Classificação dos Grupos Funcionais para Fins de Nomenclatura*

Transcrição

Classificação dos Grupos Funcionais para Fins de Nomenclatura*
ARTE
Profª.: Juliana
Lista: 02
Aluno(a): _______________________________________________
Ano: 2ª Série
Genoveva – Sinhá Inácia que lhe diga, chorei muito... Mas o coração
mudou... Mudou... (sorrindo com ingenuidade) Conto-lhe tudo isto, como
se estivesse diante do padre.
Marcela – De início, nossa paixão teve duas fases: a consular e a
imperial! Na primeira – que foi curta – Brás Cubas disputava-me com
Xavier – como se disputasse o reino de Roma. Na segunda fase – a
cesariana – Brás triunfou soberano sobre os meus afetos.
Genoveva – Pensei em fugir com Deolindo para o sertão, mas ele
partiu... Fizemos juras, mas não sabia o que o futuro me guardava... José
Diogo era um caixeiro viajante, um mascate – daqueles que conhece de
tudo um pouco, sabe negociar...
Marcela – Ele sempre me trazia uma seda, alguma jóia. E se era jóia,
contemplava-a entre os meus dedos, buscava a melhor luz, beijava-o, mas
protestava acerca das investidas de Brás Cubas. O nosso amor não
precisava de tão vulgar estímulo.
Genoveva – Um dia, quando José Diogo estava para os lados de
Guaratiba, Deolindo apareceu à minha porta. Contei-lhe tudo, o quanto
senti saudades suas, da insistência do mascate, as minhas recusas, até que
um dia, sem saber como, amanheci gostando dele.
Marcela – Numa ocasião, o pai de Brás Cubas ficou sabendo do
penhor no banco, tratou de afastá-lo de mim, mandando o filho estudar no
estrangeiro.
Genoveva – Não me defendi de um erro ou de um perjúrio; não me
defendi de nada.
Marcela – Ficaram as boas lembranças dos encontros com Brás Cubas.
Nunca fui tão cortejada...
Genoveva (pergunta a Marcela) – E o seu amante, nunca mais o viu?
Marcela – Brás Cubas não me procurou mais, fiquei sem seus afetos,
seus presentes. Tive que me casar. Não tive sorte, vendi minhas jóias, perdi
o frescor da pele que os anos levam impiedosamente...
Genoveva – Quer saber, não preciso indagar o destino, vou deixar-me
guiar pela vida.
Marcela – Tem razão, essa cartomante não me dará o que a vida já me
tirou.
(Saem as duas alegremente conversando.)
GRANDE ENCONTRO
(Criação coletiva a partir dos personagens femininos na obra de
Machado de Assis. Adaptação: Juliana Imítria.)
Quadro 1
Obra
Memórias Póstumas
de Brás Cubas
Noite de Almirante
A Cartomante
Personagem
Marcela
Virgília
Brás Cubas
Genoveva
Cartomante
Ator/atriz
Data: 09/03/2015
Microfone
05
17
13
03
07
TRILHA: CD 01
Faixa 1
Manter MICROFONE: 07 da Cartomante sempre ligado.
ABRIR MICROFONES: 03, 05
(Entram duas mulheres num ambiente encardido e simples. Uma,
depois a outra examinam o ambiente. É a ante-sala da cartomante
Fernanda. Logo tratam um diálogo amistoso. Cada uma fala de si, por
vezes perguntam algo sobre a vida da outra.)
Genoveva – Você vai sempre a cartomantes?
Marcela – Não. A credulidade não é o meu forte. Mas sou uma boa
cristã. Vivo do amor do próximo... (ri contemplando um anel)
Genoveva – Estava passando e fiquei curiosa com o anúncio na porta,
resolvi entrar.
Marcela – O que te traz aqui é caso do coração?
Genoveva – O destino. Acho o destino curioso, como muda a vida da
gente de uma hora para outra.
Marcela – Você é muito jovem, na certa deve ter muitos amores...
Genoveva – Eu, não... mas você parece ter muitos pretendentes...
Marcela – Mas não como ele... Levaram 30 dias e três esmeraldas para
que eu me apaixonasse... Ah, mas Brás Cubas não era ainda o que eu
queria!
CORTAR MICROFONES: 03, 05
ABRIR MICROFONES: 13
Faixa: 2
(Flashback. LUZ Esquerda 1. Estão Marcela e Brás Cubas)
Faixa: 3
(Virgília entra na ante-sala, como não vê ninguém, dirige-s ao
consultório da cartomante e é recebida por ela. Entra de negro, com
aspecto fúnebre. Chora. Ar misterioso, evitando ser vista.)
ABRIR MICROFONES: 07, 17
Marcela – É lindo, Brás Cubas. Ah, mas não é ainda o que eu queria.
Brás Cubas – O que você quer, Marcela, diga que conseguirei, farei o
que quiser!
Marcela – Um colar de pérolas que vi no joalheiro. Mas sei que você
não pode!
Brás Cubas – Quem disse que não.
(Brás Cubas, puxa o fundo do bolso, conta umas poucas moedas. Entra
um banqueiro com dinheiro e o colar.)
Brás Cubas – Os anjos e os demônios assumem várias faces. Por vezes
de banqueiros, outras de joalheiros. (entrega o colar à Marcela, ela ameaça
jogá-lo fora)
Marcela – Não lhe perdôo, se você fizer de mim essa triste ideia...
(LUZ 2 central - Volta para a ante sala da cartomante)
CORTAR MICROFONES: 13
Virgília – Vim me confessar.
Cartomante – Desculpe-me, aqui não é uma igreja.
Virgília – Para mim é.
Cartomante – Diga, minha filha... O que você quer saber?
Virgília – Nada!
Cartomante – Como nada? Todos vem aqui em busca de respostas,
movidos pelos maiores e também os mais mesquinhos dos sentimentos.
