os impactos sociais positivos e negativos da reimplantação do jogo

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os impactos sociais positivos e negativos da reimplantação do jogo
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RESORTS TURÍSTICOS E CASSINOS: OS IMPACTOS SOCIAIS
POSITIVOS E NEGATIVOS DA REIMPLANTAÇÃO DO JOGO NO BRASIL
Autores: Antonella Satyro e
Dario Luiz Dias Paixão, M.Sc.
RESUMO
Percebe-se no mundo, um crescimento significativo do turismo e seus respectivos segmentos se
desenvolvendo expressivamente, trazendo inúmeras divisas aos países incrementando suas
economias. E, conseqüentemente aumentando a qualidade de vida das populações.
O segmento abordado neste artigo diz respeito, a priori, das pessoas que viajam em busca do jogo
como sua principal motivação. É uma atividade extremamente lucrativa e que onde se estabelece pode
trazer uma magnitude considerável de riquezas, melhoras na infra-estrutura do destino, geração de
empregos, conscientização da população quanto ao seu próprio patrimônio, implantação de novas
tecnologias, integração da comunidade com os turistas, entre muitos outros benefícios.
Por isso, são necessárias estratégias antes de implementar qualquer tipo de atividade relacionada aos
jogos de azar, que posteriormente, devem ser readequadas e controladas paralelamente a planos de
conscientização da população local e de visitantes para que saibam jogar de forma prazerosa, sem
vícios, malefícios causados à saúde ou qualquer outro tipo de sentimento causado pelo jogo.
Contudo, existem conseqüências maléficas à sociedade, que podem repercutir na sua vida cotidiana.
Vale salientar, a lavagem de dinheiro, fraudes fiscais e outros gravames que podem ocorrer na
localidade, se não forem fiscalizados rigorosamente por autoridades envolvidas e organismos
responsáveis por um turismo sustentável. Contudo, o principal impacto negativo diz respeito às
repercussões causadas na sociedade, o jogador patológico; conteúdo que é abordado neste estudo.
Como os cassinos foram proibidos no Brasil, por meio deste trabalho, são expostos os impactos sociais
negativos e positivos da reimplantação do jogo no país.
ABSTRACT
Nowadays, it is perceptible a very significant growth in tourism and its segmentations are developing
expressively. All these activities increase the income of the destination and improve the quality of life of
its population.
The focused segment in this article concerns about people who travel to gaming and gambling, their
main motivation. This area in tourism brings high profits; improves basic structures; creates jobs and
opportunities; educates a good part of the population about their own touristic attractions and heritages;
brings technologies never before experienced; integrates the community with the tourists and vice-versa;
among others.
And afterwards, they must be controlled by plans with the local community to teach them how to gamble
in a pleased way without addiction or bad influences to their health. If they are very organized and well
thought, they will succeed and will have lots of improvements in the local community. However, there are
some harmful consequences too. That is why some plans and strategies must be studied meticulously to
implant any kind of activity related to games and gambling.
Issues that must be paid attention are the frauds with the money earned, corruption, illegal international
transactions and others. All of that has to be rigorously watched by the authorities involved and
organizations that are responsable for sustantable tourism.
But the most powerfull of the negative impacts is related to consequences that can affect society: the
patological gambler. This will be explained in some details.
Casinos were banned from the Brazilian legislation, so this article tries to expose the positive and the
negative impacts that this activity can provide. It is fundamental to discuss them based on researches
and bibliographies in order to emphasize relevant aspects and topics about this important issue to the
Brazilian society and tourism in general.
PALAVRAS CHAVES: resorts, cassinos, jogo, impactos e vício.
KEYWORDS: resorts, casinos, gambling, impacts and addiction.
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INTRODUÇÃO
Na maioria dos países, o polêmico tema dos cassinos vem relacionado ao lazer e ao
turismo. Na Espanha, por exemplo, a relação destas áreas é evidente, e somente grandes
hotéis-cassinos ou complexos turísticos (os conhecidos resorts) podem atuar nesta área,
como por exemplo: Las Vegas e Atlantic City nos Estados Unidos; Sun City na África do
Sul; Macau na Ásia, e outros. Vale ressaltar que estes citados são grandes centros do
jogo-entretenimento.
No Brasil esta relação é conflituosa, pois há um impasse em relação ao jogo entre governo
e especialistas. Geralmente, os interessados são empresários e pessoas com interesses
financeiros que salientam e discutem sua reimplantação no país.
