CAPÍTULO VII: Angina de Ludwig
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CAPÍTULO VII: Angina de Ludwig
ISBN: 978-85-64327-04-7 ODONTO SCIENCE 53 ANOS FOUPF 3 5 Anos Organizadores: Maria Salete Sandini Linden João Paulo De Carli Miriam Lago Magro Micheline Sandini Trentin Soluete Oliveira da Silva FICHA TÉCNICA Editora Plena Todos os direitos reservados 1ª edição Conselho Editorial Adair Luiz Stefanello Busato ULBRA/Canoas/RS Editor Responsável Janete Moreira Martins Flávia Martão Florio São Leopoldo Mandic/Campinas/SP Francisco Carlos Groppo Unicamp/Piracicaba/SP Projeto Gráfico e Diagramação Ghislaine Bomm Juliana Cama Ramacciatto São Leopoldo Mandic/Campinas/SP Capa Manoella Cardoso Bibliotecária Responsável Mona Youssef Hammoud - CRB 9°/1353 Maria Luiza Tagliaro PUCRS/Porto Alegre/RS Rogério Heládio Lopes Motta São Leopoldo Mandic/Campinas/SP Rui Barbosa de Brito Júnior São Leopoldo Mandic/Campinas/SP Rua Janiópolis, 245 - Cidade Jardim 83035-100 - São José dos Pinhais - PR Fone: (41) 3081.4052 www.editoraplena.com.br Capítulo de revisão / Review chapter L 216o Linden, Maria Salete Sandini; Carli, João Paulo de; Magro, Miriam Lago; Trentin, Micheline Sandini; Silva, Soluete Oliveira da. (org.) – Odonto Science: 53 Anos FOUPF - São José dos Pinhais: Editora Plena, 2014. 84p. ISBN: 978-85-64327-04-7 1. Odontologia. 2. Prótese. 3. Cirurgia. 4. Clínica. 5. Ortodontia. 6. Periodontia. 7. Estomatologia. 8. Patologia Bucal. 9.Endodontia. I. Título CDD: 617.6 2 Como integrante do corpo humano, a boca desempenha funções fisiológicas delicadas e vitais para a manutenção da saúde como um todo. É um órgão de absorção de nutrientes, essencial para o desenvolvimento físico e mental, bem como para a expressão de sentimentos, de defesa, instrumento de reivindicação de direito, de justiça social, de denúncias contra a desigualdade social e a dignidade humana. Com efeito, torna-se importante não separá-la da pessoa, mas revelar o comportamento espacial de suas diversas dimensões: física, social, antropológica e filosófica. A Odontologia foi vista, durante muitos anos, como uma área isolada no âmbito da saúde. As afecções da boca raramente eram relacionadas ao sistema orgânico do indivíduo. O profissional atendia em seu consultório, mas sem integrar-se a outras áreas da saúde. Atualmente, cada vez mais estudos apontam que muitas condições sistêmicas podem ser causadas ou ter seu quadro clínico agravado em decorrência de doenças bucais; além disso, sabe-se que as áreas da Odontologia são totalmente interdependentes. A presente obra consta de capítulos versando sobre as mais diversas áreas odontológicas, buscando promover a construção do diálogo transdisciplinar que a partir da saúde bucal promova saúde sistêmica, desenvolvimento tecnológico e responsabilidade social. A visão odontológica multidisciplinar torna-se fundamental às ações de bem-estar da pessoa humana como mecanismo indispensável para o exercício profissional no encontro com o outro no mundo contemporâneo. O livro “Odonto Science – 53 anos da FOUPF” ampara esta breve exposição, assumindo a importância da intersetorialidade nas ações de saúde, incluindo a ciência odontológica. Prof. Dr. João Paulo De Carli 3 editorial A Odontologia como Ciência Multidisciplinar SUMÁRIO 5-12 13-26 27-34 35-40 CAPÍTULO I Association between oral candidosis and oral lichen planus Associação entre candidose e líquen plano bucal João Paulo De Carli, Soluete Oliveira da Silva, Bethânia Molin Giaretta De Carli, Angélica Zanata, Fernanda Andrade Marafiga, Micheline Sandini Trentin, Maria Salete Sandini Linden. CAPÍTULO II Extração de DNA a partir de polpas dentárias humanas - revisão dE literatura Dental Pulp DNA extraction – literature review Patrícia Comiran, Tiago Fortunato, João Paulo De Carli, Bethânia Molin Giaretta De Carli, Maria Salete Sandini Linden, Micheline Sandini Trentin, Soluete Oliveira da Silva. CAPÍTULO III Preparo do canal radicular com lima única reciprocante WaveOne e Reciproc – revisão de literatura Root canal preparation with single file reciprocating system WaveOne and Reciproc – literature review Marilia Fagury Videira Marceliano-Alves, Daniela Cristina Miyagaki, Doglas Cecchin, Miriam Lago Magro, Sandra Rivera Fidel. CAPÍTULO iv Violência doméstica contra vulneráveis Domestic violence against vulnerable Catielma Nascimento Santos, Graziela Oro Cericato, Ramon Nazareno Menezes Andrade, Henrique Damian Rosário, Armando Koichiro Kaieda, Luiz Renato Paranhos. 41-48 CAPÍTULO V Lesões orais frequentemente diagnosticadas durante o tratamento ortodôntico Oral lesions often diagnosed during orthodontic treatment Elói Eustáquio Souza, Anderson Paulo Barbosa Lima, Tadeu Evandro Mendes-Júnior, Tadeu Evandro Mendes, Geraldo Eugênio Marchiori, Luiz Renato Paranhos. 49-54 CAPÍTULO Vi A autopercepção da saúde em idosos e os desafios para a Odontologia Self-perception of health among elderly community and the challenges for Dentistry Claudia Trentin Lampert, Cristina Ribas Teixeira, Pricila Welter, Yasmim Guedes Maurer, Silvana Alba Scortegagna, Mauro Dal Zot Dutra, Eduardo Sandini Linden. 55-62 CAPÍTULO Vii Angina de Ludwig: aspectos anatômicos, etiologia e abordagem multidisciplinar Ludwig’s Angina: anatomical aspects, etiology and multidisciplinary approach Alessandra Kuhn-Dall’Magro, Nathália Louize Nunes Vieira Silva, Jonathan Lauxen, Renato dos Santos, Túlio del Conte Valcanaia, Saulo Cocio Martins Filho, Eduardo Dall’Magro. 63-67 CAPÍTULO Viii Problema estético em DENTE permanente decorrente de traumatismo na infância Esthetic problem in permanent teeth due to trauma in childhood Capítulo de revisão / Review chapter Berenice Perussolo, Caroline Magnabosco, Eduardo Grigollo Patussi, Fabio Eduardo Woitchunas, Larissa Corrêa Brusco Pavinato, Juliane Bervian. 69-75 CAPÍTULO ix Frenectomia lingual: cirurgia a laser x cirurgia convencional Lingual frenectomy: surgical laser x conventional surgery Alessandra Kuhn-Dall’Magro, Francisco Baccega, Jonathan Lauxen, Renato dos Santos, Túlio del Conte Valcanaia, Eduardo Dall’Magro. 77-81 CAPÍTULO x Alteração do desempenho esportivo associado a causas bucais Decline of sports performance associated with oral health aspects Marcelo Pecin Vanz, Gabriela Luana Arbo Gehlen, Gisele Rovani, Ferdinando de Conto, Mateus Ericson Flores. 82-83 Conselho editorial / autores 4 CAPÍTULO I Association between oral candidosis and oral lichen planus Associação entre candidose e líquen plano bucal João Paulo De Carli1 Soluete Oliveira da Silva1 Bethânia Molin Giaretta De Carli2 Angélica Zanata3 Fernanda Andrade Marafiga3 Micheline Sandini Trentin4 Maria Salete Sandini Linden4 MSc, PhD, Department of Stomatology – FOUPF/Brazil. MSc, Department of Oral and Maxillofacial Surgery – FOUPF/Brazil. 3 Dental Surgeon – FOUPF/Brazil. 4 MSc, PhD, Department of Implantology – FOUPF/Brazil. 1 2 ODONTO SCIENCE - 53 ANOS - FOUPF Association between oral candidosis and oral lichen planus Introduction Candida albicans is one of the most frequently isolated fungi of oral lichen planus (OLP) lesions. Several virulence factors are associated to the pathogenicity of C. albicans, including adherence to epithelial or endothelial tissues, phenotypic switching and antigenic modulation as a result of pseudo hypha formation. Previous research also showed that OLP may present some similar clinical manifestations to oral candidiasis3. Successful colonization of host tissues and infection of microorganisms depend on adherence to the host surfaces. Since the yeast adherence to host surfaces is widely recognized as an essential prerequisite in modulating the colonization and infection8, adhesion plays a crucial role in the permanent attachment of the yeast. A study40 revealed that the adhesion of Candida to erosive OLP is stronger than its adhesion to healthy control tissue. This indicates that C. albicans with stronger adhesion influences the permanent attachment, provide qualification for other toxicity factors and participate in the development of the pathological changes (Figure 1). The objective of this chapter is to review the current literature on the association of candidosis and oral lichen planus, providing important information for a correct diagnosis and proper treatment of these associated diseases. Capítulo de revisão / Review chapter Figure 1 – OLP lesions affecting tongue and oral mucosa superimposed by oral candidosis. Oral lichen planus (OLP) Lichen planus is a relatively common chronic inflammatory disease with a prevalence of oral manifestations between 0.1% and 2.2% of the population. First described in 1869 by Erasmus Wilson, the disease may involve skin and mucosa, individually or simultaneously. Lesions can be restricted to the mouth or with cutaneous involvement24. The etiology of lichen planus has not been completely elucidated, however it is considered a multifactorial disease mediated by an immunopathological mechanism, particularly involving T lymphocytes5. In a significant number of cases, the disease is associated with anxiety and depression, according to Garcia-Pola Vallejo et al.9 (2001). It occurs in patients of both sexes, with predominance in women, generally over 40 years old32. A total of 50 dermatologists from Bauru (SP-Brazil) have completed a questionnaire of 19 questions about etiology, diagnosis and treatment of 6 lichen planus. The main etiological factors reported included: idiopathic factor (22.4%), psychosomatic (21.5%), immune (14.0%) and viral (14.0%). Other factors related to the disease pathogenesis mentioned by the clinicians were diabetes mellitus, infections, anemia, genetic predisposition, allergies, smoking habits and sun exposure5. According to Souza and Rosa32 (2008), stress, food such as tomatoes, citrus fruits and spicy dishes, dental procedures, systemic diseases, abuse of alcohol and use of any source of tobacco are associated to periods of exacerbation of the disease. The con- cern of its association with systemic diseases, especially hepatitis C virus (HCV) infections, is rising in recent years. The OLP is a disease of polymorphous clinical appearance, being classified as typical or atypical form. The typical form can be divided into: reticular (Wickham striae) (Figure 2), papular, plaque and warty. Atypical forms are ulcerated, atrophic, erythematous, erosive (Figure 3), and bullous pigment. In the mouth, it occurs mainly at the buccal mucosa, bilaterally, at the margin and dorsum of the tongue and at the lip32. Figure 2 – Reticular OLP at the left oral mucosa. Figure 3 – Erosive OLP at the right oral mucosa. Essentially, there are two forms of oral lesions: reticular and erosive. The reticular lichen planus is much more common than the erosive form. However, several studies report predominance of the erosive form, because is symptomatic and, in many cases, is the only treated variety of OLP. The reticular form usually presents no symptoms and involves the posterior region of the buccal mucosa bilaterally. Other areas of the oral mucosa are likely to be affected, such as the lateral border and dorsum of the tongue, gums, palate and lip vermilion24. The diagnostic of Lichen planus is performed by biopsy and/or clinical examination of the mouth or skin lesions5. The lace-like white streaks that appear bilaterally in the posterior region of the buccal mucosa are virtually pathognomonic. Difficulties in diagnostics may arise if the Lichen planus is superimposed by candidosis lesions, since the organism Candida albicans can change the reticular pattern characteristic of OLP. Thus, the biopsy of the lesions is often necessary to exclude the hypothesis of other erosive or ulcerative diseases such as systemic lupus erythematosus or chronic ulcerative stomatitis. Histopathological findings are characteristic of Lichen planus, but may not be specific since other conditions such as lichenoid reactions to drugs may also show similar patterns. Varying degrees of parakeratosis and orthokeratosis may be presented on the surface of the epithelium, depending on the characteristics of the injury (erosive or reticular) from which the sample has been removed. The thickness of the spinous layer can also vary. The interpapillary ridges may be absent or hyperplasic, but are classically pointy shaped or “saw-tooth”. The destruction of the basal cell layer of the epithelium (hydropic degeneration) is also evident, accompanied by an intense band-like infiltration, especially T lymphocytes underlying the epithelium. Degenerate keratinocytes can be seen in the interface area of the epithelium-connective tissue, being called Civatte bodies, colloids, or hyaline cytoid35. These authors believe that specific and non-specific mecha7 Carli JP, Silva SO, Carli BMG, Zanata A, Marafiga FA, Trentin MS, Linden MSS. Association between oral candidosis and oral lichen planus Capítulo de revisão / Review chapter ODONTO SCIENCE - 53 ANOS - FOUPF nisms may be involved in the pathogenesis of lichen planus. The former include antigen presentation by keratinocytes of the basal layer and death of antigen-specific cytotoxic T lymphocytes, whereas the latter include mast cell degranulation and activation of matrix metalloproteinases. When these mechanisms are combined they lead to the accumulation of lymphocytes in the lamina propria underlying the epithelium; disruption of the basement membrane; migration of intraepithelial T lymphocytes; and apoptosis of keratinocytes, which are characteristic of OLP. In addition, the chronic characteristic of the disease can be explained in part by a deficiency in the mechanism of immunosuppression, mediated by transforming beta growth factor. Regarding the treatment of OLP, 27.6% of professionals recommend steroids. Some of them reported the use of other therapies for lichen planus reticular with lesions restricted to the oral mucosa, such as cauterization with trichloroacetic acid, rinsing with urea and distilled water, prescription of vitamin A derivatives and tranquilizers5. The corticosteroids are the drugs of choice for treatment of lichen planus, due to its ability to modulate the inflammatory and immune response. The topical application and local injection of steroids are being successfully used for controll the disease. However, the systemic use of corticosteroids is an option for cases presenting severe symptoms. The addition of antifungal drugs improves clinical outcomes. Apparently, this is a consequence of the elimination of secondary growth of Candida albicans in tissues affected by OLP. Antifungal drugs also prevent fungal growth associated to the use of corticosteroids5. OLP is a local condition presenting defects of epithelial cells. In these cases, the adherence of Candida to the oral epithelium is the first step in the infection process and enables the yeast to overcome the normal flushing mechanism of body secretions4,29. Candida may act as a secondary pathogen and this super infection can possibly increase the signs and symptoms of OLP, which may be referred as “burning” sensation or discomfort14. Dysplastic changes are usually associated to lesions of candida infection mainly due to the potential for endogenous nitrosation of this organism36. gic entity of the buccal cavity. It is a fungal infection caused by the pathogenic action of Candida species, most commonly microorganism C. albicans. These fungi are normally found in the mucous membranes and cause disease only when some growth conditions (predisposing factors) are satisfied. It is estimated that from 30% to 50% of the population has the microorganism in the mouth and present no clinical evidence of infection. The incidence increases with age, reaching close to 60% of dentate patients over 60 years old4. According to Stramandinoli34 (2010), oral candidosis is associated with local and systemic predisposing factors. Local factors comprise poorly sanitized and/or poorly adapted prosthetic restorations or braces; smoking habits; poor oral hygiene and hyposalivation. Systemic predisposing factors include hormonal changes; diseases such as AIDS, diabetes mellitus and other systemic diseases which lead to immunodeficiency; drugs such as corticosteroids, antibiotics and immunosuppressive drugs; and treatments such as head and neck radiotherapy and chemotherapy. Even in the presence of these factors, the invasion of fungus in the superficial layers of the epithelium is mandatory for the disease manifestation. The candidosis infections are caused by Candida albicans. Other members of the genus Candida, such as C. tropicalis, C. parapsilosis, C. krusei, C. guilliermondii, C.glabrata, C. dubliniensis, can also be found intra-orally but only occasionally cause disease. The candidosis may present different clinical aspects, complicating the diagnostic. The infection depends on three factors: the immune status of the host, the environment of the oral mucosa and the resistance of C. albicans. The infection can range from mild to fatal when the disease spreads in severely immunocompromised or patients suffering from AIDS19. In dental practice, the diagnostic of oral candidosis is usually guided by clinical signs. The definitive identification of the microorganisms is performed by the microbiological diagnosis. For treatment of oral candidosis, various antifungal agents can be used with diverse advantages and disadvantages, as example nystatin, clotrimazole, ketoconazole, fluconazole and itraconazole. Nystatin, azol-containing therapeutics, e.g., fluconazole, miconazole, and ketokonazole, and amphotericin B are the most commonly prescribed drugs for treatment of OC. Alternative substances Oral candidosis (OC) Oral candidosis (OC) is the most frequent oral disease (98% of cases), being an important nosolo8 Association between oral candidosis and oral lichen planus such as chlorhexidine have both antibacterial and antimycotic effects7 and colostrum-containing products may have an antimycotic effect as well25. C. krusei is natively resistant to azol-containing products and C. glabrata and C. dubliniensis have a weak response to this therapeutics. Thus, selection of resistant Candida species after medical treatment can occur12. The production of nitrosamine by C. albicans is pointed out as a possible reason for the higher potential for malignization presented by the non-homogeneous leukoplakias in comparison to the homogeneous leukoplakias17. In addition to the morbidity, this is the reason for antimycotic treatment in secondary candida infections in OLP lesions. Candida is commonly found in oral mucosal lesions and generally causes no problem in healthy people. Overgrowth of Candida, however, can lead to local discomfort, an altered taste sensation, dys- phagia from esophageal overgrowth, resulting in poor nutrition, slow recovery, and prolonged hospital stays1. Figure 4 – Reticular OLP associated to pseudomembranous candidosis in tongue. Figure 5 – Case of Figure 4 after treatment with nystatin (100.000 IU) three mouthwashes per day during 2 weeks. Note a significant clinical improvement. Candida has been found in 37.0% to 76.7% of OLP cases13,16. The treatment of OLP with steroids is known to lead to secondary yeast infection, which may complicate the treatment. C. albicans, C. glabrata and C. tropicalis were isolated from OLP lesions treated with topical steroids. Studies have shown that OLP patients suffer from OC and that C. albicans is the microorganism most frequently found in OLP patients13. Kragelund et al.15 (2013) performed a study to identify correctly the species of Candida present in patients with OLP in order to adequate the antifungal treatment, since different Candida species have diverse susceptibility to antifungal drugs. Therefore, conventional cytosmear and culture tests were compared to genetic diagnostic. According to the authors, Candida species found in oral rinse and agar culture test were different from the samples collected by exfoliative cytology of the mucosa lesion using cytobrush. The exfoliative cytology of the mucosa lesion was able to detect more non-albicans species. Unexpectedly, Candida dubliniensis was 9 Carli JP, Silva SO, Carli BMG, Zanata A, Marafiga FA, Trentin MS, Linden MSS. Association of OLP to OC Oral candidosis (OC) is subdivided into primary and secondary. Secondary infections are superimposed on other diseases of the oral mucous membranes, such as oral lichen planus (OLP), a chronic inflammatory disease. The histopathological characteristics of OLP include hyperkeratinization26, which may contribute to a predisposition for Candida infection. Erythematous or pseudomembranous areas in OLP can be a manifestation of the disease itself or a result of superimposed candidosis. Both cases are associated to morbidity, suffering and pain (Figure 4 and 5)28,38. Capítulo de revisão / Review chapter ODONTO SCIENCE - 53 ANOS - FOUPF found to be overrepresented in patients with a history of antimycotic treatment, which indicates iatrogenic unintentional selection. An alternative therapy could be suggested for 27% of the 22 OLP patients receiving treatment, using an improved technique of diagnostic. Correct fungal identification is critical to initiate adequate antimycotic therapy, avoiding the selection of non-albicans species. In another study, which examined the prevalence of Candida species in erosive lesions of OLP, Candida species was observed in both healthy participants and in patients with OLP and was no significant difference between these two groups. Since no significant differences were found between the groups, Candida has not been confirmed as an etiologic factor of erosive lichen planus20. Candida infection has been observed in 17.4% of ulcerated and 16.4% of non-ulcerated OLP cases10. Some special genotypic profiles and virulence attributes of C. albicans might have a contribution to the development and progression of OLP20,39. Masaki et al.18 (2011) detected and identified Candida species in samples from the oral mucosa, dorsal surface of the tongue and supragingival plaque of patients with OLP. The authors concluded that healthy individuals with OLP are more prone to have oral colonization of Candida, and C. non-albicans species are specifically present in patients with this condition. Presence of Candida spp. was confirmed in 0 to 17% of biopsies of OLP, without considering the type of clinical manifestation (erosive or non-erosive lesions)10. A recent study40 showed higher prevalence of Candida spp. in patients presenting the erosive form of OLP (72%) than the non-erosive form (28%). The study of Holmstrup and Dabelsteen (1974)11 investigated the prevalence and distribution of Candida spp. in biopsies of OLP presenting hyperorthokeratosis and hyperparakeratosis. The research concluded that OLP lesions lower susceptibility to infection by Candida species than other studies since Candida was found in only one of 43 cases. Lipperheide et al.18 (1996) performed a research on the prevalence of colonization by Candida species in patients presenting oral leukoplakia, OLP or without oral lesions. The authors observed that the prevalence of yeasts colonization was higher for patients with oral leukoplakia (54.3%; 19 of 35) and for the group of individuals without oral lesions (45.3%; 43 of 95) than for the OLP patients (35.3%; 12 of 34). Vuckovic et al.37 (2004) have investigated the presence of Candida spp. in lesions with malignant potential, especially oral leukoplakia and OLP. Candida spp was found in 3 (25%) of a total of 12 lesions of oral leukoplakia, and 4 (44%) of 9 cases of OLP. The presence of yeasts was confirmed in 82% of patients with oral leukoplakia and 37% of patients with OLP. The dominant species was Candida albicans in both lesions, but C. tropicalis, C. pintolopesii, Torulopsisglabrata, and Saccharomyces ceresivae were also found. Lipperheide et al. (1996)18 studied the prevalence of Candida colonization in patients with OLP, oral leukoplakia and individuals without oral lesions. The authors examined a total of 116 patients (25 with oral leukoplakia, 17 with OLP and 74 individuals without oral lesions). C. albicans was the predominant species found in all groups, confirming 76% cases in patients presenting oral leukoplakia, 88.2% in individuals with OLP and 60.8% in individuals without oral lesions. Other species, such as C. famata, C. tropicalis, C. parapsilosis, C. guilliermondii, Rhodotorularubra, and Trichosporoncapitatun, were identified in lesions of oral leukoplakia and OLP. C. glabrata, Cryptoccocusalbidus, C. krusei, C. lipolytica, C. intermediate and C. rugosa were also observed in individuals without oral lesions. In a study assessing the prevalence of Candida infection in OLP lesions, 15 patients (44.11%) of a total of 34 presented Candida positive culture on Sabouraud’s dextrose agar medium. None of the 34 histological sections of OLP showed Candida hyphae using acid-Schiff staining. No significant association of Candida and lichen planus symptoms and patterns were found. The authors concluded that Candida infection in OLP patients was not significant30. Another study33 determined the prevalence of Candida sp. infection in 832 biopsies of oral mucosal lesions, analyzing the presence of Candida sp. in malignant lesions and lesions with various degrees of dysplasia. Results showed a positive association of Candida infection to epithelial dysplasia; mild, moderate and severe squamous cell carcinoma; and hyperkeratosis. Inflammatory fibrous hyperplasia, lichen planus, and pyogenic granuloma were not associated to fungal infections. The authors concluded that there was a positive correlation between yeast infection and dysplastic lesions and carcinoma, occurring more frequently in males. These data do not indicate whether the fungus causes epithelial dysplasia and carcinoma, but confirmed the presen10 Association between oral candidosis and oral lichen planus ce of Candida in these lesions. Researches performed in the 1960s were the first reports of a possible association between Candida spp. and oral cancerization. In the 1970s, some studies have found strong evidence of the link of Candida albicans (specifically) to the oral cancer development20. For Nagy et al.23 (1998), the frequency of Candida spp., mainly Candida albicans, is higher at the areas affected by oral carcinomas than in healthy tissues. In addition to the fact that the OLP is a lesion with carcinogenic potential, such finding suggests that infection by Candida fungus is more frequent in OLP lesions than in patients without these lesions. Study of Barrett et al.2 (1998) found significant association of fungal infection to the presence of oral lesions with histologically confirmed epithelial dysplasia. This study suggests an interaction between oral infection by yeast, especially Candida species, and the development of oral epithelial dysplasia and neoplasia. The yeast infections mechanism of action is responsible for the development and progression of dysplasia, however it remains unclear20. A study in animals found that Candida species have a potential ability for endogenous production of nitrosamines, which are carcinogenic in the oral mucosa27. The endogenous nitrosamines metabolism by Candida species is observed primarily by Candida albicans. These nitrosamines may be associated directly or indirectly to the activation of specific oncogenes, which are responsible for malignant transformation6,31. Some authors suggest the use of antifungal agents in some cases of OLP to reduce the potential production of carcinogenic N nitrosobenzylmethyl-amine by C. albicans16. It is difficult to establish whether a synergistic pre-malignant effect would occur in cases of exposure to potentially carcinogenic substances (contributing external risk factors) and persistence of OLP (intrinsic risk factor)21. Although there are many studies demonstrating the association of Candida spp. to oral carcinogenesis (including precancerous lesions, such as OLP), this link is still questionable, needing further study22. ase was suggested. However, whether this infection is a cause or a consequence of OLP lesions remain still unclear needing further longitudinal clinical and laboratory studies. 1. 2. 3. 4. 5. 6. 7. 8. 9. 10. 11. 12. 13. 14. 15. 16. 17. 18. 19. Final considerations Based on the literature reviewed, a higher prevalence of Candida yeast infection in patients with OLP when compared to individuals without the dise- 20. 11 Akpan A, Morgan R. Oral candidosis. Postgrad Med J.2002; 78:455–9. Barrett AW, Kingsmill VJ, Speight PM. 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São José dos Pinhas: Editora Plena; 2014. p. 5-12. 12 CAPÍTULO II Extração de DNA a partir de polpas dentárias humanas revisão dE literatura Dental Pulp DNA extraction – literature review Patrícia Comiran¹ Tiago Fortunato¹ João Paulo De Carli² Bethânia Molin Giaretta De Carli³ Maria Salete Sandini Linden4 Micheline Sandini Trentin5 Soluete Oliveira da Silva6 ¹ Cirurgião-dentista – FOUPF. ² Especialista em Prótese Dentária, Mestre e Doutor em Estomatologia, Professor – FOUPF. ³ Especialista em Cirurgia e Traumatologia Bucomaxilofacial e Odontologia do Trabalho, Mestra em Clínica Odontológica, Professora – FOUPF. 4 Especialista em Periodontia e Implantodontia, Mestra em Reabilitação Oral, Doutora em Implantodontia, Professora – FOUPF. 5 Especialista em Implantodontia, Mestra e Doutora em Periodontia, Professora – FOUPF. 