portugal e a cooperação euromediterrânica

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portugal e a cooperação euromediterrânica
CONSELHO ECONÓMICO E SOCIAL
PORTUGAL E A COOPERAÇÃO
EUROMEDITERRÂNICA
RELATÓRIO PARA A CIMEIRA EUROMEDITERRÂNICA DE PARIS
(Aprovado na Sessão Plenária de 14 de Outubro de 1996)
LISBOA, 1996
O presente relatório, aprovado na Sessão Plenária do Conselho Económico e
Social de 14 de Outubro de 1996, foi elaborado com o objectivo de ser apresentado à
Cimeira dos Conselhos Económicos e Sociais Euro-mediterrâneos, a realizar em
Novembro de 1996.
Na sua elaboração participaram o Dr. Vasco Cal, que redigiu o texto de base,
e técnicos da AIP, CGTP, CIP, UGT e Ministério dos Negócios Estrangeiros.
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ÍNDICE
1. Antecedentes
4
2. Considerações Gerais sobre os Temas Propostos para a Cimeira de Paris
5
3. Relações entre os Conselhos Económicos e Sociais
no âmbito Euromediterrâneo
12
4. Prioridades do CES Português para a Cooperação Euromediterrânea
13
Anexo: Portugal, a Declaração de Barcelona e as relações com Países da Bacia
do Mediterrâneo
18
Quadros
28
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1. Antecedentes
A primeira Cimeira Euromediterrânea dos Conselhos Económicos e Sociais e
organismos equivalentes, que se reuniu em Madrid nos dias 12 e 13 de Dezembro de
1995, decidiu que fossem elaborados três relatórios monográficos sobre o “problema
da dívida externa”, a “emigração e a criação de uma zona de comércio livre” e a
“energia, ambiente e recursos hídricos”.
A coordenação desta elaboração foi atribuída, respectivamente, ao CNES argelino,
ao CES europeu e ao CES francês, que se constituíram em Grupo de Trabalho
preparatório da próxima Cimeira (Paris, Novembro de 1996).
Os outros Conselhos económicos e sociais foram convidados a associarem-se à
preparação dos três relatórios temáticos e a apresentarem um “relatório nacional”,
incluindo as suas posições relativamente à cooperação euromediterrânea.
A participação do CES português nestas iniciativas multilaterais tem sido
relativamente limitada e a nova fase das relações euromediterrâneas deve ser
plenamente aproveitada para que Portugal, enquanto país com características
mediterrâneas, reforce as suas relações com todos os seus parceiros desta importante e
estratégica região.
A nível das organizações patronais e sindicais portuguesas tem-se verificado uma
participação mais activa em iniciativas euromediterrâneas. A Associação Industrial
Portuguesa (AIP) organizou um Seminário em Lisboa e, posteriormente, participou
nas cimeiras de organizações patronais dos dois lados do Mediterrâneo em Valência e
em Malta. A Confederação Europeia de Sindicatos criou um grupo permanente para
acompanhar as acções de cooperação nesta região e estabeleceu protocolos de
cooperação com as organizações congéneres do lado Sul.
O presente Relatório foi elaborado e discutido pelo Conselho Económico e Social,
respeitando os procedimentos em vigor, de forma a servir de base à sua participação
na próxima Cimeira dos Conselhos Económicos e Sociais.
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2. Considerações gerais sobre os temas propostos para a Cimeira de Paris
Tema: Energia, ambiente e recursos hídricos
Como se pode constatar no Anexo “Portugal, a declaração de Barcelona e as
relações com os países da bacia Mediterrânea”, são relativamente limitadas as
relações actuais de Portugal com os países terceiros mediterrâneos a nível do
comércio externo, do investimento directo estrangeiro, da criação de infra-estruturas,
da cooperação entre pequenas e médias empresas, bem como da cooperação
financeira.
No entanto, no que se refere a um dos maiores projectos em curso entre os países
da UE e os países do Magrebe, Portugal tem uma participação muito significativa. O
projecto de gás natural, que inclui a construção das infra-estruturas necessárias em
Portugal e a ligação, através do estreito de Gibraltar, da rede peninsular com
Marrocos e a Argélia, envolve um investimento global de 4,5 mil milhões de dólares,
cabendo à parte portuguesa quase metade (44%) desse total.
A diversificação das fontes energéticas é o principal objectivo deste projecto para
Portugal, enquanto que, para a Argélia, este gasoduto, permitirá, numa segunda fase,
duplicar as suas exportações de gás natural (de 8 Gm3 para 16 Gm3) através de
Marrocos e da Espanha. Se não forem tomadas medidas que permitam um
significativo aumento das exportações portuguesas, o défice comercial de Portugal
com a Argélia tenderá a agravar-se.
Um segundo gasoduto, que liga a Argélia via Tunísia à Itália, viu recentemente a
sua capacidade ampliada (de 16 para 24 Gm3). O potencial de exportação argelino é
avaliado em 70 a 100 Gm3, após o ano 2000.
O papel estruturante do sector energético foi expressamente reconhecido pela
Cimeira de Barcelona, cujos participantes decidiram “reforçar a cooperação e
aprofundar o diálogo no domínio das políticas energéticas... criar as condições-quadro
adequadas para os investimentos e as actividades das empresas do sector energético e
criar as condições para permitir a estas empresas alargar as redes energéticas e
promover as suas interconexões ”.
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De notar, no entanto, que os países mediterrâneos não participam na Carta europeia
de energia e que os mecanismos de garantia dos financiamentos externos, ainda não
se encontram operacionais, a nível da União Europeia. Estes aspectos foram
analisados numa conferência de ministros da energia, em Triestre, a 8 e 9 de Junho,
na qual se fixaram como objectivos da cooperação nesta área a criação de condições
apropriadas para os investimentos no sector da energia e o incremento do comércio de
produtos energéticos.
As posições fundamentais a ter presente, nos debates a nível comunitário e com os
países mediterrâneos, são:
•
a defesa da prioridade à diversificação das fontes energéticas, face à
dependência do nosso País relativamente ao petróleo e, nomeadamente, no que
respeita à introdução de gás natural;
•
a importância dos mecanismos de garantia para a expansão dos investimentos
estrangeiros neste sector;
•
a coerência dos investimentos a financiar a nível comunitário, nomeadamente
evitando-se a duplicação de redes e tirando-se pleno partido das
potencialidades dos gasodutos existentes ou em construção.
