. - Núcleo de Pesquisa em Economia Empresarial
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UNIVERSITÉ DE LA SORBONNE NOUVELLE PARIS III AGROINDÚSTRIA BRASILEIRA CONTEMPORÂNEA : INOVAÇÕES ORGANIZACIONAIS E TRANSFORMAÇÕES TECNOLÓGICAS NA AVICULTURA TESE Para o Doutorado (Arrêté du 30 mars 1992) Apresentada por : Armando João DALLA COSTA Sob a orientação de : M. Guy MARTINIÈRE Professor e Diretor de Pesquisas PARIS III (IHEAL) 1997 2 Para Rosa, Maria e André, Com amor e carinho 3 APRESENTAÇÃO Esta tese foi desenvolvida no contexto do acordo de cooperação entre o Brasil e a França, CAPES-COFECUB, assinado entre a Universidade Federal do Paraná e a Sorbonne Nouvelle Paris III, cujos respectivos responsáveis são Roseli ROCHA DOS SANTOS e Raúl H. GREEN. O autor contou com uma bolsa de estudos concedida pelo CNPq – Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico, vinculado ao Ministério da Educação do governo brasileiro. A tese foi realizada nas dependências do IHEAL – Instituto de Altos Estudos da América Latina, da Université de la Sorbonne Nouvelle Paris III, sob a orientação do Prof. Dr. Guy MARTINIÈRE, tendo como co-orientador o Diretor de Pesquisas Dr. Raúl H. GREEN, do INRA – Institut National de la Recherche Agronomique. O autor agradece o conjunto das instituições brasileiras e francesas e as pessoas mencionadas, graças às quais este trabalho de tese pôde ser feito em boas condições. Todas as idéias e pontos de vista apresentadas neste trabalho, assim como os eventuais erros são da estrita responsabilidade do autor não envolvendo, portanto, nem as instituições e nem as pessoas mencionadas. 4 AGRADECIMENTOS A elaboração deste trabalho foi possível graças à contribuição fundamental de algumas pessoas e institruições que desejo agradecer particularmente. Em primeiro lugar agradeço ao CNPq – Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico pela bolsa de estudos que me foi concedida durante os quatro anos e pela atenção dos funcionários da instituição que acompanharam minha trajetória neste período e forneceram as informações e documentos necessários. Agradeço especialmente à Rosa por aceitar deixar o país para dar continuidade à sua formação universitária, fazendo também de sua parte o doutorado e, pelo carinho e paciência dos quais deu prova durante estes anos passados na França. Seu apoio foi essencial sobretudo pela leitura e correção dos manuscritos que tornaram o texto mais compreensível. Agradeço igualmente à Maria e André que alegraram estes anos com sua esperança, ternura e criatividade infantis. Não esqueceremos jamais os momentos passados em família, assim como as dificuldades e descobertas cotidianas destes anos passados do outro lado do oceano. A meu professor e orientador, Dr. Guy MARTINIÈRE, por aceitar orientar e facilitar as relações inter-institucionais entre a Université de la Sorbonne Nouvelle Paris III e o CNPq. Agradeço sua insistência em me fazer aprofundar a teoria da história e da economia, sua paciência e seu engajamento na discussão do projeto final da tese, assim como na leitura dos originais, uma presença indispensável na finalização deste trabalho. Agradeço particularmente a presença constante de Raúl H. GREEN, pesquisador no INRA que, desde a chegada na França, contribuiu com suas observações acerca da teoria e prática acadêmicas. Sua experiência enquanto pesquisador do agronegócio, tanto da produção como da distribuição alimentar, suas indicações bibliográficas e as inumeráveis discussões foram fundamentais para meu amadurecimento e minha formação pós-universitária. O mesmo tipo de agradecimento se dirige a Bernard SCHALLER, também pesquisador do INRA pela sua contribuição ao trabalho através das inumeráveis informações fornecidas sobre a avicultura de maneira geral e sobre a avicultura francesa, de modo particular. Diversos pesquisadores brasileiros também colaboraram comigo durante estes anos, começando pela Profa. Dra. Roseli ROCHA DOS SANTOS, que desde o Mestrado me incentivou a fazer o doutorado, acompanhando o desenrolar da pesquisa neste tempo todo. Suas orientações práticas, científicas e pessoais enriqueceram minha formação e tornaram-me 5 mais confiante para conseguir meus objetivos. Devo a ela, assim como a Carlos Roberto Antunes dos SANTOS, agradecimentos especiais. Do mesmo modo, agradeço a Angela e Paulo DAMASCENO pelo jeito como me receberam na França e pelas informações « práticas » que me forneceram. Agradeço ao professor John WILKINSON que esteve em Paris durante meu doutorado e que, nas diversas reuniões que mantivemos, contribuiu para melhor compreender a teoria econômica e o sistema agro-alimentar. Ao longo do doutorado, vivi com a família descobertas profissionais e pessoais enriquecedoras. O contato com diversos brasileiros que vivenciaram as mesmas emoções e momentos difíceis e felizes, de insegurança ou de serenidade, fizeram parte do processo. Agradeço Gustavo, Luciana e Pedrinho ; Geraldo, Lu, Francisco e Lourenço ; Edson, Vera e Luiza ; Morel, Cristina e Ana Paula ; Marcelo, Evelyn, Maiara e Alexandre ; Nelson, Neuza e Caio ; Maria Lúcia Urban pela amizade e presença. Agradecimento especial aos amigos que ficaram no Brasil e testemunharam através de cartas, artigos de jornais enviados, telefonemas e fotos. Obrigado à Elza e Carlão pelo envio regular de notícias e documentos. Aos membros da equipe de História do Brasil e de Relações Internacionais da América Latina, cujo responsável é o prof. Guy MARTINIÈRE : Obrigado ao Hugo e Mônica ; JeanPierre, Carla, Adriana pelas sugestões e críticas aos trabalhos apresentados e as discussões nos seminários de doutorado. Agradeço aos amigos franceses que me acompanharam no período do doutorado, com os quais aprendi a conhecer melhor a maneira de ser e de pensar deste povo, sobretudo a Nicolas, Catherine, Audray e Thomas ; Bertrand, Agnès, Cécile e Clément ; Loïc, MarieFrançoise e Stéphanie ; Guy e Julie, pelas inúmeras vezes em que nos receberam na intimidade de seus lares e pela gentileza como nos trataram tanto aos adultos como às crianças. Entre as empresas brasileiras, agradecimento especial à Sadia, Perdigão, Frangosul, Avipal e Batavo pelas entrevistas que seus dirigentes concederam, pelo acesso aos diversos documentos e pelas visitas aos abatedouros, sem os quais não poderia ter realizado este trabalho. Agradecimentos também aos Secretários da Agricultura de Minas Gerais, São Paulo, Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul, à EMBRAPA e ao CNPSA – Centro Nacional de Pesquisa em Suínos e Aves, de Concórdia-SC, pelas entrevistas, dados e acesso às respectivas bibliotecas. As entrevistas com dirigentes de organizações profissionais UBA, ABEF, ANAB, 6 APA e AVIMIG, as informações coletadas e o acesso às bibliotecas forma fundamentais ao trabalho. Meus sinceros agradecimentos ao INRA pelo acesso freqüente à biblioteca e pela participação no grupo de estudos a respeito do agro-negócio europeu que se reunia nas suas dependências. Aos membros do Grupo de Reflexão sobre a Economia Brasileira, da Escola de Altos Estudos em Ciências Sociais, onde pude participar de numerosos debates, conferências e estudos sobre a economia brasileira, além da discussão e publicação dos « Cadernos do Brasil Contemporâneo ». Agradeço particularmente a Ricardo Henriques, o coordenador do grupo, João Furtado e Gutemberg. Enfim, um agradecimento cheio de amor à minha família e, em particular, a meus pais Albino e Delvina, pelo apoio e carinho à distância, através de suas cartas e telefonemas, sem os quais teria sido praticamente impossível permanecer estes anos longe do país. 7 SIGLAS UTILIZADAS ABEF – Associação Brasileira dos Produtores e Exportadores de Frango ACARESC – Associação de Crédito e Assistência Rural de Santa Catarina ACCS – Associação Catarinense dos Criadores de Suínos ACAVE – Associação Catarinense dos Avicultores ACRAVE – Associação Catarinense dos Criadores de Frnago de Santa Catarina AINCADESC – Associação das indústrias de Carnes e Derivados do Estado de SC ANAB – Associação Nacional dos Abatedores Avícolas ANFAR – Assocaição Nacional dos Fabricantes de Rações APA – Associação Paulista de Avicultura APINCO – Associação Nacional dos Produtores de Pinto de Corte ASGAV – Associação Gaúcha de Avicultura AVESP – Associação dos Abatedores Avícolas do Estado de São Paulo AVIMIG – Associação dos Avicultores de Minas Gerais BADESP – Banco de Desenvolvimento do Estado de São Paulo BASA – Banco da Amazônia BDMG – Banco de Desenvolvimento de Minas Gerais BESC – Banco do Estado de Santa Catarina BNDE – Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico BVQI – Bureau Veritas Quality International CASP – Sociedade Comissionária Avícola Ltda CCLP – Cooperativa Central de Produtos Leiteiros do Paraná - BATAVO CEAN – Comissão de Estudos da Avicultura Nacional CIPOA – Centro de Inspeção de Produtos de Origem Animal CNA – Comissão Nacional de Avicultura CNPq – Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico CNPSA – Centro Nacional de Pesquisa em Suínos e Aves CNPSu – Centro Nacional de Pesquisa em Suínos CONAB – Comnpanhia Nacional de Abastecimento COOPERCENTRAL – Cooperativa Central do Oeste de Santa Catarina CUT – Central Única dos Trabalhadores DERAL – Departamento de Economia Rural DESER – Departamento de Estudos Sócio Econômicos Rurais DIPOA – Departamento de Controle de Produtos de Origem Animal 8 EMATER – Empresa de Assistência Técnica e de Divulgação Rural EMBRAPA – Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária ESALQ – Escola Superior de Agricultura « Luiz de Queiroz » ETA – Escritório Técnico de Agricultura : Brasil/Estados Unidos FACTA – Fundação Apinco de Ciência e Tecnologia Avícolas FAF – Fundação Attilio Franisco Xavier Fontana FUNDESC – Fundo de Desenvolvimento de Santa Catarina GATT – General Agreement of Tariff and Trande IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística ICM – Imposto sobre Circulação de Mercadorias IEE – Indice de Eficiência Europeu ISA – Indice Sadia ISO – International Organisation of Standardization MAARA – Ministério da Agricultura e Reforma Agrária PIB – Produto Interno Bruto PQTC – Programa de Qualidade Total da Ceval SAICC – Sociedade Anônima da Indústria e Comércio de Chapecó SEAB – Secretaria da Agricultura e do Abastecimento SENAI – Serviço Nacional da Indústria SIC – Serviço de Informação ao Consumidor SIDAN – Sindicato Nacional das Indústrias de Medicamentos para Animais SIF – Serviço de Inspeção Federal SINTCRAVE – Sindicato dos Trabalhadores Integrados na Produção de Frangos de SC SINCRAVESC – Sindicato Patronal dos Criadores de Frango de SC STRs – Sindicatos dos Trabalhadores Rurais SUDAM – Superintendência para o Desenvolvimento da Amazônia TQC – Total Quality Control TQS – Total Qualidade Sadia UBA – União Brasileira de Avicultura UFPel – Universidade Federal de Pelotas-RS UFV – Universidade Federal de Viçosa-MG UFSM – Universidade Federal de Santa Maria-RS USDA – United State Department of Agriculture 9 INDICE DE TABELAS 1. Cálculo do custo de produção de um frango - 1927 ........................................................... 2. Minas Gerais e suas exportações de galinhas - 1860-1910 ................................................. 3. População total e porcentagem urbana - 1940-1960 ........................................................... 4. Estabelecimentos abatedores e aves abatidas no Brasil - 1956 ........................................... 5. Distribuição das aves entre os estados brasileiros - 1954-1956 .......................................... 6. Brasil: população e número de aves por habitante - 1920-1960 ......................................... 7. Abate de aves no Brasil - 1942 e 1944 ................................................................................ 8. Distribuição dos contingentes imigratórios por períodos de entrada .................................. 9. Distribuição dos abatedouros de frango controlados pelo SIF e sua capacidade instalada, segundo os Estados brasileiros. Antes de 1970, anos 70 e anos 80 ..................... 10. Cidade e ano de fundação dos frigoríficos catarinenses ...................................................... 11. Brasil. População e porcentagem urbana - 1960-1991 ......................................................... 12. Distribuição regional da população e da renda 1940-1980 ................................................... 13. Sadia Concórdia S.A. Ano de fundaçãototal , distribuição geográfica e atividades de suas empresas - 1944-1995 .............................................................................. 14. Sadia e a composição de sua receita operacional bruta - 1986-1995 ................................... 15. Participação percentual das principais empresas no abate SIF nacional de frangos ............ 16. Número de abatedouros com SIF e número de empresas nos quatro maiores estados produtores avícolas nacionais - 1980,1990,1994 ...................................................... 17. As 20 maiores empresas de abate de aves no Brasil - 1995 .................................................. 18. Sadia: receita bruta e lucro por funcionário ........................................................................... 19. Sadia e a quantidade de aves abatidas - 1961-1995 ............................................................... 20. Sadia e sua produção de rações - 1976-1995 ......................................................................... 21. Potencial do consumo de rações por região do Brasil ........................................................... 22. Estrutura do sistema de produção Avicooper - 1991 ............................................................. 23. Aves abatidas em cada abatedouro da Sadia - 1995 .............................................................. 24. Aves abatidas em cada abatedouro da Ceval - 1989, 1995, 2000 .......................................... 25. Aves abatidas em cada abatedouro da Perdigão - 1994 ......................................................... 26. Cidade e ano de fundação das filiais comerciais da Sadia .................................................... 27. Etapas da produção e comercialização, com sua forma de gerenciamento no sistema de integração vertical na avicultura brasileira - 1995 .......................................... 28. Tipologia e principais características das empresas avícolas brasileiras - 1995 ................... 29. Sadia e quantidade de aves abatidas - 1961-1995 .................................................................. 30. Sadia e sua produção de rações - 1976-1995 ......................................................................... 31. Potencial do consumo de rações por região do Brasil - 1995 ................................................ 32. strutura do sistema de produção Avicooper - 1991 ................................................................ 33. Aves abatidas em cada abatedouro da Sadia - 1995 .............................................................. 34. Aves abatidas em cada abatedouro da Ceval - 1989-2000 ..................................................... 35. Aves abatidas em cada abatedouro da Perdigão .................................................................... 36. Cidade e ano de fundação das filiais comerciais da Sadia .................................................... 37. Etapas da produção e comercialização, com sua forma de gerenciamento no sistema de integração vertical na avicultura brasileira - 1995 ............................................................ 38. Tipologia e principais características das empresas avícolas brasileiras - 1995 ................... 39. Importação de avós, produção de matrizes, de pintos de corte e de cane de frango no Brasil 1971-1995 .............................................................................................................. 10 40. Evolução do índice de produção do frango de corte - 1930-2001 ......................................... 41. Produção brasileira de frangos - 1970-1995 .......................................................................... 42. Preços médios da carne de frango no varejo - 1974-1995 ..................................................... 43. Consumo per capita de carne bovina, suína e avícola no Brasil - 1970-1995 ....................... 44. Faturamento bruto da Ceval nos mercados interno e externo - 1985-1995 ........................... 45. Exportação brasileira de frangos inteiros, em cortes e total, segundo as empresas exportadoras - 1990 e 1995 ..................................................................................................... 46. Principais estados exportadores - 1995 .................................................................................. 47. Produção, exportação de frango inteiro e em cortes, com suas respectivas participações e, valor total das exportações - 1975-1995 ............................................................................. 48. Venda de frangos inteiros e em cortes, segundo os principais países importadores - 1990-1995 ...................................................................................................... INDICE DE MAPAS 1. Localização dos abatedouros das seis maiores empresas avícolas nacionais: Sadia, Ceval, Perdigão, Avipal, Frangosul e Chapecó - 1995 ................................................. 2. Localização das filiais comerciais da Sadia, da Ceval, da Frangosul e da Batavo - 1995 ....... INDICE DE ORGANOGRAMAS 1. Sadia e sua estrutura de comércio de frango no Brasil - 1995 ................................................ 2. Ceval e sua estrutura de comércio de frango no Brasil - 1995 ............................................... 3. Sadia e sua estrutura de comércio internacional - 1995 .......................................................... INDICE DE FIGURAS 1. Empresa multifuncional de múltiplas unidades ....................................................................... 11 S U M Á R I O INOVAÇÕES ORGANIZACIONAIS E TRANSFORMAÇÕES TECNOLÓGICAS NA AGROINDÚSTRIA BRASILEIRA CONTEMPORÂNEA: O CASO DA AVICULTURA Introdução ................................................................................................................................ 1. Elementos teórico-metodológicos e sua relação com as indústrias agroalimentares ..1 1. Concepção de empresa .......................................................................................................... 2 2. Integração vertical na produção industrial ............................................................................ 5 3. Economia de escala, de diversificação e de transação .......................................................... 7 4. Produção em escala e diversificação conduzem à rede própria de comercialização .......... 8 5. Estrutura da empresa ........................................................................................................... 10 6. First movers e challengers ................................................................................................... 11 7. Lugar e função dos managers na firma ............................................................................... 14 8. Relação destes princípios teórico-metodológicos com as indústrias do setor avícola ..... 17 Primeira Parte - PASSAGEM DA PRODUÇÃO FAMILIAR E ARTESANAL À AVICULTURA INDUSTRIAL Introdução ................................................................................................................................... A - Produção avícola brasileira antes do paradigma tecnológico 2. Avicultura incipiente e suas primeiras formas de representação ................................ 1 1. Avicultura e suas formas de organização .............................................................................. 3 2. São Paulo e Rio de Janeiro dominam avicultura nacional .................................................... 5 3. Atividade inspirada no exterior ............................................................................................. 8 4. Produção artesanal e os « basse-cour » ................................................................................. 9 5. Evolução da produção ......................................................................................................... 13 6. Condições do comércio de aves .......................................................................................... 14 3. Produtores tradicionais e empresas avícolas familiares................................................. 1 1. Incentivos do Estado à avicultura ......................................................................................... 2 2. Fortalecimento da relação com a avicultura norte-americana .............................................. 4 3. Produção artesanal ................................................................................................................ 7 4. Evolução da produção e do consumo ................................................................................... 8 5. Comercialização continua tradicional ................................................................................. 13 6. Indústria avícola familiar .................................................................................................... 14 B - Implantação e desenvolvimento da avicultura industrial 4. Constituição das primeiras empresas avícolas nacionais ............................................. 1 1. Imigrantes, pequenas propriedades e origem da Sadia e Perdigão ..................................... 1 Ocupação do oeste catarinense ............................................................................................. 2 Origem de Concórdia ............................................................................................................ 4 Attilio Fontana e a Sadia Concórdia S.A. ............................................................................. 5 Saul Brandalise e a Perdigão S.A. Comércio e Indústria .................................................... 10 Sadia inicia atividades com um moinho de trigo e um abatedor de suínos ........................ 11 12 2. Sadia e Perdigão ampliam atuação geográfica e diversificam produção ............................ 15 Diferentes estratégias de expansão ..................................................................................... 16 Em busca de matéria-prima para a Frigobrás ...................................................................... 19 « Sadia Avícola » e a produção de perus ............................................................................ 20 Perdigão centra sua produção de suínos e aves em Santa Catarina .................................... 22 3. Expansão brasileira do número de empresas avícolas até a década de 80 ......................... 25 Regiões Sul e Sudeste dominam avicultura industrial ........................................................ 27 4. Empresas de caráter predominantemente familiar .............................................................. 29 Sadia: de Attilio Fontana ao Conselho de Administração .................................................. 29 Outras empresas avícolas familiares ................................................................................... 34 Plínio De Nes e a S.A. Indústria e Comércio Chapecó ....................................................... 35 Família Pauludo e a « Seara Avícola » ............................................................................... 37 Empresas familiares no Rio Grande do Sul ........................................................................ 38 Empresas avícolas paranaenses surgiram mais tarde .......................................................... 38 5 - Empresas implantam a integração vertical ................................................................... 1 1. Implantação da integração vertical na avicultura brasileira ................................................. 2 2. Pesquisa genética e sua aplicação na avicultura ................................................................... 5 A pesquisa genética no Brasil ............................................................................................... 6 3. Matrizeiros, incubatórios e produção de pintos de corte ...................................................... 8 4. Vacinas e outros medicamentos ............................................................................................ 9 5. Evolução histórica da produção de rações .......................................................................... 11 O surgimento das vitaminas ................................................................................................ 12 Evolução das plantas industriais ......................................................................................... 14 Produção de rações no Brasil .............................................................................................. 16 6. Contratos de parceria avícola com pequenos agricultores .................................................. 18 Fomento agropecuário e a qualidade da matéria-prima ...................................................... 22 7. Abatedouro como principal etapa da integração vertical ................................................... 24 8. Empresas próprias de transporte ......................................................................................... 28 9. Logística de distribuição dos principais grupos .................................................................. 32 Perdigão e sua rede de comercialização ............................................................................. 34 Conclusão .................................................................................................................................. Segunda Parte - AVICULTURA BRASILEIRA ATINGE SUA MATURIDADE Introdução .................................................................................................................................. A - Empresas do Sul dominam o setor de carnes e impõem a integração vertical à avicultura nacional 6. Empresas que disputam o mercado avícola brasileiro ..................................................... 1. Sadia consolida sua predominância no mercado avícola nacional .......................................... Expansão da produção avícola da Sadia no Paraná e em Santa Catarina ................................ Produção avícola da Sadia em São Paulo e no Mato Grosso ................................................... 2. Ceval passa a ser a segunda empresa avícola .......................................................................... Ceval cresce, diversifica atividades e muda estratégia de mercado ........................................ Carnes e derivados, a nova estratégia do grupo ....................................................................... 3. Perdigão reencontra sua rota em novas mãos .......................................................................... 4. Aquisições e mudanças no ranking das maiores empresas nacionais ...................................... Avipal cresce e expande atividades para o Centro-Oeste ........................................................ 13 Frangosul continua centrando suas atividades no estado de origem ........................................ Chapecó cresce mudando de estratégia ................................................................................... 5. Reestruturação empresarial e administrativa ........................................................................... 6. A disputa pelo mercado interno ............................................................................................... 7. Estados do Sul e São Paulo lideram produção avícola ............................................................ 8. Grupos avícolas implantam a « Qualidade Total » ................................................................. 7. Empresas do Sul consolidam a integração vertical ............................................................. 1. Pesquisa aplicada em genética e primeiras linhagens nacionais ............................................. 2. Infra estrutura de produção de pintos de corte ........................................................................ 3. Indústria de vacinas e medicamentos ....................................................................................... 4. Fábricas próprias de ração ........................................................................................................ 5. Relação das empresas com o setor de fornecimento da matéria-prima .................................. Integração vertical do Sul chega a outras regiões e ganha novos adeptos ............................... Contratos de parceria avícola ................................................................................................... Sadia, seu setor de Fomento Agropecuário e a qualidade de sua matéria-prima ..................... Perdigão e Ceval e suas formas de atuação no setor avícola ................................................... 6. Abatedouros automatizados e produção em escala .................................................................. 7. Transporte: de totalmente próprio a totalmente terceirizado ................................................... 8. Logística de distribuição nacional ............................................................................................ Sadia e sua própria rede de distribuição .................................................................................. Logística: do abatedouro ao consumidor ................................................................................. Logística de distribuição das demais líderes ............................................................................ Logística de distribuição das « imitadoras » e das pequenas empresas .................................. 9. Produção repartida entre grandes/médias, pequenas/micro empresas .................................... Papel das empresas líderes na avicultura nacional .................................................................. O desafio das « imitadoras » .................................................................................................. Pequenas empresas respondem pela metade da produção nacional ....................................... B. Consequências da integração vertical e do desenvolvimento da avicultura industrial 8. Aumento da produção e do consumo e as novas formas de representação da avicultura industrial ......................................................................................................... I. Avicultura industrial baixa os preços, aumentando a produção e o consumo de frango .......... 1. Fatores que levaram a um maior consumo avícola .................................................................. 2. Avanços tecnológicos e organizacionais contribuem para baixar o preço do frango .............. 3. Preços baixos e diversificação de produtos levam a um maior consumo ................................ II. Avicultura industrial e suas novas formas de representação ................................................... 1. Entidades de representação nacional ....................................................................................... 2. Entidades de abrangência estadual .......................................................................................... 3. Organização dos produtores integrados ................................................................................... 4. Principais eventos da avicultura brasileira ............................................................................... 9. Exportações e internacionalização das empresas avícolas 1. Sadia e sua atividade exportadora .......................................................................................... 2. Ceval nasce voltada para o mercado externo ......................................................................... 3. Empresas e estados exportadores de frango ........................................................................... 4. Evolução dos volumes e dos valores de frango exportado ..................................................... 5. Principais países compradores ............................................................................................... 14 6. Internacionalização das empresas avícolas ............................................................................. Conclusão Bibliografia 15 L’agro-industrie brésilienne contemporaine : innovations organisationnelles et transformations technologiques dans l’aviculture. Cette étude est une analyse historique, économique et sociale des transformations qui ont eu lieu dans l’aviculture brésilienne au cours de la période allant de 1889 à 1995. En partant des caractéristiques de l’aviculture artisanale, nous avons analysé les principales innovations organisationnelles et technologiques adoptées tout au long de l’histoire, qui ont fait de l’aviculture une des branches les plus développées de l’industrie alimentaire brésilienne. Nous nous sommes basés, pour la théorie, sur les travaux d’histoire économique de Fernand BRAUDEL et d’Alfred CHANDLER Jr, ainsi que sur les auteurs de travaux portant sur l’organisation industrielle : Masahiko AOKI, Frédéric TAYLOR, Henry FORD et Taiichi OHNO, entre autres. Dans un premier temps nous avons montré le fonctionnement de l’aviculture artisanale et familiale, destiné au départ surtout à la production pour l’autoconsommation et ses premières expériences d’organisation. Ensuite, nous analysons l’histoire des plus grandes entreprises (Sadia, Ceval, Perdigão, Avipal, Frangosul et Chapecó), qui se disputent actuellement le marché avicole brésilien. Au cours de cette analyse, nous avons mis l’accent sur les raisons qui ont permis à ces entreprises de se maintenir sur le marché, ainsi que sur les innovations organisationnelles et technologiques mises en place par ces entreprises pour arriver à dominer le marché intérieur et les exportations. Nous soulignons l’intégration verticale comme principale innovation organisationnelle du secteur, ce qui a contribué à l’augmentation de la production et de la consommation en réduisant les prix, en diversifiant la gamme des produits et en améliorant la logistique de distribution des viandes. Comme résultat de l’implantation de cette innovation organisationnelle et de la modernisation du parc industriel, en moins de trois décennies le poulet est devenu une des viandes le plus consommées par la population brésilienne. Agroindústria brasileira contemporânea: inovações organizacionais e transformações tecnológicas na avicultura. O presente estudo faz uma análise histórica, econômica e social das transformações ocorridas na avicultura brasileira no período compreendido entre os anos de 1889 e 1995. Partindo das características da avicultura artesanal, analisamos as principais inovações organizacionais e tecnológicas adotadas ao longo da história e que fizeram da avicultura um setor de ponta da indústria alimentar brasileira. Teoricamente, fundamentamos este trabalho nos textos de história econômica de Fernad Braudel e Alfredo Chandler Jr , bem como nos trabalhos sobre organização industrial de Masahiko Aoki, Frédéric Taylor, Henry Ford e Taiichi Ohno, entre outros. Num primeiro momento mostramos o funcionamento da avicultura artesanal e familiar, dedicada sobretudo à produção para o autoconsumo e suas primeiras formas de organização. Em seguida, analisamos a história das maiores empresas (Sadia, Ceval, Perdigão, Avipal, Frangosul e Chapecó), que disputam atualmente o mercado avícola brasileiro. Neste caso, destacamos as razões que garantiram a sobrevivência dessas empresas e quais as inovações organizacionais e tecnológicas que colocaram em prática para dominar tanto o mercado interno como as exportações. Apontamos a integração vertical como principal inovação organizacional no setor, que contribuiu para o aumento da produção e do consumo, reduzindo os preços, diversificando a gama de produtos e melhorando os canais de distribuição de carnes. Resultado da implantação de tal inovação organizacional e da modernização do parque industrial, em menos de três décadas, o frango tornou-se uma das carnes mais consumidas pela população brasileira. Contemporary Brazilian Agricultural Industry: organizational innovations and technological transformations in agriculture. The present study performs a historical and social analysis of the changes in the Brazilian poultry sector between 1889 and 1995. Starting from the characteristics of domestic poultry, we analyze the main organizational and technological innovations that established poultry as a leading sector in Brazilian food industry. The theoretical basis of this work can be found on the economical history texts by Fernand Braudel and Alfredo Chandler Jr, as well as on the works about industrial organization by Masahico Aoki, Frédéric Taylor, Henry Ford and Taiichi Ohno. Initially we describe the dynamics of domestic poultry and its original forms of organization, mainly dedicated to auto-subsistence. We then investigate the history of the larger companies (Sadia, Ceval, Perdigão, Avipal, Frangosul and Chapecó), that presently compete in the Brazilian poultry market. We higlight the conditions that guaranteed the survival of those companies and which organizational and technological innovations allowed them to control both the internal market and exports. Vertical integration is identified as the foremost organizational innovation on the sector, contributing to production and consume increase, price 16 decrease, product diversification and improvement of distribution channels. The implementation of such organizational innovation and the modernization of industry, within three decades, converted chicken in one of the most consumed meat types by the Brazilian population. 17 INTRODUÇÃO Entre 1970 e 1995 a produção avícola brasileira passou de 217 mil para 4.050 mil toneladas. Fruto das diversas transformações organizacionais e tecnológicas, o preço médio da carne de frango no varejo diminuiu de US$ 4,05 para US$ 1,08 entre 1974 e 1995. Como consequência destes fatores, o consumo de frangos passou de 2,3 kg/hab/ano para 23,2 kg/hab/ano no mesmo período, tornando-se uma das principais proteínas animais consumidas pela população brasileira. Neste trabalho buscaremos encontrar as razões e os fundamentos históricos que causaram tais transformações. De início analisaremos a avicultura familiar e tradicional, com suas primeiras formas de organização no período da República Velha (1889-1930). Em seguida veremos como se instiuíram as primeiras empresas familiares e quais os contatos desta avicultura com os avanços tecnológicos conseguidos na América do Norte e na Europa (1930-1960). A partir deste momento aconteceu a passagem da avicultura tradicional e familiar para a industrial. Nesta passagem, aconteceram duas experiências diferentes. De um lado, continuoaram a desenvolver-se as empresas paulistas e mineiras, cada uma dedicadas a uma etapa da filière. Por outro, acontecu no Sul do país a principal inovação organizacional da avicultura brasileira, que foi a implantação da integração vertical pelas empresas que implantaram a avicultura industrial naquela região. Uma vez recuperada a história da implantação da integração vertical, analisaremos a trajetória das principais empresas do setor (Sadia, Ceval, Perdigão, Avipal, Frangosul e Chapecó). Estas, além de consolidarem a integração vertical, distputam atualmente tanto o mercado nacional como as exportações. Por fim, analisaremos três das principais consequências da integração vertical e do desenvolvimento da avicultura nacional. A primeira refere-se aos fatores que levaram a baratear o preço do frango ao consumidor. A segunda, como consequência desta, o forte aumento do consumo de carne de frango e, a terceira, as exportações e a internacionalização das empresas avícolas. As datas utilizadas no título de alguns capítulos são indicativas, para facilitar a compreensão dos avanços da avicultura no contexto sócio-político-econômico do país. Por vezes representam datas marcantes da história brasileira, como as referentes à República Velha e, por outras, momentos importantes para a avicultura nacional, como o ano de 1975, quando se iniciaram as exportações. Claro que quanto às datas de fundação ou diversificação 18 das empresas, volumes e valores expressos ao longo do trabalho, são precisos e foram extraídos, na sua maior parte, do material das empresas ou das entidades mencionadas. Tese e hipóteses A tese que buscamos defender é a de que a avicultura brasileira se desenvolveu em função das inovações organizacionais introduzidas ao longo de todas as etapas da integração vertical, desde a produção de pintos de um dia e rações, passando pelos contratos de parceria avícola, abate e industrialização, até a distribuição dos produtos. É claro que junto com as inovações organizacionais houve a preocupação de acompanhar a melhor tecnologia desenvolvida a nível internacional. Em tempos de « globalização da economia », não se entenderia uma atividade industrial competitiva caso não acompanhasse tais avanços. Entretanto, sustentamos que as empresas que privilegiaram a integração vertical, por causa das vantagens que lhe são inerentes, tornaram-se as maiores e continuam determinando tanto a competitividade, como a concorrência e a disputa pelo mercado nacional e pelas exportações. A partir da revisão bibliográfica em história econômica, em sociologia da organização do trabalho, em economia industrial e do conhecimento anterior da agroindústria brasileira (Dalla Costa, 1993), levantamos as seguintes hipóteses: 1. A integração vertical foi a principal mudança organizacional implantada pela avicultura industrial e significou fator de sobrevivência e de maior competitividade para as empresas que a implantaram e continuaram a desenvolvê-la. 2. A produção fordista implantada na década de 70, através da economia de escala, fez com que houvesse uma sucessiva redução do preço do frango ao consumidor, principal fator que colaborou para o aumento de seu consumo. 3. Na integração vertical, uma das principais mudanças organizacionais introduzidas pelas empresas avícolas foi a implantação de suas próprias redes de distribuição, fator essencial para a disputa e ocupação do mercado nacional e para a sobrevivência das empresas. 4. O estado de São Paulo, tradicional produtor avícola, é o que detém o maior número de empresas com Serviço de Inspeção Federal. Como aconteceu uma forte concentração empresarial no Sul via aquisições de empresas, a (as) empresas que comprarem mais abatedouros em São Paulo concentrarão em suas mãos a produção nacional. 5. As empresas administradas por managers profissionais, onde existe uma completa separação entre os detentores de ações e o gerenciamento empresarial, tanto das decisões a 19 longo prazo (estratégicas) como da direção diária da produção e distribuição, são mais competitivas e têm menos problemas de sucessão que as « empresas familiares ». Pesquisa de campo O levantamento de dados empíricos deu-se em duas etapas, sendo que a primeira ocorreu entre os meses de abril e maio de 1995 e a segunda no mês de março de 1996. Nestas duas ocasiões tivemos oportunidade de fazer visitas às indústrias, entrevistar dirigentes de empresas e de instituições representativas, pesquisadores e outros técnicos que trabalham em órgãos vinculados à avicultura. Além disso, tivemos acesso a bibliotecas especializadas, onde fizemos o levantamento da principal bibliografia sobre o tema. Na primeira parte da pesquisa, fizemos visitas a dois abatedouros cuja produção estava voltada para o mercado interno e externo (Sadia em Concórdia-SC e Frangosul em Montenegro-RS) e um abatedouro cuja produção estava toda voltada para o mercado nacional (Avipal, de Porto Alegre-RS). No caso dos dois primeiros, a degola e os cortes eram feitos manualmente, por exigência dos importadores enquanto que no terceiro, as duas operações eram realizadas maquinalmente. Entrevistamos dez dirigentes de empresas (Sadia, Ceval, Avipal, Frangosul e Batavo), com o objetivo sobretudo de entender como se dá a produção e a distribuição e como está organizada a relação com os pequenos agricultores integrados, responsávies pela produção da matéria-prima. Entrevistamos ainda doze técnicos, pesquisadores e professores de órgãos públicos (EMBRAPA, CNPSA, Universidades, Secretarias da Agricultura do RS, SC, PR e SP) e de entidades representativas (UBA, ABEF, ANAB, APA). Neste caso buscamos atualizar dados sobre os abates das empresas com SIF nos estados mencionados, detectar tendências e tomar conhecimento das pesquisas atuais no setor. Tivemos ainda acesso ao depoimento de dois diretores executivos da Sadia, feitos em 1993 para o Projeto Sadia 50 anos, que foram importantes para perceber as principais decisões estratégicas tomadas ao longo deste meio século da empresa. A segunda etapa da pesquisa de campo aconteceu durante o mês de março de 1996, por ocasião da participação no « Programa especial de retorno de talentos - PERT-95 », promovido pelo CNPq, cuja viagem teve duplo objetivo. De um lado permitiu contatos com o CNPq e com universidades, tendo em vista a obtenção de uma bolsa de « recém-doutor » para 20 engajamento no trabalho de ensino e pesquisa e, de outro, serviu para complementar os dados empíricos. Para atender o primeiro objetivo, fomos a Brasília, na sede do CNPq, onde fizemos contatos com os dirigentes e sugestões sobre o referido programa. Em seguida, visitamos a Universidade Federal do Paraná, onde entrevistamos o vice coordenador do mestrado em Ciências Sociais e o coordenador do mestrado em Economia. Além disto, sempre com o mesmo objetivo, proferimos duas palestras, uma no mestrado em Ciências Sociais, na UFPR, sobre A aplicação da teoria de Chandler ao estudo da história da indústria de carnes de frango no Brasil e outra na EMBRAPA, sobre A integração vertical na cadeia produtiva do frango de corte. Estas palestras ajudaram a aprofundar o conhecimento de tais entidades e melhor organizar a teoria que seria desenvolvida na tese. Para complementar os dados da pesquisa de campo, visitamos a AVIMIG e o MAARA, em Minas Gerais, onde entrevistamos dirigentes e coletamos dados aos quais não tivemos acesso na primeira etapa da pesquisa. No Rio de Janeiro entrevistamos o diretor executivo da ABEF, o que nos permitiu conhecer a situação atual das exportações e ter dados concretos sobre o histórico dos volumes, valores e empresas exportadoras. Na ANAB, em São Paulo, tivemos acesso ao último levantamento sobre a participação de cada empresa nos abates nacionais. Por fim, para compreender como são feitos os pedidos de compra e venda em grandes volumes, entrevistamos um operador de vendas da central de comercialização da Ceval, em São Paulo. Os dados sobre cada abatedouro dos estados do Sul e de São Paulo, foram levantados junto aos órgãos ligados às Secretarias da Agricultura, complementados pelos levantamentos feitos pelas entidades representativas de cada estado. Os dados gerais sobre a participação de cada empresa a nível nacional são organizados pelas entidades do setor (sobretudo UBA, ANAB, APINCO, ABEF, APA). As informações sobre a história foram coletados junto às empresas, que nos forneceram diversos tipos de materiais. Os mais importantes são os relatórios anuais e as revistas de cada uma das principais empresas do setor. Há ainda que mencionar os diversos materiais da Assessoria de Imprensa, artigos em revistas especializadas e matérias de jornais que trazem dados sobre o balanço e a estratégia de ocupação territorial das empresas. Por fim, 21 existem os relatos pessoais dos fundadores da Sadia e Perdigão1, com inúmeras informações sobre sua história. No caso da primeira, existe ainda o livro Sadia 50 anos construindo uma história, justamente narrando os principais eventos deste primeiro meio século. Como trabalhamos a maior parte do tempo com documentos, livros, revistas e relatórios anuais das empresas buscamos ser « neutros » na interpretação dos dados. Entretanto, é difícil fugir dos « elogios e do otimismo » por vezes exagerados em tal tipo de documentação. Estrutura da tese Uma vez confrontados os dados da realidade com as leituras decidimos dividir a tese em duas partes, com um capítulo « teórico-metodológico » introdutório. Neste capítulo procuramos explicitar a relação entre a história econômica e a economia industrial, assim como as demais leituras feitas. Por fim, decidimos apresentar resumidamente a teoria de Alfred Chandler Jr. porque foi o autor que mais nos ajudou a compreender a história econômica das empresas. Sua análise histórico-econômica das principais empresas americanas é a que mais se aproxima do que tentamos fazer com uma das filières da economia brasileira, que é a avicultura. Dividimos cada uma das partes em dois sub-itens que contam, por sua vez, com dois capítulos. Na primeira parte o item « A » mostra como funcionava a avicultura familiar e tradicional e quais eram suas principais formas de organização. A partir da recuperação dos principais fatos ligados à avicultura durante a República Velha ou seja, entre 1889 e 1930, relataremos no segundo capítulo, a formação da primeira associação avícola nacional e a concentração da produção, sobretudo em São Paulo e no Rio de Janeiro. Outros aspectos serão analisados, como a busca constante dos grandes avicultores da época de acompanharem as pesquisas e o desenvolvimento avícolas a nível internacional, sobretudo na Europa e nos Estados Unidos; a produção para o auto-consumo de carne e de ovos, que era feita em praticamente todas as pequenas propriedades do interior; a evolução da produção e; as condições do comércio das aves. No terceiro capítulo analisaremos os avanços da avicultura entre as décadas de 1930 e 60, com destaque para os produtores tradicionais, de um lado e, para as empresas avícolas 1 Attilio Fontana História da minha Vida, Editora Vozes, Petrópolis, RJ, 1980, 278 p. No caso de Saul Brandalise, o livro chama-se Retrato de um homem, Indústria Gráfica Editora, SP, 1982, 151 p., e foi organizado pelos membros de sua família. 22 familiares, de outro. O texto enfocará o surgimento destas empresas na década de 40, para atender a uma demanda crescente por carne de aves, causada pela escassez e encarecimento da carne bovina durante a Segunda Guerra. Serão relatados também os incentivos que o Estado deu à avicultura; o fortalecimento cada vez maior da ligação dos produtores nacionais com a avicultura norte-americana; a produção, que apesar do aumento continuava sendo artesanal; a evolução do consumo, sobretudo a partir de meados da década de 40; a comercialização, sempre feita nos moldes tradicionais; e as indústrias familiares nascentes, dedicadas tanto ao abate de aves, como à produção de matrizes e pintos de um dia e de equipamentos para a avicultura. No item « B » da primeira parte buscarmos recuperar a história das empresas que implantaram a integração vertical no Sul assim como o surgimento das demais empresas avícolas industriais. No quarto capítulo descreveremos a história do surgimento das primeiras empresas do setor organizadas para abater frangos de forma industrial. De início, narramos a formação dos dois principais grupos, a Sadia e a Perdigão, relatando suas atividades antes mesmo de atuarem na avicultura. Em seguida, abordaremos o surgimento das demais empresas da época, destacando sua localização geográfica principalmente nas regiões Sul e Sudeste e, terminaremos analisando o caráter familiar destas empresas e a forma como estava organizada sua administração interna, bem como a importância da atuação destes frigoríficos na passagem da avicultura artesanal para a industrial. O capítulo seguinte tratará da implantação da integração vertical por estas empresas, começando por demonstrar como as empresas se posicionaram diferentemente diante das principais etapas produtivas. Na caso da pesquisa genética, da produção de vacinas e de medicamentos, ficaram de fora, comprando os « pacotes prontos no mercado ». Com exceção destas duas as empresas assumiram internamente as etapas mais importantes do processo de integração vertical, como a implantação dos próprios matrizeiros, a produção de pintos de um dia, a instalação de fábricas próprias de ração, a adoção de contratos de parceria avícola com produtores integrados, a construção de seus abatedouros, a compra de frotas de caminhões, para seu transporte e a montagem de sua logística de distribuição, com filiais comerciais para atingir o mercado nacional. Na segunda parte buscaremos ver como foi a evolução das empresas, da produção, do consumo e das exportações entre 1975 e 1995. O item « A » busca relatar a história das seis maiores empresas e qual a situação atual da integração vertical na avicultura nacional. No sexto capítulo mostraremos como se desenvolveu a história das principais empresas que disputam atualmente o mercado nacional (Sadia, Ceval, Perdigão, Avipal, 23 Frangosul e Chapecó). Primeiro veremos a forma como as « líderes » atuaram no setor avícola e se estabeleceram no país, tanto com plantas industriais como com filiais comerciais. A mesma história será analisada em relação às quatro principais « imitadoras » cuja estratégia foi semelhante, buscando implantar-se em todo território nacional. Depois de recuperada a história, outros aspectos serão analisados, como a reestruturação empresarial e administrativa, a disputa pelo mercado interno, a participação dos estados do Sul e de São Paulo na avicultura industrial e, a implantação dos processos de « qualidade total » pelas principais empresas do setor. No capítulo seguinte buscaremos estudar a consolidação da integração vertical pelas empresas do Sul, vendo como estão organizadas as principais etapas do processo de produção. Entram nesta relação o estudo da pesquisa genética, do controle dos matrizeiros e incubatórios para produção dos pintos de corte, as indústrias dedicadas à produção de vacinas e medicamentos, as fábricas de ração, os contratos de parceria avícola. Outros três setores, a partir daí serão analisados, que são os frigoríficos, as fábricas de embutidos e industrializados e a própria rede de distribuição constituída pelas empresas avícolas. Buscaremos também fazer uma tipologia destas indústrias, destacando suas principais características. No item « B » apresentaremos algumas das principais consequências da integração vertical e do desenvolvimento da avicultura industrial. No oitavo capítulo buscaremos demonstrar tanto o aumento da produção e do consumo, como as novas formas de representação colocadas em prática pelas empresas envolvidas no processo de produção. No caso do consumo, o fator preponderante no seu aumento foi o preço baixo do frango inteiro. As novas representações, sobretudo as ligadas ao setor industrial produtivo, fizeram com que os interesses da avicultura fossem levados em conta pelo governo e conseguiram fazer da carne de aves uma das proteínas mais importantes na alimentação dos atuais consumidores. No último capítulo analisaremos a exposição dos produtos e das empresas ao mercado internacional. Neste caso, buscaremos seguir o que fizemos ao longo de toda tese, ou seja, analisar as exportações a partir das principais empresas. Buscaremos entender como a Sadia e a Ceval se relacionaram com o setor exportador de modo geral e, sobretudo, no que se refere à avicultura. Depois veremos o papel das demais empresas e os maiores estados exportadores, assim como a evolução dos volumes e valores e os principais países compradores. Por fim, buscaremos estabelecer a relação entre a importância das exportações e a internacionalização das empresas que iniciaram implantando escritórios comerciais e, a partir de meados da década de 90, também começaram a implantar-se industrialmente no exterior. 24 Por fim ressaltamos que buscamos com este trabalho, suprir uma das lacunas da história das empresas brasileiras. Neste caso, procuramos estudar um dos setores mais dinâmicos da atual economia, procurando entender as inovações organizacionais e as transformações tecnológicas que foram colocadas em prática, sobretudo a partir dos anos 1960, quando implantou-se a avicultura industrial. 25 CAPÍTULO 1 HISTÓRIA E ECONOMIA CONFRONTADAS À EVOLUÇÃO INDUSTRIAL « Assim como o especialista de história econômica tem necessidade de fazer teoria, é limitado o conhecimento teórico do economista que negligencia a história ». (Thierry Paquot, in : Wallerstein, 1985, p. 109). 1. História econômica e empresarial dentro de um novo contexto da historiografia Ao longo do século XX o estudo da história sofreu profundas transformações, quando deixou de se limitar à explicação dos fatos a partir de seu encadeamento, para buscar novos objetos, novos métodos e a ligação com outras ciências sociais. Com isto, a história passou a ter como objetivo a compreensão das sociedades do passado a partir de suas múltiplas dimensões: política, social, econômica, psicológica, religiosa, cultural. Além disso, o desenvolvimento de outras ciências, tais como a economia, a sociologia, a geografia e a demografia, entre outras, acabaram por enriquecer os rumos da historiografia. Braudel define estas alterações, dizendo que « houve uma alteração do tempo histórico tradicional. Um dia ou um ano podiam parecer boas medidas para um historiador político no passado. O tempo era considerado como uma somatória de dias. Entretanto, uma sequência de preços, uma progressão demográfica, o movimento dos salários, as variações da taxa de juros, o estudo da produção, uma análise minuciosa da circulação do dinheiro exigem medidas de tempo muito mais largas » (Braudel, 1969, p. 48). Estas « divisões » da história deram origem ao que hoje são a história econômica, história política, história social, história das mentalidades, etc. Cada uma delas com seu campo de atuação específico e suas próprias ramificações, como por exemplo a história 26 econômica, onde se situa esta pesquisa. Esta última trabalha muito ligada à economia, da qual se aproxima pelos objetos de estudo (produção, comercialização, moeda, crescimento...) e pelos métodos de análise (estatística, contabilidade, matemática...). As preocupações econômicas apareceram na história já no século XIX, mas foi somente a partir da década de 1930 que, por diversas razões essa especificidade de estudo começou a se desenvolver. Por um lado, com a Revolução Russa, as influências do marxismo se intensificaram e, com isto, não era mais possível encontrar explicações para todos os fenômenos a partir da história política. O estudo das estruturas econômicas das sociedades passou a ter uma importância maior e a contribuir para a explicação dos fatos históricos. Por outro lado, a crise econômica de 1929 causou mudanças sociais e políticas que fizeram os observadores voltarem-se cada vez mais para os estudos da economia2 na busca de explicações. Na França, foi criada a revista « Annales d’histoire économique et sociale » em 1929 que, no entanto, teve sua análise histórica « marginalizada » até os anos 50, quando passou a ter destaque no país. A revista defendendo o ponto de vista de uma história total, onde são estudados ao mesmo tempo o político, o econômico e o social, fez com que, a partir daí, os estudos históricos, as tabelas demonstrando a evolução demográfica, a economia e também os fenômenos sociais, como a criminalidade, os casamentos, etc., ganhassem importância. Desde então, os historiadores se dedicaram à explicação do crescimento da economia: estudaram a evolução dos preços, construíram curvas explicativas, interessaram-se aos investimentos, aos fluxos de capital e buscaram explicar os setores mais dinâmicos. Nos anos 70, a história econômica francesa ampliou seu objeto de estudo trazendo para dentro de seu campo de pesquisa os « atores » econômicos. 2. Nascimento da história industrial nos Estados Unidos O surgimento, em 1938 nos Estados Unidos, da disciplina de economia industrial moderna na Harvard University, foi resultado de vários esforços feitos desde o final do século XIX, através de numerosos trabalhos sobre a organização da indústria e a concentração 2 Para maiores detalhes ver Geoffrey Barraclough (1980), Tendances actuelles de l’histoire, Flammarion, Paris; Almir Pita Freitas Filho (1989), « História econômica e história da empresa: algumas reflexões metodológicas », Ensaios FEE, n° 10, pp. 168-177; Flávia Cruz Moreira (1996), Saint-Gobain et Pont-à-Mousson au Brésil : une approche a partir des produits (1955-1965), mémoire de DEA, Paris VIII. 27 econômica, que prepararam a emergência desta nova disciplina3. Além da criação da cadeira de « Business History » na Universidade de Harvard, em 1927, outras instituições foram fundadas, como a « Business Historical Society », em 1925 e o « Journal of economic and business History », em 1928, que contribuíram para a expansão das idéias econômicas dentro do campo da história4. Nesta perspectiva histórica, A.T. Hadley deve ser considerado um dos pioneiros, com seu livro « Railway transportation », consagrado ao setor das estradas de ferro e publicado em 1885. A publicação deste livro é anterior, portanto, ao « Insterstate Commerce Act » de 1887 e ao « Sherman Anti-Trust Act » de 1890, que marcaram duas etapas decisivas na elaboração da legislação americana sobre o controle da concentração industrial. Os debates anteriores e posteriores à elaboração do « Sherman Act » fizeram nascer nos Estados Unidos, uma vasta literatura amplamente dedicada à concentração econômica. « O caráter ‘natural’ dos monopólios, as vantagens e inconvenientes econômicos da constituição de trustes e a questão da necessidade de uma regulamentação pública das infrações à concorrência, foram os problemas mais evocados » (Arena, 1991, p. 39). Note-se ainda, a coincidência histórica entre a aparição destes trabalhos e o movimento de concentração industrial americana que começou no início dos anos 1870 e teve uma nova aceleração em meados da década de 1880. O conjunto destes trabalhos situa-se no contexto do pensamento teórico norteamericano do final do século XIX. Particularmente a formação da « American Economic Association » en 1885 foi a ocasião de um importante debate de idéias neste setor. Por outro lado, os principais economistas, iniciadores desta operação, foram fortemente influenciados pela escola histórica alemã. H.C. Adams, J.-B. Clark, R. Ely e E. Seligman, principais autores deste movimento seguiram alguns dos cursos específicos na Escola Histórica alemã. Contrários ao « laissez-faire » extremo, eles insistiam sobre a necessidade da « pesquisa econômica, em particular, o estudo histórico e estatístico das condições atuais da vida industrial » (Arena, 1991, p. 40). Depois da Segunda Guerra, a Business History chegou à maturidade com dois tipos de análises, ambas reafirmando sua ligação com a história econômica. A primeira era voltada para os estudos de caso, onde o que se pesquisava não era somente o lugar do « empreendedor 3 Richard Arena, « Structures industrielles et concentration économique : les antécédents historicistes et institutionnalistes de l’économie industrielle », pp. 22-54, in : Richard Arena, Jacques de Bandt, Larent Benzoni et Paul-Marie Romani (org.), (1991), Traité d’économie industrielle, Paris, Economica. 28 inovador », mas o lugar da firma dentro da economia nacional. A segunda estava voltada sobretudo aos temas maiores, como o estudo de um setor industrial, da origem social dos dirigentes, das inovações tecnológicas e organizacionais. Mas, foi definitivamente o historiador Alfred Chandler Jr. que abriu novas perspectivas e deu novo impulso à história industrial a partir dos anos 60, como veremos mais adiante. 3. Pensamento econômico e história das empresas no Brasil O pensamento desenvolvimentista latino-americano formou-se ao longo dos anos 1940-50, colocando-se contra os paradigmas liberais que predominavam na época. Esta corrente desenvolvimentista constituiu-se à partir das análises de Raul Prebisch, economista da Cepal5, cujas análises tinham como objetivo refutar as soluções liberais para os problemas latino-americanos. Tratava-se de provar que as teorias de mercado estabelecidas não traziam soluções para os diferentes problemas econômicos latino-americanos (desequilíbrio orçamentário, inflação, etc) que impediam de resolver o problema da pobreza. Não era através da inserção crescente no mercado mundial ou, em outras palavras, da intensificação das exportações de matérias-primas, que o continente se desenvolveria. Entre os autores brasileiros que seguiram a teoria do desenvolvimento podemos citar de um lado Roberto Simonsen e Roberto Campos e, de outro, Celso Furtado. Os três propunham a formação de um capitalismo industrial e moderno para a sociedade brasileira, discordando, entretanto, em alguns aspectos, como a questão da redistribuição da riqueza, da reforma agrária e do lugar que ocuparia o capital estrangeiro. Roberto Simonsen6 foi o precursor do desenvolvimentismo defendendo já entre os anos 1935-45 a idéia da industrialização sustentada pelo Estado e sobretudo a idéia do protecionismo. Celso Furtado7 é certamente o economista brasileiro mais conhecido. Dentro da tradição da Cepal ele defendia a intervenção do Estado na economia e a subordinação da política monetária ao 4 J.P. Daviet, « Anciens et nouveaux visages de la Business History », in: Yves Lequin et Sylvie Vandecasteele (org.), (1990), L’usine et le bureau : itinéraires sociaux et professionnels dans l’entreprise au XIXè et Xxè siècles, Lyon, Presses Universitaires de Lyon. 5 Raul Prebisch (1949), The economic development of Latin America and some of its principal problems, Santiago, Cepal. 6 Roberto Simonsen (1973), Evolução industrial do Brasil e outros estudos, São Paulo, Companhia Editora Nacional. 7 Celso Furtado (1962), A pré-revolução brasileira, Rio de Janeiro, Fundo de Cultura; (1966), Subdesenvolvimento e estagnação na América Latina, Rio de Janeiro, Civilização Brasileira; (1972), Análise do modelo Brasileiro, Rio de Janeiro, Civilização Brasileira; (1977), Formação econômica do Brasil, São Paulo, Cia Editora Nacional. 29 projeto de desenvolvimento industrial. Além disso o autor insistia sobre medidas econômicas de caráter social, que visavam diminuir a miséria, assim como insistia sobre uma melhor redistribuição de renda e uma efetiva reforma agrária. Podemos citar Roberto Simonsen e Caio Prado Jr.8 como precursores dos estudos a partir do movimento de industrialização da sociedade brasileira que começou na década de 1930. As pesquisas da época centravam-se sobretudo nas questões macroeconômicas, como o desemprego, a balança comercial e a intervenção do Estado, sendo que a história das empresas era considerada secundária e pouco desenvolvida. Talvez a principal razão de não se desenvolver uma história das indústrias no Brasil era a própria falta de industrialização. Não havendo empresas fortes, com tradição e importância para o país, não se desenvolvia também esta disciplina. Além disso, a industrialização acelerou-se impulsionada pelo Estado, a partir dos anos 1930 e, a maioria dos estudiosos admitia que os empreendedores nacionais eram fracos, quando não, inexistentes. Os raros empresários nacionais não chegaram a chamar a atenção dos historiadores. Desta forma a história das empresas só começaria timidamente, a partir dos anos 1970. Ainda assim, o único empreendedor estudado foi Irineu Evangelista de Souza, o visconde de Mauá. Outro livro, sobre o grupo Matarazzo9, estava a meio caminho entre a história e a sociologia da empresa. Entretanto, a disciplina começou a se tornar objeto de interesse de outros historiadores10 e, a partir dos anos 1980 os trabalhos sobre a história das empresas se multiplicaram11. Os temas mais estudados foram o papel do empreendedor, a ação do Estado, as origens da industrialização brasileira, a ideologia e a ação sindical dos grupos industriais. Um dos problemas encontrados pelos historiadores foi o acesso aos arquivos das empresas, tanto pelo fato de serem inexistentes como pela desconfiança e medo dos proprietários. Ao contrário das empresas nacionais, as multinacionais, presentes no país desde o final do século XIX, quando se instalaram empresas inglesas, francesas, alemães e norte- 8 Roberto Simonsen (1937), História econômica do Brasil 1500-1820 ; Caio Prado Jr. (1974), História econômica do Brasil, São Paulo, Brasiliense. 9 José de Souza Martins (1976), Conde Matarazzo, o empresário e a empresa, São Paulo, Editora Hucitec, 121 p. 10 Almir Pita Freitas Filho (1989), « História econômica e história da empresa: algumas reflexões metodológicas », in: Ensaios FEE, Porto Alegre, n° 10, pp. 168-177. 11 Elisabeth von der Weid e Ana Marta Bastos (1985), O fio da meada. Estratégia e expansão de uma indústria têxtil ; Miriam Stanley, A companhia agrícola Santa Maria ; Mônica Oberg, História da Resana S.A. ; José Luis Sampaio, Companhia Empório industrial do norte: 1891-1973 ; Margareth Martins, A Central do Brasil: 19081940. 30 americanas, foram objeto de diversos estudos. Estas indústrias dedicaram-se sobretudo às atividades « clássicas » da época, ou seja, estradas de ferro, portos, eletricidade e finanças12. Se estas empresas começaram a se instalar no país no final do século passado, foi a partir dos anos 1920-1930 que começaram a ganhar força e importância no mercado e, a partir dos anos 1950 o movimento de entrada de outras multinacionais se intensificou. Neste último período havia pontos de vista diferentes sobre a penetração das multinacionais. Alguns pensadores desenvolvimentistas viam com bons olhos a chegada de capital estrangeiro (Roberto Campos), enquanto uma grande parte da « intelligentsia », com um discurso nacionalista, condenava sua instalação no país. Além disso, uma parte dos empreendedores nacionais preferia, o que é compreensível, evitar a concorrência das empresas estrangeiras13. Apesar dos argumentos dos nacionalistas a partir do governo de Kubitschek e sobretudo a partir do golpe militar de 1964, as multinacionais marcaram cada vez mais sua presença na economia brasileira. Com isto, a literatura sobre estas empresas também se ampliou e ganhou espaço na história econômica14. Entretanto, as pesquisas visavam sobretudo as multinacionais em geral e suas relações macro econômicas (dominação do mercado, relações com o poder, peso sobre o desenvolvimento econômico), enquanto a história propriamente dita de cada empresa era menos levada em conta, com exceção de alguns poucos trabalhos15. Um dos objetivos do nosso trabalho é justamente cobrir uma das lacunas sobre a história das principais empresas avícolas nacionais. É verdade que já existem vários estudos a respeito da avicultura brasileira, mas nenhum deles é dedicado à história empresarial propriamente dita. Podemos destacar entre os mais importantes, os trabalhos de Dinarte Belato (1985), dedicado sobretudo a compreender a relação de exploração das empresas sobre os pequenos agricultores integrados; de Indio Campos (1987), que recupera a história da 12 Frédéric Mauro, « French firms and financing of Brazilian industrialization », XIth International Congress of Economic History, Milano, sept 1994 et Frédéric Mauro (dir.), (1990), Transport et commerce en Amérique Latine, 1800-1970, Paris, Harmattan. 13 Para maiores informações sobre os argumentos dos pensadores favoráveis e contrários à penetração das multinacionais, Flávia Cruz Moreira (1996), Saint-Gobain et Pont-à-Mousson au Brésil : une approche à partir des produits (1955-1965), mémoire de DEA, Paris VIII. 14 Maria da Conceição Tavares (1980), « La presencia de las grandes empresas en la structura industrial brasileña », in: Industrialización y internacionalización en la América Latina, México ; Carlos von Doellinger (1975), Empresas multinacionais na indústria brasileira, Rio de Janeiro ; Winston Fritsch (1991), L’investissement étranger direct au Brésil, OCDE ; John Connor (1980), El poder de mercado y la rentabilidad de las corporaciones multinacionales, México ; Marcos Arruda (1978), Las empresas transnacionales y el Brasil, México ; J.M. Gouveia Vieira (1975), O capital estrangeiro no desenvolvimento do Brasil, São Paulo ; Osny Duarte Pereira (1974), Multinacionais no Brasil, Rio de Janeiro. 15 Gilles Gleise (1988), La régie nationale des usines Renault et l’Amérique Latine depuis 1945 (Argentine, Brésil, Colombie), mémoire de maîtrise, Paris X ; Frédéric Mauro (dir), (1990), Transport et commerce en 31 ocupação territorial do oeste catarinense, palco do surgimento das principais agroindústrias do setor; de Maria Inês Paulilo (1990), que discute o conceito de « integração » e quem são os « agricultores integrados » a partir da produção de fumo e de aves no litoral catarinense; o de Luiz Carlos Mior (1992), dedicado a compreender tanto os avanços nas instituições de assistência técnica à pequena propriedade, como as novas estratégias das empresas agroalimentares para garantirem seu fornecimento de matéria-prima; o de Aldair Rizzi (1993), dedicado às empresas avícolas, sobretudo buscando explicar a concentração industrial e as inovações de produtos; o nosso trabalho (Dalla Costa, 1993), onde buscamos compreender a história de uma empresa, a Sadia, no sentido macro econômico e sua relação com os agricultores integrados. Neste trabalho buscaremos justamente mostrar a história das empresas « vistas por dentro », à partir de sua administração e da estratégia da implantação da integração vertical como fator essencial para seu crescimento e sua competitividade. Num primeiro momento vamos contextualizar a produção avícola antes do paradigma tecnológico industrial, analisando a produção e os pequenos produtores avícolas familiares. No que se refere especificamente à história empresarial, analisaremos o surgimento e o desenvolvimento das principais empresas avícolas nacionais, insistindo sobre suas inovações organizacionais e tecnológicas, assim como sobre o papel de seus dirigentes. Para terminar a análise da « filière »16 falta um aprofundamento sobre os canais de distribuição, ou a importância dos super e hipermercados nesta atividade, o que demandaria outro estudo, uma vez que as indústrias do setor encarregam-se até a distribuição de suas mercadorias junto aos pontos de venda. Mesmo não fazendo uma análise comparativa com a avicultura francesa (terceiro maior país produtor, depois dos Estados Unidos e Brasil), citaremos três autores17 cujas obras Amérique Latine, 1800-1970, Paris, l’Harmattan, que contém alguns artigos sobre determinadas empresas estrangeiras no Brasil. 16 A noção de filière foi desenvolvida desde os anos 50 pelos norte-americanos Davis J.H. et Goldberg R.A. (1957), A Concept of Agribusiness, Boston, Harvard University. Em seguida foi retomada e aprofundada na França por diversas equipes (J. le Bihan, INRA, Ecole Nationale Supérieure des Industries Agricoles et Alimentaires; Louis Malassis, Institut Agronomique, Faculté de Droit et Sciences Economiques de Montpellier; trabalhos do Centre National d’Etudes Economiques et Juridiques Agricoles de l’Université de Grenoble). Uma das noções clássicas é a definição de Malassis (1973) : « é o conjunto dos agentes (empresas e administrações) e das operações (de produção, de distribuição, de financiamento) que concorrem para a formação e a transformação do produto até seu estágio final de utilização, assim como os mecanismos de ajustamento dos fluxos dos produtos e dos fatores de produção ao longo da filière até seu estágio final ». 17 Pierre Saunier et Bernard Schaller (1978), L’aviculture française 20 ans après, Vol.1 - Quatre études sur la portée et sur les limites de la « revolution avicole » ; le cas des volailles de chair, Institut National de la Recherche Agronomique, 344 p. ; Pierre Saunier et Bernard Schaller (1982), Les determinants de la concentration dans les secteur agro-alimentaires. Le cas de la filière « volailles de chair », Institut National de la Recherche Agronomique, 112 p. ; Jean-Paul Diry (1985), L’industrialisation de l’élevage en France. 32 buscaram tanto analisar a filière avícola como recuperar a história das principais empresas e a transformação da avicultura artesanal e familiar para a industrial. Pierre Saunier e Bernard Schaller iniciam por estudar o consumo de carne de aves na França a partir de 1840 para se consacrar, em seguida, aos avanços da avicultura industrial e suas relações de contratualização; no segundo volume de seu trabalho, analisam a concentração que houve na filière avícola durante os anos 1980, as mudanças tecnológicas e os circuitos de distribuição. Jean-Paul Diry fez uma retrospectiva da passagem da avicultura familiar para a produção industrial « hors-sol », analisando a filière como um todo e as relações de integração entre as diferentes empresas da cadeia produtiva. Corentin Canevet estuda a « revolução » agrícola e agro-industrial na região da Bretanha, mostrando a participação das empresas privadas e cooperativas; a ação dos sindicatos e a organização dos pequenos agricultores. 4. Inovações organizacionais e tecnológicas no Taylorismo, Fordismo e Toyotismo Conforme os trabalhos de Chandler as empresas modernas desenvolveram-se nos Estados Unidos a partir de meados do século XIX, quando os transportes e as comunicações estavam implantados e funcionando. A partir daquele momento houve um grande crescimento e diversificação empresarial e se iniciou tanto uma busca de inovações na organização interna do trabalho, quanto uma intensa pesquisa para descobrir novos « brevets », assim como máquinas mais modernas que produzissem mais, melhor, em menos tempo e a um custo menor. Foi neste contexto de desenvolvimento econômico e empresarial nos Estados Unidos que tiveram origem os dois primeiros grandes movimentos para melhorar a competitividade empresarial do mundo moderno, que foram o Taylorismo e o Fordismo. Com o desenvolvimento das empresas ferroviárias americanas (Chandler, 1988, cap. 3, 4 e 5) surgiu o desafio de aperfeiçoar a administração e a produção assim como de estudar o papel dos dirigentes e dos funcionários para melhorar a competitividade. Para responder a estas questões, iniciou-se um movimento combinando ensino universitário (como vimos acima) e busca de soluções práticas, a partir da experiência empresarial, sobretudo desenvolvidas pelos Economie et géographie des filières avicoles et porcines, Lyon, Editions Ophrys, 680 p. ; Corentin Canevet (1992), Le modèle agricole breton, Histoire et géographie d’une révolution agro-alimentaire, Renne, Presse Universitaire de Rennes, 397 p. No final destas obras encontra-se uma exaustiva bibliografia sobre as publicações mais importantes neste domínio. 33 engenheiros de produção. Um destes engenheiros que mais desenvolveu um sistema buscando resolver os problemas de produção e administração foi Frederic Wislow Taylor18. A idéia básica de Taylor, escrevia Henry Le Châtelier19 « visa o crescimento do rendimento do trabalho, sem aumentar o cansaço do operário, conduzindo assim a um aumento considerável dos salários ». O sistema taylorista visava duas partes essenciais da produção industrial. De um lado resolver o problema do comando e melhor compreender o papel dos dirigentes das novas e grandes empresas norte-americanas e, de outro, estudar « cientificamente » o tempo de trabalho necessário para a produção de cada mercadoria. No que se refere à direção do trabalho, Taylor estudou a « organização militar », onde os operários recebiam as ordens do contra-mestre, que as recebia do chefe da seção, que as recebia do chefe de divisão, que era submetido ao chefe de serviços gerais, que por sua vez dependia do chefe dos engenheiros, subordinado ao diretor geral. A esta ordem ele propunha uma substituição pela « direção administrativa », composta de um diretor assistido pelo seu Estado-Maior, com especialistas nos diversos domínios não necessariamente conhecidos pelo diretor geral da empresa (Fayol, 1970). Nestas duas direções: papel dos dirigentes e organização científica do trabalho, consistem as principais contribuições do taylorismo20. Se o taylorismo teve seu momento auge nas primeiras décadas do século, ele continuou sempre presente na história das empresas através da busca constante por uma melhor competitividade e novas formas de organização do trabalho para superar as diversas crises do capitalismo. « Na verdade, Taylor não morreu, ele tornou-se mais inteligente »21, adaptando-se às novas conjunturas. A continuação deste processo deu-se com a implantação 18 Frederic Taylor (1856-1915) americano, estudou no Collège de Harvard, do qual saiu antes de terminar os estudos por problemas de visão. Depois de quatro anos trabalhando como aprendiz numa pequena firma, empregou-se como operário na Midvale Steel de 1878 a 1889, onde tornou-se contra-mestre, chefe de atelier, chefe mecânico, chefe de desenho e engenheiro chefe. Em 1881 ele introduziu os estudos da medida do tempo para a produção de cada peça na empresa, com muita resistência dos funcionários. A partir de 1889 trabalhou como consultor para grandes empresas. Um de seus inventos mais célebres foi o processo de tratamento das ferramentas para corte rápido do ferro, o que lhe valeu a celebridade e uma medalha de ouro na exposição de Paris em 1900. Seu livro mais famoso é o Principles of scientific management, publicado em 1911. Depois de ter depositado cerca de 40 brevets ele se aposentou em 1901 e passou o restante de seu tempo divulgando suas idéias. 19 Henry Le Châtelier (1911), « Le taylorisme vu en 1911 », in: prefácio à edição francesa de Organisation du travail et économie des entreprises, de F.W.Taylor, pp. 12-13. 20 Para uma análise sobre o papel do taylorismo no passado, o taylorismo atualmente e seu futuro, ver Maurice de Montmollin e Olivier Pastré (org.), (1984), Le taylorisme, Acte du colloque international sur le tylorisme organisé para l’Université de Paris-XIII, 2-4 mai 1983, Paris, Edition La Découverte. O mesmo texto apresenta diversos artigos mostrando os avanços e as aplicações do taylorismo nos diferentes países da Europa e dos países do terceiro mundo. Nilton Vargas, « Le taylorisme au Brésil », pp. 155-166, analisa a introdução e os avanços do taylorismo no Brasil até o início da década de 1980. Benjamin Coriat (1979, ed. de 1994), L’atelier et le chronomètre, Paris, Christian Bourgois Editeur. 21 Guillaume Duval, « Quand Taylor en voit de toutes les couleurs », in: Alternatives Economiques, n° 130, septembre-octobre 1995, p. 56. 34 da « linha de montagem », uma das principais contribuições do Fordismo para a produção de massa e a diminuição constante dos preços por unidade. Resumindo, o fordismo « é um sistema de produção fundado na produção de massa, sob a base da economia de escala; ele se assenta na racionalização do trabalho tayloriana (divisão das tarefas, separação do trabalho de concepção e de execução, racionalização dos gestos), sobre a estandardização dos componentes e sobre a linha de montagem »22. Henry Ford23, depois de inúmeras experiências de análise científica das medidas do tempo de trabalho e das melhores formas de organização descreve como foi a implantação da linha de montagem. « Nossa primeira forma de fazer a montagem consistia em montar todas as peças do carro num único lugar, os operários trazendo as peças na medida em que eles tinham necessidade, como quando a gente constrói uma casa » (Ford, 1925, p. 90). O primeiro progresso consistiu em levar o trabalho ao operário, ao invés deste correr atrás das peças. « Nenhuma pessoa deve ter que fazer um passo sequer; na medida do possível, ninguém deve precisar se abaixar ». O avanço na linha de produção deu-se através da montagem do chassis do carro. Ford conta como o que tinham conseguido de melhor até então era montar um chassis numa média de doze horas e vinte e oito minutos de trabalho cada um. « Em seguida nós fizemos a experiência de fazer circular o chassis através de um cabo e de um rolo ao longo de uma linha de montagem de duzentos e cinquenta pés de comprimento. Seis operários da linha de montagem « viajavam » com o chassis e pegavam as peças arrumadas em pilhas ao longo da linha. Esta experiência reduziu o tempo a cinco horas e cinquenta minutos por chassis. No início de 1914, nós levantamos a linha de montagem. Nós tínhamos adotado o princípio do « trabalho à altura do homem ». (...) Esta instalação à altura das mãos e uma subdivisão do trabalho mais eficaz, diminuindo o número de movimentos necessários, reduziu a mão-deobra por chassis a uma hora e trinta e três minutos » (Ford, 1925, p. 92). A combinação de inovações organizacionais (linha de montagem) com tecnologias sempre melhoradas, a repetição ilimitada dos mesmos gestos, fazendo produtos idênticos24 e a concorrência entre as empresas do mesmo setor, levou a uma constante diminuição dos preços. No caso dos automóveis Ford, em 1909 eram vendidos a 950 dólares sendo fabricados 22 Henry Houben e Marc Ingham, « Par quel système remplacer le fordisme? », in: Problèmes économiques, n° 2.458, 7 février 1996, pp. 1-10. 23 Henry Ford (1925), Ma vie et mon oeuvre, Paris, Payot. Para um ensaio sobre o fordismo e a produção de massa na época da eletrônica, Benjamin Coriat (1983), L’atelier et le robot, Paris, Christian Bourgois editeur. 24 Tornou-se muito conhecida a expressão de Ford que dizia « Todo cliente poderá ter seu carro da cor que ele quiser, desde que o queira preto » (Ford, 1925, p. 82). 35 18.664 carros, enquanto em 1920 o preço caiu para 440 dólares, e a produção subiu para 1.250.000 carros (Ford, 1925). Dos anos 1920 até os anos 1990 houve muita evolução tecnológica e inúmeras inovações na organização do trabalho. A que deu mais certo e que de certa forma « substituiu » o fordismo veio do Japão, da empresa Toyota e ficou conhecida como Toyotismo ou Ohnismo, do engenheiro responsável pela introdução das mudanças na firma. Grosso modo, podemos dizer que o toyotismo « é uma organização da produção fundada sobre o « juste-in-time » (a procura determina a produção) e sobre a « automação » (a capacidade de uma máquina parar sozinha desde que ela encontre um problema e portanto, a funcionar de maneira autônoma), implantando uma série de transformações nas relações de trabalho das quais, as mais importantes são a polivalência multifuncional dos operários, cujo trabalho é organizado por equipes e uma forte utilização da terceirização » (Houben e Ingham, 1996, pp. 1-2). Entre a extensa literatura atual do Toyotismo ressaltamos o texto do engenheiro da Toyota, Taiichi Ohno25, principal responsável pela introdução de tais mudanças na empresa. Quanto às vantagens do toyotismo sobre o fordismo e os demais modos de produção de massa, podemos dizer que sua superioridade se deve: « à economia dos recursos e à eliminação dos desperdícios em material, em equipamentos, em estoques e em efetivos; a uma racionalização do trabalho em grupo, sob a base de uma racionalização do trabalho individual; a uma adaptação mais rápida às necessidades do mercado graças aos princípios da produção comandada pelos pedidos e au juste-in-time; a uma gestão dos defeitos de fabricação mais rigorosa, o que implica um controle integral da qualidade; a uma informação obtida mais rapidamente e sendo autorizada em seguida; a uma organização mais flexível e mais integrada das diversas funções » (Houben e Ingham, 1996, p. 9). Um dos autores que fez uma comparação entre as empresas norte-americanas e japonesas nos anos 1970-80, analisando suas diferentes inovações organizacionais foi Aoki que estabeleceu as diferenças entre a firma A (Americana) e J (Japonesa)26. Para o autor, as principais diferenças entre elas são as seguintes. « No primeiro caso, a eficácia é buscada através de uma alta especialização e de uma estrita definição das tarefas, enquanto que no segundo caso se insiste sobre a capacidade dos operários em equipe para fazer face eles 25 Taiichi Ohno (1990), L’esprit Toyota, Paris, Masson. Para comentários a este texto e outras experiências de como o toyotismo estava sendo aplicado no Japão no final dos anos 1980, ver Benjamin Coriat (1991), Penser à l’envers, Paris, Christian Bourgois Editeur. 