Compaixão, sabedoria e coragem

Transcrição

Compaixão, sabedoria e coragem
Compaixão, sabedoria e coragem
Para a humanidade viver em paz
PROPOSTA DE PAZ 2013
Por Dr. Daisaku Ikeda, presidente da Soka Gakkai Internacional
Enviada às Nações Unidas (ONU)
por ocasião do 38o aniversário da SGI, em 26 de janeiro de 2013
Compaixão,
sabedoria e coragem
Para a humanidade viver em paz
PROPOSTA DE PAZ
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proposta de paz
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PROPOSTA DE PAZ
Compaixão, sabedoria e coragem
Para a humanidade viver em paz
Daisaku Ikeda
CRÉDITOS: SEIKYO SHIMBUN / alexmak72427 / SHUTTERSTOCK
nasceu em Tóquio,
Japão, em 2 de janeiro de 1928.
Formado pela Escola Superior Fuji, na área
de Economia, é atualmente presidente da Soka
Gakkai Internacional (SGI), uma das maiores organizações não governamentais das Nações Unidas, com mais de 12 milhões de associados em
192 países e territórios.
Fundou várias instituições educacionais e culturais, como as escolas Soka (da educação infantil
ao ensino superior), a Associação de Concertos
Min-On, o Instituto de Filosofia Oriental e o Museu de Arte Fuji de Tóquio.
Pacifista, filósofo, poeta laureado e escritor,
com obras traduzidas para mais de vinte línguas,
é sócio-correspondente da Academia Brasileira de Letras (ABL) desde 1992, ocupando a cadeira de no 14.
Ikeda acredita que um movimento popular centralizado nas Nações Unidas é a chave para transformar o mundo, onde imperam a desunião e a hostilidade, num lugar de coexistência pacífica. Por isso,
apresenta anualmente, no dia 26 de janeiro, aniversário de fundação da SGI, sua proposta de paz.
A SGI é oficialmente registrada como ONG no
Conselho Econômico e Social das Nações Unidas
(Ecosoc), no Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados (Acnur), no Departamento de Informações Públicas das Nações Unidas
(UNDPI) e na Organização das Nações Unidas para
a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco). Também
integra a Federação Mundial das Associações das
Nações Unidas (WFUNA).
PROPOSTA DE
DE PAZ
PAZ
PROPOSTA
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proposta de paz
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PROPOSTA DE PAZ
Compaixão, sabedoria e coragem
Para a humanidade viver em paz
Compaixão,
sabedoria e coragem
Para a humanidade
viver em paz
Por Dr. Daisaku Ikeda,
presidente da Soka Gakkai Internacional
Enviada às Nações Unidas (ONU)
por ocasião do 38o aniversário da SGI, em 26 de janeiro de 2013
Revisão: Thiago de Mello
Tradução: Mariana Ballestero Sales Vieira
Colaboração: Maria Alice da Costa e Edson Cruz
Foto da capa e quarta capa: Getty Images
Arte: Henrique Kubota
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proposta de paz
Descontração e alegria dos jovens da SGI durante o curso de aprimoramento realizado no Japão em setembro de 2012
D
esejo abrir a minha Proposta deste ano,
em que se comemora mais um aniversário da Soka Gakkai Internacional , com
grandes esperanças, que contemplam 2030, de
uma sociedade mundialmente unida pela paz e
pela coexistência humana criadora.
Há sessenta e cinco anos foi proclamada a
Declaração Universal dos Direitos Humanos .
E desde a sua fundação a Organização das Nações Unidas (ONU) vem deixando clara a importância de temas que devem orientar e promover a
cooperação internacional, mediante esta e outras
resoluções da Assembleia Geral e várias conferências mundiais. Distinguem-se, entre eles, o
desenvolvimento sustentável (resposta aos desafios da pobreza, da degradação ambiental e da
instabilidade econômica); a cultura de paz (ante
aos desafios dos conflitos e da violência estrutu-
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PROPOSTA DE PAZ
ral); e a segurança humana (tema de resolução
adotada pela Assembleia Geral em setembro do
ano passado).
Todos esses esforços definem as principais
questões do nosso tempo, sobretudo as que exigem prioridade de ação.
Ilustração concreta está nos Objetivos de
Desenvolvimento do Milênio (ODM) , definidos pelas Nações Unidas em 2000. Quais?
Reduzir à metade, até 2015, a proporção da
população mundial que sofre dos grandes males que a atingem. O da pobreza extrema já se
alcançou bem antes do prazo. O de cortar pela
metade a proporção de pessoas sem acesso
regular à água potável de melhor qualidade
também já foi atingido. Está perto de se alcançar o de eliminar a diferença de gênero entre
alunos na educação primária.
Compaixão, sabedoria e coragem
Para a humanidade viver em paz
SEIKYO SHIMBUN
UN Photo / mb
Austregésilo de Athayde discursa sobre direitos humanos no Palais
de Chaillot, Paris, França (12 out. 1948)
Objetivos de Desenvolvimento Sustentável
Um dos principais resultados da Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento
Sustentável (Rio+20), realizada em 2012, foi o
acordo para o início de um projeto de desenvolvimento de um conjunto de Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS). Esse acordo será
baseado nos Objetivos de Desenvolvimento do
Milênio (ODM) — metas internacionais de desenvolvimento que visam melhorar as condições
sociais e econômicas nos países mais pobres do
mundo — que expirarão em 2015.
Os participantes concordaram que os ODS devem abordar aspectos econômicos, sociais e ambientais sobre sustentabilidade e suas interligações.
Os grandes objetivos consistem na erradicação da
pobreza, na sustentabilidade ambiental e no consumo e na produção sustentáveis. Também foi acordado que o projeto será aberto a todos os interessados
e será coordenado em conjunto com os processos
da agenda de desenvolvimento pós-2015.
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proposta de paz
PINTURA E GRAVURA: WIKIMEDIA
Johann Wolfgang von Goethe aos
79 anos (1828). Pintura do artista
Joseph Karl Stieler
Por outro lado, mantido o atual ritmo de progresso, é duvidoso que certos objetivos possam
ser alcançados até 2015. E, como é natural, mesmo que todos eles sejam atingidos, um número
excessivo de pessoas continuará a enfrentar condições que ameaçam a vida e sua dignidade. Está
clara a necessidade de mais esforços para acelerar as conquistas.
De qualquer forma, os objetivos atingidos
mostram que é possível, sim, mudar o mundo,
desde que as pessoas tenham uma percepção
comum da gravidade desses problemas, definam
prazos claros, aperfeiçoem e acelerem os planos
de trabalho.
Depois da Conferência das Nações Unidas
sobre o Desenvolvimento Sustentável (Rio+20)
em junho de 2012, os esforços se concentram
na definição do conjunto de Metas de Desenvolvimento Sustentável (MDS), como extensão
dos ODM e, em dezembro de 2012, criou-se
um grupo de trabalho para levar adiante essa
tarefa. O debate sobre esses objetivos servirá
de oportunidade para reunir diversas opiniões
e planificar o que ainda precisa ser alcançado,
até 2030 (data-limite) na construção de uma
sociedade global.
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PROPOSTA DE PAZ
Gravura de Julius Nisle retrata a cena do pacto de Fausto com
Mefistófeles (produzida por volta de 1840)
A procura de Fausto
Hoje, meu caro amigo, tudo é levado ao
extremo. Tudo é perpetuamente transcendente, no pensar ou no fazer. Os moços cedo
se entusiasmam e depois são levados pelo
redemoinho do tempo. O que o mundo atual
mais admira é a riqueza e rapidez. O que todos querem é enriquecer depressa.1
Podem parecer palavras de um intelectual
contemporâneo. Mas são antigas. Quem faz a
aguda crítica à nossa civilização é Johann Wolfgang von Goethe (1749—1832) .
Compaixão, sabedoria e coragem
Para a humanidade viver em paz
”O principal é dar aos
que lutam diante de
terríveis ameaças
a esperança e a força
necessárias para viver
com dignidade”
Venho conversando ultimamente com o Dr.
Manfred Osten, da Sociedade Goethe, em Weimar, Alemanha, sobre a vida e o pensamento do
grande escritor, autor de Fausto , sua obra-prima.
O Dr. Osten se aprofunda na análise dessa
obra, na qual o mestre alemão investiga a patologia da civilização: a loucura humana da incessante procura do manto mágico (o meio de transporte mais veloz), do ágil punhal (a arma mais
ligeira), e do dinheiro rápido, tudo para satisfazer
uma sucessão de desejos, mas que conduz ao
inevitável declínio.2
Na opinião do Dr. Osten, esses três poderes,
resposta de Mefistófeles ao pedido de Fausto,
constituem as ferramentas da rapidez demoníaca.3 Seus nomes e suas formas diferem daqueles
do século 21. Mas o conteúdo é o mesmo. Ele se
pergunta se somos capazes de nos reconhecer
como contemporâneos de Fausto. Creio que não
podemos nos dar ao luxo de ignorar as semelhanças entre a nossa época e a que Goethe se
refere. Sem a influência de nenhum Mefistófeles,
criamos uma trágica situação na qual o que deveria ser valorizado é pisoteado, sem a necessária reflexão. A patologia que Goethe descreve é
ainda mais grave em nosso tempo.
As armas nucleares comprovam: seu uso defende o país que as possui, ao risco e preço da
extinção da humanidade. Vivemos numa socie-
dade em que a livre concorrência é glorificada,
enquanto crescem as desigualdades e o descaso
consciente dos deserdados. Acelera-se o ritmo
da destruição ecológica que favorece enriquecimento econômico acima de tudo, enquanto a especulação dos produtos agrícolas provoca a crise
mundial de alimentos.
Os ODM foram criados para reduzir o sofrimento ao máximo. Se não eliminarmos as doenças ocultas da civilização, qualquer avanço será
efêmero, apagado por novos desafios. Esta verdade torna ainda mais importante a advertência
de Goethe: “Serão inúteis medidas para chegar
ao triunfo num único dia. Cada passo deve ser, ao
mesmo tempo, avanço e objetivo”.4
Em outras palavras, nosso empenho para
melhorar a qualidade da condição humana deve
ir além de medidas paliativas. O principal é dar
aos que lutam diante de terríveis ameaças a
esperança e a força necessárias para viver com
dignidade.
Este é o nosso maior desafio: transformar a
história da destruição em construção, a do confronto em convivência, a da divisão em solidariedade.
Precisamos de energia espiritual que ilumine coisas que não podemos deixar de saber,
conscientes de que tudo o que fizermos servirá
de algum modo à construção de uma sociedade
humana pacífica e de convivência criadora. Assim estaremos facilitando o surgimento de novos
Objetivos de Desenvolvimento Sustentável.
Creio que o respeito à dignidade da vida nos
dará essa nova energia.
Ser capaz de se alegrar com a alegria
ou sofrer com a dor dos outros
Imaginemos a sociedade mundial pacífica e
de convivência criadora como um edifício. Os
princípios da segurança e dos direitos humanos
seriam as colunas fundamentais que o sustentam. O respeito pela dignidade da vida seria seu
alicerce. Se a sua base for apenas de conceitos
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proposta de paz
SEIKYO SHIMBUN
Em maio de 1972, o historiador britânico Arnold Toynbee e o presidente Ikeda iniciaram um diálogo sobre as perspectivas da
humanidade no século 21 que está eternizado no livro Escolha a Vida
abstratos, a estrutura inteira se desequilibra e
pode até desabar se atingida por uma crise
mundial.
Para que o respeito à dignidade da vida seja
o fundamento de um esforço contínuo é necessário que as pessoas do mundo inteiro sintam e
vivam esse respeito de maneira palpável, em seu
próprio modo cotidiano de ser e viver. Proponho
três compromissos como guias de ação:
Ter a capacidade de se alegrar ou
de sofrer com os outros.
Crer nas infinitas possibilidades da vida.
Defender e celebrar a diversidade.
A propósito do primeiro compromisso, recordo o que ouvi do historiador Arnold J. Toynbee
(1889—1975) , quando conversamos há cerca
de quarenta anos sobre as perspectivas da humanidade no século 21. Pelo fim de nossa última
conversa ele salientou: “A dignidade é uma coisa
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PROPOSTA DE PAZ
insubstituível”.5 É a natureza única e insubstituível de cada ser que dá peso e valor à dignidade
da vida.
Ele advertiu: “Um ser humano pode perder
a própria dignidade se não respeitar a de outras
pessoas”.6 Condicionou a dignidade da vida à
qualidade das relações entre as pessoas.
A pobreza é ameaça insistente à dignidade de
muitas pessoas. Exige uma resposta da comunidade internacional.
Como acentuei, alguns objetivos dos ODM
já foram alcançados. Como vários deles se referem a uma redução de número de pessoas que
vivem na miséria, tudo indica que em 2015 ainda restará um bilhão de pessoas em situação de
extrema pobreza e mais de 600 milhões sem
acesso à água potável, a menos que se acelere
o ritmo do trabalho.
Além disso, há desigualdades no ritmo da
redução da pobreza. Na África subsaariana, por
exemplo, a redução é inferior à de outras regiões,
como o sul da Ásia ou da América Latina, que,
por sua vez, ainda não reduziram à metade a
quantidade de pessoas que vivem na miséria.
A Quinta Conferência Internacional de Tóquio sobre o Desenvolvimento Africano (Ticad V)
realiza-se em Yokohama no Japão. Um de seus
temas serão as sociedades inclusivas e resistentes. Espero que isso motive a solidariedade internacional para a criação de um “Século da África”,
promovendo os valores da paz e coexistência da
África para um mundo onde todos vivam dignamente.