No que respeita à questão da água, introduzida neste tema pelos representantes da
parte sul do mediterrâneo, a situação portuguesa é mais próxima destes do que dos
países do norte da Europa. O CES entende por isso que, ao contrário do que aparece
no Relatório preparado pelo CES francês, Portugal deve ser incluído nas análises e
debates relativos ao problema da água nas regiões mediterrâneas. Por outro lado,
considera positiva a proposta incluída no relatório do CES espanhol de criar um
quadro específico para a cooperação euromediterrânea em matéria de água, com a
participação da sociedade civil.
A insuficiência dos recursos, pluviais e fluviais, por um lado, e a persistência dos
factores que conduzem ao agravamento da situação da água, demográficos e
económicos, conduziram à necessidade de levar à prática todas as medidas para o
pleno aproveitamento das fontes e para o fomento da poupança de água. A gravidade
da situação não permite que as medidas se limitem ao curto prazo ou se baseiem
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apenas no aumento das tarifas. É necessário preparar as soluções a prazo mais longo,
reforçando
a
cooperação
internacional,
potencializando
a
pesquisa
e
o
desenvolvimento, nomeadamente no que respeita às fontes menos utilizadas,
praticando uma política de transferência de tecnologia que permita aos países mais
necessitados uma maior racionalização na utilização dos seus recursos em água.
A recente Comunicação da Comissão Europeia sobre o problema da água, embora
se limitando ao contexto comunitário e se concentrando nas questões do meio
ambiente, demonstra bem que a raridade crescente da água exige uma vontade política
mais firme, uma maior disciplina na exploração e utilização dos recursos hídricos e
esforços mais importantes para afrontar esta problemática.
Tema: Dívida externa
O tema da dívida externa não foi objecto de tratamento suficiente na Cimeira
Ministerial de Barcelona e os representantes do sul do Mediterrâneo presentes em
Madrid insistiram na sua inclusão nos debates no âmbito dos Conselhos Económicos
e Sociais, apesar de diversos representantes dos países da União Europeia terem
considerado que este não seria o fórum mais apropriado.
No relatório preparado pelo CNES argelino para a cimeira de Paris, considera-se
que os níveis de endividamento atingidos pelos países terceiros mediterrâneos são
alarmantes e que a abertura dos seus mercados no âmbito da instauração da zona de
livre comércio euromediterrânea constitui para estes países um duplo desafio que
poderá agravar os seus problemas económicos e sociais.
O relatório debruça-se sobre a génese do endividamento, sobre os programas de
ajustamento estrutural seguidos e sobre as acções a desenvolver quer ao nível dos
Países do Sul e do Leste do Mediterrâneo (PSEM), quer ao nível dos países do Norte
(são referidos a criação de um banco regional, de um fundo de apoio e de garantia do
Investimento Directo Estrangeiro, bem como as ajudas técnicas e financeiras) quer,
ainda, ao nível internacional (sobre o funcionamento do sistema monetário
internacional).
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Trata-se de um tema no qual Portugal tem um interesse imediato relativamente
menor, quer devido aos pouco elevados montantes em dívida, quer devido aos
reescalonamentos que se têm vindo a processar normalmente, pelo que não existem
grandes razões para se opor às medidas necessárias à resolução deste problema, que
dificulta a recuperação económica dos países gravemente endividados.
A proposta de criação de um fundo de garantia do investimento directo estrangeiro
é favoravelmente acolhida pelas consequências positivas que pode ter na dinamização
da cooperação económica, nomeadamente entre pequenas e médias empresas.
Tema: Emigração e criação de uma zona de comércio livre
O CES da UE já discutiu e aprovou o Relatório de Informação sobre este tema,
elaborado por um grupo de trabalho interno, mas que contou também com a
colaboração de representantes de CES do sul do Mediterrâneo.
O relatório sublinha a importância do diálogo a nível da sociedade civil e da
participação dos parceiros económicos e sociais das duas margens do Mediterrâneo. O
relatório analisa os problemas da transição das estruturas económicas e do papel do
Estado, face aos desafios impostos pela competitividade internacional, bem como as
medidas de acompanhamento social, incluindo, em particular, a formação
profissional.
No que se refere à questão da emigração, o relatório propõe um modelo inovador
para gerir os fluxos migratórios, dimensionando-os às necessidades dos países de
acolhimento. Se bem que Portugal não seja ainda afectado pelos fluxos migratórios
originários do lado sul do Mediterrâneo, a proposta de avançar com políticas de
emigração no âmbito comunitário terá de ser analisada com precaução, pois poderá
conduzir a “desvios de tráfego” levando candidatos à emigração a privilegiar o nosso
País como porta de entrada no espaço comunitário. É por isso conveniente que sejam
criadas as bases para uma política comum a nível da emigração.
Quanto à questão da agricultura, um dos temas mais polémicos nas relações com
os PSEM, até porque nos acordos de criação de uma zona de comércio livre não está
prevista a livre circulação dos produtos agrícolas mais significativos no âmbito da
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PAC, o relatório defende a necessidade de incrementar a assistência técnica e
financeira e de se tentar evitar o aumento da concorrência dos produtos
mediterrânicos no mercado comunitário.
No estabelecimento da zona de comércio livre deverá também dar-se maior
destaque ao comércio sul-sul e não deveria limitar-se às questões do comércio sulnorte.
No que respeita à zona de comércio livre, a produção de alguns dos países do sul,
nomeadamente nos sectores agro-alimentar, têxteis, vestuário e calçado são
concorrentes com produções em Portugal. Verifica-se que empresas estrangeiras que
tinham investido nestes sectores em Portugal, estão agora a efectuar investimentos do
mesmo tipo em países mediterrâneos, o que obrigará a um esforço acrescido de
“upgrading” da produção portuguesa nos sectores e regiões mais afectados, esforço
que deverá continuar a merecer o apoio comunitário correspondente.
Outros temas que poderão ser abordados na cimeira de Paris
A criação da zona de comércio livre entre os 15 países da UE e os 12 países
mediterrâneos vai ser acompanhada de um programa importante de ajuda técnica e
financeira, consubstanciado no Programa MEDA (Regulamento 1488/96 do
Conselho, de 23 de Julho publicado no JO L189 de 30 de Julho). Cerca de 90% das
ajudas a conceder serão canalizadas de forma bilateral entre a UE e cada um dos
países. O restante sê-lo-á a nível regional. O Programa destinar-se-á basicamente ao
apoio à transição económica e ao reforço do equilíbrio sócio-económico dos países
mediterrâneos, através, nomeadamente, do desenvolvimento de infra-estruturas, de
acções de cooperação empresarial e de formação profissional.