36 mesmos às urgências que se lhes apresentam, capacidade que desenvolve a formação in-loco e a coletivização dos conhecimentos. Na primeira, a função de fabricação é separada da busca de soluções e da prevenção de acidentes, enquanto que na segunda as duas funções tendem a ser integradas » (Aoki, 1991, p. 17). A partir do Japão o toyotismo expandiu-se para a maioria dos países europeus e de outros continentes. Do setor automobilístico, onde se desenvolveu, passou para os demais setores da economia e atualmente envolve grande parte das empresas que buscam sobreviver e competir no contexto da globalização da economia. No que se refere a nosso trabalho, buscaremos ver como as empresas avícolas implantaram o fordismo neste setor industrial e como, a partir dos anos 1990, iniciaram a implantação de outras inovações organizacionais e tecnológicas, aproximando-se dos princípios toyotistas. 5. Contribuição chandleriana à história das empresas É entretanto em Chandler, historiador econômico norte-americano, que vamos encontrar as principais referências teóricas para a realização desta pesquisa. Uma nova concepção de empresa Uma das preocupações de Chandler é mostrar a passagem da empresa tradicional e familiar à empresa moderna e multidivisional. Para isto o autor fez um longo estudo da produção e comercialização tradicional e familiar, levantando as suas principais características de produção e distribuição de mercadorias, que são: a) Ela formava uma só unidade; b) Nesta empresa, um ou vários proprietários dirigiam uma loja, uma fábrica, um banco ou um serviço de transporte à partir de um único escritório; c) Em geral este tipo de empresa só executava uma função econômica, para uma única categoria de produtos e numa determinada região geográfica; d) Antes do desenvolvimento da empresa moderna, as atividades de cada uma destas pequenas empresas cuja gestão e propriedade eram individuais, eram coordenadas e reguladas pelos mecanismos de preço e de mercado (Chandler, 1988, p. 3). 26 Masahiko Aoki (1991), Economie Japonaise. Information, motivations et marchandage, Paris, Economica ; (1990), « Towards an economic model of the Japanese Firm », in : Journal of economic literature, American Economic Association, mars 1990. 37 A passagem entre uma e outra forma de produção e distribuição deu-se aos poucos e progressivamente. Foram necessários inúmeros avanços tecnológicos e muitas reorganizações na forma de trabalhar para que os industriais colocassem em prática a produção em escala e inovassem na sua distribuição, criando novos meios de transporte e de conservação das mercadorias, assim como instaurando redes próprias de distribuição. Ao analisar a empresa industrial, que substituiu a tradicional e familiar, Chandler a define como « toda grande empresa privada (cujo objetivo é o lucro) que intervém, pelo menos parcialmente, em toda a cadeia de operações industriais para produzir uma mercadoria, desde o aprovisionamento em matérias-primas, até a venda dos produtos finais » (Chandler, 1972, p. 35). Aprofundando e explicitando melhor sua definição, o autor diz que na empresa industrial moderna, « cada unidade - uma fábrica, um escritório de compra ou de venda ou um laboratório de pesquisa - dispõe de sua própria organização administrativa, de seus próprios dirigentes, de sua própria direção executiva, de sua própria contabilidade assim como de seus recursos próprios (suas instalações físicas e seu pessoal) para realizar uma função específica no processo de produção ou de distribuição de um determinado produto numa região geográfica específica. Cada unidade - cada fábrica, escritório de compra ou de venda, laboratório de pesquisa - poderia teoricamente agir como uma empresa econômica independente ». Na empresa moderna de multiunidades, as atividades dos dirigentes destas unidades (os dirigentes que estão situados nos escalões inferiores da hierarquia) são supervisionadas e coordenadas pelos dirigentes de nível intermediário da linha hierárquica. Estes últimos, por sua vez, são eles próprios supervisionados e coordenados ou pelo responsável de mais alto nível com dedicação exclusiva para esta função, ou por uma equipe de tais responsáveis, que planejam e repartem os recursos para as diferentes unidades operacionais e para a empresa no seu conjunto. As decisões dos dirigentes de mais alto nível devem normalmente ser ratificadas por um conselho de administração legalmente definido como o representante dos proprietários » (1992, I, p. 40)27. 27 O texto de Alfred D. Chandler Jr., (1990), Scale and Scop. The Dynamics of Industrial Capitalism, The Belknop press of Harvard University Press, Cambridge, Massachussetts, London, England, foi traduzido para o francês em 1992 e 1993, sob o título Organisation et performance des entreprises e, foi dividido em três volumes. Volume 1, (1992), Organisation et performance des entreprises. Les USA (1880-1948). Volume 2 (1993), Organisation et performance des entreprises. La Grande-Bretagne (1880-1948). Volume 3 (1993), Organisation et performance des entreprises. L’Allemagne (1880-1939). Daqui para frente, ao nos referirmos a tais textos, utilizaremos o volume da tradução francesa, acompanhado da sua data de publicação e do volume correspondente. 38 Para mostrar a evolução das empresas familiares e tradicionais em direção à empresa moderna e multidivisional, Chandler elaborou uma série de figuras, representando as principais atividades e lugar que ocupam os dirigentes superiores, intermediários e inferiores. Reproduzimos abaixo, uma destas figuras, que nos ajudam a compreender visualmente como estava estruturada a empresa industrial moderna norte-americana. 39 Organograma 1 - Empresa multifuncional à multiunidades Fonte: Chandler (1992, I, p. 41). 40 Depois de ter feito seu último grande estudo, onde comparou a história das 200 maiores empresas norte-americanas, inglesas e alemães, Chandler definiu a empresa industrial moderna como « uma coleção de unidades operacionais, cada uma dispondo de suas próprias instalações e de seu próprio pessoal, cujos recursos e atividades são coordenados, supervisados e repartidos de forma específica através da hierarquia dos dirigentes. É a existência desta hierarquia que faz com que as atividades e as operações da empresa concebida na sua globalidade representem mais que a soma de suas unidades operacionais » (1992, I, p. 42). Chandler se pergunta ainda porque as empresas modernas crescem construindo novas unidades ou atuando em diferentes zonas geográficas e ampliam suas gamas de produtos. Uma das respostas a estas perguntas encontradas pelo autor é que a empresa torna-se multifuncional, multiregional e multiprodutos porque a adição de novas unidades lhe permite manter uma taxa de rentabilidade a longo prazo sobre importantes investimentos feitos para abaixar os custos globais de produção e de distribuição. Além disso, pode fornecer produtos adaptados à demanda e transferir suas instalações e suas qualificações para mercados mais rentáveis assim que a taxa de rentabilidade tende a diminuir pelo fato das mudanças intervenientes no nível das tecnologias ou da demanda dos clientes. 41 Integração vertical na produção industrial Um dos conceitos utilizados por Chandler é o processo de integração vertical que consiste na organização da produção, dominada por determinadas empresas, que vai desde a pesquisa básica, passando pelo aprovisionamento da matéria-prima, a industrialização e a comercialização dos produtos finais. A integração vertical tornou-se possível e vantajosa quando as primeiras « empresas modernas », foram obrigadas a assumir todas estas etapas porque algumas delas já não eram preenchidas pelos atores tradicionais de cada setor. Isto foi necessário sobretudo na pesquisa básica, na aquisição e controle das matérias-primas e na comercialização das mercadorias. O que motivou a formação do processo de integração vertical foi a necessidade de assegurar o aprovisionamento constante de matérias-primas, que garantiam a manutenção das vantagens provenientes da redução dos custos, da economia de escala e de diversificação. Ela permitia a segurança contra um aumento brutal dos custos resultando das flutuações da produção e até mesmo do encerramento das atividades de determinados fornecedores. A integração vertical reduzia os altos custos de estocagem e de transporte, assim como diminuía o risco de ver os fornecedores serem incapazes de garantir os engajamentos de entrega previstos em contrato (Chandler, 1992, I). Nem todos os ramos industriais fizeram uma integração vertical completa, devido às grandes diferenças entre as atividades empresariais. Havia setores onde era vantajoso, por exemplo, aplicar em pesquisa básica28 e na produção própria de matéria-prima29, enquanto em outros, era mais barato e fácil comprar os « brevets » do que investir no desenvolvimento, tanto de novas tecnologias como de novos processos produtivos. Neste caso, as empresas investiam nas etapas de produção onde os problemas eram maiores. Analisando o exemplo da Swift pode-se ter uma noção do que aconteceu num dos ramos agroalimentares. O desenvolvimento da empresa de Gustavo Swift representa um bom exemplo de integração vertical pela criação de um serviço comercial. Em 1878 ele associou28 Chandler, ao escrever a história da « Du Pont », nos fornece um bom exemplo de empresa que investiu em pesquisa básica para desenvolver novos produtos e entrar em novos setores. O fato de criar e lançar produtos até então inexistentes no mercado lhe dava uma ampla vantagem sobre seus concorrentes e trazia enormes lucros, que compensavam todos os investimentos feitos pelo departamento de pesquisa e de novos produtos (para maiores detalhes, ver Chandler, 1972, pp. 93-170). 29 A mesma empresa Du Pont, para garantir seu fornecimento de matéria-prima, comprou em 1906, usinas de nitrato no Chile (Chandler, 1972, pp. 103-104). Outro exemplo de implantação de integração vertical é dado por Henry Ford, quando descreve as diversas peças necessárias na fabricação de um veículo. Ele mostra, em detalhes, como ficava mais barato produzir em usinas próprias que comprar de terceiros. Além disso, a Ford chegou a comprar grandes áreas de pinheiros onde se aprovisionava de matéria prima em madeira, como construiu usinas hidrelétricas visando sua autosificiência no setor (Ford, 1925, sobretudo pp. 171-175). 42 se com seu irmão Edwin para vender a carne fresca do Oeste nas cidades do Leste americano. Swift trabalhou durante dez anos para realizar seu projeto de criar uma organização de venda e distribuição em escala nacional. Cada sucursal dirigia o conjunto das atividades comerciais para uma região. Em 1890 Swift tinha constituído cinco empresas de condicionamento de carne e, na mesma época, ele sistematizou a compra do gado e estendeu sua rede comercial ao estrangeiro, além de cobrir todo território americano. Antes do fim do século, Swift tinha fundado um imenso império industrial de integração vertical30 (Chandler, 1972 e 1988). Neste caso, as indústrias não implantaram uma integração vertical completa, restringindo-se àquelas etapas do processo que lhes permitiam dominar o setor e serem eficientes. Não chegaram a montar subsidiárias próprias no setor agropecuário, para produzir bovinos, nem mesmo investiram em pesquisa genética para melhorar as raças e aperfeiçoar a matéria-prima, pois a produção bovina era bem conduzida pelos fazendeiros, ficando mais barato comprar o gado pronto para o abate. Postura semelhante foi adotada pelas empresas avícolas brasileiras que deixaram algumas das etapas da integração vertical para outros atores econômicos, como veremos ao longo da tese. Economia de escala, de diversificação e de transação Outro conceito importante para compreender a produção e distribuição de mercadorias é o de economia de escala, de diversificação e de transação, desenvolvido utilizado por Chandler na sua história empresarial. Segundo o autor, a empresa industrial moderna não pode continuar crescendo a longo prazo se ela não fizer investimentos na produção e em novas unidades produtivas que lhes permitam: a) Redução de custos. A redução dos custos e a utilização eficaz dos recursos é o resultado da utilização das economias de escala ao nível da produção e da distribuição. A exploração destas últimas decorre da aplicação dos meios de produção e de distribuição au ainda da redução dos custos de transação. 30 As outras grandes empresas de carne logo seguiram seu exemplo. Para continuarem competitivas, Armour, Morris, Cudahy, Schwarzschild & Sulzberger adotaram a mesma estrutura integrada. As empresas que não seguiram o exemplo da Swift foram relegadas ao comércio local. Assim, por volta de 1895, com o desenvolvimento das empresas integradas verticalmente, o mercado de embalagem da carne tornou-se oligopolizado. Ele estava quase inteiramente dividido entre as « cinco grandes » que tinham constituído suas unidades operacionais, seus departamentos de compra de bovinos e venda de carne e tinham instituído uma direção central (Chandler, 1988, pp. 333-335). 43 As economias de escala podem ser definidas como « as economias realizadas no momento em que o tamanho de uma unidade operacional cresce produzindo ou distribuindo um só tipo de produto e cujo resultado é a diminuição do custo de produção ou de distribuição de cada produto » (1992, I, p. 43). As economias de diversificação que resultam da aplicação dos meios de produção e de distribuição, são provenientes da utilização de diversos processos no interior de uma única unidade operacional, produzindo ou distribuindo mais de um produto. Os custos de transação são os custos de transferência de bens e de serviços de uma unidade operacional a uma outra. Quando estas transações são realizadas entre empresas ou indivíduos diferentes, elas implicam geralmente uma transferência de propriedade e são definidas em termos contratuais. Quando ao contrário, elas são realizadas dentro do quadro de uma mesma empresa, são definidas por procedimentos contábeis. Os custos de tais transações podem ser reduzidos por um processo de trocas mais eficaz de bens e de serviços entre as unidades operacionais. As economias de escala e aquelas realizadas pela diversificação são especificamente ligadas a uma utilização mais eficaz das instalações e das competências do pessoal no interior destas unidades. As economias realizadas sobre os custos de transação são estreitamente ligadas às economias realizadas graças ao tamanho da empresa (economia de escala) e à diversificação (economia de diversificação). As economias de escala e as economias de diversificação permitem a uma unidade o crescimento de sua produção de bens e de serviços, o que aumenta por sua vez, proporcionalmente, o número de transações comerciais regulares e de relações contratuais que a empresa deve realizar com outras unidades operacionais. A evolução das economias de escala e de diversificação, resultam da utilização mais ou menos importante de diferentes tecnologias de produção e de distribuição e igualmente das diferenças de tamanho e de localização dos mercados (1992, I, p. 44). b) Aumentar a eficiência de suas funções no setor da comercialização e das compras. c) Melhorar seus produtos existentes e seus processos de fabricação. d) Desenvolver novos produtos. e) Repartir os recursos para responder aos desafios e às oportunidades oferecidas pelos mercados e pelas tecnologias constantemente melhoradas. 44 Produção em escala, diversificação e rede própria de distribuição Uma das características centrais dos estudos de Chandler é de estudar não só a firma enquanto lugar de produção, mas de analisar também como é feita a distribuição dos produtos. Primeiro ele estuda como era feito o comércio antes da indústria moderna, isto é, uma venda em pequenos volumes e para o mercado local. Antes da introdução das inovações no setor de transporte e de comunicações (ocorridas, nos EUA, entre 1850 e 1880), « os fabricantes não tinham a possibilidade de vender diretamente seus produtos além de seu lugar de implantação » (1992, I, p. 104). Para entender a evolução na distribuição de massa, o autor estudou os « grands magasins » e as estruturas próprias de comercialização assumidas por determinadas empresas de certos setores. No processo de distribuição de massa, as empresas assumiam o compromisso de fazer a distribuição de produtos provenientes de vários fabricantes e com isto conseguiam realizar um grande volume de negócios e a um custo unitário mais baixo do que nenhum fabricante conseguiria obter no domínio da comercialização e distribuição para um número restrito de mercadorias (economia de escala). Além disto, estes mesmos comerciantes, multiplicaram sua vantagem estendendo suas operações a um número maior e mais diversificado de itens, isto é, distribuindo uma grande quantidade de produtos semelhantes à partir de um único conjunto de instalações (economia de diversificação). Esta adição dos princípios de economia de escala e de diversificação foi utilizada por um novo tipo de comerciante: os « grands magasins », assim como as empresas de venda por correspondência e as cadeias com múltiplas sucursais (1992, I, p. 60). Este novo tipo de comerciantes surgiu nos EUA assim que as estradas de ferro, o telégrafo e o barco a vapor tornaram possível uma nova organização regular dos transportes em grandes quantidades e em menor espaço de tempo, ou seja, quando a infra estrutura para tal transporte existia e funcionava. Uma vez que determinadas firmas conseguiram pôr em prática um sistema de produção de escala e de diversificação que produzia uma quantidade e diversidade de mercadorias cuja distribuição não era mais feita de maneira eficiente pelos tradicionais comerciantes, elas próprias montaram suas redes de distribuição. Os fabricantes tinham necessidade de uma rede própria de vendas para se consagrar a um marketing agressivo; à busca de novos clientes; às entregas dentro dos prazos previstos; organizando serviços especiais para uma gama de produtos especiais, como é o caso de instalações especializadas para produtos refrigerados, por exemplo; de serviços de pós-venda; de crédito a determinados 45 compradores e assim por diante. Uma eficiente rede de distribuição tornava-se um instrumento indispensável à obtenção e à conservação de uma parte do mercado suficientemente importante para assegurar as vantagens dos custos provenientes da instalação de suas filiais comerciais. Além disso, tal forma de vendas fornecia um fluxo permanente de informações sobre os mercados, assim como das necessidades e dos gostos dos consumidores. Chandler resume bem este pensamento, quando afirma que « na medida em que a produção das empresas aumentava e que as instalações e os serviços específicos para a distribuição de massa desta produção limitava a capacidade dos intermediários a explorar as economias de diversificação, os grandes líderes das novas indústrias altamente capitalistas decidiram investir em instalações consagradas a seus próprios produtos, assim como a recrutar e formar o pessoal destinado aos serviços especializados de marketing » (1992, I, p. 64). Estrutura da empresa Analisando as diferenças entre a empresa tradicional e familiar com a moderna, Chandler caracteriza a familiar como sendo aquela formada por uma estrutura simples, onde o proprietário era também o administrador, o comprador, o dirigente e o encarregado das vendas. Normalmente esta empresa só produzia uma mercadoria, para um mercado local e sua existência era tão longa quanto o tempo de vida de seu fundador. Na medida em que avançaram suas pesquisas da empresa moderna, Chandler deu-se conta que a principal evolução foi a passagem de uma estrutura centralizada e organizada em departamentos funcionais para uma estrutura multidivisional, contendo uma direção central e um certo número de divisões especializadas cada uma num produto ou numa área geográfica (Chandler, 1972). Para o autor, o que levou à passagem para esta nova estrutura foi o excesso de trabalho da direção central, que acumulava tanto as tarefas diárias de acompanhar a produção como a de tomada de decisões mais importantes e à longo prazo. Entretanto a necessidade de mudança não vinha do crescimento e do tamanho da empresa. Ela estava mais ligada à diversidade e à compexidade crescente das decisões que os dirigentes tinham que tomar. Esta mudança acontecia, normalmente, quando a empresa começava a exercer atividades em diversas regiões geográficas e em vários produtos conexos. Tanto a dispersão geográfica como a diversidade de produtos levaram as empresas a repensar sua estrutura. O aumento do volume de produção levou à criação de uma direção administrativa responsável de uma atividade dentro de uma determinada região. A dispersão 46 geográfica exigiu a criação de uma direção departamental encarregada de supervisionar diversas unidades operacionais. O fato de se lançar em novas atividades exigiu a criação de uma direção central e de uma organização multidepartamental. O desenvolvimento de novos produtos ou uma expansão progressiva sobre o plano nacional ou internacional levaram à formação de uma organização multidivisional tendo em seu topo uma direção geral (1972, p. 43). « O sucesso da divisão multifuncional é devido sobretudo ao fato de ter liberado da rotina da produção os responsáveis pelo destino da empresa, concedendo-lhes assim o tempo, as informações e o « espírito » necessário para o planejamento a longo prazo. Reciprocamente, tal forma de organização deixou aos encarregados das divisões multifuncionais uma autoridade suficiente e a gestão da produção quotidiana » (1972, p. 425). First movers e challengers Diversas vezes Chandler insiste sobre a concepção e o papel dos first movers31e dos challengers em sua análise das empresas, sobretudo no seu estudo das duzentas maiores empresas norte-americanas, inglesas e alemães32. Para o autor, a empresa industrial moderna nasceu de empreendedores que investiram em unidades de produção cujo tamanho era suficientemente grande para explorar as economias de escala e de diversificação. Além disso, investiram em instalações especializadas para distribuir determinados produtos particulares, assim como na pesquisa de tecnologias de ponta e, em dirigentes capacitados para assegurar a coordenação de todas estas atividades. Os primeiros investidores que seguiram este processo, adquiriram vantagens enormes sobre seus concorrentes. Isto é particularmente verdadeiro para as empresas que produziram novas mercadorias ou produtos fortemente melhorados e fabricados por processos de produção recentes. A este tipo de empreendedores, o autor chama de first movers. Para competir com os first movers, seus rivais tinham que fazer os mesmos investimentos para conseguir aproveitar das economias de escala e de diversificação. Precisavam também investir em uma estrutura de distribuição e, em muitos casos, em 31 O termo first mover foi conservado no texto. First move representa as noções de primeiro passo, da primeira decisão ou do primeiro gesto. First mover seria portanto, aquele que toma pela primeira vez uma decisão e que a coloca em prática ele próprio. Move representa a idéia da passagem de um estado a um outro. Por isto, é difícil de encontrar um único termo em português que reagrupe todos estes significados sendo que talvez a palavra que mais se aproxima destes singificados seria pioneiro. 32 As idéias que seguem sobre os first movers e os challengers foram extraídas de Chandler (1992, I, sobretudo pp. 70-74). 47 pesquisa básica. Outro complicador era que, sobretudo no início, tais instalações produziam uma quantidade de mercadorias que ultrapassava as necessidades do mercado, o que os levava a ter que buscar novos consumidores fora da área de alcance dos primeiros empreendedores. Outra dificuldade era que os challengers deviam conhecer as características e o funcionamento de tecnologias novas ou altamente melhoradas. Quando sua força de vendas estava ainda na etapa de implantação, recrutamento e formação dos dirigentes, os first movers já tinham resolvido seus principais problemas tanto de produção como de vendas. Eles sabiam de que forma responder às necessidades particulares dos consumidores e lhes fazer demonstrações de produtos, oferecer-lhes facilidades de pagamento, tinham instalações específicas e serviços de pós-venda instalados. No que diz respeito aos produtos embalados e vendidos sob marca, onde a publicidade era uma arma importante na concorrência, os first movers já tinham investido uma grande parte de seus enormes lucros provenientes graças à produção em escala e à publicidade já feita. Entretanto, as vantagens dos first movers eram ainda maiores. Eles tinham, além das economias de escala e de diversificação consolidadas, uma séria vantagem no desenvolvimento de capacidades em todas as atividades, de produção, compra, distribuição, pesquisa, finanças e management geral. Estes first movers eram capazes de implementar novas formas de produção e de redução de custos antes mesmo que os challengers entrassem em operação plenamente. Estas vantagens dinâmicas faziam com que muitas vezes os first movers matassem ainda no ovo a concorrência dos challengers, antes que estes tivessem feito os três investimentos básicos para se tornarem concorrentes sérios. Estas vantagens podiam (e foram muitas vezes) ser usadas de forma cruel, implacável. O autor define, a partir destas considerações, as duas categorias de concorrentes. Para ele, os first movers « foram os pioneiros, os empreendedores que efetuaram os três conjuntos de investimentos interativos dentro do quadro da produção, da distribuição e dos dirigentes necessários para conseguir as vantagens competitivas resultantes seja do tamanho da empresa, seja de sua diversificação, seja ainda das duas em função da novidade ou da melhoria dos produtos e dos processos de fabricação ». Os challengers « foram os recém chegados destas novas indústrias e que, apesar dos first movers, efetuaram o mesmo triple investimento e desenvolveram as mesmas qualificações necessárias para obter as mesmas capacidades concorrenciais » (1992, I, p. 72). 48 No que se refere ao surgimento de challengers, eles apareceram sobretudo quando aconteceram rápidas mudanças demográficas, com aumento da população ou fortes êxodos rurais, que mudaram e/ou aumentaram significativamente a capacidade de consumo. Também deve-se destacar o surgimento de tais empresas no caso de grandes transformações tecnológicas no processo de produção, que lançaram novos produtos, substituindo ou reduzindo a importância de antigos mercados. A concorrência entre os first movers e challengers dava-se evidentemente através dos preços, entretanto, contavam mais a eficácia organizacional e a estratégia de longo prazo de cada empresa. Isto é, o fato de ser mais eficaz na produção e distribuição, melhorando tanto os produtos como os processos de fabricação se apoiando em bem estruturadas equipes de pesquisa, estabelecendo fontes de aprovisionamento em matérias-primas mais adaptadas, se dotando de serviços de marketing mais performantes, lançando produtos diferenciados e, enfim, entrando rapidamente em novos mercados, sabendo abandonar no tempo certo os que entravam em declínio. Tanto a concorrência pelo mercado como a disputa entre first movers e challengers levou a um aprimoramento dos dirigentes intermediários, responsáveis pela produção. Além disso, exigiu uma melhor performance dos diretores gerais, responsáveis pela coordenação, planejamento estratégico e divisão de recursos. A capacidade de direção estratégica e a dos responsáveis pela produção diária podem ser consideradas como a competência da empresa em relação às demais. Seus diretores, ao longo da história da empresa, lhes desenvolvem características próprias que as distinguem e marcam claramente a competência e a competitividade de uma em relação à outra. A competência e a maneira de realizar todas as etapas do processo de produção de uma firma constitue-se num dos elementos mais importantes na disputa pela sobrevivência da empresa e pela conquista de novas fatias de mercado. Lugar e função dos managers na firma Chandler começa por caraterizar o tipo e as funções do dirigente da empresa tradicional e familiar. Dentro de uma pequena empresa, uma só pessoa ou um só grupo de pessoas pode se ocupar da compra das matérias-primas, da venda dos produtos finais e supervisionar a fabricação, além de coordenar, planificar e supervisionar estas diferentes operações. Ao contrário, dentro de uma grande empresa, o trabalho administrativo exige em geral um especialista a tempo integral (1972, p. 36). 49 A passagem da organização familiar e tradicional para a empresa multidivisional foi longa e exigiu várias idas e vindas até se implantar. Os dirigentes das principais empresas norte-americanas tiveram que criar novos métodos e modelos de administração, testá-los e inovar na sua implantação33. Aos poucos, durante o final do século XIX e início deste século, implantou-se uma nova forma de administração e surgiu uma nova categoria de dirigentes, com velhas e novas funções, aos quais Chandler chama de « managers ». A carreira destes novos managers da empresa moderna passou a ter uma característica cada vez mais técnica e especializada. Nas principais empresas modernas, o recrutamento e a promoção dos dirigentes fundou-se cada vez mais em sua formação, na experiência e no sucesso anteriores do que sobre as relações de família ou de riqueza. Outra característica básica é que o crescimento das empresas multidivisionais em tamanho e em diversidade e a profissionalização de seus managers fez com que houvesse uma separação entre a propriedade das empresas e sua gestão. Em geral, as empresas modernas exigiam um número de dirigentes com determinada qualificação que dificilmente a família fundadora ou seus associados podiam fornecer. Aos poucos, com a consolidação de tal tipo de empresas, os acionistas não tinham mais as condições técnicas, nem as informações necessárias para tomar as melhores decisões, que passaram a ser tomadas sempre mais pelos dirigentes a tempo integral. Seu papel foi ficando sempre mais restrito ao conselho de administração, onde ainda (por causa do número de ações) tinham o poder de vetar certas decisões. Nos estudos de Chandler, dentro de uma empresa moderna, os diretores exercem suas funções em quatro níveis diferentes. Cada um deste níveis tendo uma função e um grau de autoridade diferentes. Encontra-se no topo, uma direção geral, onde os dirigentes superiores coordenam, decidem e planejam os objetivos e as políticas da sociedade a longo prazo e repartem os recursos entre um certo número de divisões quase autônomas. Cada divisão é encarregada de um produto importante, ou representa a sociedade numa determinada região. Por sua vez, a direção de cada divisão gera um certo número de departamentos que têm, cada um a responsabilidade de uma das atividades da sociedade: 33 Schumpeter, ao analisar a importância e o papel dos « entrepreneurs » aproximava-se desta visão. « Nós chamamos de ‘empresa’ a execução de novas combinações (...) et empreendedores os agentes econômicos cuja função é de executar as novas combinações ». Como a inovação é um processo descontínuo, a qualidade de empreendedor no sentido schumpeteriano não está nunca definitivamente adquirida: « alguém não é, em princípio, empreendedor que à medida em que executa novas combinações; assim ele perde o caráter de empreendedor se ele continua explorando sua empresa conforme um circuito já criado (...). Ser empreendedor 50 fabricação, venda, compra ou produção de matérias-primas, engenharia, pesquisa, serviços financeiros, etc. Os chefes de departamentos coordenam, decidem e planejam, por sua vez, as atividades de um certo número de unidades operacionais. Em baixo da escala, cada unidade operacional dirige uma fábrica ou o serviço de vendas de um ramo ou de uma região, um serviço de compras, um laboratório de pesquisas ou de engenharia, um serviço financeiro ou outro (1972, p. 37). Estudando o caso da empresa Du Pont por volta de 1920, Chandler chega a duas conclusões importantes, sobre a responsabilidade individual e a autoridade não dividida de cada diretor em seu cargo. « Depois de definida uma unidade - por exemplo o departamento de vendas ou o de desenvolvimento de produtos - é confiada ao homem mais competente que, enquanto chefe deste departamento, é o responsável por seus resultados. Ele pode, dentro do quadro oficial de suas funções, determinar como bem entender, todos os detalhes de seu departamento, tendo como único inconveniente, a perspectiva de ser substiduído por algum outro, caso seu julgamento não seja o melhor. O mesmo princípio é seguido no caso dos diretores de sucursais, ou de diretores de fábricas, que são responsáveis pela condução dos negócios da companhia que lhes foram confiados, sendo unicamente obrigados a respeitar os princípios e os métodos fixados pela hierarquia superior » (1972, p. 117 e 163). Outro princípio importante que Chandler reteve ao estudar quatro das grandes empresas que primeiro implantaram a divisão multidepartamental foi o da diferença entre as responsabilidades individuais e as coletivas. Sempre que se tratava de responsabilidade direta da direção de uma usina ou departamento de pesquisa, a responsabilidade era individual. Sempre que se tratava de decidir os rumos da empresa a longo prazo, a responsabilidade era assumida por um pequeno grupo de diretores. O sucesso da estrutura multidivisional baseou-se no fato de haver liberado da rotina da produção os responsáveis pelo destino da empresa, oferecendo-lhes assim, o tempo, as informações e o « espírito » necessário para a planificação e a arbitragem a longo prazos. Reciprocamente, ela deixou aos chefes de divisões multifuncionais, uma autoridade suficiente e a responsabilidade necessárias para conduzir a gestão quotidiana (1972, p. 425). Outra conclusão a que chegou o autor foi a de que os organizadores das empresas e verdadeiros reformuladores e inovadores eram jovens e novos em seus postos de trabalho (1972, p. 438). não é uma profissão e nem, em regra geral, um estado duradouro ». Joseph A. Schumpeter (1935), La théorie de l’évolution économique, Paris, Dalloz, p. 86 e 112. 51 A hierarquia dos managers, uma vez formada e confirmada com sucesso na sua função de coordenação administrativa, tornou-se ela mesma uma fonte de premanência, de poder e de crescimento contínuo para a empresa. Os dirigentes profissionais, confrontados à necessidade de tomada de decisões administrativas, tinham a tendência de preferir as linhas de ação favorecendo a estabilidade e o crescimento a longo prazo de sua empresa, mais do que aquelas que pudessem trazer um máximo de benefícios a curto prazo. Para dirigentes assalariados, a continuidade da existência da empresa onde eles trabalhavam era um elemento fundamental para sua carreira profissional. As tarefas dos dirigentes intermediários eram uma novidade, pois eles estão na origem da coordenação administrativa moderna. Foram eles que, não só conceberam um jeito de coordenar os fluxos massivos de produtos passando do produtor de matérias-primas au consumidor final, mas que inventaram e aperfeiçoaram também os meios de aumentar os mercados e acelerar os processos de produção e de distribuição (1988, p. 454). Estas são as principais caraterísticas da teoria chandleriana da empresa que utilizaremos no decorrer deste trabalho. Embora o autor tenha desenvolvido o estudo de outros aspectos da produção industrial, estes nos parecem os mais adequados para a análise do processo histórico e econômico do setor agrícola brasileiro. Para escrever a história deste setor e analisar o desenvolvimento de suas principais empresas, a partir desta revisão bibliográfica e de nosso conhecimento anterior da agroindústria brasileira34, levantamos as seguintes hipóteses: 1. A integração vertical foi a principal mudança organizacional implantada pela avicultura industrial brasileira e significou tanto a sobrevivência como uma maior competitividade para as empresas que a implantaram e continuaram a desenvolvê-la. 2. Na integração vertical, uma das principais mudanças organizacionais introduzidas pelas empresas avícolas foi a implantação de suas próprias redes de distribuição, o que foi essencial para a disputa e ocupação do mercado nacional e para a sobrevivência das empresas. 34 Armando Dalla Costa e Valter Bianchini (1991), A integração e os avicultores no sul do Brasil, Caderno de estudos do DESER, n° 5, 29 p. ; Dalla Costa (1991), « A situação do complexo carnes no sul do Brasil », in: Anais do seminário Inovações tecnológicas e reestruturação do sistema alimentar, Curitiba, 24 a 26 de junho de 1991, pp. 202-214 ; Armando Dalla Costa, Claudino Veronese e Ivaldo Gehlen (coord.), (1992), Diagnóstico sócio-econômico da agricultura familiar do sudoeste do Paraná, Curitiba-Francisco Beltrão, Deser-Assesoar, 290 p. ; Dalla Costa (1993), O grupo Sadia e a produção integrada. O lugar do agricultor no complexo agroindustrial, dissertação de mestrado, UFPR, 254 p. 52 3. A produção fordista implantada na década de 70, através da economia de escala, fez com que houvesse uma sucessiva redução do preço do frango ao consumidor, principal fator do aumento de seu consumo. 4. O estado de São Paulo, tradicional produtor avícola, ainda mantém um grande número de empresas com SIF35, diferente dos estados do Sul, onde houve forte concentração industrial via aquisições. Portanto, o grupo que comprar mais empresas em São Paulo concentrará em suas mãos a produção nacional. 5. As empresas administradas por managers profissionais, onde existe uma completa separação entre os detentores de ações e o gerenciamento empresarial, tanto das decisões a longo prazo (estratégicas) como da direção diária da produção e distribuição, são mais competitivas e têm menos problemas de sucessão que as « empresas familiares ». 6. Relação entre história, economia industrial e empresas agroalimentares O conceito fundamental desenvolvido nesta tese será o de integração vertical, cuja aplicação pelas empresas avícolas do Sul do país foi feita em três momentos distintos. Primeiro foi a implantação da integração vertical pelas empresas líderes a partir de Santa Catarina, nas décadas de 60 e 70. Neste caso, a integração vertical foi posta em prática mais por « falhas de mercado » do que por motivos econômicos. Era praticamente impossível desenvolver uma avicultura industrial quase mil quilômetros longe de São Paulo, comprando pintos de um dia, ração de terceiros. Para superar estes problemas, as empresas implantaram seus próprios matrizeiros, incubatórios e fábricas de ração. Por outro lado, não havia na região, como em São Paulo e no Rio de Janeiro, produtores independentes, com tradição e experiência na produção avícola em larga escala. Para resolver o problema do fornecimento da matéria-prima, as empresas estabeleceram contratos de parceria avícola com pequenos agricultores (aspectos jurídicos) e implementaram, sob a coordenação da direção agropecuária 35 O Serviço de Inspeção Federal - SIF começou em 1915 como exigência dos países importadores de carne durante a Primeira Guerra. Sua estruturação aconteceu nos anos 20 com a criação da divisão de Carnes e Leite. A lei 1.253/50, promulgada em 1950, instituiu o Regulamento de Inspeção Industrial e Sanitária de Produtos de Origem Animal. A partir das décadas de 50 e 60 o Serviço de Inspeção Federal começou a se estruturar melhor, criando os setores de Inspeção de Pescado, Inspeção de Ovos e Inspeção de Produtos Agrícolas. Com a lei 7.889/89, a competência do controle sanitário desses produtos foi dividida em três níveis de responsabilidade. Ao governo federal (SIF) compete inspecionar os estabelecimentos industriais que praticam o comércio interestadual e internacional. Aos estados e municípios compete inspecionar os estabelecimentos que trabalham ou comercializam produtos de origem animal no âmbito de sua jurisdição (« SIF, um serviço que orgulha o Brasil », entrevista com Jessy Antunes Guimarães, diretor do Departamento de Produtos de Origem Animal, Brasília, 11 de agosto de 1995, publicada na revista Integração, órgão interno da FAF, São Paulo, n° 143, julho/agosto de 1995, pp. 8-11). 53 de cada grupo, o « fomento agropecuário » (aspectos operacionais). Além disso, instalaram os abatedouros, compraram frotas de caminhões frigoríficos (compraram ou alugaram aviões), assim como montaram uma rede própria de comercialização para fazer chegar os produtos até os pontos de venda. Num segundo momento, à partir dos anos 80, com o desenvolvimento do volume de produção, várias etapas da integração vertical mostraram-se vantajosas para as empresas por causa da economia de escala. Por isso, fabricar rações tornou-se mais interessante economicamente do que comprar de terceiros. Outro fator importante, neste caso, é a integração vertical das empresas líderes também no setor de soja e milho, fazendo tanto a compra como o esmagamento, produção de farelo, óleo bruto, óleo refinado e margarinas. As etapas da integração onde não era possível ter os ganhos de economia de escala e de diversificação foram terceirizadas. É o caso sobretudo dos setores de transportes, de manutenção empresarial e de outros não ligados diretamente à produção e distribuição de alimentos. A partir dos anos 90 a integração vertical começa a perder importância, sendo substituída por novas formas de articulação entre as firmas, o que exige também novos conceitos, como o de « economia de rede » e de « empresas-rede ». Utilizaremos aqui a definição de empresa-rede de Raul Green e Roseli Rocha dos Santos, que a definem como « la structure organisationnelle synergique qui articule d’une manière contractuelle, à moyen terme, des rapports inter-entreprises, afin de répondre en forme conjointe, solidaire et flexible, sous la direction d’une entreprise donneuse d’ordres, à une demande finale ou intermédiaire volatile, dans un espace économique de rapports productifs de biens et services »36. Pensando nos custos de transação, a questão fundamental que se colocava era a seguinte: o que é mais barato, produzir ou comprar? Com a passagem da análise das cadeias produtivas para as empresas-redes, a pergunta passa a ser: como responder com mais eficácia à demanda? Desta forma, passa-se da empresa e da administração de seus custos ao conjunto dos custos dos diferentes atores integrados na operação produtiva, onde a propriedade do capital não é o único determinante. Com isto produz-se uma evolução de um sistema de forte concorrência das relações inter-empresariais para um sistema de solidariedade produtiva. A partir desta reflexão que envolve um conjunto de empresas cujo objetivo é permitir uma melhor relação entre si para aperfeiçoar as transações, diminuindo os custos e 36 Raúl H. Green e Roseli Rocha dos Santos, « Economie de réseau et chaîne agro-alimentarie », in: Green et Rocha dos Sanots (Org.), (1993), Brésil, un système agro-alimentaire en transition, Edition de l’Institut des Hatues Etudes de l’Amérique Latine, Paris, pp. 11-41. 54 aumentando a competitividade, os mesmos autores chegam à definição de economia-rede. Para eles, « l’économie-réseau peut être définie en tant qu’espace productif où prédomine la concurrence entre des ensembles d’entreprises liés par contrat » (Green e Rocha dos Santos, 1993, p. 23). Portanto, na análise que faremos da avicultura, sobretudo a partir dos anos 90, o conceito de empresa-rede e de economia-rede passa, aos poucos, a substituir e/ou complementar o conceito de integração vertical. Enquanto esta última baseava-se sobretudo na lógica fordista, centrada sobre a busca de economias de escala a partir dos meios de produção, a lógica do pós-fordismo ou toyotismo está centrada na resposta rápida, múltipla e adaptada a uma demanda heterogênea e flutuante, sobretudo para atender novos consumidores urbanos. Isto torna-se mais claro com a implantação dos programas de qualidade total a partir das maiores empresas do setor, sobretudo baseados na teoria toyotista e assessoradas por consultores japoneses. Ressaltamos que algumas das etapas do processo produtivo, nunca foram assumidas pelas empresas porque não valia a pena, economicamente, investir em determinados setores. Apesar de toda a discussão havida, sobretudo nos anos 70 e 80 da « segurança alimentar », nem o governo brasileiro, nem as empresas privadas investiram em genética e na produção de vacinas e medicamentos avícolas. Quando implantou-se a avicultura industrial, já havia « pacotes tecnológicos » prontos e à venda no mercado. As empresas importaram as « avós »37, recebendo junto as orientações técnicas necessárias à produção. No que se refere às vacinas e medicamentos necessários para uma produção « fora do sol » e em larga escala, também adquiriram de outras empresas, normalmente multinacionais, cujos produtos já estavam desenvolvidos e disponíveis no mercado. Buscaremos demonstrar também que uma das inovações organizacionais mais importantes, também copiada dos Estados Unidos, foi o fato de delegar a pequenos agricultores a criação e engorda dos frangos. Para investir nesta etapa da produção as empresas deveriam fazer altos investimentos38, o processo é relativamente simples, podendo 37 O material genético importado, denominado « avós », constitui uma geração posterior às « bisavós », que guardam o segredo dos diversos cruzamentos genéticos realizados pelas empresas que investem nesse tipo de pesquisa. As avós importadas geram as matrizes que, por sua vez geram os pintos de corte que serão criados pelos agricultores integrados. 38 O diretor de produção agropecuária da Sadia, explicou porque a empresa não cria ela mesma os frangos. Disse que existe uma demanda de produtores para construir aviários e se dedicam ao cuidado dos frangos com mão-deobra familiar, o que permite um trabalho mais caprichado e uma melhor produtividade. Além disso, é mais fácil administrar esta mão-de-obra do que a de trabalhadores contratados. Por fim, a empresa não precisa investir capital para adquirir propriedades, construir e equipar os aviários. Hoje, um aviário padrão de 1.200 metros quadrados custa cerca de US$ 26.500,00 (entrevista com o diretor de Fomento Agropecuário da Sadia Concórdia S.A., Concórdia, SC, 8 de junho de 1992). Podemos ter uma comparação do quanto custa aos avicultores 55 ser realizados pelos colonos, garantindo a matéria prima na qualidade, quantidade e no momento exigidos para o desenvolvimento das empresas. Além disso, os contratos de parceria avícola permitiram uma melhor adaptação para atender grandes e bruscas demandas (exportações, em 1975; amumento da demanda nos Plano Cruzado, em 1986 e Plano Real, em 1994), o que dá uma vantagem significativa às empresa integradas verticalmente em relação às demais que devem suprir-se de matéria-prima comprando-a pelas « leis de mercado ». Depois da integração vertical, outra inovação de capital importância foi a montagem de uma rede própria de filiais comerciais. Mostraremos como, para substituir com vantagens os antigos consignatários tais empresas montaram uma rede de distribuição que, tendo São Paulo como centro, atingiu todo território nacional. No caso da comercialização, utilizaremos uma parte da análise de Chandler, justamente aquela onde o autor explica o porquê da entrada das empresas produtoras na comercialização de seus produtos. Não entraremos nos detalhes das mudanças tecnológicas e organizacionais colocadas em prática tanto pelos « grossistes » como pelos « grands magasins », porque na verdade, as redes de distribuição colocadas em prática pelas empresas foram feitas para levar seus produtos até os pontos de venda e não diretamente ao consumidor. Os conceitos de economia de escala e de diversificação serão fundamentais para explicar a diminuição constante no preço final do frango. Veremos como as empresas implantaram a economia de escala buscando o tamanho ideal para os abatedouros, que varia de um grupo para outro. Além disso, a diversificação de produtos instiga a disputa das empresas por fatias de mercado e leva-as a atender as novas exigências dos consumidores. Quanto aos termos first movers e challengers empregados por Chandler na explicação das empresas « pioneiras » e « seguidoras » modernas nos Estados Unidos, são de difícil aplicação no setor avícola brasileiro. Preferimos tipificá-las em « pioneiras » ou « líderes », empresas « imitadoras » e pequenas empresas, por duas razões. Primeiro porque não houve oligopolização neste setor, como foi o caso das grandes indústrias norte-americanas (ver construir e equipar seus aviários analisando a compra do abatedouro de frangos da Chapecó, de Francisco Beltrão-PR, em 1991. Nesta ocasião, a Sadia comprou um abatedouro de frangos, duas granjas de matrizes e uma fábrica de rações pertencentes à Chapecó Avícola S.A., pagando o equivalente a US$ 14 milhões (Jornal Gazeta Mercantil, São Paulo, 11 de janeiro de 1991, p. 17). Para produzir os frangos que servem de matéria-prima ao abatedouro havia, na época, 559 avicultores integrados. Se multiplicarmos o valor de cada aviário equipado pelo número de avicultores, veremos que estes investiram um total de US$ 14.813.500,00. Isto significa que o capital investido por estes últimos foi maior que o da empresa, na compra do frigorífico. Este raciocínio é também corroborado por outros autores, quando afirmam que « segundo os cálculos, para que as empresas integradoras 56 exemplo do oligopólio de carnes em Chandler, 1988, pp. 333-335). Segundo, porque mesmo as líderes não foram propriamente « first movers », limitando-se a « copiar » um sistema de produção que já estava funcionando. Além disso, não investiram em pesquisa de base para desenvolver novos produtos e nem compraram os « brevets ». O que fizeram foi adquirir os « pacotes tecnológicos » genéticos e veterinários, que já vinham com assistência técnica pósvenda e implementaram a produção. As empresas líderes - Sadia e Perdigão - foram as que melhor e primeiro implantaram as principais etapas do processo de integração vertical. Neste sentido, fizeram, de certa forma, o papel de first movers na avicultura nacional. Por sua vez a Ceval (outra das atuais líderes), teria feito o papel de challenger ao fazer os mesmos investimentos que as duas principais concorrentes. Entretanto, como o papel das pequenas e micro-empresas é muito importante (em 1995 as pequnas39 e micro-empresas foram responsáveis por 54,45% da produção nacional) e não houve oligopolização, as tipificaremos de « líderes, imitadoras, pequenas empresas ». Nosso estudo está centrado sobretudo nas « líderes e imitadoras », por serem as mais importantes, por dispormos de mais material e porque são as que dão a direção e inovam no setor avícola. Entretanto, mereceriam um estudo mais aprofundado, por deterem cerca da metade do mercado nacional (o segundo maior do mundo), as pequenas empresas que têm características próprias e estão em situações muito distintas. Umas à beira da falência e outras galgando passos para disputarem o mercado com as líderes e « imitadoras ». O fato de terem implantado a integração vertical não garantiu a sobrevivência de todas as empresas. Umas foram adiante, enquanto outras foram compradas pelas concorrentes. Nós buscamos entender o desenvolvimento da avicultura a partir das « sobreviventes » e das maiores do setor, indo do presente em direção ao passado e buscando entender o porquê umas sobreviveram e outras não. Em nossa análise passamos diversas vezes da macro para a micro-economia. Recorremos à análise macro para explicar a avicultura a nível nacional, a participação de cada região ou das principais empresas. Recorremos à micro-economia para buscar detalhes que explicassem a redução de custos de produção, baseada em pequenas e micro mudanças tecnológicas e organizacionais ao longo de toda a filière. produzissem elas próprias toda a matéria-prima (frango), seria necessária uma imobilização de capital para investimentos em terras e instalações superior ao total do capital social das empresas » (Sorj et alii, 1982, p. 65). 39 Consideramos como pequenas as empresas que detinham, em 1995, segundo levantamento da ANAB Associação Nacional dos Abatedouros Avícolas, menos que 1,2% do total da produção nacional. 57 CAPÍTULO 2 AVICULTURA INCIPIENTE E SUAS PRIMEIRAS FORMAS DE REPRESENTAÇÃO: 1889-1930 « Pobre quando come galinha, um dos dois está doente »40. Em 1995, o Brasil produziu 4 milhões de toneladas de carne de frango, ocupando o segundo lugar entre os maiores produtores do mundo e o consumo interno per capita, foi de 23,2 kg/hab, transformando o frango numa das carnes mais consumidas por sua população. Entretanto, um século atrás, a avicultura do país se baseava na produção artesanal, para autoconsumo e sem nenhuma utilização de tecnologia. Por isso era válido o ditado popular que dizia « quando pobre come galinha, um dos dois está doente », uma vez que o consumo era destinado sobretudo aos dias de festas, às canjas para doentes ou aos restaurantes mais caros das grandes capitais. A galinha, que não é uma ave natural do Brasil ou do continente americano, ali foi introduzida pelos colonizadores à medida que foram ocupando suas terras. No país, as primeiras raças chegaram junto com Pedro Alvares Cabral, colonizador português que « descobriu » o país em 1500. De acordo com as narrações da época41 a galinha foi um dos primeiros animais domésticos a entrar em contato com o novo continente. O fato foi inclusive relatado na carta que Pero Vaz de Caminha escreveu ao rei narrando a descoberta do Brasil42. 40 Máxima histórica do Barão de Itararé, que se tornou ditado popular. Osler Desouzart (1994), « O quo vadis da indústria avícola para o ano 2000: Avanço no consumo de carnes e a perspectiva do mercado internacional », in: Anais da Conferência Apinco 1994 de Ciência e Tecnologia Avícolas, Campinas, SP, p. 152. 41 O livro a partir do qual tiramos as informações referentes ao funcionamento da avicultura antes da produção e abate de forma industrial é de Osny Arashiro (1989), A História da Avicultura do Brasil, São Paulo, Gessulli Editores. 42 Ancorada próxima dos recifes de Porto Seguro, a nau capitânea foi visitada, na noite de 24 de abril de 1500, por dois índios trazidos de terra por Afonso Lopes. Entre outras coisas que lhes foram exibidas, escreveu Caminha, « mostraram-lhe um papagaio pardo que o capitão trazia consigo. Tomaram-no logo na mão e 58 Logo em seguida, em 1503, na expedição exploradora de Gonçalo Coelho, seus tripulantes trouxeram casais de galinhas para serem criadas na região do Rio de Janeiro. As aves se aclimataram bem e, em 1519, Fernão de Magalhães, no transcurso da viagem de circunavegação da terra, aportou neste local e refez as provisões de suas naus com as galinhas crioulas encontradas na região. Entre as espécies trazidas ao Brasil estavam aquelas das regiões de onde vieram os colonizadores. Eram aves de origem mediterrânea, pertencentes ao mesmo grupo das galinhas ibéricas, italianas e norte-africanas. Ainda na época colonial foram introduzidas no Brasil as raças orientais e asiáticas, que os portugueses trouxeram de suas viagens às Índias e ao Oriente. Cruzadas com as aves já existentes, deram então origem à famosa « galinha caipira », que até hoje forma os plantéis das aves criadas em praticamente todas as pequenas propriedades do interior. Com o desenvolvimento, no século XIX, da cultura do café43, os grandes fazendeiros do Rio de Janeiro e de São Paulo começaram a viajar para a Europa trazendo, na volta, exemplares de galinhas daquele continente. O mesmo aconteceu com os primeiros imigrantes que vieram se instalar no país, tanto para trabalhar nas fazendas de café, como nas pequenas propriedades independentes ou na nascente indústria. Com isto, a criação de aves passou a fazer parte integrante das atividades dos pequenos agricultores. No entanto, a avicultura não chegava a ser, sobretudo na República Velha, uma atividade importante. Não havia nem produção, nem comercialização, nem demanda e nem associações organizadas para dinamizar a atividade e desenvolvê-la. Só mais tarde, no início do século XX, é que os avicultores mais próximos dos grandes centros (Distrito Federal e São Paulo), passaram a organizar suas atividades através da Sociedade Brasileira de Avicultura. acenaram para a terra, como quem diz que os havia ali. Mostraram-lhes um carneiro; não fizeram caso. Mostraram-lhe uma galinha, quase tiveram medo dela; não lhe queriam pôr a mão e depois a tomaram como que espantados » (Arashiro, 1989, p. 17). 43 O café foi o principal produto da economia da República Velha, baseada essencialmente na agricultura. No período compreendido entre 1891 a 1900, este produto representou 64,5% do valor das exportações do país, porcentagem que chegou a 69,6 durante os anos de 1921 a 1930. Politicamente falando, a burguesia cafeeira, articulada no PRP - Partido Republicano Paulista e no PRM - Partido Republicano Mineiro, já na Constituição de 1891 conseguiu impor seus interesses através da autonomia política e econômica dos estados. Manipulando os sufrágios (o voto não era secreto, só podiam votar os homens, maiores de 21 anos e alfabetizados, o que representava menos de 6% da população brasileira), as forças políticas que dominavam os estados mais ricos e populosos (São Paulo, Minas Gerais e Rio de Janeiro), puderam dominar e dirigir o destino político e econômico do país. Nas onze eleições presidenciais da chamada República Velha (1889-1930), São Paulo e Minas gerais tiveram nove candidatos vitoriosos (São Paulo 6 e Minas 3), instituindo com isto, a chamada política café-comleite. 59 1. Avicultura e suas formas de organização A partir do início do século podemos começar a estabelecer uma distinção entre os produtores avícolas nacionais. Havia, de um lado, os pequenos agricultores, dedicados à produção da galinha caipira para suprir seu próprio consumo de ovos e de carne, assim como os habitantes da periferia das cidades, que praticavam uma atividade avícola de « fundo de quintal », com as mesmas finalidades. De outro lado, sobretudo próximos às maiores cidades da época (Rio de Janeiro, Belo Horizonte e São Paulo), havia os avicultores interessados em produzir galinhas para concorrer nos concursos de beleza, nas exposições e, em condições de acompanhar os avanços ocorridos a nível internacional. É este segundo grupo de avicultores que começa a criar associações com o objetivo de levar adiante a atividade. Formado sobretudo por médicos, veterinários, agrônomos e de outras profissões liberais, esse grupo queria ganhar dinheiro vendendo suas aves de raças puras e conquistar os prêmios das exposições. Para tanto, acompanhavam os avanços em termos de raças puras conseguidos pelos « clubes do galo » ingleses e pelos principais avicultores norte-americanos, enquanto os pequenos agricultores criavam galinhas para sua subsistência. Trocando informações através da revista Chácaras e Quintaes44 os avicultores começaram a discutir a possibilidade de criar uma associação que os congregasse, representasse e levasse adiante os interesses da categoria. Deste modo, foi fundada em São Paulo, em 20 de março de 1913, a Sociedade Brasileira de Avicultura, reunindo os principais produtores dos grandes centros avícolas da época. Seus estatutos foram muito discutidos entre os avicultores paulistas e cariocas. Estes últimos, por trabalharem mais vinculados com os ingleses defendiam um standard voltado para a Inglaterra, enquanto que os paulistas defendiam mais a avicultura praticada nos Estados Unidos. Depois de muitas discussões, seguiu-se o rumo do que já acontecia na prática das importações de raças estrangeiras que eram baseados nas normas regimentais da « American Poultry Association ». O artigo I° dos estatutos define bem o objetivo da sociedade. « Com o título de Sociedade Brasileira de Avicultura, fica organizada no Brasil uma associação destinada a 44 Por iniciativa do Conde Amadeo Amidei Barbiellini, dono do Posto de Avicultura de Vila Ema em São Paulo, foi lançado em outubro de 1909, um « número de ensaio » da revista Chácaras e Quintaes. Tal revista teve um papel importante na divulgação e organização da avicultura do início do século, sobretudo incentivando as primeiras exposições nacionais. A revista, que se manteve com este nome entre os anos 1910 e 1970, retrata os principais avanços e personalidades do setor durante este período. Osvaldo Gessulli, que começou a trabalhar nela em 1948, com a morte do fundador, em 1955, passou a ser um dos sócios e o principal responsável pela redação e divulgação da revista. Em 1967 a editora foi adquirida pela família Gessulli, que a partir de 1971 modificou seu título para « Chácaras e Quintaes-Avicultura Industrial ». Na década de 70 e 80, a Editora 60 estreitar as relações entre os amadores e criadores de aves; a promover exposições periódicas de aves, pássaros e material de avicultura; a realizar feiras e concursos, na capital federal e em outros centros avícolas importantes; a concorrer por todos os meios para a seleção, aperfeiçoamento e pureza das raças bem como para o desenvolvimento da avicultura no país » (citado por Arashiro, 1989, pp. 33-34). Além disso, a Sociedade se propunha a promover excursões pelos estados, a criar escolas e postos avícolas, fazer conferências públicas, publicar boletins e monografias, organizar um museu e uma biblioteca, importar aves para os associados, informar a todos os avicultores brasileiros, mesmo os não associados, as novidades inerentes à atividade. Os avicultores da época podiam ainda contar com uma bibliografia especializada45. Uma das atividades mais importantes da Sociedade Brasileira era a organização da Exposição Nacional de Aves. A primeira realizou-se no Rio de Janeiro no período de 6 a 8 de setembro de 1914 e seu sucesso incentivou a diretoria da entidade a repeti-la todos os anos. Foi a partir destas exposições que a avicultura começou a ser divulgada nas grandes cidades. A cada nova etapa deste evento, outros avicultores se inscreviam e participavam, expondo suas raças de aves, concorrendo aos prêmios e realizando negócios. Assim, na terceira Exposição Nacional de Aves, realizada em 1916, refletindo o aumento que a avicultura vinha tendo junto aos produtores, participaram 55 criadores. Para levar esta experiência a um público mais amplo e envolver um número maior de produtores, começaram a ser realizadas também exposições locais e, ainda neste ano, realizaram-se a Primeira Exposição de Avicultura no Rio Grande do Sul e em São Paulo. Em 1924, para melhor atender aos avanços do setor, a Sociedade Brasileira de Avicultura resolveu reformular seus estatutos. A partir daí, nas exposições promovidas pela entidade, haveria uma seção à parte, dedicada às aves mistas nacionais. Desta forma, a entidade procurou atrair aqueles que, dedicando-se à criação de aves, não encaravam a avicultura como um esporte, mas sim como uma fonte de renda, uma « indústria rudimentar ». Como a Sociedade Brasileira não conseguia atender a todas as necessidades e responder as demandas localizadas, fortaleceu-se a idéia de formar associações por estado. Depois de trocar experiências e promover vários encontros entre os produtores locais, Gessulli publicava duas revistas: « Avicultura Industrial » e « Suinocultura Industrial ». A partir de 1989, estas duas revistas passaram a circular numa só, sob o título « Avicultura e Suinocultura Industrial ». 45 Entre os textos mais difundidos estavam o do espanhol Salvador Castelló y Carreras Avicultura Moderna, o do italiano Luigi Pochini L’Avicoltura. Entre os autores nacionais, destacavam-se Wilson da Costa O Avicultor Prático, Moléstias das Aves e Como fiquei rico criando galinhas; Delgado de Carvalho Tratado de Galinocultura, Galináceos e Columbinos, Marrecos e Gansos, Questões de Avicultura; e Lourenço Granato, que publicou Moléstias das Aves ou O Médico Brasileiro das Galinhas. 61 surgiram as primeiras organizações. Foram fundadas três sociedades: a Sociedade Brasileira de Avicultura, no Rio de Janeiro, em 1913; a Sociedade Riograndense de Avicultura, em Pelotas, em 1916 e a Sociedade Paraibana de Avicultura, em 1919. Em 1926, graças à semana da galinha, outras sociedades estaduais foram fundadas46. Apesar da avicultura estar presente em todo território nacional, era na região Sudeste que aconteciam os principais fatos e estavam localizadas as organizações avícolas mais importantes. 2. São Paulo e Rio de Janeiro dominam avicultura nacional Os trabalhos para melhorar as raças de galinhas vindas do exterior iniciaram na última década do século XIX. Um dos estabelecimentos que conduziu estudos neste sentido, foi a Leste Basse-Cour, do Rio de Janeiro, cujos trabalhos iniciaram-se em 1895 e tinham como objetivo selecionar, dentre as raças de aves importadas, as que maior interesse econômico pudessem proporcionar aos criadores brasileiros. A granja Leste Basse-Cour pertencia a Delgado de Carvalho, primeiro presidente da Sociedade Brasileira de Avicultura, tendo mudado seu nome, posteriormente, para chamar-se Posto Avícola do Rio de Janeiro. Neste estabelecimento, através dos cruzamentos com outras raças, conseguiu-se aclimatar no Brasil a raça Orpington, importada da Inglaterra. Em seguida, esta linhagem contribuiu para melhorar os plantéis, especialmente no Sul do país, tanto no que se refere à produção de carne, como às aves de postura. Outra raça estudada e aclimatada a partir deste mesmo estabelecimento foi a Plymouth Rock, cujos primeiros exemplares foram trazidos dos Estados Unidos por Salvador de Mendonça. Estas galinhas americanas, cuja característica principal era a rusticidade, constituem atualmente o tipo « carijó » (variedade Plymouth Barred Rock), que ainda está presente em grande parte dos plantéis no meio rural. A primeira exposição nacional de aves, organizada pela Sociedade Brasileira de Avicultura e realizada em 1914, refletiu a dominação dos estados do Rio de Janeiro e de São Paulo nas atividades do setor. As mais de 600 aves apresentadas ao público nesta ocasião, foram expostas por apenas quatro avicultores, dois do estado do Rio de Janeiro, um de São Paulo e outro do Rio Grande do Sul. Além das aves, a exposição apresentou aos interessados 46 Foram fundadas sete novas associações: Sociedade dos Avicultores do Amazonas, Sociedade de Avicultura do Piauí, Associação dos Avicultores do Ceará, Sociedade de Avicultura do Rio Grande do Norte, Sociedade Pernambucana de Avicultura, Sociedade Alagoana de Avicultura, Sociedade Baiana de Avicultura, todas com sede na capital dos respectivos estados. 62 tudo o que havia de mais moderno em termos de equipamentos, produtos veterinários, livros e alimentação para a produção avícola. A granja que teve maior destaque foi a Ascurra Basse-cour, do Rio de Janeiro, que ganhou 65 prêmios no decorrer do evento. Seu proprietário, Miguel Calmon Vianna investiu mais de 100 contos de réis47 no seu estabelecimento avícola, considerado um dos mais importantes da época. Importando aves da Inglaterra, mantinha um plantel com mais de 60 variedades de galinhas, patos imperiais de Pekin, perus norte-americanos, gansos de Tolouse e faisões. Outro destaque na Primeira Exposição de Aves no Brasil foi o Aviário Villa Ema, localizado em São Paulo, de propriedade do conde Amadeu Barbiellini, editor e proprietário da revista Chácaras e Quintaes. Barbiellini começou por criar 30 raças diferentes, de todas as variedades de formas e de cores, importando os reprodutores da Inglaterra, dos Estados Unidos e da Itália. A partir destas raças, o avicultor realizou numerosas experiências, chegando à conclusão de que o número de raças criadas em seu aviário deveria ser o mais reduzido possível. Brevemente estaria trabalhando com uma única raça, a « Plymouth Rock Barred », ou galinha carijó, criada com cuidados especiais, no intuito de sempre melhorá-la e aperfeiçoá-la, para constituir a base de sua futura exploração avícola. Arashiro ao descrever o funcionamento de tal granja, lembra as palavras de seu proprietário: « continuarei, não obstante, criando mais duas ou três raças, como a « Orpington Preta », a « Wyandotte Prateada », a « Plymouth Branca » e os marrecos imperiais de Pekin, mas essas apenas por luxo e como meio de tornar mais pitoresca a vida do estabelecimento » (Arashiro, 1989, p. 53). Para Barbiellini, a carijó é a que « dá mais reslutado prático pela facilidade de sua criação, pela sua rusticidade e principalmente, porque é mais refratária às moléstias, sua carne é mais saborosa e suas posturas são bastante regulares ». A segunda Exposição Nacional de Avicultura, realizada em 1915, novamente no Rio de Janeiro, teve 1 400 aves inscritas. Devido às facilidades de participação e locomoção, a maioria dos expositores era do Rio de Janeiro, só participando um avicultor paulista. Se São Paulo foi o estado pioneiro tanto na organização dos avicultores como na fundação da primeira revista especializada, o do Rio de Janeiro impôs-se no cenário nacional, marcando 47 A unidade monetária que o Brasil herdou de Portugal foi o mil-réis. A moeda divisionária era o real, no plural, réis. As cifras eram escritas da seguinte forma: Um mil réis = 1$000; Duzentos réis = $200; Mil mil-réis = 1:000$000 (mil mil-réis eram equivalentes a um conto de réis). No início da Velha República, a moeda brasileira era convertida internacionalmente pelo valor da Libra (em 1915, uma libra era equivalente a 19$329). Em 1919, o dólar passou a substituir a libra como unidade internacional para a conversão da moeda do Brasil. Em 5 de outubro de 1942, pelo Decreto-Lei n° 7 491, o mil-réis foi substituído pelo cruzeiro, que no governo Sarney 63 presença nas exposições avícolas. Além disto, havia uma disputa para saber qual linhagem seria a melhor, a norte-americana ou a inglesa e, a tal ponto isto se caracterizou na segunda exposição, que Wilson da Costa escrevia em 1915: « Entretanto, São Paulo, sem motivo ou razão plausível, deixou-se vencer pelos esforçados avicultores cariocas, hoje muito mais numerosos e melhor aparelhados do que nós. Muitos e importantes são os aviários da Capital Federal, mas em nosso estado, segundo nossa opinião, a avicultura se acha mais adiantada quanto à qualidade das aves e perfeição dos tipos. No Rio de Janeiro predominam as aves de origem e procedência inglesa, ao passo que em São Paulo só se criam raças norteamericanas » (Arashiro, 1989, p. 59). No ano seguinte, ocorreu a terceira exposição nacional de aves, que contou com a participação de 55 criadores. Neste mesmo ano, a Sociedade Paulista de Avicultura realizou a primeira exposição estadual do setor, o que a partir de então, tornou-se uma prática em vários outros estados. O passo seguinte foi a organização da Semana da galinha, promovida pela revista Chácaras & Quintaes, realizada pela primeira vez de 23 a 30 de setembro de 1926. Nesse período, em todas as capitais brasileiras, instalaram-se amostras estaduais de aves e ovos que, na expressão de um dos redatores da revista, « não eram exposições clássicas de aves, nem uma feira; eram tão somente uma lição intuitiva, para demonstrar o que era a avicultura progressista, em todas as suas manifestações, evidenciando como qualquer pessoa poderia criar galinha de raça com sucesso ». Do Rio Grande do Sul ao Amazonas, todos os Estados promoveram a sua semana da galinha, para admirar os produtos e os resultados, para estudar os meios e ouvir os conselhos da prática vitoriosa, a fim de implantar em centenas de localidades uma nova avicultura. Conforme dados da revista, a população participou ativamente destes acontecimentos. « Em São Paulo, estimou-se em 80 mil o número de visitantes do evento » (Arashiro, 1989, p. 91). Na medida em que avançava a organização, tanto a nível nacional como estadual, fortaleciam-se também os laços entre os avicultores ligados a estas organizações e as experiências feitas pelos criadores europeus e norte-americanos. 3. Atividade inspirada no exterior (1986), seria substituído pelo cruzado. No dia 1° de julho de 1994, o Cruzeiro foi substituído pelo REAL, uma nova moeda que passou a ter equivalência igualada ao dólar norte-americano. 64 Novamente é necessário insistir na diferença entre os dois grupos de produtores nacionais. Os pequenos agricultores, dedicados à avicultura « caipira » e de auto-consumo, utilizavam as raças de aves disponíveis de sua região, pouco tendo acesso ao que acontecia a nível internacional. Suas experiências limitavam-se a trocar galos com os vizinhos, para « misturar o sangue » e ter uma criação mais sadia. Por outro lado, os « profissionais », que tinham acesso (através de leituras ou de viagens, participando dos eventos da Sociedade Brasileira de Avicultura) ao que acontecia nos meios avícolas europeus e norte-americanos, procuravam seguir seu exemplo nas experiências de cruzamentos de raças que faziam. Uma das formas de acompanhar as discussões sobre o progresso avícola internacional foi o debate que se estabeleceu para determinar o standard a ser seguido para o julgamento das aves nas exposições. Ao ser fundada a Sociedade Brasileira de Avicultura deu-se uma discussão antes de adotar um standard de produção, sobretudo entre os standards norteamericano e o inglês. A opção foi pelo norte-americano, mas não houve consenso. Sobretudo os avicultores cariocas, que trabalhavam com raças de aves importadas da Inglaterra, defendiam o standard daquele país. Para resolver o problema da disputa, uma das primeiras medidas da segunda diretoria da entidade, eleita em março de 1914 foi de modificar o Artigo 19 dos Estatutos da Sociedade Brasileira de Avicultura que determinava a escolha do Standard norte-americano para julgamento das aves nas exposições. Desta data em diante, foi adotado o critério de julgar as aves segundo os padrões de seu país de origem. Além do aprendizado em termos de « raças » de aves, estes avicultores ligados ao que acontecia nos países mais desenvolvidos também estavam preocupados com os demais segmentos da avicultura. Era de seu interesse conhecer as experiências de arraçoamento das aves, especialmente acompanhando as novidades em direção a uma alimentação « seca », que reduzia o trabalho, ocupando menos mão-de-obra e tornando mais eficiente o processo de alimentação. Também havia a preocupação de importar e/ou construir no Brasil os novos equipamentos, tanto em chocadeiras, como em outros equipamentos dos aviários. Por fim, vários técnicos avícolas viajavam para aqueles países com a finalidade de se capacitarem para conhecer e produzir vacinas e outros remédios de combate às doenças mais comuns da época. Portanto, nossa avicultura do início do século estava fortemente ligada às experiências européias e norte-americanas. No entanto, este relacionamento era mais de dependência, tanto tecnológica quanto de desenvolvimento de novas raças de aves. Neste sentido, o que se fazia no país, eram principalmente os cruzamentos para melhor adaptar as aves ao clima e à alimentação brasileiras. 65 4. Produção artesanal e os « basse-cour » Nas primeiras décadas do século, a população brasileira estava sobretudo concentrada na área rural48. Praticamente todas as famílias que viviam na agricultura criavam galinhas para seu auto-abastecimento de ovos e de carne. As galinhas eram criadas soltas, sem nenhuma tecnologia, alimentando-se de restos de comida, milho, verduras e outros alimentos encontrados na natureza. Também grande número de famílias que habitavam a periferia das cidades criavam no « fundo do quintal » suas galinhas, com os mesmos objetivos e seguindo métodos semelhantes. Segundo autores da época, as condições da criação de galinhas nas pequenas propriedades e na periferia eram precárias. No « Bulletin de la Chambre de Commerce Belge au Brésil », de setembro de 1919, Mr. V. de Vicq, analisando as atividades avícolas, descrevia-as da seguinte forma: « as aves para o consumo provêm geralmente, de pequenos agricultores, de chacareiros, que fazem a criação mais pela rotina que por verdadeiro interesse (...). O chacareiro, sem procurar melhorar a sorte de seu galinheiro, continua a criar a esmo. É de notar que agricultor algum se dedica exclusivamente à criação de aves, não se arriscando nenhum deles a dar maior extensão a seu galinheiro » (Arashiro, 1989, pp. 68-69). Paralelamente a este tipo de produção, havia os « poultrymen », dedicados à criação de raças puras, fundando aviários (chamados de « Basse-cour »), sobretudo situados próximos às capitais dos estados. A maioria deles concentrava-se no Rio de Janeiro e em São Paulo49. Entre estes avicultores havia dois grupos distintos. De um lado, os que seguiram sobretudo o modelo inglês e estavam mais preocupados com a beleza física de suas aves do que com suas qualidades de produtoras de carne ou de ovos. Seu principal objetivo era criar aves « bem empenadas » para ganhar concursos de beleza, nas exposições e vender galos de raça a altos preços. De outro lado, havia um grupo de avicultores, como Delgado de Carvalho, J. Wilson da Costa, Georges Baeder e Amadeu Barbiellini que, estudando as técnicas de manejo 48 Em 1900 o Brasil tinha uma população de 17.318.556 habitantes. Os estados mais populosos eram Minas Gerais, com 3.594.471 habitantes e São Paulo, com 2.282.279, seguidos da Bahia, com 2.117.956, Pernambuco, com 1.178.150, Rio Grande do Sul, com 1.149.070, Rio de Janeiro, com 926.035 (dos quais, 691.565 habitantes eram da Guanabara - Distrito Federal). Estima-se que em 1910, a população atingia 22.042.800 habitantes. De acordo com o censo de 1920, a população brasileira atingia 30.635.605 habitantes. Entre a população economicamente ativa, a maior parte, 6.376.380 (84,3%) pessoas empregavam-se na atividade agrícola, enquanto a atividade industrial ocupava 1.189.357 (15,7%) operários. 49 Os principais avicultores que se destacaram no Rio de Janeiro do início do século foram Delgado de Carvalho, proprietário do Posto Avícola do Rio de Janeiro e Miguel Calmon Vianna, dono da Ascurra Basse-cour. Em São Paulo, destacavam-se J. Wilson da Costa e o dr. Feliciano de Morais, na cidade de Campinas. Georges Baeder, criador de Leghorns, na Vila Mariana e Amadeu A. Barbiellini, com o Posto de Avicultura, da Vila Ema 66 européias e norte-americanas, lançaram as bases de uma verdadeira avicultura « industrial », voltada para a produção de ovos e de carne. A preocupação destes avicultores era também comercial, mas não no sentido de ganhar dinheiro vendendo raças puras e sim preocupados em desenvolver uma avicultura que pudesse atender as necessidades da população, tanto produzindo e fornecendo ovos como carne. Para tanto, era preciso realizar experiências, desenvolver e/ou adaptar as raças mais adequadas para atender estes objetivos. Foi para resolver tais problemas que « no Rio de Janeiro, o aviário do Horto da Penha, instalado e planejado pelo engenheiro agrônomo Manoel Paulino, realizava experimentos com diversas raças de aves importadas, estudando sua aclimatação ao ambiente do antigo Distrito Federal, além de coletar interessantes dados sobre postura, arraçoamento e moléstias mais frequentes » (Arashiro, 1989, p. 25). Outra iniciativa para difundir a avicultura e ao mesmo tempo preparar profissionais foi tomada por este grupo de avicultores. Junto às principais granjas avícolas, por iniciativa de seus proprietários, funcionavam « Escolas Práticas de Avicultura ». Uma das primeiras escolas neste sentido, foi fundada junto ao estabelecimento « Ascurra Basse-Cour », no Rio de Janeiro, onde as aulas eram ministradas por especialistas ingleses50. Os alunos não só assistiam aos diversos trabalhos da Escola, como também praticavam pessoalmente, divididos em turmas, a cada uma das quais eram confiadas as incubadeiras e a execução da conservação das pastagens verdes e asseio dos galinheiros, parques e demais dependências, de modo que pudessem adquirir uma prática completa em avicultura, exercida como ramo de exploração industrial. Outra escola foi inaugurada em 1916, anexa ao Aviário Wilson da Costa, em Campinas, São Paulo. O curso durava três meses e, aos alunos que completavam o curso e passavam nos exames, era concedido o atestado de « Avicultor », aos demais alunos que só cursassem as aulas práticas, era concedido o atestado de « Capataz Avícola ». Quanto aos equipamentos, eram importados da Europa e dos Estados Unidos e, sua descrição nos ajuda a entender o estágio da modernização da avicultura. « As firmas especializadas ofereciam incubadoras a querosene, casas para pintos, criadeiras, campânulas a carvão, gaiolas de arame e ferro zincado, bebedouros higiênicos, de pressão; aparelhos para engordar aves; estojos com instrumentos 50 As instalações desta escola contavam com câmaras de incubação providas de incubadeiras Hearsons para 120 ovos, aquecidas a gás, registrando todos os dias as temperaturas respectivas; laboratórios para exame minuciosos dos ovos destinados às incubadeiras; casa apropriada para criação de pintos no primeiro mês; casas para os frangos de dois meses de idade; numeroso parque de reprodução com casa para abrigo das aves; sala para isolamento das aves durante a muda ou quando enfermas; recinto de exposição permanente de aves do estabelecimento. 67 para castração de frangos; comedouros automáticos e ninhos alçapões » (Arashiro, 1989, p. 40). Já se falava, por volta de 1913, em utilizar alimentação seca para aves, técnica desenvolvida e divulgada pelos norte-americanos, que abolia por completo o fornecimento de angus e misturas úmidas às aves. A principal vantagem do novo método seria a economia em mão de obra, uma vez que os alimentos secos poderiam ser fornecidos em comedouros automáticos, além da composição variada que se podia dar às pastas endurecidas. No final dos anos 1920 ainda não era prática corrente vender galinhas e outras aves mortas, depenadas e prontas para o consumidor. Havia desconfiança e preconceito em relação a estas aves. Pensava-se que a ave oferecida morta tinha sido vítima de « peste ». O costume da época exigia que se comprasse a galinha do interior viva, sendo preferível « comprar uma ave pesteada viva, do que uma saudável, morta ». É por isso que montar um aviário unicamente para produção de carne, para corte com aves de raça, era muito difícil. Ele deveria fazer concorrência ao frango caipira no mercado, que era criado com métodos simples e sem investimentos em arraçoamento, em construções e outros cuidados, o que tornava seu custo de produção mais baixo51. Pelos cálculos do custo de produção feito na época, o produtor deveria entregar o frango de raça e de corte, no mercado, a um preço oscilando entre 6$00 e 7$000 réis para 51 Georges Baeder, um dos avicultores mais respeitados da época fez os cálculos para saber se valia a pena criar frangos de raça para abate. Utilizou para tal fim o insumo básico de milho, para um frango de quatro meses na idade do abate, contando que ele consomia a quantidade de 100 gramas de ração por dia, em média. TABELA 1 - CÁLCULO DO CUSTO DE PRODUÇÃO DE UM FRANGO - 1927 INGREDIENTES PREÇO Preço de 100 gramas de milho, à razão de 15$000/saco 60 kg equivalente a 25 réis/dia Em 4 meses: 25 réis X 120 dias 3$000 Preço dos ovos chocados à razão de 1,5 ovo para obter um pinto (300 réis $450 cada ovo) Alimentação da galinha choca durante 4 meses (21 dias no ninho) e 3 meses, mais ou menos criando a ninhada de 10 pintos em média 3$000 réis por 10 pintos $300 SUB-TOTAL 3$700 Mortalidade de 15% $250 Despesa de empregado durante 4 meses (por cabeça) $500 Matança e depenamento (por cabeça) $400 Entrega à domicílio $400 Amortização do capital $200 CUSTO MINIMO DE UM FRANGO 5$300 Lucro (15%) $795 CUSTO TOTAL 6$095 Fonte: Arashiro, 1989, pp.105-106. NOTA: É verdade que o pinto, durante um certo período, não consumia 100 gramas de alimentação por dia, mas os alimentos que recebia, como arroz, ovos cozidos, farelo de trigo e até alpiste, custavam mais caro que o milho, de maneira que a base de 25 réis não era exagerada. 68 conseguir um lucro em torno de 15%. O frango caipira, criado com resíduos alimentares, custava no mercado cerca de 3$000 a 3$500, mesmo assim depois de ter passado por diversos intermediários. Diante desta realidade, os avicultores « industriais » sentiam-se desestimulados. O exemplo do avicultor Georges Baeder, que tinha em sua granja uma pequena criação de frangos para corte, da linhagem Carijó (Plymouth Rock), nos permite entender as condições de criação e quais seriam as vantagens de se dedicar à criação de frango de corte. Até o desenvolvimento das aves, que levava quatro meses em média, o tratamento era o mesmo que se ministrava para as outras galinhas. Depois de empenados, os frangos eram fechados em espaços reduzidos, com a finalidade de evitar grandes passeios ou corridas, a fim de paralizar o mais possível o desenvolvimento dos músculos. Vinte dias antes do abate, os frangos eram fechados em pequenas gaiolas, de tamanho a impedir os seus movimentos, deixando apenas uma abertura que permitia a passagem da cabeça do frango. Três vezes ao dia, essas aves recebiam uma ração de fubá com leite. O ambiente de engorda era conservado no escuro e sempre limpo. Com esta forma de criação e de tratamento, Georges Baeder conseguia frangos quase do tamanho dos perus da época que, no entanto, eram vendidos no mercado ao preço de 4$000 a 5$000 réis (o costume era de se comprar por cabeça e não pelo peso da ave). Com este valor era possível comprar quase dois frangos caipiras. Os avicultores brasileiros sonhavam com o dia em que, como nos Estados Unidos e na Europa, os frangos seriam vendidos abatidos e prontos para o consumo. Mas no Brasil, esta é uma história para o início dos anos 1960. Na República Velha, juntos, os avicultores artesanais criando galinhas caipiras e os das « basse-cour », com suas aves de raça, mal conseguiam produzir um plantel de duas aves por habitante. 5. Evolução da produção Antes da avicultura industrial no Brasil, que se difundiu sobretudo a partir da década de 70, não havia o costume de se consumir carne de frango ou galinha. O consumo normal era de carne vermelha (bovina) ou suína. O fato de matar uma galinha era raro e só ocorria para comemorar a visita de algum parente, ou para festejar os finais de semana. Outra forma de consumir carne de aves era servi-la nos hotéis e restaurantes das cidades. Neste caso, o fornecimento era feito principalmente pelos avicultores situados nos « cinturões verdes » de tais cidades. 69 Se analisarmos os dados disponíveis da venda de aves, veremos que a atividade se desenvolveu sobretudo em Minas Gerais e no Rio de Janeiro. Além de se situarem entre os mais populosos contando, portanto, com um plantel para seu consumo interno, estes estados também representavam as maiores exportações em direção a outras regiões do país. Minas Gerais, o maior produtor, passou de 40 t. a 3,123 mil t. exportadas, de 1860 a 1910. Entretanto devemos salientar que as vendas cresceram de forma mais significativa a partir do 1900. TABELA 2 - MINAS GERAIS E SUAS EXPORTAÇÕES DE GALINHAS -1860 a 1910 ANOS VOLUME (em t) 1860 40 1870 78 1880 203 1891 429 1901 803 1910 3.123 Fonte: Arashiro, 1989, p. 22. Outro estado que se destacou nas exportações foi o do Rio de Janeiro. Suas vendas passaram de 1.047 toneladas em 1904, para 1.568 toneladas em 1911, registrando um crescimento de 40% no seu volume exportado. Os dados destes dois estados nos indicam onde estava mais difundida a avicultura e onde se produzia para além do consumo local. A nível nacional, porém, a produção de galinhas estava longe de se tornar uma atividade competitiva ao consumo de carne bovina. Se analisarmos os dados de 1919, (dados extra-oficiais), podemos calcular em 55 milhões o número de galinhas no país (Arashiro, 1989), que contava então com 25 milhões de habitantes. Ou seja, havia pouco mais de duas galinhas por habitante. 