6 Especialista em Patologia Bucal, Doutora em Estomatologia Clínica, Professora – FOUPF. ODONTO SCIENCE - 53 ANOS - FOUPF Extração de DNA a partir de polpas dentárias humanas revisão de literatura Introdução Os dentes têm uma importância fundamental na identificação humana, pois representam uma excelente fonte de DNA devido a sua capacidade de suportar as alterações ambientais, por possuir extraordinária resistência à putrefação e aos efeitos externos (físicos, químicos e biológicos) mais que qualquer outro tecido humano, preservando assim, a identidade genética individual. Este material biológico pode proporcionar a relação necessária para identificação de um indivíduo em caso de falha de métodos convencionais. A Odontologia Legal compreende as perícias no vivo, morto, nas ossadas, em fragmentos, em trabalhos odontológicos encontrados e, até mesmo, em peças dentais isoladas, sendo o principal objetivo dessa especialidade a aplicação dos conhecimentos da ciência odontológica à serviço da justiça. Dentre as inúmeras técnicas e procedimentos que o odontolegista pode executar para a identificação humana, está a identificação de DNA através de tecido pulpar, extraído de dentes das pessoas que sofreram algum tipo de acidente, nas mais variadas circunstâncias, como afogamento, queimaduras, acidentes aéreos, entre outros. A importância da identificação humana por meio do estudo dos dentes se dá, principalmente, quando o reconhecimento visual seja impossível de ser realizado e também na ausência de dados como a datiloscopia. Tendo em vista o exposto acima, o presente capítulo tem por objetivo realizar uma revisão de literatura em bases de dados a respeito da análise do DNA extraído da polpa de dentes humanos. Capítulo de revisão / Review chapter Materiais e método com o encontrado. Nas bases consultadas acima citadas foram encontrados 32 artigos. Os artigos incluídos nesta revisão de literatura foram selecionados após adoção dos critérios de inclusão citados, sendo que após a análise metodológica, foram utilizados 26 artigos e 3 livros. Foi realizado levantamento bibliográfico dos últimos 21 anos nos sites de busca científica a seguir descritos: Springer Link, disponível no endereço eletrônico <http://www.upf.br/biblioteca/>, PubMed (serviço da National Library of Medicine, Estados Unidos da América), disponível no endereço eletrônico <www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed>, e Bireme (Biblioteca Virtual em Saúde), especializado nas bases de dados Medline, Lilacs, SciELO e Cochrane, disponíveis no endereço eletrônico <www.bireme. br>. Para tal pesquisa foram utilizadas os descritores em português: odontologia legal, odontologia forense, DNA polpa dental, métodos de identificação humana; e em inglês: forensic dentistry, dental pulp DNA, methods of human identification. A revisão da literatura realizada foi do tipo crítica, sendo adotados os seguintes critérios de inclusão: 1) a obra/artigo ter sido publicada no período de 1992 a 2012; 2) o assunto ser pertinente ao objeto de estudo; 3) o objetivo ter sido claro e fiel ao estudo realizado; 4) o estudo ter sido baseado na literatura anterior e 5) conclusão baseada de acordo Revisão de literatura A Odontologia Legal se preocupa em levar conhecimentos da ciência odontológica à serviço da justiça. A atuação do cirurgião dentista que se dedica a esta área é regulamentada pela lei 5.081/66 no território nacional, lei esta que estabelece que seja de competência do cirurgião dentista proceder à perícia odontolegal em Foro Civil, Criminal, Trabalhista, realizando perícias como as de identificação, lesões corporais, responsabilidade profissional e acidentes de trabalho, bem como poderá realizar as chamadas perícias em Sede Administrativa ou de Convênios, quando atuará como avaliador ou audi14 po de preservação da estabilidade da polpa dental varia de quatro dias a duas semanas, dependendo das variações ambientais, existindo três condições para que a polpa dental seja conservada: condições de degradação do DNA post-mortem, condições em que foi feito o sepultamento, e questões relacionadas à causa da morte9. Alguns trabalhos descrevem que, nos dentes, a infiltração de fungos na dentina não se apresenta nos primeiros 50 anos após a morte do indivíduo, e que a presença desses fungos é um indicativo de que o material não tem origem recente, porém, é possível verificar a presença de hifas filamentosas entremeadas pelos túbulos dentinários em cadáveres de pessoas com tempo de morte bastante reduzido9. Inserido no fenômeno morte, estão os exames tanatológicos: a perinecroscopia ou exame do cadáver no local dos fatos, sendo geralmente realizado pelo perito criminal; a tanatognosia ou diagnóstico da realidade da morte; a cronotanatognosia ou conhecimento do tempo da morte; a necroscopia, também chamada de tanatoscopia, necropsia ou autopsia que significa o exame do corpo sem vida, bem como os exames complementares9. Nesses exames inserem-se o estudo e verificação dos fenômenos cadavéricos, sendo observados os abióticos imediatos (parada cardiorespiratória, perda da consciência, insensibilidade, imobilidade, abolição do tônus muscular, midríase ou dilatação pupilar) e os mediatos como desidratação cadavérica (perda de peso devida à perda de água, na ordem de 8g/kg em fetos e recém-nascidos e 10 a 18g/ kg em adultos), o esfriamento do cadáver (perda de calor por convecção, radiação, condução e evaporação no patamar de 1,5ºC/hora), os livores hipostáticos (ou manchas arroxeadas, que se iniciam como fino pontilhado chamado de sugilação hipostática que, por coalescência, se transformam em manchas maiores e que resultam em sangue acumulado, valendo tanto para pele como para órgãos), a rigidez cadavérica (substituindo a flacidez inicial, sendo um processo progressivo que segue uma marcha descendente conforme consta na Lei de Nysten, atingindo o máximo em cinco a oito horas, e permanecendo por dois a três dias), assim como a perda de peso, pergaminhamento da pele, dessecação das mucosas, achatamento do globo ocular e hipóstase16. Outros fenômenos tanatológicos são descritos na literatura, como os transformativos do cadáver, tor. A Odontologia Legal que tem como objetivo a pesquisa de fenômenos psíquicos, físicos, químicos e biológicos que podem atingir ou ter atingido o homem vivo, morto ou ossada, e mesmo fragmentos ou vestígios, resultando lesões parciais ou totais reversíveis ou irreversíveis (Res. do CFO-185)12,21,22. Se as circunstâncias o exigirem, a Odontologia Legal estender-se-á a outras áreas, se disso depender a busca da verdade, no estrito interesse da justiça e da administração16. Para se estabelecer a identificação humana propriamente dita, parte-se dos conceitos de identidade e identificação, que determinam por si só a organização de técnicas e procedimentos periciais. Com o decorrer dos anos, a Odontologia Legal juntamente com a Medicina Legal vêm promovendo estudos no intuito de desenvolver técnicas cada dia mais apuradas e precisas para a obtenção da identificação humana e outras áreas de interesse pericial. A Tanatologia é a ciência que estuda a morte e os problemas médicos e odonto-legais dela decorrente. Parte do exame do local, da informação acerca da circunstância da morte e, atendendo aos dados do exame necroscópico, procura estabelecer a identificação do cadáver, o mecanismo, o tempo, a causa e o diagnóstico diferencial da morte (acidente, homicídio, suicídio ou morte de causa natural). Seu conhecimento é de extrema importância para todos envolvidos nas investigações post-mortem respeitadas as devidas atribuições legais. A identificação no morto se dá geralmente por datiloscopia, porém, muitas vezes, é impossibilitada por fatores que geram interferências no corpo, como adiantado estado de putrefação, carbonização, afogamento, situações em que a polpa digital está destruída, e em grandes catástrofes, em que indivíduos perdem a vida de forma violenta, podendo ocorrer dilaceração do corpo. Em todas essas hipóteses, o odontolegista poderá contribuir por meio da identificação pelos dentes, comparando características anatômicas e/ ou patológicas, bem como tratamentos dentais presentes nos arcos dentais da vítima e na documentação odontológica apresentada9. Desta forma, a comparação com as informações da vítima pode ser feita por meio radiográfico e fotográfico, por sobreposição de imagens no computador, pesquisando-se a existência de concordância entre as linhas e curvas da face com pontos do esqueleto ou mesmo por reconstrução da face, como modelagem das partes moles sobre o crânio ou por meio de desenhos. Sabe-se, também, que o tem15 Comiran P, Fortunato T, Carli JP, Carli BMG, Linden MSS, Trentin MS, Silva SO. Extração de DNA a partir de polpas dentárias humanas - revisão de literatura Capítulo de revisão / Review chapter ODONTO SCIENCE - 53 ANOS - FOUPF e certos16. A determinação do momento da morte é muito complexa, pois, na sua maioria, trata-se de casos em avançado estado de decomposição cadavérica ou em fase de esqueletização. Atualmente, a Entomologia Forense entra como ciência no auxílio para elucidação de mortes misteriosas, pois a presença de insetos (moscas, besouros, vespas e borboletas que se utilizam dos corpos para nutrir suas proles) em cadáveres revela informações de quando, onde e como ocorreu um crime ou uma morte misteriosa. Os insetos, incapazes de controlar a temperatura do próprio corpo e os vários estágios de seu desenvolvimento (eclosão do ovo, transformação em larva ou em pupa), são controlados por fatores externos como temperatura ambiente e disponibilidade de alimento e, como este último costuma ser abundante nos casos descritos, a partir da temperatura do corpo e do ambiente é possível, depois de identificar as espécies, estimar quanto tempo levou para que os insetos atingissem o estágio em que foram encontrados e, assim, determinar quando ocorreu o óbito9. A Odontologia Legal, por meio da Tanatologia, pode ser muito útil na identificação de vítimas de desastres em massa e, às vezes, na diferenciação dos restos mortais de pessoas vitimadas por situações como catástrofes naturais, acidentes envolvendo carbonização dos corpos, acidentes aéreos, acidentes ferroviários, acidentes militares e guerras. O exame tanatológico constitui-se de grande importância pericial, determinando tempo, causa e até o local da morte, utilizando-se também de características peculiares presentes no cadáver, podendo até finalizar um caso de difícil elucidação por meio da análise e exame dos arcos dentais12. Nesse sentido, verifica-se que dentes rosáceos podem ser observados em cadáveres cuja causa de morte foi decorrente de enforcamento, sufocação, afogamento e projétil de arma de fogo, com maior intensidade de coloração nos elementos dentais da bateria labial9, fato este reforçado pela presença desse fenômeno cromático no caso de mortes violentas9, considerando que a coloração vermelha dos dentes após a morte é devida à hemólise e exsudação da hemoglobina e seus derivados no interior dos canalículos dentinários9, mostrando que a pigmentação dos dentes é uma indicação do tempo decorrido após a morte9. O fenômeno dos dentes rosados pode ser considerado, de certo modo, análogo aos cadavéricos, que são produzidos após a morte, pelo afluxo de sangue às regiões de declive exemplificados por autólise (processo autodestrutivo de células e tecidos sem interferência externa, ocorrendo quando existe uma grande acidificação do meio); putrefação, ocorrendo em quatro períodos sucessivos; coloração (compreendendo principalmente mancha verde ao nível do fígado pela presença de sulfometahemoglobina, aparecendo após a morte, entre 16h e 20h, permanecendo por cerca de sete dias), gasosa (ou enfisematosa, onde os micro-organismos produzem gás e provocam o entumescimento das cavidades, principalmente no abdômen, e nota-se a presença de flictemas putrefativos com o destacamento da epiderme do córion, permanece de uma a três semanas), coliquativa (onde verifica-se a redução dos tecidos podendo ter-se a liquefação dos tecidos, durando vários meses), a esqueletização (consequência inevitável dos processos acima descritos, que pode levar de alguns meses a alguns anos, dependendo de vários fatores) e maceração (processo no qual ocorre o amolecimento dos tecidos e órgãos, geralmente em razão do meio úmido, principalmente nos afogados, a pele torna-se esbranquiçada, friável, corruga-se e faz com que a epiderme se solte da derme e possa até se rasgar em grandes fragmentos)9. Nesse mesmo diapasão, têm-se os fenômenos conservadores: saponificação (quando não ocorre a putrefação, devido ao cadáver encontrar-se em local com excesso de umidade, terrenos argilosos, impermeáveis, onde os tecidos são transformados em adipocera, substância amarelo-escura conhecida também como gordura dos cadáveres, tendo início em 2 meses até 1 ano); mumificação (ocorrendo quando há perda rápida de água, evitando a ação das bactérias, geralmente em local seco, quente e ventilado abundantemente, não ocorrendo a putrefação, com finalização do processo entre seis meses e um ano); coreificação (processo transformativo que ocorre com cadáveres conservados em urnas metálicas, normalmente de zinco galvanizado, e hermeticamente fechadas, onde a pele assume o aspecto, a cor e a consistência de couro curtido) e petrificação (de rara ocorrência, ocorrendo a infiltração dos tecidos do cadáver por sais de cálcio, que ao precipitarem em meio às estruturas celulares teciduais proporcionam uma calcificação generalizada, exclusividade de fetos e embriões)9. A Tanatognose é o ramo da Tanatologia que estuda o diagnóstico da realidade da morte, feito por meio de numerosos sinais, chamados sinais de morte, que são classificados como duvidosos, prováveis 16 da circunstância em que o indivíduo veio a óbito. Cadáveres íntegros são submetidos inicialmente à análise das impressões digitais (papiloscopia) com o intuito de se identificar o tipo fundamental de cada dactilograma, obtido pela constatação da ausência ou presença, quantidade e localização dos deltas situados na falange distal de cada dedo das mãos. Em seguida, tenta-se identificar os elementos característicos formados pelas cristas papilares, tais como início e final de linha, bifurcações, anastomoses, confluências, dentre outros19. Caso essa metodologia não seja apropriada ou não produza resultados satisfatórios, o exame das características odontológicas torna-se a metodologia de primeira escolha. A técnica de identificação odontolegal, especificamente, é normalmente utilizada para a determinação da identidade de cadáveres considerados “irreconhecíveis”, tais como carbonizados, esqueletizados ou em avançado estágio de decomposição. Entretanto, o sucesso de uma identificação estabelecida por meio da análise das particularidades odontológicas depende da existência de características relevantes presentes tanto nos arcos dentários do cadáver como na documentação odontológica apresentada para confronto - prontuário, radiografias, modelos de gesso, fotografias intrabucais, dentre outros19. Se um desses dois parâmetros não oferecer condições de análise, outra técnica deverá ser utilizada e a análise genética (DNA) pode ser uma saída viável19. Os dois primeiros tipos de exames anteriormente descritos, o papiloscópico e o odontolegal, constituem metodologias de identificação humana classificadas como comparativas, uma vez que confrontam informações obtidas de documentos produzidos em vida com os dados obtidos em análise pós-morte. Dependendo da quantidade e qualidade dos pontos convergentes obtidos nesse confronto, o cadáver examinado poderá ser correlacionado, com maior ou menor grau de certeza, como sendo correspondente à pessoa desaparecida19. O processo de identificação é finalizado através da comparação entre as características específicas do indivíduo obtidas de registros produzidos antes (material padrão) e após a morte (material questionado), configurando-se o confronto odontolegal19. A resolução de diversas questões de âmbito jurídico, tais como partilha de bens, heranças, recebimento de seguro de vida ou oferecimento de denúncia contra pessoas acusadas de terem cometido homi- do corpo, destacando que a posição do corpo após a morte também é importante para que ocorram os dentes rosados9. Na prática pericial, o fenômeno da coloração rosada dos dentes após a morte é mais frequentemente observado em vítimas de afogamento ou que ficaram algum tempo na água, o que poderia ser atribuído à posição pendente da cabeça, comum em cadáveres que permanecem em meio líquido, permitindo o sangue fluir passivamente para as áreas de declive e, nesta situação, a cabeça9. Reforçando o conceito da coloração dental, a análise histológica e espectrofotogramétrica confirmam as fases de formação dessa alteração cromática, mostrando que a hemoglobina íntegra é a responsável pela alteração de cor, e que os seus subprodutos não têm papel fundamental no desenvolvimento do fenômeno dos dentes rosáceos, sendo que sua degradação não acontece de forma única e é mais lenta do que previamente se pensava9. Vários métodos aceitáveis estão disponíveis para identificação humana, embora ainda apresentem limitações. Historicamente, as impressões digitais têm sido utilizadas na identificação, no entanto, em certas situações, tais como carbonização, decomposição e processos de esqueletização, as digitais estão destruídas. Assim, a identificação por meio de exames genéticos é em si uma ferramenta importante e de confiança, mas assim como a datiloscopia, ele precisa de registo ou na presença de algum descendente anterior. A análise antropológica, que por sua vez pode fornecer informações úteis, tais como altura, raça, sexo, no entanto, não produzem individualmente identificações. Além da identificação humana, a Odontologia Legal pode ser útil para uma análise investigativa de erros profissionais, traumatologia forense e tanatologia, entre outros13. O campo de atuação do odontolegista não se restringe apenas ao exame dos vestígios dentários, estendendo-se a várias áreas, como antropologia, genética, bioquímica, balística forense, tanatologia e traumatologia forense, radiologia, computação e mixagem de imagens, tudo respaldado por legislação federal competente4. A identificação humana no indivíduo vivo ou morto constitui um dos procedimentos periciais mais efetuados nos departamentos de medicina legal do país. Para tanto, é necessário determinar qual a técnica mais adequada a ser empregada, pois em cadáveres, a escolha depende primordialmente da integridade de determinadas regiões corporais ou 17 Comiran P, Fortunato T, Carli JP, Carli BMG, Linden MSS, Trentin MS, Silva SO. Extração de DNA a partir de polpas dentárias humanas - revisão de literatura Capítulo de revisão / Review chapter ODONTO SCIENCE - 53 ANOS - FOUPF rios na dentição permanente, observados em radiografias panorâmicas e classificados de acordo com a tabela de cronologia da mineralização dentária. Em relação aos adultos, pode-se estimar a idade por meio da determinação radiológica da redução do tamanho da cavidade pulpar, causada por depósito secundário de dentina, o qual é proporcional à idade do indivíduo4. A literatura odontolegal relata casos em que diversas peças que integram a documentação clínica odontológica podem ser utilizadas com finalidade legal, tanto na resolução de questionamentos judiciais acerca dos tratamentos efetuados como nos casos de identificação humana18. A Odontologia Legal compreende as perícias no vivo, morto, nas ossadas, em fragmentos, em trabalhos odontológicos encontrados e, até mesmo, em peças dentais isoladas, sendo o principal objetivo dessa especialidade a aplicação dos conhecimentos da ciência odontológica à serviço da justiça. Dentre as inúmeras técnicas e procedimentos que o odontolegista pode executar para a identificação humana, está a identificação de DNA através de tecido pulpar, extraído de dentes das pessoas que sofreram algum tipo de acidente, nas mais variadas circunstâncias, como afogamento, queimaduras, acidentes aéreos, entre outros. A importância da identificação humana por meio do estudo dos dentes se dá, principalmente, quando o reconhecimento visual seja impossível de ser realizado e também na ausência de dados como a datiloscopia12. Exame odontológico forense é o principal meio de identificação em situações onde a exposição, o tempo decorrido desde a morte e a destruição do corpo (incêndio, explosão etc.) fizeram outros meios de identificação impossíveis, mas tem suas limitações, por exemplo, quando os restos mortais são fragmentados e apenas pequenas porções de dentes podem ser recuperados. Sob condições experimentais e de casos forenses reais, observou-se que o tecido pulpar podia ser extraído, na maioria dos casos. Polpa dentária consiste de um tecido de “estroma”, contendo nervos, vasos sanguíneos e linfáticos. As células pulpares têm forma irregularmente estrelada e contêm um núcleo variavelmente colocado15. As impressões digitais podem ser alteradas por cirurgias, o DNA de uma pessoa não pode ser alterado2. O dentista forense utiliza registros e dados ante-mortem para a comparação com o post-mortem. cídio, por exemplo, exigem que o corpo examinado tenha a sua identidade determinada. Nos casos de identificação odontolegal, o profissional deve focar sua atenção nos aspectos qualitativos presentes nas informações obtidas ante e pós-morte, pois a conclusão quanto ao estabelecimento da identidade e a obtenção da quantidade de pontos convergentes dependem fundamentalmente da qualidade do material a ser periciado em cada caso19. Torna-se necessário que o CFO regulamente e oriente os profissionais da Odontologia sobre os métodos adequados de identificação das milhares de próteses totais produzidas no Brasil. Esta normatização auxiliará na resolução de possíveis questionamentos técnicos e jurídicos acerca da origem desses produtos, podendo evitar transtornos sociais aos usuários de próteses dentárias totais e auxiliem na identificação dos indivíduos18. A contribuição da Odontologia Legal pode ser mensurada em inúmeros relatos científicos e quantificada, inclusive, por pessoas não afeitas à terminologia odontológica e às ciências forenses, como ocorreu quando a mídia pôs em evidência a importância dos procedimentos de identificação no caso das vítimas do desastre sofrido pelo jato da empresa TAM, em São Paulo, no final de 1996. Podem-se destacar os dois maiores acidentes aéreos brasileiros, o primeiro ocorrido em setembro de 2006, envolvendo um avião da empresa Gol, causando a morte de 154 pessoas, e o segundo, ocorrido em julho de 2007, com um avião da empresa TAM, culminando com a morte de 199 pessoas. Em ambos os acidentes foi necessária a aplicação de diferentes técnicas de identificação forense para a individualização das vítimas, incluindo a identificação pelos dentes. Historicamente, a aplicação da radiologia nas ciências forenses foi introduzida em 1896, apenas um ano após a descoberta dos raios X por Roentgen, para demonstrar a presença de balas de chumbo na cabeça da vítima. Devido a grande diversidade de métodos para estimar a idade por meio da cronologia de erupção do terceiro molar, formação da dentição e suturas, é possível citar outros parâmetros que contribuem para o diagnóstico estimado da idade humana através dos dentes: erupção dos decíduos, mineralização da coroa e da raiz, relação área de dente/área da câmara pulpar, desgaste e perda dentária. Assim, pode-se estimar a idade em crianças baseando-se no estudo dos estágios de desenvolvimento dos elementos dentá18 sobre os restos do corpo21. A descoberta da estrutura de dupla hélice do DNA, em 1953, que é responsável para a hereditariedade genética em seres humanos, causou um grande impacto e levou a notáveis mudanças em quase todos os campos da ciência. Este conhecimento tem sido a base para o desenvolvimento de técnicas que permitem caracterizar a individualidade de cada pessoa com base na sequência de DNA17. A informação contida no DNA é determinada pela sequência, como as letras do alfabeto genético estão dispostas nos cromossomos. No caso do homem, existem três bilhões dessas letras escritas nos cromossomos de cada célula do corpo humano, sempre na mesma ordem em todas as células do indivíduo. É a ordem como essas letras estão escritas nos cromossomos que faz com que cada indivíduo seja diferente dos demais. Quanto mais diferentes são os indivíduos, mais distinta é a ordem das letras no genoma. Indivíduos aparentados, irmãos, pais e filhos, apresentam maior similaridade na sequência gênica. Somente gêmeos idênticos, que são clones humanos naturais, apresentam a mesma evidência biológica coletada6. O DNA é uma molécula extremamente longa, formada por duas cadeias de polinucleotídeos enrolados de forma helicoidal e ligados transversalmente através de pontes de hidrogênio. Cada nucleotídeo é constituído por três unidades básicas: uma base nitrogenada, uma molécula de açúcar (desoxirribose) e um grupamento fosfato (PO4). As informações genéticas estão sob a forma de ácido nucleicos, descobertos em 1869 por Friedrich Miescher. Existem dois tipos de ácidos nucleicos: o ácido desoxirribonucleico (DNA), o qual contem o gene, e o ácido ribonucleico (RNA)22. O DNA pode ser extraído de amostras de sangue, esfregaço bucais, ossos, dentes, tecidos, órgãos, fio de cabelo, sêmen, urina, entre outros materiais biológicos. Eles podem ser encontrados em dois lugares, nos cromossomos do núcleo (DNA genômico) e nas mitocôndrias (RNA mitocondrial)22. Há mais de uma década a tecnologia do DNA foi utilizada pela primeira vez como método de identificação humana no campo forense17,22. O primeiro caso de identificação criminal através de exames de DNA ocorreu em 1985, na Inglaterra. Num pequeno condado, rodeado de montanhas e com uma única estrada de acesso, uma mulher foi estuprada e assassinada. “Lá havia um geneticista, Alec Jeffreys, que colheu o esperma encontrado na Todo o processo de identificação humana, a partir da análise das impressões digitais para identificação dentária ou até mesmo a tecnologia de DNA, baseia-se num processo comparativo, isto é, para alcançar um resultado positivo, uma composição de dados anteriormente obtida e relacionada com o mesmo material deve existir para permitir a comparação com o material disponível para análise no momento presente. Qualquer documentação produzida ante-mortem é capaz de ser utilizada durante o processo de identificação. Registros dentários são um dos materiais que proporcionam um maior número de informações para executar o processo comparativo, oferecendo os detalhes e particularidades que tornam uma pessoa única. Comparado com outros métodos de identificação, registros dentários são apenas menos possíveis do que análises de impressões digitais. No entanto, este último não pode ser sempre conseguido nos casos em que os tecidos são destruídos. A identificação humana pode ocorrer através dos parâmetros mais variados: papiloscopia, íris, genética e análise dental, entre outros. A escolha da metodologia depende da condição em que o corpo a ser identificado foi encontrado, bem como o tipo de material disponível para realizar a comparação. Para cadáver carbonizado, a técnica mais indicada é a Odontologia forense, devido à maior resistência dos dentes e materiais restauradores ao calor e à ação do fogo. Em vários casos, Odontologia Legal é o único método disponível para identificação3. Não há acordo entre os dentistas forenses sobre a individualidade da dentição ou o comportamento da pele humana durante a mordida. Não obstante, as distorções podem modificar, complicar ou tornar impossível a interpretação de uma marca de mordida. Procedimentos padronizados para a recolha de DNA e extração a partir de saliva depositada podem ser muito úteis para ajudar na resolução de casos criminais, desde que os dados importantes possam ser obtidos usando a análise de DNA salivar8. O uso de testes de DNA em Odontologia Legal oferece uma nova perspectiva de identificação humana. As técnicas de biologia molecular devem ser definitivamente adicionadas à constelação de meios de investigação das ciências forenses, proporcionando uma variedade de ferramentas para prática da antropologia forense em pesquisas de identidade humana, especialmente quando os métodos de identificação habitual falharem devido aos deletérios efeitos do trauma, calor ou processos autolíticos 19 Comiran P, Fortunato T, Carli JP, Carli BMG, Linden MSS, Trentin MS, Silva SO. Extração de DNA a partir de polpas dentárias humanas - revisão de literatura Capítulo de revisão / Review chapter ODONTO SCIENCE - 53 ANOS - FOUPF vítima e fez o exame de DNA. Mais tarde houve outro crime similar. Novamente Jeffreys analisou o sêmen encontrado na vítima. Era do mesmo homem que cometera o primeiro crime” conta José Maria Marlet, professor de Medicina Legal da USP. As autoridades locais forjaram uma campanha de doação de sangue cuja finalidade era identificar o agressor. Todos os habitantes foram doar sangue, mas nenhum deles possuía DNA igual ao do estuprador. “A polícia prosseguiu com as investigações e descobriu que havia um viajante no condado. Quando o sujeito voltou, foi convidado a doar sangue. Feito o teste de DNA no sangue colhido, Jeffreys concluiu que o código genético do viajante era o mesmo do estuprador” conta Marlet6. A análise do DNA mitocondrial para fins forenses fica reservada para tecidos antigos como ossos, cabelos, dentes e em grandes desastres nos quais o DNA nuclear já não oferece mais condições de análise. DNA mitocondrial se deve principalmente ao fato deste apresentar resistência à digestão enzimática devido a sua estrutura circular, sendo desta forma, a análise desse tipo de DNA excepcional no estudo forense: 1) possui alta taxa de mutação, 2) apresenta herança maternal, 3) a ausência de recombinação permite que as mutações sejam acumuladas sequencialmente na molécula, 4) o grande número de cópias do DNA mitocondrial em cada célula humana facilita sua obtenção para as análises e 5) o DNA mitocondrial é mais resistente à degradação que o DNA nuclear22. Até a década de 1980, a ciência da identificação de casos criminais foi baseada apenas em análises sorológicas de polimorfismo de proteínas, grupos sanguíneos e alguns marcadores genéticos1. O uso do DNA forense na investigação criminal, não pode por si só provar a culpabilidade do criminoso, e também a inocência do mesmo, mas pode estabelecer uma ligação entre esta pessoa e a cena do crime. Atualmente, a identificação humana por DNA forense já é aceita em processos judiciais em todo o mundo, sendo possível inclusive a identificação de pessoas mortas, há dezenas, centenas de anos, utilizando DNA obtido de ossos ou dentes6. Os testes de DNA realizados atualmente são muito confiáveis, sendo aceitos como provas legais nos tribunais para investigação de paternidade e identificação humana. As provas de identificação individual pelo uso de testes de grupo sanguíneo ganharam valor legal nos Tribunais alemães, em 1920, sendo legalmente aceitos nos Estados Unidos só em 1935. No Brasil, esses exames foram dados com valor legal à investigação de paternidade em 194817. Testes de DNA foram aceitos pela legislação brasileira somente após a década de 1990 e são ainda muito questionados por alguns indivíduos. Além disso, testes de DNA envolvem um custo elevado devido à escassez dos institutos públicos preparados para a rotina de realização de exames de DNA. No entanto, existem já evidências de que o Estado reconhece a eficácia da informação fornecida pelos testes de DNA e a consequente necessidade de torná-los disponíveis para o público geral17. No Brasil, até março de 2004, tramitavam na Câmara Federal trinta e um projetos de lei relacionando o papel do exame de DNA para fins de identificação humana. Percebe-se assim a cobrança da sociedade e a preocupação do Estado em respaldar legalmente a utilização do DNA para tal fim17. As evidências biológicas (manchas de sangue, sêmen, cabelos, etc.) são encontradas em cenas de crimes e o DNA pode ser extraído dessas evidências e estudado por técnicas moleculares no laboratório, permitindo a identificação do possível suspeito. Assim, para que a técnica de identificação pelo DNA seja plenamente realizada, a amostra biológica a ser analisada deve ser corretamente escolhida, coletada, transportada e armazenada6. O uso da saliva e esfregaços bucais como fontes de DNA apresenta algumas vantagens técnicas sobre a utilização do