Convergência no jornalismo: o caso do blog da Petrobrás

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Convergência no jornalismo: o caso do blog da Petrobrás
SBPJor – Associação Brasileira de Pesquisadores em Jornalismo
VII Encontro Nacional de Pesquisadores em Jornalismo
USP (Universidade de São Paulo), novembro de 2009
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Convergência no jornalismo: o caso do blog da Petrobrás
Andressa Pacheco Moschetta 1
Andréia Mendes Jacopetti 2
Resumo: O fluxo de conteúdo jornalístico através da multiplicidade de suportes midiáticos modificou o espaço público da imprensa. Com a cultura participativa, há acesso a mais pluralidade
de vozes. Essa liberdade quando resultada pela dispersão dos meios de comunicação compromete a relação entre públicos, produtores e conteúdos midiáticos, naturalmente alterando a lógica
pela qual a indústria midiática opera e pela qual os públicos processam a notícia. O privado ao
assumir o controle do conteúdo midiático, acentua uma tendência nociva: a informação preconcebida. O objeto deste estudo trata-se do Blog Fatos e Dados da Petrobrás que inaugura uma
nova fase de reconstituição de forças do poder da informação, atingindo a relação entre os mainstream media e sociedade privada. Como aporte teórico desse estudo está Beth Saad, Chris
Anderson e Henry Jenkins.
Palavras-chave: Comunicação; Jornalismo; espaço público; esfera privada; forças de poder.
1. Introdução
O conteúdo jornalístico disputa espaço em meio ao predomínio da audiência. De
fato, a informação cada vez mais fragmentada acentua-se em espaços públicos mais
específicos que consomem uma informação efêmera, para responder demandas cada vez
mais individualizadas, desafiando a lógica convencional da mídia. Por fatores tecnológicos, culturais, comportamentais, sociais e políticos intensificou-se o contraagendamento3 e o poder de empresas privadas no controle da informação massificada. E
1
Jornalista, Especialista em Artes Visuais nas Culturas Contemporâneas e Mestranda do Curso de Comunicação e Linguagens pela Universidade Tuiuti do Paraná (UTP).
2
Relações Públicas, Especialista em Planejamento, Gestão e Marketing Digital e Mestranda do Curso de
Comunicação e Linguagens pela Universidade Tuiuti do Paraná (UTP).
3
O fenômeno é denominado por Luiz Martins da Silva (2007) ao apontar uma outra agenda-setting, sob a
hipótese de a sociedade, em sua pluralidade de vozes, também possui suas pautas e as desejar ver atendidas pelos meios de comunicação.
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pensar que a cultura de massa assistia seu auge nas décadas de 70 e 80. A transformação
da “tendência dominante” da informação para nichos4 que vemos no cenário comunicacional estende-se muito além das fronteiras tecnológicas, “a convergência altera a relação entre tecnologias existentes, indústrias, mercados, gêneros e públicos” (JENKINS,
2008, p. 41).
No campo da comunicação a convergência estabelece relações de mediação5,
onde o desenvolvimento social é impactado pelas tecnologias. O cenário cultural contemporâneo revela características da preponderância de um novo mecanismo que tem
interferido em inúmeros paradigmas. A cultura, como forma de manifestação artística
do indivíduo, sofre ainda mais transformações em sua produção (LEMOS, 2004). Essa
cultura associada às tecnologias digitais é um dos aspectos, senão o principal, na construção deste padrão cultural que vai criar uma nova relação entre a tekhné6 e vida social
e interferir diretamente no produto jornalístico.
Contribui para o efeito de toda essa conectividade dois fatores: acesso ilimitado
e sem restrições a culturas e a conteúdos de todas as espécies, e o privado que ganhou
poder com as novas tecnologias e que vem ocupando espaço na interseção entre as mídias tradicionais e os novos meios de comunicação, uma pluralidade de vozes que está
exigindo o direito de participar no âmago da cultura. Adiciona-se ainda a tal cenário de
convergência a redução de custos de produção e distribuição e a permissão dos consumidores em tocar, manipular, interagir, criticar o agendamento da imprensa e colocar de
volta a informação em circulação com novas e poderosas formas.
A empresa estatal Petrobrás lançou no primeiro semestre de 2009 o blog Fatos e
Dados, evidenciando a convergência tecnológica e destacando peculiaridades no relacionamento com os jornalistas. O propósito deste artigo é discorrer sobre esse objeto de
estudo a partir de conceitos de jornalismo on-line e comunicação organizacional digital.
4
ver Chris Anderson, (2006).
