programa lugares da memória - Memorial da Resistência de São

Transcrição

programa lugares da memória - Memorial da Resistência de São
Memorial da Resistência de São Paulo
PROGRAMA
LUGARES DA MEMÓRIA
Alameda Casa Branca
Endereço: Alameda Casa Branca, 800,
Jardins, São Paulo, SP.
Classificação: Logradouro.
Identificação numérica: 170-13.001
A Alameda Casa Branca está situada no bairro Jardim Paulista que compõe a
nobre região conhecida em São Paulo como “Jardins” – reunindo o loteamento dos
bairros Jardim América, Jardim Europa, Jardim Paulista e Jardim Paulistano.
Planejados no início do século XX, os “quatro jardins” estão inspirados no conceito
inglês de garden-city (cidade-jardim), que propõe, urbanisticamente, a harmonia das
residências com a natureza, opondo com a construção de jardins o modelo das
cidades industriais1. Em São Paulo o garden-city foi implantado, pioneiramente, ao
longo da década de 1910 no Jardim América pela empresa Companhia City, que
desenhou o bairro com ruas curvas bastante arborizadas, estabelecendo regras de
zoneamento, direcionamento do trânsito e normas de construção com limites de
ocupação do espaço: para a aquisição de lotes havia “um contrato de venda com
cláusulas específicas sobre as acomodações das casas no lote e a localização no
terreno”2. “Os autores do desenho, Barry Parker e Raymond Unwin, arquitetos
britânicos, tinham sido os criadores de Letchworth, a primeira cidade-jardim da
história, e de Hampstead, subúrbio residencial de Londres [...]”3.
Lançado em 1919, o bairro Jardim América, cujas ruas receberam o nome dos
países do continente americano, já estava plenamente ocupado na década de 1940
por profissionais liberais, comerciantes e industriais “que iam ao cinema, dançavam
1
Para uma leitura detalhada do conceito e a história de formação do bairro ver: PAULA,
Zueleide Casagrande de. Jardim América: de Projeto Urbano a Monumento Patrimonial
(1915 a 1986). Tese (Doutorado em História). Universidade Estadual Paulista. Assis/SP, 2005.
2 PAULA, Zueleide Casagrande de. op. cit, p.122.
3 PREFEITURA DA CIDADE DE SÃO PAULO. Guia de bens culturais da cidade de São
Paulo. Departamento do Patrimônio Histórico. Secretaria Municipal de Cultura. São Paulo:
Imprensa Oficial, 2012, p.236.
1
em bailes de clubes, faziam esportes e começavam a morar em casas [...] com jardins
frontais, [...] separadas da rua apenas por pequenas muretas”4. Esse empreendimento
imobiliário no Brasil foi contemporâneo das primeiras experiências internacionais
(lançadas em Londres em 1913) e, após alguns anos, foi reproduzido em muitas
outras regiões da cidade e do país, demonstrando a grande aceitação desse modelo.
Como exemplo, também em 1919 foi lançado o loteamento do Jardim Europa, cujas
ruas recebiam nomes de países europeus. Em total harmonia com o Jardim América,
não é possível observar, pela paisagem, os limites entre os dois bairros que se unem e
se mesclam – tanto que a Avenida Europa (principal via do Jardim Europa) é uma
continuação da Rua Colômbia (coração do Jardim América).
Os quatro bairros paulistas inspirados no conceito da “cidade-jardim” possuem
algumas diferenças em relação ao tamanho dos loteamentos, mas, de modo geral,
suas ruas permanecem muito arborizadas e a arquitetura empregada não se diverge
muito, estabelecendo uma “continuidade paisagística”, que acabou por “firmar um
padrão de moradia burguesa brasileira do século XX”5.
Imagem 01: Casas do
Jardim
Paulista
em
1923. Pavimentação da
rua Bela Cintra, na
esquina com a Alameda
Itu.
Foto: Autor
desconhecido.
Fonte:
Arquivo Histórico de São
Paulo.
Imagem 02: Vista
do bairro Jardim
América no ano de
1938.
Foto:
Benedito Junqueira
Duarte.
Fonte:
Acervo Fotográfico
do
Museu
da
Cidade
de
São
Paulo.
4
5
Idem, p.238.
Idem, p. 236 e 238.
2
Imagem
03:
Empreendimento
imobiliário da Cia. City:
"Jardim América City of
São Paulo Improvements
and Freehold Land Ltd.".
Pela imagem é possível
observar a construção de
jardins internos em alguns
quarteirões. Esses jardins
foram loteados e vendidos
ao longo dos anos 1930,
descaracterizando partes
do projeto arquitetônico
inicial. Foto: Arquivo/AE.
Fonte: Jornal O Estado
de São Paulo.
Construída inicialmente como subúrbio da capital, a região dos Jardins foi,
anos depois, incorporada à cidade devido ao crescimento da malha urbana, que
tornou o subúrbio uma área de grande interesse das classes economicamente
privilegiadas, “que viam naquela região [dos Jardins] a possibilidade de usufruir os
benefícios da cidade e, ao mesmo tempo, do sossego trazido pelo planejamento
controlado das áreas”6.
Por ser ocupada por famílias abastadas da capital, no período da ditadura civilmilitar (1964-1985) a região dos Jardins, ao contrário de outros bairros da cidade, não
constituía um local de observação frequente por parte dos agentes da repressão, que
procuravam coibir qualquer tipo de movimentos de resistência ao regime militar ou
outra atividade considerada, por eles, como subversiva. Por esse motivo, a região se
configurou como um local seguro para os encontros secretos marcados entre
militantes de organizações de esquerda7. Além do sossego, a arborização do bairro
dificultava a visão noturna, pois escurecia muitos as ruas: “Além dos escassos postes
de luz, a profusão de árvores ensombrecia a rua. Não havia como negar que era um
recanto discreto para colóquios clandestinos”8. Esse quadro de uma suposta
“segurança” da região foi abalado no dia 04 de novembro de 1969, por volta das oito
horas da noite, quando foi executado na Alameda Casa Branca o líder da Ação
6
PAULA, Zueleide Casagrande de. op. cit, p.180.
Os encontros entres os militantes ocorriam em locais determinados como “pontos, ou seja,
um local onde um militante deveria comparecer em um determinado horário para se encontrar
com outro militante e receber ou passar incumbências da organização de esquerda a qual
pertenciam. Os “pontos” eram marcados sempre em locais diferentes e todos os membros, das
diversas organizações clandestinas de resistência, utilizavam-se dessa estratégia.
8 MAGALHÃES, Mário. Marighella. O guerrilheiro que incendiou o mundo. São Paulo:
Companhia das Letras, 2012, p.418.
7
3
Libertadora Nacional (ALN), Carlos Marighella. A emboscada, que resultou na morte
do guerrilheiro no momento em que este comparecia a um encontro com outros
militantes da ALN, contou com a participação de aproximadamente 30 policiais9. A
operação foi organizada e comandada por Sérgio Paranhos Fleury, delegado do
Departamento Estadual de Ordem Política e Social de São Paulo (Deops/SP) e um
dos líderes do Esquadrão da Morte, grupo de extermínio formado por policiais civis e
militares que executavam traficantes e marginalizados da cidade de São Paulo durante
a década de 197010.
