Conselho Editorial
Transcrição
Conselho Editorial
Mahfoud, M. e Massimi, M. (2003) Editorial: Psicologia, memória, história: a interdisciplinaridade. Memorandum, 5, 1-4. Retirado em / / , do World Wide Web: http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/editorial05po.htm 1 Editorial Memorandum: memória e história em psicologia Número 5 Psicologia, memória, história: a interdisciplinaridade Memorandum número 5 responde à intenção interdisciplinar da revista: propostas diversificadas, densas contribuições para a reflexão acerca das relações entre memória, história e psicologia, inclusive proporcionando instrumentos metodológicos diferentes para abordar esses três domínios. Quanto à posição do homem na história e à identidade do ser humano enquanto ser histórico, é relevante a contribuição da filosofia da história. Nesta perspectiva, o artigo de Fornari "Memoria, deseo e historia: Acontecimiento del yo y alternativa de la libertad, desde San Agustín" destaca a contribuição de Agostinho e a releitura que deste propõe Hannah Arendt - no que diz respeito à historicidade do homem. Ao passo de que Botturi (“Caduta e storia: note sul peccato originale in G. B. Vico") repropõe a concepção do filósofo italiano do século XVIII Giambattista Vico acerca do sentido da história e, nela, do papel da liberdade humana. Outra modalidade de conceber a relação entre sujeito humano e história é a proposta pela psicologia histórica: Waeny (“História e psicologia em Henri Berr") discute, nesta perspectiva, a posição de um dos fundadores desta área, Henri Berr, o qual contrapondose à filosofia da história, introduz a psicologia na concepção da história. Já a história das idéias psicológicas proporciona outras possibilidades de conceber as relações entre a história, a filosofia, e o conhecimento da subjetividade em diferentes horizontes culturais. Nesta vertente, o artigo de Amatuzzi, ao apresentar uma "Releitura de textos de Tomás de Aquino visando a construção de um pensamento psicológico", demonstra que tais textos proporcionam caminhos para enfrentar questões relevantes do ponto de vista da psicologia contemporânea (tais como a concepção do homem como ser aberto à busca de sentido e marcado pela inquietação), além de utilizarem, de modo original e pertinente, de formas da linguagem comum para clarear o entendimento do psiquismo humano. A contribuição de Silva ("Medicina do corpo e da alma: os males corporais e o exercício da palavra em escritos da antiga Companhia de Jesus") constituise num trabalho de teor histórico acerca das concepções e das relações entre medicina do corpo, medicina da alma e exercício da palavra, em escritos da antiga Companhia de Jesus, apontando que conceitos derivados destes domínios fundamentam procedimentos centrais da ação missionária, inclusive no Brasil. O artigo de Massimi, ao enfocar, nesse mesmo âmbito, as "Representações acerca dos índios brasileiros em documentos jesuítas do século XVI", evidencia a importância, para a construção dessas, da visão antropológica própria da filosofia aristotélico-tomista da época. Deste modo, o trabalho, juntamente à contribuição de Amatuzzi, evidencia a importância do pensamento de Tomás de Aquino para a história das idéias psicológicas. Memorandum 5 também revisita temas referentes ao início da história da psicologia científica, no mundo e no Brasil. Discute a contribuição de dois pioneiros: Gustav Fechner, um dos fundadores da psicofísica à luz da problemática do sujeito do conhecimento introduzida pela filosofia moderna (Ferreira: "O lugar da psicofísica de Gustav Fechner na história da psicologia"); e a teoria do "discriminacionismo afetivo" de Radecki, o qual tanto contribuiu para o enraizamento da psicologia científica no Brasil com seu trabalho no Laboratório de Psicologia da Colônia de Psicopatas em Engenho de Dentro, no Rio de Janeiro dos anos 20 do século passado (Centofanti: "O discriminacionismo afetivo de Radecki"). Ainda no domínio da história da psicologia científica, desta vez contemporânea, o trabalho de Garcia ("The Psychological Literature in Konrad Lorenz's Work:A Contribution to the History of Ethology and Psychology") ocupa-se da presença relevante da literatura psicológica na abordagem etológica, através de uma análise quantitativa da bibliografia de obras de Konrad Lorenz. Memorandum, out/2003. Belo Horizonte: UFMG; Ribeirão Preto: USP http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/editorial05po.htm Mahfoud, M. e Massimi, M. (2003) Editorial: Psicologia, memória, história: a interdisciplinaridade. Memorandum, 5, 1-4. Retirado em / / , do World Wide Web: http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/editorial05po.htm 2 Completa o percurso deste número 5 de Memorandum, uma contribuição advinda da filosofia: a partir das análises de Husserl acerca do símbolo e das diferenças deste com relação a outras vivências psicológicas (percepção, lembrança, fantasia), Ales Bello ("Il simbolo nell'esperienza sacrale-religiosa :un'analisi fenomenologica") propõe uma análise fenomenológica do símbolo em suas relações com a experiência religiosa. Temos a satisfação de comunicar que a revista Memorandum já está indexada em PsycINFO da American Psychological Association. Agradecemos a todos os colaboradores pelo empenho, seriedade e rigor no trabalho, que possibilitaram alcançar esse resultado. Miguel Mahfoud Marina Massimi Editores Outubro de 2003 Equipe Editores Miguel Mahfoud Universidade Federal de Minas Brasil Marina Massimi Universidade de São Paulo Brasil Consultores externos Ad Hoc da Memorandum 5 Carlos Ziller Camenietzki Museu de Astronomia e Ciências Afins Brasil José Paulo Giovanetti Universidade Federal de Minas Gerais Brasil Maria Emilia Yamamoto Universidade Federal do Rio Grande do Norte Brasil Marília Ancona Lopez Pontifícia Universidade Católica de São Paulo e Universidade Paulista Brasil Conselho Editorial Adalgisa Arantes Campos Universidade Federal de Minas Gerais Brasil Alcir Pécora Universidade de Campinas Brasil Angela Ales Bello Pontificia Universitas Lateranensis Italia Aníbal Fornari Universidad Católica de Santa Fé Universidade Católica de La Plata Argentina Anna Unali Università La Sapienza Italia Antonella Romano Memorandum, out/2003. Belo Horizonte: UFMG; Ribeirão Preto: USP http://www.fafich.ufmg.br/ ~memorandum/artigos05/ed itorial05po.htm Mahfoud, M. e Massimi, M. (2003) Editorial: Psicologia, memória, história: a interdisciplinaridade. Memorandum, 5, 1-4. Retirado em / / , do World Wide Web: http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/editorial05po.htm 3 École des Hautes Études en Sciences Sociales France Belmira Bueno Universidade de São Paulo Brasil Caio Boshi Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais Brasil Celso Sá Universidade Estadual do Rio de Janeiro Brasil Danilo Zardin Università Cattolica Sacro Cuore Italia Ecléa Bosi Universidade de São Paulo Brasil Francesco Botturi Università Cattolica Sacro Cuore Italia Franco Buzzi Università Cattolica del Sacro Cuore Italia Gilberto Safra Universidade de São Paulo Pontifícia Universidade Católica de São Paulo Brasil Helio Carpintero Universidad Complutense España Hugo Klappenbach Universidad San Luis Argentina Isaías Pessotti Universidade de São Paulo Brasil Janice Theodoro da Silva Universidade de São Paulo Brasil José Carlos Sebe B. Meihy Universidade de São Paulo Brasil Josef Brožek Lehig University United States of America Luís Carlos Villalta Universidade Federal de Ouro Preto Brasil Luiz Jean Lauand Universidade de São Paulo Brasil Maria Armezzani Università degli Studi di Padova Italia Maria do Carmo Guedes Pontifícia Universidade Católica de São Paulo Brasil Maria Efigênia Lage de Resende Universidade Federal de Minas Gerais Brasil Maria Fernanda Diniz Teixeira Enes Memorandum, out/2003. Belo Horizonte: UFMG; Ribeirão Preto: USP http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/editorial05po.htm Mahfoud, M. e Massimi, M. (2003) Editorial: Psicologia, memória, história: a interdisciplinaridade. Memorandum, 5, 1-4. Retirado em / / , do World Wide Web: http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/editorial05po.htm 4 Universidade Nova de Lisboa Portugal Martine Ruchat Université de Genève Suiss Michel Marie Le Ven Universidade Federal de Minas Gerais Brasil Monique Augras Universidade Católica do Rio de Janeiro Brasil Olga Rofrigues de Moraes von Simson Universidade de Campinas Brasil Pedro Morande Universidad Católica de Chile Chile Pierre-Antoine Fabre École des Hautes Études en Sciences Sociales France Regina Helena de Freitas Campos Universidade Federal de Minas Gerais Brasil Sadi Marhaba Università degli Studi di Padova Italia William Gomes Universidade Federal do Rio Grande do Sul Brasil Conselho Consultivo Adone Agnolin Universidade de São Paulo Brasil Ana Maria Jacó Vilela Universidade Estadual do Rio de Janeiro Brasil André Cavazotti Universidade Federal de Minas Gerais Brasil Arno Engelmann Universidade de São Paulo Brasil Bernadette Majorana Università degli Studi di Bergamo Italia César Ades Universidade de São Paulo Brasil Davide Bigalli Università degli Studi di Milano Italia Deise Mancebo Universidade Estadual do Rio de Janeiro Brasil Edoardo Bressan Università degli Studi di Milano Itália Eugénio dos Santos Universidade do Porto Memorandum, out/2003. Belo Horizonte: UFMG; Ribeirão Preto: USP http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/editorial05po.htm Mahfoud, M. e Massimi, M. (2003) Editorial: Psicologia, memória, história: a interdisciplinaridade. Memorandum, 5, 1-4. Retirado em / / , do World Wide Web: http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/editorial05po.htm Portugal Giovanna Zanlonghi Università Cattolica del Sacro Cuore Italia José Francisco Miguel Henriques Bairrão Universidade de São Paulo Brasil Marcos Vieira da Silva Universidade Federal de São João del Rei Brasil Maria Luisa Sandoval Schmidt Universidade de São Paulo Brasil Marisa Todeschan D. S. Baptista Universidade de São Marcos Brasil Mitsuko Aparecida Makino Antunes Pontifícia Universidade Católica de São Paulo Brasil Nádia Rocha Universidade Federal da Bahia Brasil Rachel Nunes da Cunha Universidade de Brasília Brasil Raul Albino Pacheco Filho Pontifícia Universidade Católica de São Paulo Brasil Vanessa Almeida Barros Universidade Federal de Minas Gerais Brasil Design e Produção Renata Amaral Araújo secretaria Paulo Roberto de Andrada Pacheco webmaster Apoio * LAPS - Laboratório de Análise de Processos em Subjetividade. Programa de Pós Graduação em Psicologia - UFMG * Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas FaFiCH - UFMG * Núcleo de Epistemologia e História das Ciências Miguel Rolando Covian USP/Ribeirão Preto * Programa de Pós-Graduação em Psicologia da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras - USP/Ribeirão Preto * Biblioteca Prof. Antônio Luiz Paixão - FaFiCH - UFMG A revista Memorandum é uma iniciativa do Grupo de Pesquisa "Estudos em Psicologia e Ciências Humanas: História e Memória", vinculado ao Departamento de Psicologia da Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas/UFMG e ao Departamento de Psicologia e Educação da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto/USP Memorandum, out/2003. Belo Horizonte: UFMG; Ribeirão Preto: USP http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/editorial05po.htm Mahfoud, M. e Massimi, M. (2003) Editorial: Psicologia, memória, história: a interdisciplinaridade. Memorandum, 5, 1-4. Retirado em / / , do World Wide Web: http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/editorial05po.htm Editorial Memorandum: memory and history in psychology Number 5 Psychology, memory, history: the interdisciplinarity Memorandum number 5 answers to its interdisciplinary vocation: diverse proposals, dense contributions for the reflection regarding the relationships between memory, history and psychology, and providing distinct methodological approaches to face these three domains. Regarding the position of man in history and the identity of the human being as a historical being, the contribution of history of philosophy is relevant indeed. In this perspective, Fornari's article entitled "Memoria, deseo e historia: Acontecimiento del yo y alternativa de la libertad, desde San Agustín." highlights the contribution of Augustin and the rereading of this contribution by Hannah Arendt - regarding the historicity of man. Also, Botturi ("Caduta e storia: note sul peccato originale in G. B. Vico") restates the conception of the Italian philosopher of the 18th century Giambattista Vico regarding the sense of history and the role of human freedom in it. Another modality of conceiving the relationship between the human subject and history is posed by historical psychology: Waeny (“História e psicologia em Henri Berr") discusses, in this perspective, the positioning of one of the founders of this area, Henri Berr, who, opposing the approach proposed by philosophy of history, introduces psychology in the conception of history. The history of the psychological ideas allows for other possibilities of conceiving the relationships between history, philosophy, and the knowledge of subjectivity in different cultural horizons. In this sense, the article written by Amatuzzi, as he presents a "Releitura de textos de Tomás de Aquino visando a construção de um pensamento psicológico", demonstrates that these texts open new paths to face relevant questions from the point of view of contemporary psychology (such as the conception of man as a being opened to the search of sense and marked by disquietude), besides employing, in an original and pertinent way, forms of common language to clarify the understanding of human psychism. The contribution of Silva ("Medicina do corpo e da alma: os males corporais e o exercício da palavra em escritos da antiga Companhia de Jesus") is a theoretical work regarding the conceptions and relationships between medicine of the body, medicine of the soul and the exercise of speech, in writings of the early Company of Jesus, pointing that concepts derived from these domains are the basis of the main procedures of missionary action, including those realized in Brazil. The article by Massimi, as it focuses, in the same ambit, the "Representações acerca dos índios brasileiros em documentos jesuítas do século XVI", puts in evidence the importance, for their construction, the anthropological view of the Aristothelian-Thomist philosophy of the time. In this sense, the work, jointly with Amatuzzi's contribution, makes clear the importance of the thought of Thomas Aquinas for the history of the psychological ideas. Memorandum 5 also revisits themes that refer to the beginning of the history of scientific psychology, in the world and in Brazil. It discusses the contribution of two pioneers: Gustav Fechner, one of the founders of psychophysics under the light of the problematic of the subject of knowledge introduced by modern philosophy (Ferreira: "O lugar da psicofísica de Gustav Fechner na história da psicologia"); and the theory of "affective discriminationism" by Radecki, who contributed so much towards establishing scientific psychology in Brazil with his work in the Laboratory of Psychology of the Colony of Psychopaths in Engenho de Dentro (Rio de Janeiro) during the 1920s (Centofanti: "O discriminacionismo afetivo de Radecki"). Still in the domain of the history of scientific psychology, but turning towards the contemporary scenario, the work of Garcia ("The Psychological Literature in Konrad Lorenz's Work:A Contribution to the History of Memorandum, out/2003. Belo Horizonte: UFMG; Ribeirão Preto: USP http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/editorial05po.htm Mahfoud, M. e Massimi, M. (2003) Editorial: Psicologia, memória, história: a interdisciplinaridade. Memorandum, 5, 1-4. Retirado em / / , do World Wide Web: http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/editorial05po.htm 7 Ethology and Psychology") focuses on the relevant presence of psychological literature in the ethological approach, through a quantitative analysis of the bibliography of works of Konrad Lorenz. To complete the path of this Memorandum number 5, a contribution from the philosophical field: from the analyses of Husserl regarding symbol and its differences in relation with other psychological experiences (perception, remembrance, fantasy), Ales Bello ("Il simbolo nell'esperienza sacrale-religiosa:un'analisi fenomenologica") proposes a phenomenological analysis of symbol and its relationships with the religious experience. We have the satisfaction of announcing that the review Memorandum has been indexed in PsycINFO, a database of the American Psychological Association. We thank all collaborators for their constant effort, seriousness and rigorous work, which made possible this result. Miguel Mahfoud Marina Massimi Edito rs October 2003 Editorial Board Editors Miguel Mahfoud Universidade Federal de Minas Brasil Marina Massimi Universidade de São Paulo Brasil Ad Hoc Consultants of Memorandum 5 Carlos Ziller Camenietzki Museu de Astronomia e Ciências Afins Brasil José Paulo Giovanetti Universidade Federal de Minas Gerais Brasil Maria Emilia Yamamoto Universidade Federal do Rio Grande do Norte Brasil Marília Ancona Lopez Pontifícia Universidade Católica de São Paulo e Universidade Paulista Brasil Advisory Board Adalgisa Arantes Campos Universidade Federal de Minas Gerais Brasil Alcir Pécora Universidade de Campinas Brasil Angela Ales Bello Pontificia Universitas Lateranensis Italia Aníbal Fornari Universidad Católica de Santa Fé Universidade Católica de La Plata Argentina Memorandum, out/2003. Belo Horizonte: UFMG; Ribeirão Preto: USP http://www.fafich.ufmg.br/ ~memorandum/artigos05/ed itorial05po.htm Mahfoud, M. e Massimi, M. (2003) Editorial: Psicologia, memória, história: a interdisciplinaridade. Memorandum, 5, 1-4. Retirado em / / , do World Wide Web: http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/editorial05po.htm 8 Anna Unali Università La Sapienza Italia Antonella Romano École des Hautes Études en Sciences Sociales France Belmira Bueno Universidade de São Paulo Brasil Caio Boshi Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais Brasil Celso Sá Universidade Estadual do Rio de Janeiro Brasil Danilo Zardin Università Cattolica Sacro Cuore Italia Ecléa Bosi Universidade de São Paulo Brasil Francesco Botturi Università Cattolica Sacro Cuore Italia Franco Buzzi Università Cattolica del Sacro Cuore Italia Gilberto Safra Universidade de São Paulo Pontifícia Universidade Católica de São Paulo Brasil Helio Carpintero Universidad Complutense España Hugo Klappenbach Universidad San Luis Argentina Isaías Pessotti Universidade de São Paulo Brasil Janice Theodoro da Silva Universidade de São Paulo Brasil José Carlos Sebe B. Meihy Universidade de São Paulo Brasil Josef Brožek Lehig University United States of America Luís Carlos Villalta Universidade Federal de Ouro Preto Brasil Luiz Jean Lauand Universidade de São Paulo Brasil Maria Armezzani Università degli Studi di Padova Italia Maria do Carmo Guedes Pontifícia Universidade Católica de São Paulo Brasil Memorandum, out/2003. Belo Horizonte: UFMG; Ribeirão Preto: USP http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/editorial05po.htm Mahfoud, M. e Massimi, M. (2003) Editorial: Psicologia, memória, história: a interdisciplinaridade. Memorandum, 5, 1-4. Retirado em / / , do World Wide Web: http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/editorial05po.htm 9 Maria Efigênia Lage de Resende Universidade Federal de Minas Gerais Brasil Maria Fernanda Diniz Teixeira Enes Universidade Nova de Lisboa Portugal Martine Ruchat Université de Genève Suiss Michel Marie Le Ven Universidade Federal de Minas Gerais Brasil Monique Augras Universidade Católica do Rio de Janeiro Brasil Olga Rofrigues de Moraes von Simson Universidade de Campinas Brasil Pedro Morande Universidad Católica de Chile Chile Pierre-Antoine Fabre École des Hautes Études en Sciences Sociales France Regina Helena de Freitas Campos Universidade Federal de Minas Gerais Brasil Sadi Marhaba Università degli Studi di Padova Italia William Gomes Universidade Federal do Rio Grande do Sul Brasil Board of editorial consultants Adone Agnolin Universidade de São Paulo Brasil Ana Maria Jacó Vilela Universidade Estadual do Rio de Janeiro Brasil André Cavazotti Universidade Federal de Minas Gerais Brasil Arno Engelmann Universidade de São Paulo Brasil Bernadette Majorana Università degli Studi di Bergamo Italia César Ades Universidade de São Paulo Brasil Davide Bigalli Università degli Studi di Milano Italia Deise Mancebo Universidade Estadual do Rio de Janeiro Brasil Edoardo Bressan Memorandum, out/2003. Belo Horizonte: UFMG; Ribeirão Preto: USP http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/editorial05po.htm Mahfoud, M. e Massimi, M. (2003) Editorial: Psicologia, memória, história: a interdisciplinaridade. Memorandum, 5, 1-4. Retirado em / / , do World Wide Web: http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/editorial05po.htm 10 Università degli Studi di Milano Itália Eugénio dos Santos Universidade do Porto Portugal Giovanna Zanlonghi Università Cattolica del Sacro Cuore Italia José Francisco Miguel Henriques Bairrão Universidade de São Paulo Brasil Marcos Vieira da Silva Universidade Federal de São João del Rei Brasil Maria Luisa Sandoval Schmidt Universidade de São Paulo Brasil Marisa Todeschan D. S. Baptista Universidade de São Marcos Brasil Mitsuko Aparecida Makino Antunes Pontifícia Universidade Católica de São Paulo Brasil Nádia Rocha Universidade Federal da Bahia Brasil Rachel Nunes da Cunha Universidade de Brasília Brasil Raul Albino Pacheco Filho Pontifícia Universidade Católica de São Paulo Brasil Vanessa Almeida Barros Universidade Federal de Minas Gerais Brasil Design and Production Renata Amaral Araújo secretaria Paulo Roberto de Andrada Pacheco webmaster Supported by * LAPS - Laboratório de Análise de Processos em Subjetividade. Programa de Pós Graduação em Psicologia - UFMG * Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas FaFiCH - UFMG * Núcleo de Epistemologia e História das Ciências Miguel Rolando Covian USP/Ribeirão Preto * Programa de Pós-Graduação em Psicologia da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras - USP/Ribeirão Preto * Biblioteca Prof. Antônio Luiz Paixão - FaFiCH - UFMG The electronic review Memorandum is an initiative of the Research Group "Estudos em Psicologia e Ciências Humanas: História e Memória", linked to Departamento de Psicologia da Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas/UFMG and to Departamento de Psicologia e Educação da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto/USP. Memorandum, out/2003. Belo Horizonte: UFMG; Ribeirão Preto: USP http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/editorial05po.htm Fornari, A. (2003). Memoria, deseo e historia: Acontecimiento del yo y alternativa de la libertad, desde San Agustín. Memorandum, 5, 05-17. Retirado em / / , do World Wide Web: http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/ artigos05/fornari01.htm. Memoria, deseo e historia: Acontecimiento del yo y alternativa de la libertad, desde San Agustín Memory, desire and history: the happening of the I and freedom 's alternative, since Saint Augustin Aníbal Fornari Universidad Católica de Santa Fe Argentina Resumen Agustín abre la problematicidad del sí-mismo, sacándola de la previa retracción "interiorista" y del mero análisis "objetivista". La autoconciencia del yo como radical inicio, en la pulsión del deseo-de-ser y ante la presencia de la alteridad de lo real en la memoria del ser como acción de existir y de hacer existir, es su definitivo aporte, como también lo manifiesta Hannah Arendt. A partir de un preciso y excepcional encuentro humano se hace inteligible una nueva trama del tiempo como acontecer histórico. La genialidad de Agustín es relanzada a discernir y revalorizar su tradición greco-romana y, con ello, toda otra posible tradición. La experiencia de la historicidad supera la tendencia al nihilismo como sin-sentido del tiempo y la existencia histórica es centrada en la alternativa de la libertad y en el protagonismo de la persona, entre el cumplimiento de la exigencia de felicidad y la libido dominandi. Palabras clave: San Agustín; memoria; deseo; historia; libertad Abstract Augustin opens the problematicy of him-self, taking it away from the previous "interiorist" retraction and from the mere "objectivist" analysis. The self-conscience of the I as radical beginning, in the impulse of the desire-of-being and before the alterity's presence of the real in the memory of the being as act of existing and to make exist, is its definitive contribution, as it is also manifested by Hannah Arendt. Starting from a precise and exceptional human encounter, time becomes intelligible as a historical event. Augustin's geniality is proposed, once again, to discern and re-evaluate its GreekRoman tradition and, with it, all other possible traditions. The experience of the historicity surpasses the tendency of fatalism as the non-sense of time, and the historical existence is centered in the alternative of freedom and in the protagonism of the person, between fulfillment of the exigence of happiness and the libido dominandi. Keywords: St. Augustinus; memory; desire; history; freedom. 1. Problemática experiencia de sí mismo y memoria del ser Ricoeur (2000) sitúa a Agustín, sobre todo el de las Confessiones, en la tradición de la mirada interior (1). En realidad, el joven literato filosofante afro-romano, que vive en la bisagra del siglo IV-V, adquiere esa mirada interior abierta, no ya plegada al juego subjetivista sino consciente de su fuerza intencional y de su referente objetivo, tras un encuentro decisivo que lo conduce desde el reconocimiento de la unicidad dramática del yo-encarnado, a la mirada crítica sobre el conjunto de la historia, en De civitate Dei (San Agustín, 413-426/ 1964). Acontecimiento único, que se da en un encuentro humano y se manifiesta como totalizante de todas las búsquedas y encuentros precedentes, posibilitando que Agustín coloque en términos filosóficos nuevos y rigurosos la problemática experiencia de la existencia personal y de la misma humanidad histórica. ¿Desde qué precedente Agustín se había antes concebido lo que debe ser una subjetividad filosófica "académica"? Trae un sentido de la criticidad filosófica como preservación sistemática de todo compromiso con la verdad, en cuanto se entiende que Memorandum 5, out/2003. Belo Horizonte: UFMG; Ribeirão Preto: USP. http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/fornari01.htm Fornari, A. (2003). Memoria, deseo e historia: Acontecimiento del yo y alternativa de la libertad, desde San Agustín. Memorandum, 5, 05-17. Retirado em / / , do World Wide Web: http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/ artigos05/fornari01.htm. 6 la búsqueda filosófica, para ser tal, debe presuponer que no hay nada que encontrar. O si lo hay, es preciso resguardarlo a una prudente distancia, declarando su absoluta inaccesibilidad, sólo traspasable mediante opciones extrañas a la razón. En su primer documento autobiográfico recuerda que, al abandonar "a los maniqueos -sobre todo después de haber atravesado este mar [llegado a Roma]-, los académicos tuvieron largamente el timón de mi nave, en la lucha contra todos los vientos" (San Agustín, 3 8 6 / 1979: De vita beata, 1, 4) (2). Presentía que "a través de muchos siglos y muchas controversias se ha configurado, según mi entender -dice Agustín-, una enseñanza común de la verdadera filosofía" (San Agustín, 386 / 1970: Contra Academicos, 3, 19, 42). Platón y Aristóteles, Plotino y Porfirio, más allá de sus acentos y diferencias interpretativas, reconocen algunas verdades básicas comunes y concuerdan en que el ímpetu interior potente del intelecto humano hacia la verdad es correlativo a una capacidad de recibir la manifestación de aquello que es en realidad. Más allá de las propias opiniones y previsiones, la verdad sólo puede irrumpir por sí misma desde la inagotable exterioridad de lo real. Los académicos habían consagrado la posición metódica para regular esa tensión del yo a la verdad, preservándose mediante la duda en la afirmación intelectual de sí-mismos. "Tenía la idea -dice Agustín- que los más talentosos de todos los filósofos fuesen los académicos, en cuanto habían afirmado que es necesario dudar de toda cosa y habían sentenciado que para el hombre la verdad es totalmente incognoscible" (San Agustín, c.398 / 1968: Confessiones, V, 10, 19). Para el escepticismo académico, auténtico filósofo es quien argumenta manteniendo la neutralidad respecto a contenidos comprometedores porque últimos y que, siendo tales, no pueden ser regulados desde una instancia de control previsible por la sola razón, reducida a capacidad de interna de auto-justificación. Desde tal equívoca postura, la sabiduría sería, extrañamente, buscar la verdad sin esperanza de encontrarla, auto-conformarse en la reflexión pura, sin referencia. Los académicos presuponen, como si fuese obvio, que el encuentro cierra el deseo que movió a la búsqueda. Ahora bien, ¿qué tipo de subjetividad y qué tipo de encuentro con la verdad tiene en cuenta este escepticismo académico? Se trata de una concepción abstracta de la subjetividad y solipsista de la razón. Tras la huella de Agustín, dice Hannah Arendt (1933 / 1999, p. 111): Si el pensamiento retorna sobre sí mismo y encuentra como único objeto la propia alma, si se vuelve reflexión, entonces conquita de todos modos una apariencia de poder ilimitado, en la medida en que permanece racional, porque se aisla del mundo, se desinteresa de él y, protegiéndolo, se pone frente al único objeto 'interesante': la propia interioridad. [...] La realidad no puede traer ya nada nuevo, la reflexión ha ya anticipado todo. (En Rahel Varnhagen, the life of a jewess). Por un tiempo Agustín transitó también este callejón sin salida, que devalúa los aportes gnoseológicos de la sensibilidad corporal y la forma propia aportada por los contenidos de conocimiento que vienen desde afuera. Pues, en efecto, desde la alteridad de lo real, nutriente del íntimo deseo de ser, se mueve la razón como apertura al encuentro y al juicio sobre su correspondencia (adequatio). El academicismo, antiguo y actual, enfatiza unilateralmente el aspecto metodológico apriorístico y dialéctico-argumentativo de la razón, a fin de que la subjetividad se asegure a sí misma como último tribunal de toda posible y legítima manifestabilidad del ser. Continúa al respecto H. Arendt (1969 / 1999, p. 29): Todas las concepciones por las que el hombre se crea a sí mismo, tienen en común una rebelión contra los mismos datos de hecho de la condición humana. Nada más obvio del hecho que el hombre, sea como perteneciente a la especie, sea como individuo, no debe su existencia a sí mismo. (En On violence). Memorandum 5, out/2003. Belo Horizonte: UFMG; Ribeirão Preto: USP. http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/fornari01.htm Fornari, A. (2003). Memoria, deseo e historia: Acontecimiento del yo y alternativa de la libertad, desde San Agustín. Memorandum, 5, 05-17. Retirado em / / , do World Wide Web: http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/ artigos05/fornari01.htm. 7 Nuestra reflexión avanza desde este primer paso, a mostrar que no sólo el hombre no se debe la existencia a sí mismo, sino que tampoco se debe a sí mismo la autoconciencia de ser él, cabalmente, un "yo". Y la trayectoria intelectual de Agustín es, también en esto, ejemplar. Agustín concibe la "interioridad" como apertura máxima a la exterioridad hasta la alteridad infinita, desde la finitud del ser-dado. La interioridad se manifiesta en la experiencia de la propia vida como desproporción, como cuestión: "me volví pregunta para mí mismo - mihi quaestio factus sum" (San Agustín, c.398 / 1968: Confessiones, X, 33, 50). La experiencia del sí mismo como pregunta implica "sorpenderme en el estupor -stupore aprehendit me" (Idem, X, 8, 15), atravesado por la aporía de la memoria, que también es olvido y tensión condicionada por lo negativo, paradójicamente presente en la memoria: "memoria retinetur oblivio - en la memoria se conserva el olvido" (Idem, X, 16, 24). El yo es la tensión de su memoria, en la que se hace quasi presente la propia mismidad vivida como tarea de volver a encontrarse consigo mismo, "mihi et ipse occurro meque recolo" (Idem, X, 8, 14). Sin embargo, el yo no puede alcanzar por sí su sí-mismo, ni aferrar todo lo que en sí-mismo es. Soy inconmensurablemente más de lo que se de mi. El saber de mi mismo no es sólo lo que ya objetivamente se y poseo de mí. Es también lo que olvido y, sobre todo, mi relación constitutiva con la misteriosa presencia del Ser (cuyo rostro quiero ver, pues el correlato del yo sólo puede ser el fondo del Ser como Tú, no como masa neutra). Esta relación es lo que se de mi con mayor certeza desbordante: "Tú, te amo -Domine, amo te"; pero, "a quien amo, entonces, cuando te amo? -Quid autem amo cum te amo?" (Idem, X, 6, 8). Lo que amo es a Ti, o sea, la felicidad, "la plenitud de la vida para mi -vitam beatam quaero" (Idem, X, 20, 29). Para Agustín, buscar a Dios es buscar la Vida en la plenitud de su realización, no como algo genérico sino como algo mio, incluyendo las relaciones que mi vida asume. De ahí que, la pregunta que yo mismo soy, se torna imploración: "Quién soy yo, mi Tú? ... Dónde te encontraré? -Quid ergo sum, Deus meus?... ¿Ubi te inveniam? (Idem, X, 17, 26). La memoria es el vasto campo del transire, del atravesamiento en el tiempo que me es dado, donde se resguarda la experiencia del feliz encuentro que abraza a todas las experiencias retenidas y olvidadas. El encuentro privilegiado con "la alegría de la verdad -gaudium de veritate" (Idem, X, 23, 33), esa verdad que coincide con el tú-mismo de mi yo -gaudium de te, qui veritas es, alcanza toda su potente evidencia en un encuentro histórico, externo y excepcional, en el que se verifica como auténtico signo, la referencia íntima del yo al Ser. Esto es una posibilidad dada a cada uno, sobre la base de la inevitabilidad de la relación a la verdad, pues aún cuando el hombre en su libertad se equivoque rechazándola u odiándola, no puede sino amar la verdad, aún inconscientemente, pues su mismo rehazo existe subjetivamente como homenaje a la verdad, y a lo que ilusoriamente se tiene por verdad. 2. El yo como inicio y la libertad La libertad es la traducción de la infinitud del hombre, la que se descubre en la finitud que el hombre experimenta. La razón humana, respetada en su dinámica originaria, hace cuerpo con el conjunto de la existencia humana concreta en cuanto respira, como ninguna otra forma de existencia en el mundo, de la exterioridad infinita del ser y de ese modo experimenta la libertad y se libera de la ilusión autárquica. El que del dato -ya sea la realidad del mundo o la imprevisibilidad del otro hombre o el dato de hecho que no me hice a mí mismo- se vuelve el trasfondo sobre el que se destaca la libertad del hombre, el material que inflama esta libertad. Que yo no pueda reducir lo real a lo pensable - insiste H. Arendt-, he aquí el triunfo de la libertad posible. O, paradojalmente: sólo porque no me hice a mí mismo puedo ser libre; si me hubiese hecho solo, habría podido preverme y, de tal modo, habría perdido la libertad (Arendt, 1946/ 1998, p.75). Memorandum 5, out/2003. Belo Horizonte: UFMG; Ribeirão Preto: USP. http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/fornari01.htm Fornari, A. (2003). Memoria, deseo e historia: Acontecimiento del yo y alternativa de la libertad, desde San Agustín. Memorandum, 5, 05-17. Retirado em / / , do World Wide Web: http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/ artigos05/fornari01.htm. 8 En un sorprendente pasaje final del capítulo referido a la irrupción del hombre en el universo, Agustín (413-426 / 1964: De civitate Dei, XII, 20, 1, 2, 3), discutiendo la concepción neoplatónica y gnóstica de las almas eternas sometidas a la decadencia de las sucesivas reencarnaciones - de modo que el origen del mal radicaría en la corporeidad -, se refiere a la contradicción que esto implica respecto a la admirable positividad de la singularidad y de la pluralidad humanas. La alteridad y distinción que el hombre comparte con los seres, en él "se convierte en unicidad, y la pluralidad humana es la paradójica pluralidad de seres únicos", dice Arendt (1958 / 1993, p. 202). Esta autoconciencia filosófica de la realidad humana inicia sólo con Agustín, desde la pertenencia histórica a la que accede mediante su conversión. La personal referencia al Ser y la ineliminable e insaturable exigencia de felicidad que invisten al yo concreto, es la raíz de la singularidad y de la libertad. Lo que se contrapone a la mecánica innatural de aquellas almas impersonales que circulan fatalmente, ab aeterno, desde un sitio trascendente hacia la miseria y la corrupción corporal y terrena, para desde allí iniciar una accesis de liberación, posible a unos pocos que así reinician, mediante la negación de la pluralidad, la inserción en el ciclo de lo eterno-uno. La trascendencia impersonal del alma es afirmada y en ello se atisba la excepcionalidad de lo humano, pero como un extraño que está innaturalmente en el mundo. El nacimiento mismo de cada yo carece, en tal contexto espiritual, de significado como acontecimiento ontológico, como inicio de algo nuevo en el mundo que debe portar consigo al mundo, hacia el Destino que supera la fatalidad, incluso moral, gracias al perdón que introduce en la historia la esperanza y realiza el renovado re-inicio. Para Agustín, la condición ontológica de toda acción y de toda posible iniciativa y responsabilidad es que el agente sea realmente él mismo un inicio. Más aún, si el inicio no reacontece siempre de nuevo el mundo mismo es un conglomerado para nada, porque sería para nadie, no llegaría al nivel de la significatividad y carecería de dirección como universo de álguien hacia álguien. El hombre, dice Agustín, fue hecho en un mundo ya "principiado", para que haya siempre un inicio, para que se verifique el acto creador que lo sostiene, a través de una conciencia que lo retome: quod initium eo modo antea numquam fuit. Lo que es inicio nunca fue así antes. Hoc [Initium] ergo ut esset, creatus est homo. Entonces, para que haya un inicio fue creado el hombre, ante quem nullus fuit, antes del cual no hubo nada (San Agustín, 413-426 / 1964: De civitate Dei, XII, 20, 4). Si la palabra "yo" debe ser tomada en serio, no puede menos que referirse al dato excepcional de un existente singular irreductible a la totalidad de sus antecedentes cósmico-biológicos. Como nota H. Arendt (1958 / 1993, p. 267, nota 3), Agustín empleaba la palabra initium para indicar el comienzo del hombre [de cada hombre] y principium para designar el comienzo del universo (...). Como puede verse (...) la palabra principium (3) tenía para san Agustín un significado mucho menos radical; el comienzo del mundo 'no significa que nada fuera hecho antes (porque los ángeles existían)', mientras que explícitamente añade (...) con referencia al hombre, que nadie existía antes de él. El concepto de iniciativa, en su peso real y responsabilizante, sólo es inteligible como acción que se auto-imputa álguien, el quién de la acción, cuya autoconciencia acontece cuando el agente advierte que nadie puede sustituirlo en ese nuevo inicio que lo hace creativo e imputable. Por eso mismo, la acción es iniciativa y lleva en sí misma la posibilidad de iniciar algo nuevo, como origen, como significatividad y como expresión, aún bajo la apariencia de una acción banal, de un movimiento dentro de una serie ya conocida o de un acto repetido. Y no se trata de un énfasis sobreagregado. Es la estructura intencional de toda acción como establecimiento puntual de una relación con Memorandum 5, out/2003. Belo Horizonte: UFMG; Ribeirão Preto: USP. http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/fornari01.htm Fornari, A. (2003). Memoria, deseo e historia: Acontecimiento del yo y alternativa de la libertad, desde San Agustín. Memorandum, 5, 05-17. Retirado em / / , do World Wide Web: http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/ artigos05/fornari01.htm. 9 el mundo que ante todo es una relación con el otro, con la insondabilidad del yo del otro y, desde esa referencia, con las cosas, los instrumentos, los elementos y el universo. La estructura intencional de toda acción brota de la infinitud del deseo que atraviesa el acto determinado, la iniciativa finita. En la relación concreta con los otros y con las cosas que establece la acción, se juega la posición total de la libertad: como apertura de la relación en su punto de fuga que la recrea hacia el Infinito, o como cierre de la relación sobre sí misma hasta el desgaste y la insignificancia. Entonces, la acción tiene la estructura del gesto-oferta, que comunica el significado a través del acto limitado en medio de la circunstancia, o de la ofensa que clausura la comunicación en la instrumentación despótica. ¿Cómo ha sido fácticamente posible este salto fenomenológico, desde la natural o creatural constitución ontológica originaria del yo, a la autoconciencia histórica de tal constitución creatural? 3. Auto-conciencia del yo e historicidad Agustín realiza el pasaje a la autoconciencia del yo a través de la exepcionalidad de un encuentro educativo que -en medio de su académico discurrir dialéctico y sin poder no obstante censurar la amplitud pulsional del deseo de verdad y felicidad- lo sorprende como factor de humanidad nueva, ella misma referida a la verdad de un hecho histórico, crucial y singular, que la instituye: el hecho cristiano encarnado en la persona del patricio romano Ambrosio de Milán. El salto del no-yo al yo es generado por un tú accesible y diverso, no por un razonamiento doctrinario e interiorista acerca de la verdad tomada en abstracto. El impacto de un preciso encuentro totalizante que atrae porque en él se intuye la correspondencia con el propio deseo-de-ser. El yo se mueve hacia su auténtico sí-mismo, hacia su ipseidad, cuando es tomado en serio por un tú educador que lo hace saltar a la autoconciencia. El siguiente fragmento descriptivo es revelador de cada uno de los conceptos recién vertidos: Así vine a Milán -dice Agustín- donde estaba Ambrosio, conocido por todo el mundo como uno de los mejores hombres [circunstancia espacio-temporal precisa que se torna significante por la atracción de una presencia intuida en su diversidad y grandeza]. (...) Aquél hombre de Dios [excepcional porque implica y visibiliza el Destino] me recibió paternalmente y, como buen obispo, se mostró muy contento por mi visita [el encuentro es acontecimiento porque en él Agustín es reconocido como único]. Yo, por mi parte, comencé a amarlo no como maestro de la verdad (yo no esperaba encontrarla en Tu Iglesia) sino como una persona bondadosa conmigo [la adhesión totalizante que cambia no es ante todo a una doctrina sino a una presencia]" (San Agustín, c.398 / 1968: Confessiones, V, 13, 23). El hecho cristiano se presenta como método en la unidad de forma y contenido. El encuentro provoca la conversión a la verdad de sí-mismo, abre la propia originalidad y desata la personalidad humana y filosófica de Agustín. La perspectiva reflexiva universal de la filosofía le hace asumir y profundizar ese dramático pasaje existencial del no-yo al yo desde un tu/Tu (minúscula y mayúscula son en este método indisociables) que impulsa conjuntamente a su persona toda, también la genialidad intelectual de Agustín. Él profundizará luego, llevado por las exigencias más graves de las circunstancias, en la dimensión histórica de ese salto ontológico-fenomenológico personal, en De civitate Dei, mostrando la condición, no sólo personal sino también histórico-trascendental de posibilidad de ese inicio de la conciencia histórica. Una transformación auténtica y novedosa de la filosofía, realizada críticamente y dejada abierta sobre su potente tronco histórico precedente, es correlativa al alcance ontológico de un dato nuevo que acontece en la experiencia y embarga a la razón. La antigua filosofía greco-romana evidenció, también para Agustín, la efectividad del camino humano a la verdad, junto a los trágicos límites para acceder realmente a ella, y la alta Memorandum 5, out/2003. Belo Horizonte: UFMG; Ribeirão Preto: USP. http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/fornari01.htm Fornari, A. (2003). Memoria, deseo e historia: Acontecimiento del yo y alternativa de la libertad, desde 10 San Agustín. Memorandum, 5, 05-17. Retirado em / / , do World Wide Web: http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/ artigos05/fornari01.htm. razonabilidad de una posible e imprevisible iniciativa reveladora y salvífica desde la fontal bondad del Ser, considerado racionalmente en su unidad última inaccesible pero religante. Una articulación entre la perspectiva antropológico-existencial de Confessiones y la perspectiva histórico-política del De civitate Dei, muestra la articulación que Agustín hace entre su experiencia previa de intelectual romano y su decisiva posterior experiencia de maestro de un pueblo nuevo abierto a todos, con su asunción de la filosofía greco-romana en el más vasto y apremiante horizonte de la historia de la liberación de la humanidad a través del Pueblo de Dios, hebreo primero y selecto, y luego cristiano y ecuménico. En De civitate Dei adquiere relevancia epocal ese individuo humano que precede, prefigura y anticipa la centralidad del Hecho cristológico. Éste coloca en la historia la pretensión personal de ser el lugar singular asignado por el divino cumplimiento de la espera de plenitud humana, prometida a la naturaleza misma del yo e históricamente revelada y definida en su contenido divino-humano personal. Abraham (4), es ese particular en sí mismo insignificante, extraído y convocado a una misión propedéutica respecto al cumplimiento de la promesa dirigida a cada yo singular y de significación universal, como inicio del advenimiento de la plenitud del tiempo. Ninguna filosofía de la historia que se precie puede omitirlo. A partir de Abraham comienza a evidenciarse pedagógicamente el contenido determinado de la promesa que desde el inicio e indeterminadamente urge como espera en el corazón del yo y a la que éste, adueñándose, pretende determinarla y responderla por sí mismo. La educación en la autoconciencia del yo, en el pasaje del no-yo al yo, es un largo camino en el que la fidelidad divina no se ahorra ninguna de las peripecias, vicisitudes y claudicaciones humanas, para poner la promesa salvífica histórica a la altura de la amplitud y profundidad de la dramática lucha en el hombre y entre los hombres, distanciados de la grandeza de su Destino. Abraham, recluido en lo colectivo bajo la hegemonía de la etnia, adaptado al terruño doméstico, es reclamado a levar anclas para constituir una nación diversa en su designio y trans-étnica en su abarcamiento: en él serán bendecidas todas las naciones de la tierra. La extrema puesta a prueba de la confianza de Abraham, razonable y arriesgada, en Quien lo llama y conduce, es correlativa a la excepcionalidad de su misión. Lo atestigua la dramática relación con su hijo Isaac. Su designio "político" (un pueblo) es personal y universal, y tiene como condición la confianza total en Quien le ha dado pruebas empíricas de confiabilidad, signos reales. El nuevo criterio es que "el justo vive de la fe", de la confianza hasta la polémica en el Otro que le es maestro. Esto contrasta metodológicamentecon los tres grandes imperios florecientes (greco-sicionio, egipcio y asirio - en Europa, África y Asia) que lo rodean, y que por ser "sociedad de los hombres que viven según el hombre" (San Agustín, 413-426 / 1964: De civitate Dei, XVI, 17), hacen lo que pueden para darse la felicidad y tratan de garantizar su existencia mediante el poder, que siempre cae en la ilusión determinada por la libido dominandi. Porque de él no surgió la iniciativa, sino la adhesión a la elección dirigida a él, Abraham accede a la conciencia de ser realmente ese unicum que cada hombre, aún desconociéndolo, también lo es. Por una preferencia que lo acompaña y lo hace protagonista de una historia, asumiendo todos sus vínculos humanos concretos, Abraham es introducido por la presencia, la palabra y la iniciativa de Otro en la experiencia de una sociabilidad nueva, de un pueblo definido por la irrenunciabilidad a la exigencia de felicidad. La acción humana se revela aquí, ante todo, como adhesión a la positividad del ser y la palabra como capacidad de responder. Así, como recuerda Hannah Arendt, se cumple el designio de que el discurso y la acción revelan esta única cualidad de ser distinto. Mediante ellos, (...) los seres humanos se presentan unos a otros, no como objetos físicos, sino qua hombres. Esta apariencia, diferenciada de la mera existencia corporal, se basa en la iniciativa; pero en una iniciativa (el appetitus beatitudinis) que ningún ser Memorandum 5, out/2003. Belo Horizonte: UFMG; Ribeirão Preto: USP. http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/fornari01.htm Fornari, A. (2003). Memoria, deseo e historia: Acontecimiento del yo y alternativa de la libertad, desde San Agustín. Memorandum, 5, 05-17. Retirado em / / , do World Wide Web: http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/ artigos05/fornari01.htm. H humano puede detener y seguir siendo humano. (Arendt, 1958 / 1993, p. 200). Tanto el nacimiento del yo cuanto el acceso a su autoconciencia implican la presencia y la iniciativa de un Tú/tú que, con palabras puntules y signos empíricos, provoca al yo a tomar en serio, esto es, con un juicio dentro, su appetitus beatitudinis, su despertado apetito de felicidad. Agustín es el genio de la singularidad del yo-corporal, pero abierta a lo universal, a través de la experiencia existencial del tiempo y de la epopeya de la libertad en su dimensión histórica y política. La convicción de que el conjunto de la historia tiene un sentido, comienza a dar forma a una nueva síntesis cultural que, desde la creación del mundo y del hombre, retomada y liberada por la Presencia histórica y personal del Ser, abraza en su perspectiva a la humanidad, caída en la fatalidad del eterno retorno. Pues el yo, como inicio e iniciativa, despertado desde el encuentro y el llamado histórico del Ser que se presenta como un tú inmediato, es extraído (no se extrae por sí mismo) de la inmersión en la etnia y en la pólis (por las que se percibe como mera parte del despliegue de la totalidad cósmico-biológica y social). Esto exige una revisión radical en la interpretación de Agustín como un caso más de las platónicas filosofías de la subjetividad (5). La unicidad irrepetible del yo encarnado no es intimista y cerrada sino condición fundamental de una auténtica vida política que ya no puede ser concebida en la dialéctica todo-partes sino como convivencia y totalización abierta de totalidades libres y capaces de protagonismo personal e iniciativa asociativa, sin dejarse subsumir por el poder del estado. Con respecto a este álguien que es único cabe decir verdaderamente que nunca nadie estuvo allí antes que él. Si la acción como comienzo corresponde al hecho de nacer [como un yo], si es la realización de la condición humana de la natalidad, entonces el discurso corresponde al hecho de la distinción y es la realización de la condición humana de la pluralidad, es decir, de vivir como ser distinto y único entre iguales. (Arendt, 1958/ 1993, p.202). 4. Unicidad del yo, memoria del ser y dramaticidad de la historia La trayectoria de la libertad es dramática porque significa una cierta extraterritorialidad frente al Ser, que se decide ante la presencia y la propuesta de Él llega, por una trama de encuentros y a través de la realidad dada, hacia nosotros. Crear es la acción de la libertad del Ser como Tú que se co-extiende al yo y lo reivindica, hasta el punto de cargar con la posibilidad de que esta libertad creada se vuela contra Él, en el olvido y la violencia. El acontecimiento de la Revelación, desde Abraham, es precisamente un volver a insinuarse el Rostro generoso y misericordioso del Ser que se abaja hasta la libertad humana, para rescatarla de la fatalidad. La renuncia al propio arché, a la autoconciencia del inicio como unicum, fragmenta y distrae esa pulsión constitutiva hacia la verdad de sí-mismo, radicada en la intencionalidad del yo como demanda de felicidad, que desencadena la acción. El deseo de felicidad, de plenitud ontológica de la existencia, es determinable reflexivamente en su direccionalidad pero indeterminable en su concreción mediante el solo discurrir de la razón. La impaciencia del deseo tiende a renunciar a la espera activa e inclina a "hacerse felices por sí mismos" (a se ipsis beatificari), como dice Agustín. El nexo con el Infinito, que constituye creacionalmente el ser originario de la libertad humana, está históricamente inclinado, por concesión original de la libertad tentada, a la trampa de plegar ese nexo sobre sí-misma, anulando la dirección alterativa de su estructura intencional. La libertad decide adherir o no adherir al ser, pero lo decidido incide inevitablemente sobre ella. La estructura esencial originaria del deseo-deser, cuyo ímpetu bien conoce Agustín, no puede ser anulada porque es creada. Pero la libertad puede en cada caso desvincularse existencialmente de su fuente en el nexo con el Infinito. El estado de naturaleza caída (status naturae lapsae) es la condición histórica del yo, plegado sobre su auto-idealización y distraído del principio de realidad. El intento Memorandum 5, out/2003. Belo Horizonte: UFMG; Ribeirão Preto: USP. http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/fornari01.htm Fornari, A. (2003). Memoria, deseo e historia: Acontecimiento del yo y alternativa de la libertad, desde 12 San Agustín. Memorandum, 5, 05-17. Retirado em / / , do World Wide Web: http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/ artigos05/fornari01.htm. de a se ipsis beatificari se desdobla entre dos formas de auto-afirmación ilusoria: por un lado la fragmentación esclava del deseo de felicidad, en el conformarse a la multiplicidad de objetos que distraen a la libertad en la sumatoria superficial de lo finito, y por otro, la circularidad del deseo en la voluntad de poder que pasa por encima del yo en la libido dominandi (voluntad de poder). San Agustín experimentó precisamente la magnitud de un encuentro humano que reabría para la exigencia de felicidad una nueva esperanza real, más alla de esta bifurcación fatal. La íntima desproporción bipolar entre infinitud y finitud en el yo-encarnado, constituye el cor inquietum que, desde el inicio de las Confessiones (San Agustín, c.398 / 1968), permanece como signo inextirpable para la memoria del arché y para la espera del télos. En el adecuado juicio de la razón dentro de la experiencia del deseo se juega la identidad del yo como ipseidad. El reconocimiento del yo en cuanto tal y según el calibre de su inquietud, se concentra en esta intuición poética, empírica y reflexiva de Agustín: fecisti nos ad Te (Domine) et inquietum est cor nostrum donec requiescat in Te, nos hiciste para Ti (nuestro único Señor) y nuestro corazón está inquieto mientras no te encuentre y repose en Ti. Este enunciado contiene una serie de momentos lógico-ontológicos. 1) La conciencia judicativa de existir desde y hacia Otro como inicio e iniciativa intencional (cor fecisti ad). 2) La pluralidad universal del yo como sujeto del discurso respondiente (nosnostrum). 3) La racionalidad de la referencia a la presencia de un solo último interlocutor adecuado al yo, que constituye su inicio y lo signa intencionalmente (fecisti nos ad Te). 4) El deseo racional como desproporción vivida (cor inquietum est) y la contradicción irracional de que, en forma idealista, pretenda proporcionarse a sí mismo por sí mismo (donec, el 'por tanto' lógicamente concluyente, requiescat in Te). 5) La referencia intencional al Infinito (ad Te Domine, no menos) sustenta la libertad de un existente finito, que no está hecho para someterse a cualquier ente homogéneo, sino sólo a una alteridad eminente y excepcional que lo afirme en su destino como un yo, manteniendo la proximidad y la diferencia, esto es, la participación y la analogía. 6) El dinamismo existencial del yo-corporal se mantiene en su lealtad para con la propia constitución originaria, buscando su identidad como ipseidad, es decir, en una alteridad adecuada a los dos términos de su desproporción estructural; sólo corresponde al yo un tú (donec requiescat in Te) creador de su existencia como iniciativa y, por tanto, posibilitador de una relación adecuada con el sistema del cosmos y la dramaticidad de la historia. 7) La dramaticidad como resultante de la imprevisibilidad del camino a la meta cierta y de la imprevisible manifestación del Rostro del destino inevitable; el encuentro que posibilita el hallazgo de la ipseidad humana existe en la asimetría constituyente yo-Tú y desde la propia asimetría interna al yo entre infintud intencional y finitud fáctica, generativa del movimiento hacia la totalidad; por ende, es un encuentro que se resuelve y realiza sin agotarse, sino ante todo acrecentánose, tal como en toda auténtica relación interpersonal. 8) La positiva dramaticidad no quita la posibilidad de lo trágico porque la libertad ha quedado históricamente inclinada a establecerse en el equívoco ontológico. Estando intencionada al Ser, se inclina hacia la nada tras una propia imagen del ser. Y esto como posición fundamental ante lo real y no meramente como conducta moral circunstancial. Por eso, en el corazón del hombre y en la historia, se da la grave tensión en el instante y en toda circunstancia de la vida, entre "dos amores", que potencialmente fundan dos despliegues de la personalidad y, consecuentemente, "dos ciudades", "civitates duas, amores duos" (San Agustín, 413-426 / 1964: De Civitate Dei, XIV, 28). (6). Tal es la gravedad originaria de la libertad. Ella comporta una extraterritorialidad respecto al ser, la posibilidad de confirmarlo como raíz de su existir o denegarlo, como si no existiera. Sin embargo, esta alternativa de autodeterminación del deseo no es equivalente ni escapa al juicio crítico de la razón si se considera la centralidad de la categoría de felicidad como horizonte intencional permanente del yo-en-acción, que posibilita y permanece -aunque en modos diversos- en ambos términos de la alternativa de la libertad. Se pregunta Agustín en referencia a su propio contexto cultural, "acerca de la felicidad que los romanos, veneradores de muchos dioses, se olvidaron de honrar, Memorandum 5, out/2003. Belo Horizonte: UFMG; Ribeirão Preto: USP. http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/fornari01.htm Fornari, A. (2003). Memoria, deseo e historia: Acontecimiento del yo y alternativa de la libertad, desde 13 San Agustín. Memorandum, 5, 05-17. Retirado em / / , do World Wide Web: http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/ artigos05/fornari01.htm. cuando la Felicidad es la única capaz de satisfacer a todos, felicitas, cum pro omnibus sola sufficeret". Pues ¿quién elige algo por otra cosa, quis optat aliquid propter aliud, que no sea para hacerse feliz, quam ut felix fiat? ¿Quién, queriendo recibir algo último y total, aliquo deo, no quiere aceptar sino la felicidad, nisi felicitatem velit accipere, o aquello que piensa que pertenece a la felicidad, vel quod ad felicitatem existimat petinere? (San Agustín, 413-426 / 1964: De CivitateDei, IV, 23, 1). Sucede que sólo demasiado tarde y por poco tiempo se les ocurre a los hombres reconocer y honrar a la felicidad en sí misma, manteniendo su dirección, que es lo único que une realmente a los hombres, porque ella puede estar con todos si es divina -habet in potestate cum quo homine sit -habet autem, si dea est, de modo que... es irracional-insensato, quae tandem stultitia est, pedirle a un ídolo lo que puedes impetrarle a ella misma, quam possis a se ipsa impetrare" (Idem, IV, 23, 4). El mal se decanta como concesión a una irracionalidad fundamental, como deslealtad a sí-mismos. Es preferencia por la ilusión de ser felices con algo que es ontológicamente demasiado poco para el hombre. Si lo que más se desea y necesita no resulta de una autoproducción, entonces, no se trata de buscar sustitutos menores e ilusorios, sino de mantenerse en la exigencia del deseo atento a discernir el acontecimiento total del Otro que lo cumple. La exigencia de felicidad, por su misma naturaleza pulsional unificante, ipsa suadente natura, reclama a la razón a iluminar su dirección, sin dejarlo arrastrar por la "multiplicidad superflua de ídolos, aliorum deorum superflua multitudine" (Idem, IV, 23, 4). El mismo Rómulo, deseando fundar una ciudad feliz, felicem cupiens condere civitatem, se ocupó de muchas otras cosas menos de ésta y, por eso, tuvo que empezar asesinando a Remo para imperar en la naciente Roma. La razón humana direccionada a la verdad exige "honrar a la única diosa felicidad por sobre todos los demás ídolos, deam felicitatem super deos caeteros honorare" (Idem). Ahora bien, la felicidad no es diosa porque es la exigencia de plenitud de existir, interna a nosotros, puesta por Quien nos hace a nosotros. Es el índice de la gran Presencia que, por haberse dado a sí-misma haciendo la libertad y la racionalidad encarnadas al hacer al hombre, se quiere hacer encontrar, ahora, tras la caída humana, encarnadamente por el hombre y con ellas (razón y libertad). Pues si la felicidad no es diosa, lo que es cierto, sino que es don de Dios, munus Dei, entonces búsquese a ese Dios que pueda darla, ille Deus quaeratur, qui eam dare possit, y déjese a un lado la vana multitud de ídolos, ya que es propio de los insensatos dejar de lado a quien da esos dones, endiosándolos y ofendiendo con obstinación y soberbia a su dador (San Agustín, 413426 / 1964: De civitate Dei, IV, 23, 4). La felicidad, como certeza inscripta en el yo-encarnado, del encuentro con quien la realiza, la puede otorgar ese Dador dándose a sí-mismo y no apenas dando sus dones. Ello también implica desear esperando que se manifieste, aceptando el designio siempre más grande que el previsto por la razón humana, que tiende a conformarse, irracionalmente, con los dones antes que con su Dador. En el politeísmo de las apuestas humanas a la felicidad hay algo de verdad. Agustín averigua la razón de ese politeísmo cultural que "se apega como a dioses a los que son consiguientes dones divinos, inter deos colant ipsa dona divina" (Idem, IV, 24). La condición humana caída, la humana infirmitas, no anula el corazón del hombre. Lo que se Memorandum 5, out/2003. Belo Horizonte: UFMG; Ribeirão Preto: USP. http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/fornari01.htm Fornari, A. (2003). Memoria, deseo e historia: Acontecimiento del yo y alternativa de la libertad, desde 14 San Agustín. Memorandum, 5, 05-17. Retirado em / / , do World Wide Web: http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/ artigos05/fornari01.htm. evidencia en quienes aún no lo han dejado endurecer en demasía, quorum cor non nimis orduruit. El yo de corazón vivo se da cuenta, sensit, que el carácter divino de la exigencia de felicidad, en medio de los graves y distractivos avatares de la vida, sólo puede ser correspondida en serio y hasta el final por algún Dios, aliquo Deo. Cada uno tiende a nombrarlo según lo que parcial y contingentemente más le interesa para ser feliz. Pero al sustiuir lo divino por su dones, en realidad confiesa la insuficiencia de los dioses inventados por la proyección imaginativa del yo. En realidad, todos "los hombres ignoraban el nombre de quien les daría la felicidad, quia eius nomen a quo daretur felicitas ignorabant" (Idem, IV, 25). Sólo se conoce ese nombre si el Ser se manifiesta puntualmente y se hace accesible a la experiencia humana. Ante el Hecho presente lo más racional es que el yo detenga sus variaciones imaginativas conjeturantes y también su escepticismo sobre lo divino, que contradicen y censuran el deseo de la razón. La infelicidad es consecuencia de esa debilidad querida, de esa desafección por la verdad que, en realidad, es una desafección ante todo por sí mismo (ipse). No puede menos que instalarse en la infelicidad quien se prende a la felicidad como a una diosa, tamquam deam felicitatem colit, pero deja de lado, relinquit, a quien ontológicamente puede dársela, tal como quien prefiere quedarse con su hambre lamiendo un pan pintado, para no pedirle el buen pan a quien verdaderamente lo tiene para dárselo (Idem, IV, 23, 4). 