6. Condições do comércio de aves No início do século XX, o costume era de vender as aves vivas. Para os avicultores situados próximos às cidades, não havia dificuldade de transporte pois os consumidores estavam próximos. Quanto aos que moravam no interior, geralmente o transporte era feito por intermediários que, passando em diversos estabelecimentos conseguiam se prover de uma 70 quantidade suficiente de aves para ser vendida nas cidades. Ao chegar, as aves eram mantidas vivas até sua comercialização, nem sempre em boas condições sanitárias, como podemos ver pelas análises feitas pelos escritores da época. Delgado de Carvalho, avicultor e autor de diversas publicações, primeiro presidente da Sociedade Brasileira de Avicultura, nos relata como era feito o comércio de aves em 1913. Estudando o comércio urbano de aves, comentava as quitandas que « pelas ruas centrais da capital da República e das principais cidades do Brasil exibem, impunemente, as enfezadas aves que a população inconsciente ou ignorante consome, e são o mais seguro foco de infecções várias ». Em seguida, o autor passa a criticar a falta de inspeção sanitária e a lei de funcionamento de tais estabelecimentos. « Esses tradicionais antros de miasmas jamais mereceram das inspetorias sanitárias uma detalhada visita e a lei que as permitiu deveria ser, quanto antes, revogada. A título de curiosidade percorri diversas casas desse gênero de negócio. O espetáculo que se me deparou foi o mais degradante possível: aqui, aves de qualidade inferior, raquíticas, atacadas de coriza; mais além, casos típicos de espirilose e de tuberculose, em íntimo convívio com crianças, filhos do proprietário desse inacreditável comércio! As dejeções dessas aves, presas em acanhadíssimas gaiolas, são atiradas ao solo e espalham-se nos legumes e frutas que completam o ramo de negócio protegido pela lei, em detrimento da saúde pública » (Arashiro, 1989, p. 41). Falando sobre o transporte e as condições gerais de comercialização, o autor continua dizendo que « é comum a venda ambulante de galinhas, patos, perus, etc., em pouco asseados jacás ou amarrados pelas pernas, expostos ao sol e à chuva. As aves que assim são vendidas, acham-se sem dúvida, afetadas de enfermidades ». O mesmo autor sugeria em 1913 que tais desmandos poderiam ser corrigidos, « se fosse possível manter, entre nós, depósitos de aves abatidas sob fiscalização rigorosa de uma junta veterinária de idoneidade reconhecida. Para o abastecimento de nossos mercados centrais ainda não existem estabelecimentos devidamente aparelhados, mas a importação de aves do interior é já bastante grande para que uma inspeção sanitária fosse praticada, vistoriando os jacás de aves desembarcadas, antes de serem levados às quitandas ou vendidos aos varejistas ambulantes. Seria suficiente a decretação de uma lei de vigilância para que a mercadoria que nos é oferecida na via pública não se tornasse um perigo para a nossa saúde » (Arashiro, 1989, p. 41). 71 Durante a República Velha a maior parte da população morava na área rural, onde o auto-consumo de galinhas era a prática mais corrente. Além disso, as « mercearias » ou « casas de secos e molhados » não vendiam aves mortas, prontas para o consumo. Por outro lado, além de ter o hábito de consumo de carne de gado, os habitantes urbanos, devido às condições de comércio acima descritas, não se sentiam muito motivados a mudar de hábitos alimentares. Entretanto, como veremos no próximo capítulo, na segunda metade dos anos 40, quando houve escassez e aumento no preço da carne bovina, o frango passou a ser abatido nos principais açougues, frigoríficos e abatedores de pequenos animais tornando-se uma opção de consumo de carne, sobretudo para a população urbana. 72 CAPÍTULO 3 PRODUTORES TRADICIONAIS E EMPRESAS AVÍCOLAS FAMILIARES: 1930-1960 Proveniente de um acordo das elites brasileiras representantes de outros setores que os da política café-com-leite, Getúlio Vargas52 assumiu a presidência da República através da « revolução de 1930 », que iniciou o processo de industrialização do país. Mesmo contando com mais gente na área rural que na urbana53 até 1960, a industrialização54 foi tomando corpo 52 Dificilmente outro homem público na História do Brasil republicano marcará sua presença no topo da organização política nacional com tanta força quanto Getúlio Dornelles Vargas (1883-1954). Presidente da República por duas vezes (em condições diversas, que se estendem por um total de dezoito anos, de 1930 a 1945, o que inclui o período ditatorial do Estado Novo, entre 1937 e 1945, e de 1951 a 24 de agosto de 1954, quando seu suicídio interrompeu o segundo mandato), dirigiu o país em anos decisivos de transformações. Neles, a nação viu-se às voltas com as consequências da crise mundial dos anos 30; viveu a Segunda Guerra; lançou as bases para um projeto industrial de desenvolvimento, que ganharia corpo a partir da segunda metade da década de 50. A centralização do poder em escala nacional, retirando-o do âmbito das diversas unidades federativas; a expansão e aceleração do ritmo de crescimento da produção industrial em relação à agrícola; a urbanização da sociedade; o aumento de importância da indústria de transformação e dos serviços. Estas são as principais mudanças da sociedade brasileira no período getulista. 53 Entre os anos de 1930 e 1960, houve um crescimento populacional de 69,9%, quando a população passou de 41.236.315 para 70.070.457 habitantes. Mesmo se urbanizando cada vez mais, continuava predominantemente rural, conforme podemos ver pelos dados da tabela abaixo. TABELA 3 - BRASIL - POPULAÇÃO TOTAL E PORCENTAGEM URBANA - 1940-1960 Brasil e 1940 1950 1960 Regiões Total Urbana Total Urbana Total Urbana Norte 1.462.420 27,75 1.844.655 31,49 2.571.586 37,80 Nordeste 14.434.080 23,42 17.973.413 26,40 22.142.264 34,24 Sudeste 18.345.831 39,42 22.548.494 47,55 30.550.719 57,36 Sul 5.735.305 27,73 7.840.870 29,50 11.834.901 37,58 Centro Oeste 1.258.679 21,52 1.736.965 24,38 2.970.987 35,02 Brasil 41 236 315 31,24 51 944 397 36,16 70 070 457 45,08 Fonte: IBGE. Percebe-se uma forte diferença entre as regiões. Em 1960, enquanto o Sudeste (São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais) já tinha uma população urbana de 57%, o Nordeste só tinha 34%. Exatamente a região mais urbanizada era a que possuía também a avicultura mais adiantada. 73 e transformando a base da economia nacional. A avicultura, por sua vez, patinou entre uma evolução da produção para acompanhar o mercado que se abria junto às populações urbanas cada vez maiores e uma estrutura de produção ainda baseada na economia familiar, sem avanços organizacionais, produtivos e tecnológicos. 1. Incentivos do Estado à avicultura Este novo Estado que se instituiu, com o intuito de modernizar e industrializar o país, acabou também se preocupando com setores produtivos provenientes do setor agropecuário. Um dos setores atingidos pelas políticas de modernização foi a avicultura. Para mantê-la e modernizá-la ao longo destas três décadas, o Estado tomou várias medidas, que passamos a estudar em seguida. A assinatura do decreto-lei n° 3.467, de 17 de dezembro de 1939, instituindo o regulamento de Inspeção Sanitária, Classificação, Conservação e Embalagem de Ovos destinados ao comércio exterior, constituiu-se numa das medidas de mais largo alcance, postas em prática por Getúlio Vargas, em favor da avicultura. Com isto, os avicultores tiveram que adaptar sua produção de ovos às exigências internacionais e garantir a qualidade de seus produtos. Para se manter ligados ao mercado internacional55, os avicultores precisaram operar modificações tanto nas raças de galinhas (não seria com as aves de Pedro Alvares Cabral que se faria uma avicultura competitiva a nível internacional), aproveitanto os avanços conseguidos nos países mais desenvolvidos, como melhorar suas condições de produção, sobretudo sanitárias e higiênicas. Outra medida tomada pelo governo, em forma de decreto, para defender o avicultor e estimular a produção, foi instituir o sistema cooperativista. De acordo com esta legislação, caberia às cooperativas, o fornecimento de reprodutores, a venda de máquinas modernas a preços baixos e a classificação e colocação no mercado interno e externo de toda a produção 54 A política de industrialização do novo governo já surtiu efeitos durante a década de 1930. Entre 1933 e 1939, a indústria cresceu a uma taxa média anual de 14% em São Paulo. Crescimento semelhante, ainda que em menores proporções, era observado no Rio de Janeiro, Minas Gerais e Rio Grande do Sul. O censo econômico de 1940 registrou no país, 49.418 estabelecimentos industriais, com 781.185 empregados, contra 13.569 estabelecimentos e 293.673 trabalhadores em 1920 (Teixeira e Totini, 1993). 55 Entre 1930 e 1945, os avicultores nacionais mantiveram-se ligados ao mercado internacional através da exportação de ovos. Um dos primeiros a exportar foi o engenheiro agrônomo Charles Toutain, da Granja do Mandy, em 1930. Em seguida, formaram-se cooperativas (Cooperativa Avícola de São Paulo, Cooperativa Avícola do Rio de Janeiro) e empresas privadas (Frigorífico Anglo, Sociedade Comercial e Agrícola Ltda, de São Paulo, Sociedade Comercial Agro-Pecuária, do Rio de Janeiro) no intuito de exportar ovos. Em 1933, o Brasil exportou para a Inglaterra 66.540 quilos de ovos. Para maiores informações sobre as exportações de ovos deste período, ver Arashiro (1989, pp. 113-129). 74 dos mesmos, fatores que, em conjunto, proporcionavam ao avicultor a garantia de que necessitava para seu trabalho. A Cooperativa Avícola de São Paulo, fundada em 1930, teve importante papel, tanto na exportação de ovos, como no incentivo ao melhoramento da avicultura local. Percorrendo o interior do estado e atuando junto com a Diretoria de Indústria Animal, órgão ligado ao estado de São Paulo, e com o Departamento de Assistência ao Cooperativismo, ela « fornecia um frango de raça, em troca de dois frangos crioulos » (Arashiro, 1989, p. 123). Com isto, além de fazer um trabalho de assistência aos produtores permitia-lhes, na prática, melhorar seu plantel, introduzindo raças mais aperfeiçadas. Outra medida de incentivo à avicultura foi a distribuição, nos diversos estados, sobretudo naqueles que tinham uma avicultura significativa, de reprodutores de raça, com o objetivo de, através de cruzamentos sucessivos, melhorar a qualidade das aves « crioulas », que constituíam a maioria do plantel. Em 1937 foram adquiridas pelos representantes do governo central, 140 aves Leghorns, enviadas para o Rio de Janeiro e Minas Gerais. Nos dois anos seguintes, mais 132 aves foram adquiridas e distribuídas em diversos estados. Através do Ministério da Agricultura foi colocado em prática um amplo programa para formar os avicultores e auxiliá-los a enfrentar as diversas doenças que atacavam as aves: a bouba, a cólera, a espiroquetose, a salmonelose. Além de material didático sobre tais doenças, veterinários do Ministério passaram a percorrer as granjas avícolas, orientando os produtores sobre as espécies preferíveis para a criação, os processos mais aconselháveis para evitar as doenças e a melhor forma de debelar seus surtos. Os institutos de pesquisa pertencentes ao governo também colocaram-se à disposição para produzir medicamentos e vacinas que permitissem melhorar a avicultura. O Instituto de Biologia Animal do Rio de Janeiro, junto com os Serviços de Defesa Sanitária Animal dos estados, produziram vacinas em larga escala, contra a cólera, a espiroquetose e outras doenças, que eram vendidas a preço de custo aos avicultores. Aos interessados, o Estado Novo demonstrou que a criação avícola, orientada segundo métodos modernos, com a construção de aviários modelos, alimentação racional, vacinação das aves, seria fonte de lucros e que o Governo Federal estava pronto a apoiar todas as iniciativas. Por fim, o governo incentivou técnicos ligados a seu quadro de funcionários para conhecer a avicultura de outros países e implantar melhorias na forma de produção. Apolonio Sales, avicultor e ex-ministro da agricultura foi um destes que, no início da década de 1940, foi aos Estados Unidos buscar novas formas de produção de ração. Para isso, visitou várias 75 granjas e esteve na Universidade Rural de Delaware. Descobriu que cerca de 80% do êxito da avicultura estava na porcentagem das vitaminas que entravam nas rações balanceadas. Sugeriu, para resolver o problema da alimentação, que a Cooperativa Avícola do Rio de Janeiro organizasse um laboratório de análise com um técnico especializado, que produzisse uma ração brasileira, rica em vitaminas. Com esta e outras experiências, tanto individuais como coletivas, iniciativas do Estado e de avicultores independentes, a avicultura brasileira manteve um permanente canal de informação sobre os avanços conseguidos nos países centrais. 2. Fortalecimento da relação com a avicultura norte-americana A relação dos avicultores não foi exclusiva com os progressos e avanços conseguidos na avicultura norte-americana. Desde o início até nossos dias, houve colaboração e busca de outras linhagens, de tecnologias e inovações organizacionais também junto a outros países, sobretudo europeus. Entretanto, a relação privilegiada pelos produtores independentes e por órgãos governamentais, através de acordos, foi com os Estados Unidos. Veremos, de um lado, a experiência de avicultores que, dedicando-se aos diversos ramos da cadeia produtiva avícola, querendo melhorar suas tecnologias, dirigiram-se àquele país. Em seguida analisaremos as experiências levadas adiante pelo governo, através de diversos acordos, com a finalidade de aperfeiçoar a produção avícola nacional. Entre os avicultores independentes que se dirigiram àquele país, podemos lembrar a experiência de J. Reis56 que, após seus estudos no Brasil, fez especialização no Instituto Rockefeller, em Nova York. Ao retornar ao país, dedicou-se à pesquisa, trabalhando no Instituto Biológico de São Paulo e foi um dos principais pesquisadores sobre moléstias das aves. A região de Mogi das Cruzes, próxima a São Paulo, foi uma das maiores colônias japonesas desde o início do século57. Muitos destes imigrantes dedicaram-se à avicultura e sempre mantiveram uma relação muito estreita com os Estados Unidos. Um destes avicultores, Jogi Shigueno fez sua primeira viagem aos Estados Unidos com a idade de 25 anos, em 1963. Lá visitou as instalações da Hy Line, no estado de Iowa e descobriu o 56 J. Reis nasceu em 12 de junho de 1907, na Guanabara, então Distrito Federal e formou-se em medicina, pela Faculdade Nacional de Medicina e pelo Instituto Osvaldo Cruz. 57 Segundo os dados de Darcy Ribeiro (1995, p. 242), 229.000 imigrantes japoneses entraram no Brasil entre 1901 e 1960, dos quais 75% (173.000) entraram entre 1916 e 1945. 76 funcionamento da avicultura mecanizada. Ao retornar ao país, modificou todas suas instalações, reformando os galpões e instalando os comedouros automáticos. A Granja Shigueno foi a primeira produtora de matrizes comerciais a instalar um galpão com ambiente controlado. A partir de 1954 Iwao Ito, outro imigrante japonês da mesma região de Mogi das Cruzes, começou a viajar constantemente para os Estados Unidos. Desde então passou a importar « avós » para formar os plantéis de reprodutores. Naquela época importou as raças New Hampshire, White American e White Leghorn, buscando renovar o plantel e conquistar o mercado nacional. Em 1960, numa viagem específica para melhorar seus conhecimentos em genética e nas técnicas de cruzamentos, fez vários contatos com as empresas americanas. Decidiu trabalhar com a Hy Line e obteve, através da empresa Wallace Chicks Inc., a permissão de distribuir estas aves no país58. Alberto Marques, fundador da CASP, morou vários anos nos Estados Unidos, onde pôde observar os avanços da avicultura. Retornando ao Brasil e instalando-se no « cinturão verde » paulista, dedicou-se à criação de aves, iniciando com 300 poedeiras Leghorns. Vendia os ovos para a colônia inglesa e americana, nos arredores do bairro paulistano do Brooklin. Manoel de Queiroz Telles, formou-se engenheiro em 1927. Como não encontrasse trabalho na sua área de engenheiro eletromecânico, mudou-se para os Estados Unidos, onde trabalhou na Westinghouse. Em 1932, de volta ao país, fundou a fábrica Dove, que produzia encubadeiras e outros equipamentos para avicultura. Breno Martins de Andrade, formado em agronomia pela Universidade de PiracicabaSP, foi estudar nutrição no Yowa State College, nos Estados Unidos. Em 1944, depois de voltar ao país, foi o responsável pela implantação da Refinadora de Óleos Brasil, em São Caetano do Sul-SP, do Grupo Vidigal, primeira fábrica de rações para aves com tecnologia moderna. Além destes e de outros contatos individuais com as novas tecnologias e os avanços da avicultura norte-americana, houve convênios entre os governos brasileiro e americano, permitindo a troca de experiências entre técnicos de ambos os países e visitas de grupos de pesquisadores e avicultores àquele país para melhor conhecer a avicultura moderna. Em 1957 o governo brasileiro junto ao americano firmou um acordo, mediante o qual, o Brasil receberia orientações e projetos de avicultura. Esse acordo foi denominado ETA Escritório Técnico de Agricultura: Brasil/Estados Unidos e, ao setor de avicultura 77 denominou-se ETA Projeto 42. Ainda neste ano, já fazendo parte do novo acordo assinado, aconteceram dois fatos importantes para o avanço da avicultura nacional: a ida de um grupo de avicultores aos Estados Unidos e a vinda de um técnico daquele país para contribuir na divulgação de novas tecnologias. O presidente da Comissão de Estudos da Avicultura Nacional - CEAN, organizou o primeiro grupo brasileiro de técnicos e avicultores para estagiar nos Estados Unidos, em 1957. O grupo foi formado por vinte pessoas59, entre veterinários, agrônomos, técnicos da CEAN, responsáveis pelos trabalhos nas respectivas regiões e de avicultores profissionais. Uma equipe de técnicos norte-americanos acompanhou e orientou os brasileiros neste estágio, que foi patrocinado pela International Cooperation Administration. Os estagiários visitaram várias fábricas de rações, abatedouros de aves, casas de incubação, granjas de postura, universidades, participando ainda de diversas reuniões com técnicos norte-americanos. Após o retorno do primeiro grupo de brasileiros dos Estados Unidos, em 1957, veio ao Brasil, patrocinado pelo mesmo acordo, um técnico especializado em avicultura norteamericana, chamado Frank Moore. Haroldo Vasconcellos, então chefe do Serviço Médico do Ministério do Trabalho, acompanhou a viagem que este técnico fez na maioria dos estados brasileiros. A importância desta viagem do Eta Projeto 42 está no fato de ter permitido avanços onde a avicultura era mais fraca. « Não conseguíamos bom desempenho em São Paulo, Rio de Janeiro e Sul de Minas Gerais porque, de um modo geral, nestas três regiões os produtores e líderes avícolas estavam absolutamente convencidos daquilo que conheciam », narra Haroldo Vasconcellos, que acompanhava o técnico americano (Arashiro, 1989, p. 209). A comissão trabalhou especialmente com pequenos e médios produtores, buscando incentivar a juventude para a atividade avícola. Percorreu vários estados60 e regiões do país, buscando incentivar a avicultura e implementar programas governamentais e estaduais de apoio à produção. Como resultado desta visita, em Minas Gerais foi instalada uma granja experimental num terreno pertencente ao estado, em Sete Lagoas, que servia para pesquisa e incentivo à avicultura regional. Além disso, foi implantado um programa de experimentações 58 Os dados sobre os contatos de pessoas e de grupos de brasileiros com os avanços da avicultura norteamericana foram extraídos do texto de Osny Arashiro (1989). 59 A escolha dos selecionados para este primeiro estágio de dois meses, mostra a importância da avicultura nos principais estados produtores. Dos participantes, 7 eram do Distrito Federal (Guanabara), 7 do estado do Rio de Janeiro, 4 de São Paulo, um de Minas Gerais e um de Pernambuco. 60 Entre eles, dirigiu-se ao interior de Minas Gerais (Prudente de Morais e Viçosa), Santa Catarina, Rio Grande do Sul, Goiás e região Nordeste. 78 em nutrição de aves, na Escola de Viçosa. Estas atividades foram realizadas em conjunto com a Associação dos Avicultores de Minas Gerais. No Rio Grande do Sul foram instalados postos de demonstração avícola e feitos cursos de avicultura em Carazinho e Porto Alegre. As comissões da CNA e CEAN acreditavam que o Sul do país teria grande expressão tanto na avicultura de corte como de postura, devido à grande oferta de matéria prima para rações (milho, soja e trigo) e devido à experiência de criação de pequenos animais na grande maioria dos pequenos estabelecimentos agrícolas da região. A visita deste técnico americano e a viagem que fez pelos diversos estados, contribuiu para conscientizar os avicultores da nova avicultura moderna que deveria ser colocada em prática. 3. Produção artesanal Apesar dos incentivos do governo e das tentativas de acompanhar os avanços internacionais, a avicultura do período não deu grandes passos. Aqui é preciso fazer de novo a distinção entre os pequenos agricultores situados longe dos centros urbanos que praticavam uma avicultura de subsistência e os avicultores dedicados à produção para venda, tanto de ovos, como de galos, galinhas, perus, patos para fornecer carne aos hotéis, restaurantes e outros consumidores urbanos. Entre este segundo grupo, ainda havia a concentração em alguns estados, mais privilegiados graças aos avanços avícolas e às significativas concentrações urbanas, maiores que em outras regiões. No final da década de 30 a avicultura brasileira concentrava-se no Rio de Janeiro, Minas Gerais, São Paulo e Rio Grande do Sul, que eram as principais fontes abastecedoras do mercado interno. Mudanças significativas não ocorreram até o final dos anos 50, conforme mostrava um artigo sobre « como o norte-americano vê a avicultura industrial no Brasil », publicado na edição de abril/junho de 1957 do World’s Poultry Science Journal. Reproduzimos aqui um trecho que descreve as principais áreas de produção, assim como o tamanho dos estabelecimentos envolvidos na atividade. « A indústria avícola brasileira está concentrada, principalmente, em torno de cidades, como Rio de Janeiro, São Paulo e Belo Horizonte, dentro de um raio de 200 quilômetros. Nas áreas geo-econômicas destas cidades, estão estabelecidas centenas de pequenas granjas com capacidade de mil a dez mil e algumas grandes organizaçãos, com cem mil cabeças » (Arashiro, 1989, p. 208). 79 Entre o grupo dos avicultores de subsistência, a produção era baixa e praticamente sem nehuma utilização de tecnologia. Entre estes, « a grande maioria ainda eram sitiantes, os quais, tanto para a produção de carne como de ovos, não levavam em conta as novas técnicas de alimentação » (Arashiro, 1989, p. 127). A avicultura estava centrada nos estados mais populosos do país e nas mãos dos produtores dos « cinturões verdes »61. Torná-la presente nas distantes regiões, em todos os estados (tabela 5), e acessível aos habitantes das pequenas cidades do interior, foi tarefa dos agricultores dedicados a uma avicultura de subsistência e de venda de pequenos excedentes. Sem considerar São Paulo e Minas Gerais, de longe os maiores produtores e maiores fornecedores para o consumo das grandes cidades, certamente os avicultores dos demais estados pertenciam ao grupo dos que praticavam esta avicultura artesanal, caipira ou de fundo de quintal, para auto-consumo e fornecimento ao mercado local. 4. Evolução da produção e do consumo Na verdade, tanto a produção como o consumo de carne de frango só aumentaram efetivamente no Brasil, com a introdução da avicultura industrial e a forte urbanização da população, sobretudo a partir da década de 1970. Ao longo das décadas de 30 a 60, que são o objeto de análise deste capítulo, o que vemos é o início dos abates de frangos, galos e galinhas, patos, perus e marrecos, nos frigoríficos, açougues, abatedouros de pequenos animais, sobretudo a partir de meados da década de 40, quando começou a escassear e encarecer-se a carne bovina. Até inícios da década de 40, no Brasil dava-se mais importância à criação de aves poedeiras para a exploração de ovos, dada a relativa abundância de carne bovina e suína. Com o elevado preço do « filet mignon » e seu racionamento durante a Segunda Guerra, a procura de carne de aves começou a crescer. Os matadouros e frigoríficos que apenas se interessavam pelo gado e pelo porco, passaram a matar galinhas em caráter experimental. No final da 61 Para a análise de como se deu a formação do « cinturão verde » de Curitiba-PR, ver o texto de Carlos Roberto Antunes dos Santos (1995), História da Alimentação no Paraná, Fundação Cultural, coleção « Farol do Saber ». O autor explica como as 12 colônias estabelecidas no governo de Lamenha Lins contavam, em 1876, com 4.000 colonos, estabelecidos em 509 lotes. « A finalidade destes cinturões verdes era suprir os centros urbanos através da agricultura de subsistência e com isto garantir o abastecimento. Neste sentido, as colônias passaram a produzir milho, arroz, feijão, mandioca e outros produtos (...), assim como dedicaram-se à produção de pequenos animais domésticos, verduras, frutas e vegetais, cujos excedentes eram comercializados em Curitiba » (Santos, 1995, pp. 75-76). 80 década de 1940, grande número de frigoríficos, sobretudo os situados próximos aos grandes centros urbanos, abatiam aves para o consumo. O número de aves mortas nestes frigoríficos e matadouros ainda era insignificante, se comparado com o volume dos Estados Unidos, da Alemanha, da Holanda, da Argentina e de outros países. Mas o fato representou um bom começo, pois antes da guerra, o abate das aves nem mesmo se incluía entre as atividades dos frigoríficos. Pelos fatores acima mencionados, o interesse dos consumidores brasileiros pela carne de aves vinha aumentando ao final da década de 40. Para atender a esta nova demanda, sobretudo nas duas maiores cidades do país, os matadouros passaram a abater sistematicamente e em grande número. « No Matadouro Avícola do Mercado Municipal de São Paulo se abatiam mais de um milhão de frangos e galinhas, enquanto que nos matadouros avícolas do Rio de Janeiro esse número já ia além de 1,5 milhão anualmente » (Arashiro, 1989, p. 152). O que não existia era a produção de raças e de tipos especiais de carne para atender ao paladar dos consumidores exigentes, que formavam os « nichos de mercado ». Estes produtos diferenciados e já semi-prontos só apareceriam mais tarde, com a avicultura industrial, quando as grandes empresas, além de produzir o frango inteiro vendido a preços populares, especializaram-se em outros sub-produtos, de maior valor agregado, como veremos nos capítulos seguintes. Na década de 50 os matadouros brasileiros abatiam todas as aves e de todos os tipos, desde que aprovadas pela inspeção veterinária. O consumo cada vez maior de carnes especiais de aves, sobretudo nos melhores e mais sofisticados restaurantes e hotéis, não encontrava produção satisfatória nas granjas do país. Nos armazéns frigoríficos do Rio de Janeiro, se acumulavam, mensalmente, milhares de galinhas, patos e perus importados da Argentina. Na verdade, tratava-se de produção selecionada, destinada aos consumidores dos grandes hotéis ou às recepções e festas sociais de importância. Era indiscutível, contudo, que se as granjas brasileiras estivessem em condições de fornecer aqueles mesmos animais nas mesmas condições (tipos, qualidade, preparação, etc.), não seria necessária a importação da Argentina. Como o consumo da carne de frango, no final da década de 1950, vinha ganhando importância, vários avicultores, sobretudo os situados próximos aos grandes centros urbanos que só trabalhavam com produção de ovos, começaram a produzir frangos. Davam preferência ao frango de raça, que produzia mais carne, consumia menos ração e se desenvolvia mais rápido que o tradicional. Estes frangos, sobretudo nas grandes cidades, eram assados em espetos, à vista do freguês, em máquinas especiais de aço inoxidável, instaladas 81 em bares, restaurantes, confeitarias, tanto no centro da cidade como nas periferias, dispondo de cinco espetos, cada um comportando cinco ou seis frangos. Graças aos abates feitos nos diversos estabelecimentos, o hábito de só comprar galinha viva também foi se alterando. De acordo com os dados de Arashiro (1989), em meados da década de 1950, o consumo de aves abatidas e prontas ganhava aceitação, embora ainda houvesse resistência de donas de casa que preferiam « ver morrer o frango ou a galinha em sua própria cozinha, como garantia de qualidade e saúde ». Uma análise da localização destes abatedouros de frangos antes da avicultura industrial nos indica as grandes transformações que ocorreram com o início desta prática, deslocando a maior parte da produção para o Sul do país. Até o final da década de 50, os estados onde se faziam abates eram Pernambuco, Minas Gerais, Espírito Santo, Rio de Janeiro, São Paulo, Paraná, Santa Catarina, Rio Grande do Sul e Distrito Federal. O total da produção nacional era de 33.744 perus; 4.160.199 galinhas e frangos; 73.961 patos e marrecos, incluindo o abate em matadouros-frigoríficos, matadouros-avícolas, charqueadas, fábricas de produtos suínos. O principal estado produtor era o Rio de Janeiro, com 1.715.913 de cabeças, seguido de São Paulo, com 1.598.480 e do Paraná, com 406.765 cabeças, que equivaliam a mais de 5.000 toneladas de carne e miúdos comestíveis (dados referentes a 1955). 82 TABELA 4 - ESTABELECIMENTOS ABATEDORES E AVES ABATIDAS NO BRASIL 1956 NÚMERO DE CABEÇAS ABATIDAS CATEGORIA DOS PERUS ESTABELECIMENTOS GALINHAS E PATOS E GALOS MARRECOS TOTAL PERNAMBUCO Matadouros Avícolas 34 1 195 - 1 229 - 5 759 -- 5 759 MINAS GERAIS Fábricas de produtos. suínos Matadouros avícolas 496 326 667 1 522 328 685 Total do Estado 496 332 426 1 522 334 444 - 5 192 ESPIRITO SANTO Charqueadas - 5 192 RIO DE JANEIRO Matadouros avícolas 110 17 294 344 17 748 11 954 2 110 231 47 601 2 169 786 Frigoríficos 6 819 502 178 3 860 512 857 Matadouros avícolas 1 249 898 721 17 110 917 080 Total do Estado 8 068 1 400 899 20 970 1 429 937 Frigoríficos 337 40 310 649 41 296 Matadouros avícolas - 341 145 20 341 165 Total do Estado 337 381 455 669 382 461 DISTRITO FEDERAL Matadouros avícolas SÃO PAULO PARANÁ SANTA CATARINA Frigoríficos Fábricas de produtos - 1 393 - 1 393 - 13 504 1 395 14 899 - 14 897 1 395 16 292 suínos Total do Estado RIO GRANDE DO SUL 83 Frigoríficos 16 254 Charqueadas Fábricas de 66 produtos - 54 069 24 079 - 70 323 - 66 - 24 079 suínos Matadouros avícolas Total do Estado 482 244 787 5 686 250 955 16 802 322 935 5 686 374 423 4 509 625 869 BRASIL Frigoríficos 23 410 597 950 66 5 192 - 5 258 43 342 1 395 44 737 Charqueadas Fábricas de produtos - suínos Matadouros avícolas 14 325 3 940 040 72 283 4 026 648 TOTAL 37 801 4 586 524 78 187 4 702 512 FONTE: Serviço de Estatística da Produção - Ministério da Agricultura, in: Arashiro (1989, pp.156-157). Este levantamento, feito pelo Serviço de Estatística da Produção, do Ministério da Agricultura, trazia dados incompletos, porque deixava de mencionar vários estados62 e os territórios. Existe a hipótese de que a produção destes estados era vendida diretamente para o consumo de aves vivas, ou que o número era pouco significativo. Nem mesmo o estado da Bahia, primeiro lugar na produção de perus e possuindo um rebanho de quase 6 milhões de galinhas, frangos e galos, figurava entre os produtores de aves abatidas. Se a tabela 4 nos ajuda a entender os abates de aves, a tabela 5 nos fornece indicações sobre o plantel de aves vivas presentes em cada estado. O levantamento era feito contando separadamente as galinhas de uma parte e, os frangos, frangas e galos de outra parte. Nós, para efeito de simplificação, juntamos todas as informações numa única tabela. As galinhas representavam 79.962 em 1954 e, 90.848, em 1956. Os galos, frangos e frangas, representavam 56.745 e 61.639, nas mesmas datas. Isto mostra, portanto, que a produção de ovos era mais importante que a de frango de corte, uma vez que o número de galinhas era 62 Em 1950 o Brasil tinha 20 estados, mais o Distrito Federal (Guanabara) e quatro territórios (Acre, Amapá, Rondônia e Roraima, sendo que o primeiro foi constituído em 1903 e os outros três em 1943). Em 1960 o Distrito Federal foi transferido para Brasília e os territórios foram transformados em estados (Acre em 1962, Rondônia em 1981, Amapá e Roraima com a Constituição de 1988). Além disso foram criados dois novos estados, Mato Grosso do Sul em 1979 e Tocantins em 1988. Atualmente o Brasil conta com 27 unidades federativas, incluindo o Distrito Federal. 84 superior ao de galos, frangos e frangas, representando 58,49% e 59,59% nos anos mencionados. 85 TABELA - 5 - DISTRIBUIÇÃO DAS AVES ENTRE OS ESTADOS BRASILEIROS: 19541956 (Galinhas, galos, frangos e frangas) UNIDADES DA FEDERAÇÃO NÚMERO DE CABEÇAS (em mil) 1954 1955 1956 88 90 97 Acre 362 377 383 Amazonas 458 468 529 1 326 1 346 1 361 128 131 134 Maranhão 3 969 4 123 4 125 Piauí 2 530 2 687 2 889 Ceará 3 368 3 484 3 696 Rio Grande do Norte 1 108 1 025 1 095 Paraíba 1 852 2 000 2 073 Pernambuco 3 338 3 441 3 353 Alagoas 1 712 1 750 1 837 Sergipe 1 005 958 1 003 Bahia 6 222 5 856 6 240 Minas Gerais 30 007 31 023 31 501 Espírito Santo 3 581 3 778 3 820 Rio de Janeiro 11 231 11 931 10 446 Distrito Federal - - 27 638 30 709 31 583 Paraná 9 054 9 835 11 562 Santa Catarina 5 313 5 973 6 699 11 570 12 812 13 550 Mato Grosso 3 451 4 439 5 195 Goiás 7 396 8 433 8 979 136 707 146 669 152 451 Rondônia Pará Amapá São Paulo Rio Grande do Sul BRASIL 337 FONTE: Serviço de Estatística da Produção, do Ministério da Agricultura, citado por Arashiro (1989, pp.157-158). 86 Pela tabela acima, podemos ver que o estado de São Paulo era o maior produtor, representando 20,72% da produção, em 1956, seguido de Minas Gerais, com 20,66%. Por outro lado, Santa Catarina que se tornou o maior produtor depois de implantada a avicultura industrial, como veremos nos capítulos seguintes, não representava mais que 4,39% do total. No final da década de 1950, o Brasil, com pouco mais de 60,8 milhões de habitantes, constituía uma base segura para os empreendimentos avícolas. No entanto, era difícil avaliar com certeza a capacidade de consumo de aves. O abate registrado de galinhas e frangos, segundo Arashiro (1989), não atingia a 20 milhões de unidades por ano, nas capitais dos estados. No Rio de Janeiro, por exemplo, o abate era de cerca de dois milhões de aves, proporcionando a média de menos de uma galinha por habitante/ano, podendo-se dizer o mesmo para o estado de São Paulo. Conforme estudo elaborado para o Banco de Desenvolvimento Econômico, em 1954, havia 6 milhões de aves de raça pura no Brasil. Até o final da década, este número era estimado em 10 milhões, o que representava menos de 10% do rebanho total. De acordo com os dados oficiais, a evolução do plantel avícola brasileiro foi a seguinte, na primeira metade do século. TABELA 6 - BRASIL - POPULAÇÃO E NÚMERO DE AVES POR HABITANTE : 1920 - 1960 Anos População Aves Indice 1920 30 635 605 49 766 258 1,62 1940 41 236 315 59 274 267 1,43 1950 51 944 397 73 920 274 1,42 1960 70 119 071 132 274 998 1,88 Fonte: Anuário do IBGE, 1972. 5. Comercialização continua tradicional A comercialização de aves, nesta época, era feita nas condições do comércio tradicional, sobretudo dominado pelos intermediários. As compras eram feitas tanto na periferia das grandes cidades como no interior. Em seguida, as aves eram vendidas, sobretudo vivas, no comércio tradicional das cidades e abatidas pelas próprias donas de casa, em suas residências. 87 No início da década de 30, a comercialização avícola no Brasil era muito pouco organizada. O abastecimento dos mercados resultava quase sempre da atividade de numerosos intermediários que, agindo nas zonas rurais mais afastadas, se dedicavam à tarefa de reunir a contribuição de milhares de pequenos produtores, os quais, em sua maioria, não se dedicavam propriamente à criação de aves, porém, para estas reservavam um pouco de seus esforços, dadas as facilidades que a criação apresentava. Como era de se esperar, essa criação era constituída por aves crioulas, mestiças, de diminuto rendimento, tanto em carne, como em ovos. Como os produtores não tivessem condições econômicas, nem técnicas, nem de assistência dos órgãos públicos ou privados para melhorar suas criações, a avicultura continuava sendo praticada de forma artesanal e tradicional. Quanto ao comércio, era feito de maneira tipicamente tradicional. Na década de 40, tanto as aves dedicadas à produção de ovos (no final do ciclo de postura), como os frangos, galos e outras galinhas criadas para serem abatidas, « eram vendidas no ‘Largo da Galinha’, no fim da rua General Carneiro, no centro velho de São Paulo. A dona de casa chegava e escolhia a ave viva. O comércio de aves abatidas surgiu bem mais tarde. Havia também o frango caipira, do fundo de quintal e do interior, mas o consumo era baixo » (Arashiro, 1989, p. 202). Era preciso haver uma transformação radical para que a avicultura pudesse dar saltos qualitativos, tanto na produção como na comercialização e no consumo. Para isto, deveria-se romper o círculo vicioso de produção artesanal, sem tecnologia, baixa produtividade e de poucos ganhos aos produtores; comércio tradicional, dominado por intermediários, vendendo pequenas quantidades, em condições precárias, com dificuldades de reunir a produção situada distante dos grandes centros; baixo consumo; aves compradas vivas e abatidas em casa. Esta transformação só aconteceria na década de 60, com a introdução da avicultura industrial. 6. Indústria avícola familiar A avicultura tradicional, como caracterizamos acima, não poderia fornecer uma quantidade de aves suficientes para uma indústria moderna, com capacidade de desenvolver uma economia de escala e uma grande produtividade. Além disto, o consumo era baixo e caracterizado pela venda de aves vivas. Por isto, as indústrias que atuavam no setor avícola do período eram caracterizadas como empresas familiares, de pequeno porte, com baixa produtivade e poucos investimentos tecnológicos, atendendo mais ao mercado local. 88 Aliás, até o início da década de 1930, todos os setores industriais produtivos, continuavam muito modestos, formados principalmente de pequenos estabelecimentos produzindo para os mercados locais. Eram pequenas fábricas e oficinas, quase sempre de propriedade familiar, que produziam alimentos, bebidas, tecidos, roupas, máquinas, utensílios domésticos, artigos de higiene e uso pessoal. Formavam-se de empreendimentos de pequenas aplicações de capital e de capacidade produtiva limitada, que utilizavam mão-de-obra pouco especializada. Dependiam basicamente do consumo sustentado pela renda do setor exportador e da oscilação dos preços dos produtos importados (Teixeira e Totini, 1993). A indústria avícola brasileira da época pode ser descrita com estas mesmas características. Era normalmente de propriedade familiar e formada por uma única unidade produtiva. Sua produção era dirigida e controlada pelo proprietário, auxiliado por outros membros da família. Dedicava-se a uma só função econômica, ou produzindo determinados implementos para a avicultura, ou fornecendo matrizes ou pintos de um dia e atuava numa única área geográfica, geralmente localizada próximas aos centros urbanos. Para melhor compreender estas empresas, as dividimos em três setores. Em primeiro lugar, as pequenas, voltadas ao abate de aves, que se desenvolveram sobretudo à partir de meados dos anos 40; segundo, as que se dedicaram à produção de matrizes e pintos de um dia; e por fim, as que produziam equipamentos para a avicultura. Empresas do setor de abate de aves As empresas de abate de aves passaram a existir durante a Segunda Guerra. Não foram especialmente criadas para atender à demanda do comércio de aves. Já atuando no setor de carnes, pelas dificuldades causadas pela guerra, sobretudo elevando o preço do « filet mignon » e causando seu racionamento, tais empresas buscaram diversificar suas atividades para atender a procura de carne de aves que começava a crescer. Para atender esta nova demanda, os avicultores que antes se dedicavam sobretudo à produção de ovos, também diversificaram suas atividades, criando aves para produção de carne. Na metade dos anos 40, os matadouros e frigoríficos que apenas se interessavam pelo gado, passaram a fazer abates de galinhas em caráter experimental. Como estas aves tivessem aceitação no mercado e sua procura aumentasse, no final da década, quase todos os frigoríficos abatiam aves. O número de aves vendidas mortas e prontas para o consumo ainda era muito baixo se comparado com os países mais desenvolvidos. Entretanto, o fato de vender 89 aves prontas já consistia uma novidade e seu número crescia rapidamente, conforme podemos observar pela tabela abaixo. TABELA 7 - ABATE DE AVES NO BRASIL -1942 e 1944 AVES Frescas Frigorificadas Enlatadas TOTAL 1942 1944 183.327 248.731 43.681 295.570 0 13.509 227.008 557.810 Fonte: Arashiro, 1989, p.143. Como vimos acima, as empresas dedicadas a esta nova tarefa eram de caráter familiar e pouco desenvolvidas. No final dos anos 50, as aves estavam sendo abatidas comumente, em estabelecimentos industriais e em postos de abate anexos às granjas. Os abatedouros de aves63 funcionavam também como matadouros de pequenos animais: suínos, caprinos, ovinos e coelhos. Arashiro (1989) descreve estas instalações, dizendo que eram simples e precárias, compreendendo: depósito ou curral; sala de matança; sistema de refrigeração; sistema de comercialização. O depósito ou curral era destinado a receber e « estocar » as aves que seriam abatidas. Neste local era feito o descanso e o jejum antes do abate. As aves ficavam alojadas em gaiolas de madeira ou de ferro, com lotação variável, localizadas geralmente em galpões rudimentares. A inspeção veterinária antes do abate, era feita nas próprias gaiolas. A sala de abate, bastante improvisada, abrangia as seguintes peças: local do abate; tanque de escaldamento; local de depenação; local de evisceração; tanque de limpeza (Arashiro, 1989, p. 153-155). A tecnologia utilizada era simples, com algumas adaptações das « máquinas » usadas no abate dos outros animais. As nórias, assim como as depenadeiras e evisceradoras automáticas, são tecnologias adotadas a partir da avicultura industrial dos anos 1970 e 80. Empresas do setor de matrizes e pintos de um dia 63 Para maiores detalhes sobre os diferentes tipos de abatedouros, sua localização geográfica, os tipos de aves abatidas, assim como suas quantidades, ver tabela n° 4. 90 Como nenhuma das empresas atuando no setor conseguiu até esta época implantar a « integração vertical », abrangendo todas as etapas do processo produtivo, as diversas etapas que envolviam a criação avícola permitiram o surgimento de várias empresas familiares, especializadas para cada etapa do processo de produção. Exemplo disso são as que se dedicaram à produção de matrizes e de pintos de um dia, tipicamente familiares, dedicadas a uma única etapa do processo produtivo. Até o início da comercialização dos pintos de um dia, na década de 30, os avicultores deviam ocupar-se da compra das incubadoras e da produção dos próprios pintos, o que acarretava um custo financeiro maior, exigia mais trabalho e o resultado era inferior à compra dos pintos vivos. Por isto, foi bem recebida a novidade em matéria de criação, surgida em 1931, da venda de pintinhos de um dia. Entre as empresas de São Paulo que se destacaram em tal comércio, podemos citar a Granja São Paulo, que vendia pintos da linhagem Leghorn, a partir de 2$500 réis por cabeça, e a Granja Petaluma, que remetia seus produtos para qualquer parte, desde que a viagem não ultrapassasse 60 horas. Uma vez que empresas se especializaram nesta atividade, este tipo de comércio substituiu com vantagens incontestáveis, a venda tradicional de ovos para incubação64. Outra região de destaque neste tipo de produção foi Mogi das Cruzes, por muitos anos considerada a capital nacional da avicultura. Em 1937, Shozo Sakai, diplomado em Técnicas Avícolas no Japão, depois de ter migrado para o Brasil, estabeleceu-se nesta região. O começo foi modesto, pois só dispunha de duas chocadeiras, uma a querosene, com capacidade para três mil ovos e a outra, elétrica, com capacidade para 12 mil ovos, ambas construídas por Sakai. Apesar de ter continuado fabricando chocadeiras, seu principal negócio passou a ser a venda de pintos de um dia, entre os produtores da região. Em 1941 construiu uma nova granja, onde pôde aperfeiçoar o trabalho de seleção das linhagens das matrizes. Em 1972, a Granja Sakai tinha uma produção mensal de 350 mil pintos para corte, 160 mil (ovos brancos) e 60 mil (ovos vermelhos), ambos para galinhas poedeiras. Assim como seu conterrâneo, outro imigrante japonês, Shin Shigueno chegou ao Brasil em 1934. Um ano mais tarde, incentivado por Sakai, entrou na avicultura, iniciando 64 Ao adquirir pintos de um dia no lugar de ovos incubáveis, o comprador tinha diversas vantagens, entre as quais, podemos mencionar as seguintes: Não precisaria incubar os ovos. Trabalho penoso, arriscado e que exigia considerável capital com chocadeiras; obtinha exatamente o número de pintos que desejasse, livres das desilusões dos « ovos claros » e « gorados »; certeza absoluta de que os pintos adquiridos eram sadios. Por sua vez, o vendedor também tinha vantagnes: Tinha sua reputação absolutamente garantida, pois uma vez fornecidos pintos bons e fortes, não corria risco algum de descontentar os clientes; Não estava sujeito a reclamações e trocas de ovos « claros » que sempre apareciam; Estava livre das perdas com ovos que 91 suas atividades com 300 matrizes Leghorn. O galinheiro era de ripado com poleiro e na parte externa havia uma cerca de alambrado, permitindo às aves um recinto para tomar sol e exercitar-se. As condições de produção eram muito precárias até o início da década de 60. Em 1963, Jogi Shigueno, seu filho, fez sua primeira viagem aos Estados Unidos, visitanto as instalações da Hy Line, en Iowa. Na volta, mudou completamente o método de produção. Reformou os galpões para adaptá-los aos comedouros automáticos e construiu núcleos isolados para a produção de matrizes. A Granja Shigueno especializou-se em matrizes comerciais e tornou-se a distribuidora das linhagens Dekalb. Em 1934, Giichi Kunitomo imigrou com a família para o Brasil e foi trabalhar na lavoura de café, em Ribeirão Preto. Seu pai, que trabalhava na avicultura antes de deixar o Japão, mudou-se para Mogi das Cruzes e, em 1939 retomou esta atividade, iniciando com 500 aves Leghorn, adquiridas de um grupo de incubadores da região. As instalações eram todas precárias, de madeira. Em 1954, a Granja Kunitomo Ltda., tornou-se também incubatório. Dez anos mais tarde, a granja passou a trabalhar com a linhagem Babcock, com plantel inicial de 1.370 matrizes e 137 galos. Iwao Ito nasceu em 1924, na cidade de Registro-SP e passou sua infância em São Bernardo do Campo-SP. Desde cedo dedicou-se à avicultura e fundou o Grupo Ito, um dos maiores empreendimentos dos imigrantes japoneses. Em 1945, Iwao Ito decidiu montar uma Central de Incubação. Ele mesmo construiu uma incubadora com capacidade para 10 mil ovos. Instalou-se na Avenida Pereira Barreto, em Santo André65, próximo à RFFSA - Rede Ferroviária Federal S.A., o que facilitaria o transporte dos pintos para o interior do estado. A partir de 1954 Iwao começou a viajar constantemente para os Estados Unidos. Desde então passou a importar avós para formar os plantéis reprodutores. Naquela época importou New Hampshire, White American e White Leghorn, buscando sempre renovar seu plantel. Em 1960 concluiu um acordo com a Hy Line para distribuir suas aves no Brasil66. Empresas de equipamentos para avicultura goravam por causa dos longos transportes nas mesmas posições; Era mais fácil transportar pintos do que ovos. 65 Nesta época, as granjas consideradas grandes reuniam um plantel de três mil matrizes. As granjas médias possuíam entre 200 e 300 matrizes. A maioria das granjas estavam localizadas em Mogi das Cruzes e no « Cinturão Verde » de São Paulo. 66 O Grupo Ito é uma exceção entre as empresas familiares do setor avícola paulista. Tendo diversificado suas atividades, no final dos anos 80, o abate de frangos representava 22% da receita do grupo, o gado e os suínos 92 Além das matrizes e dos pintos de um dia, os avicultores precisavam de vários outros equipamentos para levar adiante sua produção. Foi para atender a estas necessidades que outras empresas surgiram, especializadas na produção de chocadeiras, comedouros, bebedouros, etc. Neste caso, também se caracterizaram como indústrias familiares, sobretudo em seus primeiros anos de existência, antes do surgimento da avicultura industrial. Uma destas empresas, a Sociedade Comissária Avícola Ltda., mais conhecida como CASP, foi fundada por Alberto Marques, em 1936. No início, sua atividade principal era a exportação de ovos para a Inglaterra, mas também estava voltada à fabricação de pequenos equipamentos avícolas, chocadeiras e comedouros lineares. Com a Segunda Guerra, acabou a exportação de ovos e a empresa concentrou-se na fabricação de equipamentos. Em 1941 os Estados Unidos suspenderam as exportações de equipamentos por causa da guerra. Com isto a CASP passou a fabricar sua primeira incubadora para 20.000 ovos. No entanto, assim que a guerra acabou, reiniciaram-se as exportações norte-americanas e a empresa não tinha como concorrer com as grandes empresas daquele país. Voltou-se para a fabricação de pequenas chocadeiras, comedouros, engradados para ovos. A partir de 1956 a CASP passou a produzir os comedouros tubulares Hudson, com chapas galvanizadas de zinco. Um passo importante foi dado em 1959, quando a empresa fez um acordo com a Chick Master Incubator Co., de Cleveland, Estados Unidos. Com isto, a CASP ingressava definitivamente na era de fabricação de incubadoras no Brasil. Donald Marques, filho de Alberto Marques, estagiou durante o mês de setembro de 1959 na fábrica da Chick Master, trazendo todos os projetos e desenhos para o Brasil. Em julho de 1959 a CASP lançava a primeira incubadora para 33.000 ovos, com marca de Chick Master do Brasil. Nos anos seguintes, passou a fabricar a linha completa da Chick Master, sendo incubadora para 60.000 ovos, em 1962 e para 99.000 ovos, em 1963. Depois de ter vivido alguns anos nos Estados Unidos, Manoel de Queiroz Telles, fundou, em 1932 outra empresa, a DOVE, dedicada à fabricação de chocadeiras. Durante a décade de 30 e até por volta de 1945 a Dove fabricava também ração para galinhas. Nesta época parou de fabricar ração, mas continuou produzindo chocadeiras, bebedouros e campânulas, que comercializava em todo país. Cada uma destas empresas deu sua contribuição para o avanço da avicultura nacional. Por causa de seu caráter familiar e pelos escassos recursos, tanto em capital quanto em dirigentes capacitados, elas não conseguiram implementar o processo de produção vertical representavam outros 18% da receita. No entanto, seu núcleo principal continuava sendo o comércio de ovos e de pintos, que representavam 60% de suas receitas. 93 que caracterizaria a indústria avícola moderna. Entretanto, o contato de avicultores e de técnicos individuais, assim como os grupos que foram aos Estados Unidos e à Europa em busca de novas tecnologias, contribuíram decisivamente para o surgimento da avicultura moderna. Com a eleição de Juscelino Kubitschek67 à presidência da República em 1955, o Brasil aprofundou seu processo de industrialização. Graças a isto, aumentou o êxodo rural e, no início dos anos 60, o país tinha uma população que superava os 70 milhões de habitantes, sendo 45% urbanizada. Esta população urbana, vivendo de salário e não tendo mais condições de criar suas galinhas « no fundo do quintal », passou a comprar cada vez mais frangos prontos para sua alimentação, o que contribuiu para a passagem da avicultura artesanal à industrial. Por fim, a tecnologia para o processo de produção de frango de corte estava desenvolvida e à disposição no mercado internacional. Desde a genética, que criou linhagens especiais para frangos com mais carne, os equipamentos industriais, a produção de rações, até a experiência de relação com os pequenos produtores, responsáveis pela criação e engorda dos frangos. Bastava comprar estes elementos, adaptá-los às condições nacionais e implementar a integração vertical na avicultura. Foi o que algumas empresas fizeram, no início dos anos 60, substituindo assim a avicultura artesanal pela avicultura industrial, como veremos a seguir. 67 Sua política era de implementar o desenvolvimentismo através da industrialização acelerada: « 50 anos em 5 ». No Programa de Metas, apresentado durante a campanha, distribuía da seguinte forma a aplicação dos recursos: 42,4% do investimento para aumentar a produção de energia elétrica; 28,9% para a reforma e ampliação do sistema ferroviário, construção e pavimentação rodoviária; 22,3% para incremento à produção de aço, alumínio, cimento, metais não-ferrosos, papel, celulose e borracha; 3,6% nas áreas de fertilizantes, armazenagem, mecanização agrícola, frigoríficos e cultivo de trigo e; 2,8% para manutenção e ampliação do sistema escolar. 94 CAPÍTULO 4 CONSTITUIÇÃO DAS PRIMEIRAS EMPRESAS AVÍCOLAS INTEGRADAS VERTICALMENTE: 1960-1975 1. Imigrantes, pequenas propriedades e origem da Sadia e da Perdigão A região Sul do Brasil foi ocupada por imigrantes italianos68 e alemães69, sobretudo a partir da segunda metade do século XIX e no início deste século. A nível nacional as imigrações foram incentivadas para substituir a mão de obra escrava, especialmente nas lavouras de café. Por isto, a maioria dos estrangeiros foi morar e trabalhar no estado de São Paulo. Os que se dirigiram ao Rio Grande do Sul conseguiram realizar seu sonho de se tornar 68 69 Para maiores detalhes da colonização italiana no Rio Grande do Sul, ver os textos de AZEVEDO Thales de (1975), Italianos e gaúchos: Os anos pioneiros da colonização italiana no Rio Grande do Sul, Porto Alegre, A Nação/Instituto Estadual do Livro; COSTA, R. e DE BONI, Luis (1984), Os italianos no Rio Grande do Sul, Caxias do Sul, Correio Riograndense/Educs, 3a ed.; FROSI Vitalina e MIORANZA Ciro (1975), Imigração italiana no nordeste do Rio Grande do Sul, Caxias do Sul, Ed. Movimento; TRENTO Angelo (1988), Do outro lado do Atlântico: um século de imigração italiana no Brasil, São Paulo, Ed. Nobel. Darcy Ribeiro (1995, pp. 241-244), fornece uma ampla bibliografia sobre o papel da imigração e o número de imigrantes que vieram ao Brasil. A tabela que transcrevemos nos fornece uma síntese da quantidade, período e nacionalidade destes imigrantes. TABELA - 8 - DISTRIBUIÇÃO DOS CONTINGENTES IMIGRATÓRIOS POR PERÍODOS DE ENTRADA (em mil) Períodos Portugueses Italianos Espanhóis Japoneses Alemães Totais 1851-1885 237 128 17 59 441 1886-1900 278 911 187 23 1.398 1901-1915 462 323 258 14 39 1.096 1916-1930 365 128 118 85 81 777 1931-1945 105 19 10 88 25 247 1946-1960 285 110 104 42 23 564 TOTAIS 1.732 1.619 694 229 250 4.523 Fonte: RIBEIRO (1995, p. 242). 95 proprietários de terra mais rapidamente. Uma vez instalados em pequenas propriedades dedicaram-se sobretudo à policultura de subsistência e à venda dos excedentes. Os primeiros italianos chegaram ao Rio Grande do Sul em 1875 e, até as primeiras décadas deste século ocuparam as regiões mais férteis do estado, que não interessavam à tradicional pecuária extensiva, sobretudo no Alto Uruguai, Lagoa Vermelha e Passo Fundo. A partir de 1920, devido ao crescimento demográfico, ao esgotamento do solo e à falta de infra estrutura de comercialização, grande número destes imigrantes deslocou-se para o oeste de Santa Catarina e para o estado do Paraná. Ocupação do oeste catarinense Habitada sobretudo por índios e caboclos70, a região estava desligada da economia e dos principais acontecimentos nacionais. Até o final do século XIX, com exceção de alguma criação de gado e exploração de erva-mate, pouco se tinha feito para incorporar esta região à vida nacional. A situação começou a mudar a partir de 1906, quando chegaram a Santa Catarina, as obras da Estrada de Ferro São Paulo-Rio Grande, adquirida pela Brazil Railway Company, do grupo norte-americano de Percival Farquhar, concessionário do projeto de ligação ferroviária entre Itararé, em São Paulo e Santa Maria, no Rio Grande do Sul. Este projeto, nascido no Império e mantido pela República, possuía um claro objetivo estratégico: acelerar a ocupação de uma região de fronteira, ainda sujeita a litígios entre o Brasil e a Argentina (Teixeira, 1994). A construção da ferrovia no trecho catarinense e riograndense (Porto União-SC a Marcelino Ramos-RS) levou para estes estados milhares de trabalhadores, muitos dos quais se estabeleceram no local após o término das obras. A companhia, em troca da construção da ferrovia, recebeu o direito à propriedade de 15 km de terra de cada lado da estrada (Silva, 1991, p. 41). Outra companhia, a Brazil Development and Colonization Co., passou a colonizar estas terras em 1914 e, ao mesmo tempo explorou suas reservas de madeiras nobres, por meio da empresa associada Southern Brazil Lumber and Colonization Co. Depois que os primeiros trens começaram a circular pelas margens do rio do Peixe, no final de 1910, os colonos começaram a chegar em grande número e estabeleceu-se 96 definitivamente a ligação da região com os principais centros urbanos do país. Aos trabalhadores que construíram a estrada de ferro, aos índios e caboclos da região, vieram juntar-se as levas de colonos e pioneiros gaúchos, interessados em comprar os lotes oferecidos pelas novas companhias colonizadoras. O Censo de 1920 indicava que o estado de Santa Catarina contava com 670.000 habitantes dos quais, metade residia na faixa litorânea, outra boa parte no planalto e o restante espalhava-se pelas matas e campos do oeste. Sua população era formada pelos índios caigangues e xoclengues, entre outros grupos, caboclos, fazendeiros, agregados, peões e aventureiros, que plantavam e produziam muito pouco, vivendo mais da caça e do extrativismo. Com a chegada dos migrantes do Rio Grande do Sul, surgiram vários conflitos de terras entre os antigos moradores (índios e posseiros), as companhias colonizadoras e os novos colonosAlém destes conflitos, havia a disputa pelo estabelecimento das divisas entre os estados do Paraná e de Santa Cantarina. O principal destes conflitos tomou grandes dimensões, exigindo a intervenção do Exército nacional. Posseiros, índios e antigos trabalhadores da estrada de ferro que não tiveram acesso à terra, inspirados em motivos religiosos e lutando por um pedaço de chão, deflagraram a « Guerra do Contestado », que se estendeu de 1912 a 1916. Depois de várias intervenções, o Exército conseguiu vencer os posseiros e estabeleceu a « ordem » na região. Uma vez assinado o tratado de paz e estabelecidos os limites entre os estadosestudar , o governo de Santa Catarina tratou de integrar tanto jurídica como administrativamente as terras do oeste. Para isso, criou os municípios de Chapecó e Joaçaba e legalizou os títulos de propriedade, além de constituir empresas colonizadoras71, que receberam as concessões das terras em diversas localidades da região a serem povoadas. Conforme os contratos estabelecidos com estas empresas, elas deveriam demarcar os lotes e oferecê-los a colonos, nacionais e estrangeiros, assentando no mínimo 30 famílias por ano e responsabilizarem-se pela construção de estradas que servissem às diversas glebas (Teixeira, 1994). Além dos recursos próprios, as empresas recebiam subvenções oficiais para 70 Caboclos são os mestiços, descendentes de brancos e índios que habitavam a região antes da colonização e que viviam da caça e pesca, do extrativismo e praticavam uma agricultura de subsistência. 71 Entre as empresas constituídas com a finalidade de colonizar a região, podemos mencionar a Empreza Povoadora e Pastoril, de Teodoro Capelle, para atuar em Rancho Grande; a Empreza Peperi-Xapecó Ltda., em Chapecó; a Ernesto F. Bertazo, para a região de Saudade-Chapecó; a Sociedade Territorial Mosele, Eberle, Ahrons e Cia., para o rio Engano. Esta última atuou também na região atual de Concórdia. 97 aplicar em escolas, igrejas, pontes, silos, armazéns e outras benfeitorias. De acordo com as estimativas oficiais, estas companhias conseguiram trazer, até 1935, cerca de 60.000 pessoas para o interior catarinense, sobretudo vindas do Rio Grande do Sul. Origem de Concórdia A ocupação da região deu origem a três municípios que se tornariam os principais produtores da avicultura nacional. Atualmente, Concórdia72 é a sede da Sadia Concórdia S.A., destaca-se ainda por ser o município que sedia o maior e mais bem equipado centro de pesquisa, o Centro Nacional de Pesquisa de Suínos e Aves - CNPSA, órgão ligado à EMBRAPA - Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária. Em 1917 a Brazil Development Colonization Company começou a demarcação da colônia Concórdia, trazendo imigrantes ítalo-alemães, sobretudo do Rio Grande do Sul. As áreas destinadas à colonização ficavam às margens do Rio do Peixe e do Rio Uruguai. No processo de colonização fundou-se primeiro o município de Cruzeiro, atual Joaçaba, do qual foi desmembrado Concórdia, cujo nome original era Colônia Queimados (Silva, 1991). Uma das principais características da colonização73 foi a instituição do regime de pequena propriedade, com lotes coloniais em torno de 25 hectares, com frentes estreitas, orientadas para os fluxos d’água. A primeira atividade dos colonos na região foi a extração da enorme quantidade de madeira. Em seguida, dedicaram-se à pequena agricultura de subsistência, vendendo os excedentes. O desenvolvimento do setor madeireiro, ao abrir os caminhos para novos mercados, deu condições para que os suínos, o milho, o trigo e outros produtos das pequenas propriedades ganhassem expressão a nível de mercado regional. A comercialização de suínos e dos demais produtos excedentes da região, viabilizada pela ligação ferroviária com os mercados paulistas e fluminense, firmou-se na década de 1930 72 Concórdia, como já vimos, fica na região oeste de Santa Catarina. Atualmente é o município mais importante para a avicultura e suinocultura. A 51 quilômetros no sentido leste desta cidade, encontra-se o município de Seara, onde iniciou a história da Ceval no setor de aves e suínos, quando comprou a Seara, em 1980. Outros 44 quilômetros adiante na mesma direção, fica o município de Chapecó, onde está instalado o único abatedor nacional de perus, da Sadia, e serve de sede aos grupos Chapecó e Aurora. No sentido inverso, 129 quilômetros a oeste de Concórdia, está o município de Videira, sede da Perdigão, onde se encontra o principal abatedor desta empresa. Juntos, estes municípios representaram, em 1994, 59% dos abates de Santa Catarina. Esta pequena região do oeste catarinense é, portanto, o maior e mais dinâmico centro da avicultura nacional. 73 As terras fora da margem de ocupação determinada para a Brazil Railway Company, foram negociadas com a Sociedade Territorial Mosele Eberle Ahrons & Cia., em 1925. De 1922 a 1925, a colonização ganhou impulso com a constituição das firmas Luce Rosa & Cia. Ltda., Colonizadora Capelli, Colonizadora Brun e Sociedade Territorial Mosele Eberle Ahrons & Cia. (Silva, 1991, p. 42). 98 como atividade rentável. A concentração de capitais oriundos deste comércio deu origem às primeiras agroindústrias locais. A vila de Concórdia tornou-se oficialmente sede de município em 29 de julho de 1934, com uma área de 2.745 quilômetros quadrados, desmembrada de Joaçaba. A vila não abrigava mais que dois mil habitantes quando Attilio Fontana visitou-a pela primeira vez em 1942. Nas colônias e povoados dos vários distritos moravam cerca de 25 mil habitantes. Concórdia na época estava longe de ser uma cidade atraente, apesar de contar com diversas casas comerciais, oficinas, serrarias, moinho, correio, escola primária, banco, hotel e hospital. Neste local, isolado no meio-oeste catarinense pelas dificuldades das estradas e das comunicações, a vida era modesta e simples. Os grandes acontecimentos da vida nacional, como a revolução de 1930 e a implantação do Estado Novo por Getúlio Vargas, em 1937, pouco repercutiam, « certamente menos do que as visitas dos missionários ou do bispo diocesano » (Teixeira, 1994, p. 20). O que impulsionou a economia do município e da região foi a madeira, a princípio e a produção dos colonos, tanto de grãos como de pequenos animais, em seguida. O lucro com o comércio destes produtos serviu de base para as empresas agroindustriais que se implantaram na região. Attilio Fontana e a Sadia Concórdia S.A. Foi nas primeiras migrações de colonos italianos e alemães, promovidas pelas companhias colonizadoras, que os fundadores da Sadia e da Perdigão deixaram o Rio Grande do Sul, onde faziam parte da segunda geração dos imigrantes italianos. Em Santa Catarina buscavam novas terras e outras oportunidades, sobretudo no comércio de cereais e de pequenos animais produzidos pelos colonos. A história da Sadia está diretamente ligada à pessoa de Attilio e à família Fontana desde o início. Seus pais saíram de Sarcedo, na província de Vicenza, norte da Itália, região Vêneta, em 1888 e, depois de um mês de viagem, desembarcaram no Rio Grande do Sul. Como ao chegar no Brasil seus pais Romano Fontana e Theresa Dalle Rive não tivessem dinheiro para comprar seu lote de terra, Romano foi trabalhar na construção de estradas. Economizando seu salário, conseguiu comprar, em 1890, 25 hectares de terra, na Linha Weimann, no município de Santa Maria. Ali, aos 7 de agosto de 1900 nasceu Attilio Francisco Xavier Fontana, oitavo filho dos doze que o casal teve (Fontana, 1980). Sua 99 infância e adolescência foram vividas ali, na colônia do Lageadinho, em São Pedro do Sul, do outro lado de Santa Maria da Boca do Monte, onde seu pai adquiriu uma propriedade maior. Neste período, a vida do jovem Attilio foi marcada por festas italianas, catequese, missa ou terço todos os domingos; casamentos e bailes que se misturaram às longas horas de trabalho na roça, com os pais e os irmãos mais velhos. Os anos de escola foram poucos. Seu aprendizado maior deu-se no contato com a profissão de agricultor, ao lidar com a terra, cuidar das criações, plantar e colher, estocar e negociar milho, trigo, feijão, arroz e alfafa, os produtos de subsistência e do pequeno comércio da época. Desde a juventude, Attilio tinha em mente uma atividade comercial. Não se imaginava a vida toda trabalhando como agricultor. Sua primeira oportunidade de mudar de vida aconteceu em 1917, quando deixou o campo para trabalhar na casa comercial de Domingos, seu irmão mais velho. Ali, exercia a função de enfardador de alfafa e comprador dos produtos vendidos pelos agricultores. Em 1921 seu pai morreu, de colapso cardíaco. Aí ele preferiu deixar o campo para tentar a vida como comerciante. « Minha mãe me convidou para tomar conta da casa, como chefe de família. Mas eu disse: não mãe, eu preferia que a senhora convidasse o nosso irmão Honório, que está casado e eu vou sair, como sempre lhe falei, vou sair para o comércio e a indústria »74. Tomada a decisão, Attilio procurou uma oportunidade para estabelecer-se como comerciante. Surgiram duas opções: um comerciante que o convidava para trabalhar em Alegrete, na fronteira do Rio Grande do Sul e outro, convidando-o para ir a Bom Retiro de Campos Novos, atual Herval d’Oeste, no Vale do Rio do Peixe, em Santa Catarina. Após analisar as duas opções, decidiu-se pela segunda. « Fui para Bom Retiro, perto do Rio do Peixe, trabalhar com Casimiro Tisian, comerciante, a cem mil réis por mês. Em outubro de 1921, animado com as condições do local, comecei meu primeiro emprego, em Bom Retiro. Minha principal obrigação seria enfardar alfafa » (Fontana, 1980, p. 48). Em 1922, em Santa Maria, casou-se com Diva Bordin Baga. Daí para frente, constituiu família75 e investiu na vida profissional que acabava de escolher. Em 1923, Attilio 74 Depoimento de Attilio Francisco Xavier Fontana, feito no programa « Depoimentos de Empresários Brasileiros Bem Sucedidos », em 13 de abril de 1988, publicado em AQUINO Gleber (1991), História empresarial vivida, Volume V, São Paulo, Ed. Atlas, pp.195-234. 75 Attilio Fontana casou-se pela primeira vez com Diva Bordin Baga (1907-1931), com a qual teve quatro filhos: Walter (1923-1975); Lucy (1924) casada com Osório Henrique Furlan, Omar (1927) e Odila (1929), casada com Zoé Silveira D’Ávila. No dia 18 de janeiro de 1931, Diva morreu de meningite. Em 1934 Attilio casou- 100 fez sua primeira viagem de negócios a São Paulo, onde intermediou a venda da casa de comércio de seu patrão. Os Fuganti, comerciantes gaúchos estabelecidos em São Paulo, compraram o estabelecimento e, a partir daí ele passou a ser o gerente da loja. « Em vez de receber 100 mil réis por mês como com o primeiro patrão, passei a ganhar entre 50 e 100 mil réis por dia. Além da minha atividade como enfardador de alfafa, comecei a fazer pequenos negócios com suínos » (Fontana, 1980, p. 57). O novo emprego e a compra e venda de suínos permitiram acumular um primeiro capital, que Attilio aplicou na compra de um pequeno hotel, em Bom Retiro do Cruzeiro, em 1924. Ele continuava suas atividades de enfardador de alfafa e comerciante de suínos e sua mulher, ajudada por alguns parentes, tomava conta do hotel. No entanto, por estar situado numa cidade pequena, no interior do estado, o movimento era fraco, Attilio convidou seu sogro como sócio e transformou o hotel em casa de comércio. Sua atividade de comerciante estendeu-se até 1944 e lhe permitiu um longo contato e experiência com o mundo dos negócios. Attilio comprava mercadorias em São Paulo, para abastecer a loja com armarinhos, ferramentas, arame, tecidos, louças, conservas, café, açúcar, sal, óleo e outros produtos para vender aos agricultores. Ao mesmo tempo, comprava a produção dos colonos, sentindo o movimento das safras e avaliando tanto os preços, como as condições do mercado. Através da estrada de ferro, vendia em São Paulo alfafa, suínos e cereais a comerciantes de Itararé e Osasco, trazendo, na volta, a mercadoria necessária para suas lojas. Dois anos depois de transformar o hotel em casa de comércio, desfez a sociedade com o sogro e, com o dinheiro que conseguiu, comprou a casa comercial dos Fuganti, seus antigos patrões, em 1927. Neste mesmo ano Attilio se ligaria de forma mais estreita com o comércio paulista. « Em 1927 fiz a ligação comercial que foi a mais importante e decisiva de minha vida. Fui a Itararé, na casa de Carlos Menk. Acertamos que ele adiantava o dinheiro e eu comprava os suínos. O lucro era dividido a metade de cada um. Para mim aquele sistema era um suporte muito grande, porque nunca me faltava dinheiro. Essa sociedade representou o impulso definitivo em minha carreira de comerciante. O negócio durou dezoito anos » (Fontana, 1980, p. 78). se com Carlota Ringwalt, com a qual teve uma filha, Therezinha (1935), casada com Raul Mena Barreto dos Reis. Em Janeiro de 1945 faleceu Carlota, sua segunda mulher. Depois de 18 anos viúvo, casou-se com Ruth Carvalho Luz, em 1962, com a qual teve outra filha, Carla Maria, nascida em 1964 (Fontana, 1980). 101 A atividade comercial ainda não estava bem consolidada na vida de Attilio (Dalla Costa, 1993). Passado um ano da compra da casa dos Fuganti, voltou a vendê-la aos mesmos. Não precisando se ocupar da compra de mercadorias e da administração da casa comercial, Attilio ampliou seu comércio de compra e venda de suínos. Comprava-os em todas as estações da estrada de ferro do Vale do Rio do Peixe, num percurso aproximado de 200 quilômetros, indo de Caçador, em Santa Catarina, até Marcelino Ramos, no Rio Grande do Sul76. Sua atividade principal, no início da década de 1930, era portanto a compra e venda de suínos. Com os lucros desta atividade, Attilio resolveu estabelecer-se definitivamente no comércio e construiu a terceira casa comercial que possuiu em Bom Retiro do Cruzeiro. Em 1933, como as atividades iam bem, ele abriu uma segunda loja. Associou-se com Silvestre e Luis Doré e estabeleceram-se em Água Doce. Dois anos mais tarde, abriu uma terceira loja em Videira. Em 1935 os Fuganti, seus antigos patrões, propuseram-lhe uma sociedade. Nesta época, Fontana possuía três casas comerciais e os Fuganti outras tantas. Efetivada a associação, a razão social da nova firma ficou sendo « Fuganti, Fontana & Cia », cujo capital se elevava a 1.050 contos de réis, metade cada um. O primeiro contrato feito entre os dois 76 Em 1931 Attilio iniciou outra atividade na qual teria grande participação: a política. Foi escolhido, conselheiro municipal, junto com os comerciantes César Fuganti e João Leopoldo Klein, por serem os maiores contribuintes da prefeitura de Bom Retiro do Cruzeiro. No entanto, sua atividade política mais importante começou com sua participação no conselho municipal de Joaçaba, no início dos anos 1930 e extendeu-se até meados da década de 70. Por um lado a política obrigou-o a deixar na mão de outros dirigentes a indústria que ele vinha de implantar. Por outro, porém, ajudou-o muitas vezes, abrindo-lhe as portas, através dos inúmeros contatos com políticos influentes e fornecendo-lhe o conhecimento necessário da « máquina políticoadministrativa ». Em 1946 candidatou-se pela primeira vez e foi eleito vereador de Concórdia, posto que assumiu em 1947. Em 1950 candidatou-se a prefeito da cidade. Depois de uma forte disputa, elegeu-se com uma diferença de apenas 114 votos. Ele seria prefeito num lugar onde o principal estabelecimento industrial era seu próprio frigorífico e moinho. Portanto, os interesses dos cidadãos misturavam-se aos da empresa. « Minha plataforma abrangia estradas, escolas e assistência técnica aos agricultores. E ainda, procurar melhorar o sistema de iluminação da cidade, fraca e deficiente » (Fontana, 1985, p. 158). Findo seu mandato de prefeito, candidatou-se, pelo PSD - Partido Social Democrático, a deputado federal. Fazendo campanha junto com Nereu Ramos, candidato ao senado, elegeram-se ambos no seu respectivo posto. No início de 1955 assumiu sua cadeira de Deputado Federal e mudou-se para o Rio de Janeiro. Findo o primeiro mandato como deputado, candidatou-se novamente, reelegendo-se para um segundo mandato. Quando estava no meio de sua segunda legislatura como deputado, no final do ano de 1960 houve eleições para governador. Em Santa Catarina elegeu-se Celso Ramos, irmão de Nereu, seu amigo de muitos anos. Attilio foi convidado para ser Secretário da Agricultura. Neste cargo dedicou-se especialmente no desenvolvimento e modernização da produção agrícola e agropecuária no Estado. Em 1962 voltou para a Câmara dos Deputados e candidatou-se ao senado. Elegeu-se senador, assumindo esta função em fevereiro de 1963. No final do seu mandato, aceitou ser candidato a vice-governador de Santa Catarina, pela ARENA Aliança Renovadora Nacional, tendo como cabeça de chapa Colombo Salles. Exerceu este cargo até 1975, quando aos 75 anos de idade decidiu abandonar a atividade política e a vida pública. 102 acionistas tinha duração de cinco anos. Logo depois de inaugurada a sociedade, abriram outra casa comercial em Londrina, no norte do Paraná, ampliando assim sua área de atuação. Em 1940, com o fim do primeiro contrato, a sociedade foi desfeita. Attilio ficou com as três lojas de Santa Catarina e os Fuganti ficaram com as duas de São Paulo e a de Londrina. A partir deste momento Attilio pensou em deixar a atividade comercial para dedicar-se à indústria. « Nesta época meus negócios iam bem e voltei a pensar numa idéia que já tinha desde 1934, ou seja, ingressar no setor industrial. Foi sempre o meu ideal possuir um moinho de trigo e uma indústria de produtos suínos. A verdade é que eu desejava retirar-me do comércio » (Fontana, 1980, p. 117). Attilio vendeu então duas de suas casas comerciais, ficando apenas com a matriz, em Bom Retiro-SC. Este longo período dedicado à atividade comercial permitiu-lhe acumular uma série de experiências que seriam fundamentais na sua vida futura de empresário e político. De um lado conheceu profundamente a produção agrícola e o sistema da pequena propriedade e, de outro, manteve contatos estreitos com os maiores centros urbanos do país: São Paulo e Rio de Janeiro. Além disso, estabeleceu suas raízes políticas no oeste catarinense. A venda das casas comerciais forneceu um capital de giro inicial para que Fontana buscasse outros negócios. No começo de 1942, a convite do prefeito Dogelo Goss, foi para Concórdia estudar uma forma de fazer funcionar o « Frigorífico Concórdia Ltda. », que estava com suas obras paralizadas. Num primeiro momento, Fontana trabalhou em forma de participação. Logo em 1943, mostrou aos acionistas que não tinha mais interesse naquele tipo de participação na sociedade. Fez a seguinte proposta: os acionistas lhe passariam as suas cotas pela metade do valor nominal e ele se comprometia a pagar-lhes em dinheiro ou em ações da nova sociedade. Foi assim que Attilio assumiu o ativo e o passivo da organização. Logo em seguida compôs uma sociedade anônima, a que deu o nome de « S.A. Indústria e Comércio Concórdia ». « No ano seguinte (1944), eu tiraria desta razão social as duas primeiras letras - S A - e lhes juntaria a última sílaba de ConcórDIA, para formar o nome SADIA, que se tornaria a marca nacional e até internacionalmente conhecida dos nossos produtos » (Fontana, 1980, p. 127). Atualmente a Sadia Concórdia S.A., com suas demais firmas controladas (Frigobrás Companhia Brasileira de Frigoríficos e Sadia Oeste S.A.), é a maior empresa nacional do setor avícola. Saul Brandalise e a Perdigão S.A. Comércio e Indústria 103 A história do grupo Perdigão e da família Brandalise são muito semelhantes à da família Fontana e à da empresa Sadia. Procedente da Província de Treviso, na Itália, Ricardo Brandalise desembarcou em Santos-SP, no final do século passado e de lá dirigiu-se para o noroeste do Rio Grande do Sul, na colônia de Guaporé, onde casou-se com Luiza Codogno. Como Attilio Fontana, Ricardo não tinha vocação para agricultor e começou a viajar pelas colônias vendendo jóias. Em 1916, ainda em Guaporé nasceu Saul Brandalise, o oitavo, de nove filhos do casal que, mais tarde, seria o principal dirigente da Perdigão. Seguindo o caminho de outros imigrantes, no início da década de 1920, Ricardo deixou o Rio Grande do Sul, comprando uma propriedade no distrito de Perdizes, atual município de Videira e outra em Rio Bonito, ambas no oeste de Santa Catarina. Mais tarde ele venderia uma de suas propriedades, para comprar um moinho de cereais na localidade de Rio das Pedras. Em seguida, além de manter a propriedade e o moinho, Ricardo montou uma casa de comércio no centro da Vila de Perdizes-SC, a « A. David Brandalise e Irmãos » (Brandalise, 1982, p. 31). Entre a década de 1930 e a de 50, a atividade comercial e industrial da família Brandalise esteve associada a outras duas famílias: Ponzoni e Bonato. Diversas vezes se associaram entre si, aumentando o capital, a experiência e ampliando as atividades. A primeira destas associações ocorreu em 1934, quando à A. David Brandalise e Irmões juntouse a família Ponzoni. A nova sociedade passou a chamar-se « Ponzoni & Brandalise e Cia. », com um capital inicial de 160 contos de réis (Tedesco, 1992, p. 154). Desde muito jovem Saul trabalhava na casa de comércio, com seu pai e seus irmãos, sem se descuidar de sua formação escolar. Tendo esgotado a possibilidade de estudar em Vila Perdizes, seus pais matricularam-no na Escola Partenom Paranaense, em Curitiba, capital do Paraná, onde ele fez os cursos de Datilografia e de Guarda-Livros. Quando conseguiu o diploma de Guarda-Livros, Saul foi trabalhar como Contador em Herval d’Oeste, na firma de Floriani Bonato e Cia. Ltda. Em 1937, a firma de seu pai associou-se à família Bonato, a terceira que faria parte da história da atual Perdigão, onde ele trabalhava, formando a « Ponzoni Bonato e Cia. Ltda. », abrangendo várias casas comerciais no oeste catarinense. Nesta ocasião, pela primeira vez, Saul passou a exercer um cargo de diretor na empresa, que contava com cerca de 70 empregados. 104 Em 1937 Saul Brandalise casou- com Elejalde Formighieri77. Dois anos mais tarde houve outra mudança na empresa, quando a família Bonato desligou-se do grupo. Nesta ocasião, dissolveu-se a Ponzoni, Bonato e Cia. Ltda e a firma voltou a chamar-se « Ponzoni & Brandalise e Cia. ». Seus sócios os irmãos Saul e André Brandalise e os também irmãos Ângelo e Pedro Ponzoni, dedicaram-se inicialmente ao comércio, mas logo em seguida, em 1940, a empresa diversificou suas atividades com a construção de um frigorífico de suínos em Videira. Depois, visando o aproveitamento de couros e peles de seu matadouro e de terceiros, montou um curtume na mesma cidade, em 1943. Uma das principais dificuldades para as empresas localizadas no oeste catarinense, nesta época, era a comercialização dos produtos. Até fins da década de 1940 os veículos motorizados não chegavam à região. As dificuldades de transporte persistiram por longo tempo, mesmo após a construção da BR-116, estrada que liga o Paraná ao Rio Grande do Sul, em meados da década de 50. Os acessos eram precários e não se podia contar com frotas de caminhões-frigoríficos, vitais para o deslocamento de produtos perecíveis, como carne de porco e derivados. Saul tomou então a decisão de fazer o transporte por avião. « Em 1943 comprou dois aviões cargueiros, um marco na decolagem da Perdigão, que agora poderia chegar com seus produtos frescos ao eixo Rio de Janeiro-São Paulo »78. Sadia inicia atividades com um moinho de trigo e um abatedor de suínos Passado um ano da compra dos aviões pela Perdigão, fundou-se aquela que, além de ser sua principal concorrente, tornou-se a maior empresa agroindustrial do país, a Sadia. No dia 7 de junho de 1944, em Concórdia, meio-oeste catarinense, 27 acionistas, liderados por Attilio Fontana, assinaram a ata de fundação da nova empresa. Com um quadro de funcionários que não passava de 50 pessoas, a Sadia pôs em funcionamento seu frigorífico de suínos no dia 20 de novembro de 1944, abatendo 30 animais por dia. As dificuldades eram muitas. Havia mão-de-obra disponível, mas precisava ser treinada. A matéria prima era abundante porém a quantidade superava a qualidade. Não havia 77 Saul e Elejalde tiveram três filhos: Flávio Brandalise (1939), Maria Odete Brandalise (1943) e Saul Brandalise Jr (1949). Tanto Flávio como Saul Jr., mais tarde, o ajudaram na administração da Perdigão, até no início dos anos 90, quando, após a morte de Saul Brandalise, venderam a empresa, dedicando-se a outros ramos empresariais. 78 BESC - Banco do Estado de Santa Catarina (1992), Pioneiros Catarinenses, Volume 1, Florianópolis, AZ Comunicações, p. 34. 105 fornecimento de água e, o de energia elétrica era insuficiente e irregular. Não havia telefone e o telégrafo era o da ferrovia. As estradas eram ainda mais precárias79. Para levar adiante a administração desta recém inaugurada indústria, Attilio instalou-se em Concórdia, com um pequeno grupo de colaboradores diretos, todos pertencentes à família, um cunhado, um filho, um genro e um sobrinho. Com o crescimento das atividades industriais e comerciais da empresa, outros filhos, sobrinhos e genros viriam se juntar nos anos seguintes a esse núcleo original e participar decisivamente do sucesso do empreendimento. Na época da fundação da Sadia, o mundo ainda vivia os problemas da Segunda Guerra que, no caso brasileiro, dificultavam a importação de máquinas e equipamentos industriais. Como a atividade mais importante da Sadia era o moinho de trigo, Attilio conseguiu vencer estas dificuldades e importou maquinário suíço, através da empresa gaúcha Buller & Irmão, aumentando sua capacidade de moagem para 24 toneladas de grãos por dia, já em 1945. A farinha e o farelo tinham boa aceitação e, através do trem, podiam ser distribuídos pelas cidades ao longo da ferrovia, por centenas de quilômetros, até o norte do Paraná e São Paulo. Os recursos gerados com estes produtos80 ajudaram a sustentar outros investimentos, principalmente a finalização das obras do frigorífico (Teixeira, 1994). Desde que iniciou suas atividades industriais, Attilio Fontana preocupou-se em modernizar as fábricas e ampliar sua capacidade produtiva. Resolvido o primeiro problema com a importação de maquinário suíço para o moinho de trigo, restava encontrar solução para um melhor funcionamento dos abates suínos. Neste caso, a Sadia comprou máquinas de um frigorífico desativado no município de Guaporé, no Rio Grande do Sul, transferindo-as para Concórdia e, com « este equipamento velho, bastante usado, começamos nosso indústria de produtos suínos em Concórdia » (Fontana, 1980, p. 128). No início de 1946 já se abatiam 79 Os 80 quilômetros até Joaçaba podiam consumir um dia inteiro de viagem, em tempos de chuva e, os 40 quilômetros até a estação ferroviária, em Volta Grande, exigiam várias horas. Todas estas dificuldades apressaram a transferência de Attilio de Luzerna para Concórdia. Antes de sair desta última, dois fatos marcaram sua vida. Primeiro, faleceu sua mãe, no final de 1944 e, no início de 1945, morreu sua segunda esposa. Isto facilitou o desligamento emocional de Luzerna e, a venda da última casa comercial desligou definitivamente Attilio desta atividade e o deixou completamente livre para assumir sua nova vida de industrial e de homem político. 80 No início da Sadia, a atividade mais rentável era a industrialização e venda dos derivados de trigo. Com os lucros desta atividade, a empresa pode financiar tanto a construção do frigorífico de suínos de Concórdia, como sua expansão em São Paulo e outros estados. A atividade com o trigo era muito rentável porque havia um monopólio de grandes empresas. O governo federal comprava e importava todo trigo, redistribuindo-o para os grandes moinhos, que dominavam a atividade e impunham os preços ao consumidor. O próprio Attilio Fontana, quando de sua atuação na Câmara dos Deputados no Rio de Janeiro (durante o primeiro mandato como deputado federal, que assumiu no dia 31 de janeiro de 1955), admitia esta realidade. « Os moinhos recebiam o trigo e vendiam a farinha com margem de lucro muito grande, permitida pelo próprio órgão controlador de preços. E isso naturalmente me desagradava, porque eu dava como testemunho o nosso moinho, que proporcionava uma margem de lucro bastante exagerada » (Fontana, 1980, p. 207). 