sangue. A coleta é mais fácil e indolor, especialmente considerando que ela pode ser feita em bebês, crianças e idosos, e não tem as implicações religiosas de usar sangue5. Para a obtenção do perfil do DNA inclui-se sete etapas: coleta da amostra, isolamento do DNA, corte do DNA, separação dos fragmentos, tranfêrencia do DNA, hibridização de sondas e perfil do DNA. • Coleta da amostra: sangue, saliva, sêmen, pelo, dente, ossos. • Isolamento do DNA: deve ser extraído das células ou dos tecidos das amostras. Dependendo do método de análise utilizado, uma pequena quantidade da amostra pode ser o suficiente. • Corte do DNA: digestão ou fragmentação do DNA com uma enzima de restrição (enzima que cliva a molécula de DNA em uma determinada sequência curta de base) que irá conter um grande número de fragmentos de diferentes tamanhos. • Separação dos fragmentos: são ordenados 20 (short tandem repeat) e VNTR (variable number of tandem repeat), são caracterizados por sequências de nucleotídeos que se repetem em múltiplas cópias, variando o número de repetições entre os indivíduos para cada locus. Os polimorfismos de sequência são compostos de diferentes nucleotídeos em uma determinada localização do genoma. Essas variações em seqência podem ser manisfestadas como regiões de alelos alternativos ou substituições, adições ou deleções de bases. A grande diversidade nessas regiões é que o número de repetições de uma dada sequência de bases, que pode ser de 1 a 4 bases nos STRs e de 10 a 100 pares de bases nos VNTRs, varia entre indivíduos. Assim, em função da quantidade de repetições presentes, cada indivíduo terá um tamanho diferente para a região do DNA que contém um dado STR ou VNTR. Cada possibilidade de tamanho (ou de número de repetições) que pode ser encontrada representa um alelo6. PCR Multiplex é a ampliação de diversos STR no mesmo tubo de ensaio. É uma técnica de PCR na sua forma mais simples, que amplifica regiões específicas do DNA e utiliza um conjunto de iniciadores diferentes. As bases para a utilização dos testes de identificação da individualidade humana, pelo estudo do DNA, encontram-se na diversidade ou polimorfismo dos diversos loci de minissatélites, microssatélites ou HLA (antígenos leucocitários humanos). Cada um de nós apresenta um cromossomo materno e um paterno, e as segregações destas estruturas repetitivas seguem a lei de Mendel, em que um alelo é de origem materna e outro, paterna, para cada locus6. Qualquer tipo de tecido ou fuído biológico pode ser utilizado como fonte de DNA, uma vez que são formados por células. Nas células, o DNA de interesse forense encontra-se tanto no núcleo como nas mitocôndrias6. Nos casos em que não é possível a tipagem utilizando-se DNA nuclear, pode ser usado DNA mitocondrial, pois uma única célula possui mais de 5.000 cópias de mtDNA. É comparado com irmãos ou ascendentes maternos6. RFLP é uma técnica em que os organismos podem ser diferenciados pela análise de padrões derivados da clivagem de seu DNA6. Para a detecção de RFLP’s, pode ser usada a metodologia de “Shouthern Blot”, que permite a identificação de fragmentos de DNA com sequências idênticas ou similares à sonda utilizada6. A sonda de DNA é marcada de tal forma que por tamanhos, utilizando a técnica da eletroforese. Esse procedimento consiste em submeter os fragmentos do DNA de um gel a uma corrente elétrica. O gel utilizado é feito com agarose, substância extraída de algas marinhas. O gel de agarose possui uma consistência similar à da gelatina. O procedimento consiste em depositar os fragmentos de DNA em uma canaleta moldada na extremidade do gel próxima ao eletrodo negativo. Com a corrente elétrica, o DNA migrará dentro do gel na direção oposta, isto é, em direção ao eletrodo positivo. Os fragmentos menores de DNA migram mais rapidamente, separando-os por tamanhos. • Tranferência de DNA: após a separação dos fragmentos no gel, eles são transferidos do gel para uma membrana de nylon, por capilaridade. Uma vez fixados nessa membrana, os fragmentos podem ser manipulados para sua visualização. • Hibridização de sondas: a adição de sondas coloridas ou radioativas à membrana de nylon permite a visualização dos fragmentos. • Perfil do DNA: o perfil final do DNA é constituído, após a hibridização, de diferentes sondas à membrana. O resultado é um padrão de bandeamento de diferentes tamanhos2. No mínimo, 13 loci são analisados verificando-se o comprimento das sequências das bases do DNA (alelos). A partir disso, são gerados perfis de DNA, que são comparados entre si. A relação entre os alelos é que vai mostrar se existe vínculo genético familiar ou não. Depois são realizados cálculos estatísticos para estimar o número de vezes em que esse perfil ocorre na população. A possibilidade de que duas pessoas tenham as mesmas sequências dos trechos de DNA é estimada em uma em seis bilhões6. O método de STR (Short Tanden Repeats) é mais usado hoje em dia, e estuda regiões repetitivas de DNA chamadas de minissatélites (VNTRs) e microssatélites (STRs). Na identificação humana utiliza-se quase que exclusivamente marcadores microssatélites STR. O estudo dos marcadores STR é feito utizando a técnica de reação em cadeia de polimerase (PCR). Com essa técnica é possível fazer a tipagem do DNA utilizando quantidades mínimas de amostras, esse processo se faz in vitro, para fazer muitas cópias de um fragmento de DNA6. Os polimorfismos presentes nas regiões, STR 21 Comiran P, Fortunato T, Carli JP, Carli BMG, Linden MSS, Trentin MS, Silva SO. Extração de DNA a partir de polpas dentárias humanas - revisão de literatura Capítulo de revisão / Review chapter ODONTO SCIENCE - 53 ANOS - FOUPF te, idade ou sexo. Nenhuma influência significativa de condições de armazenamento ou tempo foram detectadas. A polpa dental está bem protegida na cavidade pulpar assim como os dentes estão firmemente fixados aos ossos alveolares. Quando os dentes foram extraídos e armazenados à temperatura ambiente, uma rápida desidratação da polpa foi vista. Esta desidratação é considerada uma explicação para a boa integridade do DNA recuperado em maior parte dos casos, como os processos necrótico e/ou são putrefativo. Observa-se que quando os alvéolos são afrouxados e o microambiente mantém os dentes úmidos, a polpa irá apodrecer, mas quando o ambiente permite que a célula mumifique, o DNA pode ser extraído e a qualidade é suficiente para a análise por PCR. DNA pode ser obtido a partir da polpa de dentes em fragmentos que tinham sido armazenados durante 15 anos e o sexo foi determinado em todos os casos15. A amostragem do tecido pulpar é feito de três maneiras: trituração, separação vertical ou horizontal e por acesso endodôntico10. Trituração ou moagem: não é aconselhável, pois não dá nenhuma margem para posterior avaliação da morfologia do dente e histologia. Além disso, a amostra triturada tem de passar por múltiplos ciclos de descalcificação e purificação, e a quantidade utilizável de DNA pode não ser obtida. Isso é feito como um último recurso. A documentação completa da morfologia dos dentes, incluindo fotografias de vários ângulos e radiografias, é obrigatória antes da moagem. A moagem criogênica de dentes envolve a pulverização de dente limpo em um moinho congelador com nitrogênio líquido. O pó foi solubilizado em uma solução tampão de proteinase K e incubada durante a noite. Hibridização ranhura foi utilizada para quantificar o DNA. O rendimento de DNA por grama de pó de dente foi de 18,4 ug10. Separação vertical ou longitudinal do dente é feito em muitos casos. Esse método fornece escavação fácil de todo o tecido pulpar com possibilidade de contaminação mínima. A morfologia da coroa pode ser perdida. A divisão é feita com discos de carborundum, com luvas resistentes, de preferência com gorro, pois o aerossol pode entrar em contato com a pele ou olhos, ou pode ser inalado. O dente é mantido em forma segura. Os discos carborundum são utilizados para dividir o dente a partir da borda incisal, com lavagens frequentes com água destilada. Quando a cavidade pulpar é atingida, o dente pode ser dividido por um cinzel para evitar permite ser detectada a sua presença. Essa marcação é normalmente feita incorporando-se a ela átomos radioativos ou ligando-se a ela corantes fluorescentes ou cromogênicos (substâncias incolores que produzem cor ao interagiram com um determinado meio). Essa sonda irá parear com qualquer sequência de DNA complementar a ela, então o excesso é lavado e a presença ou não da sonda na membrana é revelada por uma autorradiografia em um filme de raio-x, ou pelo aparecimento de uma cor caso a marcação cromogênica tenha sido usada. Podem ocorrer degradação e contaminação de DNA nos laboratórios e nos locais dos crimes. A degradação biológica do DNA é feita por enzimas produzidas por fungos e bactérias, por causa da umidade e do calor. O DNA resiste bem ao calor (temperatura de até 100ºC não o destrói)6. Os principais fatores exógenos que limitam a recuperação da informação a partir de restos humanos são o fogo e os acidentes que envolvem altas temperaturas. Os dentes, devido ao seu grau relativamente elevado de resistência química e física, oferecem a possibilidade para a recuperação de material genético, tornando-se importantes nos casos forenses. Devido a esta resistência contra as alterações ambientais (incineração, imersão, traumas, mutilação e decomposição), os dentes representam uma excelente fonte de DNA, quando as outras fontes biológicas têm sido perdidas. Além disso, devido ao fato da polpa dentária ser rodeada por tecidos duros, não é facilmente influenciada por alterações na temperatura externa. Sendo assim, o tecido pulpar é mais comumente utilizado, pois é geralmente abundante e tem menos chance de contaminação por DNA não humano11,14. A análise odontológica forense é uma abordagem necessária para identificação individual em situações tais como resto de esqueleto, corpos queimados ou vítimas de desastres de massa. O tecido dental duro engloba fisicamente a polpa, a qual é por si só um tecido de alta densidade celular; dentes proporcionam uma fonte adequada de DNA para fins de identificação forense. Antes da tipagem de DNA, a identificação individual dental era geralmente realizada por meio da comparação da dentição ante-mortem de registros do falecido. A identificação física tem a limitação de que os registros ante-mortem não são sempre disponíveis7. O rendimento total de DNA obtido a partir de um único dente variou de 6 a 50 pg de DNA. O rendimento de DNA não dependeu do tipo de den22 piores resultados de todas as séries, e duas explicações podem ser dadas para esse efeito. Em primeiro lugar, a quantidade de zooplâncton, a razão mais provável é o efeito de diluição de água em si, a qual aumenta a velocidade de hidrólise de DNA em comparação com a incubação no ar ou no solo. Dentes expostos ao ar livre deram melhores resultados que os enterrados. Não foram observadas diferenças entre enterrado na areia ou no solo. Uma temperatura acima de 200º raramente apresenta resultados bons, mas em 100º por 10 minutos os resultados foram bons. Dentes oferecem uma boa fonte de DNA para identificação de restos esqueléticos antigos. Os resultados positivos foram obtidos em 100% para o gene e os amelogenina DOSs em dentes variando de 10 a 30 anos, e também bons resultados para o corpo enterrado durante mais de 50 anos7. A fim de avaliar os diferentes tecidos dentários como fonte em análises forenses de DNA, em estudo anterior17, 20 dentes foram obtidos a partir de corpos não identificados, enterrados em 1995 e exumados em 2000, proporcionando 45 amostras de DNA (5 a partir da polpa, 20 a partir de dentina e 20 a partir de cemento). A pasta produzida é sinal de PCR de amplificação, enquanto que a dentina, os sinais de cemento foram muito semelhantes um ao outro. Assim, há uma boa possibilidade de utilizar como fonte de dentes materiais de DNA, mesmo nos casos em que a extração do DNA e recuperação parecem impossíveis. Se há uma estrutura no corpo do ser humano que pode resistir a um ambiente à diferentes condições e ainda fornecer material para análise, esta estrutura é o dente17. Pesquisa anterior avaliou as alterações observadas durante a cremação em 15 corpos, verificando que os ossos da face foram expostos apenas ao fim de 40 minutos, quando todo o tecido mole tinha sido queimado; a incineração completa ocorreu após duas a três horas. Com base nisto, tempos que variam entre 10 e 60 minutos foram testados, uma vez que, teoricamente, os dentes passariam por exposição direta ao fogo para, no máximo, duas horas20. Pesquisa prévia realizou um procedimento usando Chelex resina 100, a fim de extrair DNA a partir da polpa dentária para aplicação posterior do procedimento de PCR. Os dentes extraídos foram incinerados durante 2 minutos a temperaturas de 100 ºC, 200 ºC, 300 ºC, 400 ºC e 500 ºC. Todas as amostras até 300ºC foram capazes de ser amplificadas e classificadas, ao passo que nenhum produ- danos provocados pelo calor mecânico. A polpa é então escavada e transferida para frascos. O dente cortado pode ser usado para avaliação histológica10. A separação horizontal é essencialmente o mesmo procedimento e é feita quando a estrutura de coroa é para ser preservada. A raiz é seccionada e amostragem da polpa, dentina e cemento podem ser feitos. O outro método é preparar uma cavidade de acesso convencional no dente e escavar a polpa com um aparelho de mão apropriado10. Em tais casos, a exposição não é sempre contínua, com variações de temperatura, dependendo da presença de materiais inflamáveis. Nos casos de acidentes, o dente é protegido por tecido epitelial, músculo, tecido ósseo e conjuntivo antes de serem afetados, bem como pela proteção que o esmalte, dentina e cemento fornecem às células e tecidos, protegendo assim, o conteúdo genético do indivíduo20. Paul Revere foi provavelmente o primeiro dentista forense que ajudou a identificar os soldados mortos da Guerra Revolucionária Americana10. A influência do ambiente sobre a concentração, a integridade e a recuperação do DNA extraído a partir de polpas dentárias foi avaliada por estudo anterior. O pH variou de 3,7 a 10,0, a temperatura variou de 4°C a 37ºC, a umidade variou de 20,66 a 98%, o tipo de solo em que os dentes foram enterrados variou de areia, barro, grama, até imersão em água e ao ar livre). Além disso, os períodos de incubação dos dentes também foram diversos (uma semana a seis meses). Foi determinado que o meio ambiente não afeta a capacidade de obter DNA da polpa dentária humana, a fim de verificar a resistência ao calor17. Alguns autores avaliaram a amplificação por PCR do DNA recuperado a partir de dentes submetidos ao calor (200°C/392°F, 400°C/752°F, 500°C/932°F e 600°C/1112°F) durante 60 minutos, testando três diferentes métodos de extração de DNA (orgânico acetato de amônia/isopropanol e sílica). Os autores concluíram que a amplificação de todas as amostras em todas as temperaturas foi possível utilizando acetato de amônia/isopropanol, o qual dá uma credibilidade elevada para o uso de dentes em investigações forenses baseados no DNA17. Não houve diferenças significativas entre as três temperaturas estudadas (4º, 20º e 40º) ao longo dos diferentes períodos de tempo, e os resultados foram semelhantes para todas as três temperaturas. Em geral, os dentes submersos na água oferecem os 23 Comiran P, Fortunato T, Carli JP, Carli BMG, Linden MSS, Trentin MS, Silva SO. Extração de DNA a partir de polpas dentárias humanas - revisão de literatura Capítulo de revisão / Review chapter ODONTO SCIENCE - 53 ANOS - FOUPF a um intervalo de dez cortes distanciados um do outro por uma medida de 60 μm. Em lâminas, os cortes foram cobertos por lamínulas e analisados em Leica DM4000B (Wetzlar, Hessen, Alemanha). Avaliou-se a dentina com suas linhas incrementais e canalículos dentinários. Apenas em algumas amostras observou-se pequenos fragmentos de polpa dentária associados à pré-dentina. O cemento também se apresentou íntegro na análise de todos os períodos, com camadas de deposição e lacunas dos cementócitos visíveis. O tempo de preservação da estabilidade da polpa dentária varia de quatro dias a duas semanas, dependendo das mudanças ambientais. Três itens interferem na conservação da polpa dentária: condições de degradação do DNA post-mortem, condições em que foi feito o sepultamento e causa mortis. Os espécimes desta pesquisa estiveram submetidos a um processo de inumação, aspecto ainda mais relevante. Conforme descrevem alguns autores, nos dentes a infiltração de fungos na dentina não se apresenta nos primeiros 50 anos após a morte do indivíduo e a presença de tais fungos indica que o material não tem origem recente, embora seja possível haver hifas filamentosas entremeadas pelos túbulos dentinários em cadáveres de pessoas com tempo de morte bastante reduzido9. Estudo anterior avaliou a extração de DNA a partir de 50 dentes (polpa e tecidos duros). O DNA obtido a partir da polpa dentária variou entre 3 e 40 ug, e não houve correlação entre o período de armazenamento de amostras e da quantidade de DNA encontrado. Os autores investigaram a eficiência de extração de DNA de tecidos dentários duros, em diferentes concentrações de solução de descalcificação. O DNA obtido a partir de polpa dentária tinha elevado peso molecular, e foi susceptível à análise por multi-locus sonda ou PCR; o material obtido a partir de tecidos duros mostrou uma análise satisfatória apenas com a PCR20. Outro trabalho avaliou a durabilidade da saliva quando armazenados durante 7 e 180 dias. Na primeira etapa da pesquisa, a extração do DNA humano foi possível em 97,5% das amostras, enquanto na segunda fase, a extração foi possível em 100% dos casos. Isso resulta que se ocorre degradação do material armazenado, isso não diminui a qualidade do material para posterior análise de biologia molecular5. to de PCR foi obtido a partir de aqueles acima de 400 ºC20. Coletaram-se 48 elementos dentários (terceiros molares inclusos e semi-inclusos, íntegros e não expostos à atuação de qualquer estado patológico, não apresentando condições que levem à alteração tecidual) na Clínica de Cirurgia da Forp-USP. Destes, 24 pertenciam a homens e 24 a mulheres. Feita a extração, os dentes foram limpos com auxílio de gaze estéril e curetas odontológicas esterilizadas, para posterior conservação em geladeira (4ºC) até o momento de sua inumação. Em grupos de seis dentes obtidos de cada gênero, formando um total de 12 dentes por grupo de inumação, inumaram-se quatro grandes grupos, em solo comum, por períodos de 7, 30, 60 e 180 dias. O procedimento de inumação foi realizado em vasos de barro de 16 cm de altura, onde se colocou uma primeira camada de solo com altura de 4 cm. Os elementos dentários foram então depositados e cobertos por 12 cm de solo comum. Tal caracterização do solo é relevante, uma vez que as especificidades físico-químicas do meio ambiente da inumação influenciam na conservação e nas propriedades da dentina. Inumações em solos secos e alcalinos ou em valores próximos do pH alcalino facilitam a preservação dos remanescentes esqueléticos, em contraste aos solos úmidos, ácidos e que contenham fósforo em valores significativos. Os vasos sofreram a ação do tempo (sol, chuva e outras condições) em local aberto, no Centro de Medicina Legal da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da USP (Cemel-FMRP/USP). Terminados os tempos de inumação de cada grupo, os espécimes foram exumados e fez-se o processamento histológico do material (durante o período máximo de inumação – 180 dias – a temperatura média em Ribeirão Preto chegou a 25,4ºC e o índice pluviométrico em torno de 1.500 mm). Os dentes foram fixados por imersão em solução de formol a 10% durante 48 horas e descalcificados com solução de ácido fórmico a 5%, associado a um descalcificador elétrico de ossos (método eletrolítico). Após verificação de total descalcificação dos elementos dentários (tempo médio de descalcificação de aproximadamente 20 dias), estes foram retirados da solução descalcificadora e lavados em água corrente por 1 hora. As peças foram desidratadas em soluções de alcoóis, diafanizadas, incluídas em parafina e orientadas de modo a permitir cortes longitudinais de 6 μm de espessura, corados com hematoxilina-eosina. Obtiveram-se 20 cortes por bloco, correspondendo 24 Extração de DNA a partir de polpas dentárias humanas - revisão de literatura Discussão Quando os dentes são extraídos e armazenados à temperatura ambiente, uma rápida desidratação da polpa é observada. A uma temperatura acima de 200º raramente resultados bons são obtidos, mas em 100º por 10 minutos os resultados foram bons. Os dentes submersos na água oferecem os piores resultados de todas as séries. Nos dentes expostos ao ar livre verificaram-se melhores resultados que os enterrados. Não foram observadas diferenças entre o material obtido para análise nos dentes enterrados na areia ou no solo. Assim, a identificação por meio de exames genéticos é em si uma ferramenta importante e de confiança, mas, assim como a datiloscopia, ele precisa de registo ou a presença de algum descendente anterior7. Muitas técnicas existem para que o indivíduo seja identificado, porém ainda apresentam muitas limitações. As mais usadas são as impressões digitais, mas em casos de carbonização, ou em processos de putrefação, as digitais já não estão mais presentes e isto dificulta a identificação. Outro método é por análise comparativa que utiliza-se de fotografias, fichas médicas e odontológicas antes da morte. Por isso a importância de que os médicos e cirurgiões dentistas sempre mantenham atualizados os dados dos pacientes, como de todos os procedimentos neles realizados, para que sejam utilizados tanto na defesa como no auxílio de identificação. Registros dentários são um dos documentos que proporcionam um maior número de informações para executar o processo comparativo, oferecendo os detalhes e particularidades que tornam uma pessoa única9,13. Caso não se consiga identificar pelas impressões digitais ou por meio comparativo com radiografias, modelos de gesso e prontuários, existe a possibilidade do método genético, através da análise do DNA. O DNA pode ser extraído de amostras de sangue, esfregaço bucal, ossos, dentes, tecidos, órgãos, fio de cabelo, sêmen, urina, entre outros materiais biológicos. Dentre as inúmeras técnicas e procedimentos que o odontolegista pode executar para a identificação humana, está a identificação de DNA através de tecido pulpar, extraído de dentes das pessoas que sofreram algum tipo de acidente. A possibilidade de que duas pessoas tenham as mesmas sequências dos trechos de DNA é estimada em uma em seis bilhões12,22 A degradação biológica do DNA é feita por enzimas produzidas por fungos e bactérias, por causa da umidade e do calor. O DNA resiste bem ao calor - temperatura de até 100ºC não o destrói6. Devido a esta resistência contra as alterações ambientais (incineração, imersão, traumas, mutilação e decomposição), os dentes representam uma excelente fonte de DNA, quando as outras fontes biológicas forem perdidas. Além disso, devido ao fato de que a polpa dentária é rodeada por tecidos duros, o tecido não é facilmente modificado por influência de alterações na temperatura externa. Sendo assim, o tecido pulpar é mais comumente utilizado para análise na identificação de indivíduos, pois é geralmente abundante e tem menos chance de contaminação por DNA não humano11,14. Conclui-se que houve grande crescimento na área de Odontologia Forense no Brasil, e com este avanço as técnicas também melhoraram. É de suma importância que os profissionais da área da saúde sempre tenham atualizados os prontuários dos pacientes, para que diante de qualquer eventualidade possam contribuir, seja como defesa do profissional ou mesmo no método de comparação na identificação. As impressões digitais são um bom meio de identificação, mas quando não estão presentes outros métodos são requisitados, como a identificação por análise de DNA, forma mais precisa e de fácil aquisição. 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São José dos Pinhas: Editora Plena; 2014. p. 13-26. 26 CAPÍTULO III Preparo do canal radicular com lima única reciprocante WaveOne e Reciproc – revisão de literatura Root canal preparation with single file reciprocating system WaveOne and Reciproc – literature review Marilia Fagury Videira Marceliano-Alves1 Daniela Cristina Miyagaki2 Doglas Cecchin3 Miriam Lago Magro 4 Sandra Rivera Fidel5 Doutora em Endodontia – UERJ, Pós-doutoranda em Endodontia – Universidade Estácio de Sá, Professora do Curso de Especialização em Endodontia – OASD. Mestra e doutoranda em Endodontia – FOP-UNICAMP, Professora – FOUPF. 3 Doutor em Endodontia – FOP-UNICAMP, Professor – FOUPF. 4 Mestra em Endodontia, Professora – FOUPF. 5 Professora associada – UERJ. 1 2 ODONTO SCIENCE - 53 ANOS - FOUPF Preparo do canal radicular com lima única reciprocante WaveOne e Reciproc – revisão de literatura Introdução Capítulo de revisão / Review chapter Embora o objetivo do tratamento endodôntico se mantenha o mesmo, ou seja, a remoção de todo o conteúdo do canal radicular, eliminação de micro-organismos e seus subprodutos patológicos presentes no sistema de canais radiculares (SCR), novas ferramentas estão disponíveis no mercado a fim de oferecer segurança e simplificar este procedimento. Os conceitos descritos por Grossman13 (1970) e por Schilder24 (1974) continuam atuais. Deste modo, tanto a importância da limpeza mecânica, quanto a modelagem13 que permitia uma obturação tridimensional do SCR24, selando-o hermeticamente, continuam sendo considerados fatores importantes para o sucesso da terapia endodôntica. Desde então, inúmeras técnicas e instrumentos foram desenvolvidos para aprimorar e facilitar o tratamento. Os instrumentos rotatórios de NiTi foram introduzidos com a finalidade de facilitar os processos de limpeza e modelagem. Esses instrumentos oferecem vantagens sobre os tradicionais de aço inoxidável: são flexíveis31, apresentam capacidade de corte superior aos de aço inox15 e proporcionam uma melhor manutenção do formato original do canal. A lima de NiTi é uma realidade que vem auxiliando o profissional cada vez mais. Yared33 (2008) propôs a instrumentação do SCR utilizando-se apenas uma lima de NiTi, com a finalidade de reduzir o número de instrumentos rotatórios necessários para o preparo do canal, simplificar a técnica e, consequentemente, reduzir o custo operacional para a realização do tratamento endodôntico. A técnica propôs o uso apenas da lima F2 ProTaper (Tulsa Dentsply), em movimento reciprocante, após a patência manual com uma lima #08. Este foi o primeiro trabalho realizado com instrumento único. Com o sucesso do novo conceito, novas limas com o sistema de instrumentação com lima única foram desenvolvidas. Em 2011, os sistemas WaveOne (Tulsa Dentsply) e Reciproc (VDW) foram lançados. Tratam-se de instrumentos fabricados com uma nova liga de NiTi (M-Wire), que tem demonstrado um aumento na resistência à fadiga cíclica e melhores propriedades mecânicas, tornando mais segura sua utilização na rotina clínica34 (Figuras 1 e 2). Figura 1 - Instrumento R25 do sistema Reciproc. Figura 2 - Instrumento WaveOne Primary File. 28 Preparo do canal radicular com lima única reciprocante WaveOne e Reciproc – revisão de literatura Revisão de literatura grandes vantagens da técnica são a utilização de apenas um único instrumento para o preparo do canal radicular e a eliminação de possível infecção cruzada, visto que a lima deve ser descartada após seu uso. Em 2011 houve o lançamento dos sistemas WaveOne (Dentsply, Maillefer, EUA) e Reciproc (VDW, Munique), aprimorando a instrumentação com a técnica de uma única lima de NiTi aprimorada, com movimento recíproco. Os dois sistemas seguem os princípios da “força-balanceada” e prometem o “preparo perfeito até a obturação em três dimensões do canal radicular”. A simplificação deste preparo se deve ao uso de apenas um instrumento, além do domínio de canais curvos e atrésicos. A cinemática destes sistemas é reciprocante, que consiste em rotação no sentido anti-horário (direção de corte) seguido de uma rotação de menor amplitude no sentido horário (liberação do instrumento), favorecendo o avanço progressivo do instrumento até o comprimento de trabalho33, minimizando o estresse do instrumento durante o uso. Além disso, os ângulos de rotação, velocidade e torque são diferentes entre os sistemas e são fixados pelo fabricante no motor de cada sistema, não podendo, portanto, ser modificados7. Alguns autores consideram que o movimento reciprocante pode eliminar os riscos de fratura por torção, pois os instrumentos não estariam sujeitos ao estresse do movimento rotatório contínuo30,33. No que diz respeito à capacidade de limpeza, Franco et al.11 (2011) observaram que a lima rotatória de NiTi pode apresentar melhor performance quando utilizada em movimento oscilatório recíproco. Já outros autores não verificaram diferenças significativas na capacidade de limpeza ao comparar a sequência completa ProTaper rotatória com a lima única F2 ProTaper recíproca18. Por este motivo, não se justifica a utilização de toda a sequência, além de tornar o procedimento mais rápido. Burklein et al.7 (2012) avaliaram a capacidade de limpeza e modelagem dos dois sistemas recí- Rotação alternada ou recíproca A busca constante pelo aprimoramento da qualidade do preparo mecânico dos canais radiculares impulsionou a transição da instrumentação manual para a automatizada, e hoje, esta é uma realidade na prática clínica. São dois os sistemas automatizados disponíveis: os sistemas com movimento de rotação contínua, também denominados sistemas rotatórios, e os sistemas com movimento de rotação alternada ou recíproca. Os primeiros sistemas lançados foram: Giromatic (MicroMega), Dynatrack, W&H, Endo-Angle (UnionBroach) e Endolift (Kerr), com movimentos de entrada e saída, e com pequeno movimento rotacional alternado. Trabalhos comparativos foram desenvolvidos e os resultados mostraram que o preparo manual ainda era superior. Com o passar do tempo, a Endodontia evoluiu com o melhor conhecimento e compreensão da anatomia interna dos canais radiculares. Mudanças significativas no desenho e na metalurgia dos instrumentos facilitaram a dinâmica da instrumentação. Roane et al.22 (1985) introduziram o conceito de “força balanceada”. De Deus9 (1992) preconizou a técnica de “movimentos oscilatórios” como conjunto de manobras alternadas à direita e à esquerda, a fim de tornar mais efetiva a ação dos instrumentos nas paredes do canal radicular, tornando o preparo mais centralizado, com menos desvios apicais e permitindo que canais curvos pudessem ser ampliados com menor alteração do formato original do canal radicular. Yared33 (2008) introduziu o conceito de movimento alternado ou recíproco em motores para Endodontia, utilizando uma única lima de NiTi para preparar todo o canal radicular. A lima usada é a F2 