Tratamento cirúrgico da escoliose neuromuscular no paciente
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Tratamento cirúrgico da escoliose neuromuscular no paciente
59 ARTIGO ORIGINAL / ORIGINAL ARTICLE Tratamento cirúrgico da escoliose neuromuscular no paciente portador de paralisia cerebral com instrumentação posterior tóraco-lombo-pélvica Surgical treatment of neuromuscular scoliosis on cerebral palsy patient with posterior thoraco-lumbar-pelvic instrumentation Tratamiento quirúrgico de la escoliosis neuromuscular en el paciente portador de la parálisis cerebral con instrumentación posterior toracolumbarpélvica Luiz Cláudio de Moura França1 Roberto Sakamoto Falcon2 Manuel de Araújo Porto Filho3 Mauricio Pagy de Calais Oliveira4 Marcelo Gonçalves Rugani5 Rodrigo Gallinari da Costa Faria6 Guilherme Pilett7 RESUMO ABSTRACT RESUMEN Objetivo: o propósito deste estudo retrospectivo foi avaliar os resultados do tratamento cirúrgico da escoliose secundária à paralisia cerebral com instrumentação toraco-lombo-pélvica utilizando o mesmo método de instrumentação e de artrodese. Métodos: foram estudados 12 pacientes não deambuladores com escoliose associada à paralisia cerebral e com obliqüidade pélvica. A correção da deformidade e a fixação foram feitas com material composto por fios sublaminares e uma haste pré-modelada em aço. A instrumentação foi realizada desde a coluna torácica alta até o sacro com fixação pélvica nos ossos ilíacos em todos os Objective: the purpose of this retrospective study was to evaluate the results of surgical treatment of scoliosis in cerebral palsy patients with thoracolumbo-pelvic instrumentation using the same fixation and arthrodesis methods. Methods: there were studied 12 patients with scoliosis secondary to cerebral palsy. The correction of the deformity and the fixation were done with sub laminar wires and a premodeled stainless-steel rod. The instrumentation included the higher thoracic spine to the lower sacrum with pelvic fixation into the iliac bones. Results: the average time of surgery was 288 minutes. It was Objetivo: el propósito de este estudio retrospectivo fue evaluar los resultados del tratamiento quirúrgico de la escoliosis secundaria a la PC con instrumentación toracolumbarpélvia utilizando el mismo método de instrumentación y artrodesis. Métodos: fueron estudiados 12 pacientes que no deambulaban con escoliosis asociada a PC y con oblicuidad pélvica. La corrección de la deformidad y la fijación fueron hechas con material compuesto por cabos sublaminares y una asta premodelada en acero. La instrumentación fue realizada desde la columna torácica alta hasta la región sacra con fijación pélvica en Trabalho realizado no Hospital Mater Dei e Hospital da Baleia - Centro Mineiro de Cirurgia da Coluna - Belo Horizonte (MG), Brasil. 1 Ortopedista e Cirurgião de Coluna do Hospital Mater Dei e Hospital da Baleia, Belo Horizonte (MG), Brasil. Ortopedista e Cirurgião de Coluna do Hospital Ortopédico e Hospital da Baleia, Belo Horizonte (MG), Brasil. 3 Ortopedista e Cirurgião de Coluna dos Hospitais Belo Horizonte e Life Center, Belo Horizonte (MG), Brasil. 4 Ortopedista e Cirurgião de Coluna dos Hospitais Belo Horizonte e Vera Cruz, Belo Horizonte (MG), Brasil. 5 Neurocirurgião dos Hospitais Vera Cruz e Socor, Belo Horizonte (MG), Brasil. 6 Ortopedista dos Hospitais São Camilo e Life Center, Belo Horizonte (MG), Brasil. 7 Especializando em Cirurgia da Coluna Vertebral do Centro Mineiro de Cirurgia da Coluna, Belo Horizonte (MG), Brasil. 2 Recebido: 14/03/2007 Aprovado: 14/02/2008 COLUNA/COLUMNA. 