Suzie Hayashida Cabral

Transcrição

Suzie Hayashida Cabral
UNIVERSIDADE HOLÍSTICA INTERNACIONAL DA PAZ – UNIPAZ
Eneagrama: para além das tipologias
Suzie Hayashida Cabral
Goiânia, dezembro/2011
UNIVERSIDADE HOLÍSTICA INTERNACIONAL DA PAZ – UNIPAZ
GESTÃO EM RELAÇÕES HUMANAS
Eneagrama: para além das tipologias
Suzie Hayashida Cabral
Artigo apresentado à Universidade Holística
Internacional – UNIPAZ, como requisito
parcial, à obtenção do grau de especialista
em Relações Humanas, curso chancelado
pela PUC GOIÁS, sob a orientação da
Profª Msª: Hélyda di Oliveira
Goiânia, dezembro/2011
UNIVERSIDADE HOLÍSTICA INTERNACIONAL DA PAZ – UNIPAZ
Folha de Avaliação
Autor: Suzie Hayashida Cabral
Título: Eneagrama: para além das tipologias
Data de avaliação: 07/12/2011
Banca Examinadora
_______________________________________________________________
Profa. Ms. Hélyda Di Oliveira
(orientadora)
_______________________________________________________________
Profª Ms. Ivana Orionte
(professor convidado)
_______________________________________________________________
Esp. Davyson Machado
(professor convidado)
Nota final: ______________
Local: Unipaz – Goiás, Goiânia, 07 de dezembro de 2011.
Dedico esse trabalho,
às minhas filhas queridas, Gabriela e Ayumi,
sempre minhas fontes de inspiração...
à Tia Vera, meu anjo da guarda neste plano e
nesta existência...
e a todos os “anjos da guarda” que estiveram me
amparando nesses dois anos de luta e evolução,
de “morte e renascimento” e também de muitas
alegrias!
Agradecimentos
Meus mais sinceros agradecimentos,
Ao Universo por me trazer até aqui e me mostrar esse maravilhoso
caminho, a despeito da maneira pela qual esse caminho foi possível;
Ao professor Luis Carlos Garcia, a quem conheci nesse caminho, e quem
me apresentou o eneagrama, me deixando tão fascinada por ele;
À Dulce Magalhães, que me propiciou o primeiro contato com a Unipaz, e
que, pela sua presença iluminada, deu-me boas vindas ao mundo da
desilusão, e me mostrou as trilhas de um caminho difícil, mas pleno de luz,
e com absoluta confiança Nele (está tudo certo, não tem nada errado...);
Aos facilitadores da Unipaz, pelos quais me foi possível vislumbrar uma
nova forma de vida e consciência humanas – Fábio Brotto, Sebastião
Andrade, Monja Coen, Célia Burgos, Lorena Machado, Kaká Werá, Enadyr
Trípoli, Lydia Rebouças, Luiz Felipe Ormonde, Cleide Helena;
À Ivana Orionte, pela disponibilidade incondicional e por me mostrar que o
tempo pode passar e podemos não estar trilhando os mesmos caminhos,
mas a amizade e o amor estarão sempre lá, seja qual for a situação;
À toda equipe da Unipaz Goiás, pelo acolhimento com o qual me
receberam, em especial à Joênia, que me cativou com seu sorriso afetuoso
e à Leda, pela sua disponibilidade e alegria;
E finalmente, à Hélyda, cuja amorosidade desconcertante me fez entender
que, definitivamente, esse caminho é irreversível...
Não há caminho exclusivo na direção da
verdade, nem mesmo um caminho melhor,
embora cada um de nós pense assim.
O Trabalho, como a Natureza, produz uma
quantidade enorme de sementes e as espalha
por toda parte para garantir que, embora muitas
possam cair à beira da estrada, no seu devido
tempo a colheita virá.
J. G. Bennett
Sumário
Apresentação ...................................................................................... 9
Introdução ......................................................................................... 10
1
Origem do eneagrama................................................................. 12
2
O símbolo do eneagrama ............................................................ 15
2.1 A tríade ................................................................................... 16
2.2 A héxade ................................................................................ 17
2.3 O círculo ................................................................................. 18
3
A dinâmica do Eneagrama .......................................................... 19
4
Possibilidades de evolução humanas .......................................... 27
5
Astrologia e eneagrama .............................................................. 33
Conclusão ......................................................................................... 39
Referências ....................................................................................... 41
Índice de Figuras
Figura 1 - O símbolo do eneagrama ................................................................. 15
Figura 2 - O círculo, o triângulo e a héxade ...................................................... 16
Figura 3 - A serpente Cronos ............................................................................ 19
Figura 4 - Eneagrama indicando a Lei das Oitavas .......................................... 25
Figura 5 - Eneagrama dos dias da semana ...................................................... 27
Figura 6 - Os planetas no eneagrama............................................................... 34
ENEAGRAMA: PARA ALÉM DAS TIPOLOGIAS
Apresentação
Apresentação
As teorias da personalidade sempre me foram especialmente sedutoras.
Seja qual o aspecto a desvendar da profundeza e sutileza da psique, seja qual for
a abordagem aplicada, todas elas, via de regra, me chamam a atenção.
Mais do que conhecer, entretanto, o objetivo é sempre maior – o
autoconhecimento. Digo maior porque é evidente a existência desse grande
abismo: por melhor que se conheça alguém, dificilmente o conhecemos tão
profundamente. E em se tratando de nós mesmos, parece que tudo se torna ainda
mais difícil. Como me deparar com aquilo que sou, com a minha essência? Como
chegar perto dessa criança ferida e machucada que adormece no interior de cada
ser? Como cicatrizar as feridas da alma, sem antes tocá-las e fazê-las em carne
viva? Difícil, doloroso, mas ao mesmo tempo, fascinante.
As teorias psicológicas convencionais sobre a personalidade são
interessantes
e
muitas
vezes
bastante
úteis.
Contudo,
existe
certo
desapontamento com seus resultados práticos, pois seu alcance quase sempre
deixa a desejar em vários aspectos. Como afirma Charles Tart, prefaciando
Palmer (2009, p. 9), “quase todos os sistemas de personalidade amplamente
conhecidos e geralmente aceitos, não vão além do ordinário da vida.” Pela
abordagem da psicologia transpessoal, pude novamente me apaixonar pelo
estudo da personalidade, agora sob outra ótica, mais profunda e mais abrangente
– outra visão do ser humano, em sua totalidade, uma vez que reconhece a
presença das dimensões vitais do ser humano – a existencial e a espiritual.
Foi em meio a este paradigma holístico, definido por Pierre Weil como a
“renovação de visão da realidade e da vida, e que implica a criação de conceitos
que mudem nossa maneira de ver as coisas” (Weil, Leloup, & Crema, 2011, p.
13), que tive a felicidade de conhecer dois instigantes temas – o eneagrama e a
astrologia.
Nesse estudo, apresento minhas investigações, principalmente a respeito
do eneagrama, no que se refere à sua base filosófica, trazida ao Ocidente por G.
I. Gurdjieff, e que em muito difere das tipologias de personalidade mais
amplamente conhecidas. Tal proposição possibilitou a tangência deste tema com
a astrologia, entendida também em sua acepção dinâmica e cósmica.
9
ENEAGRAMA: PARA ALÉM DAS TIPOLOGIAS
Introdução
Introdução
O eneagrama me foi apresentado em um dos primeiros seminários dessa
pós-graduação, na Unipaz. Vi-me, neste momento, fascinada, ao perceber que
estava diante de uma inovadora ferramenta de estudo da personalidade. Comprei
alguns livros que falavam sobre o assunto e me debrucei estudando os tipos de
personalidade apontados pelo eneagrama, me deliciando ao perceber em mim
mesma e em várias pessoas conhecidas as descrições ali contidas.
Em outro seminário, tive a oportunidade de conhecer de perto a
astrologia, e minha reação não foi diferente. Também quis conhecer melhor essa
riquíssima forma de compreender a personalidade e o comportamento do ser
humano, e, além dos inúmeros livros adquiridos, também me inscrevi em um
curso de astrologia, de forma a me aprofundar neste vasto campo de estudo.
Nessa ocasião, comecei a perceber que deveria haver algum estudo,
alguma teoria que trouxesse as duas ferramentas – eneagrama e astrologia, de
forma complementar. Se ambas nos auxiliam na compreensão do ser humano, se
ambas nos fornecem tão importantes aportes no sentido de trazer à luz a psique
humana, de forma tão transcendente, deveria existir algum ponto coincidente,
algum paralelismo, alguma intersecção entre esses dois conhecimentos
milenares.
Ao me dispor a fazer este estudo, entretanto, notei que havia muito pouco
material escrito sob essa perspectiva. E mais ainda, me dei conta de que, a
despeito de ter lido e estudado com afinco, conhecia muito pouco, ou quase nada
a respeito de ambos os assuntos de forma que me sentisse realmente habilitada a
arriscar a proposição dessas correlações.
Também percebi, em minhas incursões teóricas, que a forma como o
eneagrama tem sido apropriado no Ocidente, e mais especificamente pela
psicologia, reduz infinitamente sua importância e sua profundidade. As tipologias
ou a mera descrição dos tipos de personalidade são o reflexo de um enfoque
limitado e estático acerca desse símbolo cósmico. E é exatamente nesse sentido
que se encontram as possíveis conexões com a astrologia: ao se retirar do
eneagrama o seu aspecto estático e descritivo da personalidade, e entendê-lo a
partir de uma dinâmica de movimento mais profunda.
10
ENEAGRAMA: PARA ALÉM DAS TIPOLOGIAS
Introdução
Reconhecendo a importância deste tema, o objetivo deste estudo vem a
ser, portanto, uma tentativa de demonstrar, ainda que superficialmente, dada a
complexidade do assunto, o que nos desvela o eneagrama, na sua proposta
original, a partir do seguinte questionamento: qual o significado do eneagrama,
que nos possibilite a sua compreensão para além das tipologias da
personalidade?
