Revista IAHGP 2014_Artigo Filipa Ribeiro

Transcrição

Revista IAHGP 2014_Artigo Filipa Ribeiro
5HYLVWDGR
,QVWLWXWR
$UTXHROyJLFR
+LVWyULFRH
*HRJUiI LFR
3HUQDPEXFDQR
REVISTA DO INSTITUTO ARQUEOLÓGICO, HISTÓRICO E GEOGRÁFICO PERNAMBUCANO - IAHGP
NÚMERO 67. RECIFE, 2014. ISSN 0103-1945.
CAPA: RETRATO DE ALFREDO DE CARVALHO (1870-1916). ÓLEO SOBRE
TAZAR DA CÂMARA. ACERVO DO IAHGP. FOTOGRAFIA:
GEORGE F. CABRAL DE SOUZA.
TELA DE
BAL-
EDITORES
ALEXANDRE FURTADO DE ALBUQUERQUE CORRÊA (UPE/IAHGP)
BRUNO ROMERO FERREIRA MIRANDA (UFRPE/IAHGP)
CONSELHO EDITORIAL
ANTÔNIO JORGE DE SIQUEIRA (UFPE/IAHGP)
BRUNO AUGUSTO DORNELAS CÂMARA (UPE/IAHGP)
ERNST VAN DEN BOOGAART (IAHGP - PAÍSES BAIXOS)
JOSÉ LUIZ MOTA MENEZES (UFPE/IAHGP)
MARCUS JOAQUIM MACIEL DE CARVALHO (UFPE/IAHGP)
ONÉSIMO JERÔNIMO SANTOS (IPHAN/IAHGP)
YONY DE SÁ BARRETO SAMPAIO (UFPE/IAHGP)
CONSELHO CONSULTIVO
ACÁCIO CATARINO (UFPB)
ANA LÚCIA DO NASCIMENTO OLIVEIRA (UFRPE)
ANTÔNIO PAULO REZENDE (UFPE)
CARLA MARY DA SILVA OLIVEIRA (UFPB)
DANIEL DE SOUZA LEÃO VIEIRA (UFPE)
GISELDA BRITO SILVA (UFRPE)
JOSÉ MANUEL SANTOS PÉREZ (UNIVERSIDADE DE SALAMANCA - ESPANHA)
MARIA ÂNGELA DE FARIA GRILLO (UFRPE)
MARIANA DE CAMPOS FRANÇOZO (UNIVERSIDADE DE LEIDEN - PAÍSES BAIXOS)
RÔMULO LUIZ XAVIER DO NASCIMENTO (UPE/IAHGP)
SCOTT JOSEPH ALLEN (UFPE)
SEVERINO VICENTE DA SILVA (UFPE)
SUELY CREUSA CORDEIRO DE ALMEIDA (UFRPE)
WELLINGTON BARBOSA DA SILVA (UFRPE)
Instituto Arqueológico, Histórico e Geográfico Pernambucano – IAHGP
Fundado em 1862
RUA DO HOSPÍCIO, 130, BOA VISTA, RECIFE-PE, BRASIL. CEP 50.080-060
55 81 3222-4952
@ [email protected]
DIRETORIA DO INSTITUTO ARQUEOLÓGICO, HISTÓRICO E GEOGRÁFICO
PERNAMBUCANO – IAHGP PARA O TRIÊNIO 2014-2017
JOSÉ LUIZ MOTA MENEZES
PRESIDENTE:
1º VICE-PRESIDENTE:
ISNARD PENHA BRASIL JÚNIOR
2º VICE-PRESIDENTE:
RAMIRES COTIAS TEIXEIRA
3º VICE-PRESIDENTE:
GILDA MARIA WHITAKER VERRI
1º SECRETÁRIO:
REINALDO JOSÉ CARNEIRO LEÃO
2º SECRETÁRIO:
RAFAEL HENRIQUE PIMENTEL DE PAULA
1º TESOUREIRO:
SILVIO TAVARES DE AMORIM
2º TESOUREIRO:
FRANCISCO BONATO PEREIRA DA SILVA
DIRETORA DE PATRIMÔNIO:
FERNANDA IVO NEVES
COMISSÃO DE ADMISSÃO DE ASSOCIADOS:
ANTÔNIO CORRÊA DE OLIVEIRA
MARIA CRISTINA CAVALCANTI ALBUQUERQUE
RAMIRES COTIAS TEIXEIRA
COMISSÃO DE HISTÓRIA E GEOGRAFIA:
CARLOS BEZERRA CAVALCANTI
GILVAN DE ALMEIDA MACIEL
MARIA JOSÉ BORGES LINS E SILVA
COMISSÃO DE ARQUEOLOGIA E ETNOGRAFIA:
FERNANDO GUERRA DE SOUZA
MARCUS JOAQUIM MACIEL DE CARVALHO
ROBERTO MAURO CORTEZ MOTTA
COMISSÃO DE GENEALOGIA E HERÁLDICA:
REINALDO JOSÉ CARNEIRO LEÃO
TÁCITO LUIZ CORDEIRO GALVÃO
YONY DE SÁ BARRETO SAMPAIO
COMISSÃO DE DIVULGAÇÃO E INFORMÁTICA:
BRUNO AUGUSTO DORNELAS CÂMARA
BRUNO ROMERO FERREIRA MIRANDA
JACQUES ALBERTO RIBEMBOIM
CONSELHO FISCAL:
PAULO FREDERICO LOBO MARANHÃO
ROQUE DE BRITO ALVES
TÁCITO AUGUSTO DE MEDEIROS
SUPLENTES
GERALDO JOSÉ MARQUES PEREIRA
LUIZ JORGE LIRA NETO
YONY DE SÁ BARRETO SAMPAIO
5HYLVWDGR
,QVWLWXWR
$UTXHROyJLFR
+LVWyULFRH
*HRJUiI LFR
3HUQDPEXFDQR
1~PHUR
5HFLIH
SUMÁRIO
NOTA
DOS
EDITORES ..................................................................................9
ARTIGOS
OS
HOLANDESES E A CONSOLIDAÇÃO DO SISTEMA ECONÔMICO
ATLÂNTICO SUL SEISCENTISTA
FILIPA RIBEIRO DA SILVA ........................................................................... 11
DO
A
MÃO QUE AFAGA.
ESTRATÉGIAS RETÓRICAS NAS CRÔNICAS PORTUGUESAS
ATLÂNTICO SUL
KLEBER CLEMENTINO ................................................................................. 39
DA PRESENÇA NEERLANDESA NO
INVENTÁRIO DOS BENS DO CASAL: FAMÍLIA, ELITE LOCAL E BENS MATERIAIS
EM CIMBRES, NOS SERTÕES DE ARAROBÁ, PERNAMBUCO (1762-1836)
ALEXANDRE BITTENCOURT LEITE MARQUES E
ANA LÚCIA DO NASCIMENTO OLIVEIRA ......................................................... 55
O HOSPITAL PEDRO II
DO
RECIFE. UM
RESGATE HISTÓRICO
E O TOMBAMENTO ESTADUAL
GERALDO JOSÉ MARQUES PEREIRA ............................................................... 91
SERÁ MESMO DE NOSSA SENHORA O MORRO DA CONCEIÇÃO?
JAMERSON KEMPS ................................................................................... 113
OS CAVALCANTI DE ALBUQUERQUE DE PERNAMBUCO E A POLÍTICA ENTRE O
PRIMEIRO REINADO E AS VÉSPERAS DO DOMÍNIO DO PARTIDO DA PRAIA
PAULO HENRIQUE FONTES CADENA ........................................................... 141
FRANS POST
E O CARRO DE BOIS: O IMAGINÁRIO
BRASIL HOLANDÊS
DANIEL DE SOUZA LEÃO VIEIRA ................................................................ 165
DA PAISAGEM DO
ORDENS, BANDOS E FINTAS PARA FAZER “A CRUEL GUERRA”: OS GOVERNADORES
PERNAMBUCO, A CÂMARA DAS ALAGOAS E AS “ENTRADAS” NOS PALMARES NA
SEGUNDA METADE DO SÉCULO XVII
ARTHUR ALMEIDA SANTOS DE CARVALHO CURVELO ........................................ 193
DE
ENSAIO
OLINDA: UM ROTEIRO
JOSÉ LUIZ MOTA MENEZES ....................................................................... 225
POLÍTICA
EDITORIAL E NORMAS GERAIS PARA A APRESENTAÇÃO DE TEXTOS
....... 245
NOTA DOS EDITORES
Um dos principais compromissos do Instituto Arqueológico,
Histórico e Geográfico Pernambucano – IAHGP, desde as suas
origens, é levar a cabo esforços para a divulgação das pesquisas sobre a história e a cultura de Pernambuco. Esse objetivo
continua norteando todas as ações realizadas por este mais que
sesquicentenário sodalício. A Revista que o leitor tem em mãos
nasceu com o Arqueológico no século XIX. Seu primeiro número viu a luz em 1863. Desde então, colaboradores e editores
trabalharam incansavelmente para manter vivo o periódico que
é um marco incontornável da produção historiográfica brasileira. Períodos de grandes dificuldades resultaram em pausas na
publicação da Revista, mas ela jamais deixou de circular, sendo
por isso, um dos mais antigos periódicos de história em funcionamento no mundo. É com muita alegria que chegamos ao ano
152 de existência do Arqueológico e que podemos anunciar a
publicação de mais um número da Revista.