O desemprego dos jovens constitui outro dos temas que os países do sul pretendem
incluir nos debates com os CES da UE mas, até agora, estes têm considerado que é
um tema demasiado vasto e complexo. Na reunião preparatória de Roma, acordou-se
que se poderão ver mais tarde as possibilidades de o tratar em futuras Cimeiras.
O turismo foi objecto de uma recente Resolução do Conselho (96/C - 1555/01 de
13 de Maio de 1996 - JO de 30 de Maio) sobre a cooperação euromediterrânea no
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sector do turismo, na qual a Comissão foi convidada a promover as medidas
necessárias à informação dos fluxos estatísticos e dos regulamentos e disposições que
tenham repercussão sobre o turismo, à identificação dos obstáculos, à valorização dos
recursos humanos e à utilização de novas tecnologias para a valorização do
património natural, histórico e cultural comum. A reunião dos Ministros responsáveis
pelo turismo em Nápoles, a 10 e 11 de Maio, à margem da semana europeia de
turismo, sublinhou a necessidade de promoção dos recursos humanos, a troca de
experiências e informação, incluindo dos quadros legislativos, com vista à
preservação da herança cultural e natural.
A sociedade de informação foi também objecto de uma conferência a nível
ministerial em Roma, a 30 e 31 de Maio. Verificou-se a necessidade de projectos
concretos para promover a interconexão e o desenvolvimento das redes (incluindo a
criação dos quadros regulamentares apropriados), a utilização da pesquisa e
desenvolvimento para promover a transferência de tecnologia e a utilização da
sociedade de informação na educação e formação profissional.
A cooperação industrial foi objecto de um Conselho de Ministros da Indústria em
Bruxelas a 20 e 21 de Maio, que aprovou uma Declaração fixando as prioridades para
a modernização industrial e para o incremento dos fluxos de investimento na região
mediterrânea. Os ministros tomaram em consideração os resultados do Fórum
Industrial Euromediterrâneo de Malta, que reuniu as organizações patronais dos dois
lados do Mediterrâneo e no qual a Associação Industrial Portuguesa interveio
activamente.
O programa de trabalho para a cooperação industrial refere como elementos chave
do partenariado económico e financeiro: a criação de condições administrativas e
legais necessárias à modernização, privatização e mobilização do capital para o
investimento; o desenvolvimento de uma cultura de empresa e a melhoria da
educação profissional; a modernização das áreas industriais e o desenvolvimento das
redes e centros especializados em serviços às PME’s; o desenvolvimento de PME’s e
a criação de novas empresas; o desenvolvimento e reforço das redes
euromediterrâneas de parceria, de informação e de comunicação, a fim de favorecer a
cooperação entre empresas; e o desenvolvimento de infra-estruturas nos sectores de
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transportes, energia, telecomunicações e recursos hídricos. Uma reunião sobre PME’s
realizou-se em seguida em Milão de 4 a 6 de Junho.
As pescas serão debatidas na reunião ministerial de Novembro de 1996 em
Veneza, que analisará a gestão dos stocks de peixe.
Sobre a utilização da herança cultural, realizou-se uma conferência ministerial em
Bolonha a 22 e 23 de Abril, na qual se debateram as formas de reforçar o partenariado
cultural e de preparar as formas de implementação de projectos conjuntos. As
prioridades acordadas pelos ministros foram: o desenvolvimento dos recursos
humanos, a transferência de saber-fazer, a formação em competências relacionadas
com a cultura, o estabelecimento de sistemas conjuntos de informação e comunicação,
o uso de novas tecnologias, a promoção do desenvolvimento económico sustentável.
Portugal acordou recentemente com Marrocos um conjunto de iniciativas para a
recuperação de monumentos marroquinos de origem portuguesa.
Outros temas que têm sido tratados a nível de reuniões de peritos poderão vir a ser
abordados na cimeira de Paris, como é o caso do diálogo entre religiões e do tráfico
de drogas e luta contra o crime organizado.
Como se pode constatar, até agora, a maioria das iniciativas relativas ao
partenariado euromediterrâneo têm sido desenvolvidas a nível governamental, à
excepção do Parlamento Europeu, que realizou uma audição no final de Junho e da
conferência tripartida de Catânia, organizada pela Presidência italiana e contou com a
representação do CES português.
O partenariado euromediterrâneo é conduzido por um grupo de pilotagem, no qual
participam representantes da “troika” comunitária, dos 12 parceiros mediterrâneos e
também da Comissão Europeia. Este grupo prepara as reuniões dos ministros dos
negócios estrangeiros, segue a implementação do processo de Barcelona, em todas as
suas componentes e actualiza o programa de acção.
Prevê-se que no biénio 1996/97 cerca de 530 milhões de ECUS sejam autorizados
para projectos regionais de cooperação. Já foi aprovado o projecto de cooperação na
área da estatística, MEDSTAT, no valor de 20 milhões ECUS e que tem como
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objectivos reforçar os sistemas nacionais, harmonizar as estatísticas e criar um
sistema normalizado a nível regional.
É de relembrar que as três áreas previstas na Declaração de Barcelona são: relações
políticas e de segurança, relações económicas e financeiras e relações sociais,
culturais e humanas e que a Conferência acordou num programa de trabalho
detalhado nestas três áreas.
3.
Relações
entre
os
Conselhos
Económicos
e
Sociais
no
âmbito
euromediterrâneo
No complexo e diversificado quadro em que se desenvolvem as novas formas de
partenariado euromediterrâneo, os Conselhos Económicos e Sociais podem ter um
papel de relevo. O programa de trabalho aprovado em Barcelona inclui uma
referência expressa às relações entre os CES e organismos similares dos dois lados do
Mediterrâneo e à Cimeira de Madrid.
Nas conclusões de Madrid, foi dada prioridade aos três temas que mereceram o
consenso mais alargado e foram abertas as vias de participação de outros CES na
elaboração dos relatórios para a Cimeira de Paris. Acordou-se também que seria útil
que os relatórios, temáticos ou nacionais, fossem objecto de um processo de
preparação e de votação nos CES semelhante ao que vigora na emissão dos seus
pareceres “habituais”, de forma a alargar aos representantes que neles participam o
debate sobre as questões euromediterrâneas.
A fase actual de cooperação entre os CES e organismos similares tem-se limitado à
realização de Cimeiras anuais sobre temas de interesse geral e das respectivas
reuniões preparatórias.
Na verdade, verifica-se que as relações bilaterais entre os CES do Norte e do Sul
continuam a ter uma grande importância e que esta via tem sido reforçada pelas
possibilidades abertas no novo quadro do partenariado euromediterrâneo.
