Tema desta edição: “Ministrando para Pessoas em Crise”
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Tema desta edição: “Ministrando para Pessoas em Crise”
Nº 06 | Julho | 2011 Tema desta edição: “Ministrando para Pessoas em Crise” • Momentos que demandam uma resposta de púlpito | Richard Dresselhaus | p.04 • Fé de 24 quilates: Tragédia e recuperação na vida do crente | Richard Dobbins | p.08 • Socorrendo os que estão em crise: As primeiras 48 horas | Jay Martin | p.14 • Um modelo de ministério para todos os tempos | Benny Aker | p.19 • Pastores: Chamados para a crise | James Berkley | p.27 • Excelência na oração | George Wood | p.31 • Abstinência de reclamação: Líderes otimistas superam a distância | Scott Hagan p.37 www.enrichmentjournal.ag.org JULHO 2011 | Recursos Espirituais •1 Editorial É com grande satisfação que levamos até você a revista Recursos Espirituais, publicada originalmente pelas Assembleias de Deus dos Estados Unidos, através da Life Publishers International, sob o título Enrichment Journal. Esta edição apresenta reflexões acerca de momentos de crise que, por sua dimensão e alcance, e pela comoção que por vezes ocasionam, requerem do líder uma resposta de púlpito, como é o caso das inesperadas tragédias envolvendo servos fiéis ou jovens dedicados ao Senhor. Momentos estes que demandam do pastor um posicionamento equilibrado para situações de desequilíbrio emocional e sobretudo espiritual. Como enfrentar a tragédia e a busca pelo estabelecimento com uma fé equivalente a ouro 24 quilates? Este número apresenta respostas a esta adversidade, bem como um prisma da crise com base no trinômio choque-tempestadebusca. As 48 horas subsequentes à eclosão de uma crise contemplam tanto a oportunidade quanto o perigo e é, por isso, crucial que a Igreja esteja preparada para uma resposta que elimine o fator de pressão dos envolvidos e os reconduza, ainda que sob pesar, à normalidade da vida. Este número também inclui reflexões sobre a excelência na oração e a importância de um obreiro abster-se das murmurações, dando oportunidade para que o Espírito Santo opere livre e abundantemente sobre a Igreja de Cristo. Nosso desejo é que você seja grandemente abençoado com esta edição. Aprecie sem moderação! márciomatta editor | versão em português Life Publishers International © Copyright Life Publishers 2010 Publicado por Life Publishers, Springfield, Missouri (EUA) Todos os direitos reservados. Agora você pode acessar online Recursos Espirituais em 15 idiomas. Visite o website do Enrichment Journal e tecle na opção desejada. Você será direcionado para, além do inglês, mais quatorze idiomas: português, tcheco, espanhol, francês, alemão, russo, ucraniano, romeno, húngaro, croata, tâmil, bengalês, malaio e hindi. Você terá oportunidade para ler os periódicos online ou pode ainda transferir os arquivos, para sua conveniência. As informações para contato encontram-se no site: www.enrichmentjournal.ag.org Equipe Editorial / V ersão em Português Versão Tradução: Nadja Matta e Lucas do Carmo Revisão de Textos: Martha Jalkauskas e Miriam Estevan Diagramação e Lay-out: ©LMDesign Revisão Final: Neide Carvalho Coordenação Geral: Márcio Matta Entre em contato conosco para obter informações adicionais ou fazer perguntas através do e-mail [email protected] 2 • Recursos Espirituais | JULHO 2011 Quais são os sinais ao longo do caminho que poderiam ajudar o pastor a usar momentos de crise de forma sábia e eficaz? JULHO 2011 | Recursos Espirituais •3 Momentos que demandam uma RESPOSTA DE PÚLPI O Pregando em Tempos de Crise Por RICHARD L. DRESSELHAUS O toque do telefone quebrou o silêncio da noite: "Pastor, houve um terrível acidente de carro." Eu rapidamente me vesti e me dirigi até o hospital, somente para ser saudado pelas novidades de que a garota do departamento de adolescentes já havia falecido e um segundo atrás estava lutando por sua vida. Antes de que uma hora tivesse passado, ela já tinha ido embora. Adolescentes e pais que tinham vindo para compartilhar sua tristeza e tentar encontrar algum consolo para seu pesar encheram o corredor. A atmosfera estava pesada com incredulidade e consternação: "Como isso pode ser?" Sugeri que nos dirigíssemos para uma capela adjacente. O que eu digo? O que eu faço? Enquanto o choque do momento tinha apagado da memória o que eu disse, eu certamente sei que falei hesitantemente sobre a bondade de Deus e a necessidade de depositar nossa confiança nEle. Hesitante como foi, era uma palavra necessária e essencial dos céus falada no meio de 4 • Recursos Espirituais | JULHO 2011 quase que inacreditável quebrantamento, incerteza e medo. Somente 6 meses antes deste acidente os jovens de nossa igreja tinham dito adeus para outro de seus companheiros. Um jovem e corajoso adolescente, depois de meses de luta, finalmente se tornou a vítima de um implacável tumor cerebral. Aqui também estava um momento que demandava uma resposta pastoral – uma palavra da parte de Deus que iria transpor o sofrimento e ajudar ancorar as emoções dispersas. Não era momento para profundas digressões teológicas, mas para alguma coisa do coração do pastor que compartilhou vicariamente a dor daqueles que ele lidera e ama. Seis meses após o acidente de carro, eu me retirava a jato com nosso grupo de viagem retornando de Israel para ser saudado com a novidade de que tínhamos perdido uma quarta garota de nossa juventude... a vítima de um assassinato brutal. Um intruso tinha entrado em casa enquanto sua mãe estava fora e a ultrajado das maneiras as mais horríveis que se possa imaginar. O que nós podemos dizer para o povo de Deus em momentos como este? Como um grupo de adolescentes consegue encarar a perda de quatro companheiros em um período de 18 meses? O que nós podemos dizer para os pais ávidos por respostas? O que nós podemos dizer num culto memorial repleto de colegiais, líderes cívicos, administradores escolares e professores? Estes momentos demandam uma resposta de púlpito. Eu estava me preparando para o dia quando nossa filha anunciou: "Papai, um avião bateu em uma das Torres Gêmeas na cidade de Nova York". Aquele era o começo de uma história que ainda reverbera em toda a nação e em todo o mundo. Então veio o Domingo após 11 de Setembro. Como um pastor poderia permanecer calado ou alheio a tal evento? O povo de Deus se reúne em determinado horário acreditando que irá, e deve, ouvir uma palavra da parte de Deus. Perder este momento é perder uma das grandes oportunidades de demonstrar o poder do Evangelho no crisol da vida. Pessoas têm Momentos que demandam uma Resposta de Púlpito: Pregando em Tempos de Crise se aproximado para ouvir alguma coisa de um outro mundo, uma declaração da eternidade, uma palavra ungida do Trono. Estes momentos demandam uma resposta de púlpito. Haddon Robinson, notável educador e pregador, cunhou a frase "Pregando através da dor". Enquanto ele ilustra o princípio ao observar os tempos em que ele foi para o púlpito em momento de grande dor pessoal, isto também se aplica em um sentido mais amplo e mais congregacional. Dor e pregação normalmente andam juntas, tanto na experiência do pregador como também no coração dos que ouvem. Às vezes eu me pergunto: "Onde Jesus é mais inteiramente encontrado?". Poderia ser que quando encontrarmos a dor também O encontraremos? Ou, de outro modo, é a dor que muitas vezes arromba o coração para ouvir a terna voz do Supremo Pastor? Se isto for verdade, que oportunidade a crise fornece! Isto ocorre quando as pessoas ouvem melhor. O que eu disse no púlpito no Domingo seguinte ao 11 de Setembro não se encontra mais em minha memória, mas eu sei que eu usei o púlpito naquele Domingo para falar sobre o pesar, os medos e as incertezas que todos os americanos sentiam – e para o corpo de Cristo, que deve carregar um profundo senso de responsabilidade e preocupação para os eventos que acarretam consequência para a sociedade em geral. Mas momentos que exigem uma resposta de púlpito vão muito mais além das crises impostas sobre a igreja por forças externas; eles também incluem a agonia da desunião, a dor da discórdia doutrinária, a dor da falha da liderança, o efeito destruidor da conduta pecaminosa e a pressão de insuficiências orçamentárias. Sim, estes também são momentos que exigem uma resposta de púlpito. Quais são os sinais ao longo do caminho que poderiam ajudar o pastor a usar esses momentos sábia e eficazmente? Mensure Cuidadosamente o Mote da Crise Pastores não devem ser alarmistas – nem tampouco minimizar possíveis ramificações. Depois de 11 de Setembro teria sido inapropriado falar de um outro ataque como iminente, mas também nada sábio sugerir que os inimigos de nossa liberdade se contentavam em atacar uma só vez. Quando os números de desemprego se mudam para a casa dos dois dígitos, é impróprio sugerir que irão provavelmente subir muito mais, mas também nada sábio sugerir que nesta vida há qualquer coisa perto de absoluta segurança de emprego. Se descobrirmos que um líder da igreja está vivendo em pecado, não é apropriado sugerir que tal conduta seja galopante, mas também nada sábio sugerir que imperfeições de liderança são consistentemente raras. Esperançosamente, o ponto é este – pastores sábios e eficazes evitarão a armadilha de uma reação exacerbada e a atenuação dos fatos. Ambos os extremos criam desconfiança e resultam em uma falta de credibilidade. A necessidade de uma avaliação precisa é imperativa. A uma igreja que enfrenta crise, seja lá de que proporção for, deve ser permitido enfrentála de forma realística, objetiva, justa e propositada. Isto demanda uma linguagem não inflamada, emoções em cheque e fatos precisos e confiáveis. Crises financeiras são comuns na igreja média. Este é o tempo de informações fatuais e não de retórica infundada. É o tempo para o ensino bíblico sobre o ato de dar e não motivação baseada em culpa. Este é o tempo de encorajamento e esperança, não de vergonha e culpa. Momentos que demandam uma resposta de púlpito requerem equilíbrio, precisão e mensuração cuidadosa das circunstâncias que podem se assomar em tempo de crise. Monitore Deliberadamente seu Envolvimento Emocional O chamado bully pulpit está fora dos limites de atuação do pastor. É inadequado a um ministro usar suas habilidades oratórias e autoridade pelo posto que ocupa a persuadir os ouvintes a abraçarem uma perspectiva somente confinada à opinião e preferência pessoal. Deixe-me ilustrar. Há questões sociais que a Igreja é chamada a enfrentar – legalização de jogos de azar, aborto, crime, tráfico de drogas, violência doméstica e pobreza. Se de um lado um pastor deve ter opiniões pessoais formadas sobre essas questões, é essencial que no púlpito ele lide com elas segundo uma perspectiva bíblica. As pessoas precisam ouvir a Palavra do Senhor e não meramente a opinião de um pastor. Billy Graham fala em separação entre o pregador e a mensagem. Afirma que às vezes ele se sente como se ele estivesse de pé e observando a partir de um outro lado o que está acontecendo na pregação da mensagem. Este é um entendimento saudável e correto. A mensagem tem vida própria. É a Palavra do Senhor. Ela se basta. Supostamente, há um sentido em que mensagem e mensageiro se fundem, mas nunca para diminuir a solidariedade e a independência da mensagem. Esta é a Palavra do Senhor. O ponto: quando um pastor cede ao impulso das emoções pessoais em detrimento da objetividade, do equilíbrio e da imparcialidade, a crise que deveria se tornar uma ocasião para desafio e ministério eficaz se torna, em vez disso, em ocasião para perdurar a mágoa e a dor. Apesar de nosso Senhor envolver Sua mensagem em carJULHO 2011 | Recursos Espirituais •5 ne humana, permanece sob a responsabilidade do pastor entregar a Palavra como ela é – clara, ungida, autêntica. AS PERGUNTAS "POR QUÊ?" Estas são as perguntas sempre presentes. "Por que isto está acontecendo?"; "Por que eu?"; "Por que isto aconteceu agora?". Aqui está uma lista com possíveis porquês: • Cada um de nós faz parte de uma raça decaída. Ninguém está imune às suas consequências. • Nunca conseguimos entender completamente os caminhos de Deus. Seus caminhos estão muito acima dos nossos. • Deus usa o que Ele não pode causar, por isso aprendemos a confiar. • Porque o nosso pertencer aqui deve permanecer experimental. A vida do projeto perfeito de Deus nos aguarda na eternidade. Aqui estão advertências sobre os porquês: • As pessoas feridas precisam de uma presença amorosa. Ficar ao lado de pessoas feridas tem mais poder do que palavras. • Aceitar o fato de que não há respostas fáceis. Deus, sendo Deus, escolheu não explicar tudo o que Ele faz ou permite que seja feito. • Confiança é sempre a cobiçada resposta para a crise. Tendo feito tudo, permanecer. • Ficar de olho no eterno. AquEle que vê a todos, como agora, reserva uma perspectiva na qual podemos confiar. — RICHARDL. DRESSELHAUS, D.MIN. 6 • Recursos Espirituais | JULHO 2011 Proteção Contra Inferências Personalizadas A trágica história aqui vai: A igreja estava em crise e o pastor utilizou o púlpito para dar vazão à sua zanga, desgosto e agressividade. Embora não citasse nomes, era claro a quem a referência se dirigia. O resultado foi catastrófico. Sim, há momentos que exigem uma resposta de púlpito, mas como isto é feito é de extrema importância. Anos atrás, a igreja que eu pastoreava enfrentou uma crise devastadora. Um pequeno grupo de membros havia se tornado insatisfeito com a liderança da igreja, incluindo ambos a diretoria e o pastor. Esse grupo expressou e fez circular seu descontentamento por meio de uma enxurrada de cartas anônimas – enviadas indiscriminadamente para membros e não-membros. O resultado foi o mais desconcertante. Como pastor eu me senti pessoalmente atacado. O conteúdo das cartas anônimas era insultante e ofensivo. Como eu deveria responder? Quando a disciplina da igreja se faz necessária? E que forma ela pode ter? Em meio à crise, o Senhor colocou dentro do meu coração que: Se você quer lutar nesta batalha, vá em frente, se você quer que Eu lute, Eu lutarei. A escolha foi fácil – e eu deixei que o Senhor apresentasse uma solução que eu jamais teria imaginado. Levou cerca de um ano e meio, mas finalmente a crise se dissipou e a igreja adentrou um período de unidade e paz. Como esta história direciona o assunto diante de nós? Simplesmente isso. Às vezes, a resposta do púlpito para a crise é simplesmente pregar a Palavra semana após semana, permitindo que o Espírito Santo faça a Sua parte como uma agência de correção específica e reconhecível. Durante todos aqueles meses, eu fui muitas vezes tentado a falar sobre a questão diretamente; às vezes esse é o caminho certo a seguir. Neste caso, entretanto, o Senhor levou a me concentrar na pregação da Palavra e permitir que o Espírito agisse como a agência de correção. Se eu tivesse personalizado a crise e conduzido o público com minhas mágoas e inseguranças, duvido que o resultado teria sido positivo. O que ocorreria se eu tivesse singularizado as pessoas por inferência? E se eu tivesse permitido que minha zanga tomasse expressão? E se eu tivesse cedido ao conselho de alguns para tratar disso a partir do púlpito? Sim, há momentos que exigem uma resposta de púlpito, mas, algumas vezes, esta resposta é a exposição simples, clara e equilibrada da Palavra de Deus. Evite Politizar Desafios Sociais Um reconhecido senso de relevância caracteriza a vida e a mensagem de uma igreja vibrante. Esta igreja ousa discutir as questões que confrontam a cultura da qual faz parte. A lista de questões que terá que enfrentar é quase ilimitada: aborto, crime, casamento entre mesmo sexo, divórcio, tráfico de drogas e corrupção na liderança cívica. Mas como? Há um princípio que deve orientar a igreja. A igreja deve contextualizar os desafios da sociedade