ANDRADE, Cristiana Cyrino Borges de. INCLUSÃO DA GESTÃO

Transcrição

ANDRADE, Cristiana Cyrino Borges de. INCLUSÃO DA GESTÃO
CENTRO UNIVERSITÁRIO UNA
DIRETORIA DE EDUCAÇÃO CONTINUADA, PESQUISA
E EXTENSÃO
MESTRADO EM GESTÃO SOCIAL, EDUCAÇÃO E
DESENVOLVIMENTO LOCAL
CRISTIANA CYRINO BORGES DE ANDRADE
INCLUSÃO DA GESTÃO SOCIAL NA COLETA
SELETIVA EM BELO HORIZONTE:
um estudo da arte e propostas de intervenções
Belo Horizonte
2014
CRISTIANA CYRINO BORGES DE ANDRADE
INCLUSÃO DA GESTÃO SOCIAL NA COLETA
SELETIVA DE BELO HORIZONTE:
um estudo da arte e propostas de intervenções
Dissertação apresentada ao Mestrado em
Gestão Social, Educação e Desenvolvimento
Local do Centro Universitário UNA, como
requisito parcial à obtenção do título de mestre.
Área de concentração: Inovações Sociais,
Educação e Desenvolvimento Local
Linha de pesquisa: Gestão Social e
Desenvolvimento Local
Orientador: Prof. Dr. Cláudio Márcio Magalhães
Belo Horizonte
2014
Dedico este trabalho aos meus pais, José Celso Borges de
Andrade e Angela Maria Cyrino de Andrade, que sempre
ofereceram todas as condições para eu ser quem sou e para
chegar até aqui: amor incondicional, educação e valores éticos.
A vocês, minha gratidão sempre.
Em memória de meus avós maternos, Alfredo Albino de Almeida
Cyrino e Augusta Maria Dantas Cyrino, e paternos, João Borges
de Andrade e Yolanda Borges de Andrade, pelo exemplo de
vida.
Em especial, ao meu bisavô materno, Luiz Ascendino Dantas,
cujo idealismo de justiça ambiental com certeza se faz presente
em meu DNA.
Agradecimentos
A Teresa Caram, Ellen Cristie e Elizabeth Colares, o meu muito
obrigada e carinho por “segurarem a onda” das minhas páginas
diárias. Valeu, equipe!
A Josemar Gimenez, o meu muito obrigada por ter possibilitado
que eu flexibilizasse meus horários e tarefas diárias no trabalho
para fazer o mestrado.
Aos amigos Péricles Pedrosa Lima e Tereza Magalhães, e à tia
Maria Luiza Cyrino Valle, o meu muito obrigada por terem me
incentivado durante todo esse caminho.
Ao meu orientador, Cláudio Magalhães, o meu muito obrigada
pela paciência, os puxões de orelha e as palavras certas nos
momentos difíceis. Valeu, prof.!
A todo o corpo docente e profissionais do Centro Universitário
UNA, e aos colegas do mestrado, o meu muito obrigada pela
companhia nessa trajetória.
“Se somos os autores da sociedade, podemos destruí-la ou
transformá-la. Basta para isso que o queiramos."
Durkheim (1887)
RESUMO
A questão ambiental ganha contornos cada vez maiores no planeta. Lidar com os
resíduos sólidos urbanos é um desafio para todos os países: dos mais ricos aos mais
pobres. Belo Horizonte, capital de Minas Gerais, tem um sistema de coleta seletiva
que atinge a maioridade em 2014, mesmo ano em que as diretrizes da nova Política
Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS) brasileira têm que ser implantadas. A PNRS,
instituída pela Lei 12.305/2010, estabelece uma série de objetivos e metas a serem
cumpridas pela sociedade brasileira, entre elas a responsabilização pela geração de
lixo e a gestão compartilhada entre sociedade civil, indústria e governo, considerando
a inclusão de catadores no processo. Diante dessas questões, busca-se contribuir
com este debate fazendo a articulação da política em curso na capital mineira e a
política nacional, e apontando alguns caminhos para o enfrentamento da questão,
enfatizando a redução da geração de resíduos, a coleta seletiva de materiais
recicláveis e a adoção da gestão social como possiblidade na condução do processo
dialógico entre município e cidadãos. Na contextualização para este debate, foi
necessário entender os conceitos de meio ambiente que passaram a ser
problematizados mais fortemente desde a década de 1970 no cenário mundial. A
estratégia de pesquisa adotada foi um estudo de literatura, a partir da pesquisa
bibliográfica e documental, situando-se, portanto, no âmbito da pesquisa qualitativa.
Observou-se, de maneira geral, que o projeto em curso em Belo Horizonte está em
consonância com alguns pontos exigidos pela PNRS e contribuiu para a articulação
de uma série de ações no setor de resíduos da capital, apesar de haver desafios a
serem enfrentados. Como propostas de intervenção, foram desenvolvidos pela
pesquisadora um blog e uma página do Facebook, com o objetivo de criar um espaço
de debate entre cidadãos sobre suas práticas pessoais em relação ao lixo, e
idealizada uma série de diálogos na capital mineira, envolvendo toda a cidade, para a
construção de elementos que componham o plano municipal de gestão integrada de
resíduos sólidos.
Palavras-chave: coleta seletiva, gestão social, desenvolvimento local e cidadania.
ABSTRACT
The environmental theme has increasingly gained prominence in the world. To deal
with urban solid waste has become a challenge for all the countries. Belo Horizonte,
capital of Minas Gerais, Brazil, has a selective waste collection Project that has
reached maturity in 2014. In this same year the Brazilian directives for the new National
Politics of Solid Waste (PNRS) must be implemented. The Law 12.305/2010 that
created the PNRS, established a series of objectives and targets that must be followed
by Brazilian society. One of these is the accountability over waste production and
integrated management involving civil society, industry and government, necessarily
considering the inclusion of the informal garbage collectors. This work is an attempt to
contribute to this debate by establishing a connection between the politics of waste
collection at the local (the capital of Minas) and national levels. It also tries to point out
some solutions to the problem question, emphasizing the reduction of waste
production, the selective collection of recyclable material and the adoption of social
management as a possibility in the conduction of the dialogic process between the
municipality and its citizens. To contextualize this debate, it was necessary to
understand the meaning of environmental problems which became a world issue in the
70’s. The research strategy was the literature study, beginning with documental and
bibliographic research, with an emphasis on the qualitative research. It was observed
that the project currently under way in Belo Horizonte is in agreement with some of the
demands of the PNRS and has contributed for the articulation of a series of actions in
the area of collection, although there are challenges to be faced. As intervention
proposals, a blog and a Facebook page were created by the researcher by aiming at
creating a space of debate among citizens regarding their personal practices in relation
to waste disposal, and a series of dialogues in the capital of the state involving the
entire city.
Key-words: selective waste collection, social management, citizenship, local
development.
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
ABDI – Associação Brasileira de Desenvolvimento Industrial
ABINEE – Associação Brasileira da Indústria Elétrica e Eletrônica
ABRELPE – Associação Brasileira de Empresas de Limpeza Pública e Resíduos
Especiais
AI-5 (ato institucional número 5)
ASMARE – Associação de Catadores de Papel, Papelão e Material Reaproveitável
de Belo Horizonte
BID – Banco Interamericano de Desenvolvimento
BNDES – Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social
CEMAT – Centrais Elétricas Matogrossenses
CEMPRE – Compromisso Empresarial para a Reciclagem
CMBH – Câmara Municipal de Belo Horizonte
CONAMA – Conselho Nacional de Meio Ambiente
COP – Convenção das Partes para Mudanças Climáticas da ONU
COPAM – Conselho de Política Ambiental de Minas Gerais
CMRR – Centro Mineiro de Referência em Resíduos
FEAM – Fundação Estadual de Meio Ambiente de Minas Gerais
FMI – Fundo Monetário Internacional
IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
IBAMA – Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis
ICLEI – International Council for Local Environmental Initiatives
INPE – Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais
INSEA – Instituto Nenuca de Desenvolvimento Sustentável
MNCR – Movimento Nacional dos Catadores de Materiais Recicláveis
LEV – Local de entrega voluntária
ONG – Organização não governamental
ONU – Organização das Nações Unidas
OPA – Operação Pan-Americana
PEI – Política Externa Independente
PIB – Produto Interno Bruto
PNRS – Política Nacional de Resíduos Sólidos
PNUMA – Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente
PBH – Prefeitura de Belo Horizonte
RMBH – Região Metropolitana de Belo Horizonte
RSU – resíduo sólido urbano
SEMAD – Secretaria de Estado de Meio Ambiente de Minas Gerais
SERVAS – Serviço Social de Minas Gerais
SINVAM – Sistema Nacional de Vigilância da Amazônia
SISNAMA – Sistema Nacional do Meio Ambiente
SLU – Superintendência de Limpeza Urbana de Belo Horizonte
SMMA – Secretaria Municipal de Meio Ambiente
SMARU – Secretarias de Administração Regional Municipal
SNVS – Sistema Nacional de Vigilância Sanitária
SUASA – Sistema Unificado de Atenção à Sanidade Agropecuária
UNCED – Conferência da ONU sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento
UNICEF – Fundo das Nações Unidas para a Infância
URPV – Unidade de Recebimento de Pequenos Volumes de Entulho
WMO – Organização Meteorológica Mundial
LISTA DE ILUSTRAÇÕES
Figura 1 – Expectativas da Política Nacional de Resíduos Sólidos para
as distintas partes relacionadas .............................................................................. 103
Figura 2 – Fotografia lixão brasileiro ........................................................................ 111
Figura 3 – Mapa de Belo Horizonte – divisões regionais administrativas ................. 129
Figura 4 – Fotografia do Fórum Estadual Lixo e Cidadania ......................................131
Figura 5 – Fotografia cooperativa de materiais recicláveis no Barreiro .................... 135
Figura 6 – Fotografia Locais de entrega voluntária em Belo Horizonte ................... 136
Figura 7 – Fotografia de bota-fora no Bairro São Paulo ........................................... 145
Figura 8 – Sensibilização social: lixômetro colocado na Praça Sete ..................... 155
Quadro 1 – Previsão antes e depois da PNRS ...................................................... 112
Quadro 2 – Fracionamento dos resíduos em Belo Horizonte ............................... 125
Quadro 3 – Estatística dos resíduos em Belo Horizonte ....................................... 129
Quadro 4 – Resultados esperados pela Prefeitura de Belo Horizonte ................... 139
Quadro 5 – Bairros atendidos pela coleta seletiva ................................................. 141
Quadro 6 – Confrontação de alguns itens da PNRS e sua realidade em Belo
Horizonte ................................................................................................................ 147
Quadro 7 – Articulação da Secretaria Municipal
Adjunta de Gestão Compartilhada ......................................................................... 150
Quadro 8 – Mudanças geradas pela passagem do mundo analógico para o mundo
digital .................................................................................................................... 157
Quadro 9 – Planejamento estratégico-participativo de ações para BH .................. 164
TABELAS
Tabela 1 – Os principais marcos para se chegar à PNRS ...................................... 104
Tabela 2 – Participação dos Principais Materiais no Total de RSU Coletado no Brasil
em 2012 .................................................................................................................. 116
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO.......................................................................................................... 14
1 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS E DOCUMENTAIS........................................ 20
1.1 Interferências ambientais e origem dos debates................................................ 20
1.2 A ONU como condutora da discussão mundial.................................................. 23
1.2.1 – A Rio-92 e a Agenda 21 .................................................................... 26
1.2.2 – Kyoto e os acordos vinculantes ........................................................ 28
1.2.3 – Debates e a Rio+20 ........................................................................... 30
1.3 As várias facetas do desenvolvimento ............................................................... 31
1.4 O lixo .................................................................................................................. 43
1.4.1 – Problema global e de saúde pública ................................................. 46
1.5 Articulando conceitos ......................................................................................... 50
1.5.1 O papel do Estado ................................................................................ 50
1.5.1.1 A Era Vargas (1930-1945) ...................................................... 53
1.5.1.2 A Era Dutra (1945-1951) ........................................................ 55
1.5.1.3 O retorno de Getulio Vargas (1952-1954) .............................. 56
1.5.1.4 A Era JK (1956-1960) ............................................................ 57
1.5.1.5 Transição até o Golpe Militar (1961-1964) ............................. 59
1.5.1.6 Militares na direção (1964-1984) ............................................ 60
1.5.1.7 O início da abertura para a democracia ................................. 63
1.5.1.8 Eleições diretas e o neoliberalismo ........................................ 64
1.5.1.9 Era FHC (1995-1998/1999-2002) ........................................... 65
1.5.1.10 Era Lula (2003-2006/2007-2010) ......................................... 66
1.5.1.11 Era Dilma Rousseff (2011-2014) .......................................... 68
1.5.2 Cidade(ania) ........................................................................................ 72
1.5.2.1 Cidadania para o mercado ou para a participação social? ..... 75
1.5.3 Desenvolvimento local e globalização .................................................. 82
1.5.4 Participação, comunicação e gestão social .......................................... 87
1.5.5 Exemplos pelo mundo e por aqui ......................................................... 96
2 CIDADE(ÃO) E O LIXO: A SITUAÇÃO DE BELO HORIZONTE DIANTE DA PNRS
E A ADOÇÃO DA GESTÃO SOCIAL NA POLÍTICA DE
COLETA SELETIVA ............................................................................................... 100
2.1 Introdução ..........................................................................................................100
2.2 A Política Nacional de Resíduos Sólidos ......................................................... 102
2.2.1 Educação ambiental na PNRS .......................................................... 106
2.2.2 Responsabilidade pelo lixo: cada um é dono do seu ......................... 108
2.2.3 Lixões banidos e a coleta seletiva presente ....................................... 110
2.2.4 Modelo de consumo e reciclagem ..................................................... 113
2.3 Minas, um estado à frente em ações ambientais ............................................. 118
2.4 Estudo de caso: a construção da política de
coleta seletiva em Belo Horizonte ...........................................................................120
2.4.1 Gestão participativa (1993-1996) ....................................................... 122
2.4.2 Continuidade, com mudanças (1996-1999) ........................................ 125
2.4.3 Reforma administrativa (2001-2004) .................................................. 128
2.4.4 Terceirização da coleta (2005-2008) ................................................. 132
2.4.5 Sem avanços (2009-2012) ..................................................................137
2.4.6 Metas e resultados (ainda) não atingidos (2013-2016) ...................... 139
2.4.7 Panorama atual e os 21 anos da coleta ............................................. 140
2.4.8 Onde BH (não) atende a PNRS .......................................................... 146
2.4.9 Espaços de participação ..................................................................... 148
2.5 Em tempo: fatos recentes, velhos problemas................................................... 152
3 PROPOSTA DE INTERVENÇÃO ......................................................................... 154
3.1 Introdução ......................................................................................................... 154
3.2 Objetivos ........................................................................................................... 159
3.3 Detalhamento .................................................................................................... 159
3.3.1 Blog /Página no Facebook .................................................................. 159
3.3.2 Rodadas de diálogos – Papo de lixo: o que
isso tem a ver com você? ........................................................................................163
3.3.2.1 Objetivos ............................................................................... 163
3.3.2.2 Metodologia ........................................................................... 164
3.3.2.3 Desenvolvimento ....................................................................167
3.3.2.4 Resultados esperados .......................................................... 168
4 CONSIDERAÇÕES FINAIS................................................................................. 169
REFERÊNCIAS ..................................................................................................... 173
ANEXOS
Anexo I .................................................................................................................... 175
Anexo II.................................................................................................................... 203
Anexo III................................................................................................................... 212
Anexo IV.................................................................................................................. 216
Anexo V ................................................................................................................... 218
14
INTRODUÇÃO
Pouco mais de quatro décadas, aproximadamente, separam a geração atual do
início dos debates, globalmente falando, sobre as questões ambientais. Dos idos de
1970, quando o Clube de Roma se reuniu para compor um relatório sobre os rumos
do planeta, até 2014, a questão ambiental extrapolou os gabinetes de dirigentes das
nações e chegou a organizações não governamentais voltadas para o tema, aos
grupos de pesquisa acadêmica que tratam cientificamente o assunto e às
consciências individuais de pessoas que acreditam poder dar sua contribuição no
dia a dia por um planeta mais saudável.
Desde o fim dos anos 1700, início de 1800, com a Revolução Industrial, a Terra
experimentou uma mudança profunda na forma de a sociedade se organizar e,
principalmente, de explorar os recursos naturais. Os países desenvolvidos usaram o
que tinham: recursos minerais e florestas de todo tipo, petróleo, água. Os
subdesenvolvidos, instados a imitar ou seguir os passos dos primeiros, buscaram
desenvolver-se como nação da mesma forma exploratória, usando e abusando das
matérias-primas naturais.
Uma das questões principais para a escolha desse tema é a crescente geração de
resíduos no Brasil, principalmente pela ascensão econômica dos últimos anos e
maior poder de compra da população, que incrementaram a produção de lixo, e a
percepção de que há uma lacuna ou ausência de projetos de conscientização da
população para a questão. Dados do Panorama dos Resíduos Sólidos no Brasil
2012, produzido pela Associação Brasileira de Empresas de Limpeza Pública e
Resíduos Especiais (Abrelpe), mostram que a “geração de resíduo sólidos urbanos
(RSUs) no Brasil cresceu 1,3% de 2011 para 2012, índice superior à taxa
populacional urbana no país, no período, de 0,9%” (ABRELPE, 2012, p. 28).
Outra questão que teve peso na escolha do tema foi o fato de os resíduos sólidos
urbanos (RSUs) englobarem quase todas as problemáticas inerentes a um agente
poluidor: mal acondicionados e mal descartados, contaminam água, solo e ar;
podem ser transformados em foco de doenças e ajudar na sua proliferação. Do
contrário, se bem geridos, podem ter diminuída sua produção; grande parte deles
15
podem voltar a ser matéria-prima; e o fato de os resíduos recicláveis serem fonte de
renda para milhares de pessoas no mundo.
O fato é: estamos diante de uma cadeia complexa, intimamente interligada, e de
responsabilidade de cada um de nós. E é com o intuito de trazer a reflexão de que
os resíduos sólidos urbanos gerados por cada pessoa são responsabilidade
individual de cada um e não apenas do Estado, e que, como cidadãos, devemos
contribuir para a não geração deles, que se tomou a problemática do lixo urbano
como o ponto crucial deste trabalho. Vale ressaltar que este é um desafio não
apenas local, da capital mineira, tampouco do Brasil, mas global.
Diante disso, considerou-se importante e pertinente, do ponto de vista da relevância
acadêmica e social, problematizar, no contexto da Política Nacional de Resíduos
Sólidos (PNRS)1, uma legislação recente no Brasil, em vigor desde 2010 (Lei
12.305), a adoção da gestão social no plano municipal de gestão dos resíduos
sólidos de Belo Horizonte, capital de Minas Gerais, com vista ao desenvolvimento
local e ao fortalecimento da participação social em uma política pública. A
elaboração deste plano é uma das exigências da PNRS para todos os 5.570
municípios brasileiros, que deve estar em execução em 2014.
Para trabalhar essas questões, recorremos à pesquisa bibliográfica e documental, e
ao estudo de caso de Belo Horizonte. Entre os objetivos do trabalho estão: a) a
análise da política de gestão da coleta seletiva de materiais recicláveis em vigor em
Belo Horizonte desde 1993 até os dias atuais; b) a verificação da existência de
ferramentas ou instâncias na capital voltadas para a participação democrática/cidadã
envolvendo a temática ambiental; c) a compreensão da possibilidade de adoção da
gestão social no desenvolvimento do plano municipal de gestão integrada de
resíduos sólidos, d) e a verificação de algumas das exigências da PNRS diante do
que a cidade já tem como prática.
Partiu-se de algumas hipóteses para essa investigação: a) a de que havia
estagnação da atual política de coleta seletiva da cidade; b) a de que o belo-
1
Política Nacional de Resíduos Sólidos na íntegra em Anexo I.
16
horizontino, de forma geral, desconhecia que a cidade tinha um programa de coleta
de materiais; c) a de que havia ausência de alguns atores pilares para um processo
completo, como as indústrias recicladoras.
Considerando
que
a
construção
do
conhecimento
está
em
constante
aprimoramento, não houve pretensão de se ater a vários conceitos já tratados
extensamente na literatura, mas trazer alguns deles para o debate, aqueles
considerados essenciais na compreensão da articulação da atual política de coleta
seletiva de Belo Horizonte e o novo plano que deve ser construído para atender a
PNRS.
Como metodologia, partiu-se da pesquisa bibliográfica (dissertações, teses e artigos)
e documental (principalmente jornais e sites oficiais de órgãos) para traçar alguns
marcos da história da temática ambiental no mundo, tendo como marco inicial os
primeiros anos da década de 1970, quando foi criado o Clube de Roma, uma das
primeiras reuniões no século 20 que congregaram uma elite formada por cientistas,
empresários e pensadores que começaram a debater a temática ambiental.
Partindo do conceito de GIL (2009) de que pesquisa social é um processo e que a
metodologia científica permite a obtenção de novos conhecimentos no campo da
realidade social – e realidade social aqui é entendida em sentido bastante amplo,
envolvendo todos os aspectos relativos ao homem e seus múltiplos relacionamentos
com outros homens e instituições sociais –, esta investigação pretendeu se
concentrar no universo da pesquisa descritiva, com leves traços que a aproximam
da pesquisa exploratória, que objetiva estabelecer, além da simples identificação de
relações entre variáveis, a natureza destas relações, qual seja, a possibilidade da
adoção da gestão social na política de coleta de materiais recicláveis em Belo
Horizonte.
Ainda segundo Gil (2009), a pesquisa explicativa tem a preocupação central de
identificar os fatores que determinam e contribuem para a ocorrência dos
fenômenos, buscando explicar a razão e o porquê das coisas. Em relação à
natureza da pesquisa, esta se classifica como preponderantemente qualitativa e
encontra respaldo em Gil (2009):
17
Os fatos sociais dificilmente podem ser tratados como coisas, pois são
produzidos por seres que sentem, pensam, agem e reagem, sendo
capazes, portanto, de orientar a situação de diferentes maneiras. (GIL,
2009, p.5)
A revisão de literatura pode ser expositiva, questionadora, histórica e opinativa.
Acredita-se que este trabalho caminhou com forte tendência à revisão opinativa. Os
critérios seguidos para fazer a pesquisa bibliográfica e documental e a coleta dos
dados secundários foram consultar primeiramente fontes oficiais, portais de teses e
artigos mais usados e consultados no meio acadêmico. Observou-se ainda a
relevância e atualidade dos dados. Foram consultados, no âmbito das fontes oficiais
as páginas oficiais e documentos (disponíveis na internet) como leis, resoluções e
decretos, do Governo Federal e seus órgãos correlacionados ao meio ambiente; da
Prefeitura de Belo Horizonte e seus órgãos correlacionados ao meio ambiente;
pesquisas e dados disponíveis no endereço eletrônico do Instituto Brasileiro de
Geografia e Estatísticas (IBGE); dissertações e teses nos bancos de dados Portal
Capes, Scielo e Google Acadêmico, que tivessem como palavras-chave: resíduos
sólidos urbanos, lixo, cidadania, reciclagem, desenvolvimento local, políticas
públicas, gestão social, gestão participativa, educação ambiental.
Na biblioteca do Centro Universitário UNA buscou-se literatura especializada com
base nos autores que mais abordam a temática, com enfoque para gestão social,
desenvolvimento local, cidadania, desenvolvimento sustentável, participação. Entre
os títulos adquiridos pela pesquisadora, todos se voltaram para a temática da gestão
social, participação, desenvolvimento local, mobilização social e comunicação para
mobilização social. Entre os jornais da grande imprensa consultados, citamos
Estado de Minas, Folha de São Paulo e O Globo.
Como esclarece Gil (2009), num estudo de caso é preciso definir o número de casos
e sua delimitação de quando e onde ele será observado. Tomou-se então a coleta
seletiva de Belo Horizonte como objeto de estudo, fazendo o recorte a partir de
1993, quando a política começou a ser implementada. Entre as variáveis
observadas, estavam a articulação da atual política de coleta seletiva da capital
mineira no contexto da Política Nacional de Resíduos Sólidos, uma legislação
recente no Brasil, em vigor desde 2010 (Lei 12.305), e a verificação de que seria
18
possível inserir a gestão social no plano municipal de gestão dos resíduos sólidos da
capital mineira, com vista ao desenvolvimento local e ao fortalecimento da
participação social em uma política pública.
Mostrou-se necessário para fundamentar a discussão da adoção da gestão social na
nova política de resíduos sólidos da capital mineira buscar no histórico recente de
BH, principalmente durante o processo de redemocratização do Estado brasileiro,
indícios de espaços, instâncias ou instrumentos democráticos de exercício da
cidadania. E se neles, em algum momento, o debate sobre a temática ambiental,
além do programa da coleta seletiva implantado em 1993, foi contemplado.
O objetivo foi compreender se o programa da coleta seletiva veio sozinho ou
acompanhado de outras discussões que envolvem o abrangente campo sociológico
ambiental, numa articulação com a educação ambiental para os cidadãos com o
intuito de lançar um olhar sobre temas como saneamento, proteção de cursos
d’água, qualidade de vida, criação de unidades de conservação no município.
Na divisão de capítulos, no capítulo 1 são abordados o início dos debates no cenário
mundial; os marcos de discussões mais pertinentes em escala global e nacional; a
contextualização com o modelo econômico e de sociedade que veio sendo
construído desde a Revolução Industrial, o papel do Estado em todo este cenário e a
conceituação de resíduos, cidadania, gestão social, desenvolvimento local,
participação e mobilização social.
No capítulo 2, foram mostrados o retrato do caminho seguido por Belo Horizonte
dentro da temática dos resíduos sólidos, as conquistas em 20 anos de experiência e
a situação da Política Nacional dos Resíduos na capital. Foi importante, nesse
contexto, descrever as principais exigências da PNRS, que deve ser posta em
prática em 2014. Pela ausência de dados recentes na literatura sobre a situação da
gestão de resíduos sólidos na capital, buscou-se informações em dados oficiais da
Prefeitura de Belo Horizonte, da Câmara Municipal de Belo Horizonte e notícias
(principalmente de jornais) sobre a condução da política para alcançar os objetivos
da PNRS.
19
Constatou-se que, apesar de ainda ser considerada referência em alguns aspectos e
de a prefeitura afirmar que detém diversas ferramentas participativas, Belo Horizonte
ainda não elaborou seu plano municipal integrado de resíduos, o pontapé inicial para
atender as exigências da política nacional. Nesse contexto, a capital mineira tem
uma oportunidade ímpar de construir esse plano juntamente com a sociedade,
adotando a gestão social nesse processo.
No capítulo 3, são apresentadas pela pesquisadora duas propostas de intervenção,
conforme exigência do mestrado profissional como produto técnico. A primeira delas
é um blog de acesso livre (papodelixobh.blogspot.com.br) e uma página no
Facebook (www.facebook.com/papodelixo), ambos já no ar, criados com o objetivo
de dar voz aos vários agentes que participam do processo de coleta seletiva na
cidade e estabelecer um espaço de diálogo acerca dos desafios impostos pela
geração de resíduos. A outra proposta é uma série de diálogos, que seria articulada
e conduzida pela Prefeitura de Belo Horizonte em cada uma das nove
administrações regionais da cidade, como possibilidade de espaço participativo para
a construção do plano integrado de resíduos sólidos conjuntamente.
Nas considerações finais, resume-se a discussão construída ao longo da
dissertação e apresentam-se algumas considerações para o aprofundamento da
reflexão sobre o tema dos resíduos.
Por fim, toma-se a colocação de Guimarães e Fontoura (2012, p. 515), inspirados
em outros autores, como forma sucinta de expressar a condução deste estudo:
É preciso considerar que o conhecimento científico não tem por finalidade
única decifrar o real e construir uma verdade definitiva de como os fatos
ocorrem, mas sim entendê-los como elementos socialmente construídos e
situados (OLIVEIRA e PICCINI, 2009, apud GUIMARÃES e FONTOURA,
2012). [...] Desta forma, o pesquisador deixa de ser um sujeito neutro e é
chamado a refletir e agir sobre o tema e os indivíduos que estuda
(BOURDIEU, 2005, apud GUIMARÃES e FONTOURA, 2012), uma vez que
o conhecimento tratado pelas ciências sociais não se constitui apenas em
um saber técnico, mas também em um saber ético. A forma de agir na
relação que se estabelece com o objeto de estudo, bem como os meios
utilizados para o estudo e a reflexão desenvolvida, deve ser acima de tudo
uma atitude ética (GADAMER, 1996, apud GUIMARÃES e FONTOURA,
2012).
20
1 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS E DOCUMENTAIS
1.1 Interferências ambientais e origem dos debates
Entre as primeiras interferências feitas pelo homem no planeta estão a adaptação de
abrigos, as pinturas rupestres, a domesticação de animais, o cultivo da terra, a
confecção de utensílios domésticos (como facas e lanças). Elas tiveram início na
pré-história, entre 10 mil antes de Cristo (a.C.) e 5 mil anos a.C, e referem-se à
própria ocupação e condição de vida humana na Terra. Os primeiros núcleos
urbanos surgiram entre 5 mil a.C. e 4 mil a.C., ou seja, quase 7 mil anos atrás.
Na Idade Média, segundo Velloso (2008, p. 1.958), a maioria dos restos resultantes
da atividade do homem estava diretamente relacionada aos resíduos produzidos
pelo seu corpo: fezes, urina, secreções em geral e o próprio corpo humano em
decomposição. Havia ainda os restos provenientes da alimentação, como carcaças
de animais, cascas de frutas e hortaliças.
Em toda a evolução da ocupação e permanência do homem na Terra, os rejeitos –
restos de comida, objetos sem serventia e conserto – foram classificados como lixo.
Historicamente, séculos depois, na segunda metade dos anos 1700 e início dos
1800, o mundo passou por uma grande transformação com a Revolução Industrial:
máquinas foram introduzidas no processo de produção de bens e alimentos,
gerando novos tipos de “lixos”, como gases, líquidos e material inerte – mais tarde,
chamados tecnicamente de efluentes.
É nessa transformação da sociedade pelo homem que está inserida e intimamente
ligada a temática ambiental, pois é a partir dessa mudança e interferência – seja na
paisagem para dar passagem a uma estrada, seja no curso de um rio para ampliar
cultivares, seja em terras férteis para dar espaço a moradias – que o natural é
modificado completamente.
Passados mais de 200 anos do início da Revolução Industrial, governantes,
especialistas e a própria população começaram a voltar sua atenção para a questão
21
ambiental, não apenas a que envolvia o lixo, a poluição, mas o meio ambiente de
forma geral, buscando formatar os primeiros conceitos sobre como conciliar o
crescimento das cidades, a tecnologia, a mobilidade urbana, a grande expansão
populacional, com os limites da natureza, a finitude das matérias-primas, o
esgotamento de algumas fontes naturais que usamos para gerar bens, como o
minério, o petróleo, as árvores.
De acordo com o Clube de Roma, foi no fim da década de 1960 e início de 1970 que
os eventos para debater a sociedade e o meio ambiente tiveram mais destaque e o
conceito ambiental ganhou força. Um deles começa em 1968, quando o industrial
italiano Aurelio Peccei e o cientista escocês Alexander King iniciam uma discussão
sobre acordos internacionais de curto prazo sobre o ilimitado consumo de recursos
naturais e os impactos disso para o planeta. Essa discussão foi iniciada na Itália,
com cerca de 100 personalidades da elite local, figuras políticas, empresários e
cientistas. Nascia ali o Clube de Roma,
querendo identificar quais eram os problemas cruciais da sociedade mundial
que pudessem determinar o futuro da humanidade, e, a partir daí, pensar
juntos cenários alternativos de desenvolvimento, o grupo contratou um
estudo do Massachusetts Institut of Technology (MIT), dos Estados Unidos,
que focasse nos problemas globais do meio ambiente. A partir desse
estudo, foi gerado o primeiro relatório do Clube de Roma, chamado Limits to
Growth (The Club of Rome, 2012, tradução nossa).
O documento indicava alguns cenários diante do rápido crescimento econômico pelo
qual o mundo passava e suas consequências: elencava, principalmente, as
restrições ambientais diante do aumento das taxas demográficas, da poluição e
escassez de alimentos e matérias-primas naturais. Frente às situações-limite
indicadas pelo relatório, algumas até catastróficas, o documento do Clube de Roma
apontou que seria necessária uma revisão do comportamento humano e de toda a
sociedade, buscando um equilíbrio entre o desenvolvimento e o planeta, podendo
este ser alcançado somente por meio de uma estratégia global. Esse relatório serviu
como subsídio para os debates da Conferência de Estocolmo, o primeiro evento sob
os auspícios da Organização das Nações Unidas (ONU), realizada em 1972, na
capital da Suécia (The Club of Rome, 2012, p. 1).
22
A origem da noção de sustentabilidade, segundo Moreira (2000, p. 1), é anterior ao
texto do Clube de Roma, Limites do crescimento, de 1972, e à publicação da
Conferência de Estocolmo sobre Human Environment, do mesmo ano. Baseado em
Brüseke (1994), ele ressalta:
Os debates sobre os riscos da degradação do meio ambiente começaram
nos anos 60 e nos anos 70. Brüseke realça a importância tanto da
publicação The entropy law and the economic process de GeorgescuRoegen, de 1971, que tornou-se o marco da economia ecológica e das
considerações sobre o papel da termodinâmica para o estudo do
desenvolvimento e da sustentabilidade, quanto do Environment and styles
of development de Ignacy Sachs, que, em 1976 por sua vez, formulou o
conceito de ecodesenvolvimento. (MOREIRA, 2000, p. 1)
Para alguns autores, o Clube de Roma tinha caráter fortemente elitista, tendo
adotado um discurso no sentido de manter a vigência do modelo capitalista nas
discussões sobre a questão ambiental.
“A partir do relatório do Clube de Roma, o capitalismo estaria se
interrogando sobre como mudar os comportamentos produtivos e de
consumo, o cálculo econômico e as formas de regulação para que o modelo
de desenvolvimento dominante pudesse prosseguir” (ACSELRAD, 2000,
p.99)
Ou seja, havia o debate, que pode ser interpretado como sinal de preocupação,
mas, para alguns autores, como Acselrad, no fundo, um desejo de que nada
mudasse as regras do jogo, de um mundo voltado para o capitalismo.
“O discurso da sustentabilidade nasceu no seio da tecnoburocracia do
desenvolvimento capitalista. Ele foi emergindo através da caracterização de
problemas globais que afetariam a biosfera e também a pressão do
movimento ambientalista. Na lógica da própria tecnoburocracia haveria o
reconhecimento de que o desenvolvimento capitalista estaria ameaçado
porque as suas bases materiais de reprodução estariam sendo
comprometidas. (ASCELRAD, 2000, p. 98)
Nos debates iniciados, então, em 1960 e em 1970, tanto do Clube de Roma como
na reunião de Estocolmo, havia o grupo de alarmistas, de que o mundo estava perto
do colapso, e o grupo dos que acreditavam que todos os recursos eram infinitos e
que a Terra teria matéria-prima abundante para todo o sempre. O mundo não
acabou (ainda), mas vem dando vários sinais de que está esgotado da forma como
23
é explorado. No âmbito dessa discussão, do impacto que o meio ambiente vem
sofrendo e, principalmente do manejo e da produção de resíduos, é impossível não
falar da intrincada relação entre o modelo econômico vigente e as decisões políticas,
temas que serão abordados mais adiante.
1.2 A ONU como condutora da discussão mundial
A reunião em Estocolmo, em 1972, quando foi realizada a Primeira Conferência das
Nações Unidas (ONU) pôs a questão ambiental nas agendas oficiais e na pauta das
organizações internacionais. A Conferência Internacional para o Meio Ambiente
Humano enfocou a necessidade de tomar medidas efetivas de controle dos fatores
que vinham causando a degradação ambiental, sendo considerada um marco
institucional do ambientalismo global.
Jogando luz sobre esta realidade, Macedo Soares diz que:
Desde o fim da II Guerra Mundial, as economias industrializadas de
mercado (Estados Unidos, Canadá, Europa Ocidental, Japão, Austrália e
Nova Zelândia) conheceram mais de 20 anos de crescimento constante com
a introdução do consumo de massa, que os norte-americanos conheciam
desde os anos 1930. [...] A combinação de tal progresso com democracia
em área tão vasta foi um fenômeno inédito na História. Na segunda metade
dos anos 1960, o mundo rico deu-se conta de que a festa não era de
graça. A juventude nesses países ocidentais, que, aliás, gozava das
benesses da riqueza e podia dar-se ao luxo de inventar novas maneiras de
viver, deu o alarme. O abuso da natureza era evidente, o ar das grandes
metrópoles estava irrespirável, os rios e as praias cheiravam mal. O
diagnóstico resumia-se pela palavra "poluição”. [...] Em poucas palavras,
Estocolmo destinava-se a limpar a sujeira e pôr filtros nas chaminés.
Era ótimo, mas custava dinheiro e exigia tecnologia. [...] (MACEDO
SOARES, 2012, p. 1, grifo nosso)
Entre os vários artigos corroborados pelos 113 países participantes da Conferência
de Estocolmo,
o Princípio 21 foi um dos mais importantes, pois afirmou o direito de cada
país em usar seus recursos naturais de acordo com suas próprias políticas
ambientais, acrescentando, em contrapartida, a responsabilidade de não
causar dano ao meio ambiente de outros países (MACEDO SOARES, 2012,
p. 1).
24
Vinte anos depois, o Princípio 21 se tornaria a Agenda 21 2, um documento global
repleto de propostas de ações que cada país, com suas peculiaridades e
características, tentaria pôr em prática.
O processo de formulação da agenda 21 foi inédito não só na história da
ONU como também na dos movimentos sociais organizados. Legitimou um
espaço de diálogo e negociação que propiciou uma mudança na visão do
papel do Estado com respeito à resolução dos problemas socioambientais.
(CORRAL, 2008, p. 202)
Outros itens, também relevantes, indicaram o embate entre os países ricos e
industrializados e os subdesenvolvidos e menos industrializados – questão que até
hoje é alvo de intensas discussões diante dos investimentos a serem feitos no meio
ambiente para tentar minimizar os efeitos do aquecimento global no planeta. Os
desenvolvidos, que já tinham explorado suas fontes naturais de riquezas,
mostravam-se pouco disponíveis a contribuir financeiramente com os países
subdesenvolvidos em busca de soluções mais limpas e menos poluentes. Esses
alegavam (e ainda o fazem) não poder pagar pelo ônus dos mais ricos e também
porque têm o direito de buscar e atingir sua independência produtiva.
O resultado de Estocolmo, do ponto de vista político, foi marcar o campo de
jogo: meio ambiente e desenvolvimento têm de combinar-se. Tratar de
um sem o outro não funciona. Além disso, e não é pouco, a preocupação
com o meio ambiente entrou nas agendas internacional e nacionais. [...]
(MACEDO SOARES, 2012, p. 1, grifo nosso)
Na visão de Sachs (2000), uma das mensagens de Estocolmo foi que
a política ambiental só será bem sucedida se for organicamente ligada a
uma política de progresso social, ou seja, desenvolvimento e meio
ambiente não podem ser dissociados (SACHS, 2000, p. 7, grifo nosso).
Foi também nesse período da reunião de Estocolomo, no fim de 1970, que o
conceito de sociedade civil, segundo Gohn (2004), passou por várias concepções e
significados, no Brasil e na América Latina, tornando-se sinônimo de participação e
organização da população civil na luta contra o regime militar.
2
Sumário principal da Agenda 21 global em Anexo II
25
Esse cenário estimulou o surgimento de inúmeras práticas coletivas no
interior da sociedade civil, voltadas para a reivindicação de bens, serviços e
direitos sociopolíticos, negados pelo regime político vigente. (GOHN, 2004,
p. 21)
Ainda no cenário da ONU como condutora dos debates ambientais, a organização
promoveu vários eventos e conferências em que o tema esteve em destaque. A
questão do aquecimento global só começou a adquirir maior importância com a
realização da Primeira Conferência Mundial sobre o Clima, em 1979, pela
Organização Meteorológica Mundial (WMO, na sigla em inglês), também das Nações
Unidas. Em 1983, foi criado o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente
(Pnuma) e, no mesmo ano, a ministra norueguesa Gro Harlem Brundtland foi
nomeada presidente da Comissão Mundial sobre Meio Ambiente.
Em 1985, houve a Convenção em Viena (para ratificar documentos assinados entre
os países), dois anos depois regulamentada por um protocolo negociado em
Montreal. Nessa época, a grande preocupação eram os gases nocivos usados na
indústria. Todo esse movimento, conforme Silva (1992), era um apelo da Assembleia
Geral das Nações Unidas, com a finalidade de
propor estratégias ambientais de longo alcance, a fim de obter um
desenvolvimento sustentável por volta do ano 2000; recomendar maneiras
para que a preocupação com o meio ambiente se traduza em ampla
cooperação entre todos os países; detectar meios e abordagens pelos quais
a comunidade internacional possa enfrentar, simultaneamente, e com
eficiência, os problemas do desenvolvimento econômico e social e a
preservação do meio ambiente (SILVA, 1992, p. 65).
Em 1990, a ONU criou um órgão científico para acompanhar os desdobramentos
dos impactos do homem no ambiente, o Painel Intergovernamental sobre a Mudança
do Clima (IPCC, na sigla em inglês). Nesta época já havia um alto grau de
conhecimento sobre os efeitos da temperatura global no planeta. O IPCC reuniu
estudos de diversos pesquisadores do mundo todo, que jogavam luz sobre a
questão ambiental em seus vários aspectos. O objetivo era ajuntar informações,
decodificá-las e propor soluções. Um dos relatórios produzidos em 1979, na Primeira
Conferência Mundial sobre o Clima, e os dados do Relatório Brundtland, serviram
para dar continuidade aos debates e à elaboração do Primeiro Relatório de
Avaliação do IPCC, em 1990.
26
Esse esforço foi traduzido politicamente na constituição do Comitê
Negociador Internacional para uma Convenção sobre Mudança do Clima.
Este relatório deu legitimidade às discussões sobre o tema, visto que se
tornou uma declaração investida da autoridade da comunidade científica
internacional na época. Assim, como reação imediata ao relatório do IPCC,
137 países reuniram-se na Segunda Conferência Mundial sobre o Clima, em
1990, e decidiram usar o ano de 1990 como ano-base para as políticas de
emissão de gás carbônico (CO2) a serem formuladas a partir dali.
(MOREIRA e GIOMETTI, 2008)
1.2.1 A Rio-92 e a Agenda 21
Em 1992, a cidade do Rio de Janeiro sediou a Conferência da ONU sobre Meio
Ambiente e Desenvolvimento (UNCED/Rio-92), que reuniu representantes de 178
países e estabeleceu as bases para ações e articulações que deveriam ser postas
em prática por todas as nações – a Agenda 21 –, dividindo tarefas entre órgãos
federais, estados e municípios, com a participação da sociedade. Cada um cuidando
de uma agenda ambiental, dentro de suas competências, com a participação efetiva
da população. Nesse sentido, Corral diz que
a noção de parceria cunhada pela Agenda 21 revolucionou o campo das
políticas públicas na medida em que o governo deixou de ser considerado o
único ator responsável pela formulação, desenho e implementação dos
instrumentos que traduzem o desenvolvimento na prática (CORRAL, 2008,
p. 202-203).
Na visão de Corral, a Rio-92 não só criou a situação para implantar uma nova
estratégia para articular recursos humanos no desenvolvimento, como concedeu um
novo significado à dimensão local:
[...] O processo de formulação da Agenda 21 [...] concedeu aos cidadãos,
às lideranças dos movimentos sociais, ambientais e corporativos pela
responsabilidade social uma nova identidade, a de parceiros do
desenvolvimento sustentável (CORRAL, 2008, p. 202, grifo nosso).
Outros dois pontos importantes a destacar da Rio-92 foram a redação e
conceituação do princípio da precaução, segundo o qual a ausência de evidência
científica não justifica a falta de ação preventiva, ou seja, o poluidor tem a obrigação
de arcar com o prejuízo caso sua atividade assim determine, bem como ele tem a
necessidade de fazer uma avaliação de impacto ambiental de sua atividade.
27
O outro ponto, bem lembrado por Macedo Soares (2012, p. 1), diz que, “pela
primeira vez, um documento consensual das Nações Unidas inclui a expressão
‘direito ao desenvolvimento’ o qual só pode ser alcançado se for combinado com
proteção ambiental”. A declaração da Rio-92 mencionava ainda a necessidade de
reduzir e eliminar padrões insustentáveis de produção e consumo, bem como fez
referência à transferência de tecnologias dos países desenvolvidos aos países em
desenvolvimento. O mundo passou a assistir a uma mudança não só dos países e
governos, mas de atitude das pessoas, conforme frisa Corral, ressaltando a
importância da parceria que começa a se desenhar entre sociedade e poder público:
Os anos que se seguiram à Conferência Rio 92 foram muito ricos no
aprendizado de uma nova possibilidade de articulação entre Estado,
sociedade e setor privado. [...] Nossa visão de cidadania e sobre as
instituições do Estado e da sociedade se alterou. O caminho para a
solução dos problemas socioambientais, cada vez mais complexos, é visto
muito mais a partir de uma articulação dinâmica dos recursos disponíveis do
que de esquemas preconcebidos atrelados a uma instituição específica. [...]
(CORRAL, 2008, p. 203, grifo nosso).
A partir daí, é possível dizer que, mesmo já havendo movimentos pró-ecologia muito
antes da Rio-92, não apenas no Brasil, mas mundo afora, foi a partir desse encontro
que o tema se tornou amplamente divulgado nos países. Diversos movimentos
sociais e organizações não governamentais (ONGs) surgiram e os já existentes,
como o grupo ativista Greenpeace e a ONG WWF, se consolidaram no apoio à
causa ambiental.
Apesar dessa sinalização da sociedade em prol da conscientização por um mundo
mais equilibrado e do esforço das Nações Unidas em colocar o meio ambiente, a
cooperação e o desenvolvimento no âmbito das discussões, pouco houve de
avanço, uma vez que até hoje as grandes corporações transnacionais não
participaram desse debate, assertiva referendada por Rivero:
As organizações internacionais não podem continuar sendo meros fóruns
diplomáticos, locais de debates e negociações entre representantes de
governos que não têm o real poder para mudar as tendências globais da
economia e do meio ambiente. A concepção de representação internacional
e corresponsabilidade deve ser estendida para incluir grandes corporações
transnacionais e representantes da sociedade civil. (RIVERO, 2003, p. 53)
28
Um ano depois da Rio-92, a ONG WorldWatch Institute divulgou um relatório no qual
analisava, de forma crítica, os resultados da conferência. Segundo Brüseke (1994),
“apesar do interesse mundial mais intensivo pelo futuro do planeta, a conferência da
ONU não correspondeu nem às esperanças e nem às expectativas com ela ligadas”.
Muitos problemas surgiram em consequência da pressão da delegação dos
Estados Unidos em favor da eliminação das metas e dos cronogramas para
a limitação da emissão de CO2 do acordo sobre o clima. [...] Também a
convenção sobre a proteção da biodiversidade teve alguns pontos fracos; o
mais grave foi a falta da assinatura dos Estados Unidos. Apesar dessas
restrições, documentou a UNCED o crescimento da consciência sobre os
perigos que o modelo atual de desenvolvimento econômico significa. A
interligação entre o desenvolvimento socioeconômico e as
transformações no meio ambiente, durante décadas ignorada, entrou
no discurso oficial da maioria dos governos do mundo. (BRÜSEKE,
1994, p. 32, grifo nosso)
Na Rio-92 também ficou acordado que representantes dos países-membros da ONU
passariam a se reunir nas chamadas conferências das partes da convenção de
mudanças climáticas (COPs). Foi nesses encontros que os países começaram a
definir marcos regulatórios e legislações universais em relação ao meio ambiente.
1.2.2 Kyoto e os acordos vinculantes
Um dos marcos nesses debates das COPs foi a assinatura do Protocolo de Kyoto,
na cidade de mesmo nome, no Japão, em dezembro de 1997, que estabeleceu
metas de redução de emissão de gases de efeito estufa (GEEs) no ambiente (entre
eles o dióxido de carbono (CO2), ozônio (O3), metano (CH4) e óxido nitroso (N2O)) e
mecanismos para que elas fossem cumpridas.
Em 2002, a Cúpula de Johannesburgo, outro evento global para o meio ambiente e
coordenado pela ONU, foi marcada pela falta de agenda detalhada de regiões e subregiões mundiais, que poderiam ter seguido as recomendações dos encontros
anteriores para desenharem juntos propostas de uma agenda comum.
O fracasso em Johannesburgo foi provocado por dois motivos
fundamentais. Por um lado, pecou-se por excesso de otimismo ao acreditar
que o mundo já estaria maduro para definir um plano de ação comum,
quando na verdade não consegue sequer introduzir maiores graus de
29
governança à Organização das Nações Unidas, arquétipo de uma
autoridade planetária com vistos de governo mundial. Por outro lado, pecouse também por excesso de pessimismo, ao não apostar na definição prévia
de uma agenda de decisões específicas. Ao tentar-se imaginar um mundo
ideal que não existia, e ao tentar-se evitar conflitos propondo uma agenda
suficientemente ampla e ambígua para agradar a todos, ou pelo menos não
alienar os mais poderosos, terminou-se criando uma situação quase
impossível de não provocar o desfecho frustrante. (GUIMARÃES e
FONTOURA, 2012, p. 515)
Uma das questões que explicam essa situação de falta de um acordo global é que o
comprometimento dos países nunca se deu de forma igualitária – uns demonstraram
vontade de reduzir emissões, outros não aceitavam assinar nenhum acordo de
redução. A COP estabeleceu compromissos distintos para cada grupo de países,
baseados nas condições socioeconômicas de cada um, e que países desenvolvidos,
sendo os maiores responsáveis históricos pelas emissões de GEEs na atmosfera,
deveriam adotar ações mais imediatas para amenizar o problema.
O primeiro grupo, denominado países Partes Anexo I engloba países
desenvolvidos da Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento
Econômico (OCDE) e os países industrializados ex-comunistas em
transição para a economia de mercado, que possuem compromissos de
redução de gases de efeito estufa. O segundo grupo, denominado países
Partes não-Anexo I, agrega os países em desenvolvimento, que não
possuem compromissos de redução, mas ficam obrigados a elaborarem
inventários nacionais de emissões de carbono. (VIOLA, 2003, p. 190, apud
MOREIRA e GIOMETTI, 2008).
Mas na prática a coisa foi bem diferente. Os Estados Unidos, por exemplo, que
estão no Anexo I, nunca assinaram um acordo vinculante em uma COP, ou seja,
nunca aceitaram se comprometer na redução de suas emissões. O que nos leva a
crer que os EUA nunca quiseram reconhecer que seu modelo capitalista
hegemônico de desenvolvimento – em que o modus vivendi das pessoas é traduzido
pelo consumo desenfreado sem reflexão sobre os impactos na vida do planeta – é
que estava em questão. E que repensá-lo não é apenas em função de proteger o
planeta, as águas, o solo, fauna e flora, mas algo muito maior: toca na questão do
poder que os Estados Unidos, como nação mais poderosa do mundo, têm sobre os
demais. Buscamos em Ricupero (2001) um fundamento para essa ideia:
30
O que caracteriza o sistema internacional atual não é que os EUA sejam o
único ator, mas o exclusivo ator a desempenhar papel de primeira grandeza
em todos os tabuleiros. [...] Esse poder multiforme permite aos americanos
defender sua soberania de qualquer intento de interferência exterior,
inclusive do resultado de negociações multilaterais de tratados e
convenções, e, ao mesmo tempo, pressionar outras soberanias a aceitar
limitações oriundas de regras e padrões que interessam a Washington
multilateralizar [...]. (RICUPERO, 2001, p. 48)
A COP-15, ocorrida em dezembro de 2009, na Dinamarca, foi uma das mais
esperadas, pois reuniu todos os chefes de Estado mundiais, um cenário que
convergia para que um acordo global fosse ratificado por todos os países – dos mais
ricos aos já atingidos pelas mudanças do clima, como as ilhas do Oceano Pacífico. A
expectativa girava em torno não apenas de reduzir os GEEs, mas no
estabelecimento da quantia destinada a um fundo monetário, a ser criado para que
países desenvolvidos ajudassem os países subdesenvolvidos. O evento terminou
um dia depois do previsto, assim como todas as demais COPs, sem avanços em
termos de um acordo global, mas com exaustivos debates sobre meio ambiente,
mudança de legislações, participação ativa de ONGs e das comitivas de 199 paísesmembros da ONU.
1.2.3 Debates e a Rio+20
As conferências continuaram colocando em pauta os efeitos do aquecimento do
planeta e suas consequências; os novos indicativos da ciência sobre o tema; a
importância da preservação de florestas e da fauna; o degelo das calotas polares e
sua influência sobre os oceanos e sobre o clima de maneira geral e global, mas
sempre sem um grande acordo. Dias antes de o Brasil sediar a Rio+20, em junho de
2012, duas décadas depois da Rio-92 na cidade do Rio de Janeiro, Abranches
(2012a) escreveu sobre a relação entre crise econômica e crise ambiental, tentando
fazer uma análise crítica sobre a falta de visão que os dirigentes mundiais ainda têm
sobre os temas, sendo que a primeira ocorre em função da segunda.
Se lemos os jornais em todo o mundo a palavra crise só aparece associada
à economia. Nos últimos meses houve várias reuniões de lideranças
mundiais para discutir a crise econômica: G8, G20, Fórum das Maiores
Economias e vários encontros de lideranças europeias, entre muitos
outros. Nos três primeiros, a questão ambiental foi tratada de passagem,
31
mas o foco foi a crise econômica. Os governantes e seus ministros
debruçaram-se sobre os dados de crescimento do PIB, balança comercial,
balanço fiscal, equilíbrio monetário, câmbio, inflação, emprego,
investimento, consumo, para verificar a eficácia das medidas a serem
tomadas para debelar a crise e definir novas ações anticíclicas. Estão
certos. A crise econômica é grave e afeta a todos nós. É uma crise que
combina aspectos estruturais – associados ao esgotamento do modelo
econômico atual, ao desequilíbrio fiscal de longo prazo e à dinâmica
dos mercados financeiros globais. (ABRANCHES, 2012a, p. 1, grifo
nosso)
Em mais um encontro dos países-membros da ONU, a Rio+20 acabou sendo palco
de debates calorosos, com foco na necessidade de que é preciso mudar o atual
modelo econômico, pautado no consumo, na concentração de renda nas mãos de
um percentual pequeno da população mundial, reforçando ainda mais a pobreza de
várias nações, na exploração (ainda) intensa da natureza. Falou-se mais do mesmo:
mudanças climáticas, redução de GEEs, mas novamente sem uma grande tomada
de decisão global.
1.3 As várias facetas do desenvolvimento
Dentro de todo o cenário do debate ambiental é impossível não falar do
desenvolvimento. Os temas estão intrinsecamente ligados, como já exposto, em
vários trechos e citações, pelo limite tênue entre economia, sociedade, exploração
natural, preservação, degradação, crescimento econômico e modo de vida.
Buscando na literatura uma definição para o termo desenvolvimento percebe-se que
