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na Igreja e no mundo
A segunda visita pastoral de Bento XVI à África
O continente africano,
“pulmão” espiritual
da humanidade
Reflexões do cardeal Robert Sarah
Suplemento: uma meditação sobre o Natal
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ED. TRENTA GIORNI SOC. COOP. A R. L. ISSN 1827-627X
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ANO XXIX - N.10 - 2011 R$ 15,00 - € 5
nella Chiesa e nel mondo
ano XXIX
N.
Sumário
1 0 ano 2011
Na capa: uma jovem africana em oração
EDITORIAL
Dom Giussani e a presença do laicado na Igreja
4
— por Giulio Andreotti
CAPA
A SEGUNDA VISITA PASTORAL
DE BENTO XVI À ÁFRICA
p. 4
O continente africano
“pulmão” espiritual da humanidade
— pelo cardeal Robert Sarah
Editorial
Giulio Andreotti
recorda Dom Luigi Giussani
3OGIORNI
nella Chiesa e nel mondo
22
NESTE NÚMERO
ANO DA FÉ 2012-2013
Um dom, não uma posse
Entrevista com o cardeal Walter Kasper
30
— por G. Valente
Diretor Giulio Andreotti
IGREJAS ORIENTAIS
REDAÇÃO
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3OGIORNI
nella Chiesa e nel mondo
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Diretor responsável
Roberto Rotondo
“Nossa fé é a dos apóstolos,
transmitida por São Tomé”
Entrevista com George Alencherry,
arcebispo-mor da Igreja siro-malabar
— por R. Rotondo e G. Valente
COLÉGIOS ECLESIÁSTICOS DE ROMA
A Índia que fica no coração de Roma
48
— por P. Baglioni
REFLEXÕES DE UM POLÍTICO ALEMÃO
O Papa continua fiel a si mesmo:
deem seu testemunho de fé
Tipografia
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— por Hans-Gert Pöttering
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RELATOS DAS MISSÕES
Colaboraram neste número
Hans-Gert Pöttering
Cardeal Robert Sarah
Este número foi concluído na redação
dia 7 de novembro de 2011
Escritório Legal
Davide Ramazzotti - [email protected]
Impressão concluída no mês de novembro
de 2011
54
Da Valtellina aos Andes
58
— por G. Ricciardi
LIVROS
Lealdade dos cristãos e tolerância de Roma
65
— por L. Bianchi
CRÉDITOS FOTOGRÁFICOS: Godong/Corbis: Capa; Per gentil concessão de padre Marko Ivan Rupnik:
p.7; Fototeca Messaggero di SantʼAntonio: p.15; Foto Scala, Firenze: p.17;
Osservatore Romano: pp.22,30,33,36,42,54-55,56; M.Merletto/Nigrizia: p.23; Paolo Galosi:
pp.23,24,46,48,49,50,51,52; Associated Press/LaPresse: pp.25,40,41,57; AFP/Getty Images:
pp.25,26,27,29,43,47,55,57; Pepi Merisio: p.28; Foto Felici: p.29; Romano Siciliani: pp.30,40,41; Franco
Cosimo Panini Editore su licenza Fratelli Alinari: pp.31,32,35; Per gentil concessão de Sua Beatitude
George Alencherry: p.44; National Geographic/Getty Images: p.39; Reuters/Contrasto: p.39; Per gentil
concessão de padre Varghese Kurisuthara, reitor do Pontificio Istituto San Giovanni Damasceno:
p.49; Michael Horowitz/Anzenberger/Contrasto: p.52; James Estrin/Redux/Contrasto: p.52-53;
Shobha/Contrasto: p.53; Per gentil concessão de padre Mirko Santandrea, Postulação da causa
de beatificação e canonização do Servo de Deus Daniele Badiali: pp.58,59,60,61,62; LaPresse: p.65.
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SEÇÕES
CARTAS DO MUNDO TODO
10
LEITURA ESPIRITUAL
14
30DIAS NA IGREJA E NO MUNDO
36
30DIAS Nº 10 - 2011
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Editorial
Dom Giussani e a presença
do laicado na Igreja
por Giulio Andreotti
O meu conhecimento pessoal com
Dom Luigi Giussani remonta ao
período entre os anos Oitenta e Noventa, porém
há muito tempo eu já o conhecia de nome, principalmente pela impressão positiva que me causara
ao saber que, de modo particular em Milão, nas
universidades finalmente alguém tinha reagido a
um certo clima ideológico. Na época tínhamos a
sensação de uma Milão fortemente contestativa e
com expressões políticas de nível ínfimo. Havia
muito medo devido às atividades das Brigadas
Dom Giussani e Rose Busingye
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30DIAS Nº 10 - 2011
Vermelhas, aos atentados e crimes, mas também
na direita havia fermentos inquietadores. Nas instituições havia a ilusão de que o método democrático, ao qual éramos ligados e do qual não queríamos absolutamente sair, em definitiva pudesse
combater por si mesmo o comunismo, mas, talvez, naquele momento não era mais suficiente, e
quando os violentos pensaram que podiam dominar, começou por meio de Dom Giussani e dos
que o seguiam a retomada. Na realidade, Dom
Giussani proporcionou uma espécie de virada, de
retorno: não mais a aquiescência à ideologia dominante mas nem mesmo a reação oposta, ou seja, a oposição visceral ao comunismo.
Porém, antes de falar de Dom Luigi gostaria
de esclarecer um ponto: de maneira incorreta a
experiência de Dom Giussani foi vista por muitos
como uma concorrência à Ação Católica daqueles anos. Desde aquela época sempre pensei que
não fosse uma leitura correta, justamente porque, pela minha intuição externa, Giussani nunca partia de uma oposição a alguma coisa mas de
algo positivo.
A Ação católica sempre contou com uma organização formada por homens, mulheres, jovens,
aspirantes, crianças e dois movimentos: os graduados e os universitários (a Fuci). Durante o período fascista esta forma de organização tinha funcionado muito bem porque consentia aquela míni-
Giulio Andreotti e Dom Luigi Giussani
ma autonomia e orgulho de diversidade sem criar
dificuldades. E foi importante que tenha sido realizada naquela forma detalhada, quase “regimentada”. Lembro que durante uma das celebrações das
jovens da Ação Católica (os “boinas marrons”) no
Fóro Mussolini, o socialista Saragat disse: “Quero
ir para ver”, e ficou bem impressionado. A justa intuição de Pio XI foi a de criar os movimentos e as
ramificações, mas deixando que a base continuasse sendo paroquial. Depois com o tempo percebeu-se um certo esgotamento. Isso não queria dizer que a experiência das paróquias não fosse mais
válida, mas se tinha interrompido o fio da formação. Cerca de dez anos atrás, no centenário da Fuci, quase fiquei escandalizado porque se manifestava esta característica de base: “Que fique claro que
nós não somos um movimento de formação, mas
de busca”. Mas para nós, crescidos na Fuci, não
era assim! Para nós, os objetivos principais eram
justamente os formativos: a liturgia, o estudo do
Antigo e do Novo Testamento, uma presença corajosa nas universidades, uma colaboração atenta
com os outros estudantes e com os professores –
dos quais devíamos ser apreciados em termos qualitativos –, também a ligação internacional através
“Pax Romana” e uma sensibilidade social cultivada
com as missões assistenciais na Conferência de
São Vicente. A este propósito, recordo frequentemente que devo às famílias pobres de Pietralata –
onde íamos com a São Vicente – algumas das mais
importantes lições de vida que aprendi.
¬
Antes de falar de Dom Luigi gostaria de esclarecer um ponto:
de maneira incorreta a experiência de Dom Giussani foi vista
em muitas situações como uma concorrência à Ação Católica
daqueles anos. Desde aquela época sempre pensei
que não fosse uma leitura correta, justamente porque,
pela minha intuição externa, Giussani nunca partia
de uma oposição a alguma coisa mas de algo positivo
30DIAS Nº 10 - 2011
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Editorial
Nos anos mais gloriosos da Ação Católica, como pode testemunhar o cardeal Angelini, as manifestações de massa tinham mostrado também uma
certa força e eram úteis, mas eram ligadas a um
momento histórico: a própria mobilização dos comitês civis em 1948 tinha um fim específico, e colocava juntos terciários franciscanos, professores
universitários e donas-de-casa. Mas essas manifestações, mesmo positivas, se estivessem fora do
contexto, eram uma espécie de antídoto, e o risco
era que o único critério apreciado fosse o número,
a massa, considerada um todo, enquanto o indivíduo, segundo os ditames da ideologia extra-católica
da época, não era considerado de nenhum modo.
Dom Giussani, eu dizia, dava o sentido da não
aquiescência, de não ter medo. Dava a sensação de
que se pudesse reagir, mesmo ideologicamente, levando ideias, formação, atualização. Considerando também o catolicismo em outros países e o que
estava acontecendo no mundo. Dom Giussani inovou com uma sua linha que, creio, tivesse clara desde o início, mas que introduziu gradualmente porque, talvez, uma pregação imediata, direta, como a
que eu tive oportunidade de ouvir, poderia sem dúvida causar fascínio, mas precisava também de preparação. E uma certa evolução aconteceu.
Um outro ponto: Dom Giussani, as obras da Comunhão e Libertação, a presença dos leigos católicos na sociedade. Permito-me uma comparação:
pensem em Marta e Maria no Evangelho. Maria ouvia Jesus e, se Marta não se dedicasse à cozinha –
mesmo se ninguém tivesse morrido de fome naquela noite porque Jesus estava com eles –, algum problema teria acontecido, porque alguém devia necessariamente preparar a comida. Uma das primeiras
vezes que assisti a um encontro entre os quadros da
Comunhão e Libertação e Dom Giussani, recordeime deste episódio do Evangelho, porque mesmo
impressionado pela atmosfera do encontro e pelo
que se dizia, pareceu-me ter percebido uma distinção, uma diferença entre Dom Giussani e as obras,
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30DIAS Nº 10 - 2011
a Companhia das Obras. Estas eram belíssimas e
positivas, mas me parecia que ele se reconhecesse mais na figura de Maria. Portanto era sensato
e positivo que alguém se dedicasse aos aspectos
organizativos, porém a ele interessavam outras
coisas. Em uma ocasião ouvi um seu discurso sobre o conceito de obra que, se não for enraizada
e sustentada por grandes ideias, esteriliza, murcha e morre. Impressionou-me o ponto central
desta sua observação que não era absolutamente
uma crítica às obras. Porém dizia: “Atenção, não
devemos ser interessados apenas na materialidade”. Este tema hoje volta a ser de atualidade pois
encontramos um certo “abatimento” nas universidades – mas também em outros âmbitos da vida cotidiana – e uma certa vivacidade foi novamente perdida.
Um terceiro elemento: Giussani tinha uma
capacidade comunicativa particular, mas no início eu não conseguia captar seu espírito. Consegui com o tempo, porque no início era como
se falasse uma língua diferente da minha: dizia
coisas muito lindas, que ficavam no coração,
mas eu não tinha a chave de leitura destas coisas. Tinha uma expressão carismática, isso sim,
via-se que era diferente, e havia algo diferente
nele; se tivesse que compará-lo a alguém, diria a
Mazzolari, mas também a padre Gnocchi. Neles
havia alguma coisa diferente, agiam sempre
com um horizonte mais amplo. Ao invés, eu sou
de outra natureza, um burocrata, levado a apreciar a normal administração. Sempre pensei
que os ministros mais merecedores sejam os
que ao invés de angustiarem-se por mais uma
reforma tentam fazer funcionar, com humildade, os mecanismos que já existem.
¬
Jesus com Marta e Maria, detalhe do mosaico
Mesa de Betânia, Marko Ivan Rupnik,
refeitório do Centro Aletti, Roma
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Editorial
O cardeal Joseph Ratzinger, durante a homilia
por ocasião do funeral de Dom Giussani, Catedral de Milão,
24 de fevereiro de 2005
E para entender integralmente Dom Giussani
foram-me úteis duas coisas. A primeira foi ouvir a
homilia feita por Ratzinger na sua missa fúnebre.
Fiquei muito impressionado porque o então cardeal Ratzinger fez uma fotografia exata de Dom
Giussani. Não era apenas um sermão fúnebre,
via-se que sentia muito o que estava dizendo e na
minha opinião, também algumas linhas de seu
pontificado são reconhecíveis naquele modelo de
apostolado que indicava Dom Giussani. Pelo modo como falou na missa fúnebre e em outras ocasiões, intui-se que não era apenas admiração ou
sentido de amizade que o ligava a Giussani, mas
também concordância com o modelo de vida cristã a ser pregado.
Apenas uma nota a este propósito: para mim
Ratzinger é um papa autenticamente moderno e
a crítica que justamente faz à falsa ideia de modernidade que hoje impera, acredito que seja a
mesma que ensinava Giussani. A nossa geração
não estava preparada para enfrentar a ideia de
que a modernidade consistisse somente em não
ter regras. Enquanto que no plano econômico e
social estávamos bem preparados – penso no código de Camaldoli, penso na modernidade da reforma agrária –, em outras frentes aderimos a de-
terminadas coisas porque pareciam sinal de modernidade, sem intuir suas consequências a longo prazo. Penso, por exemplo, na modificação
do Código dos artigos sobre o matrimônio, em
que o conceito de pai de família, a autoridade,
desaparece. Aceitamo-la para não parecermos
pouco modernos.
Sim, Giussani e Ratzinger são personalidades
que sabem indicar um caminho. E não todas as
grandes figuras do catolicismo, além da sua fé
pessoal, têm este dom. Por exemplo Lazzati,
que certamente está no paraíso, eu o vi algumas
vezes à missa, de manhã cedo, na igreja de Jesus, e parecia realmente em êxtase, porém –
afirmo isso com a consciência de fé de um ro-
E para entender integralmente Dom Giussani foram-me úteis
duas coisas. A primeira foi ouvir a homilia feita por Ratzinger
na sua missa fúnebre. Fiquei muito impressionado porque o então
cardeal Ratzinger fez uma fotografia exata de Dom Giussani.
Não era apenas um sermão fúnebre, via-se que sentia muito
o que estava dizendo e na minha opinião, também algumas linhas
de seu pontificado são reconhecíveis naquele modelo
de apostolado que indicava Dom Giussani
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30DIAS Nº 10 - 2011
Mas, voltando a Dom Giussani, a outra coisa que me permitiu
entendê-lo melhor foi participar, muitas vezes nestes anos,
à missa na Basílica de São Lourenço fora dos Muros celebrada
pelo padre Giacomo Tantardini, um sacerdote que sempre
manifestou admiração e devoção a Dom Giussani;
apresentando-o sempre como ponto de referência ao qual seguir
A capa de 30Jours, n. 1 - 2008;
padre Giacomo Tantardini
e Dom Giussani na Praça
de São Pedro, Domingo de Ramos,
Ano Santo, 23 de março de 1975
mano do povo como sou – não diria que tenha
conseguido dar um direcionamento à Universidade Católica.
Mas, voltando a Dom Giussani, a outra coisa
que me permitiu entendê-lo melhor foi participar,
muitas vezes nestes anos, à missa na Basílica de
São Lourenço fora dos Muros celebrada pelo padre Giacomo Tantardini, um sacerdote que sempre manifestou admiração e devoção a Dom Giussani; apresentando-o sempre como ponto de referência ao qual seguir. Desde que sou diretor de
30Dias, tive muitas vezes a oportunidade de participar a essas missas no sábado à noite, a batismos,
a crismas, e todas as vezes vi algo único: estudan-
tes e trabalhadores, jovens casais com crianças de
mãos dadas que vão receber a comunhão, uma
coisa realmente paradisíaca. Perguntei-me, também graças a uma bela capa de 30Dias de 2008
dedicada a Lourdes, se não seria esse o futuro do
cristianismo, o modelo do laicado para os próximos anos. Certamente me permitiu compreender
e entrar em maior sintonia com as palavras ouvidas no passado por Dom Giussani.
(Discurso para o XV Congresso Internacional
sobre o Rosto Santo, realizado
na Pontifícia Universidade Urbaniana,
dias 22 e 23 de outubro de 2011)
30DIAS Nº 10 - 2011
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Cartas do mundo todo • Cartas do mundo todo • Ca
H
á algum tempo chegam à redação
de 30Dias cartas provenientes
não apenas dos mosteiros de clausura,
das missões, dos seminários, mas também de bispos e sacerdotes, de religiosos e religiosas, de simples fiéis de
todas as partes da terra. Portanto,
consideramos oportuno chamar essa
seção “Cartas do mundo todo”, marcando-a com a imagem de Jesus com
os apóstolos Pedro, Tiago e João extraída da Última Ceia, um dos novos
mosaicos da fachada da Basílica do
Rosário, em Lourdes, realizados pelo
padre Marko Ivan Rupnik S.J., por ocasião do sesquicentenário das aparições de Nossa Senhora a Bernadete. A
escolha da imagem de Jesus com os
discípulos prediletos na Última Ceia,
quer sugerir como também essas cartas são um pequeno sinal do grande
mosaico de comunidades eucarísticas
nas quais se torna presente o sacrifício
de amor de Jesus, como dizia o Papa
Bento XVI, na quarta-feira, dia 26 de
outubro.
As cartas que chegam todos os meses à redação são numerosas. Sentimos não poder publicá-las todas e desculpamo-nos com os interessados.
Mas fazemos questão de garantir que
todas são lidas e a todas tentamos responder, e sempre que possível, realizar
os eventuais pedidos que são feitos.
10
30DIAS Nº 10 - 2011
MÉXICO
ADORADORAS PERPÉTUAS DO SANTÍSSIMO SACRAMENTO
La Paz, Baixa Califórnia do Sul, México
Ficamos entusiasmadas
por retomar o canto gregoriano,
principalmente nas solenidades
La Paz, 4 de agosto de 2011
Estimado senhor diretor,
seja louvado o Santíssimo Sacramento!
Receba uma afetuosa saudação dessas longínquas ter-
artas do mundo todo • Cartas do mundo todo • Cartas do mundo todo •
As imagens que ilustram as páginas das “Cartas do mundo todo” e as da “Leitura espiritual” são dos afrescos da basílica
de Santo Antônio de Pádua. Aqui acima, Crucifixão, Altichiero, capela de São Tiago
ras da Baixa Califórnia do Sul, onde recebemos mensalmente a sua bela revista 30Dias, graças à qual podemos saber das notícias mais variadas da Igreja e do
mundo. Por isso agradecemos ao senhor e a todos os
que trabalham na redação.
Queremos agradecer-lhe também pelo livro “El Hijo
no puede hacer nada por su cuenta”, e pelo CD com os
cantos gregorianos, que nos deu entusiasmo para retomar o canto gregoriano principalmente nas solenidades.
Somos uma comunidade de 21 irmãs; no ano passado voltaram à Casa do Pai a fundadora da comunidade, a reverenda madre María Angélica e irmã María de
San José, de modo que, a 46 anos da fundação, na comunidade permanece apenas uma das fundadoras.
Despedimo-nos garantindo as nossas orações e parabenizando-o pela revista,
a madre superiora Luísa Beltrán C.
30DIAS Nº 10 - 2011
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Cartas do mundo todo • Cartas do mundo todo • Ca
MALÁUI
IRMÃS SACRAMENTINAS DE NTCHEU
Ntcheu, Maláui
Pedimos uma contribuição para construir
um abrigo para jovens órfãs ou pobres
Ntcheu, 22 de agosto de 2011
Caríssimo senhor Andreotti,
quando estava na Itália por um breve período, tive a
sorte de encontrar e ler a sua belíssima revista 30Giorni e de apreciar os seus conteúdos.
Quanto precisaríamos, nós que residimos em terra
de missão, onde as notícias nunca chegam na perspectiva real, poder conhecer as chaves de leitura do
que acontece no mundo e saber o que acontece de belo também no mundo da Igreja!
É por isso que me permito dirigir-me ao senhor para
poder receber também na minha comunidade um
exemplar da sua revista, que considero um importante
meio não só de informação mas também de formação!
Além disso, gostaria de fazer-lhe um outro pedido:
na nossa missão dedicamo-nos à educação, com a certeza de que oferecer instrução e educação seja o meio
melhor para ajudar um país a crescer rumo a um progresso lento mas respeitador da dignidade do homem.
Queremos construir ao lado da nossa escola do grande
bairro de Nsumbi (na diocese de Mangochi) um abrigo
para uma centenas de jovens órfãs ou muito pobres,
para assim dar-lhes a possibilidade de frequentar regularmente a escola e dedicar algum tempo ao estudo, o
que raramente é possível em seus vilarejos.
Estamos nos empenhando na construção de um
abrigo para poder hospedá-las todo o ano, seriam
dormitórios e uma cozinha com refeitório, para que
encontrem um ambiente essencial para uma vida
digna e serena.
Na África, tudo está ficando cada vez mais difícil,
ainda mais nestes tempos em que parece que as injustiças sobre os mais fracos se multiplicam, a ponto de
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30DIAS Nº 10 - 2011
que o nosso projeto encontra a todo momento sempre novos obstáculos! Apenas a certeza da necessidade dessa obra em favor das mulheres da África nos dá
coragem para não desistir mesmo se as despesas se
multiplicam além dos orçamentos previstos.
Pedimos, se possível, uma contribuição para levar
adiante pelo menos no essencial este trabalho grande
que ainda devemos realizar.
Para qualquer informação, podemos nos manter
em contato por meio do correio eletrônico neste endereço: [email protected].
Desde já agradecemos-lhes o que conseguirem realizar por nós e contem com a nossa recordação diante do
Santíssimo Sacramento na nossa adoração cotidiana.
Com muita estima e reconhecimento,
irmã Ornella Sala e as irmãs sacramentinas de Ntcheu
PORTUGAL
FRATERNIDADE DOS IRMÃOZINHOS DE SÃO FRANCISCO DE ASSIS
Beja, Portugal
Somos uma fraternidade franciscana
que vive no sul de Portugal
Beja, 7 de setembro de 2011
Paz e bem!