Virgília – Preciso falar com alguém, dizer sobre as minhas angústias...
dizer o que passou pela minha cabeça nos últimos instantes de Brás Cubas.
Cartomante – Quem era Brás Cubas?
Virgília – Um pretendente, mas depois meu doce amante. Casei-me
com Lobo Neves e me fiz marquesa.
Cartomante – Os títulos... e o amor...
Genoveva – Você não se preocupa com o amor?
Marcela – Claro que me preocupo, com os meus próximos
pretendentes. (olhando para o anel que ganhou e exibindo-o acima dos
ombros.)
Genoveva – Conheci Deolindo três meses antes de sair a corveta. Eu,
uma caboclinha de vinte e poucos anos, esperta e atrevida; ele, um
marinheiro. Nos apaixonamos no ato. Fizemos juras de fidelidade, e
Deolindo logo seguiu para uma viagem de instrução.
Marcela – Como sofri com a ausência do meu diamante!
Genoveva – Foram oito ou dez meses de ausência.
Marcela – A vida mudara muito com a ausência de Brás Cubas.
Faixa: 4
Virgília – Lembro-me quando o vi pela primeira vez. Ele não tirava os
olhos de mim. Dizia que eu era a mais atrevida das criaturas.
Cartomante – E o seu marido, Lobo Neves?
Virgília – Lobo Neves não era mais esbelto que Brás Cubas, nem mais
elegante, nem mais simpático...
Cartomante – Nunca pensaram em fugir?
Virgília – Muitas vezes. Pensamos em ir para a Europa, alguma
cidadezinha perdida no nada, ou para a roça...
Cartomante – Se o seu marido descobrisse matava os dois.
1
Virgília – Mas não tive coragem, Lobo Neves era o meu marido, e me
amava. Ele me buscaria em qualquer lugar! Mas Brás Cubas deixou de me
amar, e isso eu não podia suportar...
Cartomante – Outra mulher...?
Virgília – Eu fui a única mulher de Brás Cubas, a única que ele amou!
Lembro-me trêmula de medo, do primeiro beijo no portão. Uniu-nos esse
beijo pela vida toda e também na hora da morte de Cubas; breve como a
ocasião, ardente como o amor.
Cartomante – Então, o beijo foi o prólogo de uma vida de delícias, de
remorsos, de prazeres que rematavam em dor, de aflições que
desabrochavam em alegria – uma hipocrisia paciente e sistemática, único
freio de uma paixão sem freio.
Maria Luísa – O que te traz aqui?
Helena – Estou apaixonada por um homem que é proibido para mim. E
você?
Maria Luísa – (sarcástica) O mesmo que você ... e o fato de estar
casada com um monstro!
Helena – Quando chequei naquela casa, logo vi que D. Úrsula não
gostava de mim, porém, Estácio sempre foi amável, obediente à vontade do
pai de me incluir como herdeira.
Maria Luísa – Não tive quem me odiasse, nem quem gostasse de mim.
Ele era indiferente, preocupava-se mais com os seus pacientes. Eu, sua
esposa, não importava! E eu que cheguei a achar que existia algo de
bondoso naquele homem...
Helena – Estácio sempre foi muito atencioso comigo. Com o passar do
tempo, D. Úrsula passou a simpatizar-se pelos meus modos, ver com
deferência minhas qualidades femininas – um acordo de virtudes
domésticas e maneiras elegantes. Dizia que eu sabia distribuir a atenção
sem a dispersar.
Maria Luísa – Pelo menos ela mudou contigo. Fortunato continuava o
mesmo...
Helena – Acho que o espírito jovial e a delicadeza com que eu
conseguia atrair os ásperos, atrair os indiferentes e domar os hostis
acabaram por amansar sua desconfiança ou preconceito por ter sido gerada
fora do matrimônio.
Maria Luísa – Pensei que existia benevolência na forma com a qual
Fortunato tratava os seus clientes. Mas não existia compaixão... ele sentia
prazer no sofrimento alheio! Um monstro, Fortunato é um mostro!
Faixa: 5
Virgília – Todos os dias até o dia de hoje, fiz vigília no seu leito de
morte. Não tinha a carícia lacrimosa de outro tempo; mas a voz era amiga e
doce...
Cartomante – Quem diria? De dois grandes namorados, de duas
paixões sem freio, nada mais havia ali, vinte anos depois; havia apenas dois
corações murchos, devastados pela vida, saciados dela, não sei se em igual
dose, mas saciados.
Virgília – Eu fui a única mulher de Brás Cubas, a única que ele amou!
Faixa: 6
CORTAR MICROFONES: 07, 17
(Virgília sai. Entra Brás Cubas, como num devaneio da Cartomante,
lembrando e imaginando a história não contada pela mulher. Cubas
repassa em sua memória de morto as mulheres de sua vida.)
Faixa: 8
Helena – Sou uma pobre alma lançada num turbilhão. Mas Conselheiro
Vale era um homem bom, uma grande alma! Reconheceu-me como filha,
deu-me família e futuro; levantou-me aos olhos de todos e aos meus
próprios.
Maria Luísa – A minha vida é um turbilhão, um pesadelo sem fim.
Meu marido, em certa ocasião, convidou Garcia para jantar. A sua presença
tornou-se familiar na casa. Tornou meu suplício um pouco mais brando.
Mas nunca ousou desonrar-me nem trair o amigo...
Helena – Sinto que Estácio se culpa por apaixonar-se por mim, sua
meio irmã. Se pudesse revelar-lhe a verdade... mas tenho medo de sua
reação.
Maria Luísa – A reação... Fortunato imbuído nas teorias científicas e
filosóficas, passou a fazer experiências terríveis. Metera-se a estudar
anatomia e fisiologia e ocupava-se nas horas vagas em rasgar e envenenar
gatos, cães e ratos. (sarcástica) Sentia prazer em exercer a medicina! E eu
desenvolvi uma tuberculose.