A metodologia utilizada na realização da pesquisa foi essencialmente
estudo bibliográfico, buscando apreender e demonstrar o pensamento dos
autores e apontando as devidas correlações ou divergências entre eles a respeito
do tema.
Assim, é inicialmente descrita a origem do eneagrama e as diferenças
principais na sua apropriação, em se tratando das formas pelas quais tem sido
utilizado no Ocidente.
Em seguida são evidenciadas as definições básicas e as explicações que
possibilitam a compreensão da estrutura do eneagrama e sua base filosófica.
No capítulo seguinte é explanado o método de autodesenvolvimento do
ser humano baseado no eneagrama, proposto por Gurdjieff.
Finalmente é demonstrada a correspondência do eneagrama com a
astrologia.
11
ENEAGRAMA: PARA ALÉM DAS TIPOLOGIAS
Origem do eneagrama
1
Origem do eneagrama
O eneagrama se popularizou nos últimos tempos, basicamente por nos
trazer um conhecimento compacto e profundo acerca das formas psicológicas ou
do comportamento humano possíveis. Mas, a despeito desse crescente interesse,
cujo ponto central seria a descrição de nove tipos de personalidade ou de ego,
cada qual dotado de esquemas mentais, emocionais e comportamentais
característicos, existe outra dimensão, que é pouco conhecida e difundida, e no
qual subjazem ensinamentos e conhecimentos extremamente profundos e que
vão muito além do domínio da personalidade.
Diversos
autores
(MAITRI,
2000;
SPEETH,
1981;
VOLLMAR,19981)
descrevem que as origens desse símbolo são envoltas em mistério, uma vez que
os ensinamentos trazidos por ele só eram transmitidos oralmente, sendo que
muito deste conhecimento esteve guardado em segredo durante séculos por
comunidades secretas do Oriente. Assim, ele teria sido introduzido no Ocidente
no início do século 20, por George Ivanovith Gurdjieff. Segundo Maitri (2000, p.
20), “Gurdjieff afirmava ter aprendido essa doutrina com a Fraternidade de
Sarmoung, uma suposta ordem mística da Ásia Central”.
De acordo com Vollmar (1998), Gurdjieff expôs o eneagrama como um
modelo dinâmico para todos que aspirem ao desenvolvimento de uma
consciência superior. Para tanto, combinou o eneagrama com sequências de
movimento específicas, e o utilizou como ferramenta para compreender o
funcionamento do universo. Segundo o autor, os exercícios de movimento de
Gurdjieff possuíam uma ressonância fascinante, sendo que o eneagrama só
poderia ser compreendido através do movimento. Seria uma chave que colocaria
ao alcance do indivíduo uma nova etapa de consciência, mas que, para tanto,
seria necessário um longo caminho.
Essas legendárias sequências de movimento serviam para ajudar as pessoas a
se tornarem conscientes de si mesmas e igualmente do cósmico, do centro do
movimento e para transmitir o antigo conhecimento esotérico. Suas sequências
precisas não somente fazem visíveis as leis cósmicas expressas no
eneagrama, como também, simultaneamente afetam e harmonizam os centros
emocional, físico e mental do dançarino. (VOLLMAR, 1998, p. 18 e 19).
1
Por se tratar de uma obra ainda sem edição em português, todas as citações deste autor são de minha tradução.
12
ENEAGRAMA: PARA ALÉM DAS TIPOLOGIAS
Origem do eneagrama
Vollmar (1998) também enfatiza a névoa de segredo em que o eneagrama
esteve envolto, mesmo após a sua ampla difusão alcançada pelos ensinamentos
de Gurdjieff, já que as publicações feitas por ele são recheadas de metáforas,
simbologias e palavras inventadas, tornando extremamente difícil a sua
compreensão. Além disso, Gurdjieff teria proibido categoricamente aos membros
de seu grupo de fazer ou publicar desenhos do eneagrama. Dessa forma este
conhecimento continuou sendo extremamente secreto até muito recentemente.
Conforme assinala o autor, a partir das contribuições dos alunos de
Gurdjieff, como Piotr Demianovich Ouspensky, John Godolfin Bennett e Rodney
Collins, o eneagrama pode ser melhor compreendido e se mostrou como um novo
modelo do universo, que revelava as chaves da vida, do ser humano e do
cosmos. Entretanto, o autor conclui que “o legado total de Gurdjieff parece
reduzir-se tão somente a um pequeno número de grupos ativos, vários livros
difíceis escritos por ele mesmo, às imprescindíveis contribuições de Bennett e
Ouspensky e o símbolo visível do eneagrama.” (VOLLMAR, 1998, p. 23).
O autor enfatiza que o matemático Bennett foi aluno de Gurdjieff e se
converteu em um dos seus mais influentes seguidores, tendo estudado o
eneagrama durante 50 anos antes de divulgar algo acerca dele. Seu livro,
publicado em 1974, teria circulado secretamente entre os alunos de Gurdjieff, e
apesar da sua existência, o eneagrama permaneceu desconhecido.
Em contrapartida, segundo Maitri (2000), nos anos setenta o psiquiatra
boliviano Oscar Ichazo apresentou o eneagrama a um grupo de seguidores em
Arica, no Chile. Um de seus alunos foi o psiquiatra chileno Claudio Narranjo. De
acordo com Vollmar (1998), em 1971 Ichazo fundou a Escola de Arica em Nova
York, ocasião em que houve o interesse pelo tema por parte dos jesuítas, que
vieram a ter um papel importante no desenvolvimento das aplicações psicológicas
do eneagrama.
O trabalho sobre o eneagrama, inspirado em Ichazo, se converteu rapidamente
em uma moda terapêutica, passando depois para a Alemanha, em 1988-89.
Nesse processo, entretanto, o eneagrama infelizmente logo se tornou nada
mais do que uma prática tipologia de diagnóstico. (VOLLMAR, 1998, p. 24).
A origem do conhecimento do eneagrama por parte de Gurdjieff e Ichazo
parece ter sido a mesma. Conforme Vollmar (1998), ambos tiveram vínculos
estreitos com certas ordens sufis do Afeganistão. “Entretanto, os enfoques do
13
ENEAGRAMA: PARA ALÉM DAS TIPOLOGIAS
Origem do eneagrama
eneagrama propiciado por Gurdjieff e Ichazo são completamente distintos um do
outro.” (idem, p. 24). Esse pensamento se deve, à forma pela qual se tem visto e
propagado o eneagrama atualmente. Segundo o autor, os jesuítas e os psicólogos
humanistas que baseiam seu trabalho em Ichazo, utilizam o eneagrama de
maneira estática, observando os pontos separados como parte de uma sequência
fixa. “Esta interpretação conduz a uma tipologia psicológica conveniente, como a
que se tem desenvolvido em formas facilmente acessíveis.” (VOLLMAR, 1998, p.
25).
Para o autor, Gurdjieff, ao contrário, considerava o eneagrama em termos
de movimento e processo, e para lançar luz acerca dessa dinâmica, cita
Ouspensky:
O eneagrama é movimento contínuo [...]. Para compreender o eneagrama, só
se pode imaginá-lo em movimento. Um eneagrama que não está em
movimento é um símbolo morto. (Ouspensky, apud VOLLMAR, 1998, p. 25).
Dessa forma,
No modelo dinâmico proposto por Gurdjieff, não existe nenhuma sequência fixa
dos pontos do eneagrama. Suas posições e relações podem alterar-se de uma
situação a outra e dependem do próprio estado de consciência de cada um, de
seus interesses e de seus enfoques particulares. A utilização do eneagrama de
acordo com Gurdjieff se aplica à dinâmica das situações sociais, e a padrões
de movimento que se estendem desde o cosmos até o microcosmos das
células individuais. Gurdjieff, Ouspensky e Bennett não compartilham a ideia
dos seres humanos de tipos fixos. Cada pessoa se vê como um conglomerado
de diferentes egos, um dos quais tomará o controle em um determinado
momento e situação. Em consequência, existe uma contínua alteração das
personalidades, a menos que a pessoa trabalhe sobre si mesma com a ajuda
de um mestre versado em alguma comprovada tradição de
autodesenvolvimento. (VOLLMAR, 1998, p. 26).
O autor enfatiza, de forma radical, que é necessário liberar o eneagrama
“da camisa de força cristã e psicológica em que tem sido confinada há muitos
anos, quando se tornou amplamente conhecida e popular”. (idem, p. 17).
Maitri (2000), entretanto, é mais transigente. A autora faz algumas
restrições acerca da crescente popularização do eneagrama, uma vez que há um
enfoque quase que exclusivo nos traços e esquemas psicológicos dos tipos, mas
reconhece que todo esse interesse criou um público que talvez também esteja
receptivo às outras dimensões do eneagrama. Propõe, dessa forma, uma
interpretação profundamente dinâmica do eneagrama do ponto de vista da
personalidade, não retirando o aspecto cósmico relacionado a ele, mas deixando
14
ENEAGRAMA: PARA ALÉM DAS TIPOLOGIAS
O símbolo do eneagrama
claras suas perspectivas de abordagem, que se baseiam na percepção da
natureza profunda da existência. Assim, unindo as contribuições de Ichazo e
Gurdjieff, a autora desvela o processo complexo e fascinante no qual
estruturamos nossa personalidade e retira o entendimento fixo e estático a partir
do qual tem se concebido o eneagrama.
A despeito do belo trabalho de Maitri (2000) e ainda de Riso & Hudson
(2011) sobre o eneagrama da personalidade, não serão abordados neste estudo
os tipos de personalidade em detalhes, e tampouco as proposições sobre a
interpretação do eneagrama apresentadas por estes autores, uma vez que não
são o alvo da problematização aqui apontada.
2
O símbolo do eneagrama
Eu sou um símbolo que encerra conhecimento e poder.