Pelas mãos de um amigo chegou-me uma revista
30Dias, a qual li e reli várias vezes. Confesso que gostei imenso da vossa revista, pois dá uma visão da vida
da Igreja no mundo muito completa.
Parabéns pela vossa revista. Louvado seja Deus pela vossa Obra de Evangelização.
Somos uma Fraternidade Franciscana que vive no
sul de Portugal numa das Diocese mais pobres do nosso país, a Diocese de Beja.
Gostaríamos muito de receber a vossa revista, que
nos seria muito útil para a nossa missão e para a formação dos jovens irmãos da nossa comunidade, mas
não temos meios económicos para isso.
A nossa comunidade dedica-se essencialmente à
Evangelização em terras do Alentejo.
Gostaríamos muito de receber um exemplar para
cada Irmão do livrinho Quem reza se salva, mas fica
um pouco caro para a nossa comunidade que é forma-
artas do mundo todo • Cartas do mundo todo • Cartas do mundo todo •
Imago Pietatis, Altichiero, capela de São Tiago
da por oito jovens consagrados que na pobreza e na
alegria anunciam o Evangelho da paz e do bem!
Despeço-me deixando a certeza da nossa oração
por toda a equipa de redacção desta revista que é um
instrumento valioso para a igreja.
Abraço fraterno,
ir. Ricardo Borges
Beja, 19 de setembro de 2011
Paz e Bem!
Queremos agradecer o envio que nos fizeram dos livrinhos Quem reza se salva.
O livro de orações está muito bem preparado, vai
ser muito útil para o nosso apostolado de Evangelização.
¬
continua na p. 18
30DIAS Nº 10 - 2011
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Leitura espiritual • Leitura espiritual • Le
Confiança!
É a mão de Jesus
que tudo conduz...
Santa Teresa
do Menino Jesus
Convite à oração
A redação de 30Dias convida a todos, em particular às pessoas consagradas dos
mosteiros de clausura, a rezarem por padre Giacomo Tantardini. Há alguns
meses ele vem-se tratando de um câncer no pulmão. Que o Senhor nos conceda
pedir com confiança o milagre da cura. Aos sacerdotes que estimam e querem
bem a 30Giorni pedimos que celebrem a santa missa segundo essa intenção.
Aos pais pedimos a caridade de fazerem seus filhos rezar.
Não nos cansemos
de rezar. A confiança
faz milagres.
Santa Teresa
do Menino Jesus
14
30DIAS Nº 10 - 2011
eitura espiritual • Leitura espiritual • Leitura espiritual • Leitura
Stefano da Ferrara,
Nossa Senhora
do Pilar
“Nos humildes a graça
resplandece mais”
Pádua, Basílica do Santo, quarta-feira, 28 de setembro de 2011,
santa missa pelo 33º aniversário da morte do papa João Paulo I
homilia de padre Giacomo Tantardini
empre me conforta o trecho do Evangelho
que ouvimos (Lc 9,57-62), que, no fundo, sob
diversos pontos de vista, diz uma coisa só: que
a iniciativa de seguir a Jesus não nasce do homem,
mas é de Jesus. Ninguém pode tomar por si mesmo
a iniciativa de segui-Lo. “Não fostes vós que me es-
S
colhestes; fui eu que vos escolhi” (Jo 15,16). A iniciativa é do Senhor. É em primeiro lugar Sua. O homem pode-se deixar atrair, mas não pode tomar
por si mesmo a iniciativa.
Isso, nas poucas e belas pregações de quarta-feira do papa Luciani, foi como um refrão que ele ¬
30DIAS Nº 10 - 2011
15
Leitura espiritual • Leitura espiritual • Le
repetiu várias vezes. Na pregação sobre a fé, depois de ter lido em dialeto romanesco uma poesia
de Trilussa, ele diz: “Esta poesia é boa como poesia, mas defeituosa como catecismo”, pois, explica o Papa, a fé não nasce do homem. A fé é dom
de Jesus. Tanto assim, que Jesus disse: “Ninguém
pode vir a mim, se o Pai que me enviou não o
atrair” (Jo 6,44.65).
Ninguém pode ir a Jesus, se Jesus não o atrai.
A fé é graça do Senhor. E na pregação sobre a caridade João Paulo I diz justamente isto: “Eu não
dou um passo, se Deus não toma primeiro a iniciativa”. Nós, sozinhos, não damos um passo; sozinhos, não tomamos nenhuma iniciativa. A iniciativa é do Senhor. Se Ele não começa, nós não damos o primeiro passo. Se Ele não atrai, nós não O
seguimos. É como um refrão, naquelas quatro fantásticas pregações, a afirmação de que a vida cristã é graça, é iniciativa da graça, e de que a nossa
resposta é a correspondência a essa atração.
Mas, relendo essas pregações de quarta-feira, o
que mais me impressionou, agora, foi ver que o
Papa diz várias vezes: “Rezem por este pobre Papa”. Ele usa a expressão “pobre Papa”: “Quem
sabe o Espírito Santo ajuda este pobre Papa...”.
“Quando o pobre Papa, quando os bispos, os sacerdotes propõem a doutrina...”. E ainda: “Vejo
aqui, perto de mim, alguns irmãos bispos, e com
eles este pobre Papa”. Como é bela a expressão
“pobre Papa”! Entendo talvez agora por que o
bom cardeal Gantin, comentando o conclave que
elegeu o papa Luciani, disse simplesmente: “Ficamos todos muito contentes!”. Não foi uma surpresa a eleição de Luciani, era algo previsível, mas todos ficaram muito contentes, pois uma pessoa pobre, uma pessoa humilde tinha sido eleita bispo da
Igreja de Roma. A uma Igreja pobre, a uma Igreja
humilde, a uma Igreja pequeno rebanho, tinha sido dado um Papa pobre, um Papa humilde e, portanto, ficaram todos muito contentes. Pois, como
diz Santo Ambrósio: “Nos humildes resplandece
16
30DIAS Nº 10 - 2011
mais a graça / In humilibus magis elucet gratia”.
Nos pobres, nos humildes, a graça resplandece
mais. E quando a graça resplandece ficamos todos
contentes. Quando resplandece o que o Senhor
faz, ficamos todos contentes.
É assim que lembramos esse pobre Papa trinta e
três anos depois da sua morte repentina. Celebramos a lembrança desse pobre Papa. Desse “pobre
Papa”, pobre e portanto grande aos olhos do Senhor e aos olhos de seus santos. Nós o celebramos
aqui em Pádua, na Basílica de Santo Antônio.
“Si quaeris miracula / Se queres obter milagres”, diz o canto, “reza a Santo Antônio”. Assim,
ao lado do papa Luciani, ao lado dos nossos amigos no paraíso, de todos os santos do paraíso, rezamos particularmente a Santo Antônio pelos milagres, por todos os milagres. Hoje, no breviário,
nas vésperas, havia esta frase de São Pedro: “Lançai sobre o Senhor toda a vossa preocupação,
pois ele é quem cuida de vós” (1Pd 5,7). É preciso
pedir todos os milagres. É preciso pedir todas as
graças. Nestes meses – e eu o digo pelo afeto e pela amizade que nos liga – muitas vezes, talvez
quando o medo e a angústia se apresentaram, eu
repeti esta frase: “Jesus, te ofereço; Jesus, curame; Jesus, torna-me humilde”. É preciso pedir todos os milagres, por exemplo o milagre da cura.
Todos os milagres.
Mas a imagem de Santo Antônio com o menino
Jesus nos braços sugere que todos os milagres são
pedidos dentro desse abraço. “Fora de ti, ninguém
mais desejo sobre a terra” (Sl 73,25). Fora desse
abraço de Jesus, fora do abraço de Jesus, fora da
ternura de Jesus, a pessoa nada pede. Dentro dessa
ternura – como quando Antônio tinha o menino Jesus nos braços –, a pessoa pode pedir tudo. Como a
criança pequena, que pede tudo ao pai e à mãe.
Dentro dessa ternura, dentro desse abraço: “Fora
de ti, ninguém mais desejo sobre a terra”.
Então, a primeira coisa a pedir é essa familiaridade mais que maravilhosa com Jesus. E a ternura da comunhão com Jesus. “É fiel o Deus que
vos chamou à comunhão com seu Filho, Jesus
Cristo, nosso Senhor” (1Cor 1,9). Como é doce
essa comunhão!
Santo Antônio carrega o menino Jesus nos braços, mas é Jesus quem carrega Antônio. Quantas
vezes depois da comunhão repito esta oração de
eitura espiritual • Leitura espiritual • Leitura espiritual • Leitura
Nossa Senhora no trono, Giusto de’ Menabuoi
Santo Ambrósio: “Veni, Domine Iesu, / Vem, Senhor Jesus, / ad me veni, / vem a mim, / quaere
me, / busca-me, / inveni me, / encontra-me, /
suscipe me, / toma-me nos braços, / porta me /
me leva”. Quando somos carregados pelo Senhor,
então pedimos tudo. Assim, nestes últimos tempos da minha vida, lembrei-me de uma jaculatória
do Cântico dos Cânticos (2,16), da época em
que, pequeno, entrei no seminário, que diz: “Dilectus meus mihi et ego illi qui pascitur inter lilia / O meu amado está comigo...”. O meu amado, porque amado do coração é o Senhor Jesus.
O meu amado está comigo; e nós também, pobres
pecadores, por renovada graça, podemos dizer:
“E nós com Ele, que é um pastor entre os lírios”.
Com Ele, que é o único santo, o único Senhor. Tu
solus sanctus, Tu solus Dominus. O único que
nos ama com um amor tão doce, tão terno, a ponto de o amor do pai e da mãe ser uma pequena
imagem desse amor.
Peçamos aos santos, peçamos ao papa Luciani, peçamos a Santo Antônio, peçamos a Dom
Giussani, peçamos aos santos do paraíso que
nos façam experimentar também neste mundo a
ternura de sermos amados por Jesus e, dentro
dessa ternura, peçamos todos os milagres. Todos os milagres de que precisamos para preservar e viver a fé.
q
30DIAS Nº 10 - 2011
17
Cartas do mundo todo • Cartas do mundo todo • Ca
O Anjo anunciador,
capela de São Tiago
segue da p. 13
Ficamos a aguardar algum
exemplar da vossa revista, que tiveram a generosidade de nos oferecer uma assinatura.
Só Deus poderá dar a recompensa pela vossa tão grande generosidade.
Despedimo-nos com a certeza
da nossa oração por vós,
ir. Ricardo Borges
CHILE
MISSIONÁRIOS SALESIANOS
Catemu, Chile
Um obrigado
da Terra do Fogo
Catemu, 8 de setembro de 2011
Estimadíssimos redatores de
30Giorni,
sou um assíduo leitor desta revista. Recebo-a pontualmente e considero que seja bem feita, útil e que nos
mantenha unidos à Igreja.
Desejo que o Senhor vos abençoe pelo trabalho feito em benefício dos leitores, especialmente dos que
estão longe. Sou salesiano e encontro-me no Chile, na
Terra do Fogo.
Parabéns pelo CD com os cantos tradicionais para
a missa em latim, acompanhado pelo livrinho com os
textos: formidável! Lembro-me com certa nostalgia
dos anos da minha juventude, quando se usava muito
o latim na liturgia.
18
30DIAS Nº 10 - 2011
Então, para aproveitar ao máximo o conteúdo da
revista, peço-vos o favor de enviá-la em língua espanhola, porque assim posso passá-la para outras pessoas, pois em italiano só eu posso lê-la.
Aqui chega um só exemplar destinado a Giuseppe De Marchi (que já voltou definitivamente para a
Itália).
Faço-lhes votos de prosseguimento deste trabalho, e para vocês a minha recordação nas orações, e
cordiais saudações.
Ardiccio Fusi
artas do mundo todo • Cartas do mundo todo • Cartas do mundo todo •
A Virgem anunciada,
capela de São Tiago
COLÔMBIA
CLARISSAS DO MOSTEIRO DE BELLO
Bello, Colômbia
Obrigada
por Quien reza se salva
Bello, 24 de setembro de 2011
Estimado senhor Giulio Andreotti,
receba a nossa saudação fraterna de
paz e bem, com abundantes bênçãos
do Senhor pelo maravilhoso trabalho
de evangelização que o senhor leva
adiante por meio da revista 30Días.
Alguns dias atrás recebemos dez
exemplares do livrinho Quien reza
se salva. O senhor não pode imaginar a nossa alegria ao ver as principais orações do cristianismo reunidas em um livrinho, que partilharemos com as novas religiosas e os
fiéis que nos acompanham durante
as celebrações litúrgicas do nosso
mosteiro.
Com a nossa sincera lembrança
na oração lhe acompanhamos de
perto, compartilhando com o senhor
e os seus colaboradores os tesouros
espirituais que recebemos do Senhor.
Esperamos receber logo a revista 30Días porque
a consideramos um precioso instrumento espiritual
que nos ajuda a crescer na fé e na resposta vocacional que damos a Deus da vida contemplativa que
nos une.
Deus os abençoe e a Virgem Santíssima lhes dê
coragem e conforto sempre com a força do Espírito
Santo de Deus.
Com renovado afeto e gratidão,
a abadessa irmã Margarita María
del Sagrado Corazón, OSC, e comunidade
COREIA DO SUL
CAPUCHINHOS DA CUSTÓDIA DA COREIA DO SUL
Seul, Coreia do Sul
Dos frades capuchinhos da Coreia
Seul, 27 de setembro de 2011
Pax et Bonum.
Primeiramente, obrigado pelos dois exemplares gratuitos da revista 30Days. Os nossos frades estão muito
felizes pela possibilidade de ler a revista.
¬
30DIAS Nº 10 - 2011
19
Cartas do mundo todo • Cartas do mundo todo • Ca
Eu me chamo Anthony Choi, frade capuchinho da
Custódia da Coreia. Sou um seminarista e estudo para me tornar sacerdote. Aqui no nosso convento, onde aloja os seminaristas, há três frades seminaristas
coreanos e um sacerdote irlandês.
A nossa Custódia foi fundada pela província irlandesa em 1986 e este ano festejamos o jubileu de prata. Na nossa Custódia contamos com dezesseis frades e dois postulantes.
Gostaríamos de receber, se possível, a revista
30Days gratuitamente, os nossos frades ficariam
muito contentes.
Caso não seja possível, não tem problema. Compreendemos a situação de vocês.
Recordarei suas famílias e seus amigos nas minhas
orações. Pedimos para que recordem dos frades capuchinhos na Coreia.
Deus os abençoe,
Anthony Choi
ITÁLIA
Nós moramos a vinte metros
da igrejinha onde estão os restos mortais
do beato padre Serafino Morazzone
Chiuso di Lecco,
7 de outubro de 2011
Há muitos anos sou assinante desta belíssima e importante revista da qual me “nutro” de cultura eclesial, política e muito mais!
Hoje, quando chegou o número 7/8, li na página
70 o artigo escrito por Giovanni Ricciardi intitulado
“A grandeza da pequenez”, sobre a figura do beato
padre Serafino Morazzone, citado por Manzoni em
Os Noivos (Fermo e Lucia).
20
30DIAS Nº 10 - 2011
Que surpresa! Nós moramos a vinte metros da
igrejinha dedicada a São João Batista no distrito de
Chiuso di Lecco, onde estão os restos mortais do
beato!
Além disso, pensando em dar a possibilidade aos
que vêm em peregrinação de encontrar um ponto de
descanso e pernoite, abrimos um bed and breakfast
do qual me permito enviar à redação o endereço internet www.bebtralagoemonti.it.
Renovando os meus votos para que 30Giorni possa ser cada vez mais uma revista de sucesso, cordiais
saudações.
Maria Assunta Anghileri
Aurelio Brusadelli
FRANÇA
DOMINICANAS DO MOSTEIRO NOTRE-DAME DE CHALAIS
Chalais, França
Garanto-lhe a minha oração
e a da minha comunidade
Chalais, 8 de outubro de 2011
Prezado senhor,
agradecemos-lhe pela 30Jours! É magnífica e é
uma alegria receber notícias sobre o Santo Padre e
sobre o que acontece na Itália. Sou uma irmã dominicana. Minha família é proveniente de Roma e da
região de Abruzzo. Não falo italiano, mesmo se o
meu nome é Domenica Benzi, Dominique em francês. Obrigada por nos enviarem a revista. Garantolhe a minha oração e a da minha comunidade, em
nome da qual estou escrevendo. Rezo pelo senhor e
por todos os que trabalham nesta revista de que eu
gosto muito.
Renovando meus agradecimentos,
irmã Dominique, O.P.
Coroação de Maria,
Giusto de’ Menabuoi
artas do mundo todo • Cartas do mundo todo • Cartas do mundo todo •
30DIAS Nº 10 - 2011
21
C A PA
A segunda visita pastoral de Bento XVI à África
O continente africano,
“pulmão” espiritual
da humanidade
Bento XVI durante
a viagem a Camarões
e Angola, em março
de 2009; o Papa retorna
ao continente africano
em viagem apostólica
ao Benim, de 18 a 20
de novembro de 2011
pelo cardeal Robert Sarah
presidente do Pontifício Conselho “Cor Unum”
África se sente realmente
honrada por esta segunda
visita pastoral do Santo Padre, o papa Bento XVI, que logo
irá ao Benim. Essa visita pastoral,
sem a menor dúvida, deverá encorajar o continente africano a
tomar nas mãos, de modo responsável, o seu destino, deverá
encorajá-lo enquanto atravessa
tantas provações, consolidar a fé
dos cristãos e chamar a atenção
da Igreja para a sua tarefa missio-
A
22
30DIAS Nº 10 - 2011
nária. A África está plenamente
aberta a Cristo. Deu um grande
passo na direção de Jesus Cristo.
No início do século XX não havia
mais que dois milhões de católicos em toda a África. Hoje o continente possui 147 milhões deles,
com uma quantidade impressionante de vocações à vida sacerdotal e religiosa, e muitas conversões ao cristianismo. Mas amplas
regiões não conhecem ainda “o
Evangelho de Deus” (Mc 1,14).
O primeiro Sínodo, sobre “A
Igreja na África e sua missão evangelizadora”, e o segundo Sínodo
do continente, sobre “A Igreja na
África a serviço da reconciliação,
da justiça e da paz”, enfrentaram
com muita seriedade e trabalho as
questões básicas que preocupam e
atormentam toda a Igreja e os povos africanos: a evangelização; a
inculturação; a Igreja “família de
Deus”; o diálogo como “forma de
ser do cristão dentro de sua co- ¬
Biografia do cardeal Robert Sarah
R
obert Sarah nasceu em Ourous, na arquidiocese de Conakry, na Guiné, em 15 de junho
de 1945. Ordenado sacerdote em 20 de julho de 1969, foi depois enviado a Roma, onde
obteve o mestrado em Teologia na Pontifícia Universidade Gregoriana. Em Roma enriqueceu sua formação cultural no Pontifício Instituto Bíblico, aprofundando-a, em seguida, com
um período de estudos no Studium Biblicum Franciscanum de Jerusalém. De volta à pátria,
foi pároco e depois reitor do seminário menor de Kindia. Nomeado arcebispo de Conakry
em 13 de agosto de 1979, foi consagrado em 8 de dezembro do mesmo ano. Em seguida,
foi administrador apostólico de Kankan, presidente da Conferência Episcopal da Guiné e
presidente da Conferência Episcopal Regional da África Ocidental Francófona (Cerao). Em
outubro de 2001 foi nomeado secretário da Congregação para a Evangelização dos Povos,
ofício que desenvolveu por nove anos, até 7 de outubro de 2010, quando Bento XVI o designou presidente do Pontifício Conselho “Cor Unum”. Foi criado cardeal por Bento XVI no
consistório de 20 de novembro de 2010.
D. M.
30DIAS Nº 10 - 2011
23
C A PA
A cerimônia de abertura da 2ª Assembleia Especial para a África
do Sínodo dos Bispos, Basílica de São Pedro, 4 de outubro de 2009
munidade, como também com os
outros crentes”; a justiça e a paz;
a reconciliação; a influência maciça e poderosa da mídia na evolução cultural, antropológica, ética
e religiosa das nossas sociedades.
Essas questões importantes foram estudadas e discutidas num
clima de fé e oração, examinadas
com humilde obediência à Palavra de Deus e sob a luz sempre
acesa do Espírito, que nos acompanha ao longo da história.
Tenho confiança de que com a
paciência, a determinação, a força da fé, e com a ajuda de Deus, o
continente africano conhecerá a
paz, a reconciliação, uma maior
justiça social, e poderá contribuir
para reencontrar os valores humanos, religiosos e éticos, a sacralidade e o respeito à vida desde
a concepção até a morte natural,
a grandeza do matrimônio entre
homem e mulher, o significado e a
nobreza da família, que as sociedades modernas – sobretudo ocidentais, enfraquecidas pela
“apostasia silenciosa” – “desconstroem” e tornam desfocados e inconsistentes. Poderá contribuir
para reencontrar a Deus, o senti24
30DIAS Nº 10 - 2011
do do sagrado e a realidade do pecado, em suas formas individuais
e sociais.
Além de seus fabulosos recursos naturais, o continente africano possui uma extraordinária riqueza humana. Sua população é
jovem e em constante crescimento. A África é uma terra fecunda
em vida humana. Infelizmente,
apesar das riquezas naturais e humanas, é tragicamente ferida pela
pobreza, pela instabilidade e por
desordens políticas e econômicas. Conhece ainda os efeitos da
dominação, do desprezo, do colonialismo, um fenômeno que – embora aparentemente concluído no
plano político – não está extinto
de modo algum: hoje é mais sutil e
dominante do que nunca. Em razão das fraquezas tecnológicas,
econômicas e financeiras da África, os poderosos e astutos especialistas do mundo econômico organizaram o saque e a exploração
anárquica de suas riquezas naturais, sem nenhum benefício para
os povos do continente. A África
é pobre e sem dinheiro, mas compra armas com seus recursos naturais para iniciar guerras fomen-
tadas com a cumplicidade de certos líderes africanos corruptos,
desonestos e que não se importam com os atrozes sofrimentos
de seus povos, continuamente refugiados e em fuga diante da violência, dos conflitos sanguinolentos e da insegurança.