Helena – Camargo já sabe de tudo, e está usando isso para me
chantagear. Não sei o que fazer.
Maria Luísa – Por que ele agiria assim com você?
Helena – Ele pretende casar a filha Eugênia. Padre Melchior tenta me
convencer a casar com Mendonça... Assim, deixaria o caminho livre para
Eugênia e preservaria meu segredo e a minha honra.
Maria Luísa – Como esse Camargo descobriu tudo sobre você.
Helena – Um dia, sem que eu percebesse, ele me seguiu...
Maria Luísa – Que segredo terrível ele descobriu?
Helena – Meu pai...
Maria Luísa – O que morreu, pai de Estácio?
Helena – Meu pobre e velho pai, doente, precisando dos meus
cuidados... com a posição social herdada pelo meu rico pai adotivo, que
apiedou-se de mim, garantiu-me uma vida digna, o respeito e a
consideração de todos...
Maria Luísa – Então você não precisaria se afligir por amar Estácio...
ele não era seu irmão!
Helena – O que foi que eu fiz...
Maria Luísa – Acabou com a sua vida. Casar por conveniência ou
medo. Abandar o seu grande amor.
Helena – Eu não devia ter dito nada! Meu Deus, onde estou com a
cabeça. Deixo de lado a sensatez, meu segredo... revelado! (sai
constrangida, arrependida)
Maria Luísa (amargurada) – E eu, que nunca terei um grande amor...
(sai)
ABRIR MICROFONE: 13
Brás Cubas – Tive na vida, muitas mulheres... A primeira foi a minha
mãe (a mãe passa por ele, coloca-lhe um cachecol, beija-lhe a testa com
ternura e sai).
Depois das fraldas, Marcela, amou-me tanto quanto os contos de réis.
(Marcela passa por Cubas, dá-lhe a mão, este coloca um anel, ela suspira
com afetação e sai).
Para me recuperar de amor tão caro, mudei de ares. Conheci a
Inglaterra com Elizabete. (entra, ele dá-lhe o braço e andando como a
passei dão um giro juntos)
A França com Margot. (passa por ele, toca-lhe o queixo com malícia)
Voltei para o Brasil para ver minha mãe morrer, retirei-me para a
fazenda e me consolei com Eulália. (entra Eulália, ele dá-lhe uma flor, ela
despetala a flor como bem-me-quer, mal-me-quer, dá mal-me-quer, ela faz
uma cara sem graça, enquanto isso ela vai falando) Era bonita, mas coxa.
Por que coxa se bonita, por que bonita, se coxa. (ele anda num giro com ela
enquanto continua a falar e no final ela sai) Mas ela morreu na primeira
epidemia de febre amarela, aos 19 anos.
De volta à cidade, conheci Virgília, (ela entra com uma taça de vinho,
postura segura, olha para ele encarando-o) era bonita, fresca, saía das
mãos da natureza, cheia aquele feitiço da criação... (ela dá o braço para o
outro, que não aparece e sai com ele,mas antes vira-se para Brás Cubas e
encara-o mais uma vez) mas escolheu Lobo Neves. (passa por ele) Morri
sozinho, todos morrem só. Mas deixei uma boa quantia a um amigo, que fez
as honras fúnebres.
(Blackout enquanto ele se deita como um defunto.)
CORTAR MICROFONE: 13
Faixa: 7
Quadro 2
Obra
A causa secreta
Helena
Personagem
Maria Luísa
Fortunato
Garcia
Helena
Ator/atriz
Microfones
02
10
11
06
Faixa: 9
(Pantomima. Maria Luísa, morta pela tuberculose. Fortunato, o
marido, dorme. Garcia fica velando o corpo. Certa hora, Fortunato acorda
e vê Garcia dando um beijo naquela que amou secretamente. Ia dar o
beijo, mas não agüentou entregando-se às lágrimas. Fortunato, ao invés de
indignar-se com a possibilidade de triângulo amoroso, dá-lhe um amigável
tapa nas costas, comprovando o seu caráter sádico.)
Faixa: 7 (a mesma anterior)
ABRIR MICROFONES: 02, 06
(Aos poucos a luz vai crescendo na sala de espera onde estão três
mulheres. Uma delas, Conceição vai em direção à sala da Cartomante,
ficam na sala de espera: Maria Luísa e Helena. Após hesitação e silêncio,
elas conversam.)
CORTAR MICROFONES: 02, 06
2
era atenuado e passivo. Não sabia odiar; pode ser até que não soubesse
amar.
Nogueira – Perguntou-me...
(A cena passa a ser cruzada, uma complementando a outra. No
entanto, cada canto do palco com as duplas que conversam. Apenas a
iluminação aproxima os personagens que dialogam.)
Conceição – Gosta de romances?
Amigo (vizinho) – Desse jeito, até eu passo a gostar...
Cartomante – Quantos anos tinha mesmo o seu hóspede?
Nogueira – Contava eu dezessete, ela trinta.
Conceição – Era Natal.
Quadro 3
Obra
A Missa do Galo
A Cartomante
Personagem
Conceição
Amigo
Nogueira
Fernanda
Ator/atriz
Microfones
12
10
04
07
Faixa: 10
(A cena se volta para a consulta de Conceição com a Cartomante.
Entra a fica com o olhar perdido.)
Faixa: 12
FIM Do CD 1 – Trocar para CD 2 da Trilha
ABRIR MICROFONES: 07, 12
(Ao passo que ele descreve a cena, Conceição deve realizar as ações.
Trabalhar uma cena em inversão.)
Nogueira – Comecei a dizer-lhe nomes de alguns romances. Conceição
ouvia-me com a cabeça reclinada no espaldar, enfiando os olhos por entre
as pálpebras meio cerradas, sem os tirar de mim. De vez em quando
passava a língua pelos beiços, para umedecê-los e falava algo.
Amigo (vizinho) – E quando acabou de falar?
