Roqueiro é Gente fina - Projetos de pesquisa em Jornalismo

Transcrição

Roqueiro é Gente fina - Projetos de pesquisa em Jornalismo
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1. INTRODUÇÃO
“Todo Roqueiro é Gente fina” aborda a trajetória da banda paranaense de rock,
A Chave. Para resgatar a memória do grupo foram feitas entrevistas com integrantes,
pessoas que presenciaram a história e pesquisas em jornais. A proposta principal deste
trabalho é resgatar, através de um videodocumentário, a história da primeira banda de
rock paranaense a compor músicas próprias. A Chave foi um grupo formado
originalmente em Palmeira, interior do estado do Paraná, que em meados dos anos 60
migrou para a capital. No início, projetava-se tocando composições de outras bandas:
The Beatles, The Rolling Stones, The Animals, e The Kinks em festas. Após passar por
diversas formações de integrantes o grupo passa a criar material próprio a partir de
1969, com influências concretistas 1 vindas do poeta Paulo Leminski, que também
participou do processo. Em 1975, A Chave foi a banda de abertura de Bill Haley and His
Comets,2 autor de Rock Around The Clock, um marco para o gênero rock and roll,
criado em meados dos anos 50. Infelizmente após dez anos de “estrada” a banda tem
seu fim. Com apenas um single gravado, ainda ouvimos alguém falar da Chave,
conjunto que durou apenas 10 anos.
Será importante elaborar um projeto como este, pois o material da banda foi
pouco explorado a nível nacional e pouco tratado em mídias locais. Como é o caso dos
jornais Gazeta do Povo e Estado do Paraná, principalmente em 1975, ano em que a
banda tocou ao lado de um dos pioneiros do rock and roll: Bill Haley. Naquele ano, os
veículos apresentaram apenas pequenas notas ao grupo. A fim de resgatar a história da
banda e a sua importância no cenário nacional, pretende-se, através de um
videodocumentário de 30 minutos, uma concepção mais concreta da banda no cenário
rock and roll da época ao lado de bandas como Made In Brazil, Tutti Frutti, Joelho de
Porco, Mutantes, Bixo da Seda e Secos e Molhados.
O problema de pesquisa deste trabalho é o porquê do resgate de uma banda
que foi um grande expoente na música paranaense fora esquecida por 35 anos. O
objetivo principal é produzir um videodocumentário a fim de resgatar a banda que
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Deriva de poesia concreta, que melhor se define como poesia experimental, vanguardista.
Banda americana de Rock and Roll fundada em 1952, em Chester – Pennsylvania.
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obteve representatividade nacional na época em que esteve em atividade: 1969 a 1979.
Os objetivos secundários desta pesquisa são levar até gerações já existentes e as que
virão, o conhecimento sobre essa banda que teve grande expressão no cenário
brasileiro e paranaense no tempo em que perdurou e resgatar a história da banda A
Chave para contribuir com a preservação de sua memória. Nossa hipótese baseia-se
no fato do ano de 1975, quando a banda abriu o único show de Bill Halley and His
Comets aqui em Curitiba. Este, de fato, seria o ano mais importante para a banda,
tendo em vista a repercussão de um artista, que fora considerado os inventores do
termo rock?
O referencial teórico deste trabalho contempla entre os principais autores:
FRIEDLANDER (2006), NICHOLS (2010), PIZA (2004) e VILAS BOAS (2002). No
segundo capítulo deste trabalho apresentamos a delimitação do tema, onde serão
abordados como a história do rock a nível mundial, história do rock na cidade de
Curitiba, Paraná e também a história da banda A Chave.
A seguir, na terceira parte, mostramos quais são os objetivos de pesquisa deste
trabalho, que se dividem entre um objetivo específico e objetivos específicos. O primeiro
tem como objetivo criar um videodocumentário com a intenção de resgatar a história da
banda A Chave. Já os demais objetivos resumem-se a tornar o resgate mais fácil para
pessoas que se interessam por música e arte e cinema. Na quarta parte apresentamos
à justificativa e nossas hipóteses de pesquisa. Como quinto capítulo, são apresentados
os autores que colaboraram para o processo do trabalho: Sergio Villas Boas, Cremilda
de Araújo, Daniel Piza, Bill Nichols, Robert Young, J.S Faro dentre outros.
No capítulo seguinte, o sétimo, será apresentado como o produto, no caso o
videodocumentário é trabalhado. Técnicas e processos de gravação, edição e
produção. O objetivo é mostrar como o produto foi desenvolvido e quais as técnicas
foram utilizadas para obter os resultados desejados neste trabalho.
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2. DELIMITAÇÃO DO TEMA E PROBLEMATIZAÇÃO
O rock foi uma vertente musical que abriu portas para muitas outras
possibilidades de fazer música. Variações surgiram e continuam a surgir com o
passar do tempo. Notamos que o modelo fiel de um contrabaixo, uma guitarra
elétrica e de uma bateria quebrou barreiras, musicalmente falando, até chegar a nós
aqui no Brasil.
Para A Chave, o movimento Rock foi importante, pois é nele que o grupo
resolve fazer suas criações baseadas em concretismo, poesia concreta e outras
vertentes do universo rock. A banda durou 10 anos e obteve destaque nacional
merecido no tempo em que perdurou, mas depois a história nunca mais fora
retomada, resgatada para gerações posteriores.
Nossa questão-chave, o problema de pesquisa, foi pensar como produzir um
videodocumentário que resgate a trajetória e a história da banda de rock A chave?
2.1 HISTÓRIA DO ROCK NOS ANOS 50, 60 E 70
Primeiramente é importante definir o termo “Rock”. Alguns autores utilizam
essa definição para abordar a música que viria de gêneros subsequentes ao Rock
and Roll. Assim como o autor Paul Friedlander no seu livro “Rock and Roll – uma
história Social”, o videodocumentário aborda o gênero Pop/Rock, que “reflete uma
natureza dupla: raízes musicais e líricas derivadas da era clássica do rock e seu
status como uma mercadoria produzida sob pressão para se ajustar à indústria do
disco (Pop).” (FRIEDLANDER, 2006)
O pontapé inicial do gênero tratado aqui em “Todo Roqueiro é Gente Fina”,
segundo Friedlander, acontece nos Estados Unidos da América, que se recuperava
do período pós-guerra. Como se não houvesse problemas, a geração do consumo
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estava apenas começando e tudo era novidade. Aquela história de canções
românticas, como orquestrações de Glenn Miller3, já não eram tão bem aceita por
jovens, que buscavam outra vertente musical mais prazerosa e que se conectava ao
contexto social da época. Dessa busca gerada através dessa insatisfação, nasceu o
gênero chamado de Rock and Roll. Por muito tempo fora chamado de ato de
rebeldia, pois a questão não era só a música, mas todo um universo envolvendo
vestuário, automóveis, motocicletas, topetes e a guitarra elétrica.
Podemos dividir o movimento em duas gerações: a primeira, que contava
com os músicos Fats Domino, Chuck Berry, Little Richard e Bill Haley. “Eles
conquistaram sucesso nas paradas populares entre 1953 e 1955, iniciando
a escalada como os pioneiros do rock. Sua música, uma síntese dos estilos
branco e negro e dominada por um forte acompanhamento de bateria,
exibia letras que celebravam as experiências de vida dos adolescentes do
pós-guerra, como amor, dança, alusões ao sexo e ao próprio rock and roll.”
(FRIEDLANDER, 2006, p.20).
Segundo FRIEDLANDER (2006), essa segunda geração do gênero garantiu
a sucessão do trono da música popular com um estilo que, embora um pouco menos
estridente que os roqueiros do começo e geralmente tratando mais do amor entre
jovens do que suas angústias. Ele fora adotado pela juventude da época. Após essa
ascensão do estilo, ele foi perdendo espaço com o passar do tempo para uma outra
vertente. A “surf sound” ou mais conhecida como Surf music, que contava com
vocais femininos, jovens de cabelos cortados e um revival do folk tornou-se popular.
A invasão britânica dos anos 60 estava prestes a entrar em cena:
“Em 1964 os Estados Unidos despertaram para o som dos Beatles, com sua
variedade de rock clássico combinado com toques de pop e rockabilly. Esta
invasão inglesa, a qual incluía a música dos Rolling Stones, Dave Clark Five
e The Who, entre outros, reacendeu o impulso do rock and roll na América.
Seu sucesso faria com que jovens cantores de folk americano, como Bob
Dylan e outros, “se eletrificassem”, somando o poder do rock and roll às
letras “sérias” e aos acordes de violões acústicos. Alguns se mudariam para
Los Angeles e para o cenário do folk-rock dos Byrds, Buffalo Sprinfield e
muitos outros acabariam em San Francisco como parte de uma nascente
comunidade de contracultura musical.” (BENTO ARAÚJO, 2010, p.31)
Vários festivais de arte envolvendo a música foram produzidos. Monterey
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Músico, compositor e lider de grandes orquestras – as big bands.
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Pop Festival aconteceu em 1967 e contou com a participação de bandas da invasão
inglesa, como o autor colocou e da nova onda americana, o revival folk de bandas
de San Francisco. Músicos como James Marshall Hendrix, ou Jimi Hendrix, foram
revelados à América nesse festival, que fora produzido por músicos da banda
“ianque” The Mamas and The Papas. O Woodstock é também outro festival
conhecido pelo slogan criado em 1969 (ano do festival): Três dias de paz amor e
música. É na década de 1960, que a identidade do “Hippie” é criada. Segundo a
revista Poeira Zine, o domínio vem da palavra “Hipster”, que significava na época
pessoas que se envolviam com a cultura negra. O termo foi generalizado com o
passar do tempo. Para os contemporâneos, a morte desse movimento se deu
quando no festival gratuito de Altamont um estudante morreu devido à violência
desenfreada no próprio festival, que tinha como atração principal os Rolling Stones.
Esta década é lacrada com a morte Jimi Hendrix, Janis Joplin e Jim Morrison. A
década a seguir trazia na bagagem um rock mais pesado e com guitarras
distorcidas.
