A ARTE E O ARTESANATO NA EDUCAÇÃO INFANTIL: UMA

Transcrição

A ARTE E O ARTESANATO NA EDUCAÇÃO INFANTIL: UMA
A ARTE E O ARTESANATO NA EDUCAÇÃO INFANTIL: UMA
EXPERIÊNCIA COLETIVA
Meiriane Ferreira Bezerra Santos1 - UFAL
Mariana Cordeiro Wanderley Tenório Farias 2 - UFAL
Maria Dolores Fortes Alves3 - UFAL
Surama Angélica da Silva 4 - UFAL
Idnelma Lima da Rocha5 - UFAL
Grupo de Trabalho – Educação da Infância
Agência Financiadora: BDAI-UFAL
Resumo
Este relato de experiência busca uma reflexão sobre a relevância do “Projeto Arte e
Artesanato como Elementos Contribuintes no Desenvolvimento Cultural da Criança”. Nessa
perspectiva, o objetivo é descrevê-lo e situá-lo como elemento inovador nas práticas
pedagógicas desenvolvidas no Núcleo de Desenvolvimento Infantil- NDI da Universidade
Federal de Alagoas no período compreendido entre outubro de 2014 a setembro de 2015. O
projeto de intervenção em andamento está vinculado ao Programa de Bolsa de
Desenvolvimento Acadêmico e Institucional – BDAI e articula-se com o fomento da tríade
ensino-pesquisa-extensão, favorecendo a formação complementar de graduandos do curso de
Pedagogia. A orientação metodológica adotada neste trabalho apoia-se na análise do processo
de construção e execução do projeto e na avaliação parcial dos resultados. Nesse sentido,
1
Graduada em Pedagogia pela Fundação Educacional do Baixo São Francisco Dr. Raimundo Marinho.
Especialista em Pedagogia Organizacional e Gestão de Recursos Humanos pela Faculdade Atlântico. Professora
do Núcleo de Desenvolvimento Infantil da Universidade Federal de Alagoas(UFAL). E-mail: [email protected]
2
Graduanda em Pedagogia pela Universidade Federal de Alagoas (UFAL). Bolsista do Programa de Bolsa de
Desenvolvimento Acadêmico e Institucional da UFAL. E-mail: [email protected]
3
Doutora e Mestre em Educação – PUC/SP-CNPq e UB (Barcelona); Mestre em Psicopedagogia e Pedagoga UNISA; Pós-Graduada em Distúrbios da Aprendizagem pela UBA (Buenos Aires); Especialista em Educação
em Valores Humanos-Fundação Peirópolis; Pesquisadora RIES (Rede Internacional Ecologia dos Saberes),
ECOTRANSD (Ecologia dos Saberes e Transdisciplinaridade - CNPq), RIEC (Rede Internacional de Escolas
Criativas), GIAD (Grupo de Investigação e Assessoramento Didático. UB) e ADESTE (A Adversidade Esconde
um Tesouro - Universidade de Barcelona); Professora do Núcleo de Desenvolvimento Infantil da Universidade
Federal de Alagoas. E-mail: [email protected]
4
Graduada em Pedagogia pela Universidade Estadual de Alagoas (UNEAL). Especialista em Educação em
Direitos Humanos e Diversidades pela Universidade Federal de Alagoas (UFAL). Professora do Núcleo de
Desenvolvimento Infantil da Universidade Federal de Alagoas. E-mail: [email protected]
5
Graduada em Pedagogia e especialista em Psicopedagogia pela Universidade do Estado da Bahia (UNEB).
Mestra em Educação Brasileira pela Universidade Federal de Alagoas (UFAL). Professora do Núcleo de
Desenvolvimento Infantil da Universidade Federal de Alagoas. Tutora online do curso de Pedagogia a distância
da UFAL/UaB. Membro do grupo de Pesquisa Gestão e avaliação da educação. E-mail:
[email protected]
ISSN 2176-1396
35412
toma como foco de análise as experiências vivenciadas junto às crianças como produtoras de
arte e cultura, considerando a aproximação ao artesanato local e regional e ao entrelaçamento
com a arte em suas diferentes manifestações e linguagens. Deste modo, é possível verificar,
que o desenvolvimento do projeto junto às 130 crianças do Núcleo, na faixa etária
compreendida entre 2 a 5 anos de idade, colaborou na compreensão de que as atividades
desenvolvidas favorecessem a competência, sensibilidade e criatividade infantis,
promovendo, a partir das interações coletivas, o gosto pela arte e tornando-as apreciadoras
curiosas do artesanato local. As experiências têm demonstrado que as práticas docentes que
incorporam o fazer artístico cotidianamente, promovem o lúdico, potencializam talentos e
contribuem para o desenvolvimento integral da criança de forma significativa; e ainda,
fortalecem o vínculo entre toda comunidade educativa, ao promover experiências que
consideram a participação efetiva das famílias no contexto da educação infantil.
Palavras-chave: Projeto. Desenvolvimento Infantil. Arte e Artesanato. Criança.