Nogueira – Não me disse nada... Até que falei das horas, onze e meio.
Ela não queria me atrasar para a missa e eu não queria incomodá-la, fazê-la
perder a noite.
Conceição – Eu, não; perdendo uma noite, no outro dia estou que não
posso, e, meia hora que seja, hei de passar pelo sono. Mas também estou
ficando velha.
Cartomante – Que velha o quê?
Nogueira – Que velha o quê, D. Conceição?
Cartomante – E a sua mãe? Onde estava?
Conceição – D. Inácia havia se recolhido. Tinha o sono pesado.
Amigo (vizinho) – Mais baixo! Mamãe pode acordar. (risos)
Nogueira – Pouco a pouco, havia se inclinado; fincara os cotovelos no
mármore da mesa e metera o rosto entre as mãos espalmadas. Não estando
abotoadas, as mangas caíram naturalmente, e eu vi metade dos braços...
Conceição – Tão perto ficavam nossos rostos...
Nogueira – Tinha ela um ar interrogativo...
Amigo (vizinho) – Para mim era só afirmação!
Nogueira – Às vezes, a fazia rir só para ver-lhe os dentes que luziam
de brancos, todos iguaizinhos. Cochichávamos os dois, eu mais que ela, às
vezes ficava séria, muito séria, com a testa um pouco franzida. Afinal,
cansou; trocou de atitude e de lugar.
Cartomante – (usa um leque) Deu volta à mesa e foi sentar-se ao lado
dele?
Nogueira – Pôs uma das mãos no meu ombro, e obrigou-me a estar
sentado...
Amigo (vizinho) – (excitação) E depois, Nogueira, conte-me tudo nas
entrelinhas...
Conceição – Subitamente, ouvi uma pancada na janela...
Cartomante (como se tivesse repetindo as palavras da outra) – E uma
voz bradava...?
Nogueira – Missa do galo! Missa do galo!
Amigo (vizinho) – (coloca-as mãos na cabeça ou expressão
equivalente) Maldita hora!
Nogueira – Durante a missa, a figura de Conceição interpôs-se mais de
uma vez, entre mim e o padre. Nunca pude entender a conversação que tive
com Conceição...
(O amigo olha com desdém para Nogueira. Apaga-se o foco deles.
Saem.)
Conceição – Na manhã seguinte voltou para Mangaratiba, e nunca
mais o vi.
Cartomante – São dois mil-réis. (Paga para ser ouvida e sai.)
Cartomante – Veio procurar algo?
Conceição – Sim... a minha juventude que passara sem que eu
percebesse.
Cartomante – Conte-me sobre sua vida...
Conceição – Casei-me aos 27 anos com o escrivão Menezes, fui a sua
segunda mulher.
Cartomante – Fale mais do seu marido...
Conceição – Quando lembro de meu marido, logo vem à minha cabeça
suas “idas ao teatro...”
Cartomante – Era um sujeito de cultura?
Conceição – Muita...
Cartomante – Você o acompanhava ao teatro?
Conceição – Não era conveniente. O teatro só acabava na manhã
seguinte. Ficava em casa, zelando de minha mãe e, nos últimos tempos, de
um parente de Menezes – de suas primeiras núpcias.
Cartomante – Então o teatro era um eufemismo em ação...
Conceição – Sobravam o riso das escravas, o escárnio da sociedade e
as caretas de minha mãe. Cartomante – Você quer saber quem é a mulher
“do teatro”? (mexendo nas cartas)
Conceição – É uma separada!
Cartomante – Você a viu.
Conceição – Não faz diferença. Acostumei-me a calar. Vai ver ele
estava no seu direito.
Cartomante – Como pôde calar-se, resignar-se dessa maneira?
Conceição – Preocupo-me com as prendas domésticas... mudar os
quadros das paredes, alinhar os objetos do aparador, substituir as polidas
cortinas... nunca me ocupei com outros pensamentos.
Cartomante – Feliz de você que consegue ocupar-se de outros afazeres
enquanto... Mas nunca lhe ocorreu que haveriam outros amores? Alguém
que merecesse seus cuidados?
Conceição – Certa vez, fiz sala para o hóspede de meu marido, tinha
apenas dezessete anos...
Cartomante – E o que aconteceu?
Conceição – Toda a atenção que meu marido negava nele sobrava.
Gostava de me ouvir falar, rir, observava atenciosamente cada gesto, cada
feição, cada nuance da voz. Isso me fascinava! Queria saber das minhas
opiniões sobre as coisas simples, tinha um ar de romantismo que embala
nossos sonhos da adolescência, uma ingenuidade que encanta...
(Flasback)
Faixa: 11
(Nogueira segreda o acontecimento ao amigo. O palco é dividido em
dois ambientes marcado pela luz.)
ABRIR MICROFONES: 04, 10
Nogueira – Na ocasião estava esperando a hora de ir à missa do galo na
corte.
Amigo (vizinho) – Combinou de me acordar e nada... eu que o fiz.
Nogueira – Nem preguei o olho. Achei melhor ficar acordado... Tinha
comigo um romance, os Três Mosqueteiros. Sentei-me à mesa que havia no
centro da sala, à luz de um candeeiro de querosene, a casa dormia quando
ouvi bater onze horas.
Amigo (vizinho) – E aí o que se sucedeu após as onze badaladas
naquela casa assombrada?
Nogueira – Conceição entrou na sala. Vestia um roupão branco, malapanhado na cintura. Sendo magra, tinha um ar de visão romântica.
Amigo (vizinho) – Na certa, acordou-a. Ou mesmo perdeu o sono. Ah,
a boa Conceição! Chamavam-lhe “a santa”, e fazia jus ao título, tão
facilmente suportava os esquecimentos do marido.
Nogueira – Então suas idas ao teatro, eram na verdade...