É preciso, todavia, agradecer a
Deus. Hoje a África, em seu conjunto, parece viver uma certa calma em comparação com as agudas tensões que marcaram o continente nas últimas duas décadas.
Ainda que em alguns lugares a
paz e a segurança das populações
continuem ainda frágeis e ameaçadas, é perceptível uma evolução real para a pacificação. Uma
vez ter minada – ou quase – a
guerra, é preciso agora empreender o caminho da reconciliação.
O segundo Sínodo sobre a África
chegou no momento certo para
recordar aos cristãos que eles devem ser artífices de paz e de reconciliação. Para ajudar a África a
enfrentar esse imenso desafio e
essa difícil batalha contra a pobreza, pelo desenvolvimento econômico e por uma existência humanamente mais digna e mais feliz
em que a Igreja deve colaborar
com outras instituições, o Santo
Padre, papa Bento XVI, volta à
África com o objetivo de reafirmar
aos africanos toda a sua confiança
em sua capacidade de sair autonomamente dessa longa e penosa
crise socioeconômica e política
por meio do trabalho, da unidade
e da comunhão de intenções, e
lembrar aos cristãos da África que
Deus nos reconciliou com Ele por
intermédio de Cristo, e nos confiou o ministério da reconciliação
(cf. 2Cor 5,18). O Santo Padre estimulará as energias do continente
africano e, como um pai, estimulará os africanos a sair da “reserva” e a entrar nos grandes circuitos mundiais para afirmar-se e manifestar publicamente os valores
culturais e as inestimáveis qualidades humanas e espirituais que podem oferecer à Igreja e a toda a
humanidade.
É claro que hoje a maior parte
da África está fora dos grandes
circuitos mundiais. É facilmente
deixada de lado, marginalizada. A
África é um elo negligenciável da
BENIM. A segunda visita pastoral de Bento XVI à África
corrente mundial, diante de um
mundo totalmente controlado pelas nações ricas e poderosas dos
pontos de vista econômico, tecnológico e militar. Todos os exércitos dos países ocidentais estão
alinhados quase inteiramente nos
países pobres da Ásia e da África,
para bombardear e destruir edifícios, milhares e milhares de vidas
humanas inocentes, para – dizem
– manter a paz e promover a democracia. O Iraque e a sua população estão destruídos e Saddam
Hussein foi morto. Bin Laden foi
assassinado e lançado no mar.
Muammar Kadafi foi simplesmente eliminado com outros membros de sua família, e fizeram desaparecer sua lembrança entre as
areias do deserto. A Costa do
Marfim era um país em boas condições do ponto de vista econômico. Agora foi quebrado em dois e
destruído... Não quero defender
esses personagens e suas ações,
que certamente devem ser execrados e condenados mil vezes.
Mas é bárbaro e imperdoável que
potências civis se aliem e tratem
assim seres humanos criados à
imagem de Deus. E, se essas pessoas foram bandidos e ditadores
para seus povos, por que temer
que seus túmulos se tornem lugares de peregrinação? O mesmo
destino talvez espere outros chefes de Estado!
Não sei o que Deus pensa, em
seu silêncio, de tanta crueldade. O
Seu coração, provavelmente, se
entristece. Desculpem-me este
parêntese. Deve deixar de acontecer que o dinheiro e o poder se
tornem os deuses do mundo e que
a eles sejam oferecidas vidas humanas em sacrifício. A verdade
terá de triunfar. Só Deus é a primeira e a maior verdade. Sem
verdade, o homem não pode ¬
Acima,
crianças congolesas
e ruandesas recebem
alimentos dos
soldados das Nações
Unidas perto da aldeia
de Kimua, no Congo
Oriental; à esquerda,
milicianos em
Pekanhouebli,
na fronteira entre
a Libéria e Costa do
Marfim, abril de 2011
30DIAS Nº 10 - 2011
25
C A PA
perceber o sentido da vida; deixa
então campo aberto para o mais
forte (cf. Bento XVI, Jesus de Nazaré. Da entrada em Jerusalém
à Ressurreição). A lei do mais forte, a violência e as guerras deste
mundo são o grande problema e a
grande ferida da nossa humanidade nos dias de hoje!
O continente africano foi esquecido dos homens, mas não de
Deus, que prefere de modo evidente os pequenos, os pobres e os
fracos. Já o papa João Paulo II
disse, em 1995, que “a África
atual pode ser comparada àquele
homem que descia de Jerusalém
para Jericó; ele cai nas mãos dos
salteadores que, depois de o despojarem e encherem de pancada,
o abandonaram, deixando-o meio
morto (cf. Lc 10,30-37). A África
é um continente onde inumeráveis seres humanos – homens e
mulheres, crianças e jovens – jazem, de algum modo, prostrados
à margem da estrada, doentes, feridos, indefesos, marginalizados e
abandonados. Têm extrema necessidade de bons samaritanos
que venham em sua ajuda” (Ecclesia in Africa, nº 41). Por isso, fortalecidos por sua fé em Jesus Cristo, os bispos da África confiaram
seu continente a Cristo Senhor, o
verdadeiro Bom Samaritano,
convencidos de que só Ele, por
meio do seu Evangelho e da sua
Igreja, pode salvar a África de
suas dificuldades atuais e curá-la
de seus muitos males.
Jesus Cristo, o seu Evangelho e
a sua Igreja são a esperança da
África, e a África é o futuro do
mundo. Os últimos papas pensam
nela dessa forma, na interpretação
que dou de suas palavras. E creio
que seu ponto de vista mereça crédito, pois assim se expressaram no
exercício de sua função profética.
No Antigo Testamento, os profetas tinham por missão ler, interpretar e comentar a história e os
eventos sociopolíticos e religiosos,
não só do povo de Israel, mas também dos povos vizinhos. Certamente hoje os papas, sucessores
de Pedro, continuam esse ministério profético para ler, analisar e interpretar a história da Igreja e as vicissitudes humanas, religiosas e sociopolíticas do mundo.
26
30DIAS Nº 10 - 2011
E o que dizem da África os últimos papas? Expressam com clareza o que é a África aos olhos de
Deus e a sua missão presente e futura no mundo.
Como declarou Paulo VI em
Campala, em julho de 1969:
“Nova Patria Christi, Africa. A
nova Pátria de Cristo é a África”.
Deus sempre teve uma atenção
especial à África, fazendo-a participar da salvação do mundo.
De fato, foi o continente africano que “acolheu o Salvador do
mundo quando era menino e teve de se refugiar com José e Maria no Egito para salvar a vida da
perseguição do rei Herodes” (cf.
Bento XVI, Homilia na Santa
Missa para a conclusão da 2ª
Assembleia Especial para a
África do Sínodo dos Bispos,
25 de outubro de 2009). E depois foi um africano, um certo
Simão originário de Cirene, o
pai de Alexandre e Rufo, que
ajudou Jesus a carregar a Cruz
(cf. Mc 15,21).
Em 1995, o beato papa João
Paulo II escrevia na Ecclesia in
Africa: “‘Eis que eu te gravei nas
palmas das minhas mãos’ (Is
49,15-16). Sim, nas palmas das
mãos de Cristo, trespassadas pelos cravos da crucifixão! O nome
de cada um de vós, africanos, está
escrito nestas mãos” (Ecclesia in
Africa, nº 143).
E Bento XVI, em sua homilia de
abertura da 2ª Assembleia Especial para a África do Sínodo dos
Bispos, em 4 de outubro de 2009,
diz: “A África é depositária de um
tesouro inestimável para o mundo
inteiro: o seu profundo sentido de
Deus [...]. A África representa um
imenso ‘pulmão’ espiritual para
esta humanidade em crise de fé e
de esperança. Mas este pulmão
também pode adoecer. E atualmente pelo menos duas perigosas
patologias estão a ameaçá-lo: antes de tudo, uma doença já comum
no Ocidente, isto é, o materialismo
prático, aliado ao pensamento relativista e niilista”.
BENIM. A segunda visita pastoral de Bento XVI à África
oração e encontros frequentes e
pessoais com Deus, deverá ser
promovida e fortalecida. Para
chegar a isso, temos a ajuda, o
apoio e o encorajamento dos modelos africanos de santidade que
somos chamados a imitar: os
mártires São Carlos Lwanga e
companheiros, o beato Cipriano
Miguel Tansi, Santa Josefina Bakhita, Santa Clementina Anuarite,
mártir, etc. Mas temos também
um outro grande modelo cristão e
um grande africano que acaba de
À esquerda, a cidade de Falluja,
no Iraque, atingida pelos pesados
bombardeios de novembro de 2004;
abaixo, a catedral siro-católica
de Bagdá, local de um atentado violento
em outubro de 2010
Daí a importância e a urgência
de uma mais profunda evangelização das mentalidades, dos costumes e das culturas africanas, um
trabalho intenso de aprofundamento e apropriação da fé e dos
mistérios cristãos. A formação do
coração, que permite estabelecer
laços de íntima amizade com Cristo e favorece uma intensa vida de
voltar para a casa do Pai: o venerado cardeal Bernardin Gantin.
Era um homem de Deus, um
grande homem de oração, atento
a Deus e aos homens, e de uma
delicada humildade. Eis o que recomendava: “Sejam ordenados
os seus dias, unindo o repouso ao
trabalho; ouçam o Senhor e também os homens, e depois rezem.
Rezem sobretudo por meio do sinal vivo da Eucaristia, que é o momento divino do maior amor de
Deus pela humanidade” (homilia
para uma ordenação sacerdotal,
19 de novembro de 2005). A oração era o eixo da sua vida. Disse
um dia a um jovem padre: “Meu
filho, temos de rezar muito. Temos de rezar pedindo perdão por
tudo o que poderíamos ter feito,
mas não pudemos realizar. [...]
Oração, oração; sim, oração antes de mais nada e unicamente.
[...] À medida que aumentam as
tarefas e as responsabilidades, a
oração deverá fazer-se mais intensa, mais longa, mais insistente”. Ela deve-nos unir mais a
Deus, que age por meio das nossas pessoas. E, já no fim da vida, o
cardeal o testemunhou, dizendo:
“Prometi ao papa João
Paulo II consagrar o
tempo da minha aposentadoria ao recolhimento, à escuta e à
oração” (bodas de ouro
episcopais, Ouidah, 3
de fevereiro de 2007).
O cardeal Ber nardin Gantin era um fiel e
afetuoso servidor de
Deus, da Igreja e do
Papa. Um homem de
grande fé, totalmente
embebido do Amor de
Cristo. Submissão, fidelidade e amor pela
Igreja e pelo Papa, era
assim que vivia o seu
dom e o seu humilde
serviço a Deus, que lhe
concedera a graça do
sacerdócio. Como cardeal, definiu desta forma essa honra e esse
privilégio: “O que é um
cardeal da Igreja, senão um servidor, ministro do Papa, disponível, semelhante à dobradiça de uma porta, segundo a
definição de seu étimo latino ‘cardo’, sempre feliz e grato por ter
sido escolhido unicamente para
servir” (homilia pelos trinta anos
de cardinalato, Cotonou, 27 de
junho de 2007). E acrescentava:
“Todo o meu amor cristão se resume nestas simples palavras:
Deus, Jesus Cristo, o Papa, a ¬
30DIAS Nº 10 - 2011
27
C A PA
Virgem. Realidades supremas
q u e R o m a m e f e z d e s c o b r i r,
amar e servir. Por isso, jamais
poderemos agradecer o bastante
ao Senhor”.
O cardeal Bernardin Gantin
foi, assim, também um grande
africano. Apesar dos seus trinta
anos a serviço da Igreja universal,
em Roma, continuou sendo imperturbavelmente um africano autêntico, simples, humilde, respeitador de todos, sem pompa, desejoso sobretudo de aprofundar a
cada dia o seu amor e a sua amizade com Cristo e de tornar seu serviço à Igreja e ao Papa cada vez
mais verdadeiro, total e humilde.
Foi uma ponte sólida e segura
entre a África e a Santa Sé. Foi
um digno filho da Igreja. Foi um
digno e nobre representante da
África diante dos outros continentes e povos do mundo. Eis o que
Bento XVI disse dele: “A sua personalidade, humana e sacerdotal,
constituía uma síntese maravilhosa das características da alma africana com as que são próprias do
espírito cristão, da cultura e da
identidade africana com os valores evangélicos. Foi o primeiro
eclesiástico africano que ocupou
À esquerda, Paulo VI diante
do monumento aos mártires
ugandenses, Namugongo,
2 de agosto de 1969. Montini foi
o primeiro papa a visitar a África;
abaixo, o cardeal Bernardin Gantin em
visita ao seminário de Ouidah, no Benim,
seu país natal, no qual voltou a viver em
2002 depois de deixar o cargo de decano
do Sacro Colégio
28
30DIAS Nº 10 - 2011
BENIM. A segunda visita pastoral de Bento XVI à África
morrer, dá logo um grande número de rebentos que tomam o seu
lugar. Eis o meu rebento”. Reconheço que diante das imensas
qualidades do cardeal eu não sou
mais que um rebento amarrotado, pobre e sem grande valor.
Mas tenho orgulho de tê-lo tido
como pai e que ele tenha-me considerado seu filho espiritual.
Dirigindo-se ao Benim, Bento
XVI faz uma visita à África inteira, para confirmar sua fé, despertar sua esperança e a confiança
em seu futuro, um futuro luminoso porque está nas mãos de
Deus. O Santo Padre dará à Igreja que está na África um novo impulso missionário e um dinamismo novo a serviço do Evangelho,
da reconciliação, da justiça e da
paz. Mas, se vai ao Benim, é também o cardeal Gantin, esse homem “cheio de espírito e sabedoria”, esse grande servidor de
Deus, da Igreja e do papa, que
Bento XVI desejará venerar, indo
recolher-se por alguns momenGantin com João Paulo I,
em 28 de setembro de 1978
cargos de altíssima responsabilidade na Cúria Romana, e desempenhou-os sempre com aquele típico estilo humilde e simples”
(Homilia na missa em sufrágio
pelo cardeal Bernardin Gantin,
23 de maio de 2008).
Tive o privilégio de conhecer o
cardeal Gantin em 1971. Ele era
então secretário da Congregação
para a Evangelização dos Povos
(Propaganda Fide). E eu, estudante em Roma. O meu bispo,
sua excelência dom RaymondMarie Tchidimbo, arcebispo de
Conakry, na Guiné, estava na prisão. A Igreja da Guiné atravessava a tormenta da perseguição sob
o regime revolucionário de Sékou
Touré. Eu, portanto, já não tinha
bispo e perdera todos os contatos
com o meu país e a minha família.
Assim, dom Bernardin, na época,
era para mim bispo, pai, conselheiro. A sua humildade, a sua
simplicidade e a sua delicadeza
me marcaram profundamente.
Tinha um afeto imenso por mim e
eu por ele. Considerava-me como
João Paulo II em Dacar, durante a viagem apostólica ao Senegal, à Gâmbia e à Guiné,
em fevereiro de 1992
seu filho, seu prosseguimento,
seu rebento. Um dia, durante
uma recepção na embaixada de
Senegal na Santa Sé, organizada
em sua homenagem por ocasião
de sua volta definitiva ao Benim,
disse falando de mim: “Eu hoje
sou como uma bananeira. A bananeira, depois que deu fruto, é
cortada e morre. Mas, antes de
tos diante de seu túmulo. Merece
a amizade e a atenção do Papa.
Que esta segunda visita pastoral do Santo Padre possa reforçar
e tornar mais filial e mais afetuosa
a devoção e a fidelidade de toda a
Igreja da África ao Sucessor de
Pedro, como foi a devoção e a fidelidade do venerado cardeal Bernardin Gantin.
q
30DIAS Nº 10 - 2011
29
ANO DA FÉ 2012-2013
Para descer à cripta e venerar o túmulo de Francisco, Banto XVI atravessa a Basílica Inferior de São Francisco com alguns líderes e
representantes das Igrejas, das Comunidades eclesiais e das religiões do mundo, durante o Encontro de Assis, em 27 de outubro de 2011
A fé tem a característica de um dom que sobrevém,
que não pode ser deduzido nem “produzido”. Não se trata
de uma conquista nossa. Entrevista com o cardeal Walter Kasper
Um dom,
não uma posse
por Gianni Valente
30
30DIAS Nº 10 - 2011
É Deus quem mantém a porta da fé aberta,
para nós e para todos. Por isso, o início da fé
é sempre possível. O Papa, no Encontro de Assis,
disse que os agnósticos ajudam os crentes a não
considerar Deus sua propriedade... Em meio
à secularização, Deus tem seus caminhos para tocar
o coração de cada homem. O coração daqueles
que buscam e também o daqueles que não buscam.
E são caminhos que nós não conhecemos
Nestas páginas,
afrescos de
Pietro Lorenzetti
na Basílica Inferior
de São Francisco,
em Assis.
À direita,
A última ceia
m “ano da fé”, um “tempo
de particular reflexão”
convocado a exemplo do
que fez Paulo VI em 1967, com a
intenção de promover “uma conversão a Deus cada vez mais completa, para fortalecer a nossa fé
nEle e para O anunciar com alegria ao homem do nosso tempo”.
A proposta de Bento XVI a toda a
Igreja, antecipada na homilia de
16 de outubro e explicada na carta apostólica Porta fidei, encon-
U
tra-se ainda na fase germinal do
anúncio e se concretizará apenas
daqui a onze meses, a partir de outubro de 2012, quando serão celebrados os cinquenta anos do início do Concílio Ecumênico Vaticano II e os vinte da publicação do
Catecismo da Igreja Católica.
No entanto, desde as preliminares
– observou padre Federico Lombardi, diretor da Rádio Vaticana e
da Assessoria de Imprensa Vaticana –, a iniciativa anunciada pelo
papa Ratzinger pode ser considerada uma daquelas que caracterizarão este pontificado.
Já as primeiras menções e a
Carta apostólica de proclamação
são atravessadas por vários convites discretos e reconfortantes a
deixar de lado “eclesiocentrismos” autorreferenciais e a pedir
tudo a Jesus Cristo, “autor e consumador da fé”.
“O que de mais importante nos
deveria dizer o pastor do povo ¬
30DIAS Nº 10 - 2011
31
ANO DA FÉ 2012-2013
de Deus em caminho?”, comentou padre Lombardi. 30Dias repassou a questão ao cardeal Walter Kasper, presidente emérito do
Pontifício Conselho para a Promoção da Unidade dos Cristãos.
Bento XVI proclamou um
ano da fé. Paulo VI fez o mesmo, em 1967. Naquela época, tanto o senhor como Joseph Ratzinger eram jovens
teólogos na flor da idade.
Que lembranças o senhor
tem daquela decisão do papa
Montini?
WALTER KASPER: Aqueles
eram os anos logo após o Concílio. Passado o grande entusiasmo,
parecia que estávamos vivendo
uma espécie de colapso na Igreja.
Parecia que a fé estava desfalecendo, justamente quando nos
ambientes eclesiásticos eram discutidas reformas necessárias à
Igreja, para reapresentar o anúncio cristão na realidade do nosso
tempo. Ratzinger escreveu naquela época a Introdução ao cristianismo. Eu escrevi a Introdução à
fé. Naquele contexto, Paulo VI teve a intuição de promulgar o ano
da fé, que se concluiu com a proclamação do Credo do povo de
Deus. Ele queria indicar a todos
que o coração de tudo é a fé. Até
mesmo as reformas são úteis e necessárias quando promovem a vida da fé e a salvação de todos os
fiéis. Nos últimos dias reli Bernardo de Claraval: sua grande reforma também era apenas uma retomada da fé. Como escrevia Yves
Congar, “as reformas bem-sucedidas na Igreja são aquelas que são
feitas para atender às necessidades concretas das pessoas”.
Por que proclamar um ano
da fé justamente agora?
Vivemos uma crise. É visível
sobretudo na Europa. É evidente
na Alemanha. Mas, se eu conversar com os bispos italianos, eles
me contarão as mesmas coisas.
Muitos dos jovens, sobretudo, não
têm nenhum contato real com a
vida da Igreja e com os sacramentos. Se falamos em nova evangelização, não podemos deixar de toA Crucifixão, detalhe
32
30DIAS Nº 10 - 2011
mar consciência disso. Do contrário, acabamos por fazer coisas
acadêmicas.
No entanto, Bento XVI começa a Carta de promulgação deste ano particular dizendo que “a porta da fé está
sempre aberta para nós”. O
que indica esse incipit?
É Deus quem mantém a porta
da fé aberta, para nós e para todos.
Não somos nós que podemos ou
devemos nos preocupar em abri-la.
Por isso, o início da fé é sempre
possível. Não se trata de uma conquista nossa. A fé tem a característica de um dom que sobrevém, que
não pode ser deduzido, que não
O dom da fé não é uma espécie de impulso,
um empurrão que alguém nos dá no início,
e depois prosseguimos sozinhos.
Assemelha-se muito mais a uma lanterna
que carregamos na mão, e se move conosco
iluminando o breve trecho de caminho que
temos à nossa frente. A sua luz é necessária
e suficiente para dar o próximo passo
ENTREVISTA COM O CARDEAL WALTER KASPER
Bento XVI em oração diante do túmulo de Francisco na cripta
da Basílica Inferior com alguns líderes e representantes das Igrejas,
das Comunidades eclesiais e das religiões do mundo
pode ser “produzido”. Também
por isso foi importante o convite
que o Papa dirigiu aos agnósticos
no recente Encontro de Assis. Em
meio à secularização, Deus tem
seus caminhos para tocar o coração de cada homem. O coração daqueles que buscam e também o daqueles que não buscam. E são caminhos que nós não conhecemos.
Em Assis, Bento XVI falou
dos agnósticos em termos
que certamente não são de
confronto.
