encontros do DeVIRcriação

Transcrição

encontros do DeVIRcriação
encontros do DeVIR criação
26 a 30 de Set 21h30 no CAPa - Faro
26 set
3 documentários + 1
10 projectos fotográficos
fotografia Luís da Cruz
making of do festival
27 set
Carlos Bica e Norberto Lobo musica
Abel Neves escrita
José Laginha e Marlene Vilhena dança
28 set
Amélia Muge e José Martins musica
José Mª Vieira Mendes escrita
Vera Mantero dança
29 set
João Paulo Esteves da Silva musica
Mickael de Oliveira e Mariana Tengner Barros escrita
Maria João Luís e Daniel Gorjão teatro
30 set
Cláudia Dias e Cecília Laranjeira dança
Gonçalo M. Tavares escrita
André e. Teodósio teatro
bilhetes
26 setembro 21h30 entrada livre
27 a 30 setembro 21h30
bilhete simples 6€
bilhete desconto 5€
para menores de 25 anos e maiores de 65 anos
passe 4 dias 18€
reservas
telf. 289 828784 ou 918703414(5)(6)
[email protected]
classificação maiores de 10 anos
é interdito filmar, fotografar ou gravar sem previa autorização.
por favor não se esqueça de desligar o seu telemóvel
localização
rua frei Lourenço de Stª Maria, nº4 – Faro
(junto ao parque de estacionamento do Largo do Carmo/Metalofarense)
26 set
apresentação
3 documentários + 1
10 projectos fotográficos
fotografia Luís da Cruz
making of do festival
27 set
Carlos Bica
e Norberto Lobo
e se a nossa casa fosse tudo o que nos rodeia?
what if our house was everything that surrounded us?
ficha técnica
texto e imagens Abel Neves luz Hugo Coelho captura de imagens e elaboração do guião para o vídeo Abel Neves montagem Hugo Coelho
Abel Neves
alguns sinais para um texto sobre uma visita breve
à serra do Caldeirão
some signs for a text on a brief visit to the serra do Caldeirão
[o título talvez esteja achado, mas ainda não pode revelar-se não posso saber ainda o que virá a
ser o texto sobre a visita ao Caldeirão, mas não será, nem poderia ser, uma reportagem nem será
uma crónica usar-se-á o gosto pela dispersão, ao modo das polinizações palavrinhas à brisa
algum texto está já composto, mas os sentidos ainda não imperam]
[visita relâmpago: um clarão sem ruído]
o lugar: gente, solo, casas, animais. o horizonte: imagem vídeo A paisagem a miragem: escrita/
texto A ilusão 1) o interior (o lugar) 2) o litoral (a utopia?) 3) da utopia ao lugar
o lugar [quando abri o caderno dos apontamentos breves tinha uma frase escrita numa antiga
ocasião: “podia ter perdido a memória, podia ter perdido” decidi aceitá-la]
o horizonte [o Algarve além do horizonte o Algarve a descer, não muito, mas a descer, a ir para
o mar, a ir ao sal e aos peixes, indo às áfricas para cima é ir ao país que há para baixo é ir às
áfricas]
a miragem [pés no lugar e vistas alteradas: alterações do lugar por efeito do que há além do
horizonte a ilusão de uma terra melhor as necessidades mancham a ilusão? vem uma voz que
me diz: de onde estás, vê se vês a ria Formosa leva saudades]
[para que não haja perdição, há um fio que vai do litoral à serra]
[é certo que irei aos pequenos capítulos]
[por vontade da natureza, não haveria recanto que não estivesse sujeito ao domínio das
vegetações assim, os guerreiros insurgem-se contra as raízes e o espalhafato do folhedo, e
procuram a todo o tempo impedir a praga vegetal os guerreiros somos nós, interessados em
ocupar tudo o que puder ser ocupado, afastando os moradores de antes]
[uma materialização ilusória, a utopia: a fata morgana a serra com as suas artes do espectáculo]
[são de estimar as pessoas que se aguentam neste mundo para, simplesmente, saudar as manhãs
feitos pássaros, os serrenhos interessam-se pelas manhãs o olhar dispersa-se]
[inevitavelmente a ruína, a paisagem humana arruinada: “onde vai o ferro, vai a ferrugem”]
[e talvez haja um conto breve]
ficha técnica
texto e imagens Abel Neves luz Hugo Coelho captura de imagens e elaboração do guião para o vídeo Abel Neves montagem Hugo Coelho
José Laginha e Marlene Vilhena
