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AVIAÇÃO E ESPAÇO
Governo anula concurso e adia privatização da TAP para 2014
Sirius
N.º
155
JANEIRO | FEVEREIRO 2013
magazine
AIRBUS A380
Pilotos
emigram
Saiba tudo sobre as condições de trabalho oferecidas
e as oportunidades de evolução na carreira
ENSAIO
AEROPILOT LEGEND 540,
A CÓPIA DO CESSNA 182
PITVANT
AERONAVES NÃO TRIPULADAS
REFORÇAM DEFESA AÉREA
REPORTAGEM
F-16 FALCÕES
E JAGUARES NA BA5
Preço €4,00 (Portugal Continental)
EDITORIAL
Prepotência
Cmdt. Pedro
Santa Bárbara
Presidente da
APPLA – Associação
dos Pilotos
Portugueses de
Linha Aérea
EM 1944, A CIDADE DE
Chicago tornou-se o centro das atenções mundiais.
O transporte aéreo, que já
fazia circular passageiros
e carga por todo o mundo,
necessitava de regras gerais
que proporcionassem ao utilizador, em qualquer Estado,
segurança, regularidade e
eficiência.
Nesse contexto, foi assinada a Convenção de Chicago, em 7 de dezembro de
1944. Nascia a ICAO, Organização Internacional da
Aviação Civil e foram criadas as recomendações que
proporcionariam, entre outros resultados, um desenvolvimento seguro e ordenado da aviação mundial.
Ao longo dos anos, o transporte aéreo afirmou-se como a forma mais segura de viajar.
Com o constante aumento do tráfego aéreo surge a necessidade de uma iniciativa comum europeia, destinada a manter os mesmos padrões
de segurança.
A EASA (Agência Europeia para a Segurança da Aviação) é a espinha dorsal da estratégia
da União Europeia em matéria de segurança da
aviação. A sua missão consiste em promover as
mais elevadas regras de segurança aérea e proteção ambiental no setor da aviação civil.
Enquanto as autoridades nacionais continuam
a desempenhar a maioria das funções operacionais, como a certificação individual de aeronaves
ou o licenciamento de pilotos, a EASA desenvolve regras de segurança e ambientais comuns
a nível europeu.
É um direito para qualquer passageiro exigir
que o serviço de transporte prestado por qualquer companhia seja efetuado com os maiores
padrões de segurança, respondendo escrupulosamente às normas da legislação em vigor, que,
de forma objetiva, deverão estar alinhadas com
essas premissas.
O aumento da competitividade entre companhias aéreas resulta numa maior utilização das
tripulações. A fadiga é diretamente proporcional à carga de trabalho a que os tripulantes são
submetidos e inversamente proporcional aos
índices de segurança exigidos.
A EASA, muito recentemente, aprovou novas
regras que estabelecem limites de tempo de trabalho (Flight Time Limitations) para todos os
tripulantes a bordo de aeronaves. Contudo, as
propostas já entregues para apreciação no Parlamento Europeu não levam em consideração
as recomendações emanadas pela comunidade
médica e científica, a quem a própria EASA recorreu, inviabilizando assim uma regulamentação europeia inovadora e adaptada às novas
realidades para o transporte aéreo.
Não querendo ser minucioso nesta matéria,
enumerarei alguns exemplos simples que ilustram as incoerências e os interesses instalados
no setor.
O PRINCÍPIO DA NÃO REGRESSÃO. Os Estados que no seu ordenamento jurídico já contemplam medidas mais «protetoras» para o tripulante
devem observar esses mesmos limites. A EASA invoca a uniformização europeia, renegando o princípio estabelecido pelo próprio Parlamento Europeu,
eliminando em definitivo os limites de tempo de
trabalho pré-estabelecidos pelos diferentes Estados.
A inevitabilidade será de novo a regressão de padrões de segurança já implementados.
CONJUGAÇÃO – ASSISTÊNCIA – PSV. Esta proposta da EASA, conjugando um período de assistência (período em que o piloto terá de estar apto para
ser chamado para voo) com um período de serviço
de voo, PSV (período entre a hora da apresentação
para voo e a imobilização da aeronave após voo
concluído), irá permitir que um tripulante possa
estar aos comandos de uma aeronave ao fim de 22
horas de se encontrar acordado.
A título informativo e comparativo, nos EUA,
para esta mesma situação, está contemplado um
máximo de 16 horas.
VOO NOTURNO. Todos os estudos relativos a
esta restrição, inclusive os referenciados pelos
consultores da própria EASA, referem um máximo de 10 horas de PSV sempre que o voo se
inicie, se realize ou termine dentro do «período
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SUMÁRIO
AVIAÇÃO EM DESTAQUE
05 Cockpit
Franceses da Vinci conquistam ANA
Sangria na Manutenção da TAP
Legacy 500 faz primeiro voo
10 Simuladores
RAAS no Flight Simulator X
11 Segurança
ANA quer reduzir runway excursions
12 Empresa
TAP salva in extremis
14 Tema de Capa
Voar com outras bandeiras
20 Briefing
Os biocombustíveis de síntese
22 Reportagem
A base dos Falcões e Jaguares
Pilotos da TAP na BA5
52
26 APPLA
46 Responsabilidade
Aeroporto complementar ao de Lisboa
Social
28 Balonismo
30 Spotters
48 Reportagem
32 Fatores Humanos
PITVANT reforça Força Aérea
APEA visita Base Aérea do Montijo
Sem medo de voar
34 Ensaio
No reino dos paramotores
52 Defesa
56 Opinião
Piloto de drones
58 Test Drive
Aeropilot Legend 540
40 Opinião
Pliotos criam clube de clássicos
Devemos ser uns pelos outros
60 Viagem
42 Jatos Executivos
Ilha do Fogo e Copenhaga
44 Gestão do Voo
Bartolomeu Lourenço de Gusmão
Cessna Citation Longitude
Fatores humanos + fatores culturais
62 Memória
66 Spotters
NA CAPA Airbus A380, da Emirates, fotografado no ILA Berlim, por S. Ramadier/Airbus
Editorial
(continuação)
crítico do ritmo circadiano» (período entre as 02:00 e as 06:00).
A EASA, ao sugerir um máximo de 11 horas de atividade nestas condições, está a comprometer a segurança na operação.
ATRASOS NA APRESENTAÇÃO. Um tripulante avisado para não se apresentar à hora predefinida por falta de aeronave,
avaria, razões comerciais ou outras pode permanecer em casa, mantendo-se informado dos atrasos sucessivos, até que
seja reprogramada nova hora para apresentação.
De acordo com a proposta da AESA, o PSV inicia-se a essa nova hora, e não à hora inicial. A totalidade do atraso não
conta um minuto que seja para PSV, mas o tripulante esteve
à espera que o operador lhe atribuísse uma hora de apresentação, obrigado a estar contactável. Ainda se, ao fim de 10
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horas de sucessivos atrasos, não houver nomeação para voo,
o tripulante é desnomeado, contando este período de «indefinição» como período de repouso.
Os pilotos europeus estão preocupados com as novas medidas de segurança que virão a ser decretadas pelo Parlamento Europeu. Mas opinar sobre questões fundamentais para o
garante de altos padrões de segurança para o transporte aéreo sem a estrita observância das recomendações médicas e
científicos é querer transformar opiniões fundamentadas em
verdade absoluta.
A isso chama-se prepotência.
COCKPIT
15 MILHÕES DE
PASSAGEIROS
EM LISBOA
TAP
NOTÍCIAS DO MUNDO DA AVIAÇÃO
Franceses da Vinci
conquistam ANA
O GOVERNO APROVOU A VENDA DA ANA Aeroportos ao grupo francês Vinci por 3,08 mil
milhões de euros. O grupo Vinci passa, assim, a controlar 95% do capital social da gestora aeroportuária, responsável pela operação de oito aeroportos em Portugal continental e
ilhas. Os restantes 5% do capital estão reservados para os trabalhadores.
As propostas que os restantes três investidores entregaram variavam entre 2000 e 2442
milhões de euros. A segunda oferta mais elevada foi feita pela Fraport e pelo fundo australiano IMF, que ofereciam 2442 milhões de euros para ficar com a ANA. Já o consórcio
liderado pelos argentinos da Corporación América (que estava na corrida com duas empresas nacionais, a Sonae Sierra e a Empark) dispôs-se a pagar 2408 milhões, mas uma
parte, de cerca de 542 milhões, seria entregue a dez anos. E, por fim, o agrupamento que
unia os brasileiros da CCR, os suíços da Zurich Flughafen e a GIP apresentou uma proposta de 2000 milhões de euros.
Em comunicado emanado em reação à decisão do Conselho de Ministros, a Vinci congratula-se por a sua proposta ter sido escolhida pelo Governo Português para a aquisição da
ANA e reafirma os seus compromissos com Portugal. A Vinci está já presente em concessões de infraestruturas, com uma participação de 37% na Lusoponte, gestora das Pontes
25 de Abril e Vasco de Gama, mas também nas atividades de engenharia e de obras elétricas com a Sotécnica e a Cegelec.
A empresa acrescenta que, com a aquisição da ANA, «torna-se num ator internacional de
primeiro plano nas concessões aeroportuárias, com 23 aeroportos geridos em Portugal,
França e no Camboja, que acolhem mais de 40 milhões de passageiros/ano – incluindo
um hub de mais de 15 milhões de passageiros –, e um volume de negócios global de mais
de 600 milhões de euros, para um EBITDA de cerca de 270 milhões de euros».
O AEROPORTO DE
LISBOA ATINGIU, no
dia 21 de dezembro, 15
milhões de passageiros
processados em 2012.
A passageira que
atingiu esse número
fez o seu check-in nos
balcões da SATA e o
momento foi assinalado
com a presença do
presidente do conselho
de administração da
ANA, Jorge Ponce de
Leão, e do administrador
da SATA, Rui Quadros,
bem como do diretor
do Aeroporto de Lisboa,
João Nunes. Este
recorde no número de
passageiros processados
vem confirmar que o
aeroporto de Lisboa é
dos que mais cresce na
Europa.
PERFIL DO
PASSAGEIRO
O PASSAGEIRO EM
TRANSFERÊNCIA
tem vindo a crescer no
aeroporto de Lisboa
(33,2%) e tem como
principal destino final
Portugal e Brasil. Escolhe
este aeroporto por falta
de outra opção disponível
(55,4%) e viaja quase
sempre sozinho (51,2%).
O passageiro de Lisboa
tem idade compreendida
entre 25 e 45 anos,
maioritariamente do sexo
feminino, com formação
académica superior e
empregado, que viaja pelo
menos uma vez por ano. O
passageiro inbound (35%)
reside maioritariamente
em França, visita o nosso
País em turismo/lazer e
fá-lo na companhia da
família. Utiliza o website
da companhia aérea como
canal preferencial para
pesquisa e compra da sua
viagem.
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COCKPIT
BREVES
AIR ASIA ENCOMENDA
MAIS 100 AIRBUS A320
A AirAsia colocou um novo pedido
com a Airbus para mais 100 aeronaves
da família A320. O contrato reafirma
a posição da cliente AirAsia como
a maior frota da família A320 no
mundo. No total, a companhia aérea
já encomendou 475 aeronaves de
corredor único da Airbus.
P. MASCLET/AIRBUS
BOEING 737 BATE
RECORDE DE
ENTREGAS
A Boeing atingiu o recorde de entregas,
num só ano, para o B737 com a entrega,
no dia 3 de dezembro, do 377.º avião 737
Next-Generation em 2012.
SKYWEST ASSINA
ACORDO PARA 200
AVIÕES MRJ90
A Mitsubishi Aircraft Corporation e a
SkyWest, Inc, uma holding de duas
companhias aéreas regionais, assinaram
um acordo para a compra de 100
aeronaves MRJ90 e uma opção para até
100 aeronaves adicionais.
VOOS DE GRAVIDADE
ZERO PARA O PÚBLICO
O primeiro dos três voos programados
para 2013 vai realizar-se na sexta-feira,
dia 15 de março, a bordo do Airbus A300
ZERO-G. O aparelho tem capacidade
para 40 passageiros, que pagarão cada
um 5980 euros.
AIRBUS APRESENTA
CONNECTED COCKPIT
Baptizado de Connected Cockpit, este
sistema surgiu de um projeto da Célula
de Inovação de Cockpit da Airbus,
para explorar aplicações potenciais do
iPad da Apple e aproveitar o potencial
de comunicações de banda larga via
satélite.
PARLAMENTO
CRIA AUTORIDADE
AERONÁUTICA
A Assembleia da República aprovou a
criação da Autoridade Aeronáutica de
Defesa Nacional (AADN), responsável
pela vigilância do espaço aéreo nacional
e pela certificação das empresas
ligadas à manutenção de aeronaves
estrangeiras.
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Airbus A350 XWB em testes
A AIRBUS CONCLUIU COM ÊXITO a montagem estrutural principal e a conexão do sistema do A350 XWB MSN-001 – a primeira aeronave de testes de
voo. A aeronave saiu rebocada para fora do hangar de montagem principal
(estação 40) na recentemente inaugurada Linha de Montagem Final Roger Beteille do A350 XWB, em Toulouse. Em seguida, a aeronave entrou na estação
de testes no solo ao lado (estação 30). O trabalho na estação 30 vai começar
pelos testes do sistema hidráulico da aeronave, seguidos pelo completo acionamento elétrico e hidráulico da aeronave, que será concluído no final do ano.
Isso irá marcar o início de várias semanas de testes abrangentes do sistema
funcional. Após o A350 XWB MSN1 sair da estação 30, a aeronave vai passar
por uma extensiva série de testes de produção, desenvolvimento e certificação, ser pintado e ter os seus motores instalados. Será, então, entregue à linha de voo, para ser preparado para o seu primeiro voo em meados de 2013.
SANGRIA NA TAP
MANUTENÇÃO
DEZ MILHÕES DE
PASSAGEIROS NA TAP
A TAP ESTÁ A BRAÇOS com uma verdadeira sangria. Desta feita não são apenas
os pilotos a saírem da empresa, mas também mecânicos. António Monteiro, diretor de Relações Públicas da companhia
aérea, revelou à Sirius que este ano foram mais de 50 os técnicos de manutenção que foram aliciados por outras companhias e que cederam aos convites.
«Não foram apenas para o Médio Oriente, mas também para a Europa, nomeadamente para a Lufthansa», diz.
Esta é, para este porta-voz, uma situação
mais grave para a TAP do que a perda de
pilotos, porque «um técnico de manutenção demora anos a formar. Vamos buscá-los à saída da escola e depois fazem
todo o treino e formação dentro da companhia», conta. É, por isso, uma circunstância que exige mais esforço à TAP.
O VOO DA TAP TP052, chegado a Lisboa às 11.08h, proveniente de Belo Horizonte, transportou, no dia 24 de dezembro, véspera de Natal, o passageiro «10
Milhões» da companhia, em 2012, número nunca antes alcançado num ano completo de atividade. Em todo o ano de 2011,
a TAP atingiu um total de 9752 mil passageiros. No final do dia 24 de dezembro, a
TAP atingiu 10.018.974 passageiros, mais
4,4% do que no acumulado do ano até ao
mesmo dia. Em 2012, os melhores resultados da TAP, em termos absolutos, verificaram-se nas linhas da Europa, onde a
TAP transportou mais de 300 mil passageiros do que em 2011. Em termos relativos, os melhores resultados foram alcançados no setor dos Estados Unidos, com
um crescimento de 19,3% (fruto da rota
para Miami).
TAXA DE OCUPAÇÃO
80% NA EMIRATES
DAVID QUITO, DIRETOR-GERAL DA EMIRATES AIRLINE para Portugal, assegurou, num
encontro para jornalistas, que os primeiros
cinco meses de operação em Portugal foram
muito positivos. Não querendo revelar a taxa
de ocupação específica ao nosso País, adianta
que, no global, a companhia regista 80% de
taxa de ocupação, sendo que a rota de Lisboa
– inaugurada a 9 de julho de 2012 – está em
linha com este indicador. Por isso mesmo, o
voo diário entre Lisboa e o Dubai vai contar
com mais lugares a partir de fevereiro, passando dos atuais 274 lugares para 354.
Com mais de 128 destinos distribuídos por 74
países, a Emirates vai abrir duas novas rotas
a 6 de fevereiro (Varsóvia) e 1 de março (Argel), sendo que em 2013 lançou 15 novas rotas. Ao serviço conta com 70 Airbus (28 dos
quais são A380) e 121 Boeing.
BREVES
F-16 DEIXA
‘ESCAPAR’ AVIÃO
SUSPEITO
TAP MANUTENÇÃO
GARANTE CONTRATO
COM A FINNAIR
O CAÇA F-16 MLU provou
não ser a plataforma mais
adequada para a interceção
de pequenas aeronaves
suspeitas de tráfico de droga.
No dia 3 de dezembro, dois
F-16 não lograram intercetar
um avião ligeiro, apesar de
o terem captado no radar
e no targeting pod. Ficou a
dever-se ao facto de terem
descolado com depósitos
cheios de combustível, o
que os impede de voar a
uma velocidade inferior
a 180/200 nós (330/370
km/h). Manobrando a uma
velocidade inferior, da
ordem dos 140 nós (260
km/h), a aeronave suspeita
iludiu os F-16.
A TAP Manutenção e Engenharia
garantiu um contrato para grande
manutenção de aviões A320 da Finnair
até 2016. A Finnair já entregou 10
aeronaves, que foram intervencionadas
entre janeiro e outubro de 2012.
AERONEO INVESTE €11
MILHÕES EM BEJA
A empresa portuguesa AeroNeo vai
investir 11 milhões de euros numa
unidade para desmantelar aviões
e valorizar ativos aeronáuticos no
aeroporto de Beja, num projeto
«inovador» que arranca em 2013.
LIGAÇÃO AÉREA LISBOA-BRAGANÇA SUBSIDIADA
AO BILHETE
O governo já tem solução para retomar a
ligação aérea Lisboa-Bragança, que deve
passar pela subsidiação dos bilhetes,
estando dependente da aprovação de
Bruxelas, disse o secretário de Estado dos
Transportes, Sérgio Monteiro.
LEGACY 500 FAZ PRIMEIRO VOO
EMBRAER EMBARCA
EMPENAGEM PARA O
LEGACY 500
CLAÚDIO CAPUCHO/EMBRAER
A Embraer Portugal concluiu o primeiro
carregamento de material compósito
da sua unidade em Évora: uma
empenagem do jato executivo Legacy
500 foi embarcada para São José dos
Campos, sede da Embraer no Brasil.
NO DIA 27 DE NOVEMBRO, o Embraer Legacy 500 voou pela primeira
vez, marcando o início de uma nova geração de jatos executivos do construtor brasileiro. As primeiras entregas da aeronave estão previstas para
o início de 2014. «Este jato extraordinário simboliza o futuro da aviação
executiva e é fruto da inovação, talento e dedicação que fazem parte da
cultura da Embraer», disse Frederico Fleury Curado, diretor-presidente da
Embraer. Os pilotos de teste Mozart Louzada e Eduardo Camelier, acompanhados dos engenheiros de ensaios em voo Gustavo Monteiro Paixão e
Alexandre Figueiredo, voaram o Legacy 500 durante 1 hora e 45 minutos,
realizando uma ampla variedade de testes de sistemas e avaliando características de desempenho e manobrabilidade.
ÉVORA LANÇA
CONCURSO PARA
O PAS 2013
O município de Évora lançou um
concurso público para a organização
do Portugal Airshow 2013 – Bienal
Aeronáutica de Évora. O prazo para
receção das propostas termina a 11 de
março de 2013.
CAE DE ÉVORA FECHOU
EM DEZEMBRO
A Academia Aeronáutica de Évora
fechou as portas no final de dezembro.
Um cenário já previsível, tendo em
conta que no primeiro trimestre do ano
a empresa canadiana CAE (proprietária
da escola de formação de pilotos) tinha
despedido 33 funcionários.
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COCKPIT
BREVES
VOO DO LUSITÂNIA VAI SER RECRIADO EM 2022
MODERNIZAÇÃO DOS
C-130 VAI CUSTAR 12
MILHÕES DE EUROS
O Ministério da Defesa autorizou
gastos até 12 milhões de euros para
a modernização de seis aviões C-130
Hércules, da Força Aérea, segundo um
despacho assinado pelo ministro e
publicado em Diário da República.
CLAÚDIO CAPUCHO/EMBRAER
AMERICANOS
MANTÊM LAJES
A missão americana da Base das Lajes,
nos Açores, vai manter-se 24 horas
por dia, apesar da redução prevista de
mais de 400 militares a partir de 2014,
anunciou o comandante da Zona Aérea
dos Açores, major-general Luís Ruivo.
HOT BLADE POR
MAIS DOIS ANOS EM
PORTUGAL
O maior exercício europeu de
helicópteros volta a realizar-se em
Portugal em 2013 e 2014. A decisão
foi tomada na reunião de ministros da
Defesa da União Europeia que decorreu
dia 19 de novembro, em Bruxelas.
FIM DA PRODUÇÃO DO
F-16 ADIADO PARA 2016
O fim da linha de produção do caça F-16
foi adiado novamente. A Lockheed está
a construir caças F-16 para o Egito, Omã
e Iraque – o suficiente para manter
a linha aberta, pelo menos, até janeiro
de 2016.
PROGRAMA F-35
COM CINCO MIL
HORAS DE VOO
O programa F-35 Lightning II, da
Lockheed Martin, superou as cinco mil
horas de voo. As três versões – F-35A de
descolagem e aterragem convencionais
(CTOL), F-35B de descolagem curta e
aterragem vertical (STOVL) e a versão
embarcada F-35C – contribuíram para a
realização deste objetivo.
LUÍS MIGUEL KRUG
PRESIDE AO AECP
Luís Miguel Krug é o novo presidente da
direção do AeCP (Aero Club de Portugal),
depois de a sua lista para os órgãos
sociais deste clube centenário ter ganho
as eleições na assembleia geral realizada
no dia 9 de novembro de 2012.
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Sirius janeiro | fevereiro
A PRIMEIRA TRAVESSIA DO ATLÂNTICO SUL, protagonizada por Gago
Coutinho e Sacadura Cabral em 1922, vai ser recriada 100 anos depois. A
iniciativa pertence a uma associação criada por um conjunto de entusiastas da aviação portugueses e brasileiros e visa a construção de duas réplicas do Lusitânia, o hidroavião Fairey III-D com que os dois aviadores
portugueses concluíram a viagem: uma para voar e outra para ganhar proficiência no aparelho. A associação Lusitânia 100 tem nove anos pela frente para financiar, divulgar e executar estas réplicas, praticamente a partir
do zero, mas também com base na recolha feita para o projeto Lusitânia
75 (que não chegou a realizar-se em 1998) e para restauro do Santa Cruz,
que se encontra hoje no Museu de Marinha. Para aderir ao projeto: [email protected].
LIVRO DE ÂNGELO FELGUEIRAS NA APPLA
O LIVRO MAIS ALTO e Mais Longe, Escalar por uma Causa, sobre a escalada
dos Seven Summits, de Ângelo Felgueiras, foi apresentado no passado dia 18
de dezembro no auditório da APPLA. «Ao
se lerem as descrições do planeamento
das expedições, das preparações, dos
equipamentos e das dificuldades, ao observarmos as fotografias, tanto de paisagens deslumbrantes como dos companheiros de escalada, dos amigos, da
família, da Isabel e dos filhos que o acompanharam, ficamos nós próprios companheiros de cada uma dessas caminhadas
aventurosas do Ângelo, e com ele sentimos o frio a congelar-nos os dedos, sentimos aquela pedra debaixo do saco-cama que não nos deixa dormir, sentimos
o peso da mochila, sentimos o esforço
de cada subida e cansamo-nos também
com cada passo, a respiração ofegante,
a falta de ar em cada passo dado, conseguindo imaginar a dificuldade, de um pé
a seguir ao outro, identificamo-nos com
as incertezas do tempo e de se saber se
vamos ou não atingir o cume nesse dia
ou se temos de esperar mais uma noite
dentro da tenda para o tentar...», sublinhou Filipe Conceição Silva na apresentação do livro e do autor. O livro pode ser
adquirido na APPLA por 25 euros, revertendo os direitos de autor a favor de duas
instituições de solidariedade.
ECA promove Walkout for Safety
FICHA
TÉCNICA
Sirius Magazine – Aviação
e Espaço
Propriedade da APPLA – Associação
dos Pilotos Portugueses de Linha Aérea
Administração
Rua Frei Tomé de Jesus, 8
1749-057 LISBOA
Tel.: 21 792 68 20
Fax: 21 792 68 15
E-mail: [email protected]
Periodicidade Bimestral
ECA
Medipress – Sociedade Jornalística e Editorial,
Lda. NPC 501 919 023 Capital Social: €74.748.90;
CRC Lisboa
Rua Calvet de Magalhães, 242, 2770-022
Paço de Arcos Telefone 21 469 80 00
Fax 21 469 85 00
Uma publicação da Divisão
de Customer Publishing
http://www.impresa.pt
NO PRÓXIMO DIA 22 DE JANEIRO DE
2013, um walkout simultâneo de tripulações em toda a Europa vai alertar a
opinião pública para as implicações das
novas regras de Flight Time Limitations
(Limites de Tempo de Voo) propostas
para aprovação pelo Parlamento Europeu. Pilotos, tripulantes e cidadãos europeus querem chamar a atenção dos
políticos e decisores para não aceitarem estas propostas, que precisam de
ser urgentemente alteradas, defende a
ECA (European Cockpit Association),
que uniu forças com a Federação Europeia dos Trabalhadores dos Transportes (ETF) para as demonstrações de
janeiro. «Há vários anos que as tripulações aguardam regras mais seguras
para contrariar os riscos da fadiga em
operações de voo», afirma Nico Voorbach, presidente da ECA. «As sondagens indicam que pilotos e pessoal de
cabina já lutam contra elevados níveis
de fadiga, cabeceando ao controlo dos
aviões. Apesar disso, a EASA (Agência
Europeia de Segurança Aérea) prefere
ignorar as recomendações científicas e
avançar com uma proposta que admite níveis elevados de fadiga nas tripulações.» O Walkout for Safety será uma
ação coordenada, em conjunto, pela ECA
e pela ETF que poderá ter reflexos na
indústria do transporte aéreo. «Os passageiros já estão preocupados», explica,
por sua vez, Philip von Schöppenthau,
secretário-geral da ECA, «corresponderam com mais de 82 mil assinaturas na
petição por regras de tempo de voo mais
seguras. Agora, temos de lembrar aos decisores das políticas da União Europeia
que também são passageiros. As mesmas
regras vão contar para as suas tripulações. Por isso, a questão é: os decisores
estão a favor de alterações que vão garantir a sua segurança?». A ECA lançou
um vídeo de animação com o comissário europeu dos Transportes, Siim Kallas,
rodeado de passageiros preocupados.