Também a nível das organizações patronais e sindicais se verifica uma
intensificação de contactos e de reuniões com os parceiros dos países terceiros
mediterrâneos e alguns projectos regionais foram já apresentados para financiamento
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comunitário, seja através do programa MEDA, seja através da linha orçamental
específica MEDA - democracia, que pode apoiar o diálogo a nível social e que pode
contribuir para o reforço institucional das estruturas dos parceiros sociais.
4. Prioridades do CES português para a cooperação euromediterrânea
Como se referiu anteriormente, o CES português tem participado de forma limitada
no novo quadro do partenariado euromediterrâneo. Também a nível bilateral com os
organismos equiparados do Sul, os contactos têm sido reduzidos.
Portugal é, no plano histórico e no plano climático, um país de características
mediterrânicas.
A oportunidade criada por esta nova abordagem da cooperação euromediterrânea
deve ser plenamente aproveitada para que o CES português venha a “investir” neste
processo, fixar objectivos mais ambiciosos, seja a nível multilateral, seja a nível
bilateral, afectar mais recursos e contribuir para melhorar as perspectivas e as
possibilidades de intervenção das organizações socioprofissionais representadas no
CES, tanto mais que, até agora, o partenariado tem estado muito concentrado a nível
governamental.
Alguns dos CES dos países da UE, que efectuam há mais tempo contactos e acções
de cooperação com os do sul, consideram que as perspectivas abertas a nível
multilateral devem servir, antes do mais, para reforçar as formas de cooperação que
eles já desenvolviam a nível bilateral. Consideram, por exemplo, que os fundos
comunitários agora disponibilizados devem reforçar as acções que já desenvolviam e
não têm apresentado propostas concretas para utilizar as posições comuns que
poderiam ser tomadas para iniciar novos projectos de cooperação a nível multilateral.
As áreas de cooperação mais interessantes para o CES português, incluindo as
organizações nele representadas, devem ser cuidadosamente identificadas. O nível de
desenvolvimento económico e o processo de transformação da economia portuguesa
nos últimos anos permitem uma maior aproximação e compreensão dos problemas
das economias em transição dos países mediterrâneos e a cooperação portuguesa
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pode, por isso, apresentar vantagens comparativas, nomeadamente no que respeita à
cooperação industrial, à questão da água, à formação profissional e ao turismo.
A cooperação industrial, nomeadamente a nível das pequenas e médias empresas,
constitui uma área prioritária e poderia mesmo vir a ser um dos temas centrais para
uma próxima cimeira dos Conselhos Económicos e Sociais.
O desenvolvimento de redes de parceria euromediterrânea, apoiadas pela UE, tem
propiciado uma efectiva aproximação entre as instituições de apoio às empresas dos
dois lados do Mediterrâneo, a qual deverá ser intensificada na medida em que
constitui um instrumento importante para uma desejável cooperação entre as
empresas europeias e as do sul e do leste mediterrâneo.
Os países da União Europeia podem contribuir para as medidas que se impõem,
muitas das quais são referidas no Relatório de Informação, mas que devem ser
aprofundadas e examinadas em conjunto:
•
A constituição de um fundo de garantia de investimentos, especialmente
vocacionado para a cooperação entre pequenas e médias empresas.
•
O sistema financeiro, revelando-se essencial a livre circulação de capitais.
•
A criação de um quadro regulamentar favorável ao investimento, em particular
no que se refere aos procedimentos aduaneiros, aos regimes de licenciamento
da actividade produtiva, à aplicação das normas de concorrência e ao sistema
fiscal.
•
A adaptação da legislação, muitas vezes criada em função das necessidades
das grandes empresas públicas, às necessidades específicas das pequenas e
médias empresas.
•
A transformação das relações do Estado com as pequenas e médias empresas,
dando menos peso às funções de controlo e maior peso às funções de
promoção e orientação.
•
A integração gradual e progressiva do sector informal na economia,
nomeadamente criando condições para o acesso ao crédito, particularmente
importante no caso de empresas dirigidas por mulheres, para o acesso aos
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programas de formação de gestores, à assistência técnica e às ajudas à
comercialização.
•
O acesso às redes de informação especializadas, tais como o serviço EuroInfo da Comissão Europeia e os recentemente criados Business Centers, de
forma a largar o acesso às informações sobre mercados estrangeiros, sobre
fontes de abastecimento, sobre sub-contratações, sobre normas de fabricação e
da qualidade dos produtos, aspectos cada vez mais importantes no comércio
internacional.
A coordenação e articulação das várias medidas da política mediterrânea
comunitária, nomeadamente no domínio da cooperação industrial constitui um factor
essencial para a sua eficácia. Considerando que os acordos de associação constituem
os principais instrumentos da política mediterrânea, é essencial que os trabalhos
decorrentes do Programa de Acção de Barcelona sejam estreitamente coordenados e
articulados com as acções de cooperação industrial desenvolvidas no âmbito bilateral.
O reforço do associativismo (empresarial, sindical e de outros grupos sócioeconómicos)
assume
particular
importância
no
contexto
da
cooperação
descentralizada que se pretende promover e constitui um complemento importante
para criar instrumentos de origem não estatal de promoção das políticas de
desenvolvimento económico, em especial no desenvolvimento industrial e na
formação profissional.
A questão da água assume em toda a região uma grande importância pois existem
muitas zonas estruturalmente carenciadas, o que tem reflexos no plano agrícola, na
protecção dos solos, na utilização dos recursos hídricos.
Portugal tem graves carências de água, tem problemas similares aos da maioria dos
países da região, deve estar presente em todos os debates e iniciativas sobre esta
problemática e deve participar nos projectos de cooperação que respondam ao
interesse comum dos países envolvidos. Tendo em conta a situação específica de
Portugal, a necessidade da cooperação internacional na gestão de recursos comuns
constitui uma questão essencial. A intervenção comunitária nesta questão justifica-se
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pela natureza transfronteiras de muitos problemas associados aos aspectos
quantitativos da água.
O sector dos transportes não tem merecido a prioridade devida. O CES português
considera que as deficiências dos sistemas de transportes entre Portugal e os países do
sul e leste mediterrâneos tem constituído um importante factor desencorajador no
estabelecimento de relações económicas mais profundas na região. A integração
económica dos países mediterrâneos entre si depende também das infra-estruturas de
transportes e comunicações na região, que não deveria ter as suas vias orientadas
somente no sentido norte-sul mas também no sentido leste-oeste, criando novos eixos
de desenvolvimento e articulando as redes trans-europeias com redes transmediterrâneas.
