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Evolução da teoria organizacional: as perspectivas da teoria sistêmica e da gestão por processos Nathália de Melo Santos1 Rebecca Impelizieri Moura da Silveira2 Fabrycia Maria Teodoro Santos3 Resumo As crescentes transformações mercadológicas fazem com que a competição empresarial se torne cada vez mais acirrada, exigindo das organizações a quebra de paradigmas até então estabelecidos. Assim, faz-se necessária a adoção de uma nova forma de pensamento e atuação, que integre à cadeia de suprimentos de montante a jusante e favoreça a responsividade por meio da integração eficaz de seus subsistemas. Nesse contexto, o artigo tem por objetivo enfatizar as contribuições da Teoria Geral dos Sistemas (TGS) e da Teoria Sistêmica Organizacional à elaboração do arcabouço teórico-conceitual da Gestão por Processos, de acordo com as abordagens BPO e BPM. Para tanto, este ensaio teórico, de caráter bibliográfico e exploratório, apresenta uma análise crítica às diretrizes defendidas pelas teorias “funcionalistas” de Taylor, Ford e Fayol, em oposição às quais se constroem os pilares da TGS. Estes últimos elucidam a importância de se trabalhar a organização como um todo e incluir, nas análises organizacionais, o dinâmico ambiente externo. Evolução da TGS, a Gestão por Processos auxilia as organizações a se adaptarem às demandas colocadas pelo mercado, uma vez que busca ampliar o foco da organização e enfatiza a criação e oferta de valor ao cliente dentro de uma perspectiva horizontalizada. Os resultados deste trabalho subsidiam um entendimento mais aprofundado sobre a orientação e gestão por processos, o que favorece novas interpretações e possibilidades de pesquisa no campo de estudo. Palavras-chave: Teoria Geral dos Sistemas (TGS). Gestão por Processos. BPM/BPO. The evolution of organizational theory: the perspectives of systemic theories and process management Abstract The rapid market changes lead to an ever increasing competition, which requires organizations to break established paradigms. This calls for the adoption of a new way of thinking and acting, one that integrates the end-to-end supply chain in order to improve 1 2 3 Mestranda em Operações e Cadeias de Suprimentos pelo CEPEAD/Universidade Federal de Minas Gerais – UFMG. Analista de EAD da PUC virtual. E-mail: [email protected]. Mestranda em Operações e Cadeias de Suprimentos pelo CEPEAD/Universidade Federal de Minas Gerais – UFMG. Graduada em Administração de Empresas pela Faculdades Integradas do Oeste de Minas – FADOM. Especialista em Logística Estratégica e Controladoria e Finanças pela Universidade Federal de Minas Gerais – UFMG. Gestão Contemporânea, Porto Alegre, ano 8, n. 10, p. 141-164, jul./dez. 2011 Disponível em: <http://seer2.fapa.com.br/index.php/arquivo> 141 Nathália de Melo Santos, Rebecca Impelizieri Moura da Silveira e Fabrycia Maria Teodoro Santos the responsiveness of each of its subsystems. In this context, the goal of this paper is to emphasize the contributions of the General Systems Theory (GST) and the Organizational Systemic Theory (OST) for the conception of a theoretical-conceptual framework for Process Management, according to the BPO and BPM approaches. To this end, this theoretical essay, with a bibliographical and exploratory nature, conducts an in-depth analysis of the guidelines advocated by the “functional” theories of Taylor, Ford, and Fayol, which are in opposition to the pillars of the GST. Such pillars elucidate the importance of considering the organization as a whole and of including the dynamic external environment in the organizational analyses. Evolving from the GST, Process Management helps organizations to adapt themselves to the demands imposed by the market, by widening their focus and highlighting the importance of building and offering value to consumers in a horizontal perspective. The results of this work enable a deeper understanding of the orientation and management through processes, which fosters new interpretations and research directions in the field. Keywords: General Theory of Systems (GTS). Process Management. BPM/BPO Introdução As teorias organizacionais foram confrontadas por diversas perspectivas que predominaram em diferentes momentos históricos, construindo e desconstruindo conceitos e debatendo pontos de vista, muitas vezes, divergentes. Esse confronto entre as várias linhas de pensamento é responsável pelo dinamismo intelectual que é essencial ao redescobrimento e à renovação dos estudos organizacionais (REED, 1999). As inúmeras interações entre o indivíduo e o ambiente em que ele vive e estuda, portanto, resultam em uma dada teoria organizacional, influenciada tanto pelos contextos históricos quanto econômicos e sociais. Assim, explica-se, em parte, a passagem e a criação das diferentes teorias presentes, desde o “marco inicial” dos estudos organizacionais, como forma de solucionar problemas momentâneos e explicar fenômenos presentes em determinados períodos (REED, 1999). Diferentes abordagens sociológicas coexistem nessas teorias organizacionais, e, segundo Burrell e Morgan (1979), por meio de uma classificação paradigmática, podem ser definidos os pontos de vista epistemológicos de cada linha de pensamento, dividindo-os em quatro paradigmas mutuamente excludentes. Nesse sentido, este artigo enquadra-se no paradigma funcionalista, que mantém suas raízes na denominada “sociologia da regulação” e aborda o sujeito principal de um ponto de vista objetivista, sendo, portanto, realista, positivista, determinista e 142 Gestão Contemporânea, Porto Alegre, ano 8, n. 10, p. 141-164, jul./dez. 2011 Disponível em: <http://seer2.fapa.com.br/index.php/arquivo> Evolução da teoria organizacional: as perspectivas da teoria sistêmica e da gestão por processos nomotético. Sua composição pode ser considerada como resultante da interação entre a teoria marxista, o idealismo germânico e o positivismo sociológico (BURRELL; MORGAN, 1979). Devido à integração de forças intelectuais, possibilitou-se o surgimento de distintas escolas de pensamento. Esse novo enfoque deu origem a novas escolas de sociologia, as quais, em decorrência, engendraram a teoria dos sistemas sociais. Como exemplo do dinamismo intelectual e do constante processo de construção – e desconstrução – presentes nos estudos organizacionais, a Teoria Geral dos Sistemas (TGS) surge como uma crítica à administração científica e à teoria clássica, ambas funcionalistas, ao considerar o