CARLOS MARIGHELLA: BREVE HISTÓRICO DE LUTA
Carlos Marighella, baiano nascido em Salvador no dia 05 de dezembro de
1911, era filho de um mecânico imigrante italiano com a mulata Maria Rita, descente
dos negros haussás, africanos do Sudão trazidos como escravos para o Brasil. O
audacioso baiano, que, no Ginásio da Bahia, já havia respondido em versos uma
prova de física sobre refração da luz, começou sua militância política ainda na
juventude, sendo preso quando era estudante do curso de engenharia da Escola
Politécnica da Bahia em 1932. Por ordem do interventor no governo da Bahia, Juracy
Magalhães, Marighella passou alguns dias na cadeia devido ao seu envolvimento nas
manifestações estudantis de apoio ao movimento constitucionalista iniciado em São
Paulo naquele ano. Em 1934, após desistir de sua formação como engenheiro, passou
a integrar a Federação Vermelha dos Estudantes e a Juventude Comunista em
Salvador e, aos 23 anos, filiou-se ao Partido Comunista Brasileiro (PCB)11, o Partidão.
9
Idem, p.415.
O Esquadrão da Morte era um grupo de extermínio que atuou em São Paulo durante a
ditadura civil-militar. No Presídio Tiradentes (SP), durante os anos 1970, presos políticos
afirmam que alguns presos comuns eram retirados das dependências do Presídio durante a
madrugada e apareciam mortos na manhã seguinte em algum lugar da cidade, geralmente na
periferia. O delegado Fleury perseguiu, prendeu e torturou vários militantes de esquerda e foi o
mais famoso comandante do Esquadrão. O grupo começou a ser combatido nos anos 1970 e
perdeu forças após a morte de Fleury (em 1979, aos 46 anos) e do policial Mariel Mariscot (em
1981). Para mais informações, conferir: BICUDO. Hélio. Meu depoimento sobre o Esquadrão
da Morte. São Paulo: Martins Fontes, 2002; e também SOUZA, Percival de. Autópsia do
medo. Vida e morte do delegado Sérgio Paranhos Fleury. São Paulo: Globo, 2000.
11 O PCB foi fundado em Niterói (RJ) em março de 1922 com o objetivo principal de promover
no Brasil uma revolução proletária que substituísse a sociedade capitalista pela sociedade
socialista. Recém-criado e contando ainda com poucos filiados, foi posto na ilegalidade em
junho de 1922 durante o governo de Epitácio Pessoa. Até o fim da ditadura civil-militar,
implementada no país em 1964, o PCB só vivenciou três períodos de legalidade: em 1922, de
março até junho, em 1927, de janeiro até agosto e, por fim, de outubro de 1945 até abril de
1947. Para mais informações acesse: As organizações de Esquerda. PCB – Partido Comunista
Brasileiro, p. 463-465. In: BRASIL. Direito à Memória e à Verdade. CEMDP. Brasília,
Secretaria Especial dos Direitos Humanos, 2007; e o verbete “Partido Comunista do Brasil
(PCB)”
elaborado
pelo
CPDOC/FGV.
Disponível
em
https://cpdoc.fgv.br/producao/dossies/AEraVargas1/anos20/QuestaoSocial/PartidoComunista.
Acesso em 27/08/2015.
10
4
Em 1º de maio de 1936, durante as manifestações do dia do trabalhador,
Carlos Marighella foi novamente preso, sendo agora barbaramente torturado pela
Polícia Especial do Rio de Janeiro, que queimou seu corpo com cigarros. Na cidade do
Rio, Marighella atuava, desde final de 1935, como membro da Comissão Especial do
Comitê Central do PCB, sendo o responsável pelo setor gráfico; ficou preso até julho
de 1937, quando passou a viver na clandestinidade. No começo de 1938 foi
transferido pelo Partido para São Paulo, onde deveria ajudar a reestruturar o PCB,
mas Marighella é novamente capturado em maio de 1939 pela polícia do Estado Novo
e é encaminhado, pelo investigador Luis Apollônio, para o Deops/SP onde
permaneceu preso por mais de um mês, sendo depois transferido para a Casa de
Detenção do Rio de Janeiro, onde aguardou julgamento. Marighella foi sentenciado no
dia 06 de março de 1940 a cumprir pena de cinco anos no Presídio de Fernando de
Noronha, de onde foi transferido para a Colônia Penal de Ilha Grande devido à
possível ocupação de Fernando de Noronha por tropas aliadas após a entrada do
Brasil na Segunda Guerra Mundial12.
Imagem 05: Prontuário de
Carlos Marighella após sua
prisão em 1939 pela polícia
política de São Paulo,
sendo encaminhado para o
Deops/SP. Foto: Autor
desconhecido.
Fonte:
Arquivo Público do Estado
de São Paulo.
Imagem 06: Lateral
direita do Presídio
de Fernando de
Noronha (PE), onde
Carlos
Marighella
cumpriu parte de
sua pena na década
de
1940.
Foto:
Autor desconhecido.
Fonte:
Arquivo
Público Mineiro.
12
MAGALHÃES, Mário, op. cit, p.85
5
Após a entrada do Brasil na Segunda Guerra Mundial em 1942 muitas foram as
manifestações contra a ditadura do Estado Novo, uma vez que era paradoxal que
Getúlio mantivesse no país um governo autoritário enquanto o Brasil se aliava à luta
contra o nazifascismo na Europa. Após grande pressão política, Vargas assina, em 18
de abril de 1945, o Decreto-Lei nº 7.474, anistiando cerca de seiscentos presos
políticos, dentre eles Carlos Marighella13.
Minutos depois, Marighella caminhou até o portão principal [da
Penitenciária Central do Rio de Janeiro]. Fazia cinco anos, dez
meses e 23 dias que ele estava preso. Dos doze anos de
comunismo, passara mais de sete na cadeia. Na maior parte do resto
do tempo, viveu nos subterrâneos. O Brasil mudava com o mundo.
Do bandido pintado pelos diários nove anos antes, Marighella virou,
de acordo com a hagiografia publicada em O Jornal, o “melhor aluno
da Escola Politécnica da Bahia”14.
Neste contexto do final dos anos 1940, o enorme prestígio desfrutado pela
União Soviética após o fim da Segunda Guerra Mundial contribuiu para que o Partido
Comunista Brasileiro alcançasse um expressivo crescimento no país, conquistando,
finalmente, a sua legalidade política. As eleições de 1945 comprovam esse próspero
momento vivido pelo PCB:
Nas eleições presidenciais realizadas em dezembro o PCB lançou a
candidatura do ex-prefeito de Petrópolis, Iedo Fiúza, que não
pertencia aos seus quadros. Fiúza obteve 10% do total de votos.
Votação semelhante recebeu a chapa do partido para a Assembleia
Nacional Constituinte, tendo sido eleitos 14 deputados federais. No
Distrito Federal, Prestes foi eleito senador com enorme votação15.
