história transcrita

Transcrição

história transcrita
museudapessoa.net
P/1 _ Ento. Seu Sebastio. Bom dia. um prazer t-lo de novo, depois de dez anos.
R _ O prazer nosso.
P/1 _ Fizemos nossa ltima entrevista em 2001 e queria ento retomar algumas coisas da sua histria. Que
est muito bem contada, mas vamos enriquecer mais um pedacinho. Ento eu queria que o senhor contasse.
Antes de ter vindo a So Paulo, qual era a viso que o senhor tinha da cidade? O senhor conta que achou
que era tudo banhado a ouro, porque l no nordeste a gente pinta a casa de cal todo ano. Como foi a sua
chegada aqui?
R _ Quando eu cheguei a So Paulo trazia aquela imagem da So Paulo toda iluminada. Banhada a ouro.
Aquela maravilha. Na minha viso, os prdios aqui era uma decorao estupenda. Uma maravilha. Tudo
limpo. Tudo encantador. O cho, para mim era um tapete. E quando saltei naquele abril de 1976 aqui. Na
Julio Prestes. Na estao. A vi tudo ao contrrio ao que j referi. O que mais tinha era cachorro vira lata e
mendigo pelas ruas. Aqueles prdios sujos. Com aquela fuligem louca. Aquela fuligem maluca. Aquela
fuligem bem nojenta. E at hoje continua essa fuligem que cobre So Paulo. Essa cinza maluca. A veio o
castigo, n, meu jovem. Veio o castigo. Dizem que quando a gente bebe da gua da terra, a gente no
esquece mais.
P/1 _ O senhor gostou de So Paulo?
R _ E a fiquei. E nessa ficada e nessa brincadeira j tem trinta e tantos anos.
P/1 _ O senhor falou que quando o senhor chegou, foi at o Brs. At o Borba.
R _ Pronto. Quando a gente chegou. Eu vim direto para participar da Semana Nordestina no Anhembi.
Esse evento era pela Secretaria de Turismo e parece que pela prefeitura. No. Pela Secretaria de Cultura
do municpio. E a convocao foi direta. Campina Grande. Ento coube para mim. De qualquer maneira.
Naquela poca era solteiro do time. Ns ramos. Numa linha de quatro. Alis, de trs. Eu era o regra trs do
programa chamado Retalho do Serto. J no existe mais. E um programa antigo da rdio Borborema. E o
convite foi pedindo uma dupla de repentistas para representar a Paraba. A os parceiros achavam. No. No
sei o que. Os parceiros eram casados antes de mim. Eu era solteiro e sobrou pra mim. Coube a mim essa
aventura. Cheguei. A gente saltou da rodoviria. Alis, era para vir de avio. Foram as passagens areas. S
que eu tinha medo de encarar o asa dura. (risos). Eu tinha medo. Ento eu troquei as passagens, Alias
ficava meio sacrificado porque eu tinha nessa poca. Aqueles anos setenta no tinha vo direto de Campina
Grande todos os dias. Era sempre de ms em ms. Uma coisa assim. A gente tinha que ir ate Recife tomar o
vo. Voc acha que eu vou at Recife. Vamos fazer o seguinte. Eu vou pegar logo o nibus daqui mesmo.
Troquei. Mas era medo de avio mesmo. A peguei. Troquei por passagens de nibus. Cinqenta e duas horas
de viagem. Compadre. Cheguei com o mocot dessa grossura assim.
P/1 _ Cinqenta e duas horas?
R _ Cinqenta e duas horas de viagem. sacrifcio danado. Coisa sria. Eu que no fumo. A turma fumava
vinte e quatro horas dentro daquele nibus. Aquilo era um absurdo. Chega com o pulmo seco.
Arrebentado. Um sofrimento danado. Mas nessa brincadeira. Quando a gente saltou l no Brs. No. No Brs
no. Na Julio Prestes. A j estava um carro esperando a gente. Da organizao. J sabia a hora que o nibus
chegava. Alm de mim, veio uma dupla tambm de emboladores. Geraldo Mouzinho e Cachimbinho. E a
gente pegou o carro e foi. Saindo pelas ruas ali. A So Caetano. Ali. Aquela loucura. Imundice danada. Eu
topei logo de cara com o Tamanduate. gua ftida pra danar. Vich. A So Paulo para mim arrebentou-se
toda. Acabou-se aquela imagem que eu trazia. Mas a gente chegou l no hotel do Borba. Na Rua
Cavaleira. L no Brs. A arejou. J encontrei logo de cara Jackson do Pandeiro. Estava Luis Gonzaga.
Estava Anastcia. Dominguinhos. Um moleco ainda.
P/1 _ Maria Ins.
R _ Maria Ins. Com todo pique. Abdias Filho. O Trio Nordestino. Era justamente a casta real da msica
nordestina naquele perodo. O Conzaga. Com a Maria Ins. Com Jackson. Com o Trio Nordestino.
P/1 _ E o senhor j conhecia esse pessoal l de Campinha Grande.
R _ Esse pessoal era tudo fichinha minha. Conhecia tudo l de Campina Grande. Porque Campina Grande
era vitrine. Hoje no, mas nos anos setenta. Nos anos sessenta, Campina Grande era vitrine da msica
nordestina. Qualquer artista que quisesse divulgar o trabalho dele no Nordeste tinha que morar em
Campina Grande. Ficar pelo menos uns seis meses. Foi o que aconteceu com o Teixeirinha. Saiu do Rio
Grande do Sul. Queria difundir a msica dele no Rio Grande do Sul. E at hoje o nordeste ainda conhece o
Rio Grande passado por Teixeirinha. Ele ficou seis meses morando em Campina Grande. Essas figuras
passaram tudo a ser figura nossa. Todo dia estava junto. Na frente da Borborema. Da rdio.
P/1 _ Seu Sebastio. Conte-me como foi esse encontro com o Jackson do Pandeiro?
R _ O encontro com o Jackson no foi muita novidade porque Jackson j conhecia de l. Apesar de que eu
no tinha muito contato com ele. Quando eu comecei cantar eu encontrei o Jackson. O Jackson tambm no
era muito de voltar a Campina Grande. Jackson ficava mais no trecho Rio So Paulo Braslia. Ou Rio So
Paulo. E pouco ia ao nordeste. Principalmente Campina Grande. A quando encontrei o Jackson de cara
fiquei emocionado. Eu j curtia as msicas do Jackson. Ele brejeiro tambm como eu. Eu nasci numa cidade
chamada Solnea. Faz parte cinturo do brejo. Da Zona da Mata e ele Lagoa Grande. Ento a gente tinha
histria meio parecida. Jackson tambm teve seus problemas tambm com a famlia. Um bocado de coisa. At
que ele saiu um pouco magoado de Lagoa Grande. Ele no assumiu que era de Lagoa Grande. Ele dizia
que era de Campina Grande. Mas era mentira. Era de Lagoa Grande.
P/1 _ Ento seu Sebastio. Como foi o seu inicio aqui em So Paulo? Depois disso. Fez essa apresentao na
Semana Nordestina e a?
R _ A Semana Nordestina era para fazer somente oito dias. Mas a coisa pegou tanto. Valeu tanto. Foi
tanto movimento. Naquela poca o nordestino era sedento das coisas da terra. E as pessoas de c ficaram
curiosas para sentir o que era o Nordeste. A coisa foi to boa, que prorrogaram para mais quinze dias. E
durante esses quinze dias. Os primeiros dias no. Fiquei meio besta. Metido. Aquela coisa, n? Fiquei
socado l no hotel. No visitava muito a turma. Mas quando veio a segunda semana. At gostei disso. Acho
que foi isso que me segurou. Na segunda semana a eu me soltei. A comecei a procurar os conhecidos. As
pessoas que eu tinha endereos. E comecei cantar nos cortios a. Eu ia visitar a turma e a turma pedia leva
a viola e no sei o que. A eu comeava a cantar. E nessa semana ltima eu ganhei pelo triplo do cach que eu
estava ganhando. O triplo. A turma. Com a participao da turma. Nos cortios. Aquele hbito nordestino.
Todo roda bandeja. Aqui chama roda chapu. L e bandeja mesmo. O artista. Eles pediam para eu levar a
viola e todo dia num cortio daquele. Chegava l e tinha aquele monte de rapazes. De pessoas morando.
Dez. Doze num quartinho desse tamanho. Tudo prensadinho. E quando eles preparavam aquele povo
daquele cortio e quando eu chegava l. Ao invs de eu simplesmente almoar com eles. Ou jantar. Chegava l
j tinha uma festa montada. Um esquema j montado j.
P/1 _ Que beleza.
R _ Era uma churrascada danada l dentro. Naquele espao do cortio. Os vizinhos todinhos j preparados.
Os que moravam naquele cortio. A pronto. Eu comeava a cantar aqueles poemas de nordeste para cada
um e eles se danavam para chorar e para beberem. E j bolava aquela bandeja e danavam dinheiro naquela
bandeja. E nessa brincadeira. Em oito dias eu ganhei o triplo do cach. A eu senti que So Paulo precisava
de um trabalho. Nem tanto pelo lado financeiro. claro que o lado financeiro ajuda a gente. Sem ele a
gente no pode segurar a barra. Mas a eu notei que So Paulo precisava de um trabalho. Mas isso eu
reconheci na segunda semana. Porque na primeira eu fiquei muito metido. L intocado. Era segurana para
l e para c.
P/1 _ Mas acabou a semana e o senhor volta para Campina Grande?
R _ A quando a gente terminou a etapa. Eu volto para Campina Grande. Chego a Campina Grande. J
tinha outro cantador no meu lugar. Tambm porque a turma l era obrigado a ficar trs. Dois seguravam. E
era um programa dirio. E a a direo achou melhor mudar o terceiro cantador. A eu j fiquei na regra quatro.
S que quando eu voltei para Campina Grande, j voltei pensando em So Paulo. Pensei: _ capaz de arrumar
um cantador e levar para So Paulo. Para a gente fazer um trabalho. So Paulo est precisando de um
trabalho srio. A foi quando encontrei aqui o Joo Quindingues. Alis, foi com quem eu fiz. Eu vim sozinho
de Campina Grande. E aqui eu encontrei o Joo.
P/1 _ Joo?