ele tem vários significados e, na maioria dos casos, nos remete a ideia de algo
positivo, no sentido de evolução, de crescimento.
É o desenvolvimento, evolução da sociedade, na forma de pensar, agir e de viver,
então, que daria esse sentido ao todo, ao local onde o homem vive, às suas
relações com o mundo. Ao tentar construir uma linha do tempo dos vários
significados dados ao desenvolvimento, Favaretto (2006, p. 36) diz que foi “no
nascimento das intepretações racionais do mundo, entre os gregos, que uma certa
ideia de evolução e desenvolvimento foi sendo formada”. Favaretto (2006) e
Gonçalves (2008) vão buscar na palavra physis – que indica que por si só brota, se
32
abre, emerge, se manifesta, caracteriza-se por dinamicidade – uma certa relação
entre natureza e desenvolvimento.
À physis pertencem o céu e a terra, a pedra, a planta, o animal e o homem,
o acontecer humano como obra do homem e dos deuses, e, sobretudo,
pertencem à physis os próprios deuses. [...] Vale dizer que na base do
conceito de physis não está nossa experiência da natureza, pois a physis
possibilita ao homem uma experiência totalmente outra que não a que
temos face à natureza. Assim, a physis compreende a totalidade daquilo
que é, além dela nada há que possa merecer a investigação humana.
(GONÇALVES, 2008, p. 30-31)
Segundo Gonçalves, é com Platão e Aristóteles que se inicia uma mudança no
conceito de physis, “havendo um certo desprezo “pelas pedras e pelas plantas” e a
um privilegiamento do homem e da ideia”, em meio à crise da democracia grega
(GONÇALVES, 2008, p. 31). Como no passado, frisa o autor,
é nos momentos de crise que os setores da sociedade se colocam a tarefa
de repensar seus fundamentos, seus valores, seu modo de ser. O
movimento ecológico está bem no centro dessas complexas questões. Não
é por acaso que, modernamente, a problemática ecológica transita entre a
ciência, a filosofia e a política, recolocando inclusive em novas bases a
relação entre esses três planos (GONÇALVES, 2008, p. 32).
Se faz necessário voltar um pouco na história afim de compreender um pouco o
cenário atual. O renascimento, iniciado no século 14, foi marcado pelo racionalismo,
onde a burguesia, oriunda das camadas marginalizadas da sociedade medieval,
firmou-se como classe social por meio do prestígio e da riqueza. “Essa mesma
burguesia pretendia ter o domínio completo da natureza, numa atitude chamada,
mais tarde, de científica, a fim de ampliar seus lucros.” (ARRUDA e PILETTI, 1995,
p. 132)
É nesse período que surge a matemática, tida como elemento-chave para dominar a
natureza, o que vai resultar na convicção de que tudo se pode explicar pela razão e
pela ciência, tendo tudo de ser provado. A ciência ganha força nas teorias de Galileu
Galilei, Copérnico, Pomponazzi. Nas artes e na cultura, as produções de todo tipo se
espalham pela sociedade em geral.
33
Entre os séculos 15 e 16, houve a grande expansão marítima europeia, em busca de
maior proximidade com o mercado internacional, fomentada principalmente pelos
produtos orientais e pela crise de crescimento da economia europeia que passava
pela inadequação entre dois sistemas distintos: o feudal (baseado na zona rural), em
transformação, e o capitalista (nas cidades), em formação.
No século 16, a reforma religiosa marcou a grande transformação espiritual da
época moderna. O progresso comercial e urbano dava sinais de crescimento,
criando uma nova realidade econômica.
Mas a Igreja, ao condenar os juros e os lucros, impedia o avanço do
processo de acumulação do capital. Ao mesmo tempo, a crise do
feudalismo havia criado problemas sociais que, certamente, conduziria a
uma crise religiosa. Se os senhores eram católicos, os camponeses
oprimidos facilmente assumiriam uma posição contrária, transformado luta
religiosa em luta de classes. (ARRUDA e PILETTI, 1995, p. 136)
Entre os séculos 15 e 16, durante a transição do feudalismo ao capitalismo, começa
mais fortemente a era da acumulação originária do capital, originada na Baixa Idade
Média, agora com ênfase na política econômica do capitalismo comercial.
A política mercantilista tinha como objetivo direto o fortalecimento do
Estado, e indireto o enriquecimento da burguesia. O modelo inicial do
mercantilismo foi a política econômica desenvolvida na Baixa Idade Média
pelas cidades. Elas procuravam equilibrar oferta e procura, evitavam a
concorrência intervindo na produção e estabeleciam preços máximos e
mínimos. (ARRUDA e PILETTI, 1995, p. 162)
Em Descartes (1596-1650), a relação homem natureza vai ganhar um novo
contorno, sendo a natureza um recurso, um meio para se atingir um fim. O
antropocentrismo (o homem como centro do mundo) também reforça essa
separação do sujeito e da natureza. O Brasil conhece bem essa fase de mudança da
relação homem-natureza, inclusive deve seu nome a uma das árvores mais
exploradas por seu colonizador, Portugal, o pau-brasil (Caesalpinia echinata Lam.).
Daqui, extraíram-se não apenas alguns milhares de espécimes madeireiros, mas
também todo o tipo de minerais, principalmente o ouro e o diamante.
34
O processo de colonização durante os séculos 16 e 17 está ligado não somente à
expansão comercial e marítima da Europa, mas ao fortalecimento das monarquias e
à política mercantil, que refletia a teoria do capitalismo comercial – acumulação do
capital por meio do lucro obtido com o comércio (com o conceito de comprar barato
e vender mais caro), por meio da exploração do trabalho do homem, seja o
assalariado ou o escravo. A premissa maior era a acumulação maior de riquezas.
Conquista e exploração das colônias, eis o elemento essencial de tal
política econômica. A colônia existe em função das necessidades
metropolitanas e cumpre seu papel na medida em que contribui para a
manutenção da balança comercial favorável, transferindo lucros para a
burguesia mercantil e para o Estado. (ARRUDA e PILETTI, 1995, p. 163)
É no século 18, no entanto, que toda essa construção vai se firmar como um novo
sistema de sociedade: capitalismo comercial, política mercantilista, intolerância
religiosa, e a consolidação do Estado absolutista, marcado fortemente pela
racionalização e burocratização. Vem então a Revolução Industrial, um grande
marco na segunda metade do século 18, que pôs fim à transição entre feudalismo e
capitalismo, quando as ferramentas passam a ser substituídas pelas máquinas. Num
breve resumo, esse período é marcado por três fases, segundo Arruda e Piletti:
1760 a 1850 – A Revolução Industrial se restringe à Inglaterra;
preponderam a produção de bens de consumo, especialmente têxteis, e a
energia e o vapor;
1850 a 1900 – Revolução se espalha pela Europa, América e Ásia. Cresce
a concorrência, a indústria de bens de produção se desenvolve, ferrovias se
expandem; surgem novas formas de energia, como a hidrelétrica e a
derivada do petróleo. Transporte se revoluciona com a invenção da
locomotiva e do barco a vapor.
De 1900 até os dias atuais – Surgem conglomerados industriais e
multinacionais. A produção se automatiza, surge a produção em série,
explode a sociedade de consumo de massas, com a expansão dos meios
de comunicação. Avançam a indústria química, eletrônica, a engenharia
genética e a robótica. (ARRUDA e PILETTI, (1995, p. 178)
Na visão de Gonçalves, com o crescimento da ciência e da técnica no século 19, e a
natureza sendo vista, cada vez mais como objeto a ser possuído e dominado,
“qualquer tentativa de pensar o homem e a natureza de uma forma orgânica e
integrada tornou-se agora mais difícil” (GONÇALVES, 2008, p. 34).
35
O fim do século 18 é marcado como a Era das Revoluções Burguesas, com início do
movimento nos Estados Unidos por sua independência da Inglaterra, em 1776,
atingindo outros países, como Irlanda, Holanda, Itália, Alemanha, Suíça e culmina na
França, com a Revolução Francesa, em 1789.
O homem, instrumentalizado pelo método científico, pode penetrar nos
mistérios da natureza e, assim, tornar-se “senhor e possuidor da natureza”.
[...] Com o desenvolvimento mercantil e, com ele, da burguesia, a riqueza
passa cada vez mais a depender da técnica. [...] A Revolução Industrial
evidencia a força dessas ideias ou, como preferem alguns, a Revolução
Industrial é a base dessas ideias. (GONÇALVES, 2008, p. 33-34)
Com a virada para o século 20, as ciências da natureza se separam das ciências do
homem. Conforme Gonçalves (2008, p. 35), tem-se “a ideia de uma natureza
objetiva e exterior ao homem, o que pressupõe uma ideia de homem não-natural e
fora da natureza, cristaliza-se com a civilização industrial inaugurada pelo
capitalismo”. O que o autor vai analisar ainda é que o movimento ecológico que
surgirá ao longo do século 20 e a própria ecologia, enquanto saber, tentam
denunciar as consequências dessas concepções industriais capitalistas do homem
separado da natureza, “embora o façam muitas vezes permeados pelos princípios e
valores dos seus próprios detratores” (GONÇALVES, 2008, P. 35).
Dentro desse contexto na atualidade, muitos autores sugerem a mudança no modelo
de economia vigente. Um dos críticos do modelo de desenvolvimento atual, Lima
(1997, p. 204), diz que “embora o pensamento crítico dirigido à sociedade urbanoindustrial e a seus impactos socioambientais remonte aos séculos 18 e 19, as
críticas de ontem e de hoje têm significados diversos”.
O ritmo e o volume da produção mundial, o tamanho da população e seu
estilo de vida e consumo não representavam um problema a ser
considerado. As críticas de hoje, por sua vez, surgem num contexto onde os
problemas já são evidentes, modificam a qualidade de vida de milhões de
pessoas, assumem uma escala planetária e permitem antever situações de
alta gravidade e irreversibilidade a longo prazo, caso não se tomem
providências efetivas. (LIMA, 1997, p. 204)
36
Em 1987, ao ser divulgado o Relatório Brundtland num dos eventos da ONU, esse
documento trouxe o conceito de sustentabilidade muito usado até hoje (e alvo de
críticas por diversos autores), que se resume a: “proteger recursos naturais hoje
para atender as necessidades do presente sem comprometer a capacidade de
futuras gerações proverem suas próprias necessidades”. Um de seus críticos,
Acselrad (2000), vai dizer que “esse corte intergeracional abdica, sem dúvida, de
perceber a diversidade social no interior do futuro e do próprio presente”.
As definições correntes em órgãos como o Banco Mundial afirmam que
esse desenvolvimento é pautado em estabelecer “iguais condições de
acesso aos recursos naturais às diferentes gerações”. Afirmam que a meta
desse desenvolvimento é alcançar um crescimento renovável, além de
conservar recursos e imprimir mudança técnica. Tratam-se igualmente de
definições socialmente vazias e teleológicas: são definidas pelos efeitos que
pretendem atingir e não pelos processos sociopolíticos que deverão ser
acionados em nome de tal pretensão. (ACSELRAD, 2000, p. 97)
Outro que critica o Relatório Brundtland, por não ter contemplado diversos itens que
permeiam a questão ambiental, social, econômica e, principalmente, a questão das
sociedades capitalistas e a concentração de renda nos países e sociedades mais
ricas, é Moreira (2000):
Em termos de justiça e equidade social, há uma forte inadequação. O
Relatório não questiona a propriedade e a distribuição dos ativos que
conformam nossas sociedades capitalistas. Estes ativos produtivos são a
base da concentração de rendas e da diferenciação de estilos de vida, tanto
no interior das nações como entre elas. Esse Relatório enfatiza que as
questões ambiental e ecológica impõem a necessidade de novas relações
entre nações, e sugere medidas a serem tomadas por governos nacionais e
instituições internacionais, evitando, no entanto, a explicitação da
necessidade de novas relações sociais no interior de cada território
nacional. Esta postura não problematiza o jogo de forças, as
divergências de interesses sociais em disputa e a dominação
hegemônica a ele associada. Neste sentido, a equidade social
dificilmente será alcançada e a justiça estará sempre relacionada a
interesses socialmente hegemônicos. (MOREIRA, 2000, p. 1, grifo
nosso)
Para Lima (1997), analisar a construção e emergência do conceito de
desenvolvimento sustentável é compreender os processos objetivos e subjetivos que
levaram
à
consciência
do
esgotamento
do
modelo
de
desenvolvimento
experimentado nas últimas décadas, e da necessidade de uma nova concepção. A
37
crítica relevante, segundo ele, recai sobre as características intrínsecas do
capitalismo industrial:
a) a orientação segundo princípios do mercado; b) a busca da lucratividade,
produtividade e competitividade máximas. Tais características, inerentes ao
processo de reprodução e expansão do capital tem impactos diretos sobre a
qualidade do desenvolvimento socioambiental. O sistema de mercado não
existe para satisfazer as necessidades das pessoas mas sim para
atender aos desejos dos consumidores e a lucratividade dos
produtores. Por consequência, o resultado dessa equação não poderia
ser outro senão a divisão da sociedade em zonas de inclusão e de
exclusão social, num processo crescente de desigualdade social
(LIMA, 1997, p. 205, grifo nosso).
Além da colocação de Lima, encontramos em Naredo uma reflexão fundamental:
A transição à sustentabilidade requer mudanças profundas no arquétipo
dominante de civilização, em particular no que se refere ao padrão cultural
de articulação entre os seres humanos e a natureza. O uso manipulado e
politicamente interessado do conceito de desenvolvimento sustentável, que
chega ao borde de transformá-lo em oximoro desprovido de qualquer
significado social de transformação, confunde mais do que esclarece o
debate. (NAREDO, 1998, apud GUIMARÃES e FONTOURA, 2012)
Segundo Brüseke (1994), “foi o canadense Maurice Strong que usou em 1973 pela
primeira vez o conceito de ecodesenvolvimento para caracterizar uma concepção
alternativa de política do desenvolvimento”.
Ignacy Sachs formulou os princípios básicos desta nova visão do
desenvolvimento. Ela integrou basicamente seis aspectos, que deveriam
guiar os caminhos do desenvolvimento: a) a satisfação das necessidades
básicas; b) a solidariedade com as gerações futuras; c) a participação da
população envolvida; d) a preservação dos recursos naturais e do meio
ambiente em geral; e) a elaboração de um sistema social garantindo
emprego, segurança social e respeito a outras culturas, e f) programas de
educação. (BRÜSEKE, 1994, p. 30)
Ainda na visão de Brüseke, a teoria de ecodesenvolvimento proposta por Sachs era
direcionada às regiões rurais da África, Ásia e América Latina; e passou a ganhar
uma
visão
das
superdesenvolvimento:
inter-relações
globais
entre
subdesenvolvimento
e
38
Uma crítica da sociedade industrial e, consequentemente, uma crítica da
modernização industrial como método do desenvolvimento das regiões
periféricas viraram parte integrante da concepção do ecodesenvolvimento.
Podemos constatar, principalmente nos trabalhos de Ignacy Sachs, mas
também de Glaeser & Uyasulu (1984), que os debates sobre o
ecodesenvolvimento prepararam a adoção posterior do desenvolvimento
sustentável.
Sachs
usa
hoje
frequentemente
os
conceitos
ecodesenvolvimento e desenvolvimento sustentável como sinônimos
(BRÜSEKE, 1994, p. 30)
Na opinião de Abranches (2012b), “as abordagens até agora discutidas falam muito
pouco em inovação e adotam um modelo de economia velho”.
É mais ou menos como se tudo que tivéssemos a fazer fosse reformar a
economia, como fazemos com um prédio velho, para torná-la sustentável.
Trata-se, ao contrário, de abrir caminho, com essas metas, para uma nova
economia, para a substituição dos modelos econômicos hoje em vigor. [...]
(ABRANCHES, 2012b, p. 1)
Na visão de Stahel (1994), ao falar de desenvolvimento sustentável, busca-se definir
ou compreender o desenvolvimento capitalista como sustentável, “ou seja, uma
sustentabilidade dentro do quadro institucional de um capitalismo de mercado”. “O
conceito corre o risco de tornar-se um conceito vazio, servindo apenas para dar nova
legitimidade para a expansão insustentável do capitalismo.” (STAHEL, 1994, p. 1)
Para Acselrad (2000, p. 99), a acumulação capitalista requer crescentemente
escalas mais amplas de produção, novos espaços sociais e físicos, disseminação de
monoculturas, e a substituição da diversidade social pela relação social capitalista
dominante. Esse modelo, na sua visão, é uma maneira do modelo capitalista vigente
manter-se vivo e se expandir no tecido social, mas sob o discurso da
sustentabilidade.
Formas não-capitalistas de apropriação e uso dos territórios e seus recursos
– como as camponesas, as extrativistas, as de pesca artesanal – são
frequentemente tornadas “insustentáveis” por serem comprometidas ou
destruídas por outras formas – no caso, pelas formas capitalistas que se
expandem no tecido social à custa da destruição das formas pré-existentes.
O extrativismo da borracha se torna insustentável não por sua relação
técnica com a borracha, mas porque a especulação latifundiária pretende se
apropriar do seringal e destruir as árvores. [...] Trata-se portanto de uma
concorrência instaurada entre formas sociais distintas. (ACSELRAD, 2000,
p. 98)
39
Em 1990, quando a ONU estabeleceu a criação do IPCC e os debates sobre a
redução das emissões dos gases de efeito estufa vieram à tona, as Nações Unidas
lançaram o Relatório do Desenvolvimento Humano (IDH), acrescentando à
discussão de desenvolvimento e crescimento das nações itens como educação,
saúde, lazer, ou seja, um viés muito além da medição baseada unicamente, até
então, no produto interno bruto (PIB) per capita. Uma mudança na forma de analisar
o desenvolvimento, no mínimo, interessante, conforme Veiga (2008) vai assinalar:
Foram surgindo evidências de que o intenso crescimento econômico
ocorrido durante a década de 1950 em diversos países semiindustrializados (entre os quais o Brasil) não se traduziu necessariamente
em maior acesso de populações pobres a bens materiais e culturais, como
ocorrera nos países considerados desenvolvidos. A começar pelo acesso à
saúde e à educação. Foi assim que surgiu o intenso debate internacional
sobre o sentido do vocábulo desenvolvimento. (VEIGA, 2008, p. 19)
Roegen (1971) trabalhou o conceito de crescimento econômico sob a perspectiva
biofísica, ao correlacionar os princípios da teoria da entropia aos recursos naturais.
Segundo ele, é impossível haver desenvolvimento exponencial a partir de uma base
de recursos escassos.
[Roegen] contribui, de forma inovadora, para o debate econômico e
ecológico ao propor a consideração da natureza no cálculo econômico, ou
melhor, para sugerir que o sistema econômico, apesar de sua aparente
autonomia, não passa de mero subsistema do ecossistema biofísico, do
qual depende como fonte supridora de recursos e como meio onde deposita
os resíduos finais das atividades de produção e consumo. (ROEGEN, 1971,
apud LIMA, 1997, p. 205).
Ao tentar conceituar o que é desenvolvimento, Bresser-Pereira resume:
Desenvolvimento é um processo de transformação econômica, política e
social, através do qual o crescimento do padrão de vida da população tende
a tornar-se automático e autônimo. Trata-se de um processo social global,
em que as estruturas econômicas, políticas e sociais de um país sofrem
contínuas e profundas transformações. Não tem sentido falar em
desenvolvimento apenas econômico, apenas político ou apenas social.
Não existe desenvolvimento dessa natureza, parcelado, setorializado.
[...] Se o desenvolvimento econômico não trouxer consigo modificações de
caráter social e político, se o desenvolvimento social e político não for a um
tempo o resultado e a causa de transformações econômicas, será por que
de fato não tivemos desenvolvimento. (BRESSER-PEREIRA, 2003, apud
TENÓRIO, 2007b, p. 72, grifo nosso)
40
Para Sachs (2008), “o desenvolvimento não se confunde com crescimento
econômico, que constitui apenas sua condição necessária, porém não suficiente”.
Para ele, desenvolvimento só existirá se houver redução de pobreza e das
desigualdades sociais.
[...] A sustentabilidade no tempo das civilizações humanas vai depender da
sua capacidade de se submeter aos preceitos de prudência ecológica e de
fazer um bom uso da natureza. É por isso que falamos de
desenvolvimento sustentável. A rigor, a adjetivação deveria ser
desdobrada em socialmente includente, ambientalmente sustentável e
economicamente sustentado no tempo. (SACHS, 2008, p. 9-10, grifo
nosso)
Ainda segundo Sachs (2008, p. 10), “a teologia do mercado, que hoje faz a cabeça
de muitos economistas, torna redundante o conceito de desenvolvimento. Por sua
vez, os adeptos da ecologia profunda teimam em considerar o crescimento
econômico como um mal absoluto”. Por fim, existem os que Sachs chama de
“desencantados do desenvolvimento”, que reclamam do desenvolvimentismo e
abandonam o conceito de desenvolvimento, por entenderem que este
é
simplesmente uma armadilha criada pelos países ricos para manter o poder sobre
os países periféricos.
Necessitamos de novos paradigmas, já que estamos sentados sobre as
ruínas do socialismo real, do Consenso de Washington, do crescimento
econômico socialmente perverso por se alimentar de desigualdades
crescentes, da social-democracia que foi longe demais na aceitação da
economia de mercado. (SACHS, 2008, p. 12)
Para Chanlat (2006), a hegemonia econômica do século 21 é pautada pela ausência
de uma oposição. Ele relembra que sua geração viveu basicamente com dois
modelos antagônicos, que brigavam entre si: o modelo capitalista, liberal, do livre
mercado; e o modelo soviético, socialista, comunista. Com a queda do muro de
Berlim (1993), esse embate entre modelos de vida e de desenvolvimento acaba.
O modelo europeu é bastante diferente do modelo americano, o modelo
japonês é diferente, e agora há o modelo chinês, que é totalmente diferente,
é um modelo de capitalismo, turbo-capitalismo, hipercapitalismo. [...] É
impressionante ver as condições de trabalho. Há um crescimento
econômico extraordinário, mas uma desigualdade enorme e um partido
comunista, que é o dirigente do processo. (CHANLAT, 2006, p. 10)
41
Veiga (2008), em Desenvolvimento Sustentável: desafios do século XXI, vai abordar
a questão, sob sua ótica e de vários autores que se debruçam a compreender o
conceito de desenvolvimento, sendo que um deles, Rivero, chama atenção por sua
colocação direta:
São os gurus do mito do desenvolvimento que têm uma visão
quantitativa do mundo. Ignoram os processos qualitativos históricoculturais, o progresso não-linear da sociedade, as abordagens éticas, e
até prescindem dos impactos ecológicos. Confundem crescimento
econômico com o desenvolvimento de uma modernidade capitalista
que não existe nos países pobres. Com tal perspectiva, eles só percebem
fenômenos econômicos secundários, como o crescimento do PIB, o
comportamento das exportações, ou a evolução do mercado acionário, mas
não reparam nas profundas disfunções qualitativas estruturais, sociais,
culturais e ecológicas, que prenunciam a inviabilidade dos ‘quase-Estadosnação subdesenvolvidos’”. (RIVERO, 2003, apud VEIGA, 2008, p. 22-23,
grifo nosso)
Rivero (2003) questiona como os países subdesenvolvidos vão chegar a uma
economia viável, enquanto produzem produtos primários ou de baixo grau de
transformação, e os desenvolvidos exigem cada vez mais tecnologia de ponta e
serviços especializados. Além disso, ele avalia que as corporações transnacionais
não têm interesse algum em investir nos países subdesenvolvidos, onde há uma
explosão demográfica de desempregados anualmente.
Enquanto a economia global hoje requer o incremento de alta tecnologia e,
acima de tudo, de serviços sofisticados, ela precisa cada vez menos de
produtos primários ou transformados. [...] As únicas vantagens comparativas
dos países subdesenvolvidos – mão de obra e matéria-prima – têm se
tornado cada vez menos importantes para a economia global. [...] Dessa
forma, torna-se extremamente difícil oferecer trabalho para 700 milhões de
desempregados e erradicar a extrema pobreza que atinge 1,6 bilhão de
pessoas nos países subdesenvolvidos. (RIVERO, 2003, p. 7)
Então, como equacionar a questão do modelo de consumo atual, em que o
exacerbado, o comprar e o ter são valores de vida para diversas gerações; o adquirir
equipamentos eletrônicos novos, a TV de LED que saiu ontem, os smartphones a
cada semana chegando às prateleiras com uma tecnologia nova é sinal de status
diante da sociedade, frente à geração de lixo a cada dia, de resíduos (muitos,
inclusive, perigosos, com chumbo, cádmio, mercúrio), num planeta que dá sinais de
esgotamento dessa forma de exploração com objetivos econômicos?
42
É o Estado que tem que oferecer as condições para a população agir ou esta, de
forma organizada em espaços para tal, deve se mobilizar? As universidades e
centros de pesquisa podem colaborar, de que forma? Se o modelo de sociedade
está esgotado como aponta uma corrente de autores (STAHEL, 1994; LIMA, 1997;
MOREIRA, 2000; BRESSER-PEREIRA, 2003; RIVERO, 2003; SACHS, 2008;
ABRANCHES,2012a), quem serão os atores envolvidos na marcha para a mudança
do modelo de sociedade em que vivemos? Na visão de Waizbort (1998), uma das
tarefas fundamentais do Estado é justamente a de equilibrar os conflitos que surgem
no bojo do processo econômico, devendo levá-los para a esfera do sistema político,
que é o espaço institucionalizado para discussões.
Estado moderno implica, cada vez mais, “sociedade civil” e “esfera pública”.
Sua legitimidade enquanto procedimento se ancora nelas. São espaços de
regulação e controle do Estado, e também de energização, vitalização e
revitalização. (WAIZBORT, 1998, p. 68)
Na visão de Acselrad (2000), um caminho viável do desenvolvimento é repensar as
articulações entre dimensões econômicas, sociais e político-institucionais. Um dos
modelos seria movido pelos processos temporais de inovação, velocidade de
circulação da informação e o uso do conhecimento tecnológico. O outro teria foco na
cidadania como condição do desenvolvimento.
“[Esse modelo] exigiria um mergulho no novo paradigma tecnológico e
organizacional da acumulação flexível, através da conexão estratégica entre
reestruturação produtiva, progresso técnico e educação. (ACSELRAD,
2000, p. 103)
[...] O desenvolvimento seria movido prioritariamente pelas potencialidades
do espaço territorial. Um modelo agrícola que preserve a fertilidade dos
solos, cultive a biodiversidade e seu potencial genético; um novo padrão
energético baseado em fontes alternativas e na descentralização; políticas
públicas que reconheçam as especificidades regionais do território e
das culturas. [...] Um desenvolvimento descentralizado buscaria elevar
os graus de autossuficiência microrregional, estimulando a produção
para o autoconsumo, a integração e a desespecialização de certas
economias locais, reduzindo sua dependência frente às dinâmicas nacionais
e globais. [...]” (ACSELRAD, 2000, p. 104-105, grifo nosso)
Esse pensamento de Acselrad remete a ideia da conceituação de desenvolvimento
local, focado na participação da sociedade civil em decisões políticas em prol da
evolução e bem-estar de sua base territorial. O autor vai acrescentar, ainda, que a
43
construção desse modelo seria ancorado nas experiências de movimentos sociais já
existentes (camponeses, pescadores, comunidades extrativistas), que têm ampla
vivência nessa relação de exploração sustentável com a natureza.
“A participação democrática e a socialização da política seriam
condições do desenvolvimento, que contaria com a participação da
sociedade nos fóruns de discussão sobre as decisões de interesse
público. [...] Peça emblemática de tal modelo, a reforma agrária
fortaleceria a agricultura familiar, produziria um reordenamento da
ocupação do espaço, reduzindo a pressão demográfica nas cidades,
enfrentando a desigualdade e a exclusão social, articulando metas de
segurança alimentar, preservação do potencial da biodiversidade e
buscando alternativas ecologicamente sustentáveis à agricultura
químico-mecanizada.” (ACSELRAD, 2000, p. 105)
Sen, Nobel de economia, vai dizer ainda que é preciso avaliar, dentro da concepção
de desenvolvimento como liberdade, “em que grau as pessoas têm a oportunidade
de obter resultados que elas valorizam e que têm razão para valorizar”. Ele propõe
um desenvolvimento de país ou de local pautado pelo desenvolvimento humano de
quem ali vive, e não apenas o sujeito visto apenas como um índice a compor o
produto interno bruto (PIB) do seu país.
Tanto o aspecto do processo como o aspecto da oportunidade da liberdade
requerem que avancemos muito além da tradicional visão do
desenvolvimento em termos do “crescimento do produto per capita”. [...] O
aspecto do processo da liberdade tem que ser considerado conjuntamente
com o aspecto da oportunidade [...]. Ademais, a liberdade para participar da
discussão pública e da interação social pode ainda ter um papel construtivo
na formação de valores e éticas. (SEN, 2010, p. 371)
1.4 O lixo
E o que o lixo tem a ver com o desenvolvimento e com o modelo econômico que
temos hoje? Ele pode ser considerado o produto final desse processo, ele é o
reflexo do que e como a sociedade consome, vive, se comporta. O que a produção
excessiva de resíduos no mundo, – embalagens de toda natureza, PETs, plásticos,
vasilhames variados e lixo eletrônico – principalmente nos grandes centros urbanos,
tem colocado como reflexão fundamental para as nações é: vamos continuar com
esse modelo de economia, baseado no capitalismo selvagem, no consumo
desenfreado, na exploração predatória dos bens naturais sem planejamento, sendo
44
que para mantermos esse padrão de vida estamos sufocando solos e oceanos com
tanto lixo? Onde depositar tantas sobras?
Em muitos países, principalmente nos subdesenvolvidos como Brasil e Índia, seu
descarte ocorre no ambiente natural – seja em locais preparados ou destinados para
tal, como aterros sanitários e aterros controlados; seja de forma negligente em áreas
de mananciais, cultivo, na beira de estradas, lotes vagos e nas ruas, na maioria dos
casos, sem qualquer controle sanitário. Além de poluir rios e nascentes, a
decomposição desses resíduos emite gases na atmosfera e, dependendo de como
ele é acondicionado, se transforma em hábitat de vetores causadores de doenças no
homem.
A gestão e a disposição inadequada dos resíduos sólidos causam impactos
socioambientais, tais como degradação do solo, comprometimento dos
corpos d’água e mananciais, intensificação de enchentes, contribuição para
a poluição do ar e proliferação de vetores de importância sanitária nos
centros urbanos e catação em condições insalubres nas ruas e nas áreas
de disposição final. (BESEN et.al., 2010 apud JACOBI e BESEN, 2011, p.
135).
Não há como escapar. O desafio está colocado. São mais de 7 bilhões de pessoas
ao redor do planeta gerando resíduos diariamente e as previsões são de que até
2025 a tonelagem dobre das atuais.
Em 2002 o mundo tinha 2,9 bilhões de residentes em áreas urbanas,
gerando cada pessoa 0,64 quilo de resíduos sólidos urbanos (RSU) por dia,
totalizando 719 milhões de toneladas a cada ano. Em 2012, a estimativa era
de 3 bilhões de pessoas, gerando 1,2 quilo de resíduos cada uma, o
equivalente a 1,3 bilhão de toneladas anuais. Em 2025, o percentual vai
crescer incrivelmente para 4,3 bilhões de habitantes urbanos, produzindo
1,42 quilo de lixo por dia, totalizando 2,2 bilhões t/ano. (BANCO MUNDIAL,
2012, p. 10)
Mas, afinal, o que é lixo? Segundo Ferreira,
lixo é aquilo que se varre da casa, do jardim, da rua e se joga fora; entulho.
Tudo o que não presta e se joga fora. Sujidade, sujeira, imundície. Coisa ou
coisas inúteis, velhas, sem valor. (FERREIRA, 1975, p. 847).
45
Então lixo e resíduos têm o mesmo significado? Segundo a norma brasileira NBR
10.004/1987 – Resíduos sólidos, classificação –, resíduos sólidos são
aqueles resíduos nos estados sólido e semissólido, que resultam de
atividades da comunidade de origem industrial, doméstica, hospitalar,
comercial, agrícola, de serviços e de varrição. Ficam incluídos nesta
definição os lodos provenientes de sistemas de tratamento de água,
aqueles gerados em equipamentos e instalações de controle de poluição,
bem como determinados líquidos cujas particularidades tornem inviável o
seu lançamento na rede pública de esgotos ou corpos de água, ou exijam
para isso soluções técnicas e economicamente inviáveis em face a melhor
tecnologia disponível (NBR 10.004/1987).
Na busca de definição mais abrangente, Santos (2008) procurou três referências
para lixo e resíduo: “Lixo urbano é um conceito genérico, um termo abrangente e
são vários os vocábulos usados para designá-lo” (OLIVEIRA, 1983, apud SANTOS,
2008, p. 14). “O conceito de lixo e de resíduo pode variar conforme a época e o
lugar. Depende de fatores jurídicos, econômicos, ambientais, sociais e tecnológicos”
(CALDERONI, 2003, apud SANTOS, 2008, p. 14). E ainda:
Resíduos sólidos compreendem todos os restos domésticos e resíduos não
perigosos, tais como os resíduos comerciais e institucionais, o lixo da rua e
os entulhos de construção. Em alguns países, o sistema de gestão dos
resíduos sólidos também se ocupa dos resíduos humanos, tais como
excrementos, cinzas de incineradores, sedimentos de fossas sépticas e de
instalações de tratamento de esgoto. Se manifestarem características
perigosas, esses resíduos devem ser tratados como resíduos perigosos.
(ONU, 1992)
Segundo definição do Ministério do Meio Ambiente (MMA):
Resíduos sólidos urbanos (RSUs) correspondem aos resíduos domiciliares
e de limpeza urbana (varrição, limpeza de logradouros e vias públicas e
outros serviços de limpeza urbana). Além dos RSUs, estão contemplados
nos resíduos sólidos todos os resíduos gerados e descartados pela
construção civil, pelas indústrias, os resíduos agrossilvopastoris, de
mineração, de serviços de saúde e de transportes. (PNRS, 2010, p. 7).
Mas uma das melhores definições para diferenciar lixo de resíduos e que transita
mais adequadamente pelo conceito que procura-se buscar neste trabalho – o da
importância de propor ações na sociedade para redução de geração de resíduos e
reutilização dos materiais que seriam descartados –, vem de Demarojovic:
46
O termo “lixo” foi substituído por “resíduos sólidos”, e estes, que antes eram
entendidos como meros subprodutos do sistema produtivo, passaram a ser
encarados como responsáveis por graves problemas de degradação
ambiental. Além disso, “resíduos sólidos” diferenciam-se do termo “lixo”
porque, enquanto este último não possui qualquer tipo de valor, já que é
aquilo que deve apenas ser descartado, aqueles possuem valor econômico
agregado, por possibilitarem (e estimularem) reaproveitamento no próprio
processo produtivo. Estas novas características contribuíram para tornar
prioritária, dentro do setor público nos países desenvolvidos, a política de
gestão de resíduos sólidos, demandando um comportamento diferente dos
setores públicos, produtivo e de consumo. (DEMAROJOVIC, 1995, p. 89)
Apesar das definições ‘modernas’ para lixo, as sobras ainda são, para a maior parte
das pessoas, como na Idade Média, algo “sujo” e “podre”, que tinha de ser varrido
da frente de nossas casas, conforme observa Velloso:
Ainda hoje, os resíduos são vistos como algo ameaçador e são geralmente
enviados para locais bem distantes dos nossos espaços físicos de convívio
e para longe, também, dos nossos pensamentos. Os resíduos reconhecidos
como restos, lixo ou como tudo aquilo desprovido de uma utilidade óbvia e,
portanto, objetiva, foram adquirindo uma imagem negativa, quase sempre
associada à sujeira, à doença, à morte e à miséria. (VELLOSO, 2008, p.
1.957)
1.4.1 Problema global e de saúde pública
Nos últimos anos, a violência passou a ser considerada problema de saúde pública,
não apenas no Brasil, como em outros países. Segundo Minayo (1994), o perfil da
mortalidade por causas externas no país segue a tendência mundial, em termos de
maior incidência sobre o sexo masculino e faixas etárias jovens, estando mais
concentrada em regiões metropolitanas. No caso dos homicídios, a razão é de 10
mortes masculinas para cada óbito feminino. Diante do cenário, os governos traçam
estratégias de redução da violência, são criados projetos sociais em áreas de
vulnerabilidade social, o efetivo policial é incrementado, são investidos recursos em
aparatos de segurança pública.
Ainda sob a ótica de outros problemas com os quais se convive no Brasil – a baixa
qualidade da educação, a saturação da mobilidade urbana, os déficits habitacionais,
a precarização do trabalho em grandes centros, cidades médias e na zona rural,
com toda a sua peculiaridade – nos confrontamos também com doenças
47
transmitidas por vetores (animais hospedeiros de determinados vírus, como cães,
mosquitos e roedores), como dengue, leptospirose e leishmaniose, consideradas
problema de saúde pública por atingirem um grande número de pessoas e
impactarem o sistema público hospitalar. Resíduos descartados de maneira incorreta
são foco para vetores das doenças citadas. Então, pode-se concluir que lixo e
resíduos, de maneira global, estão intrinsecamente ligados à saúde e à qualidade de
vida do indivíduo.
A disposição no solo, em lixões ou aterros, por exemplo, constitui uma
importante fonte de exposição humana a várias substâncias tóxicas. As
principais rotas de exposição a esses contaminantes são a dispersão do
solo e do ar contaminado, a lixiviação e a percolagem do chorume. O último
pode ocorrer não apenas enquanto o lixão ou o aterro está em
funcionamento, mas também depois de sua desativação, uma vez que os
produtos orgânicos continuam a degradar. [...] Assim, depósitos de resíduos
sólidos constituem em potenciais fontes de exposição para populações,
33tendo sido relatado riscos aumentados para diversos tipos de câncer,
anomalias congênitas, baixo peso ao nascer, abortos e mortes neonatais
nessas e em populações vizinhas a esses locais. (GOUVEIA, 2012, p.
1.506)
Dessa forma, seria pertinente afirmar que, assim como a violência e as doenças, o
lixo que produzimos diariamente – em casa, no trabalho, nos hospitais – pode ser
considerado problema não só de saúde pública, mas um problema social, urbano,
ambiental. Se é assim, por que o lixo ainda é tratado em nossa sociedade como algo
que não tem a ver com gente, que não é de nossa responsabilidade, sendo que
“diariamente uma pessoa produz no mínimo 1,2 quilo de lixo”? (BANCO MUNDIAL,
2012, p. 11)
Rêgo, Barreto e Killinger, em um estudo com 13 mulheres de um bairro na periferia
de Salvador (BA) constataram, ao entrevistá-las, que, na opinião delas
o lixo é um problema de responsabilidade dos poderes públicos, ainda
que seja também de âmbito individual e da comunidade (da vizinhança). A
responsabilidade assume uma dimensão individual na medida em que cada
um é responsável por jogar o seu próprio lixo em local adequado, e aqueles
que não o fazem, geram problemas para a comunidade. Apesar de
reconhecerem a responsabilidade individual em relação ao processo de
produção e de disposição do lixo, quando observados, eles demonstram
nem sempre cumprir as responsabilidades atribuídas a si próprios.
Quase sempre culpam os "outros" de jogarem o lixo em locais
inadequados. Responsabilizam a vizinhança, chamando-os de "mal
educados"; os poderes públicos pelos equipamentos inadequados e
48
insuficientes, colocados em locais impróprios; e a falta de coleta regular
(Rêgo, Barreto e Killinger, 2002, p. 1.588, grifo nosso).
O recorte feito por Rêgo, Barreto e Killinger, analisando como uma pequena
comunidade baiana vê a questão do lixo, possivelmente reflete a realidade da
maioria dos municípios brasileiros. Quem sabe qual o caminho que o lixo faz depois
que ele é colocado na porta de casa para o gari pegar? A maioria das pessoas não
faz ideia e não se preocupa em sabê-lo. Como se pensassem: “Da porta da minha
casa para fora deixa de ser problema meu. O Estado que cuide disso, já que pago
tantos impostos, IPTU, taxa de lixo etc.” Questiona-se, então, como é possível,
nessa intricada rede de relações econômicas, de poder, de diferenças sociais,
religiosas e culturais, despertar os sujeitos de todas as territorialidades para uma
causa em comum, a redução da geração de resíduos, em que todos participem e
sejam protagonistas dessas mudanças.
Em 29 de agosto de 2013, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE)
anunciou que o Brasil alcançou a marca de 201 milhões de habitantes. Em Belo
Horizonte, quarta capital brasileira em população, com 2,23 milhões de habitantes
(IBGE, 2012), “a produção de lixo aumentou 22% em uma década – de 2000 a 2010
–, passando de 513,9 mil toneladas/ano em 2000 para 629,4 mil toneladas/ano em
2010, enquanto, no mesmo período, a população cresceu 6%” (LOPES, 2011, p. 1).
Diante das constatações acima, buscamos em Guimarães e Fontoura uma síntese
do que é preciso reconhecer:
A humanidade aproxima-se rapidamente, se é que já não sofre os
resultados, do esgotamento de um estilo de desenvolvimento
ecologicamente depredador (exaurindo a base natural de recursos),
socialmente perverso (gerando pobreza e desigualdade), politicamente
injusto (congelando a escassez relativa e absoluta no acesso aos
recursos), eticamente reprovável (desrespeitando as formas de vida
humana e não-humanas) e culturalmente alienado (produzindo o
estranhamento entre os seres humanos e subjugando a natureza).
(GUIMARÃES e FONTOURA, 2012, p. 509, grifo nosso)
Diante disso, é importante ressaltar a necessidade de os países buscarem um
modelo de desenvolvimento que seja ambientalmente equilibrado no que diz
respeito ao uso dos recursos naturais e à conservação da biodiversidade; que seja
49
socialmente responsável com o estabelecimento de metas visando a diminuição da
pobreza e da desigualdade.
Que promova a justiça social; que seja culturalmente sustentável na
conservação do sistema de valores, práticas e símbolos de identidade que
determinem a integração nacional através do tempo; e que seja
politicamente sustentável ao aprofundar a democracia e garantir o acesso e
a participação de todos os setores da sociedade na tomada de decisões.
(GUIMARÃES e FONTOURA, 2012, p. 509)
De acordo com o Ministério do Meio Ambiente (MMA, 2013), o Brasil desperdiça, a
cada ano, cerca de R$ 10 bilhões por falta de destinação adequada de resíduos
sólidos. Outro exemplo do consumo desenfreado que vem sendo notado não apenas
no Brasil, mas também no mundo, é a estimativa da Associação Brasileira de
Desenvolvimento Industrial (ABDI) para 2013, de geração de resíduos de
equipamentos eletroeletrônicos no país: 918 mil toneladas.
São [resíduos de] refrigeradores e congeladores, fogões, lavadoras de
roupa e louça, secadoras, condicionadores de ar; monitores e televisores de
tubo, plasma, LCD e LED, aparelhos de DVD e VHS, equipamentos de
áudio, filmadoras; batedeiras, liquidificadores, ferros elétricos, furadeiras,
secadores de cabelo, espremedores de frutas, aspiradores de pó,
cafeteiras; computadores desktop e laptops, acessórios de informática,
tablets e telefones celulares, crescendo, progressivamente, até alcançar 1,1
milhão de toneladas nos próximos 20 anos. (ABDI, 2013, p. 27)
A indústria de eletroeletrônicos faturou em 2011 R$ 138 bilhões, de acordo com
dados da Associação Brasileira da Indústria Elétrica e Eletrônica (Abinee). Diante
desse quadro de desperdício estrondoso, Zaneti e Sá vão frisar que:
Atualmente, falar em resíduos sólidos domiciliares, nos reporta à coleta
seletiva e à política dos 3 Rs: reduzir o consumo, reaproveitar e reciclar os
resíduos. Mas a ênfase dos programas de coleta seletiva está no
reaproveitar e no reciclar e não no reduzir o consumo, que é o
principal problema. [...] Há uma insustentabilidade da estrutura
socioambiental das cidades, tanto das relações entre as pessoas, como das
relações das pessoas com a natureza e com os seus resíduos. Para que
estas relações sejam viáveis, é necessário que haja uma educação
integrada no processo de gestão ambiental. (ZANETI e SÁ, 2002, p. 5, grifo
nosso)
50
1.5 Articulando conceitos
Jogar luz sobre a questão da gestão dos resíduos sólidos urbanos em âmbito local é
pertinente neste momento em que os municípios brasileiros, e Belo Horizonte não
foge à regra, precisam construir um plano municipal integrado de resíduos. Nesse
contexto, entende-se que a gestão social se apresenta como possibilidade de
construção compartilhada do plano municipal integrado de resíduos sólidos em Belo
Horizonte, com vista ao desenvolvimento local.
Para isso, propõe-se um diálogo entre alguns conceitos considerados importantes
para a discussão: cidade e qualidade de vida; cidadania – como chave para a
mudança da realidade; participação social e gestão social; e a mobilização social
como instrumentos para o desenvolvimento local.
1.5.1 O papel do Estado
Considerando então que o bojo deste trabalho sobre resíduos sólidos está
contextualizado com um cenário atual mundial de consumo desenfreado e pressão
sobre a natureza, é indispensável falar no papel do Estado e da sociedade civil
como condutores de um processo que possa transformar essa realidade. Como diz
Chanlat (2006, p. 10), “a esfera econômica está inserida no político, no social, no
cultural e no simbólico”.
Hofling (2001, p. 31) é sucinta ao definir Estado “como o conjunto de instituições
permanentes – como órgãos legislativos, tribunais, Exército – [...] que possibilitam a
ação do governo; e Governo, como o conjunto de programas e projetos que parte da
sociedade (políticos, técnicos, organismos da sociedade civil e outros) propõe para a
sociedade como um todo”.
Estado neste trabalho, no que é conceito comum entre os autores, é
entendido como conjunto de organismos (órgãos, instituições reguladoras,
de controle, de segurança etc) que regulam a sociedade, mantém diversas
ações centralizadas em si mesmo a fim de organizar melhor os diversos
setores sociais, intervém economicamente na política do país; formula
51
regras e leis; mantém a ordem (PLATÃO, 2001; MARX, 1988; FAORO,
2001; RIBEIRO, 1998; PRADO JR., 2000; FREIRE, 2011)
Na definição de Waizbort (1998), “o Estado moderno, desde o século 16, é uma
instância implementadora da ordem, [...] pois o conceito do moderno implica [...] a
ideia da “ordem”, do fim da guerra – civil e entre as nações – e a ideia da paz”.
Então, logo de início, podemos perceber que esse Estado constitucional
moderno tem por tarefa e principal característica a administração dos
conflitos que perpassam a sociedade. [...] Esse Estado se organiza (por
exemplo na divisão dos poderes, na própria organização e desdobramento
institucional do Estado) e elabora procedimentos capazes de fazer com que
seja possível alguma espécie de consenso nos momentos e situações
conflituosas. (WAIZBORT, 1998, p. 66)
O autor vai contribuir, ainda, para a discussão sobre a democracia nesse contexto,
afirmando que “ela é aquela organização política que se legitima através de
procedimentos, institucionalizados, capazes de produzir consenso”. A partir daí, à
ideia do estado de direito se acrescenta a do Estado democrático.
Assim, um processo de democratização de uma sociedade é um
processo de organização do Estado, em que ele se organiza tendo em
vista propiciar a possibilidade de resolução dos conflitos dessa
sociedade, e isso é também, necessariamente, um processo de criação
de procedimentos adequados à resolução desses conflitos (por isso se
fala, volta e meia, que é necessário fortalecer as instituições no Brasil:
porque elas são instâncias do Estado e da sociedade capazes de
resolver problemas). (WAIZBORT, 1998, p. 66, grifo nosso)
Segundo Habermas (1983, p. 222-223, apud WAIZBORT, 1995, p. 66), “os conflitos
existentes na sociedade atual são conflitos de classe”. Tal qual era no século 17:
clero, nobreza e terceiro estado (quase sem privilégios, e divididos em burgueses,
artesãos e camponeses); ou mesmo no século 9 ou 10, no sistema feudal, em que
servos deviam obrigações aos senhores, com relações de poder muito bem
estabelecidas: senhores donos das terras; servos com o direito de usar a terra.
De organizador da sociedade a repressor, mantenedor da ordem a provedor do
bem-estar social (Welfare State instaurado na Europa, pós-Segunda Guerra
Mundial), o Estado passou por diversas transformações desde o século 16, quando
52
se firmou como Estado absolutista, centralizando o poder no que se chamou de
Estado moderno.
O conflito entre as classes sociais foi condição fundamental do poder
absoluto. O próprio rei instigou o conflito, procurando sobrepor-se a ele e
dele tirar proveito. Protegeu a alta burguesia, deu-lhe monopólios
comerciais e industriais, arrendou-lhe impostos, garantiu-lhe ascensão
social, apoiando-a contra clero e nobreza. Reciprocamente, concedeu
privilégios ao alto clero e domesticou a nobreza, atraindo-a a seus palácios
por meio de cargos e pensões. [...] O poder real, em suma, descansava
sobre o conflito generalizado que tendia a equilibrar as forças sociais,
especialmente o conflito entre as duas classes mais poderosas, a nobreza e
a burguesia. (ARRUDA e PILETTI, 1995, p. 168, grifo nosso)
Na visão de Waizbort (1998, p. 67), resumidamente, “o Estado moderno é
caracterizado por: monopólio do uso legítimo da violência, ordem administrativa e
jurídica regida por estatutos modificáveis, administração centralizada e racional,
territorialidade etc.”
O Estado é, ao mesmo tempo, “excluído e dependente da produção
capitalista”. Ele é, como disse Claus Offe, “obrigado a criar as condições e
premissas formais e materiais para que a produção e a acumulação possam
continuar, e para que a continuidade delas não se interrompa por causa dos
fenômenos de instabilidade material, temporal e social, que são imanentes à
socialização (anárquica) do processo capitalista”. (OFFE apud Habermas,
1983, p. 230, apud WAIZBORT, 1998, p. 68)
Na visão de Christoffoli, o Brasil tem peculiaridades no que diz respeito ao papel do
Estado que devem ser consideradas para se compreender que fatos históricos
refletem, muitas vezes, a realidade. Segundo ele, a elite histórica dominante no país
sempre temeu que as classes trabalhadoras se unissem e se organizassem contra a
primeira.
O processo histórico remonta às capitanias hereditárias e às terras de
sesmaria, em que o beneficiário respondia pelo governo, pelas leis, etc. A
esse patrimonialismo soma-se uma experiência histórica autoritária,
marcada por séculos de escravização de indígenas e de negros, pelo
descaso da classe dominante em relação aos destinos do povo; pela
extrema brutalidade com que a elite reage a tentativas de organização
autônoma dos trabalhadores. A repressão aos movimentos sociais vem
desde o período colonial, com a destruição dos quilombos, a dizimação dos
povos indígenas (pelo fato de não se adaptarem ao ritmo de trabalho
exigido pela economia mercantil capitalista nascente) e dos movimentos
camponeses messiânicos. (CHRISTOFFOLI, 2008, p. 234, grifo nosso)
53
Num resumido resgate histórico do papel do Estado brasileiro, faz-se um sucinto
recorte histórico, desde a Grande Depressão, em 1929, até a primeira fase do
governo de Dilma Rousseff (2011-2012), a título de compreender as decisões
políticas e econômicas feitas no país, para que seja possível compreender o atual
modelo de economia no Brasil e como a Política Nacional de Resíduos Sólidos está
inserida nesse contexto.
1.5.1.1 – Era Vargas (1930-1945)
A quebra da Bolsa de Valores de Nova York em 1929 foi o ponto de partida de uma
grande crise econômica mundial, que transformou a década de 1930 em uma
grande depressão do mundo capitalista. Bancos faliram, empresas industriais
quebraram e a agricultura solapou.
O Brasil, tanto pelo esgotamento do seu modelo interno de monocultura
[café] e seus respectivos vínculos externos, como pelas graves alterações
ocasionadas pela crise nas relações internacionais, seria estimulado a
impulsionar o seu desenvolvimento econômico por novos caminhos, bem
como redefinir o papel de sua política exterior em novas circunstâncias.
(VISENTINI, 2013, p. 2)
De 1930 a 1945, o Brasil vai viver um momento de mudança de injeção na
industrialização e incentivo à policultura, para evitar a dependência da monocultura
(do café, que havia passado por uma crise anos antes). Na visão de Visentini (2013),
o país passou por um processo de modernização de gestão da economia, com a
criação de institutos, órgãos especializados em planejamento e execução das
políticas econômicas. Para Furtado (1982, p. 183), no entanto, “ a política econômica
adotada no período não visava intencionalmente fomentar a indústria, mas
responder aos interesses cafeeiros”. Diante do cenário mundial que se desenhava, o
Brasil aproveitou vantagens que se apresentavam como competitivas: com a
ascensão de Hitler na Alemanha e Roosevelt nos Estados Unidos, essas duas
nações competiram para criar um sistema de poder internacional.
Por razões estratégicas, históricas, político-diplomáticas e econômicas, o
Brasil vai ser um dos pivôs dessa disputa, o que facilitou o
redimensionamento da política externa de Vargas. [...] Embora complexa, a
54
rivalidade Alemanha-EUA com vista à influência sobre o Brasil assumiu a
forma, inicialmente, de uma competição comercial. [...] Em 1935, foi
assinado o tratado comercial Brasil-EUA, nos marcos do livre comércio.
Entretanto, Vargas manteve o comércio compensado com a Alemanha. [...]
A industrialização passava a receber um rumo estratégico, e deveria
ser dinamizada a partir de recursos obtidos no meio internacional.
Vargas inaugura uma autêntica política externa para o
desenvolvimento, [...] mantendo em foco a otimização das vantagens
possibilidades pela barganha. (VISENTINI, 2013, p. 6-7, grifo nosso)
Paralelamente, crescia no país a presença ideológico-cultural norte-americana do
american way of life, uma forma de contrabalancear, na visão de Visentini (2013), a
influência nazista. Vargas acabara de instituir o voto secreto e o feminino, foi eleito
pelo Congresso e iniciou um novo governo em 1934. Nesse período o país vai viver
fortes mudanças, sintetizadas aqui:
A oligarquia cafeeira paulista aproveita-se da redemocratização para se
articular politicamente e se modernizar;
No mesmo ano, em 1934, é criada a Universidade de São Paulo, reforçando
o universo liberal, com a vinda de diversos professores estrangeiros, como
Claude Lévi-Strauss, Fernand Braudel, Roger Bastide e Etienne Borne;
A sociedade, em processo de urbanização, se torna mais complexa e abre
espaço para grupos políticos sem ligação com a política das elites
tradicionais;
Com a criação da Aliança Nacional Libertadora (ANL) pelo Partido
Comunista Brasileiro, surge um novo instrumento político de oposição no
país;
Em 1937, é instaurado o Estado Novo por Getulio Vargas, com forte perfil
tecnocrático, nacionalista, desenvolvimentista e com apelo aos
trabalhadores, como forma de reprimir o movimento comunista liderado por
Luís Carlos Prestes no país.
Nesse período, Vargas, em cooperação com os EUA, tenta fortalecer o
Exército brasileiro, como recebimento de armas; ao mesmo tempo que
assina, em 1941, um acordo que assegurava o fornecimento de minerais
estratégicos para os norte-americanos, que se comprometeram a adquirir
toda a produção brasileira.
(VISENTINI, 2013, p. 9; ARRUDA e PILLETI, 1995, p. 302)
Tudo o que Vargas fazia era com pompa e circunstância, convocando o povo a
aplaudir suas medidas. Em 1943, entra em vigor a Consolidação das Leis do
Trabalho e o salário mínimo. Na visão de Visentini (2013), “a Era Vargas não apenas
buscou construir o Estado, mas também a nação”, tentando deixar para trás o viés
55
de país colonizado. Para isso, sua visão estratégica teve papel fundamental em todo
esse processo.
Escritores, artistas plásticos, músicos e novos talentos populares que
emergiram com esse processo foram engajados no projeto de construir a
cultura nacional e a própria nacionalidade. [...] O que todo esse processo
econômico, político e cultural estava produzindo era uma transformação
profunda da sociedade. (VISENTINI, 2013, p. 14-15)
Na perspectiva de longo prazo, a legislação trabalhista, em especial o salário
mínimo, foi, segundo Oliveira (2003, apud CORSI, 2010a, p. 69), “um instrumento de
controle do movimento operário e de arrocho dos salários, o que potencializou a
acumulação de capital e contribuiu para o aprofundamento da concentração de
renda e das desigualdades sociais”.
Veio a Segunda Guerra Mundial (1939-1945) e, segundo Visentini (p. 15), “alguns
autores sustentavam que o Estado novo, realizando grandes exportações para os
aliados durante a guerra, teria abandonado o projeto de industrialização”. No
entanto, nesse período a divisão regional do trabalho e as desigualdades estaduais
dentro do país foram aprofundadas.
1.5.1.2 A Era Dutra (1945-1951)
De 1945 a 1951, com o general Eurico Gaspar Dutra no poder, o Brasil passou a ser
um fiel aliado dos EUA e adotou uma postura antiesquerda, marcando uma guinada
para o liberalismo. Nesse período pós-guerra, surge a chamada Guerra Fria, que
sinteticamente polarizou o mundo entre os EUA – país capitalista, em situação
hegemônica, com grande poderio militar, bases aéreas e navais, além de Exército
em todos os continentes, bomba atômica e aviação estratégica capaz de atingir
qualquer ponto do planeta – e a União das Repúblicas Socialistas Soviéticas
(URSS), uma nação de extensões gigantescas, forte aparato militar, com regime
socialista
totalmente
internacional.
diferenciado
do
capitalismo
e
com grande
prestígio
56
[Dutra] buscava diversificar a economia, mantendo o equilíbrio entre
agricultura e indústria. [...] O núcleo de sua política residia no combate à
inflação, cuja causa básica seriam os elevados déficits públicos,
financiados, sobretudo, pela emissão de moeda. [...] A abertura da
economia seria fundamental para ampliar a oferta de bens de consumo e de
capital. Bastos (2004) argumenta que o governo avaliava que a
concorrência de produtos importados levaria as empresas nacionais a se
modernizar. (CORSI, 2010a, p. 103)
Mas os EUA perdem interesse pela América Latina no pós-guerra, por não
representar mais um local estratégico. E o Brasil, com sua declinação políticodiplomática aos EUA acaba subserviente economicamente também. Nesse período,
Vargas está na oposição e passa a criticar Dutra, alegando que diante das
dificuldades financeiras do país, o governo entregaria a indústria e a economia aos
estrangeiros. Esse seria um dos motes para sua volta ao poder.
1.5.1.3 O retorno de Getulio Vargas (1952-1954)
Vargas volta “e retoma sua “negociação de barganha” com os EUA, oferecendo
apoio aos objetivos estratégicos dos norte-americanos, em troca da ajuda