Devido a estes fatos, se questiona qual é a presença “apropriada”, se é que a mesma
existe, e o papel do jogo na sociedade brasileira.
Por este motivo, o tema deve ser debatido para não ocorrer a geração de impactos
negativos na economia, na sociedade e na cultura nos destinos turísticos ou que os
mesmos ocorram subitamente, sem um período de adaptação.
A sustentabilidade deve estar implícita em todas as atividades realizadas em determinado
entorno para que o mesmo não sofra uma desestruturação no seu modo de vida e
articulação com outras culturas.
Este artigo tem por objetivo colaborar no esclarecimento e na minimização da polêmica
que se respalda na falta de informação e na ausência de ordem na erroneamente intitulada
‘indústria do jogo’ no Brasil.
Para tanto, a metodologia empregada neste trabalho baseou-se em revisão bibliográfica
rigorosa sobre o tema dos impactos sociais negativos e positivos dos cassinos,
especialmente os causados nas comunidades locais de destinos que possuem esta
atividade legalizada.
Desde tempos mais remotos, a responsabilidade não era o ponto forte dos jogadores,
gerando muitas vezes, malefícios ao mesmo (vício pelo jogo e outros que também podem
ser agregados devido às transformações nas condições de vida que o jogador incorpora),
e aos que vivem ao seu redor. Por exemplo, a idoneidade moral dos estalajadeiros era por
vezes posta sob suspeita (WALKER, 2002).
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Todavia, os impactos positivos se sobrepõem aos negativos, pois trazem conseqüências
benéficas incontestáveis. Beneficiam a população em diversos aspectos, e com um
planejamento bem elaborado, a mesma pode melhorar sua qualidade de vida e do entorno
onde se encontra. Além do que, grande parte da população mundial desfruta do jogo como
uma opção de entretenimento.
1. IMPACTOS NEGATIVOS E SUAS REPERCUSSÕES SOCIAIS
O impacto social negativo mais representativo é o do jogo patológico e que será abordado
neste artigo brevemente. Segundo a American Psychiatric Association, na incapacidade
crônica de resistir ao impulso de jogar, "o jogo patológico é um dos problemas de saúde
mental que cresce mais rapidamente nos Estados Unidos e em outros países que o
legalizaram” (página web:www.nlgc.org acessado em 17/05/2000), sendo oficialmente
reconhecido pela Classificação Internacional de Doenças da OMS, publicada em 1979.
Para a medicina moderna, o jogo patológico é transtorno diagnosticado como doença
grave, pois além de prejuízos de ordem pessoal, afeta amigos e familiares do jogador.
Entende-se aqui patologia como um ramo da medicina que se ocupa da natureza e das
modificações produzidas no organismo, por doença.
Para o psiquiatra Hermano Tavares, coordenador do Ambulatório do Jogo Patológico do
Instituto de Psiquiatria da Universidade de São Paulo existe semelhança entre o jogador
patológico e o usuário de cocaína e outras drogas.
consiste
basicamente
em
psicoterapia
porque
Segundo o especialista, o tratamento
se
trata
de
uma
dependência
comportamental, causada por um mecanismo psicológico.
Para Tavares, a taxa de jogo patológico na geração adulta atual fica em torno de 2% e,
nos adolescentes 6%, um crescimento que vem assustando os americanos (página
web:www.drauziovarella.com.br acessado em 15/7/2005).
O envolvimento de adolescentes em jogos de azar é um dos assuntos mais discutidos por
cientistas da área devido ao seu crescimento acirrado, além dos números crescentes de
cassinos virtuais e estabelecimentos situados em reservas indígenas, e até mesmo em
regiões menos favorecidas economicamente.
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O jogo patológico acaba influenciando o viciado, sua família, e principalmente, o seu
entorno que vão sofrer as conseqüências do dependente. Devido à dependência, muitas
pessoas se tornam violentas, roubam e cometem crimes para obter dinheiro, e assim
continuar jogando. Todo esse ciclo repercute diretamente na sociedade, caso não seja
contido em determinada etapa.
Por
isso,
antes
de
implementar
qualquer
cassino,
hotel-cassino,
resorts
ou
estabelecimentos que ofereçam jogos de azar, é necessária a elaboração de planos e
estratégias que consigam fazer do jogo um entretenimento, uma diversão. Elaborar
inclusive, medidas preventivas por meio da educação da população para que a mesma
saiba conviver com esta atividade harmoniosamente.