Este é o sexto número consecutivo publicado desde a retomada da periodicidade em 2009. Esta conquista não seria possível sem a colaboração dos associados do IAHGP e de pesquisadores de outras instituições que gentilmente submetem seus
textos aos pareceristas do nosso periódico. Desde já, registramos nossos mais sinceros agradecimentos. A circulação de um
periódico não-comercial como é o nosso depende, obviamente,
de apoio material. Esta nova fase da Revista do IAHGP jamais
ocorreria não fosse o apoio incondicional e constante da Companhia Editora de Pernambuco - CEPE. Devemos um pleito de
gratidão aos quadros dirigentes da CEPE que nunca hesitaram
em fazer valer o dispositivo constitucional estadual que delega
à imprensa oficial de Pernambuco o dever de produzir a Revista
do IAHGP. Agradecemos ainda aos quadros técnicos que realizam de forma primorosa a confecção deste periódico.
Este número mais uma vez combina as colaborações de pesquisadores de diversas instituições e com perfis de atuação bastante variados. O período holandês, tema dos mais frequentes
na história da Revista se faz presente novamente em três colaborações. Filipa Ribeiro da Silva aborda as intervenções dos
holandeses na formação do sistema econômico no Atlântico
Sul em meados do século XVII. Kleber Clementino analisa as
crônicas portuguesas sobre o período enfocando as estratégias
discursivas presentes nelas. Daniel Vieira retoma a abordagem
à esta fase de nossa história a partir das imagens produzidas
por Frans Post, concretamente a tela “O carro de bois” de 1638.
O período colonial é enfocado também pelo artigo de Arthur
Curvelo, que analisa a comunicação política entre os governadores de Pernambuco e a câmara das Alagoas do Sul durante
o conflito em Palmares, na segunda metade do século XVII.
Alexandre Bittencourt e Ana Nascimento trabalham com uma
instigante documentação cartorária do sertão, especificamente
com inventários post-mortem da vila de Cimbres na passagem
do século XVIII para o XIX. O cenário político de Pernambuco
na primeira metade do século XIX é analisado por Paulo Cadena com destaque para a atuação da família Cavalcanti de Albuquerque. Jamerson Kemps apresenta um enfoque atual das relações entre religiosidade e sociedade no Morro da Conceição a
partir de um cenário historicamente construído. Completando o
painel de textos temos o artigo de Geraldo Pereira – que discorre sobre a história do Hospital Pedro II no Recife no âmbito dos
esforços para o seu tombamento como patrimônio histórico do
Estado de Pernambuco – e o ensaio de José Luiz Mota Menezes
que nos apresenta um instigante roteiro de leitura dos traços
urbanos e arquitetônicos da cidade de Olinda.
Desejamos que os textos aqui apresentados possam suscitar novas pesquisas e novas perguntas sobre a história de
Pernambuco.
Recife, dezembro de 2014.
Os editores.
OS HOLANDESES E A
CONSOLIDAÇÃO DO SISTEMA
ECONÔMICO DO ATLÂNTICO SUL
SEISCENTISTA, C. 1630-16541
Filipa Ribeiro da Silva2
Resumo: Este artigo analisa o papel desempenhado pelos mercadores privados das Províncias Unidas dos Países Baixos do Norte sediados no Brasil
e pela Companhia Holandesa das Índias Ocidentais na consolidação do
sistema econômico do Atlântico Sul durante o século XVII. Para tal, vamos
examinar as trocas políticas, militares e comerciais estabelecidas entre as
capitanias do Nordeste Brasileiro e Angola durante os anos de 1630 a 1654.
Palavras-chave: Holandeses, Comércio, Atlântico Sul.
The Dutch and the consolidation of the seventeenth-century South Atlantic complex, c.1630-1654
Abstract: This article looks at the seventeenth century South Atlantic and
explores the role played by the Dutch private merchants based in Brazil
and by the Dutch West India Company for the consolidation of the South
Atlantic. To do so, we will focus on the political, military and commercial
exchanges between the North-eastern Brazilian captaincies and Angola during the years 1630 and 1654.
Keywords: Dutch, Commerce, South-Atlantic.
1
Artigo recebido e aprovado para publicação em abril de 2014.
2
Professora Assistente do Departamento de História da Faculdade de Ciências
Sociais da Universidade de Macau, SAR China.
Revista do IAHGP, Recife, n. 67, pp. 11-38, 2014
12
Filipa Ribeiro da Silva
INTRODUÇÃO
Nos últimos anos, a historiografia sobre a economia atlântica tem claramente demonstrado que ao longo do Período
Moderno, o Atlântico Sul emergiu como um sistema econômico, social, cultural e político próprio, e em muitas ocasiões
operando independentemente dos poderes coloniais sediados
na Europa (ELTIS, 2000:307; ALENCASTRO, 2000:62; Idem,
2007:118-119). Por outro lado, a informação recentemente reunida na base de dados do Tráfico de Escravos Transatlântico
(TSTD) e os estudos sobre o tráfico de escravos têm também evidenciado que a formação do sistema econômico do
Atlântico Sul remonta à década de 1570 e a sua afirmação na
globalidade da economia atlântica começa a tornar-se mais
patente a partir de meados do século XVII (DOMINGUES,
2007:477-501; SILVA, ELTIS, 2008:95-129; RIBEIRO, 2008:130154; MENDES, 2008:63-94).
Porém, a maior parte dos trabalhos sobre este sistema tem se
concentrado essencialmente nos séculos XVIII e XIX, que correspondem ao período áureo das trocas no Atlântico Sul (CANDIDO, 2008a:1-30, 2008b:63-84, 2011a:223-244, 2011b:239-272;
FERREIRA, 2006:66-99; LOPES, 2008:176; VERGER, 1997; FLORENTINO, 1997; RIBEIRO, 2006:9-27; FLORY, 1978; DONOVAN,
1990), sendo as grandes exceções a esta tendência mais geral
os estudos de Alencastro e Puntoni, entre outros (ALENCASTRO, 2000; PUNTONI, 1999, 1992). Sabemos, por isso, pouco
sobre o sistema do Atlântico Sul no período entre as décadas
de 1570 e 1650 e sobre o impacto da chegada dos mercadores
da Europa do Norte, em particular, das Províncias Unidas ao
Atlântico Sul e o papel que terão (ou não) desempenhado na
consolidação deste sistema econômico.
A chegada dos mercadores das Províncias Unidas ao Atlântico Sul, e especialmente, da Companhia das Índias Ocidentais
Holandesa (WIC), é, frequentemente, retratada na historiografia
como um momento de intenso conflito, conduzindo a grandes
perdas no comércio e noutros tipos de trocas no Atlântico Sul,
e entre este espaço econômico e a Europa (BOXER, 1952; EMRevista do IAHGP, Recife, n. 67, pp. 11-38, 2014
Os holandeses e a consolidação do sistema econômico
do Atlântico Sul seiscentista, c. 1630-1654
13
MER, 2003, 1997:57-69; MELLO, 1975, 20033). Recentes trabalhos
de pesquisa dedicados ao estudo de vários tipos de interações
estabelecidos entre portugueses e holandeses no Atlântico têm
vindo a alterar esta imagem das trocas Luso-Holandesas como
essencialmente conflituosas, ao demonstrar que, em regra, conflito e cooperação surgiram associados, quer a nível estatal,
quer entre privados. No entanto, com exceção para os estudos de Ebert, pouco é ainda sabido sobre a participação dos
mercadores da Europa do Norte no comércio do Atlântico Sul,
especialmente, no comércio bilateral estabelecido entre a Costa
Ocidental Africana (em particular Angola), o Brasil e a América do Sul entre o final de Quinhentos e meados de Seiscentos
(EBERT, 2003:49-76, 2008).
Este artigo procura preencher esta lacuna na historiografia
através do estudo do sistema econômico do Atlântico Sul durante o século XVII e do papel desempenhado pelos mercadores privados das Províncias Unidas sediados nas mesmas e no
Brasil, bem como o papel desempenhado pela WIC na consolidação desse sistema econômico, tal como viria a ser conhecido
e reconhecido nos séculos seguintes. Para tal, iremos examinar
algumas das trocas políticas, militares e comerciais estabelecidas entre as capitanias do Nordeste Brasileiro e Angola durante
os anos de 1630 e 1654.
Para analisar esta temática, começaremos por dar uma breve
panorâmica das estruturas legais que regulavam a participação
dos mercadores privados das Províncias Unidas no comércio
do Atlântico Sul. Passaremos depois à análise do período inicial
de atividade deste grupo de mercadores do Atlântico Sul, através do estudo da sua participação no comércio do Brasil e de
Angola. Seguir-se-á uma breve abordagem das relações políticas e comerciais estabelecidas entre o Brasil Holandês e Angola
durante o governo da WIC sobre estes territórios. Aqui, daremos especial atenção às negociações políticas entre o governo
3
Edição Holandesa: De Braziliaanse affaire: Portugal, de Republiek der Verenigde Nederlanden en Noord-Oost Brazilië, 1641-1669. BAREL, Catherine (trans.).
BOOGAART, E. van den (ed.). Zutphen: Walburg Pers, 2005.
Revista do IAHGP, Recife, n. 67, pp. 11-38, 2014
14
Filipa Ribeiro da Silva
da WIC no Brasil, em Luanda e nas Províncias Unidas. Para
concluir, examinaremos os circuitos comerciais e as trocas que
ligavam os dois territórios. É nosso objetivo principal salientar
o papel desempenhado por estas relações na consolidação do
sistema do Atlântico Sul.