econômica ao desenvolvimento industrial (VISENTINI, 2013, p. 26). Em 1953, o
governo cria a Petrobras, a Eletrobras e o Plano de Valorização da Amazônia. Eram
sinais de certa autonomia nacional, e tentava conciliar interesses internacionais
(havia carência de recursos financeiros e técnicos) e político-diplomáticos (o país
não pretendia entrar em confronto com os EUA).
Vargas sinalizou um discurso de aproximação com os países latino-americanos
vizinhos, principalmente Argentina e Chile, ressaltando o descaso norte-americano
com a região e a importância de um fortalecimento comercial e político-regional. Ao
aventar a assinatura do Pacto ABC com os vizinhos, foi duramente pressionado,
acusado de, indiretamente, articular uma espécie de bloco antiamericano. Isolado
totalmente, Vargas se suicida em 1954, acusando diretamente os interesses
estrangeiros. Ele adotara ao longo de seu governo um “bate e assopra”: quando era
atendido o pedido de recursos, estava ao lado dos americanos; quando estes não
sinalizavam com investimentos, criticava o imperialismo. Esse modelo foi chamado
desenvolvimento dependente associado e, na visão de Corsi (2010b, p. 131) é
57
praticado até os dias de hoje. “Não por acaso, o processo de desenvolvimento
brasileiro é altamente dependente do financiamento externo”.
1.5.1.4 A Era JK (1956-1960)
Com a chegada de Juscelino Kubitschek ao governo em 1956, o país assiste a um
grande plano de metas, “que respondesse às demandas do estrangulamento da
economia e também que promovesse o avanço da industrialização” (CORSI, 2010b,
p. 131). Mas o cenário não é muito positivo: os conflitos sociais estavam
exacerbados, havia uma crescente mobilização política e ideológica. A intenção de
JK era governar com a presença forte do Estado, tendo a economia como condutora
do desenvolvimento do país.
O populismo trabalhista, com sua retórica distributiva, foi substituído pelo
discurso desenvolvimentista e modernizador dos 50 anos em cinco. O
projeto econômico foi estruturado através do Plano Nacional de
Desenvolvimento, ou Plano de Metas [30 metas agrupadas em cinco
setores, por ordem de prioridade: energia, transportes, indústrias de base,
educação e alimentos]. Este se baseava em uma estratégia diferente da de
Vargas, pois privilegiava os bens de consumo sofisticados: automóvel,
geladeira, televisão e eletrônica. Tal projeto se apoiava em metas físicas de
produção, em um setor que demandaria o ingresso de capitais, tecnologias
e mesmo empresas estrangeiras. (VISENTINI, 2013, p. 37)
É clara a aproximação dos ideais do governo JK com os Estados Unidos, com o
modo de consumo dos norte-americanos. Houve uma busca por atrair investimentos
internacionais,
marcada,
principalmente,
pela instalação da
montadora
de
automóveis alemã Volkswagen no país, seguida, mais tarde, por outras empresas
estrangeiras. Mas o governo se vê afundado em dívidas, em uma inflação causada
pelos gastos públicos exorbitantes para promover o Plano de Metas e para construir
Brasília, o real aumento de salários e por causa da política de concessão de
empréstimos ao setor privado por meio do Banco do Brasil. (VISENTINI, 2013, p. 3739). JK então envia uma carta aos EUA sugerindo a unidade na América Latina, com
a criação de programas de assistência técnica para os países, bem como adoção de
medidas capazes de proteger preços dos produtos de base, que sempre oscilavam.
Sugere também “a atualização dos organismos financeiros internacionais, mediante
ampliação de seus recursos e liberalização dos seus estatutos, com o objetivo de
58
facultar-lhes maior amplitude de ação” (PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA, 1958, apud
VISENTINI, 2013, p. 41). Assim nascia a Operação Pan-Americana (OPA), ignorada
inicialmente pelos EUA, mas que, logo depois, teve alguns princípios reconhecidos
pelos norte-americanos, que criaram uma entidade financeira continental (Banco
Interamericano de Desenvolvimento, BID). Esboça-se também a ideia de um
marcado comum regional, a Associação Latino-Americana de Livre Comércio.
Ao longo dos anos, o que seu viu foram situações similares às barganhas da Era
Vargas, com pequenas ameaças de que, se os EUA não investissem no Brasil, o
país teria de procurar recursos em outras “freguesias”, inclusive com os socialistas.
Esse período foi marcado pelo crescimento das ligas camponesas e movimentos
nacionalistas mais fortes, como os da sociedade e também o do vice-presidente,
João Goulart e seu cunhado Leonel Brizola, governador do Rio Grande do Sul, que
denunciavam os lucros excessivos das empresas estrangeiras no Brasil.
Em 1959, JK rompeu com o Fundo Monetário Internacional (FMI), criado em 1950
para estabilizar algumas economias “periféricas”. Os EUA não mantinham interesses
no Brasil, tampouco na América Latina: em tempos de Guerra Fria, ele estava de
olho na reconstrução do Japão e da Europa pós-guerra. (CORSI, 2010b, p. 99;109).
Em abril de 60 JK inaugurou sua obra máxima, Brasília, mas não conseguiu realizar
um de seus objetivos principais, a integração da Amazônia, que ocupa 60% do
território nacional. Na visão de Souza, o final do Governo Kubitschek (1956-1960)
até o golpe militar, em abril de 1964, “permanece envolto em uma imprecisão
interpretativa oriunda de vários fatores, [...entre eles o fato de] a economia brasileira
ter entrado numa crise causada por problemas estruturais do processo de
substituição de importações. (SOUZA, 2010, p. 139). Na avaliação de Pires (2002),
“a industrialização substitutiva, até o começo dos anos 1960, e, [depois] as
estratégias de inserção internacional baseadas em nossas “vantagens
comparativas” foram apoiadas por setores majoritários das classes sociais
urbanas (burguesia nacional, camadas médias e operariado). Por conta
disso, a industrialização por substituição de importações confundiu-se por
três décadas com um projeto nacional, que criou uma certa esperança de
sobrepor-se ao secular atraso econômico e de criar uma sociedade mais
próspera e democrática (PIRES, 2002, p. 101, apud SOUZA, 2010, p. 140).
59
1.5.1.5 Transição até o Golpe Militar (1961 a 1964)
No impasse nas urnas, Jânio Quadros venceu com 5,6 milhões de votos o candidato
da situação, marechal Henrique Lott, mas quem ficou com o posto de vicepresidente foi o candidato João Goulart, ex- de JK e, à época, da chapa de Lott.
Goulart causava um certo temor no grupo político que apoiava Jânio, pois
representava “a possibilidade de dar continuidade às transformações iniciadas em
1930, o que passaria necessariamente pela reestruturação da distribuição de
riqueza do país” (SOUZA, 2010).
Entre 1961 e 1964, a tensão entre os interesses progressistas e
conservadores ganhou os tons da crise. Diante disso, é possível identificar
três momentos específicos na “crise dos anos 1960”. Seriam eles: 1) o
governo de Jânio Quadros (janeiro a agosto de 1961); 2) a tentativa
parlamentarista (setembro 1961 a janeiro de 1963); e o governo
presidencialista de João Goulart (janeiro de 1963 a março de 1964).
(SOUZA, 2010, p. 141)
Registra-se que os principais direcionamentos econômicos do governo de Jânio
Quadros foram o pagamento da dívida externa, a redução da inflação e uma freada
no crescimento econômico que vinha sendo registrado nos últimos anos. Apesar do
curto tempo de governo (sete meses), foi bastante movimentado no campo da
política exterior: Jânio lançou a Política Externa Independente (PEI), que trazia
consigo algumas características da OPA de JK, com cinco postulados básicos:
a) defesa da paz, coexistência pacífica e desarmamento geral; b) apoio aos
princípios de não intervenção e autodeterminação dos povos, dentro da
estrita obediência ao direito internacional; c) suporte à emancipação dos
territórios ainda não autônomos sob qualquer designação jurídica; d)
autonomia na formulação de projetos de desenvolvimento econômico e na
implementação da ajuda internacional; e) ampliação dos mercados externos
para a produção brasileira através de facilidades alfandegárias em relação à
América Latina e a intensificação do comércio com todos os países,
inclusive os da comunidade socialista. (DANTAS, 1962, p. 6, apud
VISENTINI, 2013, p. 48)
Jânio renunciou quando João Goulart (apelidado de Jango) estava em viagem à
China. Assumiu o presidente da Câmara dos Deputados, Rainieri Mazzili, que
permaneceu tempo suficiente para fazer uma manobra e vetar a posse de Goulart,
visto como comunista e temido por vários grupos políticos, principalmente os
60
conservadores e de direita. Uma reação forte veio, principalmente do Rio Grande do
Sul, sob liderança do governador gaúcho Leonel Brizola, e dos ministros militares,
que aceitaram Jango no poder, desde que fosse adotado o parlamentarismo, o que
se fez mediante o Ato Adicional à Constituição de 1946.
Jango tomou algumas medidas que, em parte, o levariam a perder o poder:
em janeiro de 1963, convocou plebiscito para recuperar seus poderes de
presidente; estabeleceu monopólio estatal sobre a importação de petróleo e
derivados; em janeiro de 1964, regulamentou a remessa de lucros ao
exterior. Desapropriou ainda 100 hectares de terras para fins de reforma
agrária, incluiu o voto dos analfabetos como direito e propôs a reforma
universitária, para assegurar a liberdade de ensino. (ARRUDA e PILLETI,
1995, p. 321)
Nesse período, partidos políticos brigavam entre si, havia uma série de organizações
populares (de estudantes, universitários, operários, camponeses) mobilizados para
reformas no país, inclusive os sindicatos, que buscavam a unificação dos
movimentos dos trabalhadores. O presidente foi perdendo apoio, impulsionado por
forte pressão das alas mais conservadoras da sociedade, como a Igreja Católica,
que alegavam que Jango “pretendia impor uma república sindicalista, confiscar
propriedades, abolir a religião etc. Frente a isso, a situação econômica era ruim:
73% de inflação em 1963” (ARRUDA e PILLETI, 1995, p 322).
Amedrontada com a radicalização e ameaçada em seus interesses
econômicos, a burguesia, com apoio das camadas médias
conservadoras, voltou-se contra o governo e as instituições; essa
conspiração interna recebeu apoio dos Estados Unidos, com recursos
financeiros, pressões político-diplomáticas e atuação de agitadores,
tudo em nome dos imperativos da Guerra Fria. [...] Em 1º de abril de 1964,
Jango foi deposto, e no dia 4, exilou-se no Uruguai. (ARRUDA e PILLETI,
1995, p. 323)
1.5.1.6 Militares na direção (1964-1984)
Entre os principais objetivos dos militares estavam o desenvolvimento do país, o
controle da inflação, a diminuição entre as diferenças regionais, o incentivo às
exportações e a atração do capital estrangeiro, oferecendo possibilidades de bons
lucros e de estabilidade política. Eles conseguiram boa parte das metas, “o milagre
econômico foi inegável; em 16 anos o Brasil saltou do 50º para o 10º lugar na lista
61
de nações com o maior PIB; concentrou mais de um quarto do desenvolvimento
industrial do Terceiro Mundo; subiu o nível técnico de produção; aumentou o número
de matrículas escolares, de leitos em hospitais, de casas com água, luz e esgoto e,
também, a proporção de lares com eletrodomésticos e automóveis” (ARRUDA e
PILLETI, 1995, p. 324-325).
O ‘milagre econômico’ se deveu a alguns fatores, principalmente o arrocho de
salários, permitindo maior poupança aos capitalistas para investir; preços altos na
venda de produtos brasileiros e baixos na compra de alguns estrangeiros; grandes
investimentos estatais; taxas de juros internacionais baixas; participação das
multinacionais. No entanto, a inflação estava altíssima, em 1984, bateu em mais de
200%/ ano. Mas, a economia capitalista se desenvolve em ciclos: expande e retrai.
Em 1974, o mundo assistiu a uma crise com o aumento do preço do petróleo e de
outros produtos importantes, com o trigo. Os juros subiram.
Entre 1970 e 1980, a concentração de renda aumentou no país: os ricos ficaram
mais ricos e os pobres mais pobres. Os 5% dos mais ricos aumentaram sua
participação de 30,3% para 34,7% na renda urbana; e os 50% mais pobres tiveram
queda na sua participação, de 16% para 13,1% na renda urbana.
[...] O milagre econômico se deu em condições de autoritarismo e dura
repressão política. [...] As publicações foram censuradas, as
contestações reprimidas com tortura e execuções. [...] Cerca de 150
militantes “desapareceram” e 180 foram mortos. As ações do regime
militar se pautavam pela doutrina da segurança nacional, desenvolvida
a partir da Guerra Fria (EUA e URSS); ela atribui ao Estado, como
principal função, a defesa da ordem democrática contra a guerra
revolucionária, subversiva, promovida pelo comunismo internacional.
(ARRUDA e PILLETI, 1995, p. 325-328, grifo nosso)
O que se viu no período militar foi o estímulo da demanda efetiva para a
concentração de renda e a dependência externa, principalmente depois do
lançamento do Plano de Ação Econômica do Governo (Paeg), que seguia a lógica
inversa dos planos de Meta (1956) e Trienal (1963), baseado em medidas de ajuste,
apenas, e não de desenvolvimento.
62
A estrutura de posse fundiária, extremamente concentrada, herdada do
período colonial, colocava enormes contingentes populacionais à margem
da posse de terras, impossibilitando-os de usufruir uma vida mais digna. [...]
Além disso, a falta de meios para a sobrevivência no campo deu vazão a
um fluxo quase inesgotável de migrantes para os centros industrializados do
país, o que forçou a queda nas taxas salariais e levou ao caos urbano,
criando demandas com o Estado. [...] A economia brasileira se integrava
aos centros do sistema: imitação do padrão de consumo; dependência
tecnológica e introdução de empresas multinacionais (operando no e
para o mercado interna); comprometimento do dinamismo do próprio
modelo de industrialização substitutiva; necessidade de moeda
conversível para fazer frente às importações. (SOUZA, 2010, p. 164, grifo
nosso)
De 1968 a 1980, o governo de Castello Branco incentivou o capital privado e tentou
implantar um esquema não inflacionário no país, já fortemente marcado por uma
economia com muitas oscilações. Basicamente, a tentativa era de criar bancos de
financiamento do setor imobiliário e de formas de ampliar o crédito ao consumidor,
fomentando a aquisição dos bens de consumo duráveis com o objetivo de ampliar o
mercado consumidor desses bens. A política salarial implantada, incluindo a do
salário mínimo, conjugada como cerceamento das atividades sindicais e políticas,
resultaram não apenas em uma perda dos salários na renda, “mas uma mudança
nas relações de trabalho, com maior subordinação do trabalhador às regras das
empresas, dos sindicatos, e menor atenção às necessidades, aspirações e aos
direitos do trabalhador (SINGER, 1977, p. 79 apud SOUZA, 2010, p. 195).
Se sentindo “ameaçadas” pela luta de classes e seduzidas pela promessa de
segurança e desenvolvimento, a burguesia e boa parte da classe média se
acomodam ao regime militar. Outra parte da sociedade, que não aceitava a ditadura,
lutou pela volta do processo democrático. Alguns exemplos dessas manifestações
foram a passeata dos 100 mil no Rio de Janeiro, em 1968, um protesto contra a
morte do estudante Édson Luiz pela polícia; e a Guerrilha do Araguaia, entre Goiás,
Maranhão e Pará, ocorrida entre 1969 e 1974, com cerca de 70 revolucionários.
Foram empenhados mais de 20 mil policiais, que exterminaram quase todo o grupo.
Nos idos de 1970, o governo, com cautela, começou o projeto de anistia política,
uma abertura para o retorno dos exilados. (ARRUDA e PILLETI, 1995, p. 330)
63
1.5.1.7 O início da abertura para a democracia
Em 1974, o general Ernesto Geisel apresentou a proposta de um gradual processo
democrático. Com a extinção do Ato Institucional 5 (AI-5), um dos mais repressores
atos instituídos pelo poderio militar, que permitia o governo intervir nos Estados,
municípios e territórios, cassar mandatos e suspender direitos políticos, decretar
confisco de bens e estado de sítio no país. Liberou também a imprensa.
Em 1979, quando assumiu a presidência, o general João Batista Figueiredo
prometeu fazer do Brasil uma democracia e deu início ao processo de anistia,
parcial. Mas, em agosto daquele ano, o Congresso aprovou a Lei da Anistia total,
por pressão da sociedade, que se reuniu em manifesto. Nesse período, centenas de
trabalhadores, da cidade e do campo, passavam a dar impulso às atividades
sindicais. Ainda em 1979, o governo acabou com o bipartidarismo e dissolveu os
dois partidos existentes. A abertura política deu espaço para a formação de novos
partidos, visando as eleições de 1982 para governador, prefeito, vereador,
deputados e senador. Em 1983, a mobilização pelas eleições diretas para presidente
ganhou força e chegou ao seu auge em abril do ano seguinte. As ruas do país foram
tomadas pelo povo. “Abalado com a avassaladora mobilização popular pelas diretas
já, o regime militar não queria perder regalias de 20 anos no poder, e tentava manter
o controle do processo político, da transição para o regime democrático” (ARRUDA e
PILLETI, 1995, p. 336)
Depois de 21 anos de ditadura, o Brasil voltou a ter um presidente civil, Tancredo
Neves, que obteve apoio da direita e da esquerda. O povo o saudou, com esperança
na Nova República. Mas 40 dias depois, Neves morreria, sem tomar posse. Assumiu
então seu vice, José Sarney, que de início tomou diversas medidas políticoadministrativas, eliminando leis, decretos e elementos constitucionais ligados ao
autoritarismo. Foi necessário elaborar uma nova carta constituinte para o país,
apresentada à nação em 1988, com vários avanços, mas com a reflexão do
momento naquela época: questões econômicas e sociais, como a reforma agrária,
passaram longe do texto. Segundo Arruda e Pilleti (1995, p. 393), o texto se
mostrava ambíguo em vários trechos, devido ao “jogo de interesses ou reservas de
64
mercado, através de privilégios concedidos pelo Estado, ou pelos interesses
corporativistas”.
1.5.1.8 Eleições diretas e neoliberalismo
No fim de 1989, o país é tomado por nova euforia, pela eleição direta para
presidente da República desde 1960. Fernando Collor de Melo (apoiado pelas
grandes oligarquias do Nordeste e por grandes grupos empresariais) e Luís Inácio
Lula da Silva (candidato vindo do movimento sindical e apoiado pelos setores mais
progressistas) eram os candidatos mais fortes e duelaram bravamente nas urnas, no
segundo turno, sendo que o primeiro ficou com a maioria dos votos (42%). Um dia
depois de sua posse, Collor anunciou o Plano Collor, inspirado no neoliberalismo –
que, segundo Arruda e Pilleti (1995, p. 397), é uma doutrina que defende a teoria
clássica do funcionamento da economia segundo as leis de mercado, com um
mínimo de intervenção estatal na regulamentação da atividade produtiva ou nos
investimentos de interesse social.
O Plano Collor confiscou grande parte do dinheiro dos brasileiros nos bancos,
retomou o cruzeiro como moeda nacional, congelou salários e preços, liberou o
câmbio, privatizou diversas empresas estatais, promoveu o tarifaço (reajuste de
preços nos combustíveis, energia, telefonia e serviços postais) e adotou premissas
das organizações multilaterais (FMI, Federal Reserve, BID), o chamado Consenso
de Washington, que reunia, num conjunto integrado, uma série de elementos
baseados nos princípios neoliberais, entre vários deles,
a) o de o Estado garantir as melhores condições possíveis para o
investimento privado; b) suprimir restrições ao investimento estrangeiro
direto; c) promover uma reforma cambial adequada às necessidades do
comércio internacional; d) o papel do Estado na sociedade deveria se
restringir ao mínimo de funções, vinculadas à segurança, saúde básica e à
educação fundamental. Todas as empresas públicas deveriam ser
transferidas para a iniciativa privada, que tem maior capacidade
técnica e gerencial. Esse receituário foi disseminado por toda a América
Latina, e as políticas correspondentes foram implementadas por
controversos líderes políticos como Carlos Menem e Domingo Cavallo, na
Argentina; Carlos Gortari, no México; Alberto Fujimori, no Peru; Gonçalo
Lozada, na Bolívia, Carlos Perez, na Venezuela; e Fernando Collor, no
Brasil (PIRES, 2010, p. 263, grifo nosso).
65
As discussões sobre o pagamento da dívida externa foram retomadas, e o governo
brasileiro se comprometeu a condicionar sua política econômica às diretrizes
impostas pelos credores internacionais. As denúncias de corrupção começaram a
ganhar fôlego, a economia estava em crise, a população se mostrava revoltada com
o “confisco” do dinheiro no início do mandato do presidente. Esse cenário caminhou
então para o pedido de impeachment de Fernando Collor. (PIRES, 2010, p. 267-269)
Foi uma época marcada pelo conceito de Estado Mínimo, que deve deixar a
iniciativa privada que tem planejamento e instrumentos de gestão para administrar
melhor.
1.5.1.9 Era FHC (1995-1998/1999-2002)
À beira da hiperinflação, o Brasil passou a ser dirigido por Itamar Franco, vice de
Collor. Seu ministro da Fazenda era Fernando Henrique Cardoso, que viria a se
tornar presidente nos dois mandatos seguintes (1995/1998 e 1999/2002). Na visão
de Visentini (2013), Franco defendia a importância da noção de soberania nacional e
destacava a necessidade da participação do Estado na economia de um país em
desenvolvimento como o Brasil. O Mercosul começou a ter mais importância para o
Brasil, que investiu na diplomacia, retomando diversas parcerias. Nessa época, a
União Europeia era a maior parceira econômica do país, o que inquietava os EUA. O
Brasil vivia uma fase de retomada de contatos, com a Rússia, China, Oriente Médio.
Vale lembrar que em 1992, como já destacado no início do trabalho, o Rio de
Janeiro sediou a Rio-92, importante evento na área ambiental.
Disposto a controlar a inflação que chegou a 2.500%/ano, Fernando Henrique
Cardoso (1994-1998) lançou o Plano Real em 1994, ancorado no câmbio, no nosso
caso, o dólar, para estabilizar os preços. Assim, “ele transformou objetivos
importantes da política macroeconômica, como o crescimento do PIB e a taxa de
emprego, em variáveis de ajuste da meta principal, que era a estabilidade
monetária” (PAULINO, 2010, p. 313). Estabeleceu ainda o rigor nos gastos públicos,
o abandono do crescimento e a indiferença para a crise social.
A maioria dos planos de estabilização priorizam a moeda e colocam
necessariamente em segundo plano todas as demais variáveis da vida
66
nacional, pios tudo, da soberania ao bem-estar da população, deve
subordinar-se à obsessiva busca da estabilidade. (ARAÚJO, 2005, p. 68,
apud PIRES, 2010, p. 282)
Foram adotadas algumas linhas prioritárias de ação: avançar na integração regional,
com o Mercosul; estimular a diversificação de parceiros nas relações bilaterais;
insistir com as organizações econômicas multilaterais no ideal de multilateralismo,
sempre sustentado pelo país; concentrar esforços para elevar a condição de
potência internacional (tamanho territorial, contingente populacional). Ele intensificou
o processo de privatização das grandes e eficientes empresas públicas e passou a
enxergar a indústria brasileira como economia transnacional, não havendo sentido
em ter um Estado coordenador do desenvolvimento. (VISENTINI, 2013, p. 107) FHC
adotou uma reforma do Estado, “promovendo a transferência para o setor privado, e
em grande parte para o capital estrangeiro, de parcela significativa do que restava
do parque produtivo estatal (PAULINO, 2013, p. 313)
1.5.1.10 Era Lula (2003-2006/2007-2010)
Desencantada com os resultados da política econômica neoliberal implantada ao
longo de duas gestões, a população brasileira elegeu em 2002 o ex-sindicalista e
torneiro mecânico Luís Inácio Lula da Silva, que trabalhou seu governo em três
dimensões: diplomacia econômica, política e um programa social. Lula se mostrou
um líder carismático mundialmente e aproveitou-se disso para se aproximar dos
países do primeiro mundo, obtendo recursos (investimentos e tecnologia),
negociando a dívida externa e sinalizando que o governo iria honrar todos os
compromissos firmados (VISENTINI, 2013, p. 112).
Sua gestão, diferentemente das administrações anteriores, buscou fortalecer a
estrutura do Estado, a exemplo da Petrobras e Eletrobras, que receberam injeção de
investimentos e passaram a ser consideradas instrumentos de desenvolvimento da
indústria nacional. O BNDES, de financiador das privatizações com dinheiro público,
passou a funcionar como banco de desenvolvimento, financiando a modernização
da indústria e o setor de serviço nacional. (PAULINO, 2010, p. 316)
67
Uma das demonstrações mais fortes do governo Lula foram as ações voltadas para
o social, principalmente as que se propuseram a erradicar a pobreza extrema. A
política macroeconômica de seu governo (de 2003 a 2007) teve como prioridade a
estabilidade econômica, assim como na Era FHC, com a diferença é que a gestão
de Lula não desconsiderou o restante da sociedade em detrimento da moeda.
O termo “social-desenvolvimentismo” [considerado por alguns autores como
o modelo de gestão do governo Lula] dificilmente pode descrever, sem
ambiguidades, uma estratégia de desenvolvimento de longo prazo. É
verdade que a retomada do crescimento em 2005 foi favorecida pela
elevação do piso salarial, ampliação do gasto social e inovações financeiras
(crédito consignado e microcrédito). É, contudo, improvável que esses
efeitos dinâmicos iniciais, observados durante a fase de criação ou forte
expansão de políticas redistributivas, possam ser repetidos indefinidamente,
sustentando a longo prazo a estratégia de desenvolvimento. Isso exigiria
graus de liberdade inexistentes no orçamento fiscal e da seguridade social.
(BASTOS, 2012, p.795)
Essa gestão também se beneficiou do cenário positivo mundial, puxado pela
demanda por commodities, colocando o país como grande exportador de matériasprimas e produtos agrícolas.
O projeto interno do governo Lula também deteve um significativo impacto
internacional na medida em que suas propostas sociais foram ao encontro
da agenda que busca corrigir as distorções criadas pela globalização
centrada apenas em comércio e investimentos livres. A campanha de
combate à fome representa o elemento simbólico que sinalizou a
construção de um modelo socioeconômico alternativos, respondendo à crise
da globalização neoliberal. (VISENTINI, 2013, p. 112)
Em 2006, Lula foi reeleito e durante seu segundo mandato deu ainda mais atenção
ao projeto de desenvolvimento e ao plano social. Novas jazidas de petróleo fizeram
o país se tornar autossuficiente e no âmbito do meio ambiente, os projetos com
etanol e energia alternativa ganharam destaque. Ao longo do segundo mandato, o
governo brasileiro buscou alianças com o objetivo de ampliar seu poder de influência
no cenário internacional. Começou pela retomada do Mercosul e a integração sulamericana. Estreitou intercâmbio com a África e com potências emergentes como
China, Índia e China, tudo em busca de um equilíbrio e uma democratização nas
relações com o exterior. O Bolsa-Família, projeto social de grande impacto no país e
carro-chefe de Lula foi ampliado, beneficiando mais milhares de brasileiros. Criticado
68
por muitos como programa paternalista e populista, o fato é que, segundo dados do
IBGE, o programa impactou positivamente os índices de pobreza no país.
De 1999 a 2009, segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de
Domicílios, realizada pelo IBGE em todo o território nacional, a
transferência de renda do Bolsa Família foi responsável por 15% da
queda no período. [...] Para a linha de R$ 50 de 2004, a pobreza caiu de
10% para menos de 5% da população e o benefício do Bolsa responde
por quase um terço da redução. Talvez mais relevante quanto à
contribuição do benefício do Bolsa Família para a redução da pobreza, no
longo prazo, tem sido sua atuação em momentos de crise. Entre 1999 e
2003, os programas antecessores ao Bolsa Família evitaram 40% do
aumento da pobreza que teria ocorrido na sua ausência. (SOARES, 2010,
p. 49, grifo nosso)
Segundo Teixeira e Pinto (2012, p. 923), as contas externas da economia brasileira
no governo Lula apresentaram resultados muito positivos expressos nos superávits
do balanço de pagamentos entre 2003 e 2010, permitindo saldar empréstimos com o
FMI, diminuir o endividamento público externo e acumular reservas.
No cenário internacional de meio ambiente, em 2009, durante a Conferência das
Partes da Convenção da ONU sobre Mudanças Climáticas (COP-15), o Brasil de um
passo considerado positivo ao desafiar os países desenvolvidos, anunciando que se
comprometeria a reduzir significativamente sua emissão de dióxido de carbono
(CO2). Esteve à frente da comitiva brasileira em Copenhague a então ministra da
Casa Civil, Dilma Rousseff. Ações ambientais do governo Lula que também tiveram
importância foram projetos na Amazônia para barrar o desmatamento, inclusive com
a adoção de estratégias de monitoramento, com a implantação do sistema nacional
de vigilância da Amazônia (Sinvam), com ajuda e tecnologia do Instituto Nacional de
Pesquisas Espaciais (Inpe). Em 2010, o presidente sancionou a Política Nacional de
Resíduos Sólidos (PNRS), que estava há duas décadas em tramitação no
Congresso.
1.5.1.11 Era Dilma Rousseff (2011-2014)
Dando continuidade ao governo de Lula, Dilma Rousseff buscou fortalecer a
economia brasileira face à crise mundial (EUA e Europa, principalmente). Em maio
de 2012, um discurso da presidente direcionado às instituições financeiras deu uma
69
direção nova às relações entre Estado e instituições financeiras, quando Dilma
cobrou dos bancos uma mudança em relação aos juros. “Observou-se um
crescimento baseado no mercado interno e na redistribuição de renda, com elevação
do consumo das famílias, mas com pouco dinamismo industrial. (TEIXEIRA e
PINTO, 2012, p. 935)
Ela deu sequência a vários projetos do governo anterior, com o Bolsa-Família, o
Reuni (de expansão das universidades públicas), e o Plano de Aceleração do
Crescimento (PAC), que na gestão ganhou mais visibilidade, principalmente com um
dos braços do programa, o Minha casa, minha vida, para melhorar o acesso à
habitação no país pelas camadas menos abastadas da sociedade. Nota-se que os
programas têm um viés social, com investimentos públicos, mas são todos
ancorados na iniciativa privada. Para Bastos (2012), a política macroeconômica
ainda está inserida no universo da “luta ou do conluio entre a grande finança (os
“mercados”) e o Estado, tendo a distribuição de riqueza e poder entre credores e
devedores como objeto”.
Não parece mais haver margem de manobra econômica, orçamentária e
cambial, para realizar políticas desenvolvimentistas sem alterar as rotinas
de política macroeconômica e até parte da institucionalidade que regula
suas interações com interesses privados. [...] É verdade que não basta uma
macroeconomia desenvolvimentista para assegurar seja o crescimento
econômico, seja a redução das desigualdades sociais e dos bolsões de
exclusão. [...] Não surpreende que a atual presidente, oriunda de uma
cultura política anterior à criação do PT, tenha escolhido como cavalo-debatalha uma agenda sempre evitada por Lula, voltando-se a um embate
direto contra interesses da plutocracia financeira. (BASTOS, 2012, p. 804805)
A realização de dois grandes eventos esportivos no país (a Copa do Mundo em
junho de 2014 e as Olimpíadas em 2016) demandarão esforço dobrado do governo
no que diz respeito à infraestrutura do país (estradas, aeroportos, segurança). Em
seu governo, Dilma vem tentando fazer o Estado mais presente na condução de
processos, como a reconfiguração estrutural de áreas importantes, como mobilidade
e transportes, mas, ainda percebe-se a influência do mercado nas decisões.
Exemplo disso foram as parcerias público-privadas (PPPs) que se desenharam no
país e a concessão dos aeroportos brasileiros para a iniciativa privada seis meses
antes da Copa do Mundo. Outras PPPs vêm sendo propostas na área de segurança
70
nacional e, cabe frisar, em Minas Gerais, a PPP para a gestão dos resíduos sólidos
na Região Metropolitana de Belo Horizonte, com mais de 40 municípios (MINAS
GERAIS, 2013).
Com esse breve histórico dos governos brasileiros desde 1930, suas opções
políticas, metas e decisões econômicas adotadas ao longo dos anos, percebe-se um
claro alinhamento do país aos ideais e ao modelo norte-americano de economia,
baseada fortemente no consumo, de estilo de vida mas, ao mesmo tempo, uma
tentativa de encontrar um modelo brasileiro próprio de ser. Nota-se ainda um
posicionamento importante do Brasil no cenário internacional, seja nas tentativas
ainda com JK de um diálogo maior e melhor, regionalmente, na América Latina, o
que se abre com mais intensidade nos governos Lula e Dilma.
É nítido que ao longo das décadas os vários governantes mostraram sua
preocupação em articular sua economia e sua política frente a várias questões que
têm peso, como financiamentos internacionais e influência externa. Visão
corroborado por Lima (2012), que se debruçou a investigar a decisão do país em
reduzir, voluntariamente, as emissões de gases causadores do efeito estufa no
contexto da política internacional, em 2009, conforme já citado.
A mudança da posição [brasileira] não é resultado tão somente da influência
do Ministério do Meio Ambiente [MMA] nas questões internacionais de
clima. A maior participação do MMA é um dos aspectos do cenário interno,
resultante inclusive da nova dinâmica de ação sobre os problemas
ambientais, com resultados favoráveis, como a diminuição do
desmatamento. Logo, o fator interno com impacto sobre a política externa
[...] [foi] uma conjuntura doméstica que abre novas possibilidades de
inserção internacional. Os países em desenvolvimento, em sua
configuração sob o G77, estariam perdendo terreno nas negociações
internacionais, tendo suas principais demandas rejeitadas – em parte
devido à crise econômica mundial, que reduz extremamente a
possibilidade de fartos programas de financiamento. (LIMA, 2012, p. 76,
grifo nosso)
Na visão de Brum, Bedin e Pedroso (2012, p. 33), depois do início do processo de
globalização mundial, há cerca de 20 anos – “grande mudança histórica, cujas
principais características são a crescente fragilização das fronteiras e identidades
nacionais, [...] a formação de um único sistema econômico de alcance mundial” –
71
houve notadamente um declínio do conceito de soberania e uma redefinição do
papel do Estado”.
Nesse sentido, é possível perceber que o Estado adquiriu, diante da
complexidade dos fluxos globais, um novo estatuto (uma entidade política
dotada de soberania e autonomia relativas) e passou a desempenhar novas
funções: fomentar a liberação dos mercados, criar blocos de integração
regional e instituir organizações econômicas internacionais. [...], percebe-se
que a soberania do Estado diluiu-se num conjunto de redes de fluxos
econômicos, de redes de comunicação, de intercâmbio de experiências
culturais e de influências políticas mútuas. Em consequência, o poder do
Estado passou a ser dividido com outras instituições de caráter não
nacionais e nem territoriais e alicerçadas em pressupostos globais. (BRUM,
BEDIN e PEDROSA, 2012, p. 34)
Na tentativa de se reestabelecer frente à globalização como condutor de processos
decisórios,
entende-se
que
o
Estado
se
coloca
como
fomentador
do
desenvolvimento regional, mas ainda pautado numa postura de atender os
interesses privados que operam na economia do mercado. Buscamos em Gohn
(2005) uma assertiva nesse sentido. Para a autora, os grandes problemas sociais
aos quais se assiste hoje no Brasil – aumento da população de rua nas grandes
capitais, reconstrução de cidades deterioradas, violência crescente, falta de
mobilidade, má qualidade dos serviços prestados à população etc. –,
se devem, grande parte deles à reestruturação do Estado, não mais como
produtor de ações, mas gestor e repassador de recursos, que tem levado à
privatização de serviços essenciais, à emergência de novos parceiros no
atendimento das questões sociais, segundo [...] a lógica do mercado
(GOHN, 2005, p. 11).
Bordenave (1994) tem um pensamento que acrescenta ao que Gohn diz:
O drama de nossa sociedade é que com frequência o Estado se alia aos
sistemas de interesse em detrimento dos sistemas de solidariedade e
prefere limitar drasticamente a participação destes no momento em
que considera que sua mobilização coloca em perigo o sucesso dos
sistemas de interesse. Numa sociedade regida mais pelos sistemas de
interesses que pelos de solidariedade, com uma marcada estratificação
socioeconômica, na qual uma das classes explora outras, a participação
será sempre uma guerra a ser travada para vencer a resistência dos
detentores de privilégios. (BORDENAVE, 1994, p. 42, grifo nosso)
72
Para Maricatto (2011, p. 9), “as transformações capitalistas, que se combinaram às
décadas orientadas pelo pensamento neoliberal (no Brasil, em 1980, 1990 e 2000),
tiveram forte impacto sobre as cidades”.
A desregulamentação – do que já não era muito regulamentado, como o
mercado imobiliário –, o desemprego, a competitividade, a guerra fiscal, o
abandono de políticas sociais, como o transporte coletivo, as privatizações
de serviços públicos, o planejamento estratégico, o marketing urbano, entre
outros, se combinaram a uma tradição histórica de falta de controle sobre o
uso do solo e de segregação territorial e urbana. A desigualdade continua a
reinar soberana embasada num padrão ambíguo de aplicação das leis
relativas à propriedade fundiária – em que pese o novo arcabouço legal
federal – e de investimentos, ambos profundamente regressivos nos seus
aspectos sociais e orientados por interesses do capital de incorporação, no
caso dos edifícios, e do capital de construção pesada, no caso da
infraestrutura urbana, cuja prioridade absoluta é a matriz rodoviarista e mais
exatamente o automóvel. (MARICATO, 2011, p. 9)
Considerando a atual extrema desigualdade social em vários locais do planeta, não
apenas no Brasil, e os inúmeros desafios das nações, vamos buscar em Acselrad
(2000) uma ideia que poderia ser considerada, então, uma postura a ser adotada por
esse ideal de Estado:
O que está em jogo é a capacidade do Estado desenvolver políticas
autônomas calçadas em um pacto político democraticamente
constituído. [...] Caberá, notadamente, responder em que medida haverá
espaço de poder a ser ocupado através do exercício da política. [...] Para
que o Estado reconstruído seja portador de um pacto político
efetivamente democratizante, deverá ter assegurada sua capacidade
de fazer políticas autônomas e de se fazer sensível às demandas
sociais. (ACSELRAD, 2000, p. 111, grifo nosso)
1.5.2 Cidade(ania)
A questão do papel do Estado está intrinsecamente ligada à questão do cidadão, da
cidade, do local onde se vive. Há uma vasta gama de conceituações para cidade,
entre elas, citamos:
1) Cidade pode ser entendida como uma estrutura geográfica na qual se
vive e se trabalha. Nela diferentes sistemas interagem, buscando o
equilíbrio urbano em meio a conflitos de poder e de relações (DUHL,
1963, apud WESTPHAL, 2000, p. 42)
2) Cidades e regiões de diferentes escalas são contornos organizativos
dos híbridos urbanos (SWINGEDOW, 2001; CZARNIAWSKA, 1998,
73
apud FISCHER, 2002, p. 15) e palcos privilegiados pelos novos atores
do desenvolvimento local.
A vida na cidade ocorre na perspectiva do sujeito, ou seja, sua relação com esse
território ocorre no seu lugar de viver. Nos espaços onde ele é pedestre, onde é
motorista, onde é trabalhador, onde é amigo (aonde vai ao encontro de conhecidos,
por exemplo), conforme Carlos:
[...] A tríade cidadão-identidade-lugar aponta a necessidade de considerar o
corpo, pois é através dele que o homem habita e se apropria do espaço
(através dos modos de uso). [...] São os lugares que o homem habita dentro
da cidade que dizem respeito a seu cotidiano e a seu modo de vida onde se
locomove, trabalha, passeia, flana, isso é, pelas formas através das quais o
homem se apropria e que vão ganhando o significado dado pelo uso.
(CARLOS, 1996, p.21)
Nesse sentido, a questão ambiental se faz presente na cidade (qualidade do ar,
quantidade de árvores por metro quadrado, percentual da população que tem água
encanada em casa e tratamento de esgoto) e na vida do sujeito o tempo todo. Para
Oliveira (2001), a cidadania norteia a tentativa de mensurar a qualidade de vida e o
bem-estar do sujeito. Mas o sujeito, somente de forma autônoma, crítica e reflexiva,
pode ter cidadania. Na concepção de Dowbor (2006), para ter cidadania ativa, é
preciso ter cidadania informada, e isso começa bem cedo. “A educação não deve
servir apenas como trampolim para uma pessoa escapar da sua região: deve dar-lhe
os conhecimentos necessários para ajudar a transformá-la” (DOWBOR, 2006, p. 2).
Cidade(ania), algo implícito na cidade: pode ser o edifício, o asfalto, um animal, o
sujeito. Para Cunha (2000), cidadania é termo que advém do latim (com raiz
em civitatis, de civitas, que significa cidade, palavra da qual deriva cidadão e
cidadania.
Nohara vai buscar em vários autores alguns dos significados para cidadania:
Cidadania possui vários sentidos, que vão desde o técnico-jurídico, isto é,
qualidade daquele que “usufrui de direitos civis e políticos garantidos pelo
Estado e desempenha deveres que, nesta condição, lhe são atribuídos”
(HOUAISS, 2001, apud NOHARA, 2010, p. 1) passando pela associação ao
ato de fazer valer os direitos, e havendo inclusive, no Estado
Contemporâneo, quem fale em cidadania universal (BENEVIDES, 1998,
74
apud NOHARA, 2010, p. 1): exercitada pelo “cidadão do mundo”, ou seja,
pelo indivíduo “que coloca suas obrigações para com a humanidade acima
dos interesses de seu país” (BENEVIDES, 1998).
Numa contextualização histórica, Gohn (2004) vai dizer que pesquisadores são
unânimes em localizar as origens do conceito de cidadão na Grécia clássica, nos
séculos 4 e 5 a.C., que traz a concepção de cidadão como o sujeito com direitos,
mas deveres também.
Ele surgiu associado às primeiras formas de democracia. Aristóteles definiu
o cidadão como “todo aquele que tinha o direito (e consequentemente o
dever) de contribuir para a formação do governo, participando ativamente
das assembleias onde se tomavam as decisões que envolviam as
coletividades e exercendo os cargos que executavam essas decisões.
(COUTINHO, 2000, apud GOHN, 2005).
Ainda na definição de cidadania, cidadão, direitos e deveres, Covre diz que:
A origem de cidadania se deu na pólis (cidade) grega, composta de homens
livres, com participação política contínua numa democracia direta, em que o
conjunto de suas vidas em coletividade era debatido em função de direitos e
deveres. (COVRE, 1991, p. 16).
Covre acrescenta que a cidadania está relacionada ao surgimento de vida na
cidade, e na atuação de cada indivíduo há uma esfera privada (particular daquela
pessoa) e uma esfera pública (que diz respeito a tudo que é comum a todos os
cidadãos). Ou seja, o cidadão participava das decisões em sociedade.
Viver numa relação de iguais como a da polis significava, portanto, que tudo
era decidido mediante palavras e persuasão, sem violência. Eis o espírito
da democracia. Mas a democracia grega era restrita, pois incluía apenas os
homens livres, deixando de fora mulheres, crianças e escravos. [...] Foi só
com o desenvolvimento da sociedade capitalista, com a longa ascensão da
burguesia em luta contra o feudalismo, que se retorna pouco a pouco ao
exercício da cidadania, como parte da existência dos homens vivendo
novamente em núcleos urbanos. [...] (COVRE, 1991, p. 17)
Nesta colocação de Covre é possível perceber uma certa “diferenciação” da
democracia grega, uma vez que ela fala em restrição, ou seja: homens livres eram
incluídos, havendo a exclusão de outros membros da sociedade, como mulheres,
crianças e escravos. Mas é a Revolução Francesa (1789-1799) que, segundo Covre,
75
traz a proposta de cidadania, de igualdade de todos, ainda que somente perante a
lei, porque ela significou um rompimento profundo com o direito obtido pelo
nascimento, característico da sociedade feudal.
1.5.2.1 Cidadania para o mercado ou para a participação social?
Historicamente falando, a Revolução Francesa promove uma ruptura no modelo
social vigente – de uma sociedade hierarquizada e socialmente injusta, do ponto de
vista da estratificação (clero no alto da pirâmide, sem pagar impostos e gozando de
excelente vida; abaixo dele a nobreza, formada pelo rei, sua família e um séquito de
nobres que viviam de banquetes, luxo e festas; os pequenos comerciantes, ou
burgueses, que, apesar de condição de vida melhor, queriam mais participação
política e liberdade econômica no trabalho; e a base, composta por trabalhadores,
camponeses e serviçais, que viviam em condições miseráveis, pagando altos
impostos).
Covre busca ainda em Rousseau (1712-1778) uma construção de cidadania que ela
chama de “diferente”, que aponta para relações mais justas entre os homens. “Em O
contrato social, Rousseau se diz em busca do regime político legítimo. Nenhum
homem tem autoridade natural sobre seu semelhante, argumenta ele; a força não
produz nenhum direito.”
Rousseau fala de uma democracia direta, da qual todos participariam. [...]
Um traço importante na concepção de cidadania de Rousseau é a
preocupação em não separar a igualdade (mais ligada ao aspecto
econômico) da liberdade (cujo vínculo é mais político). Isso fica mais claro
quando ele reitera que nenhum homem pode ser tão rico a ponto de sua
posição lhe permitir comprar o outro, e tampouco um outro tão pobre a
ponto de se vender. (COVRE, 1991, p.27-28)
Gohn (2005) vai dizer que a concepção legal de cidadania como representação
pública dos indivíduos permaneceu como base na concepção liberal, que situou a
cidadania em termos da sociedade de mercado e os direitos de posse, propriedade
e contratos, conforme preconiza e justifica Locke nos Dois tratados sobre o governo,
já no século 17.
76
Sabemos que direitos civis surgem com o advento do liberalismo quando a
cidadania se torna uma questão social. Tratava-se de duas ordens de
direitos – os naturais e imprescritíveis do ser humano, a saber: a liberdade
de pensamento e expressão, igualdade perante a lei e direito à propriedade;
e os direitos de nação – soberania nacional e separação dos poderes
executivo, legislativo e judiciário. A declaração dos direitos do homem de
1789 firmou a propriedade como direito supremo. Com isso nasceu o sujeito
político burguês, o cidadão, que deveria ser um proprietário. (GOHN, 2005,
p. 21)
Aqui, o conceito de cidadania parece mais ligado a uma condição mercadológica, de
ter a propriedade, ou seja, ter o dinheiro para adquirir algo. Então sou cidadão se
tenho um bem, uma propriedade. Concepção esta que pode ser entendida como
algo ligado ao “poder” de compra, diferente da ideia rousseauniana de que ser
cidadão é estar numa coletividade, em uma sociedade que busca minimizar as
desigualdades e melhorar a oportunidade para todos. Essa impressão de um
discurso mercadológico por trás das constatações de alguns autores sobre a relação
cidadão X cidadania X cidade é rechaçada por Weber:
A cidade é pré-condição do capitalismo na medida em que é necessária
para a existência do mesmo, mas mais tarde o desenvolvimento do
capitalismo intensifica o crescimento das cidades. (WEBER, 1966, apud
OLIVEN, 1980, p. 15, apud VELHO, 1967, p. 88)
Oliven (1980, p. 15) vai dizer que, nesse sentido, para Weber, “a cidade é primeiro
um pressuposto do capitalismo mas posteriormente seu desenvolvimento é um
resultado dele”. Somando à ideia de Weber de que a cidade é um resultado do
capitalismo trazemos a visão de Souza (2009, p. 78) para uma reflexão ainda mais
profunda sobre as relações que ocorrem no tecido social das cidades. Para ele,
“território é fundamentalmente um espaço definido e delimitado por e a partir de
relações de poder”.
Um dos autores que se debruçaram sobre a concepção histórica de cidadania,
segundo Tenório (2007b), foi Theodor Marshall. Curiosamente, Marshall também vai
fazer uma correlação entre os direitos civis e a economia de mercado. Para
Marshall, três elementos compõem a cidadania: o civil (direitos necessários à
liberdade individual), o político (direito de participar no exercício do poder político) e
77
o social (direito a um mínimo de bem-estar econômico e segurança e direito de
participar da herança social).
Mas pesam contra ele algumas críticas, como a de se basear excessivamente na
experiência inglesa de cidadania, sem considerar os conflitos sociais e políticos que
envolvem o tema. Bem como o fato de Marshall ser partidário de uma cidadania
passiva – “direito a ter direitos” – e não de uma cidadania ativa, que assumiria as
suas responsabilidades (CORTINA, 1998, p. 97, apud TENÓRIO, 2007b, p. 35).
Segundo Marshall, os direitos civis que deram origem à cidadania não
estavam em conflito com as desigualdades da sociedade capitalista, mas
antes eram necessários para a manutenção daquela forma de
desigualdade. Ou seja, os direitos civis eram indispensáveis a uma
economia de mercado competitivo, pois davam ao homem o poder de
participar na concorrência econômica negando, ao mesmo tempo, a
proteção social, com base no argumento de que cada indivíduo tinha
capacidade de se proteger. Logo, esse status de liberdade dos direitos civis
era um auxílio, não uma ameaça, ao capitalismo, pois esses direitos civis
conferiam apenas a capacidade legal de lutar pelos objetivos pretendidos,
mas não garantiam a sua posse. (TENÓRIO, 2007b, p. 37)
Nas palavras de Marshall, “um direito de propriedade não é um direito de possuir
propriedade, mas um direito de adquiri-la, caso possível, de protegê-la, se se puder
obtê-la” (MARSHALL, 1967, p. 80, apud TENÓRIO, 2007b, p. 37). Essa passagem
leva a crer numa cidadania apenas vista como um direito a ser exercido ou
“concedido” a quem tivesse bens, uma clara tentativa de estabelecer uma divisão
entre “quem pode ser cidadão” e “quem não pode ser cidadão” (no caso, o sujeito
que não tivesse a propriedade), estabelecendo-se, assim, uma condição
maniqueísta para tal, visão compartilhada por Tenório:
Ainda hoje continua a existir o fenômeno da exclusão. Na sociedade atual
[...] os “profetas econômicos” seguidores do “deus do mercado” pregam a
“lei do mais forte”, a necessidade de se “trabalhar com estratégias”, etc. Na
sociedade do mercado, o indivíduo não é visto como um sujeito capaz de
ação, com cidadania, mas sim um “cliente” com poder de comprar ou
vender.” (TENÓRIO, 2007b, p. 65)
Sobre os direitos do cidadão, Covre vai articular a ideia de que “o Estado de Direito
foi uma conquista histórica e deve ser irreversível da humanidade. Com toda a sua
ambiguidade, a lei pode ser também instrumento da maioria dos cidadãos”. Mas a
78
autora alerta para o fato de os cidadãos não serem ingênuos e acreditar que a luta
pela cidadania se restringe às leis e faz a seguinte análise:
As leis são instrumentos importantes para fazer valer nossos direitos ainda
que por meio de inúmeras pressões sociais. E quanto mais a sociedade
evolui, mais os homens serão capazes de lidar com os conflitos pela
palavra, conforme o espírito da polis grega. Acho importante essa dimensão
de os homens lutarem por leis justas. Elas são a sedimentação de outras
lutas e de certa estruturação da cidadania - que, por sua vez, está sempre
em processo. Só as leis não constroem a cidadania, mas é importante que
os homens comuns, os trabalhadores, se apropriem também do espaço
para a construção de leis favoráveis à extensão da cidadania. (COVRE,
1991, p. 29)
Do ponto de vista da proposta desse estudo de colocar a gestão social como
possibilidade para a condução da política da coleta seletiva de materiais em Belo
Horizonte, a análise de Covre é certeira: não só as leis constroem a cidadania, é
preciso que os cidadãos participem dos espaços de diálogos disponíveis para,
constantemente, alterarem a cidadania, já que ela é um processo em constante
mudança. No bojo desse envolvimento do cidadão com os espaços (como praças,
parques, conselhos, fóruns, audiências públicas e outros espaços de debates),
Jacobi vai dizer que
o surgimento da sociedade civil brasileira está indissoluvelmente vinculado
não apenas à emergência de movimentos sociais, mas ao processo pelo
qual atores sociais modernos e democráticos surgiram, adquiriram uma
nova identidade democrática e passaram a pressionar o Estado e o sistema
político a se adaptarem a uma nova concepção acerca da moderna
institucionalidade democrática. [...] Muitos movimentos imprimiram sua
marca e orientaram sua ação pela defesa de práticas pautadas pela sua
autonomia, pela necessidade de tornar visível a sua capacidade de se autoorganizar e de desenvolver a democracia direta, transformando as
carências do seu entorno de moradia em práticas reivindicatórias [...]
(JACOBI, 1999, p. 33).
Nesse contexto, a cidadania no Brasil, como colocada por Gohn (2004), com a saída
dos militares do poder na década de 1980, começa a ser praticada por novos atores,
agora não mais concentrados em associações de bairros, mães, pais, mas voltando
timidamente aos sindicatos e partidos políticos, bem como criando novas
instituições.
79
Houve, portanto, uma ampliação e uma pluralização dos grupos
organizados que redundaram na criação de movimentos, associações,
instituições e organizações não governamentais. (GOHN, 2004, p. 22).
Segundo ela, é a formação de uma sociedade política, com uma pluralidade de
atores sociais, decorrente de novas formas de associativismo, “que busca fixar suas
metas e conquistas na sociedade política, especialmente nas políticas públicas”.
[...] A cidadania ganha novo contorno, como cidadania coletiva, e extrapola
a demanda pelos direitos civis para incluir outros direitos, como os direitos
sociais básicos, elementares, de primeira geração, já equacionados desde a
Revolução Francesa, contidos nas demandas por casa, abrigo, comida;
como direitos sociais modernos, relativos a condições de trabalho,
educação, saúde, etc. (GOHN, 2004, p. 22)
Fazendo um elo entre a cidadania e a temática desse trabalho, é nesse momento,
nos idos dos anos de 1980, que começam a surgir no país organizações não
governamentais (ONGs) e movimentos voltados para a questão ambiental, que
embrionariamente iniciam um processo de conscientização da população acerca da
fauna e da flora, da poluição, principalmente nos grandes centros, e dos conflitos
gerados por grandes obras e seu impacto nas comunidades locais.
A saber: um dos primeiros grupos de ativismo ambiental no país, segundo Alonso,
Costa e Maciel (2007), nasceu no Rio de Janeiro, em 1958. Com perfil
conservacionista, a Fundação Brasileira para Conservação da Natureza (FBCN)
tinha entre seus integrantes engenheiros-agrônomos e cientistas naturais, que
estavam envolvidos na questão ambiental por convicção, mas também por razões
profissionais.
A situação de funcionários públicos dos membros da FBCN deu-lhe desde
sempre a feição de um grupo de interesse, procurando influir diretamente
sobre as decisões de Estado, por meio de lobby, em detrimento de
mobilizações públicas. Antes e durante o regime autoritário, essa estratégia
foi bem-sucedida: a FBCN influenciou a criação de leis, órgãos e políticas
ambientais e seus membros ascenderam aos cargos de direção na área3.
3
Os autores citam, por exemplo, o exercício de cargos dos membros do FCNB no Conselho Florestal
Federal, Serviço Florestal do Ministério da Agricultura, Parque Nacional de Conservação de Itatiaia,
Museu Nacional, Departamento de Pesquisas Florestais e Conservação da Natureza do IBDF
(URBAN, 2001, apud ALONSO, COSTA e MACIEL, 2007).
80
Nesse sentido, a trajetória de seus membros se confunde com a montagem
da própria burocracia ambiental brasileira, dando à FBCN um caráter
paraestatal até a década de 1970. (ALONSO, COSTA e MACIEL, 2007, p.
155)
Ao longo dos anos 1970 e 1980 surgiram outros grupos que começaram a dar
conotações mais políticas à questão ambiental, buscando não apenas dialogar com
o Estado sobre os problemas, mas tentando apontar soluções do seu ponto de vista,
buscando uma participação mais efetiva nas tomadas de decisões. Um dos
primeiros registros desta época, conforme os autores, foi em 1982, às margens das
cataratas de Foz do Iguaçu, quando 3 mil pessoas se reuniram para protestar contra
a construção da usina hidrelétrica de Itaipu. Na contextualização política, segundo
eles, era o início do movimento ambientalista brasileiro, dentro do processo de
redemocratização do país com a saída dos militares do poder, e também uma forma
de protesto contra o projeto desenhado sob a alcunha da ditadura.
Apesar do registro, Alonso, Costa e Maciel (2007) frisam que a grande literatura
produzida sobre os movimentos sociais surgidos no período de redemocratização
manteve foco nos movimentos populares, tendo, dessa forma, dado pouca atenção
ao ativismo ambiental. Diante disso, neste período foram feitas poucas análises
sistemáticas sobre o tema, que ficou restrito a estudos de caso.
Nos anos 1990, a literatura não seguiu essas pistas. Com a crise do
marxismo e a incorporação da Teoria dos Novos Movimentos Sociais, as
análises se deslocaram dos movimentos sociais populares para movimentos
"pós-materiais", vistos como os novos agentes coletivos da mudança social
e política. Foi então que a questão ambiental vingou como objeto de
estudos no Brasil – conjugada a temas como mulheres, negros e
homossexuais. (ALONSO, COSTA e MACIEL, 2007, p. 152)
Em toda essa contextualização da cidadania, o conceito se mostrou amplo, ora
construído seguindo um caminho, ora outro, que abarca vários outros conceitos em
si. Cabe destacar que, ao lado de todas essas definições, entende-se que há uma
condição sine qua non para a cidadania ocorrer: a de o ser humano ter instrumentos
para desenvolver um bem-estar social básico para si (ambiente onde se vive, saúde,
educação, habitação, renda). Por sua vez, a contrapartida desse indivíduo se daria
por meio de sua conduta (ética, de convivência e de seus atos), contribuindo para o
sujeito coexistir em harmonia com seus pares, independentemente do seu poder de
81
compra – porque senão estaria sendo estabelecida uma nova divisão de classes
para o indivíduo ter o direito de ser cidadão.
Os direitos sociais devem ser considerados na história do desenvolvimento
da cidadania, tema resgatado por Singer (2003) que acentua que esses
direitos, em geral, só poderão ser conquistados quando não houver mais o
antagonismo de classes, uma vez que os setores mais conservadores da
sociedade não aceitam a concessão de certos direitos que, para eles, são
privilégios injustificados. (TENÓRIO, 2007b, p. 39)
