.D. 6 30 A concepção bíblica de pecado R EV. THOMAS WHITELAW M.A., D.D. 31 O testemunho de Paulo quanto à doutrina do pecado PROF. CHARLES B. WILLIAMS, B.D., PH.D. 32 Pecado e julgamento futuro SIR ROBERT A NDERSON, K.C.B., LL.D. 33 O que Cristo ensina sobre retribuição futura R EV. WILLIAM. C. PROCTER, F.PH. 34 A expiação PROF. F RANKLIN JOHNSON, D.D., LL.D. 35 Expiação por meio da propiciação D YSON H AGUE, M.A. 36 A graça de Deus C. I. SCOFIELD, D.D. 37 Salvação pela graça R EV. THOMAS SPURGEON 38 A natureza da regeneração THOMAS BOSTON (1676-1732) 39 Regeneração, conversão, transformação R EV. GEORGE W. L ASHER, D.D., LL.D. 40 Justificação pela fé H. C. G. MOULE, D.D. 41 As doutrinas que devem ser enfatizadas no evangelismo bem sucedido L. W. MUNHALL , M.A., D.D. 42 Prega a palavra HOWARD CROSBY 43 Evangelismo pastoral e pessoal, ou ganhar homens para Cristo um a um R EV. JOHN TIMOTHY STONE, D.D. 44 O verdadeiro evangelismo da escola dominical CHARLES GALLAUDET TRUMBUL 45 O lugar da oração no evangelismo R EV. R. A. TORREY, D.D. 46 Missões estrangeiras ou evangelismo mundial ROBERT E. SPEER 47 Quais motivos missionários devem prevalecer? R EV. HENRY W. F ROST 48 Consagração(Êxodo 28.40-43) R EV. HENRY W. F ROST 339 349 361 369 377 387 399 409 425 431 439 449 459 467 477 487 495 513 521 7 49 O romanismo é cristianismo? T. W. MEDHURST 50 Roma, a antagonista da nação R EV. J. M. FOSTER 51 A Igreja verdadeira JOHN C. R YLE, D.D. 52 Os propósitos da encarnação R EV. G. CAMPBELL MORGAN, D.D. 53 A filosofia moderna PHILIP M AURO 54 O conhecimento de Deus R EV. DAVID JAMES BURRELL , D.D., LL.D. 55 A ciência da conversão R EV. H. M. SYDENSTRICKER, PH.D., 56 O transcurso da evolução PROF. GEORGE F. WRIGHT, D.D., L.L.D. 57 O valor apologético das epístolas de Paulo R EV. E. J. STOBO, JR., B.A., S.T.D. 58 A eficácia divina da oração A RTHUR T. PIERSON, D.D. 59 O ensino de nosso Senhor a respeito do dinheiro A RTHUR T. PIERSON, D.D. 60 “As escrituras” R EV. A. C. DIXON, D.D. 61 O que a Bíblia possui para o crente R EV. GEORGE F. PENTECOST, D.D. 62 A esperança da igreja R EV. JOHN MCNICHOL , BA., B.D. 63 A vinda de Cristo PROF. CHARLES R. ERDMAN, D.D. 64 O testemunho da experiência cristã PRES. E. Y. MULLINS, D.D., LL.D. Índice remissivo Notas 531 543 553 559 575 591 601 611 625 633 649 657 665 677 689 699 705 710 9 Prefácio à edição brasileira s Fundamentos é uma famosa coletânea teológica de perfil apologético que foi originalmente publicada nos EUA, em 1909. A obra resume em grande parte o perfil teológico evangelical norte-americano do final do século dezenove e começo do século vinte. A validade de tal obra no contexto brasileiro contemporâneo pode ser detectada por meio de diversos enfoques. Em primeiro lugar, a obra traz nomes de grande expressão do mundo evangélico de fala inglesa. Estudiosos destacados como B. B. Warfield, James Orr, Charles Erdman, G. Campbell Morgan, James M. Gray, A. T. Pierson, Philip Mauro, C. I. Scofield, C. G. Moule. Tal empreendimento acentuará nosso frutífero diálogo com a história do pensamento evangélico, mormente quando compreendemos que nossas raízes evangelicais devem muito à contribuição de missionários da outra América que, sob severas dificuldades e fatores limitantes, vieram ao Brasil para proclamar o evangelho. Outro fator que valoriza em muito esta obra é o fato de que seu editor e idealizador foi um homem extraordinário. Além de possuir vasta erudição, garimpada tanto nos EUA como na Alemanha, R. A. Torrey ficou conhecido por sua paixão evangelística e por sua espiritualidade. Com maestria combinou intelectualidade e vida de oração. Um dos seus principais temas foi avivamento espiritual. Em nossa terra, acostumada aos dualismos