e-Terra A assinatura fosfática de linhagens pegmatíticas Variscas

Transcrição

e-Terra A assinatura fosfática de linhagens pegmatíticas Variscas
e-Terra
http://e-terra.geopor.pt
ISSN 1645-0388
Volume 16 – nº 4
2010
Revista Electrónica de Ciências da Terra
Ge oscience s On-line Jo urnal
GEOTIC – Sociedade Geológica de Portugal
VIII Congresso Nacional de Geologia
_________________________________________________________
A assinatura fosfática de linhagens pegmatíticas Variscas – NW de
Portugal
Phosphate signatures in Variscan pegmatites suite from NW of
Portugal
C ARLOS A. A. LEAL G OMES - [email protected] (Universidade do Minho, Centro de Investigação
Geológica - Ordenamento e Valorização de Recursos - CIG-R)
RESUMO: Propõe-se uma sistematização dos fosfatos presentes em pegmatitos graníticos e pegmatóides,
procurando atribuir-lhes o estatuto de assinaturas de filiação e de enquadramento geotectónico. As
simples listas de ocorrência e os modos de prevalência – ubiquidade, carácter recorrente ou carácter
tipomórfico - revelam utilidade no estabelecimento de assinaturas. No caso em estudo, as lazulites são
precoces e ocorrem em pegmatitos NYF. Os fosfatos de Y aparecem em pegmatitos NYF pós-tectónicos.
As montebrasites e trifilites são típicas de pegmatitos LCT que se instalam em situações intermédias.
PALAVRAS-CHAVE: assinatura, fosfato, LCT, NYF, pegmatito, Varisco
ABSTRACT: Phosphate minerals from Variscan granitic pegmatites may act as signatures of geotectonic
setting and granite affiliation. Simple lists of occurrence and modes of prevalence – ubiquity, resurgence
and typical character - may indicate signature behaviour. In the case studied, lazulites are precocious
and occur in NYF pegmatites. Y phosphates occur in post-tectonic NYF pegmatites. Montebrasites and
tryphylites are typical of LCT intermediary suites.
KEYWORDS: signature, phosphate, LCT, NYF, pegmatite, Variscan
1. INTRODUÇÃO
Os pegmatitos Variscos do NW de Portugal apresentam uma grande diversidade de
paragéneses fosfatadas. Não obstante parece existir uma organização destes conjuntos de
minerais em função dos tipos paragenéticos dos pegmatitos que os comportam. Nas associações
fosfáticas observadas em vários pegmatitos de distintos enquadramentos geológicos e com
distintas relações de filiação tem-se verificado alguma persistência de afinidades o que sugere a
hipótese de existirem assinaturas específicas para os diferentes sistemas graníticos residuais. Se,
por um lado, esta constatação ainda não autoriza o estabelecimento de uma tipologia dos
pegmatitos baseada nos seus conteúdos de fosfatos, por outro lado, em vários estudos de corpos,
unidades internas e paragéneses (Leal Gomes, 1999 a, b; Leal Gomes, e Azevedo, 2003; Leal
Gomes et al., 2005) foi possível encontrar aspectos sistemáticos de correlação paragenética
relativamente a outros indicadores de fraccionação geoquímica e descritores de posição
orogénica. Assim é possível propor uma primeira sistematização geral dos conjuntos de fosfatos
presentes em pegmatitos graníticos e pegmatóides, com o estatuto de assinaturas de filiação e de
enquadramento geotectónico. Como corolário é de equacionar a possibilidade de distinguir as
linhagens graníticas produtivas em pegmatitos em função dos conteúdos de fosfatos dos corpos
filiados.
1(4)
e-Terra
Volume 16 – nº 4 | 2010
VIII Congresso Nacional de Geologia
Ao longo do tempo o uso da difractometria de RX sobre fases discriminadas em “micromounts”, quando observados em lupa binocular, tem permitido a identificação sistemática das
espécies. Do ponto de vista metodológico, o talhe dos “micro-mounts” é efectuado em prensa