O Papa disse que os agnósticos
ajudam os crentes “a não considerar Deus sua propriedade”. Deus
não é uma posse de quem crê.
Não podemos dizer a respeito da
fé: eu a possuo, outros não... Os
crentes, que receberam o dom da
fé, também estão em peregrinação. E nunca podemos pretender
antecipar esse dom, como a com-
preensão que tenhamos de um saber conceitual. Às vezes, na Igreja, diante da incredulidade e do agnosticismo, as pessoas acabam
por se entrincheirar e dão a impressão de considerar a fé como
uma posse. Como se o problema
fosse disputar e lutar com quem
não crê... Quase perdem de vista
que Cristo morreu por todos.
Nas primeiras linhas da
Porta fidei é salientado que
muitas vezes mesmo na Igreja
prevalece a preocupação com
as consequências sociais, culturais e políticas do engajamento dos cristãos, continuando a pensar na fé “como
um pressuposto óbvio da sua
vida diária”. O senhor também nota esse modo de entender a fé como algo óbvio?
Em primeiro lugar, a fé é uma
relação pessoal com Deus, que se
expressa na oração e na confiança de sermos carregados nos braços por Deus em qualquer situação, ou, como Jesus diz: amar a
Deus de todo o coração. Os teólogos falam de uma virtude teologal.
Porém, nesse primeiro mandamento o amor de Deus está imediatamente conectado com o
amor ao próximo como a nós
mesmos. Assim, a fé tem consequências sociais, culturais e políticas sem as quais não seria sincera.
Por outro lado, essas consequências devem ser animadas e motivadas pelo amor a Deus, senão se
tornam uma forma de ideologia
humanista, que fica sem fundamento firme. Penso na pregação
nas igrejas, no domingo. Nenhuma outra realidade humana tem
essa oportunidade de alcançar
tantas pessoas que vêm ouvir espontaneamente. Mas às vezes as
homilias parecem apenas instruções sobre o que os cristãos devem e não devem fazer em nível
moral, cultural, político; falta frequentemente a mensagem cheia
de alegria de que Deus sempre
nos precede com a sua graça.
Há quem diga: hoje é preciso apostar mais na fé e menos
nas obras sociais. Essa é a
“solução”?
Não podemos contrapor fé e
caridade. Seria um intelectualismo
ou uma espécie de misticismo ¬
30DIAS Nº 10 - 2011
33
ANO DA FÉ 2012-2013
mal interpretado. São Paulo disse
que a fé se torna operante na caridade. E sempre se expressou nas
obras de misericórdia corporal e
espiritual: ajudar os pobres, os encarcerados, os oprimidos, os
doentes... Essa é simplesmente a
vida cristã. Pessoalmente, vi os
testemunhos mais convincentes
da fé justamente nas viagens que
fazia quando era responsável na
Igreja alemã pela ajuda às Igrejas
dos países em via de desenvolvimento. Nós íamos a esses países
levando alguns recursos materiais
para ajudar aquelas pessoas a sobreviverem e, na miséria das al-
Pois o Credo expressa os artigos
fundamentais da fé, que são comuns a todos os cristãos e correspondem às promessas batismais.
Portanto, são constitutivos para a
existência cristã. Mas me parece
importante o fato de a simples
confissão de fé não exprimir uma
pretensão de posse conceitual da
verdade. Muitas vezes cantamos o
Credo durante a missa dominical.
Um sistema dogmático-conceitual
não pode ser cantado. Mas nós
cantamos o Credo, e o cantamos
como oração. É uma doxologia,
um louvor e um reconhecimento
que dá graças.
ras. A fé permanece aberta a reconhecer a realidade viva que essas
palavras indicam. E para Tomás a
“res” é o próprio Deus. É ele que
age, não somos nós que temos de
“demonstrá-lo”. Além disso, o
Credo é também a síntese da fé
das outras gerações. Na fé não estamos só diante de Deus. Estamos
numa comunhão que abraça todos
os séculos. Em tempos como os
nossos, percebemos ainda mais o
quanto é importante encontrar
conforto e gozar na companhia
dos santos e dos Padres da Igreja, e
de todas as grandes testemunhas
que nos precederam.
No Credo nós confessamos crer em Deus Pai,
em Jesus Cristo, no Espírito Santo,
mas não confessamos ter fé na Igreja.
A Igreja não é termo de fé. Talvez seja útil
recordar que os Padres da Igreja não sentiram
a necessidade de elaborar nenhuma
eclesiologia sistemática. Refletir sobre a Igreja
não era um problema para eles; bastava uma
ou outra menção. O cerne de seus interesses
e de suas preocupações não era certamente
a instituição eclesiástica
Paulo VI pronuncia o Credo do povo de Deus, na praça de São Pedro, domingo, 30 de junho de 1968
deias e das favelas, nos deparávamos com a alegria e a confiança de
uma vida escolhida e consolada
pelo Senhor. O mesmo me aconteceu olhando para a fé de muitos
irmãos que encontrei no diálogo
ecumênico. Por meio de relações
fraternais, damos testemunho da
fé católica.
Agora que o Ano da Fé foi
proclamado, o que é preciso
fazer?
Bento XVI pediu apenas que
refletíssemos sobre o Credo em
todas as dioceses. Não basta rezálo, é preciso conhecê-lo e compreendê-lo em sua profundidade.
34
30DIAS Nº 10 - 2011
Há quem diga que é preciso fazer mais para tornar crível a visão antr opológica
cristã.
Sim, sem dúvida isso também é
importante. A fé não é apenas um
ato intelectual, mas um modo de
ser e de viver nas mãos de Deus e
sob a sua providência. Isso implica
também a bem entendida liberdade cristã. A confissão de fé é oração porque pedido a Deus que revele seu mistério. Como dizia Santo Tomás, actus fidei non terminatur ad enuntiabile, sed ad rem.
O ato de fé não termina na repetição verbal de fórmulas verdadei-
“Os crentes fortificam-se
acreditando”, escreve o Papa, citando Santo Agostinho. Como as pessoas crescem e progridem no caminho
da fé?
Na fé, as pessoas são levadas,
quer no início, quer ao longo do
caminho da vida. Nas experiências da vida descobrimos cada vez
mais as riquezas da fé. Não somos
nós que conservamos a fé, como
uma propriedade adquirida. Nós
somos preservados na fé. Escreveu Santo Tomás: “A graça cria a
fé não apenas quando a fé nasce
numa pessoa, mas por todo o
ENTREVISTA COM O CARDEAL WALTER KASPER
A Ressurreição
tempo que a fé dura”. Usamos essa definição no quadro do acordo
com os luteranos, quando reconhecemos a identidade fundamental existente entre a teologia
de Lutero sobre a justificação pela
fé e aspectos essenciais da doutrina do Concílio de Trento definida
no decreto De iustificatione. Isso
significa que o dom da fé não é
uma espécie de impulso, um empurrão que alguém nos dá no início, e depois prosseguimos sozinhos. E também não é como os
sistemas de iluminação das pistas
dos aeroportos: luzes cimentadas
no asfalto para iluminar todo o
percurso. A fé se assemelha muito
mais a uma lanterna que carrega-
mos na mão, e se move conosco
iluminando o breve trecho de caminho que temos à nossa frente.
A sua luz é necessária e suficiente
para dar o próximo passo.
Se a fé, no início e em cada
passo, é um dom e um reconhecimento da obra gratuita
do Senhor, o que é a Igreja?
A Igreja é – como diz uma antiga definição – a comunhão dos
fiéis. Tertuliano disse: Unus
christianus, nullus christianus.
Um só cristão, nenhum cristão.
Como cristãos, nunca estamos
sozinhos, mas sempre numa comunidade de fiéis de todos os
tempos e de todos os lugares. Todavia, a Igreja não é termo de fé.
A Igreja é sacramento, ou seja, sinal e instrumento. No Credo nós
confessamos crer em Deus Pai,
em Jesus Cristo, no Espírito Santo, mas não confessamos ter fé
na Igreja. Cremos em Deus, e é
ele que nos revela a Igreja como
Corpo de Cristo e como Seu povo. A Igreja é como a lua, que não
tem luz própria mas reflete apenas a luz do sol, que é Cristo. Se
não remete a Cristo, não manifesta nenhuma beleza própria. A
beleza que se encontra nela – por
exemplo, nas liturgias – é apenas
um reflexo da glória de Deus.
No entanto, às vezes parece que a Igreja quer ocupar a
cena, pensando que dessa
forma dá testemunho do Senhor.
Talvez seja útil recordar que os
Padres da Igreja não sentiram a
necessidade de elaborar nenhuma
eclesiologia sistemática. Refletir
sobre a Igreja não era um problema para eles; bastava uma ou outra menção. O cerne de seus interesses e de suas preocupações
não era certamente a instituição
eclesiástica. A eclesiologia começa apenas no final da Idade Média,
em reação ao conciliarismo e, depois, a Lutero. E, como disse Yves
Congar, começa como “hierarcologia”, para expor as razões teológico-doutrinais da função e da supremacia das hierarquias na estrutura eclesial. Dali partiu também a
tentação e a armadilha de um certo “eclesiocentrismo”. O Concílio
Vaticano II, com seu ressourcement nos Padres, retomou também a imagem usada por muitos
deles sobre a Igreja como simples
reflexo da luz e da obra de Cristo,
o que se encontra também no título da constituição sobre a Igreja do
Concílio Vaticano II: Lumen gentium.
A propósito de hierarcologia, também hoje, ao menos
na mídia, fala-se muito dos
bispos e dos cardeais.
É claro que os bispos e os cardeais têm seu papel na vida da
Igreja. Mas Bento XVI não para
de repetir que a questão central
não é a Igreja, mas Deus. Se a fé
em Deus se enfraquece, podemos até deixar a Igreja de lado e
esquecê-la.
q
30DIAS Nº 10 - 2011
35
Curtas Curtas Curtas Cu
3ODIAS NO MUNDO 3ODIAS NO MUNDO 3ODIAS NO MUNDO 3ODIAS NO MUN
PAPA/1
PAPA/2
Ano da fé 2012-2013
Três novos santos
Bento XVI, na homilia da
santa missa celebrada na
Basílica de São Pedro, domingo 16 de outubro,
anunciou a proclamação
de um Ano da Fé, que começará no dia 11 de outubro de 2012, dia do 50º
aniversário da inauguração do Concílio Vaticano II
e ter minará a 24 de novembro de 2013, solenidade de Cristo Rei. No dia
17 de outubro foi publicado o motu proprio Porta
fidei com o qual o Papa
for malizou e explicou a
sua decisão.
No dia 23 de outubro Bento
XVI canonizou o bispo Guido Maria Conforti, o sacerdote Luís Guanella e a religiosa espanhola Bonifácia
Rodríguez de Castro. Na homilia o Papa disse: “Três novos santos, que se deixaram
transformar pela caridade
divina modelando nela toda
a sua existência”.
PAPA/3
“Deus não é
propriedade
dos que creem”
“Deus não é uma ‘propriedade’ dos que creem. Bento XVI fala aos trezentos
representantes de várias
religiões do mundo que
convidou a Assis, vinte e
cinco anos depois do primeiro encontro organizado por Wojtyla”. Este é o
incipit de um artigo de
Gian Guido Vecchi, publicado no Corriere della Sera de 28 de outubro, dedicado ao “Dia de reflexão,
diálogo e oração pela paz e
a justiça no mundo” realizado em Assis a 27 de outubro. Continua o artigo:
“Bento XVI faz um elogio
aos agnósticos que refletem, os que ‘procuram a
verdade’ e com o seu
exemplo tiram dos ‘ateus
combativos’ a sua ‘falsa
certeza’, mas ao mesmo
tempo ‘chamam em causa’
todos os que creem: para
que ‘não considerem Deus
como uma propriedade’.
Se as pessoas que procuram a verdade ‘não encontram Deus’, depende ‘também, dos que creem’ que
têm uma imagem estreita
ou mesmo deturpada de
Deus’. Assim os agnósticos
têm um papel importante
contra a ‘decadência do
homem e do humanismo’.
Vecchi conclui: “Como foi
anunciado não houve um
momento comum de oração. Ainda assim era de ver
todos juntos, quando no final desceram à cripta sob a
Basílica para prestar homenagem ao túmulo de
São Francisco”. Título do
artigo: O Papa elogia os
agnósticos: “Uma ajuda
para os que creem”.
¬
À esquerda, Paulo VI pronuncia o Credo do povo de Deus, domingo, 30 de junho de 1968,
no final do Ano da Fé
À direita, para descer à cripta
e venerar o túmulo
de Francisco, Bento XVI
atravessa a Basílica inferior
de São Francisco com alguns
chefes e representantes das
Igrejas, das Comunidades
eclesiais e das religiões de todo
o mundo, por ocasião
do Encontro de Assis,
dia 27 de outubro de 2011
36
30DIAS Nº 10 - 2011
urtas Curtas Curtas Curtas
NDO 3ODIAS NO MUNDO 3ODIAS NO MUNDO 3ODIAS NO MUNDO 3ODIAS NO MUNDO
ANO DA FÉ 2012-2013
O cristianismo está nas palavras: “Jesus ressuscitou”
O jornal Corriere della Sera de 17 de
outubro publicou amplos trechos do
discurso de Vittorio Messori ao Pontifício Conselho para a Promoção da Nova Evangelização. Este foi o incipit:
“Devemos voltar a nos conscientizar de
que aquilo que cremos, aquilo do qual
todo o resto provém, está contido (ensina-nos São Paulo) somente nas palavras: ‘Jesus ressuscitou’. A partir disso
deram-se todas as consequências: ‘Portanto Jesus é o Cristo anunciado pelos
profetas e esperado por Israel’. Isso é o
que os primeiros cristãos chamavam
kérygma, ou seja, o grito do arauto que
– pelas ruas e praças – anunciava ao
povo as novidades mais ur gentes.
Creio que a reevangelização do Ocidente, solicitada a nós por João Paulo II
e Bento XVI, não seja nada mais do que
isso: nada de doutrinas complicadas,
mas sim o reconhecimento do kérygma, a base sobre a qual tudo se sustenta. Voltar a proclamar um simples e ao
mesmo tempo escandaloso: Iesùs estì
Kyrios, Jesus é o Senhor”.
Depois, recordando os tempos do
Concílio Vaticano II, Messori continua:
“Debatia-se sobre a organização da
instituição eclesial, sobre o papel do
papa, dos bispos, dos padres, dos leigos, das mulheres, da liturgia. Não se falava de
fé, e menos ainda das suas razões, isso era considerado como um dado óbvio, assumido, enquanto se batalhava sobre como devia ser para
os católicos: a ética, o compromisso político,
social, econômico, cultural. Mas estas não
eram nada mais que as consequências de uma
causa primeira, o sim à verdade do Credo, que
ninguém se dedicava a examinar e verificar”.
Messori conclui: “Não se pode deixar uma
marca na sociedade ou na cultura repropondo
a perspectiva evangélica, se não se enfrenta
antes o problema de Cristo e da verdade do seu
evangelho. Os problemas com os quais os católicos de hoje devem confrontar-se muitas vezes têm uma raiz não declarada ou mesmo dramática: a diminuição da fé, a redução de Jesus
a um mestre de moral, do Novo Testamento a
obscuro pasticho de judaísmo e de paganismo, do milagre a mito, da esperança escatológica a compromisso secular. Bem antes de
qualquer reforma institucional e de toda a pregação moral ou social, devemos reencontrar o
Credo, o que recitamos na Missa, no seu sentido mais pleno”.
30DIAS Nº 10 - 2011
37
Curtas Curtas Curtas Cu
3ODIAS NO MUNDO 3ODIAS NO MUNDO 3ODIAS NO MUNDO 3ODIAS NO MUN
MILAGRE E MARTÍRIO
“Como cordeiros para o meio de lobos”. A espada de São Paulo
“No trecho do Evangelho que ouvimos, Jesus envia setenta e dois discípulos para a grande colheita que é o
mundo, convidando-os a pedir ao Senhor da colheita,
a fim de que nunca faltem trabalhadores para a sua colheita (cf. Lc 10, 1-3); e não os envia com meios poderosos, mas sim ‘como cordeiros para o meio de lobos’
(v. 3), sem bolsa, nem alforje, nem sandálias (cf. v. 4).
Numa das suas Homilias, São João Crisóstomo comenta: ‘Enquanto formos cordeiros, venceremos e,
mesmo que sejamos circundados por numerosos lobos, conseguiremos superá-los. Mas se nos tornarmos
lobos, seremos derrotados, porque ficaremos desprovidos da ajuda do pastor’ (Homilia 33, 1: PG 57,
389). Os cristãos jamais devem ceder à tentação de se
tornar lobos no meio dos lobos; não é com o poder,
com a força e a violência que o reino de paz de Cristo
se difunde, mas com o dom de si, com o amor levado
ao extremo, também aos inimigos. Jesus não vence o
mundo com a força das armas, mas com a força da
Cruz, que é a verdadeira garantia da vitória. E isto, para quem quer ser discípulo do Senhor, seu enviado,
tem como consequência o estar pronto também à pai-
xão e ao martírio, a perder a própria
vida por Ele, para que no mundo
triunfem o bem, o amor e a paz. Esta
é a condição para poder dizer, entrando em cada realidade: ‘A paz esteja nesta casa!’ (Lc 10, 5).
Diante da Basílica de São Pedro
encontram-se duas estátuas grandes
dos santos Pedro e Paulo, facilmente
identificáveis: São Pedro está com as
chaves na mão, e São Paulo, ao contrário, tem nas mãos uma espada.
Para quem não conhece a história
deste último, poderia pensar que se
São Paulo
trata de um grande comandante que
guiou exércitos poderosos e com a espada submeteu
povos e nações, alcançando fama e riqueza com o sangue alheio. No entanto, é exatamente o contrário: a
espada que ele tem nas mãos é o instrumento com que
Paulo foi morto, com que padeceu o martírio e derramou o seu próprio sangue. A sua batalha não foi a da
violência, da guerra, mas a do martírio por Cristo. A
sua única arma foi precisamente o anúncio de ‘Jesus
Cristo, e Cristo crucificado’ (1Cor 2, 2). A sua pregação não se fundou ‘em discursos persuasivos da sabedoria, mas na manifestação do Espírito e do poder divino’ (v. 4)”. [...] “Esta mesma lógica é válida também
para nós, se quisermos ser portadores do reino de paz
anunciado pelo profeta Zacarias e realizado por Cristo: devemos estar dispostos a pagar pessoalmente, a
padecer em primeira pessoa a incompreensão, a rejeição e a perseguição. Não é a espada do conquistador
que constrói a paz, mas a espada do sofredor, de quem
sabe entregar a própria vida”. Palavras do Papa Bento
XVI durante a audiência geral da quarta-feira, 26 de
outubro de 2011.
“Membra Christi et corpus sumus omnes simul; non qui
hoc loco tantum sumus, sed et per universam terram; nec
qui tantum hoc tempore, sed quid dicam? Ex Abel iusto usque in finem saeculi / Todos juntos somos membros e
corpo de Cristo: não somente nós que nos encontramos aqui neste lugar, mas todos nós em toda a terra. E
não somente nós que vivemos neste tempo, mas que
dizer? desde o justo Abel até o fim do mundo”, Agostinho, Sermones 341, 9, 11; cf. Lumen gentium, n. 2.
Abel e Caim, Capela Palatina, Palermo
38
30DIAS Nº 10 - 2011
urtas Curtas Curtas Curtas
NDO 3ODIAS NO MUNDO 3ODIAS NO MUNDO 3ODIAS NO MUNDO 3ODIAS NO MUNDO
IGREJA/1
Tettamanzi: o livro
da vida é Jesus
“‘O livro da vida’, diz São Bernardo, ‘é Jesus; bem-aventurado o que tem a possibilidade de ler neste livro’: para ele
haverá grande alegria e paz”.
É a conclusão de um discurso
do cardeal Dionigi Tettamanzi no Corriere della Sera de 2
de novembro por ocasião da
publicação do novo Evangeliário ambrosiano.
SAGRADO
COLÉGIO/1
Os oitenta anos
de Law
No dia 4 de novembro o cardeal norte-americano Bernard Francis Law, arcipreste
da Basílica papal de Santa
Maria Maior, completou 80
anos. Na data o Colégio cardinalício resulta composto
por 193 purpurados dos
quais 112 eleitores.
IGREJA/2
SAGRADO
COLÉGIO/2
Martini e os
movimentos
As demissões
de Rosales
“Os movimentos podem dar
muito à Igreja como se vê no
movimento ecumênico e no
movimento bíblico. Mas quando nestes predominam as dinâmicas do poder e do lucro a
Graça pode ser perdida e a
Igreja ao invés de se enriquecer de nova energia espiritual,
sofre de hemorragias debilitantes”. São palavras do cardeal Carlo Maria Martini publicadas no Corriere della Sera
de domingo, 30 de outubro,
ao responder a uma leitora na
coluna que o cardeal publica
todos os meses no jornal.
No dia 13 de outubro o Papa
acolheu as demissões do cardeal Gaudencio Borbon Rosales, 79 anos, do cargo de arcebispo de Manila, nas Filipinas.
Para substituí-lo foi nomeado
Luis Antonio Tagle, 54 anos,
desde 2001 bispo de Imus.
RÚSSIA/1
Os dons do Espírito
ou uma inexpressiva
percussão de
tambores
“O mundo não precisa de
uma ‘Igreja política’. A redu-
Batismo em Moscou
ção da Igreja de Cristo nos
últimos séculos levou ao
afastamento em massa das
pessoas. [...] Se os cristãos
não se preocuparem em
conseguir os autênticos
dons do Espírito, e em primeiro lugar a santidade, a
sua pregação se reduzirá a
uma inexpressiva percussão
de tambores”. É uma passagem do discurso do diretor
da revista do Patriarcado de
Moscou, Sergej Capnin, em
SÍNODO
Wuerl relator geral
Em vista da XIII Assembleia Geral
Ordinária do Sínodo dos Bispos,
que será realizada de 7 a 28 de outubro de 2012, sobre o tema “A
nova evangelização para a transmissão da fé cristã”, no dia 22 de
outubro o Papa nomeou como relator geral o cardeal Donald William Wuerl, 71 anos, desde 2006
arcebispo de Washington, e secretário especial o arcebispo de
Montpellier, na França, PierreMarie Joseph Carré, 64 anos.