Tenório trabalha ainda fortemente com o conceito de cidadania deliberativa, apoiado
no pensamento de Habermas:
Cidadania deliberativa significa [...] que a legitimidade das decisões políticas
deve ter origem em processos de discussão, orientados pelos princípios de
inclusão, do pluralismo, da igualdade participativa, da autonomia e do bem
comum. (TENÓRIO, 2007a, p. 12)
O autor explica que para compreender melhor essa possibilidade decisória na
sociedade é preciso trabalhar ainda com dois conceitos: o de esfera pública e o de
sociedade civil. Segundo Habermas (1997, apud TENÓRIO, 2007a, p. 12), “esfera
pública [...] é como uma rede adequada para a comunicação de conteúdos, tomada
de posição e opiniões”. Para Tenório (2007a, p.13), “a esfera pública pressupõe
igualdade de direitos individuais (sociais, políticos e civis) e discussão, [...] por meio
de autoridade negociada entre os participantes do debate”.
Esfera pública é o espaço intersubjetivo, comunicativo, no qual as pessoas
tematizam as suas inquietações por meio do entendimento mútuo. [...]
Diferente de um processo centralizador, tecnoburocrático, elaborado desde
o gabinete, no qual o conhecimento técnico é o principal argumento da
decisão, de uma perspectiva descentralizadora, de concepção dialógica, a
esfera pública deve identificar, compreender, questionar e propor as
soluções dos problemas da sociedade, ao ponto de essas serem assumidas
como políticas públicas pelo [...] aparato administrativo do governo.
(TENÓRIO, 2007a, p. 13)
O mundo da vida é o espaço da razão comunicativa. É constituído pela
cultura, sociedade e personalidade e se expressa pela busca do
consenso entre os indivíduos, por intermédio do diálogo. O mundo da
vida contrapõe-se ao mundo dos sistemas, no qual predomina a razão
instrumental, razão que se expressa em mecanismos funcionais,
construídos em torno do poder e do dinheiro e que coordenam as
ações humanas garantindo a reprodução do mundo material; é o espaço
82
do trabalho, da técnica, da economia, da administração, etc. (HABERMAS,
1987, apud TENÓRIO, 2007b, p. 56, grifo nosso)
Sendo assim, “sociedade civil é apontada como um setor relevante na construção da
esfera pública democrática” (TENÓRIO, 2007a). Diante de todas essas perspectivas
de construção da cidadania no Brasil pós-ditadura, e das ricas e variadas
contribuições dos autores citados, acrescentamos ainda a colocação de Dowbor
(2006, p. 3), quando ele diz que “na realidade, a nossa cidadania se exerce em
diversos níveis, mas é no plano local que a participação pode se expressar de forma
mais concreta”.
1.5.3 Desenvolvimento local e globalização
O termo desenvolvimento local ganhou destaque nos últimos 20 anos, depois que o
mundo entrou na era da globalização, fomentado principalmente pelas mudanças e
relações econômicas, culturais, políticas das nações e também das comunicações
virtuais – e-mails, celulares, internet de maneira geral. Tudo agora é interligado,
todos os acontecimentos na humanidade são rapidamente acompanhados por uma
multidão ávida por estar antenada a tudo. A divulgação científica, antes restrita aos
grupos intelectuais, está em todo lugar; as fronteiras das nações se abrem para
negócios e turistas. Para Giddens, a globalização foi uma verdadeira revolução:
Trata-se de uma revolução global “na vida corrente, cujas consequências se
estão a fazer sentir em todo o mundo, em todos os domínios, do local de
trabalho à política. [...] A globalização não é apenas uma coisa nova, é
também algo de revolucionário (GIDDENS, 2000, apud BRUM, BEDIN e
PEDROSO, 2012, p. 33)
Santos (2001) tem uma visão interessante do processo de globalização: ele fala
sobre o grande salto que a ciência e a técnica deram, como nunca antes já visto, em
termos de produzir materiais em laboratórios, matérias-primas, conhecer o mundo
inteiro por meio dos satélites, etc. Por outro lado, essas mudanças, na sua visão,
vêm acompanhadas de duas tiranias: a da informação e a do dinheiro.
83
Ambas, juntas, fornecem as bases do sistema ideológico que legitima as
ações mais características da época, [...] influenciando o caráter das
pessoas. A competitividade, sugerida pela produção e pelo consumo, é
a fonte de novos totalitarismos. [...] Há um verdadeiro retrocesso quanto
à noção de bem público e de solidariedade, do qual é emblemático o
encolhimento das funções sociais e políticas do Estado com a ampliação da
pobreza e os crescentes agravos à soberania, enquanto se amplia o papel
político das empresas na regulação da vida social. (SANTOS, 2001, p. 18)
Na visão de Santos, vivemos um momento único na história, em que um sistema
unificado de técnicas, principalmente na figura do computador, permite conectar-se a
tudo e todos, e acessar as informações. Ele vai chamar esse sistema de motor
único, balizado pelo “patamar da internacionalização, com a mundialização do
produto, do dinheiro, do crédito, da dívida, do consumo, da informação”. “Esse
conjunto de mundializações, uma sustentando e arrastando a outra, impondo-se
mutuamente, também é um fato novo.” (SANTOS, 2001, p. 14). Diante disso, Santos
vai criticar também o conceito de aldeia global.
“A partir desse mito e do encurtamento das distâncias – para aqueles que
realmente podem viajar – também se difunde a noção de tempo e espaço
contraídos. É como se o mundo houvesse se tornando ao alcance das
mãos, para todos. Um mercado avassalador dito global é apresentado como
capaz de homogeneizar o planeta, quando na verdade, as diferenças locais
são aprofundadas. Há uma busca de uniformidade, [...] mas o mundo se
torna menos unido, tornando mais distante o sonho de uma cidadania
universal. Enquanto isso o culto ao consumo é estimulado. (SANTOS, 2001,
p. 8)
Na tentativa de encontrar alguns nortes para a conceituação do desenvolvimento
local – a qual esse trabalho tenta se aproximar, contextualizado com a questão dos
resíduos sólidos –, Santos ainda contribui com o seguinte pensamento:
Com a globalização e a empiricização da universalidade que ela
possibilitou, estamos mais perto de construir uma filosofia das técnicas e
das ações correlatas, que seja também uma forma de conhecimento
concreto do mundo como um todo e das particularidades dos lugares,
que incluem condições físicas, naturais ou artificiais e condições
políticas. As empresas, na busca da mais-valia desejada, valorizam
diferentemente as localizações. Não é qualquer lugar que interessa a tal e
qual firma. (SANTOS, 2001, p. 15)
Na opinião de Martins (2002, p. 51), o desenvolvimento local, enquanto estratégia de
planejamento e de ação, “surge num contexto em que se esgotam as concepções de
84
desenvolvimento associadas a progresso material (acúmulo de riquezas), pessoal
(‘ganhar a vida’) e ilimitado (‘quanto mais melhor’), mas sobretudo é um produto da
iniciativa compartilhada, da inovação e do empreendedorismo comunitários”.
Mais do que um conceito, o desenvolvimento local é, na verdade, um evento
sui generis, resultante do pensamento e da ação à escala humana, que
confrontam o desafio de enfrentar problemas básicos e alcançar níveis
elementares e autorreferenciados de qualidade de vida na comunidade.
(MARTINS, 2002, p. 51)
Na visão de Claus Offe (1999 apud TENÓRIO, 2007b, p. 107), “a construção
institucional para o desenvolvimento local não pode ser mais conduzida por
[burocratas e tecnocratas]”.
O papel-chave para o desenho e a preservação da ordem social, portanto,
deve ser ocupado por cidadãos e suas próprias associações cívicas.
(OFFE, 1999, p. 42, apud TENÓRIO, 2007b, p. 107)
Contradizendo o senso comum de sua profissão, de uma visão majoritariamente
economicista do desenvolvimento, o Nobel de economia Amartya Sen volta sua
atenção para o indivíduo, como ator e articulador principal desse desenvolvimento
local. Sen (2010) acredita que “o desenvolvimento consiste na eliminação das
privações de liberdade que limitam as escolhas e as oportunidades das pessoas de
exercer ponderadamente sua condição de agente”. Ele categoriza cinco tipos de
liberdade, vistos de uma perspectiva que ele chama de “instrumental”: 1) liberdades
políticas; 2) facilidades econômicas; 3) oportunidades sociais; 4) garantias de
transparência; 5) segurança protetora.
Cada um desses tipos distintos de direitos e oportunidades ajuda a
promover a capacidade geral de uma pessoa. [...] As políticas públicas
visando ao aumento das capacidades humanas e das liberdades
substantivas em geral podem funcionar por meio da promoção dessas
liberdades distintas, mas inter-relacionadas. [...] Na visão do
desenvolvimento como liberdade, as liberdades instrumentais ligam-se
umas às outras e contribuem com o aumento da liberdade humana em
geral. (SEN, 2010, p. 25)
Na visão desses autores, é o cidadão quem é convocado a agir. Para Dowbor
(1994), os cidadãos precisam de informação sobre seus diretos e deveres, precisam
85
de liberdade para opinar, ir e vir, fazer escolhas, viver como acreditam e em
condições mínimas de dignidade, de moradia, de educação, de saúde, de meio
ambiente. Ideia compartilhada por Sen (2010), que acredita que o desenvolvimento
se dá a partir da liberdade do sujeito, que deve estar livre de privações.
As liberdades individuais são influenciadas, de um lado, pela garantia social de
liberdades, tolerância e possibilidade de troca e transações. Também sofrem
influência, por outro lado, do apoio público substancial no fornecimento de
facilidades (como serviços básicos de saúde ou educação fundamental) que são
cruciais para a formação e o aproveitamento das capacidades humanas. (SEN,
2010, p. 63)
Em um processo de desenvolvimento local, a participação comunitária não se deve
resumir a envolvimentos esporádicos e parciais de alguns órgãos e instituições de
representação social. “A participação parece manter relação direta com a
capacidade individual ou coletiva de interagir, cooperar, associar-se e confiar”
(MARTINS, 2002, p.53)
Sendo assim, pode-se afirmar que o conceito de desenvolvimento local remete a
uma ideia de evolução, de crescimento, de auto-organização de um grupo de
sujeitos frente às potencialidades do local onde vivem, em consonância com sua
participação ativa para articular o desenvolvimento desse espaço, em aspectos que
essa comunidade julgue importantes – é necessário mais conforto? A violência está
excessiva? O sistema de iluminação gera insegurança, precisamos de mais postes?
A poluição está deixando as crianças doentes? É preciso mais oportunidades de
emprego e geração de renda? Estamos sem acesso a eventos culturais e espaços
de lazer?
Na visão de Dowbor, é justamente nesse plano que desponta a imensa riqueza da
iniciativa local, esse olhar para o entorno.
Como cada localidade é diferenciada, segundo o seu grau de
desenvolvimento, a região onde se situa, a cultura herdada, as
atividades predominantes na região, a disponibilidade de
determinados recursos naturais, as soluções terão de ser diferentes
para cada uma. E só as pessoas que vivem na localidade, que a
conhecem efetivamente, é que sabem realmente quais são as
necessidades mais prementes, os principais recursos subutilizados e
86
assim por diante. Se elas não tomarem iniciativas, dificilmente alguém
o fará para elas. (DOWBOR, 2006, p. 4, grifo nosso)
Tenório traz uma definição para desenvolvimento local, como sendo
um processo centrado em um território concreto no qual os protagonistas
são uma pluralidade de atores que ocupam determinadas posições no
espaço social e que estabelecem relações em função de objetivos e
projetos comuns (TENÓRIO, 2007b, p. 105).
Para Dowbor (2006), se antigamente o enriquecimento e a qualidade de vida
dependiam diretamente, por exemplo, de uma propriedade rural, do esforço da
família, hoje, na cidade, a qualidade de vida e o desenvolvimento vão depender
cada vez mais da capacidade inteligente de organização das complementaridades,
das sinergias no interesse comum.
A grande diferença para municípios que tomaram as rédeas do próprio
desenvolvimento, é que em vez de serem objetos passivos do
processo de globalização, passaram a direcionar a sua inserção
segundo os seus interesses. Promover o desenvolvimento local não
significa voltar as costas para os processos mais amplos, inclusive
planetários: significa utilizar as diversas dimensões territoriais segundo os
interesses da comunidade. (DOWBOR, 2006, p. 3, grifo nosso)
Do ponto de vista da produção cada vez maior de resíduos pela sociedade, é
preciso que, além de se conscientizar sobre a necessidade de redução de produção
dos resíduos frente à problemática destinação do lixo, os cidadãos se envolvam
nesse universo, com o intuito de se inserirem como responsáveis nesse processo.
Pois eles o são, e a política nacional aborda essa questão como um dos primordiais
desafios atuais: o da responsabilidade compartilhada do lixo na sociedade. “A
responsabilidade compartilhada, princípio norteador da PNRS, é uma mensagem
para que todos os atores façam sua parte.” (COSTA e CRESPO, 2012, p. 59)
Essa iniciativa social, conjunta, é fundamental, como coloca Dowbor:
No espaço adensado urbano, as dinâmicas de colaboração passam a
predominar. Não adianta uma residência combater o mosquito da dengue,
se o vizinho não colabora. A poluição de um córrego vai afetar toda a
população que vive rio abaixo. Assim, enquanto a qualidade de vida da era
87
rural dependia em grande parte da iniciativa individual, na cidade passa a
ser essencial a iniciativa social, que envolve muitas pessoas e a
participação informada de todos. (DOWBOR, 2006, p. 4)
1.5.4 Participação, comunicação e gestão social
Nesse sentido do desenvolvimento local, e como colocado pelos autores acima
citados, seria necessário então haver uma gestão envolvendo mediação,
participação e interesse voltado para determinado tema – aqui o enfoque de que
trata esse trabalho, a redução de geração de resíduos e o reaproveitamento dos
materiais recicláveis –, para que pudesse haver uma mudança na forma do agir da
sociedade. Para Bordenave (1994), o homem participa nos grupos primários (família,
amigos e vizinhança), nos secundários (empresas, associações profissionais e
sindicatos) e nos terciários (movimentos de classe e partidos políticos).
Podemos então falar de processos de micro e de macroparticipação. Para
A. Meister, a microparticipação é a “associação voluntária de duas ou mais
pessoas numa atividade comum na qual elas não pretendem unicamente
tirar benefícios pessoais e imediatos. Às vezes, pensa-se, erroneamente,
que participação social é apenas a soma das associações de que se é
membro ativo. Participação social, todavia, ou participação em nível macro,
implica uma visão mais larga e ter algo a dizer na sociedade como um todo.
[...] A macroparticipação [...] compreende a intervenção das pessoas
nos processos dinâmicos que constituem ou modificam a sociedade,
quer dizer, na história da sociedade. (BORDENAVE, 1994, p. 24, grifo
nosso)
Se o envolvimento da população então se mostra como essencial para o sucesso de
um processo de mudança, a comunicação para o desenvolvimento humano e social,
bem como para a promoção da autonomia dos sujeitos se apresenta como um ponto
fundamental de mobilização social, à medida que, segundo Marteleto e Silva (2004),
o acesso à informação é um elemento-chave para o desenvolvimento econômico e
social de comunidades e grupos sociais.
A capacidade de obter informações, além dos contornos restritos da própria
comunidade, é parte do capital relacional dos indivíduos e grupos. As
transformações dependem das redes existentes entre os indivíduos do
grupo e atores localizados em outros espaços sociais, ou seja, do capital
social da comunidade [na relação com o Estado]. (MARTELETO e SILVA,
2004, p. 42)
88
Nesse cenário, o acesso à informação se revela como uma das formas de tornar os
sujeitos mais conscientes sobre seu papel nesse contexto. Para tanto, compreendese ser necessário um despertar de consciência coletiva da sociedade de que tudo o
que está em seu entorno é ambiente. E esse ambiente pode refletir em como se
darão todas as relações – afetivas, sociais, profissionais, familiares –, pois somos
parte do mesmo ambiente.
Para Henriques et.al,
a comunicação no processo de mobilização é dialógica, na medida em
que não é a transferência do saber, mas um encontro de sujeitos
interlocutores. [...] Isso significa dizer que a existência humana é, por si,
uma existência dialógica, porque o homem é um ser de relação
(HENRIQUES et.al, 2007, p.25, grifo nosso).
O autor acrescenta ainda que a mobilização social vai ao encontro de “um projeto
que permita o desencadeamento de ações concretas de cooperação e colaboração”.
Onde os cidadãos se sintam efetivamente envolvidos no problema que se
quer resolver e compartilhem a responsabilidade por sua solução. Isso
significa dizer que a comunicação deve ser planejada para estimular a
participação desses públicos, devendo ser orientada pelo sentimento de coresponsabilidade. (HENRIQUES et.al, 2007, p. 25)
Na visão de Dowbor (2007), transformações ocorrem quando as pessoas conhecem
melhor o lugar onde vivem. Ao relatar uma história sobre uma cidade no interior da
Bahia, Pintadas, o autor exemplifica o quão importante é conhecer o local para
promover o que se quer mudar e melhorar ali, a partir do conhecimento que se tem
da região.
[...] A parceria de uma prefeita dinâmica, de alguns produtores e de pessoas
com visão das necessidades locais permitiu que os que buscavam emprego
em lugares distantes se voltassem para a construção do próprio município.
Começaram com uma parceria da Secretaria da Educação local com uma
universidade de Salvador, para elaborar um plano de saneamento básico da
cidade, o que reduziu os custos de saúde, liberou terras e verbas para a
produção. A geração de conhecimentos sobre a realidade local e a
promoção de uma atitude proativa para o desenvolvimento fazem parte
evidente de uma educação que pode se tornar no instrumento científico e
pedagógico da transformação local.
89
[...] Os promotores dessas iniciativas deram-se conta de que Pintadas fica
no semiárido, e que as crianças nunca tinham tido uma aula sobre o
semiárido, sobre as limitações e potencialidades da sua própria realidade.
Hoje se ensina o semiárido nas escolas de Pintadas. É natural que esse
ensino, que permite às crianças a compreensão da sua região, das
dificuldades dos seus próprios pais nas diversas esferas profissionais,
estimule as crianças e prepare cidadãos que verão a educação como
instrumento de transformação da própria realidade. (DOWBOR, 2007, p.
75).
Contata-se que há diversas ideias acerca do processo de construção do que se
passou a chamar de desenvolvimento local nos últimos anos, que também encontra
na literatura diversas interpretações e está longe de consensos ou de uma definição
estanque. No Brasil, depois da promulgação da Constituição Federal de 1988, a
palavra de ordem passou a ser municipalização. O Brasil assistiu nesse momento a
uma efervescência de grupos, conselhos, espaços abertos para as pessoas se
engajarem em uma causa, como explicam Azevedo e Guia (2011):
A grande questão agora é a celebração de um novo pacto federativo,
institucionalizando-se mecanismos de descentralização e democratização
da gestão, e de aumento da autonomia financeira de estados e municípios.
[...] Chamam a atenção tanto o surgimento de novos atores como os novos
papéis desempenhados por atores clássicos nessa arena. No que diz
respeito aos novos atores, a maior novidade é o envolvimento da sociedade
organizada – associações civis de vários matizes e as organizações não
governamentais (ONGs) [...] A participação em conselhos de políticas
públicas [...] e na implementação e fiscalização destas seria uma das
formas de envolvimento da comunidade organizada [...]. (AZEVEDO; GUIA,
2011, p. 134-136)
A ebulição de participação da sociedade organizada experimentada no fim dos anos
1980 e início dos anos 1990 pressionou a abertura dos governos ao diálogo,
culminando na criação de espaços como conselhos e fóruns. A ideia era se abrir
para um novo modelo de governar, a partir da construção conjunta de políticas, e
para isso era necessário reunir representantes do poder público e da sociedade civil
para essa nova relação dialógica.
Na tentativa de unir a conceituação de cidadania, local e participação, tomemos
inicialmente uma curiosa colocação de Bordenave:
Fazer parte, tomar parte, ter parte. A palavra participação vem de parte.
Participação é fazer parte, tomar parte ou ter parte. Mas é tudo a mesma
90
coisa ou há diferença no significado dessas expressões? (BORDENAVE,
1994, p. 22)
Duas décadas exatamente separam as colocações de Bordenave dos dias de hoje.
E sua abordagem não poderia ser mais atual. O Brasil vivenciou neste período,
como colocado anteriormente, uma mudança nas relações da sociedade com o
Estado, na forma de atuação dos cidadãos nas políticas públicas dentro do conceito
de cidadania que se desenvolveu no período de redemocratização do país. Ainda
assim, é possível afirmar que “a participação está na ordem do dia devido ao
descontentamento geral com a marginalização do povo dos assuntos que
interessam a todos e que são decididos por poucos” (BORDENAVE, 1994, p. 12).
A participação é o caminho natural para o homem exprimir sua tendência
inata de realizar, fazer coisas, afirmar-se a si mesmo [...]. Além disso, sua
prática envolve a satisfação de outras necessidades não menos básicas,
como a interação com os demais homens, a autoexpressão, o
desenvolvimento do pensamento reflexivo, o prazer de criar e recriar coisas,
e, ainda, a valorização de si mesmo pelos outros. (BORDENAVE, 1994, p.
16)
No livro O que é participação?, Bordenave vai elencar alguns princípios desse
conceito, entre eles, destacam-se:
1.
A participação é uma necessidade humana e, por conseguinte,
constitui um direito das pessoas;
2. A participação é um processo de desenvolvimento da consciência crítica
e de aquisição de poder;
3. A participação leva à apropriação do desenvolvimento pelo povo;
4. A participação é algo que se aprende e se aperfeiçoa;
5. A participação pode ser provocada e organizada, sem que isso
signifique necessariamente manipulação;
6. A participação é facilitada com a organização e a criação de fluxos de
comunicação;
7.
Devem ser respeitadas as diferenças individuais na forma de
participar;
8.
A participação pode resolver conflitos, mas também pode gerá-los.
(BORDENAVE, 1994, p. 76-79)
Dentro do conceito de participação, Demo diz:
Parece cabível concluir que o centro da questão qualitativa é o fenômeno
participativo. Com efeito, participação é o processo histórico de conquista
da autopromoção. É a melhor obra de arte do homem em sua história,
91
porque a história que vale a pena é a participativa, ou seja, com o teor
menor possível de desigualdade, de exploração, de mercantilização, de
opressão. No cerne dos desejos políticos do homem está a participação,
que sedimenta suas metas eternas de autogestão, de democracia, de
liberdade, de convivência. (DEMO, 1987, p. 23)
Diante dessas reflexões, então, não seria incorreto afirmar que o fenômeno
participativo seria a prática do exercício da cidadania, de o indivíduo se colocar
como sujeito pensante, com opinião própria e um desejo de fazer algo
ocorrer/mudar/surgir frente a determinada questão (a busca por melhoria da escola
do bairro, que a rua seja limpa uma vez por semana, que houvesse melhoria na
qualidade da água da sua cidade, que pudesse opinar sobre quem vai dirigir a
escola onde seu filho estuda).
Ao longo das décadas de 1990 e 2000, foram diversas as experiências no Brasil
nesse sentido, de aumento da participação da população na construção de novas
realidades, principalmente com a consolidação e profissionalização na forma de
atuar de entidades sem fins lucrativos, chamadas entidades do terceiro setor (ONGs,
Oscips, fundações) no processo de transformação social. A partir desses exemplos,
vários deles foram sendo replicados, a fim de servir de modelo para outras
comunidades, e compilados em iniciativas como a da Fundação Banco do Brasil,
que mantém em seu site um Banco de Tecnologias Sociais.
Nesse sentido, Rocha e Santos (2012, p. 74) vão dizer que “a gestão desenvolvida
em organizações públicas ou em organizações não governamentais é objeto de
questionamentos, estudos e experimentos que traduzem a demanda por relações
democráticas menos hierarquizadas e mais flexíveis”.
Ações de caráter público, não necessariamente estatal, procuram refletir as
necessidades dos cidadãos em um país com elevado índice de pobreza e
desigualdade social. A preocupação com a inclusão social e com a garantia
de direitos de cidadania ganha importância, e a racionalidade instrumental
administrativa perde centralidade. (ROCHA e SANTOS, 2012, p. 74)
Assim, a “gestão” ganha o adjetivo “social”, que a qualifica e a diferencia como
objeto de estudo (TENÓRIO, 2008, apud ROCHA e SANTOS, 2012, p. 74), ideia
compartilhada por Boullosa e Schommer:
92
A expressão [gestão social], que costumava designar variadas práticas
sociais, entre organizações de origem governamental, na sociedade civil,
em movimentos sociais e empresariais – relacionada às noções de
cidadania corporativa ou de responsabilidade social, parece assumir
progressivo caráter de solidez, passando a representar um modo especial
de problematizar e gerir realidades sociointeracionais complexas”
(BOULLOSA e SCHOMMER, 2009, p. 1).
Dessa forma, busca-se articular os conceitos acima colocados de participação com a
gestão social, que difere do conceito da gestão tradicional, que tem como objetivo
uma finalidade econômica. Partindo da contextualização histórica, os registros sobre
o termo e a conceituação de gestão social começam no fim da década de 1980 e
meados de 1990, sendo considerados recentes.
A principal pista vem dos textos de Tenório, que desde 1990 está à frente
do Programa de Estudos em Gestão Social (PEGS), vinculado à Escola
Brasileira de Administração Pública e de Empresas (EBAPE) da Fundação
Getúlio Vargas (FGV). O primeiro contato de Tenório com o termo foi em um
texto de Giorgio Rovida (1985) que trata de experiências autogestionárias
na guerra civil espanhola. (TENÓRIO, 2011, apud CANÇADO, TENÓRIO e
PEREIRA, 2011, p. 683).
Segundo Rocha e Santos (2012, p. 69), “a gestão social insurge-se a privilegiar”
o processo de desenvolvimento na proteção da vida, na preservação do
meio ambiente, no atendimento das necessidades e no desenvolvimento
das potencialidades humanas (CARRION e CALLOU, 2008, p. 15, apud
ROCHA e SANTOS, 2012, p.69-70).
Gestão social é ainda definida por Tenório como
processo gerencial dialógico no qual a autoridade decisória é compartilhada
entre os participantes da ação (ação que possa ocorer em qualquer tipo de
sistema social – público, privado ou de organizações não-governamentais).
O adjetivo social junto ao substantivo gestão será entendido como espaço
privilegiado de relações sociais onde todos têm o direito à fala, sem nenhum
tipo de coação. (TENÓRIO, 2007a, p. 10)
Para somar à visão de Tenório sobre a gestão social, França Filho (2008, p. 27)
enfatiza que ela “não orienta-se, em primeiro lugar, para uma finalidade econômica –
contrariando desse modo toda a tradição de desenvolvimento das técnicas e
metodologias gerenciais em administração”.
93
A gestão social deve ser determinada pela solidariedade, portanto é um
processo de gestão que deve primar pela concordância, onde o outro deve
ser incluído e a solidariedade o seu motivo. Enquanto na gestão estratégica
prevalece o monólogo – o indivíduo – na gestão social deve sobressair o
diálogo – o coletivo. (TENÓRIO, 2007a, p. 11)
Boullosa e Schommer (2008) problematizaram a natureza e a evolução da gestão
social como oportunidade de inovação social nas políticas públicas.
Nessa busca por inovação, a gestão social vem progressivamente
afirmando-se como território de inovação e colocando-se como alternativa
plausível de modelo de governo dos processos de transformação social. A
recente popularização da gestão social extrapola fronteiras acadêmicas,
incorporada em discursos gerenciais e agendas de governos e associada à
abertura de mercados profissionais. (BOULLOSA e SCHOMMER, 2008,
apud BOULLOSA e SCHOMMER, 2008, p. 1)
As autoras fazem questão de frisar, ainda, o perfil criativo e único da gestão social:
Ao contrapor-se a modos de gestão fundados em hierarquia, controle e
racionalização, característicos da gestão privada e da gestão pública
tradicional, a gestão social manifesta um de seus potenciais de inovação.
Tal potencial foi acolhido por grupos estratégicos de atores sociais e
comunidades de prática, que passaram a explorá-lo em sua capacidade de
conceituar e contextualizar experiências criativas de gestão territorialmente
localizadas. (BOULLOSA e SCHOMMER, 2008, apud BOULLOSA e
SCHOMMER, 2009, p. 1)
Para Boullosa e Schommer (2009), “a noção de gestão social indica e fortalece um
novo modelo de relações entre Estado e sociedade para o enfrentamento de
desafios contemporâneos”. Mas as autoras vão propor uma problematização acerca
do processo de desenvolvimento do conceito de gestão social e suas práticas,
tentando compreender se, na tentativa de definir e avaliar os avanços da gestão
social, este modelo gestionário não teve seu caráter inovador tolhido e se ele não foi
“enquadrado” em uma formalização metodológica, comum a outros tipos de gestão
tradicionais.
A transformação da gestão social em produto a faz perder sensibilidade aos
próprios contextos de atuação, pois passa a impor regras de
implementação, traduzidas em amarras interpretativas ou estruturas de
problematização que priorizam a explicação da ação de gestão sobre a
94
compreensão do contexto no qual se dá a ação em si. Os esforços da
modelização correm o risco de recair, prioritariamente, se não
exclusivamente, sobre o próprio funcionamento das metodologias, que
precisam ser, então, compreendidas por meio de detalhadas descrições.
(BOULLOSA e SCHOMMER, 2009, p. 1)
Compreende-se que, ao ponderar que um processo de gestão não precisa
necessariamente seguir um modelo de instrumentalização dentro da lógica da
gestão administrativa tradicional, a colocação de Rocha e Santos contrapõe a visão
de Boullosa e Schommer citada acima:
A gestão social caracteriza-se pela construção coletiva de regras, normas e
instrumentos de gestão; pela inovação de metodologias que privilegiam o
diálogo, a participação, decisões compartilhadas, horizontalidades
hierárquicas, com a valorização dos diferentes saberes na ação. (ROCHA e
SANTOS, 2012, p. 76)
Dentro dessa visão dos caminhos que a gestão social experimenta, França Filho (2008, p.
27) alerta sobre “uma emergência súbita do termo gestão social na agenda do debate
público e mediático, indicando aí duas tendências”.
A primeira diz respeito a sua própria banalização, ou seja, o termo tem se
prestado às mais variadas interpretações e carece de maior precisão
conceitual. Tudo que não é gestão tradicional passa então a ser visto como
gestão social. A segunda, mais do que uma tendência, reflete uma
constatação: a maior visibilidade do termo está associada à própria
ascensão da discussão sobre o terceiro setor que chama atenção para o
papel de organizações privadas atuando com objetivos públicos. (FRANÇA
FILHO, 2008, p. 27)
O autor propõe ainda a seguinte reflexão:
O que tem mudado muito na prática gestionária hoje parece ser menos a
definição em si e mais o conteúdo de cada um desses processos
gerenciais. Pensada, portanto, sob essa ótica de processo (e enquanto
formulação em si), a ideia de uma “gestão social” convida a sua própria
desconstrução, pois, uma interrogação que segue necessariamente tal
formulação é aquela de saber: qual gestão não é social? (FRANÇA FILHO,
2008, p.28)
Buscando em Rocha e Santos (2012) uma definição do que se aproxima da gestão
social que está sendo proposta para o plano municipal integrado de resíduos sólidos
95
da capital mineira – não interessada que o capital econômico seja o “único” objetivo
final da ação –, os autores afirmam que “a gestão social inspira modelos
organizacionais que objetivam a consolidação de um projeto político societário”.
(ROCHA e SANTOS, 2012, p. 79)
Nele a democracia e a participação cidadã ativa são exercidas
dialeticamente por todos os sujeitos envolvidos, com a aproximação do
conhecimento técnico dos profissionais e o poder político da população.
Prática de gestão compartilhada de construção e execução de políticas
públicas, constitui-se em um modelo organizacional caracterizado com
processos gerenciais e societários de desenvolvimento da cidadania.
(ROCHA e SANTOS, 2012, p. 79)
Além de uma relação dialógica em busca de um pacto pela democracia e
compartilhamento de decisões, é preciso que haja uma mudança na forma de o
dirigente (no caso o prefeito ou a figura do Estado como condutor da elaboração e
execução da política) enxergar sua atuação, ideia reforçada por Rocha e Santos
(2012, p. 79), quando esses autores afirmam que “incorporar o princípio da gestão
social possibilita uma mudança na concepção do exercício do poder”. Colocação
compartilhada ainda na visão de Paes de Paula (2005, apud ROCHA e SANTOS,
2012, p. 79), de “que a gestão social demanda uma mudança no perfil do gestor ao
exigir dele uma visão estratégica participativa e solidária”.
Dentro dessa abordagem e inserindo uma das visões de Rocha e Santos (2012) sobre
gestão social nesse contexto de Estado e das relações de interesses na sociedade, os
autores vão dizer que “a gestão social supõe um posicionamento político quanto à sua
finalidade, ‘a favor de quem e do quê’” (ROCHA e SANTOS, 2012, p. 76).
Por mais inovadora e democrática que seja [a gestão social], está inserida
em um contexto histórico e social que resultada da relação entre capital e
trabalho. (ROCHA e SANTOS, 2012, p. 76)
1.5.5 Exemplos pelo mundo e por aqui
Dentro de todo esse contexto é interessante olhar para experiências que vem sendo
postas em prática mundo afora e também no Brasil. Primeiro para tentar situar como
estamos na questão dos resíduos e da coleta seletiva. Em Bringhenti e Günther
96
(2011), encontra-se referência a um estudo desenvolvido nos Estados Unidos sobre
os efeitos das variáveis políticas de gestão na taxa de reciclagem. As autoras dizem
que a existência de legislação específica foi eficaz no aumento da taxa de
reciclagem no estado de Minnesota. Mas observam que “a efetividade de programas
e iniciativas de coleta seletiva requerem necessariamente o envolvimento dos cidadãos, considerados, no extremo da cadeia de produção e consumo, os geradores
dos resíduos sólidos.” (SIDIQUE; JOSHI; LUPI, 2010b, apud BRINGHENTI E
GÜNTHER, 2011, p. 422).
Há ainda a necessidade de informação e divulgação dos
programas/iniciativas implantados, no que se referem às diretrizes,
princípios, instrumentos, práticas e modalidades de coleta adotadas. A
comunidade deve ser sensibilizada, motivada e os conceitos e práticas
precisam ser assimilados e incorporados no cotidiano da população envolvida, com vistas a assegurar sua operacionalização, viabilidade e
continuidade, fatores fundamentais para se atingir os resultados esperados
e garantir sua sustentabilidade. (BRINGHENTI e GÜNTHER, 2011, p. 422)
Aqui é um exemplo do que ocorre naquele que é considerado o país mais rico e
desenvolvido do planeta. Essas mesmas autoras vão falar ainda que “a participação
social depende do perfil socioeconômico e cultural da população, com destaque para
aspectos como grau de instrução e acesso à educação não formal”.
[...] A adequação do projeto à realidade local, a regularidade no funcionamento
da logística implantada e a eficiência da estratégia de marketing para
sensibilização e motivação da população são fundamentais. A relação entre
comportamento e atitudes da população e o desempenho da reciclagem a
partir da coleta seletiva tem sido tema de várias pesquisas em diversas partes
do mundo. (WANG; RICHARDSON; RODDICK, 1997; MCDONALD; OATES,
2003; BRINGHENTI, 2004; TIMLETT; WILLIAMS, 2008; SIDIQUE; JOSHI;
LUPI, 2010a, 2010b, apud BRINGHENTI e GÜNTHER, 2011, p. 422).
Elas buscaram em Timlett e Williams (2008), ainda, o exemplo de avaliação de
desempenho da reciclagem de resíduos sólidos urbanos na Inglaterra. Os autores
partiram de três estratégias para aumentar a participação da população em políticas
de coleta seletiva (PCS) e melhorar a qualidade dos recicláveis coletados:
1) Oferta de incentivos (recompensas);
97
2) Abordagem de feedback, que prevê o retorno aos moradores de eventuais
problemas existentes com a separação dos recicláveis por eles executada;
3) Inquéritos porta a porta, para levantamento das razões da não adesão ou da
baixa participação.
As duas primeiras foram altamente eficazes na redução da presença de
rejeitos nos recicláveis, porém a segunda apresenta menor custo de
investimento. Entretanto, as três opções avaliadas não resultaram em
incremento significativo nas taxas de participação social. Os autores
concluíram que a mudança de comportamento é mais eficaz a partir da
utilização de métodos simples e de baixo custo que envolvam os moradores
e a equipe operacional responsável pela coleta de recicláveis.
(BRINGHENTI e GÜNTHER, 2011, p. 422).
Bringhenti e Günther analisaram também a participação em PCS da população da
Austrália. Basearam-se no estudo de Wang, Richardson e Roddick (1997), que
agruparam famílias em três categorias – participam regularmente, não podem participar por várias razões e participam com menor frequência – e consideraram três
modalidades de participação social: grupo cativo, de participação eventual e que não
participa, trabalhando com a hipótese que o modo de participação é fator
determinante do sucesso das PCSs.
Um estudo feito em Nova York por Clark e Maantay (2006, apud BRINGHENTI e
GÜNTHER, 2011, p. 4) “mostra que fatores como a falta de compreensão do
programa por parte dos moradores e a qualidade da infraestrutura e dos serviços de
limpeza pública prestados podem afetar negativamente a taxa de participação
social”.
No Brasil, uma iniciativa baseada em sistema de recompensa e adotada por ao
menos quatro empresas de distribuição de energia elétrica, o Vale Luz, se mostrou
interessante do ponto de vista de mobilização social para a coleta seletiva. Como a
conta de energia é considerada um dos gastos essenciais numa residência e figura
entre um dos mais elevados, as empresas criaram uma forma de conceder desconto
na conta para famílias que dessem em troca materiais recicláveis, em dias
estabelecidos para a coleta. Segundo Freitas (2009), a ideia nasceu em Cuiabá, em
2006, por iniciativa da CEMAT (Centrais Elétricas Matogrossenses), seguida da
Companhia Energética do Ceará e da empresa fluminense Ampla, que adotou o
98
projeto em Niterói (RJ). Há registros também de que a Coelba, distribuidora baiana
de energia, que pertence ao grupo Neoenergia, adota o mesmo projeto.
De maneira geral os programas são parecidos e baseados na ideia da troca
de resíduos por descontos na conta de energia. No entanto, eles se
diferenciam em alguns pontos como área de alcance, tipos de resíduos
aceitos, clientes que podem participar do projeto e pontos de troca dos
resíduos. O projeto Vale Luz é destinado aos clientes de baixa renda da
área de concessão da distribuidora, no entanto, os demais clientes têm a
possibilidade de participar destinando seu bônus para alguma instituição
filantrópica pré-cadastrada. (FREITAS, 2009, p. 18)
Tomemos um exemplo de tecnologia social 4 executada em Arcos, Centro-Oeste de
Minas Gerais, como um processo participativo da comunidade em que se entendeu
que houve a articulação da cidadania, mobilização, participação, gestão social com
vista ao desenvolvimento local. O exemplo e passo a passo do projeto foram
retirados do banco de tecnologias sociais da Fundação Banco do Brasil. O objetivo
desse arquivo é compartilhar as diversas práticas, em várias áreas da sociedade
brasileira, demonstrando em detalhes como foi sua execução, seu custo, material e
mão de obra empregada, como forma de compartilhamento do conhecimento para
que outras pessoas possam replicá-las, se assim o quiserem. (FONSECA, p. 1, apud
FUNDAÇÃO BANCO DO BRASIL, 2014)
Resumidamente, o objetivo da Emater-MG era eliminar os focos de entulhos na zona
rural de Arcos, numa comunidade chamada Domingos. O primeiro passo dos
idealizadores do projeto foi propor reuniões com a escola local, a comunidade e a
prefeitura. Foi ministrada uma palestra sobre lixo rural. Em seguida, os técnicos da
Emater propuseram um diagnóstico rápido participativo, ouvindo das próprias
pessoas como elas enxergavam o lixo e onde ele estava localizado. Eles
propuseram a elaboração de mapas, feito por esse grupo de pessoas, que
indicassem os locais de bota-foras de lixo. Eles saíram em campo, fotografaram,
quantificaram e tipificaram o lixo encontrado nos pontos.
4
Tecnologia social compreende produtos, técnicas ou metodologias reaplicáveis, desenvolvidas na
interação com a comunidade e que representem efetivas soluções de transformação social, segundo
definição da Fundação Banco do Brasil. Os detalhes da tecnologia social adotada em Arcos, iniciativa
da Empresa de Agropecuária e Extensão Rural de Minas Gerais (Emater-MG), estão em Anexo III.
99
Novas palestras foram ministradas, agora falando dos impactos do lixo nas áreas
onde foram localizados e discussão como grupo sobre o mutirão para a retirada do
lixo. Nessa mesma discussão, era definido o local, por todos, de onde seria
implantado o Centro de Coleta de Lixo Rural – havia duas alternativas de modelo:
um com mourões e cerca de tela e outro como se fosse uma caixa grande, de
cimento.
No dia do mutirão, foi feita uma lista de equipamentos e material necessários: luvas
para as pessoas, água para beber, caminhão para carregar os resíduos, cordas para
ajudar no içamento dos sacos de lixo, transporte para as pessoas até os locais.
Depois da ação em campo, foi produzida uma espécie de cartilha descritiva com
todo o trabalho, distribuída na escola, e criado um concurso de redação voltado para
a comunidade. O tema era descrever como as pessoas envolvidas no processo se
sentiram contribuindo ativamente na ação ambiental.
Foi estabelecido um cronograma para reavaliação das práticas, checagem nos
Centros de Coleta de Lixo Rural da disposição dos resíduos e vistoria de bota-foras
irregulares. Um trabalho permanente. O resultado, segundo descrição no site da
Fundação BB colocada pelos mentores da tecnologia social, foi: “Implantamos a
cultura de não jogar o lixo no meio ambiente, consciência ambiental prática,
comportamento ambiental coletivo” (FONSECA, p. 1, apud FUNDAÇÃO BANCO DO
BRASIL, 2014).
Os exemplos de projetos de coleta seletiva, participação e incentivos de mobilização
social em três países desenvolvidos expuseram que as dificuldades no campo da
gestão dos resíduos sólidos não são exclusivas do Brasil ou de Belo Horizonte. São
desafios globais que se colocam frente a toda sociedade. Há iniciativas sendo
postas em prática no país que sinalizam alternativas frente a determinada
comunidade ou situação, ou seja, não há um modelo pronto a ser copiado. Cada
localidade precisa se debruçar sobre suas especificidades de viver, de se relacionar
com o local, para então construir com a participação dos indivíduos daquele local o
modelo mais apropriado.
100
2 CIDADE(ÃO) E O LIXO: A SITUAÇÃO DE BELO HORIZONTE DIANTE DA
POLÍTICA NACIONAL DE RESÍDUOS SÓLIDOS E A OPORTUNIDADE DE
ADOÇÃO DA GESTÃO SOCIAL NO PLANO MUNICIPAL DE GESTÃO
INTEGRADA DE RESÍDUOS
2.1 Introdução
O estilo de vida de grande parte das pessoas no mundo tem sofrido fortes mudanças
diante dos avanços da tecnologia, da facilidade de mobilidade, maior acesso a bens
e serviços, acompanhado por novas formas de consumir e, consequentemente, de
gerar resíduos. Sistematicamente, há pelo menos duas décadas, cientistas mundiais
vêm mostrando que este modelo de viver das sociedades está impactando fortemente
o meio ambiente e o planeta, causando sérios prejuízos para a natureza, como
derretimento das calotas polares, saturação da atmosfera com gases causadores do
efeito estufa, desertificação de diversas regiões antes alagáveis, perda em qualidade
e quantidade de biodiversidade e vários outros.
Compartilhando da realidade das grandes cidades globais, que têm o desafio de lidar
com a imensa geração de resíduos, Belo Horizonte, capital de Minas Gerais, não foge
à regra e precisa se confrontar com a questão. Entre os diversos caminhos trilhados
por municípios brasileiros para a adoção de práticas mais sustentáveis, a coleta
seletiva de materiais recicláveis foi uma das mais implantadas. Iniciativas desse
caráter em curso na capital mineira desde 1992 foram premiadas e consideradas
referência, principalmente pela política participativa e inclusiva que a administração
da cidade construiu com quem sobrevive dos resíduos: os catadores de recicláveis.
No entanto, chegando à sua maioridade e completando 21 anos em 2014, o modelo
de coleta seletiva da capital mineira dá sinais de desarticulação: a coleta porta a porta
não avança desde 2008, não há mobilização constante por parte da prefeitura, há
limitação na infraestrutura existente para expansão do sistema e pouca adesão da
população na política em curso.
A este cenário, soma-se o fato de a política local ter de se articular com a nova Política
Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS), instituída pela Lei 12.305/2010, que prevê uma
série de exigências para todo o país, sendo a elaboração do plano municipal de gestão
101
integrada dos resíduos sólidos o primeiro passo. É esse plano que vai nortear toda a
política da cidade para o tema dos resíduos. Ele deve esmiuçar como será elaborada
toda a dinâmica e logística dos resíduos sólidos em cada município e, entre alguns
itens, destacamos:
1) Classificação dos rejeitos (domiciliares, limpeza urbana, estabelecimentos
comerciais e prestadores de serviços, serviços públicos de saneamento
básico, resíduos industriais, resíduos de serviços de saúde, da construção
civil, agrossilvopastoris, resíduos dos serviços de transporte e resíduos de
mineração, resíduos perigosos e não perigosos);
2) Diagnóstico da situação dos resíduos (origem, volume, caracterização,
formas de destinação e disposição final adotadas);
3) Identificação de possibilidades de implantação de soluções consorciadas
ou compartilhadas com outros municípios, quando for o caso;
4)
Plano dos resíduos e dos geradores sujeitos a plano de gerenciamento
específico ou o sistema de logística reversa;
5)
A implantação da coleta seletiva com a participação de cooperativas
ou outras formas de associação de catadores de materiais reutilizáveis e
recicláveis;
6)
Procedimentos operacionais a serem adotados nos serviços de
limpeza urbana e de manejo de resíduos sólidos, incluída a disposição final
ambientalmente adequada;
7)
Indicadores de desempenho operacional e ambiental dos serviços
públicos de limpeza urbana e de manejo dos resíduos sólidos;
8)
Programas e ações de educação ambiental que promovam a não
geração, a redução, a reutilização e a reciclagem de resíduos sólidos;
9)
Programas e ações para a participação dos grupos interessados, em
especial das cooperativas ou outras formas de associação de catadores de
materiais reutilizáveis e recicláveis formadas por pessoas físicas de baixa
renda, se houver;
10)
Mecanismos para a criação de fontes de negócios, emprego e renda,
mediante a valorização dos resíduos sólidos;
11)
Metas de redução, reutilização, coleta seletiva e reciclagem, entre
outras, com vistas a reduzir a quantidade de rejeitos encaminhados para a
disposição final ambientalmente adequada.
(PNRS, 2012, p. 48-50)
Por já ter uma experiência que vem sendo construída ao longo de duas décadas,
pode-se considerar que Belo Horizonte se encontra numa situação positiva. E é nesse
contexto que a capital mineira tem uma oportunidade ímpar: a de adotar a gestão
social, com vista ao desenvolvimento local, na construção conjunta dessa política.
Foram buscados na pesquisa documental e na literatura especializada alguns
elementos para ajudar na compreensão desse desafio.
102
2.2 A Política Nacional de Resíduos Sólidos
Diante de uma lacuna em sua política ambiental, cujo processo levou 20 anos
tramitando no Congresso, o governo federal sancionou em agosto de 2010 a Lei
12.305, que trata da Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS). Esta lei prevê a
elaboração do Plano Nacional de Resíduos Sólidos, sendo o seu processo de
construção descrito no Decreto 7.404/2010, que a regulamentou. O Plano Nacional
de Resíduos Sólidos tem vigência por prazo indeterminado e horizonte de 20 anos,
com atualização a cada quatro anos.
A lei exige, a partir da sua regulamentação no prazo de dois anos, a
elaboração de planos de resíduos sólidos em âmbitos nacional,
estadual e municipal que erradiquem os lixões, apresentem metas
gradativas de redução, reutilização e reciclagem, com o objetivo de
reduzir a quantidade de resíduos e rejeitos encaminhados para
disposição no solo. O acesso aos recursos da União direcionados à gestão
dos resíduos sólidos dependerá da apresentação dos planos acima
mencionados. (JACOBI e BENSEN, 2011, p. 139, grifo nosso)
No início de 2011, foi constituído o Comitê Orientador Interministerial para a
implantação dos sistemas de logística reversa. A finalidade é garantir que os
resíduos sólidos sejam reutilizados, reciclados ou recolhidos pela indústria
responsável. Para tanto, serão firmados acordos setoriais com as diversas
cadeias produtivas. Assim, os fabricantes, distribuidores, comerciantes e
consumidores deverão compartilhar a responsabilidade pelos resíduos.
(JACOBI e BENSEN, 2011, p. 139)
Configuram prioridades da PNRS a não geração, a redução, a reutilização, a
reciclagem, o tratamento dos resíduos sólidos e a disposição final ambientalmente
adequada dos rejeitos. A figura a seguir ilustra que todos os setores da sociedade
estão convocados a participar da nova política. Cabe ressaltar que os municípios são
os responsáveis pela gestão (coleta e destino) dos resíduos domiciliares e os
provenientes da limpeza urbana (varrição de vias públicas, podas de árvores, etc.). E
a PNRS exige que cada estado e município e o Distrito Federal elaborem seus
próprios planos de gestão integrada dos resíduos.
103
Figura 1 – Expectativas da PNRS para cada uma das partes relacionadas
Fonte: Política Nacional de Resíduos Sólidos – Agora é lei, Cempre, 2013.
Entre suas várias proposições, a nova legislação exige que todos os 5.570 municípios
brasileiros (PORTAL BRASIL, 2013) erradiquem depósitos a céu aberto de resíduos
(os chamados lixões) e estabeleçam, entre diversos itens, programas de redução de
geração de resíduos, educação ambiental, sistema de coleta seletiva (coleta de
resíduos sólidos previamente segregados conforme sua constituição e composição).
A própria PNRS define a coleta seletiva como um de seus mais importantes
instrumentos, ao lado da logística reversa, que é
instrumento de desenvolvimento econômico e social caracterizado por
conjunto de ações [...] que viabilizem a coleta e a restituição dos resíduos
sólidos ao setor empresarial, para reaproveitamento, em seu ciclo ou em
outros ciclos produtivos, ou outra destinação final ambientalmente adequada.
(PNRS, 2012, p. 36).
Para compreender melhor como o Brasil começou a refletir a questão dos resíduos
sólidos urbanos, expõem-se os principais marcos para se chegar à PNRS.
104
Tabela 1 – Linha do tempo do Ministério do Meio Ambiente
Principais decisões para a construção da Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS)
1991
Projeto
de
Lei
203
dispõe
sobre
acondicionamento,
coleta,
tratamento,
transporte e destinação dos resíduos de serviços de saúde.
_________________________________________________________________
1999
Proposição 259 do Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama), intitulada Diretrizes Técnicas para
a Gestão de Resíduos Sólidos. Aprovada pelo plenário do conselho, mas que não chegou a ser
publicada.
_________________________________________________________________
2001
Câmara dos Deputados cria e implementa Comissão Especial da Política Nacional de Resíduos com o
objetivo de apreciar as matérias contempladas nos projetos de lei apensados ao Projeto de Lei 203/91
e formular uma proposta substitutiva global. Com o encerramento da legislatura, a Comissão foi extinta.
Realizado em Brasília o 1º Congresso Nacional dos Catadores de Materiais Recicláveis, com 1,6 mil
congressistas, entre catadores, técnicos e agentes sociais de 17 estados. Eles promoveram a 1ª
Marcha Nacional da População de Rua, com 3 mil participantes.
________________________________________________________________
2003
Realizado, em Caxias do Sul, o I Congresso Latino-Americano de Catadores, que propõe formação
profissional, erradicação dos lixões, responsabilização dos geradores de resíduos.
Presidente Luiz Inácio Lula da Silva institui Grupo de Trabalho Interministerial de Saneamento
Ambiental a fim de promover a integração das ações de saneamento ambiental, no âmbito do governo
federal. GT reestrutura o setor de saneamento e resulta na criação do Programa Resíduos Sólidos
Urbanos.
Realizada a I Conferência Nacional de Meio Ambiente.
_________________________________________________________________
2004
MMA promove grupos de discussões interministeriais e de secretarias do ministério para elaboração
de proposta para a regulamentação dos resíduos sólidos.
Em agosto, o Conama realiza o seminário “Contribuições à Política Nacional de Resíduos Sólidos” com
o objetivo de ouvir a sociedade e formular nova proposta de projeto de lei, pois a Proposição Conama
259 estava defasada.
_________________________________________________________________
2005
Criado grupo interno na Secretaria de Qualidade Ambiental nos Assentamentos Humanos do MMA
para consolidar contribuições do Seminário Conama, os anteprojetos de lei existentes no Congresso
Nacional e as contribuições dos diversos atores envolvidos na gestão de resíduos sólidos.
Encaminhado anteprojeto de lei de “Política Nacional de Resíduos Sólidos”, debatido com Ministérios
das Cidades, da Saúde, mediante sua Fundação Nacional de Saúde-Funasa, do Desenvolvimento,
Indústria e Comércio Exterior, do Planejamento, Orçamento e Gestão, do Desenvolvimento Social e
Combate à Fome e da Fazenda.
Realizada II Conferência Nacional de Meio Ambiente, para consolidar participação da sociedade na
formulação de políticas ambientais. Um dos temas prioritários são os resíduos sólidos.
Realizados seminários regionais de resíduos sólidos, promovidos pelo Conama, Ministério do Meio
Ambiente, Ministério das Cidades, Funasa, Caixa Econômica Federal e ainda debates com a
Confederação Nacional das Indústrias (CNI), Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp),
Associação Brasileira de Engenharia Sanitária (Abes), Cempre, e com outras entidades e organizações
105
afins, tais como Fórum Lixo & Cidadania e Comitê Interministerial de Inclusão Social dos Catadores de
Lixo.
Instituída nova Comissão Especial na Câmara dos Deputados.
_________________________________________________________________
2006
Aprovado relatório (deputado Ivo José) que trata do PL 203/91, acrescido da liberação da importação
de pneus usados no Brasil.
2007
Executivo propõe, em setembro, o PL 1991. O projeto de lei da Política Nacional de Resíduos Sólidos,
considerou o estilo de vida da sociedade contemporânea, que, aliado às estratégias de marketing do
setor produtivo, leva a um consumo intensivo provocando uma série de impactos ambientais, à saúde
pública e sociais incompatíveis com o modelo de desenvolvimento sustentado que se pretende
implantar no Brasil.
O PL 1991/2007 apresenta forte inter-relação com outros instrumentos legais na esfera federal, tais
como a Lei de Saneamento Básico (Lei 11.445/2007) e a Lei dos Consórcios Públicos (Lei
11.107/1995), e seu decreto regulamentador (Decreto 6.017/2007). De igual modo está interrelacionado com as Políticas Nacionais de Meio Ambiente, de Educação Ambiental, de Recursos
Hídricos, de Saúde, Urbana, Industrial, Tecnológica e de Comércio Exterior e as que promovam
inclusão social.
Texto é finalizado e enviado à Casa Civil.
Constituído GT (GTRESID) para analisar subemenda substitutiva proposta pelo relator, deputado
Arnaldo Jardim, que envolveu reuniões com a Casa Civil.
_______________________________________________________________
2008
Realizadas audiências públicas, com contribuição da CNI, da representação de setores interessados,
do Movimento Nacional de Catadores de Materiais Recicláveis e dos demais membros do GTRESID.
_________________________________________________________________
2009
Em junho, uma minuta do Relatório Final foi apresentada para receber contribuições adicionais.
_________________________________________________________________
2010
Em 11 de março, plenário da Câmara dos Deputados aprovou em votação simbólica um substitutivo ao
Projeto de Lei 203/91, do Senado, que institui a Política Nacional de Resíduos Sólidos e impõe
obrigações aos empresários, aos governos e aos cidadãos no gerenciamento dos resíduos.
Depois o projeto seguiu para o Senado. Foi analisado em quatro comissões e em 7 de julho foi aprovado
em plenário.
Em 2 de agosto, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em cerimônia no Palácio do Itamaraty,
sancionou a lei que cria a Política Nacional de Resíduos Sólidos.
Em 3 de agosto é publicada no Diário Oficial da União a Lei 12.305 que institui a Política Nacional de
Resíduos Sólidos e dá outras providências.
Em 23 de dezembro é publicado no Diário Oficial da União o Decreto 7.404, que regulamenta a Lei
12.305, de 2 de agosto de 2010, que institui a Política Nacional de Resíduos Sólidos, cria o Comitê
Interministerial da Política Nacional de Resíduos Sólidos e o Comitê Orientador para a Implantação dos
Sistemas de Logística Reversa, e dá outras providências.
Também no dia 23 é publicado o Decreto 7.405, que institui o Programa Pró-Catador, denomina Comitê
Interministerial para Inclusão Social e Econômica dos Catadores de Materiais Reutilizáveis e
Recicláveis o Comitê Interministerial da Inclusão Social de Catadores de Lixo criado pelo decreto de
11 de setembro de 2003, dispõe sobre sua organização e funcionamento, e dá outras providências.
Fonte: Quadro montado pela pesquisadora com dados oficiais do Ministério do Meio Ambiente, 2013.
106
Acrescentam-se à linha do tempo dos pontos importantes para a construção da PNRS
outras decisões ligadas ao tema consideradas de fundamental importância para a
consolidação das leis ambientais brasileiras no cenário político-institucional do país:

