Fechada a cadeado

Transcrição

Fechada a cadeado
Dezesseis meses fora do lar
D
NOTA DO EDITOR
Como este exemplar vem com uma carta à Presidente da
República e algumas críticas à EBC, e como estamos perto das
eleições, a diretoria da SOARMEC considera importante esclarecer
que a Sociedade dos Amigos Ouvintes é apartidária, e lembra, aos
eventuais interessados em fazer uso político dessas matérias, que tanto
o PT quanto o PSDB são responsáveis pelo estado atual da emissora.
Quanto à Empresa Brasil de Comunicação, cabe frisar que
a SOARMEC é a favor de sua existência, pois considera que, em
um país onde meia dúzia de famílias controlam toda a mídia, o
Governo deve, sim, ter sua rede própria de comunicação para
contrabalançar esse oligopólio que monopoliza a audiência. A
discordância da SOARMEC é com o fato de que, para fazer frente a
esse cartel midiático, o governo crie outro – pois não deixa de ser
uma espécie de cartel oficial essa coalizão de todas as emissoras governamentais –, incluindo até as educativas e culturais, como é o
caso da Rádio MEC, o que, como mostramos neste número, tem
efeitos lastimáveis para a radiodifusão educativa-cultural do país.
Ano XIX • Nº 52 • agosto de 2014
I N F O R M AT I V O D A S O C I E D A D E D O S A M I G O S O U V I N T E S D A R Á D I O M E C
Fechada a cadeado
foto: J. Collem
e acordo com a lei do uso, é o grau de utilização de um
órgão que determina sua forma e dimensão. Isso explica
o crescimento, por exemplo, do pescoço da girafa –
alongado pelo esforço de comer as folhas das árvores mais altas
–, e explica, inversamente, porque um órgão não utilizado vai se
atrofiando com o tempo, como é o caso do dedo mínimo do pé humano.
Mas não são só os seres vivos que estão sujeitos à lei do uso: as
coisas, também. Um piano sem uso, também atrofia. E a Rádio MEC
possui cinco, que estão mudos desde 21 de março de 2013.
Isso mesmo, leitor, a rádio já está há todo esse tempo fora do lar.
Isso significa que, além dos pianos, estão fechados e sem uso: o
estúdio sinfônico, o maior do país; os estúdios do 4º andar; o estúdio
de remasterização; o auditório; a discoteca; o acervo; os estúdios de
montagem e transmissão; a oficina técnica; o setor de pesquisa; as
instalações da AM e da FM; e, last but not least, as 4 salas que
sediavam, há 21 anos, a Sociedade dos Amigos Ouvintes, sendo que
duas delas eram ocupadas pelo arquivo de scripts e documentos da
emissora (com mais de 800 itens), e pela Biblioteca Tude de Souza,
única especializada em assuntos radiofônicos.
Isso significa que a cidade perdeu um importantíssimo espaço
cultural. Um espaço que ainda estava livre das injunções comerciais,
no qual músicos, artistas e produtores culturais podiam participar de
programas, gravar ou fazer apresentações ao vivo.
Isso significa também que a Rádio MEC – com a exceção honrosa
da Cultura de São Paulo – passou a funcionar como todas as outras
rádios, que apenas transmitem música mas não a produzem.
Isso significa, em suma, que estamos perdendo a única estação
capaz de emular as grandes emissoras estrangeiras, como a BBC,
por exemplo, e transmitir, de fato, “pela cultura de nossa terra”,
levando a cabo o generoso projeto educativo-cultural de RoquettePinto, que, note-se, jamais foi levado às últimas consequências.
E o pior é que o prédio nem sequer está fechado para obras: está
simplesmente fechado, e ponto. E os responsáveis estão tranquilos,
pois consideram a rádio um inútil elefante branco. Se olhassem com
mais atenção, constatariam que ela é, na verdade, uma girafa
majestosa, acostumada às altas folhas da cultura, que está sendo
obrigada a abaixar a cabeça e engolir o capim da comunicação oficial.
A lei do uso, por fim, também se aplica às palavras, que
tambem podem sofrer uma atrofia de significado. Sendo assim,
até onde o estado atual da Rádio MEC não é o reflexo fiel do mau
uso de palavras como ‘direito’, ‘educação’ e ‘cultura’?
Portão do prédio da Rádio MEC, na Praça da
República, 141-A, que desde março de 2013
está assim. Como a emissora continua no ar,
poucos ouvintes se dão conta do desastre cultural que a perda daquele endereço representa.
Na verdade, a Rádio MEC tornou-se uma ilusão
auditiva, e nunca esteve tão fragilizada.
A sociologia e a antropologia ensinam que as
minorias tendem a desaparecer quando perdem
suas referências. Isso se aplica não somente às
minorias étnicas, como certas tribos indígenas,
mas também às minorias culturais, como é o
caso dos profissionais e apreciadores da música
de concerto, para os quais a Rádio MEC é um
referencial importantíssimo. Quanto tempo
ainda precisa passar para que o endereço perca
a referência e ninguém se lembre mais que ali
funcionou, durante 73 anos, uma usina cultural,
com auditório, sala de concerto e biblioteca
abertos ao público durante toda semana? O
que acontecerá com a mais antiga, mais
espaçosa e mais completa emissora do Brasil?
Neste número
Carta-aberta à Presidente da República ....................................................pg 3
Moção de apoio da UFRJ à Rádio MEC.......................................................pg 4
E a Rádio MEC, hein ? – por Arthur Dapieve ................................................. pg 5
Depoimentos de Fernanda Montenegro, Turibio Santos, Paulinho da Viola,
Hermínio Bello e outros, em defesa da emissora ............................... pgs 4 e 5
Mantenha a Rádio no MEC, ministro! – por Artur da Távola ............................pg 9
Necrológios ............................................................................................pg 11
Alto-falante
OPORTUNO e
bem produzido o
programa do Núcleo de Radiodramaturgia,
sobre o golpe de
1964. Sim, leitor,
depois de muito
vai-e-vem, foi afinal
firmado o convênio
SOARMEC&EBC,
para a produção de
nova série de programas de radioteatro.
ALÉM DAS DEZENAS de demissões noticiadas no último
número, outros bons profissionais deixaram a Rádio
MEC: Elisa de Magalhães, Alessandra Eckstein, Jota
Carlos, Kid, Solange Boeke, Willian Ferraz e Patrícia
Borges. Os locutores da FM permaneceram porque
foram contratados como pessoas jurídicas – um tipo
de pessoa que, como todos sabem, não tem férias nem
direitos trabalhistas.
O REDUZIDO contingente profissional da MEC AM e
da MEC FM, que há mais de um ano trabalha, sem espaço nem silêncio, em uma antiga sala da TVE, é o responsável por manter as duas frequências no ar e manter
também as aparências de que nada de grave está acontecendo com a emissora. A esse punhado de radialistas
que, apesar das dificuldades, tem conseguido não
deixar a peteca eletrônica cair, o nosso aplauso.
MODIFICAÇÃO NO DIAL: o tradicional 98,9 da
MEC FM vai passar a ser 99,3. A mudança está sendo
planejada ainda para 2014.
EBC QUER TORNAR SIGILOSOS alguns de seus
documentos. Segundo a Folha de SP (21/06), a secretaria-executiva da Empresa elaborou norma interna que
prevê sigilo sobre determinados documentos, que seriam classificados como públicos (com acesso permitido), reservados (5 anos de sigilo) ou pessoais (100
anos de sigilo). A norma fez parte da pauta da reunião
da diretoria do dia 20 de junho, mas não foi votada.
A UFRJ TERÁ, finalmente, sua emissora FM. A concessão saiu no início do ano, mas, curiosamente, por
força da lei que criou a Empresa Brasil de Comunicação, a FM da Universidade ficará sob a jurisdição
daquela, ou seja: a universidade está ligada ao Ministério da Educação; mas a sua emissora, à EBC.
