REVISTA UNIVAP
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REVISTA UNIVAP Universidade do Vale do Paraíba Ficha Catalográfica Revista UniVap - Ciência - Tecnologia - Humanismo. v.1, n.1 (1993)São José dos Campos: UniVap, 1993v. : il. ; 30cm . Semestral com suplemento. ISSN 1517-3275 1 - Universidade do Vale do Paraíba A REVISTA UniVap tem por objetivo divulgar conhecimentos, idéias e resultados, frutos de trabalhos desenvolvidos na UNIVAP - Universidade do Vale do Paraíba, ou que tiveram participação de seus professores, pesquisadores e técnicos e da comunidade científica. Os artigos assinados são de responsabilidade exclusiva de seus autores. A publicação total ou parcial dos artigos desta revista é permitida, desde que seja feita referência completa à fonte. CORRESPONDÊNCIA UNIVAP - Av. Shishima Hifumi, 2.911 - Urbanova CEP: 12244-000 – São José dos Campos - SP - Brasil Tel.: (12) 3947-1036 / Fax: (12) 3947-1211 E-mail: [email protected] Av. Shishima Hifumi, 2911 - Urbanova CEP: 12244-000 - São José dos Campos - SP Fone: (12) 3947-1000 - www.univap.br Campus Centro: Praça Cândido Dias Castejón, 116 - Centro São José dos Campos - SP - CEP: 12245-720 - Tel.: (12) 3928-9800 Rua Paraibuna, 75 - Centro São José dos Campos - SP - CEP: 12245-020 - Tel.: (12) 3928-9800 Campus Urbanova: Avenida Shishima Hifumi, 2911 - Urbanova São José dos Campos - SP - CEP: 12244-000 - Tel.: (12) 3947-1000 Campus Urbanova/Jacareí: acesso pela Avenida Shishima Hifumi, 2911 - Urbanova São José dos Campos - SP - CEP: 12244-000 - Tel.: (12) 3947-1000 Campus Villa Branca: Estrada Municipal do Limoeiro, 250 - Jd. Dora Jacareí - SP - CEP: 12300-000 - Tel.: (12) 3958-4000 Campus Aquarius: Rua Dr. Tertuliano Delphim Junior, 181 - Jardim Aquarius São José dos Campos - SP - CEP: 12246-080 - Tel.: (12) 3923-9090 Campus Platanus: Campus Caçapava: Avenida Frei Orestes Girardi, 3 - Bairro Fracalanza Campos do Jordão - SP - CEP: 12460-000 - Tel.: (12) 3664-5388 / 3662-4667 Estrada Municipal Borda da Mata, 2020 Caçapava - SP - CEP: 12284-820 - Tel.: (12) 3655-4646 Supervisão Gráfica: Profa. Maria da Fátima Ramia Manfredini - Departamento de Cultura e Divulgação - Univap / Revisão: Prof. Antônio Ravanelli e Sra. Teruka Minamissawa / Editoração Eletrônica: Glaucia Fernanda Barbosa Gomes - Univap (12) 3947-1036 / Impressão: Jac Gráfica e Editora - (12) 3928-1555 / Publicação: Univap/2008 Baptista Gargione Filho Reitor Antonio de Souza Teixeira Júnior Vice-Reitor e Pró-Reitor de Integração Universidade Sociedade SUMÁRIO v. 15 n. 27 set. 08 ISSN 1517-3275 Ailton Teixeira Pró-Reitor de Administração e Finanças Elizabeth Moraes Liberato Pró-Reitora de Avaliação Maria Cristina Goulart Pupio Silva Pró-Reitora de Assuntos Jurídicos Maria da Fátima Ramia Manfredini Pró-Reitora de Cultura e Divulgação Acadêmica Maria Helena Beolchi Rios Ribeiro Pró-Reitora de Projetos e Ação Social Renato Amaro Zângaro Pró-Reitor de Cooperação Nacional e Internacional Samuel Roberto Ximenes Costa Pró-Reitor de Educação Superior e Educação Continuada Frederico Lencioni Neto Diretor Geral do Campus Villa Branca - Jacareí Eduardo Jorge Brito Bastos Diretor da Faculdade de Engenharias, Arquitetura e Urbanismo Luiz Carlos Andrade de Aquino Diretor da Faculdade de Direito do Vale do Paraíba Emilia Angela Loschiavo Arisawa Diretor da Faculdade de Ciências da Saúde Marcio Magini Diretor da Faculdade de Ciências Sociais Aplicadas e Comunicação Maria Valdelis Nunes Pereira Diretora da Faculdade de Educação e Artes e Diretora do Instituto Superior de Educação Sandra Maria Fonseca da Costa Diretora do Instituto de Pesquisa e Desenvolvimento COORDENAÇÃO GERAL Antonio de Souza Teixeira Júnior REVISÃO DE TEXTO Antônio Ravanelli e Teruka Minamissawa DIGITAÇÃO E FORMATAÇÃO Glaucia Fernanda Barbosa Gomes CONSELHO EDITORIAL Alexandro Oto Hanefeld Amilton Maciel Monteiro Antonio de Souza Teixeira Júnior Antônio dos Santos Lopes Cláudio Roland Sonnenburg Elizabeth Moraes Liberato Francisco Pinto Barbosa Frederico Lencioni Neto Heitor Gurgulino de Souza Jair Cândido de Melo Luiz Carlos Scavarda do Carmo Marcos Tadeu Tavares Pacheco Maria da Fátima Ramia Manfredini Maria Tereza Dejuste de Paula Paulo Alexandre Monteiro de Figueiredo Rosângela Taranger Samuel Roberto Ximenes Costa Vera Maria Almeida Rodrigues Costa PALAVRA DO REITOR. ..................................................................................... 5 EDITORIAL. .......................................................................................................... 7 A FUNDAÇÃO VALEPARAIBANA DE ENSINO (FVE) E A UNIVERSIDADE DO VALE DO PARAÍBA (UNIVAP) ............................... 9 ANÁLISE DAS OBSERVAÇÕES MÉDICO-PEDAGÓGICAS DESENVOLVIDAS NA CRECHE-ESCOLA MARIA CLARA MACHADO Omar Amaro, Sonia Sirolli, Maria Tereza Dejuste de Paula, Rodrigo Milagres Nascimento .......................................................................................................... 1 3 LEVANTAMENTO PRELIMINAR DE ESPÉCIES DE BORBOLETAS EM DUAS ÁREAS DO CAMPUS URBANOVA Joyce Valério Cinachi, Nádia Maria Rodrigues de Campos Velho .................. 1 8 VARIAÇÃO MORFOLÓGICA DO TRYPANOSOMA RANGELI EM DIFERENTES CONDIÇÕES DE CULTIVO Marta Aparecida Moreto, Marco Antonio de Oliveira .................................. 2 7 CONDIÇÕES PARA A LINEARIDADE DA RELAÇÃO ENTRE DÉBITO CARDÍACO E CONSUMO DE OXIGÊNIO Mituo Uehara, Kumiko K. Sakane ................................................................... 3 5 ALIMENTAÇÃO DE SERRANIDAE (ACTINOPTERYGII, TELEOSTEI, PERCIFORMES) NA PRAIA DE CABUÇU (SAUBARA, BAÍA DE TODOS OS SANTOS, BAHIA). III. RYPTICUS RANDALLI COURTENAY, 1967 Paulo Roberto Duarte Lopes, Jailza Tavares de Oliveira-Silva, Rogenaldo de Brito Chagas ........................................................................................................ 4 2 ANÁLISE ECONÔMICA DO AEROPORTO INTERNACIONAL DE VIRACOPOS Josmar Cappa, Fernanda Patrícila Alves ........................................................... 4 7 DESENVOLVIMENTO TURÍSTICO SUSTENTÁVEL: ENFOQUE NO ARTESANATO LOCAL NA CIDADE DE SANTO ANTÔNIO DO PINHAL, SP Rosangela Sant’Ana, Fábio Ricci ...................................................................... 5 6 SIMULADOR PARA SISTEMAS DE CONTROLE DE ATITUDE Claudinei José Castro, Wanderley Pires Cunha, Lízia Oliveira Acosta Dias 6 4 OTIMIZAÇÃO DE PROCESSOS NA ÁREA DE RECEBIMENTO DE MATERIAIS DA INDÚSTRIA AERONÁUTICA BRASILEIRA Teresa Raquel Pereira da Silva, Wellington Gonçalves Rodrigues, Jesuíno Takachi Tomita .................................................................................................. 7 6 O PERFIL E O FOCO NO CLIENTE: SÃO FUNDAMENTAIS PARA AS ACADEMIAS DESENVOLVEREM UM RELACIONAMENTO POSITIVO COM SEU CLIENTE Ive Luciana Ramos, Luis Fernando Zulietti, Rogério dos Santos Morais .... 8 7 Baptista Gargione Filho Reitor ESPECIAL GERONTOLOGIA ...................................................................... 9 9 Antonio de Souza Teixeira Júnior Vice-Reitor e Pró-Reitor de Integração Universidade Sociedade APRESENTAÇÃO .......................................................................................... 101 Ailton Teixeira Pró-Reitor de Administração e Finanças LONGEVIDADE, PARA QUÊ? Elizabeth Moraes Liberato .............................................................................. 105 Elizabeth Moraes Liberato Pró-Reitora de Avaliação Maria Cristina Goulart Pupio Silva Pró-Reitora de Assuntos Jurídicos Maria da Fátima Ramia Manfredini Pró-Reitora de Cultura e Divulgação Acadêmica Maria Helena Beolchi Rios Ribeiro Pró-Reitora de Projetos e Ação Social Renato Amaro Zângaro Pró-Reitor de Cooperação Nacional e Internacional Samuel Roberto Ximenes Costa Pró-Reitor de Educação Superior e Educação Continuada Frederico Lencioni Neto Diretor Geral do Campus Villa Branca - Jacareí Eduardo Jorge Brito Bastos Diretor da Faculdade de Engenharias, Arquitetura e Urbanismo Luiz Carlos Andrade de Aquino Diretor da Faculdade de Direito do Vale do Paraíba Emilia Angela Loschiavo Arisawa Diretor da Faculdade de Ciências da Saúde Marcio Magini Diretor da Faculdade de Ciências Sociais Aplicadas e Comunicação Maria Valdelis Nunes Pereira Diretora da Faculdade de Educação e Artes e Diretora do Instituto Superior de Educação Marcos Tadeu Tavares Pacheco Diretor do Instituto de Pesquisa e Desenvolvimento COORDENAÇÃO GERAL Antonio de Souza Teixeira Júnior REVISÃO DE TEXTO Antônio Ravanelli e Teruka Minamissawa DIGITAÇÃO E FORMATAÇÃO Glaucia Fernanda Barbosa Gomes CONSELHO EDITORIAL Alexandro Oto Hanefeld Amilton Maciel Monteiro Antonio de Souza Teixeira Júnior Antônio dos Santos Lopes Cláudio Roland Sonnenburg Elizabeth Moraes Liberato Francisco Pinto Barbosa Frederico Lencioni Neto Heitor Gurgulino de Souza Jair Cândido de Melo Luiz Carlos Scavarda do Carmo Marcos Tadeu Tavares Pacheco Maria da Fátima Ramia Manfredini Maria Tereza Dejuste de Paula Paulo Alexandre Monteiro de Figueiredo Rosângela Taranger Samuel Roberto Ximenes Costa Vera Maria Almeida Rodrigues Costa O PROCESSO DE ENVELHECIMENTO: CONHECENDO AS TRANSFORMAÇÕES Maria Piedade Vieira Grigoleto, Elizabeth Moraes Liberato ........................ 111 O DESAFIO DO DIAGNÓSTICO PRECOCE DO CÂNCER DE PRÓSTATA NO TRABALHADOR BRASILEIRO DENTRO DO SISTEMA PÚBLICO DE SAÚDE: UMA REALIDADE QUE PRECISA SER CONHECIDA E MODIFICADA Paulo Afonso de Barros, Elizabeth Moraes Liberato ................................... 116 DEPRESSÃO NO IDOSO José Valter de Andrade, Maria Clara Lombardi de Castro Silva, Rosana Bernacca, Rosana Pereira Domiciano Moura, Elizabeth Moraes Liberato 121 CONVIVÊNCIA FAMILIAR NA VELHICE Diva Maria Silva Santos, Lilian Cesare Costa, Mariângela Rebouças de Paula Rodrigues, Elizabeth Moaes Liberato ............................................................. 124 A IMPORTÂNCIA DO CUIDADOR DO IDOSO NA SOCIEDADE BRASILEIRA Patrícia S. M. E. Fonseca, Gesilene A, Simões, Elizabeth Moraes Liberato128 MULHERES SOLTEIRAS NA TERCEIRA IDADE: UM QUESTIONAMENTO DE VIDA Marilda Piedade Godoi, Elizabeth Moraes Liberato ..................................... 132 INTERGERACIONALIDADE: AS RELAÇÕES ENTRE JOVEM E IDOSO Maria Ruth de Almeida Cavalcante, Elizabeth Moraes Liberato ................ 136 O IDOSO VÍTIMA DE MAUS TRATOS NA FAMÍLIA Geralda Pereira Costa, Elizabeth Moraes Liberato ....................................... 138 APOSENTADORIA: PRÊMIO OU CASTIGO? Priscila Flores Chaves da Conceição, Elizabeth Moraes Liberato .............. 141 POPULAÇÃO DE RUA: ENVELHECENDO SEM ACESSO A DIREITOS Taís Cesário de Castro, Elizabeth Moraes Liberato ...................................... 145 PASTORAL DA PESSOA IDOSA: UMA AÇÃO PRÓ-ATIVA? Eliana Pereira Montenegro, Fátima Aparecida Ferreira Barbosa, Margareth Serpa Ferreira Gomes, Elizabeth Moraes Liberato ....................................... 148 A IMPLEMENTAÇÃO DO ATENDIMENTO AO IDOSO NO MUNICÍPIO DE SÃO JOSÉ DOS CAMPOS, SEGUNDO AS NOVAS DIRETRIZES DO SUAS Teresa de Jesus Freire, Elizabeth Moraes Liberato ....................................... 151 GRUPOS DE CONVIVÊNCIA DE IDOSOS NO MUNICÍPIO DE SÃO JOSÉ DOS CAMPOS, SP Dioguina das Graças B. V. Costa, Sueli N. Santos, Elizabeth M. Liberato .. 154 A MAGIA DO MERCADO MUNICIPAL: ESPAÇO URBANO DE ENCONTROS Rosa Ester Guimarães de Quadros, Elizabeth Moraes Liberato ................... 157 ENCONTROS INTERGERACIONAIS - TRANSCENDENDO DIFERENÇAS, COMPONDO ESPAÇO DE APRENDIZADO E TROCA ENTRE GERAÇÕES Mariangela Faggionato dos Santos ................................................................. 160 EDUCAÇÃO CONTINUADA E PROJETO DE VIDA DE PESSOAS IDOSAS Débora Wilza de Oliveira Guedes .................................................................... 167 NORMAS GERAIS PARA A PUBLICAÇÃO DE TRABALHOS NA REVISTA UNIVAP ........................................................................................... 173 PALAVRA DO REITOR A Revista Univap chega agora ao seu número 27. Não é tarefa simples a produção de uma Revista, como a nossa, que se dedica, com profundidade, à análise de temas ligados ao que ocorre no ensino de tantas disciplinas. Cada artigo é, sempre, um manancial precioso para novos aprofundamentos e com isto cumpre a missão da Universidade de procurar a inovação. A Revista Univap está aberta à publicação de artigos de boa qualidade, sujeitos à revisão do conteúdo e da linguagem. Neste número, abrimos ao “setor da Terceira Idade” e a seus pós-graduados em nível de Especialização, docentes e coordenadora a oportunidade de retratar a sua experiência, reservando-lhes o anexo “Especial Gerontologia” para divulgar sua experiência. A Faculdade da Terceira Idade vem sendo dirigida pela Pró-Reitora de Avaliação da Univap, Profa. Dra. Elizabeth Moraes Liberato, com grande competência e os resultados têm sido promissores, com o pessoal estudando e terminando o curso regular de extensão e atualização cultural. Mas, sobretudo a Faculdade dá a esses alunos condições de se sentirem úteis. É fácil compreender a importância de cursos da Terceira Idade, num mundo cuja esperança de vida ao nascer vem aumentando e cuja população adulta detém apreciável experiência que pode ser canalizada para realizações profícuas. Este potencial disponível é muito grande e é necessário saber aproveitá-lo. Este é o grande objetivo a alcançar. A leitura atenta da apresentação, às pp. 91-93, da Profa. Dra. Elizabeth Moraes Liberato, será sem dúvida muito esclarecedora sobre os resultados obtidos a partir da instalação, em Agosto de 1991, da Faculdade da Terceira Idade na Univap e, em 1994, do Curso de Pósgraduação Lato Sensu em nível de Especialização em Gerontologia e Família. Baptista Gargione Filho, Prof. Dr. Reitor da Univap EDITORIAL O Brasil vive momento de grande expectativa de passar a ingressar no mundo privilegiado do chamado grupo das grandes potências, com os Estados Unidos e China como as estrelas maiores no momento. E isto decorre do potencial representado pelas reservas na plataforma do Atlântico, a grandes profundidades, nas bacias de Santos, Campos, Vitória etc, como é sabido. Mas o Brasil precisa rapidamente formar recursos humanos variados para saber explorar tantas riquezas, próximas, mas de difícil acesso, em geral. E para esta tarefa e outras próximas vem buscando aliar universidades e empresas. Dos Programas em elaboração, o SIBRATEC – Sistema Brasileiro de Tecnologia – tem a finalidade de apoiar o desenvolvimento tecnológico do setor empresarial nacional, por meio da promoção de atividades de: I. pesquisa e desenvolvimento de processos e produtos voltados à Inovação; II. prestação de serviços de metodologia, extensionismo, assistência e transferência de tecnologia. O SIBRATEC foi criado mediante Decreto nº 6.259, de 20/11/2007 e Portaria MCT nº 36, de 25/1/2008, que designou seu Comitê Gestor composto por 18 entidades: MCT, MDIC, MAPA, MEC, MS, MME, MC, NAE-PR, FINEP, CNPQ, BNDES, CAPES, INMETRO, INPI, ABDI, CNI, SEBRAE e ANPEI. Resumindo, o SIBRATEC pretende a instalação de três tipos de redes compostas por: - Centros de Inovação. - Serviços Tecnológicos. - Extensão Tecnológica. Como um Programa desta envergadura vai funcionar? O exemplo a seguir ajudará a entender. Dentre muitas propostas em andamento, está prevista a estruturação de uma Rede de Centros Inovação Tecnológica do SIBRATEC – Equipamentos e Componentes de Uso médicoodontológico. O setor de equipamentos médico-odontológicos é altamente dependente de importações e é preciso torná-lo menos sujeito aos humores internacionais e ao mesmo tempo ajudar a melhorar o balanço de pagamentos do país. A idéia inicial foi elaborar uma lista dos 100 artigos com maior intensidade de importações e aparentemente com maior facilidade de substitui-los por equivalentes produzidos no país. Como solução, o programa prevê chamadas para projetos de desenvolvimento, com ajuda da ordem de 500.000 reais para chegar a protótipos-cabeças de série e a seguir efetuar novas chamadas para sua aquisição por hospitais da rede pública. Com isto, o ciclo universidade – indústria – cliente se completa e se dá início a mais empresas presentes, instalando competência de produção no setor médico-odonto-hospitalar do país, com garantia de assistência técnica e reposição de partes e peças. Mutatis mutandis, o mecanismo deve ser o mesmo para outros setores. A UNIVAP faz parte da rede de inovação do setor de equipamentos médico-odontológicos, do SIBRATEC e há um grande programa a realizar. Antonio de Souza Teixeira Júnior, Prof. Dr. Pró-Reitor de Integração Universidade - Sociedade e Vice-reitor da UNIVAP A FUNDAÇÃO VALEPARAIBANA DE ENSINO (FVE) E A UNIVERSIDADE DO VALE DO PARAÍBA (UNIVAP) A Fundação Valeparaibana de Ensino (FVE), com sede à Praça Cândido Dias Castejón, 116, Centro, na cidade de São José dos Campos, Estado de São Paulo, inscrita no Ministério da Fazenda sob o nº 60.191.244/0001-20, Inscrição Estadual 645.070.494-112, é uma instituição filantrópica e comunitária, que não possui sócios de qualquer natureza, com seus recursos destinados integralmente à educação, instituída por escritura pública de 24 de agosto de 1963, lavrada nas Notas do Cartório do 1º Ofício da Comarca de São José dos Campos, às folhas 93 vº/96 vº, do livro 275. A Universidade do Vale do Paraíba (UNIVAP), mantida pela FVE, tem como área de atuação prioritária o Distrito Geoeducacional, DGE-31. Sua missão é a promoção da educação para o desenvolvimento da Região do Vale do Paraíba e Litoral Norte (DGE-31). Até o presente, a UNIVAP possui os seguintes Campi: a) Campus Centro, em São José dos Campos, situado à Praça Cândido Dias Castejón, 116, e à Rua Paraibuna, 75. b) Campus Urbanova, situado à Av. Shishima Hifumi, 2911. c) Campus Urbanova/Jacareí, com acesso pela Av. Shishima Hifumi, 2911. d) Campus Aquarius, em São José dos Campos, situado à Rua Dr. Tertuliano Delphim Júnior, 181. e) Campus Villa Branca, localizado em Jacareí, na Estrada Municipal do Limoeiro, 250. f) Campus Platanus, localizado em Campos do Jordão, na Av. Frei Orestes Girardi, 3. g) Unidade Caçapava,na Estrada Municipal Borda da Mata, 2020. A Educação Superior, objetivo da UNIVAP, abrange os cursos e programas a seguir descritos: 1) Graduação, abertos a candidatos que tenham concluído o ensino médio ou equivalente e que tenham sido classificados em processo seletivo. 2) Pós-graduação, compreendendo programas de Mestrado, Doutorado, Especialização e outros, abertos a candidatos diplomados em cursos de graduação e que atendam aos requisitos da UNIVAP. 3) Extensão, abertos a candidatos que atendam aos requisitos estabelecidos pela UNIVAP. 4) Educação a distância, com uso de novas tecnologias de comunicação. Revista UniVap, v.15, n.27, 2008 A FVE é também mantenedora, tendo em vista a educação integral dos futuros alunos da UNIVAP, de cursos de Educação Infantil, Ensino Fundamental, Ensino Médio e ainda de Formação Profissional e Técnica. A UNIVAP, em seu Projeto Institucional, centra-se: 1) 2) 3) 4) numa função política, capaz de colocar a educação como fator de inovação e mudanças na Região do Vale do Paraíba e Litoral Norte - o DGE-31; numa função ética, de forma que, ao desenvolver a sua missão, observe e dissemine os valores positivos que dignificam o homem e a sua vida em sociedade; numa proposta de transformação social, voltada para a Região do Vale do Paraíba e Litoral Norte; no comprometimento da comunidade acadêmica com o desenvolvimento sustentável do País e, em especial, com a Região do Vale do Paraíba e Litoral Norte, sua principal área de atuação. A UNIVAP está em permanente interação com agentes sociais e culturais que com ela se identificam. Como decorrência da demanda de seus cursos ou dos serviços que presta, estabelece convênios com instituições públicas e privadas, no Brasil e no Exterior. Estes convênios resultam na cooperação técnica e científica, na qualificação de seus recursos humanos e tecnológicos, na viabilização de estágios acadêmicos e na prestação de serviços. A história da UNIVAP, enraizada na trajetória da Região do Vale do Paraíba e Litoral Norte, traz consigo a marca da participação comunitária, a partir do compromisso que tem com a sociedade regional, alicerçado na tradição, na busca da excelência acadêmica, na qualidade de seu ensino, no diálogo com a comunidade e no exercício da tríplice função constitucional de assegurar a indissociabilidade da pesquisa institucional, ensino e extensão. Como atividades de extensão, destacam-se, na UNIVAP, aquelas relativas à Comunidade Solidária, que têm por objetivo mobilizar ações que contribuam para a alfabetização e melhoria da qualidade de vida de populações carentes. Dentro deste Programa, foram realizadas, a partir de 1998, atividades nas áreas de Saúde, Higiene, Cidadania, Educação e Lazer, em Santa Bárbara (BA), Beruri (AM), Teotônio Vilela (AL), Nova Olinda (CE), Coreaú (CE), Carnaubal (CE), São Benedito (CE), Groaíras (CE), Atalaia do Norte (AM), Pão de Açúcar (AL), Canguaretama (RN), Goianinha (RN), Maxaranguape (RN), Pedra Preta (RN), Preto Velho (RN), Vila Flor (RN) e 9 São Benedito (CE) e, no Vale do Paraíba, nas cidades de Monteiro Lobato, São Bento do Sapucaí, Paraibuna, São Francisco Xavier e São José dos Campos. Com atuação no Vale do Paraíba, destacam-se: a) cursos de alfabetizadores, com 140 concluintes; b) projeto cultural Meu Bairro, sobre a história e origem do bairro de residência; c) visitas mensais de avaliação e acompanhamento das salas montadas em diversos bairros, seguidas de Mostra Cultural, com apresentações de teatro, dança, poesias na festa de encerramento; d) incentivos aos alfabetizadores a prosseguir estudos. A partir de outubro de 2005, a UNIVAP participa do Projeto Rondon / Ministério da Defesa, estando presente em 2006, em Atalaia do Norte (AM) e, em operação no Vale do Ribeira, em Itaóca, Itapirapuã Paulista e Ribeira. A seguir, em 2006 e 2007, marca presença em Chuí (RS) e Piraí do Norte (BA). E, a partir de junho de 2007, em Jordão (AC) e Muribeca (SE). Todas as pesquisas institucionais da Universidade estão centradas em seu Instituto de Pesquisa e Desenvolvimento (IP&D), o qual executa programas e projetos e congrega pesquisadores de todas as áreas da UNIVAP, envolvidos em atividades de pesquisa, desenvolvimento e extensão. Em seus oito núcleos de pesquisa, nas áreas sócio-econômica, genômica, instrumentação biomédica, espectroscopia biomolecular, estudos e desenvolvimentos educacionais, ciências ambientais e tecnologias espaciais, computação avançada, biomédicas, atrai e dá condições de trabalho a pesquisadores de grande experiência, do País e do exterior. Os alunos têm condições de participar, com os professores, de pesquisas, executando tarefas criativas, motivadoras, que propiciam a formulação de modelos e de simulações, trabalhando com equipamentos de primeira linha, e isto faz a diferença entre a memorização e a compreensão. Bolsas de estudo vêm sendo oferecidas a alunos e pesquisadores, quer pela UNIVAP, quer por instituições como CAPES, CNPq, FINEP e FAPESP. O esforço da UNIVAP em construir, no Campus Urbanova, uma Universidade com instalações especiais para cada área de atuação, com atenção especial aos laboratórios, tem por objetivo um ensino de qualidade, compatível com as exigências da sociedade atual. A UNIVAP, para o ano letivo de 2007, fiel ao lema de que “o saber amplia a visão do homem e torna o seu caminhar mais seguro”, oferece, à comunidade da Região do Vale do Paraíba e Litoral Norte, diversos cursos, que vão desde a Educação Infantil à Pós-Graduação, passando inclusive pelo Colégio Técnico Industrial e pela Faculdade da Terceira Idade. CURSOS DE GRADUAÇÃO 1. 2. 3. 4. 5. 6. 7. 8. 9. 10. 11. 12. 13. Administração Arquitetura e Urbanismo Artes Visuais Biomedicina Ciência da Computação Ciências Biológicas Ciências Contábeis Ciências Econômicas Direito Educação Física Enfermagem Engenharia Aeronáutica e Espaço Engenharia Ambiental 14. 15. 16. 17. 18. 19. 20. 21. 22. 23. 24. 25. 26. Engenharia Biomédica Engenharia Civil Engenharia de Alimentos Engenharia da Computação Engenharia de Materiais Engenharia Elétrica/Eletrônica Engenharia Química Farmácia Física Fisioterapia Geografia História Jornalismo 27. 28. 29. 30. 31. 32. 33. 34. 35. 36. 37. 38. 39. Letras (Português) Matemática Moda Nutrição Odontologia Pedagogia Publicidade e Propaganda Química Rádio e TV Secretariado Executivo Serviço Social Terapia Ocupacional Turismo CURSOS SUPERIORES DE TECNOLOGIA Design de Interiores Design de Moda Eventos Gastronomia Geoprocessamento (apl. Gestão Ambiental) Geoprocessamento (apl. Gestão Pública) Gestão Ambiental 10 Gestão de Micro e Pequena Empresa Gestão de Negócios Imobiliários Gestão de Turismo Hotelaria Produção Audiovisual Sistemas para Internet Revista UniVap, v.15, n.27, 2008 CURSOS DE PÓS-GRADUAÇÃO STRICTO SENSU - Mestrado - Doutorado Engenharia Biomédica Física e Astronomia Bioengenharia Ciências Biológicas Engenharia Biomédica Engenharia Mecânica Física e Astronomia Planejamento Urbano e Regional LATO SENSU - Cursos de Especialização Administração e Planejamento da Educação Alfabetização e Letramento Arte Educação Computação Aplicada Comunicação Empresarial Comunicação Mercadológica De Shakespeare a Pinter: Uma Leitura Midiática Dentística Direito das Cidades Direito Previdenciário e Trabalhista Direito Processual Educação Inclusiva Enfermagem em Cuidados Críticos/Cardiologia Ensino/Aprendizagem do Espanhol e Aprendizagem do Espanhol com Língua Estrangeira Especialização de Brinquedistas para os Contextos Clínico, Hospitalar e Educacional Especialização para o Ensino da Matemática Gerontologia e Família Gestão Ambiental Gestão de Negócios em Eventos Fisioterapia Dermato-Funcional Fisioterapia Traumato-Ortopédica e Desportiva Gestão de Negócios em Instituições Financeiras Gestão de Projetos Gestão Empresarial Gestão Hoteleira Gestão Social e Planejamento de Projetos Sociais História da Arte Língua Portuguesa: Leitura e Produção de Textos Marketing MBA em Geoprocessamento: Aplicado à Gestão Ambiental MBA em Geoprocessamento: Aplicado à Gestão Pública Novas Tecnologias Aplicadas à Educação Neurologia Funcional Odontopediatria Ortodontia Piscina Terapêutica Psicopedagogia: Clínica e Institucional Saúde da Família Saúde Mental Terapia Familiar - Cursos de Extensão Desenvolvimento de Aplicações Práticas usando APOO, BD e Delphi OO Metodologias Multidimensionais em Ciências Sociais Cálculos Previdenciários Cálculos Trabalhistas Capacitação Profissional Forense Produção Independente: Vídeo Documentário - Cursos de Atualização Prática Previdenciária Prática Trabalhista - Cursos de Atualização e Extensão Gestão de Pessoas Gestão de Portfólio em Projetos Gestão de Projetos Abordagem PMI Implantodontia OPM³ (Organizational Project Management Maturity Model) Preparatório para Certificação PMP Prótese Dentária Relações Interpessoais nas Equipes de Alto Desempenho - Curso a Distância Especialização em Jornalismo Científico Revista UniVap, v.15, n.27, 2008 11 São José dos Campos Com cerca de 600.000 habitantes, São José dos Campos é o município com maior população na sua região, sendo que seu grande desenvolvimento começou realmente com a construção da Rodovia Presidente Dutra e do Centro Técnico Aeroespacial (CTA). Além disso, a localização estratégica e privilegiada entre São Paulo e Rio de Janeiro e a topografia apropriada para a construção de grandes indústrias possibilitaram que a cidade crescesse vertiginosamente na década de 70, passando a ser uma das áreas mais dinâmicas do Estado e a terceira maior taxa de crescimento da década de 80. De 1993 para cá, a cidade passou por grandes transformações, alcançando avanços na área da saúde, indústria e comércio, educação, da criança e adolescente, saneamento básico e construção civil. O comércio de São José dos Campos é bastante desenvolvido e vive um período de extensão, com vários centros de compras e grandes supermercados e Shopping Centers. Com mais de 800 indústrias, 4.000 estabelecimentos comerciais e superando 7.000 prestadores de serviço, o perfil industrial de São José dos Campos tem dois lados distintos: o centralizado nas áreas aeroespacial e aeronáutica, como a Embraer, e com a Petrobras, no tratamernto do petróleo e derivados, e outro diversificado, com indústrias, como a General Motors, Johnson & Johnson, Rhodia, Monsanto, Hitachi, Bundy, Ericsson, Eaton e outras. É, no Brasil, o 7º colocado em valor adicionado bruto (12,09 bilhões de reais) e o 10º em relação ao PIB (17,7 bilhões de reais), segundo dados do IBGE, em 2004. O orçamento de 2007 do município prevê receita de 998,6 milhões de reais, sendo 291,6 milhões para Educação e 271,8 milhões para Saúde. São José dos Campos possui, como resultado da atuação de suas indústrias, dos estabelecimentos comerciais e dos organismos que desenvolvem tecnologias de ponta, mão-de-obra de altíssimo nível. Entre esses órgãos destacam-se o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), o Centro Técnico Aeroespacial (CTA), com seus Institutos: ITA - Instituto Tecnológico de Aeronáutica, IAE - Instituto de Atividades Espaciais, IFI - Instituto de Fomento e Coordenação Industrial e o IEAv - Instituto de Estudos Avançados. Com uma vida cultural bastante intensa, o município conta com uma Fundação Cultural e vários espaços culturais, como o Museu Municipal, galerias de arte, centros de exposição, casas de cultura, Museu de Aeronáutica, Teatro municipal, Cine-Teatro Benedito Alves da Silva, 12 Cine-Teatro Santana e o Teatro Univap Prof. Moacyr Benedicto de Souza, cinemas, emissoras de rádio FM e AM, Central Regional da TV Globo, jornais diários com circulação regional, além dos da capital, e várias Bibliotecas Escolares, Universitárias e de Pesquisa, como a da UNIVAP, a do INPE e a do ITA. A UNIVAP integra, com o CTA e do INPE, importante núcleo de ensino e pesquisa do município. Da Pré-Escola à Universidade, além de Cursos de Pós-Graduação e da Terceira Idade, a UNIVAP mantém o IP&D - Instituto de Pesquisa e Desenvolvimento, que garante a incorporação da pesquisa na comunidade acadêmica da UNIVAP, permitindo a indissociabilidade entre o ensino e a pesquisa. A UNIVAP tem estado aberta à interação com empresas e instituições do município, notadamente as de ensino e pesquisa, entre elas o INPE e o CTA-ITA, além de interação com FAPESP, CNPq, FINEP-MCT e universidades do país e do exterior. As atividades de extensão ganharam grande reforço com a instituição do Parque Tecnológico Univap, cujo edifício-sede, inaugurado a 1 de abril de 2005 e já abriga cerca de 30 empresas portadoras de tecnologias de futuro, instaladas em edifício moderno, de sete pavimentos e 19.000 m2 de área construída. O edifício-sede já está com sua área de utilização totalmente ocupada e deve ser dada origem a novo edifício, para atender novos pretendentes. O campus Urbanova, com área de seis milhões de metros quadrados, constitui, com seus edifícios abrigando as Faculdades, o Instituto de Pesquisa e Desenvolvimento - IP&D, Biblioteca e Administração universitária, o Parque Tecnológico Univap, cujo edifício-sede foi descrito. De futuro, está previsto moderno Núcleo de Indústrias e Centros de Prestação de serviços, de médio e grande porte, dedicados, da mesma forma que o edifício-sede, a empresas de tecnologias geradoras de produtos inovadores. Um Centro de Residências próximo reunirá, no mesmo campus, empresários, pesquisadores, dirigentes universitários e docentes, num conjunto no qual Ciência e Tecnologia se completem e produzam resultados marcantes. O ideal, consubstanciado na definição de Universidade, como sendo a instituição que pratica, de modo indissociável, ensino, pesquisa e extensão, conforme preceitua o Art. 207 da Constitutição Federal, passa a ser uma realidade plena. Revista UniVap, v.15, n.27, 2008 Análise das Observações Médico-pedagógicas Desenvolvidas na Creche-escola Maria Clara Machado Omar Amaro * Sonia Sirolli ** Maria Tereza Dejuste de Paula *** Rodrigo Milagres Nascimento **** Resumo: Neste artigo são descritas e analisadas algumas ações desenvolvidas na Creche-Escola Maria Clara Machado do município paulista de Jacareí, mantida através de parceria entre a Secretaria Municipal de Educação de Jacareí e a Fundação Valeparaibana de Ensino (FVE) mantenedora da Universidade do Vale do Paraíba (UNIVAP). São analisadas observações médicopedagógicas realizadas durante os meses de fevereiro a dezembro do ano letivo de 2007 e de fevereiro até abril do ano letivo de 2008. Conclui-se ser de elevada importância a interação da clínica médica com a prática pedagógica para a observação, análise e reflexão acerca do comportamento das crianças na creche bem como para a sistematização das ações educativas promovidas junto aos alunos que nela estudam e suas famílias. Palavras-chave: Educação infantil, creche, desenvolvimento, saúde. Abstract: This paper aims at describing and analyzing some actions developed at Nursery School Maria Clara Machado, located in Jacareí city, resulted from a partnership between Secretaria Municipal de Educação de Jacareí and Fundação Valeparaibanda de Ensino (FVE) sponsor of Universidade do Vale do Paraíba (UNIVAP). Medical and pedagogical investigation and notes taken from February to December in 2007 and from February to April in 2008 are analyzed. It was concluded to be highly important the interaction between the medical clinic and the pedagogical practice in order to observe, analyze and reflect about children behavior at the nursery school. The result also showed the importance to systematize the educative actions promoted together with the students and their family. Key words: Childhood Education, nursery school, development, health. 1. INTRODUÇÃO A Creche-Escola Maria Clara Machado é resultante de uma parceria da Prefeitura Municipal de Jacareí, SP, através da sua Secretaria de Educação, e da Universidade do Vale do Paraíba (UNIVAP). Atendeu, em 2007, 70 crianças de 4 meses a 5 anos de idade em período integral, sendo a maioria delas do bairro Santo An* Médico, disponibilizado pela FVE, para realizar visitas semanais à creche. ** Pedagoga, disponibilizada pela FVE, para dirigir a creche. *** Professora da Faculdade de Educação e Artes da Univap. **** Universitário-estagiário do curso de Educação Física, contratado pela Univap, para coordenar as atividades do eixo curricular Corpo e Movimento desenvolvido na creche. Revista UniVap, v.15, n.27, 2008 tônio da Boa Vista, Jacareí, SP, e de bairros vizinhos. Em 2008 atende, também, 70 crianças com as mesmas características. A seleção dos alunos é realizada pelo Serviço Social da Secretaria de Educação do município procurando-se atender, preferencialmente, filhos de mães-trabalhadoras da camada popular. O prédio escolar e a maioria dos equipamentos da creche são da Prefeitura Municipal de Jacareí, SP, que arca, também, com os custos de manutenção mensal da Creche-Escola tais como: alimentação (são fornecidas quatro refeições por dia para cada aluno, de segunda a sexta-feira, sendo previstos 198 dias letivos para o ano de 2008) e dois funcionários para a Cozinha e Lactário, contas de água e três auxiliares de limpeza, uma para os berçários e lavanderia e duas, para os demais serviços. A Creche-Escola em tela é uma das ações do Projeto Social Vale a Pena Viver, criado pelo Prof. Dr. Baptista Gargione Filho, Reitor da UNIVAP. 13 A UNIVAP concebeu o Projeto Pedagógico da creche que é desenvolvido na forma de estágio extracurricular para alunos universitários, e mantém com bolsas de estudos e auxílio-transporte 28 alunos provenientes dos Cursos de Pedagogia, Educação Física, Ciências Biológicas e Engenharia Ambiental, que atuam sob a supervisão da Diretora da Creche. O Dr. Omar Amaro, médico, é cedido pela FVE-UNIVAP para realizar visitas semanais à creche com o objetivo de orientar a equipe que nela atua quanto à saúde do pré-escolar. Todos os 28 universitários-estagiários, a diretora da Creche-Escola e o médico são custeados pela FVEUNIVAP, que também cede parte dos equipamentos, fornece ainda a maioria dos materiais pedagógicos e de higiene, paga as contas mensais de telefone e as de energia elétrica e realiza parte da manutenção do prédio escolar. A ação educativa planejada pela UNIVAP para a Creche-Escola Maria Clara Machado se pauta na proposta do ensino-aprendizagem construtivistainteracionista e oferece Atividades Pedagógicas de Artes Plásticas, Leitura e Produção Oral de Histórias Infantis. Através destas últimas os alunos são estimulados a prever os sentidos dos textos através de suas ilustrações e a recriar/criar oralmente ou através de desenhos outras estórias. São também oferecidas atividades na brinquedoteca, de recreação e lazer dirigido ao ar livre; Educação Física apropriada à primeira infância; Jogos Didáticos estruturados com o objetivo de desenvolver a inteligência do período sensório-motor ou préoperacional das crianças de 4 meses a 5 anos de idade atendidas pela Creche-Escola, conforme recomendações dos Referenciais Curriculares Nacionais para a Educação Infantil (BRASIL,1998). A equipe de direção da creche é composta pela diretora; por uma universitária-estagiária, orientadora educacional; por um universitário-estagiário, coordenador das atividades do eixo curricular “Corpo e Movimento”; e por duas universitárias-estagiárias, secretárias da creche, uma que atua no período da manhã e outra no da tarde. Estão funcionando no corrente ano de 2008 cinco classes com 70 alunos em período integral, das 7h30m às 17h. São dez alunos de 0 a 1 ano de idade; dez alunos de 1 a 2 anos de idade; dezenove com 3 anos de idade; dezessete com 4 anos de idade e catorze com 5 anos de idade. Cada classe conta com dois universitários-estagiários para o período da manhã e dois para o período da tarde. Há dois universitários-estagiários volantes para cada um dos períodos, os quais dão suporte aos banhos e refeições dos bebês e demais crianças, à administração dos medicamentos e a outras situações do cotidiano da creche. 14 2.A FORMAÇÃO DA EQUIPE DIRETORA E DOS UNIVERSITÁRIOS-ESTAGIÁRIOS JUNTO AO MÉDICO ATRAVÉS DAS OBSERVAÇÕES DE CAMPO No ano letivo de 2007, o Dr. Omar Amaro realizou visitas semanais à creche, às terças-feiras, de fevereiro a dezembro e no corrente ano de 2008 cumpre a mesma rotina. A formação dos universitários-estagiários pela equipe diretora da creche em parceria com o médico é realizada através da observação a distância, por ele efetuada semanalmente no campo da creche, sendo que a equipe diretora o acompanha durante as mencionadas observações. O uso do procedimento de observação a distância pelo médico permite que sejam focalizados pontos cegos não localizados pela equipe pedagógica, pois o olhar deste profissional capta comportamentos e atitudes das crianças que a equipe não consegue captar devido à maior familiaridade e do envolvimento diário com as questões da creche. Outro fator que leva à descoberta de pontos cegos decorre da pauta pedagógica que direciona o olhar da equipe, enquanto a pauta do olhar do médico é a da clínica médica, complementando-se assim as duas. Dessa forma, durante as observações das crianças trocam-se informações entre a equipe e o médico, complementando-se o olhar da equipe com as hipóteses levantadas por este último. As observações são efetuadas no pátio, no refeitório e nas classes, focalizando-se a criança só e na convivência social com seus pares, verificando-se os tipos de brincadeiras e interações que efetuam, se o comportamento é agressivo ou carinhoso, se preferem o isolamento ou a interação social, qual é o nível de sua participação nas atividades propostas em classe, pátio ou refeitório, e, quando livre para o lazer, quais tipos de atividades prefere realizar. Para efetuar as observações a distância, o médico escolhe crianças que indicam apresentar um suposto problema, dado seu comportamento perante as outras, como, por exemplo, as crianças que não interagem com o grupo no momento da observação, seja porque se sentam isoladas no pátio ou refeitório ou porque não interagem com os colegas e/ou professores dentro da classe. Um dos universitários-estagiários responsáveis pelas classes das crianças escolhidas leva-as, uma por vez, à sala de exame médico para diálogo e análise de seus comportamentos de afetividade: se são quietas, tristes, chorosas, chupam o dedo. Estas crianças continuam a ser observadas, pelo médico e equipe diretora pelo período de um mês, com o objetivo de verificar se o problema detectado de afetividade, depressão, quando muito Revista UniVap, v.15, n.27, 2008 quieta, permanece, ou se se trata de um problema de comportamento passageiro. No caso de uma criança se isolar freqüentemente dos colegas, os universitários-estagiários motivam esta criança para sentar-se com seus colegas e integrarem-se às brincadeiras e atividades propostas. Para isto, recorrem ao diálogo com a criança dando-lhe sugestões de agrupamentos para brincadeiras e para a realização das atividades. Algumas vezes é necessário que os próprios universitários-estagiários façam a brincadeira ou atividade com a criança para que ela se integre gradativamente ao grupo-classe. São também estudadas as crianças que demonstram atividade comportamental mais agitada no grupo, focalizando-se quais são as atitudes que elas expressam perante o grupo-classe. O repertório de comportamento das crianças observadas é então complementado pela saga familiar que, muitas vezes, a equipe diretora que atua na creche já conhece e, quando não a conhece, realiza visita à sua casa, entrevistando a mãe ou o responsável pela criança. Observa-se que a mordida, utilizada pela criança como forma de comunicação, tende a desaparecer quando ela ultrapassa a fase da oralidade dos 3 anos de idade. Interpreta-se que a fala da criança aos 3 anos de idade a leva a superar o uso das mordidas, pois será, então, capaz de “negociar”, através da fala, os seus desejos imediatos com os colegas da creche. As observações a distância realizadas na creche pelo médico, acompanhado pela equipe diretora, permitiram que os universitários-estagiários fossem alertados quanto às crianças canhotas que estudam na creche. Eles ainda não haviam identificado a dominância da lateralidade canhota em 1 criança da classe do Infantil I, com 3 anos de idade, do sexo feminino e em outra do sexo masculino, da classe do Infantil III, com 5 anos de idade. Apenas já haviam identificado uma criança ambidestra, da classe do Infantil I, com 3 anos de idade e do sexo masculino. Esta criança, medicada com anti-convulsivante desde os 4 meses de idade, apresenta comprometimento parcial na motricidade dos membros superior e inferior do lado direto, motivo pelo qual usa as duas mãos para realizar as atividades cotidianas. Estas observações são relevantes para que se respeitem as rotas psico-motoras das crianças pela equipe de universitários-estagiários que atua diretamente junto a elas, e para que lhes sejam oferecidas condições materiais-espaciais adequadas, porque a maior parte da mobília e equipamentos é fabricada para as pessoas destras. Os universitários-estagiários são orientados pelo Revista UniVap, v.15, n.27, 2008 médico para observarem o sono das crianças na creche, verificando se é agitado ou calmo. Se agitado, deverão observar como se manifesta o comportamento agitado da criança durante o sono e, se for muito intensa a agitação, especificar, descrevendo estes movimentos para que, então, se solicite aos responsáveis, consultá-la com o pediatra, que a encaminhará ao neuropediatra, quando necessário. Por orientação do médico verifica-se o estado físico com que cada criança é entregue diariamente nas classes da creche: se manifesta estado febril através do toque de mão em seu rosto ou pescoço, se apresenta ferimentos, urticárias, hematomas ou queimaduras no corpo. Caso a criança apresente lesões em seu corpo, questiona-se a mãe ou a pessoa que a entrega na creche sobre as evidências deste breve exame físico e suas causas. Sempre são realizados diálogos entre a equipe diretora e os pais ou demais familiares acerca dos cuidados que a criança precisa receber nos lares. Caso sejam observadas evidências de maus tratos ou descuido, o caso será notificado ao Conselho Tutelar do Município pela diretora da creche. Durante os cinco anos de existência da creche foram feitas por sua diretora duas notificações por descuido infantil ao Conselho Tutelar. Outro caso, envolvendo duas crianças irmãs, já notificado ao Conselho Tutelar pelos vizinhos da família das crianças e resultando na perda provisória da tutela materna. As crianças vinham para a creche diretamente do Abrigo Infantil da Prefeitura Municipal de Jacareí, com ordem judicial para que não fossem retiradas da creche pela mãe. Foram matriculadas na creche por uma Assistente Social deste Abrigo Infantil. A mãe destas duas crianças ficou todo o ano letivo de 2005 separada delas. Ela passou por tratamento e recebeu orientações para a efetuação do processo de ressocialização com suas duas filhas tecido, agora, em termos adequados, sendo que em 2006 obteve do Conselho Tutelar a guarda das crianças. As doenças mais freqüentemente diagnosticadas pelo médico, no grupo de crianças matriculadas na creche, têm sido a rinite, que predomina; tosse produtiva ou não; assaduras; alergias na pele e picaduras por insetos. Dentre estas crianças, uma delas apresentou herpes zóster (cobreiro bravo). Através do exame físico, ausculta pulmonar e cardíaca o médico diagnosticou 2 crianças com anomalias cardíacas congênitas, dentre o grupo de 70 crianças matriculadas na creche. Quando as crianças apresentam lesões alérgicas, são medicadas no momento da consulta com cremes anti-alérgicos e anti-inflamatórios, quando 15 existentes no estoque, em caso contrário é solicitado às mães que as levem ao Posto de Saúde do bairro, que tem fornecido estes medicamentos mediante receituário do médico que atua na creche. As orientações para as mães acerca da necessidade de levar a criança ao médico é feita pela equipe diretora da creche. Nos casos extremos, cujas famílias têm renda zero, ou apenas um pouco mais do que zero, e em que há a necessidade de agilidade de encaminhamento médico, é solicitado ao Serviço Social da Secretaria de Educação Municipal de Jacareí que verifique, através de visita à casa da família da criança, as necessidades de orientação e encaminhamento do caso. Há, na creche, 3 alunos provenientes de 2 famílias nestas condições de renda e que têm 5 e 4 filhos menores, respectivamente. Quando as crianças são encaminhadas ao médico, a equipe diretora da creche exige a apresentação do receituário, com a obrigatoriedade de trazer os medicamentos para serem dados na própria creche, nos horários e durante o período prescritos, e, na saída das crianças, eles são devolvidos às mães para continuidade do tratamento em casa. A exigência do receituário médico e dos medicamentos nele prescritos só pode ser feita aos pais dos alunos pela equipe diretora da creche, porque, no município de Jacareí, a população de baixa renda tem acesso ao Serviço Médico de Pediatria Público, que também fornece gratuitamente os medicamentos prescritos para a criança. Nos cinco anos de funcionamento da creche neste município, nunca houve um caso de criança que deixasse de ser atendida por este serviço e, em quase todos os casos de prescrição de medicamentos, estes são fornecidos gratuitamente para a família da criança atendida. Os universitários-estagiários que atuam na creche, no período da tarde, foram orientados pelo médico para fazer um relaxamento com as crianças nos últimos 15 ou 20 minutos deste período, através da audição de músicas clássicas, com o objetivo de elas irem para as suas casas mais descontraídas. 3. CONSIDERAÇÕES FINAIS A Organização Mundial de Saúde considera que o índice de mortalidade infantil aceitável, para crianças de 0 a 5 anos de idade, é o de 10 mortes para cada mil crianças nascidas vivas. A mortalidade infantil no Brasil para as crianças desta faixa etária é de 25,80 mortes para cada mil crianças nascidas vivas (IBGE, 2008). As doenças associadas às mortes das crianças brasileiras, na faixa etária de 0 a 5 anos de idade, são principalmente a disenteria e a broncopneumonia. 16 Durante os cinco anos de existência da CrecheEscola Maria Clara Machado tem-se procurado desenvolver nas mães e nos pais a cultura de levar seus filhos ao médico, mediante o uso do diálogo explicativo acerca das necessidades de acompanhamento médico de seus filhos. No terceiro episódio de diarréia da criança eles são chamados pelo telefone ou pessoalmente, e, quando não possuem telefone, à creche e solicitados a levá-la ao médico pediatra. Explica-se que com esta medida a criança provavelmente não precisará ficar hospitalizada e que, quanto mais cedo medicada, mais rápida será a sua cura. Obviamente, enquanto se espera os pais para buscarem a criança é administrado o soro caseiro e suspendida a alimentação sólida para evitar o ato reflexo do estado diarréico. A criança portadora de rinite é observada quanto à involução ou evolução deste sintoma. Se este estado se agravar, com manifestação de febre e/ou tosse e rejeição de alimentos pela criança, ela tomará banho morno como tentativa de diminuir o seu estado febril e líquidos lhe serão oferecidos na forma de sucos. Sua temperatura corporal é monitorada a cada 1 hora. Caso os sintomas persistam dentro de 2h30m, são avisados os pais, sendolhes descrito o estado em que se encontra a criança e solicitado que a levem ao médico pediatra. É exigido dos pais, no dia seguinte, a receita médica e os medicamentos prescritos, para que se receba a criança na creche. Algumas mães costumam reclamar desta exigência da equipe diretora, mas tem-se dialogado com elas argumentando-se que com esta exigência visamos o bemestar e a saúde de seus filhos. Uma vez uma mãe afirmou à diretora: - Dona Sonia, a senhora é muito enjoada, qualquer coisinha a senhora quer que a gente leve [meu filho] no médico! A diretora acolheu com tranqüilidade a observação a ela dirigida afirmando: - Mãe, mas o seu bebê não tem qualquer coisinha! Ele está com quase 39º de febre, e a febre dele poderá aumentar à noite e será mais difícil você ir com ele ao médico à noite. Se a febre aumentar muito é perigoso a criança ter uma convulsão, uma espécie de desmaio. A mãe olhou-a, suspirou e pareceu entender a explicação acima. Levou seu bebê ao médico e trouxe a receita e os medicamentos para a creche no dia seguinte. Observar, analisar, refletir, dialogar e concluir são tarefas diárias feitas pela equipe diretora junto com a Revista UniVap, v.15, n.27, 2008 equipe de profissionais que atua na creche, com o objetivo de propor práticas educativas mais condizentes com as necessidades da comunidade atendida, e que busquem promover ao máximo o seu desenvolvimento. Temse tomado consciência de que como resultado dessas tarefas, ocorreram modificações nas práticas das mães, dos pais e dos alunos atendidos pela creche e da própria equipe no que se refere às suas expectativas e práticas de manejo e pedagógicas. Os encontros e confrontos existenciais-sociais cotidianos possibilitam, à comunidade de pessoas que se interrelaciona no espaço da creche, a construção das práticas educativas em curso e possibilitam, também, que tais práticas se tornem comuns a esta comunidade. Para isto, o diálogo é um instrumento eficaz. Tem-se procurado sempre ouvir as necessidades do outro e ser capaz de mudar a própria prática, quando isto se mostra necessário, para a melhoria do processo educativo oferecido pela creche. Revista UniVap, v.15, n.27, 2008 A análise desse processo tem mostrado a importância do trabalho interdisciplinar, do trabalho coletivo e da reflexão sobre a prática como geradora de soluções e conhecimentos que permitem enriquecê-la. 4. REFERÊNCIAS BRASIL, MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO E DO DESPORTO. Secretaria de Educação Fundamental. Referencial curricular nacional para a educação infantil. Ministério da Educação e do Desporto, Secretaria de Educação Fundamental. Brasília: MEC/SEF, 1998, 3 v. INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA. Disponível em: <http.www..ibge.gov.br/ brasil_em_sintese/tabelas/população_tabela02..htm>. Acesso em: 24 abr. 2008. 17 Levantamento Preliminar de Espécies de Borboletas em Duas Áreas do Campus Urbanova Joyce Valério Cinachi * Nádia Maria Rodrigues de Campos Velho ** Resumo: As borboletas pertencem à ordem Lepidoptera, formando um dos maiores grupos da classe Insecta. O Campus Urbanova apresenta uma vegetação diversificada, com grande disponibilidade de plantas, o que favorece o aparecimento de espécies variadas de borboletas. Este trabalho objetivou realizar um levantamento preliminar das espécies de borboletas em duas áreas do Campus Urbanova, por comparação com levantamentos anteriores realizados e verificar a interferência antrópica. As coletas foram realizadas no Lago da Mata da Fazenda Santana do Poço e no Criadouro Conservacionista, ambos pertencentes à Universidade do Vale do Paraíba, no Campus Urbanova, no período de abril/2005 a julho/2006, com saídas três vezes por semana. Foram utilizadas três armadilhas e rede entomológica para as coletas. Posteriormente os exemplares eram levados para o laboratório do Borboletário para a identificação e montagem da coleção de referência e banco de dados digitais. Foram identificadas 93 espécies de borboletas, sendo distribuídas em cinco famílias, sendo a família Nymphalidae a mais abundante. Comparando com levantamentos anteriores, constatou-se que houve um decréscimo no número de espécies encontradas no Campus Urbanova, onde em 1996 foram registradas 138 espécies num período de 7 meses, comprovando assim uma possível alteração da lepidopterofauna nas áreas estudadas, decorrentes da ação antrópica e/ou da modificação ambiental. Palavras-chave: Levantamento, lepidóptera, famílias, ação antrópica. Abstract: The butterflies belong to the Lepidoptera order, forming one of the biggest groups of the insect class. Urbanova Campus presents diversified vegetation with great availability of plants, what favors the appearing of varied species of butterflies. The present work aimed at collecting data about the species of butterflies found in two areas of Urbanova Campus, comparing it with previous data collections and verifying the atrophic interference. The data were collected from April/2005 and July/2006, three times a week, in the Lake of Mata of Santana do Poço Farm and in the Conservationist Creator, both belonging to University of Vale do Paraíba in Urbanova Campus. Three traps and entomological net were used for collecting data. Later the butterfly units were taken to the laboratory of the butterfly’s house for identification and elaboration of the reference collection and digital database. Ninety-three (93) species of butterflies were identified; they were distributed in five families, being the Nymphalidae the most abundant family. Comparing with previous studies, it was found that there was a decrease in the number of species found in Urbanova Campus. In 1996 it was registered 138 species in a period of 7 months. The present result showed that a possible alteration of “lepidopterofauna” in the studied areas is due to the atrophic action and/or the environmental modification. Key words: Survey, lepidoptera, families, atrophic action. 1. INTRODUÇÃO A Ordem Lepidóptera forma um dos maiores gru- * Bióloga e pós-graduanda em Gestão Ambiental UNIVAP, 2008. ** Professora da UNIVAP. 18 pos da Classe Insecta, com aproximadamente 180.000 espécies em 127 famílias e 46 superfamílias. Esses insetos apresentam parte do corpo recoberto por escamas, que são geralmente achatados e facilmente destacáveis quando tocados e responsáveis pela reprodução dos desenhos e cores encontrados nas asas (FIGUEIREDO, 2000). Segundo Morellato (1992), são insetos comuns, Revista UniVap, v.15, n.27, 2008 de hábitos diurnos, inofensivos e apresentando várias colorações. Não só da beleza decorre sua importância; as borboletas são utilizadas em estudos de ecologia de populações, inclusive dispersão e migração, onde, no Brasil, as borboletas têm importância, também em pesquisas sobre interação inseto/planta, demarcação de propriedades, planejamento e administração de reservas naturais. Os lepidópteros também possuem uma grande importância na indicação da qualidade do ambiente. Eles são atrativos, mas também tóxicos, onde têm como predadores algumas aves e aranhas. Apesar de serem organismos bem estudados, o conhecimento da lepidopterofauna neotropical ainda é incompleto, esparso e fragmentado (SCHANTZ, 2000). As borboletas são facilmente atraídas por frutos em decomposição, uma vez que encontram água e açúcar. É possível utilizar armadilhas preparadas para coletálas, porém as capturas com iscas são bastante seletivas (ALMEIDA; RIBEIRO-COSTA; MARINONI, 1998). À medida que aumenta a pressão antrópica sobre o planeta, cresce a ameaça aos ecossistemas tropicais (ISERHARD; ROMANOWSKI, 2004 apud WOOD; GILLMAN, 1998). Em regiões nas quais o processo de fragmentação se iniciou há muitas décadas, perturbações antrópicas constantes representam uma importante ameaça à biodiversidade (VIANA, 1995). A proposta deste trabalho foi realizar um levantamento das espécies de borboletas em duas áreas do Campus Urbanova, por comparação com levantamentos anteriormente realizados e verificar se houve a interferência antrópica. 2. MATERIALE MÉTODOS 2.1 Área de estudo As coletas foram realizadas no Lago da Mata da Fazenda Santana do Poço (23°12’40’’SE e 45°57’35’’W), localizada no município de Jacareí – SP, e no Criadouro Conservacionista, localizado no Centro de Estudos da Natureza (CEN), na Universidade do Vale do Paraíba (UNIVAP), Campus Urbanova, São José dos Campos – SP (Fig. 1). Foto: Joyce C. Fig. 1 - Vista parcial do Lago da Mata e do Criadouro Conservacionista. 2.2 Amostragem Foram estabelecidas três áreas amostrais específicas, para a instalação de armadilhas para borboletas. Os dois primeiros pontos estabelecidos foram no Lago Revista UniVap, v.15, n.27, 2008 da Mata, onde possui uma vegetação diferenciada, com disponibilidade de água (Fig. 2). A terceira armadilha foi instalada no Criadouro Conservacionista, sendo esta área com menos vegetação e relativamente mais perturbada pela ação antrópica. 19 Foto: Joyce Cinachi Fig. 2 - Armadilhas instaladas em dois pontos no Lago da Mata e no Criadouro Conservacionista. As coletas foram realizadas com auxílio de redes entomológicas e os exemplares acondicionados em envelopes entomológicos e posteriormente levados para laboratório e catalogados para a montagem de uma coleção de referência e de um banco de dados digital. Para confecção das armadilhas, seguiu-se Almeida (1992) e as iscas foram colocadas no centro de um disco plástico (Fig. 3). Como atrativos foram colocadas iscas de bananas, amassadas manualmente, por sofrerem fermentação rápida e atrair espécies de borboletas. Fig. 3 - Armadilhas com iscas. As espécies coletadas foram listadas e identificadas por um especialista e também com auxílio de chave dicotômica (MORELLATO, 1992) e posteriormente foram fotodocumentadas e armazenadas em um banco de dados digital. 3. RESULTADOS Foram identificadas 93 espécies de borboletas, em um total de 1.230 exemplares, distribuídas em cinco famílias, citadas por Marcos (1996) e Santos (2000), destacando: Nymphalidae, Pieridae, Hesperiidae, Lycaenidae e Papilionidae. A família Nymphalidae foi a mais abundante, com 74 espécies identificadas, seguindo as famílias Pieridae, Hesperiidae e Lycaenidae com 6 espécies identificadas cada uma, seguida da família Papilionidae com somente um exemplar encontrado (Fig. 4). 20 Fig. 4 - Número de espécies de borboletas por família. Revista UniVap, v.15, n.27, 2008 Na Fig. 5 observa-se que no período de abril a setembro de 2005, quando comparado com o ano de 1996, houve um decréscimo no número das espécies da família Nymphalidae, com exceção, do mês de maio, provavelmente devido à elevação da temperatura. Fig. 5 - Número de indivíduos da família Nymphalidae. Para a família Pieridae, houve um acréscimo no número de espécimens no mês de julho, quando comparado ao ano de 2005, onde nenhum exemplar foi encon- trado, demonstrando uma perturbação ambiental e com isso, uma alteração na diversidade das espécies, durante o período analisado (Fig. 6). Fig. 6 - Número de indivíduos da família Pieridae. A Fig. 7 evidencia uma alteração significativa no número de exemplares para a família Hesperiidae em 2005 em relação ao ano de 1996, provavelmente devido a alterações antrópicas. Fig. 7 - Número de indivíduos da família Hesperiidae. Revista UniVap, v.15, n.27, 2008 21 Foram catalogados sete indivíduos da família Lycaenidae no mês de julho de 1996, entretanto, para o mês de setembro não houve alterações em relação ao número de indivíduos, como mostra a Fig. 8. e no período de abril a setembro de 2005 não foram registrados exemplares da família Papilionidae, sugerindo-se com isso alteração ambiental, ou seja, ausência de plantas hospedeiras (Fig. 9). Fig. 8 - Número de indivíduos da família Lycaenidae. Fig. 9 - Número de indivíduos da família Papilionidae. As espécies foram fotodocumentadas dorsoventralmente e identificadas quanto ao sexo, quan- do possível. Família Nymphalidae Dorsal Ventral Catonephele numilia (Hew., 1852) - ♂ 22 Revista UniVap, v.15, n.27, 2008 Dorsal Dorsal Ventral Catonephele numilia (Hew., 1852) - ♀ Ventral Colobura dirce (Linnaeus., 1758) Família Pieridae Dorsal Ventral Phoebis p. philea (Linnaeus, 1763) Revista UniVap, v.15, n.27, 2008 23 Família Lycaenidae Dorsal Ventral Lemonias glaphyra (Westwood, 1851) Família Hesperiidae Dorsal Ventral Autochton neis (Greyer, 1832) 4. DISCUSSÃO De acordo com Marcos (1996), foram registradas, no período de março a setembro de 1996, no Campus Urbanova, 138 espécies de borboletas pertencentes a 5 diferentes famílias. No presente trabalho, no período de abril de 2005 a julho de 2006, foram registradas 93 espécies pertencentes a 5 famílias, ocorrendo provavelmente, em uma década, alteração na lepidopterofauna, devido a influência antrópica ou perturbação ambiental. No presente trabalho a família Nymphalidae mostrou-se a mais abundante e diversificada, corroborando com o levantamento realizado por Marcos (1996) e Santos (2000) no Campus Urbanova, seguido da família Pieridae, Hesperiidae, Lycaenidae e Papilionidae, esta representada por somente um exemplar. A freqüência relativa da riqueza de espécies por famílias de borboletas para a região Neotropical mostra24 se diferente para Iserhard; Romanowski (2004). Dados compilados por Beccaloni; Gaston (1995) e Brown; Freitas (1999) indicam, para o Brasil, as famílias Lycaenidae, Hesperiidae e Nymphalidae respectivamente, as três famílias mais ricas em espécies. No presente trabalho esta ordem se inverte, sendo a família Nymphalidae a mais rica em espécies, seguida por Hesperiidae e Lycaenidae. Já em relação à região Neotropical, Nymphalidae apresenta ser a mais representativa em relação a Hesperidae segundo Beccaloni; Gaston (1995), e a mais rica entre todas, segundo Heppner (1991). Segundo Motta (2002), coletas em ambientes abertos, beira de rio, brejos e a utilização de iscas aumentam substancialmente o número de espécies. As iscas de bananas utilizadas nas armadilhas como atrativo para as borboletas foram eficazes, confirmadas também por Uehara-Prado (2003) e Ferreira (1982), apesar de serem seletivas. Revista UniVap, v.15, n.27, 2008 Nos meses de maio, agosto e setembro de 2005 registrou-se um considerável aumento dos exemplares da família Nymphalidae, coincidindo com o aumento da temperatura nestes meses, em que ela influencia nas atividades destes insetos. A abundância das borboletas e a freqüência de formas variam conforme a umidade (chuvas), os indivíduos são menos freqüentes e monomorficamente escuros, enquanto, na estação seca, a população aumenta e as formas claras predominam (RUSZCZYK, et al. 2004). Algumas borboletas, segundo Morellato (1992), são espécies que se habituaram e vivem em locais com perturbações, o que pode ser comprovado no presente trabalho, exemplificado pelas espécies: Actinote carycina – em climas frios, áreas perturbadas; Adelpha phliassa plesaure – floresta perturbada; Adelpha syma – comum em florestas perturbadas; Com a presença dessas espécies na Mata do Campus Urbanova pode se considerar que a área estudada está relativamente perturbada pela ação antrópica ou outro tipo de perturbação na natureza, uma vez que estes insetos são bioindicadores de qualidade ambiental, interferindo na lepidopterofauna local. A conservação cuidadosa e completa da flora e da fauna tem grande importância para a toda região, hoje quase totalmente ocupada pelo homem e pelas suas atividades, com a vegetação natural reduzida a fragmentos pequenos (MORELLATO, 1992). 5. CONCLUSÕES Foram identificadas 93 espécies de lepidópteros distribuídas em 5 distintas famílias, sendo 74 espécies da família Nymphalidae., 6 espécies da família Pieridae, Hesperiidae e Lycaenidae, respectivamente e 1 espécie da família Papilionidae. A diversidade da família Nymphalidae era prevista em razão da quantidade de indivíduos existentes, o que foi observado na família Pieridae para o mês de maio e para a família Lycaenidae no mês de agosto. Cobalopsis miaba – comum em áreas perturbadas. Colobura dirce – todos os hábitats, inclusive antrópicos; Diaethria clymena meridionalis – muito comum em vários hábitats, inclusive antrópicos; Eurema albula – florestas úmidas perturbadas até campos abertos, comum; Eurema arbela – florestas perturbadas; Hamadryas f. februa – comum em muitos ambientes perturbados; Heliconius besckei – florestas perturbadas ou não, de serras mais altas; Heliconius ethilla narcaea – florestas perturbadas, jardins e parques; A quantidade de espécies registradas e coletadas em 15 meses foi inferior a 7 meses quando foram registradas 138 espécies, observando-se também um decréscimo no número de subfamílias, sendo que para algumas não foi registrado nenhum representante no ano de 2005. Os dados apresentados demonstraram que provavelmente por alguma alteração ambiental nas localidades estudadas ou influência antrópica, houve o registro do baixo número de espécies, quando comparados com levantamentos realizados anteriormente. Algumas espécies encontradas permaneceram por vários meses e em todo o período de coleta, como, por exemplo, Hamadryas f. feronia e H. epinome, pertencentes à família Nymphalidae. 6.AGRADECIMENTOS Heraclides thoas brasiliensis – lugares perturbados; Ao Prof. Frederico Lencioni Neto pela identificação das espécies, à Profa. Terezinha de Fátima Nogueira pela revisão do abstract e à Profa. Karla Lopes pelas sugestões realizadas. Phyciodes claudina – muito comum em florestas perturbadas, pousando em grandes agregações em barro úmido; 7. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Pyrgus oileus orcus – muito comum em hábitats abertos ou perturbados; ALMEIDA, L. M.; RIBEIRO-COSTA, C. S.; MARINONI, L. Manual de Coleta, Conservação, Montagem e Identificação de Insetos. Ribeirão Preto: Holos, 1998. [Série Manuais Práticos em Biologia, 1]. Revista UniVap, v.15, n.27, 2008 25 BECCALONI, G. W.; GASTON, K. J. 