A votação, ocorrida em dezembro de 1945, elegeu Carlos Marighella como
deputado federal pela Bahia. O parlamentar comunista apresentou na Câmara uma
atuação política marcadamente combativa. “Fez do plenário uma tribuna de denúncias
da injustiça social e da violência contra os trabalhadores. A situação dos operários e
camponeses de todo o país [...] e a luta contra os baixos salários eram os alvos
preferenciais [...]”16. Como deputado, Marighella foi o autor de grande parte das
emendas apresentadas pela bancada do PCB17, participando também da elaboração
da Carta Constituinte de 1946.
13
Idem, p.109.
Idem, p.109-110.
15 CPDOC/FGV, loc. cit.
16 SACCHETTA, V; CAMARGOS, M; MARINGONI, G. A imagem e o gesto. Fotobiografia de
Carlos Marighella. Editora Perseu Abramo, São Paulo, 1999, p.28.
17 Ibidem.
14
6
Imagem 07: Bancada comunista da Constituinte de 1946. Na fila superior, da esq. para a
dir.: Claudino Silva, Osvaldo Pacheco, Batista Neto, Gregório Bezerra, Alcedo Coutinho,
Carlos Marighella, Alcides Sabença; em primeiro plano: Jorge Amado, Abílio Fernandes,
João Amazonas, Luís Carlos Prestes, Maurício Grabois, Milton Caires de Brito, Agostinho
Dias e José Maria Crispim. Foto: Autor desconhecido. Fonte: Acervo Iconographia.
A legalidade do PCB, no entanto, já estava com os dias contados. No contexto
da Guerra Fria, durante o governo de Eurico Gaspar Dutra, o Tribunal Superior
Eleitoral suspendeu, em abril de 1947, o registro do Partido Comunista Brasileiro
alegando que este era um instrumento para a intervenção soviética no Brasil. “A
Confederação Geral dos Trabalhadores do Brasil é fechada, mais de uma centena de
sindicatos colocados sob intervenção, e as relações diplomáticas com a União
Soviética rompidas”18. Além disso, os dirigentes comunistas começam a ser
perseguidos pela polícia até que no dia 07 de janeiro de 1948, por 169 votos contra
74, foi aprovada a cassação dos mandatos dos parlamentares eleitos do PCB. Para
Marighella, recomeçava então o período de clandestinidade, situação na qual ele viveu
até o dia de sua morte em 04 de novembro de 1969.
ROMPIMENTO COM O PCB E A ALN – ADESÃO À LUTA ARMADA
Após o golpe civil-militar de 31 de março de 1964, iniciou-se, dentro do PCB,
uma série de crises políticas decorrentes do modelo ideológico defendido pelo Partido
para o enfrentamento da ditadura. A crítica levantada pelos divergentes do Partidão
18
Idem, p.36.
7
embasava-se na defesa de que a luta armada seria o caminho da vitória para a
esquerda no Brasil19. No entanto, o PCB é contra a luta armada, apresentando um
“programa de transformações democrático-burguesas, [...] [e] defende cada vez mais
claramente uma
estratégia de transição pacífica”20.
Em
decorrência desse
posicionamento, em 1967 o Partidão sofreu uma grande cisão política, sendo dividido
em muitas outras organizações de esquerda21.
Apesar da orientação ideológica do PCB, Carlos Marighella, um de seus
dirigentes, se convencia cada vez mais dos ideais da luta armada, principalmente após
a vitória da Revolução Cubana em 1959. Assim, em 1966, Marighella publica “A crise
brasileira” na qual procura mostrar a improcedência da política de alianças com a
burguesia e da crença na via eleitoral. Destacando, por outro lado, “a importância do
trabalho junto aos operários e camponeses e a necessidade da luta armada como
caminho para a instalação de um governo popular revolucionário”22.
Em julho de 1967 ocorre em Cuba a Primeira Conferência da Organização
Latino-Americana de Solidariedade (Olas) e Marighella comparece ao país sem o
consentimento do PCB, uma vez que meses antes, em março de 1967, o Comitê
Central do Partidão já havia se pronunciado contra a Olas por esta se manifestar
“como se a luta armada fosse a única forma de luta revolucionária”23. Marighella, ao
comparecer à Conferência, e acreditando na via revolucionária da luta armada, decidiu
romper com a direção do PCB, que, por sua vez, também havia decidido pela
expulsão de Marighella do partido. No final dos anos 1960 a discordância de
Marighella em relação às diretrizes do Partidão já eram irreconciliáveis: “O que se
passa no PCB é que, depois da insurreição armada de 1935, as várias direções que
se têm sucedido abandonaram o caminho revolucionário, entregando-se às mãos da
burguesia e subordinando-se à sua liderança política e ideológica”24.
A viagem de Marighella à Cuba teve como resultado, portanto, o rompimento
entre o baiano e o Partido Comunista Brasileiro, mas, como destaca Mário Magalhães,
19
Essa linha política defendida pelo PCB consistia na defesa da via pacífica na passagem do
regime capitalista ao socialista e da política de coexistência pacífica entre os blocos do mundo
capitalista e do mundo socialista. Tal orientação foi definida pelo Partido durante a Declaração
de Março, de 1958, e foi reafirmada durante o V Congresso do partido em 1960.
20 Essa linha política defendida pelo PCB consistia na defesa da via pacífica na passagem do
regime capitalista ao socialista e da política de coexistência pacífica entre os blocos do mundo
capitalista e do mundo socialista. Tal orientação foi definida pelo Partido durante a Declaração
de Março, de 1958, e foi reafirmada durante o V Congresso do partido em 1960. Direito à
Memória e à Verdade. op. cit.
21 Mas a primeira divisão sofrida pelo PCB já havia acontecido em 1962 com a criação do
Partido Comunista do Brasil (PCdoB).
22 Verbete Ação Libertadora Nacional (ALN), produzida pelo CPDOC/FGV. Disponível em:
http://www.fgv.br/cpdoc/busca/Busca/BuscaConsultar.aspx. Acesso em 28/05/2015.
23 MAGALHÃES, Mário, op. cit, p.255.
24 Idem, p.261.
8
“o propósito real da viagem não fora assistir ao evento, mas acertar o treinamento de
novas levas de militantes”25. Após a cisão entre o Partidão e Marighella, este organiza
a Ação Libertadora Nacional (ALN) – embora esse nome só viesse a ser utilizado em
1969, sendo antes conhecido como “Agrupamento Comunista de São Paulo”, ou
simplesmente “Ala Marighella”26 –, cujo lema centra era “A ação faz a vanguarda”27. A
ALN surge “como uma estruturação orgânica pouco precisa, sem uma direção coletiva,
adotando a “autonomia tática dos grupos armados”, sob a consigna de que ninguém
precisa pedir licença a ninguém para fazer a Revolução”28. Já a partir de sua
organização, a ALN começa a atuar em ações armadas, atraindo um grande
contingente de jovens envolvidos em manifestações estudantis em todo o país, e por
isso ganha grande visibilidade nacional. Em setembro de 1969 a organização alcança
também destaque internacional ao conduzir, em conjunto com o Movimento
Revolucionário 8 de Outubro (MR-8), o sequestro do embaixador americano no Brasil,
Charles Burke Elbrick – cujo pedido de resgate foi a liberação de 15 presos políticos e
a divulgação em rede nacional, pelo governo militar, de um manifesto revolucionário,
conseguindo furar o bloqueio de censura imposto aos meios de comunicação.
