Revista Textura 2009 v. 6 Corrigida PDF.cdr

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Revista Textura 2009 v. 6 Corrigida PDF.cdr
V. 3 - nº 2 - Ago./Dez. de 2008
Cruz das Almas - BA
FACULDADE MARIA MILZA - FAMAM
DIRETOR DA FAMAM
Weliton Antonio Bastos de Almeida
DIRETORAS DO CEMAM (Instituição mantenedora da FAMAM)
Jucinalva Bastos de Almeida Costa
Janelara Bastos de Almeida Silva
EDITOR
José Lucimar Tavares
CONSELHO EDITORIAL
Weliton Antonio Bastos de Almeida
José Lucimar Tavares
Janelara Bastos de Almeida Silva
Edmar José de Santana Borges
Robson Rui Cotrim Duete
CONSELHEIROS AH DOC
Adriana Valéria da Silva Freitas - UFBA
Carmem Lieta Ressurreição dos Santos – FAMAM/UEFS
Elizabete Rodrigues da Silva – FAMAM
Marly de Jesus – FAMAM
Sérgio Roberto Lemos de Carvalho – FAMAM/EBDA
Alvaro Pereira- UFBA
CAPA
Nelson Magalhães Filho
DESIGN GRÁFICO
Antonio Wellington Melo Souza
CRUZ DAS ALMAS
2009
CRUZ DAS ALMAS - BA
Ago. - Dez. de 2008
Ficha Catalográfica
TEXTURA. Faculdade Maria Milza. - Vol. 1, n. 1. (jan. - jun. 2006) - Cruz das
Almas, BA, 2006-.
Semestral
V. 3, n. 2; ago. - dez. 2008
ISSN: 1809-7812
1. Educação
II. Título
2. Saúde
3. Ciências Agrárias
I. Faculdade Maria Milza
SUMÁRIO
Editorial ..............................................................................................................07
SAÚDE
Cuidados de enfermagem na incompatibilidade do fator RH .
Nursing care of in RH incompatibility
Fabiana Silva de Almeida; Elaine Andrade Leal Silva ..............................................09
Anemia Falciforme: fatores relacionados ao diagnóstico e tratamento
Sickle cell anemia: factors related to the diagnosis and treatment
Edna Souza Aquino; Núbia Cristina Rocha Passos .................................................23
Candidíase vaginal: ocorrência em Cruz das Almas-BA
Candidíase vaginal: occurrence in Cruz das Almas-BA
Delma Rúbia Neves Oliveira; Dellane Tigre; José Lucimar Tavares .......................41
Gravidez na adolescência: adesão tardia ao pré-natal
Pregnancy in adolescence: accession to the late prenatal
Acilene Novaes Sampaio Ferreira ........................................................................70
Parto cesariano: opinião de mulheres
Cesarean delivery: opinion of women
Acilene Novaes Sampaio Ferreira ........................................................................83
Educando os cuidadores de recém-nascidos na perspectiva da prevenção de
onfalites.
Educating caregivers of infants in view of prevention onfalites
Lucas Amaral Martins , Ises Gabriela, Eliane Fonseca Linhares,
Rosália Teixeira de Araújo, Eduardo Nagib Boery .................................................97
EDUCAÇÃO
O lugar do intelecto e a educação em Schopenhauer
The post of the intellect and education in Schopenhauer
André Luiz Simões Pereira ................................................................................104
EDITORIAL
Prezado leitor,
É com grande prazer que assumimos, a partir desse número, a editoração
desta revista e, no momento, é necessário informar que este volume, n.2 de 2008,
está saindo com um atraso semestral, em virtude de questões técnicas,
enfrentadas por todo empreendimento, que é ainda novo na nossa Faculdade.
Felizmente, estamos retomando nosso compromisso em divulgar, não
apenas a nossa produção cientifica, mas estamos abertos para esse processo de
profissionais e acadêmicos de outras instituições do Estado ou Pais, que desejem
cooperar com esse nosso empreendimento.
Para este volume da Textura, já avançamos em algumas modificações, que
objetivaram aprimorar o trabalho, a exemplo de novas orientações para
publicação, incluindo a possibilidade de recebermos artigos enviados por e-mail,
de modo a facilitar os docentes e discentes, que têm produzido estudos e, muitas
vezes, pela escassez do tempo, ficam impedidos de enviar seus relatórios de
pesquisa para divulgação, em face da exigência de um processo demorado. Tal
possibilidade, não anula o processo anterior, apenas visa agilizar o trabalho,
considerando as atribuições e exigências desse mundo globalizado. Afinal,
estamos em pleno século XXI e a tecnologia da informática é uma realidade.
Nesse contexto, temos, ainda, a intenção de manter a periodicidade da
revista, dentro do tempo previsto, e ansiamos, futuramente, reduzi-la de semestral
para a trimestralidade, em busca da sua indexação.
Por fim, registramos agradecimentos aos nossos colaboradores: autores
dos textos publicados, o Conselho editorial e Consultores ad hoc, pelo trabalho
desenvolvido e esperamos dos diversos leitores sugestões e críticas, as quais,
certamente, serão proveitosas para o nosso crescimento!
José Lucimar Tavares
Editor
CUIDADOS DE ENFERMAGEM NA INCOMPATIBILIDADE DO
FATOR RH.
NURSING CARE OF IN RH INCOMPATIBILITY
Fabiana Silva de Almeida¹
Elaine Andrade Leal Silva²
RESUMO
A Doença Hemolítica, por incompatibilidade Rh, é definida como uma patologia
imunológica causada pela passagem, através da placenta, de anticorpos
maternos específicos da classe IgG para o antígeno presente nas hemácias
fetais, encurtando o seu tempo de vida. A importância dos cuidados de
enfermagem frente à incompatibilidade Rh, quando detectada precocemente,
tende a minimizar as conseqüências graves que poderá acometer o recémnascido. Dessa forma, a abordagem qualitativa deste estudo teve como objetivo
conhecer as ações de enfermagem pré e pós-detecção da incompatibilidade Rh.
Para obtenção dos mesmos foram entrevistados cinco enfermeiros que realizam o
cuidado pré-natal na atenção básica na zona urbana, pelo menos há um ano, no
município de Cruz das Almas - BA. Para coleta de dados utilizou-se o método da
entrevista semi-estruturada e os depoimentos foram obtidos com o auxílio de um
gravador. Os resultados apontaram que há conhecimento, de alguns enfermeiros,
sobre os cuidados pré-detecção da incompatibilidade Rh, e outros não relataram
sobre os cuidados de enfermagem pós-detecção da mesma.
PALAVRAS-CHAVE: Cuidados de enfermagem; Pré-Natal; Rh negativo.
ABSTRACT:
He incompatibility of Rh hemolytic disease is defined as an immune disorder
caused by the passage through the placenta of maternal antibodies specific to IgG
for the antigen present in fetal red blood cells, shortening their lifetime. The
importance of nursing care to the front Rh incompatibility, when detected early,
tends to minimize the serious consequences that may affect the newborn. Thus,
the qualitative approach this study aimed to understand the actions of nursing preand post-detection of Rh incompatibility. To achieve the goal were interviewed five
nurses who carry out prenatal care in primary care of the urban area for at least one
¹Enfermeira Graduada pela Faculdade Maria Milza.
²Enfermeira, Sanitarista, Mestre em Saúde Coletiva e Docente da Disciplina Saúde Coletiva II, da
Faculdade Maria Milza.
Textura, Cruz das Almas-BA, vol. 3, n.º 2, p. 09-22, Ago./Dez., 2008.
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year. To collect data using the method of semi-structured interview and the
testimony was obtained using a recorder. The results showed that there is some
knowledge of nurses about the care pre-detection of Rh incompatibility, and o
theirs not reported on the care of nursing post-detection of the same.
KEYWORDS: Nursing care; Prenatal; negative Rh.
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1. INTRODUÇÃO
O fator Rh é pouco conhecido, pertence ao sistema antigênico e foi observado e descrito pela primeira vez, em 1939, por Levine e Stetson. Eles observaram a presença de um anticorpo no sangue de uma mulher que teria dado à luz a
um natimorto com doença hemolítica (DH). Seu soro havia aglutinado não só no
sangue da criança, como também, no do marido. Esse fator é a causa de incompatibilidade entre o sangue materno e o fetal. (ZIEGEL ; CRANLEY, 1985).
A Doença Hemolítica por incompatibilidade Rh é definida por Haddad
(2006), como uma patologia imunológica causada pela passagem, através da placenta, de anticorpos maternos específicos da classe IgG para o antígeno (de origem paterna) presente nas hemácias fetais, encurtando o seu tempo de vida.
Para Fonseca (2006), isso ocorre quando uma mãe Rh negativo que já
tenha tido um filho Rh positivo, dá à luz a outra criança Rh positivo (ou que tenha
tido contato com sangue Rh positivo através de uma transfusão de sangue que
não tenha respeitado as devidas regras). Assim, o feto Rh positivo pode causar
imunização na mãe Rh negativo, fazendo com que ela estimule a produção de anticorpos anti-D, contra as hemácias fetais.
O diagnóstico da DH, por anticorpos irregulares, apóia-se na procura deles,
através de solicitações de exames. Na primeira consulta de toda gestante, no PréNatal (PN), mesmo naquelas com Rh-positivo, principalmente se em sua história
pregressa há relato de abortamento provocado ou espontâneo, transfusão sanguínea, produtos ictéricos, hidrópicos ou natimortos sem etiologia esclarecida.
O tratamento dessa patologia ocorre com base na administração da imunoglobulina anti-D. Foi através dessa profilaxia que a DH adquiriu novo perfil. As estatísticas, porém, evidenciam que a doença ainda persiste, devido medidas de prevenção inadequada, com o não uso da imunoglobulina no pós-parto, dos pacientes Rh (-) não imunizadas, emprego de doses insuficientes, nos casos de abortamento e grandes hemorragias e acompanhamento PN precário ou inexistente.
(HADDAD, 2006).
O Ministério da Saúde afirma, que cerca de 10% das gestações têm a
incompatibilidade materno-fetal para o fator Rh, e que o diagnóstico deverá ser
feito através da pesquisa quantitativa de anticorpos irregulares em toda gestante
com Rh negativo e com parceiro Rh positivo ou desconhecido. (BRASIL, 2006).
Ainda, relata que, a partir do resultado, deve-se iniciar a pesquisa das condições
fetais pela espectrofotometria do líquido amniótico e, com base no resultado obtido, deverá ser estabelecido, através de uma relação entre a diferença de densidade óptica encontrada e a Idade Gestacional (IG), a realização de condutas favoráveis e específicas para cada caso.
É importante ratificar que em todas as gestantes Rh - negativo, independentemente da história obstétrica, deve ser realizado o teste de Coombs indireto,
porque este tem o objetivo de detectar e quantificar os anticorpos anti-Rh presentes na circulação materna. Haddad (2006) et al. (1998) relatam que quando esse
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teste é positivo, a paciente está imunizada e resta saber a qual tipo de anticorpo
ela está exposta. Para isso, é realizado o painel de hemácias, no qual já foi constatado que 95% das imunizações são provocadas pelo antígeno D.
Dessa maneira, Haddad (2006) recomenda a realização do painel de hemácias, o qual deverá ser realizado em todas as gestantes Rh negativo com incompatibilidade Rh; nas gestantes que receberam transfusão sanguínea, previamente e em todas as mulheres sem conhecimento da tipagem sanguínea ou que desconheçam sua história transfusional. Esse exame faz parte dos exames solicitados na rotina do pré-natal, para detecção do anticorpo exposto, e deverá ser repetido com 28 semanas, 34 e a 36 semanas de gestação.
O autor afirma, ainda, que a primeira gravidez seja a termo, de feto natimorto, abortada, ectópica ou molar, em geral, não traz problemas. O risco de sensibilização aumenta a cada gestação subseqüente.
Dessa forma, é de suma importância que a equipe de saúde desenvolva
ações com o objetivo de promover a saúde da gestante, no período reprodutivo, a
fim de prevenir a ocorrência dos fatores de risco, resolver e/ou minimizar os problemas apresentados pela mulher, garantindo-lhe a aderência ao acompanhamento do PN. (BRASIL, 2003).
Diante de tal realidade, necessário se faz não apenas ter noção sobre a definição e as conseqüências graves causadas pela Incompatibilidade do fator Rh,
mas também, que se questione quais cuidados deverão ser desenvolvidos pela
Enfermagem, pré e pós-detecção do fator Incompatibilidade Rh em gestantes. Por
conseguinte, o objetivo deste estudo foi conhecer os cuidados de Enfermagem no
Pré-Natal (PN) pré e pós-detecção do diagnóstico de Incompatibilidade Rh.
2. METODOLOGIA
Trata-se de um estudo qualitativo, que permitiu conhecer as ações de enfermagem diante da incompatibilidade Rh em gestantes. Segundo Minayo (2002) a
abordagem qualitativa centra a atenção no indivíduo, com a finalidade de responder às questões particulares, preocupa-se com a realidade, que não pode ser
quantificada, trabalhando com o universo de significados, motivos, valores, aspirações e atitudes.
Este estudo foi realizado em unidades de saúde, responsáveis pela atenção básica, no município de Cruz das Almas-BA. A Atenção Básica caracteriza-se,
segundo o Ministério da Saúde, por um conjunto de ações de saúde no âmbito individual e coletivo, que tem como objetivo abranger a promoção e proteção da saúde, prevenção de agravos, diagnósticos, tratamento e manutenção da saúde da
população adscrita. (BRASIL, 2006).
Participaram do estudo cinco enfermeiros, que realizam pré-natal na atenção básica seguindo os seguintes critérios de inclusão: trabalhar na zona urbana e
realizarem o pré-natal há pelo menos um ano.
A coleta de dados foi realizada no primeiro semestre de 2009, em um períoTextura, Cruz das Almas-BA, vol. 3, n.º 2, p. 09-22, Ago./Dez., 2008.
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do de duas semanas, compreendendo os meses de março e abril, com local e duração definidos pelos entrevistados. O local (unidade de trabalho) e o horário (duração de meia hora por entrevista) foram marcadas com antecedência, para que
nenhum transtorno comprometesse os resultados da pesquisa. Barros (2002) afirma que a coleta de dados significa a fase da pesquisa em que se indaga e se
obtém dados da realidade pela aplicação de técnicas.
Assim, os dados foram coletados por meio de entrevista semi-estruturada,
gravada, com um roteiro previamente formulado, para dar seguimento lógico do
assunto em questão. Na entrevista foram questionadas quais são as ações de
enfermagem na Incompatibilidade do fator Rh pré e pós-detecção do diagnóstico.
Foi solicitada uma autorização para registro dos depoimentos através da gravação, deixando explícita, de forma clara, a liberdade de o entrevistado solicitar a
anulação, em detrimento de algum desconforto na sua descrição.
3. ANÁLISE DOS DADOS
As informações colhidas transcritas na íntegra, lidas, avaliadas, agrupadas
e organizadas por categorias baseadas nas respostas identificadas a partir dos
depoimentos dos entrevistados. Segundo Bardin (1979) os dados coletados por
sua própria natureza de subjetividade serão sistematizados e analisados qualitativamente. Os entrevistados foram caracterizados por letras que representam o tipo
sanguíneo para manter o anonimato.
Para exploração das entrevistas, codificou-se o texto através de um recorte
das falas em unidades de registro como uma palavra, uma frase, um personagem,
um tema. Por conseguinte, foram escolhidas as regras de contagem e por último,
foram classificados e agrupados os dados, no qual poderiam surgir os núcleos de
sentidos e as categorias.
Para a análise dos resultados obtidos e a interpretação dos mesmos foram
formuladas categorias empíricas as quais estão interpretadas e encontram-se no
ítem a seguir, dos resultados do estudo.
4. APRESENTAÇÃO E ANÁLISE DOS RESULTADOS
1ª CATEGORIA: AÇÕES DE ENFERMAGEM PRÉ-DETECÇÃO DA
INCOMPATIBILIDADE RH
Com o objetivo de identificar as ações desenvolvidas pelos enfermeiros que
prestam assistência na atenção básica mais especificamente no PSF Escola de
Agronomia, USF Dona Rosa, USF Suzana/Areal, USF Alberto Passos e UBS II
Centro, foi feita uma entrevista no sentido de obter informações relacionadas à
assistência no pré-natal principalmente no que diz respeito à incompatibilidade Rh.
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As informações coletadas no sentido de conhecer as principais ações
desenvolvidas pré-detecção da incompatibilidade, o primeiro sujeito, O-, respondeu que as ações estavam baseadas nas solicitações do exame da tipagem sanguínea ABO e Rh da mãe, orientando a mesma, caso o resultado do exame fosse
positivo, a importância da solicitação do exame também do pai para, a partir daí,
se tomar às devidas providências. Por conseguinte, ao estabelecer a positividade
do fator Rh do pai seria necessário à solicitação do teste de Coombs à gestante e
orientá-la quanto aos riscos e a conduta que a mesma deverá tomar.
Nesse contexto, o sujeito O- converge com Freitas et al. (2006) que complementam ser de suma importância a solicitação desse exame na primeira oportunidade de identificação de incompatibilidade. Se negativo, a partir da 24ª semana de
gestação, será necessário repeti-lo a cada quatro semanas. Se for positivo referir
para pré-natal de alto risco.
O sujeito B- assegura que ao receber o exame no 1º ou 2º trimestre a solicitação do coombs indireto deverá ocorrer novamente no 3º trimestre. Pois, se não
for reator entre esses trimestres poderá ser no final da gestação.
Por conseguinte, ao analisar as respostas dos sujeitos A+ e B-, eles ratificam que:
[...] Se não for detectado nenhuma alteração, fator Rh (-) no
caso, segue o pré-natal normal. Se for detectado um Rh (-) a
gente vai pedir o exame de Coombs, vai solicitar o marido também pra fazer exames. [...]. (A+).
Todo Pré-Natal a gente faz a solicitação de (...) do ABO Rh (a
tipagem sanguínea da gestante); caso a gente detecte que ela
tem fator Rh (-) a gente solicita já o teste de Coombs imediatamente. [...]. (B-).
Assim, podemos notar o diferencial apresentado por esses sujeitos e os
autores Freitas et al. (2006) e o sujeito O-, no que diz respeito a ordem dos procedimentos a serem desenvolvidos para a detecção da incompatibilidade. Pois, é
notável que sem o conhecimento prévio da tipagem sanguínea do pai o diagnóstico poderá não ser preciso, pois de fato, sendo o pai Rh negativo não haveria possibilidade da existência da incompatibilidade sanguínea entre o casal.
O sujeito B- ainda apresentou, mas, com relevância, a seguinte questão
quanto à importância da orientação sobre os exames solicitados:
[...] a gente faz a orientação toda inclusive sobre por que está
pedindo e a importância daquele exame. Se o reator tiver a
reação do Coombs aí a gente já faz a orientação a ela que ela
precisa tomar a vacina e por que precisa [...]. (B-).
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Nesse aspecto, Zampiere (2003) afirma que os profissionais de saúde têm
um papel extremamente importante nesse processo de orientação, colocando seus
conhecimentos em prol da clientela, estando disponíveis e assumindo compromisso com a sua saúde. Para tanto, é necessário que a equipe de saúde esteja capacitada, tenha segurança técnica, esteja atualizada e tenha embasamento científico
para adquirir a confiança do cliente. Deve, também, estar sintonizada com novas
propostas e experiências, com novas técnicas e, principalmente, reconhecer que a
grávida é a condutora do processo, sendo sua participação essencial.
Ainda, no contexto da solicitação dos exames para a detecção da incompatibilidade, o sujeito AB+ complementa o informante O- quanto à necessidade do
acompanhamento da sintomatologia, após a realização do Coombs indireto através da ultra-sonografia.
Por conseguinte o diferencial em relação ao sujeito A+ foi à questão da solicitação do Coombs indireto às gestantes com ou sem parceiro fixo. Esse questionamento é fundamental para a detecção da incompatibilidade, pois negatividade
da ausência do pai não impedirá aos profissionais de saúde determinar o diagnóstico preciso da incompatibilidade. Pois, esse teste tem como objetivo detectar e
quantificar os anticorpos anti-Rh presentes na circulação materna.
Todavia, Ministério da Saúde enfatiza que na primeira consulta também é
de suma importância conhecer a história clínica da gestante buscando saber
dados de identificação e sócio-econômicos (idade, endereço atual, grau de instrução, profissão, situação conjugal, condições de saneamento etc), motivos da consulta, antecedentes familiares, pessoais, ginecológicos e antecedentes obstétricos com o número de gestações, partos, abortamentos, número de filhos vivos,
intecorrências ou complicações em gestações anteriores, complicações no puerpério, histórias de aleitamento em gravidezes anteriores, intervalo entre o final da
última gestação e o início da atual Brasil (2000).
Sobre a gestação atual deve-se conhecer a data do primeiro dia/mês/ano
da última menstruação (DUM), data provável do parto (DPP), idade gestacional
(IG); data da percepção dos primeiros movimentos fetais, sinais e sintomas na gestação em curso, medicamentos usados na gestação; e hábitos como fumo, álcool
e uso de drogas ilícitas (BRASIL, 2000). Pois, dessa forma, o profissional de
saúde responsável pela assistência obterá dados que servirão de suporte para
possíveis eventualidades.
Durante coleta do histórico e exame físico, identificam-se os problemas, em
conjunto com a gestante, buscando respostas e, então, discute-se as ações para
ajudar na superação das dificuldades. Todos os dados subjetivos e objetivos
devem ser registrados. Após análise dos dados obtidos, alguns exames são solicitados e dentre esses a tipagem sanguínea ABO e o fator Rh.
Consequentemente, a consulta de enfermagem deverá prosseguir com as
seguintes etapas que às vezes ocorrem de forma simultânea: histórico de enfermagem ou anamnese; exame físico geral e específico, exames complementares;
levantamento de problemas ou dados; análise dos dados; plano de enfermagem e
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registro de enfermagem. (ZAMPIERI, 2003). Dessa forma, o profissional de saúde
poderá programar suas ações baseada em possíveis eventualidades a citar a
incompatibilidade Rh.
Essa questão do histórico do paciente, anamnese e do registro dos dados
obtidos no cartão da gestante, principalmente, foi apontada pelo informante O+
como uma das ações no acompanhamento do pré-natal pré-detecção da incompatibilidade Rh.
Segundo Buzzello (2004), a mulher tem direito ao cartão da gestante. Esse
cartão deve conter todas as anotações sobre seu estado de saúde, sobre o desenvolvimento de sua gestação e os resultados dos exames que ela fizer. A gestante
deverá levar esse cartão a todas as consultas e verificar se ele está sendo preenchido, deverá também ser orientada a não esquecer de apresentá-lo aos profissionais de saúde na hora do parto.
Diante do exposto, acreditamos na importância de uma assistência prénatal de qualidade, que identifique precocemente os sinais e sintomas de risco,
possibilitando encaminhar a gestante a um atendimento especializado, se necessário, buscando o seu bem-estar.
De acordo com Maldonado et al. (1990), o atendimento pré-natal não tem o
objetivo apenas de prevenir ou evitar o surgimento de problemas durante a gravidez e o parto. Várias questões devem ser levantadas e esclarecidas no decorrer
das consultas. Também, deve-se proporcionar a formação de uma relação de confiança, na qual o “casal grávido” e família sintam-se mais seguros e tranqüilos.
Nesse contexto, O+ implementa que o apoio, a humanização e o acolhimento à gestante favorecem para o desenvolvimento positivo da gestação.
Dessa forma, Zampiere (2003) afirma que o cuidado humanizado busca
assistir o ser humano em sua integralidade, compreender sua realidade e contexto de vida, fortalecer suas capacidades para que possa manter seu “bem estar” e
“estar melhor”.
Segundo Buzzello (2004), o problema da incompatibilidade Rh está nas gestações seguintes com filhos Rh+, pois os anticorpos atacam e destroem os glóbulos vermelhos, podendo provocar anemia no feto, em casos graves como na Doença Hemolítica por incompatibilidade, pode não ocorrer a morte do feto.
Sob o ponto de vista do sujeito AB+, em caso de 1º filho deve-se aguardar e
dar continuidade ao acompanhamento, em caso de 2º filho investiga-se a questão, se a gestante tomou a vacina anteriormente e independente de ter tomado ou
não, realiza-se o teste de coombs indireto.
Freitas et al. (2006, p.199) enfatizam que “a atenção materno-infantil envolve o relacionamento da gestante e sua família com diferentes profissionais, como
a enfermeira, o nutricionista, o obstetra, o psicólogo, entre outros”. Mas, para que
essa atenção seja eficiente, é preciso que a equipe trabalhe de forma integrada e
com o mesmo objetivo. Contudo, o sujeito O+ relata que:
[...] através do resultado do exame de coombs indireto, se for
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1ª gestação, junta eu e o Drº e a gente faz orientação, aconselhamento do que ela vai fazer [...]. (O+).
A partir da avaliação na Consulta de Enfermagem e detecção da incompatibilidade, a enfermeira irá realizar os encaminhamentos que julgar necessários
para os demais profissionais da equipe de saúde ou para a emergência obstétrica.
Nesse aspecto, O- e AB+ referem que:
[...] Geralmente quando tem incompatibilidade Rh eu encaminho para o obstetra, mas a gente continua acompanhando o
pré-natal aqui. (O-).
[...] se apresentar o coombs positivo a gente vai direcionar
essa paciente ao obstetra [...]. (AB+).
O sujeito A+ diverge dos sujeitos O- e AB+ quanto à posição do encaminhamento:
[...] a gente encaminha pra secretaria de saúde; lá eles vão
encaminhar para a unidade específica pra acompanhar ela
[...]. (A+).
Contudo, AB+ complementa que o acompanhamento do Pré-Natal (PN)
continua, com um enfoque mais de perto na questão da ultra-sonografia, para
estar investigando e fazendo um apanhado juntamente com o obstetra.
Sendo assim, podemos concluir que as ações da enfermagem, prédetecção da incompatibilidade Rh, requer cuidados minuciosos no PN, principalmente no que diz respeito à saúde do binômio mãe-feto. Nesse contexto A+, enfatiza a seguinte questão:
[...] Nosso papel aqui é detectar, encaminhar e continuar
acompanhando dando apoio tanto no PN, como apoio psicológico [...].(A+).
Dessa forma, acreditamos que uma preparação que priorize o bom atendimento à gestante durante o PN tem como efeitos principais aliviar a ansiedade,
superar dúvidas e medos, aumentar a segurança e a autoconfiança em relação ao
parto e ao relacionamento positivo com o bebê, permitindo aos pais acolher o filho
da melhor maneira possível.
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2ª CATEGORIA: AÇÕES DE ENFERMAGEM PÓS-DETECÇÃO DA
INCOMPATIBILIDADE RH
Baseado na identificação da percepção dos enfermeiros sobre as ações
pós-detecção de enfermagem, todos os sujeitos O+, O-, A+, AB+, B- relataram
que:
[...] se ela (a gestante) for Rh (–) e já for 2ª gestação acima, aí
as orientações são outras e ela vai ter que tomar a vacina [...].
(O+).
Após incompatibilidade a gente vai orientar quanto à vacina
[...].(O-).
[...] a vacina que é a gamaglobulina anti-D ela vai tomar 72
horas depois do parto. Ela vai ter que tomar pra evitar complicações no 2º filho, no caso, 2ª gestação [...].(A+).
[...] a gente orienta com relação à necessidade que ela tem
dela tomar a vacina [...].(AB+).
[...] Pós-detecção ela toma a vacina. (B-).
Nesse aspecto, os inquiridos convergem com o autor Buzzello (2004), quando ele complementa que pelo fato da hemorragia transplacentária ocorrer possivelmente durante a gestação, a imunoglobulina (RhoGAM) deverá ser administrada profilaticamente na 28ª semana, para evitar a sensibilização e, também, a injeção desta imunoglobulina intramuscular até 72 horas após o parto.