dentro da Palavra de Deus. Isto é, deixar que o apelo seja baseado somente no ensino da Palavra de Deus. Partidos políticos, grupos de interesses especiais, endosso de candidatos – estes são assuntos a serem tratados pessoalmente – não pertencem ao púlpito, que deve ser reservado para o "assim diz o SENHOR". A história da Igreja está repleta de narrativas de ministros que se torna- Momentos que demandam uma Resposta de Púlpito: Pregando em Tempos de Crise ram ativistas políticos mais do que pregadores da Palavra de Deus. O que tipicamente se segue é uma perda de foco bíblico e compromisso de missão. Temos ouvido isto repetidas vezes: "O pastor se tornou muito político". Novamente, o trabalho da igreja é o de desafiar a sociedade, mas deve fazê-lo através da proclamação fiel da Palavra de Deus. Ela fala poderosamente aos problemas sociais a confrontarem a igreja. Estes ainda são momentos que exigem uma resposta de púlpito. Aprenda a Ouvir do Banco Seria ótimo se todo ministro pudesse se tornar uma parte da congregação, tempo suficiente para descobrir como as coisas soam para quem está no banco. Mais de uma vez alguém me corrigiu por algo que eu dissera no púlpito e não revelado corretamente. Enquanto tal passo em falso é tipicamente acidental, os pastores precisam tomar cuidado para garantir que o que dizem do púlpito é apropriado para as pessoas que se encontram no banco da igreja. Lembro-me de ouvir um palestrante de renome nacional que usava histórias que não eram adequadas. Ele não conseguiu manter em mente a que ele se referia. Pregadores podem ser tentados a usar sua posição de autoridade associada à capacidade de oratória para cruzar a linha e trazer insulto para as pessoas presentes no banco da igreja. Algumas práticas têm maior capacidade de criar desunião na igreja do que isso. "Como ele poderia dizer uma coisa dessas?"; "O comentário improvisado do pastor foi lamentavelmente inadequado". Karl Barth fala do sermão como um evento. Deus vem ao Seu povo através da Sua Palavra. Alguma coisa grandiosa está acontecendo. Deus está transformando vidas. O eterno visitou o temporal. O céu está tocando a terra. Quão trágico é se um maneirismo descuidado e um discurso simplista do pregador macular a majestade de um momento como esse. Minha oração pessoal é: "Senhor, o inimigo buscará roubar o ouvinte de escutar a Palavra de Deus, mas, por favor, Senhor, ajude-me a não atrapalhar seu ouvir por causa de meus maneirismos peculiares, descuido no discurso ou outras formas de insensatez". A trombeta da verdade deve soar com clareza, precisão e verdade. Tudo contribui para estragar o momento em que o púlpito deve falar com poder. Abstenha-se de Usar Culpa como Motivação Apenas uma palavra sobre o berço teológico que pode conter uma igreja firme em tempos de crise... o tipo de consciência que permitirá ao pastor falar com eficácia a uma congregação em tempos de grande dor e mágoa. A rede de alimentos McDonald's criou um mito através do qual comercializa seus produtos. Isto é, uma percepção, algo que vem imediatamente à mente quando o nome McDonald's é falado. O mesmo é verdade para qualquer empresa que detém a sua participação no mercado. O mesmo é verdadeiro em relação a uma igreja. Ela tem um mito – uma percepção – que desenvolveu ao longo do tempo. Pergunte a um não participante sobre a igreja da esquina e você provavelmente terá uma descrição do mito ou a percepção daquela igreja: "Oh, eles ajudam a nossa comunidade" ou "Eu nunca ouvi nada sobre aquela igreja". Respostas como essas expõem a forma como uma comunidade sente determinada igreja. Um dos elementos-chave no desenvolvimento de um mito bíblico e positivo para uma igreja é ter a certeza de que a atmosfera da igreja está revestida de um sentido profundo da graça de Deus. A graça é convidativa. Graça é transferência de vida. A graça é libertadora. A graça é o favor de Deus expresso ao Seu povo. Uma igreja saturada com este entendimento será saudável em sua vida interior e eficaz em sua ação social. Um forte foco na graça está em oposição a uma ênfase desequilibrada na lei. Enquanto as leis de Deus são imutáveis e certas, é a graça que lhes dá uma aplicação de ternura e misericórdia. Uma igreja equilibrada pesadamente sobre a lei tende a ser julgadora e exigente. Uma igreja equilibrada pesadamente sobre a graça será aceitadora, convidativa e engajada com um mundo ferido. A motivação baseada na lei recorre à culpa. É ameaçadora e severa. As pessoas se tornam instáveis e muitas vezes hostis. Acentuam diferenças e traçam linhas de divisão. O resultado é frequentemente catastrófico. Esta igreja viverá em crise. Sim, há momentos que exigem uma resposta do púlpito – uma palavra que ressoe com um profundo sentido de amor e graça de Deus. Esses momentos de crise se tornam convites para proclamar a Palavra de forma tal que traga a paz onde havia conflitos, a compreensão onde havia confusão, esperança onde havia desespero, conforto onde havia tristeza e vida onde havia morte. Estes são os momentos que exigem uma resposta de púlpito. RICHARD L. DRESSELHAUS, D.MIN. Presidente de Convenção Estadual e ex-pastor-presidente da First Assembly of God, em San Diego, Califórnia (EUA). JULHO 2011 | Recursos Espirituais •7 8 • Recursos Espirituais | JULHO 2011 Fé de 24 Quilates: Tragédia e Recuperação na Vida do Crente Reconhecendo que a tragédia pode levá lo a criar levá-lo o fundamento espiritual para enfrentá la com enfrentá-la “fé de 24 quilates”. Por RICHARD D. DOBBINS O ouro sempre foi uma mercadoria preciosa. Sua raridade estabelece o seu valor. Goldsmiths estima que em todas as refinarias da história humana tenhase refinado cerca de apenas 100.000 toneladas de ouro. Toda vez que você compra ouro, independentemente de onde você esteja, isso exige um preço alto... especialmente o ouro de 24 quilates. Nesta forma mais pura encontra-se um metal muito macio. O quilate do ouro indica quantas ligas o joalheiro misturou para enrijecê-lo. Por exemplo, apenas um pouco mais da metade de joias de 14 quilates de ouro é, de fato, ouro. Quando 24 quilates são carimbados em uma barra, você sabe que ela foi feita de ouro puro. Para a produção de ouro puro, as fundições devem aquecer o minério durante o processo de fundição a 5252°F. Como você pode ver, o ouro puro nunca sai barato, nem tampouco a fé de 24 quilates. Como o ouro, fé de 24 quilates é refinada no fogo. Portanto, uma vez refinada, sua fé é mais valiosa do que ouro de 24 quilates. O Que É Fé de 24 Quilates? Aqui está a definição de Pedro sobre a fé de 24 quilates: "Na qual exultais, embora agora por um pouco você possa ter tido de sofrer a dor em todos os tipos de provações. Estes vieram de modo que sua fé – de maior valor do que o ouro, que perece mesmo embora refinado pelo fogo – possa ser genuína e possa resultar em louvor, glória e honra quando Jesus Cristo for revelado." (1Pe 1:6,7). Quando Cristo falou à igreja de Laodiceia, aconselhou-a a comprar dele "ouro provado no fogo" (Ap 3:18). A natureza morna de sua fé davaLhe náuseas. Ele ansiava para que ela tivesse uma fé fervorosa e capaz de ajudá-la a suportar as provações que os primeiros cristãos enfrentaram. JULHO 2011 | Recursos Espirituais •9 Fé de 24 Quilates Quilates: Tragédia e Recuperação na Vida de um Crente Os Crentes Não Estão Imunes às Tragédias da Vida Em meu trabalho eu tenho precisado muitas vezes lembrar meus pacientes que, como crentes, não estamos imunes a provações e a tragédias. Deus quer usar esses testes para do mundo (Jó 1:8), quando a calamidade sobre ele recaiu, seus amigos estavam certos de que ele tinha falhado com Deus de alguma forma. Além disso, ao perder Jó sua riqueza, seus rebanhos e manadas, sua família e sua saúde, o conselho Uma vida cristã disciplinada nem sempre protege uma pessoa da tragédia. produzir em nós uma fé mais preciosa que o ouro... uma fé que, refinada no fogo, é capaz de suportar o calor da adversidade. Hoje, alguns ensinadores dizem aos crentes que, se eles obedecem a Palavra de Deus, Deus irá protegêlos de todas as experiências dolorosas da vida. Eles, então, nunca ficarão doentes. Ou, se ficarem, Deus sempre irá curá-los. (Quando não são curados, esses ensinadores dizem que eles não têm fé suficiente. Se eles tivessem mais fé, Deus os curaria.) Dizem que eles sempre irão prosperar financeiramente. Que nunca terão que passar por dificuldades relacionadas a desemprego. Deus irá milagrosamente fornecer algum tipo de guarda-chuva divino para protegê-los de acidentes aéreos, acidentes de carro, terremotos, epidemias, inundações, tsunamis. A maioria das pessoas que acredita neste tipo de ensino tem dificuldade para lidar com as realidades da vida quando elas lhes sobrevêm. A esposa de Jó e seus amigos acreditavam neste tipo de protecionismo divino. Muito embora Deus declarasse ser Jó a pessoa mais justa 10 • Recursos Espirituais | JULHO 2011 de sua esposa foi para "blasfemar Deus e morrer" (Jó 2:9). No entanto, através de todas as coisas trágicas que lhe sobrevieram, Jó permaneceu fiel a Deus insistindo "... ele sabe o caminho que eu tomo, quando ele testar-me, surgirei como o ouro" (Jó 23:10). Jó tinha fé de 24 quilates. As Tempestades da Vida Testam Todos Às vezes, a má escolha de uma amizade ocasiona a crise que a traz até você. Mau comportamento sexual, fumo, má gestão financeira e condução negligente são algumas poucas escolhas ruins que uma pessoa faz que podem acarretar desastre. Entretanto, uma vida cristã disciplinada nem sempre protege uma pessoa da tragédia. As Vida nos Trata de Forma Muito Semelhante Jesus concluiu Seu Sermão do Monte com uma ilustração que aponta o fato de que crentes poderiam experimentar as tempestades da vida (Mt 7:24-27). Dois homens construíram casas idênticas. Jesus disse aos Seus ouvintes que as mesmas coisas que aconteceram com uma das casas também aconteceu com a outra. Desceu a chuva, os ventos sopraram e investiram contra ambas. Uma entrou em colapso sob o peso destas tragédias naturais. A outra se manteve firme. Muito embora um homem obedeça a tudo o que Jesus ensinou, Deus não o protege das tempestades da vida. Muita coisa que acontece aos incrédulos e aos crentes desobedientes também acontecem aos crentes obedientes. Cristãos exemplares morrem de males fatais. Seus filhos têm problemas mentais e/ou físicos ao nascer. Crentes fiéis perdem seus empregos. Incêndios ou inundações destroem seus lares. São vítimas de acidentes trágicos ao viajarem. Seus cônjuges os forçam a aceitar divórcios indesejados. Perdem seus empregos em função de crises econômicas. O entendimento de que tragédia pode lhe sobrevir cria o fundamento espiritual para enfrentá-la com fé de 24 quilates. Algumas Vezes Nós Sofremos por Nossos Próprios Julgamentos Frágeis Pessoas cujas decisões frágeis resultam em suas próprias tragédias precisam de ajuda para lidar com a culpa e o arrependimento. Pedir e receber o perdão de Deus para este comportamento irresponsável é o primeiro passo rumo à recuperação. O segundo passo é ajudá-las a perdoar a si mesmas, o que muitas vezes é mais difícil para elas do que receber o perdão de Deus. Às vezes, todos nós gostaríamos de desfazer e refazer a vida. Muitas pessoas perdem horas preciosas se perguntando como poderiam ter Fé de 24 Quilates Quilates: Tragédia e Recuperação na Vida de um Crente evitado o que aconteceu. Isso geralmente resulta na prática dolorosa e inútil de culpar a si mesmas enquanto ruminam sobre o que iria, deveria ou poderia ter feito para que as coisas fossem diferentes. Ao ajudar as pessoas a romperem este ciclo sem esperança, é importante lembrá-las que todos nós temos uma margem de erro. Embora o nosso objetivo devesse ser reduzir esta margem, nenhum de nós é perfeito. Mesmo o apóstolo Paulo tomou decisões trágicas. Entre outras coisas, ele aprisionou cristãos e expôs muitos deles à morte. Como ele lidou com toda esta culpa e arrependimento? Com o tempo, ele escolheu esquecer todas essas coisas (Fp 3:12-14). Precisamos lembrar às pessoas que, se permitirmos, o Diabo irá usar os julgamentos frágeis do nosso passado para destruir o potencial de nosso futuro. Não podemos desfazer ou refazer a vida. Buscamos o perdão de Deus. Nós nos perdoamos. E vamos em frente. Tragédias Geram Crises Uma crise é um momento perigoso: uma situação ou período em que as coisas estão incertas, difíceis e dolorosas. Alguns se veem através da crise como pessoas amargas e alguns como pessoas melhores. A diferença entre estas duas palavras no inglês é apenas uma letra (bitter e better), o "e", As escolhas que eu faço à medida que atravesso a crise determinam se ela irá me fazer amargo ou melhor. Ao ajudar as pessoas a lidarem com crises, lembre-se que elas conseguem lidar com certeza desagradável mais facilmente do que com a incerteza. Assim, independentemente do quão dolorosas sejam as circunstâncias, ajude a pessoa a enfrentá-las com honestidade. Às vezes, na tentativa de sermos compassivos, tentamos proteger as pessoas da dor que elas gerenciam melhor no início da crise do que mais tarde. Muitas vezes, durante as primeiras horas e dias após a eclosão de uma crise, as pessoas tendem a estar preocupadas com a tentativa de descobrir por que isso aconteceu. Ten- tar responder essa pergunta para as pessoas é provavelmente agravar a sua recuperação. É mais saudável admitir: "Eu simplesmente não sei". Ao passar por crises com as pessoas, você irá observar que elas se movem através de quatro estágios: choque, tempestade, busca e sequela. Choque Inicialmente, a pessoa não consegue entender a realidade do que aconteceu. Felizmente, Deus criou a men- Conscientize aqueles que buscam a sua ajuda de que não existe vida sem dor. JULHO 2011 | Recursos Espirituais • 11 Fé de 24 Quilates Quilates: Tragédia e Recuperação na Vida de um Crente te para temporariamente desligar-se quando oprimida pela tragédia. As pessoas pensam e às vezes dizem: "Eu não posso acreditar que isso esteja acontecendo". "Isto é apenas um sonho ruim". "Mais cedo ou mais tarde eu vou acordar e descobrir que isto não é verdade". Outras pessoas podem reagir chorando alto, com fúria, com raiva ou recolhida ao silêncio... às vezes por horas. A fase de choque da recuperação da crise dura horas, dias ou até mais. Guerras e desastres naturais podem prolongar a fase de choque por semanas ou mesmo por meses. Durante esse tempo o ministério precisa se concentrar na compaixão e no apoio espiritual. Resistir aos esforços para explicar por que Deus permitiu que esta tragédia acontecesse. Tais esforços só irão alienar a pessoa de você. rependimento. A depressão também esgota a energia mental à medida que ela absorve o choque de sua crise. Durante este tempo, ela precisa procurar seu pastor ou um conselheiro cristão regularmente. Pode também precisar de medicação para ajudar neste tempo difícil. Às vezes, amigos e entes queridos ficam impacientes com a duração da tempestade. O tempo de recuperação normal para uma crise grave, no en- chego aqui hoje. Um louco idiota me fechou no caminho. Por um triz eu não o pego". Ao contar a história, você reduz a sua ansiedade. Pesquisa À medida que a resposta emocional de uma pessoa para a crise se assenta, começa a etapa mais importante do processo de recuperação. Durante os meses que se seguem, ela irá compor uma história sobre a crise que a deixa uma pessoa amarga ou uma pessoa melhor. Sobretudo, nenhum de nós vive com os fatos de nossas vidas. Vivemos com a história que contamos a nós mesmos sobre os fatos de nossas vidas. Vemos isso nas muitas diferentes maneiras que crianças crescidas na mesma família recordam sua história. Nós não podemos mudar os fatos de nossas vidas. Felizmente podemos editar a história que contamos a nós mesmos sobre os fatos de nossas vidas. Para os crentes, chamamos essas