R _ Joo Quindingues. E duplei com o Joo. E a gente cantou. Por sinal. E nesse encontro que a gente teve
aqui a gente cantou ainda uns seis anos duplado. Depois que eu voltei de Campina Grande. Na segunda
vez do meu retorno aqui para So Paulo. A foi que eu me aventurei junto com o Joo e a tambm j no tinha
mais cobertura de nada. E partiu mesmo para luta. Quando So Paulo era tudo difcil para arrumar onde ter
cantoria. Quando a viola tocava aqui no vizinho. O do outro lado ligava para a policia. A policia vinha e
mandava enfiar a viola no saco. Tipo vadiagem. Quantas vezes eu fui delegacia explicar porque estava
fazendo aquela zoeira. E no sei o que. Cada coisa.
P/1 _ Seu Sebastio. O senhor voltou ainda solteiro?
R _ Voltei. Naquele tempo tudo era solteiro. Isso foi em 1976. Eu fiquei aqui o ms de abril. E a quando
chegou na ltima semana de abril j estava l de novo. Eu cheguei na segunda e fiquei duas semanas aqui. E
no finzinho de abril estava chegando Paraba de novo. E fiquei o ms de maio. E em junho j vim para So
Paulo. Encarei o primeiro frio de So Paulo. Em 1976. Foi o ano que eu mais vi So Paulo fazer frio. No
foi brincadeira no. E eu tambm. No sei se foi a estria que eu estava fazendo. Para encarar a terra da
garoa. Mas de l para c eu nunca vi acontecer isso. Uma vez eu abri a torneira e a gua no desceu. Eu no vi
mais acontecer isso aqui.
P/1 _ mesmo. Esquentou. O clima da terra esquentou.
R _ O negcio foi srio. E algum diz: _ E sempre frio? _ E no. Mas eu lembro que quando eu cheguei e fui
abrir a torneira. Quando abri a torneira, a gua no desceu. Virou pedra. De l para c no vi mais acontecer
isso. Por isso que eu digo que So Paulo. O frio mximo foi em 1976, que eu cheguei aqui. Pela segunda
vez. A pronto. Fiquei aqui. Trabalhar com o Joo. Encontrei o Joo. Ele comeou a cantar. Juntos. Eu
solteiro. E aqui a gente ficou. O resto de 1976. 1977 fui Paraba de novo. Fiquei trs meses l. Voltei pra c
outra vez. Em 1978 fui l e casei. A quando casei. Pronto. A tive que encampar. A a coisa pesou. Solteiro
uma coisa. Mas casado no. Por isso precisava segurar. E eu vi que a viola s no dava aqui em So Paulo.
Sendo casado. Porque no tinha campo suficiente. Naquele tempo era perseguio de nordeste danado. O
caso do meu documento. Esse documento bem natural. (Risos). Toda esquina o indivduo me parava. O
filho de gua morava na mesma rua. Mas s para me chamar de baiano. _ O baiano. Essa rua assim. Como
que . E eu me habituei tanto com isso. Era todo dia. Todo dia. Duas. Trs vezes durante o dia. Chegava a
abusar. A me acostumei com aquilo. Nem estava ligando mais. At estava gostando. A quando casei, tive
que mudar um pouco de vida. A arrumei um servio de zelador aqui na Rua das Palmeiras, dois. Meia.
Oito. E fiquei l ainda dois anos.
P/1 _ Esse um prdio inteiro do Camasmie. No isso? Como chamava?
R _ . Taufik Camasmie. Ele tinha parece uns trs ou quatro prdios. Tinha uma aqui na Consolao. Tinha
um na Rua das Palmeiras. Tinha um, parece que na Veiga Filho. Na Santa Ceclia. Sei que eram uns
quatro prdios que ele tinha. E ento os prdios era aquela. Ele era o dono do prdio. E aquele povo todo era
inquilino. Que foi uma histria engraada. Eu alm de ser homem do campo. Nascido no campo. Criei no
campo. Ento a funo que eu sabia fazer era coisa do campo. E a no ser aquilo ali, s cantar. Tocar a viola e
cantar. Ento quando cheguei aqui em So Paulo para encarar outra funo. No sabia fazer nada. A. Casado.
Precisava. A um amigo meu trabalhava numa administradora de imveis. A ele foi e disse: _ Rapaz. Eu
tenho um servio para voc. Que vai te quebrar um galho grande. Eu digo: _ O que, rapaz? _ Sabe que tem
um prdio na Rua das Palmeiras, no nmero dois. Meia. Oito. Que o zelador l acabou de falecer. Agora.
Tem uns quinze dias que ele faleceu. O zelador aposentou-se l e acabou morrendo l no prdio.
A vida todinha trabalhou l. um prdio tranqilo. Prdio de seis andares. Voc s tem uma funo de fazer. Lavar
ele uma vez por ms. Agora o lixo todo dia tem que retirar. Eu digo: _ Rapaz. Eu no sei fazer nada disso.
_ Que nada. A gente ensina. A foram l e me ensinaram. Sei que me arrumaram. A pronto, defendi. No fui
mais pagar aluguel. J tinha um salrio. No era muita coisa, mas dava para sobreviver. No pagava aluguel.
No pagava luz. No pagava nada. Aquele negcio. Ainda tinha um salariozinho. Morando l em cima. No
ltimo andar. E os moradores eram todos inquilinos. Coitados. Ento a minha funo. L no tinha sndico. A
funo de sndico tinha que ser a minha tambm.
Zelador ali era de faxineiro at sndico. Todo mundo tinha a chave da porta. Ento. Aquele negcio. Eu no
precisava ficar na porta. E assim. Ainda encampei uns dois anos e uns quebrados. Eu acho que eu s no
estou l at hoje, porque o metro me expulsou.
P/1 _ O senhor falou que bagunaram o coreto l.
R _ Porque abriram. Interditaram a Rua das Palmeiras e fizeram um buraco enorme. E ficou muitos anos
ali. Demorou uns dois ou trs anos aquele buraco ali. E ficava s aquela trilhazinha na calada para voc
passar. A eu no podia chegar de madrugada. Eu ia cantar fora e quando eu chegava l. Muitas vezes me
tomavam as duas violas ainda.
P/1 _ Era assalto?
R _ Sim. Os caras assaltavam. Porque de madrugada ali no tinha nada. E aquela trilhazinha ali, eles
aproveitavam. Voc quando entrava l dentro os caras pegavam voc. Enquadrava. No tinha jeito. A eu com
aquilo. Desanimei-me. E pedi as contas e fui embora.
P/1 _ Mas, seu Sebastio. Ningum no prdio sabia era que o senhor era poeta?
R _ No. Sabiam.
P/1 _ Mas o senhor disse uma vez que o senhor Foi ao programa do Rafael Carvalho.
R _ Isso a. Ali na TV Tupi. At ali ningum sabia.
P/1 _ Conta como foi no dia seguinte?
R _ Ate ali ningum sabia. J tinha mais de ano que eu trabalhava no prdio e ningum sabia. Eu saa toda
noite, mas ningum sabia. A o Rafael me convidou para fazer um programa. Fiz at com o To Azevedo. Eu
e To Azevedo. Fomos fazer o programa do Rafael. Rafael Paraibano. L da minha regio tambm. Eu nasci
em Solnea e ele era de Caiaras. Mesma terra do Z Dumont. A ele tinha um programa na Tupi. Que era no
alto do Sumar. E me colocou para fazer um programa de TV. Eu fui fazer o programa do Rafael. Quando
terminei o programa aqui. Volto para o prdio Est o povo todo no meu prdio. Estava todo mundo me
esperando._ Eu quero ver o senhor. O senhor artista. Eu tambm disse para o Rafael que eu era zelador na
Rua das Palmeiras, dois. Meia. Oito. Eu j me identifiquei logo de cara. Ele perguntou: _Sebastio. Voc
vive profissionalmente da viola. E eu expliquei. _Rapaz. o seguinte. Tem uma funo paralela. Que eu
trabalho. Arrumei um servio de zelador e expliquei para ele. Ao vivo, no programa. A no deu outra. todo
mundo assistindo. Quem mandava na poca era a Tupi. Estava todo mundo. _ O senhor fica trabalhando
aqui. O senhor uma artista. E trabalhando aqui. _ No, gente; a situao assim. E comecei a explicar. Que at
ali ento. Eu no tinha como sobreviver profissionalmente direto em So Paulo. Era questo de espao, que a
gente no tinha. Era perseguio danada do nordeste. S depois da Radio Atual e depois da Erundina prefeita.
Depois que a gente fundou a UCRAN tambm, que teve parcerias com Secretaria de Cultura. Com SESC.
Com mil coisas que a gente conseguiu fazer de So Paulo esse espao nordestino estupendo que hoje .
P/1 _ Seu Sebastio. Ns vamos chegar l.
R _ O Z. Tambm convm frisar o seguinte. Eu hoje sinto saudade, gente. De o cara chegar e me abordar
na esquina e dizer assim: _ Baiano. E isso assim, assim, assim. Eu nunca mais vi ningum me falar isso a.
Sinto saudade.
P/1 _ E a. O que aconteceu. Voc saiu do prdio e foi fazer o que?
R _ A minha sada do prdio o seguinte. Quando eu sa do prdio. Eu tentei encampar outro prdio. Mas s que
no precisaria tambm. Eu j estava sobrevivendo da viola. A quando eu sa do prdio, eu fui encampar outro
prdio. Passaram-me para outro prdio. S que no outro prdio j tinha sindico. Tinha mil coisas. Ali j era
tratado como empregado. Entendeu o negcio. No era o caso do prdio antigo. A turma me tinha como um
administrador. Entendeu?
P/1 _ Mandava soltar e mandava prender.
R _ Claro. Qualquer coisinha. _ Seu Marinho. Ajude aqui por caridade. E no sei o que. Era o cabea da
coisa. A no outro prdio eu fui ser mandado. A no agentei. No agentei dois meses. Mas j tinha o canto da
viola e tenho at hoje.
P/1 _ O senhor conta na outra entrevista. Que comeou a tocar numa churrascaria que s tinha gacho
tocando.
R _ Essa a histria como a gente comeou a fixar a cantoria em So Paulo.
P/1 _ E tirar do eixo do Brs. No isso?