Introdução
O Projeto “Arte e Artesanato como Elementos Contribuintes no Desenvolvimento
Cultural da Criança” resulta do anseio de proporcionar as crianças experiências artísticas,
cultivando o gosto pela arte e pela apreciação das manifestações artísticas e do artesanato
local e regional, fomentando o desenvolvimento cultural na infância.
O seguinte projeto foi coelaborado por aluna do curso de graduação em Pedagogia,
vinculado a Bolsa de Desenvolvimento Acadêmico e Institucional e desenvolvido junto às
crianças com faixa etária compreendida entre 2 e 5 anos de idade, em turmas de Educação
Infantil sob o acompanhamento e orientação de Professores do Ensino Básico, Técnico e
Tecnológico que atuam no Núcleo de Desenvolvimento Infantil - NDI/CEDU da
Universidade Federal de Alagoas. O Núcleo, situado no campus A.C. Simões na cidade de
Maceió, atende crianças advindas das comunidades circunvizinhas e filhos (as) de servidores
e estudantes da Universidade. O Núcleo possui parceria com a Secretaria Municipal de
Educação e constitui-se em um espaço/lugar que desenvolve suas atividades com apoio de
equipe multidisciplinar composta por pedagogas, psicólogas, nutricionista, técnicos em
enfermagem e assistente social. Possui em sua organização, docentes, auxiliares de sala,
bolsistas, estagiários de diferentes cursos, gestor e coordenadores pedagógicos.
Nesse contexto, cabe ressaltar: qual a contribuição do projeto às crianças do NDI ao
facilitar e promover o fazer artístico? Como se desenvolveram as experiências práticas com as
crianças? Como o projeto se articulou com os desejos e escolhas das crianças e quais
resultados se obtiveram em curto prazo?
35413
A construção teórica do projeto parte do pressuposto de que a arte está presente em
tudo. Ela se revela em diversos contextos, de forma rica e variada. É possível percebê-la em
uma obra de arte clássica ou em uma imagem ou elemento do cotidiano. Não se trata de
produzir algo só para se alcançar resultados, pode-se sim haver resultados, mas o mais
importante são as experiências vividas em cada situação, o processo que se constrói e o prazer
consciente de usar os sentidos (não esquecendo também a intuição), experimentar suas
capacidades, percepções, desejos, limites; e sensibilizar-se com o belo.
Dessa forma, o projeto visa mostrar a importância da arte na educação infantil, as
possibilidades que a arte proporciona na vida das crianças e aproximá-las do artesanato
alagoano que representa e expressa a cultura de sua gente. Portanto, a construção de uma
sociedade que valorize as produções artísticas em geral, com um novo olhar, um olhar
sensível capaz de deslumbrar-se e permitir novas leituras da produção humana, depende,
dentre outros elementos, de um processo que precisa ser iniciado desde a primeira infância.
Aprender a apreciar e valorizar a arte, em suas diferentes manifestações, é um processo que
não pode ser negado às crianças; e, portanto, deve fazer parte da práxis pedagógica na
Educação Infantil.
Lembrando-se que uma sociedade só aprende a valorizar sua cultura e sua arte se esta
for vivenciada desde a mais tenra idade, tornando-se empiricamente, parte da vida. Nesse
sentido, cabe a Educação Infantil divulgá-la e difundi-la.
Caracterização descritiva do Projeto Arte e Artesanato como Elementos Contribuintes
no Desenvolvimento Cultural da Criança: objetivos e referencial teórico adotado
O Projeto Arte e Artesanato como Elementos Contribuintes no Desenvolvimento
Cultural da Criança têm como objetivo mais amplo, possibilitar o desenvolvimento pleno de
cada criança como produtora de cultura por meio da aproximação à arte, ao artesanato e as
manifestações artísticas locais e regionais. Sua elaboração representa um processo de intensa
imersão no cotidiano das crianças do Núcleo de Desenvolvimento Infantil e nas intenções
pedagógicas de seus profissionais. A análise do contexto e da contribuição que traria as
crianças também foram elementos importantes na sua construção, gerando um projeto movido
pelo desejo de transformar a realidade e contribuir para o desenvolvimento de práticas
docentes de qualidade na Educação Infantil. Nesse sentido, o projeto considera ainda,
significativos os objetivos elencados abaixo:
35414