Sendo assim, durante a assistência pré-natal, a enfermeira deve explicar o
que significa o Rh. Deverá, também, orientar à gestante como acontece a sensibilização e sobre a importância do RhoGAM, após cada abortamento, gestação ectópica, entre outros. A enfermagem deverá, ainda, proporcionar apoio emocional
para a mãe sensibilizada ao fator Rh e orientá-la quanto à prevenção e o tratamento do recém-nascido. (BURROUGHS, 1995, p.338).
Em se tratando da necessidade da administração da vacina imunoglobulina
pós-parto os sujeitos O- e AB+ referiram, respectivamente, que:
[...] geralmente a gente não tem um acesso muito fácil na rede
do SUS.
[...] o valor é de um salário mínimo e que ela (a gestante) tem
que tá preparando, tipo uma poupança.
Haddad (2006) refere que o fornecimento e a distribuição do medicamento
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(vacina) pelo Sistema Único de Saúde (SUS) são reservados aos hospitais públicos. Contudo, nos postos de saúde não há disponibilidade da medicação para uso
imediato; o que faz conduzir uma série de procedimentos burocráticos, que acabam atrasando o uso do medicamento pela cliente e gerando maior risco de sensibilização pelos antígenos do grupo Rh.
Nesse referido, B- informa que:
[...] a maternidade daqui está preparada para imunização.(B-).
Por conseguinte AB+ fundamenta que:
[...] quando eu vejo que a paciente não tem muito recurso para
adquirir a vacina, oriento para que ela procure o serviço social
pra ver se tem como disponibilizar. Como é uma coisa que
pode ou não usar, aí a gente ver que o município nunca tá respaldado em relação a isso, então acaba sendo um problema
da paciente. [...].(AB+).
Analisando o depoimento de AB+ pode-se perceber que há divergência
entre o autor referido anteriormente, quando o mesmo afirma que:
[...] não adianta tá orientando em relação ao que poderá acontecer por que aí a gente vai criar um problema maior em relação a essa paciente. (AB+).
Nesse aspecto, Branden (2000) refere que no atendimento pré-natal à gestante Rh negativo, a enfermeira deverá, sim, tranqüilizá-la em relação às possíveis eventualidades e quanto ao medo das conseqüências que poderão acometer o
feto.
A gestante com incompatibilidade Rh é referida ao pré-natal de alto risco. A
gestação de alto risco implica em grandes transformações bio-psico-sócioespirituais próprias do período gestacional, somadas as questões existenciais inerentes ao ser humano e aos riscos a que estão expostos o binômio mãe e filho, que
poderá resultar em aumento de estresse, alterando a trajetória evolutiva esperada
da gestação. (ZAMPIERI, 1998).
Portanto, ao analisar os depoimentos de AB+ e O -, eles ratificam que os riscos para a incompatibilidade Rh deverão ser evitados pós-parto. Dessa forma,
segundo o Ministério da Saúde, existe uma implementação acerca das atividades
de normatização para o controle pré-natal dirigido às gestantes, a fim de que
sejam utilizadas como instrumentos que permitam identificar as gestantes, no contexto amplo de suas vidas. (BRASIL, 2000).
Assegura, ainda, que essa implementação permite detectar os riscos a que
cada uma delas possa estar exposta. E, para dizer que alguém está em risco, ZieTextura, Cruz das Almas-BA, vol. 3, n.º 2, p. 09-22, Ago./Dez., 2008.
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gel e Cranley (1986, p.174) asseguram que “é preciso estabelecer uma probabilidade a respeito da possibilidade de ocorrer algum evento sob certas condições”.
Contudo, é importante enfatizar que a qualidade do tratamento que é dispensado à gestante é uma condição essencial para a sua adesão ao PN. O que se
confirma com o pensamento do Ministério da Saúde, quando afirma que a adesão
das mulheres ao PN está associada à qualidade da assistência prestada pelos profissionais de saúde. (BRASIL, 2002).
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
A incompatibilidade sangüínea materno-fetal está, na maioria dos casos,
relacionada ao sistema Rh (antígeno D), desencadeando quando uma mãe Rh
negativa tem feto Rh positivo fator oriundo do pai. A situação de incompatibilidade
Rh pode ser considerada de alto risco, porque apresenta conseqüências graves
ao RN. A transmissão do fator Rh é genética e é transmitida por um gene dominante, o antígeno D.
O principio básico da incompatibilidade feto-materna, manifesta-se através
da passagem de substâncias (antígenos) que são capazes de produzir uma resposta imune, quando são reconhecidas pelo corpo como substância estranha e os
anticorpos maternos são produzidos tentando neutralizá-los. O efeito final é a
hemólise e o aumento dos produtos de degradação da hemoglobina no feto,
podendo levar-lo à morte.
Dessa forma, a atitude diante das gestantes que possuem Rh negativo e
feto Rh positivo deverá ser minuciosa. Nesse caso, a pesquisa de anticorpos no
Pré-Natal (PN) deverá ser ministrada, assim como a orientação sobre a importância da administração do RhoGam, após cada parto, a termo ou prematuro, abortos
espontâneos ou induzidos, gestação ectópica e amniocentese que incluam fragmentos de placenta.
Normalmente a palavra de ordem, primeiramente, é a tipagem sanguínea
do pai. Se positivo, deverá ser feito o teste de Coombs indireto para confirmação
da incompatibilidade e, consequentemente, neutralizar qualquer titulo de anticorpos anti-Rh, que poderá existir no sangue da mãe com a administração da gamaglobulina anti-D.
Diante dos resultados obtidos, observa-se a positividade da essência da
pesquisa para o conhecimento, compreensão e magnitude das ações de enfermagem pré e pós detecção da incompatibilidade Rh. As ações e a forma de aplicá-las
foram entendidas em sua maioria de modo positivo ao que se pensava quanto à
aplicabilidade da assistência na rede básica.
Contudo, concluímos que a assistência de enfermagem na atenção básica
baseada no diagnóstico preciso e precoce, juntamente com a orientação sobre os
exames solicitados, a importância do encaminhamento da gestante Rh negativo
com incompatibilidade a uma unidade específica, a continuidade do acompanhaTextura, Cruz das Almas-BA, vol. 3, n.º 2, p. 09-22, Ago./Dez., 2008.
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mento PN e a administração da gamaglobulina anti-D pós-parto vêm diminuindo a
prevalência da doença hemolítica por incompatibilidade Rh.
Dessa maneira, podemos ratificar ser é de suma importância que, toda gestante, sendo Rh negativo ou não, inicie o PN o mais precoce possível. O papel da
Enfermagem, nesse sentido, será solicitar criteriosamente os exames adequados
para a identificação da incompatibilidade como tipagem sanguínea ABO e Rh, analisar os resultados desses exames, registrar os dados obtidos, preencher adequadamente os dados relativos á gestação, principalmente no cartão da gestante
para facilitar a continuidade da assistência, assim como, orientar essa gestante
quanto às possíveis eventualidades durante a gravidez para que assim se possa
minimizar as conseqüências graves da incompatibilidade, com as quais o RN é
acometido.
Assim, desejo que este estudo possa contribuir como elemento norteador
e, que estudos minuciosos com relação à importância das ações de enfermagem
na incompatibilidade Rh sejam realizados, no sentido de reforçar os aspectos positivos e de implementar medidas que possam corrigir e melhorar a qualidade da
assistência no PN, frente a incompatibilidade entre casais.
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ANEMIA FALCIFORME: fatores relacionados ao diagnóstico e
tratamento
SICKLE CELL ANEMIA: factors related to the diagnosis and treatment
Edna Souza Aquino¹
Núbia Cristina Rocha Passos²
RESUMO
O objeto de estudo desta investigação é à anemia falciforme, a qual merece
atenção especial no que diz respeito ao diagnóstico, tratamento e
acompanhamento, exigindo transparência, especialmente da parte dos
profissionais como também, dos portadores da doença ou responsáveis por eles.
Em decorrência dessa necessidade, o objetivo geral foi conhecer a doença
anemia falciforme e os fatores relacionados ao diagnóstico e tratamento dessa
doença. O tipo de estudo caracteriza-se por ser exploratório, descritivo, com
abordagem qualitativa, exigência natural da análise de conteúdo, sendo discutido
e fundamentado à luz do referencial teórico pertinente. Os conceitos básicos
foram os de Martins, chamados substantivos como tais incluem-se acessibilidade
e acesso. Os resultados obtidos demonstraram que os portadores de anemia
falciforme não dispõem de informação esclarecedora sobre a doença e os
cuidados em relação ao tratamento. Em relação ao acesso, foi possível detectar
que as dificuldades vão desde o transporte até o atendimento dado pelos
profissionais de saúde. Portanto, através dos relatos, verificamos que a
assistência aos portadores de anemia falciforme em Cruz das Almas, merece
atenção especial da política de saúde pública local.
PALAVRAS-CHAVE: Anemia falciforme; diagnóstico e tratamento;
acessibilidade.
ABSTRACT
The object of this research was to study sickle cell anemia which deserves special
attention with regard to diagnosis, treatment and monitoring, requiring
transparency, especially on the part of professionals as well as the carriers of the
disease or responsible for them. Because of this need, the general objective was to
find the sickle cell disease and factors related to diagnosis and treatment of this
disease. The type of study is characterized exploratory, descriptive, with a
¹Graduanda de Enfermagem da Faculdade Maria Milza.
²Docente da Faculdade Maria Milza.
Textura, Cruz das Almas-BA, vol. 3, n.º 2, p. 23-40, Ago./Dez., 2008.
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qualitative approach, the natural requirement of content analysis discussed and
reasoned in the light of the theoretical framework originally submitted. The basic
concepts were the Martins, called nouns as such are to be access and affordability.
The results showed that patients with sickle cell anemia do not have detailed
information about the disease and care for treatment. Regarding access, it was
possible to detect the problems that range from transportation to care given by
health professionals. Therefore, through the reports, we find that the assistance to
patients with sickle cell anemia in Cruz das Almas, deserves special attention of
public health policy locally.
KEY WORDS: Sickle cell anemia, diagnosis and treatment; accessibility.
Textura, Cruz das Almas-BA, vol. 3, n.º 2, p. 23-40, Ago./Dez., 2008.
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1. INTRODUÇÃO
O presente artigo trata da doença anemia falciforme: fatores relacionados
ao diagnóstico e ao tratamento, tais como as dificuldades encontradas pelos
portadores da anemia falciforme no município de Cruz das Almas – BA, no que se
refere ao acesso, acessibilidade, adesão ao diagnóstico e ao tratamento,
informação sobre seus direitos e sobre a própria patologia, mudança nas suas
vidas diante da descoberta dessa doença. Questiona a organização dos serviços
de saúde prestados a população, uma vez que diante de todas as dificuldades
manifestadas pelos portadores ou responsáveis, existe a possibilidade de
resolução da maioria dos problemas, uma vez que todos os serviços são gratuitos,
e o próprio município poderá intervir e atuar nas necessidades dos pacientes e
cuidadores.
A anemia falciforme é uma anemia hemolítica grave, resultante de fatores
genéticos, no que diz respeito ao gene da hemoglobina falciforme, fazendo com
que ocorra um defeito na molécula da hemoglobina. Em relação ao traço
falciforme, é uma característica genética com poucas repercussões na vida diária,
sendo assim não é considerado como doença. (DINIZ; GUEDES, 2003).
Ainda, para esses autores (2006), a afirmação de que a anemia falciforme é
uma doença de negros faz parte dos movimentos sociais, assim como da história
da genética, especialmente com a identificação molecular da doença a partir da
década de 1940. Em saúde pública, as primeiras iniciativas no campo da anemia
falciforme partiram dessa certeza, justificando as ações direcionadas às
comunidades negras, nos diversos países.
A anemia falciforme na África Equatorial atinge uma prevalência máxima de
3% de portadores, correspondendo ao total de 40% da população. No Brasil, essa
doença é mais prevalente, chegando a acometer 0,1 e 0,3% da raça negra e
miscigenados. Assim, as hemoglobinopatias constituem uma das principais e
mais freqüentes doenças genéticas, que acometem seres humanos. (DI NUZZO;
FONSECA, 2004).
No Brasil, a prevalência média do traço falciforme está em torno de 2%,
número em que pode variar segundo as características étnicas da população
estudada chegando, por exemplo, a 5,5% na Bahia, onde há forte presença de
negros e mestiços na população. (DINIZ; GUEDES, 2006).
Conforme o Ministério da Saúde, na Bahia, para cada 650 crianças que
nascem uma nasce com doença falciforme. A cada 17 crianças que nascem, uma
nasce com o traço falciforme, o que faz perceber a alta incidência em nossa
população a qual merece atenção especial e maior enfoque da política de saúde
não só nas crianças com anemia falciforme, mas também nos portadores dos
traços, uma vez que filhos de portadores do traço falcêmico, poderão herdar os
dois genes anormais e conseqüentemente serão portadores da anemia Brasil
(2007).
Faz-se necessário destacar que a freqüência de portadores assintomáticos
Textura, Cruz das Almas-BA, vol. 3, n.º 2, p. 23-40, Ago./Dez., 2008.
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de falciforme no Brasil é de 2 a 8%, conforme a intensidade da população negra
inserida na região, devido a HbS ter origem no continente africano, e sua
introdução no Brasil ocorreu justamente durante o período da escravidão. Dados
da Triagem Nacional sinalizam 3.500 nascidos por ano com a doença falciforme e
200.000 com o traço (BRASIL, 2006).
No município de Cruz das Almas – BA, apenas no ano de 2008, de 964
crianças atendidas, foram detectados no município 04 casos de anemia
falciforme, 63 casos traço S e 62 com traço C.
Para Diniz e Guedes (2006), apesar do teste do pezinho, do
aconselhamento genético, dos testes laboratoriais (eletroforese da hemoglobina),
ainda assim por si só não são suficientes sem o estabelecimento de uma
educação continuada para a população, visando reduzir o índice de novos
portadores dessa patologia, contribuindo, assim, para a diminuição de custos pela
prevenção de recidivas e conseqüentemente novos internamentos.
Ainda, para esses autores, para que isso ocorra, faz-se necessário uma
nova reformulação de políticas públicas voltadas para as doenças hemolíticas, em
especial a anemia falciforme, com o objetivo de melhorar a qualidade de atenção
aos portadores, desde a implantação do programa de prevenção em todas as
unidades de saúde, capacitação e até a contratação de profissionais qualificados
para prestar cuidados aos mesmos
Nessa perspectiva, este estudo faz uma reflexão aprofundada, sobre o
atendimento de enfermagem ao cliente, tendo como pergunta norteadora: quais
os principais fatores relacionados ao diagnóstico e tratamento da anemia
falciforme?
Para responder essa pergunta, foi definido como objetivo geral: Conhecer
os principais fatores relacionados ao diagnóstico e tratamento da anemia
falciforme. E como objetivos específicos: Levantar os principais recursos
diagnósticos existentes na comunidade; descrever as facilidades e dificuldades
manifestadas pelos responsáveis e portadores da anemia falciforme no
diagnóstico e na continuação do tratamento.
2. ANEMIA FALCIFORME
A avaliação dos portadores de anemia falciforme tem fundamental
importância para o acompanhamento e prevenção da complicação como se vê na
seguinte afirmação:
A avaliação dos fatores que precipitaram a crise em pacientes
com anemia falciforme deve ser levada em consideração,
desde os sintomas de infecção, desidratação, ou situações
Textura, Cruz das Almas-BA, vol. 3, n.º 2, p. 23-40, Ago./Dez., 2008.
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que promovem fadiga ou estresse emocional. Além disso,
solicita-se aos pacientes lembrarem de fatores que podem ter
precipitado as crises anteriores e que medidas eles usaram
para evitar e tratar as crises. (SUZANNE; BRENDA, 2002. p.
721).
As formas mais comuns e mais importantes pela gravidade são as doenças
falciformes HbSS e HbSC, devido apresentarem quadro clínico de: anemia
crônica, crises hemolíticas, crises vaso-oclusivas e crises álgicas. Faz-se
necessário realizar precocemente o diagnóstico e tratamento profilático, visando
melhorar o prognóstico da doença e a qualidade de vida dos indivíduos, além de
proporcionar orientação familiar e aconselhamento genético. (APAE, 2006).
Ainda, para a APAE (2006), as outras formas de Doenças Falciformes como
a HbSD apresentam quadro clinico de anemia crônica, porém com sintomas e
gravidades diferentes das outras Doenças Falciformes (HbSS ou HbSC). Existem
outras hemoglobinopatias, como a HbCC e a HbCD, também se caracterizam por
anemia hemolítica crônica e apresentam outros sintomas: não têm a presença da
Hemoglobina S, portanto não apresentam o fenômeno da falcização; desse modo
não são inclusas entre as Doenças Falciformes.
2.1 TRIAGEM NEONATAL
A triagem neonatal, conhecida como teste do pezinho, é fundamental para
auxiliar o diagnóstico e tratamento precoce com medidas preventivas e
profiláticas dos portadores das Doenças Falciformes e outras Hemoglobinopatias,
cooperando para diminuir a morbi-mortalidade desses eventos. Na triagem para
doenças falciformes, é realizado teste para hemoglobina, onde se diagnostica os
recém-nascidos com doenças falciformes HbSS, HbSC, HbSD, HbS-talassemia e
outras hemoglobinopatias com HbCC. (APAE, 2006).
Na prática, uma vez detectado o traço falciforme na primeira triagem
neonatal da criança, APAE solicita uma recoleta ou no município ou na APAE, na
recoleta, também é coletado sangue dos genitores da criança, para detecção da
presença de traço ou da própria doença falciforme, pois essa doença é de origem
genética.
Conforme Brasil (2006), em 06/06/01 o Ministro da Saúde lançou o
Programa Nacional de Triagem Neonatal por meio da Portaria Ministerial nº. 822,
onde se constitui de três fases, sendo a fase I constituído por Fenilcetonúria e
Hipotireoidismo Congênito; fase II onde Inclui Hemoglobinopatias e Fase III a qual
inclui Fibrose Cística. Esse exame é realizado na primeira semana de vida da
criança, em sangue total colhido do calcanhar.
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2.2 IMPORTÂNCIA DO ACESSO A INFORMAÇÕES E AOS SERVIÇOS DE
SAÚDE
Para Figueiredo (2006), a doutrina do SUS norteia-se por alguns princípios
que garantem o direito a saúde conforme a constituição federal dentre eles: a
universalidade, onde o indivíduo passa a ter direito de acesso a todos os serviços
públicos de saúde, assim como aqueles contratados pelo poder público; equidade
onde assegura ações e serviços de todos os níveis de acordo com a complexidade
do caso, sem privilégios ou barreiras; integralidade que visa às ações de
promoção, proteção e recuperação da saúde; participação popular onde os
mesmos têm o direito de participar do processo de formulação das políticas de
saúde e do controle da sua execução em todos os níveis de governo, assim como
tem o direito as informações e conhecimentos necessários para se posicionar
sobre as questões que envolvem a saúde e a complementaridade do setor
privado, por insuficiência do setor público.
Segundo Art. 196. Sessão ll da Saúde: “A saúde é direito de todos e dever
do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à
redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário
às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação”. (BRASIL,
1988)
Segundo Lora (2004), a conquista em relação à garantia da atenção à
saúde, só se tornará realidade se a população tiver condições de acessibilidade
aos serviços de saúde, a qual é de grande importância para a garantia da
universalidade da atenção, assim como a melhoria das condições de acesso aos
serviços deve ser permeada pela inter-relação do profissional e a comunidade
assistida.
A oferta desses serviços deverá ser baseada em alguns critérios como
necessidade de saúde: nos casos de morbidade, gravidade e urgência da doença;
geográficos: no caso da região; sócio-econômicas: referente à renda e educação;
organizacional: alem dos recursos disponíveis; características da oferta:
disponibilidade de médicos, ambulatórios e hospitais. (TRAVASSOS; MARTINS,
2004).
Esses autores, afirmam, ainda, que os substantivos acessibilidade e
acesso tornam-se conceitos muito complexos, por ser empregados de forma
imprecisa e pouco clara em relação ao uso dos serviços de saúde. Esses
conceitos variam de acordo com a visão de diferentes autores a exemplo:
Donabedian (apud Travassos e Martins, 2004), que emprega o substantivo
acessibilidade como um dos aspectos da oferta de serviços como a capacidade de
oferta e de corresponder ás necessidades de saúde da população. A
acessibilidade é, portanto, um fator de oferta importantíssima para explicar as
variações no uso dos serviços de saúde a uma dada população e representa uma
variável considerável nos estudos sobre equidade nos sistemas de saúde.
A acessibilidade distingue-se em duas dimensões, a sócio-organizacional,
Textura, Cruz das Almas-BA, vol. 3, n.º 2, p. 23-40, Ago./Dez., 2008.
29
que inclui todas as características da oferta de serviços; enquanto a
acessibilidade geográfica refere à distância e tempo de locomoção, custos de
viagem, entre outros. Na visão de Donabedian (apud Travassos e Martins, 2004),
acesso vai além da entrada nos serviços de saúde, necessitando considerar maior
amplitude dos fatores que interferem na acessibilidade da população aos serviços
de saúde.
2.3 PROFISSIONAIS RESPONSÁVEIS PELO ATENDIMENTO
Os profissionais da Atenção Básica são os primeiros a terem contato com a
criança portadora de doença Falciforme, quando é repassado para os pais sobre
presença da patologia no resultado de exame de triagem neonatal, sendo,
também, realizado o encaminhamento para a APAE ao hematologista pediátrico,
que é responsável pelo primeiro atendimento as crianças com doença Falciforme,
sendo atendidas, posteriormente, por pediatra, geneticista, psicóloga e
nutricionista. Na equipe de acompanhamento e atendimento longitudinal, faz-se
necessário, ainda, as consultas com os profissionais: enfermeiros, assistentes
sociais, dentistas, dentre outros, em uma ação integrada. (APAE, 2006).
2.4 ORIENTAÇÕES AOS FAMILIARES
As orientações fornecidas à família no primeiro momento deverão ocorrer
de forma esclarecedora a respeito da doença, seus sinais e sintomas, e como será
seu trabalho e acompanhamento. (APAE, 2006).
2.5 CONTROLE FARMACOLÓGICO E NÃO FARMACOLÓGICO
Para o controle farmacológico como protocolo a prescrição da penicilina
profilática é de máxima importância, devendo ser iniciada aos três meses de
idade. O tratamento dessas crianças, após a instituição da medicação, as
infecções graves e fatais pelos pneumococos reduziram em cerca de 80%.
(APAE, 2006).
O calendário básico de vacinação deve ser incentivado e seguido, assim
também quanto às vacinas especiais, que estão disponíveis para crianças com
determinadas doenças crônicas, entre elas, as doenças falciformes. Essas
vacinas são fornecidas pelo Centro de Referência em Imunobiológicos Especiais
(CRIE), em Salvador e podem ser solicitadas à SESAB, através da Diretoria
Regional de Saúde – DIRES. (APAE, 2006).
Textura, Cruz das Almas-BA, vol. 3, n.º 2, p. 23-40, Ago./Dez., 2008.
30
2.6 CUIDADOS GLOBAIS AO PACIENTE COM DOENÇA FALCIFORME
Os cuidados com os portadores da doença falciforme devem seguir alguns
critérios como: tipo de avaliação e intervalo que é realizado através do exame
físico, quando a criança menor de seis meses de vida deverá retornar
mensalmente para uma nova avaliação, maiores de seis a cada dois meses,
maiores que um ano, o acompanhamento deverá ser feito a cada três meses até
completar cinco anos, e acima deste a cada quatro meses; o aconselhamento
genético deverá ser realizado com o estudo familiar inicial seguido pelo
aconselhamento de educação anual, a avaliação nutricional anual, o exame
oftalmológico direto anual em maiores de dez anos de idade e a avaliação dentária
semestral, assim como o calendário da vacinação básica, que deve ser seguidos,
dentre outros. (BRASIL, 2006).
2.7 COMPLICAÇÕES
Dentre as diversas crises destaca-se: crises de dor, síndrome torácica
aguda, febre, crise de sequestração esplênica, crise aplástica, priaprismo,
acidente vascular cerebral, úlcera de perna, osteomielite, neuropatia do nervo
mandibular, necrose pulpar assintomática e dor orofacial.
2.8 FISIOPATOLOGIA DAS DOENÇAS FALCIFORMES
Conforme o Ministério da Saúde, a anemia falciforme ocorre quando a
pessoa não possui a hemoglobina A e, no seu lugar, produzem outra hemoglobina
diferente, chamada hemoglobina S. Esta hemoglobina não exerce a função de
oxigenar o corpo de forma necessária, motivo pela qual tal pessoa tem sempre
uma anemia que não se corrige nem com alimentação e nem com ferro. Isso
porque suas hemácias, em vez de arredondadas, tomam a forma de meia lua ou
foice, com isso essas células afoiçadas têm muita dificuldade de passar pelas
veias, que levam o sangue para os órgãos, ocasionando seu entupimento e
provoca muitas dores, principalmente nos ossos Brasil (2007).
Quando o eritrócito portador da Hemoglobina S é submetido a uma tensão
baixa do nível de oxigênio e/ou alteração do pH, a hemoglobina anormal se
“cristaliza” dentro deste, provocando deformações características, tornando
assim, a célula rígida, devido à perda da sua elasticidade, fazendo adquirir a forma
de foice, provocando obstrução e conseqüentemente, isquemia e infartos nos
diversos tecidos e órgãos do organismo. (PRADO; RAMOS; VALLE, 1993).
2.9 GRAVIDEZ E CONTRACEPÇÃO
Para o Ministério da Saúde, a gravidez promove maior risco para a gestante
Textura, Cruz das Almas-BA, vol. 3, n.º 2, p. 23-40, Ago./Dez., 2008.
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com doença falciforme e o aborto espontâneo ocorre com muita freqüência; esses
riscos, no entanto, não são tão grandes a ponto de contra-indicar uma gravidez
desejada, porém todas as mulheres devem ser informadas desses riscos. O
acompanhamento pré-natal deve ser iniciado precocemente, e deve ser feito
conjuntamente por obstetra e hematologista Brasil (2006).
A gestação na doença falciforme, frequentemente, leva a morbidade
materno-fetal. Por esse motivo a contracepção, ao possibilitar a realização de um
planejamento familiar adequado, constitui um fator importante no cuidado à saúde
da mulher com essa doença. É importante salientar que a decisão sobre o método
contraceptivo a ser adotado dependerá da análise conjunta entre o médico e a
paciente, levando em consideração as preferências pessoais, o nível de
entendimento da cliente sobre a responsabilidade da escolha, o quadro clínico, as
vantagens e desvantagens de cada método dentre outras considerações
(ZANETTE, 2007).
3. METODOLOGIA
O presente estudo é do tipo exploratório, descritivo com abordagem
qualitativa. Para Minayo (2006), o método qualitativo é o que se aplica ao estudo
da história, das relações, das representações, das crenças, das percepções e das
opiniões, produtos das interpretações que os humanos fazem a respeito de como
vivem, sentem e pensam. Participaram deste trabalho quatro pessoas, sendo três
delas responsáveis pelas crianças portadoras da doença e um portador da
mesma. Todos apresentaram plenas condições de entender e responder as
questões da entrevista, além de apresentar o exame confirmatório da patologia.
Foi garantido para todos os participantes o anonimato, os quais foram designados
por nomes fictícios tais como, nomes dos anões da branca de neve: feliz, dunga,
soneca e zangado. A entrevista foi realizada na residência dos entrevistados,
sendo utilizado um roteiro com perguntas abertas sobre o assunto, com uso de um
gravador. A análise baseou-se na orientação de análise temática referendada por
Bardin (1979), a opção por esta técnica deu-se por ela ser aquela que busca a
interpretação do material qualitativo de forma eficiente e satisfatória, permitindo
assim não só aos entrevistados a se expressar sobre o tema de forma mais
flexível, como também facilita ao entrevistador transcorrer na análise de forma
objetiva.