Lei de Saneamento (Lei 11.445/05) e alteração da Lei 8.666/93, para
permitir a contratação de organizações de catadores sem licitação;

Lei de Consórcios (Lei 11.107/05) e o Decreto 6.017/07 (que
regulamenta a Lei dos Consórcios Públicos) estimulando a integração de
municípios para a gestão associada dos resíduos;

Decreto Presidencial 5.940/06, que institui a coleta seletiva em órgãos
públicos federais e sua destinação a organizações de catadores;

Ampliação de recursos públicos para apoiar organizações de
catadores;

Leis de coleta seletiva instituídas em vários municípios.
(ABREU, 2008, p. 13)
2.2.1 Educação ambiental na PNRS
Entre as várias definições e objetivos da PNRS, destacamos o controle social, que
prevê a garantia de informar a sociedade e lhe dá o direito de participar da formulação
das políticas de resíduos; a destinação adequada dos resíduos nas cidades,
acondicionando-os de forma a não poluir e aproveitar aqueles que podem voltar à
cadeia produtiva pela coleta seletiva e pela reciclagem; e a disseminação na
sociedade de uma produção e consumo de bens e serviços de forma a atender as
necessidades das atuais gerações e permitir melhores condições de vida, sem
comprometer a qualidade ambiental e o atendimento das necessidades das gerações
futuras.
Do ponto de vista do cumprimento dos vários objetivos estabelecidos pela PNRS,
estados e municípios terão que desenvolver, cada um na sua esfera, os planos
integrados de resíduos, prevendo a educação ambiental no processo, sendo então
um dos mecanismos para conscientização da sociedade sobre a questão do lixo.
Vale ressaltar que muito antes de a política entrar em vigor o Brasil já contava com
duas peças de legislação amplas que previam a educação ambiental em todas as
107
unidades da Federação. A primeira é a Constituição Federal de 1988, cujo capítulo VI,
Do Meio Ambiente, diz:
Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso
comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder
Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as
presentes e futuras gerações. (BRASIL, CF, 1988)
No artigo 225, parágrafo 1º, o texto destaca, entre vários itens, que, para assegurar a
efetividade desse direito, incumbe ao Poder Público:
V - controlar a produção, a comercialização e o emprego de técnicas,
métodos e substâncias que comportem risco para a vida, a qualidade de vida
e o meio ambiente;
VI - promover a educação ambiental em todos os níveis de ensino e a
conscientização pública para a preservação do meio ambiente. (BRASIL, CF,
1988)
Uma década depois de promulgada a Constituição, foi sancionada a Lei 9.795/1999,
específica sobre educação ambiental, que no seu artigo primeiro conceitua o tema:
Entende-se por educação ambiental os processos por meio dos quais o
indivíduo e a coletividade constroem valores sociais, conhecimentos,
habilidades, atitudes e competências voltadas para a conservação do meio
ambiente, bem de uso comum do povo, essencial à sadia qualidade de vida
e sua sustentabilidade. (BRASIL, Lei 9.795/1999)
Seguido do artigo 2o:
A educação ambiental (EA) é um componente essencial e permanente da
educação nacional, devendo estar presente, de forma articulada, em todos
os níveis e modalidades do processo educativo, em caráter formal e nãoformal. (BRASIL, Lei 9.795/1999).
Em caráter formal, a educação ambiental deve ser tratada em todos os níveis de
educação reconhecidos no país: educação básica, infantil, ensino fundamental,
médio; educação superior, de jovens e adultos, especial e profissional. Já em caráter
não formal, prevê-se, no artigo 13 da lei, que:
108
Entende-se por educação ambiental não-formal as ações e práticas
educativas voltadas à sensibilização da coletividade sobre as questões
ambientais e à sua organização e participação na defesa da qualidade do
meio ambiente (BRASIL, Lei 9.795/1999).
Segundo Dias (2004), por definição do próprio Conselho Nacional do Meio Ambiente
(Conama), a educação ambiental
é um processo de formação e informação orientado para o desenvolvimento
da consciência crítica sobre as questões ambientais e de atividades que
levem à participação das comunidades na preservação do equilíbrio
ambiental (DIAS, 2004, p. 85).
A EA não deve ser tomada como pontual, apenas de defesa de florestas, animais ou
oceanos, mas do ponto de vista integral. Principalmente num país jovem como o
Brasil, de 514 anos, é de extrema importância que a educação ambiental seja
instrumento adotado não exclusivamente na escola, como local de aprendizagem e
desenvolvimento do saber, mas a começar pela educação em casa e em todas as
esferas da sociedade – empresas públicas, privadas, entidades sociais e religiosas,
comércio em geral, indústria, etc. – para a disseminação de conhecimento e da
informação acerca dos problemas ambientais e meios para amenizá-los.
Como ela já era prevista na Constituição, a PNRS só vem reforçar a necessidade de
usar deste instrumento como uma das ferramentas a serem adotas por estados e
municípios para a conscientização da população acerca do ambiente em que se vive,
da cidade onde as pessoas constroem suas vidas e, neste contexto, da questão dos
resíduos sólidos no cotidiano. Para Reigota,
a educação, seja formal, informal, familiar ou ambiental, só é completa
quando a pessoa pode chegar nos principais momentos de sua vida a pensar
por si próprio, agir conforme os seus princípios, viver segundo seus critérios
(REIGOTA, 1997, apud MARCATTO, 2002, p. 14).
2.2.2 Responsabilidade pelo lixo: cada um é dono do seu
Além da educação ambiental, outros aspectos que a política nacional de resíduos traz
em seu bojo são a responsabilidade compartilhada pelo ciclo de vida dos produtos e
109
a logística reversa de retorno de produtos, envolvendo a indústria fabricante, o
comércio e os consumidores, além da prevenção, precaução, redução, reutilização e
reciclagem, metas de redução de disposição de resíduos em aterros e a disposição
ambientalmente adequada dos rejeitos em aterros sanitários.
No contexto da responsabilidade compartilhada, a PNRS define em seu capítulo II,
artigo XVII:
Responsabilidade compartilhada pelo ciclo de vida dos produtos: conjunto de
atribuições individualizadas e encadeadas dos fabricantes, importadores,
distribuidores e comerciantes, dos consumidores e dos titulares dos serviços
públicos de limpeza urbana e de manejo dos resíduos sólidos, para minimizar
o volume de resíduos e rejeitos gerados, bem como para reduzir os impactos
causados à saúde humana e à qualidade ambiental decorrentes do ciclo de
vida dos produtos [...]. (PNRS, 2012, p. 37)
Os vários setores da sociedade já se organizam para detalhar a viabilidade logística
e econômica do cumprimento da legislação, que começa a ser cobrada em 2014. Em
seu relatório Logística Reversa de Equipamentos Eletroeletrônicos Análise de
Viabilidade Técnica e Econômica, a ABDI diz:
A PNRS representa um marco para a sociedade brasileira no que toca à
questão ambiental com destaque para uma visão avançada na forma de tratar
o lixo urbano. Traz uma concepção de vanguarda, ao priorizar e compartilhar,
com todas as partes relacionadas ao ciclo de vida de um produto, a
responsabilidade pela gestão integrada e pelo gerenciamento
ambientalmente adequados dos resíduos sólidos. Dessa forma, o setor
público, a iniciativa privada e a população ficam sujeitos à promoção do
retorno dos produtos às indústrias após o consumo e obriga o poder público
a realizar planos para o gerenciamento do lixo. A lei também consagra o viés
social da reciclagem, com o estímulo à participação formal dos catadores,
organizados em cooperativas. (ABDI, 2013. p. 13)
Dentro desse cenário de compartilhamento de responsabilidades é interessante
observar a colocação de Jacobi e Besen:
A PNRS fortalece os princípios da gestão integrada e sustentável de resíduos
e propõe medidas de incentivo à formação de consórcios públicos para a
gestão regionalizada com vistas a ampliar a capacidade de gestão das
administrações municipais, por meio de ganhos de escala e redução de
custos no caso de compartilhamento de sistemas de coleta, tratamento e
destinação de resíduos sólidos. (JACOBI e BESEN, 2011, p. 137)
110
O incentivo à formação de consórcios intermunicipais pode ser interessante do ponto
de vista dos pequenos municípios que têm lixões (depósitos de lixo a céu aberto, sem
qualquer controle sanitário, que poluem o ar, o solo e as águas, dependendo de sua
localização) e não teriam condições financeiras de desenvolver de maneira individual
seu plano local de manejo de resíduos, com a construção de um aterro sanitário. Esse
modelo de gestão já é usado em várias localidades brasileiras, pois otimiza custos e
logística para as prefeituras que têm menor arrecadação.
Minas Gerais mesmo, recentemente, assinou uma parceria público-privada de gestão
de resíduos sólidos que vai abranger mais de 46 dos 48 municípios da Região
Metropolitana de Belo Horizonte. Os municípios continuam sendo responsáveis pela
coleta do lixo, coleta seletiva e envio dos materiais até as estações de transbordo. De
lá, até a disposição final, a empresa vencedora da licitação passa a ser a responsável.
2.2.3 Lixões banidos e coleta seletiva presente
Entre as várias determinações da PNRS está o fechamento de lixões até 2014. Além
de ambientalmente ser uma decisão necessária, o país poderá colher, nas próximas
décadas, frutos positivos no Sistema Único de Saúde (SUS), uma vez que o lixo está
intimamente ligado à proliferação de vetores e doenças. Em vez de depósitos a céu
aberto dos rejeitos devem ser criadas soluções ambientalmente viáveis, com adoção
de novas tecnologias.
Capítulo II (Dos princípios e objetivos) – Art. 7º.
São objetivos da Política Nacional de Resíduos Sólidos, entre outros:
IV – adoção, desenvolvimento e aprimoramento de tecnologias limpas como
forma de minimizar impactos ambientais.
Capítulo III (Dos instrumentos) – Art. 8º.
São instrumentos da Política Nacional de Resíduos Sólidos, entre outros:
VI – a cooperação técnica e financeira entre os setores público e privado para
o desenvolvimento de pesquisas de novos produtos, métodos, processos e
tecnologias de gestão, reciclagem, reutilização, tratamento de resíduos e
disposição final ambientalmente adequada de rejeitos. (PNRS, 2012).
111
Figura 2 – Lixão brasileiro
Crédito: Diário do Pará – 11.01.11
Uma das opções são os aterros sanitários, já usados no país – locais preparados para
receber os resíduos, com tratamento e impermeabilização do terreno para evitar a
contaminação de lençóis freáticos. Há captação e tratamento do chorume, resultante
da decomposição do lixo; aproveitamento dos gases eliminados na decomposição do
lixo para geração de energia, entre outros mecanismos de controle do local. São
espaços licenciados pelos órgãos ambientais de cada estado ou pelo órgão municipal
competente, sendo regularmente vistoriados para checagem do cumprimento de uma
série de normas federais e estaduais. Pela nova política, deverão ser destinados para
o aterro somente rejeitos – material restante depois de esgotadas todas as
possibilidades de reuso e reciclagem do resíduo sólido.
A PNRS vai além da corresponsabilização de geração e destinação dos resíduos. Ela
trabalha com a perspectiva de desenvolvimento social e econômico, quando inclui os
catadores de material reciclado, já integrantes de políticas públicas de várias cidades
brasileiras, mas que ainda são marginalizadas pela maioria da sociedade. Essa visão,
digamos, preconceituosa em relação aos catadores não é nova. Velloso demonstra
que desde o final da Idade Média e na Modernidade as pessoas que cuidavam do
destino do lixo eram marginais à sociedade.
Assim como o resto ou a sobra, esses seres humanos também eram
escolhidos de acordo com a ocupação ou com o papel social que
desempenhavam. [...] As tarefas ligadas aos restos, inclusive o destino de
112
cadáveres, eram delegadas a prostitutas, prisioneiros de guerra,
condenados, escravos, ajudantes de carrascos e mendigos. Tal fato é
importante para a compreensão de como o trabalho com resíduos foi sendo
socialmente desqualificado. [...] (VELLOSO, 2008, p. 1.958)
Segundo Portilho (1997, apud VELLOSO, 2008, p. 1.958), desde aquela época até os
dias atuais, as pessoas que trabalham ou vivem do lixo – catadores, coletores e até
mesmo os engenheiros sanitaristas – são estigmatizadas pela sociedade. São vistos
da mesma maneira os espaços destinados ao tratamento e ao destino dos resíduos:
lixões, vazadouros, depósitos, aterros sanitários, usinas de reciclagem e estações de
tratamento de esgotos.
Do ponto de vista de sustentabilidade socioambiental urbana, o plano vai criar
mecanismos de inserção de organizações de catadores nos sistemas
municipais de coleta seletiva e possibilita o fortalecimento das redes de
organizações de catadores e a criação de centrais de estocagem e
comercialização regionais. (JACOBI e BESEN, 2011, p. 137)
Dentro do compartilhamento de responsabilidades pela geração de resíduos
estabelecido pela PNRS, o Cempre criou um quadro da situação dos resíduos pré e
pós-política, a saber:
Quadro 1 – Previsão antes e depois da PNRS
ANTES DA PNRS
DEPOIS DA PNRS
Poder público
»Falta de prioridade para o lixo urbano
» Existência de lixões na maioria dos
municípios
» Resíduo orgânico sem aproveitamento
» Coleta seletiva cara e ineficiente
» Municípios farão plano de metas sobre resíduos
com participação dos catadores
» Os lixões precisam ser erradicados em quatro
anos
» Prefeituras passam a fazer a compostagem
» É obrigatório controlar custos e medir a
qualidade do serviço
Catadores
»
Exploração
por
atravessadores
e riscos à saúde
» Informalidade
» Problemas de qualidade e quantidade dos
materiais
» Falta de qualificação e visão de mercado
» Catadores reduzem riscos à saúde e aumentam
renda em cooperativas
» Cooperativas são contratadas pelos municípios
para coleta e reciclagem
» Aumenta a quantidade e melhora a qualidade da
matéria-prima reciclada
» Trabalhadores são treinados e capacitados para
ampliar produção
Iniciativa privada
» Inexistência de lei nacional para nortear os
investimentos das empresas
» Falta de incentivos financeiros
» Baixo retorno de produtos eletroeletrônicos
pós-consumo
» Marco legal estimulará ações empresariais
» Novos instrumentos financeiros impulsionarão a
reciclagem
» Mais produtos retornarão à indústria após o uso
pelo consumidor
113
» Desperdício econômico sem a reciclagem
Consumidor
» Não separação do lixo reciclável nas
residências
»Falta de informação
» Falhas no atendimento da coleta municipal
» Pouca reivindicação junto às autoridades
» Reciclagem avançará e gerará mais negócios
com impacto na geração de renda
» Consumidor fará separação mais criteriosa nas
residências
» Campanhas educativas mobilizarão moradores
» Coleta seletiva aprimorada para recolher mais
resíduos
» Cidadão exercerá seus direitos junto aos
governantes
Fonte: Política Nacional de Resíduos Sólidos - Agora é lei, Cempre, 2013.
2.2.4 Modelo de consumo e reciclagem
Dentro do cenário não apenas brasileiro, mas mundial, de aumento no consumo de
bens materiais e, consequentemente, do crescimento da produção de resíduos, um
aspecto que vem sendo debatido é como diminuir a geração de resíduos. A escassez
de matéria-prima é visível e os fenômenos ambientais, que antes não mereciam
atenção, agora afetam milhares de indivíduos. Estima-se que 50 milhões de pessoas
foram obrigadas a abandonar suas casas por problemas decorrentes de catástrofes
naturais ou questões acarretadas pelas mudanças climáticas. Seriam os refugiados
ambientais.
Num país que vem registrando crescimento do seu Produto Interno Bruto (PIB) nos
últimos anos, como mostra Henriques (2012) é de extrema importância que sejam
desenhadas políticas públicas para equilibrar economia, sociedade, educação e meio
ambiente.
A taxa de crescimento do PIB per capita no Brasil se elevou de 0,65%, no
período 1995/2003, para 3,13%, no período 2004/2010. [...] A proporção
da população em idade ativa na população total ainda deverá se elevar
nos próximos 15 anos e contribuirá com 0,45 pontos percentuais para a
taxa de crescimento anual do PIB per capita entre 2010 e 2020.”
(HENRIQUES, 2012, p. 10-11)
Em 2010, o país teve a maior alta registrada no PIB nas últimas duas décadas, dando
indícios de que superava a crise financeira internacional. Lembrando que o PIB é a
soma de todos os bens e serviços produzidos em um país durante certo período.
114
Isso inclui do pãozinho até o apartamento de luxo. O índice só considera os
bens e serviços finais, de modo a não calcular a mesma coisa duas vezes. A
matéria-prima usada na fabricação não é levada em conta. No caso de um
pão, a farinha de trigo usada não entra na contabilidade. O primeiro fator que
influencia diretamente a variação do PIB é o consumo da população. Quanto
mais as pessoas gastam, mais o PIB cresce. Se o consumo é menor, o PIB
cai. (UOL ECONOMIA, 2013, p. 1)
Em 2012, o relatório anual da Associação Brasileira das Empresas de Limpeza Pública
e Resíduos Especiais (Abrelpe) mostrou que a produção de lixo aumentou nos últimos
anos, o que pode ser interpretado como um reflexo de maior consumo da população
brasileira. “A geração de resíduos sólidos urbanos no Brasil cresceu 1,3%, de 2011
para 2012, índice que é superior à taxa de crescimento populacional urbano no país
no período, que foi de 0,9%.” (ABRELPE, 2012, p. 28)
Conforme a Abrelpe, a situação da destinação final dos resíduos sólidos urbanos no
país não se alterou em relação a 2011 – um percentual de 58% correspondente à
destinação adequada no ano de 2012 permaneceu significativo, porém a quantidade
destinada de forma inadequada cresceu em relação ao ano anterior, totalizando 23,7
milhões de toneladas que seguiram para lixões ou aterros controlados.
Do ponto de vista ambiental (aterros controlados) pouco se diferenciam dos
lixões, pois não têm o conjunto de sistemas necessários para a proteção do
meio ambiente e da saúde pública. De 2011 a 2012, observou-se que 6,2
milhões de toneladas de RSU deixaram de ser coletados e, por
consequência, tiveram destino impróprio. (ABRELPE, 2012, p. 31)
Historicamente, a recuperação de materiais a partir do lixo é atividade milenar,
segundo Dias. “Há registros arqueológicos que sugerem que a sucata de metal e
objetos metálicos inúteis podem ter sido derretidos e reciclados já no ano 3000 a.C.”
(DOWNS e MEDINA, 2000, apud DIAS, 2009, p. 22).
De acordo com o Cempre (2008), há registros de que na década de 1940, quando o
mundo assistia à Segunda Guerra Mundial, a população civil já se organizava para
suprir a indústria de matérias-primas escassas e altamente necessárias, como
borrachas, metais, papel, madeira, latas e tecidos.
115
Nos países envolvidos com o conflito, campanhas governamentais já
incentivavam os cidadãos a doar jornais velhos, panelas, vasilhames de leite,
pneus, tudo o que pudesse ser reutilizado para o esforço da guerra. Nos
Estados Unidos, tornou-se famosa a frase “Get some cash for your trash” (na
tradução livre, ganhe algum dinheiro com seu lixo). (CEMPRE, 2008, p. 15)
Poderia de fato haver a motivação de reutilização do material necessário devido ao
período de conflito, mas Velloso (2008) faz questão de enfocar que a transformação
do lixo se deu em função de sua valoração monetária. Segundo ela, “na sociedade
capitalista só se atribui valor a coisas que podem gerar lucro”.
A valorização do lixo começa a surgir no período industrial e amplia-se por
causa da guerra. O lixo deveria ser transformado em dinheiro. Este valor foi
atribuído ao lixo, devido à possibilidade de sua transformação em matériaprima”. (VELLOSO, 2008, p. 1959)
Então, diante do exposto por Velloso, é possível fazer a assertiva de que há essa
conexão com o lixo: ele é o fruto/resultado do consumo das sociedades atuais, mas
também uma possibilidade de gerar lucros e girar a economia. Então, se ele está
inserido nesse contexto na sociedade, é de se esperar que seja possível articular
projetos para as cidades que englobassem a tríade desenvolvimento do social, do
ambiental e do econômico, por meio dos resíduos.
No Brasil, o fenômeno de reutilização teve início nos idos de 1896, em São Paulo,
quando Velloso cita os trapeiros, subdivididos em dois tipos (catador e atacadista),
que separavam materiais encontrados no lixo.
O primeiro [catador] fazia a separação dos materiais encontrados no lixo e os
enfardava para serem vendidos como matéria-prima. Ele era o “operário”,
enquanto que o atacadista – o “atravessador” – era o patrão. Havia uma
tensão entre as indústrias de trapos e o Serviço Sanitário, apesar delas terem
sido toleradas até o término da Primeira Guerra Mundial. [...] O Serviço
Sanitário começou a exigir a desinfecção dos fardos, que apresentavam um
“aspecto repugnante”. [...] Assim, o interesse econômico em manter a
indústria de trapos, foi “vencido” pelas medidas de higiene exigidas pelo
Serviço Sanitário. A partir de 1914, a Prefeitura de São Paulo foi
encarregada de criar um estatuto para o lixo, no qual, além da higiene,
estavam em questão a moral e a civilidade. (VELLOSO, 2008, p. 1.959,
grifo nosso)
116
Além da redução da geração de resíduos, que se coloca como um desafio para os
governos, mesmo a reciclagem, também prevista na PNRS, não é um processo
simples. Cada material tem um tipo de processamento (papel, alumínio, plástico,
vidro), um valor de mercado, mas de maneira geral a definição encontrada pela ABDI
(2013), sob a ótica da reciclagem de resíduos eletroeletrônicos (REEs), parece
resumir satisfatoriamente o processo:
Reciclagem é o processo de transformação dos resíduos sólidos que envolve
a alteração de suas propriedades físicas, físico-químicas ou biológicas, com
vistas à transformação em insumos ou novos produtos. Em geral, cumprem
uma série de etapas como eliminação dos dados, no caso de equipamentos
de informática e telecomunicações; pesagem; desmontagem; separação por
tipo de materiais – ferrosos, não ferrosos e plásticos; compactação dos
materiais de características similares; processamento mecânico e/ou químico
para recuperação de materiais de valor. (ABDI, 2013, p. 35-36)
O processo inclui ainda as fases de trituração e moagem; desintoxicação; filtragem;
liquidificação; separação por densidade; separação por eletrólise; decantação;
refinagem do material. E, quando necessário, tratamento e disposição de resíduos
perigosos. Conforme vimos anteriormente, os registros de algum tipo de iniciativa no
Brasil que se aproxima da reciclagem como temos hoje se deram antes dos idos de
1900. Nessa trajetória de mais de 100 anos, o processo se modificou e se expandiu.
Dados da Abrelpe mostram que em 2012 cerca de 60% dos municípios brasileiros
(3.326) registraram alguma iniciativa de coleta seletiva.
Embora seja expressiva a quantidade de municípios com iniciativas de coleta
seletiva, convém salientar que muitas vezes estas atividades resumem-se à
disponibilização de pontos de entrega voluntária ou convênios com
cooperativas de catadores, que não abrangem a totalidade do território ou da
população do município. Os 2.239 municípios restantes não tinham nenhuma
iniciativa. (ABRELPE, 2012, p. 30)
Tabela 2 – Participação dos Principais Materiais no Total de RSU Coletado no Brasil em 2012
Material
Participação (%)
Quantidade (t/ano)
Metais
2,9
1.640.294
Papel, Papelão
13,1
7.409.603
Plástico
13,5
7.635.851
117
Vidro
2,4
1.357.484
Matéria orgânica
51,4
29.072.794
Outros
16,7
9.445.830
TOTAL
100
56.561.856
Fonte: Abrelpe, 2012
Embora haja a sinalização de um quadro favorável no que diz respeito à inclusão de
programas de coleta seletiva nas cidades, o fato de a destinação inadequada ter
crescido entre 2011 e 2012 (Abrelpe, 2012, p. 31) é preocupante, principalmente
diante da nova legislação federal em vigor, opinião compartilhada por Jacob e Bensen:
A prestação do serviço de coleta seletiva pelos municípios brasileiros tem
avançado. No entanto, ainda se encontra muito aquém dos patamares
necessários para efetivamente reduzir a quantidade de resíduos
potencialmente recicláveis que ainda são dispostos em aterros ou lixões e os
impactos decorrentes. Cabe destacar que as primeiras iniciativas no Brasil
datam de 1989 e que a ausência durante mais de 20 anos de uma política
nacional de resíduos sólidos e de vontade política dos administradores
municipais gerou um passivo ambiental de lixões e aterros sanitários
controlados. E ainda, a necessidade de construção de novos aterros em
razão do esgotamento da vida útil da maioria dos existentes. (JACOB e
BENSEN, 2011, p. 142)
Apesar de avanços terem ocorrido na indústria da reciclagem, fruto da tecnologia e da
pesquisa científica desenvolvida para este setor, e de diversos municípios terem
desenvolvido práticas locais de coleta, o processo de catação nas ruas ainda é igual.
Diante disso é necessário que a nova política não apenas inclua os catadores em seu
processo (como a lei prevê e como já ocorre, na prática), mas avance no processo de
reconhecimento dos catadores como agentes ambientais da sociedade brasileira, e
também imprima investimentos na educação ambiental da população para reduzir a
geração de resíduos e separação adequada dos materiais a serem recuperados.
É importante lembrar que no Brasil a coleta seletiva tem um forte componente
social de combate à pobreza. [...] A implantação ou fortalecimento de um
programa de coleta seletiva em um município trata-se, portanto, de uma
questão muito mais complexa do que normalmente se imagina. Demanda
uma abordagem intersetorial, que integre as áreas de engenharia com as
intervenções sociais. Exige também uma forte atuação educativa para
promover a revisão de valores culturais relacionados ao desperdício, que
possibilitem a introdução de novas práticas no trato do lixo gerado
cotidianamente. (ABREU, 2008, p. 12, grifo nosso)
118
Dados do Movimento Nacional dos Catadores de Materiais Recicláveis (MNCR)
indicam que há 800 mil homens e mulheres sobrevivendo da catação de materiais
recicláveis nas ruas e avenidas dos municípios brasileiros, apesar de apenas 10%
desse total serem associados ao movimento. Já são 1,2 mil associações cadastradas,
nos 27 estados e no Distrito Federal. (Informação verbal)5
2.3 Minas, um estado à frente em ações ambientais
Em todo esse contexto é importante registrar inciativas desenvolvidas pelo governo
de Minas Gerais, considerado estado precursor em diversas iniciativas ambientais,
tendo sido um dos primeiros entes da Federação a aprovar, em 2009, um ano antes
da PNRS, legislação própria para resíduos (Lei 18.031), que estabelece exigências
similares à legislação federal no que diz respeito à erradicação de lixões, redução da
geração de resíduos, implantação da coleta seletiva, gestão compartilhada com a
sociedade, inclusão de catadores nos processos e educação ambiental.
Essa colocação e as que se seguem se fazem necessárias para ressaltar que muitas
das práticas adotadas em Belo Horizonte fundamentaram a política ambiental do
estado, o que aponta para a consolidação do processo de avanço social e ambiental
nas sociedades mineira e belo-horizontina. Desde 2003, o estado desenvolve, como
plano de governo, o Programa Minas sem Lixões, conduzido pela Fundação Estadual
de Meio Ambiente (Feam), que já reduziu em cerca de 65% o número de lixões em
território mineiro.
Minas tem atualmente 275 lixões, 529 aterros controlados, 252 municípios
com disposição regularizada com Aterros Sanitários e/ou Usinas de Triagem
e Compostagem (UTC) e 67 municípios que dispõem em outros estados ou
estão em processos de regularização. (SEMAD, 2012)
Em 2010/2011, a Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento
Sustentável (Semad) criou o programa Bolsa Verde:
5
Informação de Luiz Henrique Silva, presidente do MNCR, em novembro de 2013, durante
apresentação na 4ª Semana Mineira de Redução de Resíduos, Belo Horizonte, MG.
119
Que prevê a concessão de incentivos financeiros aos produtores rurais do
estado (proprietários e posseiros) que pratiquem atividades de conservação
e/ou restauração da vegetação nativa dentro de suas propriedades. (PINTO,
2012, p. 14)
Outra iniciativa diferenciada no país foi a criação do Bolsa Reciclagem, lançado em
2011 em Minas, que contempla cooperativas de catadores com repasses trimestrais,
uma espécie de remuneração pelos serviços prestados, e cujo cálculo é feito com
base nas notas fiscais ou recibos emitidos por empresas compradoras de materiais
recicláveis.
Em outubro de 2012, o governo estadual pagou a primeira parcela do Bolsa
Reciclagem a 59 cooperativas de material reciclável, aptas a receber o
incentivo, das 119 cadastradas, que representam um total de 1.561
catadores, dos quais 1.167 serão contemplados na primeira parcela, que
destinou R$ 1,5 milhão. O incentivo, segundo o governo do estado, será
concedido trimestralmente às cooperativas e associações, sendo que 90%
serão destinados aos catadores. O restante poderá ser utilizado para
despesas administrativas, infraestrutura, equipamentos, formação de
estoque de materiais recicláveis e capacitação de associados. (SEMAD,
2012)
O estado inovou também ao criar o Centro Mineiro de Referência em Resíduos
(CMRR), com apoio do Serviço Social de Minas Gerais (Servas) e da Semad, além de
outros parceiros como o Sebrae-MG. Localizado na Região Leste de Belo Horizonte,
esse espaço promove cursos e eventos ligados aos resíduos, como a Série Diálogos,
realizada em 2012 com a participação de vários atores da sociedade que debateram
ao longo do ano diversos itens da cadeia produtiva dos resíduos – desde a situação
social e econômica dos catadores, bem como a tributação de ICMS sobre os materiais
recicláveis; a destinação dos resíduos eletroeletrônicos e uma série de outros temas
correlatos.
É em todo esse contexto que se faz necessário o debate da Política Nacional de
Resíduos Sólidos em Belo Horizonte, tendo em vista que o município não tem lixões
e vem construindo, ao longo de 20 anos, uma política de coleta seletiva e outros
instrumentos de participação na esfera da política pública. Em São Paulo, segundo
dados da prefeitura local, 11 milhões de pessoas são beneficiadas com a coleta
seletiva, feita por duas empresas terceirizadas. A maior cidade da América latina gera
18 mil toneladas/dia de resíduos. (PREFEITURA DE SÃO PAULO, 2014). O Rio de
120
Janeiro, talvez a única capital que tem serviço municipal de limpeza urbana (os demais
tem parte do serviço terceirizado), informa no site oficial da prefeitura, que atende 68
bairros com a coleta. (PREFEITURA DO RIO DE JANEIRO, 2013).
2.4 Estudo de caso: a construção da coleta seletiva em Belo Horizonte
Belo Horizonte tem 2,37 milhões de habitantes, sendo considerada a quarta capital
brasileira em população, e uma região metropolitana que contabiliza 5,41 milhões de
pessoas (IBGE, 2010). Com 331,4 quilômetros quadrados de território, o município,
segundo dados do Portal da Prefeitura de Belo Horizonte (Portal PBH, 2014a), é
dividido em nove administrações regionais: Venda Nova (com 262 mil habitantes,
divididos em 42 bairros); Norte (com 212 mil habitantes e 45 bairros); Noroeste (com
360 mil habitantes e 54 bairros); Nordeste (com 273 mil habitantes e 68 bairros);
Barreiro (com 283 mil habitantes e 54 bairros); Centro-Sul (com 270 mil habitantes e
35 bairros); Leste (237 mil moradores, distribuídos em 25 bairros); Oeste (268 mil
habitantes e 37 bairros); e Pampulha (com 155 mil pessoas e 34 bairros). Vilas e
aglomerados não estão incluídos aqui.
No cenário atual, a estimativa é de que BH jogue literalmente no lixo R$ 75,5 milhões
em resíduos sólidos que poderiam ser reciclados, segundo Ayer e Oliveira.
Estudo elaborado pela Fundação Banco do Brasil e pela organização não
governamental WWF-Brasil mostra o enorme potencial de reciclagem
desperdiçado em BH. Somente 2,65% das 283.824 toneladas de material
reciclável descartado por ano na capital mineira – entre papel, plástico, vidro
e metais – vão para a coleta seletiva. (AYER e OLIVEIRA, 2012b, p. 22)
A construção da política de coleta seletiva em Belo Horizonte completa 21 anos em
2014. Esse processo está em contínuo aperfeiçoamento, devido à alternância de
governos, amadurecimento dos próprios atores envolvidos – técnicos da prefeitura,
catadores e sociedade em geral – e desafios constantes colocados para a questão
dos resíduos sólidos urbanos.
A preocupação com os resíduos sólidos urbanos (RSUs) na cidade ganhou maior
proporção em 1990, quando a PBH deu início aos primeiros diálogos com a Pastoral
121
de Rua da Arquidiocese da cidade, ligada à Igreja Católica, para organizar e formalizar
uma associação de trabalhadores que já tinham na catação regular de lixo uma forma
de geração de renda para sustento familiar. O trabalho social da Pastoral vinha sendo
feito, ao longo dos anos, com catadores de papel, papelão e outros materiais
recicláveis, sendo a maioria deles moradores de rua.
O impulso para a política foi a ideia de apoiar socialmente e com alguma organização
os catadores que já atuavam no Centro da cidade desde os idos de 1970. Segundo
Dias (2002), havia registros de catação desde 1930 na cidade. O impulso para a
política foi a ideia de apoiar socialmente e com alguma organização os catadores que
já atuavam no Centro da cidade desde os idos de 1970. Segundo Dias (2002), havia
registros de catação desde 1930 na cidade.
O cotidiano de vida e de trabalho do catador era impregnado de exploração,
estigmatização e perseguição. A pesquisa feita pela então Secretaria
Municipal de Ação Comunitária, em 1989, permite traçar um perfil desse
grupo à época. A maioria trabalhava sozinha (62%) ou com a ajuda de
familiares (28%) e apenas um pequeno percentual (10%) em grupos, com
uma jornada de trabalho diária de cerca de 12 horas. O material recolhido era
vendido a depósitos particulares, que por sua vez, o vendia aos grandes
aparistas e estes às indústrias de reciclagem. A exploração dos donos de
depósito sobre o trabalho era reconhecida tanto pelo catador quanto pelo
poder público. Um ofício da Superintendência de Limpeza Urbana (SLU)
assim se refere ao catador de papel: ...mendigo, via de regra que nada mais
é que um preposto, explorado e desamparado, dos donos de depósito de
papéis velhos, que se enriquecem à sua custa, à margem da lei... (DIAS,
2002, p. 45)
Ainda segundo Dias, o trabalho dos catadores era extremamente dificultado pela ação
dos fiscais da prefeitura nas chamadas “operações limpeza” – ações de retirada dos
catadores das ruas onde eles faziam a triagem dos materiais. Em 1987, apoiados por
projeto sociopedagógico desenvolvido pela Pastoral, eles começaram a se organizar,
no que, três anos depois, se tornaria a Associação dos Catadores de Papel, Papelão
e Material Reaproveitável (Asmare), o primeiro grupo organizado de catadores na
cidade, tentando minimizar na sociedade a dimensão marginal dada a eles.
O nascimento da Asmare em 1990 assume papel reivindicatório com o
município de assumir o catador de materiais recicláveis como sujeitos sociais
e como agentes ambientais que fazem um trabalho na cidade que a
administração pública, de certa forma, ignora. (DIAS, 2002, p. 62)
122
Com o nascimento da Asmare, a cidade passou a vivenciar experiências com a
separação dos resíduos de forma mais sistematizada. Nesse sentido, a PBH e a
Superintendência de Limpeza Urbana (SLU) buscaram desenvolver esse processo
reconhecendo a filosofia da Pastoral e oferecendo oportunidades de protagonismo
dos catadores na construção dessa associação. O cenário, à época, nacional e
internacionalmente falando, era favorável, uma vez que, assim como Belo Horizonte,
outros governos buscavam soluções ambientais urbanas mais justas e viáveis.
Segundo Dias (2002, p. 57), “a concepção metodológica da Pastoral se pauta pelos
princípios aplicados pela educação popular que reconhece os catadores e a
população de rua como sujeitos de sua própria história”. Naquela época, a coleta
seletiva, bem como sua execução, era feita por equipe própria da SLU, responsável
pela gestão dos resíduos na cidade.
Fracionamos adiante os períodos de gestões administrativas da Prefeitura de Belo
Horizonte, de 1993 a 2012, buscando na literatura disponível elementos que possam
ajudar na compreensão de como se deram, não apenas a configuração administrativa
na política da coleta seletiva na capital, bem como as decisões políticas referentes ao
tema, ao longo dos últimos anos.
2.4.1 Gestão participativa (1993-1996)
A partir de 1993, a Prefeitura de Belo Horizonte (PBH), sob administração do
advogado Patrus Ananias (PT), deu início a uma gestão participativa, com forte cunho
social, e passou a ver e tratar os catadores de recicláveis como parceiros
fundamentais no projeto de coleta seletiva da cidade, implantado a partir do Programa
de Manejo Diferenciado de Resíduos Sólidos da Superintendência de Limpeza Urbana
(SLU), conforme assegura Dias:
Se até 1993, a Pastoral havia priorizado o trabalho organizativo desenvolvido
junto aos catadores, a partir deste ano sua atuação é ampliada junto aos
outros segmentos da população de rua, num contexto favorável à essa ação,
em função da possibilidade de implementação de programas junto a esta
população por parte da gestão da Frente BH Popular. [...] Esse ano é marcado
por um intenso processo de movimentação e participação da população de
123
rua organizada em várias instâncias político-institucionais, que possibilitaria
a este segmento alcançar uma série de conquistas. Ao longo do período que
compreende os anos de 93-96, a parceria do poder público com a Asmare se
solidifica e a associação, devido ao seu forte cunho de geração de trabalho e
renda, cada vez mais se fortalece enquanto espaço de intercâmbio e de
alternativas para a saída da rua dos outros grupos da população de rua.
(DIAS, 2002, p. 165)
No convênio assinado entre a PBH e a Arquidiocese de Belo Horizonte, a
administração municipal ficou responsável pela estrutura logística e operacional de
suporte ao trabalho dos catadores – o que incluía a cessão ou construção de galpões
de triagem, implantação de contêineres (os Locais de Entrega Voluntária – LEVs) para
recebimento de materiais recicláveis separados pela população (e cuja doação era
feita para a Asmare), caminhões para a coleta dos recicláveis, bem como uma
assessoria no processo de capacitação dos catadores associados.
Conforme Andrade (2007a, p.19), “foram instalados 150 LEVs, dispostos em ruas ou
avenidas de grande movimentação onde o cidadão levava o material separado em
casa” e, depois, o caminhão recolhia. O material era, então, entregue à Asmare, para
que seus associados fizessem a triagem e, depois, a comercialização com grandes
estoquistas ou empresas de fora da capital. As despesas administrativas da Asmare
(água, luz, capacitação) eram custeadas com recursos financeiros repassados
mensalmente pela PBH.
Na ótica de uma política democrático-popular que visava diminuir as
desigualdades sociais e enfrentar a pobreza estrutural do país, foi incluído o
investimento na geração de trabalho e renda, no âmbito da gestão de
resíduos. Foram beneficiados setores tradicionalmente excluídos da cidade
formal, principalmente com a parceria estabelecida com os catadores de
materiais recicláveis, além da inserção dos carroceiros no programa de
reciclagem de entulho. (ABREU, 2009, p. 227)
Começava então uma mudança: a semente da coleta seletiva estava sendo plantada
na cidade. A prefeitura construiu galpões de triagem; os catadores passaram a ser
parceiros do município na coleta seletiva. Eles receberam cursos de capacitação por
técnicos da própria SLU e da Secretaria Municipal de Desenvolvimento Social
(SMDS), que depois passou a ser chamada Secretaria Municipal de Assistência Social
(SMAAS), e os filhos dos catadores foram inseridos em projetos socioculturais, por
meio de oficinas lúdicas.
124
Uma ex-agente pastoral e quatro catadores destacaram as oficinas que foram
criadas em 1995, como a de costura, de papel artesanal, de objetos de
materiais recicláveis e marcenaria. A última é uma oficina escola para os
filhos dos catadores, onde são construídos os carrinhos utilizados pelos
catadores e os contêineres para armazenamento de recicláveis, além de
outros objetos. Nesse mesmo ano foram realizadas melhorias na
infraestrutura operacional do galpão-sede da Asmare, e, em 1996, alugado
mais um galpão. (PEREIRA, 2011, p. 76)
Nos primeiros anos da década de 1990, a cidade assistiu a uma efervescência de
ações educativas, por meio da equipe de comunicação e mobilização social da SLU,
no intuito de questionar o consumismo, o desperdício e o destino dos resíduos
gerados. Como estratégia de mobilização social para a limpeza urbana, usaram teatro
e esquetes nas ruas e escolas, uma forma de sensibilizar a sociedade para a questão
do lixo e da reciclagem. Belo Horizonte encontrava-se inserida num contexto de
política ambiental, no âmbito nacional e internacional.
Para sensibilizar e motivar a população, e cumprir a função pedagógica
necessária a esse processo, a SLU – através de sua Gerência de Mobilização
Social – desenvolveu estratégias nas quais a arte e o lúdico são instrumentos
prioritários de educação ambiental. A mobilização e a comunicação,
entendidas como processo cotidiano, são realizadas, através de abordagens
corpo-a-corpo de pedestres e motoristas, em eventos culturais tais como o
carnaval dos catadores de papel, caminhadas ecológicas e ruas de lazer,
através de treinamentos e oficinas, em reuniões com a sociedade organizada
e em ações integradas em bairros. (DIAS, 2002, p. 64)
Neste período, como parte da estruturação do programa de coleta seletiva, as
operações de “limpeza” acabaram e teve início uma forma diferenciada de abordagem
dos técnicos da prefeitura junto aos catadores. “Contrataram psicólogos, sociólogos e
pedagogos, para estruturar equipes multidisciplinares de abordagem aos catadores,
numa parceria com a Pastoral de Rua.” (PEREIRA, 2011, p. 73). Um projeto básico
que contemplou ainda moradores de rua foi o Programa População de Rua. Essas
pessoas, quando abordadas nas vias da capital por equipes da SMDS, eram
encaminhadas à Asmare para reinserção profissional.
A coleta ponto a ponto foi estabelecida com grandes geradores, como indústrias,
empresas, hipermercados e condomínios residenciais, e incluía o recolhimento do
material deixado pela população nos LEVs. Já nesta época, a coleta de resíduos na
cidade era fracionada, conforme mostra o quadro.
125
Quadro 2 – Fracionamento dos resíduos em Belo Horizonte
Resíduos domiciliares – material orgânico (cascas de frutas e legumes, restos de comida em
geral; e material seco, reciclável);
Resíduos hospitalares – feito separadamente, com material contaminante e disposto no
aterro em valas separadas;
Resíduos provenientes de poda de árvores e capina na cidade – destinados à compostagem;
Resíduos da construção civil – destinado às estações de tratamento desse tipo de resíduo,
onde eram transformados em asfalto e bloquetes para uso na própria cidade (em parques,
recomposição de canteiros e meios-fios, etc.).
Fonte: Quadro montado pela pesquisadora com base nos dados de Abreu, 2009.
Pereira (2011) diz que é percebida uma transformação na cidade, a partir da gestão
participativa de Patrus Ananias (1993-1996), “da passagem de um estado, no qual os
catadores em vistos como marginais e inimigos da limpeza urbana para outro, no qual
passam a ser considerados trabalhadores e “agentes prioritários” do programa de
coleta Seletiva”. (PEREIRA, 2011, p. 79)
Outro aspecto fundamental perceptível nas narrativas foram os sentidos que
conduziram a construção do programa de coleta seletiva e que,
simultaneamente, eram reforçados e reconstruídos. A Pastoral de Rua, como
base e estimuladora da organização dos catadores, buscava construir novos
sentidos em torno do catador e do seu trabalho, enfatizando a injustiça social
e a função ecológica do trabalho que desempenham. [...] Essa gestão
municipal parece que foi caracterizada pela abertura à sociedade civil e pela
construção de projetos voltados para grupos sociais marginalizados.
(PEREIRA, 2011, p. 70)
2.4.2 Continuidade, com mudanças (1996-1999)
Nas eleições de 1996, venceu o médico Célio de Castro (PSB), vice-prefeito na gestão
anterior. Segundo Pereira (2011, p. 79), na gestão de Castro, entre 1997 e 2000, “o
cargo de superintendente da SLU foi ocupado por outra pessoa, em função de
questões políticas ligadas a barganhas entre partidos coligados”.
Mas o prefeito impôs a condição de que toda equipe da SLU continuasse
apesar da troca da superintendente e, assim, foi feito. [...] A manutenção da
equipe, incluindo cargos efetivos e de confiança, contribuiu para continuidade
do trabalho desenvolvido. (PEREIRA, 2011, p. 79)
126
Apesar da continuidade do trabalho com os catadores, segundo Dias, a troca
administrativa teve impacto na gestão da coleta seletiva.
A partir de 1997, já na gestão da frente liderada pelo PSB/PMDB, alguns dos
limites da relação com o poder público, em sua capacidade de implementação
das políticas públicas reivindicadas pela população de rua, começam a se
evidenciar. A relação inicial de “cumplicidade” que havia marcado a gestão
Patrus Ananias é substituída pela desconfiança e pelo acirramento do
discurso de autonomia e de identidade característicos dos movimentos
sociais. (DIAS, 2002, p. 165)
Em 1998, a mobilização dos catadores passou a ganhar maior volume, sendo tendo
repercussão pública. No ano seguinte, foi criado o Fórum Nacional Lixo e Cidadania,
um espaço de debate sobre o tema, principalmente sob a perspectiva dos catadores
de recicláveis. Neste período, surgiu o Instituto Nenuca de Desenvolvimento
Sustentável (Insea), na capital, com a presença de alguns técnicos da Pastoral de
Rua, que continuaram desenvolvendo projetos de organizações de catadores, agora
também em outros municípios.
Segundo relatos de Dias (2002), em 1999, técnicos da Pastoral, em conjunto com
integrantes da Asmare, começaram um trabalho piloto de consultoria, no âmbito do
Programa Lixo e Cidadania do Unicef2, nos municípios de Brumadinho e Ibirité, ambos
na Região Metropolitana de Belo Horizonte, que tinha como meta erradicar o trabalho
infantil nos lixões.
No ano de 2000, a atuação dessa consultoria já havia se ampliado para 14
municípios e para 33, no final de 2001. A grosso modo essa consultoria atua
na abordagem aos catadores; na sensibilização dos diversos grupos locais e
do poder público; na realização de diagnósticos participativos para
conhecimento da realidade local e elaboração de propostas; na realização de
audiências públicas e seminários sobre a gestão dos resíduos sólidos; na
articulação de fóruns locais de gestão do lixo que envolvam a sociedade civil,
o poder público e a iniciativa privada; na capacitação profissional dos
catadores e técnicos locais e na elaboração de planos integrado de
gerenciamento dos resíduos sólidos. (DIAS, 2002, p. 166)
2
Programa do Fundo das Nações Unidas para a Infância criado em junho de 1999 cujo objetivo era a
erradicação do trabalho infantil nos lixões, por meio do estímulo à implantação de programas de gestão
integrada de resíduos sólidos nos municípios e da inclusão social das organizações de catadores.
(DIAS, 2002).
127
Nesse processo de compartilhamento de sua experiência, a Asmare passa a ser
gerida, em 2002, pelos próprios catadores, contando com uma coordenação
colegiada, com representantes da Pastoral, SLU, SMAAS, entre outros parceiros.
(DIAS, 2009, p. 214). Foi criado ainda o Reciclo, um espaço cultural com bar, onde as
mais diversas manifestações culturais estavam presentes – shows musicais,
principalmente –, e também um local de venda de produtos feitos com material
reciclável.
A ideia desse bar era propiciar um espaço de diálogo com a sociedade,
realizar atividades culturais, divulgar a importância da reciclagem e do
trabalho dos catadores, além de gerar trabalho para ex-moradores de rua. No
espaço também eram vendidos objetos de materiais recicláveis produzidos
nas oficinas da Asmare. [...] Em 2009, no entanto, o espaço foi fechado em
função de redução da quantidade de clientes e de dificuldades financeiras.
(PEREIRA, 2011, p. 84)
Neste período, é nítida a mudança que ocorre internamente na Asmare e nos próprios
rumos da associação, que começa a tentar “andar com as próprias pernas”,
internamente, apesar de ainda ser custeada pela PBH. Um movimento, no mínimo,
inovador do ponto de vista da política pública.
No fim dos anos 1990 e início de 2000, a PBH/SLU dá mais um passo no seu modelo
de gestão compartilhada dos resíduos e abre a central de reciclagem de resíduos da
construção civil. Da reciclagem dos entulhos eram feitos blocos, usados para
recompor os meios-fios das calçadas e canteiros na cidade. Foram criadas ainda
unidades de recebimento de pequenos volumes (URPVs), para incluir socialmente os
carroceiros da cidade no processo de gestão da limpeza urbana. Foi permitido a eles,
que usavam havia anos o cavalo como locomoção ou fonte de renda na cidade, que
continuassem com esse vínculo, só que de maneira mais organizada. A ideia foi
basicamente cadastrá-los, por local de moradia (regional), e disponibilizar seu serviço
para o cidadão – mediante combinação de valor, dia e horário e conteúdo a ser
recolhido na casa da pessoa. A pessoa que queria se desfazer de um sofá, podia
contratar o carroceiro para buscá-lo; ele levaria o móvel para a URPV e, de lá, um
caminhão da SLU faria a destinação correta do material. Isso ocorria porque o
caminhão usado na coleta de lixo domiciliar não tinha/não tem capacidade para
grandes volumes.
128
A experiência de BH nessa área (de construção e demolição) foi usada como
referência para a elaboração da Resolução Conama nº 307, de 5 de julho de
2002, que estabeleceu diretrizes, critérios e procedimentos para a gestão dos
resíduos da construção civil em todo o território nacional. [...] No fim dos anos
1990 e início de 2000, a prefeitura criou três unidades recicladoras para
reciclar o entulho da construção civil, vindos dos grandes geradores
(construtoras em sua maioria) e dos depósitos dos cidadãos feitos nas
URPVs: restos de obra, argamassa, cimento, tijolos quebrados etc. As
unidades estão instaladas nas regionais Oeste, Noroeste e Pampulha. As
unidades Estoril e Pampulha foram implantadas em 1995 e 1996,
respectivamente. Em junho de 2006, foi inaugurada a unidade da Noroeste,
localizada dentro da Central de Tratamento de Resíduos Sólidos da BR-040.
(Portal PBH, 2014b)
2.4.3 Reforma administrativa (2001-2004)
Reeleito em 2000, Célio de Castro acabou se afastando do cargo um ano depois por
motivos de saúde e assumiu seu vice, o economista Fernando Pimentel (PT), que
permaneceu à frente da administração até o fim do mandato, uma vez que Castro teve
de se aposentar. A reforma administrativa, implantada em 2001, descentralizou a
Prefeitura de Belo Horizonte (Lei 1.284 de 30/12/2000), o que trouxe grandes
implicações para a SLU e, por sua vez, para o programa de coleta seletiva. A SLU
deixou de ser autarquia e se tornou Secretaria Municipal de Limpeza Urbana (SMLU)
e foram criadas subsecretarias regionais de limpeza. (PEREIRA, 2011, p. 87).
A cidade foi dividida em nove administrações regionais, tendo cada uma, a partir de
então, gerências locais de limpeza, de serviços de tapa-buraco, de serviços contra
ruídos, postos de saúde, como se cada uma fosse uma ‘mini-prefeitura’.
“As narrativas das funcionárias da SLU, que trabalharam nesse período,
convergem na percepção de que a reforma foi um equívoco, que provocou a
desestruturação da SLU. Uma ex-analista de mobilização social narra que a
SLU já funcionava de forma descentralizada, sob o ponto de vista técnicooperacional. [...] A ex-analista de mobilização social sintetiza a situação da
SLU da seguinte forma: “hoje a SLU vive de uma fama plantada nas duas
gestões anteriores [Patrus Ananias (1993-1996) e Célio de Castro (19972000)], assim, continua prestando um serviço, mas muito aquém do que fazia
antes”. (PEREIRA, 2011, p. 87)
129
Figura 3 – Mapa de Belo Horizonte, por divisão das administrações municipais regionais.
Fonte: http://www.pbh.gov.br/smsa/montapagina.php?pagina=distritos/index.html
Em 2001, surgiram demandas pela criação e apoio do poder público para novas
associações e cooperativas de trabalhadores da reciclagem, segundo Dias (2009, p.
220), muitas delas criadas a partir do incentivo das administrações regionais da PBH,
da mediação de outras instituições, e outros grupos que romperam com a Asmare
internamente. No mesmo ano, foi formado o Movimento Nacional dos Catadores de
Materiais Recicláveis (MNCR), possibilitando uma organização maior dos catadores,
em âmbito nacional, que puderam dar início a uma articulação mais assertiva não
130
apenas de atuação, mas de implantação de políticas públicas que os beneficiassem
como parceiros do poder público na história da coleta seletiva brasileira.
A SLU apoiou os grupos que surgiam pedindo sua ajuda para montar novas
associações. Inclusive com infraestrutura, com a cessão, construção de galpões ou
intermediação para que o projeto pudesse se tornar realidade.
A primeira cooperativa a apoiarem foi a da Regional Barreiro, a Coopersoli.
[...] Buscaram um local para instalação do galpão de triagem e recursos
financeiros. Inicialmente, instalaram LEVs no Barreiro e buscaram apoio na
Asmare, para que os membros da Coopersoli aprendessem a realizar a
triagem de materiais. [...] Essas novas associações e cooperativas eram
compostas de um público diferente da Asmare, predominando
desempregados e grupos de mulheres, alguns ligados a movimentos de luta
por moradia. (Pereira, 2011, p. 88)
Em 2002, com um número maior de cooperativas na cidade (espalhadas nas
regionais)3, a SLU experimentou o modelo de coleta seletiva de lixo porta a porta, com
equipes próprias, destinando todo o material recolhido às organizações. O teste piloto
foi no Bairro Serra, na Região Centro-Sul, depois estendido ao Gutierrez, na Região
Oeste. A frequência das coletas era semanal, com dias específicos para cada bairro.
Neste mesmo ano, a PBH contratou empresa para estudar a construção do edital de
licitação de terceirização do serviço de tratamento de resíduos sólidos da capital.
Neste mesmo período, os catadores passaram a se articular em redes e, segundo
Dias (2009, p. 24), foi por meio dos Fóruns Lixo e Cidadania, surgidos com o Fórum
Nacional Lixo e Cidadania sob a liderança do Unicef, em 1998, que ocorreu um
processo maior de discussões no país, com a criação de fóruns estaduais e municipais
Lixo e Cidadania. Nota-se uma articulação mais afinada dos catadores, uma busca
pelo fortalecimento da categoria, não apenas localmente, mas nacionalmente, uma
tentativa de estabelecer novas legislações e direitos para esses trabalhadores.
Em 2004, Belo Horizonte realizou o seu Fórum Municipal (que ainda em 2014 ocorria
uma vez por mês, na sede da SLU) e ganhou um aliado no debate, o Fórum Estadual
3
Os endereços das cooperativas em BH podem ser verificados no Anexo V.
131
Lixo e Cidadania, que reúne representantes de cooperativas de toda a Minas Gerais,
a cada dois anos.
“Estes fóruns têm como objetivos principais: a erradicação do trabalho infantil
em lixões a céu aberto; a erradicação de lixões (e sua recuperação ambiental)
e ainda a inclusão social de catadores de recicláveis. (DIAS, 2009, p. 24)
Atualmente, os debates são focados em toda a cadeia produtiva que engloba os
resíduos sólidos urbanos e não apenas no trabalho infantil.
Figura 4 – Fórum Estadual Lixo e Cidadania no Centro Mineiro de Referência em Resíduos
Crédito: arvoredacomunicação.wordpress.com
Este período de profundas mudanças na gestão da cidade parece desarticular de
certa forma o projeto de coleta seletiva de Belo Horizonte, mas nota-se a existência
de uma força de resistência e crença no trabalho iniciado nos idos de 1990 com os
catadores e na construção da política de resíduos da cidade, que ainda norteava
ações da Superintendência de Limpeza Urbana nessa transição, como o apoio dado
às novas associações que foram chegando e se formando. Fica claro que esse apoio
ocorria com empenho mais individual – de funcionários da SLU engajados no
processo desde o início – do que efetivamente institucional, ainda que só fosse
possível via articulação política.
132
2.4.4 Terceirização da coleta (2005-2008)
Fernando Pimentel (PT) foi eleito e, dando sequência ao seu governo, a SLU
permaneceu como estava. Segundo Pereira (2011), em 2005, foi feita uma proposta
“para que a superintendência de limpeza voltasse ao seu formato anterior, mas não
adiantou pois a SLU já estava totalmente desestruturada”.
[...] Foi reduzida a capacidade de coordenação e controle da unidade central
sob as regionais. Nesse período, as relações entre poder público e Asmare
começaram a enfraquecer, em comparação com o período anterior.
(PEREIRA, 2011, p. 87).
Com a descentralização da administração em Belo Horizonte em 2000, e consequente
desmembramento da SLU e suas operações em nove administrações regionais da
cidade – Barreiro, Centro-Sul, Leste, Oeste, Nordeste, Noroeste, norte Pampulha e
Venda Nova – o serviço de limpeza urbana precisou de reforço. Desde 2004, a limpeza
urbana passou a ser dividida entre a estrutura da SLU e contratos emergenciais sem
licitação de terceiros. A PBH alegava que o serviço, essencial, não podia deixar de
ser feito.
Neste mesmo período, a PBH tentava lançar um edital para licitar a
disposição final do lixo, processo iniciado em junho de 2001, mas, por
suspeita de irregularidades por parte do Tribunal de Contas do Estado (TCE),
todo o trâmite referente à limpeza pública da cidade foi suspenso. (ODILLA,
2003, p. 21)
Conforme Andrade (2007b, p. 23), “a PBH precisou refazer ainda os contratos de
licitação para a limpeza urbana da cidade”, que funcionavam desde 2004 de forma
emergencial (prevista na Lei de Dispensa de Licitações, Lei 8.666/1993) e parte da
coleta passou a ser feita por empresas terceirizadas. Depois de passar alguns anos