Despertar na criança o interesse pela arte ampliando os referenciais artísticos e
estéticos através de exposições e apresentações culturais;

Possibilitar que a Educação Infantil seja um lugar de acesso às manifestações
culturais e artísticas produzidas pela humanidade;

Proporcionar às crianças experiências estéticas ricas como: cheiros, gostos, sons,
temperaturas, texturas e imagens;

Estimular a imaginação, a criatividade e a expressão artística através das artes
plásticas, visuais, literárias, decorativas e expressão musical;

Garantir espaço e tempo adequados para os processos de criação individuais e
coletivos, priorizando a participação efetiva das famílias, aumentando o repertório
de atividades artísticas;

Favorecer vivências na Educação Infantil, individuais e coletivas, em que as
crianças conheçam e manifestem seus desejos, preferências, sonhos, medos,
alegrias por meio da arte em suas diferentes linguagens;

Promover ações junto às famílias e comunidade que possibilitem o acesso das
crianças aos bens culturais, a arte e ao artesanato.
No tocante ao referencial teórico, o projeto considera que ao longo da trajetória da
educação no Brasil, o ensino de Artes foi embasado dentro de diferentes tendências
pedagógicas e, com a LDB 9.394 de 1996, tornou-se obrigatório no currículo dos diversos
níveis da Educação Básica, considerando a arte em seu contexto mais amplo e não mais como
uma atividade curricular, mas sim como área de conhecimento, integrado à base de formação
cultural do sujeito e, portanto da criança. Ressalta ainda, que recentemente, as Diretrizes
Curriculares Nacionais da Educação Infantil, apontam a necessidade de imersão das crianças
nas múltiplas linguagens em seus variados gêneros e formas de expressão (gestual, verbal,
plástica, dramática e musical) e a promoção das interações com diversificadas manifestações,
tais como a música, artes plásticas e gráficas, cinema, fotografia, dança, teatro, poesias e
literatura. Sendo assim, abre um leque de possibilidades para o desenvolvimento de atividades
que priorizem a arte e suas vastas manifestações.
Ressalta a compreensão de que a criança sofre influência da cultura e também a
produz; arte e cultura se entrelaçam gerando um processo rico de experiências durante a
infância. A arte está presente no cotidiano dos indivíduos e deve ser promovida como um
fazer humano, com potencial para transformar os espaços educativos, pela diversidade e
riqueza que apresenta. Nesse sentido, as Artes devem ser vistas como uma linguagem que tem
35415
estrutura e característica próprias, por meio dos seguintes aspectos, de acordo com o RCNEI
(1998):
Fazer artístico - centrado na exploração, expressão e comunicação de produção de
trabalhos de arte por meio de práticas artísticas, propiciando o desenvolvimento de
um percurso de criação pessoal;
Apreciação - percepção do sentido que o objeto propõe, articulando-o tanto aos
elementos da linguagem visual quanto aos materiais e suportes utilizados, visando
desenvolver, por meio da observação e da fruição, a capacidade de construção de
sentido, reconhecimento, análise e identificação de obras de arte e de seus
produtores;
Reflexão - considerado tanto no fazer artístico como na apreciação, é um pensar
sobre todos os conteúdos do objeto artístico que se manifesta em sala,
compartilhando perguntas e afirmações que a criança realiza instigada pelo professor
e no contato com suas próprias produções e as dos artistas. (BRASIL.1998, p.89)
Entretanto, a arte configura-se como um conceito difícil de definir, pois existem várias
formas de enxergá-la e de explicá-la, porém, o projeto buscou seguir o pensamento de
Barbieri, ao enfatizar:
Pois arte é infância. Arte significa não saber que o mundo já é, e fazer um. Não
destruir nada que se encontra, mas simplesmente não achar nada pronto. Nada mais
que possibilidades. Nada mais que desejos. E, de repente, ser realização, ser verão,
ter sol. Sem que se fale disso, involuntariamente. Nunca ter terminado. Nunca ter o
sétimo dia. Nunca ver que tudo é bom. Insatisfação é juventude. (RILKE, apud,
BARBIERI, 2007, p.17).
Durante a infância o interesse da criança pela arte está relacionado ao meio social em
que ela vive e ao acesso às produções culturais, por isso, é preciso pensar em formas lúdicas e
criativas que possam estimular a criatividade e a imaginação da criança, pois é através dessas