O cardeal Donald William Wuerl
um congresso organizado
pela Fundação Rússia Cristã
em Milão, junto à Universidade Católica do Sagrado
Coração e publicado no
L’Osservatore Romano de
4 de novembro.
RÚSSIA/2
Medvedev
e o milagre da fé
“Se falarmos do que aconteceu nos últimos vinte
anos, em termos da minha
experiência de cristão ortodoxo, é um milagre. Francamente não poderia imaginar, 15 ou 20 anos atrás,
que a recuperação, o reencontro da fé por parte de
um número tão grande de
cidadãos teria sido tão rápido”. Palavras do presidente
da Federação Russa Dmitrj
Medvedev em um discurso
em um congresso no qual
participavam também o patriarca de Moscou, Kirill, e
outros importantes expoentes da Igreja Ortodoxa. As palavras do presidente russo foram também
publicadas no blog San ¬
30DIAS Nº 10 - 2011
39
Curtas Curtas Curtas Cu
3ODIAS NO MUNDO 3ODIAS NO MUNDO 3ODIAS NO MUNDO 3ODIAS NO MUN
Pietro e dintorni, do vaticanista Marco Tosatti, em 7
de novembro.
ITÁLIA
tam as funções religiosas
uma vez por mês ou menos) a cota dos favoráveis a
um maior engajamento organizado dos católicos é
ainda mais inferior (22%)”.
Para a maioria dos
católicos um partido
católico seria danoso
ORIENTE MÉDIO /1
No Corriere della Sera de
23 de outubro o noto especialista em pesquisa de opinião Renato Mannheimer
analisou qual seria a posição dos católicos italianos
sobre a hipótese do nascimento de um novo partido
católico. Eis as suas conclusões: “Somente pouco
mais de um quarto (26%)
dos praticantes (quer dizer,
na nossa tipologia, os que
vão à missa ao menos duas
vezes por mês) declara
apreciar um reforçamento
da presença política dos
católicos em quanto tal no
nosso país. Chega a 44% a
porcentagem dos que consideram danosa ou de todo
modo não oportuna uma
tal escolha. E entre os ‘esporádicos’ (os que frequen-
O ataque ao Irã
causaria desastres
por um século
Israel está pronto para
bombardear o Irã. Essas indiscrições filtradas na imprensa foram confirmadas
pelo presidente israelense
Shimon Peres que, em várias ocasiões públicas,
confirmou a existência de
um plano militar para evitar a produção de armas
atômicas iranianas. Um artigo do Corriere della Sera de 5 de novembro, depois de comentar que a hipótese de um ataque contra as estruturas nucleares
iranianas “divide o governo” israelense, continua
assim: “Foram três os ex
chefes de serviço secreto –
Efraim Levy, Yuval Diskin
Gilad Shalit
e Meir Dagan [...] – que desaconselharam abertamente: o Irã ainda não é
uma ameaça, Ahmadinejad não é Saddam e nem
mesmo Assad, os bombardeios a surpresa desta vez
‘causariam desastres por
um século’”.
ORIENTE MÉDIO /2
Segev: Shalit e
a histórica negociação
com o Hamas
Fiéis em uma missa dominical na paróquia
40
30DIAS Nº 10 - 2011
“A grande novidade histórica é que o Hamas e Israel fizeram um acordo. E no dia
seguinte o mundo não caiu.
Fizeram um pacto com o
diabo e o sol nasceu do mesmo jeito. As duas partes deram-se conta de que raciocinar ao redor de uma mesa é
possível. Este pequeno passo pode levar a um pouco de
racionalidade e a algo diferente, no futuro. Não acontecerá amanhã. Mas depois
de amanhã, quem sabe”.
Palavras do historiador israelense Tom Segev, entrevistado pelo Corriere della
Sera um dia depois da libertação do soldado de Tsahal
Gilad Shalit por parte do
Hamas em troca de 1.027
prisioneiros palestinos.
ORIENTE MÉDIO /3
A Unesco reconhece
o Estado palestino
“Vamos esclarecer! Se os
palestinos se armam, todos
reclamam que a violência é
um obstáculo à paz. Se os
palestinos tentam forçar a
via diplomática, como fizeram ontem, todos reclamam que estas iniciativas
‘unilaterais’ são um obstáculo à paz. Então gostaríamos de saber – particularmente de Israel, Estados
Unidos e Itália – exatamente o que os palestinos deveriam fazer, com exceção de
desaparecer entre as nuvens, como no filme Milagre em Milão. Ontem a Palestina foi admitida à Unesco. É uma história antiga –
todos os anos os palestinos
regularmente pedem para
serem admitidos –, novo
resultado: 107 contra 14,
com 52 abstenções. A
aprovação chegou, graças
principalmente ao consen-
urtas Curtas Curtas Curtas
NDO 3ODIAS NO MUNDO 3ODIAS NO MUNDO 3ODIAS NO MUNDO 3ODIAS NO MUNDO
della Sera de 27 de outubro comentando as eleições tunisianas realizadas
no final de outubro e vencidas pelo partido de inspiração islâmica Ennahda, cujo
líder é Rachid Ghannouchi.
so da nova frente que guia o
desenvolvimento mundial,
os países do Brics, Brasil,
Índia, os países africanos,
árabes, a China, a Rússia e
alguns países europeus relevantes como a França e a
Bélgica”. Texto de Lucia
Annunziata publicado no
La Stampa de 1º de novembro.
DIPLOMACIA/2
Novos embaixadores
junto à Santa Sé
TUNÍSIA
O partido islâmico
como a Democracia
Cristã de Aldo Moro
“Ennahda é comparável à
Democracia Cristã nos
tempos de Aldo Moro. Não
existe um só islã como não
existia um só comunismo.
Não podemos colocar no
mesmo plano os extremistas radicais e os islâmicos
moderados. Seria como
considerar do mesmo mo-
Rachid Ghannouchi, líder
do partido islâmico Ennahda
do Pol Pot e Berlinguer”. É
uma declaração de Moncef
Marzouki, líder do CPR
(Congresso para a República), publicada no Corriere
No dia 9 de setembro Bento XVI recebeu as cartas
credenciais do novo embaixador da Grã-Bretanha junto à Santa Sé. Trata-se de
Nigel Marcus Baker, 45
anos, diplomata de carreira, que nos últimos quatro
anos foi chefe de missão na
Bolívia.
No dia 21 de outubro foi
a vez do novo representante
dos Países Baixos, Joseph
Weterings, 62 anos, diplomata de carreira, que já foi
embaixador na Líbia e em
Zimbábue.
No dia 31 de outubro foi
a vez do novo representante
do Brasil, Almir Franco de
Sá Barbuda, 68 anos, diplomata de carreira, nos últimos anos embaixador na
Bélgica e depois cônsul geral em Washington.
Em 4 de novembro foi
recebido o novo embaixador da Costa do Marfim, Joseph Tebah-Klah, 63 anos,
diplomata de carreira, que
entre 2003 e 2006 foi conselheiro e encarregado de
negócios ad interim na embaixada junto à Santa Sé.
Enfim, em 7 de novembro foi a vez do novo embaixador da Alemanha, Reinhard Schweppe, 62 anos,
diplomata de carreira, antes
chefe de missão em Varsóvia e por último representante junto à sede da ONU
em Genebra.
q
DIPLOMACIA
Novos núncios na República Tcheca, Peru, EUA e Antilhas
No dia 15 de setembro o Papa nomeou o arcebispo siciliano Giuseppe Leanza, 68 anos, novo núncio na República Tcheca; desde 2008 era núncio na Irlanda.
No dia 15 de outubro nomeou também o arcebispo americano James Patrick Green, 61 anos, novo núncio apostólico no Peru; desde 2006 era núncio na África do Sul,
Namíbia, Suazilândia e Lesoto e a partir de 2009 também primeiro núncio em Botsuana.
No dia 19 de outubro o arcebispo Carlo Maria Viganò,
70 anos, foi nomeado novo núncio apostólico nos Estados Unidos; desde julho de 2009 era secretário-geral do
Governatorato do Estado da Cidade do Vaticano.
No dia 29 de outubro o arcebispo Nicola Girasoli, 54
anos, foi nomeado núncio apostólico em Antígua e Barbuda, Bahamas, Dominica, Jamaica, Granada, Saint
Kitts e Nevis, Santa Lúcia, São Vicente e Grenadinas, Suriname, República Cooperativista da Guiana e, enfim,
delegado apostólico nas Antilhas; desde 2006 era representante pontifício na Zâmbia e Maláui.
Carlo Maria Viganò
30DIAS Nº 10 - 2011
41
Igrejas orientais
“Nossa fé é a dos apóstolos,
transmitida por São Tomé”
Bento XVI com sua beatitude George Alencherry, na audiência com a delegação da Igreja siro-malabar,
na Sala Clementina do Palácio Apostólico Vaticano, em 17 de outubro de 2011
A origem apostólica. A fidelidade às suas tradições.
As relações com os hindus e um florescimento de vida que
não conhece fronteiras. As relações com Roma.
Entrevista com George Alencherry, arcebispo-mor
da Igreja siro-malabar, durante sua visita ao papa Bento XVI
por Roberto Rotondo e Gianni Valente
oma fica longe de Malabar.
Mas, se quisermos perceber
o que realmente significa a
proximidade que caracteriza e expressa a Communio Ecclesia-
R
42
30DIAS Nº 10 - 2011
rum, basta olhar para o fio de gratidão gratuita e recíproca que une
a Igreja de Roma e a Igreja siromalabar. Duas realidades que por
quase dez séculos não comparti-
lharam nenhum tipo de vínculo jurídico-institucional. George Alencherry, eleito em maio passado arcebispo-mor dessa Igreja indiana
de rito oriental que nasceu da pre-
ÍNDIA. Os siro-malabares
gação do apóstolo São Tomé, encontrou em outubro o Sucessor de
Pedro em sua sé apostólica. Durante sua passagem por Roma, o
chefe da comunidade católica de
rito oriental mais numerosa e relevante depois dos greco-católicos
ucranianos aceitou encontrar-se
também com 30Dias.
A entrevista foi feita na Domus
Romana Sacerdotalis, na via della
Traspontina.
Beatitude, conte-nos sobre
seu encontro com o Santo Padre.
G E O R G E A L E N C H E R RY:
Fui eleito arcebispo-mor pelo Sínodo da Igreja siro-malabar em
maio, e mais tarde o Papa confirmou minha eleição. Foi a primeira vez que esse procedimento foi
aplicado: os dois arcebispos-mores que me antecederam foram
escolhidos diretamente pela Santa Sé. A eleição ocorreu em 24 de
maio, e no dia 29 me instalei como arcebispo-mor e arcebispo da
diocese de Ernakulam-Angamaly. A visita de outubro foi a primeira que fiz ao Papa como arcebispo-mor, ao lado do Sínodo
Permanente dos nossos bispos.
Foi a oportunidade para renovar
a minha declaração de lealdade e
obediência ao sucessor de Pedro.
Durante a viagem, visitei também
outros organismos da Santa Sé,
particularmente a Congregação
para as Igrejas Orientais.
De que assuntos vocês trataram em seus encontros no
Vaticano?
Falamos muito dos problemas
de jurisdição que criam obstáculos
à nossa obra pastoral. A Igreja siro-malabar tem cerca de quatro
milhões de fiéis, dos quais 3 milhões e 400 mil vivem nas vinte e
oito dioceses que existem na Índia.
Dessas dioceses, dezoito se encontram em território próprio da
Igreja siro-malabar (Kerala, parte
do Tamil Nadu e Karnataka). Nós
temos jurisdição territorial apenas
nessas dezoito dioceses, mas gostaríamos de ter uma jurisdição territorial que cobrisse todo o território da Índia: esse é um dos nossos
apelos ao Santo Padre, e para nós
é uma exigência importante.
Acreditamos que seja um direito
nosso. Antes da chegada dos missionários ocidentais – os portugueses chegaram lá no século XVI – a
jurisdição dos “cristãos de São Tomé” se estendia por toda a Índia.
Depois, os missionários ocidentais, por influência dos soberanos
europeus, tomaram a jurisdição da
Índia, restringindo a nossa às
áreas em que estávamos mais concentrados.
Fiéis em oração durante uma missa na igreja de Nossa Senhora da Saúde,
em Hyderabad, no estado de Andhra Pradesh
Seu pedido pode parecer a
reivindicação de direitos passados, já sepultados pela história...
Não, é uma questão relacionada ao presente, em termos muito
concretos. Tem crescido o número de nossos fiéis, e eles se espalham por outras regiões. E o que
acontece é que nesses lugares o
nosso povo não encontra um
atendimento pastoral adequado,
em continuidade com a sua tradição, e sofre por isso. Nossos fiéis
estão acostumados à nossa liturgia, nossos costumes, nossas formas de oração e de participação
dos leigos na administração das
paróquias. O papel dos leigos na
vida das paróquias e na catequese
é uma peculiaridade da Igreja siro-malabar. Em muitas grandes
cidades há grandes concentrações de fiéis siro-malabares: setenta mil em Delhi, cinquenta mil
em Chennai e Bangalore, cerca
de vinte mil em Hyderabad. Gostaríamos de poder estabelecer
dioceses ao menos nesses grandes centros urbanos.
E o que lhes responderam?
A Santa Sé nos disse que em
princípio temos direito à jurisdição. Mas, visto que a Igreja latina
se instalou nas outras regiões, é
preciso estabelecer algum tipo de
entendimento negociado com os
latinos. O Santo Padre compreende as nossas necessidades e
nos explicou que será necessário
dar um passo por vez. Lembrounos as palavras do Concílio Vaticano II, que diz que cada Igreja
sui iuris tem direito a poder viver
com autonomia. Há uma anomalia histórica que precisa ser corrigida. Nós somos pacientes, mas
não é justo que as coisas continuem assim.
Quais foram as objeções
feitas ao seu pedido?
As Igrejas siro-malabar, siromalancar e latina já possuem hoje
dioceses que se sobrepõem em
nosso território histórico. Porém,
alguns bispos acham que pode haver dificuldades se estendermos
nossa jurisdição a territórios que
caem em suas dioceses. Vocês
precisam entender que em algumas dioceses latinas, atualmente,
os siro-malabares representam ¬
30DIAS Nº 10 - 2011
43
Igrejas orientais
a maior parte dos fiéis atendidos
pelos sacerdotes latinos. Se estendêssemos a jurisdição, em algumas dessas dioceses latinas poderiam restar pouquíssimos fiéis de
rito latino. Outro temor está ligado
aos padres siro-malabares que
aprenderam o rito latino e trabalham nas dioceses latinas. Há mais
de trinta bispos de origem siro-malabar que trabalham como bispos
latinos nas dioceses do norte.
E fora da Índia, como andam as coisas?
Há um grande número de fiéis
siro-malabares fora da Índia. Nos
Estados Unidos, são cerca de cem
mil, e foi instituída para eles uma
diocese com centro em Chicago.
A maior parte dos fiéis no exterior
se concentra no Golfo Pérsico.
Na Arábia Saudita, são mais de oitenta mil, quase todos trabalhadores que se transferiram para lá de
maneira permanente. O Papa nomeou dois vigários apostólicos e
um núncio, mas os sacerdotes que
foram encarregados de atender a
esses fiéis, mesmo sendo de origem siro-malabar, aderiram às
congregações latinas e são latinos
como formação. A ausência de
sacerdotes do nosso rito criou
uma certa tensão nesses países. É
um outro problema que comunicamos à Santa Sé; esperamos que
nos ouçam.
Como vai a colaboração
entre as diversas Igrejas católicas na Índia?
As três Igrejas, latina, siro-malabar e siro-malancar, são parte da
George Alencherry crisma uma criança
única Igreja universal, e temos
uma conferência episcopal formada pelos bispos das três Igrejas.
Nessa conferência, trabalhamos
juntos sem nenhum problema. A
Igreja Católica é comunhão de diversas Igrejas particulares: há vinte e duas Igrejas orientais, que,
com a latina, compõem a Igreja
universal. Só a partir dessa teologia é possível o ecumenismo: se os
greco-ortodoxos percebessem a
existência dessa comunhão, se
uniriam aos católicos. Ecumenis-
mo não é levar a Igreja Ortodoxa a
ser administrada pela latina. Nós,
de dentro, pedimos um ecumenismo real. Os ortodoxos o pedem de
fora. Mas alguns dos latinos não
compreendem isso.
E as relações com os hindus?
De modo geral, o hinduísmo é
uma religião que promove a paz e
a harmonia. A maior parte das
pessoas nos vê com simpatia, e
trabalhamos juntos. Mas, como
vocês sabem, no passado recente
O primeiro arcebispo-mor eleito pelo Sínodo
G
eorge Alencherry nasceu em 1945. Tem dois irmãos sacerdotes e
uma irmã religiosa. Estudou no Saint Josephʼs Pontifical Seminary
de Alwaye e cresceu na arquidiocese de Changanacherry, onde ocupou
vários cargos de responsabilidade antes e depois dos períodos de pósgraduação na França (doutorado em Catequética no Institut Catholique
de Paris e doutorado em Teologia Bíblica na Sorbonne). Em 1996 foi nomeado primeiro bispo de Thuckalay, diocese que nasceu da subdivisão
da arquidiocese de Changanacherry. Quarenta e seis bispos do Sínodo o
elegeram arcebispo-mor da Igreja siro-malabar em 24 de maio de 2011,
garantindo-lhe a maioria exigida de dois terços na segunda votação. Dois
dias depois, Bento XVI confirmou a eleição.
O mote episcopal de mar George Alencherry é: “Serviço em diálogo de
verdade e amor”.
G.V.
44
30DIAS Nº 10 - 2011
George Alencherry com o Sínodo
que o elegeu arcebispo-mor,
em 24 de maio de 2011
ÍNDIA. Os siro-malabares
A nossa fé é a dos apóstolos, transmitida
por São Tomé. São Tomé não poderia
ter começado uma nova Igreja por suas
próprias forças. Mesmo na Índia,
ele fez apenas o que Jesus lhe ordenou.
Pelo mesmo motivo, Tomé e todos aqueles
que dele receberam o anúncio evangélico
estão em comunhão com Pedro,
e isso é garantia da nossa fé
Uma procissão durante a “dukhrana”, a celebração de São Tomé,
perto da igreja de São Tomé, em Palayur, no estado de Kerala
houve grupos de fundamentalistas que criaram problemas. Em
todos os países, por um motivo
ou outro, existem fundamentalistas. Assim como existem extremistas políticos, que chamamos
terroristas. Na Índia existem grupos extremistas dentro do hinduísmo: quem acredita no autêntico hinduísmo não gosta deles,
mas esses grupos criam problemas sobretudo para os cristãos.
Eles temem que os cristãos, por
meio das conversões, tomem o
controle do país. Mas é um medo
sem fundamento, e os cristãos,
por sinal, não reagem com violência aos seus ataques. O governo
sabe disso e nos está ajudando.
A Igreja siro-malabar conservou-se na fé dos apóstolos
vivendo no meio de uma cultura arraigada a outros pressupostos religiosos. Esse é
um esplêndido testemunho
de que a Igreja é de Jesus
Cristo (Ecclesiam Suam, como escreveu Paulo VI). O que
a história dos cristãos siromalabar es pode sugerir à
cristandade inteira?
A herança que carregamos é o
resultado de vinte séculos de testemunho da fé católica, à qual sempre nos mantivemos fiéis, mesmo
quando fomos seriamente incompreendidos pelos missionários estrangeiros. A nossa Igreja tem um
estilo único de catequese: nas famílias, nas paróquias e nas escolas, em todos esses três níveis, ensinamos as crianças a preservar a
fé. Aqui, em Roma, há cerca de
seis mil fiéis siro-malabares: em
16 de outubro celebramos uma
bela liturgia na Basílica de Latrão.
A basílica estava cheia.
A Igreja siro-malabar confirmou a comunhão com Roma depois de séculos de ausência de contatos. É o sinal
de que a comunhão da Igreja
não é em primeiro lugar o
resultado de relações jurídicas...
A nossa fé é a dos apóstolos,
transmitida por São Tomé. São
Tomé não poderia ter começado
uma nova Igreja por suas próprias
forças. Mesmo na Índia, ele fez
apenas o que Jesus lhe ordenou.
Pelo mesmo motivo, Tomé e todos aqueles que dele receberam o
anúncio evangélico estão em comunhão com Pedro, e isso é garantia da nossa fé. A lealdade ao
Papa vem da nossa experiência de
fé: rezamos pelo Papa na celebração eucarística, consideramos na
liturgia os santos de todas as Igrejas particulares, tanto quanto os
nossos. Doutrinalmente, preservamos o que recebemos do Credo
de Niceia. A eucaristia e os outros
sacramentos, por dom do Espírito
Santo, nos unem na Igreja una,
santa e apostólica.
O senhor pode nos falar da
devoção que vocês têm a São
Tomé?
Depois das festas de Nosso Senhor, desde o Natal até a Páscoa, e
das festas da Bem-Aventurada Virgem Maria – Imaculada Conceição, Natividade e Assunção –, a
festa mais solene na Igreja siro-malabar é a “duchrana”, ou comemoração de São Tomé. Nós a celebramos no mundo inteiro; mesmo na
Arábia Saudita, onde não pode haver celebrações oficiais, mais de
trezentos fiéis se reuniram num espaço particular e me telefonaram,
pedindo uma bênção. Segundo a
tradição, Tomé fundou sete comunidades na Índia. Todos esses lugares se tornaram metas de peregrinação. E no primeiro domingo depois da Páscoa celebra-se a festa
de São Tomé tocando o lado de Jesus. É uma grande festa, da qual
participam muitos hindus.