o “navio fantasma” japonês «Ryou-Un Maru», que se dedicava à pesca da lula, estava ancorado no
porto da localidade japonesa de Hachinohe, na prefeitura de Aomori, quando foi arrastado pelo tsunami,
tendo percorrido 4.703 quilómetros entre Março de 2011 e Abril de 2012. O barco, sem sinalização nem
tripulação, esteve à deriva nas rotas de alto tráfego marítimo nas águas norte-americanas, e tornouse
um perigo* real para os marinheiros. Dirigiu-se para o sudeste do Alasca, mais precisamente para
a cidade de Sitka, a uma milha por hora. A embarcação japonesa de 65 metros de comprimento foi
localizada por um avião da Força Aérea do Canadá, quando se encontrava a 278 km a oeste da ilha Haida
Gwaii, no norte da província de British Columbia. A 5 Abril de 2012 a Guarda Costeira dos EUA abriu
fogo contra o navio fantasma, usando uma metralhadora de calibre 25 milímetros, afudando-o, segundo
Marc Proulx, coordenador marítimo do Centro de Socorro de Victoria.
* aquilo a que chamo natureza está a descansar. está quase a acontecer, virá em força, mas depois. aqui o chão chama-se terra e promete.
a esteva (cistus ladanifer) é uma espécie de planta com flores da família cistaceae. é nativa da parte
ocidental da região mediterrânica, crescendo espontaneamente desde o sul de França a Portugal, mas
também no noroeste de África. É um arbusto que atinge 1m de altura e 2,5 m de largura. As folhas são
persistentes, lanceoladas, com 3 a 10 cm de comprimento e 1 a 2 cm de largura e libertam uma resina
aromática, o lábdano, usado como fixador em perfumes. a resistência** deste arbusto advém da sua
estratégia de crescimento e expansão, a alelopatia, produção de substâncias químicas que, libertadas
no ambiente, podem prejudicar o desenvolvimento normal e até mesmo inibir a germinação de outras
espécies.
** aqui só estou, sinto-me todo. não luto mas resisto, já sou daqui. estou a deixar de me sentir para ficar.
significado de abandono subst. m. 1. acção de partir para não voltar: o abandono de um território
2. acção de deixar desamparado: negligenciar, deixar ao abandono*** um património relativamente ao
qual somos responsáveis; ao abandono sem protecção ou cuidado: eles deixaram a serra ao abandono.
*** tudo se aproxima mas nada chega. o cheiro caiu. aqui nem as memórias fazem sentido. estou destrancado.
ficha técnica
concepção, co-criação, interpretação, cenário/figurinos e texto José Laginha co-criação e interpretação Marlene Vilhena música original Simão Costa,
(excertos de sinfonias) G. Mahler (recolha) Michel Giacometti professor de voz Francisco Brazão desenho de luz Hugo Coelho e José Laginha operação
de som Luís Guerreiro luz Hugo Coelho captura de imagens e elaboração do guião para o vídeo José Laginha montagem Hugo Coelho costura Rosa
Vitorino produção Ana Rodrigues residências artísticas DeVIR/CAPa, Comédias do Minho/Centro Cultural de Paredes Coura, Casa das Artes de Arcos de
Valdevez/Movimento Incriativo
agradecimentos Miguel Vieira, Miguel Vitorino, Hugolino Rocha, João P Vaz, Pedro Morgado, Vasco Ferreira, Carlos da Silva, Nuno Soares, Susana Paiva
28 set
Amélia Muge e José Martins
sinais da noite nos dias
nota prévia acesos em mim estão os incêndios decorridos depois da visita. As memórias do que vi e trouxe nas imagens, parece que pegaram
fogo também. Toda a sinopse e a maioria do trabalho a apresentar, foi feito antes do que aconteceu. Como as matas, ardem as palavras
que escrevi e não sei, das imagens recolhidas, o que ainda existe. Como as árvores, as coisas e os bichos, o sentido desta escrita parece ser
um monte de cinzas. Está a serra de luto. E eu, mais do que nunca, quero com este trabalho homenagear os locais que visitámos e a sua
beleza única e insubstituível. O tempo vai voltar a devolver à serra o que é dela. Por isso, o que aqui partilho convosco, traz também esse
gesto de esperança, de fenix renascida, que vai voar para lá deste requiem.