CADA HORA DE TV rouba 7 minutos de sono infantil, afirma pesquisa com 1800 crianças, de 6 meses a 8
anos, feita nos EUA. Falta pesquisar quanto tempo de
sono o computador, o celular e seus apêndices roubam
a Morfeu.
2
Assembleia no
Arquivo Nacional
MUDANçAS no Museu do Rádio. Daruiz Paranhos
(direita) é o novo presidente da AERJ (mantenedora do
Museu); e Flavio Cavalcanti Jr, o novo superintendente.
Daruiz – que é do Conselho da ABP – foi diretor de
Marketing da Esso; Vice-presidente de Marketing da
Artplan; e é atualmente Diretor Geral do Grupo Bandeirantes. Flavio foi diretor do SBT, da ABERT e da
Bloch Editores. Saíram: Eugênia Castilho – principal
No dia 31 de outrubro de 2013, a SOARMEC realizou
responsável pela acolhida dada à SOARMEC – e Regisua 7ª assembleia extraordinária, convocada para: 1)
naldo Barbosa, este substituído por Jovenilson Vieira.
completar o seu quadro de diretores – em função do
Tainá Pacheco é a atual secretária-executiva.
falecimento de nossa querida vice-presidente Regina
Salles, e do pedido de exoneração de Gizélia FernanCONFIRMADO: os K7s do arquivo pessoal de Luiz
des, que tantos serviços prestou à Sociedade – e, 2) deCarlos Saroldi, digitalizados por seu filho, Murilo
bater e buscar soluções para o impasse em que a Rádio
Saroldi, e doados ao MIS e à SOARMEC, têm muito
MEC se encontra desde que foi retirada do MEC e,
valor, pois constituem quase tudo o que restou do granprincipalmente, com a interdição do seu tradicional préde e dilapidado (em 2002) acervo da Rádio JB.
dio-sede. Após a apresentação das contas e do relatório
de atividades, a assembleia elegeu, por unanimidade, a
SEGUNDO o livro A vida secreta das plantas, de
professora Nilza Saroldi – viúva do saudoso Luiz CarTompkins&Bird, os vegetais são sencientes, têm emolos Saroldi – para o cargo de Vice-presidente; e Roberto
ções e preferem música erudita ao rock. Ou seja, as
“Betinho” Montero, para o cargo de Diretor de
plantas dos ouvintes da MEC FM são mais felizes.
Patrimônio. Seguiu-se, então, um prolongado debate a
respeito da grave situação em que se encontra a emissora, tendo sido, ao final, criada uma comissão de defesa constituída por Edino Krieger, Guilherme Bauer,
Jocy de Oliveira, Myrian Dauelsberg, Nilza Saroldi, Ricardo Cravo Albin, Ricardo Bruce de Carvalho e
Rozana Lanzelotte. Nos dias subsequentes, além de divulgar a situação da emissora na grande imprensa e
é uma publicação da SOARMEC
nas instituições culturais – universidades, escolas de
Sociedade dos Amigos Ouvintes da Rádio MEC.
música, Academia Brasileira de Música e Academia
De Utilidade Pública Municipal (Lei nº 2464),
Estadual (Lei nº 3048) e Federal (portaria 3935)
Brasileira de Letras –, a comissão investigou a possiPrêmio Estácio de Sá 2002
bilidade de uma ação jurídica capaz de reverter a situCNPJ 40405847/0001-70
Praça da República l4l-A Sala 201 CEP 20211-350
ação. Foi consultado o ilustre advogado Marcelo
Tel: 2508-8295 e 21177857
Cerqueira, que se ofereceu gratuitamente para tratar do
www.soarmec.com.br/amigoouvinte
[email protected] [email protected]
assunto, mas, após um estudo do caso, concluiu ser imEDITOR-RESPONSáVEL: Renato Rocha
possível mover qualquer tipo de ação, pois, apesar da
JORNALISTA-RESPONSáVEL: Érika Franziska
ilegalidade do ato que transfere a emissora para o
PRESIDENTE DE HONRA: Beatriz Roquette-Pinto
DIRETORIA:
SECON, ele foi constitucionalmente consumado em
PRESIDENTE: Carlos Acselrad
1995, tendo já prescrito o tempo legal para qualquer
VICE PRESIDENTE: Nilza Reis
TESOUREIRO: José Oscar Santiago da Costa
medida jurídica. Em face disso, a Comissão decidiu
ATIVID. CULTURAIS: Adriana Ribeiro
escrever e colher assinaturas e apoios à uma carta diCOMUNICAçãO: Sônia Virgínia Moreira
PATRIMôNIO:Roberto Monteiro SECRETáRIO: Renato Rocha
rigida à Presidente da República, Dilma Rousseff, com
COlAbORADOREs:
cópia para o então ministro da Educação, Aloisio MerSECRETáRIA: Renata Mello
cadante – a qual não foi até agora respondida e está
CONTADOR: OSVALDO ROCHA
DIAGRAMAçãO: J.C.Mello
sendo publicada, na íntegra, desta vez como cartaaberta, na página seguinte.
Carta-aberta à Presidente da República
Para a Excelentíssima senhora Dilma Rousseff,
Presidente da República Federativa do brasil,
com cópia para o Excelentíssimo senhor
Aloizio Mercadante, Ministro da Educação
Senhora Presidente:
Nós, abaixo-assinados, artistas, músicos, educadores
e trabalhadores, representantes legítimos dos mais variados segmentos da sociedade brasileira, ouvintes assíduos da Rádio MEC, neste pleito representados pela
Sociedade de Amigos Ouvintes da Rádio MEC, vimos
à presença de Vossa Excelência manifestar a nossa profunda preocupação em relação à situação atual e às
perspectivas do futuro da mais importante emissora radiofônica do Governo Federal, dedicada exclusivamente à Educação e à Cultura.
Essa situação preocupante encontra-se registrada e
tornada pública nos documentos que anexamos à presente, para ciência e consideração de Vossa Excelência, tendo dado, inclusive, origem a uma petição na
internet, que chegou a mais de 20 mil assinaturas.
Fundada em 1923, por Edgard Roquette-Pinto, portanto a mais antiga estação radiofônica do país, foi
doada por seu fundador, em 1936, ao então Ministério
da Educação e Saúde, através de um ato jurídico perfeito, e alcançou um patam ar de excelência que lhe fez
ser referida como “a BBC brasileira”. Mantendo um
grande elenco de contratados, impossível de nomear
aqui, com produtores como Paulo Santos, Ayres de Andrade e Mauricio Quadrio; radioatores como Fernanda
Montenegro, Magalhães Graça e Sergio Viotti; cronistas como Arthur da Távola e Edna Savaget; folcloristas e musicólogos, como Aloysio de Alencar
Pinto e Helza Cameu; e também vários conjuntos musicais, como a Orquestra Sinfônica Nacional, na época
a melhor do país; a Orquestra de Câmara; o Quarteto de
Cordas; o Quinteto de Sopros; Trio de piano, violino e
violoncelo; Coro de Câmara; Conjunto de Música
Antiga e a Orquestra Afro-Brasileira. Esses conjuntos
realizaram dezenas de transmissões e gravações de
música brasileira, que chegaram a ser editadas em LP
pela FUNARTE e foram divulgadas por emissoras de
todo o mundo, contribuindo para o elevado conceito
internacional não só da música como também da radiofonia e da cultura brasileiras.
Era também frequente a presença, nos estúdios, de
grandes personalidades da arte e da literatura como
Francisco Mignone, Radamés Gnattali, Claudio Santoro, Guerra-Peixe, Eleazar de Carvalho, Pixinguinha,
Altamiro Carrilho, H.J.Koellreutter, Manuel Bandeira,
Carlos Drummond de Andrade, Cecília Meireles e
muitos outros, inclusive vindos do exterior.