Mas Marighella, muito antes de aderir aos propósitos da luta armada, já era um
alvo da repressão militar por sua conhecida atuação comunista desde os anos 1930.
Logo após o golpe de 1964 ele acabou detido por três meses após ter sobrevivido a
uma tentativa de assassinato conduzida pela polícia do Departamento de Ordem
Política e Social do Rio de Janeiro (DOPS/RJ). O fato é narrado pelo próprio
Marighella em sua obra Porque resisti à prisão:
A minha prisão, no dia 9 de maio, no cinema Eskye-Tijuca, revestiuse de sensacionalismo e suspense. Os agentes do DOPS
dispararam um tiro contra meu peito para me matar. (...) O tiro foi
desfechado à queima-roupa dentro do cinema. [...] Foi tudo numa
fração de segundo. Um estampido dentro do cinema. Os gritos de
horror. [...] Lutei todo o tempo com a bala embutida no corpo, e
sangrando sempre e muito. (...) Dominaram-me por fim com uma
pancada no crânio, que me pôs a nocaute e desacordado29.
No entanto, foi a partir da organização da ALN que Marighella se tornou o
inimigo número 1 dos militares, como destaca Florestan Fernandes: “Ele foi
perseguido como a caça mais cobiçada e condenado à morte cívica, à eliminação da
25
Ibidem.
Direito à Memória e à Verdade, loc. cit., p.470.
27 Ibidem.
28 Ibidem.
29 MARIGHELLA, Carlos. Porque resisti à prisão. São Paulo. Brasiliense, 1994, p.13-14.
26
9
memória coletiva”30. A Revista Veja de novembro de 1968 traz, como reportagem de
capa, informações sobre caçada do guerrilheiro.
Imagem
08:
Marighella
torna-se a partir de 1968 um
personagem
da
história
política do país. Antiga
liderança
do
Partido
Comunista
Brasileiro,
o
baiano é, agora, líder uma
importante organização de
esquerda atuante na luta
armada. Na imagem capa da
Veja de 20 de novembro de
1968. Foto: Correio da
Manhã. Fonte: Acervo Veja.
EMBOSCADA PARA CARLOS MARIGHELLA
A Igreja Católica no Brasil foi uma das principais bases de sustentação do
golpe civil-militar de 1964, organizando, inclusive, a Marcha da Família com Deus pela
Liberdade. No entanto, no final dos anos 1960, baseada nos princípios da Teologia da
Libertação, a ala progressista da Igreja se transformou em um setor de contestação e
denúncia das inúmeras violações de direitos humanos cometidas por agentes do
Estado e passou a ter um importante papel aglutinador na luta contra a ditadura e pela
igualdade social. Uma das ordens católicas que se destacou nessa luta foi a Ordem
dos Dominicanos, que já possuía uma tradição de militância política que vinha desde a
Segunda Guerra Mundial, quando ajudaram refugiados a se esconderem dos nazistas.
Os dominicanos chegam ao Brasil no final do século XIX e fundam, em 1938, o
Convento Santo Alberto Magno em Perdizes (mais conhecido como o Convento dos
Dominicanos)31, que após o golpe civil-militar de 1964 passou a ser um importante
espaço de aglutinação de estudantes e intelectuais. Pela proximidade com os ideais
da ala progressista da Igreja Católica, alguns freis dominicanos acabaram por
ingressar em organizações de combate direto à ditadura. Na ALN de Marighella, os
primeiros membros dominicanos “foram o frei Osvaldo e frei Betto, [e] logo outros
30
Idem, p.58.
Para uma leitura sobre o Convento conferir o documento produzido pelo Memorial da
Resistência de São Paulo. Programa Lugares da Memória. Convento Santo Alberto Magno –
Convento dos Dominicanos. Memorial da Resistência de São Paulo, São Paulo, 2014.
Disponível na página da instituição.
31
10
foram aderindo a este projeto de luta contra a ditadura militar”32, como frei Maurício
(João Valença), frei Fernando, frei Ivo Lesbaupin, frei Magno Vilela, frei Luis Felipe
Ratton Mascarenhas, frei Giorgio Callegari e frei Tito de Alencar.
A atividade dos freis dentro da organização estava associada aos diversos
contatos que os religiosos possuíam. “Dado o conhecimento que tinham de pessoas
em todas as camadas sociais, a coordenação logística ficou com os frades”33 e os
religiosos passaram a realizar ações secundárias de apoio ao grupo armado, como
indica frei Fernando de Brito: “Nós escondíamos gente, nós arrumávamos dinheiro
para o pessoal viajar, conseguíamos condução para o pessoal viajar. Ajudávamos
pessoas que precisavam de tratamento médico [...]”34. Por estabelecerem contato com
diferentes pessoas utilizando seus nomes verdadeiros, os freis estavam, de certa
forma, vulneráveis e, dentro do contexto de acirramento do “combate à subversão” do
final dos anos 1960, alguns deles foram identificados como opositores do regime e,
perseguidos, acabaram presos e torturados35.
Alguns dominicanos foram presos em 1969 no âmbito da chamada “Operação
Batina Branca”36, que consistia em uma força tarefa planejada ao longo de meses e
executada no prazo de uma semana pelos agentes do Deops/SP. Na primeira fase
desta Operação, com o objetivo de investigar o envolvimento dos dominicanos com a
organização de Carlos Marighella, a equipe do delegado Sérgio Paranhos Fleury
monitorou o convento de Perdizes e a Livraria Duas Cidades37. A Operação resultou
no sequestro dos dominicanos que sob intensas torturas acabaram por ceder algumas
informações sobre o paradeiro de Marighella e essas pistas levaram o Deops a
32
VALENÇA, João. Uma história do tempo da ditadura. Revista Revés do Avesso. Centro
Ecumênico de Publicações e Estudos Frei Tito de Alencar de Lima, São Paulo, 2004, p.39.
33 Ibidem.
34 Entrevista de frei Fernando de Brito para o documentário Marighella - Retrato Falado do
Guerrilheiro, de Silvio Tendler. 2001. Minutagem: 40:00 - 40:27.
35 O caso dos freis dominicanos torturados pelo Deops/SP é narrado por Frei Betto no livro
Batismo de Sangue: Guerrilha e Morte de Carlos Marighella, com a 1ª edição em 1982.
Para uma leitura sobre a aproximação de Carlos Marighella com os dominicanos conferir:
MAGALHÃES, Mário. Marighella. O guerrilheiro que incendiou o mundo. São Paulo:
Companhia das Letras, 2012.
36 O General Castelo Branco, então presidente, desejava a expulsão da Ordem Dominicana do
Brasil devido ao seu caráter progressista e de envolvimento com os setores de esquerda.
Dentro deste propósito, organizou-se a Operação Batina Branca, que buscava desmoralizar os
dominicanos perante a sociedade e abalar as relações dos religiosos com as alas de esquerda,
enfraquecendo, desta forma, todo o movimento revolucionário.