ambiente externo à organização e destacar a importância da visão do todo organizacional. Essa teoria possibilitou uma nova interpretação sobre as organizações, que passaram a ser vistas como um conjunto de subsistemas interligados e interdependentes que interagem continuamente com o ambiente no qual estão inseridas. Tal ampliação da perspectiva organizacional permitiu a elaboração e o desenvolvimento da teoria atual relativa à gestão de processos, em especial devido ao destaque concedido à necessidade de integração entre os departamentos e suas respectivas funções, juntamente com a importância aferida ao cliente (fator externo). Como resultado da divisão do trabalho em atividades sequenciais, foram definidos os processos de negócio que, segundo Goldkuhl e Lind (2008) e Hammer e Champy (2003), consistem em um conjunto de atividades responsáveis pelas transformações das matérias-primas ou recursos em resultados ou produtos que são valiosos para o cliente. Assim, a partir da interpretação dos termos que permeiam a abordagem por processos, percebe-se claramente que a TGS, juntamente com a Teoria Sistêmica Organizacional, representam a sua base teórica e conceitual. A abordagem por processos amplia o foco da organização e afirma que a interação entre funções pode criar valor ao satisfazer as necessidades do cliente (CHEN; TIAN; DAUGHERTY, 2009). Com isso, tem-se o deslocamento da ênfase na excelência dos silos funcionais para a melhoria no desempenho dos processos de negócio da organização, o que demanda a adoção de uma perspectiva horizontalizada (GOLDKUHL; LIND, 2008). Nesse contexto, é apresentada a orientação para processos de negócios (business process orientation, BPO), que destaca a importância dos processos essenciais da organiGestão Contemporânea, Porto Alegre, ano 8, n. 10, p. 141-164, jul./dez. 2011 Disponível em: <http://seer2.fapa.com.br/index.php/arquivo> 143 Nathália de Melo Santos, Rebecca Impelizieri Moura da Silveira e Fabrycia Maria Teodoro Santos zação bem como a integração intra e interorganizacionais. O enfoque dado pelo BPO gera a necessidade da gestão dos processos para os quais a organização está orientada, o que leva ao conceito de gerenciamento dos processos de negócio (business process management, BPM). Assim, o sistema BPM contribui, então, para os principais aspectos estratégicos das operações da organização, sobre os quais possui alto nível de influência e, proporcionalmente, maior possibilidade de adicionar valor agregado. Nesse sentido, o problema de pesquisa a ser investigado é dirigido pela seguinte questão: “qual a contribuição dada pela teoria sistêmica no contexto atual da orientação e gestão por processos (BPO/BPM)?”. O presente trabalho tem, portanto, como objetivo explicitar a conexão existente entre a TGS, a Teoria Sistêmica Organizacional e a gestão por processos, sob a perspectiva do BPO/BPM, além de ressaltar a evolução contínua da teoria em prol de uma visão baseada em processos, estudada por diversos autores da contemporaneidade. Para a consecução de tal objetivo, será realizada uma pesquisa bibliográfica centrada no conteúdo das abordagens apresentadas, por meio da análise de artigos recentemente publicados na área de organizações e operações. As contribuições deste estudo permeiam tanto o campo acadêmico dos estudos organizacionais como o empresarial, na medida em que possibilita um melhor entendimento sobre a orientação e a gestão por processos, ressaltando a sua importância no contexto teórico-prático e clarificando suas bases teóricas. O artigo foi estruturado em seis diferentes seções, contando com esta breve introdução. Na seção 2, é apresentada a metodologia utilizada para se alcançar os objetivos propostos. Como forma de demonstrar o desenvolvimento e a evolução da teoria por processos, a seção 3 aborda, brevemente, as perspectivas de Taylor, Ford e Fayol, juntamente com a perspectiva sistêmica. Posteriormente, nos pontos 4.1, 4.2 e 4.3 são definidos, sucintamente, os processos de negócio, bem como os conceitos e as principais características do BPO e do BPM. Na seção 5 são apresentadas as discussões e, finalmente, na seção 6, as considerações finais acerca da evolução da teoria organizacional na temática proposta. 144 Gestão Contemporânea, Porto Alegre, ano 8, n. 10, p. 141-164, jul./dez. 2011 Disponível em: <http://seer2.fapa.com.br/index.php/arquivo> Evolução da teoria organizacional: as perspectivas da teoria sistêmica e da gestão por processos 2 Metodologia Este artigo pauta-se em uma pesquisa bibliográfica (MALHOTRA, 2001) realizada por meio de um estudo de trabalhos recentes publicados a respeito de teorias e conceitos afins ao tema aqui estudado. Como fontes de pesquisa foram utilizadas publicações internacionais e nacionais relevantes, de impacto nas áreas de organizações e operações. De acordo com Gil (2002) e Vergara (2005), a pesquisa bibliográfica é desenvolvida com base em material já elaborado, ou seja, “abrange toda a bibliografia já tornada pública em relação ao tema de estudo” (MARCONI; LAKATOS, 1996, p. 66), propiciando ao pesquisador um contato direto com conteúdos de pesquisas e reflexões teóricas já produzidas sobre o tema em questão. A principal vantagem dos estudos bibliográficos reside no fato de permitirem ao investigador a cobertura de uma gama de fenômenos muito mais ampla do que aquela que poderia pesquisar diretamente, isto é, conhecer as diferentes contribuições científicas disponíveis sobre o tema a partir de diversas perspectivas (GIL, 2002). Embora quase todos os estudos exijam esforços dessa natureza, há pesquisas desenvolvidas exclusivamente a partir de fontes bibliográficas, como sucede em muitos estudos tipicamente exploratórios (GIL, 2002). Marconi e Lakatos (1996) afirmam que o levantamento de dados prévios tem como objetivo trazer conhecimentos que servem como pano de fundo para o campo de interesse a ser explorado, evitando duplicação de esforços desnecessários. A pesquisa bibliográfica não é, então, apenas uma repetição do que já foi dito, mas, sim, um estudo que possibilita a análise sob um novo enfoque, permitindo contribuições inovadoras, apesar de inconclusivas. 