Vinculada ao Serviço de Radiodifusão Educativa, a
rádio produziu inúmeros programas didáticos e culturais, como as séries Colégio do Ar, Aprenda Alemão
Cantando ou SOS Língua Portuguesa; e séries de literatura e a poesia, a cargo de produtores do quilate de
um Otto Maria Carpeaux ou um Geir Campos.
O processo de declínio da Rádio MEC, então uma
referência no campo da radiofonia cultural e educativa,
iniciou-se com a invasão armada da emissora em 1964,
por prepostos do golpe militar, que, nos anos subsequentes, utilizaram fitas magnéticas que continham
gravações históricas, para registrar discursos políticos,
culminando, em 1981, com a extinção do SRE e, consequentemente, de todos os conjuntos musicais estáveis
da emissora, além da transferência da Orquestra Sinfônica Nacional para a Universidade Federal Fluminense, onde se encontra até hoje.Um novo golpe contra
a Rádio MEC foi seu desligamento do Ministério da
Educação, em 1995.
Esse declínio chega hoje à sua fase mais crítica com
sua vinculação à Empresa Brasileira de Comunicação,
órgão que não tem a Educação e a Cultura entre os seus
objetivos naturais. O fechamento de sua sede, na Praça
da República, onde seu acervo de gravações permanece
praticamente abandonado, e o seu confinamento a um
espaço exíguo, cedido pela TV Brasil, são indícios de
uma situação em estado terminal, com demissões irrevogáveis e feitas de maneira traumática, motivo das
justificadas preocupações dos seus ouvintes e de todos
que militam na área da cultura neste país.
Assim, fundamentados nos preceitos constitucionais
e no exercício pleno da cidadania, conscientes de que
a Rádio MEC é um patrimônio da cultura brasileira e
portanto da sociedade da qual somos legítimos representantes, tomamos a liberdade de propor a Vossa Excelência as seguintes medidas preliminares que, acreditamos, são capazes de reverter o quadro acima
referido.
1. Destinar à EBC canais radiofônicos de FM e AM,
para que desenvolva o seu programa legítimo de órgão
de comunicação oficial.
2. Determinar a restituição da Rádio MEC ao Ministério da Educação, com seus canais atuais de AM e
FM, restabelecendo também o SRE – Serviço de Radiodifusão Educativa. Essa medida corrigirá um erro
administrativo de consequências negativas e ratificará
o ato juridicamente perfeito representado pela doação
de Roquette-Pinto.
3. Determinar, em regime de prioridade, a imediata
elaboração de projeto de reforma do prédio da Rádio
MEC, na Praça da República, e o retorno da emissora
à sua sede própria.
4. Determinar, concluída a reforma da sede e de seu estúdio sinfônico, a reorganização dos grupos musicais
extintos, em especial a orquestra sinfônica e o coro.
5. Determinar ao Ministério da Educação a contratação
ou nomeação de quadros técnicos especializados em
radiodifusão nas áreas técnicas e de produção de programas culturais e educativos.
6. Determinar que seja priorizada na programação das
emissoras FM e AM a difusão da cultura brasileira, devendo a FM dedicar sua programação musical prioritariamente à música clássica, com um terço de obras
de compositores brasileiros e a AM se dedicar prioritariamente à programação de conteúdo educativo e à
música popular, instrumental e folclórica brasileira.
Seria extremamente auspicioso, Senhora Presidente, no
ano em que se comemora o 90º aniversário da radiodifusão brasileira, que o Ministério da Educação recebesse de volta, definitivamente, a Rádio MEC do Rio
de Janeiro. Estamos certos de que tal medida marcará
historicamente o governo de Vossa Excelência, permitindo que a emissora volte a constituir-se, junto com
a TV-Escola, num valioso instrumento para o desenvolvimento da Educação e da Cultura do povo
brasileiro.
Rio de Janeiro, 15 de novembro de 2013
sIGNATÁRIOs DA CARTA À PREsIDENTE
Encabeçada pelo presidente da
SOARMEC, Carlos Acselrad , a carta é
também assinada pelas seguinte personalidades: Edino Krieger, Sergio Sá
Leitão, Ivan Lins, Chico Buarque de
Holanda, Geraldo Azevedo, Fernanda
Montenegro, Venâncio Filho, Nélida
Piñon, Alberto da Costa e Silva, Cícero
Sandroni, Marco Lucchesi, Sergio
Paulo Rouanet, Cleonice Berardinelli,
Tarcísio Padilha, Antonio Carlos
Secchin, Manoel Aranha Correa do
Lago, Ricardo Cravo Albin, Jocy de
Oliveira, Rosana Lanzelotte,
Guilherme Bauer, Carlos Lessa, Muniz
Sodré, Ricardo Tacuchian, André
Cardoso, Ernani Aguiar, Saturnino
Braga, Nilza Saroldi, Myrian
Dauelsberg, Ronaldo Miranda, Cecília
Jucá de Hollanda, Virgínia Flores,
Noemi Flores Renato Rocha e Maria
da Conceição Tavares.
3
4
Anexos à carta
Depoimentos
“Reitero o favor de colocar o meu nome ao lado de todos os que formam a
Sociedade dos Amigos Ouvintes da Radio MEC. Já me pronunciei a favor de
todo esse movimento, inclusive na luta pela volta da emissora para o
Ministério da Educação e que sua sede permaneça na Praça da República.
Fernanda Montenegro
“A Radio MEC sempre foi uma referência na minha carreira e na minha
vida. Por isso, fico espantado com o silêncio oficial sobre seu destino e
sobre os planos do governo para essa instituição, que representa tanto para
a cultura do Brasil. Não posso aceitar o silêncio oficial sobre as dúvidas
que assaltam os funcionários, os artistas e o público em geral. Há uma
questão de respeito aos cidadãos e de deferência a uma arte que levou o
nome do Brasil a todos os continentes e da qual eu me orgulho de fazer
parte. Não estamos em uma republiqueta e o perfil brasileiro precisa do
conteúdo da Rádio MEC, orgulho deste país.”
Turibio Santos
Presidente da Academia Brasileira de Música
“Como ouvinte assíduo e sabedor da importância da Rádio MEC para a
educação e cultura brasileiras quero manifestar minha solidariedade à
SOARMEC, em defesa de interesses maiores que têm feito, esta emissora,
ao longo desses anos, conquistar cada vez mais a admiração e o respeito do
público.”
Paulinho da Viola
“O desmonte da Rádio Mec é um ato de lesa cultura, que deve ser repudiado por todos.”
Herminio Bello de Carvalho
“A Rádio MEC é um patrimônio do povo brasileiro e deve ser preservado.
Todos os governos passarão, porém o autoritarismo aliado a insensibilidade
causa destruição. Nós artistas e acima de tudo brasileiros exigimos uma
atitude honesta.”
Guinga
“Apoio firmemente o retorno da Rádio MEC para o Ministério da Educação
e para o seu endereço no Campo de Santana.”
Jacqueline Laurence
“A Rádio MEC é um veículo educativo e cultural de enorme importância.
Ela é a guardiã de um acervo único, que é um patrimônio da música
brasileira. Fechá-la é um crime cultural.”
Cecília Conde
"Parece-me estar em curso um sucateamento deliberado dos equipametos
culturais geridos pelo Governo Federal. Urge, pois, a mobilização de
setores conscientes da vida pública para denunciar e tentar restaurar o que
se perde em termos de valor. A Rádio MEC é patrimônio nosso".
