Aula 9

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Aula 9
Capítulo 5: Foco narrativo
Pág.30
Ser!Pré-vestibular
Professora Rosa Barreiros – abr/2014
CRÔNICA ARGUMENTATIVA
Textos Argumentativos (argumentar sobre assuntos ou
questões)
Editorial; Textos gerais de opinião; Resenha crítica; Discursos de defesa
ou acusação; Carta argumentativa; Artigo jornalístico; Ensaio
argumentativo. Comentário argumentativo; Crônica argumentativa
(misto de argumentação e narração); Textos argumentativos em geral.
Textos Narrativos (narrar de forma ficcional ou verídica)
Conto; Romance; Novela; Anedota; Peça teatral; Fábula; Lenda;
Crônica Literária; Crônica argumentativa (misto de narração e
argumentação); Biografia (com tom literário-narrativo); Entrevista
ficcional; Narrativas em geral.
CRÔNICA ARGUMENTATIVA
Segundo Fernando Sabino é algo para ser lido enquanto
se toma o café da manhã, pois ela “busca o pitoresco
ou o irrisório no cotidiano de cada um”.
Segundo Antonio Candido, o tom “é de uma conversa
aparentemente banal”.
EFEITO DE APROXIMAÇÃO:
enunciador  leitor
Gênero textual que reúne características da narrativa e da
argumentação, privilegiando:
APRESENTAÇÃO DO ASSUNTO OU CONTROVÉRSIA A SER
DISCUTIDA, NORMALMENTE, NO INÍCIO DO TEXTO;
POSICIONAMENTO DO CRONISTA SOBRE O ASSUNTO EM
QUESTÃO;
USO FREQUENTE DE DISCURSO INDIRETO LIVRE E
PERGUNTAS RETÓRICAS;
 EXPOSIÇÃO DE ARGUMENTOS QUE FUNDAMENTAM O PONTO
DE VISTA DO AUTOR PROVAVELMENTE NUMA SEQUÊNCIA
NARRATIVA;
 CONCLUSÃO SURPREENDENTE, CRIATIVA, OU CONCLUSÃOSÍNTESE, QUE RETOMA AS IDEIAS DO TEXTO E CONFIRMA O
PONTO DE VISTA DEFENDIDO;
 TRATAMENTO SUBJETIVO DO TEMA, DEIXANDO PERPASSAR
A SENSIBILIDADE E AS EMOÇÕES DO CRONISTA;
 LINGUAGEM CRIATIVA E FIGURADA, GERALMENTE, DE
ACORDO COM O PADRÃO CULTO INFORMAL DA LÍNGUA.
Crônica argumentativa
Veiculada por
jornais e
revistas
Poesia
x
Opinião
Observa fatos
reais mas os
relata de forma
subjetiva
Protesto em
função de um
fato polêmico
Ironia e
sarcasmo
A crônica argumentativa...
Narrativa em 1ª.pessoa
Pág.30 – livro de Redação
PROPOSTA DE REDAÇÃO
Considere os textos abaixo para elaborar sua redação:
A CNV
A Comissão Nacional da Verdade foi criada pela Lei
12528/2011 e instituída em 16 de maio de
2012. A CNV tem por finalidade apurar graves violações de Direitos
Humanos ocorridas entre 18 de setembro de 1946 e 5 de outubro
de 1988.
(…)
Mortos e desaparecidos políticos
O grupo tem por objetivo a investigação das graves violações de
direitos humanos cometidas por agentes do Estado ou pessoas a seu
serviço, especialmente no período de 1964 a 1988, promovendo
o mapeamento e o esclarecimento dos casos de torturas, mortes,
desaparecimentos forçados e ocultação de cadáveres.
