influência da contaminação endofítica no potencial regenerativo in

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influência da contaminação endofítica no potencial regenerativo in
INFLUÊNCIA DA CONTAMINAÇÃO ENDOFÍTICA NO POTENCIAL
REGENERATIVO IN VITRO DE FEIJÃO-CAUPI
L. M. HOULLOU-KIDO1, L. R. S. GAZZANEO1, A. P. MELO1, A. M.
BENKO-ISEPPON1 e E. A. KIDO1
Resumo - O presente trabalho teve como objetivo avaliar o efeito da ocorrência de fungos endofíticos
em sementes de feijão-caupi (Vigna unguiculata), cv. Gurgueia, sobre o potencial de regeneração in
vitro. Foram detectadas as presenças de fungos endofíticos pertencentes a três gêneros (Botryodiplodia,
Fusarium, Phomopsis). As sementes foram germinadas em placas de Petri contendo soluções de fungicida
(Cerconil) em diferentes concentrações (0,0; 1,0; 2,0; 3,0 e 4,0 g.L-1). Foi observado que apenas na
placa controle (sem fungicida) houve a formação de colônias dos fungos. No entanto, o fungicida
aparentemente interferiu na germinação das sementes. Quanto maior a dose do fungicida menor o
desenvolvimento da semente. Em um segundo experimento, com concentrações mais baixas do 1 fungicida,
(0,0; 0,2; 0,4; 0,6; 0,8; 1,0 g.L-1), também foi observada inibição completa do desenvolvimento dos
fungos em todas as doses testadas. Neste experimento observou-se também que a germinação das
sementes foi melhor na dose mais baixa (0,2 g.L-1). Os explantes (eixos embrionários e cotilédones)
cultivados in vitro iniciaram o processo de regeneração sem haver a incidência de contaminação. Este
resultado indica que a pré germinação das sementes em solução de fungicida pode maximizar o potencial
regenerativo de feijão-caupi in vitro pela eliminação dos fungos endofíticos.
Palavras-chave: cultivo in vitro de plantas, fungos endofíticos, organogenese.
THE INFLUENCE OF ENDOPHYTIC CONTAMINATION ON COWPEA BEANS IN
VITRO REGENERATIVE POTENTIAL
Abstract - The present work aimed to analyze the effect of endophytic fungus on the in vitro plant
regeneration of cowpea beans (Vigna unguiculata), cv. Gurgueia. First, the presence of different fungus
genera (Botryodiplodia, Fusarium Phomopsis) was identified. Seeds were germinated in Petri dishes
with increasing fungicide solution concentrations (0.0; 1.0; 2.0; 3.0 e 4.0 g.L-1). Fungus growth was
only observed in control Petri dishes (without fungicide). However, fungicide treatment affected seed
germination. A second assay, tested lower fungicide concentrations which inhibited fungus growth,
with little or no effects on plant germination and regeneration. The seeds were germinated in Petri
dishes with different concentrations of fungicide solution (0,0; 0,2; 0,4; 0,6; 0,8; 1,0 g.L-1). Complete
inhibition of fungus growth was observed in all tested concentrations. The best seed germination was
observed at 0,2 g.L-1, the lowest concentration used. The explants (embrionary axis and cotiledons)
regenerated without fungus growth. Our results show that seed germination in fungicide solution may
help maximizing the regenerative potential of in vitro cowpea for ilimination of end endophytic fungus.
Keywords: In vitro plant culture, endophytic fungus, organogenesis.
1
Universidade Federal de Pernambuco, Av. Profº Moraes Rego, 1235 - Cidade Universitária, Recife, PE.