Muniz Sodré
(continua na página 6)
para a Presidente
5
Quando o uso conserva
(Carta à presidente Dilma Rousseff – continuação dos depoimentos)
“Jogar uma emissora educativa e cultural numa empresa eminentemente noticiosa, e obviamente
política, é condená-la à morte por desimportância,
por abandono e desatenção. Como velho e diário ouvinte da Rádio MEC, passei a temer seriamente que
ela morra antes de mim, o que será um desespero,
uma depressão mortal.”
Roberto saturnino braga
Reafirmo minha integral solidariedade ao movimento
da SOARMEC. Tomo a liberdade de anexar a cópia
da carta que enviei ao Sr. Fernando Moura Peixoto,
filho de um ilustre casal de funcionários da Rádio
MEC, onde demonstro minha dívida espiritual a esta
emissora. Coloco-me ao dispor para qualquer manifestação em defesa da Rádio MEC.
Ricardo Tacuchian, compositor
“A Associação dos Músicos da Orquestra Sinfônica
Naciona da UFF vem manifestar o seu repúdio ao
desmonte da estrutura física, administrativa, educativa, jornalística e cultural da Rádio MEC e solidariza-se com os profissionais demitidos, juntando suas
vozes ao clamor da sociedade brasileira pela manutenção de seus postos de trabalho, onde cumprem o
valoroso e legítimo papel de guardiães do patrimônio
cultural do país. Sede da OSN desde sua fundação,
em 1961, até 1984, a Rádio MEC foi para essa orquestra muito mais do que um local de trabalho, mas
um espaço onde a criação de músicos e compositores
do Brasil reverberou e reverbera numa frequência
ímpar, espaço do qual o país não pode e não deve
prescindir. Pela música do Brasil! Pela existência de
uma rádio para a cultura brasileira!”,
Andrea Ernest Dias, Diretora-presidente da OSN
Uno-me a vocês na luta pela nossa querida Rádio
MEC. A cultura no Brasil está ficando cada vez mais
pobre, isto é inadmissivel!
Sonia Maria Vieira, concertista
“Minha sugestão é que a EBC devolva a Rádio MEC
aos seus gestores originais, escolhidos por RoquettePinto no ato jurídico perfeito de sua doação da Rádio
Sociedade ao Governo Federal. Ele não doou sua
emissora ao DIP, que era a EBC da época, mas ao
Ministério da Educação, com o compromisso de que
a emissora fosse um veículo de difusão exclusiva da
educação e cultura”
Edino Krieger
“Muito me impressiona a forma como o Brasil lida com o
seu patrimônio e acervo cultural. Agora, por exemplo, estamos nos deparando com a falta de verbas para a preservação do acervo da Biblioteca Nacional e com a iminência
e descalabro do desmonte da mais antiga e importante
rádio do Brasil, que possui gravações antológicas de
vários músicos e conjuntos importantes: Karl Richter,
Yasha Heifetz, Paul Tortelier, Conjunto de Música Antiga
da Radio MEC, Orquestra de Câmara da Rádio MEC.... A
Rádio MEC é a emissora mais importante do patrimônio
cultural da cidade do Rio de Janeiro. Desejamos que volte
para o Ministério da Educação, conforme reza o documento de doação idealizado por Roquette-Pinto.”
Jorge Ranevsky
Professor da Escola de Música da UFRJ e Músico
Profissional.
Qualquer tentativa de desmontar este valioso patrimônio,
que é a Radio MEC, torna-se um atentado contra a inteligência daqueles que tanto fizeram pela nossa cultura, como
exemplo, meu pai, Fernando Tude de Souza, e também por
aqueles que hoje acompanham diariamente, sua esplêndida
programação musical.
Fernanda Maria Tude Correa de Araujo
6
Roberto Monteiro
Pequeno e instrutivo resumo do que pode acontecer
com os equipamentos guardados no prédio da Rádio
e os que aguardam inertes no almoxarifado na TV.
Sou solidário aos que comungam com a Rádio MEC.
Espero que vocês obtenham êxito nesta jornada. Sou
do interior do Estado de São Paulo. Já fui radialista e
avalio a importância, principalmente da Radio MEC,
sendo ela a mais antiga. É um absurdo o que pretendem fazer com ela.
Professor berbel
Manifesto meu apoio integral à carta do Maestro
Edino Krieger enviada a EBC em defesa de que a
Rádio MEC volte para o Ministério da Educação.
Prof. Dr. Rodolfo Coelho de souza
Departamento de Música da UsP
Lutar pelo pleno funcionamento da Rádio MEC, dada
sua enorme importância, equivale a lutar pela cultura
brasileira. Como cineasta, como músico, sobretudo
como brasileiro, quero manifestar minha indignação
com o absurdo que está ocorrendo. Espero que as
chamadas “autoridades competentes” estejam à altura
dos cargos que ocupam e tomem as devidas providências para a que a Rádio MEC possa retornar à sua
sede na Praça da República e à esfera do Ministério
da Educação, ou do Ministério da Cultura.
Joaquim Assis
“Escrevo para solicitar que contem comigo para o que estiver ao meu alcance, para evitar esse desastre.”
Rodolfo Caesar, professor da Escola de Música –
UFRJ
“Estou muito triste em saber que a rádio MEC será
fechada, pois essa rádio fez parte da minha infância.
Aprendi a apreciar a programação da rádio com meu
pai, que até hoje escuta, assim como todos que apreciam a música clássica e cultura. Não podem acabar
com essa importante emissora que é parte da nossa
história.”
Mônica Azevedo
Foto JCMello
Estou à disposição de vocês para quaisquer atos em
defesa do patrimônio da Radio MEC, bem como de
sua continuidade, refletindo as intenções originais do
Dr. Roquette Pinto, quando cedeu a emissora ao governo brasileiro para fins culturais.
Fabiano Canosa, produtor cultural e radiofônico
Estúdio B da Rádio MEC em novembro de 2013
O
s equipamentos eletrônicos são bastante tolerantes a grandes variações das condições ambientais. Quando energizados, os equipamentos
bem projetados podem funcionar de forma confiável,
por décadas, se a temperatura permanecer relativamente constante, mesmo se estiverem instalados em
clima quente ou frio. Os equipamentos são auto-aquecidos quando estão energizados, o que tende a eliminar
a umidade e manter a temperatura interna mais constante. Entretanto, os equipamentos eletrônicos que
ficam armazenados por longos períodos, sem energização, são mais propensos a sofrerem danos em consequência das variações ambientais. Quando o equipamento está desenergizado, a umidade pode se infiltrar
em alguns componentes e causar o envelhecimento prematuro. Ocorrências repetidas de variação térmica e
umidade, podem acelerar a deterioração dos componentes eletrônicos; principalmente nas fontes de alimentação que contêm capacitores eletrolíticos, os quais
podem deteriorar-se durante armazenamento por longo
período no estado desenergizado.
Mas isso não é o maior problema. Muitos dos equipamentos comprados, ainda quando eu estava na rádio
(2010) e que chegaram ao longo dos 2 anos seguintes,
sequer foram abertos de suas embalagens originais, que
bem ou mal os protegem das condições citadas, mas invalidam os mesmos quanto aos possíveis defeitos de
fabricação ou mesmo especificações diferentes daquelas constantes dos editais de licitação – pelo tempo
decorrido sem a devida verificação, em consequência
do fechamento da Rádio (pois os técnicos tiveram que
priorizar outras demandas), situação que foi agravada
pela demissão massiva dos colaboradores celetistas.
Longe de Roquette
Renato Rocha
E
star longe de Roquette é estar longe
de Rondon, de Euclides da Cunha, de
Gilberto Freire, de Manoel Bandeira, de
Carlos Drummond, de Villa-Lobos, de
Capanema, de Cecília Meireles, de Humberto Mauro, de Mario de Andrade, de
Anísio Teixeira, de Rodrigo Mello Franco,
de Darcy Ribeiro, de Levy Strauss e tantos outros contemporâneos, amigos e parceiros seus. Negá-los é negar toda uma
percepção e concepção intelectual que
trouxe valores autênticos e propostas culturais importantíssimas para o país.