ProTaper, em movimento oscilatório (recíproco), com ângulo do movimento no sentido horário maior que no sentido anti-horário. Com isso ocorre um avanço apical com mínima pressão apical. As 29 Marceliano-Alves MFV, Miyagaki DC, Cecchin D, Magro ML, Fidel SR. O conceito de “uso único”, introduzido com estes instrumentos, visam a proteção contra a contaminação cruzada, associada à dificuldade de uma adequada esterilização dos instrumentos endodônticos29. Mesmo após cuidadosa lavagem ultrassônica de limas utilizadas em preparo de dentes, pode-se observar a permanência de raspas de dentina nas superfícies das mesmas28. Nesse contexto, a proposta deste estudo é descrever, de acordo com a literatura, esses dois novos sistemas promissores no tratamento endodôntico com lima única: Reciproc e WaveOne, identificando suas características, que justificam seu uso na prática clínica. ODONTO SCIENCE - 53 ANOS - FOUPF Este tratamento térmico resulta em um material com as três fases cristalinas martensítica, R-Fase e austenítica, tornando-o mais elástico que as limas NiTi tradicionais e com maior resistência à fadiga cíclica1. Inicialmente, os primeiros sistemas que utilizam a M-Wire foram a Profile 25.04, o GT série X e Twisted Files. De modo geral, os autores consideram que esta nova liga de NiTi torna o instrumento mais flexível e ainda pode conferir maior resistência à fratura1,2,14,26,34. Capítulo de revisão / Review chapter procos, Reciproc e WaveOne, comparando-os aos sistemas rotatórios Mtwo e ProTaper. Mesmo utilizando uma única lima, a capacidade de limpeza dos recíprocos foi semelhante aos rotatórios, além da manutenção do formato do canal radicular por todos os sistemas. Outros autores também observaram menores alterações no formato do canal para o sistema WaveOne quando comparado ao sistema rotatório ProTaper4. Dagna et al.8 (2012) avaliaram diversos sistemas de NiTi (Mtwo, Revo-S, Reciproc e OneShape) em sua capacidade de desinfetar canais radiculares infectados com E.faecalis. Concluiu-se que tanto as técnicas de lima única quanto as sequenciais foram eficientes na redução da quantidade de bactérias. Devido às características inovadoras, a comunidade científica foi estimulada a conhecer a efetividade desses sistemas no preparo de canais radiculares. Estudos anteriores demonstraram que usando movimento recíproco assimétrico, a técnica é capaz de centralizar os canais radiculares, especialmente em casos de canais curvos. Além disso, o tempo de trabalho, o excesso de instrumentação, extrusão apical de detritos e incidência de fratura de instrumentos podem ser significativamente menores com instrumentos de NiTi com movimento recíproco do que com rotação contínua convencional. A fratura de instrumentos de NiTi gera uma grande preocupação e pode ocorrer de duas maneiras: fadiga do instrumento ou torção. Fratura por fadiga é o resultado de compressão e tensão repetidas no instrumento, especialmente em canais curvos, enquanto a fratura torção ocorre quando a ponta do instrumento prende e o restante continua a rodar. A incidência de fratura de lima NiTi é relatada sendo menor com movimento recíproco de rotação contínua. Com a técnica recentemente proposta, o instrumento trabalha sobre dentina em sua ponta, mas a rotação anti-horária imediatamente solta o instrumento, resultando na redução da deformação e fratura por torção. O uso do sistema Reciproc (VDW) Yared33 (2008) descreveu o sistema. Trata-se de uma técnica diferente por não utilizar lima manual e pré-alargamento previamente ao uso do sistema. Apenas um único instrumento é necessário para preparar e modelar o canal radicular, mesmo em canais atrésicos e curvos. Os instrumentos são fabricados em M-Wire, que proporcionam maior flexibilidade e resistência à fadiga cíclica do que as tradicionais ligas de NiTi. Possuem secção transversal em forma de “S”, incluindo três limas com diferentes tamanhos e conicidades (R25, R40 e R50). A seleção do instrumento deve ser de acordo com a radiografia: • R25 (0,25 mm de diâmetro e taper 0.08. Diâmetro em D16 = 1,05 mm) • R40 (0,40 mm de diâmetro e taper 0,06. Diâmetro em D16 = 1,10 mm) • R50 (0,50 mm de diâmetro e taper 0,05. Diâmetro em D16 = 1,17 mm) O sistema necessita de um motor específico (VDW RECIPROC silver ou gold) que apresenta programações para cada lima, possui pontas de papel absorventes e cones de guta-percha com as dimensões das respectivas limas. O motor gera movimento recíproco (oscilatório), com ângulos diferentes de rotação nos sentidos horário e anti-horário. Quando o instrumento é movimentado no sentido de corte de suas espiras, ele avança apicalmente, cortando a dentina. Durante o movimento contrário, ele se desprende da dentina, recuando no sentido apical. Entretanto, o ângulo do movimento no sentido de corte é maior que o ângulo do movimento no sentido contrário. Assim, verifica-se um avanço automático do instrumento através do canal ao fim de cada ciclo, sendo necessária uma mínima pressão no sentido apical. O ângulo do movimento no sentido de corte é sempre menor que o limite de elasticidade da lima, minimizando o risco de fratura. A liga M-Wire A M-Wire é um tipo de liga de NiTi fabricada sob tratamento térmico. O fabricante afirma que as características deste material quebram os padrões atuais de desempenho, tornando-o ideal para manufatura de instrumentos rotatórios. A liga M-Wire é de NiTi 508, e os instrumentos endodônticos são produzidos a partir de um fio “cru” submetido a tratamento sob tensão em diferentes temperaturas. 30 Preparo do canal radicular com lima única reciprocante WaveOne e Reciproc – revisão de literatura O uso do sistema WaveOne (Dentsply) O novo sistema WaveOne foi descrito por Webber et al.32 (2011) e, segundo os autores, representa um conceito de lima única/uso único capaz de atingir os objetivos mecânicos e biológicos do preparo dos canais radiculares. O sistema é composto por três instrumentos em liga M-Wire: • Small – amarelo (0,21 mm de diâmetro e taper 0,06 constante) • Primary – vermelho (0,25 mm de diâmetro e taper 0,08 de D1 a D3, diminuindo gradativamente de D4 a D16) • Large – preto (0,40 mm de diâmetro e taper 0,08 de D1 a D3, diminuindo gradativamente de D4 a D16) Apresentam duas secções transversais diferentes ao longo da parte ativa da lima: de D1 a D8 apresenta uma secção transversal triangular convexa modificada, e de D9 a D16, triangular convexa sem modificação. O instrumento gira em sentido reverso, ou seja, o sentido de corte é anti-horário e o passo é variável ao longo da parte ativa da lima. De acordo com os autores30, essas características tornam o instrumento mais flexível e mais seguro. O sistema conta com um motor WaveOne ou Smart Plus que reproduz o movimento recíproco. O ângulo do movimento no sentido anti-horário é cinco vezes maior que o ângulo do movimento no sentido horário. Assim, a cada três repetições, o motor promove um giro de 360o. As limas devem ser inseridas após a obtenção da patência foraminal. Quanto à alteração do comprimento de trabalho e manutenção da curvatura Também avaliando o sistema WaveOne, Berutti et al.5 (2012) pesquisaram a variação do comprimento de trabalho de 32 canais radiculares curvos de molares superiores. Para o preparo inicial dos canais foi utilizado o sistema PathFile (Dentsply-Maillefer) e então os canais foram instrumentados com a WaveOne Primary File (#25.08). A variação do comprimento de trabalho foi registrada pela mensuração da ponta da lima que ultrapassou o forame apical após o preparo, sendo subtraído o comprimento inicial. A diferença entre os ângulos de curvatura inicial de final foi avaliada pelo método de Schneider (1971)25. Os resultados mostraram que houve redução de 75% do comprimento de trabalho quando se utilizou o sistema testado (em média 0,14 mm). Os autores concluíram que tal fato se deveu à redução do ângulo de curvatura dos canais, que após o preparo se tornaram mais retos. Com o intuito de avaliar a manutenção da anatomia original, Berutti et al.6 (2012) realizaram um trabalho com o sistema WaveOne isolado ou após uso de instrumento guia (glide path). Para tal, foram utilizados 30 blocos, preparados com WaveOne com e sem o uso do PathFile. Foram superpostas imagens pré e pós-operatórias, processadas em programa de computador. Foram avaliados raio de curvatura e modificações no eixo do canal. Ao final, os resultados mostraram que a utilização de um instrumento guia reduz significantemente (p< 0.05) as variações anatômicas quando se utiliza o sistema WaveOne. Limpeza e modelagem Bürklein et al.7 (2012) compararam os sistemas Reciproc e WaveOne (lima única e movimento recíproco) e os sistemas ProTaper e Mtwo (rotação contínua). Para tal, 80 canais curvos foram preparados, sendo o batente apical padronizado em #35 (Mtwo), #30 (F3 Protaper) e #25 (Reciproc e WaveOne). Foram considerados tempo e a limpeza de paredes, utilizando MEV para avaliação. Os resultados mostraram que quanto ao tempo, o sistema Reciproc foi mais rápido, sendo seguido por WaveOne, não havendo significância entre Mtwo e ProTaper. Quanto à limpeza, foi visto que no terço apical Mtwo e Reciproc foram superiores, e nos cervical e médio, não houve diferenças entre WaveOne, Reciproc e Mtwo. Quando comparados todos os terços, o sistema ProTaper foi o menos eficaz. De modo geral, os autores concluíram que os sistemas testados mantiveram a Resistência torcional e a fadiga cíclica Johnson et al.14 (2008) avaliaram o sistema Profile 25.04 confeccionado em M-Wire. Para tal, os autores compararam estes aos Profile 25.04 em NiTi quanto à resistência em canais de aço inoxidável. Os instrumentos foram acionados em 300 RPM para o teste de fadiga cíclica, e para o de resistência torcio31 Marceliano-Alves MFV, Miyagaki DC, Cecchin D, Magro ML, Fidel SR. curvatura do canal, que Reciproc e Mtwo foram superiores quanto ao preparo, porém nenhum sistema promoveu total limpeza de paredes. Machado et al.17 (2013) compararam a capacidade de limpeza sobre o E. faecalis utilizando os sistemas reciprocantes WaveOne e Reciproc, oscilatórios ProTaper e Mtwo, e um controle com instrumentação manual. Não houve diferença estatística significativa entre os grupos. Capítulo de revisão / Review chapter ODONTO SCIENCE - 53 ANOS - FOUPF nal se fixou a ponta do instrumento e o acionou a 2 RPM, tendo o tempo registrado nos dois testes até a fratura. Os autores observaram que os instrumentos de M-Wire foram cerca de 400% mais resistentes à fadiga cíclica do que os de NiTi, mas quanto à resistência torcional eles se mostraram semelhantes. Também ao avaliar a fadiga cíclica de instrumentos em M-Wire, Al-Hadlaq et al.2 (2010) compararam com GT série X e Profile em NiTi convencional. Para o trabalho, foram utilizados 15 instrumentos 30.04 de cada sistema. As limas foram acionadas a 300 RPM em canais de aço simulados, sendo registrado o tempo até a fratura. Os resultados mostraram que o sistema GT série X precisou de maior número de ciclos até a fratura, logo apresentou maior resistência à fadiga cíclica quando comparados aos de NiTi convencional. De Deus et al.10 (2010) afirmam que a cinemática do movimento é um dos fatores mais importantes na determinação da resistência à fadiga cíclica de um instrumento endodôntico. Instrumentos ProTaper F2 apresentam resistência à fadiga cíclica consideravelmente superior quando acionados em movimento recíproco em comparação aos mesmos instrumentos acionados em rotação contínua. Varela-Platiño et al.30 (2010) compararam a durabilidade de instrumentos quando utilizados em movimento rotatório e recíproco. Como conclusão, observou-se que as limas usadas em movimento recíproco podem ser utilizadas em maior quantidade de vezes. Rodrigues et al.23 (2011) relataram que instrumentos de NiTi fabricados por torção apresentam maior resistência à fadiga cíclica que os instrumentos produzidos por usinagem. No mesmo ano, Shen et al.27 (2011) avaliaram os defeitos encontrados após simulação de uso de instrumentos de M-Wire: ProFile, Typhoon (TYP), Typhoon CM (TYP CM), DS-SS0250425NEYY (NEYY) e DS-SS0250425NEYY CM (NEYY CM) (DS Dental). Os instrumentos foram submetidos à simulação de uso até a fratura. A superfície fraturada foi avaliada em MEV, sendo considerados nas seções fraturadas: locais de início de fraturas e áreas com ondulações (fratura dúctil). Ao final, foi observado que os instrumentos de M-Wire apresentaram vários locais de início de fratura, enquanto os de NiTi apresentaram somente um, e ainda que as ondulações nas seções foram mais frequentes nestes. Os autores concluíram que até a fratura os instrumentos de M-Wire precisaram de maior número de ciclos, desta forma, podem ter maior vida útil. Os autores Ye;Gao34 (2012) realizaram um estudo a fim de avaliar as mudanças microestruturais em fios de M-Wire após simulação de uso. Foi testada a fadiga cíclica com 30 fios acionados a 300 RPM, e a avaliação se deu em quatro fases: estado inicial, após fadiga de 30, 60 e 90%. As amostras foram testadas em calorimetria diferencial de varredura, microdureza Vickers, e microscopia eletrônica de transmissão (MET). Os resultados mostraram não haver diferenças na temperatura entre os fios novos e usados, porém, diferenças significantes foram observadas na microdureza Vickers nas amostras fatigadas de 60 e 90% em comparação às novas e de 30%. Em MET foi evidenciado o crescimento dos grãos de martensita nas amostras de 60% fatigadas, um sinal de início de deformação. Os autores concluíram que os instrumentos em M-Wire são mais resistentes ao desgaste devido a sua microestrutura nano-cristalino martensítica. No mesmo ano, Kim et al.16 (2012) avaliaram os sistemas WaveOne e Reciproc quanto à resistência. Para avaliação da fadiga cíclica, foi construído um dispositivo metálico curvo simulado e, neste, o instrumento foi acionado em rotação alternada e contínua, em movimento de penetração e retrocesso até a fratura. Para avaliação da resistência torcional foi utilizado um torciômetro. Os resultados mostraram que de modo geral, os dois sistemas apresentaram boa resistência, porém o Reciproc parece ser mais resistente à fadiga cíclica e o WaveOne à resistência torcional. Gavini et al.12 (2012) demonstraram que o instrumento Reciproc R25, trabalhando em movimento recíproco, apresentou maior resistência à fadiga flexural quando comparado ao trabalho em movimento rotatório contínuo. Plotino et al.21 (2012) avaliaram a resistência à fadiga cíclica dos instrumentos Reciproc e WaveOne. Em canais artificiais padronizados, as limas eram acionadas até sua fratura. Como resultado, as limas Reciproc apresentaram maior resistência em relação ao outro grupo. Em outro artigo ainda no mesmo ano, Plotino et al.20 (2012) concluíram que os processos de fabricação das limas de NiTi com tratamento térmico, produzem limas mais resistentes à fadiga que os instrumentos tradicionais. Arias et al.3 (2012) analisaram a resistência à fadiga cíclica das limas Reciproc e WaveOne em dois pontos, 5 mm e 13 mm a partir da ponta ativa. As limas Reciproc se mostraram mais resistentes em 32 ambos os pontos. Park et al.19 (2013) comparou a velocidade de preparo entre Reciproc e WaveOne em molares curvos, e observou que a WaveOne foi ligeiramente mais rápida. Também avaliaram a possibilidade de reutilização dos dois sistemas e observaram em microscopia que as limas não sofreram alteração na sua estrutura mesmo após reutilizadas por 5 vezes. 3. 4. 5. 6. 7. Considerações finais 8. A Endodontia busca um constante aprimoramento em um sistema que proporcione uma melhor qualidade no resultado final, além de diminuir o tempo e o esforço físico do profissional. Diante disso, Reciproc e WaveOne apresentam um novo conceito de instrumentação. Sendo assim, esses instrumentos confeccionados em M-Wire, como nesses dois sistemas, tornam o instrumento mais flexível e ainda conferem maior resistência à fratura e à fadiga cíclica que os de NiTi convencionais, além de melhorar a centralização do preparo do canal, diminuindo o risco de transporte apical. Porém, esses sistemas foram desenvolvidos para uso único, devendo a lima ser descartada ao final do uso com o objetivo de prevenir a fadiga dos instrumentos e prevenir uma possível contaminação cruzada. É importante ressaltar que até o momento ainda não há um instrumento ideal. Nenhum instrumento ou técnica é capaz de remover por completo todo o conteúdo interno do sistema de canais radiculares. Como clínicos, devemos considerar e pesar as vantagens e desvantagens de qualquer nova técnica. Além disso, é imperativo que estejamos constantemente a procura de um melhor tratamento e estratégias para reduzir os riscos para o paciente. Os novos sistemas propostos através de um único instrumento parecem um método promissor, mas o caminho para um perfeito domínio da técnica é o treinamento e o conhecimento sobre a anatomia interna dos dentes e das características dos instrumentos e materiais que se pretende operar. 9. 10. 11. 12. 13. 14. 15. 16. 17. 18. 19. 20. 21. Referências bibliográficas 1. 2. 22. Alapati SB, Brantley WA, Iijima M, et al. Metallurgical characterization of a new nickel-titanium wire for rotary endodontic instruments. J Endod. 2009;35:1589-93. Al-Hadlaq SM, Aljarbou FA, AlThumairy RI. Evaluation of cyclic flexural fatigue of M-wire nickel-titanium rotary instruments. J Endod. 2010;36:305-7. 23. 33 Arias A, Perez-Higueras JJ, de la Macorra JC. Differences in cyclic fatigue resistance at apical and coronal levels of reciproc and WaveOne new files. J Endod. 2012;38:1244-8. Berutti E, Chiandussi G, Paolino DS, et al. 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São José dos Pinhas: Editora Plena; 2014. p.27-34. 34 CAPÍTULO IV Violência doméstica contra vulneráveis Domestic violence against vulnerable Catielma Nascimento Santos1 Graziela Oro Cericato2 Ramon Nazareno Menezes Andrade3 Henrique Damian Rosário4 Armando Koichiro Kaieda5 Luiz Renato Paranhos6 Mestranda em Odontologia – UFS. Professora Doutora – IMED. 3 Graduando em Odontologia – UFS. 4 Doutorando em Biologia Oral – USC. 5 Doutorando em Odontologia – FOP/UNICAMP. 6 Professor Adjunto – UFS. 1 2 ODONTO SCIENCE - 53 ANOS - FOUPF Violência doméstica contra vulneráveis Introdução A violência doméstica pode ser vista como qualquer ato ou omissão que cause déficit à integridade física e psicológica, liberdade ou direito ao desenvolvimento dos membros de uma família. Pode acontecer dentro ou fora do ambiente familiar e por qualquer indivíduo que exerça função de poder em relação ao agredido23. Apesar de não ser exclusivo de determinada classe, a violência doméstica ou familiar acontece em maior número em mulheres, idosos e crianças11. Apenas nos anos 80 a violência é percebida no Brasil como um problema de saúde pública a ser resolvido9,17. A violência como fator histórico e social mostra-se de diferentes maneiras, e devido às variações culturais, dificulta a formação de um conceito universal, mas traz consigo características comuns às diversas sociedades, como o emprego da força física, a submissão e a opressão psicológica19. A Constituição da República Federativa do Brasil (1988)5 institui que homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações e que ninguém deverá ser submetido à tortura nem a tratamento desumano ou degradante. Conforme alguns autores15, a estimativa no Brasil, em 1999, era de cada cem casos de agressão um se tornava homicídio. O Código Penal Brasileiro4, no Art. 129, descreve sobre crimes de lesão corporal de leve a gravíssimo, sendo que, o parágrafo nono refere-se exclusivamente à violência doméstica: Capítulo de revisão / Review chapter § 9o Se a lesão for praticada contra ascendente, descendente, irmão, cônjuge ou companheiro, ou com quem conviva ou tenha convivido, ou ainda, prevalecendo-se o agente das relações domésticas, de coabitação ou de hospitalidade: Pena - detenção de 3 (três) meses a 3 (três) anos. A violência doméstica abrange manifestações de violência de natureza física, sexual e psicológica que ocorrem na família, incluindo a agressão física a mulheres, crianças e idosos, o abuso sexual de crianças, violação, mutilação genital e outras práticas tradicionais lesivas às mulheres, violência não conjugal e violência relacionada com a exploração, prostituição forçada e violência perpetrada ou condenada pelo Estado. Atinge homens e mulheres de formas diferentes e em diferentes etapas da vida, provocando várias repercussões e problematizando um déficit ao sistema público de saúde. A Organização Mundial da Saúde (OMS) estima que no mundo, uma em cada três mulheres é, já foi, ou será vítima de violência doméstica28. Os cirurgiões dentistas (CDs) têm um papel importante no momento de identificar e intervir na violência doméstica, violência e negligência contra o vulnerável. Estudos revelam que 75% das vítimas de abuso possuem ferimentos na cabeça, na face, na boca e no pescoço e que, por isso, os CDs são os primeiros solicitados a dar os primeiros socorros quanto à manutenção da saúde bucal. Porém, a subnotificação da violência torna-se um problema, pois muitas vezes o profissional de saúde cuida sem tomar ciência que aquele paciente é vítima da violência doméstica18. Devido ao número crescente de violência doméstica praticada em mulheres, idosos e crianças, seja ela por familiares ou agregados, e que alguns desses golpes são atingidos na face causando déficit de função e estética, o tema abordado tem relevância tanto para a área da saúde como para a área jurídica, além da contribuição visível para estudantes, profissionais e sociedade em geral. Desta forma, este trabalho objetiva, por meio de uma revisão de literatura, fomentar o debate sobre violência doméstica contra vulneráveis e a importância do cirurgião dentista dentro desse contexto. Violência contra a mulher A violência de gênero tem sido bastante discutida na literatura, na qual debatem sobre violência física, psicológica, patrimonial, verbal e sexual que as mulheres podem sofrer. Tais violências geram lesões corporais e danos à integridade física, danos morais como humilhação e desprezo, furto e danos aos bens materiais, ofensas, injúrias e práticas sexuais forçadas19,28. Num contexto histórico, a participação do movimento feminista auxiliou na compreensão da perspectiva de gênero diante da violência contra a 36 maridos, deixando de denunciar por vergonha ou por medo de sofrer represália, o que dificulta aos profissionais de saúde auxiliarem na resolução do problema, além do que, a prevalência sobre a violência contra mulher fica subestimada30. A violência contra a mulher, dentre outros prejuízos (déficit na saúde pública, impactos pessoais, econômicos, familiares, sociais) é, antes de tudo, um atentado aos direitos humanos, além da diminuição da produtividade no trabalho, quando não, consequente desemprego, necessidade maior dos serviços sociais, bem como possíveis problemas físicos e mentais13. Segundo alguns autores32, para a saúde pública a violência segue quatro pontos, sendo estes: saber sobre o problema trabalhado como características e consequências da agressão no local seja ele nacional ou internacional; investigação da etiologia da violência; maneiras de preveni-la; e implementação de campanhas informativas e ações que promovam soluções para erradicá-la. A partir da Lei Maria da Penha (Lei nº 11.340/2006)7, os crimes cometidos contra as mulheres devem ser julgados nos juizados/varas especializadas de violência doméstica e familiar contra as mulheres, com competência civil e criminal, equipados com equipe multidisciplinar composta por psicólogos e assistentes sociais treinados para um atendimento totalizante, especializado e humanizado. O Brasil normatiza diretrizes para as políticas públicas, como a promoção de estudos e pesquisas com perspectiva de gênero; o respeito nos meios de comunicação social, aos valores éticos e sociais da pessoa e da família; a promoção e realização de campanhas educativas de prevenção à violência doméstica e familiar; a difusão da própria lei; a capacitação dos profissionais que trabalham com o tema; e inclusão nos currículos escolares e a disseminação dos valores éticos de respeito à dignidade da pessoa humana com perspectiva de gênero, raça e etnia26. Dessa forma, é válido afirmar que a violência doméstica contra a mulher caracteriza-se como um problema de saúde pública, pois atinge mulheres em geral, não importando classe social, raça, etnia, idade, escolaridade ou religião e com consequente aumento das taxas de morbimortalidade e agravo à saúde individual e coletiva no ambiente familiar29. mulher. Definir a violência como sendo de gênero assume uma relação hierárquica entre gênero masculino e feminino. Sendo assim, não cabe justificar a violência com problemas psicológicos, vícios (álcool e drogas), doenças ou até características relacionadas à índole do indivíduo20. Desde a década de 90, a preocupação dos estudiosos em relação à violência contra mulher tem aumentado. As pesquisas iniciaram buscando o tamanho do problema e com o avançar do tempo, também, às causas associadas e a participação da saúde pública nos desfechos dos casos25. Conforme Lucena et al.19 (2012), nos dados mundiais quase metade das mulheres mortas são por crimes passionais. Isso reflete um índice de 7% no montante de assassinatos de mulheres na faixa etária de 15 a 44 anos. A violência praticada contra mulheres não tem época nem limites geográficos29. Com o passar dos anos a agressão contra a mulher recebeu titulações diversas: em meados do século XX, intrafamiliar; década de 80, violência doméstica; década de 90, violência de gênero22. No Brasil, as agressões tornaram um problema para vários setores dos órgãos públicos e várias áreas do conhecimento, já que tornaram-se um risco para a vida humana24. De forma geral, a violência doméstica compete tanto à esfera jurídica, pois são advindas de atos dolosos, quanto aos domínios da saúde, pelos agravos físicos e psicológicos que ocasionam as vítimas11. Quando se fala em agressão física os números aumentam consideravelmente. Em certos países, chega-se a 69% o número de mulheres agredidas fisicamente e 47% violentadas sexualmente. No Brasil não é muito diferente. A violência contra mulher já está incluído como problema de saúde pública a ser resolvido19. A sociedade patriarcal influencia nas atitudes de terrorismo e violência contra a mulher. Como se alguns comportamentos vistos como inapropriados pelos homens e pela sociedade em geral, praticados pelas mulheres, servissem como gatilho ou desculpa para praticar a violência33. Em algumas sociedades fica clara a submissão da mulher, como as chinesas que desde criança são induzidas a bandarem os pés como padrão de beleza; as esposas sati, na Índia, e as mulheres no Afeganistão que são impedidas de estudar, passear ou trabalhar sem acompanhamento de um homem29. Embora em muitos lugares os números de denúncias têm aumentado, em outros, as mulheres continuam vivendo em subserviência aos pais ou Violência contra idosos Os idosos enfrentam grandes dificuldades no processo de envelhecimento decorrente das alte37 Santos CN, Cericato GO, Andrade RNM, Rosário HD, Kaieda AK, Paranhos LR. Violência doméstica contra vulneráveis Capítulo de revisão / Review chapter ODONTO SCIENCE - 53 ANOS - FOUPF de35. É possível detectar sinais e sintomas na criança vítima de maus tratos, como traumatismos dentais, fraturas nos ossos da face, alopecia, lesões simétricas em diferentes estágios de cicatrização, lacerações labiais, marcas de mordidas, queimaduras e doenças venéreas16. A violência contra crianças e adolescentes é um sério problema de saúde com possíveis consequências para o crescimento e desenvolvimento do indivíduo. O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) trouxe uma nova perspectiva para esse grupo tão vulnerável dando-lhe proteção integral, reconhecendo direitos e incumbindo a sociedade em geral de prevenir a ameaça ou violação desses direitos10. O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA)3 revela no artigo 5º que nenhuma criança ou adolescente será objeto de qualquer forma de negligência, de discriminação, de exploração, de violência, de crueldade e de opressão - punido na forma da lei qualquer atentado, por ação ou omissão, aos seus direitos fundamentais. rações fisiológicas que ocorrem com o passar dos anos. Com isso, surge a fragilidade e vulnerabilidade tendendo a torná-los vítimas em potencial da violência14. A violência contra o idoso pode ser física, sexual, psicológica, institucional, por abandono, por negligência e/ou econômica. A violência intrafamiliar, cada vez mais comum, caracteriza-se por ação ou omissão prejudicando a integridade física e psicológica, liberdade e direito à família do idoso27. Autores34 mostram nas pesquisas estudadas que a maioria das violências sofridas pelo idoso ocorre em suas próprias casas, sendo os filhos homens os principais agressores, seguido por nora, genros e cônjuges, podendo haver relação com o uso de drogas, álcool, dependência econômica, histórico de violência e doenças psiquiátricas. As pesquisas no Brasil sobre casos específicos de violência na terceira idade em seu ambiente familiar e sua etiologia ainda são bem escassas12. A maioria dos casos de violência continua invisível para a sociedade. É de comum entendimento que a violência é um problema privado, seguindo o raciocínio popular que em briga familiar ninguém opina e que deverá ser resolvido entre os envolvidos. Outra dificuldade encontra-se no fato que as faculdades de saúde não preparam seus alunos - futuros profissionais da saúde - para o manejo nos casos de violência e sua detecção, pois, muitas vezes, a violência é praticada por alguém de confiança do idoso, dificultando assim, a descoberta do problema. Dessa forma, os profissionais, mesmo que indiretamente, contribuem para a invisibilidade e resolução do problema1. Em 1994, o Brasil sancionou a Lei 8.842, a Política Nacional do Idoso, que depois se transformou em Política Nacional de Saúde do Idoso6 - Portaria MS 1.395/99. Esta garante os direitos fundamentais para a vida do idoso, bem como dita penas para os crimes mais comuns cometidos contra o idoso. O Artigo 4º do Estatuto do Idoso21 garante ao idoso não ser vítima de negligência, de discriminação, de violência, de crueldade ou de opressão, e que seus direitos estarão assegurados na forma da lei. O Estatuto do Idoso é um instrumento jurídico para a garantia de uma velhice mais tranquila. Violência doméstica e lesão facial No ranking de morbimortalidade no mundo, os traumas estão entre os primeiros colocados, destacando-se os traumas de face devido ao déficit emocional, funcional e até deformidade permanente. Esses traumas representam 7,4 a 8,7% dos atendimentos de emergência em hospitais, sendo uma consequência da exposição da face e menor proteção da região, levando assim, aos traumas mais graves2. Em crimes de lesão corporal, tanto em mulheres quanto em crianças e em idosos, há um comprometimento considerável do complexo estomatognático, mostrando assim, a importância do cirurgião dentista na identificação e prevenção de tais consequências da violência empregada em vulneráveis. Mesmo assim, é necessário aumentar os debates durante a graduação do profissional sobre o que fazer diante da violência doméstica31. Para os profissionais da saúde detectarem o abuso, precisam estar atentos às informações ditas pelas crianças ou pelos responsáveis no momento da anamnese e também na linguagem não verbal. Observar, por exemplo, marcas e sinais no corpo, além dos fatores de risco que possam confirmar a agressão sofrida. Toda suspeita deverá ser embasada em evidências, sendo importante a avaliação multidisciplinar da vítima para que possa auxiliar no processo de intervenção da violência8. Violência contra crianças O abuso infantil é um sério e comum problema em todo mundo, que pode ser visto por meio da negligência, da violência física, da emocional ou da sexual, resultando em danos à saúde da criança como também ao desenvolvimento de sua dignida38 Considerações finais 5. A violência doméstica - cada dia maior e sem resolução aparente - é um problema de saúde pública. É notável que a violência perpetuada contra vulneráveis possui similaridades entre si. Características como agressão física, sexual e psicológica se repetem tanto em mulheres, como em crianças e em idosos. Cabe ao sistema público de saúde ajudar as vítimas a superarem as sequelas da violência e aos profissionais de saúde (médicos, enfermeiros, psicólogos, cirurgiões dentistas entre outros) detectarem sinais de agressão durante as consultas para atuar sanando os machucados e ferimentos, bem como passar informação à vítima ou ao seu responsável sobre as medidas que deverão ser tomadas. Nos casos de violência doméstica, tanto os profissionais da saúde como os departamentos jurídicos devem trabalhar mutuamente para facilitar os procedimentos burocráticos e assegurar a recuperação da saúde (física e/ou mental) da vítima. Após o início da vigência da Lei Maria da Penha, do Estatuto da Criança e do Adolescente e do Estatuto do Idoso, os direitos das mulheres, crianças e idosos, respectivamente, ficaram mais nítidos e resguardados. No Brasil, as denúncias devem ser feitas nas Delegacias Especiais de Atendimento a Vulneráveis (DEAGVs), no qual estas mantêm registros sobre a evolução da violência doméstica no Brasil, divulgam informação para que as pessoas, não somente as vítimas, mas vizinhos ou conhecidos, possam fazer a denúncia. É importante ressaltar que a informação deverá ser estendida aos estudantes dentro das universidades durante a formação acadêmica do profissional de saúde para que eles possam, ao receberem o paciente vítima de violência doméstica, identificar e notificar aos órgãos competentes. 