(compreendendo)
Amigo (vizinho) – Conceição dava para maometana; aceitaria um
harém, com as aparências salvas! Deus me perdoe se a julgo mal. Tudo nela
CORTAR MICROFONES: 04, 07, 10, 12
Quadro 4
Obra
A mão e a
luva
O Alienista
CD 2 da Trilha
Faixa: 1
3
Personagem
Guiomar
D. Evarista
Dr.
Simão
Bacamarte
Tio
Padre Lopes
Ator/atriz
Microfones
16
18
10
15
14
(D. Evarista e Guiomar – usa luva em uma das mãos – andam pela rua
e param em frente a casa com a indicação de que é a casa da cartomante.)
ABRIR MICROFONES: 16, 18
Faixa: 3
(Festa de inauguração da Casa Verde. Usar uma faixa de
inauguração.)
D. Evarista – Será que estamos procurando a mesma coisa?
Guiomar (segredando) – Uma cartomante...
D. Evarista (risos confidentes) – Eu também, acho que é aquela casa
ali. (aponta) D. Evarista Bacamarte.
Guiomar (segredando) – Alguém que conheça as artimanhas do
destino... Sou Guiomar.
D. Evarista – Se alguém nos vê entrar, o que diremos?
Guiomar – Não diremos nada. Não temos que dar satisfações a
ninguém.
D. Evarista – Ainda há tempo de desistirmos.
Guiomar – Se chegamos até aqui, entramos!
D. Evarista – Que eu não me arrependa desse momento.
Guiomar – Podemos ser atendidas juntas.
D. Evarista – Isso é demais, além de confidenciar com uma estranha,
pago para que me ouça e ainda alguém escuta meus segredos...
Guiomar – Se preferir entre só...
D. Evarista – Deus que me livre... entremos juntas!
(Ao entrarem, cruzam a cena com Conceição, que sai sorridente. Elas
olham de forma engraçada. Sentem-se mais confiança em entrar, sorriem.
Ambas se deparam com a cartomante; devem se comportar como se as
duas tivessem ao mesmo tempo na presença da cartomante, que não
aparece. Os diálogos das duas não de relacionam. Cada uma fala de si. A
simultaneidade dará agilidade à cena.)
Dr. Simão Bacamarte – Deixo aqui gravado que: “Veneráveis os
doidos, pela consideração de que (fala baixo) Alá, (valoriza) DEUS, lhes
tira o juízo para que não pequem”.
Padre Lopes – De quem é essa bela passagem, meu filho...
Dr. Simão Bacamarte (pensa um pouco) – Diria que... a Benedito
VIII.
Padre Lopes – Que beleza, Benedito VIII foi papa de 1012 a 1024,
santo homem de Deus! (pensativo e emocionado)
Dr. Simão Bacamarte – Está inaugurada a Casa Verde.
(Corte da cena para D. Evarista.)
D. Evarista – Vesti-me luxuosamente, cobri-me de jóias, flores e sedas
para a cerimônia. Fui uma verdadeira rainha naqueles sete dias
memoráveis; ninguém deixou de ir visitar-me duas e três vezes, apesar dos
costumes caseiros e recatados do século. Tinham em mim a feliz esposa de
um alto espírito, de um varão ilustre, e se lhe tinham inveja, era a santa e
nobre inveja dos admiradores. Itaguaí tinha finalmente uma casa de Orates.
Guiomar – Graças a minha madrinha, uma baronesa, tive esmerada
educação. Mrs. Oswald, minha dama de companhia ensinou-me modos
encantadores de homens, sempre os tive aos meus pés porque aprendi a usar
a razão para controlar meu coração.
D. Evarista – Certo é que dificilmente se desarraigam hábitos
absurdos, ou ainda maus. A ideia de meter os loucos na mesma casa,
vivendo em comum, pareceu em si mesma um sintoma de demência.
(Foco. Corte para a cena do padre, que fala com o público como se
falasse com ela.)
Padre Lopes (caricato) – Olhe, D. Evarista, veja se seu marido dá um
passeio ao Rio de Janeiro. Isso de estudar sempre, não é bom, vira o juízo.
(corte, apaga o foco)
(Cena de inversão com Dr. Simão e D. Evarista)
D. Evarista – Estou com desejos, um principalmente, o de ir ao Rio de
Janeiro e comer tudo o que me parecer adequado.
Dr. Simão Bacamarte – Não há remédio certo para as dores da alma;
esta senhora definha, porque lhe parece que não a amo; dou-lhe o Rio de
Janeiro, e consola-se.
D. Evarista (como se contasse para a cartomante) – Se ele não ia, eu
não iria também. Não havia de mete-me sozinha pelas estradas.
Dr. Simão Bacamarte – Irá com sua tia.
D. Evarista (eles se falam diretamente, mas com inversão – não se
falam diretamente) – Oh! Mas o dinheiro que será preciso ganhar!
Dr. Simão Bacamarte – Que importa? Temos ganho muito. Queres
ver?
(D. Evarista balança a cabeça afirmativamente)
Guiomar – Sempre fui uma moça muita ativa, segura – uns até me
achavam fria e calculista – mas o que eu sempre quis foi ascender
socialmente, para compensar minha origem modesta. Como não nasci rica,
só me restava buscar um rico casamento. (olhares) Homens? Tive três...
Estevão, muito sentimental; Jorge era calculista e (encanta-se) Luís Alves,
ambicioso! Fiquei entre o amor e a ambição. Escolhi a ambição.
Faixa: 2
(Passagem de O Alienista e A mão e a luva simultaneamente.)
ABRIR MICROFONES: 10, 15
Tio – Se não era bonita, nem simpática; por que contraiu o
matrimônio?
Dr. Simão Bacamarte – Evarista reunia condições fisiológicas e
anatômicas de primeira ordem, digeria com facilidade, dormia
regularmente, tinha bom pulso, e excelente vista; estava assim apta para
dar-me filhos robustos, sãos e inteligentes.