O cardeal Levada, no último Sínodo das Igrejas ¬
30DIAS Nº 10 - 2011
45
Igrejas orientais
orientais, anunciou que consultaria os patriarcas orientais sobre uma possível reforma do exercício do ministério petrino. O que sugere,
particularmente a respeito
das relações com as Igrejas
orientais?
A Igreja Católica, por meio do
Conselho para a Unidade dos
Cristãos, já começou um diálogo
sobre o primado. Acho que devemos prosseguir nesse diálogo e
procurar um acordo comum com
as Igrejas do Oriente, como havia
nos primeiros quatro séculos da
cristandade. Naquela época havia
uma compreensão comum do
primado. Hoje a Igreja Ortodoxa
objeta que é impossível voltar à
teologia precedente ao Concílio
de Calcedônia, pois não possuímos nenhum documento daquela
época. Mas creio que mesmo a
partir dos documentos e dos pronunciamentos posteriores à época de Calcedônia seja possível um
diálogo e um acordo em torno do
ministério petrino. Pois existe a
expressão primus inter pares.
Nós todos precisamos de um ministério petrino que seja referência de unidade para todas as Igrejas. Eu tenho a esperança de que
encontremos um ponto no meio
do caminho em que a Igreja Católica e as Igrejas ortodoxas possam
encontrar-se na plena comunhão
da Igreja de Cristo.
Por séculos, a Igreja de vocês teve de lidar com os processos de “latinização” a que
foi submetida. Houve quem
os considerasse heréticos ou
cismáticos por que tinham
suas orações e suas liturgias e
não falavam latim. Hoje ainda
se veem em circulação resíduos dessa mentalidade?
O modo de pensar mudou muito, mesmo na Igreja latina. Entre
os teólogos, entre a maioria dos
bispos e na Sé Apostólica. Padre
Placid Podipara, C.M.I., um teólogo e historiador muito renomado
da nossa Igreja, disse que a Igreja
siro-malabar é cristã por fé, hindu
por cultura e oriental no culto. Infelizmente, os missionários que
chegaram no século XVI não compreenderam isso. Não tinham más
intenções, era a atitude da época.
46
30DIAS Nº 10 - 2011
Mas hoje o que eles pensaram que
era errado pode ser restaurado. Isso é o que diz o Concílio Vaticano
II. Muito mudou, mas onde não
houve essa mudança há problemas. E isso acontece com a mentalidade de alguns bispos latinos.
Eu disse isso também ao Papa:
“Santidade, há muitos bispos latinos que compreendem corretamente a eclesiologia de comunhão, mas há outros...”.
A liturgia teve um papel
central para a continuidade
histórica da sua Igreja. Como
o senhor vê a importância que
o magistério do Papa atual dá
à liturgia?
O magistério do Papa atual está
realmente salvando a Igreja de
nosso tempo. Muitas aberrações
estavam penetrando na Igreja, às
vezes em nome do Concílio Vaticano II. Alguns interpretaram mal
esse Concílio, detendo-se nas coisas acidentais e perdendo de vista
o essencial. O Papa quer seguir o
que o Vaticano II realmente quis
dizer. E quando ele, pouco a pouco, conseguir que essas coisas sejam admitidas, a Igreja estará realmente unida. A dissipação e a
mundanização da Igreja são realmente extensas, especialmente na
Europa, e será preciso tempo para
que a Igreja se recomponha. Mas
essa é a intenção do Papa, e a Igreja siro-malabar está com ele.
No entanto, houve também
na Igreja siro-malabar controvérsias acirradas entre aqueles que defendem a recuperação integral do patrimônio litúrgico tradicional e os que
julgam que isso é uma forma
de esteticismo tradicionalista. Entre “caldeizantes” e “latinizantes”...
Eu lhes digo: se uma coisa é
caldeia, ou europeia, ou de qualquer outro lugar, o que é válido é
válido. Mas alguns, em conse-
Muitos parecem não entender que se
a Igreja siro-malabar florescer e prosperar
a Igreja universal florescerá também.
Pois toda Igreja particular existe para
a Igreja universal. E a Igreja latina também
é uma Igreja particular
Sua beatitude George Alencherry durante a entrevista com os jornalistas de 30Dias,
em 17 de outubro de 2011
ÍNDIA. Os siro-malabares
Devoção mariana em Srinagar,
no estado de Jammu e Kashmir
quência da latinização, se convenceram de que o que pertence
à cultura ocidental é bom e o que
vem do Oriente não é. É uma impressão criada pela latinização a
que fomos submetidos durante
três séculos. Embora a Igreja universal, com o Concílio Vaticano
II, nos tenha restituído a liberdade
de recuperar os elementos válidos do nosso patrimônio, boa
parte da Igreja os esqueceu e não
sente a exigência dessa recuperação. Dizem: continuamos a caminhar com o que temos hoje, e se
precisarmos de outras coisas as
pegaremos da Igreja latina. Essa
é a sua atitude. Outros respondem que para continuar a ser o
que somos devemos antes de
mais nada recuperar o que nos foi
tirado e perdemos.
Eu, em meu ofício, tentarei
criar mais unidade e também uma
certa uniformidade nas celebrações litúrgicas. Não uma uniformidade integral, mas uma unidade em torno do essencial. Que
deve ser realizada aos poucos.
Gradualmente. Por exemplo, já
houve gente na Igreja latina que
dizia que nós celebramos olhando
para a parede. Mas olhar para o
leste não é ter a cara enfiada na
parede. É olhar para a direção de
onde vem o Senhor. Na teologia
da nossa Igreja, o povo e o celebrante oferecem juntos o sacrifício a Deus Pai, voltados para o
Oriente.
A Índia está-se tornando
uma espécie de superpotência geoeconômica. Surgem
novos problemas. Como é
que esses processos interferem no seu trabalho pastoral?
O mundo, ao mudar, muda-nos
também. Nossos fiéis migram, para estudar ou trabalhar. Só um terço deles vive nas dioceses originárias. Cerca de dois terços estão fora, nas grandes cidades. Nos Estados Unidos e na Europa existem
médicos, empresários, comerciantes siro-malabares que estão
subindo na escala social. Se nos
for reconhecida a jurisdição universal sobre nossos fiéis, poderemos realmente promover essa
energia, de modo que sua força
esteja a serviço da Igreja universal. Do contrário, o que perdermos a Igreja universal também
perderá. E, se nossos fiéis encontrarem dificuldades para continuar em contato com seu patrimônio espiritual, procurarão o
sentido espiritual nos grupos pentecostais ou em realidades semelhantes. Isso já está acontecendo.
Nós estamos perdendo nossos
fiéis. Eles vão da Índia para o Ocidente e encontram alguém que
lhes diz: por que você precisa ir às
igrejas dos latinos? Venha conosco, rezemos juntos. Perdemos
muitos assim. Estamos angustiados com isso e expressamos nossa angústia aos organismos vaticanos. Todos parecem compreender o que dizemos, mas depois não tomam decisões. Precisam consultar uma série de pessoas, e o tempo passa. E as coisas
pioram. Muitos parecem não entender que se a Igreja siro-malabar
florescer e prosperar a Igreja universal florescerá também. Pois toda Igreja particular existe para a
Igreja universal. E a Igreja latina
também é uma Igreja particular.
Ao passo que na cabeça de alguns
universal coincide com latino. Essa obviamente não é a doutrina
oficial. Não é o pensamento de
nenhum teólogo sério. Mas continua a ser uma mentalidade muito
difundida, e gera atrasos.
Nos últimos dias, houve um
importante congresso internacional sobre a chamada
Anáfora de Addai e Mari, na
Pontifícia Universidade Gregoriana. Por que essa anáfora
tem uma importância especial do ponto de vista ecumênico e litúrgico?
A Anáfora de Addai e Mari é a
mais antiga da Igreja universal.
Nela vemos a mais simples teologia dos Evangelhos, a mais germinal compreensão do mistério de
Cristo, sem as formulações doutrinais que vieram depois. Tal como
o Evangelho de São Marcos é o
Evangelho mais simples, a liturgia
de Addai e Mari é a mais simples
de todas. Assim, quando a celebramos, experimentamos intensamente a presença de Jesus conosco. Até mesmo as expectativas e
as súplicas da Igreja são muito
bem integradas na Anáfora. Ela
contém as orações pelos fracos,
pelos oprimidos, pelos martirizados, pelos pobres, pelos refugiados. Enfim, tem a beleza da simplicidade. A Anáfora de Addai e
Mari é usada pela Igreja assíria do
Oriente, e tem a característica de
não conter de maneira explícita as
palavras da instituição, pronunciadas por Jesus na Última Ceia (“Tomai e comei, este é o meu corpo.
[...] Tomai e bebei, este é o meu
sangue. [...] Fazei isto em memória de mim”). A Igreja siro-malabar
também usou a forma tradicional
dessa anáfora até o século XVI,
sem interpolações. Mas os teólogos latinos afirmavam que sem as
palavras da instituição não havia
verdadeira consagração, e por isso não consideravam válida a Anáfora de Addai e Mari. Em 2001,
o Pontifício Conselho para a Unidade dos Cristãos, com o consenso da Congregação para a Doutrina da Fé, reconheceu a validade
dessa anáfora, usada desde tempos imemoriais também em nosso
Qurbana, o sacrifício eucarístico
segundo o rito malabar.
q
30DIAS Nº 10 - 2011
47
Colégios eclesiásticos
A capela do Pontifício Instituto São João Damasceno,
decorada com ícones pintados por padre Jacob Kooroth;
ao centro, um mosaico de Marko Ivan Rupnik
PONTIFÍCIO INSTITUTO SÃO JOÃO DAMASCENO
A Índia que fica no
coração de Roma
O Instituto foi criado por Pio XII e hoje hospeda quarenta sacerdotes de
rito siro-malabar e de rito siro-malancar. Nossa visita é uma oportunidade
para conhecer mais de perto esses dois ritos, que, ao lado do latino,
constituem a Igreja Católica indiana, uma das mais florescentes da
cristandade
por Pina Baglioni
48
30DIAS Nº 10 - 2011
Acima, os estudantes do
espira-se um clima de grande letícia no Instituto Pontifício São João Damasceno,
a morada de quarenta sacerdotes
indianos que passam uma temporada em Roma para aperfeiçoar
seus estudos.
São os filhos da Igreja de São
Tomé, fundada, segundo a tradição, pelo apóstolo do Senhor no
extremo sul da Índia, o atual estado federal de Kerala: trinta e um
deles pertencem à Igreja Católica
siro-malabar. Os outros nove, à
Igreja Católica siro-malancar. Todos os quarenta têm entre trinta e
trinta e cinco anos, com vários
anos de sacerdócio.
Quem os guia é o padre Varghese Kurisuthara: é siro-malabar
e vem de Kerala. Dirige o São
João Damasceno há quatro
anos, depois de ter passado nove
como vice-reitor. Depois dos estudos e da ordenação sacerdotal
na Índia, obteve na Academia
Alfonsiana o doutorado em Teologia Moral, disciplina que hoje
leciona no Teresianum, a Faculdade Teológica do Colégio Internacional dos Carmelitas Descalços de Santa Teresa de Jesus e
de São João da Cruz.
Padre Varghese pertence à
província de Malabar da ordem
dos carmelitas descalços. “O papel dos carmelitas foi extremamente importante na história dos
cristãos de São Tomé”, explica o
reitor. “Foram enviados pelo papa Alexandre VII sob a jurisdição
da Congregação de Propaganda
R
Pontifício Instituto São João
Damasceno com o cardeal
Leonardo Sandri, prefeito da
Congregação para as Igrejas
Orientais, por ocasião da bênção
da iconostase, em 4 de outubro
de 2010
Abaixo, São Tomé num ícone
conservado no átrio do instituto
Fide, em meados do século XVII,
com a finalidade de reunir os fiéis
e levar a paz aos constantes conflitos entre os missionários portugueses e os cristãos de São Tomé.
Foram tão estimados pelos cristãos indianos, sobretudo em Kerala, que inspiraram até mesmo
congregações carmelitas locais”.
Entre os sacerdotes hóspedes
do São João Damasceno há estudantes da Congregação Missionária do Santíssimo Sacramento, da
Congregação Vicentina, da Congregação de Santa Teresa, da Sociedade dos Oblatos do Sagrado
Coração, da Ordem da Imitação
de Cristo e da Sociedade Missionária de São Tomé Apóstolo.
Todos os quarenta sacerdotes
chegaram a Roma graças às bolsas de estudo concedidas pela
Congregação para as Igrejas
Orientais. Alguns, para obter o
mestrado; a maior parte, para obter o doutorado: treze frequentam
os cursos de Direito Canônico e
de Liturgia Oriental no Pontifício
Instituto Oriental. Os outros estudam sobretudo teologia e filosofia
nas outras universidades pontifícias. “Este instituto, inaugurado
em 4 de dezembro de
1940, foi fortemente desejado pelo papa Pio XII,
quer para os sacerdotes
provenientes das Igrejas
orientais que não tinham
casas de formação próprias, quer para aqueles
que desejavam exercer
seu ministério sacerdotal
no Oriente. Na época,
não havia nenhum indiano”, conta padre Varghese. “O Papa quis dar-lhe
o título de João Damasceno pela afeição do santo ao papado e por sua
devoção particular à Mãe
de Deus”.
Naqueles anos, os seminaristas e os sacerdotes indianos se alojavam
numa ala do Pontifício
Colégio Russicum. Em
seguida, foram instalados
no Colégio Pio Romeno,
pois o regime comunista
proibia aos sacerdotes romenos ir a Roma. Depois, em 1993, o insti- ¬
30DIAS Nº 10 - 2011
49
Colégios eclesiásticos de Roma
tuto foi transferido para a sede
atual, uma ex-clínica, incrustada
numa densa rede de ruas entre as
basílicas de São João de Latrão e
da Santa Cruz de Jerusalém, adquirida pela Congregação para as
Igrejas Orientais e completamente reformada.
O São João Damasceno responde diretamente ao prefeito da
Congregação para as Igrejas
Orientais, o cardeal Leonardo
Sandri. E, desde o ano acadêmico
1996-1997, é reservado exclusivamente aos alunos pertencentes
à Igreja Católica siro-malabar e à
Igreja Católica siro-malancar.
Um instituto
para duas Igrejas
A rotina do instituto, explica-nos
o reitor, começa com a missa da
manhã, às 6h30. É celebrada nos
dois ritos, nas respectivas capelas:
na maior, os malabares, no rito siro-malabar; na menor, os malancares, no rito siro-antioqueno.
“Depois celebram também a missa em rito latino, todos juntos.
Uma espécie de ‘exercício’ para
quando vão celebrar a missa, no
domingo, nas paróquias romanas, ou também no Natal e na
Páscoa. Ou ainda no verão, quando os sacerdotes indianos vão dar
uma ajuda em muitas paróquias
na Itália e na Alemanha”.
Além disso, por testemunho direto desta que escreve, é possível
50
30DIAS Nº 10 - 2011
O reitor do Instituto,
padre Varghese Kurisuthara
Santa missa em rito siro-malabar
celebrada na igreja romana
de Santa Maria do Pórtico,
em Campitelli
dizer que no instituto se goza de
uma excelente arte culinária: duas
vezes por semana, os pratos são
de origem indiana; no outros dias,
italiana.
Perguntamos a padre Varghese o que farão esses sacerdotes,
quando voltarem à Índia. “Uma
parte deles vai lecionar nos seminários, outra será empregada na
cúria episcopal, na pastoral da juventude e na catequese diocesana. Outros serão párocos”.
Em Kerala, os siro-malabares e
os siro-malancares dirigem várias
escolas católicas, de toda ordem e
grau, onde desenvolvem os currículos normais definidos pelo Estado. “E as despesas ficam em grande parte a cargo das Igrejas. Além
dos católicos, essas escolas são
frequentadas também por um
grande número de estudantes hindus, pelo altíssimo nível de educação que é oferecido. Graças às escolas católicas, Kerala é o estado
mais instruído da Índia”. Na Índia,
os católicos – de rito latino, siromalabar e siro-malancar – são no
total 17 milhões: menos de 2% da
população indiana.
As três Igrejas, juntas, administram vinte e cinco mil escolas.
Sem contar milhares de casas para viúvas e órfãos, abrigos para leprosos e doentes de Aids, hospitais e casas de repouso. Em Kerala, onde os cristãos são 22% da
população, a educação, também
entre as mulheres, ostenta os níveis mais altos de toda a Índia. É
também o estado com os mais elevados índices de leitura. Desde
2008 é impressa em malayalam,
a língua local, uma edição semanal do L’Osservatore Romano,
administrada pelos car melitas
descalços da província de Malabar. Além disso, Kerala é o estado
em que se encontra a mais alta taxa de pluralismo religioso: enfim,
um exemplo vivo de convivência.
“Nas escolas católicas, abertas
a todos, são desenvolvidos os
programas escolares previstos
pelas leis do Estado. Há ainda
cursos específicos para os estudantes cristãos, que incluem doutrina, ética e moral”.
Qual é o motivo da grande vitalidade da Igreja siro-malabar, que,
com mais de quatro milhões de
À esquerda,
os estudantes do Instituto
no refeitório
Abaixo,
São João Damasceno
num ícone pintado
por Lauretta Viscardi,
conservado
no átrio do instituto
fiéis, representa a Igreja oriental
mais vigorosa e em rápido crescimento de toda a cristandade? Sozinha, é responsável por quase
70% das 120 mil vocações de toda a Índia católica. Nesse estado,
quase todas as dioceses têm um
seminário menor, e essa é uma
das poucas regiões capazes de
“exportar” sacerdotes e freiras.
“Tudo deriva das famílias, em
que o apego à oração do ângelus,
ao santo rosário e à santa missa é
fortíssimo, comovente”, revela o
reitor. “Os pais e as mães, mas
também os avós, ensinam às
crianças, desde bem pequenas, o
sinal da cruz e as primeiras orações. Enfim, elas aprendem tudo
isso com o leite materno. Consequentemente, a família é um ambiente que favorece o aparecimento de vocações sacerdotais,
que são tidas em grande consideração pelas famílias”.
A diocese de Adilabad:
uma Igreja florescente
Os sacerdotes católicos siro-malabares vivem uma situação paradoxal: sua Igreja está entre as
mais florescentes de toda a cristandade, mas fora de Kerala eles
se veem em terra de missão. “Para exercer melhor a nossa missão
e formar os fiéis segundo as nossas tradições, precisaríamos de
eparquias nossas. É por isso que
há muito tempo pedimos ao Santo Padre uma jurisdição maior,
fora de Kerala”, diz-nos padre
Prince Panengadan Devassy,
que está em Roma para obter o
mestrado em Teologia Bíblica na
Universidade Urbaniana.
Ele vem da cidade de Thrissur,
onde frequentou os ensinos fundamental e médio; depois, fez
dois anos de seminário em Bangalore, no estado de Karnataka,
para estudar filosofia. “Em seguida, fui em missão para a eparquia de Adilabad, no estado de
Andhra Pradesh, na Índia centrooriental”.
Adilabad é uma das mais jovens eparquias da Índia, criada
pelo papa João Paulo II em 23 de
junho de 1999. Antes disso, fazia
parte da diocese de Chanda, que
se estendia pelos estados de Maharashtra e Andhra Pradesh,
com duas línguas e duas culturas
diferentes.
Os primeiros sacerdotes siromalabares chegaram a Adilabad
em 1962. Lá, fundaram escolas
para promover o acesso das
crianças mais pobres à educação.
Nas aldeias, depois, os missionários trabalharam intensamente
para melhorar as condições sociais
do povo. Especialmente no âmbito
da saúde e da alimentação. E mui-
tas pessoas, atraídas pelo esplêndido testemunho dos missionários,
escolheram a vida cristã. Hoje, a
Igreja de Adilabad conta com 15
mil católicos, com sessenta sacerdotes todos indianos, vinte e quatro
dos quais diocesanos, e com sete
vocações locais.
Padre Prince é testemunha
ocular de tanta beleza. “Para poder-me comunicar com essa gente
tive de estudar a língua deles. Em
Kerala, falamos o malayalam. No
estado de Andhra Pradesh, o telugu. Até a escrita é completamente
diferente”, conta.
Depois dos anos que passou
em Adilabad, padre Prince teve ¬
30DIAS Nº 10 - 2011
51
Colégios eclesiásticos em Roma
de ir para o norte, para Madhya
Pradesh, para estudar teologia
durante quatro anos. Depois foi
ordenado sacerdote e de novo
voltou a Adilabad por mais dois
anos. Perguntamos a ele, agora, o
que significa fazer missão em
meio a um oceano de hindus e a
um grande número de muçulma-
lhadas pelas grandes áreas rurais
habitadas por pequenos agricultores e criadores de gado. Não dizemos nada de Jesus e do Evangelho, mas assistimos os doentes e
ajudamos os mais pobres. Depois
perguntamos aos pais se querem
deixar seus filhos conosco para
que estudem gratuitamente. Qua-
se todos permitem. E então levamos as crianças para as nossas escolas, onde ensinamos as matérias
curriculares. É essa a primeira fase
da missão. Ou seja, aquela em que
buscamos construir uma relação
forte com as pessoas por meio de
ajuda a suas necessidades. Muitos
missionários não mediram esforços para levar eletricidade e água
para os vilarejos isolados”.