A pobreza não é uma desgraça limitada a países em desenvolvimento. Sociedades prósperas
também padecem de exclusão social e desigualdade econômica.
Os pesquisadores britânicos Richard Wilkinson e Kate Pickett, estudiosos dos efeitos da desigualdade social, observam que, agravadas pela
privação econômica, a desigualdade tem efeito
corrosivo sobre o relacionamento entre os indivíduos em toda a sociedade.
Em seu trabalho The Spirit Level: Why More
Equal Societies Almost Always Do Better eles
confirmam que as disparidades econômicas
causam, sim, problemas sociais e de saúde. Mas
acrescentam: quanto maior a desigualdade, menor a reciprocidade no relacionamento humano,
menos as pessoas se ajudam umas às outras,
cada uma quer é cuidar de si mesma, conseguir
o que podem. É inevitável a perda da confiança.7
E acrescentam que “a desigualdade pode levar os
países à decadência”.8 Não afeta somente os pobres, atinge pessoas de diferentes classes. Maiores diferenças, mais sofrimentos.
Na prática, a privação econômica transforma
toda atividade cotidiana em fontes propensas ao
perigo. Fenômeno social que se agrava na medida em que as pessoas sentem a sua existência
subestimada, marginalizada e inútil, sem papel
nem lugar na sociedade.
As que lutam por uma vida melhor, enfrentando circunstâncias difíceis e só respostas insensíveis — tanto dos seus mais próximos quan-
UN PHOTO / DEBRABERKOWITZ
Compaixão, sabedoria e coragem
Para a humanidade viver em paz
Encerramento da Cúpula das Nações Unidas sobre os
Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (set. 2008)
to da própria sociedade — sentem o desgosto do
isolamento e da insegurança, que fere profundamente a sua dignidade.
Cresce cada dia mais, é inegável, o combate à pobreza. Mas é indispensável — a realidade
clama — maior empenho por um relacionamento
generoso entre as pessoas. Enfrentar o infortúnio
de mãos dadas fortalece a própria razão de viver.
O Budismo como resposta
ao sofrimento humano
O Budismo surgiu na Índia antiga como resposta à questão universal de como enfrentar a
realidade do sofrimento humano e ajudar as pessoas mergulhadas nessa amargura.
O Buda Sidarta Gautama ou Sakyamuni, fundador do Budismo, pertencia à realeza, que lhe
garantia uma vida confortável. A tradição conta que sua decisão de abandonar, ainda jovem,
essa comodidade e buscar a verdade por meio
da prática monástica, foi inspirada nos “quatro
encontros” que teve com pessoas atingidas pela
doença, a velhice e a morte.
Mas seu propósito nunca foi apenas a reflexão passiva sobre a transitoriedade da vida e a
inevitabilidade do sofrimento. Tempos depois,
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proposta de paz
“Devemos nos envolver com
as pessoas, estar ao lado delas
nos seus sofrimentos e em suas
esperanças, até onde alcance a
nossa força, para abrir o caminho
da verdadeira felicidade,
para nós e para os outros.”
ele descreveu o que sentira naquele momento:
“Em sua insensatez, os mortais comuns — mesmo já idosos —, quando percebem o inevitável
envelhecimento e a decadência dos outros,
ponderam angustiados, sentem vergonha e ódio
— nem refletem que é problema também deles.”9 E frisou que o mesmo acontece em relação
à doen­ça e à morte.
Sakyamuni sempre se preocupou com a arrogância que nos faz “coisificar” e isolar pessoas
afligidas pela velhice e por doenças. Foi incapaz
de fechar os olhos para os doentes e solitários ou
para os idosos ignorados pelo mundo.
Um episódio de sua vida confirma.
Certo dia Sakyamuni encontrou um monge
doente e lhe perguntou: “Por que você está sofrendo e está sozinho?” O monge respondeu que
fora uma pessoa preguiçosa de nascença, incapaz de suportar dificuldades e cuidar dos outros,
agora não havia alguém para cuidar dele. Sakyamuni respondeu: “Meu bom homem, vou cuidar
de você”. Tirou-o da cama suja, deu-lhe um bom
banho e roupa limpa. Levou-o para o ar livre e o
incentivou com firmeza a ser sempre diligente
em sua prática religiosa. O monge recuperou,
além da saúde, a alegria de viver.
Creio que não foi apenas o cuidado inespera-
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PROPOSTA DE PAZ
do e o dedicado afeto de Sakyamuni que restabeleceram o monge. O fato de tê-lo encorajado,
rigoroso e benevolente, como fazia com outros
discípulos saudáveis, reavivou a chama da vida
prestes a se apagar no coração daquele homem.
A história que conto é baseada na narrativa
do The Great Tang Dynasty Record of the Western Regions [O Conto da Grande Dinastia Tang
do Oeste].10 Quando comparada à versão transmitida nos sutras, revela-se outro aspecto da
motivação de Sakyamuni.
Depois de atender o necessitado, contam que
Sakyamuni reuniu outros monges e perguntou se
sabiam do doente. Pois sabiam, sim, de sua situação delicada, mas nenhum deles se esforçara
para aliviá-lo. Os discípulos do Buda se justificaram com o mesmo raciocínio do monge enfermo:
— Não cuidamos porque ele nunca ajudou
um doente.
Esta é a lógica da responsabilidade pessoal,
desculpa para não auxiliar os outros. O conformismo no coração do monge doente e dos demais discípulos foi a justificativa arrogante para o
descaso. Esta lógica murchou o espírito do monge doente e cegou os discípulos sadios.
“Quem quer que me socorra, deve socorrer o
doente”. Com estas palavras, Sakyamuni quis dissipar o engano que cobria a mente de seus discípulos e conduzi-los a uma compreensão correta.
Em outras palavras, praticar o caminho do
Buda significa participar ativamente das alegrias e
dos sofrimentos dos outros — jamais dar as costas aos que estão aflitos, comover-se com as dificuldades dos outros como se fossem suas. Por
essa dedicação, recuperaram o sentido de dignidade tanto os atingidos diretamente pelo sofrimento como aqueles que se compadeceram dos
que sofriam.
A grandeza da vida não se manifesta por si
mesma. Ao contrário, é por meio da ação solidária que se torna evidente a nossa natureza única
e insubstituível. A capacidade de proteger a dignidade ferida ressalta o brilho de nossa própria
existência.
Compaixão, sabedoria e coragem
Para a humanidade viver em paz
SEIKYO SHIMBUN
”Podemos fazer
dessas experiências —
normalmente consideradas
negativas — o impulso
para uma forma mais rica
e digna de viver”
Exposição sobre o Sutra de Lótus em Nova Délhi, Índia (abr. 2008)
Ao afirmar a igualdade entre ele e o monge
doente, o Buda advertia que o valor da vida humana não diminui por causa da doença ou da
idade. Recusou-se a curvar-se a tais diferenças
e discriminações. Considerar fracasso o sofrimento alheio pela doença ou idade é um erro de
julgamento que enfraquece o espírito dos envolvidos.
A base filosófica da Soka Gakkai Internacional
(SGI) está nos ensinamentos de Nitiren Daishonin (1222—1282), que enfatizam a supremacia
do Sutra de Lótus, epítome da iluminação de
Sakyamuni. No Sutra de Lótus , uma torre maciça de joias surge da terra como símbolo do valor
da vida. Nitiren compara os quatro lados dessa
torre de tesouro aos “quatro aspectos”, nascimento, velhice, doença e morte.11 Afirma que podemos enfrentar inabaláveis a dura realidade do
envelhecimento, da doença e da própria morte,
diante das angústias que as acompanham. E fazer dessas experiências — normalmente consideradas negativas — o impulso para uma forma
mais rica e digna de viver.
A grandeza da condição humana não se separa
das inevitáveis dificuldades da nossa existência.
Devemos nos envolver com as pessoas, estar ao
lado delas nos seus sofrimentos e em suas esperanças, até onde alcance a nossa força, para abrir
o caminho da verdadeira felicidade, para nós e
para os outros. Inspirados neste ensinamento, os
membros da SGI — antes ridicularizados no Japão como “pobres e doentes” — expandem com
orgulho nossa tradição de apoio mútuo e encorajamento aos sofredores e aflitos.
Nos dias atuais esse espírito é especialmente valioso, na medida em que tantas pessoas ao
redor do mundo sofrem privações inesperadas,
resultantes de desastres naturais e crises econômicas. Estes acontecimentos privam as pessoas
do que possuem e amam, sobra-lhes uma vida
carregada de dor. É imperdoável que as deixemos
isoladas e esquecidas.
PROPOSTA DE PAZ
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SEIKYO SHIMBUN
A reconstrução das regiões afetadas por terremotos, como os que assolaram o Haiti (2010)
e o nordeste do Japão (2011) , demanda tempo
e muitas vezes os resultados ficam muito aquém
das expectativas. A luta das pessoas para reconstruir a vida, recuperar o próprio sentimento
do que são, é difícil e constante. Não podemos
nos esquecer dos que sofrem. E a sociedade inteira deve participar deste esforço para reacender as esperanças.
Incentivar as pessoas até que sorrisos voltem
ao seu rosto e jamais abandoná-las. Acompanhar suas alegrias e provações nos capacita a
vencer sucessivos desafios e nos guia por uma
trilha segura.
A persistente dedicação para defender o que
é insubstituível e manter nossa própria dignidade
e a dos outros corrige as desigualdades sociais e
estabelece o alicerce da inclusão social.
UN Photo / LOGAN ABASSI
proposta de paz
Crer nas infinitas possibilidades da vida
Este segundo compromisso de fé é um verdadeiro guia para a ação.
Em setembro do ano passado, a SGI, a Associação para Educação em Direitos Humanos (HREA)
e o Escritório do Alto Comissariado das Nações
Unidas para os Direitos Humanos (EACDH) lançaram, em parceria, o DVD Um Caminho para
a Dignidade: O Poder da Educação em Direitos
Humanos , para ampla divulgação dos ideais e
princípios da Declaração das Nações Unidas sobre Educação e Treinamento em Direitos Humanos, aprovada pela Assembleia Geral das Nações
Unidas em dezembro de 2011.
Este DVD, disponível para visualização on-line, revela o respeito aos direitos humanos, em
três diferentes configurações. Embora as questões específicas de cada circunstância sejam diferentes, em conjunto transmitem a mensagem
de que é possível, sim, mudar a sociedade: mudança que começa com a transformação interior
de cada ser humano.
Organização não governamental filiada à
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PROPOSTA DE PAZ
Militar brasileiro pinta o rosto de criança haitiana durante
as atividades culturais e esportivas para a paz no Haiti (1o set. 2012)
Simpósio organizado pelos universitários de Tohoku, Japão,
com o tema: “O Futuro Delineado pelos Universitários depois de
11 de Março” (12 jan. 2013)
ONU, a SGI vem instruindo sobre direitos humanos, uma de suas principais atividades. Esta
iniciativa tem raiz na filosofia budista. Quando
Sakyamuni insistiu: “Não procure explicações
para o seu retrocesso, atue para o seu avanço”,
criticava a visão de mundo do seu tempo, que
considerava as circunstâncias de nosso nascimento na presente existência determinadas pelo
carma acumulado em vidas passadas. Ao mesmo tempo, ele usou o ditado “na verdade, toda
lenha dá fogo...”12 para afirmar que todas as pessoas possuem um estado de vida supremo e que
são, neste sentido, fundamentalmente iguais e
de ilimitadas possibilidades.
Uma visão fatalista da vida impede quem discrimina de refletir ou questionar suas próprias
ações, e ainda mais de ser verdadeiramente mo-
Compaixão, sabedoria e coragem
Para a humanidade viver em paz
CRÉDITOS: SEIKYO SHIMBUN / REPRODUÇÃO
Anúncio oficial do
lançamento do filme Um
Caminho para a Dignidade: O
Poder da Educação em Direitos
Humanos, na sede da ONU em
Genebra, Suíça (set. 2012)
vido pela voz da consciência. Cria um cenário em
que o trágico desrespeito aos direitos humanos
prevalece na sociedade: dá-se o desempoderamento das vítimas de discriminação até a perda da
noção de seu valor insubstituível, gerando a resignação e o sentimento de “eu não sirvo para nada”.
As circunstâncias atuais, irreversíveis e determinadas por causas remotas, minam o respeito à
vida, tanto para quem discrimina como para quem
é discriminado, o que Sakyamuni combatia.
Ao afirmar que temos de nos concentrar na
ação para o avanço e não nas condições de nosso nascimento, Sakyamuni ressalta que a relação
de causa e efeito é mutável e que nossas ações
e atitudes no presente momento se tornam novas causas que dão origem a novos resultados.
O verdadeiro valor de uma pessoa é medido por
suas ações no momento em que está vivendo.
Além disso, o ensinamento budista da Origem Dependente destaca nossa interdependên-
“Ouvintes da Voz” e arhat
“Ouvintes da Voz”, nome dado aos discípulos do
Buda Sakyamuni que ouviram sua pregação e buscaram
alcançar a iluminação. Este termo também foi aplicado
aos monges que ouviram o Buda pregar as quatro nobres verdades e procuraram manifestar a iluminação,
erradicando os desejos mundanos. Subhuti foi um dos
principais discípulos-ouvinte da voz de Sakyamuni.