2008;7(1):59-64 21_col_7_1.pmd 59 14/3/2008, 17:59 França LCM, Falcon RS, Porto Filho MA, Oliveira MPC, Rugani MG, Faria RGC, Pilett G 60 pacientes. O tempo médio de cirurgia foi de 288 minutos. Resultados: foi obtida correção média da escoliose de 79,8%. A correção média da obliqüidade pélvica foi de 90%. Houve 33% de complicações. Todos os pais e responsáveis informaram que, de uma forma geral, houve melhora nos cuidados com os pacientes. Conclusão: nesta série, a instrumentação foi associada a resultados satisfatórios, com boa correção e estabilidade da curva e da obliqüidade pélvica, e com poucas complicações comparadas aos relatos da literatura. Esta técnica é recomendada como método de correção e fixação da coluna no tratamento da escoliose neuromuscular grave associada à obliqüidade pélvica. obtained an average correction of the scoliosis of 79.8%. The average correction of the pelvic obliquity was 90%. There were 33% of complications. All the parents and responsibles informed that, in a general way, there was improvement in the care of the patients. The instrumentation was associated to satisfactory results, with good correction and stability in the curve and of the pelvic obliquity, and with few complications compared to the reports of the literature. Conclusion: this technique is recommended as a correction and fixation method of the spine in the treatment of severe neuromuscular scoliosis associated to pelvic obliquity. los huesos iliacos, en todos los pacientes. El tiempo promedio de cirugía fue de 288 minutos. Resultados: se obtuvo una corrección media de la escoliosis de 79.8%. La corrección promedio de la oblicuidad pélvica fue de 90%. Hubo 33% de complicaciones. Todos los padres y responsables informaron que, de una forma general, hubo mejora en los cuidados con los pacientes. Conclusión: En esta serie la instrumentación fue asociada a resultados satisfactorios, con buena corrección y estabilidad de la curva y de la oblicuidad pélvica, y con pocas complicaciones comparadas con lo relatado en la literatura. Esta técnica es recomendada como método de corrección y fijación de la columna en el tratamiento de la escoliosis neuromuscular severa asociada a la oblicuidad pélvica. DESCRITORES: Paralisia cerebral/ complicações; Escoliose/ cirurgia; Procedimentos ortopédicos/instrumentação KEYWORDS: Cerebral palsy/ complications; Scoliosis/ surgery; Orthopedic procedures/instrumentation DESCRIPTORES: Parálisis cerebral/ complicaciones; Escoliosis/ cirurgía; Procedimientos ortopédicos /instrumentación INTRODUÇÃO A paralisia cerebral (PC) é uma síndrome não progressiva, secundária a lesões ou anomalias do neurônio motor superior. Ocorre nos primeiros estágios do desenvolvimento e afeta 2-2,5/1000 nascidos vivos nos Estados Unidos 1 . A deformidade escoliótica é habitualmente progressiva e ocorre em 60% a 70% das crianças com paralisia cerebral espástica quadriplégicas 2-3. Estas deformidades são secundárias ao desequilíbrio entre forças musculares no esqueleto axial em crescimento, estão freqüentemente associadas com deformidade sagital significativa, e não respondem ao uso de órteses 4-5 . A prevalência de deformidades da coluna nos pacientes com PC, na literatura, varia entre 10% nos pacientes deambuladores com hemiplegia a 60% a 70 % nos quadriplégicos. Em pacientes deambuladores, a progressão da deformidade pode comprometer a capacidade de marcha e, em não deambuladores, pode comprometer o equilíbrio para sentar pelo aumento da obliqüidade pélvica6. Devido ao fato de que os resultados do tratamento conservador são questionáveis, recomenda-se a correção e instrumentação precoces 3, 7-8 como tratamento das deformidades com progressão e comprometimento funcional. A artrodese da coluna é indicada na PC em crianças com curvas acima de 45° a 50°, especialmente se for observada a deterioração funcional9,- 10. O princípio da cirurgia é restaurar o alinhamento do tronco, evitar o comprometimento respiratório, aliviar a dor causada pelo conflito das costelas sobre a crista ilíaca na concavidade da curva e evitar uma distribuição assimétrica de carga ao sentar devido a obliqüidade pélvica11- 12. Promover uma boa postura e melhor tolerância para permanecer sentado são alguns dos objetivos ortopédicos, assim como prevenir a luxação dos quadris e facilitar os cuidados com estes pacientes13. Durante o desenvolvimento das técnicas de instrumentação, Luque popularizou o uso de múltiplos amarrilhos sublaminares para a fixação segmentar14-,15. Isto proporciona uma correção gradual da deformidade à medida que os amarrilhos são seqüencialmente apertados. A artrodese da coluna com instrumental de segunda geração tem sido considerada o tratamento cirúrgico de escolha para as deformidades neuromusculares1. O método de Luque não proporciona estabilidade com relação às cargas axiais, pois pode haver telescopagem das hastes. A estabilidade rotacional também é menor, entretanto ela pode ser aumentada com a utilização do sistema de conexão transversal 16. A literatura ortopédica preconiza a fixação pélvica como tratamento padrão atual na correção da escoliose neuromuscular com obliqüidade pélvica significativa 17-18. Como resultado da COLUNA/COLUMNA. 