3 Fundamentação teórica da gestão por processos Constituindo o cerne conceitual dos estudos organizacionais, o trabalho de Taylor (1987), iniciado na década de 1880 com a denominada “administração científica”, retrata a aplicação da teoria científica na gestão da produção fabril. A elaboração de sua obra, viabilizada pelas pesquisas realizadas na empresa em que trabalhava, constituiu a primeira tentativa de racionalização do trabalho por meio da padronização das atividades produtivas. Entre vários, um dos objetivos de tal Gestão Contemporânea, Porto Alegre, ano 8, n. 10, p. 141-164, jul./dez. 2011 Disponível em: <http://seer2.fapa.com.br/index.php/arquivo> 145 Nathália de Melo Santos, Rebecca Impelizieri Moura da Silveira e Fabrycia Maria Teodoro Santos racionalização foi a eliminação dos desperdícios, de forma a garantir a eficiência da indústria, e a redução da variabilidade da produção, o que levaria a melhora na qualidade do produto oferecido. Com base nessas intenções, Taylor (1987) manteve seu foco no processo de trabalho, preocupando-se com o uso adequado dos recursos disponíveis e estudando quais seriam os procedimentos mais adequados à realização do trabalho (gestão de tarefas) por meio da análise apurada dos seus “tempos e movimentos”. Como consequência, introduziu-se a noção de divisão do trabalho – a cada tarefa é designado um perfil específico –, que, por sua vez, levou a um período de transição tecnológica no qual o trabalhador perdeu o controle sobre a realização do processo produtivo como um todo. Compartilhando o desejo de eficiência apresentado por Taylor (1987), o sistema empreendido por Henry Ford em suas fábricas de automóveis, em meados de 1910, representou, naquele momento, um novo conceito de organização e de execução do trabalho: a linha de montagem de produção contínua. Por meio dela, foi possível economizar tempo e trabalho desnecessários, organizando os operários e ferramentas na ordem correta de uso e no local apropriado para a execução das tarefas. Assim como Taylor (1987), Ford (1954) se preocupava com o estudo de “tempos e movimentos”, o que serviu de incentivo para o uso de uma rede de esteiras interligadas no processo produtivo. As atividades dos operários, portanto, eram cada vez mais especializadas e, consequentemente, atreladas a determinada fase do processo produtivo, de forma que a cada operário era designado um ponto específico na esteira, favorecendo sua especialização, além de maximizar o tempo e os recursos disponíveis. Em complementação aos estudos de Taylor (1987) e Ford (1954), Fayol (1990) mantém seu enfoque no aspecto interno da organização, buscando traçar seu perfil, o melhor modo de gerenciá-la e explicitar a necessidade do controle interno da organização. A junção de todos esses trabalhos culminará na chamada Teoria Clássica da Administração. Fayol (1990) descreve a organização como um conjunto interdependente de operações técnicas, comerciais, financeiras, de segurança, contábeis e administrativas. Esta última possui o objetivo de unir os atores da organização, bem como promover o consenso e a harmonia entre eles, sendo subdividida em atividades de previsão, organização, comando, coordenação e controle. Nesse sentido, as responsabilidades dentro da organização são divididas hierarquicamente, segundo o perfil, sendo 146 Gestão Contemporânea, Porto Alegre, ano 8, n. 10, p. 141-164, jul./dez. 2011 Disponível em: <http://seer2.fapa.com.br/index.php/arquivo> Evolução da teoria organizacional: as perspectivas da teoria sistêmica e da gestão por processos representadas em uma estrutura piramidal, de maneira a remeter à ideia de autoridade de cima para baixo, em que a base corresponde ao nível operacional (classe operária), o meio corresponde ao nível tático e o topo ao nível estratégico. Além disso, como forma de a organização alcançar seus objetivos, Fayol (1990) estabelece princípios que devem ser seguidos pela gerência, sendo eles: divisão do trabalho, autoridade/ responsabilidade, disciplina, subordinação do particular ao geral, remuneração, centralização, hierarquia, ordem material e social, equidade, estabilidade de pessoal, iniciativa e união do pessoal. O autor reforça, ainda, a preocupação dominante com a eficiência interna, explicitando a necessidade do controle interno e da especialização das tarefas. De forma análoga à especialização dos operários na linha de montagem proposta por Ford, a especialização deveria ser generalizada de forma abrangente, independentemente dos cargos e das tarefas desenvolvidas por cada um dos profissionais da organização. A estrutura organizacional torna-se, então, cada vez mais departamentalizada e dividida segundo objetivos funcionais, deixando de lado a perspectiva da organização como um todo (FAYOL, 1990). Muitas críticas foram feitas à visão mecanicista e reducionista da organização providas pela teoria clássica, as quais deram origem a novas pesquisas no campo organizacional. A partir daí, buscou-se, pelo desenvolvimento de diferentes estudos, humanizar e democratizar a organização por meio da ênfase nas pessoas e em seu caráter emotivo como parte constituinte dela. Os estudos de Elton Mayo em Hawthorne deram início à abordagem das relações humanas, que, posteriormente, evoluiu para a Teoria Comportamental. Apesar do avanço representado por tais estudos na teoria organizacional, o enfoque interno perpetua dentro dessas novas formas de ver a organização. Porém, com o advento da Segunda Guerra Mundial (1939-1945), grande parte das premissas, consideradas preponderantes na época, passaram a ser questionadas, levando ao surgimento de novas perspectivas acerca do tema. Com o período pós-guerra, deu-se início à evolução dos mercados de consumo, dado o aumento da concorrência e o surgimento de novas oportunidades, bem como a implantação de novas tecnologias produtivas. Esses fatores, em conjunto, promoveram o crescimento exasperado das organizações industriais, que, naquele momento, se encontravam erguidas sob estruturas verticalizadas e divididas funcionalmente (DE SORDI, 2008). Gestão Contemporânea, Porto Alegre, ano 8, n. 10, p. 141-164, jul./dez. 2011 Disponível em: <http://seer2.fapa.com.br/index.php/arquivo> 147 Nathália de Melo Santos, Rebecca Impelizieri Moura da Silveira e Fabrycia Maria Teodoro Santos Nesse cenário, nos estudos organizacionais, surge um novo foco direcionado a assuntos mais genéricos, tais como a sobrevivência da organização, as relações organização-ambiente e a eficácia organizacional, além de questões internas da empresa, como a motivação dos funcionários e o elemento humano da organização. A partir daí, novas vertentes da administração foram exploradas com o intuito de complementar ou unir parte das teorias já existentes e, assim, compreender a organização, sua estrutura e a interdependência de suas relações (MORGAN, 