Arhat, que significa “aquele digno de respeito”,
refere-se a uma pessoa que atingiu o mais elevado dos
quatro estágios da iluminação, que tanto os ouvintes
da voz buscavam atingir. Kaundinya foi um dos ascetas
que ouviram a primeira pregação de Sakyamuni e se
converteu a seus ensinamentos.
cia: todas as coisas existem nas tramas de um
mesmo tecido de influências mútuas. O fluxo de
sobreposição de causas e efeitos a cada instante
se propaga por essa rede de interdependência e
influencia os outros e o nosso meio. Assim, nossas ações neste momento têm o poder não só
de transformar a nós mesmos, mas de criar uma
cascata de reações positivas. Esta é a maravilhosa capacidade da vida — existente em todas as
pessoas, independentemente de sua condição —
que Sakyamuni tentou transmitir com a frase “na
verdade, toda lenha dá fogo...”.
Este mesmo princípio está expresso no Sutra de Lótus por meio de parábolas habilmente
expostas. Convém observar que não foram contadas por Sakyamuni, mas por seus vários discípulos. Bons exemplos são a parábola do homem
rico e seu filho pobre, narrada por um dos homens de erudição (ouvintes da voz), Subhuti, e a
parábola da pedra preciosa escondida no manto,
relatada por Kaundinya, um arhat .
A primeira descreve um homem que depois
de uma vida errante de grande infortúnio, sem
PROPOSTA DE PAZ
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proposta de paz
EDITORA BRASIL SEIKYO
Convidados apreciam a exposição sobre o Sutra de Lótus no Centro
Cultural Dr. Daisaku Ikeda em São Paulo (abr. 2011)
saber que tinha pai rico, retorna para casa, encontra trabalho. Na última, um homem desconhece que uma joia de imenso valor foi costurada
por um amigo no forro do seu manto.
Estas parábolas são contadas por discípulos do
Buda para revelar a transbordante alegria e a força
de vontade que sentem ao encontrar a essência
dos ensinamentos de Sakyamuni: todas as pessoas
possuem por igual a natureza de Buda e, assim, são
capazes de manifestar a profunda e infinita sabedoria do Buda. O Sutra de Lótus revela o drama
interior da vida, tanto na descrição da transformação dos discípulos que despertaram para sua alegre missão como nas parábolas que eles mesmos
usam para descrever as suas experiências.
A filosofia budista afirma que a humanidade pode avançar, um passo de cada vez, pelo
constante empenho de nos inspirarmos uns aos
outros e compreendermos que, assim como o
despertar de Sakyamuni provocou o despertar de
seus discípulos, aquilo que é possível a uma só
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PROPOSTA DE PAZ
pessoa é possível a todas. Esta é a base filosófica
da SGI na área da educação dos direitos humanos, ênfase ao processo que torna o indivíduo
capaz de liderança para o bem dos outros.
Um dos estudos de caso incluídos no DVD é
o de uma jovem mulher turca obrigada a se casar contra a vontade e violentada pelo marido.
Quando quis se divorciar, viu-se ameaçada fisicamente, não só pelo marido, mas até pelos familiares dela. Conseguiu refúgio numa organização de mulheres, solidária com os seus direitos.
Determinou-se a começar vida nova: “Sinto-me
forte... muito forte mesmo. Se eu pudesse ajudar
outras mulheres, então seria ainda mais feliz. Ser
um exemplo, é o que eu quero”.
É de fato um exemplo valioso de educação
prática dos direitos humanos. No sorriso de uma
mulher, que recuperou a força para viver, vemos o
calor da esperança e do poder da autoconfiança,
que surgem ao nos tornarmos plenamente conscientes de nossa própria grandeza.
Poucas pessoas expressam esta noção do
calor da esperança de forma tão clara como o filósofo americano Milton Mayeroff (1925—1979).
Ele foi o autor da proposta da teoria do cuidado,
na qual o empoderamento se baseia na atenção
que se dá aos outros.
Há esperanças de que o outro cresça com o meu carinho... Isso é de certo modo semelhante à esperança que
acompanha a chegada da primavera...
Não é uma expressão da insuficiência do
presente em comparação com a suficiência de um futuro esperançoso. Expressa a
plenitude do presente vivido com o sentido do possível.13
O importante é que a esperança não seja relegada ao status de nota promissória a ser paga no
futuro. Mas sim o do encontro com o sentido de
plenitude e suficiência na vida exatamente agora.
O que vale não é o que a nossa vida foi até
aqui. No instante em que despertamos para o
Compaixão, sabedoria e coragem
Para a humanidade viver em paz
EDITORA BRASIL SEIKYO
UN Photo / mARIA ELISA FRANCO
nosso valor original e decidimos mudar a realidade, começamos a brilhar com a luz da esperança.
Nitiren Daishonin tinha orgulho de ter nascido “numa família chandala, pobre e humilde”,14
sempre viveu com pessoas vitimadas por males
sociais. Ele descreveu o funcionamento dinâmico
e transformador da vida comparando-o ao “fogo
produzido por uma pedra tirada do fundo do rio,
ou uma lanterna iluminando um lugar que esteve
na escuridão por cem, mil ou dez mil anos”.15
Esperanças que só podem ser realizadas no
futuro distante — ainda que grandiosas e sublimes — não impulsionam a luta espiritual incessante necessária para fazê-las florescer. Nem
oferecem oportunidades concretas às pessoas
para que mudem o mundo ao seu redor, graças à
transformação conquistada em sua vida. Somente quando a esperança é cultivada no dia a dia,
como “a chegada da primavera”, é que se chega
ao sucesso, de forma paciente, alegre e orgulhosa, a partir das sementes das possibilidades. Só
assim influenciaremos positivamente os que nos
cercam, com a nossa própria transformação interior, trabalhando pela transformação sustentável
da sociedade.
Acredito que este pensamento é valioso não
só para os desafios da construção de uma cultura
dos direitos humanos, mas para a realização de
Painéis de exposições realizadas durante a Conferência
Rio+20 (jun. 2012)
uma sociedade que sustente a vida. Precisamos
de um trabalho abrangente que nos ajude a melhorar as circunstâncias atuais para alcançar um
futuro melhor. Salientei bem este ponto na proposta que encaminhei à Conferência Rio+20
em junho do ano passado.16 O sucesso de nossos
esforços visando ao ano 2030 depende de quão
profundas são as raízes do nosso movimento
para capacitar as pessoas — além de empoderá-las para que possam liderar — nas comunidades
ao redor do globo. Acima de tudo, é vital que a
nossa vida seja tomada pelo calor da esperança,
exatamente agora. E cada passo que dermos para
tornar o mundo um lugar melhor será, como Goe­
the pediu, “passo e objetivo ao mesmo tempo”.
PROPOSTA DE PAZ
17
proposta de paz
Defender e celebrar
a diversidade
Este é o terceiro guia para ação.
Faz muitos anos converso com pessoas de diversas origens: étnica, cultural e religiosa. Cada
vez mais, cresço com essa experiência e me sinto
mais profundamente convencido de que a diversidade merece respeito, sobretudo porque nos
permite a autorreflexão para enriquecer a vida de
mais significações.
Atualmente, as duas tendências da globalização e da crescente penetração de tecnologias da
informação expandem oportunidades para que
pessoas de diferentes origens possam interagir, comunicar seus pensamentos, suas ideias, a
qualquer instante. Ao mesmo tempo, o que se vê
é uma homogeneização, um nivelamento devido,
sobretudo, a processos econômicos que corroem
a singularidade de cada cultura. Além disso, a
maior circulação de pessoas por diversos países
muitas vezes resulta em choques culturais, agravados pela provocação deliberada de antipatia e
desconfiança. Diferenças que poderiam enriquecer nossa vida tornam-se alvo de ataques ou barreiras que separam, quando não se transformam
em conflitos violentos.
A Declaração de Sevilha sobre a Violência,
elaborada por um grupo de cientistas de diversos
países e adotada pela Unesco em 1989, afirma:
“É cientificamente incorreto dizer que a guerra ou
comportamentos violentos estão geneticamente
programados em nossa natureza humana. Ou que
uma guerra seja provocada por ‘instinto’ ou por
qualquer motivo particular”.
Concordo plenamente. Mas é preciso considerar ainda a existência de várias barreiras que
precisam ser superadas, a fim de romper o ciclo
de conflitos e violência. Para tanto, devemos começar perguntando a nós mesmos o que leva as
pessoas à guerra e à destruição.
Sakyamuni acreditava que o conflito surge da
escuridão fundamental ou da ilusão que nos impede
de reconhecer na vida do outro o mesmo valor in-
18
PROPOSTA DE PAZ
Declaração de Sevilha sobre a Violência
A Declaração de Sevilha sobre a Violência
é destinada a refutar a ideia de que a violência humana é determinada biologicamente.
Foi elaborada por uma equipe de cientistas
de várias nacionalidades reunidos em Sevilha,
na Espanha, em 1986, a pedido da Comissão
Espanhola da Unesco. Editada pela Unesco
em 1989, desmente as visões de que os seres
humanos teriam herdado de seus antepassados a tendência para a guerra; que a guerra ou
qualquer outro comportamento violento seriam geneticamente programados na natureza
humana; que no curso da evolução humana
teria ocorrido uma seleção do comportamento
agressivo sobre outros tipos de comportamento; que os seres humanos teriam um “cérebro
violento”; e que a guerra seria causada por
“instinto” ou qualquer motivação isolada.
substituível que possuímos. Vivendo na Índia antiga, Sakyamuni muitas vezes assistiu a confrontos
violentos, conflitos tribais por água e outras fontes
e disputas de poder entre os Estados.
Ele identificou o que considerava ser a essência do problema: “Vi uma única flecha invisível
perfurando o coração das pessoas”.17 De coração
atingido pela flecha invisível da escuridão fundamental, elas não conseguem se libertar do apego
a uma visão egocêntrica do mundo.
Sakyamuni viu dois grupos tribais em conflito tomados pelo mesmo desespero que os
deixava “como peixes se contorcendo em água
rasa”.18 A mente deles estava distorcida, não
reconheciam que o grupo adversário sentia as
mesmas aflições de falta de água ou de ser atacado e derrotado.
Para superar esta questão, Sakyamuni bradou: “Todo mundo estremece diante da violência, a vida é desejada por todos. Quem se põe
Compaixão, sabedoria e coragem
Para a humanidade viver em paz
no lugar de outra pessoa, não mata nem induz o
outro a matar”.19
Nesta declaração, há dois pontos cruciais.
Primeiro, Sakyamuni sempre tentava se colocar
no lugar dos outros e sentir a angústia alheia
como sua, em vez de agir só para se mostrar.
Segundo ponto, além de não matar, devemos
trabalhar para que os outros não matem. Ele nos
alerta a cultivar, por meio de sincero diálogo, a
bondade que existe na vida dos outros e nos unir
num juramento contra a violência e o ato de matar alguém.
As escrituras budistas contam o seguinte episódio em que a demônio Kishimojin (Hariti, em
sânscrito) foi persuadida por Sakyamuni a mudar
o seu modo de vida, após o diálogo que a incentivou a refletir sobre suas ações.
Kishimojin é retratada como um demônio
com muitos filhos — centenas ou até alguns milhares — e consta que ela matava os bebês dos
outros para alimentar os seus próprios. O povo
então recorreu a Sakyamuni, pedindo-lhe para
pôr fim às maldades dessa demônio. Sakyamuni encontrou o filho mais novo de Kishimojin, ao
qual ela prezava especialmente, e o escondeu.
Durante sete dias ela procurou desesperadamente o filho. Até que no auge do seu desespero
ciente de que Sakyamuni estava a par de tudo,
pediu-lhe ajuda.
Sakyamuni respondeu aos seus apelos:
“Ouvi dizer que você tem muitas crianças. Então, por que está tão angustiada com a perda
de apenas uma delas? A maioria das famílias
tem apenas um, três, ou talvez cinco filhos. E você
vive roubando os filhos delas”.20
Ao ouvir estas palavras, Kishimojin percebeu
que ela sentia naquele momento a mesma dor
WIKIMEDIA
Pintura japonesa do período
Kamakura (1185–1333) retrata Kishimojin
“Quem se põe no lugar
de outra pessoa, não
mata nem induz o outro
a matar”
Sakyamuni
que infligira a inúmeros outros pais. Depois de
prometer que abandonaria os maus caminhos,
ela se juntou ao filho predileto. A partir desse
momento, Kishimojin assumiu a missão de proteger os filhos de todos. No Sutra de Lótus, ela
jura proteger, junto com outras ferozes divindades, os que agem pela felicidade das pessoas.
Nitiren Daishonin considera que Kishimojin
era um “demônio” de acordo com os ensinamenPROPOSTA DE PAZ
19
tos pré-Sutra de Lótus, mas pelos ensinamentos
do Sutra de Lótus ela agia como um “demônio
benevolente”.21
O mais importante nesta história é que, mantendo sua aparência de demônio, Kishimojin
foi capaz de transformar completamente o seu
modo de vida. Mudando a sua consciência de
mãe, colocou-se no lugar do outro e, pela primeira vez, sofreu profundamente a dor de suas vítimas. E decidiu que nunca mais causaria nem permitiria a alguém causar a angústia que ela sentiu.
A pluralidade de identidades humanas
O Nobel de Economia Amartya Sen é um dos
principais defensores do ideal de que “a pluralidade
de indivíduos” é uma resistência à massificação e
à incitação à violência. Quando jovem, o Dr. Sen foi
testemunha da morte de muitas pessoas (durante o combate final do domínio britânico na Índia)
causada tão somente por diferenças religiosas.