2008;7(1):59-64 21_col_7_1.pmd 60 14/3/2008, 17:59 Tratamento cirúrgico da escoliose neuromuscular no paciente portador de paralisia cerebral com instrumentação posterior tóraco-lombo-pélvica grande extensão da artrodese e do substancial braço de alavanca, grandes momentos de força são colocados sobre a junção lombossacra, sendo necessária uma fixação segura na porção sacro pélvica do sistema. A técnica de Galveston consiste na modelagem na parte distal da barra que permite a inserção de sua extremidade por meio de uma coluna óssea no ílio posterior, justamente superior à incisura ciática maior. Outros métodos de fixação sacro-pélvica são as técnicas de DunnMcCarthy, hastes intra-sacrais, fixação ílio sacral e parafusos ilíacos. Apesar de muitos estudos terem documentado o uso destas várias técnicas, apenas alguns têm estudado estes métodos em coortes de pacientes comparáveis17. A fixação pélvica foi refinada com o desenvolvimento da “haste única”. Esta haste pré-modelada não necessita que o cirurgião execute a modelagem das hastes no préoperatório, diminuindo o tempo cirúrgico, além de se mostrar um sistema mais rígido e com maior capacidade para correção das deformidades19-20. Sistemas de terceira geração têm virtualmente eliminado o uso de gesso ou órtese no pós-operatório e diminuído os índices de pseudo-artrose nas cirurgias para deformidades idiopáticas. Apesar de tudo, existem poucos relatos dos resultados do tratamento da escoliose neuromuscular com instrumental de terceira geração e nenhum para pacientes com escoliose exclusivamente com PC1, 20-22. Diferentes estudos enfatizam que os benefícios do tratamento cirúrgico devem ser confrontados em relação à incidência aumentada de potenciais complicações pré e pósoperatórias23. Taxas de complicações na literatura após a artrodese da coluna com instrumentação para escoliose neuromuscular são altas, variando de 44% a 66%. Especial atenção deve ser dada às complicações cardio-pulmonares, gastrointestinais e neurológicas24. O propósito deste estudo retrospectivo foi avaliar os resultados do tratamento cirúrgico da escoliose secundária a PC, com instrumentação toraco-lombo-pélvica, utilizando um sistema de haste pré-modelada em todos os casos. As vantagens da técnica cirúrgica são discutidas e nossos resultados foram comparados com relatos de séries encontradas na literatura. MÉTODOS Um total de 12 pacientes, não deambuladores, com escoliose devido à paralisia cerebral e obliqüidade pélvica associada, foram submetidos ao mesmo protocolo de tratamento cirúrgico pelos autores e avaliados retrospectivamente. Todos os pacientes apresentavam PC quadriplégica. Um número significativo de pacientes possuía retardo mental de moderado a grave e nenhum deles estava livre de déficit cognitivo. Os critérios de inclusão foram o diagnóstico de deformidade progressiva da coluna causada apenas por PC para maior uniformidade da amostra, e somente os pacientes submetidos ao tratamento por artrodese vertebral com instrumentação posterior isolada utilizando o sistema de haste pré-modelada com o seguimento mínimo de seis meses fizeram parte do estudo. A indicação para tratamento cirúrgico foi baseada no relato do comprometimento funcional progressivo, aumento da rigidez da curva e descompensação ao 61 exame clínico, sendo que o valor angular da curva acima de 50 graus não foi considerado como critério isolado para a indicação do tratamento. Todos os procedimentos cirúrgicos foram realizados utilizando a mesma técnica operatória e pelo mesmo cirurgião. Os doze pacientes avaliados, seis do sexo feminino e seis do sexo masculino, tiveram um seguimento médio de 27,9 meses (8 a 46 meses). A artrodese