1996). Na década de 1950, Von Bertalanffy apresenta a Teoria Geral dos Sistemas (TGS) e, a partir daí, termos da biologia são usados de maneira comparativa àqueles da estrutura social. Essa teoria passa a constituir, então, o modo mais abrangente de estudar os campos não físicos do conhecimento científico. As metáforas do organismo ajudam os teóricos organizacionais a identificar e estudar diferentes necessidades das organizações enquanto sistemas abertos, instituindo uma visão mais integrada e harmônica destas por meio da adoção e da adaptação de palavras e conceitos provenientes das ciências naturais. Sob essa perspectiva, as organizações sociais são interpretadas como subsistemas abertos compostos por indivíduos da sociedade total, em que todos os elementos estão inter-relacionados sob forças interatuantes (MORGAN, 1996). O ambiente no qual a organização está inserida tem a função, entre diversas outras, de fornecer os insumos – inputs – necessários para a realização das atividades internas (processamento) e a entrega de resultados – outputs – a esse mesmo ambiente. Portanto, como elemento dependente do ambiente, a organização possibilita sua automanutenção por meio de um contínuo fluxo de entradas e saídas e mediante a construção e decomposição de componentes provenientes desse ambiente (VON BERTALANFFY, 1973; MORGAN, 1996). Nesse sentido, a estrutura organizacional é apresentada como um elemento passível de escolha por parte da organização e que está sujeita a modificações, em oposição à teoria clássica, que via como fatores preponderantes para levar uma organização ao sucesso uma estrutura inexorável e a necessidade de adotar as melhores práticas, juntamente com o controle rígido. Dentro dessa nova perspectiva apresentada pela teoria sistêmica, entende-se que cada organização demanda um tipo de estrutura que será a melhor para desempenhar suas atividades e manter-se no mercado. A organização, dependendo da estrutura escolhida, terá maior ou menor flexibilidade para se relacionar com seu ambiente: 148 Gestão Contemporânea, Porto Alegre, ano 8, n. 10, p. 141-164, jul./dez. 2011 Disponível em: <http://seer2.fapa.com.br/index.php/arquivo> Evolução da teoria organizacional: as perspectivas da teoria sistêmica e da gestão por processos quanto mais rígida for a estrutura organizacional, menor será a sua disposição para efetuar trocas com esse ambiente. Dentro desse contexto, Katz e Kahn (1976) afirmam que as organizações possuem propriedades que lhes são particulares, mas que, ao mesmo tempo, compartilham características generalizadas aos sistemas abertos. Nesse sentido, os autores apresentam nove características comuns aos sistemas abertos, elencadas a seguir, o Quadro 1. 1. Importação de energia 6. Insumo de informação, feedback negativo e processo de codificação 2. Transformação 7. Estado firme e homeostase dinâmica 3. Produto 8. Diferenciação 4. Sistemas como ciclos de eventos 9. Equifinalidade 5. Entropia negativa Quadro 1 – Características comuns aos sistemas abertos. Fonte: Elaborado pelas autoras com base em Katz e Kahn (1976). Tratando-se de todos os sistemas sociais, incluindo as organizações, pode-se considerá-los como resultado de uma série de atividades padronizadas realizadas por determinada quantidade de indivíduos. Essas atividades, já padronizadas, tornam-se complementares ou interdependentes com relação a alguma saída ou resultado comum, sendo continuamente repetidas, duradouras ou ligadas no espaço e no tempo. Para que haja manutenção dessa atividade padronizada, é necessária a renovação contínua do influxo de energia, que, nos sistemas sociais, garante-se pelo retorno de energia do produto ou resultado. Dessa forma, o sistema aberto possui caráter inesgotável, pois pode importar mais energia do mundo que o rodeia sempre que preciso. Assim, a tendência à entropia é contrariada no ato da importação de energia (MORGAN, 1996; KATZ; KAHN, 1976). A partir desses pressupostos, entende-se que o ambiente exerce influência, mesmo que indireta, nos resultados da organização, seja impondo restrições, seja demandando adaptações para sua sobrevivência. A organização, por sua vez, depara com incertezas acerca do que esse ambiente demanda enquanto se torna dependente dos múltiplos e vários elementos que o compõem. Assim, a diferenciação interna organizacional é baseada na premissa de que, quanto maior a complexidade do ambiente, maior deve ser a organização para conseguir adaptar-se a essas incertezas. Tal diferenciação interna é viabilizada por Gestão Contemporânea, Porto Alegre, ano 8, n. 10, p. 141-164, jul./dez. 2011 Disponível em: <http://seer2.fapa.com.br/index.php/arquivo> 149 Nathália de Melo Santos, Rebecca Impelizieri Moura da Silveira e Fabrycia Maria Teodoro Santos meio da criação de diferentes áreas, sendo, na verdade, uma demanda desse ambiente do qual a organização faz parte. Em contrapartida, tal diferenciação cria o desafio e a necessidade de introduzir mecanismos que assegurem a integração dessas diferentes subáreas para a consecução dos objetivos organizacionais. Percebe-se, porém, que, quanto maior a diferenciação, maior será o desafio de integração, que, por sua vez, gera maior dificuldade na correspondência das novas demandas impostas pelo mercado e pelo ambiente (MORGAN, 1996). Entende-se, portanto, que a eficácia de uma organização está em sua capacidade de equilibrar diferenciação e integração internas. O crescimento organizacional, bem como o consequente aumento da complexidade interna, é um dos fatores determinantes para o surgimento de proposições acerca de organizações enxutas, estruturalmente “achatadas”, e com grande uso de sistemas de informação. Estes últimos são utilizados de modo a assegurar o controle e a melhor integração das diferentes partes da organização. A TGS, portanto, possibilita uma nova interpretação sobre as organizações, atribui maior ênfase a sua complexidade e propicia uma visão completa dela, em oposição à perspectiva simplificada e mecanicista dada anteriormente pela administração científica e pela teoria clássica. Dessa forma, a TGS constitui a base para a elaboração da teoria atual sobre o gerenciamento dos processos organizacionais (DE SORDI, 2008), ao enfatizar a necessidade da integração e explicitar a interdependência entre as diferentes partes da organização em detrimento de uma estrutura baseada em silos funcionais. Tal visão corrobora a perspectiva da gestão por processos, que torna a integração intra e interorganizacionais fatores importantes para o alcance de diferenciais frente à concorrência. A Figura 1 explicita as relações existentes entre os diferentes subsistemas existentes na organização. Dessa forma, a evolução e a difusão da gestão por processos traz a perspectiva das organizações como um conjunto de processos internos e externos que devem ser entendidos e mapeados, de modo que as tarefas não sejam definidas segundo a função dos departamentos organizacionais, mas, sim, de acordo com as atividades que proporcionarão maior valor agregado à organização e aos produtos/serviços oferecidos. Assim, a racionalização contemporânea do trabalho passa a interpretar as atividades organizacionais de maneira ampla e transfuncional, de forma que um processo pode cruzar departamentos e solicitar diferentes serviços, com foco na atividade que deve ser executada (BALDAM et al., 2007). 