este título evoca uma ideia de noite simbólica, onde a ausência é escura, bem como o abandono, ou
o desconhecido. Aqui partilhamos o que foi registado pelo nosso olhar em viagem, marcado pelas
nossas lembranças, que esta visita refez e transformou em desafio criativo. Sinais da noite nos dias,
faz lembrar o desconhecimento da riqueza da serra, face a um Algarve identificado com o sol, a praia,
a visibilidade, a marca de um turismo cosmopolita, de época balnear, que parece ser a única maisvalia
da região. Sinais da noite nos dias procura vestígios de um escuro, que nos desperta a visão,
no meio de um espaço marcado pelo pisotear dos bichos, dos homens, do tempo. O que respira ali
para lá do humano que se esconde por detrás das portas, da sombra dos alpendres, das frinchas das
janelas?
Que olhares nos fazem lembrar a noite dos medos, as penas dos voos por cumprir?
Que riscos com asas dão crédito aos nossos ouvidos assaltados por chilreios de fim da tarde, ladrares
de cão, cacarejares de galinha, ou mesmo chiares de porco?
Que histórias se retorcem como os troncos?
Que pragas corrompem as seivas da esperança?
Que vida nos olha com curiosidade, medo, ou desconfiança?
Que saudades do futuro nos retêm, mesmo depois de partirmos?
Vindos desta noite que nos cega de luz, sabemos que esta serra não é de fácil entrega. Sabemos
que o fascínio se esconde por detrás dos muros caídos, dos sons que se ouvem sem que se perceba
quem os faz, ou fez. Sabemos que é impossível reter tanta dádiva, só à espera que a gente estenda
até ela o nosso olhar, o nosso tempo de sermos mais serra. Por aqui vamos, no alto da procura destes
caminhos sinuosos , cheios de curvas e saltos. São assim os caminhos que nos levam de certeza a
qualquer coisa de único, que se revela, tal como a noite, no tempo de pensar que se pensa, sentindo
que se vai, vindo do escuro, para uma sombra cheia de luz. Como a do mistério.
ficha técnica
concepção, criação Amélia Muge (a partir de proposta da DeVIR) voz e braguesa Amélia Muge banda sonora José Martins e Amélia Muge textos e
canções Amélia Muge Canções Tradicionais percussão, som e sonoplastia José Martins desenho de luz Hugo Coelho captura de imagens e elaboração do
guião para o vídeo Amélia Muge montagem Hugo Coelho agradecimento Miguel Vieira
José Mª Vieira Mendes
fechar fronteiras um diário
depois de dois dias de visita a uma serra que não é minha e a conversar com a coreógrafa Vera
Mantero, comecei um diário póstumo desta viagem. Entradas que se escrevem como se cada
dia fosse sempre aqueles dois dias, tratando a memória como ela merece: mentindo-lhe. O texto
que ainda hoje se continua a escrever (porque “hoje” não é nada), aproveita a circunstância da
observação minuciosa de uma serra e o convívio com uma representante de um género (o da dança)
para continuar a descrever aquilo que hoje obsessivamente me importa. Fechar fronteiras é um
diário que é teatro que é um território limitado. É a definição de fronteiras e a procura de um género
num mundo cheio de géneros. E denunciar nas palavras as suas armadilhas e aproveitar o que me
aparece à frente e me assegura a continuação. Escrever este diário é dar conta da existência, como
faço todos os dias. É o formato do quotidiano, unidade mínima que garante uma descrição possível.
A acumulação dos dias, dos acontecimentos, das ideias e de outros olhos é a única possibilidade que
por agora encontro para dizer que existo. E a serra é o lugar que hoje o confirma.
excertos um amigo escreveu num texto: “o homem tem um braço gigante.” Um leitor à procura de significados perguntou-lhe: “o que
significa um braço gigante?”. E o meu amigo respondeu: “Significa que o homem tem um braço gigante.” Este diário não é poesia. Não é
metáfora. Aqui, uma palavra é uma palavra. Como uma rosa é uma rosa.