histórias que contamos a nós mesmos sobre as tragédias da vida de teodiceias. A teodiceia é uma explicação teológica dos acontecimentos da vida. Durante um período de tempo, conversando com Deus e conosco mesmo, chegamos a uma versão desta história com a qual escolhemos viver. O papel do pastor ou conselheiro cristão durante este período de recuperação é crítico. Nossa tarefa é assistir a pessoa que procura a nossa ajuda a entender que o caminho que O Senhor tem uma diversidade de maneiras criativas que Ele quer que a pessoa veja nas tragédias. Tempestade À medida que uma pessoa começa a se recuperar do choque e a lidar com a realidade, suas emoções irrompem de formas imprevisíveis. Às vezes, ela pode se sentir culpada por maneiras que acredita que possam ter contribuído para o seu dilema. Em outros momentos ela pode ser invadida pelo seu medo do futuro. Ela pode exibir raiva intensa por outros que ela culpa pela sua situação. Mostras de turbulência emocional podem se estender por várias semanas ou meses. Uma pessoa pode cair em depressão profunda expressa por tristeza avassaladora, remorso e ar12 • Recursos Espirituais | JULHO 2011 tanto, é de 1 a 2 anos. Em casos de perda severa, onde os acidentes estranhos ou a violência tomou um ente querido, a recuperação pode exigir de 3 a 5 anos. Em tais casos, a vida nunca mais será a mesma outra vez... mas pode ser boa novamente. Uma forma de a pessoa facilitar a sua recuperação é processando mentalmente a crise ao recontar sua história. Isso pode fazê-la se tornar cansativa para familiares e pessoas próximas. O que realmente não ajuda no processo de recuperação, no entanto, é dizer à pessoa: "Supere isso". Por exemplo, suponha que a caminho da casa de um amigo alguém lhe dá uma fechada à sua frente e você por pouco escapa de uma colisão. Qual é a probabilidade de você não falar a respeito disso para o seu amigo ao chegar em sua casa? Uma das primeiras coisas que você provavelmente diz é: "Quase que eu não Fé de 24 Quilates Quilates: Tragédia e Recuperação na Vida de um Crente ela escolheu para falar a si mesma sobre estes capítulos dolorosos não é a única versão dos fatos. Ela pode contar uma história diferente para si mesma sobre estes fatos se quiser. Nosso objetivo deve ser o de ajudála a descobrir uma maneira de ver este capítulo doloroso sob um prisma consistente com o amor de Deus e seu amor por Ele. Esta tarefa pode não ser fácil ou rapidamente alcançada, mas o futuro da pessoa está em jogo. O Diabo tem uma diversidade de maneiras destrutivas que ele quer impor sobre fatos trágicos. O Senhor tem uma diversidade de maneiras criativas que Ele quer que a pessoa veja nas tragédias. A batalha espiritual assola a mente do crente. O objetivo do pastor ou conselheiro cristão é o de ajudá-lo a escolher uma das maneiras criativas que Deus tem para ele para colocar os fatos de suas tragédias juntos. Em nenhum lugar isto é mais demonstrado claramente do que na vida de José. Os irmãos de José trataram-no de maneira vergonhosa, vendendo-o à escravidão e dizendo ao seu pai que ele havia morrido. O esposa de seu senhor o acusou de ultrajá-la sexualmente, resultando que ele fosse lançado na prisão. Entretanto, durante o tempo em que José foi regente do Faraó, Deus o ajudou a vencer a batalha mental a respeito de como ele veria os acontecimentos de seu passado. Quando a fome forçou os irmãos de José a o enfrentarem no Egito porque era sua única fonte de alimento, ele foi capaz de dizer-lhes: "Vinde perto de mim". Quando haviam feito isso, ele disse, “Eu sou seu irmão José, a quem vendestes para o Egito! E agora, não se perturbe e não fique com raiva de si mesmo por ter me vendido, porque foi para salvar vidas que Deus me mandou adiante de vós." (Gn 45:4,5). Observa-se que José não esqueceu o fato de seus irmãos o terem vendido ao Egito. Entretanto, mental e espiritualmente, ele vencera a batalha de uma forma saudável ao colocar esta parte de sua história junto... uma teodiceia saudável. Esta versão dos fatos permitiu a ele estar em paz consigo mesmo e reconciliado com seus irmãos. Aqueles que me conhecem bem sabem que meu nascimento causou a morte de minha mãe. Não há como eu possa mudar os fatos. Até entregar minha vida para Cristo, eu me considerava o assassino de minha mãe. Afinal, meu nascimento a tinha matado. Entretanto, um dia, à sua cova, eu observei que ela estava com apenas 19 anos quando morreu. Eu disse a mim mesmo: "É muito cedo para alguém morrer". Então, o Senhor falou ao meu coração, "Está certo; não só Jesus, mas também sua mãe morreu por você. Quão valiosa sua vida deve ser. Esteja certo de fazer isso valer alguma coisa". Não penso mais como sendo eu o assassino de minha mãe. Eu vejo sua morte como acrescentando valor à minha vida. Desde aquele dia em que eu estive à sua cova, tenho me motivado a tentar e a fazer diferença na vida das pessoas. Sequela Este estágio de recuperação revela a maneira com que nós finalmente interiorizamos a crise. Durante as semanas e meses de batalha pelo nosso caminho de choque através da tempestade e da busca, estabelecemos uma versão da história com a qual escolhemos viver. A forma que nós mentalmente escolhemos para gerenciar as tragédias da vida é evidente pela nossa presença. Está registrada em nosso semblante. As pessoas que vivem conosco podem dizer se nós temos estabelecido uma forma redentiva ou destrutiva de conviver com as tragédias da vida. Elas podem dizer se nós temos encontrado cura e paz para os pesares do passado ou se ainda estamos esfolados sob a dor. Lembre aqueles que procuram sua ajuda que não há vida sem dor. Entramos neste mundo através de uma experiência dolorosa. Entre nosso nascimento e nossa morte cada um de nós é tentado no crisol da vida. É por isso que o apóstolo Pedro admoesta: "Amado, não estranheis a ardente prova que você está passando, como se isso fosse alguma experiência anormal: mas alegrai-vos, na medida em que sois protetores dos sofrimentos de Cristo; para que, quando sua glória for revelada, você possa ser feliz também com alegria demasiada." (1Pe 4:12-13, paráfrase do autor). RICHARD D. DOBBINS, Ph.D. Fundador do EMERGE e atualmente diretor do Richard D. Dobbins Institute of Ministry, em Naples, Flórida (EUA), fundado por ele em 2007. Visite seu website: www.drdobbins.com JULHO 2011 | Recursos Espirituais • 13 48 SOCORRENDO OS QUE ESTÃO EM CRISE: As Primeiras Por JAY MARTIN 14 • Recursos Espirituais | JULHO 2011 Horas Porque as primeiras 48 horas encerram perigo e oportunidade, é essencial que os pastores e os líderes da igreja deem séria consideração a vários problemas na preparação de suas respostas. A crise, ou incidente crítico, por sua própria natureza é um evento ou experiência humana repleta de perigo e oportunidade. Uma crise desafia e muitas vezes contempla recursos humanos internos e externos, causando um nível extremamente elevado de angústia. O perigo reside na possibilidade de que uma crise pode traumatizar uma pessoa além de sua capacidade de se recuperar. A consequência traz prejuízo no funcionamento ocupacional, social, psicológico e relacional que dura semanas, meses ou mesmo anos. A oportunidade reside no fato de as pessoas em crise estarem mais abertas à influência dos outros do que em qualquer outro momento. Se as pessoas recebem uma resposta de apoio qualitativa, a maioria irá se recuperar mais rapidamente e alguns irão crescer com a experiência. Segundo a pesquisa, um terço das pessoas impactadas por uma crise terá seu funcionamento prejudicado por um ano ou mais . O que faz as primeiras 48 horas serem tão significativas? As primeiras 48 horas são normalmente um momento ideal para se ir ao encontro daqueles impactados por eventos críticos e fornecer apoio imediato, bem como estabelecer as bases para um futuro ministério. Sua meta para responder durante este período inicial é estabelecer uma potencial relação de cura com aqueles diretamente impactados, bem como aqueles que os assistem. É também para comunicar de forma efetiva a sua preocupação e vontade de prestar assistência prática imediata e suporte contínuo nos próximos dias. Por causa das primeiras 48 horas terem em si tanto perigo como oportunidade, é essencial que pastores e líderes da igreja deem séria consideração a vários problemas: Quem é impactado por um evento como esse? A que tipo de evento eu estou respondendo? Como inicio um contato melhor? Que tipo de reações posso esperar de pessoas afetadas? Como posso me relacionar de uma forma que seja a mais útil? Quais armadilhas eu preciso evitar? É sempre essencial eu responder dentro de 48 horas? Quando não devo responder durante este período? Que recursos estão disponíveis? Quem é impactado por um evento como esse? Um evento que afeta o indivíduo e sua família que são membros ou participam de sua igreja é a crise mais frequente que você provavelmente enfrentará. Como seu pastor, espera-se que você inicie o contato com aqueles impactados por esta crise. Apenas a natureza do evento e a disponibilidade dos impactados impedirá sua resposta. Um evento que afeta múltiplas pessoas e famílias além de sua comunidade, como enchente, tornado, furacão, acidente de carro, etc., torna-se um desafio quando você não tem relacionamento estabelecido com eles. Portanto, não pode assumir que irão confiar em você o bastante para receber e aceitar sua assistência. Ainda mais, você deve coordenar sua resposta com outros que estão tentando ajudar também. Sua resposta deve lidar com o impacto do evento em sua comunidade fiel assim como participar do esforço pela recuperação dela. A que tipo de evento estou respondendo? Uma crise que acontece com um sentido de expectativa e preparação cria desafios para seu enfrentamento e padrões típicos de funcionamento, mas, geralmente, não tem o mesmo grau de impacto negativo como a crise causada pelo ser humano. Por exemplo, a morte de alguém amado que batalhou contra o câncer por vários anos geralmente não é tão impactante quanto a morte causada por um motorista bêbado ou assassino. Um desastre natural, como uma enchente, um tornado, furacão ou terremoto, geralmente não tem um impacto poderoso como um estupro, roubo, suicídio, tiroteio em uma escola, bombardeio ou um ataque terrorista. As reações daqueles impactados pelos últimos eventos são geralmente mais intensos e mais negativos. As pessoas da primeira crise irão lhe receber como um representante de Deus, enquanto os da última crise podem rejeitar seus esforços e possivelmente invocar reações hostis, como, "Por que Deus deixou isto acontecer?". Um desastre causado por homens geralmente envolve questões legais que desaceleram e complicam o processo de recuperação. Pode também estender a necessidade para um suporte e assistência contínuos àqueles impactados. Como melhor dou início a um contato? Se você já possui um relacionamento estabelecido com a pessoa ou as pessoas impactadas pelo evento, é apropriado que se inicie um contato direto através de visitas pessoais, telefonemas, e-mail ou uma combinação destes. Se não possui relacionamento com elas, você deve inicialmente contatá-las indiretamente através de um conhecido comum ou através do pedido de permissão via telefonema para então encontrá-las. Se as pessoas são impactadas por um evento acontecido na comunidade (enchente, tornado, incêndio, etc.) ou um evento causado por homens (estupro, assassinato, suicídio, tiroteio, bombardeio, etc.) e você vai ao local, deve-se iniciar um contato com JULHO 2011 | Recursos Espirituais • 15 A crise, ou incidente crítico, por sua própria natureza é um evento ou experiência humana repleta de perigo e oportunidade. o chefe do incidente e expressar sua disposição em prover assistência. Esse contato será provavelmente a primeira pessoa a reagir, como prestador de serviços médicos de emergência, oficial da lei, bombeiro ou agente do governo (mais detalhes disponíveis no curso "Introduction to Incident Command" no site www.fema.gov onde também fornecerá informações sobre como melhor fornecer assistência imediata em coordenação com outros). As pessoas diretamente impactadas por eventos causados por homens estão geralmente preocupadas com um processo investigativo e, portanto, indisponíveis para o contato direto. Em tais casos, concentre seus esforços de ajuda imediata em direção aos primeiros respondedores envolvidos no evento. Fazendo isso, você pode obter uma visão de como melhor assistir aqueles diretamente impactados no futuro. Se um desastre natural impacta sua comunidade, trabalhe com a congregação para suspender suas atividades usuais e assim fornecer assistência prática com necessidades básicas. Os exemplos incluem: oferecer seu esta16 • Recursos Espirituais | JULHO 2011 belecimento para a Cruz Vermelha como abrigo ou voluntariar-se na distribuição de comida, cobertores e outros itens para os necessitados. Se o incidente crítico impacta pessoas além de sua congregação, responda como um representante do Senhor, ou como um membro da comunidade. Coordene seus esforços com outros ajudantes profissionais em sua comunidade ao invés de trabalhar independentemente. Você obterá favor e influência fazendo isto. Que tipo de reação posso esperar de pessoas afetadas? Durante este período inicial, aqueles diretamente impactados passarão pela experiência de uma ampla gama de reações. Comum a todos os eventos estão a surpresa, a descrença, a confusão, o adormecimento, o medo, o sentimento de estar sobrecarregado e a sensação de incerteza e de indecisão. Se o evento for causado por homens, esteja preparado para acessos de ira, raiva e fúria. Esta crise interrompeu abrupta e completamente , se não destruiu suas vidas. Alguém roubou sua sensação de proteção e segurança e assaltou sua identidade. Sua confiança na vida e em outros, até em Deus, foi profundamente abalada, e essas pessoas se sentem incrivelmente vulneráveis. Seu sofrimento é maior do que as palavras podem transmitir e geralmente se sentem isoladas e sozinhas. Estão agora encarando sonhos destruídos e problemas esmagadores ao mesmo tempo em que tentam compreender o que aconteceu. A intensidade de suas reações é assustadora, assim como é a sua dificuldade com pensamentos racionais, memória curta e indecisões. Tais reações são compreensivelmente humanas e não refletem a falta de fé ou fidelidade de sua parte. As pessoas impactadas podem pensar de outra maneira e ser relutantes ao se expressarem. Espere que eles necessitem do seu sentimento de aceitação, compreensão e reafirmação. Como posso me relacionar de maneira a mais útil? O objetivo deve ser discutir a necessidade imediata das pessoas impactadas e não qualquer outra agenda. Portanto, não queira evangelizar, fazer proselitismo ou, do contrário, atender as suas necessidades ou de sua congregação. Tais ações podem traumatizá-los ainda mais, fazendo-as fechar qualquer porta de oportunidade para ministros e cuidadores de outras religiões. Pode-se entender também o que nutre resiliência, isto é, o processo de se adaptar bem em face de adversidade, trauma, tragédia, ameaças ou um estresse significativo. Pesquisas mostram que os fatores a seguir alimentam a resiliência: (1) relacionamentos carinhosos dentro e fora do ambiente familiar, os quais criam confiança, fornecem modelos, encorajam e tranquilizam; (2) a capacidade de fazer planos realísticos e os implementá-los; (3) autoconfiança; (4) comunicação e habilidade para resolver problemas e (5) a capacidade de administrar emoções. O objetivo de todos deveria ser reduzir a angústia, restabelecer o funcionamento, prevenir a angústia e a disfunção e fornecer conforto e suporte. Alguns fazem isto através da escuta ativa, a base de todos os esforços, da validação de seus sentimentos, reações e respostas, quaisquer que forem, e de ajudar as pessoas impactadas a