106 mais de 100 animais por dia. Com esta matéria prima-produzia-se banha, toucinho, carnes salgadas, pernil, presunto, salame, lombo e lingüiça. A banha, enlatada ou empacotada, foi durante longo tempo, o carro-chefe da produção e das vendas do frigorífico. Tinha bom preço81 e, além disso, não exigia condições especiais de conservação, podendo ser transportada pelo trem. Como a época exigia pioneirismo e criatividade, a Sadia foi providenciando os serviços de apoio indispensáveis a sua indústria principal, como serraria, caixotaria, estocagem de lenha e captação de água. O serviço de recebimento e envio de mercadorias tornou-se mais eficiente com a construção de um pequeno desvio ferroviário em Volta Grande, perto de Concórdia, com um depósito junto à estação. Para garantir matéria-prima na quantidade suficiente, foi instalada uma rede de postos de compra em diversos pontos de Concórdia e nos municípios vizinhos, como Rancho Grande, Barra do Veado, Ipumirim, Arabutã, Itá e Xavantina. Sempre com o intuito de tornar mais eficiente sua infra-estrutura de produção e de relação com os agricultores, « nós não só distribuíamos boletins entre os agricultores, como mantivemos um jornal em Concórdia durante uns dois anos. Mas os efeitos não eram satisfatórios porque os agricultores pouco liam e tinham dificuldade de interpretar e assimilar os ensinamentos ali divulgados » (Fontana, 1980, pp. 135-6). Buscando aperfeiçoar esta comunicação com os agricultores, ainda em 1957, Attilio « comprou uma estação de rádio em Concórdia a fim de que, de manhã, antes de sair para o trabalho, os agricultores tivessem ouvido dentro de sua casa os ensinamentos de como fazer o amanho da terra, como criar animais de qualidade »82. Esta rádio foi mantida pela empresa até início dos anos 90 e era utilizada sobretudo na comunicação com os agricultores integrados em suínos e aves, avisando o dia em que seriam entregues mercadorias (pintos de um dia, ração, medicamentos, matrizes, etc.) ou quando os caminhões buscariam os frangos ou os suínos. No final da década de 1940, a região oeste catarinense estava ocupada por pequenos agricultores que apoiavam seu trabalho no binômio milho-suíno. Os colonos já diziam à época que « o melhor saco de milho é barriga de porco ». Santa Catarina, junto com o Rio Grande 81 Mesmo não tendo condições técnicas para um total aproveitamento da carne suína, o frigorífico representava lucro desde o início de suas atividades, pois só a banha pagava as despesas com a compra dos suínos e sua industrialização. « Não havia um aproveitamento completo da carne e outros derivados de suínos, dadas as deficiências das nossas instalações, mas a banha cobria o valor do suíno e ainda deixava algum resultado; a carne, pois, por menos aproveitada que fosse, era sempre lucro » (Fontana, 1980, p. 130). 82 Participação de Omar Fontana, no depoimento de seu pai, Attilio Fontana, no programa « Depoimentos de empresários brasileiros bem sucedidos », dia 13 de abril de 1988, na Universidade de São Paulo, publicado in: AQUINO Gleber (org.), (1991), História empresarial vivida, Volume V, São Paulo, editora Atlas, p. 204. 107 do Sul e o Paraná destacavam-se como grandes produtores de grãos e de pequenos animais, lugar ideal para o desenvolvimento das agroindústrias. De outro lado, como vimos na tabela 3, a população não só crescia, como se urbanizava aceleradamente. A urbanização começava a mudar também os hábitos alimentares. As novas empresas do Sul tinham o desafio de produzir alimentos de boa qualidade, enfrentando a concorrência de grandes empresas tradicionais no ramo (quase sempre multinacionais e já instaladas em São Paulo) e fazê-los chegar em tempo hábil aos consumidores urbanos, sobretudo em São Paulo e no Rio de Janeiro. Em 1950, a produção industrial da Sadia estava centrada sobre dois produtos: suínos e trigo. No entanto, os derivados de produtos do frigorífico já suplantavam, de longe, as atividades do moinho. « Só o produto banha, representava 42,7% do total em dinheiro. Os demais sub-produtos suínos: lingüiças e salsichas, toucinho defumado e carne salgada, representavam 17,9%, enquanto a farinha de trigo83 representava 7,8% do total do valor da produção » (Silva, 1991, p. 59). Quanto à Perdigão, tinha uma estrutura produtiva semelhante, atuando na área de suínos e derivados de trigo. Sua implantação industrial também se assemelhava, uma vez que as indústrias das duas empresas localizavam-se no oeste catarinense. 2. Sadia e Perdigão ampliam atuação geográfica e diversificam produção Ao longo da década de 1950 a produção industrial começava a se tornar a principal fonte de renda do país e a população migrava cada vez mais em direção às cidades. Neste contexto destacava-se a cidade de São Paulo, que contava com 2,5 milhões de habitantes, orgulhava-se de ser « a cidade que mais cresce no mundo », caminhando para se tornar a maior metrópole do país. Enquanto a construção civil e as obras públicas atraíam contingentes de migrantes de baixa renda vindos do interior, a indústria de bens duráveis, as lojas de departamentos, as concessionárias de serviços e o sistema bancário concentravam a mão-deobra mais qualificada e melhor remunerada. A cidade crescia, não só em número de habitantes, mas também na produção de riqueza e na formação de uma classe média cada vez mais influente, tanto econômica como politicamente. 83 Estes dados são relativos à atuação da Sadia em Concórdia. A atividade com moinho de trigo e a venda de seus derivados ganharia novo impulso com a compra do Moinho Marcelinense, em Marcelino Ramos-RS, em 1953 e, sobretudo, com a inauguração do Moinho da Lapa, em São Paulo, no mesmo ano. 108 Os fundadores e dirigentes da Sadia, como pioneiros do setor na época, não podiam ignorar esta realidade. De fato, a empresa estava instalada industrialmente no oeste de Santa Catarina, mas os olhos de seus diretores estavam voltados para São Paulo e Rio de Janeiro, os grandes centros consumidores. A idéia era de se instalar ali, tanto para melhor comercializar seus produtos, como para abrir outras frentes industriais. Esta compreensão, aliás, já vinha dos tempos em que seu fundador era comerciante (Fontana, 1980). Sempre ligado à cidade de São Paulo, onde vendia os produtos comprados no interior catarinense e abastecia-se de mercadoria para suas casas comericiais, passou esta mesma visão para os futuros diretores da Sadia. Ainda em 1945 seu filho mais velho, Walter Fontana foi enviado para São Paulo e o vice-presidente da empresa, Dario Bordin, passou a dirigir pessoalmente, em 1948, a filial comercial que a Sadia abriu na zona atacadista daquela cidade (Teixeira, 1994). Entretanto, para estabelecer-se em São Paulo o desafio era grande. A empresa estava a mais de mil quilômetros de distância, numa época em que os transportes rodoviários eram precários, as estradas ruins, os caminhões não eram frigorificados e as viagens chegavam a durar vários dias. O segundo problema era o de capacitar a empresa a produzir para um mercado altamente disputado, introduzir sua marca entre outras já tradicionais e conhecidas dos frigoríficos concorrentes, na maioria estrangeiros. Outro problema era produzir uma quantidade cada vez maior, para atender as necessidades de uma população cada vez mais numerosa e sempre mais urbanizada. Para superar esses desafios, a Sadia buscou capacitar-se tecnicamente e melhorar a qualidade dos seus produtos. Na virada dos anos quarenta para os cinqüênta, montaram-se as primeiras câmaras frias com a supervisão de um engenheiro suiço, o dr. Jean Peter, geradores mais potentes aumentaram a capacidade de energia elétrica, prepararam-se caminhões isotérmicos e contrataram-se os primeiros técnicos especializados no ramo. Além disso, a Sadia passou a aprimorar a matéria-prima, introduzindo as raças Landrace e Duroc, para passar do « porco tipo banha » para o « porco tipo carne » e começou a transportar os produtos perecíveis de avião, entre Concórdia e São Paulo, como já fazia a Perdigão. Para aumentar a eficácia do sistema de distribuição destes produtos, implantou uma rede própria de filiais distribuidoras. Diferentes estratégias de expansão A Sadia começou sua produção moendo trigo e vendendo farinha, que foi sua principal atividade e melhor negócio durante vários anos. Exatamente por isto, a primeira aquisição 109 fora de Concórdia, rumo à sua expansão industrial foi o Moinho Marcelinense Ltda., de Marcelino Ramos, no Rio Grande do Sul. « Sócia minoritária, a Sadia assumiu o estabelecimento em 1953, desenvolveu-o e utilizou-o para industrializar o trigo da região e sobretudo o importado, recebido por trem, distribuindo diretamente a farinha pela própria ferrovia. Mais tarde, também as máquinas do moinho de Concórdia, desativado para dar lugar à fábrica de rações, foram transferidas para o Marcelinense, que acabou sendo incorporado em definitivo no ano de 1967 » (Teixeira, 1994, p. 35). Se produzir e vender farinha de trigo era um bom negócio, havia vários inconvenientes para um moinho estabelecido no interior do país e longe dos grandes centros consumidores. Frequentemente a safra nacional de trigo era insuficiente para abastecer o mercado interno e o país recorria às importações. Nestas ocasiões, os moinhos do interior ficavam em desvantagens em relação aos do litoral, pois pagavam o mesmo preço pela matéria prima, mas tinham que assumir o frete, do porto até o estabelecimento, o que encarecia o produto final. Essa desvantagem, junto com uma maior dificuldade para distribuir a farinha e a concorrência de poderosas empresas, tanto nacionais quanto internacionais, com o tempo, poderia inviabilizar os pequenos moinhos do interior. Como Attilio Fontana pensava em continuar no ramo, resolveu montar um moinho de trigo com uma capacidade maior e em São Paulo. Para isto, associou-se à família Germani, de Porto Alegre, tradicional empresa do setor. Constituída a sociedade, em meados do ano de 1950 iniciaram as obras num terreno comprado na Vila Anastácio, zona oeste da cidade. O maquinário do moinho foi comprado de uma empresa italiana, a Reggio Emília, que foi à falência antes de entregá-lo. Sua sucessora, a estatal Nuove Reggiani estava atrasando a entrega, o que levou Attilio Fontana e Alfredo Germani a fazerem uma viagem àquele país84. Por este fato percebe-se novamete a preocupação da empresa de buscar o que melhor existia em tecnologia disponível no mercado internacional. Quando as máquinas foram 84 Esta foi a primeira viagem do fundador da Sadia ao exterior e teve uma influência fundamental tanto para ele próprio como para a empresa. Conheceu a terra de seus pais e convidou vários parentes para virem ao Brasil, como muitos já o tinham feito no passado. Além da Itália, Attilio foi para a Alemanha e a Suíça, onde pode observar novas culturas, adquirir outros conhecimentos e conhecer as melhores tecnologias empregadas no seu ramo de negócios. Ao voltar, impressionado com o que viu e aprendeu, afirmou: « fiquei tão bem impressionado com o que me foi dado ver, observar, estudar, que cheguei à conclusão de que para desenvolvermos e aperfeiçoarmos as nossas atividades industriais aqui no Brasil precisávamos mandar os nossos diretores e técnicos viajarem pelo exterior para conhecer o nível de adiantamento das atividades do ramo em que trabalhávamos, não apenas no setor industrial mas no da própria agricultura e agropecuária » (Fontana, 1980, p. 178). No final de sua primeira viagem de férias, em 1953, depois de ter ficado três meses e oito dias visitando vários países europeus, firmou ainda mais esta sua convicção. « Voltei mais convencido ainda de que os nossos diretores também deveriam viajar e visitar países estrangeiros, principalmente os desenvolvidos e industrializados, para colherem informações, como eu havia feito com os meus estudos, e aplicá-las na nossa sociedade, já em fase de franco desenvolvimento » (Fontana, 1980, p.189). 110 instaladas e o moinho ficou pronto, por causa de desentendimentos com a família Germani, a Sadia comprou a parte destes últimos e, o Moinho da Lapa S.A., foi inaugurado em 10 de março de 1953 (Fontana, 1980). Tinha seis silos e uma capacidade inicial de moagem de 80 toneladas de grãos por dia, que foi aumentada posteriormente. Uma vez implantado o moinho de trigo restava resolver o problema da industrialização da carne. No final dos anos 50 e início da década de 60, o país vivia sob forte inflação e tensão política, que culminou com o golpe militar de 1964. Não pareciam bons tempos para grandes investimentos, sobretudo na área industrial. Mesmo assim os dirigentes da Sadia decidiram que deveriam se instalar em São Paulo também para produzir os derivados de carne. No dia 4 de julho de 1961, 94 acionistas, na sua maioria da família Fontana, dirigentes e funcionários da empresa, além da própria S.A. Indústria e Comércio Concórdia e o Moinho da Lapa, subscreveram o capital e aprovaram os estatutos da Frigobrás - Companhia Brasileira de Frigoríficos, que além de atuar em São Paulo, no final da década de 70, via filial em Toledo, tornou-se o maior abatedouro avícola do Paraná. Esta nova indústria foi criada pensando em diversos objetivos, todos eles voltados para a produção e comercialização de produtos alimentares. Eles abrangiam desde a « industrialização e o comércio de produtos alimentícios até a instalação de matadouros, frigoríficos, fábricas de conservas enlatadas, de carnes, gorduras e laticínios, passando pela exportação de carnes em geral e outras atividades correlatas » (Teixeira, 1994, p. 56). Com este leque de alternativas, a Sadia buscava ampliar seu raio de ação, saindo do binômio suínotrigo, além de implantar-se definitivamente em São Paulo. Para a construção desta nova fábrica compraram um terreno junto à Estrada de Ferro Sorocabana e a Via Anhanguera, que ligam a capital ao interior do estado, no mesmo lugar onde já se encontrava o Moinho da Lapa. Enquanto se construía o novo prédio onde funcionaria a fábrica, os dirigentes da Sadia trataram da gestão dos recursos, financiados pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico - BNDE e o Banco do Brasil. Também fizeram a transferência de funcionários e dirigentes de Concórdia para São Paulo, como Victor Fontana e Mário Fontana, escolheram e importaram a maioria dos equipamentos e começaram a pensar no fornecimento da matéria prima. Quando se tratou de buscar os instrumentos necessários à produção, novamente a Sadia voltou-se para o que há de melhor no mercado. « Por intermédio desta nova unidade, a Sadia equipou-se com a melhor tecnologia disponível, nacional e internacional, para competir com os mais importantes fabricantes de alimentos derivados de carne » (Teixeira, 1994, p. 58). 111 Terminada a construção, a Frigobrás foi inaugurada em 7 de agosto de 1964. Como disse o fundador da Sadia, « começamos a trabalhar em pequena escala, com a produção aproximada de 30 mil quilos por dia, fabricando presunto cozido, mortadela, lingüiça, salsicha e mais tarde passamos a produzir também hamburguer e outros » (Fontana, 1985, p. 235). Apesar da euforia dos discursos de inauguração, nos primeiros anos a Frigobrás operou com prejuízo. Havia dificuldades desde a adaptação das máquinas, até o fornecimento de matériaprima. No entanto, a principal dificuldade provinha da recessão econômica do país. Entre 1965-67, para reduzir a inflação, o governo conteve os gastos e a crise atingiu sobretudo as classes mais pobres da população, para as quais a Frigobrás destinava boa parte de sua produção. Esta situação só se reverteria no final dos anos 60, quando a empresa redirecionou algumas linhas de produtos, buscando faixas de consumo mais elevadas. Em busca de matéria prima para a Frigobrás Enquanto estava sendo construída a Frigobrás em São Paulo, Attilio Fontana e outros dirigentes da Sadia começaram a buscar um lugar que servisse de fornecimento de matériaprima para a nova empresa, sobretudo de suínos. Junto com Rubem Berta, presidente da Varig (que à época detinha 20% das ações da Frigobrás), fizeram várias viagens, partindo do interior do Rio Grande do Sul até acima de Cuiabá, no Mato Grosso. Atraídos pelas riquezas das terras do oeste do Paraná, que estavam sendo ocupadas por colonos do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina, dedicados ao plantio de trigo, milho e soja e à criação de suínos de raça « crioula », acabaram optando por Toledo, um município novo, criado em 1951. Numa das primeiras viagens à região, Raul Mena Barreto dos Reis e sua comitiva encontraram um pequeno frigorífico, chamado « Pioneiro », na periferia de Toledo, inaugurado em 1959. Decidiram comprá-lo e reformá-lo para servir de abatedouro de suínos, matéria-prima básica a ser fornecida à Frigobrás de São Paulo. A aquisição do Frigorífico Pioneiro pela S.A. Indústria e Comércio Concórdia foi formalizada em meados de 1964. Neste caso também foi necessário investir no melhoramento da tecnologia utilizada, para aumentar o volume de abate. « Refeitos telhados e paredes, recuperados os equipamentos, trocado o maquinário obsoleto de abate e preparação das carcaças e instaladas as câmaras frias, em pouco tempo a unidade estava em condições de funcionar satisfatoriamente, começando por um abate médio de 100 suínos por dia » (Teixeira, 1994, p. 60). Exatamente 20 anos após ter iniciado com um pequeno abatedor de suínos em Concórdia, a Sadia voltava a repetir a mesma experiência numa outra região pioneira. Só que 112 desta vez já tinha tanto os dirigentes experimentados como toda a tecnologia de produção de suínos de raça, desenvolvida a partir do Fomento Agropecuário. Aos poucos seus dirigentes foram implantando a substituição do « porco tipo banha » pelo « porco tipo carne », incentivando os agricultores a usar ração balanceada na alimentação dos suínos, assim como a construir novas pocilgas e melhorar o manejo dos animais. Novo problema acontecia na hora de transportar a carne para São Paulo. Nos tempos de chuva, era quase impossível vencer os 40 quilômetros de estrada de chão que separavam Toledo de Cascavel, onde passava o asfalto mais próximo. Aos poucos, estas dificuldades foram superadas com a melhoria no sistema rodoviário da região e o empreendimento de Toledo cresceu e diversificou suas atividades. Em 1971, quando foi incorporado à Frigobrás, a unidade abatia cerca de 600 suínos por dia e uma centena de bovinos para exportação, construía sua primeira fábrica de rações e preparava-se para expandir a suinocultura e introduzir a avicultura integrada. Com a Frigobrás de Toldeo, a Sadia iniciou suas atividades industriais no Paraná. Enquanto se implantava industrialmente no Paraná e consolidava sua presença fabril em São Paulo, a Sadia preparava-se para diversificar ainda mais suas atividades em Santa Catarina. Desta vez, entrou numa área menos conhecida e mais desafiadora que a do frango de corte: produzir, comercializar e popularizar o consumo de carne de perus. Esta diversificação avícola exigiu a implantação de uma nova empresa, instalada em Chapecó. « Sadia Avícola » e a produção de perus Uma vez consolidada a experiência no setor de frangos, a Sadia resolveu entrar no . abate de perus, pensando nas festas natalinas. A idéia de atuar neste setor veio de uma viagem ao Rio de Janeiro, em 1966, quando Raul Mena Barreto dos Reis, diretor do Moinho da Lapa junto com Walter Fontana, descobriu em uma granja do interior do estado, uma criação de perus « brancos e de peito largo », trazidos dos Estados Unidos. Impressionados com a diferença entre estes e os perus pretos e tradicionais das colônias do Sul do Brasil, os dois diretores entraram em contato com a empresa Kimber Farms da Califórnia, promovendo uma primeira importação de matrizes para uma criação experimental em Concórdia. Do primeiro lote encomendado de 1.500 aves, chegaram vivas ao seu destino apenas um terço. Já no ano de 1968 abatiam-se alguns milhares de perus, que passaram a ter uma enorme demanda a partir do Natal daquele ano. 113 O crescimento da demanda inicial colocou um problema para a empresa. A unidade da Sadia em Concórdia estava em fase de reestruturação industrial, que se prolongaria até 1975, e não tinha nem espaço físico e nem capacidade para uma produção de perus em larga escala. Além disso, na época temia-se que uma excessiva proximidade entre perus e frangos pudesse trazer problemas de ordem técnico-sanitária. O melhor seria pensar em outro abatedor, específico para perus, numa outra cidade. O novo projeto foi elaborado e aprovado pelo Fundo de Desenvolvimento do Estado de Santa Catarina para aplicação de incentivos fiscais estaduais. Em seguida, a Sadia escolheu a cidade de Chapecó, localizada no oeste catarinense, como sede do novo empreendimento. O novo frigorífico foi construído numa área próxima ao posto de compra de suínos da empresa. Chapecó já era uma cidade importante na região, situada no centro de uma vasta zona agrícola, rica em milho e soja. Além disso a cidade dispunha de energia elétrica, boas estradas e um aeroporto. A nova empresa foi constituída em 1970 e se chamava « Sadia Avícola S.A ». As obras, envolvendo frigorífico, silos e fábrica de rações, estenderam-se até 1973, quando iniciaram os primeiros abates. Sob a supervisão do Departamento de Fomento da nova unidade, foram sendo contatados e selecionados os agricultores integrados que forneceriam a matéria-prima. O sistema implantado foi o de integração vertical, como já funcionava em Concórdia. Quanto às matrizes foram compradas de um fornecedor norte-americano, a firma Nicholas Turkey Breeding Farms, da Califórnia. O projeto inicial foi dimensionado para abater até 5.000 aves por dia (Teixeira, 1994), prevendo-se um tempo de cinco anos para alcançar tal meta. Desta vez não foi fácil alcançar e superar a meta estabelecida. As dificuldades, diferente do que aconteceu com o início em Concórdia, não estavam relacionadas a estradas ruins, falta de energia elétrica ou comunicações precárias. Tratava-se de resolver os problemas da alta sazonalidade do produto, praticamente só vendido nas festas de final de ano e da baixa tradição do seu consumo no Brasil. Além disso, uma das queixas frequentes era a de que o peru, depois de assado, ficava muito seco, o que acontecia sobretudo por causa do costume de recheá-lo com farofa, que absorvia todos os líquidos da carne. Para superar este último problema, a empresa baseou-se em tecnologia norteamericana, que consiste em lançar no mercado o peru « pré-temperado », pronto para ser levado ao forno. Com ele, a empresa começou a melhorar seus rendimentos, o produto tornouse bem aceito e, lançado em 1974, o Peru Temperado Sadia, seria um dos produtos de maior sucesso na história da empresa. 114 A alta sazonalidade foi mais difícil de ser superada. Para viabilizar o abatedouro, depois de alguns anos, a Sadia optou por conjugar na própria unidade de Chapecó o processamento de perus e de frangos, criados pelo mesmo sistema de integração. Para resolver a sazonalidade, aos poucos, foram sendo introduzidos os « cortes » de peru tanto para o mercado interno como para exportação, além de fiambres, peitos defumados e desossados e salsichas de carne de peru. Antecedendo a industrialização dos anos 90, através da linha « Califórnia », a empresa elevou a rentabilidade da produção, agregando valor e reduzindo o peso da sazonalidade. Em 1973 abateu 550.000 perus, número que se repetiu em 1975, mas em 1977 o abate foi de 1,6 milhões de aves e, em 1980, superou a marca de 3,8 milhões (Teixeira, 1994). Com esta diversificação a Sadia adquiriu um « savoir-faire » diferente. Passou a dominar novas tecnologias - sobretudo na área de matrizes, com a criação da Hybrid Agropastoril em 1978, uma associação com a canadense Hybrid Turkey Ins., fornecedora das « avós » - acumulou outras experiências na área do fomento agropecuário e desenvolveu novas técnicas de comercialização, para vender um produto desconhecido do mercado. Perdigão centra sua produção de suínos e aves em Santa Catarina Enquanto a Sadia ampliava sua atuação, dividindo-se entre Santa Catarina, Rio Grande do Sul, São Paulo e Paraná, a Perdigão continuava ampliando e diversificando suas atividades, mas sempre no oeste catarinense. Entre os anos 1945 e 50, o grupo comprou um moinho de trigo e uma fábrica de caixas. Em 1955 construiu uma fábrica de rações balanceadas, em Videira-SC, com o objetivo de aproveitar os resíduos industriais do frigorífico de suínos e do moinho de trigo. Neste mesmo ano constituiu o Expresso Perdigão, empresa pertencente ao grupo, encarregada de distribuir os produtos das diversas fábricas pertencentes à Perdigão. Depois de se firmar no comércio, através da aquisição de aviões e da constituição do Expresso Perdigão, a empresa passou a diversificar suas atividades. Os primeiros produtos novos da Perdigão foram salsichas, lingüiças e presuntos. Com o crescimento dos grandes centros urbanos e a tendência de suas populações de consumir mais produtos industrializados de carne animal na forma de embutidos, enlatados, resfriados ou congelados e, com a popularização da geladeira nas décadas de 50 e 60, a demanda do setor alimentício cresceu significativamente. Mais tarde, no início dos anos 70, a Perdigão entraria no setor de frango 115 de corte, destacando-se como a principal concorrente da Sadia e ocupando o segundo lugar no ranking das maiores produtoras. Flávio Brandalise, seu presidente, explica a origem do nome atual da Perdigão: « O nome foi por acaso. A cidade onde a empresa foi criada chamava-se Perdizes. Perdiz é a fêmea do perdigão, então, dessa associação surgiu o nome dos nossos produtos. Quando começamos a ter penetração nos mercados de São Paulo e Rio de Janeiro, mesmo com os produtos sendo chamados de Perdigão, a razão social da empresa era Iramãos Brandalise, depois passou para Ponzoni-Brandalise. Quando nossos clientes ligavam para a casa de São Paulo, quem atendia falava o nome da empresa: Ponzoni-Brandalise. - Ah! desculpe, foi engano - sempre respondiam. Tocavam novamente e desligavam. Na terceira vez, perguntavam: - Mas aí não é da Perdigão? - Sim, o nosso produto é Perdigão. Então é com vocês que eu quero falar. Fomos forçados pelos clientes a mudar a razão social da empresa, passando em 1958, a chamar-se Perdigão S.A. Comércio e Indústria »85. No final dos anos 50 a empresa passaria por uma das maiores crises de sua história. Deste momento em diante, a Perdigão se desligaria das demais famílias que participaram do início de sua constituição, para ser dirigida por Saul Brandalise e seus filhos. Na década seguinte, continuou crescendo, sobretudo em atividades paralelas, complementares à principal, de produzir e comercializar produtos alimentares. Foi assim que em 1965 constituiu a Gráfica Perdigão Ltda, que mais tarde se transformou na Perdigão Serviços86. Além disso, em 1969, reestruturou o sistema de comercialização, constituindo a atual Perdigão Comercial e Exportadora S.A. Na década de 1970 a empresa continuou ampliando suas atividades. Em 1973 construiu o San Raphael Palace Hotel e o Supermercado Perdigão, ambos em Videira. Logo em seguida deu uma dimensão maior à atividade de couros, inaugurando as instalações do Empório de Couros S.A., em Joaçaba-SC. Para distribuir os derivados de couros, a Perdigão constituiu a Perbon Couros Ltda, em Novo Hamburgo-RS e a Perbon Couros Franca Ltda, em São Paulo, as duas maiores regiões de industrialização de couros e produtos derivados do país. Foi também neste setor que a Perdigão começou suas exportações e fez seus primeiros contatos com o mercado internacional. Em 1974 foi constituída a Perdigão Rações (atual 85 Depoimento de Flávio Brandalise, presidente da Perdigão à Fundação Centro de Estudos do Comércio Exterior, em 24 de agosto de 1989, mimeo, p. 9. 86 Os dados sobre o avanço das atividades e o ano de fundação das novas empresas foram extraídos de Saul Brandalise (1982), Retrato de um Homem, que narra sua história e a da empresa. 116 Perdigão Alimentos S.A.). Em seguida, esta empresa iniciou a atividade de extração de óleo de soja (entrando também no refino e enlatamento de óleo). Aqui já podemos fazer uma comparação entre as estratégias adotadas por cada uma das empresas. No que se refere à comercialização dos produtos as duas seguiram a mesma estratégia. Estabeleceram filiais comerciais em São Paulo e em outros importantes centros consumidores e transportaram seus produtos por avião87, enquanto não era possível o transporte frigorificado via caminhão. Mesmo assim, a Sadia saiu na frente ao inaugurar a Sadia Comercial em 1967. Nos demais aspectos, as estratégias empregadas foram muito diferentes. Em relação à ocupação geográfica, percebe-se que a Sadia implantou outras empresas no Rio Grande do Sul, no Paraná e, especialmente em São Paulo, enquanto que a Perdigão permaneceu somente no oeste catarinense, exceto na atividade de couros, setor pouco significativo no faturamento da empresa. É claro que, a longo prazo, esta postura diferenciada de planos de expansão, mostrou-se muito mais proveitosa à Sadia que a de sua concorrente, especialmente pela implantação da Frigobrás e do Moinho da Lapa em São Paulo. Outra diferença aparece ao analisar as áreas de diversificação. Enquanto a Sadia criou a Frigobrás para industrializar e fazer sub-produtos à partir da carne in natura, a Perdigão diversificou industrializando e vendendo couros. A médio prazo, novamente a Sadia adotou uma estratégia mais apropriada, principalmente porque lhe permitiu, além de aves (frangos e perus) e suínos, tornar-se uma das principais empresas nacionais no setor bovino. Se tomarmos o exemplo do trigo que, como vimos acima, foi um dos pilares para o desenvolvimento inicial da Sadia pelo lucro que proporcionava, novamente percebemos a diferença de estratégias. Enquanto a Perdigão permaneceu com seu moinho « colonial », sua concorrente instalou-se no principal mercado do país, construindo um moinho com grande capacidade de moagem. 3. Expansão brasileira do número de empresas avícolas até a década de 80 87 Neste caso, percebe-se uma postura diferente em relação aos desafios industriais e comerciais. A Perdigão comprou seus primeiros aviões antes de ser criada a Sadia. Esta, passou a transportar seus produtos de Concórdia a São Paulo através de um avião alugado, no início da década de 1950. No entanto, quando os caminhões substituíram com vantagem os aviões, a Perdigão desfez-se de seus aparelhos, enquanto a Sadia levou em frente sua companhia aérea, criando a Transbrasil (mesmo não sendo mais uma empresa ligada ao grupo Sadia, seu principal acionista continua sendo Omar Fontana, filho de Attilio) que é, atualmente, a terceira maior companhia de aviação do país. 117 Quando o novo mercado urbano, que surgiu nos anos 60 e fortaleceu-se na década de 70, exigiu um maior volume de produção de carne de frango para atender a nova demanda, houve uma forte expansão do número das empresas do setor. Neste período, ocorreram dois fenômenos paralelos no Brasil. Primeiro, o surgimento de um grande número de empresas avícolas na região Sudeste (especialmente em São Paulo e Minas Gerais), que eram os principais estados produtores de galinhas, galos e frangos, antes da avicultura industrial. Estas empresas estabeleceram-se para atender um mercado local cada vez maior e especializaram-se no abate de frangos, sem se preocupar com as demais etapas do processo produtivo. Segundo, na região Sul do país, ao contrário, as empresas que já atuavam na produção de carne suína, diversificaram suas atividades entrando no setor de frango de corte e implantaram, desde o início dos anos 60, o processo de integração vertical. Antes de 1970, só havia quatro abatedouros com inspeção federal no país, enquanto no final da década, este número passou para 84, o que significa que, em termos de quantidade de abatedouros, foi nos anos 70 que se implantou a avicultura industrial, como podemos ver pela tabela abaixo. 118 TABELA 9 - DISTRIBUIÇÃO DOS ABATEDOUROS DE FRANGO CONTROLADOS PELO SIF E SUA CAPACIDADE INSTALADA, SEGUNDO OS ESTADOS BRASILEIROS - ANTES DE 1970, ANOS 1970 E ANOS 1980 ABATEDOUROS CLASSIFICAÇÃO DA CAPACIDADE DE FRANGO (aves/hora) Total de Antes Anos Anos Mais de de 1 500 de 600 Até Estabele- ESTADO 1970 1970 1980 3 000 a 3 000 a 1 500 600 cimentos São Paulo 3 32 13 6 17 22 3 48 Minas Gerais - 4 8 1 6 4 1 12 Paraná - 8 6 6 3 5 - 14 Santa Catarina 1 9 3 9 3 1 - 13 Rio Grande do Sul - 13 2 6 4 5 - 15 Pernambuco - 3 - - 1 1 1 3 Espírito Santo - 3 - - 1 - 2 3 Rio de Janeiro - 2 - 1 1 - - 2 Distrito Federal - 1 - 1 - - - 1 Bahia - 1 - - - 1 - 1 Ceará - 1 - - - 1 - 1 Pará - 1 - - - 1 - 1 Maranhão - 1 - - - 1 - 1 Amazonas - 1 - - - 1 - 1 TOTAL 4 80 32 30 36 43 7 116 FONTE: Rizzi (1994, p.62). Nota 1 - Os dados referem-se aos anos de registro no SIF, ajustados com as informações das Associações de Avicultura que apresentaram dados de produção individualizados por frigorífico. Não significa que esse número de abatedouros exista ou que permaneça com os mesmos nomes; alguns fecharam e outros foram adquiridos por outras empresas. Deve-se observar que os registros referem-se a unidades produtivas, não sendo separados por empresa. Nota 2 - PR, SC e RS - elaboração a partir do número de abatedouros registrados, até abril de 1990, no Ministério da Agricultura (MA)-SIF, ajustado com os wazzu dados de produção por frigoríficos para os anos de 1980, 1985 e 1990, fornecidos pelas Associações de Avicultores de cada estado. SP - dados do SIF para os anos 1970 e 1980 ajustados com os dados de produção por abatedouro para os anos de 1985 e 1990, fornecido pela Associação dos Avicultores do estado. Para os outros estados, foram considerados somente os abatedouros registrados no MA-SIF. 119 Se os estados da região Sudeste atraíram o maior número de estabelecimentos, as empresas do Sul implantaram, desde o início, a integração vertical. Esta inovação organizacional lhes permitiu, nas décadas seguintes, enorme vantagem em relação às concorrentes, transformando as empresas do Sul nas maiores do setor. No oeste de Santa Catarina, baseados no exemplo bem sucedido da Sadia, diversos outros frigoríficos entraram neste setor. Se a Perdigão é ainda da década de 30, e a Sadia e a Saulle Pagnoncelli são da década de 40, as outras empresas são mais recentes. TABELA 10 - CIDADE E ANO DE FUNDAÇÃO DOS FRIGORIFICOS CATARINENSES Frigorífico Ano de fundação Cidade Ponzoni & Brandalise e Cia - Perdigão 1934 Videira Comércio e Indústria Saulle Pagnoncelli 1942 Joaçaba S.A. Indústria e Comércio Concórdia - Sadia 1944 Concórdia S.A. Indústria e Comércio Chapecó - SAICC 1952 Chapecó Frigorífico Seara (atual Ceval) 1958 Seara S.A. Frigorífico Itapiranga 1962 Itapiranga Unifrico S.A. Indústria e Comércio 1963 Salto Veloso déc.60 Ouro Cooperativa Central Oeste Catarinense - Aurora 1969 Chapecó Frigorífico São Carlos - FRISCAR 1975 São Carlos Indústrias Reunidas Ouro S.A. Fonte: Dalla Costa (1993, p. 33). Dos frigoríficos desta tabela, cinco (Sadia, Perdigão, Ceval, Chapecó e Aurora) estavam entre as dez maiores empresas do setor avícola brasileiro em 1995, enquanto os outros cinco foram comprados por seus concorrentes. Regiões Sul e Sudeste dominam avicultura industrial A região Sul do país é a que concentra a maior parte das pequenas propriedades a nível nacional, tendo tradição e experiência de trabalhar com pequenos animais88. Além disto, a região é grande produtora de milho, soja, trigo, arroz e outros cereais, que são de fundamental importância na formulação de rações. Entretanto, as empresas ali instaladas se 120 desenvolveram, sobretudo no início, apossando-se da riqueza produzida pelos pequenos agricultores que se dedicaram tanto à policultura cerealista como à produção de pequenos animais. Várias empresas (entre as principais podemos citar o caso da Sadia e da Perdigão), iniciaram sua trajetória pelo comércio. Este consistia em adquirir os produtos dos agricultores e lhes vender os instrumentos de trabalho e as mercadorias vindas de fora. Com isto, as empresas puderam acumular o capital inicial necessário para dar outro passo adiante: a industrialização dos produtos destas lavouras89. Antes da avicultura industrial, os principais produtos industrializados foram o trigo e o suíno. Em seguida, a avicultura « integrada » com pequenos agricultores passou a ser o principal fator de faturamento e crescimento destas empresas. Por outro lado, as agroindústrias da região Sul souberam aproveitar melhor os incentivos governamentais que as situadas nas demais regiões do Brasil. A partir dos anos 60 o país começava a se urbanizar90 e se industrializar com mais intensidade. Para acelerar este 88 Para maiores detalhes sobre os pequenos agricultores na região Sul, a estrutura agrária, a força de trabalho, a produção, os preços recebidos e os complexos agroindustriais, ver DESER - Departamento Sindical de Estudos Rurais (1992), Região Sul em Dados, Caderno de Estudos n° 1, 75 p. 89 Sobre a expropriação da riqueza produzida por estes agricultores, apossada pelas empresas agroindustriais já existem vários estudos. Citamos, entre outros, os trabalhos de Rizzi (1984), Santos (1984), Belato (1985), Campos (1987), Paulilo (1990), Tedesco (1991), Mior (1992), Dalla Costa (1993). 90 Foi na passagem da década de 60 para a de 70 que a população brasileira urbanizou-se. Entretanto, o fato mais marcante é que, em 40 anos, a população duplicou, passando de 70 milhões, em 1960, para 147 milhões em 1991. Outro fato a destacar é a grande concentração populacional na região Sudeste do país, assim como sua maior concentração urbana, se comparada às demais regiões e a concentração de riqueza, como podemos ver pelas tabelas seguintes. TABELA 11 - BRASIL. POPULAÇÃO TOTAL E PORCENTAGEM URBANA - 1960-1991 Regiões 1960 1970 1980 1991 Total Urb Total Urb Total Urb Total Urb Norte 2 571 586 37,8 3 185 355 45,1 5 831 135 51,7 10 597 305 57,8 Nordeste 22 142 264 34,2 27 997 594 41,8 34 867 809 50,5 43 792 133 60,6 Sudeste 30 550 719 57,4 40 049 786 72,7 51 766 201 82,8 64 603 032 88,0 Sul 11 834 901 37,6 16 485 610 44,3 19 040 442 62,4 22 653 700 74,1 Centro2 970 987 35,0 5 420 692 48,0 7 497 173 67,8 9 871 279 79,2 Oeste Brasil 70 070 457 45,1 93 139 037 55,9 119 002 760 67,6 146 917 459 75,5 Fonte: IBGE Além de ter o maior índice de população urbanizada, o Sudeste é a região mais rica do país. Contando com 43,5% da população, concentrava 65,5% da renda em 1980. Por isso, é a região mais importante para o comércio. No caso das empresas agroindustriais que iniciaram no Sul, estabelecer-se e comercializar seus produtos no Sudeste, foi e continua sendo fundamental para sua sobrevivência. TABELA 12 - DISTRIBUIÇÃO REGIONAL DA POPULAÇÃO E DA RENDA (em %) Regiões 1940 1950 1960 1970 1980 Pop. Renda Pop. Renda Pop. Renda Pop. Renda Pop. Renda Norte 3,55 2,66 5,53 1,71 3,67 2,23 3,42 2,1 4,9 3,0 Nordeste 35,00 16,73 34,60 14,65 31,60 14,78 30,06 13,5 29,3 11,7 Sudeste 44,50 62,91 43,30 65,56 43,60 62,77 43,00 62,8 43,5 65,5 Sul 13,90 15,56 15,21 16,29 16,89 17,77 17,70 18,2 16,0 17,1 121 processo, o governo favoreceu tanto o êxodo rural, para fornecer operários à indústria em expansão, quanto a produção de alimentos baratos, para atender uma população urbana com salários baixos e cada vez mais comprimidos. Tanto as políticas desenvolvidas pelo governo para modernizar a avicultura e incentivar a produção de milho e soja, como as políticas de incentivos fiscais e de outras formas de ajuda do Estado às indústrias que se implantassem fora do eixo Rio-São Paulo, favoreceram o surgimento e o fortalecimento das agroindústrias alimentares91. A Ceval, segunda maior empresa avícola nacional em 1995, é um caso típico de empresa agroalimentar que surgiu para aproveitar os incentivos fiscais fornecidos pelo governo. Por estas razões é que as maiores empresas do setor da avicultura industrial estabeleceram-se no Sul do país. No final da década de 80, dos 30 estabelecimentos com capacidade para abater mais de três mil aves por hora, 70% localizavam-se na região Sul. Em São Paulo e Minas Gerais, diferente dos estados do Sul, as novas empresas continuaram suas atividades seguindo o que já vinham fazendo antes da avicultura industrial. Cada empresa, ao invés de implantar a integração com os avicultores e instalar suas próprias fábricas de rações e incubatórios, continuou só abatendo e vendendo os frangos. A matériaprima era adquirida dos « avicultores independentes », em geral grandes produtores que vendiam seus produtos no mercado, pelo sistema de preço baseado na « oferta e procura ». Os pintos de um dia, estes avicultores compravam-nos nas incubadoras independentes, especializadas nesta etapa do processo de produção, assim como a ração (salvo alguns grandes produtores que compravam o premix e misturavam o milho e a soja, fazendo a ração em suas propriedades). Nestes estados, sobretudo em São Paulo, havia um grande número de pequenas empresas que adotaram duas estratégias de inovações organizacionais diferentes. Primeiro, Centro-Oeste Fonte: IBGE. 91 3,05 2,14 3,34 1,79 4,24 2,48 5,82 3,4 6,3 2,7 Neste caso já existem vários estudos, tanto sobre os incentivos governamentais e suas políticas, como os incentivos diretos às agroindústrias. Entre estes estudos, citamos os de Sorj (1980), Kageyama e Silva (1987), Müller (1989), Leite (1990), Silva (1991), Belik (1992). A Sadia, talvez melhor que todas as demais agroindústrias do setor de carnes soube aproveitar destes incentivos. Quando em 1971, com a autorização da SUDAM - Superintendência do Desenvolvimento da Amazônia, adquiriu o Frigorífico Várzea Grande S.A., transformando-o na Sadia Oeste S.A., para atuar no setor bovino, a empresa aproveitou dos incentivos fiscais dedicados a esta atividade. « No princípio dos anos setenta, com o grande crescimento da pecuária de corte e a generosa política oficial de incentivos e subsídios, apresentou-se a oportunidade de concretizar a intenção de entrar no setor bovino. Além de aplicar parte de seu imposto de renda em um empreendimento próprio, ainda contaria com o apoio dos recuros de grandes investidores, como o Bradesco e o Unibanco (grifo nosso), entre outros » (Teixeira, 1994, p. 80). A Companhia Têxtil Hering, seguiu processo semelhante, constituindo a « Cereais do Vale » - CEVAL, através de dinheiro conseguido via incentivos fiscais, em 1972. 122 não implantaram a integração vertical, limitando-se ao abate e comercialização de frangos. Segundo, produziam basicamente para o mercado local. Estas decisões, com o tempo, inviabilizaram tais empresas, pois não tiveram acesso às exportações e não se implantaram a nível nacional, nem com abatedouros, nem com filiais comerciais, para concorrer em igualdade de condições com as empresas do Sul. 4. Empresas de caráter predominantemente familiar A história dos grupos que implantaram a avicultura industrial é baseada em estabelecimentos que iniciaram suas atividades pelo impulso de uma pessoa ou de uma família. Em seguida, com o crescimento do capital, dos abatedouros, de outras fábricas e das filiais comerciais, eles foram adaptando suas estruturas, ampliando a área de atuação e diversificando os setores de produção, mas chegaram à metade dos anos 70 ainda como empresas basicamente familiares, sobretudo no que se refere ao capital e à gestão. Sadia: de Attilio Fontana ao Conselho de Administração « Consolidando-se de início como uma típica empresa familiar do ramo de alimentos, à semelhança de outras congêneres nascidas da vida colonial do Sul, a Sadia cresceu com o movimento ascendente da industrialização brasileira. Sua força interna proveio da constância do núcleo original de gestão, inalterado por quase três décadas, e no qual as funções executivas se confundiam com os laços de parentesco e a condição de acionistas, sob a liderança firme e madura de Attilio Fontana » (Teixeira, 1994, p. 64). Analisando o início das atividades da Sadia, na passagem do comércio para a indústria, percebemos que Attilio levou consigo os melhores quadros técnicos que já trabalhavam com ele. Em 1943, quando foi convidado pelo prefeito de Concórdia, Dogelo Goss, para fazer funcionar o moinho de trigo e a fábrica de banha, enviou para lá seu filho Walter. Um ano mais tarde, tendo abandonado definitivamente o comércio e iniciando sua carreira industrial, formou seu primeiro núcleo básico de dirigentes, que levariam a empresa adiante. Tal grupo dirigente foi formado por Attilio Fontana; Dario Bordin, seu cunhado; Walter Fontana, seu filho; Romano Ancelmo Fontana, sobrinho e Osório Henrique Furlan, seu genro. Foram estes que, mudando-se para Concórdia, dirigiram pessoalmente a compra de Em 1980 esta empresa diversificou suas atividades entrando no setor de carnes e atualmente é a segunda maior empresa avícola nacional. 123 suínos e de trigo, a moagem e a venda da farinha, o abate, a fabricação da banha e de outros produtos derivados deste animal, assim como as vendas da empresa fora de Santa Catarina. Porém, foram eles também que tomaram, junto com o fundador, as primeiras decisões estratégicas de adquirir outras empresas, estabelecer-se em São Paulo, melhorar o transporte, investir no aperfeiçoamento da matéria-prima, transformando o « porco tipo-banha » em « porco tipo-carne ». Com o crescimento das atividades industriais e comerciais da empresa, outros filhos, sobrinhos e genros vieram juntar-se nos anos seguintes a esse núcleo original, caracterizando assim a empresa como uma atividade familiar, tanto do ponto de vista do capital, como de seus dirigentes. Estes novos dirigentes - Victor Fontana, Mário Fontana, Ottoni Romano Fontana (sobrinhos); Omar Fontana (filho); Zoé Silveira d’Ávila e Raul Mena Barreto dos Reis (genros) - junto com os demais já presentes, tiveram uma participação decisiva nas tomadas de decisão estratégicas e na direção diária das empresas Sadia (Fontana, 1980). Entre estes diretores, com exceção de Attilio Fontana, todos tinham formação escolar, na sua grande maioria, universitária. Formaram uma geração posterior à do fundador da empresa, mas iniciaram seus trabalhos logo no começo, acompanhando todas as etapas de crescimento. Ajudaram a tomar as decisões chaves, tanto no que se refere à busca de melhores equipamentos, como de organização do trabalho e relação com os produtores de suas matérias primas, especialmente as de origem animal, como as decisões relativas à ocupação estratégica do espaço nacional, em empresas produtoras e distribuidoras. Foi assim que a empresa começou a colocar em prática várias idéias ousadas que lhe permitiram firmar-se e crescer sempre mais. Como tinha iniciado suas atividades moendo trigo e produzindo farinha, seu primeiro negócio fora de Concórdia, foi comprar outro moinho de trigo em 1953, como vimos acima. Ampliando esta atividade, em 1953 a Sadia inaugurou sua primeira indústria em São Paulo, o « Moinho da Lapa », produzindo farinha e outros derivados naquele que era o maior centro consumidor do país. Outro lance ousado foi decidido em relação à distribuição dos produtos. De um lado, para vencer as distâncias e fazê-los chegar a São Paulo e Rio de Janeiro, a empresa montou a Sadia S.A. Transportes Aéreos, em 1955, que levava os produtos frescos. De outro, implementou a melhoria dos transportes em caminhões-frigoríficos que, a partir de 1958 começaram a substituir, aos poucos, as vantagens dos transportes aéreos. Ao mesmo tempo, iam sendo formadas as filiais, que já eram oito na metade da década de 1960, estendendo-se numa faixa de cerca de 500 quilômetros a partir de São Paulo. 124 Na passagem da década de 50 para a de 60, os dirigentes da Sadia tomaram a decisão estratégica que se mostrou a mais importante para o grupo: diversificar suas atividades entrando no setor avícola. Enviaram Ivo Reich para os Estados Unidos e, tendo conhecido o sistema integrado de produção de frangos de corte, introduziu esta prática no Brasil. A partir de 1961 a Sadia começou abater frangos em Concórdia, criados de forma integrada junto aos pequenos produtores da região. Os recursos para investimentos eram divididos entre Concórdia, São Paulo e outras cidades onde foram se instalando as filiais comerciais. São Paulo nesse período acabou recebendo a maior parte desses recursos, desde a instalação do Moinho da Lapa, no começo da década de 50, até a inauguração do novo prédio de seis andares, da filial comercial, em 1957. Enquanto no térreo do prédio funcionavam os serviços de distribuição das mercadorias, no quarto andar « já se reunia vez por outra a alta direção da empresa » (Teixeira, 1994, p. 50). Foi numa destas reuniões que amadureceu um projeto ainda mais ousado que os anteriores, de instalar um frigorífico de produtos suínos e derivados de carne em São Paulo. Foi constituída a Frigobrás - Companhia Brasileira de Frigoríficos, inaugurada em 1964. Neste mesmo ano foi inaugurada uma filial da Frigobrás em Toledo, no Oeste do Paraná, para fornecer a matéria prima suína. Quando a Sadia decidiu entrar no setor avícola, no início dos anos 60, já contava com dois abatedores de suínos (Concórdia e Toledo), três moinhos de trigo (Concórdia, Marcelino Ramos e São Paulo) e uma fábrica de sub-produtos de suínos. Além disso, a empresa já empregava 670 funcionários e abateu 158.000 cabeças de suínos em 1960 (Teixeira, 1994). Para administrar melhor os novos empreendimentos e a diversificação de atividades, em direção ao setor avícola e à industrialização de carne suína, os dirigentes da Sadia resolveram melhorar a forma de atuação de seus principais diretores. A primeira mudança significativa foi aprovada na Assembléia Geral Extraordinária de 25 de abril de 1964, quando se decidiu criar o Conselho de Administração92. Embora desligado parcialmente da diretoria executiva, a maior parte de suas vagas seriam ocupadas por estes diretores. Mesmo assim, significou uma mudança no sentido de pensar uma perspectiva clara para a Sadia a longo alcance. Enquanto a diretoria continuava a cuidar do dia-a-dia das diversas indústrias e filiais comerciais, seguindo a programação de produção estabelecida, o conselho trataria de fixar a 92 Foram os seguintes os diretores que compuseram este primeiro conselho: Attilio Fontana, Romano Ancelmo Fontana, Osório Henrique Furlan, Walter Fontana, Victor Fontana, Ottoni Romano Fontana, Omar Fontana, Raul Mena Barreto dos Reis, Mário Fontana e Zoé Silveira d’Ávila. 125 política geral dos negócios da empresa, a aplicação dos recursos e seu planejamento a longo prazo. A partir deste momento a empresa passou a ser dirigida, mais que no início, por um grupo de dirigentes « profissionais » e foi, aos poucos, diminuindo a importância da figura do fundador93, tanto para as decisões estratégicas e da aplicação dos recursos como na administração direta diária. Foi a partir daí que a empresa tomou um novo impulso, diversificou ainda mais seus ramos industriais e cresceu no volume de produção e distribuição. Várias são as decisões importantes tomadas pelo Conselho de Administração, antes da Sadia começar suas exportações de frango em 1975. Entre elas, podemos citar a criação da Sadia Distribuidora, depois Sadia Comercial Ltda (a Sadial), em 1967. Substituindo o antigo Departamento de Vendas, o setor comercial da Sadia foi fundamental no futuro da empresa para fazer com que seus produtos chegassem a ser distribuídos em todo território nacional. Mais tarde, a Sadial teria também um papel fundamental nas exportações. Ao analisar outras grandes decisões estratégicas, percebe-se cada vez mais a importância do Conselho. Quando, em 1969, a Sadia solicitou ao Banco Central seu registro como companhia de capital aberto, « essa decisão vinha sendo amadurecida havia algum tempo e contou com o empenho de vários dirigentes, principalmente Walter Fontana » (Teixeira, 1994, p. 74). Com esta decisão, em 1971 a antiga S.A. Indústria e Comércio Concórdia deu lugar à nova Sadia Concórdia S.A. Indústria e Comércio, controladora de um grupo de cinco empresas do setor agroindustrial e comercial. Tendo ofertado um número de ações ao público que aumentava em 50% o capital social, o número de acionistas passou de 655 para 1.500. Outras duas decisões que se mostrarm acertadas, foram a entrada no setor de perus, com a construção da « Sadia Avícola » de Chapecó-SC, em 1973 e, da entrada no setor de bovinos. Neste caso, uma comissão formada por Walter Fontana, Victor Fontana e Zoé Silveira d’Ávila foi delegada pelo Conselho de Administração para escolher o local adequado 93 Se bem que Attilio teve uma influência muito forte na empresa até o momento de sua morte. Permaneceu sempre como presidente, até conseguir exercer suas funções. Em seguida, tornou-se um personagem « legendário », como se pode ver lendo a publicação de suas memórias (Fontana, 1980), onde colocou o trabalho e a dedicação aos negócios como elementos essenciais para o sucesso pessoal e empresarial. Além disso, construiu a « Fundação Attilio Francisco Xavier Fontana », para « dar assistência » aos empregados. Depois de sua morte, continua sendo « cultuado » como o grande dirigente, o símbolo do trabalho e da dedicação, a ser seguido por todos. Para mais detalhes sobre o culto à personalidade do fundador, ver a Revista Integração, da Fundação Attilio Fontana, dirigida aos mais de 30.000 funcionários da empresa. Fenômeno semelhante também aconteceu com a Perdigão e Saul Brandalise. Para maiores detalhes neste caso, recorrer aos textos de Brandalise (1982) e de Tedesco (1992). 126 à implantação da Sadia no Centro-Oeste. Tendo decidido por Várzea Grande, próximo a Cuiabá, no Mato Grosso, foi criada, em 1971, a Sadia Oeste S.A. Desde 1973 a Sadia começou a comprar e esmagar soja a partir de Toledo-PR, para obter um farelo de melhor qualidade utilizado na fabricação de rações. No entanto, foi só em 1977 que constituiu sua primeira grande fábrica de esmagamento e extração de óleo de soja, com capacidade de 200 toneladas por dia. Em 1979, para atender às necessidades de fabricação de ração de Concórdia e Chapecó, a Sadia comprou uma planta industrial em Joaçaba, constituindo a Sadia Joaçaba S.A., com capacidade de 600 toneladas por dia de esmagamento e extração de óleo. Foi com este Conselho Administrativo; com este quadro de indústrias instaladas; com um leque de atuação em suínos, trigo, frangos, perus, bovinos, soja, milho; com oito filiais comerciais implantadas, que a Sadia preparou-se para entrar numa atividade também estratégica que seria a exportação de frangos, a partir de 1975. Se tomarmos como parâmetro o conceito de empresa familiar de Chandler94 veremos que a Sadia mantinha características familiares, mas também se firmava como « empresa moderna »95. Era familiar no que se refere à administração e posse familiar, mas já atuava na produção e comercialização, em diversas áreas geográficas, tinha um Conselho de Administração, encarregado de pensar a estratégia da empresa a longo prazo, o que a distinguia das empresas familiares tradicionais. Outras empresas avícolas familiares A empresa que mais se assemelhava à Sadia, tanto na administração como na diversificação de atividades e crescimento do número de indústrias instaladas até meados da década de 70 era a Perdigão. Como vimos acima, a empresa começou e cresceu a partir da história de três famílias: Ponzoni, Bonato e Brandalise. Seus principais dirigentes, desde 94 O autor estabelece várias características de uma empresa familiar: 1) Ela era formada por uma única unidade produtiva; 2) um ou vários proprietários dirigiam a empresa à partir de um único escritório; 3) em geral este tipo de empresa só exercia uma função econômica, para uma só categoria de produtos, numa única região geográfica; 4) antes do desenvolvimento da empresa moderna, as atividades de cada uma destas pequenas empresas de gestão e propriedade individual eram coordenadas e reguladas pelos mecanismos de preço e de mercado (Chandler, 1988, p. 3). 95 Chandler em seus estudos mostra a passagem da empresa familiar e tradicional para a « empresa industrial moderna ». Ao se referir a esta última, ele diz que « pode ser definida como uma coleção de unidades operacionais, cada uma dispondo de suas próprias instalações particulares e de seu próprio pessoal, cujos recursos e atividades são coordenadas, supervisadas e repartidas de maneira específica, através de uma hierarquia de dirigentes » (Chandler, 1992, I, p. 42). 127 1934, quando foi fundada, até 1958, foram os representantes de tais famílias. Nesta data, houve a primeira grande crise e reformulação. O grupo mudou de nome e o núcleo dirigente baseou-se em Saul Brandalise e seu filho Flávio à partir de 1958 entrando mais tarde o outro filho Saul Brandalise Júnior, em 1969. Tal como no caso da Sadia, este núcleo dirigente dedicava-se tanto a pensar a estratégia da empresa a longo prazo como às atividades de direção da produção e comercialização. Na década de 60 os dirigentes da Perdigão começaram a pensar a diversificação de suas atividades. Entraram nos setores de couros, hotelaria e supermercados, além de organizar melhor a distribuição de seus produtos no mercado nacional. Por fim, resolveram entrar no setor de esmagamento de soja, sobretudo para aproveitar o farelo na fabricação de rações. Além da Sadia e da Perdigão, várias outras empresas surgiram até meados da década de 70, como vimos acima e hoje estão entre os dez maiores grupos avícolas nacionais. Passamos a estudar, em seguida, algumas delas, destacando sempre seu caráter familiar que, neste caso, é ainda mais forte que nas duas já analisadas. Plínio De Nes e a S.A. Indústria e Comércio Chapecó Plínio De Nes chegou a Faxinal dos Guedes, oeste catarinense, em 1942, onde iniciou suas atividades no setor madeireiro, montando uma serraria passando, em seguida, a atuar na agricultura e na produção de suínos, até construir e dirigir por 36 anos a S.A. Indústria e Comércio Chapecó, que se tornaria um dos maiores abatedouros avícolas nacionais. Sua história é semelhante a de muitos descendentes de italianos que chegaram ao Rio Grande do Sul no final do século passado. Plínio nasceu no dia 8 de março de 1921. Seu pai David, cansado da agricultura, tornou-se carpinteiro e montou uma loja entrando, em seguida, para o serviço público. Sua mãe Emma dirigia a casa e a loja de secos e molhados onde vendia desde fumo até material elétrico, camas e automóveis Chevrolet. Em 1932, Plínio foi no Colégio Marista da Imaculada Conceição, em Guaporé e, mais tarde em Lajeado, onde aprendeu alemão, inglês e tomou as primeiras lições de economia no curso de guarda-livros. A profissão era rara na época e, com ela, Plínio poderia assinar balanços e fazer escrita de firmas. Chegou a cursar o primeiro ano da faculdade de Ciência Política e Econômica em Porto Alegre, mas desistiu por falta de recursos. Voltou a Encantado e, aos 18 anos, abriu sua primeira empresa, a Rádio Garantia Ltda, revendedora de rádios importados. No entanto, desde 1920 as colonizadoras que haviam 128 adquirido as terras do oeste catarinense faziam intensa propaganda em todo o Rio Grande do Sul para levar colonos àquela região. Em 1942 Plínio resolveu conhecer aquelas terras e empreendeu uma viagem de cinco dias, até conseguir superar os pouco mais de 500 quilômetros entre Encantado e Faxinal dos Guedes. Quando passou por Chapecó teve uma má impressão, pois a cidade já tinha 11 anos e não passava de um amontoado de casas, uma igreja e um pequeno hotel de madeira. A maioria dos quatro mil habitantes estava no interior. Chegando em Faxinal dos Guedes, foi trabalhar como gerente de uma madeireira. Logo em seguida, comprou caminhões a prazo no Rio Grande do Sul e os vendeu à vista na região. Com isto, sobrou dinheiro para abrir a madeireira Itaoeste, em 1943. As madeireiras tiravam as toras e as reuniam em Goio-En, de onde eram enviadas para a Argentina, em até duas mil dúzias de toras, pelo rio Uruguai. Plínio morou dez anos em Faxinal dos Guedes, de 1943 a 1953. Além de madeira e do transporte pioneiro de caminhão, foi um dos primeiros a plantar lavouras com máquinas, usando tratores de esteira e de pneus. Chegou a levar duas tropas de porcos até Joaçaba, onde eram embarcados de trem para São Paulo. Na verdade não pensava em sair de Faxinal até o dia em que recebeu a visita de Serafim Bertaso, filho do colonizador de Chapecó, coronel Ernesto Bertaso. Serafim, acompanhado de duas lideranças locais, propôs a Plínio de entrar como sócio na construção de um frigorífico de suínos, que seria a primeira indústria da cidade. Seu nome foi lembrado entre os diversos sócios do empreendimento porque era vereador em Faxinal desde 1946 e mantinha boa imagem no setor madeireiro. A Sociedade Anônima Indústria e Comércio Chapecó (SAICC) foi fundada em 1952, para reverter o momento mais obscuro da história da cidade. Nos anos anteriores, uma série de incêndios criminosos semeou o medo entre os colonos e muitos ameaçavam retornar ao Rio Grande do Sul. Naquele ano a igreja foi queimada e três homens linchados pela população. O caso ganhou até destaque na imprensa nacional e contribuiu para cortar o fluxo de migrantes. A construção do frigorífico era a única prova da liderança exercida sobre a região. Plínio concordou, mas depois voltaria à sua madeireira. Entretanto, envolveu-se de tal maneira que nunca mais retornou a sua antiga atividade96. Foi primeiro fazer um estágio num 96 Pelo contrário, acabou tornando-se uma das pessoas mais influentes em Chapecó, onde foi prefeito de 1956 a 1960. Em 1962, o Oeste catarinense viveu um período conturbado. A região continuava isolada, sem manutenção de estradas e com dificuldades de comunicação. O descaso do governo estadual acendeu um movimento separatista para a criação do Estado do Iguaçu. A solução para acalmar os ânimos foi a criação da Secretaria do Oeste. Em 1969 Plínio foi nomeado secretário do Oeste, onde ficou até 1975, como « governador » de toda a região. Em seguida, foi nomeado presidente do Banco o Estado de Santa Catarina, o Besc, onde ficou entre 1976 e 1979. Assim como no caso de Attilio Fontana para a Sadia, é fácil de perceber a influência da atividade política do presidente da Chapecó, sendo ao mesmo tempo político influente na 129 frigorífico em Buenos Aires, para conhecer os detalhes do novo ramo de negócios, tanto técnicos, para a construção do edifício, como da maquinaria e do funcionamento dos abates e da comercialização. A edificação do prédio começou em 1953 e foi muito dificultada pela falta de acesso rodoviário à cidade. Pela falta de estradas, tanto as máquinas como os demais equipamentos do frigorífico eram transportados por avião. « A produção começou em setembro de 1955, com os 28 empregados abatendo 40 suínos por dia »97. Os porcos eram criados soltos na mata pelos colonos, ou fechados em chiqueiros rústicos e mangueirões e chegavam ao frigorífico em tropas tocadas à pé de locais distantes até 100 quilômetros. A péssima situação das estradas dificultava também a comercialização da produção. A solução era mandar produtos nobres, como frescais a bordo de vôos diários que os DC-3, da época da Segunda Guerra, faziam entre Chapecó e São Paulo. Quanto à banha, seguia em caminhões, que faziam centenas de quilômetros entre poeira e atoleiros, conforme as condições do tempo. O ingresso da Chapecó no ramo da avicultura foi em julho de 1974, com a implantação de uma unidade em Xaxim, que começou a operar em janeiro de 1976, abatendo 500 aves por dia. Posteriormente a Chapecó construiu um grande abatedor de aves no Sudoeste do Paraná (vendido à Sadia no início da década de 1990) e, em novembro de 1989, comprou um abatedor de frangos em Monte Alegre do Sul-SP. A atuação no ramo da suinocultura expandiu-se em dezembro de 1979, com a aquisição de um abatedouro de suínos em São Carlos-SC98. região e no Estado e estando na presidência de instituições criadas para financiar o desenvolvimento de empresas da região. Plínio Arlindo De Nes faleceu aos 74 anos de idade, no dia 5 de fevereiro de 1995. 97 BESC - Banco do Estado de Santa Catarina (1992), Pioneiros Catarinenses, Volume 1, Florianópolis, AZ Comunicações, p. 13. 98 Para outros detalhes da fundação e início das atividades da Chapecó, ver BESC - Banco do Estado de Santa Catarina (1992), Pioneiros Catarinenses, Vol. 1, pp.11-14. 130 Família Paludo e a « Seara Avícola » Na cidade de Seara, também localizada no oeste catarinense, nasceria uma das principais empresas de frango a nível nacional, a Seara Avícola Xanxerê. Tal como no caso da Sadia e da Perdigão, a Seara, criada em 1958, foi uma empresa que iniciou suas atividades abatendo suínos, cuja carne e derivados eram vendidos nos mercados de São Paulo e Rio de Janeiro. Ainda à semelhança das duas outras, foi constituída à partir da família Paludo, de imigrantes italianos vindos do Rio Grande do Sul e de outros 250 acionistas. Da produção suína, a diversificação para o setor de aves, continuou seguindo a experiência da Sadia. Neste ramo, iniciou as atividades em 1973, quando construiu a Seara Avícola Xanxerê, com uma fábrica de rações, incubatório, granja de matrizes e a implantação do sistema integrado para produção de aves e de suínos. Em junho do mesmo ano o frigorífico começou a abater 200 cabeças de aves por dia. Em 1975, quando o país iniciou o processo de exportação de frangos, a Seara, junto com a Sadia e a Perdigão, formou o primeiro « pool » de exportadores. Mais tarde, em 1980, a Seara foi adquirida pela Ceval. Empresas familiares no Rio Grande do Sul « A Avipal é uma empresa familiar, fundada em 1960, pelo senhor Luis Shen e seu irmão, com alguns outros sócios, todos descendentes de chineses. Sempre foi administrada pelos irmãos Shen e tem cem por cento de capital nacional »99. Inicialmente, com o nome de Aviário Portoalegrense, abatia frangos em pequenas quantidades e vendia toda produção em Porto Alegre, administrando o processo desde a criação de frangos, produção da ração, até o abate e a venda. No início dos anos 70, o Aviário Portoalegrense teve um aporte maior de capital dos irmãos Shen e mudou seu nome para Avipal. Em 1974, inaugurou o atual abatedor de frangos, em Porto Alegre, o que a colocou entre os grandes do setor avícola nacional. A Frangosul S.A., com seu complexo agro-industrial voltado para a alimentação humana e animal, teve sua origem em 14 de maio de 1970, com a fundação da Granja Pinheiros Ltda. Seu principal objetivo era a criação de frangos em pequena escala, abatendo inicialmente cerca de 14.000 aves por ano. Entretanto, a partir do início desta década, a procura e o consumo pela carne de frango tornou-se cada vez maior. Em 1974 houve uma reformulação, passando de « sociedade por quotas de responsabilidade limitada » para 99 Entrevista com o Diretor de produção da Avipal, Porto Alegre-RS, 28 de abril de 1995. 131 « sociedade anônima de capital fechado », formando assim a Frangosul S.A. Agro Avícola Industrial. Até meados de 1975, era constituída de uma única unidade de abate de frango, situada em Montenegro, no Rio Grande do Sul100. Empresas avícolas paranaenses surgiram mais tarde As regiões oeste e sudoeste do Paraná foram ocupadas sobretudo por imigrantes gaúchos e catarinenses a partir dos anos 40 deste século, constituindo uma colonização que privilegiou a pequena propriedade, como no oeste catarinense e no Alto Uruguai gaúcho. Este fator explica o surgimento de grandes empresas avícolas só bem mais tarde do que nas regiões de colonização mais antigas. As primeiras empresas surgiram perto de Curitiba, onde estavam tanto os produtores como o maior mercado consumidor. No final da década de 60, só havia três empresas fazendo abates com inspeção federal. Esta realidade permaneceu sem mudanças até 1971, quando entrou uma nova empresa no mercado, a Batavo. A Cooperativa Central de Laticínios do Paraná - BATAVO foi fundada pelos imigrantes holandeses que chegaram em Carambeí, na região central do Paraná, em 1911, atraídos pelo projeto de colonização da Brazil Railway Company. Em 1916 estes imigrantes formaram a empresa De Geus & Cia. e passaram a vender queijo tanto em São Paulo como em Ponta Grossa, maior cidade da região centro do estado. Em 1925 foi criada a Sociedade Cooperativa Hollandeza de Laticínios, que continuou vendendo queijos com a marca De Geus & Cia., já conhecida pelos consumidores. Em 1941, essa cooperativa foi oficialmente constituída, transformando-se na Cooperativa Agropecuária BATAVO Ltda. Em 1950, outro grupo de holandeses estabeleceu-se em Castro, na mesma região. Finalmente em 1961 outros imigrantes holandeses, junto com famílias já radiacadas no país, fundaram a Cooperativa Agropecuária Arapoti, na cidade de Arapoti-PR. Atualmente essas cooperativas são conhecidas como Cooperativas ABC e compõem a Cooperativa Central de Laticínios do Paraná Ltda101. A Batavo é mais conhecida por seus sub-produtos do leite e sua entrada na avicultura, em 1971, foi uma diversificação de atividades. Já no seu primeiro ano de atividades, abateu 90% do total SIF paranaense. Aos poucos, nos primeiros anos da década de 70, surgiram 100 Perdigão S.A. Agro-Avícola Industrial, Relatório Anual, 1990, pp. 2-4. 101 Para maiores detalhes sobre a história e as diversas áreas de atuação da Batavo, ver MEJIDO José Luiz Tejon (1993) « Cooperativa Batavo », in: ZYLBERSZTAJN Decio (org.), Estudos de caso em Agribusiness. O processo de tomada de decisões nas empresas brasileiras, Porto Alegre-RS, ed. Ortiz, pp. 163-198. 132 outras pequenas empresas familiares, no entanto a Batavo continuou abatendo cerca de 50% do total SIF do estado até meados dos anos 70102. Ela continuou dominando o mercado estadual até que a Frigobrás de Toledo diversificou suas atividades entrando na avicultura, mas isto só aconteceu à partir de 1979, como veremos nos capítulos seguintes. As últimas empresas acima mencionadas têm caracacterísticas essencialmente familiares, exceto a Batavo, que é cooperativa. Seus diretores pertencem às famílias fundadoras ou seus maiores acionistas; tinham uma única atividade (ou frango ou suíno, com exceção da Seara, que atuava nos dois setores) e uma só unidade de abate até meados da década de 1970. Desde o início de suas atividades, preocupavam-se com a comercialização, que foi ganhando filiais e estrutura própria à medida do avanço da quantidade de produtos de cada uma. Algumas delas continuam com características familiares e outras profissionalisaram-se, tanto na detenção de seu capital, como na administração dos negócios, como veremos adiante. Em 1995 a Sadia, a Ceval (antiga Seara), a Perdigão, a Avipal, a Frangosul, a Chapecó e a Batavo, todas tendo iniciado suas atividades e ainda com sede na região Sul eram respectivamente, primeira, segunda, terceira, quarta, quinta, sexta e décima segunda maiores empresas nacionais do setor, responsáveis por 57,63% dos abates SIF do país. Na região Sudeste, onde estavam localizadas 47,5% das empresas avícolas nacionais no final da década de 70 (40% só no Estado de São Paulo), as unidades eram menores, atuando em mercados locais, dominadas por estruturas familiares ainda mais que as da região Sul. Além de serem menores, não instalaram o processo de integração vertical como aconteceu no Sul. Isto fez com que se estabelecessem diversos grupos atuando ao longo da cadeia produtiva. Os abatedouros eram independentes dos incubatórios, que forneciam os pintos de um dia para produtores independentes. Estes, por sua vez, vendiam os frangos prontos no mercado, a quem pagasse o melhor preço. O mesmo procedimento era repetido no caso da fabricação de rações. Outras ainda se dedicavam à produção de equipamentos industriais (campânulas, comedouros, bebedouros, para aviários, além de equipamentos industriais), além daquelas ligadas à produção de vacinas e medicamentos (na maior parte, multinacionais). 102 Estes dados foram coletados junto ao Departamento de Economia Rural da Secretaria de Estado de Agricultura e Abastecimento - SEAB-Deral. Para uma visão geral dos abates das empresas do estado, ver Dalla Costa (1993, pp. 122-128). 133 As empresas desta região, por serem menores e não atingirem todas as etapas do processo produtivo, também permaneceram mais tempo com estruturas familiares e aproveitaram menos que as do Sul os incentivos oferecidos pelo governo para aumentar e diversificar a produção e criar uma rede de distribuição qua atingisse todo território nacional. Neste último aspecto contou também a importância do mercado paulista, que absorvia praticamente toda sua produção (como veremos adiante, as exportações são praticamente todas feitas pelos estados do Sul, pelo mesmo motivo). 134 CAPÍTULO 5 EMPRESAS QUE IMPLANTARAM A INTEGRAÇÃO VERTICAL A integração vertical foi implantada pelas empresas do Sul que, atuando em outros setores, entraram na avicultura diversificando suas atividades. Num primeiro momento a integração vertical foi utilizada para cobrir « falhas de mercado », que não conseguia produzir na qualidade e quantidade nem pintos de um dia e nem rações. Além disso não conseguia transportar as novas mercadorias por causa de sua especificidade (perecibilidade) e do seu volume, o que levou as empresas a inovarem neste setor. Outro problema surgiu na hora de comercializar um volume maior e mais diversificado de produtos a partir do funcionamento da avicultura industrial. Para resolver estes problemas, as empresas implantaram a integração vertical em quase todas as etapas do processo produtivo. Uma vez implantada, a produção vertical favoreceu o crescimento dos volumes produzidos, permitindo assim alcançar as vantagens da economia de escala. Com isto, as empresas do Sul suplantaram as de São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais em produção e, em meados dos anos 70, quando iniciaram as exportações, estas tornaram-se as principais exportadoras. Nos anos seguintes, elas suplantaram também aquelas empresas no mercado nacional, tornando-se as maiores do país. Em seguida vamos analisar as principais etapas da integração vertical na avicultura nacional. Como vimos no terceiro capítulo houve, nos anos 50, sobretudo em São Paulo, um avanço das empresas familiares dedicadas às diversas etapas do processo de produção avícola. Elas industrializaram a avicultura mas sem modificar a estrutura de produção. Continuaram a funcionar, separadamente, os matrizeiros, as fábricas de rações, os avicultores independentes, os frigoríficos e os distribuidores. A maior inovação organizacional veio com a implantação da integração vertical, iniciada pioneiramente pela Sadia, em Concórdia, a partir de 1961. 135 1. Implantação da integração vertical na avicultura brasileira Antes de iniciar o processo de produção em larga escala, a Sadia realizou diversas experiências que se prolongaram por uma década. Tudo começou em 1950, quando Attilio Fontana propôs a Roberto Nogueira da Gama103, de montar uma granja avícola em sociedade. Cada qual contribuiu com o que dispunha. Roberto da Gama entrou com seus conhecimentos no assunto e encarregou-se de orientar a construção dos aviários e de organizar o serviço. Attilio, de sua parte, comprou uma propriedade próxima ao município de Concórdia, onde construíram as instalações necessárias para obterem ovos frescos e frangos para o consumo. O que sobrasse, seria abatido no frigorífico e vendido. Neste terreno construíram dois pequenos aviários com capacidade para aproximadamente 500 aves cada um e outra casa de madeira para receber os ovos e uma chocadeira com capacidade de cem ovos (Fontana, 1980, p. 168). Quando as instalações estavam prontas, Attilio dirigiu-se a São Paulo, onde comprou junto à granja de Nicolau Chedid, mil pintos de um dia, da raça New Hampshire. Estes foram enviados de avião até Joaçaba, de onde foram de automóvel para Concórdia, inaugurando a « Granja Santa Luzia ». Depois de crescidas, as aves foram selecionadas e a firma ficou com cerca de trezentas e cinqüenta matrizes, plantel inicial da granja. Ainda nos três primeiros anos foi aumentado o número de matrizes e foram construídos outros dois aviários. Em seguida Roberto da Gama foi transferido pelo Ministério da Agricultura para Curitiba e a Sadia, que já havia assumido a parte de Attilio na sociedade, comprou também a do veterinário. Em 1953 a empresa adquiriu outro terreno maior, de cem hectares, situado há cerca de três quilômetros de Concórdia, e lá começou produzir frangos com intenção de implantar a produção em escala comercial. Nesta época, contava com orientação de técnicos holandeses, que sugeriram a construção de aviários com capacidade para cinqüenta poedeiras e cinco galos cada um. A experiência começou com a construção de dez unidades deste porte. No entanto, ainda não dava os resultados esperados, pois faltavam condições técnicas, conhecimentos práticos e a produção era pequena, inviabilizando o investimento. Para tornar a atividade rentável, a empresa enviou um funcionário, Ivo Reich, ao Rio de Janeiro, junto à Granja Guanabara e à Granja Branca, que já trabalhavam com uma avicultura mais adiantada. Reich fez então um estágio de dois meses naquelas empresas, durante o qual recolheu tudo o 103 O médico veterinário Roberto Nogueira da Gama era o encarregado da fiscalização federal que inspecionava os abates de suínos na Sadia, em Concórdia. Attilio gostava de conversar com ele, pois este recebia revistas especializadas que falavam sobre a avicultura tecnificada e sobre os avanços internacionais nesta atividade. 136 que pode em conhecimentos sobre o funcionamento da avicultura carioca. A partir desta nova experiência, foram construídos aviários maiores, com capacidade para cinco mil pintos cada um. Mesmo assim, faltava aos técnicos ligados à avicultura, um conhecimento melhor sobre o conjunto da atividade, a « integração vertical » envolvendo todas as etapas do processo produtivo (Teixeira, 1994). O impulso decisivo à avicultura na Sadia veio de uma viagem aos Estados Unidos em 1961, quando Ivo Reich ocupou uma das duas vagas reservadas pelo Ministério da Agricultura ao estado de Santa Catarina. Ele foi junto com outros 20 bolsistas brasileiros para participar do Projeto Aperfeiçamento, Produção e Marketing de Aves, patrocinado pelo governo americano, no Texas Agricultural and Mechanical College System. Este curso teve a duração de três meses e foi o suficiente para que Ivo Reich se entusiasmasse com a experiência de integração vertical da avicultura norte-americana. « Essa viagem foi de grande proveito para a nossa organização, pois ele trouxe de lá uma imagem do que de melhor se praticava na técnica da suinocultura e da avicultura » (Fontana, 1980, p. 138). A partir deste momento a Sadia modificou outra vez a capacidade dos aviários para produzir cerca de doze mil pintos cada um. Além disso, para não fazer a criação e engorda dos frangos por conta própria, a empresa estabeleceu contratos de parceria com pequenos produtores para esta atividade. « A avicultura integrada tinha a vantagem de ser um sistema de concepção muito simples. A empresa comprometia-se a fornecer os pintinhos, a ração e todo o suporte técnico necessário. O criador, por sua vez, assumia o compromisso da construção dos aviários, do alojamento e cuidado das aves, seguindo à risca a orientação recebida, até a devolução dos animais à Sadia. Nesse momento seria feito o acerto de contas entre as partes, por critérios previamente estabelecidos de desempenho e eficiência. Tiradas as dúvidas e feitos os ajustes normais a uma nova experiência, alguns colonos aceitaram o programa, assumiram a parceria e ainda nesse mesmo ano de 1961 contribuíram para elevar o total anual de abates da empresa para mais de 90.000 aves » (Teixeira, 1994, p. 46). Diomésio Bósio, da comunidade Guarani, a 10 quilômetros de Concórdia, foi o agricultor escolhido para dar início a esta nova forma de produção. Ele recebeu 100 pintos da Sadia, além de ração balanceada e orientação técnica. Num galinheiro de 3 x 3 metros, coberto de sapé e de chão batido, começou a produção integrada de frango no Brasil. Os primeiros lotes demoravam 83 dias para serem criados. Neste mesmo ano de 1961, com Diomésio Bósio e os outros produtores integrados que seguiram seu exemplo, a Sadia passou a abater, « em larga escala », os frangos provenientes do novo sistema de produção. « Aquele gesto pioneiro, afirma Ivo, da integração vertical no Brasil, que depois seria copiado por todas 137 as empresas congêneres, representou a consolidação definitiva da atividade avícola da Sadia »104. A produção integrada de frangos estabelecu uma ruptura radical com o antigo sistema. Até então os colonos só trabalhavam com galinhas caipiras, criadas no terreiro, de raças crioulas, sem nenhuma tecnologia, produzindo basicamente ovos e carne para o autoconsumo, com a venda de alguns excedentes. A introdução do « frango de corte », produzido em galinheiros fechados (chamada « fora-do-sol »), representou uma novidade total, tanto em tecnologia como em organização do trabalho. Neste caso, os galinheiros eram novos, grandes e tinham um equipamento completamente diferente daquele usado até então na produção de galinhas e frangos caipiras. Pela primeira vez os frangos passaram a ser produzidos em larga escala e abatidos de maneira industrial. Além do mais, o savoir-faire necessário a este novo tipo de produção não tinha nada a ver com aquilo que os agricultores sabiam sobre criação avícola. A Sadia, com a produção integrada de frango (de perus e de patos, mais tarde), rompeu com um sistema tradicional, implantando um novo modo de produção de frangos, baseado na moderna avicultura norte-americana. O grupo que acompanhou Ivo Reich aos Estados Unidos era formado por técnicos em várias áreas de atuação, tanto em empresas públicas como privadas. Ao retornar da viagem, cada qual dedicou-se a questões específicas, como a pesquisa e desenvolvimento de vacinas, melhoramento de rações, aperfeiçoamento de chocadeiras, comedouros, bebedouros, etc. A Sadia foi a única empresa que, importando as avós, montou seus próprios matrizeiros, produziu pintos de um dia, fez contratos de parceria avícola com os agricultores, montou suas próprias fábricas de rações, adquiriu e repassou vacinas e outros medicamentos aos integrados, abateu e encarregou-se da venda dos frangos. Essa foi sua contribuição específica para o desenvolvimento da avicultura nacional e, pelo fato de ter começado primeiro e ter feito os investimentos necessários em cada uma das etapas do processo de integração vertical, adquiriu um grande savoir-faire no ramo que lhe permitiu continuar crescendo e diversificando a produção, até tornar-se a maior empresa avícola do país. É preciso lembrar também que a Sadia já tinha o know-how necessário para trabalhar com carnes, uma vez que abatia, industrializava e vendia suínos desde 1944. Este savoir-faire acumulado, junto com a marca « Sadia » conhecida no mercado nacional e uma rede própria de distribuição atingindo os principais mercados do país, garantiram o sucesso da Sadia nesta sua primeira grande diversificação de atividades que foi a avicultura. 104 Revista Integração, Órgão interno da FAF, ano 12, n° 122, maio-junho/90, p. 5. 138 Quando a empresa diversificou suas atividades entrando no ramo da avicultura seguiu o princípio de trabalhar com a melhor tecnologia. Se a atividade começou com abatedouros rústicos e quase artesanais, logo foi substituída por equipamentos mais avançados, como podemos ver pela descrição feita pelo fundador da empresa. « Em Concórdia, substituímos os primeiros abatedouros de aves, mais rústicos e menos sofisticados, por outros rigorosamente modernos e rápidos, chegando a abater, por exemplo, hoje em dia, 14.000 aves por hora. Tudo servido por instalações proporcionais e amplas câmaras frigoríficas automáticas, dentro de um esquema o mais econômico possível, possibilitando-nos trabalhar no mercado competititvo com aves preparadas segundo o sistema da mais moderna higiene e com uma apresentação muito boa » (Fontana, 1980, p. 170). 2. Pesquisa genética e sua aplicação na avicultura A avicultura brasileira foi a atividade agropecuária que mais evoluiu nas últimas décadas. A evolução no desempenho da produção resulta de ganhos genéticos obtidos por seleção artificial e de melhorias nas condições de alimentação, manejo, instalações, sanidade, abate, industrialização e comercialização. Os ganhos em peso, conversão alimentar, idade de abate e menor mortalidade, são sobretudo frutos de avanços nas pesquisas de linhagens genéticas. No entanto, tais ganhos e melhorias são conseguidos pela avicultura nacional através de importação de material genético e de pacotes tecnológicos, limitando-se o país à multiplicação de matrizes resultantes do cruzamento de « avós » e produção de pintos de um dia para criação e abate. Isto não significa que nunca houve esforço no sentido de desenvolver pesquisas e melhoramento genético. Desde os anos 50 esta discussão esteve presente entre as empresas, entidades de pesquisa e profissionais do setor, sem contudo chegar a resultados em termos de linhagens genéticas próprias, tanto para aves de postura como para frangos de corte. A pesquisa genética no Brasil Os trabalhos de genética e melhoramento de aves no Brasil iniciaram na década de 50, com um projeto de obtenção de aves comerciais para postura, através do cruzamento entre as raças Leghorn e Rhode Island Red, desenvolvido pelo antigo Instituto de Pesquisa e Experimentação Agropecuária do Centro-Sul (Ipeacs), atualmente Pesagro, no Rio de 139 Janeiro105. Este projeto foi abandonado posteriormente e, em 1964, foram iniciados trabalhos de seleção para obtenção de poedeiras comerciais. A partir de 1975, os trabalhos de seleção deram lugar às pesquisas básicas de genética. Outro estabelecimento que se destacou pioneiramente nesta área foi a Granja Guanabara, sendo pioneira na produção de linhagens comerciais. Em 1947, após dois anos de experiência na avicultura, a empresa introduziu no mercado pintos New Hampshire. Dez anos mais tarde deu início aos trabalhos de melhoramento genético, visando a produção de aves para corte e, em 1961, de aves para postura. Em 1962, considerando as premências do mercado nacional, passou a comercializar as linhagens da Shaver Poultry Breeding Farms. Em 1972 retorna ao melhoramento e comercialização de suas próprias linhagens, estendendose nessas atividades até 1983, quando, detendo cerca de 5% do mercado nacional de frangos de corte e 10% de postura, encerrou suas atividades. As universidades e outras instituições de ensino e pesquisa também se envolveram neste trabalho. Por recomendação do Ministério da Agricultura, o Departamento de Genética, anexo à Escola Superior de Agricultura « Luiz de Queiroz » (Esalq) de Piracicaba-SP, iniciou, em meados da década de 60, pesquisas em genética e melhoramento de aves. Inicialmente os trabalhos foram direcionados para postura e, no início de 1973, passaram a ser concentrados em aves para corte. Alguns anos mais tarde, a Universidade Federal de Viçosa (UFV), em Minas Gerais, ingressou nesta área de pesquisa. Atualmente as duas instituições mantêm um convênio com empresas privadas para o desenvolvimento de pesquisas básicas, formação e treinamento de técnicos e obtenção de linhagens para produção de carne (Esalq) e carne e ovos (UFV). Em 1979, o Instituto de Zootecnia (IZ) de Nova Odessa, em São Paulo, instalou plano de obtenção de linhagens comerciais de poedeiras através da reconstituição de seis linhagens comerciais. Simultaneamente, a Universidade Federal de Pelotas (UFPel), no Rio Grande do Sul, iniciou um trabalho com poedeiras, visando desenvolver pesquisas básicas, formar e treinar técnicos. Mais recentemente, a Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), no Rio Grande do Sul passou a trabalhar no desenvolvimento de linhagens de postura e ovos vermelhos para pequenas propriedades, com a finalidade de obter uma ave de dupla aptidão, isto é, além de boa produtora de ovos poderá apresentar peso corporal elevado e alta rusticidade. 105 As informações básicas sobre as instituições de pesquisa e os avanços na área de genética foram tiradas do artigo « Linhagens avícolas brasileiras », de autoria de Gilberto Silber Schmidt e Valdir Silveira de Avila, ambos pesquisadores do Centro Nacional de Pesquisa de Suínos e Aves, da Embrapa, em Concórdia-SC, in: Sociedade Brasileira de Zootecnia (1990), Avicultura, FEALQ, Piracicaba-SP, pp. 31-36. 