Isso lhe doeu tanto, que o inspirou a procurar formas de evitar essas tragédias. Ele adverte:
Ensinamentos pré-Sutra de Lótus
e ensinamentos do Sutra de Lótus
O Sutra de Lótus é considerado uma das escrituras mais importantes do Budismo. A mensagem-chave do Sutra de Lótus é que a iluminação é uma
possibilidade aberta a todas as pessoas, independentemente de sexo, raça, posição social ou grau de
escolaridade. De acordo com o mestre budista chinês Tient’ai (538–597), os ensinamentos pré-Sutra
de Lótus foram expostos por Sakyamuni durante os
primeiros 42 anos de sua vida de pregação, desde o
momento de sua iluminação até começar a expor o
Sutra de Lótus, o qual, afirma-se, que ele tenha ensinado somente nos últimos oito anos de sua vida.
Tient’ai identificou os ensinamentos pré-Sutra de
Lótus como provisórios ou meios para se conduzir
as pessoas ao ensinamento final do Buda, o Sutra
de Lótus.
20
PROPOSTA
PROPOSTA DE
DE PAZ
PAZ
UN Photo / Devra Berkowitz
proposta de paz
Amartya Sen, economista indiano, nascido em Santiniketan em 3 de
novembro de 1933)
A insistência, ainda que implícita, sobre uma singularidade de indivíduos, sem
diversidade de escolha, não só nos diminui, deixa o mundo muito mais explosivo
(...) A maior esperança de harmonia para
este conturbado tempo, está na pluralidade
de identidades humanas, que liga uma
vida à outra e derruba o muro das diferenças de opinião da qual a pessoa não
quer abrir mão.22
É claro que os membros de qualquer grupo
étnico ou tradição religiosa não são idênticos entre si: o ambiente em que cresceram, suas ocupações e seus interesses são diferentes, como
suas convicções e seus modos de vida. É devido a essas diversidades individuais que, embora
possam existir diferenças reais entre pessoas de
igual etnia e religião, há sempre a possibilidade
de se encontrar pontos em comum e de ressonância mútua no intercâmbio de coração a coração. Como o Dr. Sen realça, isso nos permite
derrubar nítidas diferenças de opinião e criar elos
de empatia e amizade.
É por isso que no diálogo com companheiros
de diferentes origens culturais e religiosas, além de
averiguar bem as possíveis respostas a questões
globais e perspectivas para o futuro da humani-
Compaixão, sabedoria e coragem
Para a humanidade viver em paz
UN Photo / ESKINDER DEBEBE
Coral de estudantes do ensino médio do Colégio Internacional das Nações Unidas se apresenta na abertura da exposição “Construção
de uma Cultura de Paz pelas Crianças do Mundo”, na sede da ONU em Nova York, nos Estados Unidos (4 fev. 2004)
“Para ajudar uma cultura
de paz a fincar raízes no
mundo inteiro é necessário
neutralizar pacientemente
qualquer indício de ódio
e de confronto”
dade, faço questão de me informar sobre a família da pessoa, suas lembranças da juventude ou
o que a levou a prosseguir no caminho em que
vai. Tento ver com clareza as convicções e motivações individuais — a riqueza da personalidade
— que podem estar escondidas atrás dos rótulos
de etnia ou de credo. Mantenho a esperança de
que a interação de nossa vida produza melodias
que nos conduzam a um mundo genuinamente
humano. Com esses laços harmônicos, nossas
diferenças acabam por exigir que cada um de nós
revele o que tem de melhor.
De acordo com a preocupação do Dr. Sen sobre a pluralidade humana, a filósofa política ger-
mano-americana Hannah Arendt (1906—1975)
escreveu as seguintes palavras que expressam
o ponto central de seu pensamento: “Por mais
que sejamos afetados pelas coisas do mundo,
por mais que possam nos provocar e instigar,
elas somente se humanizam quando podemos
discuti-las com os nossos companheiros”.23
Arendt esclarece que usa a palavra “companheiro” para indicar “amizade” mais do que
“fraternidade” — amizade especialmente entre
pessoas cujos pontos de vista sobre a verdade
são diferentes. É precisamente por causa das
diferenças que o mundo é humanizado pelo diálogo e a rica diversidade da vida humana brilha
com sua máxima glória.
Acima de tudo, a amizade feita de coração
a coração impede as fissuras das sociedades
nas quais as diferenças muitas vezes se inclinam para a exclusão. Vamos nos esforçar para
manter essa amizade como sinal da nossa humanidade, se quisermos evitar que os laços de
empatia se desatem por uma cultura de guerra,
por um turbilhão de ódio e violência.
Inspirada pela Declaração de Sevilha, a ONU
difunde uma cultura de paz para transformar
a enraizada tendência da humanidade para a
guerra. Um exemplo é a Década Internacional
para a Cultura de Paz e Não Violência para as
Crianças do Mundo (2000–2010) . Com o
PROPOSTA DE PAZ
21
proposta de paz
SEIKYO SHIMBUN
Visitantes da exposição
“Armas Nucleares:
Ameaça ao Nosso Mundo”,
em Nova Délhi, Índia
mesmo objetivo, a SGI organizou várias exposições e outros programas para promoção da
educação pública e do diálogo, esforços nos
quais persevera.
Para ajudar uma cultura de paz a fincar raízes no mundo inteiro é necessário neutralizar
pacientemente qualquer indício de ódio e de
confronto. Como seres humanos, temos as ferramentas adequadas para essa busca: o diapasão da autorreflexão que nos deixa imaginar a
dor dos outros como se fosse a nossa; a ponte
do diálogo que nos leva ao encontro de uma pessoa no lugar onde ela estiver; a pá e a enxada da
amizade com as quais cultivamos os mais áridos
e desolados terrenos.
A amizade é poderosa: funda uma vibrante
cultura de paz que inaugura alegrias em nossa
existência neste planeta. Está na sua essência o
juramento de proteger, a todo custo e apesar das
diferenças, a dignidade de cada um. Como Nitiren Daishonin afirmou, “Felicidade é a sua alegria
e a dos outros”.24
Até aqui fiz considerações a respeito dos três
22
PROPOSTA DE PAZ
compromissos para a construção de uma civilização de respeito à vida. Eles também podem
ser pensados em termos das três qualidades que
sugeri como essenciais à cidadania mundial, na
palestra que proferi no Teachers College, na Universidade de Colúmbia, em 1996:25
• Compaixão que nunca abandona os outros
no sofrimento.
• Sabedoria de perceber a igualdade e as possibilidades da vida.
• Coragem de fazer das diferenças o impulso
para elevar a nossa humanidade.
Acredito que o desafio da construção de
uma sociedade mundial de paz e coexistência
criadora começa com o reconhecimento de que
essas virtudes são inatas na vida das pessoas.
Também acredito que a missão social da religião no século 21 deve ser incentivar o florescimento dessas capacidades: unir as pessoas
num ethos de reverência à existência humana
e seus valores.
Compaixão, sabedoria e coragem
Para a humanidade viver em paz
UN Photo / MITSUO MATSUSHIGE
SEIKYO SHIMBUN
Jossei Toda faz a declaração pela abolição das armas nucleares em 8 de setembro
de 1957, no Estádio Mitsuzawa, em Yokohama, Japão
Nuvem atômica cobre o céu de Hiroshima, Japão, dois minutos
após a bomba ser detonada (6 ago. 1945)
Armas nucleares: a maior
negação à dignidade da vida
Chego aos dois maiores desafios que o mundo enfrenta. Com propostas concretas para
vencê-los: proibir e abolir as armas nucleares e
respeitar a cultura dos direitos humanos.
Em relação ao primeiro desafio, considero as
armas nucleares a encarnação contemporânea
do “ágil punhal” de Goethe.
O filósofo francês Paul Virilio vê a velocidade
dos diferentes problemas da civilização contemporânea de maneira semelhante à sondagem feita por Goethe da psicologia humana, ávida por
um “ágil punhal”. Em Speed and Politics [Velocidade e Política], ele escreve: “O perigo maior
das armas nucleares e seus sistemas (...) não é
a ameaça de que elas vão explodir, mas o fato
real de que elas já estão, sim, implodindo nossa
mente”.26
A destruição causada por uma explosão nuclear é imensa e irreparável , mas a questão que
Virilio ressalta é a infelicidade de se viver sob a
ameaça de um confronto nuclear e seu impacto
espiritual, mesmo quando essas armas não são
usadas. Trata-se de um ponto de vista importante, sem o qual a realidade de nossa circunstância
não se revela. Virilio afirma que, “como continuação da guerra total por outros meios, a expansão
nuclear marcou o fim da distinção entre tempo
de guerra e tempo de paz...”27
Há mais de meio século, no auge da competição
da Guerra Fria em busca de armas nucleares cada
vez mais perversas, meu mestre e segundo presidente da Soka Gakkai, Jossei Toda (1900–1958),
fez uma declaração pela abolição dessas armas
. Nela, ele destacou que a posse de armas maléficas representa uma negação à vida e que elas
são inadmissíveis em qualquer circunstância. Ele
bradou o seu completo repúdio:
PROPOSTA DE PAZ
23
proposta de paz
UN Photo / ESKINDER DEBEBE
SEIKYO SHIMBUN
Ban Ki-moon faz apelo por um mundo sem armas nucleares, no sítio de testes
nucleares de Semipalatinsk, no Cazaquistão (6 abr. 2010)
Cúpula Internacional promovida pelo Instituto Toda de Pesquisas para a Paz e o
Instituto de Pesquisa de Problemas Internacionais da Noruega na Áustria (2012)
“À sua maneira, Toda
denunciou as armas nucleares
como o grande mal da
civilização contemporânea”
Ainda que neste momento cresça no
mundo inteiro o movimento pela abolição
dos testes nucleares, é meu desejo ir mais
longe, atacar o problema pela raiz: cortar
as garras ocultas dessas armas.28
Embora ele reconheça a importância dos esforços para banir os testes nucleares, considera
que o verdadeiro combate é desafiar o próprio
pensamento que os permite.
Armas nucleares não distinguem combatentes e não combatentes, destroem cidades inteiras
e matam instantaneamente milhares de pessoas.
Seu impacto sobre o meio ambiente é grave, e as
24
PROPOSTA DE PAZ
sequelas da exposição à radiação causam nos seres humanos sofrimentos que perduram. Os bombardeios de Hiroshima e Nagasaki mostraram ao
mundo a sua natureza terrivelmente poderosa.
Qual, então, o argumento dos que possuem
essas armas?
Como já disse mais de uma vez, creio que é
a mesma psicologia que trouxe a humanidade ao
ponto dessa guerra sem limites: a maneira unilateral de pensar, que identifica a todos como adversários. Independentemente das diferenças individuais, eles são vistos como inimigos. É a negação
da possibilidade de qualquer relacionamento com
eles, deixando apenas a opção de ruptura violenta
de todos os laços. Não é absoluta rejeição à vida?
Nada neste pensamento contém o que Arendt
chamou de “disposição de dividir o mundo com outros homens”, que contrasta com a cruel frieza do
misantropo: “ninguém é digno de participar de sua
alegria no mundo, na natureza e no cosmos”.29 É um
estado de vida dominado pelo impulso de rejeitar e
destruir a vida dos outros — ao qual o Budismo se
refere como a nossa escuridão fundamental.
É por este motivo que, na resolução de “cortar
Compaixão, sabedoria e coragem
Para a humanidade viver em paz
SEIKYO SHIMBUN
É imprescindível, portanto, que também cresça a
prevenção da proliferação. Creio, contudo, que o
fundamental é que estejamos alertas ao problema central da questão — a sua desumanidade intrínseca —, que o meu mestre expôs de maneira
tão clara.
É oportuna a afirmação do secretário-geral da
ONU, Ban Ki-moon : “A posse de armas atômicas por alguns incentiva a sua aquisição por
outros. E isso leva à proliferação nuclear e à expansão da contagiosa doutrina da dissuasão nuclear”.31 A menos que confrontemos a fonte fundamental desse contágio, toda ação para evitar a
proliferação será infrutífera e ineficaz.
Primeira reunião da comissão de preparativos rumo à
Cúpula do TNP em 2015, na Áustria (2012)
as garras ocultas” e de proteger o direito de viver
das pessoas, o presidente Toda foi incisivo: “Proponho que a humanidade aplique, em todos os
casos, a pena de morte para os responsáveis pelas
explosões atômicas, mesmo a um vencedor”.30
Como budista, o presidente Toda declarou
muitas vezes ser contrário à pena de morte. O
que parece apelo ao castigo extremo deve ser entendido como absoluta inadmissibilidade do poder atômico mortal. Além disso, é uma refutação
clara da lógica da posse de armas nucleares por
Estados que, por interesses de segurança, fazem
reféns os povos do mundo.
Quando o presidente Toda fez essa declaração em 1957, o mundo estava dividido entre dois
campos opostos, o Oriente e o Ocidente, ambos
negociando duramente a posse do arsenal. À sua
maneira, Toda denunciou as armas nucleares
como o grande mal da civilização contemporânea , e falou unicamente em nome do bem da
humanidade, sem levar em conta ideologias ou
interesses nacionalistas.
Desde aquela época, cresce cada vez mais o
número de países que possuem armas nucleares.
Proibição das armas nucleares
Desde a Conferência de Revisão do Tratado
de Não Proliferação Nuclear (TNP) em 2010,
cresce o movimento pela proibição das armas
nucleares, porque desumanas.