5. Deseo de ser, alternativa histórica y nihilismo La opción fundamental inherente a la dignidad de la libertad se juega, entonces, en esta alternativa totalizante ante la realidad cotidiana: vivir pertinazmente según las medidas que puede imponer la propia subjetividad como si fuese dueña del ser, esto es, existir secundum hominem, o vivir desde lo que está auténticamente dado, desde la verdad del ser manifiesta en el ser del hombre ante la presencia de la realidad, secundum veritatem. "Pues el hombre está bien hecho, factus est rectus, para que no viva ya según sus proyectos, ut non secundum seipsum viveret, sino según aquél de quien está hecho, sed secundum eum a quo factus est, viveret" (Idem, XIV, 4, 1). La ipseidad humana se juega, entonces, en la alternativa del deseo entre el horizonte de la verdad, secundum veritatem, y el horizonte de la ilusión o de la mentira, secundum mendacium. En este caso se intenta desviar y sustituir el dinamismo nativo del hombre mediante un elaborado y caprichoso artificio que lo repliegue sobre sí, según una propia imagen arbitraria entre otras tantas equivalentes, secundum hominem. Pero incluso así, dividiéndose uno del otro según la propia concepción imaginativa, no puede el yo eliminar su ontología originaria de la que no es el autor y que, por eso, "no es en sí misma mentirosa, aunque pueda ser vivida para la mentira: non quia homo ipse mendacium est, cum sit eius auctor et creator Deus [sed quia] secundum mendacium v/V/r (ídem). La violencia para consigo mismo y entre los hombres anida en esta abstractización o vaciamiento inflacionario de sí mismo - superbiam - que, desechando el dato ontológico o don originario del propio ser-dado, en vez de empuñar el arte existencial de hacerlo crecer afirmativamente en relación al ideal, al ser, se afirma a sí mismo, utópicamente, en contraposición a él. Esta posibilidad de vivir la propia humanidad Agustín la denomina también vivir según la carne, secundum carnem, lo que nada tiene que ver con el quedarse sólo con la parte material del hombre, ya que en este caso "por carne se entiende la totalidad del hombre, a carne intelligitur homo" (Idem, XIV, 4, 2). Vivir según la carne es una toma de posición espiritual. Más radicalmente aún, ¿en qué consiste esa soberbia mendáz de vivir según la carne y en qué sentido ella se comporta como la raíz de la división y de la violenta contraposición en el hombre y entre los hombres? ¿Hay alguna subterránea alianza entre la violencia que surge de la voluntad de auto-afirmación y la experiencia de la cercanía de la nada? Memorandum 5, out/2003. Belo Horizonte: UFMG; Ribeirão Preto: USP. http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/fornari01.htm Fornari, A. (2003). Memoria, deseo e historia: Acontecimiento del yo y alternativa de la libertad, desde 15 San Agustín. Memorandum, 5, 05-17. Retirado em / / , do World Wide Web: http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/ artigos05/fornari01.htm. Para esclarecer el sentido de estas preguntas vale la pena comentar este texto: En su defección ya establecida en vicio [al quedar estropeado el yo en su libertad, o sea, afectado por el pecado original, donde el Mentiroso aprovechó el hecho de que el yo es intencionalmente grande y sacado de la nada], aunque firmemente puesto en el existir en cuanto hecho por Dios, sed vitio depravari, nisi ex nihilo facta, natura non posset, quia a Deo facta est, el hombre no se redujo a mera nada-vanidad [a pasión inútil], nec sic deficit homo, ut omnino nihil esset, sino que, plegado hacia sí mismo inclinatus ad se ipsum, llegó a ser menos de lo que era, minus esset, quam erat, cuando estaba conscientemente vinculado a Quien plenamente existe, cum ei qui summe est inhaerebat". Por tanto, "existir plegado en sí mismo, o sea, autocomplacerse [recusar el principio alterativo del placer], esse in semetipso, hoc est sibi placere, ya no significa ser nada sino ir aproximándose a la nada, non iam nihil esse est, sed nihilo propinquare" (Idem, XIV, 13, 1). Vivir según la mentira significa que cada uno fabrica y pretende imponer "su verdad", o cada un se separa del otro como extraño en una indiferencia revestida de momentánea tolerancia, porque fue descartada la posibilidad de referencia a la verdad en la fuente común radicada en la exterioridad de lo real, abordada desde la interioridad deproporcionada y exigente. Tanto una como la otra (interioridad extrovertida y exterioridad dada hacia el encuentro con la interioridad intencional) son en sí mismas portadoras de la estructura de disponibilidad a la manifestación, a través de la acción y el movimiento, expresivos de la presencia creadora del ser como acto de existir y de hacer existir. La inmoralidad fundamental en el hombre no se aloja ante todo en la conducta moral sino en el conocimiento. "Vivir según la carne" es, precisamente, la clausura monádica del yo y de su sociabilidad consecuente, en el intento temerario de adueñarse del ser, de eliminar lo imprevisto, estableciendo la sospecha y el resentimiento respecto al emerger consistente de la alteridad de lo real. Pues ésta es preconcebida como hostil al proyecto de autoafirmación de la mismidad. La opción de "vivir según la carne" maltrata lo real porque lo conoce reductivamente, partiendo del presupuesto de que el ser-dado en el yo encarnado y en la realidad fuera de sí, es-nada desde el punto de vista del significado, no da signos objetivos que guían, mediante la razón, al hombre hacia su destino. Ni son el punto de partida positivo de toda constructividad histórica, por lo que ésta se traduce en la violencia de la utopía -lo contrario del ideal que guía desde dentro (eduxit) el arte de desarrollar lo dado-, como presunción mítica del carácter demiúrgico del poder. A la subjetividad hiperbólica le sucede, dentro de la misma lógica, subjetividad denigrada. Esta construcción desde el vacío ontológico se realiza en la dinámica de la "mala infinitud" propia del nihilismo, ejercida sobre toda presencia reducida a mera facticidad. Esta parodia de la ipseidad como autoafirmación comporta, según Agustín, la más trágica de las desobediencias: la auto-contradicción existencial. En efecto, ¿qué miseria hay más propia del hombre que la desobediencia de sí contra sí mismo, nisi adversus eum ipsum inobedientia eius ipsius, de modo tal que, por no haber querido lo que pudo, quiere ahora lo que no puede, noluit quod potuit, quod non potest velit? (Idem, XIV, 15, 2). De ambos términos de esta alternativa del deseo, de estos dos amores, también surgen dos ciudades y dos formas de considerar a Dios en la existencia terrena. "Encontramos pues en la misma ciudad terrena dos formas, invenimus ergo in terrena civitate duas Memorandum 5, out/2003. Belo Horizonte: UFMG; Ribeirão Preto: USP. http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/fornari01.htm Fornari, A. (2003). Memoria, deseo e historia: Acontecimiento del yo y alternativa de la libertad, desde 16 San Agustín. Memorandum, 5, 05-17. Retirado em / / , do World Wide Web: http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/ artigos05/fornari01.htm. formas. Una que se indica con esfuerzo sólo así misma autoafirmando su propia presencia, unam, suam praesentiam demonstrantem" y rinde culto a sus dioses "para conseguir victorias y gozar así de una paz terrena, no por amor al destino del prójimo, charitate consulendi, sino por voluntad de dominio, dominandi cupiditate". La otra forma de vida política (sui generis) nace como gratuita amistad comunional generada por gracia de Otro y en ella se construye para la gloria del Otro. Y la gloria de este Otro es que "el hombre viva" una vida que, desde aquí peregrina, es vida viviente para siempre (vita aeterna vita vitalis est). Mientras tanto: "Los buenos usan del mundo para gozar de Dios, utuntur mundo, ut fruantur Deo; y los malos, al contrario, para gozar del dominio del mundo quieren usar de Dios, ut fruantur mundo, uti volunt Deo" (Idem, XV, 7, 1). Si es que todavía se Lo reconoce, aunque en realidad no interesa para vivir una vida buena. Bibliografía Arendt, H. (1993). La condición humana. (R.G. Novales, Trad.) Paidós: Buenos Aires; Barcelona. (Publicación original en 1958). Arendt, H. (1998). Che cos'è la filosofia dell'esistenza? (S. Maletta, Trad.). Milano: Jaca Book. (Publicación original en 1946). Arendt H. (1999). Il pensiero secondo. Pagine suelte. (P. Terenzo & L. Amicone, a cura di). Milano: B.U.Rizzoli. Esposito, C. (1993). Quaestio mihi factus sum. Heidegger di fronte ad Agostino. En L. Alici, R. Picolomini & A. Pieretti (a cura di). Ripensare Agostino: interiorità e intencionalita. (pp. 229-259). Roma: Institutum Patristicum Agustinianum. Heidegger, M. (1999). Agustín y el neoplatonismo. En M. Heidegger. Estudios sobre mística medieval. (pp. 11-155). México: Fondo de Cultura Económica. (Publicación original en 1995). Ricoeur, P. (2000). La mémoire, l'histoire, l'oubli. Paris: Seuil. San Agustín. (1964). De civitate Dei. Obras de San Agustín. (Ed. bilingüe a cargo de F. García). Madrid: Biblioteca Autores de Cristianos. (Original del 413-426). San Agustín. (1968). Confessiones. Obras de San Agustín. T. I I . (Ed. bilingüe a cargo de F. García). Madrid: Biblioteca Autores de Cristianos (Original del c.398). San Agustín. (1970). Contra Academicos, Obras de San Agustín. T. I I I . (Ed. bilingüe a cargo de F. García). Madrid: Biblioteca Autores de Cristianos (Original del 386). San Agustín (1979). De vita beata. Obras de San Agustín. T. I. (Ed. bilingüe a cargo de F. García) Madrid: Biblioteca de Autores Cristianos. (Original del 386). Notas (1) Cf. Ricoeur, 2000, p. 115 y ss. (2) trad. del latín en el texto es, de aquí en más, de Aníbal Fornari. (3) Cfr. San Agustín, 413-426 / 1964: De civitate Dei, XI, 32. (4) Cfr. San Agustín, 413-426 / 1964: De civitate Dei, XVI, cap. 12 a cap. 36 (5) Inluso la interpretación, por lo demás provocante a pensar, de Martin Heidegger (1999), tiende a ocultar la novedad filosófica radical de Agustín, estrechándola en algunos factores significativos para su propia hermenéutica de la facticidad: Augustinus und der Neuplatonismus. Véase al respeto el esclarecedor trabajo de Costantino Esposito (1993): Quaestio mihi factus sum. Heidegger di fronte ad Agostino. (6) Cfr. también San Agustín 413-426 / 1964: De civitate Dei, XV, 2 y 5. Nota sobre el autor Aníbal Fornari, doctor en filosofía por las universidades La Sapienza y Lateranense de Roma. Actualmente director y profesor del Doctorado en Filosofía en el Departamento de Memorandum 5, out/2003. Belo Horizonte: UFMG; Ribeirão Preto: USP. http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/fornari01.htm Fornari, A. (2003). Memoria, deseo e historia: Acontecimiento del yo y alternativa de la libertad, desde 17 San Agustín. Memorandum, 5, 05-17. Retirado em / / , do World Wide Web: http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/ artigos05/fornari01.htm. Posgrado de la Universidad Católica de Santa Fe, Argentina; profesor del seminario de ética y filosofía política en la Facultad de Ciencias Jurídicas y Sociales de la Universidad Nacional del Litoral e investigador del Conicet-Consejo Nacional de Investigaciones Científicas de Argentina. Línea de investigación: la cuestión de la identidad personal y cultural exigente, en orden al protagonismo plural de la sociedad civil y para una nueva dialéctica sociedad-estado, a través de San Agustín, Paul Ricoeur, Charles Taylor, Emmanuel Levinas, Alasdair Macintyre, Hannah Arendt, Michel Henry, John Rawls y Michael Walzer. Dirección: Laprida 5059, piso 11, CP 3000 Santa Fe, Argentina. E-mail: [email protected] Data de recebimento: 06/05/2003 Data de aceite: 17/10/2003 Memorandum 5, out/2003. Belo Horizonte: UFMG; Ribeirão Preto: USP. http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/fornari01.htm Botturi, F. (2003). Caduta e storia: note sul "peccato originale" in G.B. Vico. Memornadum, 5, 18-35. Retirado em // , do World Wide Web: http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/botturi01.htm. 18 Caduta e storia: note sul "peccato originale" in G.B. Vico Fall and history: notes about the "original sin" in G.B. Vico Francesco Botturi Università Cattolica del Sacro Cuore Italia Riassunto Il presente articolo analizza un aspetto del pensiero di Giambattista Vico che ha avuto finora poco rilievo nella letteratura critica: il tema del peccato originale come luogo strategico dei complessi rapporti tra "storia sacra" e "storia profana" cioè tra i due regimi possibili della storia umana dal punto di vista religioso cristiano. Viene proposta l'analisi di alcuni temi trattati da Vico: il rapporto tra storia sacra e profana; la natura del peccato originale; il nesso tra peccato e provvidenza storica. Il peccato originale é concepito come principio e limite invalicabile della realizzazione storica dell'uomo. Il pensiero vichiano della storia si definisce proprio in rapporto al principio del peccato originale: é caratterizzato dall'idea della provvidenza, cioè da una struttura antropologico-metafisica che è normativa condizione di possibilità dell'attuarsi di un certo ordine civile nella vicenda umana, in opposizione alla tendenza alla dissoluzione catastrofica dei rapporti e alla metamorfosi ferina dell'umano. Parole chiave: Giambattista Vico; senso della storia e teologia; peccato originale;filosofia della storia; storia sacra e storia profana. Abstract The present article analyzes one aspect of the thought of Giambattista Vico which, up to the present, has received little attention from the critical literature: the theme of the original sin as a strategical place of the complex relationships between "sacred history" e "profane history", that is, between the two possible regimen of human history from the Christian religious point of view. We propose an analysis of some themes studied by Vico: the relationship between sacred and religious history, the nature of original sin, the nexus between sin and historical providence. The original sin is conceived as the beginning and the insurmountable limit of man's historical fulfillment. Vico's thought on history is defined exactly in relationship with the principle of original sin: it is characterized by the idea of providence, that is, by an anthropological-metaphysical structure which is a normative condition of the possibility of an actualization of a certain civil order in the human vicissitudes, in opposition to the tendency of catastrophic dissolution of the relationships and to the ferine metamorphosis of the human being. Keywords: Giambattista Vico; sense of history and theology; original sin; philosophy of history; sacred and profane history Sguardo d'insieme Il tema del peccato originale si colloca nel testo vichiano come luogo strategico dei complessi rapporti tra "storia sacra" e "storia profana", cioè tra i due regimi possibili della storia umana dal punto di vista religioso cristiano. Si tratta ovviamente di un intreccio di questioni di rilevante significato per la filosofia della storia vichiana, che non ha avuto finora grande rilievo nella letteratura secondaria (1), così come - si potrebbe subito notare - manca a tutt'oggi uno studio approfondito del rapporto della scrittura vichiana con la Sacra Scrittura (soprattutto i libri sapienziali dell'Antico Testamento). Probabilmente ciò dipende dal pregiudizio di origine crociana secondo cui la religiosità vichiana fosse convinzione privata, ma estrinseca e contraddittoria rispetto alla sua Memorandum 5, out/2003 Belo Horizonte: UFMG; Ribeirão Preto: USP. http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/botturi01.htm Botturi, F. (2003). Caduta e storia: note sul "peccato originale" in G.B. Vico. Memornadum, 5, 18-35. Retirado em // , do World Wide Web: http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/botturi01.htm. 19 effettiva Denkform filosofica. Pregiudizio a cui si contrappose in modo apologetico poco fecondo, da parte di autori come Chiocchetti, Vismara, Amerio, l'idea di un cattolicesimo vichiano sicuramente ortodosso e aproblematico. Questa polarizzazione interpretativa tra l'affermazione e la negazione della cattolicità del pensiero vichiano non ha certamente giovato alla sua effettiva comprensione, bloccata dalla preoccupazione preventiva per la sua collocazione confessionale. Per Croce (1911/1965) e Nicolini (1949) ogni dissonanza anche dalla sola tradizione teologica del tempo costituiva indice di un cripto-pensiero immanentistico se non ateo; mentre per gli interpreti cattolici o "clericali", come venivano apostrofati, qualsiasi discrepanza non era comunque in grado di scalfire l'ortodossia cattolica di Vico, spesso misurata addirittura sulla sua presunta fedeltà alla filosofia tomistico-scolastica. Il risultato storico e teorico di questo pseudodibattito interpretativo è stato appunto quello di togliere rilievo ai temi in senso stretto teologici della filosofia vichiana, tra cui quello del rapporto tra storia sacra e storia profana. Esemplificativamente si ricordi l'affermazione crociana secondo cui la storia sacra non sarebbe in Vico altro che oggetto di «scrupolo religioso» inessenziale al percorso effettivo del suo pensiero oppure la sentenza di F. Nicolini, per il quale l'insistita separatezza del popolo ebraico, nella rappresentazione della storia universale da parte di Vico, non può aver che «valore di mera cautela» di eliminare ciò che potesse interferire con i problemi di ortodossia del tempo e potesse perciò attirare più del dovuto l'attenzione dell'occhiuta Inquisizione ecclesiastica. D'altra parte, che questa «eccettuazione» dell'ebraismo e, in realtà, anche del cristianesimo, sentisse di zolfo è affermato dal Nicolini con il ricorso - tipico della sua strategia dimostrativa - a fonti "laiche" o "eretiche" che attestano la stessa (presunta) posizione; in questo caso si tratta di F. Bacone e di Th. Hobbes (2). Questa neutralizzazione del problema teologico finisce, però, per essere condivisa anche dalla parte avversaria, come si può osservare in un autore come A. Del Noce, che peraltro ha un'attenzione nuova per la componente religiosa del pensiero vichiano. Secondo Del Noce infatti «se Vico non ha parlato, se non occasionalmente, della storia ebraica e della religione cristiana, è perché data l'impostazione della sua ricerca, non doveva farlo». La sua indagine riguarda le vie naturali della Provvidenza nella storia profana e ciò implica coerentemente che manchi il riferimento al soprannaturale; in analogia con quanto aveva fatto Malebranche nello studio della regolazione provvidenziale della comunicazione del movimento. In conclusione, afferma Del Noce (1964/1990), si deve dire che «interpretata in senso teologico la sua [di Vico] ricerca è quella, di carattere e di intonazione nettamente antigiansenisti [ma si potrebbe aggiungere anche antimolinisti], di ciò che l'uomo può fare nello stato di natura lapsa» (pp.498-499) (3). Ora, se la conclusione delnociana è esatta - come si vedrà -, resta però sospeso l'interrogativo sul valore della distinzione-separazione di storia sacra e storia profana, che in Vico ha una funzione strutturale e quindi svolge un ruolo capitale nell'organizzazione interna della "Scienza nuova". Connessa è poi la domanda decisiva sull'unità della storia umana, nevralgica sia dal punto di vista filosofico sia da quello teologico; del resto, non è lo stesso Vico che insiste sulla distinzione, ma anche sulla "perpetuità", la continuità di storia degli ebrei e di storia dei gentili? Non è possibile, dunque, avviare un discorso sul peccato originale nell'opera vichiana senza porsi qualche interrogativo sulla posizione, sicuramente complessa e peculiare, di Vico nei confronti del problema esegetico, per il quale egli ebbe sicuramente un'attenzione specifica. Si può ricordare in proposito la preoccupazione vichiana espressa in una nota lettera al p. De Vitry (20 gennaio 1726) - per l'inadeguatezza degli studi biblico-linguistici da parte cattolica a confronto con quelli del campo protestante, che emerge nel contesto della sua sconfortata considerazione sulla trascuratezza contemporanea degli studi umanistici: «Gli studi severi delle due lingue greca e latina si consumarono così dagli scrittori del Cinque come da' critici del Seicento. Un ragionevol riposo della Chiesa cattolica sopra l'antichità e perpetuità che più che le altre vanta la version vulgata della Bibbia, ha fatto che la gloria delle lingue orientali passasse a' protestanti» (Vico, 1726/1929, p. 206) (4). La questione estremamente delicata era allora - com'è noto e come risultava di vitale interesse per Vico - quella della cronologia biblica, suscitata dal confronto con le Memorandum 5, out/2003 Belo Horizonte: UFMG; Ribeirão Preto: USP. http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/botturi01.htm Botturi, F. (2003). Caduta e storia: note sul "peccato originale" in G.B. Vico. Memornadum, 5, 18-35. Retirado em // , do World Wide Web: http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/botturi01.htm. 20 antichissime civiltà dell'oriente che ponevano in discussione la credibilità della periodizzazione biblica tradizionalmente calcolata secondo la lettera della Scrittura. La migliore conoscenza storica delle antiche civiltà rendeva ormai insufficiente o contraddittoria la cronologia tradizionale. Questa, ad esempio, poneva tra Adamo ed Abramo non più di millenovecentoquarantotto anni: troppo poco per accogliere lo svolgimento di grandi epopee storiche, come quelle degli assiri, dei caldei, degli egizi, dei persiani, dei cinesi, ma anche degli antichissimi popoli del Nuovo Mondo da cui provenivano i messicani e i peruviani. Il tentativo di I. De la Peyrère di fornire una spiegazione con la "teoria dei preadamiti" costituì un evento di vaste conseguenze per le polemiche che suscitò e per la diffusione che ebbe. La tesi dell'erudito di Bruxelles consisteva nell'attribuzione ad Adamo della paternità del solo popolo ebraico. Questo rendeva possibile pensare che popoli che dimostravano una più grande antichità avessero un'origine precedente e quindi indipendente. Venivano così affermati ad un colpo preadamitismo e poligenismo, dottrine più che sufficienti per sollecitarne la diffusione da parte libertina e per sollevare reazioni violente e persecutorie da parte tanto cattolica quanto protestante. Le conseguenze, infatti, che venivano annesse a tali dottrine non potevano essere accettate dalle autorità religiose cristiane, dal momento che non solo era tolto alla Scrittura il suo valore di documento storico universale, negandole il suo ruolo di pietra di paragone e di «testo parametrico» di tutta la storia umana, ma, molto più, erano messe in discussione le strutture portanti della tradizione dogmatica cristiana (Cfr. Zoli, 1991) (5). I popoli pagani, infatti, non provenendo da Adamo, non rientravano nel racconto biblico e in ciò che esso affermava della sorte di Adamo stesso; erano cioè affrancati dal peccato originale e erano attori di una storia diversa da quella della Scrittura ed esterna alla sua logica provvidenzialistica. Il peccato originale era relativizzato e in particolare veniva scalzata l'idea dell'unità ed unicità della "historia salutis" per tutti gli uomini, a favore di una concezione naturalistica della religiosità, cioè di una comune e vaga religiosità quale prospettiva sintetica secondo cui guardare alla storia dei popoli in sostituzione dello sguardo teologico ebraico-cristiano consegnato nella Scrittura. Vico risente con evidenza del dibattito e delle sue difficoltà, come dimostra il suo tentativo di mantenere il dualismo storico fondamentale tra popolo eletto e il resto dell'umanità e il pluralismo delle cronologie delle diverse civiltà, ma insieme di proteggere il senso unitario della storia umana (6). Dal punto di vista cronologico, infatti, Vico fa coincidere l'inizio della storia umana con quello del racconto biblico, con la motivazione, spesso ripetuta, che la storia sacra è la più "antica" e la più "certa", essendo l'unica dotata di un racconto così continuo e dettagliato. Dal punto di vista del contenuto, invece, la strategia vichiana sta, da una parte, nel separare le due provvidenze (quella soprannaturale dei popolo ebraico e quella naturale per gli altri popoli), presupponendole comunque complementari, e, dall'altra, nell'unificare la storia dei differenti popoli e civiltà non cronologicamente, ma secondo i ritmi (i "corsi") e i princìpi condivisi della "storia universale eterna". Vi è dunque un certo letteralismo che resta insuperato nell'esegesi vichiana, che lo accomuna a quella della teologia del tempo. In questo senso la posizione del Vico è avversaria dell'interpretazione di tipo libertino e di quella spinoziana, che preparano quella allegorizzante post-illuministica di un Kant, per il quale il peccato originale è immagine dell'uscita dell'umanità dalla condizione infantile, o di un Hegel, per il quale la caduta è una formulazione ancora mitologica della teoretica dialettica dello spirito. D'altra parte, però, Vico con la sua "logica poetica" e con il ribaltamento della concezione tradizionale del mito semantizzato come "vera narratio" pone oggettivamente le basi per una rilettura della Scrittura in chiave poetico-mitologici. Come è facile intravedere, quando teorizza nel Diritto universale che l'antichità della lingua ebraica è dimostrata dal fatto che «ferme omnis poetica est, parabolis ac similitudinibus referta» (Vico, 1721/1974, p.472) (7). Questa tesi resta ferma anche nelle diverse edizioni della Scienza nuova. Nella redazione del 1725 (Vico, 1971) vengono proposti «nuovi princìpi di poesia», secondo il quali «si ritruova la poesia essere stata la lingua prima comune di tutte le antiche nazioni, anche dell'ebrea» (p. 258). Anche questa infatti nasce da una condizione originaria primitiva, cioè di «povertà di parlari» (p. 261), e quindi è «tutta Memorandum 5, out/2003 Belo Horizonte: UFMG; Ribeirão Preto: USP. http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/botturi01.htm Botturi, F. (2003). Caduta e storia: note sul "peccato originale" in G.B. Vico. Memornadum, 5, 18-35. Retirado em // , do World Wide Web: http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/botturi01.htm. 21 poetica, sicché vince di sublimità quella del medesimo Omero» (p. 297). Addirittura Vico giunge ad attribuire al testo biblico - appoggiandosi in questo all'autorità di san Gerolamo che ne parla a proposito del libro di Giobbe - il verso eroico, tipico della più antica poesia (8). L'attribuzione della lingua poetica agli antichi ebrei non è senza problemi, dal momento che essa va armonizzata con l'altro assunto tradizionale, tratto dal racconto biblico di Gen. 2, 19-20, secondo cui la «lingua santa di Adamo» fu concessa da Dio stesso (onomathesia) e fu «imposizione de' nomi alle cose secondo la natura di ciascheduna» e non fu invece «un parlare fantastico per sostanze animate», come fu il caso di tutte le altre lingue storiche (Vico, 1744 / 1971, p.485) (9). A questa difficoltà si potrebbe rispondere che anche l'ebreo rimasto fedele alla religione dei padri, dopo il peccato originale ha dovuto reimparare il linguaggio. Vico infatti dice che la differenza con gli altri popoli fu piuttosto che, nonostante la poeticità immaginosa del linguaggio, quello ebraico non cedette mai all'idolatria delle sue immagini e quindi al politeismo: «non si trova però nella lingua santa né pure una volta la divinità moltiplicata» (Vico, 1725 / 1971, p.261) (10). Un'ulteriore difficoltà si pone però se si ammette che anche l'ebreo delle origini ha dovuto reimparare il liguaggio, perché ciò significa che anch'egli ha dovuto subire il ciclo storico, il «corso uniforme delle nazioni», smentendo così la separatezza della storia ebraica mantenuta da Dio all'interno di un regime provvidenziale speciale. E se si considera poi che il linguaggio poetico delle origini è tipicamente connesso con uno stato della mente ancora fortemente condizionata dal primeggiare dei sensi e delle passioni in seguito alla caduta dell'uomo nello stato ferino, ne verrebbe una grave smentita della condizione privilegiata del popolo eletto (Capistro, 1987-88). Si potrebbe, ancora una volta, controbattere che primitivismo linguistico e condizione ferina non hanno un nesso di necessità e che Vico intende dire che per il peccato originale l'ebreo perde la lingua di Adamo e deve reinventare la sua lingua per via di elaborazione fantastica ingegnosa (infatti, «Adamo, illuminato dal vero Dio, ritruovò tosto una favella eroica articolata») [Vico, 1725 / 1971, p.308] (11), ma non per questo precipita nel gigantismo e poi nell'idolatria (diversamente da Caino) e che quindi pur essendoci nella sua forma mentale un'evoluzione, questa tuttavia non segue il "corso" dei popoli pagani. Ma è chiaro che questo abbozzo di risposta non toglie la difficoltà di fondo di una posizione che da un lato insiste sulla separatezza ebraica, ma dall'altro istituisce parallelismi e convergenze. Che ruolo gioca in questo contesto la figura del "peccato originale" per la costruzione del discorso vichiano? La sua trattazione più ampia si trova nel Diritto universale, dove essa ha chiaramente una funzione cardine per la rappresentazione della stessa storia profana dell'uomo, che vale la pena precisare subito. Il peccato originale, infatti, fa la sua apparizione nel testo vichiano come principio e limite invalicabile della realizzazione storica dell'uomo: principio, in quanto la storia profana è storia comunque postparadisiaca e postdiluviana; limite invalicabile, in quanto la vicenda storica postlapsaria è in grado (provvidenzialmente) di restaurare la condizione umana in quanto tale, di recuperarne socialmente l’humanitas e di conservarla, ma non è in grado di redimerla definitivamente e personalmente dal male. In tal modo, a prezzo di uno schema fondamentalmente dualistico, ma consono allo schema bipolare di natura e soprannatura propria della teologia controriformistica (De Lubac, 1991), Vico tiene unita la storia umana e insieme la bipartisce, suddividendo - per così dire - il lavoro tra l’opera specializzata della storia sacra e quella comune della storia profana, coll'intento di neutralizzare in questo modo sia la versione pessimistica libertina del naturalismo rinascimentale, sia quella ottimistica autoredentiva (in parte condivisa forse dallo stesso Vico al tempo delle Orazioni inaugurali). Il peccato originale è per Vico quella clausola storica a motivo della quale l'uomo non ha più, ormai struttu ral mente, la capacità di realizzare la sua esistenza in stabile equilibrio con se stessa; al contrario l'esistere storico dell'uomo, continuamente minacciato di regressione "bestiale", deve guadagnare se stessa sul sfondo oscuro della sempre possibile "barbarie". Per questo il progetto vichiano della "Scienza nuova" è essenzialmente puntato contro il pessimismo libertino (ispiratore anche delle diverse forme di utilitarismo sociale), che concepisce la Memorandum 5, out/2003 Belo Horizonte: UFMG; Ribeirão Preto: USP. http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/botturi01.htm Botturi, F. (2003). Caduta e storia: note sul "peccato originale" in G.B. Vico. Memornadum, 5, 18-35. Retirado em // , do World Wide Web: http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/botturi01.htm. 22 natura umana dominata in ultima istanza dal primato della forza. Ma è anche essenzialmente polemico con ogni ottimismo sociale su base atea, come è il progetto bayliano della "società degli atei". Prescindere dal legame religioso con il "primo vero", infatti, significa ingannarsi sulla reale condizione storica dell'uomo, cioè sul suo ormai strutturale bisogno di lasciarsi attrarre dalla luce "metafisica" per non sprofondare nelle tenebre della difformità. Il peccato originale costituisce così la ferita nella condizione umana prodotta dal distacco volontario dell'uomo dal suo stato di comunicazione creaturale con Dio. Ad esso segue, secondo la complessiva ricostruzione vichiana, un tempo di indefinibile durata, che costituisce il periodo della storia oscura o "antidiluviana", in cui già fa la sua prima apparizione il fenomeno del gigantismo. Qui Vico ha l'evidente problema di includere il racconto del Genesi, che parla di «giganti» nati dall'unione dei «figli di Dio» e delle «figlie degli uomini», «eroi dell'antichità» e «uomini famosi», ma anche malvagi, perché «ogni disegno concepito dal loro cuore non era altro che male»; così che Dio pentito di aver fatto l'uomo sulla terra, manda il diluvio che tutto travolge salvo Noé e la sua famiglia (Cfr. Gen., 6, 4-5). Nella discendenza di Noé Vico colloca la divisione tra la linea di Sem, da cui verrà il popolo ebraico e le linee di Cam e Jafet in cui sono i ceppi dei popoli pagani. Mentre la progenie di Sem si mantiene fedele alla tradizione religiosa dei padri ed é privilegiata da Dio, quella di Cam e di Jafet subisce la prova del secondo gigantismo, quello postdiluviano, perché, dispersa sulla terra devastata dal diluvio, genera «uomini di vasti corpi e di forze sformate» (Vico, 1725 / 1971, p.209) (12). La e-normità del gigante é la rappresentazione icastica della condizione umana ex-lege, fuoriuscita cioè dalla misura normativa dell'essere uomini, da quell'humanitas la cui restaurazione e il cui mantenimento costituisce la posta in gioco della "storia universale profana", essendo sempre possibile anche all'uomo civilizzato la caduta nel gigantismo morale e spirituale nella forma della "barbarie della riflessione" (13). Il racconto del diluvio e la vicenda dei giganti diventano così in Vico la conseguenza storicamente costituente e sempre rilevante del peccato originale, che ne è il presupposto (14). Diluvio e gigantismo, infatti, costituiscono il principio ermeneutico della ripartizione tra storia sacra e storia profana e delle loro caratteristiche. Entrambe sono storie "certe", ma l'una nel regime speciale di una conservazione dell'humanitas, che non passa per lo smarrimento del gigantismo, e che è da subito destinata alla grazia soprannaturale della rivelazione; l'altra è invece storia "universale delle nazioni", storia "eroica", "poetica" e "favolosa", in cui l’humanitas è compromessa, ma non definitivamente perduta, perché non è una vicenda abbandonata da Dio, ma appunto è "storia", cioè accadere in cui si realizza la signoria benefica della Provvidenza sulla vita dell'uomo, nella forma inevidente della "storia ideale eterna". La Provvidenza storica naturale, infatti, garantisce comunque la presenza di Dio nella condizione umana della caduta e con ciò istituisce la possibilità che la vicenda umana sia storica. Di qui viene il carattere né reazionario, né utopico del pensiero vichiano della storia. Non reazionario, perché non c'è mai stata un'effettiva età dell'oro e, quindi, non c'è restaurazione possibile di una condizione felice pregressa; mentre la situazione paradisiaca non può certamente essere restituita dall'iniziativa umana. Ma neppure utopico, perché la catastrofe del peccato originale impedisce di pensare che l'umanità possa mai giungere all'instaurazione di un regime storico esente dalla possibilità di ricadere al di fuori dell'humanitas. Il pensiero vichiano della storia, proprio in rapporto al principio del peccato originale, è caratterizzato piuttosto dall'idea della provvidenza, cioè da una struttura antropologico-metafisica che è normativa condizione di possibilità dell'attuarsi di un certo ordine civile nella vicenda umana postlapsaria ed extragiudaica in opposizione alla tendenza alla dissoluzione catastrofica dei rapporti e alla metamorfosi ferina dell'umano. Per questo uno dei significati sintetici della "Scienza nuova" è d'essere "teologia civile", cioè comprensione della relazione teologico-metafisica che garantisce l'esistenza della civitas tra gli uomini. E per questo, ancora, la "Scienza nuova" non è scienza progettuale (volta all'indietro o in avanti), ma è «una nuova arte critica, che ne serva di fiaccola da distinguere il vero nella storia oscura e favolosa» e «un'arte come diagnostica», che, conoscendo le strutture fondamentali dell'antropologia storica, «ne dà il fine principale di questa scienza di conoscere i segni indubitati dello stato delle nazioni» Memorandum 5, out/2003 Belo Horizonte: UFMG; Ribeirão Preto: USP. http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/botturi01.htm Botturi, F. (2003). Caduta e storia: note sul "peccato originale" in G.B. Vico. Memornadum, 5, 18-35. Retirado em // , do World Wide Web: http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/botturi01.htm. 23 (Vico, 1725 / 1971, p. 304) (15), cioè in sintesi arte ermeneutica dello stato e del grado di attuazione della costituzione storica dell'uomo. Tentiamo, a questo punto, di ripercorre partitamente i grandi temi in oggetto: il rapporto tra storia sacra e quella profana; la natura del peccato originale; il nesso tra peccato e provvidenza storica. Storia sacra e storia profana La storia del popolo ebraico, che si identifica con la storia sacra nel regime dell'Antico Testamento, ha quattro caratteristiche che la contraddistinguono e la differenziano in rapporto alla storia profana: l'antichità, la continuità della sua tradizione narrativa, l'elevatezza morale della sua legislazione religioso-politica e la verosimiglianza della forma politica delle origini. Il racconto biblico delle origini - dice la Scienza nuova prima presenta caratteri di antichità esemplare, essendo «più antica» di quella più antica, cioè di quella mitica o «favolosa de' greci», che a sua volta è la più certa tra le tradizioni antiche, risultando «tronche, come le lor piramidi, [le cose] degli egizi» e «affatto oscure [quelle] dell'Oriente» (Vico, 1725 / 1971, p.179) (16). In secondo luogo - dice più avanti - «non si ritruovano nella sagra storia» «sozzi corrompimenti delle prime tradizioni de' fatti» (pp.271-272) (17), così che essa presenta una documentazione e propone una logica degli avvenimenti che non ha paragone con altri racconti d'origine. Il suo narratore, Mosé (secondo la tradizionale idea esegetica che lo vede autore dell'intero Pentateuco), è cronologicamente precedente (di ben milletrecento anni) la fonte pagana antica più accreditata, quella omerica, e «narra, con frase più poetica che non è quella di Omero» (Vico, 1744/ 1971, pp.423-424) (18). Inoltre - ed è il terzo carattere rilevante la Scrittura lega il racconto delle origini ad una dottrina teologica e morale così alta da essere confrontabile solo con le più nobili voci della filosofia greca, la metafisica di Platone e la morale di Socrate. In tal modo - mira a dire Vico - la tradizione ebraica testimonia «una perpetuità di civil discipline» cioè una continuità di elevati ordini etici, civili e politici che ne fanno un caso unico nella storia dell'umanità. Infine, Vico fa notare che la storia biblica presenta forti motivi di ragionevolezza politica, che ne attestato l'autenticità, in quanto «più spiegatamente che non fanno tutte le [storie] gentilesche, ne narra sul principio del mondo uno stato di natura, o sia il tempo delle famiglie, le quali i padri reggevano sotto il governo di Dio [...]» (Vico, 1744/ 1971, p.438) (19). Per questi suoi caratteri il racconto biblico delle origini costituisce per Vico la tradizione narrativa capace di aprire una via interpretativa della storia di tutta l'umanità, «il primo comun principio dell'umanità» (Vico, 1725/ 1971, p.179) (20) (21). Ma anche un altro tratto della narrazione biblica è significativo a tal fine, quello secondo cui essa, parlando delle origini e della loro corruzione, mette in scena anche una certa figura mostruosa dell'umanità, quella dei "giganti", di cui ci sono consistenti tracce anche nella letteratura pagana. Di giganti parla la Scrittura prima del diluvio, nella discendenza di Caino, e dopo il diluvio (22), in quella di Cam e Jafet, che a seguito dell'«empietà» finirono nella «libertà bestiale» e di qui appunto nel gigantismo «di vasti corpi e di forze sformate», effetto e ulteriore causa della disastrosa perdita della misura interiore. Ma di giganti parlano anche G. Cesare e Tacito a proposito dei «Germani antichi», mentre tracce del ricordo del diluvio e del prevalere del Caos sono presenti nella letteratura greca e in quella latina (Esiodo ed Ovidio). Si apre così - conclude Vico ulteriormente «l’unica via, finora chiusa, per rinvenire la certa origine della storia universale profana e della sua perpetuità con la Sacra» (Vico, 1725 / 1971, pp.209-210) (23). Ma soprattutto si apre la via per una interpretazione dello statuto della storia umana come sospesa tra due possibilità sempre aperte, rappresentate dai due tipi di nazione che il racconto biblico prospetta dopo il diluvio: «una di non giganti», come la progenie di Noé fedele alla tradizione dei padri ed «un'altra d'idolatri giganti» (p.210). La storia sacra, dunque, nella rappresentazione che ne fa Vico è indispensabile come criterio ermeneutico della stessa storia profana, pur restando nella sua distinzione di principio e separatezza di svolgimento; anzi ha tale funzione criteriologica proprio in forza della sua differenza. La teoria del peccato originale e delle sue conseguenze deformanti (teratologiche, si potrebbe dire in riferimento ai giganti), infatti, rinvia per contrasto ad una normatività relazionale e sociale, che è quella della condizione paradisiaca di Memorandum 5, out/2003 Belo Horizonte: UFMG; Ribeirão Preto: USP. http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/botturi01.htm Botturi, F. (2003). Caduta e storia: note sul "peccato originale" in G.B. Vico. Memornadum, 5, 18-35. Retirado em // , do World Wide Web: http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/botturi01.htm. 24 comunicazione dell'uomo con Dio e con l'altro uomo, e corrispettivamente offre parametri per comprendere la condizione decaduta e il suo costituirsi in storia. Tali parametri si unificano poi negli elementi costitutivi della "storia ideale eterna", con il suo ritmo evolutivo e la sua circolarità (24), e in ultima istanza nella Provvidenza, che costituisce la condizione di possibilità dell'esserci storico come tale. Ma di Provvidenza ha senso parlare proprio in rapporto ad una condizione storica compromessa dal peccato originale e perciò aperta alla distruzione o alla costruzione, all'involuzione o all'evoluzione, alla feritas o all'humanitas. Questa funzione strategica del peccato originale nell'ermeneutica storica è ben evidenziata dalla polemica che in rapporto ad esso viene istituita da Vico nei confronti del giusnaturalismo. Se, infatti, nel primo libro della Scienza nuova sono tracciate con ampiezza le linee del dibattito con Grozio, Selden e Pufendorf, quali rappresentanti tipici del diritto pubblico moderno, nel secondo libro ciò che viene loro attribuito è ricondotto, implicitamente ma chiaramente, ad una inadeguata concezione delle origini e in esse del ruolo del peccato originale. Che cosa imputa Vico al giusnaturalismo moderno? «Tre errori gravissimi»: l'identificazione del diritto delle genti con il diritto naturale dei filosofi; la conseguente trattazione del diritto delle genti solo nella sua forma più evoluta e universalistica, trascurando le sue modalità storiche, evolutive e differenziate; infine, la mancanza di «scienza e necessità» nell'interpretazione delle testimonianze storicoerudite. In comune queste critiche hanno l'idea di un fondamentale intellettualismo, che impedisce di comprendere davvero la logica storica della coscienza etico-giuridica delle nazioni. Esso infatti impedisce di cogliere il nesso tra le condizioni storiche particolari e l'universalità del valore. Per stare alla terminologia vichiana, diventa irrealizzabile la combinazione del diritto naturale «eterno nella sua idea» con i «costumi delle nazioni», la «conservazione privatamente de' popoli» con la «conservazione di tutto il genere umano», la «scienza e necessità» delle ragioni esplicative, che rinviano a un «ordine eterno», con le «occasioni» e le «guise» e i «tempi» dell'accadere. Ma queste separazioni impediscono la formulazione di un pensiero non nominale della storia. Così, paradossalmente, il pensiero giusnaturalistico, che vorrebbe essere fautore di un pensiero dell'universale etico, finisce per privilegiare le motivazioni empiristiche e utilitaristiche dell'agire sociale (25). Questi errori gravidi di grandi conseguenze dipendono da una falsa interpretazione delle origini e della loro decadenza. È significativo, in proposito, che Vico osservi, già nel secondo libro della Scienza nuova prima, che la condizione originaria, ipotizzata dai giusnaturalisti e in particolare da Grozio e da Pufendorf per giustificare l'istituzione della società umana, dia una descrizione dell'uomo che corrisponde a quella dell'uomo decaduto. Grozio pone l'uomo nella condizione della «solitudine e, perché solo, quindi anche debole e bisognoso di tutto» (Vico, 1725 / 1971, p.190) proprio come dopo il peccato originale e dopo il diluvio quanti non restarono fedeli al «vero Dio de' loro padri Adamo e Noé» (Idem), che finirono nella «libertà bestiale» e «a perdere ogni socievole costume, per questa gran selva della terra dispersi» (Idem). Similmente Pufendorf pensa l'uomo «venuto in questo mondo, ma abbandonato da sé, non già dalla cura ed aiuto di Dio» (Idem). Da parte sua Selden «pose princìpi comuni alle nazioni gentili ed agli ebrei, senza distinguere un popolo assistito da Dio sopra le altre nazioni tutte perdute», non riconoscendo così la specificità della dimensione religiosa della storia profana (26). Ciò che Vico intende dire è che anche i giusnaturalisti razionalisti riconoscono la condizione bisognosa, anzi misera degli inizi (cronologici e assiologici) della storia umana, ma non la riconoscono come condizione decaduta, cioè come conseguenza del peccato originale e, quindi, la naturalizzano, ritenendo che, se essa è la condizione primordiale dell'uomo come tale, essa può essere vissuta e rimediata con le sole risorse umane, senza relazione alla logica prioritaria e alla forza superiore della Provvidenza: «niuno degli tre - conclude infatti Vico -, nello stabilire i suoi princìpi, guardò la provvedenza» (Vico, 1725/ 1971, p.176) (27). Invece, il riferimento alla Provvidenza indica il nesso tra l'oggetto elementare dell'azione dell'uomo ovvero le «necessità» e le «utilità», i suoi bisogni e i suoi interessi, e la relazione strutturale della mente al «vero eterno», in virtù della quale l'uomo non è del tutto «abbandonato» a se stesso e alla sua indigenza. Che la storia umana sia successiva Memorandum 5, out/2003 Belo Horizonte: UFMG; Ribeirão Preto: USP. http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/botturi01.htm Botturi, F. (2003). Caduta e storia: note sul "peccato originale" in G.B. Vico. Memornadum, 5, 18-35. Retirado em // , do World Wide Web: http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/botturi01.htm. 25 e dipendente dal peccato d'origine significa infatti che l'uomo reale non si trova nella condizione della pura comunione con il vero e della perfetta comunicazione con i suoi simili, ma che neppure è del tutto abbruttito nella condizione della sua immediatezza sensibile. In termini più precisi l'uomo primordiale vichiano non si trova né nella condizione della "simplicitas" innocente e autosufficiente, benché debole di Grozio, né in quella radicalmente solitaria e ostile di Hobbes. Nella condizione catastrofica del gigantismo l'uomo ha ancora la possibilità di un recupero di umanità, nella misura in cui gli riesce di penetrare con la luce della relazione metafisica la greve materia della sua vita pulsionale, dando inizio con quelle prime configurazioni intelligibili che sono gli "universali fantastici", i mitemi originari, al mondo umano della comunicazione religiosa, del legame civile e della trasformazione produttiva della terra. In tal modo la centralità antropologica del dogma del peccato originale nella costruzione vichiana è funzionale alla critica dell'impostazione filosofica sia del giusnaturalismo razionalistico, sia dell'utilitarismo materialistico (che secondo Vico funzionano come opposti reversibili). Il peccato originale, infatti, è una categoria antropologica utile per rendere pensabile la connessione di indigenza mentale e di razionalità, di individualità egoistica conflittuale e di socialità comunicativa, di impotenza e di progresso. In questa coesistenza di latenza ed urgenza della ragione è posta per Vico la chiave della condizione storica dell'uomo in cui si svolge il gioco della libertà e della «storia degli ordini che quella [la provvidenza], senza alcun verun umano scorgimento o consiglio, e sovente contro essi proponimenti degli uomini, ha dato a questa gran città del genere umano» (Vico, 1744/ 1971, p.465) (28). La natura del peccato originale Sulla natura del peccato originale Vico non intraprende analisi specifiche; anzi si limita a brevi cenni. Ciononostante è necessario capire la caratterizzazione in essi contenuta per poter intendere dall'interno la funzione che al peccato d'origine è attribuita nell'economia storica delle nazioni. Nel Diritto Universale (Vico, 1721 / 1974) il peccato di Adamo è presentato, secondo una tradizionale visione teologica scolastica, come peccato di superbia, a somiglianza di quello degli angeli, che vollero competere con Dio, «esse ut Deus appetiere», con perfetta coscienza della loro trasgressione. «Ex eodem ferme genere Ada peccavit» (p.403), in quanto, essendo incorrotto, poteva non ascoltare il suggerimento del cattivo desiderio («cupiditas»); cui invece diede retta tramite l'invito del demone cattivo, a preferire non un bene corporale finito, ma «infinitum bonum animi, ipsam Dei sapientiam» (Idem), promettendogli - secondo il racconto genesiaco - la scienza del bene e del male (29). La pretesa di possedere la stessa sapienza divina fa perdere ad Adamo quella che egli realmente possedeva a misura della sua natura creata: «Ada integer mente pura contemplabatur Deum, puro animo diligebat» (Idem, p. 357). Questo era il suo «Dei cultus», costituito da «castitas mentis» e «animi pietas», rivolte a Dio e insieme ai propri simili (30). Il peccato originale ha privato Adamo «aeterni veri cognitione pura» e dalla privazione di questa visione umanamente adeguata del vero venne una innaturale e quindi nefasta divisione della originaria «sapientia integra et vere heroica» in sapienza come «contemplatio» delle cose più alte e sapienza come «prudentia» relativa alle cose civili. Effetto del peccato originale fu così la separazione e la contrapposizione tra ragion speculativa e ragion pratica; cioè un'alterazione dell'organismo della sapienza, che determinò l'involuzione e lo smarrimento sia della verità speculativa sia di quella pratica, come risulta dalla antropologia vichiana dell'uomo decaduto, di cui poi si dirà più in dettaglio (31). Questa rappresentazione tradizionale del peccato originale si specifica nella Scienza nuova nell'idea che l'essenza della colpa consista in un desiderio curioso di conoscere l'avvenire, cosa propria solo della sapienza divina. «Tale curiosità - scrive infatti Vico nella prima pagine della Scienza nuova prima -, per natura vietata, perché cosa propia di un Dio mente infinita ed eterna, diede spinta alla caduta de' due prìncipi del genere umano: per lo che Iddio fondò la vera religione agli ebrei sopra il culto della sua provvedenza infinita ed eterna, per quello stesso che, in pena di avere i suoi primi autori Memorandum 5, out/2003 Belo Horizonte: UFMG; Ribeirão Preto: USP. http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/botturi01.htm Botturi, F. (2003). Caduta e storia: note sul "peccato originale" in G.B. Vico. Memornadum, 5, 18-35. Retirado em // , do World Wide Web: http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/botturi01.htm. 26 desiderato di sapere l'avvenire, condannò tutta la umana generazione a fatiche, dolori e morte» (Vico, 1725 / 1971, p.172) (32). Questa idea passerà identicamente nella Scienza nuova seconda, che ha come uno dei suoi fondamenti la "degnità" XXIV, che recita: «La religione ebraica fu fondata dal vero Dio sul divieto della divinazione, sulla quale sursero [invece] tutte le nazioni gentili. Questa Degnità è una delle principali cagioni per le quali tutto il mondo delle nazioni antiche si divise tra ebrei e genti» (Vico, 1744/ 1971, p. 438) (33). La presunzione di sapienza, che, eguagliandosi alla «mente infinita ed eterna» di Dio, se ne arroga la proprietà della conoscenza del futuro e con essa la capacità di condurre da sé la propria esistenza, precipita l'uomo in una condizione inferiore, in cui non contempla neppure quella parte di sapienza che gli era riservata come creatura intelligente. Restando privo della guida sapiente che gli è indispensabile per condursi nella vita, l'uomo avverte la necessità di ricorrere a fonti di sapienza alternativa, che possano assicurare in qualche modo un'energia superiore ed una conoscenza del necessario e del possibile; in altri termini all'uomo decaduto e non eletto come il popolo ebraico furono indispensabili l’idolatria e la divinazione. L'uomo integro - osserva il De constantia iurisprudentis - contemplava l'«aeternum verum mente pura», mentre «in corruptione homines caelum oculis contemplari coeperunt», perché se nella prima originaria condizione l'uomo «vitae agenda a Deo ipso discebat», nello stato corrotto il genere umano «contemplatione caelum de vita agendis consulebat» (Vico, 1721 / 1974, p. 361). In coerenza con questa concezione la pagina iniziale della Scienza nuova prima recita: «Quindi le false religioni tutte sursero sopra l'idolatria, o sia il culto di deitadi fantasticate sulla falsa credulità d'esser corpi forniti di forze superiori alla natura, che soccorrano gli uomini ne' loro estremi malori; e l'idolatria [è] nata ad un parto con la divinazione, o sia la vana scienza dell'avvenire e certi avvisi sensibili, creduti esser mandati agli uomini dagli déi» (Vico, 1725/ 1971, p. 172) (34). La condizione storica decaduta è vissuta perciò necessariamente nell'inganno delle "false religioni" e in un certo senso nella indefinita reiterazione del peccato della "curiosità" originale: le forme idolatriche e divinatorie sono infatti la prosecuzione - la istituzionalizzazione, si potrebbe dire - del peccato originale. Eppure questa situazione porta in sé una paradossale positività, perché divinazione e idolatria implicano una certa verità, quella di conservare comunque il legame con il divino e di inserirlo nell'azione umana come un ordine trascendente che sottrae la condizione umana alla pulsione distruttiva del bisogno: «sì fatta vana scienza [la divinazione], dalla quale dovette incominciare la sapienza volgare di tutte le nazioni gentili, nasconde però due gran princìpi di vero: uno, che vi sia provvidenza divina che governi le cose umane; l'altro, che negli uomini vi sia libertà d'arbitrio, per lo quale, se vogliono e vi si adoperano, possono schivare ciò che, senza provvederlo, altramenti loro appartenerebbe» (Vico, 1725/ 1971, p. 172) (35). Non diversamente per la Scienza nuova seconda «la sapienza tra' gentili» cominciò con la poesia sacra che era una «scienza del bene e del male, la qual poi fu detta divinazione», che «dovett'essere propiamente dapprima la scienza in divinità d'auspìci; la quale [...] fu la sapienza volgare di tutte le nazioni di contemplare Dio per l'attributo della sua provvedenza, per la quale, da divinari, la di lui essenza appellossi divinità» (Vico, 1744/ 1971, p. 471) (36). In tal modo la punizione per la colpa dei progenitori non significa - come già s'è detto puro abbandono da parte di Dio e rottura d'ogni legame con la divinità da parte dell'uomo, perché questo coinciderebbe semplicemente con la distruzione della condizione umana, bensì caduta in una condizione in cui le stesse identificazioni della sapienza divina - come è il caso dell'idolatria e della divinazione - veicolano la possibilità di ritrovare la via del vero, che nel corso del tempo prenderà una duplice forma, quella pratica della coscienza giuridica, pienamente realizzata nella storia del diritto romano, e quella speculativa del sapere metafisico greco. In tal modo ciò che per la sua materia segna la distanza dal vero (idolatria e divinazione), è anche ciò che permette per la sua forma di ripercorrere il cammino all'inverso, almeno fino alla chiara coscienza della dipendenza umana da una sapienza superiore trascendente. In questo tragitto della coscienza falsa verso la sapienza vera sono contenuti compiutamente il senso antropologico e la legalità metafisica della storia umana. Ciò che Memorandum 5, out/2003 Belo Horizonte: UFMG; Ribeirão Preto: USP. http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/botturi01.htm Botturi, F. (2003). Caduta e storia: note sul "peccato originale" in G.B. Vico. Memornadum, 5, 18-35. Retirado em // , do World Wide Web: http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/botturi01.htm. 27 infatti il peccato originale ha prodotto è una sorta di latenza del senso del vero metafisico e del vero pratico (giustizia), che è paragonabile alla latenza delle nozioni prime che lo sviluppo cognitivo porta alla luce. Come afferma la Scienza nuova prima, «siccome in noi sono sepolti alcuni semi eterni di vero, che tratto tratto dalla fanciullezza si van coltivando, finché con l'età e con le discipline provengono in ischiaritissime cognizioni di scienze, così nel genere umano per lo peccato furono sepolti i semi eterni del giusto, che tratto tratto dalla fanciullezza del mondo, col più e più spiegarsi la mente umana sopra la sua vera natura, si sono iti spiegando in massime dimostrate di giustizia. Serbata sempre cotal differenza però: che ciò sia proceduto per una via, distinta, nel popolo di Dio e per un'altra, ordinaria, nelle gentili nazioni» (Vico, 1725/ 1971, p. 190) (37). Peccato e Provvidenza La natura umana corrotta porta dunque in sé la sua regola provvidenziale. Il senso della Provvidenza "naturale" non è da cercare in qualche ordinamento esteriore cui l'azione umana sia sottomessa, compromettendone le libertà, ma - per così dire - in un dispositivo interiore, che anche nel caso dell'abrutimento preserva l'uomo dalla rottura definitiva con il "vero eterno", ponendosi dunque come salvaguardia della libertà nei confronti della sua possibile autodistruzione. La questione della Provvidenza, infatti, fa tutt'uno in Vico con quella della "metafisica delle mente", come egli chiama nell'opera della maturità la relazione costitutiva della mente al vero. Come illustra la famosa "Dipintura" della Scienza nuova seconda, una luce proveniente dall'alto è la condizione di composizione e di intelligibilità del mondo. È il raggio luminoso della sapienza originaria, da cui ancora l'uomo è illuminato anche dopo il peccato originale, perché senza di essa la sua umanità semplicemente sprofonderebbe in modo irreversibile nelle tenebre dell'inumano. Quel dispositivo ha un nome: il "pudore". Dio, infatti, che "semplicissimis rationibus agit et regit cuncta" - dice il De constantia iurisprudentis (Vico, 1721 / 1974, p. 405) (38) in assonanza con Malebranche -, prevedendo il peccato del progenitore e la corruzione della "generis humani naturam", con essa l'ottundimento della ragione a causa della "cupiditas" e il prevalere dei sensi sulla mente, "hominem ita fabricarat ut pudore afficeretur, qui universi iuris naturalis fons est". Infatti a motivo della perdita dell'originaria semplicità, cioè della "contemplatio veri eterni ex mente pura", "statim pudor successit" (Vico, 1721 / 1974, p. 361) e i due progenitori si riconobbero nudi (39). Il pudore è insomma la conservazione della relazione al vero eterno nella condizione postlapsaria ovvero, nei termini dell'opera della maturità, il pudore è la forma che la "metafisica della mente" e la sua comunicazione sapienziale assumono dopo la caduta. Dopo il peccato, però, la sapienza non può più essere attinta nella forma della "pura contemplazione", bensì solo in quella che è concessa ad un uomo nel quale la sensibilità prevale sulla ragione, rendendola impotente a governare l'esistenza. Per questo si può dire che il pudore è una sorta di sapienza dei sensi (esterni ed interni), che opera spontaneamente e permette all'azione umana di non essere il puro risultato di una reattività passiva e distruttiva (40). Il decadimento umano non coincide con la sua totale e irrecuperabile alienazione, perché l'azione umana può ancora essere misurata da una certa presenza della verità nei rapporti degli uomini. Il fatto che nel Diritto Universale ricorra come sintagma fondamentale l'espressione «vis veri», sta appunto ad indicare che, nell'impossibilità di un rapporto dispiegato con il vero, questo fa sentire la sua esigenza e la sua urgenza, cioè il vigore di una presenza latente ma attiva ed efficace nella mente umana. Il pudore è definito da Vico in termini di pena inflitta da Dio all'uomo peccatore, come «erroris seu malefacti conscientia, quae nihil aliud est nisi veri ignorati pudor» (Vico, 1721 / 1974, p. 405) (41). Questa definizione non intende dire solo che dopo il peccato originale l'uomo ha coscienza, per quanto vaga, di una sua condizione di colpevole ignoranza del vero, ma che questo senso di inadeguatezza è anche condizione di possibilità dell'istituzione di qualsiasi relazione, perché non permette all'uomo di operare con piena e quindi ottusa adeguatezza a se stesso. Se l'uomo, infatti, non avvertisse il disagio della sua inadeguatezza, continuerebbe a inseguire la sua brama di soddisfazione immediata, la sua e-norme e spropositata ricerca di autoaffermazione, che lo rende deMemorandum 5, out/2003 Belo Horizonte: UFMG; Ribeirão Preto: USP. http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/botturi01.htm Botturi, F. (2003). Caduta e storia: note sul "peccato originale" in G.B. Vico. Memornadum, 5, 18-35. Retirado em // , do World Wide Web: http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/botturi01.htm. 28 forme e simile ad una bestia solitaria e feroce. Il senso del pudore, invece, introduce l'avvertenza di una norma ed una proporzione ignorate dall'immediatezza pulsionale, facendone sentire la mancanza colpevole. Ma è questa avvertenza che rende possibile un'autentica iniziativa, perché, distaccando dall'immediatezza della passione, apre lo spazio per la mediazione dell'azione. Il senso del pudore, infatti, segna il passaggio dalla confusione alla relazione con il mondo. La rappresentazione icastica di questo sarà data nella Scienza nuova con la celeberrima immagine del bestione che per il timore del tuono e del fulmine leva in alto lo sguardo, sospende la sua esistenza randagia e selvaggia, consumata nell'attrattiva senza remore del cibo e del sesso, e diventa capace di relazione con gli dèi, gli uomini e le cose; inizia cioè ad avere mondo (42). Il pudore è così la nozione centrale dell'antropologia vichiana, perché costituisce la stessa forma umana dell'azione. Lo stesso Vico lo afferma, quando scrive che pudore e libertà sono i due princìpi costitutivi della «humanitas», ma aggiunge che nel complesso antropologico il pudore ha funzione di «forma» rispetto ad una «materia» rappresentata dalla stessa libertà: «forma pudor, materies humanitatis libertas» (Vico, 1721 / 1974, p. 403). Il pudore è così il principio attivo e formatore che sollecita e indirizza la libertà (43) e in tal modo la riscatta dalla sua servitù ad una sensibilità ottenebrata e passionale. Si può comprendere allora perché - come già si citava - il pudore sia considerato da Vico come «universi iuris naturalis fons». In quanto presiede all'apertura della «humanitas» come tale, ne è principio formatore e condizione di mantenimento e di crescita, esso costituisce la dimensione antropologica trascendentale, la condizione prima di possibilità dell'agire umano in quanto umano e perciò la misura assiologica dell'agire stesso: in forza del pudore l'uomo decaduto è storicamente capace in senso proprio di azione e di relazione, in quanto diventa capace di giustizia. La coscienza assiologica del pudore sta dunque a capo dell'intera antropologia storica. Esso anima e orienta l'intera gamma dell'agire umano con l'introdurvi un principio di mediazione oggettiva, che distanzia l'attività umana dalla pura re-azione e le dà la forma autentica dell'azione (che è per Vico sempre anche relazione e comunicazione). Questa idea è contenuta nella tesi generale secondo cui, l'uomo essendo stato privato della «cognitio veri ex mente pura», «substitutum est vero certum» (Vico, 1721 / 1974, p. 361) (44). Alla chiara visione mentale del vero subentra il certo (anzitutto sensibile) delle oggettivazioni pratiche, il cui statuto epistemologico sta appunto in una disposizione delle cose e dei rapporti in virtù di un senso che trascende l'immediatezza della reazione individuale. In questa prospettiva la prima oggettivazione del pudore è la religione. Alla perdita della «pietas» originaria subentrò la «religio, quae est numinis metus; et ideo metus est quia nos admonet numen laesisse» (Vico, 1721 / 1974, p. 405) (45). Attraverso la mediazione delle forme religiose (miti, riti, cerimonie, formule, oggetti e tutto l'apparato della sacralità) viene espressa ed elaborata la consapevolezza del legame e insieme della distanza dalla divinità, avvertita come imponente e minacciosa. Il pudore genera infatti forme mediatrici che nascono dall'avvertenza di una relazione e insieme di una distanza colpevole. Ma come il pudore è a fondamento della relazione religiosa, così è al principio anche della relazione tra gli umani, che dal peccato sono resi estranei e avversari gli uni degli altri. Il pudore rende possibili le relazioni e gli scambi tra gli uomini, introducendovi la dimensione morale, cioè la coscienza di una misura che non è a disposizione dei singoli e che come tale ne sovrasta gli interessi. Il pudore avverte il valore del «commune hominum iudicium»; «ex pudore - infatti - est sensus communis reverentia», il pudore ispira il rispetto del comune giudizio degli uomini e fa avvertire come pena l' «infamia» per la trasgressione. A partire di qui, cioè da una sensibilità morale ancora esteriormente determinata ma non per questo inautentica, prendono forma gli abbozzi delle virtù morali come la «temperantia» e la «iustitia», attraverso i costumi rispettivamente della «frugalitas», della «probitas» e della «promissi fides», della «dicti veritas» e della «alieni abstinentia» (Vico, 1721 / 1974, p. 405) (46). Su questa base diventa possibile una trattazione comune dell'utile, cioè la possibilità di fare permute e scambi in natura e di istituire e accettare arbitrati in merito alla valutazione delle utilità in gioco, quali giudizi secondo il Memorandum 5, out/2003 Belo Horizonte: UFMG; Ribeirão Preto: USP. http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/botturi01.htm Botturi, F. (2003). Caduta e storia: note sul "peccato originale" in G.B. Vico. Memornadum, 5, 18-35. Retirado em // , do World Wide Web: http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/botturi01.htm. 29 criterio della «bona fides» (Idem, p. 419), che «pudore plurimum constant» (Idem, p. 407) (47). Il pudore insomma introduce quella dimensione fiduciale nei rapporti, che precede l'stituzione e la rende possibile. Infine, il pudore detta anche la regola dei costumi sessuali sottratti alla spontaneità ferina: intimiditi dall'aspetto del cielo creduto un dio, «a pudore tandem in statu exlegi admoniti, [...] promiscuam venerem ferarum ritu abhorruere» (Idem, p. 407)e con l'auspicio di qualche segno celeste «certas sibi uxores in omne vitae consortium destinarunt» (Idem). Questa fu la condizione fondamentale del passaggio dalla condizione di «ignavi errones», vagabondi in cerca di cibo all'istituzione del «certis sedibus [...] consedere et occupatas terras colere» (Idem) e, quindi, dell'inizio della vita sociale stabile e della sua evoluzione storica dal regime delle famiglie, alle genti maggiori e da queste alle repubbliche e agli imperi (48). Infine, oltre che principio della relazione ai divini e agli umani, il pudore è anche fondamento del rapporto al mondo delle cose. In quanto libera l'uomo dalla pura soggezione allo stimolo del bisogno, il pudore apre anche lo spazio per un interessamento conoscitivo al mondo e per una sua manipolazione progettuale. «Curiositas» e «industria» sono così i due atteggiamenti elementari che stanno a fondamento di ogni civiltà. Infatti, afferma Vico (1721 / 1974, p. 409), «ignorati veri pudor vim animi intendit quatenus menti imperat, ut in vestigando vero pertendat donec habeat exploratum»: questa è la «curiositas», con cui il senso di un vero noto ma non ancora conosciuto stimola la mente a ricercarlo e ad investigarlo. Analogamente, sul piano pratico, il pudore dota l'uomo della industriosità, cioè della capacità di costruire, di accostare secondo un ordine; «industria» - avverte Vico - viene da «struere», come un accatastamento ordinato delle cose che ha procurato agli uomini «omnia humanae vitae commoda» (Idem, p. 419) (49). In sintesi, il pudore è quella «una naturalis et simplicissima via» con cui Dio punì il peccato del progenitore («primi parentis peccatum plexit»), ma in cui anche racchiuse tutto il diritto naturale («omne ius naturale continuit»); è insomma la traccia normativa secondo cui l'uomo può ritrovare la via della sapienza (civile). Infatti «[Deus] per natam ex pudore vim animi [...] bonas artes omnes in homine lapso eduxit, per quas naturaliter sociatos sustinuit ac servavit» (Vico, 1721 / 1974, p. 409): il pudore è la scaturigine della forza d'animo che permette all'uomo di ristabilire una relazione di senso con i suoi simili e di essere soggetto storico della sua opera civile (50). La divina Provvidenza, dunque, agisce precisamente attraverso ciò che costituisce la condizione improvvida dell'uomo. Ciò che di per sé condurrebbe alla rovina l'umanità è occasione per la costruzione storica dell'umanità stessa. Vi è dunque un «constans simplicissimus ordo», che «per ea ipsa, per quae genus humanum in sui exitium erat ruiturum, tot vitae socialis commodis quot fruimur, ditavit et auxit» (Idem). Questo costituisce ciò che nella Scienza nuova seconda sarà chiamata «una dimostrazione, pe così dire, di fatto istorico della Provvedenza» (Vico, 1744 / 1971, p. 465) (51), cioè la testimonianza di un paradosso storico che invoca la Provvidenza antropologico-metafisica come unica ipotesi esplicativa. Se infatti la si negasse, bisognerebbe anche ammettere che l'uomo è privo di quella relazione al vero che lo trascende e dunque è totalmente consegnato all'egoismo della ricerca della sua esclusiva utilità, come vorrebbero Epicuro, Machiavelli, Hobbes, Spinoza e Bayle, e con loro tutti quelli che, pur da diverse posizioni filosofiche, convengono nell'affermare che la società umana non è altro che prodotto e funzione dell'utile soggettivamente percepito. Questo però - secondo Vico significherebbe attribuire la nascita e il mantenimento della società umana al «caecus Casus» oppure alla «caeca Necessitas» (Vico, 1721 / 1974, p. 409). Ma nell'una né l'altra ipotesi sono adeguate a render conto del fatto che ciò che l'uomo egoista ha instaurato e instaura continuamente è un ordine intelligente (come sono lo spazio mercantile, l'«emporium», e l'iniziativa trasformatrice, Y «industria»), che supera le intenzioni e le aspettative dei singoli. L'unica conclusione adeguata è invece quella che, a partire dall'opera storica dell'uomo, afferma che la «hominis natura» non è tale che «hominem homini lupus facit», bensì «illum aut illum hominem homini dictat Deum esse» (Idem, p. 411) (52). Il prevalere del lato ferino dell'uomo può sembrare una realistica descrizione della sua vita associata e, invece, esibisce solo la condizione corrotta dell'uomo e ignora Memorandum 5, out/2003 Belo Horizonte: UFMG; Ribeirão Preto: USP. http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/botturi01.htm Botturi, F. (2003). Caduta e storia: note sul "peccato originale" in G.B. Vico. Memornadum, 5, 18-35. Retirado em // , do World Wide Web: http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/botturi01.htm. 30 proprio ciò che rende ragione degli effetti positivi del suo fare, quel principio di conoscenza del vero che costituisce l'elemento divino nell'uomo ed insieme il principio della comunicazione con i suoi simili. Queste pagine del Diritto Universale anticipano altre importanti e famose della Scienza nuova in cui i temi sono ripresi senza modificare l'impostazione fondamentale, ma anzi presupponendola sempre (53). Vi sono comunque tre novità che la Scienza nuova presenta nel trattare l'argomento. Anzitutto l'elaborazione della "logica poetica" come mediazione antropologica del rapporto sociale-mondano e una più consapevole trattazione del farsi preterintenzionale della storia. Si tratta di due lati significativi dell'analisi dei modi con cui opera la Provvidenza nel regime storico dell'uomo decaduto. Rispetto al Diritto Universale, infatti, il discorso vichiano ha acquisito l'idea della centralità antropologica dell' "universale fantastico" e della logica conoscitiva-affettiva che gli è connessa, così che quella "sapienza dei sensi" di cui già si diceva acquista nella Scienza nuova un rilievo inedito e riceve uno sviluppo di eccezionale importanza. Sul versante della preterintenzionalità, invece, il Vico della maturità manifesta un senso più dialettico dello svolgimento storico. Qui infatti il confronto non è più limitato agli scettici e agli ateisti, ma si estende anche ai giusnaturalisti e ai moralisti soprattutto di matrice giansenista, come un Nicole, donde la nuova attenzione al tema dell' "amor proprio" e alla sue maschere. Di qui un senso accentuato del paradosso di divergenza e insieme di funzionalità esistenti tra libertà umana individuale e legge provvidente universale (cfr. Botturi, 1991). La terza novità è il tema del "senso comune" che sintetizza in modo inedito, benché non discontinuo, i contenuti antropologici fondamentali in cui si specifica il pudore nella sua funzione provvidenziale. La figura del senso comune è uno e plurimo insieme, come plesso unitario e universale di «tre sensi comuni del genere umano», da cui è costituita l'«umanità» dell'uomo: «che vi sia provvedenza; [...] che si facciano certi figliuoli con certe donne [...]; che si seppelliscano i morti» (Vico, 1725 / 1971, pp. 172-173), come recita una delle sue formulazioni (54). «Religioni natie, nozze tra loro e mortori nelle propie terre», osserva Vico, sono le tre cose che «tutte le nazioni con somme cerimonie e ricercate solennità custodiscono», perché «questo è 'l senso comune di tutto il genere umano: che sopra questi tre costumi, più che in tutt'altri, stien ferme le nazioni, acciocché non ricadano nello stato della bestial libertà; ché tutti e tre son pervenuti da un certo rossore del cielo, de' vivi e de' defunti» (Vico, 1725 / 1971, p. 305) (55). Ancora una volta e con bella sintesi Vico propone quale chiave di lettura della storicità umana il pudore, come ciò in cui avviene la mediazione tra la condizione decaduta e il senso del vero in rapporto alle relazioni umane fondamentali. Il pudore è il luogo antropologico in cui il peccato originale è assunto nell'ordine della provvidenza e quindi contenuti umani essenziali come il senso dell'ignoto e il timore, la sessualità e la generazione, l'occupazione della terra e la morte sono trasformati in relazioni stabili e diventano oggetto di comunicazione. Religione, matrimonio e rito funerario oggettivano il pudore e 10 rendono istituzione e garanzia dell'esistenza sociale e insieme criterio ermeneutico del grado di civiltà di un popolo: quanto più salda è la pratica del "senso comune", tanto più elevata é Vhumanitas; quanto più è incerta o contraddetta, tanto più la città degli uomini é minacciata dalla dissoluzione della "bestial libertà". 11 peccato originale ha così in Vico un fondamentale significato "politico", entro il quale il pudore gioca la funzione determinante del discrimine tra l'incidenza del peccato originale come catastrofe oppure come evento provvidenziale. Riferimenti bibliografici Bligny, M. (1973). Il mito del diluvio universale nella coscienza europea del Seicento. Rivista storica italiana, 1, 47-63. Boschetto, L. (1994-95). Vico e i "figliuoli di Dio". Ricerche sui giganti nel Diritto Universale e nella Scienza nuova Prima. Bollettino del Centro di Studi Vichiani, XXIV-XX, 79-95. Memorandum 5, out/2003 Belo Horizonte: UFMG; Ribeirão Preto: USP. http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/botturi01.htm Botturi, F. (2003). Caduta e storia: note sul "peccato originale" in G.B. Vico. Memornadum, 5, 18-35. Retirado em // , do World Wide Web: http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/botturi01.htm. 31 Botturi, F. (1991). La sapienza della storia: GB Vico e la filosofia pratica. Milano: Vita e Pensiero. Capistro, A. (1987-88). Ricerche su Vico e la storia ebraica. Annali dell'Istituto Italiano per gli Studi storici, X, 183-212. Croce, B. (1965). La filosofia di G.B. Vico. Bari: Laterza. (Edizione originale nel 1911). De Lubac, H. (1991). Surnaturel: etudes historiques. Nouvelle ed. Paris: Desclée de Brouwer. Del Noce, A. (1990). Il problema dell'ateismo. 4. ed. Bologna: Il Mulino. (Edizione originale nel 1964). Gunkel, H. (1901). Genesis übersetzt und erklärt. Göttingen: Vandenhoeck & Ruprecht, Malebranche, N. (1964). Recherche de la verité. t. III (G. Rodis-Lewis, Éd.). Paris: Vrin. (Edizione originale nel 1674-75). Marcus, F.R. (1995). Vico and the hebrews. New Vico Studies, 13, 14-27. Mazzola, R. (1994-1995). I giganti in Vico. Bollettino del Centro di Studi Vichiani, XXIVXX, 49-78. Nicolini, F. (1949). La religiosità di Giambattista Vico: quattro saggi. Bari: Laterza. Pasini, D. (1977) "Autorità" e "libertà" in Vico. In D. Pasini. Problemi di filosofia politica. (pp. 111-134). Napoli: Jovene. (Pubblicazioni della Facoltà giuridica dell'Università di Napoli, 160). Popkin, R.H. (1989). Isaac de la Peyrère and Vico. New Vico Studies, VII, 79-81. Porro, P. (1992). Storia sacra e storia profana in Vico. In AA.VV. Metafisica e teologia civile in G.B. Vico. (A. Lamacchia, a cura di). (pp. 159-226). Bari: Levante Ed. Vico, G.B. (1929). L'autobiografia, il carteggio, e le poesie varie. 