R _ Que at antes a gente s cantava no Brs. Virou um mito aquela coisa. Virou uma mania. O saudoso
Venncio. Da dupla Venncio e Corumb. Autor do Mata sete. Autor do S deixo meu Guariri no ltimo pau
de arara. Boi de Cajarana e tantas coisas. Venncio foi um dos pioneiros aqui. Ele comeou a abrir esses
caminhos nos anos sessenta. Com o programa da Radio Nacional. Que hoje Globo. Ele tinha um
programa chamado P da Cajarana. Ento Venncio foi quem comeou. Implantou a cantoria no Brs. E disse
se sasse do Brs a cantoria se acabava. Mas eu. Quando cheguei ao Brs. Vendo o dia a dia. Desde 1976
que eu cheguei.com poucos anos eu comecei a perceber umas coisas. Com poucos meses. Que no era o
meu cotidiano. O meu dia a dia. Eram cantadores dividindo o espao com vagabundos. Est entendendo o
negcio? Se algum chegava e dava o sinal que tinha alguma grana. Com certo dinheiro no bolso. Quando
dobrava a esquina, o vagabundo pegava e voltava e dividia com os cantadores. Era vagabundo infiltrado
naquele meio. Era coisa terrvel. E eu contei isso para Venncio. Venncio disse: _ Mesmo com isso. No
tente tirar a cantoria do Brs, que vai se acabar. Eu fiquei com aquilo. E. Alis. Venncio faleceu e at ele
morrer, a gente nunca se alinhou direitinho os dois. Porque eu discordava de tirar a cantoria do Brs. Que
ia se acabar. Mas ele morreu vendo que dava para tirar a cantoria do Brs. Eu encampei. Cheguei Rua
Augusta. Na calada a noite. Gente anima a cantoria. Que, alis. Antes da Rua Augusta. Tenho uma histria
tambm. Que teve um cara que me ajudou muito aqui. Ele hoje est em Campina Grande. diretor de teatro
l. O nosso querido Wilson Mo. Eu quando. Primeiro programa que eu fiz na Rdio Borborema. Primeiro
microfone que eu encampei. Encarei de frente. O Wilson era apresentador. E no final do setenta e seis.
Comecinho de setenta e sete. Estava em casa. Liguei o rdio. Programa de nordestino. Programa
nordestino passando forro. Quando ouvi a voz do locutor. Digo: _ Essa voz conhecida. Meu Deus. A
comecei a tentar procurar quem era. Tentando lembrar quem era. A caiu a ficha. Wilson Mo.
P/1 _ Wilson Moura?
R _ Wilson Mo. A eu vou l rdio. Que era na Capito Cavalcante. Que era na Vila Mariana. Essa rdio era
um complexo da Bandeirantes. Chamava Radio Jornal de So Paulo. Parece que isso. OU era Rdio So
Paulo. No. Era Do Jornal de So Paulo. Que era um complexo da Bandeirantes. A eu vou e falo com o
Wilson Mo. E a a gente marca nas teras. No. As segundas, quartas e sextas feiras. Trs dias por semana.
Eu fao programa com ele. E Joo Quindingues. Aquilo ali foi meio caminho andado. A a coisa estourou.
Numa dessa caminhada j fiquei cantando em vrios lugares. Marcava lugar de cantoria. Avisava no rdio.
Todo mundo acompanhando. Chegava. A casa lotada. No cabia mais ningum. E comecei a engordar
muito os bares. Donos de bares fora do Brs. Mas cantoria oficial mesmo foi essa. A gente comeou na
Rua Augusta. Eu chego num sbado na Rua Augusta. Tinha que fazer uma cantoria ali pertinho. Prximo
num bar de um conhecido nosso. E vou descer a Rua augusta. Eu morava nas Palmeiras. Vou descer
aqui. Naquele tempo a gente podia andar em So Paulo. No tinha problema. Peguei a viola e sai descendo
a Rua Augusta. A quando eu chego Rua Augusta escuto um barulho danado. Gente para danar num bar
aberto. Numa churrascaria. Quando eu chego l tinha dois gachos cantando. Repentistas. Trovadores
gachos. Mas no tinha um gacho, a no ser o dono da churrascaria. A casa estava lotada. De canto a canto s
de nordestinos. Paraibanos. Pernambucanos. Potiguares. Cearenses. O diabo a quatro. E eu vi aquele
negcio, digo _ Meu Deus. Que coisa mais sem jeito. A vou ao dono da churrascaria. Eu com a viola.
_Voc artista tambm, tch? _ Sou. _ Nossos trovadores. A olhei l dentro do salo. Primeiro ele mandou
entrar para ver os artistas l cantando. Eu entrei e voltei e falei: _ Gacho. Aqui tem uma coisa muito
errada. _ O que? _ Porque tem uma dupla de trovadores gachos, quando o pblico todo do nordeste. Que
negcio danado isso aqui. Ele disse: _ Porque infelizmente o nordestino no tem onde assistir. Mas gosta de
repentistas. No gosta? Ou do trovador? Eu digo: _ Rapaz. Eu sou repentista. Eu acho que o cantador
desse pblico foi bem usado. Eu acho que o cantador desse pblico no so esses dois conterrneos seus no.
Seus patrcios. Eu acho que o cantador desse pblico a minha linha, que de repentismo. A ele ficou
entusiasmado assim: _ Voc repentista? Ento canta a para os conterrneos seus.
P/1 _ No mesmo dia?
R _ Na mesma hora. _ S uma amostragemzinha, para dar uma palhinha. A eu peguei. No tinha nem a
minha viola. Da bizaca. Que era para no ter muita coisa. Peguei o violo do gacho l. Na hora do intervalo
o gacho me apresentou. O dono do restaurante. Apresentou para os artistas dele _ Esse aqui repentista. _
Tudo bem. E no sei o que. A diz: _ D um compasso. Meu compadre. Quando eu pego o violo do danado
do gacho. Chego l em p no palco pequeno assim. Hora que eu chego naquele palco com o violo do gacho
e ligo o violo no som. E puxo no estilo de harmonia. No violo mesmo. A vi minha gente suspirando
fundo. Meio bebaa e respirando fundo. A comecei cantando o estilo da cantoria. Vich. A a poeira cobriu.
E o gaucho endoideceu. O dono do pedao. A eu falei com ele. E n o outro sbado a gente marcou. Ele: _
Vem fazer uma experincia aqui. Chamou para fazer a cantoria._ Que danado isso? Que quer dizer isso? _
No se preocupe. _ Ento vamos fazer o seguinte. Os meninos fazem aqui aos domingos. Era um domingo.
_ Voc vai fazer aos sbados. Vamos fazer uma experincia no sbado. Ele no fazia no sbado, porque
encostadinho tinha um forro chamado Ucem. Que era o nmero cem que tinha o forro da Rua Augusta.
Ele tambm no podia concorrer com o forro. No sbado tinha. Ento ele queria que os gachos cantassem no
domingo que no tinha forro. A preparou para eu competir com o forro. _ Amigo. Eu venho. Falei com o
Joo Quindingues e ns fomos. A gente chegou l. Comeou a cantoria. A primeira noite ningum sabia muito
direito. No estava muito certo. Mas lotou. Danou-se. O gacho viu que dava certa a coisa. A a gente
marcou todos os sbados. Quando foi o segundo sbado. Aproveitei o programa do Wilson Mo. No
programa na segunda, quarta e sexta. Avisando para o de sbado. Quando foi a noite. Meu pai. No coube
ningum na churrascaria do gaucho. Lotou de nordestino. E cantar. Foi uma loucura. No teve forro. No
teve o diabo.
P/1 _ Que beleza.
R _ A a gente fez de l o espao do sbado. A faltava o espao para o domingo. Isso era para acabar de tirar a
cantoria do Brs de uma vez.
P/1 _ Mas explica para quem no sabe. Como funciona uma cantoria? o dia inteiro?
R _ Repentista aquele. o esquema. Por exemplo. O cantador. Hoje no. Hoje a maioria est querendo fazer
a coisa meio profissional, mas a natureza do repentista em si. Ele no sabe ficar s uma horinha de
apresentao. O repentista comea a cantar s oito horas da noite e a gente sai matando. Matando. Matando.
Matando. Matando at uma hora da manh. Duas horas. E tem vezes que at amanhece o dia com aquilo ali.
E o pblico sempre em cima pedindo cantoria. Pedindo motes. Como que rola uma cantoria? A gente
comea com uma sextilha explicando porque est ali. Se um aniversrio. Ou um encontro semanal. E
agradecendo as pessoas que ali esto. Aborda todas as pessoas que esto ali. Cantando. O cara cantando
falando o nome das pessoas presentes. E ali naquele meio roda a bandeja. Fica a bandeja l na frente e
todo mundo participa daquela bandeja. Com a contribuio. E o contador sa dali desenvolvendo o trabalho
dele. Depois do terceiro baio. No. Quando abre no com bandeja. O primeiro baio. O primeiro baio o que?
Leva uns trinta minutos de cantoria. O cantador falando e agradecendo as pessoas que esto ali presentes.
Agradecendo. Em sextilhas. A vem o segundo baio. Que a segunda etapa, continua em sextilhas. A
quando o organizador do evento traz a bandeja. Se o organizador abre. um hbito nordestino. Se o
organizador abre com dez reais, todo mundo vai com dez reais. Os participantes. Se o dono do ambiente
abrir com cinqenta, todo mundo obrigado a abrir com cinqenta tambm.
P/ 1 _ Eta.
R _ No. Chega l. Tm outros que abrem com cem. E vai assim. Maioria todinha acompanha. um hbito do
nordeste. Ento a gente. E a desenvolve a cantoria. Isso no segundo baio de viola. Entendeu? Ele traz a
bandeja. O dono da casa abre. O dono do evento e todo mundo acompanha. Depois que vem a primeira
fornada dos convidados do dono e todos paga a altura dos donos, a vm. O que a gente chama de gatos
pingado. A rola o resto dos gatos pingados. Essa piada do gato pingado at meio depreciativa, mas hbito l
do nordeste. Fazer o que? A vem os do cinco. Dos dez. A no tem mais limite. A todo mundo chega junto.
A quando termina a cantoria. A l vai. Todo pblico presente. A maioria do pblico do repentista. Todos
pedem motes. Estilos de cantoria. Um pede um martelo agalopado. Outro pede um galope a beira mar.
Outro pede uma stima e vamos colocar uma oitava. Um quadro. Enfim. Vrios estilos da cantoria. Pedra
embolada. um monte de coisa. Alm disso, a tem os poemas do repentista. Interpreta. Tanto dele. Pode ser
da autoria dele ou de outros autores. E da por diante. Essa brincadeira, meu irmo leva horas. Horas e
horas. Vai se queimando.
P/1 _ Isso era s o senhor e o Joo?