Por volta dos anos 70, o público de rock tinha chegado a uma certa idade, e
uma nova geração de ouvintes buscou sons diferentes daqueles procurados
pelos seus contemporâneos mais velhos, que ainda se apegavam aos seus
favoritos dos anos 60. Novos artistas apareceram como os
cantores/compositores Elton John, Paul Simon e Neil Young, Eagles,
Chicago, os ingleses do Fleetwood Mac e Doobie Brothers. À medida que a
década passava e a tecnologia de gravação se tornava altamente
sofisticada, a música popular se dirigia a um perfeccionismo estético voltado
para o estúdio (Representado pelo Boston e pelo Steely Dan). Se você não
gravasse num estúdio de última geração e não trabalhasse nota por nota
até ficaram perfeitas na Gravação, você não estava “in” - ou seria colocado
em uma programação de rádio cada vez mais restrita. (FRIEDLANDER,
2006. P.110).
Surgia aí o movimento progressivo, onde a virtuosidade era pré-requisito
para uma banda de “rock-progressivo”4. Yes, King Crimson e Gentle Giant eram
bandas percussoras desde movimento. Não demorou muito para que a rebeldia
voltasse à tona assim como em meados dos anos 50. Um movimento criado por
jovens que detestavam a ideia de solos de guitarra com mais de 30 minutos, ou até
uma única música ultrapassando um dos lados dos Long Plays. Com o lema “Do it
Yourself” a cena Punk apareceu.
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Gênero musical criado na Alemanhã
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Comemoração esta pop dominada pela tecnologia, a música punk rompeu
os portões da garagem, da escola, da arte e do pub e se lançou no cenário
britânico em meados dos anos 70. Vestindo camisetas rasgadas e
detonando uma música frenética e crua, os punks tentaram ofender a todos.
Seu sucesso foi além de seus sonhos mais loucos e, no processo, ajudaram
a revitalizar o combalido mercado do rock. Os pioneiros do Sex Pistols se
autodestruíram, mas outros, como o Clash, encontraram uma maneira de
sobreviver e crescer na cena comercial.” (FRIEDLANDER, 2006, p.26).
Essa maneira de crescer na cena comercial do Clash ajudou muitas bandas
de punk rock de décadas sucessoras, inclusive no Brasil.
2.1.1 HISTÓRIA DO ROCK EM CURITIBA
Segundo DAPIEVE (1996) em seu livro BRock: o Rock Brasileiro dos Anos
80, a primeira gravação da vertente na época no Brasil é datada de outubro de 1955.
O pontapé inicial veio de uma cantora de samba-canção (gênero que surgiu em
1920, durante o período de modernização do samba no Rio de Janeiro), Nora Ney,
quando reproduziu uma versão de “Rock Around The Clock”, de Bill Haley and His
Comets. A versão de Nora era para o filme “Sementes da Violência”. Logo após
esse acontecimento, outras versões de músicas estrangeiras foram surgindo e o
Rock foi sendo traduzido para o português. Mas foi no ano de 1957 foi gravado o
primeiro rock legítimo brasileiro: “Rock’n’roll em Copacabana, interpretado por
Cauby Peixoto.
Na capital paranaense, o Rock chegou disfarçado com o cantor norteamericano Neil Sedaka. Segundo CANDAL (2014) em 1959, Sedaka trouxe a sua
country-music para o Teatro Guaíra e apesar de não difundir o gênero Rock,
carregava consigo algo que seria novo para Curitiba. Programas de rádio também
contribuíram para o crescimento do estilo. O radialista Mario Celso apresentava o
programa “Cabeludos pela Marumbi” direcionando para juventude, a jovem-guarda
que estava em alta na época. Roberto Carlos e Erasmo Carlos eram os expoentes
do estilo, que estava em alta no Paraná. Bandas curitibanas como Os Falcons,
Aquarius Band e Os Metralhas foram aos poucos agregando fãs em território
nacional.
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No final da década de 60, com influência do movimento de contra-cultura
vindo de outros continentes, especialmente dos Estados Unidos da América e
Inglaterra, outras bandas foram surgindo e assim outras vertentes musicais. Um
exemplo de banda que conseguiu sintetizar essas novas vertentes foram Os
Mutantes. Segundo CALADO (1999) esses paulistas do bairro Pompéia, tinham
influência de Beatles, que naquela altura acabara de lançar o divisor de águas da
música Pop: Sgt. Peppers Hearts Club Band5. No início da década seguinte, 1970,
outras bandas apareceram: Novos Baianos, Gilberto Gil agora tinha uma banda de
rock, o Expresso 2222, o Made In Brazil, Secos e Molhados. Em Curitiba, ainda no
início da década de 70 o já respeitado poeta e pensador local, Paulo Leminski,
passa a se interessar por música e fazer contribuições literárias ao gênero. É com a
banda A Chave, que Leminski uniu a música à poesia concreta – sua paixão.
2.2 HISTÓRIA DA BANDA A CHAVE
A banda composta por Ivo Rodrigues, Carlos Gaertner, Paulo Teixeira e
Orlando Azevedo anteriormente era chamada de Os Jetsons e era da cidade de
Palmeira, interior do estado do Paraná. A união destes quatro músicos se deu
quando em um festival na televisão, Ivo ganhara o prêmio de melhor vocalista,
enquanto Os Jetsons ganhariam o de melhor conjunto. Seu primeiro trabalho foi uma
releitura para a canção “When i'm Sixty Four” dos Beatles, a maior influência da
banda até então, que causou impacto por muitas vezes ser confundida com a
original.
Participou de festivais como o Camburock em 1975 e em Curitiba realizou o
projeto “Sangue nas Máquinas”, onde o grupo improvisava com o som das caldeiras
e das máquinas industriais, que funcionavam a todo vapor. No grande Teatro
Guaíra, em 1975, A Chave abriu o show de um ícone dos anos 50: Bill Haley and His
Comets. Também foram responsáveis pela música nos parques, uma vez que com
frequencia se apresentavam no palco flutuante do Passeio Público.
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Oitavo disco de studio da banda The Beatles
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Segundo a revista “Antigas novidades do Rock” a única revista a resgatar a
banda na primeira década dos anos 2000, o legado da Chave foi deixado em grande
parte com os paranaenses, que de grande maioria beiram a faixa dos 60 anos de
idade. Graças aos pesquisadores de décadas passadas, as novas gerações tem
acesso a uma gravação de um ensaio realizado no estúdio da banda chamado na
época de "A Casa Branca" localizada na rua Padre Anchieta no bairro Mercês.
Donos de uma loja de discos no centro de Curitiba, Marco e Jardel, como são
conhecidos, costumavam ir às feiras de LPs em São Paulo todo semestre. Numa
dessas viagens, a dupla encontrou uma fita cassete de um comerciante, que
apresentava um dos ensaios da banda, que supõe ser do início de 1970. Ao voltar
para a capital paranaense, a dupla, que na época era dona da loja Vinyl Club,
resolveu passar a fita para formato CD-R e montar uma capa com recortes de fotos
da época denominando o material de "De Ponta Cabeça", título da canção que abre
o disco encontrado.
Por volta de um mês depois da descoberta o material foi comercializado, e
com muito sucesso entre fãs e novos conhecedores, (que por influência da dupla
Jardel e Marco começou a descobrir um pouco mais da história do Paraná através
da música da Chave) as cópias saíram do estoque e nunca mais foram reeditadas.
Algum tempo depois esse material foi disponibilizado em blogs na internet.
Juntamente com essa passagem do físico para a web, foi descoberto outro material
da banda. A Chave ao Vivo em Londrina em 1975 passou a ser item muito buscado
na própria loja de discos de onde a lenda ressurgiu. Marco, com a ajuda da
Marcinha Teixeira, (esposa do guitarrista Paulo Teixeira) começou a fazer cópias do
mesmo modo que fez o "De Ponta Cabeça".
Maravilhados com a surpresa do material, os integrantes Carlos Gaertner,
Orlando Azevedo, Ivo Rodrigues e Paulo Teixeira, resolvem em 2007 reativar a
banda, que desde 1979 estava parada. A volta foi documentada em áudio, mas não
comercializada, assim como vários rolos gravados que com o tempo se perderam.
No ano de 2012 o baterista e fotógrafo Orlando Azevedo documentou o trabalho da
banda através de um livro O Diário, que deve sair no fim do ano.
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2.2.1 PAULO LEMINSKI E A CHAVE
Em meados da década de 70, mais precisamente em 1971, Paulo Leminski
viria a conhecer a famosa casa branca da Chave. Em um encontro inesperado entre
a banda e o poeta, surgiu uma parceria que perdurou anos.
Passava das três horas da madrugada quando alguém bateu na janela
frontal da Casa Branca, gritando: “ô, de casa!” Era o fotógrafo Haraton
Maravalhas trazendo Leminski para promover as apresentações formais.
Quem estava dormindo acordou e quem estava “viajando” apenas
continuou. Apertaram-se alguns baseados, alguém apareceu com copos e
garrafas e a noite continuou rolando. (VAZ, 2001, p.137).
De imediato o poeta viria com um projeto para apresentar à banda: Em Prol
de um Português Elétrico, onde propunha uma pesquisa aprofundada para adequar
o idioma (no caso, o português) ao Rock and roll. O compromisso com a banda foi
tão forte, que Paulo e sua esposa/namorada, a também poeta, Alice Ruiz, foram
morar na famosa casa da banda. Na época Leminski escrevia alguns artigos para o
jornal O Estado do Paraná e às vezes inseria uma nota ou outra sobre a “sua”
banda.
A meta é atingir uma estética através de uma tecnologia. Assim, o projeto
visa a: libertar a música pop da imagem do inglês, reputando como veículo
ideal para esse som. Contribuir para a criação de uma música BRASILEIRA
(ao contrário dos reacionários folclóricos e saudosistas que tentam em vão
incompatibilizar a cultura brasileira com a nova realidade industrial e
eletrônica, que veio pra ficar) ELÉTRICA E INDUSTRIAL.” (LEMINSKI,
1987).
O envolvimento com o projeto resultou em composições do poeta junto à
banda. “Blues Satanás”, “Povo Desenvolvido é Povo Limpeza”, “Vai à Luta”, ”Mulher
Interessante”, “Luva de Pelica”, “Me Provoque Pra Ver” e “Buraco no Coração”, a
primeira a ser gravada no compacto de 1977. Essa parceria foi ainda mais forte com
Ivo Rodrigues, que foi apontado por Leminski como o melhor vocalista de Rock do
Brasil.