2 ed. (B. Croce, Curat.). Bari: Laterza. (Originali del 1693-1744). Vico, G.B. (1971). Opere filosof iche. (P. Cristofolini, Curat.). Firenze: Sansoni. Vico, G.B. (1974). De constantia iurisprudentis. In G.B. Vico. Opere giuridiche: il diritto universale. (P. Cristofolini, Curat.). Firenze: Sansoni. (Originale del 1721). Zoli, S. (1991). Il preadamitismo di Isaac de la Peyrère nell'età previchiana e il libertinismo europeo del Seicento. Bollettino del Centro di Studi Vichiani, XXI, 6 1 77. Note (1) Sul rapporto di storia sacra e storia profana in Vico negli studi più recenti cfr. Momigliano, A. (1966). Vico's 'Scienza nuova': roman "bestioni" and roman "eroi". History and theory, VII, 3-23; Rossi, P. (1969). Le sterminate antichità: studi vichiani. Pisa: Nistri-Listri; Rossi, P. (1979). I segni del tempo: storia della terra e storia delle nazioni da Hooke a Vico. Feltrinelli: Milano; Pastine, D. (1980). Teocrazia e storia sacra in Kircher a Vico. Bollettino del Centro di Studi Vichiani, X, 150-167; Bedani, G. (1989). Vico revisited: orthodoxy, naturalism and science in the 'Scienza nuova'. Oxford: Berg. Una più recente e specifica delineazione del problema è di Porro (1992): Storia sacra e storia profana in Vico. (2) Cfr. Croce (1911/1965) pp. 139-140 e Nicolini (1949) p.176 e sgg. La forzatura dell'interpretazione "laica" dell'opera vichiana non toglie la verità storica dei problemi di censura inquisitoriale che riguardarono Vico, oggi precisamente documentati da Costa, G. (1999). Vico e l'Inquisizione. Nouvelles de la République des Lettres, II, pp. 93-124. (3) Sulla lettura delnociana di Vico mi permetto rinviare a Botturi, 1995. Vico nel pensiero di A. Del Noce. In AA.VV. A. Del Noce: il problema della modernità. (pp.95106). Roma: Studium. Memorandum 5, out/2003 Belo Horizonte: UFMG; Ribeirão Preto: USP. http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/botturi01.htm Botturi, F. (2003). Caduta e storia: note sul "peccato originale" in G.B. Vico. Memornadum, 5, 18-35. Retirado em // , do World Wide Web: http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/botturi01.htm. 32 (4) Cfr. sull'argomento Corsano, A. (1937). Il pensiero religioso italiano. Bari: Laterza, p. 127 e Corsano, A. (1949). Interpretazioni cattoliche di Vico. Rivista di Filosofia, 3, 313314. (5) Su De la Peyrère fa testo la monografia di R.H. Popkin, Isaac La Peyrère (1594-1676: his life, his ideas and his influence. Leiden; New York: Brill, 1987. L'opera di I. De la Peyrère è il tomo composto dall'opuscolo Prae-Adamitae, sive Exercitatio super versibus XII, XII, & XIV capitis quinti Epistulae D. Pauli ad Romanos e dal trattatello Systema theologicum ex Prae-adamitarum Hypotesi: Pars Prima (cui non seguì mai la seconda parte, anche a causa dell'abiura che l'Autore fece delle sue tesi per porre fine alle persecuzioni inquisitoriali), edito ad Amsterdam nel 1655. (6) Secondo R.H. Popkin (1989) l’opera del La Peyrère ebbe forte influenza su Vico, addirittura costituisce - in conformità al parere anche di Momigliano - un obettivo polemico fondamentale della sua opera maggiore. La strategia di risposta di Vico starebbe nel far propria la tesi della separazione tra storia ebraica e storia pagana, ma con un significato opposto: quello di riconoscere la storia ebraica come l’unica vera, sicura, documentata e perciò più antica a paradigmatica. (7) De constantia iurisprudentis, I I , 13. (8) Cfr. Vico, 1971: Princìpi di Scienza nuova intorno alla comune natura delle nazioni per la quale si ritruovano i princìpi di altro sistema del diritto naturale delle genti (1725) (d'ora in poi SN I), I I I , 2, p. 258; I I I , 5, p. 261 e I I I , 39, p. 297. E Princìpi di Scienza nuova d'intorno alla comune natura delle nazioni (1744) (d'ora in poi SN II), I I , sez. I I , 5, p. 508. Il testo di Gerolamo è Praefatio in Job, PL, XXVIII, 1081. In ambito esegetico si potrebbe dire che Vico di fatto anticipa la posizione che solo molto più tardi sarà di un Hermann Gunkel (1862-1932), per il quale i racconti biblici delle origini seguono il genere letterario della leggenda, quale descrizione immaginosa, ma non per questo meno vera, dei rapporti di Dio con l’uomo (cfr. Gunkel, 1901). (9) SN II, II, sez. II, 1. (10) SNI, III, 5. (11)SNI, V, 4. (12) SN I, II, 12. (13) Scrive Vico (1971, p. 519): «la superbia delle menti le porta nell'ateismo, per cui gli atei divengono giganti di spirito» (SN I I , I I , sez. 3). (14) Non entro in merito alle variazioni del pensiero di Vico a riguardo del tema dei giganti, come sono state attentamente ricostruite da P. Porro (1992) nel Storia sacra e storia profana in Vico. Esse implicano differenti modelli di utilizzo della storia sacra da parte di Vico e importanti problemi di coerenza. Ciò che non varia mi sembrano essere però il valore antropologico e la funzione sistematica di quel tema in rapporto al peccato originale. Come evidenziano sia R. Mazzola (1994-95) e L. Boschetto (1994-95), fino al 1725 i giganti assolvono al compito di principio di connessione tra storia sacra e storia profana e per questo motivo Vico compie l’operazione di duplicare il fenomeno del gigantismo istituendo un parallelismo tra il periodo precedente e quello susseguente il diluvio (proseguendo in questo il pensiero di S. Bochardt, Geographiae sacrae pars prior Phaleg seu dispersione gentium et terrarum divisione facta in aeificatione turris Babel..., Cadomi 1646). Con la stesura del 1730 questa preoccupazione apologetica regredisce e i giganti sono per se stessi principio del storia universale (profana). In questa prospettiva Vico presta più attenzione anche alle testimonianze archeologiche e etnologiche e alle prove scientifiche del gigantismo. Quasi un'accentuazione della motivazione fisica su quella morale del fenomeno. Inoltre i giganti sono ora visti anche nel loro duplice aspetto di «uomini, stupidi, insensati ed orribili bestioni», ma anche di «uomini pii, venerabili, illustri» (secondo l’indicazione raccolta dal p. J. Boulduc, De ecclesia ante legem, Lugduni 1626), cioè - come interpreta Vico (1744/ 1971) - di «giganti nobili», che risvegliati alla ragione, «fondarono le religioni a' gentili e diedero il nome all'età de' giganti» (SN I I , I I , sez. I, p. 475). Questo cambiamento di prospettiva però non mi sembra sottrarre importanza al tema del peccato originale e quindi all'origine religiosa e morale del gigantismo, perché quello resta la motivazione fondamentale della dispersione degli uomini sulla faccia della terra e quindi dell'occasione della metamorfosi del gigantismo. Memorandum 5, out/2003 Belo Horizonte: UFMG; Ribeirão Preto: USP. http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/botturi01.htm Botturi, F. (2003). Caduta e storia: note sul "peccato originale" in G.B. Vico. Memornadum, 5, 18-35. Retirado em // , do World Wide Web: http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/botturi01.htm. 33 D'altra parte la motivazione della diversa considerazione dei giganti è data secondo R. Mazzola dal confronto con le teorie del giusnaturalismo moderno e con la loro dottrina dello stato di natura (i «semplicioni» di Grozio, i «destituti» di Pufendorf e i «violenti» di Hobbes), cui appunto Vico contrapporrebbe la teoria del gigantismo universale e in questa la figura dei «giganti nobili». Questa interpretazione mi sembra corretta, ma appunto conferma l'importanza centrale del tema del peccato originale, perché - come si avrà ancora modo di dire - è tale dogma religioso che permette di avere una concezione diversa della primordiale brutalità degli uomini, non come condizione veramente naturale, ma come sua corruzione. Infatti Vico è ben consapevole che la grande alternativa nella concezione antropologica e politica è se all'origine è la violenza (materialistica e atea) o il legame (religioso) tra gli uomini. (15) S N I , IV. ( 1 6 ) S N I , I, 7. (17) SNI, III, 19. (18) SN I I , "Annotazioni alla tavola cronologica". (19)SNII, I, 2. (20) SN I, I, 7. (21) L'ultimo argomento politico è evidentemente una conferma a posteriori dell'interpretazione vichiana dello "stato di natura" come società delle famiglie (e non come condizione di individualità separata e conflittuale secondo le teorie giusnaturalistiche di matrice hobbesiana). Questo conferma l'importanza per Vico della "storia sacra" come storia separata, ma anche paradigmatica delle forme autentiche della storia umana postlapsaria. In generale, sostiene F.R. Marcus (1995, pp. 14-27), «gli Ebrei - nel modello interpretativo vichiano - manifestano la natura dell' "umanità", funzionando da paradigmi di virtù morale, di giustizia proporzionale e di pia saggezza». (22) Sull'importanza del diluvio come oggetto di dibattito esegetico, storico e scientifico (sua storicità, sue modalità, sua universalità) nell'età vichiana cfr. Bligny (1973). (23) SN I, I I , 12. Cfr. SN I, V, 4, p. 308 (in particolare sul gigantismo derivante da Caino). (24) Non posso qui svolgere il tema, che implicherebbe ovviamente la totalità della costruzione vichiana. Mi permetto rinviare a Botturi, F. (1996). Tempo, linguaggio, azione. Lineamenti della vichiana "storia ideale eterna". Napoli: Guida. (25) SN I, I, 5. (26) SN I, I I , 3. Non entro qui in merito al ben fondato della critica vichiana nei confronti dei tre giusnaturalisti; su questo già ho svolto una certa indagine in Botturi (1991): La sapienza della storia: GB Vico e la filosofia pratica, parte I I I . (27) SN I, I, 5. A questo punto risulta chiaro il margine di incomprensione che ebbe la critica cattolica del XVIII nei confronti del Vico e in specie nei riguardi della sua dottrina delle origini, quale fu quella del Labanca, di D. Romano, di G. Lami, di G.D. Rogadeo e soprattutto del Bonifacio Finetti poi ampiamente sfruttato dalla critica di B. Croce e F. Nicolini al cattolicesimo vichiano. Del Finetti, infatti, Croce ha editato la dissertazione del 1768 "Apologia del genere umano accusato di essere stato una volta bestia" con il titolo Difesa dell'autorità della Sacra Scrittura contro Giambattista Vico (Bari: Laterza, 1936), in cui l'Autore, padre domenicano esperto in Sacra Scrittura, riscontra con pedante precisione e letteralismo puntiglioso tutti i luoghi di discrepanza tra la ricostruzione vichiana e la narrazione biblica (oltre quelli di incoerenza dello stesso Vico), al fine di demolire la teoria del gigantismo postdiluviano e dell'erramento ferino (cfr. i XXIII punti del "Sommario delle opposizioni del sistema ferino di Vico alla sacra Scrittura", pp. 27-30). Non si può negare che all'arco del Finetti fosse una freccia teologicamente acuta, consistente nell'osservare che se la condizione umana fu per un periodo, quanto lungo non importa, di "bestial libertà" senza lume razionale attivo, allora a quegli uomini non sarebbe stato possibile esercitare responsabilità morale alcuna e quindi neppure conseguire il fine ultimo umano, contro la teologia cattolica della Provvidenza soprannaturale, che destina ogni uomo alla salvezza (pp. 68 sgg.). L'osservazione coglie nel segno e mette in luce quella struttura teologicamente dualistica (separazione dei piani del naturale e del soprannaturale) dell'impianto vichiano, di cui già si diceva. Memorandum 5, out/2003 Belo Horizonte: UFMG; Ribeirão Preto: USP. http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/botturi01.htm Botturi, F. (2003). Caduta e storia: note sul "peccato originale" in G.B. Vico. Memornadum, 5, 18-35. Retirado em // , do World Wide Web: http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/botturi01.htm. 34 La preoccupazione del Finetti, d'altra parte, conclude proprio là dove anche Vico va a parare, cioè al problema della visione materialistica delle origini di tipo libertino. «Il sistema dello stato ferino fomenta, almeno indirettamente, gli errori dei libertini», afferma il Finetti aprendo l'ultimo paragrafo della sua operetta (p. 84). Qui il gioco delle parti rivela la diversità di orientamento mentale degli autori, dal momento che - come si é visto - la preoccupazione del Vico è anch'essa precisamente quella di contrastare il libertinismo (e il razionalismo giusnaturalista). Ma Finetti non coglie il procedimento dialettico di Vico, che consiste nel concedere all'avversario l'ipotesi estrema (quella dello stato di natura individualistico e conflittuale, dell'immiserimento materialistico e della paura, ecc.), per mostrarne l'insufficienza esplicativa e la necessità di presupporre un'origine assolutamente positiva (lo stato di comunicazione con Dio). La dottrina del peccato originale costituisce così per Vico un passaggio ragionevole indispensabile per sintetizzare positività originaria e negatività storica. Ma questo procedimento dialettico sfugge del tutto al Finetti e con lui ad una sensibilità culturale di tipo ormai illuministico, che privilegia l'idea di verità come universalità statica e quella di ragione come razionalità immutabile; valido esempio di quella sindrome intellettualistica che Vico ha cercato di combattere con tutto il suo lavoro filosofico (su quest'ultimo motivo di incomprensione cfr. Sarti, S. (1972). Il presupposto filosofico della polemica tra B. Finetti e G.B. Vico. In AA.VV. La filosofia friulana e giuliana nel contesto della cultura italiana. (pp. 171-186). Udine: Arti Grafiche Friulane. (28) SN II, I, 4 "Del metodo". (29) De constantia iurisprudentis, I I , 3. (30) De constantia iurisprudentis, I, 4. (31) De constantia iurisprudentis, I, 4, pp. 357 e 363. La corruzione provocata dal peccato originale - insiste Vico in queste pagine (cfr. in particolare p. 363) - ha come rimedio adeguato solo l'intervento soprannaturale di Dio. Questo tema teologico sarà solo latente nella Scienza nuova, interessata oramai alla comprensione della "storia ideale eterna" propria della "natura delle nazioni", ma non per questo abbandonata. É interessante rilevare la differente prospettiva sul peccato originale di un autore come Malebranche, particolarmente influente in quegli anni sul pensiero di Vico e nel quale la questione del peccato originale è determinante la visione antropologica. Per l'Oratoriano l'essenza del peccato non fu una superba pretesa di conoscenza pratica del futuro, ma fu l'effetto di una preferenza squilibrata nell'ambito dell'esperienza del piacere. Ad Adamo era naturale e legittimo «d'aimer le plaisir & de le goûter», ma il primo uomo «n'avoit pas une capacité d'esprit infinie» e perciò il suo piacere e la sua gioia avevano il potere di diminuire la chiara visione del suo spirito. «On peut donc concevoir que le premier homme ayant peu à peu laissé partager ou remplir la capacité de son esprit par le sentiment vif d'une joïe présomptueuse, ou peut-être par quelque amour ou quelque plaisir sensible; la presence de Dieu & la pensée de son devoir se sont affacées de son esprit, pour avoir négligé da suivre courageusement sa lumiere dans la recherche de son vrai bien. Ainsi s'étant distrait, il a été capable de tomber [...]» (Malebranche, 1674-75 / 1964, pp. 74-75). (32) SN I, I, 1. (33) SN II, I, "Degli elementi". (34)SNI, 1. (35) SN I, I. (36)SNII, II, 1. (37) SN I, II, 4. (38) De constantia iurisprudentis, I I , 3. (39) De constantia iurisprudentis, I, 4. (40) Nella Scienza nuova diverrà del tutto chiaro, infatti, che la forma gnoseologica originaria corrispondente al sentimento del pudore è quella mitico-poetica, in cui vengono rappresentate gli "universali fantastici" delle potenze divine superiori. Nel Diritto Universale l'analisi del pudore non è ancora del tutto mediata dalla "logica poetica", ma questo non impedisce che il suo ampio dettaglio antropologico resti implicito fondamento delle successive più sintetiche rielaborazioni. (41) De constantia iurisprudentis, I I , 3. Memorandum 5, out/2003 Belo Horizonte: UFMG; Ribeirão Preto: USP. http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/botturi01.htm Botturi, F. (2003). Caduta e storia: note sul "peccato originale" in G.B. Vico. Memornadum, 5, 18-35. Retirado em // , do World Wide Web: http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/botturi01.htm. 35 (42) «[...] il cielo finalmente folgorò. Tuonò con folgori e tuoni spaventosissimi [...]. Quivi pochi giganti, che dovetter esser gli più robusti, ch'erano dispersi per gli boschi posti sull'alture de' monti, siccome le fiere più robuste ivi hanno i loro covili, eglino, spaventati ed attoniti dal grand'effetto di che non sapevano le cagioni, alzarono gli occhi e avvertorono il cielo» (SN I I , I I , se. I: Vico, 1744/ 1971, pp. 476-477). (43) De constantia iurisprudentis, I I , 2. Sul tema della libertà nel Diritto Universale cfr. Pasini, 1977: "Autorità"e "libertà"in Vico. (44) De constantia iurisprudentis, I, 4. (45) De constantia iurisprudentis, I I , 3. Cfr. «natura autem per Adae lapsum corrupta, pietati successit religio, quae proprie est summi Numinis metus, et quidem ex conscientia reatus»; e ancora «ex metu Numinis pietati, sive amori erga Deum, in natura integra, successerat honor in corrupta» ( I , 4: Vico, 1721 / 1974, p. 359). Donde la relativa verità secondo Vico del lucreziano: primos in orbe deos fecit timor e l'iniziale risposta vichiana alla tesi libertina dell'origine della religione dalla paura. (46) De constantia iurisprudentis, I I , 3. (47) De contantia iurisprudentis, I I , 5, p. 419 e I I , 3, p. 407. (48) De constantia iurisprudentis, I I , 3. (49) De constantia iurisprudentis, I I , 3, p. 409 e I I , 5, p. 419. (50) De constantia iurisprudentis, I I , 3. (51) SN II, I, se. IV. (52) De constantia iurisprudentis, I I , 3, pp. 409 e 411. (53) Cfr. come esempi tipici SN I, I I , 6 (Vico, 1725 / 1971, p. 194) e V, 3 (Idem, p. 308), dove sono sintetizzati gli elementi fondamentali della pagina del Diritto Universale che ho esposto (nesso pudore-provvidenza; «pudore», «curiosità», «industria»; confronto con i teorici dell'individualismo, qui identificati con interlocutori in parte diversi (secondo la nuova prospettiva di attacco critico al giusnaturalismo razionalistico), cioè «Obbes», «Grozio» e «Pufendorfio». (54) SN I, IV. Nota al riguardo dell'autore Francesco Botturi è professore oridinario di Antropologia Filosófica presso la Università Cattolica del Sacro Cuore, Milano, Italia. È Visiting Professor presso la Facoltà teologica di Lugano, Svizzera. Contatto: [email protected] Data de recebimento: 08/04/2003 Data de aceite: 19/09/2003 Memorandum 5, out/2003 Belo Horizonte: UFMG; Ribeirão Preto: USP. http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/botturi01.htm Waeny, M.F.C. (2003). História e psicologia em Henri Berr. Memorandum, 5, 36-41. Retirado em / / , do World Wide Web: http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/waeny02.htm 36 História e psicologia em Henri Berr History and psychology in Henri Berr Maria Fernanda Costa Waeny Pontifícia Universidade Católica de São Paulo Brasil Resumo O artigo aborda algumas das idéias de Henri Berr; trata de sua proposta em história, especialmente no que ela se opõe à filosofia da história e à história alemãs; e examina como esta concepção de história à la francesa introduz a psicologia nas pesquisas em história e inaugura a psicologia histórica. Palavras-chave: História da Psicologia; Psicologia Histórica; História das Ciências Humanas; História das Idéias; Annales. Abstract Article about some of Henri Berr's ideas concerning his proposition about history, especially where it opposes Philosophy of History and German History. This study also examines how this conception of history - which has a strong French accent introduces Psychology in the field of historical research and inaugurates the field of Historical Psychology. Keywords: history of psychology; historical psychology; history of the human sciences; history of the ideas; Annales. Algumas idéias de Henri Berr Três temas inter-relacionados caracterizam o pensamento de Henri Berr (1): a noção de síntese em história, a escola histórica alemã e a vitória do espírito francês sobre o germânico (2). É provável que a primeira menção à síntese tenha sido na tese L'Avenir de la philosophie. Esquisse d'une synthèse des connaissances fondée sur l'histoire, de 1899, volume ainda não localizado em bibliotecas brasileiras. Por síntese Berr entendia a "unificação da ciência a partir da definição de uma metodologia integradora fundada sobre a história" (Gemelli, 1987 p. 228). Mas propor uma ciência fundada sobre a história exigia, antes, que a própria história fosse ciência e, portanto, implicava em superar pelo menos três aspectos que caracterizavam o saber histórico daquela época: um deles, a identificação entre história e erudição, e cujo resultado eram estéreis compilações de documentos e fatos, extensas notas de rodapé comprobatórias e monografias de árdua leitura. Outro aspecto diz respeito às formas literárias dos relatos históricos e que em nada se assemelhavam ao procedimento científico. Por fim, a divisão comumente aceita entre ciências físicas e naturais, de um lado, e ciências humanas e históricas de outro, cisão esta que impossibilitava à história conquistar o status de ciência. Berr admite que o atraso das ciências históricas em relação às ciências naturais se devia a tais fatores, motivo pelo qual também pesavam sobre a história acusações de não ter contato com a realidade, ser excessivamente científica (no sentido de erudita e de buscar fatos) e não levar a lugar algum (Berr, 1946, p. 5-9). Porém, Berr desviou esses limites ao defender que a história científica deveria se ater à atualidade, à vida, tal como sugere o seguinte trecho: Ao interesse profundo que apresenta o problema da história-ciência vem juntar-se um interesse de atualidade. (...) Do ponto de vista de pura ciência, não há problema mais urgente e mais central do que a organização da história - organização interna e lógica, organização externa e prática. Resolvendo-o, fica Memorandum 5, out/2003 Belo Horizonte: UFMG; Ribeirão Preto: USP. http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/waeny02.htm Waeny, M.F.C. (2003). História e psicologia em Henri Berr. Memorandum, 5, 36-41. Retirado em / / , do World Wide Web: http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/waeny02.htm 37 resolvido, do mesmo passo, o problema da concordância da história com a vida (Berr, 1946, p.6). É provável que este interesse pelo atual a partir de uma perspectiva historicamente orientada configure pelo menos parte da noção de síntese, que seria, segundo Gemelli, "uma interciência de fronteiras disciplinares flexíveis" (1987, p. 228). Embora pareça não haver uma definição clara do termo nos textos consultados, Berr explica o que a síntese não é ao diferenciá-la da síntese erudita e da filosofia da história: esta última seleciona exemplos que confirmem a previsão sobre o curso dos eventos; a outra organiza o trabalho analítico e associa dados, daí obtendo resultados sobretudo parciais (Berr, 1946, p.23). A síntese em história, por outro lado, tem como tarefa coordenar, agrupar e confirmar generalizações hipotéticas (Berr, 1946, p.55) e, desse modo, justifica uma ciência histórica que se caracteriza como "pesquisa de causalidades diversas e da relação que entre si mantém essas causalidades" (1911, p. 55). Na história-ciência de Berr são três os tipos de causas em jogo nos fatos humanos (1946, p. 190): a contingência, a necessidade, a lógica - que ele também denomina, respectivamente, fatos contingentes, leis, razões; ou Os fatos, O social, As idéias. A principal novidade desta proposta foi ter atribuído à relação causal um fator inusual, ou o caso único, como elemento realmente capaz de alterar o curso dos eventos. Isto porque do primeiro nível de causalidade, a contingência, Berr diferencia o puro acaso do acaso histórico, imprevisto este que "se é ... sem passado, não é necessariamente sem futuro" (1953, p. 53); ele conceitua e denomina estas possíveis ocorrências casuais, coincidências, da seguinte maneira: "É a multiplicidade e a duração dos efeitos produzidos, e a intensidade da repercussão no espaço e no tempo que caracterizam o acontecimento" (1953, p. 66). Porém, ele também atribui este caráter fortuito ao conceito de individualidade, e este passa a ser um "intermediário entre o puro acaso e a necessidade" (Berr, 1911, p. 67). Mas a necessidade, já foi dito, é equivalente a leis e O social; ou seja, a própria individualidade, de certa forma, é um acontecimento desenhado entre o acaso, as leis e o social. Se a individualidade é contingencial, por extensão conclui-se que as diversas conceituações sobre o humano também o serão. Disse ele a este respeito: Se um grande número de sentenças históricas fizeram sobressair o papel do meio, de raça, dos grandes homens, de dois destes elementos, ou dos três simultaneamente, muitas vezes os filósofos da história enganaram-se quanto à extensão explicativa dessas causas puramente contingentes (Berr, 1946, p. 68). Tudo indica que Berr se preocupou profundamente com a noção de causa; há inclusive algumas extensas notas de rodapé tratando deste assunto, citando diversos autores de diferentes áreas de saber no livro de 1911. Mas seu intuito, vale lembrar, era fazer da história uma ciência, e ele acertadamente passou a analisar as características da história de sua época, ou seja, a erudição, o relato literário e a filosofia da história. Porém, ocorre que nelas a causalidade abrange ora um encadeamento tão forte e progressivo que passa-se a conhecer o porvir, como propõe a filosofia da história; ora busca-se uma causa tão específica que se perde a noção de conjunto, de encadeamento, como acontece na história erudita; e ora a causa provém de uma fragilidade atribuída principalmente à imaginação do escritor, como na história literária. A conseqüência mais imediata da noção de acaso histórico, provavelmente inaugurada por Berr, foi não só os sujeitos históricos perderem o poder sobre a direção e previsão dos eventos, como também o próprio curso da história escapar a quaisquer predições ou leis préestabelecidas. Ou seja, estava criado um vínculo entre história e contingência. História e contingência A atitude de Berr ao introduzir elementos incomuns na determinação dos eventos e nas leis do desenvolvimento histórico, tinha como possível intenção principal enfraquecer um modo de intuição histórica, dominante na época, que permitia reconstruir com veracidade fatos passados. Tal provocação se dirigia especialmente ao historicismo alemão, ou seja, Memorandum 5, out/2003 Belo Horizonte: UFMG; Ribeirão Preto: USP. http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/waeny02.htm Waeny, M.F.C. (2003). História e psicologia em Henri Berr. Memorandum, 5, 36-41. Retirado em / / , do World Wide Web: http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/waeny02.htm 38 ao estudo das 'individualidades' específicas [onde] um lugar privilegiado pertence aos Estados, idéias de origem divina, encarnações de uma forma superior de moralidade que só podem ser compreendidas a partir de sua especificidade intrínseca. Para apreender essas 'individualidades' [deve-se] reconstituir o mais escrupulosamente possível as intenções e os motivos dos atores da história, e depois tentar buscar e apreender sua originalidade por intermédio da intuição e da simpatia (François, 1993, p. 20). O uso do termo individualidade em Berr e no historicismo alemão merece atenção. De modo geral, os historiadores alemães daquela época admitiam a existência de um substrato de motivos e intenções comuns a todo e qualquer homem, de modo que seria possível refazer a história a partir de uma evocação subjetiva experimentalmente induzida; ou seja, a partir de uma inspiração historicamente orientada apreender-se-iam os reais propósitos de atos e motivações daqueles que decidiram os destinos humanos. Apercepção estética, intuição histórica e imaginação poética, ou criadora, foram as designações para esta aptidão em reconstituir fatos e intenções humanas tal como realmente ocorreram (Berr, 1954, p. 194-195). Berr debilitou este método quando introduziu o casual na constituição da própria individualidade, de modo que este terceiro elemento necessariamente passou a determinar aquelas individualidades que legitimamente os modos da intuição histórica pretensamente diziam apreender. Esta inovação de Berr contribuiu para que o ofício do historiador superasse o esquema teórico até então vigente que priorizava o Estado, os fatos políticos e econômicos, a enumeração dos grandes eventos e o relato sobre personagens famosos. Como bem atestam os encontros por ele organizados, as famosas "Semaines de Synthèse", a pesquisa em história se abriu para temas como A civilização, As origens da sociedade, A individualidade, A multidão, A estatística, A mentalidade pré-histórica e A sensibilidade, entre outros. O bônus teórico desta operação foi duplo: o acaso alçou status de dado; e a história científica se liberou das causalidades da filosofia da história, da intuição histórica e da erudição, assim como aceitou o convite de direcionar sua atenção para o atual, para a vida. Entretanto, o custo foi o historiador passar a necessitar do senso psicológico. Diz Berr a este respeito A psicologia é indispensável ao historiador quando este faz a síntese. Esse senso psicológico, ao mesmo tempo que senso histórico, quer dizer a curiosidade por tudo quanto é humano, a inteligente simpatia para o diferente, o mutável e o complexo da vida (1946, p. 210). Pode-se perguntar se foi a recusa da evocação histórica ad infinitum que conduziu Berr a incluir a contingência como fator da individualidade; ou ao contrário, se foi a partir da relação causal que ele concluiu pela fragilidade do método intuitivo e pela força do acaso na história. Essa resposta, no entanto, em nada vai alterar um vínculo que se consumou entre história e psicologia. História e psicologia A relação entre história e psicologia data de 1898, ano de defesa da tese L'Avenir de la philosophie... Disse Berr naquela época: O espírito é o produto da história. A história é a concreção do pensamento. Psicologia da humanidade, psicologia dos povos, psicologia biográfica: ensaios diversos se multiplicam. E todas estas concepções aspiram a se fundir, absorvendo a erudição. Há uma psicologia histórica que se elabora, sem ter encontrado sua forma definitiva (citado por Chalus, 1961, p. IX). Memorandum 5, out/2003 Belo Horizonte: UFMG; Ribeirão Preto: USP. http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/waeny02.htm Waeny, M.F.C. (2003). História e psicologia em Henri Berr. Memorandum, 5, 36-41. Retirado em / / , do World Wide Web: http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/waeny02.htm 39 Um aspecto extremamente importante a ser analisado neste trecho é a inusitada relação que Berr estabelece entre espírito, história e pensamento. Inusitada porque se o espírito é produto da história, e a história é concreção do pensamento, decorre que o espírito é realização de pensamento; ou seja, ele adicionou à tradicional fórmula da época (história e espírito) um terceiro termo, o pensamento. E eis que ele provavelmente se deparou com a seguinte questão: como dotar o espírito de um novo atributo - concretizar, materializar, exteriorizar o pensamento - sem exigir da pesquisa histórica a contribuição da análise psicológica? O vínculo entre história e psicologia aparece apenas inicialmente como psicologia histórica. Foi Berr quem provavelmente criou esta denominação, em 1898, mas em textos posteriores ele usou os termos psicologia dos historiadores (1921), historiador psicólogo (1939), psicologia coletiva ou psicanálise (1949), psicologia genética (1953); um exemplo desta imprecisão ocorre no seguinte trecho: Eu quero assinalar ainda uma iniciativa interessante: como, em sociologia, busca-se constituir, a precisar uma psicologia social, um psicólogo engenhoso, I. Meyerson, criou uma psicologia do espírito humano, tentativa original, distinta desta psicologia histórica que estuda o caráter dos povos ou das épocas. (...) Esta psicologia histórica é um tipo de síntese na Síntese (Berr, 1953, p. 291). Se psicologia histórica foi seu modo de anunciar a relação entre história e psicologia, a confusão terminológica informa que Berr mais pressentiu do que sistematizou um campo de pesquisas. Um primeiro motivo para tal variedade de nomes se justifica pela própria dificuldade em precisar os limites disciplinares de ambas. Disse ele a este respeito: a psicologia é auxiliar da história, e se teve razão em declarar que a história é uma psicologia aplicada. Mas há uma relação mais profunda da psicologia com a história. A história, em suma, é a própria psicologia: é o nascimento, e é o desenvolvimento da psiquê (Berr, 1953, p. 161). Outro provável motivo para a dispersão de termos, e talvez o mais importante, foi seu interesse gravitar em torno da noção de síntese; tanto que após a fundação dos Annales a Revue de Synthèse suprimiu historique do título. Porém, embora síntese fosse uma palavra comum para a época (conforme Gemelli, 1987, p. 256), depois foi considerada um conceito demasiado subjetivo e deu-se preferência, informa Carbonell (1983, p. 133), á designação construção histórica - descrédito que possivelmente contaminou a compreensão das propostas de Henri Berr. O que Berr mais veementemente recusou foi o privilégio atribuído aos fatores claros e evidentes determinando os eventos e a existência de um único vetor dirigindo a relação causal. Este mesmo caráter contingencial se aplica ao social, ou a segunda ordem de causas em jogo nos fatos humanos; para ele o fato social é antes um resultado do que a origem da sociedade e, portanto, a sociologia da época operava com um conceito de certa forma secundário. Também por isso a primazia da psicologia, a exemplo da frase: "dos jogos do acaso e das leis psicológicas nasce incessantemente a individualidade pessoal" (Berr, 1946, p. 68). O esforço de Berr, no entanto, certamente não foi em vão. A vitória espírito francês sobre o germânico, como ele mesmo a denominou, se fez ver principalmente na Nouvelle histoire, da qual pode-se dizer que foi um dos mentores intelectuais. A abertura da história para novos temas e disciplinas também faz parte de sua herança; e o impulso em vincular história e psicologia, principalmente como psicologia histórica foi consagrado por dois autores, Lucien Febvre e Ignace Meyerson (3). Algumas observações finais A opção de Berr pelo espírito francês possivelmente se deve ao fato dele ter nascido na Alsácia-Lorena, região sucessivamente anexada por alemães e franceses. Outro aspecto Memorandum 5, out/2003 Belo Horizonte: UFMG; Ribeirão Preto: USP. http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/waeny02.htm Waeny, M.F.C. (2003). História e psicologia em Henri Berr. Memorandum, 5, 36-41. Retirado em / / , do World Wide Web: http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/waeny02.htm 40 em aberto é o percurso que o levou de sua atividade como professor de literatura à filosofia e depois à história, à síntese. Uma história da psicologia histórica necessariamente passa por Berr, Febvre e Meyerson, mesmo sem haver referências recíprocas entre eles. A título de exemplo, basta lembrar as resenhas de Febvre à Revue de synthèse historique; e que Meyerson não só participou das "Semaines de synthèse" como escreveu a Berr dizendo que tentava aprimorar suas idéias. Berr, por outro lado, parece ter abandonado a idéia de uma psicologia histórica em detrimento à infeliz noção de síntese. É certo que em cada um dos itens e temas aqui abordados (ciências naturais e ciências humanas; síntese; contingência; historicismo alemão; espírito, história e psicologia) há nuances históricas e teóricas que por si só já valeriam textos específicos. Porém, vale lembrar que os conteúdos derivam de dois livros em especial (L'Avenir de la philosophie... e La synthèse en histoire), um deles ainda inacessível. Portanto, são eles e seu autor que inicialmente poderiam ser objeto de maiores pesquisas no sentido de refinar o próprio contexto histórico de tais assuntos. Referências bibliográficas Berr, H. (1911). La synthèse en histoire: essai critique et théorique. Paris: Alcan. Berr, H. (1919). Le germanisme contre l'esprit français: essai de psychologie historique. Paris: La renaissance du livre. Berr, H. (1921). L'Histoire traditionelle et synthèse historique. Paris: Alcan. Berr, H. (1939). Les Allemagnes, refléxions sur la guerre et la'paix (1918-1939). Paris: Albin Michel. Berr, H. (1946). A síntese em história. São Paulo: Renascença. (Original publicado em 1911). Berr, H. (1949). Peut-on expliquer l'Allemagne? Psychanalyse ou psychologie historique. Revue de Synthèse, LXV, 9-66. Berr, H. (1953). La sythèse en histoire. San rapport avec la synthèse générale. (nouvelle édition). Paris: Albin Michel. Berr, H. (1954). En marge de l'histoire universelle. Paris: Albin Michel. Carbonell, C.O. (1987). Historiografia. (P. Jordão, Trad.). Lisboa: Ed. Teorema. (Original publicado em 1981). Chalus, P. (1961). Avant-Propos. Em R. Mandrou. Introduction à la France moderne: essai de psychologie historique. (pp. IX-XXII). Paris: Albin Michel. François, E. (1993). Alemanha. Historiadores alemães. Em A. Burguière (Org.). Dicionário de ciências históricas. (pp. 18-27). (H. Araújo Mesquita, Trad.). Rio de Janeiro: Imago. (Original publicado em 1986). Gemelli, G. (1987). Communauté intelectuelle et stratégies institutionelles: Henri Berr et la fondation du Centre International de Synthèse. Revue de synthèse, 2, 225-259. Waeny, M.F.C. (1998). A psicologia histórica de Ignace Meyerson. Disertação de Mestrado. Programa de Estudos Pós-Graduados em Psicologia Social, Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. São Paulo, SP. Waeny, M.F.C. (2002). História, memória e abordagens históricas: situando um Problema. Memorandum, 2, 13-20. Retirado em 05/05/2002, do World Wide Web: http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos02/waeny01.htm. Waeny, M.F.C. (2003). A psicologia histórica de Ignace Meyerson [resumo]. Boletim do Centro de Documentação e Pesquisa Helena Antipoff, 16, 98-99. Waeny, M.F.C. (2003a). Do invisível ao visível: do visível ao invisível. Uma história de como os homens criam seus mundos. Tese de Doutorado. Programa de Estudos Pós-Graduados em Psicologia Social, Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Memorandum 5, out/2003 Belo Horizonte: UFMG; Ribeirão Preto: USP. http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/waeny02.htm Waeny, M.F.C. (2003). História e psicologia em Henri Berr. Memorandum, 5, 36-41. Retirado em / / , do World Wide Web: http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/waeny02.htm 41 São Paulo, SP. Notas (1) O presente artigo é versão modificada do texto Henri Berr (1863-1954) (Waeny, 2003a, pp. 59-65). (2) La synthèse en histoire. Essai critique et théorique (1911), L'Histoire traditionelle et la synthèse historique (1921) e La synthèse en histoire. Son rapport avec la synthèse générale (1953, reedição do livro de 1911) confirmam o interesse na síntese. Quanto ao segundo item ele opõe, "às tentativas alemãs de uma história universal, uma empreitada concebida e realizada à francesa" (Berr, 1954, I, p. XI). Le germanisme contre l'esprit français (1919), Les allemagnes. Refléxions sur la guerre et sur la paix 1918-1939 (1939), e Peut-on expliquer l'Allemagne? Psychanalyse ou psychologie historique? (1949) sinalizam o projeto antialemão, uma vitória do espírito francês. (3) Sobre a psicologia história e Ignace Meyerson consultar Waeny (1998; 2003a, pp. 66-75); há ainda o resumo A psicologia histórica de Ignace Meyerson (Waeny, 2003) e o artigo História, memória e abordagens históricas: situando um problema (http://www. fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/waeny02. htm) (Waeny, 2002), publicado no n° 2 desta mesma revista Memorandum, cujo acesso imediato facilita um primeiro contato com a abordagem meyersoniana. Nota sobre a autora Maria Fernanda Costa Waeny é doutora em Psicologia Social pela PUC-SP e pesquisadora do Núcleo de Estudos em História da Psicologia da mesma instituição. Contato: R. João Miguel Jarra, 253/4, CEP 05417-040, São Paulo-SP, Brasil; [email protected]. Data de recebimento: 24/07/2003 Data de aceite: 07/10/2003 Memorandum 5, out/2003 Belo Horizonte: UFMG; Ribeirão Preto: USP. http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/waeny02.htm Amatuzzi, M. (2003). Releitura de textos de Tomás de Aquino visando a construção de um pensamento 42 psicológico. Memorandum, 5, 42-54. Retirado em / / , do World Wide Web: http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/amatuzzi01.htm. Releitura de textos de Tomás de Aquino visando a construção de um pensamento psicológico Rereading of texts by Thomas Aquinas aiming at the construction of a psychological thought Mauro Martins Amatuzzi Pontifícia Universidade Católica de Campinas Brasil Resumo Estudo teórico que começa no campo da história das idéias psicológicas. Investiga como Tomás de Aquino constrói seu pensamento no que diz respeito ao que hoje chamaríamos de psicologia. A leitura que foi feita de seus textos buscou o sentido de suas afirmações, e de suas construções, mais do que suas fórmulas. Foram encontradas três raízes para essa construção do pensamento psicológico: uma abertura para outras fontes de significado além da razão instrumental, o envolvimento com o movimento da inquietação humana, e a confiança na linguagem comum, expressiva do experimento semântico coletivo da humanidade. Esse pensamento psicológico deve clarear nosso modo de falar sobre a alma, examinar como as operações da alma se apresentam na trama da ação humana, e mostrar o sentido dos símbolos históricos do caminhar humano. Palavras-chave: Tomás de Aquino; alma; matéria. Abstract This theoretical study begins in the field of the history of the psychological ideas. It investigates how Thomas Aquinas builds his thought in that field that today we call Psychology. The reading that was done of his texts looked for the sense of his statements, and constructions, more than his words. Three roots were found for that construction of the psychological thought: an opening for other sources of meaning besides the instrumental reason, the involvement with the movement of human disquietude, and the trust in a common language as humanity's semantic research. This psychological thought should clarify our way of talking about the soul, it should examine how the operations of the soul direct the human action, and it should show the sense of the historical symbols found along the path of human life. Keywords: Thomas of Aquinas; soul, matter. Esta pesquisa começa no campo da história das idéias psicológicas (que é onde nos perguntamos como se formaram os conceitos através dos quais foram sendo pensadas a alma humana, o psiquismo e suas manifestações). Contudo não visa reconstituir fórmulas, e sim encontrar o sentido. É assim que procuramos estabelecer a ponte com o hoje da psicologia. Nosso objetivo é resgatar, por esse caminho, a psicologia contida em pensamentos antigos, anteriores às cisões epistemológicas da modernidade. Gostaríamos de explorar, por exemplo, a origem do pensamento psicológico do africano Agostinho de Hipona (1997, 1994). Ele constrói, na virada do séc. IV para o V, uma compreensão de Deus a partir da consideração da psicologia humana, baseando-se no pressuposto de que o homem, tendo sido feito à imagem e semelhança de Deus, pode ser para nós um caminho nessa compreensão. Também poderíamos explorar Boaventura de Bagnoregio (1999), o mestre franciscano do séc. XIII, ou o místico alemão do séc. XIV, mestre Eckhart (1983), profundos conhecedores dos itinerários psicológicos. Faríamos com eles um trabalho semelhante ao que Leloup (2000) fez com Fílon de Memorandum 5, out/2003 Belo Horizonte: UFMG; Ribeirão Preto: USP. http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/amatuzzi01.htm Amatuzzi, M. (2003). Releitura de textos de Tomás de Aquino visando a construção de um pensamento 43 psicológico. Memorandum, 5, 42-54. Retirado em / / , do World Wide Web: http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/amatuzzi01.htm. Alexandria (filósofo judeu do séc. I). Escolhemos, porém, para iniciar nossa viagem, Tomás de Aquino, o grande pensador do séc. XIII. Mas por que ele? Além de ele se movimentar numa atmosfera pré-cartesiana (o que por si só já seria interessante, pois nos faria entrever possibilidades diferentes da abordagem dicotomizada de se pensar o humano), Tomás está na origem de uma das fontes plasmadoras da mentalidade latino-americana, por mais incrível que isso possa parecer. Quem nos abriu essa percepção foi Marina Massimi, historiadora da psicologia no Brasil. Os primeiros missionários que por aqui estiveram ainda no séc. XVI, e muitos dos que vieram depois, e que trabalharam na formação da alma popular, foram, por sua vez, formados em escolas ibéricas onde o pensamento básico era o de Tomás de Aquino (Massimi, 2001, 2001a). Pelo pensamento de Tomás de Aquino passa praticamente todo saber da época, buscando um lugar coerente numa doutrina polarizada pela fé religiosa. Assim é que podemos encontrar em seus escritos um extenso e minucioso pensamento psicológico, baseado nos autores de referência na época, e em suas próprias observações, reflexões e sistematizações. Sua obra principal, na qual nos basearemos primeiramente aqui, foi a chamada Suma Teológica (escrita entre 1268 e 1273), uma imensa e complexa reflexão, talvez comparável somente com as belíssimas catedrais medievais. Trata-se de uma obra escrita em latim medieval, composta de 5 volumes de aproximadamente 800 páginas cada um, mas para a qual já existem boas edições bilíngües (Tomás de Aquino, 1951, 1980, 2001). O sistema de referências utilizado para as citações, aqui, é o adotado pela edição Loyola (o primeiro dígito, em algarismos romanos, indica a "parte" da Suma Teológica, o segundo, em arábicos, a "questão", o terceiro, também em arábicos, o "artigo"; e "prólogo" [pról.], "objeção" [obj.], "em sentido contrário" [s.c.] e "solução a uma objeção" [sol.] estão abreviados conforme indicado entre colchetes). Boas introduções à vida de Tomás de Aquino e sua obra podem ser encontradas em Nascimento (1992b), Lauand (1999) e Torrell (1999). - Sobre o contexto de seu pensamento, ver, por exemplo, Jeauneau (1986) e Nascimento (1992a). A leitura que faremos do mestre medieval pode ser chamada de fenomenológica, pois estaremos buscando muito mais o sentido que suas afirmações podem ter para o psicólogo de hoje, do que as próprias palavras com as quais ele encerra alguma questão. Assim sendo podemos dizer que nosso objetivo primeiro é procurar saber como Tomás de Aquino constrói o que chamaríamos nós de um pensamento psicológico, investigando as bases desse pensamento em sua obra principal, a Suma Teológica, visando tirar daí sugestões para uma construção atual que supere certos impasses epistemológicos. Nossa pretensão é, na verdade, um contato direto com o texto mesmo do mestre, a partir das preocupações atuais de uma psicologia humanista de feitio fenomenológico (deixando para outra ocasião um estudo bibliográfico a respeito de como a psicologia "tomista" pôde ser entendida). Nesse sentido, obras como a do médico-filósofo Laín Entralgo (1995) aproximam-se mais da intenção deste artigo, pois elas procuram construir também uma compreensão do ser humano a partir de uma história das idéias e em contato com pesquisas da área. Além da ciência A primeira questão que aparece na Suma Teológica diz respeito à suficiência ou não das doutrinas filosóficas (e da ciência) para dar ao homem uma orientação completa de vida. O pensamento de Tomás de Aquino aponta claramente para a insuficiência (não a inutilidade) de qualquer saber construído somente com os recursos racionais, e indica a necessidade de uma doutrina de outra ordem. É preciso, diz ele, haver uma doutrina de vida que trate de assuntos que vão além daqueles que a razão humana, sozinha, é capaz de investigar. E isso porque o ser humano, de fato, aspira coisas que estão além daquilo que pode ser investigado pela razão. Mas, além disso, porque, mesmo naquelas coisas que podem ser investigadas somente com a razão, quando se trata de assuntos como a vida e a felicidade, há dificuldade grande no seu questionamento sistemático e metódico. Estamos sempre sujeitos a erros, diz ele, e, na prática, os resultados de uma tal investigação, pela sua Memorandum 5, out/2003 Belo Horizonte: UFMG; Ribeirão Preto: USP. http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/amatuzzi01.htm Amatuzzi, M. (2003). Releitura de textos de Tomás de Aquino visando a construção de um pensamento 44 psicológico. Memorandum, 5, 42-54. Retirado em / / , do World Wide Web: http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/amatuzzi01.htm. sofisticação e complexidade, são pouco acessíveis à maioria das pessoas. Deve, pois, também por esse motivo, haver um outro caminho de acesso às verdades de vida. A afirmação básica, pois, é: como doutrina de vida, a ciência não basta. Deve haver uma outra forma de ligação com os objetivos humanos, que envolva um outro tipo de saber, um outro tipo de discurso, um outro tipo de prática. Tomás aqui se preocupa com a condição concreta do ser humano, respeita a experiência do caráter ilimitado de suas aspirações, por um lado, e, por outro, o caráter limitado de seus esforços. Mas que outro caminho é esse? Por enquanto ele só vai dizer que é uma participação a um saber maior, divino; o que significa, na sua linguagem, um saber recebido "por revelação". Por esse caminho o ser humano não mais constrói e possui a sabedoria, mas se deixa possuir por ela. O acesso a essa outra sabedoria é uma entrega pessoal, numa consciência de seu lugar no universo, e ao mesmo tempo uma entrega que se apóia na consideração de fatos concretos da história vivida pelos homens. "É necessário existir para a salvação do homem, [para] além das disciplinas filosóficas, que são pesquisadas pela razão humana, uma doutrina fundada na revelação divina" ( I , q.1, a.1). Para que a vida do homem tenha um sentido, é preciso recorrer a um conhecimento de outra ordem. "Revelação" aqui significa uma intuição, vivida como recebida de um poder maior, num determinado tempo, sobre o sentido do que acontece, e que também se transmite historicamente depois, enriquecendo-se de sentidos. A doutrina sagrada [em que consiste esse conhecimento de outra ordem] (...) procede de princípios conhecidos à luz de uma ciência superior (...). Como a música aceita os princípios que lhe são passados pelo aritmético, assim também a doutrina sagrada aceita os princípios revelados por Deus. ( I , q.1, a.2). E o ser humano pode dançar conforme essa música, sem ter que ficar pensando em alta matemática. "Fatos singulares são relatados na doutrina sagrada (...) como exemplos de vida (...) ou visam estabelecer a autoridade dos homens pelos quais nos chega a revelação" ( I , q.1, a.2, sol.2). O "fato singular" é, nesta linguagem, o coneito representante do que hoje chamaríamos, talvez, de fato histórico. A doutrina sagrada tem um aspecto de narrativa, de olhar para a história concreta dos humanos. É uma visão da história que revela uma dimensão nova, um sentido inaudito. O acesso a esse sentido, coerentemente com a forma como ele se manifesta, é uma entrega pessoal, uma fé (e não um raciocínio abstrato). No entanto desdobra-se em um pensamento exigente no qual o ser humano procura compreender a harmonia do que aí se coloca, tirar conclusões práticas e apreciar sua fundamentação. A doutrina sagrada [enquanto um pensamento construído pelo homem a partir da "revelação"] não se vale da argumentação para provar seus próprios princípios, as verdades da fé; mas parte deles para manifestar alguma outra verdade (...). Não tendo outra [doutrina] que lhe seja superior [na ordem das doutrinas de vida, diríamos nós], terá que disputar com quem nega seus princípios. Ela o fará valendo-se da argumentação, se o adversário concede algo (...). Mas se o adversário não acredita em nada [das verdades a que se poderia ter acesso por aquele outro caminho], não resta nenhum modo de provar com argumentos os artigos da fé; pode-se apenas refutar os argumentos que oporia à fé. ( I , q.1, a.8). O que ele está dizendo aqui? Como o podemos ler? Ao mesmo tempo que o acesso a esse outro saber, diferente do meramente racional, implica em uma entrega pessoal, uma fé, implica também em uma intensa atividade crítica de pensamento, que no Memorandum 5, out/2003 Belo Horizonte: UFMG; Ribeirão Preto: USP. http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/amatuzzi01.htm Amatuzzi, M. (2003). Releitura de textos de Tomás de Aquino visando a construção de um pensamento 45 psicológico. Memorandum, 5, 42-54. Retirado em / / , do World Wide Web: http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/amatuzzi01.htm. entanto não pode pretender provar o conteúdo do que é sabido nessa outra ordem de saber. Pois bem, é no contexto dessa "doutrina sagrada", dessa "teologia", que iremos encontrar toda uma psicologia implícita. O sentido mais profundo dessa psicologia vai depender de um contato com a problemática existencial concreta do ser humano, de um contato com os dilemas básicos que se colocam para o homem. Vejamos isso um pouco mais de perto. Enraizado nas buscas existenciais Uma de primeiras afirmações dessa teologia é que, por natureza, nós só temos um conhecimento vago e confuso de Deus (isto é, daquilo em que consiste o sentido último de nossa existência), embutido em nosso desejo de felicidade. Está impresso naturalmente em nós algum conhecimento geral e confuso (...) de Deus, isto é, Deus como a felicidade do homem, pois o homem deseja naturalmente a felicidade, e o que por sua própria natureza ele deseja, naturalmente também conhece. Mas nisso não consiste em absoluto o conhecimento (...) de Deus (...). Muitos [de fato] pensam que a felicidade, este bem perfeito do homem, consiste nas riquezas, outros a colocam nos prazeres ou em qualquer outra coisa. ( I , q.2, a.1, sol.1). O conhecimento daquilo em que consiste a felicidade, faz parte de um dinamismo de busca. Todos desejam a felicidade, e é esse o dinamismo que anima o viver. Mas existe a necessidade de todo um "trabalho" de discernimento e tomadas de posição para que encontremos o caminho. Nesse trabalho vamos elaborando significados, os quais nos orientam em nossa vida, gerando assim novas experiências e significados (ver também II I , q.2 e 3). Existe, então, um conhecimento apenas geral e mais ou menos vago da natureza do desejo que nos habita. É uma experiência interior da qual podemos nos dar conta. Mas não um conhecimento claro de algo que polarize esse desejo. Quem vivencia aquele outro caminho para o encontro de uma orientação de vida (acolhendo na fé o que se manifesta historicamente), poderá entender que a felicidade, em última instância, está numa reaproximação do Ser, realidade central, origem e sentido de todas as coisas, por alguns chamado de "Deus". Mas ainda assim não sabe com total clareza o que significa isso. Tem uma direção para seu caminhar, e nele vai construindo progressivamente significados que o ajudam nessa aproximação. As realidades experimentadas, porém, não são da mesma ordem que as conclusões de um saber racional. Que modelo de funcionamento humano é subjacente a essa forma de ver? Temos uma experiência do movimento que nos anima, de nosso desejo, de nossas aspirações. A partir daí, com a vida e as escolhas que fazemos, vamos significando essa experiência e o mundo em torno. Esses significados, por sua vez, iluminam nosso próprio caminhar, e geram novas experiências e novos significados. Nossa segunda afirmação poderia, então, ser essa: é no dinamismo de nossas buscas existenciais que vamos construindo nossos significados. Apoiando-se na linguagem comum como num laboratório E uma terceira afirmação seria: essa construção de significados não é obra de um ser humano isolado, mas a própria linguagem, socialmente construída, contém pistas capazes de nos orientar, colocando-nos em contato com a experiência da humanidade. Tomás se apóia nos modos de dizer para desvelar a realidade humana interior, tão complexa e de difícil abordagem direta. Na pesquisa do que consiste a vida, por exemplo, ele propõe um princípio metodológico geral: para caracterizarmos um fenômeno devemos partir da consideração daqueles seres onde esse fenômeno se apresenta de forma clara. Então, para sabermos o que é a vida, diz ele, devemos considerar os seres que manifesta mente para nós são vivos, ou Memorandum 5, out/2003 Belo Horizonte: UFMG; Ribeirão Preto: USP. http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/amatuzzi01.htm Amatuzzi, M. (2003). Releitura de textos de Tomás de Aquino visando a construção de um pensamento 46 psicológico. Memorandum, 5, 42-54. Retirado em / / , do World Wide Web: http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/amatuzzi01.htm. seja, a respeito dos quais não temos dúvida em declarar que são vivos. Ora, os seres, a respeito dos quais não temos dúvida em dizer que são vivos, são os animais. Neles o momento da morte é claro: aí eles deixam de ser entidades viventes, e a matéria de que eram compostos se dispersa. E, por outro lado, o surgimento do ser vivo, como unidade independente, também é claro: a vida começa a existir quando aquele ser se torna autônomo, passa a se mexer por si mesmo. Por aqueles em quem a vida é manifesta, podemos entender quem vive e quem não vive. Ora, a vida cabe claramente aos animais (...). Assim deve-se distinguir os vivos dos não-vivos, por aquilo pelo qual os animais se dizem vivos, a saber, por aquilo em que por primeiro a vida se manifesta e em que por último permanece. Com efeito, dizemos que, por primeiro, um animal vive, quando começa a mover-se por si próprio, e julgamos que vive tanto tempo quanto o movimento nele aparece. Quando, pelo contrário, já não tem por si mesmo movimento algum, mas é apenas movido por outro, dizemos que está morto (...). Assim, é chamado vivo tudo o que se move ou age por si mesmo. Os que, por natureza, não se movem nem agem por si mesmos só serão chamados vivos por semelhança. ( I , q.18, a.1). A linguagem é construída para dar conta da experiência. Podemos nos basear nela, então, para clarear os conceitos através dos quais designamos os objetos e suas características. Repare o leitor, no texto acima, como Tomás explora não tanto os objetos em si, mas a relação que nós humanos temos com eles, a forma como espontaneamente os significamos. A língua foi se moldando para dar conta da complexidade da vida: a vida se manifesta ...os animais se dizem vivos ... dizemos que ... julgamos que ... dizemos que. Assim, é chamado ... É tão válido dizermos que ele está esclarecendo o fenômeno em si, como dizermos que está esclarecendo nossa linguagem. Essas duas abordagens se confundem, e como que, se interpenetram. Lauand, seguindo de perto Pieper, nos lembra a esse propósito uma bela frase de Tomás de Aquino no começo de uma outra obra, a Suma Contra os Gentios: "a linguagem corrente das pessoas (ou, como traduz Lauand, o uso comum do povo - multitudinis usus), que, segundo crê Aristóteles, deve ser seguido na denominação das coisas, quis que comumente se chamem sábios aqueles que..." ( I , CG, cap.1; cf. Tomás de Aquino, 1952, p.95). E Lauand (1999) comenta: "A linguagem comum é por ele considerada depositária de sabedoria, quando devidamente trabalhada, garimpada". (p. 49). E, mais adiante: "O filosofar é, em boa medida, uma tentativa de lembrar, de resgatar os grandes insights de sabedoria que se encontram encerrados na linguagem comum" (p.50). E o fato de que as diversas línguas tenham modos diferentes de significar ( I , q.39, art.3, sol.2) não impede isso, pois, o trabalho do pensador não termina na língua em si, mas na realidade significada. O pensamento é construído para dar conta da experiência, pela mediação da linguagem. Esta, na verdade, por expressar nossa experiência com a lida das coisas do mundo, constitui-se como um sinal do que são as coisas. Quando Tomás de Aquino fala de "vida" e de "alma", por exemplo, ele está se referindo a modos de significar o real. Com ele, movimentamo-nos constantemente na relação homem-mundo. Eu ousaria dizer que, se nos ativermos às intuições e ao movimento básico de seu pensamento, não existe alma em si, e nem vida em si, assim como, aliás, também não existe a matéria em si. Esses termos são criações do homem para dar conta da realidade com a qual ele precisa lidar. Antes da elaboração explícita do pensamento, a linguagem já tinha feito seu trabalho. Nosso esforço de pensar a realidade pode se apoiar na linguagem para ir mais longe. Os possíveis conteúdos de uma psicologia Memorandum 5, out/2003 Belo Horizonte: UFMG; Ribeirão Preto: USP. http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/amatuzzi01.htm Amatuzzi, M. (2003). Releitura de textos de Tomás de Aquino visando a construção de um pensamento 47 psicológico. Memorandum, 5, 42-54. Retirado em / / , do World Wide Web: http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/amatuzzi01.htm. Partindo desses pressupostos operacionais epistemológicos, Tomás de Aquino propõe 3 grandes partes para o movimento de expor-acompanhar a Doutrina Sagrada (sobre a arquitetura e o "movimento" da Suma Teológica, ver a belíssima tese de Lafont, 1960, e também Torrell, 1999), e isso tem a ver com nosso intento de buscar sua psicologia. Na Primeira Parte ele vai considerar "Deus", fonte primeira de tudo que existe, e ao mesmo tempo sentido último de todas as existências ( I , q.2, pról.). Podemos ler aí a consideração da realidade em seus fundamentos primeiros e em seu sentido radical. No que diz respeito à psicologia, vamos encontrar nessa primeira parte considerações sobre a alma humana (o psiquismo humano) e a maneira adequada de falar sobre ela. Na Segunda Parte ele vai tratar do "movimento da criatura racional para Deus" ( I , q.2, pról.), ou seja, as ações humanas. Podemos ler nessa parte a consideração do sentido do agir, e a orquestração do interior humano nesse movimento: como se apresenta a alma na ação do homem que busca, delibera, decide. E na Terceira Parte, vai considerar "o homem chamado Cristo que é para nós o caminho que leva a Deus" (Idem). Podemos ler aí a consideração da história concreta, dos eventos que a marcam como símbolos desse caminhar da humanidade. Nossa leitura poderá encontrar aí como se apresentam os símbolos no psiquismo humano, inseridos nesse contexto concreto. Uma "psicologia tomasiana" deveria considerar então 1) como falar consistentemente da alma humana; 2) como essa alma se manifesta no dinamismo do agir; e 3) como ela se preenche de conteúdos através dos símbolos historicamente produzidos. Um imenso programa que apenas mencionamos aqui como para aquilatar o alcance dessa possível psicologia. A psicologia começa com a vida Uma psicologia que levasse em conta as intuições do mestre medieval deveria começar por um olhar para nosso mundo, situando aí a originalidade da vida. É no contexto do universo material que surge a vida, e com ela o psiquismo. Ser vivente significa ter uma unidade que transcende a dos componentes materiais elementares que se agrupam no organismo. O que caracteriza a vida é justamente o fato de que o todo do ser é que se relaciona com o meio. O ser vivo é um sistema fechado que se organiza e se preserva na relação com o meio. O conceito de "alma" atende a essa percepção: num corpo vivo existe uma estrutura integrativa dinâmica responsável pelo seu ser, por seu funcionamento como unidade, e por seu desenvolvimento. Se divido uma pedra ao meio, terei duas pedras: isso é um tipo de unidade. Se divido um gato ao meio, terei um gato morto, ou seja, não mais terei nenhum gato. É outro tipo de unidade. A linguagem criou o conceito de alma porque era necessário para darmos conta da originalidade do ser vivo. Dizer "tem alma", é o mesmo que dizer "é animado" ou "é vivente", isto é, "tem uma unidade de outro nível", ou ainda "preserva-se como um todo". A psicologia é o estudo da alma (psique = alma, logos = razão). E então deve começar fazendo contato com a originalidade do ser vivo, constituindo o psiquismo como seu objeto. Eis o que diz Tomás: "a ação da alma ultrapassa a ação da natureza corporal. A natureza corporal, toda ela, está com efeito submetida à alma, e se refere a ela como matéria e instrumento" ( I , q.78, a.1). As operações dos elementos materiais no corpo vivo são como instrumentos a serviço da vida; mas a vida as ultrapassa, como uma estrutura ultrapassa as sub-estruturas que utiliza. A partir daí Tomás vai caracterizar a vida pela autonomia de movimentos. Começa a ser vivente aquele que começa a se mover por si mesmo, preservando sua unidade (e dando continuidade assim ao fluxo da vida no planeta). E já não é mais vivente aquele que já não se move a si mesmo, mas apenas é movido por outro (colocando sua matéria a serviço de outros sistemas). A vida não é como uma porção de matéria que contamina o restante de um corpo. Ela é a própria matéria bruta enrolando-se sobre si própria, organizando-se num sistema complexo, diferente dos níveis de organização anteriores, ganhando uma autonomia nova e caminhando para uma preservação do indivíduo, e ultrapassando o próprio indivíduo na busca de se garantir como um fluxo novo no mundo material. O movimento Memorandum 5, out/2003 Belo Horizonte: UFMG; Ribeirão Preto: USP. http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/amatuzzi01.htm Amatuzzi, M. (2003). Releitura de textos de Tomás de Aquino visando a construção de um pensamento 48 psicológico. Memorandum, 5, 42-54. Retirado em / / , do World Wide Web: http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/amatuzzi01.htm. do universo material já trazia em seu bojo a potencialidade do que viria a ser vida: para Tomás ele tem uma "semelhança de vida" ( I , q.18, a.1, sol.1). Bem poderíamos dizer, de nosso ponto de vista, que essa semelhança de vida não deixa de ser uma semente. A vida transfigura totalmente uma determinada porção de matéria. Quando o corpo vivo morre, não podemos mais dizer que é o mesmo ser. Tomás evoca aqui um dito de Aristóteles: para os seres vivos, viver é ser ( I , q.18, a.2, s.c.). Viver refere-se a esse modo de ser consistente, no fluxo do universo, e não apenas ao operar. O operar decorre do ser. Em decorrência desse olhar para o ser podemos ver que a vida se apresenta em graus diferentes, e com características diferentes. O tipo de autonomia que têm as plantas não é o mesmo daquele que se apresenta nos animais. E a autonomia que é possível ao ser humano, por sua vez, ultrapassa aquela dos animais. Se a manifestação básica da vida em nosso mundo for a vegetativa, a partir daí ela vai se mostrando em formas cada vez mais complexas, até chegar no ser humano. Este cresce como uma planta, percebe e sente como um animal, e, além disso, pensa, é capaz de um entendimento e de um afeto de outra ordem de complexidade. O ser humano transcende as determinações de uma natureza fechada (própria da planta), de um instinto também totalmente determinante (como no animal), e se abre para a reflexão, o que lhe permite um grau de autonomia antes insuspeitado ( I , q.18, art.3). É importante dizermos que essa graduação nos processos da vida, explícita em Tomás de Aquino, corresponde ao que nós, melhor do que ele, vemos num fluxo evolutivo: na história do mundo foram emergindo formas cada vez mais complexas de organização autônoma e unidade, transcendendo sempre mais as possibilidades isoladas da matéria elementar. Nosso mundo não se compõe apenas de "matéria elementar". Existem "estruturas complexas" que organizam essa matéria elementar e lhe dão um sentido novo. Como se apresenta isso? Matéria e forma, corpo e alma Para Tomás de Aquino nosso mundo está cheio de "coisas", de corpos, de seres. Nesses corpos ocorrem transformações. Mas quando falamos em transformação estamos querendo dizer que algo muda, mas também que algo permanece. Esse substrato que permanece sob a transformação das "formas", é que seria a "matéria". Entre os primeiros filósofos essa matéria foi identificada com os elementos: terra, água, fogo e ar. Completos em si mesmos, os elementos entrariam em composição uns com os outros, em proporções diversas, para constituir as diferentes "coisas" de nosso mundo. Mas outros filósofos foram mais longe dizendo que cada elemento é também composto de matéria e forma: forma de terra, de água, de ar, de fogo, e a matéria primeira de que eles são feitos (ver, por exemplo, I, q.44, a.3). Essa matéria primeira, em si mesma, nada mais seria que pura potencialidade para diversas formas, e, nesse sentido, indeterminada, pois, qualquer determinação já seria uma forma, uma estrutura. Não apenas o formato externo, a cor, o contorno, são forma. A própria estrutura íntima de cada coisa é forma. A matéria primeira, então, nunca existe sozinha. Ela seria apenas o substrato de todas as transformações de nosso mundo material. Algo quase imaterial... Matéria e forma, para Tomás de Aquino, não podem ser concebidas como duas entidades completas em si mesmas, assim como, aliás, corpo e alma também não. Se assim fosse, se os componentes permanecessem completos no composto, este, como entidade, seria uma ilusão. Matéria e forma não são duas "entidades", mas dois "princípios", isto é, algo que devemos pressupor, para podermos pensar a realidade de modo consistente ( I , q.75, art.1). Quando um corpo tem como característica o fato de ele poder mover-se a si mesmo, então dizemos que é um ser vivo. Sua forma é de vivo. Neste caso, ela, a forma, se chama "alma" (anima); pois dizemos que é um corpo animado. A alma é, então, a forma própria dos corpos que são vivos, sua estrutura unificadora e dinâmica. Dizer "tem alma" é o mesmo que dizer "é animado", "move-se por si mesmo". A complexidade de nosso mundo Memorandum 5, out/2003 Belo Horizonte: UFMG; Ribeirão Preto: USP. http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/amatuzzi01.htm Amatuzzi, M. (2003). Releitura de textos de Tomás de Aquino visando a construção de um pensamento 49 psicológico. Memorandum, 5, 42-54. Retirado em / / , do World Wide Web: http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/amatuzzi01.htm. Da forma vem o ser em tal natureza. Da matéria vem a comunidade de pertença ao mesmo mundo. Matéria e forma fazem parte da linguagem usada por Tomás de Aquino para dar conta do mundo em que vivemos. Contudo, neste mundo surge uma realidade de outra ordem: o conhecimento ( I , q.75, art.1). Com ele entramos num âmbito de considerações bastante original: o mundo intencional, mental, espiritual. O que vem a ser isso? Conhecer (ver, ouvir, sentir, saber, entender) é um modo de "ter" o objeto dentro de si. No entanto esse "ter" não é físico. Se, ao ver uma árvore, eu a tivesse fisicamente dentro de mim, eu me destruiria. A árvore que "tenho dentro de mim" não é a mesma que "está lá fora". A que tenho em mim é uma "imagem" da que está lá fora, através da qual me refiro a ela. Mas o que conheço não é a imagem, e sim a árvore lá fora. Conhecer é uma relação pura, digamos assim, mesmo que mediada pela imagem. Não consiste em "fazer alguma coisa" com o objeto, mas apenas em tê-lo "espiritualmente", não materialmente. A palavra latina, muitas vezes usada para dizer isso, é "intentio", intenção. O conhecimento é um fenômeno "intencional" (eu "tendo" para a coisa, "relaciono-me" com ela). O conhecimento em si não é material, ele põe o sujeito "fora" de si mesmo, e inicia uma ordem de relações totalmente original (que só é possível para os seres onde existe um "dentro", em função de sua forma-alma). Há duas espécies de modificação: uma é natural, outra é espiritual. A modificação é natural quando a forma do que causa a mudança é recebida no que é mudado segundo seu ser natural [diríamos físico]. Por exemplo, o calor no que é esquentado [ele passa fisicamente da fonte de calor para o objeto aquecido]. Uma modificação é espiritual quando a forma é recebida segundo seu ser espiritual. (...) Para a ação dos sentidos, requer-se uma modificação espiritual pela qual a forma intencional do objeto sensível é produzida no órgão do sentido. De outra sorte, se a modificação natural bastasse por si só para produzir a sensação, todos os corpos naturais, ao se alterarem, sentiriam. ( I , q.78, a.3). A modificação material não é sempre portadora da modificação espiritual. A imagem de cor no olho que vê, é um apoio físico para a relação de conhecimento da cor. Mas o que vejo não é a imagem de meu olho (ou meu cérebro), e sim o objeto colorido que está aí fora diante de mim. Em suma, um fenômeno original no mundo material. Um fenômeno espiritual. Os modos da relação "conhecimento" variam conforme o nível de vida. O conhecimento sensorial (ver, sentir com o tato, ouvir, sentir o gosto ou o cheiro), típico da animalidade, corresponde a um nível diferente daquele do conhecimento intelectual (entender, compreender, saber o que é, raciocinar). No entanto esses níveis estão interligados no ser humano (o entendimento pressupõe uma atividade sensorial, e, de certa forma, a elabora e complexifica). - Além disso, devemos dizer que ao conhecimento se segue normalmente uma outra forma de "intenção" (ou relação). Essa outra forma de intenção é o afeto, o desejo, a busca intencional, ou, como se diz no latim, resumindo tudo, o "apetite" (que, na língua de Tomás de Aquino, é toda forma de tendência intencional, e não só aquela relacionada com o alimentar-se). Assim como existe a intenção cognitiva (relação de conhecimento), existe também a intenção apetitiva (relação de afeto, de desejo, de busca). Para Tomás de Aquino essa outra relação é derivada da primeira (pressupõe sempre algum tipo de conhecimento), e é também uma relação "espiritual". E nela também podemos falar de níveis conforme o nível de vida. Existe o "apetite sensorial" (que se segue à apreensão dos sentidos ou conhecimento sensorial), e o apetite intelectual (que se segue ao entendimento ou conhecimento intelectual) (ver I, q.81 e 82). A consideração das formas superiores de conhecimento e afeto nos leva a pensar que nosso mundo é atravessado por algo como uma energia propulsora. Essa energia é o que Memorandum 5, out/2003 Belo Horizonte: UFMG; Ribeirão Preto: USP. http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/amatuzzi01.htm Amatuzzi, M. (2003). Releitura de textos de Tomás de Aquino visando a construção de um pensamento 50 psicológico. Memorandum, 5, 42-54. Retirado em / / , do World Wide Web: http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/amatuzzi01.htm. dá o dinamismo a toda matéria e a faz evoluir para formas cada vez mais complexas. Essa energia, porém,não se identifica com a matéria. É anterior a ela, digamos assim, e se manifesta nela. É por ela que a própria matéria existe. Pois bem, essa energia aproxima-se do que Tomás de Aquino (seguindo Aristóteles) chamava de forma. Esta, na verdade, não se restringe à natureza estática de alguma coisa. É a estrutura íntima que define cada coisa, sim, mas enquanto tomando consistência num dinamismo que a ultrapassa. A forma é a "estrutura" de alguma coisa, mas também é sua "vocação" no conjunto do universo. A forma contém um sentido. As estruturas complexas que surgem em nosso mundo material são portadoras de uma direção de desenvolvimento que acaba ultrapassando o próprio momento atual do indivíduo. Falando da criação e da criatura, Tomás tem uma frase onde essa intuição aparece de modo claro: Toda criatura [1 ° ] subsiste em seu ser, [2 ° ] possui uma forma que determina sua espécie e [3 ° ] está ordenada a algo distinto ( I , q.45, a.7). Essa "ordenação a algo distinto", sua "vocação", ou sentido, lhe é, portanto, também constitutivo. Estaríamos nos distanciando muito do pensamento de Tomás de Aquino? Acredito que não. Leiamos um trecho de Ip., q.76, art.1 (alguns comentários estarão entremeados ao texto, entre colchetes, para evidenciar nossa leitura. "A natureza de cada coisa é revelada por sua operação [a natureza é pois dinâmica]. A operação própria do homem, enquanto homem, é conhecer [em latim intelligere, o conhecer de nível intelectual, entender, efetuar a leitura do mundo, daí decorrendo um afeto, uma tendência, um 'apetite', um dinamismo de ação que lhe é próprio]. É por aí que ele é superior a todos os animais. [Pela capacidade de reflexão, o ser humano pode por a cabeça para fora dos sistemas nos quais estava submerso, e se relacionar com eles, tomar posição em relação a eles. Diferencia-se, assim, dos outros animais.] Por isso Aristóteles (...) estabeleceu nessa operação (...) própriamente humana, a felicidade perfeita. [A realização plena do ser humano consiste em realizar a operação que lhe é própria, seguida das outras que normalmente decorrem dela; o homem deseja cumprir os anseios que o habitam, e nisso está sua felicidade ou realização última.] A espécie do homem deve ser pois determinada segundo o princípio desta operação. [O que é o ser humano, nós o sabemos a partir dos apelos contidos nas possibilidades de suas operações próprias.] E como a espécie de uma coisa é determinada segundo sua própria forma, segue-se daí que o princípio intelectivo é para o homem sua própria forma". ( I , q.76, art.1). O ser humano é o que é a partir de sua capacidade reflexiva, de entender, de questionar o mundo e a vida, e de iniciar a partir daí um dinamismo de ação. A operação que é própria ao ser humano é uma operação de relação, de comunhão com tudo o mais. Em outras palavras: a "forma" humana (a alma humana) tem, embutida em si mesma, uma "vocação". Não é uma forma fechada. Na seqüência do mesmo texto, Tomás diz: "Deve-se considerar, ainda, que quanto mais nobre for a forma, tanto mais domina a matéria corporal e tanto menos nela está imersa; e mais a ultrapassa por sua operação e poder. [O conceito de "nobreza" para Tomás de Aquino corresponde mais ou menos ao que para nós seria a "complexidade": quanto mais complexa for uma estrutura, tanto mais ela ultrapassa a matéria corporal, tanto menos estando nela imersa.] Assim vemos que a forma de um corpo composto [de elementos] possui alguma operação que não é causada pelas qualidades elementares. [O comportamento do corpo não se reduz às propriedades desses elementos em separado.] E quanto mais se eleva a nobreza das formas [quanto mais complexa for a estrutura] tanto mais o poder da forma vai além da matéria elementar. Por exemplo, a alma vegetativa é superior à forma do metal [isto é, dos corpos inanimados], e a alma sensitiva [do animal], à da alma vegetativa. Ora, a alma humana é entre as formas a mais elevada em nobreza [ou complexidade]. Por sua potência transcende a matéria corporal na medida em que tem uma operação e potência nas quais a matéria corporal não participa de maneira alguma. Essa potência chama-se intelecto [referido à forma mais desenvolvida de conhecimento]". ( I , q.76, a.1). Memorandum 5, out/2003 Belo Horizonte: UFMG; Ribeirão Preto: USP. http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/amatuzzi01.htm Amatuzzi, M. (2003). Releitura de textos de Tomás de Aquino visando a construção de um pensamento 51 psicológico. Memorandum, 5, 42-54. Retirado em / / , do World Wide Web: http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/amatuzzi01.htm. Fica muito clara aqui a originalidade do ser humano. Tomás chega a dizer que a potência de sua forma é tal que de algum modo transcende a matéria corporal. Vemos no mundo material emergirem formas cada vez mais "nobres", estruturas cada vez mais complexas, capazes de proporcionar uma relação com o mundo também cada vez mais elaborada. Na ponta desse desenvolvimento, encontra-se a forma humana, a alma humana. Nesse sentido o ser humano se diferencia de tudo que a natureza produziu antes dele. Ele é o primeiro que consegue olhar o mundo e "ler dentro" (intelligere), e por isso mesmo ser impulsionado por um afeto totalmente novo. É o primeiro que se pergunta pelo sentido de tudo isso, e sua essência está justamente nesse perguntar. Sua felicidadE não será plena a não ser no trabalho dessa pergunta (e na comunhão que daí resulta). Na verdade nosso mundo material não se explica somente a partir da matéria (entendida como pura potencialidade indeterminada). Vemos aí um dinamismo interior que impulsiona todo o processo. A ciência moderna parece estar voltando a isso, primeiro quando fala de evolução (a emergência de formas cada vez complexas do âmago da matéria desorganizada), mas também quando fala de uma energia, anterior à matéria, que se manifesta nela, e que é portadora de todo um impulso para o desenvolvimento. O que é então nosso mundo? É preciso que o entendamos incluindo a originalidade da vida, e da vida em sua manifestação mais complexa que é a humana. Se nós, humanos, fazemos parte do mundo, e se somos seres capazes de movimento autônomo e conhecimento (isto é, seres que são fonte de seus próprios movimentos, e seres capazes questionar o sentido), então é porque há algo mais aqui que a pura matéria-passividade. E esse algo mais que vem organizando a matéria em estruturas que acabam por transcendê-la de algum modo. A dimensão "sentido" está presente na forma, impulsionando-a a superar-se. É a "vocação" que se faz presente no desenvolvimento dos processos de nosso mundo. Uma leitura atual de Tomás de Aquino, atenta às suas intuições, para além de suas fórmulas, nos leva a pensar isso. Nosso mundo produziu a alma humana na ponta de sua evolução conhecida. Então ele é habitado por um "espírito". Estudar a alma humana Diz Tomás de Aquino: Ao teólogo compete considerar a natureza do homem no que se refere à alma, e não no que se refere ao corpo, a não ser em sua relação com a alma ( I , q.75, pról.). Existem, portanto, duas considerações complementares do ser humano: uma por parte da alma, e isto, para Tomás, define o ponto de vista do teólogo (e de quem quer que o considere como um todo, em sua natureza e em seu sentido), e outra por parte do corpo, e isso define o ponto de vista do médico (ou de todos os cientistas naturais que consideram as condições físicas da existência). O médico se interessa (e cuida) primeiramente do corpo. Ele só aborda a alma enquanto possa ter relações com as disposições corporais. Paralelamente, o teólogo se interessa primeiramente pela alma (isto é, o ser humano inteiro, em sua estrutura interior unificadora e doadora de sentido). O corpo só lhe interessa enquanto possa ter relações com as disposições anímicas. Considerar o ser humano por parte da alma é estar cuidando do sentido da vida, do significado de viver (e isso, com certeza, inclui a ética, diríamos nós hoje). Considerá-lo por parte do corpo é estar mais atento às condições físicas de saúde. O que vamos fazer uma vez tendo saúde, isso é um desafio para a alma, e não cai mais sob a consideração direta do médico. É a alma que nos dá o enfoque do todo. O corpo, somente das partes. Quando o teólogo (ou quem quer que considere o ser humano por inteiro) fala do corpo, ele está somente preocupado em como as condições corporais se relacionam com uma vida plena. São dois modos de se estudar o ser humano e, conseqüentemente, de interagir com ele, determinando duas possíveis posturas profissionais. Minha hipótese sobre a questão corpo e alma: não são duas entidades, mas dois aspectos do ser humano, que correspondem a dois discursos. A abordagem do "médico" incide sobre algo que denominamos "corpo" (o homem todo, visto por fora, e em suas partes); a do "teólogo" incide sobre algo que denominamos "alma" (o homem todo, visto por dentro, em sua estrutura unificadora e dinamizadora). A separação entre corpo e Memorandum 5, out/2003 Belo Horizonte: UFMG; Ribeirão Preto: USP. http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/amatuzzi01.htm Amatuzzi, M. (2003). Releitura de textos de Tomás de Aquino visando a construção de um pensamento 52 psicológico. Memorandum, 5, 42-54. Retirado em / / , do World Wide Web: http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/amatuzzi01.htm. alma não seria ontológica, mas epistemológica. Não se trata de duas "coisas", mas de uma só, o ser humano, visto de dois ângulos diferentes. Como dizia Jung, precisamos desses dois ângulos, porque não sabemos fazer de outro modo: são dois aspectos diferentes somente para a nossa inteligência, e não na realidade. (Jung, 1972, p.93). Estudar a alma humana é próprio do teólogo. O que faz então o psicólogo? Essa figura não existia no tempo de Tomás de Aquino. Mas, se tudo que dissemos aqui for verdade, uma psicologia que queira ser verdadeiramente humana, não pode se furtar às questões mais abrangentes que se colocam para nós, e nesse sentido fica mais para o lado da teologia do que para o da medicina. Recolhendo conclusões Nossa questão inicial era: como Tomás de Aquino constrói aquilo que nós hoje chamaríamos de um pensamento psicológico? Comparando certos textos do mestre medieval com preocupações de uma psicologia atual (principalmente humanista, existencial e fenomenológica), obtivemos 3 respostas básicas. Pelo fato de se referir ao ser humano no que ele tem de próprio, e, portanto, enquanto um ser desafiado pela busca do sentido, a construção desse pensamento psicológico supõe uma atitude aberta a todas as possibilidades de encontro com o sentido. Esta foi nossa primeira resposta. Concretamente, isso significa a necessidade de se ir além da razão instrumental. Sempre útil na organização da lida cotidiana, ela é insuficiente no que diz respeito às questões de significado que se colocam para o homem. Para essas questões é necessário perscrutar os sentidos que se manifestam de diversos modos nos fatos singulares, históricos. Mas a apreensão desses sentidos não é obra da pura razão. Supõe um envolvimento maior do ser humano por inteiro, pois está associada com a decisão da ação, ou seja, com os rumos de vida. Muito mais do que construir uma sabedoria, essa apreensão é um deixar-se possuir por uma sabedoria maior, que transcende o indivíduo. Em segundo lugar essa construção acompanha o próprio movimento da indagação humana que, apoiada no desejo da felicidade e articulada com tomadas de posição pessoais, vai produzindo e testando significados capazes de orientar a vida. Mesmo quando produz modelos de funcionamento mental, seu contexto de base, ou sua raiz, é a inquietação humana. É em torno da compreensão dessa inquietação que o pensamento de Tomás vai integrando o saber acumulado sobre a alma, suas operações, e suas paixões. Finalmente, no caminho dessa construção, Tomás de Aquino recorre constantemente às formas da linguagem comum, como guia. Não para ficar nelas, mas para, penetrando-as, clarear o entendimento da alma humana. A linguagem expressa os momentos da experiência humana na lida e na compreensão do mundo, e é como o resultado de um imenso experimento coletivo, no qual confia Tomás. Abertura para outras fontes de significado, acompanhamento do movimento da inquietação humana, e confiança no experimento coletivo que se expressa na linguagem, são, em resumo, alguns dos principais fundamentos da construção desse pensamento psicológico. No que diz respeito ao conteúdo, essa construção deve atender a três âmbitos de indagação, que podem ser indicados por 3 perguntas gerais. 