póstero-lateral foi realizada com enxerto interfacetário, decorticação das facetas, lâminas, processos transversos e espinhosos. A correção da deformidade e a instrumentação foram feitas com um sistema composto por fios sublaminares de Luque e uma haste de aço pré-modelada, confeccionadas para o tratamento da escoliose neuromuscular (Spine Sthall®), (Figura 1). Em nenhum paciente foi realizado acesso anterior para aumentar a flexibilidade da curva. A extensão da instrumentação compreendeu a coluna torácica alta (T1 ou T2) até o sacro com fixação pélvica nos ossos ilíacos. A tração ou imobilização pré-operatória não foi utilizada em nenhum dos pacientes. Após a cirurgia todos os pacientes permaneceram com dreno de aspiração contínua durante 24 a 48 horas. A fisioterapia respiratória foi realizada de rotina, bem como o posicionamento sentado habitualmente dentro de 24 horas de pós-operatório. Figura 1 Os prontuários e as raHaste de aço pré-modelada diografias dos pacientes foram para o tratamento de revisados, bem como a opinião escoliose neuromuscular dos pais e responsáveis com relação ao resultado da cirurgia Os ângulos de Cobb e a obliqüidade pélvica foram medidos préoperatoriamente nas radiografias panorâmicas com os pacientes sentados e no período pós-operatório imediato e tardio. A obliqüidade pélvica foi avaliada pela técnica de Malloney25. Os questio-nários de avaliação do trata-mento foram preenchidos pelos pais e/ou responsáveis e devolvidos durante o retorno dos pacientes ou pelo correio. RESULTADOS O tempo médio de cirurgia foi de 288 minutos (250 min a 330 min). A medida da escoliose pré-operatória teve uma média de 75,4 graus (40° a 118°) e pós-operatória de 15,2 graus (4° a 27°), obtendose correção média de 79,8%. O valor médio da obliqüidade pélvica pré-operatória foi de 22,2 graus e a pós-operatória foi de 2,2 graus, com correção média de 90%. Os valores referentes à obliqüidade pélvica foram obtidos com a avaliação radiológica de seis pacientes devido à falta destas informações pré-operatórias nos demais. COLUNA/COLUMNA. 2008;7(1):59-64 21_col_7_1.pmd 61 14/3/2008, 17:59 França LCM, Falcon RS, Porto Filho MA, Oliveira MPC, Rugani MG, Faria RGC, Pilett G 62 Houve 33% de complicações, com uma infecção pós-operatória profunda que evoluiu favoravelmente após desbridamento cirúrgico e irrigação contínua; uma pseudartrose com quebra da haste na transição espino-pélvica em paciente que apresentava bilateral espondilólise de L5 sem diagnóstico pré-operatório; uma revisão para retirada de um dos fios de Luque devido à saliência do implante sob a pele; e uma lesão de dura-máter durante a passagem do fio de Luque que evoluiu favoravelmente sem formação de fístula ou lesão neurológica adicional. Todos os pais e responsáveis informaram que, de uma forma geral, houve melhora nos cuidados com os pacientes e que estariam dispostos a realizar a cirurgia novamente. DISCUSSÃO A elevada prevalência da escoliose nos pacientes portadores de paralisia cerebral espástica, o seu caráter progressivo com evidências de comprometimento funcional e a dificuldade para a correção e a estabilização da deformidade são bem conhecidos. A abordagem e a instrumentação ideal para estes pacientes continua sendo motivo de controvérsia em virtude da magnitude das intervenções e elevada incidência de complicações. A nossa série de pacientes estudados é retrospectiva e apresenta algumas limitações, destacando-se que a avaliação da postura para sentar e a qualidade de vida não podem ser avaliados por escores funcionais objetivos, especialmente nos pacientes que apresentam retardo mental2. A avaliação do resultado funcional final nestes pacientes foi feita por meio das informações contidas nos prontuários, exame clínico e informações dos pais e responsáveis. Foi observado que as crianças com doenças neuromusculares têm períodos mais longos de internação e maiores gastos hospitalares do que as crianças com escoliose idiopática². Apesar da freqüência de morte ser cinco vezes maior no grupo neuromuscular, este ainda é um evento raro3. A sobrevida média relativamente longa foi observada nos pacientes pediátricos com PCE e