150 Gestão Contemporânea, Porto Alegre, ano 8, n. 10, p. 141-164, jul./dez. 2011 Disponível em: <http://seer2.fapa.com.br/index.php/arquivo> Evolução da teoria organizacional: as perspectivas da teoria sistêmica e da gestão por processos Subsistemas organizacionais Supra sistema ambiental Entradas que energizam a organização Recursos humanos, financeiros, materiais e informação Subsistema estratégico Subsistema técnico Subsistema gerencial Subsistema humano-cultural Subsistema estrutural Saídas organizacionais Produção de bens e serviços em nível de eficiência e eficácia que influencie a disponibilidade futura de recursos e funcionamento do sistema Fluxo de matérias-primas, energia e informação Figura 1 – Modelo genérico de sistema aberto. Fonte: Adaptada de Morgan (1996). Os conceitos utilizados na teoria sobre os processos de negócio, tal como serão tratados a seguir, foram importados dos princípios e conteúdo propostos pela TGS e pela Teoria Sistêmica Organizacional (DE SORDI, 2008). Tais conceitos são essenciais ao entendimento dos modelos de gestão baseados em processos – BPO e BPM. 4 Processos de negócio As organizações funcionam como uma rede de organismos vivos, na qual se relacionam, de montante a jusante, diferentes entidades (fornecedores, funcionários, produtos/serviços e clientes) e funções básicas (operacionais e gerenciais), as quais integram a cadeia de valor das empresas, contribuindo para seu sucesso ou fracasso (MORGAN, 1996; CAMPOS, 2004; CHOPRA; MEINDL, 2003; CHRISTOPHER, 2007). O desenvolvimento dos fluxos horizontais e verticais de tais funções ocorre por meio de múltiplos processos de negócio, os quais possibilitam a concretização dos resultados organizacionais. Gestão Contemporânea, Porto Alegre, ano 8, n. 10, p. 141-164, jul./dez. 2011 Disponível em: <http://seer2.fapa.com.br/index.php/arquivo> 151 Nathália de Melo Santos, Rebecca Impelizieri Moura da Silveira e Fabrycia Maria Teodoro Santos Vendas Compras Marketing Produção input Logística Processo de negócio Recurso Humanos Fornecedores Output Informática Finanças Clientes/ Mercado Figura 2 – Processo de negócio. Fonte: Santos et al. (2010). O processo de negócio é definido como a maneira pela qual a organização realiza o seu trabalho, representado por um conjunto de atividades estruturadas e interligadas, as quais são executadas a partir de inputs, a fim de atingir um objetivo específico do mercado ou de determinado cliente (outputs), seja ele interno e/ou externo à organização (DAVENPORT, 1993, 2005; BRONZO; OLIVEIRA, 2008; HAMMER, 2001; ARMISTEAD; MACHIN, 1997; ANUPINDI et al., 2006; ZAIRI, 1997; MCCORMACK; JOHNSON, 2001; WESKE, 2007), conforme ilustrado na Figura 2. Essas atividades podem se tornar fontes de vantagem competitiva, quando executadas de forma mais barata ou melhor do que a concorrência (PORTER, 1989). É importante notar que os processos de negócios representam uma parte crítica da organização, já que abrangem as atividades de concepção, fabricação, marketing, inovação, vendas, entre outras, que proporcionam qualidade para os clientes finais. Portanto, o processo de negócio se refere ao modo como as empresas se esforçam constantemente em busca da excelência e como elas estimulam a inovação e a criatividade para a melhoria e a otimização de processos (ZAIRI, 1997). Para ser orientada para processos, uma organização deve superar diversos desafios em prol da melhoria contínua e do aumento da qualidade. Entre eles, o rompimento com a estrutura organizacional adotada até então é aquele que exige maior esforço por parte da 152 Gestão Contemporânea, Porto Alegre, ano 8, n. 10, p. 141-164, jul./dez. 2011 Disponível em: <http://seer2.fapa.com.br/index.php/arquivo> Evolução da teoria organizacional: as perspectivas da teoria sistêmica e da gestão por processos organização, uma vez que, tradicionalmente, ela se encontra focada em seu desempenho funcional, o que leva à criação de barreiras verticais que se opõem a uma abordagem sistêmica dos fluxos de valor. Como a estrutura existente não comporta a nova perspectiva, faz-se necessária a estruturação ou reestruturação dos processos internos e externos à organização. Estes últimos devem ser reestabelecidos de acordo com as exigências dos clientes, com a estratégia individual da organização e com os agentes integrantes da cadeia. Dessa forma, a empresa que busca evoluir em direção a uma estrutura focada em processos que agregam valor deve rever constantemente suas estruturas (até então funcionais) (HAMMER; STANTON, 1999; MCCORMACK et al., 2003; CROXTON et al., 2001). O gerenciamento dos processos de negócio consiste, então, no esforço contínuo do mapeamento, do melhoramento e da adesão dos processos organizacionais. Quando bem conduzido, propicia a redução de custos, o incremento de receita e atua positivamente no investimento e na capacidade do negócio (SLACK et al., 2008; MARTINS et al., 2009). Tal gerenciamento, portanto, pode vir a fornecer uma duradoura posição de superioridade em relação aos concorrentes sob a perspectiva dos clientes (CHRISTOPHER, 2007). 