1) Como falar adequadamente da alma humana e de suas operações, dando conta de nossa experiência? (isso corresponde ao enfoque da I parte da Suma Teológica); 2) Como se manifestam as operações da alma, quando na trama do agir humano em busca de um sentido? (enfoque da II parte da Suma); e 3) Quais são os símbolos do caminhar humano, historicamente produzidos, e como esses símbolos se integram significando esse mesmo caminhar em seus momentos chave, e servindo de instrumento para ele? (enfoque da III parte). Não podemos deixar de mencionar, finalmente, uma dimensão dessa construção. Ela só esclarecerá em definitivo todas aquelas questões acima, se permitir situar o movimento humano (em seu aspecto psicológico) no movimento maior do próprio mundo. Se, nessa construção, não compreendermos qual a relação entre a psicologia humana e o Memorandum 5, out/2003 Belo Horizonte: UFMG; Ribeirão Preto: USP. http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/amatuzzi01.htm Amatuzzi, M. (2003). Releitura de textos de Tomás de Aquino visando a construção de um pensamento 53 psicológico. Memorandum, 5, 42-54. Retirado em / / , do World Wide Web: http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/amatuzzi01.htm. dinamismo do universo, não teremos tido êxito, e alguma coisa estará faltando. O pensamento psicológico é solidário com o pensamento cosmológico. Uma pergunta fica no ar: não estaríamos falando muito mais de uma psicologia filosófica (ou de uma reflexão prévia que nos situe face ao objeto da psicologia), do que de uma psicologia científica? Penso que poderíamos responder como Merleau-Ponty (1973): sem uma reflexão prévia desse tipo, a ciência não saberia de que está falando, e então poderia estar esmiuçando um fantasma. Referências bibliográficas Agostinho de Hipona (1994). A Trindade. (A. Belmonte, Trad.). São Paulo: Paulus. (Original latino do séc. V). Agostinho de Hipona (1997). Sobre a potencialidade da alma. (A. J. Faria, Trad.). Petrópolis: Vozes. (Original latino do séc. IV). Boaventura de Bagnoregio (1999). Escritos filosófico-teológicos (L. A. Boni & J. Jerkovic, Trad.). Porto Alegre: EDIPUCRS. (Original latino do séc. XIII). Boff, Leonardo (2002). Experimentar Deus. Campinas: Verus. Eckhart, Mestre (1983). Tratados y sermones (I. M. De Brugger, Trad.). Barcelona: Edhasa. (Original alemão do séc. XIV). Jeauneau, Edouard (1986). A filosofia medieval. (J. A. Santos, Trad.). Lisboa: Ed. 70. (Original francês de 1963). Jung, Carl G. (1972). Fundamentos de psicologia analítica: as conferências de Tavistok (A. Elman, Trad.). Petrópolis: Vozes. (Original alemão de 1935). Lafont, Ghislain (1960). Structures et méthode dans la Somme Théologique de Saint Thomas d'Aquin. Bruges: Desclée de Brouwer. Laín Entralgo, Pedro (1995). Cuerpo y alma: estructura dinámica del cuerpo humano. 2a ed. Madrid: Editorial Espassa Calpe. Lauand, Luiz Jean (1999). Tomás de Aquino: vida e pensamento: estudo introdutório geral. Em Tomás de Aquino. Verdade e conhecimento. (L. J. Lauand & M. B. Sproviero, Trad., estudos introdutórios e notas). (pp.1-80). São Paulo: Martins Fontes. Leloup, Jean-Yves (2002). Cuidar do ser: Fílon e os terapeutas de Alexandria. 5aed. (R. Fittipaldi, E. F. Alves, L. E. Orth & J. A. Clasen, Trad.). Petrópolis: Vozes. Massimi, Marina (2001). A psicologia dos jesuítas: uma contribuição à história das idéias psicológicas. Psicologia: Reflexão e Crítica, 14 (3), 625-633. Massimi, Marina. (2001a) Identidade, Tempo, Profecia na visão de Padre Antônio Vieira. Memorandum, 1, 13-31. Retirado em 10/05/2002, do World Wide Web: http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos01/massimi01.htm. Merleau-Ponty, Maurice (1973). Ciências do homem e fenomenologia. (S.T. Muchail, Trad.). São Paulo: Saraiva. (Edição original de 1951). Nascimento, Carlos Arthur (1992a). O que é filosofia medieval. São Paulo: Ed. Brasiliense. (Coleção Primeiros Passos). Nascimento, Carlos Arthur (1992b). Santo Tomás de Aquino: o boi muda da Sicília. São Paulo: EDUC. Tomás de Aquino (1951). Summa Theologiae. (ed. latina, com suplemento e índices). Madrid: B.A.C. 5 vols. (Original latino do séc.XIII) Tomás de Aquino (1952). Suma contra los gentiles (J.P. Castellano, Trad.). 2 vols. Madrid, BAC. (Edição bilíngüe;Original latino do séc.XIII). Memorandum 5, out/2003 Belo Horizonte: UFMG; Ribeirão Preto: USP. http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/amatuzzi01.htm Amatuzzi, M. (2003). Releitura de textos de Tomás de Aquino visando a construção de um pensamento 54 psicológico. Memorandum, 5, 42-54. Retirado em / / , do World Wide Web: http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/amatuzzi01.htm. Tomás de Aquino (1980). Suma Teológica (A. Corrêa, Trad.). Porto Alegre: Sulina. (Edição bilíngüe). 11 vols. (Original latino do séc.XIII) Tomás de Aquino (2001). Suma teológica (C.-J. P. Oliveira e equipe, Trad.). São Paulo: Loyola. (Edição bilíngüe). 8 vols. (Original latino do séc.XIII) Torrell, Jean-Pierre (1999). Iniciação a Santo Tomás de Aquino: sua pessoa e sua obra (L.P. Rouanet, Trad.). São Paulo: Loyola. (Edição original de 1993). Nota sobre o autor Mauro Martins Amatuzzi é psicólogo, doutor em Educação pela UNICAMP, docente no programa de Pós-Graduação em Psicologia da Pontifícia Universidade Católica de Campinas. Interessa-se por metodologias qualitativas de pesquisa, por processos de mudança e desenvolvimento pessoal, por psicologia da religião, e pelo resgate de pensamentos psicológicos antigos. Contato: R. Luverci Pereira de Souza, 1656 (Cidade Universitária) - 13084-031 - Campinas/ SP, Brasil. E-mail: [email protected] Memorandum 5, out/2003 Belo Horizonte: UFMG; Ribeirão Preto: USP. http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/amatuzzi01.htm Silva, P.J.C. (2003). Medicina do corpo e da alma: os males corporais e o exercício da palavra em escritos 55 da antiga Companhia de Jesus. Memorandum, 5, 55-68. Retirado em / / , do World Wide Web: http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/silva01.htm Medicina do corpo e da alma: os males corporais e o exercício da palavra em escritos da antiga Companhia de Jesus Body and soul's medicine: corporal illness and word practice in Early Society of Jesus writings Paulo José Carvalho da Silva Pontifícia Universidade Católica de São Paulo Brasil Resumo O sofrimento físico de santo Inácio de Loyola (1491-1556), bem como seus serviços médicos são imagens de efeito edificante em seu relato biográfico. Examinar usos do mesmo lugar retórico na produção escrita de expoentes da antiga Companhia de Jesus presentes nas missões brasileiras, como José de Anchieta (1534-1597) e Antônio Vieira (1608-1696), permite compreender o significado dos males do corpo para um jesuíta no início da Idade Moderna e auxilia a repensar os desdobramentos da interdição inaciana de se ensinar medicina nas escolas da Companhia. Conclui-se que a arte médica não somente é praticada, como fornece um repertório de comparações que dão inteligibilidade e sustentação metódica para procedimentos centrais da ação missionária, desde a organização cotidiana da evangelização até a pregação entendida como medicina da alma. Palavras-chave: medicina da alma; medicina; jesuítas; missões; pregação. Abstract The physical suffering and medical services of Saint Ignatius of Loyola (1491-1556) are images of pedagogical effect in his autobiography. Inquiry about the uses of the same topos in writings by the first Jesuits who worked in Brazil, such as José de Anchieta (1534-1597) and Antônio Vieira (1608-1696), could explain the meaning of the illness of the body for a Jesuit from Early Modern Age and also help in rethinking the consequences of strong recommendation for the teaching of Medicine in Jesuit schools. It could be argued that medical arts were not only practiced but its language was used to give intelligibility, and to legitimate main missionary action practices, from the organization of pastoral daily works to preaching, which was also known as soul's medicine. Keywords: soul's medicine; medicine; Jesuits; missions; preaching. O corpo de Inácio É bastante célebre a imagem do ferimento da perna direita do então jovem fidalgo Iñigo de Loyola, no cerco de Pamplona, na primavera de 1521, que viria a se tornar motivo recorrente na iconografia do santo ao longo dos séculos, devido às meditações e resoluções espirituais do período de convalescença, considerados posteriormente como modulares da conversão de Inácio e da própria germinação da vocação espiritual da Companhia de Jesus. O relato biográfico, elaborado a partir da perspectiva de Inácio pelo padre Luís Gonçalves da Camara, entre 1553 e 1555, enfatiza a descrição da gravidade do ferimento e das dores torturantes, que teriam servido de ocasião para o exercício de paciência e coragem exemplares (1). Descreve-se, ainda, que desacreditado de uma possível melhora pelos médicos e cirurgiões, Inácio teria se confessado e recebido os devidos sacramentos e na mesma noite recobrado sua melhora. Este não seria, contudo, o único momento em que a postura de paciência e fé devota, prescrita desde o cristianismo primitivo, combinada com a eficácia benéfica dos sacramentos assumiriam uma expressão edificante na narrativa biográfica de Inácio e Memorandum 5, out/2003 Belo Horizonte: UFMG; Ribeirão Preto: USP. http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/silva01.htm Silva, P.J.C. (2003). Medicina do corpo e da alma: os males corporais e o exercício da palavra em escritos 56 da antiga Companhia de Jesus. Memorandum, 5, 55-68. Retirado em / / , do World Wide Web: http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/silva01.htm forneceriam um modelo de conduta quanto ao sofrimento físico e suas exigências espirituais, sistematizado em outros escritos. Conta-se que, tempos depois do incidente em Pamplona, quando afligido por intensa febre, em Manresa, Inácio enfrentaria o sofrimento físico trazendo ao pensamento suas supostas ofensas a Deus e realizaria um trabalho de purgação destes pecados, conferindo um valor de justiça à própria dor. Na intensificação do sofrimento, recorreria ainda ao pensamento da morte, o que teria efeito consolatório (2). Embora a ênfase seja dada ao quanto a enfermidade do corpo incita à prática de "cosas spirituales", lê-se que os serviços médicos não são de todo desvalorizados e devem ser procurados a fim de se remediar todas as causas que possam eventualmente intervir, o que ficaria regula mentado nas Constituições da Ordem. A presença da atenção médica e cuidados de auxiliares é bastante pronunciada no relato da vida de Inácio, acometido várias vezes por diferentes e inconvenientes males: ferimentos, febres, dores no estômago, etc. Em sua experiência, porém, a medicina não basta para restabelecer completamente a saúde, o que exige, de um lado, um trabalho do próprio enfermo, envolvendo a virtude da paciência e o uso da razão, e, de outro lado, entra em atividade o sacerdote, na consolação do aflito e na administração do sacramento, que curaria corpo e alma. O mesmo relato constrói uma imagem de Inácio envolvido com o alívio da dor, respaldada por exemplos, como a passagem na qual alude-se que o ainda estudante em Paris teria arriscado sua vida para consolar e animar, tocando uma pessoa que acreditava sofrer da peste. Ação que viria a ser repetida outras vezes, no hospital de Veneza, onde prestou serviços junto aos primeiros companheiros, durante dois ou três meses do ano de 1537. Serviço que, mais tarde, ganharia método e sistema no interior da Companhia. Esta narrativa do passado de Inácio apresenta a sua juventude descomedida em contraste com a realização espiritual da vida adulta entregue à religião. Suas peregrinações, estudos e encontros são interpretados conforme as circunstâncias, visões e meditações que ordenaram seu corpo e sua alma segundo os princípios da vontade manifesta de Deus que ele mesmo se pôs a decifrar nos diferentes acontecimentos de sua vida, inclusive em suas enfermidades. São experiências antecedentes à elaboração dos Exercícios Espirituais e das Constituições, mas que foram ditadas posteriormente e que em sua forma textual ficariam em circulação por pouco tempo, uma vez que Francisco Borgia, terceiro geral da Ordem, teria proibido a sua leitura, dez anos após a morte de Inácio, substituindo-a pela biografia, supostamente mais completa, escrita por Pedro Ribadeneyra. Todavia, particularmente neste texto, o corpo e as ações sensíveis de Inácio convertem-se na figura da vida do religioso, que atualiza o exercício cristão primitivo de misericórdia e paciência face ao sofrimento e de busca incessante de um alívio dos próprios males e do próximo, em espelho ao devotamento à salvação da sua e da alma de todos. Ainda mais notória que a figura de Inácio convalescendo na Casa y Solar de Azpeitia ou servindo no hospital de Veneza é a sua determinação que reiterara o cânon 9 do Segundo Concílio Laterano, de 1139, e proíbe o ensino da medicina nas universidades da Companhia, no décimo segundo capítulo das Constituições (3). Retomar o emprego da imagem de Inácio, como enfermo transformado em mestre espiritual, e examinar as recorrências e desdobramentos do mesmo lugar retórico na produção escrita de expoentes da antiga Companhia de Jesus presentes nas missões brasileiras pode fornecer elementos para se repensar perguntas como: o que significava os males do corpo para um jesuíta no início da Idade Moderna? Em que sentido a comparação com a arte médica podia instrumentar uma maneira propriamente jesuítica de tratar os chamados males da alma? Como se dava a dinâmica entre os tratamentos do corpo e da alma nas missões jesuíticas? Memorandum 5, out/2003 Belo Horizonte: UFMG; Ribeirão Preto: USP. http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/silva01.htm Silva, P.J.C. (2003). Medicina do corpo e da alma: os males corporais e o exercício da palavra em escritos 57 da antiga Companhia de Jesus. Memorandum, 5, 55-68. Retirado em / / , do World Wide Web: http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/silva01.htm Outros corpos Logo na consideração das condições de ingresso de um postulante a membro da Companhia, contidas no chamado Exame, encontra-se uma definição do dever do médico em analogia ao ofício do diretor espiritual: En el tiempo de las enfermidades, no solo debe observar la obediencia con mucha puridad a los Superiores spirituales, para que gobiernen su ánima; mas aun com la misma humildad a los médicos corporales y enfermeros, para que gobiernen su cuerpo; pues los primeros procuran su entera salud spiritual, y los segundos toda su salud corporal. Así mesmo el tal enfermo, mostrando su mucha humildad y paciencia, no menos procure edificar en el tiempo de su enfermidad a los que le visitaren, conversaren y trataren, que en el tiempo de la su entera salud, a mayor gloria divina. (Loyola, Constituições, em Iparraguirre, 1952, par. 89, p. 388). As virtudes necessárias no momento de uma enfermidade são a obediência e a humildade, as mesmas virtudes que formam o caráter de um bom jesuíta. Como fica estabelecido no relato da biografia de Inácio, o adoecimento é uma ocasião para se cuidar da alma, o que deve ser feito acatando-se o saber e a autoridade do médico e do diretor espiritual. Enquanto que o diretor espiritual governa a alma, o médico governa o corpo. As duas ações são perfeitamente solidárias e se aplicam às coisas do espírito e às da matéria. Pode-se entender que as enfermidades são desgovernos e que a saúde perfeita do espírito e a plena saúde do corpo são resultado do bom governo que o superior e o médico, cada um no seu lugar complementar, supostamente são capazes de praticar. O doente, por sua vez, através de sua humildade e paciência, também empreenderá uma ação para o próximo. Este velará, com seu bom exemplo, pela edificação dos que com ele interagem durante esta fase de aflições. Não estando preparado nas artes médicas, o jesuíta terá que, necessariamente, recorrer á competência de um outro no caso de enfermidades corporais. Entretanto, deve haver na casa alguém que domine as questões relativas à conservação da saúde, normalmente um oficial subalterno nomeado pelo reitor, que prestará bastante atenção aos mais fracos, idosos e já adoentados que, por sua vez, deverão comunicar-lhe uma eventual alteração em sua saúde. O enfermeiro, ao julgar importante alguma indisposição notada, avisará o superior. Neste caso, chamar-se-á um ou mais médicos, conforme a necessidade atestada pelo superior. Desta forma, fica definido não só em que ocasião e como se deve chamar o médico, como também o seu lugar na estrutura da Companhia e a relação de seu saber com o saber e a vocação jesuítas postos em prática através de seus dispositivos legítimos. A autoridade médica e suas prescrições serão ponderadas segundo as regras que regem o equilíbrio e identidade da Ordem. Em outras palavras, o governo do corpo de cada membro deverá ser feito em concordância com o governo do corpo da Companhia enquanto conjunto - e ainda deverá ser ocasião para possibilitar o governo da alma. Desde as Constituições, decreta-se que não haverá uma "medicina jesuítica", mas que sempre haverá um uso particularmente jesuítico do discurso e do serviço médico. Cumpre ainda pontuar que as mesmas Constituições que interditam a formação médica prescrevem aos noviços, contudo, um estágio de exercício de humildade e caridade durante um mês de prestação de serviços em um hospital. Os trabalhos prestados pelos primeiros jesuítas no hospital de Veneza tornaram-se um exemplo a ser seguido pelas gerações sucessivas de membros da Ordem. Cuidar do conforto material dos doentes além de pregar e ouvir suas confissões eram as atividades previstas. Entretanto, suas atuações chegaram a tomar dimensões inesperadas em tempos de epidemias, como a de Perugia em 1553, de Roma em 1566 e 1568 e de Lisboa em 1569. Vários jesuítas envolveram-se com o estabelecimento de farmácias e enfermarias desde os arredores de Roma às mais longínquas missões. Outros engajaram-se na militância por um tratamento Memorandum 5, out/2003 Belo Horizonte: UFMG; Ribeirão Preto: USP. http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/silva01.htm Silva, P.J.C. (2003). Medicina do corpo e da alma: os males corporais e o exercício da palavra em escritos 58 da antiga Companhia de Jesus. Memorandum, 5, 55-68. Retirado em / / , do World Wide Web: http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/silva01.htm mais eficiente e humano nos hospitais. De maneira geral, empreitadas difíceis nas quais muitos jesuítas adoeceram, faleceram ou enfrentaram tantos outros graves problemas, levando-os a refletir sobre os limites da arte médica e a importância e risco do comprometimento com os cuidados dos enfermos (4). Enfim, o movimento de aproximação e recuo ponderado frente a dor e a morte tornou-se parte considerável da educação do corpo e da alma dos primeiros jesuítas, não só nos momentos agudos das devastações provocadas pelas epidemias européias, mas também frente às necessidades crônicas encontradas nas missões (5). É igualmente conhecido o envolvimento dos jesuítas na assistência médica no Brasil colônia. Muito embora, de maneira geral, a responsabilidade pelos serviços sociais, tais como tratamento dos enfermos, enterro dos pobres, amparo às meninas órfãs, aos prisioneiros, entre outras medidas assistênciais e sanitárias, recaía sobre as irmandades, principalmente a da Misericórdia, que de Lisboa, estendeu-se para a Ásia, África e América portuguesas. Admite-se, entretanto, que os jesuítas colaboraram, mesmo que de forma limitada, com o estabelecimento ou progresso destas casas. Senão, eles contribuíram com cuidados médicos em regiões distantes da capital da colônia antes do estabelecimento de Misericórdias (6). Quanto aos serviços prestados pelos padres da Companhia, Serafim Leite chega a afirmar que: "Os jesuítas, indo para o Brasil como médicos das almas, viram-se pois, obrigados, pela fôrça das circunstâncias, enquanto não vieram profissionais, a ser também médicos do corpo" (Leite, 1938, p. 570) (7). Entretanto, o estudo de S. Leite, muito mais interessado em discutir a contribuição dos jesuítas para a história das ciências médicas e naturais, não analisa a maneira como a assistência médica tornou-se uma estratégia de sobrevivência e de concretização do projeto evangelizador no Brasil de então. Pode-se dizer, valendo-se da afirmação do historiador, que os jesuítas talvez tenham se encaminhado para a colônia, a princípio, como evangelizadores, mas se viram na situação de fazerem-se médicos do corpo, para poderem realizar o que proclamam ser o ofício de médicos das almas. De um modo geral, nota-se, na documentação do período, não apenas uma descrição do aprendizado das práticas médicas, mas também uma assimilação do vocabulário médico nos escritos jesuíticos, ao longo de sua experiência missionária no Brasil. Nas cartas e documentos do padre José de Anchieta (1534-1597), por exemplo, o termo "medicina das almas", bem como suas variantes, "remédios para a alma" e "cura das almas" acompanham, geralmente, os relatos das práticas de cuidados com o corpo, conferindolhes um sentido mais missionário (8). Anchieta, enviado para o Brasil na esperança de melhoras para seus rins, ao escrever para os irmãos da enfermaria de Coimbra, onde estivera internado, dá notícias de, nas missões, haver superado pouco a pouco os seus males. Na carta "Aos Irmãos Enfermos de Coimbra, de São Vicente, 1554" ele reafirma, a título de consolação, o preceito do cristianismo primitivo, recomendado por Inácio, de se servir a Deus mesmo doente,”tendo grande paciencia nas enfermidades e, nestas, aperfeiçoando a virtude", e expressa os votos de que com tal consolação, "outras mais fortes mezinhas", possam curar os seus "coenfermos", já que as "mezinhas materiais pouco fazem ou aproveitam", como ele mesmo experimentara (Anchieta, 1554/1988, p. 72). Anchieta relata que se curou, esquecendo-se de seus males e dedicando-se à cura dos outros, pois na solidão de uma terra "mui bôa", mas sem "purgas e regalos de enfermaria", urgia-se adaptar-se aos remédios por ela oferecidos e estender o bojo da caridade até o ofício de médico: "Neste tempo que estive em Piratininga servi de médico e barbeiro, curando e sangrando a muitos daqueles Indios, dos quais viveram alguns de que se não esperava vida, por serem mortos muitos daquelas enfermidades" (p. 73) (9). Nesta mesma carta, o envolvimento dos padres nos serviços médicos, "ensinado pela necessidade", é discursado como o que pode manter aceso o fervor missionário, produzindo um efeito de edificação ao mesmo tempo que confere sentido e relevância ao cotidiano da empresa missionária. Em suas últimas linhas, o jesuíta adverte serem grandes os trabalhos da Companhia nesta terra, e exigirem muitas "virtudes adquiridas", entretanto os recomenda aos irmãos "opilados e meio doentes" de Coimbra, fazendo do Memorandum 5, out/2003 Belo Horizonte: UFMG; Ribeirão Preto: USP. http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/silva01.htm Silva, P.J.C. (2003). Medicina do corpo e da alma: os males corporais e o exercício da palavra em escritos 59 da antiga Companhia de Jesus. Memorandum, 5, 55-68. Retirado em / / , do World Wide Web: http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/silva01.htm exercício da missão um oportuno remédio para as enfermidades do corpo: "As medicinas são trabalhos e tão melhores quanto mais conformes a Cristo" (p. 74). O socorro aos enfermos é apresentado como tarefa árdua e empenhativa, que desafiava as forças e o ânimo dos jesuítas, muitas vezes eles mesmos indispostos e necessitados de médicos, mas ganhava significado na entrega resoluta dos missionários à salvação das almas, como se nota em uma carta de seis anos mais tarde, consideravelmente mais impregnada de dramaticidade: "Ao Padre Geral, de São Vicente, a 1 de junho de 1560". As carências do lugar continuavam obrigando os padres a serem auto-suficientes o máximo possível e dedicarem-se a uma série de operações sensíveis, que incluíam o cuidado do corpo, tais como "barbear, curar feridas, sangrar, fazer casas e cousas de barro" (Anchieta, 1560/1988, p. 161) (10). Embrenhar-se pelos bosques cerrados e lamaçais para acudir com "a medicina corporal e espiritual", adoecendo e curando si e o próximo, era a imagem do cotidiano destes homens tal como estes o descreviam ao prestarem contas de seus trabalhos a seus superiores na Europa: "Os Irmãos também adoecem ás vezes, mas em breve tempo convalescem; os quais com entender com a saúde dos próximos muito mais trabalham pela sua" (p. 170). Anchieta ainda relata as dificuldades do trabalho de conversão, sobretudo dos adultos, que "cerram os ouvidos para não ouvir a palavra da salvação", e descreve, com exemplos, o esforço de "os mover, a que queiram receber o batismo" quando estes adoecem, oferecendo assim seus serviços para que, mesmo não se restabelecendo a saúde do corpo, garantissem a saúde eterna da alma. A experiência dos primeiros missionários no Brasil na administração dos sacramentos exigiu que se regulamentasse a questão no próprio território. O que se concretizou com a ordem, presente no regulamento do visitador P. Golveia, de 1586, que não se batizasse nenhum índio adulto sem que se esteja seguro de que este não voltará para o sertão, devendo ser casado imediatamente. Não se deixaria, contudo, nenhum índio morrer sem o batismo, acudindo-o logo com "o remédio conveniente a suas almas", e, em caso de "perigo de morte", esperava-se que este tivesse apenas "bastante notícia para baptizarse" (Golveia, 1586, AHSI: Bras. 2, fols.146v-147, em Leite, 1938, pp. 306-307). Nas missões brasileiras, o batismo in extremis era realizado com os índios cativos, prestes a serem mortos e comidos, e, mais freqüentemente, com os doentes de enfermidades naturais. O que obrigou os jesuítas a contornarem duas decorrências problemáticas. Muitos índios acreditavam que o sacramento é que causava a morte. Outros buscavam o sacramento apenas como remédio corporal, desvirtuando seu verdadeiro sentido. Esta "confusão" da parte dos índios, chamada por Leite (1938, pp. 273-274) de "superstição e interêsse, que misturam religião e medicina", parece ter sido combatida pelos jesuítas. Porém, não se pode deixar de considerar o quanto os próprios são responsáveis por ela, uma vez que eles mesmos combinavam medicina do corpo e da alma, e ainda, atribuíam um valor curativo ao sacramento, embora esperassem que uma vez batizados, os índios passassem a viver de maneira cristã. As cartas de Anchieta expõem várias dificuldades encontradas pelos padres em administrar os remédios para o corpo e para a alma na Capitania de São Vicente. O que não significa que este considere que todos os intuitos de salvar as almas através da assistência médica haviam sido mal sucedidos. Vide as descrições "Das ocupações e trabalhos da Companhia", por Anchieta, Informações do Brasil e de suas Capitanias, de 1584: "E quando ha doenças gerais, como houve cá muitas vezes de bexigas, priorizes, tabardilho, camaras de sangue, etc., não ha descansar, e nisto se gasta cá a vida dos nossos, com que se têm ganhado em todo o Brasil muitas almas ao Senhor." (Anchieta, 1988, p. 331). Por outro lado, a determinação inaciana de se servir nos hospitais e fazer uma peregrinação durante a experiência do noviciado parece não ter tido longa carreira no Brasil. S. Leite (1938) descreve algumas tentativas de variantes conforme às condições da colônia, como servir nas Aldeias, ou acompanhar padres procuradores pelas fazendas, mas que, por se demonstrarem contraproducentes, acabaram sendo proibidas, em 1598. A ação do padre Antônio Vieira Memorandum 5, out/2003 Belo Horizonte: UFMG; Ribeirão Preto: USP. http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/silva01.htm Silva, P.J.C. (2003). Medicina do corpo e da alma: os males corporais e o exercício da palavra em escritos 60 da antiga Companhia de Jesus. Memorandum, 5, 55-68. Retirado em / / , do World Wide Web: http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/silva01.htm Padre Antônio Vieira (1608-1696) foi o primeiro a organizar o regime interno da vida das Aldeias e Missões, o qual viria a perdurar, malgrado algumas tentativas de alterações, como a lei definitiva durante a permanência dos jesuítas na Amazônia (11). Trata-se da "Direção do que se deve observar nas Missões do Maranhão ordenada pelo Venerável P. Antônio Vieira, Visitador delas", também conhecida como "Visita do P. Antônio Vieira", de data provável entre 1658, ano em que foi nomeado Visitador, e 1661, ano em que se retirou da região. S. Leite (1943) afirma, contudo, que Vieira muito provavelmente já havia disposto alguns pontos deste regulamento logo de sua chegada nas Missões (12). Na parte relativa à observância religiosa, Vieira dedica um parágrafo ao problema da inexistência de hospitais e enfermarias suficientes nas missões. Nele, está determinado que cabe ao responsável pela missão decidir sobre a construção de hospital ou enfermaria "aonde se curem todos os enfermos da Aldeia". As enfermarias existentes deverão receber a visita dos missionários todos os dias, para atender as necessidades do corpo tal como as da alma, conjugando-as, consoante o costumeiro nas missões jesuíticas ao sul: "os nossos procurarão suprir não só espiritual, mas também corporalmente como se costuma, socorrendo-os com os medicamentos, sustento e regalo, quanto a nossa pobreza der lugar." Como se constatava que morriam muitos indígenas "por falta de sangrias", Vieira ainda prevê que se "procurem meios de haver sangradores em tôdas as Aldeias". Este ofício seria desempenhado por adultos que "tiverem maior habilidade e inclinação a isso", e, na falta destes, autoriza-se aos Irmãos Coadjutores, que souberem sangrar, dedicarem-se a "esta obra de caridade" (Vieira, em Leite, 1943, p. 109). O trabalho de "remédio das Almas e satisfação de nossas obrigações" por meio do ensino da doutrina a cada indígena em particular e o trabalho de "ajudar a bem morrer", ambos, de certa forma, fazendo parte de tradições há muito designadas com a expressão medicina da alma, estão regulamentados por Vieira na parte referente à cura espiritual das almas (pp. 112-119). A primeira forma de remédio das almas diz respeito à salvação através do conhecimento e da prática da doutrina cristã. Fazer com que a palavra divina seja conhecida e faça frutos é a tarefa a qual se encarrega o missionário; mais do que isto, é sua obrigação, o que colocaria o destino de sua própria alma em jogo (13). A segunda modalidade de remédio, que não deixa de ser parte integrante da primeira, concretiza-se na administração dos sacramentos aos enfermos e moribundos (14). Vieira reafirma a importância desta ação, ao determinar que nas visitas às Aldeias, "a primeira coisa que farão" deve ser procurar se não há enfermos, "acudindo logo aos que estiverem em algum perigo." O perigo que os preocupa é muito mais o da "morte" da alma, ou seja, sua condenação eterna, do que a do corpo, isto é, as conseqüências do pecado inconfesso e sem perdão, o que se depreende da continuação do mesmo parágrafo: Os mesmos padres correrão por si mesmos as casas, e não sòmente procurarão os doentes, que houver nelas, mas também os que estiverem pelas roças, mandandoos logo, e tratando do seu remédio espiritual, e quando se partirem da Aldeia, não deixarão enfermo algum sem primeiro ficar confessado, ainda que a enfermidade não prometa perigo (Vieira, em Leite, 1943, p. 114). A mesma preocupação está documentada em um pequeno escrito, atribuído a Vieira, intitulado "Modo como se há de governar o gentio que há nas aldeias do Maranhão e Grão-Pará". O oitavo parágrafo, dentre os referentes ao domínio do espiritual, também determina que os missionários cuidem dos índios enfermos, já que se trata de sua obrigação, enquanto responsáveis pela administração temporal e salvação da alma dos mesmos. As regras, de uma maneira geral, enfatizam a responsabilidade, da parte do missionário que se encarrega de um aldeamento, pelo bem viver e bem morrer dos índios ali reagrupados e, esta passagem, em particular, dá a entender que se ocupar da saúde temporal dos índios é tarefa própria do médico espiritual, o que define o Memorandum 5, out/2003 Belo Horizonte: UFMG; Ribeirão Preto: USP. http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/silva01.htm Silva, P.J.C. (2003). Medicina do corpo e da alma: os males corporais e o exercício da palavra em escritos 61 da antiga Companhia de Jesus. Memorandum, 5, 55-68. Retirado em / / , do World Wide Web: http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/silva01.htm significado e a função maior da assistência ao corpo como parte integrante da assistência á alma: Sobre-intenderão também na cura dos índios, quando estiverem enfermos, solicitando-lhes não falte o remédio temporal, pois são médicos do espiritual, que administrarão com todo o cuidado, considerando o prêmio que com isto alcançam, sobre cujas consciências sua majestade desencarrega todo o seu cuidado e obrigação (Vieira, s.d./1992, p. 78). Assim, correr as Aldeias, "como se faz no Brasil", para "lhes acudirmos e os curarmos", também faz parte do cotidiano dos padres sob o comando de Vieira (15). Contudo, mesmo um século depois da chegada dos primeiros jesuítas no Brasil, a tradicional prestação de serviços nos hospitais não poderia ser feita porque, embora houvesse a Misericórdia em São Luís, não havia ainda o hospital. Segundo o padre, porém, o socorro poderia ser feito ao menos com os poucos medicamentos das boticas da Companhia, na expectativa de serem recompensados com a saúde e a salvação à medida que dão o que têm para o estado dos brasis (16). Ao que parece, as exortações de Vieira para que se construísse tão necessário hospital ainda não haviam dado os frutos esperados no ano de 1654, devido a uma renovação dos integrantes da Mesa, responsáveis pelas obras da Misericórdia. Na carta ao provincial do Brasil, Vieira relata a necessidade de mais negociações, nas quais se envolvera pessoalmente, para que a construção fosse iniciada. Ele dá então a notícia do começo de uma "enfermaria de doze camas", das quais, a primeira teria saído da casa da Companhia, "muito limpa e concertada, porque houve um religioso que quis dar a sua para os pobres" (Vieira, 1654/1925, pp. 407-408). Cogita-se, a partir de anotação do copista na mesma carta, que tenha sido ele mesmo que doou a sua cama, o que, de qualquer forma, ilustraria o caráter interveniente, seja através de exortações, seja através de ações concretas e simbólicas, que muitas vezes as circunstâncias das missões demandavam à figura do médico das almas. Exercício da palavra Em sua produção sermonária, Vieira emprega a imagem de Inácio convalescente em panegírico dedicado ao santo, no Real Colégio de Santo Antão, no ano de 1669. Logo em seu início, o pregador evoca o relato do ferimento e conversão de Inácio: Jazia Dom Inácio de Loiola mal ferido de uma bala Francesa no sítio de Pamplona; e picado como valente de ter perdido um castelo, fabricava no pensamento outros castelos maiores, pelas medidas de seus espíritos. (...) Cansado de lutar com pensamentos tão vastos, pediu um livro de cavalarias para passar o tempo; mas, oh Providência Divina! Um livro que só se achou, era das vidas dos Santos. (Vieira, 1669/2001, pp. 121-122). Uma vez imobilizado, a providência teria cuidado para que as palavras sagradas chegassem aos seus ouvidos. E a leitura da vida dos santos teria movido Inácio a converter-se em mestre espiritual. Mais do que isto, a idéia central no sermão é a de que tal leitura teria transformado o então ferido soldado em síntese de todos os patriarcas das demais ordens religiosas. Assim, Inácio fez-se espelho de santidade para seus confrades e constituiu a Companhia à sua semelhança, tornando-a modelo de conduta para todos os homens. Já no "Sermão do Evangelista São Lucas", pronunciado por padre Vieira na Misericórdia, em data desconhecida, o exemplo edificante e a ordem de ação é o imperativo bíblico de que os apóstolos saiam ao mundo e curem os enfermos. Segundo Vieira, Cristo converteu simples pescadores em pescadores de homens. Ele diz que os apóstolos tornaram-se pregadores armados de dois poderes que atingem ambas as vidas: o Memorandum 5, out/2003 Belo Horizonte: UFMG; Ribeirão Preto: USP. http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/silva01.htm Silva, P.J.C. (2003). Medicina do corpo e da alma: os males corporais e o exercício da palavra em escritos 62 da antiga Companhia de Jesus. Memorandum, 5, 55-68. Retirado em / / , do World Wide Web: http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/silva01.htm primeiro seria conservar e estender a existência temporal e o segundo, de prometer e assegurar a vida eterna (17). Padre Vieira diferencia, logo em seguida, a cura milagrosa dos enfermos e a ciência da medicina e adverte que falará não só da medicina sobrenatural, como também, da natural. Ao fim, a figura do Christus medicus domina o sermão, enquanto modelo de humanidade para os diferentes médicos do auditório (18). Vieira põe em revista uma série de concepções de medicina, das quais dá relevo aos aspectos éticos envolvidos na cura do corpo do outro, para, ao cabo, fazer uma distinção entre a ameaça à saúde temporal e os riscos que corre a saúde eterna. A primeira resolve-se com a própria cura da enfermidade, a segunda depende do "desengano da morte". O médico do corpo ou da alma deve saber que a morte iguala homens e reis e que a saúde eterna depende do bom juízo e das ações nesta vida: Aonde não houver este valor, esta liberdade, e esta verdade de Isaias, é certo que faltarão á sua obrigação (como muitas vezes têm faltado) não só os medicos do corpo, senão tambem os da alma, tão enganados nos respeitos humanos, ou deshumanos, de que se deixam cegar, que eles são os maiores traidores dos reis, e dos reinos; sendo pelo contrario dignos das maiores mercês, e dos mais avantajados premios, os que com verdadeiro zêlo e amor, não só os desenganavam livremente do perigo da vida, senão da certeza da morte (Vieira, s.d./1951, vol. VIII, p. 438). Trata-se, de certa forma, de uma advertência aos médicos do corpo e da alma de suas obrigações. O médico do corpo deve, com ajuda da luz divina, tratar particularmente cada indivíduo, sem fazer distinções sociais, cuidando da continuidade da vida temporal. Ambos, o primeiro e o médico da alma, devem zelar pelas boas obras com vistas na eternidade, uma vez que a morte é inelutável. A salvação das almas é a finalidade última da campanha pela saúde atualizada no púlpito de Vieira. O objetivo do exercício da palavra pregada é promover a saúde eterna e não a temporal, que se define como participação proporcional daquela. Isto implica levar aos ouvidos dos fiéis a lembrança da finitude do corpo, como Vieira faz em diversos sermões oportunos, e, em especial, no "Sermão do Evangelista São Lucas." (19). Neste caso, a pregação apresenta-se como medicina de cada alma, dentro do esforço de que cada um se responsabilize pelo seu próprio destino, empreendendo a arte de bem viver para bem morrer. No entanto, a salvação individual está sempre articulada à salvação do próximo, e o preceito de salvar-se salvando os outros, que dá base à entrega á empresa missionária, justificando muitas vezes o heroísmo requerido dos mesmos, apresenta-se na forma da arte de curar a si mesmo e ao outro. Assim como falava aos responsáveis pelo Estado em outros tantos sermões, Vieira fala no "Sermão do Evangelista São Lucas" aos responsáveis pela saúde corporal e espiritual advertindo-os de seus deveres enquanto tais. Neste sentido, o médico do corpo e o da alma aproximam-se e distanciam-se. Para ambos a morte é um limite. No caso do médico corporal, ela é o limite final e prova maior do caráter humano e, portanto, imperfeito de sua arte. Já para o médico dos males da alma, responsáveis pela difusão da palavra sagrada, a morte é o que anima e justifica sua ação, constituindo-se também em um limite final para a sua arte, porém inicial para os efeitos da mesma, que se manifestariam na eternidade. Curate infirmos Na escrita de sua própria história, estes jesuítas atualizam a idéia de que os males do corpo seriam oportunidade para a conversão ou cura da alma, de si e do próximo: Inácio, em sua narrativa fundadora e nas leis da Companhia; Anchieta, no relato de sua translação de enfermo a médico de corpos e almas e Vieira, nos discursos pelo esforço de Memorandum 5, out/2003 Belo Horizonte: UFMG; Ribeirão Preto: USP. http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/silva01.htm Silva, P.J.C. (2003). Medicina do corpo e da alma: os males corporais e o exercício da palavra em escritos 63 da antiga Companhia de Jesus. Memorandum, 5, 55-68. Retirado em / / , do World Wide Web: http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/silva01.htm concretização dos lugares complementares dos tratamentos dedicados ao corruptível e ao eterno. A medicina, excluída como formação e prática oficial, não somente é retomada nas lides missionárias, como fornece um repertório de comparações que dão inteligibilidade e sustentação metódica para procedimentos que superam o domínio do sensível. A leitura do uso dos topoi médicos nestes documentos, cartas e sermões evidenciam o pressuposto de que o corpo ou, de modo mais genérico, a matéria não deve ser desconsiderada, pelo contrário, deve ser recolocada em seu lugar suposto natural com relação à razão que lhe confere vida e finalidade. Afinal, o corpo enfermo para os jesuítas das primeiras gerações é também um corpo de linguagem, que deve ser escutado, ordenado e transformado numa imagem capaz de engendrar, ao mesmo tempo, uma ação e uma doutrina. A corrupção da saúde ou o silêncio forçado não são desejáveis em si, mas podem vir a ser ocasião em que a alma fala, como teria posto em carta de 1695, à rainha D. Maria Sofia, padre Antônio Vieira, cuja precariedade do corpo idoso já colocava obstáculos, mas não impedia o exercício da palavra: Havendo porém muitos dias que a extrema velhice me tem privado dos instrumentos da voz, e achando-me nesta ocasião, como Zacarias no nascimento do maior dos nascidos, mudo; para obedecer contudo, aos acenos do nome de V.M., apelei, como ele, para a pena, com que se pode suprir a falta de língua. Mais ditei do que escrevi, porque me falta também a mão duas vezes quebrada (Vieira, 1695/2003, p. 500). Referências bibliográficas Fontes primárias Anchieta, J. (1988) Cartas: informações, fragmentos históricos e sermões. Belo Horizonte: Itatiaia; São Paulo: EDUSP. (Originais do séc. XVI). Iparraguirre, I. S.J. (1952) Obras Completas de San Ignacio de Loyola. Madri: Biblioteca de autores cristianos. (Originais do séc. XVI). Vieira, A. (1925) Cartas do Padre Antônio Vieira. (J.L. D'Azevedo, Org.). Coimbra: Imprensa da Universidade. (Originais do séc. XVII). Vieira, A. (1951) Sermões. Porto: Lello e Irmão, 15 vs. (Originais do séc. XVII). Vieira, A. (1992) Escritos instrumentais sobre os índios. (C. Giordano & J. C. Sebe Bom Meihy, Org.s). São Paulo: Educ; Loyola; Giordano. (Originais do séc. XVII). Vieira, A. (2001) Sermões. (A. Pécora, Org.). São Paulo: Hedra. 2v. (Originais do séc. XVII). Vieira, A. (2003) Cartas do Brasil. (J. A. Hansen, Org.). São Paulo: Hedra. (Originais do séc. XVII). Fontes secundárias Agrimi, J. & Crisciani, C. (1997). Charité et assistance dans la civilisation chrétienne médiévale. Em M.D. Grmek (Org.). Histoire de la pensée médicale en Occident. Tome I: Antiquité et Moyen Age. (M.L. Bardinet Broso, Trad.) (pp. 151-174). Paris: Seuil. (Publicação original de 1993. Castelnau-L'Étoile, C. (1997) Salvar-se, salvando os outros: o Padre Antonio Vieira, missionário no Maranhão 1652-1661. Oceanos, 30-31, 55-64. Dumeige, G. (1980) Médecin (le Christ). Em M. Viller; F. Cavallera & J. de Guibert (Org.s). Dictionnaire de Spiritualité. Tomo X. (pp.891-901). Paris: Beauchesne. Leite, S. (1938) História da Companhia de Jesus no Brasil. Tomo I I . Lisboa: Portugália; Rio de Janeiro: Civilização brasileira. Leite, S. (1943) História da Companhia de Jesus no Brasil. Tomo IV. Lisboa: Portugália; Rio de Janeiro: Civilização brasileira. Memorandum 5, out/2003 Belo Horizonte: UFMG; Ribeirão Preto: USP. http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/silva01.htm Silva, P.J.C. (2003). Medicina do corpo e da alma: os males corporais e o exercício da palavra em escritos 64 da antiga Companhia de Jesus. Memorandum, 5, 55-68. Retirado em / / , do World Wide Web: http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/silva01.htm Martin, A.L. (1996) Plague? Jesuit accounts of the epidemic disease in the 16th Century. Kirksville: Sixteenth Century Journal Publishers. O'Malley, J.W. (1993) The first Jesuits. Cambridge; London: Harvard University Press. Tenenti, A. (1983) Sens de la mort et amour de la vie. Renaissance en Italie et en France. (S. Matarasso-Gervais, Trad.). Paris: L'Harmmatan-Serge Fleury. (Publicação original de 1957) . Trevisani, F. (1995). Modelos teóricos, experimentação e prática clínica: rumo à reformulação da teoria das febres no século XVII. Em A.M. Alfonso Goldfarb & C. Maia (Org.s). História da Ciência: o mapa do conhecimento (pp. 101-111). São Paulo: Edusp; Rio de Janeiro: Expressão e Cultura. Zupanov, I. (2001) Curing the Body, Healing the Soul; the Jesuit Medical Mission in Sixteenth Century India. Em Jesuits as Intermediaries in the Early Modern World. Florença, mimeo. Notas (1) "Y hízose de nuevo esta carnecería; en la cual, así como en todas las otras que antes había pasado y después pasó, nunca habló palavra, ni mostró otra señal de dolor, que apertar mucho los puños." (Loyola, "Autobiografia", em Iparraguire, 1952, p. 32). Inácio nasceu em uma família nobre no Castelo de Loyola, na atual Espanha, em 1491. Fez carreira militar, interrompida no sítio de Pamplona em 1521. Após uma peregrinação para Roma e Jerusalém, empreendeu estudos em Barcelona, Alcalá e Salamanca, finalizando-os em Paris (1528-1535). Nesta cidade, junto com outros companheiros, fez os votos da Companhia em 1534, e desde então dirigiu a mesma até sua morte em 1556. Foi canonizado em 1622. Este estudo do discurso sobre o corpo nos escritos de Inácio, bem como de outros jesuítas, teve início em pesquisa doutoral sobre o uso da expressão medicina da alma, com o apoio financeiro da FAPESP. (2) "Otra vez, en año de 50, estuvo muy malo de una muy recia enfermidad, que, a juicio suyo y aun de muchos, setenía por la última. En este tiempo, pensando en la muerte, tenía tanta alegría y tanta consolación espiritual en haber de morir, que se derritía todo en lágrimas" (Loyola, "Autobiografia", em Iparraguire, 1952, p. 51). A antiga e multifacetada convivência entre o cristianismo e a medicina pode ser explicada, conforme Agrimi e Crisciani (1997) considerando-se as implicações doutrinais, religiosas, pastorais e sociais de dois valores centrais da espiritualidade cristã expressos nas noções, de origem evangélica e desenvolvidas pela patrística, de Caritas e Infirmitas. A caridade - dilectio, misericordia, pietas - era considerada a mais nobre de todas as virtudes e mais particularmente das virtudes teologais (caridade, fé e esperança). Seu imperativo concerne à salvação de cada cristão e integra-se às estruturas coletivas institucionais da Igreja, visto que esta é a mediatriz da avaliação das necessidades e da distribuição dos esforços de misericórdia, que devem ser de motivação espiritual para que sejam também neste plano recompensados. Já a noção de infirmitas conservou-se bastante indiferenciada até a Baixa Idade Média. Ela podia designar indistintamente o pobre, o doente e o peregrino, que, de alguma forma, necessitavam de cuidados. Os pauperes infirmi misturavam-se às pessoas sadias sem serem objeto de segregação ou intervenção terapêutica específica e, com isto, a condição de infirmitas não era concebida no imaginário coletivo como um desequilíbrio momentâneo e ocasional em oposição a um estado de saúde tido como natural. Ela é a própria condição natural do homem após o pecado original. Este caráter indeterminado converte a enfermidade numa oportunidade para a edificação do próprio sofredor e daqueles que o assistem. O enfermo é, ao mesmo tempo, a imagem do pecado, causa de sua doença, mas também o remédio e o médico, sobretudo para a alma, enquanto exemplo vivo da justiça divina. Apesar de repugnante, ao exibir no seu corpo disforme a manifestação das faltas da alma, o doente é um eleito e também objeto do amor do cristão, pois reproduz e multiplica indefinidamente a imagem do Cristo sofredor, peregrino e necessitado. O papel do doente é o de cooperar à Redenção, sendo um penitente e uma ocasião para que outros pratiquem atos de Memorandum 5, out/2003 Belo Horizonte: UFMG; Ribeirão Preto: USP. http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/silva01.htm Silva, P.J.C. (2003). Medicina do corpo e da alma: os males corporais e o exercício da palavra em escritos 65 da antiga Companhia de Jesus. Memorandum, 5, 55-68. Retirado em / / , do World Wide Web: http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/silva01.htm penitência e de caridade que os levarão também à cura espiritual. Desde o cristianismo primitivo a patientia é um valor fundamental na experiência da enfermidade corporal, desempenhando uma função decisiva na cura da alma do cristão, ao com ela suportar os sofrimentos, conscientes do privilégio de ser objeto de uma correção espiritual vinda de Deus, como o fizeram Jó e Cristo. (3) Loyola, "Constituições", em Iparraguirre, 1952, par. 452, p. 471: "El studio de Medicina e Leyes, como más remoto de nuestro Instituto, no se tratará en las Universidades de la Compañia, o a lo menos no tomará ella por sí tal assumpto." Ver também J. O'Malley, 1993 (The first Jesuits). (4) Através do estudo da correspondência do período, Martin (1996) conta que os jesuítas do século XVI reagiam com certa impaciência às interferências das epidemias nos seus programas educacionais e religiosos, mas não se deixavam abater pelas perdas humanas e materiais da Companhia. Ele relata que, acreditando na providência divina, muitos jesuítas dedicaram-se à assistência dos doentes, tanto do ponto de vista dos cuidados materiais, colaborando com os médicos, como do ponto de vista espiritual, administrando os sacramentos da confissão e da comunhão, além da realização de procissões e peregrinações. (5) I. Zupanov (2001) demonstrou recentemente que os jesuítas, nas missões na Índia, no século XVI, engajaram-se nos trabalhos médicos como forma de suprir uma carência social e como estratégia de evangelização, contribuindo com o ordenamento dos hospitais e no próprio atendimento aos enfermos. A historiadora descreve a ascensão e o declínio da cura do corpo nestas missões, atribuindo este último ao status ambíguo dos médicos do corpo na hierarquia da Companhia de Jesus, muito menos prestigioso do que o lugar dos chamados médicos da alma, ou seja, confessores e, sobretudo, pregadores. O que teria sido ratificado pela determinação de coerência nas ações apostólicas jesuítas empreendida pelo padre geral Acquaviva (1542-1615), que, por outro lado, utilizava-se amplamente de analogias com a medicina para descrever as práticas missionárias e espirituais. (6) A Misericórdia do Rio de Janeiro já estava em funcionamento quando Diogo Valdés, acompanhado de muitos doentes, aportou na baía de Guanabara em 1582. Discute-se a participação do padre José de Anchieta na fundação deste hospital, mas segundo RusellWood (1968) em Fidalgos and Philanthropists. The Santa Casa da Misericórdia of Bahia, 1550-1755, parece mais verossímil que o jesuíta tenha contribuído apenas para melhorias no local. Somente no final do século XVI, São Paulo e Porto Seguro também passaram a contar com Misericórdias. E muitas outras foram fundadas no início do século XVII, como a de Belém, em 1619. A data da fundação da Misericórdia de São Luís é desconhecida, mas o historiador relembra o testemunho de sua existência em 1653, dado em carta do padre Antônio Vieira. E explica que Vieira tivera papel fundamental em estimular os colonos no estabelecimento do hospital no local. O historiador volta a mencionar a contribuição dos jesuítas para com as Misericórdias do Brasil, destacando as relações do colégio da Bahia com o hospital de Salvador. Entretanto, afirma que sua ação no Brasil fora limitada, se comparada, ao envolvimento destes em serviços sociais na África e na Ásia. Segundo M.B.N. Silva (1991), em 1551, a cidade de Lisboa contava com 57 médicos, 70 cirurgiões, 46 boticários, além de parteiras, enfermeiras, saca-molas ou dentistas, enquanto que, somente em abril de 1553, foi nomeado pela Coroa um físico para o Brasil, Jorge Fernandes, e tem-se notícias da nomeação de apenas três cirurgiões na mesma década. O que obrigava a população branca a recorrer às práticas médicas indígenas ou improvisar-se médicos e cirurgiões, como fizeram os jesuítas, que curavam si mesmos, os índios, negros e inclusive os colonos, sobretudo no planalto de Piratininga, na capitania de São Vicente. (7) S. Leite dedica um capítulo, do livro quinto da sua História da Companhia de Jesus no Brasil, tomo I I , 1938, à contribuição jesuíta para as ciências médicas e naturais, no qual Memorandum 5, out/2003 Belo Horizonte: UFMG; Ribeirão Preto: USP. http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/silva01.htm Silva, P.J.C. (2003). Medicina do corpo e da alma: os males corporais e o exercício da palavra em escritos 66 da antiga Companhia de Jesus. Memorandum, 5, 55-68. Retirado em / / , do World Wide Web: http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/silva01.htm descreve a relação dos missionários com as doenças da terra, a prática da flebotomia e das cirurgias de emergência, as epidemias por eles enfrentadas, o trato das doenças venéreas e a farmacologia por eles sistematizada, a assistência domiciliária e hospitalar, e a possível participação de jesuítas na fundação da Misericórdia do Rio de Janeiro. (8) José de Anchieta, nascido em 1534, tinha pai de origem Navarra, parente do próprio Inácio, e mãe de sangue indígena. Aos 16 anos foi estudar em Coimbra, tornando-se noviço em 1551. Embarcou para o Brasil na terceira leva de missionários, em 8 de maio de 1553, onde foi presença marcante e decisiva na empreitada missionária jesuítica, sendo inclusive considerado o fundador do colégio de São Paulo, núcleo inicial desta cidade de 1554. Sua morte data de 1597. O termo cura das almas presente em cartas de Anchieta causa surpresa pois, como se sabe, não se tratava de um ofício próprio da Companhia de Jesus. Contudo, as atividades jesuíticas, organizadas em torno dos colégios, e que se irradiavam para as Aldeias, entradas e missões, incluíam além do ensino e catequese, obras de misericórdia, visita aos presos e doentes, luta contra as blasfêmias, em suma, como afirma S. Leite (1938, pp. 270-271): "tôda a actividade não só de ensino, mas de cura de almas". O que evidentemente gerou reação contrária em Roma. Malgrado as recomendações de Francisco Borgia de que os ofícios de pároco fossem deixados à cargo dos bispos locais, muitos deles continuaram sendo realizados pelos Padres da Companhia, "não com o caráter de Párocos, mas por motivo de zêlo, postulado, aliás, pelas necessidades da terra, falha de sacerdotes, esplendor do culto divino e glória de Deus." (9) Conforme S. Leite (1938), Inácio fora consultado sobre a prática da flebotomia, autorizando-a se realizada como caridade. Entretanto, houve polêmicas a este respeito, sendo proibida em 1578. A justificativa da proibição fundava-se no risco da sua aplicação causar a morte, o que era contingente à arte médica, mas absolutamente impróprio ao sacerdócio. Devido à necessidade de uma legislação especial para o caso do Brasil, recorreu-se a Roma, obtendo-se a revisão segundo a qual estava permitida a prática, em caso de verdadeira urgência, aos Irmãos coadjutores temporais, que não sendo sacerdotes, não incorreriam em irregularidade canônica, o que estaria documentado no relato da visita de Cristóvão de Gouveia, em 1586. Vale lembrar que a prática das sangrias ainda era muito comum no período pois, mesmo com as grandes mudanças nos modelos anatômicos e fisiológicos pondo em crise a doutrina humoral, a terapia galênica era amplamente praticada na Europa do século XVI e início do XVII. Vide F. Trevisani, 1995. (10) Em suas cartas sobre o que ocorria com os padres e as coisas "dignas de admiração ou desconhecido nesta parte do mundo", o jesuíta relata métodos de cura indígena, descreve árvores, raízes e frutos medicinais, e ainda os melindres das relações entre os cuidados do corpo e da alma, no trabalho missionário. Vide, entre outras, a carta "Ao Padre Geral, de São Vicente, ao ultimo de maio de 1560", em Anchieta, 1988, pp. 113139. (11) Antônio Vieira nasceu em Lisboa em 1608, mas foi educado no colégio dos jesuítas da Bahia, completando estudos de filosofia e teologia, e tornando-se logo célebre por suas pregações. De volta à Europa após a aclamação de D. João IV, foi nomeado pregador régio e diplomata em missões na França, Holanda, Inglaterra e Roma. Ele comandou ainda as Missões no Maranhão e Pará entre 1652 e 1661. Sofreu processo inquisitorial em Coimbra com base em seus escritos histórico-proféticos, tendo partido a Roma, em busca de revisão de sua sentença, em 1669, onde recebeu convite do geral da Companhia, Gian Paolo Oliva, para sucedê-lo como pregador do papa e foi nomeado pregador da rainha Cristina da Suécia. Recebeu absolvição pontifícia em 1675, e retornou primeiro a Portugal, onde iniciou a publicação de seus sermões, e depois para a Bahia, vindo a falecer em 1697. Memorandum 5, out/2003 Belo Horizonte: UFMG; Ribeirão Preto: USP. http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/silva01.htm Silva, P.J.C. (2003). Medicina do corpo e da alma: os males corporais e o exercício da palavra em escritos 67 da antiga Companhia de Jesus. Memorandum, 5, 55-68. Retirado em / / , do World Wide Web: http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/silva01.htm (12) O regulamento, publicado por S. Leite no tomo IV da História da Companhia de Jesus no Brasil, 1943, pp. 106-124, está dividido em três partes. A primeira agrega as disposições relativas ao que pertence à observância religiosa, o que inclui a assistência médica ao lado da prática da oração, das regras de comportamento nas viagens, da realização dos exercícios espirituais, da renovação dos votos, da forma de residência nas aldeias, da clausura, da administração da casa de hóspedes, de como se comportar nas Aldeias de Visita, do ofício da tecelagem, da administração dos negócios visando ao sustento e às obras de caridade e das dívidas. A segunda parte refere-se ao que pertence propriamente à cura espiritual: as doutrinas praticadas ao longo do dia, as atividades na Escola, a catequese dominical, as festas religiosas, os ofícios nas Aldeias, as práticas devocionais, as confrarias, a administração dos sacramentos, os catecismos, os funerais e a correção dos delinqüentes. A terceira parte regulamenta a administração temporal dos índios. Nela está determinado que se proceda "paternalmente" na direção temporal dos índios, e estão definidos os procedimentos convenientes quanto às relações com as autoridades civis, a herança ou eleição do principal da Aldeia, ofícios de guerra, serviços dos índios, salários, fugas, viagens, doenças e licenças particulares. (13) Vide C. Castelnau-L'Étoile, 1997 ("Salvar-se, salvando os outros: o Padre Antonio Vieira, missionário no Maranhão 1652-1661"). (14) Manuais de aconselhamento para uma boa morte tornaram-se populares no final da Idade Média. Esta tradição teria sido iniciada com um tratado, intitulado Ars moriendi, de autor desconhecido, porém copiosamente editado nos princípios da imprensa. Ele tem como provável principal influência o opúsculo de Jean Gerson, Opusculum tripartitum de praeceptis decalogi, de confessione et de arte moriendi, de 1403, cuja terceira parte circulou em língua francesa com o título: La science de bien mourir ou La médecine de l'âme. Da tradição do final da Idade Média, que praticamente espetaculizava a morte devota para torná-la modelo de conduta edificante, permaneceu o aviso constante da finitude da vida em escritos renascentistas. Todavia, os autores passaram a dar muito mais ênfase na forma de conduzir a vida, indicando que o resultado de uma vida sóbria é justamente uma morte feliz. Dentro desta transição para uma nova abordagem da morte e elaboração de uma ars vivendi, bem mais moderada para com o sentido do macabro, destacam-se alguns manuais produzidos por nomes importantes da Companhia de Jesus, como o método de Juan Polanco (1516-1577), Methodos ad eos adjuvandos qui moriuntur, publicado em 1575, atendendo ao pedido de Inácio de que houvesse um resumo sobre a maneira de ajudar a bem morrer, para melhor realização deste ministério por parte dos jesuítas. Vide A.Tenenti, 1983 (Sens de la mort et amour de la vie). (15) O entrelaçamento da assistência ao corpo e à alma também é tema das cartas de Vieira escritas das missões. Dentre elas, destaca-se, em especial, a longa carta de notícias ao padre provincial do Brasil, de 1654, na qual, ao relatar as vicissitudes, estratégias e sucessos das missões no Maranhão e no Pará, Vieira inclui os esforços voltados ao cuidado com o corpo e a alma dos índios. Tal cuidado visa o cumprimento da ordem de que nenhum índio morra sem os sacramentos e, por conta disso, tenha sua alma condenada e, assim, percam-se também todos os empenhos dos missionários. É na hora da morte que se colhe os frutos do ensino da doutrina e de todos os trabalhos de caridade a que se dedicam os padres: "Desta maneira se vai cultivando e plantando esta antiga e nova vinha do Senhor, e no tempo de colher o fruto, que é o da morte, se trabalha muito por que se não perca o que se tem cultivado, e a experiência mostra que se não perde" (Carta LXVI, Ao Padre Provincial do Brasil: Vieira, 1654/1925, p. 400). (16) "Ao hospital não vamos, porque o não há nesta terra; mas estranhando-se isto em um sermão, logo trataram os irmãos da Misericórdia que o houvesse, se ofereceram boas esmolas e se dispõe a obra, que será um grande remédio, principalmente para os soldados, que não têm outro, e pela muita gente derrotada que aqui vem ter. (...) Com as cousas da botica, se trouxéramos muito, se poderia exercer bem a caridade, porque é a terra muito falta de medicamentos, como de médicos, que não há; mas do pouco que Memorandum 5, out/2003 Belo Horizonte: UFMG; Ribeirão Preto: USP. http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/silva01.htm Silva, P.J.C. (2003). Medicina do corpo e da alma: os males corporais e o exercício da palavra em escritos 68 da antiga Companhia de Jesus. Memorandum, 5, 55-68. Retirado em / / , do World Wide Web: http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/silva01.htm trouxemosse dá tudo com boa vontade, esperando que, pelo darmos pelo amor de Deus, nos dará Êle os não os havermos mister." (Carta LXIV, Ao Provincial do Brasil: Vieira, 1653/1925, pp. 352-353). Sabe-se que ainda em 1757 a botica do Colégio do Pará era a única da cidade. Os jesuítas forneciam remédios, vindos de Portugal ou manipulados ali, para os pobres e os vendiam aos mais abastados, que, de qualquer modo, não teriam outra alternativa onde comprá-los; vide S. Leite, 1943, pp. 189-192. Segundo o autor, as boticas contavam com o que havia de melhor em Portugal na época, em termos de medicamentos e de capacitação dos boticários e peritos da arte. De uma maneira geral, S. Leite baseia sua afirmação no que está discriminado em algumas listas de compras ou inventários de utensílios, medicamentos e livros. Uma destas listas, inclusive, notifica a transferência de medicamentos da Botica do colégio português de Sto. Antão para o Pará, em 1732, o que por si só confirmaria a importação de medicamentos. Dentre os livros citados, destaca-se, por exemplo, uma obra de Antônio Ferreira, cirurgião da corte portuguesa. (17) "Curae os enfermos, e dizei-lhes, que é chegado o tempo, em que se hão-de abrir as portas do céo, que até agora estiveram fechadas. Na cura dos enfermos milagrosa se continha o poder de conservar e estender a vida temporal: Curate infirmos: e na promessa do reino do céo confirmada com os mesmos milagres se assegurava a immortal e eterna: Appropinquavit in vos Regnum Dei." (Sermão do Evangelista São Lucas: Vieira, s.d./1951, vol. VIII, p. 405). (18) É precisamente a figura do Cristo médico que unifica as representações religiosas da infirmitas e da caritas desde os primórdios do cristianismo: ele não apenas teria operado curas milagrosas como teria, ao tomar sobre si mesmo a infirmitas corporis, ensinado o valor do sofrimento e da paciência como medicamentos do espírito. Sua imagem como médico é bastante expressiva na tradição cristã dos primeiros tempos, na qual, entre outros nomes do Cristo, a alcunha Christus medicus é empregada por um número considerável de autores (Dumeige, 1980). Em sermões, nas exortações monásticas ou mesmo sob a forma de orações, ocorrem uma breve referência, uma invocação estendida, um esclarecimento espiritual ou uma ilustração teológica com esta imagem. De uma maneira geral, nestes escritos dos padres da Antigüidade, há um encontro dos preceitos evangélicos, segundo os quais o Redentor teria o poder de curar, através da expiação dos pecados, com as concepções, mais propriamente filosóficas, que atribuem o poder curativo da alma, e até mesmo do corpo, à sabedoria e ao logos. Assim, o Cristo torna-se o remédio para a falta do gênero humano e, sendo ele o Verbo em pessoa, dá a cada perturbação o remédio apropriado, atuando em sua raiz. (19) Sobre o modelo dos procedimentos retóricos recorrentes nas pregações vieirianas cuja matéria principal é a morte, como os sermões fúnebres ou da quarta-feira de cinza, ver o estudo introdutório a Arte de morrer de Antônio Vieira de A. Pécora (1994). Nota sobre o autor Paulo José Carvalho da Silva é mestre em História da Ciência pela PUC-SP e doutor em Psicologia pela USP, faz parte do corpo docente do curso de pós-graduação lato sensu em História da Ciência da PUC-SP e leciona História da Ciência na Universidade Ibirapuera em São Paulo, Brasil. Contato: [email protected] Data de recebimento: 31/07/2003 Data de aceite: 05/10/2003 Memorandum 5, out/2003 Belo Horizonte: UFMG; Ribeirão Preto: USP. http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/silva01.htm Massimi, M. (2003). Representações acerca dos índios brasileiros em documentos jesuítas do século XVI. Memoranum, 5, 69-85. Retirado em / / , do World Wide Web: http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/massimi03.htm. Representações acerca dos índios brasileiros em documentos jesuítas do século XVI Representations about the brazilian indians in Jesuit documents of the sixteenth century Marina Massimi Universidade de São Paulo Brasil Resumo O conhecimento do índio brasileiro, adquirido pelos missionários jesuítas através da convivência quotidiana, norteada pelo objetivo da evangelização, transmitido e difundido através da correspondência epistolar foi, sucessivamente, organizado em tratados e