www O holandês que quer pôr os portugueses a ver TV na Web

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www O holandês que quer pôr os portugueses a ver TV na Web
Digital • Sábado 5 Janeiro 2008 • 11
www
O holandês que quer pôr os
portugueses a ver TV na Web
DR
Dez anos de saltos
sobre o tubarão
Jump the Shark, um ícone
da Internet que entrou
na linguagem corrente,
celebra uma década a
emitir juízos sobre séries
de TV
para o computador).
“Bem-vindo ao século XXI”
Jens Borghardt é dono do TVDirecto, um
agregador para ver TV online em português
Gonçalo Nobre
[email protected]
¬ Ver televisão através da Internet:
“Uma tendência absolutamente imparável”, opina Jens Borghardt, o holandês que criou o site TV Directo, destinado ao público lusófono que queira ver
televisão através da Web. “Os custos (de
produção, de alojamento) estão a descer de ano para ano e não há qualquer
limitação quanto ao número de canais
televisivos que podemos emitir.”
Borghardt criou a Kijkdirect, empresa em Amsterdão que actua na
área da Internet; dela nasceu o portal
Kijkdirect.nl lançado há um ano na
Holanda com uma selecção temática
de canais gratuitos. O passo seguinte
de Borghardt foi criar versões do seu
portal em outras línguas.
Há vinte por esta altura (são disso exemplos o Teledirecto.es, o
Regarddirect.fr ou o Glotzdirekt.de); há
mais de 10 mil utilizadores registados
no total dos sites. A versão portuguesa
TVDirecto
TV Tuga
Sintonizate
acaba de ser lançada (a tradução foi
feita por portugueses – Borghardt não
sabe falar a língua) e está disponível em
TVDirecto.com.pt.
Oferecia, à altura da escrita deste
artigo, um catálogo de 186 canais televisivos gratuitos na Internet provenientes de 14 países – especifique-se:
são 18 canais desportivos, 62 musicais,
49 de entretenimento, 50 noticiosos e
ainda 7 outros canais portugueses (TV
Ciência, Canal Parlamento, ManáSat,
TVnet, MinhoActual, IPV e TVBeja).
Uma selecção que se quer “responsável”: a lista não contempla canais
pornográficos, como muitos portais
do género; Borghardt espera obter lucros sem ter de depender daquela indústria. A programação emitida é inteira responsabilidade de cada canal:
tanto podem ser emissões em directo
como resumos de alguns conteúdos; a
TVdirecto limita-se a oferecer hiperligações numa plataforma uniforme
através de imagens em streaming (ou
seja, sem ser preciso fazer downloads
Outras alternativas
Existem em Portugal
serviços semelhantes ao
TVdirecto, como o Tvtuga
ou o Sintonizate. Lá fora,
os destaques para quem
quer ver televisão na Web
vão para o Joost, o Miro, o
Babelgum ou o Zattoo. E
existe ainda a já célebre
alternativa do YouTube, o
site de partilha de vídeos
online.
O TvTuga e o Sintonizate
funcionam da mesma
maneira do TVdirecto.com.
pt – usam hiperligações
disponibilizadas através
de imagens em streaming.
O Sintonizate, para além
de canais de televisão,
disponibiliza também
estações de rádio e uma
pequena base de jogos de
vídeo.
O Joost é um software
criado pelos fundadores
do Skype e do Kazaa (o
sueco Niklas Zennström
e o dinamarquês Janus
Friis). Requer o download e
instalação do seu software
de vídeo para o computador.
Utiliza tecnologia de
streaming peer-to-peer, o
que na prática significa que
se pode ver o que quiser
quando quiser. Oferece
acima de 20 mil programas
televisivos e mais de 400
canais (MTV e Paramount
incluídos).
Rival assumido do Joost é o
Miro, que utiliza tecnologia
semelhante, e que na sua
própria página inicial se
dedica a explicar por que
motivo “é melhor” do que o
adversário directo: melhor
qualidade vídeo, oferta
de mais de 2500 canais,
possibilidade de download
dos vídeos do YouTube,
e ainda o seu carácter
open-source – o mesmo é
dizer que qualquer pessoa
pode criar e disponibilizar
os seus conteúdos (ao
contrário do Joost).
¬ www.tvtuga.com
¬ www.sintonizate.net
¬ www.joost.com
¬ www.getmiro.com
Canais como a RTP, SIC ou TVI não
estão incluidos na lista. Situação que
Borghardt espera mudar a muito curto prazo: “Os canais SIC de Web TV
estão prontos para serem apresentados. A RTP oferece o RTPMobile e o
RTP Internacional. Apenas necessito
de confirmar se estou em condições de
os emitir. Em caso de dúvida, opto pela
segurança.”
É no tédio que Borghardt encontra
fundamento para a origem do seu site:
“Estava aborrecido: comprei um PC e
liguei-o ao meu LCD da sala de estar.
Encostei-me no sofá com um rato wireless e pensei: ‘Finalmente, Internet
na minha sala de estar; bem-vindo ao
século XXI! Mas não, nenhum website
era adequado ao propósito de ver televisão. Era impossível lê-los. Imaginei:
preciso de um site com poucos botões.