Este trabalho considerou os princípios da Resolução 196/96 do Conselho
Nacional de Saúde, e os pesquisados assinaram o termo de consentimento livre e
esclarecido (TCLT), ficando uma cópia ficou com o participante e a outra com a
entrevistadora.
Textura, Cruz das Almas-BA, vol. 3, n.º 2, p. 23-40, Ago./Dez., 2008.
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4. APRESENTAÇÃO E DISCUSSÃO DE RESULTADOS
Os dados do estudo estão apresentados e discutidos, com uma abordagem
qualitativa a partir da análise de conteúdo de Bardin (1979), considerando para
isto, os depoimentos dos entrevistados. As categorias que surgiram como
resultados das entrevistas foram: em relação à anemia falciforme, tendo como
subcategoria: adesão ao diagnóstico e tratamento; o conhecimento sobre a
anemia falciforme, complicações: limitações das atividades decorrentes da
doença; informação quanto aos seus direitos em relação ao acompanhamento,
continuação do tratamento e a garantia do acesso; fatores socioeconômicos,
tendo como subcategorias: gastos com transportes, vacinas especiais e falta de
atendimento especializado; mudança na vida diante da descoberta da doença
anemia falciforme.
4.1. ANEMIA FALCIFORME
Neste item são apresentadas e analisadas as questões que dizem respeito
à anemia falciforme dentre essas, discute-se as seguintes subcategorias:
4.1.1 Adesão ao Diagnóstico e Tratamento
O recurso diagnóstico para a anemia falciforme está disponibilizado ao
recém-nascido apenas em três das Unidades básica de Saúde a nível de
município, com exceção da eletroforese da hemoglobina. Os filhos das
entrevistadas foram diagnosticados através do teste do pezinho ou da
eletroforese da hemoglobina.
De acordo com os depoimentos dos entrevistados, entende-se como se dá
a adesão ao diagnóstico:
Através do teste do pezinho, antes então era tudo
normal (FELIZ 2009).
Estava com cinco meses, através da eletroforese e foi
descoberta a anemia falciforme (SONECA, 2009).
A adesão ao tratamento está sendo feita de forma irregular, devido à falta de
médico especialista, de vacinas especiais e do transporte para facilitar o
deslocamento de Cruz das Almas para Salvador-BA. Percebe-se aí, a carência
de infra-estrutura para o cumprimento de um direito, que é assegurado pela
Constituição Federal.
A comparação do que se diz está explicito nesta fala:
Textura, Cruz das Almas-BA, vol. 3, n.º 2, p. 23-40, Ago./Dez., 2008.
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(...) as vacinas chegam atrasadas ou não vem, tenho que me
deslocar para Salvador com o meu marido. Não tem vacinas,
o médico que cuida desta doença, até medicação às vezes
não tem no hospital. (DUNGA, 2009).
Essas vacinas são administradas no Centro de Referência em
Imunobiológicos Especiais (CRIE), em Salvador e podem ser solicitadas a
SESAB, através da Diretoria Regional de Saúde – DIRES (APAE,2006).. As
vacinas que fazem parte desse programa são Pneumococos, Meningococos C,
Gripe, Varicela e Hepatite A (APAE, 2006).
As informações a seguir, mais uma vez, vão reforçar as precárias condições
de saúde e tratamento. Logo, o tratamento da anemia falciforme não pode ser
diferente. O depoimento alega que o hospital não oferece a medicação, nem para
aliviar a dor, como também a falta de profissional especializado em anemia
falciforme. Conforme o relato do paciente, por falta de orientação médica,
automedica. Existe aí uma contradição entre a teoria e a prática, uma vez que
condena a prática de automedicação, mas o paciente não tem acesso ao médico.
E até no caso assim de dor, uma crise de levar ao hospital,
poderia pelo menos não ter um especialista, mais ter uma
medicação para aliviar até chegar a Salvador, até isso temos
dificuldade, eu tomo né um dipirona, uma coisa assim,
somente para aliviar, que não deveria acontecer né...
(SONECA, 2009).
4.1.2 O Conhecimento sobre a Anemia Falciforme
A anemia falciforme é uma doença genética que atinge as hemoglobinas,
as quais estão presentes nas hemácias que têm a função de transportar o
oxigênio (RAMALHO: 1986; ROCHA, 2004 apud SOUZA, 2006).
Durante o transcorrer da entrevista, foi possível perceber, na maioria dos
entrevistados, a falta de conhecimento e informação no que se refere à anemia
falciforme, a importância do tratamento para os portadores desse tipo de anemia,
e como esse tratamento atua na vida dos portadores dessa doença a exemplo dos
medicamentos profiláticos, dentre outros. O desconhecimento da doença
demonstra-se nesta fala:
(...) eu acho que essa, essa doença é assim, pra mim é como
se fosse uma bomba pronta pra explodir, mesmo eu cuidando,
sei lá..., quem sabe!!! (choro) (FELIZ, 2009).
Quanto às complicações, alguns dos sinais e sintomas da doença foram
relatados por um adolescente de dezoito anos de idade, como dores intensas nos
braços, nas pernas e limitações das atividades como jogar bola, os demais ainda
Textura, Cruz das Almas-BA, vol. 3, n.º 2, p. 23-40, Ago./Dez., 2008.
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menores, cujas genitoras apresentaram preocupação quanto aos riscos da
doença.
As falas indicam a falta de orientação no momento do diagnóstico, e após
pelos profissionais quanto ao significado desta doença, e quais as complicações
que podem ocorrer:
Eu acho que tem muito a desejar, é eu sou realista, tem muito
a desejar, até porque lá é..., me disseram que ele tem a
doença mais não me disseram até onde poderia; e, sei lá...
É..., o agravamento dela e não me explicaram mais nada, só
falaram isso, só isso! (FELIZ, 2009).
(...) eu não posso brincar muito, gosto muito de bola, mais não
posso praticar, é muito esforço, e aí eu fico olhando mesmo.
Sinto dores nas pernas, nos braços, fico muito triste, muito
triste. (SONECA, 2009).
Os responsáveis são de extrema importância no tratamento desses
portadores, uma vez que poderá intervir para evitar complicações que vai de uma
simples dor a dores insuportáveis e até o comprometimento de órgãos. Sendo
assim, uma triagem neonatal realizada de forma fidedigna e na primeira semana
da vida da criança, com diagnóstico precoce e busca ativa vêm contribuir para a
redução da morbi-mortalidade por esta doença.
4.1.3 Informação quanto aos seus direitos em relação ao acompanhamento,
tratamento e a garantia do acesso.
Nesta categoria surgiram subcategorias tais como:
4.1.3.1 Falta de Informação
Durante a entrevista foi possível detectar que os participantes não tinham o
conhecimento quanto a finalidade da APAE e HEMOBA., ., pois a criança tem
direito garantido pela Constituição o atendimento gratuito com uma equipe
qualificada nos casos positivos de fenilcetonúria, hipotireoidismo congênito,
anemia falciforme (APAE, 2006). Porém o que foi demonstrado nos depoimentos
a seguir é que estão sendo feito em instituições particulares:
Na CEVAC (particular), em Feira de Santana. (FELIZ, 2009)
No CEON Salvador-BA. O CEON é particular. (SONECA,
2009).
Textura, Cruz das Almas-BA, vol. 3, n.º 2, p. 23-40, Ago./Dez., 2008.
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O acesso a APAE será operacionalizado sob responsabilidade da gestão
de saúde do município, provendo transporte, vacinas especiais, orientação e
acompanhamento efetivo das famílias de portadores de anemia falciforme (APAE,
2006).
4.1.3.2 Garantia do Acesso
Para a realização da entrevista, a entrevistadora teve que enfrentar
diversos obstáculos até chegar à residência dos entrevistados, uma vez que são
distantes do local onde será realizada a coleta e o atendimento no momento das
crises dos portadores da anemia falciforme. Além do mais, três das residências
visitadas são localizadas onde não há pavimentação (estrada de chão),
contribuem, ainda mais, para um acompanhamento de forma irregular como
demonstra na fala de um dos entrevistados, que alega demora do atendimento:
No hospital da APAE em Salvador, de quatro em quatro,
de cinco em cinco e agora vai, diz é com seis meses.
(ZANGADO, 2009).
Acima dos três anos de idade o acompanhamento do portador da anemia
falciforme deverá ser feito no HEMOBA, porém para tal atendimento é necessária
que o município disponha de transporte. O descontentamento em relação a
garantia do acesso demonstra-se nesta fala, onde o entrevistado denuncia o
descaso das autoridades da área de saúde em relação aos portadores desse
problema:
... Não tem vacinação, transporte, medicamento, é uma
negação aqui, pois tem que buscar fora. A dificuldade em Cruz
das Almas é a falta de médico especialista, falta de
medicação, vacina, transporte, entendeu! (SONECA, 2009).
Há consciência, na fala a seguir do direito de cidadania, no pensamento
dele a cidade tem o dever de cuidar dos seus munícipes:
(...) sendo morador aqui de Cruz das Almas, não deveria de
estar esperando e ir, ir transferido, nem transferido para
Salvador porque nem ambulância tem, é não tem transporte
(SONECA, 2009).
No interior do estado, o município onde o paciente reside é inteiramente
responsável por disponibilizar o transporte para o seu deslocamento. (APAE,
2006).
Nota-se que na prática, a operacionalização do SUS ocorre com algumas
Textura, Cruz das Almas-BA, vol. 3, n.º 2, p. 23-40, Ago./Dez., 2008.
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restrições em relação ao que se trata na teoria, como exemplo, o acesso e a
acessibilidade dos serviços, a universalidade e a equidade dos mesmos, o direito
da obtenção das vacinas prescritas após a triagem, dentre outros.
4.1.4 Fatores socioeconômicos, tendo como subcategorias: gastos com
transportes, vacinas especiais e falta de atendimento especializado.
Foi possível observar que nem todos os entrevistados, embora fazendo uso
de serviços particulares (transporte, compra de vacinas e consulta médica),
dispunham de recursos para usufruir de serviços particulares, pois apenas um dos
cônjuges das entrevistadas tinha acesso ao emprego formal. Nessa fala, ele
ignora o direito que lhe é assegurado como cidadão e o que é preconizado no
SUS:
Eu acho que deveria ter o acesso às vacinas aqui, não deixar
pra dar fora, muita gente nem condição tem né?!, , , No APAE
já vai o dinheiro pra viagem, já vai o que, já vai o carro pra se
locomover, aí pronto, eu acho que o gasto em si, acho que
daria no mesmo. (FELIZ, 2009).
4.1.5 Mudança na vida diante da descoberta da doença Anemia Falciforme
Esse foi um momento difícil não só para os entrevistados como também
para a entrevistadora, que além de notar os sentimentos dessas pessoas,
observou que todas essas crianças e o adolescente estavam envoltos de muito
amor, carinho e muitos cuidados especiais. O sentimento de um adolescente
portador e das mães foi revelado no momento do questionamento sobre
mudanças na vida, após a doença.:
(...) (silêncio), (choro), desculpa! É... muda tudo, qualquer
reação que ele tem eu acredito que faz parte dessa doença,
se ele fica mole, se ele para de sorrir, tudo faz parte dessa
doença, então eu fico atenta em tudo, no dormir dele, no
acordar. Se ele... (choro), mesmo eu cuidando, sei lá...,
(choro), é mainha, mainha até fala que eu dou atenção mais a
ele do que a esse, e eu é... acho que é até pela situação que,
que... tem, aí eu fico com ele, aí qualquer coisa fico derrotada.
(FELIZ, 2009).
Mudaram muitas coisas, eu não posso brincar muito, gosto
muito de bola, mais não posso praticar, é muito esforço, e aí
eu fico olhando mesmo. Sinto dores nas pernas, nos braços,
fico muito triste, muito triste. (SONECA, 2009).
Textura, Cruz das Almas-BA, vol. 3, n.º 2, p. 23-40, Ago./Dez., 2008.
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As falas dos entrevistados traduzem a dificuldade de ordem financeira,
psicológica e social dos familiares dos portadores de anemia falciforme, uma
doença hereditária que pode trazer complicações que levam o paciente ao
sofrimento agudo e a um prognóstico reservado.
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Após apresentação dos resultados obtidos das entrevistas e comparados
com os da literatura, foi possível concluir, considerando as características
hereditárias da doença; existência de recursos diagnósticos e de tratamento na
comunidade e as dificuldades enfrentadas pelos portadores da doença. O estudo,
ainda, retratou: o desconhecimento dos usuários sobre os seus direitos quanto ao
diagnóstico e acompanhamento do tratamento da doença: transporte, vacinas, as
dificuldades que os responsáveis e portadores de anemia falciforme enfrentam
em relação à situação de estarem com a doença, o diagnóstico tardio e as
dificuldades no acesso.
A falta de vacinas ou atrasos das mesmas, a deficiência na informação dos
profissionais e da acessibilidade influencia no desencadeamento do índice de
novos casos de anemia falciforme, complicações e aumento no número de óbitos
por esta patologia, também foram mencionados.
O serviço local tem muito a oferecer e merece atenção especial por parte da
política de saúde local, através de um planejamento integrado, comunidade e
serviços de saúde, em uma ação viável, que atenda as necessidades e a realidade
dos usuários de saúde, observou-se divergência entre o que deveria ser e o que
está sendo oferecido.
Portanto, conclui-se que o ponto de partida para uma vida saudável e com
qualidade merece melhor enfoque na informação, no acesso, na acessibilidade,
no diagnóstico precoce, no tratamento e na continuação do mesmo, objetivando,
assim, a redução de casos novos, complicações e óbitos causados por anemia
falciforme.
Trabalhar em saúde requer muito mais do que conhecimentos científicos,
responsabilidade, compromisso, participação ativa, enfim, é necessário sair dos
bastidores e por em prática aquilo que foi aprendido, com o objetivo de contribuir
para prestar ações de saúde essenciais para a vida dos portadores dessa doença.
Dessa forma, o estudo contribuiu para o crescimento profissional da pesquisadora
e, também, para retratar a realidade local e as necessidades dos portadores e das
suas famílias, o que ficou evidente através dos depoimentos.
Diante da sensibilização dos fatos, será encaminhada uma cópia desta
pesquisa ao gestor municipal, com o que se espera servir de guia para a
elaboração de um plano de ação, de forma que venha solucionar as dificuldades
enfrentadas pelos portadores da Doença Falciforme e atentar para o uso correto
dos recursos que o município já dispõe: convênio com a APAE e uma DIRES local
Textura, Cruz das Almas-BA, vol. 3, n.º 2, p. 23-40, Ago./Dez., 2008.
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para a solicitação das vacinas a SESAB, deixando claro que falta melhor
organização dos serviços de saúde local. Assim, trazendo contribuições para que
tenham uma qualidade de vida melhor. Não existe nada mais significativo do que
ter o conhecimento do seu corpo, sua patologia, saber como intervir para viver
melhor e com expectativa de vida.
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Textura, Cruz das Almas-BA, vol. 3, n.º 2, p. 23-40, Ago./Dez., 2008.
CANDIDÍASE VAGINAL: ocorrência em Cruz das Almas-BA
CANDIDÍASE VAGINAL: occurrence in Cruz das Almas-BA
Delma Rubia Neves Oliveira¹
Dellane Tigre²
José Lucimar Tavares³
RESUMO
Este estudo é de caráter quantitativo-exploratório, descrevendo as características
das mulheres atendidas no Ambulatório Municipal Fernando Carvalho de Araújo,
Cruz das Almas - BA, no período de 01 de setembro a 29 de outubro de 2008, com
mulheres entre 15 a 39 anos que apresentaram diagnóstico confirmado para
candidíase vulvovaginal, tendo como objetivo conhecer o perfil dessas mulheres.
Para tanto, utilizamos entrevistas estruturadas, realizadas na consulta de
enfermagem. Os dados foram organizados em tabelas e gráficos. Os valores
encontrados revelaram que a maioria das mulheres estava em idade reprodutiva
(20 e 25 anos), eram da zona urbana, não portadoras de diabetes mellitus, e
tinham hábito de usar calça jeans e calcinha de lycra. Quanto aos hábitos de
higiene, a maioria relatou tomar um a dois banhos diários, usar somente papel
higiênico e realizar a higienização intima no sentido ânus-vagina, entretanto um
percentual de (56%) utilizava água e sabão após urinar e defecar. A maioria
apresentou ciclo menstrual de 4 a 5 dias, e não usava absorventes internos.
Quanto aos antecedentes sexuais, a maior parte teve a iniciação entre 15 a 20
anos, faz uso de pílula anticoncepcional, já teve de 1 a 3 parceiros, com uma
média de três relações sexuais por semana, sendo comum a prática de sexo oral,
e não realiza a masturbação. Quanto às características da doença a maioria
queixou se de prurido, secreção vaginal esbranquiçada e ardência ao urinar, e
72% buscaram o serviço de saúde devido ao problema, entretanto não sabiam
que se tratava de candidíase vaginal. Consideramos que algumas variáveis,
ainda, precisam ser mais pesquisadas, sendo relevante para o campo da saúde
pública, em especial no que se refere à saúde da mulher, deve haver
esclarecimento pelos profissionais da área sobre os principais fatores que
predispõem a ocorrência, não somente de candidíase vaginal, mas de outras
infecções sexualmente transmissíveis.
PALAVRAS CHAVE: Candidíase vulvovaginal; fatores predisponentes; educação
e saúde.
¹Enfermeira Graduada pela Faculdade Maria Milza;
²Docente de Microbiologia e Parasitologia do Curso de Enfermagem da FAMAM;
³Docente do TCC do Curso de Enfermagem da FAMAM.
Textura, Cruz das Almas-BA, vol. 3, n.º 2, p. 41-69, Ago./Dez., 2008.
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ABSTRACT
This study it is of quantitative-exploratório character, describing the characteristics
of the women taken care of in the Municipal Clinic Fernando Carvalho de Araújo,
Cruz das Almas, in the period of 01 of September the 29 of October of 2008, with
women between 15 the 39 years that had presented diagnosis confirmed for
candidíase vulvovaginal, having as objective to know the profile of these women.
For in such a way, it was used of structuralized, carried through interviews in the
nursing consultation. The data had been organized in graphical tables and. The
joined values had disclosed that the majority of the women seta in reproductive age
(20 and 25 years), were of the urban zone, not carrying of diabetes mellitus, and
had habit to use jeans and panty of lycra. How much to the hygiene habits, women
the majority told to take the one two banns daily, to only use hygienically paper and
carried through the hygienic cleaning summons in the direction anus-vagina,
however a percentage of (56%) used water and soap after to urinary and to
defecate. The majority presented menstrual cycle of 4 the 5 days, and they did not
use internal absorbents. How much to the sexual antecedents most had the
initiation enters the 15 20 years, makes contraceptive pill use, already the 3
partners with a average of three sexual relations per week, having been common
the practical one of verbal sex had had of 1, and they do not carry through the
masturbation. How much to the characteristics of the illness the majority
complained if of poured, vaginal secretion esbranquiçada and heat when urinary,
and 72% had searched the health service due to the problem, however did not
know that it was about candidate vaginal. We consider that some 0 variable, still,
more need to be searched, being excellent for the field of the public health, in
special as for the health of the woman, must have clarification for the professionals
of the area on the main factors that premake use the occurrence, of candidíase not
only vaginal, but for other sexually transmissible infections.
KEY WORDS: Vulvovaginal Candidíase; predisponent factors; education and
health.
Textura, Cruz das Almas-BA, vol. 3, n.º 2, p. 41-69, Ago./Dez., 2008.
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1. INTRODUÇÃO
A candidíase vaginal é uma infecção causada por um fungo comensal habitante da mucosa vaginal e digestiva, que cresce quando o meio torna-se favorável
ao seu desenvolvimento. É seguramente um dos diagnósticos mais freqüentes na
prática de diária de médicos e enfermeiros (as).
A Cândida como agente causal de vulvovaginites foi descrita pela primeira
vez em 1849 por Wilkinson. Haussmann, em 1875, associou a presença do fungo
a vômitos em crianças. Em 1986, Kurtz et al. desenvolveram um sistema de identificação do ácido desoxirribonucléico (DNA) que permitiu o estudo genético de diferentes tipos de Cândida.
Já foram identificadas mais de 400 cepas de cândida. Embora a espécie
Cândida albicans seja a mais importante causadora de candidíase. Na década de
70, do século passado, as espécies não-albicans não eram encontradas em mais
do que 5-10% dos casos de infecção genital. Já na década de 80 a maioria dos trabalhos mostravam crescimento dessa taxa para 15 a 25%.O aumento de incidência dessas espécies tem importância na medida em que apresentam sintomatologia mais branda do que a C.albicans em um espectro diferente de resistência aos
tratamentos antifúngicos. (ROSA, 2004).
Cerca de 80% das mulheres tem, pelo menos, um episódio de candidíase na
vida e, aproximadamente, 40 a 50% vivenciam um novo surto e 5% sofrem episódios
recorrentes. (HURLEY; LOUVOIS apud LINHARES; MIRANDA; HALBER, 2000).
Segundo o Ministério da saúde, a candidíase possui como fatores predisponentes: gravidez, diabetes melitus, obesidade, uso de contraceptivos orais, uso
de imunossupressores, hábitos de higiene e vestuários inadequados, contato com
substâncias alérgicas e/ou irritantes e alterações na resposta imunológica.
(BRASIL 1999),
O quadro clínico usual é o prurido vulvar. O corrimento vaginal, quando presente é em discreta quantidade, deixa a mulher despreocupada. Frequentemente
pode ser descrito como branco, de aspecto semelhante a leite talhado, de espesso a aquoso, com coloração de branca a amarela. Acompanha irritabilidade vaginal, ardor vulvar, dispareunia e disúria. Ao exame físico, pode-ser encontrar edema, eritema vulvar e fissuras na vulva ou períneo. A mucosa e o colo podem mostra-se hiperemiados com aumento do conteúdo vaginal, o pH da vagina costuma
estar abaixo de 4,5. (LINHARES; MIRANDA; HALBER, 2000).
Nosso interesse em pesquisar o assunto partiu da grande incidência desse
evento, no município de Cruz das Almas – BA, e tem como questão norteadora:
qual o perfil de mulheres portadoras de Candidíase vulvovaginal, no município de
Cruz das Almas BA? Seu objetivo principal é o de traçar o perfil de mulheres portadoras de Candidíase vaginal, no município de Cruz das Almas BA.
A relevância do estudo é a de conhecendo-se esse perfil, possamos traçar
planos de atenção a essas mulheres, bem como refletir sobre os méis de prevenção desse evento.
Textura, Cruz das Almas-BA, vol. 3, n.º 2, p. 41-69, Ago./Dez., 2008.
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2. CANDIDÍASE VULVOVAGINAL: considerações gerais
A CVV é atualmente um relevante problema na saúde da mulher, e profissionais atuantes nessa área têm a necessidade de conhecer aspectos atuais que
estão sendo abordados sobre a sua patogenia, que possui, ainda, muitos aspectos para serem esclarecidos.
A sociedade contemporânea esta, cada vez mais, marcada pelo advento farmacológico. Por conseguinte, a automedicação. Vive-se o período do analgésico
“tal”, que é ótimo para dor de cabeça ou este antibiótico sara rapidamente essa
inflamação. Nesse quadro, cautela e bom senso se fazem necessários, pois o uso
aleatório e abusivo de antibiótico, também, pode atuar como fator de risco para o
desenvolvimento de candidíase em algumas mulheres. Contudo, o mecanismo
exato para essa associação, ainda, não está estabelecido, suspeita-se que seu
uso determina redução da população bacteriana vaginal normal, particularmente
dos bacilos de Döderlein, diminuindo a competição de nutriente, o que facilitaria a
proliferação do fungo.
Por outro lado, o uso de duchas vaginais parece não ter relação com aparecimento de candidíase, exceto em mulheres que apresentam predisposição à
forma complicada (recorrente ou de repetição). Da mesma forma, as roupas justas
e o uso de absorventes, também, não contribuem como fatos de risco para a candidíase. (ROSA, 1999).
Segundo Douglas (2002) o uso de antibiótico sem orientação medica após
um episodio de candídiase podem os germes persistir em pequenos números no
ambiente vaginal o que seria suficiente para que os fungos aumentassem de
número havendo um novo episodio clínico.
Diversos estudos têm evidenciado aumento da colonização vaginal pela
Candidíase vulvovaginal (CVV) após a utilização de contraceptivos orais com
altas doses de estrógeno, devido aos altos níveis hormonais contidos nestes medicamentos, onde há um aumento do glicogênio, favorecendo o crescimento e a germinação da CVV.
Segundo Freitas (2006), quer a recorrência seja devida a reinfecção vaginal
ou recidiva, parece que as mulheres com candidíase vulvovaginal recorrentes diferem daquelas com episódios infreqüentes, em virtude de uma incapacidade de
tolerar pequenos números de Cândida reintroduzida ou que persistem na vagina.
Com base na sorotipificação doa germes, as mulheres com infecção recorrente e
infreqüentes compartilham a mesma distribuição de freqüência dos germes que
as mulheres sem sintomas.
As causas que levam uma mulher a desenvolver episódios
agudos recorrentes de vulvovaginite são incertas. Contudo,
existem fatores que podem predispor a candidíase vaginal. O
Diabetes Mellitus para aqueles mal controlados, principalmente quando os níveis de glicose estão entre 200-400 mg/dl
Textura, Cruz das Almas-BA, vol. 3, n.º 2, p. 41-69, Ago./Dez., 2008.
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têm uma maior incidência para candidíase.Mulheres em uso
de corticosteróide (sistêmicos ou tópicos) de antibióticos à
recorrência deste problema. (CALDERONE, pág 327-31,
2001).
Ainda, nessa perspectiva, Gomes (2003) afirma que se deve notar tanto o
DM interfere na CVV, aumentando a freqüência e intensidade dos episódios agudos, como a falta de controle da CVV pode dificultar o controle do DM.
Um controle rigoroso dos níveis glicêmicos se faz necessários para pacientes com DM, a fim de evitar danos à saúde e como forma de estar orientando ás
mulheres quanto possível presença da CVV.
A cerca desses fatores o quadro clínico usual é o prurido vulvar. O corrimento vaginal, quando presente, é em discreta quantidade. Freqüentemente, pode ser
descrito como branco, de aspecto semelhante a leite talhado, de espesso a aquoso, com coloração de branca a amarela. Estes autores ainda concluem que:
Acompanha a irritabilidade vaginal, ardor vulvar, dispareunia
e disúria. Ao exame físico, pode-se encontrar edema, eritema
vulvar e fissuras na vulva ou períneo. A mucosa e o colo
podem mostra-se hiperemiadas com aumento do conteúdo
vaginal o pH vaginal costuma estar abaixo de 4,5.
(LINHARES, MIRANDA e HALBER, pág. 220; 2000).
Muitos profissionais de saúde, que atendem portadores dessa patologia
não estão adequadamente preparados para lidas com pessoas nessa situação,
fazendo diagnósticos equivocados, tratamentos inadequados, deixando de orientar e aconselhar os pacientes adotando procedimentos desnecessários. (BRASIL,
2000).
Ouvir a paciente, identificar o que de fato está lhe preocupando e o que a
fizeram buscar o serviço de saúde são importantes instrumentos para estabelecer
uma relação de confiança àquilo que a paciente pensa, sabe e sente a respeito de
sua situação de saúde deve ser percebido pelo profissional que, na utilização de
técnicas verbais e não verbais da comunicação, obterá subsídios para definir a
situação em que a paciente se encontra. (FERREIRA, 2002).
Segundo Rosa (2004), a atenção e a importância dada à queixa da paciente
reduzem a porcentagem de erros diagnósticos e aumenta a boa vontade da paciente em colaborar com o exame. É ela, quem dirá ao profissional de saúde, a
razão de sua vinda à consulta. O profissional só terá um caso se houver uma queixa bem estabelecida.