37 A Livraria (e Editora) Duas Cidades foi criada em 1954 e se instalou na Rua Bento Freitas
em 1967 soa a responsabilidade da Ordem Dominicana. Este espaço foi importante para os
grupos de resistência à ditadura civil-militar, pois, para além dos contatos com Marighella, a
livraria era especializada em livros de ciências humanas e editava inúmeras obras de autores
brasileiros, muitos deles de teor marxista. Para mais leitura conferir o documento produzido
pelo Memorial da Resistência de São Paulo. Programa Lugares da Memória. Livraria Duas
Cidades. Memorial da Resistência de São Paulo, São Paulo, 2015. Disponível na página da
instituição.
11
organizar uma emboscada para o líder da ALN. Apresentamos, a seguir, parte dos
detalhes da Operação Batina Branca que resultou na morte de Marighella.
No dia 31 de outubro, frei Fernando, editor da Livraria Duas Cidades pretendia
encontrar-se no Rio com o jornalista Sinval de Itacarambi Leão, da Editora Vozes, para
conversarem sobre uma possível campanha de denúncias das torturas infringidas pela
ditadura. Para acertarem o encontro, falaram-se pelo telefone do Convento.
O primeiro erro. E foi a primeira vez que a gente cometeu esse erro
de falar pelo telefone. A gente jamais falava pelo telefone do
Convento. Nesse dia, por milhares de razões, não foi possível
telefonar de outro lugar [...]. E foi um erro de segurança. E a gente
marcou pelo telefone de encontrar um amigo nosso, sem dizer o que
que era, naturalmente, mas marcou uma viagem para o Rio pelo
telefone do Convento38.
A pista sobre a rede da ALN começou a ser levantada pelos militares após o
sequestro do embaixador americano. O sequestro foi planejado e executado pela ALN
e pelo MR-8 e gerou, como consequência, uma intensiva ação repressora do Estado
sobre a esquerda. Nesse contexto, o Deops/SP, antes mesmo do cerco aos
dominicanos, “já detinha considerável soma de informações [...]. Sabia que
auxiliávamos refugiados políticos. Sabia que alguns frades tinham contatos com
Carlos Marighella. Sabia que o Convento das Perdizes não fechara as suas portas aos
perseguidos e às suas famílias”39. Quando frei Fernando, por descuido, acerta um
encontro no Rio, o Deops/SP, já atento as movimentações dos dominicanos,
interceptou a ligação do Convento e “presumiu que Sinval intermediaria um encontro
com Marighella. Fleury acionou o SNI e o Cenimar para agirem em conjunto no Rio”40.
Os agentes da repressão prenderam no Rio os dois freis, levando-os para o Cenimar,
como relembra frei Fernando: “Eles nos prenderam no Rio. E o Cenimar é que tinha a
técnica da tortura e do interrogatório. O delegado Fleury queria nomes. “Nome,
dinheiro, aparelho”, era isso que ele queria. Ele foi para o Rio e me torturou
pessoalmente41. Frei Ivo, capturado junto com Fernando no Rio, também foi
interrogado e barbaramente torturado pela equipe de Fleury: “O interrogatório começa
38
Entrevista de frei Ivo Lesbaupin para o documentário de Silvio Tendler. 2001. Minutagem:
41:00 - 41:31.
39 BETTO, Frei. Batismo de Sangue: Guerrilha e Morte de Carlos Marighella. Editora
Bertrand Brasil S.A, Rio de Janeiro, 1987, p.131.
40 MAGALHÃES, Mário, op. cit, p.411. O Serviço Nacional de Informações (SNI) foi criado em
meados de 1964 com o objetivo de supervisionar e coordenar as atividades de informações e
contrainformações no Brasil e exterior. O novo órgão era diretamente ligado à Presidência da
República. Já o Centro de Infotmações da Marinha (Cenimar) foi criado em 1957 tendo como
antecessor o Serviço de Informações da Marinha (de 1955) com a finalidade de obter
informações de interesse da Marinha do Brasil, conforme as diretrizes do Estado-Maior da
Armada.
41 Entrevista de frei Fernando de Brito para o documentário de Silvio Tendler. 2001.
Minutagem: 41:31 - 41:58.
12
com essa afirmação: “vocês são base fixa de Marighella” [...]. E ele [Fleury] repetia
muito: “vocês vão ter contato proximamente. Vocês vão ter contato, porque ele está
muito perseguido, tá muito acuado e ele vai procurar vocês, vai precisar de vocês”42.
Além das prisões efetuadas no Rio, o Deops/SP também havia invadido a
residência dos dominicanos na Rua Caiubí, em Perdizes, e levado vários freis para
interrogatório sob sessões de tortura. Assim, no dia 03 de novembro, Fleury já sabia
que Marighella se reunia com os frades à noite, na altura do número 800 da Alameda
Casa Branca; que os dominicanos o esperavam em um Fusca azul, e que Marighella
sempre chegava a pé; que seu codinome era “Ernesto”; que o líder da ALN combinava
os pontos a partir de telefonemas para a Livraria Duas Cidades; que a senha que
designava o local era “a gráfica”; e que a próxima ligação ocorreria dali a um dia43.
No dia 04 de novembro o motorista da ALN, Antônio Flávio Médici de Camargo,
foi encarregado por Marighella da ligação para o Convento. “Ele instruiu o
companheiro sobre como marcar o encontro com Fernando para as oito da noite.
Passaria a pé nesse horário pela rua Oscar Freire, quase na esquina com alameda
Casa Branca”44. Marighella compareceria sozinho ao encontro com os dominicanos e
Antônio Flávio deveria aparecer ao local apenas meia hora depois para buscá-lo. Após
a ligação, monitorada pelo Deops/SP, Fleury prepara a emboscada.
Fleury armou a cilada para que, ao ultrapassar a esquina da alameda
Casa Branca com a alameda Lorena, Marighella não tivesse como
escapar. Ele andaria ladeira acima, com a maioria dos tiras em nível
mais alto. [...] Além de dominar militarmente o território, a tropa da
ditadura possuía meios não letais para pegar o guerrilheiro: bombas
de gás e o cão Átila, pastor-alemão da Força Pública [...]. Fleury
posicionou dois automóveis sem identificação policial na Lorena, um
na Tatuí, um na José Maria Lisboa e outro num estacionamento.
Como de costume, o Fusca azul dos frades encostou no meio-fio
esquerdo da alameda Casa Branca, no sentido da avenida Paulista.
A menos de 3 metros, policiais se esconderam atrás do tapume de
uma obra. [...] A seguir, cinco homens se abaixaram na carroceria e
se ocultaram sob uma lona [...]. Mais adiante se plantou um
Chevrolet da década de 1950. Era o “carro-piloto”, com Fleury ao
volante. Ao seu lado, a investigadora Estela Borges Morato, 22 anos
e meros 29 dias na Polícia Civil [...]. Nenhum dos sete carros da
repressão era mais importante que o dos religiosos da ALN. Àquela
altura, Fleury sabia que Marighella dispensava seguranças, chegava
a pé pelas costas do Fusca de duas portas, empurrava o banco do
42
Entrevista de frei Ivo Lesbaupin para o documentário de Silvio Tendler. 2001. Minutagem:
41:31 - 43:02.
43 MAGALHÃES, Mário, op. cit, p.412-413.
44 Idem, p.414.
13
carona e se sentava no de trás. Lá, estaria encapsulado, à mercê
dos algozes [...]”45.
Imagem 10: Posição
dos carros usados na
Alameda
Casa
Branca durante a
ação do Deops/SP no
dia 04/11/1969. Foto:
Autor desconhecido.