O documento final aprovado por esta Conferência de Revisão aborda uma “profunda preocupação com as consequências catastróficas
do poderio nuclear para a vida da humanidade”
e reafirma “a necessidade do respeito de todos
os Estados, em qualquer momento, ao direito
internacional em vigor, incluindo o direito humanitário internacional”.32
Esta declaração inovadora abriu caminho
para a resolução do Conselho de Delegados da
Cruz Vermelha Internacional e do Crescente
Vermelho, em novembro de 2011, que traz um
forte apelo a todos os Estados para que “prossigam com boa-fé e finalizem imediatamente as
negociações e determinações para proibir o uso
e eliminar completamente as armas nucleares,
graças a um acordo internacional de caráter juridicamente vinculativo”.33
Em maio de 2012, na primeira sessão do Comitê Preparatório para a Conferência de Revisão
do TNP, a realizar-se em 2015 , dezesseis países,
liderados pela Noruega e a Suíça, emitiram uma
declaração conjunta sobre a dimensão humaniPROPOSTA DE PAZ
25
proposta de paz
Presidente Ikeda visita a Praça Memorial da Paz em
Hiroshima (11 nov. 1975)
tária do desarmamento nuclear, afirmando que “é
de extrema preocupação que, mesmo após o fim
da Guerra Fria, a ameaça de aniquilação nuclear
permaneça em pleno século 21, com a falsa justificação da segurança do país. E asseveram que “é
fundamental para a humanidade que essas armas
jamais sejam usadas. (...) Todos os Estados devem intensificar os esforços pela sua proibição e
por um mundo livre delas”.34 Em outubro de 2012,
esta declaração foi apresentada, com pequenas
revisões, à Primeira Comissão da Assembleia Geral da ONU composta por 35 Estados-membros e
observadores.
Em março deste ano, realizou-se em Oslo,
Noruega, uma conferência internacional sobre o
impacto das armas atômicas sobre a humanidade. Sua finalidade é examinar cientificamente os
efeitos imediatos e em longo prazo de qualquer
uso dessas armas e as dificuldades da ajuda humanitária para amenizar suas consequências. Por
fim, em setembro deste ano, a Assembleia Geral,
em reunião de alto nível, vai discutir a necessidade do desarmamento nuclear.
Em minha proposta do ano passado, clamei
pela criação de um “Grupo de Ação para a Convenção sobre Armas Nucleares” (NWC), composto por ONGs e governos visionários. Tenho
muitas esperanças nessas conferências como
fontes de um núcleo de ONGs e governos que
apoiem essas declarações e espero que, se possível, comece antes do fim do ano o processo de
elaboração de um tratado para proibir armas nucleares em razão de sua natureza desumana.
A posição adotada pelos países que defendem a dissuasão ampliada dos Estados possuidores dessas armas, o chamado guarda-chuva
nuclear, será um fator determinante de êxito.
Os signatários dessas declarações não serão
26
PROPOSTA DE PAZ
“Os sobreviventes dos
ataques nucleares a
Hiroshima e Nagasaki
continuam a dar voz aos
que clamam para que
nenhum país seja vítima de
ataque nuclear...”
apenas os países que pertencem à Zona Livre de
Armas Nucleares (NWFZ) e os países neutros.
Também a Noruega e Dinamarca, membros da
Nato [Organização do Tratado do Atlântico Norte], que vivem debaixo do guarda-chuva. Estes
dois países não só assinaram as declarações,
como desempenharam um papel fundamental
em sua elaboração.
Compaixão, sabedoria e coragem
Para a humanidade viver em paz
UN Photo / MARCO CASTRO
SEIKYO SHIMBUN
O Japão, ainda coberto pela dissuasão ampliada de seu aliado, os Estados Unidos, deve se
juntar a outros países que buscam a proibição
das armas nucleares e trabalhar para que o mundo fique livre da ameaça delas quanto antes.
Em vez de aceitar que, diante da existência
de armas nucleares, nos acomodemos com uma
dissuasão ampliada inevitável, o Japão, país que
sofreu os horrores de um ataque nuclear, deve
promover o fim dessa distinção entre armas nucleares “boas” ou “más”, dependendo de quem
as possui, e liderar a realização de uma NWC
[Convenção sobre Armas Nucleares].
Já me referi à advertência de Sakyamuni:
“Colocando-se no lugar do outro, não se deve
matar nem instigar os outros a matar”. Os sobreviventes dos ataques nucleares a Hiroshima e Nagasaki continuam a dar voz aos que
clamam para que nenhum país seja vítima de
ataque nuclear e que nenhum país se envolva
numa agressão. Da mesma forma, o Japão deveria assumir a vanguarda, a fim de evitar, para
sempre, tragédias provocadas pelo uso de armas da morte.
Barack Obama discursa na 67a Assembleia Geral da ONU
em Nova York (25 set. 2012)
Além disso, claramente determinado a não
depender de armas nucleares para garantir a sua
segurança, o Japão deveria conduzir uma política de fortalecimento da confiança necessária à
concretização de um Nordeste Asiático NWFZ
[Zona Livre de Armas Nucleares]. O país deveria contribuir efetivamente para a diminuição das
tensões regionais e à redução do papel político
das armas nucleares de modo a criar condições
para a sua abolição mundial.
Cúpula ampliada sobre
atividades nucleares em 2015
Há recentes sinais, mesmo entre Estados
detentores das armas atômicas, de mudança de
atitudes em relação à sua utilidade.
O presidente dos Estados Unidos, Barack
Obama , em discurso no dia 26 de março de
2012, na Universidade Hankuk de Assuntos Estrangeiros, em Seul, na Coreia do Sul, declarou:
PROPOSTA DE PAZ
27
proposta de paz
SEIKYO SHIMBUN
Líder da SGI recebe o cofundador do IPPNW, Dr. Bernard Lown, em Tóquio, Japão (mar. 1989)
“Quanto às armas nucleares, meu governo reconhece que o enorme arsenal nuclear herdado da
Guerra Fria é pouco adequado para as ameaças
atuais, incluindo o terrorismo nuclear”.35
Da declaração aprovada pela cúpula da Nato,
em maio de 2012, consta: “As circunstâncias nas
quais o uso de armas nucleares seria contemplado são extremamente remotas”.36
Ambas as declarações assumem a continuidade da política de dissuasão enquanto
existirem armas nucleares. E, no entanto, desconsideram a presença delas para garantir a segurança nacional.
A simples propriedade dessas armas é posta
em questão por várias outras perspectivas. Em
diversos países, mais e mais vozes questionam a
sabedoria da sua posse contínua, à luz dos enormes encargos financeiros que dela decorrem. No
Reino Unido, que ainda sofre os efeitos da crise
econômica mundial, a reforma do velho submarino Trident, de mísseis nucleares, provocou debates sobre política fiscal.
28
PROPOSTA DE PAZ
Estima-se que o volume da despesa anual com
armas nucleares em todo o mundo gire em torno
de US$ 105 bilhões.37 A quantia revela quão pesado é o fardo sobre as sociedades somente para
possuí-las. Se esses recursos financeiros fossem
redirecionados para a saúde, o bem-estar social,
para programas de educação ou para auxiliar o
desenvolvimento de outros países, seria incalculável a melhora da qualidade e da dignidade da
vida das pessoas.
Em abril de 2012, nova e importante pesquisa
sobre os efeitos que uma guerra nuclear causaria ao meio ambiente foi anunciada no relatório
“Nuclear Famine”. Este documento, elaborado
pelos Médicos Internacionais para a Prevenção
da Guerra Nuclear (IPPNW) e Médicos pela
Responsabilidade Social (PSR) prevê que um
conflito nuclear, mesmo de escala relativamente
pequena, pode provocar alterações climáticas e
seu impacto sobre os países distantes das nações combatentes resultaria em fome de mais de
um bilhão de pessoas.38
Compaixão, sabedoria e coragem
Para a humanidade viver em paz
SEIKYO SHIMBUN
Exposição “Elos Solidários rumo a um Mundo sem Armas Nucleares”,
no Centro Internacional de Convenção de Hiroshima (ago. 2012)
A SGI, inspirada na declaração antiarmas nucleares do segundo presidente da Soka Gakkai,
Jossei Toda, em 1957, trabalha há décadas pela
proibição e eliminação dessas armas de destruição em massa. Recentemente, promovemos uma
nova exposição “Tudo Que Você Valoriza — Por
um mundo livre de armas nucleares”, em parceria com a Campanha Internacional para Abolição
das Armas Nucleares (Ican).
Como as iniciativas para solucionar a questão das armas nucleares, de uma perspectiva
política ou militar, permanecem num impasse,
essa exposição, inaugurada em Hiroshima em
agosto de 2012 , examina a situação a partir de
vários enfoques, incluindo, é claro, a ameaça à
segurança humana, a proteção ambiental, o desenvolvimento econômico, os direitos humanos,
a igualdade de gêneros e a responsabilidade social da ciência.
O objetivo da mostra é despertar os interesses de cada pessoa para ajudá-la a identificar a
relação entre as armas nucleares e suas necessidades, e expandir a rede de esperança por um
mundo livre delas.
Os esforços da SGI para lidar com a questão
das armas atômicas sustentam-se no reconhecimento de que a própria existência delas representa a máxima negação da vida. É preciso
desafiar a ideia desumana de que os interesses
dos Estados justificam o sacrifício de vidas humanas e da própria ecologia. Ao mesmo tempo,
sentimos que o perigo nuclear serve como lente
através da qual se pode ver com mais nitidez a
integridade ecológica, o desenvolvimento econômico e os direitos humanos — realidades que o
mundo contemporâneo não pode ignorar. E nos
ajuda a identificar os elementos que moldarão
uma nova sociedade sustentável na qual todos
possamos viver plenamente.
“Os esforços da SGI para
lidar com a questão das armas
atômicas sustentam-se no
reconhecimento de que a
própria existência delas
representa a máxima negação
da vida”
Com essa esperança, gostaria de fazer três
propostas concretas.
Primeira, tornar o desarmamento um tema-chave dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável. Proponho a redução pela metade dos
gastos militares mundiais em relação a 2010 e
que a abolição das armas nucleares e de todas
as outras armas consideradas desumanas pela
legislação internacional, seja incluída como um
objetivo a ser atingido até 2030. Na proposta
que elaborei por ocasião da Conferência Rio+20,
PROPOSTA DE PAZ
29
proposta de paz
em junho do ano passado, sugeri que as metas
relacionadas a economia verde, energia renovável, prevenção e redução de desastres fossem
incluídas nos ODS. Creio que as metas de desarmamento também devem fazer parte dos Objetivos da ONU.
O International Peace Bureau (IPB), o Instituto de Estudos de Política (IPS) e outras organizações da sociedade civil defendem a redução das
despesas militares no mundo todo. A SGI apoia
essa manifestação conscientizadora pelo desarmamento, considerando-a uma ação humanitária.
Segunda, iniciar a negociação de uma Convenção sobre Armas Nucleares, com o objetivo
de formalizar um projeto inicial até 2015: para
isso, se impõe a urgência de um debate sobre a
natureza desumana das armas nucleares, com
ampla participação da opinião pública internacional .
“Devemos nos engajar
ativamente num debate
sobre a natureza desumana
das armas nucleares, com
ampla participação da opinião
pública internacional”
Terceira, realizar uma cúpula ampliada por
um mundo livre de armas nucleares. A Cúpula do
G8, em 2015, marco dos setenta anos dos bombardeios atômicos em Hiroshima e Nagasaki, seria a oportunidade apropriada para a realização
SEIKYO SHIMBUN
Campanha
de assinaturas
pela abolição
das armas
nucleares
promovida
pelos
jovens da SGI
30
PROPOSTA DE PAZ
UN Photo / DAVID OHANA
SEIKYO SHIMBUN
Compaixão, sabedoria e coragem
Para a humanidade viver em paz
Trigésima sétima Cúpula do G8 em Deauville, na França (27 maio 2011)
desse encontro, que deve reunir representantes
das Nações Unidas, não integrantes do G8 , detentores de armamento nuclear, os cinco membros da NWFZ e aqueles estados que tomaram
a iniciativa de pedir a abolição nuclear. Desde
que Alemanha e Japão, sedes das Cúpulas do G8
programadas para 2015 e 2016, respectivamente, concordem em inverter essa ordem, permitindo que a convocação desta reunião se faça em
Hiroshima ou Nagasaki.
Em propostas de paz anteriores, sugeri que
a Conferência de Revisão do TNP de 2015 fosse
sediada em Hiroshima e Nagasaki, caminho para
uma cúpula pela abolição nuclear. Ainda espero
que essa reunião possa se realizar. No entanto,
os problemas logísticos envolvidos em reunir os
representantes de quase 190 países indicam que
esta acontecerá na sede da ONU em Nova York,
como habitual. Neste caso, a Cúpula do G8, alguns meses após a Conferência de Revisão do
TNP, é excelente oportunidade para a análise especial deste agudo problema pelo grupo ampliado de líderes mundiais.
A este respeito, sinto-me incentivado pelas
palavras do presidente Obama, em seu discurso
na Coreia, ao qual já me referi:
Acredito que os Estados Unidos têm
responsabilidade total de agir — na ver-
dade, temos uma obrigação moral. Digo
isto como presidente da única nação que
já usou armas nucleares.