Desse modo, é relevante ao primeiro sinal de corrimento vaginal, dor vaginal, disúria ou qualquer outro sinal anormal na vagina, a mulher procurar o serviço
de saúde para fazer uma investigação mais a risca sobre estes sinais, sendo que a
mulher grávida tem um potencial risco de contrair a candidíase vulvovaginal.
Segundo Douglas (2002), geralmente admite-se que, ao proporcionar um
Textura, Cruz das Almas-BA, vol. 3, n.º 2, p. 41-69, Ago./Dez., 2008.
46
conteúdo de glicogênio mais elevado no ambiente vaginal, os níveis de hormônios
reprodutores elevam-se proporcionando uma excelente fonte de carboidratos
para o crescimento e a germinação do fungo da candidíase.
Segundo Berg (2001), para que a candidíase colonize a mucosa vaginal, é
necessária que inicialmente, fique aderente a células epiteliais vaginais. A Cândida albicans adere-se em numero significativamente maiores às células epiteliais
vaginais que C.tropicalis, C. krusei e C.hseudotropicalis. Isso pode explicar à relativa infrequência dessas últimas na vaginite.
Segundo Moore (2000), o gênero Cândida pode ser isolado no trato genital
entre 10 e 15% das mulheres assintomáticas na idade fértil. Assim, a sua presença
em tão larga escala na microbiota vaginal nos permite classificá-la como saprófita,
ou seja, a presença desse microorganismo não significa, necessariamente, a presença da doença.
Já foram identificadas mais de 400 cepas de cândida. Embora
a espécie Cândida albicans seja a mais importante causadora
de candidíase, a incidência de não-albicans tem crescido de
maneira importante nos últimos anos. Na década de 70 as
espécies não-albicans não eram encontradas em mais do que
5-10% dos casos de infecção genital. Já na década de 80 a
maioria dos trabalhos mostrava um crescimento desta taxa
para 15 a 25%.O aumento de incidência dessas espécies tem
importância na medida em que apresentam sintomatologia
mais branda do que a C.albicans em um espectro diferente de
resistência aos tratamentos antifúngicos. (ROSA, 2004; p.
157).
Segundo Sobel (1998), vulvovaginites recorrente (VVR) é um quadro nosológico definido como três ou mais episódios anuais de infecções genitais, devidamente diagnosticadas e tratadas no período de um ano. Poderá estabelecer-se
em função de quadros de vaginoses bacterianas, candidíase vaginais ou em
forma alterada.
Mas, o que vem ocorrendo é que muitos profissionais de saúde na cuidadosa avaliação de mulheres com candidíase vaginal recorrente, geralmente não conseguem detectar qualquer mecanismo precipitante ou causador para candidíase,
mesmo que estas mulheres evitem antibióticos, anticoncepcionais orais, roupas
apertadas no seu corpo não se excluem a presença da candidíase gerando um
desconforto emocional e, em muitas das vezes, estressantes.
Observa-se que o reaparecimento da candidíase vaginal indica uma erradicação incompleta do fungo. Ainda não se sabe por que esse reaparecimento ocorre, no entanto, existem fatores que são levados em consideração como uso inadequado de antifúngico, interrupção do tratamento, uso de antibiótico após o tratamento. Tão grave quanto essas constatações são também o fato de que raramente a mulher é aconselhada por médicos ginecologistas ou enfermeiros a realizar
Textura, Cruz das Almas-BA, vol. 3, n.º 2, p. 41-69, Ago./Dez., 2008.
47
higienização íntima adequada após urinar ou defecar, atenção imediata ao primeiro sinal de corrimento vaginal com ou sem odor, o uso abusivo de antibióticos e
todos outros fatores que contribuem para candidíase vaginal.
3. TRAJETÓRIA METODOLÓGICA
3.1 TIPO DE ESTUDO
Trata-se de uma pesquisa do tipo quantitativo-exploratório, objetivando traçar o perfil de mulheres com diagnóstico confirmado para candidíase vulvovaginal
em um serviço de planejamento familiar no Município de Cruz das Almas - BA, no
2º semestre de 2008. Para Marconi e Lakatos (2001), a análise quantitativa traz a
objetividade dos dados numéricos, reduzindo as distorções interpretativas e
abrindo possibilidades para a generalização, exigindo que haja precisão nos estudos exploratórios, sendo o processo de investigação rigoroso, garantindo a credibilidade e a confiabilidade dos resultados obtidos.
3.2 CONTEXTO TEMPORAL
A pesquisa foi realizada no período de 01 de setembro a 29 de outubro de
2008, no Ambulatório Municipal Fernando Carvalho de Araújo, no município de
Cruz das Almas-BA, durante o período vespertino, a critério da pesquisadora e da
rotina da institucional. Estima-se uma duração média de 10 minutos para cada
atendimento. Inicialmente, fizemos contato formal com a direção do Ambulatório,
solicitando a permissão para a realização da pesquisa. Posteriormente, contatamos as mulheres que procuravam o serviço de planejamento familiar na instituição e que tiveram diagnóstico confirmado de CVV.
3.3 AMOSTRA
O estudo compreendeu uma amostra de 50 mulheres, com diagnóstico confirmado para CVV, com idade entre 15 e 39 anos, que apresentavam condições de
compreender as questões da pesquisa e aceitaram participar do estudo.
3.4 LOCUS DA PESQUISA
O Ambulatório Municipal conta com 45 funcionários no total distribuídos da
seguinte forma: 15 médicos; 3 enfermeiros; 8 técnicos; 2 auxiliares de odontologia; 2 dentistas; 1 nutricionista; 1 assistente social e 8 auxiliares de limpeza.
A cidade de Cruz das Almas esta situada no Recôncavo Baiano tem uma
população de 58.293 habitantes, sendo a agricultura a principal fonte de renda,
Textura, Cruz das Almas-BA, vol. 3, n.º 2, p. 41-69, Ago./Dez., 2008.
48
seguindo a indústria e o comércio (IBGE, 2002). Distante de Salvador, capital do
Estado, 146 km2 por rodovia (BR101), em conexão com a BR-324 (Salvador-Feira
de Santana).
3.5 O INSTRUMENTO E A COLETA DOS DADOS: MÉTODOS E
PROCEDIMENTOS
O instrumento de coleta de dados foi um formulário. Durante a coleta houve
a participação de um técnico de enfermagem do setor de planejamento familiar, no
processo de identificação das mulheres, com diagnóstico confirmado para CVV. O
formulário foi organizado com perguntas fechadas, devido à facilidade de aplicação e analise. Nele continha as seguintes variáveis: antecedentes pessoais, hábitos de higiene íntima, antecedentes sexuais, característica do corrimento. No total
de 25 questões.
3.6 CRITÉRIOS ÉTICOS
O projeto desta pesquisa foi apreciado pelo Comitê de Ética em Pesquisa
da Faculdade Maria Milza, obtendo parecer favorável com o número de protocolo
2147/08. A coleta de dados deu-se somente após esse parecer. A partir de então,
apresentamos o resultado ao Ambulatório, campo do estudo, a fim de obter liberação da direção para acesso à instituição, além disso, buscamos informar a população sobre os objetivos, justificativa, riscos e benefícios, bem como solicitamos a
assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (APENDICE A). Destacamos que todo o processo foi baseado na Resolução 196/96 do Conselho Nacional de Saúde, que rege os princípios éticos de pesquisa com seres humanos
3.7 ANÁLISE DOS DADOS
Para analise dos dados, utilizamos a descrição das freqüências simples e
relativas das variáveis por categorias, média das variáveis numéricas, cuja apresentação deu-se em termo de percentagem expressa em formas de tabelas e gráficos.
4. ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS
Neste item, analisamos e discutimos os resultados do estudo. Inicialmente
temos a caracterização da amostra quanto aos antecedentes pessoais, hábitos de
higiene íntima, antecedentes sexuais e características do corrimento. Por conseguinte, apresentamos e discutimos as variáveis, atendendo ao objetivo estabelecido para o estudo.
Textura, Cruz das Almas-BA, vol. 3, n.º 2, p. 41-69, Ago./Dez., 2008.
49
4.1 ANTECEDENTES PESSOAIS
Em relação à Faixa Etária, observamos na Tabela 1, a maioria das mulheres
estavam entre 20 e 25 anos de idade (40%), o que nos chama atenção é que são
mulheres em idade reprodutiva, onde a flora vaginal é composta por grande numero de lactobacilos.
Tabela 1. Distribuição das mulheres quanto a Faixa Etária. Cruz das Almas - BA,
agosto/outubro 2008.
Faixa Etária
Nº
%
15
20
4
8
20
25
20
40
25
30
13
26
30
35
8
16
35
40
5
10
50
100
Total
Fonte: dados da pesquisa
Para Prado (2005), a flora vaginal normal das mulheres na fase reprodutiva
tem seu equilíbrio mantido à custa dos Lactobacillus produtores de peróxido de
hidrogênio, que constituem cerca de 80 a 95% dos microorganismos presentes na
vagina. Os Lactobacillus são bactérias importantes no meio vaginal,
determinando o pH ácido que inibe o crescimento de possíveis agentes
patogênicos.
No que tange a moradia das mulheres com diagnóstico confirmado para
CVV, os resultados demonstraram que 58% (29 mulheres) eram moradoras da
Zona Urbana e 42% (21 mulheres, moradoras da Zona Rural (Figura 01). Nesse
contexto, nota-se que a maioria 58% ao viver na Zona Urbana, desfruta de acesso
direto ao serviço de planejamento familiar e ao serviço público como um todo.
Mudanças na saúde do Brasil vêm ocorrendo ao longo do tempo, pois vem
crescendo a participação do setor público na Zona Rural, que tem implementado
os Programas Saúde da Família (PSF), nas localidades rurais, onde a população
de modo geral ainda não aprendeu a desenvolver a saúde de prevenção,
procurando os serviços apenas quando apresentam alguma doença, seja ela
Doença Sexualmente Transmissível (DST) ou não.
Textura, Cruz das Almas-BA, vol. 3, n.º 2, p. 41-69, Ago./Dez., 2008.
50
42%
58%
Zona Urbana
Zona Rural
Fonte: Dados da pesquisa
Figura 01: Distribuição de mulheres quanto à moradia. Cruz das Almas - BA,
agosto/outubro 2008.
O Diabetes Melittus (DM) é uma doença crônica resultante da insuficiência
absoluta ou relativa de insulina, causada tanto por sua baixa produção de insulina
pelo pâncreas, como pela falta de resposta dos tecidos periféricos à insulina.
(PIROTTA ; SCHOR, 2004). De acordo com Wild e cols. (2004) o número de
diabéticos no mundo vai dobrar até 2030. O Brasil era o oitavo país com mais
casos de diabetes, dados estimados no ano 2000. Em projeção para 2030, ele
ocupará o sexto lugar, ficando atrás da Índia, China, Estados Unidos, Indonésia e
Paquistão.
Para Villela e Diniz (1998) e Wild e cols. (2004), os pacientes diabéticos
apresentam uma tendência mais elevada para o desenvolvimento de infecções,
normalmente de natureza fúngica ou bacteriana. Nesse distúrbio ocorre uma
diminuição da capacidade defensiva dos PMN e dos linfócitos T, relacionada à
hiperglicemia, gerando um meio favorável para a reprodução de espécies de
Cândida.
De acordo com a Figura 02, os hábitos de vestuário entre as mulheres
atendidas, demonstram maior prevalência do uso de calcinha de lycra (76%) e
calça jeans (88%). Estes dados revelam com de propriedade que uso da calcinha
de lycra e da calça jeans fazem parte do vestuário feminino em Cruz das Almas BA, mesmo sendo produtos que possibilitam pouquíssima ventilação na vagina, e
aumenta a umidade e o calor local. A região vaginal precisa de ventilação para se
manter saudável, pois O termômetro da saúde vaginal é o potencial
hidrigeniontico (pH) o índice de pH normal varia 3,8 a 4,2 , uma vez estando abaixo
esses valores resultam no desequilíbrio da flora microbiana ficando sujeito ao
ataque dos fungos.
Desse modo podemos inferir, que o uso freqüente de calça jeans e da
calcinha de lycra esteve associado à ocorrência de candidíase vaginal. Este
resultado está compatível ao encontrado na literatura. Sobel (1998) e Toloi e cols.
(2001) sugerem que mulheres que já tenham esta predisposição intrínseca
poderiam ter sua situação agravada por falta de aeração local, além do trauma
causado pelas roupas justas.
Textura, Cruz das Almas-BA, vol. 3, n.º 2, p. 41-69, Ago./Dez., 2008.
Tipo de vestuário
51
Não usa calça jeans
12%
Não usa calcinha de lycra
24%
76%
Usa calcinha de lycra
88%
0,0%
20,0%
40,0%
60,0%
80,0%
Usa calça Jeans
100,0%
Número de Mulheres
Fonte: Dados da pesquisa
Figura 02: Distribuição percentual por hábitos do vestuário - uso de calcinha de
lycra e calça jeans. Cruz das Almas-BA, agosto/outubro 2008.
Observamos que a maioria das mulheres 44% (22 mulheres) apresenta um
ciclo menstrual de quatro a cinco dias e 36% (18 mulheres) tem um ciclo menstrual
de três a quatro dias. De acordo com os dados apresentados na Tabela 02 as
mulheres portadoras de candidíase vaginal apresentam um ciclo menstrual com
longa duração o que significa maior desconforto, devido à presença do fungo em
meio aquoso e úmido, característico da vagina no período menstrual.
Segundo Douglas (2002), geralmente admite-se que, ao proporcionar um
conteúdo de glicogênio mais elevado no ambiente vaginal, os níveis de hormônios
reprodutores elevam-se proporcionando uma excelente fonte de carboidratos
para o crescimento e a germinação do fungo da candidíase. Diante disso,
esperamos que novos estudos em diversos ambientes, possam confirmar ou não
a associação entre um ciclo menstrual longo e candidíase.
Tabela 2. Distribuição das mulheres quanto aos dias do ciclo menstrual. Cruz das
Almas-BA, agosto/outubro 2008.
Dias da semana
Nº
%
2
3
1
2
3
4
18
36
4
5
22
44
5 ou +
9
18
Total
50
100
Fonte: Dados da pesquisa
Textura, Cruz das Almas-BA, vol. 3, n.º 2, p. 41-69, Ago./Dez., 2008.
52
4.2 HÁBITOS DE HIGIENE ÍNTIMA
Os absorventes internos absorvem o fluxo menstrual desde a origem sem
entra em contato com o meio externo, são aplicados pela própria mulher com o
dedo indicador, permanecendo um cordão fora da vagina. Esses absorventes são
feitos de algodão e fibras, com duração máxima de quatro horas, ao retirar esse
produto à força empregada na sua retirada ocasiona deixar fibras na vagina,
especialmente durante os dias de fluxo menstrual escasso. A mulher que esta
apresentando Candidíase vaginal nesse período não deve usar absorventes
internos para permitir o processo de recuperação na vagina aconteça
naturalmente sem interferência de qualquer produto.
Verificamos que não faz parte da realidade das mulheres atendidas no
Ambulatório Municipal Fernando Carvalho de Araújo, o uso de absorvente interno
onde 63% (38 mulheres) disseram não fazer uso e 37% (12 mulheres) não utilizam
(Figura 03). Não é possível estabelecer relação entre o uso de absorvente interno
e a candidíase vaginal, devendo existir outros fatores que interferem nessa
avaliação. Talvez, com uma amostra maior e critérios específicos, consiga-se
estabelecer alguma associação. Para Almeida (1994,) a utilização de absorventes
internos, duchas vaginais, desodorantes íntimos e produtos de higiene devem ser
sempre lembrados como irritantes para vagina, podendo desencadear
vulvovaginites.
37%
63%
Sim
Não
Fonte: Dados da pesquisa
Figura 03: Distribuição percentual por uso de absorventes interno das mulheres,
Cruz das Almas-BA, agosto/outubro 2008.
Conforme se vê, na Figura 04, a maioria das mulheres 56% (28 mulheres)
não faz uso de água e sabão após urinar e defecar sendo que 44% (22 mulheres)
fazem uso desse hábito de higiene. De modo que, a vagina que apresenta
corrimento, ardor e coceira têm alivio temporário destes sintomas, após fazer uso
de água e sabão, mesmo não sendo uma rotina da população estudada o auto
cuidado com essa parte do corpo é de fundamental importância para minimizar o
incomodo causado pelo fungo da Cândida na mulher. Nesse sentido, o enfermeiro
(a) deve fazer orientações, bem como, questionar a sobre como realiza a
Textura, Cruz das Almas-BA, vol. 3, n.º 2, p. 41-69, Ago./Dez., 2008.
53
higienização do órgão, na perspectiva de evitar acumulo de secreções,
proporcionando alívio do ardor característico da Candidíase.
44%
56%
Sim
Não
Fonte: Dados da pesquisa
Figura 04: Distribuição percentual quanto ao uso de água e sabão após urinar e
defecar, Cruz das Almas-BA, agosto/outubro 2008.
De acordo com a Figura 05, os hábitos de higiene quanto ao uso de papel
higiênico e o cheiro desse papel nos revelou que a grande maioria faz uso de papel
higiênico 90% (45 mulheres) e apenas 10% (5 mulheres) não usam e quanto ao
cheiro 88% (44 mulheres) disseram que o papel higiênico não tem cheiro e 12%( 6
mulheres) referiram fazer uso do mesmo com cheiro. De acordo com os dados
supracitados é válido ressaltar que o custo de papel higiênico nos últimos anos
teve uma queda considerável e que o fato de ter cheiro nesse papel acaba sendo
um maior custo no orçamento financeiro de cada família.
Hábito s de Higiene
Não Usa papel higiênico com
Cheiro
88%
12%
10%
90%
Usa papel higiênico com
cheiro
Não usa papel higiêncio após
urinar
Usa Papel higienico após
urinar
0,0%
20,0%
40,0%
60,0%
80,0%
100,0%
Número de Mulheres
Fonte: Dados da pesquisa
Figura 05: Distribuição percentual quanto ao uso de papel higiênico e bem como
característica desse papel higiênico após urinar e defecar. Cruz das Almas - BA,
agosto/outubro 2008.
Textura, Cruz das Almas-BA, vol. 3, n.º 2, p. 41-69, Ago./Dez., 2008.
54
Observa-se que as mulheres, na sua maioria 56% não faz uso de água e
sabão, em contrapartida essas, mesmas mulheres fazem o uso do papel
higiênico, 90%, superando o uso de água e sabão para a lavagem da vagina. Em
outros termos, essa mulher substitui a água pelo papel. Uma questão se coloca a
partir desse fato: há que se ficar atento, para o porque dessas, substituírem a
lavagem vaginal com água e sabão pelo uso do papel higiênico.
Segundo Moore (2007), o órgão genital feminino é diferente do masculino,
levando as mulheres á certa desvantagem em relação aos homens, pois o que
separa o óstio da vagina (abertura da vagina) do ânus é apenas o corpo do
períneo, mas que no entanto, é uma estrutura importante, para a sustentação final
das vísceras pélvicas.
Como observado na Figura 06, o percentual quanto à direção que usa o
papel higiênico após defecar foi 54% (27 mulheres), referiram usar o papel no
sentido ânus/vagina e 46% (23 mulheres) relataram usar papel no sentido correto
vagina/ânus.
54%
46%
Vagina- Ânus
Ânus-Vagina
Fonte: Dados da pesquisa
Figura 06: Distribuição percentual quanto à direção de uso do papel higiênico após
urinar e defecar. Cruz das Almas - BA, agosto/outubro 2008.
O ato de tomar banho representa, na vida das pessoas, um ato higiênico,
banho representa muito mais do que um simples hábito de limpeza. Para muitos é
uma renovação diária de ânimo, podendo ser, na verdade, uma das melhores
maneiras de promover a saúde. Dessa maneira, ativa-se a circulação da pele e
provoca-se vaso dilatação periférica, o que permite uma descarga de toxinas no
sangue, realizando assim uma higiene interna.
No entanto, essa falta de consciência foi evidenciada na nossa população
em pesquisa onde 46% (23 mulheres) referiram tomar apenas um banho diário e
40% (20 mulheres) afirmaram tomar dois a três banhos diários (Tabela 03). Um
número de banhos muito pequeno para quem esta com Candídiase Vaginal,
apresentando corrimento, ardor e outros sinais que afetam não apenas a fisiologia
da vagina como a higiene como um todo.
Textura, Cruz das Almas-BA, vol. 3, n.º 2, p. 41-69, Ago./Dez., 2008.
55
Tabela 3: Distribuição percentual das mulheres com relação à quantidade
diária de banho. Cruz das Almas - BA, agosto/outubro 2008.
Ao dia
Nº
%
1
2
23
46
2
3
20
40
3
4
6
12
4 ou +
1
2
Total
50
100
Fonte: Dados da pesquisa
Nesse entendimento, o enfermeiro (a) deve conversar e observar se seu
paciente realiza banhos diários e de formar correto, isto é, na verdade uma forma
de interagir com o mesmo e colher dele informações preciosas para sua evolução
de enfermagem.
4.3 ANTECEDENTES SEXUAIS
Em relação ao inicio da vida sexual, observamos na Figura 07 que a idade
da primeira relação sexual ocorreu, em sua maioria, entre os 15 a 20 anos. Do total
de mulheres atendidas, 64% iniciaram a vida sexual entre 15 a 20 anos, o que
ressalta os resultados encontrados em um amplo estudo populacional brasileiro,
desenvolvido por Adobe (2008), o qual observou que as brasileiras, que tem hoje
entre 18 e 25 anos tiveram o inicio da vida sexual aos 17 anos, enquanto os
brasileiros com mesma idade começaram aos 14 anos e meio. Esse autor relata,
ainda, que nas ultimas décadas a idade de iniciação sexual no Brasil diminui em
cinco anos para as mulheres e em dois anos para os homens, o que pode justificar
maior prevalência de DST, entre os jovens, nos últimos anos.
14%
2%
20%
09 a 14 anos
15 a 20 anos
64%
25 a 30 anos
31 a 35 anos
Fonte: Dados da pesquisa
Figura 07: Distribuição percentual quanto à iniciação sexual, Cruz das Almas - BA,
agosto/outubro 2008.
Textura, Cruz das Almas-BA, vol. 3, n.º 2, p. 41-69, Ago./Dez., 2008.
56
Assim, ao longo dos últimos 30 anos, a posição da mulher na sociedade
sofreu significativas transformações. A luta feminista por liberdade sexual e
igualdade de direitos resultou em inúmeras mudanças, como maior participação
feminina no mercado de trabalho, alterações no código civil, exigência por uma
maior participação dos homens nas relações familiares e a maior
representatividade política da mulher.
Os resultados encontrados reforçam o fato de que, cada vez mais, a vida
sexual vem tomando um caminho diferente havendo troca de parceiros em 50%
(25 mulheres) após o início da vida sexual e 38% (19 mulheres) referiram ter
trocado de 4 a 6 parceiros após o início da atividade sexual (Figura 08).
Atualmente, já é mais natural essa troca, perante a sociedade, sendo que a mulher
busca satisfação sexual. Tal questão recai sobre a necessidade de auto cuidado e
preservação do corpo, paciente com início precoce das atividades sexuais ou com
múltiplos parceiros, bem como aquelas cujos parceiros possuem grande número
de parceiras, apresentam uma maior incidência desenvolver Candidíase vaginal.
8%
4%
38%
1 a 3 parceiros
50%
4 a 6 parceiros
7 a 9 parceiros
10 a 15 parceiros
Fonte: Dados da pesquisa
Figura 08: Distribuição percentual quanto à quantidade de parceiros sexuais após
a iniciação sexual. Cruz das Almas - BA, agosto/outubro 2008.
Segundo Pirotta e Schor (2004), por meio de um trabalho realizado com
universitários de uma faculdade pública de São Paulo, concluíram que 45,8% dos
estudantes namoravam no momento da entrevista, enquanto 83,8% mantinham
relacionamento sexual com parceiros (as) esporádicos(as).
Para Carmita (2004), em um estudo realizado em seis capitais brasileiras,
revelou a média de relação sexual por semana, constatada entre mulheres de até
25 anos, era de 2,5.
Dessa forma, as mulheres do estudo mantêm a média de relações sexuais
nacionais de 2,5 por semana. Superando essa média, este estudo revelou que
30% (15 mulheres) afirmaram ter três relações por semana, seguido por 22% (11
mulheres) com quatro relações semanais. Em um estudo com 211 mulheres,
portadoras de CVV de repetição, Moraes (2003) constatou que 65,8%
desenvolveram a doença após o início da atividade sexual regular, e que a relação
sexual é o mais freqüente fator desencadeante das crises, seja pelo trauma local,
seja, pelo efeito imunodepressor do sêmen. Neste trabalho, a média de idade das
pacientes foi de 31 anos e 96% tinham vida sexual ativa (Figura 09).
Textura, Cruz das Almas-BA, vol. 3, n.º 2, p. 41-69, Ago./Dez., 2008.
57
14%
4%
8%
22%
1 vez
2 Vezes
3 Vezes
22%
30%
4 vezes
5 vezes
6 Vezes
Fonte: dados da pesquisa
Figura 09: Distribuição percentual das mulheres quanto ao número de relações
sexuais na semana. Cruz das Almas - BA, agosto/outubro 2008.
Uma vez que a mulher adquiriu a candidíase vaginal, quanto mais relações
essa mulher tiver, sem preservativo, maior será a infestações no órgão genital do
parceiro, tornando-se fonte de contágio.
A Figura 10, revela-nos que 60% (30 mulheres) relataram não ter trocado de
parceiros nos últimos seis meses e 40% (20 mulheres) afirmaram ter feito essa
troca. Apesar da maioria não ter trocado de parceiros, nos últimos seis meses,
esses dados estão de acordo com outras pesquisas realizadas sobre esse tema.
Em uma pesquisa desenvolvida por Aguiar (2007), com estudantes universitários
de São Paulo, mais da metade dos estudantes, tanto do 1º ano (57,9%), quanto do
4º ano (62,0%), citou ter tido apenas um parceiro (a) sexual nesse último ano. Em
menor escala, apareceram aqueles que disseram ter tido de 2 a 3 parceiros (a)
sexuais, (8,3%) de 4ª a 5ª, (4,2%) mais de 6 parceiros e (4,2%) referiram não ter
tido nenhum parceiro sexual, naquele ultimo ano. Para Brasil (2000), são
considerados parceiros (as) sexuais, aqueles com os quais os pacientes se
relacionarem nos últimos 30 dias. Do ponto de vista biológico, tanto mulheres
quanto homens são vulneráveis as infecções transmitidas sexualmente, porém as
mulheres devem ser conscientizadas de que algumas características, especificas
do corpo feminino, podem aumentar a incidência dessas infecções, inclusive a
candidíase vaginal. (VILLELA, 1999).
A prática do sexo oral é mais comum do que se imagina. Com a liberação
sexual, as mulheres passaram a exigir e a praticar essa forma de prazer, o
problema esta nessa prática, sem preservativo, por se entrar em contato mais
íntimo e direto com as secreções do parceiro. A mulher com candidíase vaginal
apresenta fungos em grande quantidade no meio vaginal, e o companheiro (a) ao
praticar o sexo oral sua cavidade bucal poderá ser contaminada e se os níveis de
imunoglobulinas da classe IgA estiverem baixo, os fungos aderem mais facilmente
à mucosa bucal, apresentando, assim, um quadro de candidíase oral,
popularmente chamado de sapinho.
Textura, Cruz das Almas-BA, vol. 3, n.º 2, p. 41-69, Ago./Dez., 2008.
58
40%
60%
Sim
Não
Fonte: Dados da pesquisa
Figura 10: Distribuição percentual das mulheres quanto troca de parceiros nos
últimos seis meses. Cruz das Almas - BA, agosto/outubro 2008.