R _ Eu e o Joo. S que eu adotei com o Joo. Como eu trabalhava. Como eu trabalhava. Essa cantoria que a
gente arrumou na Augusta foi nos anos 1978. Quando eu j trabalhava de zelador. E o Joo era porteiro. Eu
trabalhava na Rua das Palmeiras e o Joo era porteiro na Higienpolis. No bairro Santa Ceclia. Como ns
ramos empregados. Tinha que levantar de manh. No eu. Eu no tinha problema. Mas o Joo tinha que
levantar de manh, que ele trabalhava de porteiro. O que a gente fazia. De oito horas a meia noite. Era
cantoria de famlia. De casais. Para trazer os filhos na churrascaria. Ficava uma maravilha. E de meia
noite em diante. A entravam outros cantadores. Colegas nossos. Felelon. No mote dele. Entravam. A
chamava a turma do m. A turma da cachaa. A turma j vinha do Ucem toda zoada. A maioria vinha zoada.
E os cantadores tambm j chutaram muito. Esses chegavam at oito horas da manh.
P/1 _ Nossa.
R _ . Eu mais O Joo no. Para as famlias. Para os casais. Coisa comporta mesmo. A gente ficava at meia
noite. E todo mundo j sabia. Era cantoria minha com Joo at meia noite. At meia noite ficavam os casais,
crianas. Todo mundo familiar. E quando dava meia noite em diante era zoeira. Era um tirineto danado. A
depois da Rua Augusta. A a gente. Eu digo: _ Joo. A gente vai precisar de um domingo. Fixo tambm. No
prdio que eu morava, morava um japons. Morava um japons e o japons tinha um restaurante grande em
frente ao prdio. A um dia o japons foi l para a cantoria da Rua Augusta e gostou da cantoria. Est danado.
O japons com um cabelo l em cima. Espalhava at embaixo assim. Cabelo louco. A. Pelo portugus a gente
chamava de Valter. Mas o nome do bicho era Teru no sei das quantas. Ele era muito meu amigo e disse:
_ Porque voc no usa um dia para cantar l no meu restaurante? Eu abro tambm para tu.
P/1 _ Era restaurante do que?
R _ O dele era restaurante normal. Com comida normal. Era comina natural. Pratos. O pessoal que
trabalhava naquela Santa Ceclia todinha almoava ou jantava no restaurante dele. A ele me cedeu os
domingos.
(troca de fita)
P/1 _ Voc estava falando do Valter.
R _ Do japons. A, meu caro. O japons cedeu o espao para as domingueiras. A gente preparou as
domingueiras. E foi um sucesso. A gente fazia o sbado na Rua Augusta e o domingo na Rua das
Palmeiras. Casa lotada. Uma maravilha. E com isso a gente arrastou um bocado de anos. A gente comeou
em 1978 para 1979. A foi quando em 1979 abriu mais um espao na Rua Rocha. Esquina com a Praa
Quatorze Bis. O velho Baio de dois. A primeira casa tpica nordestina. Era maravilhoso. Eu trabalhei l
tambm. Dez anos fiquei trabalhando nessa casa. S que o Baio de dois a gente fazia de segunda a quinta
feira, porque da sexta em diante. At domingo era forrozo. A a gente fazia cantoria. Eu. O Lorinaldo. O
Janurio. A gente fazia de segunda a quinta.
P/1 _ Sebastio. Quando surgiu a parceria com o Andorinha?
R _ Andorinha. Eu comecei com ele no Baio de dois. Naquela poca quando eu cantava com o Joo
Quindingues. O Andorinha era enfermeiro. A depois foi o tempo do Baio de dois. A comecei a adotar
tambm uma linha com o Andorinha que j no fazia com o Joo Quindingues. Porque o Joo era aquele
cantador tradicional, que s canta o estilo da cantoria. Ele se priva s naquela linha prpria da cantoria. Do
repentismo. J com o Andorinha no. Eu ia fazer uma linha diferente. No diferente. Eu ia cantar um bocado
de coisa. Pegar Emboladas e colocar no meio. O Joo no entrava nesse tipo de embolada. Era. Era no. um
cantador tradicional. E o Andorinha era do tipo que topa tudo. Era polivalente. A duplei com Andorinha.
E pronto. Trabalho at hoje por a. Trabalhamos juntos.
P/1 _ J tem quanto tempo?
R _ Tem tempo. A gente comeou mais ou menos em oitenta. Tem cho.
P/1 _ Seu Sebastio. Eu estou retomando alguns pontos aqui que a gente falou na outra entrevista. O
senhor contou trs histrias l. Que eu tinha pedido para o senhor contar algumas histrias marcantes. O
senhor contou uma que foi a sua chegada na sua terra num grupo escolar. Foi seu reencontro com a
famlia. Ento ns j temos. Est bem contada. A histria triste de um fazendeiro inimigo que pediu para o
senhor cantar no dia seguinte que tinha morrido.
R _ . Coisa triste.
P/1 _ E outra. Que o senhor estava numa cantoria. Que a mulher que estava assistindo era viva do dono
da viola que o senhor tocava.
R _ Agora a mesma situao que aconteceu com aquela. Aconteceu agora a uns trs anos atrs. Aconteceu
outra coisa. Quando eu comecei. A minha primeira cantoria profissionalmente foi feita em 15 de
novembro de 1968. Ento o seguinte. Naquele dia foi um cantador chamado Beija flor. Conhecido na
turma como Beija flor. O nome dele Ccero Alves de Lima. um paraibano de Catole do Rocha. E passou a
morar na minha regio. Casou com uma moa da minha regio. E at 1968 eu no cantava profissionalmente.
E o Beija flor foi um cantador, que foi o primeiro cantador que eu cantei profissionalmente. Que at ali eu
levava. Cantava com todos os outros cantadores, mas era eu participando das cantorias. Como cabea das
cantorias, mas eu no queria um centavo. Entendeu? S em 1968 que eu comecei a cantar. A aconteceu o
seguinte. Beija flor morreu h uns trs anos a. E a uns trs nos atrs eu cantei. Fui cantar numa cidadezinha
chamada Casserengue. Que antigamente era vila. Municpio de Solnea. E eu fui convidado para cantar.
Eu sempre fico l todo ms de janeiro e fevereiro eu fico na Paraba. E num desses perodos a mulher de
Beija flor. A viva de Beija flor me chama para cantar. _Sebastio. Eu quero que voc faa uma cantoria na
casa da minha me. Minha me est querendo que voc faa uma cantoria. S que tem uma coisa. Voc vai ter
que cantar com a viola de Ccero. Que o Beija flor. E eu fui cantar com a viola de Ccero. E me aconteceu
quase a mesma coisa. A vou cantar com a viola de Ccero. Quando eu comeo a cantar. Comeo a entornar
a viola de Ccero. Beija flor. Me deu uma saudade to danada do meu nego veio. A eu me senti assim meio
areo. No estava achando nem que eu estava cantando com outro cantador. Para mim estava cantando com
Ccero. E teve uma bocada de horas que eu estava cantando e falando nele._ Como que est Terezinha?
Delirei. Sabe aquelas coisas meio doida que acontece com a gente. A ela disse: _ Sebastio. Voc est
cantando com o Pedrinho. No com Ccero. Digo: _ Meu Deus. Olha que negcio. E umas lembranas
terrveis que acontece com a gente.
P/1 _ E uma lembrana boa?
R _ So boas. De qualquer maneira so boas. Porque para mim estava cantando com o Ccero. _ Ccero.
Como que est Terezinha? Como que esto teus meninos? E ela disse: _ Voc no est cantando com Ccero.
Est cantando com Pedrinho. Pedro Soares. Que eu chamo mais de Pedrinho. Essas coisas meio louca,
viu.
P/1 _ Seu Sebastio. Uma histria bacana de conhecimento do senhor. De homenagem. Como essa da
escola que o senhor j tinha contado. Lembra de alguma?
R _ Eu no sei se da outra vez eu falei das minhas. De dois pontos diferentes. Por exemplo. Eu para mim.
A minha maior consagrao. A coisa que eu mais gostei. No sei se da outra vez eu falei. Falei. Foi quando
a gente participou aqui no Anhangaba das Diretas j.
P/1 _ No. No falou.
R _ No falei. Participei das Diretas J. Em cima daquele palco ali. No Anhangaba. Aquela multido. Junto
com Tancredo Neves. Ulisses Guimares. Aquela panela politiqueira todinha. Estava todo mundo junto.
Foi quando eu vi o Anhangaba todinho me aplaudindo de p. Aquela loucura. Aquela maravilha. Para
mim aquilo ali foi a consagrao. Agora me pergunto o ano. Que eu no sei mais. Eu no estou nem lembrado
qual foi o ano? Aquele movimento das Diretas j. Qual foi?
P/1 _ Foi 1984.
R _ Foi em 1984. E mais ou menos por isso mesmo. Sabe o que . O Osmar Santos era quem estava
encampado. E a gente. Eu e o ----------. Da a pouco o povo gritando e pedindo que a gente voltasse de
novo. A gente fez uns cinco minutos. A ficou o povo gritando que a gente voltasse. A gente voltou e fez
mais dez. a comearam a pedir. Foi que a gente brecou ali. Coisa bonita. O Anhangaba todo lotado.
Aquela multido. Uma loucura aquilo ali.
P/1 _ Que bonito.
R _ Coisa bonita. A vem o contrrio. Vem o contrrio. Em 1989. Foi depois do Anhangaba. Acho que foi
em 1989. Para 1990 mais ou menos. Que tinha um danado de um grupo. Uma banda que eu tambm nem
sei qual o nome. No sei se foi. Era uma banda que foi para as bandas de Recife. E l encontrou uma louca.
Tinha uma mulher louca que cantava umas emboladas loucas l na praia. E essa banda gravou essa
embolada da louca l da praia, que eles encontraram. Eu no sei qual era a banda. A essa Revista Bizz. Que
divulga rock. Negcio das bandas. Ligou para mim pedindo para eu abrir o show dessa banda no Olmpia.
P/1 _ mesmo?
R _ A foi o meu sacrifcio. E antecipadamente. Eu digo: _ Vou abrir. Falei com o menino. A apresentao
parece que era numa sexta feira a noite. Quando foi na segunda feira j tinha depositado o cach. E um
cach muito alm dos meus padres. Entendeu. Tem at uma piada: _
Quando a esmola boa. A gente desconfia. Mas bateu certinho. A apresentao era na sexta e na segunda
eles j tinham depositado. A pronto. Quando chegou a sexta feira. Eu com Mario Heleno. Chega l. A
multido danada. Era aquela fila enorme de gente. Cheguei na frente do Olmpia estava uma revoluo.