4.1 Business Process Orientation (BPO) O pensamento focado em processos é descrito como interfuncional, orientado para resultados e essencial para orientação ao cliente, qualidade, flexibilidade, velocidade, serviço e reengenharia. Nessa abordagem, uma empresa é definida não por seus produtos e serviços, mas por seus processos; dessa forma, gerenciar uma empresa significa gerir seus processos. Estes são, então, classificados de acordo com a capacidade que possuem de agregar valor, habilitar outros processos, criar ativos e/ou organizá-los. A partir dessa nova perspectiva, as empresas buscam estender suas fronteiras legais como uma nova forma de se organizarem, uma vez que, no futuro, a competição irá ocorrer, de maneira prevalecente, entre redes de negócios mais do que entre empresas independentes (MCCORMACK; JOHNSON, 2001). Nesse contexto, a gestão dos processos se tornou uma importante forma de lidar com o ambiente em constante mutação, e a agilidade passa a ser um fator de grande importância no sucesso das empresas Gestão Contemporânea, Porto Alegre, ano 8, n. 10, p. 141-164, jul./dez. 2011 Disponível em: <http://seer2.fapa.com.br/index.php/arquivo> 153 Nathália de Melo Santos, Rebecca Impelizieri Moura da Silveira e Fabrycia Maria Teodoro Santos modernas. Possuir uma visão geral de um processo permite sua fácil modificação e a busca pró-ativa por possíveis soluções para problemas originados de deficiências nesses processos (WILLAERT et al., 2007). Muitas das grandes empresas têm incluído essa nova abordagem ao seu negócio, o que as tornam mais rápidas, flexíveis e integrativas, tendo como foco clientes, a competição, as equipes e os tempos (MCCORMACK; JOHNSON, 2001). McCormack e colaboradores (2003, p.15) definem BPO como “uma orientação organizacional que enfatiza os processos em detrimento da hierarquia, com enfoque nos resultados e na satisfação dos clientes”. Segundo os autores, a abordagem BPO enxerga a organização como um amplo arcabouço que visa a organizar fluxos de trabalho e informação, os quais ajudarão a organização a construir e ofertar níveis mais elevados de valor ao cliente. Esse conceito mostra que as empresas podem maximizar seu desempenho global com base em uma visão estratégica focada em processos que agreguem valor ao cliente – os quais são foco do BPO –, já que este irá lidar com resultados positivos, tanto na esfera interna quanto na externa (OLIVEIRA, 2006; WILLAERT et al., 2007). Além disso, evidenciou-se que o BPO reduz conflitos interfuncionais e aumenta a conectividade e a integração interdepartamental, o que gera impactos no desempenho organizacional tanto no longo quanto no curto prazo. O BPO também se mostrou importante ao proporcionar um clima organizacional positivo, incluindo maiores níveis de colaboração entre os funcionários (WILLAERT et al., 2007; MCCORMACK; JOHNSON, 2001). Mais do que uma nova estratégia de negócios, o BPO enfatiza processos em oposição a hierarquias, com ênfase nos resultados, particularmente na satisfação do cliente (MCCORMACK; JOHNSON, 2001). A Figura 3 mostra a transição da gestão hierárquica para a configuração BPO. Foco na hierarquia BPO – Foco no cliente Figura 3 – Gestão hierárquica versus BPO. Fonte: McCormack, 2001. 154 Gestão Contemporânea, Porto Alegre, ano 8, n. 10, p. 141-164, jul./dez. 2011 Disponível em: <http://seer2.fapa.com.br/index.php/arquivo> Evolução da teoria organizacional: as perspectivas da teoria sistêmica e da gestão por processos A migração de uma estrutura funcional para uma focada em processos demanda conhecimento da organização e habilidades em diferentes áreas, o que exige, portanto, uma visão multidisciplinar. Os processos de negócio devem apoiar toda a estratégia organizacional e, para isso, é importante a adoção de uma ferramenta de mensuração da performance dos processos que busque alinhá-los a essa estratégia (WILLAERT et al., 2007). Nesse contexto, os processos de valor podem ser decompostos em subprocessos e atividades, de escopo mais reduzido, permitindo-se que venham a ter o seu desempenho mensurado e controlado com maior efetividade (CHAN; QI, 2003). Segundo McCormack e Johnson (2001), há três dimensões para a avaliação da orientação por processos: a) Controle e mensuração de processos: incluem métricas e indicadores referentes a aspectos do processo, tais como qualidade do processo, quantidade de outputs produzidos, lead times, custo e variabilidade do processo. b) Processos de trabalho: o trabalho incide sobre os processos, em oposição às funções. A responsabilidade passa a ser multifuncional. c) Visão de processos: visão horizontal da funcionalidade do negócio, referente a atribuições, estruturas, medidas e sistemas de gerenciamento. Na literatura técnica, assim como na prática empresarial, há evidências de que níveis superiores de orientação para processos, desenvolvidos a partir das diretrizes dos processos intra e interorganizacionais na cadeia de suprimentos, ocasionam um aumento da capacidade de resposta da organização, tanto em termos da elasticidade das demandas quanto em relação à dinamicidade em atender os padrões de especificações de produtos e serviços exigidos pelos mercados nos quais atuam (CROXTON et al., 2001). O desafio agora é ter uma cadeia de valor flexível e eficiente ao mesmo tempo, e é aí que reside a relevância de ser uma organização orientada para processos (WILLAERT et al., 2007). As organizações competitivas devem reconsiderar a importância estratégica de seus processos, vendo a organização não apenas como uma coleção de funções, mas como uma rede altamente integrada de processos. Processos são vistos, mais do que nunca, como ativos estratégicos organizacionais (MCCORMACK; JOHNSON, 2001). Dada a necessidade de se tornarem sempre mais eficientes, as práticas organizacionais começaram a trabalhar orientadas a um processo de mudança organizacional (DAVENPORT; BEERS, 1995; MARTINS Gestão Contemporânea, Porto Alegre, ano 8, n. 10, p. 141-164, jul./dez. 2011 Disponível em: <http://seer2.fapa.com.br/index.php/arquivo> 155 Nathália de Melo Santos, Rebecca Impelizieri Moura da Silveira e Fabrycia Maria Teodoro Santos et al., 2009), em que os trabalhadores deixam de lado a filosofia do trabalho individual/funcional e passam a se orientar em torno de equipes multifuncionais de trabalho (HAMMER, 2001). Esse novo desenho, por sua vez, possibilita a integração holística das unidades organizacionais por entre suas interfaces, objetivando a promoção de resultados compartilhados em toda a organização. Com a organização orientada para seus processos, tem-se a necessidade de uma nova gestão que seja suficiente para solucionar problemas provenientes de suas atividades redesenhadas, surgindo daí a importância do gerenciamento dos processos de negócios. 