***
O meu lugar é uma montanha que é uma folha de papel. Por exemplo. Posso descrever essa folha com as palavras giesta, canja para
o jantar, museu vivo, medronhos, curral, estrelas e auto-estrada. Posso pintá-la com cores e descrever os sons. A minha montanha é
construída. Andaimes a sustentar a terra. A ordem sou eu que a faço. Traduzo aquilo que me dizem umas bocas sem dentes. Sou um
porta-voz. (De pequeno porte. Mas com muitas portas.) Represento um género. Chama-se teatro. (Pode ser teatro de portas.) Nada do que digo
é meu. E no entanto ninguém me percebe. Dizem que sou abstrata. Ou simbólico. Ou bela. Ou teatral. Não percebem. Eu sou umamontanha.
Sugiro uma visita de estudo.
***
Eu não estou aqui. Sou conhecido pela minha ausência. Nunca estou nos dias em que falo. Aquilo que aqui veem é uma representação
que não me quer representar. Esta representação representa-se a si própria. É teatro. Não precisa de mim. Vive numa montanha. E isto é o
mesmo que dizer: “Eu tenho um braço gigante”. Ou: “Eu sou uma montanha”.
***
O linho é uma planta e não um lençol. Um serrano é aquele que habita a serra e não o que serra o tronco. Uma roca é um instrumento
de tecelagem e não uma rocha. Um sobreiro dá cortiça e não sobranceiros. Um pego é um acidente de relevo e não um prostituto. Uma
azinheira é uma árvore com sombra e não uma pista de velocidade. A montanha é uma serra e não uma mão estranha. Este texto é um
braço gigante e não um queixo.
ficha técnica
texto e imagens José Maria Vieira Mendes apresentação Patrícia da Silva luz Hugo Coelho e Patrícia da Silva captura de Imagens e elaboração de guião
do vídeo José Maria Vieira Mendes montagem Hugo Coelho
Vera Mantero
talvez tudo com vozes ao longe, vozes de vidas que já não existem. ou sons de pedras. música
de pedra. feita com pedras. “duas pedras afrontadas parecem indicar a abertura”.também podia usar o
triângulo (“ferrinhos”), mas só para esfregar as duas peças de metal uma na outra, não para bater. fazer
com elas um som soprado, um som de silêncio. e dizer ou cantar algo. as melodias daqui são muito bonitas
e todas de tendência “orientalóide”. parece que são “em eólio”. por serem assim lindas e enleadas. e é
frequente encontrar-se um curto estribilho que reza assim: “oh, tão lindo!”. oh, tão lindo. oh. tão lindo. oh tão
lindo. há gente assim, que se sabe espantar com a beleza. podia talvez fazer uma montagem com vários
“oh, tão lindo!” juntos e misturados. Como a sequência de beijos na boca no fim do Cinema Paraíso. muitas
das músicas são religiosas mas curiosamente “enxertadas” em ritmos quase dançantes. religião transe.
repetição hipnótica. e há também o caso de as músicas na Cortelha começarem todas com um ou no
máximo dois acordes no acordeão. “estes artefactos de pedra colocam importantes questões cronoculturais”. visita à serra, vídeo 2, 2º clip, por volta dos 3’: aqui esta parte da nossa serra é muito sui generis
no que diz respeito à produção da cortiça. Porque a
tradição está muito enraizada. Toda a vida tiraram a cortiça como tiram, toda a vida tiveram os tiradores de
cortiça como têm, toda a vida negociaram a cortiça na árvore como negoceiam, e toda a vida a cortiça foi
tratada como ainda hoje é tratada. visita à serra, vídeo 2, 12º clip, no início: “vejam uma coisa:
aparentemente isto não presta pra nada... sim, a esteva... isto é esteva, não é?... sim. isto...
onde está castanho... isto, tipo assim... é extraído daqui um óleo. do qual fazem... óleo de essência de
esteva e pasta de goma. hmm... ahã... pra quê? (silêncio). indústria cosmética. ah é?... um perfume
é tanto mais caro quanto mais tempo ele ficar fixo na pele, correcto? hmm... deve ser... não sei, eu não
uso perfume... mas deve ser... (risos) se o perfume ficar 48h na pele vais ver que ele é super caro. ahã...
a substância responsável dessa fixação encontra-se aqui” (ramo de esteva na mão desde o início).