Os dados aqui apresentados e discutidos foram reunidos durante sete anos de cuidadosa pesquisa nos arquivos holandeses.
Para o estudo dos mercadores privados envolvidos no Atlântico
Sul utilizamos a coleção dos arquivos notariais da cidade de
Amsterdã.4 A coleção da primeira WIC5 foi também essencial
para elaboração deste trabalho. Juntamente com relatos de viagens e a informação disponível na TSTD, todos estes materiais
foram fundamentais para reconstruir a participação das Províncias Unidas no Atlântico Sul. Comecemos, então, pela análise
das estruturas legais que nas Províncias Unidas regulavam o
comércio Atlântico durante o Período Moderno.
A
REGULAMENTAÇÃO DAS PROVÍNCIAS
COMÉRCIO PRIVADO NO ATLÂNTICO
UNIDAS
SOBRE
Até 1621 o comércio entre as Províncias Unidas, a América do Sul e a Costa Ocidental Africana, incluindo o Brasil e
Angola, era controlado por mercadores privados. Nas principais cidades portuárias das Províncias estava sediado um
bom número de “companhias” privadas e vários mercadores
independentes envolvidos nestes ramos de negócio (UNGER,
1940:194-217; ENTHOVEN, 2003:17-48). Naturalmente, nenhum destes “consórcios” tinha uma organização comercial
formal comparável à da futura WIC, dado que na sua maioria,
estas “firmas” somente contratavam mercadores e caixas para
defender os seus interesses a bordo dos navios, em terra, e a
bordo de uma espécie de feitorias-flutuantes (leggers) para co4
STADSARCHIEF AMSTERDAM (SAA) antigo Gemeente Archief van Amsterdam,
Notariële Archieven (Not. Arch.).
5
Nationaal Archief, Oude West-Indische Compagnie, (NA, OWIC).
Revista do IAHGP, Recife, n. 67, pp. 11-38, 2014
Os holandeses e a consolidação do sistema econômico
do Atlântico Sul seiscentista, c. 1630-1654
15
merciar no Brasil e na Costa Ocidental Africana ( JONES [Ed.],
1983:21-29, 45-96; FLEUR, 2000:28, 47, 83-103; SILVA, 2010:1938). O estabelecimento da WIC pelos Estados Gerais em 1621
iria pôr fim a este período inicial de livre comércio, dado que
à Companhia seria concedido um monopólio sobre todo o
comércio Atlântico (EMMER, 1981:71-95; HEIJER, 19946, BOOGAART, EMMER, 1979:353-375).
Desde a sua formação, a Companhia teve sempre grande
oposição por parte dos mercadores de Amsterdã, e das cidades portuárias do Norte das Províncias, que tinham importantes
investimentos nas pescas do Atlântico Norte, no comércio do
açúcar Brasileiro e do pau-Brasil, no comércio do sal com a
América do Sul, e no comércio do ouro, marfim e escravos com
a Costa Ocidental Africana. Na sequência desta contestação,
alguns destes ramos comerciais viriam a ser retirados do monopólio da Companhia pouco tempo após o seu estabelecimento.
Porém, o caráter bélico da Companhia iria causar grandes perturbações nas atividades comerciais nas referidas áreas. Por exemplo, durante vários anos após a tomada das capitanias do nordeste Brasileiro, a produção do açúcar iria diminuir, provocando
grandes perdas para os donos das refinarias de açúcar nas Províncias Unidas (EBERT, 2003:49-76, 20087). Situação idêntica iria ser
vivida em Angola. Nos anos imediatos à ocupação de Luanda, os
oficiais da Companhia também não seriam capazes de assegurar
um abastecimento regular de mão-de-obra escrava à cidade, e,
consequentemente ao Brasil holandês (RATELBAND, 2003).
Durante o mesmo período, os pesados encargos financeiros
com as enormes campanhas militares organizadas pela Companhia para a tomada das possessões portuguesas também começariam a se fazer sentir ( JONG, 2005). A Companhia começaria
então a ter falta de dinheiro em caixa para operacionalizar os
negócios no Brasil, na África Ocidental, no Caribe, e na América do Norte, e a se debater com dificuldades para assegurar o
transporte de mercadorias, pessoal, e armas entre os seus vários
6
Capítulos 1, 2, e 3.
7
Capítulos 3, 5 e 6.
Revista do IAHGP, Recife, n. 67, pp. 11-38, 2014
16
Filipa Ribeiro da Silva
postos e colônias. Para minimizar estas perdas, a Companhia
iria garantir aos seus acionistas permissão para participar no
comércio com o Brasil, e com o Caribe em 1638. Em 1647, a
Companhia iria também concordar com a abertura do tráfico de
escravos entre Angola e o Brasil, o Caribe, e as Índias de Castela aos mercadores privados das Províncias Unidas (EMMER,
1981:79-81; DILLEN, 1970:169). Estas medidas seriam, porém,
insuficientes para impedir a perda do controle sobre o Brasil
e Angola por parte da Companhia, bem como a perda da sua
cota no comércio do Atlântico Sul após o início da década de
1650, como os dados relativos ao tráfico negreiro disponíveis
na TSTD mostram claramente.
Fonte: http://www.slavevoyages.org: 19-07-2012.
A PARTICIPAÇÃO DAS PROVÍNCIAS UNIDAS NO
ATLÂNTICO SUL: ENTRE O COMÉRCIO PRIVADO
E O MONOPÓLIO DA WIC
O
NO
COMÉRCIO PRIVADO DAS
ATLÂNTICO SUL
PROVÍNCIAS UNIDAS
No final do século XVI, as Províncias Unidas ofereciam residência a dois principais grupos de mercadores com interesses
econômicos no comércio com o Brasil e Angola: um grupo
Revista do IAHGP, Recife, n. 67, pp. 11-38, 2014
Os holandeses e a consolidação do sistema econômico
do Atlântico Sul seiscentista, c. 1630-1654
17
de mercadores cristãos de origem holandesa, flamenga, e alemã8 e outro grupo formado pelos judeus portugueses que se
haviam estabelecido em Amsterdã, e em outras cidades.9 O
primeiro grupo havia iniciado as suas atividades econômicas
no Atlântico Sul no final da década de 1580, investindo maioritariamente no comércio do açúcar Brasileiro e do pau-Brasil,
e no comércio do ouro, marfim, e peles com a África Ocidental. Durante este período inicial, a participação das Províncias
no comércio de escravos era mínima, como os estudos de
Postma, Eltis, Vos e outros já demonstraram (POSTMA, 1990,
2003:158-183; VOS, ELTIS, RICHARDSON, 2008:228-249). Entre os mercadores sediados nas Províncias, envolvidos neste
inicial comércio negreiro encontraríamos os judeus portugueses. Muitos deles operavam já nos circuitos comerciais que
ligavam a Península Ibérica e as Províncias Unidas a Angola
e ao Brasil, antes do seu estabelecimento nas Províncias, na
sequência da sua deslocação de Antuérpia devido ao bloqueio
holandês, e da Península devido à perseguição desencadeada
pelos tribunais inquisitoriais.
De fato, muitos destes mercadores combinavam no seu
portfólio investimentos em ambas as regiões do Atlântico Sul.
Os mercadores cristãos de origem holandesa, flamenga e alemã surgiam envolvidos simultaneamente no comércio com a
Costa Ocidental Africana e o Brasil. No que respeita aos judeus portugueses, estes surgiam não só envolvidos no comércio com o Brasil, mas também com as Índias de Castela,
nomeadamente enquanto responsáveis pelo abastecimento de
mão-de-obra escrava e estas colônias e pelo transporte de
mercadorias, como açúcar, pau-Brasil, tabaco, prata, ouro, e
pedras preciosas para a Europa (GELDERBLOOM, 2000:180181.224, 231, 238).10
8
Sobre os grupos mercantis das Províncias Unidas, ver, por exemplo: ANTUNES,
2004; GELDERBLOOM, 2000; LESGER, NOORDEGRAAF, (Eds.), 1995.
9
Sobre os Judeus Portugueses nas Províncias Unidas, na Europa do Norte e no
Atlântico em geral, ver: ISRAEL, 1998, 2002; KAPLAN, 2000; SWETSCHINSKI, 2000.
10
Para mais informação sobre as atividades desenvolvidas por estes mercadores em
ambas as margens do Atlântico Sul, ver: SILVA, 2011(capítulo 7).
Revista do IAHGP, Recife, n. 67, pp. 11-38, 2014
18
Filipa Ribeiro da Silva
Embora os dados recolhidos não nos permitam afirmar categoricamente que estes mercadores estariam envolvidos em rotas
comerciais bilaterais entre Angola e o Brasil, utilizando circuitos
comerciais independentes daqueles operados a partir das Províncias e de outros portos Europeus, a informação recolhida
deixa claro, como explicaremos em maior detalhe adiante, que
entre estes mercadores privados já existia uma clara noção de
que estes dois mercados do Atlântico Sul eram complementares.
Esta ideia de complementaridade entre os mercados angolano
e brasileiro tornar-se-ia bastante clara após o estabelecimento
da WIC em 1621, e, particularmente, nos anos que precedem
a conquista das capitanias do Nordeste Brasileiro em 1630. As
rotas comerciais, as práticas adotadas e a logística desenvolvida
pelos mercadores portugueses e brasileiros sediados no Brasil-Colônia desde a década de 1570 para comerciar no Atlântico
Sul certamente ajudaram a desenvolver esta crescente consciência entre os oficiais da WIC acerca da complementaridade econômica dos mercados angolano e brasileiro.