(A fala é complementada pelo cruzamento das cenas entre o Tio e Dr.
Simão; D. Evarista e Guiomar. Porém, não se relacionam.)
D. Evarista – Mas contrariei as esperanças do Dr. Simão Bacamarte –
com quem casei após enviuvar. Não lhe dei filhos nem robustos nem
mofinos. Depois disso, dedicou-se à saúde da alma – que é ocupação digna
de um médico – um dos maiores do Brasil, de Portugal e das Espanhas, que
escolheu Itaguaí como universo.
Guiomar – Estevão além de sentimental era leviano, ingênuo,
superficial, inseguro, porém, sincero. Amaria qualquer mulher que
despertasse algum interesse nele. Não dava nenhum valor a si mesmo e por
isso mereceu a minha preferência. Mas depois de um tempo foi estudar
Ciências Jurídicas e Sociais em São Paulo. É certo que tentou se matar, o
fato é que não conseguiu me esquecer. Mas o meu destino não pertencia a
ele. Tive Jorge, ele era fraco, egoísta e orgulhoso de si mesmo. Era
sobrinho da minha madrinha, tão próspero quanto ela! Mas Luís Alves... era
frio e fechado. Não dividia seus sentimentos e vontades com ninguém. Era
calculista e esperava o momento oportuno para dar uma cartada! Era amigo
de Estevão e meu vizinho. Quando deu a cartada final, já tinha certeza do
meu SIM.
D. Evarista – A vereança de Itaguaí, entre outros pecados, tinha o de
não fazer caso dos dementes. Assim é que chamou a atenção de meu marido
que cada louco furioso era trancado em uma alcova, na própria casa, e,
depois andavam soltos à rua, lançados à própria sorte.
ABRIR MICROFONES: 10, 14, 15
Faixa: 4
(A cena deve ser surreal, demonstrando a grande riqueza acumulada
com os loucos. Eles tiram de uma arca notas de cruzados – moeda da
época, barras de ouro, promissórias... vários zeros cortados de forma que
abrem e se multiplicam.)
Dr. Simão Bacamarte – Quem diria que meia dúzia de lunáticos...
D. Evarista (com caótica resignação) – Deus sabe o que faz.
(Acende o foco do padre.)
Padre Lopes – Amém! Ah, e por falar nisso, a igreja está precisando
de reformas. sem conter o frenesi ao ver tanto dinheiro) Os órfãos precisam
de um abrigo, as viúvas necessitam de consolo... ( (Após falar apaga
imediatamente o foco do padre.)
Dr. Simão Bacamarte – A caridade, Sr. Soares, entra decerto no meu
procedimento, mas entra como tempero, como o sal das coisas. Se não tiver
caridade, não sou nada!
(Corte. Foco Guiomar.) SEM MÚSICA
Guiomar – Luís Alves era um homem resoluto, complementou:
resoluto e ambicioso. Ambição não é defeito, pelo contrário, é uma virtude.
Sinto que a tenho, e hei de fazê-la vingar. Não me fio só na mocidade e na
força moral: fio-me também em você, que há de ser para mim uma força
nova. Um mês depois de casada, confessei ao meu marido – fomos feitos,
especialmente, um para o outro – como a mão e a luva.
(Corte para Dr. Simão. Faz discursa num tom solene e entusiasmado,
na Câmara dos Vereadores, tentando convencer os deputados a abrir o
manicômio e angariar fundos para o mesmo.)
Dr. Simão Bacamarte – O principal nesta minha obra da Casa Verde é
estudar profundamente a loucura, os seus diversos graus, classificar-lhe os
casos, descobrir, enfim a causa do fenômeno e o remédio universal. Este é o
mistério do meu coração. Creio que com isto presto um bom serviço à
humanidade.
4
(Capitu improvisa um véu e um buquê, quando ele abre os olhos se
depara com ela sugerindo estar vestida de noiva.)
Bentinho menino (desajeitado, surpreso) – O que é isso, Capitu?
Capitu menina– Você não será padre? Você quer, Bentinho?
Bentinho menino – Mamãe querendo...
Capitu menina – Então realizará muitos casamentos...
Bentinho menino – Jura que só há de casar comigo?!
Capitu menina – Juro! Nem que você se case com outra.
Bentinho menino – Nunca me casarei!
Capitu menina – Você pode conhecer alguém, se apaixonar... (virando
de costas para ele) Mas eu nunca me casarei.
Bentinho menino – Juremos de um outro modo, que havemos de nos
casar um com o outro. Haja o que houver.
Capitu menina – Aceito...
Faixa: 4 - A MESMA FAIXA ANTERIOR DE ONDE PAROU
(Corte. Foco Alienista.)
D. Evarista – Preciso de um remédio que cure a loucura do meu
marido, o Dr. Simão Bacamante.
Dr. Simão Bacamarte – A saúde da alma é a ocupação mais digna do
médico. (vai até o público ou faz menção de interação a ele. Ele começa a
surtar, revelando por nada que o sujeito é louco e o recolhe na Casa Verde.
Cita os personagens do folhetim como se as pessoas fossem a platéia.
Quebra a 4ª parede.) Esta cidade está infestada de loucos! Recolha todos à
Casa Verde. Nem que não sobre morador. É preciso combater a loucura.
Faixa: 8
(Ela joga o buquê para o alto, ele pega, joga para ela e estabelecem
uma brincadeira. Depois de um tempo, ela joga propositalmente o buquê
fora ou para a platéia. Ele sai correndo atrás dela que vai para o balanço,
ele a empurra, Le senta-se ao seu lado. Ela toma o buquê de sua mão e sai
correndo, ele vai atrás. Saem pela plateia.)
Bentinho menino – Espere por mim, Capitu.
(Entram Capitu e Bentinho na transição dos personagens jovens para
adultos. Jogo de sedução entre eles pela dança.)