Fonte:
Arquivo
Público do Estado de
São Paulo.
A morte de Carlos Marighella foi divulgada pelos agentes da repressão como
sendo o resultado de um tiroteio entre a polícia e militantes da ALN. Conforme a
versão oficial, durante a troca de tiros os policiais atingiram Marighella, que no
momento procurava por sua arma dentro de uma maleta. Os militantes, “treze
guerrilheiros numa só camionete”46, teriam então acertado três pessoas: o policial
Rubens Tucunduva, baleado na perna esquerda – e único sobrevivente do tiroteio –, a
investigadora Estela Morato (que faleceu três dias depois após receber um tiro na
cabeça) e o alemão Adolf Rohmann que furou o bloqueio policial para entrar na
Alameda Casa Branca sendo confundido com um possível segurança de Marighella.
Essa foi a versão oficial amplamente divulgada pela mídia, embora o Deops nunca
tenha explicado como, “favorecido pelo pleno domínio militar do terreno, não capturou
um só “subversivo””47. Como reconhecimento, o “governo paulista promoveu por
“bravura” 43 policiais que participaram do cerco ao inimigo [...]”48.
VERDADE E MEMÓRIA
Embora os militares afirmem que o líder da ALN estava armado e
acompanhado por outros guerrilheiros, o que foi observado, pelos próprios militares ao
fazer a revista no corpo, é que Marighella não possuía nenhum tipo de arma e o que
procurava, quando foi alvejado, era uma cápsula de cianureto que tomaria para que
45
Idem, p.418-419.
Idem, p.426.
47 Ibidem.
48 Ibidem.
46
14
não fosse capturado com vida. O suposto tiroteio com a esquerda, que vitimou três
pessoas, foi uma ação iniciada e conduzida unicamente pelos policiais, mas, ao
oferecer essa versão dos fatos, os agentes da repressão conseguiam se eximir das
responsabilidades sobre as mortes e os disparos, justificando “o vexame de [terem]
dois policiais feridos e a morte do alemão desavisado. Além da execução do
guerrilheiro solitário e sem armas de fogo”49. Abaixo destacamos um trecho do livro de
Mário Magalhães, que passou nove anos envolvido em pesquisas sobre a vida e a
morte de Marighella, onde ele narra sobre a revista do corpo e algumas fraudes da
versão oficial:
[...] arrastam-no pela porta do motorista e o deitam na calçada. A
hemorragia interna o consome quando puxam sua camisa clara de
listras, desafivelam o cinto preto e desabotoam a calça de igual cor.
Reviram-no e acham papéis com anotações em alfabetos grego e
russo, código Morse e hieróglifos que jamais decifrarão. Recolhem
mil dólares e 85 cruzeiros novos. Apreendem o frasco com as
cápsulas de cianureto. Incrédulos, recomeçam a revista: Marighella
já suspirou pela última vez quando seus matadores se convencem de
que ele está mesmo desarmado, sem um canivete sequer. Na pasta,
buscou o veneno para não cair vivo50.
Nenhuma fraude seria tão longeva como a versão de que Marighella
estava armado. No improviso do calor da hora, o Dops plantou
notícias distintas: que ele portava uma pistola 9 milímetros, fantasia
acolhida pelo Jornal da Tarde; e que empunhava duas armas de
fogo, reproduzida pela Folha da Tarde. No relatório de 9 de
novembro de 1969, o delegado Ivair Freitas Garcia se traiu,
sugerindo a verdade por omissão: não se referiu a qualquer revólver
ou pistola em posse de Marighella. A não ser em suposições sobre a
“pasta preta onde, segundo informações, sempre conduzia o revólver
e granadas de mão”. O objeto surgiu na perícia da Secretaria de
Segurança: “Marighella tenta abrir uma pasta preta onde havia uma
arma”. Contudo os peritos não viram pasta, muito menos arma, como
registraram: antes de chegarem, “Fleury já havia recolhido a pasta”.
Eles só foram acionados pelo Dops às nove e dez da noite, mais de
uma hora após o incidente51.
Sobre o assassinato de Marighella ainda é preciso destacar que os militares,
após o executarem, ainda alteraram a posição de seu corpo no carro de forma que
fosse comprovável, através da perícia, que a versão que ofereciam era verdadeira.
Nascia a imagem amplamente divulgada e conhecida desse trágico 04 de novembro
de 1969. Na imagem, registrada por fotógrafos noventa minutos após o “tiroteio”, o
49
Idem, p.422.
Ibidem.
51 Idem, p.428.
50
15
guerrilheiro aparece com um tiro no rosto, ensanguentado e caído no banco de trás do
fusca, com seus pés para fora do veículo.
Imagem 11: Cena
da
morte
de
Marighella a partir do
relato da polícia. O
corpo foi realocado
no carro de modo a
comprovar a versão
oficial. Foto: Autor
desconhecido.
Fonte:
Arquivo
Público do Estado
de São Paulo.
A Comissão Nacional da Verdade (CNV) realizou em outubro de 2012 uma
análise pericial sobre a morte de Carlos Marighella a fim de reconstruir o evento que
resultou na morte do líder da ALN em 1969. A perícia concluiu que Carlos Marighella
fora atingido por pelo menos quatros projéteis de arma de fogo, que foram desferidos
quando ele estava no banco traseiro do Fusca em que foi encontrado, uma vez que
não há qualquer marca de sangue nas portas do veículo. Constatou-se também que
não houve troca de tiros, pois todos os disparos observados partiram de fora para
dentro do veículo. A perícia ressalta que todas as marcas de sangue observáveis no
local a partir de fotografias da perícia produzidas na época são compatíveis com a
posição do corpo de Marighella após a morte: suas roupas apresentam apenas
marcas de sangue limpas, sem nenhuma sujeira adquirida por contato com o solo – o
que teria ocorrido se tivesse sido atingido fora do veículo e caído ao ser alvejado. A
perícia da CNV inferiu ainda que todos os disparos partiram de um plano superior ao
da vítima, que se encontrava deitada no banco do carro. O tiro que atingiu Marighella
na região torácica, provavelmente o último, foi efetuado a curtíssima distância (menos
de oito centímetros), através do vão formado pela abertura da porta direita do veículo,
numa ação típica de execução52.
Informações produzidas através do documento “Análise dos Elementos Materiais Produzidos
em Função da Morte de Carlos Marighella, solicitado por meio do Ofício nº 156/2012 Comissão Nacional da Verdade - CNV, pelo membro da Comissão Dr. Cláudio Lemos
Fonteles” e disponibilizadas no Volume 1 do Relatório da CNV. In: BRASIL. Comissão Nacional
da Verdade. Relatório/Comissão Nacional da Verdade. Brasília: CNV, 2014, p.448.
Disponível em: http://www.cnv.gov.br/images/pdf/relatorio/volume_1_digital.pdf. Acesso em
01/09/2015.