A formação profissional constitui uma área importante para a cooperação com os
países do sul e do leste do Mediterrâneo. A experiência portuguesa pode ser
extremamente útil porque, tal como alguns desses países, o nível de escolaridade era
baixo e não havia estruturas suficientes de formação profissional até ao início do
processo de adesão à Comunidade Europeia. As possibilidades abertas pelos
financiamentos comunitários criaram uma forte dinâmica de formação profissional,
nas empresas e nas organizações socioprofissionais e levaram ao aparecimento de
novas iniciativas empresariais para responder à procura existente. As necessidades de
programação e de coordenação, que apareceram de seguida encerram lições que
poderão ser úteis de analisar.
O turismo é um dos sectores em que a cooperação coerente e reforçada na região
pode ser mais vantajosa para os dois lados do Mediterrâneo. A necessidade de
melhorar o conhecimento das características do turismo na região, de desenvolver a
recolha de dados e o intercâmbio de informação, nomeadamente sobre os fluxos
turísticos, de valorizar os recursos humanos e de melhorar a qualidade dos serviços
oferecidos aos turistas, de valorizar o património natural, histórico e cultural comum,
de utilizar as potencialidades abertas pelas novas tecnologias e de contribuir para a
diversificação da oferta turística são as tarefas mais importantes a desenvolver.
Também nestas áreas, a contribuição portuguesa poderá contar com a experiência das
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organizações profissionais do sector, que continua a ser um dos que apresenta maiores
potencialidades de crescimento para os próximos anos.
A participação do CES português deverá continuar a desenvolver-se
fundamentalmente ao nível das cimeiras anuais euromediterrâneas, da resposta às
iniciativas e da participação em projectos de interesse comum. Para isso é necessário
afectar novos recursos, de forma a garantir um nível adequado e actualizado de
informação sobre as diversas áreas em que a cooperação portuguesa pode vir a ter
maior importância.
Lisboa, Outubro, 1996
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ANEXO
PORTUGAL, A DECLARAÇÃO DE BARCELONA E AS RELAÇÕES
COM PAÍSES DA BACIA DO MEDITERRÂNEO
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1. A Declaração de Barcelona e Portugal
Na Conferência Euro-Mediterrânea de Barcelona, que decorreu a 27 e 28 de
Novembro de 1995, foi aprovada a Declaração de Barcelona marcando uma nova
etapa nas relações entre a União Europeia e os países da bacia do Mediterrâneo.
A Declaração de Barcelona visa estabelecer entre as duas regiões «uma parceria
global» com três vertentes:
• política e segurança - institucionalização de um diálogo político multilateral,
baseado nos princípios de direito internacional, de forma a promover a criação de
um espaço de paz e estabilidade. No domínio dos progressos alcançados neste
vector, regista-se a iniciativa do ministro francês dos Negócios Estrangeiros, com
data de 15 de Maio de 1996, em que propõe a assinatura de um Pacto de
Estabilidade. O seu principal objectivo é a criação de um «espaço comum de paz e
estabilidade no Mediterrâneo»;
• económica e financeira - criação de uma zona de comércio livre para os produtos
industriais até ao ano 2010; reforço da cooperação financeira que, de acordo com o
decidido no Conselho Europeu de Cannes, se consubstancia no montante global de
4685 MECU para o período de 1995 a 1999. Além disso, o BEI deverá reforçar o
montante dos seus empréstimos na região e conta-se ainda com apoios financeiros
ao nível bilateral. A cooperação financeira baseia-se no programa MEDA que tem
como verba de referência 3424,5 MECUS. O MEDA financiará projectos de
planeamento de infraestruturas, assistência técnica e modernização da indústria;
• social, cultural e humana - o objectivo é a aproximação das sociedades civis de
forma a promover a compreensão de culturas, abrangendo, assim, a cooperação
descentralizada (entre universidades, empresas, etc).
Portugal apresentou, no Conselho Europeu de Junho de 1995, os seus contributos
em matéria económica para as relações com os países da bacia do Mediterrâneo,
dando especial destaque à liberalização do investimento, apoio às Pequenas e Médias
Empresas, criação de infraestruturas e reforço da cooperação financeira. Também no
Conselho Europeu de Lisboa se considerou que os aspectos políticos e de segurança
eram essenciais nas relações entre a UE e o Magrebe.
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Alguns países da bacia do Mediterrâneo, nomeadamente Marrocos, Tunísia e
Israel, são considerados como mercados alvo para o comércio e investimentos
portugueses. Além disso, o projecto de gás natural, com fornecimento argelino através
do gasoduto do Magrebe, reforça os interesses de Portugal naquela região.
A concretização da Declaração de Barcelona no domínio económico e financeiro,
designadamente através da aplicação do programa MEDA, cria condições de
dinamização do investimento naqueles países, que poderá beneficiar as empresas
portuguesas, nomeadamente nas áreas de consultadoria, da assistência técnica e da
construção.
No domínio da política de segurança, foi aceite a proposta portuguesa de criação
de uma rede de cooperação e troca de informação entre os Institutos de Estudos
Estratégicos dos 15 Estados-membros da União Europeia e dos 12 parceiros da área
mediterrânea.
2. As relações institucionais
A primeira visita do Ministro dos Negócios Estrangeiros, do novo Governo, a um
país não pertencente à UE foi a Marrocos, parecendo assim que Lisboa dá uma
especial prioridade às relações com Rabat (mais próxima de Lisboa que Madrid).
Depois de Marrocos, o Ministro dos Negócios Estrangeiros português visitou a
Argélia, o que pode ser enquadrado no projecto do gás natural. Recentemente
decorreu no Porto a Cimeira Luso-Marroquina. Em Outubro virá a Portugal o
Ministro dos Negócios Estrangeiros da Tunísia.
2.1. A cimeira Luso-Marroquina
A cimeira Luso-Marroquina, que decorreu de 2 a 4 de Julho de 1996, promete criar
um novo quadro de relacionamento entre Portugal e Marrocos. É a primeira cimeira
após a assinatura, entre os dois países, do Tratado de Amizade, Boa Vizinhança e
Cooperação, estando já marcado para 1997 o segundo encontro em Marrocos.
A declaração comum, um documento de 22 páginas, é na sua maior parte dedicada
às relações económicas. No domínio político ficou decidido «iniciar contactos
20
mensais regulares, alternadamente em Portugal e no Reino de Marrocos, entre
ministros, em todas as áreas abrangidas pelo relacionamento bilateral».
Além da institucionalização dos contactos ao nível governamental, foi decidido
criar um grupo de trabalho, ao nível de altos funcionários, para as questões de política
internacional, de defesa e de segurança, e outro grupo para acompanhar as relações
com a UE.