Verificamos que a prática de sexo oral faz parte da realidade da população
feminina em estudo, e os resultados demonstraram que 54% (27 mulheres),
praticavam sexo oral e 46% (23 mulheres) não o faziam (Figura 11).
46%
54%
Sim
Não
Fonte: Dados da pesquisa
Figura 11: Distribuição percentual das mulheres quanto a pratica de sexo oral
doador no parceiro. Cruz das Almas - BA, agosto/outubro 2008.
Em estudo realizado por Gonçalves et al. (2008), das 51 mulheres
avaliadas, 13 (25,5%) apresentaram diagnóstico clínico de CVV, e destas, cinco
(9,8%) apresentaram leveduras do gênero Cândidas também na cavidade bucal.
Esses resultados vêm nos mostrar que pode haver relação entre a CVV e a
espécie de Cândida na cavidade bucal.
Sob ponto de vista restrito, masturbação é a estimulação dos próprios
genitais, usando as mãos, dedos ou com o auxilio de objetos. De maneira mais
ampla, a masturbação pode ser definida como a estimulação dos órgãos genitais,
ânus, mamilos e outras partes do corpo, utilizando-se as mãos e objetos, podendo
ser realizada pela própria pessoa ou pelo (a) parceiro (a). Contudo, ainda nos dias
atuais, as mulheres não tratam do assunto com naturalidade, talvez pela
educação recatada ou vergonha de abordar o tema.
Dessa forma, nosso estudo não pretendeu investigar as causas da não
prática da masturbação e sim, buscar uma associação com a candidíase, uma vez
Textura, Cruz das Almas-BA, vol. 3, n.º 2, p. 41-69, Ago./Dez., 2008.
59
que a parede da vagina costuma apresentar-se edemaciada e irritada pela
presença do fungo, servindo como potencializador da insatisfação do prazer.
Os resultados apresentados na Figura 12 sugerem que, a maioria das
mulheres 66% (33 mulheres) não pratica a masturbação, sendo que 34% (17
mulheres) fazem uso dessa pratica sexual.
34%
66%
Sim
Não
Fonte: Dados da pesquisa
Figura 12: Distribuição percentual das mulheres quanto à prática masturbação.
Cruz das Almas - BA, agosto/outubro 2008.
Como afirma Vilella (1998), em pesquisa com homens e mulheres, obteve
os dados referentes à masturbação, constatando que na idade adulta a maioria
das mulheres e a quase totalidade dos homens se masturbam. No Brasil, 69% dos
homens e 56% das mulheres consideram a masturbação saudável, praticando-a
com frequência.
A pílula é um composto de hormônios sintéticos similares aos naturais da
mulher (estrogênios e progesterona). É o método mais escolhido pelas mulheres
que buscam uma proteção adequada, frente à gravidez, mesmo que essa escolha
apresente efeitos colaterais indesejáveis. Para Freitas (2006), estima-se que mais
de 100 milhões de mulheres no mundo utilizem anticoncepcionais hormonais
combinados orais (AHCO), que apresentam índice de gestação menos que 1%.
Deve-se lembrar que os AHCO não apenas proporcionam anticoncepção eficaz,
relata-se também seus efeitos adversos, maior risco de troembolismo venoso
(TEV), acidente vascular cerebral (AVC) e diminuição do pH vaginal.
Em uma pesquisa com 948 prostitutas quenianas, Nelson (2005)
demonstrou que usuárias de contraceptivo oral ou injetável apresentaram
maiores riscos de infecção por Cândida sp. e outras DST, porém com menor risco
de vaginose bacteriana, comparadas com mulheres que não usavam
contraceptivos.
Verificamos nesta pesquisa, que 70% (35 mulheres) fazem uso da pílula
oral como método contraceptivo, ficando 30 % (15 mulheres) sem fazer uso deste
método. Podemos observar com esses dados um grande fator desencadeante
Textura, Cruz das Almas-BA, vol. 3, n.º 2, p. 41-69, Ago./Dez., 2008.
60
para candidíase vaginal, pois os usos de AHCO, em doses altas, aumentam os
níveis de estrogênio e diminui o pH vaginal, o que torna mais sensível a vagina
para o desenvolvimento da cândida (Figura 13).
30%
70%
Sim
Não
Fonte: Dados da pesquisa
Figura 13: Distribuição percentual das mulheres quanto ao uso de
anticoncepcional oral. Cruz das Almas - BA, agosto/outubro 2008.
4.4 CARACTERÍSTICAS DO CORRIMENTO
Quanto ao prurido associado à CVV, diversos autores propuseram a
produção de micotoxinas, que podem ser localmente irritantes e até mesmo
alergênicas. Provavelmente, os produtos formados na fermentação dos hidratos
de carbono sejam também responsáveis pelo extremo desconforto das pacientes.
Sobel (2001) afirma que sintomas como prurido agudo e secreção vaginal
são usualmente referidos pelas mulheres acometidas, mas nenhum deles está
invariavelmente associado à doença. Ainda, segundo o autor, nenhum deles é
específico para CVV. Moraes (2003) concorda em afirmar que o prurido vulvar é o
sintoma mais freqüente, e observou ausência de odor na secreção vaginal, que
geralmente é branca ou amarelada com pH menor que 4,5. A inflamação vulvar
(principalmente eritema e edema) é também um achado clínico ocasional.
Segundo Nelson (2005), o prurido, considerado o principal sintoma, exacerba-se
à noite e pelo calor local.
Como observado na Figura 14, na maioria das mulheres do estudo o prurido
vagina esteve presente em 76% (38 mulheres) e apenas 24% (12 mulheres)
afirmaram não estar apresentando esse sintoma de CVV.
Em relação à procura do serviço de planejamento familiar por conta do
prurido (Figura 16) apresentado por essas mulheres, 72% (36 mulheres)
afirmaram ter ido ao serviço por causa no mesmo e apenas 28% (14 mulheres)
declararam não ter ido por conta do prurido. De acordo com esses dados é válido
ressaltar que o percentual caracteriza grande significado, mas que não é apenas o
fato de estar apresentando o prurido que fez com estas mulheres procurassem o
serviço de planejamento familiar, mas, sim, a desagradável sensação que ele
provoca.
Textura, Cruz das Almas-BA, vol. 3, n.º 2, p. 41-69, Ago./Dez., 2008.
61
24%
Sim
76%
Não
Fonte: Dados da pesquisa
Figura 14: Distribuição percentual das mulheres quanto à presença de prurido
vaginal. Cruz das Almas - BA, agosto/outubro 2008.
28%
72%
Sim
Não
Fonte: Dados da pesquisa
Figura 15: Distribuição percentual das mulheres quanto à procura do serviço de
saúde por conta do prurido vaginal. Cruz das Almas - BA, agosto/outubro 2008.
Oriel et al. (2002), estudando 533 mulheres atendidas em uma clínica com
DST, revelaram que, dentre aquelas com cultura positiva para CCV, 50% tinham
sintomas de prurido vaginal acompanhados ou não por corrimento, 30%
apresentaram corrimento vaginal isolado e 20% não referiram nenhum sinal ou
sintoma.
Essas mulheres com CVV quando afirmam que procuram o serviço de
planejamento familiar por causa do prurido elas estavam colocando como
prioridade a cura da CVV e não buscando uma forma de evitar gravidez
indesejável.
Nesse sentido, vale o profissional de saúde seja ele enfermeiro (a) ou
medico (a) esta atenta a essas inquietações e saber identificar o real motivo da ida
da mulher ao serviço de saúde.
Na Figura 16, observam-se dados relacionados à característica do
corrimento, onde 88% (44 mulheres) afirmaram estar com secreção na vagina e
12% (6 mulheres) afirmaram não possuir secreção. Observamos que 56% (28
mulheres) afirmaram estar com secreção esbranquiçada; 32% (16 mulheres)
Textura, Cruz das Almas-BA, vol. 3, n.º 2, p. 41-69, Ago./Dez., 2008.
62
Caracteristíca da secreção
estavam com secreção amarelada; 12% (6 mulheres) com secreção translúcida e
não foi relatada entre as mulheres nenhuma secreção escurecida na vagina.
Apresenta secreção vagina
escurecida
Apresenta secreção vaginal
Translúcida
0,00%
6,00%
32,00%
56,00%
0,0%
10,0%
20,0%
30,0%
40,0%
50,0%
Apresenta secreção vaginal
amarelada
Apresenta secreção vaginal
esbranquiçada
60,0%
Número de Mulheres
Fonte: Dados da pesquisa
Figura 16: Distribuição percentual das mulheres quanto à cor da secreção vaginal.
Cruz das Almas - BA, agosto/outubro 2008.
As pacientes com vaginite intensa por cândida apresentam, comumente,
uma insignificante resposta leucocitária local à infecção. A secreção é composta
de grumos de células epiteliais com micélios entremeados, apresentando o
aspecto branco, de “leite coalhado”. Considerando, no entanto, a presença
significativa de 32% das mulheres com secreção de cor amarelada, faz-se
necessário exame mais detalhado. Nesse sentido, Gomes (2003) relata que
algumas vezes um corrimento vaginal amarelado pode ser decorrente de
cervicites, de patologias endometriais ou do trato genital superior, necessitando
de um exame clínico minucioso com investigação complementar bem elaborada,
visando diagnóstico adequado e tratamento correto.
No que tange a situação de ardência ao urinar, os resultados da Figura 17
demonstraram que 76% (37 mulheres) apresentavam esse sinal característico da
CCVV, sendo que, 24% (13 mulheres) não relataram ardência ao urinar.
Para Brasil (2005), Os sintomas característicos da CVV são: prurido
intenso, eritema vulvar ou vaginal, disúria e sensação de ardência ao urinar.
A excessiva população de cândida acidifica, ainda mais, o ph vaginal, e é o
que causa a dor e a ardência genital. Vale ressaltar que pode ocorrer tanto em
mulheres como em homens. Dessa forma, se a mulher tentar manter relações
sexuais nesse estado, poderá desenvolver fissuras e, até mesmo, lacerações na
vagina.
Observa-se, também, que não é o fato da mulher estar com CVV que irá
desenvolver o seu quadro habitual, devendo a mulher saber identificar como
ocorre esse ardor.
Textura, Cruz das Almas-BA, vol. 3, n.º 2, p. 41-69, Ago./Dez., 2008.
63
24%
76%
Sim
Não
Fonte: Dados da pesquisa
Figura 17: Distribuição percentual das mulheres quanto à presença de ardor ao
urinar. Cruz das Almas - BA, agosto/outubro 2008.
Para Novak (2005), as infecções do trato urinário também podem mascarar
o quadro, principalmente se não ficar claro se o ardor ocorre quando a urina toca
os tecidos genitais ou se na verdade trata-se de processo infeccioso urinário.
Nesse sentido, segundo Brunner e Suddarth (2002) uma queimação, que
pode seguir-se à micção, pode resultar em escoriações a arranhaduras na vagina.
Em geral esse ardor fica exacerbado antes da menstruação, ocorrendo disúria,
frequentemente em conseqüência da irritação local do meato urinário.
Os resultados na Figura 18 mostram que mais da metade das mulheres
pesquisadas 72% (36 mulheres) não tinham conhecimento sobre a CVV, apenas
28% (14 mulheres) tinham conhecimento sobre a CVV. É importante notar que as
mulheres não têm conhecimento a respeito das características da doença, isso
faz com que não possam relacionar algum sintoma físico pessoal com a
possibilidade de haver contraído uma DST. Muito embora a falta de
esclarecimento, acesso aos meios de comunicação e de um atendimento
especializado, seja ele médico ou de enfermagem, voltado para esclarecimento
sobre a patologia, fazem com que, essas mulheres, não possuam o conhecimento
sobre seu problema de saúde.
28%
72%
Sim
Não
Fonte: Dados da pesquisa
Figura 18: Distribuição percentual das mulheres quanto ao conhecimento da
Candidíase vaginal. Cruz das Almas-BA, agosto/outubro 2008.
Textura, Cruz das Almas-BA, vol. 3, n.º 2, p. 41-69, Ago./Dez., 2008.
64
Apesar de as mulheres não terem conhecimento sobre a CVV a atitude que
elas tiveram de imediato foi de procurar o serviço de planejamento familiar, na
busca de esclarecer dúvidas e alivio dos sinais e sintomas, provocados pela CVV.
Os profissionais da área de saúde devem atentar para a conduta adotada
nos seus atendimentos, não apenas para tratamento medicamentoso, como
também para o esclarecimento e condutas extras farmacológica, a exemplo de
uma dieta rica em carboidratos que pode ser fonte de nutrientes para o fungo da
cândida.
Segundo Freire (1996), a atenção e esclarecimento dado aos pacientes são
necessários para uma co-participação ativa das experiências anteriores e um
esforço comum entre ambos para conhecerem a realidade e junto buscarem as
soluções dos problemas apresentados.
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
A análise do perfil das mulheres com CVV, no Ambulatório Municipal
Fernando Carvalho de Araújo em Cruz das Almas – BA revela que há um número
alto de mulheres em idade fértil (40%), seguido de 26% de mulheres entre 25 a 30
anos. É um resultado preocupante para a sociedade, devido ao fato de não serem
mais adolescentes e estarem em plena atividade sexual. A presença de DM não
foi significativa (24%), entretanto mesmo sem essa doença as mulheres
apresentavam CVV. No que se refere ao vestuário de calça jeans e calcinha de
lycra, percebemos o uso significante dessas peças do vestuário feminino com
88% e 76% respectivamente. Afirmando o que diz a literatura que o uso dessas
peças potencializa a proliferação do fungo da cândida e, conseqüentemente, o
desenvolvimento da CVV.
A presença de um ciclo menstrual longo é uma realidade das mulheres com
CVV na cidade de Cruz das Almas – BA verificamos que 44% apresentam o ciclo
de quatro a cinco dias, implicando em mais tempo de permanência do absorvente
convencional em contato com a vagina. Entretanto, o uso de absorvente interno
representou apenas 37%. Algumas variáveis observadas precisam ser mais
trabalhadas pelos profissionais de educação e saúde, percebemos que 54% das
mulheres realizam higiene intima após defecar, entretanto essa higienização
ocorre no sentido errado (ânus/vagina) levando contaminação para o meio
vaginal.
Percebemos, também, que são mulheres da zona urbana (58%) que
mesmo tendo acesso a informações e esclarecimentos de cuidados pessoais não
tem a prática de tomar banhos com freqüência; encontramos 40% referindo tomar
um a dois banhos diários, propiciando uma maior oportunidade para infecção da
CVV.. Quando observamos os antecedentes sexuais, foi possível ressaltar que a
iniciação sexual deu-se muito cedo 64% entre 15 e 25 anos. Vale salientar que
tivemos 20% desta iniciação sexual entre 09 e 14 anos de idade. São crianças
Textura, Cruz das Almas-BA, vol. 3, n.º 2, p. 41-69, Ago./Dez., 2008.
65
iniciando atividade sexual e isto significa maior exposição à gravidez indesejável e
contrair as DST. Observa-se, também, que houve uma variação de troca de
parceiros, 50% já tiveram de um a três parceiros. É necessário um trabalho
preventivo e contínuo para que não haja desencadeamento de um CVV.
Ainda, nessa perspectiva, 30% das entrevistadas relatam ter de uma a três
relações sexuais semanais. O que significa estar dentro da média brasileira, mas
a portadora de CVV não deve ter essa prática diária tendo em vista, o atrito e
desconforto causado pelo ato sexual. Um ponto positivo, desse aspecto, foi o fato
de 60% das mulheres não terem trocado de parceiros nos últimos seis meses.
Quando nos referimos a pratica de masturbação, verificamos que 66%
destas mulheres não colocaram essa atividade como forma de sentir prazer,
talvez por educação familiar ou pelo próprio desconforto que a CVV causa.
Também, verificamos que a pratica de sexo oral doador, representou 54% das
afirmativas, diante das exigências femininas em explorar o líbido, auto-afirmação
e como forma de sentir prazer. No entanto, isso representa um meio para o
contagio de candídiase oral.
Outro índice que nos preocupou foi o prurido vaginal, quando verificamos
que 76% das mulheres com CVV apresentavam esse sinal, que provoca
desconforto e estresse. Percebemos que essas mulheres procuraram o serviço
de planejamento familiar por causa do prurido (72%) e não como forma de adotar
um método contraceptivo. Verificamos, nesse aspecto, a necessidade e a
importância de uma consulta de enfermagem detalhada.
Ao analisarmos a secreção vaginal, constatamos que 88% das mulheres
com CVV possuía algum tipo de secreção, o que não era normal e destas 56%
referiram ser esbranquiçada, o que nos preocupa, devido este sinal clássico de
CVV estar expresso em tão larga escala.
Alto índice de ardência ao urinar (76%) foi observado, sendo um sinal grave
de infecção, seja ela por bactérias ou por CVV, trazendo com essa ardência uma
micção dolorosa e desconfortável, mas 80% não conheciam a doença.
Percebemos assim que estas mulheres com CVV necessitam não apenas de
tratamento adequado, mas,também, orientações e acompanhamento
psicoemocional.
Dessa forma podemos sugerir que há falhas no comportamento
educacional dessas mulheres e no Serviço de saúde, que não as esclareceu
sobre a doença, podendo, também, ter desenvolvido estratégias, a fim de
minimizar os efeitos desconfortáveis da CVV.
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Textura, Cruz das Almas-BA, vol. 3, n.º 2, p. 41-69, Ago./Dez., 2008.
GRAVIDEZ NA ADOLESCÊNCIA: adesão tardia ao pré-natal
PREGNANCY IN ADOLESCENCE: accession to the late prenatal
Acilene Novaes Sampaio Ferreira¹
RESUMO
Considerando os registros na literatura especializada, a gravidez na adolescência
é um fenômeno universal, que engloba os valores culturais, sociais e econômicos
daqueles envolvidos no processo. Com isso, optou-se por um estudo descritivo do
tipo qualitativo, de caráter exploratório, que teve como objetivo conhecer, através
dos discursos de adolescentes, os fatores que influenciam na adesão tardia ao
pré-natal no PSF de Sapeaçu, no período de Maio a Junho de dois mil e oito. Os
sujeitos estudados foram 6 adolescentes, com faixa etária compreendida entre 14
a 18 anos de idade, que aceitaram participar do estudo. A coleta de dados foi
realizada por meio entrevista semi-estruturada, obedecendo às normas éticas em
pesquisa conforme o parecer da Resolução 196/96. Constatou-se que o inicio do
pré-natal se dá tardiamente, devido à preocupação das adolescentes em relação
à aceitação dos familiares e seus vizinhos, bem como o déficit de conhecimento
referente ao pré-natal. Este estudo, também, permitiu perceber que para algumas
adolescentes a gravidez apresenta-se como uma experiência negativa, além
disso, notou-se que existe por parte das adolescentes, pouco conhecimento sobre
o pré-natal. Portanto, cabe aos profissionais de saúde questionar e orientar as
adolescentes sobre a importância do pré-natal, no intuito de reduzir os riscos para
o binômio mãe e filho, sem desrespeitar a autonomia da mulher.
PALAVRAS-CHAVE: gravidez, adolescência, pré-natal
ABSTRACT
Whereas those described in the literature, pregnancy in adolescence is a universal
phenomenon that involves cultural, social, economic and those involved in the
process. Therefore it was a descriptive study of qualitative, exploratory in nature,
which aimed to ascertain through the speeches of the factors that influence
adolescents to join the late prenatal Sapeaçu of the PSF for the period May to June
two thousand and eight. The subjects were 6 teenagers, aged between 14 to 18
years old, who agreed to participate in the study. Data collection was conducted
through semi-structured interview, according to ethical standards in research as
¹Preceptora de estágio supervisionado na rede Básica e Pós-Graduanda em Saúde Coletiva com
ênfase em PSF da Faculdade Maria Milza.
Textura, Cruz das Almas-BA, vol. 3, n.º 2, p. 69-81, Ago./Dez., 2008.
70
the opinion of Resolution 196/96. It was the beginning of prenatal care is delayed
due to the concern of adolescents regarding the acceptance of family, and
neighbors, and the lack of knowledge regarding prenatal care. This study has also
realize that for some adolescents, pregnancy is presented as a negative
experience, in addition, it was noted that adolescents from poor knowledge on
prenatal care. Therefore, it is for health care professionals guide adolescents and
questioning about the importance of prenatal care in order to reduce the risks to the
mother and child, without disregarding the autonomy of women.
KEY WORDS: pregnancy, teens, prenatal
Textura, Cruz das Almas-BA, vol. 3, n.º 2, p. 69-81, Ago./Dez., 2008.
71
1. INTRODUÇÃO
A gravidez na adolescência é um fenômeno universal, que traz significado
condicionado aos valores culturais daqueles envolvidos no processo, do
momento histórico e do meio em que ocorre. Já os profissionais de saúde são
coadjuvantes dessa experiência e desempenham um papel fundamental na
orientação das adolescentes no cuidado pessoal e do bebê, inclusive ajudando
sobre as melhores formas de evitar outra gravidez não programada, a fim de
reduzir as taxas de gravidez na adolescência no Brasil.
O presente artigo trata da gravidez na adolescência: adesão tardia ao prénatal, fatores relacionados à incidência de adolescentes grávidas e a baixa
freqüência a consulta nos postos de saúde, no inicio e após s o primeiro trimestre
da gestação, no município de Sapeaçu- BA.
Segundo Patrício (1994), na adolescência não existe maturidade física,
psicológica e social para desempenhar o papel de ser mãe. Com isso, as
adolescentes necessitam de cuidados referente ás suas características nessa
fase da vida, bem como aos cuidados inerentes ao processo da gravidez.
A gravidez precoce é frequente em todos os níveis sociais. Contudo, a
maior incidência ocorre na população de baixa renda. É importante ressaltar que
este é um fator preocupante, pois essas adolescentes vivem nas piores condições
financeiras, baixa escolaridade e seus filhos apresentam maior risco de doença ou
de morte.
De acordo com Costa (2005), na América Latina, 3.312.000 crianças
nascem de adolescentes que embora estejam em plena fase de crescimento e
desenvolvimento, vêm participando efetivamente do aumento das taxas de
fecundidade e de mortalidade materno e neonatal.
Nesse sentido, notamos que a gravidez na adolescência além de ocorrer no
momento em que o corpo da jovem ainda está se desenvolvendo, representa
grandes riscos para o binômio mãe e filho, implicando em um problema social.
Por isso, surge a inquietação e preocupação, principalmente porque essa
conduta implica na não realização de exames no primeiro trimestre e acarreta um
déficit de vitaminas, o que pode levar a várias complicações quando comparada a
adesão ao pré-natal no início da gravidez. Daí, surge o questionamento: quais
fatores influenciam gestantes adolescentes a aderirem tardiamente ao Prénatal?
Este estudo teve como objetivo geral: conhecer os fatores que influenciam
na adesão tardia de gestantes adolescentes ao pré-natal, e como objetivos
específicos: identificar o conhecimento das adolescentes referente à gravidez e
descrever os fatores que culminam na gravidez na adolescência.
Textura, Cruz das Almas-BA, vol. 3, n.º 2, p. 69-81, Ago./Dez., 2008.
72
2. A GRAVIDEZ NA ADOLESCÊNCIA
A adolescência implica em um período de mudanças físicas e emocionais
considerada, por alguns, um momento de conflito ou crises. Não se pode
descrever a adolescência como uma simples adaptação às transformações
corporais, mas como importante período no ciclo existencial da pessoa. A
puberdade, que marca o início da vida reprodutiva da mulher, é caracterizada
pelas mudanças fisiológicas, corporais e psicológicas da adolescência.
A adolescência é definida cronologicamente como um período
compreendido entre 10 a 19 anos de idade, nessa fase ocorrem várias mudanças
físicas e psicológicas (KASSAR, 2006).
Para o mesmo autor, esse grupo constitui 1/3 da população mundial que,
embora em fase de desenvolvimento, participa do aumento das taxas de
fecundidade. Estima-se que 20% dos nascidos vivos no Brasil nos últimos cinco
anos foram concebidos de mães adolescentes. Esse fato está diretamente ligado
a relação sexual precoce, a qual pode desencadear a aquisição de doenças
sexualmente transmissíveis e em gravidez indesejada.
Segundo a BEMFAM (2007), houve, no Brasil, um crescimento da
fecundidade de mulheres de 15-19 anos, em confronto à queda significativa no
grupo de 20-24. Essa tendência acentuou-se nas décadas de 80 e 90, do século
XX. Diferenciais nas taxas de fecundidade em adolescentes são encontrados por
áreas geográficas e pelos diversos grupos sociais, afetando mais regiões rurais e
mulheres de baixa condição econômica e menor nível de instrução.
De acordo com Bruno (2006), o baixo nível socioeconômico e educacional,
são os principais fatores que contribuem para a gravidez na adolescência. Além
disso, essas adolescentes têm dificuldades em negociar com o parceiro para o
uso do preservativo.
2.1 ASSISTÊNCIA AO PRÉ-NATAL NO BRASIL
Ao longo das últimas décadas, tem-se observado um movimento crescente
com novas políticas de saúde, que visam assistir a mulher de forma integral,
universal e igualitária. Nessa perspectiva, a assistência ao parto tem sido motivo
de muitas discussões, no que se refere a qualidade do atendimento à mulher no
pré-natal, nascimento e puerpério.
Conforme Coimbra (2003) a cobertura da assistência ao pré-natal no Brasil
ainda é baixa, apesar de vir aumentando nas últimas décadas. Percebe-se que as
desigualdades no uso dessa assistência, ainda, persistem, principalmente nas
regiões mais carentes do nosso País.
Para o Ministério da Saúde, o acompanhamento ao pré-natal, deve ter
início precoce, ter cobertura universal, ser realizado de forma periódica, estar
integrado com as demais ações preventivas e curativas, e deve ser observado um
número mínimo de 6 (seis) consultas Brasil (2002).
Textura, Cruz das Almas-BA, vol. 3, n.º 2, p. 69-81, Ago./Dez., 2008.
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Diante disso, é importante salientar que o sucesso do pré-natal dependerá,
em grande parte, do momento em que se inicia o acompanhamento e do número
de consultas, a qual deverá ser em torno de seis e o intervalo não pode ultrapassar
oito semanas.
De acordo com Trevisan (2002), se a gestante não for acompanhada de
forma adequada, não poderá fazer a superposição de estados patológicos
prévios. Assim, o processo reprodutivo transforma-se em situação de alto risco
tanto para a mãe quanto para o feto.
2.2 FATORES QUE INFLUENCIAM A ADESÃO TARDIA AO PRÉ-NATAL
A maioria das investigações sobre esse tema está relacionada à
adequação do pré-natal, ao período em que ele é iniciado e ao número de
consultas realizadas, sendo pouco freqüentes as avaliações sobre a qualidade da
assistência.
Estudos indicam que o ideal é se iniciarem as consultas no primeiro
trimestre da gestação, o que possibilitaria diagnóstico e tratamento precoces de
doenças e de outras intercorrências.
Para Gama et al (2004), dentre as grávidas, é nas adolescentes que os
prejuízos de uma atenção precária à gestação se mostram mais intensos.
Discute-se a possibilidade de que os efeitos de um pré-natal inadequado nesse
grupo sejam mais pronunciados, porque a gravidez na adolescência é um
fenômeno muito mais presente em jovens de grupos sociais excluídos,
freqüentemente desprovidos de apoio da família, do pai do bebê e da sociedade.
Conforme Gama, Szwarcwald e Leal (2002), estudos têm mostrado que a
grávida adolescente inicia tardiamente o acompanhamento do pré-natal e termina
por fazer um menor número de consultas, quando comparada às mulheres com
mais de vinte anos.
Sobre o mesmo aspecto Kassar (2006) comenta que mães adolescentes
realizam menos consultas de pré-natal e têm filhos com menor peso e idade
gestacional quando comparadas às adultas. A falta de conhecimento das
adolescentes referente a importância do pré-natal contribuem para uma adesão
tardia, a qual, na maioria das vezes, pode resultar em prejuízos para o binômio
“mãe e filho”.