Ignorância
Quem são os senhores responsáveis
pelo desmonte da Rádio MEC? Grandes
expoentes da radiodifusão? Grandes luminares da história das comunicações?
Grandes especialistas em tecnologias educacionais e culturais? Espíritos sintéticos da magnitude de um John Reith
ou de um Roquette-Pinto? Nada disso.
Os responsáveis pelo estado atual da
emissora – desde Fernando Henrique
Cardoso – são políticos e jornalistas
que ignoram a radiodifusão brasileira e
sua história, ou seja, não fizeram o que
fizeram por mal, mas por ignorância. E
parecem ignorar também que, ao desmontar a mais antiga emissora do Brasil
estão, na verdade, encerrando o mais
belo, longevo e importante capítulo da
saga da nossa radiofonia cultural, e secando os frutos do trabalho de um dos
nossos mais importantes educadores.
Tudo que ele não queria, aconteceu.
A rádio que Roquette criou, formatou
e doou ao MEC, em 1936, acabou, por
ironia, caindo exatamente onde ele não
queria: no Departamento de Imprensa e
Propaganda do nosso tempo, a SECOM.
Seus dirigentes – norteados pela mesma
equivocada avaliação inicial que o ministro Capanema fez, quando pensou em
abrigar a emissora no DIP – parecem não
perceber a total incompatibilidade de
gênios entre a SECON e a Rádio MEC.
Saber é poder, e cultura é poder, certo,
mas ninguém jamais afirmou o contrário. O poder não é um bom produtor
de saber – a não ser daquele saber específico que a experiência do poder
transmite, gerando manuais de como alcançá-lo, exercê-lo e conservá-lo.
Quem foi Roquette
Nilza Saroldi
A absorção das rádios MEC pelo
poder executivo, além de ilegal – pois
ela pertence, de direito, ao MEC – é um
ato ilógico e sem respaldo conceitual.
Cultura é democracia
Se uma das missões da EBC é, precisamente, fortalecer a democracia, como pode a lei que a criou passar por cima do fato de que, assim como deve haver separação de poderes, deve haver,
também, numa democracia, separação
de competências, ou seja, democracia interna? O poder executivo não tem competência natural para dirigir emissoras
culturais, pois não compete ao estado
produzir cultura, mas, sim, propiciar
ambiente para que ela possa acontecer.
Quando vai cair a ficha?
Quando cairá a ficha de que o poder
executivo está executando a Rádio
MEC, e que a lei que criou a EBC inviabiliza a nossa radiodifusão educativacultural? O que se pode entender de seu
art. 4, que diz que os serviços de radiodifusão pública outorgados a entidades da
administração indireta do Poder Executivo serão prestados pela EBC?
A esperança é a última que morre
Em 1936, como se sabe, Roquette
convenceu o ministro Capanema e conseguiu que a rádio fosse para a Educação, e não para o DIP. Em 1942, ele
também lutou e conseguiu preservar o
INCE (ver box abaixo). Tudo que esperamos é que os atuais dirigentes se espelhem na grandeza de Capanema, examinem a questão com humildade e devolvam a emissora para o MEC.
Em 1942, Lourival Fontes, o
manda-chuva do Departamento de
Informação e Propaganda, descontente com a autonomia do INCE –
que fazia filmes culturais e não propagandísticos –, faz redigir um decreto que previa a total incorporação do instituto pelo DIP.
Roquette reagiu, insistindo na
diferença entre doutrinação e educação, e conseguiu manter a autonomia do INCE.
Educador, escritor, médico, antropólogo, etnógrafo, cientista, ecologista
avant la lettre – primeiro a propor uma
política nacional de proteção aos recursos naturais –, Roquette-Pinto foi um
profeta da mídia eletrônica e tornou-se
o nosso maior pioneiro nesse campo,
tendo criado a primeira rádio brasileira,
a primeira rádio-escola, o Instituto do
Cinema Educativo, e foi um dos
primeiros a realizar experiências com
TV no Brasil. Foi um homem que, além
do respeito de seus pares – é várias vezes
citado por Levy Strauss e Gilberto Freire
–, obteve todas as honrarias, comendas
e medalhas de seu tempo. Virou nome
de rua, na Urca; de escola, em Jardim
Nice (SP); de favela, na Avenida Brasil;
de estação de rádio; de planta, Alsophila
Roquettei; de borboletas (Agria Claudia
Roquettei e Roquettia Singularis); e até
de passarinho (Phyloscartes Roquettei).
Cronologia resumida
1884 – nasce no Rio de Janeiro, em 25
de setembro, dia hoje consagrado como
o Dia Nacional do Rádio.
1905 – forma-se em medicina.
1906 – torna-se professor de Antropologia no do Museu Nacional, onde começa
o extenso levantamento de dados sobre a
constituição anatômica, fisiológica e psicológica da população, elaborando um
amplo retrato antropológico do país, por
meio do qual procurou revelar as características raciais formadoras do Brasil.
1910 – organiza a primeira filmoteca
científica brasileira, com material das
expedições de Rondon.
1911 – viagem a Londres, como delegado do Brasil no Congresso das Raças
1912 – faz parte da Missão Rondon e
entra em contato com os índios nambiquaras, que nunca tinham tido contato
com o branco. Foi o primeiro a entrar
com um gravador na Floresta Amazônica (Nozani-na, nossa mais bela
canção indígena, foi colhida por ele).
1915 – torna-se Diretor do Museu Nacional, cargo que ocupa até 1936, realizando um amplo trabalho de
divulgação científica e os primeiros
filmes científicos brasileiros.
1916- 20 – participa do movimento sanitarista que "proclamou a doença como
principal problema do país e maior obstáculo à civilização".
1917 – publica o livro Rondônia, com
o subtítulo Antropologia etnográfica,
clássico da antropologia brasileira. Foi
Roquette quem sugeriu dar àquela
região o nome de Rondônia. Nesse
campo de estudos publicou Ensaios de
Antropologia Brasileira (1933) e Estudos Brasilianos (1941).
1920 – torna-se professor de Fisiologia
na Universidade Nacional do Paraguai.
1923 – funda a Rádio Sociedade do Rio
de Janeiro, com Henrique Morize e outros membros da Academia Brasileira de
Ciências.
1932 – funda a Revista Nacional de
Educação.
1934 – cria a Rádio Educadora, hoje
Rádio Roquette-Pinto.
1936 – doa a Rádio Sociedade do Rio de
Janeiro ao então MES, e funda o Instituto Nacional do Cinema Educativo
(INCE), que dirigiu até 1947. Foi ele
quem fez Humberto Mauro retomar a
carreira de cineasta.
1940 – é eleito diretor do Instituto Indigenista Americano do México.
(Roquette-Pinto foi membro, entre outras associações culturais, nacionais e
estrangeiras, do Instituto Histórico e
Geográfico Brasileiro, da Academia
Brasileira de Ciências, da Sociedade de
Geografia, da Academia Nacional de
Medicina, e da Academia Brasileira de
Letras).
1954 – subitamente, enquanto escrevia
seu artigo semanal para o Jornal do
Brasil, tomba sobre a máquina de escrever e falece.
7
A Empresa Brasil de Comunicação é uma estatal
“Com Pedro l se iniciou, no Brasil, o costume que já é tradição, de haver Constituição para não ser cumprida. Nunca o foi a do
Império, como nunca o foi a da República, e nessa mentira essencial vive a nação brasileira.” Manoel Bonfim, O Brasil nação
Carlos Acselrad
E
m nosso país, onde as praças públicas têm grades, a distinção entre público e privado nunca
foi muito clara. E tornou-se mais obscura,
ainda, a partir dos anos 1990, quando o poder econômico, caracteristicamente burguês e privado, mostrou
ser definitivamente mais poderoso que o poder público.