140 Entretanto, o centro mais equipado e com maior número de técnicos especializados é o Centro Nacional de Pesquisa de Suínos e Aves (CNPSA), junto à Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (EMBRAPA), de Concórdia-SC. A discussão para a criação deste centro começou em maio de 1975, na sede da Associação Catarinense de Criadores de Suínos (ACCS), em Concórdia. Ali reuniram-se lideranças dos criadores com o Ministro da Agricultura da época, Alysson Paulinelli. No mesmo ano, a Embrapa decidiu criar o Centro Nacional de Pesquisa de Suínos - CNPSu. Em dezembro de 1978, com a aprovação do Programa da Nacional de Pesquisa de Aves e a decisão da Embrapa de incorporá-lo ao CNPSu, a unidade passou a denominar-se Centro Nacional de Pesquisa de Suínos e Aves CNPSA106. Os trabalhos de melhoramento genético do Cnpsa começaram em 1983, objetivando a formação e seleção de linhagens comerciais para a produção de carne. Em 1985, com a aquisição da Granja Guanabara, de Piraí no Rio de Janeiro, pelo Ministério da Agricultura e posterior repasse à Embrapa, o Cnpsa passou a dispor do material genético desenvolvido pela referida empresa, composto de duas linhagens para ovos brancos, três para ovos castanhos e duas para frango de corte, que foi incorporado ao programa de melhoramento. O investimento mais recente na área de pesquisa genética foi feito pela Agroceres de Rio Claro, em São Paulo, formando um « joint-venture » com a empresa escocesa Ross Breeders da qual recebeu quatro linhagens puras de frangos de corte e todo o pacote tecnológico em melhoramento genético. Apesar desta estrutura e dos esforços realizados, o Brasil chegou na metade da década de 70 capacitado a exportar, sem ter desenvolvido nenhuma linhagem de frango de corte ou de postura. As empresas do setor, desde o início dos anos 60, quando se implantou a avicultura industrial, estabeleceram contratos com as multinacionais do setor, que além de fornecerem as « avós » também prestavam a assistência técnica necessária. 3. Matrizeiros, incubatórios e produção de pintos de corte O passo seguinte na integração vertical é a reprodução das matrizes, a partir das avós e, em seguida, dos pintos de corte. Neste aspecto, as empresas do Sul capacitaram-se para implantá-la, o que ajudou-as a tornarem-se mais performantes que suas concorrentes que 106 Para maiores detalhes sobre a história e as atividades desenvolvidas no CNPSA ver: EMBRAPA (19751995), Centro Nacional de Pesquisa de Suínos e Aves, edição comemorativa dos 20 anos da entidade, Concórdia-SC, 1995. 141 deixaram de fazê-lo. É preciso assinalar que no caso da Sadia e das demais que seguiram seu exemplo no oeste catarinense, não havia muita escolha. De início, se elas não implantassem a integração vertical, seria muito difícil levarem os pintos de um dia das empresas estabelecidas em São Paulo, por causa das dificuldades de transporte e devido a outros problemas de higiene e controle de doenças. Portanto, a produção numa região geográfica muito distante dos grandes centros urbanos contribuiu para a implantação do processo de produção de integração vertical, cobrindo assim as « falhas.de mercado » existentes na época. Quanto ao estado de São Paulo, como vimos no capítulo três, caracterizou-se por um grande número de empresas familiares de produção de pintos de um dia. Quando o volume de produção justificou os investimentos, as multinacionais também começaram a atuar neste ramo. Em 1963, nove filiais de empresas norte-americanas se instalaram no país para importar « avós », das quais faziam a produção local de matrizes. No dia 22 de abril de 1965, foi assinado o Decreto-Lei n° 55.981, para disciplinar esta importação (Lopes, 1992, p. 1). Daí para frente, ao invés de se importarem as « avós », passaram a ser importados os ovos que gerariam as matrizes no país. Em 1973 já existiam 18 empresas produtoras de matrizes no Brasil, nove das quais eram estrangeiras operando diretamente no país e uma firma trabalhando com linhagem própria, a Granja Guanabara. Em 1980 existiam no país 35 linhagens ou « marcas » diferentes de aves, sendo 32 estrangeiras e três brasileiras. Dentre elas, 12 eram linhagens de corte, 12 de postura de ovos brancos e 11 de postura de ovos vermelhos. Das 32 empresas estrangeiras, 19 eram dos Estados Unidos, cinco do Japão, três do Canadá, três da Holanda, uma da Inglaterra e uma de Israel (Sorj et alii, 1982, p. 14). Em São Paulo, a situação não modificou muito até meados da década de 70, caracterizando as empresas produtoras de pintos de corte como autônomas e distintas das demais envolvidas nos outros estágios da produção. Realidade semelhante encontra-se em Minas Gerais, onde até hoje estão implantadas as maiores empresas do setor de produção de pintos de corte do país, situadas fora da integração vertical. Na região Sul, onde se implantaram as maiores agroindústrias do setor foi também onde aconteceu a implantação da integração vertical de forma mais acentuada. Iniciada pela Sadia que, como vimos acima importava as « avós », tinha seus próprios incubatórios para a produção de matrizes que, por sua vez ofereciam os ovos, incubados pela empresa, para produzir os pintos de corte. Em seguida, mesmo havendo pequenos incubatórios e produtores de pintos de um dia independentes, sobretudo para fornecer quantidades eventuais de pintos às grandes integradoras, tanto a Sadia como suas concorrentes, implantaram seus próprios 142 matrizeiros e incubatórios, que produzem pintos de um dia, distribuídos a seus agricultores integrados. 4. Vacinas e outros medicamentos Tanto no caso da genética como no das vacinas e medicamentos, não há pesquisa básica feita pelas empresas agroalimentares, porque são setores muito especializados e que exigem altos investimentos. Normalmente as indústrias químico-farmacêuticas é que se dedicam a estas atividades, diversificando pesquisas que já realizam ou diversificando suas linhas de produtos para atenderem novos nichos de mercado emergentes. As vacinas e medicamentos são produzidas, portanto, por grandes empresas destes setores. Os principais laboratórios que se dedicaram à produção de produtos veterinários para a avicultura nas décadas de 1950 e 1960, quando começou a avicultura industrial, « eram em sua maior parte controlados pelo capital nacional » (Sorj et alii, 1982, p. 20). Como este é um segmento industrial que exige tecnologia sofisticada e onde a concorrência internacional é muito forte, foi também um dos setores que logo foi dominado pelas multinacionais. Nos anos 60, os principais laboratórios ligados à produção de produtos veterinários eram o Abbott, Ajinomoto, American Cyanamid, Boyer, Down, Du Pont, Eaton, Elanco, Fontoura-Wyeth, Seregy, Lepetit, Merk Sharp Dohm, Manguinhos, Pfizer, Rhodia (Rhone Poulenc), Squibb, Sabla, Vetifarm e Instituto Biológico de São Paulo (Dirigente Rural, 1969, p. 55). Graças ao grau de concentração destas empresas, o mesmo grupo que oferecia os produtos veterinários básicos era responsável também por toda a gama de insumos químicoveterinários tanto para a avicultura quanto para as demais linhas de produção pecuária. « As mesmas empresas de produtos veterinários abarcam os analgésicos, anaplasmose, anestésicos, avitaminóticos, bactericidas, defensivos contra doenças de animais em geral, complementos minerais para os diversos tipos de animais e produtos para a avicultura » (Sorj et alii, 1982, p. 21). Estas empresas localizavam-se sobretudo em São Paulo e no Rio de Janeiro, de onde expediam seus produtos para o mercado nacional. Vendiam seus produtos tanto às indústrias de rações, integradoras, como diretamente aos produtores, possuindo redes próprias de assistência técnica aos produtores, através das quais encaminhavam seus produtos. O que as empresas integradoras fazem são acordos de fornecimento com estes laboratórios, tanto de vacinas como de outros medicamentos necessários na criação e engorda dos frangos. As vacinas, sempre que necessárias, são aplicadas pelas próprias integradoras, de 143 onde os pintos de um dia já vacinados para os aviários dos integrados. Quanto aos demais medicamentos, normalmente ministrados através da água, são distribuídos pelos técnicos que fazem o acompanhamento da produção dos lotes de frangos. As empresas compram os estoques de medicamentos de que necessitam, adiantam-nos aos integrados e recebem o dinheiro na hora do carregamento dos lotes. 5. Evolução histórica na produção de rações A fórmula das rações, tanto para aves de postura como para frangos de corte, passou por várias modificações antes de chegar às atuais107. Por volta de 1920, os pintos de um dia eram alimentados à base de ovos e leite, mas o milho, encontrado com facilidade, já era o maior componente desta alimentação. As verduras - responsáveis pelo melhor desenvolvimento dos pintos, maior produção das poedeiras e aumento da eclosão - não poderiam faltar em qualquer dieta. Além destes, outros produtos eram considerados indispensáveis à alimentação, como era o caso dos alimentos de origem animal, sobretudo as farinhas de carne e de peixe. O sal, considerado estimulante do apetite e regulador das secreções também era uma constante em todas as receitas alimentares108. Outros alimentos « estranhos » entravam na formulação das rações. Era o caso do carvão, considerado imprescindível como regulador digestivo. Na impossibilidade de produzir farinhas de carne, eram muitos os avicultores que forneciam às aves carnes cruas e, na falta destas, os granjeiros alimentavam seus plantéis com insetos vivos. Prática comum era também o fornecimento de grãos germinados às aves confinadas, sendo a aveia a mais usada para essa finalidade. A germinação fazia-se em tabuleiros montados em estantes e o produto era dado às aves quando os brotos já tinham de 3 a 5 centímetros. Entretanto, por causa do problema dos fungos, que envenenavam as galinhas, esse método foi abandonado. Outros componentes normais das rações da época eram a alface, recomendada como calmante; a pimenta, para estimular a reprodução; as bananas; o pó de café; as cebolas, para a 107 « Se vossas galinhas são destinadas à produção de ovos, dá-se-lhes pela manhã uma boa ração de milho quebrado. Pelo meio do dia, uma ração de farelo misturado com sangue de boi crú, ou bofe picado. A tarde, uma boa quantidade de verduras: agrião, espinafre, hervilháceas e folhas de batata doce » (fórmula de ração de 1911). 108 As informações sobre a evolução das rações e os alimentos utilizados durante as primeiras três décadas do século XX, foram extraídas basicamente do artigo « Rações avícolas: passado e presente », in Revista Avicultura Industrial, Editora Chácara e Quintaes, Abril de 1971, n° 736, ano 62, pp. 6-12. 144 prevenção de doenças; ervilhas; flores; gafanhotos; inhame; linhaça; mel de abelha; minhocas; formigas; resíduos de cozinha. Esses alimentos foram utilizados no Brasil, durante as primeiras três décadas deste século. Isto não significa que os estudiosos do assunto nada tivessem feito. Houve um constante esforço no sentido de melhorar as rações, tanto para possibilitar um aumento na produção de ovos, como para melhorar o crescimento dos frangos de corte. Outra preocupação era a de, através dos ingredientes das rações, possibilitar a sobrevivência dos plantéis por longo período, livres das epidemias dizimadoras da época. Todo este esforço, apesar de não ter trazido grandes novidades quanto a novos ingredientes para o arraçoamento, permitiu grande evolução no tocante à fisiologia animal e ao aproveitamento da ração. Os técnicos sabiam quais os melhores alimentos para uma poedeira, frango de corte ou pinto de um dia. Vários motivos impediam que melhores performances fossem alcançadas: desconhecimento total do valor das vitaminas, problemas com o balanceamento da ração, baixa rentabilidade das aves que, até então, não havaim passado por nenhum processo de seleção genética. Outro método utilizado durante vários anos foi o processo de « engorda artificial ». Como se descobriu que a imobilidade é uma das condições para se conseguir rápida engorda dos animais, os criadores mantinham suas aves em gaiolas, onde o frango praticamente não tinha movimento. No início do século era bastante praticada a « engorda à mão », utilizando-se para isto, um instrumento chamado « epinette »109. A ave era imobilizada, obrigada a ingerir grandes quantidades de alimento. Além do epinette, utilizavam-se também para a engorda à mão, tubos e funis. Nos três sistemas, a comida, geralmente composta de farinha de aveia, farelo de trigo, cevada e centeio, era reduzida a uma pasta mole, por meio de leite desnatado, constituindo um alimento extremamante substancioso110. Por fim, durante vários anos, outro processo usado na engorda de frangos foi o da castração, que devido a seus problemas de dificuldades operacionais foi abandonado. O surgimento das vitaminas 109 Havia várias formas de epinette. O do francês O. Martin, por exemplo, era uma aparelho alimentador bastante sofisticado. Com ele, cevavam-se até 200 aves por hora. O tripé contendo a ração podia ser transportado junto às aves, que ficavam alojadas em gaiolas giratórias. 145 Novas perspectivas na formulação de ração surgiram com a identificação das vitaminas. Em 1929 já eram identificados seis tipos, sendo que destes, três interessavam à avicultura, as vitaminas A, B e D. A primeira era responsável pelo crescimento das aves, a segunda era considerada indispensável para as galinhas poedeiras e a terceira, um ótimo remédio contra o raquitismo. A vitamina D foi descoberta em 1922, mas sua utilização na avicultura só foi possível a partir de 1930. Até então, as mortes causadas por dietas deficientes, atingiam a casa dos 40 a 50%. Dessas mortes, a maior porcentagem era consequência do raquitismo verificado pela deficiência da vitamina D. A partir dos anos 30 a alimentação avícola começou a experimentar grandes progressos. Primeiro como resultado da evolução científica verificada na Europa e nos Estados Unidos. Segundo, porque a avicultura começava a se transformar em atividade industrial, atraindo a atenção e o interesse de muitos empresários. Finalmente, a produção de alimentos para aves pôde evoluir rapidamente graças às características típicas da espécie que, desenvolvendo-se em tempo relativamente curto, se comparada a outros animais, atraiu sobre si todas as experiências referentes às novas descobertas. Desta época para frente, os melhoramentos foram se sucedendo a uma velocidade cada vez maior. Uma doença comum nos pintos era a paralisia dos dedos, que pôde ser curada graças à adição nas rações, da riboflavina, identificada para a cura do mal em 1933, quando ficou comprovado que os produtos do leite eram uma grande fonte daquela vitamina. Outra doença que matava muitas aves era a peose, que foi combatida desde que se conheceram as necessidades do manganês no organismo, prática que passou a ser utilizada a partir de 1937. Entre 1936 e 1937 pesquisadores verificaram que um alimento comum na ração avícola podia ser usado com melhor rendimento. Tratava-se da soja, que mediante tratamento especial, apresentava novas e surpreendentes proteínas. Os Estados Unidos destacaram-se na evolução da pesquisa em rações. A primeira ração de alta energia foi desenvolvida na Universidade de Connecticut em 1947, depois que se descobriu que rações com preponderância de milho requeriam altos níveis de ácido nicotínico. Em 1955 surgiu a ração calórico-protéica, como consequência de estudos efetuados na Universidade de Maryland. Seu aparecimento possibilitou a utilização de alimentos altamente gordurosos, com excelentes resultados. As formulações das rações mudaram substancialmente ao longo do século. No início, o número de ingredientes para se formular uma ração era restrito e sem nenhuma utilização de 110 Tratamento semelhante é utilizado ainda atualmente na França, na fase final da engorda dos patose dos 146 elementos químicos e vitamínicos. Isto torna-se mais claro quando analisamos uma fórmula utilizada em 1925, considerada ideal para a criação de frango de corte: 70 gramas de milho picado; 10 gramas de farelo de trigo; 10 gramas de aveia socada; 20 gramas de aveia amassada; 10 gramas de trigo ou triguilho e 20 gramas de cevada. As fórmulas foram se sofisticando ao longo do tempo e tornando-se mais complexas. Um relatório da Universidade de Wisconsin mostra três fórmulas de 1907, 1937 e 1957, destinadas à alimentação de pintos White Rock. Enquanto a ração mais antiga possuía apenas seis ingredientes, entre os quais o ovo cozido, a de 1937 já apresentava características científicas, que foram aumentando em anos sucessivos, chegando em 1957, a 22 ingredientes, entre cereais, vitaminas e minerais. A melhora das rações refletiu-se na produtividade dos frangos. No final de quatro semanas o peso médio das aves era de 128, 252 e 461 gramas, respectivamente para as rações de 1907, 1937 e 1957. A mortalidade, que com a ração de 1907 atingiu 12%, caiu para 2% em 1937 e foi quase eliminada com a ração de 1957. Ao fim de nove semanas de teste, o peso médio das aves era de 246, 905, 1.457 gramas respectivamente, com uma conversão de 5,16, 2,85 e 1,98. De acordo com estes testes, em 1957 um frango consumia menos da metade da ração necessária para ganhar o mesmo peso que em 1907. É evidente que outros fatores contribuíram para o bom desempenho dos frangos de corte. Entre eles, as modificações genéticas, criando novas linhagens mais produtivas, foram essenciais. Entretanto, uma nova raça de frango só poderia se desenvolver caso as rações contivessem os nutrientes necessários e específicos. O estudo e desenvolvimento das rações foi fundamental na melhora da cadeia produtiva da avicultura, pois esta representa cerca de 70% dos custos de produção. Evolução das plantas industriais de rações Em relação aos ingredientes utilizados na fabricação de rações, houve uma significativa evolução durante a primeira metade do século XX. Entretanto, não foi só este setor que evoluiu. As indústrias que se dedicam, tanto à melhoria dos ingredientes vitamínicos, químicos e minerais e as que formulam propriamente as rações, também passaram por processo semelhante. A indústria de alimentos balanceados mudou drasticamente desde seu início, por volta de 1945. A transformação maior aconteceu no sentido da substituição de um trabalho que gansos, para se produzir o « fois-gras », alimento muito consumido nas festas de final de ano. 147 utilizava muita mão-de-obra e pouca tecnologia, para uma indústria de poucos operários, automatizada e sofisticada (Azcui, 1993). Este trabalho na evolução da melhoria das rações começou de uma forma mais sistemática, a partir de 1945. Nesta época, tanto os avicultores quanto os pecuaristas começaram a se interessar pela melhoria da conversão das rações em carne. Para responder a esta nova exigência dos produtores, as grandes plantas de alimentos começaram a produzir concentrados com altas quantidades de proteínas, minerais e outros micro-ingredientes. Em seguida, estas plantas equiparam-se para receber os grãos, fazer a trituração e a mistura dos elementos. Num primeiro momento, os produtores levavam seus grãos a estas indústrias, que os moíam, produziam as farinhas e agregavam os concentrados. Uma vez pronto era ensacado e os produtores o levavam de volta para suas granjas. Num segundo momento, por volta de 1950, a tendência era de as grandes indústrias de alimentos converterem-se em moinhos com dupla finalidade, ou seja, tanto produziam o concentrado, como formulavam os alimentos terminados, com todos os ingredientes já agregados. Nesta época, nos Estados Unidos, a avicultura começou a destacar-se como atividade integrada e a consumir uma grande quantidade de rações. As empresas do setor avícola, com seus incubatórios, passaram a contratar os avicultores para fazer a criação dos frangos. As indústrias de alimentos, por sua vez, produziam uma ração completa para estes integrados, segundo as especificações dos incubatórios. Até cerca de 1950, a maior parte dos alimentos para aves era formada de farinhas, mas já começavam os novos métodos para processar e peletizar os alimentos. Por volta de 1955, sempre nos Estados Unidos, os avicultores já produziam de forma integrada. As pequenas fábricas de rações estavam localizadas perto das granjas, formulavam o concentrado com pré-mistura de vitaminas, minerais e medicamentos. Ao invés de ensacar o concentrado, carregavam-no em caminhões que os entregavam aos produtores. Nos anos 1960 o alimento peletizado tornou-se standard para a maior parte das rações, tanto avícolas, como bovinas e suínas. Além disso, funcionava o processo de « dosificação » e mistura automáticos. O passo seguinte, e fundamental, foi a introdução do computador na formulação de rações, a partir dos anos 70. Com isto, os processos de dosificação dos ingredientes, a pesagem dos micro-ingredientes e o acompanhamento da produção (com possibilidade de imprimir os resultados alcançados) passaram a ser todos automatizados e controlados pelo computador. As vantagens de usar o computador e automatizar a produção são muitas. Em primeiro lugar, destaca-se a qualidade dos produtos. O computador assegura precisão ao pesar cada 148 ingrediente da formulação das rações e, devido à sua velocidade, ele pode ser mais rápido e preciso que os sistemas manuais. Além disto, uma vez programado, fica fora do controle dos operários, evitando os possíveis « erros humanos ». Outro elemento a destacar é o fato de o computador produzir uma ração de igual qualidade durante um longo período de produção. Como ele tem a capacidade de repetir-se sem cansar e sem errar, pode produzir exatamente a mesma fórmula centenas de vezes, com a mesma qualidade. A segunda vantagem é que ele pode informar constantemente a direção da indústria de rações sobre o processo de produção em andamento. O gerente da fábrica pode pedir relatórios impressos a qualquer momento do dia, sobre a situação dos estoques, das misturas que estão sendo realizadas, assim como das quantidades produzidas. A terceira vantagem é a economia em mão-de-obra. Claro que os operários serão em número maior ou menor conforme a organização do trabalho e as máquinas utilizadas em cada fábrica de rações. Entretanto, com a introdução do computador, conseguiu-se reduzir o número de funcionários em torno de 15 a 20%. Isto permitiu ao mesmo tempo, melhorar a qualidade e a constância na produção, assim como baixar os preços das rações. Produção de rações no Brasil No final dos anos 50 e início da década de 60, as rações eram produzidas pelas principais granjas avícolas, ou por firmas independentes que vendiam sua produção, tanto para grandes como para pequenos produtores « de fundo de quintal ». A Granja Branca, do Rio de Janeiro, tinha em 1959, um galpão próprio para fabricar e balancear rações. Entravam na sua formulação, os seguintes ingredientes: milho, soja, farinha de peixe, de ostra, de carne, trigo e vitaminas. Ainda não se utilizava, à época, vitamina sintética e acrescentava-se à ração óleo de fígado de bacalhau ou de cação. A Granja Paraíso, também no estado do Rio de Janeiro, dispunha, no final dos anos 50, de quatro silos que lhes permitiam armazenar 100 toneladas de milho. Isto possiblitou sua entrada no setor de fabricação de rações, feitas no próprio local (Arashiro, 1989). Em São Paulo, a situação era semelhante. Grandes empresas voltadas para a produção de pintos de um dia, matrizes e produção de ovos, fabricavam sua própria ração. Era o caso, por exemplo, dos grandes produtores de Mogi das Cruzes, a capital do ovo do Brasil por muitos anos, na sua maioria, descendentes de japoneses. Por outro lado, havia grandes empresas de outros setores, voltadas para atender um mercado cada vez maior de rações. Na medida em que vários abatedouros iniciaram abater 149 frangos para o consumo, outros produtores se interessaram por esta produção, elevando a demanda de rações. Sobretudo os pequenos produtores « de fundo de quintal », não tinham nem conhecimento técnico, nem condições econômicas para elaborar suas próprias rações. Foi para atender este novo mercado emergente que as empresas lançaram-se na fabricação de rações. A Dove, indústria especializada no ramo de chocadeiras, criadeiras e bebedouros, começou a fabricar ração para galinha ainda na década de 30, sendo uma das pioneiras no setor. « A avicultura comercial se firmava e muitos cidadãos tinham um galinheiro no quintal de casa. (...) Na época, eram os seguintes os ingredientes básicos das rações: carvão, farelo de trigo, girassol e milho » (Arashiro, 1989, p.198). A primeira empresa multinacional vinculada à produção de ração a se instalar no país foi a Purina que, além de oferecer uma gama de insumos básicos, montou desde o começo um plano de assistência aos produtores já testado em outros países. A seguir veio outra empresa de capital norte-americano, a Cargill, seguida pela Anderson Clayton, que tinha na comercialização de soja seu principal campo de interesse no país. Na década de 1960 as principais empresas de capital nacional que tinham interesses ligados à produção de rações eram a Anhanguera, Avisco, Grangeiro, Moinho Fluminense, Moinho da Luz, Socil e algumas das grandes cooperativas agrícolas (Revista Dirigente Rural, abril de 1969, p. 54). Os produtores dos aditivos químicos, que requerem uma tecnologia mais sofisticada e estão vinculados à tecnologia químico-veterinária, recebem seu fornecimento de insumos das mesmas empresas produtoras de produtos veterinários, quando não importam diretamente111. Como vimos acima, as empresas entrantes no setor avícola do Sul do país, o fizeram de forma integrada verticalmente. Portanto, a produção da ração era apenas uma das etapas do processo produtivo. A Sadia, empresa que já fabricava ração balanceada para suínos desde 1954, tinha um savoir-faire acumulado de alguns anos e, ao iniciar a produção avícola integrada, passou a fornecer a ração aos avicultores. A entrada da Sadia na fabricação de raçõs avícolas em Concórdia, no ano de 1961, se deu também porque não existia nenhuma outra empresa que produzisse rações para um mercado assim restrito. As vantagens da economia de escala, vieram mais tarde, com o aumento do número de integrados e as grandes quantidades de ração produzida. 111 Os principais fornecedores desses aditivos, na década de 70 eram a Bayer do Brasil, Comércio e Indústria Sétimo Céu, Cia. Brasileira de Rações, Cosmoquímica Ind. e Com., Diprovet, Englert Nutrimentos, Exatil Nutrimentos, For-Agro - Formulações Agropecuárias, Granja Guanabara, Granja Letícia, Laboratório Isa, Laboratório Prado, Minosa S.A., Indústria de Milho e Óleos Vegetais, Moinho Cruzeiro do Sul, Montedison Farmacêutica, Nutripal Ind. e Com.; Rações Criador Ind. e Com.; Rações Fri Ribe, Sivon, Socil Pró-Pecuária, Sumaré Ind. e Com. de Rações e Derivados e Usina Colombiana (A Granja, Edição especial, 1979). 150 No que se refere ao « premix » (concentrado contendo vitaminas, sais minerais e outros ingredientes químicos que entram na formulação das rações) as integradoras compravam das empresas acima mencionadas. O que elas faziam era adicionar milho, soja, trigo ou outros cereais (cerca de 80% do peso das rações) e entregar a ração pronta diretamente na propriedade dos pequenos agricultores. 6. Contratos de parceria avícola com pequenos agricultores Além dos segmentos acima, as empresas estabeleceram uma relação privilegiada para garantir seu fornecimento de matéria-prima, assinando contratos de parceria avícola com os assim chamados « agricultores integrados ». Esta foi a principal inovação organizacional introduzida pelas empresas do Sul dentro da integração vertical, o que lhes garantiu uma vantagem essencial em relação às que atuavam nas outras regiões do país e não implantaram este sistema. No início do processo de integração com pequenos agricultores, sobretudo nas décadas de 60 e 70, quando a produção ainda não atingia grandes quantidades, as firmas não se preocupavam tanto com a efetivação dos contratos e muitas não tinham nem a preocupação de efetivar este tipo de relação. Pesquisa feita em Santa Catarina, no final dos anos 70, mostrou que 38% dos contratos eram escritos, 37% verbais e 23% por cadastro. Entre as nove empresas pesquisadas, três utilizavam contratos escritos, duas utilizavam contrato verbal e cadastro; duas utilizavam só contrato verbal e apenas duas celebravam só contratos escritos (CEAG, 1978, p. 143). Mesmo mais tarde, esta relação com os integrados, apesar de ter cada vez mais um caráter contratual, baseou-se sobretudo na confiança entre as partes, onde a « palavra dada » era mais importante que o contrato, conforme podemos ver através de entrevista com um dirigente da Sadia. « No início estes contratos eram verbais. O que interessava mais era o perfil do produtor. Estabelecia-se uma relação de confiança mútua entre a empresa e o integrado. Atualmente os contratos são escritos, mas imagino que a maioria dos avicultores nem sequer leu os contratos. Nós praticamente nunca recorremos a eles para resolver nenhum tipo de problema. Eles existem mais por uma exigência legal »112. Fazendo uma análise dos contratos utilizados pelas maiores empresas do setor, podemos detectar as cláusulas básicas que contêm. Os pontos principais incidem sobre: 151 a) fornecimento exclusivo por parte do contratante, dos meios básicos de produção (aves de um dia, rações, medicamentos, que permanecem como propriedade da firma); b) estabelecimento do prazo de entrega de um novo lote de pintos (perus) após a retirada das aves para o abate; c) obediência rigorosa às normas técnicas estabelecidas pela empresa e prestadas pelo Departamento de Fomento; d) formas de comercialização e determinação do preço do produto final e direito exclusivo de compra por parte da empresa integradora; e) fixação da percentagem de quilos de aves vivas que caberá a cada uma das partes, conforme tabela anexa ao contrato; f) despesas com serviços de tratamento, aquecimento e cuidados com as aves correm por conta do produtor; g) financiamento dos instrumentos e/ou meios de produção, adiantamento de rações, medicamentos, pintos; h) permissão à parceira proprietária de acompanhar a criação e engorda das aves; i) definição dos padrões de qualidade do produto final; j) tempo de duração do contrato e foro onde se decidem as disputas que porventura possam ocorrer. Na prática, embora haja formulações diversas entre os contratos de integração (anexo 1), todos indicam na mesma direção: « do conjunto das cláusulas e procedimentos básicos, a maioria está na dependência direta do poder do integrador e sobre os quais o produtor integrado não tem qualquer controle » (Dalla Costa, 1993, p. 147). O « contrato de parceria avícola » tem características próprias e se diferencia dos contratos « clássicos » normalmente utilizados pelas firmas como forma de reduzir seus custos, garantir o fornecimento de suas matérias primas, diminuindo os custos de produção. Na avicultura, trata-se de uma produção específica de matéria-prima, de origem animal, necessária para abastecer os abatedouros. É uma produção feita « fora do sol », que exige uma mão-de-obra especializada, a adoção constante de novas tecnologias, tanto em equipamentos como no manejo dos frangos e no seu carregamento, onde o avicultor atinge uma economia de escala, devido às quantidades de carne produzidas. Para atender todos estes requisitos e garantir a quantidade de matéria prima exigidas pelas empresas é que estabelecem-se os contratos e suas cláusulas principais giram em torno disso. 112 Entrevista com o gerente do setor agropecuário da Sadia Concórdia S.A., Concórdia, Santa Catarina, 18 de 152 Williamson afirma que « a principal função do contrato jurídico é de fornecer um quadro para a quase totalidade dos tipos de organização coletiva e para a quase totalidade dos tipos de relações, passageiras ou permanentes, entre os indivíduos e os grupos (...). Quadro este que não indica quase nunca com precisão as reais relações, mas que indica, grosso modo, ao redor do que se estabelecem estas relações, servindo como um guia ocasional em caso de dúvidas e de referência última, quando a relação deixa de existir » (Williamson, 1994, p. 23). Como vimos acima, é dessa forma que os dirigentes das empresas avícolas entendem o contrato, sendo mais utilizado como referência jurídica e podendo servir em último caso, numa disputa jurídica entre os contratantes, mas sendo deixado de lado na maioria das vezes em que se precisa resolver os problemas práticos. No caso da avicultura brasileira, o contrato com os pequenos agricultores perde em importância porque as principais empresas atuam de forma integrada verticalmente. Os contratos, até meados da década de 70, eram feitos sobretudo com os produtores integrados, com os fornecedores de « avós », de vacinas e de medicamentos. Todas as demais etapas de produção sendo dominadas pelo mesmo grupo empresarial, as transações financeiras eram feitas internamente, diminuindo os custos operacionais. Lógico que as empresas que continuaram trabalhando de forma independente e não integrada tinham seus custos operacionais mais elevados, uma vez que precisavam estabelecer contratos entre as empresas operando nos diversas etapas do processo produtivo113. Estudo realizado pelo Banco de Desenvolvimento Econômico do Estado de São Paulo - BADESP em 1987, indica as principais razões pelas quais as empresas estabelecem contratos de produção com os agricultores (citado por Lopes, 1992, p. 20): - Necessidade de as firmas processadoras oferecerem produtos em quantidade e qualidade exigidas pela demanda. Esta sem dúvida parece ser a grande responsável pelo dinamismo do setor avícola brasileiro. - Redução de custo, mediante o suprimento para manter economias de escala. - Conquista de posição de mercado, mantendo fornecedores fixos que garantem o suprimento de matéria-prima. abril de 1995. 113 Existe uma diferença básica importante na utilização dos contratos entre a avicultura brasileira, funcionando de forma integrada verticalmente e a francesa, por exemplo, onde a norma é a não integração vertical. Neste caso, existem seis grandes atores econômicos independentes: o geneticista, produtor das avós; o matrizeiro, produtor de pintos de um dia; o setor químico-veterinário, fornecedor de vacinas e medicamentos; o agricultor que cria e engorda os frangos, o abatedouro e o agente comercial encarregado da distribuição. Neste caso, os contratos ganham uma importância maior, porque precisam fazer funcionar de maneira precisa as relações entre todas estas etapas da produção. 153 - Maior facilidade de se aumentar a produção e introduzir tecnologia. - Necessidade por parte do agricultor de capacidade e/ou de orientação técnica. - Redução de risco do agricultor e oportunidade de produzir para um mercado assegurado114. Outro estudo feito em Santa Catarina, nos anos 70 também mostra as vantagens do sistema de integração para as empresas e para os agricultores integrados. As empresas integradoras apontaram como principais vantagens do sistema de integração: matéria-prima (frango) de maior qualidade de rendimento industrial; abastecimento constante da matériaprima qualificada; redução dos custos industriais nas operações de abate e elaboração da matéria-prima; padronização das carcaças; redução de espaços, tempo e capital de giro necessário para estocagem da matéria-prima no período anterior ao abate (Cebrae-SC, 1978, pp. 80-86). As principais vantagens dos produtores com este sistema de integração, podem ser resumidas nos seguintes itens: assistência técnica intensa e permanentemente atualizada; utilização de equipamentos e insumos de qualidade, inclusive rações de alto valor nutricional a preços mais acessíveis; maior produtividade; redução dos custos de produção e maior rentabilidade; melhor preço médio de venda; melhor aproveitamento dos recursos disponíveis na propriedade (terra, capital e trabalho); dimensionamentos adequados das instalações, com elevação de renda líquida anual e capacitação profissional do produtor (Sebrae-SC, 1978, pp. 22-25). Fomento agropecuário e a qualidade da matéria-prima O contrato é apenas o instrumento legal da relação entre a empresa e o agricultor integrado. Para conhecer melhor esta relação, é necessário estudar, no caso da Sadia e das outras empresas que seguiram seu exemplo, a origem de seu fomento agropecuário115, cuja 114 Além dos aspectos acima mencionados, existem já estudos sobre outros aspectos dos contratos de integração. Para uma análise econômica destes contratos e sua viabilidade, ver o estudo de Lopes (1992). Para um estudo sobre os agricultores integrados, sua forma de escolha, as vantagens e as desvantagens da produção integrada de frangos, ver os estudos de Rizzi (1984), Belato (1985), Campos (1987), Paulilo (1990), Silva (1991), Mior (1992), Dalla Costa (1993). 115 « O sistema de fomento agropecuário é um mecanismo através do qual um produtor rural, geralmente de pequeno porte, cria animais destinados ao abate e industrialização, em parceria com uma indústria. O agricultor, criador de frangos ou perus, responsabiliza-se pela construção e equipamento do aviário, pelo fornecimento da mão de obra e administração dos demais meios de produção, tais como luz, água, gás e carregamento dos frangos. A indústria, por seu lado, assume o compromisso de suprir o parceiro criador com os pintos de um dia, assistência técnica e veterinária, remédios, rações e transportes. A função do integrado é de criar, sob orientação da indústria, os animais e vendê-los exclusivamente a esta última, que os abate, industrializa e vende » (Dalla Costa, 1993, p. 154). 154 principal intenção era buscar uma garantia no fornecimento constante de matéria-prima, assim como um aprimoramento também constante de sua qualidade. A Sadia implantou seu sistema de fomento agropecuário a partir do início da década de 50, quando buscou melhorar a qualidade e garantir a quantidade necessária de suínos para seu abatedouro de Concórdia. Em 1957 o frigorífico de Concórdia já abatia em torno de 400 suínos por dia e, com as novas câmaras frias, maiores e mais eficientes, ampliava-se rapidamente a capacidade de industrialização. Além disso, a recém inaugurada empresa aérea dava mais dinamismo e vitalidade às vendas das filiais estabelecidas em São Paulo e em outras cidades importantes do país. Para dar continuidade a este processo de desenvolvimento, os diretores da empresa decidiram aprimorar a matéria-prima. Para tanto, em maio de 1951 a Sadia participou da fundação da Associação Rural de Concórdia, sendo Victor Fontana eleito presidente, cargo que ocupou durante 12 anos. Esta entidade promoveu inúmeras palestras aos agricultores da região, tanto em sua sede como nas comunidades espalhadas por todo município. Nas palestras, os colonos recebiam informações atualizadas sobre preparação do solo, plantio, rotação de culturas, colheita e estocagem de grãos, montagem e higiene dos chiqueirões, alimentação dos suínos com rações balanceadas e manejo de reprodutores, matrizes e crias. Nas suas propriedades, tinham assistência e orientação sanitária direta e permanente de técnicos agrícolas e médicos veterinários contratados pela associação (Teixeira, 1994). Ao longo dos anos 50 a Sadia, sob a orientação de Victor Fontana, intensificou seus esforços para melhorar a qualidade da suinocultura. De início, desenvolveu este trabalho junto com a Associação Rural e, em seguida, por conta própria. O desafio consistia em quebrar o padrão tradicional do « porco tipo-banha », muito bom para produção de banha e toucinho, mas não para a industrialização de carne. A simples introdução de animais das raças, Duroc e Landrace, junto com melhorias no manejo, fez com que os suínos que levavam até 14 meses para atingir cem quilos, em seguida, alcançavam esse peso com apenas oito meses de vida (uma diminuição de 420 para 240 dias!), com menos banha, mais carne e de melhor qualidade. Com estes resultados, muitos agricultores que já vendiam suínos à empresa, através de seus postos de compra, passaram a adquirir reprodutores, matrizes e rações e a seguir sua orientação técnica. Para atender a um número cada vez maior de produtores, já não era suficiente o trabalho da Associação Rural, além disso, esta era uma entidade de classe e não da empresa. Por isso, na assembléia de 26 de março de 1955, os acionistas da Sadia reconheciam que « a ausência de um plano real de assistência ao agricultor por parte dos 155 governos faz com que as entidades de economia privada voltem suas vistas para o importante setor do fomento e defesa da produção agropecuária » (Teixeira, 1994, p. 44). A partir deste momento, vários funcionários foram capacitados para dar assistência aos produtores, indo fazer cursos em outros estados e até no exterior. Em 1961 quando a Sadia diversificou suas atividades entrando no ramo da avicultura, já dispunha de uma estrutura bem montada de técnicos especializados em prestar assistência aos produtores integrados de suínos. A partir deste momento, o Departamento de Fomento Agropecuário assumiu a coordenação técnico-econômica da criação de suínos e de aves. Para cuidar de ambas as atividades e atender o número cada vez maior de integrados, montou-se uma estrutura em equipamentos e pessoal especializado. No início, tratava-se de um pequeno grupo de técnicos que resolviam todo tipo de problema. Em seguida, a Sadia montou uma organização complexa e sofisticada, envolvendo importação de material genético, granjas de matrizes, incubatórios, laboratórios, além de contratar bioquímicos, zootecnistas, engenheiros florestais e outros profissionais. O fomento agropecuário da empresa chegou à metade dos anos 70 com uma equipe e estrutura em condições de atender a todos os integrados, garantindo assim tanto a qualidade como a quantidade da matéria-prima de que necessitava. « Contando com um grupo de 87 técnicos, sendo 14 médicos veterinários, 11 agrônomos, 55 técnicos agrícolas, 3 zootecnistas, 2 engenheiros florestais e 2 administradores de empresas, o Fomento Sadia continuou fiel aos objetivos que, há mais de vinte anos embasaram sua criação, quais sejam os de gerar e transferir tecnologia para milhares de agropecuaristas dedicados à produção de suínos e aves, bem como à agricultura e reflorestamento »116. O fomento agropecuário significou para a Sadia a « garantia de suprimento de matériaprima, quantitativamente e qualitativamente controlada para o atendimento dos planos de expansão da produção de carnes e derivados da empresa »117. Em seguida, esta mesma organização foi colocada em prática por todos os grandes frigoríficos de aves e suínos e, como veremos na segunda parte da tese, cada uma das maiores empresas buscou, através da garantia de melhor qualidade de sua matéria-prima, pontos significativos para manter-se competitiva em relação às demais. Finalmente, através dos contratos de parceria avícola e do fomento agropecuário, as integradoras eliminaram a figura do « intermediário-atravessador ». O atravessador estava 116 Sadia Concórdia S.A. Relatório Anual, 1977. 117 Sadia Concórdia S.A. Relatório Anual, 1979/80. 156 presente sobretudo em São Paulo e Minas Gerais, onde existia um grande número de pequenos produtores « independentes ». Estes produtores eram obrigados a adquirir pintos, ração, assistência técnica e medicamentos, contratar o transporte e fazer a venda dos frangos. Foi para intermediar todas aquelas ações que surgiram os « atravessadores ». O atravessador era basicamente a firma com frota de transporte que adquiria aves ou ovos diretamente dos produtores e, conforme o mercado, fazia um jogo especulatório na colocação do produto no destino de abate (frangos) ou no mercado atacadista (ovos), ora comercializando na região, ora estendendo seu comércio a outras regiões e para fora do estado. Os principais fornecedores de aves e ovos aos atravessadores eram (são ainda em algumas regiões e/ou estados) os pequenos produtores e aqueles produtores sem contrato com o abatedouro. Frequentemente o próprio atravessador era o que fornecia a ração pronta ao produtor. 7. Abatedouro como principal etapa da integração vertical A passagem da avicultura tradicional para a industrial se deu essencialmente na substituição dos tradicionais matadouros onde todo o processo se fazia manualmente, pelos novos e modernos abatedouros, especialmente concebidos, construídos e equipados para isto. Esta passagem é lembrada nas memórias do fundador do maior grupo abatedor de frango do país, quando afirma: « substituímos os primeiros abatedouros, mais rústicos e menos sofisticados, por outros rigorosamente modernos e rápidos, chegando a abater, por exemplo, hoje em dia, 14.000 aves por hora » (Fontana, 1980, p. 170). Entretanto, a passagem de um para outro modo de produção foi lenta e eliminou, sobretudo em São Paulo e em Minas Gerais, inúmeras pequenas e micro empresas. Uma das maiores dificuldades dos micro e pequenos abatedouros era de adaptar-se às rígidas normas de controle higiênico-sanitárias. Em São Paulo, o DIPOA - Departamento de Investigação dos Produtos de Origem Animal fez levantamento, em meados da década de 70, sobre a situação das empresas. Segundo um dos diretores de tal órgão, « atualmente são apenas dez abatedouros de carne de aves que possuem instalada a fiscalização com SIF e mais dez em via de instalação. De um total de quase 500 estabelecimentos que levantamos com uma pesquisa, apenas 16 abatedouros em São Paulo foram considerados recuperáveis pelo Dipoa para receberem a inspeção federal. Portanto, podemos verificar que a esmagadora maioria receberá ordem de fechamento » (Revista A Granja, janeiro de 1975, pp. 21-22). 157 Situação semelhante foi identificada em Minas Gerais, num levantamento do BDMG Banco de Desenvolvimento de Minas Gerais. De acordo com este órgão havia 116 estabelecimentos no estado, em 1980, sendo que 101 destes foram considerados irrecuperáveis. Esses « postos de abate » se caracterizam por « reduzidas dimensões, falta de equipamentos apropriados à operação, sendo a grande maioria localizada no quintal do proprietário ou em terreno contíguo à sua residência, com as várias atividades do estabelecimento sendo realizadas pelo próprio dono e seus familiares » (BDMG, 1980, pp. 102-103, citado por Sorj et alii, 1982, p. 59). Embora em menores proporções, o processo de eliminação de micro e pequenos abatedouros aconteceu, por ocasião da implantação do SIF, também nos demais estados. Através da mecanização de todas as etapas do abate e industrialização dos frangos, as indústrias do setor, que sobreviveram, instituíram a produção fordista, aumentando os volumes e diminuindo os custos por unidade. Com isto, a avicultura deixou de ser uma atividade artesanal para se transformar numa indústria produtora de proteína animal acessível à maior parte da população. Para melhor compreender o funcionamento dos abatedouros industrias, passamos a descrever cada uma das etapas desde a chegada do frango vivo, até sua embalagem, quando sai pronto para o consumidor118. « É como na moderna linha de montagem de uma indústria automobilística: chega a matéria-prima à fábrica e, em poucos minutos, com o apertar de botões sincronizados, o produto caminha por esteiras ou trilhos suspensos. São descartadas algumas partes para reaproveitamento em outras unidades fabris e as máquinas se encarregarão da lavagem, preparação, separação... numa operação ultra-higiênica, da porta de entrada à embalagem final », é assim que inicia a matéria. Cada um dos grandes abatedouros - Sadia, Perdigão, Ceval, Frangosul, Avipal, Chapecó... - desenvolveu tecnologia própria para ganhar velocidade e qualidade na produção. Existem temperos e fórmulas especiais para cada produto, mas o processo básico da linha produtiva é comum à maioria dos líderes do disputado ranking agroindustrial avícola. Na primeira etapa, o frango chega nas unidades fabris em gaiolas plásticas especiais, que evitam acidentes entre as aves. Chega vivo, em lotes de cerca de 10 cabeças cada gaiola, conforme seu tamanho. Rapidamente estarão dependurados na nória, que é a correia que os 118 As informações técnicas concernentes ao abate e industrialização de frangos foram extraídas da matéria « Automação chega aos abatedouros », publicada na revista Aves e Ovos, da Associação Paulista de Avicultura, Agosto de 1993, pp. 24-28. 158 conduz até o final do processo de abate, limpeza e industrialização. No início do processo, funcionários treinados para tal, cuidarão da « insensibilização »119 de cada ave, quando ela desmaia e não sofre dores ao ser abatida. Esta técnica começou a ser usada em 1978, sendo que até então, o sangramento das aves era feito sem nenhum processo anestésico. O passo seguinte é a sessão de sangria, onde a ave recebe um corte preciso na veia jugular do pescoço120 e com isso inicia-se a fase de abate e preparação da carne. O sangue das aves é recolhido numa calha especial e segue para outra seção da indústria, onde é transformado em farinha de sangue. Esta será utilizada ulteriormente como matéria-prima para a produção de ração. Em seguida, as aves seguem a automaticamente à fase de escaldagem, onde entram em contato com água quente (a temperatura é controlada e de acordo com a estratégia de cada empresa). Com isto, as penas amolecem, facilitando o trabalho de depenagem. Uma vez « escaldadas » as aves seguem pela nória e entram na depenadeira automática, uma máquina especial, dotada de « dedos » de borracha colocados num cilindro. No contato com esses dedos, as penas são retiradas. Como no caso do sangue, as penas seguem para outra seção onde um processo industrial as transforma em farinha de pena, outro componente da ração balanceada para aves. Logo após a depenagem, segue o processo de separação das partes. Primeiro são as patas, excluídas após novo banho em água quente. Uma máquina especial é utilizada para retirar toda a pele que envolve a pata do frango. A etapa seguinte é de fundamental importância nos abatedouros modernos. Trata-se da evisceração automática. Neste processo, são retiradas todas as vísceras das aves, numa operação feita com uso da automação industrial, largamente difundido entre os abatedouros do país a partir de meados da década de 80. Uma alça cortante entra na parte superior do tórax da ave, retirando-lhe todas as vísceras. 119 Existem diferentes maneiras de fazer a insensibilização das aves. Quando de nossa pesquisa de campo, vimos dois sistemas instalados num mesmo frigorífico. O primeiro deles, é o tradicional, onde as aves passam pela água e, em seguida, recebem um choque elétrico que as deixa « desmaiadas ». O segundo sistema era feito através de uma nova máquina que faz a insensibilização retirando o oxigênio. O frango passa por dentro de tal máquina, onde só respira gás carbônico e « desmaia ». Caso fique alguns instantes sem ir para a nória, ele volta ao normal. (Dados coletados durante visita ao abatedouro da Sadia Concórdia S.A., em Concórdia-SC, 18 de abril de 1995). 120 Caso se trate de aves para o mercado interno, esta parte do processo de produção pode ser feita automaticamente. Se o frango for destinado à exportação, sobretudo para os países do Oriente Médio, o trabalho é feito manualmente, para que sejam cortadas as duas veias do pescoço. Em nossa pesquisa de campo, os abatedouros que exportavam faziam toda a sangria manualmente, enquanto outro abatedouro que não exportava utilizava uma máquina para isto, economizando assim, a mão-de-obra de cinco pessoas. 159 É nesta etapa que trabalham os técnicos do SIF - Serviço de Inspeção Federal, como prevê a legislação brasileira. Do total dos frangos inspecionados, cerca de um a um e meio por cento eram descartados por tal serviço, em 1993, sendo incinerados em seguida. Quanto às vísceras serão reutilizadas na fabricação de ração balanceada. O processo de evisceração automática traz a vantagem da velocidade aliada à qualidade, pois mantém completa higiene industrial121. Quanto ao pulmão da ave, é extraído num sistema a vácuo, retirando ao mesmo tempo todo aparelho respiratório, também sendo transformado em farinha de víscera. Os miúdos de frango (coração e moela) que são vendidos separadamente ou colocados dentro do frango inteiro, são separados manualmente. Depois disto, o frango poderá ir para a linha de acabamento final do produto, sendo embalado em sacos plásticos especiais e recebendo os selos de identificação de cada empresa. A partir daí, seguirão em caminhões-frigoríficos para as filiais comerciais e os pontos de venda ou, para os portos, caso se destinem à exportação. Como a tendência de venda e consumo de frango em cortes e embutidos aumenta a cada ano, a linha de produção se estende para outras etapas. As empresas equiparam-se de máquinas especiais que separam peito, asa, coxa e sobrecoxa das aves. Novamente, se for para o mercado interno, a operação efetua-se mecanicamente e, se as aves destinam-se à exportação, os cortes serão realizados manualmente. Na verdade, até aqui tratou-se de uma linha de « desmontagem » do frango. É geralmente em dependências anexas aos abatedouros que estão as verdadeiras « linhas de montagem », que utilizam a carne de frango como matéria-prima na fabricação de inúmeros sub-produtos, desde salsichas até nuggets de frango. 8. Empresas próprias de transporte Iniciando suas atividades industriais em Concórdia, em 1944, a Sadia começava a produzir mercadorias longe dos principais centros consumidores do país. Para viabilizar-se como indústria, precisava aproveitar da proximidade da matéria-prima (trigo e suínos), mas ao mesmo tempo, resolver o problema dos transportes e fazer chegar estes produtos aos centros consumidores. 121 Estas máquinas são importadas, geralmente da Holanda, pelos maiores abatedouros nacionais. Elas podem retirar vísceras de até oito mil aves por hora e por linha de produção. No entanto, o Departamento de Inspeção de Produtos de Origem Animal - DIPOA, pede às empresas que limitem essa volocidade em torno de seis mil aves/hora, porque não consegue fiscalizar tantos animais em tão curto espaço de tempo. 160 Se a fábrica estava instalada no oeste de Santa Catarina, a atenção dos dirigentes voltava-se para São Paulo e Rio de Janeiro. Attilio Fontana já tinha feito esta experiência nos seus mais de 20 anos de comerciante entre esta região e São Paulo. Agora, ao invés de vender os suínos vivos, tratava-se de comercializar os sub produtos da carne suína e os derivados de trigo. No início, foi utilizado o transporte ferroviário, substituído e/ou combinado com o rodoviário e o aéreo mais tarde. A farinha e o farelo de trigo tinham boa aceitação na região e também eram vendidos em grande quantidade para outros mercados. Os sub-produtos de suíno, sobretudo a banha, que não conseguiam ser vendidos na região, também eram transportados via trem. O transporte entre Concórdia, sede do frigorífico e do moinho de trigo, até Volta Grande (onde foi construído um pequeno desvio com depósito junto à Rede Ferroviária), era feito por caminhão. Os sacos de farinha eram ali embarcados em trens e distribuídos pelas cidades ao longo da ferrovia por centenas de quilômetros, até o norte do Paraná e São Paulo. O mesmo era feito com os produtos suínos, sobretudo a banha. Para resolver os problemas de transporte, desde a coleta de suínos e de trigo junto aos agricultores da região, até a entrega dos produtos na estação ferroviária mais próxima, o deslocamento a São Paulo e Rio de Janeiro, a Sadia montou uma frota própria de caminhões, que aumentava conforme crescia o volume de mercadorias produzidas. Para vender sua produção nos principais centros consumidores, a Sadia começou a organizar uma rede de representantes e distribuidores de seus produtos. Onde era possível encontrar consignatários especializados em comercialização, como no Rio de Janeiro e São Paulo, procedeu desta maneira. Em outras cidades, ela mesma montou seus depósitos que se tornaram em centros distribuidores. Em 1954 já funcionava o depósito de Londrina, no norte do Paraná, responsável pela distribuição dos produtos Sadia naquela região. Em 1955 foi inaugurado o prédio da filial de Ribeirão Preto, para atender o mercado do rico interior do estado de São Paulo. Para atuar na capital paulista, a empresa inaugurou uma filial na rua Paula Souza, em plena zona atacadista, ainda em 1947. Outras filiais ou depósitos em Bauru, Campinas e Ribeirão Preto, no interior de São Paulo, assim como uma representação no Rio de Janeiro, completavam a base de sustentação para a distribuição dos produtos Sadia (Teixeira, 1994). Esta presença da empresa nos principais centros consumidores impunha-lhes dois grandes desafios. Primeiro, atingir uma produção capaz de atender uma demanda cada vez maior, sem perder a qualidade das mercadorias. Segundo, fazer chegar, em tempo hábil, os produtos aos locais de distribuição. 161 Mudanças tecnológicas no abatedor de suínos em Concórdia, permitiram aumentar a produção conforme a demanda. O problema maior era o transporte de Concórdia até Londrina, São Paulo, Bauru, Rio de Janeiro. As limitações técnicas de resfriamento e congelamento dos produtos no frigorífico e nos depósitos das filiais ou dos representantes, somadas à longa duração das viagens de caminhão, comprometiam a qualidade geral dos produtos e podiam causar prejuízos. A maioria das estradas era de terra e as condições do tráfego, muito difíceis, fazendo com que os caminhões demorassem vários dias para fazer uma viagem entre Concórdia e São Paulo. No início dos anos 50, as condições de transporte melhoraram um pouco. A distância diminuiu com a abertura da estrada BR-116 entre Lages e Curitiba, eliminando a grande volta que os caminhões deviam dar pelo litoral catarinense (Teixeira, 1994). Além disso, começaram a ser usados os caminhões isotérmicos, fechados e capazes de « reter o frio » das mercadorias por um certo tempo, para este tipo de transporte. As condições das estradas e as inovações tecnológicas nos caminhões ajudaram a melhorar as condições de transporte, mas ainda assim permanecia o problema, sobretudo para determinadas mercadorias. Os produtos perecíveis, como lingüiças, lombos, costelas, paletas, presuntos cozidos, mortadelas e outros frescais, deveriam a princípio, sair direto da fábrica para os locais de consumo. Para estes produtos, os problemas continuavam, apesar dos « expressinhos »122 vencerem os 900 quilômetros entre Concórdia e São Paulo em 24 horas. A solução para este problema foi encontrada por um dos filhos de Attilio, Omar Fontana. Admirador da aviação, convenceu o pai e demais dirigentes da Sadia a experimentar a alternativa de levar estes produtos por avião. A Sadia alugou para esta finalidade um DC-3 da Panair, uma empresa aérea mineira, no início de 1952. Este avião fazia o transporte aos domingos, entre Joaçaba e São Paulo, uma vez que Concódia ainda não tinha aeroporto. A troca das 24 horas dos « expressinhos » pelas duas horas e meia do avião foi um sucesso imediato. Já na Assembléia Geral da empresa de 15 de março deste mesmo ano, os acionistas aprovaram a compra do avião, que passou a operar diariamente. Num primeiro momento, o transporte aéreo foi o principal componente articulador entre o frigorífico situado em Concórdia e os mercados urbanos, com sua intensa rede de consumidores. Em seguida, a Sadia passou a atuar no transporte de passageiros, com ajuda do 122 O nome « expressinho » era dado aos cinco caminhões fechados com uma lona térmica, com capacidade de 3 a 4 toneladas, que levavam os produtos de Concórdia para São Paulo. Estes caminhões foram utilizados entre 1954 e 1958, trafegando as estradas de terra, viajando dia e noite, sem fim de semana e nem feriado. Na ida, levavam lingüiça, lombo, salame, presunto cozido, banha, carnes salgadas e defumados. Na volta, traziam sal, óleo e temperos para uso do frigorífico de Concórdia. 162 Estado, que subsidiava as empresas aéreas que interligassem o interior do país. Quando estes subsídios cessaram, a Sadia Transportes Aéreos era uma empresa de expressão, dedicada quase exclusivamente ao transporte de passageiros123. Em 1972 a Sadia S.A. Transportes Aéreos mudou sua razão social para Transbrasil. Com os transportes aéreos, a Sadia deu um passo importante no mercado interno, passando a ser uma empresa multi-estadual. O transporte aéreo dos produtos suínos continuou até que foram melhoradas as estradas e os caminhões frigoríficos fossem aperfeiçoados. Por volta de 1958, devido aos avanços nestes dois setores, o transporte rodoviário começou a ser mais vantajoso que o aéreo124. Portanto, para recolher a matéria-prima e distribuir os produtos finais, a Sadia atuou em três diferentes tipos de transporte. De início, utilizou muito o transporte ferroviário, além de implementar sua própria frota de caminhões e sua empresa aérea. As demais empresas concorrentes seguiram basicamente o mesmo caminho no que se refere ao transporte. Tanto a Perdigão quanto a Chapecó e a Seara, estabelecidas na mesma região de Santa Catarina, utilizaram o transporte ferroviário, como constituíram suas frotas de caminhões e usaram o transporte aéreo125. 123 Na hora de registrar a empresa aérea valeram as influências das relações políticas estabelecidas pelo fundador da Sadia. A legislação exigia um mínimo de três aparelhos para fundar uma empresa aérea. Depois da compra do primeiro avião, Omar Fontana arrendou outros dois aprelhos, em 1954, um DC-3 e um C-47, da Companhia Brasil de Transportes Aéreos, de Belo Horizonte. Com isto, pôde entrar com pedido de registro junto ao Ministério da Aeronáutica, com o qual poderia beneficiar-se dos subsídios fornecidos pelo Estado. Foi criada, assim, a Sadia S.A.Transportes Aéreos, para transporte de cargas e passageiros, em 1° de janeiro de 1955. O registro definitivo foi favorecido pela ascensão à presidência da República de Nereu Ramos, aliado político do presidente do grupo Sadia, quando Getúlio Vargas suicidou-se. O projeto da Sadia tinha dificuldade de ser aprovado, pois já havia sete ou oito empresas que exploravam o transporte aéreo no país. « Neste meio tempo, em 1954, Getúlio Vargas suicidou-se. Assumiu o vice, Café Filho. Este adoeceu e afastou-se do governo. O presidente da Câmara, Carlos Luz assumiu e viu-se envolvido numa crise militar. Convocada em regime de urgência, a Câmara declarou-o constitucionalmente « impedido », chamando o presidente do Senado, Nereu Ramos, para sucedê-lo. Antes de passar o governo a Juscelino Kubitschek, Nereu teve tempo de introduzir algumas modificações nos ministérios, inclusive no da Aeronáutica. O fato é que o nosso projeto acabou sendo aprovado. Com isso começou a atuar a Sadia S.A. Transportes Aéreos » (Fontana, 1980, p. 199). A influência política estendia-se a todos os escalões. Se Fontana tinha influência junto ao presidente e seus ministros, seu poder não passava despercebido a nível local. Na assembléia da empresa de 26 de março de 1955, os acionistas, além de aprovarem a nova companhia aérea, aprovaram um pedido formal à prefeitura para incluir entre as suas prioridades o projeto do aeroporto municipal. 124 A Sadia Transportes Aéreos continuou funcionando até 1972, quando transformou-se na atual Transbrasil S.A. Linhas Aéreas que, mesmo tendo Omar Fontana como principal acionista, é uma empresa independente da Sadia e tem sede em Brasília. 125 A Perdigão, bem antes que a Sadia alugou aviões para este tipo de transporte. A diferença é que, quando as rodovias tornaram-se mais vantajosas economicamente, ela abandonou esta atividade. A Sadia , pelo contrário, manteve seus aviões e, entre o legado de Attilio Fontana, além da Sadia, maior empresa agropecuária nacional, encontra-se também a Transbrasil, terceira maior empresa aérea do país. 163 9. Logística de distribuição dos principais grupos Segundo Chandler (1992, I), as grandes empresas industriais só verticalizaram o sistema de distribuição quando sua produção cresceu muito e os comerciantes tradicionais não davam mais conta de distribuir uma tal quantidade de novos produtos. Foi o que aconteceu também com a Sadia. No início, até que o volume produzido era reduzido, os próprios consignatários davam conta da distribuição. Com o tempo o volume de produtos cresceu muito e os problemas de distribuição cresceram mais ou menos na mesma proporção. Por isto, os dirigentes da empresa sentiam a necessidade de assumir a tarefa da distribuição com mais seriedade e pensavam em montar sua própria rede de comercialização. No início dos anos cinqüenta, quando a produção cresceu e, graças à aviação, começou a chegar em grandes volumes e rapidamente a São Paulo e nos demais pontos de distribuição, começaram a surgir vários problemas. O que seria melhor, vender no atacado ou no varejo? Destinar o caminhão fechado para um único atacadista ou sair à rua e oferecer os produtos aos feirantes, ambulantes e donos de armazéns, empórios, mercearias, padarias e restaurantes? Certamente a primeira opção seria a mais fácil e cômoda, mas os diretores da Sadia escolheram a segunda. Isto lhes permitiria estar em contato direto com o mercado, com os consumidores, discutir preços, avaliar os produtos, saber das necessidades do mercado, descobrir novos pontos de venda e concorrer com as tradicionais empresas alimentares estabelecidas no mercado. Este tipo de comercialização escolhido, permitiu uma rápida acumulação de conhecimento do mercado no plano micro, da clientela e, macro, da dinâmica geral do consumo, preços e hábitos alimentares nos grandes centros do país. A distribuição direta e própria, deu força para a venda à vista, o que era bom para a empresa e, ao mesmo tempo, consolidou a « pronta entrega » em 24 ou 48 horas, estabelecendo uma relação de confiança entre a firma e os clientes. Até a metade da década de 60, oito filiais compunham a rede comercial da Sadia, estendendo-se de Londrina, norte do Paraná, ao Rio de Janeiro, Curitiba e Belo Horizonte (Teixeira, 1994). Isto significa que a rede de filiais da Sadia, estando centrada em São Paulo, cobria um raio de cerca de 500 quilômetros ao seu redor. O estado de São Paulo foi acertadamente escolhido como sede das filiais comerciais, uma vez que concentrava, à época, cerca de 70% do mercado nacional de consumo. 164 Se a Sadia estava presente nos principais centros consumidores, ainda havia muito que fazer, tanto na expansão da rede para outras regiões do país, como na melhoria da qualidade e eficiência do serviço. O primeiro salto de qualidade em busca de maior eficiência, foi dado por volta de 1965, para responder ao crescimento das diversas indústrias e às novas exigências do mercado. Uma reestruturação do Departamento de Vendas e a introdução de técnicas e métodos atualizados de planejamento contribuíram para a melhoria do sistema de comercialização. Experiências feitas no Rio de Janeiro e São Paulo, na recadastração dos clientes, na redivisão de áreas e pesquisas de mercado sobre faixas de renda e padrões de consumo, indicaram novos produtos e novos mercados. No Rio de Janeiro, por exemplo, surgiu a idéia de produzir uma mortadela com gosto específico para o mercado carioca, que foi chamada de Sadilar. Entretanto, ainda era necessário aperfeiçoar todo o sistema de vendas e montar definitivamente uma rede própria de comercialização. Foi assim que, conforme afirmou o fundador da empresa « lá por 1965/66, havíamos chegado à conclusão de que devíamos ter uma organização que se encarregasse de receber os produtos dos nossos frigoríficos de suínos, de aves e de bovinos, assim como os derivados de trigo. Nossas indústrias já haviam progredido bastante e era necessário melhorar a distribuição dos produtos » (Fontana, 1980, p. 260). Esta foi a segunda grande decisão dos anos 60 para a Sadia, após a criação da Frigobrás. Em 1967 foi criada a Sadia Distribuidora, que mais tarde passou a chamar-se Sadia Comercial Ltda (Sadial), substituindo o antigo Departamento de Vendas no prédio da rua Paula Souza. A centralização administrativa, financeira, técnica e operacional das atividades comerciais de toda a organização, traria grandes vantagens. A Sadial permitiu a consolidação na área de vendas, com maior autonomia e responsabilidade. Com isto, ampliou suas vendas e ocupou outros espaços a nível nacional. Nos dez anos seguintes à fundação da Sadial, dobrava o número de filiais comerciais e os produtos da Sadia eram distribuídos regularmente até nas regiões mais distantes do país, como Brasília, Salvador, Recife, Manaus e áreas vizinhas (Fontana, 1980). Perdigão e sua rede de comercialização A Perdigão estabeleceu-se no oeste catarinense em 1934 dez anos antes que a Sadia. Pelas mesmas razões que esta última, desde o início de suas atividades, sobretudo com o abate 165 e transformação industrial do suíno, a maior parte das vendas era efetuada em São Paulo e no Rio de Janeiro. As dificuldades de transportes para fazer chegar os produtos aos centros consumidores, eram semelhantes às enfrentadas pela Sadia, por isto, seguiu o mesmo caminho que sua concorrente, escolhendo o transporte aéreo. Entre 1955 e 1958, os produtos industrializados pela empresa chegavam à São Paulo via aérea. A Perdigão chegou a ter uma pista de pouso em Videira e dois aviões, um DC-3 e um C-47, que faziam até duas viagens por dia126. Quanto à rede de comercialização dos produtos, a Perdigão implantou, desde o início, suas distribuidoras. Ela entendia que este sistema era melhor do que trabalhar com firmas distribuidoras, em forma de consignação. Os lugares não atingidos pelas próprias distribuidoras, eram atendidos por outros clientes da Perdigão. Estes tinham uma cota mensal de produtos, tendo cada mercadoria um preço preferencial e uma condição de pagamento. Deste modo os clientes Perdigão substituíam a empresa onde não compensava manter uma estrutura comercial própria. No final dos anos 1980 a Perdigão tinha distribuidoras e filiais em cerca de 30 cidades espalhadas no país. Nas 14 distribuidoras próprias da empresa, a Perdigão tinha, à época, 80 mil clientes cadastrados (Brandalise, 1990, p. 7). As demais empresas avícolas, na medida em que sua produção era suficientemente grande para concorrer no mercado paulista e carioca, seguiram caminho semelhante. A Chapecó, por exemplo, também transportava seus produtos via aérea para São Paulo, onde também implantou filiais comerciais127. 126 Os dados aqui expostos, foram extraídos do depoimento de Flávio Brandalise à Fundação Centro de Estudos do Comércio Exterior, « Depoimentos Empresariais », n° 6, maio de 1990, mimeo, 32 p. 127 No capítulo 7 daremos maiores detalhes sobre a comercialização das empresas líderes, das « imitadoras » e das pequenas empresas. 166 CAPÍTULO 6 GRUPOS AVÍCOLAS QUE DISPUTAM O MERCADO BRASILEIRO : 1975-1995 Na década de 70 a economia brasileira caracterizou-se por um forte crescimento. O Produto Interno Bruto - PIB manteve uma média anual de crescimento em torno de 8 por cento, mas durante os anos 80 este índice foi quase negativo. Esta nova realidade foi causada tanto por motivos internacionais, sobretudo a alta dos juros da dívida e a deterioração das relações de troca em favor dos países desenvolvidos; como nacionais, contando-se aí o desequilíbrio das contas governamentais, a dívida externa e a forte inflação. A inflação e a queda do crescimento econômico atingiu todas as faixas da população, sobretudo as mais pobres, assim como as empresas. Estas tiveram que rever seu planejamento, sua administração, a estrutura de custos, as margens operacionais e os investimentos na produção. As indústrias do setor agroindustrial não escaparam a esta realidade e buscaram adaptar-se à nova conjuntura. Para isto valeram-se dos investimentos que tinham feito na cadeia produtiva, sobretudo aperfeiçoando cada etapa do processo de integração vertical; redefiniram seus planos de investimentos a longo prazo, assim como seus objetivos; investiram em produtos de maior valor agregado e buscaram vender no exterior seus excedentes, sobretudo no setor avícola cuja capacidade de produção passava largamente o consumo interno a partir de meados dos anos 70. Outra estratégia utilizada por tais empresas foi diversificar ainda mais suas atividades. Além de investimentos em setores de produção já tradicionais, buscaram explorar também novos segmentos de consumo como o de massas, gelatinas, margarinas e óleos refinados de soja. Por outro lado, enquanto consolidavam sua presença nos mercados tradicionais, penetraram em outros mercados regionais, expandindo-se através da construção ou aquisição de empresas concorrentes. 1. Sadia consolida sua predominância no mercado avícola nacional 167 Mesmo enfrentando as adversidades da economia, o grupo conseguiu manter um crescimento médio anual em torno de 4 por cento ao longo de toda década de 80. No início da década a Sadia tinha 15 empresas entre produtoras e de serviços e contava com 14 mil funcionários. Em 1990, o número de empresas elevou-se a 22, enquanto os empregados já eram 31 mil, além dos 18 mil agricultores integrados em suínos e aves, produtores da matéria prima (Teixeira, 1994). Expansão da produção avícola da Sadia no Paraná e em Santa Catarina « A Frigobrás de Toledo, criada em 1964 basicamente para fornecer matéria-prima à unidade industrial de São Paulo, aos poucos foi ganhando força própria e tornou-se um grande complexo agroindustrial. Em 1984, ao completar 20 anos, a Frigobrás-Toledo exibia no seu organograma abate de suínos, bovinos e frangos, preparação e industrialização de carne de suínos, bovinos e aves, cortes especiais para exportação, fabricação de rações, extração de óleo de soja, reflorestamento, granjas de matrizes e incubatório »128 (Teixeira, 1994, p. 98). Foi nesta sua primeira unidade industrial no Paraná129 que a Sadia investiu na diversificação avícola, repetindo uma experiência que já tinha colocado em prática em Concórdia-SC. A avicultura e a suinocultura, em regime de integração ou parceria, continuavam como os carros-chefes de toda a produção da empresa, tendo na retaguarda um eficiente serviço de fomento agropecuário, responsável pelo fornecimento das matrizes, dos pintos de um dia e da assitência técnica e veterinária a 3.600 criadores de suínos e 400 avicultores integrados. 128 Seus 3.500 funcionários responderam, em 1984, por um abate de 600 mil suínos, 39 mil bovinos, 48 milhões de frangos, 300 mil toneladas de rações, 100 mil toneladas de farelo de soja e 24 mil toneladas de óleo degomado (Teixeira, 1994, p. 98). 129 Fundada em 1961 e inaugurada em 1964 em São Paulo, a Frigobrás manteve sua sede nesta cidade até 1988, quando foi transferida para Toledo, no Paraná. Conforme dados da ata da Assembléia Geral Extraordinária da Frigobrás realizada em 15 de julho de 1988, em São Paulo e assinada por Omar Fontana, secretário de tal assembléia, foi decidida a mudança da sede da Frigobrás da Vila Anastácio-SP para Toledo-PR, entre outros, pelos seguintes motivos: 1) « Efetivada a mudança, a Sociedade será uma das maiores empresas do estado do Paraná (entre a 3 a e 6 a), podendo usufruir junto ao governo estadual de vantagens condizentes com a sua importância econômica no estado; 2) Que haverá para a sociedade maior facilidade para obter tratamento diferenciado junto aos conglomerados financeiros em função da representatividade que terá no estado do Paraná, em comparação com o estado de São Paulo, onde sua importância é menor; 3) Que a unidadede Toledo, por suas múltiplas atividades, está enquadrada em diferentes linhas de financiamento, e que o fato da matriz estar em São Paulo cria entraves burocráticos maiores, diminuindo a flexibilidade e a agilidade na liderança desses financiamentos ». 168 Iniciando suas atividades na avicultura em 1979, a Frigobrás abateu mais de 7 milhões de frangos, representando 25% do total SIF do estado, passando a mais de 50% já no segundo ano de atividade. Assim como em Concórdia, a região oeste do Paraná é grande produtora de milho, soja e outros cereais e conta com muitos pequenos agricultores que, através dos contratos de parceria e da assistência prestada pelo serviço de Fomento Agropecuário, permitem à empresa obter matéria-prima na quantidade, qualidade e no momento necessário à expansão do volume de produção. Foi aumentando a produção avícola para o mercado interno e externo que esta unidade chegou em 1995 abatendo 72.316.789 frangos, o que representou 20,34% do total SIF estadual130. Outra região com características semelhantes, tanto na produção de cereais como nas pequenas propriedades rurais formadas por imigrantes oriundos do Rio Grande do Sul e Santa Catarina, é o sudoeste do Paraná. Ali, no município de Dois Vizinhos o Moinho da Lapa construiu um novo abatedouro de frangos a partir de 1978, que iniciou os abates em 1981. A partir deste ano, o Moinho da Lapa tornou-se uma escola, tanto na formação de novos dirigentes para a Sadia, quanto na produtividade industrial e na organização da produção junto aos integrados. Fruto deste trabalho, em 1985 o abatedouro, com suas diversas atividades, ganhou o status de « a empresa mais dinâmica e progressista do Grupo Sadia ». Desde então, « o Moinho-Dois Vizinhos transformou-se no maior produtor, abatedor e exportador de patos da América Latina, o segundo na produção, abate e exportação de frangos do Paraná, na fabricação de rações, farelo e um dos maiores na industrialização de óleo degomado de soja »131. Seguindo o exemplo do que se fazia nas demais unidades de Concórdia, Chapecó e Toledo, foi implantada junto ao abatedouro, toda a infra-estrutura necessária para realizar a produção vertical. Fazem parte desta estrutura dois silos, com sete graneleiros metálicos verticiais, capazes de estocar 128 mil toneladas de grãos. Para dar suporte ao abastecimento de patos e pintos de um dia aos 750 integrados que a empresa tinha no sudoeste, em 1989, mantinha incubatórios de patos e frangos, cujos ovos eram provenientes das 507 mil matrizes dos 78 aviários da Agropastoril. Por fim, contavam-se as unidades das matrizes/avós de suínos, para melhorar a qualidade genética dos plantéis de animais dos 1.200 integrados suinocultores. 130 Para os dados da participação da Sadia na avicultura paranaense, ver Dalla Costa (1993, pp. 123-127). Os dados de 1995 foram coletados durante a pesquisa de campo, em março de 1996, junto à SEAB/DERAL Secretaria Especial de Agricultura e do Abastecimento, Departamento de Economia Rural do Paraná. 131 Dados da revista Integração, Órgão interno da FAF, São Paulo, ano 11, n° 107, Dez/89, p. 18. 169 As mercadorias produzidas nesta unidade destinavam-se tanto ao mercado nacional como às exportações. De sua produção de aves, cerca de 5 milhões de cabeças/mês em 1989, 40% do total da produção, era exportada e o restante era comercializada no mercado interno. O farelo de soja e o óleo degomado eram destinados ao mercado nacional enquanto toda ração era vendida aos produtores integrados. A comercialização dos produtos no mercado nacional era feita pela Sadia Comercial e as exportações estavam sob a responsabilidade da Sadia Trading132. A sinergia criada entre a unidade de Toledo, mais antiga e essa mais nova de Dois Vizinhos, revelou-se compensadora. A primeira encarregou-se da retaguarda técnica para a implantação do novo pólo avícola, enquanto a segunda passou a fornecer excedentes importantes tanto em grãos como em rações e aves. Com eles, o frigorífico de Toledo pôde inaugurar, em 1982, sua terceira linha de abate e processamento de frangos. Em 1988 o abatedouro de Dois Vizinhos recebeu significativos investimentos tecnológicos para aumentar sua capacidade. Com a instalação de evisceradores automatizados, a capacidade de abate passou de 9.000 para 16.000 aves/hora. Além disso, houve um aumento de 4.000 para 7.000 carcaças/hora na capacidade de produção de cortes, com operações automatizadas133. Para bem gerar este aumento de produção, foi implantado um túnel de congelamento automático, que aumentou a capcidade para 22 ton/hora134. A unidade avícola de Dois Vizinhos logo se tornaria uma das mais significativas a nível estadual. Já em 1981 ano em que iniciou suas atividades, abateu 11.665.601 cabeças, representando 14,51% dos abates SIF do estado. A produção foi aumentando conforme a necessidade da Sadia em atender as demandas nacionais e estrangeiras, chegando em 1995, a um total de 62.699.822 cabeças, ou seja, 17,65% dos abates SIF paranaenses135. A complementação da atividade da Sadia no Paraná aconteceu em 1991, com a compra do complexo avícola de Francisco Beltrão, no sudoeste, da sua antiga proprietária, a 132 Revista Integração, Órgão interno da FAF, São Paulo, ano 11, n° 107, Dez/89, p. 18. 133 Se os abatedouros e fábricas de industrializados sempre acompanharam a melhor tecnologia disponível do setor, o mesmo não ocorre na logística de distribuição das mercadorias. Neste caso, nem os supermercados estão desenvolvidos como nos principais países ricos, nem os frigoríficos estão aparelhados para prestar um serviço mais eficiente. A Sadia, « só em 1995 iniciou entrega de mercadorias paletizadas a grandes clientes permitindo, pela primeira vez, a reposição « just-in-time » de alimentos nos pontos de venda » (Sadia, Relatório Anual, 1995, p. 16). Processo semelhante aconteceu com a Ceval que neste mesmo ano iniciou trabalhos para adaptar o carregamento dos abatedouros e os caminhões de transporte para a carga e descarga de mercadorias paletizadas. 134 Sadia, Relatório Anual, 1988, p. 7. 135 Dados da pesquisa de campo, março de 1996. 170 Chapecó Avícola136. Esta empresa iniciou os abates em 1983, com um total de 7.915.133 cabeças, representando 6,63% do total estadual. Em 1990, quando foi vendida, era a terceira maior empresa, com 13,43% dos abates SIF estaduais e chegou em 1995 abatendo 32.149.581 cabeças, com 9,04%, sendo o quarto maior frigorífico de frangos do estado. Com estes três abatedouros a Sadia domina largamente o mercado estadual. Em 1995, abateu nas três unidades 167.166.192 cabeças de frangos, representando 47,03% do total SIF de frangos137. Em relação a Santa Catarina a Sadia manteve as duas unidades de abate em Concórdia e Chapecó, aumentando sua capacidade, tanto para atender as demandas do mercado nacional como para exportação. Seus principais investimentos a partir de meados da década de 70 nestes dois abatedouros, foram no sentido de melhorar a produção, modernizando o maquinário, capacitando os funcionários, diversificando as linhas de produtos, agregando assim, mais valor às mercadorias. Em 1976 as duas unidades abateram 35 milhões de aves, correspondendo a 56% dos abates do estado138. Na medida em que outros grupos industriais se instalaram e aumentaram sua capacidade, a porcentagem da Sadia em Santa Catarina foi diminuindo, mesmo tendo aumentado muito o volume de seus abates. Em 1980, o total dos dois frigoríficos passou a 54 milhões de aves, cerca de 44% dos abates do estado139. Em 1981 aumentou para três o número de linhas de abate de frango no frigorífico de Concórdia e foram reorganizadas, para a instalação de equipamento eviscerador automático numa destas linhas, o que aumentou a produtividade e melhorou as condições de trabalho. Em 1985 foi instalada a segunda linha de corte de peru em Chapecó e um novo túnel de congelamento contínuo, com capacidade para 10 t/hora. Em Concórdia foi instalado um quarto túnel de congelamento automático no abatedouro de aves, também com capacidade 136 Para a compra de tal empreendimento a Sadia pagou a quantia de 14 milhões de dólares de recursos próprios. Fazem parte da aquisição um abatedouro de frangos, duas granjas de matrizes, uma fábrica de rações e silos para estocagem de grõs. Com isso a Sadia começou o ano de 1990 com um aumento de 30 milhões de cabeças em sua capacidade de abate, totalizando um potencial de 300 milhões de aves/ano (dados do Relatório Anual da Sadia, 1990, p. 22). Para viabilizar a produção de matéria-prima a este novo abatedouro a Sadia manteve os mesmos produtores integrados que produziam para a Chapecó Avícola. Eram 463 avicultores, com 525 aviários. A unidade começou a operar com 1.050 funcionários, a maioria já trabalhando na antiga Chapecó Avícola, supervisionados pelos novos diretores e auxiliados pela direção do abatedouro próximo, de Dois Vizinhos (dados da revista Integração, Órgão interno da FAF, São Paulo, ano 14, n° 122, pp. 16-18). 137 Dados sobre a participação da Sadia na avicultura paranaense (Dalla Costa, 1993, pp. 123-127). Os dados de 1995 foram coletados durante a pesquisa de campo, em março de 1996. Além disso, na unidade de Francisco Beltrão a Sadia instalou seu segundo abatedor de perus. Conforme dados da empresa, esta unidade tem uma capacidade instalada para abater quatro milhões de cabeças por ano, no entanto, iniciará abatendo cerca de 50% deste volume (Jornal Gazeta Mercantil, São Paulo, 17/12/95). Efetivamente tal abatedouro foi inaugurado em 2 de junho de 1996. 138 Sadia, Relatório Anual, 1976, p. 5. 171 para 10 t/hora. Neste ano a Sadia, nas suas cinco unidades industriais abateu mais de 200 milhões de aves, representando 27% do abate inspecionado no Brasil140. As duas unidades de Santa Catarina abateram 97 milhões, ou seja, 36,8% do SIF estadual. Em 1988, conforme dados do relatório anual, novos investimentos aumentaram a capacidade e produtividade das unidades industriais da empresa em Concórdia. Foi aumentada a capacidade de produção do Presunto Parma para 56 mil peças/ano e do presunto cozido para 22 ton/dia; implantada nova linha de evisceração automática, com aumento de 4.500 para 8.000 frangos/hora na capacidade de abate; e aumento de 50% na capacidade de estocagem nas câmaras de resfriamento de carcaças. Em 1990 a Sadia abateu 239 milhões de aves, 17% do mercado nacional141. Nas duas unidades de Santa Catarina, a produção foi de 104,5 milhões de unidades, 32% dos abates estaduais. Nos anos 90, a produção da Sadia em Santa Catarina cresceu pelo aumento da capacidade de suas duas unidades, passando do número acima mencionado para 111,9 milhões de unidades, 27,79% do SIF estadual em 1994, sendo que o de Concórdia era o primeiro e o de Chapecó o quinto maiores abatedores do estado142. Produção avícola da Sadia em São Paulo e no Mato Grosso A presença da Sadia em São Paulo remonta a 1946 quando foi criado um pequeno escritório comercial na capital e, logo em seguida, um em Bauru e outro em Ribeirão Preto, no rico e populoso interior paulista. Em 1950 foi criado o Moinho da Lapa, que começou a operar dois anos mais tarde, beneficiando 60 toneladas de trigo por dia, mais que o dobro da produção da unidade de Concórdia. Em 1974 o Moinho da Lapa S.A. iniciou um processo de diversificação, passando a produzir misturas para bolo e uma pequena parcela de ração, para aproveitar o farelo de trigo, sub-produto da moagem. Como a avicultura industrial crescia em São Paulo, a Sadia, através do Moinho da Lapa decidiu também participar desse processo, produzindo ração balanceada a partir de uma unidade industrial que foi inaugurada em 1977, na cidade de Campinas. Em 1986 implantou 139 Sadia, Relatório Anual, 79/80, p. 8. 140 Sadia, Relatório Anual, 1985, p. 10. 141 Sadia, Relatório Anual, 1990, p. 24. 142 Pesquisa de campo junto à Secretaria de Agricultura, Florianópolis-SC em maio de 1995. A fonte dos dados é a AINCADESC - Associação das Indústrias de Carnes e Derivados no Estado de Santa Catarina. 