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Os gêneros pertencentes a esta família parasitam animais vertebrados, invertebrados e plantas. No gênero Trypanosoma encontramos o Trypanosoma rangeli que é um protozoário não patogênico para o homem e apresenta diversas características relacionadas com o Trypanosoma cruzi que é patogênico ao homem, sendo: compartilhamento de vetores, hospedeiro o Rhodnius prolixus, distribuição geográfica e semelhanças antigênicas. Existem algumas características biológicas do Trypanosoma rangeli que permitem diferenciá-lo do Trypanosoma cruzi, como a sua provável incapacidade de invadir células de mamíferos, o seu desenvolvimento na hemolinfa e nas glândulas salivares dos triatomíneos e a sua transmissão ao hospedeiro vertebrado através da picada – via inoculativa. O objetivo desse estudo é a análise morfológica e morfométricas através de microscopia ótica das cepas Choachí e SC-58 do Trypanosoma rangeli, cultivados no meio LIT (Liver Infusion Tryptose) em diferentes concentrações de hemina: 2,5mg/ml; 5,0mg/ml; 10mg/ml e 15mg/ml, nos dias 1; 3 e 6 após o inóculo dos parasitas, os parâmetros analisados foram: comprimento celular médio; diâmetro dos parasitas; comprimento do flagelo livre; tamanho do cinetoplasto; diâmetro do núcleo dos parasitas e comprimento total dos parasitas. Os resultados no presente estudo mostraram que os parasitas cultivados em meio LIT nas diferentes concentrações de hemina induzem mudanças morfológicas nos parasitas. A principal mudança foi no tamanho total dos protozoários da cepa Choachí, causando uma redução estatisticamente significativa. Palavras-chave: Trypanosoma rangeli, família Trypanosomatidae, morfologia, morfometria. Abstract: The Trypanosomatidae family belongs to Kinetoplastida order and comprehends protozoa which are characterized by the presence of only one scourge and an organization mitochondrial structure. The species which belong to this family lodge vertebrate and invertebrate animals and plants. In the Trypanosoma specie we find the Trypanosoma rangeli which is a protozoan not pathogenic to the man and presents several characteristics related to the Trypanosoma cruzi which is pathogenic to the man, being: vector sharings, Rhodnius prolixus host, geographical distribution and no genetics similarities. There are some biological characteristics of Trypanosoma rangeli which can differ from Trypanosoma cruzi, as its probable incapacity of invading mammal cells, its progress on the “hemolinfa” and “triatomíneos” salivary glands and its transmission to the vertebral host through a bite – inoculative route. The purpose of this study is the morphology and morphometric analysis of Choachí cepa and SC-58 of Trypanosoma rangeli, cultivated in the LIT (Liver Infusion Tryptose) in different concentrations of hemine: 2.5 mg/ml; 5.0mg/ml; 10mg/ml and15mg/ml, in the 1, 3 and 6 days after parasites inoculation. The studied parameters were: average cell length, parasites diameter; length of the free flagellum; kinetoplast size; parasites nucleus diameter and total length of the parasites. The results presented on this work showed that the parasites cultivated in LIT in different hemina concentrations make morphological changes on parasites. The main change was on total size of protozoon of cepa Choachí, causing meaningful statistic reductions. Key words: Trypanosoma rangeli, Trypanosomatidae family, morphology, morphometry. * Mestranda em Ciências Biológicas - IP&D/UNIVAP, 2006. ** Professor da UNIVAP. Revista UniVap, v.15, n.27, 2008 27 1. INTRODUÇÃO O Trypanosoma rangeli Tejera, 1920 é um protozoário hemoflagelado, heteroxênico que infecta seres humanos e animais domésticos e silvestres. Sua distribuição geográfica é sobreposta a do Trypanosoma cruzi Chagas, 1909 (agente etiológico da Doença de Chagas) encontrando-se na América Central e em vários países da América do Sul. Apesar de não ser considerado patogênico para o homem, o Trypanosoma rangeli induz resposta imune humoral com altos títulos de anticorpos, que apresentam reatividade cruzada com os antígenos de Trypanosoma cruzi empregados no diagnóstico da doença de Chagas. Os ciclos de vida destes dois parasitas apresentam diferenças entre si. Apesar de compartilharem vetores e hospedeiros, existem algumas características biológicas do Trypanosoma rangeli que permitem diferenciá-lo do Trypanosoma cruzi, como a sua provável incapacidade de invadir células de mamíferos, o seu desenvolvimento na hemolinfa e nas glândulas salivares dos triatomíneos e a sua transmissão ao hospedeiro vertebrado através da picada – via inoculativa (TOBIE, 1964; D’ALESSANDRO; SARAVIA, 1992; STEINDEL et al., 1994; GRISARD et al., 1999; GUHL et al., 1987; VASQUEZ et al., 1997). anterior em condições naturais. O tripomastigota sanguíneo é a única forma evolutiva do T. rangeli detectável no hospedeiro vertebrado. Esta forma do parasito apresenta características biológicas compatíveis com outras espécies do subgênero Herpetosoma. Os tripomastigotas apresentam polimorfismo, podendo ser observadas formas delgadas e largas medindo de 26 a 34 µm de comprimento, incluindo o flagelo. A membrana ondulante é bem desenvolvida, estando o núcleo localizado na metade anterior do corpo, e o cinetoplasto pequeno e puntiforme apresenta localização subterminal (D’ALESSANDRO; SARAVIA, 1992). A infecção do T. rangeli no hospedeiro vertebrado é caracterizada, portanto, pela ausência de patogenicidade, ausência de formas em divisão nos tecidos e no sangue e pela limitada duração da parasitemia. Como conseqüência da ausência de manifestações clínicas na infecção por T. rangeli e a falta de procedimentos adequados para o diagnóstico específico, acredita-se numa subestimação do número de casos humanos de infecção pelo T. rangeli e, conseqüentemente uma possível superestimação nos casos de infecção pelo T. cruzi (SOUSA; JOHNSON, 1971; D’ALESSANDRO, 1976). 2. MATERIAL E MÉTODOS O ciclo evolutivo do Trypanosoma rangeli no vetor triatomíneo é bastante conhecido. A infecção do vetor ocorre durante o repasto sanguíneo em um hospedeiro vertebrado infectado. Formas tripomastigotas são ingeridas, as quais no tubo digestivo do inseto diferenciam-se em epimastigotas. Os epimastigotas invadem a hemocele e multiplicam-se no interior dos hemócitos ou livremente na hemolinfa. Seis dias após a invasão da hemocele, os parasitas começam a atravessar ativamente as paredes das glândulas salivares e alcançam o lúmem, onde se diferenciam em tripomastigotas metacíclicos, sendo essas formas inoculadas com a saliva do triatomíneo no hospedeiro vertebrado durante o repasto sanguíneo. Ao contrário do ciclo evolutivo no vetor, o curso da infecção por Trypanosoma rangeli no hospedeiro vertebrado até o presente momento não é bem elucidado. Nos primeiros dias após a infecção os parasitas são visualizados na circulação, e durante a primeira semana há um pequeno aumento na parasitemia que vai decaindo lentamente e, a partir do décimo quinto dia, os parasitas são detectados através de métodos indiretos, como xenodiagnóstico e hemocultura (AÑEZ, 1983). Diferentemente do T. cruzi, cuja transmissão ocorre exclusivamente pelos dejetos de triatomíneos infectados (via contaminativa), o T. rangeli é transmitido pela picada de triatomíneos infectados (via inoculativa). A transmissão do T. rangeli através de formas presentes nas fezes é considerada possível, devendo, entretanto, ocorrer em uma freqüência muito menor do que a transmissão 28 Foram utilizadas, no presente estudo, as cepas Choachí, originalmente isolada de glândulas salivares de Rhodnius prolixus naturalmente infectado, capturado no Estado de Cundinamarca, Colômbia (SCOTHELLIUS, 1987) e a cepa SC-58, isolada por hemocultura do roedor Echimys dasythrix, naturalmente infectado na ilha de Santa Catarina – Estado de Santa Catarina, Brasil (STEINDEL et al., 1991). A manutenção das formas epimastigotas das cepas Choachí e SC-58 de Trypanosoma rangeli foram cultivadas em meio LIT pH 7,2 (CAMARGO, 1964) acrescido de 10% de soro fetal bovino (SBF) a 28°C em estufa bacteriológica. A cada intervalo de 7 dias as cepas eram sub-cultivadas no mesmo meio de cultura, os inóculos eram constituídos de 10% da cultura original. Para realização dos experimentos os protozoários eram obtidos a partir do meio de cultura padrão. O volume de meio a ser utilizado foi determinado a partir de uma contagem prévia dos protozoários. Para o início do cultivo experimental foram semeadas em cada tubo a 1,0x106 células/mL. A concentração de protozoários foi determinada utilizando-se um hemocitômetro (câmara de Neubauer) partindo se de uma diluição inicial de 1:100. A partir do inóculo foram preparados esfregaços Revista UniVap, v.15, n.27, 2008 da cultura para determinação da morfologia inicial dos protozoários. Para tanto, em lâminas previamente lavadas, foram depositados 10µl de meio contendo protozoários, este volume de meio foi distendido sobre a lâmina de forma a criar um filme delgado, o qual foi seco ao ar. Em seguida, o esfregaço foi fixado com metanol puro por 1 minuto. Após, o excesso de líquido foi dispensado e adicionou-se sobre o esfregaço 3mL de corante, que foi deixado por 20 minutos sobre o mesmo. O corante utilizado foi preparado a partir de uma solução estoque, previamente filtrada em papel Whatmann, a solução de coloração foi preparada adicionando-se 3 gotas de corante para cada mL de tampão fosfato 0,1M pH 7,2. A fim de acompanhar as mudanças morfológicas ocorridas nos protozoários cultivados na presença de diferentes concentrações de hemina, preparou-se cultivo em duplicata contendo as seguintes concentrações de hemina: 2,5mg/mL; 5,0mg/mL; 10mg/mL e 15mg/mL. Nos dias 1, 3 e 6 após o inóculos dos parasitas nos meios de cultivo, foram preparados os esfregaços em duplicatas, estes foram corados como descrito anteriormente. Para a determinação de parâmetros morfológicos dos protozoários foram digitalizadas, aproximadamente 50 campos microscópios por lâmina, utilizando-se o microscópio Leica BLM equipado com uma câmera CCD com a interface QWin.A medição dos parâmetros foi realizada com o software ImageJ (http://rsb.info.nih.gov/ij). Os parâmetros mensurados foram os seguintes: Comprimento celular médio; diâmetro dos parasitas; flagelo livre; tamanho do cinetoplasto; diâmetro do núcleo dos parasitas e comprimento total dos parasitas Os valores obtidos para cada parâmetro foram analisados utilizando os softwares Origin 6.0, com o qual foram obtidos os valores de média e desvio padrão de cada parâmetro. A comparação das médias entre os diferentes tratamentos foi realizada aplicando o Teste t de Student. Os resultados foram apresentados como valores de média ±desvio padrão. 3. RESULTADOS Nas Tabelas 1, 2, 3 e 4, a coluna “Dia O” contém as medidas obtidas a partir dos parasitas cultivados em meio LIT com a concentração de Hemina padrão, antes do início de cada tratamento com as diferentes concentrações de hemina. Em nenhuma das condições empregadas nesse estudo foram detectadas alterações significativas nos parâmetros “tamanho do Cinetoplasto” e “diâmetro do Núcleo”. Após um dia de cultivo no meio contendo 2.5 mg/mL de hemina, os parasitas da cepa Choachí apresentaram uma redução significativa no comprimento celular, que ao final do experimento era de aproximadaRevista UniVap, v.15, n.27, 2008 mente 13,21 µm. Com relação a cepa SC-58 não se observou o mesmo fenômeno, os valores continuaram próximo ao do início do experimento. Com 6 dias de cultivo os parasitas apresentavam um comprimento celular de aproximadamente 15,97 µm (Tabela 1). Com relação ao diâmetro dos parasitas, observouse um comportamento semelhante ao observado para o comprimento celular para a cepa Choachí, ou seja, os valores obtidos a partir dos parasitas antes de serem cultivados no meio com 2.5 mg/mL de hemina eram maiores que ao final do experimento. Da mesma forma que os valores obtidos para este parâmetro não variou significativamente para a cepa SC-58 (Tabela 1). Para o comprimento do flagelo livre observou-se um comportamento oposto nas duas cepas, enquanto os valores deste parâmetro diminuíram para a cepa Choachí, os mesmos aumentaram para a cepa SC-58, variando respectivamente de 7,21 µm a 6,87 µm, e de 6,78 µm para 7,08 µm (Tabela 1). O comprimento total dos parasitas sofreu uma variação significativa, passando de 29,33 µm antes do início do cultivo para 24,53 µm no último dia de cultivo com 2.5 mg/mL de hemina. Os parasitas da cepa Choachí cultivadas no meio contendo 5.0 mg/mL de hemina apresentaram uma redução significativa no comprimento celular de aproximadamente 13,20 µm. Com relação a cepa SC-58 os valores se mostraram significativamente diferentes variando respectivamente de 13,08 µm a 16,97 µm (Tabela 2). Com relação ao diâmetro dos parasitas, observouse um comportamento semelhante ao observado para o comprimento celular para a cepa Choachí, ou seja, os valores obtidos a partir dos parasitas antes de serem cultivados no meio com 5.0 mg/mL de hemina eram maiores que ao final do experimento. Da mesma forma que os valores obtidos para este parâmetro não variou significativamente para a cepa SC-58 (Tabela 2). O comprimento do flagelo livre sofreu uma variação significativa, passando de 5,81 µm antes do início do cultivo para 7,09 µm no último dia de cultivo com 5.0 mg/ mL de hemina. O mesmo pode-se dizer do observado para a cepa SC-58 (Tabela 2). O comprimento total dos parasitas sofreu uma variação significativa, passando de 25,06 µm antes do início do cultivo para 20,29 µm no último dia de cultivo com 5.0 mg/mL de hemina. Os parasitas da cepa Choachí cultivadas no meio contendo 10 mg/mL de hemina apresentaram uma redu29 ção significativa no comprimento celular de aproximadamente 13,03 µm. Com relação a cepa SC-58 os valores se mostraram significativamente diferentes variando respectivamente de 17,49 µm a 18,26 µm (Tabela 3). Com relação ao diâmetro dos parasitas, observouse um comportamento semelhante ao observado para o comprimento celular para a cepa Choachí, ou seja, os valores obtidos a partir dos parasitas antes de serem cultivados no meio com 10 mg/mL de hemina eram maiores que ao final do experimento. Da mesma forma que os valores obtidos para este parâmetro não variou significativamente para a cepa SC-58 (Tabela 3). Os parasitas da cepa Choachí cultivadas no meio contendo 15 mg/mL de hemina apresentaram uma redução significativa no comprimento celular de aproximadamente 13,28 µm. Com relação a cepa SC-58 os valores se mostraram significativamente diferentes variando respectivamente de 18,04 µm a 17,51 µm (Tabela 4). Com relação ao diâmetro dos parasitas, os valores obtidos antes de serem cultivados no meio com 15 mg/mL de hemina eram semelhantes ao final do experimento. Da mesma forma que os valores obtidos para este parâmetro variou significativamente para a cepa SC58 (Tabela 4). O comprimento do flagelo livre sofreu uma variação significativa, passando de 6,89 µm antes do início do cultivo para 7,06 µm no último dia de cultivo com 10 mg/ mL de hemina. O mesmo pode-se dizer do observado para a cepa SC-58 (Tabela 3). O comprimento do flagelo livre sofreu uma variação significativa, passando de 7,34 µm antes do início do cultivo para 6,93 µm no último dia de cultivo com 15mg/ mL de hemina. Não se observou uma variação significativa para a cepa SC-58 (Tabela 4). O comprimento total dos parasitas sofreu uma variação significativa, passando de 27,44 µm antes do início do cultivo para 20,06 µm no último dia de cultivo com 10 mg/mL de hemina. O comprimento total dos parasitas sofreu uma variação significativa, passando de 25,52 µm antes do início do cultivo para 20,20 µm no último dia de cultivo com 15 mg/mL de hemina. Tabela 1 – Demonstração dos valores médios, expressos em µm obtidos para os parâmetros comprimento celular (CC), diâmetro celular (D), flagelo livre (F), comprimento do cinetoplasto (K), diâmetro do núcleo (N) e comprimento total (C) das Cepas Choachí e SC-58, cultivadas em meio LIT acrescido de 10% de soro fetal bovino contendo 2.5 mg/ml de hemina. - X = Média - DP = Desvio Padrão - Letras iguais são estatisticamente diferentes (p<0,05). 30 Revista UniVap, v.15, n.27, 2008 Tabela 4 – Demonstração dos valores médios, expressos em µm obtidos para os parâmetros comprimento celular (CC), diâmetro celular (D), flagelo livre (F), comprimento do cinetoplasto (K), diâmetro do núcleo (N) e comprimento total (C) das Cepas Choachí e SC-58, cultivadas em meio LIT acrescido de 10% de soro fetal bovino contendo 15 mg/ml de hemina - X = Média - DP = Desvio Padrão - Letras iguais são estatisticamente diferentes (p<0,05). 5. DISCUSSÃO O Trypanosoma rangeli e o Trypanosoma cruzi são flagelados morfologica, biologica e bioquimicamente distintos, compartilham vetores do gênero Rhodnius e mamíferos reservatórios, principalmente marsupiais. Por isso a necessidade de sua correta identificação e diferenciação com o T. cruzi (D’ALESSANDRO, 1972). Para este estudo foram utilizadas as cepas Choachí e SC-58 do Trypanosoma rangeli cultivados em meio LIT com a concentração de hemina padrão nos dias 1, 3 e 6 e após o inóculo, conforme Tabelas 1, 2, 3 e 4, observou-se que em nenhuma das condições empregadas nesse estudo foram detectadas alterações significativas nos parâmetros tamanho do cinetoplasto e diâmetro do núcleo. Para a definição morfológica do cinetoplasto e núcleo as laminas foram coradas com Giemsa. (D’ALESSANDRO; SARAVIA, 1992). Com os resultados obtidos no presente estudo pudemos analisar o estágio morfológico dos parasitas através da microscopia ótica e observamos: o núcleo, o cinetoplasto, o corpo celular alongado, o diâmetro e o flagelo livre. E através dessa observação vimos que a cepa Choachí teve redução significativa de tamanho nas concentrações de hemina: 2.5 mg/mL; 5.0 mg/mL; 10 mg/ mL e 15 mg/mL. Lafont (1910) e Camargo (1999), chama a atenção para o fato de que a morfologia de tripanosomatídeos não é um caráter confiável para distinguir gêneros de tripanosomatídeos encontrados em plantas dos de insetos. 32 É de conhecimento que as espécies do gênero Rhodnius são altamente suscetíveis a determinadas cepas de T. rangeli, poderíamos especular que o Trypanosoma como forma evolucionária, desenvolveu mecanismos para escapar de uma resposta imune do inseto, por outro lado o flagelado é capaz de degradar, inibir e resistir a diversos fatores antiparasitários na hemolinfa do inseto infectado. Nossa intenção, a esse respeito, não é discutir profundamente a patogenicidade que o T. rangeli demonstra para o seu hospedeiro invertebrado, já que nossos estudos se limitam unicamente a observações morfológicas e morfométricas do T. rangeli. Dados na literatura (D’ALESSANDRO; SARAVIA, 1992) corroboram com os nossos resultados onde a avaliação dos parâmetros mensurados nos parasitas cultivados em meio LIT nas diferentes concentrações de hemina observou-se formas curtas, medias e alongadas dos parasitas medindo em média 26 µm, incluindo o flagelo livre, nas cepas Choachí e SC-58. Na morfologia do T. rangeli podemos distinguir diferentes formas em seu hospedeiro vertebrado e invertebrado e por sua vez nos diferentes órgãos do inseto vetor. Na hemolinfa se encontram formas epimastigotas curtas, médias e largas, e tripomastigotas metacíclicas; também se observam formas em divisão longitudinal muito ativa, formas esferomastigotas e tripomastigotas; é freqüente encontrar a presença de numerosos hemócitos (CUBA, 1998). Nas glândulas sali- Revista UniVap, v.15, n.27, 2008 vares se encontra a maioria das formas tripomastigotas metacíclicas e no intestino formas largas de epimastigotas (AÑEZ, 1983). CAMARGO, E. P. Phytomonas and other Trypanosomatids Parasites of plants and fruits. Advances in Parasitology, v. 42, p. 29-112, 1999. Pessoa (1974) chama a atenção sobre a necessidade de uma correta identificação do tripanossomatídeo no caso de infecção mista, tendo em vista possível confusão com o T. rangeli. CUBA CUBA, C. A. Revisión de los aspectos biológicos y diagnósticos del Trypanosoma (Herpetosoma) rangeli. Rev. Soc. Bras. Med. Trop., v. 31, n. 2, p. 207-220, 1998. Durante muitos anos vem utilizando-se os termos T. rangeli-like, tripanosomas semelhantes ao T. rangeli e também o tipo-rangeli,quando eram descritos os estudos basicamente morfológicos, flagelados em diversos hospedes vertebrados e em triatomíneos infectados naturalmente. D’Alessandro (1976) definiu claramente que para ser denominado um tripanosoma como o T. rangeli, se deve evolucionar na hemolinfa do triatomíneo, invadir suas glândulas salivares e ser transmitido pela picada no vertebrado suscetível. Todos estes são parâmetros biológicos considerados indispensáveis na identificação do parasito. Devido a ocorrência simultânea de Trypanosoma rangeli e Trypanosoma cruzi em vários países da América do Sul e América Central, estudos sobre a biologia do Trypanosoma rangeli são de maior importância (GUHL ET AL., 1987; HUDSON ET AL., 1992). No contexto atual da capacitação dos recursos humanos e da infra-estrutura dos serviços de Saúde Pública os parâmetros de identificação morfológica e biológica, são de grande utilidade prática como lemento de identificação do Trypanosoma rangeli. Os nossos resultados mostraram que através da análise morfológica e morfométrica a concentração de hemina presente no meio de cultura induz mudanças morfológicas nos parasitas cultivados no meio LIT. Dessa forma, baseando-se no que foi apresentado até aqui, podemos afirmar que o T. rangeli constitui um modelo experimental de grande potência de exploração cientifica, em um completo campo do fenômeno da morfologia de um parasito protozoário digenético e nos estudos de imunidade celular de insetos. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS AÑEZ, N. Studies on Trypanosoma rangeli Tejera, 1920. VI Developmental patten in the haemolymph of Rhodnius prolixus. Mem. Inst. Oswaldo Cruz, v.77, n. 4, p. 405-415, 1983. CAMARGO, P. A. 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Trypanosoma rangeli (Tejera, 1920) isolated from a sylvaticrodent (Echimys dasythrix) in Santa Catarina Island, Santa Catarina State: first report of this trypanosome in southern Brazil. Mem. Inst. Oswaldo Cruz, v. 86, n. 1, p. 73-79, 1991. STEINDEL, M; DIAS NETO, E; CARVALHO PINTO, C. J; GRISARD, E. C; MENEZES, C. L. P; MURTA, S. M. F; SIMPSON, A. J. G; ROMANHA, A. J. Random amplified polymorphic DNA (RAPD) and isoenzyme analysia of Trypanosoma rangeli strains. J. eukaryotic microbiol., v. 41, p. 261-267, 1994. 34 TOBIE, E. J. Increased infectivity of a cyclically maintained strain of Trypanosoma rangeli to Rhodnius prolixus and mode of transmition by invertebrate host. J. parasitology, v. 50, n. 5, p. 593-598, 1964. VASQUEZ, J. E; KRUSNELL, J; RN, O. A.; SOUSA, O. E.; HARRIS, R. A. Serological diagnosis of Trypanosoma rangeli infected patients. A comparison of different methods and its implications for the diagnosis of Chagas Disease. Scandinavian Journal of Immunology, v. 45, p. 322-330, 1997. Revista UniVap, v.15, n.27, 2008 Condições para a Linearidade da Relação entre Débito Cardíaco e Consumo de Oxigênio Mituo Uehara * Kumiko K. Sakane * Resumo: Discute-se a questão da linearidade da relação entre débito cardíaco e consumo de oxigênio, durante a realização de exercício físico. A discussão é baseada numa equação recentemente deduzida, que relaciona o débito cardíaco com o consumo de oxigênio, a pressão sistólica e o rendimento do coração no trabalho de bombear o sangue. Supondo que o rendimento do coração seja uma função decrescente do consumo de oxigênio, mostra-se que a pressão sistólica sistêmica deve ser uma função crescente do consumo de oxigênio, o que é confirmado por observações experimentais. Com dados experimentais publicados na literatura faz-se uma estimativa da variação do rendimento do coração em função do consumo de oxigênio. Palavras-chave: Rendimento do coração, pressão sistólica, exercícios físicos. Abstract: The question of the linearity of the relation between cardiac output and oxygen consumption is discussed. The discussion is based on a recently derived equation which relates cardiac output to oxygen consumption, sistolic pressure and the heart efficiency in pumping blood. Assuming that the heart efficiency is a decreasing function of oxygen consumption it is shown that the sistolic pressure must increase as oxygen consumption increases, a behavior that is supported by experimental observations. By using experimental data published in the literature the variation of the heart efficiency as a function of oxygen consumption is estimated. Key words: Heart efficiency, sistolic pressure, ergometric exercises. 1. INTRODUÇÃO Observações experimentais mostram que a relação entre o débito cardíaco e o consumo de oxigênio, durante a realização de exercício físico, é linear, com muito boa aproximação. Recentemente, Beck et al. (2006) realizaram experimentos para investigar a questão da linearidade dessa relação. Porém, o estudo daqueles pesquisadores consistiu apenas numa análise estatística de dados experimentais, sem nenhuma tentativa de explicação teórica. Durante a realização de exercícios, em diferentes níveis de intensidade, a pressão arterial e o rendimento do coração no trabalho de bombear o sangue variam, como mostram observações experimentais (HIGGINBOTHAM et al., 1986; UEHARA et al., 2007). Assim, o débito cardíaco, o consumo de oxigênio, a pressão arterial e o rendimento do coração variam durante a realização de exercício. Recentemente foi deduzida uma equação relacionando as grandezas citadas (UEHARA et al., 2008), que permite analisar matematicamente a questão da linearidade entre débito cardíaco e consumo de oxigênio. Neste trabalho apresentamos uma discussão teórica da questão da linearidade entre débito cardíaco e taxa de consumo de oxigênio, durante a realização de exercícios em diferentes níveis de intensidade, com base na equação recentemente deduzida por Uehara et al. (2008). Fazemos uma estimativa da variação do rendimento do coração durante a realização de exercício, utilizando dados experimentais de Higginbotham et al. (1986), Beck et al. (2006) e de Poliner et al. (1980). 2. RELAÇÃO ENTRE O DÉBITO CARDÍACO E O CONSUMO DE OXIGÊNIO Consideremos a equação, recentemente deduzida (UEHARA et al., 2008), Q= * Professor(a) da UNIVAP. Revista UniVap, v.15, n.27, 2008 ηcEΩ p P + pS (1), 35 onde Q é o débito cardíaco, η o rendimento do coração no trabalho de bombear o sangue, E é a energia liberada por nutrientes, em reações metabólicas, por litro de oxigênio consumido, Ω o volume de oxigênio consumido pela pessoa, por unidade de tempo, c a fração de oxigênio consumida pelo coração em relação ao consumo total Ω (isto é, cΩ , sendo c < 1, é o volume de oxigênio consumido pelo coração, por unidade de tempo), pP a pressão sistólica pulmonar e pS a pressão sistólica sistêmica. Para uma dieta típica a energia liberada por litro de oxigênio consumido é aproximadamente igual a (MILNOR, 1990) E = 5,0 kcal/(litro de O2) (3). Introduzindo os valores dados por (2) e (3) na equação (1) resulta ηcΩ pS (4). Indiquemos pelo símbolo {pS} o valor numérico de pS em mmHg, por exemplo se pS = 120 mmHg, então {pS} = 120. A equação (4) pode ser escrita na forma 5 ηcΩ {p S } (5), em que apenas Q e Ω são grandezas dimensionais, dadas comumente em litros/minuto. Denotemos por r o produto ηc do rendimento, η, do coração no trabalho de bombear o sangue pela fração, c, de oxigênio consumido pelo coração. Assim, r = ηc de modo que a Equação (5) pode ser escrita como 36 3. LINEARIDADE DA RELAÇÃO ENTRE DÉBITO CARDÍACO E CONSUMO DE OXIGÊNIO Supondo que a relação entre o débito cardíaco e o consumo de oxigênio seja linear, escrevemos (8), pS =7 pP Q=1,38x10 Como c < 1, vemos que r = ηc < η, ou seja, r é sempre menor que o rendimento do coração no trabalho de bombear o sangue. Então, chamaremos r de “índice de rendimento” ou “índice de eficiência” do coração. (2). Dados experimentais mostram que a pressão sistólica sistêmica é da ordem de sete vezes maior que a pressão sistólica pulmonar (HIGGINBOTHAM et al., 1986; GRODINS, 1963). Temos, aproximadamente, Q = (1,38x10 5 mmHg ) (7). onde A e B são constantes. Observações experimentais mostram que, com o aumento do nível de intensidade de exercício, r decresce enquanto a pressão sistólica sistêmica, pS, aumenta. Como a taxa de consumo de oxigênio Ω (litros/minuto) está diretamente relacionada com o trabalho realizado pelo coração (UEHARA et al., 2008); que por sua vez deve ser maior quanto maior o nível de intensidade de exercício, vamos considerar r e pS como funções de Ω, isto é, r = r(Ω) e pS(Ω). A função r(Ω) decresce com Ω, enquanto a função pS(Ω) aumenta com Ω, mas de tal modo que a relação entre Q e Ω seja linear. Vamos supor que a função r(Ω) seja da forma (9), onde a e b são constantes positivas. De acordo com a Equação (9), a fração de rendimento, r, decresce com o aumento de Ω, e seu valor se aproxima de b para valores elevados de Ω. Das equações (8) e (9) obtemos (10), (6), que dá a forma como a pressão sistólica pS deve variar com Ω se r variar de acordo com a Equação (9) e a relação entre Q e Ω for linear. Revista UniVap, v.15, n.27, 2008 Derivando a Equação (10) obtemos d{p S } bA − aB = 1,38x10 5 dΩ (A + BΩ )2 (11) de modo que a pressão sistólica torna-se praticamente constante para valores muito elevados de Ω. Resta ver se as observações experimentais esclarecem se isso já ocorre em níveis fisiologicamente possíveis de intensidade de exercício. 4. ESTIMATIVADO ÍNDICE DE RENDIMENTO e d 2 {pS } bA − aB = −2,76 x105 2 dΩ ( A + BΩ )3 (12) As equações (11) e (12) mostram que se bA − aB > 0 , então d{pS}/dΩ > 0 e d2{pS}/dΩ2 < 0. Nesse caso, pS é função crescente de Ω e o gráfico de pS em função de Ω é uma curva com a concavidade para baixo. Por outro lado, se bA − aB < 0 , então d{pS}/dΩ < 0 e d2{pS}/dΩ2 > 0 e, nesse caso, a pressão sistólica pS seria uma função decrescente de Ω, o que não é confirmado por dados experimentais. Portanto, devemos ter bA − aB > 0 (13), A a > B b (14). donde Vemos pela Equação (11) que a derivada de pS não se anula para nenhum valor finito de Ω, de modo que a pressão sistólica não apresenta nenhum ponto de máximo. Para valores elevados de Ω, tais que B Ω >> A temos também que b Ω >> a (pois A/B > a/b) e a Equação (9) mostra que r torna-se praticamente constante e igual a b, enquanto a equação (10) se reduz a {p S } = 1,38x10 5 b B (15), A grandeza r, que chamamos de índice de rendimento, é igual ao produto do rendimento do coração (η) pela fração (c) de oxigênio consumido pelo coração, sendo, portanto, a menos de um fator c < 1, uma medida do rendimento do coração no trabalho de bombear o sangue para o sistema vascular. Vamos fazer uma estimativa de r utilizando dados experimentais publicados na literatura. 4.1 Dados de Higginbotharm et al. (1986) Higginbotham et al. (1986) mediram várias grandezas hemodinâmicas em experimentos com vinte e quatro pessoas do sexo masculino, com idade variando de 20 a 50 anos, com a área da superfície do corpo variando de 1,65 m2 a 2,10 m2. No lugar do débito cardíaco eles apresentaram os valores do índice cardíaco CI = Q AS (16), sendo CI o índice cardíaco, Q o débito cardíaco e A S a área da superfície do corpo. Como aqueles autores não deram o valor médio da área da superfície do corpo, a fim de calcular o débito cardíaco, vamos tomar a média aritmética AS = (1,65 + 2,10)m 2 2 = 1,88m 2 (17). A Tabela 1 apresenta dados experimentais de Higginbotham et al. (1986) e valores de r calculados através da Equação (7). Tabela 1 - Dados experimentais de Higginbotham et al. (1986) e valores de r calculados através da Equação (7) pS é a pressão sistólica, Ω a taxa de consumo de oxigênio, CI o índice cardíaco, Q o débito cardíaco e r o índice de rendimento do coração *Q = (1,88 m2)CI. Revista UniVap, v.15, n.27, 2008 37 Com os valores de Ω e de Q, apresentados na Tabela 1, obtemos Q =A+ B Ω (18), A = 3,7 litros/min (19) onde B = 5,7 (20). A Fig. 1 mostra o gráfico do débito cardíaco Q em função da taxa de consumo de oxigênio Ω. É interessante observar que o valor do coeficiente angular B = 5,7 coincide com o obtido por Beck et al. (2006), que fizeram experimentos com 72 pessoas. e Fig. 1 - Débito cardíaco, Q, em função da taxa de consumo de oxigênio, Ω. Com os valores de r, dados na Tabela 1, obtemos para os parâmetros a e b da Equação (9), a = 0,0023 litro/min. (21) b = 0,010 (22). A Fig. 2 apresenta o gráfico de r em função de Ω, com a e b dados pelos resultados (21) e (22). e Fig. 2 - Índice de rendimento, r, em função da taxa de consumo de oxigênio, Ω. 38 Revista UniVap, v.15, n.27, 2008 Vemos que, com os resultados (19)-(22), as desigualdades (13) e (14) estão satisfeitas, de modo que a pressão sistólica pS é uma função crescente de Ω. A Fig. 3 mostra o gráfico da pressão sistólica em função de Ω. A pressão sistólica dada pela Equação (10), com os resultados (19)-(22), não apresenta ponto de máximo, mas, para valores elevados de Ω, tende para o valor dado pela Equação (15). Das Equações (15), (20) e (22) obtemos pS = 242 mmHg (23), que é o valor da pressão sistólica para valores elevados de Ω, tais que (24). Fig. 3 - Pressão sistólica, pS, em função da taxa de consumo de oxigênio, Ω. Os pontos experimentais correspondem aos valores de pS dados na Tabela 1. A Fig. 4 é o gráfico da derivada de pS em relação a Ω, dada pela Equação (11). A derivada é positiva e para valores elevados de Ω ela tende a zero. Ω, em função da taxa de consumo de oxigênio, Ω. Fig. 4 - Derivada da pressão sistólica, dpS/dΩ Revista UniVap, v.15, n.27, 2008 39 4.2 Dados de Beck et al. (2006) e de Poliner et al. (1980) Beck et al. (2006) mediram o débito cardíaco, Q, e a taxa de consumo de oxigênio, Ω, de setenta e duas pessoas sadias, exercitando-se em bicicleta ergométrica. Porém eles não mediram a pressão arterial sistólica, pS. Poliner et al. (1980) mediram o débito cardíaco e a pressão arterial sistólica de sete pessoas sadias, exercitandose em bicicleta ergométrica, mas não mediram o consumo de oxigênio. Por uma feliz coincidência o valor médio da área da superfície do corpo das pessoas que se submeteram aos testes ergométricos de Beck et al. (2006), de um lado, e de Poliner et al. (1980), de outro lado, é praticamente a mesma, o que torna razoável supor que os dois conjuntos de dados podem se completar mutuamente. Assim, para um determinado valor de Q, tomamos o valor correspondente de Ω, medido por Beck et al. (2006), e o valor de pS, medido por Poliner et al. (1980). A área da superfície do corpo de uma pessoa é calculada através da fórmula empírica (CAMERON, SKOFRONICK E GRANT, 1990) AS = 0.202M0.425H0.725 (25), onde AS é a área da superfície do corpo em m2, M a massa da pessoa em kg e H a altura em metros. No trabalho de Beck et al. (2006), a massa e a altura médias das setenta e duas pessoas foram, respectivamente, M = 72.1 kg e H = (1.73 ± 0.09) m. Com esses valores a Equação (25) dá AS = 1.85 m2. Por outro lado, no trabalho de Poliner et al. (1980), o valor médio da área da superfície do corpo, das sete pessoas que se submeteram ao teste ergométrico, foi AS = 1.83 m2. Com os dados de Beck et al. (2006) obtemos, para a parte inicial do gráfico de Q em função de Ω, os mesmos resultados (18) – (20), que obtivemos com os dados de Higginbotham et al. (1986). Isso pode ser explicado pelo valor médio da área da superfície do corpo que é aproximadamente o mesmo nos dois trabalhos, pois, no trabalho de Higginbotham et al. (1986), vimos pela Equação (17), que AS = 1.88 m2 Com os dados de Beck et al. (2006) e de Poliner et al. (1980) calculamos, através da Equações (8), (19) e (20), o valor do índice de rendimento, r, para as várias condições de exercício. A Tabela 2 mostra os resultados que obtivemos Tabela 2 - Consumo de oxigênio, Ω, índice de rendimento, r, e pressão sistólica, pS Supondo para a função r = r(Ω) a forma expressa pela Equação (9), determinamos pelo método dos mínimos quadrados os valores de a e de b que dão o melhor ajuste aos dados experimentais apresentados na Tabela 2, obtendo os resultados a = 0.0027 litro/min. (26) b = 0.0088 (27). e A Fig. 5 mostra o gráfico de r em função de Ω. Fig. 5 - Índice de rendimento, r, em função do consumo de oxigênio, Ω. Os pontos experimentais correspondem aos valores de r dados na Tabela 2. 40 Revista UniVap, v.15, n.27, 2008 Com os resultados de A, B, a e b, dados por (19), (20), (26) e (27) determinamos, através da Equação (10), a pressão sistólica como função de Ω, cujo gráfico é apresentado na Fig. 6. Fig. 6 - Pressão sistólica, pS, em função da taxa de consumo de oxigênio, Ω. Os pontos experimentais correspondem aos valores de pS dados na Tabela 2. 5. CONCLUSÃO Mostramos que se o índice de rendimento do coração, r, variar com a taxa de consumo de oxigênio, Ω, de acordo com a Equação (9), e a relação entre o débito cardíaco, Q, e o consumo de oxigênio, Ω, for linear, como expressa pela Equação (8), então, a pressão sistólica, pS, varia com Ω na forma dada pela Equação (10). Inversamente, se r variar conforme a Equação (9) e pS variar de acordo com a Equação (10), então, a relação entre Q e Ω será linear e dada pela Equação (8). A estimativa para a variação de r com Ω, obtidas com dados experimentais de Higginbotham et al. (1986) não diferiu muito da estimativa obtida com os dados de Beck et al. (2006) e de Poliner et al. (1986), como mostram os resultados (21), (22), (26) e (27). A hipótese expressa pela Equação (9), para a função r(Ω), deu para a função pS(Ω) uma forma, expressa pela Equação (10), que descreve aproximadamente o comportamento de pS observado experimentalmente, como mostra a Fig. 6. Também a Fig. 3 mostra que a forma da função pS(Ω) está de acordo com os dados experimentais de Higginbotham et al. (1986), apesar de ter apenas dois pontos experimentais. 6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BECK, K. C.; RANDOLPH, L. N.; BAILEY, K. R.; WOOD, C.M.; SNYDER, E.M.; JOHNSON, B.D. Relationship Revista UniVap, v.15, n.27, 2008 between cardiac output and oxygen consumption during upright cycle exercise in healthy humans. Journal of Applied Physiology, v. 101, p. 1474-1480, 2006. CAMERON, J. R.; SKOFRONICK, J. 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American Journal of Physics, v. 76, p. 566-569, 2008. 41 Alimentação de Serranidae (Actinopterygii, Teleostei, Perciformes) na Praia de Cabuçu (Saubara, Baía de Todos os Santos, Bahia). III. Rypticus Randalli Courtenay, 1967 Paulo Roberto Duarte Lopes * Jailza Tavares de Oliveira-Silva ** Rogenaldo de Brito Chagas *** Resumo: Os conteúdos gastro-intestinais de 104 exemplares de Rypticus randalli Courtenay, 1967 (Actinopterygii: Serranidae) foram examinados. Os peixes foram coletados na Praia de Cabuçu (coordenadas 12°47’S - 38°46’W, município de Saubara, região ocidental da Baía de Todos os Santos, estado da Bahia, litoral nordeste do Brasil, Oceano Atlântico ocidental) nos meses de julho de 1999, março, junho, julho, novembro e dezembro de 2000, janeiro, março e abril de 2001, abril de 2002, março e maio de 2003. Foram identificadas 12 categorias alimentares. Em ocorrência e em número, predomínio de Crustacea Decapoda Dendrobranchiata (camarões, 67,86% e 53,78% respectivamente). Palavras-chave: Dieta, Teleostei, Rypticus randalli, Bahia. Abstract: The gut content of 104 specimens of Rypticus randalli Courtenay, 1967 (Actinopterygii: Serranidae) were examined. The fishes were collected in Cabuçu beach (12°47’S - 38°46’W, Saubara municipality, Western region of Todos os Santos Bay, Bahia state, northeastern littoral of Brazil, Western Atlantic Ocean) in the months of July, 1999, March, June, July, November and December, 2000, January, March and April, 2001, April, 2002, March and May, 2003. It was identified 12 food categories. In terms of occurrence and in number, predominance for Crustacea Decapoda Dendrobranchiata (shrimps, 67,86% and 73,58% respectively). Key words: Diet, Teleostei, Rypticus randalli, Bahia. 1. INTRODUÇÃO Rypticus randalli Courtenay, 1967, pertencente à família Serranidae (subfamília Epinephelinae, tribo Grammistini) e conhecido como peixe-sabão devido à grande quantidade de muco que produz quando perturbado ou confinado, atinge pelo menos 19,0 cm de comprimento e distribui-se desde Cuba e do sul das Bahamas ao estado de Santa Catarina (Brasil) associado com fun- * Prof. assistente da Universidade Estadual de Feira de Santana - Dep. Ciências Biológicas - Lab. Ictiologia E-mail: [email protected] ** Bióloga da Univ. Est. de Feira de Santana - Dep. Ciências Biológicas - Lab. Ictiologia. E-mail: [email protected] *** Biólogo. Bahia Pesca S.A., Secretária de Irrigação e Reforma Agrária do Estado da Bahia, Fazenda Experimental Oruabo, Acupe, Santo Amaro da Purificação E-mail: [email protected] 42 dos de areia, lama ou cascalho próximo à estuários até uns 20 m de profundidade (FIGUEIREDO; MENEZES, 1980; CERVIGÓN, 1991; CARVALHO FILHO, 1999; GUIMARÃES, 1999; NELSON, 2006). A Baía de Todos os Santos, com cerca de 1052 km², é o maior acidente geográfico desta natureza na costa brasileira porém não existem muitas informações disponíveis sobre sua ictiofauna bem como a respeito da biologia das espécies aí ocorrentes (LOPES et al., 1999a; LOPES; OLIVEIRA-SILVA, SANTOS, 1999b; OLIVEIRASILVA; LOPES, 2002; LOPES et al., 2003; CHAGAS; LOPES; OLIVEIRA-SILVA, 2004). 2. MATERIAL E MÉTODOS A Praia de Cabuçu, localizada no município de Saubara (região ocidental da Baía de Todos os Santos, estado da Bahia, litoral nordeste do Brasil, coordenadas 12°47’S - 38°46’W), apresenta-se com substrato predominantemente lamoso e encontra-se sob forte ação antrópica pois, além de sua população local, recebe gran- Revista UniVap, v.15, n.27, 2008 de fluxo de banhistas e veranistas nos finais de semana e nos meses mais quentes do ano resultando na ocupação desordenada do solo e no aumento do despejo de lixo e de esgotos não tratados na praia. R. randalli é citado por Lopes et al. (1999a) para a Praia de Itapema, localizada poucos quilômetros ao norte da Praia de Cabuçu e que também apresenta substrato predominantemente lamoso. Foram realizadas 5 coletas de 100,0 m de extensão totalizando 500,0 m em um trecho desta praia com auxílio de rede de arrasto manual com malha de 10,0 mm entre nós durante a baixa-mar entre julho de 1999 e maio de 2003 para captura de exemplares de R. randalli visando contribuir para o conhecimento de sua biologia através da análise do seu conteúdo gastro-intestinal. O número de exemplares capturados, por mês e ano de coleta, são apresentados na Tabela 1. Tabela 1 - Meses e anos de coleta e respectivos número de exemplares de Rypticus randalli capturados na Praia de Cabuçu (Saubara, Baía de Todos os Santos, Bahia) Após a captura, ainda no campo, todos os peixes foram acondicionados em gelo e, em laboratório, mantidos congelados sendo posteriormente fixados em formol 10% e transferidos para álcool 70%, onde permaneceram conservados. Em laboratório, o comprimento total de cada exemplar foi determinado com auxílio de ictiômetro e régua (com precisão de 1,0 mm) conforme a definição de Figueiredo e Menezes (1978). A seguir, cada exemplar foi dissecado através de incisão na região ventral para identificação do sexo a partir do exame das gônadas e retirada do tubo digestivo cujo conteúdo foi examinado em microscópio estereoscópico sob diferentes aumentos. Na análise dos resultados, considera-se freqüência de ocorrência como o número de tubos digestivos em que uma dada categoria alimentar foi encontrada dividido pelo número total de tubos digestivos examinados, expresso em porcentagem, e freqüência numérica como sendo o número de indivíduos de cada categoria alimentar dividido pelo número total de indivíduos das categorias alimentares identificados, expresso em porcentagem, segundo Hyslop (1980), Fonteles Filho (1989) e Zavala-Camin (1996). Material testemunho encontra-se depositado na coleção do Laboratório de Ictiologia (Departamento de Ciências Biológicas - Universidade Estadual de Feira de Santana) conservado em álcool 70%. Revista UniVap, v.15, n.27, 2008 3. RESULTADOS Foram analisados os tubos digestivos de 104 exemplares de R. randalli. O comprimento total dos peixes examinados variou entre 42,0 e 119,0 mm. No que se refere ao sexo, 72 indivíduos puderam ser caracterizados como fêmeas (69,23%), 13 como machos (12,5%) e em 19 (18,27%) o sexo não pode ser determinado (Gráfico 1). Quanto ao grau de repleção, 52,38% dos tubos digestivos estavam pouco cheios, 44,05% estavam cheios e apenas 3,57% estavam meio cheios; 20 tubos digestivos (19,23%) estavam vazios. No que se refere ao grau de digestão, o alimento encontrava-se pouco digerido em 33,33% dos tubos digestivos e tanto o alimento digerido como aquele meio digerido foram encontrados em 32,14% e não digerido em apenas 2,38% dos tubos digestivos examinados. Foram identificados 12 categorias alimentares. Em termos de freqüência de ocorrência, predomínio de Crustacea Decapoda Dendrobranchiata (camarões) com 67,86% seguido por matéria orgânica digerida (MOD, 25,0%), restos de Crustacea (14,28%) e quelas de 43 Crustacea Brachyura (siris, 11,9%); os demais itens atingiram valores inferiores a 5,95% (Tabela 2) Quanto à freqüência numérica, também destaca- ram-se os Decapoda Dendrobranchiata com 73,58% seguido por restos de Crustacea e quelas de Brachyura (ambos com 7,55%); os demais itens atingiram valores inferiores a 3,14% (Tabela 2). Gráfico 1 - Proporção de sexos de 104 indivíduos de R. randalli na Praia de Cabuçu (julho/1999 a maio/2003) Tabela 2 - Frequências de ocorrência e numérica para 12 categorias alimentares identificadas nos tubos digestivos de 84 exemplares de Rypticus randalli coletados na Praia de Cabuçu (Saubara, Baía de Todos os Santos, Bahia) 4. DISCUSSÃO E CONCLUSÕES Todos os representantes da família Serranidae são predadores, alimentando-se de invertebrados (principalmente crustáceos e cefalópodos) e peixes; algumas espécies tem rastros branquias numerosos, longos e deste modo estão adaptados para se alimentarem de zooplâncton (FIGUEIREDO; MENEZES, 1980; HEEMSTRA; ANDERSON; LOBEL in CARPENTER, 2002). Segundo Guimarães (1999), os representantes do gênero Rypticus Cuvier, 1829 alimentam-se principalmente durante a noite de crustáceos, moluscos e peixes. Carvalho 44 Filho (1999) comenta que R. randalli alimenta-se basicamente de peixes e, em menor quantidade, de crustáceos. Cervigón (1991) afirma que o muco produzido por Rypticus contêm uma toxina chamada gramistina cuja função parece ser defensiva uma vez que quando um predador ingere o peixe-sabão imediatamente o expulsa. Randall et al. in Cervigón (1991) citam que exemplares de Rypticus não foram encontrados em estômagos de peixes carnívoros no Mar do Caribe. Chagas; Lopes e Oliveira-Silva (2004), analisando tubos digestivos do niquim Thalassophryne sp., de hábitos Revista UniVap, v.15, n.27, 2008 bentônicos, também capturados na Praia de Cabuçu, não identificaram R. randalli nem outros representantes de Serranidae no seu conteúdo gastro-intestinal embora exemplares da família Tetraodontidae (baiacu), conhecido por sua toxicidade, tivessem sido ingeridos. Aguiar e Filomeno (1995) afirmam que a alta freqüência de matéria orgânica digerida parece estar relacionada com uma alimentação próxima ao padrão seqüencial, no qual se observa uma busca constante de alimento que é ingerido em pequenas quantidades a cada vez, o que justificaria sua elevada ocorrência também em R. randalli. O único grupo de Actinopterygii Teleostei possível de ser identificado nos tubos digestivos de R. randalli foi 1 exemplar, representante da família Gobiidae, que quase sempre vivem em contato direto com o substrato, onde comumente se enterram (MENEZES; FIGUEIREDO, 1985). Trematoda (ocorrência de 3,57%) não são considerados como item alimentar mas sim como parasitas do tubo digestivo de R. randalli (BARNES, 1984). Em Serranus flaviventris (CUVIER, 1829), outra espécie de Serranidae e também para a Praia de Cabuçu, Oliveira-Silva e Lopes (2002) analisaram 333 tubos digestivos e identificaram 21 categorias alimentares com amplo predomínio de Crustacea, principalmente Decapoda Dendrobranchiata (camarões), como observado também para R. randalli. Para Diplectrum radiale (QUOY; GAIMARD, 1824), também Serranidae e ainda na mesma praia onde se realizou este estudo, Lopes et al. (2003) identificaram 9 categorias alimentares em 36 tubos digestivos examinados com destaque para crustáceos, principalmente camarões, e peixes, ou seja, novamente semelhante ao que foi observado para R. randalli. 6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS AGUIAR, J. B. S.; FILOMENO, M. J. B. Hábitos alimentares de Orthopristis ruber (Cuvier, 1830), (Osteichthyes Haemulidae) na Lagoa da Conceição - SC, Brasil. Biotemas, v. 8, n. 2, p. 41-49, 1995. BARNES, R. D. Zoologia dos invertebrados. 4a. ed. São Paulo: Roca, 1984. CARVALHO FILHO, A. Peixes da costa brasileira. São Paulo: Melro, 1999. CERVIGÓN, F. Los peces marinos de Venezuela. Caracas: Fundación Científica Los Roques, 1991. v. 1. CHAGAS, R. B.; LOPES, P. R. D.; OLIVEIRA-SILVA, J. T. Notas sobre a alimentação de Thalassophryne sp. (Actinopterygii: Batrachoididae) na Praia de Cabuçu (Saubara, Baía de Todos os Santos, Bahia). Revista Biociências, v. 10, n. 4, p. 321-234, 2004. FIGUEIREDO, J. L.; MENEZES, N. A. Manual de peixes marinhos do sudeste do Brasil. II. Teleostei (1). São Paulo: Museu de Zoologia da Universidade de São Paulo, 1978. FIGUEIREDO, J. L.; MENEZES, N. A. Manual de peixes marinhos do sudeste do Brasil. III. Teleostei (2). São Paulo: Museu de Zoologia da Universidade de São Paulo, 1980. FONTELES FILHO, A. A. Recursos pesqueiros: biologia e dinâmica populacional. Fortaleza, Imprensa Oficial do Ceará, 1989. GUIMARÃES, R. Z. P. Revision, phylogeny and comments on biogeography of soapfishes of the genus Rypticus (Teleostei: Serranidae). Bulletin of Marine Science, v. 65, n. 2, p. 337-379, 1999. Com base nas informações aqui apresentadas, para R. randalli, na Praia de Cabuçu, apesar da limitação da amostra durante o período de estudo, constata-se um hábito demersal e predador principalmente sobre Crustacea principalmente Decapoda Dendrobranchiata (camarões), confirmando informações já citadas na literatura para esta espécie. HEEMSTRA, P. C.; ANDERSON Jr., W. D.; LOBEL, P. S. Serranidae. In: CARPENTER, K. E. (Ed.). The living marine resources of the Western Central Atlantic. Bony fishes part 1 (Acipenseridae to Grammatidae). Rome: FAO, 2002. [Species identification guide for fishery purposes, and American Society of Ichthyologists and Herpetologists Special Publication no. 5]. p. 1308-1369.v.2. 5.AGRADECIMENTOS HYSLOP, E. J. Stomach contents analysis - a review of methods and their application. Journal of Fish Biology, v. 17, p. 411-429, 1980. Ao setor de transportes da UEFS pela cessão do veículo para os trabalhos de campo. Aos estagiários do Laboratório de Ictiologia (Dep. Ciências Biológicas UEFS) que auxiliaram nas coletas e no processamento inicial do material. Revista UniVap, v.15, n.27, 2008 LOPES, P. R. D.; OLIVEIRA-SILVA, J. T.; BRANDÃO, J. O.; COUTO, A. P. L. Alimentação de Serranidae (Actinopterygii, Teleostei, Perciformes) na Praia de Cabuçu (Saubara, Baía de Todos os Santos, Bahia). II. 45 Diplectrum radiale (Quoy & Gaimard, 1824). Revista de Tecnologia e Ambiente, v. 9, n. 2, p. 53-59, 2003. NELSON, J. S. Fishes of the world. 4. ed. New Jersey: John Wiley & Sons, 2006. LOPES, P. R. D.; OLIVEIRA-SILVA, J. T.; SENA, M. P.; SILVA, I. S.; VEIGA, D. C. M.; SILVA, G. R.; SANTOS, R. C. L. Contribuição ao conhecimento da ictiofauna da Praia de Itapema, Santo Amaro da Purificação, Baía de Todos os Santos, Bahia. Acta Biologica Leopodensia, v. 21, n. 1, p. 99-105, 1999a. OLIVEIRA-SILVA, J. T.; LOPES, P. R. D. Alimentação de Serranidae (Actinopterygii, Teleostei, Perciformes) na Praia de Cabuçu (Saubara, Baía de Todos os Santos, Bahia). I. Serranus flaviventris (Cuvier, 1829). Acta Científica - Biologia e Saúde, v. 4, n. 2, p. 75-82, 2002. LOPES, P. R. D.; OLIVEIRA-SILVA, J. T.; SANTOS, I. S. Registros adicionais para a ictiofauna da Praia de Itapema (Baía de Todos os Santos, Bahia) com notas sobre a alimentação de jovens de Epinephelus itajara (Teleostei: Serranidae). Revista Lecta, v. 17, n. 2, p. 37-41, 1999b. MENEZES, N. A.; FIGUEIREDO, J. L. Manual de peixes marinhos do sudeste do Brasil. V. Teleostei (4). São Paulo: Museu de Zoologia da Universidade de São Paulo, 1985. 46 SMITH, C. L. Serranidae. In: FISCHER, W. (Ed.). FAO species identification sheets for fishery purposes. Western Central Atlantic (fishing area 31). Rome: Food and Agriculture Organization of the United Nations, 1978. ZAVALA-CAMIN, L. A. Introdução aos estudos sobre alimentação natural em peixes. Maringá: Universidade Estadual de Maringá, 1996. Revista UniVap, v.15, n.27, 2008 Análise Econômica do Aeroporto Internacional de Viracopos Josmar Cappa * Fernanda Patrícia Alves ** Resumo: Neste estudo, procurou-se fazer uma análise econômica do Aeroporto Internacional de Viracopos a partir da dinâmica da economia contemporânea, caracterizada pela formação de mercados comuns entre os países (blocos econômicos formados pelos Estados Nacionais) e pelo mercado mundial de capitais. Ambos contribuem para elevar as transações comerciais entre países e blocos econômicos e ampliam a demanda por serviços de logística integrada às operações industriais vinculadas ao transporte aéreo. O referencial teórico sobre logística integrada às operações industriais foi utilizado para compreender Viracopos como parte integrante das estratégias de produção e de comercialização de mercadorias das grandes empresas que atuam no comércio internacional. A pesquisa empírica contou com dados disponíveis pelo Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio (MDIC) relativos à movimentação de mercadorias no país entre 1996 e 2006, que foram sistematizados e analisados a partir do mencionado referencial teórico, bem como levando-se em consideração as tendências de crescimento do transporte aéreo mundial, as freqüências de vôos cargueiros e os direitos de tráfego aéreo entre o Brasil e outros países da América Latina. Palavras-chave: Políticas públicas, economia urbana e regional, transporte aéreo, aeroportos. Abstract: This study aims at carrying out an economic analysis of Viracopos International Airport from the perspective of contemporary dynamics of economy characterized by the formation of common markets among countries (economic blocks of countries) and also formed by World Capital Markets. Both contribute to the increase of trade transactions among countries and economic blocks and they increase the demand for logistic services integrated to the industrial operations linked to the airtransport. Theoretical reference on logistics integrated to the industrial operations was used in trying to understand Viracopos as an integrated part of the strategies for production and commercialization of goods by the big corporate companies that participate in international trade. The empirical survey used data available by the Ministry of Development, Industry and Trade (MDIC in Portuguese) related to the movement of goods in the country from 1996 to 2006. Data was systematically organised and analysed from the perspective of the above mentioned theoretical reference, as well as taking into account the trend for growing in the world airtransport, the frequency of cargo flights and the rights to air traffic between Brazil and other countries in Latin America. Key words: Public policies, regional and urban economy, airtransport, airports. 1. INTRODUÇÃO Este artigo procura analisar o Aeroporto Internacional de Viracopos como parte integrante das estratégi* Doutor em Economia pela Unicamp. Professor e Pesquisador na Faculdade de Ciências Econômicas da PUC-Campinas. Email: [email protected] [email protected] ** Aluna de Graduação em Economia pela PUC Campinas. Orientanda de Monografia. Revista UniVap, v.15, n.27, 2008 as de concorrência das grandes empresas no comércio internacional. O trabalho está dividido em três partes. Na primeira, houve a recuperação do debate teórico sobre logística integrada das operações industriais relacionada às características do transporte aéreo e às novas formas de produção e comercialização de mercadorias no atual ambiente de concorrência competitivo entre as grandes empresas no comércio internacional. Na segunda parte, a regulamentação sobre trans- 47 porte aéreo e a organização da infra-estrutura no país foram recuperadas para analisar como os centros cargueiros aeroportuários complementam as atividades das empresas de transporte aéreo, destacando-se o papel da Infraero nas operações aéreas e industriais realizadas em terra e os acordos bilaterais firmados pelo Brasil com 64 países para especificar direitos de tráfego, determinação de capacidade, rotas e tarifas. Na última parte, foi analisado o perfil econômico do Aeroporto Internacional de Viracopos, por meio da sistematização de dados empíricos sobre movimentação de mercadorias no país disponíveis pelo Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio (MDIC) entre 1996 e 2006. Viracopos caracteriza-se por ser um aeroporto utilizado pelas grandes empresas mais para importação de mercadorias, peças, partes e componentes diversos do que para exportação de produtos acabados. 2. O TRANSPORTE AÉREO NA LOGÍSTICA INTEGRADA DAS OPERAÇÕES INDUSTRIAIS A economia contemporânea pode ser caracterizada pela formação de blocos econômicos e pelo mercado mundial de capitais, elevando, por um lado, as transações comerciais entre países e blocos econômicos, e, por outro, a demanda por serviços de logística integrada às operações industriais vinculadas ao transporte aéreo. Na economia contemporânea as grandes empresas procuram organizar seus processos produtivos e de comercialização de mercadorias a partir de reações rápidas e flexíveis. Necessitam de matérias-primas, insumos, peças, partes e componentes de diferentes fornecedores pelo mundo que ofereçam vantagens competitivas como custos, qualidade, escala de produção, rapidez e eficiência no atendimento. A troca de mercadorias envolve, portanto, maiores distâncias e, ao mesmo tempo, necessita de rapidez, segurança e confiabilidade nas entregas. As grandes empresas procuram orientar suas estratégias no comércio internacional a partir de estoques mínimos e de serviços de logística integrada às operações industriais, tendo em vista obter redução de custos operacionais e ganhos com flexibilidade e agilidade nas decisões de produção. Utilizam as tecnologias de informação para reunir, em tempo real, todos os processos da cadeia de suprimentos como elaboração de projetos, transportes de insumos e matérias-primas, estoques mínimos, embalagens, fluxo de informações sobre vendas, legislação e atendimento aos clientes (PEDRINHA, 2000). O conceito de logística das operações industriais ajuda a compreender a economia contemporânea, porque envolve todo o processo de planejamento, implementação e controle do fluxo e armazenamento de 48 matérias-primas, insumos, peças, partes e componentes, inventário em processo, bens acabados e informações sistematizadas do ponto de origem ao destino final da mercadoria, de acordo com as necessidades das empresas (CLM, 1995; BALLOU, 2004). Para atender as necessidades de comercialização de mercadorias e insumos das grandes empresas no comércio internacional, as atividades básicas da logística de operações industriais (transporte, armazenagem e manuseio) precisam estar integradas entre si, por meio das modernas tecnologias de informação, para permitir eficácia na coordenação do atendimento das demandas (BALLOU, 1993; COSTA et al., 1999). As necessidades de integrar e coordenar as atividades de logística das operações industriais envolvem o fluxo de informações, que é compreendido pelo conceito de supply chain management ou gerenciamento cadeia de suprimentos, e refere-se à coordenação de processos e gerenciamento de parcerias dentro da empresa e, especialmente, com outras empresas na cadeia produtiva. Há também a necessidade de agilidade, pois é preciso adaptar a cadeia de suprimentos frente às oscilações de demanda no mercado ou adaptações de produtos e processos produtivos. As operações de logística integrada não se limitam ao interior das empresas, pois nas relações econômicas entre clientes e fornecedores envolvem distâncias maiores, com características continentais ou nacionais e menos regionais. Na medida em que contém o estoque mínimo das empresas em trânsito, a infra-estrutura de transporte, a armazenagem, a distribuição de mercadorias e o marketing são partes importantes da cadeia de suprimentos que complementam a logística integrada das operações industriais (CLM, 1995; COSTA et al., 1999; BALLOU, 2004). O modal aéreo possibilita o transporte de qualquer tipo de mercadorias com rapidez e segurança, além de resolver problemas relacionados à sazonalidade de produção e atender mercados que apresentam problemas em relação à acessibilidade, seja pelas precárias condições de infra-estrutura de transporte ou pelas distâncias longas (PEDRINHA, 2000). As características principais do transporte aéreo de mercadorias são: I) movimenta produtos de alto valor agregado como equipamentos eletrônicos, jóias, ouro, informática, máquinas e equipamentos industriais; II) predominam mercadorias de baixo peso e volume, apesar de ter capacidade para transportar qualquer produto como, por exemplo, aviões desmontados; III) mercadorias com data de entrega rígida e periodicidade de urgência como peças de reposição, produtos e instrumentos Revista UniVap, v.15, n.27, 2008 médicos, amostras relativas à saúde, documentos, produtos perecíveis (flores, frutas, peixes), artigos de moda, entre outros; e IV) apresenta baixo nível de perdas que podem compensar, em certos casos, custos relativos maiores como, por exemplo, seguros (BNDES, 2001; MATERA, 2007, p.103). 2.1 Tendências de crescimento do transporte aéreo mundial entre 2005 e 2025 É devido à dinâmica da economia contemporânea e às atuais necessidades de integrar as operações de logística na cadeia de suprimentos que o desempenho do transporte aéreo de mercadorias está diretamente relacionado ao crescimento econômico das nações. Ou seja, tende a crescer na medida em que os países também crescem, devido ao aumento da demanda para movimentar insumos, matérias-primas, mercadorias e também passageiros. O tráfego aéreo mundial cresceu a uma taxa de 11,6% ao ano entre 1966 e 1977, em termos de passageiros por quilômetros transportados, passando para 7,8% entre 1978 e 1986 e para 4,8% entre 1987 e 1997. De acordo com a empresa norte-americana Boeing, líder mundial na produção de aviões, a demanda por transporte aéreo de passageiros deverá crescer 5% ao ano entre 2005 e 2025 (PASSIN; LACERDA, 2003, p.228). Os principais mercados para a expansão do transporte aéreo de passageiros, apontados pela Boeing, estão localizados na China, América do Sul e Ásia-Pacífico. Para a América do Sul, a Boeing espera que o transporte aéreo cresça acima da média mundial (com 7,9% ao ano), sendo a segunda maior taxa de crescimento. A Embraer espera que o transporte aéreo na América Latina cresça 5,5% ao ano entre 2007 e 2027, a partir do crescimento da demanda para aeronaves de 30 a 120 assentos. As expectativas favoráveis para o crescimento do transporte aéreo na América do Sul devem-se à sua baixa participação no transporte aéreo mundial de passageiros por quilômetros transportados, com 3,6% do total em 1998, enquanto a América do Norte lidera com 38,5% e a Europa encontra-se em segundo lugar, com 27% (PASSIN; LACERDA, 2003, p.230-231). Não obstante, para a realidade brasileira, o setor de transporte aéreo é importante porque as empresas aéreas nacionais geraram, em 2000, cerca de 35 mil empregos diretos, uma renda de US$ 18 bilhões (aproximada- Revista UniVap, v.15, n.27, 2008 mente 3% do PIB) e impacto direto superior a US$ 6,3 bilhões, segundo o Sindicato Nacional das Empresas Aeroviárias (SNEA) (PÊGO FILHO, 2002, p.5; BNDES, 2001, p.1). Quanto ao transporte aéreo mundial de mercadorias, existe uma relação direta com o transporte aéreo de passageiros porque nos porões dessas aeronaves é possível transportar bagagens pessoais e também produtos industriais de baixo peso e volume. As projeções da empresa americana Boeing indicam uma perspectiva de crescimento do transporte aéreo mundial de mercadorias de 6,4% ao ano, entre 2005 e 2025, ficando pouco acima tanto do desempenho das exportações mundiais de 5,8% ao ano entre 1995 e 2005, quanto de suas previsões para o transporte aéreo mundial de passageiros (5%). O fluxo do comércio internacional de mercadorias por via aérea está concentrado em três regiões: Ásia-América do Norte, o Atlântico Norte (América–Europa) e Europa–Leste (PASSIN; LACERDA, 2003, p.230-231; MATERA, 2007, p.103). É devido à dinâmica da economia contemporânea e às atuais necessidades de integrar as operações de logística na cadeia de suprimentos que o desempenho do transporte aéreo de mercadorias está diretamente relacionado ao crescimento do PIB das nações. Na relação entre crescimento econômico e desempenho do transporte aéreo de mercadorias no Brasil observa-se uma evolução crescente entre 2000 e 2005 (ver Gráfico 1). Pode-se considerar que o transporte aéreo de mercadorias adquiriu papel estratégico para diferentes setores econômicos, devido aos serviços de logística integrada às operações industriais que oferece diante da maior internacionalização dos mercados. A escolha do modal de transporte de mercadorias mais adequado às necessidades das empresas durante todo o planejamento e gerenciamento da cadeia de suprimentos, dos locais de produção até os de consumo final, é fundamental porque cria possibilidades para os clientes mudarem as escolhas em resposta às mudanças nos atributos dos modos de transporte, permitindo estimar a demanda por diferentes modos de transportes em situações e necessidades distintas. Por isso, “(...) as empresas [aéreas] buscam desempenhar um papel na logística porta-a-porta saindo da função de transporte aeroporto-aeroporto, utilizando-se de conexões flexíveis [ou complementares] em aeroportos hubs (centros de distribuição) (ALBAN, 2002, p.77). 49 Gráfico 1 – Evolução do PIB e do transporte aéreo de mercadorias no Brasil (TKU)* Fonte: FIBGE – Anuário do Transporte Aéreo. *TKU é a medida utilizada para avaliar o impacto do transporte, por meio da multiplicação da massa transportada (T) pela distância percorrida (Km). No caso do Brasil, a participação do transporte aéreo na distribuição de mercadorias no país foi de apenas 0,33% em 2006. Trata-se de uma baixa participação frente aos demais modais de transporte no país (1). Predomina a ampla participação relativa do modal rodoviário no sistema de transporte de mercadorias no país, com 57,7% (ver Tabela 1). International Civil Aviation Organisation (ICAO), da qual o Brasil é signatário, fazendo prevalecer toda a legislação relativa ao transporte aéreo internacional sobre a legislação nacional como convenções, tratados, protocolos, atos e acordos aéreos de que o país seja parte integrante, conforme consta no Artigo 178 da Constituição da República Federal do Brasil de 1988 (OACI, 2001). Não obstante, o Ministério da Defesa do Brasil tem procurado ampliar as rotas aéreas entre os países da América Latina por meio de acordos bilaterais, como analisado no próximo item. O princípio básico é o da defesa da soberania de cada país, considerando-se que cada nação tem autonomia sobre seu território e seu espaço aéreo. Por isso, a utilização do espaço aéreo para fins comerciais está sujeita à autorização estatal, e quanto à formalização de acordos bilaterais entre os países signatários da ICAO é necessário que as empresas aéreas sejam de propriedade privada de cidadãos dos respectivos países, mas na condição de prestação de serviço público (transporte de passageiros e de mercadorias) sob concessão estatal. 