No domínio económico, a declaração comum revela que foram abordados aspectos
relacionados com a construção, por portugueses, de auto-estradas em Marrocos e
definiram-se diversos vectores de cooperação entre instituições e empresas
portuguesas e marroquinas. Ficou aberta a possibilidade de participação de empresas
portuguesas em grandes projectos de infraestruturas, «já decididos pela parte
marroquina», nomeadamente nos sectores energéticos e da habitação. Para esse efeito,
assumiu-se o compromisso de constituir consórcios financeiros.
Também ao nível cultural, o relacionamento entre os dois países é ilustrado pelo
Centro de Estudos Árabes em Évora. Na cimeira foi ainda acordado que a língua
portuguesa passaria a ser uma disciplina obrigatória nas universidades de Fez e Rabat.
Merece ainda referência a cooperação que os dois países virão a estabelecer no
domínio da preservação do património histórico marroquino de origem portuguesa.
Dias antes da cimeira entre o Primeiro-Ministro português, António Guterres e o
Primeiro-Ministro e Ministro dos Negócios Estrangeiros marroquino, Abdelatif Filali,
os trabalhos foram desenvolvidos pelo ICEP, DGC (Direcção Geral do Comércio) e
IAPMEI com a Câmara de Comércio Luso-Marroquino e funcionários do Ministério
do Comércio Marroquino no sentido de identificar sectores de investimento e
partenariado, organizar missões empresariais e dinamizar a linha de crédito de apoio
à exportação que não tem sido utilizada.
21
2.2. A dívida da Argélia
A 8 de Março de 1996 foi assinado um acordo de reescalonamento de dívida
(capital e juros) com a Argélia, no montante global de 9 milhões de dólares.
A dívida oficial de médio e longo prazo da Argélia a Portugal era de 88 milhões de
dólares em 31 de Dezembro de 1995.
2.3. Cooperação a nível empresarial
A
Associação
Industrial
Portuguesa
(AIP)
tem tomado
iniciativas
de
aprofundamento das relações com os países da Bacia do Mediterrâneo, quer ao nível
bilateral, como no quadro das instâncias comunitárias, com propostas próprias.
O relacionamento institucional dos industriais portugueses com os seus congéneres
do Mediterrâneo data dos anos 80, com a assinatura de protocolos nas áreas da
informação e formação profissional. Existem neste momento protocolos com as
associações congéneres da AIP de Marrocos (1987), Turquia (1988), Egipto (1988),
Tunísia (1991) e Argélia (1992).1
Além disso, a AIP desenvolve uma série de acções dirigidas aos países da bacia do
Mediterrâneo, como seminários, missões empresariais, encontros internacionais e
recepção de delegações governamentais. A AIP tem, por exemplo, participado na
divulgação das acções do programa comunitário Med-Partenariat com a organização
de seminários e «mailings».
No quadro europeu, a AIP propôs na Confederação dos Empregadores e Industriais
da Europa (UNICE) a criação da Rede Mediterrâneo. Esta rede, que integra um grupo
de peritos das associações, tem como objectivo definir as posições da UNICE sobre a
política Mediterrânea da UE.2
No quadro da iniciativa de criação da Rede Mediterrâneo, a AIP organizou o
primeiro Encontro EuroMediterrâneo de Federações Industriais, que decorreu em
Lisboa, a 22 de Setembro de 1995. Participaram nesse encontro quatro dos países da
Declaração de Barcelona - Argélia, Marrocos, Tunísia e Turquia - e sete dos 15 além de Portugal, Áustria, Espanha, França, Grécia, Holanda e Itália, contando, ainda,
com representantes da Comissão Europeia.
22
O Fórum EuroMediterrâneo de Federações Empresariais vai contar também com a
AIP como membro fundador. E a Associação de Feiras da Bacia do Mediterrâneo,
onde a AIP é responsável pela área da formação profissional, pretende apresentar à
Comissão um projecto global de cooperação.
3. As relações económicas
Os investimentos realizados nos países que assinaram a declaração de Barcelona
são pouco significativos. De acordo com o ICEP, há pequenos e poucos investimentos
em Marrocos, Tunísia e Argélia. Neste momento existem algumas intenções de
investimento em Marrocos, com oportunidades no sector das obras públicas.
Num sentido mais lato, pode considerar-se que Portugal está, com a Espanha,
envolvido num dos maiores projectos de investimento realizado em conjunto por
países da UE e da bacia do Mediterrâneo: a rede de gás natural com a construção do
gasoduto do Magrebe, que tendo como fornecedor a Argélia passa por Marrocos.
As empresas portuguesas têm vindo a desenvolver um interesse crescente por
projectos de cooperação desenvolvidos no âmbito do programa MEDA.
3.1. O investimento directo
Em termos globais, o investimento directo (ID) português na bacia do
Mediterrâneo é reduzido. O país com maior importância neste domínio tem sido
Marrocos, embora o montante de investimento se tenha reduzido durante os últimos
anos. Os investimentos dirigiam-se tradicionalmente para o sector pesqueiro e
indústrias extractivas, que têm sido os sectores preferidos. Recentemente foi
anunciado um investimento de vulto na indústria cimenteira marroquina. Por outro
lado, começam a assumir algum significado os investimentos no sector do «comércio
por grosso e a retalho, restaurantes e hotéis».
3.1.1. O projecto Gás Natural
O projecto de gás natural, não sendo um ID, reúne a característica única de
envolver países da UE e da bacia do Mediterrâneo. Argélia, Marrocos, Espanha e
23
Portugal estão assim envolvidos no maior projecto realizado em conjunto por
empresas das duas regiões.
O investimento global será da ordem dos 4125 MECUS, dos quais 1825 MECUS
realizados em Portugal (44 por cento).3 O projecto vai introduzir o gás natural em
Portugal e expandir a rede em Espanha, através da construção do gasoduto do
Magreb, que sai da Argélia (Hassi R’Mel), passa por Marrocos e entra na Europa no
estreito de Gibraltar (ver Quadro I - Rede Peninsular em 1993 e em 2000). As
empresas envolvidas são a Transgás portuguesa, a Enagás espanhola e Sonatrach
argelina.
No fim do ano passado a Argélia já tinha concretizado a sua parcela do projecto e a
Espanha realizado a ligação à sua rede de gás, em Cordoba, até então fornecida por
via marítima em Barcelona e Cartagena.