2.3 A CHAVE E A IMPRENSA
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Pode-se considerar a banda paranaense mais importante do cenário musical
brasileiro voltado para o Rock e, juntamente com a poesia de grande influência do
poeta Paulo Leminski, criou um estilo único no gênero que nasceu por volta dos
anos 50 nos Estados Unidos. A banda possui um único material que foi
comercializado: um compacto (lado A "Buraco no Coração"/lado B "Me Provoque
Pra ver") lançado em 1977 pela GTA - Gravações Tupi Associadas. O conjunto não
teve a "ajuda" da internet (Web 2.0 – Troca de arquivos entre pessoas via internet) e
mesmo assim, com duas canções comercializadas, atingiu o cenário Rio-São Paulo,
que durante as décadas de 70 possuíam uma grande repercussão no Brasil: Os
Mutantes, Made in Brazil, Joelho de Porco, Bixo da Seda, Rita Lee e Tutti Frutti.
Segundo o jornalista DUARTE (2003) foi ao fim da década de 1980 que
começou uma movimentação da mídia em torno da música local. “Apesar de não ser
o objetivo principal da cena, alguns grupos tiveram boas chances de alcançar uma
projeção maior. A cena começou a ter uma divulgação maior no cenário musical
nacional”. (DUARTE apud SOUZA NETI, 2003, p.394). Desde o momento em que a
Chave começou a ter espaços em clubes como o Sírio Libanês, a mídia local tais
como O Estado do Paraná, Diário do Paraná, Folha de Londrina, Tribuna do Paraná,
chegaram a dar notas sobre a banda em vésperas de shows e eventos que ela
promovia. A chave chegou a ter um programa de TV, mas na luta contra os direitos
da rede televisiva, até hoje ninguém conseguiu rever o programa que ia ao ar
semanalmente na década de 70.
Em pesquisa em jornais da época na Biblioteca Pública do Paraná, o
assunto foi encontrado três vezes sobre shows na capital. Com o objetivo de
procurar algo relacionado a shows ao ar livre, em teatros (exemplo, Teatro Guaíra) e
em clubes (Sírio-libanês), bem pouco foi achado. Apenas uma pequena nota no
periódico Gazeta do Povo, escolhido por ser o jornal de maior influência na época,
sobre o show realizado em 1975, onde a banda abriu o show de Bill Haley and the
His Comets (Pioneiro do gênero Rock'n'roll).
Nota-se que os tipos de matérias encontradas nos periódicos Tribuna do
Paraná, Gazeta do Povo, O Estado do Paraná, Jornal Panorama, de Londrina, Diário
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do Paraná e Jornal do Paraná os textos voltados à banda são altamente explicativos
e detalhados. É possível encontrar a importância de sua história em mais de um
parágrafo no mesmo texto. A projeção aplicada no grupo, não sendo “apelativa”, é
algo constante nos sete veículos analisados. Um exemplo disso foi encontrado em
um texto datado de 23/11/1970, na Tribuna do Paraná. “Com uma média de apenas
20 anos de idade, o conjunto realiza em Curitiba um trabalho todo especial,
mostrando um som muito pessoal e dando novas dimensões para a música pop que
se faz no Brasil. Depois de Dublar, perfeitamente, os Beatles na televisão, A Chave,
desligou-se das influências e conseguiu uma síntese que dá ao grupo uma
qualidade de som totalmente original e específica”. A Chave sempre foi colocada à
frente do seu tempo: vanguardista. Para o autor Paulo Reis, em sua obra “Arte de
Vanguarda no Brasil: os anos 60”, Vanguarda é um fenômeno inscrito no mundo do
capital da industrialização e da sociedade de classes. Originalmente ligado a uma
estratégia militar (as “guardas de frente”) e depois presente num ideário políticorevolucionário, o termo ganhou status de discussão cultural no século XX, quando
algumas movimentações artísticas propuseram seus programas estéticos. Esses
programas fundamentavam-se na autonomia da arte e do objeto artístico. Para o
autor, aquilo que é de vanguarda, é aquilo tenta fugir na realidade imediata. Já em
outro veículo analisado, singularidade do grupo é declarada. “O conjunto A Chave já
fez muitas experiências: participou de peça teatral (“A Semana” de Denise Stoklos),
apresentou-se ao ar livre (no palco flutuante do Passeio Público numa manhã de
domingo) e faz experiências de som em seu estúdio próprio (naquele casarão da rua
Pe. Anchieta, onde o grupo mora e trabalha. Agora, mais uma experiência será feita
pelo quinteto: um show numa fábrica. As máquinas acompanharão com o seu som a
música D’a Chave. Relatava que o concerto acontecerá amanhã, às 14 horas, nas
dependências Mueller, na Vila Fany. “Sangue das Máquinas” é o título dessa
experiência.
2.4 INDÚSTRIA FONOGRÁFICA
Uma banda vive, praticamente, de duas coisas: shows e discos gravados.
Uma produção sonora é o cartão de visita de qualquer músico. Mas o processo de
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gravação de um material muitas vezes pode não parecer muito fácil. Veja como
exemplo a banda em estudo. A Chave, em 10 anos de existência gravou apenas um
compacto simples contendo lado A e Lado B.
O ponta pé inicial desse processo aconteceu especificamente em 1877,
quando Thomas Edson inventou o fonógrafo, primeiro aparelho destinada a músicas
que eram gravadas. Aliás, o termo “indústria fonográfica” surgiu a partir de um dos
setores da indústria cultural, conceito criado por Adorno e Horkheimer.
Segundo CANDAL (2014) durante o século XX a indústria fonográfica se
desenvolveu de uma forma que tornou-se um catalizador financeiro. Ainda mais
quando surgiram as radiolas (onde poderiam ser escutados os discos), discos de
vinil. O mercado de meio fonográfico foi um importante disseminador cultural. O rock
e o Pop, por exemplo, foram um grande chamariz, que contribuiu para a
consolidação dessa indústria. Bandas como The Beatles, Pink Floyd foram grandes
expoentes na indústria fonográfica tanto por questões financeiras e questão o de
técnicas de gravação. Beatles, como o seu divisor de águas o Sgt. Peppers Lonely
Hearts Club Band, de 1967 e o “Floyd” com o seu “Dark Side Of The Moon”, de
1973). Ambos os discos de ambas as bandas tiveram vendas elevadíssimas (Sgt.
Peppers: 5 milhões e Dark Side: 50 milhões).As técnicas de gravação aparentes nas
duas obras foram muito revolucionárias cada um em sua época.
Foi no final da década de 90, que a indústria fonográfica teve o seu auge,
quando cinco empresas – Universal, Warner, Sony, EMI e BMG – obtinham 85,28%
das vendas do mercado mundial (Herschmann e Kischinhevsky), que totalizou 2,2
bilhões de discos vendidos em 1997. Mas, curiosamente, logo após o ápice de
vendas dessa indústria, um processo de declínio nesse processo começa a
aparecer. Com a o aparecimento da pirataria e de outros softwares voltados para
compartilhamento de arquivos e músicas, como o Kazaa, grandes empresas
começaram a quebrar. Alguns músicos foram contra essa troca de arquivo via
internet a custo zero. Lars Ulrich, membro da banda de heavy metal Metallica
processou o criador do Napster por compartilhamento sem autorização de material
de sua banda.
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3. OBJETIVOS
3.1 OBJETIVO GERAL
−
Produzir um videodocumentário sobre a banda paranaense A Chave,
destacando sua história e atuação entre os anos de 1969 e 1979.
3.2 OBJETIVOS ESPECÍFICOS
−
Levar até gerações já existentes, e as que virão, o conhecimento sobre essa
banda que teve grande expressão no cenário brasileiro e paranaense no tempo em
que perdurou .
−
Resgatar a história da banda A Chave para contribuir com a preservação de
sua memória.
−
Contribuir com o acervo cultural do Paraná.
−
Descobrir a história da banda A Chave durante os dez anos de atuação na
cena musical curitibana criando um videodocumentário.
−
Levantar quais são as características principais dessa banda que a
diferenciam cena do rock curitibano.
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4. HIPÓTESE
Partimos da hipótese de pesquisa que ajuda na estruturação teórica e na
produção do nosso produto, o videodocumentário, capaz de responder a esta
prerrogativa inicial apresentada abaixo:
1) A banda A Chave teve grande importância para o rock curitibano e nacional
com maior visibilidade em 1975, ano em que a banda se apresentou no
Teatro Guaira.
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5. JUSTIFICATIVA
Este trabalho tem como produto final um videodocumentário biográfico sobre
a banda de rock setentista A Chave. A escolha da banda foi baseada na criatividade
das composições, tanto quanto a união de poesia e o rock and roll, aspecto original
na época em que surgiu.
A história do rock em Curitiba começou na Casa Branca do conjunto A
Chave na Rua Pe.Anchieta. Estúdio e casa comunitária, a Casa Branca da
Chave foi durante muito a única prova de que estávamos na segunda
metade do século XX. Sono de Beatles e Stones, The Who e Led Zeppelin,
o rock da Chave foi durante muito tempo o nosso rock, o nosso sonho de
rock-and-roll. Fonograficamente, a Chave deixou um compacto. Mas seus
shows na segunda metade dos anos 70 eram sempre o evento máximo do
show na cidade. Houve banda de repetidores como os Metralhas. A primeira
banda curitibana de criação rock foi A Chave. (LEMINSKI, Correrio de
Notícias).
Com base nessa citação do Poeta Paulo Leminski e na visão de
documentário do autor Bill Nichols, de que “no documentário, o estilo deriva
parcialmente da tentativa do diretor de traduzir seu ponto de vista sobre o mundo
histórico em termos visuais, e também de seu envolvimento direto no tema do filme.
Ou seja, o estilo ou a voz do documentário revelam uma forma distinta de
envolvimento no mundo histórico”. (NICHOLS, 2010). A ideia de voz ao
documentário representa um “algo a mais”. Um complemento. Da uma visão literal
do que a história quer contar.
