Após maio difícil, ordem é aumentar risco em renda fixa

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Após maio difícil, ordem é aumentar risco em renda fixa
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01/06/2016 ­ 05:00
Após maio difícil, ordem é aumentar risco em
renda fixa
Por Luciana Seabra
Abbud, diretor de investimento do HSBC Brasil: "Não é hora de voltar atrás"
Se o investidor pudesse voltar atrás, passaria maio apegado ao Certificado de Depósito Interfinanceiro (CDI).
Contrariando todos os prognósticos otimistas do mercado, fundamentados no impeachment de Dilma Rousseff, o
risco não compensou no mês. O Ibovespa, principal índice da bolsa brasileira, perdeu 10,09%. A renda fixa mais
arrojada ficou bem atrás da conservadora. O IMA­B, índice que reflete a valorização de uma cesta de títulos
indexados à inflação, teve queda de 0,1%, e o IRF­M, recheado de papéis prefixados, andou somente 0,26%.
Enquanto isso, quem escolheu produtos indexados ao CDI marcou 1,11%.
Ao contrário do que se pode imaginar, alocadores de patrimônio não recomendam recuar agora, mas sim manter o
nível de risco do portfólio ou até aumentá­lo. A forma preferida de fazê­lo, entretanto, não é via renda variável,
mas juros, com compra adicional de títulos indexados à inflação e prefixados.
"Eu diria que o viés seria por aumentar o risco, aproveitando a queda recente", afirma Ronaldo Patah, estrategista
de gestão de fortunas do UBS.
"Não é hora de voltar atrás", diz Guilherme Abbud, diretor de investimento do HSBC Brasil. "Achamos que
inclusive é o momento de aproveitar essa piora de humor para aumentar um pouquinho a posição",
complementa, em referência à renda fixa.
O UBS recomenda neste momento aos clientes ficar "overweight" em renda fixa prefixada e indexada à inflação, ou
seja, com mais peso do que costuma dedicar a esses ativos no portfólio. Os vencimentos preferidos para as
posições são os intermediários: 2019 para prefixados e 2024 para inflação. O entendimento é que os prazos mais
longos têm retornos semelhantes e ficam excessivamente expostos ao risco político.
Para se ter uma ideia, no Tesouro Direto, sistema de venda on­line de títulos públicos à pessoa física, a NTN­B
para 2024 paga 6,11% mais a variação da inflação, e o título prefixado para 2019, 12,82%.
O estresse de maio tem como fundamento principal, considera Patah, a sinalização do Federal Reserve (Fed, o
banco central dos EUA) de que pode elevar os juros logo. A probabilidade atribuída pelo mercado a que a alta
aconteça na reunião deste mês ou do próximo já ultrapassa 50%, calcula o estrategista. A notícia pegou em cheio
os mercados emergentes, cujas moedas e bolsas vinham de meses consecutivos positivos, embalados pela
sensação de que a fraqueza da economia americana retardaria um aperto em sua política monetária.
No contexto doméstico, não há razão para tanto estresse, defende Patah. "A grande expectativa do mercado para o
mês era qual seria a equipe econômica do Michel Temer e ela acabou ficando melhor do que o esperado", afirma.
Em um cenário como esse, ainda que com alguns sustos com o novo governo, e com o risco de o Fed elevar o juro
já nos preços, Patah diz não ver motivos para "grandes estresses" adicionais. Para ele, as propostas de reformas
corretas devem a partir de agora melhorar o humor local e atrair o investidor estrangeiro para o país. "A chance
tanto do real quanto da bolsa se apreciarem nos próximos três meses me parece bastante boa, mesmo com a alta
de juros do Fed, mas minha preferência ainda é a renda fixa", diz.