Diretor Pedro Santa Bárbara Conselho Editorial
Pedro Santa Bárbara, Miguel Silveira, Melo
Correia, João Carlos Costa, Leonor Carneiro
e João Xara-Brasil Coordenação editorial Alexandre Coutinho Redação Alda Rocha,
Ana Pinto da Costa e Paula Carvalho Silva
Colaboradores César Lacerda, Duarte Lopes,
Egídio Lopes, Filipe Conceição e Silva, Filipe
Lança, Jorge Diogo, Jorge Lucas, Luís Inácio,
Manuel Cambeses Júnior, Paulo Pires e Rita
Tamagnini Revisão Dulce Paiva Fotógrafos André
Garcez Arte João Matos Produtor gráfico João
Paulo Batlle y Font
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Diretora de delegação Ângela Almeida
([email protected])
NOVO PROTOCOLO NA ÁREA DA SAÚDE
as Clínicas Médicas Dr. Olívio Dias,
para a prestação de serviços médicos e geriátricos. Todas as sugestões
para este tipo de protocolos por parte
dos associados são sempre bem-vindas, como, aliás, é o caso de algumas
atuais parcerias da Associação dos Pilotos Portugueses de Linha Aérea.
D.R
A APPLA ESTABELECEU MAIS UM
PROTOCOLO no âmbito da saúde com
Assinaturas
Para assinar ligue 707 200 350
(DIAS ÚTEIS, DAS 9H ÀS 19H)
E-mail: [email protected]
Internet: www. assineja.pt
Envie o seu pedido para
Medipress – Sociedade Jornalística e Editorial,
Lda., Remessa Livre 1120, 2771-960 Paço de Arcos
Atendimento ao ponto de venda
E-mail: [email protected]
Tel.: 21 469 80 00
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S. A., 2745 Queluz de Baixo
Distribuição VASP – Soc. de Transportes e
Distribuição, Lda. MLP: Media Logistic Park,
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SIMULADORES
RUNWAY AWARENESS
AND ADVISORY SYSTEM
Para quem tem a ideia de que o Flight Simulator X já está
desatualizado, este artigo serve para demonstrar o oposto
Texto Jorge Diogo *
O FSX, COMO SIMULADOR DE VOO,
possui um potencial bastante grande
ainda por explorar. Exemplo disso é o
sistema recriado agora pela produtora
FS2Crew, o RAAS, Runway Awareness
and Advisory System.
É certo que o simulador não evolui, mas a possibilidade de expansão
é infinita e a confirmação dessa regra é a quantidade de expansões que
continuam a ser disponibilizadas quase diariamente para o Flight Simulator.
Na aviação comercial, principalmente nas aeronaves mais recentes, a existência do RAAS é uma ferramenta bastante importante para as tripulações
que operam em aeroportos de grandes
dimensões. O sistema fiscaliza os movimentos da aeronave e alerta os pilotos sobre a sua localização. Este tipo
de equipamento é bastante importante quando se está perante operações de
baixa visibilidade (LVO).
A ajuda aos pilotos é feita através
de um sistema de voz que vai dando
indicações sobre a posição da aeronave no terreno, informações relativas ao
comprimento da pista, se é suficiente
para a descolagem, a posição dos flaps,
se está correta, entre muitas outras características.
Os alertas não se limitam aos avisos
no solo, durante a aproximação à pista
é possível ouvir «aproaching one four
left», por exemplo.
O RAAS está presente no FS2004,
FSX e Prepar3D através da produtora
FS2Crew, que dedica toda a sua produção a programas de interacção entre a
aeronave e a tripulação.
A instalação é bastante simples e rápida, e assim que termina coloca um
ícone para o manual no desktop. É bastante importante ler o manual, é um sis10
Sirius janeiro | fevereiro
tema com alguma complexidade que se
não estiver bem configurado pode não
cumprir a sua função correctamente.
Como é um sistema baseado em
sons, estes são de excelente qualidade
– uma voz feminina que nos dá as informações como se de um verdadeiro
avião se tratasse. O ambiente recriado
é bastante realista.
Apesar de o RAAS funcionar em
qualquer avião que esteja instalado no
nosso simulador, há que configurar o
tipo de aeronave/sistema para que não
haja lugar a informações erróneas. Se
está habituado a voar de Boeing 737 e
mudar para um Airbus 320, há que alterar as configurações, pois as posições
de flaps são diferentes. Este é apenas
um dos exemplos de configuração que
este software permite.
APESAR DE O FSX já ter alguma idade (o seu lançamento foi no final de
2006), os addons continuam a evoluir
e são produzidos, na sua maioria, em
cima de máquinas recentes. Apesar
disto, não consideramos que o RAAS
da Fs2Crew seja um factor que degrade a performance do simulador. Há
que ter em conta a aeronave onde está a ser usado. Se for uma aeronave
comercial com alguma complexidade,
PMDG, Level D, Airbus Aerosoft, etc.,
então o computador deverá possuir
uma configuração moderna no que
diz respeito ao hardware.
Apesar de não ser um addon que
ofereça grandes imagens (o seu trabalho tem muito pouco ou mesmo nada
ao nível visual), achamos que é uma
mais-valia para quem tem por hábito
a realização de voos comerciais em aeroportos de grandes dimensões. Como
diz o ditado, «as imagens valem mais
que mil palavras», o RAAS da FS2Crew
é a excepção à regra, e esperamos que
as palavras que aqui escrevemos sejam
motivo suficiente para lhe despertar algum interesse!
* AirSim.net.
Este artigo foi escrito sem recurso ao acordo
ortográfico por opção do autor.
SEGURANÇA E OPERAÇÃO
ANA QUER REDUZIR
SAÍDAS DE PISTA
As saídas de pista (runway excursions) representam
24% dos acidentes com aeronaves
Texto Filipe Lança Fotos André Garcez
O Cmdt. Egídio
Lopes (à esq.) referiu
a importância das
ferramentas LOFT
(Line Oriented Flight
Training) e LOSA (Line
Operations Safety
Audit); Cmdt. Miguel
Carvalho, piloto-chefe
da TAP, à conversa
com o Cmdt. Santa
Bárbara, presidente da
APPLA
O CUSTO ESTIMADO DAS RUNWAY excursions para a
indústria ascende a mais de 900 milhões de dólares (cerca de 700 milhões de euros) por ano. Existem diferenças
fundamentais em matéria de gestão de safety: as saídas
de pista apenas ocorrem com aeronaves, enquanto as incursões de pista podem envolver outros veículos, pedestres e aeronaves.
Apenas as segundas podem ser geridas. É, por isso, uma
das maiores preocupações da EASA para os próximos dois
anos (2013-2015), afirmou Miguel Carvalho, piloto-chefe
da TAP, para quem estes eventos estão relacionados com
os fatores humanos: «Temos esse poder de influenciar
as estatísticas e melhorá-las. Os fatores humanos estão
muito presentes nas runway excursions, na não decisão
de executar o go around ou no reject take-off ao atingir a
V1 (velocidade de decisão).»
Carlos Damásio, do Gabinete Técnico da APPLA (Associação dos Pilotos Portugueses de Linha Aérea), revelou que, «em operação normal, a tendência dos pilotos
é para aterrar longo, entre os mil e os três mil pés. Os
pilotos têm de estar conscientes dos riscos associados a
aterragens longas». Para este piloto, a existência das Bases Aéreas do Montijo, de Sintra e de Monte Real, bem
como o Aeródromo de Cascais, são condicionantes para
uma aproximação estabilizada a Lisboa.
Em 2009, 27% dos acidentes reportados à IATA corresponderam a runway excursions, um tipo de acidentes que
sucede, sobretudo, nas aterragens. Quase todas tiveram
origem numa aproximação não estabilizada ou numa aproximação com velocidade excessiva, combinada com uma
aterragem longa.Embora existam mais probabilidades de
acidentes fatais nas descolagens, o mais grave ocorrido
em Portugal teve lugar no Funchal, durante uma aterragem, no dia 19 de novembro de 1977 (TP 425). Miguel
Carvalho reconhece que o comercial e a operação têm
de andar de braço dado, mas sublinhou que os pilotos
«separam completamente a eficiência económica da operação» nesta matéria. «Deveriam questionar quando os
pilotos não executam o go around ou o borrego e o deveriam fazer», acrescentou.
Durante as corridas de aterragem, na generalidade, as
aeronaves imobilizam-se até 300 metros do fim da pista.
Na fase de desaceleração, com velocidades abaixo dos 80
kts, só o efeito dos travões se torna efetivo para controlar e imobilizar a aeronave. «Em 2013, a RESA (Runway
End Safety Area) da pista 03 vai ser aumentada de 140
para 240 metros», revelou Paulo Medo, safety manager
do aeroporto de Lisboa.
As luzes de aproximação, as ajudas à navegação, os
PAPI (Precision Approach Path Indicator), a sinalização
apropriada, são igualmente fatores que condicionam a s
saídas de pista. Como fatores de risco mais preponderantes podemos observar os trabalhos de manutenção, a drenagem, o atrito e as diferentes contaminações de pista.
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EMPRESA
TAP SALVA ‘IN EXTREMIS’
A privatização da TAP ‘borregou’ por decisão política do
governo, que adiou a operação para 2014
UMA VEZ MAIS, A TAP foi salva do
risco de deixar de ser a companhia
portuguesa de bandeira. O governo
recusou a proposta do empresário sul-americano Germán Efromovitch por
falta de «garantias adequadas» e porque «não foram cumpridos os requisitos previstos no caderno de encargos».
Bastava que uma condição não se verificasse para que o processo não fosse levado em frente. Recorde-se que o
único candidato à privatização da TAP
pagaria ao Estado 35 milhões de euros,
garantiria o passivo da TAP, na ordem
dos 1200 milhões de euros, e reporia
os capitais próprios da empresa em
316 milhões de euros.
É um facto que, dos sindicatos da
TAP à generalidade dos trabalhadores
da companhia e de vários setores da
sociedade civil, quase todos os portugueses estavam contra a privatização da sua companhia aérea nestas
condições. Caberá agora ao governo
ponderar se a privatização vai mesmo
avançar e qual a melhor estratégia,
considerando o memorando de entendimento com a troika. O novo modelo de privatização poderá passar pelo
encerramento da TAP Manutenção &
Engenharia Brasil e pela definição de
um modelo de sustentabilidade para a
companhia. Em 67 anos de vida, não
foi a primeira vez que a TAP esteve
em risco. Em 1953, ano em que foram
adquiridos os primeiros três aparelhos
Super Constellation, a empresa deu
prejuízo e um membro do governo
de Salazar sugeriu o seu encerramento. «A TAP pode dar prejuízo, mas é
como a CP: um mal necessário», terá
respondido o então primeiro-ministro.
Já depois do 25 de abril, em outubro
de 1974, foi feita uma proposta de encerramento parcial da empresa. A TAP
continuaria a fazer os voos domésti12
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FOTOS TAP
Texto Alexandre Coutinho
EM 67 ANOS DE VIDA, NÃO FOI A
PRIMEIRA VEZ QUE A TAP ESTEVE EM
RISCO DE FECHAR OU SER VENDIDA
cos e alguns voos na Europa, mas o
longo curso passaria para a Aeroflot.
O País estava em pleno PREC (Processo Revolucionário em Curso), Vasco
Gonçalves era o primeiro-ministro e a
primeira comissão administrativa pós-25 de abril era encabeçada pelo Coronel Moura Pinto. A famosa 5.ª Divisão
(do Estado-Maior das Forças Armadas,
controlada pela ala comunista do MFA)
preparava-se para dar andamento ao
processo de encerramento parcial da
TAP, mas foi extinta.
Depois, a TAP entrou num período
difícil, porque, em 1975, quem controlava completamente a empresa eram
os cerca de três mil homens da Manutenção & Engenharia. Ninguém entrava ou saía da empresa que não passasse pelos piquetes da Manutenção,
que chegaram a aprisionar os admi-
nistradores durante oito dias. A TAP
caiu no que se refere à regularidade. A
execução dos voos manteve-se sempre,
mas a pontualidade veio para valores
incríveis. Nessa altura, o administrador Peixoto Rodrigues ia a despacho
com o primeiro-ministro, Vasco Gonçalves, e ele disse-lhe: «Vê se resolves isso, porque se não eu encerro a
TAP.» E ele foi falar com o Cmdt. Hugo Damásio, que aceitou o cargo de
DOV (que ninguém queria assumir),
iniciando um consulado de quase 12
anos, até se reformar.
É fantástico como a TAP sobreviveu
ao PREC. Depois, em 1977, houve mais
uma tentativa para fechar a TAP. Havia uma situação de conflito salarial
grande com os pilotos e era presidente do conselho de administração Gomes Mota (próximo de Mário Soares,
que era primeiro-ministro). O DOV e o
seu adjunto foram demitidos e houve
uma greve de três semanas, em que
os aviões não voaram. Mário Soares
foi com o ministro dos Transportes,
Rui Vilar, ao Presidente da República,
Ramalho Eanes, propor a sua concordância para encerrar a TAP. O General
Ramalho Eanes disse-lhes: «Não estão
a ver o que a TAP representa a visibilidade do País por este mundo fora?
Se tirarmos a TAP, o País sofre muito
em termos de imagem, até da vossa
imagem política.» Rui Vilar demitiu-se; o secretário de Estado também, e
foram substituídos. Na TAP, o sindicato mantinha as exigências e exigia
que todos os quadros e o DOV fossem
reconduzidos. A situação complicou-se, houve processos disciplinares. Os
pilotos estavam requisitados civilmente. Mas perante a irredutibilidade do
Presidente da República em aceitar o
encerramento da TAP, foi necessário
negociar com os pilotos. A exigência
era simples: voltar ao acordo coletivo
de trabalho e negociá-lo, reintegrar a
estrutura de gestão das Operações de
Voo e mandar embora a administração, que foi o que aconteceu.
Em 1980, está como presidente do
conselho de administração Álvaro Barreto, que acertou com a Direção do
SPAC o novo acordo coletivo de trabalho para os pilotos. Só que, passados três ou quatro meses, o primeiro-ministro, Sá Carneiro, convida-o para ministro da Indústria. É nomeado
Santos Martins, que chama os pilotos
para lhes dizer que não tinha nada a
ver com o ACT acordado. A situação
complicou-se e começou a haver um
desentendimento grande por um documento que já estava feito, aceite e
assinado por ambas as partes, e, a certa altura, há rutura. O SPAC vai para a
greve: quatro semanas. A assembleia
geral de pilotos era constante (noite
e dia), no Hotel Roma. No dia 13 de
setembro de 1980, a portaria para encerramento da TAP já estava feita, mas
um nova intervenção do Presidente da
República, o General Ramalho Eanes,
conseguiu o entendimento entre os 23
sindicatos da TAP.
Uma dezena de anos mais tarde,
em abril de 1999, a Swissair comprou
uma participação de 20% na TAP como primeiro passo de uma anunciada privatização. Mas a entrada para
a aliança Qualiflyer acabaria por revelar-se catastrófica e quase levou ao
encerramento da TAP. Quem estava
na TAP pôde assistir aos meses terríveis que a companhia passou a partir do momento em que o Qualiflyer
começou a tomar conta do sistema
de reservas da TAP, gerando milhões
de prejuízo. Foram meses a fio em
que os aviões andavam praticamente vazios, com o sistema de reservas
das agências de viagens a indicar aviões sem disponibilidade de lugares.
Houve voos Rio de Janeiro-Lisboa em
que os aviões vinham com 30 ou 40
passageiros na classe económica (e
com a executiva vazia), e os aviões
da Swissair completamente cheios,
obrigando os passageiros a fazer escala em Zurique. A falência da companhia aérea suíça, em fevereiro de
2002, voltou a colocar o processo de
privatização da TAP na estaca zero.
TEMA DE CAPA
VOAR COM OUTRAS
BANDEIRAS
Com muito poucas opções profissionais a nível nacional,
os pilotos não são exceção no panorama português.
Emigram para terem trabalho, melhores condições de
vida e oportunidades de evolução na carreira
YSSYGUY/WIKIMEDIA COMMONS
Texto Paula Carvalho Silva
Boeing 777 - 200 ER
LUFTHANSA (ALEMANHA), Vietnam Airlines, Lion Air (Indonésia),
Asiana Airlines (Coreia do Sul), Emirates Airline (Dubai), Aeronova (Espanha) e Vueling (Espanha) são apenas alguns exemplos de companhias e
países onde encontraram lugar alguns
pilotos portugueses. A crescente oferta e decrescente procura destes profissionais – fruto de um cada vez menor
número de companhias aéreas nacionais – forçou muitos a iniciarem uma
vaga de emigração nunca vista nesta
profissão. Mas não só. São também
cada vez mais aqueles que, mesmo
estando já integrados numa empresa como a TAP, optam por procurar
melhores condições além-fronteiras.
14
Sirius janeiro | fevereiro
Tudo passa, a maioria das vezes,
por encontrarem empresas mais estáveis, onde a evolução na carreira não
seja uma simples miragem. E é precisamente na TAP onde a sangria é cada vez mais evidente, com cerca de 18
pilotos a abandonarem a companhia
em 2012 e, possivelmente, mais sairão
este ano. António Monteiro, diretor de
Relações Públicas da TAP, assegura à
Sirius que, dos 18 profissionais, cinco
abandonaram a empresa por antiguidade – estavam adstritos ao A340 – e
confirma que os restantes terão ido
para o Médio Oriente. «Se, em 2013,
a situação se repetir, teremos de abrir
concurso, mas não será nenhum drama, porque aparecem sempre muitos
candidatos», assegura. «E depois há
quem fique sempre a ganhar, porque
os pilotos que ficam vão a comando
mais depressa», reforça António Monteiro. A Emirates Airline, onde trabalham cerca de 15 pilotos portugueses,
é uma das companhias mais apetecidas na área geográfica referida. Infelizmente, dos três pilotos contactados
pela Sirius que se encontram nestas
circunstâncias nenhum respondeu às
perguntas e ao repto de partilhar as
suas experiências.
Mas não se pense que o percurso
no estrangeiro é fácil. Na verdade, é
quase sempre sinuoso e pouco consentâneo com uma vida familiar normal. Tito Viegas é piloto sénior. Aliás,
Ásia, continente de novas oportunidades. Na sul-coreana Asiana Airlines
trabalham Luís Azevedo (60 anos) e
João Gonçalves (27 anos), pilotos de
gerações e com percursos bem diferenciados. O primeiro iniciou a sua
aprendizagem na Força Aérea Portu-
D.R
Cmdt. Tito Viegas, na Vueling desde 2006;
Cmdt. Luís Azevedo, há quase 11 anos na Asiana
D.R
em fevereiro de 2014 perfaz 65 anos
de vida, altura em que dará por finda
a sua carreira aeronáutica. Hoje ainda trabalha na companhia espanhola
Vueling, mas, até lá chegar e depois
de se ter iniciado na Força Aérea, passou pela SATA, LAR Transregional, Air
Columbus, DHL (Bruxelas), Air Luxor,
Air Madrid e Clickair. Conta que, como
quase todos os pilotos portugueses,
ainda tentou a TAP, não tendo passado
dos exames médicos e psicotécnicos.
Sem querer alongar-se, afirma que
da Air Luxor «guarda as melhores e
piores recordações» de toda a sua vida aeronáutica. Dos espanhóis só diz
bem: «Na companhia respeitam e admiram os pilotos portugueses, o seu
profissionalismo, a sua maneira de estar e de atuar no cockpit. Nunca me
senti estrangeiro», assinala. A opção
Vueling em 2006 também foi melhor
do que ir para a Ásia ou para o Médio Oriente, mudança que implicaria
«evidentes sacrifícios a nível familiar».
Para além de ganhar entre seis mil
e nove mil euros por mês, para Tito
Viegas as grandes vantagens de trabalhar na Vueling passam por «estar
a apenas duas horas de voo de casa, viver nos arredores de Barcelona,
poder gerir várias opções de escala»,
entre as quais folgas acumuladas até
oito dias por mês.
Apesar de tudo, este comandante afirma que quando recorda Portugal sente «grande saudade dos tempos da Air Luxor, dos aviões voados,
dos destinos conhecidos, da Austrália
às Maldivas, Koweit, Cabul, Ilha de
Ascensão, Moçambique, das grandes
e agradáveis estadas, da sã camaradagem». E assegura que foi aqui, em
território nacional, que evoluiu tecnicamente, mais precisamente aos comandos dos A320 e A330, onde teve o
«privilégio de partilhar o cockpit com
grandes profissionais da nossa praça».
guesa, onde permaneceu 13 anos, o
segundo – bem mais novo – concluiu
o brevet na OMNI, em Tires, já em
2009. Talvez por isso também tenham
sentimentos diferentes em relação a
exercerem a profissão em Portugal.
«Sou e serei sempre português e sintome triste pelo que vejo e oiço sobre o
meu país», por isso, diz Luís Azevedo «muito dificilmente trabalharia em
Portugal. Talvez se tivesse ingressado
na TAP após sair da FAP…». Já João
Gonçalves, que nunca voou a partir de
Portugal (exceto durante o PLA), logo
nunca falou português no cockpit, nem
voou com a bandeira nacional, nem
sequer voltou para ao pé da namorada,
família e amigos depois de um voo no
seu próprio país, assegura que trabalhar em Portugal «seria um sonho, e
sem dúvida trocaria talvez melhores
condições no estrangeiro por poder voar numa companhia aérea nacional».
Ainda em solo português, Luís Azevedo voou um ano pela SATA e cinco
anos, «extremamente ricos em termos
profissionais e humanos», pela Air Columbus, onde chegou a comandante no espaço de oito meses. «Infelizmente, a companhia não sobreviveu
a uma gestão desastrosa e os últimos
meses de 1994 foram penosos, pois
os atropelos sucederam-se e os salários deixaram de ser pagos», conta. Foi
nesta altura que decidiu emigrar. «O
panorama da aviação em Portugal não
era animador, pois, excetuando a TAP,
pouco mais existia. Poderia, eventualmente, ingressar numa companhia tipo charter, mas depois da experiência
anterior não aceitaria trabalhar outra
vez para incompetentes e desonestos.»
Assim, em 1995 rumou a Taiwan e
à EVA Airways, uma mudança drástica, uma «cultura diferente, outro tipo
de desafios». Aceitou um downgrade
janeiro | fevereiro Sirius
15
BOEING
TEMA DE CAPA
Boeing 737 - 900 ER
Depois dos atentados do 11 de setembro às Torres Gémeas, o pânico instalou-se nos mercados asiáticos e o seu
contrato viria a ser cancelado. No entanto, foram poucos os meses que decorreram até ingressar na Asiana Airlines, onde trabalha há quase 11 anos.
E assegura: «Foi o melhor contrato que
tive em toda a minha vida profissional.
Seria exaustivo enumerar as diferenças
para melhor entre a minha realidade e
a de colegas a trabalhar em Portugal,
mas, para simplificar, posso dizer que
ganho bastante mais, tenho base em
Frankfurt, usufruo de 13 dias de folgas
consecutivas por mês, escolho os dias
em que quero folgar, escalas a dois meses e tenho uma atmosfera de trabalho
excelente. Sou respeitado, não existem
querelas laborais e os dias de folga são
sagrados e intocáveis.»
16
Sirius janeiro | fevereiro
D.R
e voou durante dois anos como cruise
captain – uma espécie de copiloto sénior –, mas valeu a pena. «Obtive as
qualificações em B767 e B747-400 e fui
confrontado com uma aviação completamente diferente daquela a que estava
habituado, com ótimas condições de
trabalho, excelente salário e o sentir fazer parte de algo importante», explica.
João Gonçalves num A320 da Fly Niky. Hoje, é primeiro-oficial na Asiana Airlines
Com plena consciência de que
“apenas” o curso não chegava, João
Gonçalves, filho de um comandante
reformado da TAP, decidiu avançar
para um type rating, e explica porquê:
«Simplesmente chegou-se ao ponto
de haver demasiadas escolas de aviação, com pouco ou nenhum critério
de admissão e muito pouca saída profissional.» Portanto, ter o curso de piloto e 200 horas de voo deixou de ser
suficiente.
Restavam-lhe, assim, três hipóteses,
visto que desistir nunca entrou na equação: tirar o curso de instrutor, seguido
de um estágio de instrução numa escola; comprar pacotes de horas de voo
em qualquer aeroclube para fazer hour
building, ou fazia um type rating. Esta
última hipótese foi a escolhida, apesar
de implicar um investimento avultado.
Começou, assim, uma pesquisa intensiva por TRTO e companhias aéreas onde pudesse fazer a qualificação junta-
Pedro Sottomayor com a tripulação, onde o
inglês é a única língua comum
D.R
go e os oito dias de folga seguidos a
cada dois meses.
Mas também existem desvantagens,
sobretudo por a Coreia do Sul ficar à
distância de 20 horas de voo de Portugal. Também «o choque cultural é bastante grande e os primeiros meses são
complicados». No entanto, «a ajuda,
cooperação e meios concedidos pela
companhia para os pilotos, sobretudo
estrangeiros, é fantástica», assegura.