CEP: 50670-901. E-mail: [email protected]; [email protected]; [email protected];
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Introdução
O feijão-caupi [Vigna unguiculata (L.) Walp.] apresenta grande importância sócio-econômica para
o Estado de Pernambuco e para o Nordeste do Brasil. Esta cultura é desenvolvida principalmente por
pequenos produtores rurais, com emprego de mão de obra familiar. A maioria dos agentes etiológicos
das doenças do feijão-caupi é transmitida por sementes, principalmente às causadas por fungos que
reduzem o poder germinativo. As sementes infectadas podem disseminar esses fungos, estabelecendo
assim focos primários de infecção em novas áreas de cultivo (Machado, 1994; Agarwal & Sinclair,
1987). A má qualidade sanitária das sementes contribui para a sua baixa germinação, redução do
número de plantas no campo, podridões radiculares, murchas, e conseqüentemente, baixo rendimento
da cultura. Muitos fungos estão associados a sementes interna ou externamente, e muitas vezes,
contribuem para um baixo poder germinativo (Vechiato et al. 1997). Bolkan et al. (1978) detectaram,
em 43 variedades de feijão comum e feijão-caupi, um total de 25 gêneros de fungos pertencentes a
diferentes classes, como Fusarium, Aspergillus e Penicillium. Barros & Menezes (1981), estudaram 23
variedades de feijão-caupi, nas condições de Pernambuco. Estes autores encontraram 32 fungos
associados às sementes das variedades estudadas, indicando uma grande variação na condição
fitossanitária. Um dos maiores problemas enfrentados na fase inicial de estabelecimento do explante in
vitro diz respeito à contaminação bacteriana e fúngica, presentes no interior dos tecidos e que é conhecida
como contaminação endógena. A contaminação microbiológica é a principal causa de perdas do cultivo
in vitro de plantas com finalidade científica ou comercial (Leifert & Weiters, 1994). Este tipo de
contaminação é mais freqüente em explantes derivados de plantas cultivadas no campo e pode causar
uma redução considerável da viabilidade no cultivo in vitro (Gunson & Spencer-Phillips, 1994). Sendo
assim, a correta identificação dos patógenos endofíticos e o estabelecimento de uma metodologia viável
de controle destes contaminantes, pode viabilizar o estabelecimento de diferentes técnicas de cultivo in
vitro de feijão-caupi, com potencial para auxiliar os programas convencionais de melhoramento.
Material e Métodos
Os trabalhos foram realizados no Laboratório de Genética Molecular do Departamento de Genética
da UFPE. Foram utilizadas sementes de feijão-caupi cv BR 17-Gurguéia fornecidas pela Embrapa MeioNorte. Inicialmente, foi realizado um primeiro experimento, para confirmar a ocorrência de fungos
endofíticos. Neste experimento, foi adotada a seguinte metodologia de desinfestação: Imersão em solução
de álcool 70% por 5 min, seguida pela imersão em solução de hipoclorito de sódio (NaOCl), a 1,5% de
cloro ativo, por 15 minutos, seguida de duas lavagens com água destilada esterilizada. Por último, as
sementes foram flambadas antes de serem inoculadas em placas de Petri, previamente esterilizadas
em autoclave (20 min. 121o C). As placas continham papel de filtro esterilizado e umedecido com 5 ml
de água destilada e estéril. As sementes foram incubadas em condições de fotoperíodo e temperatura
ambiente, durante um dia. Após esse período, os cotilédones e eixos embrionários foram isolados, sob
condições assépticas e inoculados em frascos contendo 25 ml de meio de cultura para regeneração de
feijão-caupi [sais e vitaminas de MS acrescido de sacarose (30 g/L-1), BAP (0,5 mg.L-1) e Agar (6,0 g.L1
)] . Estes frascos foram mantidos em sala de crescimento com fotoperíodo de 16 h e temperatura
controlada (26o C). Paralelamente, foi efetuado o levantamento da população fúngica das sementes. As
colônias que se desenvolveram sobre as sementes foram transferidas para meio BDA (batata, dextrose
e ágar), para posterior identificação. Os isolados fúngicos foram identificados de acordo com as
características morfológicas, seguindo-se a literatura específica disponível. Um segundo experimento
foi realizado para avaliar a viabilidade do pré-tratamento das sementes de feijão-caupi com fungicida
sistêmico como parte da desinfestação antes da introdução in vitro. As sementes foram inicialmente
desinfestadas por imersão em solução de álcool 70% por 1 min e, em seguida, em solução de hipoclorito
de sódio (NaOCl), a 0,15% de cloro ativo, por 15 minutos, seguida de três lavagens com água esterilizada.