E caso exista a ocorrência de viciados, que sejam tomadas medidas para resolver a
situação e não acarretar danos à sociedade onde o jogo está presente. Tanto os
estabelecimentos que oferecem estes serviços, como o próprio governo podem trabalhar
em parceria para encontrar soluções e caminhos melhores para estes problemas.
Historicamente, governos ameaçados pelo jogo proibiram esta atividade, até que uma
nova legislação e controle rigoroso do mesmo entrassem em vigor. Como isso não ocorreu
em muitos países, muitos deixaram de oferecer este tipo de entretenimento à população
por medo de não conseguir controlar o vício, por não elaborar leis rigorosas para o seu
controle, por ideologias próprias e uma série de outros fatores.
2. ESTUDOS SOBRE OS JOGADORES PATOLÓGICOS
A dissertação de mestrado de Oliveira (1997) constitui-se provavelmente no primeiro
estudo sistemático desse problema em amostra brasileira. Em sua pesquisa de campo,
entrevistou 171 freqüentadores assíduos de casas de aposta (bingo, Jockey Club e
videopôquer), dos quais 75 foram diagnosticados como jogadores patológicos. Em sua
maioria homens (87,7%), com 2o grau ou nível superior de educação (82,3%), empregados
em regime integral (71,6%), sendo a metade deles (50,7%) casados, com média de idade
em torno dos 40 anos e renda mensal média de R$ 4.000,00 (cerca de US$ 3.500 no
câmbio da época). Observa-se por esse perfil que se tratavam de adultos inseridos no
mercado de trabalho (grande maioria pertencente à classe média).
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O Jogo Patológico já foi classificado como comportamento compulsivo, como dependência
e, atualmente, encontra-se dentre os "Transtornos do Controle dos Impulsos NãoClassificados em Outro Local" no DSM-IV (AMERICAN PSYCHIATRIC ASSOCIATION,
1995).
O comportamento de jogar, sua estreita relação com o prazer e sua associação com
outras patologias de perfil impulsivo justificam sua classificação dentre os transtornos do
impulso. Contudo, o jogo patológico apresenta conformidade com outras patologias de
caráter não-impulsivo, como transtornos do humor e da ansiedade, e jogar, como forma de
evitar estados emocionais desfavoráveis, associado à sintomatologia ansiosa, sugere para
alguns autores, natureza compulsiva (SKODOL & OLDHAM, 1996).
Segundo a American Psychiatric Association (1995), o comportamento de jogo maladaptativo, persistente e recorrente, é indicado por cinco (ou mais) dos seguintes quesitos:
1. preocupação com o jogo (como obter dinheiro para jogar); 2. necessidade de apostar
cada vez mais; 3. esforços repetidos e fracassados no sentido de controlar, reduzir ou
cessar o jogo; 4. Inquietude ou irritabilidade, quando tenta reduzir ou cessar o jogo; 5. jogo
para fugir de problemas ou aliviar humor disfórico (impotência, culpa, ansiedade,
depressão e outros); 6. após perder dinheiro no jogo, volta outro dia para ficar quite
("recuperar o prejuízo"); 7. mente para familiares para encobrir a extensão de seu
envolvimento com o jogo; 8. comete atos ilegais, tais como falsificação, fraude, furto ou
estelionato, para financiar o jogo; 9. coloca em perigo o emprego ou uma oportunidade
educacional ou profissional por causa do jogo; 10. recorre a outras pessoas com o fim de
obter dinheiro para aliviar uma situação financeira desesperadora causada pelo jogo.
Custer (1984) define três fases fundamentais da evolução: a fase de ganhos, a de perdas
e a do desespero. A fase de ganhos é o período inicial de sorte que o jogo leva o jogador a
vitórias freqüentes, o que causa excitação, mais apostas e um progressivo montante de
dinheiro investido. Essa fase pode durar meses ou anos. O jogador patológico acredita que
é um jogador excepcional e, não se diferencia do social, mesmo indo a casas de apostas
freqüentemente. A segunda inicia-se com uma grande premiação, corroborando a
convicção do jogador de que ele possui uma relação particular com a sorte. A fase de
perdas se caracteriza por um otimismo irracional em relação ao jogo, quando o jogador se
vangloria de seus prêmios. Perdas são encaradas como ocorrências intoleráveis e
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reversíveis por meio de novas apostas. Jogar para recuperar os prejuízos é um marco do
comportamento patológico. (CUSTER, 1984)
O dinheiro emprestado não chega a preocupá-lo, pois, de acordo com sua convicção, as
dívidas serão saldadas com a premiação da vitória iminente. Eventualmente, o jogador
patológico chega a uma situação em que necessita recorrer a familiares ou conhecidos
para aliviar uma situação preocupante (ameaça de divórcio, perda de emprego, prisão ou
mesmo ameaça de morte).