“Em seguida, só quando se estabeleceu uma relação de confiança mútua, procuramos tornáAcima, crianças na escola católica
de Champakulam, em Kerala,
durante o almoço; à direita, A Última ceia,
ícone pintado por padre Jacob Kooroth,
conservado no refeitório do Instituto
nos. “É a maravilha da nossa cultura indiana. A Índia deu origem a
diversas religiões e acolheu todas
as religiões do mundo. Os indianos são tolerantes, pacíficos e
acolhem a todos. Respeitar as outras religiões e acolher o bem de
braços abertos, de onde quer que
ele venha, é a característica da
cultura indiana. Cada um tem a liberdade de crer na religião que
prefere”, acrescenta o jovem sacerdote. “Para nós, fazer missão
significa em primeiro lugar ir simplesmente visitar as aldeias espa52
30DIAS Nº 10 - 2011
À esquerda,
estudantes
do seminário menor
Saint Paul,
na diocese
de Irinjalakuda,
em Kerala
Abaixo,
o batismo na igreja
de Saint Alex,
em Calangute,
no estado de Goa
los conscientes da dignidade da
vida e dos direitos humanos. Às
vezes colaboramos para emancipá-los da exploração e da injustiça”, diz ainda padre Prince Panengadan Devassy. “Depois de
algum tempo de serviço nos vilarejos e nas escolas, acontece,
com muita frequência, que as
pessoas nos perguntam a respeito da nossa religião e do nosso
Deus. Nessa altura nós falamos
explicitamente de Jesus. Não
pregamos Jesus com a força e
não procuramos converter ninguém com
incentivos. Mas procuramos dar testemunho
de Jesus por meio da
nossa vida, amando todas as pessoas sem nenhuma distinção. Esse
nosso modo de viver
atrai as pessoas, que
são impelidas a nos
perguntar de onde
vem a nossa capacidade de acolher a todos,
ricos e pobres, quem é
realmente Jesus e o
que é o Evangelho. Para facilitar a compreensão da nossa fé,
às vezes projetamos filmes sobre a vida do
Senhor em alguma sala ou no espaço público do vilarejo, já que
quase ninguém possui
aparelho de televisão. A coisa
mais bonita é que muitas dessas
pessoas, sobretudo as crianças,
fazem experiência pessoal de Jesus. Porque, graças à oração e à
relação pessoal com Ele, veem
uma correspondência na sua vida, têm uma resposta às suas perguntas, como nunca lhes acontecera antes. É claro que muitos
não querem saber de Cristo. Mas
aqueles que dizem “sim” recebem
uma fé fortíssima. Enfim, nós não
convertemos ninguém, mas as
próprias pessoas se convertem
sob a ação da graça divina. É uma
escolha delas. E nesse contexto o
Estado garante a liberdade de
crer na religião escolhida por cada um. Essa é a terceira fase da
missão”, conclui padre Prince. “É
compreensível que todas as pessoas que servimos e ajudamos
não cheguem ao mesmo ponto.
Muitas ficam na primeira ou segunda fase. Apesar disso, não
deixamos de desenvolver o minis-
tério. Continuamos a servir essa
gente, pois as nossas atividades
não visam a conversão, que é
obra do Espírito Santo, mas a
proposta respeitosa e livre”.
Nesse meio-tempo, Benedict
Kurian, da Igreja Católica siromalancar, vem fazer parte da
conversa. Ele é originário da
eparquia de Mavelikara, sufragânea da arquieparquia de Trivandrum. Ordenado em 2002, foi
pároco por quatro anos em Amburi, no estado de Kerala. Em Roma desde 2007, está para obter o
doutorado em Direito Canônico
Oriental com uma tese sobre os
direitos e os deveres dos leigos.
“Gosto muito de Roma. Até porque na Índia, na escola, estudamos a história do Império Romano em profundidade”, conta.
Perguntamos a ele o
que têm de tão particular os católicos siro-malancares, que voltaram
à comunhão com Roma apenas em 1930.
“A diferença em relação aos nossos irmãos
malabares está apenas
na liturgia; a nossa é siro-antioquena. A da
Igreja siro-malabar provém da tradição caldeia. Uma das particularidades da nossa liturgia é o fato de
celebrarmos a missa com o sacerdote voltado sempre para o altar, e
os nossos fiéis são muito apegados
à nossa tradição litúrgica”, explica
padre Benedict.
“A reunificação com o sucessor de Pedro, o papa, foi realizada por cinco pessoas. Hoje somos 500 mil. E em nossa Igreja
nasceram também duas congregações femininas – denominadas
Sisters of the Imitation of
Christ e Daughters of Mary – e
uma congregação masculina, Order of Imitation of Christ. Nós,
siro-malancares, temos a mesma
tradição apostólica, a mesma origem dos siro-malabares. Somos
também herdeiros dos cristãos de
São Tomé. E nós também, como
os nossos irmãos malabares, pedimos à Santa Madre Igreja de
Roma que nos ajude, que estenda
a nossa jurisdição”.
q
30DIAS Nº 10 - 2011
53
Viagem apostólica à Alemanha
O Papa continua fiel a si mesmo:
deem seu testemunho de fé
Abaixo, Bento XVI durante a visita ao Bundestag, em Berlim, dia 22 de setembro de 2011; abaixo, à direita, por ocasião do encontro
com os católicos comprometidos na Igreja e na sociedade, no Konzerthaus de Freiburg, dia 25 de setembro
As palavras do Papa Bento XVI na sua terra natal podem
ser lidas como um caloroso apelo para voltar ao essencial
e viver as suas consequências. Palavras de Hans-Gert Pöttering,
ex-presidente do Parlamento Europeu
por Hans-Gert Pöttering
54
30DIAS Nº 10 - 2011
REFLEXÕES DE UM POLÍTICO
visita de Bento XVI foi um
evento comovedor. Um papa alemão veio à sua terra
natal. Trouxe uma mensagem
profundamente teológica: a renovação da Igreja pode acontecer
somente com a disponibilidade à
conversão e por uma fé renovada. Ele falou de modo tão apaixonado e convincente de Deus, a
ponto de ser surpreendente para
A
um teólogo sucessor de Pedro como Bento XVI.
O seu discurso no Bundestag
alemão no início da sua viagem a
Berlim foi particularmente significativo. Na ocasião questionou-se
sobre a essência da atividade política, sobre o fundamento do direito e sobre a distinção entre o bem
e o mal. Colocou as suas reflexões
dentro do grande contexto das
tradições do pensamento europeu: a filosofia grega, o direito romano e a fé em Deus judaico-bíblica, que formam a “identidade
profunda da Europa”. Na busca
de um fundamento comum para a
construção do próprio direito a
Europa não deveria limitar-se a
uma pura visão positivista. Isso é
redutivo ante a realidade total do
homem. Ele comparou uma tal limitação a um edifício de cimento
sem janelas. Excluído de tudo o
que acontece fora, o homem se
atrofia. Ao invés, com uma visão
global, poderia colher todos os influxos. Aqui entra em jogo “a ecologia do homem” como na encíclica Caritas in veritate. O aparecimento do movimento ecologista foi uma “invocação de ar fresco” que não se podia deixar de
ouvir. O homem deveria ouvir a
linguagem da natureza. Se ele
presta atenção nela e acolhe-a como algo que não é produzido por
ele mesmo, a liberdade do homem encontra cumprimento. Porém, dado que as normas podem
derivar somente da vontade, essas pressupõem o reconhecimento da “razão criadora” de Deus. E,
questionou Bento XVI de modo
quase provocatório: “É verdadei-
ramente desprovido de sentido
refletir se a razão objetiva, que se
manifesta na natureza, não pressuponha uma razão criadora, um
Creator Spiritus?”.
O Papa insistiu particularmente com os políticos no exemplo do
rei Salomão, que tinha desejado
um “coração dócil” para buscar o
verdadeiro direito, para servir a
justiça e a paz. Considerando que
o discurso do Papa no Bundestag
foi principalmente teológico e de
princípio, na ocasião ele não falou sobre as concretas exigências
da Igreja alemã embora isso fosse
previsto e esperado por muitos.
Bem diferente foi o discurso no
Konzerthaus de Freiburg, que
chegou a irritar alguns. Ali, dirigiu-se principalmente à Igreja alemã. Convidou a concentrar-se no
essencial, prescindindo de qualquer raciocínio de caráter institucional. O conceito de “mundanização” poderia ser mal-entendido, mas para Bento XVI estes
pensamentos não são novos. Ele
já os havia manifestado no final
da década de 1960. Exprimem
uma visão de fundo, autocrítica
sobre toda a Igreja. Ele julga-a em
perspectiva histórica e chamou a
atenção sobre o fato de que o testemunho da Igreja seria muito
mais límpido se fosse livre “dos
fardos materiais e políticos”. Neste caso, ela poderia dedicar-se
melhor aos verdadeiros valores
cristãos no mundo inteiro, ser
verdadeiramente aberta ao mundo. A Igreja seria tão mais crível
quanto mais se concentrasse no
próprio âmbito, na sua mensagem central.
O Papa concebeu tudo isso,
como disse ele mesmo, não como uma nova tática para obter
maior consideração pela Igreja,
mas como a vontade de procurar
“a plena sinceridade, que não reprime nada da verdade do nosso
hoje, mas realiza plenamente a
fé no hoje”.
Justamente os alemães, como
revelou o arcebispo de Freiburg
im Breisgau, Robert Zollitsch,
não deveriam se deixar dissuadir,
por meio de seu zelante organizar, estruturar e reformar, desta
busca de Deus. Todavia, como o
Papa não deu outras indicações ¬
30DIAS Nº 10 - 2011
55
Viagem apostólica à Alemanha
À esquerda, Bento XVI no encontro com os católicos
comprometidos na Igreja e na sociedade, no Konzerthaus
de Freiburg, dia 25 de setembro; acima, durante o encontro
com os representantes das comunidades muçulmanas
presentes na Alemanha, na Nunciatura de Berlim,
dia 23 de setembro; abaixo, no final da missa celebrada
na Praça da Catedral de Erfurt, dia 24 de setembro
práticas sobre o que ele entenda
por “fardos mundanos”, precisase de mais debates e discussões
sobre quais sejam as consequências a serem extraídas para promover a fé como o Papa indicou.
Poderá ser visto nos próximos
meses se se deve compreender
como uma rejeição do sistema
alemão aos impostos para o culto
e à comprovada relação EstadoIgreja, como alguns interpretaram ousando muito, ou se o seu
discurso não tenha sido principalmente um caloroso apelo para
voltar ao essencial e viver as suas
consequências.
Este seu convite a concentrarse no essencial da mensagem bíblica não foi dirigido somente aos
católicos na Alemanha, o seu
olhar dirigiu-se também à Europa. Nesse âmbito as condições da
convivência de Igreja e Estado
desenvolveram-se de modo muito diferente no decorrer dos séculos. A este propósito deve-se recordar que o artigo 17 do Tratado de Lisboa garante a cada país
europeu a manutenção da sua
tradicional relação entre Estado e
Igreja. É decisivo manter ativo o
diálogo com as Igrejas e levar à
nossa política as solicitações que
o Papa deu-nos justamente na
Alemanha. Trata-se da realização
dos valores cristãos na prática
política.
Com efeito, Bento XVI promoveu justamente isso nas suas homilias: a fé em Deus não deveria
permanecer como algo privado,
56
30DIAS Nº 10 - 2011
mas deveria se manifestar na sociedade. Encorajou os cristãos a
comprometerem-se com frutos
na sociedade e serem fermentos.
Trata-se de imprimir os valores
cristãos no discurso social, mas
também acolher as preocupações
do homem e sustentá-las. Isso foi
dito pelo Papa na sua homilia em
Freiburg, a cidade da Cáritas. Na
homilia agradeceu explicitamente
a todos os que se dedicam ao próximo nas creches e nas escolas,
mas também os que se dedicam
aos carentes e aos deficientes nas
muitas instituições sociais e caritativas na Alemanha e no mundo.
Este é um estímulo muito importante principalmente para os políticos. A fé tem consequências pa-
ra a nossa vida social e para o nosso agir público. Por isso é necessário de agora em diante que os
católicos se empenhem na política, na economia, na sociedade e
também nos serviços sociais com
ajuda concreta.
Neste sentido, em Erfurt louvou o empenho dos cristãos que
na base da fé se opuseram ao regime totalitário da RDA. Apesar
das circunstâncias adversas, eles
permaneceram fiéis a Cristo. Ainda hoje na Alemanha Oriental
procuram-se novas vias para a
promover a fé cristã em um ambiente muito distante da fé e para
falar exatamente aos que buscam
orientação e respostas às questões cruciais.
REFLEXÕES DE UM POLÍTICO
À esquerda, Bento XVI com Nikolaus Schneider, presidente do Conselho da Igreja
evangélica na Alemanha, no convento dos Agostinianos, em Erfurt, dia 23 de setembro;
acima, a partir da esquerda, o presidente da República Federal Alemã Christian Wulff
e esposa, o ministro da Defesa Thomas de Maizière (na segunda fila), o presidente
do Bundestag Norbert Lammert, e a chanceler Angela Merkel, assistem à missa
celebrada por Bento XVI no Estádio Olímpico de Berlim, dia 22 de setembro de 2011
Também a ponte que Bento
XVI lançou aos muçulmanos no
encontro em Berlim demonstra
que o Pontífice coloca-se justamente como “construtor de pontes” para a prática pública da religião. Ele disse muito claramente que gostaria que os muçulmanos também contribuíssem ao
bem comum a partir da sua religião, e que portanto a partir da
sua fé defendessem a causa de
uma convivência pacífica na sociedade. Aqui também se reflete
o reconhecimento do nosso tipo
de relação entre Estado e religião, que deve ser aberta também aos muçulmanos.
Como esta viagem, para o Papa, tratou-se principalmente de
um aprofundamento da fé, o desejo de rápidas mudanças concretas inevitavelmente não era
esperado. E isso vale também
para a questão do ecumenismo
com a Igreja evangélica na Alemanha. Um sinal importante,
sem dúvida, um acontecimento
de nível histórico, foi o Papa ter
encontrado no convento dos
agostinianos de Erfurt os repre-
sentantes da Igreja evangélica. É
um lugar de grande importância
simbólica para os protestantes
alemães. Ali viveu e atuou Martinho Lutero. Por isso tal gesto já é
um sinal de abertura. Com insistência e com o olhar dirigido para o futuro, o Papa citou Lutero
na sua busca de um Deus misericordioso. Aqui pôde perceber
grandes afinidades entre as confissões com relação ao mundo
secularizado: as grandes Igrejas
devem cuidar juntas da questão
de Deus e devem manter esta
questão de Deus no mundo secularizado. Para Bento interessavam os fundamentos da fé cristã
em resposta às questões existenciais “de onde viemos” e “para
onde vamos”.
No entanto muitos esperavam
do Papa um “passo inequivocável para a superação da divisão
entre as Igrejas”, como disse
Norbert Lammert, presidente do
Bundestag. Na realidade – segundo as palavras do arcebispo
Robert Zollitsch – é preciso referir-se à Conferência Episcopal
alemã para traduzir as reflexões
fundamentais do Papa e, junto
com os representantes da Igreja
evangélica na Alemanha, encontrar vias para um aprofundamento do ecumenismo. Nikolaus
Schneider, presidente do “Conselho para a Igreja evangélica na
Alemanha”, falou de um “ecumenismo de dons” e propôs as-
sim uma via para prosseguir um
caminho comum.
Espera-se que os problemas
dos matrimônios e das famílias
formadas por membros de diferentes confissões cristãs com relação à comum vida de fé, mas
também as limitações para os divorciados casados novamente,
possam ser repensados depois
da visita do Papa e que possam
ser feitos realísticos passos de reconciliação.
São muitas as questões abertas:
certamente é muito cedo para fazer um balanço. Os resultados dos
múltiplos e intensos encontros
com o Papa, os estímulos e as solicitações que ele ofereceu serão
elaborados nas discussões e nos
debates das próximas semanas e
dos próximos meses. Assim se poderá ver como poderá subsistir a
Igreja na Alemanha no tempo
presente e como os fiéis individualmente poderão ser testemunhas da fé em seu ambiente.
Para mim, como político e como católico, permanece o convite para refletir sobre os princípios da minha política à luz das
solicitações que o Papa fez na
sua visita. Bento XVI com a sua
mensagem nem sempre fácil,
nem sempre cômoda, levou nós
alemães a refletir. Devemos-lhe
uma profunda gratidão pelas
suas palavras, pelo seu encorajamento a viver a fé, pela visita na
sua terra natal.
q
30DIAS Nº 10 - 2011
57
Relatos das missões
Da Valtellina aos Andes
“Sempre desejei ver com os meus olhos como era o oratório
de Valdocco quando Dom Bosco vivia ali. Meu desejo foi respondido
aqui, aos pés dos Andes”. Foi o que disse o cardeal Martini ao visitar
a missão do salesiano Ugo de Censi,
iniciador da Operação Mato Grosso.
Contamos sua história
por Giovanni Ricciardi
58
30DIAS Nº 10 - 2011
Operação Mato Grosso
     
P
adre Ugo de Censi tem hoje oitenta
e sete anos, sessenta de sacerdócio
na congregação salesiana. Desde
1976, vive em Chacas, uma cidadezinha
perdida no leste do Peru, aos pés da Cordilheira dos Andes, que lembram a ele, em
sua majestosidade, as montanhas de sua
Valtellina. Um lugar em que a vida é precária, os meios de sustento devem ser arrancados todos os dias da montanha e a pobreza é a condição de todos.
“Con los pobres de la tierra quiero yo
mi suerte echar”, canta uma das mais famosas canções latino-americanas, Guantanamera; um verso que resume, na sua
beleza, a beleza da experiência missionária
de padre Ugo: “Com os pobres da terra
quero lançar minha sorte”. Lançar a sorte,
apostar, semear uma semente que em
Chacas deu um fruto excepcionalmente
abundante, tanto que o cardeal Martini,
quando visitou a missão para inaugurar
uma casa doada pela diocese de Milão, disse: “Sempre desejei ver com os meus olhos
como era o oratório de Valdocco quando
Dom Bosco vivia ali. O meu desejo foi respondido aqui, aos pés dos Andes”.
Padre Ugo volta de vez em quando à Itália para encontrar os grupos de voluntários
que há muitos anos o ajudam recolhendo
todos os meses gêneros alimentícios e roupas e trabalhando gratuitamente para enviar dinheiro à missão: uma experiência
aconfessional, sem uma identidade jurídica
na Igreja, em que são acolhidos todos
aqueles que têm vontade de ajudar. Desde
a década de 1970, seu nome não mudou:
chama-se Operação Mato Grosso. Padre
Ugo prega retiros para quem deseja um
momento mais destacadamente católico
dentro do movimento. As fórmulas são
simples, rezam segundo a tradição da Igreja, ficam de joelhos, até para se confessar.
São muitas pessoas, que em silêncio tomam notas ditadas pelo padre, como um
professor do primário, acrescentando pouco oralmente. Este ano o tema foi: “Bernadete e Aqueró”. Objetivo do retiro:
“Aprender a fazer bem o sinal da cruz”.
A referência a Lourdes não é casual,
mas lembra uma etapa fundamental na vida desse salesiano “vivo, alegre e contestador”, como o definiam seus superiores.
Mas também de saúde frágil. A espondilite
tubercular que lhe foi diagnosticada no seminário o manteve internado por três anos
no hospital. E a fístula aberta que o obrigou
a tanto tempo de cama só se fechou diante
da gruta de Massabielle. Assim padre Ugo,
finalmente restabelecido, pôde ser ordenado padre em 1951 pelo cardeal Schuster,
na Catedral de Milão. “Mas os superiores”,
conta, “me consideravam uma pessoa irrequieta. E assim, para ‘fazer passar a vontade de brincar’ que eu tinha, deram-me o
cargo de diretor espiritual de um reformatório masculino em Arese”. Ali ficou por
nada menos que vinte anos: “E ali aprendi
que as palavras religiosas não servem para
nada. Os jovens que ouviam meus sermões
se viravam para o outro lado. E no final,
diante da minha decepção, alguns diziam:
‘Mas você olhou para si mesmo? Não vê a
cara que você tem? Procure pelo menos
gostar um pouco de mim’”.
E assim, no final da década de 1960,
comovido pelos relatos dos confrades missionários que falavam da pobreza e das
imensas exigências das missões, começou
a viajar para a América do Sul e a organizar ajudas para essas obras salesianas.
Até que, em 1976, aos 52 anos, tomou a
decisão de ir viver estavelmente no Peru,
em Chacas. Foram com ele alguns jovens
que tinham saído do reformatório de Arese. “Eu tinha perdido muito da exterioridade da religião. Mas em Chacas voltei a
ser criança. E descobri outra vez as coisas
simples da fé: a vida de Jesus e a devoção,
cantar bem na igreja, ter as mãos unidas ¬
30DIAS Nº 10 - 2011
Na página ao lado,
padre Ugo de Censi
com padre Daniele
Badiali, em Yanama,
no Peru, em 1992
O santuário de
Pomallucay, no Peru
(no qual, em 1992,
nasceu o seminário
da diocese de Huari),
projetado
e construído
pelos voluntários
da Operação
Mato Grosso
59
Relatos das missões
Acima, a nova igreja
de San Luis, no Peru,
inaugurada em 18
de março de 2007;
no alto, à direita,
trabalhando para
a decoração
do coral da igreja,
os jovens da escola
profissionalizante
para entalhadores
de madeira fundada
por padre Ugo
60
em oração. Essas coisas eu retomei com os
jovens da missão”.
“Agora eu sou padre”, escrevia nos primeiros meses de sua permanência nos
Andes: “Chacas tem uma igreja enorme,
que no domingo se enche de gente, todos
em silêncio. Eu me sinto em casa, sinto
que são o meu povo. Gosto de fazê-los
cantar. Sinto que me querem bem, gostaria de conhecer um por um”. E ainda:
“Acredito que aqui vou ser padre como
antigamente: catecismo, canto, visitar os
doentes, missas... com esta gente que
precisa de pão, estradas, trabalho, higiene. Os jovens da Operação que vierem
vão me ajudar a encontrar solução para
estas necessidades”.
E isso aconteceu, nos anos seguintes.