AS
POLÍTICAS DA WIC PARA O
ATLÂNTICO SUL
Quando a Companhia traçou planos para a ocupação de
grandes territórios, como o Brasil e Angola, o conselho dos Diretores (HEIJER, 1997, 2005:17-43) – também designados como
os Dezenove Senhores – consideraram pela primeira vez a possibilidade de estabelecer um governo central para o Atlântico
holandês, com sede no Atlântico Sul. Entre 1629 e 1630, quando a Companhia lançou o seu segundo ataque ao Brasil, mais
precisamente sobre a capitania de Pernambuco, o Conselho
dos Diretores, com a permissão dos Estados Gerais, começou
a preparar um documento que definia o novo governo central
das colônias Atlânticas holandesas, incluindo regulamentação
relativa à organização comercial, militar, judicial, administrativa
e fiscal – a chamada Ordem do Governo de 1629.
Com o estabelecimento de um governo central com poder
de tutela sobre todas as colônias e postos das Províncias no
Revista do IAHGP, Recife, n. 67, pp. 11-38, 2014
Os holandeses e a consolidação do sistema econômico
do Atlântico Sul seiscentista, c. 1630-1654
19
Atlântico, o principal objetivo da Companhia era criar certa
unidade administrativa, militar, judicial, comercial e fiscal que
se estendesse a todos estes espaços (SCHILTKAMP, 2003:320321). A sede deste governo central seria no Brasil. Isto significa que qualquer colônia a ser estabelecida pela Companhia
no Atlântico Sul ficaria sob a jurisdição do governo central
sediado no Brasil. Assim, de acordo com a Ordem de 1629, todos os postos e colônias que futuramente fossem tomados aos
portugueses, como iria suceder durante as décadas seguintes
de 1630 e 1640, nomeadamente, São Jorge da Mina, Achem,
Chama, e os territórios de São Tomé e Angola, ficariam, pelos
menos em teoria, sob a jurisdição do governo central no Brasil. Na prática, a realidade viria a ser bastante diferente, como
explicaremos mais adiante.
Na verdade, seria o Governo Central sediado no Brasil, e o
Conde Maurício de Nassau, na qualidade de governador-geral
do Brasil holandês, que iriam traçar o plano para a conquista
de Angola e de São Tomé aos Portugueses, e para manter os
laços econômicos entre ambas as margens do Atlântico Sul. O
principal argumento utilizado pelo Conde Nassau e o Governo Central para obter autorização do Conselho dos Diretores
e dos Estados Gerais para a expedição fora a elevada procura
de mão-de-obra escrava no Brasil holandês. Porém, a decisão
de preparar e financiar esta enorme operação naval e militar
pelo Conde Nassau e pelo Governo Central não fora tomada,
em nossa opinião, independentemente da jurisdição que a Ordem de 1629 concederia ao Governo Central sediado no Brasil
holandês sobre o Atlântico. Esta decisão não fora certamente
tomada de leve consciência e sem um conhecimento detalhado
dos laços entre estes dois territórios do Atlântico Sul.11 As ações
do Conde Maurício de Nassau e do Governo Central no Brasil
que se seguiram à tomada de Luanda e São Tomé, conduzindo
a grandes disputas entre estas duas entidades, o Conselho dos
Diretores e os Estados Gerais das Províncias Unidas são, em
11
NA, OWIC 8: 18 Dezembro 1640: “Les XIX au gouverneur et au conseil de Recife”
in JADIN [Ed.], 1975:I, 19 doc. 9.
Revista do IAHGP, Recife, n. 67, pp. 11-38, 2014
20
Filipa Ribeiro da Silva
grande medida, reveladoras das intenções associadas à tomada
destes territórios quer do ponto de vista administrativo, e militar, quer do ponto de vista político.
Imediatamente após a ocupação de Angola e São Tomé, o
Conde Maurício de Nassau e o Governo Central no Brasil solicitaram aos Estados Gerais a integração destes territórios sob a
tutela do dito Governo, dada a elevada procura de mão-de-obra
escrava na colônia, e as rotas diretas entre Angola e o Brasil, estabelecidas desde 1630, e utilizadas para satisfazer essa procura. Os Estados Gerais elaboraram um relatório sobre a questão
e submeteram o documento à apreciação do Conselho de Diretores da Companhia para aprovação. Para estudar a questão, os
Dezenove Senhores organizaram uma comissão. Em relatório
datado de 6 de Fevereiro de 1642, a comissão votou a favor da
proposta dos Estados Gerais. De acordo com este documento,
Angola deveria ficar sob administração direta dos Dezenove
Senhores. A colônia devia ser abastecida de provisões e bens
de troca diretamente a partir das Províncias Unidas. O seu governo devia, assim, ser separado do Governo Central no Brasil,
tal como, o era durante o domínio dos Portugueses. Do ponto
de vista da Comissão, não fazia sentido abastecer Angola e São
Tomé via Brasil, pois esta colônia também era abastecida pelas
Províncias. Além disso, de acordo com a opinião da comissão,
as viagens entre o Brasil e Luanda eram, mais longas do que a
rota entre as Províncias e Angola. Por outro lado, o Brasil já se
debatia com problemas financeiros, e a administração de outra
colônia poderia ser demasiado danosa para o Brasil holandês.12
A comissão argumentou, assim, que Angola e São Tomé deviam ser abastecidos diretamente a partir das Províncias, e todas as instruções para seu governo deviam ser emitidas e enviadas pelos Dezenove Senhores. Em sua opinião, a procura de
mão-de-obra escrava no Brasil não era um argumento suficientemente sólido para dar ao Governo Central no Brasil holandês
12
NA, Staten Generaal (SG), 5773: 6 Fevereiro 1642: “Rapport de la commission
formé par les XIX pour étudier le pro et le contre de la séparation de Loanda avec
le Brésil” in JADIN [Ed.], 1975:I, 200-202, doc. 76.
Revista do IAHGP, Recife, n. 67, pp. 11-38, 2014
Os holandeses e a consolidação do sistema econômico
do Atlântico Sul seiscentista, c. 1630-1654
21
jurisdição sobre Angola e São Tomé, pois outras colônias que a
Companhia pudesse vir a estabelecer no futuro também poderiam vir a necessitar de importar escravos africanos. Além disso,
a Comissão acrescenta ainda que embora o tráfico negreiro
fosse o principal comércio em Angola, existiam nesta região
outros ramos comerciais que a Companhia desejava desenvolver. Por outro lado, segundo a Comissão, o Brasil não tinha
como abastecer Angola e São Tomé sem os abastecimentos enviados a partir das Províncias. Na verdade, a experiência havia
já demonstrado que esta função redistributiva não funcionava
adequadamente, dado que os funcionários da Companhia em
Angola enfrentavam problemas com falta de alimentos, munições e provisões, apesar das elevadas quantidades de provisões
enviadas das Províncias para o Brasil. Além disso, a redistribuição das tropas transportadas das Províncias para o Brasil e
daí para a Angola sofria problemas semelhantes, pois as tropas
chegadas ao Brasil eram mantidas neste território. Consequentemente, o Brasil não conseguia assegurar a redistribuição dos
militares para os vários postos da Companhia da África Ocidental e em Angola e em São Tomé não era possível assegurar a
rotação dos soldados. Todos este argumentos seriam apresentados perante os Estados Gerais a 4 de Março de 1642.13
Os Estados Gerais aceitaram os argumentos da comissão e,
contrariamente aos pedidos do Conde Maurício de Nassau e
do Governo Central no Brasil, decidiu em favor da separação
dos governos de São Tomé e Angola do Governo do Brasil,
estabelecendo, assim, uma nova divisão administrativa para os
postos da WIC na África Ocidental. De acordo com essa nova
organização, a Costa Ocidental Africana ficaria dividida em dois
distritos com governos separados. O Distrito do Norte incluía
as áreas costeiras entre o Cabo das Três Pontas e o Cabo Lopo
Gonçalves (atual Cabo Lopes); enquanto o Distrito do Sul englobava as regiões costeiras a partir do referido Cabo até ao
13
NA, SG, no. 5773: 4 Março 1642: “Arguments des commissaires de XIX contre
un mémoire des États-Géneraux sur le gouvernement des nouvelles conquêtes
d’Afrique” in JADIN [Ed.], 1975:I, 237-239, doc. 84.
Revista do IAHGP, Recife, n. 67, pp. 11-38, 2014
22
Filipa Ribeiro da Silva
Cabo da Boa Esperança, bem como as Ilhas do Golfo da Guiné.
O governo do Distrito do Norte teria sede em Elmina e o do
Distrito do Sul em Luanda. Cada governo teria jurisdição sob
questões administrativas, judiciais, comerciais e religiosas.14 A
estes dois distritos, o Conselho dos Diretores viria adicionar um
terceiro: o Distrito de São Tomé, com o seu respectivo governo.