172 granjas de matrizes em Itirapina e em Descalvado, além de uma unidade produtora de ração em São Joaquim da Barra. Em 1979 o Moinho da Lapa instalou-se em Américo Brasiliense, no centro geográfico do estado de São Paulo com um abatedor de frangos. Com esta terceira unidade do Moinho da Lapa no segmento aves e os contratos de parceria assinados com agricultores integrados, a empresa fechou o ciclo, implantando pioneiramante no estado o sistema de integração vertical na avicultura. Em 1979 a unidade contava com 90 funcionários e abateu 521.993 frangos, menos de um por cento dos abates SIF estaduais. Pesquisas da época mostraram que a preferência do consumidor regional era pelo frango resfriado. A partir desta constatação, a Sadia desenvolveu ali esta tecnologia e passou a vender o frango resfriado sob a marca veloz. Até julho de 1989 a empresa abatia 50.000 aves/dia. Em função do crescimento do mercado consumidor, a unidade implantou o segundo turno de trabalho, gerando 200 novos empregos diretos e elevando o abate para 80.000 aves/dia. « A instalação de evisceradora automática, de túnel de congelamento aumentou a performance dos processos produtivos. A aquisição de balança automática facilitou o trabalho e a produtividade cresceu. Sete mil frangos/hora podem ser classificados por ordem de tamanho e peso »143. Para complementar o processo de integração vertical no estado, a unidade implantou o Fomento Agropecuário em 1985, representando o que havia de melhor no seu ramo de atividades. A equipe de técnicos especializados passou a acompanhar os integrados para garantir e assegurar a qualidade das aves. A assistência era prestada pelo sistema de fomento, aos 187 integrados, envolvendo 31 municípios, num raio de 180 quilômetros. No início da década de 90, com capacidade para alojar 3,4 milhões aves, o fomento avícola do Moinho da Lapa era a maior integração do estado de São Paulo. Em 1990, com a média de 2.150 t/mês em produção, 90% de frango resfriado e 10% de congelado, a unidade atendia o mercado, de acordo com a demanda dos clientes e consumidores. A própria unidade abatedoura encarregava-se de distribuir os produtos num raio de até 300 km da empresa. Com seus 25 veículos de frota própria, transportava mais de 120 toneladas de produtos, atendendo diariamente a clientela do interior paulista. A Sadia Comercial colocava sua estrutura de distribuição à disposição para vender os 30% restantes dos produtos do abatedouro em São Paulo e outras regiões do país. 143 Os dados sobre a presença e a participação da Sadia na avicultura paulista foram extraídos da matéria « Moinho da Lapa-Américo Brasiliense: o presente como garantia do futuro », in: Revista Integração, Órgão interno da FAF, São Paulo, ano 12, n° 110, Mar/90, pp. 18-20. 173 Em 1994 o Moinho da Lapa de Américo Brasiliense abateu 27.590.522 frangos, representando 8,12% do total estadual144. Com este volume de produção, a Sadia detém o maior abatedouro de frangos deste que é o segundo maior estado produtor e o maior consumidor de frangos do país. Para aproveitar dos amplos incentivos fiscais as empresas agroalimentares estão ocupando estrategicamente o centro-oeste brasileiro. A Sadia, tendo sido pioneira no setor de gado de corte, também o foi na avicultura. Para isto iniciou, em 1989, a implantação do projeto da Sadia Agroavícola S.A. Indústria e Comércio145, com sede em Várzea Grande-MT. O empreendimento, além de unidade industrial propiciou a introdução pioneira do sistema integrado de fomento agropecuário nesta região, o aproveitamento e industrialização de matérias-primas locais e a produção de frangos para abastecer o Centro-Oeste e Norte do país. Neste lugar, pela primeira vez a Sadia combinou produção própria com integração via contratos de parceria. Contando com o suporte de 100 aviários próprios146 e 70 de integrados, o abatedouro da Sadia Agroavícola entrou em atividade em maio de 1992, processando 60.000 aves/dia. Procedentes da região de Campo Verde, Dom Aquino, Jociara num raio de 140 km de Várzea Grande, as aves são abatidas num frigorífico « equipado com o que existe de mais avançado em termos de tecnologia de abate e frigorífico de aves em níveis mundiais »147. Estas aves, automaticamente selecionadas, pesadas, abatidas, processadas, embaladas, congeladas ou estocadas, servem para abastecer o mercado consumidor do Mato Grosso, Amazonas, Acre e Rondônia. Trabalham neste abatedouro cerca de 200 funcionários, dos quais 30 vieram da Sadia Oeste, ao lado, da qual recebe o apoio administrativo e logístico. Depois de terem estagiado na Frigobrás-Toledo e aprendido a lidar com o frango nas linhas de abate, com 100 outros, treinados por eles, efetuaram o primeiro abate em escala de aves no Centro-Oeste, em 27 de 144 Pesquisa de campo, levantamento dos dados junto ao MAARA - Ministério da Agricultura e Reforma Agrária de São Paulo, maio de 1995. 145 Para a implantação deste projeto, a Sadia contou com incentivos fiscais e o apoio marcante da Superintendência para o Desenvolvimento da Amazônia - SUDAM, do Banco da Amazônia S.A. - BASA e do Programa de Desenvolvimento Industrial - PRODEI, do governo do estado do Mato Grosso (dados da revista Integração, Órgão interno da FAF, São Paulo, ano 15, n° 128, Jan/Fev-93, pp. 18-19). 146 Instalados em Campo Verde, 760 metros acima do nível do mar, com temperatura média de 26 graus, a 140 km de Várzea Grande, em área de 936 hectares, os 100 aviários da Agroavícola estão distribuídos em grupos de 20 em cada uma das 5 granjas (revista Integração, Órgão interno da FAF, São Paulo, ano 15, n° 128, Jan/Fev-93, pp. 18-19). 147 Os dados sobre a Sadia Agroavícola foram extraídos da matéria « Avicultura, nova alternativa para o CentroOeste brasileiro », in: Revista Integração, Órgão interno da FAF, São Paulo, ano 15, n° 128, Jan/Fev-93, pp. 18-19. 174 abril de 1992, testando o novo complexo agroindustrial que, em maio entrou em fase efetiva de produção. Junto com o abatedouro, repetindo de novo o que havia feito em outras regiões, a Sadia implementou as demais etapas da integração vertical. Construiu granjas para alojamento das matrizes, incubatórios para produção de pintos de um dia e fábrica de rações. Depois de abater e industrialzar os frangos, ela própria se encarrega da distribuição, através de suas filiais comerciais e de seus representantes exclusivos. Foi com a intensificação da avicultura no oeste e sudoeste do Paraná, somada à dos demais pólos criadores de Santa Catarina, São Paulo e Mato Grosso que a Sadia pôde dar o grande salto de quantidade e qualidade na produção e venda de frangos inteiros ou processados. A marca anual de um milhão de frangos alcançada pela primeira vez em 1968, tem atualmente apenas valor simbólico, se comparada aos mais de 323 milhões148 de aves abatidas em 1995, quando a Sadia foi responsável por 19,38% dos abates SIF nacionais. Estes são os dados da Sadia na produção avícola. Entretanto, para melhor compreender o desempenho do grupo neste setor de atividades, desenvolveu-se, desde 1944 uma diversificação tanto nos setores de atuação como na ocupação geográfica do país. Para melhor acompanhar a evolução geral da empresa, fornecemos a tabela seguinte, elaborada a partir do material da empresa, das entrevistas com seus dirigentes e da pesquisa de campo. TABELA 13 - SADIA CONCORDIA S.A. Ano de fundação, distribuição geográfica e atividades de suas empresas - 1944-1995 Ano Cidade-Estado Empresa Atividades 1944 Concórdia-SC Sadia Concórdia S.A. Moinho de trigo e abatedouro de suínos 1945 Concórdia-SC Sadia Concórdia S.A. Fazenda e serraria. Produção de embalagens 1951 Concórdia-SC Sadia Concórdia S.A. Início do fomento de suínos 1952 São Paulo-SP Sadia Concórdia S.A. Transporte aéreo de produtos perecíveis 1953 São Paulo-SP Moinho da Lapa S.A. Moinho de trigo 1953 Marcelino Ramos-RS Sadia Concórdia S.A. Moinho de trigo 1954 ConcórdiaSC « Expressinho » Transporte de produtos Concórdia - São Paulo 1954 Concórdia-SC Sadia Concórdia S.A. Fabricação de ração balanceada 1955 Concórdia-SC Sadia Concórdia S.A. Jornal. Comunicação com os agricultores 195? Concórdia-SC Hotel Alvorada Ltda Serviços de hotelaria 1955 São Paulo-SP Sadia SA Transp Aéreos Transporte de cargas e de passageiros 1957 Concórdia-SC Rádio Rural Concórdia Informação e orientação aos integrados, em casa 1961 Concórdia-SC Sadia Concórdia S.A. Abate e industrialização de frangos 148 Dados do Informativo da ANAB, ano XIX, n° 509, Janeiro/96, p. 4. 175 1964 São Paulo-SP Frigobrás Industrialização de produtos cárneos 1964 Toledo-PR Frigobrás Abate de suínos e bovinos 1967 Paulo-SP Sadia Comercial Ltda. Comercialização dos produtos Sadia 1971 Toledo-PR Frigobrás Fabricação de rações balanceadas 1971 Cuiabá-MT Sadia Oeste S.A. Abate e industrialização de bovinos 1972 São Paulo-SP Transbrasil S.A. Transporte de passageiros e de cargas 1973 Chapecó-SC Sadia Avícola S.A. Abate e industrialização de perus e de frangos 1976 São Paulo-SP Fundaç. Attilio Fontana Assistência e previdência para os funcionários 1977 Campinas-SP Moinho da Lapa S.A. Fábrica de rações 1977 Toledo-PR Frigobrás Esmagamento e extração de óleo de soja 1978 Faxinal Guedes-SC Hybrid Agropastoril Matrizeiro e incubatório de perus 1979 Américo BrasilienSP Moinho da Lapa S.A. Abate e industrialização de frangos 1979 Joaçaba-SC Sadia Concórdia S.A. Esmagamento e extração de óleo de soja 1979 Toledo-PR Frigobrás Abate e industrialização de frangos 1980 Concórdia-SC Supermercado Sadia Venda no varejo 1980 Goiatuba-GO Sadia Goiás Peru, frangos, pintos, ração, soja (projeto) 1980 Rio de Janeiro-RJ Sadia Concórdia S.A. Fábrica de lingüiças, salsichas e mortadelas 1981 Dois Vizinhos-PR Moinho da Lapa S.A. Abate e industrialização de frangos e de patos 1981 Barueri-SP Edifício sede da Sadia Centro Admin., sede Comitê Corporativo de Gestão 1982 São Paulo-SP Sadia Concórdia S.A. Serviço de Informação ao Consumidor - SIC 1983 Paranaguá-PR Frigobrás Exportação. Esmagamento e extração de óleo soja 1985 Barra do Garças-MT Sudanisa Abatedouro de bovinos 1985 Três Passos-RS Polipar Comércio e Criação, abate e industrialização de suínos. Representações Ltda Produção de rações, extração, refino de óleo de soja Matrizeiros, incubatórios e produção de pintos 1986 Itirapina-SP Agropastoril Paulista 1986 Rondonópolis-MT Sadia Mato Grosso S.A. Esmagamento, refino e envase de óleo de soja 1987 Barra do Garças-MT Supermercado Sadia 1988 São Paulo-SP Loja de Varejo da Sadia Show-room dos produtos, atendimento ao consumid 1989 Andradina-SP Frigorífico Mouran S.A. Abatedouro de bovinos 1989 Araçatuba-SP Frigorífico Mouran S.A. Abatedouro de bovinos 1989 Concórdia-SC Sadia Concórdia S.A. Fábrica de presunto cozido 1989 Osasco-SP Frigobrás Industrialização de suínos e bovinos 1989 Ponta Grossa-PR Frigobrás Abate e comercialização de suínos 1989 Dois Vizinhos-PR Supermercado Sadia Comercialização de produtos no varejo 1989 Freder Westphalen-RS Sadia Concórdia S.A. Abatedouro de suínos 1991 Francisco Beltrão-PR Sadia Concórdia S.A. Abatee e industrialização de frangos e de perus 1991 Paranaguá-PR Fábrica de hidrogenados, margarinas e cremes Frigobrás Venda no varejo veget 1991 Itapetininga-SP Moinho da Lapa S.A. Fábrica de massas 1992 Campo Verde-MT Sadia Mato Grosso Fábrica de rações 176 1992 Várzea Grande-MT Sadia Agroavícola S.A. Produção de pintos de corte 1992 Várzea Grande-MT Sadia Agroavícola S.A. Abate e industrialização de frangos 1992 Campo Grande-MS Frigobrás Processamento de soja 1993 Itapetininga-SP Lapa Alimen Produção de massas e alimentos secos (J.Macedo) 1993 Buenos Aires e SPaulo Granja Tres Arroyos Distribuição de produtos Sadia na Argentina Fonte: Elaboração própria a partir da pesquisa de campo e do material da empresa. O grupo Sadia tinha, conforme dados de seu Relatório Anual de 1995, três companhias de capital aberto (Sadia Concórdia S.A. Indústria e Comércio, Frigobrás Cia. Brasileira de Frigoríficos e Sadia Oeste S.A. Indústria e Comércio), que contavam com 24 plantas industriais, 20 filiais de venda no Brasil, 5 filiais de venda no exterior, 150.000 clientes no Brasil, 43 países clientes no exterior, 32.767 funcionários, mais 5.680 integrados de aves e 8.470 de suínos. Com um faturamento operacional bruto de US$ 2,9 bilhões, um lucro líquido de US$ 110,5 milhões, a Sadia era em 1995, a primeira empresa avícola brasileira, tendo abatido 325,4 milhões de frangos e 13,4 milhões de perus, a primeira em suínos (2,6 milhões de cabeças) e na industrialização de carnes (334 mil t.); a segunda colocada no abate de bovinos (354,9 mil cabeças) e a terceira no setor de soja e de óleo refinado149. 2. Ceval diversifica atividades e torna-se a segunda empresa avícola nacional « Ceval-Cerais do Vale Ltda., Ceval Agro Industrial S.A., Ceval Alimentos S.A. As três razões sociais retratam as mudanças na missão e nas grandes orientações estratégicas ocorridas ao longo dos vinte anos da empresa » (Wedekin e Pinazza, 1993, p. 102). Na época de sua fundação, em 1972, a Ceval tinha suas atividades voltadas para a compra, industrialização e comercialização de soja oriunda de sua área de atuação, daí seu nome originar-se de cerais do vale, referência ao rio Itajaí-Açu, formando o Vale do Itajaí, onde encontra-se até hoje a sede do grupo. No início dos anos 1970 o governo catarinense, com apoio da Universidade Federal de Florianópolis, definiu como relevante a busca da ampliação e diversificação industrial do estado e montou, para tanto, vários programas de incentivos150 à formação de novos pólos regionais e novas opções industriais. Por seu lado, a 149 Dados da Sadia, Relatório Anual, 1995, pp. 2-3, 12. 150 O primeiro fundo, criado em 1963, foi o FUNDESC - Fundo de Desenvolvimento de Santa Catarina, cuja base financeira de operação foram os incentivos fiscais. Pela legislação da época, as empresas podiam 177 Companhia Hering151 buscava diversificar suas atividades, então concentradas no ramo têxtil. « Foi em 1972, através do Fundesc que se constituiu a Ceval » (Gisele, 1991, p. 81). Uma vez criada, a Ceval iniciou suas atividades comprando, armazenando, processando e comercializando a soja produzida na região. Já em 1973 entrou em operação a primeira planta industrial, com capacidade para esmagar 100 t/dia, transformando-a em óleo e farelo. No entanto, como a produção regional de soja era muito baixa a Ceval mudou de estratégia e instalou-se nas grandes regiões produtoras, não só para comprar e comercializar, mas implantando a integração vertical e industrializando o produto. Isto significou também a primeira mudança de razão social, de « Ceval Cerais do Vale » para « Ceval Agro Industrial ». A nova estratégia foi bem sucedida, pois em 1979 a Ceval esmagou mais de 500 mil toneladas. Para atingir este resultado, em 1974 construiu silos em Campos Novos-SC; no ano seguinte incorporou a fábrica da Extração e Refinação de Óleos Vegetais S.A., em ChapecóSC; e em 1976 concluiu a refinaria de Gaspar-SC, lançando no mercado de óleo refinado a marca Soya, que se tornaria a mais vendida do Brasil. Para entender os avanços e os lucros da empresa neste setor, é preciso citar a conjuntura favorável do mercado internacional de soja na décadas de 70 e início dos anos 80. Os produtos tinham colocação fácil no exterior e a Ceval soube aproveitar as oportunidades que se apresentaram. Por outro lado, « a empresa procurava extrair o melhor partido dos incentivos à exportação »152. Na sua estratégia de crescimento, a Ceval baseou-se em três pontos: Primeiro aumentou a capacidade de esmagamento e refino; segundo, montou uma ampla estrutura de armazenagem nas regiões de produção visando dar aos agricultores uma garantia de venda da safra153; terceiro, agilidade decisória e política comercial agressiva, tanto no mercado interno descontar 10% do ICM - Imposto sobre a Circulação de Mercadorias, desde que aplicassem em projetos industriais. O Fundesc funcionou até 1975, quando o governo federal proibiu a manutenção ou a criação de incentivos com base no ICM (Mior, 1993). 151 Para entender a participação dos empresários agroindustriais na formulação e direcionamento destes fundos, ver Bárbara Giese (1991), A atuação política do empresariado catarinense dos ramos têxtil e agroindustrial: demandas e canais de influência (1970-1985), dissertação de mestrado, UFSC, Florianópolis. 152 Os dados sobre o início da Ceval e sua atuação no ramo sojícola foram extraídos de Ivan Wedekin e Luiz Antonio Pinazza, « CEVAL: diversificação e busca de valor agregado », in: Decio Zylbersztajn (coord.), Estudos de caso em Agribusiness. O processo de tomada de decisões nas empresas brasileiras, editora Ortiz, Porto Alegre, 1993, pp. 95-126. 153 A Ceval « foi antes » para as regiões de produção, podendo-se citar os exemplos de Barreiras, na Bahia e de Balsas, no Maranhão, estado no qual a empreza realizou os primeiros embarques pelo porto de Itaqui, em 1992 (Wedekin e Pinazza, 1993). 178 quanto no externo, onde a Ceval « abriu negócios em qualquer parte do mundo » para ampliar os volumes exportados. Em 1982, dez anos depois de iniciar suas atividades a Ceval ocupava uma posição de destaque na sojicultura nacional. Sua estrutura montada representava capacidade para processar, anualmente, 1,2 milhão de toneladas e gerava emprego para 2.883 funcionários. Contava também com amplo sistema de aquisição de matéria-prima, do qual faziam parte 28 silos, com capacidade de estocar 650 mil toneladas, distribuídos nas áreas tradicionais e em desenvolvimento da soja (Santa Catarina, Rio Grande do Sul, Paraná, Mato Grosso do Sul e Mato Grosso). Suas fábricas localizavam-se em São Francisco do Sul, Gaspar, São Miguel do Oeste e Chapecó, todas em Santa Catarina. Em 1980 a Ceval era a décima oitava maior empresa exportadora nacional e detinha 9% do mercado interno de consumo de óleo de soja refinado. Até então, a prioridade estratégica da empresa era o mercado externo. Ceval cresce, diversifica atividades e muda estratégia de mercado O segundo momento na história da Ceval, do ponto de vista estratégico, partiu da decisão de diversificar a empresa para entrar no grande potencial da indústria brasileira de alimentos. A opção escolhida foi dar continuidade ao processo de integração vertical a partir de sua atividade soja, aproveitando seu farelo na fabricação de rações, entrando no complexo carne, mediante a produção, o abate, a industrialização e a distribuição de carnes de aves e suínos. O suprimento de animais para abate seguiu o mesmo modelo adotado pelas duas maiores empresas do setor, a Sadia e a Perdigão. Para efetivar esta diversificação a Ceval comprou, em 1980 a Seara Brascarne Participações S.A., controladora de empresas que operavam um frigorífico com capacidade de abate de 800 suínos e outro para abate de 4.500 aves/dia, situada na cidade de Seara-SC. Já em 1981 com o objetivo de ampliar a escala e ocupar uma região estratégica para o empreendimento na área de suínos e aves, foi adquirida a empresa S.A. Frigorífico Itapiranga Safrita, de Itapiranga-SC. Em seu estágio inicial, os negócios da Seara no complexo carnes concentravam-se nas vendas de carcaças para o mercado interno154. 154 Paralelamente a esta segunda atividade, a Ceval continuou a estrutura de armazenamento, industrialização e comercialização de soja e seus sub-produtos. Fez investimentos relevantes, como a aquisição da unidade industrial de Rio Grande-RS, junto ao terminal graneleiro da Cotrijuí, compreendendo uma instalação de esmagamento e refino. Ainda neste estado adquiriu o parque industrial de Três de Maio, composto por uma unidade de extração e silos. Para a consolidação do complexo industrial gaúcho, foram ampliadas as instalações de armazenamento e secagem das unidades de São Gabriel, Tupanciretã, Santo Ângelo, Santa Bárbara do Sul e Rio Grande, com a montagem de seis novos secadores e silos. Uma unidade foi projetada em 179 Em 1991 a Ceval complementou sua reformulação e reestruturação estratégicas, com o objetivo de « transformar a companhia e conceituá-la como produtora e comercializadora de alimentos industrializados com forte ascensão da agregação de serviços » (Wedekin e Pinazza, 1993, p.109). Para ampliar o volume de negócios no mercado interno, foram dados novos passos na verticalização das atividades ligadas à soja, para a fabricação de alimentos com maior valor agregado. Neste sentido, em 1990 a Ceval entrou no ramo de margarinas155 e cremes vegetais. A Ceval investiu US$ 282,3 milhões no período de 1986 a 1991 na construção de novas unidades, ampliação de fábricas e incorporação de empresas. Grande parte destes recursos foram usados para ampliar o crescimento na área de soja. Fruto desta política de investimentos, a Ceval chegou no início da década de 90 como a maior empresa do complexo soja na América Latina. Tinha, na época, uma rede de silos com mais de 60 unidades de recepção e armazenagem, com capacidade estática superior a 2 milhões de toneladas, distribuídos em dez estados da federação. Seu parque industrial era representado por onze unidades, com capacidade de esmagar até 14.650 tonedas de soja por dia. Em 1991 o complexo soja ainda representava 61,2% da receita da empresa, assim distribuído: moagem de soja (farelo e óleo bruto) 29,9%; industrialização de soja (óleo refinado e margarinas) 31,3%; carnes 35,2% e milho 3,6% (Wedekin e Pinazza, 1993, p. 113). Entretanto, este perfil mudou nos anos seguintes devido aos investimentos prioritários em outro setor, sobretudo na compra de novas unidades destinadas ao abate e à industrialização de carnes. Carnes e derivados, a nova estratégia do grupo Como vimos acima a Ceval iniciou suas atividades no setor avícola em 1980 ao adquirir o abatedouro da Seara. Naquele ano foram abatidos 10,9 milhões de aves, representando 12,23% dos abates SIF de Santa Catarina. Já em 1981 entrou em operação o segundo abatedouro da empresa em Itapiranga, com capacidade de abate semelhante à do primeiro e, em 1984, um terceiro abatedor foi comprado em Jaraguá do Sul. Na metade da 1985, para Campo Grande, no Mato Grosso do Sul, a primeira fora dos estados do Rio Grande do Sul e Santa Catarina (Wedekin e Pinazza, 1993). 155 A entrada de outras empresas neste setor, como a Ceval e a Sadia desencadeou a chamada « guerra das margarinas », que contribuiu para baixar o preço de US$ 2,10 em 1990, para US$ 1,50 o quilo, em 1992. O ramo de margarinas reúne dez fabricantes, que produzem por cerca de US$ 270 milhões, sendo que em 1990, a Gessy Lever e a Sanbra dominavam mais de 80% do mercado (Wedekin e Pinazza, 1993, p. 110). 180 década de 80, com os três frigoríficos a Ceval abateu cerca de 30 milhões de aves, ou seja, 11,6% do total estadual156. Outra grande investida foi dada no final dos anos 80, quando entraram em operação três novos abatedouros. Desta vez a Ceval instalu-se em outros dois grandes estados produtores, o Paraná e São Paulo. Em Jacarezinho, no norte do Paraná, começou a operar um abatedouro com capacidade de 6,4 milhões de cabeças/ano. Em São Paulo, entraram em operação os abatedouros de Jundiaí, com capacidade para 10,5 milhões e o de Nuporanga, com capacidade para 1,4 milhão de cabeças/ano. Para implementar ainda mais a divisão Carnes, a Ceval adquiriu a Agroeliane Indústria de Alimentos, em abril de 1995. A Agroeliane teve sua origem em 1970 quando o empresário Maximiliano Gaidzinski, fundador e ex-presidente da Cerâmica Eliane, decidiu diversificar suas atividades empresariais. Iniciou comprando a Moinhos Vigor, empresa produtora de rações, situada em Criciúma-SC, adquirindo também, no mesmo ano, o Frigorífico Sul Catarinense S.A. Em 1973 foi criada uma área específica para incremento da suinocultura na região e, com isso, os abates iniciais do frigorífico, de 35 suínos/dia passaram a 300 cabeças/dia em 1975. Em 1976 a empresa se firmou no mercado com a criação da Eliane Pecuária S.A., responsável pelo sistema de integração e suporte de um projeto audacioso que em 1977 entrou em funcionamento: a Avícola Eliane, com capacidade para abater 6.000 aves/dia. Em 1981 foi constituída a Eliane Avicultura do Sul Ltda., com a instalação de granjas de matrizes poedeiras e um incubatório para a produção de pintos de um dia. Em 1989, todas as atividades foram centralizadas numa só empresa, a Agroeliane S.A. Indústria de Alimentos157. Em 1994 a Agroeliane estava classificada no décimo quinto lugar das maiores empresas nacionais avícolas. Com esta aquisição a Ceval aumentou em 25% sua capacidade de abate de aves e tornou-se a segunda maior empresa nacional do complexo carnes, passando na frente da Perdigão. Em 1995, segundo dados da ANAB, a Ceval abateu 146,7 milhões de 156 Levantamento feito durante a pesquisa de campo, a partir dos dados da Aincadesc, na Secretaria da Agricultura de Santa Catarina, Florianópolis, maio de 1995. 157 Pelo valor de US$ 60 milhões a Ceval adquiriu da Agroeliane, abatedouros de frangos e suínos e incubatório, na cidade de Forquilhinha; fábrica de rações em Criciúma; granjas de suínos e aves em Urussanga, Araranguá, Maracajá, Forquilhinha, Cocal do Sul e Rio Galo. Abatedouro de frangos, que inclui também incubatório, fábrica de rações e granja de matrizes, localizados em Sidrolândia-MS. Nos dois estados a empresa mantém uma parceria com 519 produtores de frangos e 261 produtores de suínos. Dados da matéria « Ceval e Agroeliane agora juntas », in: Revista Ceval Notícias, Órgão de divulgação dos empregados da Ceval, Gaspar-SC, ano 12, n° 105, pp.12-17. 181 cabeças, representando 8,78% dos abates SIF nacionais158. Além disso, abateu 916.000 suínos e industrializou 5,17 milhões de toneladas de soja, produziu mais de 100 milhões de ovos e quase 80 milhões de pintos de um dia e 620 mil toneladas de rações animais. Contando com 17.422 funcionários, teve um faturamento bruto de 2,5 bilhões de dólares, com um lucro líquido de US$ 64,6 milhões159. 3. Perdigão reencontra sua rota em novas mãos A Perdigão conseguiu manter um crescimento e investimento na área avícola semelhante ao da Sadia até início da década de 90. Para tanto, copiou de sua concorrente o processo de integração vertical, implantando granjas próprias de matrizes, incubatórios para produção de pintos de um dia, fábrica de rações, instituiu um setor de fomento agropecuário, assinou contratos de parceria com pequenos agricultores integrados, construiu abatedouros, montou fábricas de embutidos e industrializados e implementou sua rede de distribuição em todo território nacional. Esta inovação organizacional junto com o investimento nas melhores tecnologias disponíveis tanto para a produção agrícola como para a industrialização e distribuição permitiram a esta outra empresa líder de manter-se competitiva e acompanhar a escalada de avanço na produção avícola nacional. A empresa chegou a meados da década de 70 tendo apenas um abatedouro no oeste catarinense. Em 1980 foram abatidos nesta unidade 36.859.299 frangos, representando 26,84% do total SIF estadual. Ao longo desta década a Perdigão aumentou seu número de empresas abatedouras, chegando a cinco unidades, sendo duas em Santa Catarina (Capinzal e Videira), duas no Rio Grande do Sul (Marau e Serafina Correa) e uma em São Paulo (Mococa). Em 1990 as unidades de Santa Catarina abateram 102,7 milhões de cabeças, representando 31,5% do SIF do estado; as do Rio Grande do Sul abateram 28,6 milhões de 158 Seu plano mais arrojado, num futuro próximo, é a implantação de um complexo destinado à produção de aves, suínos, rações animais, desenvolvimento genético, parceria com produtores rurais e um frigorífico para abater aves e suínos, bem como industrializar suas carnes para suprir o mercado do Nordeste. Nele serão investidos diretamente pela Ceval US$ 80,1 milhões. No frigorífico será possível abater três milhões de aves/mês, 60 mil suínos/mês e industrializar 9,7 mil toneladas de carne/mês. A Fábrica de rações irá produzir 20 mil toneladas/mês. Depois de concluído o projeto, no ano 2002, a Ceval fará parceria com 900 produtores rurais na criação de frangos e suínos (Revista Ceval Notícias, Órgão de divulgação dos empregados da Ceval, Gaspar-SC, ano 12, n° 109, setembro/95, p. 3). 159 Ceval, Relatório Anual, 1995. 182 cabeças, sendo 14,8% do SIF estadual e a de São Paulo abateu 2,3 mihões de cabeças, representando pouco mais de um por cento do total estadual160. Nos primeiros anos da década de 90, por problemas administrativos a Perdigão passou por sérias dificuldades econômicas. Apesar disto conseguiu manter seu nível de produção avícola e consolidou-se como a terceira maior empresa no Rio Grande do Sul, quando abateu nas duas unidades 32,3 milhões de cabeças, em 1993, representando 11,6% do total SIF estadual. Em Santa Catarina, através de suas duas unidades a Perdigão abateu mais que a Sadia em 1994, chegando a 112 milhões de cabeças, ou seja 27,81% do SIF estadual. Neste mesmo ano, a unidade paulista abateu cinco milhões de cabeças, representando 1,48% do SIF estadual161. Com estas unidades industriais implantadas no Sul e Sudeste, a Perdigão chegou em 1994 como segunda maior empresa do setor, tendo abatido 140.058.638 de cabeças, representando 9,57% do total SIF nacional162. Devido às dificuldades enfrentadas no setor administrativo e gerencial, acumularam-se dívidas, sobretudo de curto prazo, inviabilizando a continuidade do empreendimento industrial, levando a família Brandalise a vender a empresa. Depois de forte disputa por esta que era a segunda maior do setor avícola nacional, a Perdigão foi adquirida por um pool de fundos de pensões, liderados pela Previ, dos funcionários do Banco do Brasil163 em setembro de 1994, que pagaram à família Brandalise US$ 150 milhões. Os novos acionistas da empresa entraram em ação imediatamente para recuperar o espaço de mercado que ela perdeu nos últimos anos164. Para tanto, nomearam um novo 160 Dados coletados durante a pesquisa de campo, em março e abril de 1995, nas instituições públicas dos respectivos estados. 161 Levantamento feito durante pesquisa de campo, em abril e maio de 1995. Os dados do Rio Grande do Sul pertencem à ASGAV - Associação Gaúcha de Avicultura; os de Santa Catarina à Aincadesc e os de São Paulo ao Maara. 162 Dados do Informativo da ANAB, ano XIX, n° 496/497, janeiro-Fevereiro/95, p. 3. Em 1995 só foi suplantada pela Ceval porque esta última comprou a Agroeliane. 163 Somando-se o total de ações, entre ordinárias e preferenciais, ficou assim distribuído o controle acionário da Perdigão: Previ-Caixa previdenciária da fundação do Banco do Brasil 15,03%; Fundação Telebrás de seguridade social-Sistel 15,03%; Petrus-Fundação Petrobrás de seguridade social 12,17%; Real grandeza fundação de APAS 9,74%; Weg motores Ltda 8,80%; União de comércio e participações Ltda 3,88%; PreviBanerj 2,80%; BNDES participações S.A. 2,01%; Valia-Fundação Vale do Rio Doce 1,73%; Telos-fundação Embratel de seguridade social 1,57%; Bradesco turismo S.A. 1,12%; Fundo de participação social 0,35%; Banco Bradesco 0,10%; outros 16,66% (Perdigão, Relatório Anual, 1994). 164 Por conta da produção insuficiente de suas nove unidades de processamento de carnes, a Perdigão (que faturou US$ 628,3 milhões em 1994), viu sua participação de mercado cair de 19% para 16,4% nos últimos três anos. Neste período, após a morte de Saul Brandalise, seus filhos Flávio e Saul Brandalise Jr. passaram cerca de três anos sem investir na empresa (dados publicados pelo jornal O Globo, Caderno de Economia/Negócios, 2 de maio de 1995, p. 22). 183 presidente, incumbindo-o de preparar um plano estratégico para curto, médio e longo prazos; reestruturar a empresa; centrar suas atividades no setor de produção e distribuição de alimentos. O novo Conselho de Administração aprovou o « projeto de otimização das fábricas atuais », que prevê investimentos de US$ 150 milhões, para ampliação da capacidade total de produção em 50% até 1998165. Os recursos serão destinados ao Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Paraná, São Paulo e Minas Gerais. De acordo com o novo presidente, « não está prevista a implantação de novas unidades industriais, mas a otimização das fábricas atuais, via inovação tecnológica, ganhos em eficiência e economia de escala, racionalização de técnicas e processos »166. Depois de sua reestruturação, a Perdigão voltou a crescer e a reinvestir em diversos setores produtivos, assemelhando sua estratégia à das outras duas líderes. Em 1994 produziu 164,7 mil toneladas de carne de aves e 143 mil toneladas de carne suína. Além disso, reativou o setor de soja, que estava parcialmente desativado, produzindo 80 mil t de farelo, 17,6 mil t de óleo refinado e 19 mil t de óleo degomado. Para atender seus integrados produziu 841,6 mil t de rações. Contando com 12 mil funcionários, teve uma receita operacional bruta de US$ 800 milhões e um lucro líquido de US$ 14,4 milhões167. Em relação às estratégias das empresas líderes houve uma significativa mudança do que aconteceu até meados dos anos 70, como vimos no capítulo quatro. A Sadia continuou com uma grande produção de aves em Santa Catarina, de onde expandiu suas atividades para o Paraná, São Paulo e Mato Grosso. Neste caso, a Perdigão seguiu estratégia semelhante, implantando-se fortemente no Rio Grande do Sul, em São Paulo e, recentemente, indo para o Centro-Oeste. Agregando a estas a terceira líder, vemos que a Ceval ao entrar neste setor 165 Relatório da Administração da Perdigão S.A. Comércio e Indústria, in: Jornal O Estado de S.Paulo, Caderno de Economia, 11 de maio de 1995, cad. B, p. 13. 166 Revista Avicultura e Suinocultura Industrial, n° 1.019, ano 85, março de 1995, p. 30. « A Perdigão vai investir cerca de US$ 250 milhões para expandir suas atividades no cerrado, no centro-oeste do país. Ainda em fase de estudo, o projeto amplia entre 33% e 40% a capacidade total de abate de frangos e suínos e deve começar a operar regularmente a partir de 1999. Atualmente a empresa tem 13 unidades industriais concentradas no Sul do país: oito em SC, quatro no RS e só uma em São Paulo » (Jornal Folha de S.Paulo, Caderno de Economia, 12 de dezembro de 1995). Em 1996 a empresa decidiu construir um grande abatedouro de suínos e aves em Rio Verde, Goiás. Serão investidos US$ 500 milhões, dos quais US$ 250 milhões das empresas Perdigão, US$ 100 milhões do Banco do Estado de Goiás, US$ 100 milhões do governo goiano e US$ 50 milhões de 20 empresas que vão se instalar no município atraídas pelo projeto. Segundo o presidente da Perdigão, o projeto promoverá a criação de três mil empregos diretos e seis mil indiretos. Serão implantados na região 840 módulos de integração para aves e suínos, cuja produção deverá suprir as unidades de abate. Está previsto o alojamento de 900 mil matrizes, distribuídas em três granjas, além de um incubatório, capaz de produzir cerca de 6,5 milhões de pintos. O abate de frangos começará em 1998 e o de suínos no ano 2000 (Jornal O Globo, 26 de junho de 1996). 184 seguiu a mesma estratégia. Comprou diversos abatedouros em Santa Catarina, mas também no Paraná, em São Paulo, no Mato Grosso do Sul e está construindo na Bahia. Outra estratégia semelhante das três foi investir na integração vertical da soja, fabricando produtos com maior valor agregado, que vão desde o farelo (para sua produção própria de rações) até o óleo refinado e as margarinas. No caso da Perdigão, por questões administrativo-financeiras, perdeu preciosos pontos de mercado, o que distanciou-a das outras duas tanto em diversificação de atividades como em crescimento dos conglomerados, visivelmente inferior no que se refere à receita operacional bruta e ao lucro líquido. A mesma estratégia foi mantida com relação às exportações, como veremos no último capítulo. Portanto, neste momento, as estratégias das três líderes são semelhantes devendo estabelecerse a disputa entre elas a partir de outros elementos, tais como o savoir-faire acumulado, a capacidade de gerenciamento de seus managers, a capacidade de inovação e lançamento de novos produtos, de pesquisa de mercado, de pesquisa aplicada, a efetivação dos processos de qualidade total. Fruto da estratégia de inovar com a integração vertical, transformando a produção de carne de aves e de suínos no seu ponto forte, as novas indústrias do Sul passaram a dominar o setor de carnes, superando as tradicionais empresas multinacionais que centravam-se na produção e exportação de carne bovina168. 4. Aquisições e mudanças no ranking das maiores empresas nacionais A aquisição de empresas concorrentes foi uma prática comum na estratégia de crescimento dos grupos agroalimentares, sobretudo no Sul do país169. O que aconteceu de novo nas três principais aquisições de 1995, foi o fato das empresas compradas pertencerem à lista das 20 maiores nacionais, causando uma mudança na tradicional lista das maiores colocadas. Como já vimos acima, a principal compra foi feita pela Ceval, ao adquiri a Agroeliane, seguida pela Avipal e Chapecó, que incorporaram, respectivamente, a Coagri de Dourados-MS e a Diplomata Agroindustrial de Cascavel-PR. 167 Perdigão, Relatório Anual, 1994. 168 Geraldo Müller (1991), Poder econômico e empresas líderes na cadeia agroindustrial de carnes, Rascunho n° 8, Araraquara, UNESP. Neste trabalho o autor mostra como ao longo da década de 70 as empresas nacionais de carnes suplantaram a Swift, Armour e Wilson, instaladas no país desde a década de 1920. 169 Para maiores detalhes das aquisições inter-empresas avícolas, ver os trabalhos de Mior (1992) e de Rizzi (1993). 185 Avipal cresce e expande atividades para o Centro-Oeste Depois de ampliar seus abates com a estrutura montada em Porto Alegre-RS, compreendendo abatedor de frangos, granjas de matrizes, incubatório e integração com produtores agrícolas, a Avipal cresceu diversificando suas atividades. Em 1978 fundou a empresa Granóleo para compra, armazenamento e esmagamento de soja, cuja finalidade básica era produzir farelo para a fabricação de rações e exportação e, óleo bruto para o mercado interno. No ano de 1985 a Avipal tomou duas medidas importantes. De um lado, continuou sua política de expansão via aquisições, quando comprou a Copave, uma cooperativa de produtores. De outro lado, transformou-se em empresa de capital aberto, com o objetivo de buscar dinheiro no mercado e poder continuar seu crescimento. O grupo Avipal atuava na área de frangos, ovos, pintos, suínos, construções, corretora de valores, soja e fábrica de embalagens plásticas. No entanto o carro-chefe da empresa era o setor de frangos, representando entre 80 e 85% do faturamento, seguido do setor de ovos, com 11% do total em 1995. « A suinocultura até agora ficou em terceiro lugar, mas no momento a empresa está terminando de construir um abatedor para abater e industrializar suínos em larga escala »170. A Avipal, como todas as suas concorrentes do Sul do país, atua na integração vertical da produção. Possui abatedouros de frangos em Porto Alegre, Lajeado e Passo Fundo; fábrica de rações, incubatórios e granjas de matrizes em Porto Alegre e Arroio do Meio, no Rio Grande do Sul. Seu último grande investimento no setor foi feito em 1995, quando comprou o complexo agroindustrial da Cooperativa Agropecuária e Industrial Ltda - Coagri, de Dourados, no Mato Grosso do Sul. Pelo valor de US$ 18,5 milhões, adquiriu um abatedor de aves, uma fábrica de rações e uma estrutura de armazenagem de grãos, além de incorporar toda a produção avícola, num total de 282 avicultores integrados. A Avipal vai investir para dobrar a capacidade atual do abatedouro, construindo também duas granjas de matrizes e um incubatório, para verticalizar a produção171. 170 Entrevista com o diretor de produção da Avipal, Porto Alegre, RS, 28 de abril de 1995. 171 Informativo da ANAB, ano XIX, n° 508, dezembro de 1995, p. 5. 186 Em 1995 a Avipal abateu em seus três estabelecimentos gaúchos 94,5 milhões de frangos, representando cerca de 30% do total SIF estadual. Se somarmos a isto os 21 milhões de abates da antiga Coagri172, a Avipal passou a ocupar a quarta posição como maior empresa avícola no ranking nacional, com 6,92% dos abates SIF, superando sua conterrânea, a Frangosul. Frangosul continua centrando suas atividades no estado de origem A Frangosul, como vimos no captítulo quatro, iniciou suas atividades com a criação de frangos em 1970 através da Granja Pinheiros Ltda, trabalhando em pequena escala. Em 1976, para integrar verticalmente a produção, ela implantou uma estrutura avícola composta por um incubatório que atualmente tem capacidade para incubar 650 mil ovos/semana e galpões denominado « Granjas Campestre Ltda. ». Em 1979 criou a Indústria de rações Frangosul Ltda., para fabricar sua própria ração. Em 1984 a Frangosul tornou-se empresa de capital aberto, para buscar dinheiro no mercado. No mesmo ano comprou a Inavical - Indústria Avícola Caxias Ltda, com sede em Caxias do Sul-RS, complexo agroindustrial composto por um abatedouro avícola e uma fábrica de rações. Visando um maior incremento na produção própria de pintos de um dia, adquiriu em 1986, um incubatório e um matrizeiro no mesmo município. Ainda em 1986 a Frangosul comprou outro complexo agroindustrial de propriedade da Mavepal - Matadouro de Aves, composto por uma fábrica de ração, um incubatório, ambos em Nova Bassano-RS, além de um abatedouro de frangos em Passo Fundo-RS. Três anos mais tarde adquiriu a Cia. Petefi de Alimentos, que contava com um frigorífico especializado no abate de suínos, ovinos e bovinos173. Através de construções próprias e de aquisições de terceiros, a Frangosul chegou em meados da década de 90 com uma bem montada estrutura de produção vertical de frangos no Rio Grande do Sul. Esta estrutura compõe-se pelas granjas de matrizes, formadas por 20 galpões que produzem mais de 1,3 milhão de matrizes de aves de linhagens para produção de ovos. Estes, vão para os três incubatórios eletrônicos, de onde saem os pintos para as granjas de criadores integrados, com um dia de vida, sexados e vacinados. Para criar estes frangos a 172 Informativo da Associação Nacional dos Abatedouros Avícolas, Informanab, São Paulo, ano XIX, n° 509, janeiro/96, p. 4. 187 empresa mantém contratos de parceria com dois mil pequenos agricultores vizinhos aos abatedouros. Para atender a demanda dos integrados dispõe de três fábricas de rações, com capacidade para produzir mais de 600 mil ton/ano. Por fim, abate as aves em seus três frigoríficos e as distribuiu através de suas próprias filiais comerciais. A Frangosul abateu nestes três frigoríficos 113,9 milhões de frangos em 1995, o que representa 6,82% do total SIF nacional e a coloca como a quinta maior empresa nacional do setor174. Chapecó cresce mudando de estratégia A Chapecó chegou em 1985 abantendo 33,5 milhões de frangos, no seu abatedouro de Xaxim-SC, representando 12,7% dos abates SIF estaduais. Em 1990 este número evoluiu para 36,7 milhões175, mas a percentagem estadual diminuiu para 11,27%. O primeiro investimento fora de Santa Catarina ocorreu no final dos anos 70, com a implantação da Chapecó Paraná S.A. Indústria e Comércio, em Francisco Beltrão, sudoeste paranaense. Esta nova unidade avícola, composta de incubatório, fábrica de rações e frigorífico, entrou em operação em 1983, com capacidade de abate de 120 mil aves/dia. No entanto estas instalações foram vendidas para a Sadia, em 1991, quando o grupo Chapecó passava por sérias dificuldades financeiras. Sua segunda investida fora do estado foi a aquisição de outro abatedouro avícola no município de Amparo-SP, em 1989, cuja capacidade de abate chegava a 30 mil aves/dia. Em 1990, a Chapecó abateu 5,2 milhões neste abatedouro, o que representava 2,4% dos abates SIF do estado176. Em parte, as dificuldades financeiras foram agravadas pelo pagamento deste novo abatedouro. Em meados da década de 90, a Chapecó, cujas vendas estavam mais voltadas para os açougues, com ênfase nos produtos a granel, partiu para a conquista de um lugar nas prateleiras dos supermercados, em busca de melhores preços para a sua produção. A empresa deixou a timidez e os prejuízos de lado e adotou uma agressiva estratégia de investimento, 173 Os dados da Frangosul foram tirados a partir de seus Relatórios Anuais, de 1991 a 1995, de uma entrevista com um de seus diretores e da visita a seu principal abatedouro avícola, em Montenegro-RS, em abril de 1995. 174 Informativo da ANAB, Informanab, São Paulo, ano XIX, n° 509, janeiro/96, p. 4. 175 Dados da AINCADESC, coletados durante a pesquisa de campo na Secretaria da Agricultura de Santa Catarina, Florianópolis, abril de 1995. 176 Levantamento de dados feito durante a pesquisa de campo no MAARA, São Paulo, abril de 1995. 188 projetando, para 1997, um faturamento de US$ 500 milhões177, 50% maior que o registrado em 1994. Um dos efeitos desta mudança de política manifestou-se em 1995 quando o grupo voltou a investir no Paraná, para aumentar sua capacidade produtiva e atender as novas demandas do mercado interno e das exportações, comprando a Diplomata Agroindustrial, de Cascavel, no oeste do estado178. Com este novo abatedouro, a Chapecó não só aumentou seu volume de produção, como agregou mais valor a seus produtos, uma vez que o estabelecimento estava equipado para transformar o total de sua produção em cortes especiais. Com estes três abatedouros a empresa abateu 89,5 milhões de aves, em 1995, representando 5,35% do total SIF nacional179, o que lhe permitiu passar do oitavo para o sexto lugar no ranking das maiores empresas nacionais do setor. 5. Reestruturação da gestão e da administração das empresas As atuais empresas líderes e as « imitadoras » do setor avícola nasceram como indústrias familiares, na grande maioria e, ao longo dos anos, sofreram diversas reestruturações internas, sempre tentando se adaptar às novas conjunturas. Estas mudanças aconteceram pela dispersão geográfica, pela diversificação de setores e de produtos e, muitas vezes, pela disputa entre os principais acionistas, também presentes na direção dos conglomerados. Sadia e suas sucessivas reestruturações A primeira grande mudança administrativa foi implantada na Sadia em 1964, quando foi criado o Conselho de Administração. Esta mudança se impôs para responder às novas exigências de atuação de uma empresa que havia diversificado suas atividades (trigo, suínos, aves, transporte) e construído plantas industriais em quatro estados diferentes, além de contar 177 Entrevista com o presidente da Chapecó, publicada no jornal Gazeta Mercantil, São Paulo, 20/12/95. 178 A Chapecó pagou por este abatedouro a importância de US$ 15 milhões. O abatedouro tem capacidade de produzir 47 ton/ano de carne e está preparado para produzir cortes em 100% do seu abate. Para garantir a matéria prima, funciona um sistema de integração com 434 agricultores que têm 530 aviários. A Chapecó vai construir ainda uma fábrica de ração próximo ao abatedouro (Jornal Gazeta Mercantil, São Paulo, 10 de dezembro de 1995). 179 Informativo da Associação Nacional dos Abatedouros Avícolas, Informanab, São Paulo, ano XIX, n° 509, janeiro/96, p. 4. 189 com uma rede de distribuição implantada em diversos estados, cuja coordenação localizava-se em São Paulo. Com esta reestruturação, foi criado o Conselho de Administração e a Diretoria Executiva. Cabia ao primeiro fixar a política geral do grupo; cuidar da aplicação dos recursos; encarregar-se do planejamento da empresa a longo prazo. A Diretoria Executiva cuidava do dia-a-dia das indústrias e das filiais comerciais. Com este tipo de organização a Sadia capacitou-se administrativamente para pensar seu crescimento e sua diversificação de atividades ao longo dos anos seguintes (Teixeira, 1994). Em 1984, quando Attilio Fontana deixou a presidência do Conselho de Administração, efetivou-se uma segunda mudança importante na gestão empresarial, criando-se a presidência executiva separada do conselho. Em 1987 foi instituído o Comitê Corporativo de Gestão e no ano seguinte, com apoio de uma consultoria especializada, foi elaborado o Planejamento Estratégio do Grupo. No início da década de 90 fazia-se necessária uma nova reestruturação para enfrentar a globalização econômica, a entrada em funcionamento do Mercosul, o desafio de implantar a Qualidade Total e a necessidade de internacionalizar a empresa. Estes desafios fizeram repensar a administração empresarial do grupo, diminuindo os níveis hierárquicos, dividindo responsabilidades, estabelecendo ajustes na visão estratégica de curto e longo prazos. Este processo de mudança culminou em 1993, quando tomou-se a decisão de desvincular inteiramente o Conselho de Administração da Diretoria Executiva (Teixeira, 1994). A partir de 1994 foi implantado o novo modelo de gestão corporativa, quando a Sadia contou com assessoria da empresa de consultoria norte-americana McKinsey. O novo modelo está baseado na presidência executiva e em quatro unidades de negócios, que são as grandes atividades da empresa: industrializados, carnes in natura, grãos e derivados, internacional. A partir deste momento, ficou sob a responsabilidade do presidente do Conselho Superior de Administração decidir a estratégia do grupo e escolher a diretoria executiva. Além disso, cuidar da comunicação externa e interna, do relacionamento com o mercado de capitais e da auditoria dos negócios da corporação. Ao presidente da Diretoria Executiva cabe preparar o planejamento estratégico e o plano operacional, de acordo com as linhas globais acordadas com o Conselho Superior de Administração; avaliar o desempenho de cada área de negócio e dos principais executivos da empresa; mediar as negociações entre as quatro áreas de negócios180. 180 Revista Integração, Órgão interno da FAF, Edição Especial 50 anos, São Paulo, Junho de 1994, p. 28. 190 A área do « negócio industrializados » envolve a produção e a venda de produtos industrializados, elaborados com carne de frango, peru, suínos e bovinos. Além disso encarrega-se da produção e venda de hidrogenados, cremes vegetais e margarinas. Fornece produtos acabados para o « negócio internacional », dá suporte de engenharia industrial e presta serviço de marketing a toda a corporação Sadia181. O setor « carnes in natura » atua na produção agropecuária, nos abatedouros de aves, suínos e bovinos e fábricas de rações, na venda de todas as carnes « in natura », inclusive de rações para o mercado interno182. A divisão « grãos e derivados » encarrega-se da compra de milho, praticamente todo destinado à fabricação de ração. No setor soja, além da compra faz a industrialização, produzindo farelo, extraindo, refinando e enlatando o óleo, em suas oito fábricas de esmagamento e quatro de refino e enlatamento. O « setor Internacional » responsabiliza-se pelas exportações e importações, ajudando a Sadia como um todo a implantar-se no exterior, não só com filiais comerciais mas também com indústrias no setor de carnes e soja183. Esta nova estrutura administrativa adapta-se às principais atividades do grupo Sadia. Na formação de sua receita operacional bruta ganha cada vez maior importância o setor de carnes industrializadas e o da avicultura, como podemos ver analisando os dados da empresa durante os últimos dez anos. TABELA 14 - SADIA E A COMPOSIÇÃO DE SUA RECEITA OPERCIONAL BRUTA 1986-1995 (em %) Setores 1995 1994 1993 1992 1991 1990 1989 1988 1987 1986 Carnes Ind. 38 33 33 31 36 35 28 20 18 17 Aves 30 31 29 29 32 31 31 30 27 25 Soja 15 19 19 18 14 12 17 22 14 15 Bovinos 7 10 11 14 13 11 8 7 5 5 Suínos 6 6 6 6 3 3 6 7 7 7 Outros * 4 1 2 2 2 8 10 14 29 31 * Moinho de trigo, alimentos secos, venda de rações. Fonte: Sadia, Relatórios anuais, 1986-1995. 181 Revista Integração, Órgão interno da FAF, São Paulo, n° 140, Jan-Fev/1995, pp. 22-23. 182 Revista Integração, Órgão interno da FAF, São Paulo, n° 139, Nov-Dez/1994, p. 22. 183 Revista Integração, Órgão interno da FAF, São Paulo, n° 141, Mar-Abr/95, pp.22-23. 191 Com esta nova estruturação, a Sadia caracteriza-se cada vez mais como empresa dirigida por « managers profissionais »184, como os denomina Chandler (1988). São executivos que fazem da arte de dirigir a empresa sua profissão, especializando-se cada vez mais no seu « metier ». Paradoxalmente, o grupo continua como empresa familiar no que se refere à posse das ações e à presidência do grupo185. Pelo menos por enquanto, a troca de gerações no comando da empresa não causou grandes traumas, pelo contrário, a permanência por longos anos da mesma equipe nos principais lugares de comando significou um crescimento seguro, não impedindo as inovações necessárias para crescer, inovar e manter o dinamismo empresarial. Ceval sempre foi uma empresa profissionalizada A segunda colocada no ranking da avicultura nacional seguiu caminho semelhante no que se refere à administração de seus negócios. Desde o início manteve sempre uma pessoa da família Hering, a matriz, na presidência. No entanto, as coincidências páram aí. Nenhum dos demais dirigentes da empresa fazem parte da família ou são grandes acionistas da mesma. Estes, mais que no caso da Sadia, são verdadeiros « managers » que dedicam sua carreira profissional à empresa e apostam no sucesso da mesma como forma de continuar crescendo profissionalmente. Desde 1972, quando foi fundada, a empresa teve na diretoria geral o engenheiro Vilmar de Oliveira Schürmann. A estrutura da Ceval compreende três grandes divisões: a divisão de produtos industriais, a de produtos de consumo e a de carnes. A divisão de « produtos industriais » é responsável pela movimentação anual de mais de seis milhões de toneladas de matériasprimas e produtos, além de fornecer todo o apoio às exportações. O setor coordena a compra da soja, o armazenamento, o deslocamento às indústrias, a venda dos produtos commodities nos mercados brasileiro e internacional e o transporte rodoviário, ferroviário e marítimo até os consumidores de farelos, farinhas e óleos. 184 Zoé Silveira D’Ávila, genro do fundador e vice-presidente do Conselho disse que, embora a alta administração do grupo seja familiar, dos 43 diretores executivos, apenas seis pertencem à família. « Assuntos da família ficam restritos ao Acordo de Acionistas, separados das decisões do Conselho » (revista Integração, órgão interno da FAF, São Paulo, ano 15, n° 129, março/abril/93, p. 19). 185 A família do fundador, filhos, genros e netos detém cerca de 75% das ações da Sadia. No que se refere à presidência da empresa, sempre houve um membro da família ocupando o posto. Primeiro, foi o próprio Attilio Fontana, de 1944 a 1983, que foi substituído por seu sobrinho Romano Ancelmo Fontana, de 1983 a 1987. Em seguida, assumiu o comando um genro do fundador, Zoé Silveira d’Ávila, de 1988 a 1992, quando chegou a vez da terceira geração, assumindo a presidência do Conselho de Administração Luiz Fernando Furlan, neto do fundador, em 1993. 192 A divisão « produtos de consumo » é a que proporciona maior receita para a empresa a nível de produtos de consumidor final. Aqui estão inseridos os óleos refinados, as margarinas e cremes vegetais, o azeite de oliva, os fubás e as farinhas pré-cozidas. A área de carnes « é uma atividade muito complexa, que vai desde o desenvolvimento genético, produção de animais de alta linhagem, parcerias com produtores integrados, assistência técnica, veterinária e cuidados ambientais até o desenvolvimento e adaptação de técnicas de abate, industrialização, formulações, geração de novos produtos, bem como a múltipla ação mercadológica e logística para atender ao mercado, acompanhar as tendências e posicionar-se junto às marcas e produtos líderes »186. Foi com esta estrutura administrativa e com uma forte política de investimentos e aquisições de outras empresas que a Ceval chegou em 1995 como a segunda maior empresa avícola nacional. A atuação no ramo da soja ainda é seu principal negócio, mas seus investimentos são dirigidos cada vez mais para o setor carnes e industrializados187. Perdigão e os problemas da « administração familiar » A Perdigão, ao contrário da Sadia, não soube administrar a passagem de seu principal dirigente, Saul Brandalise para os filhos. Saul foi presidente da empresa desde o final da década de 50 até o início dos anos 90, quando faleceu. A Perdigão caracterizou-se como empresa tipicamente familiar durante todo este tempo, tanto do ponto de vista da posse das ações como da ocupação dos cargos diretivos. Entretanto a passagem de uma geração à outra de dirigentes mostrou-se difícil. Os herdeiros não souberam fazer os investimentos necessários para continuar crescendo e diversificando as atividades. Em função disso, acumularam-se dificuldades administrativas e dívidas de curto prazo, que passaram a inviabilizar a empresa. Esta situação estendeu-se até 1994, quando a Perdigão foi vendida pela família Brandalise a um consórcio encabeçado pelos fundos de previdência do Banco do Brasil e da Telebrás. A partir deste momento, com auxílio de auditorias externas e do grupo Pensa da Universidade de São Paulo a empresa iniciou nova fase de reestruturação e planejamento de suas atividades. Para dirigir o conjunto de empresas foi contratado um manager que assumiu a 186 Revista da história da « Ceval Alimentos », Tem sempre um jeito de fazer melhor, Gaspar-SC, s/d, p. 32. 187 Ceval, Relatório Anual, 1995, p. 10. 193 presidência e iniciou o processo de reestruturação e de investimentos necessários para recuperar o espaço perdido no mercado. Uma das primeiras medidas foi elaborar um planejamento estratégico, que definisse os rumos para os próximos anos. Além disso, foi feita uma reestruturação organizacional, reagrupando empresas e vendendo outras que não fazem parte do « savoir-faire » do grupo188, com o objetivo de reduzir custos operacionais e aumentar a eficiência. Em novas mãos, com managers profissionais e um novo plano estratégico de curto, médio e longo prazos, a Perdigão entra novamente na rota do crescimento e na disputa para manter sua fatia tanto no mercado nacional como nas exportações. 6. A disputa pelo mercado interno O grande mercado para as empresas avícolas é o interno, pois as exportações, como veremos no último capítulo, representam cerca de 12% da produção total. Cada ponto percentual deste mercado significa portanto, milhões de toneladas, milhões de dólares e milhares de clientes. É na luta pelos percentuais deste mercado que se estabelece a verdadeira disputa entre as empresas do setor, que concorrem entre si em dois setores principais. O primeiro deles é a agregação de valor às mercadorias, o que permite um maior ganho econômico, forçando a cadeia produtiva para a elaboração da maior parte da produção em sub-produtos industrializados e semi-prontos para o consumo. O segundo é o lançamento de novos produtos para atender às constantes exigências dos consumidores. Para isto, as empresas devem investir constantemente em seus centros de pesquisa aplicada e desenvolvimento de novos produtos, assim como em marketing, para lançá-los no mercado e competir com os concorrentes. Uma boa maneira de ver o funcionamento prático desta concorrência é analizar o disputado mercado das festas de fim de ano189, um dos principais momentos de consumo, 188 A Perdigão colocou em prática um programa de alienação de bens não ligados diretamente à produção e distribuição de alimentos, que faz parte de sua reestruturação operacional e societária. A empresa Verde Vale Serviços Ltda., que explorava serviços de hotelaria em Videira-SC, foi vendida, assim como uma granja de suínos em Fraiburgo-SC e um imóvel residencial em Porto Alegre-RS. Além destes bens, outros serão colocados à venda, à medida em que avança a reestruturação (Perdigão, Relatório Anual, 1994). A Sadia, no início dos anos 90, quando de sua reestruturação procedeu de forma semelhante, vendendo empresas que não estivessem ligadas diretamente à produção e distribuição de alimentos. Foi nesta ocasião que vendeu vários imóveis urbanos, diversas fazendas, além do Hotel Alvorada, de Concórdia-SC. Para melhor investir nos setores principais na formação de seu faturamento bruto, fez, em 1993, uma joint-venture com o grupo J.Macedo, tradicional produtor e distribuidor de massas, formando a « Lapa Alimentos ». 189 Em 1995, a Sadia, a Ceval, a Perdigão, a Chapecó e a Frangosul investiram US$ 4,8 milhões para divulgar seus antigos e novos produtos de final de ano. 194 aliando as festas de natal e final de ano com o 13° salário. Cada empresa, além dos apresuntados, busca conquistar uma fatia deste mercado com um produto específico. A primeira a diferenciar-se foi a Sadia, ao lançar para estas oportunidades o peru, ainda na década de 70. Além das vendas do peru inteiro, principalmente nas festas de final de ano, de páscoa, dia das mães e dos pais, a empresa lançou novos sub-produtos de carne de peru190 para que seu consumo atingisse outros clientes especiais e acontecesse durante todo o ano, barateando assim os custos de estocagem. Para o Natal de 1995 a Sadia colocou no mercado interno 16,8 mil toneladas de peru191, assim como novos produtos da linha Fiesta, desenvolvidos a partir de um frango especial, maior que os outros, para disputar mercado com os « frangões » das concorrentes. Resultado dos investimentos em tecnologia e em inovações organizacionais, especialmente colocadas em prática pelo esforço da implantação da TQS, os produtos de final de ano foram vendidos ao mesmo preço do ano anterior, « devido aos ganhos em produtividade ». A Perdigão foi a primeira empresa que investiu num produto concorrente, lançando em 1982 o Chester, um frango grande, que tem 70% de carne no peito e nas coxas. Para desenvolver este produto, foi importada tecnologia norte-americana e investidos três anos de pesquisa aplicada para adaptar a linhagem genética às condições de produção local. Para o Natal de 95 a empresa produziu 4 milhões destas aves buscando manter sua fatia neste mercado. As demais empresas entraram nesta disputa com os « superfrangos ». A Ceval colocou à venda três mil toneladas da ave Classy, volume equivalente a 690 mil aves. A Classy é uma ave geneticamente melhorada, com mais carne na coxa e no peito, lançada pela Ceval em 1993, cujas « avós » são importadas dos Estados Unidos. A Frangosul lançou em 1994 o Bruster, um superfrango com características semelhantes ao da Ceval e ao da Perdigão, cujas « avós » são importadas da Escócia192. Para este natal a empresa vendeu três mil toneladas, 190 O principal destes lançamentos foi a linha Califórnia, com diferentes apresentações de produtos oriundos do peito e da coxa de peru. Estes produtos são elaborados a partir de unidade industrial estabelecida em Chapecó, ao lado do abatedouro de perus da Sadia, que era o único do Brasil até entrar em funcionamento o segundo abatedouro da mesma empresa, no sudoeste do Paraná, em junho de 1996. Depois disso, vários outros subprodutos de peru foram lançados ao mercado. Para o Natal de 95 a Sadia lançou o « peito temperado de peru ». 191 Os dados sobre a produção para final de ano das diversas empresas foram tirados da matéria « Guerra do Natal traz 9 milhões de aves », in: Jornal Folha de S.Paulo, São Paulo, 21 de novembro de 1995. 192 O Bruster, resultado de um investimento de US$ 2,5 milhões e três anos de pesquisa, é uma ave com maior volume de carnes nobres, peito e coxas, com baixo teor de gordura e altas taxas de proteínas. Abatido aos 60 dias, com peso médio de três quilos, o desenvolvimento desta ave exigiu a importação de tecnologia, a implantação de novas granjas de matrizes, parceria com integrados para a criação e adaptação da linha de produção do frigorífico (Frangosul 25 anos « Muito mais que frango », Montenegro-RS, 1994, p. 11). 195 obtidas do abate de um milhão de aves. A Chapecó, por sua vez, lançou em 1995, o Frangão, ave temperada com peso entre 2,8 e 3,6 quilos, buscando disputar com as grandes do setor este mercado especial. Com esta mesma intenção, a Da Granja lançou o Frangosnoff. Quanto à estratégia de agregar mais valor às mercadorias, a disputa também é grande entre as maiores indústrias do setor193. A Perdigão, sob nova direção, investiu todas suas cartas nesta diversificação, chegando em 1995 a destinar 70% da linha de carnes a cortes e industrializados. Esta porcentagem era de 40% dois anos antes. A Ceval segue caminho semelhante, destinando 50% das aves a cortes e industrialização. A Sadia investe na mesma direção, mas com uma desvantagem em relação às duas outras, pois em 1995 destinava 37% de sua produção de aves para cortes e industrializados194, concentrando ultimamante, entretanto, sua maior parte de investimentos neste setor. Quanto aos demais grupos avícolas que buscam competir para disputar fatias do mercado interno, fazem um caminho semelhante, especializando-se cada vez mais em cortes de frango e em produtos semi-preparados, de maior valor agregado. Outra forma de mensurar a disputa pelo mercado interno é analizar a porcentagem da produção SIF dos principais grupos avícolas. Se forem analisados os dados das quatro maiores empresas, veremos que houve uma progressão de 29,87 para 48,70% entre 1980 e 1990. Entretanto, sua participação caiu nos últimos cinco anos, situando-se em 43,82% em 1995. Se a análise estender-se às 20 maiores empresas, veremos que houve um crescimento constante entre 1980 e 1995, quando a percentagem passou de 47,42 para 81,48%, o que demonstra a capacidade de reação das « imitadoras » e das pequenas empresas. TABELA 15 - PARTICIPAÇÃO PERCENTUAL DAS PRINCIPAIS EMPRESAS NO ABATE SIF NACIONAL DE FRANGOS - 1980, 1985, 1990, 1995 (em %) Estratificação/Ano 4 maiores 1980 29,87 1985 48,47 1990 48,70 1995 43,82 193 Agregada a esta estratégia está a localização geográfica das principais usinas de produção de industrializados. A Sadia tem pautado sua produção levando em conta dois pontos estratégicos: a proximidade com as fontes de suprimento da matéria-prima e a localização e acesso ao mercado consumidor. Assim a industrialização de carne suína está em grande parte no Sul do país, região tradicional nessa atividade, facilitando a obtenção pela empresa de maior volume de suínos para abate. Da mesma forma, regiões tradicionais de criação de bovinos, como Várzea Grande-MT, Andradina-SP, absorvem unidades industriais dedicadas à produção de carnes bovinas industrializadas, para o mercado externo, onde estão localizadas a Sadia Oeste e as Inústrias Mouran. Por fim, os hábitos de consumo da região metropolitana de São Paulo, bem como o contingente expressivo de consumidores urbanos e seu nível de renda elevado explicam a presença, na capital paulista, da mais importante unidade do grupo, dedicada aos congelados semi-prontos, a Frigobrás-SP. Já o Rio de Janeiro, segundo mercado mais importante do país, tem também uma fábrica de industrializados, dedicada à produção de lingüiças, salsichas e defumados, a fim de facilitar a atuação da empresa no mercado do Grande Rio (Sadia, Reltório Anual, 1990, pp. 20-21). 194 « Guerra do Natal traz nove milhões de aves », in: jornal Folha de S. Paulo, 21/12/95. 196 8 maiores 37,55 58,48 64,44 65,10 20 maiores 47,42 73,87 80,47 81,48 Demais 52,58 26,12 19,53 18,52 100,00 100,00 100,00 100,00 Total abate 20 maiores* 56.192.025 565.120.826 838.529.731 1.360.224.551 Total abate SIF Brasil* 537.643.912 764.941.372 1.042.056.288 1.670.255.415 Total * Em número de cabeças abatidas. Fonte: ANAB - Associação Nacional dos Abatedouros Avícolas. É preciso lembrar, no entanto, que em 1995 os abates sem SIF representaram 34,23% do total do país. Se considerarmos a participação dos 20 maiores grupos sobre o total abatido, sua percentagem cai para 53,56%. Isto significa que, mesmo havendo grandes empresas, existe ainda cerca da metade do mercado nacional sendo disputado por médias e pequenas. 7. Estados do Sul e São Paulo lideram produção avícola Antes da produção industrial, como vimos no capítulo três, a avicultura concentrava-se em São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais. A industrialização da produção significou também mudança entre as principais empresas e os maiores estados produtores. Quanto aos estados tradicionais, somente São Paulo manteve-se entre os principais produtores, mesmo assim perdendo sua liderança para Santa Catarina. Isto só aconteceu quando o sistema de produção vertical implantado no Sul estava consolidado e plenamente funcionando. Em 1980 São Paulo ainda era o maior produtor, com 196 milhões de cabeças, enquanto Santa Catarina abatia 137 milhões. Já em 1985 a liderança estava com Santa Catarina que abateu 264 milhões de cabeças enquanto São Paulo passou para segundo plano, com 170 milhões195. Este deslocamento da produção de São Paulo em direção ao Sul aconteceu fundamentalmente em função da principal mudança organizacional introduzida pelas empresas do Sul, que foi a integração vertical na produção. O fato de ter implantado os contratos de parceria com os agricultores integrados, combinado aos ganhos de economia de escala nas demais etapas do processo produtivo, aliados à bem montada logística de distribuição em todo território nacional, deu vantagens significativas às empresas estabelecidas no Sul. 195 Dados coletados no MAARA, em São Paulo e na Secretaria da Agricultura de Santa Catarina, durante a pesquisa de campo, abril e maio de 1995. 197 Outro fator que contribuiu para isto foi a economia de escala conseguida à partir do tamanho ideal dos abatedouros. Se analisarmos o total de empresas e de abatedouros em cada um dos quatro principais estados produtores, veremos que houve uma forte diferença entre os três do Sul e São Paulo. Os abatedouros do Sul otimizaram as vantagens de escala aproveitando melhor sua capacidade instalada. Enquanto o volume produzido é praticamente o mesmo nos quatro estados, Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Paraná fazem seus abates a partir de 14, 11 e 13 plantas industrias respectivamente, enquanto São Paulo tinha 46 estabelecimentos em 1994, mostrando uma produção diluída em grande quantidade de pequenas empresas. TABELA 16 - NÚMERO DE ABATEDOUROS COM SIF E NÚMERO DE EMPRESAS NOS QUATRO MAIORES ESTADOS PRODUTORES AVÍCOLAS NACIONAIS - 1980, 1990, 1994. Abated./Emp. Anos N° abatedouros N° empresas RS SC PR SP 1980 1990 1994 1980 1990 1994 1980 1990 1994 1980 1990 1994 12 12 14 11 10 11 8 11 13 48 46 46 9 8 8 9 6 6 8 9 11 48 45 45 Fonte: Elaboração própria a partir da pesquisa de campo. É preciso ressaltar que as empresas do Sul também estabeleceram-se em São Paulo. O maior dos abatedouros pertence à Sadia (8,12% do SIF estadual em 1994), enquanto a maior empresa abatedoura era, neste mesmo ano, a Ceval (9,52% do SIF total), sendo a única que atuava com dois estabelecimentos neste estado. Além destas duas, a Perdigão, a Chapecó e a Pena Branca, todas entre as dez maiores nacionais, têm abatedouros em São Paulo. As indústrias paulistas, além de não atingirem a economia de escala dos principais abatedouros do Sul, também não implantaram a integração vertical, o que lhes dá menor competitividade em relação às concorrentes196. Ainda como resultado desta baixa produção, não conseguem competir com as concorrentes no mercado nacional, limitando sua atuação no mercado regional. A médio e longo prazo isto significa que tais empresas serão prejudicadas, pois além de não aproveitarem os subsídos oferecidos pelos governos dos demais estados para se implantarem com outras plantas industriais, não conseguem disputar o mercado das demais regiões do país e nem enfrentar as concorrentes nas exportações. Através dos mapas 1 a 3 podemos observar a evolução histórica da produção na região Sul e em de São Paulo. Nota-se um forte aumento da produção e uma continuidade sempre 198 nas mesmas regiões de cada estado. Mais adiante, no mapa n° 4 podemos constatar a coincidência entre os maiores municípios produtores e a presença dos abatedouros das seis maiores empresas avícolas. 196 Não é o caso dos abatedouros controlados pela Sadia, Ceval, Perdigão e Chapecó que, ao se instalarem no estado, implantaram também a integração vertical, ganhando em economia de escala em cada uma das etapas do processo produtivo. 199 Mapa 1 - Região Sul Evolução da produção de frangos (em mil cabeças) Fonte: Elaboração própria a partir da pesquisa de campo e dos dados das empresas. 200 Mapa 2 - Região Sul Evolução da produção de frangos (em mil cabeças) Fonte: Elaboração própria a partir da pesquisa de campo e dos dados das empresas. 201 Mapa 3 - São Paulo Evolução da produção de frangos (em mil cabeças) Fonte: Elaboração própria a partir da pesquisa de campo e dos dados das empresas. Fruto da integração vertical e da diversificação para outros setores, especialmente suínos e soja, atividades complementares e auxiliares à avícola, as empresas integradas do Sul se impuseram também em outras regiões e dominaram o mercado nacional (tabela 17). Entre os 20 maiores grupos nacionais, encontram-se quatro paulistas, entretanto, não tem nenhum entre os dez primeiros colocados e só têm uma planta industrial no próprio estado. Isto, além de limitar seu raio de ação, dificulta-lhes o acesso ao processo de integração vertical, originário e mais implantado no Sul e, de outro lado, dificulta-lhes o acesso ao mercado nacional, quando por falta de produtos, não viabiliza uma rede própria de distribuição para atender as demais regiões. TABELA 17 - AS 20 MAIORES EMPRESAS DE ABATE DE AVES NO BRASIL - 1995 Ordem Empresa/Estado Aves % SIF % Total 01 Sadia SC PR SP MT 323.719.000 19,38 12,75 02 Ceval SC PR SP MS 146.751.926 8,78 5,79 03 Perdigão SC RS SP 146.018.351 8,74 5,75 202 Sub-Total 616.489.277 36,90 24,29 04 Avipal RS MS 115.636.896 6,92 4,55 05 Frangosul RS 113.962.704 6,82 4,49 06 Chapecó SC PR SP 89.487.460 5,35 3,52 07 Pena Branca RS SP PA MA PE 82.118.762 4,92 3,23 08 Da Granja PR MG 69.910.173 4,19 2,75 09 Minuano RS 35.384.499 2,19 1,39 10 Aurora SC 33.754.206 2,02 1,33 Sub-Total 1.156.743.977 69,31 45,55 11 Copacol PR 30.969.028 1,87 1,22 12 Batavo PR 27.397.252 1,64 1,08 13 Pif Paf MG 27.084.859 1,62 1,07 14 Sertanejo SP 26.649.376 1,59 1,05 15 Só Frango DF 19.645.495 1,18 0,77 16 Coroaves PR 15.441.116 0,92 0,61 17 Comaves PR MS 14.780.592 0,88 0,58 18 Coperguaçu SP 14.346.569 0,86 0,56 19 Holambra SP 13.596.441 0,81 0,54 20 Maristela SP 13.569.846 0,80 0,53 Sub-Total 1.360.224.551 81,48 53,56 Outras 1.179.475.590 18,52 46,44 Com SIF 1.670.255.415 65,77 2.592.390 t. Sem SIF 869.444.726 34,23 1.458.059 t. TOTAL 2.539.700.141 100 4.050.449 t. Fonte: ANAB - Associação Nacional dos Abatedouros Avícolas. Quanto ao estado de Minas Gerais, que era grande produtor antes da avicultura industrial, perdeu sua importância, se comparado com estes quatro acima mencionados. As empresas instaladas naquele estado, são pequenas e não têm abatedouros em outras unidades da federação, com exceção da Da Granja, que tem sua sede no Paraná e outro abatedor em Minas. Em 1994 existiam naquele estado 15 empresas com SIF que abateram 73,6 milhões de aves, o que não representa mais que 4,7% dos abates nacionais197. 197 Dados levantados junto à AVIMIG - Associação dos Avicultores de Minas Gerais, durante a pesquisa de campo, março de 1996. O abatedouro da Da Granja foi responsável, em 1994, por 22,7% dos abates SIF estaduais, sendo o segundo maior do estado. 203 Em 1995 os estados do Sul abateram 64,84% do total SIF nacional (RS, 20,26; SC, 23,36; PR, 21,24). Se acrescentarmos os 21,81% de abates paulistas, teremos um total de 86,67 por cento198. Portanto, a avicultura nacional está firmemente instalada nos estados do Sul e São Paulo. Esta realidade deverá mudar quando estiverem em funcionamento as novas unidades abatedouras das empresas do Sul que estão se implantando nos estados do Centro-Oeste e Nordeste. Entretanto, a maior parte da produção continuará saindo do Sul, pelas facilidades de produção locais (matéria-prima para rações, clima temperado, grande número de agricultores com savoir-faire na produção de pequenos animais, experiência acumulada das empresas, processo de integração vertical bem implantado). Além disso, com a abertura do Mercosul, é vantajoso para as empresas que exportam para outros países do cone sul estarem implantadas nas regiões mais próximas a este mercado. Analisando a localização geográfica dos abatedouros das seis maiores empresas do país podemos ter uma idéia mais precisa da importância destes estados e da estratégia adotada por tais grupos industriais. Dentre eles, só um, a Frangosul mantém sua atuação restrita ao estado do Rio Grande do Sul, enquanto os outros buscam expandir suas unidades industriais para diferentes regiões, na estratégia de melhor atender às demandas do mercado nacional. 198 Informativo da Associação Nacional dos Abatedouros Avícolas, Informanab, São Paulo, ano XIX, n° 509, janeiro/96, p. 6. 204 Mapa 4 - Localização dos abatedouros das seis maiores empresas avícolas - 1995 Fonte: Elaboração própria a partir dos dados das empresas e da pesquisa de campo. 205 8. Grupos avícolas implantam a Qualidade Total « A filosofia da Sadia, desde os tempos de Attilio Fontana sempre privilegiou a qualidade, as pessoas e o trabalho em equipe », disse o presidente do Conselho Superior de Administração199. Foi na reestruturação do grupo do início dos anos 90 que decidiu-se envolver todos os dirigentes e funcionários da empresa no processo TQC - Total Quality Control, que passou a chamar-se TQS - Total Qualidade Sadia, dentro da empresa. A trajetória da TQS na Sadia iniciou em 1990, quando alguns produtos da empresa apresentavam problemas de conformidade ou identificação padronizada de tamanho, que precisavam ser solucionados. Nesta mesma época a Sadia recebeu a visita do professor Fred Benoff, da Universidade da Georgia, Estados Unidos, que entre outras coisas, falou com os dirigentes da empresa sobre as técnicas e os processos da qualidade total na produção industrial. Para levar adiante a idéia, os diretores da Sadia entraram em contato com a Escola de Engenharia da Fundação Christiano Ottoni, ligada à Universidade Federal de Minas Gerais. Com assessoria do consultor Vicente Falconi, ligado a tal fundação, a Sadia estabeleceu um Programa de Qualidade Total que foi implantado na empresa a partir de março de 1992. Para colocar em prática o TQS a empresa iniciou pelo treinamento de todos os conselheiros, membros da Executiva e Diretores no Japão e, dos gerentes e chefes de departamento na Fundação Christiano Ottoni. As demais pessoas tanto os funcionários das indústrias como os das filiais comerciais, foram treinadas em seminários internos administrados por assessores da Fundação Christiano Ottoni e por técnicos japoneses que vêm regularmente dar cursos sobre temas específicos da TQC. O programa começou a ser implantado pela unidade industrial de Chapecó-SC, em 1992, de onde se expandiu para as demais indústrias e filiais comerciais. Começando pelos dirigentes, passou a formar todos os demais funcionários de cada unidade, até chegar aos fornecedores de matéria prima. « A próxima etapa do programa de qualidade da Sadia deverá envolver os 18.000 criadores de frangos, porcos e perus que fornecem matéria-prima para os frigoríficos da empresa »200. 199 Revista Integração, Órgão interno da FAF, São Paulo, Edição especial 50 anos, junho de 1994, p. 29. 200 Revista Integração, Órgão interno da FAF, São Paulo, ano 15, n° 135, Mar-Abr/94, p. 10. 206 A Sadia começou a colher os resultados deste esforço de implantação do processo de qualidade total e do investimento realizado201. Em dezembro de 1995, o abatedouro de Chapecó-SC recebeu da BVQI (Bureau Veritas Quality International) do Brasil o certificado de aprovação, tornando-se o primeiro frigorífico do Brasil a obter a ISO 9001202. Outra forma de perceber os resultados alcançados pelo desenvolvimento do TQS é o rendimento bruto por funcionário da empresa. Implantando o programa, a Sadia diminuiu o número de funcionários, aumentou a produção, a produtividade e o rendimento por empregado, como podemos ver pela tabela abaixo. Entre os anos de 1993 e 94, a receita operacional bruta cresceu 61,57%, entre outros fatores, também como resultado dos investimentos e da implantação do plano de qualidade total. TABELA 18 - RECEITA BRUTA E LUCRO POR FUNCIONÁRIO NA SADIA - 1990-1995 Itens/Anos 1990 1991 1992 1993 1994 1995 Receita operacional bruta* 1.503 1.419 1.638 1.714 2.784 2.904 Lucro líquido** 29.538 45.830 28.834 39.856 65.929 110.564 N° funcionários 31.912 33.928 35.625 32.475 32.357 32.767 47,1 41,8 46,0 52,8 86,0 88,6 Receita bruta/funcionário** * em milhões de dólares ** em mil dólares. Fonte: Sadia, Relatórios Anuais, 1990-1995. As outras empresas do setor avícola estão implantando programas semelhantes ao desenvolvido pela Sadia. A Ceval, desde o início da década de 90 vem adotando programa de qualidade total, chamado PQTC- Programa de Qualidade Total da Ceval203. A Perdigão, sob nova direção, implantou a partir de 1994, o Programa de Qualidade Total, que faz parte da 201 « Iniciado em 1990, o TQS - Total Qualidade Sadia, absorveu em 1995, recursos da ordem de US$ 7 milhões para treinamento de 22 mil funcionários. Neste ano foram realizados 1.050 eventos, cujos resultados se reproduzem no aumento global da produção e ganhos gerais de qualidade e produtividade, de custos das operações produtivas e de aprimoramento do atendimento aos clientes » (Sadia, Relatório Anual, 1995, p. 20). 202 A ISO - International Organization of Standardization, organismo das Nações Unidas, foi criado em 1987, para a Normatização da Qualidade, com sede em Genebra, na Suiça. As normas da ISO-9000 são adotadas atualmente por cerca de 100 países, com setenta mil empresas credenciadas, dentre as quais estão aproximadamente mil empresas brasileiras. A ISO visa estabelecer padrões internacionais de sistemas de qualidade para desenvolvimento, produção, instalação, assistência técnica e prestação de serviços nos mais diferentes segmentos da economia (Revista Integração, Órgão interno da FAF, São Paulo, n° 146, JanFev/1996, pp. 6-8). 203 Para maiores detalhes sobre os investimentos da empresa feitos no setor de TQC, do número de funcionários envolvidos, quantidade de problemas identificados e resolvidos, situação de implantação do programa nas unidades industriais e filiais comerciais, ver as duas revistas internas da empresa Ceval Notícias, Órgão de divulgação dos empregados de Ceval, revista mensal e Linha Direta, Órgão de comunicação do marketing, vendas e clientes da Ceval, revista mensal que, a partir de início dos anos 90 trazem matérias referentes ao assunto. 207 reestruturação da empresa, na busca de maior produtividade e qualidade dos produtos. Quanto às demais empresas do setor instaladas no Sul do país, todas estão implantando programas semelhantes para manterem-se competitivas e continuarem a disputar o mercado com as líderes. 208 CAPÍTULO 7 EMPRESAS DO SUL CONSOLIDAM A INTEGRAÇÃO VERTICAL Nos últimos 20 anos, as empresas instaladas no Sul do país consolidaram a integração vertical que teve início na década de 60 e expandiu-se nos anos 70. Durante este tempo, várias pequenas inovações organizacionais foram introduzidas ao longo da cadeia produtiva, na maior parte das vezes acompanhadas das melhores tecnologias desenvolvidas no mercado internacional. Outro aspecto a observar é que esta nova forma de organização da produção foi se expandindo para outras regiões do país, inclusive em São Paulo, tradicional estado onde havia uma articulação entre as empresas das diferentes etapas do processo produtivo, mais do que uma integração vertical. Neste caso, além da instalação de filiais das maiores empresas do Sul, trazendo consigo a integração vertical, algumas empresas tradicionais do estado passaram a adotar tal sistema de produção, pelas vantagens que lhe são inerentes. O fato das empresas estabelecerem contratos de parceria avícola com agricultores integrados é um dos principais componentes de sua competitividade. Atualmente, já contando com duas gerações de produtores integrados, com um savoir-faire acumulado, não se entende mais avicultura industrial sem a participação fundamental deste setor. Analisaremos, em seguida, as principais etapas da integração vertical e a forma como foram consolidadas pelas maiores empresas do setor. 1. Pesquisa aplicada em genética e primeiras linhagens nacionais Mesmo sendo ainda dependente de importações genéticas de empresas estrangeiras, o Brasil já realizou bons avanços em pesquisa no setor. Existem instituições públicas com uma razoável estrutura montada e, sobretudo, com técnicos altamente capacitados para levar 209 adiante experiências genéticas. Além disso, as principais agroindústrias também mantêm importantes centros de pesquisa aplicada, com savoir-faire, técnicos e condições de adaptar as linhagens compradas no exterior, mas também, caso seja necessário, de desenvolver em conjunto com as empresas públicas, linhagens próprias para aves de corte e de postura. No caso das entidades públicas, a mais importante é o Centro Nacional de Pesquisa de Suínos e de Aves - CNPSA, que começou seus trabalhos de melhoramento em 1983, objetivando a formação e seleção de linhagens comerciais para a produção de carne. Em 1985, com a aquisição da Granja Guanabara, de Piraí-RJ pelo Ministério da Agricultura e posterior repasse à Embrapa, o Cnpsa passou a dispor do material genético desenvolvido pela referida empresa, composto de duas linhagens para ovos brancos, três para ovos castanhos e duas para frango de corte, que foi incorporado ao programa de melhoramento204. Em setembro de 1989 aconteceu em Belo Horizonte-MG, o Primeiro Simpósio de Avaliação do Programa de Ciência e Tecnologia em Produção Animal, onde as diversas instituições de pesquisa em genética aplicada à avicultura apresentaram seus resultados. Estiveram presentes em tal simpósio a Embrapa, com seus resultados conseguidos em aves de corte e postura; a Esalq, com suas linhagens de corte; a Universidade Federal de Viçosa-MG, que pesquisa aves de corte e postura; a Universidade Federal de Santa Maria, com seus trabalhos em aves de postura e o Instituto de Zootecnia-SP, que também conduz pesquisas para aves de postura. Todas estas instituições públicas desenvolviam pesquisas, conforme suas infra-estruturas e pessoal. As universidades, mais que buscar linhagens próprias para competir com o material genético importado, tinham seus objetivos voltados para a formação de mão-de-obra especializada, sobretudo formando engenheiros nos diferentes campos da ciência, como especializando técnicos em pesquisa, especialmente através dos cursos de mestrado. Os resultados das diversas instituições presentes no simpósio demonstraram claramente o avanço conseguido nos últimos anos com relação ao desempenho das linhagens comerciais desenvolvidas e a geração de tecnologia na área. Outra conclusão do simpósio foi a necessidade de o Estado continuar investindo recursos para manter ou ampliar as instituições existentes para poder viabilizar linhagens genéticas que possam competir com as importadas. 204 As informações sobre o desenvolvimento da pesquisa genética no Brasil foram tiradas do artigo « Linhagens avícolas brasileiras », de Gilberto Silber Schmidt e Valdir Silveira de Ávila, pesquisadores da EmbrapaCnpsa, in: Sociedade Brasileira de Zootecnia (1990), Avicultura, FEALQ, Piracicaba, SP, pp. 31-36. 210 Entre os institutos de pesquisa, o Centro Nacional de Pesquisa de Suínos e Aves, ligado à Embrapa de Concórdia -SC é o que mais tem infra-estrutura, pessoal capacitado e experiência acumulada para desenvolver pesquisa genética, tanto em frango de corte como em aves de postura. Seu programa mantinha, em 1992, quatro linhagens para corte, sendo duas linhas macho e duas linhas fêmea e cinco para postura, duas para ovos brancos e três para ovos castanhos. Nesta época, os resultados « in laboratório » demonstravam a competitividade do frango da Embrapa, sobretudo analisando os testes de desempenho da matriz e do frango de corte. Entretanto, nesta mesma época, as grandes indústrias de frango estabelecidas no oeste catarinense introduziram uma nova linhagem de frango de corte (sempre importada das multinacionais), mais competitiva e melhor adaptada às condições de produção regionais, revelando que os esforços dispendidos pelos institutos públicos com o objetivo de manter a competitividade em relação a uma linha comercial, amplamente utilizada, não foram suficientes. Diante deste fato novo a equipe de pesquisa do Cnpsa percebeu a fragilidade de seu programa e que deveria manter, de maneira similar às multinacionais, várias populações sendo selecionadas através de diferentes metodologias e propósitos. « Em linhas gerais podese considerar que os programas de melhoramento em andamento no país são simplistas e ingênuos para atingir o objetivo principal, ou seja, o desenvolvimento de linhagens nacionais de aves para corte e/ou postura »205. Segundo os autores e pesquisadores do Cnpsa deveria haver uma reavaliação dos objetivos das entidades oficiais de pesquisa. Os objetivos das principais instituições ao serem fundadas eram a redução da dependência externa; o treinamento de recursos humanos, evitar a evasão de divisas com a importação de « avós » e; a segurança nacional. Com as mudanças ocorridas nas relações político-econômicas internacionais, estes objetivos deveriam evoluir para uma maior participação entre as instituições públicas e as empresas privadas, onde « as instituições oficiais devem trocar o papel de concorrente pelo de contribuidoras, o mesmo ocorrendo com a visão da iniciativa privada ». Apesar das dificuldades, sobretudo em recursos financeiros e humanos, cada vez mais escassos, o Cnpsa lançou duas linhagens para frango de corte em 1996, sendo uma especial para frango inteiro e outra voltada para cortes de frango. Entretanto, por não dispor de um serviço de marketing competitivo como o das multinacionais e não contar com serviço de 205 Gilberto Silber Schmidt, Mônica Corrêa Ledur e Elsio Antonio Pereira de Figueiredo (1993), « Melhoramento genético de aves no Brasil: resultados obtidos nas instituições oficiais de pesquisa », in: Anais, Apinco, Facta, SP, p. 14. 