Inicia, então, a terceira fase, ou a fase do desespero. Sem conseguir abster-se, o jogador
sofre paulatina exclusão da família pelo não-pagamento do dinheiro emprestado e pela
desilusão de promessas não cumpridas.
Aumentam, também, o tempo e o montante apostado. Um estado de grande ansiedade e
agitação emerge por: nova grande dívida; desejo de sanar as dívidas prontamente;
afastamento da família e dos amigos; reputação negativa que adquiriu na comunidade;
desejo nostálgico de voltar aos dias em que ganhava.
O otimismo esvai-se. Essa fase caracteriza-se pelo integral compromisso com o jogo e o
progressivo desinteresse pela família e pelos amigos. Jogar passa a ser um fim em si
mesmo e o emprego de métodos ilícitos para garanti-lo é comum. Essa fase é marcada
por constante agitação e irritabilidade, irregularidade nos padrões de sono e alimentação.
Física e psicologicamente exausto, um quarto dos jogadores nessa fase é preso e o
suicídio também é freqüente (DE CARIA et al, 1996).
Apenas uma parcela minoritária busca tratamento. Várias modalidades terapêuticas têm
sido sugeridas para o mesmo, mas investigações apontam efetividade apenas no início.
Quanto à questão da eficácia terapêutica, ela deve ser investigada criteriosamente, pois
até o momento não foi encontrado nenhum estudo de seguimento a longo prazo avaliando
custos e benefícios de um programa terapêutico abrangente.
Já, os resultados preliminares no AMJO1 são animadores: ao cabo de seis meses de
tratamento, dentre 14 pacientes inicialmente admitidos, 10 experimentam atualmente 60
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Trabalho desenvolvido no Ambulatório do Jogo Patológico e Outros Transtornos do Impulso – AMJO - do
Laboratório de Psicofarmacologia Experimental e Terapêutica Psiquiátrica do Departamento de Psiquiatria LIM-23 - da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo – FMUSP -, com apoio da FAPESP Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo e da CAPES - Coordenadoria de Aprimoramento
de Pessoal de Nível Superior.
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dias ou mais de abstinência, 2 abandonaram e 2 ainda jogam, porém com uma
significativa redução na freqüência e montante de dinheiro empregado nas apostas.
(TAVARES et al., 1998)
3. UMA ANÁLISE PATOLÓGICA DOS JOGOS DE AZAR NO BRASIL E SUAS
PERSPECTIVAS
Atualmente o Brasil experimenta e se ajusta às mudanças rápidas sob influência do
mercado globalizado, mas, em relação às questões do vício nada é simples. A igreja
combate à prática do jogo e algumas razões para o recuo dos políticos no momento de
legalizar os cassinos são inconfessáveis.
Muitas indagações são feitas sobre a forma contumaz e progressiva que alguns indivíduos
jogam, chegando a uma dependência emocional, afetando de forma negativa sua vida
pessoal, familiar e profissional.
Para vários pesquisadores, é possível desenvolver um bom método de diagnóstico capaz
de revelar a intensidade do vício por jogos de azar, caso o problema seja detectado a
tempo. Identificar as características dos portadores deste problema patológico tem sido
tema de constantes investigações em vários países.
A necessidade de recuperar o dinheiro após perdê-lo, os problemas familiares ou a
obsessão por continuar jogando, são algumas das razões que levam ao vício. Estudos
mostram que uma vez viciados, cerca de 80% dos pacientes em tratamento, costumam
mentir à família, e ocultam sua condição de jogador insopitável. Também, especialistas
buscam os motivos pelos quais se joga para verificar as emoções que as apostas
produzem, o que tem provado que o jogo intenso é um vício igual ao uso freqüente de
drogas, pois ambos tem por finalidade dar prazer ao “usuário”.
Pesquisas concordam que na Espanha e nos Estados Unidos, dois dos países onde mais
se joga (1,5% a 2,0% da população representa jogadores patológicos que necessitam de
tratamento para poder abandonar esta prática. (VOLBERG in: EADINGTON &
CORNELIUS, 1993)
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Como nestes países, no Brasil, os números premiados ganham espaço na mídia, sendo
transmitidos os resultados de maneira instantânea e via satélite.