Segundo Bruno (2006), a gravidez na adolescência gera diversos
sentimentos como: medo, vergonha e desespero, que contribuem para a não
adesão ao pré-natal. Além disso, muitas adolescentes são obrigadas a
abandonarem seus estudos.
Outro aspecto importante, citado pelo autor, é que a gravidez indesejada
pode culminar em um aborto como refúgio para o seu problema. Com isso,
percebe-se que a gravidez na adolescência é constituída de um ato impensado
dos jovens nessa fase de modificações físicas e psíquicas.
Textura, Cruz das Almas-BA, vol. 3, n.º 2, p. 69-81, Ago./Dez., 2008.
74
3. METODOLOGIA
Esta pesquisa compreende um estudo descritivo do tipo qualitativo, de
caráter exploratório. Para Minayo (2006), a abordagem é qualitativa quando
afirma que ela se aplica ao estudo das relações, das representações, das crenças,
das opiniões, dos produtos das interpretações que os humanos fazem,
relacionado a como vivem, pensam, sentem e constroem seus artefatos e a si
mesmo.
Este estudo foi realizado com 6 (seis) adolescentes, que estavam em
plenas condições de lucidez, com faixa etária compreendida entre 14 a 18 anos de
idade, que aceitaram participar da pesquisa, as quais estão denominadas de
Admirável, Adorável, Amiga, Amorosa, Agraciada, carinhosa, afim de preservar o
anonimato. O estudo foi desenvolvido no período de janeiro a junho de dois mil e
oito no Posto de Saúde da Família no município de Sapeaçu no recôncavo da
Bahia
A coleta de dados foi realizada a partir de entrevistas semi-estruturadas,
que foram desenvolvidas no consultório, após a consulta de enfermagem,
gravadas através de gravador em fita cassete, e posteriormente transcritas e
analisadas. Esta pesquisa obedece às normas éticas em pesquisa, conforme o
que consta na Resolução 196/96, do Conselho Nacional de Saúde (CNS)..
4. ANÁLISE E DISCUSSÃO DE RESULTADOS
Os resultados estão discutidos a partir da técnica de análise de conteúdo de
Bardin (1977), apresentados e analisados descritivamente com uma abordagem
qualitativa. Para isso, utilizou-se da apresentação por categorias e subcategorias,
baseadas nas respostas e identificadas a partir dos depoimentos dos sujeitos, os
quais estão caracterizados abaixo:
4.1 PERFIL DOS SUJEITOS
Fizeram parte do presente estudo 06 (seis) adolescentes grávidas, que
vivem com seus pais. A média de idade das participantes prevaleceu a faixa etária
de 14 a 18 anos de idade. Todas eram solteiras, possuíam o ensino fundamental
incompleto, demonstrando grau de instrução precário. Além disso, 4 (quatro)
delas não trabalhavam e duas trabalhavam, porém recebiam pouco mais que
meio salário mínimo.
Essas particularidades remontam que as características dos sujeitos estão
ligadas diretamente a problemática da gravidez na adolescência. Isso pode gerar
conflito sócio-econômico, levando a preocupação da saúde pública, pois as
adolescentes não têm emprego fixo e dependem dos seus pais para se manter.
A partir do estudo com esses sujeitos foi possível definir algumas categorias que
Textura, Cruz das Almas-BA, vol. 3, n.º 2, p. 69-81, Ago./Dez., 2008.
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nos ajudaram na discussão e análise.
4.2 INICIO TARDIO DO PRÉ-NATAL
Segundo Kassar (2006), mães adolescentes realizam menos consultas de
pré-natal e o filho geralmente apresenta riscos. Este dado foi comprovado em um
dos seus estudos com mães jovens (menores de 15 anos de idade), as quais
representam maiores riscos perinatais e o filho maior risco de morrer no primeiro
ano de vida, isso quando comparados as mães com idades superiores.
Nessa categoria foi permitido avaliar os fatores que induzem as
adolescentes a procurar a consulta de pré-natal quando já estão com uma idade
gestacional superior a três meses. Foi possível perceber dois fatores que
ocasionam a procura tardia pelo acompanhamento da gravidez
4.3 PREOCUPAÇÃO DAS ADOLESCENTES FRENTE À ACEITAÇÃO DOS
FAMILIARES E SEUS VIZINHOS
Nessa subcategoria verificou-se que existe sentimento de vergonha das
adolescentes, relacionado à gravidez e as conseqüências que ela irá
desencadear em sua vida. Além disso, surge a inquietude referente aos
comentários dos vizinhos, bem como uma possível punição dos pais, ao descobrir
o fato.
Quando engravidei logo eu fiquei com vergonha, o que as
pessoas pensavam de mim [...] tinha que ir logo fazer prénatal, mas só que eu não podia ir se não o povo ia saber que
eu estava grávida, porque meus peitos começaram a crescer
logo minha barriga também e todo mundo ia vê. (Amiga).
Porque quando minha mãe descobriu já era tarde, não contei
logo, eu ia pra contar, mas tinha vergonha, eu tinha medo,
mas ela desconfiau.(Admirável)
Outra preocupação identificada nas falas das adolescentes foi o medo de
sair na rua, para não serem notadas pelos vizinhos, através das transformações
fisiológicas do corpo, ocorridas na gravidez. Por isso elas só procuram o
acompanhamento do pré-natal quando não é mais possível esconder a barriga.
Nos depoimentos abaixo a problemática da gravidez na adolescência
envolve todo o contexto familiar, e a maioria dos pais, diante dessa situação,
discriminam a filha e não aceitam a gravidez. Segundo eles ainda é cedo para ser
mãe, pois nessa fase não se tem uma vida estrutura da para criar uma criança,
atendendo todas as suas necessidades.
Textura, Cruz das Almas-BA, vol. 3, n.º 2, p. 69-81, Ago./Dez., 2008.
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Sofri discriminação de minha mãe que não aceitava a
gravidez na adolescência, pois eu com 15 para 16 anos,
minha irmã também que não me aceitava dentro da casa dela
de barriga e o pai da criança que não quis assumir, no início eu
fiquei sozinha (Amiga).
[...] a dificuldade foi de minha família por não aceitava, pelo
simples fato de não ser casada e ser muito nova eu não tive
apoio dessas pessoas ( Carinhosa).
[...] os meus familiares sempre falam para não ter filho cedo.
,(Agradecida)
Para Godinho (2000), as adolescentes grávidas, muitas vezes, sofrem a
rejeição da família, o parceiro a abandona; os serviços de saúde especializados
são ainda insuficientes e a escola ainda não está preparada para auxiliá-la.
Freqüentemente sofrem críticas de familiares, seja por pressões sociais
envolvidas, seja por problemas financeiros. Muitas vezes, também, não podem
contar com o apoio de amigos ou vizinhos, sentem-se envergonhadas, culpadas e
têm dúvidas quanto ao seu futuro e o do seu filho.
Nesse sentido, é importante ressaltar que a orientação a adolescente deve
ser repassada no dia-a-dia, para evitar a gravidez no tempo inapropriado, no qual
essas meninas deveriam estar na escola, e não nas maternidades para parir uma
criança concebida a partir de um ato impensado ou por falta de conhecimento.
4.4 CONHECIMENTO DAS ADOLESCENTES REFERENTE AO PRÉ-NATAL
Nos depoimentos a seguir as entrevistadas apontam a falta de
conhecimento e experiência como fatores que contribuem para inserção tardia ao
pré-natal.
Então é assim eu fiquei com muita vergonha eu sabia que
tinha que fazer pré-natal, pois quando minha mãe estava
grávida de minha irmã caçula ela fez pré-natal, não lembro
quando começou ( Amiga).
Em minha opinião não achava que com 1 mês estava grávida,
na minha opinião o certo era com 5 mês ( Amorosa).
A falta de experiência, a vergonha de sair na rua, a barriga, do
povo falar, medo de minha mãe também (Adorável).
A partir dessas falas, evidencia-se a necessidade dos profissionais de
saúde fornecer instruções a essa parcela da sociedade na tentativa de melhorar o
Textura, Cruz das Almas-BA, vol. 3, n.º 2, p. 69-81, Ago./Dez., 2008.
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acesso as informações, ajudando a redução desse problema que,
freqüentemente, se encontra dia-a-dia.
Isto nos possibilita ter jovens providos de conhecimentos de não apenas de
quando deverá começar o pré-natal, mas do tempo que estarão preparados
socialmente, fisicamente e psicologicamente para ter um filho e proporcionar a ele
atenção em todos os âmbitos, favorecendo um desenvolvimento saudável.
4.5 A GRAVIDEZ NA ADOLESCÊNCIA COMO UMA EXPERIÊNCIA NEGATIVA
Nos depoimentos a abaixo nota-se as diferentes concepções das
adolescentes no que se refere à gravidez precoce e indesejada, pois para elas
esse fato só deveria acontecer quando se tem uma vida estruturada. No entanto,
as jovens, no momento do ato sexual, não pensam nas conseqüências que
poderá acarretar para as suas vidas. Além disso, também, reconhecem essa fase
como um período que, ainda, não deixou de ser criança.
É uma gravidez que começa antes da gente ta casada com a
vida estruturada, sem terminar os estudos (Amiga).
É aconteceu assim rápido, cedo e pro ter mais tarde, porque
não tem casa não tenho trabalho, agora que vim pensar como
cria um filho assim (Adorável).
[..]eu só tinha 15 anos era pra ta na escola, era pra ta ajudando
minha mãe dentro de casa, era na verdade pra ficar brincando
não pra ta grávida (Amiga).
Nos depoimentos a seguir algumas entrevistadas revelaram que a
preocupação com os transtornos, decorrentes da concepção indesejada, só é
percebida tardiamente, ou seja quando são privadas de ir a escola, têm que
trabalhar para comprar as coisas da criança ou, ainda, quando têm dificuldade de
conseguir emprego.
Dificuldade de arrumar um trabalho as vezes falta muita coisa
as vezes deixo de comprar uma coisa para mim para comprar
pro bebê, tem coisa que eu quero fazer a barriga atrapalha
(Carinhosa)
No início eu fiquei sozinha parei de estudar tive que trabalhar
para fazer o enxoval da criança. (Amiga)
Enche a barriga de estria, fica grande, mas o ruim vai ser
quando nascer para comprar uma coisa e outra, fralda, roupa,
remédio porque o filho pode ficar doente( adorável).
Textura, Cruz das Almas-BA, vol. 3, n.º 2, p. 69-81, Ago./Dez., 2008.
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Diante dessa visão das jovens, referente a problemática vivida por elas,
surge a necessidade de se pensar em estratégias, que apontem particularidades
da iniciação sexual das adolescentes, na tentativa de reduzir tanto a gravidez,
quanto doenças sexualmente transmissíveis.
4.6 O SIGNIFICADO DO PRÉ-NATAL PARA AS ADOLESCENTES
Observou-se que existe certo conhecimento por parte das adolescentes no
que se refere a importância do pré-natal no processo da gravidez. Elas revelaram
que se trata de um acompanhamento que avalia as etapas da gestação, pois
mede a barriga, “olha” a idade gestacional, e ausculta a freqüência cardíaca da
criança
Para algumas adolescentes o pré-natal tem a função de acompanhar a
mulher na tentativa de orientar, prevenir e investigar possíveis riscos durante a
gestação, o que possibilita um parto sem complicações.
Sabe com a criança ta a saúde saber como ta o dia a dia da
criança ainda na barriga (Amorosa).
Para mim, é pra vê como está o bebê, escuta o coração, medir
a barriga certinho tudo direito para vê como vai parir quando o
bebê ta tudo bem (Carinhosa).
O pré-natal para mim é tudo é ali que a gente ta aprendendo
como a criança ta, se o neném ta crescendo bem, para mim o
pré-natal é ótimo (Agraciada).
Eu não sabia o que era pré-natal para mim o pré-natal era um
acompanhamento mesmo que não tinha importância
nenhuma e só depois vi que era para saber como lidar com a
criança com a gravidez e com a saúde (Adorável).
Acho que o pré-natal que agente tem que começar logo no
primeiro mês que agente ta, porque o pré-natal além de ser
um jeito assim de prevenir as doenças faz com que o filho da
gente nasça com saúde (Amiga).
A assistência ao pré-natal oferece oportunidade única para observar e
tratar a gestante por um período que pode ir além de seis meses. Supervisionando
e mantendo a normalidade da gestação, se caminha em busca de evitar e
controlar riscos, como também dar apoio e educar a gestante.
Diante disso, é importante salientar que a compreensão da mulher,
referente a importância de um acompanhado de pré-natal feito de forma assídua,
Textura, Cruz das Almas-BA, vol. 3, n.º 2, p. 69-81, Ago./Dez., 2008.
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ajuda, significativamente, o desenrolar do parto e os cuidados com o bebê e o da
própria mulher no puerpério. Vale dizer que o puerpério é uma das etapas mais
difíceis, pois a jovem mulher depara-se com um novo ser para cuidar e dar
atenção.
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
A gravidez na adolescência é um fenômeno universal, que traz significado
condicionado aos valores culturais daqueles envolvidos no processo. Observa-se
que, nessa fase, a adolescente ainda não tem maturidade física, psicológica e
social para desempenhar o papel de ser mãe.
Esse estudo, portanto, buscou conhecer através dos discursos das
adolescentes os fatores que influenciaram a adesão tardia ao pré-natal no PSF de
Sapeaçu. Constatou-se que a preocupação das adolescentes em relação a não
aceitação dos familiares, vizinhos, parceiros, o sentimento de vergonha e também
o pouco conhecimento referente ao pré-natal, são fatores que contribuíram para
adesão tardia ao pré-natal.
Verificamos que as adolescentes se preocupam com que as pessoas vão
pensar, têm medo de sair na rua, para não serem notadas pelos vizinhos, através
das transformações fisiológicas ocorridas no corpo pela gravidez.
Outros aspectos que possibilitam a inserção tardia ao pré-natal foram a
falta de conhecimento e de experiência em relação à gravidez na vida dessas
mulheres.
Também, a problemática da gravidez na adolescência envolve todo o
contexto familiar. Pois a maioria dos pais, diante dessa situação, não aceita a
gravidez, alegando que nessa fase da vida não se tem estrutura para criar uma
criança, atendendo as suas necessidades.
Além disso, algumas adolescentes revelaram que a preocupação com os
transtornos decorrente da concepção indesejada só é percebida tardiamente, ou
seja, quando são privadas de ir a escola, quando tem que trabalhar para manter as
despesas ou quando nem mesmo conseguem um emprego. Ainda, verificou-se
que para algumas adolescentes, consciência de que o pré-natal tem a função de
acompanhar a mulher na tentativa de orientar, prevenir e investigar possíveis
riscos durante a gestação, possibilitando um parto sem distócias.
Enfim, a decadência na assistência adequada e a falta de informações por
parte de algumas adolescentes poderão levá-las a uma gravidez precoce e
indesejada. Desse modo, é importante que o profissional de saúde conheça os
agravos inerentes a esse problema, para informar, acompanhar, e ajudar as
adolescentes na prática de sua sexualidade, de forma responsável.
Textura, Cruz das Almas-BA, vol. 3, n.º 2, p. 69-81, Ago./Dez., 2008.
80
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PARTO CESARIANO: opinião de mulheres
CESAREAN DELIVERY: opinion of women
Acilene Novaes Sampaio Ferreira¹
RESUMO
Trata-se de um estudo, cujo objetivo foi conhecer, através dos discursos de
puérparas, os fatores que influenciam mulheres a optar pelo parto cesariano em
um Hospital e Maternidade X, no período de Fevereiro a dezembro de dois mil e
sete. Os sujeitos estudados foram as puérparas. A coleta de dados foi realizada
através de entrevista semi-estruturada, gravada em fita K7. Os resultados foram
obtidos por meio da análise de conteúdo de Bardin (1977). Constatando-se que
existem motivações que contribuem pela escolha da cesárea, como o medo da
dor no trabalho de parto e parto, perda da integridade do períneo, a concepção
cirúrgica e as complicações obstétricas. Este estudo, também, permitiu perceber
que para algumas mulheres o parto cesariano representa um equivoco, que
denota insatisfação e dor, já para outras se tornou uma experiência satisfatória.
Ainda, revelou que o parto normal encontra-se desvalorizado, em virtude da
desqualificação da assistência obstétrica e a falta de humanização dos
profissionais de saúde. Dessa forma, permitiu perceber que a escolha por essa via
de parto surge a partir dos anseios e dúvidas que as mulheres têm em relação ao
nascimento. Portanto, cabe ao obstetra questionar e orientar a mulher sobre o que
esse ato intervencionista representa, respeitando a autonomia da escolha
materna sem, no entanto, ignorar os critérios clínicos, que podem levar a tomada
de decisão pelo profissional.
PALAVRAS-CHAVE: gravidez, adolescência, sentimentos, significado.
ABSTRACT
This is a study whose aim was to, through the discourse of mothers, the factors that
influence women to opt for cesarean section in a Maternity Hospital and X, in the
period February to December two thousand and seven. The subjects were the
mothers. Data collection was conducted through semi-structured, tape recorded in
K7. The results were obtained from analysis of content of Bardin (1977). Noting
that there are motivations that contribute the choice of cesarean section, as the
fear of pain in labor and delivery, loss of integrity of the perineum, the design and
the surgical obstetric complications. This study also allowed for some women find
that the cesarean section is a misconception that indicates dissatisfaction and
¹Preceptora de estágio supervisionado na rede Básica e Pós-Graduanda em Saúde Coletiva com
ênfase em PSF da Faculdade Maria Milza.
Textura, Cruz das Almas-BA, vol. 3, n.º 2, p. 82-95, Ago./Dez., 2008.
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pain, as for other became a satisfactory experience. Still, revealed that normal birth
is devalued because of disqualification of obstetric care and the lack of
humanization of health professionals. Thus, the choice has to realize that by this
route of delivery comes from the desires and concerns that women have in relation
to birth. Therefore, the obstetrician and guide the woman question about what this
act is interventionist, respecting the autonomy of maternal choice, but without
ignoring the clinical criteria, which may lead to decision making by the professional.
KEY WORDS: pregnancy, adolescence, feelings, meanings.
Textura, Cruz das Almas-BA, vol. 3, n.º 2, p. 82-95, Ago./Dez., 2008.
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1. INTRODUÇÃO
O presente estudo trata do Parto Cesariano, pelo fato de ser um tipo de
parto, que tem alta incidência em quase todo País. Buscou-se conhecer os fatores
que influenciam a escolha da cesárea, segundo a opinião de mulheres. Visto que,
a cesárea predispõe a cliente a diversas complicações, tais como: infecção
puerperal, gravidez ectópica, histerectomia intraparto ou puerperal, acidentes
tromboembólicos e má implantação placentária na gestação posterior.
Segundo, Fabri et al., (2002), entre os vários motivos desse aumento, os
mais conhecidos são cesárea anterior, sofrimento fetal, apresentação pélvica e
distócias. Além dessas causas, é permitido destacar a inadequada assistência
médica, o déficit sócioeconômico e cultural da gestante e a própria percepção
valorativa da mulher e do profissional médico a respeito do parto cirúrgico. Os
autores comentam, também, que o aumento progressivo da cesárea ocorre de
forma mais acentuada nas camadas sócio-economicamente privilegiadas, que
freqüentam clínicas privadas e/ou têm plano de saúde. Já nas classes menos
favorecidas, esses índices apresentam menores proporções e ocorrem
principalmente nos hospitais públicos ou em hospitais-escola.
Para Rattner (1996), a realização de cesariana, em termos institucionais e
societários, representa maior consumo de recursos hospitalares (centro cirúrgico,
leitos/dia, medicamentos, cuidados de enfermagem, e outros), e, portanto, maior
custo financeiro, sem se falar no custo derivado da mobimortalidade
É necessário considerar que, no parto, o fator mais importante é que mãe e
filho estejam saudáveis, o que acontece mais eficazmente, quando existe o
mínimo de intervenções. Sendo assim, pode-se inferir que o parto normal é menos
traumático para mãe e seu concepto e, com isso, a escolha pela cesárea deve ter
uma justificativa válida para que se possa interferir no processo natural do
nascimento. Partindo desse pressuposto, surgiu a necessidade de desenvolver
um estudo relacionado ao tema, com a seguinte pergunta de pesquisa: quais os
fatores que influenciam mulheres a optar pelo parto cesariano em um Hospital e
Maternidade X, tendo como objetivo; conhecer, através dos discursos de
puérparas, os fatores que influenciam mulheres a optar pelo parto cesariano, em
um Hospital e Maternidade X, de um município do estado da Bahia.
A importância do estudo reside no fato de, ao se conhecer tais fatores, nos
profissionais da saúde, possamos refletir sobre os meios que possam promover
a redução desse evento e, conseqüentemente, buscar meios que evitem as
possíveis complicações da cesariana, muitas vezes realizada indevidamente.
2. A CESÁREA BRASIL E NO MUNDO
Segundo Ziegel e Cranley (1985), a cesariana é uma operação pela qual o
feto é liberado através de uma incisão na parede abdominal e uterina.
Os primeiros relatos inerentes à essa cirurgia contemplam a antiguidade,
Textura, Cruz das Almas-BA, vol. 3, n.º 2, p. 82-95, Ago./Dez., 2008.
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onde, na cultura grega, afirma-se que o deus Apolo foi arrebatado do ventre de sua
mãe através de um corte após a morte da sua genitora. Ainda, segundo a historia,
este termo “cesárea,” foi uma homenagem ao imperador Júlio César, por ter
nascido dessa forma. Segundo Rezende (1989 apud Pilloso et al., 1999, p.22), “a
igreja católica tornou essa prática obrigatória durante a Idade Média, em casos de
emergências, principalmente quando ligado à morte materna”.
Até o final do século XIX, as estatísticas mundiais mostravam uma
sobrevida materna à operação cesariana que não ultrapassava 50%. A partir do
início da segunda metade desse século, as técnicas cirúrgicas evoluíram,
oferecendo significativa melhoria dos resultados obstétricos maternos e
perinatais, o que causou rápido aumento no número de indicações de parto
abdominal.
Com o aparecimento da anestesia e, posteriormente, da antibioticoterapia
na década de 40, do século passado, esse tipo de parto tornou-se mais seguro na
intenção de salvar a vida da mãe e da criança quando em situação de risco.
Entretanto, o aumento da incidência da cesárea ganhou altas proporções em
quase todos os países do mundo.
Cecatti et al., (2000, p. 175) lembram com muita propriedade, que:
Durante praticamente toda a década de 60 até quase metade
da década de 80, supunha-se que a cesariana melhorava o
prognóstico perinatal, que serviu como justificativa para o
aumento do número de cesárea neste período. Hoje já se
sabe que os principais determinantes da diminuição da
morbimortalidade perinatal em décadas anteriores foram os
avanços no tipo, qualidade e disponibilidade dos serviços
médicos em geral e dos obstétricos e neonatais em particular,
com a melhoria global na atenção a saúde materna, sem
relação com a via de parto.
Segundo Castro e Clapis (2005), a tecnologia e os estudos científicos, têm
proporcionado avanços inquestionáveis na qualidade da assistência obstétrica.
Destacando-se a evolução da operação cesariana que, de um procedimento
antes utilizado em mulheres mortas para salvar a vida fetal, passou a ser um
procedimento que, em algumas situações, proporciona segurança a vida, tanto da
mulher quanto do feto.
Assim, sustenta-se o fato de que a descoberta e o aperfeiçoamento dessa
técnica têm ajudado significativamente as ações médicas diante das
complicações obstétricas, porém torna-se preocupante o uso aleatório percebido
através da elevação do seu índice.
Cacitte (2000, p. 175) contribui inferindo que “no Rio de Janeiro e em São
Paulo, as taxas de cesárea já ultrapassam mais de 50% do total de partos”.
Uma pesquisa realizada pela Secretaria de Saúde de São Paulo (1994)
ilustra a seguinte situação: em um hospital filantrópico o índice de cesárea foi de
Textura, Cruz das Almas-BA, vol. 3, n.º 2, p. 82-95, Ago./Dez., 2008.
86
6,31% e no privado chegou a 86,41% (RATINER, 1996).
De acordo com a BEMFAM (1997 apud Barbosa et al., 2003, p. 1611):
A tendência de crescimento desse tipo de parto que alcançou
36% no Brasil com taxas maiores em São Paulo, 52% e na
região Centro-Oeste 49%, sendo as menores taxas na região
nordeste 20% e norte 25%. Observa-se ainda que sua maior
freqüência seja nas regiões urbanas 41,8% do que nas
regiões rurais 20,1%, além de se mostrar fortemente
associado ao grau de instrução da mulher, aumentando
progressivamente com número de ano de estudo.
Essa afirmação nos permite observar que o maior número de cesáreas está
presentes nas áreas urbanas e nos estados e regiões brasileiras mais
desenvolvidas. Além disso, a incidência está atrelada ao grau de escolaridade das
mulheres, pois, hoje, a escolaridade materna tem sido apresentada, como
variável independente, em trabalhos epidemiológicos que abrangem os mais
variados temas. Dessa forma, o maior grau de escolaridade está associado a
uma significativa taxa de parto cesárea.
2.1 O PARTO FISIOLOGICO NO BRASIL
Atualmente, o parto é visto não como um processo fisiológico, pelo qual o
útero gravídico expulsa o produto da concepção, por meio de contrações uterinas
regulares, de intensidade e freqüência crescente. Porém, continua sendo visto
como ponto importante no processo da maternidade: dar a luz a uma criança não é
um ato fisiológico, mas um evento definitivo e desenvolvido em um contexto
cultural. (GOLDMAN, 2002 apud BARROS et al.; 2002).
É coerente a colocação de Domingues et al., (2004, p. 53) ao afirmarem
que:
A gravidez e parto são eventos marcantes na vida das
mulheres e de sua família. Representa mais do que um evento
biológico, já que são integrantes importantes da transição do
status de “mulher” para “mãe”. Embora a fisiologia do parto
seja a mesma, em nenhuma sociedade é tratado de forma
apenas fisiológico, pois é um evento biossocial, cercado de
valores culturais, sociais, emocionais e afetivos.
Dessa maneira, vê-se que é imprescindível que o sentimento e a satisfação
da mulher e de familiares sejam respeitados, e que a escolha do parto garanta
segurança para o binômio.
Para Lourdes e Carvalho (2004, p. 34, “Por muitos séculos o parto normal
era designado como um ato provindo da vontade divina que dominou a prática
Textura, Cruz das Almas-BA, vol. 3, n.º 2, p. 82-95, Ago./Dez., 2008.
87
obstétrica até ser substituída pela concepção de um ato originado pelo próprio
feto”. Ainda, segundo as autoras, enquanto o parto foi considerado um processo
natural, sua existência permaneceu desvinculada das práticas médicas e eram
atendidas por parteiras, com conhecimento próprio e solidário as mulheres na
hora de darem à luz, a ponto de adquirir importante papel na sociedade. Contudo,
a partir do século XIX, o parto passou a ser atendido por esses profissionais,
deixando, aos poucos, de acontecer no domicílio, e sim, no hospital.
Diante disso, observa-se que houve descaracterização do modo do
nascimento, pois a mulher saiu de um ambiente seguro e de respeito para outro
desprovido de tais preceitos. Além disso, o corpo da mulher passou pelo processo
de medicalização e também passou a sofrer os traumas das rotinas do hospital.
2.2 REALIDADE DA ASSISTÊNCIA OBSTÉTRICA NO BRASIL
Ao longo das últimas décadas, tem-se observado um movimento crescente
com novas políticas de saúde que assista a mulher de forma integral, universal e
igualitária. Nessa perspectiva, a assistência ao parto tem sido motivo de muitas
discussões no que se refere à qualidade do atendimento a mulher no pré-natal,
nascimento e puerpério.