Represento os processos cíclicos de transformação. Posso
ajudá-lo a ver dentro e fora de si mesmo. Posso acionar forças
desconhecidas, que agem de acordo com as leis universais da
Criação-do-Mundo e da Manutenção-do-Mundo. Minha
forma gera energia espontânea quando contemplada, traçada,
imaginada, estudada, adivinhada, representada, dançada...
(Bernier, 2005)
Originais do Grego, as palavras Ennea e Grammos significam
respectivamente, nove e pontos ou ângulos. Nove Pontos. Nove Visões. Nove
Vertentes.
Figura 1 -
O símbolo do eneagrama
15
ENEAGRAMA: PARA ALÉM DAS TIPOLOGIAS
O símbolo do eneagrama
O eneagrama é um símbolo cósmico, que representa um poder superior
(VOLLMAR, 1998), e que, entendendo sua dinâmica, é possível compreender como
se processa tudo no universo e em nossas vidas (BERNIER, 2005).
Segundo Bennett (1981, p. 19), é um instrumento que “nos permite ver
quando e de que modo os eventos se ajustam às leis cósmicas e reconhecer,
assim, o que é possível e o que não é possível nos empreendimentos humanos.”
O símbolo do eneagrama tem três partes, que, segundo Gurdjieff (apud
RISO & HUDSON, 2011), representam as três leis Divinas que regem toda a
existência. O círculo, o triângulo e a héxade.
Figura 2 -
O círculo, o triângulo e a héxade
“Ele é um símbolo que demonstra a integridade de algo (círculo), cuja
identidade resulta da interação de três coisas (triângulo) e evolui ou muda ao
longo do tempo (héxade).” (RISO & HUDSON, 2011, p. 31). Portanto, o eneagrama
é um símbolo cuja representação gráfica é de uma esfera dividida em nove
partes. Essa figura encerra relações matemáticas simples e surpreendentes, que
são analisados nos itens que se seguem.
2.1
A tríade
Represento a Lei-de-Três. Englobo a atividade das sete
tríades, desde a tríade perfeita até as tríades de criação,
identidade, interação, ordem liberdade e evolução.
(Bernier, 2005)
Segundo Bennett (1981 p. 14), no século XV, alguns matemáticos
descobriram a importância do número zero e criaram o sistema numérico decimal,
que utilizamos atualmente. Observou-se que quando se dividia a unidade por três
ou por sete, surgia uma nova espécie de número.
16
ENEAGRAMA: PARA ALÉM DAS TIPOLOGIAS
O símbolo do eneagrama
Dessa forma, quando dividimos a unidade por três, obtemos uma
sucessão infinita de três, em uma dízima periódica, assim:
⅓ = 0,3333...
Se a isso somarmos mais uma terça parte obteremos uma sucessão
infinita de seis:
⅓ + ⅓ = 0,6666...
Também quando somamos a terça parte final, obtemos:
⅓+⅓+⅓=1
que também poderia ser expresso por 0,9999...
Esses três números – 3, 6 e 9 – dão origem ao triângulo do eneagrama
que representaria a Lei de Três, ou Lei da Criação, com suas três forças
fundamentais: a força ativa, a força passiva e a força neutra, uma das leis básicas
que fazem parte do sistema de Gurdjieff.
Tais forças, como assinala Speeth (1981), estão presentes em toda parte,
e são representadas em muitas das religiões do mundo, como Brama, Vishnu e
Siva; Pai, Filho e Espírito Santo, e outras trindades.
2.2
A héxade
Sou o próprio movimento e sou mais que movimento.
Sigo ao mesmo tempo o ciclo cronológico e um ciclo atemporal
interior de funcionamento. Em cada ponto já estou adiante, e
evoco etapas anteriores em feedback pelos arcos do círculo,
pela héxade, ou pelas linhas internas. Nunca estou parado.
Represento a existência e, portanto, as constantes e
permanentes mutações de tudo que é manifestado e atualizado.
(Bernier, 2005)
17
ENEAGRAMA: PARA ALÉM DAS TIPOLOGIAS
O símbolo do eneagrama
Conforme Bennett (1981), se dividirmos a unidade por sete e somarmos
outros sétimos sucessivamente, obteremos outro padrão numérico, mais
complexo, o qual não contém nenhum algarismo três, seis ou nove:
1
/7 = 0,1482857
2
/7 = 0,285714
3
/7 = 0,428571
⁴/₇ = 0,571428
⁵/₇ = 0,714285
⁶/₇ = 0,857142
A héxade (figura que interliga os pontos 1-4-2-8-5-7) simboliza o que
Gurdjieff chamava de “A Lei de Sete”, ou “Lei das Oitavas”, que diz respeito a
processos e desenvolvimento ao longo do tempo. Ela afirma que nada é estático,
tudo está em movimento e no processo de tornar-se outra coisa. Tudo está em
mudança, recicla-se e evolui ou involui – embora de maneira previsível e de
acordo com uma lei, segundo sua natureza e as forças que estejam atuando. Os
dias da semana, a tabela periódica e a oitava musical baseiam-se na Lei de Sete.
(RISO & HUDSON, 2011, p. 31).
De acordo com Speeth (1981), a Lei de Sete governa sucessões de
acontecimentos, ao especificar que sempre que qualquer manifestação se
desenrola, seu movimento não tem forma linear, mas há uma descontinuidade
ordenada em toda a progressão das coisas.
2.3
O círculo
Represento a unidade na multiplicidade, a unidade cíclica ou
recorrente, o tempo e a eternidade. Eu sou completo e sem fim.
O círculo, como primeira limitação do Absoluto. Sou modelo
de todos os processos cíclicos de transformação em todas as
suas fases e contenho todos os seus detalhes em meus próprios
insuspeitados detalhes.
(Bernier, 2005)
18
ENEAGRAMA: PARA ALÉM DAS TIPOLOGIAS
A dinâmica do Eneagrama
A vida é cíclica, e por esta razão o eneagrama se apresenta como um
círculo, “que representa a serpente Cronos devorando a si mesma pela cauda.”
(Bennet, 1981). Todas as coisas se movem ciclicamente, e o círculo indica o
movimento rotatório de tudo o que existe.
Figura 3 -
A serpente Cronos
Segundo Bernier (2005), as estações – primavera, verão, outono e
inverno, são ciclos sucessivos calculados matematicamente. Estas estações
ficarão se repetindo sucessivamente, são movimentos precisos da natureza. Da
mesma forma que podemos ver na natureza os eventos cíclicos, nós também
somos cíclicos. Na natureza, no universo e no ser humano, tudo tende a se repetir
ciclicamente.
Dessa forma, “o centro, círculo ou esfera interior, é o mesmo que a esfera
exterior, o Alfa e o Ômega, Cronos, a Eternidade e o Tempo.” (BERNIER, 2005).
De acordo com Riso & Hudson (2011), o círculo diz respeito à unidade,
integridade e identidade, simbolizando a ideia de que Deus é uno, compartilhada
pelas três maiores religiões ocidentais: o judaísmo, o cristianismo e o islamismo.
3
A dinâmica do Eneagrama
A cada fim corresponde um novo início. Tridimensional em cada
ciclo, represento as três oitavas da Criação. Eu sou música,
porém eu tenho mais do que apenas uma oitava musical. Tenho
a melodia, a harmonia e o ritmo...
(Bernier, 2005)
Vollmar (1998) ressalta que o eneagrama deve ser visualizado em uma
forma tridimensional: “as nove pontas de sua periferia devem ser imaginadas
19
ENEAGRAMA: PARA ALÉM DAS TIPOLOGIAS
A dinâmica do Eneagrama
como se fossem distribuídas em certos intervalos sobre uma espiral.” (p. 25).
Assim, formar uma imagem deste eneagrama tridimensional é fundamental para
se captar a dinâmica do seu movimento.
Bennett (1981), explica o sistema do eneagrama como uma forma de
superar a incerteza e o acaso. Assim, seus nove termos teriam a característica da
harmonização, e os termos seriam de duas espécies: há três pontos de partida
numerados 3, 6 e 9, e seis etapas, 1, 4, 2, 8, 5 e 7. Há também uma dupla
progressão: em volta do círculo, de 1 a 9, e em torno da héxade na ordem 1-4-28-5-7.
O autor, ao discorrer sobre a dificuldade que temos em compreender o
eneagrama, enfatiza que ele pode se tornar para nós uma inesgotável fonte de
inspiração e compreensão, na medida em que conseguirmos ir além do
pensamento linear quando pensamos no homem e nas suas ações, uma vez que
não se tratam de coisas lineares. Dessa forma, sendo o homem um ser complexo,
cuja vida é constituída de diferentes processos, é necessário que haja uma
mudança na nossa maneira de pensar. Para o autor, o eneagrama é um
instrumento que nos ajuda a adquirir uma percepção e uma ação mental triádicas,
ou seja, enquanto nossos processos mentais comuns são lineares e sequenciais,
o mundo em que vivemos é tríplice. E conclui, citando Gurdjieff, que “a triplicidade
é uma das „Leis Cósmicas Sagradas fundamentais‟ e deve ser estudada por todo
aquele que quer compreender-se a si mesmo e compreender o mundo no qual
vive.” (BENNETT, 1981, p. 19).
Segundo Gurdjieff (1993), a Lei de Três é a lei fundamental que cria todos
os fenômenos e, segundo ela, todo fenômeno surge e ocorre do encontro e da
combinação de três forças, duas delas estando em oposição como força ativa e
passiva, ou positiva e negativa. O autor refere-se a essas três forças usando os
nomes de Sagrada Afirmação, Sagrada Negação e Sagrada Conciliação. Mas
afirma que todo fenômeno só surge da interação destas forças com uma terceira
neutralizante, que permite que a oposição ou conflito seja superado ou
harmonizado para desencadear, ou gerar o fenômeno. Assim, segundo o autor,
nada pode acontecer a não ser que essas três forças estejam presentes. Sem a
neutralizadora, a ativa e a passiva ficam em inútil oposição e nada de novo pode
surgir.