escoliose que foram submetidos à cirurgia da coluna²³, o que é consistente com o conceito atual de aumento da expectativa de vida mesmo para os pacientes quadriplégicos26. Embora os pacientes gravemente afetados pela PC apresentem múltiplos problemas médicos, que potencialmente podem elevar o risco do procedimento, os estudos prévios têm documentado uma alta taxa de satisfação dos responsáveis pelos cuidados, que vêem como altamente apreciável o impacto dos procedimentos de realinhamento espinhal nos níveis funcionais das crianças e na facilidade com os cuidados de enfermagem23, 27-28. Os índices de satisfação relatados na literatura são comparáveis aos resultados do nosso estudo. Cassidy et al.27 relataram que 95% dos 46 enfermeiros, técnicos de enfermagem, terapeutas, professores, e pessoal administrativo acreditavam que os pacientes submetidos à artrodese vertebral estavam mais confortáveis e em melhores condições gerais comparados àqueles com escoliose que não foram operados e 81% dos responsáveis pelos cuidados recomendavam cirurgia espinhal para os pacientes com quadros clínicos semelhantes27. Comstock et al. encontraram 85% de análises positivas entre pais e responsáveis a respeito do conforto, função e cuidados com o paciente após a artrodese espinhal. Entre os 15% insatisfeitos com os resultados da cirurgia, houve pequena correção da curva ou o desenvolvimento de deformidade escoliótica residual marcante com aumento da obliqüidade pélvica no pós-operatório28. Sponseller et al. por meio de um questionário distribuído aos pais, fisioterapeutas e enfermeiros de 34 pacientes com escoliose devido a PC grave, observaram grande melhora funcional em um terço destes pacientes e melhora menos significativa no restante, incluindo primariamente o melhor equilíbrio em pé ou sentado, aumento do tempo sentado, e a diminuição das dores lombares 29. Os pacientes com os vários tipos de deformidade vertebral paralítica, mesmo com flexibilidade limitada, se beneficiam da artrodese vertebral com instrumental de segunda geração, particularmente nos cuidados de enfermagem, função respiratória e alimentação1. Os pacientes tratados com procedimentos apenas por via de acesso posterior tiveram menor tempo de internação e menor tempo cirúrgico segundo Peelle et al.17. Devido às comorbidades clínicas e conseqüências pulmonares, uma alta taxa de complicações têm sido relatadas com procedimentos por via anterior nesta população de pacientes30-31. Outros estudos em pacientes deambuladores portadores de PC sobre o efeito da artrodese espinhal de T1, T2 ao sacro com fixação pélvica, utilizando instrumental com haste única, demonstraram melhora significativa na aparência física das crianças, balanço da cabeça e do tronco, habilidade para sentar e nenhuma mudança na habilidade para deambular1, 32-33. Nossos resultados demonstraram resultados positivos da percepção funcional entre pais e responsáveis de crianças com PC do tipo quadriplégica severa. Devido ao fato de todos os nossos pacientes terem obtido uma correção acentuada da curva escoliótica (média de 79,8%), que foi mantida com o passar do tempo (Figura 2), nossos índices foram concordantes e até superiores aos achados na literatura1, 5, 13, 17,34-36. Figura 2 Radiografias de JTS com oito anos e 11 meses de idade. Radiografias préoperatórias em AP (A) e perfil (B) evidenciando curva de 118º e obliquamente pélvica. Radiografias em AP (C) e perfil (CD) após um mês da cirurgia. Radiografias em AP após um ano e oito meses de pós-operatório (E) A C COLUNA/COLUMNA. 