UM ESTEVAL É UM MAR DE ESTEVAS. visita à serra, vídeo 2, 37º clip: “mas Miguel, diz-me lá, para além
das barragens para reter a água, o que é que era importante fazer aqui? olha, parece-me importante... [fica
a pensar]... ppvvvv [som com os lábios]... que o Estado diga aos proprietários dos terrenos o seguinte: Meus
amigos, ou o vosso terreno começa a produzir alguma coisa ou nós tomamos posse dele. [olha para mim
em silêncio com ar de quem pergunta se estou a perceber].Tás a ver a ideia?. Tou”. Maria não acredito que
não saibas dar o passo. Dá um passinho atrás de outro, encosta-te aqui ao meu braço. Olha lá maria, meu
amor já ganhaste, olha lá maria, não o deixes fugir Olha lá maria, tem muito cuidado, olha lá maria,não o
deixes partir. como usar texto de outras maneiras que não pura e simplesmente dizendo-o? acho que esta
questão sempre esteve presente em mim em relação
ao texto. como agora só consigo imaginar dizer texto de uma maneira normal e estou a estranhar muito isso
e isso parece-me uma coisa pobre, lembrei-me que dantes era assim que eu abordava a
palavra: nunca a ser dita normalmente, sempre a ser encontrada uma forma outra, “estranha”, de a
dizer. como se “dizer normalmente” não servisse para se perceber o que se está a dizer, não funcionasse
para se perceber o fenómeno do que está a ser dito. e além disso talvez a maior parte das vezeso texto não
fosse de facto usado para ser dito e sim para outras coisas. “Quem fala encontra uma extraordinária fonte
de inspiração num rosto humano que esteja à sua frente; e um olhar que nos anuncia que um pensamento
ainda só meio expresso já foi captado oferece-nos muitas vezes a expressão necessária para a restante
metade [que ainda está por expressar/articular]”. Heinrich von Kleist, Sobre o Teatro de Marionetas.Coisas
deste género intersectadas por uma litania que não tenha nada a ver com coisas deste género.
29 set
João Paulo Esteves da Silva
partitura
no princípio não acreditei no projecto que desenhei em segredo logo durante a visita à Serra do
Caldeirão. Recolher imagens com uma câmara era, no meu caso, uma completa novidade. E no
entanto tive a sensação que poderia fazer um filme! Foi esse o começo do projecto, silencioso; só
acreditei depois da montagem com o Hugo Coelho. Mas é isso! Com as imagens recolhidas na serra
fiz um filme de trinta minutos.
Chama-se Partitura; a ideia para a performance de 29 de Setembro é a de ler essa partitura, ou
seja, produzir, ao vivo, a banda sonora do filme, tocando piano, acordeão, dizendo, aqui e ali alguns
textos, cantando e guardando, ocasionalmente os sons originais: cacarejos, balidos, vozes, vento,
etc…
Agora, ao trabalhar com o filme, tenho a sensação de estar a elaborar como que um poema
multimédia, em que os diversos elementos, visuais, textuais, sonoros… se vão traduzindo numa
harmonia possível, ou inventada.
O título, Partitura, remete também para a ideia de partida nos seus diversos sentidos: abandono,
viajem, separação, quebra etc.…há gente que parte, modos de vida que se quebram, destruições e
restauros…Tudo isso faz a partitura que vai estar na estante.