Aquela Rua Cllia estava lotada de canto a canto. Multido para assistir essa banda. Esqueci o nome da
banda, rapaz. Sei que era uma banda que estava com um sucesso danado na poca. A. Para a gente abrir o
show da banda. Quando estou no camarim chega o Heleno. A gente prepara tudo direitinho. O cara fez
uma vistoria l no palco. Onde era que a gente entrasse. Tudo bem certinho. Quando chega a hora para a
gente entrar tudo escuro. Aquele negcio. A abriram as cortinas. E ns entramos, de acordo com o
esquema. O cara disse: _ Os pontos era aqueles. Voc fica naquele e voc fica nesse. Dois pontos. Eu vou
para o meu ponto e Heleno fica no dele. A a cortina abre. Quando a cortina abre, comea a cantar. Meu
compadre. Tudo escuro. Quando abre a cortina. A minha estrofe saiu, mas a do Heleno s teve jeito de
sair. Saiu dois versinhos porque o resto no saiu mais.
P/1 _ Por qu?
R _ Olha. O que foi. Batom. Tnis. O diabo. Tudo que no prestava caiu em cima da gente. Uma raiva.
Porque na hora que acenderam as luzes. Que a gente olhou estava toda aquela turma com aquele cabelo
moicano, cabelo doido. Aquele negcio. Aquela cristona l. Cabelos vermelhos e azuis. Aquelas meninas
com aqueles rapazes todinhos. Estava tudo em ponto de bala para embalar na banda. A entra dois
repentistas cantando ao som da viola. Vaia. O vaia. O vaia. E jogaram tudo que tinha em cima da gente.
Jogaram bolsa. Jogaram sacola. Tnis. O diabo. Eu sei que o coitado do Heleno saiu sem fala. Eu tambm
recuei. No tinha mais. Era pancada por cima da viola. Pa pa pa. Jogaram tudo. Parece que o povo estava
preparado para jogar troo na gente. Ento foi a maior vaia que eu tomei em toda a minha vida. A estou te
mostrando esses dois ngulos. O aplauso em nome da multido no Diretas J. E a vaia estupenda do Olmpia.
Foram dois cenrios diferentes. Outra coisa que eu consegui em So Paulo atuar. Eu no sei se falei da outra
vez. Algum pergunta assim para mim. Algum j perguntou. Jornalista j perguntou. _ Aonde que a viola
atua? A eu expliquei. O Jos Erminio. Irmo do Antnio Ermrio de Morais. Aqui nessa regio aqui dos
Jardins. Todos os anos eu cantava no aniversrio do Jose Ermrio. Na manso do Z. Ou era na casa dele ou
ento naquele Tnis Clube Harmonia. Ali perto da Nove de Julho ali embaixo. Na regio dos jardins. A eu
digo: _ Gente. Onde a viola atua o seguinte. Eu tenho cantado na casa do Jos Ermrio, que irmo do
Antonio. Empresrio danado. Entendeu. Tenho atuado. E tem uma coisa. No barraco mais simples da
favela. L na periferia. Ento ela est em todos os ngulos. Outra. Na Igreja da S. Dentro da Catedral da S eu
j cantei muitas vezes. Digo que cantei vrias vezes j. Depois da Catedral da S, depois atuo l dentro nesse
tempo de Carandiru. Eu vivo dentro do Carandiru tambm. Na cela para os.
P/1 _ mesmo?
R _ Fiz. Ento dois ngulos. A Catedral da S. Dentro da Catedral e no Carandiru. Na manso do Jos Ermrio
e na favela. Ento ela j cobriu todos os ngulos. A viola fez isso. J participei.
P/1 _ Queria falar agora sobre umas coisinhas sobre o fazer da sua profisso. Da sua arte. O cantador j
nasce pronto?
R _ Nasce nada. Isso papo furado. Eles so fantasiosos, n rapaz. Os cantadores. A fantasia deles to louca,
que eles viajam nela. Na fantasia. E no s o cantador. o msico. Eu tenho visto isso com o pintor. O diabo a
quatro. Fulano nasceu pintor. Aqui que nasceu pintor. (Risos). O repentista tem um aprendizado muito
longo. Eu, por exemplo, comecei menino cantando. Quando eu vim me profissionalizar eu estava com
vinte anos de idade. Viu. Foi quando eu achei que tinha condies de partir. Hoje a gente pega um
moleque. Comea a preparar o menino. Vai. Vai. Vai. Vai. Quando vai se profissionalizar tem que ter no
mnimo cinco a oito anos de treinamento. Cara nasceu cantador. No tem esse negcio no. treinamento.
Alis, tudo.
P/1 _ Tudo tem que ter.
R _ Isso o pintor. O msico. Qualquer rea. Nasceu. Nasceu o caramba
P/1 _ Vocs precisam muito da memria?
R _ A memria est acima de tudo. Repentista sem memria no funciona. Por exemplo. Eu estou cantando.
Uma hiptese. Voc meu parceiro. Eu cantando com voc. Voc tem. Eu tenho. Ns dois temos. Temos trinta
segundos. A gente tem trinta segundos para preparar uma estrofe. Que seja de dez verses. Que seja de
oito. Sete ou seis. Entendeu? A gente tem trinta segundos. Pelo menos. Pelo menos. Se no preparar a
estrofe toda, mas voc tem que rever os trintas segundos. Preparar. Chegar ao menos com oitenta por
cento dela pronta. Vinte por cento voc se vira. Entendeu. Ento se voc no tiver. A memria no for boa, voc
arrebenta. Porque naqueles trinta segundos que voc tem que preparar. Na hora que voc abre a boca, tem
que estar gravada. Entendeu? Gravada no seu subconsciente. Ento a memria ali. Ento se voc falhar um
pouquinho voc se perde. Ento memria est acima de tudo. Repentista, por isso um problema quando a
gente chega a certa idade. Os neurnios velhos comeam a desandar, o cantador comea a ficar meio lento.
Coisa sria.
P/1 _ Mas Seu Sebastio. Conta para o pblico entender um pouquinho da dificuldade. Por exemplo. Como
a estrutura de um martelo agalopado?
R _ O martelo agalopado. A gente d o nome de martelo agalopado aos decasslabos. Pode ser em
sextilhas. Uma estrofe de seis versos. Oito ou dez versos. Ento o seguinte. O martelo agalopado. Voc
vem que decasslabo. Se for de dez. Ento aquele que o primeiro verso rima com o quarto e o quinto. O
segundo com o terceiro. O sexto e o stimo com o dcimo. Oitavo com o nono. Tudo na linha dez slabas.
Cada verso dez slabas. Agora.
P/1 _ Isso em trinta segundos?
R _ Voc tem trinta segundos. Voc tem trinta segundos para preparar pelo menos oitenta por cento da sua
estrofe. Agora no s o martelo. Alis, da cantoria de viola um dos estilos mais difceis o martelo.
Principalmente o que se chama martelo solto. O martelo que eu sou obrigado a pegar na sua deixa. No
verso que voc deixar, eu tenho que pegar. Ento. Aqueles trinta segundos meus vai ser mastigados a mil.
Voc est entendendo? So dez versos. Caramba. Todos tm que ser rimados. Est entendendo? Os outros
estilos no. A maioria tem versos soltos que voc no se preocupa com ele. Apesar de que ainda tem o
problema da metrificao tambm. Que uma coisa sria. o seguinte. Quem nunca se aventurou. Pelo menos
fazer uma msera quadra. Uma redondilhazinha. Uma quadrazinha. Quem nunca se aventurou a fazer uma
quadra. Vai morrer sem saber o sacrifcio que tem o repentista. Agora. Se o cara queimou mil neurnios
para fazer pelo menos uma quadrinha. Obedecendo rima e mtrica e orao. Esses trs itens cruciais do
mundo da versificao. Que universal. Ele vai saber o que o trabalho do repentista. E o repentista tambm.
Se raciocinar direitinho, nunca mais vai dizer na frente de um microfone que nasceu repentista. mentira.
P/1 _ Seu Sebastio. O senhor est preocupado com o legado. De fazer com que a coisa amplie. O senhor
criou o UCRAN. E at o senhor falou na entrevista. Ns ramos muito perseguidos at aparecer Erundina,
radio Atual. Uma srie de coisas. Inclusive a UCRAN. O Senhor podia contar um pouco sobre isso?
R _ porque a UCRAN chegou num perodo em So Paulo. Ela necessitava de uma associao. Para o
repentista ter uma referncia. Repentista ter uma organizao que respeitasse ele no campo da cantoria.
Porque at ali. O Venncio criou uma Associao chamada Arporfobe Que eu tambm nem sei definir como
era. O nome completo dele. O que Arporfobe? Era um negcio danado. Mas o Venncio usou aquilo ali
para dar o pontap inicial do movimento do repentismo em So Paulo. Alis, no nordeste todo em si. Mas
quando eu cheguei em 1976 j no existia mais. Venncio tinha relaxado e abandonado para l. E era uma
perseguio danada com os cantadores. E eu. Um dia, num festival que a gente fez na Estrada do Campo
Limpo. Dia primeiro de maio de 1988. Dia do trabalhador. A gente fez esse festival. E juntamente com
uma advogada amiga da gente. Nunca mais encontrei. Nem sei qual o destino dela. Doutora Maria da
Penha Guimares. Que era pernambucana. Gostava muito de cantoria. Junto com ela e mais outra amiga
minha. A Marta Campos. Que j foi secretria do bem estar da Erundina. Nunca mais encontrei Dona
Marta. Ns trs nos reunimos num espao. Numa mesa do Baio de dois. L onde eu cantava toda segunda. At
a quinta feira. A gente se reuniu em 1988 e a gente fez os estatutos da associao. Da UCRAN. Unio dos
cantadores e repentistas e apologias do nordeste. Que hoje o cantador vai trocar por cordelista. Agora
estou preparando a documentao direitinho j. Porque repentista e cantador a mesma coisa. Ento j pega o
cordelista coloca no lugar do cantador. Ento a associao que era o nosso objetivo. Era fazer com que o
cantador tivesse um ponto de referncia. Justamente uma entidade que o representasse. E o meu desejo
tambm era fazer a associao, que era para continuar o projeto do Venncio. Eu quis resgatar o Arporfobe
do Venncio. Pelejei. Pelejei. No tinha mais jeito. A tinha caducado. Mil coisas. Tinha que reformar.