O pronunciamento reforça a convicção do
que afirmou em seu discurso de Praga em abril de
2009:
Acima de tudo, falo como pai, que deseja que suas duas jovens filhas cresçam
num mundo onde tudo que conhecem e
amam não possa ser eliminado instantaneamente.39
Estas palavras transmitem o anseio de como
o nosso mundo deveria ser, desejo que ainda não
alcançamos, apesar de toda uma política e medidas de segurança serem devidamente consideradas. É a afirmação de um único ser humano
elevando-se acima das diferenças de interesse
nacional ou orientação ideológica. Esta maneira
de pensar pode nos ajudar a “desatar” o nó-cego
que faz tempo vincula a segurança nacional à
posse de armas nucleares.
Não há lugares mais propícios para um profundo exame do significado da vida na era nuclear
do que Hiroshima e Nagasaki. Como se reconheceu quando, em 2008, se reuniu em Hiroshima a
Cúpula do G8 de Palestrantes da Câmara Baixa.
PROPOSTA DE PAZ
31
proposta de paz
UN Photo
UN Photo
Eleanor Roosevelt segura o pôster da Declaração Universal dos
Direitos Humanos em inglês (Estados Unidos, 1o nov. 1948)
A cúpula ampliada que solicito herdaria esse espírito do mundo livre dessas armas: ponto de
partida dos esforços para que 2030 seja o ano do
desarmamento.
Promover a cultura dos direitos humanos
Quero me entregar agora ao desafio da cultura dos direitos humanos.
Assim como a primeira resolução aprovada
pela Assembleia Geral das Nações Unidas, em
1946, foi a proibição e abolição das armas nuclea­
res, a proteção dos direitos humanos é um dos
principais objetivos da ONU desde a sua fundação.
A escassa referência aos direitos humanos
no projeto inicial da Carta da ONU levou muitos
participantes da Conferência das Nações Unidas
sobre a Organização Internacional, realizada em
São Francisco em 1945 — e até mesmo ONGs
32
PROPOSTA DE PAZ
Plenário da Conferência da ONU em junho de 1945
— a pedir a inclusão de dispositivos claros sobre esta questão primordial. O pedido resultou
na “promoção do respeito aos direitos humanos”
definida no artigo 1º da Carta como um dos principais objetivos da nova organização e ganhou a
importância de tema central, para o qual se definiu a criação de uma comissão especializada.
No ano seguinte, 1946, criou-se a Comis-
UN Photo / JEAN-MARC FERRÉ
SEIKYO SHIMBUN
Compaixão, sabedoria e coragem
Para a humanidade viver em paz
Navanethem Pillay faz pronuciamento no escritório da ONU em
Genebra, Suíça (30 jun. 2011)
Encontro da Comissão das Mulheres para a Paz comemora os 60 anos da
Declaração Universal dos Direitos Humanos, Tóquio, Japão (dez. 2008)
são de Direitos Humanos, antecessora do atual
Conselho de Direitos Humanos. Dois anos depois, 1948, foi promulgada a Declaração Universal dos Direitos Humanos . Eleanor Roosevelt
(1884—1962) , a primeira presidente da Comissão, que desempenhou papel decisivo, tanto
na elaboração quanto na aprovação, declarou: “A
presente Declaração Universal dos Direitos Humanos pode muito bem tornar-se a Carta Magna
internacional de todos os homens em todos os
lugares”.40 Como previu, a Declaração tem influenciado a legislação sobre direitos humanos
de vários países, além de ser a base filosófica de
vários tratados internacionais de direitos humanos e continua a inspirar a todos que se dedicam
a esta grande causa.
Nos sessenta e cinco anos da Declaração,
avançou a definição de normas para os direitos
humanos, o desenvolvimento de instituições que
os garantam e a provisão de benefícios jurídicos
contra as suas violações. Hoje, com base nestes
avanços, cresce a ênfase internacional pelos direitos humanos.
O conceito de cultura dos direitos humanos
tem como objetivo a promoção de um ethos social, pelo qual as pessoas valorizem a dignidade
humana. É uma forma de incentivar cada indivíduo a agir conscientemente para reforçar os
seus direitos.
Estes valores estão de acordo com os princípios que destaco nesta proposta. Para a criação
de uma sociedade que respeite a vida, o sentimento do valor insubstituível de cada indivíduo
deve desabrochar no coração de todos e, ao mesmo tempo, ser o fundamento dos laços humanos
que sustentam a sociedade.
A ONU incentiva a formação dessa cultura
por meio de seu Programa Mundial de Educação
em Direitos Humanos, que já existe desde 2005.
Para melhor contribuir com esses esforços, sugiro que a promoção dos direitos humanos seja
elemento central dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável para o ano de 2030, ao lado
do desarmamento. Concordo plenamente com a
declaração de Navanethem Pillay , alta comissária das Nações Unidas para os Direitos Humanos, quando refletiu sobre o resultado da Rio+20:
“Temos de garantir que a estratégia (...) dos ODS
seja a nossa estratégia”.41
Com essas ideias em mente, proponho a
inclusão das seguintes metas. A primeira é a
implementação de um Piso de Proteção Social
PROPOSTA DE PAZ
33
proposta de paz
34
PROPOSTA DE PAZ
UN Photo / PAULO FILGUEIRAS
(FPS) em todos os países, com o objetivo de garantir que aqueles que sofrem com a miséria sejam capazes de recuperar o sentido de dignidade.
Embora o direito a um padrão adequado de
vida esteja incluído na Declaração Universal dos
Direitos Humanos, uma parte inaceitavelmente
grande da população mundial não tem acesso
aos seus mínimos direitos, necessários para uma
vida digna. Para enfrentar o impacto da crise econômica mundial sobre emprego, saúde e educação, a ONU lançou, em 2009, a Iniciativa Global
para a Área de Proteção Social Universal (SPF-1).
Já é tradição dos governos elaborar redes de
segurança social, mas sempre há pessoas que
escorregam pelas suas malhas. Para evitar as imperfeições, surgiu o conceito de um piso que abarque e sustente todas as pessoas, para que tenham
o que toda vida merece.
Proporcionar um piso de proteção social mínimo para pessoas em todo o mundo é um grande
desafio. Sucede que, de acordo com estimativas
feitas pelas agências das Nações Unidas, é possível, para muitos países — em qualquer estágio de
desenvolvimento econômico —, cobrir os custos
de uma estrutura básica de rendimento mínimo
e garantia de subsistência. De fato, aproximadamente trinta países já estão pondo em prática
esses planos.
O Conselho de Direitos Humanos retomou,
setembro do ano passado, a questão da extrema
miséria e os direitos humanos. Aprovou uma série
de princípios de ação e orientações para a comunidade internacional. Incluem “agência e autonomia”
e “participação e empoderamento”. O Conselho
apela para que os Estados “elaborem uma estratégia
mundial a ser adotada em cada país, para redução
da pobreza e da exclusão social” e para “assegurar
que as políticas públicas priorizem as pessoas que
vivem em extrema pobreza”.42
Nas palavras de Muhammad Yunus , economista de Bangladesh e fundador do Grameen Bank,
“como a pobreza nega às pessoas qualquer indício
de controle sobre o seu próprio destino, ela é a negação extrema dos direitos humanos”.43 Eliminar a mi-
Muhammad Yunus, ganhador do Nobel da Paz
de 2006, na sede da ONU em Nova York, EUA (16
nov. 2006)
séria é a tarefa primordial: ela enfraquece a própria
base dos direitos e da dignidade humana.
A situação da juventude é particularmente
preocupante. De acordo com a Organização Internacional do Trabalho (OIT), cerca de 12% dos
jovens do mundo não têm emprego.44 E dos empregados, mais de 200 milhões são obrigados
a trabalhar por menos de US$ 2 ao dia. A OIT
adverte: “Só uma ação urgente e enérgica impedirá a comunidade mundial de enfrentar o legado
sombrio de uma geração perdida”.45
Uma sociedade que não dá esperanças aos
jovens não pode alcançar a sustentabilidade nem
sequer construir uma cultura dos direitos humanos. O esforço para garantir um nível de proteção
social deve ter em mente esta verdade.
O segundo objetivo é a inclusão nos ODS da
educação e capacitação para promover os direitos humanos.
Não me canso de afirmar que a interação com
outras pessoas e o apoio da sociedade como um
todo podem dar a sensação de estarmos juntos e
podermos ajudar as pessoas a recuperar a esperança e a dignidade, por mais difíceis que sejam
as circunstâncias. Os esforços para aumentar a
consciência dos direitos humanos por intermédio
da educação e formação poderão servir de catalisador, ao lado de garantias jurídicas.
Compaixão, sabedoria e coragem
Para a humanidade viver em paz
SEIKYO SHIMBUN
Líder da SGI se encontra com o historiador americano Dr. Vincent Harding na Universidade Soka, Japão (abr. 1996)
“Uma sociedade que não
dá esperanças aos
jovens não pode alcançar a
sustentabilidade nem sequer
construir uma cultura de
direitos humanos”
O documentário, “Um Caminho para a Dignidade”, ilustra bem como a educação dinamiza os
direitos humanos e seu impacto tanto nos afetados pela violação como nos agressores potenciais.
Tomo o caso de um menino discriminado.
Graças a um programa de educação em direitos
humanos na sua escola, ele achou que poderia dizer as coisas que, a seu ver, não estavam corretas.
Certo dia, ele se deu conta de que uma menina do
seu bairro fora obrigada a se casar contra a própria
vontade. Os pais alegaram que arranjaram o casamento porque eram pobres. Mas o menino insistiu
que isso estava errado, melhor seria que ela fosse
estudar. Insistiu tanto, o casamento foi cancelado
e a menina permaneceu na escola.
Na Austrália, todos os escalões da Polícia do
Estado de Vitória receberam formação em direitos humanos. O resultado foi uma série de mudanças em seus procedimentos de prisão, investigação e custódia. As queixas sobre violações de
direitos humanos diminuíram, os policiais ganharam a confiança da população.
Esse documentário é exemplar: mostra como
o despertar de uma única pessoa para o valor de
sua existência e a dos outros acende a noção real
dos direitos humanos na mente do indivíduo e
fortalece uma cultura mais ampla desses direitos.
Há alguns anos, conversei com o historiador
americano Dr. Vincent Harding, que lutou ao
lado do Dr. Martin Luther King Jr. (1929—1968)
no Movimento dos Direitos Civis nos Estados
Unidos entre 1950 e 1960. Ele enfatizou que o
objetivo da luta do Dr. King não foi simplesmente
para eliminar a injustiça e a opressão, mas para
criar uma nova realidade.46 Também acredito que
isso seja elemento essencial na construção de
uma cultura dos direitos humanos.
Proponho a inauguração de centros regionais
de educação e formação em direitos humanos
junto aos Centros Regionais de Expertise, para
colaborar com a Universidade das Nações Unidas na promoção da Década das Nações Unidas
em Educação para o Desenvolvimento Sustentável. No mundo todo, existem 101 centros que são
PROPOSTA DE PAZ
35
proposta
propostade
depaz
paz
UN Photo / PERNACA SUDHAKARAN
Ishmael Beah discursa durante
a reunião que comemorou o
Dia Universal das Crianças e os
sessenta anos da Declaração
Universal dos Direitos Humanos,
na sede da ONU em Nova York (20
nov. 2006)
UN Photo / ESKINDER DEBEBE
Os direitos das crianças
Crianças iraquianas num campo de refugiados próximo a Suleimaniyah,
no Iraque (5 maio 1997)
parceiros: universidades, ONGs, grupos comunitários locais e pessoas interessadas.
Um sistema semelhante para educação em
direitos humanos pode envolver as comunidades
que demonstraram melhores práticas e também
as que se esforçam para melhorar as suas condições, apesar dos severos e históricos problemas
de abuso destes direitos.
As comunidades que passaram por dificuldades e sofrimentos têm potencial único para
transmitir poderosa mensagem de esperança e
incentivo para outras comunidades que lutam
contra situações semelhantes. Elas também podem contribuir para a criação de uma cultura dos
direitos humanos, na medida em que as pessoas
os vivem como uma realidade tangível.
36
PROPOSTA DE PAZ
As crianças de hoje desempenham, inevitavelmente, um papel crucial na construção da cultura dos direitos humanos. Para protegê-las, com
melhores condições de vida, é fundamental que
todos os países ratifiquem a Convenção sobre os
Direitos da Criança e Protocolos Facultativos e
aprovem a legislação interna necessária ao cumprimento de suas obrigações.
Esta Convenção de 1989 é a mais universal
de todas as convenções de direitos humanos
aprovadas pelas Nações Unidas, ratificada por
193 países até o momento. A fim de evitar graves
violações, dois protocolos opcionais foram inseridos em 2000: o envolvimento de crianças com
idade inferior a 18 anos em conflitos armados e o
tráfico de crianças, prostituição e pornografia infantis. Um terceiro Protocolo Opcional, adotado
em dezembro de 2011, permite às próprias crianças denunciar violações a seus direitos.
Na prática, é comum a ignorância dos direitos enunciados nesta Convenção, até violados
em virtude da promulgação equivocada da legislação nacional, que não prevê a ratificação dos
Protocolos Facultativos, e pela falta de conscientização do povo.
Compaixão, sabedoria e coragem
Para a humanidade viver em paz
UN Photo / PAULO FILGUEIRAS
Declaração de Genebra sobre os
Direitos da Criança
A Declaração dos Direitos da Criança é um
documento que reconheceu e afirmou a existência de direitos específicos das crianças e a
responsabilidade dos adultos em relação a elas.