Houve uma desgraça durante as filmagens; mas ainda bem: uma imagem na qual depositava
grandes esperanças não apareceu depois no vídeo. Falta de pilha, com certeza. Era uma planta
de linho em flor. Durante o passeio tinha estado uns minutos a filmá-la e a escrever num bloco
umas melodias que ia ouvindo só por estar a vê-la, ao mesmo tempo que, ao fundo ressoavam
explicações técnicas sobre tecelagem. A imagem desapareceu! Mas não da memória. E é possível
que este linho desaparecido acabe por dar o tom à Partitura, tecida com o que se esvai… com o que
se parte, e que parte.
ficha técnica
piano, composição, direcção musical e imagem João Paulo Esteves da Silva operação de som Luís Guerreiro luz Hugo Coelho captura de imagens e
elaboração do guião para o vídeo João Paulo Esteves da Silva montagem Hugo Coelho.
Mickael de Oliveira e Mariana Tengner Barros
apologéticas se me perguntarem se sou um homem de visão, direi que não.
se me perguntarem se a verdura me desperta emoções, direi que não.
Se me perguntarem se o degelo me assusta, direi que não.
Se me perguntarem se as alterações climáticas mexem comigo, direi que não.
Se me perguntarem se o impacto de um asteróide faz-me sentir pequeno e finito, direi que não.
Se me perguntarem se a presença do homem é uma peste para o planeta, direi que não.
Se me perguntarem se o homem deve povoar o planeta, direi que não.
Se me perguntarem se o homem é bom, direi que não.
Se me perguntarem se o homem é mau, direi que não.
Se me perguntarem se sou um homem de dialéctica, direi que não.
Se me perguntarem se sou um homem de visão, direi que não.
E o meu pequeno “teatro” na black-box do CaPa será um simples mea culpa, sob fundo musical.
ficha técnica
textos Mickael de Oliveira direcção Mickael de Oliveira, com a colaboração de Mariana Tengner Barros interpretação e música Mickael de Oliveira e
Mariana Tengner Barros acompanhamento crítico Cláudia Dias e Mariana Tengner Barros operação de som Luís Guerreiro luz Hugo Coelho captura de
imagens e elaboração de guião para o vídeo Mickael de Oliveira
Maria João Luís e Daniel Gorjão
uma solidão igual à minha
“Do que somos e queremos na verdade pouco resta, um pó ínfimo sobrenada, e o resto, Pierre Loeb, o que
é?”
encontros e reencontros para questionar a serra e o homem. O encontro de Daniel com Maria João
e de ambos com Antonin, para em conjunto pensar uma performance com a ideia de que a serra
é apenas e só o espelho do homem e o homem o espelho da serra, que vivem neste momento
uma solidão partilhada, sem encontros nem desencontros, sem chegadas nem partidas, presos por
si mesmos à vontade de uma natureza que não se apoia a si própria, onde os movimentos são
constantes de ambos os lados, dispersos, perdidos e nunca apoiados. É o abandono da serra ao
homem e do homem à serra que se torna inevitável como nascer e morrer, como sermos gente, a
gente entre serras, antes das serras e depois das serras.
ficha técnica
criação e interpretação Maria João Luís e Daniel Gorjão texto Antonin Artaud e Maria João Luís desenho de luz Hugo Coelho captura de imagens e
elaboração de guião para o vídeo Daniel Gorjão montagem video Hugo Coelho residência DeVIR/CAPa
30 set
Cláudia Dias e Cecília Laranjeira
ES.CA.LA
Pour des raisons climatiques, pour des raisons économiques, pour des raisons de délocalisation d’entreprises, pour des raisons
touristiques, les gents bougent, et ils bougent dans un monde qui est effectivement de plus en plus petit. Paul Virilio
é um projecto que tem início com a visita efectuada à Serra do Caldeirão, em Abril de 2012, no
âmbito dos Encontros do Devir. Nessa visita fiquei impressionada pela camada extremamente fina
dos solos, originada pela rocha xisto-grauvaque. Esta rocha produz solos poucos férteis, uma das
razões para o abandono da Serra e pela migração das populações para a zona Litoral do Algarve.
Por outro lado, a pedra é um material passível de ser trabalhado, moldado, transformado e usado,
quer na construção de objectos concretos e utilitários, quer na construção de objectos artísticos.