3. TRANSPORTE AÉREO E INFRA-ESTRUTURA AEROPORTUÁRIA NO BRASIL O setor de transporte aéreo organiza suas atividades a partir da regulamentação internacional exercida pela Tabela 1 – Distribuição do transporte de mercadorias no Brasil (em %) Fonte: Matera, 2007, p.103. 50 Revista UniVap, v.15, n.27, 2008 Os acordos bilaterais entre os países signatários da ICAO são o principal instrumento de regulação do transporte aéreo internacional (de passageiros e de mercadorias), com intuito de garantir a soberania de cada país. Por meio de acordos bilaterais, os países estabelecem controles de acesso e direitos de tráfego nos espaços aéreos, além de regras, por exemplo, sobre quantas e quais serão as empresas que poderão operar nas rotas aéreas estabelecidas, a capacidade de transporte, as freqüências de vôo, a forma de fixação de preços e se é permitido que as companhias aéreas apanhem tráfego em terceiros países (BNDES, 2001; PASSIN; LACERDA, 2003, pp.219-222). O Brasil tem acordos bilaterais com 64 países, especificando direitos de tráfego, determinação de capacidade, rotas e tarifas. Entre 1998 e 2001, o Ministério da Aeronáutica do Brasil desenvolveu esforços junto aos países da América Latina para eliminar restrições e aumentar as freqüências de vôos cargueiros e os direitos de tráfego aéreo, com intuito de expandir o setor de transporte aéreo de mercadorias nos vôos internacionais. “(...) As inovações nos acordos firmados entre o Brasil e outros países aconteceram a partir de 1989, com o acordo assinado entre o Brasil e os EUA, que introduziu bandas tarifárias, multidesignação e autorizou vôos charter. Outra inovação foi o Acordo de Fortaleza, assinado em 1996 por Argentina, Bolívia, Brasil, Chile, Paraguai e Uruguai e que entrou em vigor em 1999” (PASSIN; LACERDA, 2003, p.227). Segundo o Ministério da Aeronáutica do Brasil (2002, p.18), atualmente o país possui direitos de tráfego aéreo de: 3ª, 4ª e 5ª liberdades (2) para vôos cargueiros com os seguintes países: México, Panamá, Argentina, Bolívia, Chile, Colômbia, Peru e EUA, o que viabiliza os vôos das cargueiras nacionais de/para os EUA. As empresas cargueiras americanas, tanto regulares quanto nãoregulares, na grande maioria de seus vôos, prosseguem do Brasil para Buenos Aires, Assunção, Santiago, Bogotá, Cali, Quito, Guaiaquil, Lima, retornando para Miami. Além dos acordos bilaterais, as companhias aéreas necessitam do apoio da infra-estrutura aeroportuária oferecida pelos aeroportos para completar os serviços de transporte de passageiros e mercadorias como, por exemplo, sistemas de auxílio e controle de navegação aérea, alocação de slots (espaço físico da pista para pousos e decolagens de aeronaves), portões de embarque e desembarque em aeroportos e galpões para manutenção de aeronaves, entre outros. A infra-estrutura aeroportuária brasileira é composta por 2.014 aeródromos civis (715 públicos e 1.299 privados utilizados com permissão do proprietário), sendo, no entanto, proibida a exploração comercial. Conta ainda com 703 aeroportos públicos, dos quais 67 são administrados pela Empresa Brasileira de Infra-estrutura Aeroportuária (Infraero) e 235 são administrados por meio de convênio Revista UniVap, v.15, n.27, 2008 entre o Comando da Aeronáutica, Estados e Municípios. Os aeroportos administrados pela Infraero concentram 97% de toda a movimentação de passageiros e 99% do transporte de cargas aéreas regulares no país, o equivalente, em 2000, a 2,09 milhões de pousos e decolagens de aeronaves (nacionais e estrangeiras) e 67,9 milhões de passageiros; e, em 2004, a 2,11 milhões de toneladas de mercadorias transportadas ou US$ 159,3 bilhões entre exportações e importações (BNDES, 2002; MOREIRA, 2005). As companhias aéreas cargueiras contam ainda com 32 Terminais de Carga Aérea (Teca) nos aeroportos brasileiros, que também são administrados pela Infraero. Trata-se de uma área equipada com tecnologias de informação para orientar a gestão da logística integrada das operações industriais, utilizando-se, por exemplo, de códigos de barra e intercâmbio eletrônico de dados, Electronic Data Interchange (EDI), para melhorar a velocidade e a acuraria das informações durante toda a movimentação das mercadorias. Nos Tecas são realizadas as atividades de recebimento, classificação, armazenamento, despacho e documentação das mercadorias, por meio do processo de recebimento e distribuição de produtos pelo sistema de carga utilizada, ou seja, por meio de contêiners e pallets. Essas operações envolvem todo um processo de embalagem das mercadorias em contêiner’s ou pallets, armazenagem de contêiners e de pallets para o recebimento e despacho das mercadorias, além da “desconteinerização” e “despaletização”(3). 4. CARACTERÍSTICAS ECONÔMICAS DO TRANSPORTEAÉREO DE MERCADORIAS NO BRASIL No Brasil foram gerados US$ 118,3 bilhões com exportações em 2005, e outros US$ 73,5 bilhões com importações, segundo dados do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio (MDIC, 2006). Em 2005, o Aeroporto Internacional de Viracopos representou o segundo lugar em movimentação de mercadorias importadas com participação relativa de 9,36%, avaliada pelos valores gerados em dólares. Superou o Porto de Vitória (7,45%) e o Aeroporto Internacional de Cumbica (6,32%). O Porto de Santos é o mais importante do país com 26,67% do total dos valores gerados pela movimentação de mercadorias importadas (ver Tabela 2). Quanto à movimentação de mercadorias para o mercado internacional em 2005, também avaliada pela geração de valores em dólares, o Porto de Santos também manteve a primeira posição, sendo seguido pelos portos de Vitória (9,6%) e Paranaguá (7,3%). Viracopos ocupou a 12a posição (2,4%), mas representa o segundo maior aeroporto para movimentações de mercadorias exportadas entre os aeroportos brasileiros, enquanto o aeroporto de Cumbica representou o primeiro lugar com 3,3% do total exportado (ver Tabela 3). 51 Tabela 2 – Distribuição das importações por modais de transportes (2005) Fonte: MDIC (2006). Tabela 3 – Distribuição das exportações por modais de transportes (2005) Fonte: MDIC (2006). Com base em pesquisa empírica realizada junto ao MDIC (2006), a movimentação de mercadorias no país, por meio do modal aéreo, está distribuída em 13 aeroportos, mas de forma concentrada nos aeroportos de Cumbica e Viracopos, no Estado de São Paulo, que, juntos, responderam por 81% das exportações e 65% das importações em 2005 (Tabela 4). Tabela 4 – Fluxo de comércio exterior em aeroportos Brasil (2005) Fonte: MDIC (2006). 52 Revista UniVap, v.15, n.27, 2008 A importância do Aeroporto Internacional de Viracopos, como infra-estrutura logística que integra as estratégias corporativas das grandes empresas, está sinalizada pela sua participação na evolução do PIB do Brasil(4). Observa-se pelo Gráfico 2 que a movimentação de mercadorias em Viracopos acompanha o desempenho do PIB, com exceção do período de 1999 a 2001 quando a desvalorização do Real (R$) frente ao dólar (US$) possibilitou um aumento significativo das importações e influenciou na evolução do PIB. O papel estratégico de Viracopos para as grandes empresas pode ser analisado também a partir da série histórica da movimentação de mercadorias entre os dois maiores aeroportos cargueiros no país (Cumbica e Viracopos), avaliada pela geração de valores em dólares. Por meio da Tabela 5 observa-se a evolução das participações relativas dos aeroportos de Cumbica e Viracopos na geração de valores pela movimentação de mercadorias exportadas e importadas entre 1996 e 2006. Em 1996, durante o Plano Real, a participação do Aeroporto de Viracopos nas importações era de 37,8% e a de Cumbica era de 62,2%. No entanto, para os anos seguintes observa-se que a participação relativa do Aeroporto de Viracopos na movimentação de mercadorias importadas adquiriu uma evolução crescente e chegou a 57,5% em 2006, enquanto no Aeroporto de Cumbica ocorreu o inverso, pois a participação relativa foi decrescente e chegou a 42,5%. Gráfico 2 – Evolução do PIB e do Fluxo de comércio exterior em Viracopos Tabela 5 – Participação de Viracopos e Cumbica na geração de valores com mercadorias exportadas e importadas – 1996-2006 Fonte: MDIC - Elaboração do Autor VCP = Aeroporto Internacional de Viracopos GRU = Aeroporto Internacional de Cumbica Revista UniVap, v.15, n.27, 2008 53 A participação relativa do Aeroporto de Cumbica nas exportações é maior quando comparada ao Aeroporto de Viracopos. Mas enquanto o Aeroporto de Cumbica teve sua participação relativa na movimentação de mercadorias exportadas reduzida de 80,4%, em 1996, para 55,7%, em 2006, Viracopos, ao contrário, aumentou de 19,6% para 44,3% em igual período, sinalizando para uma tendência de maior participação nas estratégias comerciais de empresas transnacionais que atuam no mercado mundial (ver Tabela 5). 5. CONCLUSÃO O Aeroporto Internacional de Viracopos caracteriza-se por movimentar mercadorias de alto valor agregado, especialmente nas importações de produtos diversos, sublinhando o papel estratégico de Viracopos como infra-estrutura de logística integrada às operações industriais na cadeia de suprimentos das grandes empresas que atuam no comércio internacional. Dessa forma, Viracopos complementa os processos produtivos das empresas seja por meio da importação de peças, partes e componentes de alto valor agregado, para repor estoques e evitar a paralisação da produção, seja para exportar produtos acabados para o destino final dos mercados consumidores. 6. NOTAS (1) Nos EUA o transporte rodoviário representa 26% da movimentação de mercadorias e o transporte rodoviário representa 40%. Com isso, os custos com transporte e logística nos EUA chegam a 8,20% do PIB, enquanto no Brasil chegam a 12,75% do PIB. (2) Trata-se das chamadas cinco “liberdades do ar” estabelecidas pela ICAO, conforme segue: 1ª) direito de voar sobre um outro país sem aterrisagem, 2ª) direito de fazer aterrisagem por motivos técnicos, tal como reabastecimento em outro país, mas sem embarcar ou desembarcar passageiros e cargas que gerem receita para a empresa; 3ª) direito de transportar passageiros e cargas, geradores de receitas entre o país doméstico e outro país; 4ª) direito de transportar passageiros e cargas, geradores de receitas, entre um outro país e o país doméstico; 5ª) direito de uma empresa de um país A transportar passageiros e carga, geradores de receita, entre um país B e outro país C, em vôos com origem ou destino no país A (OACI, 2001). (3) Visita Técnica ao Aeroporto Internacional de Viracopos realizada em 27-4-2007 com alunos de Iniciação Científica e da Pós-graduação da PUC Campinas, sob a orientação do Prof. Dr. Josmar Cappa. (4) Esta relação também provoca impactos para a 54 Região de Campinas. Para detalhes, ver Cappa (2006). 7. BIBLIOGRAFIA ALBAN, M. Transportes e logística: os modais e os desafios da multimodalidade na Bahia. Salvador: Fundação Luís Eduardo Magalhães, 2002. BALLOU, R. H. Gerenciamento da cadeia de suprimentos: planejamento, organização e logística empresarial. São Paulo: Bookman, 2004. _______. Logística empresarial: transportes, administração de materiais e distribuição física. São Paulo: Atlas, 1993. BANCO NACIONALDE DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO E SOCIAL – BNDES. Aspectos de competitividade do setor aéreo (modal aéreo III). Informe Infra-Estrutura, n. 42, mar. 2001. Rio de Janeiro: BNDES. _______. Aviação regional brasileira (modal aéreo IV). Informe infra-estrutura, n. 50, nov. 2002. Rio de Janeiro: BNDES. _______. Aeroporto Internacional de Viracopos e o futuro da Região Metropolitana de Campinas. São Paulo em Perspectiva. São Paulo: Fundação SEADE, v. 20, n.3, jul.-set., 2006. COUNCIL OF LOGISTICS MANAGEMENT (CLM). 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Revista UniVap, v.15, n.27, 2008 55 Desenvolvimento Turístico Sustentável: enfoque no artesanato local na cidade de Santo Antônio do Pinhal, SP Rosangela Sant’Ana * Fábio Ricci ** Resumo: Este estudo analisou a percepção dos proprietários de oito ateliers e turistas referentes ao sistema turístico do Município de Santo Antônio do Pinhal, Estado de São Paulo (SP). Metodologicamente foi realizado através de pesquisas, bibliográficas, de levantamento e descritiva com abordagem quali-quantitativa. Foram selecionados 12 artesãos, para a primeira etapa do estudo, em virtude de possuírem a mesma filosofia de trabalho, ou seja, visarem o desenvolvimento do turismo sustentável. De acordo com os resultados obtidos, percebeu-se que referente a algumas variáveis a percepção do artesão faz correlação com a dos turistas, mas, muitas vezes não. Portanto, entende-se, conforme a literatura, que para se desenvolver o turismo local são necessárias estratégias, parcerias em arranjos produtivos e, principalmente, apoio do poder público. Palavras-chave: Artesanato, turismo, sustentabilidade, Santo Antônio do Pinhal. Abstract: The objective of this study was to analyze the perception of eight atelier owners and some tourists referring to the touristic system of Santo Antônio do Pinhal City, São Paulo State. Bibliographical and descriptive researches with a quali-quantitative approach were used and also a survey was conducted. For the first part of the study 12 craftsmen were selected, because they had the same philosophy of work, that is, they aimed at developing the sustainable tourism. According to the results, it was perceived that the perception of the craftsman correlates to the one of the tourists, just referring to some variables but most of the time does not. Therefore, based on the literature, it was understood that in order to develop the local tourism, some strategies, partnerships in productive arrangements and, mainly, support of the public power are necessary. Key words: Art, tourism, sustainability, Santo Antônio do Pinhal. 1. INTRODUÇÃO O turismo é uma atividade que ultrapassa os setores convencionais da economia, requerendo dados de natureza econômica, social, cultural e ambiental. Os dados econômicos mostram uma forte relação entre o ambiente econômico e o crescimento do turismo em todo o mundo. O crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) potencializa o crescimento turístico, tanto no sentido positivo quanto negativo, no período entre 1975 e 2000, o turismo cresceu a um ritmo médio de 4,4% anual, enquanto o crescimento econômico mundial médio, medido pelo PIB, foi de 3,5% ao ano (MINISTÉRIO DO TURISMO, 2006). * Mestre em Desenvolvimento Urbano e Regional pela UNITAU, 2007. ** Doutor em História Econômica e Professor da UNITAU. 56 No Cone Leste Paulista circula cerca de 14 milhões de turistas domésticos por ano, apenas o município de Aparecida responde por oito milhões de visitantes, o Litoral Norte e a Serra da Mantiqueira, onde se destacam os municípios de Campos do Jordão e Santo Antônio do Pinhal, juntos recebem cinco milhões e o restante está distribuído nas outras cidades do Cone Leste Paulista (GAZETA MERCANTIL 2006). O Cone Leste Paulista é uma das primeiras regiões do Brasil a serem povoadas e colonizadas, participou dos principais ciclos econômicos do país, tendo como legado um patrimônio rico em histórica, cultura e arquitetura em seus municípios, principalmente no Vale Histórico (PIVOTT, 2003). O turismo no Município de Santo Antônio do Pinhal, no Cone Leste Paulista, se desenvolveu em função de sua localização na Serra da Mantiqueira, à beleza natural, ao clima, à qualidade das águas e ao aspecto pitoresco de cidade interiorana. Revista UniVap, v.15, n.27, 2008 Há um grande crescimento das atividades do artesanato, de acordo com o histórico da feira nacional do artesanato, os dados comprovam que o volume de vendas na feira cresceu 43,87% em relação ao ano anterior, e por meio do levantamento do Programa do Artesanato Brasileiro (PAB) do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, foram comercializadas mais de trinta mil peças. Já na edição de nº 16, realizada em novembro de 2005, o evento recebeu cerca de 135 mil pessoas, vendendo mais de R$ 26 milhões. Ainda, a respeito do escoamento da produção artesanal, os produtores encontram dificuldades em estabelecer uma logística de transportes para seu artesanato. Nesse sentido, as feiras e as exposições surgem como oportunidades de geração de negócios, pois, é a partir destes eventos que são realizados novos contatos, facilitando o acesso a locais mais distantes. Este estudo teve por objetivo analisar a percepção de proprietários de oito ateliers e de turistas referente ao sistema turístico do Município de Santo Antônio do Pinhal, Estado de São Paulo. Como complemento, pudemos caracterizar os ateliers, avaliar o artesanato local produzido e identificar o perfil dos turistas. A pesquisa foi realizada na estância climática de Santo Antônio do Pinhal, região do Cone Leste Paulista, Estado de São Paulo, por oferecer uma variedade de atratividades turísticas como o artesanato local. Foram realizadas pesquisas em dois tipos de amostragem não probabilística: 26 turistas em baixa temporada e 34 em alta temporada de inverno, totalizando 60 sujeitos da amostra da pesquisa. As perguntas foram destinadas aos 12 artesãos, e estes, foram divididos, sendo seis mulheres e seis homens, as quais, foram respondidas por meio de dois formulários compostos por questões semi-abertas: um com vinte questões, sendo um destinado aos proprietários de ateliers, e o outro, com 17, aos turistas que já visitaram esses locais. A análise foi feita de acordo com as questões formuladas nas seguintes hipóteses: o Município de Santo Antônio do Pinhal não oferece infra-estrutura adequada aos turistas; o turista não reconhece o artesanato como um dos principais atrativos turísticos de Santo Antônio do Pinhal; o turista considera os ateliers agradáveis e originais, divulgação e a localização dos ateliers exercem influência na visão dos turistas; os artesãos não possuem uma real concepção sobre o perfil do turista de Santo Antônio do Pinhal e por fim, se os artesãos procuram uma prática de turismo sustentável em Santo Antônio do Pinhal. Os dados foram coletados entre o final do mês de junho, durante o mês de julho e início de agosto de 2006. 2. DESENVOLVIMENTO 2.1 Turismo e Hospitalidade Segundo A. H. M. Oliveira (2005) o turismo é a atividade humana capaz de produzir resultados de caráter econômico-financeiro e sócio-político-cultural realizados numa localidade, decorrentes do relacionamento entre os visitantes com os lugares visitados durante a presença temporária de pessoas que se deslocam de seu local habitual de residência para outros, de forma espontânea, sem fins lucrativos. No sentido de sustentabilidade, Gastrogiovanni (2002) diz que o turismo avança por demonstrar maior comprometimento social, sem ultrapassar os limites físicos e psíquicos dos elementos naturais e culturais do local. Desta forma, como o artesanato representa uma alavanca para o turismo de Santo Antônio do Pinhal, por meio de um grupo de artesãos que seguem uma filosofia ligada à preservação do meio ambiente e da sustentabilidade, adotar-se-á para esse estudo o conceito de turismo sustentável. Hospitalidade refere-se ao bom tratamento dado ao cliente, receber bem envolvendo um bom relacionamento interpessoal. A hospedagem é um componente necessário ao desenvolvimento do turismo, dentro de qualquer destinação que busque servir os visitantes, outros que não viajantes de um dia (CAMARGO, 2004). Cooper et al (2001) explicam que, no contexto do setor turístico em geral, a hospedagem tem um lugar ou uma lógica própria. Isto significa que a qualidade e a abrangência da hospedagem disponível refletirão e influenciarão o tipo de visitantes de um local. Sendo assim, a obtenção do equilíbrio apropriado da hospedagem para atingir os objetivos estratégicos de desenvolvimento turístico de uma destinação pode ser um desafio. 2.2 Planejamento Econômico Muitos países como o Brasil, o turismo tornou-se um grande trunfo para o processo de desenvolvimento. Além dos problemas econômicos básicos, a maioria dos países em desenvolvimento é caracterizada pelo rápido crescimento da população, que pressionam o governo, que precisam gerar mais empregos a fim de absorver as crescentes demandas (LICKORISH; JENKINS, 2000). Qualquer forma de desenvolvimento econômico Revista UniVap, v.15, n.27, 2008 57 requer um planejamento cuidadoso para que possa atingir os objetivos implícitos ou explícitos, que são a base do desenvolvimento (COOPER et al., 2001). O processo de planejamento do desenvolvimento envolve um cruzamento amplo de participantes que podem trazer consigo objetivos conflitantes. Diante de um mercado competitivo, Sancho (2001) enfatiza que há a necessidade de desenvolver os produtos turísticos, segundo um plano elaborado que englobe cinco etapas, que são: análise de desenvolvimentos turísticos anteriores, avaliação da posição turística atual, formulação da política turística, definição da estratégia de desenvolvimento e a elaboração de programas operacionais. 2.3 Artesanato como Produto Turístico Dentre as atividades turísticas de Santo Antônio do Pinhal está o artesanato. Conforme dados extra-oficiais da Prefeitura Municipal, há mais de cem artesãos na cidade, produzindo desde velas até móveis entalhados, fazendo desta atividade um meio de sobrevivência. Até os anos de 1960, o turismo ganhava força na preocupação básica com a ampliação da demanda turística. Esse panorama alterou-se a partir do momento em que a conscientização e a preservação do meio ambiente invadiram a esfera da gestão do turismo, tornando-se um elemento de conflito entre a promoção e a preservação, pois a ampliação da demanda pode causar danos ao meio ambiente prejudicando a própria atividade turística. Nesse contexto, formou-se a base de um turismo sustentável, em que há interação entre o meio urbano, o meio ambiente e a formação de profissionais (RUSCHMANN, 1997). A concepção de desenvolvimento sustentável implica em um novo paradigma de pensar as sociedades humanas, sendo uma nova ética de democratização de oportunidades e justiça social, percepção das diferenças como elementos norteador de planejamento, compreensão da dinâmica de códigos e valores culturais com compromisso global com a conservação de recursos naturais (IRVING, 2002). O desenvolvimento sustentável é um projeto social e político que aponta para o ordenamento ecológico e a descentralização territorial da produção, assim como para a diversificação dos tipos de desenvolvimento e dos modos de vida das populações que habitam o planeta (LEFF, 2001, p. 57). Swarbrooke (2003) acredita que é preciso começar a ver o turismo sustentável como parte de um sistema mais amplo de desenvolvimento sustentável, um sistema aberto no qual cada elemento afeta os demais, esses ele58 mentos são: agricultura, sociedades/comunidades, meio ambiente e recursos naturais, artesanato, preservação ambiental e sistemas econômicos, onde uma mudança em qualquer um desses elementos suscitará uma reação em cadeia nos demais elementos do sistema. É de fácil entendimento de que o turismo sustentável é uma ferramenta poderosa no auxílio à realização do desenvolvimento sustentável, agindo como catalisador para o desenvolvimento de pequenos negócios e fornecendo mercado para a produção agrícola e artesanal. Por outro lado, na visão de Swarbrooke (2000b), as parcerias são primordiais para o turismo sustentável, uma vez que o alcance pela política do setor público é limitado. A maioria dos órgãos públicos não tem orçamentos próprios ou capacidade para criar um impacto significativo na indústria do turismo e em suas atividades. Enfatiza que tudo isso exige ação da parte dos governos das localidades turísticas, dos turistas, da comunidade local e da indústria do turismo. Ou melhor, que as comunidades locais precisam de mais poder para que lhes seja permitido o exercício de seus direitos no planejamento do turismo e no processo de desenvolvimento. Ruschmann (1997) acredita que, o planejamento deve contabilizar todas as possíveis formas de impactos, prevendo, se possível, a que nível para que as conseqüências não sejam profundas, fazendo surgir programas que minimizem os efeitos. Muitas vezes, devido a mercantilização da cultura, a arte local é induzida a mudanças para agradar os turistas e vender mais. A cultura torna-se uma mercadoria, além de poder ser descaracterizada em função de um processo de assimilação de parcelas das culturas dos turistas. Na verdade, é preciso reconhecer que o sistema turístico, e também os valores e os padrões culturais devem caminhar juntos não somente para o aumento da produção de bens e serviços como o progresso técnicotecnológico, mas irá influenciar também no nível de bemestar e de justiça social em uma sociedade (SOUZA, 2005). 2.4 Sistema Turístico O sistema turístico deve procurar garantir a qualidade de seus serviços, de sua cidade e suas atrações aos visitantes, e não deixar um questionamento ao cliente no final da visita se ele foi bem atendido. Para garantir a satisfação do turista, é preciso manter a qualidade em cada uma das interfaces do sistema turístico com o cliente (PETROCCHI, 1998). Nesse sentido, é preciso montar um sistema turístico abrangente e integrado em todos os seus subsistemas, que são eles: sistemas de promoção e informação, sistema viário e de comunicações, sistema de hospedagem, sistema do meio ambiente, sistema de equipamentos e sistema de formação profissional. Revista UniVap, v.15, n.27, 2008 A integração de cada interface do sistema turístico responde à necessidade de oferecer uma completa e especializada prestação de serviços ao visitante. Para isso, existe o grupo gestor, incumbido de contribuir bastante para o desenvolvimento da atividade de turismo sustentável. De acordo com a Vitae Civilis e WWF-Brasil (2003), cabe ao grupo gestor estimular a participação efetiva no sistema turístico e a sensibilização dos atores envolvidos – turistas, empreendedores locais, órgãos públicos, associações, lideranças comunitárias, etc. O maior problema da ausência do planejamento em localidades turísticas reside no seu crescimento descontrolado, que gera a descaracterização e a perda da originalidade das destinações que motiva o fluxo dos turistas, e o empreendimento de ações isoladas, esporádicas, eleitoreiras e desvinculadas de uma visão ampla do fenômeno turístico (RUSCHMANN, 1997). Atualmente, hem á uma evidente preocupação correspondente à interferência que o meio produz na arte e na cultura da comunidade, influenciando casos de preservação e de continuidade das tradições. No aspecto sociológico, essa influência resulta em atividades programadas para simplesmente atender as expectativas dos visitantes, não reproduzindo com exatidão as performances de raízes das comunidades envolvidas. Ao se caracterizar o sistema turístico de um determinado município, como no caso Santo Antônio do Pinhal, Cone Leste Paulista, pode-se pensar na formação de um arranjo produtivo local, de acordo com os artesanatos e as parcerias da localidade em promoção de um desenvolvimento turístico sustentável. Pois, Freitas (2006) acredita que deve se estimular os artesãos a trabalharem de maneira cooperativista de produção, a qual poderia ser vista, primeiramente, como um caminho para a comercialização do artesanato e fortalecimento coletivo. 2.5 Arranjo Produtivo Local O desenvolvimento de arranjos produtivos é importante para a geração de pólos de crescimento e descentralização industrial. Atualmente, destacam-se exemplos internacionais como os empreendimentos do Vale do Silício – importante centro de empresas do setor de informática – e a Terceira Itália – que abrange empresas de pequeno e médio porte de diversas áreas como têxtil, móveis, cerâmica e mecânica (SANTOS, GUARNIERI, 2002). Os arranjos produtivos, que são conceituados como um fenômeno vinculado às economias de aglomeração, associados à proximidade física das empresas forRevista UniVap, v.15, n.27, 2008 temente ligadas entre si por fluxos de bens e serviços, variam de tamanho, amplitude e estágio de desenvolvimento, fortalecidos pela política governamental, federal ou estadual, visando o desenvolvimento regional e gerando emprego e renda. O BNDES (2006) procura desenvolver uma política de desenvolvimento regional, considerando a instituição de arranjo produtivo local para composição de uma atividade nacional de atendimento aos municípios e microrregiões em processo de desenvolvimento. A Política Nacional de Desenvolvimento Regional (PNDR), implementada pelo Ministério da Integração, adotou critérios para classificação de micro-regiões, segundo orientação territorial e formulação de estratégias de atuação próprias, utilizando-se de duas dimensões para avaliar o grau de desenvolvimento econômico de micro-regiões brasileiras. 3. RESULTADOS E DISCUSSÃO Os resultados mostram que 92% dos artesãos estão distribuídos por parcerias locais em busca do desenvolvimento turístico sustentável é apoiada por 92%. No entanto, quanto ao tipo de parceria, a mesma pesquisa revela ainda que, o índice de maior parceira está entre os próprios artesãos 67%, seguido pelos restaurantes 41%, excluindo-se artesanatos ou panfletos nos tipos de estabelecimento. Em relação à variável número de turistas que o município recebe por dia em baixa e alta temporada, a coleta aponta que na alta temporada a Olaria Paulista, localizada no Shopping de Santo Antônio do Pinhal apresenta maior número de turistas (trinta), seguida pela Serra Rústica (20) e pela Prata D’Lua (20). Já, na baixa temporada, a Serra Rústica recebe mais turistas (15) que os demais ateliers, seguida da Olaria Paulistana (cinco) e da Prata D’Lua (cinco). Os três estabelecimentos têm maior freqüência de turistas tanto em baixa como em alta temporada por estarem localizados no centro da cidade, embora este fator é indicado pelos artesãos como de pouco importância para sua visitação. Estes dados estão correlacionados à variável infraestrutura observada como precária pelos proprietários de ateliers. Segundo Angel (1981), a demanda de visitantes é influenciada pelo sistema turístico adequado e eficiente, o que não ocorre em São Antônio do Pinhal-SP. Com relação às técnicas utilizadas pelos artesãos, cada um deles tem seu diferencial demonstrado a seguir. O atelier Jardins de Barro, cujo produto é a cerâmica, utiliza técnicas de modelagem em torno e queima da cerâ59 mica em forno elétrico. O estabelecimento chamado Morito Móveis, que tem móveis, cadeiras e mesas, utiliza a marchetaria com madeiras, sem pregos e colas, elaborado mediante a anatomia humana. Já o atelier Feitiço das Rosas, que comercializa flores e arranjos, faz a esqueletização (retirada da clorofila da folha de plantas em soda cáustica), clareamento em cloro e tingimento de folhas. A Ophicina das Artes, cujo produto são as velas, utiliza a parafina e reaproveitamento de elementos naturais (sementes, flores, madeiras, bambu e essência). O Recanto Terra Forte, que fabrica móveis, luminárias e utensílios, faz a reciclagem (madeira, metais, ferro, vidros, plásticos, fibras e sementes), transformação de lixo em arte funcional. A Prata D’Lua que fabrica jóia utiliza a técnica da confecção com prata, cobre, sementes, couro, madeiras, frutas, pedras semipreciosas e sintéticas. O atelier Olaria Paulistana produz cerâmica queimada em forno de alto grau, e por último a Serra Rústica cujos produtos são os móveis, baús, mesas e luminárias, realiza a marchetaria em madeiras de reflorestamento e reaproveitadas da construção, transformadas em móveis. Os ateliers de Santo Antônio do Pinhal apresentam potencial de produto turístico, principalmente porque cada tipo de produção artesanal possui características próprias. Quanto à destinação do artesanato, a maioria 91% produz para o próprio município, seguido da cidade de São Paulo 75%. Referente à produção mensal de artesanato, o atelier que mais produz é a Ophicina das Artes, numa quantidade de mil velas ao mês devido ao simples processo artesanal de itens de pequeno porte e baixo custo. Em segundo, aparece a Olaria Paulistana com uma produção de quatrocentas peças em cerâmica, talvez considerando à sua localização no centro da cidade. Por outro lado, o que menos produz é a Serra Rústica, numa média de quatro móveis ao mês, pois apesar de estar situado no centro da cidade, seu produto artesanal é de grande porte e requer mais tempo de trabalho, devido à técnica minuciosa de marchetaria que tem maior valor agregado em termos de custo. Em relação ao meio ambiente, os proprietários de ateliers que demonstraram preocupação utilizaram estratégias próprias, descritas a seguir. A Ophicina das Artes que além da parafina, trabalha com recursos naturais e materiais reciclados, pois as velas são artesanais e muitas vezes ornamentadas com folhas, lascas de árvores, sementes e flores. Os artesãos, deste recinto, acreditam que não produzem poluição ou resíduos, uma vez que reaproveitam as sobras de parafina. 60 Na Olaria Paulistana, a artesã tenta reduzir ao máximo o descarte de argila e tinta a óleo no esgoto municipal, reaproveitando as matérias-primas; já o Feitiço das Rosas, trabalha com recursos naturais, utilizando folhas residuais de podas de árvores, folhas secas e flores descartadas pelas floriculturas da cidade. A grande preocupação da proprietária deste atelier é referente à soda cáustica e ao cloro, duas substâncias químicas necessárias para o processo de produção de suas rosas. O atelier Prata D’Lua preocupa-se com a emissão de gases, haja vista que trabalha com maçarico queimando gás liquefeito de petróleo (GLP) – composto por butano e propano – e oxigênio para a emissão de chamas, as quais derretem a prata para torná-la maleável para o molde de jóias como anéis, correntes, pingentes, pulseiras e brincos, precisaria de um filtro para reduzir os efeitos negativos que seu processo artesanal causa ao meio ambiente. O Recanto Terra Forte tem à frente uma pessoa que lidera o grupo de artesãos, a qual promove em seu estabelecimento a conscientização ecológica dos turistas. Em seu processo artesanal utiliza recursos naturais, como resíduos de madeireira da Serra da Mantiqueira. O artesão aproveita, ao máximo, materiais recicláveis visando um equilíbrio do meio ambiente. No atelier Jardins de Barro como matéria prima, recicla resíduos da argila para não sujar o leito dos rios. A pequena produção com a utilização dessa matéria prima é considerada ecologicamente correta. Os artesãos da Morito Móveis utilizam madeiras provindas de regiões ainda não reconhecidas como em estado crítico de desmatamento. Oferecem resíduos do processo artesanal às fazendas e aos haras locais. Não utiliza madeira denominada ecológica, uma vez que tem conhecimento que durante o beneficiamento passa por um processo químico e de estufa, o qual faz com que a madeira torne-se mais leve e, ao mesmo tempo, tenha um índice de durabilidade reduzido em 50%, uma vez que uma madeira tradicional dura cerca de vinte anos, enquanto uma ecológica, apenas dez. Além de ser mais frágil, o preço da madeira ecológica é mais alto. E por fim, a Serra Rústica, que não compra matéria prima de madeireiras, aproveita material reciclado de municípios adjacentes. Percebe-se que esse grupo de artesãos não está preocupado apenas em divulgar seu artesanato, mas propõe também adequar suas práticas produtivas ao cuidado quanto à preservação do meio ambiente. Utilizando-se de recursos naturais e culturais, ajuda a criar uma identidade. Baseando-se em Ruschmann (1997), Irving (2002), Leff (2001), Sansolo (2002) e Sachs (2000), os artesãos buscam pela integração sócio-econômico-cultural por meio de um grupo mesclado de produção artesanal reuRevista UniVap, v.15, n.27, 2008 nindo-se, freqüentemente, uma vez ao mês para trocar idéias, adquirir novos conhecimentos e aprender um com outro mediante benchmarking. A idéia do grupo é promover artesanato cultural com qualidade e bom atendimento, entretanto, sem apoio da Prefeitura Municipal de Santo Antônio do Pinhal. De modo geral, os artesãos reivindicam que a Prefeitura Municipal instale uma sinalização para que o turista, ao chegar à cidade, saiba como ir até o destino. duz artesanatos considerados pelos turistas como originais e com excelente qualidade. Porém, a maioria dos ateliers está localizada na Zona Rural do município, com difícil acessibilidade, tendo em vista a má-condição das estradas. Outro fator negativo apontado pela pesquisa foi a inexistência de sinalização de indicação dos ateliers, seguindo-se a falta de divulgação do artesanato local como produto turístico e, como fator mais criticado por artesãos e turistas, a falta de uma política municipal mais efetiva. Referente ao local de origem dos turistas, a pesquisa mostra que o maior número de visitantes na baixa temporada 62% é do Vale do Paraíba Paulista. Acreditase que este fenômeno ocorre devido à proximidade dos municípios. Freqüentemente, a maior demanda de turistas de baixa temporada visita o município a passeio com a família através de indicação de amigos. Os turistas de alta temporada são na maioria de visitantes de primeira viagem, conhecendo o município com seus familiares, valendo-se de guia turístico. Geralmente, estes visitantes de primeira viagem encontram-se de férias, apontando como ponto turístico preferencial o Pico Agudo e os restaurantes. A origem dos visitantes confronta a percepção do artesão quanto ao perfil do turista e os resultados do estudo realizado em 2004, por A. P. Oliveira (2005), em Santo Antônio do Pinhal, no qual a maior freqüência, tanto na baixa temporada quanto na alta, seria de turistas oriundos da capital de São Paulo, o que comprova uma predominância em 42%. Enquanto na alta temporada houve predominância pelo guia turístico, resultado este que faz correlação com o apontado pelos artesãos, entretanto confrontando o perfil da pesquisa de 2004 de A. P. Oliveira (2005), que indicou a Internet como forma de optar pelo município. Muitos turistas têm o hábito de visitar o município com uma certa freqüência 62% em baixa temporada. Já, na alta temporada, a maior freqüência é de pessoas que visitam o município pela primeira vez 44%, fazendo correlação com os dados de A. P. Oliveira (2005). Isso pode indicar que há um potencial de ampliação do índice de retorno na alta temporada. E por fim, a pesquisa aponta que grande parte 42% dos turistas de baixa temporada não tem preferência pela época de visitar o local. Entretanto, os participantes da pesquisa durante a alta temporada, preferem este período por estarem em férias juntos com seus filhos. 4. CONCLUSÃO Este estudo teve por objetivo analisar a percepção de proprietários de oito ateliers e de turistas referente ao sistema turístico do Município de Santo Antônio do Pinhal, Estado de São Paulo. Como complemento, pudemos caracterizar os ateliers, avaliar o artesanato local produzido e identificar o perfil dos turistas. Desta forma, entende-se que o grupo pesquisado, composto por 12 artesãos, que possui uma filosofia voltada para o desenvolvimento do turismo sustentável, proRevista UniVap, v.15, n.27, 2008 Na ótica dos turistas, os ateliers são reconhecidos e considerados pela qualidade e originalidade de seus artesanatos, muito embora deixando de oferecer um ambiente agradável. Porém, no que se refere ao grau de influência para visitação destes estabelecimentos, a pesquisa revela que, considerando os fatores mais críticos apontados pelos turistas, o acesso e a sinalização mereceram destaques, percebe-se desta forma que o Município de Santo Antônio do Pinhal deve melhorar as condições em termos de infra-estrutura. Portanto, observou-se que a má conservação das estradas, a falta de sinalização de indicação dos atrativos turísticos e a pouca divulgação do artesanato, exercem influência negativa na visitação de turistas. Isso pode estar correlacionado com o fato de que os turistas não reconhecem o artesanato como um dos principais atrativos turísticos locais. A pesquisa revelou em alguns pontos que a opinião dos proprietários de ateliers de Santo Antônio do Pinhal corresponde com a dos visitantes no que se refere ao sistema turístico do município. Todavia, na maioria das variáveis há divergência de percepções. Isto explica que, de acordo com Angel (1981), Irving (2002), Lemos (1997), A. H. M. Oliveira (2005), Petrocchi (1988), Ruschmann (1997), Santos (2002), Swarbrooke (2000a; 2002d), para o desenvolvimento turístico local são necessárias estratégias, parcerias em arranjos produtivos e, principalmente, apoio do poder público, que sem o qual, o turismo pode não prosperar. De acordo com a percepção dos sujeitos da pesquisa, ficou entendido que, para que o artesanato ganhe maior conotação e, conseqüentemente, venha a colaborar para um provável turismo sustentável local, sugerese um investimento público necessário no que tange à 61 sinalização de indicação dos atrativos turísticos e nas condições de acessibilidade dos ateliers. Por outro lado, no que tange aos artesãos, propõe-se criação de um grupo gestor para a organização do arranjo produtivo artesanal, e buscar por parcerias efetivas na divulgação do artesanato como produto turístico de Santo Antônio do Pinhal, Estado de São Paulo. KRIPPENDORF, J. Turismo: investigação e crítica. São Paulo: Contexto, 2002. A escassez financeira do município e a ausência de ação coletiva, ainda não tornaram possível que o poder público, adotasse uma posição de organização e planejamento para os diversos setores produtivos da área do turismo de Santo Antônio do Pinhal. LEFF, E. Saber ambiental: sustentabilidade, racionalidade, complexidade, poder. Tradução de Lúcia Mathilde Endlich Orth. Petrópolis: Vozes, 2001. Não se trata de apenas divulgar o artesanato local, mas, sobretudo porque Santo Antônio do Pinhal está dentro de uma Área de Preservação Ambiental (APA), gerando responsabilidades adicionais para turistas, artesãos, população e poder público municipal. Como conclusão geral, notou-se um grande número de alternativas turísticas como, restaurantes, pousadas, pesqueiros e artesanato para o progresso turístico em Santo Antônio do Pinhal, assim, essa investigação, colaborou com a análise do artesanato no município. A diversidade dessas atividades feitas pelos artesãos que produzem grandes peças através de encomendas, não admitiu apenas o recurso de exposição em “feirinhas”. 5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ANGEL, M. N. B. Planejamento e organização em turismo. Campinas: Papirus, 1981. BANCO Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). Clusters. 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SWARBROOKE, J. Turismo sustentável: conceitos e impacto ambiental. Tradução de Margarete Dias Pulido. São Paulo: Aleph, 2000a. _______. Turismo sustentável: turismo cultural, ecoturismo e ética. Tradução de Saulo Krieger. 2 ed. São Paulo: Aleph, 2003. SOCIEDADE e ecoturismo: na trilha do desenvolvimento sustentável. Como diferentes atores sociais podem de forma participativa, elaborar planos estratégicos de conservação e geração de renda. O caso do ecoturismo do Vale do Ribeira na Mata Atlântica. São Paulo: Vitae Civilis, WWF-Brasil, 2003. _______. Turismo sustentável: setor público e cenários geográficos. Tradução de Esther Eva Horovitz. São Paulo: Aleph, 2000b. Revista UniVap, v.15, n.27, 2008 63 Simulador para Sistemas de Controle de Atitude Claudinei José de Castro * Wanderley Pires Cunha ** Lízia Oliveira Acosta Dias *** Resumo: Este trabalho descreve a proposta de um simulador para testes de sistemas de controle de atitude e velocidade de veículos espaciais. O simulador será equipado com um mancal aeroestático esférico, sensor de posição angular, sensores de velocidade e sistema de aplicação de torque. Permitirá movimentos de rotação com três graus de liberdade, 360 graus em dois eixos e até 30 graus no outro. Para validar esta proposta é apresentado um programa-modelo, simulando computacionalmente o sistema de controle de velocidade do projeto SARA (Satélite de Reentrada Atmosférica), em desenvolvimento no IAE, de modo a zerar as velocidades residuais indesejadas, devido às forças aerodinâmicas, torques e perturbações diversas que ocorrem durante o vôo do veículo. Palavras-chave: Simulador, mancal a ar, sistema de gás frio, controle de atitude, corpo rígido. Abstract: This work describes the proposal of an attitude control simulator to spacecraft. The simulator will be equipped with spherical gas bearing, angular position sensor, velocity sensors and torque systems (cold gas system). This equipment will allow rotation on three degrees of freedom, 360 degrees on two coordinate axes and up to 30 degrees on the third coordinate axis. In order to validate the proposal, a computational program simulating the Velocity Control System of the SARA Reentry Satellite is presented. This program is to bring to zero the undesired residual velocity due to aerodynamic forces, torques and different perturbations, which could be present during the vehicle flight. Key words: Simulator, air bearing, cold gas system, attitude control, rigid body. 1. INTRODUÇÃO Atualmente no Brasil simuladores de atitude e velocidade são desenvolvidos exclusivamente por centros de pesquisas para aplicações diretamente na área espacial e por algumas universidades para uso didático (CUNHA, 1993; KIM; VELENIS; KRIENGSIRI; TSIOTRAS, 2001). O Instituto de Pesquisas Espacias (INPE) e o Instituto de Aeronáutica e Espaço (IAE), ligados à AEB – Agência Espacial Brasileira – são centros onde existem equipamentos para testes de sistemas de controle de atitude e velocidades. No INPE há um simulador de pequeno porte que foi desenvolvido para teste de alguns sistemas de controle de satélites. Já no IAE, um simulador localizado no laboratório de sistemas de controle da divisão de projetos, Fig.1 (EULER, 2004), é utilizado para testes dos sistemas de controle de atitude do Veículo Lançador de Satélites - VLS e do Graduando em Engenharia Aeronáutica - FEAU/ UNIVAP, 2008. ** Graduado em Engenharia Mecânica. *** Professora da UNIVAP. Satélite de Reentrada Atmosférica (SARA), além de contribuir para o desenvolvimento de novos programas de controle. De acordo com o PNAE, Programa Nacional de Atividades Espaciais, da Agência Espacial Brasileira, AEB, um novo programa de veículos lançadores foi anunciado, chamado de Programa Cruzeiro do Sul (MORAES, 2006), Fig. 2. * 64 Fig. 1 - Simulador do IAE. Revista UniVap, v.15, n.27, 2008 Esse projeto prevê o desenvolvimento e qualificação de cinco veículos lançadores até o ano de 2022. Os cinco veículos denominados Alfa, Beta, Gama, Delta e Épsilon, correspondem à ambiciosa proposta do IAE para colocar o Brasil no seleto grupo de países com tecnologia para lançamento de satélites. Aproveitando parte da tecnologia já desenvolvida pelo IAE com o VLS, com apoio da Agência Espacial Russa e o governo brasileiro através da AEB, o IAE tem para a próxima década a missão de fazer um sonho tornar-se realidade. Fig. 2 - Programa Cruzeiro do Sul. Devido às exigências referentes à precisão no controle de atitude destes novos veículos, que serão desenvolvidos e que incorporarão alto grau de automatismo, testes que os qualifiquem em terra serão de suma importância. Sendo assim, novos sistemas para testes deverão ser também desenvolvidos. A confiabilidade desses sistemas dependerá dos testes simulados em solo. Existe disponível na literatura uma variedade de técnicas de controle de atitude tratando de questões como estabilização, identificação, estimativa e robustez, que precisam ser validadas e implementadas experimentalmente e que podem incrementar o desempenho dos Sistemas de Controle de Atitude (SCA). Uma das maiores dificuldades para o desenvolvimento de bancadas de teste experimentais está associada à criação do ambiente livre de torques, semelhante ao ambiente em que o SCA opera no espaço. Uma das soluções para o problema de simulação do ambiente espacial são os mancais aeroestáticos. Certamente estes mancais não podem siRevista UniVap, v.15, n.27, 2008 mular gravidade zero, que ocorre no espaço, mas permitem manipulação de hardware em uma condição de ambiente com o mínimo torque de atrito. Um simulador equipado com mancais aeroestáticos oferece talvez o mais próximo ambiente de testes livre de torque de atrito e por essa razão eles são a tecnologia mais utilizada nas pesquisas baseadas em terra de dinâmica e controle de atitude (SCHWARTZ; PECK; HALL, 2003). Os mancais aeroestáticos (SCHWARTZ; PECK; HALL, 2003) são usados há mais de 40 anos em simuladores espaciais e em diversas outras aplicações, e cada vez mais, com o avanço da tecnologia, aparecem novas aplicações, principalmente com o advento da Estação Espacial Internacional (ISS). Um simulador para testes de sistemas espaciais equipado com mancais a ar é cada vez mais uma necessidade nos Centros de Pesquisa e Universidades e desse modo a existência de um equipamento como este é um investimento altamente lucrativo e de retorno imediato, considerando-se o milionário mercado de lançamento de satélites e de pesquisas espaciais em estações em órbita ao redor Terra. Nos últimos anos, devido à crescente necessidade de reparos de veículos espaciais em órbita ao redor da terra por astronautas, o tensor de inércia e o centro de gravidade do conjunto astronauta/veículo espacial, tiveram de ser simulados em terra para maior segurança e para o êxito das missões, ao passo que o consumo de combustível também tem exigido a identificação dessas propriedades, que variam no espaço (BERGMANN; WALKER; LEVYS, 1985; PECK; 1999). Assim, o processo de identificação é feito através de simuladores em terra. Neste trabalho, é abordada a proposta de um simulador utilizado para controle de atitude e velocidade de um veículo espacial utilizando sistema de gás frio (JUNG; TSIOTRAS, 2003). 2. METODOLOGIA A presente proposta do simulador aborda primeiramente a descrição básica do simulador. Na segunda etapa são feitos os modelamentos referentes a dinâmica e cinemática envolvidas (sistema coordenadas, momentos de inércia, eixos principais de inércia, equações dinâmicas de Euler e equações cinemáticas de Euler). A proposta aborda somente o modelamento pelo método dos Ângulos de Euler, fazendo um comentário do método dos quatérnios como um método onde não ocorre o problema de singularidade como no método dos Ângulos de Euler. Ainda, para a simplificação da proposta são modelados somente os torques devidos ao campo gravitacional da terra, tendo em mente que para uma 65 modelagem completa devemos levar em conta todos os torques relativos às perturbações que atuam freqüentemente sobre um veículo espacial em órbita. Estas perturbações podem ser devidas aos seguintes fatores: · · · · · · · Pressão da radiação solar; Vazamento de gás dos sistemas de controle; Influência atmosférica (aerodinâmica); Influência magnética; Momentos devido à força gravitacional; Impacto de meteoritos; Momentos giroscópicos. Para confirmar a validade da proposta foi feito uma simulação computacional que poderá ser aplicada ao simulador proposto. A simulação consiste de um controle de velocidades com a finalidade de zerar as velocidades residuais de um veículo espacial específico. Este controle foi implementado utilizando o software Simulink. 3. VISÃO GERAL DO SIMULADOR Este trabalho apresenta uma proposta inovadora no âmbito nacional de um simulador para testes de sistemas aplicados a veículos espaciais, principalmente controle de atitude e velocidade angular (SCHWARTZ; HALL, 2003). mais realisticamente o controle de atitude de veículos espaciais. É um sistema que permite 3 graus de liberdade, 360 graus de rotação em dois eixos perpendiculares, em relação ao eixo vertical e horizontal respectivamente e uma inclinação de até 30 graus em relação ao terceiro eixo, rotação esta limitada por um barra que passa través do centro da esfera e que suporta as plataformas de montagem dos experimentos, Fig. 3. Durante a fase de desenvolvimento dos softwares de controle embarcado, várias atualizações ocorrem. Este simulador possibilita manobras mais realísticas e colabora para aprimorar a qualificação dos sistemas de controle testados. Os Mancais a ar apresentam várias vantagens sobre outros tipos de mancais. A sua característica principal é praticamente a inexistência de atrito entre a superfície côncava do mancal e da esfera. Duas plataformas fixas nas extremidades de um eixo acoplado à esfera suspensa no mancal a ar terão o propósito de fixar os sensores, o sistema de aplicação de torque de controle, baterias e instrumentação da telemetria. 3.1 Descrição dos Subsistemas Base/Mancal a ar. O mancal, com capacidade de 1,5 toneladas, repousa sobre um pedestal de aço, fixo à uma base de concreto. Este mancal a ar esférico consiste de uma esfera de alumínio suspensa em uma película de ar dentro de um mancal côncavo. A esfera de alumínio tem dois rebaixos eqüidistantes 180o, onde são fixadas as barras para as plataformas. O conjunto é mostrado na Fig. 4. Fig. 3 - Simulador proposto. Fig. 4 - Mancal a ar esférico. Este equipamento tem a capacidade de simular 66 Revista UniVap, v.15, n.27, 2008 Plataforma. Composta por duas placas de alumínio fixadas uma de cada lado da esfera central do mancal por meio de barras. Possibilita a montagem de vários subsistemas do simulador. Essas placas têm várias furações e slots para fixação dos subsistemas (sensores, baterias, computador de bordo, etc.) e contrapesos para balanceamento, Fig. 3. Sensor. Para o controle da velocidade angular são utilizados girômetros, os quais medem as velocidades angulares nos três eixos. Computador. Para a aquisição de dados e controle é utilizado um computador remoto, tipo laptop. Computador de Bordo e Telemetria. É utilizado um sistema de aquisição de dados remoto do tipo transmissor de dados, PC 104, AMD K6, placas A/D-D/A e I/O ou um CompactRIO com interface cRIO-9052 de baixo consumo da National Instruments (SANTOS; SILVA, 2006; MOURA, 2007). Este está fixado numa das plataformas e controla remotamente o simulador. Este computador de bordo permite tanto o armazenamento do programa de controle desenvolvido como o controle via telemetria, Fig. 5. Fig. 6 - Atuador tipo liga-desliga. Reguladores de pressão. Para a regulagem das pressões nos atuadores são utilizados quatro reguladores de pressão. Carga de Ar dos atuadores. Para o controle de torque são utilizados cilindros de alta pressão, carregados com ar sintético a 150 PSI, que têm carga para até 2 minutos de testes. Baterias. Tipo seladas (20-30 VDC), fixas a uma das plataformas, fornecem energia elétrica a todos os equipamentos no simulador. 4. MODELAMENTO Fig. 5 - Laptop/Controlador CompactRIO 9052. Atuadores. 12 atuadores, tipo liga e desliga são utilizados, 8 para controle de rolamento, 2 para arfagem e 2 para guinada. O Atuador é composto de uma válvula solenóide de 24 VDC da Parker, que comanda a abertura e fechamento das saídas do ar a alta pressão, através de uma pequena tubeira com um orifício calibrado, Fig. 6 (SANTOS; SILVA, 2006; MOURA, 2007). Uma gama de tubeiras para varias faixas de torque poderá ser fabricada estando disponível para atender a vários clientes específicos, com montagens de várias configurações de teste. A princípio, para um dos testes propostos, é utilizado um conjunto de tubeiras com ponto de operação de 10 bar de pressão de entrada, o qual fornece 2 newtons de empuxo cada. Esta tubeira é fabricada e calibrada para gerar os 2 newtons de empuxo nominal. Uma curva de resposta valida a calibração. Revista UniVap, v.15, n.27, 2008 A modelagem matemática do simulador aborda a dinâmica e a cinemática dos movimentos rotacionais. As relações entre velocidade e torque no sistema de coordenadas do corpo são descritas pelas equações dinâmicas, já as relações entre velocidade e atitude nas coordenadas do sistema inercial são tratadas pelas equações cinemáticas (NASIRIAN et al., 2005). Os torques de controle são calculados através das equações dinâmicas de Euler e a atitude do veículo espacial é definida pelos ângulos de Euler que são calculados com as equações cinemáticas de Euler. Como simplificação do modelamento, é considerado somente o torque referente ao campo gravitacional da terra, lembrando que para o modelamento completo devese considerar todos os torques envolvidos no sistema. Para o controle da atitude do veículo espacial, é usado um sistema de gás frio. O veículo espacial em estudo é um corpo rígido em órbita circular em torno da Terra, com movimentos de rotação em torno de seu centro de massa. O momento devido às forças externas corresponde à atuação do gradiente gravitacional sobre o centro de gravidade do veículo espacial. 67 4.1 Sistema de Coordenadas Para o estudo do movimento de um veículo espacial, consideram-se três sistemas de coordenadas ortogonais, sendo um sistema de referência fixo e dois móveis (WERTZ, 1978): · Sistema Inercial (WERTZ, 1978). Tem origem definida no centro de massa da terra e está fixo no espaço. Este sistema não acompanha a rotação da terra. Seu eixo X aponta para o equinócio vernal, seu eixo Z aponta para o Pólo Norte e seu eixo Y é orientado seguindo a regra da mão direita. Neste artigo, a origem deste sistema será representada por 0X0Y0Z0, Fig. 7. · Sistema da Órbita (WERTZ, 1978). É o sistema de coordenadas fixo na órbita. Este sistema tem o seu eixo X na direção da velocidade tangencial da órbita, seu eixo Z na direção radial ao plano da órbita, apontando para a origem do sistema de coordenadas inercial, e por último o eixo Y, perpendicular ao plano da órbita. Neste artigo a origem deste sistema será representada por 0XYZ, Fig. 7. (1) As grandezas Ixx, Iyy, e Izz são conhecidas como momentos de inércia, e Ixy , Ixz e Iyz como produtos de inércia. Para o sistema de coordenadas do corpo é conveniente adotar como referência os eixos principais de inércia, cuja distribuição de massa é simétrica em relação ao centro de gravidade do sistema (simulador + veículo espacial), e os produtos de inércia do sistema são nulos, assim os elementos fora da diagonal (Ixy ,Ixz ,Iyx Iyz ,Izx ,Izy ) da matriz de inércia desaparecem, permanecendo então apenas os elementos da diagonal (Ixx ,Iyy ,Izz). Assim sendo, o tensor de inércia será: · Sistema do Corpo (WERTZ, 1978). É o sistema fixo no corpo, cuja origem coincide com o centro de gravidade do corpo e com a origem do sistema da órbita. Tem seus eixos coincidentes com os eixos principais de inércias. Neste artigo a origem deste sistema será representada por 0xyz, Fig. 7. Fig. 7 - Sistemas de Coordenadas. Os vetores de posição, velocidade, aceleração e força são representados em relação ao sistema de coordenadas inercial, sendo que as equações do movimento são analisadas considerando-se o movimento do corpo em relação ao sistema de coordenadas da órbita (BETTIATO, 2003). (2) 4.3 Equações do Movimento O comportamento rotacional de um veículo espacial é descrito pelas “equações do movimento” de rotação. Essas são equações diferenciais de segunda ordem, sendo que sua derivada primeira corresponde à velocidade angular e a derivada segunda à aceleração angular. Na astronáutica, as dinâmicas de trajetória e de atitude são quase que perfeitamente desacopladas. A rotação não tem influência na órbita do veículo, e geralmente a órbita não influencia a atitude da nave. As equações do movimento de rotação de um veículo espacial consideram a influência de momentos externos (torques) que agem sobre o veículo espacial. Podemos estabelecer essas equações aplicando-se “a lei do momento angular” (SCHLINGLOFF, 2005). Equações Dinâmicas de Euler. Os movimentos rotacionais (atitude) dos veículos espaciais tratados como corpos rígidos no espaço são descritos pela equação (MERIAM, 1966; WERTZ, 1978; SCARBORUGH, 1958): (3) 4.2 Momento de Inércia e Eixo Principal Pela dinâmica dos corpos rígidos têm-se (MERIAM, 1966): 68 onde: Revista UniVap, v.15, n.27, 2008 As três matrizes de rotação na seqüência 3-1-3, multiplicadas simultaneamente, descrevem a transferência de um sistema de referência para outro, neste caso do sistema de coordenadas fixo no corpo para o sistema da órbita. Uma rotação ψ em torno do eixo Z, Fig.8, uma rotação em torno do eixo X, Fig. 9 e uma rotação , novamente em torno do eixo Z, Fig.10. m é uma função conhecida do tempo (SCHLINGLOFF, 2005). Para se determinar os valores de em termos dos ângulos de Euler ( ) e suas derivadas no tempo, consideram-se as projeções de todos os vetores da velocidade angular sobre cada um dos eixos em movimento (WERTZ, 1978). Assim, têm-se abaixo as equações: Como resultado, a matriz de transformação será: (10) (9) Equações Cinemáticas de Euler. Na atitude de um veículo espacial em rotação, o vetor velocidade angular Na Fig. 11, têm-se a demonstração das projeções das taxas de variação angular, de cada eixo de rotação, nos eixos na posição final da rotação. A somatória destas projeções em cada eixo resulta nas velocidades angulares mostradas na equação (10). Fig. 11 - Seqüência adotada dos ângulos de Euler 3-1-3 (Z-X-Z). 70 Isolando-se a taxa de variação angular obtém-se: Assim, ao integrar o sistema de equações diferenciais de primeira ordem acima, obtida a partir do vetor velocidade angular , chega-se aos ângulos de Euler, os quais determinam a atitude do veículo espacial. Estas equações diferenciais não-lineares são chamadas “Equações Cinemáticas de Euler” (WERTZ, 1978; SCARBORUGH, 1958). (11) Torques Gravitacionais. Os torques aplicados Revista UniVap, v.15, n.27, 2008 podem ser decompostos em: (12) é a somatória de todos os torques externos apli- onde cados, são os torques provocados por perturbações externas, que para o nosso caso não serão modelados e é o torque do gradiente gravitacional. (13) , o torque do gradiente gravitacional, pode ser definido como (BETTIATO, 2003): Quatérnios. Na determinação da atitude de um corpo rígido os Quatérnios (CHOBOTOV, 1991) têm várias vantagens sobre o uso dos ângulos de Euler. Os quatérnios envolvem o uso de relações algébricas para se determinar os elementos da matriz de rotação ao invés de funções trigonométricas. Os cálculos computacionais tornam-se mais rápidos utilizando-se este método e não há o problema de singularidade como pode ocorrer na formulação dos ângulos de Euler. Este problema de singularidade para o caso da seqüência 3-1-3, adotada neste artigo, ocorre quando o ângulo é múltiplo negativo ou positivo de 180o (CHOBOTOV, 1991). Para a não ocorrência desta singularidade, numa análise geral, deve-se escolher sen >0, ou 0o< <180o (CHOBOTOV, 1991). Assim sendo, o nosso sistema proposto tem a flexibilidade de abordar tanto o método pelos ângulos de Euler como pelos quatérnios. Neste nosso artigo a simulação proposta aborda somente o método pelo os ângulos de Euler. (14) 5. RESULTADOS OBTIDOS onde: (15) e: (16) sendo: G = constante gravitacional M = massa da Terra = vetor unitário na direção radial do veículo espacial RC = Distância entre o centro de gravidade do veículo espacial em órbita circular em torno da terra e o centro da terra. como: (17) Para auxiliar na consolidação desta proposta de um simulador de controle de atitude de veículos espaciais, é apresentada uma simulação computacional através do Simulink do MatLab (ADADE, 1997), Fig.13. Esta simulação foi idealizada para zerar as rotações residuais provenientes de perturbações originadas durante a missão de lançamento de um veículo espacial. O SARA é um satélite de reentrada atmosférica em fase de desenvolvimento pelo IAE e deverá cumprir uma missão científica sub-orbital, que conduzirá experimentos para teste em microgravidade. As manobras de controle de atitude deste veículo serão testadas em solo e o simulador proposto deverá provavelmente ser utilizado para isto. A Fig. 12 apresenta o esquema de controle de velocidades básico. O valor utilizado para a zona morta mostrada, no caso, para o sistema de controle de velocidade do SARA é de 0,2 graus/s, este valor foi utilizado para o desenvolvimento do programa da simulação proposta. têm-se: (18) E as componentes do torque gravitacional serão: Fig. 12 - Sistema de Controle do SARA. (19) Revista UniVap, v.15, n.27, 2008 71 Na idealização do controle de velocidade, para aplicação do torque de controle, foi utilizado um sistema de gás frio, o qual no modelo real deverá estar acoplado no veículo ou na mesa do simulador. Para a simulação proposta, foram utilizados os parâmetros do SARA, os quais são mostrados na Tabela 1. Tabela 1 - Dados para a Simulação Fig. 13 - Layout do Programa de Controle desenvolvido no Simulink. 72 Revista UniVap, v.15, n.27, 2008 Foi rodado o programa elaborado no Simulink e foram obtidos os resultados apresentados nas Figs. de 14 até 19. Fig. 16 - Deslocamento Angular durante 500 s. Fig. 14 - Velocidades Angulares versus Tempo. A Fig.14 mostra que as velocidades iniciais de 20, 5 e -10 graus/s, são minimizados até 0,2 graus/s (definido pela zona morta do controlador on/off), em um período de frenagem de 9 segundos. Quando as velocidades atingem esse valor residual de 0,2 graus/s, os atuadores são desabilitados. O valor residual está associado à precisão da velocidade final admissível e o valor da microgravidade em veículos de sondagem como o SARA. Fig. 17 - Deslocamento Angular durante 20 s. A Fig. 16 mostra a história temporal da atitude do veículo durante o período de 500s., e a Fig. 17 apresenta ainda detalhes do período de frenagem de 9s. Verifica-se que a partir da condição inicial de 0-0-0 graus os ângulos variam até 50-35-25 graus durante a frenagem e após 9 segundos a atitude varia lentamente devido a velocidade residual de 0,2 graus/s definida pela zona morta. Fig. 15 - Plano de Fase. A Fig. 15 mostra o plano de fase, ou seja, as curvas obtidas parametrizadas nos eixos velocidade/posição angular. No plano de fase é possível avaliar as amplitudes das velocidades e posição angular simultaneamente. Fig. 18 - Torques de Atuação. Revista UniVap, v.15, n.27, 2008 73 A Fig. 18 mostra os sinais dos torques de atuação, durante o período de 20 segundos. Ao serem acionados, os atuadores realizam o processo de frenagem do veículo e a área sob as curvas representam o impulso específico utilizado para a frenagem. A estimativa do impulso específico permite definir as especificações do sistema de gás frio. O campo de atuação para o simulador proposto é dado pelas características esperadas, como se pode citar: Carga útil de 0 a 1.500 kg; 0,5 a 4 Newtons de empuxo; torques de atuação de 0,5 a 32 N.m; =360o, ψ =30o e m =360o; velocidades angulares: 0 a 100 graus/s; aceleração angular: 0 a 3 graus/s2. 7. TRABALHOS FUTUROS Este trabalho consiste na fase preliminar de um projeto que terá início em 2008 no IAE para a implantação do simulador proposto neste artigo, e que terá como uma das funções, além da qualificação do sistema de controle de atitude, a identificação do tensor de inércia do 4o Estágio do VLS. Fig. 19 - Torques de Acoplamento. A Fig. 19 mostra os valores dos torques de acoplamento devido às três velocidades e aos valores das diferenças entre os momentos de inércia (Equação 5). O acoplamento no eixo x é pequeno justamente porque o termo (B-C) é aproximadamente zero, ao passo que (A-B) e (C-A) são representativos. 