pós-platônicos, marcada pela polarização entre razão e espiritualidade, o exemplo de R. A. Torrey tem muito a ensinar. O Por outro lado, não tenho dúvidas de que alguns círculos teológicos duvidarão do valor de uma obra como os Fundamentos, principalmente por aquilo que pode ser chamado de seu perfil apologético. A verdade é que o cenário iluminista europeu trouxe uma difícil relação entre “o mundo científico” e o “mundo da fé”. Tal relação mostrou-se problemática e dolorida no contexto teológico e religioso protestante, particularmente quando enfoques acentuadamente racionalistas do texto bíblico surgiram iluminados pelo alvorecer do “Aufklärung” europeu. A obra de Torrey representa uma reação a tal vertente, procurando de todas as formas, destacar a confiabilidade, a razoabilidade e a afirmação das Escrituras. Naturalmente, toda empreitada apaixonada costuma exceder certos limites e corre até mesmo o risco de uma polarização completa. É bem provável que muitas críticas ao cenário teológico evangelical norte-americano do primeiro quarto do século XX, para o qual esta obra contribuiu, mereçam ser ouvidas e consideradas com bom senso. Apesar destes fatores, há grande vantagem de ter esta obra em português, no Brasil, hoje. Primeiro, porque os tempos são outros. A própria história da filosofia nos mostrará que a maneira de interagir com uma obra assim tão definida hoje acabará sendo muito distinta da do cenário americano de cem anos atrás. O amadurecimento histórico e teológico permitirá um grande proveito de quem souber utilizá-la. Além disso, a terra do “deixa disso”, da tolerância e do “futebol-arte”, possui suficiente “jogo de cintura” e sabe processar com eficiência máxima tudo que lhe parece edificante e construtivo a partir de qualquer cenário teológico, diminuindo exponencialmente um possível coeficiente de atrito nada desejável. Aqueles que facilmente polarizam e radicalizam certas questões de certo carecem de suficiente brasilidade. Que o respeito pela Palavra de Deus, e o equilíbrio entre razão e espiritualidade de R. A. Torrey e a fértil terra cada vez mais de “Nosso Senhor” permitam que esta obra seja uma bênção para todos que dela utilizarem. LUIZ SAYÃO 10 11 Prefácio à última edição norte-americana (1990) E m 1909, Deus levou dois Cristãos leigos, Lyman e Milton Stewart, a comprometerem-se com os gastos da publicação de uma série de doze volumes que deveriam apresentar os fundamentos da fé cristã. Como tinham o desejo de combater as incursões do liberalismo, esses volumes foram enviados gratuitamente a ministros do evangelho, missionários, supervisores da escola dominical e a outros que se empenhavam em obras cristãs de campo por intermédio do mundo de fala inglesa. A supervisão da seleção dos artigos a ser incluídos em Os Fundamentos foi entregue a um comitê de homens, conhecidos por ser dignos de confiança quanto à fé. A liderança desse comitê incluía homens resolutos como A. C. Dixon e R. A. Torrey. Mais tarde, em 1917, sob o patrocínio do Bible Institute of Los Angeles (hoje Biola University), foi publicada uma edição em quatro volumes que incluía apenas alguns dos artigos originais. Para celebrar o Ano de Jubileu, em 1958, o Bible Institute, em cooperação com a Kregel Publications, patrocinou a emissão de uma nova edição de Os Fundamentos. Sob a supervisão geral do Dr. Charles L. Feinberg, um comitê de professores do Talbot Theological Seminary selecionou os artigos mais relevantes teológica e culturalmente do original de Os Fundamentos e os atualizou cuidadosamente para o leitor contemporâneo. Essa coleção foi publicada como Os Fundamentos para Hoje e foram feitas diversas tiragens. A Kregel Publications, reconhecendo a enorme importância que esta