20
ENEAGRAMA: PARA ALÉM DAS TIPOLOGIAS
21
A dinâmica do Eneagrama
Em nosso atual estado de consciência, somos cegos para a terceira força. Para
ver mais do que dualidade nas coisas é necessário um nível de percepção
muito mais elevado do que o estado normal. [...] Quando as três forças se
encontram e há um ato de criação, uma corrente de manifestações poderá
desenvolver-se, tecendo ou trançando o fio das ocorrências. (SPEETH, 1981, p.
35)
Gurdjieff (1993) também discorre sobre a Lei de Sete ou das Oitavas,
como sendo a lei fundamental que descreve a forma pela qual os eventos
transcorrem, e as relações entre os elementos, forças ou, como descreve o autor,
“as vibrações”, durante o desenvolvimento dos processos. Esta Lei é muitas
vezes chamada de Lei do Acidente, pois se apoia no princípio da descontinuidade
das vibrações, que no seu desenvolvimento não seguem uma direção uniforme,
pelo contrário, interagem entre si seguindo rumos que, numa visão superficial,
parecem desordenados e estabelecendo conexões com pontos aleatórios do
processo. No entanto, é exatamente esta descontinuidade que nos permite
interferir no desenvolvimento destes processos, no sentido de obtermos
resultados específicos e nos libertarmos da Lei do Acidente, que nos condiciona
ao status de escravos de um processo que, sem interferência consciente, segue
sempre a direção da entropia, tornando extremamente difícil o desenvolvimento
numa escala evolutiva. O que geralmente termina por acontecer é a perda de
energia no decorrer do processo.
Segundo Speeth (1981), A Lei de Sete especifica que, sempre que
qualquer manifestação se desenrola, seu movimento não tem forma linear, uma
vez que há uma descontinuidade ordenada em toda a progressão de coisas. A
autora coloca ainda, que existem, portanto, pontos cruciais nessa sequência,
onde energias adicionais devem ser colocadas para que não ocorram desvios que
podem acarretar a não concretização do fenômeno. “A esses pontos dá-se o
nome de choques. Quando uma energia adicional não é colocada no ponto de
choque ocorre um desvio na evolução do fenômeno que o distancia da sua
concretização.” (SPEETH, 1981, p. 35).
Segundo a autora, um dos exemplos marcantes da introdução deste
conhecimento
relaciona-se
com
a
escala
musical,
que
descreve
o
desenvolvimento das vibrações numa escala ascendente das vibrações ou notas
musicais, com seus semitons e intervalos nos exatos pontos de maior perda de
ENEAGRAMA: PARA ALÉM DAS TIPOLOGIAS
A dinâmica do Eneagrama
energia, entre MI e o FÁ, e entre o SÍ e o DÓ. A Lei das Oitavas, dessa forma,
pode ser expressa como se segue:
DÓ →RÉ→MI→FÁ→SOL→LÁ→SI→DÓ
↑
primeiro choque
↑
segundo choque
Os choques correspondem aos semitons que representam o momento, no
desenrolar do fenômeno, em que uma energia externa deve ser colocada. Se o
primeiro choque for dado, a oitava se desenvolve naturalmente sem desvios até o
si. Nesse momento um novo impulso deve ser colocado para que a oitava alcance
o próximo dó.
Gurdjieff (1993) enfatiza que qualquer evento dentro da Lei das Oitavas
vai evoluir, desde que a energia para os choques seja introduzida, de dó para ré,
de ré para mi, para fá, sol, lá, si, dó, sendo que este último dó, por sua vez tem as
mesmas características do dó inicial, só que ele vai estar situado em uma
dimensão energética ou numa qualidade acima.
A sequência de dó a dó é chamada de oitava humana ou oitava evolutiva
porque a partir de um nível de energia inicial, o processo seguiu através de um
conjunto de passos, até que atingiu um resultado que reflete o ato inicial num
outro nível ou qualidade ou energia. Os momentos de choque receberam a
energia necessária de tal forma que o processo chegou ao seu final. Esse
processo ocorre quando temos uma intenção inicial e chegamos ao final obtendo
aquilo que havíamos proposto a nós mesmos no início. Nesse caso, a qualidade
do produto final costuma ser apenas suficiente para os padrões cotidianos e
encontra-se dentro dos valores normais em termos de eficiência, bom gosto,
criatividade, produtividade, etc. dependendo do evento que analisarmos.
Mas, como assinala Speeth (1981), devemos notar que a Lei das Oitavas
afirma que o nível de energia que ocorre em um patamar é suficiente para que o
dó evolua para ré, e para que o ré evolua para mi, mas a partir desse ponto, não
existe mais energia suficiente intrínseca para que o processo siga em frente na
sua exata dimensão. Se a energia adicional não for colocada, o processo tende a
parar, o que é muito comum, ou então ele decai para um outro nível mais baixo,
22
ENEAGRAMA: PARA ALÉM DAS TIPOLOGIAS
A dinâmica do Eneagrama
onde agora a quantidade de energia disponível é suficiente para fazer o processo
seguir em frente: de fá passa para sol, sol para lá, lá para si e aqui novamente
temos uma outra parada. A partir desse ponto o processo decai de novo, e chega
a um outro patamar. Esse tipo de evolução de processos costuma ser chamado,
conforme a autora, de oitava natural, pois acontece naturalmente onde existe
pouca energia para manter o processo. É também chamada de oitava do homem
adormecido. Aqui o produto será sempre degenerado ou inferior em relação à
ideia inicial. O esquema seria assim:
dó→ré→mi
fá→sol→lá→si
dó
No entanto, ainda existe uma terceira possibilidade, na qual, no choque
entre mi e fá existe um suprimento de energia extra, que é capaz de elevar a
oitava para um nível acima em termos de qualidade. Nesse caso, como afirma a
autora, dá-se o nome a essa oitava de oitava do Trabalho ou do homem
consciente. A qualidade final do processo é notável e situa-se bastante acima do
padrão comum. O esquema seria este:
dó
fa→sol→la→si
dó→ré→mi
Speeth (1981) analisa que através dos diagramas fica claro que existem
várias possibilidades, onde, por exemplo, o choque entre mi e fá pode acontecer e
o choque entre si e dó não, o que acarreta uma gama muita grande de variações.
No entanto, o elemento básico e mais importante que atua como energia nos
momentos de choque é a atenção. Muitas vezes será a qualidade da atenção que
definirá os processos. É preciso estar atento à evolução do processo e
principalmente, estar atento nos momentos chaves, onde o choque se faz
presente. E, além disso, é fundamental ter atenção suficiente para perceber qual a
qualidade do choque. Muitas vezes a energia necessária está no próprio ambiente
23
ENEAGRAMA: PARA ALÉM DAS TIPOLOGIAS
A dinâmica do Eneagrama
à nossa volta e para percebê-la é indispensável desenvolver uma certa
sensibilidade à realidade, tentando perceber as nuances e sutilezas. Às vezes é
preciso uma energia de ordem física, às vezes, emocional ou intelectual. É
necessário treinar essa capacidade de discriminação sutil para que a energia
produzida no momento seja realmente útil.
Para Speeth (1981), ascender na oitava em ambos os choques é algo
incomum. O aumento de qualidade e a geração de um produto especial,
geralmente são possíveis apenas para pessoas bem treinadas. É muito raro, mas
é possível. Todas essas alternativas existem. E existem outras. E isso pode ser
aplicado para qualquer evento. Podemos analisar a negociação de um contrato
usando esse modelo; estabelecer a planta de um escritório ou de um prédio.
Podemos definir com antecipação se queremos um resultado aceitável, razoável
ou se queremos um resultado excepcional. E então, devemos
definir
precisamente quais são os pontos em que deveremos colocar energia para
atingirmos as metas que desejamos. Não adianta colocar energia antes ou depois
do momento preciso porque isso não modificará substancialmente o resultado.
Sabemos que a energia necessária entre os pontos mi e fá é a metade da
necessária entre os pontos si e dó. Gurdjieff (1993) diz que a diferença entre eles
parece residir no fato de que a energia para que o primeiro choque aconteça, tem
uma maior chance de ser provida pelo próprio ambiente, mas a energia para o
segundo choque deve forçosamente vir da pessoa envolvida com o processo.
"A estrutura do Universo é tal que nenhum processo, causal ou
intencional, poderá chegar ao seu termo exceto em condições ambientais
planejadas", afirmava Gurdjieff (apud BENNETT 1981, p. 35). Essa proposição
pode ser observada em todos os eventos. Isso acontece porque na vida cotidiana
as coisas sempre acontecem por si mesmas e carregam os indivíduos na direção
que o acaso determina. Condições ambientais planejadas significam ou implicam
em atenção para com os atos e suas consequências e para com os sinais que a
realidade constantemente nos dá, para que sejamos capazes de escapar da Lei
do Acidente.
Por isso, o estudo da Lei das Oitavas e do eneagrama deve ser sempre
experiencial. Implica em uma atitude de maior responsabilidade frente aos
eventos que desencadeamos. Esse estudo nos conduz a perceber os momentos
24
ENEAGRAMA: PARA ALÉM DAS TIPOLOGIAS
A dinâmica do Eneagrama
em que devemos estar mais atentos para desencadearmos os choques
corretamente, de forma a garantir que o desenrolar do fenômeno aconteça a
contento. E ainda, ajuda-nos a cumprir os objetivos que muitas vezes iniciam-se
com um forte impulso, mas que aos poucos esmorecem, ou se desviam. Por
exemplo, começamos empolgados com a ideia de trabalharmos sobre nós
mesmos e terminamos perdidos em ilusões intelectuais, arrogância, etc.. Muito
pouco acaba por sobrar do objetivo inicial até que, em momentos determinados,
percebemos o quanto nos afastamos dele e tentamos começar tudo de novo.