Na Asiana, trabalha mais um Comandante português, Luís Dias que
está na companhia há cerca de 6 anos.
mente com a line training (período de
formação inicial em que o piloto voa
com passageiros em transporte aéreo
mas em treino, sendo que o comandante tem de ser instrutor) e de preferência
num Boeing 737 ou num Airbus 320.
A escolha recairia na austríaca Fly Niki, em grande parte pelo fator «qualidade e por ser uma companhia aérea
em crescimento». Foram seis meses e
mais 120 horas de voo num A320 para completar a formação que lhe daria,
meses mais tarde, o primeiro contrato
na companhia em que tinha apostado.
Mas nessa altura esta já não era a sua
única opção. «Tive mais propostas de
trabalho, entre as quais aqui em Portugal para a SATA, na Polónia para a
Wizzair, mas, uma vez que tinha acabado de assinar com a Fly Niki, devia
lealdade nem que fosse pela oportuni-
dade que me tinha sido dada», explica.
Um ano depois, a companhia foi
comprada pelo grupo alemão Air Berlin e os pilotos estrangeiros que não
falavam alemão fluente foram dispensados. «Felizmente, já tinha adquirido
a experiência suficiente para conseguir
arranjar outro emprego.»
Mais opções, outros tantos processos
de recrutamento depois, João Gonçalves ingressa na Asiana Airlines como
primeiro-oficial na frota A320. Com
uma frota extensa de A320 e 330, B747,
767 e 777 e encomendas fixas de A380
e A350, a Asiana «era uma companhia
onde poderia evoluir». Mas outros fatores pesaram na escolha, como a formação, a duração do contrato (três anos,
sempre renovável), o salário líquido
acima dos 5500 euros mensais (entre
6500 e 7000 dólares), o alojamento pa-
EMIRATES RECRUTA PORTUGUESES
VERDADEIRAMENTE INTERNACIONAL – com trabalhadores provenientes de mais
de 137 países e mais de 50 línguas –, a Emirates Airline não só já recrutou pelo menos 15 pilotos portugueses como abriu uma rota para Lisboa a 9 de julho de 2012.
Em Portugal estão a trabalhar para a companhia 26 portugueses e no Dubai estão baseados à volta de 250 cidadãos lusos.
O entusiasmo notou-se no passado dia 17 de novembro, em Lisboa, data de mais um Open
Day, evento de recrutamento que juntou mais de 500 candidatos. No dia 23 do mesmo
mês, a história repetiu-se na cidade do Porto. Apesar de ser exclusivo para pessoal de cabina, no local revelaram-nos que se um piloto aparecesse para entregar o currículo tal iniciativa não seria em vão.
Explorar outras paragens. A bordo
da indonésia Lion Air está Pedro Sottomayor (28 anos), que terminou o PLA
em julho de 2008 na Academia Aeronáutica de Évora. O lado do mundo
onde se encontra atualmente a viver
descreve-o como «o incrível Sudeste
Asiático. É uma zona do mundo fantástica, com possibilidades para viajar
e aventuras que nunca mais acabam!
Vou regularmente a sítios onde a maioria junta dinheiro durante anos para
passar 15 dias…», descreve. E pormenoriza: «Já fiz cursos de mergulho, subi a vulcões, fiz viagens inesquecíveis,
a última a Timor Leste, conheci gente
de todo o mundo que ficaram meus
amigos para a vida.»
Mas não existe bela sem senão. A diferença cultural pesa e chega a ser perigosa. O inglês é a única língua comum
e parte das tripulações locais, bem como o controlo de tráfego aéreo, não a
dominam. Para além disso, a Indonésia
é possuidora de uma geografia e clima
particulares, com a época das chuvas
– novembro a abril – a tornar-se um
obstáculo enorme. Depois, o país carece de infraestruturas modernas, como,
por exemplo, pistas curtas e mal mantidas, por isso «voa-se muito à mão e
fazem-se aproximações de não precisão e ILS so Cat 1», enfim, dificuldades
que vão sendo geridas.
Pedro Sottomayor, que passou pela
Gestair para tirar o curso de piloto instrutor e fez a qualificação para largar
para-quedistas para acumular horas,
janeiro | fevereiro Sirius
17
TEMA DE CAPA
Começar por baixo. Os recém-brevetados têm cada vez maiores dificuldades
em encontrar trabalho. Foi o que aconteceu a Joel Lutas (22 anos), que, tendo
acabado o ATPL na Escola de Aviação
Aerocondor, da Gestair, e sem encontrar
nada «mais aliciante e suportável monetariamente», acabou por ingressar na
Aeronova, em Espanha. «Esta pareceume uma boa opção, consciencializando-me sempre das minhas limitações,
devido ao facto de não ter experiência.»
A empresa deu-lhe formação, o primeiro contacto com o avião e a primeira
experiência operacional. Esta última fase durou uma semana e foi constituída
por 12 setores, seis deles como copiloto
e os restantes no jump seat. A bordo da
Aeronova faz-se quase de tudo: servir
catering aos passageiros, carregar as ma18
Sirius janeiro | fevereiro
Boeing 777 - 200 ER
tem vantagens em trabalhar numa companhia como a Aeronova. Desde logo, a
diversidade da operação, que passa por
voos de linha regulares e charter express
de passageiros ou apenas de carga. E
também a componente do voo, porque
o avião «é um pouco trabalhoso para
controlar, devido à força necessária que
se tem de exercer nos controlos de voo»,
e opera-se para todos os aeroportos da
Europa e Norte de África.
Agarrar-se com unhas e dentes às
oportunidades que surgem é o que advoga e o que fez Rui Parreira (30 anos),
hoje a trabalhar na Lufthansa, mas tendo passado por um longo processo de
recrutamento, testes e muito, muito estudo.
Nos primórdios, não assim há tanto
tempo quanto isso, formou-se na OMNI,
tirou o curso de instrutor na Gestair e
voltou à OMNI para dar instrução como
freelancer. Sem grandes perspetivas em
Portugal – tentou a TAP, a Aeroatlântico, a Portugália e a SATA, esgotando
todas as possibilidades a nível nacional
–, foi uma conversa com um colega que
tinha sido chamado para uma entrevista para a Lufthansa Italia que despoletou o seu próprio processo. Enviou
email para o contacto que lhe deram e
las, acomodar a carga, ajudar a mudar
a configuração do avião e, claro, voar
aos comandos do Metroliner.
«Não foi fácil», confessa Joel Lutas.
No entanto, «os comandantes e os colegas mostraram-se extremamente disponíveis para me ajudar, corrigir e ensinar. Foram e são uma ajuda preciosa».
E nem o ordenado é muito aliciante: 950 euros base por mês, acrescidos
de 60 euros de ajudas de custo diárias
quando fora do país e 40 euros em Espanha. Mas este piloto garante que exis-
D.R
conta que o seu ordenado base ronda
1700 euros por mês, mas ainda recebe
por hora de voo e tempo de serviço. Assim, num mês em que se voe 100 horas,
ganha-se cerca de 3100 euros. Mas não
se pagam impostos e o alojamento, água
e eletricidade ficam a cargo da empresa. Trabalham 10 semanas e folgam duas, com direito a mais 12 dias por ano.
Apesar de o estar longe da família
ser o fator claramente pior, Pedro confessa que o que «achava que iam ser
dois anos de interrupção, acabou por
tornar-se na vida que sempre quis!».
Voar até aos 65 anos e «beber umas
cervejas à sombra de uma qualquer
bananeira aqui nas Filipinas ou pela
Tailândia» é o futuro de sonho do comandante Leonel Gonçalves (50 anos),
dono de um currículo extensíssimo.
Ora vejamos: FAP em 1982, Aerocondor (PCA), Lusitanair, AeroService (em
Brazzaville, República Popular do Congo), que, em 1989, é o primeiro trabalho
no estrangeiro, Aerobeira, Air Luxor,
LAR, PGA, Air Macau, Vueling (Espanha), Click Air (Espanha), King Fisher
(Índia), Wind Jet (Sicília, Itália) e, finalmente, em 2007, Vietnam Airlines.
Depois de anos a vaguear fora de
portas, Leonel Gonçalves responde de
uma forma muito simples à pergunta
«que sentimentos nutre profissional e
pessoalmente por Portugal?»: «Ótimo
para passar férias no verão.»
Joel Lutas, piloto da Aeronova
Dois meses depois, fez um teste num
simulador de um B737 e uma parte de
CRM (Crew Resource Management). A
terceira fase durou dois dias e consistiu
numa série de testes às soft skills, ou seja, a características da personalidade que
determinam as reações ao stress, entre
outros pormenores. O processo culminou com uma entrevista, e Rui Parreira
passou a tudo. «Quando me disseram
‘bem-vindo à Lufthansa Italia’ fiquei superfeliz.»
Seguia-se o type rating em Viena, numa altura em que já se ouvia falar do
encerramento da companhia e se questionava a motivação dos pilotos. Mas o
processo continuou com cursos de segurança em Milão, Operation Conversion
D.R
MILAD/WIKIMEDIA COMMONS
pouco depois estava a preencher uma
candidatura online. Os primeiros testes
foram no Centro Aeroespacial alemão
em Hamburgo. Psicotécnicos em computador e de coordenação motora. Rui
Parreira revolta-se quando lhe dizem para não criar ilusões, porque acredita que
com esforço tudo é possível. Para esta
fase, em que foram fornecidos testes de
treino aos candidatos com o conselho de
começarem a praticar dez dias antes e
Rui optou por pegar neles com um mês
de antecedência. A estratégia resultou e
este piloto passou à fase seguinte.
Rui Parreira, piloto da Lufthansa, optou por continuar a morar em Portugal
Course em Amesterdão e mais simuladores. As horas necessárias ao type rating
foram cumpridas sob enorme pressão,
com a empresa a fechar já algumas rotas, mas Rui Parreira conseguiu terminar
o treino uma semana antes do encerramento da companhia.
Em agradável volte face, a Lufthansa
envia uma carta aos pilotos a anunciar
que, caso quisessem aprender alemão,
a empresa pagava o curso. «Fui para o
fundo de desemprego italiano e para
o curso de alemão em outubro», conta o piloto, que confessa ter sido uma
das fases mais difíceis. «Já estudei muito, tinha tirado Ciências Aeronáuticas,
mas o curso de alemão foi a coisa mais
difícil que fiz em toda a minha vida,
porque tinha pouco tempo e estava sob
enorme pressão. Desse curso dependia
conseguir arranjar trabalho ou não.» E,
depois de uma última entrevista em alemão, lá ficou.
Foi para Bremen, para mais aulas de
teoria ATPL e de… alemão. Simuladores
e, finalmente, o voo. «Quando acabei,
queria era divertir-me, começar a voar
a sério», suspira Rui Parreira. Quanto à
Lufthansa e aos alemães…, bem, a primeira «tem um lado social fantástico»
e os segundos «são bastante diferentes
do que julgamos e para melhor, fiquei
surpreendido pela positiva», assegura.
A voar desde julho de 2012 pela Lufthansa, Rui Parreira aufere cerca de 3500
euros e tem a garantia de ser aumentado todos os anos: 300 euros por mês
no primeiro ano, 700 no segundo, e assim sucessivamente. Aos comandos de
A319, 320 e 321 fazem-se voos curtos;
o mais comprido que este piloto já fez
foi para a Rússia. Duas horas e meia é
o que separa o emprego e a casa deste
piloto, que optou por continuar, mesmo
assim, a morar em Portugal, mesmo com
o acréscimo de cansaço inerente às viagens de ligação.
De toda a experiência ficam dois sentimentos contraditórios: «Os alemães são
leais e justos, foram incansáveis quando
a outra companhia fechou, pagaram-me
o curso, que foi bastante caro, o que me
deu prazer e revolta, porque em Portugal nunca fui a uma entrevista apesar
de ter entregue currículos em todas as
companhias. Nunca me chamaram para
falar com ninguém e na Lufthansa Italia
foram chamados 2400 pilotos e passaram apenas 28…»
Quanto ao futuro, João Gonçalves,
da Asiana, é quem exprime melhor o
sentimento do todo: «Tudo está muito
incerto em relação ao que será o futuro,
e previsões não são mais do que manifestações de desejos.»
janeiro | fevereiro Sirius
19
BRIEFING
OS BIOCOMBUSTÍVEIS DE SÍNTESE
E A PREVENÇÃO DOS FOGOS FLORESTAIS
O processo de produção de biocombustíveis de síntese
(BTL – Biomass-to-Liquid) permite converter qualquer tipo
de biomassa em combustíveis líquidos com características
idênticas aos combustíveis obtidos a partir do petróleo
Texto Jorge Lucas*
Posteriormente, a partir da década de 50, a tecnologia
CTL registou grandes desenvolvimentos na África do Sul,
através da empresa Sasol. Novamente um pais rico em reservas de carvão mineral e com fortes restrições à importação de combustíveis líquidos face ao embargo comercial imposto contra o apartheid. Atualmente, o país com
maiores investimentos nesta tecnologia é a China: maior
produtor mundial de carvão mineral e segundo maior consumidor mundial de combustíveis líquidos.
Muito basicamente, os combustíveis de síntese são obtidos a partir da gaseificação da matéria-prima (carvão
mineral, no caso do CTL), seguido da limpeza e acerto
da mistura do syngas (CO, H2) e posterior síntese num reator Fischer-Tropsch.
No caso dos combustíveis sintéticos obtidos a partir do
carvão mineral, a grande desvantagem está relacionada
20
Sirius janeiro | fevereiro
AIRBUS
BIOMASSA (RESÍDUO FLORESTAL) é matéria-prima
abundante nas matas e florestas nacionais. Atualmente já não há necessidade de proceder à recolha de lenha
para aquecimento e preparação de refeições; a pastorícia
é cada vez mais concentrada e «aditivada», percorrendo
áreas de território cada vez menores. Como resultado, a
floresta acumula combustível até… à próxima época de
fogos florestais.
Segundo o manifesto «Outra vez os incêndios florestais», publicado no semanário Expresso do passado dia 10
de novembro, subscrito por 21 personalidades, «o custo
anual dos incêndios ascende a mil milhões de euros. As
melhorias no sistema de combate a incêndios são consensualmente reconhecidas, mas falta resolver as causas profundas e estruturais que estão na origem das dificuldades
da floresta portuguesa».
Os combustíveis de síntese como alternativa aos combustíveis líquidos de origem fóssil têm já uma longa história. Tudo começou na Alemanha, na década de 20, com
a conversão de carvão mineral em combustíveis líquidos
(CTL – Coal-to-Liquid). Por ser um país pobre em petróleo, mas rico em reservas de carvão, a Alemanha utilizou
esta tecnologia para produzir combustíveis líquidos durante a 2.ª Guerra Mundial.
com as emissões associadas, em especial as emissões de
CO2. Uma vez que o carvão se trata de um combustível
pobre em átomos de hidrogénio, é necessário trocar parte
do CO obtido na gaseificação por moléculas de H2 extraídas da água através do processo químico water-gas shift.
Só no processo de produção de um combustível sintético
a partir do carvão mineral é emitida a mesma quantidade
de CO2 que é emitida na combustão do produto final. Portanto, considerando só as emissões de CO2, trata-se de um
processo com o dobro do impacto dos produtos derivados
do petróleo. Acrescem outras emissões com impacto mais
local na zona circundante da instalação CTL, como a fuligem e os óxidos de enxofre (que originam chuvas ácidas).
Mais recentemente foi desenvolvida a tecnologia GTL –
Gas-to-Liquid, tendo como matéria-prima o gás natural. A
primeira instalação de grande dimensão, desenvolvida em
conjunto pelas petrolíferas Shell e Qatar Petroleum, começou a operar em Pearl, no Qatar, em junho de 2011. Uma
segunda instalação de grande dimensão está em construção na Nigéria, numa parceria entre a Chevron, a Sasol e
a petrolífera local.
Entre 2008 e 2010 foram realizados vários voos experimentais utilizando como combustível misturas de jet-fuel
sintético GTL com jet-fuel convencional. Em 2011, a mistura 50/50 de jet-fuel sintético com jet-fuel convencional
obteve a certificação ASTM D7566 (Aviation Turbine Fuel
Containing Synthesized Hydrocarbons).
No que toca às emissões de CO2 do GTL, são da mesma
ordem de grandeza do jet-fuel convencional. O gás natural é basicamente constituído por metano, uma molécula contendo quatro átomos de hidrogénio e um de carbono, logo muito mais balanceada em termos dos produtos
presentes no syngas. As emissões de outros poluentes são
também praticamente nulas (fuligem e óxidos de enxofre).
De salientar que quer o Qatar quer a Nigéria são países
com grandes reservas de gás natural (possuem a terceira e
a oitava maiores reservas mundiais, respetivamente), mas
menores reservas de petróleo. O GTL permite a estes países
converter um combustível menos versátil num combustível com maior gama de utilizações, incluindo, claro está,
o setor do transporte aéreo onde não há, no curto/médio
prazo, alternativa à utilização de um combustível líquido.
Como primeira conclusão, podemos afirmar que existe
uma notória correlação entre os países impulsionadores
destas tecnologias e o respetivo volume das reservas de
carvão e gás natural.
Portugal não tem, até ao momento, reservas conhecidas
quer de carvão mineral quer de gás natural. Tem, no entanto, muita biomassa. Ao que parece, em excesso! Veja-se a quantidade de combustível em excesso existente nas
matas portuguesas que todos os anos alimenta os fogos
florestais. São toneladas de CO2 emitidas todos os anos
para a atmosfera sem que realizem qualquer trabalho útil.
Para além da biomassa, Portugal dispõe de conhecimentos nas várias áreas do BTL. O LNEG – Laboratório
Nacional de Energia e Geologia desenvolve há já vários
anos trabalhos na área da gaseificação e limpeza do syngas. A SGC Energia tem também experiência em todo o
processo, desde a gaseificação à síntese Fischer-Tropsch.
Portugal tem também já experiência na valorização energética quer de resíduos florestais quer de resíduos urbanos.
Por exemplo, em Setúbal, o Grupo Portucel/Soporcel opera
uma central termoelétrica com a biomassa resultante do
descasque das árvores. Em Santa Iria de Azoia, a Valorsul produz energia elétrica a partir de resíduos urbanos.
Não seria mais razoável estar a produzir biocombustíveis
a partir destas mesmas biomassas?
Há quem defenda que o futuro energético da humanidade tenderá a ser cada vez mais elétrico, em especial
quando o Homem conseguir dominar a energia nuclear de
fusão. Poder-se-á converter a grande generalidade dos consumos atuais para eletricidade. Mas muito dificilmente se
conseguirá a mesma alternativa para o transporte aéreo…
Como tal, estar a converter biomassa diretamente em
eletricidade reduz toda a energia química das moléculas
da biomassa a eletrões. Estes nunca mais poderão voltar
a ser convertidos em energia química. Por outro lado, se
convertermos a mesma biomassa num combustível líquido, mantemos a possibilidade de vir a converter este combustível líquido em eletricidade através, por exemplo, da
sua combustão num motor alternativo acopulado a um
gerador elétrico. Face à eletricidade, o combustível líquido
apresenta também mais facilidade em ser armazenado e
transportado. Existe, portanto, uma «hierarquia» entre as
várias formas de energia.
Estão em curso várias iniciativas que pretendem estimular o desenvolvimento dos biocombustíveis para a aviação. Destacamos, entre os vários programas, o European
Advanced Biofuels Flighpath e o SABB – Sustainable Aviation Biofuels Brazil. O primeiro, cujo objetivo principal é
atingir a «produção anual de dois milhões de toneladas
de biocombustível produzido de forma sustentável em
2020», é liderado pela Comissão Europeia, em coordenação com a fabricante Airbus, e conta com a participação
de companhias operadoras aéreas e empresas produtoras
de biocombustíveis. O segundo é liderado pelas fabricantes Embraer e Boeing e conta com vários parceiros, quer
brasileiros quer de outros países. Em comum, verifica-se
que estes programas são «puxados» pelos fabricantes de
aeronaves e pelo regulador, no caso europeu. As operadoras estão também presentes no caso europeu, o que faz
todo o sentido, uma vez que serão elas a pagar a fatura
dos biocombustíveis.
Portugal, à sua dimensão, deverá dar o seu contributo.
O processo BTL apresenta-se como uma alternativa lógica
face ao contexto nacional.
O autor:
Jorge Lucas, assessor técnico da APTTA.
Para qualquer questão ou comentário sobre o presente artigo,
favor remeter para o seguinte e-mail: [email protected].
janeiro | fevereiro Sirius
21
REPORTAGEM
A BASE DOS
FALCÕES E JAGUARES
Com duas esquadras
operacionais, a Base Aérea
5 assegura a defesa aérea
nacional e os destacamentos de
policiamento aéreo da NATO
Texto Alexandre Coutinho Fotos André Garcez
A BA5 DISPÕE DE DUAS ESQUADRAS DE F-16
MLU, 201 Falcões e 301 Jaguares, mantendo a
tradição, mas executando o mesmo tipo de missões. Na prática, há apenas um grupo operacional
e existe alguma apreensão sobre a continuação
deste formato por muito mais tempo. Às restrições orçamentais, que limitam o número de
voos ao estritamente necessário para manter os
níveis de operação e a proficiência dos pilotos,
vai agora concretizar-se a anunciada venda de
nove aparelhos à Roménia.
Atualmente existem 35 aparelhos F-16 MLU
(Peace Atlantis II), «mas não estão todos a voar»,
revela o Coronel Paulo Mateus, comandante da
BA5. O mesmo responsável admite que houve
uma redução considerável (50%) do regime de
esforço desde 2010. No entanto, estas restrições
não comprometem as missões que esta unidade
22
Sirius janeiro | fevereiro
Quatro dos
cinco módulos de
manutenção dos
motores são feitos na
oficina de motores
da BA5
tem de cumprir nem a segurança de voo, fatores inquestionáveis para o mesmo responsável.
«Sentimos as mesmas dificuldades do País e tivemos de alterar algumas rotinas, alguns processos e fazer certos sacríficos, mas obtivemos
poupanças na ordem de 30%», afirma. A BA5
assegura o nível de prontidão de 15 minutos, 24
horas por dia, com um total de 25 pilotos MCR
(Mission Combat Ready). Os F-16 MLU portugueses são multi-role FBX/ADX (all weather, dia
e noite). «A mission capability rate da BA5 é de
Pedro Santa Bárbara compara o cockpit do F-16 com o do Fiat
G91: «Espaço mais reduzido, posição mais reclinada do banco e mais
instrumentos. O G91 era mais básico» (à dir.)
Coronel Paulo Mateus, comandante da BA5, e Cmdt. Santa Bárbara,
presidente da APPLA
mais 65%, mas podia ser superior», frisa o Coronel Paulo Mateus.
Os pilotos dos F-16 MLU dispõem dos novos capacetes JHMCS (Joint Helmet-Mounted
Cueing System), em que a projeção de dados
na viseira acompanha os movimentos do olhar,
NVG (Night Vision Goggles), para visão noturna, e Targeting Pod, para detetar alvos e guiar
munições. Entre estas, destaque para os mísseis
ar-ar, sidewinder (para combate próximo), ar-chão LGB/PGM (Laser Guided Bombs/Precision
Guided Munitions) e canhão de 20 mm (seis mil
tiros por minuto).
As esquadras integram igualmente pilotos
belgas e norte-americanos, ao abrigo do intercâmbio de experiências dos programas EFAP
– European Participating Air Forces (Portugal,
Dinamarca, Holanda, Bélgica e Noruega) e MN-FP (Multi-National Fighter Program), com os
Estados Unidos. «No âmbito da NATO, a Força
Aérea Portuguesa dispõe de um destacamento
de 100 militares e seis aeronaves F-16 prontas
para operar, no prazo de 30 dias, seja onde for
no mundo», frisa o Coronel Paulo Mateus. Em
2007, nos meses de novembro e dezembro, a FA
assegurou o Lithuania Air Policing e, em agosto
VISITA
Incluiu um percurso
pela doca 4, hangar
de manutenção
e oficina de
motores, bem como
deslocações às
Esquadras 201 e 301
e aos simuladores.
Criada em 1959, a
Base Aérea n.º 5
ocupa uma área
de 482 ha na zona
de Monte Real. Na
BA5, os efetivos
distribuem-se
pelo grupo de
apoio e pelo grupo
operacional. No
total, são 807
pessoas, 29% das
quais pilotos
e setembro de 2012, o Iceland Air Policing. Em
2011, no NATO Tiger Meet, a Esquadra 301 ganhou o Silver Tiger Award, como Best Overall
Squadron e Best Flying Squadron, alcançando a
distinção de Excellent no Tacevall realizado no
mesmo ano, em Ovar.
Fundamental para o elevado nível de proficiência dos pilotos de F-16 da Força Aérea é a
modernização MLU (Mid Life Upgrade) dos aparelhos, uma transformação iniciada em 2003, na
OGMA (Indústria Aeronáutica de Portugal), que
executa 70% do trabalho. Na doca 4, duas dezenas de militares asseguram os restantes 30%
do MLU, culminando com o voo de ensaio e o
regresso à OGMA para a pintura final. Em julho
de 2013, toda a transformação MLU ficará concluída. Quatro dos cinco módulos de manutenção dos motores também são feitos na oficina
de motores da BA5 (a Pratt & Whitney só não
deu o core do motor).
A APPLA (Associação dos Pilotos Portugueses
de Linha Aérea) e a AFAP (Associação da Força
Aérea Portuguesa) organizaram, no dia 6 de dezembro, uma visita à BA5 para os pilotos de linha
aérea que os deixou impressionados com as capacidades da Força Aérea e dos F-16.
janeiro | fevereiro Sirius
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REPORTAGEM
PILOTOS DA TAP NA 'PONTA DA
LANÇA' DA BASE AÉREA 5
Foi com grande orgulho e satisfação que o 45.º
Curso de Pilotos TAP realizou, no dia 17 de maio
de 2012, o festejo do seu 13.º aniversário ao
serviço da TAP Portugal.