http://www.cnv.gov.br/index.php/2012-05-22-18-30-05/graves-violacoes-de-direitoshumanos-torturados-mortos-e-desaparecidos
Ditadura
"Para quem foi torturado, visitar o passado não é festa"
Em diligencia à antiga sede da Polícia do Exército na Vila Militar, exmilitantes e representantes de comissões da verdade revisitam
centro de tortura no Rio
por Marsílea Gombata — publicado 23/01/2014 21:12, última modificação 24/01/2014
16:31
Do Rio de Janeiro
Mais de 40 anos depois de terem sido presos e torturados, exmilitantes da luta armada contrários à ditadura voltaram na quintafeira 23 para a antiga sede da Polícia do Exército na Vila Militar, no
Rio de Janeiro. Ao lado de representantes da Comissão Nacional da
Verdade (CNV) e das comissões do Rio e de Pernambuco, eles
foram acompanhados pelo comandante José da Costa Abreu,
general de Divisão do Exército, e por peritos responsáveis por
identificar as modificações feitas no edifício.
O local, cujo clima mescla o bucolismo típico do subúrbio carioca
com o ar de repressão característico da disciplina militar, concentra
um total de 51 quartéis. Apesar do nome, a Vila Militar é
considerada um bairro autônomo dentro da região de Deodoro, na
zona oeste da cidade.
Depois de acompanhar a visita com os peritos, o advogado e consultor
Francisco Celso Calmon, articulador nacional da Rede Brasil Memória,
Verdade e Justiça, falou sobre o desconforto de estar no local onde
temia morrer a qualquer momento. “Para nós, que passamos por aqui,
fomos torturados e tivemos companheiros assassinados em
decorrência de tortura, visitar o passado não é uma festa. A gente está
fazendo isso pelo nosso compromisso com a história. O que a gente
quer é que o pau de arara seja abolido definitivamente”, disse ao
lembrar que por ali passaram cerca de 50 militantes, entre eles sua
namorada à época com 16 anos.
Calmon foi pego em 1969 na Rua Figueiredo Magalhães, em
Copacabana, mesma época em que estiveram presos os militantes
Antonio Roberto Espinosa, presente à visitação, Maria Auxiliadora
Lara Barcellos, Severino Viana Colou e Chael Charles Schreier, sendo
os dois últimos mortos na antiga sede da PE na Vila Militar. “Ouvi os
gritos do Chael até ele não gritar mais”, lembra Calmon.
O corpo do estudante de medicina Chael Charles foi levado para o
Hospital Central do Exército, onde o general Galeno Penha Franco
recusou-se a declará-lo morto no hospital, como pretendiam os
agentes torturadores, e mandou que fosse feita a autópsia. Apesar de
um laudo elaborado por três
médicos ter constatado as lesões sofridas por Chael, o Exército
anunciou na época que ele havia morrido de ataque cardíaco em
consequência de ferimentos sofridos em um tiroteio. Maria
Auxiliadora Lara Barcellos, que acabou se suicidando em Berlim no ano
de 1976, e Espinosa foram os últimos a ver Chael com vida. Em
depoimento, afirmaram que o militante da VAR-Palmares tinha o pênis
dilacerado e o corpo ensopado de sangue.
Severino Colou, por sua vez, era sargento da Polícia Militar da
Guanabara e passou a integrar o Colina (Comando de Libertação
Nacional). Preso, foi levado para a PE da Vila Militar, e encontrado
morto na manhã de 24 de maio de 1969. Apesar de relatos oficiais
falarem que ele havia se "enforcado com a própria calça, amarrada em
uma das barras da cela", depoimentos de ex-presos políticos nas
auditorias militares apontam que sua morte ocorreu sob tortura.
Ex-advogada de presos políticos, Eny Moreira, contou ter sido recebida
na antiga sede da PE com uma cordialidade inusual. “Hoje nos
receberam de forma estranhamente respeitosa e civilizada.
Vínhamos aqui, e o primeiro obstáculo eram oficiais que se achavam
donos do país. Havia uma dificuldade enorme para se chegar ao
cliente, mesmo quando vínhamos com alvará de soltura assinado pelo
presidente do Superior Tribunal Militar”, contou.