O nosso setor das comunicações é uma boa vitrine
dessa confusão. Temos empresários que se elegem para
cargos públicos ou que “fazem” ministros; temos
políticos que obtêm concessões e viram empresários
midiáticos, e vários outros exemplos de promiscuidade
entre o público e o privado – sendo um deles oficial: o
partidarismo imposto aos órgãos públicos de comunicação pelos governos que se sucedem.
A EBC e a Constituição
Há, sem dúvida, vários acertos creditados aos responsáveis por sua criação, sendo que a afirmação dos postulados constitucionais é um deles, ou seja, os objetivos da
EBC são os mesmos arrolados na Constituição, o que significa que as emissoras da EBC devem: manter uma programação voltada para a Educação, a Cultura, e a
informação de interesse público; compartilhar com a Sociedade Civil a gestão e a programação; gozar de autonomia frente ao Governo, e contribuir para o fortalecimento
da democracia e da cidadania. Qualquer meio de comunicação, privado ou público, deveria se pautar por essas
disposições; mas, repetindo, isso não se dá – o que é outra
prova do domínio inconteste do poder privado.
O ar é público
A Constituição Federal (art. 21, XII, a) estabelece
que, como o ar é um bem público, qualquer emissora,
ao transmitir um programa, está, antes de tudo, prestando um serviço público. O que não é a mesma coisa
que “ao público” ou “ao seu público”. Só que as empresas privadas – como vaticina a epígrafe acima –
não dão a menor bola para a Lei Máxima. Por outro
lado, as empresas públicas de comunicação também
não cumprem a Carta Magna, pois em nenhum artigo
está escrito que elas devam se colocar à disposição do
governante de plantão – e é isso que aconteceu desde,
pelo menos, o famigerado DIP e, até bem pouco tempo,
com a mal-afamada Radiobrás.
A Radiobrás
A Radiobrás – uma estatal que, de acordo com seu
estatuto, se dizia uma empresa pública – foi criada
pelos militares, em 1975, para centralizar a gestão das
emissoras de rádio e TV da União. Subordinada diretamente à Presidência da República, não tinha a função
precípua de divulgar os atos do governo e preservar a
imagem dos governantes, mas era isso o que ela fazia.
Não há dúvida de que, em relação à Radiobrás, a
EBC avançou bastante em direção ao status de emissora pública. Só o fato de os mandatos do presidente
do país não coincidirem com os mandatos dos dirigentes da EBC já é bastante auspicioso. Se, além disso,
a EBC se auto-atribui a missão pública de dialogar com
a Sociedade Civil, criando um Conselho Curador, uma
Ouvidoria e promovendo Audiências Públicas regulares, tanto melhor. Isso é democrático, sem dúvida,
mas não a torna numa emissora pública – veja box ao
lado, sobre os três modelos de radiodifusão .
8
“O que é bom a gente mostra,
o que é ruim, esconde”
Esse é o lema secreto dos serviços
de comunicação de todos os
governos, de todos os países.
Siga o dinheiro
Para saber se uma emissora é realmente pública,
basta “seguir o dinheiro”, como diria o delator do Watergate. A BBC, o melhor exemplo de emissora
pública em todo o mundo, é sustentada por um imposto pago por todos os usuários da radiodifusão do
país – o que faz com que os ouvintes e telespectadores
sintam-se mais ou menos como acionistas e responsáveis pela existência da emissora. Além disso, esse
dinheiro vai para os cofres de uma fundação responsável pela administração da rede BBC e, importantíssimo, responsável pela escolha dos seus dirigentes.
No caso da EBC, se seguirmos essa pista, vamos ver
que é a própria União quem paga a conta, e também
quem escolhe os seus dirigentes. Ou seja, a EBC não
tem independência financeira nem política, pois, como
se sabe, além de recursos, a estatal depende de uma
série de negociações, acordos, autorizações e beneplácitos do governo, para funcionar.
Conselho, ouvidoria e audiências
É altamente louvável que a EBC disponha de um Conselho Curador, de uma Ouvidoria e que se obrigue a re-
alizar audiências públicas regulares. Tais mecanismos
são fundamentais, mas, como cabe ao presidente da
República escolher e nomear os membros do Conselho
Curador, há sempre o risco de que a decantada autonomia legal da EBC seja prejudicada pelo poder factual
que a Presidência tem de escolher os membros que,
dentro da estatal, ‘ecoariam’ a voz da sociedade civil.
Lembrando Ricúpero
“O que é bom a gente mostra, o que é ruim, esconde”.
Esse é o lema secreto dos serviços de comunicação de
todos os governos, de todos os países. O ex-ministro
Ricúpero perdeu o cargo porque, ingenuamente revelou este inconfessável segredo de estado. Mas, embora o ministro tenha sido removido, o lema continuou
e continua em vigor, mesmo que em latência.
Não há dúvida de que a EBC foi um passo à frente,
mas também não há dúvida de que ela é um apêndice
do poder executivo. Menos que um projeto de radiodifusão, menos que um projeto de comunicação, e muito menos que um projeto de informação cultural e educativa, a EBC é um projeto específico de comunicação
voltado para o poder – o que, repetindo, por si só, inviabiliza, completamente, a radiodifusão educativa-cultural, pois é impossível compatibilizar educação e
cultura com informação oficial. E mais: mesmo que o
governo atual resista ao lema revelado por Ricúpero,
quem garante que futuros governantes não vão tirar da
hibernação o velho uso político dessas emissoras?
Os três modelos de radiodifusão
(definições e características)
1) emissoras comerciais: as que usufruem
da concessão para explorar comercialmente
frequências radiofônicas;
2) emissoras estatais: as que são geridas
por entes da federação ou por entidades
criadas por ente da federação; e,
3) emissoras públicas: aquelas cujo
controle pertence de direito e de fato à
sociedade civil, e não ao governo, nem às
emissoras privadas. A verdadeira emissora
pública é independente do poder econômico
(não visa ao lucro) e do poder político (não
beneficia, nem prejudica o governo, candidatos ou partidos).
Mantenha a Rádio no MEC, Ministro
Artur da Távola
Foto: Rádio Senado
Este texto foi publicado, originalmente, em O Globo,
em 21/04/1982. Escrito pelo famoso jornalista e também locutor e depois produtor da Rádio MEC, o texto
reflete a visão de um profissional que conhece a
história da radiodifusão brasileira, sabe quem foi
Roquette-Pinto, dá o valor devido ao rádio educativocultural, e sabe da importância crucial da Rádio MEC
dentro de todo esse contexto.
N
Máscara Beethoven por Franz Klein
otícias de ontem falam da disposição do Ministro da Educação de passar a Rádio MEC e a
TVE para a Radiobrás. Questões de orçamento
e de organograma, argumenta.
Faço algumas ponderações ao Ministro Ludwig,
começando pelo fim: por favor, ministro, dê-se mais
algumas reflexões antes de decidir pela passagem da
Rádio MEC e da TVE para a Radiobrás. Televisão e
rádio educativos estão mais próximos do Ministério da
Educação que da Radiobrás, por melhores intenções
que tenha essa entidade.
A Rádio MEC é uma estação sui generis. Consegue
ser a única em mais de mil (pasmem!) que mantém um
tipo de programação próprio, modelo para experiências
radiofônicas que as outras emissoras não realizam, obsedadas que vivem pelo problema da audiência. É uma
em mais de mil...
Essa resistência da Rádio MEC ao longo de anos deuse por uma razão: pertencer ao Ministério da Educação.
De alguma forma essa vinculação liga-a com pessoas
da área da cultura que preservam alguns valores da voracidade das modas e das estratégias mercadológicas,
cabíveis nas emissoras comerciais.