Portugal fez, nesse período, a construção da rede de Braga a Setúbal,
concretizando 34 por cento do investimento a realizar. Durante este ano (1996), a
Transgás prevê concluir a ligação entre Leiria e Cordoba, iniciando a exploração do
sistema em 1997.
O contrato assinado entre a Transgás e a Sonatrach consagra o fornecimento de 2,5
mil milhões de metros cúbicos por 25 anos, no sistema «take or pay», isto é, mesmo
que não seja consumido será pago. A central eléctrica da Tapada do Outeiro (onde se
realiza 28 por cento do investimento global) funcionará como uma espécie de garantia
de consumo mínimo.
Os problemas de segurança e o agravamento do défice comercial com a Argélia
são as principais desvantagens do projecto. As vantagens são o aumento da
competitividade da indústria portuguesa por redução dos custos energéticos, o efeito
positivo ao nível ambiental por redução das emissões de dióxido de enxofre e de
carbono e a diversificação das fontes de energia, hoje muito concentradas no petróleo
(72% do consumo de energia em 1995).
A história de fornecimento de gás natural da Argélia à Europa modera a avaliação
do risco associado à instabilidade política do país. O sul da Europa recebe gás natural
da Argélia há 30 anos4, sem que se tenha registado uma falha no fornecimento.
24
De qualquer forma, o projecto enquadra medidas de precaução. Por um lado, e já
com a construção desta rede, estão garantidas reservas nacionais equivalentes ao
consumo de 20 dias úteis, armazenadas em cavernas subterrâneas na zona de Pombal,
a 1000/1500 metros de profundidade. A prazo, perspectiva-se a construção de um
terminal de gás líquido na costa atlântica, orçado em 257 MECUS (50 milhões de
contos).
O agravamento do défice comercial bilateral é estimado em 155 MECUS (30
milhões de contos), valor que corresponde ao pagamento do fornecimento de gás à
Argélia no ano de cruzeiro de funcionamento do projecto, em 1999. Um valor
superior ao montante global das importações em 1995 (119 MECUS).
3.2. As relações comerciais
O comércio com os países extracomunitários da bacia do Mediterrâneo tem ainda
um peso reduzido, mas em anos recentes tem vindo a crescer a ritmo significativo. As
exportações representaram 9,7 por cento das vendas de Portugal aos países extracomunitários e as importações 6,5 por cento. A balança comercial portuguesa com os
países da bacia do Mediterrâneo tem melhorado. Está-se a procurar melhorar a
eficácia das linhas de crédito bilaterais abertas por Portugal para promover o
comércio com alguns países da região (nomeadamente Marrocos, Argélia e Tunísia).
Apontam-se ainda dificuldades de transporte. Ao nível dos seguros de crédito, a
cobertura de risco comercial quase duplicou de 1993 para 1994.
3.2.1. O comércio externo
Em 1995 Portugal exportou para os 11 países 338 MECUS (65,5 milhões de
contos) e importou 426,9 MECUS (82,7 milhões de contos) (Quadro II). A taxa de
cobertura das importações pelas exportações foi de 79,2 por cento, tendo aumentado
sempre desde 1991, ano em que era de 32,4 por cento.
A média da taxa de crescimento nominal das exportações nos últimos quatro anos
foi de 22 por cento, enquanto no caso das importações se verificou uma estagnação
(Quadro III).
25
Quatro países dos 11 correspondiam a 70,7% das exportações para aquela região
(Israel, Marrocos, Turquia e Tunísia). Também quatro países (Argélia, Egipto,
Turquia e Marrocos) representavam 73,9 por cento das importações. (ver Quadro IV).
O petróleo (Óleos de petróleo) é o principal produto importado da Argélia, Egipto
e Turquia. Marrocos «fornece» peixe fresco e refrigerado, chumbo e algodão não
cardado. Nas exportações, os principais produtos vendidos para a região parecem ser
dos sectores do vidro e papel (ver Quadro V)
As principais dificuldades apontadas pelas empresas portuguesas para exportar
para essa região são:
•
Custos de transporte - como não existem ligações directas, a exportação exige
que se transporte os produtos até aos portos de Roterdão ou Barcelona. Como
os países que concorrem directamente com Portugal nesses mercados são a
França, Itália e Espanha, as empresas enfrentam uma desvantagem ao nível
dos custos de transporte;
•
Linhas de crédito pouco competitivas.
Os instrumentos de apoio à exportação parecem limitar-se ao PEASE (Programa
Especial de Apoio ao Sector Exportador), anunciado em 1993, com o objectivo de
diversificar as exportações portuguesas. As linhas de crédito disponíveis têm sido
pouco utilizadas, o que pode ser explicado pela falta de competitividade apontada
pelos empresários, mas projectam-se melhores.
3.2.2. Seguros de crédito à exportação
O risco político é o que assume maior peso nos seguros realizados pela COSEC
(Companhia de Seguros de Crédito) para aquela região, envolvendo assim o Estado
português.
As responsabilidades da COSEC em 31 de Março de 1996 eram 3,4 MECUS
(665,3 mil contos) em riscos comerciais (garantidos pela companhia) e 43,3 MECUS
(8,4 milhões de contos) em riscos políticos (cobertos pela COSEC, mas garantidos
pelo Estado português). A Argélia é responsável por 97 por cento das
responsabilidades assumidas no domínio dos riscos políticos.
26
De 1993 para 1994 o montante capitais garantidos no âmbito do risco comercial
aumentaram praticamente para o dobro mantendo-se ao mesmo nível em 1995
__________________________
1
Os protocolos foram assinados com as seguintes associações: Marrocos - Confédération Générale
Economique Marocaine (CGEM); Turquia - Turkish Industrialist’s and Businessmen’s Association
(TUSIAD); Egipto - Federation of Egyptian Industries; Tunísia - Union Tunisienne de l’Industrie, du
Commerce et de l’Artisanat (UTICA) e Argélia - Confédération Algérienne du Patronat.
2
Em Outubro de 1995 a Rede Mediterrânea já tinha concluído a sua primeira posição, sobre a “Política
Mediterrânea da União Europeia” e em Junho de 1996 estava a trabalhar na preparação de uma posição
sobre a “Cooperação Industrial Euromediterrânea”.
3
De acordo com os valores fornecidos pela Transgás, o investimento global é de 4,5 milhões de
dólares, cerca de 800 milhões de contos, dos quais 354 milhões concretizados em Portugal. A taxa de
câmbio utilizada corresponde à média de 1995.
4
A Argélia tem uma quota de 60% do gás consumido em Itália, a totalidade do sul de França e de 80%
em Espanha. Os restantes 20% consumidos em Espanha são fornecidos pela Líbia.