6. CONCLUSÃO Os resultados obtidos com a simulação computacional foram bastante satisfatórios para auxiliar na proposta deste simulador. Classicamente os sistemas de controle são primeiro projetados e em seguida tem a sua estabilidade examinada. A aplicação do método de Lyapunov para verificação da estabilidade de um sistema de controle baseado nas equações dinâmicas de Euler não é algo fácil e não foi o escopo do trabalho. Assim simplesmente foi observado que o sistema de controle de velocidade projetado é estável segundo Lyapunov. Baseados nas pesquisas realizadas para a elaboração deste artigo, conclui-se que esta proposta é única no Brasil. A implementação deste simulador será submetida ao fundo setorial de ciência e tecnologia do IAE, no ano de 2008. Uma estimativa preliminar do custo para o simulador proposto é da ordem de quatrocentos mil dólares. 74 O Atualmente no setor espacial do IAE são feitas medições de momentos e produtos de inércia do veículo espacial, antes do seu lançamento. Durante o vôo, o tensor de inércia do veículo varia com o consumo de massa de propelente. Para avaliar essas variações, são feitas simulações numéricas com os dados coletados em ensaios em banco de provas. Esses dados são utilizados para o controle do veículo no espaço, porém, os erros existentes nas interpolações numéricas utilizadas não podem ser verificados, devido à inexistência de meios para a sua detecção. Essas dificuldades podem ser superadas utilizando junto com o simulador proposto uma maquete que permita medir a variação do tensor de inércia em tempo real. O simulador proposto, em conjunto com o desenvolvimento da maquete, representará uma inovação tecnológica, pelo fato de permitir simulações em três graus de liberdade, medições de centro de gravidade e o tensor de inércia em um único equipamento. 8.AGRADECIMENTOS Em primeiro lugar agradeço à minha esposa Ariane pelo amor, compreensão e apoio nos momentos mais difíceis; aos meus pais Adão e Mercedes, por me ensinarem a importância dos estudos e a nunca desistir de nossos objetivos; ao meu amigo Loures do IAE, por me incentivar a retornar aos estudos; aos meus orientadores Wanderley P. Cunha, Euler G. Barbosa e Lízia O. Acosta Dias, pelo apoio à elaboração deste artigo e a todos os meus amigos do curso, em especial ao Sílvio N. Abreu, ao Pedro S. de Araújo e à Teresa Raquel P. da Silva que, mais que colegas, foram também estímulo e companhia para que concluísse com êxito essa jornada. 9. REFERÊNCIAS ADADE, A. JR. Simulação de Sistemas Dinâmicos Simulink. São José dos Campos, SP: Instituto Revista UniVap, v.15, n.27, 2008 Tecnológico de Aeronáutica - ITA, 1997. BERGMANN, E.V. ;WALKER, B. K. ; LEVYS, D. R. Mass Property Estimation for Control of Asymmetrical Satellites. Paper 85. Snowmass, CO, 19-21 Aug. 1985. BETTIATO, A. C. Estabilidade e Controle Ótimo de Atitude de Satélites Artificiais com Rotores de Reação e de Momento em Órbitas Circulares. 143 f. Dissertação (Mestrado em Mecatrônica e Sistemas Dinâmicos Aeroespaciais) – Instituto Tecnológico de Aeronáutica, Comando Geral de Tecnologia Aeroespacial, São José dos Campos, 2003. CHOBOTOV, V. A. Spacecraft Attitude Dynamics and Control. Malabar, Florida: Krieger Publishing Company, 1991. CUNHA,W. P. Sistema para medições de propriedades de massa. 161 f. Dissertação (Mestrado em Mecatrônica e Sistemas Dinâmicos Aeroespaciais) - Instituto Tecnológico de Aeronáutica, Comando Geral de Tecnologia Aeroespacial, São José dos Campos, 1993. EULER, G. B. Test Bench and Attitude Control, In: INDUSCON, n. 6, Joinvile, 2004. JUNG D ; TSIOTRAS P. A 3-Dof Experimental Test-Bed for Integrated Attitude Dynamics and Control Research. Atlanta, GA: School of Aerospace Engineering. Georgia Institute of Technology. 2003. KIM, B. M.; VELENIS, E.; KRIENGSIRE, P.; TSIOTRAS, P. A Spacecraft Simulator for Research and Education. Atlanta: Georgia Institute of Technology. [ASS 01-367]. MERIAM, J. L. Dynamics. New York, NY: John Wiley & Sons, Inc, 1966. MOURA, D. Y. Análise de Desempenho e Integração de Sistemas Dedicados para o Simulador de Controle de Atitude. 34 f. Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação) – Instituto Tecnológico de Aeronáutica, Comando Geral de Tecnologia Aeroespacial, São José dos Campos, 2007. Revista UniVap, v.15, n.27, 2008 NASIRIAN, M; BOLANDI, H; SEDIGH,A. K.; KHOOGAR, A. R. Design of a Satellite Attitude Control Simulator. In: SYMPOSIUM ON SMALL SATELLITES FOR EARTH OBSERVATION. n. 5, Berlin, Germany, April 2005. OGATA, K.Engenharia do Controle Moderno, 2 ed. Rio de Janeiro: Prentice Hall do Brasil, 1993. PECK, M. Mass-Properties Estimation for Spacecraft with Powerful Damping, Girdwood, Alaska: Hughes Space & Communication. AAS/AIAAAstrodynamics Specialist Conference, 16-19 Aug. 1999. SANTOS, R. B.; SILVA, T. M. Comunicação Sem Fio (Wireless) para o Simulador de Basculamento do VLS. 65 f. Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação) – Instituto Tecnológico de Aeronáutica, Comando Geral de Tecnologia Aeroespacial, São José dos Campos, 2006. SCARBORUGH, J. B. The Gyroscope: Theory and Applications. 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Dordrecht, Holland: D Reidel Publishing Company, 1978. 75 Otimização de Processos na Área de Recebimento de Materiais da Indústria Aeronáutica Brasileira Teresa Raquel Pereira da Silva * Wellington Gonçalves Rodrigues ** Jesuíno Takachi Tomita *** Resumo: Este trabalho destaca a importância da qualificação de fornecedores para uma empresa, apresentando exemplos de relacionamento entre a Empresa Brasileira de Aeronáutica (EMBRAER) e o fornecedor de peças e conjuntos, relacionados ao interior de suas aeronaves. Neste artigo, os autores propõem um método de qualificação deste fornecedor, baseado na escolha adequada das ferramentas da Qualidade, tais como, análise de Pareto, Diagrama de Causa-Efeito, Fluxograma, sistema JIT e outros. Uma metodologia interna baseada na reengenharia de processos também é sugerida para a empresa, o que permite eliminar a inspeção de recebimento dos materiais analisados, sem causar impactos nas demais etapas do processo produtivo. A análise de métodos identifica o material mais propício, em termos de valor financeiro e quantidade de problemas, para ter a inspeção eliminada. No final da análise é possível concluir se a implementação da proposta é viável ou não, considerando os custos de investimento do projeto. Palavras-chave: Otimização, processos, inspeção, recebimento, qualidade. Abstract: This work emphasizes the importance of the suppliers qualification for a company, by showing examples of the relationship between the Empresa Brasileira de Aeronáutica (EMBRAER) and the supplier of parts and assemblies related to the interior of its aircraft. In this article, the authors propose a method of supplier qualification, based on the adequate choice of Quality tools, such as, Pareto analyze, cause-effect diagrams, Flowcharts, JIT systems and others. A methodology based on reengineering process is suggested for the company in order to eliminate the receiving inspection of analyzed materials, without causing impacts in the later stages of the production process. The methods analysis identifies which material is most propitious, in terms of financial value and amount of problems, to have inspection eliminated. In the end of the analysis it is possible to conclude if the implementation of the proposal is viable or not, considering investments costs of the project. Key words: Optimization, process, inspection, receiving, quality. 1. INTRODUÇÃO Com o intuito de garantir o aumento de competitividade no mercado, as empresas buscam constantemente uma forma de melhorar a qualidade dos produtos. Devido a este fato, a engenharia da qualidade propõe diversas ferramentas que objetivam gerenciar este processo de melhoria contínua. Bons resultados são * Graduanda em Engenharia Aeronáutica e Espaço FEAU/UNIVAP, 2008. ** Eng. Mecânico Industrial e Especialista em Administração de Empresas. *** Professor da UNIVAP. 76 obtidos com a utilização destas ferramentas da qualidade, entretanto, estes resultados não dependem apenas do esforço interno da empresa, mas também da qualidade dos produtos e serviços fornecidos por terceiros, os quais passam, também, a integrar o produto da empresa cliente. Este trabalho apresenta uma metodologia de relacionamento, entre empresa e fornecedor, que foi desenvolvida com o objetivo de ser implementada na Empresa Brasileira de Aeronáutica - EMBRAER. Os valores adotados neste trabalho são fictícios, prestando-se apenas para demonstração dos resultados obtidos com a implementação da proposta. Revista UniVap, v.15, n.27, 2008 1.1 EMBRAER A EMBRAER - Empresa Brasileira de Aeronáutica S.A. é a terceira maior empresa aeronáutica do mundo atrás somente da Airbus e da Boeing, posição alcançada graças à busca permanente e determinada da plena satisfação de seus clientes. Com mais de 36 anos de experiência em projeto, fabricação, comercialização, manutenção e pós-venda, a EMBRAER já produziu cerca de 3.900 aviões, que hoje operam em 70 empresas aéreas e 43 países, nos cinco continentes. A EMBRAER tem uma base global de clientes e importantes parceiros de renome mundial, que resulta em uma significativa participação no mercado. 1.2 Ferramentas da qualidade Kaoru Ishikawa citado em Correa e Correa (2006) afirma que: “Noventa e cinco por cento dos problemas relacionados à qualidade podem ser resolvidos com o uso de sete ferramentas quantitativas básicas”. Para análise do problema discutido neste trabalho, foram utilizadas as ferramentas Diagrama de Pareto, Diagrama de Causa e Efeito e Fluxograma de Processo, devido estas, serem as mais adequadas para gerenciar esta análise e identificar as causas dos problemas discutidos. Através da análise de Pareto é possível identificar os casos/ problemas mais críticos, e atacálos inicialmente, tendo como base os critérios estabelecidos pela empresa cliente. No momento que se entende o porquê da existência dos estoques, pode-se eliminar as causas que geram sua necessidade, acarretando sua diminuição ou até mesmo eliminação. Quanto ao diagrama de causa e efeito (conhecido também como diagrama de espinha de peixe, ou diagrama de Ishikawa), este tem como objetivo orientar no processo de identificação das possíveis causas-raiz de um problema, o que é fundamental para eliminá-lo de forma definitiva. Uma terceira ferramenta utilizada no nosso trabalho e também muito utilizada nas indústrias para a organização de processos, é o Fluxograma de Processos. Sua função é ilustrar os passos necessários para a execução de um processo qualquer. Além da utilização destas ferramentas, este trabalho está baseado em duas teorias da qualidade: o Just in time (JIT), e a Reengenharia de Processos. A seguir estão algumas afirmações de especialistas na área de quaRevista UniVap, v.15, n.27, 2008 lidade, com relação a estas duas teorias: Marinho e Armando Neto (1997), afirmam que: “A implantação do sistema Just In Time (JIT) em uma empresa proporciona vários benefícios tais como: redução de estoques, diminuição de lead-times, e melhoria da qualidade. O sucesso da implantação deste sistema depende de fornecedores que atendam pré-requisitos como disciplina, estabilidade da programação, transporte, e peças de qualidade”. Para Isnard Marshall (2003), “A Reengenharia visa, quando bem empregada, à otimização dos métodos e processos organizacionais, reduzindo custos e aumentando a produtividade de forma radical”. 2. DESCRIÇÃO DO PROBLEMA No recebimento direto de materiais de elevado custo vindo de fornecedores da indústria aeronáutica estão envolvidos riscos de problemas de qualidade. Em alguns casos, estes materiais quando chegam ao departamento de Recebimento da empresa, não podem ser utilizados devido a não conformidade de determinadas especificações, conforme contrato entre fornecedor-cliente. Fatores como: qualidade inadequada do produto, falha na inspeção final e danos sofridos no processo de transporte são alguns exemplos dessa não conformidade. Esta situação, obriga a empresa-cliente a executar inspeções de recebimento mais rigorosas do material, resultando em maiores gastos. Além do gasto que a empresa-cliente incorre pela não utilização dos materiais nãoconformes, esta ainda assume custos adicionais de mão-de-obra, armazenagem, gasto de capitais nos estoques envolvidos e tempo despendido na execução das inspeções, custos estes que poderiam ser evitados, se o fornecedor enviasse os referidos materiais dentro dos padrões de qualidade e nos prazos requeridos. Na inspeção de recebimento, os inspetores devem desembalar e re-embalar o material, processo este, que gera riscos grandes de o componente ser danificado pelo próprio inspetor. Grande parte dos produtos reprovados na inspeção de recebimento é submetida a retrabalhos pelo fornecedor, a fim de serem aprovadas em nova inspeção, mas este processo pode acarretar outras não conformidades nos materiais, que são, em alguns casos, detectadas somente na linha final de montagem. 77 Nesta etapa do processo, é praticamente impossível detectar o causador da não conformidade e direcionar as ações corretivas adequadas. 3. OBJETIVO DO TRABALHO O objetivo do trabalho é o de eliminar a inspeção de recebimento dos respectivos materiais analisados, e conseqüentemente reduzir volume financeiro de materiais em estoque. Com a eliminação da inspeção de recebimento, o plano de produção do fornecedor passa a ser ainda mais integrado ao da empresa, caso em que, é possível realizar o planejamento considerando que o material será fornecido diretamente para a linha de montagem. 4. PROPOSTA DO TRABALHO Através deste trabalho, propõe-se apresentar um modelo de atuação que melhore a qualidade dos produtos fornecidos, permitindo assim eliminar a inspeção de recebimento. Pretende-se, também, sugerir uma metodologia interna para a empresa aeronáutica, que permita eliminar esta inspeção, sem causar impactos nas demais etapas do processo produtivo. O fornecedor é responsável por garantir o provimento de um material que atenda aos parâmetros de qualidade pré-determinados em normas e contratos. Com a implementação das ações propostas neste trabalho, a empresa economizará em mão-deobra, espaço físico, tempo e eliminará inspeções desnecessárias, fazendo uso mais racional dos recursos que possui. prio fornecedor, logo quaisquer custos relacionados a danos originados no transporte, são de responsabilidade do contratante. A empresa cliente somente arca com custo de transporte quando esta faz uma solicitação que não está prevista no planejamento ou, quando é avaliada como a causadora da não conformidade. 6. MÉTODO DE ANÁLISE A análise do problema discutido neste trabalho teve como base as duas ferramentas da qualidade citadas anteriormente: Análise de Pareto e Diagrama de Causa e Efeito (ou diagrama de espinha de peixe). Este processo foi operacionalizado em três etapas, como segue: 1º Etapa: Identificação dos materiais, de maior valor monetário e com altas taxas de rejeição no recebimento, através da análise de Pareto. A Tabela 1 classifica em ordem decrescente, em termos de valor financeiro parado em estoque, os materiais que equipam o interior das aeronaves comerciais na EMBRAER. A coluna “Valor (%)” representa a porcentagem de valor do determinado material em relação ao valor total dos 57 materiais listados na Tabela 1. Tabela 1 - Pareto Valor do Material 5. PROCESSO LOGÍSTICO ENTRE FORNECEDOR E EMPRESA O embarque dos materiais analisados pode ser via transporte marítimo ou aéreo. Usualmente os materiais são fornecidos via transporte marítimo devido ao custo ser menor. Neste caso, o tempo que o material leva para ser transportado é quatro vezes maior do que se este fosse embarcado via transporte aéreo. Porém, existem situações em que os itens são enviados via transporte aéreo para atender demandas relacionadas a modificações no plano de compra dos materiais. Este trabalho modela as soluções tendo como referência o transporte marítimo. Uma vez enviados por transporte marítimo, os materiais são despachados no porto de Santos e de lá, são transportados para São José dos Campos por meio de caminhões. O Embarque marítimo tem duração de 40 dias desde a origem até sua chegada na Embraer. A empresa transportadora é contratada pelo pró78 Fonte: autores. Revista UniVap, v.15, n.27, 2008 A Tabela 2 classifica em ordem decrescente os materiais que possuem maiores índices de rejeição no recebimento da empresa cliente. A coluna “nº de rejeições” representa a porcentagem rejeições de um material em relação à rejeição total dos 57 materiais listados na Tabela 2. Tabela 2 - Pareto Incidência de Problemas lada, os materiais de alto custo e os materiais com índice alto de rejeição. Para que os recursos voltados a solução de problemas tenham seus resultados maximizados, é necessário priorizar o material que realmente é o mais crítico para empresa, ou seja, um material que possua custo elevado e que ao mesmo tempo apresente um número alto de rejeições no recebimento. Na Tabela 3, os mesmos itens citados nas Tabelas 1 e 2 se repetem, porém agora, classificados em ordem decrescente de acordo com sua criticidade. A criticidade do material é representada pela equação abaixo, nomeada Índice Crítico: IC (%) = (2 × valor .material ) + (1 × n º rejeições ) 3 Este indicador é o mais adequado para o caso em questão devido o volume em estoque da empresa ser medido em função dos custos dos produtos estocados e não em função da quantidade. Logo, o peso adicionado ao valor do material no estoque é maior do que o peso adicionado à quantidade de problemas. Devido a restrição do número de páginas do artigo, na Tabela 3 estão contidos somente os dados essenciais para análise do problema apresentado. Fonte: autores. As Tabelas 1 e 2 comprovam a afirmativa de Campos (2004) sobre a análise de Pareto: “Cerca de 80% do valor dos estoques concentram-se em cerca de 20% dos itens estocados; 80% dos problemas de qualidade concentram-se em 20% dos itens fabricados”. Porém, não é suficiente conhecer de maneira iso- Na Tabela.3, o item 1 representa um pouco mais de 23% do valor total dos 57 materiais listados nesta Tabela. Do mesmo modo, o mesmo item, representa 11,24% de rejeição em relação ao número total de rejeições dos 57 itens listados na Tabela 3. A Tabela 3 indica que dos 57 materiais analisados, os itens 1, 4, 3, 2 e 7 são os mais críticos para a empresa, porém dada a restrição do tamanho do texto para o presente trabalho, é discutido somente o item 1, considerado mais relevante na análise. O item 1 citado neste trabalho, representa os assentos de passageiros do avião. Tabela 3 - Comparação Valor do materual Versus Incidência de Problemas Fonte: autores. Revista UniVap, v.15, n.27, 2008 79 2º Etapa: Identificação das causas-raízes da rejeição dos assentos de passageiros, através do diagrama espinha de peixe. sentos de passageiros, de maneira com que os requisitos da engenharia de logística da empresa cliente, sejam seguidos pelo fornecedor. A descrição do problema é colocada no lugar onde ficaria a cabeça do peixe. Já as possíveis causas do problema são acrescidas, em forma de ramificações, no lugar onde seria sua espinha dorsal. O manual de embalagem da empresa cliente deve ser utilizado como referência. A Fig.1 ilustra a análise causa-efeito do problema observado: assentos de passageiros recebidos com danos. Com relação as ramificações máquina, meio ambiente, método e meio de medição, não foram detectadas causas que contribuíssem para ocorrência do problema analisado. Já nas demais ramificações da espinha, algumas falhas no processo foram detectadas. No caso dos assentos analisados, a embalagem deve ser de papelão (Fig. 3) e os assentos devem ser envolvidos por plásticos chamados “plásticos bolha”. Sugere-se que os próximos kits sejam enviados com um reforço de madeira na base dos assentos (Fig. 2). Este reforço deve conter suportes de aço em ângulo nas cantoneiras da madeira para evitar que a base de madeira se desloque e quebre, causando danos nos assentos. As fivelas dos cintos de seguranças também devem ser protegidas quanto à riscos e marcas. Fig. 1 - Diagrama de Causa e Efeito. Fonte: autora Fig. 2 - Reforço de madeira para suportar o assento. Para cada falha (causa raiz) encontrada, são propostas ações de contenção e correção conforme descritas na 3º etapa desta análise. 3º Etapa: Eliminação dos defeitos analisados no diagrama de Ishikawa, através de ações corretivas sugeridas pela área da Qualidade da empresa cliente. Propõe-se que sejam adicionadas cláusulas em contratos que determinem a responsabilidade dos custos de implantação dos itens a seguir como sendo do fornecedor, devido este ser o causador das não conformidades analisadas no Diagrama de Ishikawa. i) Embalagem Inadequada Ações: Emitir documento de ação corretiva para o fornecedor, solicitando alteração na embalagem dos as80 Fig. 3 - Embalagem de papelão. Revista UniVap, v.15, n.27, 2008 ii) Desentendimento e Utilização Inadequada dos critérios de Inspeção Ações: Implantação do sistema de Intervenção EMBRAER nas instalações do fornecedor. A inspeção final ao processo produtivo do fornecedor será executada por um empregado qualificado da EMBRAER e o produto somente será aceito no recebimento da empresa, se houver evidência desta inspeção ter sido executada. O alinhamento dos critérios de inspeção é a principal atividade do empregado EMBRAER, porém outras funções podem ser acrescentadas de acordo com o cenário vivido e desde que ambas as empresas estejam de acordo. iii) Variação de Mão-de-Obra Ações: Implementação de sistema de inspeção delegada no fornecedor. O fornecedor deverá designar dois ou três empregados para executar uma inspeção final ao processo produtivo normal e o produto somente será aceito pela EMBRAER no recebimento se houver evidência desta inspeção ter sido executada por este(s) empregado(s) aprovando o produto. Os inspetores devem ser treinados nos requisitos e necessidades da EMBRAER. Caso seja necessária a substituição do inspetor delegado, um novo processo de delegação deverá ser executado. 7. PROPOSTA DE ELIMINAÇÃO DA INSPEÇÃO DE RECEBIMENTO DO ITEM 1 – ASSENTOS DE PASSAGEIROS Propõe-se que sejam adicionadas cláusulas em contratos estabelecidos entre a empresa e fornecedor, referenciando os itens abaixo citados como proposta para eliminação da inspeção de recebimento dos assentos de passageiros. i) Criar uma métrica da Qualidade É importante que uma métrica de qualidade seja criada com o objetivo de avaliar se as ações implantadas no fornecedor tiveram resultados positivos. Também é possível definir em que momento o produto fornecido estará com qualidade assegurada e não mais precisará submeter-se à inspeção de recebimento. Para o presente trabalho é sugerido o seguinte indicador de monitoriamento: IM = n º lotes.discrepant es n º lotes.recebidos Este indicador tem uma grande importância e é o Revista UniVap, v.15, n.27, 2008 mais indicado, pois no recebimento da empresa, a inspeção do item 1 é feita por números de lotes, logo faz-se uma relação entre o número de lotes recebidos e o número de lotes com defeitos. O indicador deve ser monitorado e o item deve conter um histórico de aprovação, por dois meses (tempo suficiente para receber um número superior à 15 lotes), no recebimento da EMBRAER, à partir da implementação dos itens da etapa 3, para assim iniciar o processo de inspeção amostral e posteriormente eliminar a inspeção de recebimento de forma definitiva. ii) Alteração do planejamento de compras do material O planejamento de compra dos assentos de passageiros deverá ser alterado de maneira com que a EMBRAER possa efetuar o pagamento deste material com 12 dias de prorrogação, isto porque, os 12 dias economizados na inspeção não serão migrados para o estoque. Este re-planejamento deverá ser feito pelo departamento de suprimentos da empresa cliente. iii) Criar um padrão de inspeção (PI) específico para inspetor responsável pelo item 1. Será de responsabilidade do inspetor receber o material, registrá-lo no sistema, checar a documentação e verificar a integridade da embalagem. Caso algum problema seja detectado, o inspetor deverá reportar a não conformidade. Nota: A inspeção visual do material será por amostragem, ou seja, a cada 15 lotes o sistema EMBRAER envia um aviso de alerta ao inspetor informando que esta atividade deve ser executada. iv) Realizar Curso de Reciclagem com a área de Transporte Interno da EMBRAER. O transporte interno da Embraer deve ser capaz de garantir a integridade do produto, protegendo o mesmo quanto a danos ou manchas no material. Propõe-se curso de reciclagem de manuseio adequado dos materiais, aos responsáveis pelo transporte dos mesmos. Não é proposto nenhuma ação específica devido atualmente não existir problemas relacionados ao transporte interno dos assentos de passageiros. v) Realizar reciclagem da equipe da linha de produção quanto aos critérios de inspeção. Os operadores responsáveis pela inspeção do material devem estar alinhados com os critérios de inspeção de interiores determinados pela Engenharia da Qua81 lidade da empresa. Os operadores receberão treinamento de maneira que a inspeção realizada por eles antes da instalação do material no avião, seja idêntica, em termos de critérios,em relação à inspeção anteriormente realizada no Recebimento e na empresa fornecedora. A seguir, está o cronograma das atividades que devem ser cumpridas para atingir o objetivo do projeto. O tempo de duração da proposta foi estimado, permitindo assim conhecer em que momento a empresa poderá contar com o retorno do capital investido. Cronograma das Atividades de Implementação da Proposta 8. CUSTOS DE INVESTIMENTO DO PROJETO A Tabela 4 mostra os custos de investimento do projeto. O valor total do custo de implementação do projeto é de $ 33,000.00. Propõe-se que o fornecedor seja responsável pelos custos de implementação das três primeiras atividades da Tabela 4, devido às ações implementadas serem necessárias para tratar as não conformidades originadas pelo fornecedor. Tabela 4 - Custos de Investimento no Projeto 82 Revista UniVap, v.15, n.27, 2008 9. RESULTADOS ECONÔMICOS ESPERADOS Os ganhos econômicos para a empresa cliente, estimados a seguir, partem da estimativa para a família 170/190, de produção anual de 100 aeronaves, considerando kit com 72 poltronas e de reduções de lead-time mostradas na Tabela 5. A economia obtida com a implementação deste projeto está relacionada a três aspectos distintos: 9.1b) Fluxograma proposto para o processos de recebimento de materiais e componente. Na Fig. 5 indica um processo simplificado proposto para o recebimento dos assentos de passageiros, que elimina a inspeção visual e a sua estocagem no almoxarifado, reduzindo o lead-time e consequentemente, custos. 9.1 Economia estimada em relação lead-time do material A Tabela 5 explica a proposta do lead-time de logística no Recebimento da Empresa. As atividades “conferir” e “inspecionar” atual possui um lead time de 14 dias para realizar as atividades conforme Fluxograma 9.1a. Embora o ciclo de recebimento, (checar e inspecionar) do material ser menor que 14 dias, este é o tempo planejado para que o assento esteja à disposição na área para execução da atividade. No lead-time proposto, de 2 dias, a atividade “inspecionar” será executada em forma de amostragem, ou seja, a cada 15 lotes, faz-se uma inspeção visual. Quando não houver a necessidade da inspeção visual, as atividades realizadas serão conforme Fluxograma 9.1b. 9.1a) Atual fluxograma logístico de recebimento. Fig. 5 - Fluxograma da melhoria proposta. Fonte: os autores. Tabela 5 - Logística Recebimento do Item 1 A Fig. 4 ilustra a atual situação do fluxo de recebimento do material (item 1). O lead time terá uma redução de 86%. Note que os 10 dias economizados na inspeção não serão migrados para o estoque e o planejamento de compra destes materiais será alterado de maneira que a EMBRAER poderá fazer o pagamento deste material com 10 dias de prorrogação, reduzindo o nível de estoque e melhorando o giro de capital. 9.2 Economia estimada em relação à mão-de-obra. Fig. 4 - Fluxograma da logística de recebimento atual. Fonte: os autores Revista UniVap, v.15, n.27, 2008 No fluxograma atual, utilizam-se dois funcionários: o conferente e o inspetor. Já no proposto fluxograma, a única mão de obra utilizada é do inspetor que irá somente conferir o material em um tempo reduzido de 50% em relação ao atual. Logo, a mão de obra utilizada para um lead time de 14 dias não será mais necessária para um lead time de 2 dias. A redução de mão de obra será de 50% e esta poderá ser reaproveitada em outras atividades de acordo com a priorização da empresa. 83 9.3 Economia estimada em relação ao custo do material em estoque. 1 VPL = −33000 + ∑ 1 234000 (1 + 0,18)1 VPL = 165,605.08 Assumindo um custo médio ponderado de capital (WACC, Weighted Average Cost of Capital) de 18% ao ano, teremos uma economia anual, apenas para o kit 1, da ordem de US$ 234,000.00 considerando um custo de US$ 390,000.00 para o kit 1. 0 = −33000 + ∑ Considerando interpolação linear simplificada, para 12 dias, o custo de capital será de 0,6% por kit. Assim, 0,6% x US$ 390,000.00 = US$ 2,340.00/kit US$ 2,340.00 x 100 aeronaves = US$ 234,000.00 /ano. O valor do VPL calculado é positivo e bem atrativo em termos financeiros para este projeto, porém caso o fornecedor esteja de acordo com a proposta deste trabalho e concorde em arcar com os três primeiros custos indicados na Tabela 4, os valores do VPL e da TIR se tornam ainda mais atrativos financeiramente: O cálculo acima mostra que o valor bruto de retorno é de US$ 234,000.00 no ano, porém, é necessário considerar o conceito de valor do dinheiro no tempo. Para isto, existe a necessidade de calcular o VPL (valor presente líquido) e a TIR (taxa interna de retorno). O valor presente líquido (VPL) é a fórmula matemático-financeira que determina o valor presente de pagamentos futuros descontados a uma apropriada taxa de juros, menos o custo do investimento inicial. Basicamente, é o cálculo de quanto os futuros pagamentos somados a um custo inicial estaria valendo atualmente. O VPL maior do que zero: significa que o investimento é economicamente atrativo, pois o valor presente das entradas de caixa é maior do que o valor presente das saídas de caixa. Já o VPL igual a zero indica que o investimento é indiferente, e VPL menor do que zero indica que o investimento não é economicamente atrativo. A TIR de um projeto é a taxa que torna nulo o VPL do fluxo de caixa do investimento. Esta taxa torna o valor presente dos lucros futuros equivalentes aos dos gastos realizados com o projeto, caracterizando, assim, a taxa de remuneração do capital investido. n VPL = − I + ∑ t =1 n VPL = − I + ∑ t =1 FCt (1 + K )t FCt (1 + TIR )t Acima, as fórmulas de cálculo do VPL (1) e da TIR (2) onde: I é o investimento de capital na data zero, FCt o retorno na data t do fluxo de caixa; n é o prazo de análise do projeto; e, k é o custo de capital do projeto de investimento. Supõe-se que a EMBRAER assuma todos os custos de investimentos, o valor do VPL do nosso projeto será: 84 1 1 234000 (1 + TIR )1 1 VPL = −22500 + ∑ 1 1 0 = −22500 + ∑ 1 234000 (1 + 018)1 234000 (1 + TIR )1 TIR = 609% VPL = 175,805.08 TIR = 940% Os resultados acima indicam que o projeto terá lucro de $175,805.00 e uma taxa de retorno de 940% por ano. 9.4 Eliminação de riscos de o material ser danificado no manuseio interno da empresa cliente. O material não mais sofrerá riscos de ser danificado durante o manuseio da inspeção de recebimento e/ou no transporte interno da empresa cliente. 10. ANÁLISE DE RISCOS / PLANO DE CONTIGÊNCIA Propõe-se que sejam adicionadas cláusulas em contratos estabelecidos entre a empresa e fornecedor, referenciando o procedimento abaixo proposto para casos em que alguma não conformidade for detectada na inspeção amostral ou na linha de montagem antes da instalação do material. As cláusulas adicionadas devem contemplar as seguintes situações: 10.1 Não conformidade detectada na inspeção amostral de recebimento. O inspetor deverá acionar o fornecedor e emitir uma nota de não conformidade, para caso de reparo ou retrabalho. O fornecedor deverá executar o trabalho em um tempo determinado que não afete o planejamento de intalação do material no avião, tempo este, acordado em contrato entre fornecedor e empresa. Uma sugestão é que, o responsável por reportar a não conformidade no sistema, seja o próprio fornecedor. Revista UniVap, v.15, n.27, 2008 Caso em que, para a não conformidade não seja aplicável retrabalho, o material deverá ser devolvido imediatamente para a origem. O causador da não conformidade deverá ressarcir os custos gerados para a empresa cliente. Caso exista a necessidade de re-inspeção de estoque, o fornecedor deverá executar esta tarefa e informar o inspetor para que este emita o documento de não conformidade no sistema se, detectado algum problema no material/documentação. Uma vez liberado acesso para o fornecedor, este mesmo poderá emitir o documento de não conformidade no sistema. 10.2 Não conformidade detectada na linha de produção antes da instalação do material. Para casos em que for detectado alguma não coformidade em relação ao produto inspecionado, o mesmo procedimento, citado no item 10.1 deste capítulo, deverá ser seguido. O fornecedor deverá arcar com os custos e assumir a responsabilidade da rejeição do material caso este chegue com problemas na linha de produção, exceto quando houver evidência de que a causa da rejeição tenha sido originada no transporte interno da EMBRAER; so, ou conforme o contrato entre cliente/fornecedor. Uma sugestão de contenção é o fornecedor manter um estoque, dentro da empresa cliente, das principais peças que compõem o item 1. Estas peças devem ser, as que hoje, são as maiores causas de rejeição dos assentos no recebimento, ou seja, no caso do item 1, as peças devem ser os couros dos assentos e dos encostos, e revestimento dos braços das poltronas. Em alguns casos, é interessante a empresa cliente possuir mais de um fornecedor para garantia de que sua produção não irá parar por falta de material. 10.5 Retorno à inspeção de recebimento Existindo a necessidade de retorno da inspeção de Recebimento, o planejamento de materiais deverá ser refeito e o fornecedor pagará uma multa devido ao não cumprimento do proposto contrato. É importante a empresa cliente possuir um estoque controlado que permita o retorno da inspeção de recebimento, sem grandes impactos, pois o estoque da empresa será alterado com o retorno desta inspeção. O mesmo procedimento citado no item 10.1 deste capítulo, com relação a re-inspeção de estoque, deverá ser executado para este caso. Sugere-se que o próprio fornecedor execute a inspeção de recebimento como forma de penalidade por não ter cumprido o acordado em contrato, assim, o fornecedor terá que dispor de sua mão de obra para executar a inspeção de recebimento. 10.3 Quality Escape do fornecedor 11. CONCLUSÃO O fornecedor deverá ser acionado e terá que prover um plano de ação de contenção em um determinado tempo, baseado no impacto do problema, tempo este, acordado em contrato. O estudo e análise realizados, demonstram a viabilidade da simplificação do processo de recebimento dos assentos de passageiros. O processo proposto atinge um VPL e TIR de $165,605.08 e 609%, respectivamente, no ano, caso a empresa cliente assuma todos os custos do projeto. O VPL e o TIR passam a ser financeiramente mais atrativos, caso o fornecedor se responsabilize por parte dos custos de implantação do projeto, os quais são relacionados às não conformidades originadas pelo mesmo. Neste caso, o retorno estimado seria de $175.805,08 no ano. Além do item 1, situado na primeira linha da Tabela 3, a sistemática proposta pode ser aplicada para qualquer outro item, que hoje apresenta problema de não conformidade, e que possua, concomitantemente, custo elevado, e alta incidência. A re-inspeção de estoque deverá ser executada pelo próprio fornecedor e este acionará o inspetor para a emissão da não conformidade no sistema, caso algum problema seja detectado com relação ao material. Uma outra sugestão é que seja liberado acesso ao fornecedor para que ele seja o responsável por registrar a não conformidade no sistema e prover com as ações de contenção e correção. O fornecedor deverá ressarcir os custos à empresa cliente em relação a cada dia excedente que o material ficar no estoque além do tempo previsto, aguardando inspeção ou retrabalho. 10.4 Crise de abastecimento e falta de peças Em caso de crise de abastacimento ou falta de material, o fornecedor pagará multa por cada dia de atraRevista UniVap, v.15, n.27, 2008 Com a implantação deste projeto, o plano de produção do fornecedor passa a ser mais integrado ao da empresa, sendo o material fornecido diretamente para a linha de montagem. A empresa economizará mão-de-obra, espaço físico, tempo e eliminará inspeções desnecessárias, conseqüentemente, volume financeiro em estoque. O material não mais precisará submeter-se ao processo 85 de inspeção, quarentena, estoque, transporte, entre outros, diminuindo os riscos de serem danificados durante o transporte e movimentação entre o recebimento e a linha de produção. Não há restrição em regulamentos ou em contratos com relação a eliminação da inspeção de recebimento dos materiais de acabamento das aeronaves ERJ170/190. De acordo com o manual da qualidade da empresa cliente, esta inspeção pode ser delegada ao próprio fornecedor, desde que os procedimentos da empresa sejam seguidos corretamente. 12.AGRADECIMENTOS A Deus em primeiro lugar, por me capacitar e permitir que eu me tornasse engenheira com apenas 22 anos de idade. Aos meus pais, Ferreti e Bene, que sempre estiveram do mau lado, me motivando e apoiando de maneira que eu pudesse me dedicar 100% ao trabalho e aos estudos. Ao meu irmão Junior pela grande ajuda no início deste trabalho. Agradeço ao Cleber pela paciência a consideração que teve comigo durante estes anos. Ao meu orientador Wellington Rodrigues, pela atenção e tempo despendido na orientação deste trabalho. Aos meus professores MSC Jesuino Takachi, Mestre Lizia Dias e Dr. Sergio Choze, por terem me ensinado tanto sobre o mundo aeronáutico. Aos meus amigos Alex Alan, Adriano Barbieri, Claudinei Castro e Silvio Abreu, pelo companheirismo. Sem a ajuda destas pessoas, não teria conseguido concluir este curso, pois nenhum sonho é concretizado quando se luta sozinho. Muito obrigada a todos. CORREA, H. L.; CORREA, C. L. Administração de Produção e Operações: Uma Abordagem Estratégica. 2. ed. São Paulo: Atlas, 2006. GIL. A. de L. Auditoria Operacional e de Gestão: Qualidade da Auditoria. São Paulo: Atlas, 1992. HARRINGTON, H. J. Gerenciamento Total da Melhoria Contínua. São Paulo: Makron Books, 1997. ISNARD Jr., M. Gestão da Qualidade. 4. ed. São Paulo: FGV, 2003. MARINHO, B. L.; AMATO NETO, J. A Necessidade de Gerenciamento da Qualidade de Fornecedores no Ambiente Globalizado. ENEGEP, n. 17, Anais, v. 4. Gramado, outubro de 1997. PETRUS, C. R. F. J. S. Diagnóstico da Qualidade, Utilização de Ferramentas Estatísticas e Modelo de Relacionamento com Fornecedores em Uma Indústria Cerâmica. Florianópolis: UFSC, 1996. Dissertação (Mestrado em Engenharia de Produção). Programa de Pós-Graduação em Engenharia de Produção, Universidade Federal de Santa Catarina, 1996. SHINGO, S. O Sistema Toyota de Produção do Ponto de Vista da Engenharia de Produção. Porto Alegre: Artes Médicas, 1996. SLACK, N. et al. Administração da Produção. Edição compacta. 2. ed. São Paulo: Atlas, 1996. ALMEIDA, L. G. Gerência de Processos. Rio de Janeiro: Qualitymark, 1993. TUBINO, D. F. O Relacionamento Fornecedor-Cliente na Filosofia Just-In-Time segundo a Ótica do Cliente. Florianópolis: UFSC, 1994. Tese (Doutorado em Engenharia de Produção). Programa de Pós-Graduação em Engenharia de Produção, Universidade Federal de Santa Catarina, 1994. BAND, W. A. Competências Críticas - Dez Novas Idéias para Revolucionar a Empresa. Rio de Janeiro: Campus, 1997. TUBINO, D. 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Belo Horizonte: Sografe, 2004. 86 Revista UniVap, v.15, n.27, 2008 O Perfil e o Foco no Cliente: são fundamentais para as academias desenvolverem um relacionamento positivo com seu cliente Ive Luciana Ramos * Luis Fernando Zulietti ** Rogério dos Santos Morais *** Resumo: O objetivo deste trabalho é mostrar que, em ambientes competitivos, o atendimento ao cliente é o mais importante instrumento de diferenciação da empresa, e que atualmente a concorrência entre as empresas está tão acirrada que quem ganha com isso são os clientes. A empresa tem que estar ciente e comprometida com a visão da excelência em atendimento. A luta dos prestadores de serviço é deixar o cliente encantado, fazer com que o cliente tenha suas expectativas superadas, que ele sinta uma vontade quase que incontrolada de utilizar o serviço. Entendendo isso, toda empresa deve primar por transformar em prática diária e regular todos os valores da instituição que garantam com que o cliente se sinta numa posição especial, diferenciada e, se possível, única. O objetivo é sempre exceder as expectativas dos clientes. Ao agir assim, a empresa tratará de cada um deles como se fosse o mais importante, e cuidará de cada aspecto do atendimento como se fosse o mais importante, e que, para conquistar o cliente, será necessário conhecer as suas necessidades, identificar quais produtos e serviços que agradam o cliente e oferecer um atendimento fantástico. Conseqüentemente tornar o cliente fiel é a chave para a lucratividade e o crescimento da empresa. Não basta mais atrair o cliente, mantê-los se tornou mais importante. Palavras-chave: Atendimento, cliente, necessidade. Abstract: The objective of this work is to show that the attendance to the customer is the most important instrument of differentiation of the company and that currently the competition among the companies is so strong that the customers take good advantages by having more options. The company must be conscious and engaged in the vision of having an excellent attendance. The fight of the service rendering is to let the customer fascinated, to make him having his expectations topped, and that he feels an uncontrollable will to use the service. By understanding this, all companies must top for transforming into daily and regular practice all the values of the institution that guarantee the customer feels in a special, differentiated and, if possible, unique position. The objective is always to exceed the expectations of the customers. Behaving this way, the company will deal with each one of them as if he is the most important person, and it will care about each aspect of the attendance as if it is the most important one. In order to attract the customer it will be necessary to know his needs, to identify which products and services satisfy the customer and to offer a fantastic attendance. To make the customer regular and loyal is the key for the profitability and the growth of the company. To attract the customer is not enough anymore, to keep him became more important. Key words: Attendance, customer, necessity. 1. INTRODUÇÃO O presente estudo tem como objetivo promover e apresentar conceitos, fundamentos, idéias, sugestões e reflexões sobre o atendimento e como fidelizar o cliente. Fidelizar o cliente é a palavra chave para a lucratividade e o crescimento da empresa. O novo desafio é criar clientes fiéis. * Professora da UNIVAP. ** Professor da Fac. Anhanguera, IBTA e UNIP. *** Professor da Fac. Anhanguera. Fidelização ao cliente mostra alguns passos simples para usar, desenvolver e melhorar uma empresa. O grande desafio é saber se a empresa está totalmente com- Revista UniVap, v.15, n.27, 2008 87 prometida em proporcionar um excelente atendimento e se o cliente é o principal centro de atração da empresa. facilidade de estacionamento, podem ser fatores fundamentais para a escolha de uma determinada academia. Todos os funcionários devem estar cientes e comprometidos com a visão de excelência no atendimento ao cliente. Realmente, os serviços devem ser desenvolvidos com foco no cliente. Dessa forma, é preciso preocupar-se com os serviços que o seu negócio oferece atualmente e verificar se atendem as demandas dos clientes. Daí a importância de uma oferta segmentada. Oferecer soluções específicas é uma forma de segmentar a sua oferta. Todavia, nunca se deve esquecer de avaliar o custo da customização. É bom lembrar-se de que tudo pode ser copiado; é preciso antecipar-se. (ARAÚJO, 2005) A seguir, vamos refletir sobre a qualidade do atendimento proporcionada ao cliente, como desenvolvê-lo e aperfeiçoá-lo. O objetivo dos prestadores de serviço é deixar o cliente encantado. Fazer com que ele tenha suas expectativas superadas; que o cliente seja até surpreendido. Entendendo isso, toda empresa deve primar por transformar em prática diária e regular todos os valores da instituição que garantam ao cliente uma posição especial, diferenciada, e se possível única. Finalmente, lembrar-se de que qualquer tipo de comunicação com o cliente representa uma oportunidade extremamente valiosa para desenvolver um relacionamento positivo com o mesmo. 2. FIDELIZAÇÃO DO CLIENTE O que significa cativar um cliente? Significa criar laços. Atualmente, a concorrência entre as empresas está acirrada. Isso é conseqüência da internacionalização da economia. E quem ganha com essa competição são os clientes, com mais opções. Eles ganharam poder para exigir o que querem. E dentre os serviços prestados ao cliente, o atendimento destaca-se como um forte instrumento de diferenciação. O bom atendimento começa pelo conhecimento profundo de seus clientes. Fidelizar o cliente, é a chave para a lucratividade e o crescimento da empresa. Atrair o cliente não é o bastante e mantê-los se tornou mais importante (ALMEIDA, 2002). O novo desafio é criar clientes fiéis. E a estratégia eficaz para isso é um “Fantástico Atendimento”. 2.1 A importância da segmentação dos clientes e da oferta Os clientes não são todos iguais. Em todo segmento de mercado e em especial em academias é possível observar grupos de clientes que têm comportamentos distintos. Em função destas diferenças, as exigências serão específicas. Estar atento ao perfil dos clientes é fundamental para o sucesso do negócio. Para um cliente de academia que possui tempo restrito e precisa otimizá-lo com outras atividades profissionais, família e lazer, as instalações do banheiro e a 88 O mercado das academias tem sofrido mudanças constantes nas últimas décadas. Os clientes têm-se tornado mais exigentes e criteriosos, portanto o profundo conhecimento de suas necessidades é fundamental para promover sua satisfação. O paradigma de cada produto e serviço é que ele atenda perfeitamente as necessidades individuais. Precisa-se saber quais são as necessidades, os sonhos e o estilo de vida de sua clientela, ou seja, se seu cliente é solteiro, casado, pai com filho, raça, rendimento, formação educacional etc. Só assim é que se pode satisfazer e atender-lhes os sonhos. Como os clientes não são todos iguais, o ideal seria que para cada um fosse oferecido um serviço específico, no entanto esta atitude incide em custos e o empresário deve avaliar qual a gama de serviços deve oferecer para o seu publico alvo, preservando a rentabilidade do negócio (ARAÚJO, 2005). Quanto maior a customização dos serviços (maior variedade de aulas, diferentes opções de aparelhos para mesmos grupamentos musculares, maior variedade e oferta de serviços associados com estacionamento, orientação nutricional) maior poderá ser o impacto nos custos do negócio e a questão passa a ser o quanto o seu cliente está disposto a pagar. 2.2 Conceitos Para Kolter (1996) “as pessoas são diferentes. Quanto mais customizada a oferta em função do perfil do cliente, maiores as chances de fidelizar”: · Um cliente fiel é dinheiro no bolso. · Um cliente fiel está menos propenso a evadir-se. · Um cliente fiel pode se tornar mais rentável ao longo do tempo. Revista UniVap, v.15, n.27, 2008 Qual a diferença de segmentar o mercado e os clientes? A segmentação de clientes está focada nos que já estão em sua academia, ou seja, conhecer para melhor atender. Já a segmentação de mercado está focada em conhecer o mercado para tomada de decisão de novos investimentos. Ao abrir uma nova academia, o empresário deve realizar uma segmentação do mercado, visando definir qual segmento pode ser mais rentável, qual destes segmentos é compatível com sua capacidade de investimento, quais serviços devem ser oferecidos para melhor atender aquele mercado. O investimento em uma nova academia deveria ser precedido de uma análise sistemática do mercado. A primeira etapa consiste na segmentação do mercado, o ato de identificar e agrupar compradores distintos que podem exigir serviços e/ou compostos de marketing separados. A segunda etapa consiste na escolha do mercado-alvo, selecionando-se um ou mais segmentos de mercado. A terceira etapa é o posicionamento de mercado, ou seja, estabelecer e comunicar ao mercado os principais benefícios dos serviços que serão oferecidos. consiste em dividir o mercado em grupos baseados em variáveis demográficas como idade, sexo, ciclo da vida (solteiro, casado, pai com filho, etc) raça, rendimento, formação educacional. Isto é visto pelo fato de que os desejos das pessoas variam com a idade e o sexo. · Psicográficas – Na segmentação psicográfica, os clientes são divididos tomando-se como base a classe social, estilo de vida e/ou personalidade. · Comportamental – Já na segmentação comportamental, os clientes são divididos, tomando-se como base seu conhecimento, atitude, e uso ou resposta para um determinado serviço. Muitas empresas do setor de serviço já começaram a adotar fortemente este último tipo de segmentação por acreditar que é o melhor ponto de partida para definição de segmentos de mercado. Segundo Araújo (2005) “um exemplo são as redes de hotéis que levam muito em consideração a questão da ocasião de uso de um serviço de hotel, segmentando o mercado em turismo de negócios e de lazer, ocasiões que certamente exigem serviços distintos”. Cada vez mais as empresas do setor de Fitness, saúde e lazer se dedicam a uma abordagem de mercado utilizando estas três etapas. Elas ajudam a identificar melhor as oportunidades e desenvolver a oferta mais adequada para cada mercado alvo. Podem ajustar seus preços promoções de acordo com o mercado alvo (ARAÚJO, 2005). Da mesma forma pode-se avaliar os clientes de uma academia. Existem clientes que podem estar utilizando os serviços visando uma recuperação devido a algum problema físico (tendinites, fortalecimento muscular, etc.) e outros que usam o serviço visando redução de stress ou apenas benefícios estéticos. Segundo Araújo (2005), recentemente a Cia. Athletica lançou sua segunda bandeira, a Cia. Express. Serão academias menores e mais baratas. A rede de academias que por 19 anos colocou seu logotipo em galpões de 5 mil m², voltados à classe média alta, cria agora sua segunda bandeira, batizada de Cia. Express. Serão academias menores (1,5 mil m²) e mensalidades reduzidas (R$100,00). Foi essa a fórmula encontrada pela empresa para sobreviver no mercado de fitness no Brasil. Ao segmentar um mercado buscando determinar qual o melhor investimento, realizar a primeira etapa é definir quais variáveis serão utilizadas. Conforme Kolter (1996) “estas variáveis serão utilizadas para orientar as pesquisas de mercado. Tradicionalmente quatro grupos de variáveis são utilizadas”: Para Armiliato (2006) a “avaliação de atratividade de mercado deve levar em conta três fatores”: 1.Tamanho e crescimento do segmento. 2.Atratividade estrutural do segmento. 3.Objetivos e recursos da empresa (academia). Uma vez definidas quais são as variáveis que serão investigadas, o próximo passo é o levantamento dos dados de mercado. Diversas são as formas de levantamento de dados, desde pesquisas de mercado até levantamento de dados secundários. Ao avaliar a atratividade de cada segmento de · Geográficas – A segmentação geográfica pro- mercado as empresas devem considerar três fatores: põe dividir o mercado em unidades geográficas diferentes; estados, cidades, bairros. A empresa, uma nova academia, pode decidir operar em uma ou algumas áreas geográficas ou operar em todas, mas prestando atenção às diferenças locais. · Demográficas – A segmentação demográfica Revista UniVap, v.15, n.27, 2008 · Tamanho e crescimento, · Atratividade estrutural do segmento e · Objetivos e recursos da empresa. 89 Estes conceitos não se aplicam apenas a grandes empresas. Eles estão próximos da realidade de todas as academias, de seus proprietários, gerentes e coordenadores. · Econômica 22%. Ao selecionar onde montar uma academia ou expandir criando novas unidades é importante avaliar o tamanho do mercado e taxa de crescimento. Analisando dados disponibilizados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) é possível encontrar dados sobre renda, idade, sexo dentre outras informações. Todas as cidades possuem bairros já consolidados onde a possibilidade de crescimento é menor, e também possuem novos condomínios e bairros cujo potencial de crescimento pode ser maior. · Situacional 29%. · Pessoal 24%. · Relacionada à academia 25%. As razões mais freqüentemente mencionadas para não renovar a matrícula são: · Não ter um companheiro para treinar. · Seu professor preferido saiu da academia. 3. MEDIÇÃO DE SATISFAÇÃO DOS CLIENTES Pesquisas indicam que grande parte das academias sofrem do problema da evasão; é comum profissionais do setor afirmarem que os clientes é que desistem. Mas por que desistem? A culpa é dos profissionais do setor ou este é um problema sem solução? A dificuldade enfrentada pela gerência de uma academia é que, mesmo que a maioria enuncie uma razão “principal” de evasão, é bem provável que a decisão de sair também tenha sido influenciada por vários fatores. Para muitos consumidores o processo de inscrever-se em uma academia é complicado e às vezes emotivo. Como resultado, reter uma base de clientes cada vez mais diversificada, baseada em muitos sócios diferentes, é uma tarefa impossível para uma única estratégia de ação. Conforme Araújo (2005), se a academia quiser aumentar sua capacidade de reter clientes e recuperar alguns outros, deve implementar várias estratégias, tratando de elementos como: capacitação de funcionários, vendas e propaganda, manutenção das instalações e desenvolver uma identidade para a academia. A razão principal para o cliente sair de uma academia não está relacionada à academia. A grande maioria não sai porque a academia tenha, de alguma forma, falhado no atendimento, mas sim por outras razões. Infelizmente, isto parece sugerir que a maioria dos que saem o faz por questões como falta de tempo e motivação pessoal, fatores que parecem ser menos propensos a uma intervenção da academia. No entanto, isso não é necessariamente verdade. Não é surpresa que preocupações com o tempo e dinheiro se encontrem entre as três razões mais comumente citadas para alguém sair de uma academia. Segundo Araújo (2005), “as razões pelas quais as pessoas saem das academias são”: 90 · Mudança para exercício em casa. · Perda de interesse/motivação. · Não se identificou com a academia. Dentre as razões relacionadas à academia como motivo de saída, das respostas relativas a fatores de controle imediato da academia, as instalações lotadas aparecem em primeiro lugar. No entanto, três das cinco razões mais comumente citadas dentro das relacionadas com a academia, envolvem algum descontentamento com os funcionários e/ou a direção. Por si só, a percepção de lotação é suficientemente importante para sugerir que os operadores deveriam formular estratégias para propiciar uma utilização mais equilibrada das instalações e uma movimentação melhorada na academia. O impacto combinado de temas relacionados com os funcionários e sua interação com os sócios representam um problema maior. No entanto, ao mesmo tempo isto oferece uma grande oportunidade às academias para reterem seus clientes. Para Araújo (2005), “existem cinco razões principais relacionadas à academia com motivo de saída”: · Academia lotada 27%. · Descontentamento com funcionários 13%. · Falta de atenção personalizada 13%. · Descontentamento com programas/ atividades 8%. · Gerência inacessível/pouco receptiva 6%. Revista UniVap, v.15, n.27, 2008 3.1 O que é satisfação do cliente Segundo Araújo (2005), “satisfação consiste na sensação de prazer ou desapontamento, resultante da comparação do desempenho (ou resultado) percebido de um produto em relação às expectativas do comprador/ cliente”. O Modelo de Gap originou-se de estudos realizados por Zeithaml, Parssuraman e Berry (1990), e se propunha a encontrar respostas às seguintes dúvidas: · Como exatamente os consumidores avaliam a qualidade de um serviço? · Os serviços são avaliados pelos consumidores de uma forma global ou parcial? · Quais as múltiplas facetas das dimensões de um serviço? Os pontos comuns observados nas entrevistas determinaram que a chave da qualidade de um serviço é atender ou exceder a expectativa do cliente; em decorrência disso, a qualidade de um serviço pode ser definida como o grau da discrepância entre as expectativas ou desejos dos clientes e suas percepções. A discrepância entre as expectativas dos consumidores e suas percepções da qualidade de serviço foi considerada pelos autores como a maior causa dessas deficiências, e é o resultado de outras discrepâncias que se inter-relacionam e formam o Modelo Conceitual da Qualidade de Serviço ou Modelo de Análise do Gaps da Qualidade. Esse modelo é composto por cinco Gaps, descritos a seguir: os Gaps 1, 2, 3 e 4 representam as causas relacionadas ao prestador do serviço e o Gap 5 representa o cliente. Ou seja: ço esperado e o serviço recebido. Para gerar satisfação do cliente é preciso ir além da oferta básica. Um grande erro é achar que se proporciona um excelente serviço quando na verdade está apenas atendendo às expectativas básicas dos clientes. Como seres humanos, procuramos manter nossas relações com as pessoas em equilíbrio, se alguém me convidar para jantar, então eu vou me sentir na obrigação de retribuir a gentileza, se eu não fizer isso, não haverá equilíbrio e eu vou me sentir em dívida. (ARAÚJO, 2005) A Teoria da Equiparação (Teoria da equiparação = Equilíbrio) é base do que acontece na academia. Quando uma pessoa se matricula, ela acha que já fez um favor ao “escolher a academia” (afinal tinha outras opções). A meta de um bom “serviço ao cliente” é criar constantemente balanços positivos” para o cliente (ele se sentir “devedor”). A maioria das pessoas sai não por “preço” ou “tempo”, mas simplesmente porque eles não receberam valor pelo investimento que fizeram. Isso só é possível quando “excedemos” as “expectativas básicas” dos clientes. (ARAÚJO, 2005) Para tal é importante que seja identificado claramente o que o cliente deseja e projetar seus serviços, treinar seus funcionários e prestar o serviço de forma adequada. O que vimos até o momento foi como medir a satisfação o que não garante o sucesso da academia, o mais importante é que os serviços sejam adequados para o cliente. (ARAÚJO, 2005) Para garantir que a qualidade do serviço prestado · Gap 1 – representado pela discrepância entre as esteja de acordo com os padrões estabelecidos com base expectativas do cliente e as percepções da gerência sobre as expectativas desses clientes. · Gap 2 – representa a discrepância entre as percepções que os gerentes têm das expectativas dos clientes e as especificações da qualidade do serviço. · Gap 3 – representa a discrepância entre as especificações da qualidade de serviço e a prestação do serviço. · Gap 4 – representa a discrepância entre o serviço prestado e a comunicação externa com os clientes. · Gap 5 – representa a discrepância entre o serviRevista UniVap, v.15, n.27, 2008 nas exigências do cliente, é preciso que a prestação do serviço seja acompanhada periodicamente. Neste sentido, um conjunto de itens de controle pode ser definido e acompanhado, para garantir que o cliente não ficará insatisfeito e para verificar se os profissionais da academia (professores, recepcionistas, serviços gerais) estão cumprindo os padrões estabelecidos. Em uma academia diferentes setores estão envolvidos na prestação do serviço, desde o atendimento na recepção, passando pela manutenção e limpeza da academia e seus equipamentos e instalações físicas, até a orientação e acompanhamento dos clientes em aulas coletivas, individuais, no salão de musculação ou outras dependências. Para cada setor pode ser estabelecido um conjunto de itens que pode ser monitorado, sem necessariamente perguntar ao cliente. Na avaliação de itens de controle o coordenador, supervisor ou proprietário podem concluir se os servi91 ços estão sendo prestados segundo o padrão estabelecido. 3.2 Por que o atendimento ao cliente é importante? · Economia de custos operacionais (visto que muitos custos estão relacionados ao cliente e não ao nível de vendas). A resposta a esta pergunta talvez seja óbvia. Segundo Araújo, apud Peters e Austin (2005), em A passion for excellence, citam Edson P. Williams, vice-presidente da Ford Motor Company: · Ganhos vindos de clientes adicionais que se- “Devo dizer que (antes dos acontecimentos dos últimos árduos quatro anos) nossa cultura na Ford Motor Company mostrava que havia um objetivo em nosso negócio: obter o retorno do nosso investimento. Acho que agora aprendemos que há outro fator essencial – e os lucros virão se você encarar como fundamental: atender ao cliente. Os custos e a qualidade devem estar adequadamente realizados – obviamente tudo isso tem que ser feito – mas devemos pensar sempre no cliente como o centro de nossas atividades”. pessoas pagarão por um serviço ou produto em que confiam. Ambos os administradores concentram-se em um ponto em comum – o de melhorar ou obter maiores lucros -, mas levantam duas questões importantes, e talvez diferentes, sobre o atendimento ao cliente. Spedan Lewis ressaltou a necessidade de diferenciar-se dos concorrentes, e Edson Williams, a importância de colocar os clientes no centro de tudo o que se faz. Muitos argumentariam que um bom atendimento ao cliente é essencial somente à sobrevivência, e que é a excelência nesse aspecto que irá diferenciá-lo dos concorrentes. Algumas empresas falam sobre o atendimento ao cliente como sendo o núcleo de uma rocha, permeando todas as partes e atividades da empresa. O atendimento ao cliente não se resume a um conjunto de tarefas ou a uma lista do que se pode ou não fazer: é um modo de ser (FRANCES; ROLAND BEE, 2000). guiram indicação de um cliente satisfeito. · E ganhos originados do preço adicional que as Um ponto importante a se ressaltar é que, ao perder um cliente, geralmente não se perde somente uma venda, mas potencialmente uma vida inteira de vendas. Considerando-se que pode ser muito dispendioso conquistar um cliente por meio de propaganda e outros custos do marketing, possivelmente represente uma surpresa o fato de algumas empresas tratar com tanta negligência os clientes antigos que já são fieis, pois estes clientes geram lucro a empresa. Dados o volume de retórica e as provas concretas sobre a importância de se manter e conquistar novos clientes, seria surpreendente se a maioria das empresas não concordasse com o princípio de que o atendimento ao cliente é imprescindível. Entretanto, o que distingue os empreendimentos bem-sucedidos é o modo pelo qual eles transformam esse princípio em realidade (FRANCES; ROLAND BEE, 2000). Existem motivos para se acreditar na importância do atendimento ao cliente, podendo até ser pessoal, mas deve-se estar atento: · Clientes satisfeitos provocam menos estresse. São poucos os que, tendo que lidar com um cliente insatisfeito, não conhecem as pressões que tais situações causam. Existem algumas provas concretas: a revolução apresentada pela qualidade começou no setor de produção em que nasceu o conceito de “defeitos zero” – a aspiração de se ter sempre produtos perfeitos. A idéia foi estendida aos clientes – com “deserções zero”, isto é, não perder um único cliente. Pesquisas mostraram os elevados custos de se perder um cliente ou o provável fluxo de perda de lucros quando um cliente “deserta”. Segundo Frances e Roland Bee (2000) “as evidências indicam que os lucros auferidos com um único cliente aumentam significativamente com o correr do tempo. Esses lucros originam-se de”: · Clientes satisfeitos tomam menos o nosso tem- · Aumento das compras realizadas pelo cliente requeiram um atendimento atencioso, prestativo e eficiente. ao longo do tempo. 92 po. Lidar com queixas e problemas pode consumir muito tempo e eles sempre surgem quando se está mais ocupado. · Clientes satisfeitos falam de sua satisfação a outras pessoas, o que amplia sua boa reputação. · Clientes satisfeitos trazem satisfação ao trabalho e podem ajudar a motivar a empresa. · Clientes são seres humanos – é natural que eles Revista UniVap, v.15, n.27, 2008 Finalmente, existe a velha, mas ainda oportuna máxima: sua empresa são seus clientes. Não há opção: eles são importantes. 3.3 A excelência no atendimento ao cliente Para Frances e Roland Bee (2000) “a excelência em atendimento ao cliente depende de quatro princípios fundamentais”, que são: 1.a empresa está totalmente comprometida em proporcionar um excelente atendimento e o cliente é o principal centro de atenção em toda a empresa; 2.todos os funcionários estão cientes e comprometidos com a visão de excelência no atendimento ao cliente; 3.todos os funcionários são treinados para proporcionar o mais elevado nível de atendimento ao cliente; e 4.sistemas e procedimentos são desenhados para dar impulso ao atendimento ao cliente. Para Frances e Roland Bee (2000), “a visão de futuro de várias empresas aparece muitas vezes na forma de declarações de princípios ou de intenções apoiadas pelo que chamamos de valores essenciais”. Essas declarações são planejadas para expor aos clientes, funcionários, fornecedores, etc. o objetivo que a empresa deseja alcançar e o modo como deseja alcançá-lo. Por exemplo, a Eastern Electricity expõe sua visão dessa forma: “O Eastern Group irá oferecer um atendimento de qualidade nos setores de gerenciamento de redes e energia que a transformará na escolhida pelos clientes” (Idem). Tal afirmativa é sustentada por alguns valores fundamentais dos quais um deles é: · Acreditar em atender a nossos clientes Como parte do processo de qualidade, a Eastern Group continua a desenvolver uma parceria com os clientes e antecipando e atendendo às necessidades de mudança sentidas por seus clientes de modo que seja seu fornecedor escolhido. Revista UniVap, v.15, n.27, 2008 Antecipar e prever as necessidades dos clientes são mecanismos pelos quais as empresas assumem compromissos públicos com a qualidade do atendimento que querem oferecer. Esse é um primeiro passo vital no caminho da excelência no atendimento ao cliente. No entanto, para que as declarações de princípios e de intenções se transformem em linha mestra, ainda há três importantes passos a serem dados: 1.Todos na empresa precisam estar cientes e comprometidos em relação a esses princípios e intenções. 