hidráulica para não perder a expressão tridimensional das relações de cristalização. A análise
descritiva da diversidade mineralógica é convertida sistematicamente em listas de identificações
e transposta para quadros paragenéticos aproximados, sugerindo algumas das condições
cinemáticas que regem o crescimento cristalino. Estas em alguns casos podem ser convertidas
em condições de formação.
Mas são as simples listas de ocorrência e os modos de prevalência – ubiquidade, carácter
recorrente ou carácter tipomórfico - que revelam maior utilidade no estabelecimento de
assinaturas.
2. QUADROS DE PREVALÊNCIA OBSERVADOS
No quadro 1 listam-se algumas das prevalências mais sistemáticas, que podem já ter o valor
de assinaturas mineralógicas de filiação e concretamente, correlacionam-se com o contexto
geotectónico e metamórfico em que os pegmatitos se implantam. Por isso permitem situá-los em
termos orogénicos – estado e cronologia relativa.
Tipo
1
2
3A
Situação dos
pegmatitos
exo-graníticos
exo-graníticos
intra-graníticos
3B
exo-graníticos
3C
3D
4A
4B
4C
5
6
7
8
9
10
11
D
Fosfato típico
D2
D2
D3precoce
sin D3
lazulite
lazulite ± apatite
ambligonite
ambligonite
Expressão
aluminosa típica
crisoberilo
andaluzite
ganite
Corpo paradigmático
petaliteespodumena
ganite
olenite
berilo
moscovite
espodumena
berilo
lepidolite
petalite
berilo
moscovite
topázio
amazonite
Real – S. A.
Sta Rita – S. A.
Encruzilhada - S. A.
Rossas - V. Minho
exo-graníticos
sin D3
gorceixite - goyazite
Balouca – S. A.
exo-graníticos
sin D3
eosforite
Balouca – S. A.
peri-graníticos D2-D3
eosforite ±berilonite
Lourinhal – S. A.
exo-graníticos
D3
eosforite
Balouca – S. A.
exo-graníticos
D3
wavelite - turqueza
Vilarinho – S. A.
exo-graníticos
D3
trifilite
Cerdeirinha – S. A.
exo-graníticos
D3
ambligonite
Balouca – S. A.
peri-graníticos D3
apatite ± trifilite
Queiriga – V. N. Paiva
intra-graníticos tardi-D3 trifilite
S.Assunção – Sátão
intra-graníticos tardi-D3 trifilite
P.Moura – P. Barca
intra-graníticos tardi-D3 ambligonite
Gravanho - Gouveia
intra-graníticos pós-D3
xenotima, monazite
Covide, Terras do Bouro
peri-graníticos
e Taião, Valença
Quadro 1 – Ocorrências mais persistentes de fosfatos em pegmatitos Variscos. Notas: D - fase de
deformação e campo de tensões Varisco que controla a instalação; S. A. – Serra de Arga onde se
escolheram várias ocorrências paradigmáticas representativas de muitas situações de aplito-pegmatitos
intrusivos em terrenos metassedimentares Silúricos (Leal Gomes, 1999 a, b; Leal Gomes, e Azevedo,
2003; Leal Gomes et al., 2005); as séries ambligonite-montebrasite, trifilite-litiofilite, triplite-zwiezelite,
lazulite-scorzalite, são aqui representadas pelo primeiro termo.
Do quadro 1 sobressai que os pegmatitos NYF precoces (D2) são os que caracteristicamente
apresentam lazulite-scorzalite abundante. São estes que mais dificilmente se conseguem
relacionar com plutões graníticos e seus tipos de fácies. Em alguns casos são claramente corpos
venulares resultantes de colheita de leucossoma. Os NYF tardios apresentam fosfatos de Y o que
2(4)
e-Terra
Volume 16 – nº 4 | 2010
VIII Congresso Nacional de Geologia
é típico da sua especialização metalogénica, sendo relacionáveis com os granitos pós-D3
(tendência subalcalina) de cuja fraccionação residual resultam. Os pegmatitos LCT caracterizamse por terem filiações, ou mais difíceis de estabelecer ou mais complexas, com várias situações
de hibridização e contaminação, mas existem fosfatos bastante típicos da sua cronologia de
instalação no contexto orogénico e também típicos da posição relativamente aos granitos.
3. OCORRÊNCIAS SISTEMÁTICAS COM O ESTATUTO DE ASSINATURAS
Decorre também do quadro I que a implantação dos pegmatóides e pegmatitos de contexto