Ao corroborar o conceito com SILVA (2007) vimos que refere-se à necessidade de mediação de um
tema, através da mídia, “entendida como o conjunto dos meios de comunicação de massa, dado que esse
aparato tem uma capacidade que transcende a sua inserção nos ramos dos negócios e do mercado (p. 98).
6
Segundo Adriana Amaral (2009) o termo cibernética (1954) que se reporta ao controle, vem do grego e
traz a ideia da tekhné (técnica) que para a configuração ocidental é um modo de fazer.
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2. A Convergência Tecnológica e a Web 2.0
O avanço dos recursos tecnológicos marcados especialmente pelo surgimento e
evolução da Internet caracterizam um ambiente com novas oportunidades e desafios.
Vive-se atualmente uma fase denominada por alguns autores de Web 2.0. Trata-se de
um movimento de novo posicionamento frente às formas de utilização dos recursos da
Internet. Segundo Primo (2006, p.1) a Web 2.0 é a segunda geração de serviços on-line
e caracteriza-se por potencializar as formas de publicação, compartilhamento e organização de informações, além de ampliar os espaços para a interação entre os participantes
do processo. Para o autor, a Web 2.0 tem repercussões sociais importantes, que potencializam processos de trabalho coletivo, de troca afetiva, de produção e circulação de informações, de construção social de conhecimento apoiada pela tecnologia da informação.
Saad Correa (2008, p. 178) estuda as características que diferenciam o cenário 1.0
e o cenário 2.0 dentro das organizações. A primeira diferenciação é a de que anteriormente, a comunicação digital era mais informativa, na web 2.0, porém, reflete-se a participação, na qual os públicos podem influenciar positiva e negativamente com uma
organização, seja colaborando na criação de um novo produto ou prejudicando sua imagem. No cenário 1.0, as expressões comunicacionais ocorrem com baixa intervenção do
receptor ou do usuário, baixa capacidade de personalização do conteúdo, predomínio do
emissor sobre o controle do conteúdo e de suas relações com o usuário.
O fato é que o espaço público está vivenciando a cultura da convergência. Um
ambiente transmutado: do consumo individualizado e personalizado para o consumo
compartilhado em rede, fenômeno que essencialmente incentiva a participação e a inteligência coletiva. A colaboração pode ser vista como o “equilíbrio” entre o poder dos
meios tradicionais, produção e público, “ainda estamos aprendendo a exercer esse poder
– individual ou coletivamente – e ainda estamos lutando para definir as condições sob
as quais nossa participação será permitida” (JENKINS, 2008, p. 313).
Para o autor uma política de participação “[...] começa a partir do pressuposto de
que podemos ter maior poder coletivo de barganha se formarmos comunidades de consumo” (2008, p. 317). Ou seja, aquela tendência do discurso da indústria de estrangular
os públicos massificados está deixando espaço para o que o autor chama de “comunida
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comunidades de marca”7, sustentadas por meio da produção mútua e troca recíproca de
conhecimento.
Embora as questões relativas à transposição, a metáfora e o webjornalismo e dos
mainstream media tenham sido estudadas desde o surgimento e do desenvolvimento das
redes de comunicação8, sua investigação tem sido aprofundada, teorizada e sistematizada no universo das tecnologias digitais como uma cultura pós-massiva, libertária e resistente à cultura de massa (Recuero, 2004; Lemos, 2004) e, por outro lado, uma amplificação da indústria cultural, porque a produção ainda está relacionada ao comércio, não
visualiza-se uma autonomia do emissor, ainda há filtros no que se refere a reprodução
(Rudiger, 2007).
A cibercultura proporciona novas subculturas9 e outras novas formas de massificação (Recuero, 2004). Uma massificação não massificada ou uma “universalidade sem
totalidade”, termo usado por Lévy (1999) para declarar que há uma segmentação individualizada, apesar do livre acesso a uma infinidade de conteúdos. “De fato, o ciberespaço
funciona como alguns sistemas ecológicos: a longo prazo, um determinado “nicho” não
pode acolher um número de espécies concorrentes” (LÉVY, 1999, p. 112).
Sobre o jornalismo participativo enquanto fenômeno midiático e inserido na
convergência cultural – mais abrangente que a tecnológica - um estudo da professora e
jornalista Claudia Quadros (2005) traz à tona questões relevantes que demonstram preocupação quanto a participação do público no jornalismo digital: a informação vista como como um negócio.
7
Na concepção de JENKINS (2008), são consumidores que se movimentam on-line, com interesses semelhantes, buscam e trocam informações relacionadas ao consumo.