(Corte. Foco Guiomar. Sai.) SEM MÚSICA
Guiomar – O amor é uma carta, mais ou menos longa, escrita em papel
velino, corte dourado, muito cheiroso e catita; carta de parabéns quando se
lê, carta de pêsames quando se acabou de ler. Tu chegaste ao fim, põe a
epístola no fundo da gaveta, e não te lembres de ir ver se ela tem um postscriptum.
Faixa: 5
D. Evarista – Senhora Cartomante, Fernanda, não é?! Preciso curar
meu marido da medicina. (Entram dois homens e levam a mulher na camisa
de força.)
Blackout
CORTAR MICROFONES: 10, 14, 15, 16, 18,
Quadros 5 e 6 fim com a morte da Cartomante
Obra
Personagem
Ator/atriz
Dom Casmurro Capitu (adulta)
Dom Casmurro Capitu (criança)
(flasback)
Dom Casmurro Bentinho
Bentinho
(criança)
Dom Casmurro Escobar
Marido de Rita
A Cartomante
(flasback)
Amante de Rita
Rita
A Cartomante
Fernanda
A Cartomante
(cartomante)
Faixa: 09
Ephant gun Banda: Beirut Faixa: ____
(Volta a cena para a sala de estar da Cartomante.)
Depois da Música Elephant Gun
ABRIR MICROFONES: 11, 01, 02
Bentinho (voz off.) – Eu tinha apenas 15 anos, Capitu, 14; minha doce
companheira da meninice. Era mais mulher do que eu era homem.
Capitu (indignada) – Alguém o está envenenando contra mim. Por
quê?
Rita (falando de si, mas que se adequa perfeitamente a Capitu) – São
as cartas. As cartas.
Capitu – Sim, ele recebeu algumas cartas... Mas quem pode ser?
Rita – Todos nós queremos saber.
Capitu – O ciúme que sente é infundado.
Flashback
Microfones
02
09
11
08
04
13
Faixa: 10
(Cena da dança do suposto triângulo amoroso: Bentinho, Capitu e
Escobar. Quando um está sem o par, dança com o invisível. Todas as falas
são de Bentinho, só ele possui a voz e a narrativa dos acontecimentos.)
ABRIR MICROFONES: 04 mantém os anteriores
10
01
07
Bentinho – A vida tanto pode ser uma ópera, quanto uma viagem de
barco; o uma batalha!
Capitu – Na adolescência tem certa graça ameaçar tudo e não fazer
nada.
Escobar – Os olhos de Capitu – olhos de ressaca, cigana oblíqua e
dissimulada.
Bentinho – Oh, vindes outra vez, inquietas sombras!
Capitu – Não fará grande carreira amando, as emoções o dominam!
Escobar – Jura que há de casar comigo?
Capitu – Aos quinze anos tudo é infinito!
Bentinho – No fim, quis atar as duas pontas da vida e restaurar a
velhice a adolescência. Não consegui reter o que foi, nem o que fui! (Capitu
se esvai por entre seus dedos.)
(No giro da dança, Capitu se desprende de Bentinho e volta à cena com
Rita, na sala de espera da Cartomante Fernanda)
Faixa: 6
(Capitu apreensiva vê Rita e a cumprimenta. Ela puxa papo com Rita
que também espera para ser atendida pela Cartomante. Rita tem um
semblante fechado, perdida em seus pensamentos. Veio para matar
Fernanda – a cartomante. Deve demonstrar um ar de mistério em suas
atitudes. Envolve-se pela conversa de Capitu.)
ABRIR MICROFONES: 01, 02
Capitu – Você já esteve aqui antes?
Rita – Sim, uma vez. Uma única vez.
Capitu – E ela prevê o futuro mesmo? Ela acertou?
Rita – Não estou aqui para ver meu futuro.
Capitu – Queria muito que ela pudesse me ajudar. Bentinho está me
deixando louca!
Rita – Esse é o fim de todos nós – a loucura.
Capitu – Crescemos juntos, aprendemos muita coisa juntos, inclusive
sobre o amor.
Flashback
CORTAR MICROFONES: 04, 11
Rita – Os homens são capazes de tudo quando movidos pelo ciúme, tal
como Otelo que envenenado por Iago, mata Desdêmona.
Capitu – Isso não! Vou-me embora com meu filho Ezequiel.
Rita – Fuja enquanto ele não suspeita que o seu amor não é mais dele.
Fuja enquanto ele não descobre que o filho não é dele.
Capitu – Como ousa me acusar assim?!
Rita – Nem tudo dura para sempre, nem mesmo o amor ou o ódio. Mas
isso já não importa mais.
Capitu – Pensas que traí o meu marido? Nunca trairia, Bentinho!
Rita – O passado é concreto, incerto é o futuro.
Capitu (desdém) – Você é uma pérfida, engana o marido e diz creditar
no amor...
Faixa: 7
ABRIR MICROFONES: 08, 09
CORTAR MICROFONE: 02
(Capitu fala de sua infância. Brincadeiras de infância Capitu e
Bentinho: Balanço, bem-me-quer-mal-me-quer...)
Bentinho (de olhos fechados, brinca de esconde-esconde) – Já vou,
Capitu!
5
Rita – Todas nós um dia, enganaremos os maridos, por vontade ou por
acidente.
Capitu – Cartomante pra quê? Já sei o que devo fazer. Não preciso de
ninguém para me julgar. Vocês são como a cidade inteira!
Rita – As promessas são como promissórias, ainda que os devedores
não as paguem, valem a conta que dizem.
CORTAR MICROFONE: 02
ABRIR MICROFONE: 13 e 07
Brás Cubas – Sai quite da vida. Não! Sai com o saldo positivo. Não
tive filhos, não transmiti a nenhuma criatura o legado da nossa miséria.
Cartomante – A morte também é uma loteria.
Brás Cubas – Na morte, que diferença, que liberdade, que desabafo...
Cartomante – Matamos o tempo, mas o tempo nos enterra.