As loterias oficiais aumentam não só a quantidade de seus sorteios, como massificam a
divulgação de resultados, especialmente em programas esportivos de grande audiência.
Belas mulheres apresentam os resultados e alertam para a premiação acumulada, para
assim, atingir um número maior de apostadores.
Esta presença da publicidade nos jogos de azar sem que seus organizadores não gastem
nada é somada à propaganda oficial, cujas mensagens criativas e sutis, arremetem o
jogador para sonhos inatingíveis. A ilusão surge na mente do trabalhador assalariado,
como única e rara oportunidade de prosperar.
Enquanto
os
chamados
jogos
oficiais
institucionalizados,
supervisionados
pela
administração pública se valem de um aparato burocrático impressionante, crescem no
seio do povo as apostas clandestinas. Rinhas com as eróticas brigas de galo ganham
adeptos e malgrado o esforço de uma Juíza no Rio de Janeiro, ninguém consegue acabar
com as proibidas “fézinhas” do jogo do bicho.
Ninguém duvida das boas intenções das associações de moradores e do síndico do seu
prédio, de sofisticadas estratégias de marketing até “ações entre amigos”. A quantidade de
apelos emotivos diariamente é indiscutível. Dos formandos aos paroquianos festeiros,
todos nos oferecem a sorte grande, o que evidencia ainda mais que vivemos em um
cassino clandestino.
Os participantes de jogos de azar vêem essa diversão inofensiva, fortalecedora de laços
de amizade, gostam da ilusão de ganhar um grande prêmio investindo uma quantia
acessível e argumentos do gênero que lhes são dados.
No Brasil, a Caixa Econômica Federal tem elevados ganhos com a Loteria Federal; Loteca
(periodicidade semanal); Lotogol, Lotomania (para quem não acerta); Quina (apostas
prognósticos), Mega-Sena; Dupla Sena e Lotofácil. A mega-sena é uma modalidade de
jogo de apostas de prognósticos, cujo resultado é a apuração de seis dezenas sorteadas
dentre um total de 60, diferente da Dupla Sena, cujo resultado é a apuração de seis
dezenas sorteadas dentre um total de 50.
Já o Lotofácil sugere ao apostador que é uma maneira fácil de ganhar. Por uma simples
Circular, a de nº 238 de 8 de fevereiro de 2002, a Diretoria de Serviços Financeiros da
Caixa lançou dois concursos de prognósticos esportivos, ampliando sua captação, cuja
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premiação é baseada ou nos resultados (Loteca) ou nos escores (gols marcados), a
Lotogol.
Árbitros foram corrompidos e uma pesquisa do Jornal Folha de São Paulo, sobre o
escândalo do apito e seus desdobramentos nos tribunais mostram que para mais de 70%
dos torcedores, o campeonato brasileiro “perdeu a graça”.
Do valor total (bruto) arrecadado de cada concurso da Caixa, são descontados 4,5% para
a Secretaria Nacional de Esportes; 7% para seguridade social; 4,5% para o Fundo de
Financiamento ao Estudante de Ensino Superior; 3% para o Fundo Penitenciário Nacional;
10,5% para a Secretaria Nacional de Esportes; 10% para Entidades de Prática Desportiva
(clubes e seleções); 3% para o Fundo Nacional de Cultura; 1,7% para o Comitê Olímpico
Brasileiro e 20% vai para o pagamento de custeio e manutenção.
Do montante destinado a prêmios, são deduzidos os recursos destinados ao Fundo
Nacional de Cultura; Comitê Olímpico (e Paraolímpico) Brasileiro, além da incidência do
percentual de 30% destinado ao Imposto de Renda.
De um lado, temos os “acertadores dos jogos oficiais” e de outro os “jogadores de azar dos
jogos proibidos”. A sorte no lado oficial; e o azar na periferia, nos morros e nas favelas?
Será que o jogo ilegal ocorre somente nestes ambientes? E será que os jogos oficiais são
realmente legais em todos os seus aspectos e trâmites?
Pode-se dizer que a palavra azar não faz parte da propaganda oficial. Ela dá idéia de má
sorte, enquanto os “não oficiais” são classificados como “jogos de azar”.