Compare-se a programação da Rádio MEC com a da
Rádio Ipanema, que pertence à Radiobrás. O que é
essa emissora (sucessora da Rádio Mauá)? Apenas a
repetidora dos esquemas de programação das emissoras comerciais. Para quê? Para fazer exatamente o
mesmo que mais de mil outras rádios do país, sem
qualquer originalidade ou contribuição cultural.
Bastaria à Rádio Ipanema deixar de fazer o que faz e
realizar programas de aperfeiçoamento de professores
o dia inteiro que estaria sendo muito mais útil ao país
e custando muito menos. [...]
E no terreno da programação infantil? Li uma estatística que dava cerca de 0,05% (menos de um por
cento, portanto) à proporção de programas infantis em
toda a radiofonia nacional. Não é de estarrecer? Pode-
riam ou não as rádios oficiais preparar programação infantil de qualidade, divertindo e preparando a sensibilidade da garotada? Claro que sim. [...]
O que se impõe, Ministro, e talvez esteja latejante
em suas preocupações, é algo mais complexo e profundo do que resolver um problema de organograma
(os organogramas são divisões lógicas da realidade, só
que a realidade não é lógica). O que se impõe e está no
limbo do entendimento do dedicado Ministro é compreender que o país precisa de uma política de rádio
educativo e de TV educativa, consentânea com as necessidades educativas e culturais de nosso povo. Rádio
educativo é assunto sério, profundo, importante. Pode
ser tentado, ampliado, procurado. A rigor, até hoje,
salvo há muitos anos, não foi tentado com profundidade e interesse.
As rádios educativas podem ser centros difusores
de cultura e preparadores da parte “áudio” da educação.
Trabalhos que cresçam aos poucos e cheguem à população e ao magistério são muito mais importantes que
enormes e custosas campanhas colocando o rádio como
a salvação da educação, como se tentou anos atrás com
o Projeto Minerva. Rádio e TV são instrumentos auxiliares de ensino, jamais substitutos do professor ou
da sala de aula.
Organizar uma política de rádio e TV educativos
visando formar quadros para a aplicação de multimeios
em educação (e, assim, multiplicar a possibilidade de
ensinar e a eficácia do processo), só isso já é tarefa para
uma administração bem-intencionada como a do atual
titular da pasta. Isso só pode ser feito pelo Ministério
da Educação, única organização vocacionada para tal.
Jamais pela Radiobrás. As rádios desta é que deveriam
vir para o MEC, pois o país não precisa de seu canal
para realizar outras tarefas na área educativa e cultural.
Ficar virando disco de rock pode ser feito (e é) pelas
mil e tantas outras emissoras do Brasil.
Das rádios da Radiobrás, apenas a Nacional tem
uma destinação cultural importante: a de difundir
música brasileira, embora pouco faça pela música erudita e pela música de segmentos minoritários de nossa
cultura. Mas algo faz, e esse algo é muito no oásis da
utilização educativa do rádio oficial, que, se é público
é do povo e não do governo. Este apenas administra.
No Brasil, quem gostar de ópera, de canto gregoriano,
de música de câmara, de músicos eruditos brasileiros, de
programas especializados em música popular brasileira,
só tem uma emissora: a velha e valente Rádio MEC.
Essa resistência heróica da emissora doada por
Roquette-Pinto ao Ministério da Educação (e só a ele)
só foi possível ao longo de todos esses anos por ser ela
desse Ministério que, mal ou bem, sempre soube manter
alto o lema de seu doador: “pela cultura dos que vivem
em nossa terra, pelo progresso do Brasil”.
“Quem comporá a Apassionata do nosso tempo,
quem removerá as cinzas, despertará a brasa
quem reinventará o amor, as penas de amor,
quem sacudirá os homens do seu torpor?”
Carlos Drummond de Andrade
9
RADIO MEC ASCENSÃO E QUEDA
• 1923 – é criada, por iniciativa de Roquette- • 1964 a 1982
Pinto, a Radio
Sociedade do
Rio de Janeiro,
na Academia
Brasileira de
Ciências, por
acadêmicos e
cidadãos como
sócios e
presidida por
Enrique
Morize.
• 1936 – a rádio é
doada por Roquette-Pinto
ao então MES, cujo
ministro era Gustavo
Capanema, e provoca a
criação do SRE – Serviço
de Radiodifusão
Educativa.
• 1940
– a Rádio
muda-se do sobrado da
Rua da Carioca, 45, para
o prédio do Campo de
Santana.(FOTO
ESTÚDIO CARIOCA)
• 1940 a 64
– Apogeu da rádio, que, em
pleno uso de suas possibilidades, afirma seu
tradicional perfil de qualidade e austeridade, após a
criação do Estúdio Sinfônico (1948) e da OSN
(1959), a única orquestra radio-sinfônica do país.
• 1982 a 1992
– Extinção do CEBRE
que é substituído pela Fundação Roquette-Pinto. A
OSN sai da emissora e fica lotada na UFF, uma
universidade que não ensina música. O sinfônico para
de funcionar e a Rádio passa por maus momentos,
durante os governos de Sarney e de Collor.
• 1992 a 98
– Criação da Sociedade dos
Amigos Ouvintes da Rádio MEC, que: 1) retoma a
realização dos programas ao vivo, com o Ao vivo
entre amigos, apresentado por Luiz Carlos Saroldi, o
que recoloca o auditório do 1º andar na lista dos
endereços culturais da cidade. Ao mesmo tempo,
começa a publicar seu jornal, doa a primeira leva de
equipamentos que, cedidos pela embaixada dos
EUA, permite montar o embrião do novo estúdio de
jornalismo; faz as duas primeiras caixas de Cds
Repertório Rádio MEC; e elabora um projeto para a
aquisição do piano de concerto que irá reacender a
fosforescência do Estúdio Sinfônico. (AO VIVO
COM SAROLDI APRESENTANDO)
• 2002
– Durante o Governo Lula, o
desenraizamento da Rádio
MEC, em vez de ser revertido
foi cristalizado. A Radiobrás
foi extinta e em seu lugar,
criada a EbC – Empresa
brasil de Comunicação.
Com isso, a Rádio MEC, que
era a única estação radiofônica
do MEC, passa a ser mais uma das emissoras da
EBC. Por quanto tempo ela manterá o nome MEC?
Lembremos, antes de responder, que a TVE, por sua
vez, já não existe mais, ou seja, a grife TV Educativa
desapareceu do mapa da radiodifusão carioca.
• 2010/11
– A EBC troca de comando, as
obras pontuais pedidas pela Rádio não são feitas, e
surgem os primeiros prazos para uma reforma completa, que implicaria no esvaziamento total do prédio.
• 2012
– A SOARMEC escreve carta pedindo
explicações a respeito da obra, questionando a
ausência de projeto e a necessidade de evacuar o
prédio, e demonstrando preocupação com o destino
da emissora. Após uma reunião, com o sr. Eduardo
Castro, diretor-administrativo da EBC, no qual essas
apreensões foram reiteradas, a SOARMEC recebe,
em outubro, carta assinada pelo diretor-administrativo, assegurando o retorno da emissora para a
Praça da República, assim que as obras fossem
concluídas.
• 2013
– O prédio da Rádio MEC é
evacuado, não em função das obras, mas por conta de
uma surpreendente interdição, lavrada em 21 de
março de 2013. A emissora passa a funcionar numa
sala improvisada no 2º andar da antiga TVE.
Todos os funcionários contratados pela ACERP são
demitidos, incluindo a maioria dos técnicos de som –
que constituíam a mais experiente e melhor preparada
equipe do rádio carioca.