52
16
A preocupação da CNV em oferecer, através de uma perícia imparcial,
informações que ajudem a esclarecer as circunstâncias da morte de Carlos Marighella
representa uma parte do compromisso do Estado brasileiro com a luta por verdade,
oferendo recursos para que familiares e a sociedade possam conhecer o passado
histórico do país. Conforme avalia Marlon Alberto Weichert, o acesso à informação
permite o conhecimento e a compreensão da realidade histórica a todos os cidadãos,
que exercerá seu direito fundamental de tomar decisões como membro da
sociedade53. O estabelecimento da verdade sobre o passado ditatorial ajuda também a
sensibilizar as futuras gerações sobre os crimes do passado e a continuidade das
violações aos direitos humanos no presente.
A verdade e a memória são instrumentos essenciais para o processo de
confrontação das violações de direitos humanos pelo regime democrático e estão
profundamente associadas aos projetos de memorialização conduzidos pelo Estado
brasileiro. O processo de preservação dessas memórias também é uma medida
simbólica de reparação às vítimas e à sociedade que procura, através da criação de
memoriais e monumentos, manter viva a memória das vítimas e ressignificar o
passado violento evitando que práticas semelhantes ocorram no presente e no futuro.
Esse processo de memorialização conseguiu dar importantes passos como o
que ocorreu na Alameda Casa Branca. A alameda é um dos poucos lugares de
memória da cidade de São Paulo a receber uma identificação que faça referência aos
eventos ali ocorridos durante o período ditatorial. Na calçada, na altura do número
800, local onde ocorreu o assassinato de Carlos Marighella pela polícia, foi colocada
em 1999 uma placa fixada em uma pedra talhada em homenagem ao guerrilheiro. O
granito polido, denominado Memorial Carlos Marighella, traz a inscrição "Aqui tombou
Carlos Marighella, assassinado em 4 de novembro de 1969 pela ditadura militar". A
placa, que seria instalada em uma árvore conforme pretendia seu autor, o arquiteto
Marcelo Carvalho Ferraz, foi instalada sobre a calçada devido às reações contrárias à
homenagem. A placa foi posteriormente roubada por vândalos, mas a pedra
permanece como uma importante sinalização desse lugar de memória.
Além dessa ação de caráter mais institucionalizado, é comum também que o
logradouro receba, durante o aniversário de morte de Marighella, ações anônimas que
o homenageiam ao alterar o nome da rua para “Alameda Carlos Marighella”. Como
consequência dessa ação social reivindicatória, em 2011 entrou em tramitação na
Câmara Municipal de São Paulo o projeto de lei n° 570/2011, que propõe a alteração
da denominação dessa via para “Alameda Casa Branca – Carlos Marighella”. Esse
53
WEICHERT, Marlon Alberto. Arquivos secretos e direito à verdade. In: SANTOS, Cecília
Macdowell... [et al] (orgs). Desarquivando a Ditadura: memória e justiça no Brasil. São
Paulo: Aderaldo & Rothschild Editores, 2009. p.407.
17
projeto de lei pode ganhar mais força a partir de 2015, pois em agosto de desse ano
foi assinado o projeto “Ruas de Memória”, na qual a Prefeitura de São Paulo propõe a
alteração dos nomes de ruas, pontes, viadutos, praças e demais logradouros públicos.
O objetivo é remover as homenagens feitas às pessoas vinculadas à repressão do
regime militar e ressignificá-los com o nome de pessoas envolvidas na luta pela
democracia, liberdade e direitos humanos. Segundo o levantamento realizado pela
Coordenação de Direito à Memória e à Verdade (DMV) da Secretaria Municipal de
Direitos Humanos e Cidadania (SMDHC), existem na cidade de São Paulo 38
logradouros associados à ditadura, dos quais 22 homenageiam ditadores, torturadores
ou chefes dos serviços de segurança que serviram à repressão54. A remoção dessas
homenagens é aqui observada como uma reparação simbólica às vítimas e à
coletividade, permitindo desacreditar ideologias como as que sustentaram o golpe de
1964 no Brasil.
Imagem 12: Durante o
aniversário de morte de
Marighella, uma ação
anônima o homenageia
alterando o nome da
rua para “Alameda
Carlos
Marighella”.
Foto:
Paula
Sacchetta/UOL. Fonte:
Portal UOL.
Imagem 13: Memorial Carlos
Marighella inaugurado em
1999 na Alameda Casa
Branca. A Placa com inscrição
"Aqui
tombou
Carlos
Marighella, assassinado em 4
de novembro de 1969 pela
ditadura militar" foi roubada.
Foto: Pablo Pereira. Fonte:
Jornal O Estado de São
Paulo.
PREFEITURA DE SÃO PAULO. “Ruas de Memória” pretende mudar nomes de vias que
homenageiam símbolos do regime militar. Secretaria Executiva de Comunicação. Prefeitura de
São
Paulo.
13
de
agosto
de
2015.
Disponível
em
http://www.capital.sp.gov.br/portal/noticia/5914#ad-image-6. Acesso em 02/09/2015.
54
18
ATUALMENTE E/OU ACONTECIMENTOS RECENTES:
A região dos Jardins foi tombada em 1986 pelo Conselho de Defesa do Patrimônio
Histórico, Arqueológico, Artístico e Turístico de São Paulo (Condephaat) com base no
Processo nº 23.372/85. Essa foi a primeira área urbana residencial a alcançar o
estatuto de patrimônio paisagístico na cidade de São Paulo, com base na paisagem e
no traçado urbano. O tombamento incidiu sobre o traçado urbano, a vegetação e as
linhas demarcatórias dos lotes.
A Alameda Casa Branca reúne anualmente, no dia 04 de novembro, familiares,
amigos e defensores dos direitos humanos em uma manifestação que relembra a
execução de Carlos Marighella, cobrando “memória, verdade e justiça” sobre as
atrocidades cometidas pela ditadura civil-militar.
ENTREVISTAS RELACIONADAS AO TEMA
O Memorial da Resistência possui um programa especialmente dedicado a registrar,
por meio de entrevistas, os testemunhos de ex-presos e perseguidos políticos,
familiares
de
mortos
e
desaparecidos
e
de
outros
cidadãos
que
trabalharam/frequentaram o antigo Deops/SP. O Programa Coleta Regular de
Testemunhos tem a finalidade de formar um acervo, cujo objetivo principal é ampliar o
conhecimento sobre o Deops/SP e outros lugares de memória do Estado de São
Paulo, divulgando, desta forma, o tema da resistência e repressão política no período
da ditadura civil-militar.
- Produzidas pelo Programa Coleta Regular de Testemunhos do Memorial da
Resistência
FERREIRA, Francisco. Entrevista sobre militância, resistência e repressão
durante a ditadura civil-militar. Memorial da Resistência de São Paulo, entrevista
concedida a Karina Alves e Marcela Boni Evangelista em 24/05/2013.
FREIRE, Alípio Raimundo Viana. Entrevista sobre militância, resistência e
repressão durante a ditadura civil-militar. Memorial da Resistência de São Paulo,
entrevista concedida a Kátia Felipini Neves, em 02/11/2008.
LOBO, Elza Ferreira; NOGUEIRA, Rosemeire. Entrevista sobre militância,
resistência e repressão durante a ditadura civil-militar. Memorial da Resistência de
São Paulo, entrevista concedida a Maurice Politi, Kátia Neves, Cristina Bruno e
Marcelo Araújo, em 16/09/2008.