6. 7. 8. 9. 10. 11. 12. 13. 14. 15. 16. 17. 18. 19. Referências bibliográficas 1. 2. 3. 4. 20. Apratto Júnior PC. A violência doméstica contra idosos nas áreas de abrangência do Programa Saúde da Família de Niterói (RJ, Brasil). Ciência & Saúde Coletiva. 2010 nov; 15 (6): 2983-95. Aranega AM, Ponzoni D, Garcia-Júnior IR, Clície SV, Magro-Filho O. 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São José dos Pinhas: Editora Plena; 2014. p. 35-40. 40 CAPÍTULO V Lesões orais frequentemente diagnosticadas durante o tratamento ortodôntico Oral lesions often diagnosed during orthodontic treatment Elói Eustáquio Souza1 Anderson Paulo Barbosa Lima2 Tadeu Evandro Mendes-Júnior2 Tadeu Evandro Mendes3 Geraldo Eugênio Marchiori3 Luiz Renato Paranhos4 Aluno do Curso de Especialização em Ortodontia – INAPÓS. Clínica Privada. 3 Professor do Curso de Especialização em Ortodontia – INAPÓS. 4 Professor Adjunto – UFS. 1 2 ODONTO SCIENCE - 53 ANOS - FOUPF Lesões orais frequentemente diagnosticadas durante o tratamento ortodôntico Introdução Na Ortodontia, assim como em qualquer outra especialidade, os clínicos devem ser capazes de reconhecer e identificar estruturas normais, variações da normalidade e lesões. A cavidade oral é uma região de fácil acesso e a maioria das lesões pode ser identificada facilmente15. Dentro do leque das inúmeras patologias que acometem o sistema estomatognático, algumas são mais frequentes, principalmente antes e após tratamento ortodôntico, tais como processos proliferativos não neoplásicos13, processos harmatomatosos14, cistos e tumores odontogênicos6,7,9, lesões fibro-ósseas1,10 e neoplasias malignas15. A higiene bucal pode ficar comprometida durante o tratamento ortodôntico e isso contribui para a formação de lesões gengivais, como os processos proliferativos gengivais não neoplásicos que clinicamente assemelham-se com tumores, por exemplo, hiperplasia fibrosa inflamatória, granuloma piogênico, fibroma ossificante periférico e lesão periférica de células gigantes. Essas lesões, dependendo de alguns fatores — como o tempo de evolução, constituintes histopatológicos e condições bucais — podem ser reversíveis, em alguns casos, por meio da orientação sobre higiene bucal e da terapia periodontal básica13. Processos harmatomatosos também remetem a lesões com aparência tumoral, entretanto, elas surgem durante o desenvolvimento do órgão ou do tecido14. Pode-se ilustrar como exemplo o harmatoma pericoronal que é caracterizado por espaço radiolúcido em torno da coroa de um dente não erupcionado14. A presença de lesões intraósseas deve ser investigada pelo ortodontista antes do tratamento por meio de exames imaginológicos. Um grupo de lesões relativamente frequente são os cistos e tumores odontogênicos, que são lesões exclusivas da cavidade oral. O cisto dentígero e o tumor ceratocístico odontogênico são os mais comuns. O tratamento para o cisto dentígero é conservador, embora seja discutido muito na literatura a mesma abordagem para o tumor ceratocístico odontogênico, em função das recorrências dessa lesão6,7,9. Lesões fibro-ósseas benignas são lesões caracterizadas pela substituição do tecido ósseo normal pelo tecido fibroso, com aspecto trabecular irregular1,10. Dentre esse grupo destacam-se a displasia fibrosa óssea monostótica (envolvimento de um osso) e poliostótica (múltiplos ossos), displasia cemento óssea e fibroma ossificante central1,10. Por fim, a ocorrência de neoplasias malignas intra-ósseas, embora não sejam frequentes, devem ser pesquisadas. Dentre esse grupo, o carcinoma mucoepidermoide intra-ósseo é o tumor maligno mais comum das glândulas salivares em localização intra-óssea. O prognóstico dessa lesão depende de vários fatores, tais como gradação histológica, estadiamento, invasão e envolvimento de estruturas adjacentes15. Nota-se uma lacuna na literatura de uma abordagem mais específica para os ortodontistas a respeito de lesões intraorais mais frequentes no momento da abordagem do paciente antes de iniciar o tratamento ortodôntico. Assim, é escopo do presente trabalho realizar uma revisão da literatura a respeito das lesões mais comuns e, discutir o melhor manejo do paciente pelo ortodontista. plásicos8,13. De uma forma geral, os processos proliferativos não neoplásicos caracterizam-se clinicamente pelo crescimento tecidual exofítico, séssil ou pediculado, de coloração rósea a eritematosa, podendo apresentar-se ulcerados e com sangramento espontâneo. Ocorrem mais predominantemente na segunda década de vida, atingindo mais jovens do gênero feminino, possivelmente por causa de efeitos vasculares dos hormônios femininos. O tratamento normalmente empregado é a excisão cirúrgica, as- Capítulo de revisão / Review chapter Revisão de literatura Respostas gengivais hiperplásicas e inflamatórias durante o tratamento ortodôntico são comuns, podendo levar a complicações e requerendo terapia periodontal. O granuloma piogênico e a hiperplasia gengival inflamatória são crescimentos teciduais de origem inflamatória, com graus variados de tecidos granulosos e fibrosos inflamatórios, decorrente possivelmente de irritação crônica de baixa intensidade, denominando-se processos proliferativos não neo42 sociada à remoção dos fatores irritativos locais. Entretanto, o reconhecimento e a identificação desses fatores nem sempre são possíveis e a taxa de recorrência das lesões é relativamente alta8,13. Pedron et al.13 (2010) relataram um caso clínico de uma paciente melanoderma do gênero feminino, com 20 anos de idade, que após 6 meses de tratamento ortodôntico compareceu à clínica particular, queixando-se de alterações gengivais. Ao exame clínico, foi observada lesão de aspecto tumoral, de coloração eritematosa, formato irregular, superfície lisa, de base pediculada. Essa estava localizada em região edêntula, entre os dentes 23 e 25, sob trauma de oclusão, com tempo de evolução de uma semana, iniciando-se por nódulo na região. As hipóteses diagnósticas eram de granuloma piogênico, hiperplasia gengival e lesão periférica de células gigantes. A lesão foi removida na sua totalidade e o diagnóstico histopatológico foi granuloma piogênico. A outra lesão foi observada entre os dentes 41 e 42, caracterizada por moderado aumento gengival, de coloração rósea, base séssil, superfície lisa, a partir da papila e alcançando os bráquetes, com hipótese diagnóstica de hiperplasia gengival inflamatória. O diagnóstico foi de hiperplasia fibrosa. No pós-operatório de 7 dias, foram removidos o cimento cirúrgico e as suturas remanescentes. A paciente foi avaliada após 20 dias, apresentando reparação satisfatória na região entre os dentes 41 e 42. Dessa forma, percebe-se que o aparelho ortodôntico pode dificultar a higiene bucal e contribuir para a formação de lesões gengivais, como os processos proliferativos gengivais não neoplásicos. Essas lesões, dependendo de alguns fatores — como o tempo de evolução, constituintes histopatológicos e condições bucais — podem ser reversíveis, em alguns casos, por meio da orientação sobre higiene bucal e da terapia periodontal básica. Outro grupo de lesões que são comuns no dia a dia da clínica odontológica são as lesões ulceradas. As úlceras orais constituem um tipo de lesão que possui elevado índice de prevalência na mucosa oral, sendo sua prevalência bastante variável - em torno de 4,6% a 30,7%. Estes tipos de lesões, na maioria das vezes, possuem aparência clínica similar, no entanto, a sua etiopatogenia pode ser variada. A etiologia pode ser local por meio de irritação mecânica, malignidade e reações adversas a fármacos ou representar uma manifestação de diversas patologias sistémicas, tais como doenças mucocutâneas, gastrointestinais e infeciosas16. São lesões de diagnóstico relativamente fácil e podem representar manifestações de doenças locais ou sistêmicas de etiologias infecciosa, imunológica, neoplásica ou traumática. A história clínica do paciente determinará se as lesões são agudas ou crônicas, únicas ou múltiplas, primárias ou recorrentes. As ulcerações aftosas recorrentes e aquelas de natureza traumática são mais frequentes na boca. Durante a terapia ortodôntica pode ocorrer o aparecimento de lesões ulceradas na mucosa oral. O diagnóstico correto dessas lesões é imprescindível para se descartar outras doenças importantes de natureza não traumática. O diagnóstico diferencial, realizado por meio da análise de todas as causas possíveis de ulceração da cavidade oral, é necessário para estabelecer um tratamento apropriado a cada paciente que apresente úlceras orais. Assim, faz-se necessária a eliminação do fator agressor causador da lesão e a aplicação de fármacos adequados, vislumbrando a reparação tecidual rápida e o alívio dos sintomas inflamatórios5,8. A presença de lesões intraósseas é frequente no aparelho estomatognático e devem ser avaliadas pelo ortodontista antes do tratamento por meio de exames imaginológicos, dentre eles as radiografias11,12. As radiografias são exames complementares rotineiramente incluídas para a elaboração do plano de tratamento ortodôntico. Tem sido relado que mais de 90% dos ortodontistas solicitam radiografias lateral de crânio e panorâmicas para os seus pacientes4. A radiografia lateral de crânio fornece imagens a respeito da morfologia dentofacial e do tecido mole e sua contribuição para a má oclusão. Por outro lado, as radiografias panorâmicas são utilizadas para detectar a falta de elementos dentais como também a presença de supranumerários, avaliar o padrão de erupção e mau posicionamento de dentes. A radiografia panorâmica é também um instrumento para a detecção de patologias presentes em tecidos ósseo e mole4. É de especial interesse para o ortodontista ter conhecimento da frequência de achados incidentais de patologia ou anormalidade em um paciente ortodôntico, porque em muitos casos, tais resultados podem requerer tratamento médico ou odontológico prévios12. Mattick et al.12 (1999), em um estudo retrospectivo, verificaram o valor diagnóstico de radiografias de rotina intraorais na avaliação ortodôntica. Para tal, dois ortodontistas avaliaram 1169 radiografias (670 do gênero feminino e 499 do masculino) de pacientes jovens (8 a 15 anos de idade). Vinte e dois 43 Souza EE, Lima APB, Mendes Jr TE, Mendes TE, Marchiori GE, Paranhos LR. Lesões orais frequentemente diagnosticAdas durante o tratamento ortodôntico Capítulo de revisão / Review chapter ODONTO SCIENCE - 53 ANOS - FOUPF casos não tinham dados clínicos completos. Trinta e oito casos exibiram dentes supranumerários, 53 ausência de algum elemento dental, 126 tinham dentes ectópicos, 24 reabsorção radicular, 11 patologia periapical e 128 anormalidades na coroa. Assim, os autores sugerem que uma cuidadosa examinação clínica deve ser feita antes das radiografias e a qualidade das radiografias devem ser boas o suficiente para que não prejudique a análise. Na Suíça, Bondemark et al.4 (2006) avaliaram a prevalência e a localização de lesões patológicas em radiografias panorâmicas antes de iniciar o tratamento ortodôntico. Foram analisados 496 pacientes, sendo 232 do gênero feminino e 264 do masculino. Desse total, 56 pacientes exibiram alguma patologia, sendo a mais comum esclerose idiopática em 22 casos, espessamento da mucosa em seio com 15 casos e lesões inflamatórias periapicais em 10 pacientes. Cisto dentígero esteve presente em 3 casos e odontoma em 2 casos. Embora os autores não precisem o número, eles salientam que a maioria das lesões foram identificadas na mandíbula. Assim, reforçam que os ortodontistas devem estar atentos às radiografias panorâmicas para detectar anormalidades ou patologias durante a avaliação pré-tratamento ortodôntico. Kuhlberg; Norton11 (2003) realizaram um estudo retrospectivo na University of Connecticut School of Dental Medicine. Eles analisaram radiografias panorâmicas e cefalogramas de 396 pacientes da clínica de Ortodontia da instituição. Dos 396 casos, apenas 26 tinham alguma alteração. Dentre as patologias, destacaram-se 3 casos de cistos dentígeros, 1 caso de displasia fibrosa e 1 odontoma. A frequência desses achados demonstra a importância de revisar cuidadosamente as imagens radiográficas por patologias ou anormalidades. Uma abordagem sistemática por parte dos ortodontistas para examinar as radiografias faz-se necessária para avaliar cada região anatômica com cuidado3. Ainda sob esse aspecto, Deboni et al.7 (2012) relataram casos de cistos e tumores odontogênicos em crianças diagnosticadas durante a avaliação ortodôntica. O primeiro caso é de uma criança com 8 anos de idade com aumento de volume na mandíbula acompanhado de dor. Na radiografia panorâmica, foi observado uma lesão cística unilocular radiolucente com bordas escleróticas associadas ao incisivo lateral, canino e primeiro e segundo molar. O exame histológico revelou que se tratava de um cisto dentígero. A lesão foi removida cirurgicamente e após um ano de acompanhamento, iniciou-se o tratamento ortodôntico. O segundo caso trata-se de uma criança de 10 anos com aumento de volume da mucosa alveolar em região de primeiro molar direito a canino inferior direito. Foi solicitado o exame complementar radiográfico e verificou-se na radiografia panorâmica uma área radiolúcida na mandíbula direita com bordas escleróticas, acompanhada de deslocamento do canino, primeiro e segundo pré-molares inferiores direito. Após a biópsia, o diagnóstico de tumor odontogênico ceratocístico foi estabelecido. Após dois anos de acompanhamento, sem sinais de recidiva, instaurou-se o tratamento ortodôntico. Os autores salientam a importância do diagnóstico dessas lesões para que possa iniciar com segurança a abordagem ortodôntica. A cooperação entre cirurgião, patologista e ortodontista por vezes é crucial. Quintella et al.14 (2008) relataram que uma criança de 8 anos do gênero feminino possuía o primeiro molar inferior esquerdo não irrompido. Na radiografia notou-se um espessamento radiolúcido em torno da coroa. Removeu-se cirurgicamente e o laudo histopatológico foi de harmatoma pericoronal. O tratamento ortodôntico foi instaurado seis meses após a cirurgia e durou 14 meses. Aos 17 anos de idade, ocorreu semelhantemente com o segundo molar inferior esquerdo e uma nova abordagem ortodôntica foi realizada com sucesso. Outra lesão intraóssea não muito comum, mas que requer atenção é a displasia fibrosa. Displasia fibrosa é uma doença, congênita e benigna, que provoca desgaste ósseo e crescimentos ou lesões em um ou mais ossos do corpo humano. Essas lesões são crescimentos semelhantes a tumores que consistem na substituição do osso medular pelo tecido fibroso, causando a expansão das áreas e enfraquecimento dos ossos envolvidos. Especialmente quando envolvendo ossos do crânio ou face, as lesões podem causar deformidades visíveis externamente. A displasia fibrosa pode afetar um osso (monostótica) ou mais de um osso (poliostótica) e pode estar associada a uma rara síndrome de McCune-Albright1. Akintoye et al.1 (2003) avaliaram 36 pacientes com displasia fibrosa dos quais 10 estavam sob tratamento ortodôntico. Eles analisaram dosagem dos hormônios da glândula pituitária, tireoide, paratireoide, adrenal e gonadal, além de exames clínicos e imaginológicos. Os pacientes foram acompanhados por 12 meses. Nenhum paciente sob tratamento or44 Lesões orais frequentemente diagnosticAdas durante o tratamento ortodôntico todôntico desenvolveu alterações, embora tenham notado uma dificuldade na movimentação nas lesões mais escleróticas. A displasia fibrosa é um processo harmatomatoso que pode se tornar instável mediante aos estímulos externos, como a movimentação mecânica ortodôntica. Assim, os autores concluem que a displasia fibrosa não foi exacerbada pelas terapias de rotina da Odontologia (restaurações, movimentação ortodôntica) e que os pacientes devem ser proservados e acompanhados com exames imaginológicos periódicos. Em outra situação, o ortodontista pode se deparar com lesões que envolvem os quatro quadrantes do paciente, dentre elas o querubismo. O querubismo é uma doença não neoplásica rara que afeta os maxilares causando destruição significativa e desfiguração. A doença afeta também a erupção normal, oclusão e função do complexo dentoalveolares. O querubismo assemelha-se radiográfica e histologicamente à lesão central de células gigantes e displasia fibrosa10. Kau et al.10 (2012) relataram um caso de uma menina de 15 anos de idade, sem sinais evidentes de inchaço facial ou indícios de querubismo. A paciente exibia má oclusão, que incluía a erupção ectópica e deslocamentos dentais causados pela lesão. Iniciou-se o tratamento com interferon. Paralelamente, iniciou-se o tratamento ortodôntico para regularizar a má oclusão. O tratamento ortodôntico durou 26 meses. Neoplasias malignas podem acometer locais intraósseos e isso exige maior atenção do clínico. Tumores de glândula salivar são relativamente incomuns e, consequentemente, um número substancial dessas lesões é diagnosticada em um estágio mais avançado. O carcinoma mucoepidermoide é o tumor maligno mais comum nos ossos maxilares15. No Brasil, Rocha et al.15 (2010) relataram dois casos de pacientes com carcinoma mucoepidermoide. No primeiro caso, o paciente tinha a lesão em palato duro sem alteração nos linfonodos. A radiografia panorâmica não mostrou alteração óssea. Por meio da biópsia confirmou-se o diagnóstico de carcinoma mucoepidermoide. No segundo caso, a lesão também era em palato duro e a radiografia panorâmica não revelou alterações dignas de nota. Foi confirmado o diagnóstico de carcinoma mucoepidermoide por meio de biópsia. Ambos os casos foram encaminhados por ortodontistas. De acordo com os autores, os ortodontistas detectaram alterações à inspeção clínica intraoral. Os autores ainda reforçam que os ortodontistas podem também participar no processo de diagnóstico, além de contribuírem para o tratamento e reabilitação do paciente. A abordagem multidisciplinar é essencial para obter sucesso no tratamento e um melhor prognóstico para o paciente. Todos os cirurgiões dentistas, seja qual for sua especialidade, podem fazer um exame clínico correto e reconhecer lesões orais. Tratamentos ortodônticos geralmente duram por anos, com pacientes retornando mensalmente para consultar com o ortodontista; assim, estes profissionais têm grande responsabilidade no reconhecimento de lesões orais em sua fase inicial. Consequentemente, os ortodontistas podem contribuir para o diagnóstico precoce, o que converge para um tratamento adequado e bom prognóstico. Quintella et al.14 (2008) enfatizaram a importância da cooperação entre ortodontista, patologista e cirurgião no reconhecimento de lesões orais para o sucesso do tratamento. Além de um exame clínico correto, uma adequada anamnese com um histórico médico completo são extremamente importantes e pode evitar erros de diagnóstico. Os exames complementares, como as radiografias panorâmicas, podem ser úteis no processo de diagnóstico. No entanto, os raios X não substituem um exame clínico perceptivo, pois a lesão pode afetar apenas o tecido mole15. Há inúmeras lesões que acometem os tecidos moles, mas os processos proliferativos não neoplásicos são os mais comuns na clínica odontológica. Dentre os processos proliferativos não neoplásicos, os mais frequentes são a hiperplasia gengival inflamatória e o granuloma piogênico. O fibroma periférico, a lesão periférica de células gigantes e a hiperplasia gengival medicamentosa também fazem parte desse grupo, contudo em menor prevalência13. Pedron et al.13 (2010) relataram um caso clínico em que a paciente exibiu duas lesões, sendo uma granuloma piogênico e a outra hiperplasia fibrosa. Em linhas gerais, a etiopatogenia de ambas as lesões está relacionada ao trauma crônico de baixa intensidade, representado na maioria dos casos pela inflamação e infecção gengivais causadas pela dificuldade de remoção do biofilme dental no paciente portador de aparelho ortodôntico. O trauma durante a fixação do aparelho ortodôntico e sua persistência, promovendo áreas de pressão, causa o espessamento do epitélio e proliferação do teci45 Souza EE, Lima APB, Mendes Jr TE, Mendes TE, Marchiori GE, Paranhos LR. Discussão Capítulo de revisão / Review chapter ODONTO SCIENCE - 53 ANOS - FOUPF do conjuntivo, o que resulta em aumento tecidual. O possível processo alérgico desencadeado pelo monômero da resina acrílica da base dos aparelhos ortodônticos removíveis, quando associado à presença de Candida albicans, também pode provocar a proliferação tecidual13,16. As úlceras orais possuem uma etiologia variada, o que representa um desafio quando se pretende a determinação do diagnóstico clínico definitivo. As úlceras traumáticas são uma das lesões mais comuns dos tecidos moles da cavidade oral. As lesões são consideradas traumáticas, uma vez que se originam devido a uma irritação mecânica, térmica, elétrica ou química, existindo, portanto, uma relação causa-efeito. O trauma provocado por um dente fraturado ou pelo trauma contínuo de um aparelho ortodôntico pode ser a origem deste tipo de traumatismo. As úlceras provocadas pela terapia ortodôntica são caracterizadas por dor aguda de intensidade moderada e por área central branca ou amarelada com um halo eritematoso. Lesões autoinfligidas podem, por vezes, ser observadas na mucosa oral de crianças e pacientes com alterações mentais. As úlceras traumáticas podem ser também causadas por escovação inadequada e mordida pós-anestesia da língua e lábio. O paciente pode também provocar úlceras traumáticas por meio da mordida da mucosa inadvertidamente ou devido ao hábito inconsciente13. Atualmente, os ortodontistas dispõem de poucos recursos para prevenir ou aliviar as lesões da mucosa bucal. A irritação tecidual das extremidades, causadas por arcos de nivelamento, pode ser reduzida por meio do cuidadoso corte no extremo distal do arco e desgaste quando eles emergem da porção distal dos acessórios ortodônticos. Vários são os medicamentos que podem ser utilizados para diminuir as lesões inflamatórias decorrentes do trauma causado pelo uso do aparelho ortodôntico. No que concerne à via de administração, preferem-se os medicamentos de uso tópico, ou seja, aqueles de ação local. Um dos principais medicamentos utilizados no controle e na redução das ulcerações da mucosa bucal são os anti-inflamatórios, como o Omcilon-A e a triancinolona13. A presença de lesões intraósseas é frequente no aparelho estomatognático e devem ser avaliadas pelo ortodontista antes do tratamento por meio de exames imaginológicos11,12. Os profissionais de saúde utilizam a radiografia para detectar e diagnosticar patologias ósseas. Os ortodontistas, em particu- lar, dependem de exames radiográficos para avaliar as características do crânio-facial dos pacientes e para refinar a identificação de problemas e o planejamento do tratamento. Radiografias cefalométricas fornecem dados quantitativos relativos à morfologia dentoesqueléticas e sua contribuição para a má oclusão. Adicionalmente, as radiografias panorâmicas fornecem dados qualitativos para a detecção de patologias em tecidos duro e mole. A frequência com que um ortodontista pode esperar para descobrir patologia ou anomalias é de interesse específico para o clínico11. Ao analisar a literatura, constataram-se poucos trabalhos verificando a frequência de patologias ósseas diagnosticadas antes do tratamento ortodôntico. Mattick et al.12 (1999) notaram que dos 1169 casos, 380 exibiam alguma alteração. Dessas, apenas 11 eram patologias periapicais (menos que 1%). Semelhantemente, Kuhlberg; Norton11 (2003) ao estudar 396 casos, constataram que 5 (1%) tinham alguma patologia óssea. O mais frequente foi o cisto dentígero7. O cisto dentígero é o segundo tipo mais comum de cisto odontogênico. Normalmente é associado à coroa de dentes inclusos ou em desenvolvimento, geralmente os terceiros molares. A maioria dos pacientes com um cisto dentígero está na segunda ou terceira década de vida. Os cistos dentígeros originam-se inicialmente da proliferação e transformação cística de ilhas de epitélio no tecido conjuntivo da parede do folículo dentário, e este epitélio transformado une-se com o epitélio folicular e forma um cisto solitário ao redor da coroa do dente. Caso não ocorra a epitelização, pode-se tratar de um harmatoma pericoronal2,7. Quintella et al.14 (2008) relataram um caso de harmatoma pericoronal em que iniciou-se o tratamento ortodôntico após a remoção da lesão. Dois métodos indicados para o tratamento de cistos dentígeros são a enucleação e a marsupialização. A enucleação é indicada quando não existe risco de danificar as estruturas anatômicas, tais como ápices de dentes vitais, seio maxilar ou o nervo alveolar inferior. Marsupialização pode manter o dente impactado nesta cavidade e promover a sua erupção. A marsupialização é, especialmente, útil para cisto dentígero em dentes deslocados2,7. Por outro lado, existem lesões ósseas menos frequentes e que requerem muita atenção no diagnóstico e acompanhamento do paciente, como a displasia fibrosa e o querubismo. 46 Lesões orais frequentemente diagnosticAdas durante o tratamento ortodôntico Considerações finais Akintoye et al.1 (2003), ao analisar 36 pacientes com displasia fibrosa, notaram que o tratamento ortodôntico pode ser instaurado sem prejuízo ao paciente. Percalços podem ocorrer caso a displasia fibrosa esteja acompanhada por outras patologias como oligodontia, hipoplasia de esmalte, taurodontismo entre outros, o que exigirá do ortodontista um planejamento mais refinado. O manejo de pacientes com querubismo varia entre indivíduos. Ele oscila de uma abordagem conservadora a uma cirurgia mais radical. O tratamento ortodôntico pode ser utilizado como um tratamento de suporte e ajudar a manter e estabilizar a oclusão, bem como para corrigir deformidades dentais resultantes da lesão ativa. A preocupação de mover os dentes usando tratamento ortodôntico e o seu efeito sobre o comportamento da lesão precisam ser discutidos. No entanto, o tratamento ortodôntico permite o reposicionamento do dente ectópico e impactado. Escassas são as informações na literatura sobre a possibilidade de movimentação ortodôntica de dentes em pacientes com querubismo ativo nos maxilares e seu prognóstico. Na literatura, Kau et al.10 (2012) reforçaram que este é o primeiro relato de caso que apresenta um paciente diagnosticado com querubismo em tratamento ortodôntico sem complicações. Por fim, tumores de glândula salivar são neoplasias relativamente raras, afetando predominantemente as glândulas salivares maiores, sendo a maioria benigna. Os carcinomas das glândulas salivares têm etiologia desconhecida e podem ser agressivos quando o diagnóstico é tardio. O carcinoma mucoepidermoide é o tumor maligno mais prevalente, compreendendo cerca de 36% a 59% de todos tumores de glândulas salivares orais malignas. Rocha et al.15 (2010) discutiram dois casos de carcinoma mucoepidermoides identificados antes de iniciar o tratamento ortodôntico. Ambos os pacientes receberam tratamento adequado e tiveram um bom prognóstico devido ao rápido reconhecimento dessas lesões orais por seus ortodontistas. Evidentemente, não se inicia a terapia ortodôntica enquanto a lesão não for removida e não apresentar sinais de recidiva. Acompanhamento clínico regular com exames orais adequados são meios adequados para detectar lesões bucais, tais como tumores da glândula salivar, na sua fase inicial, e uma abordagem multidisciplinar é essencial para a obtenção do sucesso do tratamento e um bom prognóstico. Diante do exposto, conclui-se que os processos proliferativos não neoplásicos e cistos odontogênicos, como o cisto dentígero, são as lesões mais frequentemente diagnosticadas durante o exame clínico que antecede a terapia ortodôntica. A abordagem cirúrgica para a remoção dessas é necessária, e logo após, pode iniciar a movimentação ortodôntica. Em alguns casos, como a displasia fibrosa, não se faz a remoção da lesão e pode-se iniciar a abordagem ortodôntica, desde que se faça acompanhamento imaginológico periódico. Embora raras, algumas neoplasias malignas podem ser diagnosticadas e quando o ortodontista as identifica precocemente, o prognóstico para o paciente é melhor. 1. 2. 3. 4. 5. 6. 7. 