descobertas que a criança passa a conhecer a si mesma e o mundo do qual faz parte. É com
seus pares que ela vivenciará trocas de experiências ricas em afetividade e descobertas.
A prática educativa com projetos tem muito a colaborar nesse processo, sendo uma
ferramenta muito importante para o amadurecimento das habilidades e potencialidades das
crianças, pois é durante as etapas do projeto que elas tornam-se protagonistas das suas
próprias descobertas. A contribuição de Barbosa e Horn (2008) reafirma com propriedade
esse entendimento, ao concluir que:
A pedagogia de projetos vê a criança como um ser capaz, competente, com um
imenso potencial e desejo de crescer. Alguém que se interessa, pensa, duvida,
procura soluções, tenta outra vez, quer compreender o mundo a sua volta e dele
participar, alguém aberto ao novo e ao diferente. Para as crianças, a metodologia de
projetos oferece o papel de protagonistas das suas aprendizagens, de aprender em
sala de aula, para além dos conteúdos, os diversos procedimentos de pesquisa,
organização e expressão dos conhecimentos (2008, p. 87).
35416
De acordo com as palavras das autoras, trabalhar com projetos na educação infantil é
uma excelente forma de atrair o interesse pelo conhecimento - de algo específico ou geral pois é neste momento que o educador tem a possibilidade de oferecer uma série de estratégias,
onde ele, as crianças e a instituição de educação infantil podem participar de uma forma
contínua e ativa em cada etapa do projeto. A criança que aprende por meio da pedagogia de
projetos, tem a oportunidade de construir sua independência e posterior autonomia, aprender a
pensar, a atuar no e com o coletivo, a argumentar, a entender o mundo ao seu redor e ser
sujeito ativo no processo de ensino-aprendizagem.
A escolha metodológica e o projeto
O principio metodológico caracterizado pela pesquisa-ação, (THIOLLENT, 2008)
apresenta-se no projeto como a possibilidade de vincular aspectos da pesquisa à prática
pedagógica, ou seja, a ação; levando consequentemente a uma ressignificação do fazer
docente. Assim sendo, ao iniciarem-se os momentos de acompanhamento de diversos grupos
de crianças na faixa etária de 2 a 5 anos, da observação in loco das atividades das quais
participavam, tornou-se evidente de que as crianças teriam assegurado o seu desenvolvimento
pleno, à medida que aspectos mais específicos deste desenvolvimento fossem considerados e
subsidiados em diversas propostas sistematizadas. Desta forma, analisou-se que a arte e o
artesanato são elementos socialmente e culturalmente enriquecedores e que poderiam
contribuir significativamente no desenvolvimento integral da criança. O projeto desdobrou-se
em três etapas: a primeira refere-se à construção do projeto a partir de análise do contexto do
Núcleo e suas necessidades, contato com bolsistas, professores e comunidade, levantamento
de dados e pesquisa bibliográfica; a segunda etapa compreende o período de sistematização de
algumas atividades de cunho artístico e preparação dos materiais; e a terceira etapa está
vinculada a execução do projeto, a princípio, em turmas com grupos de crianças de 3 e 4 anos
de idade.
As oficinas de arte realizadas junto as crianças merecem um olhar atento,
representando uma experiência muito significativa, sobretudo para as crianças. As famílias
foram convidadas a participarem e sensibilizaram-se ao perceber a intensa criatividade
infantil. Os trabalhos com pintura utilizando tinta guache em telas e as sobreposições com
diversos materiais (sementes, fitas, tecidos, materiais plásticos) foram apreciados por todo o
grupo, pais, familiares e crianças. Foi possível perceber o quanto as crianças sentiam-se
35417
reconhecidas por suas produções e demonstravam satisfação e auto-realização com a presença
e participação dos pais ou familiares durante as atividades.
O projeto reveste-se de um caráter inovador e socialmente relevante ao considerar
como fundamental uma contínua parceria com as famílias junto às crianças, ao corpo docente,
aos bolsistas, técnico-administrativos, comunidade e funcionários em geral. Apresenta, de
forma simples, objetiva e pedagogicamente sistematizada as seguintes estratégias:

Realização de exposições de arte no pátio da instituição, promovendo a
oportunidade de apreciação de produções artísticas locais e regionais por toda a
comunidade, com ênfase na participação da família;