Foi elaborada por Eglantyne Jebb (1876–1928),
fundadora da ONG Save the Children, e aprovada na Convenção Internacional da União Save
the Children em Genebra, em 1923. As necessidades fundamentais das crianças foram resumidas em cinco itens, que abrangem o bem-estar
das crianças e seu direito ao desenvolvimento, à
assistência, ao socorro e à proteção. A Liga das
Nações aprovou a Declaração em 1924 e intitulou-a como Declaração de Genebra. Foi o primeiro documento internacional sobre direitos
humanos a abordar especificamente os direitos das crianças. A Assembleia Geral da ONU
aprovou uma versão ampliada em 1959, como
sua própria Declaração Internacional dos Direitos da Criança, mas ela não possuía força jurídica vinculativa. A Convenção sobre os Direitos
da Criança foi adotada pela Assembleia Geral da
ONU em 1989 e entrou em vigor em 1990.
Jovens participam do lançamento da campanha “2010 — Ano Internacional da Juventude”,
na Sede da ONU em Nova York (12 ago. 2010)
Fico impressionado com as palavras de Ishmael
Beah,
sobrevivente da traumática experiência de criança-soldado durante a guerra civil em
Serra Leoa, sua terra natal, e agora poderoso defensor dos direitos das crianças.
Beah participou de uma conferência nas Nações Unidas quando tinha 16 anos e pela primeira
vez ouviu falar da Convenção sobre os Direitos
da Criança. Ele descreve essa experiência reveladora: “Lembro-me de como aquele conhecimento reacendeu o valor de nossa vida e de nossa
humanidade, especialmente para nós que viemos de países devastados pela guerra”.47
Ele revela:
A minha existência foi enriquecida pelos artigos 12 e 13, que garantem às crianças e aos jovens o direito de expressar
abertamente seus pontos de vista sobre
assuntos que os afetam e “de procurar, receber e transmitir informações importantes” por todos os meios de comunicação,
enriqueceram a minha existência. Esses
artigos têm ajudado muitas crianças a se
tornar participantes ativas na busca de
soluções para os seus problemas.48
Peço a todos os países que defendam essa
Convenção, dando ênfase ao interesse da criança, e que este documento sirva de inspiração
para a geração mais jovem e a desperte para o
seu valor próprio e, assim como Ishmael Beah,
seja uma fonte de esperança para a vida.
Uma geração educada numa sociedade imbuída desse espírito será uma presença transformadora e certamente cultivará esse mesmo
espírito nas gerações vindouras. O Preâmbulo
da Declaração de Genebra sobre os Direitos da
PROPOSTA DE PAZ
37
proposta de paz
SEIKYO SHIMBUN
Presidente Ikeda recebe os primeiros estudantes intercambistas chineses na Universidade Soka no Japão (maio 1975)
Criança , de 1924, precedente histórico-chave
e inspiração para a atual Convenção, estabelece
que “a humanidade deve dar à criança o que tem
de melhor”.49
A garantia de que este nobre juramento será
transmitido de uma geração para a outra edifica a
cultura dos direitos humanos como o eixo central
em torno do qual gira a sociedade.
Amizade duradoura entre China e Japão
Por fim, desejo repartir alguns pensamentos
sobre o que fazer para aliviar as tensas relações
entre China e Japão — a curto e longo prazos. Persevero em minha convicção de que a resolução
dessa questão é indispensável à construção de
uma sociedade mundial de paz e de coexistência.
38
PROPOSTA DE PAZ
O ano passado marcou o quadragésimo aniversário da restauração das relações diplomáticas sino-japonesas. No entanto, uma série de
eventos e de intercâmbios comemorativos dessa data foram cancelados ou adiados em razão
de crescentes atritos. As relações entre os dois
países se deterioraram após a Segunda Guerra
Mundial e as relações econômicas esfriaram significativamente.
Não sou pessimista sobre o futuro das relações sino-japonesas. De acordo com a máxima
chinesa: “Gotas de água podem furar até uma
rocha”. A amizade entre o Japão e a China tem
sido alimentada no período do pós-guerra exatamente na forma do adágio e graças aos esforços de dedicados pioneiros, que mesmo antes da
normalização das relações diplomáticas, traba-
Compaixão, sabedoria e coragem
Para a humanidade viver em paz
SEIKYO SHIMBUN
“Estes laços se formam
pelas amizades que nascem
de inúmeras relações
de coração a coração
e de intercâmbios, cada qual
com a sua contribuição,
que mesmo pequena é de
valor inestimável”
lharam tenazmente para romper os obstáculos
entre os países. Estes laços de amizade foram
fortalecidos pelos incontáveis intercâmbios ao
longo dos anos, que não serão desfeitos facilmente.
Quando clamei pela normalização das relações diplomáticas sino-japonesas em setembro
de 1968, era quase impensável, no Japão, sequer
mencionar a possibilidade de amizade com a
China. A situação era ainda mais grave do que
hoje. Mas minha crença era de que o Japão não
teria futuro sem a amizade de seus vizinhos e
que laços estáveis e harmoniosos com a China
seriam essenciais para a Ásia e o mundo avançarem no caminho para a paz.
Em 1972, as relações diplomáticas afinal foram normalizadas. Seis anos depois daquele meu
pedido inicial, em dezembro de 1974, pude visitar Pequim e me encontrar com o premiê chinês,
Zhou Enlai (1898—1976) e o vice-premiê Deng
Xiaoping (1904—1997). Nos diálogos com essas
personalidades, aprendi que eles viam tanto os
japoneses como os chineses vítimas do regime
militar japonês.
Encontro do presidente Ikeda com o premiê chinês Zhou Enlai, na China
(dez. 1974)
Isso aprofundou ainda mais o meu objetivo
de promover a amizade indestrutível entre os
dois povos a fim de impedir que uma guerra entre
nossas nações voltasse a acontecer.
A partir de então, tenho me dedicado com
paixão à promoção de intercâmbios de amizade,
especialmente entre os jovens . Em 1975, fui
avalista dos primeiros seis estudantes intercambistas, recebidos pela Universidade Soka, financiados pelo governo da República Popular da China. Agora, quase quarenta anos depois, cem mil
estudantes chineses estudam no Japão e quinze
mil estudantes japoneses estudam na China.
Ao longo dos anos, China e Japão criaram
uma história de intercâmbios culturais, educacionais e em muitos outros campos, incluindo a
criação de 349 cidades-irmãs. Criamos também
uma tradição de apoio mútuo em momentos difíceis como no terremoto de 2008 em Sichuan e
PROPOSTA DE PAZ
39
Tratado de Paz e Amizade
entre China e Japão (1978)
O Tratado de Paz e Amizade entre China e Japão
foi assinado entre os dois países em 12 de agosto
de 1978, mais de trinta anos após o fim da Segunda Guerra Mundial. O tratado teve origem na normalização das relações diplomáticas entre Japão e
China, em 1972. E prevê que ambos os países desenvolvam relações de paz e amizade perenes, resolvam todas as disputas por meios pacíficos e se
abstenham do uso ou da ameaça de força. Também
estipula que nenhum país busque a hegemonia na
região da Ásia-Pacífico ou em qualquer outra região, e que se esforcem para desenvolver relações
econômicas, culturais e intercâmbios.
no terremoto de 2011 no nordeste do Japão. Apesar dos períodos ocasionais de tensão, os elos de
amizade entre os dois países crescem fortes.
Estes laços se formam pelas amizades que
nascem de inúmeras relações de coração a coração e de intercâmbios, cada qual com a sua
contribuição, que mesmo pequena é de valor
inestimável. Por esta razão, não se desfazem facilmente, resistem a desafios e obstáculos. Cabe
a nós garantir que se mantenham fortes.
Em palestra na Universidade de Pequim, em
maio 1990 , insisti neste ponto: “Não importa
que surjam questões entre nós, os laços de amizade não devem ser rompidos”.50 Agora, mais do
que nunca, devemos reafirmar esta convicção.
As arenas políticas e econômicas são sempre
influenciadas pelos fluxos e refluxos dos tempos.
Na verdade, os momentos de tranquilidade são
exceções e não a regra. Quando estamos diante
de uma crise, o que importa é manter inflexíveis
as duas promessas centrais do Tratado de Paz e
Amizade entre o Japão e a República Popular da
China (1978): evitar o uso ou ameaça de força e
não recorrer à hegemonia regional.
Enquanto preservarmos estes princípios, en-
40
PROPOSTA DE PAZ
SEIKYO SHIMBUN
proposta de paz
Terceiro discurso do presidente Ikeda na Universidade de Pequim (maio
1990)
contraremos infalivelmente formas de superar
a crise atual. Ainda que nem tudo corra bem, a
sabedoria é encontrar nas adversidades ocasiões
propícias ao aprofundamento da compreensão e
fortalecer os laços. Incentivo vividamente o Japão e a China a reafirmar o seu compromisso de
defesa das duas promessas do Tratado de Paz e
Amizade e criar um fórum de alto nível para um
diálogo destinado a impedir a deterioração das relações.
A primeira ordem de trabalhos para esse fórum deve instituir uma moratória sobre todas as
ações interpretadas como provocadoras. Deve-se seguir uma análise minuciosa dos passos de
evolução do confronto — como as ações foram
percebidas e as reações foram provocadas. Isso
facilitaria o desenvolvimento de diretrizes para
respostas mais eficazes em caso de futuras crises. Sem dúvida, algumas nítidas diferenças de
opinião poderão surgir, mas se decidirmos enfrentar a divergência nos mesmos termos, então
a esperança de restauração das relações amistosas entre os dois países — para maior estabilidade na Ásia e por um mundo de paz — continuará
sendo uma ilusão.
Compaixão, sabedoria e coragem
Para a humanidade viver em paz
SEIKYO SHIMBUN
Líder da SGI conversa calorosamente com Mikhail Gorbachev, ganhador do Nobel da Paz
Logo após o fim da Guerra Fria, em julho de
1990, encontrei-me pela primeira vez com o então presidente soviético Mikhail Gorbachev .
Abri a conversa: “Vim para debater uma questão
com você. Vamos soltar faíscas, falar sobre muitas coisas de maneira aberta e honesta, para o
bem da humanidade e das relações nipo-soviéticas!”. Falei assim para deixar clara a esperança
de uma discussão real e franca em vez de uma
reunião meramente formal, num momento em
que eram incertas as perspectivas para as relações entre o Japão e a União Soviética.
Quanto mais difícil a situação, mais necessário é o diálogo coerente, comprometido em
manter a paz e a convivência criadora. O diálogo
caloroso e sério pode revelar emoções — cuidados, preocupações, interesses — que sustentam
as posições de cada lado.
Dentro desta realidade, proponho que a China e o Japão instituam a prática regular de reu­
niões de cúpula.
Janeiro marca o cinquentenário da assinatura do Tratado do Eliseu pela França e pela
Alemanha. Tratado importante: ajudou os dois
países a superar a sua história de guerras e der-
Tratado do Eliseu
O Tratado do Eliseu é um acordo de
amizade que estabeleceu uma base para a
cooperação entre França e Alemanha, encerrando séculos de conflitos entre essas nações. Foi assinado em 22 de janeiro de 1963,
pelo presidente francês Charles de Gaulle
(1890–1970) e pelo chanceler alemão
Konrad Adenauer (1876–1967). O tratado
prevê estratégias de cooperação entre as
autoridades francesas e alemãs nas áreas
de relações exteriores, defesa, educação e
juventude. Estabelece a realização de cúpulas regulares entre altos funcionários e
define vários projetos bilaterais. A criação
de um Fundo Franco-Alemão de intercâmbio entre os estudantes dos dois países é
uma das conquistas mais importantes desse acordo e permitiu a realização de mais
de oito milhões de intercâmbios de jovens
até hoje.
PROPOSTA DE PAZ
41
proposta de paz
SEIKYO SHIMBUN
“A chave para a concretização
destes objetivos reside,
em última instância, na
solidariedade entre os
cidadãos comuns”
Jovens chineses realizam intercâmbio com os estudantes da Universidade
Soka em Tóquio, Japão (dez. 2011)
ramamento de sangue, a manter relações cada
vez mais próximas, com encontros de chefes de
Estado e de governo, pelo menos duas vezes por
ano e reuniões ministeriais, pelo menos uma vez
a cada três meses, para tratar de assuntos sobre
negócios estrangeiros, defesa e educação. A meu
juízo, a atual crise entre Japão e China é uma
oportunidade para a construção de um quadro
semelhante, criando uma atmosfera que conduza os seus líderes a um diálogo frente a frente em
qualquer circunstância.
Sugiro que o Japão e a China fundem em
conjunto uma organização para a cooperação
ambiental na Ásia Oriental. Seria um objetivo
provisório para 2015 e assentaria as bases de
uma nova parceria voltada para a paz e a convivência criadora e de uma ação conjunta para
o bem da humanidade.
A melhoria das condições ambientais beneficiaria os dois países. Esta nova organização
criaria oportunidades para que os jovens da China e do Japão trabalhem juntos com um objetivo comum. E ainda estabeleceria um padrão de
contribuição conjunta para a paz e estabilidade
do leste da Ásia e da criação de uma sociedade
mundial sustentável.
42
PROPOSTA DE PAZ
Quando pedi a normalização das relações
diplomáticas em setembro de 1968, exortei os
jovens de ambos os países a se unir num laço de
amizade para construir um mundo mais digno da
condição humana . Creio que a sua base já foi
assentada tranquilamente e sem cerimônias por
meio de interações que até hoje se realizam.