19
MIYAKI, Darci Toshiko. Entrevista sobre militância, resistência e repressão
durante a ditadura civil-militar. Memorial da Resistência de São Paulo, entrevista
concedida a Karina Alves Teixeira e Ana Paula Brito em 24/04/2014.
ROIG, Vicente Eduardo Gomes. Entrevista sobre militância, resistência e
repressão durante a ditadura civil-militar. Memorial da Resistência de São Paulo,
entrevista concedida a Karina Alves Teixeira e Paula Salles em 15/04/2014.
Outras entrevistas
SHIBATA, Harry. O jornalista José Nêumanne Pinto conversa com o legista Harry
Shibata, diretor do Instituto Médico Legal de São Paulo entre 1976 e 1983. Dossiê
Shibata. Jornal do Brasil. São Paulo, 09 de novembro de 1980.
TV CULTURA. Antônio Abujamra entrevista Clara Charf. Provocações. São Paulo,
exibido
em
06
de
dezembro
de
2011.
Disponível
em:
https://www.youtube.com/watch?v=e_KG3PC64pI. Acesso em 25/08/2015.
RÁDIO HAVANA. Entrevista de Carlos Marighella. Rádio Havana. Havana, Cuba,
1967. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=J3CFHY_hwQk. Acesso em
25/08/2015.
REDE TVT. Maria Amélia Rocha Lopes entrevista Aton Fon Filho e Raphael Martinelli.
Memória e Contexto: Carlos Marighella - Um homem chamado coragem. São
Bernardo do Campo/SP, exibido em 21 de outubro de 2013. Entrevista em 3 partes.
Arquivo 1 disponível em https://www.youtube.com/watch?v=uijA7az5Ee0. Acesso em
25/08/2015.
TV BRASIL. Luiz Carlos Azedo entrevista Mário Magalhães. Participação do
historiador Francisco Carlos Teixeira e do jornalista Chico Otávio. Três a Um:
Marighella em livro. São Paulo, exibido em 18 de janeiro de 2013. Disponível em
https://www.youtube.com/watch?v=muLf2Q65hxw. Acesso em 26/08/2015.
SEDUFSM. D Docente entrevista Mário Magalhães. 57ª edição do Projeto Cultura
da Seção Sindical dos Docentes da Universidade Federal de Santa Maria. Santa
Maria/RS,
13
de
maio
de
2013.
Disponível
em
https://www.youtube.com/watch?v=Z7X1eyjp_dY. Acesso em 26/08/2015.
20
FILMES E/OU DOCUMENTÁRIOS
Documentário: Marighella - Retrato Falado do Guerrilheiro. Direção de Silvio
Tendler. 2001. Sinopse: O documentário conta a história, as polêmicas, as vitórias e
derrotas de Carlos Marighella, um dos líderes da luta armada contra a ditadura militar
no Brasil. Autor do Manual do Guerrilheiro Urbano foi fundador da Ação Libertadora
Nacional, primeiro movimento armado pós-64. Foi homenageado com o filme no ano
em que completaria 90 anos.
Documentário: Marighella. Direção de Isa Grinspum Ferraz. 2011. Sinopse: Maior
nome da militância de esquerda no Brasil dos anos 60, Carlos Marighella atuou nos
principais acontecimentos políticos do Brasil entre os anos 1930 e 1969 e foi
considerado o inimigo número um da ditadura militar brasileira. Líder comunista, vítima
de prisões e tortura, parlamentar, autor do mundialmente traduzido “Manual do
Guerrilheiro Urbano”, sua vida foi um grande ato de resistência e coragem. Dirigido por
sua sobrinha, o longa-metragem Marighella é uma construção histórica e afetiva desse
homem que dedicou sua vida a pensar o Brasil e a transformá-lo através de sua ação.
Gravação: Rádio Libertadora - A palavra de Carlos Marighella. Livro, com mídia
em áudio, lançado pelo Projeto Marcas da Memória do Ministério da Justiça.
Organização de Iara Xavier Pereira. 2013. A Rádio Libertadora foi um projeto criado
por Carlos Marighella em 1969 com o objetivo de difundir a mensagem revolucionária
para rádios e autofalantes quando a censura da ditadura militar bloqueava as notícias
dos grupos de resistência. As gravações em fita da Rádio Libertadora foram reunidas
pela Comissão de Anistia do Ministério da Justiça, que reconheceu Marighella como
anistiado e lhe prestou as homenagens, pelo centenário de seu nascimento
(5/12/2011), com a publicação do livro Rádio Libertadora – A palavra de Carlos
Marighella
com
as
transcrições
das
gravações.
Disponível
em:
https://www.youtube.com/watch?v=4RV21ENFlIo. Acesso em 25/08/2015.
Filme: Batismo de Sangue. Direção de Helvécio Ratton. 2007. Sinopse: Ambientado
no fim dos anos 1960, o filme é baseado no livro homônimo de Frei Beto. O convento
dos frades dominicanos torna-se uma trincheira de resistência à ditadura militar que
governa o Brasil. Movidos por ideais cristãos, os freis Tito, Betto, Oswaldo, Fernando e
Ivo passam a apoiar o grupo guerrilheiro Ação Libertadora Nacional, comandado por
Carlos Marighella. Eles logo passam a ser vigiados pela polícia e posteriormente são
presos, passando por torturas que culminam em uma emboscada organizada pela
polícia para assassinar Marighella.
21
REMISSIVAS: Livraria Duas Cidades; Departamento Estadual de Ordem Política e
Social de São Paulo (Deops/SP); Convento Santo Alberto Magno - Convento dos
Dominicanos.
REFERÊNCIAS:
BETTO, Frei. Batismo de Sangue: Guerrilha e Morte de Carlos Marighella. Editora
Bertrand Brasil S.A, Rio de Janeiro, 1987.
BRASIL. Direito à Memória e à Verdade. Comissão Especial sobre Mortos e
Desaparecidos Políticos. Brasília, Secretaria Especial dos Direitos Humanos, 2007.
BRASIL. Comissão Nacional da Verdade. Relatório/Comissão Nacional da Verdade.
Brasília:
CNV,
2014.
Disponível
http://www.cnv.gov.br/images/pdf/relatorio/volume_1_digital.pdf.
em:
Acesso
em
01/09/2015.
MAGALHÃES, Mário. Marighella. O guerrilheiro que incendiou o mundo. São
Paulo: Companhia das Letras, 2012.
PAULA, Zueleide Casagrande de. Jardim América: de Projeto Urbano a
Monumento Patrimonial (1915 a 1986). Tese (Doutorado em História). Universidade
Estadual Paulista. Assis/SP, 2005.
PREFEITURA DA CIDADE DE SÃO PAULO. Guia de bens culturais da cidade de
São Paulo. Departamento do Patrimônio Histórico. Secretaria Municipal de Cultura.
São Paulo: Imprensa Oficial, 2012, p.236.
SACCHETTA, V; CAMARGOS, M; MARINGONI, G. A imagem e o gesto.
Fotobiografia de Carlos Marighella. Editora Perseu Abramo, São Paulo, 1999.
COMO CITAR ESTE DOCUMENTO: Programa Lugares da Memória. Alameda Casa
Branca. Memorial da Resistência de São Paulo, São Paulo, 2015.
22