Promoção de exposição e demonstração das danças culturais alagoanas e no
segundo momento as crianças são convidadas a participarem das danças;

Organização de um momento chamado de “Vamos à feira”, onde as crianças terão
contato com frutas e legumes, podendo sentir suas texturas, seus cheiros e gostos,
além de perceber as diversas cores que elas possuem;

Oferta de espaço-oficina onde as crianças juntamente com suas famílias e o corpo
docente, terão a oportunidade de produzir trabalhos utilizando diversas técnicas
como sobreposição, pintura em telas, modelagem em argila e massa de modelar;

Contação de histórias da literatura infantil, de forma lúdica possibilitando a
participação das crianças através da encenação teatral, onde as mesmas serão os
personagens da referida história;

Oficina para produção de instrumentos musicais com materiais reciclados;

Oficina criativa onde as crianças realizam modelagens com o uso do Papel Machê
produzido por elas;

Realização da “Parede da minha vida”, onde as crianças podem expressar através
de desenhos e pinturas, seus desejos, preferências, sonhos, medos e alegrias;

Organização de uma mostra do artesanato local e regional em parceria com as
famílias das crianças e artesãos da região;

Promoção de um Sarau com a participação de toda comunidade (pais, crianças,
funcionários e colaboradores).
35418
Tecendo algumas contribuições
Pela arte, pela expressão artística, a criança constrói em seu interior, novas
possibilidades, pensamentos, sonhos. É um aparato à construção cognitiva e um suporte as
imensas possibilidades de expressão e elaboração dos sentimentos e emoções. A arte conduz o
sujeito a si próprio e o liga a cultura. Produzir arte é produzir cultura e produzir cultura se
traduz na materialização da essência do humano.
A criança dá mergulhos cada vez mais profundos e traz à tona situações cheias de
emoção. A brincadeira simbólica (a arte), por ser zona fronteiriça entre a realidade e
a fantasia, entre o eu e o outro, entre o consciente e o inconsciente, muito próxima
do sonho, dá realmente condições à criança de representar situações carregadas de
afeto e emoção, e de se aproximar de forma mais criativa de conteúdos angustiantes.
Há possibilidade também de viver os medos e as tensões do outro, de intervir papéis
e, portanto, de compreender melhor as relações vividas (PIAGET, apud,
OLIVEIRA, 2000, p. 33 e 34, grifo nosso).
A arte é mais que lazer, é mais que um componente curricular; ela é uma expressão da
plenitude humana, uma forma de liberação dos impulsos, uma linguagem, um modo impar, e
singular de comunicação. Como fruto e produto cultural, ela é uma expressão de valores,
sentimentos da própria cultura.
Segundo Alves e Bossa (2006), o fazer artístico, para além de ser lúdico e criativo,
constitui-se como um elemento estruturante das funções psíquicas. Ele traz representações
simbólicas e faz emergir conteúdos inconscientes, possibilitando assim, a elaboração de
traumas, afetos, sentimentos e sintomas.
Sob a luz dessas considerações, o projeto, ainda em execução, representa um avanço
na construção de uma educação que, voltada às crianças, priorizem a arte como expressão
humana resultando em práticas de qualidade social. Iniciou-se em turmas onde a bolsista que
o desenvolveu atuava, considerando que o vínculo existente facilitasse o desenvolvimento das
atividades e contribuísse para que as crianças ficassem mais soltas, sem receio de errar, visto
que o propósito das oficinas era favorecer a criatividade e a imaginação infantil, onde desejos,
pensamentos, gostos e sonhos pudessem emergir nas telas. A apreciação de obras de arte
reproduzidas através de recursos áudio visuais gerou momentos lúdicos e de muita diversão
para as crianças, ficando atentas as imagens e por diversas vezes tentando reproduzi-las. As
danças folclóricas alagoanas trouxeram momentos de grandes realizações, enriqueceram o
repertório musical infantil e fortaleceram a valorização da cultura local e sua produção desde
a infância. As crianças passaram a solicitar, escolher e sugerir quais atividades queria realizar
35419
e quais materiais utilizariam. Solicitavam constantemente a participação dos familiares e já
tinham incorporado à prática de realizar os convites e lembretes relacionados às atividades.
Paulatinamente, os pais e familiares foram percebendo a importância que o projeto assumira