4.2 Business process management (BPM) Na atualidade, a grande maioria das organizações busca agilidade, em especial aquelas que são forçadas a lidar com mudanças contínuas em um mercado de alta volatilidade. A tecnologia da informação surge como uma importante ferramenta, juntamente com a gestão dos processos, que se tornam a base para a agilidade organizacional (JESTON; NELIS, 2010). De acordo com o BPM CBOK (ABPMP, 2009), a atual tendência em gestão por processos foca a organização como um todo e os processos transfuncionais que adicionam valor aos clientes, sendo eles internos ou externos. Os processos de negócio definem como as empresas devem desempenhar seu trabalho para entregar valor aos seus clientes. A gestão intencional desses processos cria práticas de negócio mais fortes que levam a processos mais efetivos, maior eficiência, mais agilidade e maiores retornos aos investimentos dos stakeholders. Dessa forma, entende-se que o BPM é um conjunto de componentes que não devem ser implementados de uma só vez e, sim, ao longo do tempo, evoluindo a arquitetura organizacional (DAVIS, 2010). Nesse contexto, o BPM contribui com os principais aspectos estratégicos das operações da organização, em que possui alto nível de influência e, proporcionalmente, maior possibilidade de adicionar valor agregado, com o intuito de garantir a habilidade consistente para oferecer elevados padrões de qualidade de produtos e serviços. O BPM, por ser um sistema amplo e abrangente, se inicia no entendimento e no envolvimento gerencial, com foco na melhoria dos processos em toda a cadeia de suprimentos, incutindo uma abordagem estruturada 156 Gestão Contemporânea, Porto Alegre, ano 8, n. 10, p. 141-164, jul./dez. 2011 Disponível em: <http://seer2.fapa.com.br/index.php/arquivo> Evolução da teoria organizacional: as perspectivas da teoria sistêmica e da gestão por processos para modificar seu gerenciamento com ênfase na gestão e no desenvolvimento de pessoas (JARRAR et al., 2000). O conceito utilizado por Zairi (1997, p.64) e similarmente compartilhado por Montanini e colaboradores (2008) e Hammer (2002) define BPM como “uma abordagem estruturada que tem por objetivo entender, analisar, dar suporte e melhorar continuamente os processos fundamentais, tais como fabricação ou produção, marketing, comunicação e outros elementos essenciais na operação da organização”. Para o bom desenvolvimento do BPM, Zairi (1997, p. 65) apresenta alguns pontos que servem de orientação: a) mapeamento e documentação das atividades principais e essenciais à organização; b) embasamento do BPM em uma abordagem de otimização contínua por meio da resolução de problemas e da coleta dos benefícios extras, de forma a garantir que a competitividade superior seja alcançada por meio da adoção das melhoras práticas; c) a criação de foco voltado para o cliente através de ligações horizontais entre as atividades-chave da organização; d) a utilização de atividades de mensuração para avaliar o desempenho de cada processo individual (estabelecimento de metas); e) utilização de sistemas e procedimentos documentados de forma a assegurar a disciplina, a consistência e a repetibilidade do desempenho de qualidade. Cabe ressaltar que o sucesso da implementação do BPM, por ser uma abordagem para a mudança cultural organizacional, não é obtido somente pelo uso de bons sistemas e de estrutura adequadas (ZAIRI, 1997). Nesse sentido, é necessário destacar que o alcance de uma cultura baseada no BPM depende muito da obtenção de um alinhamento total dos objetivos da empresa e do direcionamento dos esforços de cada funcionário para a agregação de valor ao cliente final (ZAIRI, 1997; HAMMER, 2002). O uso do BPM assegura que as atividades sejam pensadas, desenhadas e, posteriormente, desempenhadas em um contexto de processo (HAMMER, 2002). Portanto, a gerência diretamente relacionada a processos, em conjunto com sua equipe e/ou recursos humanos da organização, é determinante para a estruturação correta dos processos de negócios. Estes devem ser periodicamente avaliados, de forma a realizar sua manutenção ou atualização constantes, podendo, até mesmo, gerar uma estrutura para a realização da reengenharia. Gestão Contemporânea, Porto Alegre, ano 8, n. 10, p. 141-164, jul./dez. 2011 Disponível em: <http://seer2.fapa.com.br/index.php/arquivo> 157 Nathália de Melo Santos, Rebecca Impelizieri Moura da Silveira e Fabrycia Maria Teodoro Santos Segundo Willaert e colaboradores (2007), a visão holística sobre BPM tem como aspecto central o ciclo de melhoria contínua para analisar, redesenhar e medir os processos, a fim de melhorar o desempenho destes, como sintetizado na Figura 4. Além disso, o BPM inclui também atividades que se referem à gestão da qualidade do fornecedor (WILLAERT, 2007; ZAIRI, 1997), buscando garantir a qualidade do produto/serviço durante todo o processo produtivo até a entrega ao consumidor final. Assim, a gestão dos processos de negócios é realizada por meio da medição de desempenho para a posterior fixação de metas para melhoria. Isso engloba também a mensuração da capacidade do produto/serviço oferecido pelos fornecedores, bem como aspectos de eficiência/eficácia em termos de tempo de ciclo, normas de qualidade, custos, entre outros pontos importantes (ZAIRI, 1997). Consumidores / Fornecedores / Agentes envolvidos Estratégia Recursos Humanos Visão por processos Implementação da estrutura Valores e crenças Métricas de controle Eficiência / Consumidor satisfeito Informação e tecnologia Melhoramento / Aprendizagem / Crescimento Figura 4 – A visão holística no BPM. Fonte: Adaptada de Willaert et al. (2007). Deve-se ressaltar que a gestão dos processos de negócio, dependendo do âmbito na qual é referenciada, pode ser também entendida como: 158 Gestão Contemporânea, Porto Alegre, ano 8, n. 10, p. 141-164, jul./dez. 2011 Disponível em: <http://seer2.fapa.com.br/index.php/arquivo> Evolução da teoria organizacional: as perspectivas da teoria sistêmica e da gestão por processos a) esforços de automação de processo, o qual, uma vez automatizado, pode ser gerenciado por meio de ferramentas de software; b) esforços para organizar e melhorar o gerenciamento humano dos processos de negócios; c) esforços para o desenvolvimento e a manutenção de uma arquitetura de processos de negócios (HARMON, 2003). Dessa forma, o BPM pode ser considerado uma abordagem abrangente e dependente dos elementos estratégicos e operacionais, do uso de modernas ferramentas e técnicas, do envolvimento das pessoas internas à organização e, mais importante, de um foco horizontal que irá atender às necessidades dos clientes de forma ideal e satisfatória (ZAIRI, 1997). Determina-se, portanto, que a abordagem BPM facilita a adequação de processos destinados a atender as demandas do ambiente no qual a organização está inserida, sejam elas relacionadas a qualidade, segurança, legislação ou a outros fatores (BALDAM et al., 2007). 