normalizarem suas ações. Uma citação de Viktor Frankl pode ajudar: "Reações anormais a eventos anormais se igualam ao comportamento normal". Podemos também encorajar as pessoas a normalizarem suas respostas ajudando-as a delinearem seus pontos fortes e habilidade de enfrentamento que as ajudaram no passado. Incentivá-las a identificar os próximos passos que precisam dar para ajudar a si mesmas e, então, a realmente dar esses passos. Você simbolicamente representa a presença de Deus apenas pela sua presença. Você demonstra a coragem de presença pelo fato de estar presente com a pessoa em crise quando a maioria se afastaria por medo ou incerteza sobre o que dizer ou fazer. Seu ministério de estar presente nos momentos os mais obscuros das crises é o ato de carinho definitivo. Quem você é e não o que você faz é que, sim, conta neste momento. Você pode oferecer a compaixão de ouvir enquanto testemunha o sofrimento delas. Ao permitir que descrevam com suas próprias palavras o que aconteceu e quais suas reações, você pode dar suporte e começar a recuperar um sentimento de comando sobre suas vidas e situação. Oferecendo empatia e validação, você permite que comecem a se reconectar com a vida dos outros em um ambiente seguro. Você também pode oferecer integridade de mistério. Este aspecto é particularmente desafiador. Muitas pessoas em crise tentam fazer sentido daquilo que aconteceu e querem uma explicação. Alguns irão repetidamente perguntar: "Por que isto aconteceu?" ou "Por que Deus deixou que isto acontecesse?". Evite este campo minado teológico. Enquanto se sentaram com ele em silêncio, os amigos de Jó foram muito úteis; quando ofereceram explicações, só aumentaram seu sofrimento. Tenha a integridade de dizer a verdade, que é "Eu não sei". Não existe explicação que você ou apoiá-las ao enfrentarem esta realidaqualquer outra pessoa possa fornecer de seja lá a qual for a extensão que que irá reduzir ou extinguir a angús- tome. Com sua atitude e suas palavras, tia das pessoas. A resposta sincera é: você pode ser um lembrete vivo de "Às vezes a vida não faz nenhum sen- que a esperança é sempre uma escotido" ou "Esperamos entender algum lha, não apenas baseada no que alguém pode ou não pode ver no modia o que não faz sentido agora". Você pode também oferecer hu- mento. Você pode manter a conscimildade de desamparo. Como você entização da possibilidade de novos não pode fazer ou dizer nada que eli- inícios, novos relacionamentos, novas mine o sofrimento das pessoas e como possibilidades no futuro quando elas sabe que apenas Deus cura, você é li- não conseguem fazer por si mesmas. Você pode simultaneamente oferevre para estar totalmente presente. Convide-as a explorar e descobrir suas cer a liberdade de inadequação. A próprias forças, perfeitas na fraqueza, conscientização de suas limitações hue a encontrar suas próprias soluções através de sua jornada de fé. Você pode oferecer a graça de aceitação. Pessoas impactadas por crises geralmente reagem de maneira que parecem estar alheia ao seu caráter. Algumas podem dizer ou fazer coisas no calor da reação e mais tarde se O objetivo deve ser discutir a arrependerem. Você necessidade imediata das pessoas pode demonstrar a impactados e não qualquer outra benevolência que faz com que lembremos agenda que imprudência em palavras, ações e atitudes não prejudicam relacionamen- manas e de seu ministério de presento com Deus ou entre humanos que ça permite que seja apenas quem você é para eles – um representante de Deus esteja baseado no amor. Pode também incorporar o com- e não seu salvador ou solucionador promisso de esperança. Eventos de problemas. A percepção de que traumatizantes roubam das pessoas a precisarão muito mais da assistência normalidade da vida tal como conhe- que você ou sua igreja podem dar as ceram. Elas passam pela experiência liberta para construir uma ponte para de um profundo desespero sobre a re- outros recursos que estão disponíveis alidade de que a vida nunca mais será para elas e para fazer encaminhamena mesma. O desespero pode ser tos apropriados para aqueles recursos avassalador e derrotador, e pode não (Cruz Vermelha, médico da família, ser minimizado, especialmente neste patrocinador dos Alcoólicos Anôniperíodo inicial. De fato, você pode mos, conselheiros, etc.). JULHO 2011 | Recursos Espirituais • 17 Que armadilhas preciso evitar em meus esforços para ajudar? Não simule entender sua experiência – aprenda com as pessoas em crise o que isto representa para elas. Não tome para si qualquer expressão de raiva expressadas a Deus ou atitudes negativas direcionadas a religiões ou ministros – é apenas uma reflexão de sua angústia, desilusão e desconfiança. Não seja rápido em incentivar rituais religiosos, como a oração. Antes de orar, pergunte quais são as preocupações imediatas pelas quais desejam orar. Não se concentre em distinções sectárias e religiosas. Você representa a realidade e importância da fé, independentemente de tradição. É sempre essencial que eu responda dentro de 48 horas? Se não, quando não devo responder? Uma resposta dentro das primeiras 48 horas pode não ser ideal em algumas situações porque pode não ser uma opção baseada na circunstância em que a crise se encontra. Por exemplo, se um tornado acabou de destruir uma área de casas, múltiplas casas, pode não ser seguro aventurar-se nesta área devido aos vazamentos de gás, fontes de energia destruídas e outros perigos. A segurança pessoal é o prérequisito para se estar capaz de ajudar outros; por isso, não responda até que esteja seguro. Existem várias situações para as quais você deve adiar seus esforços de cuidado e suporte até que as pessoas impactadas possam receber sua ajuda de forma segura e legal. Por exemplo, uma família de seis pessoas passou pela experiência de um suicídio aparente de um garoto de 16 anos. Uma ação policial está investigando para que se elimine a possibilidade de ter ocorrido um crime. A polícia está detendo membros da família e os inquirindo e, portanto, eles estão indispo18 • Recursos Espirituais | JULHO 2011 níveis para você. Há vezes também em que você deve não responder durante o período inicial com base em sua situação. Seu compromisso profissional atual pode impedir suas respostas dentro desta janela de tempo. Por exemplo, um acidente automobilístico acontece em uma noite de sexta-feira, impactando quatro famílias em sua comunidade, as quais são amigas porém não membros de sua congregação. No sábado você tem dois funerais durante o dia e um casamento à noite. No domingo você tem dois cultos para conduzir, uma classe de novos membros para ensinar e visitas hospitalares a membros criticamente doentes. Aguardando para iniciar um contato após o final de semana, honre seus compromissos existentes, mantenha a integridade com as pessoas que dependem de sua liderança e trabalhe dentro de suas limitações. Existem momentos em que seus relacionamentos pessoais e responsabilidades têm primazia. Se um membro de sua família está doente ou em crise, se sua saúde não está bem, ou se você tem responsabilidade de cuidar de pais idosos, então cuidar de si mesmo e de sua família deve ser sua prioridade. Também, se você está exausto da combinação de compromissos profissionais e pessoais e é incapaz de estar totalmente presente para pessoas impactadas por uma crise, então não responda até que você tenha um descanso adequado. Do contrário você correrá o risco de prejudicar ainda mais as pessoas impactadas pela crise. Lembre-se que existem muitos ministros e leigos que podem representar o Senhor no cuidado com os outros. Sua esposa não tem outro parceiro, seus filhos não têm outro pai e seus pais não têm ninguém para substituí-lo. Sem sua saúde, você não consegue ajudar ninguém. Quais os recursos disponíveis para que eu possa ajudar as pessoas em crise? Há um recurso projetado especificamente para preparar você para participar efetivamente em crises, tanto naturais quanto causadas por homens. Trata-se de uma publicação, PRIMEIROS SOCORROS PSICOLÓGICOS, disponível no site www.ptsd.va.gov (você pode fazer o download deste manual totalmente gratuito). O International Society of Traumatic Stress Studies, o International Critical Incident Stress Foundation, o National Center for Posttraumatic Stress Disorder e o American Red Cross adotaram essa abordagem, projetada para toda pessoa que participa de respostas a desastres, substituindo o CRITICAL INCIDENT STRESS MANAGEMENT como padrão de tratamento para aqueles que experimentam incidentes críticos. Outro recurso está também disponível para você sem custos. Intitula-se QUALIDADE PROFISSIONAL DE VIDA, disponível no site www.isu.edu/bhstamm (você também pode fazer o download e imprimir para usar em múltiplas ocasiões com estipulações claramente definidas). O último recurso no ministério é o exemplo da presença espiritual do Senhor. Que nossa oração possa ser como a que São Francisco de Assis fez em seu coração: "Senhor, faça-me um instrumento de Sua paz". JAY MARTIN, D.Min, LFTM, CT, CFS, CEAP Codiretor do Oklahoma Traumatology Institute, em Oklahoma City, Oklahoma (EUA). Enriquecimento Teológico O Outro Lado dos Sinais e Maravilhas: Atos 3:1-10 Um Modelo de Ministério para Todos os Tempos Por BENNY C. AKER A cura do coxo registrada em Atos 3 frequentemente se torna uma espécie de mantra para os pentecostais e carismáticos, especialmente com relação à declaração de Pedro: "Não temos dinheiro, mas nós damos-lhe o que temos". Vários problemas tratam crentes bem-intencionados em circunstâncias como em Atos 3. Primeiro, a causa se torna justificativa por não haver recursos financeiros ou por não pôr em ação recursos financeiros em um problema físico ou social que este milagre representa. Ou, segundo, esse milagre se torna um artifício retórico (a moldura de um sermão persuasivo) tentando incentivar os santos a crerem por sinais e maravilhas. As circunstâncias contemporâneas que proporcionam oportunidade de replicar o milagre de Atos 3 nem sempre geram o mesmo resultado. Verdade seja dita, os resultados raramente são os mesmos. Por outro lado, não-pentecostais ignoram seu profundo JULHO 2011 | Recursos Espirituais • 19 Enriquecimento Teológico significado por ignorarem sua intenção ou espiritualizarem a causa. Todos nós pertencemos ao mesmo campo: queremos fazer o que Deus quer, mas nós nos encontramos aquém na luz de expectativas desta passagem. Há uma lição neste milagre para nós? Sugiro que sim. O objetivo deste artigo é apresentar um novo olhar para o milagre em Atos 3:1-11 e sugerir que ele seja de fato um exemplo a ser seguido em todos os tempos. O Pano de Fundos Literário, Histórico e Social Como os destinatários de Lucas-Atos teriam entendido esse relato de cura? lógico de Lucas/Atos e Lucas o baseia na promessa de Deus a Abraão. Este é o escopo da nova aliança. A maior parte da atividade de Atos 2 ocorre no dia de Pentecostes (vv. 1-41). Nos versículos 37-41, Lucas resume o que havia acontecido naquele dia. Os versículos 43-47 resumem o que aconteceu nos dias subsequentes. Observe as perspectivas do tempo nestes dois parágrafos: em 2:41, Lucas tem "naquele dia" (en th hmera ekeinh), com ênfase "naquele dia". Isto denota que o escritor olhou para trás naquele dia com significado especial. Mas, no parágrafo seguinte, Lucas simplesmente usou referências de tempo gerais para relacionar outros eventos, sem descrição específica, nos dias posteriores ao Dia de Pentecostes – versículos 46, 47, "diariamente" (kaq hmeran). Esses acontecimentos foram maravilhosos e milagrosos, mas enfatizaram os resultados da ação de Deus através das mãos de Seus apóstolos com o poder do Espírito. É importante observar que Atos 3:1 começa com aquela distinção de assuntos e pessoas. Decorrentes dos resumos do capítulo 2 sobre o início da nova era sob a nova aliança, o capítulo 3 serve como um modelo distinto para o ministério nesta nova era escatológica de Jesus e do Espírito. Lucas desacelera e explode uma imagem de um desses incidentes maravilhosos para começar a mostrar como os crentes deveriam proceder em relação ao ministério neste novo tempo. Porque isso é o primeiro incidente descritivo no esquema de Atos seguindo o histórico da vinda do Espírito, isso torna-se típico; ou seja, ele fornece um modelo, indicando a natureza do ministério da nova aliança – a idade de Jesus e do Esta cura do coxo ocorre logo após a vinda do Espírito Santo no capítulo 2 e flui como resultado desta vinda. A LITERATURA Considere as seguintes observações sobre a estrutura literária dessa passagem. Nós precisamos ver a forma como Lucas, sob a inspiração do Espírito, estruturou Lucas e Atos 1 para entender como essa história se encaixa dentro do esquema de Lucas. A estruturação de Atos feita por Lucas, especialmente para o texto em relevo, requer que o intérprete preste atenção ao foco narrativo para cada unidade até Atos 3. Esta cura do coxo ocorre apenas após a vinda do Espírito no capítulo 2 e flui a partir dos resultados que daí advêm. Atos 1 conecta o Evangelho de Lucas e o Livro de Atos e serve como uma introdução a Atos. Atos 2 é o episódio paradigmático que fornece a base estrutural para a missão de Deus em Atos. Este capítulo é significativo porque fala da conclusão do ministério de Jesus em relação à chegada de uma nova aliança – especialmente destacando a chegada do Espírito – o componente final e a chave para a obra de Deus 20 no mundo. A vinda do Espírito sinaliza que os últimos dias chegaram e que os crentes devem proclamar o Evangelho até os confins da terra. Atos 2 apresenta o relato da vinda do Espírito em plenitude – a terminologia de Lucas (At 2:4). O Evangelho de Lucas faz um relato do trabalho de Deus em Cristo, Seu Filho, o Messias prometido. A obra de Jesus, o Messias, traz à fruição o segundo pacto prometido – baseado na • Recursos Espirituais | JULHO 2011 promessa de Deus a Abraão – que o seu prodígio iria abençoar todas as nações. Uma grande parte dessa aliança pertence à presença e obra do Espírito. Ezequiel 36:24-27 torna isto claro (ver também Jr 31:31-34). Mas o Espírito ainda não havia chegado, muito embora a obra de Jesus estivesse quase acabada. Ela não foi concluída até que Ele ascendesse à destra do Pai, no trono, de cuja posição de autoridade Ele enviou o Espírito. Isso explica a vinda do Espírito em Atos 2 – Ele veio porque Jesus terminou Seu trabalho e então entregou o Espírito em Sua plenitude. Esta é a resposta que o sermão de Pedro oferece. O Espírito veio em Sua plenitude porque Jesus havia terminado Seu trabalho e estava começando sua missão escatológica global. Esta é a função de Atos 2 – a obra de Jesus está concluída, a nova aliança está totalmente em vigor, e Jesus, como Senhor, envia Seu Espírito para conferir poder a Seus apóstolos para que levassem o Evangelho a todas as nações e plantassem congregações sadias. Este é o forte impulso missio- Enriquecimento Teológico Espírito. A partir desse relato, tomamos conhecimento do que Deus considera importante. A DIÁSPORA HISTÓRICA Também é importante olhar para o contexto histórico de Atos 3. De particular interesse são as diásporas (dispersões) dos israelitas no Antigo Testamento. Diáspora é a palavra em inglês para um método um tanto violento de julgamento usado por Deus. A palavra diáspora descreve antigas técnicas políticas e campanhas de guerra em que o rei conquistador levava os povos conquistados para longe de sua pátria para prevenir de qualquer outro problema posterior, entre outras formas de sujeição. A primeira diáspora ocorreu quando Deus julgou as tribos do Norte, geralmente referidas como Israel, pelo seu grave e contínuo pecado de idolatria. Deus usou os assírios para conquistar e levar os cativos de volta para sua pátria. Mais tarde, várias diásporas ocorreram quando os