Trata-se de um trabalho único a tratar da banda A Chave. O tema “rock em
Curitiba” já foi tratado em dois outros trabalhos acadêmicos: “Sou Legal, Eu Sei” e
“Voz Disfarçada de Gente”. Ambos trataram da vida do cantor e compositor Ivo
Rodrigues da banda Blindagem. No formato biográfico, os documentários apenas
citaram o trabalho da Chave, uma vez que Rodrigues também tenha sido o vocalista
principal da banda até 1979, ano em que o conjunto acabou.
Em outros formatos, tais como jornais, programas de TV e revistas o
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assunto é muito raso, ou seja, o assunto é muito pouco explorado, ou nem é
abordado. O Documentário “Todo Roqueiro é Gente Fina” tem como objetivo contar
a história da banda de forma profunda, para que as próximas gerações do estado do
Paraná tenham ciência de quem foi uma das bandas de rock mais importante do
cenário musical de Curitiba até hoje.
Preservar a memória da cultura musical é importante para a cultura de
qualquer estado. A Chave contribuiu muito para bandas que viriam depois dela. O
modo com que articulavam uma canção. Como articulavam a poesia e melodia. É
importante trazer a gerações póstumas a história da banda que “fabricou” mais de
150 músicas.
21
6. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA
Resgate de memória requer uma pesquisa intensa. Seja em livros, revistas
ou documentários. No caso do grupo de rock A Chave, o processo foi basicamente
ao contrário. Pesquisas foram importantes, mas não em livros, revistas ou
documentários como já citados. Os dados mostrados abaixo foram retirados, em
grande parte, de entrevistas com pessoas que conviveram com a banda e com
integrantes da Chave. Foram entrevistados Carlos Gaertner, Orlando Azevedo,
Paulo Teixeira, Judith Magalhães, Sandra Carraro, Luiz H. Groff, Lucas Nieri, Jardel
Simões, Marco Antônio, Luiz Maurício Carraro e Luiz Carlini.. A partir de recortes de
jornais e fotos foi construída uma linha de pesquisa orientada por Sergio Villas Boas,
Cremilda de Araújo, Daniel Piza, Bill Nichols, Robert Young e J.S Faro.
6.1 BIOGRAFIA NO JORNALISMO
Segundo o autor Sergio Vilas Boas a biografia representa a reprodução de
uma vida, ou de várias, que chegam a ser copilados em um material final – o
produto.
A biografia é uma compilação de uma ou de várias vidas. Pode ser
impressa em papel, mas em outros meios, como o cinema, a televisão e o
teatro podem acolhe-la bastante bem. Por enquanto, não há características
epistemológicos para o fazer biográfico. Para os propósitos deste trabalho,
o que interessa é a escrita e o autor, a criação e a publicação, o
personagem e a sua interpretação. (VILAS BOAS, 2002, p.56)
Vilas Boas (2002) diz que a vida de celebridades e pessoas famosas
despertam a atenção de grupos variados e que o material a ser consumido, ou seja,
o documentário da banda A Chave, trata-se também de um produto social, um
22
documento de resgate do passado de alguém. Hoje no Brasil o mercado é
“bombardeado” com biografias heróis, ídolos das gerações que passaram, ou até as
que hoje se apresentam ativas. Em sua maioria, músicos biografados que já
morreram ou que construíram uma história digna de ser lembrada pelo pesquisador
que tem total liberdade de escolher quem biografar. “Tanto a lista de pessoas
biografáveis no mundo quanto às opções dos biógrafos são finitas e não se
restringem a este ou àquele campo. Até porque o (a) biógrafo(a) pode escolher
quem irá biografar. (VILAS BOAS, 2002).
Young (2002 apud VILAS BOAS, 2002, p. 19) diz que a biografia é uma
espécie de disciplina que contém uma linguagem única, sua própria reflexão. A
biografia traz acontecimentos, dados históricos. Ela acaba se tornando um roteiro de
memórias que, somado a acontecimentos relacionados com o biógrafo, resultam em
um novo produto a partir do conhecimento e da vontade em resgatar o passado. Ele
também diz que sem passado não há biografia.
Para Vilas Boas (2002), a biografia apresenta dois princípios básicos tendo o
jornalismo como aliado: o que conta a história mais próxima da realidade, e o que
garante proximidade do receptor com o conteúdo apresentado, partindo do princípio
de pesquisas jornalísticas, que resgatam a memória do biografado. O jornalismo,
segundo o autor, desenvolveu um conjunto de técnicas, conceitos e princípios, que
dão rumo ao biógrafo na hora de descrever, ou escrever sobre o acontecimento.
Para o autor, as técnicas utilizadas pelo jornalista pra contar eventos periódicos, tais
como política, esportes, cultura, muitas vezes não são entendidos por leigos, quando
transcreverem isso para uma biografia, que não é munida de técnicas estritamente
jornalísticas, exceto parte da pesquisa. Ou seja, não é necessário apenas aplicar o
jornalismo aos meios comuns do cotidiano – Televisão, rádio, jornal impresso – para
a biografia também é possível.
O autor Vilas Boas (2002) chama os biógrafos, que na maioria dos casos
são jornalistas, de repórteres especiais. Alguns se denominam repórteres
investigativos e renegam a tradição do biógrafo como catedrático. Stephen B.,
também citado por Vilas Boas, diz que para contar a história de um sujeito escolhido
23
para ser biografado, o biógrafo tende a se apoiar na linguagem, nas imagens,
diálogos, citações, personalidade, detalhes. Ele utiliza-se de símbolos que
caracterizam a “personagem” a uma biografia.
6.2 JORNALISMO CULTURAL
Nos dias de hoje apresenta-se uma dificuldade em definir o termo
“Jornalismo Cultural” presente em periódicos do dia-a-dia ou em revistas. Uma vez
que um conceito seja formado e esclarecido para um leitor, para o outro o mesmo
pode não ocorrer. Tomando como exemplo a “Ilustrada”, caderno de cultura do jornal
Folha de S. Paulo, percebe-se que os temas ali encontrados permeiam assuntos
ligados à arte no geral. Para alguns indivíduos, essa segregação de editorias pode
não fazer sentido uma vez que a existência de um jornal diário que aborde pautas do
cotidiano da sociedade local já caracteriza um produto sociocultural.
O jornalismo cultural encontrado em cadernos como Caderno 2, do Estado
de S. Paulo e o Caderno G, da Gazeta do Povo abordam temas relacionados a
música, cinema e literatura. Com base nisso, Teixeira Coelho (1997, p. 103) diz em
sua obra “Dicionário Crítico de Política Cultural” que a cultura pensada num modo
amplo, como a “ideia de uma forma que caracteriza o modo de vida de uma
comunidade em seu aspecto global”, seguindo a definição, o conceito emerge em
todas as editorias de um veículo de imprensa, já que não é possível desvincular
práticas políticas, econômicas ou esportivas, por exemplo, da cultura em que elas se
manifestam.
Segundo Piza (2004), o jornalismo cultural é inteiramente dedicado a
avaliações de ideias, valores e artes, é um produto de uma era que se inicia depois
do renascimento. “O jornalismo cultural pode sofrer crises de identidade frequentes,
e é bom que sofra – até porque, como na arte, a condição moderna é “crítica”, isto é,
envolve sinais de crise, é instável, cíclica, plural - , mas as dicotomias fáceis só lhe
tem efeito mal”. (PIZA, 2004). Nesse caso, é necessário entendermos o papel do
jornalismo cultural dentro de uma cultura de massa, onde produtos culturais estão
inseridos e prontos para serem consumidos, dentre eles, videodocumentários
24
retratando biografias de conjuntos de rock.
O autor (2004) diz ainda que algumas características do jornalismo cultural
obtiveram mudanças ao longo do tempo. Muitas delas, por crises financeiras que
jornais impressos enfrentaram. Quando o auge do jornalismo cultural teve
decadência total, os editoriais de cultura cederam lugar a “assuntos que não faziam
parte das chamadas “sete artes” (literatura, teatro, pintura, escultura, música,
arquitetura e cinema), como moda e design.” (PIZA, 2004).
O autor (2004) relata também que no jornalismo cultural, o papel do
jornalista inserido na área, é de mostrar a influência da arte na sociedade em que
vive. Assim, como uma análise, permitiria que a vertente jornalística voltasse a ser
feita como antes. O resultado desse feito seria o retorno da imparcialidade dele para
com os produtos a serem expostos ao público geral, que os consome a partir do
papel do jornalista cultural. Seria aplicado como uma espécie de mediador entre o
produto artístico que será consumido e o consumidor.
Já para Faro (2008), a análise dessas restrições ao jornalismo cultural é
pouco complicada, uma vez que ele coloca que “todo jornalista é intelectual”. Para
ele o jornalismo cultural é formado a partir dessa verdade. “Um exemplo são as
afirmações segundo a qual “todo jornalismo é cultural”, uma espécie de verdade
absoluta, ao qual se segue quase sempre uma tautologia: “todo jornalismo é
intelectual””.
Segundo ele (2008), no jornalismo cultural ocorrem alguns trâmites em torno
da avaliação e da análise da produção desse tipo de jornalismo representada pelos
eventos artísticos do mundo social, razão pela qual diversos veículos com as
características já apontadas se prestaram à condição de interpretadores.
6.3 VIDEODOCUMENTÁRIO
25
O autor Nichols (2010) coloca que cada documentário tem uma voz distinta,
assim como cada pessoa possui a sua própria impressão digital. É como uma voz
que fala, a voz fílmica tem um estilo ou uma “natureza” própria. “Ela atesta a
individualidade do cineasta ou diretor, ou, às vezes, o poder de decisão de um
patrocinador ou organização diretora” (NICHOLS, 2010). Para ele (2010), no cinema
as vozes individuais estão a mercê do autor/diretor, ou seja, não possuem
características de sua natureza, uma vez que o que foi dado pelo responsável pela
obra criou algo a ser interpretado por um personagem. “No vídeo e no filme
documentário, podemos identificar seis modos de representação que funcionam
como subgêneros do gênero documentário propriamente dito: poético, expositivo,
participativo, observativo, reflexivo e performático.” (NICHOLS, 2010, p.135).