211 assistência pós-venda, as possibilidades de ocupar o mercado nacional são muito remotas. De acordo com as informações do Serviço de Divulgação da empresa206 ela tem potencial para atingir um por cento do mercado, sobretudo fazendo convênios com as cooperativas que atuam na avicultura. De acordo com o mesmo entrevistado, a única empresa privada nacional que mantém um centro de pesquisas aplicadas com capacidade para desenvolver uma linhagem própria de frangos é a Sadia. Neste mesmo ano ela havia divulgado a informação que estaria lançando uma linhagem para frango de corte. Após análises de mercado, a Sadia resolveu não fazer mais tal lançamento. Entretanto, de novo segundo informações do mesmo entrevistado, tal empresa estaria produzindo parte de suas matrizes (cerca de 40%) a partir de linhagens próprias, desenvolvidas no seu centro de pesquisas aplicadas de Faxinal dos Guedes-SC207. A Sadia iniciou pesquisas próprias no final dos anos 70, através de sua empresa Sadia Agropastoril Ltda., nos vários estados do país, na área de suínos, perus, aves de corte e postura, bovinocultura, soja e milho. Para tornar mais eficaz o sistema, dividiu seus investimentos, cabendo ao estado de Goiás as pesquisas e desenvolvimento de tecnologias na área de bovinos de corte e ao Paraná as pesquisas para o setor de aves de corte e postura. Todavia, é importante ressaltar que este trabalho de pesquisa está mais centrado na avaliação da performance agrícola e industrial de um conjunto de materiais genéticos do que propriamente pesquisa básica no sentido de produzir novas linhagens de aves. Em genética de aves, o que a empresa pesquisa, é desenvolvido a partir da Sadia Agropastoril de Fachinal dos Guedes, em Santa Catarina (Teixeira, 1994). As atividades de pesquisa em perus são feitas pela Sadia Agropastoril Ltda., através de uma « joint-venture » com a Hybrid Canadense. Esta atividade vem associada com a introdução do peru, uma nova diversificação na produção de carnes. Suas pesquisas, realizadas sobretudo através de cruzamentos, visam a obtenção de linhagens de peru mais adequadas às condições de produção no oeste catarinense. A partir desta atividade, o grupo passou a dominar a pesquisa em melhoramento genético o que lhe permitiu, além de produzir 206 Entrevista com o diretor do Serviço de Divulgação da Embrapa, Concórdia-SC, 21 de março de 1996. 207 A Sadia Agropastoril Catarinense foi fundada ainda na década de 70, com a finalidade de realizar pesquisas aplicadas na adaptação das linhagens de frangos, perus e patos às condições de produção locais, levando em conta sobretudo o clima temperado do Sul do país. Foi também neste centro que se desenvolveram pesquisas no setor de suínos, onde obteve-se o Hiper Sadia, com o qual a empresa livrou-se das importações e, foram realizadas inúmeras pesquisas nos setores de milho híbrido e de soja. A última novidade foi no setor da bovinocultura, quando a Agropastoril conseguiu, em julho de 1991, obter os primeiros resultados na transferência de embriões bovinos (revista Integração, órgão interno da FAF, São Paulo, ano 15, n° 129, marabr/93, p. 10). 212 matrizes para o seu próprio sistema de integração, fornecer para o mercado interno e exportar para outros países da América Latina. O Brasil é o segundo maior produtor mundial de frangos, representando portanto, um forte mercado para ser disputado pelas maiores empresas multinacionais que desenvolvem pesquisa genética no setor avícola. No que se refere ao frango de corte, nomes como Hubbard, Ross, Arbor Acres, Cobb, Isa, Hy-Line e Lohmann jão são bastante conhecidos. Com o fortalecimento da avicultura nestes últimos anos, novos concorrentes vieram se somar a estes tradicionais fornecedores. Em 1994 a Planalto (Uberlândia-MG) firmou uma parceria com a norte-americana Avian Farms para representar a marca com exclusividade no Brasil e sua expectativa era de atingir, em poucos anos, a marca de 5 a 6% das reprodutoras de corte208. Durante a pesquisa de campo, realizada em 1995 e 1996, todos os dirigentes de empresas entrevistados disseram ter um centro de pesquisas aplicadas, sobretudo para adaptar as linhagens importadas ao clima e às condições de produção locais, para testes de rações e resistência às doenças. Em casos especiais, como para o lançamento do chester pela Perdigão e do classy, pela Ceval, foi importado o « pacote tecnológico pronto » do estrangeiro. Todos os empresários entrevistados acham que o mercado é muito pequeno, os investimentos muito elevados e, portanto, não vale a pena desenvolver pesquisa genética básica para desenvolver uma linhagem própria de frango. « As importações de « avós » feitas pelo país em 1994 não atingiram US$ 20 milhões, enquanto as exportações de frango representaram US$ 588 milhões. Então, o valor das importações é relativamente pequeno para que as empresas invistam em pesquisa genética »209. Segundo pesquisadores do assunto, na área da genética avícola, as principais transformações já foram realizadas. De agora em diante acontecerão melhorias sobretudo em ganhos de peso e de qualidade da carne, mas sem grandes e bruscas mudanças. Conforme dados de pesquisas norte-americanas, « até o século XXI faremos o seguinte progresso por geração em algumas das características mais importantes: haverá uma melhoria de cerca de 70 208 Em Rio Claro-SP funciona a produção de matrizes de corte da Agroceres, em parceria com a Ross Breeders e outras empresas buscam disputar este mercado, como a Indian River. Todas elas disputam o mercado de compradores independentes de matrizes e de pintos de um dia. As maiores empresas mantêm seus próprios matrizeiros e incubatórios, fazendo contratos de importação com diferentes linhagens. A Sadia trabalha com a Arbor Acres, a Pilch e a Ross; a Ceval com a Ross; a Perdigão com a Cobb; a Pena Branca com a Arbor Acres; A Avipal tem matrizes de diversas linhagens (50% da Ross e os outros 50% da Hubbard, Arbor Acres e Isa Vedette). 209 Entrevista com o presidente da UBA e diretor da Frangosul, Montenegro-RS, 27 de abril de 1995. 213 gramas de peso e 20 gramas menos de ração por quilo; o rendimento de carcaça melhorará em cerca de 0,10% e o da carne desossada de peito em cerca de 0,15% por geração »210. 2. Infra estrutura de produção de pintos de corte Quando se deu a passagem da produção avícola artesanal para a industrial, ocorreram duas situações distintas no país. De um lado, os estados tradicionais onde as empresas que já produziam pintos para o mercado, cresceram junto com a maior demanda do setor, o que ocorreu sobretudo em São Paulo e Minas Gerais. De outro lado, as indústrias que viram na avicultura uma forma de diversificar suas atividades, fizeram-no construindo seus próprios matrizeiros e incubatórios, tornando-se autosuficientes na produção de pintos de corte. A Sadia deu continuidade ao processo de implantação de matrizeiros e incubatórios iniciado em Concórdia, ainda na primeira metade da década de 50 quando construiu a « Granja Santa Luzia », para testar a produção avícola com galinhas da raça New Hampshire. O avanço no setor deu-se dez anos mais tarde quando Ivo Reich voltou de uma viagem aos Estados Unidos e convenceu os diretores da empresa a implantar a « avicultura integrada », seguindo o modelo norte-americano. Para implantá-lo, « a Sadia ampliou os incubatórios, aumentou a produção de pintos de um dia e dinamizou seu Departamento de Fomento Agropecuário » (Teixeira, 1994, p. 47), aumentando a capacidade dos incubatórios de acordo com o crescimento da produção de frangos. Na medida em que instalou novos abatedouros em outras regiões e estados voltou a repetir a mesma experiência, estendendo-a inclusive, para outras aves, como foi o caso da produção de perus em Chapecó-SC e de patos em Dois Vizinhos-PR. O segundo matrizeiro e incubatório foi implantado em Chapecó, quando a Sadia decidiu diversificar sua atividade entrando no setor de perus. Para tanto, construiu um novo abatedouro próprio para abate destas aves, fazendo uma « joint-venture » com a Hybrid Canadense e produzindo os peruzinhos em seu próprio incubatório, além de tornar-se a representante de tal empresa para vendê-los em toda a América Latina. Em 1995 a Sadia abateu 13,4 milhões de perus, saídos de seus próprios incubatórios. Entretanto, no início o consumo de perus era pequeno e a Sadia, para viabilizar o investimento feito no abatedouro, implantou também nórias especiais 210 Dr. Ira Carter, diretor de pesquisas da Hubbard Farms, em palestra sobre « Melhoramento Genético da Ave de Corte para o Século XXI », durante o XIII Congresso Brasileiro de Avicultura, in: revista Aves & Ovos, APA, São Paulo, ano IX, n° 9, agosto de 1993, p. 42. 214 para abate de frangos, implantando para isto, também novos matrizeiros e incubatórios, a exemplo do que já havia feito em Concórdia (Teixeira, 1994). Quando a empresa decidiu implantar-se em outros estados, repetiu novamente esta experiência bem sucedida em Santa Catarina. Em 1979 inaugurou dois novos abatedouros, um em Américo Brasilense-SP e outro em Toledo-PR. Para poder distribuir os pintos de um dia a seus produtores integrados em cada uma destas duas novas regiões produtoras, a Sadia implantou matrizeiros e incubatórios tanto numa quanto em outra unidade abatedoura, tornando-se autosuficiente em pintos de corte, mesmo em São Paulo, estado onde havia fortes e tradicionais empresas neste ramo. O mesmo procedimento foi seguido no Mato Grosso, quando a empresa passou a abater frangos a partir de 1992. Para abastecer-se de pintos de um dia, criados em parte em seus próprios aviários e em parte por produtores integrados, a empresa implantou seu matrizeiro e incubatório em Várzea Grande-MT, através da Sadia Agroavícola S.A. Desta forma, instituiu o primeiro grande matrizeiro neste estado. Uma vez instalados seus próprios matrizeiros e incubatórios, a Sadia foi aumentando sua capacidade de produção para atender os aumentos exigidos tanto pelo mercado nacional como pelas exportações. Pelos dados da tabela abaixo podemos acompanhar como foram evoluindo a produção de pintos de corte, conforme os abates da empresa. TABELA 29 - SADIA E QUANTIDADE DE AVES ABATIDAS : 1961-1995 (em mil cab.) ANO 1961 1972 1975 1980 1985 1990 1991 1992 1993 1994 1995 AVES 99 5.935 30.412 75.280 225.035 239.267 276.000 292.000 309.214 325.000 338.800 Fonte: Relatórios anuais da Sadia. Todas as demais grandes empresas do Sul que adotaram o mesmo processo de integração vertical na produção seguiram o exemplo da Sadia. Mantêm próximo a cada abatedouro, seus próprios matrizeiros e incubatórios, encarregados da produção de pintos de um dia que serão entregues aos agricultores integrados. Eventualmente compram parte de sua produção de pequenos matrizeiros independentes, sobretudo na época da implantação de novos abatedouros. No entanto, a regra geral é a produção própria do total dos pintos necessários para seu consumo o que, diferentemente de São Paulo e de Minas Gerais, inviabiliza a existência de grandes matrizeiros independentes. Nos dois estados acima mencionados encontram-se os maiores matrizeiros nacionais atuando fora do sistema de integração vertical. O mercado para os produtores independentes e 215 outros pequenos compradores de pintos de um dia para criação artesanal é dividido, basicamente, entre três grandes empresas. A primeira delas é a Granja Rezende, de Uberlândia-MG, que há anos mantém cerca de 50% do mercado de matrizes de corte. Sua rival mais próxima é a Agroceres de Rio Claro-SP, em parceria com a Ross Breeders, que passou de 7% para 35% do mercado entre 1990 e 1995. A outra grande também é mineira, da cidade de Uberlândia, a granja Planalto que, em parceria com a norte-americana Avian Farms tem « a expectativa de atingir 5 ou 6% do mercado de reprodutoras de corte até o final de 1995 »211. 3. Indústrias de produtos veterinários Conforme vai crescendo a importância da avicultura nacional em volumes de produção, vai se tornando mais importante para o setor da indústria veterinária, fornecedora de vacinas e medicamentos animais. De acordo com o Sidan - Sindicato Nacional das Indústrias de Defensivos Animais, o setor passou de um faturamento de US$ 293 milhões em 1986, para US$ 730 milhões em 1995. « Já somos o terceiro mercado para produtos veterinários no mundo, perdendo apenas para os Estados Unidos e a França »212. A área avícola responde por 15% do mercado veterinário e a disputa entre as empresas se estabelece a partir da prestação de serviços associada ao fornecimento das vacinas e dos medicamentos. Segundo o presidente do Sidan, « apenas sobreviverão neste mercado, as empresas que, além de vender o produto, possam garanti-lo, oferecendo assitência ao veterinário e ao produtor integrado ». As empresas do setor são todas multinacionais, com filiais no Brasil. A maior delas, em 1994, era a Tortuga, com 15% do faturamento total. Se somarmos o faturamento das dez maiores213, teremos 70,4% do total. Faziam parte da lista do Sidan, neste mesmo ano, 43 empresas. As principais empresas avícolas abastecem-se através de contratos com as firmas acima mencionadas. No caso das vacinas, são aplicadas ainda nos incubatórios, antes dos pintos de um dia saírem para os aviários dos integrados. Os demais medicamentos, 211 Dados publicados na reportagem « Disputa de gente grande », in: revista Avicultura e Suinocultura Industrial, São Paulo, março de 1995, pp. 43-44. 212 Declaração do presidente do Sidan, publicada na revista Avicultura Industrial, São Paulo, ano 85, n° 1028, dezembro/1995, p. 28. 213 As dez maiores do setor eram, em 1994: Tortuga, MSD, Pfizer, Rhodia, Mallinckrodt, Sarsa, Bayer, CibaGeigy, Cyanamid e Vallée (revista Avicultura Industrial, São Paulo, ano 85, n° 1028, dezembro/95, p. 29). 216 ministrados pela água, são distribuídos aos agricultores pelos técnicos que fazem acompanhamento da produção. Nos estados onde a avicultura não é integrada verticalmente, as firmas vendem diretamente aos produtores independentes, matrizeiros e incubatórios e o acompanhamento da medicação é feito via assistência técnica das empresas vendedoras dos produtos veterinários. 4. Fábricas próprias de ração Assim como aconteceu com o setor de matrizeiros e incubatórios, quando as empresas integradas passaram a produzir frangos de corte produziram também a ração necessária para atender a demanda de seus integrados. Com isto caracterizou-se novamente a diferença entre São Paulo, tradicional produtor de rações animais, e os estados do Sul, no início e os demais que adotaram o sistema vertical de produção, em seguida. A Sadia iniciou sua fabricação de rações balanceadas ainda em 1954 para atender seus produtores de suínos que iniciavam a produzir animais de raça, com uma alimentação diferenciada dos antigos « porcos tipo banha ». Ao entrar na avicultura já dispunha, portanto, de certa experiência no ramo, introduzindo as modificações necessárias para adaptar a ração às aves e poder entregar aos integrados, além dos pintos de um dia, também a ração. Outras fábricas foram instaladas junto aos abatedouros, para atender a demanda dos integrados. Atualmente a empresa mantém fábricas de rações junto aos principais abatedouros avícolas, ou seja, em Concórdia e Chapecó, em Santa Catarina; Francisco Beltrão, Dois Vizinhos e Toledo, no Paraná; Campinas, em São Paulo e Campo Verde, no Mato Grosso, além de Três Passos, no Rio Grande do Sul onde mantém um grande abatedouro de suínos e Faxinal dos Guedes em Santa Catarina, junto à Sadia Agropastoril214. Outro aspecto a ressaltar é a atualização tecnológica que acompanha tal atividade. Desde 1976, « junto com o aspecto quantitativo, no sentido de adequar o volume de produção de rações à expansão dos outros setores, a qualidade do produto é conseguida com o emprego da computação eletrônica, que permite formular rações balanceadas mais econômicas para o criador e com resultados energéticos mais favoráveis »215. A quantidade de rações produzidas evoluiu conforme a demanda dos integrados. Atualmente, a Sadia é a maior produtora de rações balanceadas do país, produzindo 214 215 Entrevista com o gerente do setor agropecuário da Sadia Concórdia S.A., Concórdia-SC, 18 de abril de 1995. Sadia, Relatório Anual, 1976, p. 6. 217 basicamente para atender seus agricultores integrados em frangos, perus e suínos. Pela tabela abaixo podemos acompanhar o volume de rações produzido pela empresa. TABELA 30 - SADIA E SUA PRODUÇÃO DE RAÇÕES : 1976-1995 (em mil t.) ANO 1976 1980 1985 1990 1991 1992 1993 1994 1995 RAÇÃO 300 798 1.249 1.504 1.683 1.780 1.900 2.136 2.200 Fonte: Sadia, Relatórios Anuais. Pelo fato de produzirem sua própria ração, as maiores integradoras Sadia, Ceval e Perdigão também dominam o mercado de compra de soja e milho, entrando na integração vertical desta cadeia, indo até a produção de óleos refinados e margarinas. As demais integradoras como Ceval, Perdigão, Avipal, Frangosul, Chapecó e outras, procedem exatamente da mesma forma que a Sadia, implantando sempre uma fábrica de rações próxima a cada abatedouro avícola. Os motivos alegados para produzirem sua própria ração são semelhantes, conforme pudemos perceber nas diversas entrevistas com os diretores de produção de várias empresas. A Sadia fabrica sua própria ração « basicamente por três motivos. Primeiro porque produzimos e consumimos grandes quantidades. Neste caso, conseguimos uma economia de escala e a produção da ração acaba ficando mais barata que a compra. Segundo, porque podemos controlar com mais facilidade a qualidade da ração que nossos animais consomem. Por fim, porque formulamos as rações adaptadas para cada tipo de animal (suínos, bovinos e aves), para cada raça diferente e para cada estágio específico de vida216 destes animais »217. Em 1992, entre as 15 maiores empresas nacionais produtoras de rações, fora do sistema integrado da avicultura, as quatro maiores eram de São Paulo e outras duas empresas deste estado faziam parte da lista das quinze maiores. Esta relação completava-se com três 216 Existem basicamente três tipos de rações: inicial, de crescimento e de engorda. A partir da ração de crescimento as empresas fornecem ração peletizada às aves. Os pellets de soja passam por um processo de pasteurização onde são eliminadas eventuais bactérias que causariam doenças nas aves e estas, ao serem ingeridas pelo consumidor, poderiam provocar distúrbios alimentares e riscos à saúde (« Integração avícola completa 32 anos de vida e de alta tecnologia », in: revista Aves & Ovos, APA, São Paulo, agosto de 1993, p. 9). 217 Entrevista com o gerente do setor agropecuário da Sadia Concórdia S.A., Concórdia-SC, 18 de abril de 1995. Os demais entrevistados utilizaram argumentos semelhantes, insistindo sobre o « segredo da fórmula » de cada empresa e os produtos utilizados na fabricação. O diretor de produção da Avipal, por exemplo, disse que « hoje se pensa em trabalhar com qualquer ingrediente na fabricação de ração (milho, soja, arroz, girassol...), desde que seja mais barato e responda às exigências nutricionais ». 218 empresas de Pernambuco, duas de Minas Gerais, uma do Espírito Santo, uma do Pará e só duas da região Sul, uma do Paraná e outra do Rio Grande do Sul218. Da produção total de rações voltadas para o setor avícola, tanto de postura como de corte, as regiões Sul e Sudeste são responsáveis por 85,6%, como podemos ver pela tabela abaixo. Isto vem confirmar outras informações acima mencionadas sobre a importância dos estados do Sul e de São Paulo para a avicultura nacional. TABELA 31 - POTENCIAL DE CONSUMO DE RAÇÕES POR REGIÃO DO BRASIL - 1995 Regiões Toneladas % Sul 6.640.000 44,6 Sudeste 6.094.000 41,0 Nordeste 1.542.000 10,4 Centro-Oeste 373.000 2,5 Norte 221.000 1,5 14.870.000 100 TOTAL Fonte: APA - Associação Paulista de Avicultura. Além disto, percebe-se a importância da produção em volume e em economia de escala das grandes integradoras do Sul que fabricam sua própria ração. Neste caso, apesar da « flexibilização » do conceito de integração vertical a partir dos anos 90, com a introdução das práticas de terceirização e de maior « colaboração » inter-empresarial, vale a pena manter a produção própria de rações, pelas economias e garantias que esta fornece às agroindústrias. 5. Relação das empresas com o setor de fornecimento da matéria-prima Nestes 35 anos de experiência entre as empresas avícolas integradas e o setor de fornecimento da matéria-prima (frangos, perus, codornas, perdizes e « frangões »), desenvolveu-se um savoir-faire diferenciado, sobretudo entre os principais grupos. Analisaremos em seguida como tais empresas influenciaram a adoção de tal sistema em outras regiões do país, inclusive em São Paulo e Minas Gerais, onde a produção era feita tradicionalmente por produtores independentes. Em seguida veremos como no quotidiano os 218 Dados da Revista Exame Maiores e Melhores, 1992. Do total da receita operacional líquida destas empresas, 74,2% pertenciam às empresas paulistas, o que demonstra a importância deste estado para as empresas de 219 contratos de parceria são menos importantes que o setor de fomento agropecuário de cada empresa. Por fim, estudaremos as estratégias colocadas em prática pelas três líderes para garantirem seu fornecimento de matéria-prima. Integração vertical do Sul chega a outras regiões e ganha novos adeptos A partir de Santa Catarina a integração vergical avançou primeiro para o Paraná e Rio Grande do Sul, estados que também não tinham tradição e estrutura avícola e onde a atividade não tinha expressão até meados da década de 70. Diferente de Santa Catarina, onde empresas suinícolas diversificaram para a avicultura, implantando a integração, no Rio Grande do Sul empresas como a Avipal, a Frangosul, a Minuano e a Pena Branca já nasceram ligadas à integração avícola, seguindo o exemplo do que se fazia no estado vizinho. No Paraná a integração nasceu com a avicultura industrial e ganhou força quando as empresas catarinenses implantaram suas filiais seguindo o mesmo modelo do estado de origem. Consolidado no Sul do país, o sistema de integração começou sua expansão em direção às regiões Centro-Oeste, Sudeste e Nordeste. Cálculos dos grandes abatedouros revelam que 70% da produção nacional de carne de frango provém do sistema de integração. « Na ponta do lápis, teríamos então em 1992, algo em torno de 20 mil avicultores integrados em todo o país, colocando no mercado de 100 a 140 toneladas de carne de frango cada um, por ano »219. Segundo os dados da Associação Paulista de Avicultura (APA) as empresas estão ocupando o Centro-Oeste brasileiro graças a incentivos e programas de desenvolvimento do governo central e dos estados. Quando as empresas do Sul implantaram-se nesta região levaram consigo o sistema de produção integrada, graças à disponibilidade de grãos para a fabricação de ração, à topografia plana, à presença de pequenos agricultores. Em 1992 toda a produção SIF de frango do Mato Grosso, Mato Grosso do Sul e Distrito Federal era proveniente do sistema integrado. Em Goiás, este índice localizava-se em torno de 25%. rações desvinculadas da integração vertical na avicultura. 219 Informações da matéria « Integração do Rio Grande do Sul aos aviários de Pernambuco », in: revista Aves & Ovos, APA, São Paulo, agosto de 1993, p. 10. 220 No Nordeste do país, o sistema de integração está menos implantado. Segundo dados da APA, « atualmente os frangos produzidos por integração representam cerca de 20% da produção do Nordeste »220, responsável por cerca de 10% da produção nacional. Se a integração vertical se expandiu sem problemas para o Centro-Oeste, o mesmo não ocorreu em relação ao Sudeste. Esta região, tradicional na produção avícola teve mais dificuldades para assinar contratos de parceria com os produtores. Diferente dos estados do Sul, onde se estava construindo uma coisa que não existia e que portanto, nascia com a integração, o estado de São Paulo já tinha uma avicultura formada, embora com uma estrutura de produção segmentarizada221. Na verdade, ao tentar introduzir contratos de parceria, pediase a empresários para se tornarem parceiros, o que lhes tiraria a autonomia de negociar seu produto no mercado. Consequência deste processo, os abatedouros paulistas mais integrados são os pertencentes à Sadia, Ceval, Perdigão e Chapecó que, desde o início de sua atuação no estado introduziram o « savoir-faire » da parceria avícola já desenvolvida em outros estados. Algumas empresas tradicionais do estado começaram a imitar o exemplo da integração vertical, como é o caso da Maristela, cujos 350 produtores integrados fornecem ao abatedouro da empresa 1,5 milhão de frangos por mês222. Quanto aos demais avicultores paulistas, muitos insistem em produzir por conta própria. Pelos dados da APA, 50% do frango produzido em São Paulo vem de produtores totalmente integrados, 30% de parcialmente integrados e 20% de produtores independentes223. Mesmo com a tradição de produzir de forma independente, pesquisadores são unânimes em afirmar que a tendência é de aumentar a produção via contratos de parceria, cujos produtores estariam produzindo já cerca de 80% dos frangos industrializados no estado224. Contratos de parceria avícola 220 Dados da reportagem « Integração do Rio Grande do Sul aos aviários de Pernambuco », in: revista Aves & Ovos, APA, São Paulo, agosto de 1993, p. 14. 221 A segmentação se dava a partir dos produtores de matrizes, que vendiam os ovos aos incubadores; que vendiam os pintinhos aos produtores; que vendiam o frango aos abatedouros; que vendiam para o intermediário. 222 Arnaldo de Souza (1995), « Quem ganha com a integração? », in: revista Avicultura & Suinocultura industrial, Editora Gessulli, São Paulo, n° 1019, ano 85, março de 1995, p. 14. 223 « Integração do Rio Grande do Sul aos aviários de Pernambuco », in: revista Aves & Ovos, APA, São Paulo, agosto de 1993, p. 14. 221 Como já vimos, os contratos de parceria avícola são utilizados mais por uma exigência legal que para garantir o fornecimento da matéria-prima necessária à empresa. Para isto, os grupos agroindustriais desenvolveram seus próprios setores de fomento agropecuário, que passaram a ter uma importância maior que os contratos. Analisando os contratos utilizados pela Sadia em 1984 e em 1995, não existe nenhuma mudança significativa. Uma das diferenças é em relação à idade dos frangos, enquanto no primeiro contrato ela variava de 43 a 80 dias, no último esta idade baixou para 32 a 62 dias. No entanto, isto não tem nada a ver com a relação de parceria e sim com os ganhos de produtividade conseguidos através dos avanços nas diferentes etapas do processo produtivo. Existem outras duas pequenas mudanças, mas sem grande importância. A primeira, refere-se ao « vazio sanitário » entre os lotes. No primeiro caso, este varia de três a 15 dias, enquanto no segundo contrato, este período se estende de três a 20 dias, o que dá uma maior margem de manobra à empresa para enfrentar crises de super produção, sem maiores problemas em relação ao atraso de entrega de um novo lote de frangos. A outra mudança é quanto à duração do contrato. Em 1984 o contrato dizia que sua validade era de dez anos, « podendo ser renovado por um novo prazo a ser combinado entre as partes », enquanto o de 1995 diz que « o prazo de duração do contrato é indeterminado ». Todas as demais cláusulas permanecem exatamente iguais. Se as empresas dão pouca importância prática aos contratos, « quase nunca se reportando a eles para solucionar problemas concretos »225, os mesmos não têm muita importância junto aos produtores integrados, porque estes não dispõem de sindicatos ou outras organizações suficientemente fortes para impor às empresas contratos que lhes sejam mais favoráveis. Em anexo, fornecemos cópia dos « contratos de parceria avícola » de três das maiores empresas do Sul, cuja análise nos leva a afirmar que as agroindústrias, de um modo geral, agem de forma semelhante no que se refere à sua relação « contrataual » com os agricultores integrados. Sadia, seu setor de Fomento Agropecuário e a qualidade da sua matéria-prima Um dos aspectos onde se percebe a disputa entre os diversos grupos agroindustriais é na organização pela obtenção de uma matéria-prima de qualidade superior que garanta tanto a 224 Entrevista com pesquisador do Instituto de Economia Agrícola, ligado à Secretaria da Agricultura do Estado de São Paulo, São Paulo, 4 de abril de 1995. 225 Entrevista com o gerente do setor agropecuário da Sadia Concórdia S.A., Concórdia-SC, 18 de abril de 1995. 222 qualidade dos produtos como a quantidade exigida para aumentar o volume de produção e a diversidade de produtos. Analisando as diferentes estratégias dos grupos colocadas em prática sobretudo a partir do final da década de 80, percebe-se a importância deste setor no desenvolvimento e na competitividade de cada empresa. Todos os grupos agroindustriais cuja principal fonte de renda baseia-se na produção de carnes de aves e de suínos vêm diversificando e sofisticando seus produtos, agregando-lhes maior valor e vendendo produtos semi-prontos para o consumo. Para alargar o processo de industrialização, colocaram em prática uma reestruturação da produção agrária visando assegurar seu fornecimento de aves e de suínos. Cada uma das grandes empresas integradoras elaborou projetos de relação com a produção agropecuária, buscando garantir seu fluxo de matéria-prima. Entre estes projetos, o mais arrojado é o da Sadia que lançou, no final de 1988, o Projeto 21, cujo principal objetivo inicial era reestruturar o sistema integrado na suinocultura. Neste período a preocupação do grupo era fazer frente às estratégias adotadas pelos principais concorrentes (especialmente a Perdigão e a Coopercentral) e a autonomia cada vez maior do setor suinícola, onde os produtores buscavam se organizar em condomínios, fazer rações alternativas ou, simplesmente, abandonavam a atividade buscando outras alternativas. Estas preocupações aparecem logo na introdução do Projeto 21 quando, entre as justificativas para o lançamento do mesmo encontram-se: « concorrentes estão inovando, atraindo os bons criadores; outras atividades estão concorrendo com a suinocultura (gado leiteiro, fumo, erva-mate); tradicionais clientes (integrados) estão abandonando o setor; não existe controle e oferta de animais »226, entre outras. O Projeto 21 trazia propostas concernentes à propriedade como um todo, no entanto analisaremos somente os trabalhos da Sadia visando renovar sua relação com os integrados avícolas227. Para manter e amplifiar sua atuação avícola e fazer frente a seus concorrentes, a empresa reestruturou seu relacionalmento com o setor integrado. Estas mudanças podem ser 226 Para uma análise mais detalhada do Projeto 21, ver Dalla Costa (1993, pp. 190-193). O mesmo texto contém uma cópia integral do Projeto 21 (anexo 6, pp. 234-239). 227 Mior (1992, pp. 306-316) analisa as diferentes propostas para um desenvolvimento integrado da propriedade e os avanços da empresa no setor de genética de suínos, com o Programa de Melhoramento Genético de Suínos - PMGS, cujo principal resultado foi a obtenção do Hiper Sadia, um suíno híbrido SPF - Specific Pathogen Free, conseguido através de cruzamento de diversas raças e que dispensou as importações de matrizes, tornando a empresa auto-suficiente neste setor. Em 1987 a Agropastoril Catarinense Ltda contava com sete médicos veterinários, dois agrônomos, dois zootecnistas e 15 técnicos agrícolas de nível médio. O PMGS teve o apoio, principalmente na área laboratorial, do CNPSA, que também desenvolvia o programa a nível de pesquisa em menor escala. Mais tarde a Sadia desenvolveu um laboratório para seus próprios controles e exames. 223 visualizadas através da assistência técnica, tanto em seu comportamento como nos novos instrumentos metodológicos; na criação de uma nova fórmula de pagamento do lote de frangos e perus e; no novo tipo de avicultor a ser « integrado » à firma. A assistência técnica não deveria mais estar restrita à produção de frangos (perus ou suínos), mas estender-se às demais atividades econômicas realizadas na propriedade. Para isto, os técnicos deveriam ser formados para acompanhar os novos instrumentos de difusão tecnológica e de gestão da administração rural228. Outro aspecto colocado em prática foi o de acompanhar os produtores de acordo com uma nova tipologia, conforme seus resultados técnico-econômicos, onde seriam caracterizados de « eficientes, médios e ineficientes ». Boa parte destas atividades seriam feitas utilizando o método grupal, onde os produtores presentes nas reuniões poderiam avaliar seu sistema de produção em comparação com seus vizinhos de comunidade229. A mudança na forma de pagamento dos avicultores veio através da criação do Indice Sadia - ISA. Até 1990 o índice adotado pelo grupo era o Indice de Eficiência Europeu (I.E.E.) adaptado para as condições brasileiras. Por este índice existia uma tendência do resultado econômico do produtor integrado situar-se na média. O I.E.E. variava de 130 até 212 pontos. Se um avicultor obtivesse 130 pontos ficaria com 3,4% do volume de carne obtido no lote, valor que aumentava até 9,5% com a pontuação máxima de 212 pontos230. A nova fórmula, além dos índices de produtividade constantes da tabela anterior, incorporou o índice médio específico por sexo da ave, o que demonstra a existência de diferenças de rendimento entre um lote de machos, de fêmeas e um mixto e, por outro lado, a capacidade de avaliação destas diferenças de rendimento231. Os próprios dirigentes das empresas reconhecem estas diferenças. « Estamos atualizando a tabela a partir das inovações 228 A formação específica dos técnicos para atuar nas áreas de metodologia e comunicação em extensão, gestão e administração rural, tecnologia básica de manejo avícola, foi feita através de cursos específicos, ministrados por profissionais do ramo, sobretudo os técnicos da ACARESC - Associação de Crédito e Assistência Rural de Santa Catarina. Em 1990 a Sadia treinou quatro grupos de técnicos, num total de 95 participantes e, em 1991, outros dois grupos, com 53 técnicos. Entre as demais empresas, foi a Perdigão a primeira a realizar cursos para seus técnicos, iniciando este trabalho a partir de 1987. A Chapecó também realizou dois cursos, em 1990 e 1991, com 47 participantes. A Coopercentral realizou três cursos em 1991, com 78 participantes (Mior, 1992). 229 Para uma análise dos resultados obtidos através das reuniões de famílias de integrados em Dois Vizinhos-PR, ver revista Integração, órgão interno da FAF, São Paulo, n° 137, julho/agosto de 1994, p.32. 230 Ver contrato de parceria e tabela de pagamento da Sadia em anexo. Uma das reclamações frequentes dos avicultores era sobre as mudanças efetuadas nos pagamentos. De fato, uma observação no final da tabela diz que « ela poderá ser mudada, desde que ocorram fatos novos significativos na comercialização de frangos, tanto no mercado interno como externo ». 231 Estas diferenças no rendimento de cada lote de frangos só foi possível graças aos avanços da microinformática aplicados na avaliação do rendimento dos lotes. 224 tecnológicas. Por exemplo, hoje em dia já temos condições de saber se um avicultor recebe pintos de um dia pesando 40 ou 50 gramas. Conforme o peso dos pintos, provavelmente o peso final do frango e a conversão serão diferentes, exigindo uma remuneração diferenciada para cada produtor »232. A nova fórmula se caracteriza ainda por outras duas mudanças. A primeira se refere à ampliação da faixa de pontuação e sua correspondente possibilidade de ampliação dos ganhos por parte dos parceiros. Enquanto no I.E.E. a percentagem variava de 3,4% a 9,5%, com o ISA o produtor pode alcançar até 12% do volume de carne de cada lote233. A segunda é a inclusão de um índice médio obtido a partir do resultado técnico dos lotes recebidos pelo grupo na última semana. Assim, a nova fórmula, ao premiar o aumento da produtividade, ao mesmo tempo penaliza os avicultores « ineficientes », tornando-se um instrumento para pressionar a melhora da produtividade de todos os integrados. Esta nova forma de pagamento, colocada em prática no início da década de 90, gerou conflitos entre a agroindústria e os sindicatos, que colocaram restrições ao seu uso, já que um número crescente de seus associados passou a reclamar da baixa remuneração. Além disto, estudos de entidades de pesquisa voltadas a este setor demonstraram a dificuldade dos integrados localizados abaixo da média. De acordo com o DESER - Departamento Sindical de Estudos Rurais234, « a distância entre os melhores lotes e os piores tende a aumentar, deixando em dificuldade os produtores abaixo da média. Ao mesmo tempo, a remuneração média que vem sendo paga ao agricultor, não atende o custo total de produção »235. Quanto ao parceiro integrado, a empresa busca sempre aperfeiçoar tanto a formação e capacitação dos mesmos quanto os investimentos em novas tecnologias. De acordo com dirigente entrevistado, geralmente a segunda geração de produtores integrados é melhor que a primeira, mas não por causa da « experiência de seus pais. Se eles fizessem o trabalho como era feito no início da avicultura industrial, estariam sendo ineficientes. A segunda geração é 232 Entrevista com o gerente do setor agropecuário da Sadia Concórdia S.A., Concórdia-SC, 18 de abril de 1995. 233 Durante a entrevista mencionada na nota anterior, não nos foi fornecida cópia desta nova tabela. 234 O DESER é um órgão de pesquisa e assessoria, criado pelos Sindicatos dos Trabalhadores Rurais do Sul do país, fundado em 14 de junho de 1988, cuja sede fica em Curitiba, no Paraná. Além de pesquisas e assessorias para o movimento sindical e outros movimentos populares da região, o órgão publica um boletim mensal Conjuntura Agrícola e vários cadernos de divulgação, com os resultados de suas pesquisas. 235 Armando Dalla Costa e Valter Bianchini (1991), A Sadia e a Fórmula de Pagamento das Aves, Deser, Curitiba, mimeo, p. 1. Para resolver os conflitos surgidos, os diretores da Sadia organizaram, junto com o SINTCRAVE, reuniões com produtores integrados para explicar a nova fórmula. Depois de várias negociações, mesmo sem muitas alterações, a nova tabela continuou em vigor. 225 melhor porque é mais flexível, aceita mais facilmente as inovações, é mais aberta às mudanças ». Já em relação ao manejo e aos equipamentos utilizados por estes avicultores houve significativos avanços236. No início da integração vertical, foram testados comedouros de correia, automáticos que, no entanto, mostraram-se menos eficientes que os comedouros de prato. Sua vantagem era a economia de mão-de-obra, já que funcionavam sozinhos. O avanço, neste caso, foi introduzir a correia que distribui a ração dentro dos comedouros de prato. Processo semelhante ocorreu com os bebedouros, quando os de calha, menos eficientes, foram substituídos pelos pendulares. Ultimamente estes estão sendo substituídos pelos bebedouros de Nippel (formados por um cano com biquinhos onde os frangos bebem). A vantagem destes é que não exigem limpeza, desperdiçam menos água e não molham a cama do aviário. Também foram introduzidas campânulas automáticas, que são autoreguláveis conforme a temperatura dentro dos aviários. A altura dos galpões foi ampliada, passando de 2,50 a 3,0 e até a 3,30 metros de altura, para melhor arejar o aviário. Neste caso, ainda tem uma combinação de controle de temperatura e ventilação através do manejo das cortinas e do uso de ventiladores. Este conjunto de estratégias da Sadia para o setor avícola, imbutidas no espírito geral do Projeto 21, pode ser visto como o mais arrojado plano de intervenção na organização da produção agrária de suínos e de aves. A partir de meados da década de 90, deverão surgir outras inovações tecnológicas e, sobretudo mudanças organizacionais, quando o programa TQS atingir os produtores integrados e eles puderem sugerir e participar de outras inovações, contribuindo com seus já 35 anos de experiência na produção de frangos de forma integrada. Perdigão e Ceval e suas formas de atuação no setor avícola A Perdigão começou a fazer pesquisa interna para melhoramento genético quando resolveu criar e lançar no mercado um produto para concorrer com o peru. Para desenvolver o Chester, frango superior ao comum em peso, com cerca de 70% de carnes nobres (peito e coxas) adquiriu, em 1982, um pacote genético nos Estados Unidos. Inicialmente o trabalho foi feito com assistência técnica de geneticistas americanos e « hoje é uma produção própria, isto 236 Informações obtidas durante entrevista com o gerente do setor agropecuário da Sadia Concórdia S.A. Concórdia-SC, 18 de abril de 1995. 226 é, a linhagem tornou-se domínio da Perdigão »237. No caso de frangos de corte, a empresa está desenvolvendo projetos em parceria com o CNPSA (Mior, 1992, p. 324). O grupo Perdigão foi um dos primeiros a modificar sua relação com os produtores de matérias-primas (aves e suínos). Esta modificação pode ser vista através de duas ações, sendo que a primeira foi a transformação do contrato de integração em contrato de parceria avícola, em 1984. Com isto mudou especialmente a forma como seus técnicos atendiam à propriedade como um todo e não somente à produção integrada. Além disto a Perdigão buscou instaurar um sistema que permitiu a modernização tecnológica dos aviários de seus integrados238. A segunda foi a transformação do antigo departamento de fomento e integração no « Serviço Rural Perdigão », a partir de 1986. Com isto, a proposta de assistência integral da propriedade do parceiro ganhou mais força e a firma investiu na capacitação de seus técnicos agrícolas, como vimos acima. Assim como no caso da Sadia, outras modificações foram introduzidas a partir de meados dos anos 90, quando foi implantado o plano de reformulação empresarial e, sobretudo, na medida em que o Plano de Qualidade Total foi colocado em prática. A relação da Ceval com as fontes de matéria-prima eram mediadas, até 1990, por sua controlada, a Seara Agroindustrial S.A. Portanto, pesquisa e assistência técnica aos produtores eram os que tal empresa construiu ao longo de sua história. Nesta data, com a incorporação da Seara à estrutura administrativa da Ceval, modificou também a relação com a pesquisa e assitência técnica. Mesmo tendo-se reestruturado e reequipado, a Ceval não desenvolve pesquisa interna em melhoramento genético de aves. O que a empresa faz é um conjunto de testes para decidir, de acordo com o mix de produtos produzidos e comercializados, qual linhagem é a mais adequada. Quando a empresa lançou o Classy, para concorrer com o chester e o peru, agiu de forma semelhante à Perdigão, « importando dos EUA um pacote genético especial para a produção de tal ave »239. Os demais grupos que atuam de forma verticalizada na região Sul seguem um caminho semelhante às três maiores empresas do setor, com a diferença de ter uma estrutura menos 237 Flávio Brandalise, entrevista à Fundação Centro de Estudos do Comércio Exterior do Banco do Brasil, Depoimentos Empresariais, n° 6, 24 de agosto de 1989, p.3. As pesquisas na Perdigão são feitas por quatro pesquisadores (dois de nível superior, um com mestrado e um com doutorado) e visam melhorar a conversão alimentar da ave e ganhar rusticidade (Mior, 1992). 238 Numa ação combinada entre a Perdigão e a Associação dos Avicultores do Meio-Oeste Catarinense, a empresa « paga » 5% além da renda de cada lote do integrado para formar um fundo rotativo administrado pela Associação a fim de financiar a substituição de equipamentos obsoletos por outros mais modernos nos aviários (Mior, 1992, p. 329). 239 Entrevista com o gerente do setor de produção de aves da Ceval, Gaspar-SC, 4 de maio de 1995. 227 significativa voltada à pesquisa e adaptações genéticas. Exceção deve ser feita à Coopercentral - Cooperativa Central Oeste Catarinense240, que inovou através do programa Avicooper. Apesar de recente na atividade entrou inovando no ramo, implementando um sistema de produção mais adequado à realidade de seus associados. Até aquele momento o tamanho padrão, que era praticamente exigido pelas agroindústrias era o de 100 metros de comprimento por 12 de largura, comportando cerca de 12 mil aves. A Coopercentral inovou ao implantar galpões de 50 por 12 metros, o que possibilitava abrigar metade das aves e, outros aviários ainda menores, com capacidade para 2,5 a 3 mil aves, com as dimensões de 25 metros de comprimento e 12 de largura. Além disto, constatou-se que os aviários menores eram os que apresentavam os melhores índices técnicos. As possíveis explicações para este fato estão na existência de ambiente interno mais homogêneo, aliado a um melhor manejo do lote por parte do avicultor, mesmo perdendo em economia de escala. A tabela a seguir ajuda a entender a estrutura de produção da cooperativa no início dos anos 90. TABELA 32 - ESTRUTURA DO SISTEMA DE PRODUÇÃO AVICOOPER - 1991 Tamanho do Capacidade de alo- Número de Participação Participação aviário jamento (n° aves) aviários % do total % acumulada 12 x 25 m 3.000 136 17,7 17,7 12 x 50 m 6.000 448 58,0 75,7 12 x 75 m 9.000 46 6,0 81,7 12 x 100 m 12.000 136 17,7 99,4 12 x 125 m 15.000 2 0,3 99,7 12 x 140 m 16.800 2 0,3 100 770 100 100 Total Fonte: Departamento técnico Avicooper da Coopercentral, in: Mior (1992, p. 364). Com este quadro de produtores, onde 75,7% do total dos aviários são iguais ou menores a 50 metros, a Coopercentral inovou no tamanho dos galpões, incorporando produtores menores, seu público alvo, sem perder nem em tecnologia e nem em qualidade da 240 A Coopercentral foi fundada em 1969 na cidade Chapecó-SC e conta com 15 cooperativas filiadas, congregando cerca de 50 mil agricultores associados. Destes, cerca de nove mil são suinocultores e fazem parte do programa Suicooper. Suas atividades agroindustriais iniciaram nos anos 70, com abate de suínos e venda de carcaças, só entrando na industrialização de sua carne durante os anos 80. Em 1987 diversificou suas atividades entrando no ramo avícola, quando construiu seu próprio abatedouro e, no ramo de sucos de uva e de laranja (Mior, 1992, p. 356). Seus produtos são vendidos com o nome AURORA. 228 matéria-prima, mostrando que existem alternativas ao « sistema padrão » das maiores agroindústrias. 6. Abatedouros automatizados e produção em escala « Taille optimale d’une unité de production désigne la taille la plus efficace pour une unité de production à un moment donné et dans un lieu donné » (Chandler, 1990, I, p. 58). Como vimos no capítulo anterior as três empresas líderes cresceram construindo e ou adquirindo novos abatedouros. Analisando suas histórias percebemos dois fatos constantes: de um lado, uma permanente atualização tecnológica, acompanhando o que há de mais moderno em tecnologia a nível mundial e, de outro, a preocupação em atingir a economia de escala, otimizando o tamanho dos abatedouros de acordo com uma produção que permita atingir a economia de escala, investimentos na diversificação de produtos e na constante adaptação da organização do trabalho para atingir o máximo de produtividade. A preocupação com a modernização industrial esteve sempre presente na história das maiores empresas do setor. Entretanto houve um fato marcante, em meados da década de 70 quando iniciaram as exportações, que exigiu uma atualização tecnológica ainda maior, porque as empresas se viram confrontadas com as demais concorrentes, sobretudo norte americanas e francesas. Isto levou à utilização de todos os meios possíveis para baratear a produção, melhorando a qualidade, o que exigiu fortes investimentos em novos maquinários241. Entretanto, a instalação de evisceradoras automáticas e de balanças eletrônicas computadorizadas se deu na segunda metade dos anos 80. A grande preocupação dos anos 90 é de continuar acompanhando os avanços tecnológicos, evidente, mas sobretudo de introduzir novas formas de organização do trabalho para garantir e melhorar a qualidade, otimizando os custos, aumentando a produtividade. Isto se percebe ao analisar a implantação dos projetos de Qualidade Total tanto na Sadia como na Perdigão e na Ceval (assim como em suas concorrentes). Neste caso, em todas elas houve aumento da produção, com redução do número de funcionários e adaptações na organização interna do trabalho. Uma destas adaptações, paradoxalmente, foi de retroceder da tecnologia em direção ao trabalho manual. « Nós tínhamos abatedouros equipados com maquinário de corte automático, que foram desativados e os cortes passaram a ser feitos à mão, por exigência dos 241 Estes maquinários são praticamente os mesmos utilizados pelas empresas concorrentes no mercado internacional. Em entrevistas com dirigentes da Sadia, Ceval, Frangosul, Avipal, Batavo, constatou-se que as 229 importadores, porque queriam um produto diferenciado daquele oferecido por outros concorrentes internacionais »242. Na pesquisa de campo percebemos que as empresas cujos produtos eram voltados para a exportação todas tinham adaptado as linhas de produção para fazerem cortes manuais, enquanto que a produção destinada ao mercado interno utilizava tanto um como outro sistema, dependendo de vários fatores, como preço dos equipamentos, baixos salários, qualidade da mão-de-obra, etc. Outras adaptações foram feitas para atender exigências específicas de alguns importadores, devido aos hábitos alimentares e « tradições » religiosas. « Cada mercado exige um tipo de especificação. O Japão, por exemplo, compra sobrecoxa desossada. Para atender esta demanda nos adaptamos para produzir em quantidade e qualidade este produto para os japoneses. Nas exportações para o Oriente Médio, devemos manter pessoas daqueles países permanentemente dentro dos abatedouros. Eles fazem todo um cerimonial religioso antes do abate e exigem que as aves abatidas estejam voltadas na direção da Meca »243. Analisando um abatedouro da Sadia, podemos ver como são introduzidas novas máquinas e são adaptadas as formas de organização do trabalho. No abatedouro de Concórdia-SC, por ocasião da pesquisa de campo em 1995, estavam implantando o ‘juste-intime’ na recepção dos frangos, isto é, ao chegar vão imediatamente para a linha de abate. A insensibilização era feita de maneira diferente em cada uma das nórias. Na primeira, o frango era insensibilizado passando por um pequeno tanque de água, enquanto na segunda passava por um pequeno túnel, de onde era retirado o oxigênio, fazendo com que ele ficasse ‘adormecido’. A sangria era feita por vários operários em cada linha de produção e a evisceração era toda automática. A embalagem final do frango era semi-automática. « No entanto o que se pode dizer, de maneira geral, é que há uma tendência à automatização. Na medida em que a mão-de-obra vai ficando mais cara, aumenta o grau de automatização dos abatedouros »244. Outra preocupação é buscar a otimização das instalações, do maquinário e do pessoal empregado. Para tanto, as principais empresas foram aumentando a produção até chegar ao máquinas mais sofisticadas são importadas sobretudo da Holanda e, em menor parte, dos Estados Unidos. Quanto ao maquinário « menos sofisticado », muito já é produzido no Brasil. 242 Entrevista com o gerente do setor de produção de aves da Ceval, Gaspar-SC, 4 de maio de 1995. 243 Entrevista com o gerente do setor agropecuário da Sadia, Concórdia-SC, 18 de abril de 1995. Nas visitas a este abatedor e no abatedor da Fangosul em Montenegro-RS, constatamos que das cinco pessoas encarregadas do corte dos frangos em cada nória, a primeira da fila era sempre um representante dos países importadores do Oriente Médio. Outra particularidade é que devem ser cortadas as duas veias do pescoço, para que o frango perca todo o sangue. 244 Entrevista com gerente do setor agropecuário da Sadia, Concórdia-SC, 18 de abril de 1995. 230 ponto de conseguir aproveitar das vantagens da economia de escala. « Nós trabalhamos com duas linhas de abate e abatemos 65 milhões de frangos por ano. Fazemos dois turnos por dia, de 8h 48 m cada um, trabalhando 5 dias por semana. Aos sábados e domingos o abatedouro fica fechado. Os operários trabalham 44 horas por semana e cada linha faz, portanto, 88 horas de trabalho semanal »245. Analisando os abatedouros da Sadia, percebemos que três deles podem ser considerados de tamanho médio, enquanto os demais são grandes, considerando as quantidades abatidas, conforme podemos verificar pela tabela abaixo. TABELA 33 - AVES ABATIDAS EM CADA ABATEDOURO DA SADIA : 1995 (em cab.) Concórdia Chapecó * Toledo 2 Vizinhos Fco Beltrão A. Brasilien V. Grande SC - 1994 SC - 1994 PR - 1995 PR - 1995 65.088.905 46.909.114 PR - 1995 72.316.789 62.699.822 32.149.581 SP - 1994 MT - 1994 27.590.522 30.000.000 * Neste abatedouro eram feitos todos os abates de peru da empresa, até junho de 1996, quando entrou em funcionamento outra linha de abate de perus na unidade de Francisco Beltrão-PR. Fonte: Levantamento feito durante a pesquisa de campo nas instituições públicas dos estados. É preciso ressaltar que o abatedouro de Francisco Beltrão além de ser uma aquisição recente, vinha sendo preparado para atuar também no abate de perus; que o de Várzea Grande é o mais novo da empresa (e é o único lugar onde a Sadia produz mais da matade da matériaprima internamente) e que; em São Paulo, considerando o de Américo Brasiliense, o custo de produção é mais elevado que no Sul do país. Analisando os abatedouros da Ceval percebemos que houve também um forte crescimento nos abates por unidade, mas a estratégia global é de manter mais unidades, com um número menor de abates em cada uma. Sem contar os dois últimos abatedouros adquiridos quando da compra da Agroeliane246, podemos analisar os avanços e a quantidade abatida nas unidades da empresa, pela tabela abaixo. 245 Informações obtidas na entrevista acima citada. Dividindo os 65 milhões de frangos pelas 52 semanas do ano, teremos um total de 1.250.000 frangos por semana, nas duas nórias, ou 625.000 por nória. Se dividirmos este total por 5 dias trabalhados por semana, teremos um abate de 125.000 frangos por dia, ou de 14.710 frangos por hora e por nória. Em cada nória trabalham 5 pessoas para pendurar os frangos, outros 5 no setor de degola, 4 inspecionadores do SIF, 24 na separação dos miúdos, 6 para arrumar os miúdos e 18 na embalagem, totalizando 62 pessoas, o que dá uma produção de 2.016 frangos por dia e por funcionário. 246 Em 1994, o abatedouro de Forquilhinha-SC, tinha uma capacidade de abate de 108 mil cabeças por dia, enquanto o outro abatedouro situado em Sidrolândia, no Mato Grosso do Sul abatia 60 mil cabeças por dia. 231 TABELA 34 - AVES ABATIDAS EM CADA ABATEDOURO DA CEVAL : 1989-2000 (em cab.) Anos Seara Itapiranga Jaraguá do Jacarezinho Jundiaí Nuporanga SC SC Sul - SC PR SP SP 17.810.800 11.222.748 11.165.269 6.391.770 10.490.529 1.416.698 1995* 20.617.000 17.532.000 20.989.000 12.702.000 25.166.000 15.921.000 2000* 37.800.000 37.800.000 37.800.000 34.335.000 37.800.000 33.390.000 1989 * Previsão. Fonte: Ceval. Percebe-se portanto que a Ceaval adota uma estratégia de estabelecer-se com abatedouros considerados « médios » para a Sadia. Quanto à Perdigão, combina estratégias de pequenos com médios e grandes abatedouros. TABELA 35 - AVES ABATIDAS EM CADA ABATEDOURO DA PERDIGÃO : 1994 (em cab.) Capinzal Videira Marau Serafina Correa Mococa SC - 1994 SC - 1994 RS - 1993 RS - 1993 SP - 1994 62.905.565 49.171.908 21.840.950 10.420.048 5.022.661 Fonte: Levantamento feito durante a pesquisa de campo nas instituições públicas dos estados. Neste caso, ressalte-se que, após a aquisição da empresa pelos novos proprietários, estão previstos investimentos para dobrar sua capacidade de produção nestes frigoríficos, assim como a possibilidade de construção de um novo grande abatedouro no Centro-Oeste do país. As demais empresas situadas entre as dez maiores do país, mantêm grandes e médios abatedouros no Sul, enquanto as paulistas e mineiras continuam trabalhando com pequenos e médios frigoríficos, direcionando sua produção mais para o mercado local e regional. 7. Do transporte totalmente próprio ao totalmente terceirizado Dados da revista Ceval Notícias, órgão de divulgação dos empregados da Ceval, ano 12, n° 105, maio de 1995, p. 16. 232 Como vimos no quinto capítulo a Sadia, a Perdigão e a Chapecó combinaram, de início, os transportes ferroviário, rodoviário e aéreo para fazer chegar os produtos do oeste catarinense até São Paulo e Rio de Janeiro. Durante a década de 60, com a melhoria no sistema rodoviário e na tecnologia dos caminhões frigoríficos, este modelo de transporte passou a predominar sobre os demais. Com isto as empresas desfizeram-se de seus aviões e a Transbrasil desligou-se do grupo Sadia, em 1972, tornando-se uma empresa independente. Este fato fez com que aumentasse cada vez mais a frota de caminhões próprios das empresas, para distribuir um volume sempre maior de produção, sobretudo a partir dos anos 80. Como o transporte exige altos investimentos e não agrega valor às mercadorias, as empresas perceberam que a terceirização deste serviço seria um bom negócio, sobretudo nos setores considerados « não estratégicos », como é o caso do transporte de mercadorias finais, dos frigoríficos aos portos, às filiais comerciais ou diretamente aos grandes consumidores247. Segundo o mesmo dirigente, nos últimos dez anos houve uma acentuação no processo de terceirizar tudo aquilo que não agrega valor ou não faz parte da missão da empresa, que é de produzir alimentos. No que se refere ao transporte de pintos de um dia, havia uma mescla, sendo que a Sadia entregava uma parte e outra parte era terceirizada. No começo dos anos 90 todo este serviço foi terceirizado, o mesmo acontecendo com o transporte de rações para os integrados. Para garantir tanto os horários de entrega quanto a qualidade das mercadorias, a Sadia mantém frota própria em cada filial comercial. Esta, é formada por caminhões menores248, encarregados de distribuir os produtos num raio de até cerca de 350 quilômetros de cada filial. Nesta área onde a empresa construía os armazéns com câmaras frigoríficas e tinha sua própria frota de caminhões, também começou a terceirizar. Em Fortaleza, no Ceará, a Sadia está presente com uma filial comercial desde 1986. Em 1994 mudou-se para um município vizinho, alugando as instalações de armazenagem dos produtos frigorificados. Além disto, 247 O que a Sadia exige destes prestadores de serviço é um tamanho fixo de caminhão conforme o objetivo. Caminhões de 12 toneladas para cargas menores, até de 25 toneladas, para viagens mais longas; tempo de uso dos caminhões (três a quatro anos, no máximo); a câmara fria é inspecionada a cada carregamento; o transporte não agrega valor, mas tem que garantir a qualidade da mercadoira; o motorista tem que seguir à risca os horários de entrega das mercadorias (entrevista com dirigente da Sadia, Concórdia-SC, 18 de abril de 1995). 248 A filial de Curitiba, por exemplo, tinha 14 caminhões próprios em 1988. Dentre eles, os que faziam as viagens mais longas, eram caminhões médios, com capacidade de 6 toneladas, enquanto os que faziam as entregas para Curitiba e cidades vizinhas eram pequenos, tipo furgões, com capacidade para uma tonelada (revista Integração, órgão interno da FAF, São Paulo, ano 10, n° 85, fevereiro de 1988, pp. 18-20). 233 conta com 16 caminhões próprios e outros seis em parceria249, iniciando a terceirizar também este setor. Na Ceval o transporte é todo terceirizado. Inicialmente houve épocas em que a empresa tinha alguns caminhões, mas atualmente toda a frota é terceirizada250. Os caminhões que fazem longo percurso têm capacidade variável de 12 a 25 toneladas e levam os produtos diretamente para as unidades de distribuição ou para clientes que compram em grandes quantidades251. Outros caminhões menores fazem a distribuição dos armazéns aos clientes. Neste caso, até cinco anos atrás os caminhões pertenciam à Ceval, sendo terceirizados em seguida. Na Avipal, desde o início da década de 90 todo o transporte foi terceirizado, mesmo os caminhões que fazem o transporte interno. Até os veículos dos técnicos que prestam serviço à empresa pertencem aos técnicos e a Avipal paga por quilômetro rodado. « Só mantemos alguns caminhões no transporte de longa distância para avaliar o custo e a qualidade dos produtos »252. Na maioria das grandes empresas , todo o sistema de transporte que ainda não é terceirizado tende a caminhar para isto, o que diminui os custos operacionais, os investimentos e faz com que cada empresa concentre seus esforços naquilo que melhor sabe fazer, no caso das agroindústrias, produzir alimentos253. 8. Logística de distribuição nacional 249 Dados da revista Integração, órgão interno da FAF, São Paulo, n° 146, jan-fev de 1996, p.21. 250 Os dados sobre o funcionamento do sistema de transporte da Ceval foram conseguidos na entrevista com o gerente da área comercial da divisão de carnes da Ceval, São Paulo, 12 de maio de 1995. 251 Os que fazem os longos percursos formam uma frota em torno de 300 caminhões personalizados, que só trabalham para a Ceval. Os caminhões menores são de uma, duas, três e seis toneladas. 252 Entrevista com o diretor de produção da Avipal, Porto Alegre-RS, 28 de abril de 1995. 253 Ainda uma curiosidade em relação ao número de caminhões envolvidos na integração vertical da avicultura, cujos dados foram fornecidos pelo presidente da UBA e diretor da Frangosul. « Nós produzimos nossos próprios pintinhos e, para isto, temos que alojar em torno de 460 a 470 mil pintos por dia, o que significa entregar diariamente 20 caminhões carregados de pintos. Nós matamos 450 mil frangos por dia e, como um caminhão carrega em torno de 2.500 frangos, temos que recolher diariamente 180 caminhões carregados de frango vivo. Precisamos produzir os ovos férteis, a serem levados para os incubatórios, sendo mais 25 cargas por dia de transporte de ovos. Temos que produzir 2,35 toneladas de ração e, para isto, são em torno de 150 caminhões de milho e farelo de soja por dia que precisamos descarregar. Os caminhões de distribuição de ração carregam 9 toneladas, o que dá 260 caminhões por dia que temos que carregar e despachar. Para distribuir o frango abatido (são em torno de 700 toneladas por dia), os caminhões carregam entre 14 e 15 t, em média, são 50 caminhões por dia. Portanto, nós carregamos e/ou descarregamos, por dia, 685 caminhões, no sistema de integração vertical da Frangosul » (entrevista feita em Montenegro-RS, 27 de abril de 1995). 234 Com o aumento do volume produzido, a urbanização da população, a ocupação territorial em direção ao Centro-Oeste e Norte do país, o consumo cada vez maior de carne de frango, as empresas sentiram o desafio de ocupar, com suas redes distribuidoras, todo o território nacional. Sadia e sua própria rede de distribuição « O padrão dos produtos Sadia só será mantido através de unidades distribuidoras próprias que, cuidando deles, lhes garantirão a qualidade original da fábrica até a mesa do consumidor final »254. Para tornar efetiva esta máxima, a Sadia se preocupou, desde os anos 50, em substituir os antigos vendedores « consignatários » por uma crescente rede de filiais comerciais próprias. Esta rede foi se desenvolvendo, tendo São Paulo como centro geográfico e maior consumidor do país. Atualmente, esta rede é formada por 20 filiais comerciais que se responsabilizam pela distribuição de seus produtos em todos os pontos do território nacional. TABELA 36- CIDADE E ANO DE FUNDAÇÃO DAS FILIAIS COMERCIAIS DA SADIA ANO CIDADE / ESTADO ANO CIDADE / ESTADO 1947 São Paulo - SP Anos 70 Brasília - DF 1955 Ribeirão Preto - SP Anos 70 Serra - ES 1956 Londrina * - PR 1985 São José dos Campos - SP 1956 Bauru - SP 1985 Porto Velho - RO 1956 Duque de Caxias - RJ 1986 Fortaleza - CE 1957 Campinas - SP 1987 Campo Grande - MS 1964 Belo Horizonte - MG 1989 Uberlândia * - MG 1964 Curitiba - PR Anos 80 1977 Manaus - AM 1990 Santo André - SP 1977 Salvador - BA 1990 Imperatriz - MA 1979 Itajaí - SC 1993 Porto Alegre - RS Recife - PE * As filiais de Londrina e de Uberlândia foram terceirizadas no início dos anos 90. Fonte: Elaboração própria a partir do material da Sadia e da pesquisa de campo. A Sadia chegou, portanto, no início dos anos 90 como a empresa agroindustrial que tinha a melhor rede de distribuição, com 20 filiais comerciais que atingiam todas as regiões do 235 país. Antes de ver como funciona a distribuição desde os abatedouros e fábricas de produtos industrializados até os pontos de venda, vamos recordar os princípios que orientam a logística de distribuição, já presentes no início da implantação desta logística e que foram se consolidando com o passar dos anos. A partir dos anos 80 as estratégias de distribuição sofisticaram-se, graças ao uso da informática, mas permaneceram assentadas nos princípios e métodos consagrados há anos na Sadia. « Ênfase na qualidade, entrega no prazo, racionalização dos serviços da frota de 600 caminhões, distribuição capilarizada através da ampliação e ou abertura de novas filiais, flexibilização das margens operacionais para manter posições de mercado, extensão do controle de qualidade aos 115 mil pontos-de-venda, assistência permanente a clientes e consumidores. Este continuou sendo o espírito de comercialização da Sadia » (Teixeira, 1994, p. 112). Para ter um canal permanente de comunicação com os consumidores, a Sadia inovou instituindo o SIC - Serviço de Informação ao Consumidor, em 1982. Através do SIC a empresa acolhe reclamações e sugestões, passa esclarecimentos sobre frabricação, conservação, manuseio e preparo dos produtos. As ligações255 são registradas num banco de dados, a partir dos quais toda a empresa se beneficia, sobretudo a área comercial e de marketing. Exatamente dez anos depois de lançado o SIC, a Sadia ampliou ainda mais seus canais de comunicação criando a Casa do Consumidor, em 1992. Situada no bairro da Vila Anastácio, em São Paulo, numa área de 400 metros quadrados, ela é, na verdade, um complexo que envolve o SIC, a Cozinha Experimental e uma área de treinamento e cursos. A experiência do SIC levou a empresa a integrar num único espaço seus serviços de atendimento, informação e interação com clientes e consumidores256. 254 Ottoni Romano Fontana, sobrinho do fundador da Sadia, que trabalhou muitos anos na filial comercial de Belo Horizonte-MG (revista Integração, órgão interno da FAF, São Paulo, ano 9, n° 79, agosto/1987, p. 17). 255 « SIC - Você liga e a Sadia responde pelo que faz », através deste slogam, o SIC recebeu, em 1993, a média de de 170 ligações por dia, além de receber e responder uma média de 650 cartas mensais (Teixeira, 1994, p. 114). 256 Uma equipe de técnicos formados na área de nutrição e alimentação responde por esse atendimento, bem como pelo desenvolvimento de cursos e sessões de treinamento para profissionais da área, da empresa ou de fora, tais como degustadores e demonstradoras em pontos-de-venda, técnicos, professores, maîtres, gastrônomos e outros. 236 Logística: do abatedouro ao consumidor Em 1995, segundo dados do relatório anual, a Sadia abateu 325,4 milhões de frangos, 13,4 milhões de perus, produziu 2,6 milhões de toneladas de suínos e 354,9 mil de bovinos, produzindo 546 mil toneladas de carne de aves, 183 mil de carne suína e 85 mil de carne bovina, sendo que desta produção, 334 mil toneladas de carne (41%) foram destinadas a produtos industrializados. Para distribuir esta produção, « a Companhia opera uma sólida frota de 500 caminhões frigoríficos próprios, além de 1.200 caminhões terceirizados que respondem pelo deslocamento de produtos das 24 plantas industriais para as 20 filiais de comercialização, que atendem a 150 mil clientes, do Amazonas ao Rio Grande do Sul »257. Basicamente existem três fluxos para os produtos da Companhia: das 24 unidade industriais para as 20 filiais comerciais; destas para os 150 mil pontos-de-venda espalhados pelo país e; vendas diretas da indústria para o cliente, no caso de volumes muito expressivos, assim chamados clientes institucionais258. Uma pequena parte destes produtos é distribuída diretamente pelos supermercados Sadia259. 257 Sadia, Relatório Anual, 1994, p. 12. 258 O mercado institucional é formado por aqueles clientes que compram produtos da empresa, geralmente em grande quantidade, não para revendê-los, mas para consumi-los ou servi-los como alimento. Encontram-se entre eles, os restaurantes industriais auto-geridos, redes de lanchonetes, estabelecimentos de ensino, hospitais, restaurantes especiais, buffets, redes de hotéis e órgãos governamentais. O que caracteriza o mercado institucional é a comercialização dos produtos com determinados prazos de pagamento, ao contrário do que acontece nas vendas a varejo, cujo pagamento dos produtos é efetuado à vista. 259 « Já temos uns 10 a 12 supermercados atualmente, mas foi uma decisão difícil de tomar para entrar nesta área » (depoimento de Ivo Frederico Reich para o Projeto 50 anos de história da Sadia, São Paulo, 1° de junho de 1993). Os supermercados do grupo estabelecem-se nas cidades onde a empresa mantém indústrias ou abatedouros. O último deles foi inaugurado em Francisco Beltrão, no sudoeste do Paraná, em novembro de 1993, contando « com 9.600 m2 de área construída, dos quais 3.600 m2 são destinados ao estacionamento em área coberta. É o mais bem informatizado do interior do país, contando com um sistema de rede de computadores e códigos de leitores de barra nos check-outs » (revista Integração, órgão interno da FAF, São Paulo, ano 16, n° 134, Janeiro/fevereiro de 1994, p.18). 237 ORGANOGRAMA 2 - SADIA E SUA ESTRUTURA DE COMÉRCIO DE FRANGO NO BRASIL - 1995 G R U P O S A D I A Matrizeiros Incubatórios - pintos de um dia Fábricas de rações Agricultores integrados Abatedor SC Abatedor Abatedor SC PR Concórdia Chapecó Toledo Abatedor PR D.Vizinhos Abatedor Abatedor PR SP Fco Beltrão Abatedor MT A.Brasiliense V.Grande C O M E R C I A L I Z A Ç Ã O 500 caminhões próprios 1 200 caminhões terceirizados Representantes nas 20 filiais commerciais cidades médias RS, SC, PR, SP (6), RJ em cada estado ES, MG, DF, MS, AM MA, RO, BA, PE, CE Mercado Institucional: escolas, hospitais hipermercados, supermercados redes de restaurantes, organismos avícolas, padarias, feiras, governamentais, buffets, hotéis açougues, mercearias 10 a 12 Supermercados 7 150.000 pontos de venda em 2.300 cidades, servidas pelas filiais comerciais e representantes Em 1995 a Sadia comercializou 421.393 toneladas de aves no mercado interno e exportou 124.607 toneladas da Sadia 238 Fonte: Elaboração própria, a partir dos dados da Sadia e da pesquisa de campo. Uma vez chegados às filiais comerciais ou aos representantes exclusivos da Sadia nas regiões e/ou cidades onde o volume de vendas não justifica a presença de uma filial, são distribuídos aos pontos de venda. Cada filial atende os clientes num raio médio de 350 quilômetros da sede, havendo pequenas diferenças conforme a localização de cada uma. Em São Paulo, por exemplo, as distâncias são menores, no entanto, o volume e o número de clientes é muito grande, sem contar as dificuldades cada vez maiores de transporte260. No Mato Grosso do Sul, a filial distribui seus produtos num raio de até 425 quilômetros devido à dificuldade de estabelecer outras filiais ou representantes, por causa do pequeno volume de vendas. Para compreender melhor a logística de distribuição de cada estado, vejamos como funciona no Paraná. Existe a filial comercial de Curitiba, implantada ainda em 1964 no centro da cidade, ampliada e transferida para a periferia, com novas instalações, em 1973. Esta unidade atende Curitiba e região metropolitana, o sul do Paraná, o litoral, parte do norte do estado, além de parte do sul de São Paulo e norte de Santa Catarina, num raio de até 350 quilômetros da sede, com uma frota própria de 14 caminhões261. Além da filial comercial de Curitiba, a Sadia tem representantes exclusivos em Londrina, Foz do Iguaçu, Cascavel, Toledo e Pato Branco, principais cidades do interior, possibilitando-lhe estar presente em todo o estado. « Através de uma moderna e eficiente prestação de serviços, a empresa atende aproximadamente 250 cidades paranaenses, comercializando mais de 300 itens alimentícios, numa média mensal de 2.300 toneladas em quase 12 mil pontos de venda no estado »262. Quanto ao sistema de informações e de coordenação de vendas, está centrado em São Paulo, na sede administrativa da empresa. Existe um diretor geral de vendas, auxiliado por três diretores por região do país, que passam a semana viajando e visitando as filiais, 260 Para manter a agilidade e eficiência, apesar dos problemas de transporte, a Sadia iniciou, em 1990, a implantação de roteirização por computador na Grande São Paulo, Campinas e São José dos Campos-SP. Esta medida se justifica pela grandiosidade desse trabalho que, na região metropolitana de São Paulo significa chegar mensalmente a 25 mil pontos-de-venda. Com a otimização de rotas, pelo critério de racionalização do uso dos caminhões, a meta é alcançar uma economia de 10% nos custos de distribuição (Sadia, Relatório anual, 1990, p. 28). 261 A filial de Curitiba estava entre as cinco maiores unidades da Sadia Comercial, no final dos anos 80, quando contava com uma área total de 6.071 m2 de área construída, dos quais 1.176 m2 de câmaras frias, capazes de estocar 373 toneladas de congelados, resfriados e alimentos secos. Em 1988, a unidade distribuía 1.200 toneladas de produtos por mês (revista Integração, órgão interno da FAF, São Paulo, ano 10, n° 85, fevereiro de 1988, pp. 18-20). 262 Sadia, material da Assessoria de Comunicações: Sadia no Paraná, 1991, p. 3. 239 retornando na sexta-feira a São Paulo, para avaliar as vendas e programar o trabalho da semana seguinte263. Logística de distribuição das demais líderes A Ceval segue um caminho semelhante ao da Sadia, no que se refere à logística de distribuição de suas mercadorias. Os produtos avícolas e seus derivados partem dos oito abatedouros para as 15 unidades de distribuição, localizadas nas regiões Sul, Sudeste e Centro-Oeste. No Norte e Nordeste, os produtos da Ceval são distribuídos por representantes exclusivos da empresa. 263 Entrevista com superintendente da ANAB, São Paulo, 27 de março de 1996. 240 ORGANOGRAMA 3 - CEVAL E SUA ESTRUTURA DE COMÉRCIO DE FRANGO NO BRASIL - 1995 G R U P O C E V A L Matrizeiros Incubatórios - pintos de um dia Fábricas de rações Agricultores integrados Abatedor Abatedor Abatedor Abatedor Abatedor Abatedor Abatedor Abatedor SC SC SC SC PR SP SP MS Itapiranga Seara Jguá Sul Criciúma Jacarezinho Nuporanga Jundiaí Sidrolândia C O M E R C I A L I Z A Ç Ã O 300 caminhões terceirizados 20 Representantes 15 filiais commerciais no Norte e Nordeste SC (3), PR(3), SP (5) RJ, DF, MG, MS Hipermercados hospitais supermercados feiras avícolas açougues restaurantes mercearias Em 1995 a Ceval comercializou 257.239 toneladas de frangos no mercado interno e exportou 69.641 toneladas. Fonte: Elaboração própria, a partir dos dados da Ceval e da pesquisa de campo. 241 As unidades comerciais da Ceval distribuem 20 mil toneladas por mês de produtos industriais, entre os quais 8 mil toneladas de frango por mês264. Para isso a Ceval dispõe de uma frota de 320 veículos, de uma a seis toneladas, todos contratados. Quanto ao raio de atendimento de cada filial, a « média é de 130 a 150 quilômetros, mas chegam a ir até 300 quilômetros da sede, fazendo entrega com os caminões pequenos. Em São Paulo o raio é menor, só que leva mais tempo em função do trânsito »265. Um dos grandes problemas para atender os clientes em todo país são as distâncias. Para resolvê-lo, a Ceval comprou em 1995, um abatedouro no Mato Grosso do Sul, que atenderá o Centro-Oeste e Norte. Além disso, está viabilizando a construção de outro grande abatedor na Bahia para atender o Nordeste. « Nós enviamos frangos de Santa Catarina para Manaus. Nosso transporte é todo feito via caminhão e as estradas estão em más condições. O frete do frango que vai de Santa Catarina para Manaus, representa 50% do custo. O frango, portanto, é vendido mais caro »266. Em relação às demandas e o atendimento dos pedidos, funciona da seguinte maneira. Todos os pedidos em grandes volumes e o atendimento às grandes empresas distribuidoras é feito à partir da mesa de operação da Ceval Comercial de São Paulo. Ali são atendidos, analisados e decididos os pedidos de grandes quantidades de lojas como o Carrefour, o Pão de Açúcar, o Macro, o Sendas, o Eldorado, etc. Uma vez realizadas as negociações a nível nacional, as informações são repassadas às filiais comerciais de cada local que irão atender aos pedidos de cada loja. Quanto à logística de distribuição, « os abatedouros de São Paulo servem este estado, mais as regiões Norte e Nordeste. Os de Santa Catarina servem a região Sul, mais o Norte, parte do Nordeste e as exportações. O do Mato Grosso do Sul, serve o Centro-Oeste e exporta para a Arábia Saudita e outros países do Oriente Médio »267. A Divisão Produtos de Consumo da Ceval, encarregada das vendas de margarinas, óleos vegetais e farinhas, tem um diretor geral e outros seis sub-diretores regionais. « Nós 264 Entrevista com o gerente da área comercial da divisão de carnes da Ceval, São Paulo, 12 de maio de 1995. 265 Entrevista com o gerente da área comercial da divisão de carnes da Ceval, São Paulo, 12 de maio de 1995. Atualmente, os estados mais importantes para as vendas da Ceval são São Paulo, Rio de Janeiro, Brasília, Santa Catarina e Paraná. 266 Entrevista acima citada. Para termos uma idéia da distância, entre Florianópolis, capital de Santa Catarina e Manaus, capital do Amazonas, são 4.343 quilômetros, o que dá quase duas vezes a distância entre Madrid e Berlin (2.378 km). 267 Entrevista com operador da área comercial da divisão de carnes da Ceval, São Paulo, 27 de março de 1996. 242 ainda não estamos presentes em todos os pontos de venda do país, mas vamos chegar lá »268. Cada uma das regionais tem sua característica. A Regional São Paulo e Grande São Paulo caracteriza-se por concentrar as centrais dos principais supermercados do país. A Regional Sul (RS, SC, PR) tem um público consumidor exigente, atento à qualidade, a um bom produto e a um baixo preço. A Regional Nordeste, criada em 1992, tem sede em Paulista-PE e atende de Salvador-BA até Teresina-PI. A Regional São Paulo/Interior abrange o interior de São Paulo, Mato Grosso do Sul e Triângulo Mineiro. A Regional Rio atende o Rio de Janeiro, a Grande Belo Horizonte e o Distrito Federal. A Regional Centro-Oeste abrange os estados de Goiás, Tocantins, Pará, Maranhão, Mato Grosso, Rondônia, Acre e Amazonas. A Perdigão também seguiu caminho semelhante à Sadia, implantando filiais comerciais com o objetivo de atingir todo o território nacional. « Uma rede de 28 armazéns distribuidores, espalhada por todo o Brasil, dá apoio permanente ao abastecimento dos mais de 50 mil clientes Perdigão »269. Certamente com a venda da empresa para outros donos, o Plano Estratégico e a implantação da Qualidade Total no grupo, haverá mudanças também na logística de distribuição. Logística de distribuição das « imitadoras » e das pequenas empresas A Frangosul, apesar de ter seus três abatedouros localizados no Rio Grande do Sul, segue o exemplo das líderes, buscando distribuir seus produtos em todo território nacional. Para isto dispõe de nove filiais comerciais no Sul e Sudeste. « Além das filiais as vendas também são realizadas diretamente pelas unidades produtoras, através de distribuidores e representantes comerciais, abrangendo todo o território nacional »270. A logística de distribuição da Frangosul busca atingir desde os pequenos pontos de venda até as grandes redes de supermercados. « Nos grandes volumes nós temos os grandes supermercados e outros grandes clientes, como as redes de hotéis, restaurantes, que atendemos direto, com uma distribuição mais concentrada, mais barata »271. Os milhares de pequenos comerciantes de periferia são atendidos pelas filiais comerciais e distribuidores 268 Entrevista com o diretor da Divisão Produtos de Consumo da Ceval, in: revista Linha Direta, órgão de comunicação do marketing, vendas e clientes da Ceval Alimentos S.A., Gaspar-SC, ano 1, n° 2, jun/95, pp. 6-7. 269 Perdigão 60 anos, 1994, Videira-SC, p. 12. 270 Frangosul, Relatório Anual, 1994, p. 7. 271 As informações sobre a logística de distribuição da Frangosul foram obtidas em entrevista com o presidente da UBA e diretor da Frangosul, Montenegro-RS, 27 de abril de 1995. 243 exclusivos. « Nós fazemos negócio com uma pessoa, que constitui uma firma para si, recebe o nosso produto e ele faz a distribuição, mediante pagamento imediato. Temos várias empresas destas, onde nós levamos o frango até seu centro de distribuição e eles redistribuem ». Com este sistema de comercialização a Frangosul distribui 700 toneladas de frango por dia. « Atingimos praticamente o Brasil inteiro, desde Manaus, Recife, Fortaleza, Bahia e São Paulo, enfim, estamos presentes em todos os estados brasileiros ». A logística de distribuição da Batavo busca trabalhar sobretudo com pequenos clientes. « Nossa filosofia é a de fugir dos supermercados. Por isso, procuramos vender nossos produtos em panificadoras, avícolas, restaurantes e outros pequenos e médios consumidores. Os grandes supermercados, como o Carrefour, exigem preço mais baixo, pontualidade, entrega diária, produto fresco e longo prazo de pagamento. Por isso que nós não temos interesse de trabalhar com eles »272. Quanto aos produtos da empresa, são distribuídos pelas suas cinco filiais comerciais, estabelecidas no Sul e Sudeste. Como o número de filiais é menor que o das líderes, seu raio de ação é maior. A filial de Curitiba, por exemplo, atende toda a região Sul, indo até Porto Alegre-RS273. As filiais comerciais distribuem todos os produtos da Batavo274 e, além delas, a empresa tem distribuidores independentes, que são seus representantes exclusivos, nas regiões onde não mantém filiais. Já a Chapecó que, com a compra da Diplomata de Cascavel-PR passou a ser a sexta maior empresa nacional, deixou de lado este tipo de logística para tornar-se mais agressiva no mercado. « A Chapecó, cujas vendas estavam mais voltadas para os açougues, com ênfase nos produtos a granel, partiu para a conquista de um lugar nas prateleiras dos supermercados, em busca de melhores preços para a sua produção »275. De uma maneira geral podemos dizer que todas as empresas centradas no Sul buscam dirigir sua produção em direção ao Sudeste, principal mercado consumidor nacional (mapa 5). 272 Entrevista com o gerente de exportações da Cooperativa Central de Laticínios do Paraná - BATAVO, Curitiba, 19 de maio de 1995. Acrescentou ainda o entrevistado: « Mas reconhecemos que eles estão certos. Eu, por exemplo, se tivesse um supermercado, faria as mesmas exigências ». 273 Os produtos são transportados por uma empresa chamada Transardo, fazendo transporte exclusivo para a Batavo, sendo que os caminhões são personalizados. A empresa também tem alguns caminhões próprios, mas a grande parte do transporte é feita por terceiros. 274 No caso específico do frango, a Batavo só vende no Paraná, São Paulo e Santa Catarina. Quando sobra frango destes mercados, envia também para o Rio de Janeiro. « No entanto, não temos uma grande produção para atingir todos os estados do país. Nossos produtos derivados do leite chegam até Brasília, mas não é o caso do frango. Todo nosso produto tem mercado e teríamos mercado garantido para mais produto, mas para isto, teríamos que aumentar a capacidade do abatedouro ou instalar uma nova planta » (entrevista acima mencionada). 244 Quanto às empresas menores, normalmente com um único abatedouro, por não conseguirem volume de produção e nem condições de competir no mercado nacional, destinam seus produtos para o mercado local e/ou regional. Neste caso estão sobretudo incluídas as empresas médias e pequenas de São Paulo, Minas Gerais, Goiás e as do Nordeste e Norte. 275 Jornal Gazeta Mercantil, São Paulo, 10 de dezembro de 1995. 245 Mapa 5 - Localização das filiais comerciais da Sadia, Ceval, Frangosul e Batavo: 1995 Fonte: Elaboração própria a partir dos dados das empresas e da pesquisa de campo. 246 A tabela abaixo nos ajuda a compreender, de maneira resumida, como está organizada atualmente a produção avícola integrada no país. TABELA 37 - ETAPAS DA PRODUÇÃO E COMERCIALIZAÇÃO, COM SUA FORMA DE GERENCIAMENTO NO SISTEMA DE INTEGRAÇÃO VERTICAL NA AVICULTURA BRASILEIRA - 1995 ETAPAS DA PRODUÇÃO FORMAS DE GERENCIAMENTO Pesquisa genética Importação (sobretudo da América do Norte e da Europa), adquirida « avós » fora da integração vertical. Empresa. Importando os ovos, as empresas produzem suas próprias Matrizeiros matrizes. Primeira etapa do processo de integração vertical dos principais grupos nacionais. Empresa. Integração vertical nas principais empresas (compra eventual Incubatórios (produção de terceiros para complementar a produção própria). Compra de de pintos de um dia) terceiros, por parte de muitas empresas de médio e pequeno porte, sobretudo em São Paulo e Minas Gerais. Empresa. Integração vertical. As grandes empresas produzem toda a ração utilizada por seus integrados (vendem eventualmente para Produção de ração terceiros). Sobretudo em São Paulo, existem empresas que atuam fora do sistema de integração, especializadas em produção de rações e vendem para os « avicultores independentes » e de « fundo de quintal ». Adquiridos pelas grandes empresas fora do sistema de integração Vacinas e vertical. Os pintos de um dia já saem vacinados dos incubatórios para os Remédios aviários. Os remédios posteriores, são comprados pelas grandes empresas avícolas e repassados aos integrados. Agricultor. Integração vertical, com serviço terceirizado, desde o início da avicultura industrial no Sul do país e realizado por pequenos Criação e « engorda » agricultores integrados. Em São Paulo, historicamente esta etapa da dos frangos produção era feita por grandes avicultores independentes. Com a entrada das empresas do Sul (Sadia, Ceval, Perdigão, Chapecó) os integrados passam a substituir esta forma de produção. Empresa. Integração vertical, sendo realizado nos próprios Abate das estabelecimentos da empresa. O abatedouro é colocado como ponto aves « central » da cadeia produtiva. É a partir dele que se organiza a integração vertical, tanto « para trás » como « para frente ». Empresa. Integração vertical. Os cortes são geralmente feitos em salas Cortes e anexas aos próprios abatedouros. Os produtos industrializados a partir da 247 industrialização carne de frango, geralmente são elaborados em indústrias próprias para isto, anexas aos abatedouros. Terceirizado. No início todo transporte era feito pelas empresas. Atualmente, com exceção de alguns serviços especializados, tudo é Transporte terceirizado, desde o transporte de pintos de um dia, ração, carregamento dos frangos até o abatedouro e deste à filial comercial, até a distribuição aos pontos de venda. Empresa e terceiros. Integração vertical. As principais empresas trabalham com filiais comerciais nos estados onde o consumo é mais Comercialização importante (Sul, Sudeste e Centro-Oeste). No Norte e Nordeste seus produtos são distribuídos por representantes exclusivos, com exceção da Sadia, que mantém filiais comerciais também nestas regiões. O mercado principal é o interno. A partir de 1975 as empresas iniciaram Mercado as exportações de frango inteiro e, desde 1984 exportam também partes de frangos, entretanto, as vendas externas só representam, historicamente, cerca de 13% da produção nacional. Fonte: Elaboração própria a partir do material das empresas e da pesquisa de campo. 