Texto e Fotos 45º Curso de Pilotos da TAP
PARA COMEMORAR ESTE MARCO
importante na sua vida profissional,
foi-lhes proporcionada uma visita à Base Aérea n.º 5, da FAP, em Monte Real.
O Coronel Piloto-Aviador Paulo Mateus, comandante desta unidade aérea
fundada, em 1959, sob o lema «Alcança quem não cansa», autorizou o nosso
pedido e convidou este grupo de pilotos a desfrutar de um dia com cariz
aeronáutico militar e proporcionou um
acrescido conhecimento das missões
desta unidade aérea e suas esquadras
de voo, bem como um honrado convívio aeronáutico com os pilotos avia24
Sirius janeiro | fevereiro
dores de defesa aérea das Esquadras
de Voo 201, Falcões, e 301, Jaguares,
a operar F-16 MLU.
A visita começou com as apresentações no Salão Nobre do Comando
da BA5 e o grupo foi acompanhado
pelo Ten/Pilav Augusto (Esq. 201),
iniciando a visita no estacionamento
estático de aeronaves que operaram
no passado nesta unidade aérea. Alguns dos pilotos TAP recordaram experiências aeronáuticas ao serviço da
FAP e explicaram a missão primária
e as principais características técnicas
destas aeronaves:
– O F-86F Sabre, em 1960, com um
total de 69 aeronaves, operou em duas
esquadras de combate: Esquadra 51,
Falcões, e Esquadra 52, Galos, ambas
com a missão primária de caça e interceção diurna e missão secundária
de ataque ao solo.
– O Fiat G-91 R4 Gina, em 1966,
com um total de 40 aeronaves adquiridas à Alemanha, operou na Esquadra 121, Tigres, com a missão de combate em teatro de guerra ultramarina
no ataque ao solo e reconhecimento.
Anos mais tarde viria a equipar as Esquadras 301, Jaguares, e 303, Tigres.
– O T-33A Shooting Star, em 1974,
com 30 aeronaves, veio iniciar nesta
Base Aérea a EICPAC – Esquadra de
Instrução Complementar de Pilotagem
de Aviões de Combate, que posteriormente se designou por Esquadra 103,
Caracóis.
em ambiente marítimo.
Algumas capacidades destas aeronaves da FAP são: Link-16, equipamento de visão noturna Night Vision
Goggles – NVG, mísseis ar-ar de médio alcance AIM-120 C5 (AMRAAM),
bombas de guiamento Laser – GBU e
guiamento inercial GPS-JDAM, identificação e seguimento de alvos – Targeting Pod – TGP e visualização através
do capacete Helmet Mounted Cueing
System – HMCS.
Para além desta apresentação, com
intuito didático e a pedido prévio, ficámos mais conhecedores sobre as técnicas e formas de interceção de aeronaves civis pela defesa aérea nas FIR
de Lisboa e Santa Maria.
– O T-38A Talon, em 1977, com um
total de 12 aeronaves vindas dos EUA,
foi atribuído inicialmente à Esquadra
51, Falcões, e destinava-se à instrução
avançada de combate, para anos depois todos serem atribuídos à Esquadra 103, Caracóis.
– O A7P Corsair II, em 1981, com
um total de 50 aeronaves, operou em
duas esquadras de voo, a Esquadra
302, Falcões, com a missão de TASMO
– Interdição e Defesa Aérea e Apoio
Aéreo Tático a Operações Marítimas,
e em 1984, com a Esquadra 304, Magníficos, com a missão primária inicial,
a execução all weather de operações
de interdição aérea, luta aérea ofensiva e defensiva e apoio aéreo tático
a operações marítimas.
Após esta histórica exposição estática, fomos visitar os hangares da Manutenção, nomeadamente as secções
de motor e célula da aeronave F-16
MLU, onde recebemos uma apresentação da complementaridade da missão
e responsabilidade desta importante
área. Aqui, são convertidos os motores
das aeronaves F-16, F100-PW-100/200,
da Pratt & Whitney, em F100-PW-220E,
motor de grande qualidade, com elevada fiabilidade e durabilidade.
Efetuam também a reconversão dos
F-16A/B em F-16 AM/BM com a incorporação do kit MLU (Mid Life Update),
de forma a dotar esta aeronave de capacidade de uso de armas e sistemas
de última geração.
De seguida tivemos um breve contacto com o simulador de voo, tendo
alguns aproveitado a oportunidade da
vida de «sentir» nas mãos um F-16, e
no final da manhã veio o momento importante e aguardado com expectati-
OS PILOTOS TAP
RECORDARAM
EXPERIÊNCIAS
AO SERVIÇO DA
FORÇA AÉREA
va: o convite feito pelo Maj/Pilav João
Raimundo, comandante da Esquadra
201, Falcões, para nos dar uma excelente apresentação, na sala de briefing
dos pilotos de caça, sobre a missão da
Esquadra 201 e capacidades operacionais do F-16 MLU.
Estas esquadras de voo têm como
missão executar operações de luta aérea ofensiva/defensiva, operações de
interdição aérea e apoio aéreo tático
No final da manhã, fomos convidados pelo comandante para um almoço, onde pudemos relembrar passados aeronáuticos comuns e trocar
opiniões sobre o futuro das nossas
instituições estratégicas de defesa da
FAP e de transporte da TAP.
À tarde, fomos à Linha da Frente
visitar o shelter da parelha de alerta
F-16 MLU, pronta e segura para descolar em menos de 15 minutos, onde de
bem perto presencíamos uma sequência de aterragens e passagens baixas
de esquadrilhas de F-16 a regressar
das suas missões de treino.
A visita à BA5 terminou no edifício de comando, com a despedida e
agradecimentos dos pilotos da TAP
ao Comandante Paulo Mateus pelo
excelente dia proporcionado e o forte
desejo de manter laços e saudações
aeronáuticos. Para alguns de nós, foi
a oportunidade de visitar alguns dos
nossos amigos, para outros, saíram
com mais uns amigos com quem podem contar no futuro.
No final do dia, o Comandante Pedro Castro, a quem o curso agradece
pelo empenho e a sua ideia deste dia
especial, surpreendeu-nos com uma
pequena exposição fotográfica particular alusiva ao início da era jato da
companhia aérea de bandeira TAP Portugal e a tradicional comemoração de
mais um ano do nosso curso.
Há quanto tempo não bebíamos…
ÁGUA.
janeiro | fevereiro Sirius
25
ESTUDO
AEROPORTO COMPLEMENTAR
AO AEROPORTO DE LISBOA
A previsão da procura é a principal variável a considerar no
planeamento de um negócio. É em função desta que se projeta
a capacidade ótima de oferta (2ªparte)
Texto Rui Cavaco *
NO PLANEAMENTO DA REDE DE
oferta de qualquer infraestrutura aeroportuária deve-se tomar particular
atenção a este dado. Verificou-se em
projetos públicos no passado, caso do
TGV, que a modulação deste dado serviu para viabilizar os mesmos, sendo
aparentemente modulado mais em função de orientações políticas do que de
princípios técnicos.
Desta forma, a análise das previsões
existentes é determinante na aceção da
qualidade das decisões visadas. Num
primeiro plano, estas afetaram diretamente a boa utilização de recursos
públicos. No extremo, a prossecução
de projetos financeiramente inviáveis
conduz diretamente, não considerando a alocação de recursos externos ao
projeto, tais como receitas provenientes
de impostos, a uma diminuição sistémica de liquidez, com a consequente
perda de capacidade de manutenção
de níveis de segurança mais elevados.
É, assim, importante avaliar as previsões existentes.
Comparámos os valores dos relatórios de tráfego da ANA de 2007, 2008,
2009 e 2010 com os valores de previsão efetuados para validação do NAL.
Nos valores obtidos das Estatísticas de
Tráfego 2007/2008/2009/2010 da ANA
foram considerados, quando diferentes,
os valores referentes ao ano obtidos no
relatório mais atual, sendo considerado
este o valor corrigido e, consequentemente, mais representativo.
Verifica-se, no período, uma evolução de 6,00% no volume de passageiros no total de aeroportos da ANA
e de 3,43% no Aeroporto da Portela.
26
Sirius janeiro | fevereiro
Estatísticas de Tráfego
No Relatório Anual de Tráfego de
2011, da ANA, constatamos que «a taxa média de crescimento anual nos
últimos dez anos foi de 4,1% no que
respeita a passageiros e 2,4% quanto
a movimentos. À semelhança dos anos
anteriores, o aeroporto de Lisboa apresentou um comportamento acima da
média dos aeroportos europeus da sua
classe» (in Relatório Anual de Tráfego
de 2011 – pág. 07). Verifica-se que entre 2006 e 2010 o Aeroporto da Portela
cresceu percentualmente em volume
de passageiros abaixo do crescimento do mesmo indicador para o total
de aeroportos concessionados à ANA.
É de realçar que se inicia em 2005 a
operação da Ryanair no aeroporto do
Porto e em 2006 a estratégia de desenvolvimento do segundo hub da TAP
nesse mesmo aeroporto (in Relatório
e Contas TAP 2006 – pág. 4). Esta implementação de capacidade oferecida
pela Ryanair e deslocação de capacidade oferecida pela TAP contribuem
para a distribuição de tráfego apresentada. Podemos inferir que uma maior
dinâmica na captação de capacidade
oferecida do aeroporto do Porto, por
um lado, e dificuldades de expansão
no seu hub principal por parte da TAP
apresentam-se como uma possível interpretação da diferença apresentada
do crescimento percentual do volume
de passageiros do total de aeroportos
e do Aeroporto da Portela.
Apresentamos no quadro seguinte
a previsão de crescimento da procura
efetuada nos estudos do NAL (in seminário APPLA Logistel, Carlos Madeira, 2010). O estudo de previsão foi
efetuado com base no tráfego de Lisboa em 2006, sendo projetada a sua
evolução por modelo econométrico de
relação procura por crescimento económico dos países contribuintes para
o tráfego. Neste estudo foi considerado
o impacto da linha de alta velocidade
Lisboa-Madrid e Lisboa-Porto. Sendo
μ o crescimento agregado num dado
período, verifica-se uma previsão de
crescimento da procura de 3,9% entre 2009 e 2017.
Verifica-se um crescimento de volume de passageiros inferior ao previsto
entre 2009 e 2017. Mesmo considerando
que não foi implementada a linha de alta velocidade, fator que pressionaria em
baixa o valor por efeito de transferência.
Mais conservadores são os valores apresentados no seminário Os Transportes e
a Economia, realizado no Palácio da Independência, em 2012, pela Dr.ª Fátima
Rodrigues, da ANA. Neste, a previsão
foi de 2,8% na taxa de crescimento do
volume de passageiros e de 2% no total de movimentos. É de salientar que a
margem de erro máxima para o período
de estudo em ambas as previsões é da
ordem de décimas.
Considerando a última previsão, por
mais conservadora, verifica-se que a Portela atinge 43 movimentos/hora em 2015.
A sua capacidade declarada em 2012 era
de 13 movimentos/hora noturnos e 38
movimentos/hora diurnos, num total de
51 movimentos/hora por dia. Apresentando uma situação crítica de peaking
na primeira onda do hub, entre as 7 e
as 10 horas da manhã, operando a 94%
da capacidade declarada. Ou seja, mesmo utilizando um modelo de previsão
conservador, não existindo alteração à
capacidade de oferta, o aeroporto não
consegue dar resposta ao crescimento
de tráfego em 2014. Medidas de de-peaking ou alocação prioritária de slots a
movimentos de transferência podem,
eventualmente, mitigar este problema
num curto prazo.
De acordo com o Relatório e Contas da
ANA, pág. 45, temos que «o ano de 2011
foi marcante para o aeroporto de Lisboa
pelo serviço prestado a 14,8 milhões de
passageiros e que se traduziu num crescimento de 5,1% face a 2010. Esta variação, resultante da boa performance do
segmento tradicional, conjugado com a
evolução da oferta em termos de movimentos (+1%) e de lugares (+2,1%),
determinou um crescimento da taxa média de ocupação de aeronaves (+2,1
p. p.) em voos comerciais».
Portanto, apesar da crise nacional e
internacional que se vive desde 2008,
constata-se um crescimento sustentado
do número de passageiros e movimentos no aeroporto de Lisboa ao longo da
última década.
No ponto 16 do Relatório e Contas
da ANA, pág. 139, referente às perspetivas futuras, temos que «o ACI prevê
para 2012 um crescimento do tráfego
nos aeroportos que, a nível mundial, se
Previsão de crescimento
Previsão a médio prazo por região
Real
Africa
Asia/Pacifico
Europa
América Lat/Caraíbas
Médio Oriente
América do Norte
Mundo
Previsões
2010
YOY%
2011
2012
2013
2014
2015
2011-2015
156.0
1.294,9
1.466,9
403,7
206,6
1.509,8
5.037,7
9,5%
11,3%
4,3%
13,2%
12,0%
2,5%
6,6%
(9,5%)
5,0%
7,5%
8,3%
6,8%
2,6%
4,9%
8,8%
6,8%
2,3%
5,9%
5,7%
1,9%
3,9%
5,6%
6,8%
3,5%
6,2%
5,2%
2,7%
4,5%
5,5%
6,7%
3,4%
6,2%
5,1%
2,6%
4,4%
5,4%
6,6%
3,3%
5,7%
4,8%
2,5%
4,3%
2,9%
6,4%
4,0%
6,4%
5,5%
2,5%
4,4%
situará em 3,9%, ficando-se por 2,3%
a nível europeu».
Relativamente ao aeroporto de Lisboa,
lê-se que «o aeroporto de Lisboa, com
um crescimento previsto para o tráfego
de passageiros na ordem de 0,8%, continuará a fortalecer e a consolidar as condições para o desenvolvimento de uma
política de hub para os mercados Brasil
e África, a par do acréscimo da quota
das companhias de baixo custo. Em abril
de 2012 está prevista a abertura da base
da easyJet, que originará a abertura de
cinco novas rotas Schengen».
Estas previsões de crescimento permitem antever o esgotamento de capacidade do aeroporto de Lisboa, tornando necessário o aumento de capacidade
deste e/ou o desenvolvimento de uma
estrutura complementar ou de um novo
aeroporto para acomodar a procura prevista, bem como a procura já existente e
que não é satisfeita por indisponibilidade
de slots para os horários pretendidos pelos operadores, pelo que, neste momento, efetivamente já se verifica falta de
capacidade do aeroporto de Lisboa em
acomodar tráfego e, consequentemente,
existe uma perda de receita potencial para a ANA e para o País decorrente desse
facto. É de salientar que a indisponibilidade de slots é sentida num período específico do dia, pelo que o racional de
investimento não pode ser considerado
apenas pela rutura de capacidade de um
período de operação.
A transferência de tráfego não relacionado com a operação de hub em Lisboa durante o período crítico das 7 às
10 horas pode apresentar-se como uma
solução de médio prazo. Deste modo,
o desenvolvimento de uma solução de
aumento de capacidade declarada deve visar, com a menor relação de custos (investimento/operacionais), obter
o maior incremento de capacidade num
horizonte de tempo definido. As opções
consideradas viáveis nos estudos preliminares são expansão da capacidade da
Portela, aproveitamento da Base Aérea
do Montijo para tráfego civil, ou construção modular do Novo Aeroporto em
Alcochete.
(Continua no próximo número)
(in Relatório e Contas de 2011 – ANA, pág. 139)
Fonte: ACI World YOY: Year over Year
* Gabinete Técnico da APPLA.
janeiro | fevereiro Sirius
27
BALONISMO
16.º FESTIVAL
INTERNACIONAL
BALÕES DE AR QUENTE
Texto e fotos André Garcez
28
Sirius janeiro | fevereiro
JÁ ASSUMIDO COMO UM DOS MAIORES
e mais importantes festivais da Europa, o Festival Internacional Balões de Ar Quente realizou
a sua 16.ª edição, de 10 a 18 de novembro, em
Elvas, que foi cidade anfitriã, pela primeira vez,
no âmbito da classificação das suas fortificações
como Património Mundial da UNESCO.
Durante oito dias, 45 equipas, compostas por
250 participantes, de oito nacionalidades, realizaram voos de lazer pelas planícies alentejanas,
em total harmonia com a Natureza, onde o silêncio do voo é apenas interrompido pelas chamas
que aquecem o interior do balão, um calor que
agradecemos quando estamos no ar às 9 horas da
manhã de um dia gélido, a 700 metros de altitude.
Com a mudança de Fronteira para Elvas, o evento
conseguiu captar novos apoios e atenção mediática, não só nacional mas também de Espanha, algo
que se refletiu nos batismos de voo à população,
que estiveram esgotados – algo inédito na história
do festival –, com dezenas de pessoas a fazerem fila de madrugada na esperança de conseguirem um
lugar num dos cestos.
janeiro | fevereiro Sirius
29
SPOTTERS
APEA VISITA BASE AÉREA
DO MONTIJO
Seguindo uma tradição anual, a APEA – Associação Portuguesa
de Entusiastas de Aviação realizou uma visita à Base Aérea n.º
6, no Montijo, no dia 3 de dezembro, com o objetivo de ficar a
conhecer as esquadras e meios que lá operam
Texto e Fotos André Garcez
SOB O LEMA «A promoção e divulgação da Aviação em Portugal», as visitas
a instalações militares e civis são um
dos pontos fortes da APEA, proporcionando uma proximidade à atividade aérea que não é possível estando
do lado de fora da rede e permitindo
um contacto direto entre os profissionais e entusiastas que têm uma paixão
30
Sirius janeiro | fevereiro
em comum: o gosto pelas aeronaves
e pelo voo.
Apesar da redução crítica das horas
de voo nos meios da Força Aérea Portuguesa, os 13 participantes da visita à BA6 tiveram a oportunidade de
acompanhar, com a devida distância
de segurança, os preparativos e desco-
lagem do helicóptero EH-101 de alerta
rumo a mais um salvamento de um
surfista ferido numa escarpa da Praia
Grande, em Sintra. O outro movimento inesperado, que acabou por ser o
ponto alto do dia, foi a escala de um
C-130J da Força Aérea canadiana durante a viagem de regresso à sua base, em Ontário, após uma missão de
transporte de carga para um local não
revelado no Médio Oriente. Num gesto de tremenda simpatia da tripulação
canadiana, que não tinha conhecimento prévio desta visita, os associados
da APEA foram autorizados a entrar
no Hércules que se preparava para o
voo intercontinental e assistir ao preflight check no interior do cockpit de
última geração, minutos antes do startup dos motores, e a conversar com os
loadmasters no porão de carga, tendo
a tripulação oferecido patches e autocolantes da esquadra, ao que os participantes da visita retribuíram com
fotografias da passagem da aeronave
pelo Montijo. No final, houve ainda
tempo para rever os Aviocar da Esquadra 401, desativados há um ano,
encontrando-se armazenados à espera de um comprador, algo que, segundo o ministro da Defesa, José Pedro
Aguiar-Branco, está em negociação.
C-295
AS PRIMEIRAS 10 MIL HORAS
No dia 5 de dezembro, e numa cerimónia
presidida pelo Chefe do Estado-Maior da
Força Aérea (CEMFA), General José Pinheiro, foram assinaladas as 10 mil horas de voo da frota C-295M, operada pela
Esquadra 502, Elefantes, desde fevereiro
de 2009.
A comemoração do marco atingido a 15
de outubro, que contou com a presença das altas patentes militares, dos presidentes da Airbus Military, da DEFAERLOC e da EMPORDEF, iniciou-se com
uma reunião entre as chefias militares, o
presidente da Airbus Military e a Missão
de Acompanhamento e Fiscalização (MAF
FISS) do contrato de prestação de serviços
logísticos associados de manutenção (FISS
– Full in Service Support) das Aeronaves de
Transporte Tático e Vigilância Marítima –
C-295M.
Seguiu-se a cerimónia no hangar da Esquadra 502, onde foi apresentado um filme histórico sobre a esquadra e a aeronave e na qual o comandante dos Elefantes,
Tenente-Coronel Pedro Bernardino, e o CE-
MFA proferiram algumas palavras alusivas
ao evento.
Terminada a cerimónia, as entidades convidadas visitaram a exposição temática O
sistema de armas C-295M, suas valências e
capacidades operacionais, onde também
foi lançado o novo website dos Elefantes,
presenciando de seguida a aterragem de
uma aeronave com pintura alusiva a este
marco histórico, que contou com o patrocínio da Airbus Military.
janeiro | fevereiro Sirius
31
FATORES HUMANOS
SEM MEDO DE VOAR
Cerca de 30% da
população adulta
portuguesa têm medo
de voar. A boa notícia
é que há cura
À HORA MARCADA, CHEGAM à Associação dos Pilotos Portugueses de
Linha Aérea (APPLA), em Lisboa. Não
é a paixão pelo voo que os guia, mas o
medo. Vão participar num dos cursos
da Voar sem Medo (VSM), um centro
especializado no estudo e tratamento
da fobia de voo, que tem por parceira
a Valk Foundation, um dos mais prestigiados centros mundiais de investigação e tratamento aerofóbico. A recebê-los, Cristina Albuquerque: rosto
e alma da VSM. É nela, e na sua equipa, constituída por psicólogos e por
profissionais da aviação, como pilotos,
assistentes de bordo, especialistas em
segurança de voo e controladores de
tráfego aéreo, que os pacientes confiam os seus medos, na esperança de
os perderem. Psicóloga clínica, está
ligada à aviação há mais de 20 anos
e tem vasta experiência no tratamento
desta fobia. Merece a confiança deste
grupo, tão diferente mas tão igual no
que os prende à terra.
Ecoam relatos pela sala: o da senhora que esteve 30 anos sem viajar de avião porque não gosta de estar fechada; o do senhor que fugiu
antes de descolar para a viagem de
núpcias porque tinha medo de que
o avião caísse; o da adolescente que
sabe de cor os acidentes dos últimos
anos, e o da jovem que nunca conseguiu entrar num avião, tal como os
pais, e que sonha ir a Londres. No ar,
sente-se a tensão, que atinge o auge logo na projeção da primeira imagem: um Boeing B-747. Ninguém fica
indiferente, mas constato que só eu
32
Sirius janeiro | fevereiro
D.R
Texto Rita Tamagnini
A PRIMEIRA
CONCLUSÃO
É QUE O MEDO
É BOM
sorrio. Os meus olhos veem o Jumbo, o meu avião favorito. Os deles,
uma enorme ameaça de ferro! Já os
de Cristina Albuquerque focam-se nas
reações despertadas. As expressões de
desconforto são tais que não resisto a
abandonar o papel de observadora e
exclamar, com intenção apaziguadora:
«Mas é tão bonito!» Serve para arrancar gargalhadas e aliviar o ambiente.
«Para muitos pacientes, as imagens
servem para abrir o baú das memórias negativas que já viram sobre acidentes de aviação», refere a psicóloga.
O primeiro passo para vencer o medo está dado. Ter consciência dele. E
o segundo também: enfrentá-lo. Nas
horas seguintes, é de medo que se fala. De como ir às origens e superá-lo.
A primeira conclusão é que o medo é
bom. Ajuda-nos a enfrentar ameaças.
Mas, e se essas ameaças não existem?
É aí que se transforma numa doença
que limita a vida e que precisa de ser
tratada. É então preciso identificar as
causas. A falta de controlo é uma das
mais comuns. «E se há local onde não
se consegue controlar quase nada é
dentro de um avião», diz Cristina Albuquerque. Outro dos agentes provocadores é o desconhecimento quanto
ao voo. É nesta altura que Rui Alves
assume o controlo.
O comandante começa por falar da
forte regulamentação do setor e da formação dos pilotos, sempre em constante evolução e avaliação. Em minutos,
e munido de um apurado sentido de
humor, prende a atenção. Explica como funcionam os aviões, faz um retrato geral sobre os acidentes e assegura
que «o avião está preparado para lidar
com tudo o que há na Natureza. Com
o vento, a chuva, a noite e o dia!». Tal
como garante que se não houver condições para voar, não se voa. Nada é
deixado ao acaso na aviação, frisa.
TAP
Ainda assim, é impossível evitaremse os acidentes. Essencial, diz Cristina Albuquerque, é pensar na relação
entre o possível e o provável. E aconselha aos pacientes mantras como estes: «É possível mas não é provável»
e «abana mas não cai».
Ao segundo dia, o progresso é notório. A apresentação de Helena Barata,
assistente de bordo, apesar de conter muitas imagens de aviões, já não
provoca tremores. Helena alerta para
o facto de a cara dos tripulantes não
refletir eventuais problemas técnicos
do avião mas apenas o seu estado de
espírito. Passa depois a conselhos práticos, como fazer as malas com antecedência, o check in atempadamente
e embarcar tranquilamente, sem stress
acrescido. Fala do treino exaustivo da
tripulação de cabina, capacitada para lidar com todo o tipo de situações
de emergência, e responde a dúvidas. E não, assegura, não é possível
ficar preso dentro da casa de banho
do avião, um dos principais medos
dos fóbicos. Termina com outras di-
cas: convém mexer-se e beber muita água a bordo. Aliás, beber água,
diz Cristina Albuquerque, «é uma das
principais técnicas de controlo da ansiedade». E sem efeitos secundários,
acrescento eu. O mesmo não se pode dizer da ingestão de álcool e de
medicamentos. Dizem as estatísticas
que 20% dos aerofóbicos recorrem a
estas «muletas» para enfrentar o voo.
Uma estratégia desaconselhada pela
VSM, que acredita que ela só serve
para maquilhar o medo.
Sentimentos de inferioridade e vergonha são recorrentes neste tipo de
fobia. Para ajudar a superá-los entra
em cena a psicóloga Íris Monteiro,
que ensina técnicas de descontração,
a começar pela respiração e a acabar
num exercício de relaxamento que
deixa a sala semiadormecida ao final
da manhã. A tarde é passada na NAV,
onde ouvimos falar de manutenção,
controlo aéreo e de como ele é feito:
em segurança. Não falta sequer uma
visita à sala e à torre de controlo do
aeroporto de Lisboa, um dos momen-
tos mais altos do curso. Por fim, uma
passagem pelo aeroporto, numa espécie de visita técnica, e, ao terceiro
dia, o momento tão esperado quanto
temido: o voo. Apenas um dos participantes não consegue embarcar para Madrid, tendo-o feito mais tarde.