2.Os princípios e as intenções precisam ser transformados em ação. 3.Os princípios e as intenções devem ser transformados em metas mensuráveis visando ao desempenho do atendimento ao cliente para que a empresa possa monitorar e revisar suas realizações. Segundo Frances e Roland Bee (2000), para realizar a etapa 1, as empresas podem transmitir para os funcionários uma mensagem consistente, por meio de apresentações, palestras, reuniões, etc, usando vídeos, boletins, etc. Para chegar à etapa 2, as empresas podem realizar uma pesquisa a fim de descobrir quais são as necessidades do cliente e o que eles pensam sobre o atendimento que recebem; realizar programas de treinamento para os funcionários sobre atendimento ao cliente; realizar programas de treinamento para assegurar que os funcionários sejam competentes em suas funções e rever processos e procedimentos a fim de assegurar que sejam direcionados para o cliente. Na etapa 3, as empresas podem definir metas de desempenho claras para equipes e indivíduos de modo que todos saibam que padrão de desempenho é visado e monitorar e agir quanto aos resultados. Os fatores que costumam aparecer com constância da excelência no atendimento ao cliente são descritos na Tabela 1 a seguir: 93 Tabela 1 - Fatores que contribuem para o bom e para o péssimo atendimento ao cliente Conforme Frances e Roland Bee (2000), o que também surpreende é a duração dessas reações. E disto, o que aprendemos é que o bom/mau atendimento ao cliente pode gerar emoções intensas e resultar em alguns benefícios notáveis ou conseqüências desastrosas. Então não existe somente a oportunidade de manter ou perder o cliente em questão, mas também a de ganhar ou perder muitos outros. Alguém que teve uma péssima experiência como cliente irá contá-la para pelos menos à dez outras pessoas. As estratégias adotadas pelas pessoas em resposta ao péssimo atendimento são diferentes das pessoas que são bem atendidas, pode-se argumentar que, como cliente interno, é um cliente cativo e não pode procurar outro lugar. As pessoas, contudo, muitas vezes tentarão fazer algo equivalente – isto é, encontrarão formas de contornar o colega difícil ou não prestativo, procurando outro integrante da equipe; ficando sem o serviço; tirando, por exemplo, ele mesmo suas cópias no xerox, ou ficando sem uma determinada informação. O efeito final é prejudicial ao funcionamento eficiente e eficaz da empresa, e quem sofre, no final, é o cliente. A reação de contar a todos o que aconteceu é exatamente a mesma – é muito fácil conseguir a reputação de não ser prestativo, de nunca cumprir prazos, de não se saber o que está fazendo. Da mesma forma – mas talvez não com tanta facilidade – pode-se atingir a meta de ser considerado um membro valioso e competente da equipe, alguém com quem é um prazer lidar. 3.4 Quem são seus clientes? Fonte: Frances; Roland Bee, 2000. E as reações das pessoas em relação a essas experiências são muito parecidas, como mostra a Tabela 2: Tabela 2 - Reações ao excelente e ao péssimo atendimento ao cliente Fonte: Frances; Roland Bee, 2000. Quando começa o que agora considera ser a arriscada jornada para oferecer excelência em atendimento ao cliente, com os campos floridos e o brilho da estrela do sucesso de um lado e a terra devastada e o céu cinzento do fracasso de outro, a primeira e óbvia pergunta a fazer é: quem são seus clientes? É muito difícil oferecer um bom atendimento aos clientes a menos que se saiba exatamente quem eles são. Em alguns casos, a resposta pode parecer muito simples. Se é um professor de uma academia, seus principais clientes são, evidentemente, as pessoas a quem se ministram as aulas. Entretanto, o que dizer dos alunos que entram e saem ou os que ligam para pedir informação e reclamação? O que dizer de seus clientes internos – seus colegas de trabalho (ARAÚJO, 2005). O segredo para identificar os clientes está em pensar em um dia ou uma semana comum e anotar com quem entra em contato – diretamente, ao telefone ou por escrito. Em seguida, pensar no objetivo de tal interação – eles são clientes para serviços ou produtos? Na teoria da qualidade de serviços dois fatores são fundamentais: 94 Revista UniVap, v.15, n.27, 2008 · O conceito do momento da verdade: é todo o momento em que o cliente entra em contato com uma empresa e dela obtém uma impressão; · O conceito do ciclo de serviços: é a reunião seqüenciada de todos os momentos da verdade. Conforme Godri (1998), toda vez que o cliente entra em contato com a empresa, ele redesenha um novo ciclo de serviços. Existem três tipos de momento da verdade: 1. Momento encantador (mágico): É aquele momento em que o cliente recebe um serviço excepcional. Sempre quando ele procura serviços de qualidade, ele lembra da sua empresa. Inclusive está disposto a pagar um pouco mais para ter aquele serviço diferenciado que você oferece. 2. Momento desencantador (desastrado): O cliente também lembra de quem o atendeu. Só que com efeito absolutamente contrário. Ele lembra com ódio e raiva. É quando ele só teve momentos desagradáveis com a empresa e a conseqüência é grave: ele irá falar da empresa de forma negativa. 3. Momento normal: É quando o cliente foi atendido, não se criou nenhum problema: fez-se exatamente o que estava programado. Mas perde-se a oportunidade de fazer o mikromarketing (É o marketing feito no momento da verdade, aquele momento ímpar, que se tem de mostrar ao cliente que a empresa é a melhor opção para ele). 3.4.1 Tipos de clientes Segundo Godri (1998), “os momentos da verdade desencantadores e os apelidos mais comuns de clientes são”: 1. Cliente Pateta: Quando o cliente liga para uma empresa a fim de que ela resolva um problema e um atendente passa para outro, que passa para outro, que passa para outro, e ninguém resolve nada. Cuidado! O cliente se cansa desta situação e migra para os braços da concorrência. Uma empresa tem de ter uma estrutura de atendimento eficaz, com no máximo dois momentos até a resolução de um problema do cliente. Revista UniVap, v.15, n.27, 2008 2. Cliente Chato: O cliente chato, que reclama, é o consultor do seu negócio. Temos de tomar consciência que o cliente é a razão de ser de uma empresa. Temos de dar graças a Deus quando o cliente reclama, assim temos uma chance de melhorar. Pesquisas demonstram que a maioria dos clientes que são mal atendidos não retornam e possivelmente vão ao seu concorrente. 3. Cliente Otário: Este está em extinção! Atualmente, a maior preocupação não é mais com a conquista de novos clientes e sim com a sua manutenção. Dentro deste novo cenário, é fundamental cultivar o relacionamento com o cliente, com o máximo de ética e princípios. Cultivar a prática do cliente otário é a liquidação do seu negócio. 4. Cliente Desocupado: Isto se refere a uma empresa que não consegue resolver o problema de um cliente na hora e pede para que ele retorne amanhã. Atualmente, uma empresa tem de ser ágil e eficaz senão ela estará fora do mercado (GODRI, 1998). 3.5 Que produtos e serviços oferece? Depois de identificar seus clientes, a próxima etapa é pensar sobre seus produtos e serviços. Por exemplo, se trabalha no varejo, em uma loja, seus principais clientes provavelmente são integrantes do público; os serviços que oferece pessoalmente são fornecimento de informações, anotação de pedidos, recebimento de pagamento e o empacotamento de mercadorias. Alguns de seus clientes internos podem ser: o departamento de contabilidade, para o qual oferece o serviço de somar os valores contidos na caixa registradora; os escriturários, para quem se preenchem formulários de pedidos especiais; e os fiscais da loja, a quem se avisa sobre ocorrências suspeitas. Além disso, que serviços são prestados aos colegas de loja? Ficar atento para ajudar quando estão ocupados ou assegurar-se de voltar de seu intervalo a tempo de a outra pessoa fazer sua pausa na hora certa, podem ser alguns desses serviços. Como um instrutor, talvez esteja prestando o serviço de ensinar uma habilidade ou um conhecimento específico aos trainees e fazendo contato com os clientes de treinamento para certificar-se de que o tipo correto de ensinamento está sendo ministrado (FRANCES; ROLAND BEE, 2000). 3.5.1 Você oferece bom atendimento ao cliente? Depois de identificar seus clientes e a natureza do serviço ou produto que oferece, a questão final e crucial 95 é saber até que ponto ele é bom – que tipo de qualidade de atendimento ao cliente você está oferecendo no momento? Segundo Godri (1998), “normalmente há quatro elementos essenciais envolvidos no atendimento de qualidade ao cliente”: · ADEQUAÇÃO: seu serviço/produto é o que o cliente realmente quer – ele atende às necessidades dele? · CONSISTÊNCIA/CONFIABILIDADE: seu serviço/produto corresponde sempre a um mesmo padrão? · OPORTUNIDADE: o atendimento é oferecido quando o cliente precisa e durante um período de tempo razoável? · SATISFAÇÃO: o atendimento é oferecido de modo a representar uma experiência agradável para o cliente, ou seja, é simpático e prestativo, mostra interesse e/ou preocupação? O atendimento ao cliente pode ser resumido na seguinte equação: · Fazer um estudo detalhado de segmentação, afinal, é preciso conhecer muito bem a que tipo de cliente se atende. · Conhecer os detalhes do cliente, mediante o conhecimento exato da necessidade dele, asseguradamente, garantindo uma vantagem competitiva. · O cliente deve ser ouvido se possível 24h por dia. · Canais de atendimento devem ser abertos. · Ouvir sempre quem quer reclamar. · Sugestões devem ser aceitas e os procedimentos devem ser melhorados. · Expectativas do cliente devem ser atendidas. · A satisfação do cliente deve ser monitorada. · As opiniões devem ser sistematizadas mediante os índices monitorados mensalmente. Através da análise desta equação, nós podemos identificar três situações típicas: · Barreiras que impeçam o cliente de ir até a sua P < E = Desencantado P = E = Normal P > E = Encantado · Qualquer processo de entrave burocrático deve Maximizar o valor desta fórmula deve ser uma meta, um objetivo não só da empresa, mas de todos que fazem parte dela. E se aplicar a fórmula do bom atendimento, certamente o resultado será sempre o encantamento (GODRI, 1998). O foco no cliente é a principal estratégia competitiva da atualidade. A primeira iniciativa a ser tomada para se tornar uma empresa voltada para o cliente é conscientizar todos os funcionários a resgatarem a idéia de que: o cliente é a razão de ser de qualquer negócio. Para Godri (1998), as ações indispensáveis para ser uma empresa voltada para o cliente são: empresa devem ser eliminadas. ser eliminado. · Conveniências para o seu cliente devem ser criadas. · Atue como se o cliente fosse seu sócio. · O cliente deve ser pensado como seu parceiro. · O sucesso do cliente é o objetivo da empresa. · Não parar nunca! A volta à empresa para o cliente é um processo eterno do qual participam todos. Encantar o cliente é não desencantá-lo. É · Certificar-se que a empresa é totalmente volta- surpreendê-lo com um fantástico atendimento. da para o cliente. · Identificar o cliente. 96 Primeiro o cliente deve ser satisfeito das necessidades básicas, no trivial; depois extrapole, encante-o. Revista UniVap, v.15, n.27, 2008 Precisa fazer o que ninguém faz. lente impressão. 3.6 Comunicando-se com os clientes · Saudação: Enfática. Há uma habilidade que permeia todos os aspectos da vida profissional: a de se comunicar eficazmente. Ela é a essência do atendimento ao cliente e é fundamental para desenvolver relacionamentos profissionais positivos com eles. Segundo Frances e Roland Bee (2000), “podemos nos comunicar com os clientes de três formas diferentes”: · Tom da voz. · Diretamente – na loja, no escritório ou na fábrica, ou quando em visita a suas casas ou escritórios. · Ao telefone – respondendo às chamadas ou ligando para eles. · E por escrito – por carta, memorando, relatório, circular; etc. A recepção ao cliente é fundamental para que ele obtenha uma impressão sobre o seu trabalho: cumprimente, sorria, olhe nos olhos e escute. A apresentação deve ser impecável. Tenha postura, bom humor, empatia, gentileza, disposição, rapidez, tranqüilidade, precisão, compromisso, mantenha uma comunicação correta. Pergunte ao cliente, utilize esse eficaz instrumento para conhecê-lo e se informar sobre suas necessidades. Assim o cliente percebe que realmente nos preocupamos com ele. O recurso da pergunta pode ser utilizado antes, durante ou depois do atendimento. Com um fantástico fechamento do atendimento, possibilitamos a volta do cliente. O fechamento é a mais recente impressão que o cliente tem da empresa; por isso tende a ser fixado com mais facilidade. É necessário perguntar ao cliente se ele está satisfeito, reforçar que se está sempre a disposição de ele ouvir a empresa; agradecer sempre (FRANCES; ROLAND BEE, 2000). Segundo Almeida (2002), o atendimento tecnológico é aquele que não é feito pessoalmente. Pode ser por telefone, fax, bip, correspondência ou e-mail. Quando se atende ao telefone, a imagem da empresa é percebida do outro lado da linha. Dicas para um bom atendimento o telefone: · Atenda: o pronto atendimento causa uma exceRevista UniVap, v.15, n.27, 2008 · Disponibilize-se. · Escute. · Informe. · Despeça-se. Servir bem o cliente, é mais que uma estratégia de lucro ou de sucesso pessoal, é uma filosofia de vida. Além de tudo, essa prática tem o poder de fazer o mundo melhor. Um mundo onde servir ao próximo seja uma missão, um objetivo de todos. 4. CONSIDERAÇÕES FINAIS O objetivo de toda empresa é captar e fidelizar clientes. Independentemente de sua ideologia, credo, função social ou interesse financeiro. No mundo em que vivemos, onde os consumidores têm invariavelmente uma enorme dificuldade de se ligar por muito tempo em alguma determinada marca, a disputa pela sua fidelidade é acirrada. Além dos clientes terem uma infinidade de opções quando se trata de utilizar algum produto ou serviço ainda temos que disputá-los com outras empresas que não são do mesmo ramo. As empresas que quiserem manter seus clientes fidelizados, com um relacionamento mais duradouro devem tentar entender que não basta mais falar em cliente satisfeito. Isso porque a satisfação se define como sendo a condição obtida por um serviço em que o cliente sente que sua expectativa foi atingida. E isso ele pode conseguir em vários concorrentes. Basta que o cliente encontre o que estava procurando. Segundo Armiliato (2006), a luta dos prestadores de serviço é deixar o cliente encantado. Fazer com que o cliente tenha suas expectativas superadas. Que ele sinta uma vontade quase que incontrolada de utilizar o serviço. Entendendo isso toda empresa deve primar por transformar em prática diária e regular todos os valores da instituição que garantam que o cliente se sinta numa posição especial, diferenciada e, se possível, única. 97 Certamente não será um discurso, nem será uma oferta financeira vantajosa, não será também o trivial, o comum, o fácil e corriqueiro, nada disso fará o cliente voltar nos outros dias. O que será então? Nos contatos com ex-alunos de academia (ex-clientes) é comum percebermos que o cliente “foi desistindo”. É, ele não desistiu de uma vez, não foi do dia para a noite. Foi um processo. Primeiro ele faltou uma vez, depois duas, depois ficou bastante tempo sem vir, depois acreditou que não dava mais para recuperar e, aí, desistiu definitivamente. E o interessante é que dificilmente ouvimos de um ex-cliente alguma reclamação de que foi mal tratado, ou os professores e funcionários foram indiferentes. A maioria deles atribui sua desistência à sua própria incompetência de se auto-gerenciar no relacionamento com a atividade física (ARMILIATO, 2006). uma pessoa que tem pouca experiência com a atividade física (como a maioria dos novos clientes). A experiência dos professores tem mostrado que quando se fazem perguntas sobre os hábitos do dia-adia, sobre a profissão, sobre expectativas do cliente, o professor faz com que o cliente se sinta à vontade em falar, expressar seus anseios, e se manifestar de uma maneira espontânea, inclusive dando a oportunidade excepcional ao professor de prestar atenção à coisa mais importante de tudo nesse momento. Se desde o primeiro momento o professor utiliza como referência no relacionamento com o cliente somente as experiência e valências físicas, fica difícil imaginar que o cliente sinta que possa ter nesse professor o parceiro que certamente ele necessitará no doloroso e difícil processo de adaptação à atividade física regular. 5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Não passa pela cabeça do ex-cliente (e do atual cliente também) que alguém poderia tê-lo motivado de uma maneira que ele tivesse forças para lutar contra as forças que certamente o acometeram e que o impediram de persistir. O professor, por exemplo, poderia agir nesse sentido. Não é mais somente um bom treino a melhor coisa que o professor pode oferecer ao aluno. O profissional deveria efetivamente agir na ambientação do cliente na academia, deveria comprometer-se com os resultados que o aluno deseja alcançar, deveria ensinar sobre mudanças de hábitos alimentares, deveria atendê-lo respeitando suas características de personalidade e comportamento, enfim, deveria oferecer mais coisas do que o cliente está esperando. E se não pode fazer com todos por falta de tempo, faça com os alunos de risco, aqueles que não têm perfil atlético, aqueles que relatam pouca experiência com a atividade física, os tímidos e inseguros. ALMEIDA, S. Ah! Não Acredito. São Paulo: Atlas, 2002. ARAÚJO, F. de A. Disciplina de Segmentação e Medição da satisfação de cliente. MBA em Gestão de Academias, São Paulo: UVA, 10 dez. 2005. ARMILIATO, A. Disciplina de Gestão do Relacionamento com o cliente. MBA em Gestão de Academias, São Paulo: UVA, 18 mar. 2006. FRANCES; ROLAND BEE. Fidelização do Cliente. São Paulo: Nobel, 2000. GODRI, D. Conquistar e Manter Clientes. 64. ed. Blumenau: Eko, 1998. KOTLER, P. Administração de Marketing. 4. ed. São Paulo: Atlas, 1996. Qual a primeira pergunta que um professor faz quando está entrevistando um aluno em sua primeira aula? – Você está treinando? Você está parado há muito tempo? REICHHELD, F. F.; SASSER, W. E. Jr. Zero defections: quality comes to services. Harvard Business Review, set.out. 1990. Essas perguntas parecem ser inapropriadas para ZEITHAML; PARASURAMAN; BERRY. Modelo Gap. 1990. 98 Revista UniVap, v.15, n.27, 2008 ESPECIAL GERONTOLOGIA Revista UniVap, v.15, n.27, 2008 99 100 Revista UniVap, v.15, n.27, 2008 APRESENTAÇÃO A capacitação de profissionais de diferentes áreas para atuar nos programas destinados à população idosa, que abordem em seus conteúdos as questões decorrentes do processo de envelhecimento da população brasileira, está prevista no Estatuto do Idoso, lei 10.741, de 1/ 10/2003, título I, art.º 3º/VI, que diz: – capacitação e reciclagem dos recursos humanos nas áreas de geriatria e gerontologia e na prestação de serviços aos idosos. O Estatuto assinala, ainda, no art. 3º/VII: – estabelecimento de mecanismos que favoreçam a divulgação de informações de caráter educativo sobre os aspectos biopsicossociais de envelhecimento. O referido Estatuto garante aos idosos todos os direitos fundamentais inerentes à pessoa humana, mas assinale-se que, os textos em pauta asseguram que o atendimento seja realizado por profissionais com conhecimento e prática dos meandros da legislação, dos seus significados e modos de operacionalização. E o que é mais relevante é que os idosos devem ser portadores desses conhecimentos para poder usufruir do envelhecimento com dignidade e saber garantir seus direitos, como sujeitos de um processo ao qual a sociedade deve estar atenta. A Universidade do Vale do Paraíba – UNIVAP incorporou uma visão que antecedeu à própria legislação, ao participar das discussões que já ocorriam nas Instituições e áreas profissionais e voltar-se para incorporar, em sua missão social, a questão do idoso. A criação da Faculdade da 3ª Idade – UNIVAP se deu em Agosto de 1991, tendo como subsídio os debates conduzidos no Seminário da 3ª Idade: Educação Continuada, um direito do cidadão – Encontro Nacional das Universidades da 3ª Idade, realizado em Junho/1991, na UNIVAP. Esse encontro reuniu as 7 escolas pioneiras então existentes no Brasil, ligadas à UNICAMP, UNISANTOS, Universidade Federal do Ceará, Universidade Federal de Santa Catarina, Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Santa Maria e Passo Fundo) e Universidade Federal de Juiz de Fora. As fundamentações teóricas produzidas até então, em nível nacional e internacional, foram tomadas como base para definir os objetivos e propostas de ação da Faculdade da 3ª Idade: · Permitir o acesso à Educação Continuada às pessoas com idade acima de 45 anos, propiciando condições para o desenvolvimento do indivíduo e para sua integração na comunidade, reconhecendo seu potencial de contribuição para a sociedade e seus direitos como cidadão. Revista UniVap, v.15, n.27, 2008 101 · Estimular a participação do indivíduo como agente habilitado para ação junto à família e à comunidade. · Envolver a Universidade, de forma interdisciplinar, no tratamento das questões da 3º Idade, abrindo campo de atuação de ensino, pesquisa e extensão. · Contribuir para a consolidação da finalidade da UNIVAP no que se refere a “desenvolver ações permanentes de forma que um segmento cada vez maior da comunidade possa usufruir dos benefícios das atividades por ela desenvolvidas” (art. 3º it. V do s/Estatuto). A partir de 2001, o Programa passou a fazer parte do “Projeto Vale a Pena Viver”, que centraliza as ações de filantropia da Universidade. A Faculdade da 3ª Idade - UNIVAP é um programa de cunho eminentemente social que tem, como ponto de partida, o reconhecimento do potencial de contribuição das pessoas da 3ª idade para a sociedade. Essas pessoas, na maioria dos casos, não tiveram oportunidade de estudar; outras, na condição de aposentadas, encontram dificuldades para retomar seu espaço social. A Faculdade da 3ª Idade atende o interesse dessas pessoas na busca de novos conhecimentos e se constitui, também, num espaço para a ampliação dos contatos interpessoais, para a vivência grupal e para o exercício das responsabilidades e direitos de todo cidadão. Com compromisso e constante processo de avaliação e recriação, a Faculdade da 3ª Idade entende, como diz Novaes, em seu livro Psicologia da Terceira Idade: “O importante é considerar a educação da e pelas pessoas da terceira idade sempre baseada no desejo de auto-realização, nas relações sociais, na melhoria da qualidade de vida, no desenvolvimento de potencialidades, numa aprendizagem continuada e na motivação pelo conhecimento”. (NOVAES, 1997, p. 140) Dentro da estrutura acadêmica, a Faculdade da 3º Idade, sob coordenação do Curso de Serviço Social da Faculdade de Ciências da Saúde, é um programa institucional em nível acadêmico e social que congrega o Curso de Extensão e Atualização Cultural - CEAC; o Centro de Estudos Avançados para Terceira Idade - CEATI; o Centro de Estudos em Gerontologia Social; o Curso de Pós-Graduação “Lato-Sensu”, em nível de Especialização em Gerontologia e Família. Curso de Especialização em Gerontologia e Família Objetivos: Oferecer oportunidade de aperfeiçoamento e especialização aos profissionais que atuam no campo do envelhecimento, capacitando-os para o trabalho interdisciplinar e para a análise e melhoria do nível de atendimento à população idosa. Suscitar ainda a formação de quadros especializados em Gerontologia Social, assim como qualificar a formação de docentes na área. 102 Revista UniVap, v.15, n.27, 2008 Destina-se a Graduados com nível superior em Medicina, Fisioterapia, Enfermagem, Serviço Social, Psicologia, Psiquiatria, Sociologia, Pedagogia, Educação Física, Nutrição, Terapia Ocupacional e áreas similares. Abrange as Disciplinas: Gerontologia Social, Noções de Geriatria, Psicologia do Envelhecimento, Família no Processo das Relações Sociais, Direito e Legislação Social, Gerontologia e Interdisciplinaridade, Políticas Sociais Contemporâneas, Pesquisa Social, Planejamento e Administração de Programas Sociais, Educação Continuada, Didática do Ensino Superior, Metodologia Científica, Estágio Prático Supervisionado/Orientação de Monografia. O Curso de Especialização em Gerontologia e Família formou sua 3ª turma, no 1º semestre de 2008, composta de profissionais experientes e atuantes no trabalho com o idoso, que buscaram novos conhecimentos e significados para suas ações com esse segmento. A aprendizagem constante incorporada ao dia-a-dia é que motiva esses profissionais a querer aprender cada vez mais, a buscar conhecer além do que já dominam, pois fazem parte integrante de um processo que não se esgota e de um caminho que se percorre ao longo da vida. Salienta Novaes, em seu livro citado: “Sem técnicos especializados, sem instalações adequadas, recursos financeiros, programas motivadores, ou assistência adequada, o desejo de assistir bem aos idosos não se transformará nunca numa ação sistematizada e profícua”. (NOVAES, 1997, p. 101) Os trabalhos aqui apresentados são artigos que abordam a gerontologia em alguns aspectos, dentro da vasta gama de temáticas que podem ser tratadas teoricamente ou discutidas em suas práticas; demonstram o propósito da construção do conhecimento e de propiciar o debate sobre as questões atuais que devem ser priorizadas para que, a partir delas, possíveis soluções sejam buscadas pelo conjunto da sociedade. Elizabeth Moraes Liberato, Profa. Dra. Pró-reitora de Avaliação da Univap Revista UniVap, v.15, n.27, 2008 103 104 Revista UniVap, v.15, n.27, 2008 Longevidade, para quê? Elizabeth Moraes Liberato * Resumo: Este estudo trata das constatações de mudanças na concepção do envelhecimento, abordando a questão do crescimento dos índices de longevidade da população mundial e brasileira, e suas repercussões no processo de construção de políticas de atendimento aos idosos, para alcance dos direitos que lhes são garantidos pela legislação específica, mas que se encontram, ainda, em fase de implementação para que se concretizem como direitos adquiridos. Palavras-chave: Longevidade, envelhecimento, idoso. Abstract: This study is about the changes of the ageing conception and the rate increase in longevity of the global and Brazilian population and its effects on the politics and legislation for the elderly. This specific Legislation is still being implemented in order for the elderly to achieve the rights that are assured in it. Key words: Longevity, ageing, elderly. 1. INTRODUÇÃO dos, o que interfere em seu processo de envelhecimento. Um tema que tem sobressaído em estudos e pesquisas nas diferentes áreas do conhecimento é o aumento da longevidade da população mundial. O crescimento expressivo da população idosa é um fenômeno global, que se acelerou e tende a ser mais pronunciado nas próximas décadas. Além do mais, o tema da longevidade humana traz uma nova consciência sobre a vida que deve ou pode ser vivida, e o que representa o processo de envelhecer. A longevidade é desejada, com certeza, pela maioria dos indivíduos, quando representada por autonomia e preservação de qualidade de vida. Diz Souza “Longevidade é uma conquista científica, social, educacional, mas acima de tudo individual”. (SOUZA, 2005, p. 31) Primando por um caráter interdisciplinar, a gerontologia é a ciência que estuda o envelhecimento, em seus aspectos físicos, biológicos, psíquicos e sociais, para construção de aportes teóricos e práticos que tratam desse processo, dos significados e das ações nesse campo específico. O envelhecimento é uma categoria socialmente construída; pode-se afirmar que é um processo biológico marcado por determinantes sociais com características próprias ao momento histórico de cada país, e uma questão política que depende do valor atribuído ao idoso nessa sociedade. Para o indivíduo, em sua singularidade, os eventos biológicos acontecem em ritmos e momentos diferencia- * Pró-Reitora de Avaliação e Professora da Univap Doutora em Serviço Social e Especialista em Gerontologia. Revista UniVap, v.15, n.27, 2008 Como exemplo, no campo das ciências avança-se à luz dos novos conhecimentos e teorias sofisticadas de “imagens cerebrais”, é possível monitorar o cérebro humano em suas atividades e em seus processos de raciocínio, aprendizado, processamento, condições de melhoria (LIMA, 2001). O conhecimento das ciências se amplia em todos os sentidos, físicos e mentais. Além das conquistas da biogenética, a longevidade vai estar ligada ao desenvolvimento sóciopolítico do país, às condições de saneamento básico, de combate às doenças infecciosas e degenerativas típicas da velhice e, sobretudo, à prevenção às doenças e aos fenômenos de diminuição da vitalidade do indivíduo. Segundo dados da Fundação Perseu Abramo FPA, o aumento do envelhecimento da população brasileira será de 25%, nos próximos 25 anos; essa pesquisa, realizada em 2006, aponta para a “falta de informação na sociedade sobre a velhice e sobre as reais necessidades dos idosos, sejam elas físicas, morais, sociais, culturais e ou de garantia de direitos.” O Censo de 2000 registra, no Brasil, 15 milhões de pessoas idosas. Para Souza: “O envelhecimento saudável não de105 pende só das condições macroestruturais como saúde, renda, educação e urbanização, mas também de atitudes, oportunidades sociais, valores e o grau de compromisso da sociedade para o bem estar dos idosos”. (SOUZA, 2005, p.29) 2. MATERIAIS E MÉTODOS O processo de envelhecimento envolve 3 fatores: - A sociedade, que se serve de números que indicam a faixa etária da população considerada envelhecida, embasada em valores que se transformam no tempo, que elegem as novas questões e prioridades, ao apontar o que se torna obsoleto, sem utilidade. Esta sociedade não está preparada para conviver com a nova dinâmica demográfica e seus efeitos, como a longevidade da população; nela permeia o preconceito e a estigmatização do idoso. Segundo a Tábua de Mortalidade, divulgada pelo IBGE, em 4/12/2007, o indicador de expectativa de vida chegou, no Brasil, a 72,3 anos. - A família, cuja estrutura e história incorpora aquele indivíduo em sua condição de criança, jovem, e depois do adulto que se encaminha para a fase da maturidade e do envelhecimento. É o espaço onde se processam as relações e se estabelecem os vínculos que podem permanecer por toda a existência ou ser rompidos em algum momento. Mas, é na família que ocorrem os primeiros relacionamentos, onde se dá a transmissão de conhecimentos e as trocas afetivas, onde o indivíduo inicia o processo de construção da sua identidade; a partir da família, irá estabelecer os primeiros vínculos com o mundo exterior. Hoje, depara-se com uma família cuja estrutura sofreu muitas mudanças, antes extensa passa a ser progressivamente substituída pela nuclear, que é aquela composta pelo casal e filhos. As estatísticas apontam para a diminuição do número de filhos. A síntese dos indicadores sociais do IBGE, divulgado em setembro de 2007, aponta que o número médio de membros nas famílias brasileiras caiu de 3,6 para 3,2 membros. Os valores mais arraigados ligados à família se afrouxam no modelo de sociedade atual, que aproxima-se da permissividade, da desintegração de valores. Hoje, convivem formas tradicionais com modelos mais modernos e abertos, e outros que já se prenunciam como mais avançados. - O idoso, que de acordo com a legislação específica, é o indivíduo na faixa etária acima de 60 anos, segundo o Estatuto do Idoso (lei 10.741, de 1º/10/2003). Esta designação está ligada ao ciclo da vida, portanto é cronológica, medida pelos anos de vida, tomando-se por base a evolução do homem nas suas etapas de nascimento, crescimento, adolescência, maturidade, velhice e morte. Esse indivíduo idoso acompanhou as mudanças 106 da sociedade, não esteve fora do processo ou totalmente alheio ao que se passava à sua volta. Mas, ele constata que ser idoso já não corresponde ao papel antes atribuído, que com certeza ele teve a oportunidade de observar em sua família ou grupo de origem, ao sentir o tratamento que era dado aos seus familiares idosos. Hoje, depara-se com novas realidades, como: o núcleo familiar se dispersou, as casas se tornaram um ponto de referência, um endereço que possibilita alguns encontros e confraternizações. A família já não significa o espaço maior e constante das relações intergeracionais e das afetividades. A idade social incorpora os significados do ser idoso, a imagem que lhe agrega valor pela experiência, sabedoria, pelo respeito; ou, em sentido contrário, lhe impõe a morte social antes que esse fato supremo se aproxime e se concretize. Este quadro é agravado pelas perdas biológicas e sociais, que resultam no isolamento e perda de papéis sociais, pela desvalorização de suas lembranças e formas de expressão. A memória do velho, um bem a ser preservado, perde sua função social, perde seu significado. O prolongamento da vida, ligado a fatores genéticos, físicos e biológicos que influenciam a longevidade, está sendo possível àqueles que, desde o nascimento, desfrutam de melhores condições de vida e acesso aos benefícios da medicina e saúde, da alimentação balanceada, das melhorias da crescente urbanização e saneamento. No outro lado das projeções de longevidade estão os idosos que se mantêm no patamar das carências nutricionais, sanitárias, educacionais, habitacionais, cujas famílias não usufruíram dos direitos sociais, que vivem nas favelas e sub-habitações, nas periferias das cidades, nas regiões pouco desenvolvidas de nosso país, onde o envelhecimento biológico e social favorece o desenvolvimento de problemas de saúde mais complexos; prevalece a velhice precoce que se expressa no aspecto físico e marcas no rosto das pessoas cuja idade não é compatível à imagem mais desgastada que aparentam, envelhecidas antes do tempo. O conceito de classe social permeia o pleno desenvolvimento humano e suas etapas, visto que existem diferenças sócio-econômico-culturais que favorecem ou por outro lado impedem - a preservação da saúde, o acesso à escola e educação, aos bens e serviços, o alcance e manutenção de bem-estar individual e coletivo. (MAGALHÃES, 1989) Quais os efeitos do envelhecimento para aqueles que fazem parte das camadas mais excluídas da sociedade, cujo valor se mede pelo consumo, que atribui status diferenciado àquele que não tem vínculo de trabalho? Revista UniVap, v.15, n.27, 2008 Fala-se hoje que o mundo do consumo está se voltando para o idoso, um consumidor em potencial, isto na classe média e na camada mais privilegiada; mas se esquece do grande contingente de idosos que mal sobrevivem com parcas aposentadorias e ainda ajudam os filhos e netos. Como diz Magalhães “se são pouco ou nada produtivos, e se não produtivos, são pequenos consumidores ou não são consumidores”. (MAGALHÃES, 1989, p. 28) Para Arendt, “... o consumo já não se restringe às necessidades de vida mas ao contrário visa principalmente as superfluidades da vida, não altera o caráter desta sociedade; acarreta o grave perigo de que chegará o momento em que nenhum objeto do mundo estará a salvo do consumo e da manipulação através do consumo”. (ARENDT, 1995, p.146) A sociedade busca o novo, a produção em massa, o computador, com suas linguagens, substitui a expressão afetiva e viva; cria-se o estereótipo do “rejuvenescimento” ou a indústria do consumo como cura para tudo. (LEHR, 1999) Como se sente aquele indivíduo que, no exercício de sua capacidade produtiva, realizado ou não em seus projetos profissionais, defronta-se com a aproximação da aposentadoria, cuja imagem social é de descarte e desprestígio? Salienta Ferrigno: “A aposentadoria, a viuvez, a perda dos amigos e a chamada “síndrome do ninho vazio”, esta última caracterizada pela debandada dos filhos emancipados, são fenômenos que impõem aos mais velhos uma expressiva diminuição de funções.” (FERRIGNO, 2003, p.52) A questão de gênero também deve ser analisada considerando as atribuições que a mulher cumpre no ambiente familiar. As idosas (pela pesquisa da FPA, representam 57% da população idosa brasileira), muitas em situação de viuvez (conforme dados da FPA, 48% das idosas são viúvas e 37% casadas), compõem o segmento mais pauperizado da população idosa. A família, pela dispersão de seus membros, não tem como manter seus familiares idosos; muitos idosos são institucionalizados em asilos, casas-lares e centrosdia ou outras formas de abrigo. Há famílias que mantêm um processo dinâmico de interação e idosos que optam por viverem sozinhos, preferem a qualidade dos relacionamentos em vez de dependência mútua. (NOVAES, 1997) A pesquisa da FPA aponta que 22% de idosos não se sentem à vontade com sua família, por situações de desentendimento, desarmonia, desrespeito ou falta de afeto. Ou ainda ocorrem situações mais sérias que implicam em negligência e abandono. Revista UniVap, v.15, n.27, 2008 3. RESULTADOS O estudo da velhice, enquanto fato social, permite o desvelamento de construções sociais e de concepções que foram produzidas através dos tempos. A velhice expressa uma condição humana, faz parte do código genético do homem, que irá corresponder às alterações biológicas, donde poderá advir o surgimento de patologias e problemas de natureza psicossocial; mas não é necessariamente patológica. As pesquisas biogenéticas e as hipóteses delas decorrentes abrem possibilidades futuras à engenharia genética para alterar o programa genético regulador do tempo. É futurologia? Não, é realidade, se tomarmos a teoria relacionada à produção de radicais livres, que podem destruir células e tecidos orgânicos e teorias relacionadas à alteração do sistema imunológico, estudos sobre doenças auto-imunes, cujos resultados refletem-se na maior resistência às doenças. (DUARTE, 1999; PY, 1999) Muitas mudanças podem ocorrer na história pessoal de cada um, em sua organização de vida e em suas possibilidades de sobrevida. (GUIMARÃES, 1989; PY, 1999) Para Néri, “envelhecer satisfatoriamente depende do delicado equilíbrio entre as limitações e as potencialidades do indivíduo, o que lhe possibilitará lidar, em diferentes graus de eficácia, com as perdas inevitáveis do envelhecimento”. (apud PY, 1999, p.63) O que deve servir de alerta é que a velhice saudável dependerá de qualidade de vida anterior que a pessoa conseguiu manter. Fraiman (1994) diz que a problemática social tem início na infância carente e culmina na velhice abandonada. Velhice tem o significado da temporalidade e da vida humana, sob a regência de Cronos, que significa tempo, medida e de Kairós, que expressa o tempo vivido, os significados de histórias de vida preservados pela memória que, por conter o sujeito em movimento, não é somente tempo presente, mas contém possibilidades de reconstrução e de ressignificação, através de novos olhares para si e para os outros. (LOUREIRO, 1998, apud STANO, 2001) Para Py “O envelhecimento enquanto experiência crucial dos seres humanos presentifica-se nos domínios da arte de viver. No modo peculiar de cada um participar da construção da existência”. (PY, 1999, p. 30) A sociedade está alcançando o prolongamento dos anos vividos, a longevidade, mas deve assegurar condições de dignidade para a velhice. Muito se discursa, se debate e se escreve sobre o assunto, tanto que os idosos, que até os anos de 1980 eram quase ignorados nos estudos sócio-demográficos, estão ganhando visibilidade cada vez maior a partir de 107 então. Para Guimarães: “A relativa demora dos censos demográficos para melhor analisar os dados referentes ao envelhecimento populacional é um dos fatores que contribuíram para que esta faixa da população demorasse a ter visibilidade social”. (GUIMARÃES, 1996, p.72) Ao ganhar essa nova projeção, a preocupação com esses dados deve conduzir à mudanças nos padrões de saúde e doença que interferem nos fatores demográficos, econômicos e sociais, visto que a desigualdade social se acentua na velhice. O “I Seminário Internacional: Envelhecimento populacional – uma agenda para o final do século”, realizado em Brasília/1996, foi marcante nas discussões da sociedade brasileira. As pressões do segmento idoso, através de suas associações e conselhos, somadas às análises e produções de especialistas apontando o crescimento acelerado e o aumento significativo do número de idosos representados em fóruns e conselhos, foram fatores desencadeadores da criação da legislação específica para o idoso, que já tinha seus direitos assegurados pela Constituição de 1988 (art. 203, art. 229, 230 e outros), mas se impôs na Política Nacional do Idoso – PNI, lei 8.842, de 4/ 1/1994. O ano de 1999 foi declarado, pela Organização Mundial da Saúde – OMS, o Ano Internacional do Ido- Composição Familiar Renda Renda Familiar Fontes de Renda Traços negativos da velhice Analfabetismo funcional Preconceito contra velhice Algum tipo de violência Doença Atendimento à saúde Mas a legislação não se sobrepõe à visão distorcida que ainda permanece na sociedade, em relação à velhice, “carregada de distanciamento ou indiferença ou muitas vezes de preconceitos ostensivos e velados em relação à competência para o trabalho, para a vida social, política e cultural ou para a simples convivência no lazer (...) na sociabilidade que valoriza a inovação e subestima o antigo” (MAGALHÃES, 1989, p.99), visão que não supera a representação social das características e estereótipos atribuídos aos idosos, como perda gradativa da energia física e mental, intolerância, hipersensibilidade, conformismo, sentimento de solidão, depressão. (NOVAES, 1997) Os dados estão aí para mostrar a situação do idoso no Brasil, que refletem as condições estruturais da sociedade industrializada e globalizada, voltada às novas formas de organização do trabalho e da produção, e que não prioriza os direitos e a dignidade da população envelhecida. A pesquisa Idoso no Brasil – Vivências, desafios e expectativas na 3ª Idade, realizada pela Fundação Perseu Abramo, em 2006 e publicada em 2007, apresenta, dentre outros, os seguintes resultados: 54% vivem ao menos com um filho/a 51% vivem com o cônjuge 30% vivem com netos ( 16% Responsáveis por eles) 92% têm alguma fonte de renda própria 88% contribuem para a renda familiar 43% recebem até 2 salários mínimos aposentadoria por tempo serviço ou por idade e pensão por morte 57% apresentam debilidades físicas e doenças 14% apontam dependência física 18% apontam discriminação social 49% 80% para esse percentual, existe 35% já sofreram (doméstica física, violência urbana, psíquica, humilhações, institucional, desrespeito aos direitos, ironia, menosprezo, falta de tratamento e remédio, ameaças, lesão corporal, trabalho excessivo ou obrigatório). 81% possuem alguma doença (hipertensão, visão, coluna, diabetes, problemas cardíacos, colesterol alto) 68% utilizam serviços públicos 24% utilizam convênio médico Fonte: Fundação Perseu Abramo Estes dados e outros constantes da referida pesquisa devem nos alertar para o compromisso que deve ser assumido, de fato, com o idoso no Brasil. 108 so. Esses foram eventos marcantes para a instituição do Estatuto do Idoso, em 2003. Principalmente, se refletirmos sobre este quadro, construído em uma primeira aproximação, desta autora, que aponta alguns elementos cujas análises devem ser ampliadas: Revista UniVap, v.15, n.27, 2008 Questões Geracionais e Envelhecimento Valores tradicionais/ conservadorismo. Família extensa/numerosa 1938 1948 1968 Mudanças na sociedade e na estrutura da vida familiar. Liberação dos costumes. Mulheres: acúmulo de funções/participação na renda familiar e responsabilidades com tarefas domésticas. 1978 Nova dinâmica das relações sociais e familiares. Família núclear: progressiva diminuição do nº de filhos (de 1970 a 2007, passou de 6,7 filhos para 2.6 filhos por casal). 1988 Grandes avanços tecnológicos: trabalho, saúde, habitação, comunicação, etc. Informatização / Inovações no cotidiano das famílias. Papel da mulher: cada vez mais ativo. 1998 Rearranjos familiares, para atender crescente inserção da mulher no mercado de trabalho e mudançass na estrutura familiar. Família nuclear, diminuição do nº de filhos. 2008 Sociedade altamente competitiva para homens e mulheres. Estresse nas relações famíliares e sociais. Família nuclear, diminuição do nº de filhos. Dados do Ministério da Saúde, agosto/08/ Taxa de fecundidade: 1,8 filho por mulher. 70 anos 60 anos 50 anos Geração que comporá a próxima faixa de idosos. Falta de preparação para enfrentamento das questões do envelhecimento. Núcleo familiar mais disperso. 40 anos Profissionais com experiência / competitividade no campo do trabalho. Pressões frente à mão de obra jovem que pretende ingresssar no mercado de trabalho. Contribuição a Planos de Previdência Privada para garantir reforço da renda. 90 anos 80 anos 70 anos Aumento da população idosa, aumento da longevidade. Implementação de políticas públicas de atendimento ao idoso. Ampliação de programas para idosos. Repercussões na estrutura familiar, resultante de os filhos (em nº menor) estarem na faixa dos 40 a 70 anos (nasceram da década de 70 à frente, quando mudanças estavam ocorrendo de forma acelerada; valores são diferentes). Estrutura doméstica e de recursos insuficiente para cuidar do idoso em situação de dependência. 60 anos 50 anos Fase da pré-aposentadoria, para aqueles inseridos no mercado de trabalho. Programas de preparação à aposentadoria. Contribuição a Planos de Previdência Privada, para garantir reforço da renda. Relações familiares mais restritas. 40 anos Profissionais experientes / competitividade no campo do trabalho. Pressões frente à mão-deobra jovem que pretende ingresssar no mercado de trabalho. Contribuição a Planos de Previdência Privada para garantir reforço da renda. Família nuclear, rearranjos familiares. Busca de realização profissional, experiência, campo de trabalho e renda. Constituição da família: diminuição do nº de filhos. 20 anos Formação profissional. Fase de conciliação: trabalho e escola. 30 anos Busca de realização profissional, experiência, campo de trabalho e renda. Competitividade. Constituição de família: diminuição do nº de filhos. 10 anos Família/ Escola: socialização, educação; busca de alternativas institucionais. 20 anos Formação profissional. Fase de conciliação: trabalho e escola. 0a9 anos Família/ Escola: socialização, educação; busca de alternativas institucionais. 10 anos Família/ Escola: socialização, educação Convivência familiar mais restrita. Delegação de papéis familiares às instituições. Criança / Adolescente / jovem Adulto 30 anos Criança Adolescente /jovem Demandas/ enfrentamentos 100 anos Adulto 1958 Processo de industrialização e urbanização crescente. Permanência de valores tradicionais e introdução de novos paradigmas. Famílias menos numerosas. 80 anos Faixa de 90 anos: filhos na faixa de 60 anos/idoso. Políticas públicas incipientes no cumprimento da legislação. Família ainda é um esteio importante, responsável pelos ascendentes idosos, mas conta com menos estrutura doméstica e de recursos para a atenção e cuidados ao idoso principalmente se em situação de dependência. Cabe à mulher cuidar do familiar idoso. Relações familiares: convivência menor. Aposentadoria não é suficiente para suprir gastos; mas muitos idosos contribuem na renda familiar. Idade em 2018 Idoso (expectativa de vida deve aumentar) 1928 90 anos Demandas/ enfrentamentos Pré-aposentadoria 1918 Idade em 2008 Idoso (expectativa de vida 76 anos - IBGE 2007) Caracteristicas predominantes na sociedade brasileira e família Pré-aposentadoria Ano Quadro elaborado por: Profª Drª Elizabeth M. Liberato - 2008 É preciso refletir, como Salgado: “Se as perspectivas dos velhos são poucas, o mesmo acontece com os jovens, para os quais o caminho há de ser mais longo e Revista UniVap, v.15, n.27, 2008 as possibilidades para o futuro bem menores”. (SALGADO, 1996, p. 65) 109 4. CONSIDERAÇÕES FINAIS lo. Vozes. 2003. Neste contexto, em primeira instância, uma política para o envelhecimento significa uma política para a família, “é pensar, a rigor, em nossas crianças e filhos, pois serão eles os que efetivamente poderão ser beneficiários ou vítimas do que fizermos hoje. Aos velhos de hoje só nos resta compensar perdas que poderiam ter sido evitadas, fossem outras as condições históricas de seu ciclo e percurso de vida”. (MAGALHÃES, 1989, p. 59) FRAIMAN, A. P. Coisas da idade. São Paulo. Gente. 1994. Assim, as ações devem ser mais abrangentes, possibilitar à população brasileira maior acesso aos programas de saúde, alimentação, trabalho, lazer, habitação; há que se proteger a infância, priorizar que a educação seja inclusiva para todos, enfim alcançar a diminuição das desigualdades sociais. GUIMARÃES, R. M. O processo de envelhecimento como campo de investigação. In Anais I Seminário Internacional. Envelhecimento Populacional – uma agenda para o final do século. MPAS. Brasília. 1996. LEHR, U. A revolução da longevidade: impacto na sociedade, na família e no indivíduo. In Estudos interdisciplinares sobre o envelhecimento. Porto Alegre, R.S. UFRS. 1999. LIMA, M. P. Reformas paragmáticas na velhice do século XXI. In Longevidade, um novo desafio para a educação. São Paulo. Cortez. 2001. É preciso ter presente que, no Brasil, “a política para a velhice assume contornos mais amplos porquanto para milhares de velhos a questão não se iniciou no tempo de velho, decorrendo essencialmente do acúmulo de desigualdades ao longo do ciclo de vida”. (SALGADO, 1966, p. 66) MAGALHÃES, D. N. A invenção social da velhice. Rio de Janeiro. Papagaio. 1989. Aos idosos de hoje, da 3ª ou 4ª idade, ou como sejam designados, não deverão ser reservadas ações compensatórias e assistencialistas. A sociedade e suas instituições devem abrir espaços e caminhos que envolvam a família, para experiências interativas que superem as dificuldades de relacionamento. É preciso criar possibilidades para intercâmbio e trocas de vínculos e afetos, para que os idosos reelaborem suas perdas, garantir mecanismos para recomposição de suas rendas para que se mantenham ativos e valorizados, buscando desenvolver novas aptidões; e, principalmente, recriar a imagem social que lhes assegure a importância de registrar suas marcas numa contínua inscrição no tempo vivido e no futuro ainda a viver. NOVAES, M. H. Psicologia da terceira idade. Conquistas possíveis e rupturas necessárias. Rio de Janeiro. NAU. 1997. Isto significa (FERNANDES, 1997) criar situações que assegurem o tratamento eqüitativo e de reconhecimento social, o combate a todas as formas de discriminação, o respeito à autonomia e à dignidade inerente a todo cidadão. NERI, A. L. (org.). Qualidade de vida e vida madura. Campinas, SP. Papirus. 1993. PY, L. Testemunhas vivas da história. Rio de Janeiro. NAU. 1999. SALGADO, M. Políticas Sociais na perspectiva da Sociedade civil. In anais I Seminário Internacional. Envelhecimento Populacional. Uma agenda para o final do século. MPAS. Brasília. 1996. SOUZA, E. M. S. C. Velhice e provisão familiar. In Gerontologia Social. A práxis no envelhecimento. Aracaju, SE. J. Andrade. 2005. STANO, R. de C. M. T. Identidade do professor no envelhecimento. São Paulo. Cortez. 2001. Constituição da República Federativa do Brasil – 1988. 5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFIAS Estatuto do Idoso, 2003. ARENDT, H. A Condição humana. Rio de Janeiro. Forense Universitária. 1995. DUARTE, F. Envelhecimento normal e patológico. In Finitude. Uma proposta para reflexão e prática em Gerontologia. Rio de Janeiro. NAU. 1999. FERNANDES, F. da S. As pessoas idosas na legislação brasileira. Direito e Gerontologia. São Paulo. LTR. 1997. FERRIGNO, J. C. Co-educação entre gerações. São Pau110 Política Nacional do Idoso – PNI. 1994 Portal da Fundação Perseu Abramo. Pesquisa Idosos no Brasil. Vivências, Desafios e Expectativas na 3ª Idade. 2006. Disponível em: http://www2.fpa.org.br/portal/modules/news/article.php?storyid=3516 I Seminário Internacional: Envelhecimento populacional - uma agenda para o final do século. MPAS. Brasília. ANAIS 1996. Revista UniVap, v.15, n.27, 2008 O Processo de Envelhecimento: conhecendo as transformações Maria Piedade Vieira Grigoleto * Elizabeth Moraes Liberato ** Resumo: Este trabalho tem por objetivo conhecer e entender as transformações físicas e psicológicas que ocorrem com os idosos, pessoas do grupo etário acima de 60 anos. A Gerontologia, que é o estudo científico da velhice, desconhecida da maioria das pessoas, apresentava uma conotação voltada para a área médica; hoje, incentiva a retomada dos estudos da velhice sob novas perspectivas, ampliando o conhecimento sobre o fenômeno do envelhecimento. Palavras-chave: Envelhecimento, transformações. Abstract: This work aims to know and understand physical psychological the transformations that occur with the aged ones. The gerontology is the scientific study of the oldness. Much people do not know about it. Nowadays, there are studies in new perspectives increasing the knowledge about the ageing. Key words: Ageing, transformations. 1. INTRODUÇÃO Durante os primeiros quarenta anos do século passado, muito pouco se estudou sobre o processo de envelhecimento, já que naquela época eram priorizados os estudos sobre a infância. Logo após o final da Segunda Guerra Mundial, em 1946, nos Estados Unidos, a criação da Gerontological Society of América, da América Geriatric Association e da American Psychological Association incentivou a retomada dos estudos sobre a velhice, lançando as bases para o desenvolvimento de uma gerontologia social. Alguns anos depois, outros países, como a França, a Inglaterra e a Alemanha começaram a perceber os efeitos do envelhecimento em suas populações e intensificaram-se, na Europa, os estudos e as pesquisas sobre o envelhecimento e o interesse daí decorrentes que se refletiam em problemas de saúde, educação e seguridade social. No Brasil, embora a Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia (SBGG), filiada à Associação Médica * Pós-Graduada do Curso de Especialização em Gerontologia e Família. ** Pró-Reitora de Avaliação e Professora da Univap Doutora em Serviço Social e Especialista em Gerontologia. Revista UniVap, v.15, n.27, 2008 Brasileira, existisse desde 1961, tinha-se conhecimento das iniciativas européias e norte-americanas para abordar os problemas dos idosos; porém, os primeiros estudos acadêmicos brasileiros sobre o tema, só foram publicados a partir de 1975. (SESC, 2003) Este trabalho tem por objetivo conhecer e entender as transformações físicas e psicológicas, que ocorrem com as pessoas da terceira idade, grupo etário acima de 60 anos, conforme dispõe a legislação brasileira. 2. MATERIAL E MÉTODOS De acordo com o Estatuto do Idoso, Lei nº 10.741, de 1º/10/2003, são consideradas idosas as pessoas com idade igual ou superior a sessenta anos. Atualmente, as estatísticas mostram um aumento significativo da população idosa; segundo projeções estatísticas da Organização Mundial da Saúde (OMS) – até 2025, a população de idosos, no Brasil, crescerá 16 vezes, contra cinco da população atual. Esse crescimento é o mais acelerado no mundo e só comparável ao México e Nigéria. (CALDAS apud VERAS, 1997) Ao analisar a configuração da vida na senectude, Hall observou que ocorre uma transição crítica para a idade provecta e que difere muito de uma pessoa para outra: “de modo que a norma de vida para um homem seria o desastre para um outro”. (HALL, 1992, p. 393) 111 2.1 Teorias do Envelhecimento Na opinião de Pikunas (1979, apud HALL, 1992), o ser humano permanece, essencialmente, juvenil até mesmo na idade avançada. A idade avançada pede-nos: ...para construirmos um novo eu, exatamente como tivemos de fazer na adolescência, um eu que tanto soma quanto subtrai muito da antiga personalidade de nossos verdes anos. (HALL, 1992, p.394) Erikson (1963, apud PIKUNAS, 1979) oferece uma interpretação bidirecional da velhice.) Se as crises existenciais durante os estágios adultos da vida foram resolvidas em favor da intimidade e capacidade de produção, tornar-se possível uma alta integridade do ego para a velhice. A pessoa que possui esta integridade pode, prontamente, defender a dignidade de seu estilo de vida contra quaisquer ameaças. Entretanto, se a vida adulta foi marcada por preponderância de isolamento e estagnação, a velhice estará cheia de desespero. O dano substancial ao ego e as emoções transitórias têm a probabilidade de produzir sintomas de hipocondria, alucinações ou outras perturbações de moderadas a severas que marcam a senilidade. Bühler (1968, apud PIKUNAS, 1979), tem, também, em sua teoria a característica de bidirecionalidade, trata da auto-realização na idade avançada, salienta a auto-avaliação crítica em termos das realizações ou nãorealizações da vida toda. Os fracassos e as perdas são inevitáveis, porém muitas vidas conseguem realização parcial – a satisfação é encontrada em uma ou duas áreas básicas da vida. Quando a experiência frustradora foi muito preponderante, muitas vezes, a velhice é assinalada pela resignação. Cumiming et al. (1960 apud PIKUNAS, 1979), deram origem à teoria do desengajamento; aparentemente é a primeira interpretação psicossocial bem elaborada dos constitutivos do envelhecimento. Henry (1965, apud PIKUNAS, 1979), alega que o ponto central desta teoria é o “ressurgimento do foco na interioridade” acompanhada de um declínio na importância anteriormente atribuída a outras pessoas e eventos. Observou-se que o desengajamento dos idosos é um processo intrínseco e inevitável, já acontece em todos os estilos de vida. Tanto a teoria do desengajamento como a da atividade são muito simples para responderem por uma grande variedade de configurações de ajustamento nos anos tardios da vida. Ainda deverá ser formulada uma teoria global do envelhecimento. Normalmente, as pessoas envelhecem de maneira coerente com a história de sua vida. Existem muitas con112 figurações psicossociais distintas sobre a forma de envelhecer. Quando o idoso se ajusta ao declínio biológico e ao desengajamento social, significa que a pessoa que envelhece continua a recorrer ao que foi, assim também como ao que é. 2.2 Alterações Biológicas O envelhecimento biológico é um processo gradual de debilitação que não pode ser parado ou invertido. Há um declínio generalizado das funções orgânicas no decorrer do processo de envelhecimento. As modificações no organismo dos indivíduos avançam proporcionalmente ao desenvolvimento inicial, o envelhecimento está geneticamente programado, sendo ambos inerentes ao longo da vida, cuja característica principal é a acentuada perda da capacidade de adaptação e menor expectativa de vida. Entretanto as modificações variam de pessoa para pessoa, dependendo, entre outros aspectos, de suas condições físicas internas, do meio ambiente e do estilo de vida. O envelhecimento causa alterações significativas na estrutura e função do sistema pulmonar. Algumas pessoas podem se sentir limitadas na sua capacidade de participar de atividades físicas moderadas e intensas por causa das limitações dos seus sistemas pulmonar e/ou cardiovascular. As alterações relacionadas com a idade que ocorrem no sistema músculo-esquelético constituem, talvez, uma maior fonte de preocupação para os idosos do que as alterações sobre a função cardiovascular e pulmonar. A perda óssea e da força muscular, com freqüência, acarretam sérias e perigosas lesões. Muitas das alterações relacionadas com a idade que ocorrem no sistema músculo-esquelético são resultados da inatividade física. Com a idade, os ossos tornam-se mais frágeis. Na velhice, fraturas sérias e, com freqüência, debilitantes são comuns. Segundo projeções, por volta dos 90 anos, cerca de 32% das mulheres e 17% dos homens são suscetíveis a uma fratura do quadril e de 12% a 20% desse grupo podem morrer em conseqüência de complicações relacionadas com as fraturas. A massa muscular diminui com a idade, resultando em menor força e resistência muscular. A força muscular começa a diminuir em torno dos 40 anos e essa queda se acelera após os 60 anos. Para cada década, após os 25 anos, 3% a 5% da massa muscular é perdida. A força muscular e a capacidade de preensão diminuem significativamente com a idade. (RAMOS, 2000). A perda da força muscular nas pessoas da terceira idade pode afetar significantemente a qualidade e o tempo de vida. Revista UniVap, v.15, n.27, 2008 Com o envelhecimento normal, o tecido conjuntivo torna-se mais rígido e as articulações menos móveis. Com a idade, a perda da flexibilidade pode, também, ser o resultado de processos de doença degenerativa subjacente, tal como a artrite. A flexibilidade diminui com a idade, no entanto, não há evidências de que os processos biológicos associados ao envelhecimento sejam responsáveis por essa perda. Parece que os indivíduos mais velhos possuem um sistema de controle térmico menos eficiente. Tanto o ganho quanto a perda de calor não são tão eficientes em pessoas idosas. Existe uma maior taxa de mortalidade e morbidade para as doenças relacionadas com o calor, na velhice, em comparação à população mais jovem. (ROBERGS; ROBERTS, 2002) As deficiências visuais e de orientação, o aumento de tempo de reação, a coordenação reduzida e a probabilidade de dores musculares de fadiga intensa – tudo isso contribui para uma perda de mobilidade e suas sérias conseqüências para o ajustamento social. (SACHER, 1965 apud PIKUNAS, 1979) 2.3 Alterações Biopsicológicas Nesta fase da vida, o decréscimo de energia é um dos fatores na mudança da estrutura motivacional. A agilidade nos movimentos começa a diminuir ligeiramente a partir dos 30 anos, ao passo que a coordenação permanece bastante estável até os 60 anos. Em alguns casos, a saúde declina a partir dos 40 e o vigor físico aos 45 anos. Deve-se levar em consideração a variação individual no envelhecimento biológico. PIKUNAS, 1979) 2.4 A Capacidade Cognitiva Um dos principais aspectos cognitivos da inteligência é a capacidade de reter informações. Na atividade profissional, o indivíduo idoso, geralmente, experimenta uma perda de eficiência. Pouco depois dos sessenta anos, muitos começam a demonstrar inadequações no desempenho do trabalho costumeiro, cansam-se com mais facilidade do que antes. Estabelecer uma aposentadoria, arbitrariamente, a uma determinada idade, por exemplo, aos sessenta e cinco, não é justo para alguns que ainda são capazes de desempenhar bem seus cargos. A falta de instalações recreativas apropriadas para aposentados, além da sensação de que eles já não são mais necessários, leva a sentimentos de inadequação e depressão. Se o idoso não encontra saídas para exercer suas capacidades, o sentimento de inutilidade que resulta é prejudicial à sua segurança. Os efeitos psicológicos do “tempo vago” são prejudiciais a muitos, especialmente para os que têm falta de variedade de interesses que possam ocupar o tempo que antes era dedicado ao trabalho. Duvall (1971 apud PIKUNAS, 1979), afirma que a participação ativa em algumas atividades individuais e grupais é de capital importância psicológica para a manutenção da auto-estima e do sentimento de importância. 2.5 Senescência e senilidade No sexo masculino, há um ligeiro declínio da atividade sexual durante os últimos anos de vida adulta, acelerando-se a partir dos 50 anos. Os homens simplesmente sentem seu desejo regular de alívio sexual diminuir à medida que a atividade sexual se torna menos interessante que nos primeiros anos de vida adulta. Uma única falha em manter ereção, na maioria das vezes, tem efeito desproporcional sobre as pessoas de mais de quarenta ou quarenta e cinco anos. Senescência é o período da vida identificado, arbitrariamente, como idade cronológica. Nos estudos atuais, a idade de sessenta e cinco anos é considerada o ponto para a introdução neste ciclo. A aposentadoria, com seus problemas de ajustamento, pode marcar esse momento. É importante salientar que isto não implica em deterioração marcante dos sistemas orgânicos, poderes cognitivos ou perícias adquiridas. (PIKUNAS, 1979). Nas mulheres, a menopausa dura cerca de dois anos, é quando ocorre o fim do ciclo menstrual. As mulheres estão sujeitas a marcante excitabilidade, calores, suores, tonturas, sensibilidade a frio e calor, e outros sintomas. Os temores de perda da feminilidade e de envelhecer complicam o comportamento emocional. Após este ciclo, a estabilidade comportamental e a autoconfiança também se elevam e são mantidos por, aproximadamente, uma década. Os desejos afetuosos e sexuais duram a vida toda, mas para estes há um declínio moderado na idade avançada. (BISCHOF, 1969 apud A senilidade, por outro lado, embora intimamente aliada à senescência, implica numa perda substancial de integração orgânica e funcional. O período da velhice é de mudança disseminada, e às vezes, drástica. A velhice, assim como a adolescência, é caracterizada por alterações físicas, sociais e emocionais. E da mesma maneira precisa de uma preparação adequada para tais mudanças. A expectativa social e a pressão cultural atuam em conjunto, amiúde forçando uma nova modalidade de vida antes que haja uma necessidade pessoal ou as capacidades em declínio o exijam. (PIKUNAS, 1979) Revista UniVap, v.15, n.27, 2008 113 2.6 Alterações na Personalidade Na senectude, ocorrem mudanças na estrutura e na organização da personalidade. A repetição e o hábito de atividades rotineiras aumentam e declinam o ajustamento às preferências expressas pelos outros. O sucesso na preservação da integridade da personalidade e seus traços operativos mostram amplas diferenças individuais relacionadas ao desenvolvimento anterior da personalidade. Seu nível funcional de autoexpressão é coerente com seus dotes e ocasiona muitas experiências gratificantes de auto-realização. A saúde mental não pode se substancialmente melhorada durante os estágios mais tardios da vida. As perturbações emocionais, hipocondria e demência senil geral são freqüentes. Aparentemente, muitas pessoas deixam de tratar com sucesso das privações, conflitos e problemas moderados e sérios dos seus vinte ou trinta anos e tornam-se predispostas a perturbações psicossomáticas e mentais na idade adulta. A pessoa idosa desenvolve uma diminuição do espaço vital e há, também, a negação de respostas. (MATSUDO et al., 2000) assalariados aposentam, mas passam a realizar “bicos” ou biscates para enfrentar despesas básicas, como alimentação, moradia e saúde. (BOSI, 1994) Conviver com o processo de envelhecimento é aceitá-lo como condição existencial, visto que só envelhecem aqueles que tiverem o privilégio de não morrer quando crianças ou quando jovens; isto pode soar como óbvio para alguns. É imprescindível aprender a conviver com a realidade humana que é o envelhecimento. Ao se conquistar este espaço de ser, o idoso será capaz de ressignificar sua história, na sua trajetória de vida entre o nascer e o morrer, em todos os seus significados. 4. CONSIDERAÇÕES FINAIS A velhice pode ser uma fase compensadora se é alcançada com alegria, criatividade e curiosidade. Estas qualidades requerem viver em plenitude o momento presente, já que o hoje é a juventude da longevidade. A idéia não questionada do paradigma ligado à velhice era que, à medida que o corpo ia se desgastando com o passar do tempo, a vida se tornava cada vez menos gratificante. 