com contrato de emergência para limpeza pública, sem licitação – de 2004 a 2007 –
e ser investigada pelo Ministério Público, a prefeitura conseguiu emplacar a licitação
do edital 006/2006 em 2007, sendo a coleta de lixo comum, coleta seletiva, e demais
itens da limpeza urbana na cidade (capina, varrição, limpeza de boca-de-lobo)
terceirizadas para empresas vencedoras. (ANDRADE, 2007a, p. 23; 2007c, p. 21)
133
Em 2005, segundo Abreu (2009), um diagnóstico preliminar das associações e
cooperativas de catadores feito pela SLU4 indicou que todos os galpões usados pelas
cooperativas, em sua maioria, eram viabilizados pela PBH, que fornecia ainda
equipamentos de proteção individual para a maioria das associações. O diagnóstico
indicou ainda que os catadores não contribuíam com a Previdência Social, estando,
dessa forma, descobertos pelos benefícios e serviços previdenciários. A maioria deles
tem apenas o ensino fundamental (1ª a 8ª série). (ABREU, 2009, p. 239)
Em 2006, uma série de ocorrências tornou a relação entre associações de catadores
e PBH mais tensa: o galpão-sede da Asmare foi interditado, pois não tinha
equipamentos de combate a incêndio; a administração municipal criou um decreto
com regras para a atividade de catação; e o sistema de coleta passou a ser
terceirizado.
O decreto regulamentava a atividade de catação com o estabelecimento de
regras, tais como o horário que os catadores poderiam sair nas ruas com os
carrinhos de tração humana. [...] A interdição da Asmare, ocorrida em julho
de 2006, foi um acontecimento narrado, especialmente pelos catadores e
ex-membros da Pastoral e da Cáritas. [...] A associação não tinha sistema
contra incêndio, mas o galpão foi construído e entregue pela prefeitura sem
essa estrutura. (PEREIRA, 2011, p. 90)
Em 2006, foi criada a Cooperativa de Reciclagem dos Catadores da Rede de
Economia Solidária (Cataunidos)5, com o início da construção da unidade de
processamento de plásticos da rede, com recursos do Ministério das Cidades. “O
objetivo era beneficiar o plástico coletado pelas nove associações da Cataunidos, de
modo a agregar valor ao material recolhido e eliminar a figura do atravessador,
gerando uma maior renda para os catadores.” (PEREIRA, 2011, p. 96). A fábrica
4
Relatório Avaliação preliminar das associações e cooperativas de trabalhadores de materiais
recicláveis em Belo Horizonte, 2005, Belo Horizonte. Prefeitura. Superintendência de Limpeza Urbana,
apud ABREU, 2009, p. 238.
5
As associações e cooperativas que formam a rede são: a Asmare, a Associação de Catadores de
Papel e Recicláveis de Betim (Ascapel), a Associação dos Catadores do Vale do Paraopeba (Ascavap),
a Associação dos Catadores de Materiais Recicláveis de Contagem (Asmac), a Associação dos
Catadores de Materiais Recicláveis de Igarapé (Apaig), a Cooperativa de Reciclagem e Trabalho de
Itaúna (Coopert), a Associação dos Catadores de Papel e Material Reciclável de Nova Lima (Ascap), a
Associação de Catadores de Materiais Recicláveis de Pará de Minas (Ascamp), e a Associação dos
Trabalhadores de Papel e Materiais Recicláveis de Ibirité (Astrapi).
134
começou a funcionar em 2008, mas um ano depois foi fechada por falta de capital de
giro, problemas de gestão e operacionalização.
Entre 2007 e 2008, a coleta seletiva porta a porta estava presente em oito bairros:
Gutierrez, Carmo, Sion, Serra, Buritis, Savassi, Cidade Nova e parte do São Lucas.
Um processo de licitação naquela época previa a ampliação da coleta, totalizando 30
bairros. De acordo com dados oficiais da SLU na época, a superintendência recolhia
650 toneladas de recicláveis mensalmente, o equivalente a 27t/dia. A própria
autarquia reconhecia que os números estavam aquém do que era gerado na cidade.
Em entrevista ao jornal Estado de Minas, em abril de 2007, Sinara Meireles, então
superintendente da SLU, afirmou:
Se 100% da população aderissem à coleta, teríamos 418 toneladas diárias
de lixo disponíveis para serem recolhidas, mas ainda não há esse cenário de
adesão, nem temos capacidade para fazer a coleta porta a porta em toda a
capital. (MEIRELES, 2007, apud ANDRADE, 2007a)
Neste mesmo ano, o aterro de resíduos da capital teve sua vida útil encerrada, sendo
necessário dispor os resíduos coletados em outro local. No processo licitatório,
venceu a empresa privada que já tinha um aterro em operação e com licença do
Conselho Estadual de Políticas Ambientais (Copam), a Central de Resíduos Sólidos
Macaúbas, localizada em Sabará, na Grande Belo Horizonte. Esse foi, por assim
dizendo, o último item do processo da “terceirização” da gestão do lixo na cidade: o
aterramento em terreno privado. A PBH até divulgou que procurava um terreno no
município vizinho a BH, Esmeraldas, para abrigar um aterro público, mas essa ideia
nunca se concretizou.
De acordo com Abreu (2009), em 2008 o programa de coleta seletiva da capital
destinava para reciclagem cerca de 30 toneladas/dia de material, o equivalente a
menos de 1,5% do total de resíduos domiciliares e comerciais gerados na cidade, que
é de mais de 2 mil toneladas/dia. Em comparação aos dados da própria SLU de um
antes, os números não mostravam uma evolução, mesmo tendo a quantidade de
galpões e cooperativas aumentada.
135
A Asmare e a Cooperativa Solidária de Trabalhadores e Grupos Produtivos
do Barreiro (Coopersoli) recolhem em torno de 480t/mês, mais do que a
coleta feita, pela SLU, em LEVs e porta a porta. As demais associações e
cooperativas só processam o material coletado pela SLU. A Asmare processa
510t/mês, sendo que 235t/mês são oriundos da coleta feita por catadores,
com carrinhos manuais; 197t/mês obtidas de doações; 30t/mês da aquisição
de terceiros (catadores não associados); e 49t/mês coletadas pela SLU.
(ABREU, 2009, p.241-242)
Abreu (2009, p. 227) relata dificuldades encontradas pelos empreendimentos dos
catadores, da precarização das condições de trabalho, a pouca gestão das
organizações, além da presença de duas empresas, chamadas depósitos líderes, que
compravam praticamente toda a produção de recicláveis na cidade, determinando,
então os valores praticados na compra e venda de vidros, plásticos, metais, papel.
Figura 5 – Cooperativa de materiais recicláveis no Barreiro
Crédito: Charles Duarte – 29/11/2007
A limpeza urbana era (e ainda é) difícil e desafiava a administração. Para se ter ideia,
a Avenida Paraná, no Centro, era varrida 10 vezes ao dia e a Praça Sete, quatro
vezes.
Era evidente que os problemas relacionados ao lixo urbano demandavam
mais do que soluções operacionais e que o poder público não seria capaz de
resolvê-los, sozinho. Caberia, assim, ao governo municipal, assumir de forma
complementar, uma função educativa e de estímulo à participação social.
Tratava-se de revisar valores, princípios, comportamentos... Em outras
palavras, o trabalho precisava enfrentar a enorme desconsideração da
sociedade em relação à limpeza pública. (ABREU, 2009, p.227)
136
Ao longo desses anos, os LEVs começaram a ser depredados e acumulavam lixo em
seu entorno, atraindo vetores como baratas e ratos, gerando reclamações da
população para a retirada dos contêineres. Somaram-se a esse cenário dificuldades
no ajuste da frequência da coleta, dimensionamento dos contêineres, baixo índice de
recuperação do material depositado pela população, entre outras limitações.
O material reciclável continuou sendo recolhido pelos catadores e pela
prefeitura, que destina o que recolhe para as associações organizadas. Numa
tentativa de melhorar o trabalho para os catadores, houve uma experiência
usando carrinhos motorizados no Bairro Barro Preto, no Centro da cidade,
mas eram apenas quatro equipamentos e o modelo logo fracassou. (ABREU,
2009, p. 230)
Figura 6 – Local de entrega voluntária em Belo Horizonte (LEV)
Crédito: Planetalixo.com.br/ googlemaps.com.br
A conclusão a que chega Abreu (2009) é que os desafios da coleta seletiva na capital
mineira são ampliar o atendimento à população e o índice de recuperação de
recicláveis, em parceria com os catadores, aprimorando suas condições de trabalho
e renda. Ela cita ainda a necessidade de treinamento e capacitação aos catadores.
Acrescenta-se às colocações de Abreu a necessidade de fortalecimento de toda a
rede social envolvida na coleta seletiva – sociedade civil organizada, poder público e
iniciativa privada – em atendimento à Política Nacional de Resíduos Sólidos.
Apesar da capital ter se tornado referência nacional no fortalecimento dos
catadores, o programa de coleta seletiva não apresentou avanços na mesma
proporção. Tem uma cobertura muito baixa de coleta porta a porta, com
137
índice de recuperação de recicláveis também muito pequeno, decorrente da
baixa coberta e do alto índice de rejeitos. (ABREU, 2009, p. 240)
Percebe-se que com a terceirização do serviço de limpeza urbana, as relações entre
poder público e a rede de catadores se tornam mais “formais”, no sentido de deixá-los
caminhar com as próprias pernas. Por um lado, foi um ponto positivo, de
desenvolvimento da capacidade de se organizar em grupo, de eles se haverem com
o processo das cooperativas em si (negociação de preços, organização interna dos
catadores, divisão de tarefas, etc.). Mas, por outro, nota-se uma posição política da
PBH de deixar a questão dos resíduos na mão de terceiros, responsáveis pela
“destinação final do lixo”, sem dar um norte participativo com a sociedade sobre tema.
É perceptível que o cidadão não está envolvido em nenhum dos processos (apenas o
de levar seu lixo seco para os pontos de entrega voluntária ou colocar na rua nos dias
e horários estipulados, onde a coleta porta a porta existe; e que os catadores, de certa
forma, são “deixados de escanteio”. Uma percepção corroborada por Pereira (2011):
A terceirização é vista como uma forma de predominância dos interesses do
“grande capital” em uma tentativa de excluir o catador do processo, ou seja,
de retirar desse grupo sua fonte de sobrevivência. (PEREIRA, 2011, p. 92)
2.4.5 Sem avanços (2009-2012)
Em 2009, assume como prefeito o empresário Marcio Lacerda (PSB). No âmbito da
coleta seletiva de materiais recicláveis, pouco foi visto de mudanças grandiosas ou
significativas na cidade entre 2009 e 2012. Estatísticas da SLU de 2012 (PORTAL
PBH, 2014b) indicavam que eram coletadas por dia cerca de 4.700 toneladas de lixo,
das quais 320 destinadas à reciclagem, sendo 280 toneladas de entulho da
construção civil, 30 toneladas de recicláveis da coleta seletiva (papel, metal, vidro e
plástico) e 10 toneladas de resíduos orgânicos. Os dados são similares aos expostos
por Andrade (2007b) há sete anos, um indício de que pouca evolução no volume de
materiais coletados, principalmente da coleta seletiva, ocorreu neste período.
A coleta seletiva representa apenas 0,8% [...] do total de lixo produzido
diariamente na cidade. Comparado aos dados de capitais como Porto Alegre
e Curitiba, onde o índice chega a 20%, o resultado é vergonhoso. E, mesmo
138
tendo como referência a média nacional, que é de 3%, não há nada do que
se orgulhar. (CARVALHO, 2012, p. 1)
Segundo Lopes (2011), “o lixo domiciliar coletado pela SLU saltou de 513,9 mil
toneladas em 2000 para 629,4 mil toneladas em 2010. Isso representa cerca de 300
toneladas diárias a mais”.
Apesar de estar atrás de outras capitais do mesmo porte, como Brasília, onde
o aumento na geração de lixo foi de 45% no mesmo período (de 538,6 mil
para 781,3 mil toneladas), o crescimento na capital é três vezes maior do que
o da população no período (6%) e preocupa ambientalistas e a prefeitura.
(LOPES, 2011, p. 22)
Quadro 3 – Estatísticas dos resíduos sólidos urbanos de Belo Horizonte
RESÍDUOS EM BH
Lixo domiciliar
4.700t/dia geradas, sendo: (t/dia/%)
29; 1%
Resíduos públicos (entulho
disposto clandestinamente,
animais mortos, lixo de boca de
lobo etc)
Resíduos de varrição de vias
públicas
30; 1%
103;
3%
26; 1%
280;
10%
Resíduos da construção civil
(destinados à reciclagem)
630; 22%
Resíduos recicláveis da coleta
seletiva
1800; 62%
Resíduos hospitalares
Resíduos de podas de árvores
(Dados referem-se a 2012) / Fonte: Portal PBH, 2014b)
Percebe-se, novamente, a ausência de interesse ou de uma política mais contundente
da Prefeitura de Belo Horizonte para debater a questão da geração de resíduos.
139
2.4.6 Metas e resultados (ainda) não atingidos (2013-2016)
Reeleito, Marcio Lacerda (PSB) lançou em 2 de maio de 2013 o BH Metas e
Resultados, um plano de metas a serem cumpridas na cidade de Belo Horizonte até
2030 em várias áreas (mobilidade urbana, saúde, educação, qualidade de vida, cidade
sustentável, na qual está inserida a limpeza urbana). No quesito resíduos sólidos,
o objetivo da meta é garantir serviços de limpeza urbana, expandir os
serviços de coleta, incluindo coleta seletiva, otimizar limpeza de córregos
abertos e reduzir a deposição clandestina de resíduos, visando a melhoria do
meio ambiente e da saúde pública (PBH, 2014g).
Quadro 4 –Resultados esperados pela própria Prefeitura de BH:
Aumento da cobertura dos serviços de coleta de resíduos sólidos
domiciliares, passando de 95,01% (ref. 2012) para 97% de vias atendidas
pelo município, até 2016.
Aumento da cobertura dos serviços de coleta seletiva porta a porta,
passando de 30 bairros para 60 bairros atendidos em toda a cidade, até
2016.
Aumento da cobertura dos serviços de coleta seletiva na modalidade ponto
a ponto, passando de 95 para 200 Locais de Entrega Voluntária (LEV)
instalados em toda a cidade, até 2015.6
Aumento da cobertura dos serviços de limpeza urbana em vilas e favelas,
utilizando mão de obra residente nesses locais, passando de 161km para
200km de vias atendidas por dia, até 2016.
Aumento da frequência de limpeza continuada de 30,74km de córregos
abertos, que se localizam em vilas e aglomerados, passando de duas para
quatro vezes por ano, até 2016.
Expansão da Rede Física de Unidades de Recebimento de Pequenos
Volumes (URPV), passando de 31 para 40 URPV implantadas até 2016.
Plano Municipal de Gestão Integrada de Resíduos Sólidos, elaborado em
consonância com a Política Nacional de Resíduos Sólidos, concluído até
2015.7
Fonte: PBH (2014g, p. 1)
6
Segundo a própria PBH, houve adiamento para até 2015 deve-se à necessidade de compatibilização
do cronograma do processo licitatório dos equipamentos e respectivos prazos legais com a efetiva
disponibilização do serviço à população. (PBH, 2014g, p. 1)
7
Houve adiamento para até 2015 ocorreu por ter sido necessário rever o processo licitatório: a
elaboração do Plano conta com recursos do Governo Federal, e o processo licitatório, iniciado em
março de 2013, teve que ser revisto por orientação da Caixa Econômica Federal. Novo processo
licitatório foi iniciado no segundo semestre de 2013. (PBH, 2014g, p. 1)
140
O que se nota é que pouco ou nenhum avanço foi registrado nesse período. Mais: que
a administração municipal deu grande ênfase para os projetos que envolviam a Copa
do Mundo 2014 – entre elas a mobilidade urbana, de suma importância para a cidade
– e menos atenção para outras questões. Um fato que chamou a atenção e foi
amplamente divulgado nas redes sociais foi a ausência da chamada da população
para desenhar, com a prefeitura, as propostas locais que seriam levadas à conferência
nacional de meio ambiente nos anos de 2013 e 2014, uma sensação da pesquisadora
de que o tema não despertava tanto interesse nos dirigentes.
2.4.7 Panorama atual e os 21 anos da coleta
Ao longo desses 21 anos, a SLU contou com diversas fontes de recursos para
estruturar a coleta, principalmente do governo federal, por meio de repasses de verbas
de editais específicos para saneamento e resíduos sólidos, do Banco Nacional de
Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), Ministério das Cidades e Caixa
Econômica Federal, e orçamento da própria prefeitura.
Notadamente, a política em curso em Belo Horizonte não atinge, ainda, os resultados
listados por Besen:
São alcançados os seguintes resultados [para um bom sistema de coleta
seletiva]: criação ou fortalecimento de associações e cooperativas de
catadores, com a integração dos catadores autônomos; alta taxa de adesão
da população (50% a 70%); alto índice de recuperação de materiais
recicláveis (mais do que 10% do total de resíduos domiciliares e comerciais);
baixa taxa de rejeitos (menos que 10% do total de recicláveis); integração das
associações e cooperativas para a venda conjunta e a defesa de interesses
comuns; setorização da cidade e implementação de um sistema misto de
coleta, eficiente e de baixo custo (catadores fazem a coleta porta a porta e os
materiais acumulados em pontos estratégicos são coletados pela prefeitura e
encaminhado aos galpões); apoio logístico às associações e cooperativas,
estimulando a busca de sua autonomia. (BESEN, 2006, apud ABREU, 2009,
p. 240)
Esse cenário de lacunas existentes na coleta seletiva foi corroborado pela própria
chefe do Departamento de Projetos Especiais da SLU, Aurora Pederzoli, em entrevista
recente concedida ao jornal Estado de Minas:
141
Há uma dificuldade de colocar a coleta seletiva no programa de governo,
pois ainda há outros problemas de limpeza urbana, como bota-foras,
que representam risco de saúde pública. Num contexto em que muita
gente ainda joga lixo em lugares inadequados, a coleta seletiva ainda é
perfumaria. (PEDERZOLI, 2012, apud AYER e OLIVEIRA, 2012, p. 22b, grifo
nosso)
Assim como nos anos 2000, a cidade continua sendo beneficiada por duas
modalidades de coleta seletiva: ponto a ponto e porta a porta. A saber:
Coleta seletiva ponto a ponto: Nesse tipo de coleta, são instalados
contêineres nas cores padrão definidas pela Resolução do Conama para os
materiais recicláveis: azul para o papel, vermelho para o plástico, amarelo
para o metal e verde para o vidro. A população separa os recicláveis em sua
residência ou local de trabalho e os deposita em contêineres instalados pela
PBH, os LEVs. Cada uma das administrações regionais da PBH tem LEVs
em endereços específicos.
Coleta seletiva porta a porta: presente em 30 bairros da cidade. Os
materiais recicláveis são separados pelos moradores e recolhidos na rua, por
um caminhão. (PORTAL PBH, 2014c)
Dados do Portal PBH mostram que a prefeitura disponibiliza 94 Locais de Entrega
Voluntária (LEVs). Esse é um indicativo negativo, do ponto de vista da articulação da
sociedade para a coleta seletiva disponibilizada pelos LEVs, uma vez que há 21 anos,
quando do início do programa, eram disponibilizados 150 pontos de equipamentos, e
pelo BH Metas e Resultados, até 2015, o objetivo é expandir para 200 LEVs.
Quadro 5 – Bairros atendidos pela coleta porta a porta
Regionais
Regional Centro-Sul
Bairros atendidos pela coleta
Anchieta, Belvedere, Carmo, Cidade Jardim,
Comiteco, Coração de Jesus, Cruzeiro, parte do
Lourdes, Luxemburgo, Mangabeiras, Santa
Lúcia, Santo Antônio, São Bento, São Pedro,
Savassi, Serra, Sion, Vila Paris.
Regional Oeste
Parte do Barroca, Buritis, parte do Estoril, parte
do Grajaú, Gutierrez, parte do Olhos d’Água
Regional Barreiro
Parte do Barreiro
Regional Leste
Parte do São Lucas
Regional Pampulha
São José, parte do São Luís
Regional Nordeste
Cidade Nova
Fonte: Quadro construído pela pesquisadora, com dados oficiais do Portal PBH (2014c).
142
Segundo a prefeitura, outros bairros ou parte deles passaram a ser beneficiados em
2014 pela coleta porta a porta, ainda que numa expansão muito tímida: na Regional
Oeste, os bairros Alto Barroca, parte do Barroca, parte do Grajaú, parte do Betânia; e
na Regional Barreiro, parte do Bairro Cinquentenário e parte do Bairro Indústrias II.
Atualmente são beneficiados 120.828 domicílios, totalizando 375.775
pessoas que recebem a coleta porta a porta. Todos os materiais recicláveis
recolhidos pela coleta seletiva são destinados para as associações ou
cooperativas de catadores e trabalhadores com materiais recicláveis,
participantes do Fórum Municipal Lixo & Cidadania. (PORTAL PBH, 2014c)
Apesar de inúmeras campanhas feitas no passado, de a mídia constantemente
abordar a questão de coleta seletiva, na prática são muitos os desafios encontrados
para conscientizar a população. Prova disso é a descrição de uma situação vivida por
catadores cotidianamente, em uma reportagem de 2012 do jornal Estado de Minas
constatando que a população ainda destina como reciclável lixo comum. “O
levantamento do jornal foi feito com as sete associações e cooperativas em operação
na cidade” (AYER e OLIVEIRA, 2012).
Papel higiênico, absorvente íntimo, seringas e restos de comida passam
todos os dias pelas mãos desprotegidas do catador Claudinei Custódio
Santos, de 42 anos, em um dos galpões da associação dos catadores
Asmare, em Belo Horizonte. Sem luvas, ele despeja os sacos de lixo numa
bandeja de madeira e tenta garimpar materiais de onde, em tese, deveria
haver apenas recicláveis como plástico, vidro, metal e papel. [...] Cerca de
30% [dos materiais destinados à reciclagem] viram rejeito nos galpões [...] e
vão direto para o lixo comum. [...] Com tanta sujeira, profissionais da
reciclagem, empenhados em contribuir para a limpeza urbana, acabam
expostos a riscos. (AYER e OLIVEIRA, 2012b, p. 22, grifo nosso)
Além de encaminhar lixo misturado aos materiais recicláveis para o programa de
coleta seletiva, acarretando não apenas contaminação do material que poderia ser
processado e risco de saúde para os garis e catadores, a cidade não é dotada, nem
no seu entorno, de indústrias recicladoras que poderiam estar na ponta final da cadeia
da reciclagem, tratando o material separado para ser transformado em matéria-prima
novamente.
Precisamos melhorar o modelo de coleta, 60% dos catadores ainda estão nas
ruas e nos lixões; há extrema pobreza; e 80% deles têm história na catação.
Precisamos deixar o custo mais barato. [...] A coleta porta a porta e a coleta
143
dos grandes geradores devem continuar. [...] A educação ambiental porta a
porta pode ser feita pelos catadores, eles podem ser os agentes dessa
mudança nas cidades, com apoio de uma equipe técnica que pudesse dar
um treinamento específico. Precisamos aprender mais sobre a tecnologia de
gestão dos empreendimentos [cooperativas] e modelos de infraestrutura
(prensa, caminhões, equipamentos de proteção individuais). E, claro,
precisamos discutir nacionalmente o pagamento pelo serviço prestado. O que
acontece é um lobby político e setorial de difícil discussão, uma vez que as
empresas estão querendo entrar no negócio também. A gente teme que os
catadores percam o que já conquistaram nesse processo. (Informação
verbal)8
Em janeiro de 2014, nova reportagem do Estado de Minas trouxe um outro problema
à tona: o uso de caminhões compactadores em vez dos caminhões-baú na coleta
seletiva. Em entrevista ao periódico, a presidente da Cooperativa Central Solidária dos
Trabalhadores de Materiais Recicláveis de Minas Gerais (Redesol), Neli Medeiros,
reclamou:
O uso dos caminhões compactadores em vez do baú é um retrocesso. Os
materiais chegam misturados até com lixo comum e isso compromete o
resíduo todo. [Houve troca da empresa de coleta seletiva]. Vemos que não
foram capacitados para esse serviço. Eles põem no caminhão tudo que veem
na rua. Estamos com o comprometimento de 30% dos recicláveis, que
acabam indo para o aterro sanitário. (MEDEIROS, 2014, apud AYER e
PARANAÍBA, 2014, p. 1)
No mesmo artigo, a integrante da Cooperativa Solidária dos Recicladores e Grupos
Produtivos do Barreiro e Região, Elis Regina Silvério Pinho, de 42 anos, sendo 10
dedicados à reciclagem, se mostrou preocupada:
O vidro vem todo quebrado, o material todo fedorento. As comidas, óleos e
líquidos que as pessoas deixam no recicláveis amassam e sujam o resto todo.
Estamos nos machucando com esses cacos. O trabalho não rende e o galpão
está com um cheiro horrível. Várias pessoas já ficaram doentes. [...]. Nossa
bolsa reciclagem depende do peso do material que fazemos na triagem.
(PINHO, 2014, apud AYER e PARANAÍBA, 2014, p. 1)
Acesso a resumos das audiências públicas realizadas na Câmara Municipal de Belo
Horizonte permitiu o conhecimento de uma importante reunião, em 17 de maio de
8
Informação de Luiz Henrique Silva, presidente do Movimento Nacional dos Catadores de Recicláveis
(MNCR), em novembro de 2013, durante apresentação na 4ª Semana Mineira de Redução de
Resíduos, Belo Horizonte, MG.
144
2011, que tratou dos resíduos sólidos urbanos. Nela, o diretor de Planejamento da
SLU, engenheiro Lucas Gariglio, deu um panorama da situação no município.
A capacidade das associações que recebem e processam estes
materiais, conveniadas com a PBH, está no limite. [...] Não adianta
aumentar o volume coletado se não tivermos como processar e para
onde encaminhar. [...] É importante fomentar e dar incentivos a empresas
que utilizem materiais reciclados, para garantir a destinação de tudo o que é
recolhido. (GARIGLIO, 2011 apud CMBH, 2011, grifo nosso)
No mesmo evento, o representante do Sindicato das Indústrias de Construção Civil
(Sinduscon), Roberto Matozinhos, expôs as medidas que a categoria vem adotando
para o tratamento dos resíduos, como:
A disponibilização de cartilhas para construtores e operários, [...] a
segregação de materiais para reciclagem e seu reaproveitamento no próprio
canteiro de obras, e sugestão da criação de associações especializadas no
recolhimento desse tipo de material. (CMBH, 2011)
Representantes de associações de reciclagem presentes à audiência pública
destacaram a necessidade de maior apoio à atividade e da inclusão de outras
cooperativas na parceria. Se a PBH incluísse outras associações que atuam na cidade
no convênio [de destinação do material que a PBH recolhe e envia para as sete
associações conveniadas] um volume bem maior de resíduos poderia ser processado.
Outros depoimentos foram marcados pela indicação de haver uma união de esforços,
com a conscientização da população, ampliação das parcerias com as cooperativas e
o incentivo aos investimentos privados (CMBH, 2011).
Os bota-foras irregulares se configuram, na atualidade, como outro grave entrave
enfrentado pela administração de Belo Horizonte e também por municípios vizinhos.
Somente na capital, a SLU recolheu, em 2012, 223,5 mil toneladas de entulho, sendo
120 mil (53,6%) descartes clandestinos em lotes vagos, vias públicas e cursos d’água.
Nas caçambas de entulho que cruzam a Grande Belo Horizonte a bordo de
caminhões há mais do que sobras da construção civil. Em estações de
transbordo, bota-foras e aterros há também resíduos considerados tóxicos
pela legislação ambiental nacional, como lâmpadas, solventes, tintas e
embalagens de produtos químicos. Material que, de acordo com a
Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), pode trazer “risco à
145
saúde pública, provocando mortalidade, incidência de doenças ou
acentuando seus índices, e riscos ao meio ambiente, quando o resíduo for
gerenciado de forma inadequada”. (PARREIRAS, 2013, p. 21)
No Portal da PBH (2014), está disponível na página da SLU a definição dos materiais
recicláveis, que podem ser separados e destinados à coleta seletiva, que estão
detalhados no Anexo IV deste projeto. Outra constatação de que falta informação e
consciência por parte da população vem de indicadores da própria administração
municipal.
Foram recolhidas mais de 120 mil toneladas de entulho e lixo depositado
em bota-foras irregulares e realizadas 467 mil limpezas de bocas de lobo
nas 60 mil bocas de lobo existentes (média de 7,7 limpezas em cada uma
delas, espalhadas na cidade). [...] Os dados de limpeza de córregos no
mesmo ano [2012] mostram que numa área de 2,3 milhões de metros
quadrados de córregos na cidade foram retirados 900 metros cúbicos de
entulho dos cursos d’água e 2 mil metros cúbicos de lixo. (PORTAL PBH,
2014c, grifo nosso)
Figura 7 – Fotografia de bota-fora clandestino no Bairro São Paulo
Crédito: Frederico Haikal/Hoje em Dia – 13/3/2013
http://www.hojeemdia.com.br/minas/prefeitura-anuncia-fim-dos-lix-es-clandestinos-para-2015
Diante desses dados, é possível interpretar que a população ainda faz o descarte
irregular de resíduos nas ruas, em locais não permitidos e nos córregos da cidade. O
balanço oficial mostra também que, em 2012, a Unidade de Recebimento de Pneus
(URP) recebeu 197.500 unidades de pneus inservíveis de vários geradores e das
URPVs. Todos foram enviados para unidades recicladoras (PORTAL PBH, 2014d).
146
Dentro do Programa de Reciclagem de Entulho da Construção Civil, foram
destinadas às estações de reciclagem de entulho 103.500 toneladas de
resíduos da construção civil no ano de 2012. (PORTAL PBH, 2014d)
Falta informação da própria administração, conforme constata Carvalho:
No telefone 156 da SLU [esse número é o telefone que o cidadão tem para
fazer contato com a prefeitura como um todo e solicitar serviços, fazer
reclamações e buscar informações], tudo o que o morador conseguirá
descobrir são os endereços dos locais de entrega voluntária (LEV) e das 32
unidades de recolhimento de pequenos volumes (URPV), que recebem até
dois metros cúbicos de entulho, como pneus e móveis velhos. Para uma
população de 2,4 milhões de habitantes, são pouquíssimos pontos. E o
número não vem subindo, ao contrário do que era de esperar. (CARVALHO,
2012, p. 1)
Então, diante dessa estrutura, como falar em conscientização da população?
Percebe-se que falta uma falta de vontade política por parte da PBH em sustentar a
política em curso há 21 anos. Mas com as exigências da PNRS, algo terá de ser feito
nesse sentido.
2.4.8 Onde BH (não) atende a PNRS
Uma das principais exigências da Política Nacional de Resíduos Sólidos, o plano
municipal de gestão integrada de resíduos ainda não existe na capital mineira. Ele
deveria ter sido elaborado e entregue ao Ministério do Meio Ambiente há dois anos,
mas não o foi, conforme atesta reportagem do Estado de Minas, em agosto de 2012:
A ampliação das metas de reciclagem em BH esbarra na falta de elaboração
do plano municipal de gestão integrada de recursos sólidos, planejamento
obrigatório de acordo com a Política Nacional de Resíduos Sólidos, instituída
pela Lei Federal 12.305/2010. A exigência era de que municípios concluíssem
o plano, que deve contemplar ações de coleta seletiva [em 2012], mas Belo
Horizonte nem sequer começou o trabalho. (AYER e OLIVEIRA, 2012b, p.
22)
A justificativa, registrada na mesma reportagem, foi dada pela chefe de Projetos
Especiais da SLU, Aurora Pederzoli: “Tivemos problemas para conseguir firmar o
termo de referência e conseguir o recurso. Agora estamos em período eleitoral, o que
nos impede de fazer licitações” (PEDERZOLI, 2012 apud AYER e OLIVEIRA, 2012,
147
p. 21a). Digno de nota é que 2014 também é ano eleitoral e instâncias governamentais
ficam limitadas a fazer licitações.
A punição aos municípios que não têm o plano prevista na legislação é o impedimento
de solicitar recursos à União para a limpeza urbana. Registra-se que a capital está às
voltas com a elaboração do plano e “conseguiu recurso de R$ 1,4 milhão do Ministério
do Meio Ambiente para contratar consultoria especializada” para tal (AYER e
OLIVEIRA, 2012, p. 22b).
A ausência do plano municipal da gestão integrada dos resíduos em Belo Horizonte
se mostra crucial neste debate: se o plano não foi contratado ainda, pode ser
construído com a participação da sociedade belo-horizontina. Ou seja, uma
oportunidade ímpar de empregar inovação nas áreas social, política, de gestão e
ambiental, principalmente nos itens que dizem respeito ao envolvimento da população
na execução da PNRS.
Com o objetivo de verificar qual a situação de Belo Horizonte frente ao cumprimento
de outras exigências da PNRS, confrontaram-se aqui alguns pontos gerais da
legislação federal, que estão sendo tratados no bojo desta pesquisa, e foi feita uma
comparação com as políticas ou ações em curso no município. Para acessar as
informações, foram levantados dados disponíveis, e considerados oficiais, do Portal
da BH (www.pbh.gov.br).
Quadro 6 – Confrontação de alguns itens da PNRS e sua realidade em Belo Horizonte
EXIGÊNCIA DA PNRS
REALIDADE EM BELO HORIZONTE
I – plano dos resíduos sólidos
III – a coleta seletiva, os sistemas de
logística reversa e outras ferramentas
relacionadas à implementação da
responsabilidade compartilhada pelo
ciclo de vida dos produtos
IV – incentivo à criação e ao
desenvolvimento de cooperativas ou de
outras formas de associação de
catadores de materiais reutilizáveis e
recicláveis
Belo Horizonte ainda não tem o plano.
A capital tem, conforme já demonstrado, um sistema
de coleta seletiva que sem sendo construído desde
1993. A logística reversa ainda não foi
operacionalizada com indústrias e comerciantes
locais.
Belo Horizonte vem apoiando, desde 1993, a
formação de cooperativas na cidade, inclusive
disponibilizando o espaço físico e equipamentos,
como prensas, material de segurança etc. Mas precisa
avançar na infraestrutura existente, principalmente no
número de galpões de triagem dos materiais. Em
entrevista ao jornal Estado de Minas em agosto de
2012, a chefe do Departamento de Programas
Especiais da SLU, Aurora Pederzoli, afirmou:
148
Um dos problemas para a ampliação [da
coleta] é porque os galpões estão
saturados e não têm espaço para receber
mais material. (AYER e OLIVEIRA, 2012b,
p. 22)
VIII – educação ambiental
VIII – educação ambiental
Entre as atividades estão oficinas de educação
ambiental (abordam diversos temas, entre eles
Agenda 21, história ambiental, aspectos naturais e
intervenções humanas, poluição sonora, participação
popular e cidadania, recursos hídricos, saneamento,
unidades de conservação e consumo responsável);
BH Itinerante, um curso de extensão em educação
ambiental semestral teórico e prático, cujo objetivo é
formar educadores ambientais na cidade; visitas
orientadas (visitas ao aterro sanitário, parques e
praças da capital); travessias urbanas (atividade que
possibilita uma leitura ambiental ao longo do percurso,
onde são destacados aspectos naturais e
intervenções
humanas,
com
orientações
e
esclarecimentos apresentados por técnicos da
SMMA); circuitos ambientais regionais, realizados em
parceira com os Centros Regionais de Educação
Ambiental (disponíveis no Barreiro, Venda Nova,
Pampulha e Regional Norte). . (SMMA, PORTAL PBH,
2014e). As atividades de educação ambiental ocorrem
todos os meses. A programação pode ser acessada
no próprio portal da PBH (www.pbh.gov.br).
Outra iniciativa interessante é o programa Óleo nosso
de cada dia, de destinação do óleo de cozinha
saturado, por parte dos comerciantes e cidadãos, para
reciclagem. A primeira etapa do programa, de instalar
um coletor público em cada uma das nove Secretarias
de Administração Regional Municipal (SARMU), foi
concluída, e cada uma das nove regionais da cidade
tem ao menos um coletor. O programa é uma parceria
da PBH, através da SMMA e a Recóleo, empresa que
faz a coleta e a destinação correta deste
material. (SMMA, PORTAL PBH, 2014f)
Acredita-se que se houvessem avanços na educação
ambiental para a população de BH, a cidade tivesse
mas condições para sustentar as mudanças
necessárias de melhorias na infraestrutura da coleta
seletiva.
Fonte: Capítulo III, Dos instrumentos da PNRS, PNRS, p. 40, 2012
2.4.9 Espaços de participação
Com base nos dados dispostos na página oficial da Prefeitura de Belo Horizonte,
procurou-se identificar os conselhos e espaços abertos à participação e ao diálogo na
capital ligados ao contexto da discussão deste trabalho. O intuito foi verificar se, de
149
fato, eles estavam em consonância com a preocupação ambiental, que se fazia
crescente também, não apenas na capital, mas, como já demonstrado, no mundo,
naquele momento (e atualmente). Eis o que se encontrou:
O Conselho Municipal de Meio Ambiente (Comam) foi criado pela Lei n°4.253
de 04 de dezembro de 1985 [...] e é responsável pela formulação das
diretrizes da Política Municipal de Meio Ambiente em Belo Horizonte. [...]
Entre suas competências destacam-se a promoção de medidas destinadas à
melhoria da qualidade de vida no município, a formulação de normas técnicas
e padrões de proteção, conservação e melhoria do meio ambiente para o
município, observadas as legislações federal e estadual, a concessão de
licenças para implantação e operação de atividades potencialmente
poluidoras, a aprovação das normas e diretrizes para o Licenciamento
Ambiental no município e a atuação no sentido de formar consciência pública
sobre a necessidade de proteger, conservar e melhorar o meio ambiente.
(PORTAL PBH, 2014g)
O Conselho Municipal de Saneamento de Belo Horizonte foi criado pela Lei
8.260 de 03 de dezembro de 2001 e regulamentado pelo Decreto 11.289/03
e tem como principais funções, entre outras, regular, fiscalizar, controlar e
avaliar a execução da Política Municipal de Saneamento e estabelecer
diretrizes, fiscalizar e deliberar sobre a aplicação dos recursos do Fundo
Municipal de Saneamento, incluindo aprovação da prestação de contas. O
Conselho Municipal de Saneamento de Belo Horizonte não restringe a
possibilidade de participação aos conselheiros. As reuniões podem ser
acompanhadas por qualquer cidadão interessado, com a possibilidade de fala
em plenário, se respeitada a ordem de inscrição podendo solicitar, por escrito
e com justificativa, que se inclua assunto de seu interesse na pauta da reunião
subsequente. (PORTAL PBH, 2014g)
O Comitê Municipal de Mudanças Climáticas e Ecoeficiência busca trabalhar
na articulação das políticas públicas e da iniciativa privada para a diminuição
de gases poluentes na atmosfera e na conscientização ambiental da
sociedade. Ele é formado por representantes da prefeitura, da Câmara
Municipal, do Estado, universidades, ONGs e entidades representativas da
indústria e do comércio. O Comitê Municipal estuda as formas de estimular a
ampliação de políticas públicas já existentes, como o aproveitamento dos
gases produzidos pelo lixo do Aterro Sanitário, o uso da energia solar nas
residências e reciclagem do lixo. (PORTAL PBH, 2014g)
Uma recente iniciativa do município é a criação da Secretaria Municipal Adjunta de
Gestão Compartilhada, “com o objetivo de agilizar, organizar, ampliar e integrar todas
as atuais formas de participação na gestão de BH, promovendo o aperfeiçoamento da
Gestão Compartilhada” (GESTÃO COMPARTILHADA, 2014a).
Trata-se de uma maneira de ampliar o diálogo com a sociedade na hora de
governar a cidade, que cresce tão rapidamente. Assim, a prefeitura vai
incentivar a mobilização social, promover a capacitação dos representantes
das instâncias de participação, criar novos espaços de diálogos, ampliar a
150
cooperação institucional e proporcionar maior transparência e acesso às
informações das ações do governo. (GESTÃO COMPARTILHADA, 2014a)
Quadro 7 – Articulação da Secretaria Municipal Adjunta de Gestão Compartilhada
Sala de Situação
Ambiente configurado na forma física e virtual com finalidade de disponibilizar dados, informações
e conhecimentos estratégicos do município, a fim de subsidiar a definição de soluções, otimizar
a tomada de decisões e a gestão pública. [...] Constitui-se em um instrumento para a
democratização da informação em diversos níveis dos órgãos públicos e sociedade. É de sua
responsabilidade gerar e atualizar dados para o Portal Gestão Compartilhada.
Acompanhamento de Colegiados
A Gerência de Acompanhamento de Colegiados [...] acompanha o funcionamento das instâncias
participativas de Belo Horizonte, sendo responsável pelo desenvolvimento de uma ferramenta
cujo objetivo é promover, de forma sistematizada, a organização das informações internas dos
colegiados, como os conselhos de políticas públicas. O intuito é potencializar, ampliar e incentivar
a atuação integrada e intersetorial dos atores do poder público e da sociedade civil que compõem
essas instâncias, contribuindo para a transparência e o fortalecimento de seu desempenho.
Relacionamento e Mobilização Social
A mobilização social é responsável por ampliar e fortalecer as redes organizadas e promover
espaços de diálogo com a sociedade para aperfeiçoar a gestão compartilhada. Atua na promoção
de um processo permanente de sensibilização e formação da cidadania, utilizando instrumentos
de comunicação e informação, bem como de atividades lúdicas e artísticas. Também identifica os
processos participativos existentes nas diferentes secretarias e órgãos, visando integrar,
potencializar e dar maior visibilidade a essas iniciativas. A proposta é fortalecer a cultura de
cidadania e planejamento, ampliando cada vez mais a participação do cidadão na gestão
municipal.
Aprimoramento do Orçamento Participativo
A Gerência de Planejamento do Orçamento Participativo visa contribuir para desenvolver e
aprimorar, em conjunto com as secretarias afins, a metodologia e as diretrizes do OP Regional,
Habitação e Digital.
(Fonte: Gestão Compartilhada, 2014b)
Belo Horizonte associou-se, na primeira gestão de Marcio Lacerda (2009-2012), a
uma rede internacional que reúne governos e organizações não governamentais de
90 países com a filosofia comum de construírem cidades mais sustentáveis, por meio
da prática das Agendas 21, de matrizes energéticas e construções sustentáveis, bem
como outras práticas ambientais. Segundo Macedo e Freitas (2011), a cidade é
parceira do Iclei (Conselho Internacional para Iniciativas Ambientais Locais, tradução
nossa), cuja atuação na América Latina e Caribe se dá por meio de apoio aos
governos locais com ferramentas e serviços adequados à realidade de cada região,
em temas como mudanças climáticas, compras públicas sustentáveis, eficiência
151
energética e energias renováveis, construções sustentáveis, Agenda Local 21,
biodiversidade, proteção do solo, resíduos e outros.
Um dos projetos do Iclei, o Políticas de Construção Sustentável (PoliCS), busca
estabelecer o compromisso de governos locais na América do Sul para o
desenvolvimento e implementação de políticas de construção sustentável, com foco
em eficiência energética e fomento a tecnologias de baixa emissão de carbono,
inclusive energias renováveis. A capital mineira, ao lado de Montevidéu (Uruguai) e
Buenos Aires (Argentina), foi escolhida como cidade-piloto em 2011 pelo Iclei
atendendo um critério de seleção entre cidades “com histórico de políticas de [...]
compromisso político com o tema, interesse e experiência em participar ativamente
em redes internacionais; e liderança para induzir a replicação em outras cidades”
(MACEDO e FREITAS, 2011).
Belo Horizonte, inserida geograficamente como capital do estado e numa
região metropolitana, é responsável por 1,4% do PIB brasileiro e abriga o
principal polo de serviços, conhecimento e tecnologia de Minas. Ao longo dos
anos, o município tem apresentado uma abordagem proativa. Um grande
exemplo disto é o Plano de Gerenciamento dos Resíduos Sólidos da
Construção Civil da Cidade, que existe desde 1995, enquanto a resolução
nacional que regulamenta o assunto, só foi instituída em 2002. A Cidade
também foi pioneira ao estabelecer o Comitê Municipal de Mudanças
Climáticas e Ecoeficiência, em 2006. O Comitê foi o órgão responsável pela
elaboração do primeiro inventário de gases de efeito estufa da cidade,
lançado em 2 de dezembro 2009. (MACEDO e FREITAS, 2011)
Contatou-se que instâncias de participação popular foram criadas na cidade de Belo
Horizonte com foco na temática ambiental, bem como ações de educação ambiental.
Cabe ressaltar apenas que a forma como está se dando atualmente a
operacionalização de cada uma dessas instâncias, dentro do que se propõem, não foi
investigada neste trabalho e se configura tema para outra pesquisa.
O que se percebe, claramente, é que se antes a Prefeitura de Belo Horizonte se
adiantava ao Plano Nacional de Resíduos Sólidos, agora mal cumpre suas
determinações mais básicas, a exemplo do plano municipal integrado, a expansão
dos locais de entrega voluntária, o incentivo à redução do consumo, a gestão
compartilhada dos resíduos com o comércio.
152
Parece óbvio, mas se faz pertinente frisar que a capital mineira ainda tem diversos
entraves e desafios a enfrentar, principalmente no que diz respeito à melhoria nas
condições de qualidade de vida da população. Alinhavar, na prática, os ideais da
gestão social na política dos resíduos sólidos urbanos com vista ao desenvolvimento
local (DL) do município não é tarefa simples.
2.5 Em tempo: fatos recentes, velhos problemas
A greve dos garis no Rio de Janeiro durante o carnaval de 2014 foi uma excelente
oportunidade para a sociedade brasileira se debruçar sobre o debate dos resíduos
sólidos frente à nova legislação e o desenfreado descarte de resíduos. O que se viu
durante sete dias foram montanhas de plásticos, garrafas de água, latas, caixas de
papelão e, claro, lixo comum transbordando por toda a capital fluminense. Não teria
sido esse um ótimo momento para uma mobilização emergencial de educação
ambiental com os cariocas? Com os turistas foliões?
Numa análise muito superficial do noticiário de dois dos maiores jornais de circulação
no Brasil – O Globo e Folha de São Paulo – ambos se limitaram a retratar os fatos,
claro, dando ênfase à gravidade da situação, às doenças correlacionadas, como
leptospirose e diarreias, mas não avançaram no debate chamado a sociedade para a
corresponsabilidade, nem situando a PNRS nesse contexto.
O Globo publicou uma nota de Opinião, levantando a hipótese de oportunismo político
do movimento, em pleno carnaval, com a cidade repleta de gente e com 3 mil
toneladas de lixo pela cidade todos os dias, sem desmerecer que os garis podiam
ganhar mais. No bate-pé entre Prefeitura do Rio e garis, os trabalhadores dos resíduos
venceram: pediram R$ 1.200 e levaram R$ 1.100, um aumento real de 37%, em cima
do salário de R$ 803.
Em Belo Horizonte, chamou a atenção uma Reunião Ordinária da Comissão de
Direitos Humanos e Defesa do Consumidor da Câmara Municipal de Belo Horizonte
(CMBH, 2014)), ocorrida em 13/3/2014, que apreciou pareceres, entre eles, o pedido
de uma audiência pública, requerida “em caráter de urgência” pelo vereador Adriano
153
Ventura (PT), oposição à gestão atual. Segundo o site da CMBH, o objetivo era discutir
os projetos de lei 43/13 e 52/13, os quais permitem ao município a contratação de
empresas para tratamento térmico de resíduos urbanos com geração de energia, que
poderá resultar no enfraquecimento do Movimento Nacional de Catadores de
Materiais Recicláveis (MNCR) e de diversas entidades que atuam na defesa dos
trabalhadores da reciclagem e suas organizações. Ambos de autoria do vereador Léo
Burguês de Castro (PTdoB), presidente da CMBH, os projetos 43/13 e 52/13
autorizam, respectivamente, a utilização de tecnologia de plasma para processamento
do lixo e a realização de licenciamento de entidades ou empresas públicas ou privadas
para tratamento térmico de resíduos urbanos com geração de energia (CMBH, 2014).
O mais curioso nisso tudo é que Belo Horizonte nem plano municipal para gerenciar
os resíduos confeccionou ainda e já discute, em caráter Legislativo, apenas, um
projeto de lei para adotar tecnologia de plasma para processar o lixo. Será o interesse
do coletivo, da cidade, que está sendo colocado como prioridade nessa propositura?
Sinal que não. Aliás, sinal de uma gestão em que o debate passa longe do povo, onde,
o que parece, as decisões continuam sendo tomadas de cima para baixo, sem debate,
sem ouvir o que a população pensa.
154
3 PROPOSTAS DE INTERVENÇÃO
3.1 Introdução
O papel do cidadão frente aos desafios ambientais deste século 21 não se resume
a adotar hábitos de redução de geração de resíduos ou separar lixo orgânico dos
materiais recicláveis e disponibilizá-los para a coleta seletiva (caso haja em sua
cidade). Como atestam Braga e Mafra, as pessoas precisam, no mínimo, de
informação para se mobilizar.
Mas, além disso, precisam compartilhar visões, emoções e conhecimentos
sobre a realidade das coisas à sua volta, gerando a reflexão e o debate para
a mudança. (BRAGA e MAFRA, 2000, p.4, apud HENRIQUES et al., 2007,
p. 22)
Contextualizando a temática deste projeto, sobre a importância de reduzir a geração
de lixo e o fortalecimento da coleta seletiva em Belo Horizonte, via conscientização
da sociedade para a problemática ambiental, questiona-se: como seria possível
sensibilizar uma comunidade inteira para o tema, para refletir sobre seu modo de
viver, de consumir, de descartar suas sobras e, diante disso, estar disposta a
construir um plano em conjunto sobre resíduos para sua cidade?
É necessário envolver desde crianças, estudantes, adultos, bem como comerciantes,
donas de casa e todos os demais cidadãos para tudo o que os circunda diariamente,
buscando a reflexão coletiva sobre o não descarte de lixo em ruas e avenidas das
cidades, que entope bueiros e gera alagamentos quando chove; o cuidado com a
nascente de um córrego perto de casa; a gentileza com canteiros, parques e praças,
que mantêm vivos um microecossistema local muitas vezes imperceptível (formigas,
cupins, pequenas aranhas, insetos variados, pássaros, e flores e frutos de vários
tipos), tudo isso está intrinsecamente ligado, proporcionando a vida ao redor.
Uma iniciativa interessante de mobilização adotada pela Prefeitura de Belo Horizonte
e pela Superintendência de Limpeza Urbana em 2011 foi a colocação de um
lixômetro na Praça Sete, Centro da capital, com os resíduos que são recolhidos
155
diariamente no local. A maioria é formada por lixo que as pessoas jogam no chão. A
meu ver uma iniciativa como essa é interessante para fazer a pessoa enxergar algo
muitas vezes imperceptível e se ver como responsável pelo problema existente. Ou
seja, a partir do olhar dela sobre o que ocorre à sua volta e até mesmo uma reflexão
sobre a sua contribuição para aquilo (lixo na rua, por exemplo) a pessoa pode ser
tocada para a questão.
Figura 8 – Sensibilização social: lixômetro colocado na Praça Sete
Crédito: Divino Advíncula/Portal PBH
Para Marcatto, problemas ambientais se manifestam em nível local. “Em muitos
casos, os residentes de um determinado local são, ao mesmo tempo, causadores e
vítimas de parte dos problemas ambientais” (MARCATTO, 2002, p. 12).
São também essas pessoas quem mais têm condições de diagnosticar a
situação. Convivem diariamente com o problema e são, provavelmente, os
maiores interessados em resolvê-los. Os grupos locais podem ser muito
mais eficientes que o Estado na “fiscalização” do cumprimento de um
determinado acordo e no controle do uso de bens públicos ou dos recursos
naturais. Além disso, uma parte importante dos problemas ambientais
somente serão efetivamente resolvidos se a população local assim desejar.
(MARCATTO, 2002, p. 12)
Na visão de Henriques et. al (2007, p. 21), a participação é uma condição intrínseca
e essencial para a mobilização social e “a corresponsibilidade existe quando o
público age por se sentir responsável pelo sucesso do projeto, entendendo sua
participação como essencial ao todo”. Marcatto vai acrescentar que
156
Participação implica envolver, ativa e democraticamente, a população local
em todas as fases do processo, da discussão do problema, do diagnóstico
da situação local, na identificação de possíveis soluções, até a
implementação das alternativas e avaliação dos resultados. (MARCATTO,
2002, p. 12)
A proposta de educação ambiental prevista na Política Nacional de Resíduos Sólidos
(PNRS) se coloca como fundamental instrumento para essa sensibilização. A Lei de
Educação Ambiental (9.795/1999) mostra que o tema deve ser trabalhado em
transversalidade em todos os níveis de educação (fundamental, médio, ensino
superior, técnico, Educação de Jovens e Adultos), mas não só nessa esfera. Dessa
forma, segundo Henriques et.al (2007), “é necessário cumprir outras funções que
devem estar integradas e articuladas”, a saber:
1) Difundir informações – [...] a rede comunicativa se estabelece por
meio da difusão (divulgação e publicização) do tema mobilizador
[...] dando visibilidade da iniciativa aos diversos atores.
2) Promover a coletivização – a simples difusão não é garantia de que
as pessoas irão se sensibilizar e participar da mobilização. A
coletivização pode ser alcançada pelo sentimento e certeza de que
não se está sozinho na luta pela mudança, há outros atuando com
o mesmo sentido e propósito. [...] A circulação das informações
legitima as ações das pessoas, conferindo-lhes reconhecimento,
conectando-as umas às outras pelo sentimento de pertencimento a
um grupo com interesses comuns.
3) Registrar a memória do movimento – A existência de um banco de
dados e outros modos de organização do acervo e da memória do
movimento com o intuito de registrar sua trajetória também é
fundamental para fortalecer a mobilização.
4) Fornecer elementos de identificação com a causa e com o projeto
mobilizador – Cabe à comunicação uma articulação entre valores e
símbolos no processo de construção da identidade de um
movimento, estabelecendo uma maneira estruturada a produção de
elementos que orientem e gerem referências para a interação dos
indivíduos,
possibilitando,
assim,
um
sentimento
de
reconhecimento
e
pertencimento
capaz
de
torná-los
corresponsáveis. (HENRIQUES et.al, 2007, p. 22-24)
É importante lembrar que a comunicação passou por uma verdadeira transformação
nos últimos anos, haja vista o processo de globalização, já abordado neste trabalho,
que rompeu de vez com as fronteiras geográficas, principalmente a partir da
evolução tecnológica, que interligou países, processos, informações e pessoas de
todo o mundo. No que diz respeito às mudanças do mundo analógico para o digital,
157
elas impactaram profundamente as relações e influências na vida social, conforme
retrata Castro (2012), ao trazer algumas situações que ela chama de contradições
que estão sendo vivenciadas e que precisam ser levadas em conta ao abordarmos
essas transformações.
Quadro 8 – Mudanças geradas pela passagem do mundo analógico para o mundo digital
Transformações
1.1 Espaço/lugar
1.2 Espaço/lugar
1.3
Espaço/tempo/lugar
Mundo analógico
Mundo digital
Estávamos em um só lugar, Podemos “estar” em vários
marcado geograficamente por lugares, sem sair do lugar
fronteiras.
geográfico. Ex: falar pelo MSN,
realizar
videoconferência,
ministrar aula via Educação a
Distância
Só podíamos ver o que estava Visualizamos tudo virtualmente,
ao nosso alcance.
a
partir
de
diferentes
plataformas tecnológicas.
Estávamos em um mesmo lugar Brincamos com a realidade
e só podíamos ver o que estava virtual. Um dos exemplos mais
ao nosso alcance.
conhecidos é o jogo Wii ou o uso
da terceira dimensão no cinema
e na TV digital.
2. Espaço
A maior parte da população era
anônima e no máximo sonhava
alcançar 15 minutos de fama
nos meios de comunicação.
A população é, cada vez mais,
pública, por meio de blogs,
Twitter, páginas da web e redes
sociais que são usadas a partir
de diferentes plataformas, como
celulares ou videojogos em
rede.
3. Conteúdos
Eram oferecidos apenas pelos Para além dos meios de
meios de comunicação.
comunicação,
os
públicos
oferecem outras versões da
realidade, por meio de blogs,
páginas da web e Twitter.
4. Local/nacional
O espaço para a cultura, a
informação e o entretenimento
era restrito ao local e ao
nacional.
As tecnologias da informação e
da
comunicação
(TICs)
aproximam o local, o nacional e
o global, redefinindo-o.
Fonte: CASTRO (2012, p. 16-17)
Na visão de Castro (2012), “uma das características mais marcantes desse processo
de mudança é a passagem da comunicação unidirecional (produção-mensagemrecepção) para a comunicação bidirecional, dialógica e interativa”, que se resume:
158
Produção-mensagem-recepção-resposta ao campo da produção. Nesse
sentido, a digitalização permite recuperar o sentido latino da palavra
comunicação, no sentido de comunhão e compartilhamento. (CASTRO,
2012, p. 19)
Henriques et.al (2007) afirma ainda que “a comunicação para a mobilização social
deve ser dialógica, na medida em que defende uma causa de interesse mútuo, que
deve ser compartilhada entre os sujeitos”.
A comunicação para a mobilização social, tendo esse caráter dialógico,
tenderá também a ser libertadora, já que um sujeito não tenta invadir ou
manipular o outro, reduzindo-o a mero objeto, mas tenta, com o outro,
problematizar um conhecimento sobre uma realidade concreta, para melhor
compreender essa realidade, explicá-la e transformá-la. (Henriques et.al,
2007, p. 27)
Diante dos objetivos deste trabalho – de descrever o processo de gestão da coleta
seletiva de materiais recicláveis em vigor em Belo Horizonte desde 1993; de verificar
a presença de instâncias na capital voltadas para participação democrática/cidadã
envolvendo a temática ambiental; de buscar compreender a possibilidade de adoção
da gestão social no desenvolvimento do plano municipal de gestão integrada de
resíduos sólidos; e de discutir as exigências da Política Nacional de Resíduos
Sólidos diante da realidade de Belo Horizonte – foram elaboradas duas propostas de
intervenção, como contribuição técnica e parte do trabalho de conclusão do curso de
Mestrado Profissional em Gestão Social, Educação e Desenvolvimento Local do
Centro Universitário UNA.
Como profissional da comunicação, em especial do jornalismo, não poderia me
abster de apresentar ideias, dentro do bojo deste trabalho de pesquisa, que
inserissem de alguma forma as práticas do meu cotidiano e de diálogo com o tema
dos resíduos na proposta de intervenção social. Entende-se que as duas sugestões
se encontram dentro de uma possibilidade de ampliação do diálogo sobre os
resíduos sólidos e da construção de reflexão do sujeito acerca de seu papel de
cidadão frente ao tema.
159
São elas:
1) Criação de um blog e de uma página no Facebook, que se propõem a ser um
espaço de debates sobre a política de resíduos em Belo Horizonte;
2) Propor que a Prefeitura de BH e a Superintendência de Limpeza Urbana
(SLU) promovam uma série de diálogos pela cidade, em cada uma das nove
administrações regionais da capital mineira, com o intuito de fomentar o
debate e o acesso à informação pela população, com vista à adoção da
gestão social no processo de elaboração do plano municipal de gestão
integrada de resíduos sólidos.
3.2 Objetivos