Essas seis características apresentadas por NICHOLS (2010) determinam
aquilo que o espectador espera. Estabelecem convenções que um determinado
filme pode adotar e propiciam expectativas específicas já aguardadas pelo
espectador, que por sua vez espera ficar satisfeito.
Cada modo compreende exemplos que podemos identificar como protótipos
ou modelos: eles parecem expressar de maneira exemplar as
características mais peculiares de cada modo. Não podem ser copiados,
mas podem ser emulados quando outros cineastas, com outras vozes
tentam representar aspectos do mundo histórico de seus próprios pontos de
vista distintos. (NICHOLS, 2010, p.138).
O desejo do documentarista em criar um novo tipo de documentário é
aparentemente normal, uma vez que como um conjunto mutável de circunstâncias, o
desejo de propor maneiras diferentes de representar o mundo também contribui para
a formação de cada modo.
Modos novos surgem, em parte, como a resposta às deficiências
percebidas nos anteriores, mas a percepção da deficiência surge, em parte,
da ideia do que é necessário para representar o mundo histórico de uma
perspectiva singular num determinado momento. A aparente neutralidade e
o atributo “entenda como quiser” do cinema observativo surgiram no fim dos
calmos anos 50 e durante o auge das formas descritivas da sociologia,
baseadas na observação. Eles floresceram, em parte, como concretização
de um suposto “fim de ideologia” e de um fascínio pelo corriqueiro, mas não
26
necessariamente da afinidade com a situação social difícil ou o ódio político
daqueles que estão às margens da sociedade. (NICHOLS, 2010, p.136).
Devemos aceitar que um novo modo de filmagem e de roteiro faz com que a
arte cinematográfica progrida. Assim, dessa forma é capaz de captar aspectos que
jamais foi possível. Sem esquecer-se de processos já realizados, que não excluem
os anteriores nem os sucessores. Assim como um meio de comunicação não é
capaz de excluir um mais antigo.
Um modo novo não é melhor, ele é diferente, embora a ideia de
“aperfeiçoamento” seja frequentemente alardeada, especialmente entre os
defensores e praticantes de um modo novo. Um modo novo tem um
conjunto diferente de ênfases e consequências e, por sua vez, acabará se
mostrando vulnerável à crítica pelas limitações que um outro modo de
representação prometa ultrapassar. (NICHOLS, 2010, p.140).
Colocando um documentário como uma nova forma pode tornar-se uma
nova ideologia para explicar a nossa relação com a realidade e um novo conjunto de
questões e desejos para inquietar o público. Segundo Nichols (2010) existem sete
tipos
de
documentários:
Ficção
Hollywoodiana,
Documentário
Poético,
Documentários Expositivos, Documentários Observativo, Documentário Participativo,
Documentário Reflexivo e o Documentário Performático. Para produzir o
Videodocumentário “Todo Roqueiro é Gente Fina: A História da Banda A Chave”,
resolvemos se basear no Documentário Participativo, Documentário Reflexivo e
adotar algumas características do Documentário Poético.
6.3.1 DOCUMENTÁRIO PARTICIPATIVO
O Documentário participativo tem como característica a entrevista e a
interação com eles. Usa imagens de arquivo para recuperar a história. Possui fé
excessiva em testemunhas e é evasivo demais. Segundo Nichols (2010) quando
assistimos a documentários participativos, esperamos testemunhar o mundo
histórico de maneira pela qual ele é representado por alguém que nele se engaja
ativamente, e não por alguém que observa discretamente, reconfigura poeticamente
27
ou monta de forma argumentativa esse mundo. Metaforicamente, o autor coloca
uma mosca, que está em quadro, mas em segundo plano, e que acaba se tornando
importante para o documentário. “O cineasta despe o manto do documentário com
voz-over, afasta-se da meditação poética, desce do lugar onde pousou a mosquinha
da parede e torna-se um ator social (quase) como outro qualquer. (Quase como
outro qualquer porque o cineasta guarda pra si a câmera e, com ela, um certo nível
de poder e controle potenciais sobre o acontecimentos)”. (NICHOLS, 2010, p. 154).
6.3.1 DOCUMENTÁRIO REFLEXIVO
Apresenta o caráter dos anos 80, questiona a forma do documentário e tira a
familiaridade dos outros modos. É abstrato demais e perde de vista as questões
concretas. Esse estilo de documentário, segundo Nichols (2010), aborda um caráter
mais consciente de si mesmo. Nas entrelinhas ele é o que mais se questiona.
O acesso realista ao mundo, a capacidade de proporcionar indícios
convincentes, a possibilidade de prova incontestável, o vínculo indexador e
o que ela representa – toas essas ideias passam a ser suspeitas. O fato de
que essas ideias podem forçar uma crença fetichista inspira o documentário
reflexivo a examinar a natureza de tal crença em vez de atestar a validade
daquilo em que se crê. (NICHOLS, 2010, p.160).
Em suma, o autor diz que o documentário reflexivo estimula o espectador
uma forma mais elevada de consciência a respeito de sua relação com o
documentário e aquilo que ele representa.
6.3.3 DOCUMENTÁRIO POÉTICO
É característico dos anos 1920 reunir fragmentos do mundo de modo
poético. Tem como deficiência a falta de especificidade e por ser de caráter poético,
tende a ser abstrato demais. “O modo poético sacrifica as convenções da montagem
em continuidade, e a ideia de localização muito específica no tempo e no espaço
28
derivada dela, para explorar associações e padrões que envolvem ritmos temporais
e justaposições espaciais”. (NICHOLS, 2010, p.138). Nichols coloca o modelo
poético de uma forma mais qualitativa em relação às demais vertentes do
documentário oriundos do século XX. Essa característica é observada, uma vez que
é colocada a vertente poética como a única a possibilitar formas alternativas de
conhecimento para transferir informações diretamente, dar prosseguimento a um
argumento ou ponto de vista específico ou apresentar preposições sobre problemas
que necessitam solução.
O modo poético começou ainda alinhado ao modernismo, como uma forma
de representar a realidade em uma série de fragmentos, impressões
subjetivas, atos incoerentes e associações vagas. Essas características
foram muitas vezes atribuídas às transformações da industrialização, em
geral, e aos efeitos da primeira guerra mundial, em particular. A divisão do
tempo e do espaço em múltiplas perspectivas, a negação de coerência a
personalidades sujeitas a manifestações do inconsciente e a recusa de
soluções para problemas insuperáveis cercam-se de uma sensação de
sinceridade, mesmo quando criavam obras de arte confusas ou ambíguas
em seus efeitos. (NICHOLS, 2010. p.160).
Embora alguns filmes explorem concepções mais clássicas do poético como
fonte de ordem, integridade e unidade, essa ênfase na fragmentação e na
ambiguidade continua sendo um traço importante em muitos documentários
poéticos.
29
7. METODOLOGIA
As metodologias usadas para este trabalho foram estudo de caso da banda
A Chave, pesquisa exploratória e experimental, com revisão bibliográfica, análise
documental e entrevistas com personagens que estivessem relacionados com a
banda, e a produção de um videodocumentário. O videodocumentário amparado
pelas entrevistas e análise documental vai ajudar a responder nossos objetivos geral
e secundários e no auxílio de afirmar que nossa hipótese de pesquisa estava
correta, parcialmente correta ou incorreta.
O foco da discussão A Chave e imprensa surge a partir de imagens atuais e
imagens nunca mostradas da banda com um olhar mais poético e menos didático,
relatos de integrantes, história da banda, rota dos bares que frequentavam, eventos
que a banda participou, em sua maioria sustentados por livros que envolveram a
época. Dentre eles, "Bandido Que Sabia Latim", biografia do poeta Paulo Leminski
produzida pelo autor Toninho Vaz. A soma desses materiais culminará em um
videodocumentário sobre A Chave.
A partir de técnicas citadas por Bill Nichols em “Introdução ao
Documentário”, dicas de entrevista com a autora Cremilda de Araújo em “Entrevista:
diálogo possível” e noções de como se contar uma história, ou fazer um perfil, com
Sérgio Vilas Boas o videodocumentário “Todo Roqueiro é Gente Fina” mostrará o
trabalho da banda que mesclou poesia com acordes de guitarra e como cano de
escape obtém distorções de amplificadores valvulados.
Para a produção deste projeto de videodocumentário foram utilizados
materiais impressos obtidos de jornais da época em que a banda esteve em
atividade – 1969 a 1979. Os tipos de mídias consultadas: documentários que
abordassem o tema, sites, livros e fanzines 6 . Os jornais usados para ilustrar a
6
Publicação não official e não profissional, que geralmente é produzida por fãs ou pessoas
que tem interesse no assunto abordado
30
relação da banda com a imprensa foram Tribuna do Paraná, Gazeta do Povo, O
Estado do Paraná, Jornal Panorama, de Londrina, Diário do Paraná e Jornal do
Paraná. Pesquisando exemplares do ano de 1975, apenas cinco notas foram
encontradas. Este ano foi importante para a banda, uma vez que tocariam ao lado
do ícone do rock and roll: Bill Haley and his Comets no palco do Teatro Guaíra.
Foram feitas entrevistas informais com pessoas que conheceram o trabalho
da banda A Chave e que ainda vivem na capital paranaense. Algumas entrevistas
foram feitas via e-mail e outras em encontros, uma vez que a fonte não fora avisada
sobre entrevista alguma. As fontes mais usadas foram Carlos Augusto Gaertner,
Orlando Azevedo e Jardel Simões. O baixista, Carlos Caertner e o baterista, Orlando
Azevedo da banda em pesquisa, obtém grande quantidade de material a ser usado
no videodocumentário. Simões, além de responsável pela volta da banda em 2004 e
grande fã da banda, reuniu fotos e recortes de jornais possibilitando a pesquisa mais
a fundo. O fotógrafo Orlando Azevedo, baterista da Chave, também possui um vasto
repertório sobre o assunto. Na época Azevedo já era fotógrafo e com isso registrou
momentos muito importantes para não só a carreira da banda, mas para o futuro da
música na capital paranaense. Com a ajuda dele, autores como Manoel J. Souza
Neto, autor curitibano, descreveu a cena cultural musical de Curitiba em
“[des]Construção da Música na Cultura Paranaense”.