O tratamento tem uma taxa de sucesso de 95% e garante um follow
up de dois anos. Para Cristina Albuquerque, que é também autora do livro Voar sem Medo – Um Guia Prático
para Voar Confiante e Descontraído e
que lançou a Medo de Voar App, uma
aplicação para iPhone e Android destinada a todos os que têm medo de
voar, cada paciente a ultrapassar a
fobia é uma vitória. O próximo curso
da VSM é em abril, em Lisboa, e custa 700 euros. O sucesso do programa,
esse, não tem preço.
CONTACTOS VSM
Linha Directa 913282092
[email protected]
www.voarsemmedo.com
janeiro | fevereiro Sirius
33
ENSAIO
AEROPILOT LEGEND 540
EM EQUIPA QUE
ESTÁ A GANHAR…
É jovem, irmão do primogénito que fez o voo inaugural em
abril de 2011. Esta quarta unidade do Legend 540 já detém, no
entanto, maturidade inerente a um ultraleve que foi beber a
sua conceção ao sucesso incontornável do Cessna 182
Texto Paula Carvalho Silva Fotos André Garcez
ENSAIO
COSTUMA DIZER-SE QUE NÃO SE MEXE EM
equipa que está a ganhar. Talvez não seja sempre assim, mas a alusão óbvia ao aproveitamento
do que de bom já se fez ou inventou assenta que
nem uma luva ao Aeropilot Legend 540. Deixemonos, para já, de ditos e ditados populares, para
assinalarmos o que de único tem este ultraleve,
inventado pelo checo Peter Mára e inspirado no
Cessna 182.
À primeira vista, parece demasiado grande para entrar na categoria de ultraligeiro, demasiado
arredondado para alcançar velocidade de cruzeiro
razoável, mas estes pormenores entram de imediato no lote de qualidades do Legend quando explicados por Luís e Paulo Santos, irmãos e sócios
da Ultrafly, em conjunto com Ricardo Rodrigues
e José Lino. Basta medir o espaço no cockpit, e
nem sequer com necessária precisão (ombros não
se tocam mesmo em movimentos amplos), para perceber que uma viagem mais longa a bordo
deste ultraleve não é um problema.
Aliás, um dos primeiros voos efetuado pelo
ultraligeiro da Aeropilot foi precisamente aquele
que o traria da República Checa para Portugal e
que não serviria apenas como teste de conforto.
Ora vejamos: com três malas, peças sobressalentes para o avião, tanques de combustível cheios,
piloto e passageiro, o Legend veio pesado. No
entanto, Paulo Santos garante que com um bom
36
Sirius janeiro | fevereiro
À primeira vista,
parece demasiado
grande para entrar
na categoria de
ultraligeiro
cálculo de pesos e centragem o comportamento
do aparelho «foi igual ao que seria em vazio».
Ao longo de quatro pernas – Mannheim, na Alemanha, para abastecer, paragem nas proximidades do circuito de Magny-Cours, em França, para
dormir e encher depósitos, refill em San Sebastian (Espanha) e, finalmente, Tires –, o avião foi
para o ar sempre sem problemas e nem sequer
consumiu de mais. Apesar de ainda não terem
feito bem os cálculos, Paulo Santos julga que o
Legend gastará qualquer coisa entre 12 e 15 litros/hora em velocidade de cruzeiro. É que não
há nada como uma superfície limpa de rebites ou
de outros obstáculos para garantir uma aeronave
aerodinamicamente eficiente.
Paulo Santos esteve na fábrica a acompanhar
NOVOS VOOS EM TEMPOS CONTURBADOS
RICARDO RODRIGUES (PILOTO POR HOBBY), Luís Santos (piloto profissional), Paulo Santos (mecânico e piloto) e José Lino (instrutor, examinador e
piloto de ultraleves e aviação geral) juntaram-se e criaram o projeto Ultrafly.
Importar e comercializar aviões ultraligeiros é o principal intuito desta empresa, que para isso escolheu dois modelos: o checo Legend 540 e o italiano
Savage. «Achámos que deveríamos representar dois aviões diferenciados. O
Legend é a cópia de um avião extraordinário, o C-182, em ponto pequeno; o
Savage tem outro elã, é um todo-o-terreno em tudo semelhante ao nostálgico Piper Cub. O valor total do investimento foi de cerca de 150 mil euros.
a montagem final. A réplica do 182 foi construída
em fibra de carbono e kevlar e é de concessão «extremamente simples»: «A vantagem destes aviões
de fibra é necessitarem de pouca manutenção, no
entanto, temos sempre de garantir as conexões
dos controlos de voo, etc.» E neste exemplar a
tarefa é facilitada pelas janelas nas asas, a partir
das quais podemos ver os sistemas dos ailerons,
pelo tubo de pitot por onde se pode substituir a
landing light e ainda pela simplicidade com que,
removendo o cone de cauda, é possível retirar o
estabilizador por inteiro, garantindo, assim, a remoção das asas sem qualquer dificuldade.
De salientar ainda as longarinas das asas, que
também são integralmente em fibra de carbono,
e o revestimento total do cockpit em kevlar, o
que aumenta a resistência do habitáculo. Apenas os trens de aterragem são em fibra maciça,
por causa da flexão.
Com uma área alar de 10,54 m2, a primeira
impressão que os novos proprietários tiveram
quando viram o modelo exposto pela primeira
vez em 2011, em Friedrichshafen, foi que o Legend parecia um planador. A corda, enorme, e
os fowler flaps, quando acionados, contribuem
para esta área. A elegância e eficácia são garantidas por asas muito finas. São também estas
características que lhe conferem a capacidade
de voo, mas também a principal dificuldade para quem o voar pela primeira vez. Paulo Santos
explica que com tal capacidade de planeio há
que «reduzir drasticamente a velocidade, tirando mesmo quase todo o motor, e manter o nariz
nivelado ou ligeiramente em cima para reduzir a
velocidade, conseguindo-se assim que junto ao
solo, quando se arredonda, o avião não vá para
o ar novamente». «Até já chegámos à conclusão
de que, como o avião voa de tal maneira bem e
tem uma tão grande sustentação, basta vir para o chão com um ponto de flaps. O problema
CONSUMO
Apesar de ainda
não ter feito bem
os cálculos, Paulo
Santos julga que
o Legend gastará
qualquer coisa entre
12 e 15 litros/hora
em velocidade de
cruzeiro. É que não
há nada como uma
superfície limpa
de rebites ou de
outros obstáculos
para garantir
uma aeronave
aerodinamicamente
eficiente
é que as pessoas normalmente têm medo de tirar motor. E a aprendizagem terá de incidir neste capítulo.» Aliás, Luís Santos já o trouxe para
a pista a 30 nós e o avião continua a voar com
full control.
Como de costume, não podíamos deixar de experimentar este novo modelo. O convite levounos ao campo de voo de Campinho, ali paredes meias com a Barragem do Alqueva. E nada
melhor do que uma pista de apenas 400 m de
comprimento para testar as melhores e as mais
difíceis características do Legend. A asa alta e
a amplitude do cockpit facilitam a entrada. Lá
dentro, o painel de instrumentos foi desenhado
custom made para ser user friendly, até porque
a empresa Ultrafly quer investir no ensino. Assim, do lado esquerdo estão posicionados todos
os instrumentos de controlo de voo, enquanto do lado direito ficaram todos os instrumen-
janeiro | fevereiro Sirius
37
ENSAIO
COCKPIT
O painel de instrumentos foi desenhado custom made para
ser user friendly, até porque a empresa Ultrafly quer investir
no ensino. Assim, do lado esquerdo estão posicionados todos
os instrumentos de controlo de voo, enquanto do lado direito
ficaram todos os instrumentos do motor. Há um GPS Aera
500 da Garmin, um transponder da Trig, uma box de intercom,
horizonte, gyro, enfim, todos os instrumentos necessários.
tos do motor. Há um GPS Aera 500 da Garmin,
um transponder da Trig, uma box de intercom,
horizonte, gyro... enfim, todos os instrumentos necessários. E depois temos ainda o yoke, a
alavanca da potência que a partir de um certo
ponto para a retaguarda funciona como travão
e, mantendo este movimento até ao limite, permite o bloqueamento para se conseguir o travão
de parque, por fim, dois sistemas que acionam os
38
Sirius janeiro | fevereiro
Cópia do Cessna
182 à escala de 75%, o
Legend pode também
ser apetrechado com
um motor Rotax de
80 cv e outro de 115 cv
turboalimentado
flaps – um no painel de instrumentos, outro na
manete da potência.
Com o motor de 100 cv a rolar e o hélice DUC
tripá de passo fixo a funcionar, Luís Santos posiciona o Legend e, depois de garantir que a pista
está livre, acelera e descola em menos de 200 m.
Depois de estabilizado, e já a sobrevoar as águas
do Alqueva, Luís Santos oferece-me os comandos.
Fáceis, leves, sem, no entanto, serem tão sensíveis
que ao mínimo toque haja uma reação. Agrada-me,
até porque isto não obriga o piloto a concentração
extra, o que é vantajoso para alunos e pilotos com
pouca experiência. Voltas apertadas mantendo altitude e velocidade são exercícios que não requerem
esforço. O Legend com o passo do hélice aumentado em 1 grau por Paulo Santos adquiriu prestações ainda melhores, sobretudo na velocidade de
cruzeiro. «Agora fazemos 100 nós de airspeed a
4200 rpm. Talvez mesmo a 4400 rpm, se estiver
um pouco mais de vento, e isto com menor consumo de combustível. Depois, a fundo, o Legend
faz 5200 rpm e continua a aumentar, a embalar,
e chega às 5400 rpm de máxima, altura em que
chega a atingir 130 nós.» De referir que este avião,
AEROPILOT LEGEND 540
Ano 2012 DIMENSÕES Comprimento 7 m Altura 2,6 m Envergadura
9,06 m Área das asas 10,54 m2 Largura da cabina 1,17 m Número de
passageiros Dois Peso em vazio 289 kg Peso máximo à descolagem
450 kg Carga máxima na bagageira 15 kg atrás do banco do passageiro MOTOR Fabricante Rotax Potência 100 cv Hélice Tripá DUC de passo fixo
PRESTAÇÕES Autonomia Dois tanques de combustível com capacidade
para um total de 110 litros, que permitem voar durante pelo menos seis
horas, mas o fabricante garante que a autonomia pode chegar às 8,5 horas
Consumo Entre 12 e 15 litros/hora Velocidade a não exceder (VNE) 255 km/
h/137kts Velocidade de cruzeiro a 75% da potência máxima 210 km/h/113kts
Velocidade de perda 62 km/h/33kts Velocidade mínima de aterragem
65 km/h/35kts Velocidade máxima com 40º de flaps 120 km/h/65kts
Velocidade máxima com 15º e 30º de flaps 145 km/h/78kts Velocidade
máxima em turbulência 170 km/h/91kts Razão de subida 5,9 metros/s/1100
pés/min. Distância de descolagem 150 m Distância de aterragem 190 m
Fator de carga +4.0/-2.0 G Teto de operação 14.000 pés EQUIPAMENTO
Velocímetro, altímetro, variómetro, conta-rotações, GPS Aera 500 da Garmin,
transponder da Trig, horizonte artificial, gyro, manómetros de motor e do óleo
de motor, pressão e quantidade de combustível. PREÇO Cerca de 76 mil euros
(unidade testada); 63 mil euros versão base.
pela sua construção e performance, merece, sem
dúvida, um hélice de passo variável, para que se
possam explorar todas as suas qualidades de tourer, na velocidade de cruzeiro alta a muito baixos
regimes de motor, e com a consequente baixa de
consumo.
Cópia do Cessna 182 à escala de 75%, o Legend
pode também ser apetrechado com um motor Rotax de 80 cv e outro de 115 cv turboalimentado –
mais utilizado em países colados aos Pirenéus – e
um hélice de passo variável. A opção pelos 100 cv
e pelo passo fixo prendeu-se com o facto de a Ultrafly querer utilizar o avião num maior leque de
funções, nomeadamente a instrução, e de ambientes, como, por exemplo, África.
Neste último continente, a empresa espera
ainda aproveitar a legislação que permite o reboque de mangas mesmo em aviões de lazer (ao
contrário do que ditam as regras portuguesas) e
recuperar, por essa via, o investimento efetuado. A única diferença reside, como é óbvio, no
tipo e no reboque das mangas. Nos ultraleves, as
mangas são presas ao avião ainda no chão com
um varão (a única peça metálica do sistema) e
saem a rolar em conjunto com a aeronave. No
ar, e com a ajuda de um peso numa das extremidades desse tubo de duro alumínio, a manga
cai à vertical, ficando no perfil normal de leitura.
O tecido com que é feita a manga também é especial, ultraleve. Por exemplo, uma manga com
87 m2 não ultrapassa os 6 kg. A diferença no reboque reside na incapacidade que o ultraligeiro
tem de picar, porque não tem suficiente inércia
de peso para pegar numa manga em voo rasante.
Outras qualidades do Legend são a autonomia
de, no mínimo, seis horas, graças a dois depósitos de 55 litros cada, localizados nas asas, e um
preço de aquisição relativamente acessível quando comparado com outros aviões na mesma categoria. A versão testada custou cerca de 76 mil
euros, mas já se compra um Legend por 63 mil
euros na versão base. Sem querer fazer grandes
comparações, Paulo Santos aponta o TL 3000 Sirius como o mais parecido com a nova aquisição
da Ultrafly.
janeiro | fevereiro Sirius
39
OPINIÃO
DEVEMOS SER UNS
PELOS OUTROS
O conceito de ser «uns pelos outros» foi bem apresentado no lema
dos mosqueteiros de Alexandre Dumas
Texto Filipe Conceição Silva
COM UMA LIGEIRA DIFERENÇA,
mas querendo dizer o mesmo, ele brindou-nos com «um por Todos. Todos por
um». Um conjunto de palavras bonitas,
e será raro quem, ao lê-las, discorde do
seu significado e simbolismo.
O que tem este pequeno artigo a
ver com a Sirius? Já compreenderão.
Há cerca de 25 anos surgiu num
semanário de grande circulação uma
lista com perto de duas centenas de nomes dos mais «ricos» de Portugal. Esta
lista de «ricos» foi elaborada a partir
de uma só fonte: das listas de contribuintes da Direção-Geral das Contribuições e Impostos, vulgo... fisco, ou
seja, pelas listas dos maiores contribuintes identificavam-se, supostamente, os personagens mais ricos de Portugal. Num país civilizado e de bem,
deveria ser assim e não deveria haver
grandes surpresas.
Estranho é que, em cerca de metade
da lista constava um número substancial de... pilotos-comandantes da TAP!
Esta notícia foi recebida, principalmente pelos incluídos na lista, com um
misto de embaraço e irritação, porque
não era aceite que a vida privada (financeira, nesse caso) fosse devassada
daquela forma. O ambiente em Portugal era tal que os «ricos» eram malvistos e ironicamente estes «ricos» estavam identificados e listados então, o
«mau olhado» poderia ser totalmente
focado neste grupo. Pode-se, assim,
compreender a irritação pela devassa,
mas embaraço? Porquê? Afinal, com
o seu trabalho estavam a contribuir, e
bem, para o coletivo, bastando esfregar nos narizes de qualquer um a dizer
«eu contribuo para ‘Todos’ com isto,
40
Sirius janeiro | fevereiro
e tu?», não havendo vergonha nisso,
muito antes pelo contrário.
Porque constava uma quantidade
enorme de pilotos da TAP nestas listas? A primeira razão seria que a empresa era pública, os pilotos eram seus
funcionários e a lei assim o obrigava,
mas a segunda razão, não menos importante, é que os pilotos de linha aérea da TAP, aliados à sua força corporativa (quem não o faz?), através de
décadas sempre tentaram ganhar os
melhores e mais altos salários possíveis, de acordo com as suas responsabilidades profissionais, e, no geral,
sempre pugnaram por receber salários
e aumentos anuais por «cima da mesa», não alinhando em «esquemas» de
O ESTADO
DEVERIA
ENTENDER E
ATÉ PROMOVER
UMA CARREIRA
CONTRIBUTIVA
fuga ao fisco, o que não era o caso em
muitas outras classes profissionais, liberais ou não, que simplesmente não
descontavam de acordo com o que ganhavam. Entendia-se que o Estado era
uma pessoa de bem e que, no fim da
carreira profissional de piloto de linha
aérea, além de, em paralelo, se contribuir para o bem coletivo, se iria receber uma reforma compatível, de acordo com o total da carreira contributiva.
Na era iniciada com um primeiro-
-ministro que só queria trabalhar, que
«nunca se enganava e raramente tinha
dúvidas», na mesma altura que se colocavam posters gigantescos pelas estradas afirmando que era bom viver
em Portugal, e que continuou até um
presente recente, começaram a aparecer umas fórmulas em que se determinava que o que se receberia quando
se atingisse a idade da reforma era de
acordo com os «cinco melhores anos
dos últimos dez ou os dez dos últimos
quinze», ou um palavreado ou fraseado similar. Poderia supor-se que quem
elaborava estes esquemas de reforma
o faria fazendo as contas macroeconómicas a longo prazo, de forma a que
o País, o coletivo, o tal... «Todos», não
saísse lesado... Mas não!
A perfídia, o maquiavelismo, o desleixo e a vergonha superavam em tudo a devida e necessária correção das
contas, encontrando-se nos bastidores
silenciosos e conspirativos do poder político. Assim, havia um número imenso
de personagens que rondava, que se
imiscuía ou que fazia parte desse poder político que criara estes esquemas
de reformas estatais, em sede de Parlamento, em benefício exclusivamente
próprio. Toda a sua vida contributiva,
que tinha sido pelos mais baixos valores
possíveis ou até quase inexistente, era,
de acordo com as suas conveniências,
magicamente majorada, de forma que
as suas reformas fossem indexadas a
estes novos valores, e em muitos casos
nem sequer era preciso atingir a idade
da reforma! Idade da reforma? Mas...
que pormenor mais mesquinho. Analise-se ao de leve, e como mero exemplo,
as reformas automáticas de prestação
PETRONILO G. DANGOY JR.
de trabalho, supostamente de serviço
público, de deputado no Parlamento,
ou de determinados cargos públicos...
dando para páginas e páginas de recriminações e a náusea acompanhante.
Presentemente, se for perguntado a
qualquer dos criadores e naturalmente contemplados por estes esquemas
«miraculosos» de reformas, que fariam a Dona Branca sorrir de aprovação e o Madoff tomar notas e inclinar
a cabeça de admiração, todos dizem,
com um ar injustiçado, que não estão a violar nenhuma lei. É verdade...
até foram criadas leis para que este
procedimento, gritantemente imoral,
não fosse ilegal, e, assim, o que se
pode chamar a isto? Perfídia? Fraude? Vergonha?
Façam-se umas contas de aritmética simples: um piloto da TAP que
descontou (sempre o fez e ainda o
faz) para a Segurança Social e, consequentemente, para a sua reforma,
inclusive sem ter qualquer outra opção, toda a sua vida profissional, como é que pode vir a receber igual ou
menos do que personagens que nem
chegaram, aritmeticamente, perto da
metade ou à terça parte do total das
contribuições do piloto da TAP? Uma
«pessoa de bem», como deveria ser o
Estado, deveria entender e até promover que a carreira contributiva da vida profissional devesse ter a primazia
para que a reforma estatal (de notar
que não há outra opção) seja indexada
de acordo, e não se virem a mudar de
regras ao longo do jogo, à medida das
conveniências do momento político.
Como vai ser a partir de agora?
Daqui a uns meses, daqui a um ano,
daqui a dez?
Com as renovadas ameaças que
dão a entender que se pretende de
novo baixar ordenados, reduzir reformas ou até as plafonar, o poder
político executivo ainda vai obrigar
a descontar o ordenado do trabalho
de piloto de linha aérea em condições
quase similares aos mafiosos em estabelecimentos comerciais sicilianos ou
à dízima de algumas pseudorreligiões?
O movimento neoliberal iniciado
na era Reagan-Thatcher, cujos frutos
maduros se revelam presentemente
num capitalismo selvagem assustador,
é o ambiente em que mais cedo ou
mais tarde a TAP vai ser privatizada,
independentemente de quem venha a
ser o comprador. Desse modo, podese crer que o mesmo comprador não
se importará de negociar com os pilotos da TAP uma forma de, «pagando
mais no fim do mês», mas baixando
as contribuições ao Estado (o tal coletivo – «Todos»), passando a pagar
por «baixo da mesa» em offshores ou
coisa que o valha (nada que já não
tenha sido feito em Portugal) e que
cada um organize esquemas privados
de reforma. O problema com isto é
que, em vez da frase «um por todos
e todos por um», entra-se por um caminho em que se cria uma sociedade
de «um por si e todos por cada qual»,
que inevitavelmente vai provocar um
retrocesso civilizacional que, infelizmente, na minha humilde opinião, já
dá mostras de vida. Da minha parte,
preferia não fazer parte de um país
ou uma união de Estados que prossegue esse tipo de conceito existencial.
Os representantes do Estado Português já deram mostras do que são
capazes de fazer, e neste caso «retirar» cegamente e sem o mínimo de
contemplações. No caso da TAP, estamos perante um contra-senso total,
em que os resultados da taxação extra
mensal não vai para o Estado, como
se quer fazer parecer, aparentando
assim que só se aplica para «inglês
ver», neste caso «para troika ver».
Os pilotos no ativo ainda se podem
«mexer», tendo como último recurso
o abandono do País, como, inclusive,
se está a começar a verificar, mas os
pilotos de linha aérea já reformados
estão agora numa condição de verdadeiros «reféns» desse monstro acéfalo que é a Segurança Social e perante
injustiças, que já se verificam, se se
aplicar o conceito de «todos por um»
personificado através de uma conjugação solidária e maciça dos pilotos
no ativo é que os poderá salvar de
um calvário judicial que porventura
tenham que enfrentar.
«Devemos ser uns pelos outros!»
porque os «uns» de hoje serão os «outros» de amanhã.
* Piloto de linha aérea.
janeiro | fevereiro Sirius
41
JATOS EXECUTIVOS
CESSNA CITATION
LONGITUDE
A Cessna entrou na corrida aos jatos executivos de luxo com o Longitude,
um supermidsize para oito passageiros, para viagens transatlânticas a uma
velocidade que ultrapassa 907 km/h, pelo preço de um birreator
Texto Filipe Lança Fotos Cessna
CAPAZ DE PERCORRER uma distância de quatro mil milhas náuticas (7408
km) à velocidade máxima de Mach
0.86 (907,4 km/h), o Citation Longitude oferece ligações diretas entre Nova Iorque e Paris, Londres e Dubai ou
Pequim e Moscovo. Ao posicioná-lo ligeiramente abaixo dos 26 milhões de
dólares (cerca de 21 milhões de euros),
o construtor defende que o Longitude
representa a melhor relação preço/performance disponível no mercado na categoria dos jatos supermidsize.
O Citation Longitude tem capacidade para transportar oito passageiros
e dois pilotos, com assento opcional
para um terceiro tripulante, além de
uma vasta bagageira. A cabina tem 9,4
metros de comprimento e uma altu42
Sirius janeiro | fevereiro
ra de 1,8 metros. A configuração dos
assentos inclui um dual-club seat para oito lugares ou quatro lugares para diante e um sofá para três pessoas
e um aparador de entretenimento. A
iluminação indireta em LED estende-se
ao longo de toda a cabina, com luzes
de leitura diretamente ajustáveis. Para os voos de longa distância, o avião
possui uma dupla zona de controlo
de temperatura, uma galley completa,
com forno, frigorífico e sistema pressurizado de água. O WC está equipado
com um lavatório largo e uma sanita
com sistema de vácuo.
Na prática, trata-se do Cessna com
maior autonomia jamais construído,
com a maior largura de cabina e também dotado de equipamentos eficien-
tes, assegurando conectividade, estilo
e conforto. O cockpit do Longitude assenta nos aviónicos do sistema Garmin
G5000, com ecrãs sensíveis ao tato e
capacidade para preencher todos os
requisitos exigidos a um avião para
voos intercontinentais, nomeadamente
FANS/CPDLC (Future Air Navigation
System/Pilot Data Link Communications), ADS-B (Automatic Dependant
Surveillance – Broadcast) e RNP (Required Navigation Performance). Os
sistemas de comando de voo podem
ser convencionais ou fly-by-wire.
O Cessna Citation Longitude será
equipado com dois motores Silvercrest
com 11 mil libras de impulso, fornecidos pela Snecma (Grupo Safran), que
garantem uma boa conjugação entre
A iluminação indireta em LED estende-se ao longo de toda a cabina, com
luzes de leitura diretamente ajustáveis
eficiência de consumo, peso e custos
de manutenção. Estes motores estarão sujeitos a um plano de manutenção on-condition (baseado em intervenções preditivas) e a intervalos de
manutenção estendidos, o que deverá
FICHA TÉCNICA
Motores dois motores Snecma
Silvercrest, com 11 mil libras de
impulso Velocidade máxima Mach
0.86 (907,4 km/h) Teto máximo 45
mil pés (13.700 m) Raio de ação
7410 km (4000 NM) Capacidade
oito passageiros e dois pilotos Preço (estimado) cerca de 21 milhões
de euros.
reduzir significativamente os custos de
operação da aeronave.
Ao lançar o novo Citation Longitude, a Cessna aposta numa extensão
da sua gama de jatos executivos – que
conta já com uma linha de produção
de 16 aparelhos – e numa expectativa
de crescimento do segmento na Europa
Ocidental e na Europa de Leste. «Esperamos que a União Europeia continue
a ser o nosso maior mercado fora dos
Estados Unidos da América. A Europa é, possivelmente, a região mais diversificada para a aviação executiva,
combinando mercados maduros, como a Alemanha e o Reino Unido, por
exemplo, com mercados emergentes,
no Leste Europeu», afirmou Scott Ernest, presidente e CEO da Cessna, no
salão da aviação executiva EBACE,
em Genebra.