Esta ilha e o seu governo seriam responsáveis, na visão dos
Dezenove Senhores, pela ligação entre os outros dois distritos.15
Porém, este terceiro distrito não iria sobreviver por muito tempo. Logo, em 1645, as ilhas de São Tomé seriam incorporadas
no Distrito do Norte, mas mantendo governo próprio.16
Esta nova divisão administrativa teria também implicações
no que respeita ao abastecimento de alimentos, medicamentos,
roupa, munições, armas, materiais para equipar e reparar navios, etc. Tudo seria fornecido diretamente pelas Províncias a
estes governos. O abastecimento de mercadorias de troca para
o comércio, de pessoal civil, naval e militar seria assegurado
pelas várias Câmaras da Companhia, de acordo, com a sua quota de participação no capital da mesma. Na prática, nem tudo
funcionaria da melhor forma. Esta nova divisão jurisdicional e
a interferência dos Estados Gerais nos assuntos administrativos
da WIC dado as suas implicações do ponto de vista político e
diplomático para as Províncias, deu lugar a múltiplos conflitos
entre as várias entidades envolvidas, que, na maioria dos casos, resultariam em grandes perdas para os governos da África
14
VV. HH. Puissances, par leur lettre du 13 courant, nous ont chargés de hâter
l’élaboration de l’instruction sur le gouvernement du district sud de la côte
d’Afrique. Il s’étendra du sud de la ligne de ‘Equateur au cap de Bonne-Espérance, et comprendra notamment São Paulo de Loanda et l’île de São Tomé. Nous
avons établi cette instruction ici, à la réunion de ce 19, selon votre demande, et
nous en envoyons ci-joint la copie à VV. HH. Puissance. » NA, SG, 5773: 19 Março
1642: “Les XIX aux États-Généraux” in JADIN [Ed.], 1975:I, 250-251, doc. 96. NA,
OWIC 9: 19 Abril 1642: “Les XIX à Jacob Ruychaver, commandeur à la Guinée” in
JADIN [Ed.], 1975:I, 271 doc. 101.
15
NA, OWIC 9: 14 Junho 1642: “Les XIX aux directeurs de Loanda” in JADIN [Ed.],
1975:I, 296-302, doc. 112.
16
NA, OWIC 56, doc. 23: 28 Maio 1641: “Instruction du comte de Nassau et du
conseil secret du Brésil pour l’admiral Jol, P. Moortamer, C. Nieulant and J. Henderson” in JADIN [Ed.], 1975:I, 34-42, doc. 27.
Revista do IAHGP, Recife, n. 67, pp. 11-38, 2014
Os holandeses e a consolidação do sistema econômico
do Atlântico Sul seiscentista, c. 1630-1654
23
Ocidental, do Brasil e de outros territórios no Atlântico. Por
um lado, o abastecimento irregular de mercadorias de trocas
aos fortes na Costa Ocidental Africana pelas referidas entidades
causaria grandes perdas do ponto de vista comercial. Por outro
lado, o abastecimento insuficiente de alimentos e munições e o
deficiente sistema de rotação entre as tropas conduziria a grande descontentamento, que certamente viria a contribuir para
as perdas militares e territoriais que a Companhia viria a sofrer
não só na África Ocidental mas também no Brasil, no final da
década de 1640 e no decênio seguinte.17
Os territórios de Angola e São Tomé foram provavelmente
aqueles que mais sofreram as consequências diretas deste tipo
de problemas. Inicialmente, os abastecimentos a estas áreas deviam ser assegurados pelo Governo Central no Brasil. Em 1642,
após os Estados Gerais considerarem que esta prática era um
enorme encargo para as finanças da Colônia ficou decidido
que essas provisões passariam a ser enviadas diretamente das
Províncias pelo Conselho dos Diretores. Porém, os Dezenove
Senhores não libertaram formalmente o Governo Central no
Brasil da obrigação de ajuda e assistência a Angola e a São
Tomé.18 E, frequentemente, as Câmaras da Companhia nas Províncias também falhariam no abastecimento a estes territórios.
O pedido e os argumentos utilizados pelo Conde Maurício
de Nassau e o Governo Central do Brasil para solicitar jurisdição sobre os territórios de Angola e São Tomé são bastante
reveladores da visão que o Governador-geral e o Governo Central tinham do Atlântico Sul sob o domínio da WIC. Para eles,
o Atlântico Sul tinha uma lógica e unidade econômica própria,
que, caso fosse preservada, iria beneficiar as colônias da Companhia na região. Porém, os Estados Gerais e o Conselho dos
Diretores da Companhia não partilhavam da mesma opinião.
17
Para mais informação sobre as disputas entre as Câmaras de Amsterdã e da Zelândia relativamente aos investimentos no Brasil e ao financiamento dos conflitos
militares com Portugueses no Brasil-Colônia, ver, por exemplo: EMMER, 1981:7195 e DILLEN, 1970:160-170.
18
NA, OWIC 8: 3 Agosto 1643: “Les XIX au gouverneur et au Conseil du Recife
(extraits)” in JADIN [Ed.], 1975:I, 466-467, doc. 165.
Revista do IAHGP, Recife, n. 67, pp. 11-38, 2014
24
Filipa Ribeiro da Silva
Aquilo que parece ter estado aqui em jogo foi um conflito
entre diferentes interesses políticos e econômicos: de um lado,
tínhamos os interesses sediados no Brasil holandês e na Angola
holandesa, e, de outro, os interesses enraizados nas Províncias;
sendo os primeiros representados e defendidos pelos oficiais
da Companhia nesses territórios, e os segundos pelos Dezenove Senhores nas Províncias. Enquanto os Dezenove Senhores
estariam, pelo menos em teoria, a proteger os interesses dos
mercadores de açúcar e dos donos das refinarias de Amsterdã
(na prática e a longo-termo, as políticas adotadas pelo Conselho viriam a prejudicar os interesses destes grupos), o Governo
Central no Brasil e o Conde Maurício de Nassau defendiam os
interesses na Companhia na Colônia, nomeadamente as atividades dos colonos e dos mercadores portugueses que faziam
negócio com os holandeses, e os novos colonos e mercadores
que começaram a produzir e comerciar com a colônia já durante o governo da Companhia.
Ao seguir práticas já existentes e rotas comerciais já em
funcionamento, Nassau estava indiretamente a encorajar certa autonomia econômica para a colônia da WIC, que poderia ajudar a melhorar a sempre precária situação financeira e
econômica do território. Embora, o Conselho dos Diretores
fosse a favor do desenvolvimento das colônias e que estas se
tornassem autossuficientes; por outro lado, temia que a colônia pudesse se tornar demasiado autônoma e eventualmente
demasiado poderosa.
O poder pessoal que o Conde Nassau tinha adquirido na
Europa antes da sua partida para o Brasil, e a sua crescente
autoridade e influência entre os funcionários navais e militares que serviam na Colônia, bem como, em Angola e São
Tomé, foi, em nosso ponto de vista, outro fator que levou a
Companhia a descartar o pedido subscrito pelo Conde Nassau e o Governo Central para obter a jurisdição sobre Angola
e São Tomé.
As disputas e os argumentos trocados entre o Governo
Central no Brasil, o Conselho dos Diretores e os Estados Gerais colocam também, em evidência, a diferente visão e entenRevista do IAHGP, Recife, n. 67, pp. 11-38, 2014
Os holandeses e a consolidação do sistema econômico
do Atlântico Sul seiscentista, c. 1630-1654
25
dimento de uma mesma realidade por parte de funcionários
a servir nas colônias e aqueles que serviam na Europa, e o
conhecimento da situação real por parte desses dois grupos
de funcionários da Companhia.
Aqueles que serviam nas colônias da WIC pareciam ser muito
mais conscientes do papel desempenhado pelas relações comerciais entre os dois territórios do Atlântico Sul, não só durante o
domínio da WIC, mas também em épocas anteriores, quando
os dois territórios ainda estavam em controle dos comerciantes
Portugueses e de mercadores privados a operar nestes mercados.
Os elementos recolhidos nos arquivos notariais de Amsterdã, na
coleção da WIC e na TSTD não só mostram claramente uma
continuidade nas relações comerciais Angola-Brasil sob o domínio holandês, mas também sugerem um crescente dessas trocas
durante o domínio da Companhia sobre o Brasil e Angola, como
iremos explicar em detalhe na seção seguinte.
AS
ROTAS COMERCIAIS HOLANDESAS NO
ATLÂNTICO SUL
Durante o período inicial de atividades Holandesas no Atlântico Sul, os mercadores das Províncias parecem ter utilizados
três tipos de rotas no seu comércio de longo-curso: rotas diretas
ligando as Províncias ao Novo Mundo, nomeadamente ao Brasil; circuitos triangulares ligando as Províncias às Américas, mas
com escala na Costa Ocidental Africana, em particular junto ao
Cabo Lopes, Loango, Kongo e Angola; e rotas diretas ligando as
Províncias ao Golfo da Guiné e às zonas litorais circundantes;
e ainda rotas diretas em direção às regiões costeiras do Cabo
Lopes, Loango, Kongo e Angola. A maior parte destes circuitos
incluía também navegação de cabotagem para garantir a troca
de mercadoras – uma prática comum entre os mercadores das
Províncias envolvidos no comércio atlântico.
Assim, e contrariamente aos mercadores sediados em Portugal, no Brasil e em Angola que no final do século XVI já haviam desenvolvido circuitos bilaterais entre o Brasil e Angola, e
entre esta Colônia e outros portos ao longo da Costa Ocidental
Revista do IAHGP, Recife, n. 67, pp. 11-38, 2014
26
Filipa Ribeiro da Silva
Africana, completamente separados dos circuitos europeus, os
mercadores das Províncias baseavam suas atividades somente
em circuitos bilaterais entre a Europa e ambas as margens do
Atlântico Sul, e os chamados circuitos triangulares ligando a
Europa à Costa Ocidental Africana e às Américas.