3. RESULTADOS E DISCUSSÃO O universo de estudo sobre o processo de envelhecimento é complexo e amplo e faz parte da vida de todos os seres humanos; contudo, no dia-a-dia, o tema é tratado como tabu, como assunto que não deve ser comentado ou debatido. O indivíduo precisa se sentir capaz de tomar suas próprias decisões, de administrar sua própria vida, mas, é imprescindível que faça isso desde a idade adulta, preparando-se para as fases posteriores. A questão essencial é superar os preconceitos da incapacidade ou inutilidade, assumir as possibilidades que se apresentarem de manter-se física, psíquica e socialmente capaz. A função social da velhice é “facilitar a continuidade da população humana na ordem dos valores, daquilo que pode justificar a vantagem de viver e assegurar a qualidade de vida”. (BASTIDE, 1999, p.9) Contudo, o estoque de possibilidades de vida não se esgota após uma certa idade; esta é definida por cada sociedade e indivíduo. O novo paradigma diz que a vida é um processo de transformação constante, não de declínio, mas plena de potencial para um crescimento sem limites. Para conservar a chance de novas possibilidades, década após década, tem-se que saber quais são as possibilidades que existem. O que se deveria esperar física, mental e emocionalmente no segundo cinqüenta anos de vida? Está sendo formulada uma nova ciência da longevidade para responder a essa questão. O declínio automático não está programado dentro dos corpos. A longevidade acontece para aqueles que descobriram isto por si mesmos – a ciência está validando as numerosas melhorias nas funções corporais que as pessoas mais velhas já estão experimentando. (CHOPRA, 1994) 5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS O mundo atual é o resultado da ação do homem na busca da realização individual e coletiva. A sociedade cria as categorias de homens produtivos e improdutivos, ideologicamente considerados como atributos comuns e naturais. Essa perspectiva encobre a categoria dos desempregados, desqualificados profissionalmente ou altamente qualificados, que oculta as diferenças de classe social. Tal perspectiva encobre, ainda, o fato de que os 114 BASTIDE, P. Arbousse. A idéia do tempo e envelhecimento. In Rev. Terceira Idade. Ano X, n. 16. São Paulo. SESC, 1999. BOSI, E. Memória e Sociedade: lembranças de velhos. 3.ed. São Paulo: Companhia das Letras, 1994. CHOPRA, D. Corpo sem idade, mente sem fronteiras. 3.ed. Trad. De Haroldo Netto. Rio de Janeiro: Rocco, 1994. Revista UniVap, v.15, n.27, 2008 EVANS, W. J.; FIATARONE, M. Exercício e atividade física para pessoas idosas. Atividade física e saúde. v. 1, 1998. PIKUNAS, J. Desenvolvimento Humano: uma ciência emergente. São Paulo: McGraw-Hill do Brasil, 1979. FERREIRA, V. Atividade Física na terceira idade: o segredo da longevidade. Rio de Janeiro: Sprint, 2003. RAMOS, A. T. Treinamento de força na atualidade. Rio de Janeiro: Sprint, 2000. FREUD, S. Escritos sobre a psicologia do inconsciente, v 1. Trad. Luiz Alberto Hanz. Rio de Janeiro: IMAGO, 2004. ROBERGS, R. A.; ROBERTS, S. O. Princípios fundamentais de fisiologia do exercício: para aptidão, desempenho e saúde. São Paulo: Phorte, 2002. MATSUDO, S. M. et al. Efeitos benéficos da atividade física na aptidão física e saúde mental durante o processo de envelhecimento. Atividade física e saúde. v. 5, n. 2, 2000. SOARES, J. M. C.; APPEL, H. J. Adaptação muscular ao exercício físico. Lisboa: Cultura Física, 1990. O século da Terceira Idade. São Paulo: SESC, 2003. Revista UniVap, v.15, n.27, 2008 115 O Desafio do Diagnóstico Precoce do Câncer de Próstata no Trabalhador Brasileiro dentro do Sistema Público de Saúde: uma realidade que precisa ser conhecida e modificada Paulo Afonso de Barros * Elizabeth Moraes Liberato ** Resumo: O artigo trata da necessidade do diagnóstico precoce do câncer da próstata, discute a existência de um grande preconceito que persiste entre a população masculina, os tabus e os medos que cercam a realização dos exames de prevenção e detecção e as dificuldades que o sistema de saúde público impõe aos trabalhadores de empresas privadas que não dispõem de plano de saúde próprio. O assunto é tratado considerando os dados nacionais de incidência da doença. O trabalho traz uma proposta de reformulação na política de saúde no município de São José dos Campos, estado de São Paulo, e em caráter nacional, considerando o aumento da população idosa e o caráter preventivo voltado à promoção da saúde de maneira plena. Palavras-chave: Saúde, diagnóstico precoce, prevenção, próstata, preconceito. Abstract: The article treats the necessity of the precocious diagnosis of the cancer of prostate in the city of São José dos Campos, discuss the existence of a great prejudice that persists among the masculine population, the taboos and the fears that surround the accomplishment of the prevention exams and detection and the difficulties that the public system of health imposes the workers of private companies who do not have own health insurance. The work brings a proposal of reformularization in the politics of health in the city of São José dos Campos, state of São Paulo, and in national character, considering the increase of the aged population and the preventive character directed to the promotion of the health in full way. Key words: Health, precocious diagnosis, prevention, prostate, preconception. A saúde é um direito fundamental do ser humano, devendo o Estado prover as condições indispensáveis ao seu pleno exercício, por meio de políticas econômicas e sociais que visem à redução de riscos de doenças e de outros agravos e no estabelecimento de condições que assegurem acesso universal e igualitário às ações e serviços para a promoção, proteção e recuperação da saúde individual e coletiva (BRASIL, 2002; 2006). * Pós-Graduado do Curso de Especialização em Gerontologia e Família. ** Pró-Reitora de Avaliação e Professora da Univap Doutora em Serviço Social e Especialista em Gerontologia. 116 1. INTRODUÇÃO A Constituição da República Federativa do Brasil, promulgada em 5 de outubro de 1988, contemplou a saúde como um direito de todos e dever do Estado. A partir de então, e sempre com a mobilização da sociedade civil organizada, foram publicadas as Leis Orgânicas da Saúde (8.080/ 90 e 8.142/90), o Decreto No.99.438/90 e as Normas Operacionais Básicas -NOB, editadas em 1991 e 1993. A Lei 8.080/90 regulamentou o Sistema Único de Saúde - SUS, estabelecendo as obrigações da União, dos estados e municípios, cada um em sua esfera de atuação, e devidamente integrados, a partir do que seriam propiciadas as condições mínimas para que todo cidadão brasileiro tivesse acesso aos cuidados básicos de sua saúde, não só pela medicina curativa, prática essa ainda muito comum em nosso país, mas, principalmente, utilizandose da medicina preventiva, consagrada universalmente como única forma de se evitar doenças preveníveis. Revista UniVap, v.15, n.27, 2008 A atenção à saúde, ainda de acordo com a referida NOB, implica a implementação de ações de assistência, voltadas para as pessoas, de maneira individual ou coletiva, seja ambulatorialmente ou em ambientes hospitalares e ainda domiciliares, prevendo também, intervenções ambientais, especialmente nos ambientes de vida e trabalho e, por fim, políticas externas ao setor saúde, onde estão previstas políticas direcionadas ao emprego, habitação e, dentre outras, a educação. É ratificado na mesma NOB o amplo conceito de saúde, segundo a Organização Mundial de Saúde - OMS (Organização Nações Unidas - ONU): “Saúde é um estado de completo bem- estar físico, mental e social, e não apenas a ausência de doença ou enfermidade”.. Para tanto são enfatizadas as necessárias e imprescindíveis ações nesses três níveis de atenção à saúde, envolvendo sua promoção, proteção e recuperação, prioritariamente focando-se a prevenção. baixa complexidade realizados nas Unidades Básicas de Saúde-UBS; o nível secundário trata de procedimentos com maior complexidade nas Unidades de Pronto Atendimento-UPA, nos hospitais e nos ambulatórios de especialidades; já o atendimento em nível terciário diz respeito aos atendimentos de média e alta complexidade, em hospitais geralmente ligados às universidades (GUTIERREZ apud PELOSO, 2005) As Unidades Básicas de Saúde representam a porta de entrada do cidadão ao Sistema Único de Saúde, cabendo-lhes prestar a atenção básica aos munícipes. De acordo com a Secretaria Municipal de Saúde de São José dos Campos (2005), cabe à rede de atenção básica as “ações ligadas à manutenção da qualidade de vida das pessoas pela promoção de hábitos e atitudes saudáveis, pela prevenção de doenças e agravos e pela assistência a doenças mais comuns na comunidade”. (PELOSO, 2005, p.73) 2. MATERIALE MÉTODOS A cidade de São José dos Campos – São Paulo, através da Norma Operacional Básica do Sistema Único de Saúde - NOB-SUS, de 01/96, assumiu, a responsabilidade de gerir plenamente esse sistema, ressalvadas as obrigações do Estado e da União. O Sistema Único de Saúde possui níveis de atendimento à população, sendo primário, secundário e terciário. Ao nível primário cabem os atendimentos de Cada UBS possui uma área de abrangência delimitada de acordo com a origem da demanda dos serviços de saúde pública, e também devido à acessibilidade disponível, considerando, assim, a oferta dos serviços de saúde e a demanda. (CORTEZ, 2004 apud PELOSO, 2005) Segundo dados da Secretaria Municipal da Saúde, o município de São José dos Campos dispõe de uma rede de atendimento, conforme quadro abaixo: REGIÃO Centro Leste Norte Oeste Sudeste Unidade Básica de Saúde 4 11 6 2 3 Unidade Especializada em Saúde 10 1 1 0 0 Unidade de Pronto Atendimento 0 2 2 0 0 Hospital Público 1 1 0 0 0 Unidade de Apoio 1 0 0 0 0 São seis os hospitais contratados e conveniados que fazem parte do atendimento. Não há programas e projetos específicos para o idoso, eles estão inseridos no programa de saúde PROGRAMA DE SAÚDE DO ADULTO. Serviços de Atendimento Sul 10 2 0 0 2 Fonte: Secretaria Municipal da Saúde. A partir desse quadro, pretendemos demonstrar a necessidade de uma reformulação na política de saúde do município, em relação ao diagnóstico precoce de patologias oncológicas, especialmente a do câncer da próstata. 2.1 O Câncer de Próstata “A próstata é uma glândula que só o homem possui e que se localiza na parte baixa do abdômen. É um Revista UniVap, v.15, n.27, 2008 órgão pequeno, tem a forma de uma maçã e se situa logo abaixo da bexiga e adiante do reto. A próstata envolve a porção inicial da uretra, um tubo pelo qual a urina armazenada na bexiga é eliminada. A próstata produz parte do sêmen, um líquido espesso que contém os espermatozóides produzidos pelos testículos e que é eliminado durante o ato sexual”. (INCA, 2005, p. 34) O Instituto Nacional de Câncer - INCA, juntamen117 te com o Ministério da Saúde, desde o ano de 1995, vem aprimorando a coleta de dados que trata da incidência de câncer em nosso país; esse trabalho é hoje um dos instrumentos essenciais para enfrentar as muitas dificuldades que ainda são muito presentes, na população masculina brasileira, em aceitar e buscar a prevenção do câncer de próstata. O número de casos novos de câncer de próstata estimado para o Brasil, em 2006, é de 47.280. Estes valores correspondem a um risco estimado de 51 casos novos a cada 100 mil homens. (INCA, 2005, p. 34) O câncer de próstata é o mais freqüente em todas as regiões entre o total de tumores, exceto pele não melanoma, com risco estimado de 68/100.000 na região Sul, 63/100.000 na região Sudeste, 46/100.000 na região Centro-Oeste, 34/100.000 na região Nordeste e 22/100.000 na região Norte. (INCA, 2005, p.34) Em países desenvolvidos, o número de casos novos diagnosticados de câncer de próstata representa 15,3% de todos os casos incidentes de câncer, enquanto que, nos países em desenvolvimento, esse índice é de 4,3% dos casos. Seguramente o câncer de próstata é o mais prevalente entre os homens. (INCA, 2005, p. 34) Com o surgimento de exames de rastreamento, dentre eles o teste de Antigeno Prostático Específico (PSA), observa-se um aumento nas taxas de sua incidência em indivíduos assintomáticos, justamente onde esse exame já é uma rotina. O surgimento desse tipo de câncer na velhice, notadamente a partir dos 65 anos de idade, conforme descrito na referida publicação, se deve em muito à não realização de exames preventivos já a partir dos 45 anos ou mesmo antes, pelo menos desde os 40 anos, caso haja antecedentes familiares diretos que desenvolveram essa patologia antes dos 60 anos, dentre eles, pai, e irmão. 3. DISCUSSÃO Um dado significativo que nos remete à futura condição de vida do idoso, é que 75 % de todos os casos de câncer da próstata no mundo acometem indivíduos a partir dos 65 anos. (INCA, 2005, p. 34) Se considerarmos o aumento da população idosa brasileira, especificamente da população de São José dos Campos, conforme abaixo, e correlacioná-la aos dados estatísticos já referenciados que envolvem o câncer de próstata, podemos projetar uma difícil situação para esse contingente importante de indivíduos velhos, com o enfrentamento das conseqüências do diagnóstico tardio do câncer da próstata, já com metástases, que lhes trará 118 grande sofrimento e precárias condições de sobrevida com qualidade e dignidade, além ainda do aumento dos custos para a previdência social e para o sistema de saúde. De acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística-IBGE, Censos e Estimativas, a estimativa para a população residente por faixa etária em São José dos Campos, no ano de 2006, é de 610.962 indivíduos, dos quais 301.870 (49,40%) são do sexo masculino e destes, 39.004 (12,54%) estão na faixa etária entre 50 a 79 anos, período de maior incidência e mortalidade em decorrência do câncer de próstata. Geralmente os homens só querem fazer o exame de sangue para dosagem do PSA, uma vez que os mitos que cercam a realização de um exame clínico específico da próstata, que é o toque digital, ainda é cercada de medo e vergonha e que, em muitos casos, no imaginário do homem, atentaria contra a sua própria masculinidade. (MURAD, 2005) É importante ressaltar que, para o indivíduo assintomático principalmente, a dosagem do PSA , alterada ou não, só serve de informação complementar para o médico, a sensibilidade do toque é vital para a percepção de alterações na próstata que podem indicar a necessidade da realização de exames complementares, tais como a ultra-sonografia prostática transretal (através do ânus), eventual biópsia que confirmará ou não a existência de um tumor maligno ou de um aumento da próstata em decorrência de doenças inflamatórias (prostatites) e a hiperplasia benigna, que produz crescimento de um adenoma (tumor benigno) (MURAD, 2005). Dentre as várias formas de conscientização e esclarecimento da população, ressaltamos a necessidade da utilização de um dos mais importantes instrumentos, a educação formal, desde o ensino fundamental, com a devida capacitação dos professores das redes pública e privada, bem como persistirmos na contínua realização de campanhas. Infelizmente, esses veículos de comunicação são pouco aproveitados enquanto estratégias para diminuição desse preconceito tão enraizado em nossa cultura. 4. RESULTADOS Uma vez conscientizada, a população masculina não encontra mecanismos operacionais adequados na rede pública para buscar orientação e apoio; enfrenta, na prática, muitas dificuldades, a começar pela marcação de sua primeira consulta na UBS. O procedimento atual para a realização de consultas e exames no município de São José dos Campos não favorece a prevenção do câncer da próstata, visto que, o maior contingente de pessoas que freqüentam as UnidaRevista UniVap, v.15, n.27, 2008 des Básicas de Saúde, no município, é de mulheres, as quais, enquanto aguardam suas respectivas consultas ou de seus filhos, participam de palestras e esclarecimentos de patologias que as afetam e a necessidade da realização de exames preventivos. Já os homens, especialmente os assintomáticos em se tratando de patologias que acometem a próstata, raramente participam dessas palestras ou simplesmente não procuram a rede pública. Os homens, trabalhadores formais, não são estimulados pelas empresas que não oferecem plano de saúde próprio ou contratado, a procurarem as UBSs, em função da quantidade de vezes que esse empregado deixará de trabalhar ou chegará atrasado. Entre a marcação de uma consulta, sua efetiva realização, ida ao laboratório de análises clínicas para coleta de sangue, retirada desse resultado, mais um retorno à UBS, e encaminhamento ao especialista na Unidade Especializada em Saúde para outra avaliação, e a necessidade de eventuais exames complementares, isto demandará um número elevado de ausências ao trabalho, ainda que parciais. Essa peregrinação inibe o indivíduo a dar seqüência à investigação clínica necessária. O empregador, via de regra, não aceita esse processo, não só visando à redução de seus índices de absenteísmo e a redução de custos de seu produto final, também pela falta de conhecimento e ausência de incentivo por parte do sistema público, que, por sua vez, precisa atuar de maneira pró-ativa, facilitadora e preventivamente. Assim, resta ao trabalhador a insegurança entre buscar seu direito à saúde ou a manutenção de seu emprego. 5. CONSIDERAÇÕES FINAIS Assim como a legislação obriga as empresas a realizarem exames médicos ocupacionais, é importante que, com a participação dos diversos segmentos dos trabalhadores, representações de classe, conselhos comunitários de saúde, entidades médicas e a classe política, especialmente do legislativo federal, seja alterada a legislação trabalhista, institucionalizando-se o Programa Nacional de Diagnóstico Precoce do Câncer da Próstata, obrigando as empresas a liberarem os trabalhadores que se enquadrarem no perfil acima descrito, ou seja, idade associada a antecedentes familiares, quando for o caso, para a realização de consultas e exames na rede pública. A partir de então, através de uma parceria com o poder público municipal, seriam operacionalizados todos os procedimentos necessários, conforme aqui suRevista UniVap, v.15, n.27, 2008 cintamente mencionados, de maneira prática, ágil e objetiva, diminuindo significativamente o tempo de espera para as consultas e realização de exames complementares. Uma vez regulamentado esse programa, certamente seriam propiciadas condições mínimas para um aumento considerável na quantidade de indivíduos que, de fato, passariam a fazer a prevenção do câncer de próstata, dando-lhes oportunidade de uma velhice com mais qualidade de vida, lembrando que a maior incidência dessa patologia ocorre a partir dos 65 anos de idade. Dessa forma, empresas, trabalhadores, entidades de classe e poder público, juntos, formariam uma sólida cooperação para combater o preconceito e viabilizar a promoção da saúde de maneira plena e digna. 6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BOSI, E. Memória e Sociedade: lembranças de velhos. 3. ed. São Paulo: Companhia das Letras. 1994. BRASIL, Congresso. Senado. Constituição da República Federativa do Brasil, Brasília, DF, 1988. Disponível em: http://www.senado.gov.br. Acesso em: 6.nov.2006. BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria Nacional de Assistência à Saúde. Instituto Nacional do Câncer. Coordenação de Prevenção e Vigilância - Conpre. Câncer da Próstata, consenso. Rio de Janeiro: INCA. 2002. CAMARANO, A. A. O idoso brasileiro no mercado de trabalho. Brasília: IPEA-2000. Disponível em: http:// www.ipea.gov.br. Acesso em: 7 out. 2006. Centro de Orientação e Desenvolvimento da Sexualidade - Clínica de Urologia e Sexualidade. (CEDES. 2006). COLIN, D. R. A.; FOWLER, M. B. LOAS: Lei Orgânica da Assistência Social anotada - São Paulo, 1999. Série Núcleo de Pesquisa 4. Instituto Brasileiro Interdisciplinar de Sexologia e Medicina Psicossomática - ISXP. [s.l.], 2006. Disponível em: http://www.isexp.com.br. Acesso em: 6 nov. 2006. Instituto Nacional do Câncer (INCA). Estimativa 2006, Incidência de Câncer no Brasil. Rio de Janeiro, 2005, p. 34-35. Disponível em: http://www.inca.gov.br. Acesso em: 5 nov. 2006. Ministério da Saúde. Indicadores Municipais de Saúde. Brasília, 2006. Disponível em: www.saude.gov.br. Acesso em: 7 nov. 2006. MURAD, A. M. Combate ao câncer da próstata. [s.1]. Saúde Plena, 2006. (entrevista). Disponível em: http:// 119 www.saudeplena.com.br. Acesso em: 6.nov.2006. PELOSO, L. A. O processo de envelhecimento, os serviços e equipamentos de saúde pública em São José dos Campos - um estudo para o Planejamento Urbano. São José dos Campos, Univap, 2005. pp. 72-73. São José dos Campos. Prefeitura Municipal. Sistema Único de Saúde – SUS. Norma Operacional Básica do SUSNOB-SUS 01/96. São José dos Campos, 2006. Disponível em: http://www.sjc.sp.gov.br, Acesso em: 5 nov. 2006. 120 Seminário Nacional de Saúde População Negra: síntese de relatório, I, 2004. Brasília-DF. Anais Eletrônicos...Brasília-DF: Ministério da Saúde, Secretaria de Gestão Estratégica e Participativa, Departamento de Apoio à Gestão Participativa. - 2. ed. - Brasília: Ministério da Saúde, 2006. pp.11-15. Serviço Social do Comércio (SESC). Encontro Velhos Cidadãos. A Terceira Idade, SESC, n. 21, ano 12:2001. Revista UniVap, v.15, n.27, 2008 Depressão no Idoso José Valter de Andrade * Maria Clara Lombardi de Castro Silva * Rosana Bernacca * Rosana Pereira Domiciano Moura * Elizabeth Moraes Liberato ** Resumo: Este artigo propõe-se a uma reflexão sobre alguns aspectos que levam, hoje, ao alto índice de ocorrência de depressão no idoso, analisando o que leva a um quadro depressivo e o papel da família no tratamento. Trata, ainda, da visão do idoso integrado na sociedade moderna, antes e após a aposentadoria. De acordo com Kramlinger, em seu livro Depressão Pesquisada e Comentada pela Clínica Mayo, “a depressão não é parte natural da velhice.” Palavras-chave: Idoso, depressão, família, aposentadoria. Abstract: This study aims to reflect about aspects that affect the occurrence of depression between the elderly people, and analyze the cause of the depressive situation, and paper of the family in the treatment. It treats about the elderly vision, in the modern society, before and after the retirement. Key words: Elderly, depression, family, retirement. 1. INTRODUÇÃO A visão que a sociedade moderna tem dos velhos nem sempre é agradável, principalmente aos seus próprios olhos; muitas vezes, eles são motivos de comentários jocosos e preconceituosos. O idoso, hoje, vem de uma realidade diferente, pertence a um tempo em que os filhos cuidavam de seus pais. Isto, por vezes, não acontece nos dias de hoje, onde as famílias têm um número menor de filhos, todos trabalham fora para melhorar as condições financeiras, sobrando pouco tempo e espaço para o idoso dentro do núcleo familiar. O idoso é penalizado, ainda, por suas próprias questões financeiras. Após anos de trabalho, o valor da aposentadoria que recebe não lhe proporciona tranqüilidade e dignidade. Afirma Cerqueira: “Estudar as condições de saúde e bem estar da população idosa implica, necessariamente, dar uma atenção especial à sua saúde mental, investigando, particularmente, a demência e a depressão, doenças que têm suas incidências e prevalências aumen- * Pós-Graduado(a) do Curso de Especialização em Gerontologia e Família. ** Pró-Reitora de Avaliação e Professora da Univap Doutora em Serviço Social e Especialista em Gerontologia. Revista UniVap, v.15, n.27, 2008 tadas com o avanço da idade e que podem levar o idoso à perda de sua autonomia, aumentando os anos de vida vividos com incapacidade”. (CERQUEIRA, 2003, p. 143) 2. MATERIAL E MÉTODOS 2.1 Pesquisa Epidemiológica Segundo estudo da distribuição dos transtornos psiquiátricos na população humana e dos fatores que influenciam sua distribuição (LILIENFELD; LILIENFELD, 1980 apud KRAMLINGER, 2000), a pesquisa epidemiológica da depressão no idoso é um assunto relevante na prática clínica, pois determina a taxa de ocorrência de depressão em pessoas idosas na comunidade e os possíveis fatores de risco associados à depressão. São usadas três fontes de dados para verificação da extensão dos transtornos depressivos no idoso: · O registro de casos psiquiátricos é um protocolo central que inclui informação sobre todas as pessoas com diagnóstico de transtorno psiquiátrico, através de contato com serviços psiquiátricos, como hospitais e ambulatórios. · As pesquisas em instituições representam a segunda fonte de dados com relação à distribuição da depressão em idosos. A depressão é comum entre pessoas idosas em asilos e há preo121 cupação quanto ao fato de que ela é freqüentemente sub-diagnosticada. · Uma terceira fonte de dados para a freqüência da depressão é a pesquisa populacional. Um método de avaliação comumente utilizado em epidemiologia é a da prevalência por períodos (número de casos ocorridos durante um dado período por unidade da população ou do grupo). A depressão no idoso é uma doença que pode levar à perda da autonomia funcional; muitas vezes, não é uma doença isolada, ela antecede algum problema mais grave de saúde ou surge logo após este problema ter ocorrido, como por exemplo, o infarto ou o derrame. De acordo com pesquisa da Clínica Mayo (Mayo Foundation For Medical Education and Research), citada por Kramlinger em seu livro “Depressão Pesquisada e Comentada – 2000”, o derrame tem uma forte relação com a depressão, e independentemente do nível de complicações (leve, moderada ou grave) pode durar até 2 anos após a sua ocorrência. Nas doenças de Parkinson e nos Acidentes Vasculares Cerebrais (AVCs), a depressão faz parte da própria doença; são consideradas como Depressão Secundária. Algumas pessoas com dificuldades leves entram em depressão e outras, com graves seqüelas físicas, não deprimem. Pode ocorrer que as pessoas que cuidam desses idosos acreditem que os sintomas depressivos sejam “normais” mas, a falta de um tratamento eficaz prejudica a recuperação dos comprometimentos físicos advindos do derrame. 2.2 Causalidade da Depressão As características clínicas da depressão no idoso podem tomar por base os clássicos conceitos de depressão reativa, depressão secundária e depressão endógena, que se confundem na depressão senil. Depressão Reativa - reativa a alguma situação vivencial traumática (o idoso passa por uma condição existencial problemática e, muitas vezes, sofrível) Depressão Secundária – secundária a alguma condição orgânica (o idoso costuma desenvolver estados patológicos e degenerativos que facilitam o desenvolvimento da depressão). Depressão endógena – é constitucional, atrelada à personalidade (as pessoas com depressão endógena ou constitucional envelhecem e continuam depressivas). Verifica-se pelas condições existenciais, que a depressão do idoso bem que poderia ser reativa. Poderia igualmente ser secundária conforme as condições físicas do idoso e finalmente, pelos eventuais antecedentes, poderia ser endógena. 3. RESULTADOS/DISCUSSÃO Citando os estudos dos pesquisadores norteamericanos Beekman et al. sobre a prevalência de depressão entre idosos, Cerqueira (2003) cita como relevante os dados de incidência de uma em cada oito pessoas com mais de 65 anos. Verifica-se que um dos fatores sociais que levam à depressão do idoso é a não-participação deste no seio familiar. O idoso se vê em uma situação marginalizada na família e na sociedade, excluído no dia-a-dia, das decisões familiares, dos eventos sociais, enfim, situações em que, há pouco tempo, era ele quem se destacava ou organizava. Outro fator social é a chegada da aposentadoria, nem sempre o idoso está preparado emocionalmente e financeiramente; torna-se um fato que ocasiona mudanças profundas em sua vida, levando-o a se sentir inútil ou inválido para a sociedade e a família. O envelhecimento ocorre de forma variada nos indivíduos, alguns fazem uma passagem tranqüila. Aqueles que extraem do trabalho a satisfação pessoal como elo social, sua auto-estima com a chegada da aposentadoria pode alterar-se; a rotina muda, as expectativas mudam, os relacionamentos também podem mudar. Algumas atitudes tomadas certamente podem prevenir a depressão, como manter uma vida social, aprender novas atividades, engajar-se em um trabalho voluntário, consultar um profissional para fazer atividades físicas que dêem prazer. A renovação espiritual também fortalece o indivíduo, de acordo com sua crença, seus valores e propósitos de vida. Outras causas de depressão no idoso são: medicação inadequada; perda de pessoas queridas; distanciamento familiar; incapacidade funcional; entre outras. Os sintomas de depressão nos idosos podem ser vários, entre eles se destacam: tristeza profunda; desânimo; diminuição de interesse por atividades anteriores; alterações no sono e apetite; irritabilidade. A depressão pode causar um forte impacto nas relações familiares e afetar a qualidade de vida. Toda depressão deve ser avaliada e tratada por 122 Revista UniVap, v.15, n.27, 2008 médico. Ela pode ser leve, moderada ou grave e cabe ao médico diagnosticá-la e tratá-la, com medicamentos ou não. Com as devidas orientações e identificação da doença, esta pode ter o auxílio de outros tratamentos, como psicoterapia individual ou em grupo; atividade física ou terapia ocupacional. Para um tratamento eficaz são importantes o apoio e participação da família. O idoso pode reagir tão bem ao tratamento tanto quanto os mais jovens. 5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS CASTILHO, T. O idoso fragilizado e a família. In: A Terceira Idade. v. l8, n. 38. São Paulo. SESC. Fev. 2007. CERQUEIRA, A. T. de A. R. Deterioração cognitiva e depressão. In O Projeto SABE no Município de São Paulo: uma abordagem inicial. SP. OPAS/OMS. 2003. DALGALARRONDO, P. Psicopatia e Semiologia dos Transtornos Mentais. 2000. 4. CONSIDERAÇÕES FINAIS A depressão no idoso ou qualquer pessoa, seja qual for a causa, tem que ser tratada como doença, tendo sempre avaliação e acompanhamento médico. O papel da família durante e após o tratamento é parte integrante deste; é a família que deve dar o apoio e suporte para que o tratamento seja mantido do início ao fim, sem interrupções, pois uma recidiva sempre é pior do que a própria doença. Como dizia Samuel Johnson, escritor inglês do século XVII, “a tristeza é a ferrugem da alma. A atividade limpa e a torna brilhante”. Citando Castilho: “A falta da família e da rede social pode tornar os idosos pessoas tristes e agravar a já esperada depressão comum à velhice(...) As políticas públicas e institucionais contribuiriam muito se incluíssem em seus programas projetos que promovessem o fortalecimento dos vínculos familiares e o resgate da história e da memória dos eventos e dos afetos”. (CASTILHO, 2007, p. 63) Revista UniVap, v.15, n.27, 2008 FORLENZA, O. V. Neuropsiquiatria Geriátrica. Ed. Atheneu. KRAMLINGER, K. M. D. Depressão Pesquisada e Comentada pela Clínica Mayo. Tradução da Psicóloga Ângela Lobo de Andrade. 2000. Depressão no idoso www.psiqweb.med.br/geriat/depidoso.html A depressão no idoso www.josemol.com.br/adepressaonoidoso.html Idade Ativa – revista eletrônica da Terceira Idade www.techay.com.br/techway/revista_idoso/comportamento/comportamento_renata.htm Serviços de saúde-Depressão no idoso www.lincx.com.br/lincx/saude a z/3 idade/depressao.asp Sua Saúde - Portal do envelhecimento w w w. p o r t a l d o e n v e l h e c i m e n t o . n e t / s u a s a u d e / suasaude5.htm 123 Convivência Familiar na Velhice Diva Maria Silva Santos * Lilian Cesare Costa * Mariângela Rebouças de Paula Rodrigues * Elizabeth Moraes Liberato ** Resumo: Este trabalho tem por finalidade focalizar a relevância do convívio familiar na velhice. Os estudos contemporâneos sobre o assunto têm evidenciado mudanças na família nuclear, com o surgimento de novos arranjos e re-arranjos familiares. Buscou-se em pesquisa bibliográfica referencial para a compreensão do tema. Palavras-chave: Convivência, família e idoso. Abstract: This work focuses on the relevance of living among their own family for elderly people. The present studies over this subject have shown changes in the family nucleus, with the uprising of new family arrangements and rearrangements. It was used bibliographic references for a better comprehention of the subject. Key words: Convivance, family and elderly people. 1. INTRODUÇÃO ção, devido à situação de fragilidade. “Desde o início da história da humanidade, a família sempre existiu”, mesmo nos grupos sociais mais diversos culturalmente (LUFT, apud MARTINS, 1991, p. 68). Daí a necessidade de se refletir primeiramente sobre o conceito de família para, posteriormente, enfatizarmos sobre a dinâmica das relações familiares nas diferentes culturas. Com o aumento da expectativa de vida da população, com a redução do âmbito familiar e com as crescentes demandas de trabalho e sobrevivência, estas questões estão cada vez mais em debate. (GOLDIM, 2004) Como dizem Vergara e Vergara: “Diante disso, a questão é saber como recriar novas formas de convivência com aqueles que, por direito, reivindicam reconhecimento, respeito e inclusão nos acontecimentos da vida cotidiana e no contexto em que vivem”. (VERGARA; VERGARA, 2004, p.36) O crescimento da população idosa e o surgimento de novos arranjos familiares repercutem no crescente número de idosos em situação de isolamento e depressão. Citando Castilho: “pouco espaço resta para o idoso da família contemporânea, cujos membros – embora juntos – vivem isolados”. (CASTILHO, 2006, p. 59) Neste contexto social, a família encontra dificuldades em manter relações de reciprocidade com seus idosos, principalmente quando estes requerem maior aten- * Pós-Graduada do Curso de Especialização em Gerontologia e Família. ** Pró-Reitora de Avaliação e Professora da Univap Doutora em Serviço Social e Especialista em Gerontologia. 124 Como alternativa imediatista, muitas famílias optam pela institucionalização de seus idosos, avaliando por si próprias, qual encaminhamento seria mais adequado para o bem-estar deles. De maneira geral, as instituições de longa permanência para idosos não priorizam a manutenção da convivência familiar e comunitária, dispensando maior atenção aos cuidados básicos. Sendo assim, o desafio da sociedade moderna deve estar pautado na reconstrução da identidade social do idoso, entendendo que não existe um único protagonista, mas uma co-responsabilidade que deve abranger o idoso enquanto agente de sua própria história, assim como a família e o poder público. 2. MATERIAIS E MÉTODOS 2.1 Conceito de Família A origem etimológica da palavra “família” provém do vocábulo latino “familus”, que significa “servo” ou Revista UniVap, v.15, n.27, 2008 “escravo”. A família foi assim designada porque, nos povos primitivos, incluía o conjunto de escravos ou criados de uma mesma pessoa. A noção de posse e obediência sempre esteve presente nas relações familiares, não só entre os povos primitivos como ao longo dos tempos. Os pais se julgavam com direito absoluto sobre os filhos e a mulher devia obediência ao seu marido. O sentimento de posse e a questão do poder estão, portanto, intrinsecamente vinculados à origem e evolução do grupo familiar. (SIQUEIRA, 2006). Definir o que é família é uma tarefa complexa, pois não é uma expressão passível de conceituação, mas de descrições de várias estruturas assumidas pela família ao longo dos séculos. A família não deve ser vista como algo estático, definitivo e fechado, ou seja, a família está sempre em movimento, em um constante processo de transformação. (CABRAL, 2002). Na realidade, “família é uma construção sóciocultural”(...) que altera no tempo e no espaço os seus modelos e atitudes. As idéias de família são construídas dentro de contextos históricos específicos, que lhes dão características culturais especiais, de acordo com os valores, a cultura, a crença e hábitos existentes nesses contextos. (CABRAL, 2002) Segundo Cabral (2002), diferentes critérios são utilizados para conceituar família, entre eles coabitação, consangüinidade, afinidade afetiva, etc..., que variam de acordo com o contexto social apresentado. Nas definições clássicas de família, o critério de consangüinidade aparece com maior evidência; assim como, na modernidade, o de afetividade e solidariedade sobressaem. Família é sinônimo de família patriarcal e extensa, típica do período colonial, instituição vertical baseada no parentesco, lealdades pessoais e territorialidade. (FREIRE apud CABRAL, 2002) Família são pessoas aparentadas que vivem em geral na mesma casa, particularmente o pai, a mãe e os filhos: pessoas do mesmo sangue, ascendência, linhagem e estirpe. (HOLANDA apud CABRAL, 2002) Família não é apenas uma instituição social capaz de existir isoladamente, mas constitui também e particularmente um valor. A sociedade brasileira valoriza a família como uma instituição fundamental à própria vida social; é um grupo social e uma rede de relações: funda-se na genealogia e nos elos jurídicos, mas também se faz na consciência social intensa e longa. (da MATA apud CABRAL, 2002) Família é aquela que propicia os aportes afetivos e o bem-estar dos seus componentes: ela desempenha um papel decisivo na educação formal e informal; é em seu espaço que são absorvidos os valores éticos e humanitários e onde se aprofundam laços de solidariedade; é também em seu interior que se constroem as marcas entre as gerações e são observados os valores culturais. (FERRARI apud CABRAL, 2002) Família é a gente com quem se conta. (ONU apud CABRAL, 2002) 2.2 A família nos dias atuais O modelo tradicional de família, que perdurou durante séculos, sofre questionamentos “a partir do desenvolvimento técnico e econômico da revolução industrial, que gera mudanças filosóficas, ideológicas, étnicas e políticas, transformando significadamente a vida social.” (PRADO apud MARTINS, 2005, p. 68). Esse novo contexto é caracterizado pelo “aumento do número de separações conjugais, e ainda: “a independência feminina, o consumo de tóxicos pelos jovens, o capitalismo, o liberalismo sexual, a mídia, a baixa taxa de natalidade e individualismo”. (MARTINS, 2005, p. 68) Em virtude das transformações sociais, surge a necessidade de novas configurações de padrões familiares, como resposta à necessidade de uma organização da sociedade moderna, que assim se constituem. · Famílias Monoparentais: decorrentes de divórcios ou separações; um dos pais assume a responsabilidade dos filhos. · Famílias Reconstituídas: decorrentes da ampli- ação do relacionamento familiar; o casal separado constitui uma outra composição familiar, agregando outros indivíduos. · Uniões consensuais – decorrentes de vínculo entre as pessoas, mas de forma independente. É uma união informal, sem compromisso legal. · Casais de adolescentes: decorrentes da união de dois adolescentes, geralmente relacionada à gravidez precoce. · Casais sem filhos por opção: decorrentes da opção do casal em não ter filhos, geralmente priorizam a satisfação pessoal/ascensão profissional, independência social e financeira. · Associação – decorrente da união de amigos, porém sem grau de parentesco. Revista UniVap, v.15, n.27, 2008 125 · Casais de homossexuais – decorrentes da união Diante desses arranjos e rearranjos familiares, é relevante a preocupação com as relações familiares nessa dinâmica social. Afirmam Vergara e Vergara que, em décadas passadas, “chegar à velhice no Brasil era menos complicado, pois as desigualdades sociais pareciam ser menores, o custo de vida era mais baixo e a aposentadoria permitia-lhes uma vida de menos miséria e abandono”. (VERGARA; VERGARA, 2004, p. 37) Paralelamente a estas mudanças, destaca-se o crescimento acelerado da população idosa; no entanto, “as relações e as atitudes estabelecidas pelas famílias com o idoso são quase nulas” (MARTINS, 2005, p. 68); reproduz-se uma imagem negativa e depreciativa da velhice. Muitas vezes, na velhice, os problemas de saúde causados por patologias múltiplas são agravados pela solidão e a pobreza. A falta de companhia do velho, nos dias atuais, está diretamente ligada às transformações que se operam no interior das famílias. Contraditoriamente, ao mesmo tempo em que as transformações sociais da sociedade contemporânea reforçam uma identidade estigmatizada do idoso, nem tanto pelo aspecto cronológico, mas por uma série de características negativas (doença, tristeza, capacidade de produção, etc...), afetando diretamente na construção de sua identidade social, inicia-se uma preocupação com uma velhice mais sadia. (ROCHA, 1980) Viver só não é precisamente algo negativo, muitas pessoas, em todas as idades, optam em viver assim. No entanto, viver por um grande período sem companhia pode ocasionar isolamento. de indivíduos do mesmo sexo. Em decorrência do processo de socialização progressiva da velhice, emerge um novo-idoso, que anseia reconstruir seu papel na sociedade, no âmbito familiar, social, econômico e político. As relações familiares não se tornam diferentes com a possibilidade de as pessoas viverem mais tempo, apenas tornam-se mais complexas, devido ao crescente número de pessoas interagindo. “O aumento do número de interações propicia uma maior possibilidade de relações caóticas”. (MORIN apud GOLDIM, 2004, p.2) Em virtude da dificuldade de reorganização e reconstrução destas relações, muitas vezes opta-se pela exclusão dos mais vulneráveis, principalmente dos mais velhos. Neste sentido, é necessária a atenção das famílias e do poder público para a busca de estratégias, visando à inclusão do idoso, reconhecendo suas diferenças e possíveis contribuições. As estratégias de como lidar com situações de conflito devem ser ampliadas, permitindo maior possibilidade de uma melhor convivência familiar. (GOLDIM, 2004) 3. RESULTADOS O crescimento da população idosa traz novas implicações no âmbito familiar e no âmbito público, decorrente de uma diversidade de demandas apresentadas pelos idosos, onde percebe-se um despreparo tanto da família quanto dos órgãos públicos para atendê-las, principalmente em relação aos idosos fragilizados. 126 Outros fatores contribuem para a diminuição do suporte familiar para com o velho, entre eles a maior mobilidade das famílias e o aumento do número de divórcios, que resultam em uma vida mais isolada e uma redução do apoio familiar ao idoso. Como solução imediatista, muitas famílias recorrem às instituições asilares como resposta às necessidades sociais dos idosos e aos conflitos gerados no convívio familiar. No entanto, essa deve ser a última alternativa, visando garantir os direitos sociais dos idosos, conforme preconiza o Estatuto do Idoso, em seu art. 3º, parágrafo V. A velhice é uma questão social e, nesse aspecto, ressalta-se a responsabilidade do poder público, seja na esfera municipal, estadual ou federal, no sentido de criar políticas públicas que garantam uma velhice digna, através de programas/projetos e serviços que propiciem alternativas de atendimento com vistas ao não-asilamento dos velhos e assim proporcionar suporte/apoio aos idosos e, respectivamente às suas famílias, para a manutenção do convívio familiar e comunitário na velhice. A Lei 8.842, de 4 de janeiro de 1994, que dispõe sobre a Política Nacional do Idoso, traz algumas propostas de atendimento alternativo aos idosos. Centro de convivência: local destinado à permanência diurna do idoso, onde são desenvolvidas atividades físicas, laborativas, recreativas, culturais, associativas e de educação para a cidadania; Centro de cuidados diurnos: Hospital-Dia e Centro-Dia-Local destinado à permanência diurna do idoso dependente ou que possua deficiência temporária e necessite de assistência médica ou de assistência multiprofissional; Revista UniVap, v.15, n.27, 2008 Casa Lar: residência, em sistema participativo, cedida por instalações públicas ou privadas, destinadas a idosos detentores de renda insuficiente para sua manutenção e sem família; Oficina Abrigada de Trabalho: local destinado ao desenvolvimento, pelo idoso, de atividades produtivas, proporcionando-lhe oportunidade de elevar sua renda, sendo regida por normas específicas; Atendimento Domiciliar: é o serviço prestado ao idoso que vive só e seja dependente, a fim de suprir as suas necessidades da vida diária. Esse serviço é prestado em seu próprio lar, por profissionais da área de saúde ou por pessoas da própria comunidade; Outras formas de atendimento: iniciativas surgidas na própria comunidade, que visem à promoção e à integração da pessoa idosa na família e na sociedade. Para Vergara eVergara (2004) nem todas as camadas sociais de idosos têm acesso a esses programas de convivência. Não é objetivo atribuir uma imagem negativa ao atendimento das instituições de Longa Permanência para Idosos, mas ressaltar que a prioridade de encaminhamento a este serviço deve ser para aqueles idosos que já não possuem vínculo familiar, aos que se encontram em situação de risco, ou ainda àqueles que por si próprios fizerem a opção. 4. CONSIDERAÇÕES FINAIS A convivência familiar é indispensável ao desenvolvimento humano, independente do ciclo de vida. Também é uma referência importante na construção da identidade social do indivíduo, que necessita participar, relacionar, interagir e assim construir sua história de vida, ao mesmo tempo que também é parte da história de outros e do meio em que vive. A condição de isolamento e abandono dos idosos por seus familiares é relativa, pois não corresponde à totalidade dos idosos, por isso não deve ser generalizada. Os estudos sobre a velhice têm contribuído para derrubar alguns estigmas sobre a condição dos idosos e apontam para o surgimento de um “novo-idoso”, que Revista UniVap, v.15, n.27, 2008 apresenta estilos de vida com foco na participação, sociabilidade e no grande desafio de reinventar a própria velhice. Esta questão se apresenta como central a todos aqueles que trabalham ou desenvolvem projetos voltados à população idosa. 5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BETTY, C.; MC GOLDIVICK, M. et al. As mudanças no ciclo de vida familiar. 2. ed. – Art. Méd, 2001. BRASIL. Lei 10.741, de 1º de outubro de 2003. Dispõe sobre o Estatuto do Idoso. BRASIL. Lei 8.842, de 4 de janeiro de 1994. Dispõe sobre a Política Nacional do Idoso. CABRAL, C. et al. Trabalho social com família. 2. ed. Rio de Janeiro: Booklink Publicações Ltda., 2002. CASTILHO, T. O idoso fragilizado e a família. In Ver. A Terceira Idade. v. 18, n. 38. São Paulo: SESC. fev. 2007. FERRIGNO, J. C. Coeducação entre gerações. São Paulo: Vozes, SESC. GOLDIM, J. R. Bioética, relações familiares e envelhecimento. 2004. Disponível em: www.ufrgs.br/bioética/ gerfam.htm. Acesso em: 16 out. 2006. IBGE. Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Censo demográfico: Brasil, 2000. MARTINS, L. A. A exclusão social do Idoso Institucionalizado. Revista A Terceira Idade. SESC SP, v. 16, n. 32, pp. 68-77. 2005. PINTOS, C. C. G. A família e a terceira idade, São Paulo: Paulinas, 1997. ROCHA, G. Sob o signo de Saturno, Reflexões Antropológicas em torno da velhice. Cad. Serviço Social. v. 3, n.3. Belo Horizonte, pp.25-55, 1998. SIQUEIRA, M. M. N. T. Conceito de Família (Apostila). São José dos Campos, 2006. VERGARA, M. C.; VERGARA, G. dos S. O. Convivência: uma saída e um desafio para os idosos. In: Rev. Memorialidades, n. 1 UESC/DFCH. Ilhéus, BA, 2004. 127 A Importância do Cuidador do Idoso na Sociedade Brasileira Patrícia S. M. Esteves da Fonseca * Gesilene A. Simões * Elizabeth Moraes Liberato ** Resumo: Este artigo tem a finalidade de apresentar a importância do papel do cuidador de idoso no meio familiar e social, destacando suas ações e dificuldades nos cuidados com idosos fragilizados dentro da estrutura familiar. Neste contexto, o artigo explanará sobre o cuidador, as responsabilidades que assume, fragilidades, necessidades no desempenho de suas funções ao preencher as lacunas deixadas por programas sociais voltados ao processo de cuidar de idosos. Palavras-chave: Cuidador, idoso, família. Abstract: This study aims to present the importance of the paper of elderly caretaker in the family. In this context, it treats about his responsibility fragilities, necessities in the performance of its functions when filling the gaps left for social programs come back to the process to take care of aged. Key words: Caretaker, elderly, family. 1. INTRODUÇÃO “Cuidar é uma atitude de amor e interesse por outra pessoa. Cuidar de alguém é geralmente considerado um atributo positivo – um sinal de comportamento maduro e civilizado. A capacidade de uma sociedade cuidar de seus membros menos afortunados é a marca do seu desenvolvimento.” (BROTCHIE; HILLS, 1991, p. 33). O cuidador vem adquirindo um espaço importante na sociedade, devido à grande demanda de idosos fragilizados ou não, que precisam de cuidados não oferecidos pelo Estado, sociedade e família que não vêem a velhice e suas perdas como parte da sua vida, e não é capaz, em alguns casos, de oferecer amor e cuidados. Isso ocorre no Brasil e no mundo, pois a sociedade não é capaz de colocar a velhice como parte do meio social, econômico e político. 1.1 O Cuidador de Idoso Para definir a figura do cuidador, não se pode dei* Pós-Graduada do Curso de Especialização em Gerontologia e Família. ** Pró-Reitora de Avaliação e Professora da Univap Doutora em Serviço Social e Especialista em Gerontologia. 128 xar de esclarecer o porquê desse arranjo familiar na realidade atual. O processo de envelhecimento, no Brasil, vem ocorrendo de forma acentuada, sem a implantação de uma política eficaz e de programas voltados para o idoso, como ressalta. A Política Nacional para o Idoso – PNI, de 4/11/1994, no artigo 3º: que é obrigação da família, da sociedade e do Poder Público assegurar, ao idoso, a efetivação do direito à saúde, à promoção e assistência social, à educação, à cultura, esporte, e lazer, à justiça, ao trabalho e previdência social, à habitação, que compreenderá garantias de autonomia, integração e participação efetiva na sociedade. A população idosa, em sua maioria, tem capacidade funcional que vai além dos 60 anos. O IBGE, em 1981, apontava que a taxa de portadores de deficiência, com mais de 60 anos, era de 9%. (MEDINA apud KARSCH, 2003, p.104). Nessa fase da vida, aumenta o risco de doenças degenerativas que levam a casos mórbidos, ocasionando perda de independência ou autonomia. Estudos analisados em 1986 apontavam que idosos de mais de 80 anos eram duas vezes mais dependentes do que na faixa de 60 a 80 anos (RAMOS apud KARSCH, 2003, p. 104). Para Duarte: “na área de Gerontologia, o desempenho funcional dos idosos, ou seja, sua capacidade de vivenciar as atividades cotidianas sem a necessidade de auxílio, mostra-se mais significativa na vida dos mesmos do que a presença de doenças, sinais clínicos ou, até Revista UniVap, v.15, n.27, 2008 mesmo, questões biomecânicas (Baltes e Silvenberg). Assim considerando, parece mais indicado verificar em que nível tais doenças impedem o desempenho, de forma autônoma e independente, das atividades cotidianas dos idosos e, por outro lado, que demandas assistenciais decorrem da presença de limitações, subsidiando, dessa forma, um planejamento assistencial mais adequado”. (DUARTE, 2003, p.186) Várias mudanças ocorreram na sociedade brasileira em todas as áreas. No campo da saúde, cabe referirse à política de saúde hospitalar, de desospitalização, que se reflete no retorno do paciente à sua casa em prazo menor, em condições que possa ser cuidado. Daí a importância de se estudar como estão sendo atendidos os idosos que demandam maiores cuidados. Às vezes, após a alta, em muitos casos, o idoso é cuidado pelo cônjuge, igualmente idoso. Muitas famílias não têm condições materiais, físicas e emocionais, ou habilidades específicas de algum de seus membros para desempenhar a função de cuidador, pois significa um processo que envolve tarefas domésticas, pessoais e sociais. Surge então a necessidade de uma categoria própria de pessoa para realizar essa intervenção no cuidado com o idoso. O que se observa é que, em geral, há a delegação para uma pessoa, que é designada para este papel. A categoria de cuidadores de idosos no Brasil é pouco reconhecida. Em vários países europeus é uma formação aperfeiçoada ao longo de anos. No Brasil, o não-reconhecimento aos cuidadores, ocorre, pois os cuidados são invisíveis aos olhos do Estado, assim como das organizações que deveriam se responsabilizar por programas de atendimento, mas persistem em não enxergarem a real situação, de forma que não são criadas redes de apoio, serviços externos, ou políticas e programas, dentro de uma política voltada para o envelhecimento da população. Para atender a esta situação, é que surge a figura do cuidador, como ator social que opera na dinâmica dos cuidados necessários às atividades de vida diária dos idosos fragilizados ou não, que perderam sua independência, necessitando assim de uma ação interventiva dentro da estrutura sócio-familiar. Citando Castilho: “Pouco espaço resta para o idoso da família contemporânea, cujos membros embora juntos vivem isolados. As muitas funções exercidas por filhos e netos impedem que os cuidados não sejam terceirizados.” (CASTILHO, 2007, p. 5). Os cuidadores podem ser representados como: cuidador familiar, comunitário, cuidadores informais, e formais; instituições e profissionais de prevenção. Revista UniVap, v.15, n.27, 2008 · Cuidador Familiar: cônjuges, filhos, parentes pre- sentes à realidade do paciente idoso que precisa de cuidados. Na maioria das vezes, uma pessoa é designada pela família para oferecer os cuidados necessários durante e pós doença, e acaba assumindo obrigações e tarefas que o idoso não tem mais possibilidade de realizar. As tarefas vão desde a higiene pessoal até administração financeira da família. Para o idoso é importante ser cuidado por parente, pois assim, estará num mundo conhecido e com laços familiares. Segundo Karsch (2003), “A eleição do cuidador familiar obedece à seguinte ordem: parentesco direto com o cuidador, gênero do cuidador, à distância entre o idoso e o cuidador e a proximidade afetiva.” Na sociedade brasileira está implícito que o papel de cuidador é assumido pela mulher, podendo ela ser esposa, filha ou nora. · Ajuda Comunitária: é representada por agentes Comunitários, tais como vizinhos, voluntários, associações. · A família, embora tenha amor pelo idoso, muitas vezes se encontra desgastada, por um cotidiano repleto de pressões e responsabilidades, não sobrando tempo, nem energia, para desempenhar o papel de cuidador. Neste contexto, verifica-se a importância da ajuda comunitária, representada por pessoas que apóiam e complementam as tarefas dos cuidadores familiares, construindo assim uma rede. A finalidade desta é “substituir os cuidados familiares,(...) dar suporte aos cuidadores, aliviar o seu cansaço, substituí-los periodicamente, assim como complementar os cuidados de rotina.” (KARSCH, 2003, p. 109) · Cuidador Informal: representado pela família e amigos que cuidam, oferecendo suporte físico, social e afetivo na comunidade em que vive. Estes, também, desempenham um papel de grande relevância na ajuda cotidiana, pois são fundamentais para a rede de cuidadores comunitários para idosos. Embora o significado deste cuidado tenha sido modificado nas últimas décadas, onde o cuidado informal se constituía por redes locais, de parentes, e grupos de pessoas que cooperavam entre si, hoje, é difícil encontrar na estrutura familiar diferentes gerações sob o mesmo teto, gerando assim uma intimidade à distância. 129 Assim, a categoria que vem muito contribuindo para esta representação é a de empregada doméstica. · Cuidador Formal: são os médicos, enfermeiros, fisioterapeutas, etc., profissionais que prestam serviços domiciliares ou como voluntários em trabalhos comunitários. · Instituições: Hospitais-Dia, ou Centro-Dia, são opções que as famílias e os cuidadores têm na sua comunidade, para receber ajuda nos cuidados com seus pacientes idosos. · Profissionais de Prevenção: São psicólogos, educadores e outros profissionais que estimulam a independência de idosos para serem autocuidadores nas suas necessidades físicas e emocionais. · Programas de Atendimento Domiciliar ao idoso: Como exemplo, o programa da Unifesp-SP, cujo objetivo é o atendimento ao idoso e orientação aos cuidadores. 2. RESULTADOS Segundo Stephens (apud LEAL, 1990), as intervenções relacionadas a cuidar de idosos pertencem a quatro domínios: 1ª- Intervenções relacionadas a proporcionar suporte em atividades instrumentais na vida diária do idoso, como arrumar, limpar a casa, preparar refeições, fazer compras, receber e administrar o pagamento, transportar e acompanhar em consultas, exames e passeios. 2ª- Intervenções ligadas a dificuldades funcionais associadas a atividades físicas e ao autocuidado, como: caminhar, alimentar, tomar banho, tomar medicação, etc., são todas as atividades diárias. tribuir para a motivação de seus idosos, facilitando condições favoráveis e prestando valiosas informações sobre a evolução dos atendimentos, condutas e reações dos idosos. 2.1 O cuidador também precisa de cuidados e de conhecimentos “Você não pode viver um dia perfeito sem fazer algo por alguém que nunca será capaz de retribuir”. (JONH WOODEN apud BERALDO, 2002). Como vimos, o papel do cuidador é expressar amor e cuidados além dos seus limites, é vivenciar e deixar, muitas vezes, de viver a sua vida em função do outro; geralmente, esta pessoa cuidadora precisa de suporte profissional e familiar para manter os cuidados a pacientes debilitados por doenças degenerativas, como doenças de Alzheimer, câncer e outras. Os cuidadores enfrentam doenças como depressão, stress, passam a sofrer da “síndrome do cuidador”, pois suas funções são intensas e suas vidas são deixadas em segundo plano, para suprir a necessidade do outro que precisa de seus cuidados. Com o objetivo de ajudar os cuidadores, existem associações, encontros familiares, grupos de apoio, etc., que procuram dar subsídios para melhorar a qualidade de vida do cuidador. Estes grupos oferecem apoio psicológico para o cuidador relatar seus medos, suas raivas e suas angústias, trocar experiências de vida, readquirindo assim, uma estabilidade emocional para lidar com os problemas dos outros, como profissional, ou como cuidador de pessoas fragilizadas da própria família. 3. CONCLUSÃO 3ª- Intervenções que envolvem as necessidades de suporte emocional, exemplo: fazer companhia, atuar como confidente, conversar sobre questões pessoais e emocionais, compartilhar atividades, manter e reatar laços afetivos. Através deste artigo, podemos verificar nas questões relacionadas ao envelhecimento, a importância da discussão dessa realidade, na sociedade brasileira. Sendo que as políticas sociais não suprem as necessidades de áreas como saúde, cuidados, moradia, previstos em leis e estatutos para a população em geral. O que se reflete na situação dos idosos, é que podem ser excluídos em sua própria família. 4ª- Intervenções psicológicas relacionadas a distúrbios psicológicos e psiquiátricos, depressão, baixa satisfação ao proporcionar cuidados. Assinala Duarte: “compreende-se ser cada vez mais necessária, na assistência aos idosos, a compreensão que estes estão inseridos num contexto familiar em um contínuo processo de interação”. (DUARTE, 2003, p. 198) A família tem um papel importante como facilitadora de intervenções necessárias, devendo con- Na estrutura familiar contemporânea, muitos familiares não são capazes de amar e cuidar, pois não ad- 130 Revista UniVap, v.15, n.27, 2008 quiriram, através da cultura, noções de respeito para se sentirem responsáveis, oferecendo à pessoa idosa cuidados especiais. CASTILHO, T. O idoso fragilizado e a Família: representações, preconceitos, conflito e solidariedade. A Terceira Idade. Revista Sesc. v.18, n. 38. SP. Fev. de 2007. Hoje, como resultado desta realidade, surge o papel do cuidador, que enfrenta dificuldades para poder ser reconhecido como categoria, para exercer suas funções. DUARTE, Y. A. O. Desempenho funcional e demandas assistenciais. In o Projeto SABE no Município de São Paulo: uma abordagem inicial. São Paulo. OPAS/OMS. 2003. O idoso precisa do cuidador para que possa ser atendido em suas dificuldades, no meio familiar e social; o cuidador é um agente essencial para atender essa realidade. É importante, dentro deste contexto, a implementação de projetos de capacitação de cuidadores para o atendimento adequado do idoso em seu domicilio. Estudos Interdisciplinares Sobre Envelhecimento – v. 1 (1999) – Porto Alegre: Núcleo de Estudos Interdisciplinares Sobre o Envelhecimento. KARSCH, U. M. Revista Serviço Social e Sociedade – Cuidadores familiares de idosos: parceiros da equipe de saúde. Ano XXIV - n. 75. São Paulo: Cortez, 2003. 4. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS A Terceira Idade. Revista Sesc. v. 18, n. 38. SP. Fev. de 2007. Lemos et al. PADI – Programa de Atendimento Domiciliar ao Idoso: 8 anos de experiência. BORN, T. Revista Kairós: Gerontologia – Quem vai cuidar de mim quando ficar velha?Ano I, n. 1 – São Paulo: Educ, 1998. LEAL, M. G. S. O Desafio da Longevidade e o Suporte do Cuidador - Revista A Terceira Idade, Ano XI, n. 20 – Ago. 2000. NOVAES, M. H. Psicologia da terceira idade: conquistas possíveis e rupturas necessárias. 2ª ed. Aumentada, Paulo de Frontin. RJ: NAU. 1997. BROTCHIE, J.; HILLS, D. Equal shares in caring. London: S. H. Association, 1991. Revista UniVap, v.15, n.27, 2008 131 Mulheres Solteiras na Terceira Idade: um questionamento de vida Marilda Piedade Godoi * Elizabeth Moraes Liberato ** Resumo: Em dados estatísticos apresentados recentemente, deparamo-nos com uma realidade incontestável – o aumento da população idosa no Brasil. Fruto de significativas quedas nas taxas de mortalidade e fecundidade, decorrentes de uma destacada melhoria na qualidade de vida das pessoas. Notou-se o aumento relevante da população feminina junto ao segmento idoso, num fenômeno conhecido como feminização da velhice. Este fator se evidencia frente a vários ramos da sociedade, trazendo esta nova mulher idosa como destaque em sua atuação. Perante esta realidade, propomo-nos a estudar aquela mulher jovem do século XX – décadas de 60 a 80, que perante toda repressão familiar, social e política, optou pela identidade civil de solteira. Diante disso, este estudo terá como objetivo o traçado de vida, através de relato de história oral do sujeito pesquisado até chegar aos patamares atuais, já que o estigma “solteirona” tinha um forte teor de negatividade. O estudo do envelhecimento humano é uma questão prioritária. O conhecimento da população feminina que habita este universo se faz necessário, assim como pesquisar o comportamento psicosócio-cultural da mulher discriminada em seu potencial, ao redefinir os papéis a ela atribuídos pela sociedade. Palavras-chave: Velhice, feminização, idosa solteira. Abstract: The increase of the aged population in Brazil is caused by significant falls in the taxes of mortality and fecundity, decurrent of one detached improvement in the quality of life of the people. The increase of the aged feminine population, is a phenomenon, the “feminização” of the oldness. This fact is evidenced in some branches of the society. This work aims to study the young woman of century XX - decades of 60 the 80, that before all familiar, social repression and politics, opted to the civil identity of bachelor. This study objectives the tracing of life, through verbal story of history of that woman. The stigma “solteirona” has a strong text of negativity. The study of the human ageing is a priority question. The knowledge of the feminine population is necessary, as well as searching the physico-social-cultural of the woman discriminated in its potential, when redefining the papers attributed by the society. Key words: Ageing, “feminização”, elderly bachelor. 1. INTRODUÇÃO O teor do movimento feminino no século XX é indiscutível. As mulheres deixaram de interpretar o papel de coadjuvantes da história para fazerem parte do elenco principal. Ao longo dos anos 1960, quando os canais de comunicação começaram a abrir espaço para as denúncias sobre a condição marginal da mulher brasileira, mal se * Pós-Graduada do Curso de Especialização em Gerontologia e Família. ** Pró-Reitora de Avaliação e Professora da Univap Doutora em Serviço Social e Especialista em Gerontologia. 