A necessidade pelo estudo destas Leis era sempre bastante enfatizada
por Gurdjieff, como demonstram os diversos autores estudados (SPEETH, 1981,
BENNETT, 1981, BERNIER, 2005). A compreensão e a utilização consciente de suas
premissas seriam, em si mesmas, princípios que poderiam libertar o ser dos
processos mecânicos e inconscientes.
Speeth (1981) ainda atenta para o fato de que se observarmos o desenho
do eneagrama com atenção perceberemos que o segundo choque está,
aparentemente, no local errado, pois ele deveria estar entre si e dó e no entanto,
ele aparece entre sol e lá (ponto 6).
Figura 4 -
Eneagrama indicando a Lei das Oitavas
A autora analisa que, na verdade, depois que uma oitava se iniciou, se o
primeiro choque for corretamente dado, nesse ponto (ponto 3) começará o
desenvolvimento de uma segunda oitava paralela à primeira, onde o ponto 6 da
primeira oitava (choque) corresponderia ao ponto 3 da segunda oitava, o ponto de
choque. Sempre que iniciamos um evento, outras oitavas paralelas se
desenvolvem, levando-nos, se tudo der certo, a uma espiral em direção a
25
ENEAGRAMA: PARA ALÉM DAS TIPOLOGIAS
A dinâmica do Eneagrama
objetivos cada vez mais amplos. Por exemplo, o estudo de um livro muito difícil,
mas muito importante, pode gerar uma segunda oitava paralela, por exemplo, da
formação de um grupo que se dispõe a estudá-lo. Desse estudo outras oitavas
podem se desenvolver com as propostas de trabalhos práticos que o grupo pode
executar com a finalidade de experienciar as ideias do livro. Uma outra oitava
pode surgir se o grupo decidir fazer um trabalho que leve as ideias do livro para
fora do contexto do grupo, por exemplo, através de uma peça teatral ou
escrevendo um novo livro. Uma outra oitava surgiria então envolvendo as
pessoas que entrariam em contato com essa peça ou livro, culminando em outra
oitava da formação de um novo grupo de estudos, por exemplo, e assim por
diante.
Até agora falamos apenas do percurso externo do eneagrama que vai do
ponto 1 sequencialmente até o ponto 9 (ou de dó a dó). Existe, porém um
segundo caminho que é o caminho interno cuja sequência é a interna, ou seja, a
dos números que formam a dízima periódica 142857. Esse caminho indica a
direção e o fluxo de influências dentro da própria estrutura.
O caminho externo, portanto, é fundamentado pela Lei das Oitavas,
enquanto que o interno o é, pela Lei de Três. Analisando cada ponto em
separado, pelo caminho interno, notamos que ele se liga a outros dois pontos.
Cada um desses pontos irá interagir com o ponto de análise, de forma a
complementar o evento, seja mandando ou recebendo energia. O ponto central é
o local onde as informações são recebidas, elaboradas e enviadas para o próximo
ponto, gerando uma energia adicional que dará condições para a continuação do
processo.
Para Speeth (1981), podemos tentar entender isso usando o eneagrama
dos dias da semana. Cada dia liga-se, pelo caminho interno, a outros dois pontos.
Assim, na segunda-feira (ponto 1) eu recebo as influências dos acontecimentos
da sexta-feira da semana passada (ponto 7) e que repercutirão na próxima
quarta-feira (ponto 4). Portanto, o ponto central é o Neutralizador do processo,
uma vez que é aí que se pode interferir e causar modificações, colocando ou
retirando energia para que a oitava (caminho externo) se feche.
26
ENEAGRAMA: PARA ALÉM DAS TIPOLOGIAS
Possibilidades de evolução humanas
Domingo
Sábado
Segunda
Sexta
Terça
Quinta
Figura 5 -
Quarta
Eneagrama dos dias da semana
De um outro ponto de vista: se o ponto central é o ponto onde devemos
interferir, isso significa que ele representa o momento presente. E neste instante,
temos a possibilidade de estarmos interligados com o passado e o futuro ao
mesmo tempo. Assim, dizemos que cada evento ocorre, simultaneamente, no
passado-presente-futuro.
Ampliando essa ideia nós podemos considerar a possibilidade da existência,
fora da progressão cronológica de causa e efeito, de ligações entre
acontecimentos que poderiam, por exemplo, modificar a configuração dos
acontecimentos de hoje e ser a causa de uma futura calamidade. (SPEETH,
1981, p. 42)
A autora nos convida a refletir sobre a compreensão de que o passado já
se foi e que o futuro ainda não existe. Assim sendo, o único momento que
realmente conta é o momento presente; ele existe como uma continuação do
passado e poderá evidentemente, determinar os acontecimentos futuros. Com a
ajuda do eneagrama podemos localizar quais pontos, no passado e no futuro,
devemos analisar ou interferir para realizar algo desejado, com eficiência e com o
menor dispêndio de energia possível. A energia que sobra, poderá então ser
utilizada para os pontos de choque das oitavas paralelas.
4
Possibilidades de evolução humanas
O homem que dorme não pode “realizar”.
Tendo despertado, verá que, sendo como é, não poderá
“realizar”. Terá que morrer voluntariamente.
Quando estiver morto, poderá nascer.
27
ENEAGRAMA: PARA ALÉM DAS TIPOLOGIAS
Possibilidades de evolução humanas
Todavia, o ser que acabou de nascer precisa crescer e
aprender. Quando tiver crescido e aprendido, então “realizará”.
(Gurdjieff, apud Speeth, 1981)
Gurdjieff
apud
Speeth
(1981)
formulou
um
método
de
autodesenvolvimento cujo objetivo seria libertar o indivíduo da pesada carga de
leis sob as quais é obrigado a viver em decorrência do seu lugar e função no
universo. Seu método seria, segundo a autora, uma tecnologia capaz de tapar os
vazamentos de energia, de harmonizar o corpo, de tornar a personalidade passiva
em relação à essência, de aumentar o conhecimento e o existir, de desenvolver
corpos mais evoluídos e de ministrar o primeiro e o segundo choques
conscientes. Este sistema de estudo e prática transmitido aos seus discípulos
ficou conhecido simplesmente como o “Trabalho de Gurdjieff”. (SPEETH, 1981, p.
95).2
Será abordada neste capítulo, uma explanação concisa dessa importante
contribuição do autor, que a expôs como um modelo dinâmico para todo aquele
que aspira ao desenvolvimento de uma consciência superior, baseada na filosofia
do eneagrama.
Speeth (1981), explanando sobre o entendimento de Gurdjieff sobre
essência e personalidade, relata que, para ele, cada ser humano nasce com uma
natureza essencial que não é uma tábula rasa, ou uma massa em branco, mas
que possui áreas em branco nas quais são impressas as marcas das influências
das experiências da vida. Seria uma identidade individual real, com suas próprias
tendências e predisposições, já colorida, no momento do seu nascimento, pela
configuração das estrelas e dos planetas, e uma vez que não seja sufocada,
crescerá até chegar à idade adulta da autoconsciência. Entretanto, neste
processo, segundo a autora, todos nós caímos no estupor que é o estado de
vigília comum e esquecemos nossa origem e nosso destino.
Assim, seguindo a explanação da autora, nossa personalidade seria
formada na medida em que a socialização tem início, momento em que a criança
aprende a modificar o seu comportamento para ajustar-se a padrões de conduta
culturalmente aprovados.
2
Toda apresentação detalhada e clara a respeito do conjunto de ensinamentos do método do Trabalho de Gurdjieff pode
ser encontrada em Speeth (1981).
28
ENEAGRAMA: PARA ALÉM DAS TIPOLOGIAS
Possibilidades de evolução humanas
Desse modo, como consequência inevitável do prolongado período de
dependência social humana, adquirimos conjuntos de hábitos, funções, gostos,
preferências, conceitos, preconceitos, desejos, e necessidades, todos eles
refletindo a família e o meio cultural e não necessariamente as predisposições e
as tendências inatas3.
A autora explicita então, de maneira pungente, o processo paradoxal no
qual a personalidade é construída:
Este é o paradoxo perfeito. Tudo parece normal; não houve a intenção de
cometer nenhum crime, na há cadáver, não há culpa. [...] O que perdeu?
Simplesmente, a única parte verdadeira e vital de si mesma; seu próprio
sentimento de auto-afirmação, que é sua própria capacidade de
desenvolvimento, seu sistema básico. [...] A partir do momento em que se
rende, começa, sem ter nenhum conhecimento disso, a criar e manter uma
pseudopersonalidade. Mas isto por pura conveniência – é uma personalidade
sem desejos. Esta será amada enquanto ela é desprezada; será forte onde ela
é fraca; executará todos os movimentos, não para divertir-se ou por alegria,
mas por sua sobrevivência; não simplesmente porque quer movimentar-se,
mas porque precisa obedecer. Esta necessidade não é vida – não é a vida dela
– é um mecanismo de defesa contra a morte. A partir desse momento será
despedaçada por conflitos compulsivos (inconscientes) até ficar paralisada,
cada momento, cada instante, anulando sua individualidade, sua integridade; e
durante todo esse tempo está usando o disfarce de pessoa normal e todos
esperam que se comporte como tal! (SPEETH, 1981, p. 69).
Dessa forma, a autora demonstra que aquilo que é a essência só pode
manifestar-se no mais simples comportamento instintivo e em emoções primitivas,
sendo o restante do comportamento controlado “por uma progressão acidental de
„Eus‟ que compõem a personalidade”. (idem, p. 70). Ou seja, segundo Gurdjieff
(apud SPEETH, 1981, p. 71), “regra geral, a essência de um homem é primitiva,
selvagem e infantil, ou então simplesmente estúpida”. Assim, o desenvolvimento
da essência até que ela alcance a maturidade, dependerá do trabalho que esse
indivíduo realiza em si mesmo, em sua busca pelo autodesenvolvimento.