8
Mark Deuze (2006) analisa a participação como um dos elementos essenciais da cultura digital. Axel
Bruns (2005) seus estudos apresentam o grau de abertura de sites a partir da participação do público em
três fases da produção noticiosa: a captação, a publicação e o comentário. Reese, Rutigliano, Hyun e
Jeong ( ) a investigação assenta-se no fenômeno blog. Carvalho (2001); Sibilia (2003) e Schittine (2004)
analisam sobre os diários íntimos na rede. Recuero (2003); Primo; Samaniotto (2005) investigam a conversação. Recuero (2003), Silva (2003), Quadros et. al. (2005) e Quadros; Sponholz (2006) investigam a
rede como um sistema de comunicação que transformou o jornalismo. Adghimi (2006) seus estudos focam no espaço de autoria e identidade na web. Aldé et.al. (2007) analisa o potencial dialógico e democrático. Escobar (2007) com o estudo no webjornalismo. Christofoletti; Laux (2006); Christofoletti (2007)
analisa a credibilidade do conteúdo no novo meio. Bolano; Brittos (2007) o meio digital capaz de pautar a
atuação das indústrias culturais tradicionais. Palácios (2007) investiga o campo do jornalismo participativo, entre outros. Diversos estudos exploram ainda o modelo open source, produção colaborativa.
9
Subcultura é um sinônimo de nicho, característica do ciberespaço. Sua origem surge na Escola de Chicago (1940), onde iniciam os primeiros trabalhos etnográficos, culturas desviantes da normalidade da
sociedade. (AMARAL, 2006).
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Na tentativa de reconquistar e/ou ampliar o seu público, empresários da comunicação olham com mais seriedade as mudanças em seu entorno, buscando adaptar e até criar algumas idéias que atraiam o usuário/leitor/telespectador/ouvinte. No entanto, a preocupação deles pelo público
pode ser resumida em um interesse central: o lucro (QUADROS, 2005, p.
18).
Dentro dessa convergência, surgem novas iniciativas. O controle centralizado
dos meios massivos vem sendo assumido pelas empresas privadas ao terem nas mãos o
poder dos novos canais midiáticos, como exemplo, os blogs e a potencialidade da internet, buscando seu lugar na audiência e experimentações interativas com seu público.
Considerado como uma nova categoria de webjornalismo, o jornalismo de blog, para
AMARAL; RECUERO; MONTARDO (2009), ganha seu status a partir de seu caráter
de personalização.
[...] para ser considerado jornalístico, um blog deve possuir os atributos que
consideramos necessários para o jornalismo de uma maneira geral: difusão
para um grande número de pessoas, geralmente com periodicidade determinada, de acontecimentos reais dotados de atualidade, novidade, universalidade e interesse. (AMARAL; RECUERO; MONTARDO, 2009, p. 224)
A questão da esfera pública é a que torna efetivamente um blog jornalístico. No
entanto, a questão que se funda nesse artigo é a postura ética da empresa estatal, através
de sua assessoria de comunicação, com seus conteúdos gerados nas salas de imprensa
virtuais, tendo em vista que na comunicação da web 2.0 “[...] a sociedade adquire novos
comportamentos e valores, provocados por mudanças sociais, políticas, econômicas e
culturais, a uma velocidade muito mais rápida do que em outros tempos” (QUADROS,
2005, p. 17). Assim, é necessária a observação da mediação proposta pela internet que
surge a partir das relações de poder e de questões políticas, já que expressões lingüísticas em face da política é mais notória, principalmente quando sai do privado para o público (ESTEVES, 2002).
Embora estejamos atravessando uma grave crise ética a melhor alternativa é
ainda privilegiar a ética e a transparência nos relacionamentos com a imprensa. Isto se consegue não com dinheiro, mas com caráter, e é preciso exigir
dos clientes que sejam leais, responsáveis em todos os momentos. A imprensa muitas vezes comete seus deslizes, mas costuma ser impiedosa quando se
sente traída, ou quando alguém lhe esconde algo (BUENO; PIMENTA, 2008,
p. 03).
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Dentro das práticas jornalísticas afetadas pela nova mídia, esta afirmação paira
sobre o jornalismo na era da informação e como um processo complexo, a apropriação
do virtual “[...] para as conversas mais tácitas e mais fáticas do cotidiano estariam permeadas pela onipresença das categorias estratégicas (e não, comunicativas) do poder e
do dinheiro (SILVA, 2007, p. 93). Essa alteração enunciativa da informação repercute
de forma sistêmica sobre o processo comunicacional como um todo. O paradigma da
argumentação revela o caráter ideológico que a esfera pública vem vivenciado, como
corrobora BISNETO (2008, p. 67) “[...] o estágio atual da mídia é o espaço do conflito.