O Citation Longitude vai posicionar-se acima do Citation Ten e lado a lado com o Hawker 4000 e o Gulfstream
G280, embora o seu construtor acredite que fará alguma concorrência aos
jatos de cabina larga, como o Falcon
2000 LX, o Challenger 605 e o Legacy
650. O Longitude é a versão estendida do Cessna Citation Latitude, apresentado há pouco mais de seis meses.
O seu primeiro voo está previsto para meados de 2016, com certificação
e entrada ao serviço no final de 2017.
O Longitude será produzido em Wichita, mas pode ser montado noutras
regiões do mundo onde a procura o
justifique.
janeiro | fevereiro Sirius
43
GESTÃO DO VOO (1)
FATORES HUMANOS FATORES
CULTURAIS – MODELOS E FERRAMENTAS
DE GESTÃO DO ERRO
Com o advento da Internet, tornou-se fácil aceder a todo o tipo
de informações sobre a indústria aeronáutica.
AGORA TRATA-SE APENAS de procurar os sítios de instituições, organizações, entidades, empresas e particulares, no âmbito internacional,
regional, nacional e local, para pesquisar as informações desejadas.
Mais cuidadosa deve ser a seleção e
sistematização das informações. Mesmo assim, a Internet ainda não substitui os livros, seminários, grupos de
estudo e cursos especializados, nem
a aprendizagem e evolução de muitos conhecimentos, e muito menos a
aplicação e validação dos conceitos a
nível local, operacional e empresarial.
Por outro lado, nem todos os pilotos têm disponibilidade ou disposição para se dedicarem a este tipo de
procura, nem as empresas possuem
os mesmos processos de comunicação e divulgação de documentação
que possam complementar os conhecimentos dos cursos de qualificação
das aeronaves.
Há, todavia, duas «bíblias» que os
pilotos podem e devem consultar (estudar e aplicar):
– O DVD sobre Approach-and-Landing Accident Reduction TOOL KIT, da
Flight Safety Fondation, atualizado
em 2010 com a inclusão das Runway
Excursions (o maior número de acidentes dos últimos anos relaciona-se
com saídas de pista).
– O Safety Management Manual,
da ICAO, 3.ª edição, 2012, descarregável da Internet.
É, portanto, demasiado ousado fazer a síntese dos temas e acrónimos
que me proponho abordar nesta série de artigos e que todos os pilotos
conhecem bem.
Motivou-me o apelo da direção da
44
Sirius janeiro | fevereiro
D.R
Texto Egídio Lopes
APPLA para escrever alguns artigos
técnicos (na senda de outros artigos
que tenho publicado ao longo dos
anos) e, acima de tudo, a oportunidade de fazer um breve exercício conjunto com os leitores sobre estes modelos e ferramentas de aprendizagem
que se vão banalizando e entre as
quais não é possível estabelecer fronteiras. São, na sua essência, metodologias complementares na validação
ou avaliação dos fatores humanos e
fatores culturais e a sua influência e/
ou repercussões diretas nos fatores
técnicos e na execução dos procedimentos (fatores operacionais), com
o objetivo de se reforçar a eficiência
e segurança de voo.
Primeiras preocupações com
fatores humanos
Falar das primeiras máquinas voadoras e dos intrépidos aviadores dessas
épocas é sempre bastante gratificante
e motivador 1.
Já nesses tempos «gloriosos» do
início do século XX havia a preocupação de gerir riscos calculados ou
aceitáveis na execução dos primeiros
voos. Eram os fatores humanos no
seu primeiro esplendor.
Wilbur Wright, há quase 100 anos
escreveu uma sintomática carta ao
pai, em que afirmou: «Voando, aprendi que o descuido (carelessness) e o
excesso de confiança (overconfidence) são usualmente mais perigosos do
que a aceitação deliberada de riscos.»
Um quarto de século mais tarde
(1930), o Cap. A. G. Lamplugh, piloto da I Grande Guerra, sumarizou
assim a sua preocupação: «A aviação
não é perigosa por si só (in itself is
not inherentlt dangerous). Mas num
grau superior ao do mar, não perdoa
qualquer descuido, incapacidade ou
negligência (it is terrible unforgiving
of any carelessness, incapacity or neglect).»
Institucionalização dos fatores
humanos
A institucionalização dos fatores humanos, ou ergonómicos, segundo alguns autores, esteve presente na criação de várias organizações há várias
décadas (Ergonomics Research Society, 1949; Human Factors Society,
1957; International Ergonomics Association, 1959).
A necessidade de formação e treino em fatores humanos nas diferentes atividades aeronáuticas foi tragicamente enfatizada em 1977, com o
acidente (incursão na pista) ocorrido
em Tenerife, com 583 mortos na colisão de dois B747.
As estatísticas evidenciam, ao longo dos anos, que os FH têm contribuído para três em cada quatro acidentes.
Finalmente, na assembleia da ICAO
de 1986 (Resolution A26 on Flight and
Human Fatores) foi formulada a «importância dos fatores humanos nas
operações da aviação civil através da
prescrição de práticas e medidas de
fatores humanos desenvolvidos com
base na experiência dos Estados».
As cinco digest da ICAO que se seguiram começaram a abordar os vários
aspetos dos fatores humanos e o seu
impacto na segurança (safety), sendo
dirigidos aos gestores das administrações das entidades nacionais e da indústria aeronáutica, incluindo os responsáveis pela operação e treino das
tripulações, investigadores, bem com
a todos os gestores intermédios não
operacionais, na procura da melhoria
da eficiência e segurança operacionais.
Afinal, o que se entende por fatores humanos, para além da simples
asserção de que dizem respeito ao ser
humano?
No mundo da aviação, os fatores
humanos envolvem todos os aspetos
do ser humano que afetam o exercício das suas funções, individualmente e/ou nas tarefas ou atividades de
dois ou mais elementos ou equipas
que convergem num objetivo comum.
Fatores humanos são acerca de:
– Atuação das pessoas no seu dia
a dia e no local de trabalho;
– Relacionamento entre pessoas;
– Interação entre as pessoas e as
máquinas, procedimentos, regras, organizações, ambientes envolventes e
contextos culturais,
que o modelo SHEL – Software,
Hardware, Environment, Liveware –
tão bem caracteriza [primeiramente
desenvolvido pelo Prof. Elwyn Edwar-
L – Liveware O humano
Aspetos pessoais: atitudes
de processos de pensamento
H
ds (1972) e depois modificado e ilustrado por Frank Hawkins (1975)] 2.
Importa, pois, capitalizar as energias e virtualidades do ser humano
e minimizar as suas fraquezas e limitações.
Nesta perspetiva, as falhas e erros
humanos devem ser vistos e analisados como experiências e hipóteses de
aprendizagem que possam conduzir
a uma melhoria no desempenho individual e em equipa(s).
É óbvio que não entram nesta análise os erros deliberados ou por negligência, na medida em que são do
foro disciplinar ou criminal.
Quanto maior for a complexidade
dos locais e ambientes de trabalho,
maior deve ser o empenhamento posto na otimização do comportamento
e performance do ser humano. Pretende-se que a proficiência do treino
dos pilotos, combinada com a resiliência do ser humano, possa permitir
reações/decisões mais normalizadas
em situações mais críticas, anormais
ou de emergência.
Na realidade, o ser humano ocupa
o centro de qualquer sistema.
Aplicado ao voo, o ser humano é
o elemento mais crítico e vulnerável
a influências que podem afetar adversamente a sua performance. Mas
é também o único com flexibilidade,
adaptabilidade e bom senso capaz de
substituir ou interagir com os restantes elementos de maneira a manter o
S
L
S – Software
Procedimentos
Aspetos interpessoais:
interação com
procedimentos e pessoas
L
L – Liveware Pessoas
Meio organizacional
H – Hardware Máquina
Conhecimento das
pessoas: o meio ambiente,
procedimentos, o avião
E – Situação do meio
Situation awareness
E
Aproximação e aterragem, CFIT, perda de controlo, Runway Incursion e Excursion
equilíbrio de um sistema altamente
dinâmico, não obstante todos os problemas de ordem física, psicológica,
emocional, familiar, económica, etc.,
que lhe são inerentes.
Poder-se-á resumir que o ser humano é o último elo da cadeia do erro
que conduz aos acidentes/incidentes,
mas também é a última rede de segurança do transporte aéreo.
Disciplinas relacionadas com
os fatores humanos
Não se pode pretender interpretar a
temática dos fatores humanos com
uma visão limitada ou como pertencentes a uma única disciplina. São,
por natureza, multidisciplinares, com
informações e conhecimentos derivados, em primeiro lugar, da psicologia
e da fisiologia.
A informação é importada da psicologia para se compreender como
as pessoas processam a informação
e tomam decisões.
Da psicologia e da fisiologia deriva a compreensão dos processos
sensoriais e dos meios para detetar
e transmitir informações.
Outras disciplinas, como a engenharia, a medicina e a sociologia, começaram a ser tomadas em crescente
consideração. Porém, a antropometria, a biomecânica e a cronobiologia foram ocupando algum destaque
com a evolução das máquinas e da
diversidade dos voos, sem descurar
a participação de outras especialidades ligadas à educação, matemática,
física, bioquímica, desenho industrial
e pesquisa operacional.
Já o Prof E. Edwards afirmava que
a utilização académica destas fontes
de informação e de conhecimentos,
com fronteiras difíceis de definir, deve
ter sempre em consideração que os
fatores humanos estão essencialmente virados para a melhor solução de
problemas no mundo real.
(Continua no próximo número)
1
A propósito, lembram-se da divertida comédia
britânica de 1965 Those Magnificent Men in Their
Flying Machines? Os pilotos mais novos não
percam esta maravilha, descarregável da Internet.
2
Hawkins, Frank H., Human Factors in Flight;
Gower.
janeiro | fevereiro Sirius
45
RESPONSABILIDADE SOCIAL
PROMESSAS DE ANO NOVO
Quando me comecei a envolver na área da
responsabilidade social, ouvi com alguma
frequência: «Até gostaria de fazer algo, mas com
os nossos horários...»
É VERDADE QUE A MAIOR parte das organizações estão formatadas para quem tem horários de trabalho «normais», o que não acontece com a maioria dos tripulantes. Por um lado,
normalmente estas organizações são compostas por indivíduos que começaram, não por
terem formação em gestão ou conhecimentos
em organizações não governamentais, mas por
acreditarem numa causa, e, deste modo, o seu
forte não é a gestão de voluntários nem a sensibilidade para problemas básicos de marketing,
especialmente no que diz respeito ao público
interno e à gestão das expectativas. Por outro
lado, a maioria dos candidatos a voluntários
tem uma perspetiva muito própria da atividade de voluntariado que gostariam de fazer, não
tolerando muitas variações.
Um dos motivos que me leva a assinar esta rubrica da Sirius é a tentativa de, através de
exemplos, demonstrar que o facto de a maioria
dos tripulantes da aviação civil trabalhar por
turnos não tem que ser impeditivo para atuar
nesta área. Pode até ser uma mais-valia para as
organizações, pois podemos atuar durante o horário de expediente, ao contrário da maioria da
população. Ao mesmo tempo, devido à nossa
profissão, temos uma capacidade de organizar
e priorizar acima da média. Bastaria juntar um
pouco de Situation Awereness Social e perceber onde é que poderíamos fazer falta e se as
nossas capacidades serão adequadas à missão
que de nós é esperada para rapidamente aparecerem oportunidades. Passar de «até gostaria de
fazer algo...» a «vou fazer o que for preciso!».
Não nos podemos esquecer que ao nos envolvermos na vida de outros vamos criar expectativas e dependências a pessoas que já foram
muitas vezes defraudadas pela vida e que não
precisam de mais uma desilusão.
Em vez de fazer um resumo dos artigos que
escrevi em 2012, aproveito para divulgar uma
iniciativa que se encaixa bem neste artigo e
anunciar o alargamento do âmbito destes arti46
Sirius janeiro | fevereiro
D.R
Texto Duarte Lopes
gos, que passarão a incluir iniciativas realizadas por tripulantes de outros países.
Tampas que são rampas
(O piloto aviador que coordena este projeto preferiu não se promover neste artigo.)
Um piloto aviador começou com a expressão
«até gostaria de fazer algo...» e foi evoluindo
até ter a certeza de que queria mesmo fazer alguma coisa e que estava disposto a dar o seu tempo
a longo prazo. Começou a procurar, até que lhe
propuseram coordenar um projeto de recolha de
tampinhas de plástico que iria envolver o mundo
dos tripulantes da aviação civil e das companhias
aéreas em geral. Como temos acesso à matéria-prima (tampas de plástico) e uma forma fácil de
as reunir, parecia um conceito simples. Após alguns meses de diligências e investigação, conheceu uma iniciativa da Câmara Municipal de Sintra
(CMS), «TAMPAS QUE SÃO RAMPAS». Este projeto
é coordenado pela Dr.ª Ana Alcântara e tem um
acordo com uma empresa recicladora de plástico.
Quando recebem as tampas, elas são pesadas e é
passado um recibo que indica para quem reverte a entrega e qual o peso. Ao mesmo tempo, a
CMS seleciona os candidatos aos projetos através
dos serviços sociais, escolas, propostas diretas ou
boca-orelha. Quando se atinge o valor necessário
da cadeira de rodas, é dada instrução à empresa
recicladora para adquirir o material e entregar ao
destinatário final. Tudo sob a supervisão da CMS.
Deste modo não se lida diretamente com dinheiro
e a credibilidade do projeto fica garantida.
Chegar a este ponto foi apenas o primeiro passo. Na fase seguinte, teve que começar a coordenar de forma contínua toda a logística de escolher
os recipientes indicados para este projeto, a sua
manutenção, obter autorização para a colocação
dos mesmos nos diversos pontos, recolha atempada antes de os contentares encherem demasiado, uma primeira triagem das tampas, a entrega e
manter um registo correto e atualizado das mesmas. O projeto tem vindo a crescer com o apoio
de muitos colegas e da TAKE C’AIR – Crew Volunteers, tornando esta tarefa cada vez mais exigente.
Será que era este o projeto que o piloto aviador
imaginou que iria fazer? Não. Mas foi uma forma
de fazer mais que «algo, eventualmente, quem sabe, um destes dias...». Foi a forma de «fazer o que
é preciso» e ter capacidade para o fazer.
Esta atitude, além de responsável, adquire um
caráter de urgência no contexto atual. Temos que
acreditar mesmo na promessa que estamos a fazer,
seja de Ano Novo ou não. Temos que equacionar
se somos mesmo uma sociedade ou apenas um
grupo de alguns milhões de pessoas que coabitam, como um daqueles condomínios em que os
vizinhos mal dizem bom-dia.
Como dizia Ghandi: «Temos que ser a mudança que queremos ver.»
(Se algum leitor conhecer uma causa ou atividade de um piloto aviador que gostasse de ver
publicada, envie, por favor, uma proposta por
correio eletrónico para [email protected].)
REPORTAGEM
NO REINO DOS
PARAMOTORES
Campo de voo de Campinho
recebe 19 ultraleves e 22
paramotores
Texto Paula Carvalho Silva Fotos André Garcez
A AFLUÊNCIA É MENOR, comentava-se ao almoço de dia 13 de outubro
no Campo de Voo de Campinho, ali
junto à Albufeira do Alqueva. No ano
passado as coisas estavam melhores,
sublinhava-se em referência à crise
económica. Mesmo assim, 19 ultraleves e 22 paramotores – em destacada maioria, não só pelo número de
aparelhos mas também pelo número
de acompanhantes – aderiram a mais
esta iniciativa liderada por Luís Rato
Fonseca, presidente da Junta de Freguesia de Campinho. Todos os anos
o encontro repete-se naquela que é
uma tentativa da Junta para ter um
papel ativo na divulgação do turismo
da região. Para isso, os melhoramentos nas infraestruturas – incluindo no
estado da pista – são evidentes e Luís
Rato Fonseca pretende ainda inaugurar um parque de campismo na próxima primavera. Mas o plano principal e mais ambicioso passa por juntar
equipas que conjuguem o meio aéreo
(ultraleves e paramotores), terrestre
(motociclismo) e aquático (catamarãs, hovercrafts e vela clássica) e haver uma troca de experiências benéfica para todos.
48
Sirius janeiro | fevereiro
ESPANHÓIS
De entre os 22
paramotores que
se deslocaram
a Campinho, 12
vieram de Espanha
(Huelva, Madrid,
Sevilha). Segundo
o piloto Américo
Mendes, Campinho
é o encontro que
mais pilotos desta
modalidade agrega.
MEDICINA
TABACO OU SAÚDE ORAL
São do domínio comum os efeitos nocivos do tabaco. Este artigo visa, por
um lado, alertar para factos menos divulgados e, por outro, trazer à luz da
consciência sinais de alarme a ter em conta, que a maior parte das vezes
são tidos como inofensivos
GETTY IMAGES
Texto Marta Teixeira Dias *
A NICOTINA, OBTIDA ATRAVÉS DE
UMA PLANTA, é uma substância incolor hidrossolúvel, alcaloide, potencialmente tóxica, encontrada no tabaco
e classificada como inseticida. Tem a
sua ação cancerígena pelas alterações
que provoca a nível do DNA (componente genética) celular, e componente
do tabaco, por diminuição geral da oxigenação do corpo humano, afetando
assim todas as células do corpo humano sem exceção. Provocando elevados
níveis de dependência química, tornase assaz difícil abandonar o seu consumo, dependendo fundamentalmente
de força de vontade pessoal.
O tabaco de um cigarro seria fatal
para dois adultos se fosse injetado via
endovenosa. Duas gotas de nicotina na
50
Sirius janeiro | fevereiro
língua de um gato provocam convulsões e morte imediata em dois minutos.
E há literatura que comprova o efeito
fatal da ingestão do tabaco por tentativas de suicídio ou acidental (crianças).
O tabaco é responsável por 4,9 milhões de mortes por ano, tendo sido designado como «holocausto silencioso»
pelo Royal College of Physicians, Reino
Unido. E prevê-se um aumento para 10
milhões de mortes até ao ano de 2020,
a maior parte em países em desenvolvimento. Há que salientar que em cada 6,5 segundos, algures no mundo,
morre um fumador com uma doença
relacionada com o tabagismo. De facto, o tabaco faz parte da etiologia de
todas as doenças de maior mortalidade
a nível mundial (OMS). Atualmente,
conta com 1300 milhões de consumidores, e o número continua a crescer.
O aumento do consumo de tabaco
está a deslocar-se dos países industrializados para os em desenvolvimento
por estratégias de marketing e para
procurar substituição dos consumidores que morrem prematuramente
por tabagismo. Os custos do consumo
implicam, além dos custos da saúde
do consumidor, um peso económico
no orçamento familiar e social e uma
grande ameaça ao desenvolvimento
sustentável e equitativo.
O fumo do tabaco é considerado
um dos maiores poluentes do planeta, tal como a poluição industrial ou
de veículos motorizados. Um estudo
espanhol feito em 2006 conclui que o
fumo do tabaco é 60 vezes mais tóxico que a poluição do trânsito.
Um dos componentes da combustão
do tabaco é o monóxido de carbono; a
quantidade que chega aos pulmões depende do modo como o tabaco é fumado, ritmo e profundidade da inalação.
O envenenamento e morte por monóxido de carbono são bem conhecidos, mas no tabagismo as doses assimiladas são menores, muito embora
os seus efeitos sejam igualmente nocivos. Este componente fixa-se à hemoglobina, proteína dos glóbulos vermelhos que fixa o oxigénio nos pulmões,
e transporta-o a todo o organismo. Ao
verificar-se a fixação do monóxido de
carbono no glóbulo vermelho, ao invés do oxigénio, a oxigenação de todo
o corpo fica significativamente comprometida, afetando assim todas as
células do corpo humano. Além do
monóxido de carbono existente já pela poluição do ambiente, a do tabaco
é administrada de uma forma ainda
mais contundente. Assim, em ambientes restritos, em que a quantidade de
oxigénio é reduzida, ambientes pressurizados ou até de condições precárias (minas, fábricas, etc.), os consumidores de tabaco sofrem mais efeitos
adversos destas condições pela menor
oxigenação generalizada da qual padecem, provocada pelo tabaco, estando, por exemplo, mais predispostos a
fadiga crónica.
Os efeitos do tabaco a nível da saúde
traduzem-se, entre eles, em doenças
cardiovasculares (uma vez que até a
oxigenação do próprio músculo cardíaco está afetada), carcinomas pulmonar,
do tubo digestivo, do aparelho reprodutivo, renal, doença pulmonar crónica
obstrutiva, asma, carcinoma hepático,
do pâncreas, cataratas (opacificação do
cristalino do olho), leucemia e é até
responsável pelo síndrome de morte
súbita infantil, por fumo passivo, no
que respeita aos filhos de fumadores.
A nível da cavidade oral, o tabaco
tem as suas extensas repercussões também, desde a alteração do paladar à
periodontite (doença das gengivas e do
osso que suporta os dentes), levando
à perda prematura de peças dentárias.
Há uma relação direta entre tabagismo e gravidade de doença periodontal,
dependente da quantidade de tabaco
consumido.Os fumadores apresentam
baixas taxas de sucesso de tratamento periodontal. Verifica-se um severo
atraso na cicatrização de feridas intraorais, podendo um fumador ter 100%
mais de dores após uma extração dentária do que um não fumador, por ausência de formação de coágulo sanguíneo e necrose da superfície óssea
exposta após cirurgia, que se designa
por alveolite. Verifica-se também um
aumento da probabilidade de rejeição
de implantes, pois, após a ingestão de
um cigarro completo, a circulação sanguínea da cavidade oral fica reduzida
durante três horas, por vasoconstrição. Na maior parte, surge a melanose
do fumador e/ou palato do fumador,
a língua pilosa típica do tabagismo
e também as lesões pré-cancerosas,
como as leucoplasias, lesões brancas
aparentemente inofensivas e que passam despercebidas à maior parte das
ças e mortes, os efeitos da globalização do comércio do tabaco e as crescentes taxas de consumo nos países
em desenvolvimento serão sentidos
nas próximas décadas.
As doenças orais provocadas pelo tabaco têm um peso significativo no total das patologia orais; a maioria das
consequências do consumo do tabaco
afetam a qualidade de vida, desde a
halitose, hipertensão, acidente vascular
cerebral a defeitos congénitos. Salientase ainda que as tripulações de aeronaves, ao estarem submetidas a variações
da pressão atmosférica do meio em
que trabalham, submetem o sistema
circulatório a esforço adaptativo tanto
mais intenso quanto maior o número
de aterragens e descolagens verificado. O tabaco prejudica seriamente esse processo, sendo estes profissionais
mais sujeitos a acidentes vasculares
fatais ou incapacitantes.
Há vários obstáculos ao abandono
dos hábitos tabágicos, desde pressão
O TABACO PREJUDICA ESSE
PROCESSO, SENDO OS TRIPULANTES
DE AERONAVE OS MAIS SUJEITOS A
ACIDENTES VASCULARES
pessoas que não estão alertadas para
este tipo de situação.
A leucoplasia é uma lesão pré-cancerígena que, não o sendo, tem potencial acrescido de se transformar
em lesão cancerígena se associada ao
consumo de tabaco e acentuando as
probabilidades de malignização se associada ao consumo de álcool ou até
mesmo ao hábito de ingestão de bebidas muito quentes, como o chá (muito
frequente nos países de cultura árabe
e oriental). Com o tabagismo surge
também a halitose e a inestética pigmentação dentária, sendo só removida por processos de higiene oral, por
profissionais em gabinete dentário.
Para concluir, há que referir que,
devido ao longo período entre o início
do hábito e o aparecimento de doen-
social e controlo da ansiedade, stress,
etc. No entanto, há medicação coadjuvante que auxilia a pessoa a deixar
de fumar (ansiolíticos, adesivos de
nicotina para desabituação, psicoterapia e medicina alternativa, como
a acunpuctura), sendo indispensável
como denominador comum a força de
vontade e a motivação para hábitos
saudáveis, como a prática desportiva, e melhoria significativa da qualidade de vida. Sendo cada vez mais a
informação disponível, bem como as
entidades responsáveis que alertam
para os malefícios, há atualmente um
crescente número de sucesso de fumadores que abandonam definitivamente o tabaco.
* * Médica dentista – OMD 2738.
janeiro | fevereiro Sirius
51
DEFESA
UAV PRONTO
A VOAR
Portugal já dispõe de uma plataforma UAV autónoma com
capacidade para o desempenho de múltiplas missões
Texto Alexandre Coutinho Fotos André Garcez
QUATRO ANOS VOLVIDOS SOBRE o arranque
do PITVANT (Projeto de Investigação e Tecnologia em Veículos Aéreos Não-Tripulados), a Força
Aérea Portuguesa está apta a reforçar o sistema de
defesa aérea com a introdução destas pequenas
aeronaves em diversos tipos de missões, civis e
militares. Não surpreende que este desenvolvimento seja de origem nacional, reconhecidos os
méritos e as competências no seio da Academia
da Força Aérea e da Faculdade de Engenharia
da Universidade do Porto (FEUP), mas é notório
que o mesmo seja o fruto de um orçamento de
apenas dois milhões de euros a sete anos (2008-2015). O País não necessita, assim, de investir
em tecnologias UAV importadas, com o que daqui advém em matéria de economia de recursos
humanos, materiais e financeiros.
OS UAV PITVANT
JÁ CONTAM COM
MAIS DE 700 VOOS
AUTÓNOMOS
E MAIS DE 300
HORAS DE VOO
Todos os sistemas e subsistemas (à exceção
do piloto automático Piccolo, da CloudCap Technology), assim como a maioria dos componentes, foram desenvolvidos por engenheiros e
militares portugueses no âmbito deste projeto.