O UBS está neutro em bolsa, ou seja, indica ao investidor manter o
que carrega em renda variável. Em moedas, prefere uma posição
comprada em real e vendida em peso mexicano, com a tese de que por
ser bastante acessível a investidores estrangeiros a moeda costuma
sofrer mais que as demais emergentes quando há um risco expressivo
no mercado ­ no caso, a alta dos juros americanos. Assim também
evita a posição contra o dólar, que ainda cai no ano, 7,93% no
acumulado, mas subiu 4,18% somente em maio.
"O nosso maior otimismo está com a renda fixa", diz também Abbud, do HSBC. Hoje o ativo preferido do diretor
de investimento é a NTN­B, que paga uma taxa prefixada mais a variação da inflação. Enquanto o prêmio pago
pelos papéis prefixados cedeu quatro pontos percentuais do ano passado para cá, garantindo ganhos fartos para
quem carregava o papel, o das NTN­Bs caiu somente um ponto percentual, aponta, em meio à virada de um
cenário fiscal bastante ruim, com risco de a inflação sair do controle, para um de equipe econômica com perfil
ortodoxo. Além disso, indica Abbud, as NTN­Bs são mais confortáveis de carregar por serem menos voláteis.
No HSBC, a recomendação é fazer um mix de diferentes prazos de títulos, incluindo vencimentos em 2020, 2024,
2045 e 2050, sendo que os últimos são mais indicados para portfólios de longo prazo, como previdência.
Nos prefixados, a preferência do HSBC é pelo vencimento em 2019. Papéis com prazos muito curtos não são
recomendados pelo banco dado o entendimento de que o novo Banco Central pode levar um tempo para
equacionar o cabo de guerra entre inflação alta e recessão forte. "Talvez o BC demore um pouco para ancorar as
expectativas, mas possa cortar mais juro do que o mercado imagina, pela credibilidade criada", considera Abbud,
que já comandou a equipe de renda fixa da Western Asset.
Em bolsa, o HSBC também vê a possibilidade de mais um movimento de valorização geral. Para Abbud, o novo
governo vai começar a entregar resultado, inclusive com aprovações no Congresso, e a bolsa pode chegar dos
menos de 50 mil pontos atuais a 60 mil pontos. "Hoje existe certo ceticismo com o governo e acho que ele é um
pouco exagerado", defende. Já quanto a um segundo movimento, em que o choque de gestão transforma­se em
crescimento econômico, o executivo é muito menos otimista. Para ele, o elevado endividamento do governo, das
pessoas e das empresas pode dificultar esse avanço. "Aí a bolsa poderia se frustrar um pouco ou ficar parada
durante um bom período", diz.
Por esperar esse movimento da bolsa, de avanço limitado, é que Abbud prefere a posição em ações via fundos
multimercados, que podem ajustar rapidamente a exposição de acordo com o cenário.
A GPS, que administra o portfólio de clientes de alto patrimônio, que vinha aumentando a renda fixa indexada à
inflação desde o começo do ano, não voltou atrás agora. "Estamos confortáveis com a manutenção. Achamos que
é muito provável que se inicie um ciclo de afrouxamento no segundo semestre", afirma o estrategista Paulo
Miguel, para quem o fato de a inflação ter surpreendido para cima dificultou a aposta em um ciclo próximo de
corte de juros. É apenas, entretanto, uma questão de tempo, na opinião dele.
Já na renda variável, a gestora de patrimônio é muito mais cautelosa. "Conversamos seriamente, mas resistimos
muito e não mexemos em bolsa, estamos na mínima alocação desde 2013", diz o estrategista da GPS, que aguarda
uma retomada mais forte da economia para voltar às compras.
Na gestora de patrimônio Taler, a bolsa foi reduzida em parte dos portfólios, mas os títulos indexados à inflação
também ganharam espaço. "Achamos que o papel tem um retorno bacana para os próximos meses e é menos
afetado caso haja um retrocesso", afirma o sócio Otávio de Magalhães. Ele lembra que a NTN­B tem compradores
cativos, como fundos de pensão e estrangeiros atraídos pelo juro real elevado, em contraposição à taxa perto de
zero em seus países.

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