babilônios conquistaram as tribos do Sul, conhecidas como Judá. A última ocorreu por ocasião da queda de Jerusalém em 587/86 a.C. 40 em diante, Isaías fala deste tempo em termos de um novo êxodo, uma nova criação. A linguagem que os escritores usavam para descrever o primeiro êxodo torna-se a linguagem para o "novo" êxodo , um tempo de salvação de Deus. NOVA ALIANÇA, SINAIS E MARAVILHAS Não só Isaías fala do novo êxodo, o modelo de salvação escatológica, como de uma nova aliança que, Pedro acrescenta "sinais" ao citar Joel (At 2:19). "Sinais e maravilhas", baseado especialmente na linguagem de Êxodo e de Deuteronômio, torna-se o termo bíblico técnico para o poder de Deus na salvação ao libertar povos da opressão do pecado. Está sempre associado nas Escrituras desta maneira e torna-se o termo que associa o poder da aliança de Deus com Sua atividade miraculosa de salvação e missão. O profeta Malaquias nos informa que o novo êxodo ainda não tinha acontecido, pois o povo nesta época estava ainda em grande pecado e, juntamente com Isaías 40, fala de um novo mensageiro da aliança que ainda estava por vir. João Batista, que se refere a estes versículos identificando a si próprio e à sua missão, é o indício de que este novo êxodo está à mão. De fato, Jesus é o “EU SOU” de Isaías que vem para resgatar Seu povo e fazer brilhar uma luz para os gentios. Ele é o Bom Pastor que vem para reunir suas ovelhas oprimidas e alienadas. Ele faz sinais e maravilhas e sobretudo a expiação. Ele é Aquele que batiza no Espírito. Esta é a cena de Atos 2 e nosso milagre no capítulo 3. Atos 2:22-24 claramente se refere a estas atividades. O versículo 22 denota em particular que "Jesus de Nazaré foi um homem acreditado por Deus para vós por milagres, sinais e maravilhas, o qual Deus realizou entre vós por meio dele." O milagroso (sinais e maravilhas) em Atos 3 é o que Deus faz em missão. Na verdade, o tema “Novo Êxodo” forma todo o Livro de Atos – Lucas propositadamente moldou o livro de Atos para mostrar a consequência da nova aliança, novo êxodo As pessoas frequentemente associam coxeadura com cegueira para descrever os povos oprimidos e marginalizados que precisam da libertação de Deus. NOVO ÊXODO Os profetas do Antigo Testamento refletem a angústia de Deus por Seu povo pecador e sua contínua obstinação. Isaías especialmente prega contra a idolatria de Israel e outros pecados, mas promete um tempo em que Deus viria de novo e o levaria para o deserto. Os filhos de Israel iriam preparar um caminho para Ele no deserto. Isaías 40 sugere que este seria um tempo longo (ou seja, "os que esperam no Senhor [pela sua libertação da dispersão]"). Do Capítulo como uma aliança eterna, ancora e guia esta nova salvação. Jeremias e Ezequiel aderem explicitamente à pregação contra os pecados de Israel e Judá, mas estendem-se sobre essa nova salvação e nova aliança (Jr 31:31ss; Ez 37:26,27), e o novo êxodo como salvação. Enquanto a nova aliança sustenta a natureza de Deus e a fidelidade das antigas alianças, novos e significativos acréscimos pertencem à atividade expiatória de Jesus e da vinda do Espírito Santo para salvar e conferir poder às pessoas para servirem na missão de Deus no mundo. Isaías particularmente enfatiza isso – além de trazer a salvação ao povo judeu, uma luz iria brilhar para os gentios – a missão de Deus iria incluí-los – e eles iriam morar junto como os redimidos judeus e gentios. Joel 2:28-32 transporta este tema no imaginário do novo êxodo, especialmente no versículo 30, onde ele usa primeiro a linguagem do êxodo: "sinais e maravilhas". Embora não esteja presente em Joel, a palavra "sinais" está implícita em sua estrutura paralela e JULHO 2011 | Recursos Espirituais • 21 Enriquecimento Teológico e missão de Deus para o mundo. COXEADURA – O FOCO DA ATIVIDADE SALVÍFICA DE DEUS A questão do homem coxo em Atos 3 também é significativa. As pessoas frequentemente associam coxeadura com cegueira para descrever os povos oprimidos e marginalizados que precisam da libertação de Deus. Mateus 21:14 ilustra isso: “Os cegos e os coxos vieram a ele no templo, e ele os curou”. Mas um anfitrião em outras condições de opressão, com cegueira e coxeadura, descreve pessoas em circunstâncias terríveis aguardando libertação de Deus e 22 • Recursos Espirituais | JULHO JUNHO2011 2011 poder missional. Em todos os casos nos Evangelhos, pessoas nestas condições receberam a atenção de Jesus. Mateus 15:30 atesta: "Grandes multidões aproximaram-se dele,trazendo os coxos, os cegos, os aleijados, os mudos e muitos outros, e pô-los a seus pés; e ele os curou". Jesus se concentrava em pessoas aprisionadas a essas doenças, e Lucas/Atos eleva em âmbito literal e tipológico a necessidade do poder de Deus na missão da Igreja. Na igreja primitiva (no período apostólico), os coxos se tornaram tipos Pedro e João empregam uma abordagem apropriada com base no Evangelho e radicada no amor de Deus para os marginalizados de pessoas marginalizadas à espera do Evangelho. Promessas do Antigo Testamento para este tipo de atividade abundam e servem como diretivas para o futuro, quando Deus inaugura Seu plano para as etapas da vida. Atos estabelece a agenda de Deus para esta atividade, a qual é fundamentada em textos e promessas do Antigo Testamento. Jesus compreendeu o Seu ministério (Lc 4:18,19) em termos de Isaías 61:1,2 e 58:6 estar no contexto do novo êxodo. Lucas, especialmente, fornece a imagem mais clara destas conexões. Em Lucas 4, na rejeição de Jesus em Nazaré, Lucas fornece um relatório extenso do sermão de Jesus naquele lugar. Mateus e Marcos deixam de fora o Seu sermão e os textos Enriquecimento Teológico de Isaías e simplesmente fazem referência à Sua rejeição. Lucas enfatizou que o Espírito Santo estava sobre Jesus: Ele foi ungido para pregar as Boas Novas aos pobres, proclamar a liberdade aos prisioneiros, trazer a vista aos cegos, libertar os oprimidos, realizar sinais e maravilhas como evidência de que o Reino estava próximo, e que o novo êxodo havia chegado. Isaías 35:6 também aparenta ter sido influente: "Então o coxo saltará como um veado, e a língua do mudo cantará de alegria. Águas transbordarão na selva e córregos no deserto." Os judeus compreenderam este texto m e s s i a n i c a m e n t e, cumprindo a restauração de Israel na nova aliança – era escatológica. O homem coxo pulou de alegria depois que foi curado em Atos 3. "Quando o dia de Pentecostes tinha chegado completamente" (At 2:1, paráfrase do autor) aponta para a chegada plena do plano de Deus com a vinda do Espírito. Este foi o último de uma série de atividades divinas combinadas que culminaram na efetivação do plano. A cura do coxo captou a essência daquele plano na história – a atenção de Deus para este coxo se torna um modelo para Sua invasão dos povos e sistemas opressores e marginalizados na história. "Coxeadura", enquanto descreve de uma forma literal a condição desta pessoa, torna-se algo muito maior. Ela serve como uma imagem tipológica de pessoas e grupos de pessoas oprimidas e marginalizadas. nificativamente para a compreensão de seu significado. Na Bíblia, os escritores originais levaram em consideração que seus ouvintes/leitores abraçaram o mesmo mundo social que eles e não deram nenhuma explicação sobre sua matriz social. Por isso é importante para leitores posteriores tentarem recuperar esse pano de fundo tanto quanto possível, pois isto influenciou o significado de textos escritos, não menos do que o texto à mão e o evento em que este coxo O agrupamento básico era familiar naquele parentesco pertencente às conexões biológicas. Famílias nucleares, famílias expandidas e clãs formavam tais relações de parentesco. Enquanto algumas diferenças existiam entre gregos, romanos e judeus, todos os grupos tinham a mesma orientação básica – parentesco. Além disso, a identidade de cada pessoa era proveniente do seu grupo – não de seu próprio eu. Naquele caso, sentimentos de autovalor e de identidade vinham da afirmação do grupo – não de seu feito individual. Honra e vergonha governam todos os comportamentos. O SOCIAL O pano de fundo social refere-se particularmente à recuperação de informações sociais que os insights antropológicos fornecem. Este tipo de exploração ajuda a recuperar a matriz de um texto literário e contribui sig- foi curado. Foi um ato subversivo quando Deus curou o coxo na era da nova aliança dentro do templo à porta chamada "Formosa". PARENTESCO Culturalmente falando, todas as sociedades antigas eram orientadas pelo parentesco. Isto significa muitas coisas. Relacionamentos formados e grupos sociais humanos controlados; eles eram a base de todas as culturas. Nós chamamos este tipo de estrutura social de parentesco. O termo descreve a ideia básica nestes relacionamentos – de sangue ou laços biológicos. Enquanto essas sociedades sustentavam fortemente laços de sangue, elas tinham meios pelos quais forasteiros poderiam ter o mesmo tipo de relacionamento. O instrumento pelo qual isto era feito era a adoção. Quando usavam este tipo de ação, eles chamavam o relacionamento de parentesco de fictício. Esta é a forma de entender nosso relacionamento um com o outro e com Deus, a considerar que somos todos irmãos e irmãs em Sua família, a Igreja. HONRA E VERGONHA Honra e vergonha governam todos os comportamentos. O grupo espera que cada pessoa esteja em conformidade com as leis, costumes e tradições do grupo. Nos dias de Jesus, receber o reconhecimento positivo e afirmação do grupo de alguém equivalia a receber honra. Honra é um reforço positivo das expectativas de um grupo. Receber o input negativo é vergonhoso, um reforço negativo. Uma vez que honra e vergonha são uma questão de cultura particular de grupo, tudo transparece na esfera pública. Todos os níveis da sociedade, especialmente os aristocratas (elite) que pensavam que eram mais desejáveis que quaisquer propriedades ou dinheiro oferecidos, altamente buscado depois da honra. SISTEMA DE PATROCÍNIO Pessoas basearam uma parte significativa desta sociedade de honra/vergonha em retribuição entre as classes mais altas e as mais baixas. A classe média virtualmente não existia. Isto ficou conhecido como um sistema de patrocínio. Juntamente com o imperador romano e os membros do senado, além de outros com eles, JULHO 2011 | Recursos Espirituais • 23 Enriquecimento Teológico incluindo proprietários de terra em todo o império, a classe aristocrata – elite (estimada em torno de 3% da população) deteve todo o poder e riqueza. Embora tivessem todo o poder, eles dependiam das classes mais baixas para sustentar sua riqueza, razão por que tinham que assegurar sua existência. Fizeram isto distribuindo apenas o suficiente para as classes mais baixas – trabalhadores livres, escravos, mulheres e comerciantes (no topo da classe mais baixa) para subsistir. A classe mais alta (elite) neste sistema de patrocínio eram os patronos; a classe mais baixa, que dependia deles para sua subsistência, eram os clientes. Os aristocratas (elite) desejavam honra (retribuída) e os clientes eram aqueles que se beneficiavam de seus patrocínios e davam (isto é, retributivamente) sua honra em uma configuração pública, tal como nas celebrações comunitárias e na época de contrato no mercado (ver Parábola dos Trabalhadores na Vinha, em Mt 20:1-15). Os ricos construíam edifícios públicos como templos e sinagogas (o judeu rico por si só era patrono (elite), assim como os romanos). Eles exibiam seus nomes em lugares conspícuos de forma que as pessoas continuamente lhes tributariam honra. Todo mundo podia ver que esta pessoa era generosa e assim recebia grande honra. Desta forma, o povo a chamava de benfeitor. Uma outra pessoa neste sistema de patrocínio era um corretor que intermediava tratos entre um patrono e um cliente. Esta é a configuração da cura do 24 • Recursos Espirituais | JULHO 2011 Foi um ato subversivo, quando Deus curou o coxo na era da nova aliança dentro do templo, à porta chamada "Formosa". coxo registrada no capítulo de Atos. IMPLICAÇÕES A Natureza Subversiva do Evangelho Atos 2, um episódio paradigmático, contém em si elementos subversivos. Atos 2:5-11 encerra uma lista de pessoas de nações ao redor do mundo romano. O Enriquecimento Teológico governo romano, em sua propaganda, desfilava seus talentos e controle pelo mundo ao listar as pessoas que havia conquistado. Aquele grupo que habitualmente dava problema a eles eram os partos, o primeiro grupo listado em Atos 2:5. Os romanos não puderam listar este grupo. Implicações disto são: o que o poder romano não pôde fazer – Deus pôde e fez – mas por meios completamente diferentes. Sutilmente de forma subversiva de reino Deus conseguiu fazer o que Roma não pôde e de maneira diferente. A cura do coxo em Atos 3 é, analogamente, subversiva. Enquanto não estava claro que este homem era um pária, como o eram os leprosos, ele ainda pertenceu aos marginalizados da sociedade e foi ridicularizado por sua cultura. Enquanto mendigo, ele serviu de cliente às elites que vinham em seu caminho para o templo. Ele tinha que ser carregado para e de seu lugar de mendicância por várias pessoas. (O verbo é plural em 3:2 -"colocavam-no diariamente no porta", tradução do autor). Esses amigos colocavam o coxo ao lado do porta do templo chamada "Formosa", onde o tráfego era intenso. A subsistência desta pessoa dependia do desejo da elite de receber honra. Cada vez que alguém lhe dava uma moeda, essa pessoa receberia honra pública – o coxo estava preso neste sistema e não tinha saída. A cultura o havia congelado neste sistema, para o qual não havia escapatória. Ao continuar a doar como patronos, seu desejo por honra mantinha o coxo encarcerado em sua opressão. As pessoas aceitavam o destino muito embora desse honra e mostrasse a crueldade dos outros. Quan- do Pedro e João vieram por seu caminho para o templo como ministros cheios do Espírito Santo na nova aliança, eles ofereceram pela primeira vez um raio de esperança para ele – e para todos. Esta cura iria confrontar e mudar o sistema, além de fornecer uma nova cultura de comunidade na qual todos os seus membros tinham o mesmo status e eram aceitos com honra. Pregar o Evangelho na era da nova aliança inclui a realidade da liberta- víduos – uma outra maneira de dizer honra (o Reino tem seu próprio sistema de honra também conhecido como glória). Deus recebe honra ao estender a salvação e integridade (física, social e bem-estar espiritual) – não por meio de oprimir as pessoas. A abordagem do mundo ainda era a mesma, mas com o novo êxodo, o (ex) coxo estava cantando louvores a Deus que o levantara e lhe dera grande honra. O status alterado do coxo estava manifesto no templo – cultura de Deus – os apóstolos recebendo o homem curado. Eles não estavam com receio de tocá-lo – um sinal de aceitação social – quando eles pela primeira vez o abordaram (3:7). A alegria agora preenchia a nova pessoa, e ele acompanhou os apóstolos (v. 8) andando, saltando e louvando a Deus. Observe, no entanto, a natureza da subversão de Deus. Ele não faz isso de uma forma política ou má – antes, Ele faz isso com a mais elevada integridade. Ao invés de abordar a situação como uma questão política ou social (os primeiros cristãos não tinham voz no governo), Pedro e João empregam uma abordagem apropriada com base no Evangelho e radicada no amor de Deus para os marginalizados, embora as autoridades prevalecentes do templo oferecessem respostas ameaçadoras à pregação do Evangelho. Além disso, Lucas não era contra ajudar os pobres e oprimidos através de outros meios, tais como dar esmolas. O Antigo Testamento, o Judaísmo, Jesus e Seus seguidores apoiam esta atitude benevolente. Ao tomar conhecimento do milagre nesta forma, a cura do homem em Atos 3 enfatiza que o Evangelho promo- O Cristianismo desafiou os sistemas políticos