Varisco, pode ser ordenada de acordo com as associações fosfáticas características. Essa ordem
tem correspondência em alguns outros minerais tipomórficos e situações estruturais internas que
interessa nomear como atributos da assinatura:
1 – lazulite – scorzalite I associada a andaluzite (± corindo);
2 – lazulite – scorzalite II – segregação metamórfica no encaixante e colheita do fosfato em fracturas do
pegmatito (± crisoberilo ± berilo);
3 A – ambligonite-montebrasite I verde escura com ganite inclusa;
B – ambligonite-montebrasite II branca e plumosa, muito deformada;
C – svambergite-gorceixite-goyazite-candralite- churchite com ganite em fluidalidades e cumulados;
D – eosforite com olenite nodular em fluidalidades e cumulados;
4 A*– fosfatos muito variados em corpo helicoidal peri-granítico – hibridização com metassedimentos e
metavulcanitos Silúricos;
B – 3D retomado;
C – wavelite ou venulações de turqueza com troleite nuclear - interacção aplito-pegmatito / quartzito
com contactos difusos por injecção mecânica ou segregação;
5 – trifilite-litiofilite verde escura I – pegmatito instalado em S2;
6 – ambligonite-montebrasite III branca± lacroixite ± wardite com lepidolite;
7* – associação complexa por hibridização extensiva com litologias meta-vulcanossedimentares do
encaixante e magmas básicos misturados em corredores de “mingling ;
8* – associação complexa em corpos diferenciados em ambiente de “mingling” e cúpula granitóide e
também fraccionação intrínseca às unidades fosfáticas;
9* – associação complexa com fraccionação entre unidades independentes e bolsadas individualizadas em
ambiente de “mingling” e cúpula granitóide;
10 – ambligonite-montebrasite V branca em intercrescimento gráfico com lepidolite e/ou topázio em
“sills” que transectam a situação 8;
11 – xenotima, churchite-(Y).
NOTA * - Associações muito complexas de fosfatos ocorrem em pegmatitos situados em cúpulas
graníticas ou em situações perigraníticas onde são afectados por misturas de magmas ou
contaminações com rochas encaixantes de natureza primitiva poligénica (incluindo proto-níveis
de rochas fosfáticas estratiformes e níveis vulcanogénicos – exalíticos):
4 A – berilonite, berlinite, eosforite II, ernstite - secundários muito abundantes com predominância
de variscite e beraunite-rockbridgeite;
7 - trifilite-litiofilite, gormanite, apatite com carbonatos (oligonite-rodocrosite típicas) e sulfuretos
(kesterite, estanite típicas) - secundários muito abundantes incluindo fosfofilite e hureaulite;
8 - OH-herderite miarolítica; lazulite-scorzalite III e ambligonite-montebrasite IV, (augelite,
witlockite, tavorite, wolfeite, wagnerite, brasilianite) transformadas de trifilite-litiofilite II, por
sua vez fraccionada com triplite-zwiezelite depois de isockite e apatite - secundários muito
abundantes incluindo sicklerite (Fe), heterosite-purpurite, taburtite, vivianite;
9 - ximengite em intercrescimento com sulfossais de Ag, Bi e Pb inclusos em quartzo nuclear;
fraccionação de triplite-zwiezelite seguida de trifilite-litiofilite II e F-apatite a wolfeite secundários muito abundantes com predominância de vivianite.
3(4)
e-Terra
Volume 16 – nº 4 | 2010
VIII Congresso Nacional de Geologia
Na maioria dos casos as ambligonites-montebrasites brancas, que são as mais próximas do
termo montebrasite, têm uma ampla distribuição em pegmatitos filonianos exo-graníticos sintectónicos relativamente a D3 e filiados em granitos de duas micas.
A trifilite-litiofilite é mais típica de corpos de forma irregular, intra-graníticos, geneticamente
relacionados com granitos tardi-D3, de duas micas, mas essencialmente biotíticos e de tendência