Moreira falou ainda de casos no qual testemunhou a tortura de
militantes contrários ao regime, como no caso de Maria do
Nascimento Furtado. “No dia 10 de novembro de 1972 no Jornal
Nacional foi anunciado que teria morrido num tiroteio essa ‘terrorista’,
e a família pediu para eu receber o corpo. Quando eu recebi, ela
estava literalmente dilacerada. Tinha um olho pendurado, um
afundamento no maxilar, não tinha bico do seio, tinha um rasgo que ia
do umbigo até a vagina, uma fratura exposta no braço. E a última
coisa que fizeram com ela foi apertar um torniquete de aço para
pressionar o cérebro. Por isso o olho saltou.”
Irmã do militante pernambucano até hoje desaparecido Fernando
Santa Cruz, Roselina acompanhou a visita ao antigo centro de tortura
no qual também ficou presa antes de ser levada para a penitenciária
de Bangu. “Foi difícil voltar aqui. Estou muito mexida”, contou. “Aqui,
sempre fui torturada nua e por homens. Desde cortes nos seios a
choques na vagina.”
Estava presente na visita também o cineasta Silvio Da-Rin, vítima da
repressão da ditadura e diretor de Hércules 56, baseado no livro que
conta a história do grupo de militantes presos que foram retirados do
País em troca da libertação do então embaixador americano no Brasil,
Charles Elbrick, sequestrado pelo MR-8 em 1969.
http://www.cartacapital.com.br/sociedade/para-nos-que-fomos-torturados-aqui-visitar-opassado-nao-e-festa-3615.html
Imagine-se como um ex-militante político que, aos 25 anos de idade e
como estudante universitário no ano de 1969, foi preso e torturado
durante o regime militar no Brasil.
Em 2014, quarenta e cinco anos depois, você está diante da “Comissão
Nacional da Verdade” para prestar seu depoimento acerca do que
vivenciou naquele período.
Ao rememorar o passado, você decide entregar a essa Comissão um
depoimento que você opta por escrevê-lo em forma de uma CRÒNICA
ARGUMENTATIVA.
Essa CRÔNICA ARGUMENTATIVA deverá:
- Fazer uso da 1ª pessoa do singular.
- Narrar o dia da chegada ao interrogatório e o ápice dos instantes de
tortura física e psicológica.
- Argumentar contrariamente aos atos de tortura, prisões arbitrárias e
violações dos Direitos Humanos.
“Não me chega à lembrança momento mais constrangedor
que aquele, quando minha mãe, depois de retirar a galinha,
já privada de sua liberdade, dentro daquele galinheiro, torcialhe o pescoço, denotando a intimidade materna com a arte de
calar qualquer cocoricó.”
 “A atitude de minha mãe resignava-me. Não teria eu, aos
seis anos, plena consciência da dominação torturante de
quem se sobrepõe à privação de outrem?”
 “Bem mais tarde, sentir-me-ia uma galinha, tal qual
mantinha em minhas lembranças, só que agora em mãos
maiúsculas de um soldado, cujas unhas ciscavam no terreiro
formado pela minha pele.”
 “Não vejo, mais, minha mãe torturando galinhas, o que
não mais me autoriza a queixar-me, no entanto, e nem
tampouco, ouço-a refletindo sobre as atitudes “generalescas”
de outrora.”
Projeto de texto
UNIFESP/2013
Com base nos textos apresentados e em seus próprios
conhecimentos, redija um texto dissertativo,
obedecendo à norma-padrão da língua portuguesa,
sobre o tema:
Comissão da Verdade: que Verdade alcançar?
Pensamento chicletoso
Na maior parte das vezes é um trecho de música, mas pode ser
também fala de filme, verso de poesia ou uma frase solta, sem qualquer
sentido aparente – é o que, na falta de nome melhor, chamo de
pensamento chicletoso. Ele chega sorrateiro, você nem percebe: quando
se dá conta, já está lá, instalado no trapézio da consciência como um
cunhado na poltrona da sua casa, numa tarde de domingo, grudado aos
seus neurônios como chiclete na sola do sapato.