27
QUADROS
28
Quadro II
Países
Argélia
Chipre
Egipto
Israel
Jordânia
Líbano
Malta
Marrocos
Síria
Tunísia
Turquia
Total
Por memória
Total extra-EU
em %
Comércio com os 11 em 1995
(em MECUS)
Exportações
Importações
24,868
119,039
12,855
0,695
11,487
89,857
86,911
34,872
14,249
2,017
13,513
0,161
19,178
37,051
61,941
47,813
2,892
20,800
44,755
15,849
45,628
58,759
338,277
426,912
3503,076
9,7
6607,034
6,5
29
Saldos
-94,171
12,160
-73,370
52,039
12,232
13,352
-17,872
14,128
-17,908
28,907
-13,131
-88,635
Quadro III
Relações Comerciais com os Países da Declaração de Barcelona
(Saldo em MECUS e taxa de cobertura em %)
Países
Argélia
Saldo
Taxa de cobertura
Chipre
Saldo
Taxa de cobertura
Egipto
Saldo
Taxa de cobertura
Israel
Jordânia
Líbano
Saldo
Marrocos
-94,171
8,6
5,0
14,9
18,5
20,9
11,810
8,162
8,187
11,941
12,160
809,7
256,1
293,0
1519,4
1850,4
-135,3447
-192,8341
-70,028
-115,3411
-78,370
5,0
4,5
11,2
9,0
12,8
16,282
18,830
29,526
37,313
52.039
170,8
198,7
208,1
249,2
0,605
1,865
9,013
12,232
Taxa de cobertura
295,6
353,8
482,8
4948,8
706,6
Saldo
9,300
5,546
7,611
9,577
13,352
35487,2
12502,6
30512,8
9895,3
8397,8
-17,872
Saldo
2,566
3,080
7,356
7,581
Taxa de cobertura
211,7
191,1
2099,3
501,0
51,8
Saldo
5,713
21,930
13,426
18,467
14,128
Saldo
Saldo
Saldo
Taxa de cobertura
TOTAL
1995
162,2
Taxa de cobertura
Turquia
1994
-173,5359
0,575
Taxa de cobertura
Tunísia
1993
-235,1315
Saldo
Taxa de cobertura
Síria
1992
-156,5123
Taxa de cobertura
Taxa de cobertura
Malta(1)
1991
-189,2771
Saldo
Taxa de cobertura
118,2
213,9
146,1
145,1
129,5
-3,743
-5,584
-14,972
-10,321
-17,90796
40,1
24,2
23,5
24,2
13,9
-1,883
0,595
2,195
30,903
28,907
54,9
117,6
132,7
304,7
282,4
-37,76596
-14,75596
-0086
-33,20704
-13,131
30,5
61,8
99,8
47,7
-88,635
-321,7717
-310,938
-250,0503
-207,6107
-88,635
32,4
33,9
48,6
59,3
79,2
Fonte: ICEP/INE e Banco de Portugal
(1) Malta: o aumento das importações registado em 1995 é explicado pela rubrica “Outros veículos aéreo (helicópteros e aviões)
e veículos especiais” que representam 95.4% das importações)
As taxas de câmbio utilizadas forma publicadas pelo Banco de Portugal:
178,833(91); 187,368(94) e 193,897(95).
30
Quadro IV
Estrutura das exportações e importações 91 e 95
Países
Argélia
Chipre
Egipto
Israel
Jordânia
Líbano
Malta
Marrocos
Síria
Tunísia
Turquia
Total
Exportações
1991
1995
11,5
8,7
4,7
27,5
0,6
6,0
3,2
24,0
1,6
1,5
10,7
100,0
7,4
3,8
3,4
25,7
4,2
4,0
5,7
18,3
0,9
13,2
13,5
100,0
Fontes: ICEP/INE
31
Importações em %
1991
1995
43,5
0,3
29,9
5,5
0,1
0,0
0,5
6,6
1,3
0,9
11,4
100,0
27,9
0,2
21,0
8,2
0,5
0,0
8,7
11,2
4,9
3,7
13,8
100,0
Estrutura das exportações em 1995
Argélia
7%
Turquia
13%
Chipre
4%Egipto
3%
Tunísia
13%
Síria
1%
Marrocos
18%
Malta
6%
Jordânia
Líbano 4%
4%
Estrutura das Importações em 1995
Turquia
14%
Argélia
28%
Tunísia
4%
Síria
5%
Chipre
0%
Marrocos
11%
Malta
9%
Líbano
0%
Egipto
21%
Jordânia
0%Israel
8%
32
Quadro V
Países
Argélia
Chipre
Egipto
Israel
Jordânia
Líbano
Malta
Marrocos
Síria
Tunísia
Turquia
PRINCIPAIS PRODUTOS EXPORTADOS EM 1995
Exportações
Importações
33,5% - Pastas químicas de madeira
30,1% - Papel e cartão não revestidos em
rolos ou folhas
Diversificada: Embalagens de vidro,
automóveis, obras de cortiça
Em 1995: Barcos
Papel e cartão
Óleos de girassol, polímeros de etileno
Embalagens de vidro
Moldes
Pastas químicas de madeira
Óleos de petróleo
Medicamentos
Papel e cartão (inic. Em 95)
Óleo de soja
Pedras de cantaria ou de construção
Turboreactores, turbopropulsores e outras
turbinas de gás
Óleos de petróleo
Diversificada:
cabos
de
filamentos
sintéticos (9,7%);
Madeira serrada (7,3%);
Óleo de petróleo (7%)
Papel e cartão; conservas de peixe
Óleos de petróleo (56,8%); Óleo de soja
(20,9%) com inicio em 95)
Pastas
químicas
de
madeira;
Hidrocarbonetos cíclicos;
Minérios de cobre;
Óleo de soja
33
68,5% - Óleos de Petróleo ou de minerais
betuminosos
28% - Óleos brutos de petróleo
betuminosos
25,3 – Fechos de correr
16,9 – Peles em bruto
Óleos brutos de petróleo
Óleos de petróleo
Algodão não cardado
Adubos e fertilizantes
Águas, incluindo as minerais
Máquinas
automáticas
processamento de dados
para
Televisões e aparelhos para circuitos
eléctricos
(Veículos aéreos em 1995)
Peixe fresco ou refrigerado (19,8%);
Chumbo (13%);
Fios de algodão (9,5%)
Algodão não cardado
(superior a 50%)
Azeite de oliveira (62,3%)
Adubos ou fertilizantes (21%)
Pouco concentrada: Óleos de petróleo;
produtos laminados planos

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