Depois de poucos cliques deveria ser
possível ver ‘qualquer coisa’. Não consegui encontrar um site assim. Por isso
fiz um.”
A ideia não tem pretensões de ser
inovadora (ver caixa), mas Borghardt
espera marcar a diferença: “Quero destacar-me pela boa manutenção (de tal
forma que os canais realmente funcionem), pela simplicidade e transparência”. Outra mais-valia oferecida pelo
TVdirecto passa pela possibilidade do
utilizador, após o registo gratuito, seleccionar os seus canais de preferência
que ficam de imediato definidos como
“favoritos” na página inicial.
Sendo o canal gratuito, as receitas
derivam exclusivamente da publicidade (via anúncios de texto Google): “Se
o número de [espectadores] for grande, poderei ganhar dinheiro com isso.
No entanto, não é preciso tornar-me
milionário.”
E é legal?
Será a televisão online uma séria ameaça à televisão tradicional? “Ainda creio
que a Internet e a televisão se vão unir,
só não sei como e quando. Nessa perspectiva a Web TV pode ser uma ameaça.
Contudo, com conteúdos de qualidade e um orçamento para marketing, as
emissoras tradicionais vão ficar bem.
Por agora, eu acredito que a Web TV seja
um acrescento à televisão tradicional:
adiciona centenas de canais e as pessoas
podem vê-los em diferentes locais.”
Borghardt está ainda a reunir dados
sobre quem vê estes canais, mas à partida aponta os jovens como grupo-alvo:
“Podem estar ligados a um canal musical enquanto fazem os trabalhos de
casa ou estão no messenger”; outros
grupos: “Pessoas que vivem no estrangeiro e querem ver televisão da sua terra
natal ou pessoas no trabalho enquanto o
chefe pensa que estão a trabalhar.”
Mas e serviços como o TV Directo
são legais? “Segundo as minhas informações, esta forma de hiperligação é
permitida”, diz Borghardt. “Apesar disso, caso alguma estação coloque objecções, retiro o canal. Isso ainda nunca
aconteceu.”
¬ www.tvdirecto.com.pt
Pedro Ribeiro
[email protected]
Jon Hein
criou o Jump
the Shark há
dez anos, e
continua a
trabalhar no
site onde se
determinam
os momentos
fatídicos em
que uma série
de TV entra em
decadência
¬ Muito antes de haver Web 2.0, já o site
Jump the Shark recorria à “sabedoria das
multidões” para determinar o momento
em que uma série de televisão atinge o
seu pico de qualidade, e inicia a sua decadência. Foi fundado a 24 de Dezembro de
1997; é um resquício da era de euforia das
“dot-com” que sobreviveu à bolha. Agora
que celebra uma década de existência,
continua a existir, é uma enorme base
de dados sobre a televisão americana, e
o conceito que lhe dá nome entrou para
o léxico da língua inglesa.
Jump the Shark: traduzida à letra, a
expressão significa “saltar o tubarão”. É
uma referência a uma cena particularmente rebuscada da série Happy Days,
exibida nos EUA nos anos 70, em que
uma das personagens, “Fonz”, dá um
salto numa rampa em skis aquáticos sobre um tubarão. Para Jon Hein, a cena
marcou o momento em que Happy Days
perdeu o rumo e iniciou o seu declínio.
Hein pensou que em todas as séries televisivas se pode encontrar um momento
que marca o princípio do fim – um momento em que a série “salta o tubarão”.
E, no final de 1997, Hein fundou o Jump
the Shark.
“Comecei o Jump The Shark porque
sempre gostei de falar sobre televisão e
de debater esses momentos ‘especiais’”,
disse Hein ao Digital. Há muita gente que
também gosta desses debates. O site tornou-se popular, e “saltar o tubarão” entrou no vernáculo.
“Houve dois momentos enormes” para a inserção do conceito “saltar o tubarão” na cultura popular americana. “[A
influente colunista do New York Times]
Maureen Dowd escreveu um artigo de
opinião sobre políticos que ‘saltam o
tubarão’, o que atraiu imensa atenção.
O outro foi quando me tornei um convidado regular do Howard Stern Show
[programa de rádio muito popular nos
EUA]. A expressão acabou por chegar ao
dicionário, e a certa altura já não tinha
que explicar às pessoas o seu significado.
Percebi que tinha inventado o meu próprio ‘catch 22’ [a expressão que dá título
ao livro de Joseph Heller Artigo 22].”
“Saltar o tubarão” tornou-se um fenómeno viral (por exemplo, há um episódio de Ficheiros Secretos com esse nome).
Muitos anglófonos usam a expressão sem
sequer saber ao certo a sua origem.
Hein capitalizou a popularidade do
site escrevendo livros, artigos para sites, fazendo uma parceria com a Rolling
Stone e, em 2007, vendendo o site à TV
Guide (revista americana de televisão).
Continua a escrever no Jump the Shark
– e, diz, “já sei o que vai estar escrito na
minha sepultura”.
¬ www.jumptheshark.com
Versão alargada do artigo e entrevista
com Jon Hein, criador do Jump the
Shark, em digital.publico.pt