Abrir dois espaços para o debate sobre os resíduos e práticas pessoais de
gestão do lixo dos cidadãos (moradores, comerciantes, educadores,
formadores de opinião, catadores de recicláveis, representantes do poder
público, ou seja, todos os atores envolvidos na questão do lixo);

Informar as pessoas sobre eventos, reuniões, cursos, audiências públicas
sobre resíduos sólidos urbanos;

Trabalhar para que o blog e a página do Facebook se transformem em espaço
de reflexão, debate e compartilhamento de experiências acerca dos resíduos
sólidos na capital mineira.
3.3 Detalhamento
3.3.1 Blog /Página no Facebook
Vive-se uma realidade cada vez mais digitalizada, em que “novos atores sociais vêm
aparecendo no cenário midiático. Eles acessam e se apropriam das novas mídias de
maneira formal (através de cursos) ou informal” (CASTRO, 2012, p.25). Nesse
sentido, o uso dos aparelhos celulares inteligentes (smartphones), com acesso à
160
internet e cada vez mais difundidos, principalmente entre jovens e adolescentes, e
também as redes sociais, permite uma vastidão de conexões, compartilhamentos de
ideias, imagens (fotos e vídeos) e também a troca de informações, pensamentos e
reflexões.
Considera-se
que
a
criação
do
blog
Papo
de
Lixo
BH
(www.papodelixobh.blogspot.com.br) se mostra como uma plataforma atual, em que
estarão dispostas informações públicas (atividades, eventos, chamamentos públicos
de órgãos governamentais e ONGs) para conhecimento das pessoas e também
questionamentos para promover a reflexão acerca do tema. O blog é de acesso livre,
estando as pessoas aptas a postar comentários, práticas e experiências que
vivenciam no seu cotidiano, o que pode despertá-las para seus próprios hábitos
frente ao lixo e estimular algumas mudanças de atitude.
O mesmo pode ocorrer na página do Facebook (www.facebook.com/papodelixo),
cuja criação também se mostrou interessante do ponto de vista da dinâmica dessa
rede social, sua abrangência e visibilidade. “No Brasil, a rede social criada nos
Estados Unidos atingiu 73 milhões de usuários em maio de 2013” (SBARAI, 2013).
A missão do Facebook é dar às pessoas o poder de compartilhar
informações e fazer do mundo um lugar mais aberto e conectado.
(FACEBOOK, 2004)
Tanto o blog como a página do Facebook estão no ar e já recebendo comentários
sobre alguns temas que vêm sendo abordados, como a greve de garis ocorrida no
Rio de Janeiro, durante o carnaval 2014, e sobre hábitos de consumo. Inicialmente,
foram enviados convites para que pessoas do círculo profissional e social da
pesquisadora visitem as páginas e comentem os temas. Num segundo momento,
essa ação deverá se estender para ONGs da capital que trabalhem com resíduos;
associações dos catadores de recicláveis; órgãos da Prefeitura de Belo Horizonte
que têm relação direta com o tema, inicialmente para tomarem conhecimento da
proposta.
161
Figura 9 – Capa do blog Papo de Lixo
162
Figura 10 – Capa página no Facebook Papo de Lixo
163
3.3.2 Rodadas de diálogos – Papo de Lixo: o que isso tem a ver com você?
Com 117 anos, Belo Horizonte é uma cidade jovem, que vem construindo ao longo
das últimas décadas uma política mais participativa e cidadã. Exemplos disso são o
Orçamento Participativo, a criação de conselhos e fóruns, as audiências públicas,
todos com a presença de cidadãos que, ao lado do poder público, compartilham
opiniões sobre os rumos da cidade.
Diante dos espaços que já existem para a prática do diálogo e mesmo aqueles com
finalidade de educação ambiental (a Sala Verde e os Centros de Educação
Ambiental presentes em algumas administrações regionais da cidade), conforme
citado no capítulo 2, a Prefeitura de Belo Horizonte (PBH), por meio da
Superintendência de Limpeza Urbana (SLU) e da Secretaria Municipal de Meio
Ambiente (SMMA), pode montar um projeto, antes da elaboração do plano municipal
de gestão integrada dos resíduos sólidos, para ouvir a população acerca dos
resíduos em geral, com o intuito de compreender a visão do cidadão sobre a atual
política e, em que pese sua responsabilidade por descartar esse lixo, como esse
cidadão pode contribuir nesse processo.
Ao promover a Rodada de Diálogos – Papo de Lixo: o que isso tem a ver com você?,
em cada uma das regionais administrativas – uma vez que cada região tem
peculiaridades, hábitos de vida e consumo e, portanto, formas distintas de gerar seus
resíduos – a PBH/SLU estaria não só ouvindo o que o cidadão pensa, como teria
uma grande oportunidade de promover esse diálogo e a aplicação dos conceitos de
gestão social na prática, por meio da comunicação dialógica e da construção
compartilhada de um plano de resíduos para Belo Horizonte.
3.3.2.1 Objetivos



Inserir o cidadão no debate dos resíduos sólidos de Belo Horizonte;
Construir o plano municipal de gestão integrada de resíduos levando em conta
a visão do cidadão sobre os problemas e possíveis soluções apresentadas
pelo cidadão;
Adotar a prática dialógica e construção compartilhada nas decisões acerca da
política de resíduos em BH.
164
3.3.2.2 Metodologia
A proposta é usar a metodologia participativa apresentada por Silva (2001) – Onze
Passos do Planejamento Estratégico-Participativo –, que, segundo o autor,
“incorpora uma lógica para assegurar que ações sejam organizadas dentro de uma
concepção estratégica e participativa” (SILVA, 2001, p.166).
Os pressupostos teóricos que estão na base dos Onze Passos surgem de
uma abordagem cuja principal característica é a busca de compreender a
realidade, modificando-a. Essa abordagem, baseada na concepção
metodológica dialética, leva-nos a compreender a complexidade em que os
acontecimentos estão situados e não concorda com leituras deterministas,
embora considere que a estrutura da sociedade esteja demarcada por
classes sociais diferentes e opostas. (SILVA, 2001, 165)
Abaixo, está uma reprodução dos Onze Passos do Planejamento idealizados por
Silva (2001), com o acréscimo de algumas hipóteses do tema tratado, para
vislumbrar onde as ações de fato poderiam ocorrer, lembrando que esse modelo de
planejamento pode ser usado para as diversas variáveis presentes na temática dos
resíduos sólidos urbanos. Tomou-se com mais ênfase a questão dos bota-foras
irregulares, por estes se apresentarem como grave problema enfrentado por Belo
Horizonte ultimamente. Mas, reforça-se: a planilha do planejamento pode ser
adotada para ações para erradicar os bota-foras; para implantação da coleta seletiva
em determinada regional; para ação de educação ambiental, enfim, vai depender do
nó crítico do problema a ser enfrentado.
Quadro 9 – Planejamento estratégico-participativo de ações para BH
PASSO
Primeiro passo
Segundo passo
AÇÃO
EXEMPLO DE
SITUAÇÃO/AÇÃO
Definir quem é o ator que
planeja = todos
Nota da pesquisadora: dentro do
conceito da gestão social, a relação é
dialógica, sem coerção. Pode haver
um grupo moderador, retirado pelo
grupo maior.
Levantar os problemas
existentes em cada regional
com a questão dos resíduos,
na visão dos cidadãos.
Ex: na Regional Leste, há
muito bota-fora; na Centro-Sul,
ninguém separa materiais
recicláveis; no Barreiro, a
maioria nunca ouviu falar da
coleta seletiva.
Nota da pesquisadora: Possivelmente,
a PBH/SLU/SMMA tem o diagnóstico
165
feito por gerências de limpeza urbana
e o mapeamento de onde ocorrem os
problemas relacionados ao lixo. Ter
conhecimento sobre a visão do
cidadão a respeito dos problemas é
fundamental para inseri-lo no debate.
Terceiro passo
Escolher o problema que vai
ser enfrentado, primeiramente,
em cada administração
regional de BH.
Ex: Bota-fora irregular feito por
empresas de caçamba no
Barreiro e na Leste; ausência
de informações na Centro-Sul,
etc.
Listados os problemas, devese fazer um escalonamento
sobre qual deles vai ser
atacado primeiro. Aqui o grupo
moderador questiona sobre
cada problema qual o seu
grau de impacto frente a
ações naquele local / qual sua
capacidade de enfrentamento
/ seu poder de resolvê-lo.
Problema que afeta a
comunidade diretamente.
Impacto negativo é alto.
Capacidade de resolver o
problema: fazer um trabalho
de conscientização com as
empresas. Chamar a equipe
de fiscalização para atuar em
conjunto num segundo
momento; advertir quem for
pego fazendo bota-fora; num
segundo flagrante, multar a
empresa.
Quarto passo
Buscar as causas do problema
escolhido. É preciso descobrir
o que origina o problema.
Ex. Possíveis causas do botafora irregular:
→ não há na região afetada
ação de educação ambiental
→ empresas de caçamba
desconhecem legislação
→ população não denuncia
Quinto passo
Selecionar a causa principal, o
nó crítico do problema.
Sexto passo
Elencar resultados desejados
e os indicadores de resultados
Ex: Nó crítico é a ausência de
ações de educação ambiental
com a comunidade do
Barreiro.
Ex: Diante da PNRS,
precisamos que os resíduos
depositados clandestinamente
tenham destinação correta em
toda a cidade. Diante de todo
o plano de intervenção, vamos
166
Sétimo passo
Sétimo passo
Explicitar qual o projeto do
ator/moderador. O projeto
deve ser apresentado de
forma clara e específica, com
detalhamento, para haver
ação que realmente
transforme a situaçãoproblema.
estabelecer metas para
chegar nos resultados que é
acabar com os depósitos
clandestinos na cidade.
Ex: Pôr fim aos bota-foras
clandestinos em todas as
regionais, em um ano.
Resultado esperado: fim dos
depósitos clandestinos pela
cidade.
Quem vai agir de imediato:
Equipes de mobilização social
da SLU e da Secretaria
Municipal de Meio Ambiente
(SMMA) vão programar ações
de educação ambiental a ser
desenvolvidas no Centro
Ambiental de cada região da
cidade (onde não houver,
pode-se estabelecer parceria
com uma escola da região ou
entidade representativa),
chamando a comunidade em
geral, escolas, empresas de
caçamba da região e
construtoras que mais atuam
em cada área.
Oitavo passo
Traçar o plano de ação.
Construir o caminho para
chegar aos resultados
esperados. Estabelecer quais
ações podem ser adotadas
para pôr fim aos bota-foras;
prazo para execução do
plano; resultado esperado;
indicadores do resultado;
recursos necessários; como o
plano vai ser posto em
prática.
Ex: Integram o plano de ação:
Seleção por sorteio de 50
pessoas (entre as que se
candidatarem e compulsórias)
da comunidade que serão
treinadas por técnicos da
SLU/SMMA para se
transformarem em agentes
ambientais da sua região e,
assim, serem multiplicadores
do conhecimento e de ações
que podem ajudar a melhorar
a destinação dos resíduos
sólidos em BH, com o objetivo
de reduzir sua geração.
Articulação com escolas da
região para sensibilizar os
estudantes sobre disposições
clandestinas de resíduos (os
chamados bota-foras
irregulares) em seus bairros e
a importância de destinar os
resíduos corretamente (aqui
podem ser abordadas várias
temáticas transversais: saúde,
higiene, meio ambiente etc.)
Chamar as empresas
construtoras da região,
167
Nono passo
Analisar a viabilidade do plano
da ação.
Nono passo
-
Décimo passo
Décimo primeiro passo
empresas de caçamba e
empresários do setor de
construção para o debate,
mostrando a importância de
sua conscientização acerca do
problema que geram e
articular com eles metas de
redução dos bota-foras.
Verificar os recursos, mão de
obra e meios de pôr o plano
em ação. Estabelecer equipes,
dias de atuação, fiscalização,
ação da comunidade
conjuntamente com os
técnicos da PBH.
Neste passo o grupo já tem
segurança sobre como e
aonde quer chegar. Falta
definir instrumentos de
gerenciamento para executar
o plano.
Cada pessoa envolvida recebe
uma cópia do plano, define-se
uma comissão que possa
tomar iniciativas conjuntas
quando surgir algum
imprevisto, agendar reuniões
do gerenciamento de
execução do plano, avaliar o
andamento da execução do
plano (se necessário, mudar
ações), afixar o plano e seus
avanços mês a mês para todo
o grupo acompanhar.
Realizar avaliação
permanente e ações de
reconstrução do plano.
Fazer avaliação entre o que foi
planejado e o que foi realizado
(dentro do que foi planejado e
não realizado, questionar o
por quê, o que fazer para
superá-los etc.); não planejado
mas realizado (o que justificou
sua execução? Quais
resultados obtidos? Podemos
avançar?).
Fonte: Quadro montado pela pesquisadora, com base nos Onze Passos do Planejamento
Estratégico-Participativo de SILVA (2001, p.163-179)
3.3.2.3 Desenvolvimento
1) Usando os espaços já disponíveis na cidade para educação ambiental (Sala
Verde na Regional Centro-Sul e Centros Regionais de Educação Ambiental
do Barreiro, Venda Nova, Pampulha e Regional Norte), poderiam ser feitas as
primeiras rodadas dos diálogos Papo de Lixo: o que isso tem a ver com você?
168
O Centro Mineiro de Referência em Resíduos poderia sediar debates para
cobrir as regionais Leste (onde está localizado) e Nordeste, por sua
proximidade;
E as regionais Noroeste e Oeste poderiam ter suas reuniões em locais
referência de suas regiões, como uma escola ou a própria sede da
administração regional.
2) A partir das rodadas de diálogos, mensais, em cada regional administrativa,
seria possível conhecer a opinião/visão/práticas dos cidadãos frente ao lixo
domiciliar e reciclável; diagnosticar os problemas relacionados ao lixo de cada
administração regional da cidade, a partir da visão do cidadão; ouvir desses
cidadãos sugestões sobre como resolver os problemas;
3) Durante a construção desse planejamento em cada uma das nove
administrações regionais, poderia haver uma espécie de votação pela internet
com algumas propostas retiradas das rodadas de diálogos, e também urnas
eletrônicas estrategicamente espalhadas pela cidade para todos os cidadãos
darem sua opinião sobre o que está sendo construído conjuntamente com o
objetivo de elaborar o plano municipal de gestão integrada de resíduos.
3.3.2.4 Resultados esperados
A proposta da Rodada de Diálogos – Papo de Lixo, o que isso tem a ver com você?
não tem a pretensão de que o cidadão dê o direcionamento técnico e logístico da
gestão de resíduos no município, mas que seja participante neste processo e se sinta
chamado a refletir e construir, junto com o poder público, uma nova realidade para a
capital mineira. A partir de experiências pessoais com os resíduos, com certeza,
cada um de nós tem algo a contar e compartilhar.
169
4 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Os debates no Brasil sobre a relação da sociedade com o lixo, as políticas públicas, a
coleta seletiva e a reciclagem têm avançado. Nos últimos anos, foram criados eventos
específicos como locais de reflexão e debate, um canal de comunicação importante.
Exemplo disso é o Fórum Lixo e Cidadania, que reúne para a discussão sobre
melhorias nos sistemas públicos de limpeza urbana os catadores de materiais
recicláveis, os gestores municipais, estaduais e federais e a sociedade civil
organizada. É nesse espaço que ocorrem diversas discussões, troca de experiências
e pesquisas sobre o mundo dos resíduos e as formas de gerir as políticas públicas.
Objetivou-se nesta pesquisa contextualizar a problemática ambiental dos resíduos
globalmente e a experiência de Belo Horizonte com a coleta seletiva para situar a
capital mineira diante da Política Nacional dos Resíduos Sólidos (PNRS), suas
exigências colocadas e os desafios que o município tem para se adequar à legislação,
no intuito de articular a política em curso aos modelos da gestão social, por entender
que esse seja um caminho possível de diálogo para o desenvolvimento de uma
sociedade mais justa e mais igualitária.
Mesmo com lacunas e dificuldades a serem vencidas no escopo do seu programa de
coleta seletiva, Belo Horizonte não se enquadra na situação de ter de começar do
zero. Pelo contrário. Há uma estrutura em operação. Mas o município não
desenvolveu ainda o plano municipal integrado de resíduos, que vai nortear toda a
ação política dessa temática na cidade. Diante dessa situação, entende-se que Belo
Horizonte tem uma oportunidade única de construí-lo com a participação da
sociedade, adotando a gestão social como modelo dialógico de participação.
Experiência de formas e espaços para incluir a população no debate o município tem,
como já demonstrado.
O resíduo é problema, pelo volume que representa, pela necessidade de destinação
correta, mas ele é valioso também. Valioso em todo o sentido que a palavra pode
representar. O econômico é mais fácil de ser quantificado. Mas seu maior valor não
está apenas nos milhões que ele representa em termos econômicos, mas sim nas
170
possibilidades que se descortinam a partir de mudanças nas relações da sociedade
para tentar dar solução a ele. Brevemente, elencam-se algumas delas:
Sob a ótica do social, uma efetiva inclusão dos trabalhadores que estão em toda a
cadeia de recicláveis. Os catadores, como agentes ambientais, são grandes aliados
dos municípios no trabalho da coleta seletiva e podem ser capacitados dentro dessa
lógica, inclusive para dar um salto em sua condição de “catadores” e para sair de
situações de pobreza em que se encontram. Então, poderia se pensar o
desenvolvimento local por meio da melhoria da gestão de resíduos para essa camada
da população, ou seja, um DL para esse grupo de pessoas;
Na área ambiental, registram-se os enormes ganhos na saúde humana, animal e
vegetal, melhoria de qualidade do solo e do ar, além de redução no impacto de rios e
oceanos e toda a sua biodiversidade, se os resíduos forem manejados corretamente.
Por meio dos resíduos, comunidades de condomínios, ruas, bairros, cidades, estados
e países podem se unir em torno de um objetivo específico que é a diminuição da
produção de resíduos para gerar menos impacto ao planeta. Consequências disso
seriam menos poluição nas cidades, menos proliferação de doenças, melhoria da
qualidade de vida e bem-estar. Nesse sentido, adotar outros hábitos no cotidiano em
relação aos resíduos seria um exercício de participação coletiva em busca da
transformação de várias realidades.
A partir da pesquisa documental e bibliográfica, foi possível corroborar algumas das
hipóteses levantadas no início deste projeto:
Negativas

A cidade está atrasada em relação à elaboração do plano municipal de
resíduos sólidos, portanto, em descompasso com a Política Nacional de
Resíduos Sólidos.

É uma realidade que o cidadão conhece pouco ou desconhece o programa de
coleta seletiva da cidade. Ao destinar para o programa seringas, absorventes
171
e restos de comida, percebe-se a inconsistência na forma de participação geral
da sociedade;

A cidade ainda convive com problemas graves, como bota-foras clandestinos,
lançamento e disposição incorreta de resíduos (a exemplo de lixo jogado em
cursos d’água, nas ruas e avenidas);
Positivas

O município já cumpre com algumas exigências da legislação, como a
destinação correta dos resíduos para aterro sanitário licenciado, adoção de
coleta seletiva (mesmo que apenas em 30 bairros); há uma tentativa de
inclusão dos catadores de materiais com a destinação dos resíduos para as
cooperativas, que recebem ajuda financeira para se manterem da PBH;

Belo Horizonte dispõe de instrumentos para se adequar à PNRS, a exemplo
das ações e programas de educação ambiental voltados para a população;

Ao longo da década de 1990, a cidade, incentivada pela administração
municipal, experimentou diversas formas de políticas participativas sociais,
portanto, tem um histórico nesse sentido;

A cidade é dotada de conselhos municipais de Meio Ambiente e Saneamento,
canais de fortalecimento da participação de toda a sociedade nas discussões;