Agora no tem mais jeito. Pronto. A gente abriu a mo. E o Venncio disse a mim um bocado de vezes: _
Voc abre uma associao aqui, no conte com cantadores. Conte mais com pblico da cantoria. Porque com o
cantador no vai funcionar. Tinha experincia prpria. J estava calejado de associao. A a gente fez com que
o povo da cantoria se responsabilizasse pela coisa.E naqueles anos quando a gente abriu em 1988. Foi
muito bom. Aquilo foi vital. Foi atravs dela que a gente conseguiu parcerias. Com a Secretaria de Cultura
e um bocado de coisas. SESC e mil coisas. Alis, quando a Rdio Atual foi lanada. Na pedra fundamental
estavam l. Eu, representando a UCRAN. A Erundina representando o nordeste em si. Seu Pedro
Sertanejo representando o forro. E teve um representando a capoeira. Esqueo o nome do cara. Todas as
linhas do nordeste. Ento a UCRAN teve uma marca l na pedra fundamental naquele Centro de Tradies
Nordestinas que tem aqui no bairro do Limo.
P/1 _ Que beleza.
R _ Teve l. A gente esteve l. Todo mundo estava l na fundao. Dentro de um brejo, meu querido. Ao lado
era uma favela. No meio era um brejo. Um brejo mesmo. Um lugar terrvel. Imundo. Lixo pra caramba.
Ftido pra danar. E o Z de Abreu todo entusiasmado. Primeiro que ele sabia que ali estava a carreira dele.
Foi deputado trs gestes. Trs mandatos. E ali a gente deu o pontap inicial. At quando eu chego hoje no
Centro de Tradies Nordestinas, l no CTN. Eu olho para um lado e olho para outro e digo: _ Rapaz.
Quanto sonho perdido morreu aqui. Porque o nosso sonho ali era coisa linda.
P/1 _ Seu Sebastio. Uma das tarefas. Misso da UCRAN foi colocar a mulher a nesse mundo da cantoria.
Como que foi isso?
R _ Bem. Isso a. Porque toda organizao depende do cabea.
E eu, desculpe a modstia, eu sempre fui apaixonado por mulher cantando. Sempre gostei da mulher
cantando. Desde menino j tive minha canta atrizes. Minhas musas inspiradoras que cantavam. Eu
gostava. Alis, quando entrei na viola mesmo. Encampando j foi inspirado por mulher. Chamada Maria da
Soledad. Maria da Soledad chegou l na minha regio. Hoje ela est bem madura. sindicalista. Para quem no
sabe. Ela substituiu o lugar da Margarida. Uma que mataram l na regio de Lagoa Grande. Uma
sindicalista. Ela presidia o sindicato e mataram essa Margarida. Os senhores de engenho mandaram
matar a Margarida. E a Soledad substitui essa Margarida. E eu vendo Soledad cantando. Cantava ruim
pra caramba. No rimava nada com nada e aquele sacrifcio dela fez com que eu entrasse na viola tambm.
No como profissional. Entrei. Entusiasmei-me com o sacrifcio dela. Ento inspirado nas mulheres. E tinha
Otlia Soares que antecipava a Soledad. Outra que falecida tambm. Foi uma artista extraordinria. Ento fui
sempre apaixonado pelo mundo da mulher cantando. De repente. E ao contrrio. Os homens so contrrios a
cantoria de viola com mulher cantando. Eu, por exemplo, no meu quadro tem sempre mulher cantando.
Eu comecei com Otlia Soares, depois a Soledad. Depois gravei com Mocinha de Passira. Produzi o
primeiro, atravs da UCRAN. E parceria com a UMES, o primeiro CD de dupla feminina. O primeira
dupla feminina foi produzido pela gente.
P/1 _ Quem que era?
R _ Minervinha Ferreira e Mocinha da Passira. As duas. Hoje j tem um bocado delas gravaram, mas o
primeiro foi com a gente. A depois a gente produziu Lucivan Matias e Lucinha Saraiva. Ento so duas
duplas femininas que a gente conseguiu colocar no cenrio da viola.
P/1 _ Lucivan j veio aqui.
R _ A Lucivan parceira nossa. Trabalha comigo tambm. Ela e a Mocinha tambm. Eu gravei com a
Mocinha tambm.
P/1 _ Ento so vrios CDs gravados l na UCRAN? A UCRAN participou.
R _ Participou. Vrios. Das mulheres. Tem quatro CDs de mulheres. E com parceira de homem com elas
tm vrios tambm.
P/1 _ Por exemplo. Chega um cantador e desce na rodoviria Tiet. Se ele procurar a UCRAN ele vai ter
um apoio?
R _ Agora no. Mas j teve. Nos anos carentes mesmo.
A gente precisou mesmo. Entendeu o negcio. A gente atuou de 1988 at 2000. Foram doze anos
trabalhando firme mesmo. Junto com todos os cantadores. Era apoio para o cantador mesmo. Era um
apoio geral. E, alm disso, a, a gente usava uma ttica. Um esquema de mapear as cantorias em So Paulo.
Para ver a evoluo. Do que estava acontecendo. Ento. Por exemplo. Quando chegou em 2001. Foi em
2001. Foi o ltimo levantamento que a gente fez. Todo final de semana a gente mapeava as cantorias em
So Paulo. Todo cantador que cantasse em So Paulo era obrigado a entrar em contato com a UCRAN e
dizer o local que ia cantar. E a gente fazia o levantamento de quantas duplas iam cantar. Ento, em 2001, a
gente conseguiu. o ltimo levantamento que a gente fez. E isso aconteceu vrias vezes. Todos os meses a
gente fazia esse levantamento. Todos os meses. Todos os meses. A gente entrava em contato com as
associaes no nordeste. De Fortaleza. De Joo Pessoa. Alis, do nordeste todo. Campina Grande. De
Caruaru. E a gente fazia o levantamento de quantas cantorias tinham nas cidades. Entendeu o negcio. A
quando a gente fez esse levantamento. Em 2001 a gente teve em So Paulo no ms de dezembro. A gente
teve trezentas e uma cantorias. Aqui em So Paulo. Nomes de dezembro de 2001. Resultado. Juntou com
as cantorias do nordeste todinho. As nove capitais do nordeste no deram cento e dez. Ento So Paulo
superou. Foi muito alm. Voc me entendeu? Dali para frente gente parou ali.
P/1 _ Entendi. J tinha um mercado para ele.
R _ J tinha o mercado pronto. Era para fazer o levantamento pra ver como era o desenvolvimento da
cantoria em So Paulo. E foi atravs da associao que a gente conseguiu fazer isso a. Atravs de parcerias.
Parcerias. E mais parcerias. Primeiro. A gente, juntamente com vrios movimentos que a gente fez. Foi
com a fundao da Rdio Atual. Que a gente tinha participao direto j com a Rdio Atual. Foi quebrar essa
besteira, desse preconceito doido de perseguio com a msica do nordeste aqui em So Paulo. A gente
conseguiu quebrar um bocado disso. E a UCRAN foi junto nesse movimento.
P/1 _ Seu Sebastio. Desses dez anos. Da para c. O senhor fez muita coisa. E eu queria que o senhor
contasse um pouquinho da sua participao na literatura. Eu vi o seu livro. A sua adaptao para crianas do
Romeu e Julieta.
R _ Romeu e Julieta. Aquilo ali era uma dvida que eu tinha para com os meus professores velhos. Eu, por
exemplo. Vou te explicar o seguinte. As minhas primeiras letras. Vamos colocar logo direto. A minha
carta de ABC foi o cordel. Cordel. Que eu aprendi essa palavra cordel aqui em So Paulo. L no nordeste a
gente chamava folheto romance. Ento o seguinte. No meu tempo de menino. Aquele povo do interior.
Era muito difcil escola. E os pais de famlia para distrair a molecada iam para a cidade e comprava os
folhetos e levava para os filhos. A os meninos comeava a brigar ali aprendendo as primeiras letras.
Aqueles que sabiam alguma coisinha passavam para os outros. _ Esse aqui o B. Com A d BA. E La vai.
E no sei o que. Comeava naquilo ali. Os moleques iam comeando com aquilo ali. E daqui a pouco j
comeava a ler. Ento aqui ali foi muito forte para mim. Pelo fator de me tornar cantador. O cordel foi
quem me teleguiou. E ento eu devia tudo a esses mestres. Se eu sou cantador. Mesmo tendo a parte
fonogrfica. Tendo feito um bocado de participaes em vrios CDs. Vrios LPs. Coletneas. De muita coisa
por a gravada. Por parte de fonografia. Mas faltava a escrita. Ento o seguinte. Uma dvida que eu tinha
com meus mestres. E eu peguei a encampar. O Marco Aurlio me deu o toque do Romeu e Julieta. Eu
digo: _ Eu pego.
P/1 _ Marco Aurlio o editor da Nova Alexandria?
R _ . S que nesse tempo quando ele falou, ele no tinha entrado na Alexandria ainda. Quer dizer. J tinha
entrado. Porque justamente, a Alexandria foi quando o Marco entrou. Logo de cara. Que o Marco entrou
nesse projeto. Eu estava l em casa e o amigo nosso. Como que era o nome dele? Agora danou-se, rapaz.
Cara nascido l no Par. Como que ? Poeta nosso. Trabalhou na Secretaria de Cultura muitos anos. Celso
de Alencar, caramba. Celso ligou para mim e disse: _ Sebastio. Tem uma editora a que est querendo
lanar todos os clssicos da literatura universal. E lendas tambm. Eu digo: _ Qual a editora? _ A Nova
Alexandria. _ Voc tem poetas para colocar esse negcio? V quem a gente pode pegar o nome. Que eles
esto procurando. A logo de cara eu disse: _ Ns temos o Marco Aurlio. Que est trabalhando na Editora
Luzeiro. um crnio. Uma potncia nisso a. A l vai. Dei um bocado nome. Varnesi. Moreira. Um monte
deles. Costa Sena. Valdec de Garanhuns. A ele anotou a lista todinha. A quando foi com poucos dias,
Marco disse: _ Rapaz. A Nova Alexandria me convidou. Eu digo: _ Est bom.
P/1 _ E como foi adaptar. O senhor pegou o texto original do Shakespeare.
R _ E at foi gostoso, porque nunca tinha me aprofundado naquele texto. A gente usava na cantoria. Nada
com conhecimento. Usava mais de ouvido. Que algum tinha falado. E no sei o que. Jogava alguma coisa.