Os tipos de documentários analisados para esse projeto, como “Ervilha da
Fantasia, de Werner Schumann, torna-se próprio, no caráter de originalidade, em
relação aos documentários musicais colocados no mercado. Documentários como o
da banda Foo Fighters 7 , são considerados comuns por apresentar uma linha
cronológica a seguir. Segundo Bill Nichols esse estilo de documentário é chamado
de “Documentário expositivo”. Este é excessivamente didático. Já no modo
escolhido para o videodocumentário “Todo Roqueiro é Gente Fina” foram escolhidos
três vertentes dos documentários citados em “Introdução ao Documentário”, de
Nichols.
Documentário participativo, que possui uma característica mais participativa
7
Banda norte-americana fundada em 1994.
31
com o entrevistado e com a história, documentário no estilo reflexivo, que questiona
a forma do documentário, tirando a familiaridade dos outros modos, e por fim, um
pouco do caráter do documentário poético, que possui fragmentos de mundos
imaginários, tal como ausência da realidade.
Para produzir o videodocumentário foi preciso um olhar mais poético,
misturando realidade com ficção, que também será encontrado no projeto. O projeto
será de caráter mais solto e interpretativo, de modo que faça o receptor tirar
conclusões, mesmo que o caráter didático seja traçado de forma clara e
compreensiva.
Segundo Antônio Carlos Gil, pesquisas exploratórias compreendem uma
forma divergente de outras pesquisas sociais. Ela possui um caráter mais
investigativo, aquele que esclarece ideias sobre o assunto pesquisado. Nesse caso,
a trajetória da banda A Chave, um levantamento bibliográfico de documental,
entrevistas não padronizadas e estudos de caso. “Procedimentos de amostragem e
técnicas quantitativas de coleta de dados não são costumeiramente aplicados
nestas pesquisas”. (GIL, 1999).
Para o autor (1999), o tipo de pesquisa utilizada nesse projeto é realizada
especialmente quando o tema é pouco explorado e torna-se difícil sobre ele formular
hipóteses precisas. O produto final deste processo passa a ser um problema mais
esclarecido, passível de investigação mediante procedimentos mais sistematizados.
A pesquisa documental também é usada para explorar o projeto do
videodocumentário. Esse tipo de pesquisa consiste em explorar as fontes
documentais, que são em grande número.
Existem, de um lado, os documentos de primeira mão, que não receberam
qualquer tratamento analítico, tais como: documentos oficiais, reportagens
de jornal, cartas, contratos, diários, filmes, fotografias, gravações, etc. De
outro lado, excitemos documentos de segunda mão, que de alguma forma
já foram analisados, tais como: relatórios de pesquisa, relatórios de
empresas, tabelas estatísticas, etc. (GIL, 1999, p.99 ).
Aqui, não necessita um tratamento mais analítico, ou seja, que já não
32
receberam um tratamento “especial”, e que ainda podem ser reelaborados de acordo
com os objetivos da pesquisa.
8. DELINEAMENTO DO PRODUTO
Um videodocumentário, assim como qualquer outra forma de biografia,
exemplifica quase por inteiro a história daquilo que quer será resgatado. Nesse
formato são apresentadas fotos, músicas, entrevistas, passagens, que simbolizam
ou que recriam aquilo que vai ser resgatado. Para “Todo Roqueiro é Gente Fina”
todos esses recursos foram utilizados, dando a condição de resgate do período
proposto: 10 anos da primeira banda de Rock, aqui no Paraná, a produzir músicas
próprias.
8.1 SINOPSE
“Todo Roqueiro é Gente Fina” deve traçar a história da extinta banda
paranaense A Chave. A união dos músicos em 1969, sua passagem pelo cenário
musical nacional durante a década seguinte, 1970, o envolvimento com o poeta
Paulo Leminski Filho, a gravação do único compacto e o fim em 1979 da formação
original. Entrevistas com membros da banda, fãs e colecionadores estarão ilustrando
ao máximo o que foi o legado D’A Chave.
8.2 ARGUMENTO
A banda A Chave foi à pioneira em solo paranaense, a compor canções de
rock. Juntaram-se a poesia concreta de Paulo Leminski e “decolaram” no cenário
33
musical brasileiro. Bandas como Rita Lee & Tutti Frutti, Made in Brazil, Mutantes,
Som nosso de Cada Dia (o tecladista/ saxofonista Manito era muito amigo do
quarteto. Chegou a gravar as duas músicas do único compacto da banda, O Peso.
Elas também foram bandas que passaram pela capital paranaense, a fim de visitar
os amigos que até então moravam em uma casa, denominada “A Casa Branca”,
onde a arte (em todas as formas) era divulgada para o Brasil. O videodocumentário
biográfico tem como objetivo resgatar a memória de uma das bandas mais
importantes do estado do Paraná. Tem como objetivo difundir uma área tão pouco
explorada por críticos, fãs e até pelos integrantes da banda.
8.3 PROPOSTA
O videodocumentário tem como objetivo resgatar a história da banda que foi
pouco explorada em solo paranaense e do Brasil. “Todo Roqueiro é Gente Fina”
pretende trazer à tona a memória cultural da música paranaense, focada em quatro
figuras muito importantes para o avanço da arte no estado do Paraná e o
entendimento desse processo todo: Ivo Rodrigues, Paulo Teixeira, Orlando Azevedo
e Carlos Augusto Gaertner. Alguns documentários e obras biográficas (ou não)
analisados e colocados como próximos ao projeto em questão: “Ervilha da Fantasia”,
“Polaco Louco Paca”, “Para Limpar Lágrimas”, o filme “Ex-Isto” e o romance-ideia
8
"Catatau".
8.4 DESCRIÇÃO DO OBJETO
Este projeto de videodocumentário é baseado na história da banda
paranaense A Chave e da vida dos quatro integrantes: Ivo Rodrigues, Paulo
Teixeira, Orlando Azevedo e Carlos Augusto Gaertner. A essência do registro
surgirá do envolvimento com os entrevistados em frente a uma câmera, somado a
abordagem abstrata de outros videodocumentários que serviram de influência para o
8
Pode ser chamado também de romance filosófico ou aenas romance. O termo foi criado pelo
poeta Paulo Leminski.
34
projeto. A forma com que será abordado o documento é de característica universal,
mas moldada a características não usuais em demais àqueles videodocumentários,
que resgatam histórias. Tomadas, ângulos tentam acompanhar a história, do mesmo
jeito que o conjunto tentou projetar-se no cenário musical: de forma criativa, mas
sem perder a essência de um documentário.
Duração: 30 minutos
8.5 ABORDAGEM
Documentários do estilo Participativo, Reflexivo e Poético serão explorados
em sua totalidade. Serão realizadas entrevistas em forma de depoimento, mas sem
cair no modo didático, muito utilizado no cinema dos anos 20. O modelo preto e
branco do videodocumentário foi escolhido para uso uma vez que se tem como
objetivo acompanhar traços característicos da banda.
8.6 ESTRUTURA
A partir de entrevistas e ficção, o videodocumentário tomará forma, uma vez
que assuntos interligados a banda podem surgir, de forma que não se distanciem do
assunto proposto: documentar a história da banda A Chave. Um exemplo disso
seriam as poesias que serviam de base para criação de melodias e composições.
Trechos de músicas serão utilizados para ilustrar composições que jamais foram
gravadas.
A estrutura do videodocumentário:
1) Começa com uma representação de uma pessoa colocando um compacto em
um toca-discos, dando início a história d’A Chave
2) Primeiro entrevistado, Paulo Teixeira. Ele é quem vai dar o pontapé inicial da
história do grupo.
35
3) Logo em seguida, temos Orlando Azevedo, dialogando com Teixeira sobre a
história da banda. Algumas imagens em forma de fotografia da época foram
utilizadas para ilustrar o assunto que é tratado pelos dois.
4) Carlos Augusto Gaertner, baixista do grupo, entra após 4 minutos,
simbolizando a sua entrada tardia na formação da banda.
5) A partir daí, os três dialogam com complementos de mais três entrevistados:
Luiz Groff, Lucas Nieri e Luiz Carraro.
6) Entre os diálogos algumas faixas musicais compostas pela Chave aparecem
de fundo, a fim de complementar o assunto discutido.
7) Ao final do documentário temos Paulo Teixeira tocando a faixa que dá nome
ao videodocumentário.
8) Os créditos são apresentados junto à sonorização deita por Teixeira.
8.7 PÚBLICO-ALVO
Esse videodocumentário visa atingir admiradores de três vertentes da arte:
cinema, música e poesia, uma vez que o projeto tende ser abordado pelo formato
abstrato. Abrange também o público que acompanhou na época os caminhos da
banda A Chave, e tem a curiosidade de relembrar os dez anos de estrada da
primeira banda paranaense a compor uma canção de rock. Também agrega o
público jovem que é atraído por cultura no geral. Tem como um dos objetivos ser
exibido na Biblioteca Pública do Paraná, cinemateca e em mostras de cinema que
acontecerem na capital, ou até mesmo em cidades do interior.
8.8 PROCESSO DE GRAVAÇÃO
Para a gravação de “Todo Roqueiro é Gente Fina” foram usadas duas
36
câmeras do modelo Canon Rebel, com diferentes lentes. Foi escolhida a “olho de
peixe” para alguns entrevistados, a fim de criar um caráter mais poético e menos
usual nos demais vídeo, já apontado por Nichols. Outra característica marcante
nesse tipo de lente é a retratação do modo de filmagem presente nos anos 60 ou até
em filmagens Super 8.
A presença das duas câmeras por integrantes da banda é proposital
justamente para captar de outros ângulos a reação do entrevistado ao resgatar sua
memória dentro de uma banda de rock de grande expressão. Também foi escolhida
a mudança da fotografia dentro do videodocumentário por uma questão de opção.
Preto e branco retratam sentimentos e memória.
8.9 LINGUAGEM
No Resgate d’A Chave foi importante criar um tipo de linguagem, que
seguisse a verve do grupo. Poesia e música concreta fizeram boa parte da história
da Chave. Ruídos estão presentes no videodocumentário de forma proposital, assim
como intervalos de poucos segundos entre a troca de assuntos. Assim como na
música, a imagem em movimento precisa de respiro9.