5 Discussão A perspectiva e os pressupostos apresentados pela Teoria Clássica da Administração passaram a ser questionados após a Segunda Guerra Mundial (1939-1945). A visão voltada exclusivamente para funções e para a face interna da organização era insuficiente para garantir a sobrevivência organizacional em um contexto de competição e globalização crescentes. A estrita ênfase dada às funções levou ao aumento das barreiras intraorganizacionais e ao isolamento de áreas multidisciplinares que atuam sobre os mesmos processos. Tais limitações culminaram na ineficiência da comunicação interdepartamental e no estímulo à criação de níveis hierárquicos de gestão. A mudança nas necessidades das organizações demanda a evolução concomitante da teoria, em concordância com o contexto histórico. Nesse sentido, as teorias ditas “clássicas” da administração foram incorporadas e desenvolvidas por novas teorias, mais completas e complexas, que buscaram explicar tanto as influências internas quanto aquelas externas à organização. A integração das diferentes teorias e perspectivas apresentadas neste trabalho podem ser sintetizadas pela Figura 5, na qual é representada a visão ampliada dos processos organizacionais e seu inter-relacionamento com o ambiente que cerca a organização. São apresentados Gestão Contemporânea, Porto Alegre, ano 8, n. 10, p. 141-164, jul./dez. 2011 Disponível em: <http://seer2.fapa.com.br/index.php/arquivo> 159 Nathália de Melo Santos, Rebecca Impelizieri Moura da Silveira e Fabrycia Maria Teodoro Santos os elementos que estão diretamente envolvidos em um processo em particular, sendo eles: entradas (materiais, energia, informações e clientes); saídas (produtos, informações e valor agregado); recursos utilizados (colaboradores, equipamentos, instalações e sistemas) e controles (procedimentos operacionais, regras, leis e normas). Ainda na Figura 5, é evidenciada a influência do ambiente no qual a organização está inserida, aqui representado pelas esferas de mercado, pelas estruturas políticas e jurídicas, pela tecnologia e pela cultura. Tais influências podem afetar o funcionamento do processo, bem como os produtos por ele produzidos (BALDAM et al., 2007; MORGAN, 1996; BATEMAN; SNELL, 2007). Por meio da sua interpretação, é possível perceber claramente a sobreposição e a interação entre a visão sistêmica e a abordagem por processos utilizada pelo BPO/ BPM. Leis e Normas Regras internas Procedimentos operacionais o s se s d rca ura tica ica Me E ut str lí po íd jur Informações em feedback Materiais Produtos com valor agregado Energia Processo Informações Agregação de valor público oló gic Repositores de informações instalações Sistemas/Softwar e de controle ot ecn Equipamentos açã Informações para outros propósitos Colaboradores Clientes Cri Saídas indesejadas a Esf era m do ést ica ul ec al tur Figura 5 – Visão sistêmica dos processos e o ambiente. Fonte: Adaptada de Baldam et. al. (2007). 160 Gestão Contemporânea, Porto Alegre, ano 8, n. 10, p. 141-164, jul./dez. 2011 Disponível em: <http://seer2.fapa.com.br/index.php/arquivo> Evolução da teoria organizacional: as perspectivas da teoria sistêmica e da gestão por processos Tomando como base os princípios da TGS, em que as organizações são sistemas abertos, que efetuam trocas com o meio envolvente, relacionando-se a montante e a jusante com diferentes entidades, percebe-se a existência de uma cadeia de valor integrada, composta pelas empresas parceiras, que contribui para o sucesso ou o fracasso organizacional (MORGAN, 1996; CAMPOS, 2004; CHOPRA; MEINDL, 2003; CHRISTOPHER, 2007). Considerações finais A contribuição dada pela teoria sistêmica no contexto atual da orientação e gestão por processos (BPO/BPM) foi clarificada no decorrer do texto ao abordar diferentes conceitos e autores concernentes ao tema estudado. Como as teorias não são estáticas e estão em constante aperfeiçoamento, a TGS, frente às necessidades crescentes de eficácia e eficiência, incorporou demandas surgentes que foram trabalhadas com base em seus princípios fundamentais. Desse modo, diferentes mudanças estão sendo implementadas constantemente nas estruturas organizacionais como forma de responder e se adaptar aos diversos fatores ambientais, tais como a crescente internacionalização dos mercados, a constante pressão por menores preços e níveis superiores de serviços e de qualidade dos produtos. Esses fatores representam desafios que exigem das empresas um rompimento com a estrutura focada em silos funcionais, o que evidencia a necessidade de uma mudança de paradigma na própria maneira como as organizações são projetadas. Nesse sentido, a gestão por processos se apresenta como forma de enfatizar a necessidade da integração e a interdependência existente entre as diferentes partes da organização, bem como a adaptação desta ao mercado em constante mudança. Portanto, ter uma visão geral sobre o processo permite sua fácil modificação e a busca pró-ativa por soluções possíveis a problemas causados por deficiências nesses processos. Ser orientado para processos leva a uma visão distinta sobre estes e a maior agilidade para a organização. O desafio é encontrar formas de proporcionar, concomitantemente, flexibilidade e eficiência à cadeia de valor, o que enfatiza a relevância de uma organização ser orientada para processos. Gestão Contemporânea, Porto Alegre, ano 8, n. 10, p. 141-164, jul./dez. 2011 Disponível em: <http://seer2.fapa.com.br/index.php/arquivo> 161 Nathália de Melo Santos, Rebecca Impelizieri Moura da Silveira e Fabrycia Maria Teodoro Santos Uma das limitações presentes está ligada à abrangência dos estudos consultados e analisados, uma vez que nem toda a bibliografia disponível pode ser incluída. Outro ponto a ser discutido é o fato de o estudo não ser empírico, não podendo, portanto, esclarecer particularidades de um dado contexto. Por fim, entende-se que o campo de estudos em orientação/gestão por processos ainda está em construção, o que evidencia lacunas teórico-conceituais que possibilitam a elaboração de novos estudos, em especial aqueles empíricos. Recebido em junho de 2011. Aprovado em outubro de 2011. Referências ANUPINDI, R.; CHOPRA, S.; DESHMUKH, S.; MIEGHEM, J.; ZEMEL, E. Managing Business Process Flows. New Jersey: Pearson/Prentice Hall, 2006. 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