Porém, após a tomada das capitanias do Nordeste Brasileiro
pela WIC, novas rotas comerciais seriam estabelecidas. A partir de
1630, os Dezenove Senhores iriam defender que o comércio com
o Loango e o Kongo fosse feito via Brasil. Esta decisão iria contribuir para a abertura de duas novas rotas comerciais: um circuito
que ligava as Províncias ao Brasil holandês; e uma segunda rota
que ligava a Colônia Holandesa à costa do Loango, Kongo e Angola. No primeiro circuito, provisões, munições, pessoal e produtos de troca eram enviados das Províncias para o Brasil; enquanto
açúcar, pau-Brasil, e tabaco constituíam a maior parte da carga
na torna-viagem, juntamente com funcionários da Companhia e
alguns passageiros de regresso às Províncias. A segunda rota que
ligava os portos de Pernambuco aos da Costa Ocidental Africana
tinham várias funções. Por um lado, eles abasteciam os funcionários da Companhia no Loango, Kongo e Angola de mercadorias
de troca, alimentos e armas. Por outro lado, este circuito também
garantia o fornecimento de escravos Africanos necessários aos
produtores de açúcar no Brasil-Colônia. Este circuito garantia ainda o transporte de marfim, e plantas tintureiras para a Europa,
via Brasil. Por último, esta rota assegurava ainda a comunicação
entre os governos da Companhia nos vários portos e colônias do
Atlântico. Além dos referidos circuitos, várias outras rotas ligavam
o Brasil holandês aos portos sob domínio da Companhia na Costa
Ocidental Africana. Na década de 1630, as rotas principais ligavam
os portos de Pernambuco aos da Senegâmbia, nomeadamente à
Ilha de Gorée, bem como aos portos de Mori e da Mina na Costa
do Ouro. Existia também uma importante rota que ligava Pernambuco ao Cabo Lopes. Este era, geralmente, o local na Costa
Ocidental Africana, onde os navios da Companhia que operavam
no comércio costeiro do Golfo do Biafra e na Costa dos Escravos
aguardavam as frotas brasileiras para as abastecer com os escravos adquiridos nestes mercados e destinados a colônia holandesa.
Revista do IAHGP, Recife, n. 67, pp. 11-38, 2014
Os holandeses e a consolidação do sistema econômico
do Atlântico Sul seiscentista, c. 1630-1654
27
Entre 1641 e 1648, a Companhia também promoveu o desenvolvimento de rotas diretas ligando as Províncias a Angola e a
São Tomé. Os circuitos mais importantes ligavam as Províncias
a Luanda e ao porto da ilha de São Tomé. Estas rotas tinham
duas funções principais: i) abastecer de provisões, munições e
alimentos o pessoal militar e civil da Companhia a servir nestes
territórios; e transportar os produtos africanos comprados nestas áreas costeiras com destino às Províncias, nomeadamente
açúcar são-tomense e marfim angolano, e plantas tintureiras.
Porém, dado que o principal “produto” disponível nesta costa era mão-de-obra escrava destinada ao mercado de trabalho
brasileiro, as rotas diretas com destino a Europa nunca se tornaram muito intensas. De fato, as torna-viagens para a Europa
eram frequentemente feitas com escala no Brasil, onde os escravos africanos eram desembarcados e as cargas completadas
com açúcar brasileiro, pau-Brasil, e tabaco.
Durante o domínio da WIC sobre Angola e São Tomé (16411648), Luanda tornar-se-ia o principal centro abastecedor de escravos africanos para satisfazer as necessidades dos produtores
de açúcar no Brasil-Colônia, quer de origem luso-brasileira, judaica, holandesa, ou flamenga. Tal como a informação disponível na TSTD mostra, na década de 1640, a rota mais importante
ligava Pernambuco a Luanda.
Fonte: http://www.slavevoyages.org: 19-07-2012.
Revista do IAHGP, Recife, n. 67, pp. 11-38, 2014
28
Filipa Ribeiro da Silva
Em suma, a partir de 1630, o Brasil holandês foi utilizado
pela Companhia como uma placa giratória para o comércio
com a Costa Ocidental Africana, especialmente com as áreas
ao sul do Cabo Lopes, como o Loango, o Kongo e Angola.
Desta forma, o abastecimento de produtos de troca europeus,
provisões e munições a estes territórios, bem como o fornecimento de produtos Africanos e escravos adquiridos nessas
regiões, era garantido aos mercados consumidores da Europa
e das Américas através do Brasil. O pessoal militar e civil ao
serviço da Companhia na costa do Loango, Kongo e Angola
também era transportado via Brasil. Portanto, a Companhia
mantinha circuitos bilaterais ligando os seus postos e estabelecimentos no Atlântico Sul, em separado dos circuitos de
ligação à Europa.
A perda do Brasil por parte da Companhia holandesa pôs
termo a estes circuitos que ligavam o Brasil holandês à costa
africana, pelo menos para os navios operando sob pavilhão
holandês. Os circuitos ligando o Brasil a Angola e ao Golfo
da Guiné seriam reativados na década de 1650 por iniciativa de mercadores luso-brasileiros. Estes mercadores traziam
bebidas alcoólicas (cachaça), tabaco e algum ouro para comprar escravos africanos nos postos comerciais dos diferentes
poderes europeus instalados na costa africana, em particular
no Golfo do Benim e a chamada Costa da Mina. Estes circuitos viriam a adquirir especial importância durante a existência e funcionamento da segunda WIC (1674-1791) (HEIJER,
2003:139-170).
Os mercadores privados sediados nas Províncias com interesses no Atlântico Sul começaram a operar novos circuitos
ligando o Loango, Mpinda, e Angola à ilha de Curaçao (a nova
plataforma comercial da WIC para o seu comércio transatlântico), ao Suriname, e, por vezes também à América do Norte.
O complexo econômico do Atlântico Sul controlado pelos holandeses havia terminado. Estas novas rotas tinham por base as
tradicionais rotas triangulares e garantiam as trocas essenciais
entre o Atlântico Sul e o Atlântico Norte.
Revista do IAHGP, Recife, n. 67, pp. 11-38, 2014
Os holandeses e a consolidação do sistema econômico
do Atlântico Sul seiscentista, c. 1630-1654
29
CONCLUSÃO
Os circuitos bilaterais entre o Brasil holandês e a Costa Ocidental Africana, mais precisamente o Loango, o Kongo e Angola, desempenharam um papel importante na consolidação
de um conjunto de práticas comerciais e trocas entre estes dois
territórios, que tiveram início anteriormente quando estes espaços estavam sob o controle dos Portugueses, como aliás a
informação reunida na TSTD sugere.
Fonte: http://www.slavevoyages.org: 19-07-2012.
Através do aproveitamento de ligações comerciais entre o
Brasil e Angola pré-existentes ao estabelecimento holandês
nesses espaços, a presença e domínio da WIC sobre estes dois
territórios não só contribuiu para estimular o desenvolvimento dos circuitos entre as capitanias do Nordeste, o Loango e
Angola, como também, para fortalecer os laços entre essas
regiões. Além disso, a presença holandesa no Brasil também
forçou os mercadores luso-brasileiros, luso-angolanos e portugueses a deslocaram-se para as capitanias do sul do Brasil, o
estuário do Rio Kwanza e a região de Benguela, em Angola, e
a utilizar de uma forma mais regular e intensa os circuitos comerciais que já tinham começado a emergir a partir da década
de 1570. O poder naval da WIC e os seus ataques frequentes
aos navios portugueses a circular entre o Atlântico Sul e o
Revista do IAHGP, Recife, n. 67, pp. 11-38, 2014
30
Filipa Ribeiro da Silva
Atlântico Norte poderão ter sido também importantes razões
para promover o desenvolvimento dos circuitos bilaterais já
existentes, bem como de novos circuitos de ligação entre o
Brasil e a costa angolana.
Na verdade, após a conquista de Pernambuco pela WIC, os
produtores de açúcar luso-brasileiros foram forçados a plantar cana nas regiões ao sul da Bahia e nos arredores do Rio
de Janeiro (SANTOS, 2005; ABREU, 2005; SCHWARTZ, 1998;
MAURO, 1997). Além disso, devido à tomada de Angola e São
Tomé pelos holandeses, os mercadores luso-brasileiros foram
também obrigados a encontrar novos mercados abastecedores
de mão-de-obra escrava de forma a satisfazer a procura de trabalho dos produtores de açúcar do Brasil. O desenvolvimento
de produção local no Brasil garantiu a estes mercadores o abastecimento regular de produtos de troca, como álcool, tabaco,
e mais tarde ouro, que podiam ser trocados por mercadorias e
mão-de-obra na costa ocidental africana (CURTO, 2005).19 Por
outro lado, o conhecimento dos mercadores sobre as exigências dos mercadores consumidores africanos desempenharam
também um papel importante no estabelecimento destas novas
rotas comerciais. A Bahia e o Rio de Janeiro emergiriam durante o período aqui estudado como os dois principais portos de
partida para estas rotas comerciais bilaterais entre as capitanias
a Sul do Nordeste brasileiro e Angola. Alguns autores, como
David Eltis, argumentam que durante o domínio holandês do
Brasil e Angola foram feitas várias tentativas para desenvolver
o transporte de escravos africanos a partir de Moçambique com
destino ao Brasil, e existem, de fato, referências a algumas viagens (SMITH, 1974:233-259; BOXER, 1949:474-497).20 Porém, a
duração da viagem e as exigências logísticas destas viagens
tornavam-nas pouco lucrativas. Após a tomada das capitanias
do Nordeste Brasileiro e Angola à WIC, as rotas diretas ligando
o Brasil à costa angolana e ao Golfo da Guiné tornar-se-iam
uma característica fundamental do Atlântico Sul luso-brasileiro,
19
Ver também: RIBEIRO, 2008:140-145.