Em música, podemos chamar o respiro de intervalo. Segundo Med (1996),
intervalo é a diferença de altura entre dois sons, é a relação entre duas alturas e é
também o espaço que separa um som do outro. Altura, divide-se entre absoluta10 e
relativa11. Como esse respiro o telespectador é capaz de processar o que foi lhe
dito, estando assim preparado capítulo a capítulo.
9
Descanso, repouso ou intervalo.
Do som é a altura exata, correspondente a um determinado número de vibrações
11
Do som é o resultado da comparação entre sons (no mínimo dois)
10
37
9. CONCLUSÃO
Concluímos que a banda A Chave, primeira banda de rock autoral no
Paraná, teve uma grande influência para o cenário rock/cultural do estado e
nacionalmente falando. Junto com outras bandas, que foram contemporâneas a ela
e existem até hoje, obtiveram reconhecimento no universo rock.
Vale lembrar, que nas entrevistas, foi expressado isso de forma verbal e
também de forma expressiva para cada entrevistado. Foi concluído também, que o
período de 1975, que no inicio foi colocado como importante em nossa hipótese
estruturadora de pesquisa, por ser a abertura do show do Bil Halley and His Comets,
passou a não a não ser tão significativo para o videodocumentario e até para os
membros d’A Chave. Para eles, a construção e produção de músicas dentro dos 10
anos de existência recebe forma e importância maior.
“Todo Roqueiro é Gente Fina” alcançou o objetivo de contar a história do
grupo e passar a sua importância a nível nacional, junto às demais bandas, que
citadas no videodocumentário formavam a “nata” do rock nacional na década de
1970.
O processo de gravação e inteiração com os entrevistados foi intenso, uma
vez que resgatar a história de uma banda, que relativamente sobreviveu do boca a
boca e não de algo concreto, exceto o compacto lançado no final de sua carreira. Os
dados coletados foram praticamente escassos. Problemas de comunicação também
quase foram uma barreira a ponto de fazer desistir. Questões não resolvidas entre
integrantes, ego, brigas internas quase fez com que esse trabalho não fosse
concluído. Depois de dois anos de tentativa, o conseguimos constatar que
realmente, Todo Roqueiro é Gente fina. O título escolhido foi escolhido a partir de
uma composição, não gravada, que no fim fez sentido. A história foi compartilhada,
foi contada e com certeza outras aparecerão.
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10. CRONOGRAMA
2º Semestre 2014
Atividades
jul
ago
Metodologia e execução
X
X
set
Pré-entrevista
X
X
Pré-produção
X
X
Elaboração do roteiro
X
Produção do DOC
X
out
nov
X
Decupagem
X
X
Edição
X
X
Redação Final
X
X
Apresentação Final
X
39
11. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ADORNO, T. “A Industria Cultural”. In: Cohn, G (org) Comunicação e Industria
Cultural. São Paulo: Nacional, 1975.
CALADO, Carlos. A Divina Comédia dos Mutantes. São Paulo: Editora 34, 1995.
CANDAL, Rômulo. “Garoa e Solidão: O Rock’n’Roll Curitibano Abordado em
Almanaque. Curitiba, 2014.
DAPIEVE, Arthur. BRock – O Rock Brasileiro dos Anos 80. São Paulo: Editora 34,
1995.
DUARTE, R. Teoria Crítica da Indústria Cultural. Belo Horizonte: Editora UFMG,
2003.
EAGLETON, T. The Idea of Culture. Oxford: Blackwell Publishing, 2000.
FRIEDLANDER, Paul. Rock and Roll: Uma História Social. São Paulo. Ed.
Record, 2006.
GIL, Antônio Carlos. Métodos e Técnicas de Pesquisa Social. São Paulo: Ed
Atlas, 1999.
LEMINSKI, Paulo. Música Com Gosto de Pinhão. Correio de Notícia. Curitiba:
18/01/1987.
MED, Bohumil. Teoria da Música. Brasília. Editora Musimed, 1996.
MEDINA, Cremilda de Araújo. Entrevista: O Diálogo Possível. São Paulo. Ed
Ática, 2002.
Nichols, Bill. Introdução ao Documentário. São Paulo: Papirus Editora 5 ed. 2010.
PIZA, Daniel. Jornalismo Cultural. São Paulo: Editora Contexto 4 ed. 2011.
ROCHA LEITE, E. Leminski: o Poeta da Diferença. EDUSP, 2012.
SOUZA NETO, Manoel J. [des] Construção da Música na Cultura Paranaense.
Curitiba: Ed Aos quatro ventos, 2004.
VAZ, Toninho. O Bandido que Sabia Latim. Ed. Record 1 Edição, 2008.
40
VILAS BOAS, Sergio. Biografia e Biógrafos – Jornalismo Sobre Personagens.
São Paulo: 2 ed. 2002.
VINIL, Kid. Almanaque do Rock. São Paulo. Ed. Ediouro. Março, 2008.
WOLFE, Tom. Radical Chique e o Novo Jornalismo. São Paulo. Companhia das
letras. Fevereiro, 2005.
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12. ANEXOS
Luiz Calanca
- Pode começar
- Você não vai fazer uma pergunta?
- Não, é livre.
- Legal! Eu abri minha loja em 78, e já conhecia a Chave de ouvir falar em casa de
amigos. Eu não tinha o disco, adquiri depois aqui na loja. Eu acho bacana lembrar
dessas bandas do mesmo período da Chave, como O Terço, Casa das Máquinas,
Made in Brazil, Joelho de Porco. Eu vim de uma época em que era difícil conseguir
todos os tipos de disco de bandas. Era complicado achar loja que colocasse de tudo
pra vender. Eu lembro de ter escutado Beatles pela primeira vez e achar que eles
estavam copiando Renato e seus Blues caps. Aliás, quando eu pensei em abri a
minha loja, a Baratos Afins, eu tinha pensado em vender só lps que não pudessem
ser encontrados por aí, ser um lance segmentado mesmo. Temos exemplos de
bandas que tinha um baita potencial, mas que ficava a mercê das lojas ou até das
rádios em tocar o material. Aquela época era difícil mesmo, ms acho que a mídia
focava mais nas coisas daqui do que coisas de fora, bem mais o que hoje.
Atualmente tudo vai pelo ralo, temos mania de valorizar sempre o que vem de fora.
Muitas vezes o referencial era, por exemplo, um músico mais famoso, que
gravou/produziu uma banda que não era do meio. Você chegava a buscar de
alguma forma aquela banda que o artista famoso teve alguma relação, como o caso
do Manito com a Chave. Foi a Chave, né?
- Sim, gravou sax e piano no single.
- Isso mesmo. Naquela época era mais por indicação mesmo, quando não saia em
revistas, jornais, etc. Hoje, graças a Deus, tem a inernet que é capaz de resgatar um
monte de material que nunca foi botado na roda. Esse disco pirata da banda eu só
tenho em mp3, no meu computador. Não tenho uma cópia em cd. Era diferente, por
exemplo, dos anos 80, que muita coisa tocava em rádio ou aparecia em revista. Era
comum, também, ter grandes casas de shows, onde as bandas faziam a via sacra,
passavam por todos os lugares. Até parecia que a música aqui ia decolar mesmo.
As pessoas tinham acesso. Isso meio que morreu. Ah, também é bom lembrar que
não temos mais alguma rádio especializada em rock. Mas a Chave, sem dúvida, era
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uma banda ao nível das outras que eu já havia citado. Muitas vezes até melhor,
sabe? Com peso, e pegada. Sem falar nas letras. Aliás, acho que a banda tinha um
ponto bem positivo de ter um puta letrista, que era o Paulo Leminski, que escrevia
muitas letras da banda. Um ícone da literatura brasileira. Muito legal a tua iniciativa
com esse trabalho. O Brasil foi e é repleto de bandas, mas o pessoal só fica preso a
Mutantes e os que fizeram sucesso. Muitas bandas foram esquecidas, como Os
Incríveis, Jet Blacks , muita banda instrumental, tipo o Jordans, que foram
praticamente esquecidas. O Jordans estão tocando até hoje. Fizemos o show deles
no Sesc Pompéia agora pouco tempo atrás. O legal também é sacar que os outros
países também estão de olho nas nossas bandas, inclusive devem saber muito mais
do que nós mesmos sobre. Inclusive ontem eu postei um som da Chave e um amigo
meu, que conhecia o material da banda, veio conversar sobre as falcilidades dos
músicos hoje em dia. Parece que a música perdeu um pouco da alma, acho que os
µúsicos ficaram todos vagabundos com essas facilidades. Com todo respeito aos
que usam modernidades, mas acho que a música perdeu muito feeling. Sabe?
Então, acho que é válido sempre procurar o que havia no passado e sacar que
desde a música até a produção artística eram mais impactantes do que os de hoje
em dia.
Luiz Sergio Carlini
- Como você conheceu a Chave? Como foi sua convivência com a banda em
Curitiba, ou até aqui em São Paulo?
- Bem, assim. Quando comecei com Rita Lee e Tutti Frutti, talvez a Chave já
existisse. Logo que começamos, a banda com Lee Marcuci, Lucia Turnbul, nosso
bateristas era o Emilson Colantoni, Rita e eu. E de 1973 pra 74, nós fomos pra
estrada pra apresentar o primeiro disco, o Atrás do Porto de Uma Ciade” , e
consequentemente fomos pra Curitiba tocar no teatro Paiol. Tá lá até hoje. Lembro
de estar um frio insuportável e que ficávamos nos aquecendo num aquecedor antes
de entrar no palco. Lembro também de andar com a Chave pra cima e pra baixo
numa Kombi, que era da banda. Foi assim que conheci o Ivo, o Carlão, Paulo
Leminski, Orlando e o Paulinho Teixeira. Lembro também que tinham o próprio
estúdio de ensaio. O legal era que saímos naquela Kombi, a banda toda, pra
passear. Fizemos isso várias vezes quando estávamos lá. Essse foi meu primeiro
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contato com a banda. Uma outra grande oportunidade de encontra-los foi num
festival que aconteceu, o Festival Praia de Lest, no Paraná. Em 1975. A Chave
esteve por lá também, eles tinham acabado de conseguir um equipamento super
foda. Tudo do bom e do melhor. Ficamos amigos, inclusive lembro de uma história
da banda onde nos shows, a plateia arremessava chaves no palco. Muito doido!