Nada de conhecimento. E o Marco estava na Nova Alexandria. E ele est no projeto. Ento est timo. A ele
disse assim: _ Voc vai ter que entrar tambm. Rapaz. A foi que eu me toquei. Que eu tinha uma dvida
com meus mestres. Eu vou encampar. _ Escolhe uma ai, Marco. _ O que acha de Romeu e Julieta? _ Est
bom. A ele at me emprestou o livro. E li texto todo direitinho. A fiz uma ilustraozinha l em cima. E est l.
P/1_ No foi bem isso no. Tem muito trabalho. Eu queria que o senhor lesse um pedacinho para a gente.
R _ Era uma divida que eu tinha com meus mestres. rapaz. Romeu e Julieta.
P/1 _ Podia ler o inicio para a gente.
R _ Ficou bonito. Ilustrao do Murilo. Murilo a copia do Bin Laden. (risos)
P/1 _ Parece mesmo.
R _ Murilo uma figura.
P/1 _ Seu Sebastio. O senhor podia ler uma duas estrofes a para a gente?
R _ Vamos. Para voc hoje eu vou ler. S que tem o seguinte. Isso aqui, no meu tempo de moleque a gente
no lia. A gente cantava.
P/1 _ Ento. O senhor que sabe. Como for melhor.
R _ Aqui tem a apresentao do Marco. Que ele j pegou direitinho tudo. Isso aqui para a crianada uma
maravilha. Quem quiser informao. Est tudo aqui nesse livro. A Alexandria est de parabns. E como todo
cordealista. Todo cordealista tem que buscar a fonte. A eu digo assim: _ Vasculhando os alfarrbios
desbotados na gaveta. Deparei-me com a obra maior de todo o planeta. a shakespeariana de Romeu e
Julieta. Aconteceu na Itlia, na cidade de Verona. Esse sinistro episdio, que no conto menciona. Que
sendo contra o amor, o dio no funciona. Vamos repetir essa estrofe. Aconteceu na Itlia, na cidade de
Verona. Esse sinistro episdio, onde a obra menciona. Que sendo contra o amor, o dio no funciona.
P/1 _ Que beleza.
R _ . E foca duas famlias ricas da sociedade. Montechio e Capuletos, que agitavam a cidade. Com uma
velha pendenga de mortal rivalidade. Essa rixa se estendia aos mais remotos parentes. Envolvendo
servidores, at os seus dependentes. Nos encontros casuais, as brigas eram freqentes. Serviais das duas
casas, s viviam de bravatas. Derramamento de sangue. Correrias insensatas. Quebravam a harmonia
daquelas ruas pacatas.
(Troca de fita)
R _ No Castelo Capuleto. De laureado esplendor. Tinha a jovem Julieta um verdadeiro primor. A pureza
de um anjo. A candidez de uma flor. A personificao de Venus, sis e Latona. Se Leonardo da Vinci
exagerou na Madona. Deus acertou na beleza da jovem flor de Verona. Nem as deusas do Olmpio.
Ninfas do maranelo. Musas do monte parnaso e as virgens do Carmelo foram dignas da beleza da flor
daquele castelo.
P/1 _ Foi fundo.
R _ Era linda. A Julieta era linda. Parecia um querubim enviado l de cima. Para fazer do amor a sua
matria prima. Merecendo das pessoas a mais devotada estima. Ai diz no castelo dos Montechio. Vivia o
moo Romeu. Que no regao dos pais. Nasceu, viveu sadio e cresceu. O jovem mais elegante que Verona
conheceu E da por diante. Quem quiser mais leia o livro. Pega na Alexandria.
P/1 _ Seu Sebastio. Esse movimento novo de cordel na escola. De cordel como profisso para crianas.
Como o senhor est vendo isso?
R _ Eu acho que p um tempo novo. um tempo novo. Se ontem, o cordel me foi to importante na minha
caminhada. Eu acredito que hoje isso, para desenvolvimento da leitura. Sabe que um treinamento forte, n
rapaz. Que obedecendo as rimas e as mtricas. Quer dizer. De acordo com a mtrica dos versos. So todos
cantantes. A a pessoa. muito mais prtico para desenvolver a leitura. Para a crianada isso timo. Invs de
estar envolvida com tanta coisa. Tem tanta coisa que a criana se envolve por a afora. Coisas que at no
leva a canto nenhum. Ento acho que a vez agora pegar esse cordel e ver esse caminho. Eu acho que a
Alexandria est de parabns com isso a. O que est precisando com mais seriedade de colocar isso na escola.
Passar a ser quase. Vamos colocar.
P/1 _ Adotado.
R _ Adotado. Logo de cara. Vamos colocar logo de cara. Eu sou meio bravo. Como obrigao.
P/1 _ Seu Sebastio. Eu queria dar um fecho aqui. Eu no sei se o senhor lembra a outra vez. O senhor
improvisou um pouquinho na viola. Sobre o que o senhor contou na entrevista. A gente j tem um
material riqussimo l, mas se o senhor pudesse ter uns dez minutinhos.
R _ Outra coisa tambm que curiosa o acrstico.
P/1 _ O acrstico. E Bastio deu certo. Que tem seis letras.
R _ No. So sete. So doze estrofes de sete versos. Bastio Marinho. quando vem o desfecho final e diz
assim: _ Barrados pelo destino. Aqueles jovens leais. Sacrificaro as vidas. Tomando rumos fatais.
Impotentes e sem comando. Ambos morrero pagando. Os velhos erros dos pais. Montechio para Julieta.
A nora que Deus lhe deu. Recomendou uma esttua. Imensa no tmulo seu. Noutra Capuleto tenro.
Homenageou seu genro. O venervel Romeu. Bastio Marinho.
P/1 _ Isso uma tradio?
R _ . O acrstico.
P/1 _ De se fazer o acrstico no final? O senhor comeou com sextilha e a fez a setilha no final.
R _ . obrigatrio. Segundo meus mestres. Assim como eles falaram: O poeta que se preza tem que deixar o
acrstico no final.
P/1 _ Seu Sebastio. Hoje em dia. Como est sua rotina de vida de trabalho?
R _ Rapaz. Aos sessenta e trs anos, muito feliz. Estou feliz. Porque de qualquer maneira, o movimento
hoje est bem corrido. Que eu at pensei um dia. Quando eu completasse os sessenta anos de brecar a viola.
Brecar de cantar. Mas parece que agora depois dos sessenta foi que eu peguei pique. Eu agora no sei
quando vou parar no.
P/1 _ Tem muita lenha para queimar ainda.
R _ Enquanto a gente viver com o trabalho. Voc est firme na caminhada. Eu acho que voc tem que
continuar. At um advogado amigo meu. _ Porque voc no se aposenta? Eu tenho medo de me aposentar.
No estou precisando me aposentar ainda no. (risos).
P/1 _ Que bom. O senhor est envolvido agora em que projetos?
R _ Os projetos que a gente est fazendo sempre junto. Juntamente sempre com a UCRAN. A gente est
querendo agora encampar. Eu estou querendo voltar para a rua. Teve uns anos a em So Paulo. Que todo
final de semana, a gente tinha duas ou trs duplas de repentistas atuando em praas por a afora. E eu estou
querendo brigar junto com a Secretaria de Cultura para ver se volta a Arte na Rua.
P/1 _ Muito bom.
R _ Precisa. Precisa porque a gente usou muitos anos isso a. E foi importantssimo para o
desenvolvimento da cantoria em So Paulo. A gente fazia todo final de semana. Fazia Largo do Arouche.
Praa Marechal Floriano. L em Santo Amaro. Fazia So Miguel. Fazia s vezes Praa da Repblica. E da por
diante. Todo final de semana tinha quatro ou cinco duplas. Atuando por a afora. E isso precisa muito aqui
em So Paulo.
P/1 _ Seu Sebastio. Para terminar essa partea. Sem aviola.
R _ E alm do movimento nas praas. Eu estou. A gente est com um projeto de logo. De julho para frente,
talvez de montar um programa de rdio. Precisa.
P/1 _ Ah. ? Opa. Avisa para a gente.
R _ Precisa. Estamos brigando a. Correndo atrs de patrocinadores. Esperei. Levei vrios. Tentei assanhar.
Um cantinho e outro. As organizaes de rdio para ver se cediam horrio por conta da rea cultural. Mas no
tem jeito. Eles querem dinheiro mesmo. Ento tem que comprar. Fora do ar no pode ficar.
P/1 _ Pois . Seu Sebastio. Como o senhor avalia ento sua trajetria? Esses sessenta e trs anos de vida.
R _ Meu compadre. o seguinte. Relativo cantoria. Porque minha vida todinha foi cantador. Eu um dia fui
lavrador. Caador. Fui tudo na vida. Estudante preguioso pra danar. E o resto me campeei tudo para a
viola. A fiz da viola meu mundo e continuo at hoje. E nessa trajetria conquistamos muitos espaos. Que eu
jamais sem a viola teria alcanado. Como por exemplo. O Brasil. Consegui conhec-lo de ponta a ponta.
Aventuras loucas que jamais sem ser cantador faria. Por exemplo. Nos quinhentos anos de Brasil. Junto
com a Globo. Eu consegui chegar numa aldeia l na regio do Xingu. Chegar numa aldeia onde o ndio no
tinha contato com o homem branco. A atravs de um guia da tribo. A gente o usou como guia. A gente
chegou at l para gravar a matria. No conseguiu gravar. Porque o paj s aceitava se fosse entrar l dentro.
Para filmar a matria. Quinhentos anos de Brasil. O que interessava era ndio que no tivesse contato com
ningum. Com o branco. A. Mas o paj abriu uma exceo. Mas s entrava l dentro se fosse todo mundo
pelado. Disse que a roupa era maldio. Disse que se entrasse com roupa ia dar epidemia. E morria todo
mundo. E a matria no saiu porque tinha um bocado de moas que foram no se atreveram. Ento so essas
aventuras loucas. Que jamais noutro espao eu teria chegado l. Ver o ndio natural l. Estivemos bem
pertinho mesmo. Eu entrei l pelado. O diretor, que era o filho daquele do Carlos Manga. O Manguinha. O
filho. Levou a gente at l dentro e eu vi como era a aldeia. Tinha a maior curiosidade. Nunca tinha visto.
Foi atravs da viola. Sem ela no tinha chegado l. Andar de Bfalo. O que o Bfalo. aquele avio. Hidro avio
que eles usam no Amazonas. Ficar no meio do rio com aquele aviaozo. Um mundo l do outro lado.