Com a ajuda dos voluntários da Operação
Mato Grosso, padre Ugo realizou um número impressionante de obras de caridade: escolas profissionalizantes para entalhadores de madeira, enfermeiras e professoras de instrução primária, um hospital
em Chacas, casas para crianças órfãs ou
abandonadas, reparo e construção de pontes e estradas, e até a construção de uma
central hidrelétrica que fornece energia
para a cidade. Todas essas obras levam os
nomes de Dom Bosco ou de Maria Auxiliadora, na mais genuína tradição salesiana. E
naturalmente não poderia faltar o oratório
para milhares de crianças e jovens, que o
enchem nos domingos.
30DIAS Nº 10 - 2011
“Vocês deveriam ir a Chacas”, escreve
sobre padre Ugo um confrade e colaborador salesiano, “para conhecer a casa dele,
para que possam descobrir a riqueza de
um coração livre como o dele, um coração
do qual é fácil se apaixonar. Vocês vão
descobrir que a casa do padre Ugo é uma
praça sem paredes, sem portas, não porque não existam, mas porque foram derrubadas pelas pessoas que se amontoam
na porta para entrar na casa. Um pouco
como diz o Salmo: ‘Foram derrubadas as
cercas da vinha do Senhor e todo peregrino faz a vindima’”.
Nestes anos, centenas de voluntários
italianos fizeram a experiência de dedicar
alguns meses para ajudar padre Ugo em
sua missão. Alguns ficaram por mais de
um ano, outros decidiram ficar para sempre. Outros, ainda, movidos pelo exemplo do padre, sentiram o desejo de seguilo no caminho do sacerdócio. Padre Ugo
fundou assim um seminário para aspirantes ao sacerdócio que depois são “doados” às diversas dioceses do Peru, já que a
Operação Mato Grosso não tem um enquadramento jurídico na Igreja. Entre
eles, houve um jovem padre italiano, padre Daniele Badiali, que concluiu sua existência terrena em 1997, assassinado por
um grupo de bandidos que o sequestraram para pedir um alto resgate.
Padre Daniele amadureceu sua vocação
na Operação Mato Grosso. Dois anos de
voluntariado em Chacas, de 1984 a 1986,
levaram-no a tomar a decisão definitiva.
Voltou a Faenza, estudou no seminário regional de Bolonha e, logo depois de sua ordenação para a diocese de Faenza-Modigliana, foi enviado como sacerdote fidei
donum à diocese de Huari, no Peru, para
ajudar padre Ugo em sua missão, tomando
como encargo, em 1º de setembro de
Operação Mato Grosso
     
1991, a paróquia de San Luis, na Cordilheira Blanca: um território vasto, com
mais de sessenta lugarejos espalhados pelas montanhas, aos quais se chega a pé ou
a cavalo. Padre Daniele procurava ir a todas as comunidades, até as mais distantes,
e sua casa paroquial se tornou um ponto de
referência para muitas necessidades dos
pobres. Numa carta, descreve essa condição: “Para escrever, roubei este tempo às
pessoas que não param de bater à minha
porta para pedir comida, para pedir remédios, para pedir, para pedir, para pedir...
Estou atônito com esses assaltos constantes, é difícil sair de casa, logo vejo correrem
atrás de mim para me cercar, para pedir.
Não sei o que fazer... Eu fugiria diante de
tudo isso, porque não sei dizer sim e sinto
que não posso negar-lhes ajuda... Sou chamado a dar tudo, sabendo que amanhã recomeço do princípio e tenho de dar tudo
de novo. Os pobres me cravam um espinho e é uma dor contínua que gostaria de
acalmar, mas não depende de mim. É
meio-dia, vou almoçar com os jovens do
taller [oficina, ndr], uma velhinha está na
porta de casa. Ela não fala, mas há outros
que suplicam até cansar você. Seu silêncio
chegou ao meu coração, fecho os olhos,
vou lá embaixo pegar uma tigela de sopa, o
macarrão é italiano: dou a ela, me envergonho, é ela que deve implorar a Jesus a
graça de me salvar. Agradece-me com um
sorriso que me parece extremamente doce. E se atrás dessa velhinha tão suja estiver mesmo Jesus?”.
Começa o trabalho do oratório com as
crianças. Em março de 1992, prepara
quatrocentos para a primeira comunhão.
Em outubro desse mesmo ano, um voluntário e amigo de Daniele, Giulio Rocca,
que estava amadurecendo também a vocação ao sacerdócio, é morto por um grupo
de terroristas. Daniele escreve assim sobre
a sua morte: “Giulio morreu como um mártir, não escolheu, a situação o levou a morrer de uma morte violenta, semelhante à
dos mártires. Agora fica claro também para mim o caminho da Operação Mato
Grosso: perder a vida até o martírio. Tudo
isso me assusta, mas ao mesmo tempo sinto uma paz dentro de mim...”.
Nos anos seguintes, fora alguma volta à
Itália por motivos de saúde, dedica-se de
corpo e alma ao trabalho da missão. Constrói um refúgio andino com seus jovens,
para acolher montanhistas e turistas e conseguir, com os ganhos, ajudar economicamente os mais pobres. Em 1997, mesmo
tendo programado uma volta à Itália, decide ficar no Peru para assumir também as
atividades de padre Ugo, que fora à Itália
pregar os retiros aos voluntários. Passa oito semanas na cidade de Yanama para levar oitocentas crianças à crisma. Todas as
sextas-feiras prepara a confissão; é o momento mais importante para padre Daniele, que nesse último ano de sua vida o descreve assim: “Hoje é o dia da Paixão. Não
tenho palavras, gostaria só de chorar. Senti frio. Desejava uma ajuda dos meninos;
não pedia que viessem no meu lugar, só
que me dessem uma mão. Que significa
dar a mão a alguém que sofre? Eu tinha de
falar da morte de Jesus, não podia falar dela como uma fábula. A distração dos jovens
voltava diretamente ao meu coração como
os risos do diabo: ‘Por que se preocupa,
por que se agita, é tudo inútil...’ Ao menos
deveriam rezar ou manter as mãos jun- ¬
30DIAS Nº 10 - 2011
Padre Ugo
e padre Daniele
durante uma
procissão
Padre Daniele
durante uma
confissão
61
Relatos das missões
tas. Mas não podemos pretender, precisamos apenas dar... perdoar. Senti-me um
de Yanama, em 1992
condenado, a mesma cena da Paixão se repetia aqui. Recebia todos os golpes. Tive
de aceitá-los todos, seria um erro não querê-los. Espero apenas que este sofrimento
sirva para alguém. Eu o ofereço. Deus
meu, só de Ti desejava falar aos meninos”.
Na sua volta à paróquia de San Luis, em
10 de março de 1997, começa a preparação para a comunhão de quinhentas crianças: duas semanas de intensa partilha, dividida entre catecismo, oração e brincadeiras, até a Quinta-Feira Santa em que receberiam Jesus pela primeira vez. Padre Daniele trabalha incansavelmente e ao mesmo tempo espera a volta de padre Ugo da
Itália. Naqueles dias, escreve: “Vejo-me incapaz de me abandonar, de deixar Deus
conduzir todas as coisas: embora me pareça dar tudo, vejo que ainda devo apostar a
favor de Deus. Ser servo inútil é realmente
chamar o patrão, deixar tudo em suas
mãos, não querer conduzir nada. Ser servo
de Jesus é realmente invocá-lo com suas
mesmas armas: a bondade, o
perdão, o abandono, a paciênPARA SABER MAIS
cia, um sorriso... a morte”.
Operação Mato Grosso
Seis dias depois, em 16 de
março,
um domingo, depois de
É possível fazer contato pelo e-mail
ter
celebrado
a missa da noite na
[email protected].
cidadezinha
de
Yauya, encontra
Para informações a respeito da Operade repente a estrada bloqueada
ção Mato Grosso, dos grupos de trabalho na Itália, dos campos de trabalho de
por pedras. Aparece um bandido
verão e sobre como ajudar a Operação
armado que pede uma pessoa
Mato Grosso, pode-se entrar em contacomo refém. Uma voluntária itato diretamente pelo e-mail info@operaliana, Rosamaria, está para deszionematogrosso.it ou visitar o site
cer do jipe, mas Daniele a detém:
www.operazionematogrosso.it.
“Vou eu, você fica”. Num bilhete
para padre Ugo, é feito um pediPara contribuir para o processo de
do de resgate pelo prisioneiro.
beatificação e canonização de paMas dois dias depois, em 18 de
dre Daniele Badiali (dando um testemunho sobre padre Daniele, levando
março, o corpo de padre Daniele
cartas escritas por ele, fornecendo reé encontrado numa escarpa pelatos de eventos milagrosos atribuídos
dregosa. Dias antes, quando ainà sua intercessão), dirija-se a padre Alda estava em liberdade, escreveberto Luccaroni, juiz delegado. Para
ra a um amigo na Itália, a propóreceber informações e publicações sosito da “boa batalha” da fé: “Sobre padre Daniele, entre em contato
bretudo nos damos conta de que
com padre Mirko Santandrea, vicea batalha em favor de Deus já espostulador.
Para outra informações, visite o site
tá perdida... devemos morrer no
www.padredanielebadiali.it.
campo de batalha para que Deus
entre para vencer o inimigo, o
Padre Daniele com
os jovens do oratório
62
30DIAS Nº 10 - 2011
diabo. Nós devemos apenas preparar a
vinda de Deus. Custa muito, porque devemos dar a vida por um Deus que conta
sempre menos na vida dos homens. Você
vai perceber logo que esse Deus a quem
deseja servir não é tão buscado e benquisto
pelos homens. E quanto mais avançar,
mais lhe parecerá que esse Deus desaparece da vida dos homens, até da nossa. Ele o
deixa sozinho para representá-lo no campo de batalha. Você vai se perguntar muitas vezes: ‘Mas quando é que o Senhor vai
chegar?’ Não ouvirá nenhuma resposta,
você mesmo terá de dar a resposta com a
sua vida. O general entrará quando e como
quiser... Não conhecemos nem o momento, nem a hora... A única coisa certa são as
disposições deixadas para combater o inimigo: ‘Vai, vende o que tens e o dá aos pobres... Se quiseres ser meu discípulo, toma
a minha cruz e segue-me...’ Seu companheiro de batalha, padre Daniele”. Hoje,
na diocese de Faenza-Modigliana, iniciouse o seu processo de beatificação.
O martírio de padre Daniele fez florescerem vocações na Operação Mato Grosso. Hoje o seminário da diocese de Huari
tem cerca de quarenta aspirantes ao sacerdócio e a missão de padre Ugo é mais ativa
e próspera do que nunca. Mesmo que ele,
com quase noventa anos de idade, não
queira saber de nomear um sucessor, nem
de dar uma regra para a sua obra: “Se é
obra de Deus”, repete sempre, “continuará. Do contrário, é melhor que acabe”.
Na sua veneranda idade, parece realmente que voltou a ser criança: “Deus não
é o que eu tenho”, diz, “mas o que me falta
e que mais desejo. Não sei fazer outra coisa
a não ser reconhecer a minha incredulidade. Ser pecador, ser incapaz de viver de
Deus, ser um pobre coitado que precisa
apenas da misericórdia de Deus, precisa de
Deus. Que Deus me tome e faça de mim o
que Ele quiser. Mas que me tome”.
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Livros
Lealdade dos cristãos
e tolerância de Roma
As fontes antigas sobre a relação entre
o primeiro cristianismo e Roma, discutidas
nos estudos da historiadora Ilaria Ramelli,
contradizem a vulgata de um poder romano
ideologicamente inimigo dos cristãos
Ilaria Ramelli, I cristiani
e l’impero romano. In memoria
por Lorenzo Bianchi
di Marta Sordi, Marietti 1820,
Gênova – Milão 2011, 96 p.
pequeno e recente livro de
Ilaria Ramelli, filóloga e
historiadora, estudiosa do
cristianismo antigo, contém, como
ela mesmo indica no prefácio, uma
seleção de breves artigos de divulgação publicados nos anos de
2009 e 2010 no jornal Avvenire.
Porém não se trata, como se poderia pensar, de uma simples reedição de artigos agregados por afinidade de argumentação, nem de
uma simples antologia, mas de um
detalhado e denso resumo, que
ilustra com extrema síntese, mas
sem omitir nada de necessário ou
fundamental, os resultados dos estudos sobre o primeiro cristianismo realizados pela autora, com rigorosa metodologia científica (em
particular no que se refere à análise filológica dos textos e à avaliação das fontes históricas), nos últimos vinte anos.
Portanto, mesmo dirigindo-se
principalmente a leitores não especializados na matéria, o livro resulta
de grande utilidade também para
estudiosos, para os quais se configura – e isso é particular mérito da
autora e a preciosidade da obra –
como um extenso índice lógico,
que ordena e sistematiza uma vasta
produção (há sempre a indicação,
no lugar oportuno, de todas as necessárias indicações bibliográficas),
e da qual emerge o fio condutor da
pesquisa, coerente e unitária mesmo se “dispersa” em várias revistas
científicas especializadas.
O
64
30DIAS Nº 10 - 2011
Considerando a estrutura da
obra, não é possível, em uma recensão, assinalar todos os assuntos
tratados, a não ser fazendo uma
longa lista: o que não queremos fazer, limitando-nos a indicar as temáticas que parecem mais originais
e significativas.
Inicialmente diremos que o livro se articula em quatro distintas
seções.
Na primeira, a que trata da figura de Jesus nas fontes não cristãs do
século I, evidenciam-se dois textos
dos quais se demonstra a autenticidade, que se colocam em um período bem anterior às conhecidas passagens de Tácito: a carta de Mara
Bar Serapion, um estoico pagão,
escrita por volta do ano 73, e uma
passagem da Antichità giudaiche
(XVII, 63-64) do historiador José
Flávio, fariseu que escreve logo depois da queda de Jerusalém (ocorrida no ano 70); “justamente a estraneidade das duas fontes ao cristianismo”, escreve a autora (p. 10),
“fazem de Mara Bar e José Flávio
testemunhas preciosas e não ‘suspeitas’ da figura histórica de Jesus:
e mesmo se estes não acreditam na
ressurreição física, testemunham
sobre a fé que têm os cristãos ‘porque apareceu-lhes novamente vivo,
depois de três dias’” (Antichità giudaiche XVII, 64).
Mais adiante, na terceira seção,
será evidenciada a presença de
uma série de evocações ao cristianismo nos romances e nas sátiras
pagãs dos séculos I-II: o Satíricon
de Petrônio, As Aventuras de
Quereas e Caliroe de Caritão de
Afrodisía, Metamorfoses de Apuleio, obras nas quais se encontram
alusões, às vezes evidentes, aos fatos narrados pelos Evangelhos. E
na quarta faz-se a busca dos indícios históricos da primeira difusão
do cristianismo do Oriente Próximo à Índia: em particular as vicissitudes do rei Abgar de Edessa (sobre o qual parece fundamentada a
relação com o imperador Tibério),
a evangelização de Edessa por
obra de Addai (nome sírio de Tadeu, um dos setenta discípulos de
Jesus, enviado pelo apóstolo Tomé), a da Mesopotâmia por obra
de Mari (discípulo de Tadeu, pelo
qual foi convertido), a menção de
mandylion (a imagem aquiropita
de Jesus comparável ao Sudário),
a missão de Panteno na Índia (realizada pelo filósofo estoico, convertido ao cristianismo e mestre de
Orígenes e Clemente Alexandrino,
entre 180 e 190).
Mas queremos nos deter mais
exatamente na segunda seção, a
que trata do primeiro cristianismo
em Roma.
Nesta seção a autora demonstra
que o cristianismo logo ficou conhecido em Roma: o testemunho
disso é dado pela notícia da Consulta ao Senado do ano 35, relatada
por Tertuliano, com a qual o Senado recusou a proposta do imperador Tibério de dar legitimidade ao
credo cristão. Considerada muito
duvidosa por muitos, Ilaria Ramelli
confirma esta como histórica com
novos argumentos acrescentados
aos que já tinham apresentados por
Marta Sordi e por Carsten Thiede,
e em particular, baseada em um
fragmento do filósofo neoplatônico
Porfírio (233-305), que certamente
não pode ser suspeitado de propósitos apologéticos como, ao invés,
Tertuliano. Ao recusar a ressurreição de Jesus, Porfírio afirma que,
se tivesse realmente ressuscitado,
não deveria aparecer a pessoas
obscuras (como eram os apóstolos),
mas “a muitos homens contemporâneos e dignos de fé, e principalmente ao Senado e ao povo de Roma, onde estes, impressionados
pelos seus prodígios, não pudessem, com uma Consulta ao Senado
unânime, emitir sentença de morte,
sob a acusação de impiedade, contra os que lhe eram obedientes”.
A legislação anticristã de Roma
deveu-se ao Senado, mas Tibério
não aplicou as acusações, e até o
ano 62, os cristãos não foram condenados por nenhuma autoridade
romana como tais. O comportamento de tolerância do ambiente
da corte imperial para com os cristãos é testemunhado também pela
correspondência entre São Paulo e
Sêneca, que chegou até nós por um
caminho diferente daquela do corpus paulino. Precipitadamente deixada de lado como apócrifa na vulgata da crítica moderna, aqui ao invés, é revalorizada, com base em
novas e abundantes considerações
filológicas e lexicais particularmente convincentes, como provavelmente autêntica, ao menos na
maior parte das cartas (ou melhor,
breves bilhetes) que chegara até
nós, com datas dos anos 58 e 59.
São os anos nos quais (se se aceita a
cronologia alta) Paulo tinha chegado há pouco a Roma para ser submetido ao juízo do imperador, e, na
espera do processo, gozava da custódia militar benévola e era livre para pregar, difundindo o cristianismo
mesmo no pretório (“em todo o
pretório e em toda a parte, ficou-se
sabendo que eu estou na prisão por
causa de Cristo”, Fl 1, 13) e na corte imperial (“todos os santos vos
saúdam, sobretudo os que são da
casa imperial”, Fl 4, 22).
A relação de tolerância, ou mesmo de benevolência do poder imperial romano para com os primeiros cristãos – ao menos até a virada
autoritária neroniana em 62 e o desencadear-se da perseguição depois do incêndio de Roma que estourou em 19 de julho de 64 (perseguição que, como nos transmitiram
Tácito, Anais XV, 44, e Clemente
Romano, Carta aos Coríntios V,37 – VI, 1, foi alimentada pela inveja
e a denúncia de cristãos) –, descrito
por Ilaria Ramelli na segunda se-
atenta das fontes históricas, assim
como a ideia de fundo: ou seja, que
a oposição, que as perseguições
sem qualquer dúvida demonstram,
entre os que administravam o poder romano e os cristãos, não foi o
resultado, ao menos nas suas raízes
mais profundas, de um choque político ou de uma luta de classes, como afirma um preconceito ainda
muito difuso, mas teve outras causas, causas ligadas principalmente
à esfera religiosa. São os próprios
documentos históricos que demonstram que a atitude dos cristãos
nos primeiros séculos para com o
poder imperial foi sempre marcada, desde o início, pela lealdade e
pelo respeito da sua autoridade.
Portanto é historicamente errado
ver no império romano uma encarnação particularmente maligna do
poder e o inimigo da Igreja; aliás,
ao contrário – nós acrescentamos
–, foi justamente o império romano, como sugere a interpretação
Acima,
São João
Crisóstomo
(cerca de
344-407);
à direita,
o Coliseu
ção, transporta-nos diretamente ao
título do seu livro. Com efeito, neste a autora retoma literalmente o título de uma obra fundamental da
sua mestra, Marta Sordi, que por
mais de duas décadas foi titular da
cátedra de História Antiga na Universidade Católica do Sagrado Coração de Milão (I cristiani e l’impero romano, publicada em 1984,
que segue, sintetiza e atualiza o livro anterior Il cristianesimo e Roma, publicado em 1965). Ilaria Ramelli dá prosseguimento ao trabalho de sua mestra com um método
de avaliação rigorosa, analítica e
que São João Crisóstomo (IV Homilia, Sobre a II Carta aos Tessalonicenses, PG 62, 485) deu às palavras de São Paulo, é o que parece
interpor-se como obstáculo ao verdadeiro inimigo da Igreja, o anticristo: “E sabeis o que atualmente
retém o Adversário [o anticristo], de
maneira que ele se revele somente
na hora devida. Pois o mistério da
iniquidade já está em ação. Basta
que o obstáculo atual seja afastado”
(2 Ts 2, 6-7). O que, ou quem, retém o mistério da iniquidade, segundo São João Crisóstomo, é o
poder imperial de Roma.
q
30DIAS Nº 10 - 2011
65
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do banco Intesa Sanpaolo, IBAN IT36Y0306903207074003252819, BIC BCITITMM.
Conta corrente postal n. 13974043, nominal a "COOPERATIVA TRENTA GIORNI S.R.L. ROMA".
Western Union: para ulteriores detalhes escrever a [email protected]
Estou muito contente, portanto, com o fato de 30Giorni fazer uma nova edição deste
pequeno livro que contém as orações fundamentais dos cristãos, amadurecidas ao longo
dos séculos. Elas nos acompanham durante todas as vicissitudes da nossa vida e nos ajudam a celebrar a liturgia da Igreja rezando. Faço votos de que este pequeno livro possa se
tornar um companheiro de viagem para muitos cristãos.
da apresentação do cardeal Joseph Ratzinger
(eleito Papa em 19 de abril de 2005 com o nome de Bento XVI)
QUEM REZA SE SALVA
O livrinho Quem reza se salva
que 30Dias já distribuiu
centenas de milhares de exemplares,
contém as orações mais simples
da vida cristã como as da manhã
e da noite, e tudo o que ajuda
para uma boa confissão.
CUSTA APENAS 1€
o exemplar mais despesas
de expedição.
AS OUTRAS EDIÇÕES
EM LÍNGUA ITALIANA, FRANCESA,
ESPANHOLA, INGLESA,
ALEMÃ E CINESA
É possível solicitar
exemplares de todas as edições
(a edição italiana apresenta-se
em dois formatos, grande e pequeno),
escrevendo a 30GIORNI via Vincenzo Manzini,45 - 00173 Roma
Ou ao endereço e-mail: [email protected]

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