informes. Nesses documentos o conhecimento do outro, adquirido pela experiência direta, é filtrado pelo crivo da visão antropológica da teologia católica e da filosofia da época (especialmente, da visão elaborada pelos teólogos e pelos filósofos aristotélicotomistas da Companhia de Coimbra e em Roma). As proposições acerca do índio brasileiro, inspiradas nestes referenciais teóricos, comparadas com os resultados concretos da ação evangelizadora, não definem um modelo unívoco. Com efeito, contradições, dúvidas, revisões estão presentes na representação que o pensamento jesuíta constrói acerca do índio e do mundo social deste. No presente trabalho, serão analisados os documentos mais importantes produzidos pelos religiosos, significativos para a descrição da 'realidade' do índio brasileiro, assim como esta aparece aos olhos dos europeus. Palavras-chave: representações dos índios; história das idéias; jesuítas. Abstract The knowledge about the Brazilian Indians, acquired by the Jesuit missionaries through the experience of daily conctact, guided by the goal of evangelization, transmitted through letters was, successively, organized in treaties and reports. In these documents, the knowledge of the other, acquired through direct experience, is filtered through the examination of the anthropological view of Catholic theology and philosophy of the time. The propositions regarding the Brazilian Indian, inspired in these theoretical background, compared with the concrete results of the acts of evangelization, do not define an univocal model. In fact, contradictions, doubts and revisions are present in the representations that Jesuits construct regarding the Indian and its social world. In the present work, we will analyze the most important documents written by the religious persons, which are meaningful for the description of 'reality' of the Brazilian Indian, as it appears from the European point of view. Keywords: representations about the indians; history of ideas; Jesuits. Introdução O estudo histórico das representações dos índios propostas em textos de jesuítas europeus que viveram no Brasil ao longo do século XVI permite acompanhar o dinamismo de construção do conhecimento de identidades humanas diversas, a partir das categorias conceituais disponíveis na cultura ocidental da época. (Todorov, 1989; Mazzoleni, 1992). Memorandum 5, out/2003 Belo Horizonte: UFMG; Ribeirão Preto: USP. http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/massimi03.htm Massimi, M. (2003). Representações acerca dos índios brasileiros em documentos jesuítas do século XVI. Memoranum, 5, 69-85. Retirado em / / , do World Wide Web: http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/massimi03.htm. Nosso pressuposto é o de que o entendimento de experiências humanas diferentes da própria, elaborado a partir de um primeiro nível de compreensão proporcionado pela convivência quotidiana, estrutura-se numa mais complexa construção, moldada pelas categorias próprias do universo sociocultural do sujeito epistêmico. (Massimi, Mahfoud e col., 1997). Esse tipo de conhecimento seria, então, parcialmente determinado pela representação do outro disponível nesse âmbito, representação esta que se constitui num primeiro termo de comparação e modelo de organização da experiência adquirida pelo contato direto. Através da ánalise de alguns documentos históricos, queremos acompanhar este processo, bem como evidenciar a possível presença de indícios que evidenciem a modificação e a transformação de tais conhecimentos preconcebidos, num novo contexto espaço-temporal de convivência. No século XVI, os cronistas e os historiadores encarregados de preservar e transmitir a memória histórica dos contatos e dos choques com os novos mundos, possuíam um código de interpretação das realidades socioculturais alheios, construído a partir dos padrões disponíveis na Europa da época, e inspirado pela exigência pragmática de realizar relações e ações concretas nos novos mundos. São exemplares nesse sentido, os escritos acerca do Brasil e de seus habitantes, elaborados no seio da cultura oficial portuguesa, inspirados pela tentativa que o mundo intelectual, religioso e político português faz para reelaborar os resultados da aventura ultramarina no contexto do modelo cultural de referência, próprio de sua tradição e da do ocidente europeu em geral, visando inclusive legitimar os objetivos práticos, políticos e culturais da dita aventura. (Albuquerque e col., 1991; Barreto, 1993 e 1996; Buesco, 1983; Godinho, 1990; Hollanda, 1977; Margarido, 1984). Nessa literatura, é possível evidenciar a presença de algumas categorias básicas para a interpretação da experiência concreta de encontro com a alteridade, fundamentadas principalmente na antropologia aristotélicotomista, e que dizem respeito aos aspectos físicos e raciais (cor, beleza, notadamente a beleza feminina), culturais (hábitos de vestuário e de alimentação), sociais (moradia, língua, organização social), políticos (meios de defesa militar e guerras administração do poder e do direito), aos comportamentos rituais (antropofagia, crenças e gestos religiosos). (Albuquerque e col., 1991; Gliozzi, 1977). Entre os três tipos de fontes próprias da produção cultural da Europa quinhentista, que retratam o índio brasileiro (as "Crônicas", ou seja os relatos históricos oficiais, os "Tratados históricos-descritivos" elaborados por viajantes ou colonos no último quartel do século XVI, e os relatos jesuíticos), somente nestes últimos pode-se reconhecer a presença de um certo interesse por fenômenos e comportamentos que hoje consideraríamos expressivos da subjetividade do outro; ao passo que, nos demais, a observação e a interpretação se detêm num nível propriamente exterior. Essa característica parece-nos depender de dois fatores: por um lado, a necessidade de demonstrar que ó índio tenha uma vida subjetiva, uma "alma", para fundamentar a possibilidade da cristianização do mesmo, razão esta da presença e da atuação da Companhia de Jesus no Brasil (Caeiro, 1982; Hanke, 1985; Rodrigues, 1985). Por outro lado, sendo tais informes e tratados reelaborações de informações derivadas das cartas enviadas do Brasil pelos missionários, pode-se supor que a longa convivência e as contínuas e dramáticas relações com os nativos tenham proporcionado a quem escreve um conhecimento mais profundo e global dos mesmos. (Massimi, Mahfoud e col., 1997). Além do mais, é possível que a ênfase na individualidade humana e nos aspectos subjetivos da vida pessoal, que caracteriza entre outras coisas o carisma dos seguidores de Inácio de Loyola, tenha orientado o "olhar" dos narradores na consideração daquela modalidade de ser humano nova e desconhecida com que quotidianamente se deparavam. Com efeito, os pensadores da Companhia de Jesus, ordem religiosa fundada por Inácio de Loyola no século XVI, visando realizar uma síntese entre a herança do catolicismo medieval e o novo espírito renascentista (1), encarregaram-se de "traduzir" tais concepções num método de formação do homem, seja em seu percurso evolutivo da infância até à maturidade pela educação (Giard, 1995), seja no que diz respeito à Memorandum 5, out/2003 Belo Horizonte: UFMG; Ribeirão Preto: USP. http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/massimi03.htm Massimi, M. (2003). Representações acerca dos índios brasileiros em documentos jesuítas do século XVI. Memoranum, 5, 69-85. Retirado em / / , do World Wide Web: http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/massimi03.htm. aculturação dos povos ameríndios, africanos e orientais, através do processo de cristianização (Caeiro, 1989). Nesse âmbito, o conhecimento da subjetividade, por um lado, e da dinâmica das relações sociais, por outro, aparecem como instrumentos necessários e, num certo sentido, privilegiados. No Brasil, ao longo de pelo menos dois séculos, os jesuítas constituíram-se numa presença cultural e social significativa. Apesar de estarem mergulhados no contexto do regime colonial, profundamente imbuído por contradições e conflitos, e submetidos às regras e aos jogos do poder régio, os missionários da Companhia foram responsáveis pela criação da primeira rede de ensino no país e pela construção de numerosas obras, visando à integração das culturas indígenas e das culturas européias. Destacam-se, entre outras, as peças teatrais e poéticas e o compêndio da gramática da língua tupi - guarani, redigidas por José de Anchieta (Buesco, 1983). O conhecimento do índio, adquirido pelos missionários jesuítas através da convivência quotidiana com eles, norteada pelo objetivo da evangelização, transmitido e difundido através da correspondência epistolar é, sucessivamente, organizado em tratados e informes. Nesses documentos, o conhecimento do outro, adquirido pela experiência direta, é filtrado pelo crivo da visão antropológica da filosofia e da teologia católica da época, visão esta elaborada entre os jesuítas, principalmente pelos mestres atuantes nos Colégios da Companhia em Coimbra e em Roma (Tavares, 1948; Giard, 1995; Giard e Vaucelles, 1996). As proposições desta filosofia e desta teologia, comparadas com os resultados concretos da ação evangelizadora, não definiram porém um modelo unívoco, sendo que contradições, dúvidas, revisões permeiam a representação que o pensamento jesuíta constrói acerca do índio e do mundo social deste (Santos, 1955). No presente trabalho, foram analisadas, em primeiro lugar, as categorias teóricas utilizadas no âmbito do saber elaborado pela Companhia de Jesus, no período considerado, para definir as dimensões antropológica e psicológica da experiência humana bem como os fenômenos a esta relacionados. Para tanto, abordou-se o estudo da psicologia filosófica elaborada pelos pensadores da Companhia, em obras cuja influência no contexto luso-brasileiro foi marcante: trata-se dos assim chamados tratados Conimbricences, redigidos pelos professores do Colégio das Artes da Companhia em Coimbra, e que, posteriormente, foram utilizados para os estudos filosóficos nos colégios da Companhia no Brasil (Barreto, 1983; Caeiro, 1982; Martins, 1989; Santos, 1955; Tavares, 1948). Os tratados são comentários das obras aristotélicas. No caso do estudo antropológico e psicológico, evidenciam-se os seguintes textos: o comentário ao tratado De Anima (Sobre a Alma, Góis, 1602), o comentário ao tratado Parva Naturalia (Pequenas coisas naturais, Góis, 1593a), o comentário ao tratado Ética a Nicomaco (Gois, 1593b), o comentário ao De Generatione et Corruptione (Sobre a geração e a corrupção, Góis, 1607). No âmbito dos referidos textos - todos redigidos em idioma latino - evidenciaram-se os principais conceitos referentes ao conhecimento antropológico psicológico. Uma vez fundamentados no conhecimento deste referencial teórico, analisamos alguns documentos produzidos pelos religiosos da Companhia, significativos para o entendimento da representação do índio brasileiro, por eles elaborada. O Diálogo do Padre Nóbrega sobre a conversão do gentio Um exemplo importante da dinâmica epistemológica pela qual o conhecimento do índio vem sendo construído pelos missionários é o Diálogo do Padre Nóbrega sobre a conversão do gentio. Neste texto, Nóbrega (1560c. / 1988) utiliza a figura retórica do diálogo, comum à cultura da época, marcada pela retomada do platonismo à luz dos ideais humanistas. Nóbrega utiliza tal recurso retórico para apresentar duas visões contrastantes existentes na Companhia de Jesus, acerca do índio e do trabalho missionário. A primeira é expressa pela figura do irmão Gonçalo Alves pregador nas aldeias indígenas, e a outra pela pessoa de seu interlocutor, o irmão Mateus Nogueira, ferreiro de ofício. A conversa entre os dois tem como ponto de partida a tomada de consciência de uma crise interna no grupo dos missionários, que vindo de Portugal com Memorandum 5, out/2003 Belo Horizonte: UFMG; Ribeirão Preto: USP. http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/massimi03.htm Massimi, M. (2003). Representações acerca dos índios brasileiros em documentos jesuítas do século XVI. Memoranum, 5, 69-85. Retirado em / / , do World Wide Web: http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/massimi03.htm. 72 os melhores propósitos de dedicar suas vidas à conversão dos nativos, acabam ficando "resfriados, porque vinham cuidando de converter a todo o Brasil em uma hora, e vêmse que não podem converter em um ano, por sua rudeza e bestialidade" (1560c. / 1988, p. 230). Inclusive o próprio Gonçalo está "meio desesperado" (Idem, p. 229), sendo "tentado" a pensar que a conversão dos índios ao cristianismo seja de fato impossível. Por isso, solicita Nogueira a fim de que este, a partir de sua opinião pessoal e das discussões ouvidas no Colégio da Companhia sobre o assunto, indique-lhe algumas razões para reafirmar a esperança na possibilidade de conversão dos nativos. Com efeito, a única perspectiva, a seu ver, é a da doutrinação dos gentios através da imposição da fé cristã pela força e pelo medo, sobretudo considerando a situação histórica na perspectiva do futuro: uma vez submetidos os pais, "os filhos, netos e dahi por diante, poderiam vir a ser cristãos" (Idem, p. 235). A resposta de Nogueira às dúvidas de Gonçalo Alves tem como ponto de partida uma afirmação doutrinária de caráter universal: estou eu imaginando todas as almas dos homens uma, nos serem umas e todas de um metal feitas à imagem e semelhança de Deus, e todas capazes de gloria e criadas para ella, e tanto val diante de Deus por naturaleza a alma do Papa, como a alma do vosso escravo Papana. (Idem, p. 237). Assumindo este enunciado como ponto de partida, Nogueira aplica-o ao caso dos índios, para comprovar que estes também têm alma. A verificação desta afirmação é feita baseando-se no dado de observação de que eles possuem todas as "potências" atribuídas pelos filósofos à alma, a saber "entendimento, memória e vontade". (Idem, p. 237). Em suma, a demonstração da humanidade do índio é feita a partir do conhecimento de suas características psicológicas, definidas pela filosofia da época. Com efeito, algumas teses fundamentais referentes à definição aristotélico-tomista da alma humana e do homem, constituem-se nos alicerces da afirmação de Nogueira. Em primeiro lugar, destaca-se a definição de alma como ato primeiro substancial do corpo, forma do corpo e princípio da nossa atividade, definição esta que remonta à doutrina aristotélica clássica (Aristóteles, séc. IV a.C. / 1993a, 1993b, 1994, 1996). A alma possui capacidades peculiares, que, na linguagem da dita doutrina, são denominadas de potências. São elas: a potência vegetativa; a sensitiva (a saber a capacidade sensorial proporcionada pelos sentidos internos e externos), a locomotora, a apetitiva (sensitiva e inteletiva); a cogitativa ou estimativa e a potência intelectiva (intuitiva e abstrativa). Na realidade, as potências da alma correspondem ao que hoje a psicologia moderna define como funções psíquicas, notadamente: as funções sensoriais, as funções motivacionais e emocionais, as funções intelectuais (2). A reproposição da psicologia aristotélica pelos jesuítas passa pela interpretação que dela foi realizada pelo filósofo e teólogo Tomás de Aquino (1980), no século XIII, assumindo portanto a denominação de doutrina aristotélico-tomista. Todavia, para além da continuidade com esta tradição filosófica medieval, os pensadores jesuítas de Coimbra sofrem a influência das mudanças culturais que marcam o período humanista e renascentista ao qual pertencem. Deve-se a tal influência, por exemplo, o fato de que, na discussão dos Conimbricences, as teses e as questões referentes à dinâmica das potências psicológicas sejam enfrentadas inclusive no plano do comportamento humano, acarretando a interseção entre os domínios da Psicologia e da Ética. Com efeito, o Humanismo e sobretudo a Renascença - devido à ênfase na visão do homem como fazedor de si mesmo (Cassirer, 1977; Garin, 1995) - revisitaram o pensamento ético de Aristóteles, sendo que por isto a Ética a Nicomaco (Aristóteles, 1996) foi um dos livros mais lidos e interpretados pelos pensadores daquele período, inclusive pelos intelectuais da Companhia de Jesus. A dinâmica psíquica que dá origem às ações humanas é a resultante da interseção e interação entre a vontade, o intelecto e o desejo e o apetite sensitivo. Todavia, na esteira do pensamento da época, os Conimbricences supõem que haja uma relação de Memorandum 5, out/2003 Belo Horizonte: UFMG; Ribeirão Preto: USP. http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/massimi03.htm Massimi, M. (2003). Representações acerca dos índios brasileiros em documentos jesuítas do século XVI. Memoranum, 5, 69-85. Retirado em / / , do World Wide Web: http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/massimi03.htm. 73 dependência entre as demais potências da alma e a vontade e por isto detêm-se na análise da dinâmica pela qual a vontade move as demais potências. Para tanto, o elemento básico é a noção de desejo, que - na tradição do aristotelismo - consiste na apetição ou seja na inclinação de todas as coisas para o bem. Distingue-se entre o apetite inato e o apetite aprendido (elícito) - pois a ênfase na formação do homem pela educação própria dos séculos XV e XVI ressalta a importância da aprendizagem. O apetite inato distingue-se em natural sensitivo (concupiscência) e natural intelectivo (vontade). E propriamente no plano de uma fragilidade dos apetites e da vontade, fragilidade induzida (segundo a teologia católica) pelo "pecado original" que - no entendimento de Nogueira - pode ser explicado o "estado de barbaridade" dos índios. Esta condição existencial, pela qual o homem "foi tornado semelhante à besta", é comum a todos os povos, seja os mais civilizados seja os menos, no momento atual da história: de maneira que todos, assim portuguezes, como castelhanos, como Tamoios, como Aimurés, ficamos semelhantes a besta, por naturaleza corrupta, e nisto todos somos iguaes, nem dispensou a naturaleza, mais com uma geração, que com outra. (1988, p. 238). Sendo esta a condição básica comum a todos os homens, a transformação é pensada numa perspectiva totalmente moldada pelo Humanismo, pois ocorre através da educação. Assim como o ferro "mettido na forja, o fogo o torna, que mais parece fogo que ferro: assim todas as almas sem graça e charidade de Deus, são ferros frios sem proveito, mas, quanto mais se aquenta, tanto mais fazes delle o que quereis." (Idem). O atributo de "bestialidade" reservado aos índios pela literatura quinhentista, leiga e confessional, é considerado por Nogueira comum a "todas as gerações" e civilizações: adoravam pedras e páus, dos homens faziam deuses, tinham credito em feitiçarias do diabo; outros adoravam os bois e vaccas, e outros adoravam por deus aos ratos, e outras immundicies; e os judeus, que eram a gente de mais razão, que no mundo havia, e que tinha contas com Deus, e tinha as escrituras desde o começo do mundo, adoravam uma bezerra de metal... os romanos, os gregos, e todos os outros gentios, pintam e têm inda por deus a um idolo, a uma vacca, a um gallo. (Idem, p. 239). Em comparação, a idolatria dos índios aparece como mais razoável, pois eles cultuam um objeto que os atemoriza, a saber o trovão: "os índios têm que há Deus, e dizem que é o trovão, porque é cousa que elles acham mais temerosa, e nisto têm mais razão, que os que adorão as rãs e os galos." (Idem). Para Nogueira, a inferioridade cultural dos povos indígenas em relação às outras nações não é devida a uma diversidade quanto à estrutura psicológica dos mesmos (por exemplo, o estado de barbaridade em que eles vivem não deve ser atribuido a uma pressuposta inferioridade intelectual), e sim à educação: "terem os romanos e outros gentios mais polícia que estes, não lhes veiu de terem naturalmente melhor entendimento, mas de terem melhor criação, e criarem-se mais politicamente" (1988, p. 240). O aspecto particularmente significativo deste enunciado é o fato de que ele é comprovado pelo conhecimento por experiência direta do índio: e bem creio que vós o vereis claro pois trataes com elles, e vêdes, que nas cousas de seu mestre, e em que elles tratam, têm tão boas subtilezas, e tão boas invenções e tão discretas palavras, como todos, o os padres os experimentam cada dia com seus filhos, os quaes acham de tão bom entendimento, que muito fazem a vantagem aos filhos dos christãos. (Idem). Memorandum 5, out/2003 Belo Horizonte: UFMG; Ribeirão Preto: USP. http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/massimi03.htm Massimi, M. (2003). Representações acerca dos índios brasileiros em documentos jesuítas do século XVI. Memoranum, 5, 69-85. Retirado em / / , do World Wide Web: http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/massimi03.htm. 74 A conclusão deste raciocínio é, então, a afirmação de que a personalidade humana e o desenvolvimento de suas potencialidades dependem do processo educacional: um homem tem dois filhos de igual entendimento, um criado na aldea, e outro na cidade; o da aldea empregou seu entendimento em fazer um arado, e outras coisas da aldea, o da cidade em ser cortezão e político; certo está, que ainda que tenha diversa criação, ambos têm um entendimento natural exercitado segundo sua criação. (Idem). A tese de Nogueira é inovadora se comparada à representação do índio própria do modelo cultural da época e anteriormente analisada, o que fica ainda mais evidente procedendo ao estudo da continuidade de seu discurso, ou seja a refutação da explicação da inferioridade cultural do índio baseada na teoria da maldição bíblica da raça camítica, explicação bastante difundida e acreditada naquele momento histórico: dae-me vós que lhe entre a fé no coração que o mesmo será de um que de outro, e o tempo e o trabalho e a diligência, que é necessário para convencer um judeu ou um philosopho, se outro tantos gastardes com doutrinar de novo um destes, mais fácil será sua conversão de coração. (Idem). Por outro lado, como já dissemos, esta visão fundamenta-se nos alicerces do pensamento pedagógico humanista, que juntamente com a psicologia aristotélico tomista, é a grande fonte inspiradora da doutrina antropológica da Companhia. Não é casual, por exemplo, o grande espaço dedicado no Comentário ao De Anima (Góis, 1602) à questão das diferenças individuais quanto à alma humana. Este tema - já abordado por Tomás de Aquino na Suma Teológica (séc. XIII / 1980) de forma um tanto duvidosa, e interpretado pelos filósofos peripatéticos de diferentes maneiras, é tratado com grande ênfase pelos autor jesuíta do Comentário, o professor Manuel de Góis, no capítulo referente às qualidades da alma. Aqui, afirma-se com firmeza que, no que diz respeito à alma e às suas potências, os homens de todas as raças e de todos os tempos, são iguais. Desse modo, a deficiência ou a perfeição quanto às operações da mesma potência não devem ser atribuídas à menor ou maior perfeição da potência, e sim ao defeito ou à perfeição do órgão empregado (Góis, 1602, artigo I I , capitulo I, quaestio V). Tendo o objetivo de afirmar as efetivas possibilidades de cristianização dos índios e de legitimar o trabalho missionário da Companhia, Nogueira chega a declarar que quanto à fé esses têm maior predisposição do que os povos ocidentais imbuídos de racionalismo, fundamentando tal afirmação mais uma vez num elemento derivado do seu conhecimento direto (por "experiência") da psicologia indígena. Com efeito, Nogueira acha que os nativos são mais dispostos a acreditar na palavra dos outros, pois "se lhes deitaes a morte, cuidam, que os podeis matar, e morrerem da imaginação pelo muito e sobejo que crêm e crêm que o panicú ha de ir à roça, e outras coisas semelhantes, que seus feiticeros lhes mettem na cabeça." (1988, p. 241). Além de referir o dado derivado da observação dos índios em seu mundo cultural, Nogueira constata que análoga disposição se manifesta com relação à pregação dos missionários católicos: "muito há, que estou na terra, e tenho fallado de Deus muito, por mandado dos padres, e nunca vi a nenhum ter tanta fé, que me parecesse que morreria por ella, se fosse necessário." (Idem, p. 241-242). Quanto aos casos em que os nativos resistam à pregação, a causa é, para Nogueira, o fato de que eles não podem confiar na palavra dos pregadores, os quais com seus maus exemplos desacreditam seu próprio discurso. Em todas estas afirmações, fica evidente a influência do pensamento humanista do século XVI: notadamente a relevância atribuida à palavra e ao exemplo, um certo teor utópico na consideração do homem e da sociedade, a ênfase no poder da imaginação (rotulada como fantasia e como potência cogitativa). Memorandum 5, out/2003 Belo Horizonte: UFMG; Ribeirão Preto: USP. http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/massimi03.htm Massimi, M. (2003). Representações acerca dos índios brasileiros em documentos jesuítas do século XVI. Memoranum, 5, 69-85. Retirado em / / , do World Wide Web: http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/massimi03.htm. Não devemos esquecer, todavia, que o motivo inspirador de toda esta discussão no âmbito da Companhia é eminentemente pragmático. Com efeito, o Diálogo, provavelmente elaborado visando a intenção de convencer a opinião pública católica acerca do valor e da eficácia dos trabalhos missionários dos jesuítas junto aos índios brasileiros, obedece evidentemente à mesma lógica política e cultural que inspirou Nóbrega e a Companhia em sua atuação no Brasil. No que diz respeito ao objetivo específico de nossa análise, é interessante observar que a inferência de características psicológicas do índio é necessária, nesse texto, para corroborar a tese da humanidade do índio, tese que por sua vez justifica a ação evangelizadora dos religiosos junto a ele. Apesar do autor fazer, em várias ocasiões, referência ao seu conhecimento direto dos povos indígenas, é evidente que esta psicologia do índio é construída nos moldes do modelo cultural europeu da época, notadamente da filosofia aristotélica-tomista e do humanismo pedagógico, doutrinas essas que, conforme vimos, permeavam o espírito da formação jesuítica (Rodrigues, 1985; Giard, 1995). As informações de José de Anchieta Na Informação da Província do Brasil escrita por José de Anchieta em 1585 e destinada ao Padre Geral da Companhia, algumas das teses de Nóbrega são repropostas, embora com nuances diferentes. O juízo geral de Anchieta acerca da "natureza" do índio parece menos positivo do que o de Nobrega, pois ele afirma que "são gente de mui pouca capacidade natural, se bem que para sua salvação têm juízo bastante e não são tão boçais e rudes como por lá se imagina." (ed. 1988, p. 441). Este trecho é muito significativo, pois ao mesmo tempo em que Anchieta parece propor uma representação do índio livre daquilo que ele acredita ser um fácil e retórico otimismo, contrapõe-na à visão negativa acerca do mesmo que teria sido elaborada "por lá". O conhecimento do outro adquirido pela experiência direta é aqui explicitamente privilegiado e contraposto a um conhecimento a priori, determinado por um código cultural preconcebido. Anchieta propõe, então, um ponto de vista epistêmico a partir do qual pode construir o saber sobre o 'outro', baseado no contato direto com a realidade deste e não no que "lá se imagina" (Idem). Quanto à importância da pregação como instrumento fundamental para a doutrinação dos índios, esta tese, já enunciada por Nóbrega, é reforçada por Anchieta a partir de considerações análogas às que já encontramos no pequeno tratado de Nóbrega, ou seja o enorme valor atribuído à fala e à palavra pelos índios: Fazem muito caso entre si, como os Romanos, de bons línguas e lhes chama senhores da fala e um língua acaba com eles quanto quer e lhes fazem nas guerras que matem ou não matem e que vão a uma parte ou a uma outra, e é senhor da vida e morte e ouvem-no toda uma noite e às vezes também o dia sem dormir nem comer e para experimentar se é bom língua e eloqüente, se põem muitos com ele toda uma noite para o vencer e cansar, e se não o fazem, o têm por grande homem e língua. Por isso há pregadores entre eles muito estimados que os exortam a guerrear, matar homens e fazer outras façanhas desta sorte. (Idem, p. 441). O olhar de Anchieta é particularmente atento aos traços psicológicos do temperamento dos nativos. Portanto, afirma que eles "são algo melancólicos" e da mesma forma como vários outros autores acima analisados, retrata neles a sensibilidade e a força de sua imaginação: "se querem morrer com apreender somente a morte na imaginação ou com comer terra; ou lhes digam que se hão de morrer ou lhes ponham medo morrem brevissimamente." (Idem, p. 442). Memorandum 5, out/2003 Belo Horizonte: UFMG; Ribeirão Preto: USP. http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/massimi03.htm Massimi, M. (2003). Representações acerca dos índios brasileiros em documentos jesuítas do século XVI. Memoranum, 5, 69-85. Retirado em / / , do World Wide Web: http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/massimi03.htm. Neste ponto, Anchieta apoia-se nos conhecimentos próprios de uma área de saber definida no universo mental e cultural do Ocidente, como Medicina da Alma ou Medicina do Espírito. Na mentalidade do ocidente medieval e renascentista, a Medicina da Alma corresponde à "ciência" ou à "arte de viver". Desse modo, teologia, filosofia e medicina encarregam-se de construir o domínio da Medicina da Alma - cada uma com suas competências e perspectivas próprias - e é assim que este domínio vem abarcar um conjunto de conhecimentos de vária natureza, desde as teorias médicas (como, por exemplo, a teoria humoralista) até aos conselhos sugeridos pela sabedoria dos Padres do deserto, da antiga tradição da Patrística cristã. A teoria humoralista - cujas origens remontam a Hipócrates e Galeno, considera a constituição do homem determinada pela presença de quatro humores fundamentais que, por sua vez, correspondem aos quatro elementos básicos da composição do Universo. Os humores são: biles preta (melancolia), biles amarela, fleuma e sangue. Conforme o predomínio de um destes na constituição dos indivíduos, tem-se quatro tipos de temperamentos: melancólico, colérico, fleumático e sangüíneo. Os temperamentos, por sua vez, determinam as características psicossomáticas do sujeito: sua condição orgânica bem como seus estados psíquicos (Klibansky, Panofsky e Saxl, 1983). No século XVI, o médico espanhol Huarte de San Juan, formado pela Universidade de Alcalá e autor do Examen de ingenios para las sciencias (1574), estabelece estreita correspondência entre a Medicina do corpo, a Medicina do Animo e a construção política e social da sociedade, baseando-se no modelo da República platônica. Desse modo, a prática social apoia-se na filosofia natural, sendo o corpo social estruturado em analogia com o microcosmo que é o homem (San Juan, 1989). Os jesuítas dão continuidade a esta tradição e difundem-na, inclusive em seus âmbitos de presença missionária, como o Brasil. Já nos escritos de Inácio de Loyola, fundador da Ordem religiosa, vemos a referência freqüente a esta tradição de conhecimentos, em função do entendimento mais profundo do ser humano e de seu destino, visando à orientação ("direção") de sua vida espiritual. Assim, por exemplo, em carta escrita ao Padre Antônio Brandão em junho de 1551, Loyola frisa a importância de que o mestre espiritual conheça o temperamento daquele que se entrega aos seus cuidados, afirmando a necessidade de "acomodar-se à complexão daquele com quem se conversa, a saber, se é fleumático ou colérico, etc. (...), e isto com moderação." (Loyola, 1993, vol. 2, p. 89). A mesma "arte de viver" (3) Loyola demostra ao indicar algumas regras de convivência ao Padres Broett e Salmerón (carta escrita em Roma, setembro de 1541): Nos negócios com toda a gente, principalmente com iguais ou inferiores em dignidade, falar pouco e esperar, ouvir muito e de bom grado; sim, escutar longamente até acabarem de dizer o que querem. Depois disso, responder em diversos pontos, concluindo e despedindo-se. Se retomarem a questão, abreviar as respostas no que for possível. A despedida, embora rápida, seja amável. No trato de pessoas de qualidades insignes, procurar ganhar-lhes a afeição para maior serviço de Deus Nosso Senhor. Para isso atender primeiro ao seu temperamento e adaptar-se a ele. Se são coléricos e falam com viveza, tomar um pouco seu modo em bons e santos assuntos; para esses, nada de grave, lento ou melancólico. Mas com os sérios, lento no falar, graves e pesados, tomar também o modo deles, porque isto lhes agrada: "Fiz-me tudo para todos". Advirta-se o seguinte: se alguém é de temperamento colérico e trata com outro colérico, se não são de um mesmo sentir, há grandíssimo perigo de se desajustarem suas conversas. Portanto, se um conhece Memorandum 5, out/2003 Belo Horizonte: UFMG; Ribeirão Preto: USP. http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/massimi03.htm Massimi, M. (2003). Representações acerca dos índios brasileiros em documentos jesuítas do século XVI. Memoranum, 5, 69-85. Retirado em / / , do World Wide Web: http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/massimi03.htm. 77 ser de compleição colérica, deve ir, em todos os pontos do negócio, muito armado de consideração, com decisão de suportar e não altercar com o outro, principalmente se sabe que é doente. Mas se tratar com fleumático ou melancólico, não há tanto perigo de desajuste por palavras precipitadas. (Loyola, 1541 / 1993, vol. 3, pp. 21-22). É natural então que, seguindo seu mestre Inácio, José de Anchieta utilize este referencial na observação dos índios brasileiros, visando o estabelecimento do melhor "trato" com eles. Anchieta (1585 / 1988) frisa também o fato de que eles "amam muito os filhos" e interpreta a nudez como sinal de sua "candura natural", representado "o estado de inocência" (p. 442). Esta notação é sucessivamente confirmada pela informação de que, após a conversão do índios ao cristianismo, eles "com andarem nus, não há homem que ponha o olho em mulher alheia." (p. 443). Outra qualidade positiva da psicologia indígena apontada por Anchieta é o da sociabilidade: Não são demandões, mas benfazejos e caritativos; todos os que lhes entram em casa comem com eles sem lhes dizer nada... Vivem muitos juntos e umas casa mui grandes de palma que chamam ocas e com tanta paz que põem espanto, e com terem as casa sem portas e suas cousas sem chave por nenhum modo furtam uns aos outros. (1585 / 1988, p. 442). Da mesma forma que Nóbrega, Anchieta acredita na educação como instrumento fundamental da conversão dos índios, os quais parecem "tamquam tabula rasa para imprimir-se-lhes todo o bem" (Idem, p. 443). O apego dos nativos ao seu modelo cultural e a seus costumes tradicionais parece ser subestimado por Anchieta neste informe pois ele escreve que nem ha dificuldade em tirar-lhes rito nem adoração de ídolos porque não os têm e os costumes depravados, deixam-nos com facilidade e ficam muito sujeitos a nosso padres e lhes têm amor e respeito e não movem pé nem mão sem eles. (Idem, p. 443). Sabemos porém, pela leitura da correspondência jesuítica, que nem sempre as coisas serião tão fáceis para os missionários, os quais deparavam-se muitas vezes com a resistência dos índios e com a recusa de abandonar suas tradições contrárias à ética cristã, ou com o retorno dos convertidos aos antigos hábitos pagãos. A apreciação das capacidades intelectuais dos índios também é positiva, aos olhos de Anchieta, pois "compreendem muito bem a doutrina" (1585/ 1988, p. 443) e na aprendizagem da leitura, da escritura, da aritmética, do canto e da língua portuguesa, "tudo tomam mui bem" (ibidem). É provável que, conforme já discutimos acerca do Diálogo de Nóbrega, tratando-se de uma informação de teor oficial destinada a obter apoios e aprovação dos trabalhos missionários, a ênfase positiva nesta descrição do índio seja devida, pelo menos em parte, à necessidade de convencer os leitores acerca das possibilidades de sucesso do empenho missionário dos padres jesuítas. De qualquer forma, o interesse acerca do conhecimento das características psicológicas do índio parece marcante nos escritos de Anchieta. Na Informação dos casamentos dos índios do Brasil, o mesmo autor busca investigar as peculiares relações de parentesco existentes na comunidade indígena, procurando desvendar os sentimentos vivenciados em tais relações sociais. Ele descobre por exemplo que os índios não têm um particular "sentimento de adultério" (1585 / 1988, p. 457), e acerca dos índios polígamos os quais possuem várias mulheres, afirma que "não é possível saber-se com qual delas se juntaram com ânimo marital, porque nem eles entendem quanto importa falar nisto Memorandum 5, out/2003 Belo Horizonte: UFMG; Ribeirão Preto: USP. http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/massimi03.htm Massimi, M. (2003). Representações acerca dos índios brasileiros em documentos jesuítas do século XVI. Memoranum, 5, 69-85. Retirado em / / , do World Wide Web: http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/massimi03.htm. verdade, nem o sabem dizer realmente, porque para com todas tivera o mesmo ânimo" (Idem, p. 460). A dificuldade do missionário em compreender a psicologia do outro é, aqui, muito clara. Anchieta busca inclusive entender os motivos de alguns fenômenos sociais particularmente curiosos e estranhos para o olhar europeu, já descritos pelos demais cronistas, como por exemplo, o fato de que, após o parto, é o pai a receber cuidados e visitas, e não a mãe. Isto explica-se pelo fato de que os índios "têm para si que o parentesco verdadeiro vem pela parte dos pais, que são os agentes; e que as mães não são mais que uns sacos, em respeito dos pais, em que se criam as crianças." (Idem, p. 460). Do princípio e origem dos índios do Brasil e narrativa epistolar de uma viagem e missão jesuítica, de Fernão Cardim Uma postura muito semelhante refletem os escritos Do princípio e origem dos índios do Brasil e a Narrativa epistolar de uma viagem e missão jesuítica, atribuídos ao jesuíta Fernão Cardim e redigidos provavelmente por volta de 1584. Um aspecto muito interessante do primeiro texto é a de que nele Cardim faz distinção entre crenças religiosas e conhecimentos psicológicos dos índios. Estes, apesar de não parecerem ter crenças religiosas, revelam dispor de algum tipo de conhecimentos psicológicos em sua bagagem cultural: de fato, apesar de não ter noção de Deus nem de culto divino, "sabem que têm alma e que esta não morre e depois da morte vão a uns campos onde ha muitas figueiras ao longo de um formoso rio, e todas juntas não fazem outra coisa senão bailar." (1584/ 1980, p. 87). No que diz respeito aos conhecimentos acerca da psicologia indígena, repete-se aqui a observação de que os índios são em extremo submetidos ao poder da imaginação: assim, por exemplo, eles "têm grande medo do demônio e é tanto o medo que lhe têm, que só de imaginarem nelle morre, como aconteceu já muitas vezes." (1584 / 1980, p. 87). A importância das emoções e de suas influências (às vezes nefastas) no plano orgânico, é de fato enfatizada na literatura jesuítica bem como na cultura da época em geral. Os tratados Conimbricences, por exemplo, atribuem grande importância a estes estados da alma definidos como paixões, e que na linguagem da psicologia moderna correspondem às emoções ou sentimentos. As paixões são entendidas como movimentos do apetite sensitivo, provenientes da apreensão do bem ou do mal, acarretando algum tipo de mutação não natural do corpo. Neste sentido, elas dependeriam sempre de uma representação que o intelecto faz de algum objeto julgado como bom ou mau. Os Conimbricences, assim como toda a cultura do seu tempo, atribuem grande importância aos estados da alma definidos como paixões, e que na linguagem da psicologia moderna correspondem às emoções ou sentimentos. As paixões são entendidas como movimentos do apetite sensitivo, provenientes da apreensão do bem ou do mal, acarretando algum tipo de mutação não natural do corpo. Neste sentido, elas dependeriam sempre de uma representação que o intelecto faz de algum objeto julgado como bom ou mau. Como o apetite sensitivo tem sua localização orgânica no coração, é possível que um movimento muito brusco chegue a causar o óbito. (4) Cardim também enfatiza a sociabilidade do temperamento indígena, que se expressa em vários sinais, desde a liberalidade no repartir o alimento ("repartem tudo o que têm com seus amigos", idem, p. 88), até a estrutura da casa, chamada "oca", na qual "não há repartimentos entre uns e outros... e entrando nella se vê tudo quanto tem." (Idem, p. 90). A descrição da oca feita na Narrativa é ainda mais sugestiva: Parece a casa um inferno ou labyrinto, uns cantam, outros choram, outros comem, outros fazem farinhas e vinhos, etc., e toda a casa arde em fogos; porém é tanta a conformidade entre elles que em todo o anno não há peleja, e com não terem nada fechado não há furtos; se fora qualquer outra nação, não poderiam Memorandum 5, out/2003 Belo Horizonte: UFMG; Ribeirão Preto: USP. http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/massimi03.htm Massimi, M. (2003). Representações acerca dos índios brasileiros em documentos jesuítas do século XVI. Memoranum, 5, 69-85. Retirado em / / , do World Wide Web: http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/massimi03.htm. viver da maneira que vivem sem muitos queixumes, desgostos, e ainda mortes, o que se não acha entre elles. (1584/ 1980, p 152). Segundo Cardim, desde criança os índios acostumam-se ao convívio social, pois os meninos jogam entre eles com muita quietação e amizade, (...) entre eles não se ouvem nomes ruins, nem pulhas, nem chamarem nomes aos pais e mães, e raramente quando jogão se desconcertão, nem desavêm por causa alguma, raramente dão uns nos outros, nem pelejão. (Idem, p. 93). A sociabilidade no interior da tribo contrasta com a agressividade e a violência demostrada no comportamento contra os inimigos. Nesse aspecto, Cardim confirma o juízo dos demais autores: "são intrépidos e ferozes que mete espanto" (1584 / 1980, p. 95). O valor atribuído à palavra e à disposição para o discurso é relatado por Cardim ao descrever o hábito que os chefes da tribo têm de pregar de madrugada, organizando e distribuindo tarefas para o ritmo quotidiano da vida da povoação. O autor refere a interpretação dada pelos próprios nativos acerca da origem desse hábito: tomarão este modo de um passaro que se parece com os falções o qual canta de madrugada e lhe chamam rei, senhor dos outros passaros, e dizem elles que assim como aquelle passaro canta de madrugada para ser ouvido dos outros, assim convém que os principaes fação aquellas falas e pregações de madrugada para serem ouvidos dos seus. (Idem, p. 89). Quanto aos sentimento, confirma-se o fato de que os índios "amão os filhos extraordinariamente" (p. 91) e que "não lhes dão nenhum gênero de castigo" (p. 91). Na Narrativa, Cardim voltar a observar que os nativos "nenhum gênero de castigo têm para os filhos; nem ha pai nem mãe que em toda a vida castigue nem toque em filho, tanto os trazem nos olhos" (1584 / 1980, p. 153). Cardim constata que, apesar disso, "em pequenos são obedientíssimos a seus pais e mães, e todos muito amáveis e aprazíveis"(Idem, p. 153), fato que devia intrigar muito a mentalidade e os conceitos pedagógicos do jesuíta europeu, acostumado a considerar a punição como necessária na relação educativa, conforme a prática de seu tempo, quando se usava castigar até estudantes universitários, príncipes e reis (Ariés, 1981). Quanto ao temperamento, "são melancólicos" (Cardim, 1584 / 1980, p. 93), ainda que os "meninos são alegres e dados a folgar" (Idem), mais do que os meninos portugueses. Outro aspecto do modelo cultural indígena de que Cardim ressalta a novidade é a saudação lacrimosa reservada aos hóspedes ou aos recém chegados, a respeito da qual o jesuíta comenta: "é cousa não somente nova, mas de grande espanto, ver o modo que têm em agasalhar os hospedes, os quaes agasalham chorando por um modo estranho" (Idem, p. 153). O narrador jesuíta declara sua incapacidade de avaliar a dimensão afetiva deste gesto (o choro que aos olhos do europeu é expressão de tristeza, para o índio pode comunicar também alegria), mas reconhece o valor que o gesto tem para o outro e a necessidade de respeitá-lo: "Neste tempo do triste ou alegre recebimento, a maior injuria que lhes podem fazer é dizer-lhes que se calem, ou que basta com esses choros" (Idem, p. 153). O missionário parece demonstrar aqui um conhecimento prático da psicologia dos índios, conhecimento este que é necessário para manter um bom relacionamento com esses, pois apesar dele ser incapaz de interpretar o significado de determinados gestos, novos aos seus olhos, entende que tais gestos são para o outro muito importantes, e como tais devem ser respeitados. Coisas do Brasil, de Francisco Soares Memorandum 5, out/2003 Belo Horizonte: UFMG; Ribeirão Preto: USP. http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/massimi03.htm Massimi, M. (2003). Representações acerca dos índios brasileiros em documentos jesuítas do século XVI. Memoranum, 5, 69-85. Retirado em / / , do World Wide Web: http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/massimi03.htm. O pequeno tratado Coisas do Brasil do jesuíta Francisco Soares (1590) descreve também alguns elementos da cultura indígena significativos no que diz respeito aos conhecimentos psicológicos. Entre outras coisas, Soares relata que sabem estes índios que o homem tem alma (...) e que depois de morrerem vão suas almas a uns campos muito formosos cheios de árvores e figueiras e se ajuntam com outros doutra nação, mas os vêem afastados, e que lá não há tristeza, senão cantar e bailar junto ao rio (1590 / 1989, p. 146). Além disto, também este autor jesuíta refere-se à grande influência da imaginação sobre o comportamento dos mesmos, pois morrem por medo dos demônios "por terem grande eficácia na imaginação", (Idem). Soares refere a interpretação dos nativos acerca da origem do fogo, do diabo, da antropofagia, do dilúvio. Seu escrito confirma o juízo positivo dos textos anteriormente analisados, acerca da sociabilidade do temperamento dos índios ("logo repartem por todos" os frutos de sua caça, p. 150), mas à diferença de outros autores, Soares julga que "não são luxuriosos"e "posto que alguns tenham muitas mulheres, é por estado" (Idem). Conclusão A análise dos documentos acima apresentados evidenciou-se que para alguns entre os autores considerados, a compreensão do índio brasileiro em suas características psicológicas, culturais e sociais, para além de um código interpretativo preconcebido, ou de um crivo ideológico que oriente a construção de sua re presenta ção, foi favorecida pela existência de um âmbito espaço-temporal de convivência. Uma vez que esta condição se tornou possível, a representação do outro sugerida pelo modelo cultural de referência possuído pelo observador, exigiu de ser modificada pelos dados de observação da experiência direta e pelas interpretações destes dados, colhidas através de relacionamentos concretos com informantes nativos. No que diz respeito ao nosso objeto de investigação, a saber, a representação das características psicológicas do índio na literatura jesuítica quinhentista, vimos como esta representação foi, na maioria dos casos, moldada por categorias próprias do modelo cultural tradicional. Assim, a atribuição ao índio de um psiquismo, deriva, em parte, das condições que o código interpretativo da alteridade inerente a este modelo indica como elementos necessários para que outro ser possa ser reconhecido como ser humano. Por outro lado, o reconhecimento efetivo da identidade psicossocial do índio, enquanto sujeito, fundamenta-se num espaço de relações concretas onde a subjetividade dele se revele e os seus comportamentos possam ser considerados, respeitados e, eventualmente, entendidos em sua peculiaridade e diversidade. É o que vimos ocorrer, mesmo que parcialmente, nos escritos de José de Anchieta, de Fernão Cardim. Fora desse espaço constituído por relações sociais concretas, acaba prevalecendo um tipo de conhecimento preconcebido, construído com base em categorias apriorísticas e estandardizadas. Com efeito, se, por um lado, tal conhecimento é fruto de uma tradição cultural fecunda e consistente, já amadurecida pelos contatos estabelecidos com outros povos e culturas ao longo da história, por outro, é também delimitado por interesses e objetivos parciais de natureza política, doutrinária e econômica. Trata-se, para retomar a expressão de Anchieta, de uma "imagem de lá", projetada num aqui-e-agora distante, na tentativa (ilusória) de torná-lo próximo, um aqui-e-agora que, somente para quem aventurou-se em atravessar o espaço da distância geográfica e aquele mais profundo da distância cultural e social, tornou-se presença real, evidência de alteridade, desafio para o conhecimento. Referências bibliográficas Albonico, A. (1990). Il cardinal Federico "Americanista". Roma: Bulzoni. Memorandum 5, out/2003 Belo Horizonte: UFMG; Ribeirão Preto: USP. http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/massimi03.htm Massimi, M. (2003). Representações acerca dos índios brasileiros em documentos jesuítas do século XVI. Memoranum, 5, 69-85. Retirado em / / , do World Wide Web: http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/massimi03.htm. Albuquerque, L.; Ferronha, A.L.; Horta, J.S. & Loureiro, R. (Org.). (1991). O confronto do olhar: o encontro dos povos na época das navegações portuguesas. Lisboa: Caminho. Anchieta, J. (1988). Cartas, informações, fragmentos históricos e sermões. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo; Belo Horizonte: Ed. Itatiaia (Coleção Reconquista do Brasil, serie 2, 149). Andrade, A.B. (1981). Contributos para a história da mentalidade pedagógica portuguesa. Lisboa: Imprensa Nacional; Casa da Moeda. Acquaviva, C. (1893). Instructio ad reddendam rationem conscientiae iuxta morem Societatis Iesu; Industriae ad curandos animi morbos Em B. De Angelis (Org.). Institutum. v. 2. (pp. 397-440). Firenze: Tipografia della Concezione. (Original publicado em 1600). Aquino, T. (1980). Suma Teológica. v. 3. (R. Costa, Org.; A. Correa, Trad.). Porto Alegre: Editora Sulina. Aristote. (1993a). Rethorique. (P. Louis, Trad.). Paris: Les Belles Lettres. (Original do séc. IVa.C.). Aristote. (1994). Problémes v. 3. (P. Louis, Trad.). Paris: Les Belles Lettres. (Original do séc. IVa.C.). Aristotele. (1993b). Etica a Nicomaco. (C. Mazzarelli, Trad.) Milano: Rusconi. (Original do séc. IVa.C.). Barreto, L.F. (1983). Descobrimentos e Renascimento: formas de pensar e de ser nos séculosXVeXVI. Lisboa: Imprensa Nacional; Casa da Moeda. Barreto, L.F. (1986). Caminhos do saber no renascimento português: estudos de história e teoria da cultura. Lisboa, Imprensa nacional; Casa da Moeda. Bloch, M. (1993). Os reis taumaturgos. (M. Vilela, Trad.). São Paulo: Companhia das Letras. (Original publicado em 1983). Buesco, M.L.C. (1983). O estudo das línguas exóticas no século XVI. Lisboa: Instituto da Língua e Cultura Portuguesa. Caeiro, F.G. (1982). O pensamento filosófico do século XVI ao século XVIII em Portugal e no Brasil. Em Faculdade de Filosofia de Braga (Org.). Acta do primeiro congresso luso-brasileiro de filosofia. (pp. 51-90). Braga: Faculdade de Filosofia. Caeiro, F.G. (1989). El problema de las raíces históricas. Em: E. Barba (Org.). Iberoamerica, una comunidad. (pp. 377-389). Madrid: Ediciones de Cultura Hispánica. Cardim, F. (1980). Tratados da terra e gentes do Brasil. São Paulo: Editora Universidade de São Paulo; Belo Horizonte: Itatiaia (Coleção Reconquista do Brasil, 13). (Original publicado em 1625). Cardini, F. (1986). Magia, stregoneria, superstizioni nell'Occidente medievale. Firenze: La Nuova Italia. Memorandum 5, out/2003 Belo Horizonte: UFMG; Ribeirão Preto: USP. http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/massimi03.htm Massimi, M. (2003). Representações acerca dos índios brasileiros em documentos jesuítas do século XVI. Memoranum, 5, 69-85. Retirado em / / , do World Wide Web: http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/massimi03.htm. 82 Carvalho, J.B. (1980). O Renasc imento português (em busca da sua especificidade). Lisboa: Imprensa Nacional; Casa da Moeda. Cascudo, L.C. (1989). Dicionario do folclore brasileiro. São Paulo: Editora Universidade de São Paulo; Belo Horizonte: Itatiaia (Coleção Reconquista do Brasil, 151). Cassirer, E. (1977). Individuo e cosmo nella filosofia del Rinascimento. (F. Federici, Trad.). Firenze: La Nuova Italia (Original publicado em 1935). Certeau, M. (2000). A escrita da história. (M.L. Menezes, Trad.). Rio de Janeiro: Editora Forense Universitária. (Original publicado em 1975). Crombie, A. (1987). Historia de la ciencia: de San Agustín a Galileo. (J. Bernia Trad.). v. 1 e 2. Madrid: Alianza Universitaria. (Original publicado em 1959). Delumeau, J. (1994). A civilização do Renascimento. (M. Ruas, Trad.). Lisboa: Estampa, v. 1 e 2 (Original publicado em 1964. Eliade, M. (1991). Paradiso e utopia: il messianismo nella societá americana. I Quaderni di Avallon: rivista di studi sull'uomo e il sacro, 24, 29-50. Freyre, G. (1958). Casa Grande & Senzala: formulação da família brasileira sob regime de economia patriarcal. Rio de Janeiro: José Olympio. 2v. Garin, E. (1995). L'uomo del Rinascimento, Bari: Laterza. Giard, L. (1995). Les jésuites á la Renaissance: système éducatif et production du savoir. Paris: PUF (Bibliothèque d'histoire des sciences). Giard, L. & Vaucelles, L. (1996). Les jésuites à l'âge baroque, 1540-1640._ Grenoble: Millon. Gilardo, L.M. (1995). Autobiografie di gesuiti in Italia (1540-1640): interpretazione. Archivum Historicum Societatis Iesu, 64, 3-38. storia e Gliozzi, G. (1977). Adamo e il nuovo mondo. La nascita dell'Antropologia come ideologia coloniale: dalle genealogie bibliche alle teorie razziali (1500-1700). Firenze: La Nuova Italia Editrice. Godinho, V.M. (1990). Mito e mercadoria: utopia e pratica de navegar, séculos XIIIXVIII. Lisboa: Difel. Góis, M. (1593). Commentarii Collegii Conimbricensis Societatis Iesu in Libros Aristotelis qui Parva Naturalia appellantur. Lisboa: Simão Lopes. Góis, M. (1602). Commentarii Collegii Conimbricensis Societati Iesu in tres Libros de Anima. Veneza: Tipografia Vincenzo Amandino. Góis, M. (1607). Commentarii Collegii Conimbricensis Societatis Iesu in Libro de generatione et corruptione Aristotelis stagiritae nunc recens omni diligentia recogniti et emendati. Veneza: Tipografia Vincenzo Amadino. Góis, M. (1957). Disputas do Curso sobre os livros da Moral da Ética a Nicomaco, de Aristóteles em que se contêm alguns dos principais capítulos da Moral (A B. Andrade, Trad.). Lisboa: Instituto de Alta Cultura. (Original publicado em 1593). Memorandum 5, out/2003 Belo Horizonte: UFMG; Ribeirão Preto: USP. http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/massimi03.htm Massimi, M. (2003). Representações acerca dos índios brasileiros em documentos jesuítas do século XVI. Memoranum, 5, 69-85. Retirado em / / , do World Wide Web: http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/massimi03.htm. Hanke, L. (1985). La humanidad es una. Mexico: Fondo de Cultura Economica. Holanda, S.B. (1977). Visão do Paraíso: os motivos edênicos no descobrimento e colonização do Brasil. São Paulo: Companhia Nacional. Iparraguirre, I. (1961). Répertoire de spiritualié ignatienne, de la mort de S. Ignace à celle du P. Aquaviva, 1556-1615. Roma: Institutum Historicum Societatis Iesu. Iparraguirre, I. (1967). Comentarios de los Ejercicios Ignacianos (siglos XVI-XVIII), Repertorio critico. Roma: Institutum Historicum Societais Iesu. Klibansky, R.; Panofsky, E. & Saxl, F. (1983). Saturno e la melanconia. (R. Federici, Trad.). Torino: Einaudi. (Original publicado em 1923). Lamalle, E. (1981-1982). L'archivio di un grande ordine religioso: l'Archivio Generale della Compagnia di Gesù. Archiva Ecclesiae, 24-25 (1), 89-120. Leite, S. (Org.). (1956-60). Monumenta Brasiliae. Roma: Monumenta Historica Societatis Iesu. 5 v. Loyola, I. (1993). Cartas. (A. Cardoso, Trad.). São Paulo: Loyola. 3v. (Originais: 15241556). Loyola, I. (1982). Obras completas. Madrid: Bibliotecas Autores Cristianos. Macedo, J.B. (1975). Livros impressos em Portugal no século XVI: interesses e formas de mentalidades. Arquivos do Centro Cultural Português, IX, 183-221. Maravall, J.A (1997). A cultura do barroco. (S. Garcia, Trad.). São Paulo: Editora Universidade de São Paulo. (Original publicado em 1975). Margarido, A. (1984). La vision de l'autre (Africain et indien d'Amérique) dans la Renaissance portugaise. Paris: Foundation Calouse Gulbenkian; Centre Cultural Portugaise. Martins, A.M. (1989). Conimbricenses. Logos, 2, 1112-1126. Massimi, M.; Mahfoud, M.; Silva, P.C.J. & Avanci, S.H.S. (1997). Navegadores, colonos, misisonários na Terra de Santa Cruz: um estudo psicológico da correspondência epistolar. São Paulo: Loyola. Massimi, M. (2000). La psicologia dei temperamenti nei cataloghi triennali dei gesuiti in Brasile. Physis: rivista internazionale di storia della scienza, 37, 137-150. Mazzoleni, G. (1992). O Planeta cultural: para uma antropologia histórica. (L. Laganá, Trad.). São Paulo: Istituto Italiano di Cultura di São Paulo; Editora Universidade de São Paulo. (Original publicado em 1990). Mello e Sousa, L. (1989). O diabo na Terra de Santa Cruz. Rio de Janeiro: Companhia das Letras. Mello e Sousa, L. (1993). O inferno atlântico. Rio de Janeiro: Companhia das Letras. Metraux, A. (1979). A religião dos Tupinanbás. (E. Pinto, Trad.). São Paulo: Companhia Editora Nacional. (Original publicado em 1950). Memorandum 5, out/2003 Belo Horizonte: UFMG; Ribeirão Preto: USP. http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/massimi03.htm Massimi, M. (2003). Representações acerca dos índios brasileiros em documentos jesuítas do século XVI. Memoranum, 5, 69-85. Retirado em / / , do World Wide Web: http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/massimi03.htm. Navarro, A. e col. (1988). Cartas avulsas. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo; Belo Horizonte: Editora Itatiaia. (Coleção Reconquista do Brasil, 148). Nóbrega, M. (1988). Cartas do Brasil. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo; Belo Horizonte: Editora Itatiaia. (Coleção Reconquista do Brasil, 147) (Originais de 1549-1560). Paim, A. (1974). História das idéias filosóficas no Brasil. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo. Rodrigues, M.A. (1985). Do Humanismo à Contra-Reforma em Portugal. Revista de história das idéias, 3, 40-52 San Juan, H. (1989). Examen de ingenios. Madri: Catedra; Letras Hispánicas. (Original publicado en 1574). Santos, M.A. (1955). Apontamentos à margem das conclusões impressas dos mestres jesuítas portugueses de Filosofia. Revista portuguesa de filosofia, 11, 561-567. Soares, F. (1989). Coisas notáveis do Brasil. Em L.. Albuquerque. O reconhecimento do Brasil. (pp. 131-200). Lisboa: Publicações Alfa. (Biblioteca da Expansão Portuguesa, 14). Tavares, S. (1948). O Colégio das artes e a filosofia em Portugal. Revista portuguesa de filosofia,4, 227-240. Todorov, T. (1989). La conquista de América: el problema del otro (M. Soler, Trad.). Madrid: Siglo XXI (Original publicado em 1982). Verheecke, M. (1984). L'itineraire du chrétien d'après les Exercices spirituels d'Ignace de Loyola et ses presupposés anthropologiques. Louvain La Neuve: Diffusion Centre Cerfaux; Lefort. Notas (1) A importância da contribuição da Companhia de Jesus na elaboração do saber e da ciência ocidentais, a partir do século XVI, tem sido recentemente apontada por vários estudiosos. A historiografia da ciência e da pedagogia jesuítica constitui-se hoje numa área muito importante de atuação dos historiadores da ciência e da cultura (Andrade, 1981; Caeiro, 1982 e 1989; Giard, 1995; Giard e Vaucelles, 1996; Maravall, 1997; Rodrigues, 1985). (2) Todavia, na perspectiva da psicologia aristotélica, as potências não se identificam tout court com os fenômenos, ao passo que a psicologia moderna reconhece existência apenas aos fenômenos, tendo sido inclusive esta diferenciação o salto decisivo para o nascimento da ciência psicológica no século XIX. (3) A aplicação deste conhecimentos encontra-se também nos escritos de Cláudio Acquaviva (1543-1615), um dos sucessores de Inácio na Generalado da Companhia (Acquaviva, 1893). (4) Os Conimbricences atribuem grande importância também às questões acerca dos correlatos fisiológicos e biológicos da dinâmica das paixões, tais como: as relações entre a tristeza, o sono e os sonhos; as relações entre os sonhos e as paixões; as relações entre as paixões, o sistema cárdio-vascular e a respiração; as relações entre as paixões e Memorandum 5, out/2003 Belo Horizonte: UFMG; Ribeirão Preto: USP. http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/massimi03.htm Massimi, M. (2003). Representações acerca dos índios brasileiros em documentos jesuítas do século XVI. Memoranum, 5, 69-85. Retirado em / / , do World Wide Web: http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/massimi03.htm. a constituição psicossomática dos indivíduos (temperamento); as relações entre as paixões e as diversas idades da vida. Afirmam os efeitos benéficos do sono no controle das paixões. Discutem os casos de óbitos ou de doenças induzidas por paixões de excessiva intensidade (especialmente os excessos na ira, no medo, na tristeza, ou na alegria). Analisam os efeitos somáticos de algumas paixões, tais como o empalidecer e o tremor induzidos pelo medo, a sede e o arrepio de cabelos em decorrência do medo; as relações complementares entre diversas paixões (por exemplo, entre a ira, a tristeza, a dor e o prazer) e os nexos entre o amor e a loucura. Nota sobre a autora Marina Massimi é Livre Docente e trabalha junto ao Departamento de Psicologia e Educação na Faculdade de Filosofia Ciências e Letras da Universidade de São Paulo, Campus de Ribeirão Preto, Brasil. Especialista na área de História das Idéias Psicológicas na Cultura Luso-Brasileira. Contato: Avenida Bandeirantes, 3900 - 14040-901 - Ribeirão Preto (SP) / Brasil. E-mail: [email protected]. Data de recebimento: 31/07/2003 Data de aceite: 17/10/2003 Memorandum 5, out/2003 Belo Horizonte: UFMG; Ribeirão Preto: USP. http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/massimi03.htm Ferreira, A.A.L. (2003). O lugar da psicofísica de Gustav Fechner na história da psicologia. 86 Memorandum, 5, 86-93. Retirado em / / , do World Wide Web: http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/ferreira01.htm. O lugar da psicofísica de Gustav Fechner na história da psicologia The place Gustav Fechner's psychophysics in the history of psychology Arthur Arruda Leal Ferreira Universidade Federal do Rio de Janeiro Brasil Resumo O objetivo deste texto é mostrar a importância do trabalho de Gustav Fechner à luz da problemática do sujeito do conhecimento introduzida pela filosofia moderna. Questão do conhecimento iniciada em Descartes, buscando no Sujeito o ponto de partida de toda verdade demonstrável, e que gerará como contraparte o estudo dos riscos das ilusões a serem produzidas neste Sujeito. Esta tarefa caberá a psicologia, que desde o século XVIII tentará se estabelecer como parceira desta tarefa gnosiológica. Tarefa que será condenada pelos próprios filósofos como Imannuel Kant, decretando a a-cientificidade deste saber. Aqui será vista a importância do trabalho de Fechner: como através de seu trabalho empírico e de sua famosa equação, ele dará subsídio para uma psicologia verdadeiramente científica a ser constituída no final do século XIX. Palavras-chave: história da psicologia; teoria do conhecimento; psicofísica. Abstract The aim of this study is to show the importance of Gustav Fechner's contributions to the History of Psychology, as it relates to the epistemologic questions introduced by modern philosophy. The question of knowledge posed by Descartes serves as a starting point for all demonstrable truth, and this generates - as a counterpart - the study of the risks of illusion produced in the subject. This task lies in the realm of psychology, which, since the 18th century, establishes itself as a partner in the theory of epistemology. The possibility of the study of our subjective experiences has been condemned by philosophers such as Immanuel Kant, who argued that the study of psychology is not a scientific endeavor. Through his empiricist work and based in his famous equation, Fechner elevates psychology to the field of science, overcoming Kant's objections and establishing the beginning of the history of scientifical psychology. Keywords: history of psychology; knowledge theory; psychophysic. Introdução Quando abordamos o trabalho de Gustav Fechner (1801-1887), podemos seguir três trilhas. Em primeiro lugar haveria uma trilha indicada pelo conjunto dos seus textos, caracterizando um trabalho mais ou menos sistemático na direção do que ele designou por "visão diurna" ou panpsiquismo. Por panpsiquismo entendia-se um conjunto de pensamentos e reflexões sobre o mundo enquanto composto por uma hierarquia de seres em que o espírito e o corpo seriam coextensivos desde as esferas mais elementares. O trabalho psicofísico de Fechner não seria uma exceção dentro desta visão metafísica, mas a própria tentativa de lhe estabelecer a sua prova e o seu rigor. Uma segunda trilha é operada por alguns historiadores da psicologia, como Edwin G. Boring (1886-1968), que produzem a cisão entre a doutrina panpsiquista, o que para este hitoriador era o lazer de um livre pensador, e o seu trabalho psicofísico, enquanto um rigoroso esforço de Fechner em estabelecer uma ciência psicológica (Boring, 1950/1979). Ainda que Fechner não se denominasse psicólogo, tais historiadores consideram o surgimento experimental desta Memorandum 5, out/2003 Belo Horizonte: UFMG; Ribeirão Preto: USP. http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/ferreira01.htm Ferreira, A.A.L. (2003). O lugar da psicofísica de Gustav Fechner na história da psicologia. 87 Memorandum, 5, 86-93. Retirado em / / , do World Wide Web: http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/ferreira01.htm. ciência no trabalho deste psicofísico (cf. Idem, p. 297). Mais especificamente na famosa intuição de Fechner de 22 de Outubro de 1850, que, segundo Boring (citado por Saul Rosenzweig, 1987), deu ensejo ao seu trabalho psicofísico. De modo mais conciso, o trabalho psicofísico de Fechner se produz como a reunião de uma doutrina (a do Panpsiquismo), uma metodologia experimental (correlacionando as variações dos estímulos e das sensações percebidas) e um conjunto de leis matemáticas (destacandose a famosa lei Weber-Fechner). Destes três fatores os dois últimos aspectos são considerados relevantes para o surgimento da psicologia. Esta cisão, que se opera no sentido contrário das intenções de Fechner, tem como finalidade constituir uma história triunfal da psicologia, escandindo o científico do seu "resto metafísico". Contudo, haveria uma terceira trilha: em que o conjunto dos trabalhos de Fechner é confrontado com um conjunto de questões presentes em meados do século XIX, notadamente com relação ao reconhecimento da psicologia enquanto saber científico. Pensar que o surgimento de uma ciência se restringe ao estabelecimento de procedimentos experimentais e de uma formalização matemática, é esquecer todo um campo de problematizações em que os instrumentos criados por Fechner puderam superar alguns obstáculos e responder a estas questões, notadamente as colocadas pela filosofia crítica de Imannuel Kant (1724-1804). É por esta trilha que este artigo seguirá. Antes de observar como esta resposta é possível, vejamos como este campo problemático que leva ao surgimento da psicologia surge no seio da filosofia moderna, de René Descartes (1596-1650) a Imannuel Kant e Augusto Comte (1798-1857). E finalmente, como os fisiólogos do século XIX, como Johannes Müller (1801-1858) e Ferdinand von Helmholtz (1795-1878), irão dar subsídios para resolver estas questões junto com a psicofísica de Fechner. Em suma: o que estes últimos autores irão proceder é uma suspensão das críticas kanteanas e comteanas quanto à possibilidade de uma Psicologia Científica. É neste circuito problemático que se pretende enxergar a importância da psicofísica de Fechner para a constituição de uma Ciência Psicológica, mais do que qualquer contribuição metodológica ou matemática. Passemos à montagem desta história e de seus personagens. A filosofia moderna como problematização do sujeito Antônio Penna (n.1917), um eminente historiador da psicologia brasileiro, considera o trabalho de Descartes como indutor, através do seu dualismo metafísico entre uma substância extensa (o corpo) e outra inextensa (a alma), o dualismo de uma psicologia que se divide entre comportamentalista e mentalista. Seguindo os veios da substância extensa estaria uma psicologia com porta menta l fundada por John Watson (1878-1958) que, apoiada na doutrina dos "animais-máquina" de Descartes e na garantia darwinista de que o homem é um animal, concluiria que o ser humano nada mais é do que uma soma de reflexos. Por outro lado, nas trilhas da substância inextensa, teria se desenvolvido uma psicologia cognitivista, cujo maior expoente é Noam Chomsky (n.1928), a qual o corpo é posto entre parêntesis, a fim de dar conta das competências do pensamento humano às quais ele apenas executa em mero desempenho mecânico (cf. Penna, 1981, p.81). Contudo, mais do que a delimitação do dualismo metafísico que habita a Ciência Psicológica, balizando a opção das relações entre mente e corpo, pode ser visto em Descartes a colocação de uma nova problemática, ou ao menos, um novo ponto de partida para o pensamento ocidental. No século XVI, o aristotelismo temperado com cristianismo, próprio de São Tomás de Aquino (1225-1274) dava provas de esgotamento, favorecendo todo um pensamento cético como o de Michel de Montaigne (1533-1595). Nutrindo-se da dúvida cética, a certeza de que não há certezas, radicalizando-a, tornando-a hiperbólica, e pondo-a sob o julgo de um suposto gênio maligno apto a fazer com que nos equivoquemos com tudo, é que Descartes estabelecerá os primeiros pilares de um novo porto-seguro do pensamento: Não há, pois, dúvida alguma que sou, se ele (o suposto Gênio Maligno) me engana; e, por mais que me engane,não poderá jamais fazer com que eu nada seja, Memorandum 5, out/2003 Belo Horizonte: UFMG; Ribeirão Preto: USP. http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/ferreira01.htm Ferreira, A.A.L. (2003). O lugar da psicofísica de Gustav Fechner na história da psicologia. 88 Memorandum, 5, 86-93. Retirado em / / , do World Wide Web: http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/ferreira01.htm. enquanto eu pensar ser alguma coisa. De sorte que, após ter pensado bastante nisso e ter examinado cuidadosamente todas as coisas, cumpre enfim concluir e ter por constante que essa proposição eu sou, eu existo, é necessariamente verdadeira todas as vezes que a enuncio em meu espírito (Descartes, 1641/1972, p.100). Essa intuição imediata do próprio eu pensante impõe um novo ponto de partida para a filosofia ocidental: não mais o Ser, as Essências ou Deus, mas o Espírito e o Sujeito, enquanto sedes da verdade, mesmo que em Descartes as idéias claras e distintas que instruem nossa razão sejam de origem divina. É neste ponto que todo o nosso pensamento se torna gnosiológico: para saber do tema da verdade era necessário saber da verdade do sujeito. Como a psicologia se insere neste projeto? Não apenas pelo fato do Sujeito e do Espírito terem sido estipulados como os novos alvos do pensamento, que por transformações sucessivas viriam a dar na mente, no psiquismo ou no complemento destes, o comportamento, mas principalmente ao se por o problema do conhecimento, como condição de acesso à verdade. Desde o tempo de Descartes, debatem racionalistas e empiristas sobre a via mais segura para atingir a verdade através do Espírito: razão ou sentidos? Discussão esta que se rebate nos dias de hoje, no interior da epistemologia entre racionalistas aplicados, como Gaston Bachelard (1884-1962) e Georges Canguilhem (1904-1991), e neopositivistas, como Rudolf Carnap (1891-1970) e Moritz Schlick (1882-1936), e na psicologia entre behavioristas e cognitivistas. Contudo, a questão gnosiológica que nutre o surgimento da psicologia é complementar à da busca da verdade no sujeito: trata-se da questão do erro. É neste aspecto que Aron Gurwitsch (1901-1973) verá a origem da psicologia na questão do erro, como uma desculpa do espírito à Razão identificada com o ideário mecanicista da ciência iniciante no século XVII: O que caracteriza essencialmente a física, tal como nós a conhecemos é a separação definitiva que ela estabelece entre a realidade verdadeira e as aparências "subjetivas". O mundo não é como ele parece ser, tal como se oferece à percepção ordinária, na verdade ele é como a ciência física consegue construí-lo... Segundo as ciências físicas, eis todo o aspecto fenomenal do mundo: as qualidades consideradas secundárias, os caracteres de valor de toda as espécies, os momentos teleológicos que ele parece conter, etc., não constituem nada de real; com estes fatos estamos na presença de uma contribuição que se deve à subjetividade humana, e que o homem, graças a sua constituição psicofisiológica, projeta sobre um universo que é de outra natureza... A psicologia é colocada diante da tarefa de mostrar, como, por outro lado, sendo dada a realidade objetiva e, por outro lado, a constituição psicofisiológica do homem, o universo pode assumir este aspecto fenomenal e "subjetivo", que uma tendência natural nos leva a considerar como a própria realidade (Gurwitsch, 1935, p.107). Esta problemática do Espírito foi detectada por Galileu e Descartes na divisão entre as qualidades primárias e secundárias. Pensar no Espírito como ponto da verdade implica como tarefa complementar pensar o que nele conduz ao equívoco. Se há algo em Descartes que inspira o surgimento da Psicologia no século XIX não é o Eu pensante ou o Corpo mecânico, mas as Paixões, enquanto ponto do Espírito em que as duas substâncias se misturam, especialmente através dos sentidos, produzindo o erro. Memorandum 5, out/2003 Belo Horizonte: UFMG; Ribeirão Preto: USP. http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/ferreira01.htm Ferreira, A.A.L. (2003). O lugar da psicofísica de Gustav Fechner na história da psicologia. 