• 1995
Beatriz Roquette-Pinto no estúdio da Rádio Sociedade
– No início do governo de Fernando
Henrique Cardoso, cujo ministro era Paulo Renato, a
Rádio MEC e a TVE foram “ saídas” do Ministério
da Educação – numa manobra administrativa ilegal,
posto que a doação da radio ao MEC constitui um ato
jurídico perfeito e, como tal, defeso de ser
contraditado. Com a manobra, a rádio foi parar no
colo da Secon, mas tudo feito a toque-de-caixa:
nunca houve o obrigatório informe do inventário de
seus acervos sonoro e iconográfico ao Arquivo
Nacional, e a extinção da Fundação Roquette-Pinto –
sem o parecer obrigatório da Curadoria das
Fundações – e em seu lugar, criada, da noite para o
dia, sem experiência anterior em rádio educativocultural , a malfadada ACERP.
foto: J. Collem
10
– Intervenção na Rádio MEC, destituição de Maria
Yeda Linhares e perseguição dos profissionais
contrários ao regime militar, incluindo reprimendas
ao próprio
Carlos
Drummond de
Andrade,
censura de
músicos e
compositores
da Cortina de
Ferro. Criação
da Radiobrás e
criação do
Centro
Brasileiro de Radiodifusão Educativa, que passa a
administrar conjuntamente a Rádio MEC e a TVE.
Obituários
Victória Delfino dos Santos (1922-13/6/2014)
Marlene, a incomparável, foi um dos maiores
mitos do rádio brasileiro.
Em 1949, um ano após
estrear no programa
Cesar de Alencar, venceu
a cantora mais popular
do país, Emilinha Borba,
no concurso para Rainha
do Rádio – o que deu início à maior rivalidade do
nosso rádio e provocou a
criação dos dois maiores, mais renhidos e longevos fãs-clubes de que se teve
notícia. Seu casamento com o radioator Luiz Delfino, no Outeiro da Glória,
parou a cidade.
Lata d'Água na Cabeça, Zé Marmita, Sapato de Pobre, Que nem Jiló e Mora
na Filosofia são alguns dos principais sucessos dela, uma cantora que gravou
cerca de quatro mil canções. Fez também cinema, teatro e novelas na televisão. De 1987 a 1992, apresentou o programa Marlene Total, ao vivo, no auditório da Rádio MEC. Em 2006, em parceria com a Rádio MEC, um desses
programas, no qual ela entrevista Herivelto Martins, foi transformado em CD
pela SOARMEC.
CAO – Central de Atendimento aos Ouvintes
(1994-2014)
Criada, significativamente, 30 anos após o golpe militar, a Central de Atendimento
foi um dos frutos – e o de mais longevidade – do maior movimento de democracia
interna ocorrido na Rádio MEC. Movido por uma genuína noção de pertencimento
à Casa, o corpo funcional da emissora criou, em 1993, uma Comissão de Funcionários e organizou um evento inédito, que lotou o auditório durante 5 dias, de
manhã e de tarde, para ouvir 27 palestrantes debater questões cruciais do rádio educativo- cultural e buscar soluções para o descaso do governo para com a emissora.
Tal evento – o 1º Encontro de Funcionários da Rádio MEC –, além de um detalhado diagnóstico da situação da emissora, deu origem a duas grandes propostas.
Uma foi a indicação de uma funcionária de carreira, a professora Regina Sales, para
a direção da emissora – o que deu um basta à crônica ciranda de diretores que não
esquentavam lugar (haviam sido 7 nos últimos 5 anos, sem contar os interinos); a
outra foi a criação da Central de Atendimento ao Ouvinte, que, estruturada por Ana
Lúcia Rodrigues, tornou-se, desde então, uma usina de informações preciosas para
os profissionais da casa, lançando luz sobre questões que o IBOPE, por trabalhar só
com estatística, não ilumina.
E, de lá para cá, tornou-se o termômetro de referência para a produção da emissora:
críticas, sugestões, promoções, dúvidas, eram consignadas e tabuladas pela CAO,
o que fornecia um panorama de como o trabalho era recebido. Com a criação da Ouvidoria da EBC, a Empresa entendeu que a Central de Atentimento não era mais
necessária. Com isso, a CAO foi desativada; Patrícia, a última responsável pelo
setor, foi demitida; o telefone 2117-6122 perdeu a referência; e a produção da Rádio
MEC ficou mais longe de seus ouvintes.
Na verdade, tudo não passa da velha mania de centralização de poder. Por essa e
outras medidas, a EBC age como quem quer democracia, sim, mas só até certo
ponto; e não a ponto de tolerar uma CAO existindo ao mesmo tempo que a ouvidoria. É triste constatar o óbito de uma das maiores iniciativas dos radialistas da
MEC – uma verdadeira conquista trabalhista – fruto de um raro momento em que
seus funcionários e profissionais fizeram valer o conceito de que o trabalhador é o
cidadão da empresa.
Humberto Moraes Franceschi (1930-2014)
Ele não era músico, mas nasceu, cresceu e viveu imerso nela. Era neto do
folclorista Mello Moraes e primo mais novo de Vinicius de Moraes. Na casa
de seus pais havia saraus regulares, frequentados por Lucio Rangel, Sergio
Porto, Bororó, Rubem Braga e o próprio Vinícius. Grande fotógrafo e
pesquisador, Franceschi tornou-se também um dos nossos maiores colecionadores de discos 78 rotações. Sua coleção, com mais de 12 mil itens é
importantíssima – foi comprada pelo Instituto Moreira Salles, beneficiada e
transformada em uma série de CDs com gravações raríssimas de Pixinguinha,
Nazareth, e outros – adquirida e doada pela SOARMEC à discoteca da Rádio
MEC. Franceschi é autor dos livros Registros sonoros por meios mecânicos
no Brasil (1984); A Casa Edison e seu tempo (2002) e Samba de sambar do
Estácio (2010). O primeiro desses livros, uma raridade, pode ser consultado
na Biblioteca Tude de Souza.
Setor de Pesquisa da Rádio MEC
(1952, provavelmente, a 2014)
Foi durante a gestão de Carlos Rizzini (195153) que o Setor de Pesquisa da Rádio MEC
passou a existir. O objetivo do Setor era o de
apoiar a programação e contribuir para o desenvolvimento profissional dos produtores.
Nos anos 1970, o Setor teve um papel central
na produção do programa Rádio MEC Responde – a versão da emissora para o Pergunte
ao João, da JB.
A partir dos anos 1990, com a ascensão da internet e a morte das enciclopédias, o Setor foi
sendo paulatinamente abandonado, tanto pela
direção da Rádio (que permitiu sua defasagem Doada pela Soarmec, a porta em jato-de-areia
tecnológica) como pelos próprios produtores. (fechada desde março de 2013 e agora sem seratesta a importância que os Amigos OuO que é de se lamentar, pois o fato de que, hoje ventia)
vintes davam ao setor.
em dia, portais como o Google tenham tornado
a pesquisa uma atividade mais fácil e comum, não torna desnecessária a existência
de um Setor de Pesquisa, mormente no caso de emissoras de caráter educativo e cultural. A SOARMEC chegou a fazer um projeto para revitalizar o Setor – que depois
deu origem ao seu site sobre o rádio educativo –, no sentido de fazê-lo reassumir a
função de apoio à produção, e também o de estruturar um programa de pesquisa
voltado para o desenvolvimento da radiofonia educativa-cultural, analisando todo o
espectro radiofônico mundial para trazer e tabular novos conhecimentos sobre as
grandes campanhas educativas e culturais realizadas atualmente ou no passado. Além
disso – sniff!– a SOARMEC também sempre viu o Setor de Pesquisa como o herdeiro
natural da Biblioteca Tude de Souza, caso a sociedade tivesse que ser extinta –
ameaça que, infelizmente, desde março de 2013, paira sobre ela.
11
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