Nas palavras da autora, Gurdjieff afirmava que o indivíduo deve encontrar
dentro de si mesmo uma atração pelo autodesenvolvimento, e a isso ele chamou
de centro magnético. Assim a pessoa recebe influências (vindas da própria vida
ou também inconscientes) e, uma vez que sua quantidade seja suficiente, afetam
3
Esse conceito da formação da personalidade a partir de Gurdjieff encontra clara correlação em Ormonde (2008), que
descreve os registros mentais que criamos como resultado de uma série de influências, informações e mensagens
recebidas ao longo de nossa vida e que definem o nosso comportamento e limitam a expressão do nosso potencial interior
e a ampliação de nossa consciência.
29
ENEAGRAMA: PARA ALÉM DAS TIPOLOGIAS
Possibilidades de evolução humanas
a orientação e produzem uma sensação de necessidade de autodesenvolvimento,
ou pelo menos, um vago descontentamento. Dessa forma, os valores e objetivos
da vida cotidiana se transformam num contexto para uma busca, um anseio por
certo tipo de leitura, uma inclinação para estar em companhia de pessoas que
também se preocupam com tais coisas. Portanto, o indivíduo poderá ser
conduzido à harmonia e à unidade interiores e a estados alterados e níveis de
existência que ascendem mais e mais às oitavas evolutivas possíveis à
humanidade.
A autora coloca que Gurdjieff irá descrever então, os caminhos da
evolução pelos quais o ser humano poderá trilhar na medida em que se oriente
para a bondade, a beleza e a verdade, e que se coloca em linha com aquilo que
emana de fontes mais conscientes do que o normal. Três desses caminhos
referem-se às abordagens religiosas tradicionais, quais sejam:
O caminho do faquir, ou o caminho da força, que não exige muito
conhecimento, e cujos discípulos aprendem por imitação a desenvolver o poder
de dominar o corpo físico, suportando exercícios ou posturas físicas tortuosas,
fortalecendo assim a sua vontade de forma inflexível.
O caminho do monge, também chamado de caminho do coração,
caracterizado pela devoção, pelo sacrifício religioso e pela fé. O autodomínio é
alcançado e as emoções são transcendidas quando os desejos mesquinhos são
subjugados pelo amor a Deus. “Não obstante, mesmo quando este estado de
existência é alcançado, o monge não passará de um „santo tolo‟ se não seguir
adiante, a fim de desenvolver as funções físicas e intelectuais correspondentes.”
(SPEETH, 1981, p. 78).
O caminho do iogue, ou o caminho do conhecimento, que baseia-se no
desenvolvimento dos poderes da mente, e pelo qual, segundo Gurdjieff (apud
SPEETH, 1981, p. 78), “para que a unidade seja alcançada, novos esforços e
novos estudos terão que ser realizados em prosseguimento.”
A autora enfatiza a necessária renúncia ao mundo, a abstenção de uma
vida familiar e a devoção de todas as energias ao desenvolvimento pessoal,
exigidas pelo princípio de cada um destes caminhos.
O quarto caminho, apontado por Gurdjieff, ao contrário dos caminhos
tradicionais, não tem instituições permanentes, mas aparece e desaparece
30
ENEAGRAMA: PARA ALÉM DAS TIPOLOGIAS
Possibilidades de evolução humanas
conforme a hora, o lugar e as pessoas. Seria, segundo Speeth (1981), o caminho
para aqueles que querem permanecer no mundo, mas não pertencer a ele, ou
seja, ao seguir esta forma de aproximação da autorrealização, o indivíduo
“renuncia à renúncia” (idem, p. 79)4.
Speeth (1998) enfatiza que o trabalho de Gurdjieff, assim como vários
outros existentes, segue as tradições do quarto caminho, e lembra que não há
que se nomeá-lo, uma vez que o que interessa é o objetivo final a ser alcançado,
independentemente da orientação religiosa, seita, tradição ou método. Dessa
forma, segundo a autora,
cada um dos quatro caminhos poderá levar o aspirante – tirando-o das
complexidades samsáricas e dos sofrimentos do estado de vigília comum (o
pão de cada dia das massas de gente, que formam aquilo que poderia ser
chamado de círculo exterior de humanidade) para o reino dos seres
aperfeiçoados [...]. Embora, pela própria natureza do mundo vulgar, cada um
dos caminhos tenha que transmitir os ensinamentos de uma forma deturpada
(pois é assim que isso pode ser ouvido no mundo de mentiras e confusões), há
um entendimento perfeito entre aqueles que conseguiram chegar, qualquer que
possa ter sido o seu caminho. A entrada no círculo interior significa um
desenvolvimento adicional na comunhão com seres iguais, e um fim para a
incerteza e a discórdia. (SPEETH, 1981, pp. 79 e 80).
De acordo com Speeth (1981), Gurdjieff baseia seu sistema na distinção
de três níveis distintos de operação – três centros, ou três cérebros – como
pavimentos em um edifício. O centro intelectual (no pavimento superior), o centro
emocional (no pavimento do meio) e o andar inferior, local de controle de três
funções, que trabalham independentemente – o centro motor, o centro instintivo e
o centro sexual. Segundo a autora,
Em adição a estes cinco centros, que estão em atividade em toda pessoa
normal, ainda há mais dois centros que, embora estejam perfeitamente
formados e em constante funcionamento, não tem ligação com os outros a
menos que seja feita uma conexão, intencionalmente e com habilidade. Estes
são o centro intelectual superior (cuja linguagem é símbolo), e o centro
emocional superior (cuja linguagem é mito), no andar do meio. (SPEETH, 1981,
p. 50)
De forma geral, para Gurdjieff os cinco centros inferiores funcionam de
maneira ineficiente e desarmônica, e os centros superiores não são utilizados.
Assim, um indivíduo, no seu estado normal de percepção, não dá atenção a si
4
Ormonde (1998, p. 198) também compartilha dessa possibilidade, ao assegurar que a mudança de atitude no sentido de
focar a nossa vida a estar no processo da consciência e realização verdadeira como seres humanos, “não implica em
realizarmos mudanças externas, nem em renunciar a nenhuma coisa material, mas sim vivenciar as experiências a partir
de um novo referencial.”
31
ENEAGRAMA: PARA ALÉM DAS TIPOLOGIAS
Possibilidades de evolução humanas
mesmo, e a consciência de suas funções motora, emocional e intelectual é muito
confusa e inconsistente. Gurdjieff estabelece, então, distinções entre quatro
estados de consciência possíveis aos seres humanos; sono, vigília comum,
autoconsciência e consciência objetiva. Mas afirma que, embora todos esses
estados possam ser alcançados por todos os indivíduos, eles diferem
amplamente em duração e em probabilidade de ocorrência.
Para Gurdjieff estamos todos inconscientes, adormecidos e funcionamos
automaticamente como máquinas. O objetivo seria, assim, acordar e tomar
consciência
do
tríplice
trabalho
dos
centros.
Através
da
consciência,
perceberíamos então que somos federações de múltiplos Eus, que afinal somos
máquinas que alimentam e são alimentadas por vários tipos de agregados
psíquicos, e que o trabalho a partir daí, seria, pelo próprio esforço, distinguir essas
influências compulsivas e se libertar delas. A autora sublinha a ênfase de Gurdjieff
em relação ao grande esforço exigido para a aquisição do verdadeiro
conhecimento, uma vez que nem todos querem ter esse trabalho. E pondera que
“até mesmo nos tempos atuais, quando o dharma está ao alcance de todos
impresso em brochura, e quando aquilo que antes estava oculto agora é
amplamente divulgado, o segredo protege a si mesmo.” (SPEETH, 1981, p. 100).
Partindo desses pressupostos, a doutrina de Gurdjieff se realiza em três
“linhas de trabalho”, apresentadas pela autora. A primeira linha refere-se ao
trabalho “em nós por nós”, que se resume em diversos exercícios (denominados
de autorrecordação e auto-observação) com o objetivo do conhecimento de nós
mesmos e da ampliação da nossa percepção e atenção.
A segunda linha é o trabalho “com os outros e pelos outros”, na qual são
providenciadas condições especiais (trabalho físico, artes e projetos mecânicos
empreendidos em grupo) para apoiar o indivíduo no esforço que faz para perceber
seus modos de relacionamento com os outros e oportunidades para praticar
novas formas de coexistência.
A terceira linha é o trabalho a serviço das ideias do Trabalho e pelo
próprio Trabalho em si, na qual são consideradas as necessidades e os requisitos
da organização, do grupo de pessoas que se reuniram para trabalhar em si
mesmas. O impulso principal do esforço não é o progresso pessoal, mas um
serviço e uma ação desinteressada.
32
ENEAGRAMA: PARA ALÉM DAS TIPOLOGIAS
Astrologia e eneagrama
Em todas as linhas de trabalho propostas por Gurdjieff os participantes
partilham do aprendizado composto de movimentos de ginásticas, exercícios de
respiração, danças, meditações, baseados na filosofia, leis, teoria e prática do
eneagrama.
5
Astrologia e eneagrama
A massa da Terra é uma fração quase negligenciável da massa total dos
planetas do sistema solar e esses planetas exercem uma influência muito
grande sobre a vida na Terra e sobre todos os organismos vivos que nela se
encontram. Uma influência muito maior do que imagina a nossa ciência.
(Gurdjieff, 1993)
Segundo Vollmar (1998), para Gurdjieff a astrologia era muito importante
e relevante, no que se refere ao “ser interno” no indivíduo e nem tanto para a
personalidade que se desenvolvia. O autor, inspirando-se no quarto caminho e
parcialmente no modelo astroeneagrâmico da astróloga norteamericana Patrizia
Norelli-Bachelet, apresenta uma exposição muito compacta e equilibrada ao situar
os planetas de forma heliocêntrica, segundo as sequências astronômicas de suas
órbitas ao redor e segundo sua proximidade com o sol.