89 Memorandum, 5, 86-93. Retirado em / / , do World Wide Web: http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/ferreira01.htm. Qual é o caminho de acesso à verdade através do Espírito? A ordem das Razões desviando-se dos equívocos dos sentidos, como sugerem os racionalistas? Ou a impressão dos sentidos, a partir da qual a nossa razão nada mais seria do que um hábito, uma ilusão, conforme os empiristas? A coexistência destas duas vias de mãodupla da verdade e do erro irá inspirar um discípulo de Gottfried Leibniz (1646-1716), Christian Wolff (1679-1754) a produzir em meados do século XVIII, uma nova análise do Espírito, que chamará de Psychologia Rationalis, ao estudar a alma imortal como substância em 1734, e Empírica, ao estudar o fluxo de nossas vivências nesta alma em 1732. Com uma novidade: não é mais o conhecimento que está em questão, mas a possibilidade de se descrever objetivamente o espírito. É neste aspecto que Georges Canguilhem criticará esta suposta filiação cartesiana desta psicologia filosófica ao afirmar que: Toda a história desta psicologia pode se escrever como a dos contra-sentidos dos quais as Meditações (Metafísicas) foram a ocasião sem ter a sua responsabilidade... As Meditações são chamadas por Descartes Metafísicas porque elas pretendem atingir diretamente a natureza e a essência do Eu penso, na apreensão imediata de sua existência. A meditação cartesiana não é uma confidência pessoal (Canguilhem, 1956/1972, p.111-112). E, mais adiante: É que se desconheceu o ensinamento de Descartes ao mesmo tempo constituindo, contra ele, uma psicologia empírica como história natural do eu - de Locke a Ribot, através de Condillac, os Ideólogos franceses e os Utilitaristas ingleses - e constituindo, segundo ele, acreditava-se, uma psicologia racional fundada numa intuição de um Eu substancial (Idem, p. 113). Imannuel Kant será o formulador da mais derradeira crítica a esta psicologia mal apoiada no pensamento cartesiano. Inicialmente, ao propor que o conhecimento nada mais seria do que a reunião entre o empírico e o racional, dada na síntese a priori entre o diverso sensível e as formas e categorias do Sujeito transcendental, e superando as aporias da gnosiologia moderna entre empiristas e racionalistas. Neste ponto, a própria pedra fundamental do pensamento cartesiano é problematizada: a intuição intelectual deste Eu penso, que seria a primeira evidência dentro de uma ordem das razões, não é mais possível, uma vez que o próprio Eu penso não é passível de uma intuição sensível. Ele não se encontra como um objeto no tempo e no espaço, mas acompanha todas as representações produzidas pelo sujeito. Se a psicologia filosófica é um equívoco ao tomar a evidência do Cogito como uma confidência pessoal, este engano será duplicado, ao se permitir que o Eu Penso seja abordado a partir de uma intuição intelectual. Em função da revolução copernicana da gnosiologia kantiana é que as psicologias racional e empírica de Wolff serão criticadas, por não poderem dar conta como uma ciência legítima do Sujeito transcendental. Examinemos as críticas e os vetos a essas psicologias. A Psychologia Rationalis será alvo da Crítica da Razão Pura kantiana, mais especificamente da sua Dialética Transcendental, onde são examinadas as Idéias de Razão (como a de alma imortal), enquanto produtos de uma busca em uma série conceitual de um termo incondicionado, que é tomado inadequadamente como uma coisa em si. A tarefa da Dialética kantiana é, pois, demonstrar os paralogismos, ou sofismas, presentes numa razão desenfreada e sem limite, como a presente nas metafísicas, e, em especial, a de Wolff. O argumento básico contra a Psicologia Racional é que o suposto conhecimento de uma alma imortal está assentado na experiência de um eu, ou o sentido interno fenomenal, que nada mais é do que uma intuição empírica, que diz respeito ao próprio tempo da consciência, de resto, bem diferente do Eu penso. Este seria uma pura função de organização da experiência e sujeito de todo julgamento de apercepção, sobre o qual não poderia recair qualquer ciência, uma vez que ele é condição Memorandum 5, out/2003 Belo Horizonte: UFMG; Ribeirão Preto: USP. http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/ferreira01.htm Ferreira, A.A.L. (2003). O lugar da psicofísica de Gustav Fechner na história da psicologia. 90 Memorandum, 5, 86-93. Retirado em / / , do World Wide Web: http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/ferreira01.htm. transcendental de toda ciência. O erro da Psicologia Racional está em tomar este Eu penso, enquanto função transcendental do conhecimento com algo a ser vivenciado, como o eu empírico. Em outras palavras, seria confundir eu determinante com eu determinável; sujeito com objeto. Nas palavras de Kant: De tudo isto se vê que a psicologia racional deve a sua origem a um simples mal entendido. A unidade da consciência, que serve de fundamento às categorias, é tomada aqui por uma intuição do sujeito enquanto objeto e, em seguida a ela aplicada a categoria de substância (1781/1994, p. 359-360). Se o Eu penso da Psychologia Rationalis não é passível de se tornar objeto de uma ciência, uma vez que condição de todas as ciências, resta o Eu empírico, tema da Psychologia Empirica. Esta, inclusive estaria mais próxima do projeto que norteará o surgimento da Psicologia Experimental no século XIX, visando estudar as ilusões da experiência imediata. Mas, persiste a pergunta: caberia uma ciência aqui? A resposta de Kant (1786/1989) nos Princípios metafísicos da ciência da natureza é que a Psychologia Empirica não seria uma ciência nem impropriamente dita, como a química, que assim seria por não operar com relações matemáticas (ao menos em 1786). Passemos a palavra a Kant: A psicologia empírica está mais distanciada que a química da classe da ciência da natureza propriamente dita, primeiro, porque a matemática não é aplicável aos fenômenos do sentido interno e a suas leis, pois teria que se ter em conta em tal caso somente a lei de continuidade no fluxo das mudanças do dito sentido interno. Mas, a ampliação do conhecimento assim obtido se relacionaria com o conhecimento obtido pela matemática dos corpos de maneira semelhante ao modo como se relaciona a doutrina das propriedades da linha reta com toda a geometria. Pois a pura intuição interna, na qual devem se constituir os fenômenos da alma é o tempo, mas este tem uma só dimensão. A doutrina empírica da alma jamais poderá se aproximar da química como arte sistemática de análise, ou doutrina experimental, uma vez que nela, o múltiplo da observação interna está separado somente por uma simples divisão no pensamento, sem poder manter-se separado, e unificar-se de novo arbitrariamente; menos ainda poderá se submeter outro sujeito pensante a nossa busca, de tal modo que seja conforme a nossos propósitos, e inclusive a observação em si mesma altera e distorce o estado do objeto observado. Por isso, a psicologia nunca pode ser mais do que uma doutrina histórica do sentido interno, e como tal, tão, tão sistemática quanto possível, uma simples descrição da alma, mas não uma ciência da alma, nem uma doutrina psicológica experimental (Kant, 1786/1989, p. 32-33). Para Kant, segundo Canguilhem, não restaria à psicologia lugar senão na "Antropologia, como propedêutica de uma teoria da habilidade e da prudência, coroada por uma teoria da sabedoria" (Canguilhem, 1956/1972, p.114). Resta dizer que as críticas de Kant a psicologia empírica encontraram eco no positivismo de Augusto Comte, que em seu Curso de Filosofia Positiva assim criticava o método da introspecção: "O indivíduo pensante não poderia se dividir em dois, um raciocinando, enquanto o outro o visse raciocinar. O órgão observado e o órgão observador, sendo, neste caso, idênticos, como poderia haver a observação?" (Comte, 1830/1972, p. 20). Deve-se dizer que as críticas Memorandum 5, out/2003 Belo Horizonte: UFMG; Ribeirão Preto: USP. http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/ferreira01.htm Ferreira, A.A.L. (2003). O lugar da psicofísica de Gustav Fechner na história da psicologia. 91 Memorandum, 5, 86-93. Retirado em / / , do World Wide Web: http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/ferreira01.htm. de Comte voltam-se aqui no século XIX contra outras psicologias filosóficas: a dos Ideólogos, a dos Ecléticos, e a da Escola Escocesa, conforme Lèvy-Brul (1913, citado por Penna 1990, p.19). Restam, contudo, os vetos propostos por Kant à psicologia empírica. Para se provar ciência ela terá que: 1) Descobrir o seu elemento de modo similar à química, para com isto efetuar análises e sínteses; 2) Facultar a este elemento um estudo de tal modo objetivo, em que sujeito e objeto não se misturem como na introspecção; 3) Que se produza uma matematização mais avançada que geometria da linha reta, apta a dar conta das sucessões temporais do sentido interno. E esta missão caberá aos fisiólogos do século XIX, e, em especial a Fechner. A superação dos vetos kantianos: fisiologia sensorial e psicofísica O primeiro problema listado, a falta de um elemento objetivo, será suprido pela teoria das energias nervosas específicas de Johannes Müller, formulada explicitamente em seu Handbuch der Physiologie de 1826. Para este fisiólogo, cada via aferente possuiria uma energia nervosa específica que se traduziria em uma sensação específica de cada nervo. Assim, o nervo ótico excitado pela ação da retina, ou por forças mecânicas e químicas produzirá sempre imagens luminosas. O mesmo ocorreria com os demais sentidos. Seria uma espécie de kantismo fisiológico, em que o mundo percebido seria uma mera propriedade das nossas energias nervosas específicas (do que Galileu havia chamado de qualidades secundárias), estimuladas sempre por um fator físico qualquer, não importando a sua natureza. Trata-se de um elemento preciso, corporalmente situado como fenômeno, ao contrário das idéias e impressões descritas pelos empiristas, enquanto elementos arbitrários. É por tal razão que a sensação vai se oferecer como elemento para uma possível psicologia: ela ligaria o mundo físico que constantemente estimula os sentidos; o fisiológico, uma vez que as energias nervosas específicas estão ligadas aos nervos, e o psicológico, uma vez que a sensação seria a base de nossas representações. E quem desenvolverá este aspecto, junto com a solução do segundo problema kantiano será um discípulo de Müller, Hermann von Helmholtz Helmholtz irá elaborar em 1860 uma teoria sobre o surgimento das representações psicológicas, ou das apercepções, que, no seu reverso, irá fomentar um novo método para estudo objetivo das sensações. A teoria proposta é a das inferências inconscientes, de claro cunho empirista, e o método, o da introspecção experimental, bem diferente, como veremos do produzido na psicologia filosófica. As nossas sensações seriam organizadas por experiências passadas, que seriam armazenadas como as premissas maiores de um silogismo, aptas a ordenar de modo inconsciente e rápido as premissas menores informadas pelos sentidos, produzindo como conclusão as nossas representações psicológicas. O modo de análise das sensações, a introspecção experimental, se processaria no inverso dessas sínteses inconscientes, visando neutralizar os efeitos dessa inferência silogística operada pela experiência passada. Para neutralizar esta síntese inconsciente, processa-se então uma análise consciente, em que os sujeitos dos experimentos são treinados para reconhecer o aspecto mais bruto e selvagem de nossa experiência. Como animais selvagens domesticados teriam que ser reeducados ao seu ambiente natural. Este treinamento dos sujeitos, que faz com que este estudo não possa ser feito sobre crianças, primitivos, ou doentes mentais, visa o evitar o erro do estímulo, qual seja, a confusão do objeto percebido com os juízos inconscientes acumulados pela experiência passada. Por isto, o estudo objetivo das sensações em um sujeito só poderá ser feito se este mesmo sujeito for também um fisiólogo, apto a distinguir o joio da experiência passada do trigo das sensações. Por todos estes cuidados metodológicos, em que a distância entre observador e observado se impõe, ainda que ocorra no mesmo sujeito, e na presença de um elemento objetivo é que o método introspectivo irá se distinguir da introspecção dos filósofos-psicólogos. Restava ainda o problema da matematização, o terceiro colocado por Kant. É aqui que entra a psicofísica de Fechner, delineada nos Elemente der Psychophysik de 1860. Podese dizer que ela também oferece uma resposta experimental ao segundo veto kantiano. Memorandum 5, out/2003 Belo Horizonte: UFMG; Ribeirão Preto: USP. http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/ferreira01.htm Ferreira, A.A.L. (2003). O lugar da psicofísica de Gustav Fechner na história da psicologia. 92 Memorandum, 5, 86-93. Retirado em / / , do World Wide Web: http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/ferreira01.htm. Mas a sua principal conquista está em oferecer a qualquer estudo psicológico a possibilidade de desenvolver uma matemática mais avançada que a geometria de uma linha reta. Isto, através do estabelecimento da primeira lei matemática, batizada por ele Lei Weber-Fechner, em função do aproveitamento da equação desenvolvida por Ernst Weber (1795-1878) sobre a relação de proporcionalidade entre as diferenças apenas percebidas entre estímulos e os valores absolutos destes. Fechner, além de complexificar a equação, irá transformar as diferenças apenas percebidas em sensações, sugerindo a primeira medição psicológica. Conclusão Por se tratar da superação do último veto kantiano é que se pode dizer que o trabalho de Fechner representa o primeiro pilar de uma psicologia a nascer, e que as fundações deste pilar se encontram na intuição de Fechner de 22 de outubro de 1850, data que serve de marco para este encontro. Mas deve se lembrar que o valor deste trabalho está correlacionado ao poder de resposta que ele oferece a problemas filosóficos que se iniciam em Descartes e desembocam nas críticas kantianas. É neste circuito gnosiológico que se faz a importância do trabalho de Fechner, pois ele abriu espaço para a primeira formulação científica da psicologia, superando os impasses da psicologia empírica de cunho metafísico, gerada na tentativa de também responder a estes mesmos problemas filosóficos. Por detrás do sonho de Fechner havia o sonho da psicologia de acordar do sono dogmático denunciado por Kant. O sonho de Fechner pode ter brevemente acordado a psicologia (ou ter feito sonhar que acordou) do sono dogmático, apesar da sua intenção ter sido mais nos acordar do sono materialista. Pois correlacionar o físico (estímulo) e o espiritual (sensação) para Fechner não visava provar uma psicologia matematizável, mas um duplo aspecto de uma mesma natureza extensível a todos os seres, o seu panpsiquismo. Contudo, a história da psicologia prossegue na proliferação de escolas e sistemas que se colocam como a quintessência da cientificidade na psicologia. Em função da proliferação destes mundos científicos possíveis é que se pode perguntar se os vetos kantianos, formulados no final do século XVIII não continuam a assombrar a psicologia. Novos Kants e novos Fechners não apenas serão recorrentes, mas igualmente bem vindos. Referências bibliográficas Boring, E. G. (1979). História de la psicologia experimental. (R. Ardilla, Trad.). México: Trillas. (Original publicado em 1950). Canguilhem, G. (1972). O que é psicologia? (M. G. R. Silva, Trad.). Tempo Brasileiro, 30/31, 104-123 (Conferência original pronunciada em 1956). Comte, A. (1972). Curso de filosofia positiva. (J. A. Giannotti, Trad.). São Paulo: Ed. Abril (Coleção Os Pensadores, XXXIII). (Original publicado em 1830). Descartes, R. (1972). Meditações metafísicas. (J. Ginsburg & B. Prado Júnior, Trads.). São Paulo: Abril (Coleção Os Pensadores, XV). (Original publicado em 1641). Fechner, G. (1966). Elements of psychophysic.s (D. H. Howes & E. G. Boring, Edit.s; H. Adler, Trad.). New York: Holt, Rinehart and Winston. (Originalmente publicado em 1860). Gurwitsch, A. (1935). Developpement historique de la gestalt-psychologie. Thalès, 2, 167-176. Kant, I. (1994). Crítica da razão pura (M. P. Santos & A. F. Morujão, Trads.). Lisboa: Calouste Gulbekian. (Original publicado em 1781). Kant, I. (1989). Pricípios metafísicos de la ciência de la naturaleza. (C. Másmela, Trad.). Madri: Alianza. (Original publicado em 1786). Lowrie, W. (1946). Religion of a scientist. New York: Pantheon Books. Penna, A.G. (1981) História das idéias psicológicas. Rio de Janeiro: Zahar. Memorandum 5, out/2003 Belo Horizonte: UFMG; Ribeirão Preto: USP. http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/ferreira01.htm Ferreira, A.A.L. (2003). O lugar da psicofísica de Gustav Fechner na história da psicologia. 93 Memorandum, 5, 86-93. Retirado em / / , do World Wide Web: http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/ferreira01.htm. Penna, A.G. (1990) Filosofia da mente: introdução ao estudo crítico da psicologia. Rio de Janeiro: Imago. Rosenzweig, S. (1987) The final tribute of E. G. Boring to G. Fechner. American Psychologist, 42 (8), 787-789. Nota sobre o autor Arthur Arruda Leal Ferreira é Professor Adjunto do Instituto de Psicologia da Universidade Federal do Rio de Janeiro, Doutor em Psicologia Clínica pela Pontifícia Universidade Católica da São Paulo e pesquisador financiado pela FAPERJ. Contato: Rua do Riachuelo 169/405. Rio de Janeiro/ RJ. Brasil. CEP: 20.230-014. E-mail: [email protected] Data de recebimento: 15/08/2003 Data de aceite: 18/10/2003 Memorandum 5, out/2003 Belo Horizonte: UFMG; Ribeirão Preto: USP. http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/ferreira01.htm Centofanti, R. (2003). O discrininacionismo afetivo de Radecki. Memorandum, 5, 94-104. Retirado em / / , do World Wide Web: http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/centofanti01.htm. 94 O discriminacionismo afetivo de Radecki The affective discriminationism of Radecki Rogério Centofanti Brasil Resumo O artigo localiza e esclarece o conceito de discriminacionismo afetivo, termo utilizado por Waclaw Radecki, personagem da história da psicologia no Brasil, para identificar o que denominou ser o seu sistema psicológico. Radecki está associado ao Laboratório de Psicologia da Colônia de Psicopatas em Engenho de Dentro, no Rio de Janeiro dos anos 20 do século passado. Citado em várias publicações, o discriminacionismo afetivo tornouse objeto de mitificação, pelo fato de não ter sido até então elucidado. Palavras-chave: Waclaw Radecki; laboratório de psicologia; discriminacionismo afetivo. Abstract The article locates and explains the concept of affective discriminationism, term used by Waclaw Radecki, important characterthe history of Psyhology in Brazil, to identify what is designated as his own psychological system. Radecki is associated with the Laboratory of Psychology of the Colony of Psychopaths in Engenho de Dentro, Rio de Janeiro, during the 1920s. Mentioned in several publications, affective discriminationism is an object of mythicization, due to the fact that it has not been yet properly clarified. Keywords: Waclaw Radecki; laboratory of psychology; affective discriminationism. Introdução Quando conclui o artigo que foi em 1982 publicado com o título de Radecki e a Psicologia no Brasil, um texto de natureza histórica, sabia que faltava esclarecer o significado de discriminacionismo afetivo, termo adotado por Waclaw Radecki para denominar o que afirmava ser o seu sistema. Deixei de fazê-lo, a época, por dois motivos. O primeiro foi o entusiasmo - fiquei preso ao que a investigação tinha de intrigante e reveladora em seus aspectos factuais. O segundo motivo é imperdoável - não tentei entender o discriminacionismo afetivo. Dez anos depois, em seu importante livro História da Psicologia no Rio de Janeiro, Antonio Gomes Penna observa, coberto de razão, que não adiantei "palavra alguma sobre o que significou a perspectiva do mestre polonês" (Penna, 1992, p.17). Ao dizer isso, Penna tinha em vista o discriminacionismo afetivo. Quem lê meu trabalho e o de Penna, encontra inúmeras referências e até mesmo histórias de desafetos criados em torno do discriminacionismo afetivo. Por outro lado, fica sem saber o que ele significava. Falamos sobre, mas não dissemos o que era! Esse espaço vazio apenas serviu para que o conceito de discriminacionismo afetivo fosse mitificado. Agora, vinte e um anos depois, quero livrar-me dessa sensação de que existem dedos apontados em minha direção acusando - "você deve". Vou pagar! Logicamente que, a exemplo de qualquer outra atividade interpretativa, minha leitura está sujeita a equívocos e ilusões. Como fonte de análise, ficarei inicialmente restrito nos limites dos dezessete fascículos do Resumo do Curso de Psicologia, publicados pela Imprensa Militar em 1928 e 1929, um excelente manual ou tratado de psicologia, que encontrei em um sebo no Rio de Janeiro. O curso, ministrado por Radecki, foi promovido pela Escola de Aplicação do Serviço de Memorandum, 5, out/2003 Belo Horizonte: UFMG; Ribeirão Preto: USP. http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/cenofanti01.htm Centofanti, R. (2003). O discrininacionismo afetivo de Radecki. Memorandum, 5, 94-104. Retirado em / / , do World Wide Web: http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/centofanti01.htm. 95 Saúde do Exército e os fascículos encadernados na forma de livro. O Resumo tinha uma finalidade instrucional e o pensamento do autor se revela entre as inúmeras apresentações conceituais dos grandes teóricos de seu tempo, relativas a uma imensa variedade de assuntos, em um plano de obra bem elaborado. Ao final, recorrerei também á tradução do Resumo para o castelhano, publicado na Argentina em 1933, onde recebeu o título de Tratado de Psicologia (resumido). A localização do discriminacionismo afetivo No Resumo do Curso de Psicologia, o termo discriminacionismo afetivo aparece uma única vez em todas as 447 páginas, no capítulo dedicado aos Problemas da psicologia individual e coletiva, inserido no subtítulo Problemas da psicologia individual (diferencial) (1). Não mereceu do autor nem mesmo um subtítulo especial. Surge ao pé da página 368, da seguinte forma: assim, se chamo o meu sistema, exposto aqui, de discriminacionismo afetivo, instituo esta denominação, que inclui o reconhecimento da discriminação e da sensibilidade afetiva como processos básicos e primordiais, justamente pelo fato de serem mais numerosas as correlações que os rodeiam (Radecki, 1928-29, p.368). A dificuldade de entendimento imediato fica por conta do significado que emprestamos aos termos utilizados por Radecki. A palavra sistema, por exemplo, conduz à idéia de que autor teria criado uma ordenação de dados e teorias, com pressupostos, definições e métodos específicos - um "sistema psicológico". Isso parece muito complicado - ainda mais se somarmos ao termo sistema o indicativo de que a discriminação e a sensibilidade afetiva são processos básicos e primordiais, com numerosas correlações. Se resolvermos entender por processo a sucessão de estados ou mudanças e, por correlação, uma relação entre duas ou mais variáveis, fica tudo aparentemente ainda mais complexo. O que é discriminacionismo afetivo O objeto do capítulo em que se localiza o termo discriminacionismo afetivo, é a aplicação prática dos dados fornecidos pela psicologia geral "sob a forma de interpretações psicológicas de determinado indivíduo" (Radecki, 1928-29, p.357). Afinal, se as leis da psicologia geral resumem o que há de constante no psiquismo, deixam "vasta margem às variantes individuais de cada função regida pela lei geral" (p.357). É a questão do universal e do particular! A psicologia individual era, portanto, "uma projeção de todos os dados da psicologia geral através dos variados indivíduos humanos, projeção cuja necessidade se impôs em virtude da própria variabilidade" (p.357). Ao sabor da psicologia de seu tempo, Radecki entende que a variabilidade humana estabelecia o caráter dos indivíduos - "a noção básica na psicologia individual é a de caráter" (p.358), sendo seu fim último a edificação de uma caracterologia. A dificuldade de fundar uma caracterologia, na ótica do mestre polonês, residia no fato do conceito de caráter variar de um autor para outro, deixando como resultante "o poder do psicólogo de definir essas variações" (p.358). Além dessa divergência conceitual, os autores "também discordam no atribuir o papel primário ou secundário a tal grupo de funções psíquicas" (p.358). Ribot, de acordo com Radecki, privilegiava o sentir e o agir. Kant, segundo ele, reservava o termo caráter "para definir exclusivamente o modo individual de pensar" (p.359). Diante das diferenças dos autores, conclui Radecki que as pretensões de eleger esta ou aquela função como primordial, "não passava, entretanto, de expressões do próprio gosto pessoal de determinado autor para aplicar o prisma, para ele mais cômodo, de encarar a individualidade" (p.360). Memorandum, 5, out/2003 Belo Horizonte: UFMG; Ribeirão Preto: USP. http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/cenofanti01.htm Centofanti, R. (2003). O discrininacionismo afetivo de Radecki. Memorandum, 5, 94-104. Retirado em / / , do World Wide Web: http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/centofanti01.htm. 96 Como exemplos de variantes funcionais que o psicólogo poderia "procurar descrever e estudar geneticamente, cumprindo a primeira tarefa da psicologia individual" (p.266), estavam: uma sensibilidade sensorial maior ou menor, uma atenção mais concentrada ou dispersa, uma discriminação mais ou menos desenvolvida, uma memória mais ou menos durável, uma sensibilidade afetiva mais ou menos acurada etc. O estudo das variantes funcionais, entretanto, não podia ser realizado "sem abordar o segundo e importantíssimo problema da psicologia individual: o da correlação funcional, isto é, o problema da fixa relação mútua de certas modalidades funcionais" (p.366). De acordo com Radecki, o estudo das correlações era um dos mais importantes assuntos da psicologia individual. A lógica é simples, embora a equação seja complexa. Apenas como exemplo: se um pesquisador escolhe a memória como variável funcional primária, resta saber como investigará suas correlações com as demais funções - pensamento, afetividade, memória etc. Esse era, portanto, o desenho da psicologia individual - o estudo das variações dos processos psíquicos nos indivíduos e o estudo das correlações desses processos - "até que ponto os diferentes processos psíquicos podem ser independentes um do outro, e até que ponto eles se influenciam mutuamente" (p.367). A análise do mecanismo psíquico não poderia dispensar a análise correlata da função estudada. Mais um exemplo: procurar saber se a memória e a atenção são funções ou processos independentes e, sendo ou não, se é possível identificar correlações entre elas. Na psicologia individual, o estudo das correlações consistia em "hierarquizar" determinadas funções psíquicas, sob o ponto de vista da importância psicológica. Assegurava Radecki que "a hierarquização das funções, baseada nas correlações" (p.368), resolveria o problema da procura pelo ponto central da investigação, eliminando a escolha arbitrária da maioria dos autores. Diz ele que "determinando as variantes funcionais e estabelecendo as leis correlativas" (p.369), o psicólogo estuda os processos psíquicos, em relação à variabilidade que representam através dos indivíduos. Ao enunciar seu conceito de discriminacionismo afetivo, Radecki afirma que "limitei-me, portanto, a indicar caminhos metódicos de resolução do problema" (p.369) - o da investigação teórica e prática da psicologia individual. O discriminacionismo afetivo era, pois, um sistema no sentido de que indicava um modo de ação para investigar e solucionar problemas de psicologia individual - como diz o próprio Radecki, é um método - o seu. Se atentarmos à definição de discriminacionismo afetivo, veremos que Radecki privilegia a discriminação e a sensibilidade afetiva como funções ou processos básicos, pelo fato dessas duas funções estabelecerem um grande número de correlações com as demais funções ou processos. Pronto! Deciframos o enigma. A discriminação e a sensibilidade afetiva deveriam ser os pontos centrais na pesquisa e aplicação de uma psicologia do caráter - de uma caracterologia. Foram escolhidos por uma questão de hierarquia metodológica. Por que discriminação? Na esfera da vida intelectual, Radecki privilegia a discriminação como uma função básica dentre todas as demais funções cognitivas - associação, memória, juízo, raciocínio etc. Por que? Se as sensações são processos receptores e fornecedores de material para a elaboração psíquica [para Radecki, os processos sensoriais têm um caráter pré-psíquico] e, a atenção um "lugar" para onde as impressões sensoriais são conduzidas, é o processo de discriminação que tem por efeito a formação de unidades psíquicas no indivíduo - "a unidade é o que se discrimina como unidade" (Radecki, 1928-29, p.68). Se é por meio das sensações que o indivíduo recebe as impressões, é por intermédio da discriminação que ele "transforma as impressões recebidas em conteúdos intelectuais próprios" (p.69). A discriminação, portanto, depende exclusivamente do indivíduo que Memorandum, 5, out/2003 Belo Horizonte: UFMG; Ribeirão Preto: USP. http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/cenofanti01.htm Centofanti, R. (2003). O discrininacionismo afetivo de Radecki. Memorandum, 5, 94-104. Retirado em / / , do World Wide Web: http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/centofanti01.htm. 97 discrimina - é o processo que representa a função, cujo efeito "decide o caráter da mentalidade intelectual de cada indivíduo" (p.68). A discriminação é um mecanismo imediato da consciência pela função de delimitar o campo focal, uma vez que "só um conteúdo pode ocupar o foco da consciência em um determinado momento" (p.70). Como o conteúdo discriminado preenche completamente o foco da consciência, os demais conteúdos "recuam para a franja" (p.71). Diante dessa síntese, formada na consciência do indivíduo pelo processo de discriminação, parece claro que associação, memória, juízo e raciocínio tornam-se funções elaboradoras secundárias da vida intelectual. Afinal, só é possível associar, memorizar, ajuizar e raciocinar sobre conteúdos discriminados - presentes no campo da consciência. Junto a recognição, apercepção e abstração, a discriminação é definida por Radecki enquanto uma função elaboradora primária da vida intelectual. A consciência "de que o estado vivido não nos é estranho" (p.73) é atribuída por Radecki ao processo de recognição. A recognição desenvolve-se pela experiência e está acompanhada dos processos afetivos. Como serve de base à muitos fenômenos mnemônicos, está intimamente ligada à noção de personalidade. A discriminação e a recognição, "complementando-se mutuamente durante a corrente ininterrupta de nossa consciência, decidem o preenchimento do foco a todo momento, elaborando as unidades psíquicas sucessivas" (p.76). Essa complementaridade determina a formação das representações, que expressam a realidade externa mediante os processos da consciência. Uma representação, diz Radecki, "é uma série de conteúdos focais, limitados em cada momento pela discriminação, e reconhecidos pela recognição" (p.82). A abstração e a apercepção, junto à discriminação, "representam três lados do mesmo fenômeno da consciência imediata, que constitui a primeira elaboração das impressões sensoriais atuais ou passadas" (p.72). A abstração diz respeito ao processo de saturação, pela consciência, "dos conteúdos abstraídos positivamente, em comparação com os conteúdos abstraídos negativamente" (p.71). O que é isso? A função de abstrair tem por finalidade "filtrar" o conteúdo que é "trazido" à consciência. Dessa forma, os conteúdos abstraídos positivamente são dotados de maior saturação, e compõem o limite focal do fenômeno discriminado. Os conteúdos abstraídos negativamente são dotados de menor saturação e, assim, repelidos para o segundo plano da consciência (franja). A apercepção consiste no ato de por em foco os conteúdos da consciência, "que um momento antes se achavam fora dela" (p.72). A apercepção, portanto, é o "ato motor necessário para introduzir no foco o apercebido" (p.72). Ora, a apercepção é um ato motor e a abstração um filtro - dois complementos, portanto, do processo de discriminação. A recognição é a manutenção afetiva de uma discriminação original. A representação é uma expressão da realidade externa mediatizada pela consciência e, portanto, limitada pela discriminação. Assim sendo, mesmo dentre as funções elaboradoras primárias da vida intelectual, a discriminação é a função básica, primordial, e capaz de estabelecer um grande número de correlações, podendo ser privilegiada pelo fato de atender ao critério de hierarquia metodológica proposto por Radecki. Por que sensibilidade afetiva? A afetividade é, no discriminacionismo afetivo, um adjetivo da discriminação. A discriminação afetiva, enquanto síntese, é a função a ser colocada no topo da hierarquia metodológica, quando dos esforços de pesquisa e aplicação de uma psicologia do caráter. Afinal, o indivíduo que discrimina não tem vida intelectual independente de vida afetiva. A consciência tem um ingrediente de sensibilidade afetiva - sentimento e emoção - que ocorre, como já vimos, pelo processo de recognição, que se desenvolve pela experiência. Memorandum, 5, out/2003 Belo Horizonte: UFMG; Ribeirão Preto: USP. http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/cenofanti01.htm Centofanti, R. (2003). O discrininacionismo afetivo de Radecki. Memorandum, 5, 94-104. Retirado em / / , do World Wide Web: http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/centofanti01.htm. 98 Não há, em relação à afetividade, a proposta de estabelecer uma hierarquia metodológica para fins de pesquisa, até mesmo porque "a consciência afetiva deve ser estudada e analisada em um outro nível, diferente do da consciência intelectual, nível em que não procuramos estabelecer gradações de clareza" (Radecki, 1928-29, p.218). Isso porque "a consciência afetiva não tem foco e nem franja" (p.217), diferentemente da consciência intelectual. Não tendo a consciência afetiva foco e franja, "não se pode falar em representações dos sentimentos, porque a noção de representação está ligada com sucessivas revivescências focais" (p.224). Não sendo os sentimentos representáveis, "não se prestam também a uma definição conceitual" (p.232). O mesmo ocorre com a essência psicológica da emoção que "é tanto indefinível e irrepresentável como a consciência do prazer e desprazer" (p.259). De volta aos problemas de psicologia individual Avançando um pouco além do parágrafo em que Radecki anuncia o discriminacionismo afetivo, na qualidade de seu sistema, fica claro que a esperada classificação dos caracteres não será encontrada no Resumo: não proponho nenhum um quadro de classificação dos caracteres porque uma tal proposta sobrepujaria a tarefa de um simples esboço dos problemas da psicologia individual, entrando na resolução desses problemas e me obrigaria também a discutir dezenas de classificações propostas por outros autores. Limiteime, portanto, a indicar os caminhos metódicos de resolução do problema sem impor para isso formas rígidas (Radecki, 1928-29, p.369). Não há nada de errado no fato de um autor limitar-se a indicar caminhos metodológicos para a resolução de um problema ou de deixar de propor um quadro com vistas a uma caracterologia, ainda mais em se tratando de um Resumo. É, além do mais, uma posição adequada para um teórico que afirmava: a psicologia individual, na época atual, não possui ainda qualquer sistema completo totalmente elaborado: ela está em franco período de contribuições parciais, recolhidas em milhares de trabalhos por centenas de pesquisadores. Entretanto, a criação de um sistema firme que possa ser universalmente aceito impõe-se. Sem incluir um tal sistema na metodologia dos estudos psicológicos, nunca poderão ser suficientemente explorados os dados da psicologia geral na ação prática (Radecki, 1928-29, p.373). Para que o leitor tenha uma idéia da visão de Radecki quanto às possibilidades da edificação de uma psicologia unificada como ciência e profissão, passarei a ele a palavra, até mesmo para que se torne melhor conhecido: a conciliação e o entendimento da psicologia com várias disciplinas de aplicação, como psiquiatria, psicotécnica, educação etc., poderão ser atingidos única e exclusivamente através da psicologia individual. A separação da psiquiatria, os freqüentes insucessos da psicotécnica, as dúvidas na metodologia da educação, só poderão ser evitados quando tentarmos colocar essas disciplinas na base psicológica, tanto da psicologia geral, como individual. Infelizmente, a onda do "prático" que invadiu o mundo fez com que, desprezando a ordem metodológica das aplicações, Memorandum, 5, out/2003 Belo Horizonte: UFMG; Ribeirão Preto: USP. http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/cenofanti01.htm Centofanti, R. (2003). O discrininacionismo afetivo de Radecki. Memorandum, 5, 94-104. Retirado em / / , do World Wide Web: http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/centofanti01.htm. 99 queiram saltar da pura teoria para a direta aplicação, omitindo os necessários intermediários científicos. Por causa disso, sente-se cada vez mais a necessidade de preencher as lacunas criadas pela aplicação apressada, e este preenchimento realizar-se-á pela elaboração sistemática dos dados da psicologia individual (Radecki, 1928-29, p. 373-374). O que pode haver de mais atual neste momento em que teoria e prática parecem cada vez mais distanciadas? A questão que permanece é a seguinte: se o discriminacionismo afetivo era apenas uma indicação de caminho metodológico para investigação e aplicação da psicologia individual, com vistas a criação de uma caracterologia, por que se tornou polêmico? O retorno ao mito do discriminacionismo afetivo Ao analisar os trabalhos dos colaboradores de Radecki, Penna (1992) faz referência à Psicologia da Vida Afetiva de Nilton Campos, até mesmo por esse livro apresentar-se como um ensaio crítico e analítico baseado no sistema do discriminacionismo afetivo de Radecki. Assinala Penna (1992) que, "todavia, nele, efetivamente, não se encontra uma exposição do que seria o discriminacionismo afetivo como sistema psicológico [e que espanta] o fato de que em nossa convivência durante dezoito anos com Nilton Campos jamais dele ouvimos qualquer comentário acerca desse sistema que, não obstante, lhe deveria ser conhecido" (p.17). Imagina, inclusive, que o conhecido rompimento de Nilton Campos com Radecki possa ter ocorrido por conta do discriminacionismo afetivo. Ao analisar o trabalho de Antonio de Bulhões Pedreira, outro colaborador de Radecki, chama a atenção de Penna (1992) o fato dele declarar sua fundamentação no discriminacionismo afetivo, embora o autor não adiante "nenhuma informação capaz de nos esclarecer quanto ao seu conteúdo conceitual" (p.45). Nos diversos artigos dos membros da "escola" de Radecki a que tive acesso, nada encontrei que lembrasse a indicação metodológica denominada discriminacionismo afetivo, inclusive porque os trabalhos não estão orientados para uma caracterologia. Mesmo Jayme Grabois, assistente de Radecki com quem mantive vários encontros, nunca se mostrou muito à vontade quando perguntado sobre o discriminacionismo afetivo, limitando-se a afirmar que não aceitava o sistema desde que ingressou no laboratório. Setores da igreja católica, que em 1932 insurgiram-se contra a proposta de Radecki criar um Instituto de Psicologia, usaram o discriminacionismo afetivo como sinônimo de psicologia materialista etc. Lourenço Filho, embora reconhecesse os méritos de Radecki, dizia fazê-lo apesar da insistência com que o mestre polonês repisava os princípios do discriminacionismo afetivo, embora não julgasse a "doutrina" isenta de méritos. Independentemente das motivações dessas pessoas, fica claro que Radecki empregava, em suas atividades cotidianas, o conceito de discriminacionismo afetivo muito além dos limites que encontramos no Resumo. Certamente fazia propaganda do conceito e parece não ter dúvida na suspeita levantada por Jacó-Vilela (2000), de que havia um autoritarismo de Radecki traduzido "na obrigação de seus colaboradores inscreverem" (p.46) o discriminacionismo em seus trabalhos. Resta a hipótese de que havia uma outra dimensão do discriminacionismo afetivo, sobre a qual até mesmo os ex-assistentes silenciaram. Vamos acompanhar Radecki na Argentina e Uruguai - países em que passou a residir e atuar depois que deixou o Brasil em 1932 - em busca de algumas respostas. O discriminacionismo afetivo no Prata Há novidades no Prata. O Resumo de Radecki, traduzido para o castelhano e intitulado de Tratado de Psicologia (resumido), recebeu um Anexo denominado Posición de la psicologia en el sistema de las ciencias (Posição da psicologia no sistema das ciências), Memorandum, 5, out/2003 Belo Horizonte: UFMG; Ribeirão Preto: USP. http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/cenofanti01.htm Centofanti, R. (2003). O discrininacionismo afetivo de Radecki. Memorandum, 5, 94-104. Retirado em / / , do World Wide Web: http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/centofanti01.htm. 100 inexistente na versão brasileira. No Anexo, com a erudição e esmerada lógica de costume, Radecki trata de assuntos relativos aos critérios de cientificidade, classificação das ciências, posição da psicologia em relação às demais ciências etc. No trato desses assuntos, o discriminacionismo afetivo entrará novamente em cena, agora com um novo vulto. É um sistema de psicologia geral. uma tentativa de organização sistemática de tudo que até agora foi colecionado como caudal fenomênico da psicologia, tentativa nascida no interior de pesquisas consecutivas de fenômenos psíquicos os mais variados, tentativa na qual o autor não ocultou nada de positivo das doutrinas e estudos monográficos até hoje existentes (Radecki, 1933, p.376). Isso começa a fazer sentido. Como Radecki está tratando, agora, de aspectos de classificação das ciências e da posição da psicologia em relação às demais, o conceito original de discriminacionismo afetivo, até então apresentado como um método a ser empregado no campo da psicologia individual, avançou para um território mais amplo - o da psicologia geral. Faz também sentido a configuração de sua psicologia geral na arquitetura do Resumo - psicologia da vida intelectual, psicologia da vida afetiva e psicologia da vida ativa - cada qual dividida em funções ou processos psíquicos inerentes a cada uma dessas "vidas", contendo os conceitos dos mais diversos teóricos relativos a cada função, finalizando, sempre, com a posição de Radecki sobre cada um deles. O discriminacionismo afetivo é a proposta de organizar em um único sistema, tudo que fora produzido até então na psicologia, aproveitando os pontos passíveis de articulação das teorias, visando a concretização do ideal de uma psicologia unificada. No campo da psicologia individual, conforme apresentado no Brasil, o discriminacionismo afetivo é a forma de evitar que a classificação caracterológica fique por conta dos desentendimentos arbitrários dos diferentes autores. Agora, no campo da psicologia geral, o discriminacionismo afetivo é a forma de evitar que as doutrinas psicológicas, pela fragmentação, impeçam a constituição de uma unicidade científica. O discriminacionismo afetivo é o sistema que "tenta" viabilizar a unicidade. Será isso? Vejamos! A psicologia geral dos anos 30 do século passado representava, de acordo com Radecki, "uma variabilidade profunda". Essa variabilidade fazia com que os psicólogos não adotassem um sistema geral e apreciassem o quadro dessa ciência "como um conjunto de pequenas correntes (...) que não se fundiram, todavia, em um leito comum" (1933, p.375). Uma constatação que se mostra verdadeira até hoje - "a psicologia não cultiva nenhum um sistema universalmente aceito e consagrado", sendo esse o motivo pelo qual "a evolução interna da psicologia difere muito da evolução de outras ciências, como por exemplo, a química" (p.375). Enquanto nas demais ciências os estudos particulares ou trabalhos monográficos as completam, na psicologia ocorre o fenômeno oposto: cada trabalho particular ou monográfico provoca interpretações doutrinárias muito adiantadas, que se apresentam como pretensões de chave sistematizadora para o restante caudal da ciência (Radecki, 1933, p.375). Vamos acompanhar Radecki analisando as "doutrinas" de seu tempo, pelas suas próprias palavras: o behaviorismo de Watson e outros autores americanos, o formismo proposto por Köhler, Koffka e Wertheimer, o eidetismo estudado por Jaensch e seus adeptos, a psicanálise de Freud e seus numerosos Memorandum, 5, out/2003 Belo Horizonte: UFMG; Ribeirão Preto: USP. http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/cenofanti01.htm Centofanti, R. (2003). O discrininacionismo afetivo de Radecki. Memorandum, 5, 94-104. Retirado em / / , do World Wide Web: http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/centofanti01.htm. 101 partidários ortodoxos ou rebeldes, todas essas correntes - que na realidade não são mais que doutrinas, nascidas no fundo da observação parcial ou das restrições metodológicas - aspiram impor à totalidade da ciência, "novos" pontos de vista gerais, declarando sempre que a verdade de suas doutrinas deve fazer uma "revolução" completa em toda a psicologia, subordinando tudo o que não estudam ao que conhecem e, arbitrariamente, elevam ao primeiro plano da importância científica (Radecki, 1933, p.375). Não poupa também os tratados de psicologia de autoria coletiva de sua época que, pretendendo manter uma "certa imparcialidade", transformam-se numa "pura coleção de trabalhos sobre vários domínios da vida psíquica, sem nexo interno e até com contradições e confusões metodológicas", simplesmente por falta de uma "sistematização interna". Quando são tratados de psicologia produzidos por um único autor, "enfocam reduzido número de problemas, deixando em silêncio os domínios funcionais que o autor não selecionou como objeto de sua preocupação", o que faz com que tais trabalhos se transformem "em exposição direta do partidarismo ou do doutrinarismo do autor". (p.375). As "relações primordiais" da psicologia com as demais ciências, pelo prisma do discriminacionismo afetivo, nasceram no terreno do objeto e do método. Sendo o "fenômeno psíquico" o objeto da psicologia, pertencendo portanto ao grupo dos "fenômenos vitais" (de onde psicologia da "vida" intelectual, afetiva e ativa), "coloca esta ciência no conjunto das disciplinas biológicas, subordinadas diretamente à biologia geral" (p.376). No terreno do método, o emprego do empirismo e do racionalismo, enquanto abordagens de trabalho, fez com que "em certos pontos, a psicologia não emancipasse suficientemente seus estudos da influência da filosofia e das ciências formais: da lógica e da matemática" (p.379). Essa influência exigia cuidados pois um sistema verdadeiramente psicológico, isto é, baseado nas premissas sistemáticas de origem exclusivamente psicológica, ainda que interpretando os dados psíquicos através de certas categorias filosóficas, lógicas ou matemáticas, nunca irá subordinar seu objeto de estudo a essas ciências; nunca colocará a psicologia na posição de ser parte da filosofia, lógica ou matemática (Radecki, 1933, p.379). A vida psíquica, diz Radecki, "não pode e não deve ser reduzida a expressões de uma forma lógica ou filosófica" (p.379), pois tinha uma evolução mais rica do que as ciências formais poderiam conceber. Para evitar a confusão metodológica do logicismo e do psicologismo, o discriminacionismo afetivo, enquanto sistema psicológico, procura orientar, uma rigorosa distinção, cuidando de não introduzir contradições nas interpretações parciais dos vários domínios psíquicos, não satisfazendo-se em evitar contradições lógicas, mas cuidando, sobretudo, da compatibilidade fenomenológica de suas interpretações parciais. A harmonia lógica que disso resulta, não é um fim colimado art pour art, mas o resultado de uma severa seleção dos métodos interpretativos, puramente psicológicos (Radecki, 1933, p.380). Nos métodos interpretativos ou analíticos, diz Radecki, a psicologia segue "muitos caminhos traçados pela química e pela física" (p.383). Como na física, a psicologia Memorandum, 5, out/2003 Belo Horizonte: UFMG; Ribeirão Preto: USP. http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/cenofanti01.htm Centofanti, R. (2003). O discrininacionismo afetivo de Radecki. Memorandum, 5, 94-104. Retirado em / / , do World Wide Web: http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/centofanti01.htm. 102 avançou da estática para o dinamismo, enquanto atributo dos fenômenos psíquicos vitais: inicialmente em sua parte afetiva (Freudismo), estendendo-se gradualmente à interpretação dos processos intelectuais (parcialmente o formismo e totalmente o discriminacionismo afetivo). A vida psíquica é hoje concebida mais como um caso específico dos fenômenos energéticos (embora concebidos metodologicamente como intransformáveis em outras formas de energia), do que como um determinado conteúdo imaterial estático (Radecki, 1933, p. 383). A metodologia da química influenciou a psicologia "sobretudo na busca do simples, do indivisível, do átomo". Segundo Radecki, se o sensualismo e o associacionismo combateram com razão o atomismo psicológico, não ofereceram todavia "o substituto do átomo objetivo, que surgiu impropriamente na psicologia, como natural expressão da investigação analítica do simples" (p.384). Nesse sentido, o discriminacionismo afetivo, evitando o atomismo, teve o intento de resolver o problema com a introdução da unidade subjetiva dinâmica que, na interpretação da vida intelectual, facilita a análise dos fenômenos complexos, sem introduzir o caráter da objetividade, impróprio dos fenômenos psíquicos (Radecki, 1933, p.384). As análises de Radecki prosseguem mas, para meus propósitos, creio que já temos elementos para concluir a análise que aqui nos propomos. Desmitificando o discriminacionismo afetivo Como vimos, o discriminacionismo afetivo foi uma proposta bem desenvolvida e, de fato, compreensível. Não posso assegurar que tenha encontrado seus elementos primordiais e, para dizer como Radecki, realizado as correlações devidas - mas o que encontrei parece suficiente para afirmar que esse sistema existiu e tem compreensibilidade. O que parece claro é que essa concepção de Radecki não surgiu de uma hora para outra, depois que deixou o Brasil em 1932. Permeia o Resumo do início ao fim, o que permite imaginar que Radecki tinha ao menos um esboço dessa idéia enquanto produzia os textos, ou que foi perceber essa possibilidade quando se dedicou a tratar da temática da psicologia individual. Radecki escreveu em 1932, portanto ainda no Brasil, um artigo intitulado O discriminacionismo afetivo, a ser apresentado no Congresso Internacional de Psicologia que teria lugar em Copenhague [infelizmente, nunca tive acesso a esse texto]. Assim sendo, não há como pensar que o sistema fosse desconhecido de seus assistentes e de uma parcela significativa de figuras expressivas da psicologia brasileira de seu tempo. Não contendo absurdos lógicos, fica difícil entender os motivos pelos quais, ainda que apenas para expressar discordâncias, o discriminacionismo afetivo não tenha sido, naquele tempo, motivo de discussões de natureza tipicamente intelectual. Que Radecki não realizou o discriminacionismo afetivo, ainda que na condição de uma tentativa de organização sistemática, parece não restar dúvida. A ordenação de dados e teorias que pretendia unificar não foi efetivada. O elenco de pressupostos, definições e métodos de seu sistema, ainda que explicitados, ficaram devendo uma finalização, principalmente quando resolveu ampliar a extensão do discriminacionismo para um universo mais amplo. Prova disso foi o esforço aqui demonstrado para localizar o conceito dentro de publicações, bem como a temerária aventura de deduzir seu alcance a partir de situações nem sempre muito definidas. Creio que, apenas pela leitura de trechos transcritos de Memorandum, 5, out/2003 Belo Horizonte: UFMG; Ribeirão Preto: USP. http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/cenofanti01.htm Centofanti, R. (2003). O discrininacionismo afetivo de Radecki. Memorandum, 5, 94-104. Retirado em / / , do World Wide Web: http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/centofanti01.htm. 103 Radecki, deve ter o leitor percebido que a ele não faltavam condições para teorizar e escrever. Fica a impressão que, na análise da relação da psicologia com as demais ciências, o termo discriminacionismo afetivo extrapolou os limites de ser um método com vistas a uma psicologia do caráter, embora a idéia central de criar uma unicidade teórica, metodológica e prática para a psicologia, estivesse presente na publicação brasileira. Como a história da psicologia, diferentemente da própria ciência psicológica, tem a propriedade de ser acumulativa, pretende-se que este artigo sirva como abertura para que outro pesquisador, mais capacitado para lidar com teorias, sistemas, metasistemas etc., encontre na obra de Radecki um novo significado. Talvez o discriminacionismo afetivo tenha uma importância que até agora nenhum de nós foi capaz de descobrir. Talvez! Independentemente dessa possibilidade, eu, que tenho Radecki e a experiência do Laboratório de Psicologia da Colônia de Psicopatas em Engenho de Dentro muito bem definidos no meu campo focal afetivo, continuo com a avaliação que tinha há 21 anos: Um homem intelectualmente bem formado, culto e inteligente, por motivos ainda desconhecidos, atravessa o Atlântico em companhia de sua mulher (Halina Radecka), buscando edificar uma nova vida. Chega a um país ao sul da América do Sul, nos anos 20 do século passado, onde a psicologia é ainda algo de novo que acontece na "metrópole". Às custas de seu esforço pessoal, tendo por retaguarda um respeitável currículo, vai conquistando seus espaços na condição de professor, diretor de laboratório de psicologia experimental, chefe de equipe, palestrante, pesquisador e autor. Um estrangeiro, com hábitos extravagantes, insistindo que a formação teórica e metodológica deveria preceder à aplicação prática da psicologia diante de um público que ansiava em aplicar; empreendedor o bastante para tentar criar um Instituto de Psicologia quando psicologia era somente disciplina de Escola Normal; e que ainda dizia ser autor de um sistema psicológico próprio, certamente encontraria problemas. Disputas geradas por interesses e vaidade não é invenção recente. Como nunca ouvi ou li qualquer crítica a Radecki, que não fosse em torno do discriminacionismo afetivo, sou levado a crer que a insistente propaganda de tal sistema foi a razão maior de suas dificuldades. Não duvido que "...a criação de um sistema firme que possa ser universalmente aceito impõe-se" (Radecki, 1928-29, p.373), a que já nos referimos em outro contexto, tivesse, no Brasil, a pretensão de ter o discriminacionismo afetivo como sinônimo. Se é verdade que as teorias não são verdadeiras e nem falsas, mas férteis ou estéreis, o discriminacionismo afetivo mostrou-se estéril, não sendo capaz nem mesmo de convencer aos assistentes de Radecki, ficando no esquecimento. Seus principais assistentes escolheram outros caminhos: Nilton Campos o da fenomenologia e Jayme Grabois o da psicanálise. Isso não tira os méritos de Radecki. Ainda considero, vinte e um anos depois da publicação de meu primeiro trabalho a seu respeito, que Radecki foi, em sua época, uma das figuras mais expressivas da história da psicologia neste país. De qualquer forma, como um sistema unificado de psicologia continua por se fazer, Radecki nos deixou também este legado - o discriminacionismo afetivo como um indicativo dessa possibilidade. Referências bibliográficas Centofanti, R. (1982). Radecki e a psicologia no Brasil. Psicologia: Ciência e Profissão, 3 (1), 2-50. Jacó-Vilela, A.M. (2000). Psicólogos estrangeiros no Brasil. Cadernos IPUB, VI (18), 7-52. Penna, A.G. (1992). História da psicologia no Rio de Janeiro. Rio de Janeiro: Imago. Radecki, W. (1928-29). Resumo do curso de psicologia. Rio de Janeiro: Imprensa Militar. Memorandum, 5, out/2003 Belo Horizonte: UFMG; Ribeirão Preto: USP. http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/cenofanti01.htm Centofanti, R. (2003). O discrininacionismo afetivo de Radecki. Memorandum, 5, 94-104. Retirado em / / , do World Wide Web: http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/centofanti01.htm. 104 Radecki, W. (1933). Tratado de psicología (resumido). Buenos Aires: Casa Editora Jocobo Peuser. Nota (1) Este mesmo texto é encontrado em Trabalhos de Psychologia, Laboratório de Psychologia na Colônia de Psychopatas em Engenho de Dentro, Rio de Janeiro: vol. II de 1929, p. 51-73, que foi extraído dos Annaes da Colônia de Psychopatas, Rio de Janeiro: vol. II de 1929. Nota sobre o autor Rogério Centofanti é bacharel em psicologia e consultor da Escola de Administração de Empresas de São Paulo - FGV. E-mail: [email protected]. Data de recebimento: 24/08/2003 Data de aceite: 01/10/2003 Memorandum, 5, out/2003 Belo Horizonte: UFMG; Ribeirão Preto: USP. http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/cenofanti01.htm Garcia, A. (2003). The psychological literature in Konrad Lorenz's work: a contribution to the history of ethology and psychology. Memorandum, 5, 105-133. Retirado em / / , do World Wide Web: http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/garcia01.htm. 105 The psychological literature in Konrad Lorenz's work: a contribution to the history of ethology and psychology Agnaldo Garcia Universidade Federal do Espírito Santo Brasil Abstract This paper aims at investigating the presence of psychological literature in Konrad Lorenz's work as a preliminary instrument to investigate how Lorenz's ideas are related to Psychology. The bibliography of fourteen books written by Konrad Lorenz (including three volumes containing 26 selected papers) have been analyzed. A total of 245 references related to Psychology and related sciences have been selected. These references were organized in five groups: a) The pioneers of Ethology; b) Animal and Comparative Psychology; c) General Psychology (Associationism, Structuralism, Functionalism, Russian Reflexology and Classic Conditioning, Perceptual and Gestalt Psychology, Psychoanalysis, Behaviorism, Social and Developmental Psychology, Cognition, Emotion and Motivation); d) Epistemology; e) Psychiatry and Neurosciences. These data show that the History of Ethology and, particularly, Lorenz's ideas, show an extremely important relation with Psychology, justifying the inclusion of Konrad Lorenz also in the History of Psychology. Keywords: Konrad Lorenz; ethology; history of ethology. I. INTRODUCTION Konrad Zacharias Lorenz (1903-1989), Nobel Prize for Physiology or Medicine (1973), may be considered one of the most important authors in the History of Ethology. Although the use of the term Ethology replacing Comparative or Animal Psychology has become usual, Lorenz preferred the expression Vergleichende Verhaltensforschung to name his approach (Comparative Behavioural Research). The use of Ethology as a synonym for Biology of Behaviour has, in a certain way, given the impression that Ethology had been separated from Psychology. This paper aims at investigating the presence of psychological literature in Konrad Lorenz's work as a preliminary instrument to investigate how Lorenz's ideas are related to Psychology. This literature is organized and classified and some points are discussed regarding the inclusion of Konrad Lorenz as a relevant author in the History of Psychology. II. METHODOLOGY The bibliography of fourteen books written by Konrad Lorenz (Lorenz, 1949, 1950, 1963, 1965, 1970, 1971, 1973a, 1973b, 1978a, 1978b, 1978c, 1983, 1988, 1992), including three volumes containing 26 selected papers (Lorenz, 1970, 1971, 1978b), and covering the period from 1931 to 1988, have been analyzed. A total of 245 references related to Psychology and related sciences have been selected. The bibliography has been analyzed and the references relevant for Psychology have been classified in five items: a) The Pioneers of Ethology; b) Animal and Comparative Psychology; c) General Psychology; d) Epistemology; and e) Psychiatry and Neurosciences. Each one of these five areas are briefly discussed below. Complementary data on the History of Psychology have been based on Garrett (1974), Heidbreder (1978), Herrnstein & Boring (1971), Marx & Hillix (1978), Mueller (1968), Penna (1978) and Schultz & Schultz (2002), especially concerning the position of the cited authors in the History of Psychology, their theoretical Memorandum, 5, out/2003 Belo Horizonte: UFMG; Ribeirão Preto: USP. http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/garcia01.htm Garcia, A. (2003). The psychological literature in Konrad Lorenz's work: a contribution to the history of ethology and psychology. Memorandum, 5, 105-133. Retirado em / / , do World Wide Web: http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/garcia01.htm. 106 affiliation and biographical data, when available. The notes at the end of the paper give the data available on the references found in Lorenz's writings. I I I . RESULTS AND DISCUSSION 1. THE PIONEERS OF ETHOLOGY Lorenz considered that Ethology had been created mainly by Whitman and Heinroth, although other authors such as Craig and Huxley are also mentioned. Two works published by Charles Ottis Whitman (1842-1910) are cited by Lorenz. The paper Animal Behavior - 16th lecture from Biological Lectures from the Marine Biological Laboratory of Woods Hole, Massachusets (Whitman, 1898, cited by Lorenz, 1970, 1971, 1973b, 1978a, 1978b, 1992)(1) is considered an important work in the foundation of Ethology due to the fact that Whitman used behavioural data with systematic aims. Whitman investigated the bahaviour of pigeons (Whitman, 1919, cited by Lorenz, 1963, 1978a, 1992)(2). Wallace Craig (1876-1954), a disciple of Charles Whitman, also interested in bird behaviour, has also influenced Lorenz. Lorenz cites several works by Craig on the behaviour of doves. His work Appetites and aversions as constitutens of instincts (1918, cited by Lorenz, 1963, 1965, 1970, 1971, 1973b, 1978a, 1978b, 1992)(3) is mentioned in eight of the books reviewed. Among the cited works, Craig wrote about animal learning (Craig, 1912, cited by Lorenz, 1970, 1992) (4), the development and social behaviour of doves (Craig, 1908, cited by Lorenz, 1970 and Craig, 1914, cited by Lorenz, 1970) (5)(6), aggressive behaviour in animals (Craig, 1921, cited by Lorenz, 1970)(7) and the expression of emotions in animals (Craig, 1909, cited by Lorenz, 1970, 1992, and Craig, 1921/1922, cited by Lorenz, 1970, 1992) (8)(9). Craig published in journals of Biology, Ethics, Sociology, Animal Behaviour, Comparative Neurology and Psycholgy, Abnormal and Social Psychology. Craig's discovery of appetitive behaviour is considered one of the most important theoretical contributions in the advance of Ethology. Oskar Heinroth (1871-1945) was considered by Lorenz the founder of Ethology. Three works by Heinroth are mentioned in the material analyzed: about behavioural patterns in vertebrates (Heinroth, 1930, cited by Lorenz, 1973b, 1978a)(10), about reflexive movements in birds (Heinroth, 1918, cited by Lorenz, 1970, 1973b)(11) and, the one cited most frequently (in ten books) is a text presented at the Fifth International Congress of Ornithology (Heinroth, 1910, cited by Lorenz, 1963, 1965, 1970, 1971, 1973a, 1973b, 1978a, 1978b, 1983, 1992)(12). This is a remarkable paper about "Ethology and Psychology" of Anatids. Julien Huxley, also considered to be an important influence in the shaping of Ethology, related field studies and psychology (Huxley and Howard, 1934, cited by Lorenz, 1970)(13). What may be concluded from these authors cited and considered as pioneers of Ethology is that although Whitman, Craig and Heinroth were ornithologists, they were close to the area of Animal Psychology. 2. ANIMAL OR COMPARATIVE PSYCHOLOGY The classic area of Animal Psychology has a fundamental influence on Lorenz's work. Several authors are mentioned including English, German, Austrian, American and others. 2.1 Charles Darwin and other English Authors There is a strong influence of evolutionary thinkers on Lorenz's work, including Charles Darwin (1809-1882). Although Lorenz adopted evolutionary approach, the only book written by Darwin and mentioned in his work is The Expression of Emotions in Man and Animals (1872, cited by Lorenz, 1963, 1971, 1973b, 1978a, 1978b, 1983, 1992)(14), which appears in the bibliography of seven books. It should be noted, for instance, that in the Russian Manuscript (Lorenz, 1992), Darwin is mentioned only a few times while Kant, for instance, is mentioned more than 80 times. Another classic of evolutionary thinking mentioned is Herbert Spencer (1820-1903) (Principles of Psychology, 1855Memorandum, 5, out/2003 Belo Horizonte: UFMG; Ribeirão Preto: USP. http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/garcia01.htm Garcia, A. (2003). The psychological literature in Konrad Lorenz's work: a contribution to the history of ethology and psychology. Memorandum, 5, 105-133. Retirado em / / , do World Wide Web: http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/garcia01.htm. 107 1872, cited by Lorenz, 1992)(15). Another English animal psychologist who is present in Lorenz's work is Charles Lloyd Morgan (1852-1936) in a book relating instinct and totality (Lloyd Morgan, 1909, cited by Lorenz, 1992)(16) and another relating instinct and experience (Lloyd Morgan, 1913, cited by Lorenz, 1970, 1992)(17). William MacDougall (1871-1938) is the most important British proximate influence on Lorenz's work. The psychologist MacDougall worked at Oxford for several years and then moved to the USA, where he was a fierce opponent of Watson. Three of his books are mentioned: An Outline of Psychology (1923, cited by Lorenz, 1970, 1971, 1978a, 1978b, 1983, 1992)(18), An introduction to social psychology (1923, cited by Lorenz, 1970)(19) and The use and abuse of instinct in social psychology (1921-1922, cited by Lorenz, 1970)(20). Hinde's book Animal Behavior, a Synthesis of Ethology and Comparative Psychology (1972, cited by Lorenz, 1973b)(2 1 ) may also be mentioned as an effort to relate Ethology and Comparative Psychology, although Lorenz had some reserves about the synthesis. Although the idea of evolution is a central issue in Lorenz's writings, the influence of Darwin should be regarded in a general theoretical level, as the proponent of evolution. He has written several articles to defend the idea of evolution, claiming that the 'theory of evolution" should not be considered a 'theory' but a fact, often defending the idea of evolution as an established scientific fact. However, the original idea of behaviour patterns being subject to homology (and so being useful to systematics) are not attributed to Darwin, but to Whitman and Heinroth. Although Darwin has received an increasing attention in the last decades from English and American psychologists, he may not be considered the direct founder of Ethology, according to Lorenz. It is interesting to note that in the 25th anniversary of the Nobel Prize for Ethology, the organizers of the event (in Canada) chose the image of Darwin and not of Lorenz, Tinbergen and Von Frisch to celebrate the event. Herbert Spencer, MacDougall and Lloyd Morgan are criticized as ‘vitalistic philosophers'. This does not prevent Lorenz from agreeing with these authors in some points. For instance, he agrees with MacDougal that the healthy animal is up and doing. He also declared that MacDougall made a number of entirely correct points. The opposition between Lorenz and Hinde is known. The title of the copy of the above mentioned book by Hinde, in Lorenz's private library, was changed to read "Animal Behaviour, a Castration of Ethology in Order to Save Comparative Psychology", what represents the feelings of Lorenz regarding the work of Hinde. 2.2 Traditional Animal Psychology and the Concept of Instinct Traditional papers on Animal Psychology are present in Lorenz's work. These include from old papers on the "Psychology" of ants by Brun (1912, cited by Lorenz, 1973b)(22) and the investigation of the biologische, tierpsychologische und reflexbiologische aspects of the behaviour of ants by Doflein (1916, cited by Lorenz, 1970)(23). There is also an experimental psychological analysis of hens published by Katz in the Journal für Psychologie (1909, cited by Lorenz, 1970)(24) and again about hunger and appetite, Katz (1931, cited by Lorenz, 1970)(25),and some general books on Animal Behaviour: Russell (1934, cited by Lorenz, 1970, 1992)(26), and Buytendijk (1940, cited by Lorenz, 1971, 1978a, 1992)(27). Three works by D. O. Hebb (1904-1985) are mentioned: The Organization of Behaviour (1940, cited by Lorenz, 1978a, 1978b)(28), Heredity and environment in mammalian behaviour (Hebb, 1953, cited by Lorenz, 1965, 1971, 1978a, 1978b)(29), and A Textbook of Psychology (1958, cited by Lorenz, 1978a)(30). Several traditional animal psychologists are mentioned concerning their conceptions of instinct. Among these, Lorenz cites Herrick (n.d., cited by Lorenz, 1970, 1992)(31) and the image that he had proposed of the key and lock to give an idea of innate releasing mechanism and the fixed action pattern. The problem of animal instinct is also discussed by Bierens de Haan, 1933 (cited by Lorenz, 1970) (32), 1935 (cited by Lorenz, 1970) (33) and 1940 (cited by Lorenz, 1971, 1978a, 1978b, 1992) (34), Ziegler (1920, cited by Lorenz, 1971)(35), and Fletcher (1957, cited by Lorenz, 1970)(36). William Thorpe discussed learning and instinctive behavior in animals (1948, cited by Lorenz, 1971)(3 7 ), the Memorandum, 5, out/2003 Belo Horizonte: UFMG; Ribeirão Preto: USP. http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/garcia01.htm Garcia, A. (2003). The psychological literature in Konrad Lorenz's work: a contribution to the history of ethology and psychology. Memorandum, 5, 105-133. Retirado em / / , do World Wide Web: http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/garcia01.htm. 108 modern concept of instinctive behaviour (1956, cited by Lorenz, 1963, 1965, 1971)(38) and science, man and morals (1965, cited by Lorenz, 1978b)(39). Lorenz's criticism on traditional Animal Psychology refers to the problem of teleology and the lack of an evolutionary approach. These authors, usually, are related somehow to the problem of innate and learned aspects of behaviour. Lorenz used to identify two trends in traditional Animal Psychology: Vitalism and Mechanism. Although he may not be identified with any of these schools, he accepted and adopted ideas present in both of them. Authors, such as Bierens de Haan (and also Russell), have been considered vitalists (a kind of supernatural interpretation of instinct). This author, for instance, has been critized by Lorenz for having proposed that we meditate on instinct, but we do not explain it. He also criticizes Buytendijk for having questioned the dependence of the human psyche upon biological laws, in particular those of heredity. Sometimes, he replies to criticism directed against ethological ideas (the concept of innate), as the case of Hebb. In other cases, he accepts some ideas of a cited author, as the case of Thorpe's ideas about habituation as a form of modification of behaviour. In other cases, a particular point is mentioned as a support of his ideas, as the case of Brun, who, according to Lorenz had demonstrated in ants that each individual fixates its social response on the particular species of ant which helped in hatch from the pupa or Katz, whose studies about domestic chickens have demonstrated that a bird can individually recognize a fair number of conspecifics. 2.3 Animal Sociology, Animal Social Psychology and Phenomenology Animal Sociology and Animal Social Psychology are expressions used by some authors cited by Lorenz. Lorenz mentions the works of Schjelderup-Ebbe on the social psychology of the domestic hen (1922/1923, cited by Lorenz, 1970, 1992)(40) and the social psychology of birds (1924, cited by Lorenz, 1970)(4 1 ). Both these papers were published in the Zeitschrifit für Psychologie. The expression Animal Sociology was used by Alverdes (1925, cited by Lorenz, 1970, 1992)(42) and Brückner (1933, cited by Lorenz, 1970)(43), in a paper also published in the Zeitschrift für Psychologie. Jakob von Uexküll, considered by Lorenz as one of his "masters", was a representative of Phenomenology. He cites three works written by von Uexküll on animal and human behaviour: Umwelt und Innenleben der Tiere (Uexküll, 1909, cited by Lorenz, 1970, 1971, 1973b, 1978a, 1978b, 1983, 1992)(44), cited in seven books; Theoretische Biologie (Uexküll, 1920, cited by Lorenz, 1970, 1992)(45); and Streifzüge durch die Umwelten von Tieren und Menschen (Uexküll, 1934, cited by Lorenz, 1970)(46). The idea of Animal Sociology or Animal Social Psychology in these authors (including Lorenz) is influenced by the classic considerations of whole and part in the behaviour, classic ideas of Gestalt Psychology. In this way, Lorenz, as a researcher of animal social behaviour using these ideas, should be included also in the history of Social Psychology, sharing some points of view with Kurt Lewin. The presence of authors related to Phenomenology among the influences Lorenz received is an indication that Lorenz's intention has never been to deny subjective experience or subjective phenomena. 