romano e judaístico, cultural e religioso. ção como salvação e seu resultado – a alegria. Muitas vezes ela tomou a forma de cura, como aconteceu aqui em Atos 3, mas sempre estava incluída uma elevação no status. Esse homem já não era mais coxo ou marginalizado – o Evangelho não tinha apenas o libertado, mas tinha lhe atribuído um sobre-passo social – no Reino. O Evangelho tinha invadido a sociedade do mundo de uma forma subversiva e ameaçado o controle das coisas. O restante do capítulo 3 confirma isso – o milagre trouxe tanto espanto (isto é, a maravilha do milagre chamou a atenção de forma grandiosa) e oposição. A elite, religiosa ou secular, já não conseguia obter a sua honra social/cultural tirando vantagem desta pessoa desamparada (coxo desde o ventre de sua mãe). O Reino de Deus não funciona daquela forma. Ele não usa técnicas de autopromoção para fazer avançar sua própria agenda da mesma forma que a cultura do mundo daquele dia e do nosso faz. O Reino traz plenitude e bondade para seus indi- JULHO 2011 | Recursos Espirituais • 25 Enriquecimento Teológico ve uma mudança notável em, e eleva para, os marginalizados e pecadores. Isto está em contraste gritante com as situações religiosas e culturais do dia. O Cristianismo desafiou os sistemas políticos romano e judaístico, cultural e religioso. Por um lado, o sistema romano prevalecente havia influenciado as autoridades judaicas. Mas, há muito tempo atrás, a idolatria de Israel havia causado o afastamento do Espírito de Deus do templo em Jerusalém. Ezequiel 8ss chama essa partida de Icabode – A Glória se Foi. Mas o Espírito voltaria um dia – na nova aliança, no novo templo. O Espírito retornara ao templo em Atos 2 – desta vez o templo consistia do povo redimido (incluindo agora o homem curado e não mais marginalizado) de Deus; eles haviam orado e recebido o Espírito à sombra do templo construído por mãos herodianas e romanas. Foi um ato subversivo, quando Deus curou o coxo na era da nova aliança dentro do templo, à porta chamada "Formosa". uso desta metáfora instrui a todos nós sobre o papel fundamental do corretor e mediador mencionados acima. Em Atos 3, o Evangelho é o meio pelo qual todos os pecadores são trazidos de volta a Deus. É Jesus e Sua obra que ligam um mundo pecaminoso a um Deus santo. Jesus é o Corretor no decurso dos Evangelhos. Entretanto, os apóstolos (e todos os crentes) são corretores menores (mediadores) quando pregam o Evange- vo e relevante ao mesmo tempo, o líder/crente do século 21 deve ser destemido e espiritualmente discernente. Esta verdade é fundamental e progressiva, com ênfase em todo treinamento e exercício de habilidades, e isto deve ser intencional. Nós somos pessoas do Espírito e devemos crescer continuamente no âmbito espiritual através de orações, jejum e leitura da Bíblia. O resultado do crescimento espiritual é viver e ser liderado pelo Espírito – para usar o termo de Lucas – "cheios do Espírito". Como líderes, devemos olhar para Deus para nos relacionarmos com o mundo e olharmos para Ele para ajudar na avaliação de nossa cultura – o Reino (regra de Deus) é fundamentalmente subversivo. Devemos direcionar nossos recursos para onde eles serão os mais eficazes – para aqueles que são ridicularizados, marginalizados e feridos. O coração do Evangelho é missional – o centro da salvação é a redenção e libertação de todas as pessoas. Finalmente, as pessoas de Deus devem fornecer uma comunidade do Reino onde justiça e retidão prosperam, onde todas as pessoas encontram perdão e aceitação (ênfase nos relacionamentos), onde todas as pessoas são iguais no status, e onde amor e cuidados funcionam. Em resumo, a comunidade de crentes deve estar em processo, servindo de instrumento de Deus através do qual Ele traz pessoas feridas para a plenitude. O coração do Evangelho é missional – o centro da salvação é a redenção e libertação de todas as pessoas. UM MODELO DE MINISTÉRIO Deus trabalhou subversivamente através de Pedro na cura do coxo, mas em uma outra forma Ele falou à cultura de forma relevante. Pedro rompeu as normas culturais de seu dia quando tais normas contribuíram para o alívio do pecado e do sofrimento humano. Ao mesmo tempo, Pedro usava uma metáfora para comunicar que o novo êxodo é a única solução para os problemas culturais de hoje. Os apóstolos sabiam que tinham que se relacionar com a cultura enquanto subvertiam seu déficit de pecado básico. Na metáfora, os apóstolos se colocaram a serviço do Evangelho. O 26 • Recursos Espirituais | JULHO 2011 lho ("Nós não temos dinheiro, mas temos, na realidade, Jesus"). Este é o cerne da questão e isto é o que torna a Igreja missional. Este evento de cura/salvação tipifica a natureza da obra salvífica de Deus no mundo e flui para fora da nova aliança. Deus não somente expia pelos pecadores, mas os liberta da consequência do pecado. O Senhor ressurreto e a atividade do Espírito implementaram e direcionaram esta era da nova aliança. O mais alto componente nesta nova era é o Espírito. Ele é o mais preocupado com os marginalizados, doentes e oprimidos. Este também deveria ser o máximo na mente de líderes de igreja em nossa era póscristã e além. Antes de qualquer outra coisa, nós devemos harmonizar nossa teologia (convicção) e costume para este fato. Para ser subversi- BENNY C. AKER, PH.D, Professor emérito de Exegese do Novo Testamento, AGTS (Assembly of God Theological Seminary), Springfield, Missouri (EUA). E OS MAIORES DESAFIOS DO CUIDADO PASTORAL D Prontos ou não, o aconselhamento para crise nos encontra como pastores, e leva tudo o que conseguimos reunir para encará-lo. Por JAMES D. BERKLEY M uitas pessoas alimentam um conceito irrealista sobre a vida de um pastor. Ouvir deboches do tipo "Ah! Você só trabalha uma vez por semana" é o conceito bizarro de que pastores levam uma vida enclausurada e resguardada, longe das realidades deslumbrantes da existência a que a maioria das pessoas resiste. Pessoas há que supõem que os pastores despendem seus dias em reflexão quieta, em um resplandecente doceticismo pastoral. Estas pessoas acreditam que os pastores parecem apenas estar neste mundo e não poderia possivelmente receber cotoveladas ou se machucar com arranhões como elas. Tais pessoas acreditam que os pastores bebem chá em seus serenos e benignamente luxuriantes gabinetes entre pensamentos sublimes na maior parte da semana. Eu me lembro de haver conhecido o filho de um membro da igreja em uma ocasião social. Ele era um promotor adjunto, e, naquela época, eu era voluntário como capelão da polícia local. Aproximamo-nos imediatamente e estávamos tendo um momento agradável a contar histórias sobre a polícia e os tribunais. Então sua mãe, andando ao redor, ouviu parte de nossa conversa. Horrorizada, ela gentilmente repreendeu seu filho promotor por me dizer sobre tais leviandades. "Ele não quis pensar sobre essas coisas terríveis", ela repreendeu, "ele é um ministro". Em outras palavras, "O que ele saberia ou se importaria com as coisas desagradáveis sobre este mundo que o restante de nós vive?". "Muito!" eu poderia ter dito. "Desde quando me tornei pastor, estou sendo puxado para uns dos incidentes mais escuros, tristes e violentos da vida das pessoas. Longe de estar protegido das realidades duras da vida, eu as trago até mim em vertiginosa carreira". O que eu deveria ter dito para aquela mãe é, "os pastores são chamados nas crises". Faz parte do pacote quando Deus nos chama para sermos pastores que tratam as feridas das ovelhas. Um dos meus escritores seculares favoritos é Ivan Doig, que tece histórias coloridas baseadas em sua infância em um rancho de ovelhas da família em Montana. Em sua biografia, ESSA CASA DO CÉU, ele conta sobre seu cuidado com as ovelhas em um verão: "Não houve uma partícula sequer em todas essas milhas de alcance em que uma ovelha pudesse se esfregar e um ataque de carrapatos estava começando a causar coceira debaixo de sua lã... As ovelhas estavam rolando no chão para se coçar – rolando tanto que as levou para longe, fazendo com que não pudessem se levantar e, dentro de minutos naquele calor, sua dificuldade de levantar iria levá-las à morte. Tivemos a perspectiva de infinitos cadáveres inflados em torno de nós". JULHO 2011 | Recursos Espirituais • 27 Uma crise. Pelos 14 dias seguintes ele continuou a patrulha ostensiva entre suas ovelhas e freneticamente ajudava-as a levantar sempre que uma rolasse. Esse é o trabalho de um pastor de ovelhas. A crise naturalmente os encontra e eles improvisam um plano de intervenção pelo bem da ovelha. E assim fazem os pastores. Todo pastor poderia relembrar histórias tristes como essas: • Uma doce ex-rainha do baile vai para a faculdade. Uma terrível transformação acontece e ela se lança de um viaduto. Alguns minutos depois sua mãe passa pelo mesmo viaduto para visitar sua filha. • Um pai jovem e sadio é acometido por um tumor cerebral e outro e mais outro. Ele aguenta firme cirurgia após cirurgia, procedimento após procedimento. Então, sua filha mais nova contrai leucemia. • Um casamento aparentemente normal se destrói quando uma sequência de infidelidades aparece. O padrão do marido se torna contínuo e frequente e a humilhação da esposa e a sensação de traição quase a sufocam. Pastores podem não apenas contar tais histórias, como também se tornar participantes nesses eventos juntamente com a expectativa das pessoas de que eles podem fazer alguma coisa para ajudar a trazer algum tipo de bálsamo, cura e palavras de esperança. Enquanto outros leem ou fofocam sobre tais acontecimentos e talvez alguma vez já tenham tido essa experiência , os pastores entram nestas situações várias vezes por ano, possivelmente centenas de vezes durante sua vida de ministro. Os pastores, em sua maioria, não são altamente treinados como conselheiros. Eu me formei em psicologia na faculdade e tive algumas aulas de aconselhamento. Mas trabalhar com ratos em caixas Skinner e ler um ou dois livros dificilmente me prepararia para aconselhamento em tempos de crise. Eu esperava que a maioria dos pastores se sentisse inadequada como eu com essa tarefa. Nós trabalhamos em tempo real: aprendemos ao longo da jornada. Deus de alguma maneira nos usa e nós adquirimos a experiência como treinamento durante o trabalho. 28 • Recursos Espirituais | JULHO 2011 Como a maioria do ministério, as intervenções de crise não deve ser sobre nós, sobre a nossa necessidade de resgatar as pessoas, sobre a nossa necessidade de provar o nosso valor ou sobre a nossa necessidade de ser bem sucedido. Enquanto não há um diploma avançado em "crisiologia" para o Espírito trabalhar através de nós, não nos custa darmos ao assunto um pouco de reflexão. Assim como a maioria das pessoas tem um extintor de incêndio em sua cozinha porque querem estar preparadas para o fogo, é recomendável que pastores pensem um pouco sobre a crise antes que o telefone toque e que tenham que correr pela porta com sua Bíblia em mãos para ajudar alguma ovelha a se virar e a ficar novamente em pé. Em 1989, tive a oportunidade de me consultar com alguns excelentes conselheiros sobre crise – ambos pastores de congregação e conselheiros cristãos profissionais. A Christianity Today, Inc., havia feito uma pesquisa sobre que crises que demandam o cuidado pastoral e que os pastores consideram mais difíceis. Fiquei encarregado de destilar a sabedoria de especialistas nos nove maiores desafios dos cuidados pastorais: conflito matrimonial e divórcio, má conduta sexual, violência e abuso domésticos, homossexualidade, doenças e lesões graves, a morte de uma criança, a morte de um cônjuge, suicídio e problemas com drogas e álcool. O livro de liderança CALLED INTO CRISIS (que pode ser baixado pelo site www.ChristianityTodayLibrary.com) resultou em fornecer uma visão no aconselhamento em tempos de crise em geral e como lidar com vários tópicos em particular. A seguir estão algumas das lições que aprendi e comuniquei neste processo, e ainda uma atualização para circunstâncias particulares em que pastores se encontram hoje. MODO DE CRISE No centro de uma crise está a sensação de se perder o controle. Quando alguém se sente no controle, até mesmo um problema grande ou difícil pode ser resolvido rotineiramente. Mas quando sentimos que não estamos mais no controle, entramos em crise. Por exemplo, dirigir em uma rodovia com chuva e com visibilidade limitada é mais difícil, mesmo com o motor ligado. Quando o sinal de trânsito fica vermelho, no entanto, e pisar no freio não faz nenhuma diferença porque o carro está em aquaplanagem, o motorista está em uma crise. Durante a crise, o mecanismo de enfrentamento pode não funcionar quando a vida de alguém está fora de controle. Muitas vezes as pessoas batem literal e figuradamente. É quando os pastores se fazem necessários. Quando um pastor adentra uma situação de crise, é necessário que faça algumas avaliações rápidas. Esta crise é resultado de fatores reais ou imaginários? Aqueles que se observam estar em crise, de fato estão, mas é útil para os pastores saberem o que está por trás dela. Uma mulher repetidamente chamava a polícia porque extraterrestres estavam tentando roubar seus pensamentos lançando feixes de luz pela sua janela. Alguém adivinharia que a crise desta mulher era imaginária – embora provasse ser facilmente resolvida quando um policial desconfiado adverte-a pedindo para cobrir sua janela com papel alumínio para refletir os raios. Mas quando fui chamado para confortar uma família cujo filho tinha sido eletrocutado em um estranho acidente rural, não havia nada de imaginário nesta circunstância. É sobretudo útil ter conhecimento dos fatos de uma situação. Que história a pessoa traz para a crise? Pessoas passam por experiência em diferentes níveis de estresse e capacidade de lidar com a situação. Uma mulher que acabou de perder o emprego, de enterrar seu pai e acabou de ver seu marido ir embora é suscetível de responder com a possibilidade de ser presa de forma diferente de uma mulher que está no topo do mundo. As experiências da vida e os traços de personalidade capacitam alguns a lidarem melhor que outros. Algumas pessoas tiram proveito de uma placa em cima da mesa dizendo: "Posso lidar com qualquer coisa, menos com a adversidade". Nossa fé cristã e maturidade espiritual geralmente têm maior impacto em nossa habilidade de lidar com as situações. Ajuda se um pastor puder olhar através da bagunça imediata e enxergar quais recursos ou obrigações uma pessoa traz para a situação. Que apoio a pessoa tem? Um dia a polícia me chamou em um condomínio. Esperavam, com um homem idoso, o legista retirar o corpo de sua esposa que havia morrido de repente. Este novo viúvo não tinha igreja, tampouco pastor. Não conhecia seus vizinhos. Havia perdido contato com sua família, tendo se alienado dela por anos. Não tinha filhos. Não tinha amigos. Ele e sua esposa haviam estreitado seu círculo apenas em torno de si próprios e agora ela havia partido. Finalmente, ele sugeriu que eu ligasse para seu corretor de valores. Aquele era o único número que ele tinha. Era trágico – aquele homem estava em crise. Obviamente, quanto mais perto de uma rede de apoio que uma pessoa esteja, maiores são suas perspectivas de gerenciar uma crise. ©2006 George Crenshaw Quais os sintomas presentes? Certamente uma hemorragia ou uma parada cardíaca sinalizam uma crise, porém há mais sintomas psicológicos sutis que também podem ser indicativos: dores de cabeça, vômitos, hiperventilação e pânico são alguns exemplos. O humor também é um indicador – este inclui o sentimento de se estar sobrecarregado, sem esperança, abatido, arrasado, desesperado ou agitado. Na pior de suas manifestações, os sintomas da crise são: alcoolismo, depressão e desespero, como exemplos. Enquanto os sin- tomas agudos precisam de cuidado, os sintomas