Surge, assim, a esfera pública do conflito”. E, complementa, “[...] a Internet, pelo menos
de forma cultural, técnica, ideológica e informativa, é um caminho que, potencialmente,
pode resgatar a esfera pública” (2008, p. 68). Tais afirmações refletem a instauração do
caráter interacional da sociedade moderna-contemporânea e os blogs, na Web 2.0, permitem a aproximação direta e de conversação entre blogueiros e leitores.
3. Análise do Blog da Petrobrás
Para Orihuela (2005, p. 88), o termo blog existe desde 1997, quando Barger o
designou para "identificar um website baseado e conexões com breves comentários dispostos em uma cronologia". Eles tem sido utilizados pelas empresas para ações de comunicação interna e externa. Para Terra, os blogs corporativos têm se caracterizado
como um dos mais novos meios/veículos de comunicação.
O publicitário Fredrik Wacka conceitua os blogs corporativos como blogs
publicados por ou com a ajuda de uma organização que queira atingir seus
objetivos e metas. Em relação à comunicação externa os potenciais benefícios incluem o fortalecimento do relacionamento com importantes públicosalvo. Quanto à comunicação interna, os blogs são geralmente uma ferramenta
que serve para a colaboração e a gestão do conhecimento (TERRA, 2008, p.
4).
A Petrobrás lançou seu blog corporativo em junho de 2009 na ocasião da CPI da
empresa estatal. Ao entrar na web 2.0, se constitui, segundo Saad Correa (2009) como
um novo pólo de emissão na rede, ameaçando os tradicionais emissores em seu papel
constituído do Quarto Poder. De acordo com a pesquisadora, “o fato, em seu todo, inau-
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gura uma nova etapa de reconstituição de forças do poder da informação, só possível
nos ambientes de mídias sociais.”. Rogério Christofoletti (2009) corrobora com a opinião de Saad ao afirmar que a chegada da Petrobrás à blogosfera é um movimento que
transcende a opção de uma grande empresa por canais gratuitos e mais ágeis de informação.
Lançado em uma ferramenta gratuita, o Blog Fatos e Dados possui em seu conteúdo artigos, reportagens, áudios, entrevistas, informes, opinião, esclarecimentos à imprensa, perguntas à imprensa, entre outros espaços. Relacionados ao blog, a Petrobrás
criou outros espaços colaborativos na web 2.0. No twitter divulga as novidades da empresa e as novas publicações do blog. No Youtube criou um canal onde centraliza todos
os vídeos postados no blog.
Há algumas características comuns e tradicionais do blog Fatos e Dados, mas o
que o diferencia para os demais blogs corporativos é o seu posicionamento e a sua política de transparência ao adentrar ao mundo web 2.0. A estatal decidiu publicar todas as
perguntas que os jornalistas fazem à assessoria antes que os próprios jornais publiquem
as reportagens, ao contrário do propósito das salas de imprensa virtuais apontado por
BUENO; PIMENTA (2008) que é o de permitir acesso dos profissionais de imprensa às
informações das empresas e organizações para descobrir pautas e fontes. A atitude da
Petrobrás incomodou a muitos jornalistas colocando em cheque o “furo jornalístico”,
que segundo Nilson Lage (2001) é o imediatismo da notícia e o próprio agendamento da
imprensa, que resumidamente, “consiste na capacidade dos veículos de comunicação de
massa em pautar para a sociedade os temas de debate de boa parte das interações do
cotidiano (SILVA, 2007, p. 86). Além disso, a relação dos mainstreams e a perca do off
com a empresa deflagrou desconforto profissional em ambas as partes, nesse sentido, é
necessário conhecer bem essas ferramentas na blogosfera e mudar essas relações no
canal virtual midiático, pois quanto mais se conhece o instrumento virtual maior é a
possibilidade de manipulação.
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Figura 1: Assessoria de imprensa da Petrobrás responde às perguntas encaminhadas pelos veículos de
comunicação em blog corportativo.
Fonte: http://www.blogspetrobras.com.br/fatosedados/?p=5135
Reforçando que, como coloca as autoras AMARAL; RECUERO; MONTARDO
(2009, p. 266), “[...] os blogs tornaram-se um fenômeno e uma plataforma para jornalistas e empresas do mainstreams media que os utilizam para interagir de uma forma mais
próxima de seus internautas”.