A equipa da Força Aérea é constituída por duas
dezenas de pessoas, no centro de investigação,
apoiadas por alguns colaboradores. «Estamos
em condições de fazer uma transferência de
tecnologia para a Força Aérea, os outros ramos
das Forças Armadas, entidades governamentais
e não governamentais. Ultrapassada a fase de
experiência (2011), os sistemas estão aptos para missões. O PITVANT é único, a nível nacional, em voo autónomo», frisa o Tenente-Coronel José Morgado. Para mais, é uma tecnologia
exportável para outros países, e «Portugal tem
condições únicas para o teste de UAV (com muito mar e uma meteorologia favorável) de Forças
Armadas de outros países», acrescenta o mesmo responsável.
Os UAV Alfa e Alfa Extended, desenvolvidos
no âmbito do projeto PITVANT, já contam com
mais de 700 voos autónomos e mais de 300 horas de voo. O primeiro é um UAV de pequena
dimensão, com um peso de 10/12 kg, uma autonomia de cinco a seis horas de voo (motores
elétrico de 2,8 kW ou de combustão de 1,5 cv)
e um payload (capacidade de carga) de 4 a 8
kg; o segundo, pesa 25 a 29 kg, dispõe de uma
autonomia de voo de oito horas (que pode ser
alargada a 15/16 horas) e de um payload de 35
kg. A frota de Alfa 1 da Força Aérea compreende um total de seis aeronaves (das nove construídas, registando-se a perda de três unidades).
No decurso da reportagem efetuada pela Sirius
na Base Aérea n.º 2, na Ota, ficaram bem patentes as capacidades dos UAV Alfa em missões de
observação e vigilância, com envio de imagens
em tempo real para a estação de controlo. A plataforma encontra-se numa fase amadurecida de
desenvolvimento, estando demonstrada a sólida
experiência adquirida pelos pilotos e operadores
do sistema. Além de todos os procedimentos de
operação e segurança perfeitamente rodados, o
mais impressionante reside na capacidade de
programação das missões do UAV. Em escassos
minutos, a aeronave pode ser reprogramada para
um novo objetivo, recebendo as instruções em
voo. Os UAV estão preparados para voos diurnos e noturnos, tendo como única restrição o
vento. Com um consumo de 0,5 l/h, a operação
de um UAV ronda 50 cêntimos por hora. A vigi-
ORÇAMENTO
É notório que o
PITVANT seja o fruto
de um orçamento de
apenas dois milhões
de euros a sete anos
(2008-2015).
O País não necessita,
assim, de investir
em tecnologias
UAV importadas,
com o que daqui
advém em matéria
de economia de
recursos humanos,
materiais e
financeiros
lância dos 750 km da costa portuguesa poderia
ser realizada a um custo de 2,5 euros por dia!
Instalada a estação avançada de controlo numa tenda de campanha junto da pista, o tempo
de prontidão para fazer descolar uma aeronave deste tipo não ultrapassa 10 minutos. O UAV
é operado a partir de um computador portátil,
que constitui o cockpit da aeronave, enquanto
as imagens captadas pela câmara instalada a
bordo são visualizadas noutro monitor e podem
ser registadas em suportes de memória. «É tal e
qual como num avião, só que não vai ninguém
lá dentro», comenta o Sargento-Ajudante Gomes,
operador de voo. Na pista, o Sargento-Ajudante Teixeira fez o check de potência e prepara-se
para fazer descolar o UAV através do radiocomando. Em menos de 50 metros, o Alfa 06 está
no ar. Normalmente, a descolagem é feita em
manual, passando depois a aeronave para plano de voo automático. O aparelho pode aterrar
em automático, mas é retomado em manual,
para melhor controlo do voo cruzado que se faz
sentir. Em situações de emergência ou perda de
PITVANT ALFA
Envergadura (m) 2,4 MTOW (kg) 10 Payload
(kg) 4 Motor (cv/kw) 1,5/2,8 Autonomia (h) 2/5
Vel. máx. (km/h) 120 N.º de aparelhos 6
janeiro | fevereiro Sirius
53
DEFESA
contacto com o UAV, este está preparado para
regressar a um ponto pré-programado, por cima
da estação, voando em círculos até ser retomado pelo operador.
A Ota, a grande base da Força Aérea nos anos
50, foi agora escolhida como base permanente
de testes da «esquadra» dos UAV, bem como para a manutenção de 1.º e 2.º escalão (que não
obrigam a paragens prolongadas), permanecendo a manutenção de 3.º escalão na Academia
da Força Aérea. Para o efeito, foram construídas
oficinas, uma sala de briefing e uma sala de formação para pilotos e operadores (oriundos da
escola de sargentos), bem como um hangar para
estacionamento das aeronaves e da estação de
terra móvel (1.º trimestre de 2013).
Em 2012, os testes da Força Aérea com os seus
UAV incidiram, sobretudo, nos voos sobre o mar,
a partir de uma base instalada no Aeródromo
de Santa Cruz, em missões de vigilância marítima e busca e salvamento. Os sistemas permitem a localização de um beacon emitido a partir de uma lancha ou navio, mas a Força Aérea
está a trabalhar na aquisição de alvos a partir
do processamento de imagens captadas. Serão
instaladas câmaras de filmar com zoom orientáveis a partir de terra. Através de uma plataforma
deste tipo, é possível localizar um navio, tirar-lhe a matrícula e avaliar, pelo rasto, se está a
fazer uma lavagem de porão. Em terra, os UAV
podem ser empregues em cenários de catástrofes (como relais de comunicações), incêndios e
controlo de multidões.
Em 2013 deverão começar os voos multi-UAV
em voo cooperativo. Atualmente, existe capacidade para colocar várias aeronaves no ar, mas
sem comunicação entre elas. O objetivo é constituir uma rede de pequenos UAV, que podem
ser otimizados em função dos sensores que levam a bordo. O primeiro teste deverá ser feito em colaboração com a Marinha, durante o
exercício REP13.
No âmbito dos exercícios de segurança Perseus (rede de vigilância do perímetro marítimo
europeu), a Força Aérea planeia levar os seus
UAV até Portimão, Porto Santo, ilhas Selvagens
e novamente Santa Cruz. No 1.º semestre de
2013, a plataforma Alfa Extended vai igualmente participar em testes no âmbito do programa
Galileo, na zona de Berchtesgaden, na Alemanha. O ano de 2013 foi também escolhido para
o desenvolvimento do Antex de nível 2, com um
peso de 150 kg à descolagem.
Remontam a 2006 as primeiras experiências
no Laboratório Aeronáutico da Academia da For54
Sirius janeiro | fevereiro
OBJETIVOS
Entre os principais
objetivos, o PITVANT
foi lançado para
desenvolver e
testar tecnologias
para UAV para fins
militares e civis em
plataformas não
superiores a 150 kg
(80% dos sistemas
desenvolvidos no
mundo inteiro).
Essencialmente
desenvolvidos
para missões civis
e de defesa, não
está excluída a
possibilidade de
utilização destas
aeronaves para fins
ofensivos, embora
não seja um objetivo
a curto ou médio
prazo.
ça Aérea com UAV de pequena e média dimensão, embora nunca em voos autónomos, mas
sempre com controlo remoto. A Faculdade de
Engenharia da Universidade do Porto (FEUP)
foi escolhida como parceira destes desenvolvimentos, dada a sua experiência com sistemas
de controlo para submarinos autónomos, e em
maio de 2007 nasceu uma primeira plataforma
de 12 kg apta a voar em voo autónomo.
Por coincidência, no 3.º trimestre desse ano,
o Ministério da Defesa Nacional lançou um repto
aos três ramos das Forças Armadas, no sentido
de apresentarem um projeto neste mesmo domínio, e a Força Aérea avançou com o PITVANT,
que acabaria por ser aprovado, com um orçamento de dois milhões de euros para sete anos
(2008-2015). O projeto conta ainda com as parcerias de empresas e instituições de renome,
como a Universidade da Califórnia, em Berkeley, a Universidade das Forças Armadas de Munique, a Agência de Defesa Sueca, a Honeywell
e a Embraer.
CONSCIÊNCIA AMBIENTAL
A proteção do ambiente representa um desafio
único para a Força Aérea
Texto Alexandre Coutinho
ANDRÉ GARCEZ
AS CAPACIDADES E POTENCIALIDADES das plataformas PITVANT estiveram em evidência nas II Jornadas
de Ambiente da Força Aérea, no dia
7 de novembro, numa apresentação
do Tenente-Coronel José Morgado,
diretor do Centro de Investigação da
Academia da Força Aérea, completada
com a projeção de um conjunto de vídeos bem elucidativos da performance destes aparelhos UAV: deteção de
alvos em movimento (em terra e no
mar); patrulhamento e vigilância marítima, com lançamento em catapulta
a partir de uma lancha da Marinha ou
descolagem do Aeródromo de Santa
Cruz em missão de observação até às
Berlengas, e deteção de pesca ilegal,
lavagem de tanques em alto mar, erosão costeira ou incêndios florestais.
Ficou, assim, demonstrado que os
UAV podem complementar as missões
de aparelhos de maiores dimensões,
como os C-295. De acordo com o Tenente-Coronel Pedro Bernardino, comandante da Esquadra 502, os C-295
PORTUGAL TEM
BONS EXEMPLOS
AMBIENTAIS A
NÍVEL MUNDIAL
Representantes
dos três ramos das
Forças Armadas
e investigadores
encheram o auditório
do EMFA
verão reforçadas as suas capacidades, no primeiro semestre de 2013,
com a adoção de um VDL (VHF Data
Link) para transmissão de imagem
em tempo real, idêntico ao usado no
PITVANT, um SLAR (Side Looking
Airborne Radar) e câmaras fotográficas digitais.
A integração de requisitos ambientais nas atividades militares, quer na
presença de conflitos, quer em tempo
de paz, representa um desafio único
para as Forças Armadas, e em particular para a Força Aérea, que, sem descurar a sua missão, tem investido recursos para responder às necessidades da
gestão ambiental das suas atividades
(desde 1989 que a Força Aérea dispõe
de um gestor ambiental). É neste contexto que surgiu a iniciativa de organizar as II Jornadas de Ambiente da
Força Aérea, onde se pretende alargar
o conhecimento sobre a proteção ambiental no cumprimento da missão,
assim como dar a conhecer outras realidades e práticas ambientais dentro e
fora da organização.
Na sua apresentação sobre a implementação faseada do EMAS (Sistema
Comunitário de Ecogestão e Auditoria) no setor da Defesa Nacional, Nuno Videira, professor auxiliar na Faculdade de Ciências e Tecnologia da
Universidade Nova de Lisboa, salientou os bons exemplos a nível mundial
que constituem os casos de estudo
do Campo de Tiro de Alcochete, do
Instituto Geográfico do Exército e do
Campo Militar de Santa Margarida.
Na Força Aérea, destaque ainda para
a implementação do EMAS na BA5 e
na Estação de Radar n.º 2, com resultados práticos traduzidos numa redução de 50% no consumo de água
e de 30% no consumo de energia.
janeiro | fevereiro Sirius
55
OPINIÃO
PILOTO DE DRONES
Toda a vez que leio uma matéria sobre drones fico imaginando que
grandes mudanças terão que ser feitas no que, em mais de dois
milénios, se entendeu como guerra
«UM RELATÓRIO ELABORADO POR
duas universidades americanas, a Stanford Law School e a New York University School of Law, com o título A vida sob os drones, afirma que a grande
maioria das milhares de pessoas mortas nos ataques, iniciados em junho de
2004, nas zonas tribais paquistanesas
eram combatentes islamitas. No entanto, o relatório insiste nas graves consequências sociais e psicológicas dos
bombardeios na população: os drones
sobrevoam as localidades do Noroeste
24 horas por dia, atacam veículos, casas e espaços públicos sem aviso prévio. A sua presença aterroriza homens,
mulheres e crianças, criando um trauma psicológico. No momento, existem
mais de 500 drones norte-americanos
no Afeganistão, Paquistão e Iraque.»
Como exemplo, vou-me fixar nas
cenas que aparecem num filme muito
divulgado na Internet, onde uma moça de óculos, pertencente à USAF, num
local protegido no centro dos Estados
Unidos, pilota remotamente uma aeronave que voa noutro continente, com
a finalidade de bombardear uma área
previamente especificada.
Como terá sido o dia dela?
Acordou, penteou o cabelo, fez uma
ligeira maquilhagem, preparou café,
ovos, torradas e bacon para o marido
e os filhos, levou um deles à paragem
do autocarro, fez as recomendações de
sempre, enquanto o pai deixava o mais
novo na escola. Pegou no casaco, ligou
o carro, que, por falta de tempo, ainda
não levara para trocar dois pneus, entrou num tráfego pesado, mas organizado, e chegou ao trabalho. Marcou a
hora de entrada digitalmente, perguntou a um colega como estava o filho,
que ontem tivera febre, abriu a bolsa,
tirou uma chiclete e ligou o computa56
Sirius janeiro | fevereiro
FOTOS EADS
Texto Cesar Augusto Araripe Lacerda (*)
dor. Na página destinada a missões,
encontrou a sua para aquele dia: destruir um esconderijo talibã cujas coordenadas codificadas apareciam na tela.
Consultou as condições meteorológicas, fez um check-up ao drone, observou o combustível, testou o armamento e as câmaras de televisão. Contactou
o seu comandante imediato, leu na tela
algumas recomendações importantes,
pediu permissão para iniciar a missão.
Contactou a torre de controle, ligou a
aeronave, fez os check-ups regulares
previstos antes da descolagem, soltou os travões, iniciou o táxi, chegou
à pista indicada, acelerou, acionou o
manche e já estava no ar. O voo seria
direto sobre o alvo, mas um pouquinho longo. Fez os devidos registos no
painel, avisou o comando e ligou o piloto automático. Com algum tempo de
sobra, foi até à casa de banho, lavou
as mãos, retocou o cabelo e a maquilhagem. Tirou o Iphone do bolso, ligou
para a mãe, conversou sobre as notas
baixas do filho mais velho na escola,
pediu uma receita de bolo de chocolate... o que fizera ontem não tinha
ficado bom, ninguém quis comer. A
mãe poderia enviar a receita pelo Ipad,
por um notebook ou qualquer aparelho
moderno, mas acontece que ela não
sabia nem ligar um micro-ondas. Paciência, a idade, às vezes, é um problema. Enviou um e-mail para a melhor
amiga a confirmar a sua presença e a
do marido na festa à noite. Sabia que
a boa educação mandava que tivesse feito a confirmação até à véspera,
pelo menos, mas com este negócio de
combater todo o dia não sobrava tempo para nada. Tudo bem, eram amigas
de colégio e seria certamente desculpada. Olhou para o relógio, só seria
possível um rápido café na máquina
e teria que retomar o voo. Sentada
novamente na sua cadeira, colocou
o copo de café sobre a mesa, ajustou
os fones e assumiu o comando da aeronave. Olhou para os instrumentos,
em especial o GPS – estava perto. Na
tela aparecia um lugarejo perdido no
meio do nada, nenhuma árvore, ca-
sas pobres sem jardim, pouquíssimos
automóveis, um caminhão, dois cavalos soltos a pastar na única mancha
verde. Um aviso sonoro e um círculo sobre uma das casas mostrou que
o alvo estava identificado. Informou
o comando de que se encontrava em
posição e iria abrir fogo. Um segundo após ouvir o OK fez dois disparos:
o primeiro atingiu o alvo em cheio, o
outro acertou no muro.
As explosões que se sucederam
mostraram que devia haver muitos
explosivos guardados e de entre as
pessoas que saíram a correr uma tentava apagar o fogo nas suas roupas.
Avisou o comando sobre o êxito da
missão, recebeu os parabéns e a ordem de voltar à base. Voo tranquilo,
a paisagem feia e monótona de sempre. Ajudada pelo piloto automático,
leu as notícias do dia no jornal local:
«Outro desastre de automóveis perto
da minha casa? Não é possível, isto
é um perigo, preciso alertar as crianças», fez algumas palavras cruzadas
e depois pousou sem problemas e levou a aeronave até ao hangar. Começou a digitar o relatório e só parou no
item que perguntava se havia vítimas.
Lembrou que um homem estava com
a roupa em chamas, mas os outros
eram três ou quatro? Colocou quatro;
se houvesse problema, requisitaria o
vídeo gravado; o comandante não era
tão exigente assim.
Desligou o sistema, pegou no casaco, marcou a hora de saída e caminhou na direção do carro a pensar que
talvez fosse melhor trocar os quatro
pneus. Outro carro não era possível,
estavam com problemas com a hipoteca da casa. Àquela hora, o tráfego
não estava assim tão intenso, daria
para passar no supermercado. Pegou
na lista de compras, tirou alguns produtos de limpeza da prateleira e duas
caixas de sumo de laranja. Examinou
o rótulo, viu que nenhum deles viera
da América Latina, os preferidos do
marido. «Uma palermice, laranja é tudo igual. E depois, se existe diferença,
é claro que as laranjas da Califórnia
são melhores que as laranjas cucarachas.» A casa estava vazia, nem marido, nem filhos. Deu-lhe tempo para
um banho quente... «quando sobrar
dinheirinho, vou comprar uma banheira de hidromassagem». Enrolou o cabelo, escolheu o vestido e os sapatos
para a festa e foi para a cozinha preparar o jantar das crianças. Estava a
divagar sobre quem iria encontrar na
casa da amiga quando o marido chegou. Desfez o nó da gravata, abriu a
camisa e colocou a pesada pasta sobre a mesa («Para que ele anda com
tantos papéis na pasta? Não é o dono
do escritório de contabilidade, é só o
subgerente, não precisa trazer trabalho para casa...»). Como era hábito,
só então ele lhe fez um breve cumprimento e repetiu a pergunta de sempre:
«Como foi o teu dia?» E ela, também
como sempre, respondeu: «Tudo normal, sem novidades.»
(*) Coronel de artilharia do Exército Brasileiro, engenheiro civil, historiador e
professor.
janeiro | fevereiro Sirius
57
TEST DRIVE
PILOTOS CRIAM CLUBE
DE CLÁSSICOS C4 CREW
Os sócios são maioritariamente pilotos, mas também há vários
tripulantes de cabina e entusiastas da aviação
Textos e Fotos Paulo Pires
ESTÃO REUNIDAS AS CONDIÇÕES
para que a conversa no cockpit flua sobre diversos temas. Aos poucos, vamos
percebendo que temos muitas coisas
em comum, sendo que os hobbies por
vezes são partilhados. Foi desta forma
que este clube nasceu, pois muitos dos
tripulantes nutrem um gosto especial
por máquinas, sejam elas aéreas, terrestes ou aquáticas. A paixão por carros antigos e clássicos é partilhada por
muitos de nós. Contudo, às vezes não
podemos participar nos encontros e
passeios organizados pelos clubes de
carros antigos a que pertencemos, uma
vez que são planeados ao fim de semana. Para nós, os fins de semana são, na
sua maioria, para trabalhar; nos restantes aproveitamos ao máximo o tempo
com a família e amigos.
O objetivo deste clube é proporcionar
aos nossos sócios e amigos um encontro durante os dias úteis, num ambiente de boa camaradagem, para falarmos
das nossas paixões, trocando experiências e conhecimentos. Fazemos alguns
almoços por ano, sendo que em maio
comemoramos o nosso aniversário (com
O futuro é incerto,
mas hoje ainda é
investimento comprar
determinadas viaturas
clássicas ou antigas
58
Sirius janeiro | fevereiro
passeio e visita cultural) e em setembro
a nossa prova de karts. Todavia, estamos
abertos a convites para participar noutros eventos, como aconteceu em junho
de 2010, quando nos juntámos ao Museu
Aerofénix e ao Aeroclube de Portugal e
no Dia da Criança rumámos ao Aeródromo de Santarém. Lá estavam duas
associações (Terra de Sonhos e Acreditar) que têm a seu cargo crianças que
padecem de doenças graves, por vezes
terminais. Nesse ano decidiu-se proporcionar um dia diferente a estas crianças.
Foram voar nos diversos aviões presen-
PARCERIAS
Com o crescimento do clube,
decidimos fazer algumas
parcerias, e neste momento
temos uma com o CAACA –
Clube de Automóveis Antigos da
Costa Azul, com sede na Costa
de Caparica, bem como com
diversas oficinas de clássicos
e fornecedores
tes e nos intervalos andaram nos carros
clássicos que se deslocaram até Santarém. Foi, sem dúvida, o melhor evento
em que participámos, não só pelo facto de juntarmos as nossas duas paixões
(carros e aviões), mas porque não há
dinheiro que pague o sorriso que recebemos destas crianças, dos seus pais e
responsáveis... Uma lição de vida para
todos nós!
Os nossos sócios são maioritariamente pilotos, mas também temos vários tripulantes de cabina e entusiastas
de todas as origens aeronáuticas: TAP,
WHITE, SATA, Portugália, FAP, etc.
Com o crescimento do clube, decidimos fazer algumas parcerias, e neste
momento temos uma com o CAACA –
Clube de Automóveis Antigos da Costa
Azul, com sede na Costa de Caparica,
bem como com diversas oficinas de
clássicos e fornecedores. Estes estão
publicados no nosso blogue: www.c4crew.blogspot.com. Destaco esta parceria uma vez que através do nosso
clube podemos usufruir da inscrição
livre de joia e ter acesso a todas as atividades e acordos do CAACA, nomeadamente seguros e inspeções de viaturas com interesse histórico a preços
muito razoáveis.
O futuro é incerto, mas hoje ainda
é investimento comprar determinadas
viaturas clássicas ou antigas. Salvo poucas exceções, ou restauros muito caros,
o valor dos clássicos é garantido.
Para os interessados, segundo a FIVA
(Fédération Internationale des Vehicules Anciens), considera-se como carro
clássico um veículo rodoviário de propulsão mecânica fabricado há pelo menos 30 anos, preservado e mantido em
estado historicamente correto, que não
é utilizado como meio de transporte
diário e que faz parte do nosso património técnico e cultural. Os automó-
veis de fabrico anterior a 1 de janeiro
de 1960, desde que reconhecidos como
veículo antigo pela Comissão Técnica
do CPAA (Clube Português de Automóveis Antigos), estão isentos de IPO
anuais, conforme despacho da Direção-Geral de Viação.
O classicismo foi sempre visto pela sociedade de uma forma atípica, ou
seja, quase todas as pessoas gostam de
ver carros antigos, seja a circular ou em
exposições estáticas. Os portugueses
param para ver estas máquinas, relembram tempos antigos em que viajavam
nestes carros, pertença dos seus pais
ou avós. Contam-se histórias, vivem-se
momentos quase esquecidos e sonha-se... No entanto, as instituições ou organismos públicos já não veem este
hobbie da mesma forma, pois criam
impostos demasiado altos, limites de
circulação nas cidades e obrigatoriedade de inspeções (por vezes não adequadas a clássicos). Não deixa de ser
irónico que peçam aos proprietários
para que as exponham em feiras, exposições e certames (para enaltecerem
os eventos autárquicos, regionais ou
nacionais), mas exerçam tanta pressão sobre os mesmos posteriormente.
Quem tem um carro antigo tem uma
paixão, alimenta os sonhos de outros
às suas custas, não é rico (ao contrário do que muita gente pensa) e a única coisa que pede é respeito! Portugal
tem organismos, como os clubes de
automóveis antigos, que podiam ser os
responsáveis por estas viaturas. Desta
forma isentavam as viaturas clássicas
de IPO e IUC. Só assim podíamos ter
um parque de clássicos de excelência,
aumentando o espólio nacional, importando novas viaturas antigas, em vez
de assistirmos a uma saída em massa
da nossa história automóvel. Faz algum sentido um carro com interesse
histórico com 80 anos pagar mais de
800 euros/ano de IUC? Apesar de não
termos o respeito devido, nós, classicistas, continuaremos a reparar, a restaurar e a cumprir com estas regras que
nos são impostas, pois é este o nosso
hobbie e paixão.
Tal como brindamos muitas vezes,
«que nunca falte a gasolina!». Bons
voos e melhores aterragens.
janeiro | fevereiro Sirius
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VIAGEM
ILHA DO FOGO (CABO VERDE)
O CHARME DO VULCÃO
O Fogo é uma das ilhas mais bonitas de Cabo Verde. Situada no sotavento,
juntamente com Santiago, Maio e Brava
Texto e Fotos Paula Carvalho Silva
CHEGAR AQUI NÃO CUSTA MUITO.
Os TACV fazem a viagem Lisboa-São
Filipe, com escala na cidade da Praia
(Santiago), por 600 euros. E vale a pena. Um dos atrativos é, claro, a subida
ao cone central e ao ponto mais elevado da ilha (2829 metros). A cratera
deste vulcão ocupa nove quilómetros
de largura e tem paredes com um quilómetro de altura.
Em Chã das Caldeiras, concelho de
Santa Catarina, produz-se o famoso vinho do Fogo e é também aqui que os
turistas fazem o ponto de partida para
a subida à montanha.
Ao passar por Cova Figueira, sede
do concelho, encontra a zona do Espigão, mais ou menos no lugar onde
o Atlântico ocupa a vista de um lado
e, do outro, surge o imponente vulcão,
num verdadeiro testemunho da capacidade que a Natureza detém para nos
arrebatar com a sua beleza. É também
em Chã das Caldeiras que se encontram os terrenos mais férteis, aproveitados pelas gentes afáveis e resistentes
CHÃ DAS
CALDEIRAS,
PARTIDA PARA
ESCALAR O PICO
DO FOGO
REPOUSO SINGULAR
NO CENTRO DA CIDADE FICA UM DOS SOBRADOS referenciados pelo escritor Teixeira de Sousa
na obra Ilhéu de Contenda. Chama-se Pousada Bela
Vista e é possuidor de uma atmosfera simpática e familiar. Os quartos, de decoração simples mas onde
nada falta, têm espaço q. b. e são muito limpos. Escolha, de preferência, o que fica no andar de cima,
encostado à varanda/terraço, onde poderá passar
ótimos fins de tarde (telefones: 2811220/2811734; fax:
2811879; email: [email protected]). Em Chã das Caldeiras, a pousada Pedra Brabo é
uma opção. Com uma gestão familiar, tem a desvantagem de não possuir quartos com casa
de banho privativa, mas é um dos locais de encontro daqueles que se aventuram a subir o
vulcão (telefones: 2818940/9944641; fax: 2812904; email: [email protected]; sítio
na Internet: www.pedrabrabo.net).