É evidente que os altos impostos cobrados impedem o desenvolvimento dos jogos de
azar, desde que sejam mantidos pelo Estado. São pagos voluntariamente, sem
necessidade do aparato da fiscalização ou da coação dos agentes fazendários.
Dados interessantes, também, foram coletados e estudados pelo AMJO - Ambulatório do
Jogo Patológico do Instituto de Psiquiatria da Universidade de São Paulo, com ênfase ao
perfil do viciado patológico em jogos (bingos, loterias, vídeo-pôquer, corridas de cavalos,
cassinos e outros que envolvam dinheiro). Inicialmente foram selecionadas 120 pessoas
com a idade média de 40 anos, objetivando comparar o comportamento do jogador
patológico com o portador de transtorno obsessivo-compulsivo (TOC). O grupo foi dividido
em três partes iguais, sendo uma de viciados patológicos, outra de portadores de TOC e
uma terceira de pessoas sem comprovação de problemas deste tipo. (TAVARES et al.,
1998)
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Neste estudo, concluiu-se que as mulheres desenvolvem o vício em média quatro vezes
mais rápido do que os homens. Em grande parte dos viciados o problema ocorre no
período entre 3 e 12 meses (40% dos casos) e para outro grande número, o vício ocorre
antes dos três meses (22% dos casos). Verificou-se ainda que há uma grande relação
entre viciados em jogos e alcoolismo (20% deles são também alcoólatras), fumo (62% são
tabagistas) e desemprego (50% dos viciados estavam desempregados).
Na comparação aos portadores de TOC, viu-se que entre os viciados em jogos, a
dependência de substâncias psicoativas é dez vezes maior (esta pesquisa inicial foi
defendida como tese de doutorado na USP pelo doutor Hermano Tavares). O jogo
patológico é um transtorno psiquiátrico cujo diagnóstico operacional foi formalizado
recentemente, e que é também conhecido como jogo compulsivo. (TAVARES et al., 1998)
Como este transtorno, hoje classificado dentre os Transtornos do Impulso a aguardar
melhor caracterização psicopatológica, vem aumentando em decorrência da exploração
comercial do jogo, o mesmo impõe a necessidade de superação da atual falta de
informação e desconhecimento em relação a esse diagnóstico.
Do ponto de vista médico-científico, ao se constituir como uma dependência prescindida
de substância psicoativa, o jogo patológico oferece um modelo propício para investigações
de fatores extrafarmacológicos de dependências.
Tavares e Gentil (1997) assinalam que o jogo patológico somente veio ser reconhecido
oficialmente como transtorno psiquiátrico a partir do DSM-III da American Psychiatric
Association de 1980. Esse diagnóstico pode ser vítima de considerável negligência tanto
na esfera médica quanto na social.
No Brasil, dados epidemiológicos sobre transtornos mentais são escassos, e quando a
patologia diagnosticada é recente, estes se tornam quase inexistentes. Ainda, é
necessário alertar as autoridades para o aumento da patologia no país à medida que se
popularizam os jogos computadorizados.
4. IMPACTOS SOCIAIS POSITIVOS DO JOGO
Do ângulo do turismo e do entretenimento, os aspectos regulamentares têm como objetivo
limitar, restringir e controlar o jogo por meio de normas em que empresários obtém
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licenças ou concessões. Ainda, regular o jogo para assegurar operações justas e
honestas; vigiar a operação do jogo para prevenir atividades ilícitas ou ilegais, regular e
vigiar as companhias fornecedoras e prestadoras de serviços de apoio para prevenir
atividades ilegais e o acesso de menores de idade na área do cassino, dentre outras
medidas.
Esta combinação de fatores deve proporcionar as bases para o alcance de programas e
benefícios sociais necessários. Cada licença ou concessão que se outorgue deve
considerar o planejamento do entretenimento familiar, tais como eventos desportivos ou
concertos musicais, atividades para menores, entre outros.
Ainda, é importante que não se facilite o acesso da população local a estes
empreendimentos – que deveriam apenas existir em poucos resorts turísticos com entrada
restrita - diminuindo, assim, os efeitos negativos do jogo e reforçando o aspecto turístico e
de entretenimento da atividade.