Saad (2009) destaca o papel do profissional de jornalismo na web 2.0 ao analisar
o lançamento do blog. De acordo com a pesquisadora, esse fato dá início a uma nova
etapa de reconstituição de forças do poder da informação, só possível nos ambientes de
mídias sociais. “A gritaria geral da imprensa tradicional (hiper justificável pela questão
jornalística) também se dá pela incapacidade de nossos veículos se defrontarem com a
prática da web 2.0 e sua multiplicidade de vozes” (SAAD, 2009).
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Ela aponta os seguintes questionamentos: “Nesse contexto, estariam os nossos
profissionais preparados para a dinâmica contemporânea? Profissionais, empresas informativas e escolas querem efetivamente promover mudanças? Rápidas?” (SAAD,
2009).
De acordo com João Pissara Esteve (2002) o poder é marcado por características
simbólicas. E, para sustentar o caso da Petrobrás é necessário avaliar o poder existente
na relação entre empresa estatal e os meios de comunicação. Christofoletti destaca esse
aspecto ao afirmar que:
A Petrobrás tem lucro superior a PIB de muitos países, é uma grande anunciante, uma expressiva financiadora de projetos. Seus interesses nem sempre
coincidem com os do país ou com os de largos setores da sociedade. Afinal, é
uma empresa colossal, de escala mundial e agressiva nos segmentos que opera. Grandes jornais como a Folha e O Globo – a exemplo de outros veículos –
não querem ficar nas garras desse dinossauro. Mas o gigante já está à beira
do lago, sua presença esbarra nos interesses comerciais da mídia, seu hálito
incomoda. O blog da Petrobras pode constranger, intimidar, acuar pequenos e
grandes meios, jornalistas experientes e novatos. O blog da Petrobras não tem
que se submeter aos preceitos da ética jornalística, já que seus produtores são
assessores de comunicação, cujas condutas devem se orientar pelos interesses
da empresa (CHRISTOFOLETTI, 2009).
As expressões lingüísticas em face da política são mais notórias, principalmente
quando sai do privado para o público. Na clássica obra Mudança estrutural na esfera
pública, Jürgen Habermas faz algumas definições dos principais termos ligados à esfera
pública, onde é possível relacionar à análise do blog da Petrobrás.
Os burgueses são pessoas privadas; como tais, não “governam”. Por isso, as
suas reivindicações de poderio contra o poder público não se dirigem contra
a concentração do poder que deveria ser “compartilhado”; muito mais eles
atacam o próprio princípio de dominação vigente. O princípio de controle
que o público burguês contrapõe a esta dominação, ou seja, a esfera pública,
quer modificar a dominação enquanto tal (HABERMAS, 1984, p. 43).
Para Carlos Nepomuceno (2009), o case do Blog da Petrobrás servirá de exemplo, seja positiva ou negativamente, de discussão para outras iniciativas, tanto no Governo, quanto fora dele sobre empresas colaborativas”. Ele questiona se a empresa está
preparada para atuar nesse cenário em que se lançou ao criar um blog tão ousado, levantando as seguintes perguntas:
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Estará a Petrobrás disposta a realmente dialogar? Além disso, de conversar e
assumir seus erros, a partir do blog? Será ela capaz de criar um espaço na
sua hierarquia para fazer do internauta colaborativo um guia para seu destino,
através de ideias, críticas e sugestões vindas da rede? Será que o projeto passou por essa reflexão mais profunda e estratégica? (NEPOMUCENO, 2009).
A conclusão mais contundente desta análise é que com a chegada da Petrobrás
na blogosfera dá-se abertura aos mais variados campos de “audiência”, segundo SILVA
(2007, p. 97), uma mídia que age além de seu contexto tradicional e transcende a unilateralidade dos sentidos “[...] em uma dinâmica processual e multilateral: da mídia para a
sociedade; da mídia para o Estado; da mídia para o mercado; da mídia para a própria
mídia [...] da sociedade para a mídia”.
Aspecto relevante observado é que a informação levada à opinião pública no
ambiente da convergência ainda necessita do “processamento mental”, como chama
Nilson Lage (2001), que inclui a percepção do profissional jornalista e sua inserção do
contexto social , “[...] além de traduzir, deve confrontar as diferentes perspectivas e selecionair fatos e versões que permitam o leitor orientar-se diante da realidade” (LAGE,
2001, p. 23).
São muitas as questões e pontos a serem levantados e analisados sob o ponto de
vista da comunicação ao estudar esse caso. Certamente, o Blog da Petrobrás é um excelente objeto de estudo a ser explorado nos estudos científicos da comunicação.
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