coleção clássica das verdades bíblicas fundamentais tem hoje, tanto quanto quando foi publicada pela primeira vez, põe agora à disposição esta nova edição em um único volume, como a de 1958, para a qual o Dr. Warren W. Wiersbe graciosamente providenciou Introduções Biográficas e um proveitoso Prefácio. Esta é a oração de todos os envolvidos: que o Autor da Verdade que auxiliou nestes Fundamentos — o próprio Senhor Deus — possa, mediante estes escritos, vir a abençoar e edificar Seu povo em toda parte. OS EDITORES 12 13 Prefácio O s doze volumes compreendendo Os Fundamentos, editado por A. C. Dixon, que foi posteriormente assistido por Louis Meyer e R. A. Torrey, foram publicados de 1910 a 1915 e enviados gratuitamente a pastores, missionários e a outros obreiros cristãos. Financiados pela riqueza dos magnatas do petróleo da Califórnia, os irmãos Lyman e Milton Stewart, três milhões de volumes foram distribuídos no mundo de fala inglesa. Naquele momento da história, o Fundamentalismo tornava-se uma força que contava, graças a pregadores efetivos, com conferências bíblicas populares e com publicações que ensinavam “os fundamentos”, assim como também expunham a crescente apostasia daqueles dias. A Scofield Reference Bible foi publicada em 1909 e tornou-se o texto padrão para os estudiosos da Bíblia da escola dispensacional. Era um tempo de mudanças e desafios. De 25 de maio a 1o de junho de 1919, seis mil pessoas se encontraram na Filadélfia para “A Conferência Mundial sobre os Fundamentos Cristãos”. W. H. Griffith Thomas presidiu o Comitê das Resoluções e entre os quinze oradores de melhor conhecimento do programa estavam W. B. Riley, R. A. Torrey, Lewis Sperry Chafer, James M. Gray e William L. Pettingill. Estavam ali presentes delegados de quarenta e dois estados dos EUA e da maioria das províncias canadenses, como também de mais sete países. W. B. Riley disse em seu primeiro discurso: “O futuro olhará de volta para a Conferência Mundial sobre os Fundamentos Cristãos... como um evento mais histórico do que a fi xação, em Wütenberg, das noventa e cinco teses de Martinho Lutero. Chegou a hora do surgimento de um novo Protestantismo”. Nestes dias de comunhões fragmentadas e doutrinas diluídas, a igreja deve descobrir novamente a ampla base que os “Pais Fundamentalistas” construíram e da qual eles ministraram. Nossa moderna sociedade pluralista faz com que seja fácil para nós ser tão tolerantes, que quase deixamos de ter convicções, ou tão intolerantes, que pensamos que nosso grupo particular é o único guardião da verdade. É bom ter Os Fundamentos novamente impresso, e acredito que a nova geração de estudiosos da Bíblia se identificará com esta plêiade de grandes líderes e aprenderá com eles os elementos fundamentais da doutrina e da prática. WARREN W. WIERSBE 14 15 1 A história da alta crítica CANON D YSON H AGUE, M. A., Diretor da Memorial Church, Londres e Ontário. Prof. de Liturgia e Eclesiologia no Wycliffe College, Toronto, Canadá Original em inglês revisado por Charles L. Feinberg, Th.D., Ph. D. O que significa a expressão “Alta Crítica”? De imediato, deve-se dizer que a palavra “alta” é um termo acadêmico, utilizado em um sentido puramente particular e técnico. É utilizado em contraste à “Baixa Crítica”. A alta crítica não significa nada mais do que o estudo da estrutura literária dos vários livros que compõem a Bíblia. Tal estudo é indispensável para se averiguar o autor, data, circunstâncias e propósito de um escrito. Porque a alta crítica é identificada com a descrença? É preciso dizer que existe uma alta crítica que é reverente no tom e erudita na obra. Contudo, a pesquisa da alta crítica nem CANON DYSON HAGUE (1857- 1935) foi ordenado em 1883 após estudar artes