Para Goldman (2002 apud Barros et al.; 2002) houve grandes progressos
na obstetrícia, assim como nos conceitos de assistência à mulher e na formação
dos profissionais de saúde envolvidos nessa área. Em relação à assistência ao
parto, existem preocupações por parte dos profissionais no sentido de se
aperfeiçoarem e nortearem sua prática em fundamentação cientifica, a fim de
garantir qualidade na assistência.
Segundo Bio et al. (2006), o Ministério da Saúde (MS) manifesta certa
preocupação com o parto, quando lançou no Brasil, em junho/2000, o Programa
de Humanização do Parto e Nascimento, formalizando e evidenciando iniciativas
já existentes, no sentido de se recuperar participação ativa da parturiente em todo
o processo do parto. Porém, sua atuação não se deu de forma homogênea no
País, sendo difícil avaliar seu impacto sobre a saúde da mulher, dada à
complexidade das ações e o grande conjunto de variáveis envolvidas.
Ainda, na perspectiva de melhor assistência ao parto, em 1996, o Ministério
da Saúde, em parceria com FEBRASGO, UNICEF e OPAS, lançou o projeto
Maternidade Segura, que pretendia reduzir a mortalidade materna e perinatal.
(BRASIL, 2001).
Esses programas buscam implementar uma atenção à parturiente, menos
intervencionista, destacando-se, dentre elas: práticas baseadas em evidências,
menor uso de tecnologias, maior incentivo e ajuda para o parto vaginal.
Textura, Cruz das Almas-BA, vol. 3, n.º 2, p. 82-95, Ago./Dez., 2008.
88
2.3 INFLUÊNCIAS NOS ALTOS ÍNDICES DE CESÁREAS NO BRASIL
A prática intervencionista, que cresce significativamente no Brasil, não está
pautada apenas na preferência médica e de mulheres que fazem esse tipo de
opção, mas, também, é influenciada por fatores sócio-culturais, institucionais e
legais.
Segundo Faúndes (1991), o que contribui para alta incidência de cesárea, é
a idéia de que, sendo decidida com antecedência permitirá, a mulher, um parto
sem dor e garante ao médico não tomar mais de uma hora do seu tempo. Ao
contrário, o parto normal pode ocorrer a qualquer dia, noite, finais de semana,
feriados, pois suas demandas são imprevisíveis. Outros fatores que acarretam a
prática da cesárea são a incerteza quanto à possibilidade de hipóxia ou trauma
fetal durante o trabalho de parto, bem como a presença de profissionais que não
possuem bom treinamento obstétrico.
Barbosa et al. (2003) enfatizam alguns fatores que influenciam mulheres a
optar por cesariana como: organização obstétrica pautada pela conveniência de
uma intervenção programada e pela segurança médica, decorrente de
treinamento insuficiente na gama de variações, que ocorrem durante o desenrolar
de um parto normal, o não pagamento de anestesia peridural para parto vaginal
pelo SUS; a esterilização cirúrgica; o medo da dor; as lesões anatômicas e
fisiologia da vagina, e a crença de que o parto vaginal é mais arriscado do que a
cesárea.
Enfim, quando a mulher opta pela cesariana pressupõe-se que ela já
conhece suas particularidades. No entanto, estudos comprovam que há uma total
indiferença dessas mulheres, relacionada aos reais riscos da cirurgia, que são
superados pela confiabilidade oferecida por seus obstetras.
3. PERCURSO METODOLÓGICO
Trata-se de um estudo qualitativo, que, segundo Minayo (2006), essa
abordagem aplica-se ao estudo das relações, das representações, das crenças,
das opiniões, dos produtos das interpretações que os humanos fazem,
relacionado à como vivem, pensam, sentem, constroem seus artefatos e a si
mesmo. Este estudo foi realizado com 09 puérperas no pós-operatório, e foi
desenvolvido no período de fevereiro a dezembro de dois mil e sete, no município
de Sapeaçu-Ba. A coleta de dados se deu através de entrevista semi-estruturada.
O estudo seguiu às normas éticas da pesquisa, conforme a Resolução
196/96, do Conselho Nacional de Saúde, que estabelece critérios éticos para
pesquisa com seres humanos, respeitando os sujeitos em sua integralidade e
dignidade, destacando-se a aprovação do projeto por Comitê de ética em
pesquisa e a assinatura do termo de consentimento livre e esclarecido, pelos
sujeitos do estudo.
Textura, Cruz das Almas-BA, vol. 3, n.º 2, p. 82-95, Ago./Dez., 2008.
89
4. APRESENTAÇÃO E DISCUSSÃO DE RESULTADOS
Nesse item apresentamos os diversos fatores para a opção pelo parto
cesariano, demonstrado pelas mulheres do estudo, conforme categorias e
subcategorias discutidas abaixo.
4.1 MEDO DA DOR
Nessa subcategoria foi percebido que as mulheres ficam apreensivas
quanto ao fato de sentir dores no trabalho de parto e no parto. Portanto, a cesárea
é para essas mulheres, a possibilidade de realização do parto sem qualquer dor.
Podemos confirmar isso na fala a seguir:
É também devido a primeira ser cesariana eu não podia ter a
segunda normal, só que eu gostei de ter cesariana porque eu
não suporto sentir dor [...] (Compreensiva)
Constatam-se, na literatura pertinente, diversas interpretações para a dor,
tornando-se pertinente relatar que em 1979, o comitê de taxonomia da Associação
Internacional de Estudo da dor, como uma experiência sensorial e emocional
desagradável, relacionado-a a um dano tissular real, ou potencial, ou descritivo
em termo desse dano.
Segundo Brasil (2001), as dores do trabalho de parto e parto estão
associadas aos fatores inerentes a este evento como dilatação do colo uterino,
distensão das fibras uterinas e do canal do parto, tração de anexos esse peritôneo
bem como a pressão sobre as raízes do plexo lombossacro. Sobre o mesmo
aspecto, Pereira (1998 apud BUENO, 2006) ressalta que a dor do parto é
produzida do próprio canal e no períneo, sendo irradiada através do nervo
pudendo, que é responsável por todas as inervações sensitivas e motoras no
canal do parto, caracterizando-se como uma dor somática.
Para Figueiredo (2002), a dor experimentada durante o parto não é
facilmente esquecida. Algumas mulheres relembram, muitas vezes, a dor intensa
que sentiram como em uma situação traumática, o que impedem algumas delas
de engravidar novamente ou a optarem por cesárea. Faúndes e Cecatti, (1991)
acrescentam, referindo que alguns dos fatores que predispõe a opção das
mulheres pelo parto cesariano, são: o medo da dor no momento do parto e a
possibilidade de evitar dores após a cirurgia, através da utilização de fortes
analgésicos.
4.2 MANUTENÇÃO DA INTEGRIDADE DO PERÍNEO
As puérperas entrevistadas relataram que a cesárea permite à mulher a
integridade perineal e vaginal, com ganhos significativos no coito, não perdendo
Textura, Cruz das Almas-BA, vol. 3, n.º 2, p. 82-95, Ago./Dez., 2008.
90
assim, sua sexualidade que está diretamente relacionada à imagem estética da
genitália feminina.
É que as pessoas ficam falando... . [...] preferi fazer minha
cirurgia cesariana aqui porque cortar na barriga e dar
anestesia, e a dor é menos e continua virgem. (Amorosa)
Segundo Bueno (2006), a maioria das parturientes apresenta solução de
continuidade na região vulvo-perineal no parto, pois quando o feto passa pelo
canal vaginal exige uma elasticidade natural. Não ocorrendo tal fator, faz-se
necessário a episiotomia ou laceração, sendo freqüentemente corrigido por meio
de epsiorrafia; que se configura como uma sutura das mucosas perineais e
tecidos adjacentes.
Essa afirmação de Bueno provoca em muitas mulheres ainda hoje a idéia
de defenderem o parto cirúrgico, pois ele manterá intacta a anatomia e fisiologia
do períneo e não prejudicará o coito normal (PELOSO et al.; 1999). Sobre o
mesmo assunto Cecatti (2000) refere que a integridade do períneo prejudicado
encontra-se ligado aos fatores culturais, no qual o parto normal é visto pelas
mulheres como um evento marcante e capaz de levar a perda da função sexual.
4.3 CONTRACEPÇÃO CIRÚRGICA COMO RESPONSABILIDADE FEMININA
Os relatos das entrevistadas demonstraram que outro motivo relacionado à
cesárea é a comodidade de realizá-la conjuntamente à ligadura tubária.
É importante entendermos que a partir dos anos sessenta, do século XX,
surgir por parte das mulheres, a preocupação com a contracepção. Nesse
período, as mulheres brasileiras começaram a se desvincular do papel social que
lhes era atribuído pela maternidade, introduzindo-se no mercado de trabalho e
ampliando suas aspirações de cidadania. A esterilização apareceu como modo de
controlar a fecundidade e praticar a anticoncepção, bem como para uma vivência
plena da sexualidade, desvinculando a maternidade do desejo e da vida sexual
(COSTA 2006).
A esterilização feminina continua sendo o método anticoncepcional mais
usado pelas mulheres brasileiras. Os Conselhos de Medicina não têm
recomendado a esterilização como um procedimento ético, afirmando que
médicos que realizam a esterilização poderiam ser enquadrados em um artigo do
código penal, que estabelece como crime a perda de órgãos ou funções orgânicas
(CRMESP, 1988).
Sabe-se que por razões éticas e para evitar o arrependimento, a
orientação, o aconselhamento, e a posse total das informações pertinentes à
esterilização, são fundamentais durante o processo de decisão sobre a
esterilização. No entanto, a clandestinidade em que é realizada essa cirurgia não
propicia que a candidata à esterilização seja orientada, pois ela, muitas vezes,
Textura, Cruz das Almas-BA, vol. 3, n.º 2, p. 82-95, Ago./Dez., 2008.
91
acontece simultaneamente à cesariana (VIEIRA, 1998).
Sobre isso, Berquó (apud Tedesco 2004) comenta que a demanda da
laqueadura, concomitante a cesárea, é também responsável pelas altas
incidências de cesárea no País. Fator este bem definido pela maioria das
entrevistadas.
Já comentaram que era melhor, mais em questão assim são
muitas dores e no parto normal a gente só sente dor na hora e
o repouso é totalmente diferente. Na segunda gestação na
verdade eu escolhi porque ia fazer ligadura e em questão o
parto normal é bem melhor. (Amorosa)
Observa-se na fala da entrevistada, que não existe nenhuma preocupação
com a fase posterior ao parto cesariano. A questão principal é evitar uma próxima
gravidez o que mostra a influência cultural, na qual estão inseridas. Nesse
contexto, a mulher é forçada a ser responsável pelo controle familiar e para isso
muitas delas submetem-se a intervenção cirúrgica, não importando se isso lhes
acarretará riscos.
4.4 COMPLICAÇÕES OBSTÉTRICAS
Sabe-se que o emprego das cesáreas deve estar envolvido com indicações
clínicas pertinentes à gravidez e ao parto. Esse fato foi evidenciado nas falas
abaixo.
Porque passou da data de nascer, aí o médico disse que tinha
que fazer uma cesariana, no caso não tava sentindo dor, só
que não tinha como ter normal, porque não tinha passagem,
aí optou pela cesariana. Só a barriga que tá cortada, mas é
normal se tem que ser! (Amiga)
Segundo Costa (2005), o parto cirúrgico, nas últimas décadas, passou a ser
utilizado sem justificativa obstétrica adequada, levando a uma medicalização
excessiva, um processo natural e fisiológico que é o parto.
Para Cecatti (2000), o parto cesariano é uma alternativa médica, usada em
situações, onde as condições materno-fetais não favorecem o parto vaginal.
Apesar do reconhecimento da contribuição dessa intervenção para uma melhor
assistência à saúde e da segurança da cesárea moderna, é importante que sua
indicação seja criteriosa, pois não é um procedimento isento de riscos adicionais
para a mãe e a criança.
Há diversos critérios clínicos que indicam o parto cesariano, e somente eles
são suficientes para justificá-lo, sendo as principais indicações obstétricas para a
sua realização: sofrimento fetal, distócia funcional, patologia materna grave,
Textura, Cruz das Almas-BA, vol. 3, n.º 2, p. 82-95, Ago./Dez., 2008.
92
líquido amniótico meconial, apresentação pélvica, oligodrâmnio, gestação
gemelar, má formação fetal, infecção materna pelo HIV, ruptura prematura da
placenta, entre outros.
4.5 A DOR, O EQUÍVOCO E A INSATISFAÇÃO DO PARTO CESÁREO
A experiência da cesárea revelou-se para a maior parte das mulheres
entrevistadas como um fenômeno difícil, principalmente devido aos incômodos
pós-operatórios. Estes prejudicam a interação do binômio mãe-filho, e ainda
resulta em dependência de outras pessoas, até mesmo, nos cuidados pessoais.
[...] agora fiz a cesárea porque eu opinei pra ligadura, porque
fazia de uma vez só, a recuperação é muito mais difícil do que
o parto normal você sente menos dor, o parto cesáreo você
sente muito mais dor é difícil para andar, pegar o nenê. Tem
que dá repouso... [...]. E o parto normal é bem menos, é
opinião de cada um, mais eu se não fosse ligar queria normal.
(Amiga)
Mulheres que passaram por um parto normal ou não, puderam fazer a
comparação e conseguiram avaliar com precisão o parto cesariano, e o fez
negativamente. Dentre os muitos problemas citados, incomodam-nas, muito, o
fato de não poderem relacionar-se adequadamente com seus bebês. Sobre isto
Figueiredo (2002) afirma que o parto cesariano traz um impacto adverso sobre a
percepção e satisfação da mulher, por repercutir no sentimento da mãe com o
bebê, pois ela passa menos tempo com o ele, tem dificuldade de interagir e de
pegá-lo no colo.
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Considerando que o parto é um evento social que integra a vivência
reprodutiva de homens e mulheres, é relevante pensarmos nas elevadas taxas de
cesáreas em nosso País. Observa-se que essa alta incidência não está pautada
apenas na preferência médica e de mulheres que optam por este parto, mas
também é influenciada por fatores sócio-culturais, institucionais e legais.
Este estudo, portanto, buscou conhecer através dos discursos das
puérperas os fatores que as influenciaram a optar pelo parto cesariano em um
hospital/maternidade do interior da Bahia. Constatamos-se que existem
motivações que contribuem para a escolha da cesárea como: o medo da dor no
trabalho de parto e parto, a perda da integridade do períneo, a concepção cirúrgica
e as complicações obstétricas.
Verificamos que, algumas mulheres, mostraram-se, apreensivas quanto ao
Textura, Cruz das Almas-BA, vol. 3, n.º 2, p. 82-95, Ago./Dez., 2008.
93
fato de sentirem dor no trabalho de parto e parto. Sendo, portanto, a cesárea a
possibilidade de realização do parto sem qualquer dor. Outras relataram que a
cesárea permite à mulher a integridade perineal e vaginal, com ganhos
significativos no coito, não perdendo, assim, sua sexualidade que está
diretamente relacionada à imagem estética da genitália feminina.
Observamos, também, que a esterilização é, um motivo relevante para a
escolha do parto cesariano, sendo a questão principal é evitar uma próxima
gravidez, o que mostra a influência cultural na qual estão inseridas. Nesse
contexto, a mulher é forçada a ser responsável pelo controle familiar e, para isso,
muitas delas submetem-se a intervenção cirúrgica, mesmo com os riscos.
A experiência da cesárea revelou-se para a maior parte das mulheres
entrevistadas como um fenômeno difícil, principalmente devido aos incômodos
pós-operatórios, os quais prejudicam a interação do binômio mãe-filho e, ainda,
resulta em dependência de outras pessoas, até mesmo, para os cuidados
pessoais.
Assim, foi permitido perceber que a decadência na assistência adequada,
durante a gestação e o déficit de informações, por parte de algumas mulheres,
podem influenciar a escolha pelo parto cesariano. Desse modo. é importante que
o profissional de saúde conheça os agravos inerentes a esse ato intervencionista,
para informar, acompanhar, e ajudar a gestante na melhor escolha, que deve
garantir, principalmente, segurança para mãe e filho.
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Textura, Cruz das Almas-BA, vol. 3, n.º 2, p. 82-95, Ago./Dez., 2008.
EDUCANDO OS CUIDADORES DE RECÉM-NASCIDOS NA
PERSPECTIVA DA PREVENÇÃO DE ONFALITES1
EDUCATING CAREGIVERS OF INFANTS IN VIEW OF PREVENTION
ONFALITES¹
Lucas Amaral Martins 2, Ises Gabriela2, Eliane Fonseca Linhares3,
Rosália Teixeira de Araújo4, Eduardo Nagib Boery5
RESUMO
O presente estudo, fundamentado no Projeto de Extensão “Programa Educativo:
Saúde do Coto Umbilical”, teve como objetivo capacitar os discentes do Curso
Técnico de Enfermagem na sistematização dos conhecimentos, acerca dos
cuidados com o coto umbilical e desmistificar as crenças e tabus relacionados aos
cuidados com o coto umbilical. Trata-se de um estudo exploratório, de natureza
qualitativa, baseado na problematização, com o intuito de socializar experiências
com oficinas pedagógicas. Teve como amostra 15 discentes da Escola Técnica de
Enfermagem de Jequié. Foi possível constatar, nos resultados, pontos positivos e
uma boa aceitação das informações transmitidas pelos facilitadores durante a
oficina, atingindo uma das propostas do Projeto que é a sensibilização dos futuros
profissionais de saúde nas questões relacionadas com o recém-nato. Concluímos
que a oficina contribuiu de forma eficaz na capacitação dos discentes do Curso
Técnico de Enfermagem, quanto à aquisição de conhecimentos acerca da
prevenção das onfalites, o que favorece melhor qualidade de vida para o recémnato, tornando-os multiplicadores de conhecimentos.
PALAVRAS-CHAVE: cuidado, coto umbilical, tabus, recém nato.
ABSTRACT
This study, based on Project Extension Program Education: Health of Coto
Umbilical "aimed to empower the students of the Technical Course of Nursing in
systematization of knowledge about the care of the umbilical stump and demystify
the beliefs and taboos related to the care umbilical stump. This is an exploratory
1
Projeto de extensão financiado pela UESB; 2 Discentes do Curso de Graduação em Enfermagem da
Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia – UESB; 3Docente do Curso de Graduação em
Enfermagem da Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia – UESB e Coordenadora do Projeto de
Extensão: Saúde do Coto Umbilical; 4Professora Mestre do Curso de Graduação em Enfermagem da
Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia – UESB; 5Professor Doutor do Curso de Graduação em
Enfermagem da Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia.
Textura, Cruz das Almas-BA, vol. 3, n.º 2, p. 96-102, Ago./Dez., 2008.
97
study of qualitative nature, based on questioning, to socialize with experience
teaching workshops. Was to sample 15 students from the Technical School of
Nursing Jequié. It was possible to see positive results and good acceptance of the
information provided by the facilitators during the workshop, to one of the proposed
Project is the awareness of future health care professionals on issues related to the
newborn. We conclude that the workshop contributed effectively in the training of
students of the Technical Course of Nursing on the acquisition of knowledge about
the prevention of omphalitis, which promotes a better quality of life for the newborn,
making it the multiplier of knowledge.
KEY WORDS: care, umbilical stump, taboos, newly born.
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1. CONSIDERAÇÕES INICIAIS
Com o propósito de estender os conhecimentos adquiridos nos estudos e
práticas das temáticas do cuidado com os recém-natos, inerentes ao coto
umbilical, foi realizada a oficina: “Educando os Cuidadores de Recém-Natos na
Perspectiva da Prevenção de Onfalites”, que surgiu a partir do convite da Escola
Técnica de Enfermagem de Jequié, pela necessidade de promover educação em
saúde aos seus discentes, sendo organizada pelo Projeto de Extensão
Continuada Programa Educativo: Saúde do Coto Umbilical da Universidade
Estadual do Sudoeste da Bahia (UESB), coordenado por docente do
Departamento de Saúde dessa Universidade.
O coto umbilical é sítio habitual de infecção neonatal, porta de entrada de
fácil acesso para bactérias que, penetrando na circulação geral do bebê
(permeabilidade dos vasos umbilicais), podem determinar graves complicações.
Além disso, qualquer bactéria que o penetre atingirá facilmente órgãos nobres,
tais como: fígado, pulmões, coração e cérebro. Portanto, o perigo de um quadro
séptico é bem maior (FONTES, 1991).
As infecções na região umbilical formam o chamado granuloma umbilical e
constituem, também, ponto de partida dos processos mais graves: septicemias,
abscessos hepáticos, tétano, peritonite e erisipela (REZENDE, 2005).
Das infecções umbilicais, a mais grave é o Tétano Neonatal, uma doença
que produz hipertonia da musculatura estriada e paroxismos de convulsões
tônicas, que se intensificam com estímulos externos como: luz, ruídos e
manipulações, comprometendo funções vitais do organismo. Sua ocorrência
deve-se à falta de assistência médica, parto domiciliar e más condições de
higiene, como o seccionamento do cordão umbilical com materiais contaminados
ou a aplicação de produtos contaminados por esporos do bacilo tetânico
.(MIURNA, 1997)
É notório que nos últimos anos vêm reduzindo as notificações de incidência
do tétano neonatal, que é a onfalite com alto índice de letalidade. Conforme
informações do Ministério da Saúde (MS), no Brasil, em 2005, das 10 notificações
de Tétano Neonatal, 08 foram a óbito. Sendo assim, ainda é uma preocupação
dos profissionais de saúde, por ser uma patologia que pode ser evitada,
principalmente por meio da vacinação das gestantes durante o pré-natal.
O banho é fator predisponente na manifestação de onfalites, quando a
secagem da região umbilical não é realizada de forma criteriosa. Alguns autores,
como Rezende e Marcondes (2005), não recomendam molhar a região umbilical
até que ocorra sua queda. Tal afirmação tem sido observada durante as visitas
domiciliares do referido Projeto, pois quando não ocorre a secagem adequada do
coto umbililical, após o banho do recém-nato, a manifestação das onfalites são
mais freqüentes, fato observado, também, quando do uso da fralda cobrindo o
coto umbilical.
Este estudo teve como objetivos capacitar os discentes do Curso Técnico
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de Enfermagem na sistematização dos conhecimentos acerca dos cuidados com
o coto umbilical, e desmistificar as crenças e tabus relacionados aos cuidados
com o coto umbilical. É importante salientar que a falta de informações corretas
vinculadas por profissionais não capacitados levam os cuidadores dos recémnascidos a uma resistência de aceitação dos métodos preconizados por Rezende
(2005), Ministério da Saúde (2005) entre outros.
2. MATERIAL E MÉTODOS
Este estudo consiste em um relato de experiência, vivenciado por docentes
e discentes do Curso de Graduação em Enfermagem da Universidade Estadual
do Sudoeste da Bahia, Campus de Jequié, durante a realização de oficina
intitulada “Educando os Cuidadores de Recém-Natos na Perspectiva da
Prevenção de Onfalites”, com os discentes da Escola Técnica de Enfermagem de
Jequié. Esta atividade consistiu de uma das ações do Projeto de Extensão
Continuada Programa Educativo: Saúde do Coto Umbilical, no dia 14 de setembro
de 2007.
A oficina foi realizada com os discentes que estavam cursando a Disciplina
Saúde da Mulher; todos procedentes do estado da Bahia, a maioria do sexo
feminino, contabilizando uma população de 15 discentes. Foi pautada no método
da problematização, sendo um estudo exploratório, de natureza qualitativa. Foi
aplicado em primeiro momento, um questionário a fim de avaliar os
conhecimentos dos discentes acerca dos cuidados com o recém-nato e
complicações com o coto umbilical. Em seguida foram realizadas palestras e
orientações práticas, com a utilização de um boneco, a fim de detectar ações
impróprias na realização desses cuidados e, posteriormente, mostrando-lhes as
técnicas adequadas. Para tanto, foram utilizados bonecos, banheiras e outros
materiais, fazendo-se simulações de situações cotidianas. Ao término da oficina
aplicou-se um segundo questionário para que os discentes pudessem avaliar a
contribuição desse trabalho para a formação profissional.
Os aspectos éticos da Resolução 196/96, do Conselho Nacional de Saúde,
que delibera acerca da pesquisa envolvendo seres humanos foram respeitados,
Nesse sentido, os informantes foram esclarecidos quanto à pesquisa, e sua
participação só foi iniciada após a assinatura do termo de consentimento livre e
esclarecido, que por sua vez contém as informações sobre a garantia do
anonimato, respeitando os valores culturais, sociais, morais e religiosos, e a
garantia do livre acesso aos resultados da pesquisa.
3. RESULTADOS E DISCUSSÃO
Os dados foram analisados a partir das observações contidas nos
questionários e discussões durante a oficina.
A priorI é imprescindível ressaltar a receptividade do grupo alvo, desde o
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momento em que nos alocamos em sala para o desenvolvimento da oficina, bem
como a integração dos mesmos, o que só veio somar no decorrer das atividades.
Dentre os participantes, foi observado que alguns já tinham filhos e outros já
haviam realizado cuidado com o coto umbilical, e banho do recém-nato, durante
prática de formação profissional.
Os participantes dispuseram-se a colaborar de forma ativa na oficina,
sendo solicitado que eles, voluntariamente, demonstrassem suas habilidades no
cuidado com o recém-nato em bonecos, realizando desde o banho até os
cuidados com a região umbilical. Durante essa prática pode-se avaliar os
conhecimentos referentes as condições com recém-nato.
Pudemos perceber a aplicação de conhecimentos empíricos nas suas
atuações, realizando os cuidados de forma insatisfatória, contrariando o que
preconiza o Ministério da Saúde, Rezende, Linhares e outros. Em seguida, os
facilitadores demonstraram as formas adequadas na realização de tais cuidados.
Através da análise dos dados obtidos, pode-se observar que apenas 33,3%
dos participantes da oficina conheciam o antisséptico adequado (álcool etílico a
70%) utilizado no cuidado do coto umbilical do RN, recomendado por Rezende,
Ministério da Saúde (MS), Linhares e outros. Observam-se, também, que 100%
dos participantes não souberam conceituar Tétano Neonatal, sendo que apenas
46,6% sabiam o que era uma onfalite. Com isso, é notório a real necessidade da
realização de treinamentos e divulgação dos cuidados com o recém-nato aos
profissionais de saúde, para que possam reduzir e/ou erradicar a ocorrência de
onfalites em RN na cidade de Jequié e região.
Na avaliação final da oficina foi possível constatar resultados positivos e a
boa aceitação das informações transmitidas pelos facilitadores, durante a sua
realização, correspondendo a proposta do projeto que é a sensibilização de
futuros profissionais de saúde para as questões relacionadas com o recém-nato e
que podem ser observadas com os relatos a seguir, nos quais os nomes dos
participantes foram substituídos por nomes de flores:
“...tirei as minhas dúvidas, mitos que ainda existe nos dias
atuais; Dar o banho correto, limpeza do coto umbilical isso é
muito importante para nós que seremos profissionais de
saúde. E futuramente para os meus próprios filhos...”
(Orquídea)
“...o grupo esclareceu dúvida, demonstrou a maneira correta
de dar banho e os cuidados com o coto umbilical (...) com
certeza será de grande utilidade para nosso futuro
profissional.” (Violeta)
“Gostei dos conhecimentos passados durante essa oficina,
aprendemos como dar banho no bebê, cuidar do coto
umbilical, não sabia de nada que foi passado na aula; uma
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experiência que vai nos ajudar bastante.” (Margarida)
“...elevou mais os meus conhecimentos, com relação ao
cuidados adequado: banho, limpeza (no coto umbilical).
Coisas que eu achava está correto. E realmente não estava.
Realmente foi muito proveitoso e satisfatório.”(Rosa)
Esses relatos nos motiva a desenvolver ações educativas para esclarecer
esses agravantes, pois contribuem, de forma eficaz, para a redução das onfalites,
favorecendo melhor qualidade de vida para o recém-nato, alem de capacitar
futuros profissionais de saúde a lidar com essa problemática, tornando-os
multiplicadores de conhecimentos.