As sementes foram inoculadas em placas de Petri contendo papel de filtro estéril umedecido com
solução de cerconil (0,0; 1,0; 2,0; 3,0; 4,0 g.L-1). e cultivadas a temperatura e luminosidade ambiente
por três dias. Após este período foi avaliado o desenvolvimento de contaminações (aparecimento de
colônias de fungos sobre as sementes) e da germinação. Em seguida, os cotilédones e eixos embrionários
foram isolados sob condições assépticas e inoculados em meio de cultura próprio para regeneração de
caupí. Estes explantes foram mantidos em sala de crescimento por 30 dias, durante os quais foi avaliado
o desenvolvimento. Um terceiro experimento foi realizado para estabelecer a dose mínima do fungicida,
eficaz para controlar a contaminação endógena. As sementes foram inicialmente desinfestadas por
imersão em solução de álcool 70% por 1 min e em seguida em solução de hipoclorito de sódio (NaOCl),
a 0,15% de cloro ativo, por 15 minutos, seguida de três lavagens com água destilada esterilizada. Em
seguida, as sementes foram plaqueadas em placas de Petri contendo papel de filtro estéril umedecido
com solução de cerconil (0,0; 0,2; 0,4; 0,8; 1,0 g.L-1). As sementes foram cultivadas a temperatura e
luminosidade ambiente por três dias. Após este período foi avaliado o desenvolvimento de contaminações
(aparecimento de colônias de fungos sobre as sementes) e da germinação. Em seguida, os cotilédones
e eixos embrionários foram isolados sob condições assépticas e inoculados em meio de cultura próprio
para regeneração de feijão-caupi. Estes explantes foram mantidos em sala de crescimento por 30 dias,
durante os quais o desenvolvimento foi avaliado.
Resultados e Discussão
Observou-se o desenvolvimento de colônias de fungos em todas as sementes intumescidas e
germinadas em placas de Petri, após o processo de desinfestação (Figura 1A). Os explantes coletados
destas sementes não apresentaram nenhum indício de desenvolvimento (regeneração) durante o cultivo
in vitro. Apenas as colônias de fungos se desenvolveram sobre toda superfície do explante, assim como
do meio de cultura, no decorrer do cultivo. A análise dos fungos permitiu identificar que as sementes de
feijão-caupi cv. BR 17-Gurguéia apresentaram, como contaminantes, os seguintes gêneros de fungos:
Botryodiplodia, Fusarium Phomopsis. As colônias dos fungos iniciaram o desenvolvimento cerca de três
dias após a inoculação dos explantes no meio de cultura apropriado para a regeneração in vitro de feijãocaupi. Foi observado também que o fungicida sistêmico utilizado (cerconil) conseguiu eliminar
completamente a incidência de contaminação em ambos os tipos de explantes utilizados no cultivo in
vitro (eixos embrionários e cotilédones) em todas as doses testadas. No entanto, houve uma redução da
germinação em placa de Petri, assim como da regeneração in vitro, com o aumento da dosagem de
fungicida utilizado. Das dosagens utilizadas no primeiro experimento com fungicida (0,0; 1,0; 2,0; 3,0 e
4,0 g.L-1), apenas a dosagem mais baixa (1,0 g.L-1) apresentou indícios de regeneração. Este resultado
evidenciou que apesar do tratamento com fungicida ter sido eficiente quanto ao controle da contaminação
endógena, sua forma de atuação prejudicou tanto a germinação como a regeneração in vitro. Em um
segundo experimento, ficou evidenciado que doses mais baixas foram tão eficientes quanto as doses
mais altas no controle dos fungos endofíticos (figura 1B) que ocorrem na semente de feijão-caupi cv. BR
17-Gurguéia. A principal diferença observada neste segundo experimento está correlacionada ao
desenvolvimento das sementes (germinação e crescimento da radícula) e ao início do processo
regenerativo in vitro que ocorreu de forma mais evidente nas sementes tratadas com a dose mais baixa
do fungicida (0,2 g.L-1). Estes resultados indicam que a germinação das sementes de feijão-caupi em
solução de fungicida sistêmico pode auxiliar significativamente o controle dos contaminantes endofíticos,
otimizando o protocolo de regeneração in vitro.
A
Bsemente de feijão-caupi cultivados in vitro. A
Figura 1. Aspecto de cotilédones de
– sem pré-tratamento com fungicida, B - Com pré-tratamento com fungicida.
Agradecimentos
Os autores agradecem à colaboração dos órgãos UFPE, CAPES, CNPq, FACEPE e Embrapa MeioNorte.
Referências
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