132 podia prever a verdadeira revolução que se anunciava neste campo. Alguns sinais de que as coisas começavam a mudar já podiam ser apontados: em 1962, o Código Civil eliminava, enfim, o princípio segundo o qual a mulher, ao contrair matrimônio, abria mão, por assim dizer, do direito de decidir sobre alguns aspectos fundamentais de sua condição de cidadã, como firmar contrato de trabalho, sem autorização do marido, dispor de conta ou poupança bancárias, opinar na fixação do domicílio, viajar para o exterior, isto para criar apenas alguns exemplos; os projetos de lei que propunham o divórcio, eliminando da Constituição o princípio do casamento indissolúvel, embora rejeitados pela maioria no Congresso (sua aprovação só viria 12 anos depois) eram amplamente apoiados pela sociedade civil; crescimento verti- Revista UniVap, v.15, n.27, 2008 ginoso de matrículas femininas na universidade denunciava a queda de um reduto tradicional do patriarcado brasileiro: no mercado de trabalho aumentava sua participação em áreas não-convencionais dos diferentes setores de produção. A partir de meados da década de 1970, os primeiros movimentos organizados de mulheres cresciam e se espalhavam por todo o país e as teorias de Simone de Beauvoir e Betty Friedan eram amplamente debatidos, nos diversos espaços sociais, da universidade à fábrica de sutiãs, passando pelos sindicatos e pelos partidos políticos (BAUER, 2001). Os anos 1970 irão marcar uma reviravolta do movimento feminista, que coloca no centro das discussões a relação homem-mulher. Nessa década, as mulheres, já organizadas, combinaram a luta contra a ditadura e por melhores condições de vida, com a discussão dos problemas específicos das mulheres – sexualidade, contracepção, aborto, dupla jornada de trabalho e a discriminação econômica, social e política. As estatísticas no Brasil e no mundo exibem uma predominância da população feminina entre os idosos – e este fenômeno é uma realidade numérica constatada internacionalmente na literatura, pelos estudos sociodemográficos. Existem no mundo cerca de 302 milhões de mulheres e 247 milhões de homens com 60 anos de idade ou mais. Nos países desenvolvidos, as mulheres acima de 60 anos representam mais de 20% do total da população feminina (ONU, 1995 apud VERAS, 1999). Essa maior proporção de mulheres no total da população idosa – superioridade que aumenta com a idade – é denominada de “feminização da velhice” (ARBER; GINN, 1991; BRITTO DA MOTA, 1998; BERQUÓ, 1999; VERAS, 1999; CAMARANO et al., 1999; NERI, 2001; RATELIFF, 2002; BASSIT, 2004). Dados atuais são apresentados pela pesquisa do SESC/Fundação Perseu Abramo, maio de 2007, onde os índices de idosas passa para 57% da população acima dos 60 anos. Para Saffioti (1992), inclusive, pode-se dizer que tanto o gênero quanto o sexo são inteiramente culturais, pois o sexo, em si, não tem registro apenas no terreno biológico, mas é perpassado por toda uma elaboração social, uma vez que os próprios fatos de sexualidade são expressos socialmente e incluem significados oriundos da cultura. As preocupações teóricas relativas ao gênero, enquanto categoria de análise, estiveram ausentes na maior parte das teorias sociais formuladas desde o século XVIII até o começo do século XX. No Brasil, o campo de estudos de gênero só veio a se consolidar no final dos anos 70, paralelamente ao fortalecimento do moviRevista UniVap, v.15, n.27, 2008 mento feminista no país (FARAH, 2004). Estes comportamentos de acatar, renunciar, submeter-se e obedecer – herança de um modelo tradicional que restringiu a mulher ao espaço doméstico durante séculos, estão na origem da naturalidade e até do orgulho com que muitas mulheres aceitam e tomam para si o papel de grandes “cuidadoras” da humanidade. Segundo Duarte e Santos (2004), “desde o patriarcado, uma das representações sociais mais identificadas às mulheres foi a indissolúvel paridade mulher-cuidadora” (...) e “ser altruísta não era uma qualidade, mas, antes de tudo, um requisito de toda mulher” (DUARTE; SANTOS, 2004, p.4). Ao se falar em envelhecimento é, preponderante, falar das mulheres idosas, uma vez que dados sociodemográficos confirmam ser a velhice um episódio vivido, em sua expressiva maioria, pelas mulheres. Os dados do Censo de 2000 e da Pesquisa Nacional por amostra de Domicílios/PNAD/2001, do IBGE, confirmam esta superioridade numérica das mulheres idosas em relação aos homens idosos: “Como resultado da mortalidade diferenciada por gênero, constatou-se um excedente feminino na composição da população, o que se torna mais evidente nas idades mais avançadas. Em 2001, a parcela feminina representava 55,8% do contingente de pessoas de 60 anos ou mais idade” . Já em 2007, através da pesquisa: “Idosos no Brasil: Vivências, desafios e expectativas na 3ª Idade”, feita pelo SESC e a Fundação Perseu Abramo, o índice passa para 57% de mulheres idosas contra os 43% de homens. Perante todo o estudo apresentado por pesquisadores do envelhecimento, cabe-nos descobrir quem é esta mulher idosa que aparece com tanta evidência dominando o contexto da “feminização acentuada da velhice”. Esta mulher que era o retrato da repressão física, social e psicológica, que não poderia ser exposta publicamente, pois seu papel era de provedora da educação dos filhos, mantenedora da moral familiar e trabalhadora invisível num mundo de muitos “sins”, torna-se a jovem revolucionária do século XX (décadas de 60 a 80). Esta mulher idosa deixou de ser uma presença silenciada na história, passou a ser ouvida na política, a ser respeitada como cidadã, deixa de ser da esfera privada para ser da esfera pública, evidenciando suas particularidades, ao invés de diluir-se na homogeneidade do todo. Propomos-nos a estudar teoricamente estas jovens - hoje idosas - que questionaram aberta e publicamente o seu papel social, ao quebrarem regras que a elas eram atribuídas desde o final do século XVIII. Fizeramse ouvir, expressando seus propósitos e rompendo com os mitos que as haviam relegado ao silêncio durante séculos. Isto significou um importante avanço na vida cotidiana das mulheres no século XX, abrindo caminhos 133 para o grito de liberdade e respeito à mulher, para conhecer como foi esta trilha, suas dores, sucessos, sublimações e como isto se refletiu no seu comportamento atual. Através de relato de história oral, pretendemos estabelecer uma ponte entre o que foi rememorado e o que está por vir, com a intenção de contribuir para parâmetros de maior inclusão da mulher idosa no mundo atual, como cidadãs que têm consciência de seus direitos e potencial humano, deixando de ser uma coadjuvante para ser a atriz principal no teatro da vida. 2. METODOLOGIA Fez-se uma investigação (sobretudo bibliográfica) sobre as transformações ocorridas (ou a elas relacionadas), que se alicerça em bibliografias específicas, bem como revistas científicas da área e dos assuntos afins. Através de filmes de época e atuais, analisaram-se os comportamentos e sua correlação. Por fim, apoiamo-nos também em informações obtidas pela Internet. Para a análise da bibliografia, recorreremos a fichamentos (fichas de transcrição e/ou fichas analíticas) e resumos. Consideramos importante um levantamento empírico; para tanto, será feito entrevista qualitativa com idosa participante de atos públicos e políticos, que traz na memória fatos e atos guardados no subconsciente. Para a realização da entrevista, utilizaremos gravadores, posteriormente, transcreveremos as fitas e, por fim, faremos a análise teórico-científica dos discursos e dados obtidos. Deixamos claro, entretanto, que pela vastidão do assunto a pesquisa poderá se estender e, assim, ser necessário direcionar para um foco mais específico, dando sua continuidade em outros estudos posteriores. cuidadoras de pais, sobrinhos, irmãos, etc. Através do relato de história oral pela personagem solteira de nossa pesquisa, analisaremos o reflexo desta opção em sua vida, durante o ciclo vital do envelhecimento que hoje vivencia. 4. RESULTADOS De início, através de uma leitura sistemática, apreenderemos o que houver de mais relevante na literatura brasileira e internacional sobre o processo de envelhecimento. Da mesma forma, será indispensável a realização de uma análise conceitual do material bibliográfico levantado no decorrer do estudo. Se possível, utilizaremos documentos escritos sobre a rememorização da entrevistada, juntando-se a um fichário do informante; obtendo dados pessoais adquiridos no final da gravação. Registros paralelos serão feitos durante a entrevista, sobre o ambiente da pesquisa, captando emoções e interpretações, seguindo-se o processo de organização dos dados, fichamentos por temas orientados e introdução de subtemas trazidos pela testemunha; e após isto, organizaremos os arquivos de temas sobre a fala da entrevistada. A análise dos achados será realizada comparando os temas com as informações da pesquisa sócio-histórica e cultural realizada, bem como análise do referencial teórico previamente estudado. A partir disto, construiremos o produto final, com uma análise comparativa das informações coletadas. Esse primeiro procedimento dará suporte teórico para a nossa investigação. Após os estudos teóricos, traçaremos características significativas do perfil da idosa e como foram trabalhadas as barreiras sócio-culturais e políticas, refletidas no seu mundo atual. 3. DISCUSSÃO Ser mãe, esposa e dona-de-casa era considerado o destino natural das mulheres. A vocação para a maternidade e a vida doméstica seriam marcas de feminilidade, enquanto a iniciativa, a participação no mercado de trabalho, a força e o espírito de aventura definiriam a masculinidade. A mulher que não seguisse seus caminhos estaria indo contra a natureza, não poderia ser realmente feliz ou fazer com que outras pessoas fossem. O casamento seria a porta de entrada para a realização feminina, era tido como “o objetivo” de vida de todas as jovens solteiras. O papel de mulher de vida privada passaria a propor-lhe poucas possibilidades de ter uma vida pública. Perante as opções de muitas mulheres em permanecer solteiras, hoje idosas, assumiram papéis como 134 Traçado o perfil da idosa solteira, poderemos compilar dados estatísticos de posicionamento da mesma nos diversos tipos de escala sócio-cultural e qual o atual perfil que ela tem perante a sociedade e como sua opção se refletiu em seu novo papel, analisando – inclusive – a quebra do estigma de “solteirona” que a acompanhou durante estas últimas décadas. 5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ARBER, S.; GINN, J. Gender and later life: a sociological analysis of resources and constraints. London: Sage, 1991. BASSIT, A. Z. Na condição de mulher: a maturidade feminina. In: L. Py; J.L. Pacheco; J.L.m. de Sá; S.N. Goldman (orgs.), Tempo de Envelhecer – percursos e dimensões psicossociais (pp. 137-157). Rio de Janeiro: NAU, 2004. Revista UniVap, v.15, n.27, 2008 BAUER, C. Breve História da Mulher no Mundo Ocidental. Xamã: Edições Pulsar. 2001. BEAUVOIR, S. A Velhice. 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Salvador, UFBA, Núcleo de Estudos Interdisciplinares sobre a Mulher, 1998. pp. 137-145. SAFFIOTI, H.I.B. Rearticulando gênero e classe social. In: A. de O. Costa e C. Bruschini (Orgs.). Uma questão de gênero. Rio de Janeiro. Rosa dos Tempos. São Paulo. Fundação Carlos Chagas, 1992. pp. 183-215. CAMARANO, B.; PASCOM; MEDEIROS; GOLDANI. Como vive o idoso brasileiro? In: A. A. Camarano (Org.). Muito além dos 60 – Os novos idosos brasileiros. Rio de Janeiro: IPEA, 1999. pp. 19-71. VERAS, R.P. O Brasil envelhecido e o preconceito social. In: R.P. Veras (Org.) Terceira Idade – alternativas para uma sociedade em transição. Rio de Janeiro. RelumeDumará, UNERJ, UNATI, 1999. pp. 35-50. DUARTE, C.V.; SANTOS, M.A. dos. E agora... de quem cuidarei – o cuidar na percepção de idosas institucionalizadas e não institucionalizadas. Revista Ciência e Profissão [on line], v. 24, n. 1, pp. 1-19.Disponível em: http://www.revistacienciaeprofissão.org. Acessado em: 22 fev. 2006 Revista UniVap, v.15, n.27, 2008 135 Intergeracionalidade: as relações entre jovem e idoso Maria Ruth de Almeida Cavalcante * Elizabeth Moraes Liberato ** Resumo: Na atualidade, um grande contraste se apresenta: de um lado, uma sociedade que caminha para o envelhecimento, e por outro, a apologia do mundo do jovem. Surge então, o distanciamento entre as gerações e a necessidade de se estabelecer novas relações entre o jovem e o idoso. Idoso que já foi jovem e que também teve suas dificuldades de se relacionar com o idoso. O jovem, cheio de expectativas, que não aceita, muitas vezes, as idéias e questionamentos do idoso. Decorre daí a necessidade de se investir em novos relacionamentos entre as gerações. Palavras-chave: Envelhecimento, aprendizagem, intergeracional. Abstract: We live in a world that from one point of view see its population growing older and from another point of view we still have the world of younger people. From this, come a generation gap and the necessity to promote new ways of contact between these two generations. There is the elderly generation that was once young and had its share of trouble dealing with the old generation itself. There is the young generation, full of expectation that sometimes refuses the ideas and the arguments of the other generation. We are at the moment of change, where we see the needless of a new bonding between. Key words: Aging, learning, intergeracional. 1. INTRODUÇÃO Na atualidade, o aumento da longevidade do ser humano tem ampliado o cenário em que ocorre o relacionamento intergeracional. O contexto familiar é a instância essencial da relação entre as gerações. Os dados censitários indicam que, em futuro próximo, o Brasil deixará de ser predominantemente um país de jovens. A população idosa, hoje, aspira a mudanças e busca novas perspectivas e modelos de vida. No entanto, como característica marcante dos novos tempos, o núcleo familiar vivencia um afastamento em suas relações, os encontros familiares, tão importantes, não ocorrem com constância, com quantidade e qualidade. Cada membro da família encontra-se, cotidianamente, correndo para realizar seus afazeres, num impulso frenético atrás de seus interesses; ao chegar em casa, continua esse efeito estressante. Os membros da família continuam suas tarefas, sem perceberem que não se relacionam, não se cumprimentam, não se olham e nem conversam sobre o * Pós-Graduada do Curso de Especialização em Gerontologia e Família. ** Pró-Reitora de Avaliação e Professora da Univap Doutora em Serviço Social e Especialista em Gerontologia. 136 seu dia e seus problemas. Como conseqüência, cada vez mais se estabelece a distância relacional. Cada qual vive em seu espaço-tempo exclusivo, quer seja o jovem, o adulto ou o idoso. 2. MATERIAL E MÉTODOS Em nossa cultura e realidade, o universo do jovem é simbolizado pela ousadia. O jovem acredita e valoriza a sua juventude, julgando-a eterna. Para ele, o mundo apresenta-se cheio de significados e de promessas, acredita que tem que investir em seus objetivos e projetos, seguir suas metas e realizar seus sonhos. Manifesta sua rebeldia e preconceito. Prefere não acreditar no processo de envelhecimento. O adulto quando se vê envelhecendo, muitas vezes enfrenta profunda crise de identidade. Para o idoso, isso não ocorre de forma diferente. Ele também vive em seu próprio espaço. Com o passar dos anos e apoiando-se em suas experiências de vida torna-se cada vez mais autêntico e franco ao falar; freqüentemente, cria resistência e um equivocado preconceito em relação ao jovem, ao ignorá-lo e não considerá-lo como ser provido de competência e responsabilidade. A intergeracionalidade somente ocorrerá ao se criar Revista UniVap, v.15, n.27, 2008 mecanismos que promovam a interação mais humana entre o jovem e o velho, que possibilite a convivência harmoniosa, a aceitação das diferenças. Como diz Beauvoir “(...) a amizade dos jovens é muito grata às pessoas de idade: ela lhes dá a impressão de que este tempo em que estão vivendo ainda é o seu tempo, ressurge sua própria juventude e os arrasta para o infinito do porvir: constitui, em suma, a melhor defesa contra a melancolia que paira sobre a velhice. (BEAUVOIR, 1970, p. 226) O aumento progressivo de idosos, na sociedade, deixou de ser questão a ser encarada somente pela família, mas constitui-se, de fato, em questão social e política. O idoso, em épocas anteriores, era mais respeitado, passava para a sociedade sua vivência e conhecimentos adquiridos ao longo de sua vida. Mas, nos dias atuais, como o progresso industrial e tecnológico, a sabedoria gravada na mente deixou de ser tão importante. Muitos idosos ficam presos a esta memória e deixam de acompanhar o desenvolvimento que está à sua volta. Atualmente, o jovem busca o que quer, usando a tecnologia a que facilmente tem acesso. Não considera relevante o conhecimento que pode ser transmitido pelo idoso. Com o crescimento da população idosa, torna-se necessária a preparação da nova geração para um convívio saudável e profícuo entre gerações. 3. RESULTADOS A troca entre gerações poderá garantir um futuro com mais integração, uma sociedade mais humana, mais justa e com qualidade de vida. Não podemos esquecer que envelhecer é um processo sempre presente na realidade de cada um, em seu contexto de vida. A interação entre as gerações poderá levar à descoberta do desconhecido para ambos, possibilitando novas leituras sobre a realidade. Há que se promover a convivência e a aproximação entre as gerações. Essa ocorrência somente será positiva se houver o intercâmbio afetivo. Deve-se despertar no jovem e no idoso a troca de suas peculiaridades no modo de ser, sentir, pensar e querer de cada um. Há que existir a cumplicidade entre eles. Sobretudo, atender ao que dispõe o Estatuto do Idoso – Lei 10.741 (1º/ 10/2003), Título I art. 3º/IV: Viabilização de formas alternativas de participação, ocupação e convívio do idoso com as demais gerações. Ferrigno apresenta a questão: “É realmente possível a co-educação entre gerações? Quais são as condições necessárias e suficientes para que ela se estabele- Revista UniVap, v.15, n.27, 2008 ça?” E traz suas reflexões sobre a importância e possibilidades das trocas geracionais, resultando uma visão mais realista sobre as demais gerações, decisiva para a luta contra a segregação das faixas de idade que empobrece as relações sociais e provoca o preconceito etário dos velhos em relação aos jovens e destes em relação aos idosos. (FERRIGNO, 2003) A partir da intergeracionalidade, o jovem alicerçará seus conhecimentos com base nos conhecimentos e nas lições de uma vida já vivida pelo idoso. O idoso conservará sua vontade de viver, sustentado pelo fascínio pela vida, pela esperança e pela paixão do jovem. Assim, o jovem confiante e seguro, preparará seu lugar para o futuro; o idoso, com a ternura realimentada pelo jovem, ao trilhar os caminhos ainda a percorrer, sentirá novas forças e a energia resultante do compartilhamento de experiências. 4. CONSIDERAÇÕES FINAIS A velhice exige mudanças de atitudes e deve ser respeitada, pois a cada dia, desde o nascimento, estamos em processo de amadurecimento e envelhecimento. Assim, a partir do instante em que o jovem e o idoso descobrirem a necessidade da interação, da busca pela aprendizagem conjunta, ambos serão agraciados pela beleza da vida e poderão contemplar a sua idade com serenidade e descobrir que vale a pena viver a idade que têm. 5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BEAUVOIR, S. de. A velhice. Difusão Européia do livro, São Paulo, 1970. BROCHSZTAIN, C. O susto ao espelho: um estudo psicológico do envelhecer. Dissertação de mestrado. PUCSP, 1996. FERRIGNO, J. C. Co-educação entre gerações. Petrópolis: Vozes, 2003. NÉRI, A. L. Psicologia do envelhecimento: uma área emergente. Campinas: Papirus, 1995. SALGADO, M. A. Por uma Pedagogia do adequado envelhecimento. Revista A Terceira Idade, SESC/SP, 1994. http://pt.wikipedia.org/wiki/Ajuda: como escrever um bom artigo, 9/10/2006. Estatuto do Idoso, 2003. 137 O Idoso Vítima de Maus Tratos na Família Geralda Pereira Costa * Elizabeth Moraes Liberato ** Resumo: No contexto das sociedades modernas, o termo velho ou velhice ganha um significado depreciativo. Além do preconceito, os idosos são vítimas dos mais diversos tipos de violência. Estas variam de insultos a agressões físicas praticados por familiares e cuidadores; outras são decorrentes de políticas socioeconômicas que reforçam as desigualdades presentes na sociedade. Certamente, muitos dos avanços já alcançados com a criação do Estatuto do Idoso, em 2003, são de grande valia para a abordagem e tratamento desta questão no Brasil. O presente trabalho tem por objetivo abordar, em sua temática, a situação do idoso vítima de maus tratos no âmbito familiar. Palavras-chave: Idoso, violência, família. Abstract: In the society context the expression elderly people is depreciative. Aged people are victims of prejudism and violence. They would range from insults to physical aggressions done by members of the family or caretakers. Other violence result of the social economics politic that are the reflection of social inequality. The advances achieved by the “Estatuto do Idoso”, in 2003, are important to treat this question in Brazil. This present work intends to discuss the situation of the elderly people that are victims of maltreat in the family. Key words: Elderly, violence, family. 1. INTRODUÇÃO 2. MATERIAL E MÉTODOS Os idosos são vítimas dos mais diversos tipos de violência, que podem variar de insultos e agressões físicas, muitas vezes, praticados por familiares e cuidadores. As políticas socioeconômicas reforçam as desigualdades presentes na sociedade, que repercutem nos direitos que deveriam ser assegurados a todos. Com relação ao idoso, os avanços já conquistados com o Estatuto do Idoso, Lei 10.741, de 1º/10/03, têm buscado reverter o trato dessa questão social no Brasil. A violência é um fenômeno cada vez mais presente em nossa sociedade, abrange aspectos econômicos, sociais, culturais. Atinge todo e qualquer cidadão, em suas diferentes formas de manifestação. Frente a essa violência instalada em diferentes contextos, como garantir segurança àqueles que a requisitam das diversas instâncias públicas? Como sentir-se protegido contra a agressão, o preconceito e a discriminação que permeiam as relações sociais e se instalam progressivamente como fatores inexoráveis, contra os quais não se tem mecanismos de defesa? Ao analisar os reflexos dessa situação sobre o idoso, acresce-se que a sua própria condição de ser na sociedade é vista na perspectiva do desprestígio social, somada à dificuldade de acesso aos programas de saúde, alimentação, lazer. O presente trabalho tem por objetivo abordar a questão do idoso vítima de maus tratos no âmbito familiar. Se por um lado, a violência contra os idosos se insere nos meandros dos conflitos intrafamiliares, muitas vezes invisíveis para a sociedade, por outro lado, a própria construção do ser idoso, na sociedade capitalista, associa a idade avançada à obsolescência, que se traduz em violência social. Isto coloca a questão da violência como parte de uma questão mais ampla. * Pós-Graduada do Curso de Especialização em Gerontologia e Família. ** Pró-Reitora de Avaliação e Professora da Univap Doutora em Serviço Social e Especialista em Gerontologia. 138 A implementação do Estatuto do Idoso garante ao idoso os instrumentos legais que regulam os direitos das pessoas com idade igual ou superior a 60 anos. Com a aprovação do Estatuto do Idoso, os direitos dos idosos foram ampliados e legitimados perante a sociedade, garantindo punição severa para aqueles que desrespeitam ou abandonam os cidadãos da terceira idade. Este Estatuto resgatou princípios constitucionais que garantem, aos cidadãos, direitos que preservam a dignidade da pessoa humana, sem discriminação de origem, raça, Revista UniVap, v.15, n.27, 2008 sexo, cor e idade. Esta legislação traz, em seu conteúdo, a garantia dos direitos fundamentais referentes à pessoa humana, além de penalizar as pessoas que praticam a discriminação, a crueldade, a opressão, a negligência e a violência contra os idosos, bem como aqueles que omitem das autoridades competentes os crimes de que tenham conhecimento. Assim, o Estatuto foi uma conquista legítima da sociedade e teve, com certeza, uma grande repercussão social, que deve ser efetivada em garantias reais que abranjam a população idosa. A violência contra o idoso não pode ser generalizada às famílias de baixa renda, pois extrapola a análise de classe social. Porém, o fenômeno pode ser agravado por fatores da conjuntura socioeconômica. Embora o idoso seja protegido pelo Estatuto, a família brasileira nem sempre tem condições de arcar com essa responsabilidade, devido às altas taxas de desemprego e separações conjugais, o que a torna sem condições econômicas, físicas e emocionais para cuidar de seus idosos. 3. RESULTADOS Valle assinala um dado a ser levado em conta e que influencia a real situação do idoso na atualidade: “a rapidíssima passagem de um contexto rural, com seus sistemas de parentesco e estruturas de proteção, seja da criança ou do idoso, para um contexto urbano de país subdesenvolvido, de megalópoles circundadas por cinturões de miséria, favelas e bairros populares sem infra-estrutura, dentro de um condicionamento social extremamente violento, além de excludente. Essa violência é uma questão estrutural”. (VALLE, 1997, p. 33) Ser velho, na sociedade, é estar debilitado, não pela decorrência de um processo natural de envelhecimento, mas por maus tratos decorrentes de alimentação inadequada e horário desorganizados, relacionamentos interrompidos ao longo do tempo, que resultam em isolamento e solidão. A violência contra o idoso pode também se apresentar sob a forma de insultos e agressões físicas perpetradas por familiares e cuidadores; outras são decorrentes de políticas socioeconômicas, que reforçam as desigualdades presentes na sociedade. O ato de culpar a família pela falta de cuidado com os idosos é recorrente, se levar-se em conta a crescente precarização das condições de vida e as mudanças ocorridas em seu interior. É importante ressaltar que a violência contra o idoso não deve ser entendida fora do contexto da violência social/estrutural em que os indivíduos estão inseridos. O Ministério da Saúde (2002, p. 15), conceitua violência intrafamiliar: (...) toda ação ou omissão que prejudique o bem-estar, a integridade física, psicológica ou a liberdade e o direito ao pleno desenvolvimento de outro membro da família. Pode ser cometida dentro ou fora de casa por algum membro da família, incluindo pessoas que passam a assumir função parental, ainda que sem laços de consangüinidade e assumem relação de poder frente à outra. Nessa sociedade em que a família tem como base condições profundamente desiguais, a vida cotidiana é permeada de conflitos. Para Mello: “a violência dos mais fortes contra os mais fracos (...) sempre está presente (...) é preciso não confundir a violência dos conflitos que atingem estas famílias (...) é necessário ver as condições em que vivem estas famílias”. (MELLO, 2000, p.58) Afirma Castilho: “Nas famílias que vivem em maior vulnerabilidade social, a relação com os idosos acontece na complexidade de um cotidiano difícil, orquestrado pela pobreza e exclusão social”. (CASTILHO, 2007, p. 60) A ausência de políticas públicas de auxílio tem como possível conseqüência os maus tratos contra idosos, que acabam sofrendo nos ambientes onde moram. Minayo (2004) classifica os maus tratos e a violência contra os idosos em: físicos, aqueles que se concretizam em agressões, falta de cuidados de higiene, alimentação, chegando até à situações extremas de imobilização e “cárcere privado”. Psicológicos, quando ocorrem pressões, chantagens, ameaças explícitas ou não, formas abusivas de controle e exercício de poder discriminatório contra o idoso. Abusos financeiros e materiais, geralmente contra idosos que têm alguma fonte de renda, alguns bens, e que são despojados das decisões e usufruto, chegando ao extremo da manipulação e uso de sua renda ou aposentadoria, de sua moradia, em proveito de outros. Negligência e abandono: situações instaladas junto a idosos incapacitados, que são verdadeiramente abusados em seus direitos de tratamento e acompanhamento devidos em suas dificuldades de alimentação, higiene, apoio emocional e afetivo. A sociedade não pode permanecer omissa frente a esse quadro; cabe a todo e qualquer cidadão denunciar e estar atento à violência que se instala no cotidiano de vida dos idosos, muitas vezes impossibilitados de reação e de requisitar respeito e direitos. 4. CONCLUSÃO Certamente, os avanços implementados pela le- Revista UniVap, v.15, n.27, 2008 139 gislação e as estratégias e políticas de atendimento são de grande auxílio para o trato da questão da prevenção aos maus tratos ao idoso. É preciso integrar o idoso e sua família à sociedade, dando-lhes capacidade de enfrentar obstáculos e promover mudanças em seu interior e nas relações sociais. MINAYO, M. C. S. Violência contra Idosos: O avesso do Respeito à experiência e à sabedoria. Secretaria de Direitos Humanos, 2004. MINISTÉRIO DA SAÚDE. Violência intrafamiliar: orientações para a prática em Serviço. n. 8. Série A. Brasília, 2000. 5. BIBLIOGRAFIA CASTILHO, T. O idoso fragilizado e a família. In A terceira Idade. v. 18, n. 38. São Paulo. SESC, 2007. VALLE, E. A velhice e o futuro – os novos velhos do terceiro milênio. São Paulo. PUC/SP, 1997. MELLO, S. L. Família: perspectiva teórica e observação factual. In: A Família contemporânea em debate. São Paulo: Cortez, 2000. 140 Revista UniVap, v.15, n.27, 2008 Aposentadoria: prêmio ou castigo? Priscila Flores Chaves da Conceição * Elizabeth Moraes Liberato ** Resumo: A aposentadoria é um direito de todos; no entanto, essa fase da vida das pessoas pode corresponder a diferentes formas de encará-la, fazendo com que um número significativo de idosos não queiram requerê-la temendo como será suas vidas após aposentarem-se. Ao abordar este tema, o artigo chama a atenção para a necessidade de preparar continuamente o indivíduo para a fase de desligamento de sua atividade laboral, para que ele analise o seu estilo de vida e planeje o seu futuro fora do âmbito profissional, após a aposentadoria, para que tenha a possibilidade de aproveitar melhor essa nova etapa da vida. Palavras-chave: Velhice, aposentadoria, trabalho. Abstract: The retirement is a right of all; however, in this phase of the life of the people is difficult to face it, making with that a significant number of aged does not want to require fearing, afraid of its lives after to retire. This article calls the attention for the necessity to prepare the individual for the phase of disconnection of its labor activity, so that he analyzes his style of life and plans his future after the retirement, so that he has the possibility to advantage this new stage of the life. Key words: Elderly, retirement, work. 1. INTRODUÇÃO “Não se vê nada mais comum entre os velhos do que ansiar pela aposentadoria: e nada mais raro, entre os aposentados, do que não se arrepender por estar inativo” (SAINT-EVREMOND apud BEAUVOIR, 1990, p. 326). No Brasil, a aposentadoria é direito assegurado a todo trabalhador, urbano e rural, pela Constituição Federal, de 1988 (art. 7º). A aposentadoria é entendida como o conjunto de leis que regulamentam as condições de retirada de um trabalhador do mercado de trabalho. A aposentadoria é o período em que a pessoa passa a receber uma remuneração sem manter o vínculo de trabalho. Representa uma recompensa financeira vitalícia a quem já contribuiu com seu trabalho e agora pode usufruir de seu tempo livre de outra forma, executando outras atividades. Sendo um direito de cada trabalhador, devemos indagar por que, cada vez mais, pessoas a consideram como um castigo, algo penoso ou até mesmo, como é * Pós-Graduada do Curso de Especialização em Gerontologia e Família. ** Pró-Reitora de Avaliação e Professora da Univap Doutora em Serviço Social e Especialista em Gerontologia. Revista UniVap, v.15, n.27, 2008 comum ouvir, uma “sentença de morte”? Para tentar responder a esta questão, é necessário entender o significado atribuído ao ato de aposentarse nos dias atuais. 2. MATERIAIS E MÉTODOS Aposentadoria vem do vocábulo “aposento”, lugar ou local de morada, habitação de alguém. (CALDAS AULETTE, 1958) Os autores Zanelli e Silva, apontam sinônimos encontrados, em dicionários, para o verbo aposentar: “[...] pôr de parte, de lado. O que é colocado de parte, de lado? Aquilo que já não presta [...] recolher-se aos aposentos. Novamente a imagem é de reclusão ou retirada” (ZANELLI; SILVA, 1996, p.27). Estes sentidos retratam bem a imagem que as pessoas têm do que é desligar-se da vida profissional. Para Rodrigues: “Uma geração só vai se preocupar com o envelhecer quando sente que esta nova fase de vida está se aproximando, produzindo sensações de desconforto, ansiedade, temores e medos fantasiosos” (RODRIGUES apud ALVES, 2005, p.124). Para muitos, aposentar-se significa morrer, tais pessoas consideram que após a aposentadoria as doenças aparecem e a vida perde o sentido. Rocha (1998) comenta que pode acontecer a morte social do indivíduo, uma vez que há uma ruptura com o meio social em que estava inserido 141 e ele se depara com o vazio e a solidão, ficando o aposentado a esperar a morte física. Além disso, a aposentadoria é sinônimo de velhice e esta, por sua vez, remete à imagem do feio, chato, inútil, da pessoa doente e muito próxima da morte. É de espantar-se que exista ainda esta relação, pois como coloca Adler (1999), até algumas décadas atrás, depois da aposentadoria, o tempo vivido era curto; mas hoje, com o avanço da medicina e tecnologia, a longevidade dos indivíduos aumentou consideravelmente, podendo o aposentado programar projetos e sonhos para a sua nova etapa de vida. Para Guimarães (2004), a aposentadoria é considerada um rito de passagem, por indicar muitas mudanças na vida do indivíduo. Compreendê-la significa interpretar a fase anterior e a fase posterior, ou seja, quando o indivíduo passa da classe dos trabalhadores para a dos inativos, ou do mundo público para o privado, e percebe que “os momentos da separação, da não pertença, do afastamento, da incerteza, dos desafios que estão por vir” (GUIMARÃES, 2006, p. 36); ou como dito anteriormente, entra na fase da velhice. Independente se a pessoa a deseja ou prorroga ao máximo ingressar na fase de aposentadoria, sua chegada causa ansiedade, expectativa e mudanças econômicas e sociais que podem acarretar conseqüências morais e psicológicas. 2.1 Aposentadoria e Trabalho Alguns estudos comparam a espera pela aposentadoria com a satisfação profissional, como cita Frias: “A expectativa de que um dia teremos mais tempo para nos dedicar ao prazer, se deve, provavelmente, ao fato de que, no Brasil, poucas pessoas atingem a realização profissional ou estão satisfeitas com o seu trabalho [...]” (FRIAS, 1999, p.183). Estando ou não satisfeitas com a atividade laboral desempenhada, é o trabalho que organiza a vida social do indivíduo. Zanelli e Silva dizem que “toda a nossa vida é baseada no trabalho. Os processos de socialização nos preparam para isto quando ainda não entendemos tais significados” (ibid., p.19). Sendo assim, não deve ser fácil desprender-se de todo o contexto relacional e ativo que o trabalho proporciona ao indivíduo. Mesmo para aqueles que gostam da atividade que exercem e estão realizados profissionalmente, a idéia de ter mais tempo para aproveitar a vida e realizar passeios e projetos que o tempo do trabalho não permite, permeia a mente de todos, relata Frias (1999). Porém, quando questionados sobre como, de fato, aproveitarão o tempo no 142 momento que se aposentarem, poucos têm a resposta e muitos se percebem sem ter construído um substituto para o trabalho. Numa cultura em que “tempo é dinheiro”, os trabalhadores chegam a se dedicar quase que integralmente ao trabalho, deixando a família e o lazer de lado; muitos até julgam indesejável o tempo fora do trabalho. A pessoa tem sua importância reconhecida pela produção e pelo lucro gerado, o indivíduo tem a sensação de total inutilidade quando se aposenta. Rodrigues ilustra bem o significado do trabalho, atualmente, quando escreve que “o tempo livre, não raro, é preenchido com tarefas, na empresa ou fora dela. É como se o serviço fosse parte da sua família, a empresa passa a ser o sobrenome” (RODRIGUES, 2001, p.78). 3. RESULTADOS Envolvidos com a carreira que o trabalho impõe, as pessoas não têm tempo para outra atividade que não seja laboral e não param para programar como será a vida na época do desligamento profissional. França (1999) relata que as pessoas estão “alienadas” em relação ao próprio futuro. Devido à importância atribuída ao trabalho, ao se aposentar, muitos indivíduos se sentem perdidos, sem objetivos, “sem chão”, suas vidas tornam-se desestruturadas de um dia para o outro. Perdem a rotina, os relacionamentos afrouxam-se, pois na grande maioria, eram colegas de trabalho e vêem-se isolados e solitários. O trabalhador, antes acostumado ao tempo escasso e corrido, agora tem que se adaptar aos dias intermináveis, como se fossem eternas tardes de domingo, explica Rocha (1998). Beauvoir cita a angústia de Hemingway em relação ao afastamento do trabalho: “a pior morte para um indivíduo é perder o que forma o centro de sua vida, e que faz dele o que realmente é [...] aposentar-se é abandonar nossas ocupações – essas ocupações que fazem de nós o que somos – equivale a descer ao túmulo” (BEAUVOIR, 1990, p. 325). Esta fala retrata a perda de identidade social que acontece com freqüência entre os aposentados, que deixam de ser o funcionário, o gerente de tal empresa e ainda não visualizam o novo papel social que agora ocupam na sociedade. As mudanças inerentes ao processo de aposentadoria podem desencadear nas pessoas sentimentos de inutilidade, por não se sentirem produtivas; dificuldades de relacionamento familiar, ficando mais sensíveis nas relações com cônjuges e filhos; não é fácil romper os vínculos com o mundo do trabalho, as relações sociais estabelecidas e encarar de frente a ociosidade ou dar novos sentidos à vida. (GUIMARÃES, 2004) Revista UniVap, v.15, n.27, 2008 Algumas vezes, os indivíduos buscam substitutos não adequados para o preenchimento do vazio deixado pelas horas não dedicadas ao trabalho formal, como o exagerado consumo de alimentos e bebidas. A condição que se instala de falta de perspectivas é tanta, que é comum o desenvolvimento de doenças psicossomáticas e, em casos mais graves, a ocorrência de morte súbita. Devido à nossa cultura considerar o homem como responsável pelo sustento da família, o aposentar-se pesa ainda mais para ele; Rodrigues (2001) assinala que, se afastando do trabalho, o homem sente como se estivesse afastando-se também da sua masculinidade. Rocha (1998) ressalta que há também a cisão entre o mundo do trabalho e o doméstico, pois o homem não reconhece o ambiente da casa como seu. Em relação a ser o provedor da casa, tal situação está mudando, visto que cada vez mais as mulheres têm participação igual a dos companheiros no orçamento da casa. Em contrapartida, mesmo sendo relevante a participação das mulheres no mundo do trabalho, elas não abandonam o mundo doméstico, acumulam funções e, mais comumente, vêem na aposentadoria a oportunidade de terem mais tempo para cuidarem de si mesmas. É bom salientar que isto não isenta a mulher de todas as angústias e mudanças decorrentes da aposentadoria. Além disso, geralmente ocorre a perda econômica e o padrão de vida tem que ser alterado. Como um direito ao não-trabalho, os proventos da aposentadoria deveriam ser suficientes para satisfazer às necessidades do aposentado, mas isso nem sempre ocorre; como diz Beauvoir (1990), ele é obrigado a escolher entre descansar e viver decentemente. Os autores Rodrigues (2001) e França (1999) ressaltam que a perda financeira na aposentadoria é relevante, porém, esta fase acumula muitas outras perdas e por este motivo, pessoas que continuam com o mesmo poder aquisitivo podem sofrer, até mais que outras, com o fim da atividade profissional. 4. CONSIDERAÇÕES FINAIS Podemos concluir que a aposentadoria é um evento que representa a passagem de uma situação laboral à outra de inatividade, que não deve ser elaborada como fase final de vida. Além disso, não é somente após a aposentadoria que o indivíduo não sabe o que fazer com o tempo livre. Durante toda sua vida, ele não se permitiu ter muitas horas de lazer e esta conduta interfere diretamente em como viverá a fase pós-trabalho. O Estatuto do Idoso (lei 10.741, de 1º/10/03) art. 28/II, diz que cabe ao Poder Público criar e estimular programas de preparação dos trabalhadores para a aposentadoria, com antecedência mínima de um ano, por meio de estímulo a novos projetos sociais, conforme seus inRevista UniVap, v.15, n.27, 2008 teresses, e de esclarecimentos sobre os direitos sociais e de cidadania. Percebendo a dificuldade dos funcionários em aceitar a aproximação da condição de aposentados, muitas empresas oferecem programas que auxiliam na preparação para essa fase da vida, os chamados PPA – Programa de Preparação para Aposentadoria. A Lei 8.842, de 1994, da Política Nacional do Idoso, estimula a manutenção desses programas nos setores públicos e privados, com antecedência mínima de dois anos antes do afastamento. Esses programas buscam encorajar o trabalhador para que planeje sua aposentadoria como fato natural e social, discutindo formas de complementação de renda, alternativas de ocupação e aspectos de saúde e psicológicos. Alguns programas sugerem ao indivíduo desenvolver um trabalho voluntário, como uma boa forma de ocupar o tempo livre e sentirem-se úteis e ativos. Melhor seria que esta preparação começasse cedo, assim que o indivíduo iniciasse a sua atividade profissional, para que se tenha uma reeducação em relação ao lazer e ao planejamento da vida. Pois como diz Rodrigues: “Se pretendemos ter homens vivendo esse período da vida de maneira mais prazerosa, devemos pensar em políticas que se preocupem com esta questão durante a vida profissional, e não deixar para as vésperas da aposentadoria para se tentar mudar o padrão de uma vida inteira” (RODRIGUES, 2001, p. 81). 5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BEAUVOIR, S. de. A Velhice. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1990. FRANÇA, L. Preparação para aposentadoria: Desafios a enfrentar. In: Veras, R. (org.) - Terceira Idade: Alternativas para uma sociedade em transição. Rio de Janeiro: Relume-Dumará UnATI/UERJ, 1999. FRIAS, S. R. de. Aspectos emocionais da aposentadoria. In: Veras, R. (org.) - Terceira Idade: Alternativas para uma sociedade em transição. Rio de Janeiro: Relume-Dumará UnATI/UERJ, 1999. ADLER, E. Aspectos emocionais da aposentadoria. In: Veras, R. (org.) - Terceira Idade: Alternativas para uma sociedade em transição. Rio de Janeiro: Relume-Dumará UnATI/UERJ, 1999. ALVES, M. L. M. J. Aposentadoria e finalidade de vida. In: Silva, N. L. (org.) – Gerontologia Social: A práxis no 143 envelhecimento. Aracaju - SE, 2005. ROCHA, G. Sob o signo de saturno: reflexões antropológicas em torno da velhice. Cad. Serviço Social. Belo Horizonte, v. 3, dez., 1998. GUIMARÃES, A. F. A. Aposentadoria como rito de passagem. Rev. Memorialidades. ano 1, n. 1 UESC/DFCH. Ilhéus, BA. Jun., 2004. 144 RODRIGUES, C. L. Homem de Pijama: o imaginário masculino em relação à aposentadoria. Revista Kairós, São Paulo, v. 4, n. 2, dez. 2001. ZANELLI, J. C.; SILVA, N. Programa de preparação para aposentadoria. Florianópolis: Insular, 1996. Estatuto do Idoso, 2003. Revista UniVap, v.15, n.27, 2008 População de Rua: envelhecendo sem acesso a direitos Taís Cesário de Castro * Elizabeth Moraes Liberato ** Resumo: O presente artigo visa discutir a dificuldade de acesso da população de rua envelhecida aos direitos que deveriam ser acessados com base na legislação em vigor, justapondo à realidade excludente que é vivenciada por esse segmento. Para dimensionar esta realidade, procurou-se retratar a situação da população de rua que passa pelo processo de envelhecimento sem ter um lugar definido para morar, assim, deixa de estabelecer vínculos e condições de recorrer a seus direitos básicos. Palavras-chave: População de rua, envelhecimento, direitos. Abstract: The present article aims to analyze the difficulty of access to the law by the aged homeless, by understanding in the present time the relations established between legislation and reality. In order to have greater vision of this reality it was adopted bibliographies in such a way to report the general overview of either the current capitalist society or the situation of the homeless who feels the process of aging without a definite place. Key words: Homeless, aging, access to rights. 1. INTRODUÇÃO Artigo 25 – Toda pessoa tem direito a um nível de vida suficiente para assegurar a sua saúde, o seu bem-estar e o de sua família, especialmente para alimentação, vestuário, moradia, cuidados médicos e serviços sociais necessários; tem direito à segurança em caso de desemprego, doença, invalidez, viuvez, velhice ou em outros casos de perda dos meios de subsistência, graças às circunstâncias independentes de sua vontade. (PALERMO, 1984) No livro Direitos Sociais no Brasil: síntese de uma política social, Palermo ressalta os direitos fundamentais do homem. Dada a importância de abordar a temática em questão, este trabalho visa ressaltar que existem pessoas, em nossa sociedade, que não possuem acesso a quaisquer desses direitos. Assim ocorre com relação às pessoas que vivem na rua, pois nenhum desses direitos lhes é assegurado, eles não possuem um endereço de referência, logo, não conseguem ter acesso às políticas * Pós-Graduada do Curso de Especialização em Gerontologia e Família. ** Pró-Reitora de Avaliação e Professora da Univap Doutora em Serviço Social e Especialista em Gerontologia. Revista UniVap, v.15, n.27, 2008 de saúde, de educação ou de assistência social, uma vez que, para fazer qualquer cadastro, é necessário endereço e documentação, sendo que normalmente, quem vive em situação de rua não os possui. 2. MATERIAL E MÉTODOS O que leva a pessoa a permanecer na rua, em situação de desabrigo e desamparo? Afirma Ferez: “Na categoria genérica da população de rua estão: mendigos, doentes crônicos e agudos, pessoas idosas em situação de desproteção e abandono, famílias desabrigadas (...) desempregados ocasionais ou permanentes (...), etc.” (FEREZ, 1991, p.58). o que os unifica é a condição de desproteção social, decorrente de fenômenos estruturais, que se agravam em determinadas conjunturas econômicas e sociais. Envelhecer em situação de rua torna a questão do envelhecimento uma realidade ainda mais grave, pois quando se alcança certa idade as dificuldades de locomoção aumentam, os problemas de saúde se agravam; enfim, inicia-se um processo de degradação física e, muitas vezes, mental. Em 1º/10/2003, foi aprovado o Estatuto do Idoso, Lei Federal nº 10.741 – que se constitui em leis de amparo ao idoso, as quais asseguram direitos como andar gratuitamente de ônibus, a garantia de um salário mínimo para pessoas com idade igual ou superior a sessenta e cinco anos, com renda per capita inferior a um quarto do salário 145 mínimo, entre outros direitos assegurados à população idosa. Mas cabe refletir sobre a situação do idoso morador de rua que não consegue acessar esses direitos, pois não possui referências para reivindicá-los. evolução, uma expansão e um recesso, uma força que não pode se manifestar sem desgastar-se, sem degradar-se.” (BASTIDE, 1980, p.7) Diante deste cenário divergente entre ter direito e poder usufruí-lo, questiona-se que a sociedade acaba por criar leis, que, no entanto, não são capazes de atingir os objetivos propostos, o que gera segregação em uma sociedade em que prevalecem as políticas de exclusão e marginalização; considere-se, nesse quadro, o agravante da situação de vida do morador de rua, destituído de todas as garantias sociais. Este paradoxo acentua-se nas condições da rua. Pois o uso em demasia do álcool e/ou de drogas, a má qualidade de alimentação, o pernoitar ao relento, as más condições de saúde, tudo isso agrava e acelera o processo de envelhecimento. Beauvoir (1990) afirma que, o organismo tende a declinar quando as suas chances de subsistir se reduzem. Pode-se reconhecer que este processo é acelerado nas condições de rua, pois subsistir nela, é doloroso, solitário e, demais, sem acesso a direitos. 2.1 População de Rua Envelhecida 3. RESULTADOS A situação de rua é um fenômeno existente em todas as sociedades, pessoas co-habitando em espaços públicos e fazendo desses, seu espaço de sobrevivência e de subsistência. Isso é uma constante na contemporaneidade. Segundo Rosa (2005), desde a década de 50, havia grupos de pessoas residindo na rua em São Paulo; mas foi somente na década de 80 que se iniciou um trabalho voltado para essa demanda. Demanda essa que pode ser encontrada nos logradouros públicos, seu único refúgio, pois, a partir do momento em que se perde um endereço, perde-se também, a família, o trabalho e todas as demais referências. Segundo reportagem do Jornal “O Estado de São Paulo”, de 25/10/07, todos os anos São Paulo ganha mil novos moradores de rua, 60% concentrados na região central da cidade. Diz Valle: “Andando pela ruas de São Paulo e olhando os menores abandonados, vendo os flanelinhas, os trombadinhas, a gente tem uma amostragem. Se hoje eles, que ainda têm alguma possibilidade, já são excluídos, como será sua velhice?” (VALLE, 1997, p. 37) Estar na rua é um processo de (re) construção de valores. Rosa (2004) cita Dias (1987), retratando assim a questão do tempo na rua, sendo que para ambos “É outro o tempo da rua, ele não está controlado pelo relógio”. Assim como o processo de envelhecimento, envelhecer na rua não está vinculado ao tempo do relógio, mas ao tempo de cada um, de cada história. Esse mesmo tempo traz consigo o cansaço, o desgaste, sendo que esses são sentimentos e vivências que não se podem mudar. Bastide afirma que: “O ser humano envelhece desde o seu nascimento. Viver é envelhecer. O paradoxo e o enigma da vida e, talvez, de todo o universo, é que ao mesmo tempo, é uma 146 Segundo Dowbor: “a sociedade do futuro - para garantir qualidade de vida - deve ser economicamente viável, socialmente justa” (DOWBOR apud MEDEIROS, 2001, p.8), as transformações sociais e políticas devem atingir a todos e não excluir determinados segmentos. Reconhecem-se as dificuldades em garantir o direito aos idosos, direitos básicos, como o de ir e vir, como o de acesso aos benefícios, ou mesmo à segurança. A velhice traz consigo certa fragilidade, e pode, para alguns, ser pior, a improdutividade. A sociedade capitalista se baseia no lucro e na produtividade, é nesta sociedade que o Estado cria as políticas públicas de atendimento à população em geral. Tanto os idosos quanto a população de rua não se enquadram nas categorias de classes sociais, são pessoas consideradas improdutivas, que perdem a condição de sujeitos de direito. Este cenário excludente acentua-se quando se reporta para o idoso em situação de rua, pois este não consegue acessar seus direitos básicos, devido à falta de documentação, de ter um logradouro fixo para moradia ou ainda por falta de informações para que busque, através dos órgãos competentes, os direitos que lhe cabe. A realidade da rua mediada pelo processo de envelhecimento, juntamente com as dificuldades e preconceitos estabelecidos pela sociedade atual, tendem a afastar os direitos de seus agentes receptores. O idoso com família, residência fixa e tudo mais que a sociedade considera como padrão, já passa por um processo de desvalorização e de estigmatização, o que dificulta o acesso a seus direitos garantidos em lei. O que poderá ser considerado em relação ao idoso morador de rua? É uma questão que demanda atenção dos responsáveis pelas políticas públicas e pelos órgãos representativos dos direitos do idoso. Revista UniVap, v.15, n.27, 2008 4. CONCLUSÃO MEDEIROS, S. A. R. Longevidade. São Paulo: Cortez, 2001. São históricas as dificuldades que os segmentos excluídos têm para acessar seus direitos. Vive-se, na contemporaneidade, o aspecto contraditório das políticas públicas, sendo elas limitadas e acessíveis à minoria. Hoje, há uma desvalorização de quem não produz; o morador de rua, sem emprego e idoso, está entre os excluídos dos excluídos, sendo que assim permanece à margem das políticas públicas e da sociedade que deveria lhes assegurar seus direitos. FEREZ, A. I. Família nos segmentos da população mais empobrecida. In: Debates Sociais. RJ. CBCISS, 1991. 5. BIBLIOGRAFIA ROSA, C. M. M. Vidas de Rua. 3. ed. São Paulo: Hucitec/ Rede Rua, 2005. BASTIDE, P. A. A idéia do Tempo: O Envelhecimento. Caderno da Terceira Idade: SESC. N6, 1980. BEAUVOIR, S. de. A Velhice. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1990. PALERMO, A. Direitos Sociais no Brasil: síntese de uma política social. Franca: Departamento de Serviço Social, 1984. ROSA, C. M. M. População de Rua: quem é, como vive, como é vista. 3. ed. São Paulo: Hucitec, 2004. VALLE, E. A velhice e o futuro – os novos velhos do terceiro milênio. São Paulo. PUC/SP. Jornal Estado de São Paulo, 25 out. 2007. DIAS, C. J. M. A Catação de Papelão nas Ruas de São Paulo. São Paulo, Mimeo, 1987. Revista UniVap, v.15, n.27, 2008 147 Pastoral da Pessoa Idosa: uma ação pró-ativa? Eliana Pereira Montenegro * Fátima Aparecida Ferreira Barbosa * Margareth Serpa Ferreira Gomes * Elizabeth Moraes Liberato ** Resumo: Este trabalho tem por finalidade demonstrar as atividades desenvolvidas por um grupo intitulado – Pastoral da Pessoa Idosa, que pertence à Igreja Católica, junto a idosos da comunidade, que se empenha para que estes idosos conquistem espaços de valorização na sociedade. Palavras-chave: Idoso, Pastoral da Pessoa Idosa. Abstract: The aim of this study is to show the development of the activities of “Pastoral da Pessoa Idosa”, linked to the Catholic Church. This Program looks for the achievement the rights that elderly people in the community have. Key words: Elderly, Pastoral da Pessoa Idosa. 1. INTRODUÇÃO O idoso tem ocupado um espaço na sociedade, cada vez mais marcante, pelas projeções que apontam o crescimento da população idosa. A Organização Mundial da Saúde (OMS) define o idoso como a pessoa com idade a partir de 60 anos; em um estudo realizado pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) a categoria idosa não pode ser considerada como o indivíduo isolado, tem que ser visto no contexto da sociedade em que ele vive. Em sua obra, A Velhice, Beauvoir diz que “...quando compreendemos o que é a condição dos velhos, não podemos contentar-nos em reivindicar uma “política de velhice” mais generosa (...) a reivindicação só pode ser radical: mudar a vida”. (BEAUVOIR, 1990, p. 665) No Brasil, os passos em relação a um atendimento digno na velhice têm sido tímidos. O movimento da Pastoral da Pessoa Idosa significa um marco no conjunto das ações que a sociedade civil construiu para o atendimento ao idoso. e trabalham em prol da melhora de qualidade de vida dos idosos. Os voluntários, conhecidos como agentes pastorais, recebem capacitação e avaliação antes de iniciar o trabalho. Há um livro que serve de instrumento de metodologia para os voluntários e de base para avaliação do trabalho desenvolvido. Foi editado nacionalmente com apoio do Mistério da Saúde e entregue a todos os agentes pastorais, que o utilizam como manual de trabalho. O objetivo do trabalho é desenvolver, na família e na comunidade, o senso de responsabilidade e participação na qualidade de vida que o idoso tem direito, nos dias atuais. Este atendimento é bastante abrangente, vai desde as orientações de higiene pessoal, cuidados com alimentação, prevenção de doenças e seqüelas, até conforto espiritual. Existe também a preocupação de colocar o idoso em situações que propiciem o desenvolvimento de suas habilidades mentais e físicas ainda preservadas. 1.1 Histórico A Pastoral do Idoso é constituída por um grupo de pessoas voluntárias que comungam do mesmo credo * Pós-Graduada do Curso de Especialização em Gerontologia e Família. ** Pró-Reitora de Avaliação e Professora da Univap Doutora em Serviço Social e Especialista em Gerontologia. 148 Em 1993, aconteceu um encontro de Drª Zilda Arns Neumann – Médica Pediatra e Dr. João Batista Lima Filho – Médico Geriatra, na época presidente da Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia – Seção Paraná. Na ocasião, surgiu a semente germinadora da Pastoral do Idoso. Em 1994 e 1995 – Foi elaborado o manual “De Bem Revista UniVap, v.15, n.27, 2008 com a Vida”, de autoria de Dr. João Batista Lima Filho e de Sophia Sarmiento, que serviu de base para desencadear o processo de formação de líderes comunitários, com material de conteúdo científico sobre o envelhecimento e os cuidados com as pessoas idosas, mas ao mesmo tempo, em linguagem simplificada, acessível às pessoas da comunidade. Em 2003 – Esse ano foi marcado por dois importantes eventos, o primeiro, a Campanha da Fraternidade com o tema: “Fraternidade e as Pessoas Idosas” e o lema: “Vida – Dignidade – Esperança”. E ainda houve a promulgação da Lei nº 10.741, de 1º de outubro de 2003 – Estatuto do Idoso. Em 2004 – Foi o Ano da Fundação da Pastoral da Pessoa Idosa. Em novembro, aconteceu a I Assembléia Nacional da Pastoral da Pessoa Idosa, com participação de pessoas de todas as regiões do Brasil. Nessa Assembléia foi fundada, oficialmente, a Pastoral e foi aprovado o Estatuto da Pastoral; foram elaboradas e aprovadas as linhas de ação, sendo escolhido e aprovado o nome Pastoral da Pessoa Idosa. Em 2005 – A Pastoral fez sua Inscrição no Cadastro Nacional de Pessoas Jurídicas, recebeu o Título de Utilidade Pública Municipal, Estadual e Federal e foi inscrita no Conselho Municipal e Nacional de Assistência Social. A Pastoral da Pessoa Idosa acompanhou, em nível nacional, no 4º Trimestre de 2005, 31.699 pessoas idosas, 110 dioceses, 347 paróquias, com ações realizadas por 3.638 líderes comunitários. 1.2 Objetivos Para alcance do objetivo da Pastoral da Pessoa Idosa houve necessidade de se estruturar o trabalho e estabelecer metas e avaliá-las, o que é realizado através de grupos treinados e harmônicos que desenvolvem o atendimento aos idosos e familiares, em suas respectivas residências. Com essa proposta, durante a I Assembléia Nacional da Pastoral da Pessoa Idosa, foi aprovado o Estatuto da Pastoral da Pessoa Idosa (PPI); em seu 2º artigo, descreve seus objetivos e finalidades, como segue: 1 – Promover o desenvolvimento físico, mental, social, espiritual, cognitivo e cultural dos idosos; 2 – Promover o respeito da dignidade e da cidadaRevista UniVap, v.15, n.27, 2008 nia das pessoas idosas, colaborando na divulgação e na implementação do Estatuto do Idoso – Lei nº 10.741, de 1º de outubro de 2003; 3 – Promover o convívio das pessoas idosas com as demais gerações, estimulando uma velhice ativa, buscando uma longevidade com qualidade; 4 – Estimular e respeitar a espiritualidade das pessoas idosas; 5 – Valorizar a história de vida, as experiências, o ser biográfico, a sabedoria adquirida ao longo da vida de cada pessoa idosa, respeitando-a como guardiã da memória coletiva; 6 – Capacitar agentes pastorais para o acompanhamento das pessoas idosas através de visitas domiciliares, encontros e outras atividades afins; 7 – Organizar redes de solidariedade nas comunidades e nos diferentes níveis, para promover o bem-estar dos idosos; 8 – Incentivar a criação de conselhos de direitos do idoso em níveis nacional, estadual e municipal e estimular a participação dos mesmos; 9 – Somar esforços com outras pastorais, com a comunidade científica, com associações de geriatria e gerontologia e com organizações de defesa dos direitos dos idosos, de assistência social e outras entidades afins; 10 – Manter e divulgar informações sobre a situação das pessoas idosas no Brasil. 2. CONSIDERAÇÕES FINAIS Neste trabalho, ressaltamos a importância da mobilização de todos os segmentos da sociedade e do governo para que haja um atendimento com qualidade ao idoso carenciado. Na Pastoral da Pessoa Idosa, além do acompanhamento voluntário dos agentes pastorais, também há uma parcela de compromisso de cada cidadão. Esta valorização deverá ser iniciada com a prática de desenvolver, na criança e no adulto, a consciência de que envelhecer é um processo natural da vida. Citando Proust: “É com adolescentes que duram um número bastante grande de anos que a vida fez velhos”. 149 A partir dessa conscientização, será possível mobilizar outros segmentos da sociedade e do governo a desenvolverem ações eficazes voltadas para o alcance de uma velhice digna e livre de riscos, como o abandono, a fome, a falta de vontade de viver, a falta de esperança e a descrença nos homens. Definida pela Organização Mundial da Saúde (OMS) “como completo bem-estar físico, mental e social, e não somente a ausência de doença”, a saúde é o bem mais importante de qualquer ser humano. A organização e a participação de todos poderá viabilizar esta proposta de bem-estar digno e humano. A valorização do idoso e sua participação na comunidade é de responsabilidade social de cada um de nós. O trabalho realizado pela Pastoral da Pessoa Idosa demonstra que é possível uma nova abordagem no cuidado com o idoso e o que é preciso fazer para a sua integração na sociedade. Com um diferencial, que é a integração do próprio idoso nas ações de auto-cuidado, pela dimensão comunitária dada ao conceito de saúde e 150 pela soma de esforços e resultados alcançados pela ação voluntária de pessoas compromissadas com o bem-estar do idoso. 3. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BEAUVOIR, S. de. A Velhice. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1990. FERREIRA, A. B. de H. Novo Aurélio XXI: Dicionário da Língua Portuguesa. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1999. SARMIENTO, S. A terceira idade na Pastoral da Criança: de bem com a vida. 2. ed. Curitiba: Ministério da Saúde do Governo Federal, 2003. Texto para discussão nº 681. IPEA – Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada, 1998. Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão. httpp://www.pastoraldapessoaidosa.org.br httpp://www.pastoraldoidoso.org.br Revista UniVap, v.15, n.27, 2008 A Implementação do Atendimento ao Idoso no Município de São José dos Campos, Segundo as Novas Diretrizes do SUAS Teresa de Jesus Freire * Elizabeth Moraes Liberato ** Resumo: O presente tema foi escolhido considerando o momento atual de implementação dos programas, projetos e serviços em face às diretrizes estabelecidas pelo Sistema Único de Assistência a Saúde e as adequações que o órgão gestor municipal deverá fazer para a sua concretização. Isto é importante uma vez que o SUAS foi aprovado para ser implantado em todo o território nacional, de forma a normatizar o padrão e qualidade no atendimento, a nomenclatura dos serviços, além de definir os indicadores de avaliação e resultados a sem utilizados em todos os programas. Palavras-chave: Sistema Único de Assistência Social, proteção social, política pública. Abstract: The present issue was chosen considering the current moment of programs, projects and services implementation, due to the new directives established by SUAS and the adaptations that the City Council Administrative Office should do in order to make it real. This is very important once SUAS was approved for being implemented within the national territory to regulate the quality, the standard and the nomenclature of the services, beyond defining ratings of evaluation and results to be used in all programs. Key words: Unified System of Social Assistance, social protection, public politic. 1. INTRODUÇÃO Ao abordar o tema da implementação do atendimento ao idoso, é preciso assinalar a legislação específica que a antecede. Em 7/12/1993, a Lei Orgânica da Assistência Social – LOAS, Lei Federal nº 8742, coloca a Assistência Social no campo dos direitos sociais, enquanto Política de Seguridade não contributiva e estabelece como diretrizes, em seu art. 5º: I - descentralização político-administrativa para os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, e comando único das ações em cada esfera de governo; II - participação da população, por meio de organizações representativas, na formulação das * Pós-Graduada do Curso de Especialização em Gerontologia e Família. ** Pró-Reitora de Avaliação e Professora da Univap Doutora em Serviço Social e Especialista em Gerontologia. Revista UniVap, v.15, n.27, 2008 políticas e no controle das ações em todos os níveis; III - primazia da responsabilidade do Estado na condução da Política de Assistência Social em cada esfera de governo. A expansão demográfica e o envelhecimento da população idosa despertaram a preocupação da sociedade e de seus representantes legais, pressionados pelas questões emergentes, em discutir e implantar diretrizes e leis que assegurassem os direitos do idoso. 2. MATERIAL E MÉTODOS Em 1º/10/2003, foi aprovada a Lei Federal nº 10.741, que institui o Estatuto do Idoso, destinado a regular os direitos assegurados às pessoas com idade igual ou superior a 60 anos, o qual estabelece, ainda os direitos fundamentais, as medidas de proteção, a política de atendimento, o acesso à justiça e os crimes previstos. Em 15/10/2004, foi aprovada pelo Conselho Nacional de Assistência Social – CNAS, através da resolução nº 145, a Política Nacional de Assistência Social – PNAS, que estabelece como diretrizes as mesmas definidas na 151 Constituição Federal de 1988 e na LOAS, acrescida do item: IV – Centralidade na família para concepção e implementação dos benefícios, serviços, programas e projetos. para redução e prevenção do impacto das vicissitudes sociais e naturais ao ciclo da vida, à dignidade humana e à família como núcleo de sustentação afetiva, biológica e relacional” (NOB/SUAS-2005, p. 16) 3. RESULTADOS Ainda de acordo com a PNAS/2004, são funções da Assistência Social: “... a proteção social hierarquizada entre proteção básica e proteção especial, a vigilância social e a defesa dos direitos socioassistenciais”. (NOB/SUAS-2005, p.15) Em 15/7/2005, é aprovada a Norma Operacional Básica do Sistema Único da Assistência Social, definida como “um sistema público não contributivo, descentralizado e participativo, que tem por função a gestão do conteúdo específico da Assistência Social no campo da proteção social brasileira” (NOB/SUAS-2005, p. 12). Estabelece como eixos estruturantes da gestão do Sistema Único da Assistência Social - SUAS: a) Precedência da gestão pública da política; b) Alcance dos direitos socioassistenciais pelos usuários; c) Matricialidade sociofamiliar; 3.1 A Rede Socioassistencial para o Idoso em São José dos Campos, SP Segundo a NOB/SUAS, “a rede socioassistencial é um conjunto integrado de ações de iniciativa pública e da sociedade que ofertam e operam benefícios, programas e projetos, o que supõe a articulação dentre todas estas unidades de provisão de proteção social sob a hierarquia básica e especial e ainda por níveis de complexidade”. (NOB/SUAS-2005, p. 19) São José dos Campos, SP, segundo dados censitários de 2000, contava com uma população de 539.313 pessoas, sendo que a população idosa representava 5,92% (entre o sexo masculino) e 7,21% (entre o sexo feminino) e em 2006, contava com uma população estimada de 610.965 pessoas. A Secretaria de Desenvolvimento Social do Município - SDS, órgão gestor e executor da Política Municipal de Assistência Social, segundo o site oficial da mesma, tem como funções básicas “a inserção, prevenção, proteção e promoção das famílias e indivíduos em situação de vulnerabilidade social e/ou em situação de risco social e/ou pessoal”. d) Territorialização; e) Descentralização político-administrativa; f) Financiamento partilhado entre os entes federados; g) Fortalecimento da relação democrática entre estado e sociedade civil; h) Valorização da presença do controle social; i) Participação popular/cidadão usuário; j) Qualificação de recursos humanos; k) Informação, monitoramento, avaliação e sistematização de resultados (NOB/SUAS-2005, p. 13) O SUAS define, ainda, a proteção social como: “... conjunto de ações, cuidados, atenções, benefícios e auxílios ofertados pelo SUAS 152 No que tange ao atendimento voltado à população idosa, os programas/projetos estão assim classificados: · Proteção Social Básica 1) Projeto Convive: atende 527 idosos em 11 grupos de convivência ligados aos programas municipais e 331 idosos em 6 entidades sociais conveniadas. 2) Benefício de Prestação Continuada – BPC: é repassado a 2.881 pessoas idosas. · Proteção Social Especial de Média Complexidade 1) Projeto de Atendimento Domiciliar ao Idoso – PROJEDI: atende 80 idosos. · Proteção Social Especial de Alta Complexidade 1) atende 122 idosos em 3 instituições de longa Revista UniVap, v.15, n.27, 2008 permanência, sob o regime de abrigo, conveniadas com o poder público. A SDS aprovou, em 2005, o projeto da Casa do Idoso, inaugurada em 2007, com objetivo de prestar atendimento aos idosos a partir de 60 anos de idade, através de ações voltadas aos aspectos de saúde, assistência social, educacional, cultural, recreativo e de lazer, contribuindo para a melhoria da qualidade de vida da população idosa. A meta de atendimento mensal da Casa do Idoso é de, aproximadamente, 7.000 idosos. idoso usuário da Assistência Social o papel de protagonista da rede de ações e serviços, ampliando espaços para o exercício pleno da cidadania. Citando Fernandes, o desenvolvimento das políticas específicas “deve realçar a dignidade humana e criar igualdades entre os distintos grupos de idade para compartilhar recursos, direitos e obrigações da sociedade” (FERNANDES, 1997); isso só se alcança reconhecendo direitos humanos como aqueles considerados fundamentais a todas as pessoas para consecução de uma sociedade igualitária e justa. 5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 4. CONSIDERAÇÕES FINAIS Estatuto do Idoso – Lei nº 10.741, 1º.10.2003. A partir da implantação do SUAS no município, o órgão gestor define a família/comunidade como eixo das ações da Política Municipal de Assistência Social, como elo integrador das ações e foco dos programas específicos. Com isso, passa a atender o princípio da matricialidade sociofamiliar estabelecido pela NOB/ SUAS. Contudo, alguns pontos ainda não estão plenamente efetivados, tais como: · Envolvimento da população na formulação das políticas e no controle das ações; · Adequação do BPC/Idoso; · Atendimento à família dos idosos inseridos no Projeto Convive. A implementação desses aspectos garantirá ao Revista UniVap, v.15, n.27, 2008 FERNANDES, F. S. As pessoas Idosas na Legislação Brasileira. São Paulo: LTR, 1997. Lei Orgânica da Assistência Social – LOAS, Lei nº 8.742, 7.12.1993. Norma Operacional Básica – NOB/SUAS, resolução nº 130, 15.7.2005. Política Nacional de Assistência Social – PNAS, resolução nº 145, 15.10.2004. Disponível em: www.mdsm.gov.br/suas, acessado em 9.11.2006. www.sjc.sp.gov.br/acidade, acessado em 6.11.2006. www.sjc.sp.gov.br/sds, acessado em 6.11.2006. 