Ningum acreditava. Aquilo coisa de doido. Cai quatro vezes dentro do Rio Miranda, em Mato Grosso do
Sul. Tudo aventuras de cantador. Naqueles avies de teco-teco. Ali o seguinte. O avio entra em pane. Por
qualquer coisinha o motor d defeito. Por isso que eles andam seguindo os rios. Voc tem que ter um
treinamento j de cair no rio.
P/1 _ ?
R _ Tem. Eu trabalhei seis meses de campanha. Em 1986. Naquela poca que prenderam a carne do boi.
Ningum comia carne de jeito nenhum. L. Eles matavam vinte, trinta bois em cada comcio. Uma cultura
que eles tm de assar A banda do boi inteira. Assim. Faz um braseiro danado. Ento essas aventuras
todinhas. Passei por isso tudo como cantador. Chapada dos Guimares. Guair. Serra Gacha. Todo aquele
mundo todinho da Serra Gacha. Todinha. So Raimundo Nonato. No Piau. Enfim. O Amazonas todinho.
Cruzar o rio todinho. Fazendo gravao para a sandlia Azalia. Eu sempre participei. Brasil de ponta a
ponta. S fiz isso porque era cantador. Sem ser cantador, jamais eu faria. Entendeu? Ento so essas coisas
que levam a gente se sentir realizado. A voc pergunta: _ E financeiramente? Financeiramente que v para
os quintos. O importante nossa sobrevivncia. Est timo.
P/1 _ Seu Sebastio. Queria agradecer a sua volta dez anos depois. Com mais histrias. Com o mesmo bom
humor.
R _ Eu que agradeo. Isso tem que fazer. Essas histrias tm que fazer pelo menos de dois em dois anos.
P/1 _ Ento em 2021 vamos retornar.
R _ Retocando. Retocando. Retocando.
P/1 _ Eu queria s dar um parada. E se o senhor topar. O senhor conta a sua trajetria de So Paulo para c
cantando.
Toca msicas.
R _ Sabia que os primeiros cordis que eu lia, cantava todos.
P/1 _ Nem memorizava?
R _ Cheguei cantar dez a doze livros de cordis. Dez a doze folhetos eu conseguia. Primeiro era esse. Era
o meu principal cordel. Como adorava: Eu vou contar uma histria de uma moa e de um rapaz. De um
caso recente que deu se em Minas Gerais. O leitor preste ateno. O amor falso o que que faz. Essa de um
autor da Paraba, j falecido. Antonio Eugenio. Ele fez essa histria. Ele fez essa e depois ele fez tipo de
recreao na vida de Maria Madalena. Fez do Cavaleiro Roldo. Depois criou mais outras trs ou quatro
histrias. Sandoval e Anita. Essa se chama Valdemar e Irene. Vamos l. S no sei se a afinao era essa.
Quebra no. O mundo do cantador. Muita linhagem ela tem. Oba ba ba ba. Como o nome, menina?
Gabriela. Vou contar para Gabriela, que a minha origem vem. Do mundo do repentista, os segredos que
ele tem. Cantando as suas magoas e s vezes queixas de algum. Comecei assim tambm. Com meus dez
anos de idade. Hoje com sessenta e trs. Do ontem sinto saudade. Mas s tem no presente e vai me deixar a
vontade. Eu sinto a vitalidade na minha mente florir. Tenho ento que cantar. Que prosar e que sorrir. Que
todos ns temos o norte. Lugar certo para onde ir. Oi gente. Eu cheguei aqui no ano setenta e seis. Foi na
primeira semana de abril. Aquele ms. Que eu passei a morar na So Paulo de vocs. Chegando a primeira
vez. Senti uma frustrao brava. So Paulo no era aquela, que antes tanto eu pensava. Que eu no achei nem
um tero do que a turma me falava. Foi uma frustrao braba quando deixei os meus pais. E cheguei at So
Paulo, no velho bairro do Brs. Contudo ela me aplicou coisas que no esqueo jamais. Mas So Paulo no
mais aquela terrinha boa. Aquele So Paulo antiga toda cheia de garoa. Eu encontrei em setenta e seis
quando deixei a Leoa. A Leoa, gente, a Paraba. Para quem no sabe. A Paraba. D o nome de leoa porque
ela caminhou sempre junto de Pernambuco. E Pernambuco conhecido no nordeste como Leo do norte.
P/1 _ Podia cantar um pouquinho da UCRAN.
R _ Para o mundo da cultura a nossa UCRAN investe. Pois o seu objetivo trazer nosso nordeste. Com a
linha cultural para esse meio sudeste. Trazendo a cultura agreste. De serto e cariri. Um pedacinho das
coisas do cho aonde eu nasci. Que aos poucos a gente est divulgando por aqui. Em So Paulo eu recebi o
claro de outra aurora. A virtude que em So Paulo, onde a mente se aflora. Que d cobertura aos filhos e
abraa aos que vem de fora. Em So Paulo toda hora se v um taco de histria. Cada rua, cada praa representa
uma memria. De uma figura querida que foi tal palco da gloria. A gente encontra histrias perto da Praa da
S. O Largo de So Francisco quem ali coloca o p. Lembra da universidade, a grandeza que ela . No Brs a
Praa da S lembrando a poca passada. Faz lembrar de Castro Alves na caminhada malvada. Aonde
perdera o p em uma triste caada. Santo Amaro na jogada tem a esttua de Borba Gato. Carrega uma
espingarda. Tem chapu e tem sapato. E o dedo ainda aponta para onde outrora era a mata. Mas que o
progresso ingrato apresentou tudo de si. Se Anchieta voltasse para essas bandas daqui. Talvez chorasse
com nojo do seu Tamanduate.
P/1 _ Que beleza.
R _ Que coisa, n?
P/1 _ Est muito bom. Podia falar um pouquinho das Diretas. Do comeo das Diretas. O senhor falou que
teve uma passagem bacana no comeo das Diretas. L no Anhangaba.
R _ Naqueles anos oitenta, quando eu estive por c. L no Anhangaba e bom que lembrando v. Quando eu
participei das grandes Diretas J. Comcio Diretas J naquele divino meio. Poltico pra toda banda sem
mostrar aspecto feio. S sei que o Anhangaba de sonhos estava cheio. gente naquele meio eu gostei para
chuchu. O grito de Diretas j em pleno Anhangaba.Senti o Brasil em peso me olhando a olho nu.
P/1_ Muito bom.
R _ uma coisa que a gente jamais esquece. Naquele tempo era uma coisa sria. Por exemplo. Nos anos
setenta. Eu cantava numa casa chamada Ful da Laranjeira. Do Saulo Larajeira;
P/1 _ Do mineiro l. Saulo Laranjeira.
R _ Na Alameda Santos. E a nossa cantiga l. Naquela poca a gente participava de movimentos. Setenta e
seis. Setenta e sete. Largando a lenha. Era nossa maneira. Era romntico fazer aquilo. Eu usava uma barba
grande. Era romntico aquilo. Era muito gostoso. E numa dessas manifestaes. Ali dava muito estudantes.
Repentista era o nico que se sobressaa naquele campo. E mesmo j tendo a abertura com o Figueiredo.
Aquela coisa ali. No tinha jeito, vinha aquela ressaca do tempo dos militares. Eu estava cantando uma
noite. Eu e Quindingues. Eu no primeiro piso. Elomar no segundo. A a gente deixa o primeiro piso.
Elomar desce para o primeiro piso e a gente sobe para o segundo. Eu estou l cantando. Largando a lenha.
Eu e o Joo. E tome pau. Tome pau. Papapapa. A figura que a gente mais gostava de esculhambar era o
Delfim Moreira. A gente adorava. Ns arrebentvamos com o Delfim . E nessa brincadeira. Nesse perodo.
O ministro era Murilo Macedo.
P/1 _ Murilo Macedo. Ministro do trabalho.
R _ . E tinha aquelas guerras danadas l no ABC. Tinha havido um negcio das greves. Prendeu um bocado
de metalrgico. E a gente est largando o cassete no ministro. Papapa. E s via mulher. A mulher assim.
Apontando assim como dedo assim. A mulher apontando com o dedo assim. Mas o danado do salo era
escuro. Eu olhava e no via nada. E tome letra. Tome letra. Tome letra. A quando terminei, eu deso. A
mulher corre e encontra: _ Rapaz. Voc largando e o homem est l no canto da parede. Ali, na outra mesa
do canto.
P/1 _ O ministro?
R _ Sim. Eu subi para saber se era verdade. No acreditei no. A olhei de soslaio. No que o cara estava
bem no cantinho da parede. No disse nada. O susto danado. O susto doido. Coisas que acontecem com a
gente. A Saulo disse: _ O medo danado.
P/1 _ Se quiser encerrar falando da entrevista e dos vinte anos do Museu da Pessoa.
R _ Eu agradeo ao Museu da Pessoa. Por uma entrevista boa que eu fiz at agora. Nesse cenrio de papo e
de cantoria. Coqueiro da Bahia. Quero ver meu bem agora. Quer ir mais eu vamos. Quer ir mais eu
vamos embora. Quer ir mais eu vamos. Quer ir mais eu vamos embora. A Jos Santos e a simptica
Gabriela. Nessa festa pura e bela. Tenho que agradecer agora. Que alegraram com boa companhia.
Coqueiro da Bahia. Quero ver meu bem agora. Quer ir mais eu vamos. Quer ir mais eu vamos embora.
Quer ir mais eu vamos. Quer ir mais vamos embora. Pois o Museu no seu quadro to comum. A histria de
cada um. Representa toda hora. Isso para a gente mais do que alegria. Coqueiro da Bahia. Quero ver meu
bem agora. Quer ir mais eu vamos. Quer ir mais eu vamos embora. Quer ir mais eu vamos. Quer ir mais
eu vamos embora. em Pinheiros.Vila madalena. Onde se entra em cena diversos versos feitos na hora.
Onde a viola no cenrio denuncia. Coqueiro da Bahia. Quero ver meu bem agora. Quer ir mais eu vamos.
Quer ir mais eu vamos embora. Quer ir mais eu vamos.Quer ir mais vamos embora. Adeus e at outro dia.
Palmas.
P/1 - Que beleza.
Rua Natingui, 1100 - São Paulo - CEP 05443-002
tel +55 11 2144.7150 | fax +55 11 2144.7151 | [email protected]
Image not found
http://dualtec.museudapessoa.net/furniture/v2013/common/media/layout/banner_transcrit.png

Documentos relacionados