e teologia na Universidade de Toronto. Serviu como coadjutor na Catedral de St. James, também em Toronto, e como diretor da Catedral de St. Paul, em Brockville, Ontário, e na de St. Paul, em Halifax, Nova Escócia. De 1897 a 1901, Hague lecionou apologética, liturgia e homilética no Wycliffe College, em Toronto. Seus escritos incluem vários livros sobre liturgia anglicana. Os fundamentos sempre foi realizada com um espírito reverente, nem respeitando o espírito científico e a erudição cristã. Em primeiro lugar, os líderes desse movimento baseiam suas teorias amplamente em suas próprias conclusões. Eles fundamentaram suas conclusões, em grande escala, sobre uma base bastante dúbia, a do estilo do autor e suas supostas qualificações literárias. O estilo não é uma base segura para a determinação de uma obra literária. Não é possível garantir que um homem, por ser perito em filologia, seja capaz de compreender a integridade ou credibilidade de uma passagem qualquer das Escrituras, assim como não é possível assegurar que tenha compreendido a beleza ou o espírito dela melhor do que outras pessoas. A qualificação para a percepção da verdade Bíblica é a compreensão espiritual. Em segundo lugar, as teorias da alta crítica estão nas mãos daqueles que extrapolam no domínio das conjecturas. Foi Newton quem alertou que nenhuma consideração, seja ela qual for, deveria ser dada às meras conjecturas ou hipóteses de pensadores. Em terceiro lugar, aqueles que dominam o movimento são homens que possuem uma forte tendência a negar o sobrenatural. Alguns dos homens que se destacaram no movimento da alta crítica são homens que não possuem nenhuma fé tanto no Deus da Bíblia, como na necessidade ou na possibilidade de uma revelação sobrenatural pessoal. Não é nossa posição afirmar que todos os críticos foram ou são super antinaturalistas, mas as figuras dominantes o foram e o são. É triste, mas a alta crítica se identifica com um sistema de crítica que está baseado sobre hipóteses e suposições que têm por seu objeto o repúdio à teoria tradicional, assim como, aparentemente, tem investigado as origens, formas, estilos e conteúdos não para confirmar a autenticidade, credibilidade e a dignidade das Escrituras, mas para, na maioria dos casos, desacreditar sua autenticidade, para descobrir discrepâncias e lançar dúvidas sobre sua autoridade. A origem do movimento Quem eram os homens cujas perspectivas moldaram o pensamento dos principais escritores da escola da alta crítica de hoje? Neste desenvolvimento podemos discernir três estágios: (1) O franco-holandês; (2) o alemão; e (3) o anglo-americano. As perspectivas que hoje são aceitas como axiomáticas parecem ter sido primeiramente sugeridas por Carlstadt em 1521. Pode-se dizer com certeza que a alta crítica teve sua origem com Spinoza, 16 A história da alta crítica o filósofo racionalista holandês. Em 1670 ele, de forma ousada, revelou e impugnou as datas tradicionais e a autoria Mosaica do Pentateuco, atribuindo o mesmo a Esdras ou a algum outro compilador posterior. Em 1753, o físico francês, Jean Astruc, segundo opinião geral, um livre pensador de caráter libertino, expôs pela primeira vez a hipótese divisora dos elementos Javistas e Eloístas, dando assim início a uma nova era. Ele reivindicava que o uso dos dois nomes, Iavé e Elohim, mostravam que o livro de Gênesis fora composto por diferentes documentos. Astruc pode ser chamado o pai das teorias documentais. Ele afi rmava haver vestígios de pelo menos dez ou doze pequenas biografias no livro de Gênesis. Ele negou a autoridade divina desse livro, pois o considerava um livro desfigurado pelas repetições sem utilidade, pela desordem e pela contradição. Eichhorn publicou em 1780 sua obra, uma