Agora, creio que o foco deve se voltar para
algo mais visível e duradouro. Chegou a hora de
medidas de médio e longo prazos e de modelos
mais concretos de cooperação em novos campos. Estou convencido de que, com esses esforços contínuos e determinados, os laços de amizade entre China e Japão crescerão como algo
indestrutível que será transmitido com orgulho
de geração a geração.
Uma fortaleza de solidariedade
Dei nesta proposta a minha visão e sugeri
ações que considero vitais para a construção de
uma sociedade mundial de paz e coexistência
nestes anos que nos conduzem a 2030. A chave
para a concretização destes objetivos reside, em
última instância, na solidariedade entre os cidadãos comuns.
Em sua obra Sistema Educacional de Criação
de Valores, o primeiro presidente da Soka Gakkai,
professor Tsunessaburo Makiguti (1871—1944),
ponderou por que, com raras exceções, o esforço de pessoas decididas a corrigir os males
sociais acaba falhando:
Compaixão, sabedoria e coragem
Para a humanidade viver em paz
EDITORA BRASIL SEIKYO
Estudantes da BSGI se reúnem alegremente no Centro Cultural Campestre em São Paulo (abr. 2013)
O objetivo de Makiguti ao fundar a Soka
Gakkai, com o meu mestre Jossei Toda a seu
lado, era quebrar esse trágico padrão da história
humana. Transcendendo os estreitos impulsos
de autopreservação, levantaram-se para criar
uma fortaleza de solidariedade, feita de pes­soas
que agem para proteger a dignidade da vida humana. Esta fortaleza hoje se espalha por 192 paí­
ses e territórios.
O ano de 2030 será o marco histórico dos
esforços para a cooperação internacional. Mar-
SEIKYO SHIMBUN
Ao longo da história, pessoas de boa
vontade sempre foram perseguidas. Outras, de bom coração, podem até simpatizar com a causa, mas temerosas,
incapazes de participar, permanecem
espectadoras, enquanto as lutadoras fracassam. Pelo estreito sentido de autopreservação da vida de cada um deles, estes
espectadores, não passam de meros elementos constitutivos da sociedade, sem
qualquer influência mobilizadora que evite a sua desintegração.51
Tsunessaburo Makiguti (1871—1944)
educador e fundador da Soka Gakkai
cará também o centenário de fundação da Soka
Gakkai. Na esperança de grandes significações,
vamos aprofundar a solidariedade entre os povos
do mundo, trabalhando lado a lado pelo desenvolvimento sustentável, em benefício da vida das
gerações vindouras .
PROPOSTA DE PAZ
43
proposta de paz
Notas
1. Goethe e Zelter, Goethe’s Letters to Zelter [Cartas de Goethe para Zelter], p. 246.
2. Cf. Osten, Kasoku suru jikan, p. 165.
3. (traduzido de) Osten, “Alles veloziferisch” oder Goethes Entdeckung, p. 31.
4. Goethe, Conversations with Eckermann [Conversas com Eckermann], p. 18.
5. Ikeda e Toynbee, Choose Life [Escolha a Vida], p. 341.
6. Ibidem.
7. Wilkinson e Pickett, The Spirit Level [O Nível Espiritual], p. 56.
8. Ibidem, p. 174.
9. (traduzido de) Nakamura, Gotama Budda 1 [Buda Gautama 1], p. 156.
10. Cf. Xuanzang, The Great Tang Dynasty Record of the Western Regions [O Conto da
Grande Dinastia Tang do Oeste].
11. Cf. Nichiren, Nichiren Daishonin Gosho Zenshu [Coletânea dos Escritos de Nitiren
Daishonin], p. 740.
12. Müller (tradução), The Sutta-nip ta, v. 4, n. 9, p. 462.
13. Mayeroff, On Caring [Sobre o Cuidado], p. 18-19.
14. Nichiren, The Writings of Nichiren Daishonin [Os Escritos de Nitiren Daishonin], v. 1,
p. 303.
15. Ibidem, v. 1, p. 923.
16. Cf. Ikeda, The Challenge of Global Empowerment [Os Desafios do Empoderamento
Global].
17. (traduzido de) Nakamura, Budda no Kotoba, p. 203.
18. Saddhatissa (tradução), The Sutta-nip ta, v. 4, n. 2, p. 936.
19. Buddharakkhita (tradução). The Dhammapada, v. 10, n. 130, p. 2.
20. (traduzido de) Iwano (Ed.), Kokuyaku issaikyo, v. 29/30, p. 162.
21. Cf. Nichiren, Nichiren Daishonin Gosho Zenshu [Coletânea dos Escritos de Nitiren
Daishonin], p. 778.
22. Sen, Identity and Violence [Identidade e Violência], p. 16.
23. Arendt, Men in Dark Times [Homens em Tempos Sombrios], p. 24-25.
24. (traduzido de) Nichiren Daishonin Gosho Zenshu [Coletânea dos Escritos de Nitiren
Daishonin], p. 761.
25. Ikeda, A New Humanism [Um Novo Humanismo], p. 52-61.
26. Virilio, Speed and Politics [Velocidade e Política], p. 166.
27. Virilio, Ground Zero [Marco Zero], p. 52.
28. Toda, Declaration Calling for the Abolition of Nuclear Weapons [Declaração pela
Abolição das Armas Nucleares].
29. Arendt, Men in Dark Times [Homens em Tempos Sombrios], p. 25.
30. Toda, Declaration Calling for the Abolition of Nuclear Weapons [Declaração pela
Abolição das Armas Nucleares].
31. Ban, Remarks at Dialogue with Waseda University Students [Comentários sobre o
Diálogo com os Alunos da Universidade Waseda].
32. UN General Assembly, 2010 Review Conference [Conferência de Revisão 2010],
p. 19.
33. ICRC, Council of Delegates 2011: Resolution 1 [Conselho de Delegados 2011: Resolução 1].
34. Unoda, Joint Statement [Declaração Conjunta].
35. Obama, Remarks by President Obama at Hankuk University [Discurso do Presidente
Obama na Universidade de Hankuk].
36. Nato, Deterrence and Defence Posture Review [Dissuasão e Revisão da Postura de
Defesa].
37. Rizvi, Govts Boost Nukes While Cutting Aid, Social Services.
38. IPPNW, Nuclear Famine: A Billion People at Risk [Fome Nuclear: Um Bilhão de Pessoas em Risco].
39. Obama, Remarks by President Obama at Hankuk University [Discurso do Presidente
Obama na Universidade de Hankuk].
40. Roosevelt, Address to the United Nations General Assembly [Discurso à Assembleia Geral das Nações Unidas].
41. UN OHCHR, Rio+20 Outcome [Resultados da Rio+20].
42. UN General Assembly, Final Draft of the Guiding Principles [Assembleia Geral da
ONU, Versão Final dos Princípios Orientadores], p. 10.
43. Yunus, Creating a World Without Poverty [Criando um Mundo sem Pobreza], p. 104.
44. OIT, Global Employment Trends for Youth 2012 [Tendências Globais de Emprego
para a Juventude 2012], p. 43.
45. Idem. The Youth Employment Crisis [A Crise de Emprego entre os Jovens], p. 3.
46. (traduzido de) Ikeda e Harding, Kibo no Kyoiku [Educação da Esperança], p. 172.
47. Unicef, The State of the World’s Children [A Situação das Crianças do Mundo], p. 46.
48. Ibidem, p. 47.
49. UN, Geneva Declaration of the Rights of the Child [Declaração de Genebra Sobre os
Direitos das Crianças].
50. Ikeda, A New Humanism [Um Novo Humanismo], p. 17.
51. (traduzido de) Makiguchi, Makiguchi Tsunesaburo Zenshu [Coletânea de Orientações de Tsunessaburo Makiguti], v. 6, p. 68.
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44
PROPOSTA DE PAZ
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PROPOSTA DE PAZ
45
proposta de paz
Propostas de paz proferidas pelo
Dr. Daisaku Ikeda em 26 de janeiro, Dia da SGI
2013
2012
2011
2010
2009
2008
2007
2006
2005
2004
2003
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Compaixão, sabedoria e coragem — Para a humanidade viver em paz
Segurança humana e sustentabilidade: Compartilhar o respeito pela dignidade da vida
Por um mundo digno de todos: triunfo da vida criadora
Novos valores para uma nova era
Competição Humanitária: nova esperança na história
A humanização da religião a serviço da paz
Resgatar a nossa humanidade: primeiro passo para a paz mundial
A nova era do povo: uma rede mundial de indivíduos conscientes e fortes
Uma nova era de diálogo: o triunfo do humanismo
Revolução interior: uma onda mundial pela paz
Por uma ética global — A dimensão da vida: um paradigma
O humanismo do caminho do meio — O alvorecer de uma civilização global
O desafio da nova era: construir a todo instante o “Século da Vida”
A paz pelo diálogo — É tempo de falar: uma cultura de paz
Pela cultura de paz — Uma visão cósmica
A humanidade e o novo milênio: do caos para o cosmos
Novos horizontes de uma civilização global
Rumo ao terceiro milênio: o desafio da cidadania global
Criando um século sem guerras por meio da solidariedade humana
A luz do espírito global: uma nova alvorada na história da humanidade
Rumo a um mundo mais humano no século vindouro
Uma Renascença de esperança e harmonia
O alvorecer do século da humanidade
O triunfo da democracia: rumo a um século de esperança
A alvorada de um novo globalismo
Entendimento cultural e desarmamento: os blocos edificadores da paz mundial
Propagando o brilho da paz: rumo ao século do povo
Rumo a um movimento global por uma paz duradoura
Novas ondas de paz rumo ao século XXI
Criando um movimento unido para um mundo sem guerras
Nova proposta para a paz e o desarmamento
Pakhnyushcha / SHUTTERSTOCK
46
PROPOSTA DE PAZ
Compaixão, sabedoria e coragem
Para a humanidade viver em paz
Carta da Soka Gakkai Internacional
Preâmbulo
Nós, organizações constituintes da Soka Gakkai
PROPOSTA DE PAZ
alexmak72427 / SHUTTERSTOCK
Internacional (SGI), abraçamos o objetivo fundamental e a missão de contribuir para a paz, a cultura
e a educação, com base na filosofia e nos ideais do
Budismo Nitiren.
Reconhecemos que, em nenhuma outra época
da história, a humanidade testemunhou tamanha
justaposição de guerra e paz, discriminação e igualdade, pobreza e fartura, como no século 20. O desenvolvimento da tecnologia militar cada vez mais
sofisticada e exemplificada pelas armas nucleares,
criou uma situação em que a própria sobrevivência da espécie humana foi posta em risco. A realidade
da violenta discriminação étnica e religiosa tem se
apresentado num interminável ciclo de conflito. Se
não bastasse, o egoísmo e a negligência do homem
causaram, e continuam causando, problemas mundiais, como a degradação do meio ambiente. Também observamos que os abismos econômicos criados se intensificam entre as nações desenvolvidas e
em desenvolvimento, com sérias repercussões para
o futuro coletivo da humanidade.
Acreditamos que o Budismo de Nitiren Daishonin, filosofia humanística de infinito respeito pela
dignidade da vida e de benevolência que abrange
tudo, capacita os indivíduos a cultivar a sabedoria
e a criatividade do espírito humano para vencer as
dificuldades e as crises que a humanidade enfrenta.
Tal capacitação faz surgir uma sociedade de coexistência próspera e pacífica.
Nós, organizações constituintes e membros da
SGI, nos determinamos a hastear bem alto a bandeira da cidadania mundial, do espírito de tolerância
e do respeito aos direitos humanos. Embasados no
humanismo budista, no diálogo, nos esforços práticos e no firme compromisso com a não violência,
dispomo-nos a desafiar as questões mundiais. As-
sim, adotamos esta Carta para ratificar os seguintes
propósitos:
1. A SGI contribuirá para a paz, a educação e a
cultura, visando à felicidade e ao bem-estar de toda
a humanidade, inspirada no respeito budista à dignidade da vida.
2. A SGI, com base no ideal da cidadania mundial, salvaguardará os direitos humanos fundamentais e não discriminará nenhum indivíduo.
3. A SGI respeitará e protegerá a liberdade de
crença e de expressão religiosa.
4. A SGI promoverá a ampla compreensão do
Budismo Nitiren por meio de intercâmbios, contribuindo, dessa forma, para a concretização da felicidade individual.
5. A SGI, por intermédio das organizações constituintes, encorajará seus membros a contribuir
para a prosperida­de de suas respectivas sociedades, como bons cidadãos.
6. A SGI respeitará a independência e a autonomia de suas organizações constituintes, de acordo
com as condições predominantes em cada país.
7. A SGI, com base no espírito budista de tolerância, respeitará outras religiões, promoverá diálogos e atuará, em parceria, para a solução de questões fundamentais da humanidade.
8. A SGI respeitará a diversidade cultural e realizará intercâmbios culturais para criar uma sociedade internacional de cooperação e de compreensão mútua.
9. A SGI visará, com base no ideal budista de
simbiose, à proteção da natureza e do meio ambiente.
10. A SGI contribuirá para a promoção da educação, da busca da verdade e também do desenvolvimento da ciência para capacitar as pessoas a aprimorar o caráter e desfrutar uma vida plena e feliz.
47
proposta de paz
“A grandeza da vida não se manifesta por si mesma.
Ao contrário, é por meio da ação solidária que a
nossa natureza única e insubstituível se torna
evidente. A capacidade de proteger a dignidade
ferida ressalta o brilho de nossa própria existência”
Daisaku Ikeda
48
PROPOSTA DE PAZ

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