porfiróide.
Na relação com outras assinaturas existem situações de expressão do Ta, ao longo das
especializações LCT/NYF que se vão sucedendo na pegmatitização Varisca, as quais podem ter
uma marcada relação com a assinatura fosfática:
a) Ta sequestrado em ilmenite e rútilo – linhagem NYF precoce --- 1 ;
b) libertação do Ta por “annealing-recovery” – linhagem NYF com migração do Ta para a
sequência struverite – tapiolite --- 2;
c) expressão de cassiterite com inclusões herdadas de zircão, Ti, Sc, Sn-ixiolite, thortveitite,
columbite e tapiolite – linhagem LCT – petalítica --- 3;
d) fraccionação de Fe-columbite até Mn-tantalite – linhagem LCT – turmalino-lepidolítica --- 6;
e) fraccionação de Ti-ixiolite a pirocloro - linhagem LCT fosfática --- 8;
f) fraccionação de Fe-columbite inclusa em trifilite – litiofilite a Mn-tantalite inclusa em tavorite ou
wolfeite – linhagem LCT fosfática --- 8;
g) fraccionação e substituição envolvendo os domínios composicionais, Fe-columbite, Mncolumbite, Mn-tantalite, microlite, alumotantite, simpsonite – linhagem LCT – lepidolítica --- 10;
h) fraccionação de Fe-columbite a W-wodginite – linhagem NYF tardia --- 11.
NOTA – Os algarismos finais correspondem aos tipos expostos no quadro 1.
4. OUTRAS UTILIDADES DA ASSINATURA FOSFÁTICA
No que respeita por exemplo, ao aproveitamento de materiais cerâmicos pegmatíticos as
assinaturas fosfáticas podem ter algum interesse prospectivo mas sobretudo sugerem a qualidade
dos minerais industriais expressos nos pegmatitos:
- podem indiciar o potencial cerâmico de um grupo intragranítico;
- representam o potencial penalizante dos fosfatos nos mesmos pegmatitos em que ocorrem ;
- sugerem a importância das jazidas no caso particular dos jazigos de feldspato potássico de 1ª
qualidade;
- ajudam a classificar as jazidas de materiais cerâmicos pegmatíticos.
Referências
Leal Gomes, C. (1999a) – Equilíbrio e Evolução dos Fosfatos do Pegmatito do Lourinhal – Campo
Aplito-Pegmatítico da Serra de Arga (Minho, Norte de Portugal). Actas do II Congresso Ibérico de
Geoquímica e XI Semana de Geoquímica, Lisboa, pp. 87-90.
Leal Gomes, C. (1999b) – Expressão Míneralógica Recorrente de Alumina e Fosfato, no Decurso da
Evolução Tectóno-Metamorfica D2-D3 Hercínica - Interpretação de Índices Paragenéticos do
Campo Aplito-Pegmatítico da Serra de Arga - Minho - N de Portugal. Actas do II Congresso Ibérico
de Geoquímica e XI Semana de Geoquímica, Lisboa, pp. 95-98.
Leal Gomes, C., Azevedo, A.S. (2003) – Caracterização Difractométrica e Evolução Paragenética de
Fosfatos em Pegmatitos do Grupo Senhora da Assunção (Viseu). IV Congresso Ibérico de
Geoquímica e XIII Semana de Geoquímica, Coimbra, pp. 56-58.
Leal Gomes, C., Figueiredo, M. O., Pereira da Silva, T., Lopes Nunes, J. (2005) – A Ocorrência de
Svambergite e Fosfatos do Grupo da Alunite (Al-Sr-Ba) no Campo Aplito-Pegmatítico da Serra de
Arga, Minho – Significado Paragenético e Implicações para a Geoquímica de Sequências AplitoPegmatíticas. Actas da XIV Semana de Geoquímica, VIII Congresso de Geoquímica dos Países de
Língua Portuguesa, Univ. Aveiro, pp. 135-139.
4(4)

Documentos relacionados

recursos minerais metálicos - geomuseu

recursos minerais metálicos - geomuseu Figura 1 – Representação esquemática da zonação de um campo pegmatítico do tipo LCT . Adaptado de Cerny (1991b)

Leia mais

As assinaturas LCT e NYF em aplito-pegmatitos Variscos de metais

As assinaturas LCT e NYF em aplito-pegmatitos Variscos de metais RESUMO: A discriminação LCT e NYF baseia-se em minerais tipomórficos e elementos indicadores. Em contexto Varisco, aquelas especializações podem ser encaradas como assinaturas de enquadramento geot...

Leia mais