2.4 Ethology and Psychology of Animals in Zoos and Circuses Lorenz mentions several authors working with animals in zoos and circuses and who used the expression Animal Psychology in their works. The most famous is, problably, Heini Hediger (1908-1992) and his works on the Psychology of animals in zoos and circuses. Hediger wrote about the Biology and Psychology of scape in animals (1934, cited by Lorenz, 1963, 1970, 1978a, 1983)(47), about Biology and Psychology of animals in captivity (1935, cited by Lorenz, 1970)(48) and about wild animals in captiviy (1942, cited by Lorenz, 1983)(49). His most famous work is "Studies of the Psychology and Behaviour of Captive Animals in Zoos and Circuses" (Hediger, 1954, cited by Lorenz, 1978a, 1983 and Hediger, 1955, cited by Lorenz, 1963) (50)(51). Portielje wrote about Ethology and Psychology of Botaurus stellaris and Phalacrocorax carbo subcormoranus Memorandum, 5, out/2003 Belo Horizonte: UFMG; Ribeirão Preto: USP. http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/garcia01.htm Garcia, A. (2003). The psychological literature in Konrad Lorenz's work: a contribution to the history of ethology and psychology. Memorandum, 5, 105-133. Retirado em / / , do World Wide Web: http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/garcia01.htm. 109 (Portielje 1926, cited by Lorenz, 1970; Portielje, 1927, cited by Lorenz, 1970; and Portielje, 1928, cited by Lorenz, 1978a, 1983, 1992) (52) (53) (54). It should not be forgotten that Heinroth, who Lorenz considered the real "father ’ ’ of Ethology, investigated captive animals in the Berlin Zoo. Zeeb (1964, cited by Lorenz, 1973b, 1978a)(55) also wrote about circus and Animal Psychology. Another author who discussed "ethological and psychological" aspects of birds is Makkink (1960, cited by Lorenz, 1970, 1978a, 1978b)(56). It is interesting to note the use of both terms Biology (or Ethology) and Psychology. Heinroth, and even Lorenz, sometimes, used both terms as complementary in the study of their animals. Lorenz has always given credit to people who knew animals from experience, people who had to live with animals every day, to work with them and, so, familiar with them. This was the case of these authors, several of them working as zoo directors. This is the kind of experience that he cannot find in some American psychologists who investigate animal behaviour in laboratory conditions. 2.5 The Behaviour of Lower and Higher Organisms The behaviour or primates is of special interest to Lorenz. Several references are made to comparative psychologists working on primate behaviour, usually American psychologists investigating the behaviour of the chimpanzee and other primates. The authors mentioned include Klüver (1933, cited by Lorenz, 1971, 1978b)(57), on behaviour mechanisms in monkeys, R. M. Yerkes and his book on "Chimpanzees: A Laboratory Colony" (1943, cited by Lorenz, 1963)(58). Several works by H.F. Harlow have been mentioned: Harlow, 1954 (cited by Lorenz, 1971)(59), Harlow, 1960a (cited by Lorenz, 1973b) (60), Harlow, 1960b (cited by Lorenz, 1973b, 1978a, 1983) (61), Harlow,1950 (cited by Lorenz, 1965, 1971, 1973b, 1978a, 1983) (62), Harlow, 1962a (cited by Lorenz, 1978a, 1983) (63), Harlow, 1962b (cited by Lorenz, 1978a, 1983) (64). Harlow's themes are: learning and object discrimination, maternal and infantile affectional patterns, the effect of rearing conditions on behaviour and social deprivation in monkeys. Lorenz also mentions three works of Gardner and Gardner, published in 1967 (cited by Lorenz, 1978a) (65), 1969 (cited by Lorenz, 1978a) (66) and 1971 (cited by Lorenz, 1978a) (67) about language and communication in the chimpanzee. Finally, Lorenz mentions two works by D. Premack (1971, cited by Lorenz, 1978a and Premack, 1976, cited by Lorenz, 1978a) (68)(69) who discussed intelligence and language in man and ape. Hayes (1951, cited by Lorenz, 1978a)(70) investigated the behaviour of apes in home environment and Carpenter (1934, cited by Lorenz, 1963)(71) investigated the behaviour and social relations of howling monkeys. As an ornithologist, the interest of Lorenz in these papers on primate behaviour indicates that these references are relevant for his discussions of the evolution of human psychological aspects, in his Evolutionary Epistemology. On the other side, Lorenz also mentions some classic authors working on the behaviour of lower organisms. This is also an indication that he is interested in the wide possibilities of animal behaviour. These traditional studies are also related to physiological investigation and are, in this way, a bridge between biological and psychological issues. Lorenz mentions three classic authors: a) the American psychologist H.S. Jennings (1868-1947). His book Behaviour of the lower organisms (1906, cited by Lorenz, 1970, 1971, 1973b, 1978a, 1992)(72) was mentioned in five books; b) The German psychologist Jacques Loeb (1859-1924) was important by the work Die Tropismen, published in a handbook of comparative physiology (1913, cited by Lorenz, 1973b, 1992)(73); c) The book Die Orientierung der Tiere im Raum, written by Alfred Kühn (1919, cited by Lorenz, 1965, 1971, 1973b, 1978a, 1978b, 1983, 1992)(74) received seven mentions and discusses the orientation of animals in space. Jennings, for instance, is praised and considered to be the first one to observe and describe animal behaviour as a worthy task, however, he never conducted phylogenetic comparisons between the behaviour patterns of related animal species. Some ideas that became very important in Lorenz's work, such as the ideas of orienting responses and Memorandum, 5, out/2003 Belo Horizonte: UFMG; Ribeirão Preto: USP. http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/garcia01.htm Garcia, A. (2003). The psychological literature in Konrad Lorenz's work: a contribution to the history of ethology and psychology. Memorandum, 5, 105-133. Retirado em / / , do World Wide Web: http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/garcia01.htm. 110 taxes, are taken from Alfred Kühn. The idea of tropism is used by Lorenz although he criticizes the attempts of Loeb to explain all animal and human behaviour in terms of the principle of tropism. 3.GENERAL PSYCHOLOGY It is possible to find several classic authors related to traditional systems in Psychology in Konrad Lorenz's work, such as Associationism (including Russian Reflexology), Perception and Gestalt Psychology, Psychoanalysis, Behaviourism, Social and Developmental Psychology and papers on cognition, emotion and motivation, classic themes in Psychology. 3.1 "Classic Psychology": Associationism, Structuralism and Functionalism It is possible to find references to representatives of Associationism (Edward L. Thorndike, 1874-1949), Structuralism (Wilhelm Wundt, 1832-1920) and Functionalism (John Dewey, 1859-1952) in Lorenz's work. Wundt's book Vorlesungen über die Menschen- und Tierseele (1922, cited by Lorenz, 1978a, 1973b, 1992)(75) was cited in three books. Thorndike's Animal Intelligence (1911, cited by Lorenz, 1965, 1973b, 1978a)(76) is also cited. The references seem to be mainly related to Animal Psychology. Thorndike and Wundt are considered representatives of the mechanistic way of thinking. Lorenz agrees with the pragmatist John Dewey in that the idea that a factor introduced for the purpose of explanation is nothing other than the articulation of the already known fact with a new word, an epistemological point. 3.2 Russian Reflexology and Classic Conditioning Lorenz is quite positive in relation to Ivan P. Pavlov (1849-1936) and classic conditioning. He mentions two books written by Pavlov: a treatise on the higher nervous activities of animals (1926, cited by Lorenz, 1992)(77) and a classic work on conditioned reflexes (1927, cited by Lorenz, 1965, 1971, 1978a, 1978b, 1992)(78). As previously observed, the liaision of Lorenz with some psychological authors seems to be in function of Animal Psychology. Lorenz also mentions a work by W. Bechterev (1857-1927) on human reflexology (1926, cited by Lorenz, 1970)(79). Another Russian reflexologist mentioned is P.K. Anokhin, also in a text on conditioned reflex, discussing a new physiological interpretation (1961, cited by Lorenz, 1978a)(80). Other authors that are mentioned working on conditioned reflexes are H.S. Lidell (1934, 1944) and Hogan and Adler (1963, cited by Lorenz, 1978a)(81). Two of these texts are directly related to comparative psychology of animal behaviour. Lidell (1934, cited by Lorenz, 1978a)(82) writes about conditioned reflexes in a book on Comparative Psychology. Lidell (1944, cited by Lorenz, 1978a)(83) relates conditioned reflex method and experimental neurosis in a book about personality and behaviour disorders. Hogan & Adler (1963) relate classical conditioning and punishment and instinctive response in the fish Betta splendens. An intriguing aspect of Lorenz's writings is his fierce opposition to Behaviourism (dealing with operant conditioning) and his positive reaction to Pavlov's work on classic conditioning. Two points could be discussed: 1) The first is that Lorenz has always been interested in processes of learning (which he prefers to denominate modification of behaviour). His opposition to Watson and Skinner is not because he denies the importance of learning processes in animals and man but for their election of one kind of learning process as the only one to be considered; 2) The second point is that, while Watson and Skinner are not interested in physiological processes, Pavlov was, in reality, a physiologist. Lorenz considers that the discovery of conditioned reflex was an extremely useful tool for the analytical investigatoin of animal and human behaviour. Lorenz also considered that Pavlov never denied the psychological side of the phenomena he studied from a physiological point of view, what he considered a positive aspect. 3.3 Perception and Gestalt Psychology Memorandum, 5, out/2003 Belo Horizonte: UFMG; Ribeirão Preto: USP. http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/garcia01.htm Garcia, A. (2003). The psychological literature in Konrad Lorenz's work: a contribution to the history of ethology and psychology. Memorandum, 5, 105-133. Retirado em / / , do World Wide Web: http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/garcia01.htm. These are, probably, the areas/systems of Psychology that were more influential on Lorenz's thinking. Traditional authors investigating perception such as Ehrenfels and Helmholtz are very important in Lorenz's work. Perception was an essential aspect in the development of Evolutionary Epistemology. Helmholz, assistant of Gustav Fechner (18011887), worked on visual and auditory perception uniting Physics, Physiology and Psychology. Several works by Hermann von Helmholtz (1821-1894) are cited by Lorenz (especially in Lorenz, 1992 and 1978). The first one to be mentioned is the Handbook of Physiological Optics (1856-1867, cited by Lorenz, 1978a, 1992)(84). Writings about perception, Physics, Epistemology (Erkenntnistheorie) are also mentioned: Helmholtz, 1877 (cited by Lorenz, 1978a) (85), Helmholtz, 1878 (cited by Lorenz, 1978a)(86), Helmholtz, 1882-1895 (cited by Lorenz, 1978a)(87), Helmholtz, 1887 (cited by Lorenz, 1978a)(88), Helmholtz, 1897-1898 (cited by Lorenz, 1978a) (89) and Helmholtz, 1921 (cited by Lorenz, 1978a) (90). Lorenz presents several points in common with Helmholtz, as the interest in Epistemology, in perception and in Physics/Physiology. Christian von Ehrenfels (1859-1932), considered one of the pioneers of Gestalt Psychology and known by the proposition of Gestatqualitäten or form qualities is cited in the Russian Manuscript (Ehrenfels, 1904, cited by Lorenz, 1978a, 1992)(91). The idea of totality (ganzheit) and of parts is an important basis for the development of Lorenz's systemic ideas. Wolfgang Köhler (1887-1949) is another case in which Animal Psychology is discussed from the point of view of an important school of Psychology. Lorenz cites the experiments of insight in apes and this will be taken into account in his Evolutionary Epistemology. The references to Köhler are always due to his research on the mentality of apes (Köhler, 1915, cited by Lorenz, 1970, 1992 and Köhler, 1921, cited by Lorenz, 1978a, 1978b, 1983 and Köhler, 1973, cited by Lorenz, 1973b) (92) (93) (94). The Austrian Gestalt Psychologists were very influential on Lorenz's thinking. In this sense, he mentions Charlotte Bühler's work on developmental psychology (1922, cited by Lorenz, 1971)(95) and about the problem of instinct (1927, cited by Lorenz, 1970)(96). The most important psychological influence on Lorenz was certainly the work of Karl Bühler. This author has exerted a direct influence on Lorenz as his teacher. Bühler was an important "bridge" to psychological thinking in Lorenz's career. Lorenz was guided in the field of psychological literature by Bühler, and this author used to invite researchers from other countries to go to Austria. Bühler's experiments of "aha" effects are cited in Lorenz's books. He cites three works by Bühler: Handbuch der Psychologie, I. Teil: Die Struktur der Wahrnemungen (Bühler, 1922, cited by Lorenz, 1971, 1973b, 1978a, 1983, 1992)(97), Die geistige Entwicklung des Kindes (Bühler, 1922, cited by Lorenz, 1965, 1971)(98) and, Zukunft der Psychologie (Bühler, 1936, cited by Lorenz, 1970)(99). Other authors related to the Gestalt movement are mentioned: Metzger (1936, cited by Lorenz, 1992 and Metzger, 1953, cited by Lorenz, 1973b, 1978a, 1983) (100)(101) working on perception and general psychology, Sander (1928, cited by Lorenz, 1971)(102) and Matthaei (1929, cited by Lorenz, 1971, 1978a, 1992)(103). Important issues in Gestalt Psychology (as the concept of totality) were also the object of biological thinkers close to Lorenz, what can be found in the works by Alverdes (Die Ganzheitsbetrachtung in der Biologie, 1932, cited by Lorenz, 1970)(104) and Otto Koehler (Die Ganzheitsbetrachtung in der modernen Biologie, 1933, cited by Lorenz, 1992)(105). The contact between Lorenz and psychological thinking was first mediated by Karl Bühler, a Gestalt Psychologist. Some similarities between Lorenz ideas and the attitudes of Gestalt psychologists are amazing, as the opposition in relation to Behaviourism, the influence of Physics (Lorenz's correspondence with Max Planck), the research in the same areas (as animal intelligence), the ideas os system, the proximity with Physiology and the importance of perception, for instance. The Evolutionary Epistemology proposed by Lorenz is, in a large measure, a development of Gestalt Psychology. 3.4 Psychoanalysis Memorandum, 5, out/2003 Belo Horizonte: UFMG; Ribeirão Preto: USP. http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/garcia01.htm Garcia, A. (2003). The psychological literature in Konrad Lorenz's work: a contribution to the history of ethology and psychology. Memorandum, 5, 105-133. Retirado em / / , do World Wide Web: http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/garcia01.htm. 112 Konrad Lorenz and Sigmund Freud (1856-1939) share several similar ideas about motivation, the problems civilization brought to human life and so on. Four references to Sigmund Freud (1856 - 1939) may be found in the books reviewed: Three Essays on the Theory of Sexuality (1905, cited by Lorenz, 1978a)(106); Introductory Lectures on Psycho-Analysis (1917, cited by Lorenz, 1978a)(107); Vorlesungen zur Einführung in die Psychoanalyse (1930, cited by Lorenz, 1971, 1992)(108) and Gesammelte Werke (1950, cited by Lorenz, 1978a)(109). Concerning the first authors working on Psychoanalysis, there is a reference to Jung in a work by Feuerborn (1939, cited by Lorenz, 1992)(110), relating the concept of instinct and the concept of archetype. Alverdes also discussed the idea or archetype in animal psychology in the Die Wirksamkeit von Archetypen in den Intinskthandlungen der Tiere (1937, cited by Lorenz, 1971)(111). Another ancient reference to a work published in the Psychoanalitycal Review is Friedmann's The instinctive emotional life of birds (1934, cited by Lorenz, 1970)(112). René Spitz (18871974), an Austrian psychoanalist, was a friend of Lorenz and influenced Lorenz's ideas, especially those concerning the risks of hospitalism. Two books written by Spitz have been mentioned: Hospitalism (1945, cited by Lorenz, 1970)(113) and La première année de la vie de l'enfant (1958, cited by Lorenz, 1963, 1970, 1973a, 1978a, 1978b, 1983)(114). John Bowlby (1907-1990), whose work has been influenced by Ethology, had two references cited: Maternal care and mental health (1952, cited by Lorenz, 1970, 1978b)(115) and The nature of the child's tie to his mother (1958, cited by Lorenz, 1970, 1978b)(116). Lorenz, in his last books, also cites Erik Erikson (especially his idea of pseudo-speciation). The works by Erikson cited by Lorenz are Wachstum und Krisen der gesunden Persönlichkeit (1953, cited by Lorenz, 1978b)(117); Insight and Responsibility (1964, cited by Lorenz, 1973a)(118) and Ontogeny of Ritualization in Man (1966, cited by Lorenz, 1973a, 1973b, 1978b, 1983)(119). Lorenz also cites Erich Fromm's Anatomie der menschlichen Destruktivitat (1974, cited by Lorenz, 1978b, 1983)(120). There is a trend in Lorenz's work to discuss human social life as a physician and to discuss human behaviour and its crisis in human civilization. In this sense, he tends to be closer to some authors in Psychoanalysis. Mitscherlich's Die vaterlose Gesellschaft (1963, cited by Lorenz, 1973a)(121) should also be inserted here. There is no doubt that the theoretical system developed by Lorenz shows several points in common with Psychoanalysis. As we have discussed in relation to Behaviourism, the relationship of Lorenz and Psychoanalysis, however, presents positive and negative aspects, agreement and disagreement. Some times he criticizes some points of Psychoanalysis (as the opposition of Eros and Thanatos), in other moments he adopts and uses psychoanalytic concepts (as the concept of sublimation). Some personal contacts have influenced Lorenz in this use. Lorenz's meeting with Erik Erikson in a work group organized by the World Health Organization may have been sufficient for Lorenz's adoption of his concept of'pseudo-speciation', which he applied several times. The classic concept of sublimation is adopted and used side by side with the concept of behaviour displacement. The ideas of motivational energy, of accumulation of energy, and of catharsis (close to the idea of consumation) are very similar to some of Lorenz's ideas. Concerning human life and civilization, some ideas of Lorenz remind those of Freud as our difficulty to live in the modern conditions of civilization and the demands of culture upon our psychic apparatus. 3.5 Behaviourism The behaviourists Watson, Skinner (1904-1990), Tolman and Garcia are mentioned. Lorenz is a hard opponent of the Behaviourism of Watson and Skinner, but he is more positive concerning the ideas of Tolman and Garcia. John Watson (1878-1958)'s Psychology as the behaviorist views it (1913, cited by Lorenz, 1971, 1978b)(122) and Der Behaviorismus (1930, cited by Lorenz, 1983)(123) are cited. He also cites four references by Skinner: Conditioning and extinction and their relation to drive (1936, cited by Lorenz, 1973b, 1978a)(124), The Behavior of Organisms (1938, cited by Lorenz, Memorandum, 5, out/2003 Belo Horizonte: UFMG; Ribeirão Preto: USP. http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/garcia01.htm Garcia, A. (2003). The psychological literature in Konrad Lorenz's work: a contribution to the history of ethology and psychology. Memorandum, 5, 105-133. Retirado em / / , do World Wide Web: http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/garcia01.htm. 113 1973b, 1978a, 1983)(125), Reinforcement Today (1958, cited by Lorenz, 1973b, 1978a, 1983)(126) and Beyond Freedom and Dignity (1971, cited by Lorenz, 1973b, 1978a, 1983)(127). Lorenz has always been an opponent of Behaviourism, considering that the behaviouristic selection of conditioning by reinforcement as a general principle of behaviour as an error. Lorenz never denied the importance of learning and his theory on the possibilities of different kinds of learning occupies an important place in his work. What is remarkable is that the main opponents of his ideas (behaviourists) are in the psychological field. In his opposition to Behaviourism, Lorenz is again aligned with Gestalt psychologists and even with MacDougall. He also mentions Clark L. Hull (18841952) and his "Principles of Behavior" (1943, cited by Lorenz, 1965, 1970, 1971, 1973b, 1978a)(128). Although Lorenz is very critic about Watson and Skinner contributions, he is influenced by Tolman and he cites Garcia several times as a positive contribution. Tolman's Purposive Behaviour in Animals and Men (1932, cited by Lorenz, 1965, 1970, 1971, 1973b, 1978a, 1992)(129) is frequently cited (in six books). Tolman's purposive behaviour and Lorenz's appetitive behaviour are similar concepts. In both, we may see the emphasis on cognitive mechanisms that have been recognized as a very important theme in contemporary Psychology. John Garcia (1917- ) is another behaviourist that is cited by Lorenz as a support for the idea that learning shows important limitations. He cites Garcia & Koelling (1967, cited by Lorenz, 1973b, 1978a)(130); Garcia & Ervin (1967, cited by Lorenz, 1978a)(131); Garcia, McGowan, Ervin & Koelling (1968, cited by Lorenz, 1978b)(132) and Garcia, Hankins & Rusiniak (1974, cited by Lorenz, 1978a)(133). Although Lorenz criticizes the position adopted by Watson, for instance, denying the existence of complex coordinated sequences of innate motor acitivities, he also recognizes the considerable value of behaviourist research, for instance, taking objective behaviour as the focus of observation. The same may be said about Tolman. Lorenz considered animal behaviour as purposive and considered that Tolman had given a very good objective definition of purposive behaviour as the fact that the same constant end or goal is achieved in the animal by variable adaptive behaviour. 3.6 Social and Developmental Psychology Several authors related to social and developmental psychology are mentioned in Lorenz's writings. Concerning these areas, the idea of imprinting seems to be an important point of contact. Social psychologists are not usual in Lorenz's writings. Traditional authors are restricted to Bavelas (1957, cited by Lorenz, 1971)(134), in a paper about group size, and the classic Milgram's Behavioral Study of Obedience (1963, cited by Lorenz, 1978b)(135). Although Gehlen is an anthropologist, we could mention his paper on human life in industrial society and social-psychological problems arising from it (Gehlen, 1960, cited by Lorenz, 1978b)(136). References to Kurt Lewin (1890-1947) and to incest taboo are also mentioned (Bischof, n.d., cited by Lorenz,1973b and Bischof, 1972, cited by Lorenz, 1973b) (137)(138). The problem of development is a common point of interest in Psychology and Ethology. Several works related to Developmental Psychology are cited by Lorenz in the material investigated. The area may be subdivided as follows: a) The investigation of the relations between development and animal psychology, including Volkelt (1914, cited by Lorenz, 1970, 1992)(139) and Schneirla (1966, cited by Lorenz, 1978b)(140). Volkelt (1937, cited by Lorenz, 1970, 1978b, 1992)(141) discussed Animal Psychology as genetic totality psychology; b) The discussion of imprinting, early social experience and development: Carmichael (1926, cited by Lorenz, 1970, 1992)(142), Birch (1945, cited by Lorenz, 1971)(143), Riess (1954, cited by Lorenz, 1965, 1971, 1978b)(144), Hess (1959, cited by Lorenz, 1970, 1978b)(145), Hess (1973, cited by Lorenz, 1978a)(146), Schutz (1964, cited by Lorenz, 1965)(147), Gottlieb (1965, cited by Lorenz, 1978b)(148) and Kruijt (1971, cited by Lorenz, 1978a)(149); c) Neonate behaviour including early Memorandum, 5, out/2003 Belo Horizonte: UFMG; Ribeirão Preto: USP. http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/garcia01.htm Garcia, A. (2003). The psychological literature in Konrad Lorenz's work: a contribution to the history of ethology and psychology. Memorandum, 5, 105-133. Retirado em / / , do World Wide Web: http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/garcia01.htm. 114 social behaviour: Freedman, 1964 (cited by Lorenz, 1978b) (150) and Freedman, 1965 (cited by Lorenz, 1978b) (151), Peiper, 1935 (cited by Lorenz, 1971) (152) and Peiper, 1961 (cited by Lorenz, 1978b) (153), Prechtl & Knol (1958, cited by Lorenz, 1965, 1971)(154); d) Play and object manipulation: Groos (1907, cited by Lorenz, 1970)(155), Bally (1945, cited by Lorenz, 1971, 1973b, 1978a, 1978b, 1983)(156), Bower (1971, cited by Lorenz, 1973b, 1978b) (15 7 ), Eigen & Winkler (1975, cited by Lorenz, 1978a, 1983)(158); e) Developmental Psychology general issues: Werner (1933, cited by Lorenz, 1970) (159), Schroeder (1931, cited by Lorenz, 1971) (160) and Ahrens (1953, cited by Lorenz, 1978b)(161). Although Lorenz has always investigated social behaviour, his discussions with authors from Social Psychology are limited. The importance of the phenomenon of imprinting for Developmental Psychology probably explains a more proximate relation with some literature in the area, although one could consider it quite limited as well. 3.7 Cognition, Emotion and Motivation These three concepts are very important in the History of Psychology and are also present in Konrad Lorenz's work in a remarkable form. Lorenz mentions authors discussing cognition (learning, reasoning, perception, thinking, orientation, language), emotion and motivation. Lorenz emphasized cognition what makes sense with his interest in Evolutionary Epistemology. Cognition and language are traditional areas of Psychology and Lorenz cites works about different cognitive processes: a) Orientation: optical orientation in ants (Jander, 1957, cited by Lorenz, 1965)(162); orientation in birds - Hoffman (1954, cited by Lorenz, 1965) (163) and Sauer (1961, cited by Lorenz, 1970) (164); the sun in the orientation of animals (Hoffmann, 1952, cited by Lorenz, 1965)(165); orientation of animals Engelmann (1928, cited by Lorenz, 1928)(166) and Fraenkel & Gunn (1961, cited by Lorenz, 1978b)(167); b) Space perception: in the chick - Hess (1956, cited by Lorenz, 1965, 1971, 1973b, 1978a)(168) and Bateson (1964, cited by Lorenz, 1970)(169), and in children (Ball & Tronick, 1971, cited by Lorenz, 1973b, 1978b)(170); c) Size, colour and form perception: in birds (Bingham, 1913, cited by Lorenz, 1970)(171), in bees (von Frisch, 1914, cited by Lorenz, 1965)(172) and Hertz (1937, cited by Lorenz, 1965) (173), and in children (Bower, 1966, cited by Lorenz, 1978b)(174); d) Sound perception: music (Kneutgen, 1970, cited by Lorenz, 1978b, 1983)(175); e) Kinesis (Birdwhistell, 1963, cited by Lorenz, 1978b and 1970, cited by Lorenz, 1978b)(176)(177); f) Social perception: the kindchenschema (Hückstedt, 1965, cited by Lorenz, 1978b)(178); sensory cues involved in maternal retrieving in rats (Beach & Jaynes, 1956, cited by Lorenz, 1965)(179); g) Reasoning: in white rats (Maier, 1929, cited by Lorenz, 1973b)(180), in humans, on direction (Maier, 1930, cited by Lorenz, 1973b)(181); h) Language: evolution of language and reason (Hopp, 1970, cited by Lorenz, 1973b)(182), non-verbal communication - Frijda, 1964 (cited by Lorenz, 1978b)(183) and Birdwhistell, 1968 (cited by Lorenz, 1978b)(184), language of bees (von Frisch, 1923, cited by Lorenz, 1992)(185), an experimental test of an alleged innate sign stimulus (Hirsch; Lindley &Tolman, 1955, cited by Lorenz, 1971)(186); i) Learning: discrimination learning by rhesus monkeys to visual exploration (Butler, 1953, cited by Lorenz, 1953)(187), experience and problems of Learning Psychology (Foppa, 1966, cited by Lorenz, 1973b, 1978a)(188). And also general works such as the discussion of epistemological basic problems of Perception Psychology (Bischof, 1966, cited by Lorenz, 1978b)(189) and conceptual thinking and hominisation (Decker, n.d., cited by Lorenz, 1973b)(190). Concerning emotions, a paper by Labarre (1947, cited by Lorenz, 1978b)(191) about the cultural basis of emotions and gestures is cited. Motivation is a common concept in both areas: classic Ethology and Psychology (and also Behavioral Physiology). Lorenz mentions the physiological aspects of motivation - Stellar (1954, cited by Lorenz, 1978a) (192), Roberts & Kiess (1964, cited by Lorenz, 1978b)(193) and motivation in Ethology (Leyhausen, 1965, cited by Lorenz, 1963)(194). Memorandum, 5, out/2003 Belo Horizonte: UFMG; Ribeirão Preto: USP. http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/garcia01.htm Garcia, A. (2003). The psychological literature in Konrad Lorenz's work: a contribution to the history of ethology and psychology. Memorandum, 5, 105-133. Retirado em / / , do World Wide Web: http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/garcia01.htm. 115 In sum, cognition, emotion and motivation are parts of Lorenz's system. His work not only takes into account these traditional psychological concepts but he also tries to relate them. Cognition is the most evident trend in his system. Learning, reasoning, perception, thinking, orientation, language are present in his writings. These processes receive an evolutionary interpretation and also a physiological explanation. What could be observed here is that it is not difficult to relate Lorenz ideas with psychological literature in these fields. Obviously, Lorenz has emphasized evolutionary processes and he has never worked directly on human beings. What is remarkable is that his advances in the studies of cognition, emotion and motivation have not been continued in an empirical area of research. His disciples or students have focused on other points. Eibl-Eibesfeldt, for instance, devoted his career to find and investigate universals in human behaviour in a descriptive way, being closer to the ancient ideas of Lorenz that instinctive behaviour patterns should be shared by all the members of a species. Others worked on Cultural Ethology (e.g. Otto Koenig). It is remarkable that Ethology could possibly have influenced the development of an 'Ethological Psychology' as a continuation and expansion of Lorenz's ideas. However, Human Ethology has taken another direction and these ideas resulted in the building of an Evolutionary Epistemology, and not a formal school of Psychology. The reason why this ocurred is an open question. One could speculate that Lorenz's ideas have been poorly understood and that Ethology has been received as a form of observation of external behaviour (and even a kind of Behaviourism in its 'objectivity'). But this does not represent the intelectual project of Lorenz. Lorenz was fully interested in human cognition (the evolution and functioning of human cognitive apparatus), emotion (even as the basis of our ethical, esthetic and moral judgements) and motivation. Human Ethology developed in Austria as a search for universals in human behaviour (close to Anthropology) or as a method of observation of human behaviour (not directly dealing with language and cognitive, emotional processes). Psychology has recently advanced towards evolutionary ideas stemming mainly from Sociobiology. 4. EPISTEMOLOGY Although Epistemology is, traditionally, a division of Philosophy, recent authors working on Epistemology have exerted a crucial influence on Psychology and vice-versa. There are three major areas in which the epistemological literature may be found in Lorenz's writings: a) Physics and Knowledge; b) Philosophy and Konwledge; and, c) Cognition and Epistemology. Epistemology and Cognitive Psychology are intimately related and Lorenz considered that his contribution to Epistemology (particularly Evolutionary Epistemology) was even more important than his contribution to Ethology. As Epistemology and Psychology are related fields, we list and comment below the references in Lorenz's work about this area of knowledge. 4.1 Physics and Knowledge There is no doubt that Lorenz had a particular admiration for Physics. He was proud of his contact with Max Planck, one of the most important physicists of the XXth century and known for his contribution to Quantic Physics. The point of contact between Lorenz and the scientists of the physical world are the limits and possibilities of knowledge as the result that we, human beings, are also formed by physical elements and that our knowledge of the world is limited by our capacities. Lorenz cites Bohr (1958, cited by Lorenz, 1971)(195) commenting on atoms and human knowledge (and remarks made by Bridgman, 1958, cited by Lorenz, 1971)(196). But, the most important influence from a physicist on Lorenz was from Max Planck (1942, cited by Lorenz, 1971, 1973b, 1992)(197). Lorenz was proud of having changed letters with Planck and that both agreed in the need of Epistemology as an important tool for the advancement of science, when we have also to analyse our perceptual apparatus together with the world that we are investigating. This attraction between Physics and Epistemology and Psychology is a Memorandum, 5, out/2003 Belo Horizonte: UFMG; Ribeirão Preto: USP. http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/garcia01.htm Garcia, A. (2003). The psychological literature in Konrad Lorenz's work: a contribution to the history of ethology and psychology. Memorandum, 5, 105-133. Retirado em / / , do World Wide Web: http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/garcia01.htm. 116 tradition in German Psychology, as we can see in the work by Helmholtz or in the attraction that Physics has exerted on Gestalt Psychology. 4.2 Phylosophy and Knowledge Konrad Lorenz's interest in Epistemology certainly was influenced by the position he occupied as professor of Psychology in Königsberg. He was the last one to occupy the chair of Immanuel Kant, together with Eduard Baumgarten. Baumgarten had studied with John Dewey in the USA and Lorenz mentions several works by Baumgarten, a philosopher of Pragmatic orientation, closely related to Dewey, an important American philosopher and psychologist - Baumgarten, 1933 (cited by Lorenz, 1978b) (198), Baumgarten, 1938 (cited by Lorenz, 1978b, 1992) (199), Baumgarten, 1941 (cited by Lorenz, 1978b) (200), Baumgarten, 1950 (cited by Lorenz, 1971, 1978b) (201). He also cites John Dewey's Experience and Nature (1925, cited by Lorenz, 1978a, 1992)(202) and Reconstruction in Philosophy (1936, cited by Lorenz, 1978a, 1992)(203). John Dewey is a very important bridge between Philosophy and Psychology in the USA, and the familiarity of Lorenz with his work is an interesting point of contact between both areas. 4.3 Cognition and Epistemology Two distinguished psychologists investigating the problem of knowledge are present in Lorenz's writings: Egon Brunswick and Donald T. Campbell. Lorenz cites Brunswik's Wahrnemung und Gegenstandwelt, Psychologie vom Gegenstand her (1934, cited by Lorenz, 1970, 1978a, 1992)(204), The Conceptual Framework of Psychology (1952, cited by Lorenz, 1973b)(205) and Scope and aspects of the cognitive problem (1957, cited by Lorenz, 1965, 1971, 1973b, 1978a, 1983)(206). Lorenz and Brunswick present similar ideas concerning the importance of constance phenomena in perception and knowledge. Campbell, former president of the American Psychological Association, was also directly related to Lorenz, especially concening Evolutionary Epistemology. Campbell's Methodological suggestions for a comparative psychology of knowledge processes (1958, cited by Lorenz, 1965, 1971)(207), Pattern matching as an essential in distal knowing (1966a, cited by Lorenz, 1971, 1973a, 1973b, 1983)(208) and Evolutionary Epistemology (1966b, cited by Lorenz, 1971, 1973b, 1983)(209) have been mentioned by Lorenz. Lorenz considered that Campbell (and also Popper, Riedl and himself) had, independently from each other, developed similar ideas about Evolutionary Epistemology. Anyway, Campbell and Brunswick, are important psychologists working on cognition in the borders of Psychology and Epistemology. It is interesting to note that cognition is one of the most important areas of research in nowadays Psychology and that Lorenz was interested in the evolution and functioning of cognitive processes. His epistemological ideas, related to cognition, are also largely influenced by Gestalt Psychology: the ideas of perception and knowledge, of insight, the central role of the central representation of space, for instance, and also include learning possibilities in the evolution of knowledge. 5. PSYCHIATRY AND NEUROSCIENCES Both these areas are closely related to Psychology and the History of Psychiatry and Neurophysiology is also closely connected with the History of Psychology. Several psychiatrists and neurophysiologists are mentioned. 5.1 Neurophysiology Authors related to Physiology and Neurophysiology are frequently cited in Lorenz's work. Classics of Physiology are mentioned, as Sir C. Bell's The Nervous System of the Human Body (1830, cited by Lorenz, 1992)(210), Claude Bernard's Physiologie générale (1872, cited by Lorenz, 1992)(211) and Johannes Müller's Handbuch der Physiologie des Menschen (1833-1840, cited by Lorenz, 1992)(212). Two books of the English psychologist C.S. Sherrington (1857-1952) about the integrative action of the nervous Memorandum, 5, out/2003 Belo Horizonte: UFMG; Ribeirão Preto: USP. http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/garcia01.htm Garcia, A. (2003). The psychological literature in Konrad Lorenz's work: a contribution to the history of ethology and psychology. Memorandum, 5, 105-133. Retirado em / / , do World Wide Web: http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/garcia01.htm. 117 system (1906, cited by Lorenz, 1973b, 1978a)(213) and about low level coordination (1931, cited by Lorenz, 1978a, 1978b)(214) are mentioned, relating Physiology and Psychology. But Lorenz cites especially authors analysing the brain and the central nervous system: Weiss, 1941 (cited by Lorenz, 1971)(215), Hess & Brügger, 1943 (cited by Lorenz, 1971)(216), Grey Walter, 1953 (cited by Lorenz, 1971, 1978a)(217), Hess, 1954 (cited by Lorenz, 1978b)(218), Hess, 1957 (cited by Lorenz, 1978a) (219), Mark & Ervin, 1970 (cited by Lorenz, 1978b)(220) or investigating the influence of hormones and chemicals - Beach, 1942 (cited by Lorenz, 1965, 1971, 1978a)(221) and Beach, 1948 (cited by Lorenz, 1973b) (222), Richter, 1954 (cited by Lorenz, 1965)(223), Hassler & Bak, 1966 (cited by Lorenz, 1978b)(224). Lorenz cites three works written by the important neurophysiologist John Eccles about the neurophysiological basis of mind (Eccles, 1953, cited by Lorenz, 1973b, 1978a)(225), brain and conscious experience (Eccles, 1966, cited by Lorenz, 1973b, 1978a)(226) and about the uniqueness of man (Eccles, 1968, cited by Lorenz, 1973b, 1978a)(227). A paper by Leyhausen (1954, cited by Lorenz, 1963)(228) about the relative coordination trying to take into account physiological and psychological aspects is also mentioned. But, certainly, the most important neurophysiological ideas in Lorenz's work are derived from Erich von Holst. Lorenz worked together with von Holst in Germany and his ideas about the spontaneity of the nervous system is one of the most important founding ideas in Lorenz's system. Several of von Holst's papers are mentioned discussing the process of central coordination (Holst, 1935a, cited by Lorenz, 1965, 1973a)(229), the problem of everything or nothing in nervous activity (Holst, 1935b, cited by Lorenz, 1992)(230), about locomotor reflexes in Fish (Holst, 1937, cited by Lorenz, 1978b and Holst, 1939, cited by Lorenz, 1971, 1992)(231)(232), optical perception (Holst, 1955, cited by Lorenz, 1965 and Holst, 1957, cited by Lorenz, 1965, 1971) (233) (234), and his general work on the behavioural physiology of men and animals (Holst, 1969-1970, cited by Lorenz, 1973b, 1978a, 1983)(235). One could state that Neurophysiology is one of the foundations of Lorenz's concept of instinctive behaviour and also important for his epistemological ideas. Several of the neurophysiologists mentioned are dealing with humans. 5.2 Psychiatry Historically, the first citation of psychiatry appears in the Russian Manuscript, written from 1944 to 1948 (Lorenz, 1992). Kretschmer's Körperbau und Charakter (1921, cited by Lorenz, 1992)(236) is mentioned only in the Russian Manuscript. Massermann's Behavior and Neuroses (1943, cited by Lorenz, 1963, 1965, 1978a)(23 7 ). The "psychiatric drift" in Lorenz's work is remarkable in two more recent books on human civilization (Lorenz, 1973a, 1983). In these polemic books, Lorenz proposes to discuss the pathology of modern civilization. Five authors related to Psychiatry and the problem of man in modern civilization are mentioned in these books: Hahn (1960, cited by Lorenz, 1973a)(238), Hargreaves (personal communication, cited by Lorenz, 1983), Czerwenka-Wenkstetten (a conference of 1977, cited by Lorenz, 1983)(239), Frankl (1979, cited by Lorenz, 1983)(240), Klages (1981, cited by Lorenz, 1983)(241). It is remarkable the citation of four books by H. Schulze: Schulze, 1963 (cited by Lorenz, 1983) (242), Schulze, 1964 (cited by Lorenz, 1973a) (243), Schulze, 1971 (cited by Lorenz, 1973a (244), Schulze, 1977 (cited by Lorenz, 1983) (245), all discussing neuroses in our contemporary living conditions and psychotherapy. It is not surprising the influence of Psychiatry on Lorenz writings. Lorenz was trained as a medical doctor and the idea of normal and pathological is clearly present in his unweltanschauung. Even considering the role of natural selection in the evolution of living creatures, Lorenz does not deny the possibility of the existence of patterns of behaviour that may be considered pathological. His contact with Psychiatry was still more important in war time, when he worked as a psychiatrist of the German Army. It is no coincidence that ideas stemming from Psychiatry are already present in the Russian Manuscript. His contact with patients suffering from neurosis during his work in the war Memorandum, 5, out/2003 Belo Horizonte: UFMG; Ribeirão Preto: USP. http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/garcia01.htm Garcia, A. (2003). The psychological literature in Konrad Lorenz's work: a contribution to the history of ethology and psychology. Memorandum, 5, 105-133. Retirado em / / , do World Wide Web: http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/garcia01.htm. 118 apparently exerted an enduring influence on his view of normal and pathological aspects of human life. Lorenz's contact with Psychoanalysis was also possible during this period, as his chief in the psychiatric service was Freudian. Lorenz mentions some episodes of his work as a psychiatrist and his way of dealing with neurotic behaviour. 6. CONCLUDING REMARKS In sum, considering the literature related to Psychology in Lorenz's work, Heinroth (1910, cited by Lorenz, 1963, 1965, 1970, 1971, 1973a, 1973b, 1978a, 1978b, 1983, 1992) is the most frequently cited work (ten times) in Lorenz's writings. Craig (1918, cited by Lorenz, 1963, 1965, 1970, 1971, 1973b, 1978a, 1978b, 1992) occupies the second position with eight citations. Darwin (1872, cited by Lorenz, 1963, 1971, 1973b, 1978a, 1978b, 1983, 1992), Uexküll (1909, cited by Lorenz, 1970, 1971, 1973b, 1978a, 1978b, 1983, 1992), and Kuhn (1919, cited by Lorenz, 1965, 1971, 1973b, 1978a, 1978b, 1983, 1992), have been cited seven times each. Whitmann (1898, cited by Lorenz, 1970, 1971, 1973b, 1978a, 1978b, 1992), Mac Dougall (1923, cited by Lorenz, 1970, 1971, 1978a, 1978b, 1983, 1992), Tolman (1932, cited by Lorenz, 1965, 1970, 1971, 1973b, 1978a, 1992) and Spitz (1958, cited by Lorenz, 1963, 1970, 1973a, 1978a, 1978b, 1983) have been mentioned six times each. Finally, Jennings (1906, cited by Lorenz, 1970, 1971, 1973b, 1978a, 1992), Karl Bühler (1922, cited by Lorenz, 1971, 1973b, 1978a, 1983, 1992), Pavlov (1927, cited by Lorenz, 1965, 1971, 1978a, 1978b, 1992), Hull (1943, cited by Lorenz, 1965, 1970, 1971, 1973b, 1978a), Bally (1945, cited by Lorenz, 1971, 1973b, 1978a, 1978b, 1983), Harlow (1950, cited by Lorenz, 1965, 1971, 1973b, 1978a, 1983) and Brunswick (1957, cited by Lorenz, 1965, 1971, 1973b, 1978a, 1983) have been cited five times each one. These data refer to the presence of authors related to the psychological field of knowledge in Lorenz's selected works. The kind of influence (if any) these authors exerted on Lorenz's work is complex. Some authors may have influenced his way of thinking, others may have been identified as assuming similar positions after Lorenz had already taken a position (as the case of Whitman, for instance) or being criticized for assuming diverse positions. The meaning of each one must be understood in a particular way. This is a huge and detailed work that we are conducting at the present moment. However, there is no simple direction of influence, when this may be considered. Usually, the same author is criticized by Lorenz in some aspects and this does not prevent him from agreeing with the same author in other points. The presence of an author does not mean that Lorenz depended on him to build his theoretical system, but that this particular author is relevant for the discussion of his ideas (agreeing or disagreeing). The important aspect here is that many of the authors he discusses in his work are recognized as representatives of the psychological area of knowledge. Sometimes, the authors are mentioned as belonging to the new area of research, giving identity to this area, as the case of the presence of Heinroth (1910), the most frequently cited author in Lorenz's writings. It is possible to see here the efforts of Lorenz to identify his approach with that of Heinroth, who employed both terms, Ethology and Psychology in his work. Craig (1918) exerted some influence on Lorenz's ideas, especially concerning the conception of the appetitive behaviour. In this sense, Lorenz is conservative, trying to present his position as the continuation of a trend already extant. This kind of attitude towards authors before him is usually present in his works. Lorenz is continually trying to connect his ideas with a historical movement, trying to convey that his ideas are not new, but they are inserted in a wider scientific movement. The same may be said of Darwin (1872). The idea of evolution is extremely important in Lorenz's writings, but Lorenz has never tried to follow Darwin's points of research directly. Uexküll (1909) was considered by Lorenz a respected master and influenced Lorenz in the ideas of companion in the social world, the meaning of other animals as having specific social roles. As a representative of Phenomenology, Uexküll represents how diverse the influences on Lorenz have been. Uexküll was not an evolutionist and this also means that authors may be influential in some aspects but not in other ones. Memorandum, 5, out/2003 Belo Horizonte: UFMG; Ribeirão Preto: USP. http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/garcia01.htm Garcia, A. (2003). The psychological literature in Konrad Lorenz's work: a contribution to the history of ethology and psychology. Memorandum, 5, 105-133. Retirado em / / , do World Wide Web: http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/garcia01.htm. 119 Kuhn (1919) is another classic in the study of animal behaviour from a physiological point of view. Whitman (1898) may be considered a case similar to Heinroth. The research conducted by Lorenz has been done independently of Whitman. The constant presence of this author in Lorenz writings may indicate the recognizing by Lorenz (and Heinroth) of the seminal work conducted by Whitman with pigeons. The following authors mentioned have a conflicting influence on Lorenz's ideas (agreement and disagreement), although they are criticized by the author, it is possible to note Lorenz using some of their ideas. This is the case of Mac Dougall (1923) and Tolman (1932). The idea of intention or purpose is important in Lorenz's system, however he criticized vehemently what he called the vitalists (such as MacDougall). His attempts to discriminate teleology and teleonomy may be understood as an attempt to reformulate some of their ideas. The relationship of Lorenz with Psychoanalysis is in no way only a positive or negative one. Sometimes Lorenz criticizes psychonalytical ideas (such as the idea of the opposition of Eros and Thanatos), in other moments he not only shows an amazing similarity with psychoanalytical thinking (as the case of his motivational model or the uneasiness of man in modern civilization) but he even adopts explanatory resources from Psychoanalysis. In fact there is no formula to describe the possibilities of discussion of Lorenz's ideas and the traditional schools of Psychology. In this sense, he adopted the idea of hospitalism from Spitz (1958) and this concept presents an enduring influence on Lorenz's writings about the conditions of modern civilization. The case of Jennings (1906) is similar to that of Kuhn. The influence of traditional physiological analysis of behaviour is an indication of the importance of this area of the biological sciences for Ethology. The most intimate contact of Lorenz with mainstream psychologists was with Karl Bühler (1922), an important representative of Gestalt Psychology. Bühler could be considered his most important direct influence in the psychological field and Lorenz could be considered, from the psychological point of view, a rather dissident and original Gestalt psychologist. His ideas about Evolutionary Epistemology are very influenced by psychological reasoning and quite close to Gestalt Psychology. In sum, if Lorenz had to be included in a traditional psychological system, we most probably should insert him in the Gestalt movement (although he might not be considered an orthodox Gestalt psychologist, he considered himself as heretic in regard to Gestalt Psychology). It is noteworthy that Piaget, when discussing Lorenz's ideas, seems to consider Lorenz as a Gestalt psychologist. The presence of Pavlov (1927), as it is the case of Kuhn and Jennings, is an indication that Lorenz was interested not only in the physiological aspects of behaviour, but also in the processes of modification of behaviour. At this point we could state that Lorenz was a fierce opponent of Behaviourism, including Watson and Skinner. Lorenz criticizes the importance Behaviourism attributed to conditioning by reinforcement, he criticizes the doctrine of the 'empty-organism' of Behaviourism as responsible for a lot of problems of modern civilization and as the basis of 'pseudo-democracy' and the modern decadence of human civilization. Although these outrageous attacks against Behaviourism, his system also includes the conditioning by reinforcement (or modification of behaviour with feedback) as an extremly important part of his approach to learning. So, the relationships of Lorenz with other schools of Psychology are not always only positive or negative. Hull (1943) could be inserted in his discussion with Behaviourism. Bally (1945), in fact, is cited as a representative of Kurt Lewin's idea of the relevance of a tension-free environment for playing. Harlow (1950), and also Yerkes and Köhler, are of particular interest for Lorenz due to his theories about the origins of human conceptual thought. Brunswick (1957) was an assistent to Karl Bühler and his influence is also a direct one. Brunswick's interest in cognition is clearly connected with Lorenz's growing dedication to Epistemology. This is an introductory essay pointing the massive presence of psychological literature in Lorenz's work and discussing some aspects of the complex links between the psychological field of knowledge and Konrad Lorenz's work. Of course, detailed analysis of the several points of contact deserve particular attention. Memorandum, 5, out/2003 Belo Horizonte: UFMG; Ribeirão Preto: USP. http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/garcia01.htm Garcia, A. (2003). The psychological literature in Konrad Lorenz's work: a contribution to the history of ethology and psychology. Memorandum, 5, 105-133. Retirado em / / , do World Wide Web: http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/garcia01.htm. 120 Ethology, and particularly Konrad Lorenz's work, are directly related to Psychology and its related fields. At least, part of the roots of Ethology may be found in traditional Animal and Comparative Psychology and Lorenz's ideas have developed in constant interaction with the psychological literature. Citations originated from the most important historical systems of psychology are present in his writings and they are relevant for his thinking (Associationism, Structuralism, Functionalism, Gestalt Psychology, Behaviorism, Psychoanalysis). In sum, Psychology is part of the structure of Lorenz's work. Other related fields, such as Psychiatry, Neurophysiology, Epistemology, are also present in Lorenz's writings. All this suggests that the History of Ethology and the History of Psychology should be understood side by side. References Garrett, H.E. (1974). Grandes Experimentos da Psicologia (M. P. P. de Toledo, Transl.). São Paulo: Cia Editora Nacional. (Original published in 1951). Heidbreder, E. (1978). Psicologias do Século XX. 4. ed (L. S. Blandy, Transl.). São Paulo: Mestre Jou. (Original published in 1933). Herrnstein, R.J. & Boring, E.G. (1971). Textos Básicos de História da Psicologia (D. M. Leite, Transl.). São Paulo: Herder; EDUSP. (Original published em 1966). Lorenz, K. (1949). Er redete mit dem Vieh, den Vogel und den Fischen. Vienna: Borotha Schoeler. Lorenz, K. (1950). So kam der Mensch auf den Hund. Vienna: Borotha. Lorenz, K. (1963). Das sogenannte Böse: Zur Naturgeschichte der Aggression. Vienna: Borotha-Schoeler. Lorenz, K. (1965). Evolution and Modification of Behaviour. London: Methuen. Lorenz, K. (1970). Studies in Animal and Human Behaviour. v. 1. (R. Martin, Transl.). Cambridge, Massachusetts: Harvard University Press. (Original published in 1970). Lorenz, K. (1971). Studies in Animal and Human Behaviour. v.2. (R. Martin, Transl.). Cambridge, Massachusetts: Harvard University Press. (Original published in 1971). Lorenz, K. (1973a). Die acht Todsünden derzivilisierten Menschheit. Munich: Piper. Lorenz, K. (1973b). Die Rückseite des Spiegels. menschlichen Erkennens. Munich: Piper. Versuch einer Naturgeschichte Lorenz, K. (1978a). Vergleichende Verhaltensforschung: Grundlagen der Ethologie. Vienna-New York: Springer. Lorenz, K. (1978b). Das Wirkugsgefüge der Natur und das Schicksal des Menschen. Gesammelte Arbeiten. Herausgegeben und eingeleitet von Irenäus Eibl-Eibesfeldt. Munich; Zurich: Piper. Lorenz, K. (1978c). L'année de l'Oie Cendré. Paris: Editions Stock. Lorenz, K. (1983). Der Abbau des Menschlichen. Munich: Piper. Lorenz, K. (1988). Hier bin Ich - Wo bist du? - Ethologie der Graugans. Munich: Piper. Lorenz, K. (1992) [1944-1948]. Das Russische Manuskript. Die Naturwissenschaft vom Menschen. Munich: Piper Verlag. Marx, M.H. & Hillix, W.A. (1978). Sistemas e Teorias em Psicologia. 3. ed. (A. Cabral, Transl.). São Paulo: Cultrix. (Original published in 1973). Memorandum, 5, out/2003 Belo Horizonte: UFMG; Ribeirão Preto: USP. http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/garcia01.htm Garcia, A. (2003). The psychological literature in Konrad Lorenz's work: a contribution to the history of ethology and psychology. Memorandum, 5, 105-133. Retirado em / / , do World Wide Web: http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/garcia01.htm. 121 Mueller, F.-L. (1968). História da Psicologia: da Antigüidade aos nossos dias (L.L. Oliveira, M. A. Blandy & J.B.D. Penna, Transl.). São Paulo: Cia Editora Nacional; EDUSP. (Original published in 1960). Penna, A.G. (1978). Introdução à História da Psicologia Contemporânea. Rio de Janeiro: Zahar. Schultz, D.P. & Schultz, S.E. (2002). História da Psicologia Moderna. 16th ed. (A.U. Sobral & M.S. Gonçalves, Transl.). São Paulo: Cultrix. (Original published in 1992). Notes (1) Whitman, C.O. (1898). Animal Behavior. Biological Lectures from the Marine Biological Laboratory, 16, 285-338. (2) Whitman, C.O. (1919). The Behavior of Pigeons. Publ. Carnegie Inst., 257, 1-161. (3) Craig, W. (1918). Appetites and aversions as constituents of instincts. Biological Bulletin, 34 (2), 91-107. (4) Craig, W. (1912). Observations of young doves learning to drink. Journal of Animal Behaviour, 2 (4). (5) Craig, W. (1908). The voices of Pigeons regarded as a means of social control. American Journal of Sociology, 14. (6) Craig, W. (1914). Male Doves reared in isolation. Journal of Animal Behaviour, 4 (2). (7) Craig, W. (1921). Why do animals fight? International Journal ofEthics, 31. (8) Craig, W. (1909). The expression of emotions in the pigeons: The blond ring-dove (Turtur risorius). Journal of Comparative Neurology and Psych., 19 (1). (9) Craig, W. (1921/1922). A note on Darwin's work on the expressions of emotions etc. Journal of Abnormal and Social Psychology, 1921/1922. (10) Heinroth, O. (1930). Über bestimmte Bewegungsweisen Sitzungsbericht der Gesellschaft der naturforschenden Freunde, Berlin. (11) Heinroth, O. Ornithologie, 66. (1918). Reflektorische Bewegungen bei der Wirbeltiere. Vögeln. Journal für (12) Heinroth, O. (1910). Beiträge zur Biologie, namentlich Ethologie und Psychologie der Anatiden. Verhandlungen des V. Internationalen Ornithologen-Kongresses, Berlin, pp. 589-702. (13) Huxley, J.S. & Howard, E. (1934). Field studies and psychology: a further correlation. Nature, 133. (14) Darwin, C. (1872). The Expression of the Emotions in Man and Animals. London: Appleton. (15) Spencer, H. (1855-1872). Principles of Psychology. (16) Lloyd Morgan, C. (1909). Instinkt und Ganzheit. Leipzig and Berlin: Teubner. Memorandum, 5, out/2003 Belo Horizonte: UFMG; Ribeirão Preto: USP. http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/garcia01.htm Garcia, A. (2003). The psychological literature in Konrad Lorenz's work: a contribution to the history of ethology and psychology. Memorandum, 5, 105-133. Retirado em / / , do World Wide Web: http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/garcia01.htm. 122 (17) Lloyd Morgan, C. (1913). Instinkt und Erfahrung. Berlin: Springer. (18) MacDougall, W. (1923). An Outline of Psychology. London: Methuen. (19) MacDougall, W. (1923). An Introduction to Social Psychology. Boston. (20) MacDougall, W. (1921-1922). The use and abuse of instinct in social psychology. Journal of Abnormal and Social Psychology, 16 (5-6). (21) Hinde, R.A. (1972). Animal behavior: a synthesis of ethology and comparative psychology. New York: McGraw-Hill. (22) Brun, E. (1912). Zur Psychologie der künstlichen Allianz kolonien bei den Ameisen. Biologisches Zentralblatt, 32. (23) Doflein, F. (1916). Der Ameisenlöwe: Eine biologische, tierpsychologische und reflexbiologische Untersuchung. Jena. (24) Katz, D. & Revesz, G. (1909). Experimentelle psychologische Untersuchungen an Hühnen. Zeitschrift für Psychologie, 50. (25) Katz, D. (1931). Hunger und Appetit. Leipzig. (26) Russell, E.R. (1934). The Behaviour of Animal. London. (27) Buytendijk, F.J.J. (1940). Wege zum Verständniss der Tiere. Zürich & Leipzig: Max Niehaus Verlag. (28) Hebb, D.O. (1940). The Organization of Behaviour. New York. (29) Hebb, D.O. (1953). Heredity and environment in mammalian behaviour. British Journal of Animal Behavior, 1, 43-47. (30) Hebb, D.O. (1958). A Textbook of Psychology. Philadelphia: Saunders. (31) Herrick, F.H. (n.d.) Instinct. Western Res. Univ. Bulletin, 22 (6). (32) Bierens de Haan, J.A. (1933). Der Stieglitz als Schöpfer. Journal für Ornithologie, 80 (1). (33) Bierens de Haan, J.A. Naturwissenschaften, 23: 42-43. (1935). Probleme des tierischen Instinktes. (34) Bierens de Haan, J.A. (1940). Die tierischen Instinkte und ihr Umbau durch Erfahrung. Leiden: Brill. (35) Ziegler, H.E. (1920). Der Begriff des Instinktes einst und jetzt. Jena. (36) Fletcher, R. (1957). Instinct in man. London. (37) Thorpe, W.H. (1948). The modern concept of instinctive behaviour. Bulletin of Animal Behaviour, 7. (38) Thorpe, W.H. (1956). Learning and Instinct in Animal. London: Methuen. Memorandum, 5, out/2003 Belo Horizonte: UFMG; Ribeirão Preto: USP. http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/garcia01.htm Garcia, A. (2003). The psychological literature in Konrad Lorenz's work: a contribution to the history of ethology and psychology. Memorandum, 5, 105-133. Retirado em / / , do World Wide Web: http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/garcia01.htm. 123 (39) Thorpe, W.H. (1965). Science, Man and Morals. London: Methuen. (40) Schjelderup-Ebbe, T. (1922-1923). Zeitschrift für Psychologie, 87. Zur Sozialpsychologie des Haushuhnes. (41) Schjelderup-Ebbe, T. (1924). Zur Sozialpsychologie der Vögel. Zeitschrift für Psychologie. (42) Alverdes, F. (1925). Tiersoziologie. Leipzig. (43) Brückner, G.H. (1933). Untersuchungen zur Tiersoziologie, insbesondere zur Auflösung der Familie. Zeitschrift für Psychologie, 128(1-3). (44) Uexküll, J. von (1909). Umwelt und Innenleben der Tiere. Berlin. (45) Uexküll, J. von (1920). Theoretische Biologie. (46) Uexküll, J. von (1934). Streifzüge durch die Umwelten von Tieren und Menschen. Berlin. (47) Hediger, H. (1934). Zur Biologie und Psychologie der Flucht bei Tieren. Biologishces Zentralblatt, 54, 21-40. (48) Hediger, H. (1935). Zur Biologie und Psychologie der Zahmheit. Archiv für Psychologie, 93. (49) Hediger, H. (1942). Wildtiere in Gefangenschaft. Basel: Schwabe. (50) Hediger, H. (1954). Skizzen zu einer Tierpsychologie im Zoo und im Zirkus. Zurich: Gutenberg. (51) Hediger, H. (1955). Studies of the psychology and behavior of captive animals in zoos and circuses. London. (52) Portielje, J.A. (1926). Zur Ethologie, beziehungsweise Psychologie von Botaurus stellaris, 15(1-2). (53) Portielje, J.A. (1927). Zur Ethologie, Phalacrocorax carbo subcormoranus, 16 (2-3). beziehungsweise Psychologie von (54) Portielje, J.A. (1928). Dieren zien en leeren kennen. Amsterdam: Nederlandsche Keurboeherij. (55) Zeeb, K. (1964). Zirkusdressur und Tierpsychologie. Mitteilungen der Nationalen Forschungsgesellschaft (Bern), NF, 21. (56) Makkink, G.F. (1960). An attempt at an ethogram of the european avocet (Recurvirostra avocetta L.) with ethological and psychological remarks. Ardea, 25, 1-60. (57) Klüver, H. (1933). Behaviour Mechanisms in Monkey. Chicago: Univ. Press. (58) Yerkes, R.M. (1943). Chimpanzees: a laboratory colony. New Haven: Yale University Press. Memorandum, 5, out/2003 Belo Horizonte: UFMG; Ribeirão Preto: USP. http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/garcia01.htm Garcia, A. (2003). The psychological literature in Konrad Lorenz's work: a contribution to the history of ethology and psychology. Memorandum, 5, 105-133. Retirado em / / , do World Wide Web: http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/garcia01.htm. 124 (59) Harlow, H.F. & McClean, F.G. (1954). Object discrimination learned by monkeys on basis of manipulation motives. Journal of Comparative Physiology and Psychology, 47. (60) Harlow, H.F. (1960). The maternal and infantile affectional patterns. (61) Harlow, H.F. (1960). Primary affectional patterns in primates. American Journal of Orthopsychiatry, 30. (62) Harlow, H.F.; Meyer, D.R. & Harlow, M.K. (1950). Learning motivated by a manipulation drive. Journal for Experimental Psychology, 40, 228-234. (63) Harlow, H.F. & Harlow, M.K. (1962). The effect of rearing conditions on behavior. Bull. Menninger Clinic, 26, 213-224. (64) Harlow, H.F. & Harlow, M.K. (1962). Social Deprivation in Monkeys. Scientific American, 207, 137-146. (65) Gardner, R.A. & Gardner, B.T. (1967). Acquisition of sign language in the chimpanzee. Univ. Nevada Progr. Report (ms). (66) Gardner, R.A. & Gardner, B.T. (1969). Teaching sign language to a chimpanzee. Science, 165: 664-672. (67) Gardner, R.A. & Gardner, B.T. (1971). Two-way communication with an infant chimpanzee. In: A. Schreier & F. Stollnitz (Eds). Behavior of Nonhuman Primates (vol 4, pp. 117-184). New York/London: Academic Press. (68) Premack, D. (1971). Language in the chimpanzee? Science, 172, 808-872. (69) Premack, D. (1976). Intelligence in Ape and Man. New York: Willey. (70) Hayes, C. (1951). The Ape in Our House. New York: Harperand Row. (71) Carpenter, C.R. (1934). A Field Study of the Behavior and Social Relations of Howling Monkeys. Comp. Psychol. Monogr., 10, 1-168. (72) Jennings, H.S. (1906). Behaviour of the lower organisms. New York. (73) Loeb, J. (1913). Die Tropismen. Handbuch der Vergleichenden Physiologie, 4. (74) Kühn, A. (1919). Die Orientierung der Tiere im Raum. Jena: Gustav Fischer. (75) Wundt, W. (1922). Vorlesungen über die Menschen- und Tierseele. Leipzig: Voss. (76) Thorndike, E.L.C. (1911). Animal Intelligence. New York: Macmillan. (77) Pavlov, I.P. (1926). Die höchte Nerventätigkeit bei Tieren. Munich. (78) Pavlov, I.P. (1927). Conditioned reflexes: an investigation of the activity of the cerebral cortex. London. (79) Bechterev, W. (1926). Reflexologie des Menschen. Leipzig & Vienna. (80) Anokhin, P.K. (1961). A new conception of the Physiological Architecture of conditioned reflex. In Brain Mechanisms and Learning (pp. 189-229). Oxford: Blackwell. Memorandum, 5, out/2003 Belo Horizonte: UFMG; Ribeirão Preto: USP. http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/garcia01.htm Garcia, A. (2003). The psychological literature in Konrad Lorenz's work: a contribution to the history of ethology and psychology. Memorandum, 5, 105-133. Retirado em / / , do World Wide Web: http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/garcia01.htm. 125 (81) Hogan, J.A. & Adler, N. (1963). Classical conditioning and punishment of an instinctive response in Betta splendens. Animal Behaviour, 11, 351-354. (82) Lidell, H.S. (1934). The conditioned reflex. In: F.A. Moss (Ed.) Comparative Psychology (pp. 247-296). New York: Prentice-Hall. (83) Lidell, H.S. (1944). Conditioned reflex method and experimental neurosis. In: J.M.V. Hunt (Ed.) Personality and the Behavior Disorders (V.I., pp. 389-412). New York: Ronald. (84) Helmholz, H.L.F von (1856-1867). Handbuch derphysiologischen Optik. (85) Helmholz, H.L.F von (1877). Das Denken in der Medizin. (86) Helmholz, H.L.F von (1878). Ueber die Tatsachen in der Wahrnehmung. (87) Helmholz, H.L.F von (1882-1895). Abhandlungen. (88) Helmholz, H.L.F von (1887). Zählen und Messen erkenntnistheoretisch betrachtet. (89) Helmholz, H.L.F von (1897-1898). Vorlesungen über theoretische Physik. (90) Helmholz, H.L.F von (1921). Schriften zur Erkenntnistheorie. (91) Ehrenfels, C. von (1904). Über Wissenschaftliche Philosophie, 14, 249-292. Gestaltqualitäten. Vierteljahresschrift für (92) Köhler, W. (1915). Intelligenzprüfungen an Anthropoiden. I. Abhandlungen der Preussischer Akademie, Wiss Phys-mathem. Kl (Berlin). (93) Köhler, W. (1921). Intelligenzprüfungen an Menschenaffen. Berlin: Springer. (94) Köhler, W. (1973). The Mentality ofApes. 2. Ed. Routledge & Kegan Paul. (95) Bühler, C. (1922). Das Seelenleben des Jugendlichen. Jena. (96) Bühler, C. (1927). Das Problem des Instinktes. Zeitschrift für Psychologie, 103. (97) Bühler, K. (1922). Wahrnemungen, Jena. Handbuch der Psychologie, I. Teil: Die Struktur der (98) Bühler, K. (1922). Die geistige Entwicklung des Kindes. Jena: Gustav Fischer. (99) Bühler, K. (1936). Zukunft der Psychologie. Vienna. (100) Metzger, W. (1936). Gesetze des Sehens. Frankfurt. (101) Metzger, W. (1953). Psychologie. Darmstadt: Steinkoppf. (102) Sander, F. (1928). Experimentelle Ergebnisse der Gestaltpsychologie. Berichte des 10. Kongress für experimentelle Psychologie. Jena. (103) Matthaei, R. (1929). Das Gestaltproblem. München: Bergmann. (104) Alverdes, F. (1932). Die Ganzheitsbetrachtung in der Biologie. Sitzungsbericht der Gesellschaftzur Förderung des ges. Nturwiss. zu Marburg, 67. Memorandum, 5, out/2003 Belo Horizonte: UFMG; Ribeirão Preto: USP. http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/garcia01.htm Garcia, A. (2003). The psychological literature in Konrad Lorenz's work: a contribution to the history of ethology and psychology. Memorandum, 5, 105-133. Retirado em / / , do World Wide Web: http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/garcia01.htm. 126 (105) Koehler, O. (1933). Die Ganzheitsbetrachtung in der modernen Biologie. Verh. Der Könisberger gelehrten Gesellschaft. (106) Freud, S. (1905). Three Essays on the Theory ofSexuality. (107) Freud, S. (1917). Introductory lectures on psycho-analysis. 1916-1917. Part I I I , General theory of neuroses (1917). Lecture on fixation to traumas: the unconscious. (108) Freud, S. (1930). Vorlesungen zur Einführung in die Psychoanalyse. Vienna. (109) Freud, S. (1950). Gesammelte Werke. London: Imago. (110) Feuerborn, H.J. (1939). Der Instinktbegriff und die Archetypen C.G. Jungs. Biologia Generalis, 14. (111) Alverdes, F. (1937). Die Wirksamkeit von Archetypen in den Instinkthandlungen derTiere. Zoologischer Anzeiger, 119. (112) Friedmann, H. (1934). The instinctive emotional life of birds. The Psychoanalytical Review, 21 (3/4). (113) Spitz, R.A. (1945). Hospitalism. The psychoanalitical study ofthe child, 1: 53-74. (114) Spitz, R.A. (1958). La première année de la vie de l'enfant. Paris: Presses Universitaires de France. (115) Bowlby, J. (1952). Maternal care and mental health. World Health Organization. Monograph Series 2. (116) Bowlby, J. (1958). The nature of the child's tie to his mother. Int. J. of Psychoanalysis, 39, 350-373. (117) Erikson, E.H. Stuttgart: Klett. (1953). Wachstum und Krisen der gesunden Persönlichkeit. (118) Erikson, E.H. (1964). Insight and Responsibility. New York: Norton. (119) Erikson, E.H. (1966). Ontogeny of Ritualization in Man. Philos. Transct. Royal Society of London, 251 B, 337-349. (120) Fromm, E. (1974). Anatomie der menschlichen Destruktivitat. Stuttgart: Deutsche Verlagsanstalt. (121) Mitscherlich, A. (1963). Die vaterlose Gesellschaft. München: Piper. (122) Watson, J.B. (1913). Psychology as the behaviorist views it. Psychological Review, 20, 158-177. (123) Watson, J.B. (1930). Der Behaviorismus. Stuttgart: Deutsche Verlangsanstalt. (124) Skinner, B.F. (1936). Conditioning and extinction and their relation to drive. Journal of General Psychology, 14, 296-317. (125) Skinner, B.F. (1938). The Behavior of Organisms. New York: Appleton-CenturyCrofts. Memorandum, 5, out/2003 Belo Horizonte: UFMG; Ribeirão Preto: USP. http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/garcia01.htm Garcia, A. (2003). The psychological literature in Konrad Lorenz's work: a contribution to the history of ethology and psychology. Memorandum, 5, 105-133. Retirado em / / , do World Wide Web: http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/garcia01.htm. 127 (126) Skinner, B. F. (1958). Reinforcement Today. American Psychologist, 13, 94-99. (127) Skinner, B. F. (1971). Beyond Freedom and Dignity. New York: Knopf. (128) Hull, C.L. (1943). Principles of Behavior. New York: Appleton-Century. (129) Tolman, E.C. (1932). Purposive behaviour in animals and men. New York: Appleton-Century-Crofts. (130) Garcia, J.A. & Koelling, R.A. (1967). A comparison of aversions induced by X rays, toxins and drugs in the rat. Radiation Research Supplement, 7, 439-450. (131) Garcia, J. & Ervin, F.R. (1967). A neuropsychological approach to appropriateness of signals and specificity of reinforcers. Proc. ofIntern. Neuropsychology Society Meeting. (132) Garcia, J.; McGowan, B.K.; Ervin, F.R. & Koelling, R.A. (1968). Cues: Their relative Effectiveness as a Function of the Reinforcer. Science, 160, 794-795. (133) Garcia, J.; Hankins, W.G. & Rusiniak, K.W. (1974). Behavioral regulation of the milieu interne in man and rat. Science, 185, 824-831. (134) Bavelas, A. (1957). Group size - Interaction and structural environment. Group processes. Transaction of the Fourth Conference, 1957. New York: The Josiah Macy Jr. Foundation. (135) Milgram, A. (1963). Behavioral Study of Obedience. Journal of Abnormal and Social Psychology, 67, 372-378. (136) Gehlen, A. (1960). Die Seele im technischen Zeitalter. Sozialpsychologische Probleme in der industriellen Gesellschaft. Hamburg: Rowohlt. (137) Bischof, N. (n.d.). Aristoteles, Galileu, Kurt Lewin - und die Folgen. Zeitschrift für Sozialpsychologie. (138) Bischof, N. (1972). Die biologischen Grundlagen der Inzesttabus. In Reinert (ed) Bericht über den 27. Kongress der Deutschen Gesellschaft für Psychologie, Kiel. Göttingen: Verlag für Psychologie. (139) Volkelt, H. (1914). Die Entwicklungespsychologie. F. Krueger. Vorstellungen der Tiere: Arbeiten zur (140) Schneirla, T.C. (1966). Behavioral Development and Comparative Psychology. Quart. Ver. Biol, 41, 283-302. (141) Volkelt, H. (1937). Tierpsychologie als genetische Ganzheitpsychologie. Zeitschrift für Tierpsychologie, 1 (1), 49-65. (142) Carmichael, L. (1926). The developent of behaviour in vertebrates experimentally removed from the influence of external stimulation. Psychological Review, 33. (143) Birch, H.G. (1945). The relation of previous experience to insightful problemsolving. J. Comp. Psychol, 38. (144) Riess, P.E. (1954). The Effect of Altered Environment and of Age on the MotherYoung Relationships among Animals. Ann. NYAcad. Sci., 57, 606-610. Memorandum, 5, out/2003 Belo Horizonte: UFMG; Ribeirão Preto: USP. http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/garcia01.htm Garcia, A. (2003). The psychological literature in Konrad Lorenz's work: a contribution to the history of ethology and psychology. Memorandum, 5, 105-133. Retirado em / / , do World Wide Web: http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/garcia01.htm. 128 (145) Hess, E.H. (1959). Imprinting, an Effect of Early Experience. Science, 130, 133141. (146) Hess, E.H. (1973). Imprinting: Early Experience and the development of Psychology of Attachment. New York: van Nostrand. (147) Schutz, F. (1964). Die Bedeutung früher sozialer Eindrücke während der "Kinderund Jugendzeit" bei Enten. Z. Exptl Angew. Psychol., 11, 169-178. (148) Gottlieb, G. (1965). Imprinting in relation to Parental and Species Identification by Avian Neonates. J. Comp physiol. Psychol., 59, 345-356. (149) Kruijt, J. (1971). Early experience and the development of social behaviour in Jungle Fowl. Psychiatr. Neurol. Neurochir., 74, 7-20. (150) Freedman, D.G. (1964). Smiling in Blind Infants and the Issue of Innate vs. Acquired. J. Child Psychol. Psychiat., 5, 171-184. (151) Freedman, D.G. (1965). Hereditary Control of Early Social Behavior. In B.M. Foss (Ed.). Determinants of Infant Behavior I I I . London: Methuen. (152) Peiper, A. (1935). Die ‘Instinkte' des Neugeborenen. Z. Psychol, 136. (153) Peiper, A. (1961). Die Eigenart der kindlichen Hirntätigkeit. 