Nasce assim a imagem detonadora para esta criação – trabalhar com pedras recolhidas na Serra do
Caldeirão, retiradas do seu meio natural e deslocadas para o estúdio. A transposição de elementos
naturais/reais para o contexto ficcional do palco não tem uma ambição naturalista. Prende-se
tão somente com curiosidade explorar a matéria pedra. De forma a evitar essa leitura naturalista
decidi trabalhar sobre a escala. Construí uma maquete de uma black box, com as dimensões de
50cm/50cm, correspondente a um palco de 10m/10m. Será nessa representação laboratorial do
palco que as pedras serão colocadas e o centro da acção decorrerá. O espectáculo resultará da
manipulação da maquete ao vivo com possível captação e projecção vídeo
ficha técnica
direcção Cláudia Dias assistência Cecília Laranjeira interpretação Cláudia Dias e Cecília Laranjeira vídeo Cecília Laranjeira desenho de luz Cláudia Dias
captura de imagens e elaboração de guião para o vídeo Cláudia Dias montagem Hugo Coelho som a definir residência DeVIR/CAPa
Gonçalo M. Tavares
simplicidade e ameaça um passeio pela Serra
(escrito antes do fogo-mau)
como se simplificar fosse assumir que no oitavo dia o que há a fazer é nada
deixar crescer o que já está em crescimento.
ficha técnica
textos Gonçalo M. Tavares luz Hugo Coelho captura de imagens e elaboração de guião para o vídeo Gonçalo M. Tavares montagem Rui António
André e. Teodósio
(*??)
aka PERIGO DE MORTE
a convite dos encontros DeVIR/Capa percorri no Algarve ‘cidades fantasma’.
Onde por entre serras e cidades se podia assistir ao fim da humanidade, essa nova natureza, estive
presente como testemunha.
Haverá maior Museu que a Natureza?
De máquina de filmar na mão assisti e registei a catástrofe humana acompanhada por desertos,
cruzes, selvas, ossos, migalhas, tachos furados, carros bambos, casas e casotas adjacentes.
PERIGO DE MORTE é um grande desastre: o sacrifício de se estar em perigo de morte.
Não a morte do espaço.
O de toda a humanidade (ou pelo menos, a minha).
E há que fazer alguma coisa!
PERIGO DE MORTE é a acção de um dia.
E no fim diremos...
Ite, missa est.
ficha técnica
um espectáculo de e por André e. Teodósio captura de imagens e elaboração de guião para o vídeo André e. Teodósio
ficha técnica do festival
direcção artística José Laginha
gestão e direcção de produção Ana Rodrigues
produção executiva e comunicação Marlene Vilhena
registo de imagem Rui António
direcção técnica António Martins
iluminação Hugo Coelho
som Luís Guerreiro
manutenção e limpeza Rodica Fornea
documentários
documentários
concepção José Laginha realização Rui António
com Beatriz Inácio, Manuel António, Carminha e Maria Teresa (Mealha), Floripes Coelho e Manuel Joaquim Rodrigues
(Alcarias Pedro Guerreiro) Ermelinda Maria, Salvador Gonçalves (Montinho do Cravo) José Rodrigues Cavaco (Vale de
Ôdres), Francisco Candeias Domingos, José Ângelo Gonçalves (Currais) Ivone Coelho banda
sonora abusoverbal Red Trio - Quick Sand lavraofícios Ricardo Villalobos/Max Loderbauer-Redetach
mak
making of concepção e realização vídeo Rui António
fotografia no curral da família Tomás 2003 Luís da Cruz
agradecimentos CECAL/CMLoulé; Biblioteca Álvaro de Campos/CMTavira; Miguel Vitorino; Ludovico Silva; Elisabete Teodoro; LeonelLores;
Maria Rosário Domingos, Sérgio Cavaco (Currais), Maria José Gonçalves, Rogério dos Reis Simão, Maria Isabel Rosa (Mtº do Cravo),
OtíliaCardeira (Cachopo), Ana Mª Cavaco Martins (Moita da Guerra)
organização DeVIR/CAPa estrutura financiada pelo Estado de Portugal - Secretaria de Estado da Cultura / Direcção-Geral das Artes cofinanciamento PO Algarve 21/QREN assessoria técnica Comissão de Coordenação e Desenvolvimento do Algarve, jornal Algarve 123, Aldeia da
Luz, Associação de Produtores Florestais da Serra do Caldeirão, Instituto de Conservação da Natureza e das Florestas