8. 9. 10. 11. 12. 13. 47 Akintoye SO, Lee JS, Feimster T, Booher S, Brahim J, Kingman A, et al. Dental characteristics of fibrous dysplasia and McCune-Albright syndrome. Oral Surg Oral Med Oral Pathol Oral Radiol Endod, 2003; 96(3):275-82. Al-khateeb TH, Bataineh AB. 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Lesões orais frequentemente diagnosticadas durante o tratamento ortodôntico. In: Linden MSS, Carli JP, Magro ML, Trentin MS, Silva SO, organizadores. Odonto Science: 53 Anos FOUPF. São José dos Pinhas: Editora Plena; 2014. p. 41-48. 48 CAPÍTULO VI A autopercepção da saúde em idosos e os desafios para a Odontologia Self-perception of health among elderly community and the challenges for Dentistry Claudia Trentin Lampert1 Cristina Ribas Teixeira2 Pricila Welter3 Yasmim Guedes Maurer4 Silvana Alba Scortegagna5 Mauro Dal Zot Dutra6 Eduardo Sandini Linden7 Mestranda do Programa de Pós-Graduação em Envelhecimento Humano, bolsista Taxa/Capes – UPF. Mestranda do Programa de Pós-Graduação em Envelhecimento Humano – UPF. 3 Acadêmica do Curso de Psicologia, bolsista Probic/Fapergs – UPF. 4 Acadêmica do Curso de Psicologia, bolsista Pibic/CNPq – UPF. 5 Doutora em Psicologia – USF, Docente do Programa de Pós-Graduação em Envelhecimento Humano – UPF. 6 Mestre em Prótese Dentária, Professor – FOUPF. 7 Especialista em Periodontia. 1 2 ODONTO SCIENCE - 53 ANOS - FOUPF A autopercepção da saúde em idosos e os desafios para a Odontologia Introdução A população idosa brasileira tem aumentado rapidamente. Segundo as projeções estatísticas da Organização Mundial de Saúde (OMS), até o ano de 2025, o grupo de idosos no Brasil deverá ter aumentado em quinze vezes, ocupando o sexto lugar quanto ao contingente de idosos, alcançando cerca de 32 milhões de pessoas com 60 anos de idade ou mais3. O crescimento demográfico desta população exige a preparação adequada do país para atender às novas demandas, principalmente àquelas voltadas à saúde integral do idoso. Nesta perspectiva, a 2ª Conferência Nacional de Saúde3 aponta a saúde bucal como parte integrante e inseparável da saúde geral, ampliando o conceito de atenção à saúde e incluindo todas as dimensões da vida do indivíduo. A partir disso, a Diretriz Nacional de Saúde Bucal1 destaca como um de seus objetivos o aumento da proporção de brasileiros idosos a alcançar um nível satisfatório de saúde bucal, enfatizando-a como um fator decisivo para a manutenção de uma boa qualidade de vida. Para tanto, as ações na atenção à saúde integral, destinadas a esta população, demandam conhecimentos sobre a senescência e suas implicações na clínica2. No processo de envelhecimento, constatam-se alterações fisiológicas e metabólicas em órgãos, aparelhos e tecidos, ocorrendo com isso processos clínicos muitas vezes irreversíveis21. Algumas condições clínicas fisiológicas podem estar presentes na cavidade bucal do idoso, como a redução da capacidade gustativa, alterações nas glândulas salivares/xerostomia, alterações no periodonto e alterações nos dentes/uso de próteses e implantes13. Há também determinadas enfermidades comuns ao paciente idoso, como câncer, artrite, diabetes e mal de Parkinson, que apresentam consequências bucais para as quais o cirurgião-dentista deve estar atento, a fim de minimizar interferências no tratamento odontológico13. A assistência ao idoso deve observar a complexidade clínica decorrente do envelhecimento como comorbidades, mecanismos de adaptação, vulnerabilidade orgânica, apresentação atípica de doenças e maior suscetibilidade à iatrogênia14. Desse modo, o objetivo deste texto é apresentar e discutir alguns aspectos relacionados a autopercepção da saúde em idosos, e os desafios para a Odontologia. Capítulo de revisão / Review chapter Revisão de literatura gativos e prejudiciais para os idosos15. A perda dos dentes é um dos problemas bucais mais frequentes e, quando permanentes, influencia na digestão, gustação, na pronúncia e estética13, o que traz danos psicológicos. Tais condições podem afetar a autoimagem do paciente, a autoestima, o relacionamento interpessoal, além de desenvolver sentimento de inferioridade e levar à depressão. Todavia, a ocorrência de uma mudança gradual no perfil de saúde bucal do idoso que, apesar dos altos índices de edentulismo, aponta uma tendência de maior manutenção dos dentes naturais pela população que está envelhecendo, aumenta a complexidade de cuidados pessoais e de atenção profissional14. Diante disso, a manutenção contínua da saúde bucal das populações até a velhice torna-se um desafio, sendo necessária a busca por novos sentidos e práticas em saúde4. A elaboração dessas práticas deve pautar-se na Um dos grandes dilemas para a atenção ao idoso advém do fato de que quanto mais envelhecem, mais diferentes se tornam as pessoas. O agrupamento de indivíduos com histórias biológica, psíquica e social distintas, em uma mesma faixa etária, resulta em grande heterogeneidade de características e demandas. O atendimento, portanto, requer um olhar e um interagir com a compreensão da individualidade do idoso14, assim como exige do profissional cirurgião-dentista habilidade para identificar e manejar as necessidades emocionais do paciente, geradas em razão do desequilíbrio no estado de saúde bucal. Outros problemas, como a diminuição da capacidade mastigatória, a dificuldade de deglutição, a secura na boca, as modificações no paladar e a perda de dimensão vertical têm efeitos cumulativos ne50 concepção do envelhecer como um processo complexo e, principalmente, considerar os determinantes biológicos, econômicos, sociais e emocionais que intervêm de forma singular na vida de cada indivíduo. Desse modo, deve-se averiguar suas crenças, seus hábitos e suas atitudes que foram construídos ao longo da vida e perfazem as percepções que tem de si mesmo e de sua saúde. Tais concepções poderão orientar a conduta do idoso frente ao autocuidado e a sua expectativa quanto às intervenções em saúde e, sendo assim, cabe aos profissionais conhecê-las para o desenvolvimento de adequadas medidas e ações. bucal deve considerar diferentes aspectos. Em vista disso, o modelo teórico proposto por Gift et al. e adaptado por Martins et al.9 sugere a autoavaliação em saúde bucal por meio de fatores objetivos e subjetivos associados. Este sistema avaliativo prevê uma relação de retroalimentação entre cinco subgrupos de variáveis (ambiente externo, características individuais, comportamentos relacionados à saúde, condições objetivas e subjetivas de saúde) e a autoavaliação da saúde geral e bucal. O ambiente externo (local de residência e sistema de atenção à saúde) e as características individuais (demográficas, predisposição e disponibilidade de recursos) influenciam os comportamentos relacionados à saúde (uso de serviços, autocuidado e hábitos). Os comportamentos, por sua vez, podem predizer ou serem consequência das condições objetivas (geral e bucal) e subjetivas (geral, bucal e qualidade de vida) relacionadas à saúde. As características individuais, os comportamentos relacionados à saúde interferem significativamente na avaliação das condições objetivas e subjetivas de saúde, e estão relacionados à formulação da autopercepção de saúde e de qualidade de vida. Conhecer os determinantes da autopercepção pode auxiliar no diagnóstico e tratamento do paciente idoso e nos processos de avaliação das expectativas frente ao atendimento odontológico. Esses indicadores podem servir como instrumento epidemiológico e para identificar as necessidades desta população e, consequentemente, resultar em ações de cunho curativo, preventivo e educativo20. Reconhecendo a autopercepção da saúde bucal no idoso como um fator que interfere na busca pelos serviços odontológicos, várias pesquisas foram desenvolvidas. Um estudo buscou conhecer a percepção da condição bucal em 201 idosos dentados, pela aplicação de questionário com perguntas voltadas para a autoavaliação da situação bucal. Os resultados apontaram que a percepção da condição bucal é um importante indicador de saúde, pois sintetiza a condição de saúde objetiva, as respostas subjetivas, os valores e as expectativas culturais. Contudo, houve um contraste entre a autoavaliação da condição bucal e a condição clínica, em que o idoso teve uma visão positiva, mesmo com seus dados não sendo satisfatórios. Isto revela que as pessoas utilizaram critérios diferentes dos usados pelo cirurgião-dentista para avaliar sua condição bucal. Assim, a percepção de saúde bucal pode estar relacionada com o meio social em que a pessoa vive e Autopercepção da saúde bucal O desenvolvimento de medidas de promoção e prevenção em saúde que objetivam melhorias na condição de vida dos idosos, configura-se numa prática em saúde bucal. Sendo assim, uma área a ser explorada é a das ações de educação com ênfase no autocuidado. Para tanto, é importante abordar a autopercepção dos idosos acerca da saúde bucal20. Entende-se como autopercepção a interpretação das experiências e do estado de saúde no contexto da vida diária, baseada na informação e nos conhecimentos de saúde e doença, normas sociais e culturais8. O conhecimento sobre a autoavaliação da saúde da população contribui para orientar decisões políticas e sociais que tenham como meta a qualidade de vida e não meramente a saúde física. Conhecer os determinantes da autoavaliação da saúde bucal é fundamental para entender o comportamento dos indivíduos e como os mesmos avaliam as suas necessidades9. Nesse sentido, o acesso às necessidades de tratamento odontológico poderia ser realizado por meio de uma abordagem “sócio-dental”18. Nesta abordagem, os principais subsídios seriam as estimativas clínicas das necessidades compreendidas; as percepções subjetivas, incluindo a necessidade de tratamento percebida; o impacto na saúde bucal em relação às dimensões funcionais, psicológicas e sociais e propensão do indivíduo a adotar comportamentos de promoção da saúde. Na avaliação das condições de saúde, torna-se imprescindível considerar as percepções clínicas, advindas do profissional quanto às percepções subjetivas do pacientes, que englobam os sentimentos e satisfações sobre sua aparência dentária, as dimensões psicossociais e o bem-estar relacionado à saúde. Do mesmo modo, a autoavaliação em saúde 51 Lampert CT, Teixeira CR, Welter P, Maurer YG, Scortegagna SA, Dutra MDZ, Linden ES. A autopercepção da saúde em idosos e os desafios para a Odontologia Capítulo de revisão / Review chapter ODONTO SCIENCE - 53 ANOS - FOUPF com fatores subjetivos16. Outra pesquisa buscou identificar os fatores associados à autoavaliação negativa da saúde bucal dos idosos brasileiros, utilizando a base de dados do inquérito de Saúde Bucal do Brasil (Projeto SB Brasil), realizado pelo Ministério da Saúde nos anos 2002/2003. Os resultados mostraram o predomínio da autoavaliação positiva, mesmo esta sendo antagônica, tendo em vista as precárias condições objetivas de saúde apresentadas pelos idosos, pois além do edentulismo que atinge metade da população idosa, a análise dos dentados mostrou que a maioria apresentava poucos dentes remanescentes e necessidade de tratamento9. Também utilizando a base de dados do Projeto SB Brasil10, objetivou-se analisar a autopercepção em idosos dentados e edentados. Os resultados apontaram que quanto menor o número de dentes presentes, maior a autopercepção da saúde como positiva. Isto se deve ao fato de os idosos avaliarem mais positivamente sua saúde bucal, estando livres de dentes cariados e possivelmente de doenças, do que com a manutenção de poucos dentes em precárias condições, em número insuficiente e sem acesso à prótese para assegurar uma mastigação eficiente e confortável. Houve, também, associação entre ausência de sensibilidade dolorosa e autopercepção positiva da saúde bucal. Como se pode constatar, a perda dos dentes assume diversos significados subjetivos, e interfere na autopercepção da saúde e na autoimagem do idoso. Além das consequências na saúde física, a perda dos dentes pode acarretar problemas psicológicos19. Igualmente, a perda dentária ou o uso de próteses inadequadas podem implicar em impactos negativos na qualidade de vida, especialmente no que se refere ao estresse decorrente de problemas na boca17. Assim sendo, o tratamento não deve somente estar relacionado aos cuidados com a recuperação estética e funcional, mas também restaurar o autoconceito do paciente e tratá-lo como um ser inteiro, com características singulares. A falta de percepção quanto à necessidade de tratamento odontológico, tanto por parte do paciente idoso, como pelos seus familiares, é a principal causa para a não procura por serviços odontológicos13. No entanto, há diferentes percepções relacionadas aos motivos que fazem com que idosos não procurem regularmente o dentista, como a falta de tempo, o medo, o uso de prótese total e a falta de sintomatologia dolorosa4. Ao conhecer os fatores que interferem diretamente nas percepções e condutas, os profissionais envolvidos no cuidado ao idoso devem incluir a atenção à saúde odontológica. Isso requer não apenas a conscientização do idoso, mas da família e dos cuidadores sobre a importância da saúde bucal no envelhecimento, e na permanência de uma vida física, social e emocional mais saudável possível. Desafios à saúde integral dos idosos Alcançar o envelhecimento dignamente é um desejo de qualquer sociedade, porém só representará uma conquista social quando for traduzido por uma melhor qualidade de vida7. Contudo, ainda há muitos conceitos acerca do envelhecimento que precisam ser superados. Entre eles está o estigma de que a população idosa é naturalmente doente, sendo muitas vezes a ideia que o próprio indivíduo tem de si, não reconhecendo suas necessidades de saúde14, em que o edentulismo e condições precárias da dentição, assim como o adoecimento, ainda parecem ser considerados parte do processo “normal” de envelhecimento9. Para que esses conceitos e crenças sejam esclarecidos, a informação e a orientação básica da população constituem os meios mais efetivos para modificar a autopercepção em relação aos aspectos de saúde14. Considerando a saúde bucal como parte indissociável à atenção à saúde integral do idoso, os novos desafios encontram-se em romper com esta associação entre uma boa autopercepção de saúde bucal enquanto as condições clínicas a apontam como precária e necessitando de tratamento. No Brasil, a oferta de serviços odontológicos aos idosos, na área pública, ainda é restrita, e isso pode acarretar falhas na percepção da realidade de saúde desta população16. Por isso, o melhor entendimento das interações entre a autoavaliação da saúde bucal e o ambiente externo, as características individuais, o comportamento relacionado à saúde, as condições objetivas e subjetivas de saúde que interferem no comportamento dos idosos e na busca pelos serviços em Odontologia são fundamentais9. Este entendimento por parte dos profissionais desta área pode servir como o primeiro passo na elaboração de uma programação que inclua ações educativas, voltadas para o autodiagnóstico e o autocuidado, além de ações preventivas e curativas, visando a qualidade de vida no envelhecimento9,16,18. O investimento em ações preventivas destinadas à saúde necessitam estar voltadas para a aten52 ção integral em saúde, disponibilizando informações e orientações quanto ao cuidado no decorrer de todo o processo do envelhecimento. Com isso, a incorporação de hábitos e de modos de vida mais saudáveis requer uma postura ativa e consciente da população, enfatizando-se que o indivíduo saiba o que é importante para sua saúde, para assim, solicitar os serviços. A partir disso, podem ocorrem mudanças de atitudes pessoais, que são pré-requisitos para a reivindicação de medidas específicas e sua aceitação. Particularmente, em relação à saúde bucal em idosos, esse aspecto é fundamental para que os indivíduos e seus familiares e/ou cuidadores mantenham a motivação para o autocuidado e o seguimento de prescrições profissionais14. A valorização do autocuidado, com a higiene pessoal, incluindo a higiene bucal, somente ocorre quando o indivíduo mantém sua autoimagem como um aspecto importante da vida. Uma boa autoestima é importante para que ocorra mudança de hábitos no processo de promoção de saúde e para a utilização de serviços de saúde, incluindo os cuidados odontológicos14. É importante salientar que a autoavaliação da saúde bucal pode se alterar ao longo da vida, ao longo de um dia ou de uma semana, em razão do seu estado físico, psicológico e de condições contextuais. Portanto, captar a subjetividade do bem-estar e do adoecer, e quantificar o que é subjetivo pode ser limitado9. Nesse sentido, conhecer a autopercepção do idoso, suas motivações e expectativas diante dos cuidados em saúde é de suma importância para o trabalho do odontólogo e dos demais profissionais de saúde envolvidos. O papel da Odontologia em relação aos idosos é manter os pacientes em condições de saúde bucal para que não comprometam a alimentação nem tenham repercussões negativas sobre a saúde geral e sobre seu estado psicológico12. Por isso, há a necessidade de proporcionar maior qualidade de vida no envelhecimento, enfocando os aspectos físico, social e psicológico. Para oferecer um serviço integral em saúde, cabe ao profissional uma boa comunicação com o paciente para que se extraiam dele todas as informações desejadas, proporcionando-lhe confiança e incentivar o autocuidado e, assim, aumentar a sua satisfação em relação ao atendimento13. Os profissionais devem conhecer sobre as percepções dos idosos quanto às suas condições de saúde, e objetivar mudanças benéficas para que ocorra a pro- moção da saúde bucal. Entre as modificações, deve incentivar a busca pelo serviço odontológico como uma condição para que os idosos possam usufruir de uma vida com qualidade4. A postura do profissional odontólogo e a relação dentista-paciente é um fator determinante neste processo de mudanças da autopercepção dos idosos quanto a sua saúde bucal. Dessa forma, a função principal do cirurgião-dentista é manter uma boa condição de saúde bucal de seu paciente por meio de um contato frequente com o mesmo, conscientizando-o sobre os cuidados adequados para manter um comportamento de saúde. O papel do cirurgião-dentista não deve se limitar somente a execução do tratamento bucal, mas precisa recair sobre uma boa relação com o paciente e ter capacidade de empatia para poder identificar as situações geradoras de estresse e medo11. A empatia está relacionada em perceber os componentes emocionais de uma outra pessoa, se colocar no lugar desta, sem ser, no entanto, o outro6. Além disso, o cirurgião-dentista não pode deixar de observar o seu próprio comportamento e estar atento aos aspectos técnicos da prática odontológica, e aos efeitos desta no comportamento do paciente, dos acompanhantes e sobre si mesmo5. Os desafios à saúde integral dos idosos começam a partir da ideia da formação de profissionais. Um profissional dentista para lidar com essa população deve estar preparado de forma mais ampla e aberta, frente à responsabilidade de seu trabalho, não voltado apenas para a eliminação de doença, e sim à procura de qualidade de vida, necessitando ver o idoso de forma globalizada. Isso requer não apenas o estudo específico odontológico, mas também o entendimento da área de gerontologia e de um trabalho multidisciplinar. Considerações finais Os desafios à Odontologia, diante do processo de envelhecimento humano, é garantir a saúde bucal como parte importante da saúde geral e promovedora de qualidade de vida. Para tanto, há a necessidade de rever conceitos e transformar paradigmas presentes na sociedade e na própria visão do idoso, principalmente àqueles associados à normalidade do edentulismo e às doenças bucais como parte integrante da velhice. As ações em saúde devem acompanhar todo o ciclo vital do indivíduo, e incluir a promoção e pre53 Lampert CT, Teixeira CR, Welter P, Maurer YG, Scortegagna SA, Dutra MDZ, Linden ES. A autopercepção da saúde em idosos e os desafios para a Odontologia ODONTO SCIENCE - 53 ANOS - FOUPF venção em saúde bucal. O conhecimento das percepções dos indivíduos quanto a sua saúde bucal, a avaliação dos determinantes subjetivos e objetivos que interferem na busca por serviços odontológicos devem ser contemplados no planejamento e na execução das práticas dos profissionais de saúde. Considera-se que as medidas preventivas, promovedoras e reabilitadoras em saúde bucal devem fazer parte do atendimento integral do idoso, auxiliando-o por meio de ações educativas e promovedoras do autocuidado. 15. Silva SRC, Valsecki Júnior A. Avaliação das condições de saúde bucal dos idosos em um município brasileiro. Rev Panam Salud Publica/Pan Am J Public Health 2000; 8(4):268-71. 16. Silva SRC, Fernandes RAC. Autopercepção das condições de saúde bucal por idosos. Rev Saúde Pública 2001; 35(4):349-55. 17. Silva ME, Villaça ÊL, Magalhães CS, Ferreira EF. Impacto da perda dentária na qualidade de vida. Ciênc Saúde Colet 2010; 15(3):841-50. 18. Tsakos G. 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Como citar este capítulo: Lampert CT, Teixeira CR, Welter P, Maurer YG, Scortegagna SA, Dutra MDZ, Linden ES. A autopercepção da saúde em idosos e os desafios para a Odontologia. In: Linden MSS, Carli JP, Magro ML, Trentin MS, Silva SO, organizadores. Odonto Science: 53 Anos FOUPF. São José dos Pinhas: Editora Plena; 2014. p. 49-54. 54 CAPÍTULO VII Angina de Ludwig: aspectos anatômicos, etiologia e abordagem multidisciplinar Ludwig’s Angina: anatomical aspects, etiology and multidisciplinary approach Alessandra Kuhn-Dall’Magro1 Nathália Louize Nunes Vieira Silva2 Jonathan Lauxen3 Renato dos Santos4 Túlio del Conte Valcanaia5 Saulo Cocio Martins Filho6 Eduardo Dall’Magro7 Especialista em CTBMF – Santa Casa/POA, Mestre em Ciências Médicas – UFRGS, Professora dos Cursos de Pós Graduação em CTBMF – CEOM e IOA, Membro do Corpo Clínico – HSVP/RS e IOT/RS. 2 Aluna de Graduação – FOUPF. 3 Cirurgião-Dentista – FOUPF. 4 Aluno do Curso de Especialização em CTBMF – CEOM – HSVP/RS. 5 Especialista e Mestre em CTBMF – UFPel, Doutor em CTBMF – PUC/RS, Professor Titular – UNIVALI, Professor de CTBMF – Faculdade Avantis, Coordenador do Curso de Especialização em Implantodontia – Faculdade Avantis. 6 Médico graduado – PUC/RS, Mestre e Doutor em Medicina (Pneumologia) – UFRGS, Membro do Corpo Clínico – HSVP/ RS – Especialidade de Cirurgia Torácica. 7 Especialista em Prótese Dentária – USP, Mestre em Laser em Odontologia – USP, Mestre e Doutor em Materiais Dentários – UNICAMP, Professor Titular III – FOUPF. 1 ODONTO SCIENCE - 53 ANOS - FOUPF Angina de Ludwig: aspectos anatômicos, etiologia e abordagem multidisciplinar Introdução A Angina de Ludwig (AL) é um processo infeccioso caracterizado por uma celulite do tecido conectivo cervical e assoalho de boca, de rápida disseminação, normalmente proveniente de uma infecção dentária. O termo “angina” origina-se do latim angere que significa estrangular. Descrita inicialmente por Wilhelm Friedrich von Ludwig (1836), promove aumento de volume firme, consistente e não flutuante, provocando o enrijecimento do assoalho bucal, dificuldade na deglutição, elevação da língua e risco de obstrução das vias aéreas2,3,27. O paciente tem sensação de sufocamento associado à sialorreia, disfagia, dispneia, trismo, entre outros sintomas28. O diagnóstico precoce é parte determinante do prognóstico da doença, pois se combatida com terapêutica adequada nos estágios iniciais, não há tempo para comprometimento das vias aéreas, nem para disseminação para estruturas vitais, diminuindo o risco de morte do indivíduo. O tratamento consiste em manutenção das vias aéreas, drenagem da supuração, remoção da causa, analgésicos e antibióticos2,3,12,27,28,29. Este trabalho tem como objetivo realizar uma revisão de literatura sobre o tema AL com ênfase nos aspectos anatômicos, etiológicos e na abordagem multidisciplinar de tratamento. Capítulo de revisão / Review chapter Revisão de literatura • Primários: Os espaços primários são representados na maxila pelos espaços canino, bucal e infratemporal; e na mandíbula pelos espaços submentual, bucal, submandibular e sublingual (Figuras 2A-F)28. • Secundários: São representados pelos espaços: massetérico, pterigomandibular, temporal superficial e profundo, lateral da faringe, retrofaríngeo e pré-vertebral (Figura 3)28. Anatomia da face e espaços fasciais: As fáscias As fáscias da cabeça e pescoço são folhas de tecido conectivo denso que circundam músculos e oferecem pouca resistência à disseminação das infecções29. Breves características atômicas das fáscias são descritas abaixo, de acordo estudo referencial de anatomia de Dubrul7 (1991) (Figura 1). • Fáscia cervical superficial: formada pelo tecido subcutâneo, se estende da região zigomática ao tórax e axilas, circunscrevendo os músculos da expressão facial e platisma. Nesta camada existem vasos sanguíneos e linfáticos, e nervos7. • Fáscia cervical profunda: é dividida em 3 camadas: superficial, média e profunda. A camada superficial envolve os músculos esternocleidomastóideo, trapézio, glândulas submandibular e parótida. A camada média é subdividida em duas, a porção muscular, que envolve os músculos anteriores da tireoide e a porção visceral, que envolve glândula tireoide, esôfago, faringe, laringe e traqueia. A camada profunda também se subdivide em duas, a fáscia pré-vertebral e alar7. Os espaços fasciais Os espaços fasciais podem ser divididos em primários e secundários27,28. Figura 1 – Espaços fasciais do pescoço24. 56 A B C D E F Figura 2 – Espaços fasciais primários. A) Espaço canino. B) Espaço bucal. C) Espaço infratemporal. D) Espaço submentual. E) Espaço sublingual. F) Espaço submandibular10. 57 Kuhn-Dall’Magro A, Silva NLNV, Lauxen J, Santos R, Valcanaia TC, Martins Fo SC, Dall’Magro E. Angina de Ludwig: aspectos anatômicos, etiologia e abordagem multidisciplinar ODONTO SCIENCE - 53 ANOS - FOUPF mices e também fungos como Candida Albicans. Micro-organismos resistentes são na maioria anaeróbios facultativos, que sobrevivem com escassez de nutrientes e elevada patogenicidade21. A infecção dissemina-se rapidamente acometendo os espaços sublingual, submandibular e submentoniano. Essa disseminação pode se estender pelo mediastino, com consequências graves. Promove um aumento de volume firme, consistente e não flutuante no soalho de boca e região supra-hioidea, acompanhado de elevação e deslocamento posterior da língua, atinge a região do pescoço podendo comprometer as vias aéreas. Queixas álgicas somadas à restrição de movimentos do pescoço, disfagia, disfonia, disartria e sialorreia estão entre os principais sintomas. A principal causa é a infecção dentária, contudo, há relatos de piercings linguais, contatos com animais, condições sistêmicas debilitantes, como diabéticos, aidéticos, transplantados, desnutridos, alcóolatras, toxicômanos, entre outras, que podem favorecer a evolução do processo32,35,40. O plano de tratamento da Angina de Ludwig consiste em manutenção das vias aéreas, antibioticoterapia, drenagem da infecção e remoção da causa. A contaminação dentária é dada por micro-organismos aeróbios, anaeróbios e facultativos encontrados na cavidade bucal, como Cocos Gram-positivos Staphylococcus e Streptococcus; Cocos Gram-negativos Neisseria; Bacilos gram-negativos Porphyromonas e Prevotella; Espiroquetas Treponema, de forma que quando o canal radicular está infectado, as bactérias presentes podem atingir a corrente sanguínea e promover bacteremia. Se essas bactérias não forem destruídas pelas defesas do organismo poderão encontrar sítios favoráveis para sua colonização15. As bactérias anaeróbias são responsáveis pela produção de gases nos tecidos moles e pelos espaços sublingual e submandibular. O processo infeccioso estende-se ao longo da carótida e da região retrofaríngea, causando mediastinite11. Anatomicamente a infecção invade espaços faciais e do pescoço, podendo chegar ao mediastino. O soalho de boca é formado exclusivamente por tecidos moles. Os músculos genioglosso e milo-hioideo são afetados pela supuração da infecção dentária. As amigdalas, também conhecidas como tonsilas palatinas, estão localizadas bilateralmente às fossas tonsilares. A fossa tonsilar é delimitada pelos arcos palatoglosso e palatofaríngeo, pelo véu palatino e pela base da língua. Por ser um mecanismo de defesa contra infecções e inflamações, as amigdalas Capítulo de revisão / Review chapter Figura 3 – Espaços fasciais secundários: 1) Espaço Submandibular, 2) espaço ptérigo-mandibular, 3) espaço lateral da faringe, 4) espaço retro-faríngeo10. Características clínicas e etiológicas A AL é uma tumefação de tecido mole, proveniente de infecções dentárias da região submandibular. Quem descreveu pela primeira vez a patologia foi o pesquisador alemão Wilhelm Frederick von Ludwig, em 18362,3,25,27. A Angina de Ludwig ou flegmão de assoalho de boca é considerada uma celulite grave, porém relativamente rara. É uma infecção de evolução rápida do soalho de boca com consequente elevação da língua, comprometendo a mastigação, deglutição e respiração37. No exame intraoral percebe-se língua elevada e deslocada, com dificuldade de ser projetada, eritema, local da palpação firme e febril. No exame extraoral observa-se assimetria facial e edema, além de alterações dos sinais vitais26. Os abscessos na região de molares inferiores podem penetrar nas inserções do músculo bucinador. O edema inflamatório agudo e a supuração se disseminam para o interior dos tecidos moles da face e do pescoço, apresentando-se como uma celulite. O aumento da pressão hidrostática faz com que o pus assuma trajetos ao longo das linhas de menor resistência34. Em casos de abscessos, estão presentes todos os micro-organismos de um canal radicular contaminado, mas se a microbiota já estiver neutralizada, isto é, o tratamento endodôntico já estiver concluído, restarão os micro-organismos resistentes, como Enterococcus faecalis (o principal micro-organismo do insucesso do tratamento endodôntico), Actyno58 to cirúrgico. Os principais exames de rotina são: de sangue (hemograma completo, coagulograma completo, tipagem sanguínea e glicemia), de urina (elementos anormais e sedimentos) e de exsudatos (cultura e antibiograma). Através dos resultados obtidos pode-se avaliar a capacidade do paciente em suportar a agressão cirúrgica, assim como se recuperar da lesão. Também auxilia na confirmação diagnóstica16. Os exames de imagem da região maxilofacial, cervical e torácica funcionam como importantes ferramentas no diagnóstico do comprometimento respiratório, determinação da extensão do processo infeccioso e no planejamento da abordagem terapêutica em infecções maxilofaciais e cervicais. Imagens dos tecidos moles da região cervical permitem a identificação de desvios laterais e anteroposteriores da traqueia8,29,38, sendo em alguns casos, o único exame de imagem disponível19. Apesar da grande