3. Aufl. Leipzig. (154) Prechtl, H.F.R.; Knol, A.R. (1958). Die Fussohlenreflexe beim neugeboren Kind. Archiv Psychiatrie und Z. für die Gesamte Neurologie, 196, 542-553. (155) Groos, K. (1907). Die Spiele der Tiere. (156) Bally, G. (1945). Vom Ursprung und den Grenzen der Freiheit. Eine Deutung des Spielens bei Tier und Mensch. Basel: Birkhäuser. (157) Bower, T.G. (1971). The object in the world of the infant. Scientific American, 225 (4), 30-38. (158) Eigen, M.; Winkler, R. (1975). Das Spiel. Naturgesetze steuern den Zufall. Munich/Zurich: Piper. (159) Werner, H. (1933). Entwicklungspsychologie. Leipzig. (160) Schroeder, P. (1931). Kindliche Charaktere und ihre Abartigkeiten. Breslau. (161) Ahrens, R. (1953). Beitrag zur Entwicklung des Mimikerkennens. Z. exp. Angew. Psychol., 2, 412-454, 599-633. Physiognomie - und (162) Jander, R. (1957). Die optische Richtungsorientierung der roten Waldameisen (Formica rufa L.). Z. vgl. Physiol., 40, 162-238. (163) Hoffman, K. (1954). Versuche zu der im Richtungsfinden der Vögel enthaltenen Zeitschätzung. Z. Tierpsychol, 11, 453-475. (164) Sauer, F. (1961). Further studies on the stellar orientation of nocturnally migrating birds. Psychologische Forschung, 26, 224-244. Memorandum, 5, out/2003 Belo Horizonte: UFMG; Ribeirão Preto: USP. http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/garcia01.htm Garcia, A. (2003). The psychological literature in Konrad Lorenz's work: a contribution to the history of ethology and psychology. Memorandum, 5, 105-133. Retirado em / / , do World Wide Web: http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/garcia01.htm. 129 (165) Hoffmann, K. (1952). Die Einrechnung der Sonnenwanderung bei der Richtungsweisung des sonnenlos aufgezogenen Stares. Naturwissenschaften, 40, 148. (166) Engelmann, W. (1928). Untersuchungen über die Schallokalisation bei Tieren. Z. für Psychologie, 105. (167) Fraenkel, G.S. &Gunn, S.D. (1961). The Orientation of Animals. Oxford: Clarendon Press. (168) Hess, E.H. (1956) Space perception in the chick. Scientific American, 195: 71-80. (169) Bateson, P.P.G. (1964). An effect of imprinting on the perceptual development of domestic chicks. Nature, 202, 421-422. (170) Ball, W. & Tronick, E. (1971). Infant responses to impending collision: optical and real. Science, 171, 818-820. (171) Bingham, H. (1913). Size and form perception in Gallus domesticus. Journal of Animal Behavior. (172) Frisch, K. von (1914). Der Darbensinn und Formensinn der Biene. Zool. Jahrb., 35, 1-188. (173) Hertz, M. (1937). Beitrag zum Farbensinn und Formensinn der Biene. Z. vgl. Physiol., 24, 413-421. (174) Bower, T.G. (1966). Slant Perception and Shape Constancy in Infants. Science, 151, 832-834. (175) Kneutgen, J. (1970). Eine Musikform und ihre Biologische Funktion. Über die Wirkungsweise der Wiegenlieder. Z. für exp. u. angew. Psychol., 17 (2), 245-265. (176) Birdwhistell, R.L. (1963). The kinesis level in the investigation of the emotions. In: P. H. Knapp (Ed), Expressions of the Emotions in Man. New York: Int. Univ. Press. (177) Birdwhistell, R.L. (1970). Kinesis and Context. Philadelphia: Univ. of Pennsylvania Press. (178) Hückstedt, B. (1965). Experimentelle Untersuchungen zum 'Kindchenschema". Z. exp. und angew. Psychologie, 12, 421-450. (179) Beach, F.H. & Jaynes, J. (1956). Studies of maternal retrieving in rats. I I I . Senrory cues involved in the lactating female's response to heryoung. Behaviour, 10, 104-125. (180) Maier, N.R.F. Monographs, 6, 29. (1929). Reasoning in white rats. Comparative Psychology (181) Maier, N.R.F. (1930). Reasoning in humans. I. On direction. J. of Comp Psychology, 10, 115-143. (182) Hopp, G. (1970). Evolution der Sprache und Vernunft. Berlin: Springer. (183) Frijda, N.H. (1964). Mimik und Pantomimik. In R. Kirchoff (ed.). Handb. d. Psychol. 5, Ausdruckspsychologie (pp. 351-421). Memorandum, 5, out/2003 Belo Horizonte: UFMG; Ribeirão Preto: USP. http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/garcia01.htm Garcia, A. (2003). The psychological literature in Konrad Lorenz's work: a contribution to the history of ethology and psychology. Memorandum, 5, 105-133. Retirado em / / , do World Wide Web: http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/garcia01.htm. 130 (184) Birdwhistell, R.L. (1968). Communication without words. In P. Alexander (Ed). L'Aventure Humaine. Paris. (185) Frisch, K. von (1923). Über die Sprache der Bienen. Zool. B. Abt. Physiol, 40. (186) Hirsch, J.; Lindley, R.H. & Tolman, E.C. (1955). An experimental test of an alleged innate sign stimulus. J. comp. Phys. and Psych., 48. (187) Butler, R.A. (1953). Discrimination Learning by Rhesus Monkeys to Visual Exploration Motivation. Journal of Comp. physiol. Psychol, 46, 95-98. (188) Foppa, K. (1966). Lernen, Gedächtnis, Verhalten. Ergebnisse und Probleme der Lernspsychologie. Köln: Kiepenheuer und Witsch. (189) Bischof, N. (1966). Erkenntnishteoretische Grundlagenprobleme Wahrnemungspsychologie. Hand. d. Pscyhol, I: 21-78. Gottingen: Hogrefe. der (190) Decker, H. (n.d.). Das Denken in Begriffen als Kriterium der Menschwerdung. (191) Labarre, W. (1947). The Cultural Basis of Emotions and Gestures. Journal of Personality, 16: 49-68. (192) Stellar, E. (1954). The physiology of motivation. Psychol. Review, 61: 5-22. (193) Roberts, W.W. & Kiess, H.O. (1964). Motivational Properties of Hypothalamic Aggression in Cat. J. comp. Physiol. Psychol., 58, 187-193. (194) Leyhausen, P. (1965). Das Motivationsproblem in der Etholoige. Hdbch Psychol. Bd Motivationslehre, Göttingen. (195) Bohr, N. (1958). On atoms and human knowledge. Daedalus (American Academy of Arts and Sciences), Spring, 1958. (196) Bridgman, P. (1958). Remarks on Niels Bohr's talk. Daedalus (American Academy of Arts and Sciences), Spring, 1958. (197) Planck, M. (1942). Naturwissenschaften, 30. Sinn und Grenzen der exakten Wissenschaft. (198) Baumgarten, E. (1933). Franklin-Studies. Leipzig: Hinzel. (199) Baumgarten, E. (1938). DerPragmatismus. Frankfurt; Main: Klostermann. (200) Baumgarten, E. (1941). Allgemeine elementare Philosophie I. Ms. Königsberger Vorlesung. (201) Baumgarten, E. (1950). Versuch über die menschlichen Gesellchaften und das Gewissen. Studium Generale, 3, 10. (202) Dewey, J. (1925). Experience and Nature. Chicago and London: Open Court Publishing. (203) Dewey, J. (1936). Reconstruction in Philosophy. New York: Henry Holt. Memorandum, 5, out/2003 Belo Horizonte: UFMG; Ribeirão Preto: USP. http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/garcia01.htm Garcia, A. (2003). The psychological literature in Konrad Lorenz's work: a contribution to the history of ethology and psychology. Memorandum, 5, 105-133. Retirado em / / , do World Wide Web: http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/garcia01.htm. 131 (204) Brunswik, E. (1934). Wahrnemung und Gegenstandwelt, Psychologie vom Gegenstand her. Leipzig and Vienna. (205) Brunswik, E. (1952). The Conceptual Framework of Psychology. Chicago: Chicago University Press. (206) Brunswik, E. (1957). Scope and aspects of the cognitive problem. In: J.S. Bruner et al. (Eds) Contemporary approaches to cognition. Cambridge (Mass): Harvard University Press. (207) Campbell, D.T. (1958). Methodological suggestions for a comparative psychology of knowledge processes. Oslo Univ. Press, Inquiry. (208) Campbell, D.T. (1966a). Pattern matching as an essential in distal knowing. In K.R. Hammond (Ed.). The psychology of Egon Brunswik. New York: Holt, Rinehart and Winston. (209) Campbell, D.T. (1966b). Evolutionary Espitemology. In P.A. Schilpp (Ed). The Philosophy of Karl R. Popper. La Salle: Open Court Publishing. (210) Bell, C. (1830). The Nervous System of the Human Body. (211) Bernard, C. (1872). Physiologie générale. (212) Müller, J. (1833-1840). Handbuch der Physiologie des Menschen. Koblenz. (213) Sherrington, C.S. (1906). The integrative action of the nervous system. New York: Scribner's. (214) Sherrington, C.S. (1931). Quantitative management of contraction in lowest level coordination. Brain, 54:1-28. (215) Weiss, P. (1941). Autonomous versus reflexogenous activity of the central nervous system. Proc. Am. Phil. Soc, 84. (216) Hess, W.R. & Brügger, M. (1943). Das subkortikale Zentrum der affektiven Abwehrreaktion. Helvetica Physiologica et Phamacologica Acta, 1. (217) Grey Walter, W. (1953). The Living Brain. London: Gerald Duckworth. (218) Hess, W.R. (1954). Das Zwischenhirn. 2. Aufl. Basel: Schwabe. (219) Hess, W.R. (1957). Die Formatio reticularis des Hirnstammes verhaltensphysiologischen Aspekte. Psychiatr. Nervenkr., 196, 329-336. im (220) Mark, V.H. & Ervin, F.R. (1970). Violence and the Brain. New York: Harper & Row. (221) Beach, F.H. (1942). Analysis of Factors Involved in the Arousal, Maintenance, and Manifestation of Sexual Excitement in Male Animals. Psychosomatic Med., 4, 173-198. (222) Beach, F.A . (1948). Hormones and Behavior. New York: Cooper Square. (223) Richter, C. P. (1954). Behavioral Regulators of Carbohydrate Homeostasis. Acta Neurovegetativa, 9, 247-259. Memorandum, 5, out/2003 Belo Horizonte: UFMG; Ribeirão Preto: USP. http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/garcia01.htm Garcia, A. (2003). The psychological literature in Konrad Lorenz's work: a contribution to the history of ethology and psychology. Memorandum, 5, 105-133. Retirado em / / , do World Wide Web: http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/garcia01.htm. 132 (224) Hassler, R. & Bak, I.J. (1966). Submikroskopishce Catecholaminspeicher als Angriffspunkte der Psychopharmaka Reserpin und Mono-Amino-Oxidase-Hemmer. Der Nervenarzt, 37, 493-498. (225) Eccles, J.C. (1953). The Neurophysiological Basis of Mind: The Principles of Neurophysiology. London: Oxford University Press. (226) Eccles, J. C. (1966). Brain and Conscious Experience. New York: Springer. (227) Eccles, J. C. (1968). Uniqueness of Man. In J.D. Roslansky (Ed.). Amsterdam: North Holland. (228) Leyhausen, P. (1954). Die Entdeckung der relativen Koordination: Ein Beitrag zur Annäherung von Physiologie und Psychologie. Studium Generale, 7, 45-60. (229) Holst, E. von (1935a). Über den Prozess der zentralnervösen Koordination. Pflüg. Arch, 236, 149-158. (230) Holst, E. von (1935b). Alles oder Nichts: Block, Alternans, Bigemini und Verwandte Phänomene als Eigenschaften des Rückenmarks. Pflügers Archiv. f. d. gesamte Physiologie, 236. (231) Holst, E. von (1937). Bausteine zu einer vergleichenden Physiologie der lokomotorischen Reflexe bei Fischen. I I . Z. vgl. Physiologie, 24, 532-562. (232) Holst, E. von (1939). Entwurf eines Systems der lokomotorischen Perioden bildung bei Fischen; ein kritischer Beitrag zum Gestaltproblem. Z. vergl. Physiologie, 26. (233) Holst, E. von (1955). Regelvorgänge in der optischen Wahrnehmung. Rept 5th Conf. Soc. Biol. Rhythm. Stockholm. (234) Holst, E. von (1957). Aktive Leistung der menschlichen Gesichtswahrnemung. Studium Generale, 4, 231-243. (235) Holst, E. von (1969-1970). Zur Verhaltensphysiologie bei Tieren und Menschen. Munich/Zurich: Piper. (236) Kretschmer, E. (1921). Körperbau und Charakter. (237) Massermann, J.H. (1943). Behavior and Neuroses. Chicago: University of Chicago Press. (238) Hahn, K. (1960). Die List des Gewissens. In: Erziehung und Politik. Minna Specht zu ihrem 80. Geburtstag. Frankfurt: Öffentliches Leben. (239) Czerwenka-Wenkstetten, G. (1977). Das ‘leere' Gesicht. Lecture. (240) Frankl, V. E. (1979). Der Mensch von der Frage nach dem Sinn. Munich; Zurich: Piper. (241) Klages, L. (1981). Der Geist als Widersacher der Seele. 6.ed. Bonn: Bouvier. (242) Schulze, H. (1963). Das Ganzsituationserlebnis in der Neurosentherapie. Pr. d. Psychotherapie. Memorandum, 5, out/2003 Belo Horizonte: UFMG; Ribeirão Preto: USP. http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/garcia01.htm Garcia, A. (2003). The psychological literature in Konrad Lorenz's work: a contribution to the history of ethology and psychology. Memorandum, 5, 105-133. Retirado em / / , do World Wide Web: http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/garcia01.htm. 133 (243) Schulze, H. (1964). Der progressiv domestizierte Mensch und seine Neurosen. München: Lehmann. (244) Schulze, H. (1971). Das Prinzip Handeln in der Psychotherapie. Stuttgart: Enke. (245) Schulze, H. (1977). Nesthocker Mensch. Stuttgart: Enke. Note on the author Agnaldo Garcia - Researcher and professor of the Graduate Course in Psychology, Federal University of Espírito Santo (UFES), Brazil. Areas of research: History and Epistemology of Psychology and Ethology and Interpersonal Relationship. The author obtained his title of Doctor in Psychology at the University of São Paulo. Address: Av. Des. Cassiano Castelo, 369, Manguinhos/Serra - ES, CEP 29173-037, Brazil E-mail: [email protected] Data de recebimento: 29/07/2003 Data de aceite: 26/10/2003 Memorandum, 5, out/2003 Belo Horizonte: UFMG; Ribeirão Preto: USP. http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/garcia01.htm Ales Bello, A. (2003). Il simbolo nell'esperienza sacrale-religiosa: un'analisi fenomenologica. 134 Memorandum, 5, 134-147. Retirado em / / , do World Wide Web: http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/alesbello02.htm. Il simbolo nell'esperienza sacrale-religiosa: un'analisi fenomenologica The symbol in the sacred-religious experience: a phenomenological analysis Angela Ales Bello Pontificia Università Lateranense Italia Riassunto Il saggio si apre con un resoconto delle analisi sul simbolo condotte da Husserl nell'opera Phantasie, Bildbewusstsein, Erinnerung (Husserliana vol. XXIII) dalle quali si ricava la caratteristica del simbolo, da intendersi come rimando ad una realtà non presente e quindi la sua differenza con gli altri vissuti (Erlebnisse) di cui l'essere umano ha coscienza, ad esempio percezione, ricordo, fantasia etc., ciascuno diverso dall'altro qualitativamente. Si procede, poi, all'analisi dell'esperienza religiosa sotto il profilo fenomenologico e si ricava che essa è "presenza" del sacro o del divino. Si approfondisce, allora, la differenza fra "presenza" e "simbolo" notando, attraverso esemplificazioni tratte da esperienze religiose arcaiche e storiche, che la conoscenza simbolica non è esaustiva del sacro e del religioso ed è solo una modalità espressiva di tali esperienze e non ne costituisce l'essenza. Parole chiave: simbolo; esperienza sacrale-religiosa; fenomenologia husserliana. Abstract The essay starts by revisiting the analyses on symbols realized by Husserl in his work Phantasie, Bildbewusstsein, Erinnerung (Husserliana vol. XXIII). Through the analyses of this work, which we can affirm that the characteristic of the symbol is that it refers to a non-present reality, which is different of other "lived-through" experiences (Erlebnisse) that the human being has conscience of, as, for instance, perception, remembrance, fantasy - each of which is qualitatively diverse of each other. Then, we proceed to the phenomenological analyses of the religious experiece and we discover that it is "presence" of the sacred or the divine. Further, we deepen the difference between "presence" e "symbol" noting, through examples taken from the archaic and religious experiences, that the symbolic knowledge does not exhausts the sacred and the religious experience. It is only an expressive modality of these experiences and it does not constitute their essence. Keywords: symbol; sacred-religious experience; Husserlian phenomenology Mi propongo di affrontare il tema del nostro convegno usando il metodo offerto dall'analisi fenomenologica e quindi sottoponendo ad indagine i due momenti centrali della problematica in esame, quello relativo al fenomeno "simbolo" e quello connesso alla serie dei fenomeni che concernono l'esperienza sacrale-religiosa. Con questo ultima espressione intendo da un punto di vista storico-valutativo le religioni arcaiche, che conosciamo indirettamente o attraverso sopravvivenze, e le religioni positive con le loro configurazioni che sono per noi accessibili attraverso documenti e testimonianze. Il ritorno alle proposte metodologiche offerte dalla fenomenologia presenta, a mio avviso, il vantaggio di penetrare nelle nozioni, nei fatti, negli eventi, in breve nelle "cose", Sachen, che ci si presentano dal punto di vista esperienziale e culturale per coglierne il Memorandum, 5, out/2003 Belo Horizonte: UFMG; Ribeirão Preto: USP. http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/alesbello02.htm Ales Bello, A. (2003). Il simbolo nell'esperienza sacrale-religiosa: un'analisi fenomenologica. 135 Memorandum, 5, 134-147. Retirado em / / , do World Wide Web: http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/alesbello02.htm. senso sia nella loro singolarità sia nella loro connessione. La difficoltà sta nella necessità di ripercorrere analiticamente il cammino già in gran parte delineato dei fenomenologi classici per vagliare di nuovo la validità dei risultati raggiunti sempre in riferimento, non ad opinioni soggettive, ma alle "cose stesse". E' necessario, pertanto, l'esercizio di una "pazienza" analitica, perché i risultati saranno tanto più validi, quanto più il procedimento sarà rispettoso delle realtà prese in esame. Ponendomi nella prospettiva indicata vorrei ripercorrere in primo luogo le analisi di Husserl sul simbolo che accompagnano gran parte della sua ricerca rappresentando un aspetto non secondario, ma spesso trascurato e non proficuamente utilizzato per applicare alcuni risultati della sua indagine al tema dell'esperienza religiosa. L'analisi della funzione simbolica si trova, infatti, all'inizio della ricerca husserliana già nella Philosophie der Aritmetik del 1890 e si snoda fino agli anni Venti, connessa con l'indagine del vasto territorio delle operazioni presenti nella soggettività umana di cui abbiamo consapevolezza (Erlebnisse). Nella sua prima opera tale funzione è studiata relativamente alla genesi del numero; infatti, tutte le operazioni aritmetiche conducono ad una rappresentazione numerica simbolica che si esprime in un determinato numero. Per stabilire che cosa sia il simbolo in se stesso e che cosa possa essere considerato simbolico, ad esempio il numero, la parola e altre nozioni che sono ritenute tali, Husserl torna sull'argomento nelle Logische Untersuchungen, in cui si sottolinea la differenza fra il segno puro e semplice e il segno significativo nel quale si esprime intenzionalmente il pensiero simbolico. Non interessa ora ripercorre nei dettagli il cammino husserliano, ma ai fini della presente trattazione i testi più importanti sono quelli relativi alle Lezioni del semestre invernale tenute da Husserl nel 1904-05 e dedicate alle Hauptstücke aus der Phänomenologie und Teorie der Erkenntnis (Parti principali tratte dalla fenomenologia e dalla teoria della conoscenza ora pubblicate nel vol. XXIII della Husserliana dal titolo Phantasie, Bildbewusstsein, Erinnerung 1898-1925) (Husserl, 1980). Fra queste "parti principali", si potrebbe dire "articoli fondamentali", si trova lo studio della percezione, quello della coscienza immaginativa o raffigurativa che si divide in una forma fantastica e una simbolica e l'analisi del ricordo. Tutto ciò rimanda per una comprensione più approfondita alla questione del tempo, che Husserl (1985) sta parallelamente analizzando in modo autonomo (Zur Phänomenologie des Zeitbewusstseins 1893-1917). Come si può notare l'approccio alla dimensione della coscienza diventa sempre più analitico ed ulteriori atti sono sottoposti ad indagine; ciò consente di esaminare il significato del simbolo risalendo alla sua funzione specifica attraverso il confronto con altre espressioni umane. In primo luogo è opportuno distinguere due modi "primitivi"di rappresentazione: la percezione e la ripresentazione. Quest'ultima può avvenire attraverso l'analogia e in tal modo la raffigurazione che si ottiene può essere interna o immanente, nel senso che è legata all'oggetto rappresentato, oppure può rimandare all'esterno, in tal modo si ha una rappresentazione simbolica. In questo tipo di rappresentazione si individuano due classi; la prima, che Husserl definisce simbolica nel senso originario e tradizionale della parola, si realizza attraverso raffigurazioni, ad esempio, di tipo geroglifico. In origine anche il linguaggio e la scrittura avevano questo carattere geroglifico, infatti, l'operazione qui implicata era quella di "levigare", togliere il superfluo per ottenere una sorta di stilizzazione; in seguito si costruirono artificialmente parole, segni algebrici - ritorna qui la riflessione sul simbolismo matematico - che danno alla rappresentazione un carattere "segnico" senza legami con le cose rappresentate con le quali, anzi, non hanno nulla a che fare internamente, e questa è la seconda classe della rappresentazione simbolica. Tutto ciò riconduce alla coscienza immaginativa che si articola nella raffigurazione interna o esterna, quest'ultima simbolica, e nella fantasia. Alla fantasia, in verità, è dedicata la parte più cospicua dell'analisi condotta da Husserl (1980) nel testo che si sta esaminando e negli altri testi contenuti nel volume XXIII della Husserliana. Ed è proprio il confronto con la fantasia e con il ricordo che consente di circoscrive in modo sempre più preciso la funzione simbolica. Poiché quest'ultima fa parte di una raffigurazione (Bild), se essa consiste in un oggetto in senso fisico che è qualcosa di finto (Fiktum), appare come una Memorandum, 5, out/2003 Belo Horizonte: UFMG; Ribeirão Preto: USP. http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/alesbello02.htm Ales Bello, A. (2003). Il simbolo nell'esperienza sacrale-religiosa: un'analisi fenomenologica. 136 Memorandum, 5, 134-147. Retirado em / / , do World Wide Web: http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/alesbello02.htm. cosa fisica, ma non è la cosa originaria che è percepita in modo diretto. Questa finzione, o meglio la coscienza producente la finzione, si compenetra con la coscienza della ripresentazione, in tal modo nasce la coscienza immaginativa (1) e con essa un nuovo contrasto fra ciò che è oggetto di finzione (Fiktum) e ciò che è immaginato (Imaginatum). Alla fantasia manca l'oggetto finto; l'immagine di fantasia non è una raffigurazione relativa a qualcosa di reale e presente, infatti non c'è nessun riferimento ad una percezione. Se c'è una sorta di raffigurazione essa non è rivolta all'esterno o se lo è, l'aspetto importante è quello della raffigurazione interna. L'oggetto raffigurato come oggetto fisico pone la questione della maggiore o minore conformità con la cosa reale - e qui Husserl porta esempi tratti dalle tecniche artistiche di tipo raffigurativo, il quadro ad olio, l'incisione, il disegno ad inchiostro di china o il calco di gesso - sottolineando che si ha una percezione sia nel caso dell'originale sia in quello della copia, anzi che, da questo punto di vista, essi sono sullo stesso piano, ma che, contemporaneamente, la copia contiene sempre un negativo, nel senso che "non" è l'originale; al contrario, se si esamina la fantasia, i suoi oggetti non solo non cadono nell'ambito della percezione, ma appartengono ad un mondo totalmente diverso, del tutto separato da quello attualmente presente. Se pensiamo di togliere il carattere di raffigurazione agli oggetti raffiguranti e il loro non essere gli oggetti raffigurati, rimane l'oggetto di percezione; ma se compiamo la stessa operazione con gli oggetti della fantasia, non ci rimane certo alcunché di percepito. E' possibile, allora, distinguere l'immaginazione in senso proprio e l'immaginazione nel senso della semplice fantasia. Nel primo caso un oggetto appare come raffigurazione di un altro, quindi l'oggetto presente come ri-presentazione di quello non presente, sia esso fisico o meno. Tutto ciò è chiaro nella funzione segnica o simbolica: "Il simbolo appare in se stesso, ma è portatore di una connessione con qualcosa d'altro che in esso è segnalato" (Husserl, 1980, p. 82). Tuttavia è opportuno distinguere la funzione raffigurativa da quella simbolica in quanto la prima è raffigurante internamente, mentre il simbolo esternamente. La raffigurazione, però, non è l'originale. Nel caso dell'immaginazione, intesa come fantasia, il ruolo dell'oggetto è del tutto diverso. Non si tratta di un oggetto che il soggetto guarda come membro di un campo di oggetti percepibili, sia esternamente raffigurato dal soggetto sia simbolizzato attraverso una somiglianza sempre più lontana. Nella fantasia non c'è rimando a ciò che non è presente, ma l'oggetto è proprio della fantasia. Ad esempio posso formarmi una raffigurazione fantastica dell'imperatore Cesare, é chiaro che se la analizzo mi rendo conto che non si tratta né di una rappresentazione "propria", nel senso che Cesare è presente in carne ed ossa, né di una raffigurazione di lui come non presente e neppure di un ricordo. Infatti non lo "percepisco", né lo ho percepito e lo ricordo, né lo ho percepito e lo raffiguro, neppure so che la raffigurazione mi rimanda ad un possibile percepire (cf. Idem, p. 153). Questa sottile analisi delle differenze fra i vissuti - percezione, ricordo, raffigurazione, fantasia - consente di individuare attraverso una serie di esclusioni reciproche il significato proprio del simbolo. Nei testi ai quali ci si riferisce l'analisi riguarda in particolare la dimensione estetica. L'esame del quadro di Tiziano "Amor sacro e amor profano" dà lo spunto per individuare un pluralità di approcci. Una riproduzione in formato ridotto di quel quadro, che probabilmente Husserl aveva davanti a sé, gli consente di riprendere il tema della raffigurazione e quindi del rimando a ciò che assomiglia; qui si sviluppa il tema della somiglianza che è alla base della rappresentazione simbolica come nel caso delle parole onomatopeiche, caso in cui si è consapevoli della somiglianza. Tuttavia ci si può immergere nel quadro cercandone il significato in questo caso la coscienza raffigurativa non coglie il quadro ma ciò che è simbolizzato; si può cogliere, pertanto, una nuova intenzione, quella relativa al soggetto stesso che è autore del quadro. Nei momenti di concordanza di interesse si ha una "rappresentazione" del soggetto stesso, in modo tale che viviamo, sperimentiamo concordanze; si attua, così, un processo di somiglianza per cui cogliamo ciò che intendeva il pittore stesso, come se fossimo Tiziano. Questo non esclude la tensione fra Memorandum, 5, out/2003 Belo Horizonte: UFMG; Ribeirão Preto: USP. http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/alesbello02.htm Ales Bello, A. (2003). Il simbolo nell'esperienza sacrale-religiosa: un'analisi fenomenologica. 137 Memorandum, 5, 134-147. Retirado em / / , do World Wide Web: http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/alesbello02.htm. la funzione di rimando del quadro che ri-presenta un oggetto e la profonda unità di esperienza che si attua con il soggetto autore del quadro, per cui la coscienza va verso l'interno e poi di nuovo verso l'esterno; si può comprendere meglio tutto ciò usando il riferimento alla funzione simbolica nella quale si realizza un rimando fra il simbolo e ciò che inteso dal simbolo, anzi quest'ultimo può attrarre l'attenzione di per sé, prescindendo dal rapporto simbolico (cf. Idem, pp. 153-156). Si può notare, allora, che ci sono gradi diversi di "somiglianza" che riguardano la coscienza raffigurativa, quella simbolica o quella segnica, come sottolinea Husserl nell'Appendice dedicata a Stufen der Ähnlichkeit, beim Bild-, Symbol- Zeitbewusstsein (cf. Idem, pp. 149 e segg.), ma anche distinzioni. In tal modo la funzione simbolica è individuata attraverso un'analisi che la mette in correlazione e la distingue da altre funzioni e operazioni della coscienza che nel procedere concreto sono spesso intrecciate, compresenti o simili; ci si rende conto, perciò, delle difficoltà nello svolgimento del compito analitico e della pazienza richiesta al ricercatore nel seguire i sottili intrecci della vita della coscienza. Realtà e simbolo Dall'analisi precedente si ricava un risultato generale che emerge come filo conduttore; esso consiste in una prima, fondamentale individuazione del significato della coscienza percettiva che si trova davanti a ciò che è percepito "in carne ed ossa" e che quindi è riempita in modo originario, l'originarietà della percezione consiste proprio in questa possibilità di accedere a ciò che è reale (wirklich). E' sufficiente una breve, concisa affermazione di Husserl per intendere ciò: «Gemalte Farben sind nicht ganz so wie wirkliche» (Idem, p.49): I colori dipinti sono affatto come quelli reali. Ed è chiara anche la coscienza di questa distinzione che, come tutte le distinzioni essenziali, è colta intuitivamente. Ciò non esclude che in particolari condizioni ci si possa ingannare, l'errore é sempre tenuto presente ed è a sua volta oggetto di analisi; per citare un rimando significativo, ciò è esaminato da Husserl (1966) nella Prima Parte delle sue Analysen zur passiven Synthesis (1918-1926), Husserliana vol. XI, in cui tratta delle modalità conoscitive (Modalisierung) (2). Se la percezione gioca un ruolo fondamentale per la vita della coscienza, quest'ultima manifesta un'ampiezza e una ricchezza di funzioni che è sorprendente. Si è cercato di dare un saggio di questo processo analitico e si sono indicati alcuni risultati che hanno consentito di individuare l'altra funzione importante della coscienza che è quella della ripresentazione, perché se la coscienza percettiva coglie ciò che presente, altre funzioni hanno un andamento ri-produttivo; tuttavia non possono essere poste sullo stesso piano, infatti la raffigurazione è una riproduzione che muove da ciò che è percepito anche se lo propone secondo gradi diversi di "somiglianza", mentre la fantasia, pur essendo una ripresentazione, ha una funzione riproduttiva di modificazione tale che genera un mondo diverso, "altro" rispetto al mondo reale. La funzione simbolica differisce da entrambe in quanto non raffigura semplicemente, ma intende qualche cosa d'altro, essendo legata in modo più vicino o più lontano a ciò che è inteso, ma non generando un mondo alternativo. La raffigurazione, il simbolo, la fantasia hanno una loro originarietà come atti della coscienza, ma non sono certamente originari nel senso della percezione, ciò che manca ad essi è, appunto, il riferimento alla realtà, cioè non sono wirklich. Il primato accordato al momento percettivo non può essere inteso come un residuo empiristico. Ciò che bisogna sottolineare in ogni caso è che, lungi dal rinchiudersi nell'ambito coscienziale, l'essere umano è in primo luogo aperto al mondo reale, al contatto percettivo con le cose attraverso la sua corporeità che è riconosciuta nella sua funzione di presenza nel mondo fisico e di tramite fra esso e il mondo dell'interiorità. È necessario sottolineare, tuttavia, che il "mondo per noi" non si riduce al semplice mondo percepito; al contrario se la percezione rappresenta un'apertura, il mondo è costituito dall'insieme delle esperienze sedimentate, elaborate, e quindi raffigurate e ricordate, ma anche progettate come possibili, per cui il mondo per noi è il mondo che ci portiamo Memorandum, 5, out/2003 Belo Horizonte: UFMG; Ribeirão Preto: USP. http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/alesbello02.htm Ales Bello, A. (2003). Il simbolo nell'esperienza sacrale-religiosa: un'analisi fenomenologica. 138 Memorandum, 5, 134-147. Retirado em / / , do World Wide Web: http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/alesbello02.htm. dentro come un bagaglio enorme e dilatabile sempre, ulteriormente nel contatto e nel rapporto con le cose e soprattutto gli altri soggetti. La varietà e pluralità degli atti ci consente di individuare le venature di questo mondo che in ultima analisi è un mondo culturale, ma mai solipsistico, anche se la dimensione interiore con le sue modalità strutturali e con le sue caratteristiche particolari e insostituibili costituisce un unicum irripetibile. Su questo sfondo la funzione simbolica si affianca alle altre svolgendo il suo ruolo specifico, possedendo pari valore e dignità, ma non tutto passa attraverso il simbolo, anche se è possibile simbolizzare. Ciò che la coscienza vuole cogliere in verità è il significato di ogni "cosa", sia questa da intendersi anche come operazione stessa della coscienza, e quindi si vuole individuare il significato del simbolo in quanto simbolo. E il significato si coglie come evidenza e non in un rimando simbolico. Analisi fenomenologica dell'esperienza religiosa Tenendo presente l'indagine sulla funzione simbolica, sinteticamente proposta, si tratta ora di stabilire quale sia la sua presenza nell'ambito dell'esperienza sacrale-religiosa, ma per fare questo è necessario sottoporre alla stessa analisi anche tale esperienza. Ci si può domandare, rimanendo sul terreno individuato dalla fenomenologia, quello dei vissuti, quale sia la specificità dei vissuti religiosi. In realtà, pur parlando molte volte i fenomenologi classici dell'esperienza religiosa, una vera e propria ricognizione fenomenologica in questo ambito non appare nei loro scritti, ma è ora che si proceda a svolgere tale compito. Si può prendere spunto da una domanda che si pone la fenomenologa Edith Stein e dalla risposta ella dà; tale domanda riguarda che cosa sia la sensibilità artistica e la risposta è così formulata: "E' la potenza di valutare qualcosa circa il suo grado di bellezza e di godere di esso" (Stein, 1931 / 2003, p.210). Se ci si pone la stessa domanda riguardo alla "sensibilità" religiosa si nota che si tratta sempre di una "potenza di valutare" riferita a quell'esigenza di "riempimento" di un'apertura costitutiva dell'essere umano verso qualche cosa che lo trascende, che viene incontro, per usare l'espressione di van der Leeuw (1933 / 1992) (3), e che soddisfa tale apertura e che consente, quindi, il godimento. Si tratta, per usare ancora il linguaggio della Stein, di una naturale disposizione della persona, potenzialmente presente in essa fin dall'inizio della sua esistenza e tutto ciò si riflette nella dimensione dei suoi vissuti. Ma di quest'ultimo punto si parlerà in seguito. Qui è bene insistere sulla fondamentale apertura, costitutiva dell'essere umano. Perché tale apertura non sia solo un presupposto ma sia giustificata, si possono percorrere vie diverse, vie di carattere filosofico, come quella di Agostino e Anselmo, vie descrittive in senso fenomenologico, vie proprie di un'indagine psicologica, tutte confluenti e non alternative. Una pensatrice che ha avuto il merito di indicarle e di percorrerle è stata Edith Stein; ella ci sollecita ad individuare nel primo caso "un pensiero originario" della divinità, presa nel senso più ampio presente in noi (4), nel secondo caso un nucleo, come centro o radice della persona (5), nel terzo un'esigenza o desiderio di riempimento di una mancanza, di un'insufficienza, che è forse la spia più forte e immediata della presenza del pensiero originario. Lungi dall'essere disprezzabile la via psicologica è, al contrario dell'utilizzazione che ne fanno i sostenitori dell'ateismo - si pensi a Feuerbach o a Freud -, una fonte corroborante le altre, perché la domanda che può essere rivolta a chi sostiene che l'esperienza del sacro e del divino sia frutto del desiderio umano riguarda proprio la ricerca della ragione ultima della nascita nell'essere umano di tale esigenza o di tale desiderio e qui risuona validamente la parola agostiniana, secondo la quale non cercheremmo e quindi non desidereremmo, se già non sapessimo, benché oscuramente, ciò che cerchiamo. Rispetto a queste tre vie vorrei indagare in questa sede la via descrittiva in senso fenomenologico. Uso le indicazioni dei fenomenologi classici, come ho già fatto, ma vorrei, anche, integrarle e ampliarle. Memorandum, 5, out/2003 Belo Horizonte: UFMG; Ribeirão Preto: USP. http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/alesbello02.htm Ales Bello, A. (2003). Il simbolo nell'esperienza sacrale-religiosa: un'analisi fenomenologica. 139 Memorandum, 5, 134-147. Retirado em / / , do World Wide Web: http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/alesbello02.htm. Per incamminarci su questa via è necessario osservare che si debbono utilizzare i risultati dell'analisi fenomenologica nel campo dell'antropologia. Che cosa è l'essere umano? A questa domanda la fenomenologia classica risponde seguendo Paolo di Tarso: carne, anima, spirito, ma il modo in cui conferma l'interpretazione paolina - senza citarla esplicitamente, l'accostamento è mio e riconosco che solo una supposizione - è estremamente importante, la via scelta è, infatti, quella che movendo dalla riduzione eidetica e da quella trascendentale, entra nella sfera dei vissuti e li esamina non relativamente ai loro contenuti, ma alla loro struttura. Tali vissuti, ad esempio la percezione, il ricordo, l'immaginazione, come si è già indicato, ma anche il desiderare, il tendere, prendere posizione spontaneamente il valutare, il pensare il volere, rimandano a sfere che sono denominabili come corpo, psiche e spirito (6). Ma proprio l'ingresso attraverso i vissuti consente di cogliere la differenza fra profondità e superficie e lo scavo nella profondità conduce a quella che la Stein definisce l'anima dell'anima, oppure, insieme a Husserl, il Kern, il nucleo, il luogo più profondo in cui avviene l'orientamento verso altro da sé, e l'apertura verso l'Altro. E tale orientamento utilizza tutta la dimensione dei vissuti per procedere verso il riempimento atteso, desiderato, pensato e va l utato. Il nucleo e la presenza Il nucleo è il luogo ultimo di disvelamento dell'impronta del sacro-divino, tuttavia l'essere umano, preso nella complessità dei suoi momenti costitutivi, è impegnato globalmente in tale esperienza, anzi essa comincia proprio dalla sfera hyletica. Per comprendere la funzione di tale sfera è opportuno ricordare che nell'analisi dei vissuti Husserl pone in evidenza la duplicità fra il momento noetico intenzionale e quello hyletico o materiale. Seguendo tale filo conduttore tento sinteticamente di riproporre un itinerario che si potrebbe definire gnoseologico, ma che si intreccia fortemente con quello antropologico nel doppio senso dell'antropologia filosofica e dell'antropologia culturale. La duplicità di noesis e hyle si rintraccia in base all'analisi del corpo vivente il quale non ha soltanto localizzazioni relative alle sensazioni sensoriali che esercitano una funzione costitutiva per gli oggetti che appaiono nello spazio, ma anche relative a sensazioni di gruppi completamente diversi, cioè ai sentimenti sensoriali, alle sensazioni di piacere e di dolore, di benessere corporeo o di disagio derivante da un'indisposizione corporea. Siamo nella sfera della passività esaminata nella prospettiva delle sintesi passive, nel momento in cui soggetto e oggetto non sono ancora distinti e i dati hyletici sensoriali non egologici sono strettamente legati ai dati egologici. Dal punto di vista che si può definire largamente gnoseologico, si inizia dall'unità associativa attraverso la quale si delinea l'omogeneità e la differenza per passare alla sfera dell'affezione, campo dei dati hyletici sensoriali, ad esempio del colore e della ruvidezza; la recettività che si esercita a questo punto suscita sentimenti sensoriali e si apre la via alle operazioni più consapevoli nelle quali agisce il momento noetico, cioè l'apprensione, la comprensione e l'appercezione. Tutto ciò consente il doppio movimento del conoscere e del valutare e la conseguente distinzione fra soggetto e oggetto la quale, poi, può essere più o meno fortemente tematizzata (7). Applicando i risultati delle analisi ora condotte alla dimensione del sacro si costata che la via della sacralità è quella in cui soggetto e oggetto, conoscenza e valutazione non sono distinte fino in fondo ed è su questa base che si delineano le differenze culturali fra visione arcaica-sacrale e visione religiosa propria delle religioni storiche. Ciò non significa che nella prima il momento noetico non sia presente, ma che non agisce autonomamente, anzi è guidato dalla hyleticità, in altri termini il momento conoscitivo e quello valutativo sono sempre presenti, ma fortemente legati e attratti dalla sfera hyletica. Particolarmente importanti sono i sentimenti sensoriali che svolgono per gli atti del sentimento e per gli atti valutativi lo stesso ruolo che le sensazioni primarie hanno per gli Erlebnisse intenzionali nella sfera della costituzione degli oggetti spaziali-cosali perché le sensazioni della tensione e del rilassamento dell'energia, le sensazioni dell'inibizione interna, della paralisi e della liberazione e così via sono sensazioni Memorandum, 5, out/2003 Belo Horizonte: UFMG; Ribeirão Preto: USP. http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/alesbello02.htm Ales Bello, A. (2003). Il simbolo nell'esperienza sacrale-religiosa: un'analisi fenomenologica. 140 Memorandum, 5, 134-147. Retirado em / / , do World Wide Web: http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/alesbello02.htm. localizzate con le quali si connettono le funzioni intenzionali del sentimento e della valutazione, fondamentali per il riconoscimento della "Potenza" sperimentata attraverso la forza manifestativa e attrattiva propria della hyle. Lo stato di piacere, il senso di benessere possono essere il fondamento della gioia come il malessere, l'inibizione interna possono essere alla base della paura, del terrore. Penetrando nella dinamica interna dell'esperienza religiosa si può rintracciare come agisca la forza attrattiva nell'ambito religioso e in modo sorprendente si chiarisce la struttura di quel terreno, apparentemente misterioso ed inesplorato costituito dalla sacralità arcaica. Si pensi alla forza attrattiva esercitata da un luogo straordinario, ad esempio da una sorgente, da un alto monte, da un albero isolato e peculiare per la sua forma, da una grotta e così via, come manifestazioni del sacro riconosciuto come tale perché ad essi si lega lo stato di benessere che procura la gioia. Ma nello stesso tempo tutto ciò può essere fonte di paura, di timore, e presentarsi come il luminoso o il tremendum di cui parla Rudolf Otto. Nella fenomenologia classica un esempio proposto da Edith Stein può esser di sostegno e conferma di ciò che è stato qui ricavato. Ella si riferisce ad un blocco di granito. Si tratta certo, secondo il punto di vista prevalente nella nostra cultura, di una formazione materiale, tuttavia, in essa si rivela un senso, essa è piena di senso, perché tale formazione è costituita secondo un principio strutturale proprio "ne sono parte essenziale il suo peso specifico, la sua consistenza, la sua durezza; anche la massa, il fatto che "si presenti" in blocchi enormi" e tutto ciò "richiama la nostra attenzione in modo singolare", infatti "questa irremovibile consistenza e questa massa - continua la Stein - non sono solo qualcosa che cade sotto i nostri sensi e che la ragione costata come una realtà. I sensi e la ragione sono colpiti interiormente; in essi si rivela a noi qualcosa; in questa realtà leggiamo qualcosa" (Stein, 1932-33 / 2000, p. 166). Il qualcosa che è individuato non è soltanto un senso simbolico, che pure può essere presente secondo l'esplicita ammissione della Stein, ma una presenza che si giustifica attraverso l'analisi dei dati hyletici; il blocco di granito "ci parla di un'imperturbabile stabilità e di una sicura affidabilità come qualità ad esso adeguate" (Idem, p. 167) (8), l'imperturbabilità, la stabilità, l'affidabilità sono risonanze interiori, danno un senso di benessere, di sicurezza che non è lo stesso che può esser suscitato dall'argilla o dalla sabbia che "non si lasciano interpretare allo stesso modo del granito" (Idem, p.167). Si pone qui la questione riguardante il significato del "ci parla". Si tratta di analizzare le modalità interiori di ricezione di tale linguaggio, che è la manifestazione di un "senso" che rimanda all'Autore del senso di ogni formazione (9). Riprendendo l'analisi dalla dimensione corporea si ritorna al livello sensoriale, notando che alle sensazioni localizzate si connettono, allora, i sentimenti sensoriali che formano la base della vita del desiderio, della volontà, delle sensazioni di tensione e di rilassamento dell'energia, le sensazioni dell'inibizione interna, della paralisi, della liberazione, e a tutto ciò si aggiungono le funzioni intenzionali, noetiche, ma il momento hyletico sembra trascinare quello noetico, da qui la perentoria affermazione di Husserl: “l’intera coscienza di un uomo è in un certo modo legata al suo corpo proprio attraverso la sua base hyletica" (Husserl, 1913 / 2002, p. 547). Che ciò sia da noi sperimentato è confermato anche dal fatto che non distinguiamo la sensazione localizzata dalla percezione, quando localizziamo la percezione tattile nel dito o il pensiero nella testa, la percezione e il pensiero non sono, infatti, localizzati ma l'attrazione hyletica fa concentrare l'attenzione sul corpo proprio. Si comprende, allora, che il termine hyletica non indica la materia nel senso della nostra tradizione culturale, ma un nuovo territorio mai completamente esplorato che costituisce il "materiale" per la dimensione noetica. Mi sembra che l'analisi della sfera hyletica possa essere utile strumento per cogliere il significato profondo dell'esperienza sacrale-religiosa, infatti il momento hyletico ha un valore altamente manifestativo anche se non egocentrato e ciò è caratteristico di quelle culture in cui la hyletica trascina la noetica generando una sorta di impersonalità che si contrappone ad una diversa combinazione della noetica e della hyletica nelle culture Memorandum, 5, out/2003 Belo Horizonte: UFMG; Ribeirão Preto: USP. http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/alesbello02.htm Ales Bello, A. (2003). Il simbolo nell'esperienza sacrale-religiosa: un'analisi fenomenologica. 141 Memorandum, 5, 134-147. Retirado em / / , do World Wide Web: http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/alesbello02.htm. avanzate in cui la noetica è a sua volta trascinante, come è dimostrato dall'emergenza del momento coscienziale propriamente egocentrato. Il momento hyletico può essere considerato come un noema sui generis, per cui non si tratta di ricondurre il sacro alla sensibilità e quindi procedere alla riduzione alla sfera soggettiva-sensibile, in primo luogo perché la hyle non è da intendersi in senso empiristico o fisicalistico, in secondo luogo a causa della continua presenza dei momento noetico, costitutivo per l'attribuzione del valore sacrale, attribuito proprio grazie alla forza trascinante-manifestativa della hyletica. Si può affermare che il sacro è una "presenza" il cui nucleo noematico è hyletico. Presenza e simbolo Per discutere il rapporto presenza e simbolo nell'esperienza sacrale-religiosa, propongo di iniziare da un caso particolare, quello legato alle ricerche relative alla cultura della cosiddetta Dea-madre o Grande-Madre, mi riferisco alle indagini condotte da Marija Gimbutas e da Bernard C. Dietrich sulle religioni arcaiche presenti nell'Europa continentale e nelle regioni del bacino del Mediterraneo su reperti databili fra il 6.500 e il 3.500 a.C. nell'Europa sud-orientale e dal 4500 al 2500 a.C. nell'Europa occidentale, quindi dal Paleolitico all'Età del Bronzo per alcune culture mediterranee come Cipro, Creta, Sardegna, Sicilia e Malta. La Gimbutas considera i reperti come Il linguaggio della Dea (Gimbutas, 1989), si tratta, perciò, si porre il problema del modo in cui tale linguaggio debba essere analizzato. Seguendo l'impostazione prevalente nella scuola di Lovanio sostenuta da Julien Ries, l'autrice sottolinea l'aspetto simbolico di tali reperti le cui strutture rinvenibili in immagini e disegni rimanderebbero a..., avrebbero il significato di..., rappresenterebbero gli attributi della Dea. L'analisi fenomenologica prima proposta consente di superare questa interpretazione che tende a fare di quelle rappresentazioni "simboli"e che è coerente con la nostra mentalità, ma che non appare propria del pensiero arcaico. I reperti dimostrano, infatti, che la scelta delle raffigurazioni, degli oggetti, dei luoghi è guidata non da un rimando simbolico, ma da profonde somiglianze sul piano hyletico che sono testimonianza del "realismo" della mentalità arcaica di quelle popolazioni e non della loro attitudine simbolica. D'altra parte la stessa Gimbutas implicitamente sembra ammettere ciò quando sostiene che il menhir è l'epifania della Dea uccello e quindi non il suo simbolo e quando sostiene che la dea, pur nella varietà delle sue epifanie e funzioni, è una sola ed è immanente più che trascendente e perciò si manifesta fisicamente. La donna-uccello con seni e glutei prominenti è dispensatrice e protettrice di vita e di nutrimento perché suscita un senso di benessere con la sua manifestazione e fornisce, quindi, quella potenza che si cerca per la propria vita, ed è valutata come fornente tale potenza che riempie l'aspirazione profonda verso la potenza. E proprio per questo si manifesta come la "Potenza", non si tratta di rimando, ma di presenza. Molti esempi si potrebbero addurre per mostrare il realismo della mentalità arcaica, voglio citare solo un'interessante osservazione di Dietrich, egli scrive: "La sensazione della presenza divina, la pratica dell'invocazione diretta erano i tratti principali della religiosità minoica e micenea. Tutti gli sforzi errano rivolti alla comunicazione diretta col divino, un concetto che fondamentalmente diverso dall'esercizio di un culto praticato davanti ad una statua" (Dietrich, 1991, p. 87), questo spiega la mancanza di reperti statuari, come è costatabile ancora in Omero, infatti la figura seduta di Athena nel tempio di Troia (Iliade, 6, 302-11) non può essere considerata una statua, in quanto il poeta dice che ella scuote la testa. In seguito si perse la consapevolezza di tutto ciò, infatti Aristònico, commentatore omerico, giudicava ridicola questa descrizione perché riteneva che si trattasse di una statua. Un'ulteriore conferma della credenza nell'epifania si ha nell'architettura dei palazzi e dei luoghi di culto della civiltà minoica, in essi si trova uno spazio aperto destinato all'apparizione della divinità, forse rappresentata in qualche caso dalla sacerdotessa, quindi "presenza" della divinità e non "rimando". Memorandum, 5, out/2003 Belo Horizonte: UFMG; Ribeirão Preto: USP. http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/alesbello02.htm Ales Bello, A. (2003). Il simbolo nell'esperienza sacrale-religiosa: un'analisi fenomenologica. 142 Memorandum, 5, 134-147. Retirado em / / , do World Wide Web: http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/alesbello02.htm. Si può addurre un altro esempio tratto dalla religione egiziana. La studiosa Edda Bresciani (2001) afferma nella sua Introduzione ai Testi religiosi dell'antico Egitto che: "Per gli egiziani un'immagine era ben più che una semplice raffigurazione, era una realtà, una presenza fisica; e il tempio, a sua volta, era un "cielo" sulla terra che conteneva la statua del dio animata dalla magia (heka) - cioè l'energia attiva dell'universo - ed era la sua residenza. Quando al mattino il sacerdote apriva le porte sigillate del tabernacolo, apriva in realtà le porte del cielo in modo da vedere la forma del dio nel cielo terrestre. Una delle ragioni del culto era quindi costituire in terra un luogo di soggiorno attraente per gli dei, fare del tempio una replica del cielo, degna della statua del dio, e prendersene cura perché egli fosse felice di vivere fra gli uomini" (pp. XVIII-XIX). Nella cultura occidentale la crisi dell'arcaicità e l'inizio del predominio del momento noetico - testimoniata dal commentatore omerico - risale alla nascita della cultura greca classica in parte già dal periodo presocratico. Attraverso tale primato non si elimina certamente la dimensione hyletica, ma la sua funzione sembra diventare secondaria. Tuttavia è proprio nella dimensione religiosa che la sopravvivenza della hyletica si mostra più fortemente. La stessa Gimbutas (1989) studia la sopravvivenza del culto della DeaMadre e le vede in molti simboli della nostra arte e letteratura. Tutto ciò può valere a livello simbolico, ma cosa ne è della "presenza" del divino nella nostra cultura? Compiendo uno spostamento enorme in termini temporali, fisso l'attenzione sulla religione cristiana per esaminare il rapporto simbolo-presenza. Ma prima voglio fare riferimento a due eventi presenti ancora oggi nella religione induista. Percorrendo da nord a sud il subcontinente indiano troviamo nelle due estremità riti identici nel significato che sono segni della credenza nella "presenza" della divinità. Nel Nepal ancora oggi la Dea-bambina si affaccia da una finestra di un palazzo di Katmandu essendo l'epifania della Dea; è stata scelta con particolare cura in un villaggio vicino attraverso un rituale crudele e non rappresenta la Dea, ma è la Dea. Nel Tamil-Nadu sulla rive dell'Oceano Indiano dove si trova il tempio della Kania Kumari la Dea appare nella fase della luna crescente rappresentata ogni giorno da bambine e fanciulle da 1 a 16 anni che sono la manifestazione della Dea. Riguardo al cristianesimo pongo l'attenzione su alcuni passi evangelici. In primo luogo vorrei commentare l'incontro di Gesù con la donna samaritana perché mi sembra estremamente importante dal punto di vista della storia delle religioni, intesa come configurazione/espressione dell'esperienza religiosa. Il tema dell'acqua, che coinvolge la sfera psico-fisica: impulso al bere come esigenza fisica, ricerca dello stato di benessere che deriva dal soddisfacimento di questa esigenza importante per la vita, si sposta sul un altro piano, quello che noi definiamo spirituale, in modo da evidenziare la distinzione fra i due piani. Gesù dice: "chiunque beve di quest'acqua avrà di nuovo sete; ma chi beve dell'acqua che gli darò, non avrà mai più sete, anzi l'acqua che gli darò diventerà in lui sorgente di acqua che zampilla per la vita eterna" (Gv. 4, 13-14). Ulteriore distinzione si trova nella discussione, che si potrebbe definire teologica, che si svolge fra Gesù e la donna la quale sollecitata da questo straordinario incontro, intuendo le capacità profetiche presenti nell'uomo che ha davanti, pone, inaspettatamente, la questione della scelta del luogo di culto di Dio, oggetto di divisione fra i Giudei e i Samaritani. La risposta di Gesù sposta la questione sottraendola al predominio del piano hyletico, mette in crisi non solo la scelta del luogo di culto, ma supera la ragione per cui era stato scelto il monte Garizim o Gerusalemme, come luogo di "manifestazione" della divinità. La forza attrattiva che il monte suscita attraverso le sensazioni reazioni straordinarie non ha più senso, si attua uno spostamento sul piano dello spirito, il nucleo, nel quale si manifesta l'apertura verso la presenza, deve essere riempito attraverso il riempimento che viene dalla Verità: "Dio è spirito, e quelli che lo adorano devono adorarlo in spirito e verità; perché Dio cerca tali adoratori" (Gv. 4, 23). Non solo si attua uno spostamento che opera una svolta sul piano della storia delle religioni, ma si evidenzia in termini di analisi fenomenologica lo spostamento sul momento valutativo noetico legato ad un'esperienza profonda di contatto con la divinità. Tuttavia tale contatto non elimina la sfera hyletica, perché nelle stesse parole di Cristo si conferma il Memorandum, 5, out/2003 Belo Horizonte: UFMG; Ribeirão Preto: USP. http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/alesbello02.htm Ales Bello, A. (2003). Il simbolo nell'esperienza sacrale-religiosa: un'analisi fenomenologica. 143 Memorandum, 5, 134-147. Retirado em / / , do World Wide Web: http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/alesbello02.htm. passaggio attraverso la sua persona come fisicamente configurata e quindi oggetto di sensazioni che provocano reazioni e che hanno una forza attrattiva e manifestativa: " Gli rispose la donna: So che deve venire il Messia (cioè il Cristo): quando egli verrà ci annunzierà ogni cosa . Le disse Gesù: Sono io che ti parlo" e qui si apre il grande tema dell'incarnazione nel quale hyletica ha molto da dirci (10). La tensione fra momento hyletico e momento noetico è rintracciabile proprio nella "presenza" di Cristo, annunzio della presenza: "Chi vede me vede colui che mi ha mandato" (Gv. 12,45) e riconoscimento di tale presenza da parte di Pietro: "Tu sei il Cristo, il Figlio del Dio vivente" (Mt. 16, 16); è vero che ciò non è stato detto né dalla carne né dal sangue perché la sfera sensibile da sola non può dirlo, ma la presenza passa anche attraverso tale sfera: "Signore da chi andremo? Tu hai parole di vita eterna" (Gv. 6, 68), parole che "udite" riempiono l'apertura profonda verso la Potenza. Ma il luogo in cui la hyletica manifesta tutta la sua forza attrattiva è quello della vita sacramentale. In tale sfera la connessione profonda fra hyletica e noetica si ricostituisce. Il sacramento è il luogo della manifestazione della divinità, il luogo della sua presenza reale, che passa attraverso la sensazione, la percezione, gli stati d'animo psicofisici, raggiunge per mezzo della valutazione il piano noetico, confermando il riempimento del nucleo a livello spirituale. Presenza reale nella cosa che è recepita come riempiente l'anelito alla presenza reale e tale riempimento opera la trasformazione, altrettanto reale, che è lo stato di grazia coinvolgente tutto l'essere umano nella complessità dei suoi momenti costitutivi. Che cosa a che fare tutto questo con il simbolo? Nel colloquio con la donna samaritana, in realtà Gesù utilizza anche i simboli, l'acqua del pozzo è simbolo, cioè rimanda all'acqua come sorgente che zampilla per la vita eterna e quest'ultima può essere compresa a sua volta grazie al rimando all'estinzione possibile, prevista, sperata oltre i confini della speranza, della sete fisica: "Signore, gli disse la donna, dammi di quest'acqua, perché non abbia più sete e non continui a venire qui ad attingere acqua" (Gv. 4, 15). La funzione simbolica può e deve in qualche caso essere attivata perché la comprensione possa avvenire, perché ci si possa avvicinare a quella realtà che non si coglie immediatamente. In questo senso è chiaro che, oltrepassata la fase dell'arcaicità, la dimensione simbolica viene sempre più frequentemente attivata, ma altra questione è se possa qualificare di per sé l'esperienza religiosa. Che il linguaggio religioso possa servirsi del simbolo una volta avvenuta la scissione fra la realtà, il pensiero e la parola, è legittimo, ma l'esperienza religiosa si caratterizza in quanto esperienza del divino è sempre esperienza di presenza reale. La difficoltà sta nel mantenere in un contesto in cui pensiero, parola e linguaggio si sono separati progressivamente in maniera sempre più forte, come è accaduto nella cultura occidentale, la loro connessione e ciò è dimostrato dallo sganciamento del linguaggio come dimensione autonoma e anzi onnicomprensiva e dalla sostituzione in alcuni casi del simbolo alla realtà. Rimanendo sul terreno dell'analisi della dimensione sacramentale vorrei richiamare l'attenzione sull'istituzione dell'eucarestia da parte di Gesù che si innesta sui gesti del rituale giudaico, ma che assume un significato nuovo: "Prendete e mangiate; questo è il mio corpo" (...) "Bevetene tutti, perché questo è il mio sangue dell'alleanza, versato per molti, in remissione dei peccati" (Mt. 26, 26-28). In questa sede non ci interessa la centralità di questa istituzione per la vita della Chiesa cristiana, ci interessa l'insistenza contenuta nella recente Lettera Enciclica di Giovanni Paolo II sul tema della "presenza"; nell'Introduzione si legge "...nella sacra eucaristia, per la conversione del pane e del vino nel corpo e nel sangue del Signore, essa (la Chiesa) gioisce di questa presenza con un'intensità unica" e ancora "Perciò lo sguardo della Chiesa è continuamente rivolto al Signore presente nel Sacramento dell'Altare". Nel capitolo primo l'aggettivo "presente" ritorna insistentemente con la chiara affermazione che non si tratta solo di un'evocazione ma di una ri-presentazione. Se si vuole leggere tutto ciò in chiave fenomenologica si può cogliere la differenza a livello di vissuti e a livello di linguaggio fra evocazione, come ricordo, e ri-presentazione, secondo l'intenzione espressa nel documento papale. Ora è vero che anche il ricordo ri-presentifica, ma tale ri-presentificazione non ridà la cosa Memorandum, 5, out/2003 Belo Horizonte: UFMG; Ribeirão Preto: USP. http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/alesbello02.htm Ales Bello, A. (2003). Il simbolo nell'esperienza sacrale-religiosa: un'analisi fenomenologica. 144 Memorandum, 5, 134-147. Retirado em / / , do World Wide Web: http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/alesbello02.htm. stessa nella sua presenza, anzi essa si dà in modo depotenziato rispetto alla sua originaria apparizione. Il rivivere pienamente ciò che è ricordato, quindi il renderlo presente di nuovo in carne ed ossa, è possibile solo se l'evento si ripropone ogni volta in se stesso, se non si tratta perciò di un rimando simbolico, ciò implica anche una diversa concezione della temporalità da intendersi non come successione, ma come stratificazione (11). L'evento originario si dà di nuovo nella sua originarietà. Il sacrificio del sangue versato ritorna presente "perpetuandosi sacramentalmente in ogni comunità che lo offre per mano del ministro consacrato" (§ 12). Tutto questo ribadisce una lunga tradizione e in particolare quanto Paolo VI aveva già scritto nella Enciclica Misterium Fidei "...questa specialissima presenza (...) "si dice ‘reale', non per esclusione, quasi che le altre non siano ‘reali', ma per antonomasia perché è sostanziale, e in forza di essa Cristo Uomo-Dio, tutto intero si fa presente" (testo citato in Ecclesia de Eucharestia, § 15). Si realizza in tal modo da un lato l'unione intima dei fedeli con Cristo - in termini temporali é già la realizzazione della vita eterna "la si possiede già, come primizia della pienezza futura che riguarderà l'uomo nella sua totalità" (§ 18) - dall'altro investe anche il ministero sacerdotale di una funzione particolare, il sacerdote non offre il sacrificio "a nome di" o "fa le veci di", ma si identifica con il Sommo ed eterno Sacerdote (§ 29). Prescindendo dalle conseguenze di tale impostazione sul piano pastorale - funzione eccezionale del sacerdozio ministeriale rispetto al sacerdozio dei fedeli - e sul piano ecumenico - difficoltà di incontro con chi, anche cristiano, crede che l'Eucarestia sia solo un simbolo - ciò che interessa è, appunto, il tema della "presenza reale" che attraverso la fisicità, usando la nostra visione dell'essere umano, entra nell'anima coinvolgendola fino in fondo ed è consacrata da chi manifesta con la sua persona la presenza di Cristo. Si può notare una straordinaria continuità con le prospettive di fondo della mentalità arcaica, nonostante le numerose differenze nel rapporto hyletica - noetica, come è stato indicato sopra. Si può concludere dicendo che il nucleo autentico dell'esperienza religiosa è la presenza. Ciò non esclude l'importanza della dimensione simbolica come espressione di questa presenza nel linguaggio, anzi si può notare che la funzione simbolica, sempre potenzialmente presente nell'essere umano, assume storicamente un ruolo sempre più preminente. Come dire, infatti, ciò che si sente se non utilizzando immagini aventi in verità un significato simbolico? Come potrebbe essere detta l'esperienza mistica, esperienza somma della Presenza se non attraverso tale strumento? Ma questo è una altro argomento. Riferimenti bibliografici Ales Bello, A. (1996) Archeologia fenomenologica del tempo e dello spazio. In A. Dentone (a cura di). Esistenza. I vissuti: "tempo" e "spazio". (pp.21-32). Foggia: Bastoni, 1996. Ales Bello, A. (1999). L'incarnazione nella prospettiva della Hyletica fenomenologica. In M.M. Olivetti (textes réunis par). Incarnation. (pp. 105-113). Padova: Biblioteca dell'Arquivio di Filosofia / CEDAM. Ales Bello, A. (2000). Edmund Husserl: riflessioni sull'antropologia. Per la filosofia, XVII (49), 22-28. Ales Bello, A. (2001). Teologia filosofica e Hyletica fenomenologica: intersoggettività e impersonalità. In M.M. Olivetti (textes réunis par). Intersubjectivité et théologie philosophique. (pp.263-277). Padova: Biblioteca dell'Archivio di Filosofia / CEDAM. Ales Bello, A. (2002). Teologia negativa, mística, hilética fenomenológica: a propósito de Edith Stein. Memorandum, 3, 98-111. Downloaded at 3 1 / 10/ 2002, from World Wide Web http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos03/alesbello01.htm. Bresciani E. (a cura di). Testi religiosi dell'antico Egitto. Milano: Arnoldo Mondatori, 2001. Memorandum, 5, out/2003 Belo Horizonte: UFMG; Ribeirão Preto: USP. http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/alesbello02.htm Ales Bello, A. (2003). Il simbolo nell'esperienza sacrale-religiosa: un'analisi fenomenologica. 145 Memorandum, 5, 134-147. Retirado em / / , do World Wide Web: http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/alesbello02.htm. Dietrich, B.C. (1991). Religione, culto e sacro nella civiltà cretese-micenea. In J. Ries (a cura di). Le civiltà del Mediterraneo e il sacro. (M.G. Telaro, Trad.). (pp.69-90). Milano: Jaca Book; Massimo. Gimbutas, M. (1989). Il linguaggio della dea:mito e culto della Dea Madre nell'Europa neolitica. Introduzione di Joseph Campbell. (N. Crocetti, Trad.). (pp.XIII-XXIII) Milano: Longanesi, 1989. Husserl. E. (1966). Analysen zur passiven Synthesis (1918-1926). (M. Fleischer, Cu rato re). Husserliana, XI, 1-556. Husserl, E. (1980). Phantasie, Bildbewusstsein, Erinnerung (1898-1925). (E. Marbach, Curatore). Husserliana, XXIII, 1-770. Husserl, E. (1985). Zur Phänomenologie des Zeitbewusstseins (1893-1917). Husserliana, X, 1-562. Husserl, E. (2002). Idee per una fenomenologia pura e per una filosofia fenomenologica; v . I , a cura di V. Costa. (E. Filippini, Trad.). Torino: Einaudi. (Originale del 1913). Husserl, E. (2002a). Idee per una fenomenologia pura e per una filosofia fenomenologica; v.II: (libro secondo e terzo), a cura di V. Costa. (E. Filippini, Trad.). Torino: Einaudi. (Originale del 1952). Ricoeur, P. (2000). La mémoire, l'histoire, l'oubli. Paris: Seuil. Stein, E. (1999). Essere finito e Essere eterno. 4 ed. Presentazione di A. Ales Bello. (L. Vigone, Trad.). Città Nuova: Roma. (Originale del 1936, Prima edizione nel 1950). Stein, E. (2000). La struttura della persona umana. Presentazione di A. Ales Bello. (M. D'Ambra, Trad.). Roma: Città Nuova. (Originale del 1932-33). Stein, E. (2003). Potenza e atto: studi per uma filosofia dell 'essere. Prefazione di A. Ales Bello. (A. Caputo, Trad.). Roma: Città Nuova. (Originale del 1931, Prima edizione nel 1998). van der Leeuw, G. (1992). Fenomenologia della religione. (L. Conte, Trad.). Torino: Bollati Boringhieri. (Originale del 1933). Note (1) Phantasie, Bildbewusstsein, Erinnerung (1898-1925), di E. Husserl (1980) è stato oggetto di analisi da parte di P. Ricoeur (2000) nel suo La memoria, la storia e l'oblio, Parte prima Della memoria e della reminiscenza. (2) In particolare sotto il profilo dell'Enttäuschung, la delusione dell'aspettativa, Parte Prima, cap. I, § 5. (3) § 110. (4) Discutendo il modo il cui i filosofi medievali hanno riflettuto sulla nozione di Dio, E. Stein si sofferma sull'inseparabilità dell'essere e dell'essenza in Dio sottolineata da Tommaso e osserva che se questo è vero «...é allora impossibile anche solo pensarlo senza l'essere: non rimarrebbe nulla se si eliminasse col pensiero l'essere - nessun quid a mo' del quale poter pensare il non-ente. Quid, essenza e essere non sono qui distinguibili. Se si potesse cogliere con tutta chiarezza questo pensiero, avremmo qui il fondamento per una " prova ontologica di Dio" , che sarebbe ancora più profonda ed evidente del pensiero dell'ens quo nihil maius cogitari possit, dell'essenza perfetta che si può pensare da cui prende le mosse sant'Anselmo» (Stein, 1936 / 1999, p. 148). In realtà ella ritiene che non sarebbe una prova, ma una conclusione tratta dalla "trasformazione del pensiero originario"; in che cosa consista il pensiero originario e quale trasformazione possa subire, mi sembra che si possa ricavare dalle osservazioni che seguono nelle quali si osserva che anche Tommaso, che pur rifiutava la prova di Memorandum, 5, out/2003 Belo Horizonte: UFMG; Ribeirão Preto: USP. http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/alesbello02.htm Ales Bello, A. (2003). Il simbolo nell'esperienza sacrale-religiosa: un'analisi fenomenologica. 146 Memorandum, 5, 134-147. Retirado em / / , do World Wide Web: http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/alesbello02.htm. Anselmo, non ha contestato il pensiero originario, quando ha sostenuto che la proposizione Dio esiste è evidente, poiché, però, non è evidente la coincidenza di essere ed essenza, ecco la necessità della prova che muova dagli effetti. Il "pensiero originario" presente nello spirito umano - come afferma anche Agostino - può essere "trasformato" attraverso una razionalizzazione e quindi dar luogo ad una dimostrazione, ma rivela in ogni caso un "paradosso", quello della tensione che esso vive fra finito e infinito e su questo sembra alla Stein che «...si fondi il destino singolare proprio della prova ontologica; che si trovino, cioè, sempre nuovi difensori e nuovi avversari di essa: chi si è spinto fino al pensiero dell'Essere divino - dell'Atto primo, eterno infinito, puro - non può sottrarsi alla necessità dell'essere che vi è inclusa. Ma quando cerca di coglierlo così come si cerca di cogliere qualche cosa per via di conoscenza, esso si allontana da lui e non appare più come fondamento sufficiente per erigervi l'edificio di una prova» (Idem, p.150). Ella indica in realtà la presenza in noi dell'infinito che, pur non potendo essere colto dal finito, fa sì che il finito colga se stesso in quanto tale. (5) Per cogliere il significato di questo nucleo non servono né le determinazioni spaziali né quelle temporali, si tratta di ciò che la persona è in se stessa, di ciò che, nella sua semplicità, prescinde dal rapporto superficie - profondità e dallo sviluppo temporale della sua vita. Cfr. Stein (1931 / 2003): Potenza e Atto, cap.V, 8 e, p.198 e segg. (6) Ho indicato le linee di fondo dell'antropologia filosofica presente nella descrizione essenziale fenomenologica in Ales Bello, 2000: Edmund Husserl: riflessioni sull'antropologia. (7) E' chiaro che qui sono sintetizzate intere serie di analisi che s'ispirano a numerosi passi delle opere di Husserl, che vanno dalle Idee per una fenomenologia pura, vol. I e II (Husserl, 1913 / 2002, 1952 / 2002a) alle Analisi della sintesi passiva (Husserl, 1966), a manoscritti in cui il rapporto hyletica-noetica è ulteriormente affrontato. Rimando per una trattazione più ampia, impossibile in questa sede, a Ales Bello, 2001 (Teologia filosofica e hyletica fenomenologica: intersoggettività e impersonalità) e 2002 (Teologia negativa, mistica, hyletica fenomenologica: a proposito di Edith Stein). (8) "Si tratta, da un lato, di un senso simbolico che troviamo in una formazione: esso ci parla di un'imperturbabile stabilità e di una sicura affidabilità come qualità ad essa adeguate" (Stein, 1932-33 / 2000, pp.160-161). (9) La Stein scrive che tale senso lascia "...presagire la presenza di uno spirito personale che sta dietro al mondo visibile ed ha conferito ad ogni formazione il suo senso; ha dato ad essa una forma a seconda della posizione che occupava nella struttura del tutto". Si tratta "...della presenza di Colui che ha scritto questo 'grande libro della natura' e che per mezzo di esso parla allo spirito umano [...] intervenendo nel contesto della vita." (Stein, 1932-33/ 2000, p. 167). (10) Ho compiuto l'analisi fenomenologica dell'incarnazione in Ales Bello (1999): L'incarnazione della prospettiva della hyletica fenomenologica. (11) A proposito della doppia modalità del vivere il tempo, quello lineare e quello ciclicoripetitivo che implica una stratificazione rimando al mio articolo Ales Bello, 1996: Archeologia fenomenologica del tempo e dello spazio e al mio libro in corso di stampa L'universo nelle coscienza - Introduzione a Edmund Husserl, Edith Stein , Hedwig Conrad-Martius, Pisa: ETS, in cui analizzo l'operazione della Wiederholung, studiata da Husserl in Teleologia e temporalità. Nota al riguardo dell'autrice Angela Ales Bello è professore ordinario di Storia della Filosofia Contemporanea presso la Facoltà di Filosofia della Pontificia Università Lateranense, Roma, Italia. Dirige il Centro Italiano di Ricerche Fenomenologiche. È direttore della rivista "Aquinas" e fa parte del comitato di redazione di numerose riviste italiane e straniere fra cui "Per la filosofia", "Segni e Comprensione", "Analecta Husserliana", "Phenomenological Inquiry"; collabora Memorandum, 5, out/2003 Belo Horizonte: UFMG; Ribeirão Preto: USP. http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/alesbello02.htm Ales Bello, A. (2003). Il simbolo nell'esperienza sacrale-religiosa: un'analisi fenomenologica. 147 Memorandum, 5, 134-147. Retirado em / / , do World Wide Web: http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/alesbello02.htm. con "Recherches Husserliennes" e "Studien zur interkulturellen Philosophie". Contatto: Pontificia Università Lateranense, Facoltà di Filosofia, Piazza San Giovanni in Laterano n.4, Città del Vaticano (00120). Data de recebimento: 07/05/2003 Data de aceite: 03/10/2003 Memorandum, 5, out/2003 Belo Horizonte: UFMG; Ribeirão Preto: USP. http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/alesbello02.htm