Quem me contou isso foi o Orlando! A Chave rolava! Era a banda de rock de
Curitiba, que estava atuando nos anos 60 e 70. Na verdade, por afinidade, talvez, eu
e o Carlão nos tornamos muito amigos. Inclusive temos até uma banda juntos, o
Bartenders. Meu contato era ele! Mas da Chave lembro desse festival e de passear
muito com eles pela noite de Curitiba. Legal! Banda que é o alicerce do rock
nacional, assim como os mutantes da época. Era uma banda de extrema
importância. O embrião do Blindagem, né? É isso, cara!
Luiz Maurício “Miau” Carraro
- Então, Miau! Como você conheceu a Chave?
- Então, era o único grupo de rock que tinha em Curitiba, né?! Não me lembro quem
me apresentou o grupo, mas lembro de ir em todos os shows que eles faziam.
Lembro bem que a sociedade hípica tinha uma boatinha e eles tocavam lá direto.
Lembro do Ivo cantando In-a-gadda-da-vida , com aquele cabelão enorme ele
deitava no chão e a galera ia ao delírio. E com o passar do tempo eu fui convivendo
com a banda através do Helinho Pimentel eu fui ficando amigo deles. Fui ficando
amigo, amigo. Nessa época eu me envolvi com música e cheguei a ensaiar com
eles. Ensaiar, não. A gente passava umas músicas que eu tinha e tal. O final de
semana inteiro. Com o Paulo Leminski, o Ivo, o Paulinho, Orlando, Carlão e o
Helinho Pimentel, que era o agregador dessa galera toda. O João Lopes também
apareceu e participou desse movimento de rock. Eu era apenas o caçulinha do
grupo, um piá de bosta, mas já convivia com essa turma.
- E ela chegou a ter uma boa projeção aqui em Curitiba? Não merecida, mas nessa
época A Chave era muito falada?
- Assim, a galera em Curitiba, os “loucos” eram no máximo, 200 loucos. Todo mundo
se conhecia! E o barato era que ninguém ficava estagnado musicalmente, o pessoal
gostava de coisa nova e não ficavam apenas em Roberto Carlos, Erasmo Carlos e
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Chico Buarque. Essa galera era louca pela Chave, tinha um movimento grande, mas
não envolvia a cidade inteira, né?! Até porque era separada em loucos x caretas. Os
caretas não gostavam da Chave. Os loucos é que gostavam.
- Foi me passado, que na época ou até um pouco antes da Chave, existia Os
Metralhas.
- Os Metralhas, era o seguinte, mais pop. Coisa de rádio! Era um rock bem pop,
junto aos Beatles. A Chave era alternativo, um rock pesado. E sem preocupação.
- Musica autoral, né?!
- Musica autoral, exatamente!
- E você lembra de ter ido em algum show da Chave com alguma banda de fora do
estado?
- Lembro de festivais. Festival de Matinhos, o show da Chave com a Rita Lee e o da
Nina Hagen no estádio do Coxa. Foi muito legal! Eu lembro também de um show da
Chave em Joinville, que estávamos indo pra Barra do Saí, onde a banda estava
hospedada e no meio da estrada a gente parou a Kombi e o Ivo, o João Lopes e o
Belo, um amigo nosso do interior do Paraná saíram correndo atrás de um tatu.
Lógico, o tatu foi mais rápido e eles não tiveram sucesso. Mas enfim, foi uma época
muito legal e produtiva. O Leminski participava muito de processo de criação. Quem
convivia muito com a Chave, eram uma 50 pessoas, que inclusive vivam uma paixão
muito doida. Curtíamos um lance muito bacana.
- Você acha que existe muita diferença entre o processo de criação da Chave e de
bandas do contexto atual?
- Olha, assim, não acompanho muito o processo das bandas de hoje em dia, mas o
pouco que escuto dá pra sacar que um vem com a poesia ou a letra e o outro bem
com arranjo. Trabalham naquilo até ficar numa métrica legal. Naquela época, eu
lembro do Leminski e o Ivo junto e meses depois aquilo virava uma música, sabe?! A
música já vinha junto com a letra. Depois os poemas do Leminski virava, mas no
total era muito instintivo.
Naquela época, Os Metralhas tocavam em rádio, era um lance mais pop, como eu já
te disse. A Chave sempre trazia bandas de fora pra tocar aqui. Era super legal, mas
por outro lado era difícil ver essas bandas levando a Chave pra fora do estado,
sabe?! Não entendia isso. Talvez fosse ciúmes ou medo de que a banda realmente
estourasse. A Chave era foda, cara. O Ivo tinha a melhor voz do Brasil sem dúvida
alguma. Era uma grande potência.
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Gilberto Nogueira
- Então, Giba! O que você tem a falar sobre A Chave?
- O que mais me impressionava nos shows da Chave era a qualidade dos músicos,
mas de cara, mesmo, o que me fez prestar atenção na Chave, foi a guitarra do
Paulinho! Ele tinha uma pegada diferente, o jeito de construir os solos, muito bem
feito. Isso me impressionou! Ah, claro, o peso do baixo do Carlão! Depois eu
descobri o que ele fazia. Ele simplesmente pegava e botava o grave no 10 e o
agudo, no zero. E Pau! Qualidade Marshall, com a válvula, um baixo Fender de
qualidade só podia dar no que deu. Ficava uma “cama” muito boa pro Paulinho
construir solos e pro Ivo cantar. Claro, o Ivo. Ele tinha aquele vocal, aquele visual
típico dos roqueiros da década de 70. Estilo próprio. Os primeiros cabeludos da
história da música. Ali fechou! Bateria do Orlando sensacional e claro, qualidade das
letras. Letras bem bolas. Enfim, todas as qualidades que uma banda de rock tem e
tem que ter. Pena hoje em dia isso ter acabado um pouco, os conceitos são outros!
Judith Vieira Magalhães
- Então, Juju! Pode começar falando como você conheceu a Chave e como foi sua
trajetória com ela.
- Eu conheci a Chave, como eu já te disse, através de um amigo meu, o Billy. Eu
tinha acabado de chegar em Curitiba e estávamos pouco tempo aqui. Eles estava
me apresentando as coisas aqui da cidade, e foi uma surpresa ver a banda. Ele me
apresentou a banda dizendo que eles eram incríveis, que tocavam Rolling Stones,
Led Zeppelin super bem e que o vocalista cantava muito. Não, minto, ele nem
elogiava muito, mas quando vi pela primeira vez a voz do Ivo, realmente a voz dele
era demais. Ninguém tinha uma voz daquela. Nenhuma banda no Brasil tinha uma
voz daquela. Uma pena não ter estourado! Realmente, a guitarra do Paulinho
também era muito boa. O Orlando, naquela época não tinha entrado na banda. Mas
quando entrou, também tinha uma figura muito boa como baterista. Ficou incrível
depois! Mas calma aí, acho que ele não era baterista, né?
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- É, ele era o produtor da banda antes. Quem era o batera era o Gianfranco.
- Ah, você já sabe mais ou menos a história, né?
- Mais ou menos, mais ou menos. Pode continuar.
- Eu esqueço. Eu pensei “pô, poderia ter me perguntado isso há uns 10 anos atrás”
eu diria bem melhor. Então, a meninada era adorada, mexia mesmo. Vou dar um
pulo na história aqui, mas lembrei de como eles eram com o lance de comprar os
equipamentos. Aqueles que conseguiram com o CR Almeida e tal. Eles tinham um
caderninho, tipo uma meta, em que tinham que cumprir pra poder pagar toda a
aparelhagem que foi comprada mas acabou que não deu muito certo. Comecei a
preparar bailes pra poder arrecadar grana pra banda. O legal é que foi um sucesso,
fizemos três. Meu irmão fazia os cartazes, ele era um excelente ilustrador, e logo
depois de pronto eu ia até uma gráfica e já espalhava por tudo. Era muito legal! O
sucesso foi tão grande que o meu quartinho ficava lotado de dinheiro, até debaixo do
meu colchão tinha, pois não tinha nem onde guardar. Era difícil fazer vários assim,
pois eles viajavam bastante. Numa dessas viagens o Ivo deu uma palhinha solo e a
galera foi ao delírio. Na verdade, acho que o Ivo já devia ter começado a fazer isso
antes. Na verdade, achei que ele já iria começar a fazer isso antes do que ele já
tinha começado. Ter a Chave e um lado mais country, sozinho. Mais tarde ele se
juntou com o pessoal do Blindagem e tal. Ele, quando entrou no Blindagem, nem
tinha me falado nada. Fui descobri depois. A Chave meio que estava em crise, eles
já não estavam mais se entendo como banda e o Ivo foi procurar outras pessoas,
acho. O nosso relacionamento também já não estava muito bem. Dizem que depois
dos sete anos vem uma crise no relacionamento, né?! Ou você supera ou acaba.
- Como era a convivência na casa branca?
- Era muito boa. Muita gente, Muita loucura. No começo eu ia lá, encontrava o Ivo a
gente namorava e tal. Mais tarde eu o encontrava nos shows Eles tinham os
horários deles e eu tinha os meus, né?! De vez enquanto a gente combinada de sair,
mas por a casa estar lotada, acabávamos por abortar a ideia. Depois de um tempo
os meninos, Carlão e Orlando, punham uma certa ordem, pois estava começando a
ficar difícil com tanta gente rodando por lá. Era uma coisa Organizada, não era uma
loucura e tal. Por exemplo, quando vinha alguém de fora, algum músico de fora eles
mantinham a ordem. Mas fora isso, não. Era uma coisa que funcionava. Eles eram
sérios, tinham uma rotina de banda e de criação.
- Lembra como era o processo de criação?
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- Lembro de quando a banda foi pra chácara do avô do Carlão ensaiar shows e
trabalhar em novas composições. Eles ficaram três meses lá compondo todas as
músicas que o pessoal conhece. Bem quase todas! Eu ia lá nos finais de semana
junto do meu irmão, o Sam. Levávamos cerveja, galinha, comida. Era bem bacana!
Mas eles era muito sérios no lance da composição. Muito rígidos e centrados naquilo
que queriam.

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