utilidade das radiografias, a tomografia computadorizada com contraste é o método mais eficaz na avaliação das condições aéreas do paciente com infecção em região de cabeça e pescoço9,29,33. O oxímetro também pode ser uma ferramenta auxiliar na interpretação da capacidade respiratória. A saturação abaixo de 94% indica oxigenação insuficiente dos tecidos, sendo indicação para estabelecimento de uma via aérea segura8,18. As condições de vias aéreas funcionais são obtidas por meio de cricotireoidotomia e traqueotomia, normalmente realizadas por profissionais habilitados. Estabelecidas condições respiratórias adequadas, as atenções se voltam para o controle da disseminação da infecção e remoção da causa. A principal forma de tratamento é a drenagem cirúrgica, com exploração de todos os espaços fasciais envolvidos27,28,31. A abordagem para a incisão e drenagem em pacientes com abscessos de espaços profundos fasciais e cervicais, com ou sem trismo, é mais difícil e requer anestesia geral e intubação. As opções para o manejo das vias aéreas podem incluir orotraqueal, nasotraqueal cego, que são vias de passagem de ar; em anestesiologia são as vias de intubação por onde irá passar o tubo de anestesia geral, e intubação de fibra óptica ou cricotireoidotomia com jato de insuflação13. Dependendo do nível de abertura bucal o anestesista pode ter dificuldade na intubação do paciente durante a anestesia geral, necessitando o auxílio do cirurgião torácico para fibroscopia e auxílio durante a mesma, bem como eventual traqueostomia em caso de qualquer intercorrência durante o ficam hipertrofiadas podendo contribuir para o fechamento das vias aéreas, impedindo a passagem de ar. As amigdalas recebem suprimento sanguíneo das artérias linguais, faríngeas e faciais. Através do espaço parafaríngeo comunicante, abscessos importantes podem espalhar-se em direção caudal30. Antigamente essa infecção era letal em quase 50% dos casos. Atualmente, devido ao surgimento de antibióticos, outros medicamentos e melhoras na higiene oral da população, essa porcentagem caiu para 10% dos casos, sendo duas vezes mais frequente em homens1. Fatores etiológicos menos comuns são citados como sialoadenites, epiglotites, infecções pós-traumáticas resultante de fraturas mandibulares, ferimentos penetrantes do soalho de boca, presença de corpo estranho ou, ainda, trauma endotraqueal causado por intubação ou broncoscopia34. Septicemia, mediastinite, empiema torácica, fasceíte necrotizante, laringo-espasmos e insuficiência renal, são algumas das complicações dos casos de AL que podem levar à morte36. Fatores de comorbidade, como o diabetes mellitus e dente com foco de infecção podem eventualmente se transformar em graves complicações médicas como a cetoacidose diabética e desenvolver infecções cervicais potencialmente letais14. Segundo Moorhead;Guiahi22 (2010), cerca de 50% das mulheres grávidas nos Estados Unidos são afetadas por doenças periodontais e infecções odontogênicas. A paciente grávida com infecção maxilofacial requer atenção especial dada as alterações fisiológicas da gravidez, o que coloca a paciente em maior risco de complicações. O diagnóstico diferencial da AL inclui edema angioneurótico, carcinoma lingual, hematoma sublingual (após anticoagulação), abscesso de glândulas salivares, linfadenite, celulite e abscesso peritonsilar20. Tratamento multidisciplinar O tratamento inicial inclui aspectos importantes como medidas gerais a respeito das vias aéreas e, se necessário, internação na unidade de tratamento intensivo. Medidas específicas destinadas à administração de antibióticos, anti-inflamatórios e analgésicos, bem como a necessidade de drenagem cirúrgica devem ser planejadas por equipe multidisciplinar, especialmente pelo clínico geral e pelo cirurgião bucomaxilofacial6,15,37. Exames complementares e laboratoriais são de fundamental importância para um procedimen59 Kuhn-Dall’Magro A, Silva NLNV, Lauxen J, Santos R, Valcanaia TC, Martins Fo SC, Dall’Magro E. Angina de Ludwig: aspectos anatômicos, etiologia e abordagem multidisciplinar ODONTO SCIENCE - 53 ANOS - FOUPF procedimento anestésico (Figuras 4 e 5). A Figura 6 ilustra os principais locais de drena- gem na região de cabeça e pescoço. Inicia-se então a cirurgia: incisão, divulsão, drenagem, colocação do dreno e curativo37 (Figuras 7 e 8). Figura 4 – Cirurgião torácico manejando aparelho de fibroscopia devido à dificuldade de intubação do paciente. Figura 5 – Intubação nasotraqueal realizada com sucesso. Figura 6 – Localização extrabucal dos locais de drenagem das infecções em região de cabeça e pescoço. As incisões são pontos de drenagem para os espaços fasciais indicados8. Figura 7 – Incisão com bisturi para drenagem. Capítulo de revisão / Review chapter Discussão A AL é uma infecção grave, de rápida evolução, evolvendo o assoalho da boca, os espaços submandibular, submentoniano e sublingual com risco potencial de obstrução de vias aéreas1,27,28. Caracterizada por uma celulite tóxica, aguda, firme que provoca o enrijecimento do assoalho bucal, elevação da língua, dificuldade de deglutição, fonação e mastigação35. Está relacionada sobretudo com abscessos na região de molares inferiores que por continuidade podem penetrar as inserções do músculo bucinador, gerando um quadro de edema inflama- Figura 8 – Colocação do dreno. 60 Angina de Ludwig: aspectos anatômicos, etiologia e abordagem multidisciplinar tório agudo que invade o interior dos tecidos moles da face e do pescoço. Infecções maxilofaciais graves são caracterizadas pela disseminação do processo infeccioso aos tecidos adjacentes e espaços fasciais da região de cabeça, pescoço e tórax. Sua principal origem é odontogênica, resultante da infecção periapical e doença periodontal. Outras causas incluem lacerações, fraturas e cirurgias contaminadas29,39. Embora a maioria dos processos infecciosos em seus estágios iniciais sejam bem controlados com intervenção cirúrgica e antibioticoterapia, eles têm potencial para se disseminar através dos planos fasciais da cabeça e do pescoço e acometer estruturas como órbita, seio cavernoso e mediastino5,19, podendo causar o comprometimento de vias aéreas, resultando em septicemia e morte5,17,19,33. Fatores que incluem a demora na procura do atendimento especializado, antibioticoterapia inicial inadequada, condições sistêmicas imunossupressoras e virulência do micro-organismo podem contribuir para a rápida disseminação do processo infeccioso4,23. Sendo assim, o conhecimento de condições que favorecem a progressão da doença é necessário ao profissional com a finalidade de diagnóstico de um quadro de potencial com gravidade. Dados da literatura mostram que a infecção maxilofacial pode ser considerada grave problema de saúde pública em diversos países do mundo, envolvendo serviços de Medicina Bucal e Estomatologia, Cirurgia Bucomaxilofacial, Otorrinolaringologia, Cirurgia de Cabeça e Pescoço, Cirurgia Torácica, Oftalmologia, Microbiologia e Infectologia2,3,4,9,33. O risco de infecção está sempre presente na Traumatologia Bucomaxilofacial, quer pela contaminação do traumatismo em si, quer pelo frequente envolvimento e comunicação com as cavidades naturais que compõem a face. Além da cavidade oral, o terço médio da face possui os seios paranasais e fossas nasais, cavidades naturais que possuem microbiota anfibiôntica. A perda da continuidade da superfície cutânea e/ou mucosa causada pelas feridas ou fraturas pode também ser considerado um fator predisponente à infecção, que se torna mais relevante diante da contaminação com uma cavidade natural. A prevenção e o tratamento das feridas advindas de traumatismo na face estão sujeitas a muitas variáveis, tais como tipo de ferida, localização da ferida, envolvimento com cavidades naturais que possuem flora anfibiôntica, tempo de traumatismo, tipo de cirurgia, estado de saúde do pacien- te, tipo de antibiótico (inclusive a disponibilidade deste), momento de aplicação, duração da terapia, resistência atual ao antibiótico, entre outros27,28. A abordagem multidisciplinar aos pacientes em situações de emergência por infecção é de fundamental importância para o sucesso do tratamento. Embora alguns autores sugiram que o tratamento primário consiste em drenagem cirúrgica, remoção da causa, antibioticoterapia1 e manutenção das vias aéreas6, cada paciente evolui de forma diferente por possuir particularidades sistêmicas que podem agravar o seu quadro clínico, tais como diabetes, gravidez, neutropenia, alcoolismo, anemia aplástica, glomerulonefrite, dermatomiosite, AIDS, câncer, obesidade mórbida, transplantes prévios e lúpus eritematoso20,27,28. A AL é uma patologia grave causada, sobretudo, por infecções de origem dentária. Embora sua prevalência tenha diminuído com medidas preventivas, tais como o manuseio do paciente dentro das normas de biossegurança e o uso criterioso da antibioticoterapia nos procedimentos com indicação para tal, alguns casos ainda tendem a causar grande preocupação para o CD. O encaminhamento do paciente para centros hospitalares capacitados que atuem dentro de uma abordagem multidisciplinar é a melhor conduta para o CD que se depara diante de um quadro de AL. Referências bibliográficas 1. 2. 3. 4. 5. 6. 7. 8. 61 Accetta AF, Soares MS, Moreira TG, Accetta I. Angina de Ludwig complicada com síndrome da resposta inflamatória sistêmica e sepse. Rev. Bras. Cir. Cabeça Pescoço 2012;41(3)144-146. Boyanova L, Kolarov R, Gergova G, Deliverska E, Madjarov J, Marinov M, et al. Anaerobic bacteria in 118 patients with deep-space head and neck infections from the University Hospital of Maxillofacial Surgery, Sofia, Bulgaria. J Med Microbiol. 2006;55:1285-9. Brennan MT, Runyon MS, Batts JJ, Fox PC, Kent ML, Cox TL, et al. Odontogenic signs and symptoms as predictors of odontogenic infection. A clinical trial. JADA. 2006;137:62-6. Bullock JD, Fleishman JA. The spread of odontogenic infections to the orbit: diagnosis and management. J Oral Maxillofac Surg. 1985;43:749-55. 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São José dos Pinhas: Editora Plena; 2014. p. 55-62. 62 CAPÍTULO VIII Problema estético em DENTE permanente decorrente de traumatismo na infância Esthetic problem in permanent teeth due to trauma in childhood Berenice Perussolo¹ Caroline Magnabosco² Eduardo Grigollo Patussi³ Fabio Eduardo Woitchunas4 Larissa Corrêa Brusco Pavinato5 Juliane Bervian6 Cirurgiã-dentista, Mestra, Professora da disciplina de Clínica da Criança e do Adolescente – FOUPF. Aluna de Graduação – FOUPF. 3 Cirurgião-dentista, Mestre, Doutor, Professor da disciplina de Clínica da Criança e do Adolescente – FOUPF. 4 Cirurgião-dentista, Mestre, Professor da disciplina de Clínica da Criança e do Adolescente – FOUPF. 5 Mestra, Doutora, Professora da disciplina de Clínica da Criança e do Adolescente – FOUPF. 6 Cirurgiã-dentista, Mestra, Doutora, Professora da disciplina de Clínica da Criança e do Adolescente – FOUPF. 1 2 ODONTO SCIENCE - 53 ANOS - FOUPF Problema estético em dente permanente decorrente de traumatismo na infância Introdução Ao longo dos anos as pessoas começaram a testemunhar o quanto é importante cuidar da sua saúde, para assim ter uma qualidade de vida cada vez melhor. Com isso, outras lesões da cavidade bucal, não apenas lesões cariosas, surgiram. A ocorrência passou a ser diagnosticada e o tratamento proposto e, dentro deste contexto, verificou-se casos envolvendo lesões traumáticas dentárias4. A literatura apresenta alta prevalência das lesões dentárias traumáticas em dentes decíduos, podendo variar de 9 a 36%. Os fatores etiológicos são diversos e os dentes anteriores superiores são os mais afetados2. A luxação intrusiva é um dos traumatismos que envolvem, além da estrutura dental, o tecido de sustentação, que consiste no deslocamento do dente para o interior do seu alvéolo, seguindo em uma direção axial, afetando comumente a dentição decídua e podendo gerar sequelas na dentição permanente6,9. Caracteriza-se pelo esmagamento e ruptura do ligamento periodontal e do feixe vasculonervoso, o que pode comprometer o suprimento neurovascular da polpa3. De acordo com a literatura a prevalência de intrusão varia de 15,3% a 29%, sendo uma das injúrias traumáticas mais predominantes, fato esse decorrente, provavelmente, da grande resiliência do osso alveolar nessa idade9. Complicações relacionadas com a intrusão de dentes decíduos podem afetar o dente lesado ou seu permanente sucessor. As implicações mais comuns na dentição decídua envolvem a obliteração pulpar, alteração de cor da coroa e necrose pulpar, não reerupção do decíduo acompanhada ou não de anquilose ou erupção em posição ectópica3,6,7,9. Na dentição permanente, devido a proximidade do germe dentário, podem ocorrer hipocalcificação, hipoplasia, dilaceração coronária e radicular e distúrbios de erupção3. Partindo do pressuposto acima, o objetivo deste artigo é apresentar um caso clínico de um tratamento restaurador estético em dente permanente com hipoplasia de esmalte de etiologia traumática do tipo luxação intrusiva. Relato de caso / Case report Relato de caso diagnosticado com necrose pulpar, que ocorreu por rompimento do feixe vasculonervoso no momento do traumatismo ou por hiperemia que posteriormente comprime os vasos apicais, e também pode ter sucedido uma necrose pulpar secundária, como uma complicação após obliteração do canal pulpar. A terapêutica indicada para a necrose pulpar foi a pulpectomia do elemento 51. A troca da dentição decídua pela permanente ocorreu de forma natural, sendo que os dentes incisivos que haviam sofrido o traumatismo erupcionaram em épocas distintas. O dente 11 erupcionou antes, porém com sequela visível (Figura 1). Pelo histórico do paciente e pelos aspectos clínicos e radiográficos (Figura 2), foi diagnosticado que o elemento 11 apresentou-se com hipoplasia de esmalte. O tratamento sugerido e realizado no paciente constituiu na recuperação estética e funcional do dente envolvido. Anteposto ao tratamento restaurador foi reali- Paciente gênero masculino, 2 anos, acompanhado pela mãe, compareceu à Clínica da Criança e do Adolescente/UPF, com queixa principal de lesão na região bucofacial. No exame anamnésico a mãe relatou que a criança havia caído brincando em casa. Ao exame clínico intrabucal constatou-se ausência dos incisivos centrais superiores (51 e 61), compatível com diagnóstico de intrusão. No exame radiográfico foi comprovada a hipótese diagnóstica. De acordo com a recomendação científica1, optou-se por um plano de tratamento conservador, aguardando a reerupção dos dentes decíduos. Após trinta dias, durante a realização do exame clínico, verificou-se a reerupção dentária do elemento 61, e três meses após ocorreu a do 51. Em ambos havia alteração de cor, entretanto, ausência de dor e fístula. Dois anos depois o paciente retornou com notável edema relacionado ao dente 51, o qual foi 64 Problema estético em dente permanente dEcorrente de traumatismo na infância em duas camadas no preparo com um pequeno pincel (microbrush®), removendo o excesso com leves jatos de ar, posteriormente, aplicou-se o adesivo com microbrush®, removendo os excessos e, em seguida, foi fotopolimerizado por 20 segundos. O passo seguinte consistiu da restauração com resina composta pela técnica incremental (Figura 5), realizando também acabamento e polimento da restauração do elemento 11 (Figura 6). Para a utilização desses dados e dessas fotos, o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido foi assinado pela mãe da criança, que esteve acompanhando o menor em todas as sessões. Figura 1 – Início da erupção do elemento 11. A B Figura 2 (A-B) – Aspecto clínico e radiográfico do dente 11 com hipoplasia de esmalte. 65 Perussolo B, Magnabosco C, Patussi EG, Woitchunas FE, Pavinato LCB, Bervian J. zada a técnica cirúrgica de gengivoplastia (Figura 3), a qual visa obter uma arquitetura gengival anatômica e fisiológica normal, o que por sua vez favorece harmonia do sorriso15 (Figura 4). Iniciando o tratamento restaurador, realizou-se profilaxia dos dentes com pasta profilática, taças de borrachas e escovas de Robson. O dente foi preparado com brocas diamantadas com o mínimo desgaste, e após foi realizado o isolamento absoluto do campo operatório (IACO). Após o IACO, os dentes foram condicionados com ácido fosfórico a 37% por 15 segundos, lavados com jatos de água/ar por 30 segundos e secos com papel absorvente. O primer foi aplicado Relato de caso / Case report ODONTO SCIENCE - 53 ANOS - FOUPF Figura 3 – Técnica cirúrgica de gengivoplastia. Figura 4 – Notável aumento da coroa clínica após o procedimento. Figura 5 – Restauração com resina composta pela técnica incremental. Figura 6 – Aspecto final após acabamento e polimento da restauração. Discussão direção ao sucessor permanente, o dente decíduo deve ser removido o mais atraumaticamente possível8. Se o movimento for oposto ao permanente, o tratamento é conservador, aguardando a reerupção do dente decíduo3,6. No traumatismo citado acima, o atendimento deverá ser de excelência para a dentição decídua, mas a intensidade deste trauma deve preocupar pelas consequências ao permanente sucessor, uma vez que os ameloblastos são células epiteliais muito sensíveis, que expressam um importante conjunto de genes que codificam a produção de proteínas essenciais para a formação desse tecido dentário, sendo que qualquer fator exógeno ou endógeno pode afetá-los resultando em anomalias de esmalte. Devido à sensibilidade dos ameloblastos a qualquer mudança, uma pequena alteração local ou sistêmica é notada por ele, fato que afeta a produção do esmalte. Caso a agressão sofrida pelo ameloblasto seja de grande intensidade e duração, maior será a Os traumatismos dentários têm a maior prevalência verificada em crianças entre 1 e 3 anos de idade, e os incisivos superiores são os mais comumente afetados, chamando a atenção para a interdependência entre o desenvolvimento motor e trauma evento. O osso alveolar nessa idade é mais poroso, por isso o dente decíduo que sofre trauma tende a se deslocar, diferentemente do osso alveolar na fase de dentição permanente. Pelo fato de o germe dental do dente permanente estar bem próximo à raiz do dente decíduo, existe um alto risco de ele ser afetado após um trauma e o metabolismo do esmalte pelos ameloblastos sofrer algum distúrbio3,8,9. Como vimos anteriormente a luxação intrusiva é o principal evento traumático nessa faixa etária e os fatores que norteiam o plano de tratamento são a direção do deslocamento e a ocorrência de fratura da parede alveolar. Quando o deslocamento for em 66 Problema estético em dente permanente dEcorrente de traumatismo na infância 1. 2. 3. 4. 5. 6. 7. 8. 9. 10. 11. 12. 13. 14. Considerações finais 15. A literatura evidencia e a prática clínica confirma que traumatismos na dentição decídua são uns dos fatores etiológicos básicos para problemas futuros no sucessor permanente. O tratamento restaurador direto com resina composta mostrou-se uma excelente alternativa restauradora estética para esse caso, pois pôde restabelecer a harmonia entre função e estética, satisfazendo as expectativas do paciente e propiciando significativo impacto positivo à sua autoestima. Andreasen JO, Andreasen FM. Texto e atlas colorido de traumatismo dental. 3 ed., São Paulo: Artmed, 2001, 770p. Bonifácio CC, Miura F, Bonini GAVC, Imparato JCP, Raggio DP. Clareamento em dente decíduo vitalizado: caso clínico. RGO 2008;56(1):97-101. Bortoli D, Brusco LC, Kramer PF, Feldens EG, Ferreira SH. 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Torriani DD, Baldisseira EFZ, Moura ASX, Ferro RL, Goettems ML. Radiographic analysis of traumatized primary teeth. Arq. Odontol 2010;46(3):121-6. Como citar este capítulo: Perussolo B, Magnabosco C, Patussi EG, Woitchunas FE, Pavinato LCB, Bervian J. Problema estético em dente permanente decorrente de traumatismo na infância. In: Linden MSS, Carli JP, Magro ML, Trentin MS, Silva SO, organizadores. Odonto Science: 53 Anos FOUPF. São José dos Pinhas: Editora Plena; 2014. p. 63-67. 67 Perussolo B, Magnabosco C, Patussi EG, Woitchunas FE, Pavinato LCB, Bervian J. Referências bibliográficas área de esmalte malformado, que pode ser notado até como grandes áreas de esmalte perdido. Caso seja rápida e de pequena intensidade, a irregularidade notada clinicamente será menor, podendo ser observada em forma de sulcos, fossetas ou depressões5,14. Tendo em vista o processo de formação em que o dente permanente 11 se encontrava e a sua proximidade com o dente decíduo, ocorreu o que é definido como hipoplasia de esmalte, que origina-se de uma alteração no alinhamento ou na atividade sincronizada dos ameloblastos, induzindo uma destruição irreversível do epitélio interno do órgão do esmalte, determinando parada na formação da matriz, o que resulta em irregularidades no esmalte. Apresenta-se como manchas brancas, variando de amarelo à marrom escuro, podendo apresentar-se ainda como sulcos ou depressões, ou como falta parcial ou total de esmalte, proporcionando assim, exposição dentinária11,12. No exame radiográfico nota-se que o esmalte afetado visualiza-se como uma mancha radiolúcida sobre a superfície dentária11,13,14. Clinicamente, observa-se sensibilidade dentinária e predisposição à cárie dental não constituindo problemas dentários funcionais, exceto a estética, a qual se apresentava insatisfatória. Várias terapêuticas podem ser realizadas desde clareamento, microabrasão, restaurações estéticas10,13. O tratamento visa melhorar as condições funcionais, estéticas e psicológicas do paciente. CAPÍTULO IX Frenectomia lingual: cirurgia a laser x cirurgia convencional Lingual frenectomy: surgical laser x conventional surgery Alessandra Kuhn-Dall’Magro1 Francisco Baccega2 Jonathan Lauxen3 Renato dos Santos3,4 Túlio del Conte Valcanaia5 Eduardo Dall’Magro6 Especialista em CTBMF – Santa Casa/POA, Mestre em Ciências Médicas – UFRGS, Professora dos Cursos de Pós Graduação em CTBMF – CEOM e IOA, Membro do Corpo Clínico – HSVP/RS e IOT/RS. 2 Aluno – FOUPF. 3 Cirurgião-Dentista – FOUPF. 4 Aluno do Curso de Especialização em CTBMF – CEOM – HSVP/RS. 5 Especialista e Mestre em CTBMF – UFPel, Doutor em CTBMF – PUC/RS, Professor Titular – UNIVALI, Professor de CTBMF – Faculdade Avantis, Coordenador do Curso de Especialização em Implantodontia – Faculdade Avantis. 6 Especialista em Prótese Dentária – USP, Mestre em Laser em Odontologia – USP, Mestre e Doutor em Materiais Dentários – UNICAMP, Professor Titular III – FOUPF. 1 ODONTO SCIENCE - 53 ANOS - FOUPF Frenectomia lingual: cirurgia a laser x cirurgia convencional Introdução A frenectomia é um procedimento que visa a excisão do freio labial ou lingual, com objetivo de melhorar a fonação, estética e também a higiene do local onde encontra-se o freio hipertrófico. Para que a frenectomia lingual seja indicada, o teste da linguinha é etapa indispensável previamente ao procedimento cirúrgico. Sabe-se que a realização de qualquer intervenção em crianças pode necessitar, muitas vezes, de anestesia geral para uma melhor desenvoltura das técnicas pretendidas, uma vez que a presença de sangramento e manipulação intraoral podem ser traumáticas para a mesma. Este estudo buscou mostrar as vantagens da frenectomia lingual utilizando o laser cirúrgico sobre as técnicas convencionais. A utilização do laser cirúrgico, especialmente em crianças, é uma técnica rápida e confortável mostrando melhores condições no pré, trans e pós-operatório, especialmente pela ausência de sangramento e por dispensar a etapa de sutura. Capítulo de revisão / Review chapter Revisão de literatura coordenadas com a respiração. Em ambas, a participação dos movimentos da língua é fundamental. Sendo assim, qualquer restrição à livre movimentação da língua pode resultar no comprometimento das funções, dificultando a amamentação. Essa dificuldade para amamentar pode levar ao desmame precoce e/ou baixo ganho de peso, comprometendo o desenvolvimento dos bebês15. De acordo com Neville et al.17 (2004), a anquiloglossia pode variar de casos leves, com pouco significado clínico, a exemplos raros de anquiloglossia completa, na qual a língua está realmente unida ao assoalho da boca. Algumas vezes, o freio estende-se para frente e se une à ponta da língua, que pode estar levemente fendida. Também conhecida como “língua presa”, acaba limitando os movimentos da língua, comprometendo até mesmo a oclusão do paciente, fazendo com que o mesmo apresente mordida aberta com o passar do tempo. Os problemas mais comuns estão relacionados com as dificuldades de articulação da fala, pois o paciente poderá ter limitações quando realiza certos movimentos articulatórios e mais amplos e elaborados, o que reduz a abertura da boca e os seus grupos consonantais. São também conhecidos problemas em alguns fonemas, tais como o z, d, t, s, l, n, tendo especial dificuldade em pronunciar a letra “r”15,17. Além disso, o dano social para a pessoa portadora desta anomalia pode ser enorme, devido ao grande número de casos relacionados ao “bullying” nos dias atuais. Este efeito acaba cau- Anquiloglossia A língua é um órgão especializado localizado na cavidade oral que participa ativamente das funções de sucção, deglutição, mastigação e fala. Possui, em sua face inferior, uma pequena prega de membrana mucosa que a conecta ao assoalho da boca, sendo denominada frênulo ou freio da língua16,21. O frênulo possibilita ou interfere na livre movimentação da língua. Quando não ocorre a apoptose completa do frênulo durante o desenvolvimento embrionário, o tecido residual que permanece pode limitar os movimentos da língua, podendo levar à anquiloglossia. A anquiloglossia é uma anomalia oral congênita, que pode ocorrer de forma total ou parcial, limitando a mobilidade de língua em graus variados e podendo interferir nas funções orais. Diagnosticar a anquiloglossia total não é difícil, pois ela é muito visível; mas diferenciar as variações anatômicas do frênulo requer conhecimento bastante aprofundado da anatomia da língua e do assoalho da boca para identificar se os achados anatômicos podem comprometer a movimentação da língua e, consequentemente, as funções orais. Não há consenso nos critérios utilizados para a avaliação e classificação anatômica do frênulo da língua, o que pode justificar a grande variação, entre 0,88% e 12,8% nos índices de incidência de anquiloglossia. Em bebês, a amamentação está diretamente relacionada com as funções de sucção e deglutição, 70 Frenectomia lingual: cirurgia a laser x cirurgia convencional -se a conclusão que na presença de uma anquiloglossia significativa, a frenectomia mostrou ser um tratamento que facilitou a amamentação nos 123 casos que tinham sido indicados para cirurgia. Em virtude da remoção do freio, observaram ainda uma melhoria no padrão de transferência do leite, bem como no que diz respeito aos problemas do mamilo da mãe e suas patologias da mama13. Remoção cirúrgica: técnica convencional Num estudo onde foi perguntado aos cirurgiões-dentistas (CDs) quais as cirurgias mais comuns realizadas em seus respectivos locais de trabalho, a frenectomia apareceu em primeiro, sendo escolhida por 29,4% dos CDs, seguida da gengivectomia com 29,3% e do aumento de coroa com 17% dos procedimentos cirúrgicos executados6. As técnicas convencionais de frenectomia têm os mesmos princípios básicos. O primeiro passo é a anestesia, sendo esta a nível regional, infiltrando ambos os nervos linguais. Seguidamente está recomendada a transfixação da língua com fio de sutura, feita na estrutura muscular, situada próxima à ponta da língua. Isto vai manter a língua elevada e numa posição superior, conseguindo assim, o acesso direto ao freio lingual. Com uma tesoura cirúrgica, secciona-se o freio, na sua porção mediana, tendo cuidado para que não haja um corte excessivo. De modo a facilitar a sutura, pode-se dissecar bilateralmente os bordos da incisão. Antes de completar a sutura, efetuada por pontos simples, está recomendado que o paciente execute movimentos livres da língua (Figuras 1 a 5)13. Importância do teste da “linguinha” Na fase de amamentação a alteração do freio lingual no bebê está diretamente relacionado aos problemas da sucção do leite do peito da mãe, podendo até interferir no seu peso. A anquiloglossia no recém-nascido tem sido alvo de grande investigação no Brasil a ponto de se tornar projeto de lei. Atualmente o “teste da linguinha” já está entre os exames de rotina pós-nascimento, assim como o “teste dos olhinhos” e o “teste da orelhinha”, em alguns estados brasileiros15. A triagem para a indicação da frenectomia é realizada através de protocolos específicos que levam em consideração a resposta funcional da língua nos movimentos desta durante a mamada13,15. Com o objetivo de pesquisar a anquiloglossia e a sua repercussão na amamentação, 3036 bebês em aleitamento materno foram acompanhados no Cincinnati Children’s Hospital Medical Center, nos Estados Unidos. Foram mensurados por um método quantitativo o nível de anquiloglossia, medindo a função da língua e a sua aparência. Após esta avaliação criteriosa da função da língua, chegou- Figura 1 – Paciente com anquiloglossia. 71 Kuhn-Dall’Magro A, Baccega F, Lauxen J, Santos R, Valcanaia TC, Dall’Magro E. sando sério comprometimento na vida social, comprometendo a autoestima do paciente1. Para que a língua seja clinicamente normal, é necessário que sua extremidade livre consiga alcançar 16 mm. Assim como a má oclusão possui classes, a anquiloglossia também apresenta quatro classes2: • Classe I: anquiloglossia suave, 12 a 16 mm; • Classe II: anquiloglossia moderada, 8 a 11 mm; • Classe III: anquiloglossia grave, 3 a 7 mm; • Classe IV: anquiloglossia completa, menos de 2 a 3 mm . Um estudo com o objetivo de descrever as modificações na língua e nas funções orofaciais, entre o pré e o pós-cirúrgico após 30 dias, reuniu oito homens e duas mulheres entre 2 e 33 anos. Após o período citado observou-se nos pacientes diferenças nos movimentos de elevação, protrusão e lateralidade da língua. Ficou nítida a melhora da abertura bucal durante a fala, protrusão da língua e a limpeza da cavidade oral. De oito pacientes que apresentavam a boca muito fechada, seis apresentaram melhora na amplitude. Quatro dos oito pacientes com problema na fala melhoraram, fazendo com que todos obtivessem melhora na comunicação oral14. Capítulo de revisão / Review chapter ODONTO SCIENCE - 53 ANOS - FOUPF Figura 2 – Paciente devidamente anestesiado; rafia da língua com fio seda 3.0. Figura 3 – Remoção do freio com lâmina de bisturi nº15. Figura 4 – Sutura com fio seda 4.0 (média de 5 pontos). Figura 5 – Mobilidade da língua após 30 dias. Existem várias maneiras de executar uma frenectomia, com o passar dos anos as técnicas foram sendo aperfeiçoadas, buscando sempre uma melhora na questão do medo e dor que envolvem o paciente. Entre todas as técnicas, a que mais se assemelha ao uso do laser cirúrgico para tratamento das frenectomias é a eletro-cirurgia, recomendada para pacientes que apresentam distúrbios hemorrágicos, dispensando o uso de bisturi, devido à grande dificuldade de hemostasia que a técnica convencional apresenta quando empregada. Portanto, enquanto nas outras técnicas são utilizados instrumentos, como lâmina de bisturi, gazes, fios de sutura, alicates, tesouras e curativos, a eletro-cirurgia necessita de uma unidade com eletrocautério e uma pinça hemostática3,13. Na Odontologia pode ser usado em procedimentos nos tecidos moles e duros, tais como gengivectomias, ulotomias, ulectomias, aumento de coroa clínica, acesso aos implantes, incisão para drenagem de abcessos bucais, excisão de diversos tumores, hemangiomas e outras lesões vasculares, cistos de erupção, tratamento de bolsa periodontal, remoção de cárie dentária, selamento de cicatrículas e fissuras, entre outros9,10,11,18,19. O laser de alta potência possui diversos efeitos, entre eles os fototérmicos que com a luz geram calor provocando coagulação, vaporização e corte. Não existe o melhor laser, mas sim o mais indicado para cada aplicação. Quanto ao uso do laser cirúrgico na frenectomia pode-se dizer que em alguns casos o uso de anestésicos poderá ser dispensado O sucesso deste tipo de tratamento demonstra o efeito da qualidade, sofisticação e tecnologia que o laser de alta intensidade apresenta, sendo um tratamento diferenciado dos demais. Enquanto a frenectomia convencional é feita com rafias para conten- Laser cirúrgico O laser tem sido cada vez mais utilizado nas mais diversas áreas da saúde, tais como Odontologia, Medicina, Fisioterapia, etc12. 