A Superintendência de Limpeza Urbana, responsável pela coleta seletiva na
cidade, tem corpo técnico e expertise na condução de processos dialógicos e
de mobilização social para fortalecer a premissa número um da PNRS, de não
geração de resíduos, bem como para resgatar e executar campanhas
educativas para todo o município.
172
Sendo assim, e considerando o conjunto de instâncias de participação social em
políticas públicas existente na estrutura administrativa de Belo Horizonte, adotar a
gestão social em uma política pública, com vista ao desenvolvimento local, se mostra
possível. Mas só isso não é suficiente. É preciso que haja um norte político para
realmente ativar essas instâncias todas. Outra questão é a alocação de recursos e
energia numa nova e ampla campanha educativa e de mobilização da comunidade,
que, embora não seja tarefa simples por se tratar de uma cidade com 2,37 milhões de
pessoas, já se mostrou viável em outros momentos, como demonstrado.
Por fim, torna-se claro que a proposta de adotar a gestão social na construção do
plano municipal de gestão integrada dos resíduos sólidos de Belo Horizonte não se
traduz em um processo fácil, mas tampouco impossível. O momento se mostra mais
do que oportuno para o município resgatar sua força mobilizadora e articuladora de
envolvimento da sociedade numa política pública, a exemplo do início de implantação
da semente da coleta seletiva, em 1993. A prefeitura e a cidade detêm expertise e
instrumentos para tal, dependendo de uma vontade política mais contundente e de
uma participação ativa da sociedade para acioná-la.
173
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Anexo I – Política Nacional de Resíduos Sólidos
Presidência da República
Casa Civil
Subchefia de Assuntos jurídicos
LEI Nº 12.305, DE 2 DE AGOSTO DE 2010.
Regulamento
Institui a Política Nacional de Resíduos
Sólidos; altera a Lei no 9.605, de 12 de
fevereiro de 1998; e dá outras providências.
O PRESIDENTE DA REPÚBLICA Faço saber que o Congresso Nacional
decreta e eu sanciono a seguinte Lei:
TÍTULO I
DISPOSIÇÕES GERAIS
CAPÍTULO I
DO OBJETO E DO CAMPO DE APLICAÇÃO
Art. 1o Esta Lei institui a Política Nacional de Resíduos Sólidos, dispondo sobre
seus princípios, objetivos e instrumentos, bem como sobre as diretrizes relativas à
gestão integrada e ao gerenciamento de resíduos sólidos, incluídos os perigosos, às
responsabilidades dos geradores e do poder público e aos instrumentos econômicos
aplicáveis.
§ 1o Estão sujeitas à observância desta Lei as pessoas físicas ou jurídicas, de
direito público ou privado, responsáveis, direta ou indiretamente, pela geração de
resíduos sólidos e as que desenvolvam ações relacionadas à gestão integrada ou ao
gerenciamento de resíduos sólidos.
§ 2o Esta Lei não se aplica aos rejeitos radioativos, que são regulados por
legislação específica.
Art. 2o Aplicam-se aos resíduos sólidos, além do disposto nesta Lei, nas Leis
n 11.445, de 5 de janeiro de 2007, 9.974, de 6 de junho de 2000, e 9.966, de 28 de
abril de 2000, as normas estabelecidas pelos órgãos do Sistema Nacional do Meio
Ambiente (Sisnama), do Sistema Nacional de Vigilância Sanitária (SNVS), do Sistema
Unificado de Atenção à Sanidade Agropecuária (Suasa) e do Sistema Nacional de
Metrologia, Normalização e Qualidade Industrial (Sinmetro).
os
CAPÍTULO II
189
DEFINIÇÕES
Art. 3o Para os efeitos desta Lei, entende-se por:
I - acordo setorial: ato de natureza contratual firmado entre o poder público e
fabricantes, importadores, distribuidores ou comerciantes, tendo em vista a
implantação da responsabilidade compartilhada pelo ciclo de vida do produto;
II - área contaminada: local onde há contaminação causada pela disposição,
regular ou irregular, de quaisquer substâncias ou resíduos;
III - área órfã contaminada: área contaminada cujos responsáveis pela
disposição não sejam identificáveis ou individualizáveis;
IV - ciclo de vida do produto: série de etapas que envolvem o desenvolvimento
do produto, a obtenção de matérias-primas e insumos, o processo produtivo, o
consumo e a disposição final;
V - coleta seletiva: coleta de resíduos sólidos previamente segregados conforme
sua constituição ou composição;
VI - controle social: conjunto de mecanismos e procedimentos que garantam à
sociedade informações e participação nos processos de formulação, implementação
e avaliação das políticas públicas relacionadas aos resíduos sólidos;
VII - destinação final ambientalmente adequada: destinação de resíduos que
inclui a reutilização, a reciclagem, a compostagem, a recuperação e o aproveitamento
energético ou outras destinações admitidas pelos órgãos competentes do Sisnama,
do SNVS e do Suasa, entre elas a disposição final, observando normas operacionais
específicas de modo a evitar danos ou riscos à saúde pública e à segurança e a
minimizar os impactos ambientais adversos;
VIII - disposição final ambientalmente adequada: distribuição ordenada de
rejeitos em aterros, observando normas operacionais específicas de modo a evitar
danos ou riscos à saúde pública e à segurança e a minimizar os impactos ambientais
adversos;
IX - geradores de resíduos sólidos: pessoas físicas ou jurídicas, de direito
público ou privado, que geram resíduos sólidos por meio de suas atividades, nelas
incluído o consumo;
X - gerenciamento de resíduos sólidos: conjunto de ações exercidas, direta ou
indiretamente, nas etapas de coleta, transporte, transbordo, tratamento e destinação
final ambientalmente adequada dos resíduos sólidos e disposição final
ambientalmente adequada dos rejeitos, de acordo com plano municipal de gestão
integrada de resíduos sólidos ou com plano de gerenciamento de resíduos sólidos,
exigidos na forma desta Lei;
190
XI - gestão integrada de resíduos sólidos: conjunto de ações voltadas para a
busca de soluções para os resíduos sólidos, de forma a considerar as dimensões
política, econômica, ambiental, cultural e social, com controle social e sob a premissa
do desenvolvimento sustentável;
XII - logística reversa: instrumento de desenvolvimento econômico e social
caracterizado por um conjunto de ações, procedimentos e meios destinados a
viabilizar a coleta e a restituição dos resíduos sólidos ao setor empresarial, para
reaproveitamento, em seu ciclo ou em outros ciclos produtivos, ou outra destinação
final ambientalmente adequada;
XIII - padrões sustentáveis de produção e consumo: produção e consumo de
bens e serviços de forma a atender as necessidades das atuais gerações e permitir
melhores condições de vida, sem comprometer a qualidade ambiental e o atendimento
das necessidades das gerações futuras;
XIV - reciclagem: processo de transformação dos resíduos sólidos que envolve
a alteração de suas propriedades físicas, físico-químicas ou biológicas, com vistas à
transformação em insumos ou novos produtos, observadas as condições e os padrões
estabelecidos pelos órgãos competentes do Sisnama e, se couber, do SNVS e do
Suasa;
XV - rejeitos: resíduos sólidos que, depois de esgotadas todas as possibilidades
de tratamento e recuperação por processos tecnológicos disponíveis e
economicamente viáveis, não apresentem outra possibilidade que não a disposição
final ambientalmente adequada;
XVI - resíduos sólidos: material, substância, objeto ou bem descartado resultante
de atividades humanas em sociedade, a cuja destinação final se procede, se propõe
proceder ou se está obrigado a proceder, nos estados sólido ou semissólido, bem
como gases contidos em recipientes e líquidos cujas particularidades tornem inviável
o seu lançamento na rede pública de esgotos ou em corpos d’água, ou exijam para
isso soluções técnica ou economicamente inviáveis em face da melhor tecnologia
disponível;
XVII - responsabilidade compartilhada pelo ciclo de vida dos produtos: conjunto
de atribuições individualizadas e encadeadas dos fabricantes, importadores,
distribuidores e comerciantes, dos consumidores e dos titulares dos serviços públicos
de limpeza urbana e de manejo dos resíduos sólidos, para minimizar o volume de
resíduos sólidos e rejeitos gerados, bem como para reduzir os impactos causados à
saúde humana e à qualidade ambiental decorrentes do ciclo de vida dos produtos,
nos termos desta Lei;
XVIII - reutilização: processo de aproveitamento dos resíduos sólidos sem sua
transformação biológica, física ou físico-química, observadas as condições e os
padrões estabelecidos pelos órgãos competentes do Sisnama e, se couber, do SNVS
e do Suasa;
XIX - serviço público de limpeza urbana e de manejo de resíduos sólidos:
conjunto de atividades previstas no art. 7º da Lei nº 11.445, de 2007.
191
TÍTULO II
DA POLÍTICA NACIONAL DE RESÍDUOS SÓLIDOS
CAPÍTULO I
DISPOSIÇÕES GERAIS
Art. 4o A Política Nacional de Resíduos Sólidos reúne o conjunto de princípios,
objetivos, instrumentos, diretrizes, metas e ações adotados pelo Governo Federal,
isoladamente ou em regime de cooperação com Estados, Distrito Federal, Municípios
ou particulares, com vistas à gestão integrada e ao gerenciamento ambientalmente
adequado dos resíduos sólidos.
Art. 5o A Política Nacional de Resíduos Sólidos integra a Política Nacional do
Meio Ambiente e articula-se com a Política Nacional de Educação Ambiental, regulada
pela Lei no 9.795, de 27 de abril de 1999, com a Política Federal de Saneamento
Básico, regulada pela Lei nº 11.445, de 2007, e com a Lei n o 11.107, de 6 de abril de
2005.
CAPÍTULO II
DOS PRINCÍPIOS E OBJETIVOS
Art. 6o São princípios da Política Nacional de Resíduos Sólidos:
I - a prevenção e a precaução;
II - o poluidor-pagador e o protetor-recebedor;
III - a visão sistêmica, na gestão dos resíduos sólidos, que considere as variáveis
ambiental, social, cultural, econômica, tecnológica e de saúde pública;
IV - o desenvolvimento sustentável;
V - a ecoeficiência, mediante a compatibilização entre o fornecimento, a preços
competitivos, de bens e serviços qualificados que satisfaçam as necessidades
humanas e tragam qualidade de vida e a redução do impacto ambiental e do consumo
de recursos naturais a um nível, no mínimo, equivalente à capacidade de sustentação
estimada do planeta;
VI - a cooperação entre as diferentes esferas do poder público, o setor
empresarial e demais segmentos da sociedade;
VII - a responsabilidade compartilhada pelo ciclo de vida dos produtos;
VIII - o reconhecimento do resíduo sólido reutilizável e reciclável como um bem
econômico e de valor social, gerador de trabalho e renda e promotor de cidadania;
192
IX - o respeito às diversidades locais e regionais;
X - o direito da sociedade à informação e ao controle social;
XI - a razoabilidade e a proporcionalidade.
Art. 7o São objetivos da Política Nacional de Resíduos Sólidos:
I - proteção da saúde pública e da qualidade ambiental;
II - não geração, redução, reutilização, reciclagem e tratamento dos resíduos
sólidos, bem como disposição final ambientalmente adequada dos rejeitos;
III - estímulo à adoção de padrões sustentáveis de produção e consumo de bens
e serviços;
IV - adoção, desenvolvimento e aprimoramento de tecnologias limpas como
forma de minimizar impactos ambientais;
V - redução do volume e da periculosidade dos resíduos perigosos;
VI - incentivo à indústria da reciclagem, tendo em vista fomentar o uso de
matérias-primas e insumos derivados de materiais recicláveis e reciclados;
VII - gestão integrada de resíduos sólidos;
VIII - articulação entre as diferentes esferas do poder público, e destas com o
setor empresarial, com vistas à cooperação técnica e financeira para a gestão
integrada de resíduos sólidos;
IX - capacitação técnica continuada na área de resíduos sólidos;
X - regularidade, continuidade, funcionalidade e universalização da prestação
dos serviços públicos de limpeza urbana e de manejo de resíduos sólidos, com adoção
de mecanismos gerenciais e econômicos que assegurem a recuperação dos custos
dos serviços prestados, como forma de garantir sua sustentabilidade operacional e
financeira, observada a Lei nº 11.445, de 2007;
XI - prioridade, nas aquisições e contratações governamentais, para:
a) produtos reciclados e recicláveis;
b) bens, serviços e obras que considerem critérios compatíveis com padrões de
consumo social e ambientalmente sustentáveis;
XII - integração dos catadores de materiais reutilizáveis e recicláveis nas ações
que envolvam a responsabilidade compartilhada pelo ciclo de vida dos produtos;
XIII - estímulo à implementação da avaliação do ciclo de vida do produto;
193
XIV - incentivo ao desenvolvimento de sistemas de gestão ambiental e
empresarial voltados para a melhoria dos processos produtivos e ao reaproveitamento
dos resíduos sólidos, incluídos a recuperação e o aproveitamento energético;
XV - estímulo à rotulagem ambiental e ao consumo sustentável.
CAPÍTULO III
DOS INSTRUMENTOS
Art. 8o São instrumentos da Política Nacional de Resíduos Sólidos, entre outros:
I - os planos de resíduos sólidos;
II - os inventários e o sistema declaratório anual de resíduos sólidos;
III - a coleta seletiva, os sistemas de logística reversa e outras ferramentas
relacionadas à implementação da responsabilidade compartilhada pelo ciclo de vida
dos produtos;
IV - o incentivo à criação e ao desenvolvimento de cooperativas ou de outras
formas de associação de catadores de materiais reutilizáveis e recicláveis;
V - o monitoramento e a fiscalização ambiental, sanitária e agropecuária;
VI - a cooperação técnica e financeira entre os setores público e privado para o
desenvolvimento de pesquisas de novos produtos, métodos, processos e tecnologias
de gestão, reciclagem, reutilização, tratamento de resíduos e disposição final
ambientalmente adequada de rejeitos;
VII - a pesquisa científica e tecnológica;
VIII - a educação ambiental;
IX - os incentivos fiscais, financeiros e creditícios;
X - o Fundo Nacional do Meio Ambiente e o Fundo Nacional de Desenvolvimento
Científico e Tecnológico;
XI - o Sistema Nacional de Informações sobre a Gestão dos Resíduos Sólidos
(Sinir);
XII - o Sistema Nacional de Informações em Saneamento Básico (Sinisa);
XIII - os conselhos de meio ambiente e, no que couber, os de saúde;
XIV - os órgãos colegiados municipais destinados ao controle social dos serviços
de resíduos sólidos urbanos;
194
XV - o Cadastro Nacional de Operadores de Resíduos Perigosos;
XVI - os acordos setoriais;
XVII - no que couber, os instrumentos da Política Nacional de Meio Ambiente,
entre eles: a) os padrões de qualidade ambiental;
b) o Cadastro Técnico Federal de Atividades Potencialmente Poluidoras ou
Utilizadoras de Recursos Ambientais;
c) o Cadastro Técnico Federal de Atividades e Instrumentos de Defesa
Ambiental;
d) a avaliação de impactos ambientais;
e) o Sistema Nacional de Informação sobre Meio Ambiente (Sinima);
f) o licenciamento e a revisão de atividades efetiva ou potencialmente
poluidoras;
XVIII - os termos de compromisso e os termos de ajustamento de conduta; XIX
- o incentivo à adoção de consórcios ou de outras formas de cooperação entre os
entes federados, com vistas à elevação das escalas de aproveitamento e à redução
dos custos envolvidos.
TÍTULO III
DAS DIRETRIZES APLICÁVEIS AOS RESÍDUOS SÓLIDOS
CAPÍTULO I
DISPOSIÇÕES PRELIMINARES
Art. 9o Na gestão e gerenciamento de resíduos sólidos, deve ser observada a
seguinte ordem de prioridade: não geração, redução, reutilização, reciclagem,
tratamento dos resíduos sólidos e disposição final ambientalmente adequada dos
rejeitos.
§ 1o Poderão ser utilizadas tecnologias visando à recuperação energética dos
resíduos sólidos urbanos, desde que tenha sido comprovada sua viabilidade técnica
e ambiental e com a implantação de programa de monitoramento de emissão de gases
tóxicos aprovado pelo órgão ambiental.
§ 2o A Política Nacional de Resíduos Sólidos e as Políticas de Resíduos Sólidos
dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios serão compatíveis com o disposto
no caput e no § 1o deste artigo e com as demais diretrizes estabelecidas nesta Lei.
Art. 10. Incumbe ao Distrito Federal e aos Municípios a gestão integrada dos
resíduos sólidos gerados nos respectivos territórios, sem prejuízo das competências
195
de controle e fiscalização dos órgãos federais e estaduais do Sisnama, do SNVS e do
Suasa, bem como da responsabilidade do gerador pelo gerenciamento de resíduos,
consoante o estabelecido nesta Lei.
Art. 11. Observadas as diretrizes e demais determinações estabelecidas nesta
Lei e em seu regulamento, incumbe aos Estados:
I - promover a integração da organização, do planejamento e da execução das
funções públicas de interesse comum relacionadas à gestão dos resíduos sólidos nas
regiões metropolitanas, aglomerações urbanas e microrregiões, nos termos da lei
complementar estadual prevista no § 3º do art. 25 da Constituição Federal;
II - controlar e fiscalizar as atividades dos geradores sujeitas a licenciamento
ambiental pelo órgão estadual do Sisnama.
Parágrafo único. A atuação do Estado na forma do caput deve apoiar e priorizar
as iniciativas do Município de soluções consorciadas ou compartilhadas entre 2 (dois)
ou mais Municípios.
Art. 12. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios organizarão e
manterão, de forma conjunta, o Sistema Nacional de Informações sobre a Gestão dos
Resíduos Sólidos (Sinir), articulado com o Sinisa e o Sinima.
Parágrafo único. Incumbe aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios
fornecer ao órgão federal responsável pela coordenação do Sinir todas as
informações necessárias sobre os resíduos sob sua esfera de competência, na forma
e na periodicidade estabelecidas em regulamento.
Art. 13.
classificação:
Para os efeitos desta Lei, os resíduos sólidos têm a seguinte
I - quanto à origem:
a) resíduos domiciliares: os originários de atividades domésticas em residências
urbanas;
b) resíduos de limpeza urbana: os originários da varrição, limpeza de
logradouros e vias públicas e outros serviços de limpeza urbana;
c) resíduos sólidos urbanos: os englobados nas alíneas “a” e “b”;
d) resíduos de estabelecimentos comerciais e prestadores de serviços: os
gerados nessas atividades, excetuados os referidos nas alíneas “b”, “e”, “g”, “h” e “j”;
e) resíduos dos serviços públicos de saneamento básico: os gerados nessas
atividades, excetuados os referidos na alínea “c”;
f) resíduos industriais: os gerados nos processos produtivos e instalações
industriais;
196
g) resíduos de serviços de saúde: os gerados nos serviços de saúde, conforme
definido em regulamento ou em normas estabelecidas pelos órgãos do Sisnama e do
SNVS;
h) resíduos da construção civil: os gerados nas construções, reformas, reparos
e demolições de obras de construção civil, incluídos os resultantes da preparação e
escavação de terrenos para obras civis;
i) resíduos agrossilvopastoris: os gerados nas atividades agropecuárias e
silviculturais, incluídos os relacionados a insumos utilizados nessas atividades;
j) resíduos de serviços de transportes: os originários de portos, aeroportos,
terminais alfandegários, rodoviários e ferroviários e passagens de fronteira;
k) resíduos de mineração: os gerados na atividade de pesquisa, extração ou
beneficiamento de minérios;
II - quanto à periculosidade:
a) resíduos perigosos: aqueles que, em razão de suas características de
inflamabilidade,
corrosividade,
reatividade,
toxicidade,
patogenicidade,
carcinogenicidade, teratogenicidade e mutagenicidade, apresentam significativo risco
à saúde pública ou à qualidade ambiental, de acordo com lei, regulamento ou norma
técnica;
b) resíduos não perigosos: aqueles não enquadrados na alínea “a”.
Parágrafo único. Respeitado o disposto no art. 20, os resíduos referidos na
alínea “d” do inciso I do caput, se caracterizados como não perigosos, podem, em
razão de sua natureza, composição ou volume, ser equiparados aos resíduos
domiciliares pelo poder público municipal.
CAPÍTULO II
DOS PLANOS DE RESÍDUOS SÓLIDOS
Seção I
Disposições Gerais
Art. 14. São planos de resíduos sólidos:
I - o Plano Nacional de Resíduos Sólidos;
II - os planos estaduais de resíduos sólidos;
III - os planos microrregionais de resíduos sólidos e os planos de resíduos
sólidos de regiões metropolitanas ou aglomerações urbanas;
197
IV - os planos intermunicipais de resíduos sólidos;
V - os planos municipais de gestão integrada de resíduos sólidos;
VI - os planos de gerenciamento de resíduos sólidos.
Parágrafo único. É assegurada ampla publicidade ao conteúdo dos planos de
resíduos sólidos, bem como controle social em sua formulação, implementação e
operacionalização, observado o disposto na Lei no 10.650, de 16 de abril de 2003, e
no art. 47 da Lei nº 11.445, de 2007.
Seção II
Do Plano Nacional de Resíduos Sólidos
Art. 15. A União elaborará, sob a coordenação do Ministério do Meio Ambiente,
o Plano Nacional de Resíduos Sólidos, com vigência por prazo indeterminado e
horizonte de 20 (vinte) anos, a ser atualizado a cada 4 (quatro) anos, tendo como
conteúdo mínimo:
I - diagnóstico da situação atual dos resíduos sólidos;
II - proposição
macroeconômicas;
de
cenários,
incluindo
tendências
internacionais
e
III - metas de redução, reutilização, reciclagem, entre outras, com vistas a reduzir
a quantidade de resíduos e rejeitos encaminhados para disposição final
ambientalmente adequada;
IV - metas para o aproveitamento energético dos gases gerados nas unidades
de disposição final de resíduos sólidos;
V - metas para a eliminação e recuperação de lixões, associadas à inclusão
social e à emancipação econômica de catadores de materiais reutilizáveis e
recicláveis;
VI - programas, projetos e ações para o atendimento das metas previstas;
VII - normas e condicionantes técnicas para o acesso a recursos da União, para
a obtenção de seu aval ou para o acesso a recursos administrados, direta ou
indiretamente, por entidade federal, quando destinados a ações e programas de
interesse dos resíduos sólidos;
VIII - medidas para incentivar e viabilizar a gestão regionalizada dos resíduos
sólidos;
IX - diretrizes para o planejamento e demais atividades de gestão de resíduos
sólidos das regiões integradas de desenvolvimento instituídas por lei complementar,
bem como para as áreas de especial interesse turístico;
198
X - normas e diretrizes para a disposição final de rejeitos e, quando couber, de
resíduos;
XI - meios a serem utilizados para o controle e a fiscalização, no âmbito nacional,
de sua implementação e operacionalização, assegurado o controle social.
Parágrafo único. O Plano Nacional de Resíduos Sólidos será elaborado
mediante processo de mobilização e participação social, incluindo a realização de
audiências e consultas públicas.
Seção III
Dos Planos Estaduais de Resíduos Sólidos
Art. 16. A elaboração de plano estadual de resíduos sólidos, nos termos
previstos por esta Lei, é condição para os Estados terem acesso a recursos da União,
ou por ela controlados, destinados a empreendimentos e serviços relacionados à
gestão de resíduos sólidos, ou para serem beneficiados por incentivos ou
financiamentos de entidades federais de crédito ou fomento para tal
finalidade. (Vigência)
§ 1o Serão priorizados no acesso aos recursos da União referidos no caput os
Estados que instituírem microrregiões, consoante o § 3o do art. 25 da Constituição
Federal, para integrar a organização, o planejamento e a execução das ações a cargo
de Municípios limítrofes na gestão dos resíduos sólidos.
§ 2o Serão estabelecidas em regulamento normas complementares sobre o
acesso aos recursos da União na forma deste artigo.
§ 3o Respeitada a responsabilidade dos geradores nos termos desta Lei, as
microrregiões instituídas conforme previsto no § 1o abrangem atividades de coleta
seletiva, recuperação e reciclagem, tratamento e destinação final dos resíduos sólidos
urbanos, a gestão de resíduos de construção civil, de serviços de transporte, de
serviços de saúde, agrossilvopastoris ou outros resíduos, de acordo com as
peculiaridades microrregionais.
Art. 17. O plano estadual de resíduos sólidos será elaborado para vigência por
prazo indeterminado, abrangendo todo o território do Estado, com horizonte de
atuação de 20 (vinte) anos e revisões a cada 4 (quatro) anos, e tendo como conteúdo
mínimo:
I - diagnóstico, incluída a identificação dos principais fluxos de resíduos no
Estado e seus impactos socioeconômicos e ambientais;
II - proposição de cenários;
III - metas de redução, reutilização, reciclagem, entre outras, com vistas a reduzir
a quantidade de resíduos e rejeitos encaminhados para disposição final
ambientalmente adequada;
199
IV - metas para o aproveitamento energético dos gases gerados nas unidades
de disposição final de resíduos sólidos;
V - metas para a eliminação e recuperação de lixões, associadas à inclusão
social e à emancipação econômica de catadores de materiais reutilizáveis e
recicláveis;
VI - programas, projetos e ações para o atendimento das metas previstas;
VII - normas e condicionantes técnicas para o acesso a recursos do Estado, para
a obtenção de seu aval ou para o acesso de recursos administrados, direta ou
indiretamente, por entidade estadual, quando destinados às ações e programas de
interesse dos resíduos sólidos;
VIII - medidas para incentivar e viabilizar a gestão consorciada ou compartilhada
dos resíduos sólidos;
IX - diretrizes para o planejamento e demais atividades de gestão de resíduos
sólidos de regiões metropolitanas, aglomerações urbanas e microrregiões;
X - normas e diretrizes para a disposição final de rejeitos e, quando couber, de
resíduos, respeitadas as disposições estabelecidas em âmbito nacional;
XI - previsão, em conformidade com os demais instrumentos de planejamento
territorial, especialmente o zoneamento ecológico-econômico e o zoneamento
costeiro, de:
a) zonas favoráveis para a localização de unidades de tratamento de resíduos
sólidos ou de disposição final de rejeitos;
b) áreas degradadas em razão de disposição inadequada de resíduos sólidos
ou rejeitos a serem objeto de recuperação ambiental;
XII - meios a serem utilizados para o controle e a fiscalização, no âmbito
estadual, de sua implementação e operacionalização, assegurado o controle social.
§ 1o Além do plano estadual de resíduos sólidos, os Estados poderão elaborar
planos microrregionais de resíduos sólidos, bem como planos específicos
direcionados às regiões metropolitanas ou às aglomerações urbanas.
§ 2o A elaboração e a implementação pelos Estados de planos microrregionais
de resíduos sólidos, ou de planos de regiões metropolitanas ou aglomerações
urbanas, em consonância com o previsto no § 1 o, dar-se-ão obrigatoriamente com a
participação dos Municípios envolvidos e não excluem nem substituem qualquer das
prerrogativas a cargo dos Municípios previstas por esta Lei.
§ 3o Respeitada a responsabilidade dos geradores nos termos desta Lei, o plano
microrregional de resíduos sólidos deve atender ao previsto para o plano estadual e
estabelecer soluções integradas para a coleta seletiva, a recuperação e a reciclagem,
200
o tratamento e a destinação final dos resíduos sólidos urbanos e, consideradas as
peculiaridades microrregionais, outros tipos de resíduos.
Seção IV
Dos Planos Municipais de Gestão Integrada de Resíduos Sólidos
Art. 18. A elaboração de plano municipal de gestão integrada de resíduos
sólidos, nos termos previstos por esta Lei, é condição para o Distrito Federal e os
Municípios terem acesso a recursos da União, ou por ela controlados, destinados a
empreendimentos e serviços relacionados à limpeza urbana e ao manejo de resíduos
sólidos, ou para serem beneficiados por incentivos ou financiamentos de entidades
federais de crédito ou fomento para tal finalidade. (Vigência)
§ 1o Serão priorizados no acesso aos recursos da União referidos no caput os
Municípios que:
I - optarem por soluções consorciadas intermunicipais para a gestão dos
resíduos sólidos, incluída a elaboração e implementação de plano intermunicipal, ou
que se inserirem de forma voluntária nos planos microrregionais de resíduos sólidos
referidos no § 1o do art. 16;
II - implantarem a coleta seletiva com a participação de cooperativas ou outras
formas de associação de catadores de materiais reutilizáveis e recicláveis formadas
por pessoas físicas de baixa renda.
§ 2o Serão estabelecidas em regulamento normas complementares sobre o
acesso aos recursos da União na forma deste artigo.
Art. 19. O plano municipal de gestão integrada de resíduos sólidos tem o
seguinte conteúdo mínimo:
I - diagnóstico da situação dos resíduos sólidos gerados no respectivo território,
contendo a origem, o volume, a caracterização dos resíduos e as formas de
destinação e disposição final adotadas;
II - identificação de áreas favoráveis para disposição final ambientalmente
adequada de rejeitos, observado o plano diretor de que trata o § 1o do art. 182 da
Constituição Federal e o zoneamento ambiental, se houver;
III - identificação das possibilidades de implantação de soluções consorciadas
ou compartilhadas com outros Municípios, considerando, nos critérios de economia
de escala, a proximidade dos locais estabelecidos e as formas de prevenção dos
riscos ambientais;
IV - identificação dos resíduos sólidos e dos geradores sujeitos a plano de
gerenciamento específico nos termos do art. 20 ou a sistema de logística reversa na
forma do art. 33, observadas as disposições desta Lei e de seu regulamento, bem
como as normas estabelecidas pelos órgãos do Sisnama e do SNVS;
201
V - procedimentos operacionais e especificações mínimas a serem adotados nos
serviços públicos de limpeza urbana e de manejo de resíduos sólidos, incluída a
disposição final ambientalmente adequada dos rejeitos e observada a Lei nº 11.445,
de 2007;
VI - indicadores de desempenho operacional e ambiental dos serviços públicos
de limpeza urbana e de manejo de resíduos sólidos;
VII - regras para o transporte e outras etapas do gerenciamento de resíduos
sólidos de que trata o art. 20, observadas as normas estabelecidas pelos órgãos do
Sisnama e do SNVS e demais disposições pertinentes da legislação federal e
estadual;
VIII - definição das responsabilidades quanto à sua implementação e
operacionalização, incluídas as etapas do plano de gerenciamento de resíduos sólidos
a que se refere o art. 20 a cargo do poder público;
IX - programas e ações de capacitação técnica voltados para sua
implementação e operacionalização;
X - programas e ações de educação ambiental que promovam a não geração, a
redução, a reutilização e a reciclagem de resíduos sólidos;
XI - programas e ações para a participação dos grupos interessados, em
especial das cooperativas ou outras formas de associação de catadores de materiais
reutilizáveis e recicláveis formadas por pessoas físicas de baixa renda, se houver;
XII - mecanismos para a criação de fontes de negócios, emprego e renda,
mediante a valorização dos resíduos sólidos;
XIII - sistema de cálculo dos custos da prestação dos serviços públicos de
limpeza urbana e de manejo de resíduos sólidos, bem como a forma de cobrança
desses serviços, observada a Lei nº 11.445, de 2007;
XIV - metas de redução, reutilização, coleta seletiva e reciclagem, entre outras,
com vistas a reduzir a quantidade de rejeitos encaminhados para disposição final
ambientalmente adequada;
XV - descrição das formas e dos limites da participação do poder público local
na coleta seletiva e na logística reversa, respeitado o disposto no art. 33, e de outras
ações relativas à responsabilidade compartilhada pelo ciclo de vida dos produtos;
XVI - meios a serem utilizados para o controle e a fiscalização, no âmbito local,
da implementação e operacionalização dos planos de gerenciamento de resíduos
sólidos de que trata o art. 20 e dos sistemas de logística reversa previstos no art. 33;
XVII - ações preventivas e corretivas a serem praticadas, incluindo programa de
monitoramento;
202
XVIII - identificação dos passivos ambientais relacionados aos resíduos sólidos,
incluindo áreas contaminadas, e respectivas medidas saneadoras;
XIX - periodicidade de sua revisão, observado prioritariamente o período de
vigência do plano plurianual municipal.
§ 1o O plano municipal de gestão integrada de resíduos sólidos pode estar
inserido no plano de saneamento básico previsto no art. 19 da Lei nº 11.445, de 2007,
respeitado o conteúdo mínimo previsto nos incisos do capute observado o disposto
no § 2o, todos deste artigo.
§ 2o Para Municípios com menos de 20.000 (vinte mil) habitantes, o plano
municipal de gestão integrada de resíduos sólidos terá conteúdo simplificado, na
forma do regulamento.
§ 3o O disposto no § 2o não se aplica a Municípios:
I - integrantes de áreas de especial interesse turístico;
II - inseridos na área de influência de empreendimentos ou atividades com
significativo impacto ambiental de âmbito regional ou nacional;
III - cujo território abranja, total ou parcialmente, Unidades de Conservação.
§ 4o A existência de plano municipal de gestão integrada de resíduos sólidos
não exime o Município ou o Distrito Federal do licenciamento ambiental de aterros
sanitários e de outras infraestruturas e instalações operacionais integrantes do serviço
público de limpeza urbana e de manejo de resíduos sólidos pelo órgão competente do
Sisnama.
§ 5o Na definição de responsabilidades na forma do inciso VIII do caput deste
artigo, é vedado atribuir ao serviço público de limpeza urbana e de manejo de resíduos
sólidos a realização de etapas do gerenciamento dos resíduos a que se refere o art.
20 em desacordo com a respectiva licença ambiental ou com normas estabelecidas
pelos órgãos do Sisnama e, se couber, do SNVS.
§ 6o Além do disposto nos incisos I a XIX do caput deste artigo, o plano
municipal de gestão integrada de resíduos sólidos contemplará ações específicas a
serem desenvolvidas no âmbito dos órgãos da administração pública, com vistas à
utilização racional dos recursos ambientais, ao combate a todas as formas de
desperdício e à minimização da geração de resíduos sólidos.
§ 7o O conteúdo do plano municipal de gestão integrada de resíduos sólidos
será disponibilizado para o Sinir, na forma do regulamento.
§ 8o A inexistência do plano municipal de gestão integrada de resíduos sólidos
não pode ser utilizada para impedir a instalação ou a operação de empreendimentos
ou atividades devidamente licenciados pelos órgãos competentes.
203
§ 9o Nos termos do regulamento, o Município que optar por soluções
consorciadas intermunicipais para a gestão dos resíduos sólidos, assegurado que o
plano intermunicipal preencha os requisitos estabelecidos nos incisos I a XIX
do caput deste artigo, pode ser dispensado da elaboração de plano municipal de
gestão integrada de resíduos sólidos.
Seção V
Do Plano de Gerenciamento de Resíduos Sólidos
Art. 20. Estão sujeitos à elaboração de plano de gerenciamento de resíduos
sólidos:
I - os geradores de resíduos sólidos previstos nas alíneas “e”, “f”, “g” e “k” do
inciso I do art. 13;
II - os estabelecimentos comerciais e de prestação de serviços que:
a) gerem resíduos perigosos;
b) gerem resíduos que, mesmo caracterizados como não perigosos, por sua
natureza, composição ou volume, não sejam equiparados aos resíduos domiciliares
pelo poder público municipal;
III - as empresas de construção civil, nos termos do regulamento ou de normas
estabelecidas pelos órgãos do Sisnama;
IV - os responsáveis pelos terminais e outras instalações referidas na alínea “j”
do inciso I do art. 13 e, nos termos do regulamento ou de normas estabelecidas pelos
órgãos do Sisnama e, se couber, do SNVS, as empresas de transporte;
V - os responsáveis por atividades agrossilvopastoris, se exigido pelo órgão
competente do Sisnama, do SNVS ou do Suasa.
Parágrafo único. Observado o disposto no Capítulo IV deste Título, serão
estabelecidas por regulamento exigências específicas relativas ao plano de
gerenciamento de resíduos perigosos.
Art. 21. O plano de gerenciamento de resíduos sólidos tem o seguinte conteúdo
mínimo:
I - descrição do empreendimento ou atividade;
II - diagnóstico dos resíduos sólidos gerados ou administrados, contendo a
origem, o volume e a caracterização dos resíduos, incluindo os passivos ambientais a
eles relacionados;
III - observadas as normas estabelecidas pelos órgãos do Sisnama, do SNVS e
do Suasa e, se houver, o plano municipal de gestão integrada de resíduos sólidos:
204
a) explicitação dos responsáveis por cada etapa do gerenciamento de resíduos
sólidos;
b) definição dos procedimentos operacionais relativos às etapas do
gerenciamento de resíduos sólidos sob responsabilidade do gerador;
IV - identificação das soluções consorciadas ou compartilhadas com outros
geradores;
V - ações preventivas e corretivas a serem executadas em situações de
gerenciamento incorreto ou acidentes;
VI - metas e procedimentos relacionados à minimização da geração de resíduos
sólidos e, observadas as normas estabelecidas pelos órgãos do Sisnama, do SNVS e
do Suasa, à reutilização e reciclagem;
VII - se couber, ações relativas à responsabilidade compartilhada pelo ciclo de
vida dos produtos, na forma do art. 31;
VIII - medidas saneadoras dos passivos ambientais relacionados aos resíduos
sólidos;
IX - periodicidade de sua revisão, observado, se couber, o prazo de vigência da
respectiva licença de operação a cargo dos órgãos do Sisnama.
§ 1o O plano de gerenciamento de resíduos sólidos atenderá ao disposto no
plano municipal de gestão integrada de resíduos sólidos do respectivo Município, sem
prejuízo das normas estabelecidas pelos órgãos do Sisnama, do SNVS e do Suasa.
§ 2o A inexistência do plano municipal de gestão integrada de resíduos sólidos
não obsta a elaboração, a implementação ou a operacionalização do plano de
gerenciamento de resíduos sólidos.
§ 3o Serão estabelecidos em regulamento:
I - normas sobre a exigibilidade e o conteúdo do plano de gerenciamento de
resíduos sólidos relativo à atuação de cooperativas ou de outras formas de associação
de catadores de materiais reutilizáveis e recicláveis;
II - critérios e procedimentos simplificados para apresentação dos planos de
gerenciamento de resíduos sólidos para microempresas e empresas de pequeno
porte, assim consideradas as definidas nos incisos I e II do art. 3o da Lei
Complementar n o 123, de 14 de dezembro de 2006, desde que as atividades por elas
desenvolvidas não gerem resíduos perigosos.
Art. 22. Para a elaboração, implementação, operacionalização e monitoramento
de todas as etapas do plano de gerenciamento de resíduos sólidos, nelas incluído o
controle da disposição final ambientalmente adequada dos rejeitos, será designado
responsável técnico devidamente habilitado.
205
Art. 23. Os responsáveis por plano de gerenciamento de resíduos sólidos
manterão atualizadas e disponíveis ao órgão municipal competente, ao órgão
licenciador do Sisnama e a outras autoridades, informações completas sobre a
implementação e a operacionalização do plano sob sua responsabilidade.
§ 1o Para a consecução do disposto no caput, sem prejuízo de outras
exigências cabíveis por parte das autoridades, será implementado sistema
declaratório com periodicidade, no mínimo, anual, na forma do regulamento.
§ 2o As informações referidas no caput serão repassadas pelos órgãos públicos
ao Sinir, na forma do regulamento.
Art. 24. O plano de gerenciamento de resíduos sólidos é parte integrante do
processo de licenciamento ambiental do empreendimento ou atividade pelo órgão
competente do Sisnama.
§ 1o Nos empreendimentos e atividades não sujeitos a licenciamento ambiental,
a aprovação do plano de gerenciamento de resíduos sólidos cabe à autoridade
municipal competente.
§ 2o No processo de licenciamento ambiental referido no § 1 o a cargo de órgão
federal ou estadual do Sisnama, será assegurada oitiva do órgão municipal
competente, em especial quanto à disposição final ambientalmente adequada de
rejeitos.
CAPÍTULO III
DAS RESPONSABILIDADES DOS GERADORES E DO PODER PÚBLICO
Seção I
Disposições Gerais
Art. 25. O poder público, o setor empresarial e a coletividade são responsáveis
pela efetividade das ações voltadas para assegurar a observância da Política Nacional
de Resíduos Sólidos e das diretrizes e demais determinações estabelecidas nesta Lei
e em seu regulamento.
Art. 26. O titular dos serviços públicos de limpeza urbana e de manejo de
resíduos sólidos é responsável pela organização e prestação direta ou indireta desses
serviços, observados o respectivo plano municipal de gestão integrada de resíduos
sólidos, a Lei nº 11.445, de 2007, e as disposições desta Lei e seu regulamento.
Art. 27. As pessoas físicas ou jurídicas referidas no art. 20 são responsáveis
pela implementação e operacionalização integral do plano de gerenciamento de
resíduos sólidos aprovado pelo órgão competente na forma do art. 24.
§ 1o A contratação de serviços de coleta, armazenamento, transporte,
transbordo, tratamento ou destinação final de resíduos sólidos, ou de disposição final
206
de rejeitos, não isenta as pessoas físicas ou jurídicas referidas no art. 20 da
responsabilidade por danos que vierem a ser provocados pelo gerenciamento
inadequado dos respectivos resíduos ou rejeitos.
§ 2o Nos casos abrangidos pelo art. 20, as etapas sob responsabilidade do
gerador que forem realizadas pelo poder público serão devidamente remuneradas
pelas pessoas físicas ou jurídicas responsáveis, observado o disposto no § 5o do art.
19.
Art. 28. O gerador de resíduos sólidos domiciliares tem cessada sua
responsabilidade pelos resíduos com a disponibilização adequada para a coleta ou,
nos casos abrangidos pelo art. 33, com a devolução.
Art. 29. Cabe ao poder público atuar, subsidiariamente, com vistas a minimizar
ou cessar o dano, logo que tome conhecimento de evento lesivo ao meio ambiente ou
à saúde pública relacionado ao gerenciamento de resíduos sólidos.
Parágrafo único. Os responsáveis pelo dano ressarcirão integralmente o poder
público pelos gastos decorrentes das ações empreendidas na forma do caput.
Seção II
Da Responsabilidade Compartilhada
Art. 30. É instituída a responsabilidade compartilhada pelo ciclo de vida dos
produtos, a ser implementada de forma individualizada e encadeada, abrangendo os
fabricantes, importadores, distribuidores e comerciantes, os consumidores e os
titulares dos serviços públicos de limpeza urbana e de manejo de resíduos sólidos,
consoante as atribuições e procedimentos previstos nesta Seção.
Parágrafo único. A responsabilidade compartilhada pelo ciclo de vida dos
produtos tem por objetivo:
I - compatibilizar interesses entre os agentes econômicos e sociais e os
processos de gestão empresarial e mercadológica com os de gestão ambiental,
desenvolvendo estratégias sustentáveis;
II - promover o aproveitamento de resíduos sólidos, direcionando-os para a sua
cadeia produtiva ou para outras cadeias produtivas;
III - reduzir a geração de resíduos sólidos, o desperdício de materiais, a poluição
e os danos ambientais;
IV - incentivar a utilização de insumos de menor agressividade ao meio ambiente
e de maior sustentabilidade;
V - estimular o desenvolvimento de mercado, a produção e o consumo de
produtos derivados de materiais reciclados e recicláveis;
207
VI - propiciar
sustentabilidade;
que
as
atividades
produtivas
alcancem
eficiência
e
VII - incentivar as boas práticas de responsabilidade socioambiental.
Art. 31. Sem prejuízo das obrigações estabelecidas no plano de gerenciamento
de resíduos sólidos e com vistas a fortalecer a responsabilidade compartilhada e seus
objetivos, os fabricantes, importadores, distribuidores e comerciantes têm
responsabilidade que abrange:
I - investimento no desenvolvimento, na fabricação e na colocação no mercado
de produtos:
a) que sejam aptos, após o uso pelo consumidor, à reutilização, à reciclagem ou
a outra forma de destinação ambientalmente adequada;
b) cuja fabricação e uso gerem a menor quantidade de resíduos sólidos
possível;
II - divulgação de informações relativas às formas de evitar, reciclar e eliminar
os resíduos sólidos associados a seus respectivos produtos;
III - recolhimento dos produtos e dos resíduos remanescentes após o uso, assim
como sua subsequente destinação final ambientalmente adequada, no caso de
produtos objeto de sistema de logística reversa na forma do art. 33;
IV - compromisso de, quando firmados acordos ou termos de compromisso com
o Município, participar das ações previstas no plano municipal de gestão integrada de
resíduos sólidos, no caso de produtos ainda não inclusos no sistema de logística
reversa.
Art. 32. As embalagens devem ser fabricadas com materiais que propiciem a
reutilização ou a reciclagem.
§ 1o Cabe aos respectivos responsáveis assegurar que as embalagens sejam:
I - restritas em volume e peso às dimensões requeridas à proteção do conteúdo
e à comercialização do produto;
II - projetadas de forma a serem reutilizadas de maneira tecnicamente viável e
compatível com as exigências aplicáveis ao produto que contêm;
III - recicladas, se a reutilização não for possível.
§ 2o O regulamento disporá sobre os casos em que, por razões de ordem técnica
ou econômica, não seja viável a aplicação do disposto no caput.
§ 3o É responsável pelo atendimento do disposto neste artigo todo aquele que:
208
I - manufatura embalagens ou fornece materiais para a fabricação de
embalagens;
II - coloca em circulação embalagens, materiais para a fabricação de
embalagens ou produtos embalados, em qualquer fase da cadeia de comércio.
Art. 33. São obrigados a estruturar e implementar sistemas de logística reversa,
mediante retorno dos produtos após o uso pelo consumidor, de forma independente
do serviço público de limpeza urbana e de manejo dos resíduos sólidos, os
fabricantes, importadores, distribuidores e comerciantes de:
I - agrotóxicos, seus resíduos e embalagens, assim como outros produtos cuja
embalagem, após o uso, constitua resíduo perigoso, observadas as regras de
gerenciamento de resíduos perigosos previstas em lei ou regulamento, em normas
estabelecidas pelos órgãos do Sisnama, do SNVS e do Suasa, ou em normas
técnicas;
II - pilhas e baterias;
III - pneus;
IV - óleos lubrificantes, seus resíduos e embalagens;
V - lâmpadas fluorescentes, de vapor de sódio e mercúrio e de luz mista;
VI - produtos eletroeletrônicos e seus componentes.
§ 1o Na forma do disposto em regulamento ou em acordos setoriais e termos de
compromisso firmados entre o poder público e o setor empresarial, os sistemas
previstos no caput serão estendidos a produtos comercializados em embalagens
plásticas, metálicas ou de vidro, e aos demais produtos e embalagens, considerando,
prioritariamente, o grau e a extensão do impacto à saúde pública e ao meio ambiente
dos resíduos gerados.
§ 2o A definição dos produtos e embalagens a que se refere o § 1 o considerará
a viabilidade técnica e econômica da logística reversa, bem como o grau e a extensão
do impacto à saúde pública e ao meio ambiente dos resíduos gerados.
§ 3o Sem prejuízo de exigências específicas fixadas em lei ou regulamento, em
normas estabelecidas pelos órgãos do Sisnama e do SNVS, ou em acordos setoriais
e termos de compromisso firmados entre o poder público e o setor empresarial, cabe
aos fabricantes, importadores, distribuidores e comerciantes dos produtos a que se
referem os incisos II, III, V e VI ou dos produtos e embalagens a que se referem os
incisos I e IV do caput e o § 1o tomar todas as medidas necessárias para assegurar
a implementação e operacionalização do sistema de logística reversa sob seu
encargo, consoante o estabelecido neste artigo, podendo, entre outras medidas:
I - implantar procedimentos de compra de produtos ou embalagens usados;
209
II - disponibilizar postos de entrega de resíduos reutilizáveis e recicláveis;
III - atuar em parceria com cooperativas ou outras formas de associação de
catadores de materiais reutilizáveis e recicláveis, nos casos de que trata o § 1 o.
§ 4o Os consumidores deverão efetuar a devolução após o uso, aos
comerciantes ou distribuidores, dos produtos e das embalagens a que se referem os
incisos I a VI do caput, e de outros produtos ou embalagens objeto de logística
reversa, na forma do § 1o.
§ 5o Os comerciantes e distribuidores deverão efetuar a devolução aos
fabricantes ou aos importadores dos produtos e embalagens reunidos ou devolvidos
na forma dos §§ 3o e 4o.
§ 6o Os fabricantes e os importadores darão destinação ambientalmente
adequada aos produtos e às embalagens reunidos ou devolvidos, sendo o rejeito
encaminhado para a disposição final ambientalmente adequada, na forma
estabelecida pelo órgão competente do Sisnama e, se houver, pelo plano municipal
de gestão integrada de resíduos sólidos.
§ 7o Se o titular do serviço público de limpeza urbana e de manejo de resíduos
sólidos, por acordo setorial ou termo de compromisso firmado com o setor
empresarial, encarregar-se de atividades de responsabilidade dos fabricantes,
importadores, distribuidores e comerciantes nos sistemas de logística reversa dos
produtos e embalagens a que se refere este artigo, as ações do poder público serão
devidamente remuneradas, na forma previamente acordada entre as partes.
§ 8o Com exceção dos consumidores, todos os participantes dos sistemas de
logística reversa manterão atualizadas e disponíveis ao órgão municipal competente
e a outras autoridades informações completas sobre a realização das ações sob sua
responsabilidade.
Art. 34. Os acordos setoriais ou termos de compromisso referidos no inciso IV
do caput do art. 31 e no § 1o do art. 33 podem ter abrangência nacional, regional,
estadual ou municipal.
§ 1o Os acordos setoriais e termos de compromisso firmados em âmbito
nacional têm prevalência sobre os firmados em âmbito regional ou estadual, e estes
sobre os firmados em âmbito municipal.
§ 2o Na aplicação de regras concorrentes consoante o § 1 o, os acordos firmados
com menor abrangência geográfica podem ampliar, mas não abrandar, as medidas
de proteção ambiental constantes nos acordos setoriais e termos de compromisso
firmados com maior abrangência geográfica.
Art. 35. Sempre que estabelecido sistema de coleta seletiva pelo plano
municipal de gestão integrada de resíduos sólidos e na aplicação do art. 33, os
consumidores são obrigados a:
210
I - acondicionar adequadamente e de forma diferenciada os resíduos sólidos
gerados;
II - disponibilizar adequadamente os resíduos sólidos reutilizáveis e recicláveis
para coleta ou devolução.
Parágrafo único. O poder público municipal pode instituir incentivos econômicos
aos consumidores que participam do sistema de coleta seletiva referido no caput, na
forma de lei municipal.
Art. 36. No âmbito da responsabilidade compartilhada pelo ciclo de vida dos
produtos, cabe ao titular dos serviços públicos de limpeza urbana e de manejo de
resíduos sólidos, observado, se houver, o plano municipal de gestão integrada de
resíduos sólidos:
I - adotar procedimentos para reaproveitar os resíduos sólidos reutilizáveis e
recicláveis oriundos dos serviços públicos de limpeza urbana e de manejo de resíduos
sólidos;
II - estabelecer sistema de coleta seletiva;
III - articular com os agentes econômicos e sociais medidas para viabilizar o
retorno ao ciclo produtivo dos resíduos sólidos reutilizáveis e recicláveis oriundos dos
serviços de limpeza urbana e de manejo de resíduos sólidos;
IV - realizar as atividades definidas por acordo setorial ou termo de compromisso
na forma do § 7o do art. 33, mediante a devida remuneração pelo setor empresarial;
V - implantar sistema de compostagem para resíduos sólidos orgânicos e
articular com os agentes econômicos e sociais formas de utilização do composto
produzido;
VI - dar disposição final ambientalmente adequada aos resíduos e rejeitos
oriundos dos serviços públicos de limpeza urbana e de manejo de resíduos sólidos.
§ 1o Para o cumprimento do disposto nos incisos I a IV do caput, o titular dos
serviços públicos de limpeza urbana e de manejo de resíduos sólidos priorizará a
organização e o funcionamento de cooperativas ou de outras formas de associação
de catadores de materiais reutilizáveis e recicláveis formadas por pessoas físicas de
baixa renda, bem como sua contratação.
§ 2o A contratação prevista no § 1o é dispensável de licitação, nos termos
do inciso XXVII do art. 24 da Lei no 8.666, de 21 de junho de 1993.
CAPÍTULO IV
DOS RESÍDUOS PERIGOSOS
211
Art. 37. A instalação e o funcionamento de empreendimento ou atividade que
gere ou opere com resíduos perigosos somente podem ser autorizados ou licenciados
pelas autoridades competentes se o responsável comprovar, no mínimo, capacidade
técnica e econômica, além de condições para prover os cuidados necessários ao
gerenciamento desses resíduos.
Art. 38. As pessoas jurídicas que operam com resíduos perigosos, em qualquer
fase do seu gerenciamento, são obrigadas a se cadastrar no Cadastro Nacional de
Operadores de Resíduos Perigosos.
§ 1o O cadastro previsto no caput será coordenado pelo órgão federal
competente do Sisnama e implantado de forma conjunta pelas autoridades federais,
estaduais e municipais.
§ 2o Para o cadastramento, as pessoas jurídicas referidas no caput necessitam
contar com responsável técnico pelo gerenciamento dos resíduos perigosos, de seu
próprio quadro de funcionários ou contratado, devidamente habilitado, cujos dados
serão mantidos atualizados no cadastro.
§ 3o O cadastro a que se refere o caput é parte integrante do Cadastro Técnico
Federal de Atividades Potencialmente Poluidoras ou Utilizadoras de Recursos
Ambientais e do Sistema de Informações previsto no art. 12.
Art. 39. As pessoas jurídicas referidas no art. 38 são obrigadas a elaborar plano
de gerenciamento de resíduos perigosos e submetê-lo ao órgão competente do
Sisnama e, se couber, do SNVS, observado o conteúdo mínimo estabelecido no art.
21 e demais exigências previstas em regulamento ou em normas técnicas.
§ 1o O plano de gerenciamento de resíduos perigosos a que se refere
o caput poderá estar inserido no plano de gerenciamento de resíduos a que se refere
o art. 20.
§ 2o Cabe às pessoas jurídicas referidas no art. 38:
I - manter registro atualizado e facilmente acessível de todos os procedimentos
relacionados à implementação e à operacionalização do plano previsto no caput;
II - informar anualmente ao órgão competente do Sisnama e, se couber, do
SNVS, sobre a quantidade, a natureza e a destinação temporária ou final dos resíduos
sob sua responsabilidade;
III - adotar medidas destinadas a reduzir o volume e a periculosidade dos
resíduos sob sua responsabilidade, bem como a aperfeiçoar seu gerenciamento;
IV - informar imediatamente aos órgãos competentes sobre a ocorrência de
acidentes ou outros sinistros relacionados aos resíduos perigosos.
§ 3o Sempre que solicitado pelos órgãos competentes do Sisnama e do SNVS,
será assegurado acesso para inspeção das instalações e dos procedimentos
212
relacionados à implementação e à operacionalização do plano de gerenciamento de
resíduos perigosos.
§ 4o No caso de controle a cargo de órgão federal ou estadual do Sisnama e do
SNVS, as informações sobre o conteúdo, a implementação e a operacionalização do
plano previsto no caput serão repassadas ao poder público municipal, na forma do
regulamento.
Art. 40. No licenciamento ambiental de empreendimentos ou atividades que
operem com resíduos perigosos, o órgão licenciador do Sisnama pode exigir a
contratação de seguro de responsabilidade civil por danos causados ao meio
ambiente ou à saúde pública, observadas as regras sobre cobertura e os limites
máximos de contratação fixados em regulamento.
Parágrafo único.
conforme regulamento.
O disposto no caput considerará o porte da empresa,
Art. 41. Sem prejuízo das iniciativas de outras esferas governamentais, o
Governo Federal deve estruturar e manter instrumentos e atividades voltados para
promover a descontaminação de áreas órfãs.
Parágrafo único. Se, após descontaminação de sítio órfão realizada com
recursos do Governo Federal ou de outro ente da Federação, forem identificados os
responsáveis pela contaminação, estes ressarcirão integralmente o valor empregado
ao poder público.
CAPÍTULO V
DOS INSTRUMENTOS ECONÔMICOS
Art. 42. O poder público poderá instituir medidas indutoras e linhas de
financiamento para atender, prioritariamente, às iniciativas de:
I - prevenção e redução da geração de resíduos sólidos no processo produtivo;
II - desenvolvimento de produtos com menores impactos à saúde humana e à
qualidade ambiental em seu ciclo de vida;
III - implantação de infraestrutura física e aquisição de equipamentos para
cooperativas ou outras formas de associação de catadores de materiais reutilizáveis
e recicláveis formadas por pessoas físicas de baixa renda;
IV - desenvolvimento de projetos de gestão dos resíduos sólidos de caráter
intermunicipal ou, nos termos do inciso I do caput do art. 11, regional;
V - estruturação de sistemas de coleta seletiva e de logística reversa;
VI - descontaminação de áreas contaminadas, incluindo as áreas órfãs;
213
VII - desenvolvimento de pesquisas voltadas para tecnologias limpas aplicáveis
aos resíduos sólidos;
VIII - desenvolvimento de sistemas de gestão ambiental e empresarial voltados
para a melhoria dos processos produtivos e ao reaproveitamento dos resíduos.
Art. 43. No fomento ou na concessão de incentivos creditícios destinados a
atender diretrizes desta Lei, as instituições oficiais de crédito podem estabelecer
critérios diferenciados de acesso dos beneficiários aos créditos do Sistema Financeiro
Nacional para investimentos produtivos.
Art. 44. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, no âmbito de
suas competências, poderão instituir normas com o objetivo de conceder incentivos
fiscais, financeiros ou creditícios, respeitadas as limitações da Lei Complementar
no 101, de 4 de maio de 2000 (Lei de Responsabilidade Fiscal), a:
I - indústrias e entidades dedicadas à reutilização, ao tratamento e à reciclagem
de resíduos sólidos produzidos no território nacional;
II - projetos relacionados à responsabilidade pelo ciclo de vida dos produtos,
prioritariamente em parceria com cooperativas ou outras formas de associação de
catadores de materiais reutilizáveis e recicláveis formadas por pessoas físicas de
baixa renda;
III - empresas dedicadas à limpeza urbana e a atividades a ela relacionadas.
Art. 45. Os consórcios públicos constituídos, nos termos da Lei no 11.107, de
2005, com o objetivo de viabilizar a descentralização e a prestação de serviços
públicos que envolvam resíduos sólidos, têm prioridade na obtenção dos incentivos
instituídos pelo Governo Federal.
Art. 46. O atendimento ao disposto neste Capítulo será efetivado em
consonância com a Lei Complementar nº 101, de 2000 (Lei de Responsabilidade
Fiscal), bem como com as diretrizes e objetivos do respectivo plano plurianual, as
metas e as prioridades fixadas pelas leis de diretrizes orçamentárias e no limite das
disponibilidades propiciadas pelas leis orçamentárias anuais.
CAPÍTULO VI
DAS PROIBIÇÕES
Art. 47. São proibidas as seguintes formas de destinação ou disposição final de
resíduos sólidos ou rejeitos:
I - lançamento em praias, no mar ou em quaisquer corpos hídricos;
II - lançamento in natura a céu aberto, excetuados os resíduos de mineração;
214
III - queima a céu aberto ou em recipientes, instalações e equipamentos não
licenciados para essa finalidade;
IV - outras formas vedadas pelo poder público.
§ 1o Quando decretada emergência sanitária, a queima de resíduos a céu aberto
pode ser realizada, desde que autorizada e acompanhada pelos órgãos competentes
do Sisnama, do SNVS e, quando couber, do Suasa.
§ 2o Assegurada a devida impermeabilização, as bacias de decantação de
resíduos ou rejeitos industriais ou de mineração, devidamente licenciadas pelo órgão
competente do Sisnama, não são consideradas corpos hídricos para efeitos do
disposto no inciso I do caput.
Art. 48. São proibidas, nas áreas de disposição final de resíduos ou rejeitos, as
seguintes atividades:
I - utilização dos rejeitos dispostos como alimentação;
II - catação, observado o disposto no inciso V do art. 17;
III - criação de animais domésticos;
IV - fixação de habitações temporárias ou permanentes;
V - outras atividades vedadas pelo poder público.
Art. 49. É proibida a importação de resíduos sólidos perigosos e rejeitos, bem
como de resíduos sólidos cujas características causem dano ao meio ambiente, à
saúde pública e animal e à sanidade vegetal, ainda que para tratamento, reforma,
reúso, reutilização ou recuperação.
TÍTULO IV
DISPOSIÇÕES TRANSITÓRIAS E FINAIS
Art. 50. A inexistência do regulamento previsto no § 3 o do art. 21 não obsta a
atuação, nos termos desta Lei, das cooperativas ou outras formas de associação de
catadores de materiais reutilizáveis e recicláveis.
Art. 51. Sem prejuízo da obrigação de, independentemente da existência de
culpa, reparar os danos causados, a ação ou omissão das pessoas físicas ou jurídicas
que importe inobservância aos preceitos desta Lei ou de seu regulamento sujeita os
infratores às sanções previstas em lei, em especial às fixadas na Lei no 9.605, de 12
de fevereiro de 1998, que “dispõe sobre as sanções penais e administrativas
derivadas de condutas e atividades lesivas ao meio ambiente, e dá outras
providências”, e em seu regulamento.
215
Art. 52. A observância do disposto no caput do art. 23 e no § 2o do art. 39 desta
Lei é considerada obrigação de relevante interesse ambiental para efeitos do art. 68
da Lei nº 9.605, de 1998, sem prejuízo da aplicação de outras sanções cabíveis nas
esferas penal e administrativa.
Art. 53. O § 1o do art. 56 da Lei no 9.605, de 12 de fevereiro de 1998, passa a
vigorar com a seguinte redação:
“Art. 56. .................................................................................
§ 1o Nas mesmas penas incorre quem:
I - abandona os produtos ou substâncias referidos no caput ou os utiliza em
desacordo com as normas ambientais ou de segurança;
II - manipula, acondiciona, armazena, coleta, transporta, reutiliza, recicla ou dá
destinação final a resíduos perigosos de forma diversa da estabelecida em lei ou
regulamento.
.............................................................................................” (NR)
Art. 54. A disposição final ambientalmente adequada dos rejeitos, observado o
disposto no § 1o do art. 9o, deverá ser implantada em até 4 (quatro) anos após a data
de publicação desta Lei.
Art. 55. O disposto nos arts. 16 e 18 entra em vigor 2 (dois) anos após a data
de publicação desta Lei.
Art. 56. A logística reversa relativa aos produtos de que tratam os incisos V e VI
do caput do art. 33 será implementada progressivamente segundo cronograma
estabelecido em regulamento.
Art. 57. Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.
Brasília, 2 de agosto de 2010; 189o da Independência e 122o da República.
LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA
Rafael Thomaz Favetti
Guido Mantega
José Gomes Temporão
Miguel Jorge
Izabella Mônica Vieira Teixeira
João Reis Santana Filho
Marcio Fortes de Almeida
Alexandre Rocha Santos Padilha
Este texto não substitui o publicado no DOU de 3.8.2010
216
ANEXO II – Agenda 21 Global
A Organização das Nações Unidas – ONU realizou, no Rio de Janeiro, em 1992,
a Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e o Desenvolvimento
(CNUMAD). A CNUMAD é mais conhecida como Rio 92, referência à cidade que
a abrigou, e também como “Cúpula da Terra” por ter mediado acordos entre os
Chefes de Estado presentes.
Cento e setenta e nove países participantes da Rio 92 acordaram e assinaram a
Agenda 21 Global, um programa de ação baseado num documento de 40
capítulos, que constitui a mais abrangente tentativa já realizada de promover, em
escala planetária, um novo padrão de desenvolvimento, denominado
“desenvolvimento sustentável”. O termo “Agenda 21” foi usado no sentido de
intenções, desejo de mudança para esse novo modelo de desenvolvimento para
o século 21.
A Agenda 21 pode ser definida como um instrumento de planejamento para a
construção de sociedades sustentáveis, em diferentes bases geográficas, que
concilia métodos de proteção ambiental, justiça social e eficiência econômica.
Sumário do Documento
Resumo do Documento Agenda 21 da Conferência das Nações Unidas sobre
Meio Ambiente e Desenvolvimento
CAPÍTULO 1 Preâmbulo
Seção I - DIMENSÕES SOCIAIS E ECONÔMICAS
Cooperação internacional para acelerar o desenvolvimento
sustentável dos países em desenvolvimento e políticas internas
correlatadas
Promoção do Desenvolvimento Sustentável por meio do
comércio
Estabelecimento de um apoio recíproco entre comércio e meio
ambiente
Oferta de recursos financeiros suficientes aos países em
desenvolvimento
Estímulo a políticas econômicas favoráveis ao Desenvolvimento
CAPÍTULO 2 Sustentável.
CAPÍTULO 3 Combate à pobreza
217
Capacitação dos pobres para a obtenção de meios de
subsistência sustentáveis.
Mudança dos padrões de consumo
Exame dos padrões insustentáveis de produção e consumo
Desenvolvimento de políticas e estratégias nacionais para
CAPÍTULO 4 estimular mudanças nos padrões insustentáveis de consumo.
Dinâmica demográfica e sustentabilidade
Desenvolvimento e difusão de conhecimentos sobre os vínculos
entre tendências e fatores demográficos e Desenvolvimento
Sustentável.
Formulação de políticas nacionais integradas para meio
ambiente e desenvolvimento, levando em conta tendências e
fatores demográficos.
Implementação de programas integrados de meio ambiente e
desenvolvimento no plano local, levando em conta tendências e
CAPÍTULO 5 fatores demográficos.
Proteção e promoção das condições da saúde humana
Satisfação das necessidades de atendimento primário da saúde,
especialmente nas zonas rurais.
Controle das moléstias contagiosas.
Proteção dos grupos vulneráveis.
O desafio da saúde urbana.
Redução dos riscos para a saúde decorrentes da poluição e dos
CAPÍTULO 6 perigos ambientais.
Promoção do Desenvolvimento Sustentável dos assentamentos
humanos
Oferecer a todos habitação adequada
Aperfeiçoar o manejo dos assentamentos humanos
Promover o planejamento e o manejo sustentáveis do uso da
terra.
Promover a existência integrada de infra-estrutura ambiental:
CAPÍTULO 7 água, saneamento, drenagem e manejo de resíduos sólidos.
218
Promover sistemas sustentáveis de energia e transporte nos
assentamentos humanos.
Promover o planejamento e o manejo dos assentamentos
humanos localizados em áreas sujeitas a desastres.
Promover atividades sustentáveis na indústria da construção.
Promover o desenvolvimento dos recursos humanos e da
capacitação institucional e técnica para o avanço dos
assentamentos humanos.
Integração entre meio ambiente e desenvolvimento na tomada
de decisões
Integração entre meio ambiente e desenvolvimento nos planos
político, de planejamento e de manejo.
Criação de uma estrutura legal e regulamentadora eficaz.
Utilização eficaz de instrumentos econômicos e de incentivos de
mercado e outros.
Estabelecimento de sistemas de contabilidade ambiental e
CAPÍTULO 8 econômica integrada.
Seção II - CONSERVAÇÃO E GESTÃO DOS RECURSOS PARA O
DESENVOLVIMENTO
Proteção da atmosfera
Consideração das incertezas: aperfeiçoamento da base científica
para a tomada de decisões.
Promoção do Desenvolvimento Sustentável.
Prevenção da destruição do ozônio estratosférico.
CAPÍTULO 9 Poluição atmosférica transfronteiriça.
Abordagem integrada do planejamento e do gerenciamento dos
recursos terrestres
CAPÍTULO
10
Abordagem integrada do planejamento e do gerenciamento dos
recursos terrestres.
CAPÍTULO
11
Combate ao desflorestamento
219
Manutenção dos múltiplos papéis e funções de todos os tipos de
florestas, terras florestais e regiões de mata.
Aumento de proteção, do manejo sustentável a da conservação
de todas as florestas e provisão de cobertura vegetal para as
áreas degradadas por meio de reabilitação, florestamento e
reflorestamento, bem como de outras técnicas de reabilitação.
Promoção de métodos eficazes de aproveitamento e avaliação
para restaurar plenamente o valor dos bens e serviços
proporcionados por florestas, áreas florestais e áreas
arborizadas.
Estabelecimento e/ou fortalecimento das capacidades de
planejamento, avaliação e acompanhamento de programas,
projetos e atividades da área florestal, ou conexos, inclusive
comércio e operações comerciais.
Manejo de ecossitemas frágeis: a luta contra a desertificação e a
seca
Fortalecimento da base de conhecimentos e desenvolvimento de
sistemas de informação e monitoramento para regiões
propensas à desertificação e seca, sem esquecer os aspectos
econômicos e sociais desses ecossistemas.
Combate à degradação do solo por meio da intensificação das
atividades de conservação do solo, florestamento e
reflorestamento.
Desenvolvimento e fortalecimento de programas de
desenvolvimento integrado para a erradicação da pobreza e a
promoção de sistemas alternativos de subsistência em áreas
propensas à desertificação.
Desenvolvimento de programas abrangentes de
antidesertificação e sua integração aos planos nacionais de
desenvolvimento e ao planejamento ambiental nacional.
Desenvolvimento de planos abrangentes de preparação para a
seca e de esquemas para a mitigação dos resultados da seca,
que incluam dispositivos de auto-ajuda para as áreas propensas
à seca e preparem programas voltados para enfrentar o
problema dos refugiados ambientais.
CAPÍTULO
12
Estímulo e promoção da participação popular e da educação
sobre a questão do meio ambiente centrados no controle da
desertificação e no manejo dos efeitos da seca.
CAPÍTULO
13
Gerenciamento de ecossitemas frágeis: Desenvolvimento
Sustentável das montanhas
220
Geração e fortalecimento dos conhecimentos relativos à ecologia
e ao Desenvolvimento Sustentável dos ecossistemas das
montanhas.
Promoção do desenvolvimento integrado das bacias
hidrográficas e de meios alternativos de subsistência.
Promoção do desenvolvimento rural e agrícola sustentável
Revisão, planejamento e programação integrada da política
agrícola à luz do aspecto multifuncional da agricultura em
especial no que diz respeito à segurança alimentar e ao
Desenvolvimento Sustentável.
Obtenção da participação popular e promoção do
desenvolvimento de recursos humanos para a agricultura
sustentável.
CAPÍTULO
14
CAPÍTULO
15
Melhora na produção agrícola e dos sistemas de cultivo por meio
da diversificação do emprego não-agrícola e do desenvolvimento
da infra-estrutura.
Conservação da Diversidade Biológica
Conservação da diversidade biológica.
Manejo ambientalmente saudável da biotecnologia
Aumento da disponibilidade de alimentos, forragens e matériasprimas renováveis.
Melhoria da saúde humana.
Aumento da proteção do meio ambiente.
Aumento da segurança e desenvolvimento de macanismos de
cooperação internacional.
CAPÍTULO
16
Estabelecimento de mecanismos de capacitação para o
desenvolvimento e a aplicação ambientalmente saudável de
biotecnologia.
Proteção de oceanos, de todos os tipos de mares - inclusive
mares fechados e semifechados - e das zonas costeiras e
proteção. Uso racional e desenvolvimento de seus recursos
vivos
CAPÍTULO
17
Gerenciamento integrado e desenvolvimento sustentável das
zonas costeiras, inclusive zonas econômicas exclusivas.
221
Proteção do meio ambiente marinho.
Uso sustentável e conservação dos recursos marinhos vivos de
alto mar.
Uso sustentável e conservação dos recursos marinhos vivos sob
jurisdição nacional.
Análise de incertezas críticas para o manejo do meio ambiente
marinho e mudança do clima.
Fortalecimento da cooperação e da coordenação no plano
internacional, inclusive regional.
Desenvolvimento sustentável das pequenas ilhas.
Proteção da qualidade e do abastecimento dos recursos
hídricos: aplicação de critérios integrados no desenvolvimento,
manejo e uso dos recursos hídricos
Desenvolvimento e manejo integrado dos recursos hídricos.
Avaliação dos recursos hídricos.
Proteção dos recursos hídricos, da qualidade da água e dos
ecossistemas aquáticos.
Abastecimento de água potável e saneamento.
Água e desenvolvimento urbano sustentável.
CAPÍTULO
18
Água para produção sustentável de alimentos e desenvolvimento
rural sustentável.
Impactos da mudança do clima sobre os recursos hídricos.
Manejo ecologicamente saudável das substâncias químicas
tóxicas, incluída a prevenção do tráfico internacional ilegal dos
produtos tóxicos e perigosos
Expansão e aceleração da avaliação internacional dos riscos
químicos.
Harmonização da classificação e da rotulagem dos produtos
químicos.
Intercâmbio de informações sobre os produtos químicos tóxicos
e os riscos químicos.
Implantação de programas de redução dos riscos.
CAPÍTULO
19
Fortalecimento das capacidades e potenciais nacionais para o
manejo dos produtos químicos.
222
Prevenção do tráfico internacional ilegal dos produtos tóxicos e
perigosos.
Manejo ambientalmente saudável dos resíduos perigosos.
Incluindo a prevenção do tráfico internacional ilícito de resíduos
perigosos
Promoção da prevenção e redução ao mínimo dos resíduos
perigosos.
Promoção do fortalecimento da capacidade institucional do
manejo de resíduos perigosos.
CAPÍTULO
20
Promoção e fortalecimento da cooperação internacional para o
manejo dos movimentos transfronteriços de resíduos perigosos.
Prevenção do tráfico internacional ilícito de resíduos perigosos.
Manejo ambientalmente saudável dos resíduos sólidos e
questões relacionadas com esgotos
Proteção da qualidade e da oferta dos recursos de água doce
(18)
Promoção do desenvolvimento sustentável dos estabelecimentos
humanos (7)
CAPÍTULO
21
Proteção e promoção da salubridade (6)
Mudança dos padrões de consumo (4)
Manejo seguro e ambientalmente saudável dos resíduos
radioativos
CAPÍTULO
22
Promoção do manejo seguro e ambientalmente saudável dos
resíduos radioativos.
Seção III - FORTALECIMENTO DO PAPEL DOS GRUPOS PRINCIPAIS
CAPÍTULO
23
Preâmbulo
CAPÍTULO
24
Ação mundial pela mulher, com vistas a um desenvolvimento
sustentável eqüitativo
223
A infância e a juventude no desenvolvimento sustentável
CAPÍTULO
25
Promoção do papel da juventude e de sua participação ativa na
proteção do meio ambiente e no fomento do desenvolvimento
econômico e social.
A criança no desenvolvimento sustentável.
CAPÍTULO
26
Reconhecimento e fortalecimento do papel das populações
indígenas e suas comunidades
CAPÍTULO
27
Fortalecimento do papel das Organizações NãoGovernamentais: parceiros para um Desenvolvimento
Sustentável
CAPÍTULO
28
Iniciativas das autoridades locais em apoio à Agenda 21
CAPÍTULO
29
Fortalecimento do papel dos trabalhadores e de seus sindicatos
Fortalecimento do papel do comércio e da indústria
CAPÍTULO
30
Promoção de uma produção mais limpa.
Promoção da responsabilidade empresarial.
A comunidade científica e tecnológica
Melhoria da comunicação e cooperação entre a comunidade
científica e tecnológica, os responsáveis por decisões e o
público.
CAPÍTULO
31
Promoção de códigos de conduta e diretrizes relacionados com
ciência e tecnologia.
CAPÍTULO
32
Fortalecimento do papel dos agricultores
Seção IV - MEIOS DE IMPLEMENTAÇÃO
224
CAPÍTULO
33
Recursos e mecanismos de financiamento
CAPÍTULO
34
Transferência de tecnologia ambientalmente saudável,
cooperação e fortalecimento institucional
A ciência para o Desenvolvimento Sustentável
Fortalecimento da base científica para o manejo sustentável.
Aumento do conhecimento científico.
CAPÍTULO
35
Melhora da avaliação científica de longo prazo.
Aumento das capacidades e potenciais científicos.
Promoção do ensino, da conscientização e do treinamento
CAPÍTULO
36
Reorientação do ensino no sentido do Desenvolvimento
Sustentável
Aumento da consciência pública.
CAPÍTULO
37
Mecanismos nacionais e cooperação internacional para
fortalecimento institucional nos países em desenvolvimento
CAPÍTULO
38
Arranjos institucionais internacionais
CAPÍTULO
39
Instrumentos e mecanismos jurídicos internacionais
Informação para a tomada de decisões
CAPÍTULO
40
Redução das diferenças em matérias de dados.
Aperfeiçoamento da disponibilidade da informação.
Fonte: Ministério do Meio Ambiente – Disponível em
http://www.mma.gov.br/responsabilidade-socioambiental/agenda-21/agenda21-global. Acessado em 22 Fev. 2014.
225
ANEXO III – Centro de coleta seletiva de lixo rural, metodologia Arcos
e Agroecopedagogia
Foto: arquivo pessoal
Resumo da tecnologia:
Cercado madeira tela e piso ou de alvenaria para coleta seletiva lixo rural. Usa
metodologia Arcos (Ação, Reflexão, Combinando Objetividade e Subjetividade
no processo participativo e agroecopedagogia: interação, extensão rural,
pesquisa e ensino nos agroecossistemas para gerar comportamento
sustentável).
Tema principal: Meio ambiente
Tema secundário: Educação
Problema solucionado:
A coleta de lixo rural foi iniciada pioneiramente pela Empresa de Extensão
Agrícola e de Extensão Rural (Emater-MG) em Arcos, uma autarquia do Governo
do Estado de Minas Gerais. Ao criar o Grupo de Ação Ambiental Guaxinim, a
Emater envolveu prefeitura, Escola Municipal Laura Andrade e Boa Vista,
Associação de Recicladores e outras entidades em 2009. Poucos
administradores públicos investem na coleta de lixo rural em função de ser no
meio rural, falta de organização da comunidade, veículo, e às vezes há
invisibilidade política quando não se usam as metodologias participativas.
226
Criada por Zenaido Lima da Fonseca, funcionário da Emater-MG-Arcos, usamos
a metodologia Arcos e Agroecopedagogia e geramos comportamento
sustentável: o lixo era queimado ou jogado na natureza produzindo dioxinas e
outros contaminantes afetando lençol freático, nascentes e outros corpos d’água.
Na primeira ação, foram retiradas mais de 9 toneladas de lixo na Grota do
Fundão na Comunidade Rural São Domingos. Logo depois, nasceram os
Centros de Coleta Seletiva de Lixo, idealizados por Zenaido Fonseca. De 2009
até a presente data, vários bota-foras de lixo foram realizados, tendo retirado
mais de 200 toneladas de lixo em uma educação ambiental prática.
Objetivo geral:
Por intermédio da metodologia Arcos e agroecopedagogia fazer aflorar o
compromisso das pessoas no meio rural e urbano para se comprometerem com
a retirada de lixo e promover a cultura de colocá-lo em locais apropriados.
Objetivo específico:
1)
2)
3)
4)
5)
6)
7)
8)
9)
Fazer a coleta seletiva de resíduos sólidos;
Realizar educação ambiental prática;
Trabalhar educação ambiental das famílias rurais;
Propiciar ação, reflexão sobre o meio ambiente;
Deflagrar um movimento nacional de atenção para ação de redução e
destinação adequada de resíduos sólidos do (lixo rural);
Proteger a qualidade da água e da biodiversidade;
Interagir com o setor de ensino em todas as fases inserindo no DNA
comportamentos sustentáveis para serem herdados pelas gerações
seguintes;
Dar visibilidade política para que os prefeitos motivem o trabalho com o
lixo rural;
Demonstrar que é preciso investir no ser humano, para investir no meio
ambiente.
Solução adotada:
Primeiro passo foi reunir com a comunidade e as entidades que podiam somar
ao processo, sendo fundamental envolver o setor de ensino, clubes de serviços.
Discutir a temática do lixo rural, fazer diagnósticos rápidos participativos com as
comunidades rurais. Nesse processo, foram usados mapas feitos pelas
comunidades mostrando as estradas e localizando pontos de entulhos
existentes.
Grupos foram formados para diagnóstico fotográfico, avaliação de acessos de
pessoas e veículos, tipificação do lixo, quantificação. Profissionais capacitados
se reuniram com o público-alvo e mostraram as imagens, falando dos impactos
que o lixo causa ao meio ambiente nos diferentes agroescossistemas. Marcaram
o dia da retirada do lixo observando: luvas para as pessoas, água para beber,
caminhão, cordas para içar sacos cheios de lixo, transporte de pessoas.
Divulgação nas rádios e encontros religiosos que a ação vai ocorrer, convidando
mais pessoas.
227
Retirada do lixo e destinação para o aterro sanitário / pesagem. Depois, concurso
de redação com o tema “O que eu senti em participar de uma ação prática em
benefício do meio ambiente e da vida”. Categorias do concurso: famílias rurais,
alunos de escolas. Prêmio para as categorias e momento especial para entrega
dos prêmios mostrando imagens das ações para os participantes. Coloca placa
no local de retirada do lixo informando que a ação foi feita e que conta com a
participação de todos para o local continuar limpo. Depois, marca-se um botafora de lixo das casas rurais combinando locais de colocação do lixo – o
caminhão passa na casa daqueles que têm muito lixo. Realiza-se reflexão no
local de concentração no meio rural. Somente depois que se fala em centro de
coleta de lixo, quando a comunidade define os locais e a prefeitura faz o
compromisso de buscar o lixo no CLR sempre que atingir quantidade de um
caminhão de carroceria.
Resultado alcançado:
Implantamos a cultura de não jogar o lixo no meio ambiente, consciência
ambiental prática, comportamento ambiental coletivo. Mais de 200 toneladas de
lixo retiradas do meio rural e encaminhadas para o aterro sanitário. O prefeito
atual, Roberto, diante da grandiosidade do trabalho e sensibilidade da
comunidade com o lixo rural, passou a fazer o Centro Coleta de Lixo de
alvenaria.
Locais onde a tecnologia social já foi implementada:
Cidade/UF
Bairro
Arcos/Minas
Gerais
COMUNIDADE
DOMINGOS
Data
implementação
SÃO
da
01/2009
Público-alvo da tecnologia:
Público-alvo
Adolescentes
Profissionais necessários para implementação da tecnologia:
Profissional
servente de pedreiro
Quantidade
1
Recursos materiais necessários para implementação da tecnologia:
13 postes de madeira de 3m de comprimento, 25 metros de tela grossa,
madeiras para portão, pregos, areia e brita.
Valor estimado para a implementação da tecnologia:
R$ 700 (setecentos reais)
228
Instituições parceiras na tecnologia:
Instituição
parceira
PREFEITURA
ARCOS
Atuação na tecnologia social
DE
TRANSPORTE DO LIXO DO CENTRO DE
COLETAS PARA O ATERRO SANITÁRIO
Impacto ambiental:
Eliminação de fontes diretas de contaminação da água, terra e biodiversidade
com dioxina, metais pesados e outros contaminantes, retirada de mais de 200
toneladas de lixo do meio rural destinado para o aterro sanitário.
Forma de acompanhamento:
Reuniões periódicas com a comunidade para avaliação e divulgação de
resultados na imprensa para motivar a prefeitura.
Forma de transferência:
1º passo reunião com a comunidade, escolas, prefeitura, Emater-MG, palestra
sobre lixo rural, diagnóstico rápido participativo, diagnóstico dos pontos de lixo,
realização de bota-fora de lixo rural, divulgação na imprensa, visibilidade, depois
a comunidade escolhe onde vai ser implantado o Centro de Coleta de Lixo Rural,
produção de material feito com a comunidade para utilizar nas escolas.
Fonte: Fundação Banco do Brasil – www.fbb.org.br. Disponível em
http://www.fbb.org.br/tecnologiasocial/banco-de-tecnologias-sociais/pesquisartecnologias/detalhar-tecnologia-206.htm. Acessado em 11 de Mar. 2014.
229
Anexo IV – Dos materiais recicláveis que podem ser dispostos na coleta
seletiva de Belo Horizonte e nos locais de entrega voluntária
Papel: pode ser reciclado várias vezes. A matéria-prima vegetal mais utilizada
na fabricação do papel é a madeira. Para aproximadamente 50 quilos de papel
reciclado, poupa-se o corte de uma árvore. O papel não encaminhado para a
reciclagem demora 3 meses para se decompor na natureza.
São papéis recicláveis: jornais, revistas, impressos, catálogos telefônicos,
caixas de papelão, rascunhos, envelopes, cartões, embalagens longa vida.
Metal: são classificados, quanto a sua composição, em ferrosos (ferro, aço) e
não ferrosos (alumínio, cobre, chumbo, níquel). A lata de alumínio leva de 200 a
500 anos para se decompor na natureza e cada tonelada de alumínio reciclado
economiza 95% de energia e 5 toneladas de minério.
São metais recicláveis: alumínio, arames, fios, grampos, pregos, latas de
alimentos.
Plástico: é feito de derivados do petróleo, que é um recurso natural não
renovável, e leva em torno de 450 anos para se decompor na natureza. Uma
tonelada de plástico reciclado economiza milhares de litros de petróleo.
São plásticos recicláveis: garrafas PET, brinquedos, copos descartáveis,
embalagens de xampu, garrafas de detergente, garrafas de álcool e água
sanitária, sacolas e saquinhos plásticos, potes de produtos alimentícios, baldes
e bacias.
Vidro: demora aproximadamente 4 mil anos para se decompor na natureza, no
entanto é 100% reciclável, ou seja, um quilo de vidro usado transforma-se em
um quilo de vidro novo. Sua produção utiliza matérias-primas como areia,
barrilha, calcário e feldspato. O vidro deve ser embalado em material resistente
antes de ser encaminhado para a coleta seletiva, assim ele não fica exposto e
diminui o risco de acidentes.
230
São vidros recicláveis: cacos de vidro, frascos, garrafas de cerveja, garrafas
de refrigerante, potes, garrafas de água, copos de vidros planos lisos.
Todos os materiais separados para a coleta seletiva devem estar limpos e secos,
para evitar mau cheiro e não atrair animais.
PILHAS E BATERIAS
A SLU orienta que esses materiais sejam entregues nos locais onde foram
comprados. Os fabricantes têm a obrigação de recolhê-los.
ÓLEO DE COZINHA
A orientação da SLU é separá-lo em uma garrafa e entregá-lo em pontos de
coleta nas nove regionais.
Centro-Sul (Avenida Afonso Pena, 4.000, Bairro Cruzeiro)
Barreiro (Parque das Águas, na Avenida Ximango, 809, Bairro Flávio Marques
Lisboa)
Oeste (Rua Belfort Rocho, 215, Bairro Nova Granada)
Leste (Rua Lauro Jaques, 20, Bairro Floresta)
Norte (Parque Nossa Senhora da Piedade, na Rua Rubens Souza Pimentel,
750, Bairro Aarão Reis)
Noroeste (Rua Peçanha, 144, Bairro Carlos Prates)
Nordeste (Rua Queluzita, 45, Bairro São Paulo)
Venda Nova (Rua Padre Pedro Pinto, 1.055, Venda Nova)
Pampulha (Rua Radialista Ubaldo Ferreira, 501, Bairro Castelo)
Para mais informações sobre horários e dias de coleta, além do endereço dos
LEVs e telefones das associações, ligue 156.
Fonte: Portal da Prefeitura de Belo Horizonte, 2014.
Coleta Seletiva em BH. Disponível em
http://portalpbh.pbh.gov.br/pbh/ecp/comunidade.do?evento=portlet&pIdPlc=ecpTaxonomiaMen
uPortal&app=slu&tax=34900&lang=pt_BR&pg=5600&taxp=0&. Acessado em 22 fev. 2014.
231
Anexo IV – Endereços das cooperativas de catadores de materiais recicláveis
em Belo Horizonte
ASMARE
Unidade I: Avenida do Contorno, 10.555, Barro Preto
Unidade II: Rua Ituiutaba, 460, Bairro Prado
ASSOCIRECICLE
Rua Araguari ,12, Barro Preto
COOMARP-PAMPULHA
Unidade I: Avenida Presidente Antônio Carlos, 4.070, Bairro São Francisco
Unidade II: Rua Caldas da Rainha, 2.083, Bairro São Francisco
COOPERSOL VENDA NOVA
Rua Santa Vitória, 136, Bairro Jardim Leblon
COOPEMAR – OESTE
Avenida Solferina Ricci Pace, 1250, Bairro Vale do Jatobá
COOPESOL LESTE
Rua São Vicente, 151, Bairro Granja de Freitas
COOPERSOLI BARREIRO
R. Lacyr Máffia, 115, Bairro Jatobá IV
Fonte: Portal da Prefeitura de Belo Horizonte, 2014.
Coleta Seletiva em BH. Disponível em
http://portalpbh.pbh.gov.br/pbh/ecp/comunidade.do?evento=portlet&pIdPlc=ecpTaxonomiaMenuPortal
&app=slu&tax=34900&lang=pt_BR&pg=5600&taxp=0&. Acessado em 22 Fev. 2014

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