geralmente apontam o problema subjacente. Duas questões fundamentais persistem. A primeira é: De quem é o problema? Os pastores são sábios para lembrar que Deus e o participante são os únicos detentores do problema. Os pastores podem ajudar, mas não é bom assumir para si o problema. Um pastor da Califórnia disse: "Se as pessoas tentassem entregar o problema para mim, eu devolveria e diria: 'É seu. Como posso te ajudar com isso?'". A segunda questão é: Por que estou fazendo isto? Como a maior parte do ministério, a intervenção da crise não deve estar em nós – nossa necessidade de resgatar as pessoas, de provar nosso valor ou de sermos bem-sucedidos. Pular para dentro de uma crise não é fácil. É confuso e arriscado. Muita coisa é desconhecida. Uma crise toma tempo e pode ser inconveniente. Pastores não fazem aconselhamento para crise para seu próprio benefício. Fazem-no para ministrar e servir outros. Deus chama pastores em tempos de crise para cuidar das ovelhas que Ele ama. As ovelhas, algumas vezes, precisam de uma mão. A REALIDADE DE HOJE Desde que escrevi CALLED INTO CRISIS, quase 2 décadas foram gravadas na paisagem cultural. Enquanto Deus e Sua Palavra entregue pelo Espírito Santo permanecem firmes, a sociedade mudou, os costumes sociais foram reescritos, e as atitudes sociais se afastaram das atitudes cristãs. Isso significa que a imagem e o papel do pastor como conselheiro de crise está em um solo mais frágil do que estava na década de 80. Quando um pastor adentra uma situação de crise, ele precisa fazer algumas avaliações rápidas. Fazer perguntas o ajudará decidir como desembaraçar emaranhados de fatos. Você promete amá-la e protegê-la na saúde ou na doença, até que o convênio médico o faça? Por exemplo, notei que enquanto revia uma crise que intervim há 30 anos eu me relacionei com uma mulher jovem perturbada de maneira que hoje não seria prudente: dirigindo com ela sem ninguém no JULHO 2011 | Recursos Espirituais • 29 carro, me encontrando com ela sozinhos, trazendo-a para nossa casa para ficar brevemente comigo e com minha esposa. Minha conduta era inocente: nada impróprio aconteceu. Mas uma boa política de conduta sexual desaprova tal prática para evitar um dano ou a oportunidade de suspeita ou falsas acusações que poderiam facilmente acontecer por causa de uma atitude inocente. Hoje, ser platônico, piedoso, e bem intencionado não cola. Infelizmente, os pastores devem ser mais cautelosos. Aqui estão algumas outras influências da sociedade de hoje que afetam a intervenção da crise. Pós-Cristandade Há pouco tempo atrás os valores culturais e valores cristãos eram os mesmos. Este não é mais o caso. O Cristianismo não é mais a tendência. Muitas pessoas não entendem o Cristianismo. Os cristãos – e especialmente pastores – são geralmente mal-entendidos, senão alvo de desconfiança. Há algum tempo os pastores podiam esperar um pouco de respeito, honra e confiança, porém não podem mais adentrar uma crise assumindo tais vantagens. Desde que me tornei pastor, tenho sido levado a atender pessoas com os mais tenebrosos e desoladores incidentes em suas vidas. Pós-cristandade também significa que os valores básicos de uma pessoa podem estar em desacordo com o Cristianismo. Tome a valorização da vida, por exemplo. Não é todo mundo que pensa que suicídio deve ser impedido. Ouvimos histórias de multidões gritando: "Pula! Pula!" para uma potencial vítima de suicídio que está no alto de uma laje. Os pastores não podem esparar que as pessoas compartilhem valores cristãos. JAMES D. BERKLEY, D.Min. Diretor de questões ministeriais dos Presbiterianos para Renovação. 30 • Recursos Espirituais | JULHO 2011 Pós-modernismo e Desconstrucionismo Estes termos tratam de como as pessoas pensam, o que é muito diferente de o que elas estão acostumadas a ser. Respostas racionais e lógicas não carregam mais o mesmo peso. Verdade e significado estão em disputa – antes, efêmera e sem valer a pena se preocupar, alguns dizem. Reações que uma vez poderiam ser efetivas em responder questões fundamentais de pais sobre o problema do mal na morte de uma criança agora caem em ouvidos mistificados. Ler uma passagem da Bíblia sobre o amor inabalável de Deus pode também provocar um: "E daí?". Para muitos, "sua verdade" pode ser muito diferente da "minha verdade". Também há uma grande indiferença sobre a verdade. Os pastores não podem assumir que estas pessoas irão automaticamente ressoar com os tipos de ajuda que têm sido tradicionalmente providenciados. Individualismo e Intitulação As pessoas se tornaram extremamente individualistas, desejando estilizar a religião para que combine com suas fantasias pessoais. Elas esperam selecionar sua experiência com Deus da mesma maneira que fazem o pedido de seu café preferido. Enquanto são constantemente barradas pelos slogans da adversidade, essas pessoas também se sentem no direito de ter prazer e realizações constantes, onde a frustração e a decepção são certas na vida real em um mundo decaído. Como resultado, elas se preparam para uma grande caída. Quando muitos atingem a crise inevitável, não se ligam no benefício de um clássico cuidado pastoral. Os pastores que mergulham em crises podem primeiramente precisar entender como mergulhar em seu “sistema de fiação”, o qual é diferente de nossa maneira de pensar. Podemos assumir que algumas pessoas reagirão contra a fé implícita em nossa ajuda. Relativismo Moral Hoje, as pessoas consideram imoral pastores que mantêm romances com um membro da congregação – não porque viola os padrões sexuais definidos por Deus – o que é dificilmente o segundo pensamento – mas por causa do poder desigual no relacionamento. As pessoas podem não concordar que a infidelidade sexual por si só seja errada, fazendo com que seja difícil recolher os cacos após a situação. Elas podem considerar Deus o vilão se a esposa morre de alcoolismo. Neste caso, o pastor deve lidar com a raiva do viúvo contra Aquele que é capaz de curar sua dor. O "cônjuge" o qual a morte causa a crise pode ser do mesmo sexo ou apenas um parceiro com quem vive. Os pastores não podem mais assumir que as pessoas estarão na mesma página com eles em relação ao comportamento moral. Enquanto a cultura se modifica, Deus não; tampouco Seus mandamentos e promessas. Aqueles que se perguntam se Deus existe, aqueles que debatem Sua vontade para suas vidas, aqueles que são criativos em moldar deuses falsos para que se encaixem em seus próprios propósitos – entram em crise e podem, por fim, passar pela experiência da crise de fé, que é uma das maiores crises. Estas pessoas – confusas e viradas de ponta-cabeça, zangadas e perdidas, caídas e enganadas – continuam a ser o objeto do amor de Deus. Também continuam a ser objeto de nosso cuidado em tempos de crises, um cuidado mais difícil por causa de seus desafios, porém necessário. Para aqueles que são chamados em tempos de crise, a verdadeira compaixão cristã encontrará um caminho. Excelência na Oração Por George Wood JULHO 2011 | Recursos Espirituais • 31 Rumo à Excelência NÃO IMPORTA NOSSA IDADE, NOSSOS ANOS DE SERVIÇO CRISTÃO, NOSSA MATURIDADE NO MINISTÉRIO, SEMPRE PRECISAREMOS CONTINUAR CRESCENDO NO EXERCÍCIO E NA DISCIPLINA DE ORAÇÃO. ERNEST S. WILLIAMS FOI SUPERINTENDENTE GERAL DAS ASSEMBLEIAS DE DEUS de 1929 a 1949. Pessoas em todas Assembleias de Deus o amavam e respeitavam profundamente por sua humildade, sabedoria e santidade. Anos antes de se tornar nosso líder, ele tinha sido um dos professores da minha mãe na Escola Bíblica. E u gostava de ouví-lo orar. Tinha uma rica e profunda voz de barítono que poderia cortar o nevoeiro. Como um jovem casal a pastorear nossa primeira (e única) igreja, minha esposa e eu viemos da Califórnia para Springfield para uma visita. O irmão Williams estava com seus 90 anos. Fomos chamados em sua casa humilde. Nós só queríamos obter sua bênção e sua oração. Foi um momento comovente e memorável. Que experiência poderosa de nossa parte ouvir a abordagem de um santo senhor acerca do Trono da Graça. Eu nunca ouvi o apóstolo Paulo orar, mas a Bíblia me permite voltar através de 20 séculos para ouvir no meu espírito como ele orava. Quero especificamente me concentrar em sua oração em Efésios 3:14-21 : "Por esta razão eu me ajoelho diante do Pai, de quem toda a sua família no céu e na 32 • Recursos Espirituais | JULHO 2011 terra toma o nome. Oro para que fora de suas gloriosas riquezas que ele possa fortalecê-lo com poder pelo seu Espírito em seu ser interior, para que Cristo habite em seu coração através da fé. E oro para que você, estando arraigados e estabelecidos no amor, possa ter poder, juntamente com todos os santos, compreender a largura e o comprimento, e a altura, e a profundidade que é o amor de Cristo, e conhecer este amor que excede todo o entendimento – que você possa ser preenchido com a plenitude de Deus. Ora, àquele que é poderoso para fazer infinitamente mais do que tudo o que pedimos ou pensamos, segundo o seu poder que está operando dentro de nós, a ele seja glória na igreja e em Cristo Jesus por todas as gerações, para todo o sempre! Amém". Não importa nossa idade, nossos anos de serviço cristão, a nossa maturidade no ministério, sempre precisaremos continuar crescendo no exercício e disciplina de oração. Neste artigo, quero incentivá-lo, enquanto cumpre o chamado de Deus em sua vida, a ser uma pessoa comprometida com a excelência em oração. À medida que entramos na oração de Paulo, deixe-me observar duas coisas: sua postura e seu prefácio. POSTURA Na oração dos judeus, ficar de pé é a postura normal (Mt 6:5; Lc 18:11,13). Ajoelhar-se, porém, é a forma mais intensa de oração. Encontramos o ato de ajoelhar em tempos de crise nas seguintes circunstâncias: • Salomão se ajoelhou na dedicação do templo (1Rs 8:54). • Jesus se ajoelhou no Getsêmani (Lc 22:41). • Estêvão se ajoelhou em seu martírio (At 7:60). • Pedro se ajoelhou no leito de morte de Dorcas (At 9:40). Rumo à Excelência • Paulo se ajoelhou em sua oração de despedida dos anciões de Éfeso (At 20:36) e novamente em sua despedida na praia de Tiro (At 21:5). Paulo disse, "Por causa disso me ponho de joelhos" (Ef 3:14, ênfase minha). Esta é uma dica para o fervor de uma oração eficaz. Um dos pais da igreja primitiva colocou assim: "Ajoelhando, nós demonstramos a plena for- (vv. 3,4,6,9). O "mistério" é que a igreja – composta de gentios e judeus – poderia tornar conhecida a sabedoria multiforme e de múltiplas faces para governantes e autoridades no reino dos céus. Em linguagem clara, Paulo está dizendo: "Antes de iniciar minha oração, me permita dizer o que está por trás disso. A igreja tem o nome de Deus nela. Nós somos assembleia de Deus. A igreja é Seu orgulho e Sua alegria". A primeira coisa que mostrarei a vocês quando visitarem meu escritório serão as pinturas a óleo de cenas de missionários penduradas em minha parede. Para mim, são obras-primas. Paulo está dizendo: "Deus quer exibir Sua igreja na categoria de seres celestiais e dizer, 'Esta igreja aqui embaixo – é minha obra-prima!'". Mas quantas vezes a igreja partiu o coração de Deus? Ele quer que os arcanjos olhem para Sua obra-prima; mas quando levanta a igreja para exibi-la, ela está cheia de divisões, mesquinhez, disputas desnecessárias, egoísmo e falta de oração, evangelismo e compaixão, além de cuidados para com relação às preocupações que estão no coração do Pai. Toda igreja Assembleia de Deus local deve mostrar a glória e a sabedoria do Pai à sua comunidade, à sua cidade. Uma igreja dividida ou derrotada não é um boa referência para o Rei dos reis. Mas, oh, que gloriosa é uma igreja que adora, evangeliza, discipula, é compassiva e que, sobretudo, ora. O apóstolo Paulo tem uma visão grande da igreja – e devemos ter também. A igreja é o templo, a habitação do Deus vivo. E, porque as autoridades celestiais estão olhando a igreja (acrescentamos – o mundo e nossa comunidade estão olhando para a igreja) – essa se torna a razão que fortalece nossa oração. "Oh Jesus, ajude-nos a anunciar o mistério que está se tornando conhecido, o de que Tu estás fazendo uma igreja gloriosa a partir de um povo maltrapilho; a partir dos pobres, dos ricos, dos intermediários; a partir do branco, do negro, do vermelho e do amarelo; a partir dos jovens, dos de meia-idade, dos idosos; a partir dos brasileiros e dos americanos, dos árabes e dos judeus. A igreja, oh, Jesus, é Sua obra-prima." Portanto, a postura e o prefácio da oração de Paulo nos levam à intensidade de três petições que ela traz, as quais resumimos em três palavras: poder, compreensão e crescimento. Paulo está dizendo: “Antes de iniciar minha oração, me permita dizer o que está por trás disso. A igreja tem o nome de Deus nela. Nós somos assembleia de Deus. A igreja é Seu orgulho e Sua alegria. ma da oração. Não devemos simplesmente inclinar nossas mentes para a oração, mas também nossos corpos. Fazemos bem em diminuir os nossos corpos para que não se crie uma impressão de elevação ou uma aparência de orgulho". Jesus "posto em agonia, orava mais intensamente" (Lc 22:44). O que aconteceria em nossas vidas, nossas casas e nossas igrejas se nos ajoelhássemos e orássemos mais veementemente – indo além do hábito e da rotina da oração – para uma oração fervorosa? PREFÁCIO Paulo começa dizendo, "Por causa disso me ponho de joelhos" (Ef 3:14, ênfase minha). Qual a razão? Qual a razão que o leva a orar? É a frase que ele também usa em 3:1, "Por esta causa eu, Paulo, sou o prisioneiro de Jesus Cristo..." De alguma maneira Paulo conecta a razão – o prefácio – a toda a oração a seguir. Paulo une aquela "razão" à palavra mistério que é citada quatro vezes em Efésios 3 JULHO JUNHO2011 2011 | Recursos Espirituais • 33 Rumo à Excelência PETIÇÕES 1. Poder. "Para que, segundo as riquezas da sua glória, vos conceda que sejais corroborados com poder pelo seu Espírito no homem interior; Para que Cristo habite pela fé nos vossos corações; a fim de, estando arraigados e fundados em amor" (Ef 3: 16,17). Pense em si mesmo estando numa sala de ginástica flexionando-se em uma barra paralela. O problema: em um curto momento você perde sua força. Você precisa de força não só para segurar mas também para apertar mais forte. É por isso que dizemos, "Segura!", quando estamos quase caindo. Como você, oro por várias pessoas. Ao longo dos anos, minha lista diária de orações cresceu para mais de 250 pessoas. Coloquei a oração de Paulo sobre minha lista e percebi quão oportuna sua oração é – por causa de tantas pessoas em minha lista, incluindo a mim mesmo, precisamos que nossas mãos sejam fortalecidas pelo poder do Espírito. Aqui estão algumas amostras de pessoas por cujo poder eu oro diariamente: • Um novo crente que acabou de sair das drogas e teve problemas com a lei; • Várias lutas com doenças terminais; • Plantadores e revitalizadores de igreja: • Cônjuges recentemente enlutados e passando por um momento de grande dor; • Pais de crianças deficientes; • Pessoas aprisionadas por sua fé; ©2010 Paul F. Gray Quero que vocês saibam que eu sempre estarei aqui, à vossa disposição, isto é, das 08:00h às 17:00h. Depois disso, chamem o 190. 