Brás Cubas – Ah, o amor, quantas vezes se cometeu crime com alma
alegre, só porque o amor nos impele para o mal.
Cartomante – A franqueza é a primeira virtude de um defunto.
Brás Cubas – A minha época não estava preparada para me entender.
Cartomante – Fazemos parte de várias histórias, contadas por várias
vozes, como num grande encontro.
Brás Cubas – E quem poderá dizer que essa história é verdadeira?
Cartomante – Afinal, o que existe entre a vida e a morte?
Brás Cubas – Uma outra ponte. E o espectador procura numa história
escapar da vida.
ABRIR MICROFONE: 07 .... e continua 01
Faixa: 11
(Capitu sai nervosa. Rita contempla a aliança, retira-a e joga-a no
chão.)
Rita (para si) – Não há tempo para lágrimas, hoje é dia de acertar as
contas com o destino. (Rita entra na sala da Cartomante, ela se assusta
com a presença da moça.) Você se lembra de mim? (estranhamente dócil)
Cartomante (intrigada) – O que a traz aqui?
Rita (misteriosa) – Você.
Cartomante (para si, misto de medo e desconfiança) – A morte me
espreita... não pode ser. Agora consigo ver tudo claramente.
Rita (lembrança) – Na ocasião, confessei a Camilo ter vindo consultar
uma cartomante! Ele ria... (tom de loucura) Não ria de mim, não ria.
(prática) Os homens são assim, não acreditam em nada. Mas não foi
sempre assim, quando menino, Camilo teve um arsenal inteiro de crendices
herdadas de sua mãe, mas aos vinte anos desapareceram, limitando-se a
negar tudo. No fundo, Camilo sentia-se lisonjeado por me ver arriscar por
ele, correr à cartomante na antiga rua dos Carbonos... Fiquei impressionada
quando você adivinhou o motivo da minha consulta, antes mesmo que eu
lhe dissesse palavra!
Cartomante (relembrando) – A senhora gosta de uma pessoa... Uma
mulher entre dois homens...
Rita (gritando, crise de choro) – Eu confessei!
Cartomante – Cartas anônimas! Muitas delas...
Rita (explode) – Foi por isso que vim aqui pela primeira vez.
Cartomante – Desconfiança, medo...
Rita (explosão contida) – Vilela a partir daí falava pouco, mostrava-se
sombrio. Nem me procurava como esposa e mulher.
Cartomante – A ideia se estarem descobertos parecia-lhe cada vez
mais verossímel.
Rita – Uma denúncia anônima! Podia ser que Vilela conhecesse tudo
agora. Poderia saber tudo sobre eu e Camilo...
Cartomante – Vi a minha morte quando Camilo entrou por essa porta.
Tudo por causa de um bilhete de Vilela.
ABRIR MICROFONE: 13
CORTAR ODOS OS MICROFONES
Faixa: 13 (A mesma anterior corrida)
Música com
misto de fúnebre e sinistra
(Cena das mulheres de Brás Cubas como se fossem os fantasmas do
seu passado. Todas as personagens entram em cena, vestem negro e
colocam flores vermelhas no centro do palco – como se fosse na lápide de
Fernanda – a cartomante – até formar uma espécie de ribalta iluminada
com elipsoidais. Os personagens se encontram, mas não mais se
relacionam. Estão lado a lado formando a obra de Machado de Assis.
Rapidamente, quebram a linha e formam duas diagonais que faz surgir ao
centro os três atores que representaram os personagens masculinos da
obra.)
Faixa: 14 – Poema de Pessoa, “Quando eu era jovem”, por Paulo
Autran
(Blackout enquanto o poema faz o público refletir sobre o próprio
Machado de Assis. Os atores retiram os objetos do palco ainda no escuro.)
Faixa: 15
Quebra. Muda a música.
(De repente, os contrarregras quebram a ordem e surgem com o divã,
sobem nele em posições não convencionais e agradecem ao público
jogando as flores pela platéia, saltam em direção ao público e distribuem
as flores. Nesse momento os personagens dão lugar aos atores que pegam
nas mãos correndo em direção ao público e agradecem. Mas permanecem
no proscênio. A cartomante e Brás Cubas saem das lápides. Todos
dançam.)
Faixa: 12
Voz Vilela (off.) – Vem já, já, à nossa casa; preciso falar-te sem
demora.
(Um corpo no chão, provavelmente de Rita. Vilela com uma arma na
mão, espera Camilo.)
FIM
CORTAR MICROFONE: 13
Rita (descontrolada) – Você afirmou que não nos aconteceria nada!
Você afirmou para Camilo que o terceiro não sabia de nada! De nada!
Cartomante – Ragazzo innamorato... foram dois tiros!
Rita – Você acabou com a minha vida!
Cartomante (embaralha as cartas rapidamente, retira uma carta,
depois outra e outra: demônio, torre e a morte) – Um desastre! (evocativa)
Rita (pega uma arma e vai em direção à Cartomante) – Há mais
mistérios entre o céu e na terra do que sonha a nossa vã filosofia.
Cartomante – Eles não te amavam, Rita.
Rita – Você não vai mentir para mais ninguém! (atira nela)
Cartomante – Eu sempre soube que seria assim. (morre)
Faixa: 12 - A MESMA ANTERIOR
(Rita sai. Novamente o ambiente de sua casa. Ela entra, o marido
Vilela dá dois tiros, ela fica com o corpo estirado no chão. Entra Camilo,
ele atira duas vezes, cai. Mantém imóvel.)
Blackout
Faixa: 13 (Só o início alto, continua depois no BG.)
(A Cartomante e Brás Cubas encontram-se cada um em sua lápide.
Está escrito na lápide de Brás Cubas: 64 anos, solteiro. Na cartomante:
Fernanda, ?/ 1869, solteirona. Travam uma corriqueira conversa sobre o
amor e a morte.)
6

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