153 Grupos de Convivência de Idosos no Município de São José dos Campos, SP Dioguina das Graças Bitarelli Viana Costa * Sueli Neves dos Santos * Elizabeth Moraes Liberato ** Resumo: Atualmente, existe no município de São José dos Campos-SP, espaços de convivência, os chamados grupos de Terceira Idade, através dos quais a sociedade busca formas de engajar e reintegrar os idosos ao meio social. Neste contexto da política municipal do idoso, surge a criação da Casa do Idoso, um centro com o objetivo de oferecer ao idoso todos os serviços nas áreas de lazer, cultura, saúde e orientação jurídica. Assim, neste artigo, voltamos nossa atenção para a Política Municipal do Idoso, para uma reflexão necessária, buscando contribuir para o planejamento de uma proposta de intervenção interdisciplinar, visando a atenção aos idosos que possuem condições desfavoráveis, cuja mobilização é importante para o processo de construção da cidadania da população idosa. Palavras-chave: Grupo de convivência, envelhecimento. Abstract: Nowadays, there are environments named “Grupos da 3ª Idade”, in São José dos Campos, with the aim of reintegrate the elderly people in the social context. The local politics created the “Casa do Idoso”, in order to offer all kinds of services such as leisure, culture, health and juridic assistance. In this work we intend to reflect about the “Política Municipal do Idoso”, in order to contribute for the interdisciplinary action to overcome the disadvantaged conditions and achieve the construction of the citizenship of the elderly. Key words: Togetherness group, ageing. 1. INTRODUÇÃO O presente trabalho tem por objetivo refletir sobre os grupos de convivência do idoso e sua importância no Município de São José dos Campos, SP. O envelhecimento populacional é uma realidade no Brasil, desde a década de 70, caracterizando-se pela aceleração desse processo. Em 1991, a população idosa brasileira com mais de 60 anos ou mais perfazia um total de 10,7 milhões. Hoje, essa população idosa já passa de 14 milhões e, no ano de 2020, está estimada em 31,8 milhões, situando o Brasil como o sexto país do mundo em termos de número de idosos; evidencia-se, assim a importância dessa faixa etária no Brasil. (VERAS, 2002) Com o crescente aumento da população idosa brasileira, é importante para o efetivo exercício da cida* Pós-Graduada do Curso de Especialização em Gerontologia e Família. ** Pró-Reitora de Avaliação e Professora da Univap Doutora em Serviço Social e Especialista em Gerontologia. 154 dania, a construção de uma sociedade mais consciente do envelhecimento populacional e de sua realidade atual e futura. A Política do Idoso está estabelecida em três esferas: Federal, Estadual e Municipal, contendo medidas de proteção e que asseguram direitos ao cidadão, a partir dos 60 anos, conforme estabelece o Estatuto do Idoso (lei 10.471 de 1º/10/03). Em São José dos Campos, a população idosa, através da Política Municipal do Idoso, é atendida em programas e serviços que pontuam a necessidade de ampliar o acesso a todo o segmento. Com a construção da Casa do Idoso, na região Centro, inaugurada em julho/2007, há necessidade de se discutir a Política Municipal do Idoso nos grupos de convivência, através de fóruns regionais, assegurando sua integração nesse novo contexto. Vale ressaltar que, apesar dos direitos assegurados pelo Estatuto do Idoso, na maioria das vezes, os idosos não são reconhecidos pela sociedade, cabendolhes lutar para reafirmar a conquista do seu espaço no cenário social. Revista UniVap, v.15, n.27, 2008 2. MATERIALE MÉTODOS As pessoas idosas parecem transitar por limites muito tênues de dependência x autonomia na reprodução cotidiana das relações sociais e na família, com todas as implicações em sua realidade de vida, que refletem a complexidade de mudanças e os novos arranjos familiares no contexto urbano. pelo surgimento de um discurso científico sobre a velhice e por mudanças na forma como os indivíduos, ao envelhecer, vêem sua própria imagem refletida na sociedade. Envelhecer é uma experiência única. Ao mesmo tempo que o progresso científico permite que as pessoas vivam mais tempo, também a sociedade deve proporcionar-lhes oportunidades para viverem significativamente os anos conquistados. A ampliação das ações de apoio ao segmento idoso foi garantida pela Política Nacional do Idoso e pelo Estatuto do Idoso. Representa um esforço do Estado brasileiro em reconhecer, em forma de lei, as principais preocupações e exigências da sociedade civil, e também, o reconhecimento da necessidade de implantação de inúmeras ações de apoio ao segmento idoso, assim como a construção de um novo conceito social para velhice. No dizer de Lehr: “a expectativa de vida e a qualidade de vida não dependem somente de condições físicas ou biológicas. Fatores sociais, psicológicos e ambientais também são importantes. (...) Os indivíduos estão vivendo mais, na verdade, é uma tarefa para todos, mas também para a sociedade”. (LEHR, 1999, p. 26) Segundo Camaramo (1999), os estudos sobre o envelhecimento são importantes, pois deve-se considerar o significativo número de idosos na sociedade brasileira. A definição do que é o envelhecimento abrange várias dimensões; salientam-se três aspectos: biológico, cronológico e social. Ao lidar com a pessoa idosa, uma das causas importantes a considerar deve ser a dimensão social, que abrange aspectos da solidão, que resulta da falta de um papel social ativo, e que gera o tempo livre e a ociosidade. O envelhecimento populacional é foco de discussões de vários setores da sociedade e de diversas áreas de conhecimento que se interessam pelo tema, com o objetivo de enfrentar a problemática, na tentativa de garantir melhor qualidade de vida aos que envelhecem. O prolongamento da vida foi, sempre, uma aspiração da humanidade. A forma de tratar os idosos depende, entretanto, de cada cultura ou sociedade. Ainda incluso na dimensão social, considera-se que, à medida que as pessoas envelhecem, vão-se afastando da vida em sociedade, havendo tendência a um maior isolamento ao longo do tempo; com isso, há preservação de valores antigos, não havendo incorporação de novos conceitos e valores. Para Salgado: “O homem reduz sua participação à medida em que avança na idade. Tal atitude leva-o ao afastamento de seus semelhantes. A necessidade dessa participação social é benéfica não só ao idoso mas também ao conjunto da sociedade”. (SALGADO, 1980, p. 65) O conceito de envelhecimento saudável requer a manutenção de um envolvimento ativo com a vida. A teoria da atividade explicita que o bem-estar emocional é, em parte, resultado da interação social e da forma como o vínculo social se dá. Então, compartilhar atividades físicas, intelectuais e sociais é importante para que o idoso preserve a qualidade de vida, o que contribui notadamente para a sua autonomia. Em se tratando de velhice, que conceito deve ser adotado? Várias denominações vão sendo criadas, tais como meia idade, maturidade, terceira idade, juventude acumulada, melhor idade, entre outros. Assim o envelhecimento pode ser vivenciado em um contexto marcado Revista UniVap, v.15, n.27, 2008 3. DISCUSSÃO Nas culturas primitivas, os idosos eram reconhecidos pela sua experiência de vida. Na sociedade contemporânea, o envelhecimento está culturalmente associado com a saída do mercado de trabalho e o ingresso na aposentadoria. Com a aposentadoria, os idosos tendem a diminuir suas relações sociais, antes possibilitadas pelo trabalho. Para enfrentar essas mudanças, é necessário que os idosos recriem novas alternativas de participação, lazer e ocupação do tempo livre. Mas é preciso que todos os idosos tenham acesso a essas alternativas de lazer. Ao discutir opções de entretenimento para o idoso, é preciso ser levado em conta que o processo de envelhecimento é heterogêneo e diferenciado, pois as atividades, expectativas e o lazer não possuem o mesmo significado para todos, embora, alcançar o envelhecimento saudável seja aspiração da maioria. 4. RESULTADOS É importante refletir sobre o trabalho desenvolvido junto aos grupos de convivência, localizados nos bairros, em São José dos Campos. A importância de grupos de convivência para idosos é praticamente a mesma que para qualquer outra idade, com a característica positiva de que os idosos dispõem de maior tempo. Apesar de se viver numa sociedade que privilegia o trabalho, a produção e o consumo, e não as necessidades humanas, alguns programas para a terceira idade estão sendo criados, garantindo a gratuidade de serviços culturais e de 155 lazer a essa parcela da população. No meio urbano, os números de grupos de convivência são expressivos, configurando-se como espaços que oferecem aos idosos múltiplas atividades lúdicas, de lazer e informação, tais como: aulas de dança, canto e coral, teatro e expressão corporal, bailes, caminhadas, ginástica, excursões, palestras e eventos relacionados à terceira idade, enfim, atividades que favorecem o desenvolvimento sócio-cultural do idoso, através da sua participação na sociedade. A participação em atividades coletivas, como passeios, representam opções de lazer ao ar livre, que oferecem oportunidade de afastamento do cotidiano, despertando a solidariedade, a divisão de tarefas e responsabilidades, oportunizando o crescimento pessoal a cada membro do grupo. Sem dúvida, essas iniciativas possibilitam a inserção dos idosos no meio social, levando-os a superar a solidão, o isolamento e a ociosidade provocados, muitas vezes, pela falta de opções de lazer no cotidiano. Inserir o idoso em programas sociais é assegurar sua cidadania, reconhecendo através de seu engajamento, seus direitos, considerando-os como parte integrante de um processo dinâmico do ciclo da vida. não como uma fragilidade biopsíquica do ser em decadência. Para Beauvoir “Envelhecer é um fenômeno biológico e cultural”. (1994) A participação e o envolvimento dos idosos deve ser estimulado nos grupos, centros de convivência, clubes ou programas universitários, nas instituições. Existe o reconhecimento da importância dos grupos de convivência para o idoso; esperamos que essa reflexão traga contribuições para o município, assim como para a Política Municipal do Idoso. Entretanto, não deve significar para o idoso, somente, usufruir as atividades e programas planejados e organizados pelos outros e sim participar, trabalhar coletivamente, incluir-se nas discussões e proposições de alternativas, no planejamento de ações, na concretização de planos, na gestão, no controle e na avaliação das atividades. É preciso ampliar as possibilidades de lazer e os objetivos dos programas destinados aos idosos, qualificando aqueles já existentes, incentivando a auto-expressão, a troca de experiências, o fortalecimento mútuo, a criatividade, a autonomia e, especialmente, os processos emancipatórios, capazes de conduzir à plena inserção na vida social. 6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS A velhice precisa ser vivida e encarada como um processo natural, como as demais fases da vida. O contato social, as amizades e as demais atividades realizadas são indispensáveis para se viver socialmente. As diversas possibilidades para se estabelecer contato com o outro, seja por meio de atividades comunitárias, físicas ou religiosas precisam ser exploradas, pois, contribuem para que os idosos se adaptem às mudanças que o processo de envelhecimento envolve. É indispensável, portanto, a participação contínua e permanente dos idosos em todos os espaços da vida social, desfrutando de situações e oportunidades de acordo com os interesses e recursos pessoais de cada um, mas, acima de tudo, que esse envolvimento seja resultado de escolhas que traduzem satisfação e vontade de viver. A Política Municipal do Idoso deve ser discutida nos grupos de convivência, para que os idosos sintamse parte integrante da Casa do Idoso, equipamento que acresce, no município, os recursos para atendimento multidisciplinar à população idosa. 5. CONCLUSÃO É preciso mudar a visão da sociedade em relação à consciência do processo de envelhecimento. A velhice deve ser entendida como um processo do ciclo da vida e 156 BRUNO, M. R. P. Cidadania não tem idade. Serviço & Sociedade, SP, Ano XXIV, n. 75, set. 2003. BEAUVOIR, S. A Velhice. 3. ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1994. CAMARANO. A.A. Muito além dos 60 anos. Os novos idosos brasileiros. R.J. IPEA, 1999. LEHR, U. A revolução da longevidade: impacto na sociedade, na família e no indivíduo. In: Estudos interdisciplinares sobre o envelhecimento. Porto Alegre, R.S: UFRS, 1999. LORDA, C. R.; SANCHEZA, C. D. Recreação na Terceira Idade. Rio de Janeiro: SPRINT, 2001. SALGADO. M. A Velhice uma nova questão social. Terceira Idade. São Paulo. SESC, 1980. VERAS, R. P. Gestão Contemporânea em saúde. Rio de Janeiro: Relume Dumará, 2002. Estatuto do Idoso, 2003. Política Municipal do Idoso. Revista UniVap, v.15, n.27, 2008 A Magia do Mercado Municipal: espaço urbano de encontros Rosa Ester Guimarães de Quadros * Elizabeth Moraes Liberato ** Resumo: O texto apresenta algumas questões a serem refletidas sobre o espaço urbano e a memória social, tomando por base vivências e relações sociais observadas no Mercado Municipal de São José dos Campos, SP. Palavras-chave: Espaço urbano, memória social. Abstract: This stud presents questions to be reflected about the urban space and social memory, considering the vivencial and relationship observed in the Mercado Municipal de São José dos Campos. Key words: Urban space, social memory. 1. INTRODUÇÃO A partir de uma aproximação visando um melhor conhecimento sobre a magia que envolve o espaço urbano do Mercado Municipal, de São José dos Campos-SP, coloca-se uma instigante provocação quanto a se compreender as várias expressões manifestas, verificadas sobretudo na perspectiva de um espaço de encontro entre as pessoas idosas que vivem há um tempo histórico mais prolongado no espaço da cidade. Santos (1998) coloca a questão do direito ao entorno, do direito aos espaços públicos, típicos da vida urbana e que denotam a tradição cultural histórica. Seguindo a orientação do autor, no tocante à noção de direito a esse espaço pleno de história e tradição para a memória social das pessoas que freqüentam o Mercado Municipal da cidade de São José dos Campos, torna-se significativo analisar a dinâmica encontrada na ocupação e nas atividades desse local público, preservado como patrimônio da cidade. 2. MATERIAIS E MÉTODOS Considerando o contexto social resultante das mudanças no traçado da cidade e em suas característi- * Pós-Graduada do Curso de Especialização em Gerontologia e Família. ** Pró-Reitora de Avaliação e Professora da Univap Doutora em Serviço Social e Especialista em Gerontologia. Revista UniVap, v.15, n.27, 2008 cas, há que se olhar e pensar como é fascinante o centro histórico de São José dos Campos, onde sobressai o espaço urbano em questão, o Mercado Municipal, inaugurado em 1923 e que passou por muitas mudanças, mas manteve sua estrutura original, preservado como Patrimônio Histórico da cidade. O estudo desse espaço requer uma abordagem sócio-histórica, com base num olhar retrospectivo. É importante deixar-se envolver pela atmosfera alegre que é percebida em suas ruelas e no encontro de pessoas. Este cenário suscita ainda uma provocação, visando compreender a diversidade cultural sob o prisma da memória social presente no lugar. Num passeio, realizamos com atenção uma observação sobre esse fluxo, olhando a movimentação de pessoas, focando, de um lado, uma conversa provocada num aparente encontro casual, de outro lado, um encontro que se apresenta numa roda de conversa, talvez marcada em determinados dias da semana, se assemelhando a uma convivência prazerosa que se repete recheada com sabores, cheiros e ao som de uma música de fundo, que fala ao coração, que remete à cultura, à raiz, relacionadas às histórias de vida do grupo de pessoas ali reunidas, muitas delas idosas. Explorando um pouco mais além, através da perspectiva da ocupação do espaço social pela pessoa idosa e relacionando com uma nova identidade de uma pessoa mais ativa, mais participativa em busca da ocupação de seu lugar social, torna-se interessante questionar, conhecer, aproximar-se e registrar a roda de conversa entre 157 os idosos reunidos freqüentemente nesse mágico lugar da cidade. As questões se colocam: é um espaço de tradição que remete ao aspecto de pertencimento, de inclusão social na vida urbana? Ou é um espaço que refere à memória social? Com esta visão pode-se recorrer a citação de Poulet (1992), relembrando Proust (1957 apud BRANDÃO, 1999) que diz: “(...) graças à memória, o tempo não está perdido, e se não está perdido, também o espaço não está. Ao lado do tempo reencontrado está o espaço encontrado, um espaço que se encontra e se descobre em razão do momento desencadeado pela lembrança”. Halbwachs (1990) analisa a questão da memória ligada ao espaço, refere que enquanto algumas marcas materiais da cidade permanecerem, elas serão fontes de segurança para as pessoas que ali vivem. sociedade. Esta questão se constitui numa temática que interliga espaço, tempo e memória social. Espaço configurando o aspecto de pertencimento e que confere referência, decorrente da própria lembrança desencadeada, permitindo reconhecer o papel social por meio das reminiscências. Ainda no tocante ao tempo histórico é importante considerar que o contato com o passado possibilita recuperar a história. Este processo de rememorar supera a visão ingênua, reducionista, percebida numa recordação que não confere significado. A memória está, nesta perspectiva, dimensionada por um movimento dinâmico, que deve possibilitar, através das religações, a construção de um lugar significativo, no qual pessoas idosas sejam valorizadas e se valorizem, bem como se percebam na sociedade. Assim sendo, se for considerada esta dimensão da memória social, o espaço e o tempo não estão perdidos. Com as lembranças, tornam-se ainda mais mágicos, fascinantes e instigantes à aproximação, com vistas ao conhecimento da realidade nessa dinâmica de encontro pessoal e roda de conversa, identificados no cotidiano dos homens e mulheres circulantes no espaço do Mercado Municipal, em especial os idosos. Hoje, percebe-se o movimento de valorização da memória construída pela sociedade, através de novos olhares para a pessoa idosa. Na perspectiva do contexto apresentado, existem questões a serem refletidas e conhecidas neste processo de conhecimento; podemos levantar que, em meio a tantas mudanças, a preservação do espaço pode ser visto como referência às pessoas idosas, cujas histórias de vida foram construídas num determinado espaço urbano, em determinado tempo histórico. É uma tarefa instigante adentrar cada vez mais nessa trama e dela extrair histórias e mais histórias, daqueles que se constituem no dizer de Py (1999) “testemunhas vivas da história”. A partir deste olhar, coloca-se uma reflexão a ser melhor compreendida: Espaço, Tempo e Memória Social podem-se constituir em um recurso repleto de significados de vida, de sentimentos e emoções e ainda indicar um novo modo da pessoa idosa estar nesse lugar social. Assim, focando o espaço do Mercado Municipal, onde transitam personagens que se misturam, muitos carregam em si lembranças, sensações que reconstituem o passado daquele espaço urbano e da própria cidade. 4. CONCLUSÃO O trabalho aponta caminhos de apreensão da realidade, na continuidade da pesquisa que deverá levar em consideração personagens e a subjetividade inerente ao tema, ao deparar com os sujeitos que ajudaram a construir a história, em conseqüência, a memória social do espaço urbano do Mercado Municipal de São José dos Campos. Isto traduz-se nas palavras de Mafessoli: 3. RESULTADOS Neste enfoque dado ao trabalho, além de se considerar o surgimento na sociedade contemporânea de uma nova visão e identidade social do idoso, deve-se considerar a forma de ocupação do seu espaço social e, gradativamente, descortinar a presença histórica dessa pessoa, podendo ser vista e reconhecida socialmente no desempenho de novos papéis na realidade social urbana. Cabe uma reflexão mais ampla, considerando as referências dos autores assinalados; coloca-se a questão da presença histórica da pessoa idosa no espaço e sua imagem identificada como depositária da memória da 158 “A cidade, em sua banalidade, é potencialmente rica em aventuras produzidas por suas inumeráveis ruas e lugares diversos, assim como o dado social, em seu aspecto mais comum, através do jogo da diferença, pode provocar situações, encontros e momentos particularmente intensos.(...) é isso que permite compreender que o cotidiano mais banal seja o cadinho da permanência da socialidade”. (MAFFESOLI, 1984, p. 27) Revista UniVap, v.15, n.27, 2008 5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BEAUVOIR, S. de. A Velhice. Nova Fronteira. São Paulo, 2002. DIAS, A. Um tempo na vida em São José dos Campos. São José dos Campos: JAC Gráfica, 2000. BENJAMIN, V. História do Passado e da Memória. Tradução Revista do SESC Terceira Idade. Ano 4 n. 6. FERREIRA, M. de M.; FERNANDES, T. M.; ALBERTI, V. (Orgs). História Oral. Desafios para o século XXI. Memória e Diálogo: Desafios da História Oral, para a Ideologia do Século XXI. 1998. _______. Magia/Técnica, Arte/Política. São Paulo: Brasiliense, 1987. HALBWACHS, M. A Memória Coletiva. São Paulo: Vértice, 1990. BOBBIO, N. O Tempo de Memória.- de senectude e outros escritos autobiográficos. Rio de Janeiro: Campus, 1997. JÚNIOR, A. São José dos Campos e sua História. PM São José dos Campos, 1978. BONDESAN, A. São José dos Campos em Quatro Tempos. São Paulo: Bentivegna, 1967. BOSI, E. Memória e Sociedade-Lembrança de Velhos. São Paulo, 1994. 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Para mostrar as possibilidades de ocorrência de trocas entre as gerações, buscou-se elaborar um estudo sobre a prática desenvolvida em encontros de co-educação entre gerações no município de Campos do Jordão e São José dos Campos. Palavras-chave: Idoso, Terceira Idade, Projeto Intergeracional. Abstract: This article discusses the process of appoach between generation by educations actions of the Intergenerational Project, Third Age and Youngsters, of Third Age University of Vale do Paraíba University, Univap. To show the possibility’s of occurrence of interchange between generations, we search to elaborated a study about the partice develpe in co-education meeting between generations, in the borough of Campos do Jordão e São José dos Campos. Key words: Elderly, Thirty Age, co-education between generations. 1. INTRODUÇÃO O estudo aqui apresentado tem como proposta mostrar as vivências no desenvolvimento de projeto intergeracional, entre alunos da Faculdade da 3ª Idade da Universidade do Vale do Paraíba - Univap, nos Municípios de São José dos Campos e Campos do Jordão, e alunos de escolas de Ensino Médio e Fundamental da rede de ensino municipal e estadual destas cidades. O Programa Faculdade da Terceira Idade da Universidade do Vale do Paraíba-Univap, foi criado em 1991; permite o acesso à educação continuada e oferece condições para integração do idoso na comunidade, assim como a organização e apoio a eventos sobre o processo de envelhecimento e a condição do idoso; o incentivo a estudos ligados ao processo de envelhecimento e à fase da velhice. A Faculdade da 3ª Idade – Univap, sob a coordenação do Curso de Serviço Social, da Faculdade de Ciências Sociais Aplicadas, está vinculada ao Projeto Social Vale a Pena Viver da Universidade. Este Programa é desenvolvido nos municípios de São José dos Campos, Caçapava e Campos do Jordão. * Coordenadora do Curso de Gerontologia e Família. Coordenadora da Faculdade da Terceira Idade Univap - Núcleo Campos do Jordão. Mestre em Gerontologia. 160 A proposta de desenvolvimento do Projeto de Encontro Intergeracional: terceira idade e jovens, que vem sendo desenvolvido desde 2002, pela Faculdade da 3ª Idade - Univap, nos municípios de Campos do Jordão e São José dos Campos, surgiu enquanto fruto de reflexões sobre o processo de envelhecimento. Considera-se a importância do resgate das relações entre gerações e o papel social de cada um como ator social capaz de gerar transformações em si mesmo e em seu entorno. Compreende trabalhos de interação e de co-educação entre idosos e jovens. 2. MATERIAL E MÉTODOS O envelhecimento é inerente ao processo de vida, nascemos, crescemos, envelhecemos num tempo cujo significado é estabelecido culturalmente. Para Bruns e Abreu, há algo comum entre os seres humanos, “(...) independente de classe social, preferência sexual, estado civil, religião – todos trilham a incontornável trajetória do envelhecimento”. (BRUNS; ABREU, 1994, p.188) O ser humano é um ser histórico-social que vem, através do tempo construindo, desconstruindo e reconstruindo seus espaços sociais. Dentro dessa perspectiva, o sentido dado à velhice, ou a qualquer fase da vida, está relacionado aos valores éticos e morais da sociedade, num tempo histórico. Para Àries (1986), a demanda demográfica mostra Revista UniVap, v.15, n.27, 2008 e determina o perfil do momento histórico vivido e analisado. O autor, em sua obra, determina idades que foram privilegiadas em determinadas épocas, fala da juventude como privilégio do século XVII, da infância do século XIX, e da adolescência do século XX. O distanciamento entre os grupos geracionais levou a um enfraquecimento do espaço coletivo, a um esvaziamento na organização grupal, que impossibilita a construção de um sentimento coletivo de garantia de direitos comuns a todo. Para Todaro e Costa, “(...) se principalmente o século XVIII ajudou a nutrir e divulgar a idéia de infância é somente no final do século XIX que os franceses se destacam por passarem a dar um tratamento social à velhice.” (TODARO; COSTA, 2004, p.35) O princípio de igualdade social é construído no espaço coletivo, onde os indivíduos se apropriam do direito de serem vistos, ouvidos e o de desenvolverem ações concretas na construção da vida em comunidade. No século XX, há o prolongamento do tempo de vida em função da modernização, que promove aprimoramento das condições sociais, econômicas e de saúde, fatores que influenciam a mudança das causas de morte, anteriormente resultantes de doenças infecciosas e parasitárias, pelas doenças crônico-degenerativas, fenômeno denominado de transição epidemológica. Em função do prolongamento do tempo de vida, há um aumento progressivo da população idosa, o que determina a necessidade de estudos e de busca pela efetivação de ações, que dêem conta dessa nova realidade social do século XX. O Brasil, considerado um país em processo de envelhecimento, terá, em 2025, uma população aproximada de 34 milhões de idosos, esta será a sexta maior população de idosos do mundo. Este dado demográfico reforça a necessidade de se ampliar os esforços na efetivação de ações que contemplem as necessidades da população brasileira que envelhece num processo rápido e progressivo. Dentro desse cenário da vida moderna, nos encontramos com outro fenômeno que vem sendo alvo de discussões e reflexões, além do prolongamento do tempo de vida, o distanciamento das relações entre as gerações. Houve, na modernidade, o re-desenho da vida cotidiana, ocorre uma compartimentalização dos espaços sociais promovendo uma segregação das diversas gerações. Cada grupo etário passa a ser defensor de um espaço próprio, onde a referência da complementariedade na diversidade se perde. Para Todaro e Costa, podemos confirmar isto, “(...) nas instituições voltadas única e exclusivamente para as crianças, como por exemplo, as escolas de ensino fundamental que as separam das maiores. E no caso dos velhos podemos verificar estas práticas nos espaços de educação não-formal, onde as atividades são oferecidas unicamente para os velhos.” (TODARO; COSTA, 2004, p.35) Revista UniVap, v.15, n.27, 2008 Arendt (2002) reflete sobre essas questões e mostra as conseqüências advindas da perda do espaço coletivo, da falta de interação entre os seres humanos, quando o indivíduo se isola e vive a ausência de outros, despojando-se de ter um lugar no mundo. Assim coloca a autora: “(...) viver uma vida inteiramente privada significa, acima de tudo, ser destituído de coisas essenciais à vida verdadeiramente humana: ser privado da realidade que advém do fato de ser visto e ouvido por outros, (...) privado da possibilidade de realizar algo mais permanente que a própria vida, (...) o homem privado não se dá a conhecer, e, portanto, é como se não existisse. O que quer que ele faça permanece sem importância ou conseqüência para os outros, e o que tem importância para ele é desprovido de interesse para os outros.” (ARENDT, 2002, p. 68) A vida moderna criou o fenômeno da solidão, que destruiu a vida no espaço público, onde se dá o encontro entre os iguais, o espaço da vida coletiva. Assim colocando Arendt: “Nas circunstâncias modernas, essa privação de relações ‘objetivas’ com os outros e de uma realidade garantida por intermédio destes últimos tornou-se um fenômeno de massa da solidão, no qual assumiu sua forma mais extrema e mais anti-humana.” (ARENDT, 2002, p. 68) Enquanto ser grupal, o ser humano realiza suas experiências de autodescoberta e de descoberta do outro, através da comunicação e da comunhão interpessoal, que acontecem no espaço grupal. Os espaços de convivência grupal são espaços de construção de uma história onde o “eu” e o “tu” se fazem num tempo de possibilidades e não de determinismo. No final do século XX, há a redescoberta da importância da convivência intergeracional, se assume que as relações intergeracionais são importantes para os indivíduos e para a sociedade. São possibilitadoras de encontros onde ocorrem trocas de experiências, aprendizado e crescimento. Dos estudos de Moragas, temos que, “A União Européia fez ecoar pela primeira vez internacionalmen161 te a necessidade de estabelecer relações intergeracionais sãs em 1992. Para este fim, convocou a todos os seus membros para que apresentassem iniciativas criativas de relações intergeracionais.” (MORAGAS, 2004, p. 27) O fortalecimento e resgate da importância das relações intergeracionais constituem instrumentos efetivos para o processo de humanização do ser humano, para a preservação de suas raízes e o enfrentamento do prolongamento do tempo de vida. privadas, com o objetivo de desenvolver atividades sócio-educativas, culturais e esportivas para os idosos. Para Todaro e Costa, ainda são poucos os programas que se preocupam em promover espaços de trocas e de convivência intergeracional, assim se colocando as autoras, “(...) Infelizmente, ainda são poucas as instituições que se configuram em locais aonde se vai para experienciar vivências intergeracionais.” (TODARO; COSTA, 2004, p. 35) 3. RESULTADOS E DISCUSSÃO Em relação ao processo de humanização do humano, Oliveira coloca que, “Nenhum ser humano se humaniza sozinho. Sempre precisa de outro, aquele que testemunha seu inacabamento. Por isso, humanizar o humano é tarefa que tem um norte, mas que não tem fim.” (OLIVEIRA, 1996, p. 9) Para Alves e Correia, é nas experiências relacionais em grupo que todos têm a oportunidade de se verem ao vivo, “(...) interagindo, enfrentando as dificuldades e os conflitos interpessoais, na relação com o poder, com as normas, com os limites e com todos os símbolos de autoridade. Perceber o nível de profundidade que se quer nas relações, compartilhar os sentimentos e a possibilidade de se viver a solidariedade, a troca, a verdade, o perdão, a compreensão, a compaixão, o amor, a fé, a esperança de um mundo melhor mais humano e ético”. (ALVES; CORREIA, 2004, p. 91) O encontro intergeracional possibilita a ocorrência de uma co-educação entre gerações, onde se supõe gerações em movimento. Oliveira sugere que, nesses encontros, “(...) cada geração, além de ser vista como depositária de uma época e, portanto, banhada por um tempo datado historicamente, pode igualmente ser percebida como modeladora das marcas de sua passagem, no tempo e no espaço. Tais marcas estariam impressas na cultura material e simbólica que comporia, vamos dizer assim, o conjunto de oferendas das gerações umas às outras.” (OLIVEIRA, 1996, p. 7) Em função do aumento da população idosa, há a proliferação, no Brasil, de programas para a Terceira Idade, que são oferecidos por instituições públicas e/ou 162 3.1 Encontros Intergeracionais em Campos do Jordão O Núcleo da Faculdade da 3ª Idade-Univap, em Campos do Jordão, foi criado em 1999, por iniciativa e solicitação de um grupo de moradores, juntamente com um grupo instituído daquela cidade, o Grupo de Apoio à Implantação de Cursos Superiores, GRAICUS. Desde sua criação, o Núcleo vem desenvolvendo trabalhos de educação continuada junto à população que se encontra na 3ª Idade, tendo como uma de suas propostas de trabalho, estimular a participação social do indivíduo como sujeito histórico, agente de transformação social. Os Encontros Intergeracionais realizados na cidade de Campos do Jordão entre os alunos do Núcleo da Faculdade da 3ª Idade e alunos das escolas municipais e estadual do Município, foram realizados através de encontros dialogais, sob o esteio do pensamento de Paulo Freire e através de estudos e pesquisa de campo, que foram realizados em diversos locais no Município e nas instalações do Núcleo da Faculdade da 3ª Idade - Univap e das escolas de Ensino Fundamental e Médio, parceiras dos diversos encontros. Do primeiro ao sexto, os Encontros Intergeracionais realizados em Campos do Jordão, reunindo os núcleos de São José dos Campos e Campos do Jordão, contaram com a parceria de escolas de cada cidade; foram desenvolvidos seis projetos interligados com cada uma delas. As sensações, falas e emoções vividas nesses encontros foram transformadas em apresentações artísticas, a cada final de ano, organizadas na cidade de Campos do Jordão, reunindo idosos e os jovens da região. Revista UniVap, v.15, n.27, 2008 Nos depoimentos de alguns alunos podemos perceber a intensidade dos sentimentos e emoções presentes durante os encontros: Idoso Me senti bastante descontraída e curiosa, (...) Foi muito produtivo e oportunidade de crescimento. Jovem Eu achei o encontro super interessante, porque lá nós aprendemos e ensinamos um pouco do que sabemos. Eu gostei muito de lá, as pessoas são super educadas e gentis, eu conheci muitas pessoas e quando estou lá me sinto muito bem. O Encontro Intergeracional é legal e nos incentiva muito, pois sabemos que um dia também estaremos no lugar deles e outros jovens em nosso lugar. Jovem (...) pude perceber que a idade não interfere em nada na vida, apenas nos mostra que há tempo para tudo e que não existe cedo ou tarde demais. Idoso É sempre transformador o contato entre gerações. Há sempre uma troca de informação e portanto aprendizado. A visão amplia. Jovem (...) adquiri conhecimentos e vida com os idosos, que nenhum livro no mundo seria capaz de me ensinar. Cada sorriso, cada gesto, cada palavra de uma fonte de sabedoria, é capaz de transformar o mundo. O olhar distante, às vezes, a face vivida, mostra bem à nossa frente, em questão de instantes, como seremos daqui há algum tempo. De tudo isso, o que mais aproveitei foi o contato direto com pessoas de face vivida e alma livre. Os idosos. Jovem Todas as tardes de quinta-feira que passei com o pessoal da Terceira Idade foram muito agradáveis. São senhoras e senhores muito inteligentes, cultos, alegres, felizes, poetas, contadores de histórias, dançarinos, pintores e artistas. Estão todos dispostos a ensinar e aprender. Eu aprendi nos encontros que tivemos, que não é porque somos mais vividos, que não podemos ir na escola, ter amigos, dançar e namorar .... Idoso Foi um grande prazer, poder participar destes encontros, por ter contato com os jovens, é muito gratificante. Jovem Desde o primeiro encontro foi muito divertido, sempre tomávamos um café juntos, em todas as aulas. Assistimos uma aula sobre música, tocamos teclado, violão, cantamos e nos conhecemos. Em todos os encontros aprendemos um pouco de nós e realizamos coisas que nem pensávamos que seríamos capazes de realizar. Nesses encontros trocamos idéias, sorrisos e palavras que valeram muito e servirão como exemplo para a vida toda. Ter feito esse encontro foi muito bom, pois pudemos perceber a importância de uma convivência com pessoas da 3ª Idade, pudemos ver que eles podem ser tão divertidos quanto nós adolescentes. Idoso Foi muito bom. Na verdade é sempre bom estar com os jovens. aprendemos muito, e um elo de respeito mútuo se forma.. Idoso Passei a admirar mais Felícia Leirner e este projeto uniu mais o nosso grupo com os jovens. Jovem As obras de Felícia me passaram uma paz interior muito grande, me renovou o espírito quando descobri o verdadeiro valor, significado delas. Ao retratar uma mãe e uma filha ou até mesmo os filhos saindo do ventre da mãe. Felícia mostra que tinha uma grande capacidade interior de criar e transformar. Essas obras não são apenas monumentos sobre uma grama, num Museu distante, mas sim um progresso espiritual para cada um que conhece o verdadeiro significado delas. Idoso O que mudou em mim após participar desse projeto foi, antes de qualquer visita a museu ou ao apreciar obras de arte, conhecer o significado de cada escultura, quadro, etc. Estou muito contente e feliz, é o mais importante, não é? 4. CONSIDERAÇÕES FINAIS Idoso Me senti muito bem, é muito bom estar perto dos jovens, eles nos trazem muita alegria e vontade de viver. Jovem Foi uma experiência única. Apesar de ser jordanense, nunca tinha chegado tão perto das obras de uma grande artista que viveu aqui na minha cidade. 164 O projeto “Encontros Intergeracionais” da Faculdade da Terceira Idade-Univap é uma proposta de ação educativa que objetiva aproximar idosos e jovens. A cada ano o projeto desenvolveu um tema específico que contribuiu para promoção de um espaço, que propiciou o convívio intergeracional, através de atividades sócioeducativas-culturais, com troca de experiências que faRevista UniVap, v.15, n.27, 2008 voreceram o aprendizado conjunto entre gerações. Esse projeto surge como uma possibilidade facilitadora do restabelecimento da comunicação entre gerações, levando à apreensão de conhecimento de uma geração para outra, acreditando no poder de transformação da vida como fonte verdadeiramente inexaurível ao crescimento e desenvolvimento. As relações se apresentam como solo fértil que dispõem de um poder para originar novas expressões, novos arranjos existenciais. Os momentos vividos durante a realização do projeto intergeracional em Campos do Jordão, de 2002 a 2007, foram de amorosidade entre as gerações, realizamos diversos encontros dialogais, tendo como material de sustentação textos, músicas, oficinas e pesquisa de campo. BOSI, E. Memória e Sociedade: lembranças de velhos. 3. ed. São Paulo: Compainha das Letras, 1994. BRUNS, M. A. de T.; ABREU, A. S. O Envelhecimento: o dilema humano. Revista Gerontologia. v. 2, n. 4, São Paulo: SBGG, Dez. 1994. CAMARANO, A. A. (Org.). Muito além dos 60 – os novos idosos brasileiros. Rio de Janeiro: IPEA, 1999. Congresso Internacional de Co-educação de Gerações. São Paulo: SESC, 2003. FEATHERSTONE, M. A velhice e o envelhecimento na pós-modernidade. Revista A Terceira idade. Ano 10, n. 14. São Paulo: SESC, pp. 5-17. Ago. 1998. Foram momentos ricos na descoberta do outro. Contamos, principalmente, com o comprometimento dos alunos e professores envolvidos no projeto, sempre acreditando, de acordo com o referencial teórico de sustentação do projeto, que é possível a construção de um mundo melhor e de um estar junto alimentador. FERRIGNO, J. C. Co-educação entre Gerações. Petrópolis: Vozes, 2002. Nas vivências instituídas em Campos do Jordão no projeto de encontros intergeracionais, nos deparamos com jovens e idosos partilhando experiências, construindo possibilidades à transcendência de diferenças, compondo espaços de aprendizado e troca, a partir de uma proposta de produção conjunta. _______. Educação como prática da liberdade. 25. e. São Paulo: Paz e Terra, 2002. Ao acreditar no convívio de gerações, não como uma relação linear, mas como uma troca onde os sujeitos se refazem e se constituem mutuamente, acreditamos, como coloca Oliveira que, “Idosos, jovens e adultos interagem na vida em comum e se modificam reciprocamente. (...) uma possibilidade que se inaugura a partir de co-existência de gerações diferentes numa dada situação social.” (OLIVEIRA, 1996, p. 7) 5. REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA ARENDT, H. A Condição Humana. Tradução de Roberto Raposo. 10. ed. Rio Janeiro: Forense Universitária, 2001. ÀRIES, P. História da Criança e da Família. São Paulo: L. P. C., 1986. BEAUVOIR, S. de. A Velhice. Tradução de Maria Helena Franco Monteiro. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1990. BOFF, L. Ética da Vida. 2. ed. Brasília: Letraviva, 2000. _______. Saber Cuidar: ética do humano – compaixão pela terra. Petrópolis: Vozes, 1999. Revista UniVap, v.15, n.27, 2008 FREIRE, P. Pedagogia da Autonomia – saberes necessários à prática educativa. 21. ed. São Paulo: Paz e Terra. Coleção Leitura, 2002. _______. Pedagogia da Indignação – cartas pedagógicas e outros escritos. São Paulo: UNESP, 2000. _______. Pedagogia da Esperança – um reencontro com a pedagogia do oprimido. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1992. _______. 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O ser humano mantém, mesmo nas idades mais avançadas, a necessidade e a capacidade de repensar sua vida, cabendo a cada indivíduo e à sociedade, de modo geral, garantirem as condições necessárias para que os idosos se sintam incentivados para realizar novos projetos de vida. Esta pesquisa, realizada na Faculdade da Terceira IdadeUnivap, no município de São José dos Campos, SP, teve como objetivo verificar a existência da relação entre educação continuada e projeto de vida de pessoas idosas, visando ampliar o conhecimento existente nessa área e contribuir com programas e projetos voltados para idosos. Os resultados obtidos nesta pesquisa demonstram a existência de uma relação entre educação continuada e projeto de vida de pessoas idosas, indicando a importância da sua inclusão em programas e atividades voltadas para a construção e realização de projetos de vida. Palavras-chave: Velhice, educação continuada, projeto de vida. Abstract: Aging is a natural process for the human being and the old age; as well as the other stages of life, has its own features. The population aging and longevity bring up new challenges to the society and to the individuals on how to offer the elderly conditions so they can keep developing their life potential. In order to have a full development of it, the elderly should be inserted in the educational context, and the continuing education approach meets this demand. The human being keeps, even at the most advanced ages, the need and ability to rethink life and it is up to each individual and to the society, on the whole, to guarantee the necessary conditions so the elderly feel encouraged to make new life projects. This research, carried out at the Faculdade da Terceira Idade UNIVAP, in the city of São José dos Campos, SP, aimed at verifying the existence of relationship between the continuing education and the elderly life project, as well as, intended to broaden the knowledge of this area and to contribute to projects and programs directed to the elderly. The results of this research show the existence of a positive relation between the continuing education and the elderly life project and point out the importance of including them in programs with activities that encourage the elderly to plan and accomplish life projects. Key words: Elderly, continuing education, life project. 1. INTRODUÇÃO O envelhecimento do ser humano é um processo natural, inerente ao desenvolvimento das potencialidades de cada indivíduo. A velhice faz parte desse processo, sendo considerada uma fase com características próprias e peculiares. * que não são estanques ou independentes, a velhice também apresenta dificuldades e facilidades que se relacionam aos diferentes momentos que caracterizam a trajetória de vida das pessoas. Entretanto, como todas as outras fases da vida, O aprendizado é uma condição constante e importante para o pleno desenvolvimento do indivíduo, ao corresponder às características e necessidades próprias de cada momento vivido. Assistente Social. Mestre em Gerontologia Social. Coordenadora Pedagógica da Faculdade da Terceira Idade São José dos Campos da Univap. O tema deste trabalho foi definido a partir de observações sobre transformações significativas ocorridas com os idosos nas atividades vivenciadas na Faculdade da Terceira Idade-Univap. Revista UniVap, v.15, n.27, 2008 167 Essas transformações contemplam questões que envolvem temas relacionados à realidade do envelhecimento, da velhice e da educação continuada, elementos integrantes do objeto da pesquisa, constituindo-se nas principais categorias da base teórica deste estudo. Observou-se, também, no universo dos idosos da Faculdade da Terceira Idade-Univap, a presença de um fato específico, relacionado à questão dos projetos de vida. Dada sua relevância, essa categoria passa a ser incorporada para efeito de fundamentação teórica, somando-se às três anteriores: envelhecimento, velhice e educação continuada. A base teórica sobre educação continuada orientada para o segmento idoso é apresentada com enfoque nas faculdades para a terceira idade, entre as quais a Faculdade da Terceira Idade-Univap. Dá-se ênfase às referências teóricas sobre projeto de vida, auto-estima e liberdade, na perspectiva de sistematizar os conteúdos referentes a esses conceitos, considerando a realidade do segmento idoso e o contexto correspondente ao objeto da pesquisa. Os resultados da pesquisa de campo compõem duas partes: na primeira são apresentados os procedimentos metodológicos e na segunda os resultados da análise dos dados coletados através da realização de entrevistas, conforme os procedimentos metodológicos adotados para a realização deste trabalho. As considerações finais foram elaboradas a partir das reflexões mais relevantes recolhidas do processo da pesquisa, objetivando apresentar as principais contribuições do estudo realizado. 2. MATERIAIS E MÉTODOS O objetivo geral deste estudo é investigar a relação entre educação continuada e projeto de vida de pessoas idosas na Faculdade da Terceira Idade Univap – São José dos Campos – SP. Acredita-se que os resultados da pesquisa contribuirão para reformulações possíveis de programas educacionais para idosos, atendendo às necessidades de profissionais integrados em ações sócio-educativas que requeiram conhecimentos para conduzir seu trabalho de maneira competente. Quanto aos objetivos específicos, tendo em vista o objetivo geral, direcionou-se a investigação para identificar o motivo pelo qual o idoso procurou a Faculdade da Terceira Idade Univap. Foram reconhecidos quais os projetos de vida dos idosos antes do ingresso na Faculdade da Terceira Idade Univap e identificados quais projetos surgiram ou foram retomados após os idosos nela se inserirem. 168 Para atingir os objetivos do trabalho, e tendo em conta o universo de investigação, desenvolveu-se uma pesquisa qualitativa, considerando procedimento indicado e propiciador do conhecimento das trajetórias de vida e experiências sociais dos idosos, sujeitos da pesquisa, numa abordagem não meramente descritiva. Para Chizzotti, “A abordagem qualitativa parte do fundamento de que há uma relação dinâmica entre o mundo real e o sujeito, uma interdependência viva entre o sujeito e o objeto, um vínculo indissociável entre o mundo objetivo e a subjetividade do sujeito.” (CHIZZOTTI, 2003, p.79) Para conhecer as situações vividas pelos idosos e apreender os significados que estes lhes atribuem, também pelo fato da pesquisadora estar inserida como profissional no universo estudado, utilizou-se a técnica da observação participante, que permite ao pesquisador aprofundar-se no universo dos sujeitos pesquisados e avaliar seus comportamentos e os processos sociais nos quais estão inseridos. Moreira aponta as contribuições dessa forma de coleta ao colocar: “As pessoas precisam ser estudadas em seus próprios termos, devendo o pesquisador tentar apreender os sentidos simbólicos que as pessoas definem como importantes e reais”. (MOREIRA, 2002, p. 51) Complementando os requisitos que definem as diferentes técnicas utilizadas na realização da pesquisa, explica Moreira: “A observação participante pode ser conceituada como uma estratégia de campo que combina, ao mesmo tempo, a participação ativa com os sujeitos, a observação intensiva em ambientes naturais, entrevistas abertas informais e análise documental.” (MOREIRA, 2002, p. 52) Considerou-se importante o levantamento de dados que permitiram o conhecimento do perfil sócio-econômico dos alunos da Faculdade da Terceira IdadeUNIVAP, São José dos Campos. Para a coleta de dados nos três níveis em que se organiza a Faculdade da Terceira Idade Univap (Nível I, Nível II e CEATI – Centro de Estudos Avançados da Terceira Idade) foram escolhidos como sujeitos, três idosos, com sessenta anos ou mais, cada um cursando um desses três níveis. Utilizou-se as letras de A a C, como forma de apresentação desses sujeitos, evitando a identificação dos mesmos. O sujeito A, é aluno do nível I, tem 75 anos, é do sexo masculino, casado e possui ensino fundamental completo; o sujeito B é aluno do nível II, tem 67 anos, é do sexo Revista UniVap, v.15, n.27, 2008 feminino, casado e com ensino médio completo; o sujeito C é aluno do CEATI, com 86 anos, do sexo feminino, viúvo e possui ensino fundamental incompleto. Ampliou-se o universo da pesquisa, ainda, com a participação de um quarto idoso, na condição de ex-aluno, que é o sujeito D, com 74 anos, do sexo feminino, casado, com escolaridade de nível superior completo. A escolha dos sujeitos baseou-se também na experiência profissional da pesquisadora, na Faculdade da Terceira Idade-Univap. Esse processo de escolha se justifica em razão do objetivo da pesquisa, que não se destinou a obter dados estatísticos, mas interpretar significados e vivências dos sujeitos investigados. Desta forma, como referido por Martinelli, não se trata de um trabalho de pesquisa pautado em amostras obtidas de modo aleatório e, sim, de trabalho no qual “[...] temos a possibilidade de compor intencionalmente o grupo de sujeitos com os quais vamos realizar nossa pesquisa.” (MARTINELLI, 1999, p.24) A coleta de dados foi realizada através de entrevistas semi-estruturadas, na qual o pesquisador se utiliza teorias e hipóteses que interessam à pesquisa para sustentar os questionamentos básicos que serão o ponto de partida das entrevistas. À medida que as respostas são obtidas, surgem novas hipóteses que ampliam o campo das interrogativas. Esta técnica oferece, assim, de maneira enriquecedora, as várias perspectivas possíveis do objeto estudado, com liberdade e espontaneidade, como colocado por Triviños: “Desta maneira, o informante, seguindo espontaneamente a linha de seu pensamento e de suas experiências dentro do foco principal colocado pelo investigador, começa a participar na elaboração do conteúdo da pesquisa”. (TRIVIÑOS, 1990, p.146) A entrevista semi-estruturada, precedida da aplicação dos termos de consentimento e autorização, foi elaborada com utilização de um roteiro centrado nos objetivos da pesquisa, a partir de estudos teóricos prévios e das observações que foram feitas sobre o fenômeno pesquisado. As entrevistas foram realizadas em duas etapas, para se dispor de um momento de aproximação com o sujeito mais descontraído e possibilitador de relatos mais ricos em conteúdos e significativos. Nas duas etapas, os sujeitos entrevistados foram surpreendentes, em razão das peculiaridades dos seus depoimentos, e consolidaram os dados obtidos pelas observações realizadas anteriormente. A escolha das categorias de análise utilizadas neste trabalho, “projeto de vida” e “educação continuada”, decorrera do objetivo geral da pesquisa que propõe a investigação da relação entre essas duas categorias, relacionadas ao segmento idoso. A necessidade de trabalhar com outras duas categorias de análise surgiu da Revista UniVap, v.15, n.27, 2008 observação feita no dia-a-dia, uma vez que a auto-estima e liberdade dos idosos aparecia de maneira expressiva através dos contatos desenvolvidos na Faculdade da Terceira Idade-Univap. O processo de análise baseou-se no agrupamento dos dados coletados em categorias significativas frente aos objetivos, justificativa e referencial teóricos, elementos direcionados na realização da pesquisa. As categorias de análise: auto-estima, liberdade, projeto de vida e educação continuada, permitiram interpretar a realidade e os significados do objeto de estudo, com o propósito de chegar à compreensão do fenômeno estudado. 3. RESULTADOS A análise dos dados processou-se em vários momentos, sucessivos, iniciando-se, informalmente, quando estavam sendo feitas as entrevistas e obtidas as respostas. Já naquele momento, surgiram hipóteses inesperadas. Concluídas todas as entrevistas, os depoimentos foram transcritos e analisados. O processo de análise dos dados revelou, também, que as respostas de alguns dos entrevistados decorriam de interpretações subjetivas das perguntas, gerando dados que eram ricos em significados, embora não relacionados diretamente às perguntas feitas. Essa situação exigiu cuidados especiais para identificar objetivamente o discurso do sujeito. Para tornar mais visíveis os dados coletados e facilitar a análise do conjunto das informações, foram reunidas as respostas dos quatro sujeitos sobre cada categoria. As perguntas formuladas aos sujeitos durante a pesquisa foram reproduzidas, facilitando a organização das informações analisadas. Considerando os objetivos deste trabalho, no processo de análise das respostas oferecidas para cada pergunta, procurou-se destacar a existência da relação entre projeto de vida e educação continuada e quais as características que essa relação oferecia para cada um dos entrevistados. A análise das respostas dos entrevistados teve como base de apoio os referenciais teóricos estudados e os conceitos abordados. Viver plenamente as potencialidades humanas requer do indivíduo que mantenha ativa a sua capacidade para fazer projetos de vida que atendam suas necessidades e respondam às constantes mudanças que ocorrem em sua vida. 169 Na velhice, o indivíduo não pode abrir mão da sua capacidade de projetar para a vida, nem tampouco deve se render aos preconceitos que o impeçam de ver-se como capaz e merecedor de construir novos projetos de vida ou de realizar os projetos idealizados anteriormente. A situação de exclusão vivenciada por muitos idosos ocorre, principalmente, em razão dos preconceitos decorrentes de uma visão negativa da velhice e esta situação de exclusão gera obstáculos para que o indivíduo possa usufruir seus direitos sociais. As capacidades de aprender e de projetar para a vida comunicam-se e combinam-se nos seres humanos, alimentando-se mutuamente. Na fase da velhice, essa relação não se mostra diferente. A educação continuada, enquanto expressão de incentivo da capacidade de aprender, proporciona um ambiente ideal para estimular nas pessoas a retomada de projetos anteriores de vida, não realizados, para a construção de novos projetos, nos quais se exprime a crença nas possibilidades do futuro. Os resultados desta pesquisa demonstram que essa mesma condição é válida também para os idosos, pois o ambiente de relações sociais proporcionados pela educação continuada a essa população favorece tanto a capacidade de aprender quanto a de realizar projetos de vida. Destaca-se a idéia de que voltar a estudar, para muitos idosos, é a realização de um projeto de vida, além das conquistas em relação ao sentido de liberdade, no âmbito de autonomia e independência. Gozar de autonomia e de independência como condição para sua participação no processo de educação continuada torna-se significativo para o idoso. Esta mesma condição de liberdade é requerida para a realização de projetos de vida. Tal relação se faz de modo combinado, pois a participação do idoso no processo educacional continuado e a realização de projetos de vida permitem que ele exercite e fortaleça a sua capacidade de ser livre. tura exige que a sociedade crie oportunidades para que um contingente cada vez maior de pessoas, que usufruem o privilégio de envelhecer, possa se manter ativo e participante em sua própria vida e na vida do seu grupo social. Os que envelhecem têm o direito natural de exercer plenamente suas potencialidades e a medida das suas condições biológicas, psicológicas e sociais deve ser vista dentro da dimensão de simples medida. Medida que cabe ao indivíduo e à sociedade respeitarem e reverterem em favor do crescimento humano. Os projetos de vida que são feitos ou que são retomados a partir do momento que o idoso entra em contato com a educação continuada demonstram como a educação é um importante instrumento de conscientização, ao oferecer, para os idosos, oportunidades de convivência, de atualização e de desenvolvimento pessoal. É essencial o aumento de projetos de educação continuada como este que é desenvolvido pela Faculdade da Terceira Idade-Univap, que ofereçam um trabalho sério, criterioso e profissional, pois a educação continuada é um direito e um meio importante de exercício da cidadania. O envelhecimento, em sua condição de acontecimento apenas cronológico, não é, em si mesmo, uma garantia do exercício dos potenciais de vida e, por isso, é preciso que se imprima ao passar do tempo a sua dimensão de humanidade, no qual cada pessoa evolui enquanto indivíduo e enquanto parte do todo social. A relação entre educação continuada e projeto de vida de pessoas idosas tem o sentido de oportunidade de uma velhice com desenvolvimento pessoal e social. Vista desta perspectiva, a longevidade revela-se como a verdadeira conquista que é para o ser humano, enquanto uma extensão do seu tempo de vida plena, em que são possíveis novos aprendizados, outros sonhos e a realização de mais e belos projetos de vida. 4. CONSIDERAÇÕES FINAIS 5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS A auto-estima na velhice recebe influência positiva das atitudes desenvolvidas pelos idosos, a partir do contato com a educação continuada e com seus projetos de vida. A sociedade atual ainda cultiva idéias que se sustentam em preconceitos e na desconsideração da dignidade do idoso. É preciso, urgentemente, formular uma postura social coerente com a verdade da velhice: uma fase maravilhosa da vida, na qual é natural que o indivíduo conviva com as dificuldades e facilidades que lhe são peculiares. Um passo fundamental em direção a essa nova pos170 ALMEIDA, Vera Lúcia Valsecchi de. Velhice e projetos de vida: possibilidades e desafios. In: CÔRTE, Beltrina; MERCADANTE, Elisabeth Frohlich; ARCURI, Irene Gaeta (orgs.). Velhice envelhecimento complex(idade). São Paulo: Vetor, pp. 93-110, 2005. BEAUVOIR, S. de. A velhice: Rio de Janeiro: Nova FRONTEIRA, 1990. BREHONY, K. A. Despertando a meia-idade: tomando consciência do seu potencial de conhecimento e mudança. São Paulo: Paulus, 1999. Revista UniVap, v.15, n.27, 2008 CACHIONI, M. Quem educa os idosos? Um estudo sobre professores de universidades da 3ª idade. Campinas, SP: Alínea, 2003. NOVAES, M. H. Psicologia da terceira idade: conquistas possíveis e rupturas necessárias. 2. ed. Rio de Janeiro: NAU, 2000. CAMARANO, A. A. Muito além dos sessenta: os novos idosos brasileiros. Rio de Janeiro: IPEA, 1999. OLIVEIRA, R. de C. da S. Terceira Idade: do repensar dos limites aos sonhos possíveis. São Paulo: Paulinas, 1999. DEBERT, G. G. 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Assim, a pesquisa na UNIVAP tem, dentre suas funções, a de formar elites intelectuais, sem as quais não há progresso. Esta publicação incentiva as pesquisas e procura o envolvimento de seus professores e alunos em pesquisas e cogitações de interesse social, educacional, científico ou tecnológico. Aceita artigos originais, não publicados anteriormente, de seus docentes, discentes, bem como de autores da comunidade científica nacional e internacional. Publica artigos, notas científicas, relatos de pesquisa, estudos teóricos, relatos de experiência profissional, revisões de literatura, resenhas, nas diversas áreas do conhecimento científico, sempre a critério de sua Comissão Editorial e de acordo com o formato dos artigos aqui publicados. Solicita-se o cumprimento das instruções a seguir para o preparo dos trabalhos. 1. Os originais devem ser apresentados em papel branco de boa qualidade, no formato A4 (21,0cm x 29,7cm) e encaminhados completos, definitivamente revistos, com no máximo 15 páginas, digitadas em espaço 1,5 entre as linhas (recomenda-se o uso de caracteres Times New Roman, tamanho 12), em 1 via, acompanhada de disquete ou CD. Somente em casos muito especiais serão aceitos trabalhos com mais de 15 páginas. Os títulos das seções devem ser em maiúsculas, numerados seqüencialmente, destacados com negrito. Não se recomenda subdivisões excessivas dos títulos das Seções. 2. Língua. Os artigos devem ser escritos, preferencialmente, em Português, aceitando-se também textos em Inglês e Espanhol. No caso do uso das línguas Portuguesa e Espanhola, devem ser anexado um resumo em Português (ou Espanhol) e em Inglês (Abstract). 3. Os trabalhos devem obedecer à seguinte ordem: - Resumo. Com no máximo 250 palavras, o resumo deve apresentar o que foi feito e estudado, seu objetivo, como foi feito (metodologia), apresentando os resultados, conclusões ou reflexões sobre o tema, de modo que o leitor possa avaliar o conteúdo do texto. NBR6028. - Abstract. Versão do resumo para a língua Inglesa. Caso o trabalho seja escrito em Inglês, o Abstract deve ser traduzido para o Português (Resumo). - Palavras-chave (Key words). Apresentar de duas a cinco palavras-chave sobre o tema. - Texto. Corpo do artigo estruturado em introdução, desenvolvimento e conclusão. No caso de divisão de seções, sua ordenação deve seguir o sistema de numeração progressiva (NBr6024), com subtítulos de caráter informativo. - Citações dentro do texto. As citações com mais de 3 linhas devem ser destacadas com recuo da margem esquerda 4 cm, com letra menor que a do texto utilizado e sem aspas. Ex.: Na criança, bons hábitos posturais são importantes para evitar sobrecargas anormais em ossos em crescimento e alterações adaptativas em músculos e tecido mole. (KISNER; COLBY, 1998). Nas citações são utilizadas sobrenome e data, apresentadas em maiúsculas dentro do parênteses e em minúsculas fora do parênteses. Ex.: 1. Segundo Spector (2003), “A discussão dos resultados é a parte mais livre da tese, onde o autor tem maior latitude para demonstrar o seu domínio do tema e o valor do estudo.” Ex.: 2. A discussão dos resultados é a parte mais livre da tese, onde o autor tem maior latitude para demonstrar o seu domínio do tema e o valor do estudo (SPECTOR, 2003). - Título (e subtítulo, se houver). Deve estar de acordo com o conteúdo do trabalho, conforme os artigos aqui apresentados. - Referências Bibliográficas: devem ser apresentadas no final do trabalho, em ordem alfabética de sobrenome do(s) autor(es), como nos seguintes exemplos: - Autor(es). Logo abaixo do título, apresentar nome(s) do(s) autor(es) por extenso, sem abreviaturas. Com asterisco, colocado logo após o nome completo do autor ou autores, remeter a uma nota de rodapé relativa às informações referentes às instituições a que pertence(m) e às qualificações, títulos, cargos ou outros atributos. a) Livro: SOBRENOME, Nome. Título da obra. Local de publicação: Editora, data. Exemplo: PÉCORA, Alcir. Problemas de redação. 4.ed. São Paulo: Martins Fontes, 1992. Revista UniVap, v.15, n.27, 2008 b) Capítulo de livro: SOBRENOME, Nome. Título do capítulo. In: SOBRENOME, Nome (org.). Título do 173 livro. Local de publicação: Editora, data. Página inicial-final. Exemplo: LACOSTE, Y. Liquidar a geografia... liquidar a idéia nacional? In: VESENTIN, José William (org.). Geografia e ensino: textos críticos. Campinas: Papirus, 1989. p.31-82. c) Artigo de periódico: SOBRENOME, Nome. Título do artigo. Título do periódico, local de publicação, volume do periódico, número do fascículo, página inicial-página final, mês(es). Ano. Exemplo: ALMEIDA JÚNIOR, M. A economia brasileira. Revista Brasileira de Economia, São Paulo, v. 11, n. 1, p. 26-28, jan./fev. 1995. d) Dissertações, Teses e Trabalhos Acadêmicos: SOBRENOME, Nome. Título da dissertação (ou tese). Local. Número de páginas (Categoria, grau e área de concentração). Instituição em que foi defendida. data. Exemplo: BRAZ, A. L. Efeito da luz na faixa espectral do visível em adultos sadios. 2002. 1 disco laser. Dissertação (Mestrado em Bioengenharia) - Instituto de Pesquisa e Desenvolvimento, Universidade do Vale do Paraíba, São José dos Campos, 2002. e) Outros casos: Consultar as Normas da ABNT para Referências Bibliográficas (NBR6023). Ou acessar o site: http://www.univap.br/cultura/abnt.htm 4. As figuras (desenhos, gráficos, ilustrações, fotos) e tabelas devem apresentar boa qualidade e serem acompanhados de legendas breves e claras. Indicar no verso das ilustrações, escritos a lápis, o sentido da figura, o nome do autor e o título abreviado do trabalho. As figuras devem ser numeradas seqüencialmente com números arábicos e iniciadas pelo termo Fig., devendo ficar na parte inferior da figura. Exemplo: Fig. 4 - Gráfico de controle de custo. (fonte 10). As tabelas também devem ser numeradas seqüencialmente, com números arábicos, e colocadas na parte superior da tabela. Exemplo: Tabela 5 - Cronograma da Pesquisa. As figuras e tabelas devem ser impressas juntamente com o original e quando geradas no computador deverão estar gravadas no mesmo arquivo do texto original. Fotografias, desenho artístico, mapas etc., devem ser de boa qualidade e em preto e branco. 174 5. O encaminhamento do original para publicação deve ser feito acompanhado do disquete ou CD-ROM e com a indicação do software e versão usada. 6. O Corpo Editorial avaliará sobre a conveniência ou não da publicação do trabalho enviado, bem como poderá indicar correções ou sugerir modificações. A cada edição, o Corpo Editorial selecionará, dentre os trabalhos considerados favoráveis para publicação, aqueles que serão publicados imediatamente. Os não selecionados serão novamente apreciados na ocasião das edições seguintes. 7. Os conteúdos e os pontos de vista expressos nos textos são de responsabilidade de seus autores e não apresentam necessariamente as posições do Corpo Editorial da Revista UniVap. 8. Originais. A Revista não devolverá os originais dos trabalhos e remeterá, gratuitamente, a seus autores, dois exemplares do número em que forem publicados. 9. O Corpo Editorial se reserva o direito de introduzir alterações nos originais, com o objetivo de manter a homogeneidade e a qualidade da publicação, respeitando, porém, o estilo e a opinião dos autores. 10. Endereços. Deverá ser enviado o endereço completo de um dos autores para correspondência. Os trabalhos deverão ser enviados para: UNIVERSIDADE DO VALE DO PARAÍBA - UNIVAP PRÓ-REITORIA DE INTEGRAÇÃO UNIVERSIDADE/ SOCIEDADE Conselho Editorial da Revista UniVap Av. Shishima Hifumi, 2.911 - Bairro Urbanova São José dos Campos - SP 12244-000 Telefone: (12) 3947.1036 Fax: (12) 3947.1211 E-mail: [email protected] Revista UniVap, v.15, n.27, 2008