introdução sobre o Antigo Testamento. Ele desenvolveu a teoria documental de Astruc, foi seguido por Vater e, posteriormente, por Hartmann. Por fi m, eles fi zeram do Pentateuco um amontoado de fragmentos reunidos por um editor ou redator. Em 1806, De Wette propôs o ponto de vista de que o livro de Deuteronômio fora escrito na época de Josias (2Rs 22.8). Não demorou muito para Vatke declarar, sem ressalvas, a origem pós-Mosaica e pós-profética dos primeiros quatro livros da Bíblia. Os estudiosos subseqüentes foram Bleek, Ewald, Hupfeld, Graf, Kuenen e Wellhausen, com seus respectivos pontos de vista sobre a autoria não-mosaica do Pentateuco. Após o estágio alemão da crítica veio o anglo-americano. Davidson, Robertson Smith, G. A. Smith, Driver e Briggs seguiram o caminho traçado pelos escritores racionalistas alemães. A lista, incontestavelmente, é bastante parcial, mas esses são os nomes proeminentes em relação ao movimento. Os pontos de vista da crítica Com certeza, três coisas podem ser afirmadas sobre quase todos os líderes, se não todos eles: eles negam a validade do milagre e qualquer narrativa miraculosa; os milagres foram considerados legendários ou míticos; negaram, portanto, a realidade da profecia. A profecia foi chamada de conjectura ou coincidência, quando não de embuste. Eles negaram a realidade da revelação; manifestaram-se 17 Os fundamentos descrentes no sobrenatural. A religião do Antigo Testamento é, para eles, apenas uma religião humana. As forças formadoras do movimento da alta crítica, portanto, eram forças racionalistas. A descrença antecedeu a crítica, não foi conseqüência dela. O ponto crucial De acordo com a fé da Igreja universal, o Pentateuco é uma composição consistente, coerente, autêntica e genuína, inspirada por Deus, e escrita por Moisés uns quatorze séculos antes de Cristo. Além disso, é uma parte da Bíblia de suma importância, pois é tanto o substrato básico de toda revelação de Deus como a seção introdutória do Palavra de Deus, que sustenta Sua autoridade e a qual foi concedida mediante inspiração por intermédio de Seu servo Moisés. Esta é a fé da Igreja. A teoria da crítica De acordo com os críticos, o Pentateuco consiste de quatro documentos completamente diferentes. São eles (1) o Javista, (2) o Eloísta, (3) o Deuteronomista, e (4) os documentos do Código Sacerdotal, em geral designados como J, E, D e S. Essas diferentes obras foram compostas em vários períodos históricos, que se estendem do nono ao quinto séculos. Tais documentos representam diferentes tradições dos Hebreus e variações em relação às questões mais importantes. Esses documentos, com certeza, não foram compilados e escritos por Moisés. No processo editorial, aparentemente, nenhum limite foi atribuído à obra dos redatores. Os críticos dessa linha de pensamento concluem que os documentos contêm três tipos de material: a probabilidade verdadeira, a certeza dúbia e a definitivamente espúria. O antigo testamento desacreditado Não é apenas o Pentateuco que é desacreditado, mas o restante do Antigo Testamento também é tratado de modo similar. Os Salmos não são da época de Davi, mas da época dos Macabeus. Isaías foi escrito por um sem número de autores. Daniel foi apenas um pseudônimo da obra, escrita no segundo século a. C., no tempo de Antíoco Epifânio. 