4. CONSIDERAÇÕES FINAIS
A formação de profissionais técnicos de enfermagem requer um ensino de
qualidade, que lhe confira competência na realização de atividades assistenciais.
Para tanto, o Projeto de Extensão Continuada Programa Educativo: Saúde do
Coto Umbilical, busca desenvolver atividades teórico-práticas, levando os
conhecimentos científicos, relacionados ao cuidado do coto umbilical, à toda
comunidade intra e extramuros, através das suas ações educativas, tais como:
palestras nas Unidades Básicas de Saúde, cadastramentos de puérperas,
distribuição de materiais educativos e de antisséptico (álcool a 70%) às gestantes
e às puérperas admitidas na Unidade de Alojamento Conjunto da maternidade do
Hospital Geral Prado Valadares, visitas domiciliares, oficinas, realização de
treinamento aos Agentes Comunitários de Saúde (ACS), bem como aos
estudantes de enfermagem da UESB, Faculdade de Tecnologia e Ciências – FTC;
e da Escola Técnica de Enfermagem de Jequié, e aos profissionais Enfermeiros.
Concluímos que, através da realização dessa oficina, houve uma
aprendizagem, e apreensão de conhecimentos científicos, teóricos e práticos, das
informações trazidas aos discentes. Sendo assim, identificamos que o
desenvolvimento dessa prática foi de grande relevância aos futuros técnicos de
enfermagem.
Concluímos, ainda, que as medidas de prevenção devem ser tomadas em
conjunto, em complexo de atividades, fundamentadas em ações educativas, que
dêem suporte aos profissionais para atuarem adequadamente no cuidado com
RN, especialmente aquele relacionado ao coto umbilical, desempenhadas por
uma equipe profissional coesa, onde todos trabalhem com os mesmos objetivos.
Assim, a oficina foi considerada válida como estratégia de educação em saúde,
pois proporcionou a participação dos discentes, sanando algumas de suas
dúvidas e desmistificando algumas das crenças e tabus referentes ao tema.
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REFERÊNCIAS
BRASIL. Ministério da Saúde. Pré-natal e puerpério. Atenção qualificada e
humanizada. Manual Técnico. Brasília-DF: Editora MS, 2005.
FONTES, J. A. S. Perinatologia, ciência e arte. São Paulo: Fundo Editorial BYK,
1991.
LINHARES, ELIANE F. A Saúde do Coto Umbilical. 2 ed. Jequié: Impressora
Azevedo, 2002.
MIURNA, Ernani. Neonatologia: princípios e práticas. 2 ed. Porto Alegre: Artes
Médicas, 1997.
REZENDE, J. de. Obstetrícia. 5 ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2005.
Textura, Cruz das Almas-BA, vol. 3, n.º 2, p. 96-102, Ago./Dez., 2008.
O LUGAR DO INTELECTO E A EDUCAÇÃO EM SCHOPENHAUER
THE POST OF THE INTELLECT AND EDUCATION IN SCHOPENHAUER
André Luiz Simões Pedreira¹
RESUMO
Este artigo tem como objetivo apresentar “O Lugar do Intelecto e a Educação em
Schopenhauer”, cuja filosofia possui a Vontade, metafísica e irracional, como
conceito fundamental. Essa Vontade excede em força o intelecto, o que vem a
ocasionar sua primazia sobre ele, que se torna para ela um mero instrumento para
efetivação dos seus interesses. O intelecto e as coisas do mundo visível situam-se
no plano dos fenômenos, passíveis às mudanças do tempo e ao aperfeiçoamento,
enquanto que a Vontade é intemporal, imune às marcas tempo, pois é a coisa em
si. Por esse caráter secundário do intelecto, diante de uma Vontade poderosa, que
a tudo impregna e dirigi, pode-se constatar a impossibilidade de uma ética
prescritiva, pois a Vontade é livre, sem razão (grundlos) e ateleológica. O que é
possível ao intelecto é a mudança da forma, ou caminho, como a Vontade se
manifesta, mas isto não implica a alteração do seu escopo, ou seja, das suas
intenções originárias.
PALAVRAS-CHAVE: Intelecto; vontade; educação; moral; natureza.
ABSTRACT
This article aims to present “The place of the intellect and the education in
Schopenhauer”, whose philosophy has the Will, metaphysics and irrational, as
fundamental concept. Will this go beyond the intellect into force, which has lead to
its primacy over it, it becomes a mere instrument to this effect to their interests. The
intellect and things of the world visible lie at the level of phenomena, subject to
changes and improvement of time, while Will is timeless, immune to marks time, as
is the thing itself. For this secondary character of the intellect before a Will
powerful, that everything impregnates and direct, you can see the impossibility of a
prescriptive ethics, as Will is free, without reason (grundlos) and ateleológica.
What can the intellect is the change of shape, or path, as the Will manifests itself,
but this does not imply a change to its scope, or of its intentions originate.
KEY WORDS: Intellect; will; education; moral; instrument.
¹Mestrando em Educação pelo Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal
da Bahia (3º semestre).
Textura, Cruz das Almas-BA, vol. 3, n.º 2, p. 103-112, Ago./Dez., 2008.
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1. INTRODUÇÃO
Na tradição filosófica, Schopenhauer é considerado o primeiro filósofo que
se opõe ao racionalismo, ao afirmar, de forma sistemática, que o cerne do mundo
é irracional, fundamentalmente oposto à razão. Para ele, que recebera uma forte
influência da filosofia kantiana, o noumeno é a Vontade metafísica, raiz
constitutiva de tudo que compreende o mundo, tendo como característica
precípua a ateleologia, que por sua vez funda o irracional. No olhar do filósofo de
Danzig, ainda que de natureza incognoscível, o conhecimento da Vontade pode
ser dado internamente, à maneira momentânea, através do nosso corpo, não
provindo do conceitual, mas do sentimento, isto é, do intuitivo. O sentimento tornase via de acesso a Vontade noumênica, que é una, embora cada sujeito a entenda
como vontade particular, ficando a razão como mero instrumento para efetivação
de seus interesses. Conforme as premissas dessa filosofia, só o homem é dotado
de razão, sendo esta a característica que o difere das outras formas de vida. Pela
razão o homem torna-se capaz de abstração, tomando consciência de sua finitude
e subserviência à Vontade metafísica cuja objetidade mais perfeita é a vontade
humana.
Esta vontade, uma só e idêntica em todos os seres, tende
em todos os lugares apenas para um “único fim” que é o de
se objetivar na vida e na existência, sob forma
infinitamente variadas e diferentes, que resultam da sua
adaptação às circunstâncias exteriores: são como
variações numerosas de um mesmo tema musical.
(SCHOPENHAUER, MVR, 2001, p. 231).
A psicologia de Schopenhauer tem a Vontade de vida – Wille zun Leben –
como conceito central, cujas teses capitais são as seguintes: a primeira, da
separação entre intelecto e querer, a segunda, da primazia da vontade sobre o
intelecto. A partir dessas duas teses, podemos concluir que a vontade excede em
potência o intelecto, que representa a consciência. O intelecto não é apenas uma
faculdade do homem, mas também dos animais, pois eles são capazes de
representações intuitivas, porém somente aos homens, pela faculdade de razão,
torna-se possível à abstração acerca das intuições e, por conseguinte, a formação
de conceitos, tarefa específica da filosofia. Assim diz Schopenhauer:
Mas tal conhecimento é intuitivo, é conhecimento in
concreto. Reproduzi-lo in abstrato, ou seja, elevar as
intuições sucessivas que se modificam, bem tudo o que o
vasto conceito de sentimento abrange e meramente indica
como saber negativo, não abstrato, obscuro, a um saber
permanente – eis a tarefa da filosofia. Esta, por
conseguinte, tem de ser uma expressão in abstrato da
Textura, Cruz das Almas-BA, vol. 3, n.º 2, p. 103-112, Ago./Dez., 2008.
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essência do mundo, tanto em seu todo quanto em suas
partes. (SCHOPENHAUER, 2005, p. 137).
Essa subjugação do intelecto a um papel secundário provocou uma
verdadeira revolução na história do pensamento universal, que sempre repousou
suas convicções acerca do homem/mundo na razão, compreendida como
manifestação de uma inteligência capaz de impregnar todas as coisas e as dirigir
para fins determinados. A razão, filosofia, ora apresentada, passou a ter uma
função meramente instrumental, não sendo o móvel primeiro que conduz à ação,
como afirmara a tradição. Por tal constatação, torna-se possível apenas a
educação do intelecto, isto é, do conhecimento do próprio caráter, mais isto não
implica em uma mudança de sua natureza. Pelo intelecto é possível mudar a
forma de manifestação da Vontade, mas jamais o seu alvo.
Pode-se transformar a ação, mas não o próprio querer, ao
qual somente pertence o valor moral. Não se pode mudar o
alvo para o qual a vontade se esforça, mas apenas o
caminho que ela trilha para atingi-lo. O ensinamento pode
mudar a escolha dos meios, mas não dos últimos fins
gerais; cada vontade os põe de acordo com sua natureza
originária. (SCHOPENHAUER, SFM, 2001, p. 198).
Ao se objetivar, a Vontade cria um mundo fenomênico que irá traduzir o seu
próprio dilaceramento interno, que revela sua insaciável insatisfação, provinda da
ausência de finalidade que a perpassa. Sendo desprovida de finalidade e não
tendo um objeto capaz de conter sua fúria violenta em busca de satisfação, a
Vontade contraria-se a si mesma, produzindo inúmeros sofrimentos, visivelmente
observados, nos diversos indivíduos, também chamados à existência temporal.
Todas as frustrações vividas pela vontade são concomitantemente sentidas
pelos indivíduos que por esta foram convocados a objetidade. Aqui, podemos
identificar uma relação de identidade entre vontade e corpo. “Meu corpo e minha
vontade são um só”. (JANAWAY, 2003, p. 57) Assim, as situações que se tornam
obstáculos para as demandas de realização da vontade causam desconforto ao
corpo, bem como o contrário. Portanto, o intelecto é fenomênico, pois é de
natureza assaz distinta da Vontade, que é intemporal, sendo apenas uma
ferramenta para perseguir seus intentos. Essa relação, por sua vez, é por analogia
e secundária, já que se trata de pontos de vista absolutamente distintos, a saber,
do mundo como representação e do mundo como vontade.
2. O STATUS FENOMÊNICO DO INTELECTO
No sistema de Schopenhauer, o intelecto não é uma instância
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determinante, mas sim a Vontade. Este é suscitado por esta como aquele que
deverá se desenvolver para pôr em marcha os seus interesses, como também
vem a lhe causar grandes insatisfações, pois a retirou de seu curso instintivo,
como é perceptível nos animais, com a entrada do conhecimento abstrato. Sem o
intelecto a vontade é um desejo nu, sem forma intelectiva alguma, pois aí há a
ausência de qualquer indício do conhecimento. Isso em nada altera a sua avidez.
O intelecto tem o cérebro como seu correspondente físico, enquanto lugar
onde residem as faculdades do conhecimento, sendo a consciência este mesmo
cérebro visto de uma outra perspectiva. Porém, estas duas perspectivas são
provenientes da condição fenomênica, já que a Vontade escapa a esta condição.
Com a morte, perece o intelecto juntamente com suas derivações: faculdade de
razão e consciência, mas permanece, porém, a condição metafísica de
possibilidade de seu aparecimento: a Vontade, que é eterna. “É paradoxal,
observa Schopenhauer; o que em nós teme a morte, a Vontade, não o deveria,
pois é imortal; já o que em nós não a teme, o sujeito do conhecimento, o intelecto,
deveria temê-la, pois é mortal”. (SCHOPENHAUER, 2004, p. XVII)
Segundo Pernin (1995), o caráter objetivo do intelecto na sua identidade
com o cérebro produz três formas de conhecimento: a primeira, de uma faculdade
onde se encontram as disposições para receber as impressões do mundo
sensível - afetação, a segunda, desta mesma faculdade torna-se possível a
intuição do mundo, a terceira, por sua vez, possibilita a formulação de
pensamentos, conceitos e juízos acerca dessas mesmas impressões, ou seja, o
surgimento de um eu consciente – razão. Mas estas perspectivas permanecem no
aspecto fenomênico da distinção kantiana entre noumeno e fenômeno. Assim,
podemos identificar na filosofia em estudo uma diferença entre sujeito
cognoscente e cérebro, ou seja, vista do interior, a vontade pode ser percebida
pela consciência interior e do exterior como cérebro.
Tendo um cérebro perfeitamente desenvolvimento, o sujeito representa
como também é representado por um outro igual a si mesmo, ou seja, torna-se
capaz de exercer a atividade do conhecer. Mas como sua existência em si mesma
é o querer-viver, que possui um excedente de força maior que o intelecto capaz de
conhecer, este não poderá deixar de ser subordinado. Como tudo que é
fenomênico ou físico, o intelecto encontra-se suscetível às mudanças causadas
pelo tempo, estando sujeito à perda de suas forças até o seu desaparecimento
com a emergência da morte.
Entre esses fatos, está a contraposição entre a fadiga do
intelecto e o caráter incansável da vontade; o conhecimento é
trabalho penoso, a vontade é espontânea; a atividade da
vontade é originária, contendo em si o seu próprio movimento,
ao passo que a atividade intelectual é derivada e forçada. A
vontade já surge pronta e acabada no recém-nascido (aqui o
filósofo invoca o testemunho de Cabanis). Por outro lado, o
intelecto se desenvolve lentamente, acompanhando o
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desenvolvimento do cérebro. (CACCIOLA, 1994, p. 122).
O intelecto possui graus de força que variam de um indivíduo para o outro.
Porém, a vontade sempre o acompanha, ao modo recôndito, em seus diferentes
traços, fazendo que um único fundamento permaneça em meio ao devir, que não
alcança a Vontade em si, pois que se encontra fora do espaço e do tempo. Por ser
físico, o intelecto é acessível ao aperfeiçoamento, à assimilação e ao treinamento,
ou seja, à educação. Neste movimento, o intelecto alcança um grau extremo de
lucidez e desenvolvimento, o que não significa dizer, que “[...] a conduta, que
depende diretamente de um ato eterno da Vontade (o caráter), seja
fundamentalmente mudada”. (PERNIN, 1995, p. 96) Quando Schopenhauer
chama atenção para a condição física do intelecto, quer evidenciar sua natureza
fenomênica em detrimento a Vontade, que é potência e fonte de todas as forças.
Sob o domínio do intelecto está a forma/caminho como os interesses da
vontade são realizados, mas isto não muda o alvo para o qual a vontade se inclina,
isto é, o seu conteúdo originário. A educação, em suas diferentes modalidades,
funciona apenas como uma inibidora das manifestações antimorais da vontade,
mas com isto não se obtêm uma mudança do seu caráter inteligível, que é
incorrigível. Deste ponto de convergência com Kant, Schopenhauer apresenta
sua definição das diversas tipologias de caráter encontrados no homem,
estabelecendo uma relação hierárquica entre eles. Há, pois, três tipos de
caracteres, a saber, caráter inteligível, caráter empírico e o caráter adquirido. O
caráter inteligível é metafísico e imutável, tendo a vontade por fundamento. O
caráter empírico é físico e manifesta o caráter inteligível, isto é, reflete-o na
exterioridade, enquanto o caráter adquirido, pela sucessão temporal e parcial
daquilo que é manifestado, permite ao sujeito a conclusão do que é
essencialmente, isto é, do seu caráter inteligível.
3. A AUSÊNCIA DE OBJETO
Sendo a Vontade cega e irracional seria contraditório pensar que algum
objeto, definido pela instância intelectiva, pudesse cessar o seu movimento, que
não incerra nenhuma interrogação acerca da sua finalidade, uma vez que a
ausência dessa mesma teleologia é a condição de possibilidade de seu
irracionalismo. A idéia de objeto é uma ilusão criada pelo conhecimento em sua
tarefa sempre frustrada de encontrar um objeto capaz de saciar a vontade, que por
seu próprio fundamento, não é senão um movimento ininterrupto.
O intelecto não é capaz, pela série sucessiva de suas estratégias, de
atender as demandas da vontade, encontrando um objeto capaz de saciá-la, pois
isso daria brechas para se pensar a vontade submetida às determinações da
razão. Se a vontade tivesse um objeto definido, estaria em contradição com sua
irracionalidade. Os objetos, então, seriam os causadores da vontade. Os objetos
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são sempre posteriores ao querer, ou seja, primeiro há a vontade, isto é, há o
desejo enquanto marca individual, depois é que se conhece o objeto. A idéia de
objeto visa encontrar, ou melhor, supor uma causa para a vontade, mas essa
tentativa é marcada pelo insucesso, pois o querer precede todo e qualquer objeto.
O objeto alcançado jamais cumpre o que a cobiça prometia, a
saber, o apaziguamento final do furioso ímpeto da Vontade;
mais, pela satisfação do desejo apenas muda a sua figura,
que, agora, o atormenta sob outra forma, sim, ao término, se
todos os desejos se esgotam, resta o ímpeto mesmo da
Vontade sem nenhum motivo aparente, a dar sinal de si como
tormento incurável, horrível desolação e vazio.
(SCHOPENHAUER, 2005, p. 464).
Há na filosofia de Schopenhauer, conforme a posição de Pernin (1995), três
pontos que permitem fundamentar com mais evidência esta ausência de um
objeto para a vontade: o primeiro é o da primazia da vontade sobre o intelecto, o
que não vem a excluir a possibilidade de uma interação entre ambos, o segundo é
referente à idéia de finalidade, que não deve ser entendida senão como finalidade
que tende a manutenção da espécie pela vontade, o que vem a garantir a
harmonia ao mundo. A harmonia percebida na continuidade física da espécie
animal e vegetal, em suas formas as mais diversas, é uma obra da vontade e não
da inteligência. Tal finalidade no curso físico, que se dá pela nascença contínua
dos seres, não significar que se deva estender essa idéia de finalidade para o em
si da Vontade, que nada quer. O terceiro ponto é acerca do caráter involuntário do
apego à vida. Involuntário porque é do desígnio da Vontade que este apego
permaneça, ao modo irracional, em cada indivíduo, não sendo resultado de um
conhecimento objetivo do valor da vida. E embora este apego seja mantido pela
Vontade, esta não possui como fim a vida, pois enquanto em si não possui fim nem
causa. Se fosse vida pereceria com ela. Assim, vida somente equivale para o
fenômeno da Vontade em si, que é a vontade humana.
Portanto, ao se desenvolver o intelecto, ou seja, a razão, não se obtém o
êxito desejado, pois no construto filosófico de Schopenhauer, ele não é uma
instância preponderante, mas sim a vontade que não pode ser cerceada. Tal
assertiva invalida a possibilidade de uma ética prescritiva, pois a vontade
ultrapassa as demandas do intelecto, sendo possível apenas a este, uma ética por
recomendação através de máximas.
4. INTERAÇÃO ENTRE A VONTADE E O INTELECTO
Com o surgimento do intelecto, a Vontade, em sua objetidade, “passa a
integrar” o mundo das formas, ou seja, tem o seu curso instintivo interrompido
pelas orientações do intelecto, o que não se aplica as outras formas de vida não
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racionais, uma vez que estas seguem um ímpeto cego na consecução de suas
demandas, por ausência completa de conhecimento. Esta interação do intelecto
com a vontade vem intensificar suas contradições internas, por conta das
modificações empreendidas pelo intelecto no modo de suas manifestações.
Essas modificações, por sua vez, não diminuem sua avidez nem altera o seu
interesse mais originário.
A influência que o conhecimento, enquanto médium dos
motivos, tem não só sobre a vontade mas também sobre o seu
aparecimento em ações fundamenta também a diferença
capital entre o agir do homem e do animal, na medida em que
o modo de conhecimento de ambos é diverso. De fato, o
animal possui apenas representações intuitivas, o homem,
devido à razão, ainda possui representações abstratas,
conceitos. (SCHOPENHAUER, 2005, p. 384-85).
A vontade alimenta no intelecto a ilusão de que este lhe tem o controle. Mas
não é em todos os momentos que a vontade permite tais artimanhas. Mas, esta
permissão não habilita o intelecto a conhecer previamente as decisões da
vontade, que sempre se antecipa acerca daquilo que define como “objeto de seus
interesses”. Assim, o intelecto é sempre um a posteriori. Atua nessa condição,
visando compreender, por hipóteses, a trama inconsciente do querer. É nessa
atividade de tentar compreender a natureza inconsciente da vontade, que surgem
os motivos, levando o indivíduo a pensar que sua vontade é realmente ocasionada
pelos diversos objetos com os quais se depara no exterior, como também aqueles
que são decorrentes da faculdade de abstração. Então, não faltam indivíduos
suficientemente convencidos de que a fonte de sua vontade, ou seja, do seu
querer, sejam os objetos múltiplos encontrados na exterioridade.
A metáfora de Schopenhauer é impressionante: a vontade é
“o cego vigoroso que carrega nos ombros o paralítico
clarividente”. Esse intelecto não é mais o sol do mundo, mas a
sua lanterna. O intelecto depende da vontade como a Natura
naturata da Natura naturans. (PERNIN, 1995, p. 96-7).
Ainda, nessa relação, destacamos que o intelecto é sempre o vassalo
enquanto a vontade é a senhora. A vontade quer sempre tudo, porém o intelecto
não é capaz de lhe conceder o todo por razões de sua própria limitação, já que a
vontade não poderia se satisfazer com o que é oferecido pelos objetos exteriores.
E como se dilacera a si mesmo em sua cegueira querente, este em si tende a
“traduzir” para o mundo dos fenômenos essa insatisfação íntima que lhe é própria.
O que nos faz interrogar a Vontade da seguinte maneira: por que se objetivou,
quando poderia permanecer em sua eternidade?
Textura, Cruz das Almas-BA, vol. 3, n.º 2, p. 103-112, Ago./Dez., 2008.
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Trata-se, pois, de uma Vontade que, raramente, obedece ao intelecto,
donde se pode concluir a dificuldade de uma educação intelectual que possa
corrigir a conduta humana, uma vez que esta já vem com suas disposições
determinadas, impedindo a ensinabilidade de algo que vai de encontro ao caráter
inato do indivíduo. Schopenhauer também aponta o caráter moralista do intelecto,
não apenas no sentido daquele que busca compreender o fundamento primeiro
das ações, mas sim daquele que predica caminhos para a vontade, na infeliz
tentativa de conseguir algum domínio sobre ela. O que consegue em tal
empreitada é tão somente uma mudança na forma de suas manifestações sem
nunca poder mudar a meta para a qual esta se encaminha.
Não podemos escolher nem mudar aquilo que somos.
Podemos ser educados para entender melhor o mundo e a
nós mesmos, dando-nos motivos mais aprimorados a partir
dos quais agir, mas o eu que esses motivos incitam a agir na
verdade não se alterou: sob a casca mutável de seus anos, de
seus relacionamentos, e mesmo de seu conjunto de
conhecimentos e de opiniões, oculta-se, tal como o
caranguejo sob sua carapaça, o homem idêntico e real,
sobremodo imutável e sempre o mesmo. (JANAWAY, 2003, p.
85)
Na estética, na moral e no ascetismo de Schopenhauer, encontram-se tipos
psicológicos considerados superiores, a saber, o gênio, o compassivo e o asceta,
que possuem uma disposição inata para desenvolverem sua aptidão. O gênio
seria aquele que consegue, por um excesso de inteligência, liberta-se da servidão
perversa da vontade, não mais estabelecendo com os objetos uma relação de
interesse, pois consegue contemplar a Idéia, isto é, o caráter essencial de todas
as coisas, embora, em tal aptidão, ainda se trate de um conhecimento ligado ao
princípio de razão. O compassivo semelha ao gênio, pois é aquele que consegue
enxergar a própria essência que lhe constitui no outro, esforçando-se por buscar o
bem-estar alheio às custas do seu próprio. Nele não há um abismo, no sentido de
diferença, entre seu EU e os outros EUS. “[…] Iguala a si o ser que lhe é exterior,
sem injuriá-lo”. (SCHOPENHAUER, 2005, p. 371) É portador de um
conhecimento que consegue perceber a identidade da vontade em todas as
coisas. O asceta é aquele que ultrapassou o estágio da ética, que exige uma
intersubjetividade, por conta de um descontentamento pessoal, onde já não
consegue se sentir tranqüilo pelo fato de amar aos outros e lhes fazer todo bem ao
alcance, pois a vontade em sua afirmação, ainda que golpeada por uma tendência
inata às práticas virtuosas, tende ainda a manter o seu domínio sobre o psiquismo
humano. Esse tipo psicológico suspende seu amor dedicado ao próximo, para
abraçar uma atitude de solidão cujo objetivo é alimentar uma radical indiferença
aos desígnios da vontade, por meio de “um estado de renúncia voluntária, de
resignação, de quietude perfeita e despojamento absoluto”. (MANN, 1951, p. 207)
Textura, Cruz das Almas-BA, vol. 3, n.º 2, p. 103-112, Ago./Dez., 2008.
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Desse modo, “a nenhum preço deseja a satisfação sexual”. (Ibidem, p. 208)
Portanto, do percentual que sobra da humanidade, após a retirada do
gênio, do compassivo e do asceta, isto é, dos tipos psicológicos superiores, muito
tem a contribuir a educação, em seus mais diversos recursos de inibição das
tendências egoístas e malvadas, na possibilidade de construção de uma
sociedade menos violenta, ainda que seja pela força e expansão do castigo. E a
paz que emerge disso, em alguns momentos, não é por conta de uma modificação
dos homens em sua natureza, já que a moralidade deste tipo não é possível por
esse viés, mas sim pela legalidade da lei, que contribui apenas para uma
moralidade, ou educação aparente. A esta parcela excedente, que é constituída
em sua maioria por aqueles que vivem voltados para a afirmação ilimitada dos
seus interesses, vendo sempre o outro como meio para seus fins egoístas, que
Schopenhauer denominou de “homem vulgar”, torna-se indispensável manter, por
parte do estado e seus mecanismos de educação, a força da lei e jamais o seu
afrouxamento, pois isto viria a incitar a guerra em termos de convivência. Isto tudo
pelo simples fato de não ser possível a ensinabilidade para a genialidade, a
compaixão e o ascetismo, pois a disposição para a emergência desses tipos
psicológicos é inata.
REFERÊNCIAS
BARBOZA, Jair. Prefácio Introdutório. In: SCHOPENHAUER, Arthur. Metafísica
do amor, metafísica da morte. Tradução de Jair Barboza. 2 ed. São Paulo:
Martins Fontes, 2004.
CACCIOLA, Maria Lúcia Mello e Oliveira. Schopenhauer e a questão do
dogmatismo. São Paulo: UNESP, 1994.
JANAWAY, Christopher. Schopenhauer. Tradução de Adail Ubirajara Sobral. São
Paulo: Edições Loyola, 2003.
MANN, Thomas. O pensamento vivo de Schopenhauer. Tradução de Pedro
Ferraz do Amaral. São Paulo: Martins, 1951.
PERNIN, Marie José. Schopenhauer: decifrando o enigma do mundo.
Tradução de Lucy Magalhães. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1995.
SHOPENHAUER, Arthur. O mundo como vontade e representação. Tradução:
Jair Barboza. São Paulo: UNESP, 2005.
______. O mundo como vontade e representação. Tradução de M. F. Sá
Textura, Cruz das Almas-BA, vol. 3, n.º 2, p. 103-112, Ago./Dez., 2008.
112
Correia. São Paulo: Contraponto, 2001.
______. Sobre o fundamento da moral. Tradução de Maria Lúcia Mello e
Oliveira Cacciola. 2 ed. São Paulo: Martins Fontes, 2001.
Textura, Cruz das Almas-BA, vol. 3, n.º 2, p. 103-112, Ago./Dez., 2008.
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