O jogo aliado ao lazer e ao turismo movimenta, anualmente, recursos de montantes
exorbitantes. Uma relação econômica que atrai benefícios como: aumento das cifras do
turismo receptivo internacional; número de entradas; gasto médio/dia e permanência dos
visitantes; aumento de divisas, impostos e investimentos nos locais onde se instalem;
promoção de uma imagem de destino completo e de qualidade, competindo com mais
vantagens sobre seus concorrentes; construção de novos hotéis e resorts, além do
aumento da rentabilidade e ocupação daqueles já existentes; estímulo a eventos especiais
como congressos e convenções; espetáculos; competições desportivas; festivais de
música e cultura, reduzindo a sazonalidade dos pólos turísticos; e ainda, como impacto
positivo mais importante para este estudo, a geração de um sem número de benefícios
para as comunidades envolvidas, tanto na educação como na saúde; ampliando para a
segurança pública e até mesmo junto à infra-estrutura básica; e evidentemente o aumento
do número de empregos diretos e indiretos.
Vários estudos científicos comprovam que os impactos positivos se sobrepõem aos
negativos (especialmente vício, lavagem de dinheiro e crime organizado) quando o jogo é
implantado, administrado e controlado com rigor e honestidade.
Esse assunto reveste-se de maior interesse no Brasil, agora que se discute a legalização
de cassinos como forma de revitalização da economia por meio do comércio e do turismo.
Esta seria uma excelente alternativa para a obtenção de divisas ao país e assim, fazer
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com que o mesmo incrementasse sua economia e se desenvolvesse em muitos outros
setores que sofreriam dessas conseqüências totalmente benéficas.
Vale lembrar que este proporcionamento de divisas afetaria toda a sociedade, aumentando
e melhorando todo o sistema vigente em termos de conjuntura política e econômica atual.
Embora Oliveira (1997) conclua que a proibição completa remeteria os jogadores
patológicos às vicissitudes associadas a uma contravenção, seus dados sugerem
vantagens no controle dessa atividade: metade dos jogadores patológicos que
freqüentavam casas de videopôquer parou de jogar quando esse jogo foi proibido.
Não resta dúvida que o jogo patológico é um transtorno que pode ser grave do ponto vista
médico-social e intrigante do ponto de vista científico. O entusiasmo com as crescentes
potencialidades do turismo via estímulo do jogo, deve ser comedido, em função da
necessidade de estudos mais amplos e profundos, capazes de avaliar e o impacto social
dessa medida.
É preciso maior esforço dos interessados em diminuir os efeitos sociais do jogo e que
sejam estabelecidas regras para que este setor se desenvolva sem prejudicar a
sociedade, como programas responsáveis, jogos de entretenimento e educativos.
Segundo a pesquisa da Harrah's Entretenimentos para a Associação Americana de Jogos,
em 1996, 92% dos adultos americanos consideraram os cassinos aceitáveis para si
mesmos e para outros. Em outra pergunta, 62% diziam que os cassinos são um
entretenimento válido para qualquer um, 30% que é aceitável para outros, não para si
mesmos, e somente um 8% afirmavam que o jogo não é válido para ninguém.
A pesquisa mostra ainda um aumento de aceitação e quando a amostra está dividida em
regiões, a aceitação supera os 50% em qualquer região dos Estados Unidos. Mais de três
quartos da população americana (84%) crêem que a regulamentação dos cassinos deve
ser feita pelo governo estadual e não pelo federal.
Para muitas comunidades o jogo tem sido bom, como em Atlantic City, onde novos
colégios, construções de habitações, de um Centro de Convenções de 265 milhões de
dólares e programas de limpeza das ruas, parques, segurança e outros foram
desenvolvidos.
Em New Jersey, serviços importantes aos idosos e pessoas com necessidades especiais
recebem 8% da arrecadação anual do rendimento bruto dos cassinos por meio do Fundo
de Rendimentos de Cassinos de New Jersey.
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Também, contribuem com a polícia e os bombeiros, bem como manutenção das escolas,
instituições de saúde e assistência social, como “contra-ponto” às influências negativas
que a presença dos cassinos possam trazer à comunidade.
A Associação Americana de Jogos tem desenvolvido projetos como: Speakers Bureau e
Vídeo-Treinamento, o que traz informação up to date e cria consciência pública sobre a
real extensão dos problemas. O Treinamento em Vídeo assegura a capacitação dos
empregados dos cassinos e garante melhor qualidade possível em seus serviços. Os
vídeos mostram cenários em que há transtornos para os empregados dos cassinos,
incluindo a supervisão, direção e croupier, por exemplo.
Os empregados dos cassinos têm realizado importantes contribuições à sociedade, e
ademais, colaboram com pesquisas sobre os resultados de esforços feitos como
voluntários para organizações comunitárias e de caridade.