Anteontem, por exemplo, acordei de ressaca, entrei numa ducha fria e,
assim que a água bateu na testa, revolvendo ideias há muito
adormecidas nas catacumbas da memória, vi-me repetindo, inteirinha, a
fala do vilão de um dos piores desenhos animados que já existiram,
Thundercats: “Antigos espíritos do mal, transformem essa forma
decadente em Mumm-Ra! [Pausa] O de vida eternaaaaa!”. Faz quase
quarenta e oito horas que, a cada vinte minutos, mais ou menos, minha
vida é interrompida pela evocação maligna de “Mumm-Ra [pausa] o de
vida eternaaaa!”. É como um vício: cigarro mental ao qual volto
inúmeras vezes, do momento em que abro os olhos até a hora de fechálos novamente.
Há pensamentos chicletosos que somem depois de um
tempo, mas outros ficam para sempre, agarrados aos
rabinhos dos neurônios como os sacis à crina dos cavalos. É
o caso, por exemplo, de um trecho da trilha sonora de Pulp
Fiction, que contraí ao assistir o filme, numa remota noite do
século passado e, desde então, vai e volta das trevas para a
consciência, da consciência para as trevas, ao seu bel prazer:
“Get Down, get down! Jungle booggie. Tananananã!”. (O
tananananã é a parte instrumental). Faz mais de dez anos.
Estou cansado. No meio de uma reunião de trabalho: “Get
Down, get down!”; enquanto espero o troco no posto:
“Jungle Booggie!”; com a cabeça no travesseiro:
“tananananã”.
De todos os exus mnemônicos com quem convivo, contudo, os piores são
as músicas infantis. Minha mulher não sabe, mas no almoço de ontem,
enquanto discutíamos uns pormenores sobre o vazamento no box do
chuveiro, meu ar de cansaço nada tinha a ver com a preguiça de resolver
os perrengues domésticos: era o resultado de uma manhã inteira ouvindo,
ininterruptamente, “serra, serra, serrador, serra o papo do vovô”, no
maldito rádio instalado dentro do meu cérebro. “Atirei o pau no gato” eu
canto tanto, mas tanto, que já não me basta o português. “Atiré el palo en
el gato…” ou “I threw the stick on the cat” são a música de fundo de boa
parte dos momentos que passo sobre a Terra.
Outro dia, tive a mórbida alegria de descobrir que meu ídolo, Julio Cortázar,
também sofria de acessos semelhantes. Numa crônica do livro Um tal
Lucas, o escritor argentino conta que, no meio de um banho, pegou-se
dizendo, com “visível prazer vingativo: Now shut up your distasteful
Adberkunkus!” (Agora cale-se, seu intragável Adberkunkus). Só no fim da
chuveirada, depois de repetir a admoestação várias vezes, foi se perguntar
quem, ou o que, seria um Adberkunkus, por que o estava mandando calarse e, mais ainda, qual a razão de fazê-lo em inglês? Questões essas que o
deixaram acordado a noite toda e permaneceram sem solução, enquanto,
de tempos em tempos, continuava demandando ao Adberkunkus que
calasse a boca – ou o bico, a tromba: vai saber por onde sai o som de tal
ser.
A alegria por saber que minha loucura era compartilhada pelo ilustre
escritor, contudo, durou pouco: mal fechei o livro e abri a geladeira
para pegar uma coca, me vi gritando, mentalmente: “Agora cale-se,
seu intragável Adberkunkus!” – em português, inglês e espanhol.
Já desisti de me curar. Encaro como uma doença crônica, que vem e
vai. Podia ser asma, sinusite, malária, é o pensamento chicletoso: de
tempos em tempos ele vem, me aporrinha, depois some, fazer o que?
O negócio e tocar pra frente – “get down, get down!” -, aproveitar bem
os intervalos – “serra o papo do vovô” – e tentar ser feliz assim
mesmo – “jungle boogie”–, sabendo que certas coisas não se calam,
por mais intragáveis que sejam, e por mais que imploremos em todas
as línguas, conhecidas ou inventadas – “tananananã.”
Antonio Prata
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