34 • Recursos Espirituais | JULHO 2011 • Desviado que se voltou para fé na prisão; • Outros servindo no perigo da noite e do dia por causa de religiões hostis; • Alguns lidando com tormento em sua própria família; • Casais com dificuldades no casamento ou com os filhos; • Crentes encarando grandes tentações e estresse; • Uma esposa ou filhos lidando com as ruínas emocionais e espirituais de um romance ilícito ou de um novo casamento do marido. Um marido passando pela dor de seu divórcio disse: "Não é fácil ver um amigo casando com a mulher que foi minha esposa por 17 anos. Vê-la vivendo na mesma comunidade, trabalhando no mesmo distrito e ver seus filhos expostos a duas filosofias distintas de vida não é fácil. Nem sempre gosto das oportunidades que Cristo me disponibiliza, em que eu testemunho do amor que cura e perdoa. O amor que é para o meu quebrantamento, quando, entretanto, eu permito, ele cura". Qual é a resposta para estes amigos, estes irmãos e irmãs em Cristo pelos quais oramos? É essa – que irão fortalecer seu poder. Que irão tocar as riquezas – os recursos – de Deus, o que resultará em que seu interior se torne forte; onde Cristo fará morada em seus corações através de sua fé. Um acidente de carro logo após seu casamento fez com que minha ex-aluna ficasse permanentemente cega. Ela olhou para a frente e juntamente com seu marido se tornou missionária e, anos depois, veio a falecer devido a um câncer. Em seu funeral, recitei um poema que ela tinha escrito alguns anos antes: “Se eu desistisse, como poderia me encarar, E como teria colocado tantas Escrituras na prateleira? Uma desistente ou vencedora eu posso ser, E Deus deixou a escolha para mim. Eu pergunto: Podemos ainda sorrir quando recebemos notícias ruins sobre nossa saúde? Podemos aguentar firme quando um ente querido vem a falecer? Podemos viver com bom humor? Podemos permanecer fiéis em nosso posto de serviço, mesmo quando é difícil? Você está fraco? Cansado? Estressado? Prestes a desistir? Existe Alguém que está pronto para lhe ajudar através do Espírito em seu interior”. O Espírito ora através de nós e intercede por nós com palavras que não podem ser articuladas em nossa lín- Rumo à Excelência gua. Temos um Intercessor nos céus que está à direita do Pai suplicando por nós (Rm 8:26,34). O resultado do fortalecimento do Espírito é que Cristo está firmemente estabelecido em nossas vidas e ministérios. O que vai conquistar esta geração não é outra coisa senão uma igreja que move na presença e no poder do Espírito Santo. 2. Compreender. "Para que Cristo habite pela fé nos vossos corações; a fim de, estando arraigados e fundados em amor, poderdes perfeitamente compreender, com todos os santos, qual seja a largura, e o comprimento, e a altura, e a profundidade, e conhecer o amor de Cristo, que excede todo o entendimento" (Ef 3:17-19) Paulo não só ora por nós para que tenhamos um poder forte. Ele também ora para que tenhamos grande compreensão. Amo a oração da garotinha: "Querido Deus, eu aposto que é difícil para o Senhor amar todo o mundo no mundo todo, pois existem apenas quatro pessoas em nossa família e nunca consigo fazê-lo". Anos antes de ter escrito esta carta aos efésios a partir de uma prisão em Roma, Paulo já havia levantado e pastoreado uma igreja em Éfeso por 2 anos e meio. Durante esse período, ele enviou cartas à igreja de Corinto que foi assediada com todos os tipos de problemas e orgulho. Ele disse, em 1 Coríntios 13, o que estava faltando em sua comunidade. Ela não estava arraigada e fundamentada em amor. Esta é sempre uma palavra séria às igrejas pentecostais e carismáticas porque, em nosso desejo pela restauração e presença de charismata, podemos ser tentados a construir com base nos dons e não no Doador; no sensacional acima da ética ou da moral; no sucesso e nos números em lugar do amor. • Se falarmos em línguas mas não tivermos amor, é apenas uma dor de cabeça barulhenta para Deus, um bronze que ressoa ou o clangor de um címbalo; • Se entendermos todos os mistérios e conhecimentos mas não tivermos amor, somos deixados com egos enormes e personalidades abusivas. • Se podemos profetizar e pregar sem amor, devemos então arrumar as coisas e irmos embora. • Se temos fé para mover montanhas mas sem amor, temos uma fé sem amor. Que bem há em ministério com objetivos, focado e dirigido com sucesso porém sem amor? • Se dermos tudo, mas não o fizermos com a motivação do amor, que bem há? • Mesmo se entregarmos nossa vida por Cristo, tornando-nos mártires – mas o fizermos sem amor, não ganhamos nada. Mas quando estamos arraigados e fundados no amor – então podemos... Compreender a amplitude de Seu amor é vasto. Começa antes da corrente do tempo e flui para o oceano da eternidade. Não é um amor estreito. Abrange todas as etnias, todas as idades, masculino e feminino. Não existe uma única pessoa que Deus não ame. Compreender a duração de Seu amor é longo. O compositor escreveu bem: "Se pudéssemos encher os mares de tinta, E os céus fossem feitos de pergaminho, E cada graveto neste mundo se tornasse uma pena de escritor, e todo homem,um escriba por profissão, e escrevêssemos sobre o amor de Deus, Secaríamos os oceanos; E os rolos não poderiam conter todas as palavras Ainda que se estendessem de um extremo ao outro do céu". JULHO 2011 | Recursos Espirituais • 35 Rumo à Excelência Compreender a extremidade de Seu amor é profundo. Aprendi um hino maravilhoso no seminário e nunca mais o ouvi. Samuel Trevor Francis é o compositor. Em uma noite fria de inverno, em um momento da vida quando sua fé vacilou, ele se encontrou andando pela Ponte London's Hungerford. Remoendo sua tristeza e solidão, ouviu um sussurro tentando-o a acabar com sua angústia e a pular nas águas agitadas. Felizmente, Francis não deu atenção àquela voz. Ao contrário, ouviu as palavras reconfortantes de Deus falando com ele naquela noite. Naquela ponte, ele reafirmou sua fé em Jesus Cristo e então escreveu: "Ó profundo, profundo amor de Jesus, vasto, imensurável, ilimitado e livre!". Que o Espírito nos ajude a compreender a largura, comprimento, altura e profundidade do amor de Cristo que O trouxe dos palácios de marfim para um mundo de horror, em uma manjedoura de Belém, numa pequena vila de Nazaré. Cruz do Calvário cruel e o túmulo vazio na Páscoa. Que possamos dizer como Paulo, "Porque estou certo de que, nem a morte, nem a vida, nem os anjos, nem os principados, nem as potestades, nem o presente, nem o porvir, nem a altura, nem a profundidade, nem alguma outra criatura nos poderá separar do amor de Deus, que está em Cristo Jesus nosso Senhor." (Rm 8:38,39). 3. Crescimento. "E qual a sobrexcelente grandeza do seu poder sobre nós, os que cremos, segundo a operação da força do seu poder" (Ef 3:19) Não há oração já emoldurada que tivesse um pedido mais ousado. Colocando a plenitude de Deus dentro de você e de mim é como tentar colocar um oceano em um dedal. Como acontece esse processo? Através do Espírito Santo. Quando foi pela primeira vez a Éfeso, Paulo encontrou uns 12 discípulos (At 19:1). Tiveram uma experiência incompleta. Foram salvos. Estava do lado de dentro da porta, mas não estavam fazendo avanços no sentido de ganhar a cidade. Paulo perguntou, "Vocês receberam o Espírito Santo quando creram?" (v. 2). Há muita conversa hoje sobre igreja emergente. Percebi que em toda geração a igreja deve encontrar meios de alcançar as pessoas enquanto permanecem fiéis às doutrinas apostólicas. Porém, o que irá alcançar essa geração é uma igreja que se move na presença e no poder do Espírito Santo. A pergunta que devemos continuamente fazer é simplesmente aquela que Paulo fez em Éfeso: "Vocês receberam o Espírito Santo quando creram?". Quando uns 12 receberam e foram batizados no Es36 • Recursos Espirituais | JULHO 2011 pírito Santo com a evidência do falar em línguas, a restauração chegou em Éfeso. Em pouco tempo toda a cidade foi sacudida. Uma igreja pentecostal que não cresce e não evangeliza é, em termos, uma contradição. O Pentecostes diz respeito a ser cheio para ser habilitado como testemunha. Mas Paulo sabia que estar cheio do Espírito não era apenas uma experiência de uma única vez. Quando lê os últimos dois capítulos e meio de Efésios, você pode ver que os crentes batizados no Espírito ainda eram forçados a crescer. Era dito o que deveria ser posto para fora e o que deveria entrar. Paulo advertiu-os a estarem continuamente cheios do Espírito e a orarem em Espírito em todas as ocasiões, com todas os tipos de orações e pedidos. Não importa a nossa idade, nossos anos de serviço cristão, a nossa maturidade no ministério, sempre precisaremos continuar crescendo porque, mesmo se formos cheio do Espírito agora, ainda não estaremos cheios com toda a plenitude de Deus. Ele é infinito e capaz de nos dar mais; e somos expansivos e capazes de receber mais. O JÚBILO NO FINAL O poder. A compreensão. O crescimento. Mas não é tudo. Ele é "poderoso para fazer tudo muito mais abundantemente além daquilo que pedimos ou pensamos, segundo o poder que em nós opera" (Ef 3:20). Pense nisso – "Abundantemente além." Ficaria feliz se o Senhor respondesse minha oração e então adicionasse mais um centímetro de resposta. Melhor ainda, 12 centímetros. Ainda melhor – um metro. Que tal uma fita métrica completa de 6 metros de resposta além de meu pedido? Posso medir todas essas coisas. Mas Paulo disse: "Abundantemente além." Permitanos acreditar que o Senhor opera quando oramos por poder, compreensão e crescimento. Orações grandiosas conduzem a grande poder – "Ele é poderoso", Paulo disse. Grande poder conduz a grandes louvores. "A Ele seja glória na igreja em Jesus Cristo, em todas as gerações, para todo o sempre. Amém." (Ef 3:21). THOMAS TRASK Presidente das Assembleias de Deus norte-americanas Springfield, Missouri (EUA). Corra Bem... Termine Bem/Por Scott Hagan Abstinência de Reclamação: Líderes Otimistas Superam a Distância O pulso de Miriã ficou com os batimentos acelerados. O seu e o meu também ficariam. Prestação de contas era uma coisa, mas ter o Todo-Poderoso, pessoalmente, dando uma advertência e deixando-a leprosa, era completamente outro tipo de experiência. Em um minuto Miriã estava exercendo sua "licença-família" ao criticar seu irmãozinho adulto, Moisés. No minuto seguinte a sua pele verde-oliva foi tomada de lepra. (Ver Nm 12). Miriã acreditava que a queixa aberta contra Moisés nada mais era que uma preocupação legítima. Afinal, um etíope tinha invadido seu círculo íntimo. Sentindo-se fora de seu lugar, Miriã viu a mulher de Moisés como uma fora-da-lei em vez de propriamente uma cunhada. Nem mesmo seu amor por seu irmão poderia pôr freio em sua língua. Sua boca procurou fazer o que não poderiam os exércitos Faraós: abater Moisés. Com a ajuda de seu irmão mais novo, Aarão, os dois vulcões entraram em erupção. Então, de repente, seus dois irmãos – Moisés e Arão – olharam horrorizados como o Deus que destruíra o Egito agora enfrentava a sua irmã. Mas a negatividade comendo o seu caminho através de Israel, como um câncer fulminante, não foi iniciada pelo discurso destrutivo de Miriã. Aquele era, na verdade, o segundo estágio. A verdadeira história começou dias antes. Números 11:01 nos diz: "Aconteceu que o povo começou a queixar-se das suas dificuldades aos ouvidos do Senhor. Quando ele os ouviu, a sua ira acendeu-se e fogo da parte do Senhor queimou entre eles e consumiu algumas extremidades do acampamento." (NVI). Moisés orou e o fogo desapareceu. Mas o problema da reclamação não havia acabado. O versículo 4 nos diz: "Um bando de estrangeiros que havia no meio deles encheu-se de gula, e até os próprios israelitas tornaram a queixarse, e diziam: Ah, se tivéssemos carne para comer!". Observemos que o espírito crítico em Israel começou na periferia, ou nas beiradas do acampamento. É aí que o primeiro fogo cai. A Bíblia chama os principais instigadores de "bando de estrangeiros" – um termo interessante. Isso significa "multidões misturadas". Eles eram aqueles que caminhavam juntamente com Israel para o Êxodo, não porque amavam a Deus, mas apenas por causa de sua aversão e ódio em relação a Faraó. O bando de estrangeiros não estava comprometido com Jeová ou com Seu povo; eles só queriam ficar livres do Egito. Por ser este o motivo, viviam nos arredores do acampamento. Adoração era o que havia de mais distante em sua mente. É irônico que a reclamação começou lá. É também onde a negatividade geralmente começa na vida de um líder... nas bordas sem sentido e nas trivialidades periféricas da vida e da liderança. É nos arredores ociosos do coração de um líder onde ele é mais vulnerável. O inimigo quer desfazer a fecundidade e o corpo do líder e abater sua força tentando-o com padrões de negatividade. Nós deslizamos para este padrão como líderes quando choramingamos por coisas casuais. Nós não percebemos que, uma vez não controlado, o choramingo pode resultar em JULHO 2011 | Recursos Espirituais • 37 Abstinência de Reclamação: Líderes Otimistas Superam a Distância um surto de lepra na liderança. Satanás adora apanhar líderes em armadilhas em suas bordas negativas. Uma vez que se estabelecem, essas bordas consumirão a face mais interior da vida do Reino. Ministros podem ser os piores transgressores. Às vezes, agimos tal qual o bando de estrangeiros do Antigo Testamento. Criticamos o sermão e o terno do outro colega de ministério. Damos tiro no Conselho da to nos faz responsáveis, como fez com Miriã, para falar contra aqueles que amamos e contra aqueles a quem lideramos. Deus quer nossas bordas limpas, mas Ele também exige que sejamos bem-sucedidos nos relacionamentos essenciais em nossas vidas. Deus feriu Miriã com lepra porque ela se permitiu tornar-se negativa no que tange aos relacionamentos familiares. Por alguma razão, os líderes ten- Líderes otimistas parecem liderar por toda a vida. Líderes que murmuram, não importa quão trivial possa parecer em seu discurso, geralmente desaparecem com o tempo. As pessoas não fazem nenhum uso da negativi-dade, especialmente as encontradas em seus líderes; querem ser inspiradas positivamente. O ministério é muito parecido com o maná; às vezes ele se apresenta sem graça e repetitivo. Há espaço A Bíblia toda consistentemente ensina acerca da existência de dois grupos distintos fora da comunhão que Deus tenciona ter com o povo de Sua aliança. igreja, no gramado do vizinho; todas bordas claras da vida que realmente não têm nenhuma relação com o Reino. Afinal de contas, é apenas uma borda ociosa. Ademais, Deus sustenta um líder responsável pelas suas periferias pessoais, onde as coisas triviais da vida existem. Esta é a forma mais comum que um líder permite a deterioração de sua influência – desperdiçando suas energias e palavras em assuntos da vida sem qualquer importância. Encontramos a próxima fase onde um líder sabota sua sustentabilidade na liderança em ações de Miriã. Na esteira das bordas caídas de Israel, as relações dentro da estrutura de liderança de Israel azedaram. Isto permanece verdade até hoje; só temos um momento difícil reconhecendo-o. Por alguma razão, muitos líderes, como Miriã, sentem-se na liberdade de criticar aqueles mais próximos a eles na liderança. Mas o Espírito San38 • Recursos Espirituais | JULHO 2011 dem a seguir o mesmo padrão. Choramingamos com coisas sem importância tão facilmente quanto lamentamos a respeito das coisas mais valiosas. Há uma regra tácita na liderança que parece dar credibilidade a este tipo de padrão. Uma rápida olhada em Números 14 mostra-nos que, de repente, toda a nação de Israel começou a murmurar. Esta é a consequência natural quando nossa borda e nosso foco se corrompem com sentimentos e palavras negativos. Tudo vai mal. Esta é uma realidade poderosa na liderança: o todo é o resultado da borda e do núcleo. suficiente para se obter uma borda ociosa. Há também uma enorme pressão em nossos relacionamentos executivos – aqueles com quem vamos ombro a ombro na batalha. É muito fácil tornar-se negligente e casual e fazer-se de ofendido com aqueles que mais amamos. Líderes sustentáveis mantêm seus corações limpos em ambos os espectros – a borda e o núcleo. Eles percebem que há muita coisa em jogo... que o todo permanecerá saudável ou será vencido pela murmuração que pressiona contra eles a partir da borda e do núcleo. Portanto, é tempo de abster-se de reclamação. SCOTT HAGAN Pastor-Presidente da Mars Hill Community Church, das Assembleias de Deus de Sacramento, Califórnia (EUA).