O autor traça dois grupos de planetas, acoplando psicologia humana e
psique planetária.
A primeira sequência é:
1 – Mercúrio (princípio da materialização)
2 – Vênus (princípio integrador)
3 – Lua e Terra (princípio da atividade)
4 – Marte – (princípio criativo)
Em outro grupo:
33
ENEAGRAMA: PARA ALÉM DAS TIPOLOGIAS
Astrologia e eneagrama
5 – Júpiter (princípio de síntese)
6 – Saturno (princípio de ordenamento)
7 – Urano (princípio liberador)
8 – Netuno (princípio estruturador)
9 – Plutão (princípio unificador)
Aos três pontos de choque do eneagrama Vollmar (1998) atribui
Terra/Lua, Saturno e Plutão. Até Saturno falamos dos planetas pessoais (com
órbitas mais rápidas) e a partir dele (ponto 7) os transpessoais (com períodos de
órbitas maiores). Entre os pontos 4 e 5 encontraríamos o cinturão de asteroides,
uma região difícil e indefinida, reflexo de nossos estados anímicos negativos que
nos induzem ao medo, à dúvida e à incerteza.
Plutão
Netuno
Mercúrio
Urano
Vênus
Saturno
Terra/Lua
Júpiter
Figura 6 -
Marte
Os planetas no eneagrama
De acordo com o autor, o ponto 2 do eneagrama está conectado com o
ponto 8, Netuno, representando sua oitava, e também com o ponto 4, Marte.
“Vênus e Marte se pertencem um ao outro, mitologicamente, como amantes.”
(idem, p. 194). Como ocorre com Mercúrio, Vênus está situado relativamente
perto do sol, e está arquetipicamente relacionado com a Lua, e ambos simbolizam
o lado emocional dos seres humanos. Vênus encontra-se no ponto 2, o lugar de
transição ao plano lunar.
Como afirma o autor, no ponto 3 – o primeiro ponto de choque – é por
onde entra o sentimento com uma nova qualidade. Estando o sentimento
34
ENEAGRAMA: PARA ALÉM DAS TIPOLOGIAS
Astrologia e eneagrama
inseparavelmente conectado com a Lua de acordo com a astrologia, tem
influência sobre nossos estados anímicos.
Vollmar (1998) sublinha que para Gurdjieff, a Terra e a Lua são uma
unidade indivisível, sendo que para ele, a despeito da grande resistência a essa
ideia, encontrada em seus grupos, a Lua se nutre das emoções humanas. O autor
descreve delongadamente sobre o mito no qual Gurdjieff baseava essa afirmação,
que é transcrito seguir:
Em Cuentos de Belcebú, Gurdjieff descreve como, em tempos muito antigos,
um grande planeta errante, chamado Kondoor, chocou-se com a Terra. Isto
ocorreu como resultado dos cálculos errados de um certo ser sagrado. Kondoor
caiu sobre uma zona desabitada da Terra com tal força que se desprenderam
dois grandes fragmentos, que foram colocar-se em uma órbita geocêntrica. Um
destes fragmentos foi a Lua. Gurdjieff chamou ao outro de Anulios.
Agora necessitava com urgência um bom assessoramento, pois a Lua, que se
originou como resultado de semelhante catástrofe, causou um caos na
harmonia do sistema solar. De modo que o engenheiro cósmico e arcanjo
Sakaki recebeu a tarefa de restabelecer a ordem correta tão depressa quanto
possível. O golpe de mestre de Sakaki foi estabilizar a Lua por meio da
vibração sagrada, a que Gurdjieff chamou “Askokin”. Esta se emite com a
morte dos organismos vivos. Portanto, Sakaki teve que criar os diversos
organismos vivos sobre a Terra, de modo que as vibrações emitidas no
momento de sua morte puderam continuar estabilizando a Lua. A humanidade
evoluiu finalmente, a partir destes organismos viventes.
Mas Sakaki estava preocupado com o fato de que, à medida que se
desenvolvia sua consciência, os seres humanos combateriam coletivamente
esta exploração por parte da Lua. Se chegassem a se dar conta de que todos
os seus sofrimentos e esforços serviam unicamente para manter estável a Lua,
as coisas se tornariam difíceis. [...]. Ele teria que impedir isto a qualquer custo.
Em consequência, implantou um órgão na raça humana, que Gurdjieff chama
“Kundabuffer”, reminiscência da palavra hindu kundalini. Este órgão
Kundabuffer impede que as pessoas tenham uma clara visão de sua situação.
E assim foi como começou o sono da humanidade.
De modo que os seres humanos serviam à Lua de forma cega e inconsciente.
A Lua, como um bebê birrento, chupava a vida da Terra, ainda que sem malícia
ou agressividade, mas com a necessidade cósmica de evoluir. Uma vez que a
Lua por fim tornou-se mais estável, Sakaki retirou de imediato o órgão
Kundabuffer. Mas não surtiu muito efeito: durante esse tempo as pessoas
tinham se tornado tão dependentes da Lua como a Lua das pessoas. Com ou
sem o Kundabuffer, os padrões do comportamento humano permaneceram
iguais. Para tornar-se conscientes novamente, é necessário o “trabalho”; sem
este, continuamos vivendo debaixo de uma dependência escravista da Lua.
(VOLLMAR, 1998, pp. 195 e 196).
O autor enfatiza o efeito de um contrapeso, como um pêndulo, que a Lua
exerce, sem o qual a Terra não permaneceria em sua órbita, mas se perderia nas
profundezas do cosmos. Ressalta ainda a influência da Lua não só nas marés, ou
nas águas do oceano, mas,
35
ENEAGRAMA: PARA ALÉM DAS TIPOLOGIAS
Astrologia e eneagrama
todos os fluídos se veem afetados por ela. O ser humano, que consiste de 72%
de água está também sujeito à atração lunar, o que impede que nos
espalhemos sobre a superfície da Terra como um pudim. Pelo efeito da
influência lunar somos capazes de superar a atração da gravidade até o ponto
de permanecer eretos e caminhar. (VOLLMAR, 1998, p. 197).
Terra e Lua estão juntas no ponto 3 do eneagrama, segundo o autor,
precisamente pelo fato de estarem intimamente conectadas, como mãe e filho, e
este ponto de choque é provocado pela Lua em virtude de estar estreitamente
conectada com os movimentos automáticos e inconscientes do ser humano.
Referindo-se à Lua como o mais infantil dos corpos planetários, e
observando-a
sob
esta
luz
cósmica,
Vollmar
(1998)
afirma
sentir-se
completamente justificado ao assemelhá-la ao nosso inconsciente. Assim,
sublinha a força de atração contínua comparável à atração da gravidade, exercida
pelo inconsciente, nas palavras de Emma Jung, citada por ele.
Na próxima etapa do processo, no ponto 4, seguindo o pensamento de
Vollmar (1998), encontra-se Marte, que mitologicamente é, entre outras coisas,
um planeta agressivo e de sentimentos negativos, que é o que temos que
enfrentar. Segundo o autor, as variações no brilho de Marte – decorrentes das
grandes variações de sua distância da Terra, simbolizam, no ponto 4, a batalha
entre a luz e a escuridão na psique humana. A complexidade das emoções
humanas corresponderia, adicionalmente, ao ritmo de seus movimentos e
visibilidade.
Entre o ponto 4 e 5 do eneagrama, Vollmar (1998) atribui o que chama de
cinturão de asteroides. Ele afirma que após a descoberta do primeiro dos
asteroides, chamado Ceres, foram conhecidos milhares de asteroides, todos
girando em uma órbita situada entre Marte e Júpiter. Citando Norelli-Bachelet, o
autor explana:
O cinturão de asteroides, a órbita 4/5, é o ponto de inflexão decisivo onde, por
assim dizer, se aplicam os freios com o objetivo de rejeitar vigorosamente a
força que vibra deste centro focal, e devolvê-la, com a ajuda do movimento que
se deriva do plano da matéria e das energias sutis, até sua origem. (NorelliBachelet, apud VOLLMAR, 1998, p.202)
O autor acentua, ainda parafraseando Norelli-Bachelet, que a conexão
entre a matéria e o espírito é possibilitada pelo cinturão de asteroides, sendo que
este é o único que pode salvar a Terra de sua declinação e desintegração, tendo
em vista que, sem ele, o sistema solar continuaria se expandindo, e as sutis
36
ENEAGRAMA: PARA ALÉM DAS TIPOLOGIAS
Astrologia e eneagrama
energias do espírito (os planetas transaturnais) se afastariam cada vez mais da
Terra.
No ponto 5 do eneagrama encontramos Júpiter, origem e fonte de luz.
Estamos nos caminho correto, que se apresenta iluminado pelo brilho de Júpiter.
Ao ponto 6 é atribuído Saturno, o último planeta que pode ser observado
a olho nu. Vollmar (1998) assinala que Saturno, em seu aspecto de Cronos é o
deus do tempo, responsável, por conseguinte, por tudo que é evolução e
desenvolvimento.
Saturno, em termos psicológicos, segundo o autor, é uma entidade que
possibilita a estrutura e a ordem, demandando ação responsável. A energia
intelectual de Saturno ingressaria no sistema do eneagrama como uma qualidade
nova e consciente pelo segundo ponto de choque, parecido com o sentimento que
acompanha a Lua no primeiro ponto de choque. Dessa forma, “com Saturno no
ponto 6, cruzamos o umbral para as influências e vibrações mais finas e sutis dos
planetas transaturnais. É aqui que começa o último terço do eneagrama.”
(VOLLMAR, 1998, p. 204).