20
Idem.
Revista do IAHGP, Recife, n. 67, pp. 11-38, 2014
Os holandeses e a consolidação do sistema econômico
do Atlântico Sul seiscentista, c. 1630-1654
31
também designado como “o complexo Angola-Brasil” (ALENCASTRO, 2007:118-119). A partir das décadas de 1670 e 1680,
estas rotas iriam desempenhar um papel chave no abastecimento de escravos africanos a fim de satisfazer a elevada procura de
mão-de-obra no mercado laboral brasileiro.
REFERÊNCIAS
FONTES
MANUSCRITAS
STADSARCHIEF AMSTERDAM (SAA) antigo Gemeente Archief van Amsterdam, Notariële Archieven (Not. Arch.).
Nationaal Archief, Oude West-Indische Compagnie, (NA, OWIC).
FONTES
IMPRESSAS
Andreas Josua Ulsheimer’s voyage of 1603-4. In: JONES, Adam (Ed.). 1983.
German sources for West African history, 1599-1669. Wiesbaden: Steiner, p. 21-29.
Samuel Brun’s voyages of 1611-1620. In: JONES (Ed.). 2000. German Sources for West African history, 1599-1669. Wiesbaden: Steiner, p. 45-96.
FLEUR, J. D. La (Ed.). Pieter van den Broecke’s journal of voyages to
Cape Verde, Guinea and Angola (1605-1612). London: Hakluyt Society,
pp. 28, 47, 83-103.
NA, OWIC 8: 18 Dezembro 1640: “Les XIX au gouverneur et au conseil de
Recife”. In: JADIN, Louis (Ed.). L’Ancien Congo et l’Angola 1639-1655
d’après les archives romaines, portugaises, néerlandaises et espagnoles. Bruxelles/Rome: Institut Historique Belge de Rome, 1975, v. 1, p. 11,
doc. 9.
NA, Staten Generaal (SG), 5773: 6 Fevereiro 1642: “Rapport de la commission formé par les XIX pour étudier le pro et le contre de la séparation de
Loanda avec le Brésil”. In: JADIN. L’ancien Congo et l’Angola. v. 1, p.
200-202, doc. 76.
Revista do IAHGP, Recife, n. 67, pp. 11-38, 2014
32
Filipa Ribeiro da Silva
NA, SG, no. 5773: 4 Março 1642: “Arguments des commissaires de XIX contre un mémoire des États-Géneraux sur le gouvernement des nouvelles
conquêtes d’Afrique” ”. In: JADIN. L’ancien Congo et l’Angola. v. 1, p.
237-239, doc. 84.
NA, SG, 5773: 19 Março 1642: “Les XIX aux États-Généraux”. In: JADIN.
L’ancien Congo et l’Angola. v. 1, p. 250-251, doc. 96.
NA, OWIC 9: 19 Abril 1642: “Les XIX à Jacob Ruychaver, commandeur à la
Guinée” ”. In: JADIN. L’ancien Congo et l’Angola, v. 1, p. 271, doc. 101.
NA, OWIC 9: 14 Junho 1642: “Les XIX aux directeurs de Loanda”. In: JADIN.
L’ancien Congo et l’Angola. v. 1, p. 296-302, doc. 112.
NA, OWIC 56, doc. 23: 28 Maio 1641: “Instruction du comte de Nassau et du
conseil secret du Brésil pour l’admiral Jol, P. Moortamer, C. Nieulant and J.
Henderson”. In: JADIN. L’ancien Congo et l’Angola. v. 1, p. 34-42, doc. 27.
NA, OWIC 8: 3 Agosto 1643: “Les XIX au gouverneur et au Conseil du Recife
(extraits)”. In: JADIN. L’ancien Congo et l’Angola. v. 1, p. 466-467, doc. 165.
BIBLIOGRAFIA
ABREU, Maurício de. 2005. Um quebra-cabeças (quase) resolvido: Os engenhos da Capitania do Rio de Janeiro – séculos XVI e XVII. Actas do Congresso Internacional Atlântico de Antigo Regime: poderes e sociedades.
http://www.instituto-camoes.pt/cvc/conhecer/biblioteca-digital-camoes/cat_
view/75-coloquios-e-congressos/76-espaco-atlantico-de-antigo-regime.html.
ALENCASTRO, Luiz Felipe. 2000. O trato dos viventes. São Paulo: Companhia das Letras.
ALENCASTRO, Luiz Felipe. 2007. “The Economic Network of Portugal’s
Atlantic World”. In: BETHENCOURT, Francisco; CURTO, Diogo Ramada
(Eds.). Portuguese Oceanic Expansion, 1400–1800. Cambridge: Cambridge University Press, pp. 109-137.
ANTUNES, Cátia. 2004. Globalisation in the Early Modern Period: the
economic relationship between Amsterdam and Lisbon, 1640-1705. Amsterdam: Aksant.
Revista do IAHGP, Recife, n. 67, pp. 11-38, 2014
Os holandeses e a consolidação do sistema econômico
do Atlântico Sul seiscentista, c. 1630-1654
33
BOOGAART, Ernest van den; EMMER, P. C. 1979. “The Dutch participation in
the Atlantic Slave Trade, 1596-1650”. In: GEMERY, Henry A., HOGENBORN,
Jan S. The Uncommon market: Essays in the economic history of the
Atlantic slave trade. New York: Academic Press, pp. 353-375.
BOXER, C. R. 1949. Padre António Vieira, S. J., and the Institution of the Brazil Company in 1649. The Hispanic American Historical Review, 29(4),
pp. 474-497.
BOXER, Charles R. 1952. Salvador de Sá and the Struggle for Brazil and
Angola, 1602–1682. London: Athlone Press.
CANDIDO, Mariana P. 2008a. Merchants and the Business of the Slave Trade
in Benguela, c. 1750-1850. African Economic History, 35, pp. 1-30.
CANDIDO, Mariana P. Trade. 2008b. “Slavery and Migration in the Interior
of Benguela: the case of the Caconda, 1830-1870”. In: HEINTZ, Beatrix;
OPPEN, Achim von (Eds.). Angola on the Move: Transport Routes, Communications, and History. Frankfurt: Otto Lemberck Publishers, pp. 63-84.
CANDIDO, Mariana P. 2011a. Benguela et l’espace atlantique sud au dix-huitième siècle. Cahiers des Anneux de la Mémoire, 14, pp. 223-244.
CANDIDO, Mariana P. 2011b. “Transatlantic Links: Benguela-Bahian Connections, 1700-1850”. In: ARAÚJO, Ana Lucia (Ed.). Slaving Paths: Rebuilding
and Rethinking the Atlantic Worlds. New York: Cambria Press, pp. 239-272.
CURTO, José C. 2005. Enslaving spirits. The Portuguese-Brazilian Alcohol
trade at Luanda and its hinterland, c. 1550-1830. Leiden: Brill.
DILLEN, J. G. van. 1970. Van rijkdom en regenten, handbook tot de
economische en sociale geschiedenis van Nederland tijdens de Republiek. ‘s-Gravenhage: Martinus Nijhoff.
DOMINGUES, Daniel B. 2008. The Atlantic Slave Trade to Maranhão, 1680–1846:
Volume, Routes and Organisation. Slavery & Abolition, 29:4, pp. 477-501.
DONOVAN, William. 1990. Commercial enterprise and Luso-Brazilian
society during the gold rush: the mercantile house of Francisco Pinheiro and the Lisbon to Brazil trade, 1695-1750. Tese de Doutorado, Universidade John Hopkins.
Revista do IAHGP, Recife, n. 67, pp. 11-38, 2014
34
Filipa Ribeiro da Silva
EBERT, Christopher. 2003. “Dutch Trade with Brazil before the Dutch West
India Company, 1587-1621”. In: POSTMA, Johannes; ENTHOVEN, Victor
(Eds.). Riches from Atlantic Trade: Dutch Transatlantic Trade and Shipping, 1585-1817. Leiden: Brill, pp. 49-76.
EBERT, Christopher. 2008. Between empires: Brazilian sugar in the early
Atlantic economy, 1550-1630. Leiden: Brill.
ELTIS, David. 2000. The Rise of Slavery in the Americas. Cambridge:
Cambridge University Press.
EMMER, P. C. 1981. “The West India Company, 1621-1791: Dutch or Atlantic”.
In: BLUSSÉ, Leonard; GAASTRA, Femme (Eds.). Companies and trade:
essays on overseas trading companies during the Ancien Regime. Leiden:
Leiden University Press, pp. 71-95.
EMMER, P. C. 1997. The Struggle over sugar: The abortive Attack of the Dutch
on Portugal in the South Atlantic. Mare Liberum, 13, Junho, pp. 57-69.
EMMER, P. C. 2003. The First Global War: The Dutch versus Iberia in Asia,
Africa and the New World, 1590-1609. e-JPH, 1:1, Verão, pp. 57-69.
ENTHOVEN, Victor. 2003. “Early Dutch Expansion in the Atlantic Region,
1585–1621”. In: POSTMA, Johannes; ENTHOVEN, Victor (Eds.). Riches
from Atlantic Trade: Dutch Transatlantic Trade and Shipping, 1585-1817.