na vida das crianças e a contribuição que estava trazendo ao desenvolvimento das mesmas.
Cada vez mais, a participação das famílias se ampliava e era possível verificar, por meios de
vários relatos dos pais como eles também se realizavam ao terem a oportunidade de participar
ativamente das atividades desenvolvidas junto às crianças.
Considerando a perspectiva de ampliação do projeto, para além de uma intervenção, o
propósito é direcioná-lo a outros grupos de crianças que juntamente com suas famílias possam
vivenciar a arte em um espaço coletivo. Como um elemento gerador de inúmeras
possibilidades, o projeto, atualmente, prevê uma parceria com uma comunidade escolar do
município de Piaçabuçu no estado de Alagoas. O local oferece uma expressiva quantidade de
cabaças (planta cultivada para alimentação e como recipiente de água) que servirão como
matéria-prima para atividades de pinturas a serem produzidas pelas crianças.
Considerações Finais
Por meio da arte adquirem-se novas habilidades, fazem-se novas descobertas, se
expressa frustrações e angústias, adquire-se autoconfiança, aprende-se a valorizar o seu
potencial, existe uma rica troca de experiências que proporcionam o desenvolvimento cultural
da criança. A arte proporciona um encantamento nas suas variadas formas e o contato
cotidiano com as linguagens artísticas, possibilitam novos saberes. Assim, concebe-se o
universo infantil como extremamente rico; relacionado às diferentes linguagens da arte e
verifica-se que a criança produz cultura, produz arte e sente-se feliz quando é estimulada e
suas produções reconhecidas pelo coletivo. O fazer artístico, inserido no cotidiano da criança,
possibilita o seu desenvolvimento em aspectos variados; social, psicológico, intelectual e
emocional e o contato com o artesanato possibilita o surgimento de um sentimento de
apreciação, valorização e reconhecimento, aproximando-a da produção cultural de seu povo.
Nesse sentido, o projeto colabora para a inovação e qualificação das práticas pedagógicas
desenvolvidas no Núcleo de Desenvolvimento Infantil, e toma a forma de elemento gerador
de atuação coletiva ao engajar os pais das crianças no cotidiano das aprendizagens,
descobertas e produções na infância, representando ainda, uma contribuição experiencial
àqueles que o vivenciam.
35420
Conclui-se que fazer arte traduz-se como um elo do mundo interior com o mundo
exterior. A subjetividade se faz presente no fazer artístico embelezando a vida e a alma de
quem a vivencia e a produz. A arte contribui significativamente para o desenvolvimento
infantil, pois as crianças criam arte e recriam-se pela arte, que liberta os sonhos e a vida.
REFERÊNCIAS
ALVES, M. D. F; BOSSA, N. A. A fase inicial da criança e o olhar psicopedagógico como
re-estruturante das funções psíquicas. in: ABPP- VII Congresso Brasileiro de
Psicopedagogia. São Paulo : ABPP, 2006. v. VII.
BARBIERI, Stela. Interações: onde está a arte na infância? / Stela Barbieri; Josca Ailine
Baroukh, coordenadora; Maria Cristina Carapeto Lavrador Alves, organizadora. S. Paulo:
Blucher, 2012.
BARBOSA, M. e HORN, M. Projetos pedagógicos na educação infantil. P. Alegre:
Artmed, 2008.
BRASIL. Ministério da Educação e do Desporto. Secretaria de Educação Fundamental.
Referencial curricular nacional para a educação infantil. 3v.: il.Volume 1: Introdução;
volume 2: Formação pessoal e social; volume 3: Conhecimento de mundo. Brasília:
MEC/SEF, 1998.
________. Resolução N. 5, De 17 de Dezembro de 2009. Fixa as Diretrizes Curriculares
Nacionais para a Educação Infantil. Brasília: 2009.
________. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Básica. Diretrizes curriculares
nacionais para a educação infantil /Secretaria de Educação Básica. – Brasília : MEC, SEB,
2010.
BRASIL. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Lei n.9.394, de 20 de dezembro
de 1996.
OLIVEIRA, V. B. de (org). O brincar e a criança: do nascimento aos seis anos. Petrópolis:
Vozes, 2000.
THIOLLENT, M. Metodologia da pesquisa-ação. São Paulo: Cortez, 2008.

Documentos relacionados

Programação de lançamentos da Edufal 2015

Programação de lançamentos da Edufal 2015 12. Além do pós-rock: as crises musicais contemporâneas, mídia e a nova música instrumental brasileira, Victor de Almeida Nobre Pires 13. Mediação pedagógica do tutor e a produção autoral do aluno ...

Leia mais