Mesmo assim, o Brasil que é considerado um país em desenvolvimento por seus mais
diversos problemas econômicos, políticos, administrativos e sociais, não deve ficar alheio
ao planejamento e à discussão dos impactos sociais, uma vez que os números negativos
do jogo não podem ser maiores do que aqueles dos países ricos, que já possuem cassinos
há tanto tempo.
Outro ponto que deve ser enfatizado é que o país está perdendo uma demanda tanto
nacional como internacional que poderia abarcar se legalizasse o jogo, pois o Brasil possui
infinitos atrativos turísticos belíssimos e de uma qualidade intangível pertencentes a todos
os segmentos, e que não existem em nenhum outro continente. E também, sofre com
emissões de turistas que vão procurar este tipo de entretenimento em outros países que o
oferecem, levando divisas a mercados internacionais e que poderiam estar circulando no
próprio país e beneficiando o povo brasileiro.
Os jogos de azar fazem parte de uma segmentação que se encontra em crescente
expansão, e que ganha adeptos com muita freqüência. Na América do Sul, a oferta de
cassinos e resorts turísticos que oferecem o serviço de jogos de azar é ínfima, contando
apenas com poucos bons exemplos, como o Conrad em Punta Del Este, no Uruguai que é
de propriedade da Ceaser´s Entertainment (rede que possui diversos cassinos em Las
Vegas).
E por sinal, o mesmo possui um escritório na cidade de São Paulo e em Buenos Aires,
pois fazem freqüentes promoções, torneios, estadias totalmente pagas com aviões
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fretados para levar cada vez mais turistas que detém grande quantidade de capital e
gostam de investir em jogos. Vale salientar que a demanda brasileira é a que mais cresceu
durante os anos em número de visitantes a este empreendimento, e também devido à
proximidade do Brasil ao Uruguai.
Contudo, o mesmo não possui estrutura similar aos das cidades de Las Vegas, Reno,
Atlantic City e outras. Oferece bons serviços, padronizados, restaurantes, algumas salas
de jogos, spa, espetáculos e outros, mas as estruturas em relação ao tamanho, a
grandiosidade e a imponência não chegam perto dos famosos e gigantescos cassinos
espalhados pelo mundo.
CONCLUSÃO
Percebe-se que a prevalência e o impacto do jogo patológico no Brasil ainda não são
totalmente conhecidos. Em alguns países, como a Espanha e os Estados Unidos há
preocupação referente aos dados estatísticos obtidos nos últimos anos e muitas pesquisas
têm surgido.
Todavia, alguns dados foram apresentados para o conhecimento público de que existem
viciados em jogos de azar mesmo onde são liberados, mas é um número menor do que se
imagina e se medidas adequadas fossem aderidas, este problema não seria disseminado
facilmente.
No Brasil existem outros tipos de jogos, que também são similares aos de azar e nem por
isso, foram banidos da constituição brasileira. Notícias de fraudes e outros roubos
cometidos nestas áreas são divulgados freqüentemente, nada é feito pelo governo e
mesmo assim, existem viciados e jogadores patológicos. Talvez o número seja ainda
maior e progressivo devido à ocorrência de “jogatinas” ilegais que acontecem em todos os
estados do país, entre adolescentes, adultos e mais velhos, homens e mulheres, e sem
distinção de classe social.
Por este motivo, vale ressaltar que o jogo pode ser legalizado, desde que regulamentado
por meio de políticas governamentais precisas e rigorosas que o mantenham equilibrado e
trazendo divisas que poderão ser quantificadas e de conhecimento do governo para um
15
melhor controle da atividade. Assim, melhorando a arrecadação de impostos e
beneficiando a população de determinado destino turístico e, também, de outras regiões.
Atenta-se ao fato da implementação do jogo como um fator de criação de novos produtos
turísticos de qualidade e aptos para sua exportação mundial. E também, fazendo com que
o turismo interno fosse mais significativo e que as pessoas não precisassem ir a outros
países para jogar em cassinos.
As conseqüências positivas são inúmeras, e todas as pesquisas efetuadas mostram que
mesmo havendo jogadores patológicos, os benefícios gerados à população são de caráter
verdadeiro e que proporcionam melhorias na qualidade de vida das pessoas e incentivos a
conscientização de uma integração dentro da comunidade e também, da mesma com os
turistas e outras culturas, sempre que o governo atue com clareza, rigor e seriedade.
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