18 A história da alta crítica A Bíblia desacreditada Não pode haver dúvida de que Cristo e Seus apóstolos aceitaram na íntegra o Antigo Testamento, como um texto totalmente inspirado do primeiro capítulo do Gênesis ao último capítulo de Malaquias. Tudo era implicitamente crido como a Palavra do próprio Deus. E, desde aqueles dias, o ponto de vista da Igreja cristã universal é o de que a Bíblia é a Palavra de Deus. A Bíblia, segundo os críticos, não pode mais ser vista desse ângulo. Não é mais a Palavra, no velho sentido desse termo. Ela apenas contém a Palavra de Deus, e, em muitas de suas partes, ela é tão incerta quanto qualquer outro livro humano. Não é nem mesmo história digna de confiança. Seus relatos da história comum estão cheios de falsificações e erros crassos. Uma teoria revolucionária A alta crítica tem estado nas mãos de homens que repudiam a crença em Deus e em Jesus Cristo, portanto, essa teoria é, na verdade, uma teoria revolucionária. É uma teoria de inspiração que procura desbaratar as idéias aceitas da Bíblia e seu inquestionável padrão de autoridade e verdade. Pois o que quer que esse assim chamado elemento divino seja, parece ser inteiramente consistente com o argumento imperfeito, com a interpretação incorreta ou aquilo que o homem mediano chamaria falsificação ou fraude. Para aceitá-la, o cristão terá que reajustar completamente suas idéias acerca de honra e honestidade, de falsidade e representação errônea. Os homens costumavam pensar que a falsificação era um crime e a fraude um pecado. Eles costumavam pensar que o descuido afetaria a confiabilidade e que inconsistências comprovadas colocariam em risco a credibilidade. Hoje, no entanto, parece que tudo isso pode existir e, mesmo assim, uma constatação maravilhosa, a fé não será destruída, mas colocada sobre um fundamento mais firme. Se não Moisés, quem? Se Moisés não escreveu os livros de Moisés, quem o fez? Se houve três, quatro, seis ou nove escritores autorizados, porque não quatorze, dezesseis ou dezenove? E o que dizer do número indeterminado de redatores? De onde veio a autoridade deles? Moisés, nós 19 Os fundamentos conhecemos; Samuel; nós conhecemos; Daniel, nós conhecemos; mas vós anônimos e pseudônimos, quem sois? O Pentateuco com autoria mosaica, como Escritura divinamente creditada, é sustentado pela tradição e erudição e satisfaz à razão. No entanto, um livro recortado de compilações anônimas, cujos redatores e redações são pré e pós-exílio, significa uma enorme confusão. Nenhuma autoridade final Um outro sério resultado da alta crítica consiste em ameaçar o sistema de doutrina cristão e toda produção de teologia sistemática. Antes de mais nada, qualquer texto de qualquer parte da Bíblia era aceito como um texto-prova para o estabelecimento de alguma verdade do ensino cristão, e uma declaração da Bíblia punha fi m às controvérsias. Mas agora os críticos pensam ter mudado tudo isso. Eles proclamam que a ciência da crítica despojou a ciência da teologia sistemática. Obscurantistas não Há, portanto, duas questões com as quais o estudioso da Bíblia deve se defrontar. A primeira é: acaso não seria a recusa do sistema da alta crítica uma simples oposição à luz e ao progresso, uma posição de alarmistas ignorantes e obscurantistas? O desejo de receber toda luz que a busca mais destemida pela verdade que a erudição puder alcançar é o desejo de todo aquele que crê na Bíblia. Nenhuma mente cristã realmente saudável pode advogar o obscurantismo. No entanto, é dever de todo cristão testar todas as coisas e reter o que for bom. O leitor mais comum da Bíblia conhece o suficiente para saber que a investigação do Livro, que afi rma ser sobrenatural, quando realizada por homens que são inimigos declarados do sobrenatural e, indiscutivelmente, têm espírito irreverente, sabendo-se que os estudos desses assuntos que só podem ser compreendidos pelos homens de coração contrito e humilde, deve ser recebida com cautela. O argumento da erudição A segunda questão também é séria: não somos impelidos a aceitar esses pontos de vista quando propostos não apenas por racionalistas, mas por cristãos; e não por cristãos comuns, mas 20