2008;7(1):59-64 21_col_7_1.pmd 62 14/3/2008, 17:59 B D E Tratamento cirúrgico da escoliose neuromuscular no paciente portador de paralisia cerebral com instrumentação posterior tóraco-lombo-pélvica A obliqüidade pélvica está freqüentemente associada com a escoliose na PCE, tendo grande participação no aumento da dificuldade para sentar, e necessita ser considerada durante o manejo da deformidade espinhal37. Wimmer et al. indicam a extensão da artrodese até a pelve quando os quadris podem ser fletidos a 90 graus, nos pacientes não deambuladores, e se a obliqüidade pélvica fixa for maior que 15 graus5. A fixação através da junção lombo-sacra permanece um desafio, particularmente para a correção da deformidade espinhal neuromuscular38. Peelle et al. mostraram que os parafusos ilíacos (com parafusos pediculares lombares e/ ou sacrais) são equivalentes à técnica com haste de Galveston para a fixação pélvica na correção da escoliose neuromuscular. Parafusos permitem manutenção equivalente da correção da obliqüidade pélvica e da deformidade, mas são mais seguros durante a inserção e resultam em menos complicações com o implante a longo prazo17. Estudos recentes têm mostrado complicações com a técnica de Galveston. Sink et a.l atribuiu às forças cifosantes a alta incidência de arrancamento da fixação proximal e a migração distal das hastes de Galveston39. Existem duas grandes séries de correções de escolioses paralíticas utilizando a técnica de Galveston e duas séries com parafusos de fixação que nos permitem uma comparação das técnicas. Gau et al. estudaram 58 pacientes submetidos à instrumentação com Luque-Galveston com uma correção pélvica média de 53% (17°–8°)40. Yazici, Asher e Mardacker publicaram correção média de 81% (27°–5°) usando instrumentação com um sistema Isola-Galveston em 47 pacientes22. Miladi et al. mostraram uma correção média de 71% (21°–6°) usando parafusos ílio-sacrais com instrumentação com o sistema de Cotrel-Dubousset em 154 pacientes21 Neustadt, Shufflebarger e Cammisa relataram correção média de 37%; nove pacientes tiveram uma melhora média de 50%, mas quatro apresentaram piora da obliqüidade pélvica43. Nossa correção média da obliqüidade pélvica de 90% foi comparável às publicações encontradas. Tolo et al. utilizaram a técnica de instrumentação de Luque-Galveston em 54 pacientes e a fixação com parafusos ílio-sacrais em oito pacientes. Nos pacientes tratados com a fixação tipo Galveston, três tiveram material proeminente e sintomático com sintomas conseqüentes à proeminência do instrumental e um teve quebra do material com um índice geral de falha mecânica de 7% (4/54). Em contraste, dois pacientes com parafusos ílio sacrais tiveram quebra do material e pseudo-artrose com taxa de falha mecânica de 25% (2/8)34. Nós também tivemos um caso de material proeminente que teve de ser retirado e um caso de quebra de material associado à pseudo-artrose, observamos que estas complicações podem ser esperadas nestes casos. Devido a esta população de pacientes apresentar progressão da deformidade espinhal mesmo após a maturidade esquelética, fixação rígida e artrodese estão indicados. Ressaltamos a importância de tratar os desvios nos planos coronal e sagital e o desvio pélvico em pacientes com PC para evitar uma má postura para sentar, além de problemas relativos ao aparelho respiratório. Limitações do presente estudo incluem o design retrospectivo e a ausência de um grupo controle tratado com implantes de terceira geração. CONCLUSÃO Nesta série retrospectiva, o tratamento da escoliose nos pacientes com paralisia cerebral por meio de instrumentação longa estendida à pelve (Luque-Galveston) foi associado a resultados satisfatórios, com boa correção e estabilidade da curva e da obliqüidade pélvica e com poucas complicações se comparados aos relatos da literatura. A insuficiência do arco posterior como ocorre na espondilólise e espondilolistese ístmicas pode ser uma contra indicação para a utilização do método. REFERÊNCIAS 1. Teli MG, Cinnella P, Vincitorio F, Lovi A, Grava G, Brayda-Bruno M. Spinal fusion with Cotrel-Dubousset instrumentation for neuropathic scoliosis in patients with cerebral palsy. Spine. 2006; 31(14): E441-7. 2. Murphy N, Such-Neibar T. Cerebral palsy diagnosis and management: the state of the art. Curr Probl Pediatr Adolesc Health Care. 2003; 33(5):146-69. 3. Murphy NA, Firth S, Jorgensen T, Young PC. Spinal surgery in children with idiopathic and neuromuscular scoliosis. 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Prudente de Moraes 1965, Apto. 706 Belo Horizonte, MG Brasil CEP 30380-000 Tel.: + 31 3339-9248 / 3339-9241 E-mail:[email protected] COLUNA/COLUMNA. 2008;7(1):59-64 21_col_7_1.pmd 64 14/3/2008, 17:59
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