Conforme o autor, os planetas Urano, Netuno e Plutão começam uma
nova oitava no sistema, que representa um novo nível no que diz respeito às
qualidades previamente encontradas em Mercúrio, Vênus e Marte. Vollmar (1998)
menciona então um interessante fator adicional:
Urano foi descoberto em 1781, aos 25⁰ da constelação de gêmeos. Estes
graus nos mostram um 7 numerológico (2+5=7). Urano se encontra na sétima
órbita a partir do sol, no ponto 7 do eneagrama. Netuno foi descoberto em
1846, sobre os 26⁰ no signo de Aquário, o que nos dá um 8 numerológico
(2+6=8). Netuno se encontra na oitava órbita heliocêntrica e está atribuído ao
ponto 8 do eneagrama. Plutão foi descoberto em 1930, aos 18⁰ do signo de
Câncer. Isto nos dá um 9 (1+8=9). Plutão se encontra na nona órbita
heliocêntrica e pertence ao nono ponto do Eneagrama. É esta uma
surpreendente coincidência? Mas como disse Einstein: “Deus não joga os
dados.” (VOLLMAR, 1998, p. 205).
No ponto 7 do eneagrama encontra-se Urano, no culminar da primeira
oitava começada com Mercúrio, e findando o primeiro ciclo da criação. Como
expõe o autor, o indivíduo se sente agora livre para continuar perseguindo sua
própria tarefa ou descansar tranquilo com o que alcançou até agora. Neste ponto,
o lugar de Urano, temos que decidir se vamos continuar. Este planeta, conforme
define o autor, é capaz de dissolver o ego. Dessa forma, a partir do ponto 7 em
37
ENEAGRAMA: PARA ALÉM DAS TIPOLOGIAS
Astrologia e eneagrama
diante, fazer a coisa certa é servir aos demais. Norelli-Bachelet, de acordo com
Vollmar (1998), considera Urano como o “poder de transformar o espírito”, o que
equivale a dizer “sobrepor-se ao ego”. Mas como Urano está no princípio do
processo de desenvolvimento, também possui uma sombra poderosa que pode
nos fazer perseguir nossas metas de forma inescrupulosa, egocêntrica, impulsiva
e agressiva. Urano como o planeta da liberdade alcançada aqui no ponto 7 do
eneagrama, levanta a pergunta acerca de como deverá ser utilizada realmente
esta liberdade.
Netuno e Plutão encerram os princípios estruturador e unificador,
respectivamente nos pontos 8 e 9. Vollmar (1998) assinala o poder e a força
unificadora de Plutão, sem a qual nenhum processo chega a completar-se. Plutão
conecta todos os aspectos vitais entre si, ao abarcar a totalidade da vida, uma vez
que rege tanto a criação quanto a destruição.
Plutão/Hades cria conexões para outros mundos e dimensões inimagináveis,
sua própria órbita expressa isto, ao atravessar as profundidades remotas do
cosmos, extremamente distante do sol. Plutão situado no ponto 9 do
eneagrama monitora a transição para uma nova dimensão ou nível de
processo. (VOLLMAR, 1998, p. 208)
O autor chama-nos a atenção para o fato de que os três planetas
transaturnais da terceira tríade estão conectados astrologicamente com uma
energia específica. A Urano corresponde a eletricidade, a Netuno o combustível
fóssil (petróleo) e a Plutão a energia atômica (Plutônio); sendo que, das três, está
claro que a energia atômica é a mais poderosa. Acredita-se, segundo o autor, que
a energia plutônica com sua emissão radiativa teria um papel de suma
importância na transformação da humanidade.
O modelo que situa o sol como ponto central da figura do eneagrama,
proposto por Vollmar (1998), representaria, dessa forma, nosso EU integral,
unificado e permanente, seria o EU SOLAR. Este modelo nos ajuda a situarmonos estrategicamente e a vermo-nos em perspectiva, não para diferenciarmo-nos,
já que estão todas presentes em nós, mas para ver os EUS em conjunto e sair da
fixação neurótica em que nos encontramos. A solarização é, pois, um salto
progressivo na própria evolução que nos permite escapar das forças mecânicas
do inconsciente trazidas à nossa vida cotidiana.
38
ENEAGRAMA: PARA ALÉM DAS TIPOLOGIAS
Astrologia e eneagrama
Conclusão
A geometria sagrada e as sagradas proporções que me
constituem falam aos que podem ouvir e mostram aos que podem
ver. Mesmo que você não me compreenda hoje, inteiramente, é
possível que sinta – não em sua mente, mas em seu coração – e
então poderá intuir algo secreto em que poderá confiar e ter fé...
(Bernier, 2005)
Não tenho a pretensiosa intenção de me fazer entender tão claramente
com as palavras aqui colocadas, mesmo que tenha sido essa a vontade de quem
as leu até aqui. Acontece que tenho ciência de estar abordando um assunto, ao
mesmo tempo instigante e complexo. Tive todo o tempo a certeza de que aquela
figura continha um conhecimento infinitamente maior do que qualquer palavra que
tentasse defini-lo. Foi necessário, portanto, um certo esforço para tentar
demonstrar as percepções, insigths e compreensões adquiridas no processo de
estudo do eneagrama, de uma forma minimamente inteligível, e ao mesmo tempo
trazer igualmente a mesma sensação que eu tive, da grandeza, da importância e
da magnitude cósmica do eneagrama. Sinto, se não consegui, mas, como disse,
sabendo de sua complexidade e reconhecendo a minha limitação teórica, não
tinha essa pretensão.
Blake (prefaciando BENNETT, 1981, p. 11) define muito bem essa
dificuldade: “estudar o eneagrama é como tentar interpretar o vácuo. A cada
momento, o que está realmente ali se desfaz em nada”. Como citei no decurso
deste trabalho, o próprio Bennett estudou o eneagrama durante 50 anos antes de
se arriscar a publicar algo sobre ele. Reconheço e honro, portanto, a minha
insignificância.
Reconhecer a nossa insignificância, aliás, talvez seja um passo
importante para compreender a estrutura e as dinâmicas universais do
eneagrama. Digo
isso
em se tratando de deixar a
nossa
tendência
antropocêntrica, deixar de nos ver e perceber como centro do universo, como a
única forma de vida existente no cosmos. Entendermo-nos como uma ínfima parte
de uma totalidade, quem sabe, inimaginável para todos nós. Pois foi exatamente
esse o maior entendimento que tive, no decorrer deste estudo.
39
ENEAGRAMA: PARA ALÉM DAS TIPOLOGIAS
Astrologia e eneagrama
O entendimento de que as leis e princípios presentes no macrocosmos
são análogas às do microcosmos, e que vivemos em uma dimensão material
sujeita ao peso dessas leis, as quais só podem ser compreendidas elevando
nosso nível de consciência e nos conectando quântica e transpessoalmente com
elas.
O diagnóstico dos tipos de personalidade nos ajuda a conhecer muito
acerca de nossa peculiar forma de ser e de movermos no mundo, assim como
nos ajuda a conhecer aos demais: o que e como pensam, o modo como veem o
mundo, que coisas os motivam e o que esperam das outras pessoas. Mas, para
aqueles que buscam ir além da aparente utilidade do descobrimento dos tipos de
personalidade, que querem ver muito mais do que a aparência, não existem
fórmulas fáceis.
Talvez tenha sido por esse motivo que o eneagrama permaneceu oculto
durante milênios: por tratar-se de uma ferramenta para descobrir e experimentar o
cosmos. E talvez seja por isso que o conhecimento acerca dele não seja
completamente desvelado. Precisamente porque, para tanto, há que se evoluir, há
que se autoconhecer, há que se perceber enquanto humanidade, enquanto parte
de uma totalidade, de uma consciência única.
Pela proposta do eneagrama de Gurdjieef, a triangulação (eixo intelectoemoção-instintos), reflete o nosso “nível de ser”, e, uma vez superado ou
transcendido por meio da auto-observação e a autorrecordação nos leva a essa
Consciência
Unitiva,
situando-nos
em
um
quarto
nível
que
integra
harmoniosamente os outros níveis ou centros psíquicos. Poderíamos chamar a
essa integração harmônica de Solarização, já que põe em ordem os planetas
psíquicos internos, conforme sugere Vollmar (1998). Ambos os temas, eneagrama
e astrologia, devem, portanto, ser cuidadosamente investigados como uma forma
de edificar uma nova personalidade, em consonância com a essência, sempre
com o fim de alinhar e harmonizar a fragmentada estrutura do Eu.
Espero que essa proposta, tão fascinante, sirva de inspiração para todos
aqueles que queiram enveredar pelos caminhos e descobertas dessa nova
psicologia, inspirada na física quântica.
40
ENEAGRAMA: PARA ALÉM DAS TIPOLOGIAS
Astrologia e eneagrama
Referências
BENNET, J. G. (1981). O Eneagrama. São Paulo: Pensamento.
BERNIER, N. (2005). Eneagrama - símbolo de tudo e todas as coisas. Brasília:
Gilgamesh.
GURDJIEFF, G. I. (1993). Gurdjieff fala a seus alunos. São Paulo: Pensamento.
ORMONDE, L. F. (2008). O ser e o humano: a conexão necessária. Aparecida - SP:
Ideias & Letras.
MAITRI, S. (2000). A dimensão espiritual do eneagrama. São Paulo: Cultrix.
PALMER, H. (2009). O Eneagrama: compreendendo-se a si mesmo e aos outros
em sua vida. São Paulo: Paulinas.
RISO, D. R., & HUDSON, R. (2011). A sabedoria do Eneagrama. São Paulo: Cultrix.
s/d. (2011). O quarto caminho. http://coroa.tripod.com/eneagrama/eneatipos.htm/
acesso em 26/11/2011.
SPEETH, K. R. (1981). O trabalho de Gurdjieff. São Paulo: Cultrix.
VOLLMAR, K. (1998). El secreto del Eneagrama. Madrid: EDAF.
WEIL, P., LELOUP, J.-Y., & CREMA, R. (2011). Normose: a patologia da normalidade.
Petrópolis, RJ: Vozes.
41