Leiden: Brill, pp. 17-48.
FERREIRA, Roquinaldo Amaral. 2006. “The Atlantic Networks of the Benguela Slave Trade (1730-1800)”. In: CENTRO DE ESTUDOS AFRICANOS, UNIVERSIDADE DO PORTO (Ed.). Trabalho Forçado Africano: Experiências
Coloniais Comparadas. Lisboa: Campo das Letras, pp. 66-99.
FLORENTINO, Manolo. 1997. Em costas negras. Uma história do tráfico
entre a África e o Rio de Janeiro. São Paulo: Companhia das Letras.
FLORY, Rae. 1978. Bahian Society in the mid-colonial period: the sugar
planters, tobacco growers, merchants, and artisans of Salvador and the Recôncavo, 1680-1725. Tese de Doutorado, Universidade de Texas-Austin.
GELDERBLOOM, Oscar. 2000. Zuid-Nederlandse kooplieden en de opkomst van de Amsterdamse stapelmarkt (1578-1630). Hilversum: Verloren.
Revista do IAHGP, Recife, n. 67, pp. 11-38, 2014
Os holandeses e a consolidação do sistema econômico
do Atlântico Sul seiscentista, c. 1630-1654
35
GOSLINGA, Cornelis Ch. 1990. The Dutch in the Caribbean and on the
Wild Coast, 1580-1680. Assen: Van Gorcum.
HEIJER, Henk den. 1994. De geschiedenis van de WIC. Zupten: Walburg
Pers.
HEIJER, Henk den. 1997. Goud, ivoor en slaven: scheepvaart en handel
van de Tweede Westindische Compagnie op Afrika, 1674–1740. Zutphen:
Walburg Pers.
HEIJER, Henk den. 2003. “The Western African Trade of the Dutch West
India Company, 1674-1740”. In: POSTMA, Johannes; ENTHOVEN, Victor
(Eds.). Riches from Atlantic Commerce. Dutch Transatlantic Trade and
Shipping, 1585-1817. Leiden: Brill, pp. 139-170.
HEIJER, H. den. 2005. “Directores, Stadhouderes e conselhos de administração”. In: WIESEBRON, M. (Ed.). O Brasil em arquivos neerlandeses
(1624–1654). Leiden: CNWS, pp. 17-43.
ISRAEL, Jonathan I. 1998. European Jewry in the Age of mercantilism,
1550-1750. London: Clarendon.
ISRAEL, Jonathan I. 2002. Diasporas within the Diaspora: Jews, Crypto-Jew, and the world maritime empires (1540-1740). Leiden: Brill.
JONG, Michiel A. G. De. 2005. ‘Staat van oorlog’: wapenbedrijf en militaire
hervorming in de Republiek der Verenigde Nederlanden, 1585-1621. Hilversum: Verloren.
KAPLAN, Y. 2000. An alternative to modernity. The Sephardi Diaspora in
Western Europe. Leiden: Brill.
LESGER, C.; NOORDEGRAAF, L. (Eds.). 1995. Entrepreneurs and Entrepreneurship in Early Modern Times: merchants and industrialists within
the orbit of the Dutch Staple market. Den Haag: Stichting Hollandse Historische Reeks.
LOPES, Gustavo Acioli. 2008. Negócio da Costa da Mina e Comércio
Atlântico: Tabaco, Açúcar, Ouro e Tráfico de Escravos: Pernambuco (16541760). Tese de doutorado, Universidade de São Paulo.
Revista do IAHGP, Recife, n. 67, pp. 11-38, 2014
36
Filipa Ribeiro da Silva
MAURO, Frédéric. 1997. Portugal, o Brasil e o Atlântico (1570-1670). Lisboa: Editorial Estampa. 2 volumes.
MELLO, Evaldo Cabral de. 1975. Olinda restaurada: guerra e açúcar no
nordeste, 1630-1654. Rio de Janeiro: Ed. Forense-Universitária.
MELLO, Evaldo Cabral de. 2003. O negócio do Brasil: Portugal, os Países
Baixos e o Nordeste, 1641-1669. Rio de Janeiro: Top Books.
MELLO, Evaldo Cabral de. 2005. De Braziliaanse affaire: Portugal, de Republiek der Verenigde Nederlanden en Noord-Oost Brazilië, 1641-1669. Zutphen: Walburg Pers.
MENDES, António Almeida. 2008. “The Foundations of the System: Reassessment of the Slave Trade to the Spanish Americas in the Sixteenth and Seventeenth Centuries”. In: ELTIS, David; RICHARDSON, David (Eds.). Extending
the Frontiers: Essays on the New Transatlantic Slave Trade Database. New
Haven: Connecticut: Yale University Press, pp. 63-94.
POSTMA, Johannes. 1990. ‘‘A Reassessment of -the Dutch Atlantic Slave Trade”. In: POSTMA, Johannes. The Dutch in the Atlantic slave trade, 16001815. Cambridge: Cambridge University Press, pp. 158-138.
POSTMA, Johannes. 2003. ‘‘A Reassessment of -the Dutch Atlantic Slave Trade”. In: POSTMA, Johannes; ENTHOVEN, Victor (Eds.). Riches from Atlantic Commerce. Dutch Transatlantic Trade and Shipping, 1585-1817. Leiden:
Brill, p. 158-183.
PUNTONI, Pedro. 1992. Guerras do Brasil, (1504-1654): ataques e invasões durante o Brasil-Colônia. São Paulo: Editora Brasiliense, 1992.
PUNTONI, Pedro. 1999. A mísera sorte: a escravidão africana no Brasil
holandês e as guerras do tráfico no Atlântico Sul, 1621 -1648. São Paulo:
Editora Hucitec.
RATELBAND, Klaas. 2003. Os Holandeses no Brasil e na Costa Africana.
Angola, Kongo e São Tomé (1600-1650). Lisboa: Vega.
RIBEIRO, Alexandre Vieira. 2006. O comércio das almas e a obtenção de
prestígio social: traficantes de escravos na Bahia ao longo do século XVIII.
Locus revista de história, 12:2, pp. 9-27.
Revista do IAHGP, Recife, n. 67, pp. 11-38, 2014
Os holandeses e a consolidação do sistema econômico
do Atlântico Sul seiscentista, c. 1630-1654
37
RIBEIRO, Alexandre Vieira. 2008. “The Transatlantic Slave Trade to Bahia,
1582-1851”. In: ELTIS, David; RICHARDSON, David (Eds.). Extending the
Frontiers: Essays on the New Transatlantic Slave Trade Database. New Haven: C.T.: Yale University Press, pp. 130-154.
SANTOS, Patrícia Verónica Pereira dos. 2005. A grande construção: Trabalhar
e morar na cidade do Salvador no século XVI. Actas do Congresso Internacional Atlântico de Antigo Regime: poderes e sociedades. http://www.
instituto-camoes.pt/cvc/conhecer/biblioteca-digital-camoes/cat_view/75-coloquios-e-congressos/76-espaco-atlantico-de-antigo-regime.html.
SCHILTKAMP, J. A. 2003. Legislation, jurisprudence, and law in the Dutch
West Indian colonies: The order of government of 1629. Pro Memorie, 5:2,
pp. 320-334.
SCHWARTZ, Stuart B. 1998. Segredos internos: Engenhos e escravos na
sociedade colonial. São Paulo: Companhia das Letras.
SILVA, Daniel Barros Domingues da; ELTIS, David. 2008. “The Slave Trade
to Pernambuco, 1561-1851”. In: ELTIS, David; RICHARDSON, David (Eds.).
Extending the Frontiers: Essays on the New Transatlantic Slave Trade Database. New Haven, C.T.: Yale University Press, pp. 95-129.
SILVA, Filipa Ribeiro da. 2010. Dutch vessels in African waters: Routes, commercial strategies, trading practices and intra-continental trade (c.1590-1674).
Tijdschrift voor Zeegeschiedenis, 1, pp. 19-38.
SILVA, Filipa Ribeiro da. 2011. Dutch and Portuguese in Western Africa:
Empires, Merchants and the Atlantic System, 1580-1674. Leiden: Brill.
SMITH, D. G. 1974. Old Christian Merchants and the Foundation of the
Brazil Company, 1649. The Hispanic American Historical Review, 54:2,
Maio, pp. 233-259.
SWETSCHINSKI, Daniel M. 2000. Reluctant Cosmopolitans. The Portuguese Jews of seventeenth-century Amsterdam. London: The Littman Library of
Jewish Civilisation.
UNGER, W. S. 1940. Nieuwe gegevens betreffend het begin der vaart op Guinea, 1561-1601. Economisch-historisch Jaarboek, 21, pp. 194-217.
Revista do IAHGP, Recife, n. 67, pp. 11-38, 2014
38
Filipa Ribeiro da Silva
VERGER, Pierre. 1997. Fluxo e Refluxo do Tráfico de Escravos entre o
Golfo de Benin e a Bahia de Todos os Santos: dos séculos XVII a XIX.
Salvador: Corrupio.
VOS, Jelmer; ELTIS, David; RICHARDSON, David. 2008. “The Dutch in the
Atlantic World: New Perspectives from the Slave Trade with Particular Reference to the African Origins of the Traffic”. In: ELTIS, David; RICHARDSON,
David (Eds.). Extending the Frontiers: Essays on the New Transatlantic
Slave Trade Database. New Haven, C.T.: Yale University Press, pp. 228-249.
Revista do IAHGP, Recife, n. 67, pp. 11-38, 2014

Documentos relacionados