72 ção da língua, uso de bisturi e suturas finais; com o laser a cirurgia é realizada em menor tempo: o laser provoca vaporização dos tecidos, fazendo com que o sangramento não ocorra, os vasos superficiais acabam sofrendo hemostasia, sendo dispensável o uso de sutura9 (Figuras 6-9). Figura 6 – Paciente com anquiloglossia. Figura 7 – Frenectomia a laser. Figura 8 – Frenectomia concluída. Figura 9 – Movimentação da língua após 30 dias. O laser de dióxido de carbono (CO2) é absorvido pela água dos tecidos, com isso o dano ao tecido será maior quando houver menor quantidade de água, fazendo com que seu uso seja contraindicado para lesões em ossos, tendões e em locais que abrangem o tecido adiposo, sendo utilizado exclusivamente nos tecidos moles. Já o laser de Nd:YAG, que assim como o laser de CO2 é utilizado nas gengivectomias, úlceras e frenectomias, possui um comprimento de onda com grande profundidade de penetração, podendo agredir alguns tecidos mais profundos7. 73 Kuhn-Dall’Magro A, Baccega F, Lauxen J, Santos R, Valcanaia TC, Dall’Magro E. Frenectomia lingual: cirurgia a laser x cirurgia convencional ODONTO SCIENCE - 53 ANOS - FOUPF na fase de amamentação alguns autores comprovam que com uma anquiloglossia significativa, a frenectomia facilitava a transferência do leite para o bebê. Em outros ainda era referida a melhoria significativa nos problemas e patologias sentidas pela mãe, tanto a nível do mamilo como da mama13,15. Existe assim uma necessidade de fazer o diagnóstico recorrendo a uma avaliação multidisciplinar, sendo esta feita pelo pediatra, que acompanhou a criança desde o seu nascimento, bem como pelo fonoaudiólogo. A técnica a laser, tanto nas frenectomias linguais como nas labiais, tem tido excelentes resultados quando comparada com as técnicas convencionais, estando referido que para pacientes pediátricos esta técnica sai favorecida devido à simplicidade do seu ato cirúrgico19. A utilização do laser de alta intensidade tem sido cada vez mais apreciado na especialidade de Cirurgia e Traumatologia Bucomaxilofacial, apresentando vários benefícios devido às suas características e versatilidade. A redução do tempo cirúrgico está entre as principais vantagens sobre a técnica convencional, pois corta, vaporiza, coagula e esteriliza ao mesmo tempo. Além disso, a visibilidade do local cirúrgico é melhor e este apresenta-se mais limpo, pois o trauma é reduzido durante a intervenção. Como na cirurgia a laser as suturas não são necessárias, este método apresenta uma redução do edema, do trauma e das cicatrizes pós-operatórias. Neste tipo de cirurgia a quantidade de anestesia é reduzida. A montagem do campo operatório tradicional também é dispensada, bem como a utilização de diversos instrumentais, o que pode facilitar a aceitação da cirurgia por parte do paciente pediátrico dispensando a necessidade de anestesia geral8,9,12,13,19. O laser de diodo é citado por Gargari et al.5 (2012) para a utilização em outras indicações cirúrgicas, tais como gengivectomias, fossas gengivais, úlceras orais e gengivoplastias, podendo até mesmo remover fungos que afetam as células endoteliais. Por ter ação superficial, possibilita a remoção somente das fibras necessárias, sem atuar em profundidade, o que torna o procedimento seguro e facilita a regeneração tecidual da área abordada. Em procedimentos realizados com laser cirúrgico a administração de analgésicos pós-operatórios, quando necessária, é realizada apenas nas primeiras 48h após a intervenção, assim como a antissepsia do local com enxaguatórios, pois o paciente não está suturado o que evita a colonização do local por Em pesquisa com laser de CO2, 40 amostras de língua de porco sofreram incisão de 20 milímetros de comprimento e 5 milímetros de profundidade. As amostras do grupo controle foram suturadas com 3 pontos de fio de seda, tamanho 4-0; enquanto as amostras do grupo experimental foram irradiadas com o laser de CO2. Ao final observou-se que a soldagem a laser CO2 combinado no modo ultrapulse e sutura, não teve diferença significativa na resistência à tração imediata do fechamento da ferida, em comparação com a sutura normal20. Já o laser de diodo é utilizado tanto na forma pulsada quanto contínua, operando em um comprimento de até 940 nm. O instrumento é mais útil em casos de fossas gengivais, frenectomias, gengivectomias, tratamento de úlceras orais e também gengivoplastias. O laser poderá remover até mesmo alguns fungos sem que afete a função inflamatória de monócitos e células endoteliais, provando ser um excelente instrumento para incisão e ablação de tecidos moles. Sua utilização apresenta algumas vantagens, além de dispensar o uso de anestésicos, o laser de diodo proporciona a cura da área operada sem cicatrização, evolução clínica sem o uso de antibióticos e analgésicos e também proporciona conforto ao paciente sem causar dor e sangramento durante a cirurgia4,5. Uma pesquisa foi realizada em 23 pacientes que usavam aparelho ortodôntico e necessitavam de cirurgia em tecidos moles. Entre eles 11 foram tratados com a técnica cirúrgica convencional e 12 foram tratados com o laser de diodo, em procedimentos de gengivectomia, frenectomia e correção do crescimento gengival. Nos 12 pacientes tratados com o laser de diodo (100%) o grau de sangramento foi zero enquanto nos pacientes que foram submetidos à cirurgia pela técnica convencional, todos (100%) apresentaram sangramento8. Capítulo de revisão / Review chapter Discussão A literatura é divergente na capacidade em diagnosticar a necessidade de frenectomia lingual, pois as várias definições de anquiloglossia e pesquisas sobre esta e a necessidade de remoção do freio, parcial ou total, nem sempre são justificadas13,15. Existem algumas contradições, mas em muitas pesquisas estudadas esta pode estar indicada devido aos problemas na pronúncia de certas letras, que podem ser originados devido às limitações de certos movimentos articulatórios. Também 74 Frenectomia lingual: cirurgia a laser x cirurgia convencional micro-organismos, como ocorre nos locais onde a sutura está presente. 12. Kuhn A, Dall’Magro E, Rhoden RM. Visão multidisciplinar dos lasers de Érbio (Er:YAG) e dióxido de carbono (CO2). Rev. 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CAPÍTULO X Alteração do desempenho esportivo associado a causas bucais Decline of sports performance associated with oral health aspects Marcelo Pecin Vanz¹ Gabriela Luana Arbo Gehlen2 Gisele Rovani3 Ferdinando de Conto4 Mateus Ericson Flores5 Acadêmico – FOUPF. Cirurgiã-dentista – FOUPF. 3 Mestra em Patologia Oral, Professora Adjunta – FOUPF. 4 Doutor em Cirurgia e Traumatologia Bucomaxilofacial, Professor Adjunto – FOUPF. 5 Doutor em Radiologia, Professor Titular – FOUPF. 1 2 ODONTO SCIENCE - 53 ANOS - FOUPF Alteração do desempenho esportivo associado a causas bucais Introdução Segundo a Academy for Sports Dentistry, a Odontologia Esportiva envolve a prevenção e o tratamento de injúrias orofaciais e doenças, alterações orais relacionadas a atletas. Atualmente o profissional da Odontologia Esportiva está apto a trabalhar em clubes, academias, federações e confederações esportivas, ou até mesmo juntamente com outros profissionais da área da saúde como é o caso da educação física, médicos, fisioterapeutas, psicólogos e nutricionistas. É de suma importância que um atleta visite periodicamente o cirurgião dentista para realização de exames e manutenção da saúde oral. Atualmente, várias equipes ainda não dispõem deste profissional em suas sedes. Seja um atleta profissional ou amador, estando com saúde oral, terá uma maior facilidade em alcançar o sucesso em sua modalidade praticada. Um excelente rendimento físico às vezes pode não ser alcançado devido a uma série de fatores, como má oclusão dentária, dor e desconforto, foco infeccioso na boca, o atleta ser um respirador bucal, ter hábitos viciosos como roer unhas, ranger dentes – abrasão e desequilíbrio. Há casos em que determinados atletas que sofrem de causas bucais necessitam de uma manutenção de todo o sistema estomatognático para poder competir em alto nível. Também existem outras causas em que o cirurgião-dentista (CD) deve tomar uma série de cuidados e até mesmo alertá-lo em relação à ingestão de medicamentos que possam causar doping e a ingestão em demasiado de isotônicos comumente ingeridos por atletas de alto rendimento durante e após as competições por causarem erosão aos dentes quando consumidos de modo inadequado e com alta frequência. Investigar problemas de ordem bucal em atletas é de suma importância para um bom rendimento dentro de suas modalidades. Um esportista com má oclusão, ou sendo respirador bucal, por exemplo, pode ter prejudicado o seu desempenho durante as competições, ou até mesmo nem estar apto à prática do esporte por apresentar lesões musculares que associadas a problemas bucais, fazem com que o atleta leve um tempo maior de recuperação. Entende-se que um atleta deve ter boa higiene oral, dentes alinhados, para poder estar sempre em ótimas condições para realizar o trabalho em alto rendimento. Capítulo de revisão / Review chapter Revisão de literatura esportivas de que o cirurgião dentista é tão importante para o bom desempenho do atleta quanto o médico, o nutricionista, o fisioterapeuta. Com a união de cada uma dessas especialidades o atleta terá uma maior chance de sucesso perante seu preparo14. Atualmente vem ocorrendo um grande aumento de acidentes traumáticos na fase escolar devido ao incremento no número de praticantes de esportes radicais e de esportes de contato, que tem como objetivo a vitória e o desafio. Enquanto na dentição decídua os deslocamentos dentários são mais comumente ocorridos, através de uma maior resiliência do osso alveolar, na dentição permanente, o que predomina são as fraturas coronárias. Em relação à região afetada, os incisivos centrais superiores, em ambas as dentições, são os dentes mais acometidos12. Com o aumento significativo de traumas orofaciais no esporte, hoje, aparece em terceiro lugar na As práticas esportivas estão cada vez mais presentes no cotidiano das pessoas, sendo que as respostas obtidas são, muitas vezes, definidas por pequenas variáveis. Na Odontologia Desportiva atuam cirurgiões dentistas com um olhar esportivo a fim de melhorar o desempenho de atletas através da manutenção da saúde oral, prevenindo ou tratando possíveis lesões decorrentes do dia a dia desportivo11. A Odontologia Esportiva trata-se de um seguimento da Odontologia destinado a estudar a relação da prática esportiva com as estruturas dentárias, no que diz respeito à manutenção da perfeita saúde bucal do atleta. Alterações bucais podem ser requisitos que acabam com a carreira de muitos atletas, como a falta de dentes, fôlego e distensões. Contudo, a Odontologia Esportiva no Brasil está no estágio de conscientização de clubes e federações 78 listagem de traumas mais frequentes a fratura nasal, devido ao fato da maioria dos atletas não usarem nenhum tipo de proteção neste local, com isso um afastamento prolongado acarreta a ele um enorme prejuízo físico e psicológico, contudo, prejuízo financeiro ao clube pelo fato do atleta não poder participar das partidas juntamente com sua equipe7. O traumatismo dentário é uma injúria orofacial bastante prevalente na prática esportiva apesar de ser diferenciada de outros traumatismos, porém podem ser prevenidos, havendo a possibilidade de diminuir drasticamente os níveis de sua ocorrência através do uso de protetores bucais que realizam a proteção de toda as estruturas dentais e periodontais9. Apesar de ocorrer na pratica esportiva, o traumatismo dental atinge uma considerável parcela da população, podendo causar perdas dentárias irreparáveis, tanto no ato do acidente como no decorrer do tratamento ou, até mesmo, após anos, devido a sequelas como reabsorções radiculares. Os traumas ocasionados pela prática esportiva representam 14 a 39% das causas do traumatismo dentário e correspondem ao terceiro atendimento de trauma na face4. A proteção das estruturas dentárias e orofaciais nos esportes de contato é alvo de inúmeros estudos que buscam cada vez mais o aperfeiçoamento de técnicas, visando obter os melhores índices possíveis de injúrias às estruturas dentais. Atribui-se uma série de dificuldades perante o uso de protetores bucais durante a prática desportiva, sendo os mais frequentes dificuldade de respiração, náusea, dificuldade de fala, ferimento/dor, dificuldade na remoção perante aos atletas. Através disso, destaca-se que a maioria dos atletas não usam protetores bucais, gerando uma incidência muito alta de injúrias orofaciais e ainda pela dificuldade de adaptação ao uso3. Mesmo com a recomendação de especialistas, a incidência do uso de protetor bucal é quase nula na modalidade de futebol profissional no Brasil, simplesmente pelo fato de que os atletas acreditam que o protetor bucal pode atrapalhar seus desempenhos, principalmente no que diz respeito à respiração8. Para compreender melhor a necessidade de se usar protetores bucais atualmente, basta saber as principais funções que ele desempenha: manter os tecidos moles (lábios, bochecha e língua) afastados dos dentes, amortecer golpes frontais diretos contra os dentes anteriores, absorvendo e redistribuindo as forças do impacto por toda a arcada, evitar danos às cúspides ou às restaurações dos dentes posteriores causados pelo impacto de dentes antagonistas, prevenir distúrbios da ATM, concussões cerebrais, proporcionar vantagens psicológicas, aumentando a confiança do atleta, estabilizar fraturas ósseas e dentes avulsionados e sustentar dentes adjacentes17. O desempenho de um atleta depende muito da sua preparação física, e de nada adianta ele não estar ciente das causas bucais que poderão acometer caso ele não tome as devidas precauções, bem como estar sempre fazendo a manutenção de sua saúde oral, especialmente a prevenção. Eventualmente é comum acidentes locais ou de origem dolorosa no meio desportivo, além da existência de infecções que podem provocar consequências, à distância, psicológicas de desempenho muscular, pois um atleta que sofre de problemas bucais como gengivite, cárie dental, por exemplo, apresenta uma maior dificuldade perante a recuperação de lesões musculares. Por outro lado, os jovens atletas precocemente apresentam os primeiros problemas com terceiros molares inferiores, os mais comuns citados podem ser o trauma, podendo causar a indisponibilidade total do atleta, manifestando hiperemia, dor, trisma e inchaço6. Um dos maiores responsáveis pela alteração do desempenho esportivo trata-se do atleta respirador bucal, reduzindo a capacidade aeróbica em atividades físicas e os processos infecciosos da cavidade bucal podem espalhar-se para o restante do corpo. Existem diversas bactérias de infecções bucais que buscam lesionar as articulações, criando problemas para o atleta, sem que ele saiba a origem. Profissionais de educação física e dirigentes esportivos devem sempre relembrar, atuando em conjunto, formando uma equipe multidisciplinar, aconselhando e orientando os atletas sobre a higiene bucal e a necessidade de frequentarem um cirurgião-dentista periodicamente, proporcionando saúde e longevidade em suas carreiras esportivas10. Os atletas que apresentam dispneia certamente tentarão respirar pela boca para captar mais oxigênio, a fim de compensar sua demanda respiratória. A falta de oxigênio vai alterar o seu metabolismo a ponto de apresentar dificuldades de recuperação de lesões musculares, problemas de visão e posturais, além de fadiga. Podem aparecer também distúrbios na articulação temporomandibular (ATM) por aumento de pressão sobre essa articulação, pro79 Vanz MP, Gehlen GLA, Rovani G, Conto F, Flores ME. Alteração do desempenho esportivo associado a causas bucais Capítulo de revisão / Review chapter ODONTO SCIENCE - 53 ANOS - FOUPF vocando dores de cabeça constantes, presença de zumbidos, tensão dos músculos frontal e temporal, seguidas ou não de fadigas de músculos mastigatórios e ainda diminuirá em 21% o rendimento deste atleta se comparado a um respirador normal2. Problemas mais comuns encontrados em pacientes que respiram pela boca referem-se a falta de ar ou insuficiência respiratória, ao cansaço rápido nas atividades físicas, dor nas costas com frequência, dor na musculatura do pescoço, diminuição de olfato ou paladar, halitose, sensação de boca seca, a pessoa acaba acordando muito durante a noite engasgado, dormir mal, paciente sente muito sono durante o dia, ter olheiras e espirrar saliva ao falar e, ainda, dificuldade de realizar exercícios físicos como correr e jogar futebol. Entre as principais alterações de um respirador bucal em geral, são problemas oclusais, posturais e de má função dos órgãos fonoarticulatórios1. Atualmente um dos requisitos mais importantes para um bom desempenho esportivo se dá através de uma boa alimentação. A ingestão de uma dieta adequada para crianças desportistas é de suma importância para manter a saúde, o crescimento e a maturação, bem como para minimizar lesões e melhorar o seu rendimento. Uma dieta adequada ajudará a desenvolver hábitos alimentares saudáveis, que na idade adulta, juntamente com a atividade física, diminuirão o risco de muitas doenças relacionadas ao estilo de vida. Porém, quando crianças e adolescentes estiverem expostos a dietas ou programas de treinamento muito intensos para a sua idade, grau de maturação ou limite individual, os benefícios da participação esportiva poderão ser eliminados ou até mesmo excluído13. O exercício em excesso remete a perda hídrica através da sudorese, principalmente quando ele é realizado em um ambiente de temperaturas elevadas. Tal perda pode acarretar desidratação, alteração do equilíbrio hidroeletrolítico, dificuldade de realizar a termorregulação e, desta forma, representa tanto um risco para a saúde como pode causar uma queda do desempenho esportivo. Levando-se em consideração um percentual de desidratação corporal relacionado ao peso, são desencadeadas diversas respostas fisiológicas que mudam de um simples mecanismo de sede podendo chegar à insuficiência renal e circulatória. Com isso, além da água, os atletas costumam complementar sua hidratação durante a prática esportiva através de isotônicos16. Existem os isotônicos, frequentemente utiliza- dos por atletas de alto rendimento nos dias de hoje, após a prática esportiva, sendo usados para reidratação. O seu consumo excessivo pode causar erosão dental, mais um motivo para a frequente visita ao cirurgião-dentista para obter a correta orientação referente ao uso. Observa-se que as bebidas esportivas possuem essa denominação por apresentar osmolaridade similar à do sangue. Por isso, a despeito de suas propriedades hidroeletrolíticas, apresentam efeito danoso sobre os dentes, devido ao seu baixo pH e presença de ácido cítrico em sua composição. Essas características fazem com que apresentem elevado potencial erosivo aos tecidos duros dentais, especialmente quando consumidas de forma excessiva ou por períodos prolongados. Assim, atletas que consomem bebidas isotônicas mais de duas vezes ao dia, apresentam um risco quatro vezes maior de desenvolverem lesões por erosão dental do que aqueles que não consomem5. Contudo, podemos destacar a grande importância que um cirurgião-dentista tem, podendo detectar causas bucais em seus pacientes atletas, assim passando-lhe uma correta instrução e conscientização de que devem ser feitas periodicamente consultas de manutenção e prevenção e, caso necessário, um correto tratamento para eventual lesão. A postura de um treinador de futebol hoje em dia vem crescendo, ele não é mais apenas responsável por treinar a sua equipe dentro de campo, e sim de uma série de outros aspectos, por exemplo, monitorar a saúde bucal de seus atletas, como enviando-os ao odontologista que é de suma importância, pois ele pode fazer a ligação dentista-atleta com maior facilidade. É uma postura muito importante que vários técnicos deveriam ter, mas limitante sob o aspecto científico de informação para os profissionais que atuam nesta área. Seria de suma importância que existisse mais pesquisas dentro desta área, ajudando na preparação dos atletas de alto nível e ainda na compreensão das principais causas bucais que dificultam a deficiência profilática dentária em atletas15. Considerações finais Através deste trabalho tivemos a oportunidade de entender mais sobre as principais alterações no desempenho esportivo associado a causas bucais: • Poderá haver uma diminuição no desempenho do atleta que apresentar má higiene oral; 80 Alteração do desempenho esportivo associado a causas bucais • O número de atletas que sofrem traumatismos vem crescendo a cada dia; • O uso em excesso de isotônicos pode causar injúrias e prejudicar os dentes; • Os atletas profissionais apresentam grande dificuldade em usar protetores bucais e máscaras para proteção facial devido ao desconforto durante a prática esportiva; • Respiradores bucais apresentam um menor desempenho esportivo em cerca de 21%. É de grande importância a presença de cirurgiões-dentistas em clubes e confederações, buscando orientar, prevenir e, caso necessário, sanar as alterações bucais encontradas em atletas, buscando melhorar o seu desempenho físico durante o esporte praticado. 11. Lemos LFC, Oliveira RS. Odontologia Desportiva. Uma breve revisão sobre essa nova tendência no esporte. Revista Digital. 2007; 12(3). Disponível na internet: www.efdeportes. com/efd113/odontologia-desportiva.htm. 12. Lima DLF. Odontologia Esportiva. 1.ed. São Paulo: Santos Editora; 2012. p. 121. 13. Meyer F, Perrone AC. Considerações nutricionais para crianças e adolescentes que praticam esportes. Arq. Sanny Pesq. Saúde. 2008; 1(1):49-56, 2. 14. Rodriguez HJG, Silva RPR, Bastos RS, Bastos JRM. Odontologia Esportiva: atenção dos atletas amadores aos cuidados de saúde bucal na cidade de Bauru (SP). Rev. ABO Nacional. 2009; 17(1). Disponível na internet: http://www.abo.org.br/ revista94artigo3.php. 15. Rosa AF, Costa SB, Silva PRS, Roxo CDMN, Machado GS, Teixeira AAA, Visconti AM, et al. Estudo descritivo de alterações odontológicas verificadas em 400 jogadores de futebol. Rev. Bras. Med. Esporte. 1999; 5(2). 16. Silva FIC, Santos AML, Adriano LS, Lopes RS, Vitalino R, Sá NAR. A importância da hidratação hidroeletrolítica no esporte. Rev. Bras. Ci. e Mov. 2011;19(2):120-128. 17. Sizo SR, Silva ES, Rocha MPC, Klautau EB. Avaliação do conhecimento em Odontologia e educação física acerca dos protetores bucais. Rev. Bras. Med. Esporte. 2009; 15(4). Disponível na internet: www.scielo.br/pdf/rbme/v15n4/ v15n4a10.pdf. Referências bibliográficas Abreu DG. Respiração bucal e disfunção da articulação temporomandibular (ATM) – Problemas ortodônticos que podem trazer grandes prejuízos ao desempenho físico. Rev. Bras. de Ciências da Saúde, 2009; ano VII(21). 2. Antunez MEM, Reis YB. O binômio esporte – Odontologia. Adolescência & Saúde. 2010; 7(1). 3. Barberini AF, Aun CE, Caldeira CL. Incidência de injúrias orofaciais e utilização de protetores bucais em diversos esportes de contato. Rev. Odontol. UNICI. 2002; 14(1): 7-14. 4. Bastida EM, Peron RAF, Queiroz AF, Terada RSS, Hayacibara MF. Prevalência do uso de protetores bucais em praticantes de artes marciais de um município do Paraná. Rev. Bras. Odontol. 2010; 67(2):194-8. 5. Cavalcanti AL, Xavier AFC, Souto RQ, Oliveira M, Santos JA, Vieira FF. Avaliação in vitro do potencial erosivo de bebidas isotônicas. Rev. Bras. Med. Esporte. 2009; 16(6). Disponível na internet: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_artte xt&pid=S1517-86922010000600012. 6. Costa SS. Odontologia desportiva na luta de reconhecimento. Revista de Odontologia da Universidade Cidade de São Paulo. 2009; 21(2):162-8. 7. Coto NP, Meira JBC, Dias RB. Fraturas nasais em esportes: sua ocorrência e importância. Rev. Sul-Bras. Odontol. 2010; 7(3): 349-53. 8. Cremonez J, Abreu DGD. Protetores bucais e seu impacto no condicionamento físico de atletas de futebol. Rev. Bras. de Ciências da saúde, 2009; ano. VII(20). 9. Ferrari HC, Medeiros FMJ. Dental trauma and level of information: mouthguard use in different contact sports. Dent. Traumatol. 2008; 18(3):144-7. 10. Leite JVM, Feitosa GM, Souza FASP, Pedrosa JCP, Antunes LL, Bezerra R. Odontologia Desportiva x performance física. Disponível na internet: http://worldsoccerone.blogspot. com/odontologia-desportiva-x-performance-fisica. Como citar este capítulo: Vanz MP, Gehlen GLA, Rovani G, Conto F, Flores ME. Alteração do desempenho esportivo associado a causas bucais. In: Linden MSS, Carli JP, Magro ML, Trentin MS, Silva SO, organizadores. Odonto Science: 53 Anos FOUPF. São José dos Pinhas: Editora Plena; 2014. p. 77-81. 81 Vanz MP, Gehlen GLA, Rovani G, Conto F, Flores ME. 1. AUTORES Alessandra Kuhn-Dall’Magro Especialista em CTBMF – Santa Casa/POA, Mestra em Ciências Médicas – UFRGS, Professora dos Cursos de Pós Graduação em CTBMF – CEOM e IOA, Membro do Corpo Clínico – HSVP/RS e IOT/RS. Anderson Paulo Barbosa Lima Clínica Privada. Angélica Zanata Graduanda em Odontologia – UPF. Armando Koichiro Kaieda Doutorando em Odontologia – FOP/UNICAMP. Berenice Perussolo Cirurgiã-dentista, Mestra, Professora da disciplina de Clínica da Criança e do Adolescente – UPF. Elói Eustáquio Souza Aluno do Curso de Especialização em Ortodontia – INAPÓS. Fabio Eduardo Woitchunas Cirurgião-dentista, Mestre, Professor da disciplina de Clínica da Criança e do Adolescente – FOUPF. Ferdinando de Conto Doutor em Cirurgia e Traumatologia Bucomaxilofacial, Professor Adjunto – FOUPF. Francisco Baccega Aluno – FOUPF. Gabriela Luana Arbo Gehlen Cirurgiã-dentista – FOUPF. Bethânia Molin Giaretta De Carli Especialista em Cirurgia e Traumatologia Bucomaxilofacial e Odontologia do Trabalho, Mestra em Clínica Odontológica, Professora – FOUPF. Caroline Magnabosco Aluna de Graduação do Curso de Odontologia – UPF. Catielma Nascimento Santos Mestranda em Odontologia – UFS. Geraldo Eugênio Marchiori Professor do Curso de Especialização em Ortodontia – INAPÓS. Gisele Rovani Mestra em Patologia Oral, Professora Adjunta – FOUPF. Graziela Oro Cericato Professora, Doutora – IMED. Henrique Damian Rosário Doutorando em Biologia Oral – USC. Claudia Trentin Lampert Mestranda do Programa de Pós-Graduação em Envelhecimento Humano, bolsista Taxa/ Capes – UPF. João Paulo De Carli Especialista em Prótese Dentária, Mestre, Doutor em Estomatologia, Professor – FOUPF. Jonathan Lauxen Cirurgião-dentista – FOUPF. Cristina Ribas Teixeira Mestranda do Programa de Pós-Graduação em Envelhecimento Humano – UPF. Capítulo de revisão / Review chapter Eduardo Sandini Linden Especialista em Periodontia. Daniela Cristina Miyagaki Mestra e doutoranda em Endodontia – FOPUNICAMP, Professora da FOUPF. Juliane Bervian Cirurgiã-dentista, Mestra, Doutora, Professora da disciplina de Clínica da Criança e do Adolescente – FOUPF. Doglas Cecchin Doutor em Endodontia – FOP-UNICAMP, Professor – FOUPF. Larissa Corrêa Brusco Pavinato: Mestra, Doutora, Professora da disciplina de Clínica da Criança e do Adolescente – FOUPF. Eduardo Dall’Magro Especialista em Prótese Dentária – USP, Mestre em Laser em Odontologia – USP, Mestre e Doutor em Materiais Dentários – UNICAMP, Professor Titular III – FOUPF. Luiz Renato Paranhos Professor Adjunto – UFS. Mauro Dal Zoti Dutra Mestre em Prótese Dentária, Professor – FOUPF. Eduardo Grigollo Patussi Cirurgião-dentista, Mestre, Doutor, Professor da disciplina de Clínica da Criança e do Adolescente – FOUPF. 82 Marcelo Pecin Vanz Acadêmico – FOUPF. Maria Salete Sandini Linden Especialista em Periodontia e Implantodontia, Mestra em Reabilitação Oral, Doutora em Implantodontia, Professora – FOUPF. Tadeu Evandro Mendes-Júnior Clínica Privada. Tiago Fortunato Cirurgião-dentista – FOUPF Marilia Fagury Videira Marceliano-Alves Doutora em Endodontia, Pós-doutoranda em Endodontia – Universidade Estácio de Sá, Professora do Curso de Especialização em Endodontia – OASD. Túlio del Conte Valcanaia Especialista e Mestre em CTBMF – UFPel, Doutor em CTBMF – PUC/RS, Professor Titular – UNIVALI, Professor de CTBMF – Faculdade Avantis, Coordenador do Curso de Especialização em Implantodontia – Faculdade Avantis. Mateus Ericson Flores Doutor em Radiologia, Professor adjunto – FOUPF. Yasmim Guedes Maurer Acadêmica do Curso de Psicologia, bolsista Pibic/ CNPq – UPF. Micheline Sandini Trentin Especialista em Implantodontia, Mestra e Doutora em Periodontia, Professora – FOUPF. Mirian Lago Magro Mestra em Endodontia, Professora – FOUPF. Nathália Louize Nunes Vieira Silva Aluna da Graduação – FOUPF. Patrícia Comiran Cirurgiã-dentista – FOUPF Pricila Welter Acadêmica do Curso de Psicologia, bolsista Probic/Fapergs – UFP. Ramon Nazareno Menezes Andrade Graduando em Odontologia – UFS. Renato dos Santos Cirurgião-dentista – FOUPF, Aluno do Curso de Especialização em CTBMF – CEOM – HSVP/RS. Sandra Rivera Fidel Professora associada – UERJ. Saulo Cocio Martins Filho Médico graduado – PUC/RS, Mestre e Doutor em Medicina (Pneumologia) – UFRGS, Membro do Corpo Clínico – HSVP/RS – Especialidade de Cirurgia Torácica. Silvana Alba Scortegagna Doutora em Psicologia – USF/SP, Docente do Programa de Pós-Graduação em Envelhecimento Humano – UPF. Soluete Oliveira da Silva Especialista em Patologia Bucal, Doutora em Estomatologia Clínica, Professora – FOUPF. Tadeu Evandro Mendes Professor do Curso de Especialização em Ortodontia – INAPÓS. 83