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Sirius janeiro | fevereiro
desta região para o cultivo de frutas e
hortaliças. Exemplo disso são as uvas,
maçãs, marmelos, melancias, romãs,
figos, entre outras iguarias.
Pelas estradas massacradas da ilha
do Fogo veem-se paisagens repletas
de vinhas e pastorícia, onde a cabra
predomina. É por aqui que ainda vale
a pena parar e oferecer boleia, ouvir
as ‘estórias’ de uma anciã que nunca
conheceu outras paragens, dar tempo
ao tempo e seguir o ritmo vagaroso
do vento até à beira-mar e a São Filipe, a terceira cidade mais antiga do
arquipélago.
Os sobrados – casas em madeira com
varandas coloniais e muitas vezes com
pátios interiores – são a herança mais
bem preservada desta cidade histórica
e um dos polos de atração. Aliás, algumas delas foram mesmo transformadas
em pequenas unidades hoteleiras onde vale a pena ficar, muito ao estilo do
nosso turismo de habitação.
BREVES
COPENHAGA
O ESPELHO DA ESCANDINÁVIA
SATA VAI LIGAR OS
AÇORES A PARIS
OS CANAIS DE COPENHAGA e a
sua geografia plana tornam a visita à capital da Dinamarca num passeio agradável. Espelho e uma das
entradas privilegiadas na Escandinávia, a cidade está repleta de palácios e ruas antigas. O centro gira em
torno da Avenida Stroget, que nasce
na Radhus Pladsen (Praça da Câmara Municipal) e termina na Kongens
Nytorv (Praça Real). É por aqui que
se encontram as melhores e mais
variadas lojas.
Por estas bandas, mais precisamente num extremo da Praça Real, ergue-se o Palácio
de Charlotteborg, um magnífico exemplar do barroco holandês, assim como o Teatro
Real (Kongelige Teater).
De entre as inúmeras atrações destacam-se a Igreja do Espírito Santo (Helligandskirken), o templo mais antigo reconstruído em estilo neoclássico depois de um incêndio
no século XVII, a doca com as casas nas mais variadas cores e local onde passeou outrora o escritor Hans Christian Andersen, e ainda o Palácio de Amelienborg, residência
da família real dinamarquesa.
A subida à torre do Radhuset, sede do governo municipal, é obrigatória para obter uma
das melhores vistas sobre Copenhaga, bem como a visita ao palácio renascentista Rosenborg Slot, onde estão expostas as joias da coroa dinamarquesa.
Depois, dependendo dos dias que guardou para esta visita, pode ainda tentar tirar uma
foto junto da Sirenita (Den Lille Havfrue), pequena escultura e símbolo da cidade.
Os preços na EasyJet, que voa para a capital da Dinamarca três vezes por semana em
rota inaugurada recentemente, variam entre os 20 euros e os mais de 200 euros (só de
ida ou volta), por isso, caso consiga ser flexível nas datas, pode encontrar uma verdadeira pechincha e guardar o restante orçamento para outras experiências.
A SATA Internacional vai ligar Ponta
Delgada a Paris/Charles De Gaulle todas
as sextas-feiras, a partir de 19 de abril
de 2013. Os voos serão feitos em Airbus
A320 para 161 passageiros.
D.R
EMIRATES TROCA DE
APARELHOS
A partir de 1 de fevereiro, a Emirates
vai trocar o Boeing 777-200ER por um
B777-200LR (330 passageiros), na rota
Dubai-Lisboa, em vez do esperado
B777-300ER (365 passageiros).
VUELING ESTREIA-SE
NO PORTO EM 2013
O Porto passa a contar com mais uma
companhia aérea: a espanhola Vueling
passará a oferecer ligações diárias
entre a Invicta e Paris Orly a partir de 1
de junho de 2013.
TURKISH DUPLICA
VOOS PARA LISBOA
A Turkish Airlines vai realizar mais voos
para Lisboa (dois voos diários para
Istambul) e criar uma nova rota para
o Porto, em 2014. A companhia aérea
turca vai lançar mais 23 rotas em 2013.
SAS E NORWEGIAN
REGRESSAM A LISBOA
A SAS anunciou o lançamento de 45
novas rotas para 2013, incluindo Lisboa,
a partir da Noruega. Lisboa vai receber
igualmente dois voos semanais da
Norwegian, ligando Olso Gardermoen
à capital portuguesa, às segundas e
sextas-feiras, entre junho e outubro.
BOLIVIANA VOA COM
A330 DA HIFLY
Paisagens repletas de vinhas e pastorícia;
forcado capturado por um pescador
Já depois da independência, foi criado o concelho de Mosteiros, onde se
produz o famoso café do Fogo. Para degustar ao longo da estada recomendase não só a lagosta mas também pratos
tradicionais, como a cachupa, o xerém
com manteiga, o grogue e o ponche,
entre muitas outras iguarias. Com 31
quilómetros de comprimento por 29 de
largura, a ilha do Fogo, habitada por
cerca de 37 mil pessoas, é fácil de per-
correr de carro. Mas também a pé, e
sobretudo debaixo do solo. Contratar
um guia em São Filipe ou em Mosteiros permitirá a visita a grutas, cavernas
e fontes de água subterrânea situadas
entre o Pico do Fogo e São Lourenço.
De entre as várias belezas destacam-se
ainda os rios de areia e cascalho antracite, junto ao vulcão, e na encosta
exterior norte da cratera as florestas
de eucaliptos, jacarandás e acácias.
A companhia Boliviana de Aviación
iniciou os seus voos entre Viru Viru
(Santa Cruz de la Sierra, Boíivia) e
Madrid, com quatro frequências
semanais, operadas com o Airbus
A330-223 CS-TQW da Hifly.
PEGASUS ENCOMENDA
100 A320NEO
A Pegasus Airlines, a segunda maior
companhia aérea da Turquia, assinou
um contrato com a Airbus para a
compra de cerca de 100 aviões da
família A320neo.
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MEMÓRIA
BARTOLOMEU LOURENÇO DE GUSMÃO
O PAI DA AEROSTAÇÃO
Nasceu na Vila do Porto de Santos, São Paulo, no mês de dezembro
de 1685 e estudou no seminário jesuíta de Belém, na freguesia de
Cachoeira, capitania da Baía, onde se ordenou
Texto Coronel-Aviador Manuel Cambeses Júnior
EM 1701 FOI PARA PORTUGAL, tendo regressado ao Brasil pouco depois,
para retornar a Portugal em 1708, com
o intento de realizar o Curso de Cânones da Universidade de Coimbra. Ali
desenvolveu e aprofundou os seus estudos de Física e Matemática.
A presença do homem na terceira
dimensão passa, necessariamente, pelo
talento brasileiro, revelado na primazia de domínio das tecnologias de ascensão em balão livre, balão dirigível
e, mais tarde, aeroplano.
Trezentos e três anos nos separam
da experiência bem sucedida de Bartolomeu de Gusmão, um dos maiores
génios inventivos da História da Humanidade. Inteligência privilegiada, a
sua conceção do aeróstato, como engenho de locomoção superior, através
da atmosfera, não ficou no engenho
em si, evidenciando excecional visão
prospetiva.
Como nenhum outro inventor da
sua época, o seu espírito perscrutou o
futuro, revelando, na sua célebre Petição de Privilégio, dirigida a D. João
V – que tinha descoberto um aparato
para se locomover pelo ar –, o quanto
estava avançado em relação aos estudos sobre o domínio do ar. Nela projeta-se por inteiro a visão profética de um
bem-dotado que, à luz de um invento
fruto da elaboração primorosa do seu
cérebro, não titubeou em declarar a
possibilidade da navegação aérea.
Não há, pois, como discordar da afirmativa de Domingos Barros, que considera a Petição de Privilégio, de 1709,
«a primeira e a mais bela página da
aeronáutica».
Belas páginas, sem dúvida, que lhe
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Sirius janeiro | fevereiro
Bartolomeu Lourenço de Gusmão foi uma
personalidade de excecional singularidade,
na qual o homem, o sacerdote e o criativo
inventor se fundiam numa figura polifacetada,
que enxergava muito acima do seu tempo,
sofrendo, como corolário, as naturais e inevitáveis
consequências dessa excecionalidade
valeriam, entretanto, contestações e
sátiras contundentes, umas e outras
caracterizando a saga dos que vivem
muito além do seu próprio tempo, pagando alto preço por esta condição.
Bartolomeu de Gusmão foi um predestinado, aliando atributos de competência, tenacidade e avidez de cultura que o conduziram a momentos de
imensa criatividade.
Coincidentemente, um seu irmão,
também predestinado, Alexandre de
Gusmão (1695-1753), geógrafo e diplomata, foi o magistral redator do
preâmbulo do Tratado de Madrid, que,
consagrando a tese do utis possidetis,
consolida, em 1752, um século de expansão portuguesa no continente americano, fixando praticamente os limites
da terra brasileira.
Jovem ainda, Bartolomeu de Gusmão concretizou o seu primeiro invento fazendo subir a água de um lago a
uma altura de 100 metros para abastecer o seminário de Belém, edificado
sobre um monte; com isso eliminou o
penoso e demorado transporte em recipientes de pequena capacidade.
Quando inventou os balões, não os
imaginava só na paz, navegando por
diletantismo, e, sim, como surpreendentes veículos de expansão dos conhecimentos humanos, provendo as
necessidades do homem na paz e na
guerra. Além disso, viu-os como elementos de aproximação entre culturas, proporcionando, pela rapidez dos
deslocamentos, o conhecimento mútuo
das conquistas científicas dos homens
em todas as latitudes. Tudo isso deixou
transparecer claramente na sua Petição
de Privilégio.
Na famosa Universidade de Coimbra, apesar da sua profissão original – o
sacerdócio católico –, não foi no ensino
da Teologia que desenvolveu a sua inteligência privilegiada, mas sim no da
Ciência Matemática. No retiro da sua
residência entregava-se ao estudo da
Astronomia e da Mecânica Aplicada.
Ao anunciar, em abril de 1709, a intenção de realizar experiências com a
sua máquina de voar, Bartolomeu de
Gusmão passou a ser alvo de inusitada
curiosidade. Atraiu para si críticas dos
seus contemporâneos, que, por deficiência de cultura, não conseguiam compreender o alcance da sua obra. Antes mes-
Em agosto de 1709, a corte portuguesa
reuniu-se para assistir à demonstração de tal
invento. Foram realizadas três exibições, e as
datas não são bem conhecidas, assim como as
características do aparato apresentado pelo
inventor brasileiro diante do rei e de autoridades
eclesiásticas
mo dos primeiros ensaios, poetas sem
inspiração lançaram mão de todos os
recursos para destratar o jovem inventor brasileiro. Por ironia do destino, as
sátiras dos detratores transformaram-se
em verdadeiras comprovações das experiências de Gusmão e os autores das
agressões, sem nenhum talento, só passaram a ser conhecidos quando associados aos ataques desfechados contra o
precursor da aeronáutica.
Entretanto, paralelamente aos detratores, havia também os divulgadores da boa nova. A correspondência
enviada às nações da Europa, seja por
diplomatas acreditados junto à corte de
D. João V, seja por simples visitantes,
proporcionou extraordinária divulgação do invento em Itália, na Alemanha,
em Inglaterra e no Império Germânico.
A verdade é que, pela documentação existente, pode-se assegurar que
Bartolomeu de Gusmão construiu um
aeróstato e fê-lo elevar-se nos ares uns
quantos metros acima do solo.
O núncio de Lisboa, cardeal Conti,
futuro Papa Inocêncio XIII, estava entre os convidados. A primeira demonstração foi realizada no dia 3 de agosto,
sem sucesso. O aparato incendiou-se
numa das salas da Casa da Índia. Uma
segunda exibição foi realizada no dia
5 do mesmo mês, mas o sucesso foi
questionável. Assim que o engenho
se elevou, aproximadamente, a quatro
metros, os serviçais, receosos de verem
as cortinas pegarem fogo, como medida preventiva o destruíram.
No entanto, a terceira experiência,
realizada no pátio da Casa da Índia, e
novamente com a presença do rei, da
corte, de fidalgos e nobres e de uma
imensa multidão, mostrou de forma
inédita um artefacto produzido pelo
homem elevar-se livremente no espaço,
sem nenhum apoio, e deslizar no ar.
QUANDO
INVENTOU OS
BALÕES, NÃO OS
IMAGINAVA SÓ
NA PAZ
Voou e foi esbarrar numa cimalha da
torre da Igreja do Rosário. Com a colisão, o pequeno balão caiu e incendiou-se. Era a primeira vez que um aparelho
mais leve que o ar realizava um voo.
Mas a demonstração não causou muito entusiasmo. Foi algo muito tímido,
muito singelo, muito distante das promessas ofertadas ao rei. Bartolomeu,
numa reação natural, sente a necessidade de prestar esclarecimento sobre
o invento, na realidade um pequeno
globo com uma vela, incapaz, portanto, de realizar qualquer uma das anunciadas proezas.
Embora o inventor tentasse explicar como o aparelho deveria ser interpretado, os seus argumentos não podiam convencer nem o público nem os
poucos sábios portugueses, que viam
nas palavras dele argumentos desconexos e sem elaboração minimamente científica.
O globo de papel com uma vela
acesa é o que hoje conhecemos nas
tradicionais festas juninas, ou seja, os
tradicionais balões de São João. Evidentemente, tal invento não poderia
realizar as promessas feitas no pedido de privilégio, mas demonstrava ser
possível buscar uma solução para um
aparelho voador até então desconhecida. Era um protótipo, e o seu desenvolvimento poderia ter dado frutos mais
práticos. Mas Portugal não era, à época, local para isso acontecer. Não havia tradição no estudo das ciências e
o país estava em atraso em relação a
vários países da Europa.
O ambiente científico era praticamente nulo. Inexistiam revistas científicas,
as publicações eram raras e o ensino era
voltado primacialmente para o terreno
das ciências teológicas, a jurisprudência e a literatura. Na Universidade de
Coimbra já fazia algumas décadas que
não havia sequer um professor para a
cátedra de Matemática.
Porém, pese embora não ter despertado grande interesse em Portugal
o pequeno voo do balão, o mesmo não
ocorreu noutros países. Logo a notícia
se espalhou, ganhando novas cores.
«Um padre voou em Lisboa: Padre Voador Bartolomeu Lourenço.» Junto com
as notícias sensacionalistas surgiu um
desenho apócrifo, provavelmente feito pelo próprio inventor, representando um estranho artefacto munido dos
mais extravagantes instrumentos. Com
uma cabeça de águia, tinha uma espécie de pequena nave, onde ia instalado
o navegante, cercado por instrumentos
janeiro | fevereiro Sirius
63
MEMÓRIA
científicos: esferas imantadas, uma luneta, um astrolábio e outros elementos.
Ademais, remos em forma de penas parecem contribuir para o deslocamento
no ar e um estranho engradado cobre
a barcaça onde está o piloto. Imãs estão distribuídos, dando a entender que
a força magnética poderia ter ali uma
função. E, para não deixar vestígios de
dúvida, na parte posterior, um grande
pavilhão real com o sol heráldico dos
Bragança. O que se vê é uma fantasiosa representação de alguma invenção
que não faz nenhum sentido. O ponto
crucial, a fonte térmica que permitia
ao balão subir, não está representado,
ou seja, foi abolida intencionalmente
do desenho. Desta maneira, nada informa como tal aparato poderia navegar pelo ar. Curiosamente, as gravuras
apareceram, em diversas variantes, em
diferentes países. Foram publicadas em
França, na Alemanha, em Itália, e o
aparelho recebeu o nome de Passarola.
Lamentavelmente, o desenho original
perdeu-se no tempo.
Não tem sido tarefa fácil aos historiadores reunir provas da prioridade aerostática de Bartolomeu de Gusmão. Não
fora a dedicação de ilustres e persistentes
pesquisadores, como Afonso de E. Taunay, reunindo peças em defesa do pioneiro, teria sido impossível atestar essa
prioridade, em parte por culpa do pró-
DIPLOMATA
Um seu irmão,
Alexandre de
Gusmão (1695-1753), geógrafo
e diplomata, foi o
magistral redator
do preâmbulo do
Tratado de Madrid,
que consolida, em
1752, um século
de expansão
portuguesa
no continente
americano, fixando
praticamente os
limites do Brasil
da navegação aérea? Parece que, mais
uma vez, o acaso foi o detonador das
energias da inteligência humana, ao
colocá-lo diante de uma observação
simples: a de uma bolha de sabão que,
subitamente, se elevou ao entrar no
ar aquecido em torno de uma chama.
De relance, Gusmão percebeu a dinâmica dos aeróstatos, aparelhos mais-leves-que-o-ar, concebendo um engenho
que adquiria força ascensional valendo-se da diferença de densidade entre
dois fluidos.
Da conceção à realização foi um passo, não havendo mais dúvidas de que
PORTUGAL NÃO ERA, À ÉPOCA, LOCAL
PARA DESENVOLVER O PROTÓTIPO
prio Gusmão, que para evitar apropriação indébita de seu invento, o que era
comum naquela época, omitiu na sua
Petição a D. João V desenhos e detalhes
do engenho que concebera. Inclusive, a
única peça iconográfica contemporânea
das experiências – a estampa Passarola
–, tal como hoje se conhece, foi engendrada por detratores, com o objetivo de
desmoralizar o invento e o inventor, na
medida em que a sua conceção é fantasiosa, irreal e absurda.
Mas o que levou Gusmão a afirmar
na sua Petição ter resolvido o problema
64
Sirius janeiro | fevereiro
Bartolomeu de Gusmão fez subir aos
ares um aeróstato. Comprovam-no oito documentos pacientemente reunidos
por obstinados pesquisadores durante
quase um século: o primeiro divulgado em 1844 e o oitavo em 1938. Deles,
contudo, não se pode inferir que o precursor da aerostação tenha sido também o primeiro aeronauta. Qualquer
afirmação neste sentido não encontra
respaldo em documentação confiável
até hoje conhecida.
Sobre um ponto, porém, não há dúvidas: os documentos confiáveis regis-
tam o ano de 1709 como aquele em
que os experimentos públicos (mais
de um) se realizaram. No entanto, os
testes realizados em sigilo que, possivelmente, teria realizado não há como
os comprovar.
Os experimentos com o aeróstato
idealizado por Bartolomeu de Gusmão
indiscutivelmente lhe conferem a primazia da conquista do ar.
O reconhecimento dessa primazia,
embora muito lento, vem sendo progressivo nos grandes países europeus,
pese embora a pressão francesa reivindicando o feito para os irmãos Montgolfier, em 1783.
Mesmo entre os franceses, entretanto, houve os que, fiéis à verdade, não
se deixaram levar por arrobos de patriotismo deformado, afirmando perentoriamente, como o fez Marcel Jauneaud, em 1902: «La gloire française des
Montgolfier et de Charles ne sera pas
diminuée par l’hommage que nous devons rendre au pauvre brésilien, qui fût
vraisemblablement le premier aérostier
des temps modernes.»
Esta atitude contrasta com os insultos dos poetas do seu tempo, sobretudo
Tomaz Pinto Brandão, que foi implacável nas suas sátiras e crítica. Tendo
vivido na Baía, dali foi deportado para o Rio de Janeiro e, posteriormente,
degredado para Angola, de onde conseguiu regressar a Portugal, o poeta
passou a hostilizar os filhos de terras
Pode-se assegurar que Bartolomeu de
Gusmão construiu um aeróstato e fê-lo elevar-se
nos ares uns quantos metros acima do solo
brasileiras, dos quais guardava amargas recordações.
Gusmão, que se notabilizava na corte pela genialidade, foi o alvo preferido
da sua ira, mesmo após a morte. Na
ânsia de diminuir e ridicularizar o feito
e o inventor, paradoxalmente acabou
registando alguns aspetos importantes
da vida e da obra do nosso pioneiro.
Sempre prestigiado por D. João V,
que nele reconhecia talento invulgar,
Bartolomeu de Gusmão recebeu importantes missões diretamente do monarca. Entre elas, por exemplo, a de descodificar cifras usadas pelas chancelarias
estrangeiras na correspondência com
os seus representantes credenciados.
Era prática comum, naquela época,
a violação da correspondência entre
governos e seus embaixadores, o que
os induziu à utilização de códigos para
segurança das comunicações.
Enquanto viveu, Bartolomeu de
Gusmão traduziu todas as cifras que
lhe foram apresentadas, revelando-se
exímio decifrador. Com isso proporcionou ao governo português conhecimento prévio de importantes decisões
políticas de outros governos, o que foi
extremamente vantajoso para a própria tomada de decisão de D. João V
na solução de contenciosos entre Portugal e outras cortes.
Entretanto, quanto mais revelava
competência e probidade, mais despertava a reação de quantos não se
conformavam com os privilégios que
auferia do monarca.
Fundador da Academia Real de História, coube-lhe escrever a História
do Bispado do Porto, tarefa à qual se
dedicou com verdadeiro espírito de
pesquisa. Mas, enquanto se dedicava a esse mister, foi progressivamente solapado pela ação destruidora de
áulicos e de invejosos.
Tão bem engendrada foi a campanha de difamação que os membros da
Academia, na última reunião, de 1724,
fingindo ignorar a sua morte 20 dias
antes, não só deixaram de lhe prestar
as honras fúnebres da praxe como decidiram hipocritamente ocupar a sua
cadeira, considerada vaga em virtude
de ter expirado o prazo de ausência
consignado pelos estatutos.
Na realidade, perseguido pelo Tribunal da Inquisição, ia Bartolomeu de
Gusmão ser preso a 26 de setembro
de 1724, culminando um processo de
calúnia e intrigas contra ele preparado
pelos seus opositores. Antecipando-se
a esse evento, fugiu com seu jovem
irmão, João de Santa Maria, religioso
carmelita de 21 anos.
Inicialmente pretendia atingir Paris, via Madrid, mas o seu precário
estado de saúde fê-lo interromper a
viagem em Toledo, onde faleceu, a 19
de novembro de 1724, no Hospital da
Misericórdia. Perdido de tudo, até da
própria vida, vislumbrou ali o seu último raio de luz, e tão indigente quanto anónimo foi sepultado, a expensas
piedosas da Misericórdia, na Igreja de
San Roman daquela cidade, que cristãmente lhe deu a absolvição da paz
eterna na lisura pacífica de uma tumba coletiva. Tinha 39 anos de idade.
Terminava, assim, uma vida plena
de realizações, extremamente avançadas para a sua época e o entendimento de seus contemporâneos.
Detentor inconteste da primazia aerostática, Bartolomeu de Gusmão foi
também, na feliz expressão de Taunay, o primeiro inventor americano.
Neste ano em que comemoramos
o tricentésimo terceiro aniversário da
experiência aerostática realizada pelo ilustre inventor brasileiro, rendemos justa homenagem a um homem
cuja vida foi um eterno sonhar e sua
magnífica obra o doce despertar para
a materialização de ideias benfazejas.
Pela dimensão da sua vida, pela preciosidade do seu exemplo, pela grandeza das suas lições e pelas suas brilhantes realizações, Bartolomeu de
Gusmão tornou-se um génio inspirador que paira sobre a Pátria inteira,
extrapolando dos contornos da sua
vida científica e sacerdotal, para fazer-se credor de título mais amplo e mais
proporcional à grandeza e à multiplicidade da sua edificante vida: «Pai da
aerostação».
SOBRE O AUTOR
MANUEL CAMBESES JÚNIOR
Coronel-aviador.
Membro emérito do Instituto de Geografia e História Militar do Brasil,
membro da Academia de História Militar Terrestre do Brasil e conselheiro
do Instituto Histórico-Cultural da Aeronáutica.
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65
SPOTTERS
HOBBIT INSPIRA
AIR NEW ZEALAND
Londres é uma das cidades onde poderá ver este Boeing 777-300
AIR NEW ZEALAND
Texto Filipe Lança
É uma representação única da inovação e criatividade dos neo-zelandeses
A AIR NEW ZEALAND, companhia de
bandeira da Terra Média, decidiu aplicar esta decoração espetacular de 73
metros num dos seus Boeing 777-300,
inspirada nas personagens do filme
The Hobbit: Uma Viagem Inesperada.
O aparelho foi apresentado à imprensa
em Auckland, na Nova Zelândia, e, na
opinião do CEO da Air New Zealand,
Rob Fyfe, «este avião vai entusiasmar
os passageiros e os fãs das fantasias
cinematográficas de Peter Jackson, nos
voos entre Auckland, Los Angeles e
Londres».
66
Sirius janeiro | fevereiro
A Nova Zelândia é o berço da Terra
Média e estima-se que os filmes do The
Hobbit irão dar um impulso considerável ao turismo nos próximos anos.
Muitos turistas ficam inspirados e motivados para ver e experienciar por si
próprios as paisagens que viram nos
filmes. E os que viajarem neste avião
também irão assistir a um safety vídeo com os conselhos de segurança
a bordo, rodado com as personagens
do filme.
«É maravilhoso ver uma imagem
tão impressionante para celebrar o The
Hobbit num dos maiores aviões da Air
New Zealand. É uma representação
única da inovação e criatividade dos
neo-zelandeses e uma grande oportunidade para mostrar a beleza incomparável deste país», afirmou, por sua
vez, o realizador Peter Jackson (O Senhor dos Anéis).
O filme The Hobbit: Uma Viagem
Inesperada é o primeiro de uma trilogia produzida pela New Line Cinema
e pela Metro-Goldwyn-Mayer (MGM).
Os restantes são aguardados para 2013
e 2014.

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