9. Grandes e médias dividem a produção nacional com as pequenas e micro-empresas Como vimos no capítulo anterior, apesar da importância das empresas líderes, não houve formação de oligopólios. Mesmo não tendo havido, é inegável a diferença e o peso econômico dos principais grupos agroindustriais em relação às empresas « imitadoras » e sobretudo às pequenas. Entretanto, pelo menos até 1995, havia lugar para estas últimas e mesmo para as micro-empresas. Aliás, as pequenas e micro foram responsáveis, neste ano, por 54,45% da produção total do país. Buscaremos, em seguida, estabelecer uma tipologia das empresas avícolas classificando-as em três grupos em função de suas principais características. Papel das empresas líderes na avicultura « Nós temos hoje no Brasil em torno de 100 abatedouros avícolas, pertencentes a cerca de 80 empresas que trabalham com SIF, das quais 57 são associadas à ANAB »276. Deste 276 Entrevista com o superintendente da ANAB, São Paulo, 27 de março de 1996. 248 conjunto de empresas destacamos as três maiores como as líderes do setor277. Classificamos a Sadia, a Ceval e a Perdigão num grupo à parte, porque a verdadeira disputa pelo mercado nacional se estabelece entre elas e a partir delas. Além disto, são as únicas que têm abatedouros suficientes e uma rede de distribuição para responder às exigências e necessidades do mercado nacional e têm uma clara política de internacionalização, com vistas à instalação de plantas industriais em outros países. A Sadia foi a primeira a implantar a integração vertical e a se beneficiar das economias de escala e de diversificação conseguidas graças a este processo. As outras duas líderes seguiram seus passos. Atualmente são as três empresas do setor cujos processos de terceirização, de implantação de projetos de qualidade total e de « colaboração interempresas » estão mais adiantados. As três maiores fazem pesquisa genética sobretudo em suínos (onde desenvolvem raças puras) mas também em aves, onde centram seu trabalho nas adaptações de raças importadas ao clima e à alimentação local. Para isto, dispõem de centros de pesquisa aplicada e de outros centros de pesquisa para controle de qualidade e de desenvolvimento de novos produtos. Pelo seu volume de produção, atingem as vantagens da economia de escala e de diversificação, lançando novos produtos a cada ano, para atender as novas demandas do mercado. Cada vez destinam maior parte do frango à produção de cortes e sub-produtos industrializados, o que aumenta o valor agregado e sua rentabilidade278. Não atuam só no setor de carne de aves (neste caso, são as únicas a possuir outras aves, como o peru da Sadia e a « avis rara »: codorna e perdizes, da Perdigão). A Sadia é a única das empresas do setor com atuação também na bovinocultura. Quanto à Ceval, tem sua história ligada à compra, exportação, industrialização e comercialização de soja, mesmo sendo a segunda maior empresa nacional no setor de carnes. O mesmo procedimento de economia de escala e integração vertical em soja e milho é seguido pela Sadia e Perdigão, onde além de aproveitarem o farelo como matéria-prima na fabricação de rações, fazem produtos finais, como óleo refinado e margarinas. 277 Para Müller (1991, p. 41) fazem parte da lista das empresas líderes da cadeia agroindustrial de carnes no Brasil, a Sadia, a Ceval, a Perdigão, a Avipal e a Frangosul, além de sete ou oito centrais cooperativas. Para o autor, uma das características das empresas líderes é o fato de terem suas atividades de planejamento estratégico, investimentos e controle das grandes decisões centralizadas numa « holding ». 278 Se o frango inteiro foi vendido a cerca de US$ 1,10 em 1995, seus cortes e produtos industrializados ajudaram a fortalecer o caixa dos grupos agroindustriais pelos seus preços mais elevados. O filé de peito de frango foi vendido a US$ 3,30, o peito desossado com pele a US$ 2,42 e o filé de coxa a US$ 1,93 (dados do jornal da semana Anab, ano III, n° 138, 8 de maio de 1995). 249 Há 20 anos transformaram-se nas três maiores exportadoras de carne de frango do país, o que lhes permitiu acumular um importante savoir-faire em comércio internacional e, sobretudo a partir dos anos 90, iniciaram um processo de internacionalização, primeiro com filiais comerciais e, em seguida, comprando e/ou instalando indústrias fora do país. Para manter sua posição e disputar fatias do mercado nacional e das exportações, fazem altos investimentos279 tanto para aumentar suas vantagens de economia de escala e de diversificação, como para aumentar sua capacidade de produção para atender a um consumo sempre crescente de carne de frango. Além disso, os investimentos servem para melhorar a qualidade dos produtos e inovar com novos produtos de maior valor agregado. Em relação aos managers e dirigentes intermediários, são as que possuem mais experiência e, sobretudo no caso da Sadia e Ceval, « escolas de formação interna de quadros » a partir de determinadas empresas de cada grupo onde capacitam, na prática, seus novos dirigentes. Todas dão grande importância (e têm condições financeiras para fazê-lo) à participação de eventos e experiências internacionais, tendo também acesso a consultorias especializadas no momento de reestruturar, repensar e elaborar planejamentos a longo prazo para suas empresas e seus investimentos. São as três empresas do setor cujo processo de « Qualidade Total » está no estágio mais avançado de implantação, conseguindo a partir dos últimos dois anos, tirar proveito deste novo modo de organização, aumentando seu volume de produção, seu faturamento e seu lucro líquido. O desafio das « imitadoras » Existe um segundo grupo que classificamos de « imitadoras », por estarem localizadas num segundo nível, tanto no que se refere ao volume de produção, como na ocupação do território nacional em vendas. São consideradas « imitadoras » porque estão fazendo basicamente os mesmos investimentos que as três maiores, em toda cadeia produtiva. Neste segundo grupo estão a Avipal, a Frangosul, a Chapecó, a Pena Branca, a Da Granja, a Minuano e a Aurora, que completam a lista das dez maiores a nível nacional. Elas caracterizam-se por ter implantado a integração vertical, seguindo o mesmo exemplo das anteriores. Mesmo investindo menos em pesquisa aplicada, conseguem competir 279 A Sadia investiu, de 1991-95, uma média de US$ 74,4 milhões por ano (Sadia, Relatório Anual, 1995). A Ceval « pretende investir US$ 300 milhões nos próximos cinco anos » (Ceval, Relatório Anual, 1994, p. 3). 250 com aquelas, no lançamento de novos produtos e disputando mercados específicos como o de final de ano, por exemplo280. Pelo seu volume de produção conseguem atingir as vantagens da economia de escala, muitas delas conseguindo também uma economia de diversificação, disputando os melhores e mais rentáveis mercados dos produtos com valor agregado e semi-prontos, acrescentando pontos importantes no seu lucro líquido a cada ano. Perdem para as três anteriores no que se refere à estrutura de comercialização nacional, tanto por não terem uma rede tão ampla de filiais comerciais, como pela falta de produtos para atender à demanda nacional, dirigindo sua produção sobretudo para o mercado local e regional. Outra característica que as assemelha às três anteriormente é sua disposição de disputar o mercado da região Sudeste, estabelecendo filiais comerciais em São Paulo e no Rio de Janeiro. Outra característica que as aproxima das líderes é sua diversificação de produtos. Nenhuma delas produz só derivados de frango. A Avipal é a única das grandes empresas avícolas também dedicada à produção comercial de ovos, a Frangosul a única ligada ao abate, industrialização e venda de carne ovina, a Aurora a única que atua no setor de sucos de laranja, uva e tangerina. A maioria delas atua também na suinocultura e algumas dominam a integração vertical da soja, como elemento importante na fabricação de rações. Todas exportam produtos provenientes do frango e têm no mercado internacional uma importante fonte de venda dos excedentes do mercado interno. Além disso, as exportações exigem destas firmas uma constante atualização tecnológica e organizacional, para atender as exigências dos importadores, savoir-faire que as torna mais competitivas também no mercado interno. Diferente das demais, ainda não têm perspectivas imediatas de implantação com usinas próprias no estrangeiro. Seu maior desafio ainda é o de se implantar com usinas e filiais comerciais nas diferentes regiões do país. Um obstáculo em relação às líderes é seu volume de investimentos, bem menor que o das grandes empresas281, o que dificulta acompanhar o ritmo de crescimento daquelas. Mesmo assim, graças aos ganhos da produção em escala e da diversificação no sentido de agregar A Perdigão investirá US$ 50 milhões por ano entre 1995 e 1998 (jornal Indústria e Comércio, Curitiba, 18 de outubro de 1995). 280 Como já vimos anteriormente, várias destas empresas lançaram « frangos especiais » para disputar com o peru, o chester e o classy o mercado de final de ano e, várias delas lançaram também apresuntados de suínos para este mesmo tipo de festividades. 281 A Chapecó pretende investir US$ 30 milhões entre 1995 e 1997, o que dá uma média de 10 milhões por ano (entrevista com o presidente da empresa, publicada no jornal Gazeta Mercantil, São Paulo, 20/12/95). A 251 mais valor, seus investimentos permitem-lhes continuar crescendo e ganhar pontos na disputa com as maiores pelo mercado interno. Mesmo não atingindo o mesmo grau que as líderes, todas iniciam ou estão em estágios relativamente avançados de implantação de programas de « qualidade total », o que lhes permitirá continuar no mercado e mesmo crescer. Algumas delas, para apressar seu processo de crescimento, têm lançado mão da compra de empresas concorrentes, o que lhes permite queimar etapas e aumentar sua capacidade. Pequenas e micro-empresas respondem pela metade da produção nacional Como vimos na tabela 17 as pequenas e micro-empresas avícolas respondiam, em 1995, por 54,45% da produção nacional. Considerando uma produção total de 4.050 mil toneladas, estas empresas foram responsáveis por 2.205 mil toneladas, fato suficientemente significativo para analisar estas pequenas e micro empresas separadamente. Estas empresas, integradas verticalmente ou não, situam-se sobretudo em São Paulo, Minas Gerais, Centro-Oeste, Nordeste e Norte do país. Muitas delas têm dificuldades de permanecer no mercado porque, « com o achatamento dos valores do frango inteiro, não conseguem a mesma economia de escala que as grandes e nem a diversificação de produtos daquelas e, em consequência, estão mal ». Enfrentam ainda outra dificuldade, em relação ao custo de produção. « As empresas do Sul estão mais capitalizadas que as outras porque o custo da ave viva na região é de 12 a 13% mais baixo que em São Paulo. Em função disto, existem várias pequenas empresas paulistas em dificuldades financeiras »282. Em geral só dispõem de um abatedouro, destinando toda sua produção para o mercado local, não tendo volumes suficientes nem para concorrer no mercado nacional e nem para exportar. Conseguem permanecer no mercado porque seus custos administrativo-gerenciais são menores e porque têm menos gastos com o transporte das mercadorias. As que conseguem ter clientes cativos, colocando facilmente sua produção, têm menos problemas, apesar de Frangosul investiu US$ 18,6 milhões em 1995 e pretendia investir US$ 32 milhões em 1996 (Frangosul, Relatório Anual, 1995, p. 17 e 26) 282 Entrevista com o superintendente da ANAB, São Paulo, 27 de março de 1996. 252 enfrentar uma concorrência cada vez maior das líderes e « imitadoras »283. Estão melhor colocadas as que conseguem descobrir e atender nichos específicos de mercado. Em função de seu capital, de seu volume de produção, de seu savoir-faire e do menor acesso às informações e transformações acontecidas a nível internacional, muitas não conseguem implantar programas de qualidade total para acompanhar as maiores do setor, fazendo com que a médio prazo tenham ainda maiores dificuldades. Como trabalhamos com as maiores, as « sobreviventes », as que dominam e determinam a dinâmica e a concorrência nacional, temos menos informações sobre as pequenas e micro-empresas. Reconhecemos que seria necessário um estudo especial para melhor compreender o universo destas que produzem mais da metade das aves do país. TABELA 38 - TIPOLOGIA E PRINCIPAIS CARACTERÍSTICAS DAS EMPRESAS AVÍCOLAS BRASILEIRAS - 1995 Tipo de empresas Principais características Estão bem estruturadas em todas as etapas da integração vertical Fazem pesquisa genética adaptada em outros setores, sobretudo em suínos (bovinos e cereais, no caso da Sadia) Conseguem as vantagens tanto da economia de escala quanto de diversificação Estão centradas nos derivados de carne, mas atuam fortemente no setor de soja e de milho e seus sub-produtos (óleos e margarinas) Empresas Líderes Sadia, Ceval Perdigão Dispõem de bem montada rede logística de distribuição, atingindo todo território nacional Investem constantemente altas somas para manterem-se competitivas Disputam fatias dos principais mercados (fim de ano, páscoa, dia das mães...) com produtos concorrentes (peru, chester, classy, tender) Todas estão em avançados processos de implantação de programas de « qualidade total » São as três maiores exportadoras de carne avícola e derivados, tendo 283 Além de contar com grande número de pequenas empresas, o estado de São Paulo também tem miniabatedouros avícolas. Pelos dados do Centro de Inspeção de Produtos de Origem Animal - CIPOA, existiam em 1995, 25 miniabatedouros avícolas com inspeção estadual, cuja capacidade instalada de abate variava de 500 até 5.000 aves/dia (revista Avicultura Industrial, São Paulo, Ed. Gessulli, ano 85, n° 1028, pp. 78-79). 253 escritórios ou filiais comerciais em várias regiões no exterior Têm uma clara política de internacionalização, com implantação de plantas industriais no exterior Estão bem estruturadas em todas as etapas da integração vertical Menos estruturadas em pesquisa genética aplicada, mas conseguem lançar novos produtos para concorrer no mercado nacional Empresas « imitadoras » Conseguem as vantagens da economia de escala e de diversificação Sua logística de distribuição está voltada para os mercados locais, mas Avipal, Frangosul, estão presentes no Sudeste, algumas também em outras regiões Chapecó, Pena Todas atuam em outros setores, além da produção e industrialização de Branca, Da Granja, carnes avícolas Minuano, Aurora Estão vinculadas ao mercado internacional através das exportações, mas ainda não com instalações industriais próprias Não conseguem acompanhar os altos investimentos das líderes Estão implantando programas de qualidade total Integradas ou não verticalmente Só têm um abatedouro Não conseguem atingir as vantagens da economia de escala e nem de Pequenas e micro-empresas diversificação Seus custos administrativos são menores Sertanejo-SP, Pif Vendem seus produtos no mercado local ou regional Paf-SP, Só Frango- Têm reduzida capacidade de reinvestimento na produção DF, Frango Mineiro-MG... Menor acesso à tecnologia e inovações organizacionais internacionais Pouca capacidade técnico-financeira de implantar « processos de qualidade total » Muitas têm dificuldades de permanecer no mercado Responsáveis por mais da metade da produção nacional Fonte: Elaboração própria a partir do material das empresas e da pesquisa de campo. 254 CAPÍTULO 8 AUMENTO DA PRODUÇÃO E DO CONSUMO E AS NOVAS FORMAS DE REPRESENTAÇÃO DA AVICULTURA INDUSTRIAL Rico come frango porque é saudável Pobre come frango porque é barato. I. Avicultura industrial baixa os preços, aumentando a produção e o consumo de frango Um dos grandes desafios e, ao mesmo tempo mérito das agroindústrias avícolas brasileiras foi o de popularizar o consumo de frango num país cuja tradição era até então do consumo de carnes vermelhas. Os hábitos alimentares foram mudando gradativamente e o ditado popular citado no início da tese foi se transformando. O frango passou à mesa dos ricos por ser saudável e à dos pobres por ser barato e acessível. O aumento do consumo da carne de frango é apenas uma entre as muitas consequências da implantação da integração vertical e do desenvolvimento da avicultura industrial no Brasil. A formação de grandes complexos agroindustriais e o domínio da economia de diversificação levou o país à segunda posição mundial em termos de produção avícola, sendo superado apenas pelos Estados Unidos. Com uma gama cada vez maior de produtos que variam do frango inteiro a inúmeros embutidos e industrializados, cada vez mais fáceis de serem preparados, as empresas do setor acumularam, nestas três últimas décadas, um savoir-faire que lhes permite além de disputar o mercado interno, competir internacionalmente através das exportações e iniciar um processo de implantação industrial no estrangeiro. Várias empresas ligadas ao processo de produção avícola - tanto multinacionais dos setores de genética e veterinária como nacionais voltadas à produção de máquinas e 255 equipamentos para abate e industrialização do frango - tornaram-se referência de desenvolvimento no parque industrial do país. Como consequência, o consumo da carne de frango aumentou proporcionalmente mais que o das demais carnes e passou a ocupar o primeiro lugar no ranking do consumo de carne animal. Entretanto, alguns fatores tanto externos como próprios do desenvolvimento das indústrias do setor tiveram grande influência neste processo, como a mudança do perfil demográfico do país, a redução dos custos de produção e as novas representações políticas dos setores afins. 1. A mudança nos hábitos alimentares Um dos principais fatores de influência na mudança dos hábitos alimentares dos brasileiros foi a mudança do perfil demográfico do país, ocorrida a partir dos anos 50 e fortemente acelerada nas décadas seguintes. Se em 1960 o Brasil tinha 70 milhões de habitantes, dos quais apenas 45% viviam nas cidades, em l99l sua população passou para cerca de l50 milhões de habitantes, sendo 75,5% urbana. Assim, o país que passou mais de quatro séculos e meio de sua história com uma população e uma produção centradas na área e na economia rural, viu em apenas três décadas, além da rápida mudança do seu quadro demográfico, a importância da sua produção se deslocar da agricultura para a indústria e o setor de serviços. Tamanhas mudanças desencadearam uma série de outras transformações sócioeconômicas e culturais. Em primeiro lugar, um novo contingente de brasileiros passou a viver de salários mensais que lhes permitia adquirir os produtos industriais lançados no mercado. Uma outra parcela da população, com salários mais altos, começava a engrossar as classes médias urbanas, público alvo das indústrias em expansão. Ao mesmo tempo, toda essa população era impelida a trocar os antigos hábitos da vida no campo, onde a maioria dos produtos alimentares era preparada na própria casa, pelos novos hábitos da agitada vida nos centros urbanos. A redistribuição familiar de tarefas também se transformou e as mulheres foram ingressando gradativamente no mercado de trabalho. Com isso, nascia uma demanda por alimentos mais fáceis de preparar ou mesmo semi-prontos e o velho costume de « comprar galinha viva e matá-la na própria cozinha como garantia de qualidade » foi sendo substituído pelo de adquirir as novidades propostas pelas indústrias do setor e cada vez mais atraentes nas gôndolas dos supermercados. 256 O fato das pessoas passarem cada vez menos tempo em casa aliado aos novos produtos ofertados no mercado - como congelador e forno de microondas284 para citar apenas dois exemplos ligados à alimentação - favoreceu o surgimento de uma gama enorme de produtos congelados, vendidos em embalagens práticas e em menores quantidades, próprias para atender ao novo estilo de vida das grandes e médias metrópoles. O número crescente de pessoas que passaram a viver sozinhas reforçou esse « nicho de mercado », rapidamente explorado pelas indústrias alimentares. Criou-se o hábito de comer fora de casa. O que até então era um privilégio das camadas mais favorecidas da população, passou a ser uma rotina obrigatória para as camadas mais populares. Para evitar os problemas gerados pelas dificuldades dos meios de transporte da casa para a indústria, muitas empresas implantaram seus próprios restaurantes, economizando o tempo de deslocamento de seus funcionários e ganhando em produtividade. Paralelamente, para os trabalhadores das pequenas e micro-empresas, surgiu uma vasta rede de lanchonetes e pequenos restaurantes fast food, nos centros urbanos, oferecendo lanches e refeições rápidas a um preço abordável. Esse novo setor de serviços, tanto os restaurantes industriais como os pequenos estabelecimentos, formaram outro importante « nicho » de consumidores dos produtos semi-prontos ou de cortes de frangos cada mais diversificados oferecidos pelas empresas avícolas. Dois outros fatores podem ainda ser destacados neste processo de aumento do consumo da carne de frango, principalmente a partir da década de oitenta. Com um mercado consumidor em plena expansão, com produtos cada vez mais sofisticados e uma forte presença publicitária veiculada sobretudo através da televisão, o Brasil viu aumentar também o padrão de exigência da sua população, que passou a ter acesso a uma série de novas informações. Uma das novas preocupações dizia respeito à saúde e à « forma » do corpo e a consequência direta disso é a opção cada vez mais frequente da carne branca (de frango majoritariamente) em detrimento da carne vermelha, até então a preferida na mesa do brasileiro. Ligada a essa questão está o aumento do número de pessoas de meia idade e de idosos na pirâmide etária do país, que também por razões de ordem médica passaram a consumir mais carnes de frango. 284 Existem 2,7 milhões de aparelhos de microondas instalados em domicílios de grandes centros urbanos. Em 1994 foram vendidos 510 mil equipamentos, volume 32,5% superior ao do ano anterior. A previsão para 1995 era de alcançar o total de 700 mil unidades (Jornal Folha de S. Paulo, 7 de maio de 1995, caderno 3, p. 3). 257 Finalmente, as mudanças ocorridas na economia brasileira neste período e a queda significativa do poder de renda da população acabaram provocando um deslocamento ainda maior do consumo de carne bovina para o setor avícola. « O consumo de frangos na década de 80 ainda era relativamente baixo se comparado ao resto do mundo. Mas a infraestrutura e as indústrias já começavam a ser poderosas no Brasil. Em 1986, quando foi editado o Plano Cruzado285, houve um forte aumento do consumo de frango. Durante este tempo houve um aumento considerado do poder aquisitivo das pessoas e a oferta de proteínas não conseguiu atender as necessidades deste consumo. Isto fez com que a avicultura começasse a participar de mesas onde antes dificilmente entrava. Por falta de carne vermelha, outras pessoas passaram a comprar e consumir frango. Houve migração de consumo da carne vermelha para a carne branca. A partir daí, o incremento do consumo per capita foi cada vez mais acelerado »286. Nos primeiros cinco anos da década de 90, o consumo de frango aumentou em 73,1%, no entanto, o maior salto deu-se entre 1994 e 95, quando entrou em funcionamento o Plano de estabilização econômica que reduziu a inflação e aumentou o poder aquisitivo das classes mais pobres. Uma das consequências imediatas foi o maior aumento de consumo da proteína mais barata (ver tabela 43). De acordo com estudiosos do consumo de carnes, até o ano 2000 o consumo nacional de frangos irá suplantar o de carne bovina. Para Desouzart287, o trinômio qualidade nutricional, sabor, baixo custo tornará o frango a opção protéica do futuro. Pelas suas projeções, « chegaremos ao ano 2000 com um consumo de 26,6 quilos de carne bovina; 26,7 quilos de carne de frango e 6,9 quilos de carne suína per capita e por ano ». 2. Avanços tecnológicos e organizacionais contribuem para baixar o preço do frango Depois de instalada a avicultura industrial no país, houve avanços significativos em todas as etapas de produção, desde a genética até a distribuição final dos produtos. Estas mudanças foram tecnológicas, com a introdução de inúmeros avanços (grande parte deles 285 O Plano Cruzado foi lançado em 1986 pelo Ministro da Economia Dilson Funaro, durante o governo de José Sarney. Seu objetivo principal era de reduzir a inflação, contendo os gastos públicos e fortalecendo a moeda. Nesta ocasião, a moeda nacional perdeu três zeros e mudou de nome, passando de cruzeiro para cruzado. 286 Entrevista com o presidente da UBA e diretor da Frangosul, Montenegro-RS, 27 de abril de 1995. 287 Osler Desouzart (1994), « O quo vadis da indústria avícola para o ano 2000: Avanço no consumo de carnes e a perspectiva do mercado internacional », in: Anais da Conferência APINCO de Ciência e Tecnologia Avícolas, Campinas, pp. 151-157. 258 acontecidos a nível internacional) e organizacionais, com a melhoria das formas de trabalho nas diferentes instâncias produtivas. Um dos setores que mais evoluiu foi a pesquisa genética, conseguindo cada vez linhagens mais produtivas, tanto de aves de postura como de corte. Analisando a produtividade por matriz (tabela 39) pode-se ter uma idéia dos avanços conseguidos na avicultura de corte brasileira que ajudaram a baixar o preço do frango ao consumidor. Uma forma de medir o rendimento das matrizes é analisar a quantidade de pintos de corte produzidos. Em 1970 cada matriz produzia uma média de 51,4 frangos enquanto que vinte e cinco anos depois a mesma matriz estava produzindo uma média de 112,8 frangos. Entretanto, os números são ainda mais convincentes se analisarmos o rendimento por quilo de carne de cada matriz. Em 1971, cada uma produzia o equivalente a 71,9 quilos de carne de frango. Em 1995 esta produção passou para 180 quilos de carne em média por matriz, com um aumento de produtividade de 250,3%. 259 TABELA 39 - EVOLUÇÃO DA PRODUTIVIDADE DA AVICULTURA BRASILEIRA 1971-1995 Importação de Produção de Produção de Produção de- Rendimento de avós matrizes de corte Pintos de corte Carne de frango carne/matriz (unidade) (unidade) (mil) (toneladas) (Kg) 1970 62.289 - - - - 1971 78.117 3.114.463 160.000 224.000 71,9 1975 94.547 4.727.338 343.000 484.000 102,4 1980 254.227 12.105.311 1.008.459 1.200.000 99,1 1985 229.582 10.890.598 1.151.982 1.482.507 136,1 1990 340.293 15.794.681 1.621.194 2.355.549 149,1 1991 345.500 17.011.970 1.819.824 2.627.746 154,5 1992 378.300 17.277.000 1.974.641 2.872.254 166,3 1993 416.740 18.915.000 2.112.921 3.144.127 166,2 1994 450.000 20.837.000 2.323.906 3.411.026 163,7 1995 - 22.500.000 2.537.191 4.050.449 180,1 ANOS Fonte: Revista Realidade Agroavícola, dezembro de 1980, para os anos 1970 a 1975. UBA, APINCO, IBGE, AVES & OVOS, para os anos subsequentes. Nota 1 - A quantidade de avós importadas em 1970 foi calculada a partir do número de matrizes do ano seguinte e com base na informação de que cada avó produzia 50 matrizes. A base de cálculo foi o ano de 1971, pois o período compreendido entre a importação de avós e o da geração de matrizes sofre uma defasagem de aproximadamente 9 meses, a partir da qual se obteria o primeiro pinto de corte criado pelo integrado, numa média de 40 dias. Nota 2 - Para a produção de carnes, utilizou-se a tabela da revista Aves & Ovos, SP, Fev/1995, ano XI, n° 4, p. 26. Esta revista utilizou como fontes a APA, a APINCO, o IBGE e a própria revista AVES & OVOS. Partindo desta informação foi calculado o rendimento médio de carne de cada matriz. Outro efeito da genética pode ser observado analisando o avanço da produtividade do frango e seus ganhos na conversão de ração em alimento. Neste caso, além do melhoramento das linhagens dos frangos houve uma forte melhoria na qualidade das rações288, assim como uma alimentação voltada para cada tipo de raça e para as diferentes idades da ave. Com isto, 288 Considerando que as rações representam até 70% dos custos na produção de frangos de corte, a Avipal fez um estudo sobre ganhos ou perdas nas diferentes etapas e as matérias-primas utilizadas na sua fabricação. Analisando oito itens, o autor chegou à conclusão que se pode obter uma redução de US$ 0,3182 por ave se forem otimizadas cada uma das etapas produtivas (Ronei Vicente Gauer (1992), « Pontos críticos no processo produtivo de frangos de cortes - Rações », in: Anais da APINCO, pp. 1-13). 260 conseguiu-se uma criação de aves com maior peso, num menor espaço de tempo e com um menor consumo de ração. TABELA 40 - EVOLUÇÃO DO ÍNDICE DE PRODUÇÃO DO FRANGO DE CORTE - 1930-2001 ANO PESO CONVERSÃO IDADE (em gramas) ALIMENTAR* (em dias) 1930 1.500 3,50 105 1940 1.550 3,00 98 1950 1.600 2,50 70 1960 1.600 2,25 56 1970 1.600 2,00 49 1980 1.700 2,00 49 1990 2.000 1,90 45 2001** 2.240 1,78 41 Fonte: Revista A Granja, São Paulo, n° 508, out/1990, p. 16. * Conversão alimentar significa a quantidade de quilos de ração consumida para obter um quilo de frango vivo. ** Previsão O manejo nos aviários também evoluiu. Combinando novos equipamentos com aperfeiçoamento do trabalho dos integrados, foi colocado em prática um sistema cada vez mais adequado, tanto na alimentação como no controle da temperatura, na utilização de medicamentos e no sistema de « apanhe » dos frangos. Isto contribuiu para que os lotes de frangos fossem mais homogêneos, diminuisse o número de aves machucadas e aumentasse o índice de aproveitamento no frigorífico, colaborando para uma maior eficiência e portanto, uma redução do custo de produção. Os frigoríficos, como vimos, passaram por duas grandes transformações a partir de meados dos anos 80. Uma delas foi tecnológica, com a introdução de evisceradoras automáticas e balanças computadorizadas, aumentando significativamente sua produtividade. Outra, foi de cunho organizacional, com a implantação do processo de « qualidade total », quando houve uma reformulação na maneira de organizar o trabalho, otimizando o uso da mão-de-obra e melhorando a produtividade por funcionário. As redes próprias de distribuição e os « representantes exclusivos » das diversas empresas aperfeiçoaram seu sistema de distribuição, tornando mais eficiente a distribuição do frango e fazendo-o chegar até os mais distantes pontos de venda, sem contar com a disputa de 261 mercado ocorrida no setor dos supermercados, sobretudo nos anos 90, que ajudaram a baixar o preço final do frango ao consumidor. As vantagens da produção « fordista » em escala, colaboraram para o forte aumento na produção de frangos. Isto foi possível graças à implantação de um bem montado e moderno parque industrial a partir dos anos 70 e a otimização da produção, via melhoramentos tecnológicos na década de 80 e via uma melhor inovação organizacional no trabalho, através da implantação de programas de qualidade total, nos anos 90. Com isto, a produção brasileira de frangos passou de 217 mil toneladas para mais de quatro milhões em pouco mais de três décadas. TABELA 41 - PRODUÇÃO BRASILEIRA DE FRANGOS : 1970-1995 (em mil t) Ano 1970 1971 1972 1973 1974 1975 1976 1977 1978 1979 1980 1981 1982 Prod 217 Ano 1983 1984 1985 1986 1987 1988 1989 1990 1991 1992 1993 1994 1995 224 294 401 484 519 604 698 858 1.096 1.200 1.444 1.508 Prod 1.489 1.356 1.483 1.617 1.970 1.947 1.983 2.356 2.628 2.872 3.144 3.464 4.050 Fonte: APA, APINCO, IBGE, AVES & OVOS. O grande volume de frangos produzidos, conseguiu graças à economia de escala, baixar os preços unitários. Esta vantagem da produção fordista, associada às demais inovações tecnológicas e organizacionais dos anos 90, assim como as vantagens da economia de diversificação, contribuíram para baixar o preço do frango289 inteiro e colocar no mercado uma gama de produtos cada vez maior para atender às diferentes demandas. O frango tornou-se mais barato, pois, com a combinação de todos estes fatores. Seu preço médio por quilo, segundo os dados da CONAB - Companhia Nacional de Abastecimento, caiu de US$ 4,05 em 1974, para US$ 1,08 em 1995, fator principal para fazer aumentar seu consumo, sobretudo entre as classes mais pobres. TABELA 42 - PREÇOS MÉDIOS DA CARNE DE FRANGO NO VAREJO : 1974-1995 (em US$ por quilo*) Ano 1974 1975 1976 1977 1978 1979 1980 1981 1982 1983 1984 Preço 4,05 3,70 3,51 3,19 3,56 3,47 3,57 2,87 2,39 2,66 2,95 Ano 1985 1986 1987 1988 1989 1990 1991 1992 1993 1994 1995 289 O fato de baixarem os preços graças à aplicação de novas tecnologias, às novas formas de organização do trabalho e à concorrência entre as empresas, aconteceu também em outros setores da economia. No setor de produtos químicos (Basf, Bayer, Hoescht), o enorme crescimento da produção de alizerina fez cair o preço de 120 marcos o quilo em 1873 para 23 marcos em 1878, para 17,5 marcos em 1881 e para 9 marcos o quilo em 1886 (Chandler, 1993, III, pp. 129-130). 262 Preço 2,50 2,56 2,14 1,97 2,32 2,00 1,41 1,44 1,32 1,13 1,08 * Valores deflacionados pelo IGP-DI (Indice Geral de Preços), com base em dezembro de 1994. O valor de 1995 foi estimado pelo presidente da UBA. Fonte: CONAB - Companhia Nacional de Abastecimento. Segundo um dos dirigentes da Frangosul, « a avicultura brasileira conseguiu conquistar seu espaço porque foi a atividade primária que mais treinou pessoas, que mais multiplicou conhecimentos, que mais investiu em tecnologias ». Resumindo de maneira clara as razões que tornaram a avicultura competitiva, ele diz: « A avicultura conseguiu produzir um produto cada vez mais barato, porque reduziu a quantidade de ração para obtenção da mesma quantidade de carne, reduziu a mortalidade dos animais e aumentou a produção de pintos por matriz alojada, encurtou o tempo de engorda dos frangos. Isto fez com que, com a redução dos custos, mais e mais gente começasse a consumir o frango »290. 3. Diversificação de produtos leva a um maior consumo Entre os fatores que levaram a um maior consumo de aves, o principal é o preço baixo do frango inteiro. Todos os atores envolvidos na cadeia produtiva empenharam-se em « transferir os ganhos de produtividade ao consumidor final, traduzida em termos de preços mais baixos »291. Esta política, que consiste em « vender mais barato para vender a todos e em maiores volumes, com menores índices de ganho », fez com que a carne de frango passasse a ser cada vez mais consumida, passando em importância as tradicionais outras duas concorrentes a bovina e a suína. TABELA 43 - CONSUMO PER CAPITA DE CARNE BOVINA, SUÍNA E AVÍCOLA NO BRASIL- 1970-1995 (em kg/hab/ano) ANO FRANGOS BOVINOS SUÍNOS TOTAL 1970 2,3 22,8 8,1 33,2 1971 2,4 23,4 7,9 33,7 1972 3,0 24,1 6,6 33,7 1973 4,0 26,2 7,0 37,2 1974 4,7 27,7 7,0 39,4 1975 4,9 29,8 7,2 41,9 290 Entrevista com o presidente da UBA e diretor da Frangosul, Montenegro-RS, 27 de abril de 1995. 291 Revista Aves & Ovos, « Guia Aves & Ovos: referência e indicadores para seus negócios », APA, São Paulo, ano XI, n° 4, Fevereiro/95, p. 8. 263 1976 5,4 35,6 7,2 48,2 1977 6,0 40,0 7,4 53,4 1978 7,1 40,0 7,5 54,6 1979 8,7 34,9 7,7 51,3 1980 8,9 32,4 8,2 49,5 1981 8,9 29,0 8,0 45,9 1982 8,5 30,2 7,7 46,4 1983 9,3 27,7 7,4 44,4 1984 8,1 23,0 7,1 38,2 1985 8,9 22,8 6,9 38,6 1986 10,0 22,6 7,3 39,9 1987 12,4 22,2 8,0 42,6 1988 11,8 24,5 7,0 43,3 1989 12,4 24,7 6,6 43,7 1990 13,4 23,6 7,0 44,0 1991 15,0 22,8 7,0 44,8 1992 16,0 22,8 7,3 46,1 1993 17,0 23,7 7,6 48,3 1994 18,0 24,5 7,7 50,2 1995 23,2 25,4 7,9 52,8 Fonte: IBGE, IEA, APA, Aves & Ovos. Outro aspecto a ressaltar é o lançamento cada vez maior de novos produtos e o consumo de partes de frango. Se por um lado este fator viabiliza as empresas, oferecendo-lhes a oportunidade de melhorar seu faturamento, através da venda de produtos com maior valor agregado, por outro, atende às novas demandas das classes média e alta, com novos produtos adaptados a seu nível de vida e às suas exigências. O fato das empresas trabalharem com cortes e embutidos de frango acentuou-se nos últimos anos. Por isto, « as empresas de maior porte, como a Sadia, a Ceval e a Perdigão passaram a fazer cortes diferenciados e a aumentar sua gama de produtos semi-prontos. A Perdigão, por exemplo, lançou 29 diferentes pratos prontos em 1996, incluindo tortas, bolinhos com recheio de frango, etc, saindo do tradicional strogonoff de frango »292. 292 Entrevista com o superintendente da ANAB, São Paulo, 27 de março de 1996. 264 Aliado aos fatores acima mencionados, existe ainda outro que ajudou a aumentar o consumo de frango, que foi o fato de ele estar disponível em todos os pontos de venda do país. Contribuíram para isto, a rede própria de distribuição dos frigoríficos, que passaram a atingir todo o território nacional e a expansão das lojas de supermercados, que além de estarem presentes em grandes, médias e até em pequenas cidades, tornaram-se responsáveis pela maior fatia na venda de frangos293. Foram estes fatores que nos levaram a afirmar, no início do capítulo, que « rico come frango porque é saudável e pobre come frango porque é barato ». A migração do consumo de carnes vermelhas para brancas (mudança de hábitos alimentares) e o forte aumento do consumo popular (maior consumo em função do baixo preço) fizeram do frango a opção protéica de alimentação da população brasileira. II. Avicultura industrial e suas novas formas de representação O fato de existirem organizações representativas dos produtores e industriais avícolas não é novidade. Como vimos no segundo capítulo, já em 1913 foi fundada a Sociedade Brasileira de Avicultura. A novidade dos anos 90 está no poder e na força destas organizações, que representam um setor forte e dinâmico da indústria nacional. Através das novas instituições, as empresas buscam fazer-se entender junto aos órgãos públicos e fazer valer seus direitos. Além disso, cada entidade específica busca solucionar os problemas de determinados setores, como os abates, as exportações, a produção de pintos de um dia. É preciso também fazer uma distinção entre as entidades que representam o setor a nível nacional e as demais representações estaduais e regionais. Estas são mais fortes nos estados onde a avicultura está mais implantada e é mais representativa. Por fim, existem as organizações de setores específicos, como os produtores de rações, de produtos veterinários, de criação e engorda dos frangos e dos sexadores de aves. 293 Pesquisa encomendada pela Associação Paulista de Avicultura chegou à conclusão que, em 1994, os supermercados respondiam por 35 a 40% da distribuição na venda de frangos em São Paulo, enquanto as avícolas eram responsáveis por 20 a 25%, as feiras e sacolões por 15% e outros modos de distribuição (mercados municipais e as próprias granjas produtoras) eram responsáveis por 5% das vendas. 265 1. Entidades de representação nacional Com o desenvolvimento da avicultura industrial, surgiram quatro grandes formas de representação nacionais. A UBA, de caráter reivindicativo e amplo e, outras três específicas, voltadas cada uma para um determinado setor. Elas abrangem atualmente os principais pontos críticos da avicultura nacional, ou seja, a criação de pintos de um dia, os abatedouros e as exportações. UBA - União Brasileira de Avicultura A nível nacional, a principal organização que articula os interesses vinculados à avicultura industrial é a UBA - União Brasileira de Avicultura, fundada em 1963, com sede em Brasília. Além de pautar sua atuação na defesa dos interesses nacionais, a UBA se propõe a ser uma organização « representativa » de todos os setores e ramos abarcados pelo complexo avícola industrial. « Sua Diretoria Setorial é composta pelos setores de produção de ovos, de frangos de corte, de matrizes, de pintos de um dia, de abatedouros, de cooperativas, de equipamentos veterinários, de rações, de comércio de produtos avícolas, pelos setores técnicos e de exportação » (Sorj et alii, 1982, p. 88). Outro aspecto que a composição da Diretoria Setorial da UBA evidencia é o intercruzamento entre associações de classe patronais294. Praticamente todos os setores representados na UBA compõem outras associações, de caráter mais específico ou intersetorial. Quase sempre um mesmo representante de um determinado ramo participa de uma série de outras associações empresariais. De acordo com seus estatutos, compete à UBA « colaborar com os poderes públicos, como órgão especializado e técnico-consultivo, no estudo, equacionando as soluções dos problemas que se relacionam com a avicultura, visando ao seu aperfeiçoamento e ao de todos os seus setores » (UBA, s/d). Além da gestão permanente junto aos órgãos oficiais, uma outra forma de colaboração com os poderes públicos são os « grupos de trabalho », compostos por representantes da associação e dos órgãos oficiais. Por exemplo, as prioridades no plano de trabalho da diretoria de 1981 foram montadas para serem desenvolvidas 294 Conforme o artigo segundo de seu estatuto, « a UBA não tem qualquer finalidade comercial ou fins lucrativos, sendo seu objetivo colaborar para o desenvolvimento da avicultura nacional, através da união e do 266 « numa ação conjunta com as entidades especializadas em setores específicos de representação, como a Apinco, a Abef, a Anfar, o Sindirações, o Sidan, além dos órgãos oficiais de pesquisa e os vinculados à política de crédito, fiscalização, fazenda e previdência social. Entre estas prioridades, segundo a diretoria, constavam alterações da incidência do ICM no comércio interestadual de matéria-prima, compulsoriedade no recolhimento do Proagro, definição da inspeção e fiscalização sanitárias, a questão do Funrural que não atrai mão-de-obra, incentivos às exportações, campanhas de aumento do consumo interno, elaboração de estatísticas, etc. Neste mesmo ano, uma das prioridades era também a implantação de uma unidade de apoio em Brasília, contratando um executivo, a fim de manter um suporte político nas principais esferas do governo » (Sorj et alii, 1982, p. 90). Em sua atuação de caráter mais técnico-informativo, a UBA promove anualmente o Congresso Brasileiro de Avicultura, com participação das organizações filiadas, órgãos oficiais, empresas e técnicos da avicultura. Além disso, a exemplo de outras associações, realiza levantamentos estatísticos periódicos para previsão e controle do mercado. A UBA é uma espécie de « federação das associações estaduais. Além disso, sob sua direção geral e, em parte por sua iniciativa, foram criadas várias outras entidades nacionais para atender aspectos específicas da avicultura, como as exportações, os abates, a produção de pintos de um dia »295. ANAB - Associação Nacional dos Abatedouros Avícolas No dia 13 de outubro de 1975 foi fundada em São Paulo a AVESP - Associação dos Abatedouros Avícolas do Estado de São Paulo. Como depois da implantação da avicultura industrial os estados do Sul passaram a ter cada vez maior importância na produção nacional, e em 1982 Santa Catarina passou a ser o maior produtor, sentiu-se a necessidade de instituir uma associação de caráter nacional. Por isto, em 21 de fevereiro de 1984, a Avesp foi transformada em Anab, para « representar seus interesses comuns perante o poder público, consumidores, fornecedores e demais integrantes do sistema avícola nacional » (Anab, s/d). A entidade então fundada, entre outros objetivos « propõe-se a organizar um sistema avícola nacional, sugerindo normas, padrões e preços para todo o país dentro dos princípios da livre iniciativa; colaborar com as autoridades competentes em tudo que diga respeito à fortalecimento de todos os setores, entidades, empresas e pessoas ligadas à produção, à industrialização, à comercialização, ao ensino, à pesquisa e à divulgação » (UBA, s/d.). 267 manutenção e à extensão, na atividade avícola, da inspeção sanitária obrigatória dos produtos de origem animal; oferecer subsídios aos poderes constituídos e a seus órgãos técnicos e administrativos em todos os assuntos de âmbito nacional ou internacional, atinentes, direta ou indiretamente, ao sistema avícola brasileiro » (Anab, s/d). Além dos abatedouros, a Anab congrega outros associados, diretamente ligados à avicultura, como as indústrias de equipamentos avícolas, fabricantes de rações, de acessórios para o corte de frangos, de fábricas de embalagens e de laboratórios que cuidam da saúde avícola296. No entanto, seu principal público alvo são os abatedouros avícolas. « Nós temos hoje em torno de 100 unidades de abate com SIF no Brasil, pertencentes a cerca de 80 empresas. Destas, 57 são associadas à Anab. Entre as 80 empresas que trabalham com SIF, muitas são médias e pequenas, que têm grandes dificuldades de se manter, conforme as condições do mercado »297. O trabalho mais importante da Anab, cuja sede fica em São Paulo, é acompanhar os abates inspecionados pelo SIF, coletando informações e formando o mais completo banco de dados sobre a avicultura nacional. Isto lhe permite uma assessoria especializada junto às empresas do setor. Cabe a esta entidade elaborar a listagem da participação de cada empresa no ranking nacional dos abates de frango. Outro setor de atividade é fazer levantamentos diários sobre a evolução do mercado e repassar estes dados aos associados298. APINCO - Associação Nacional dos Produtores de Pinto de Corte Com o objetivo de tentar « controlar » o número de pintos de corte ofertados ao mercado, foi criada nos anos 70, a APINCO - Associação Nacional dos Produtores de Pintos de Corte. Seu trabalho inicial foi de coletar informações e organizar um banco de dados que permitisse acompanhar o alojamento de matrizes, a produção e incubação de ovos e a produção de pintos de corte por empresa e por estado. Com estes dados em mãos, os principais empresários do setor tentariam « limitar » a oferta para obter um melhor preço pela carne de frango. 295 Entrevista com o presidente do Sindicato das Indústrias de Produtos Avícolas do Rio Grande do Sul, diretor da Frangosul e presidente da UBA, Montenegro-RS, 27 de abril de 1995. 296 Entrevista com o assessor da superintendência da ANAB, São Paulo, 10 de maio de 1995. 297 Entrevista com o superintendente da ANAB, São Paulo, 27 de março de 1996. 298 A Anab edita semanalmente dois boletins: Jornal da Semana e Suplemento da Semana, contendo os preços do frango nos principais mercados nacionais e pequenos artigos técnicos. Além disto, publica um boletim 268 Além deste trabalho a Apinco realizou em 1982 o « Primeiro Seminário dos Produtores de Pintos de Corte ». A idéia era realizar tal encontro a cada dois anos, mas a urgência dos temas tratados exigiu uma reunião anual. Para cuidar de tais eventos, foi criada a FACTA - Fundação Apinco de Ciência e Tecnologia Avícolas que promoveu, desde 1984, uma conferência anual para divulgar as principais pesquisas técnicas do setor. Outra novidade da Facta foi lançar os « Anais da Conferência », publicando todos os artigos apresentados no evento, que tornaram-se um referencial bibliográfico importante para trabalhos de pesquisas técnico-científicas em avicultura299. ABEF - Associação Brasileira dos Produtores e Exportadores de Frango No tocante à definição das políticas de exportação de produtos avícolas, a principal organização é a ABEF - Associação Brasileira dos Produtores e Exportadores de Frango, fundada em 5 de novembro de 1976, para congregar esforços no sentido de desenvolver e dinamizar as exportações. « No ano de 1973, uma reunião entre o Ministro da Fazenda e líderes do setor avícola resultou na recomendação para que fossem iniciados os estudos que permitissem viabilizar a exportação de parte da produção nacional de carne de frangos. Posteriormente, no início de 1975, os abatedouros de frangos foram novamente convocados pelo Governo Federal, desta vez através do Ministério da Agricultura e lhes foi sugerido o imediato início das exportações, para que não se aviltassem os preços do produto no mercado interno. Com o apoio governamental, as exportações tiveram seu início em agosto de 1975 » (Abef, 1979, citado por Sorj et alii, 1982, p. 91). A entidade foi formada pelas principais empresas exportadoras do país300 e desde sua fundação tem feito um trabalho constante na defesa das exportações. Seu principal trabalho mensal chamado InformANAB, com reportagens de fundo e os dados do custo de produção do frango. É neste boletim que é pulicada, todos os anos, a listagem das 50 maiores empresas avícolas nacionais. 299 A Facta, além dos Anais da Conferência edita uma revista mensal, Avicultura ciência & tecnologia. Na conferência Apinco de 1992, além de participantes de 20 estados de todas as regiões brasileiras, havia participantes da Alemanha, Argentina, Bolívia, Colômbia, França, Estados Unidos, Holanda, Inglaterra, Itália, México e Uruguai, mostando que tal conferência tornou-se uma referência internacional. O número de participantes aumentou de 135, em 1982, para 833, em 1992 (revista Avicultura Ciência & Tecnologia, órgão de divulgação da Facta, ano 1, n° 6, p. 6). 300 Assinaram a ata de constituição da ABEF a Perdigão, Granja Itambi Ltda, Coopave - Cooperativa Avícola do Vale do Taquari, Comércio e Indústria Saulle Pagnoncelli, Frigorífico Seara, Abatedouro Rio Branco Ltda, Sociedade Avícola Louveira, Granja Betinha, Cooperativa Agrícola Cotia e Jaeger Araújo. Mais tarde entraram na Abef a Sadia, Avipal, Chapecó e Granja Rezende (revista Poultry for Export, Abef, ano 2, n° 20, Rio de Janeiro, 1994, p. 26). 269 tem sido no sentido de combater os subsídios concedidos pelos governos norte-americanos e francês, o que dificulta muito as exportações nacionais. Os ramos industriais de produtores de rações e conexos têm no SINDIRAÇÕES Sindicato Nacional de Indústria de Rações Balanceadas, na ANFAR - Associação Nacional dos Fabricantes de Rações e no SIDAN - Sindicato Nacional das Indústrias de Defensivos Animais301, suas « corporações-lobby » principais. Visto que os produtos desses ramos industriais possuem um peso relativamente elevado (entre 70 e 80% dos custos de produção), sua atuação no complexo avícola industrial, resguardando-se os interesses específicos, está entrelaçada com as entidades nacionais acima mencionadas. À semelhança da Avesp, o Sindirações foi criado ainda em 1957, para representar os interesses dos fabricantes de rações do estado de São Paulo, só assumindo um caráter nacional a partir de 1979. Quanto à sua estrutura e funcionamento, o Sindirações possui uma delegacia em cada estado, sediada na capital, cujas atividades são coordenadas por um empresário local do setor que tem a representatividade da classe. Um dos principais trabalhos realizados pelo Sindicato foi a assinatura de 11 convênios, ainda na década de 70, com universidades rurais do Norte, Nordeste e Sul para pesquisar a utilização de recursos regionais alternativos na fabricação de rações (Sorj et alii, 1982). Apesar da Anfar atuar em conjunto com o Sindirações, essa organização caracteriza-se por congregar grandes produtores, onde predominavam filiais de multinacionais. Fundada em 1980, tinha em sua diretoria, representantes da Duratex, Purina, Rações Dutra, Anderson Clayton, Cargill e Fri-Ribe. A ação da Anfar desenvolveu-se especialmente no sentido de planejamento da produção, análise do desempenho do mercado de matérias-primas, estratégias de comercialização, promoção de consumo, avalização e acompanhamentos de safras agrícolas. 2. Entidades de abrangência estadual Para responder a desafios e necessidades localizadas foram formadas entidades estaduais. Atualmente elas existem em praticamente todos os estados da federação, no entanto, as mais fortes e representativas são aquelas dos estados maiores produtores, ou seja, São Paulo e os da região Sul. 301 O Sidan também foi fundado como entidade paulista em 1966 e só passou à condição de entidade nacional em 1972. Seus principais objetivos, de início, eram a luta contra a política de restrição de importações e o controle higiênico-sanitário (Sorj et alii, 1982, p. 95). 270 A APA - Associação Paulista de Avicultura foi fundada em 1945, sendo uma das mais antigas entre as modernas associações ligadas à avicultura industrial. No início, como o ramo mais importante era a avicultura de postura, a associação privilegiava o trabalho com os produtores de ovos, abrangendo também os avicultores de corte, na medida em que esta atividade ganhava importância. A fundação da APA coincidiu com a entrada dos imigrantes japoneses na produção de ovos. Estes imigrantes utilizavam a avicultura de postura como atividade para suprir a necessidade de produção de esterco para a plantação de café. Nas regiões cafeeiras criaram-se vários pólos de produção de ovos. « O ovo era quase um sub-produto, sendo que o produto principal era o esterco ». Os descendentes destes imigrantes são até hoje os principais representantes nacionais da avicultura de postura. Entre as principais empresas que tiveram início naquela época estão a Mizumoto, a Sato e a Ito, que se aprimoraram inclusive na questão genética, trazendo as primeiras linhagens de postura industrial302. A avicultura de corte começou a ter um suporte importante em São Paulo na década de 50, quando os moinhos de trigo, que tinham como resíduo o farelo, começaram agregar valor a este produto, entrando no setor de rações balanceadas para atender os novos mercados emergentes. Incentivaram com isto a produção de frango de corte que levava, à época, quase 120 dias para chegar à idade de abate. Como São Paulo ocupa a segunda posição entre os maiores estados produtores, por ser o mais importante em termos econômico-financeiros e porque a APA dispõe de uma longa história e de uma estrutura bem montada, é atualmente, uma das associações estaduais mais importantes. Além disso, ela destaca-se pela publicação da revista Aves & Ovos, que tornouse uma das principais publicações do setor nestes últimos anos. As outras três associações mais importantes a nível estadual são a APAVI Associação Paranaense de Avicultura, a ACAVE - Associação Catarinense dos Avicultores e AINCADESC - Associação das Indústrias de Carnes e Derivados no Estado de Santa Catarina, a ASGAV - Associação Gaúcha de Avicultura. As associações destes quatro estados ligadas aos empresários do setor avícola encarregam-se de promover os principais encontros do setor; coletar informações e organizar um banco de dados sobre os abates mensais de cada empresa; negociar, sobretudo junto às autoridades estaduais e municipais, os interesses ligados ao setor avícola; reivindicar infraestrutura e outros investimentos necessários para viabilizar a produção e a comercialização. 302 Entrevista com o diretor superintendente da APA, 12 de maio de 1995. 271 Na medida em que a avicultura começa a ter importância nos demais estados, suas associações assumem um papel mais representativo. É o caso, sobretudo da AVIMIG Associação dos Avicultores de Minas Gerais e da AGA - Associação Goiana de Avicultura. Nestes últimos estados, sobretudo em Goiás, estão se implantando filiais das grandes empresas do Sul do país, o que faz aumentar muito sua produção, mesmo que ainda seja pequena em relação ao total nacional303. 3. Organização dos agricultores integrados Desde os anos 70 os avicultores integrados de Santa Catarina buscam organizar-se para defender seus direitos e melhor encaminhar suas reivindicações às empresas integradoras. A primeira forma de organização foi constituir uma associação, chamada ACRAVE - Associação dos Criadores de Aves de Santa Catarina, fundada em 1979, com sede em Chapecó. Para se organizar, os avicultores tiveram vários problemas. Primeiro as empresas buscaram dissuadi-los, tentando impedir a formação da associação. Em seguida, a ACAV - Associação Catarinense de Avicultura, tentou impedir seu registro jurídico, mostrando-se como a legítima representante dos produtores (mesmo sendo uma organização que agrupava tanto produtores como frigoríficos). Por fim, uma vez registrada a associação, os abatedouros deram mais de cem por cento de aumento nos lotes de frango, diluindo a luta reivindicativa dos agricultores304. Com a promulgação da nova Constituição Brasileira em 1988, abriu-se a possibilidade de criar sindicatos por categorias profissionais. A partir deste momento, dois grupos começaram a discutir a formação de um sindicato específico de avicultores, os antigos dirigentes da Acrave e os representantes dos STRs - Sindicatos de Trabalhadores Rurais ligados à CUT - Central Unica dos Trabalhadores. Como não houve consenso na elaboração dos estatutos, no dia da fundação do sindicato houve a disputa entre duas chapas. O grupo de trabalhadores que representava o movimento sindical cutista ganhou as eleições, fundando o SINTCRAVE - Sindicato dos Trabalhadores Integrados na Criação de Aves de Santa Catarina, no dia 29 de novembro de 1989. 303 Existem ainda outras representações regionais, estaduais ou locais, como a Associação dos Avicultores de Descalvado-SP, a Associação Nordestina de Avicultura, a Associação Fluminense de Avicultores, a Associação Avícola de Pernambuco, Associação Amazonense de Avicultura; ou, associações mais específicas, como a Associação Brasileira de Sexadores de Aves de um dia (Sorj et alii, 1982, p. 97). 304 Para mais detalhes sobre esta associação, ver os trabalhos de Belato (1985), Mior (1992) e Dalla Costa (1993). 272 A principal atividade deste sindicato foi a realização de encontros com avicultores nas micro-regiões produtoras do estado, onde discutiu o custo de produção do frango e preparou uma pauta de negociação com os representantes dos frigoríficos (Mior, 1992 e Dalla Costa, 1993). Entretanto, depois dos primeiros encontros, as empresas negaram-se a continuar negociando, alegando que havia dois sindicatos e que não atenderiam mais as convocações do Sintcrave enquanto existissem as duas entidades. A dupla representação ocorreu porque quando os antigos representantes da Acrave perderam a eleição, resolveram fundar um sindicato patronal. Assim foi fundado em 4 de março de 1990 o SINCRAVESC - Sindicato Patronal dos Criadores de Aves de Santa Catarina. Este caracterizou-se por associar principalmente avicultores que são profissionais liberais, morando nas cidades e tendo empregados assalariados para cuidar dos aviários. Sua forma de atuação centra-se sobretudo nos aspectos jurídicos, em detrimento das reivindicações econômicas (Mior, 1992, pp. 269-274). Atualmente, estas são as principais organizações dos produtores avícolas305. Sua atuação, no entanto, não conseguiu mobilizar a categoria nem para aumentar seus ganhos econômicos e nem para melhorar suas condições de trabalho. A partir dos primeiros anos da década de 90 surgiram outros fatores que complicam ainda mais o trabalho destas associações. De um lado a busca, por parte das empresas, de melhorar e aumentar seus departamentos de fomento agropecuário e, de outro, o trabalho de implantação do processo de « qualidade total » que começou a chegar também aos produtores de matéria-prima dificultando ainda mais a atuação sindical. 305 Existem outras associações de caráter regional ou local, buscando resolver problemas específicos. Uma das mais significativas neste sentido, é a Associação dos Avicultores do Meio-Oeste Catarinense, fundada em 1982, reunindo só produtores da Perdigão. Seu objetivo é fazer um trabalho conjunto entre os integrados e a empresa. Dois fatos deixam isto mais claro. O primeiro foi a fundação de uma fábrica de adubo organomineral, onde a Perdigão é proprietária de 70% das ações e seus avicultores integrados de 30%. O segundo, foi a implantação de uma loja que comercializa equipamentos para os aviários, na tentativa de mantê-los sempre atualizados, aumentando assim a qualidade da matéria-prima e sua produtividade (para maiores detalhes, ver Mior, 1992, pp. 274-277). 273 4. Principais eventos da avicultura brasileira Acontecem a cada ano no Brasil encontros, reuniões, congressos, debates e exposições representando as principais empresas envolvidas na cadeia avícola, assim como os mais diversos setores, desde as multinacionais encarregadas de importar e produzir localmente as matrizes até as indústrias de sub-produtos semi-prontos a partir da carne de aves. O maior evento do setor, reunindo empresários, pesquisadores e produtores é promovido anualmente pela UBA. Nesta ocasião, pode-se perceber tanto a articulação política das recentes representações nacionais, quanto a importância econômica deste evento. Pelo lado político, participam da abertura de cada congresso, tanto o Ministro da Agricultura como o governador do estado que sedia o evento, as maiores autoridades nacionais e estaduais. Do ponto de vista econômico, os congressos representam a principal oportunidade de cada ano para colocar em contato os empresários avícolas com os produtores de equipamentos306. Na área de incentivos e divulgação de pesquisas científicas aplicadas, o principal evento é o encontro anual promovido pela Facta - Fundação Apinco de Ciência e Tecnologia Avícola. O primeiro destes encontros realizou-se em 1982 e, a partir de 1984 aconteceu todos os anos. Uma novidade a partir desta data é que os « Anais da Conferência Apinco » passaram a ser distribuídos a cada um dos participantes, antes do início das conferências, atualizando informações técnico-científicas que ajudaram na elaboração de outros trabalhos de pesquisa307. Os temas destes encontros são sobretudo de micro-economia, buscando resolver problemas específicos e localizados de determinada fase do processo de produção. Além disso, entre os conferencistas, de cada oito sete eram brasileiros em 1992, destacando-se entre eles professores universitários, pesquisadores, profissionais de empresas avícolas, empresários e técnicos de campo. Isto mostra que se desenvolvem no país diversas experiências e pesquisas aplicadas à realidade avícola308. 306 É nestes encontros que se expoem os novos equipamentos, se realizam os maiores negócios a nível de América Latina e se entra em contato com as novidades internacionais, graças à presença de pesquisadores e palestrantes estrangeiros. 307 Para termos uma idéia da importância dos « anais », o número de páginas destes documentos passou de 80, em 1984 para 311, em 1991 (revista Avicultura Ciência & Tecnologia, Facta, Campinas, SP, ano 1, n° 5, p. 6). Por outro lado, segundo a Apinco, o número de participantes aos encontros passou de 135 em 1982, para 809 em 1991. 308 Em 1987 iniciou-se uma sessão de apresentação de resultados de pesquisas voltadas para a avicultura. Neste ano foram apresentados sete trabalhos. Em 1989 foi instituído um prêmio em dinheiro para os três primeiros 274 A partir de 1995 aconteceu uma mudança na organização dos principais eventos da avicultura nacional, que passaram a acontecer na mesma data e no mesmo local, para facilitar tanto a participação como os negócios realizados. Assim, entre os dias 16 e 21 de setembro daquele ano, no Parque Barigüi, em Curitiba, foi realizada a Semana Avícola, organizada pela UBA, com o apoio e participação das mais importantes entidades da avicultura. Cerca de 10 mil pessoas, entre produtores, industriais, exportadores, técnicos, expositores, autoridades e visitantes, participaram do evento que reuniu as seguintes atividades: XIV Congresso Brasileiro de Avicultura, da UBA; Conferência Apinco 1995 de Ciência e Tecnologia Avícolas, da FACTA; Seminário Técnico de Ovos, da APA309; Congresso Internacional dos Exportadores de Frangos, da ABEF; Encontro Nacional dos Abatedouros Avícolas, da ANAB; outros simpósios e cursos técnicos310. colocados, aumentando o número de trabalhos apresentados para 70 em 1992 (Facta, Avicultura Ciência e Tecnologia, ano 1, n° 5, p. 16). 309 O último encontro separado deste setor de produção, aconteceu em março de 1995, sendo o V Simpósio Técnico de Produção de Ovos, em São Paulo, com promoção da APA. Foram três dias de discussão sobre os principais temas, contando com a presença de três conferencistas dos EUA, um do Canadá e um da França, além de três pesquisadores ligados às universidades brasileiras. Participaram do evento cerca de 800 pessoas ligadas a todas as atividades da cadeia produtiva (revista Aves & Ovos, Apa, SP, março/95, ano XI, n° 5, pp. 4-11). 310 Na medida em que a avicultura vai ganhando importância, outros seminários localizados acontecem, para resolver problemas técnicos de produção ou para capacitar mão-de-obra. É o caso, por exemplo, do I Simpósio Técnico de Matrizes de Corte, promovido pela Associação Catarinense de Avicultura - ACAV, em 1995, na cidade de Chapecó-SC; do III Curso de Especialização Avícola da Universidade Estadual do Ceará, 275 CAPÍTULO 9 EXPORTAÇÕES E INTERNACIONALIZAÇÃO DAS EMPRESAS AVÍCOLAS Se as empresas brasileiras do setor avícola são dependentes das multinacionais em tecnologia e em genética, em compensação, são competitivas no que se refere às exportações. Incentivadas pelo governo, que precisava de divisas para honrar os compromissos com a dívida externa, e pela necessidade de resolver o problema do excesso de produção, conseguido graças à integração vertical, as indústrias viram nas exportações um caminho para continuar crescendo. Mesmo não tendo experiência na venda de frangos a nível internacional, contavam com pelo menos duas importantes vantagens para concorrer neste mercado. A primeira era a qualidade do frango (usando a mesma genética e com rações produzidas essencialmente de milho e soja) e a segunda, a baixa remuneração, se comparada com os salários pagos nos Estados Unidos e na Europa, tanto dos operários dos abatedouros e das fábricas de industrializados como do pagamento aos agricultores integrados. Segundo os próprios diretores das empresas, uma das melhores coisas que aconteceu à avicultura nacional foi o fato de estar em contato com o mercado e a competição internacional. Pelo fato de ter que competir com empresas norte-americanas e francesas, « tivemos que melhorar a nossa produtividade e com isto a nossa competitividade alcançou níveis internacionais. Esta concorrência internacional aguçou nossa necessidade de ter a melhor tecnologia, produzindo a um preço mais barato possível. Com isto, o consumidor brasileiro ficou beneficiado, porque esta mesma tecnologia que nós fomos obrigados a buscar realizado em Fortaleza, no final de 1995 (revista Avicultura Industrial, ano 85, n° 1028, Ed. Gessulli, São Paulo, dezembro/95, p. 72). 276 para exportar, a usamos também para melhorar a produção e produtividade do frango no mercado interno »311. 1. Primeiras remessas de frango ao exterior A primeira empresa a vender frangos brasileiros no exterior foi a Sadia. No início, as quantidades tinham mais valor simbólico e de conhecimento de mercados do que valor monetário. Assim, em maio de 1975, foi embarcada no porto de Santos-SP, a primeira remessa de 25 toneladas de frango inteiro para o Golfo Pérsico. Em seguida veio a primeira transação comercial feita entre uma empresa brasileira e consumidores estrangeiros, quando a Sadia fez um contrato para remeter 30 toneladas de frango à Grécia. Enquanto estas duas remessas estavam a caminho, os dirigentes da empresa, com a ajuda da Brascan - trading com larga experiência em exportações- assinaram o primeiro grande contrato de exportação com os países do Oriente médio, no final de junho. O contrato estabelecia o fornecimento de 1.900 toneladas para o Kwait e a Arábia Saudita. Para fornecer tal quantidade de carnes formou-se um « pool » entre as três maiores empresas integradas verticalmente: Sadia, Perdigão e Seara. Naquele momento eram as únicas em condições de fornecer tais quantidades de frango, devido às vantagens de produzir de forma integrada, conseguindo atender, no curto prazo, um aumento significativo de produção. Entre os dias 28 de julho e 1° de agosto de 1975 foram carregadas no navio finlandês « Aconcágua », no porto de Itajaí-SC, as primeiras 650 toneladas de frango brasileiro destinadas a cumprir parte de tal contrato. Deste total, 467 toneladas foram fornecidas pela Sadia, 100 pela Perdigão e 83 pela Seara312. Como fizemos até aqui, vamos analisar as exportações de frango no contexto das exportações das principais empresas do setor, mencionando obviamente, as demais empresas exportadoras. Passamos portanto, à análise das três empresas líderes que, além de dominar largamente o setor exportador, são também as que têm um processo de internacionalização industrial mais avançado. 2. Sadia e sua atividade exportadora 311 312 Entrevista com o presidente da UBA e diretor da Frangosul, Montenegro-RS, 27 de abril de 1995. Dados extraídos da matéria « Frango Brasileiro entra na guerra do Oriente », in: revista Avicultura Industrial, Ed. Chácaras e Quintaes, São Paulo, agosto/1975, ano 66, n° 788, pp. 48-49. 277 Os primeiros contratos de exportação da Sadia foram assinados em 1967. Naquela ocasião a empresa vendeu algumas toneladas de carne bovina e suína in natura, congelada, para o Mercado Comum Europeu e a Suíça. O objetivo de exportar já estava presente na época da fundação da Frigobrás, quando a intenção ficou registrada nos seus estatutos de fundação. A Sadia havia estabelecido na época, que a unidade de Concórdia produziria para o mercado nacional, enquanto a Frigobrás de São Paulo buscaria abrir caminho no mercado internacional. As dificuldades que se apresentavam eram de dois gêneros. Primeiro havia a concorrência dos grandes e tradicionais frigoríficos exportadores e depois, o controle estatal da exportação de carne e derivados. « A um dos tradicionais frigoríficos do país, o governo chegava a oferecer uma cota de exportação de até mil toneladas de carne, enquanto a da Sadia não passava de cinqüenta » (Teixeira, 1994, p. 87). Na virada dos anos sessenta para os setenta realizaram-se novos contratos e foram embarcados lotes de carcaças inteiras e partes de suínos e bovinos, como lombos, línguas e fígado para a Espanha, a França, a Itália e Portugal. Estas primeiras exportações proporcionaram uma aproximação com industriais e técnicos europeus que prestariam valiosa ajuda à Sadia no conhecimento dos mercados e dos hábitos alimentares dos diversos países, além do aprendizado em desenvolvimento de cortes especiais de suínos, perus e frangos para diferentes consumidores. Junto com este aprendizado, a empresa começou aumentar os volumes exportados e, como consequência sua receita, que passou de 2 milhões de dólares em 1973, para 6,5 milhões em 1975 (Teixeira, 1994, p. 88). Num processo paralelo, a Sadia foi equipando-se materialmente e preparando os técnicos para viabilizar um maior volume de exportações. Na metade da década de 70 duas circunstâncias vieram estimular as exportações. Primeiro, o excedente de produção de frangos no país, devido à entrada em funcionamento da integração vertical e da economia de escala conseguida com abatedouros modernos, produzindo mais que o aumento do consumo interno. Segundo, o interesse do governo federal no aumento das exportações para gerar divisas e pagar os juros da dívida externa313. Neste momento, a Sadia diversificou seu leque de produtos exportáveis, entrando também no setor avícola. Com o início das vendas de frango, a receita da empresa aumentou, passando de 6,5 313 Em 1973, quando dirigentes empresariais dirigiram-se ao Ministério da Fazenda para reclamar do excesso de produção e do aviltamento dos preços, o ministro sugeriu-lhes que « exportar seria a melhor solução ». No entanto, as exportações só começaram em 1975, com incentivos do governo federal, que precisava de dólares para honrar seus compromissos com a elevação do montante e dos juros da dívida externa (revista Avicultura Industrial, ed. Chácaras e Quintaes, São Paulo, agosto/1975, ano 66, n° 788, p. 40). 278 milhões de dólares em 1975 para 21 milhões em 1976 e para 106 milhões em 1980 (Teixeira, 1994, p. 89). A partir de 1980, a Sadia Trading S.A. Exportação e Importação passou a responsabilizar-se por este setor, o que significou abandonar o amadorismo nas exportações, tornando a atividade profissional e permanente. De 1981 para 1990 as vendas da empresa para o mercado externo cresceram de 160 para 280 milhões de dólares, consolidando o grupo como grande exportador nacional. Para atender os antigos e novos clientes (europeus e do Extremo Oriente), no setor de carnes e derivados diversificou suas linhas de produção, sobretudo nos industrializados e cortes especiais, criou novas apresentações, com embalagens de qualidade melhorada, código de barras, descrição no idioma do importador e desenvolveu programas de vendas ajustados às condições e interesses dos diferentes clientes nos vários países. Para melhor exportar carnes e derivados, fortaleceu a Sadia Trading com equipamento e pessoal especializados, intensificando os contatos com o exterior. Um dos objetivos era atingir os países do Extremo Oriente. Através de distribuidores exclusivos, planos de longo prazo e produtos adequados às preferências regionais, a empresa conseguiu bons resultados. Entre 1983 e 84, os produtos da Sadia, como almôndegas, cortes de frango e peru, começaram a aparecer nas prateleiras dos supermercados de Tóquio, Hong Kong e Cingapura. Em 1985 a Sadia já era a empresa nacional que mais exportava frango para o Japão314, sendo que quatro anos mais tarde iniciou as exportações para a ex-União Soviética. No final dos anos 80 a Sadia mantinha a liderança nacional nas exportações de frango. « Nos demais segmentos - suínos, bovinos, industrializados de carne, soja e derivados como grão, farelo e óleo - também estava situada entre os maiores exportadores brasileiros. Seus representantes percorriam os cinco continentes; vendendo 70 tipos de produtos a 40 países, assinando contratos em inglês, espanhol, francês, italiano, alemão, árabe, japonês e russo » (Teixeira, 1994, p. 109). Em 1990, os 280 milhões de dólares das exportações representaram 19% do faturamento bruto da empresa (Relatório Anual, 1990, p. 12). Nos anos 90 as exportações da empresa passaram por altos e baixos. Se em 1994 as vendas externas representaram US$ 567 milhões, em 1995 voltaram para US$ 397 milhões315. Neste último ano, a empresa adotou duas medidas na área internacional. A primeira foi a de 314 315 Sadia, Relatório Anual, 1985. Em 1995 as exportações da Sadia ficaram assim distribuídas pelos setores: US$ 257,9 milhões em aves; US$ 43,6 milhões em bovinos e US$ 15,6 milhões em produtos industrializados (Sadia, Relatório Anual, 1995, p. 18). 279 reduzir calculadamente a atividade exportadora de carnes bovinas. A segunda foi deslocar os negócios do Mercosul para o « Negócio Industrializados », uma vez que as distâncias e similaridades de perfis tornam Paraguai, Uruguai e Argentina muito semelhantes ao mercado brasileiro. Mesmo diminuindo o valor total das exportações, as atividades externas mantiveram-se estáveis em relação aos 43 países compradores. 3. Ceval nasce voltada para o mercado externo A trajetória da Ceval como empresa sempre esteve ligada ao comércio exterior de soja em grãos e, mais tarde, de sub-produtos como o óleo e o farelo. A Ceval soube aproveitar os anos dourados da década de 70, quando os preços da soja no mercado internacional eram estimuladores. Para termos uma idéia do seu crescimento, basta observar seu faturamento bruto, que passou de US$ 6,4 milhões em 1973 para US$ 103 milhões em 1979 (Mior, 1992, p. 142), chegando a superar a marca de um bilhão de dólares em 1990 e de 2,5 bilhões em 1995. TABELA 34 - FATURAMENTO BRUTO DA CEVAL NOS MERCADOS INTERNO E EXTERNO : 1985 a 1995 (em US$ milhões) Ano Mercado Interno Mercado Externo Total 1985 58,8 236,0 294,8 1986 98,2 175,1 273,3 1987 221,5 272,2 493,7 1988 271,0 457,0 728,0 1989 513,5 575,5 1.089,0 1990 736,0 495,8 1.231,8 1991 650,0 555,0 1.205,0 1992 645,0 468,0 1.113,0 1993 741,5 562,5 1.304,0 1994 1.183,5 960,6 2.144,1 1995 1.383,9 1.132,5 2.516,4 Fonte: Ceval. O primeiro negócio da Ceval Alimentos foi a soja, cuja industrialização começou em Gaspar-SC, em 1973, destinada às exportações. Entretanto, foi o mercado externo que lhe permitiu agregar novas atividades, como em 1980, quando entrou no setor de industrialização 280 de carnes e, em 1988, na industrialização de milho, que era utilizado desde 1980 na fabricação de rações. A partir do início da década de 90 deu-se uma mudança estratégica nas vendas da Ceval, quando o setor externo continuou crescendo, mas a um ritmo menor que o do mercado nacional, para o qual a empresa passou a dirigir maior parte de seus produtos e, consequentemente, de seu faturamento. Por causa desta mudança estratégica, a Ceval direcionou a maior parte de seus investimentos à expansão das atividades ligadas ao mercado interno. Além disso, apesar de expandir seus negócios no setor de carnes316, seu faturamento bruto é formado principalmente pelo setor soja e derivados. No que se refere especificamente às exportações, do total de 1995, o setor avícola representou somente 13,79%, mostrando que a empresa, apesar de estar entre as maiores exportadoras de frango, ainda está mais centrada nas vendas de soja e derivados, seu tradicional ramo de atuação e onde concentra mais savoir-faire. Neste ano, o setor representou 82,67% do total317. 4. Empresas e estados exportadores de frangos Como vimos acima, as três empresas que formaram o primeiro « pool » exportador foram a Sadia, a Perdigão e a Seara (Ceval) e, desde então, permaneceram as maiores exportadoras do país. O que aconteceu nos últimos anos foi a entrada de várias empresas « imitadoras » nas exportações, algumas delas ganhando importantes pontos percentuais em relação às líderes, como é o caso da Frangosul. Entre as três líderes, a Sadia e a Perdigão permanecem como as maiores exportadoras, mas nos últimos cinco anos perderam vários pontos percentuais do total exportado. Algo semelhante aconteceu com a Chapecó, que passou de cerca de 14 para 10% do total. Por outro lado, a Ceval quase dobrou sua participação em porcentagem, como podemos ver na tabela a seguir. TABELA 35 - EXPORTAÇÃO BRASILEIRA DE FRANGOS INTEIROS E EM CORTES, SEGUNDO AS EMPRRESAS EXPORTADORAS : 1990 e 1995 1990 (em t e em %) 316 1995 ( em t e em %) Em 1994 a Ceval elaborou um plano de investimento no setor carnes que prevê sua duplicação na produção e no faturamento durante os próximos quatro anos. As vendas dessa divisão atingiram US$ 781 milhões em 1995, representando 31% do faturamento total da empresa (Ceval, Relatório Anual, 1995, p. 18). 317 Ceval, Relatório Anual, 1995. 281 EMPRESAS Inteiros (t) Cortes (t) Total (t) Sadia Total (%) Inteiros (t) Cortes (t) Total (t) Total (%) 103.190 17.818 121.008 34,5 93.915 30.692 124.607 29,1 Perdigão 83.752 27.891 116.643 28,0 50.033 50.302 100.335 23,4 Ceval 27.390 11.722 39.112 9,2 12.281 57.360 69.641 16,2 Frangosul 16.770 - 16.770 5,6 35.055 10.191 45.246 10,5 Chapecó 43.126 5.826 48.952 14,4 22.078 19.511 41.589 9,7 Minuano - 7.474 7.474 2,5 4.543 9.363 13.906 3,2 Da Granja - - - 60 5.169 5.229 1,2 Copacol - - - - 4.323 4.323 1,0 Aurora - - - 698 3.198 3.896 0,9 Batavo - - - - 3.189 3.189 0,7 Pena Branca - - - 360 2.102 2.462 0,6 Osato - - - 118 1.735 1.853 0,4 Avipal - - - 724 868 1.592 0,4 Agroeliane - 7.454 7.454 2,5 - - - - 24.993 11.467 36.460 3,3 2.558 8.562 11.120 2,6 299.219 89.652 388.871 100,0 222.423 206.565 428.988 100,0 Outras TOTAL (t) Fonte: ABEF - Associação Brasileira dos Produtores e Exportadores de Frango. Outro aspecto a remarcar é a diferença entre as exportações de frangos inteiros e « cortes ». Neste caso, a diferença de volumes é altamente significativa, pois em 1995, uma tonelada de frango inteiro foi vendida, em média, a US$ 1.133, enquanto os cortes de frango foram vendidos a US$ 1.849,19 à tonelada318. Neste segmento, a melhor posicionada era a Ceval, com mais de 57 mil toneladas, seguida da Perdigão, com 50 mil, sendo que a Sadia vinha em terceiro, mas com cerca de 30 mil toneladas. As três cooperativas que participaram das exportações (Copacol, Aurora e Batavo) praticamente só exportaram cortes, o que mostra sua competitividade neste setor, embora representando um volume pequeno em relação ao total. No que se refere aos estados exportadores, desde o início os do Sul dominaram o setor. Em 1995, Santa Catarina foi responsável, sozinho, por quase 81% do total. 318 ABEF, Relatório Anual, 1995, p. 6. 282 TABELA 36 - PRINCIPAIS ESTADOS EXPORTADORES - 1995 Estado Total (em t) Santa Catarina Total (em %) 345.764 80,6 Rio Grande do Sul 64.777 15,1 Paraná 15.873 3,7 Outros 2.574 0,6 428.988 100,0 Total Fonte: ABEF. São Paulo, apesar de ser um dos maiores estados produtores, entra com uma parte ínfima nas exportações porque sua produção direciona-se basicamente para o mercado local e para o Rio de Janeiro. Além disso, seu parque industrial caracteriza-se por um grande número de pequenos abatedouros, se comparados com os das grandes empresas baseadas no Sul (os maiores frigoríficos do estado pertencem à Sadia e à Ceval) e que atuam com produtores independentes. Este fato, dificulta-lhes o acesso às vantagens de economia de escala e de diversificação, assim como as impossibilita de atender grandes pedidos de exportação. 5. Evolução dos volumes e dos valores de frango exportado As exportações começaram em pequenas quantidades (tabela 47) em 1975, mas logo cresceram e colocaram o Brasil no segundo lugar no ranking dos exportadores mundiais. Apesar das exportações terem crescido bastante, o principal mercado é o interno. Em 1984 as exportações chegaram a representar 21,2% da produção total, índice que foi abaixando a partir desta data, para se estabilizar ao redor de 13% da produção nacional. Outro dado a ressaltar é a venda de cortes de frango e de produtos industrializados. As empresas nacionais só se capacitaram para exportar cortes de frango na metade da década de 80. De 1984 para 1994, a parte destes produtos passou de 11 a 42% do total, aumentando as vendas de produtos com maior valor agregado. Em 1995, as exportações de cortes de frango representaram 48,15% do volume, mas seu valor foi de 60,25% sobre o total. TABELA 37 - PRODUÇÃO, EXPORTAÇÃO DE FRANGO INTEIRO E EM CORTES, COM SUAS RESPECTIVAS PARTICIPAÇÕES E O VALOR TOTAL DAS EXPORTAÇÕES : 1975 a 1995 Produção Exportação (mil t) Participação das exportações (%) Valor 283 Anos (mil t) Inteiros Cortes Total (mil (A) (B) (C) (D) B/A C/A D/A C/D US$) 1975 519 4 - 4 0,8 - 0,8 - 3,3 1976 604 20 - 20 3,3 - 3,6 - 19,6 1977 698 33 - 33 4,7 - 5,2 - 31,9 1978 858 52 - 52 6,1 - 6,2 - 46,9 1979 1.096 81 - 81 7,4 - 7,9 - 81,1 1980 1.200 169 - 169 14,1 - 12,9 - 220,0 1981 1.444 294 - 294 20,4 - 19,7 - 354,2 1982 1.507 302 - 302 20,0 - 18,8 - 285,4 1983 1.489 289 - 289 19,4 - 18,2 - 242,2 1984 1.356 256 32 288 18,9 2,4 21,2 11,1 263,5 1985 1.483 237 36 273 16,0 2,4 18,4 13,2 238,3 1986 1.617 180 44 224 11,1 2,7 13,8 19,6 220,3 1987 1.970 165 50 215 8,4 2,5 10,9 23,2 211,8 1988 1.947 165 72 237 8,5 3,7 12,2 30,4 228,4 1989 1.983 161 83 244 8,1 4,2 12,3 34,0 263,0 1990 2.356 210 90 300 8,9 3,8 12,7 30,0 319,7 1991 2.627 203 119 322 7,7 4,5 12,6 37,0 392,8 1992 2.872 232 140 372 8,1 4,8 12,9 37,6 430,1 1993 3.144 270 147 417 8,6 4,7 13,3 35,3 463,6 1994 3.464 279 202 481 8,0 5,8 13,8 41,8 588,5 1995 4.050 222 206 429 5,5 5,1 10,6 48,1 634,0 Fonte: Como não existe coincidência entre os dados das diversas fontes, explicitamos com quais informações trabalhamos. Os dados sobre a produção nacional foram tirados da revista Aves & Ovos, da APA, São Paulo, ano XI, n° 4, fevereiro de 1995, p. 18, que cita como fonte a APA, a APINCO, o IBGE e a revista AVES & OVOS. Os dados sobre as exportações de frangos inteiros e de cortes são dos Relatórios Anuais da ABEF. Nos primeiros quatro anos da década de 80 as exportações cresceram muito, tanto em volumes quanto em valores. A partir de 1985 houve uma mudança na competição internacional, quando o Brasil passou a competir com os subsídios dos EUA e da Europa. O governo brasileiro, como signatário do GATT319, endossou os termos da Rodada do Uruguai 319 O GATT - General Agreement of Tariff and Trade - é um acordo geral sobre as tarifas e o comércio, assinado em 1947 por 22 países, por iniciativa dos Estados Unidos, afim de criar um dispositivo transitório esperando a 284 no início de 1985 e a partir de então começou a retirar gradativamente os subsídios às exportações, chegando em 1987 à eliminação total deste apoio (Rizzi, 1993, p. 160). Em contrapartida, logo após a negociação do GATT daquele ano, o governo americano criou o programa de apoio às exportações (EEP - Export Enhancement Program), a partir do qual subsidiou fortemente a venda de carne de frango para alguns países, entre os quais estavam incluídos compradores da indústria brasileira320. Quanto à política agrícola da comunidade européia, além dos subsídios321 e taxações aos produtos estrangeiros, procurou a auto-suficiência na produção avícola e a intensificação do comércio intra-comunidade. Estas circunstâncias afetaram fortemente as exportações brasileiras. O ano de 1984 representou o pico das exportações do país em relação à produção. Além disso, significou a entrada das empresas num mercado cada vez mais promissor, que foi a exportação de cortes de frango. A partir daquele ano, devido aos incentivos dos governos norte-americano e francês, a porcentagem de produtos exportados em relação ao total produzido caiu sistematicamente, estabelecendo-se numa faixa ao redor de 13%, com exceção do último ano. Como podemos ver pela tabela acima, houve uma significativa diminuição das exportações em 1995, causada por dois fatores. O primeiro foi o forte aumento no consumo interno de carne de frango e derivados, fruto da estabilidade da moeda, que possibilitou um ratificação de La Havane que previa a criação de uma Organização Internacional do Comércio. Como esta ratificação nunca aconteceu, o GATT continuou a existir, tendo Genebra como sede do secretariado encarregado de sua execução. Atualmente o GATT reagrupa mais de cem países, efetuando cerca de 80% do comércio mundial. 320 O Export Enhancement Program foi anunciado em maio de 1985 pelo USDA, com o objetivo de viabilizar as exportações de frangos, especialmente para concorrer com produtos subsidiados pela Europa. Entre 1986 e 1990 o EEP apresentou o seguinte resultado: venda para o Egito de 27.500 t de frangos inteiros, com US$ 27,1 milhões de subsídios ou US$ 985/t, 46.000 t de coxas, com US$ 21,2 milhões de subsídios ou US$ 456/t; venda para o Iraque de 35.000 toneladas de frangos inteiros, com US$ 22,3 milhões de subsídios ou US$ 637/t e 35.000 t de coxas, com US$ 24,3 milhões de subsídios ou US$ 694/t; vendas para a República Dominicana de 3.500 t de coxas, com US$ 1,8 milhão de subsídios ou US$ 520/t; vendas para as Ilhas Canárias de 8.000 t de coxas com US$ 1,9 milhão de subsídios ou US$ 238/t; venda para Cingapura de 1.157 t de frangos inteiros com US$ 560 mil de subsídios ou US$ 484/t e 385 t de coxas, com US$ 136 mil de subsídios ou US$ 353/t; vendas para a Arábia Saudita de 2.900 t de frangos inteiros, com US$ 1,9 milhão de subsídios ou US$ 669/t e 2.500 t de coxas com US$ 1,5 milhão de subsídios ou US$ 587/t; venda para os Países do Golfo de 10.500 t de frangos inteiros, com US$ 5,5 milhões de subsídios ou US$ 520/t e 7.000 t de coxas, com US$ 3,6 milhões de subsídios ou US$ 519/t; venda para a África de 20 t de coxas, com US$ 100 mil de subsídios ou 5.000/t. No total foram 179.962 t de carne de frango, com US$ 111,9 milhões de subsídios ou US$ 662/t (Rizzi, 1993, p. 161). 321 O nível de subsídios às exportações de carne de frango, concedido pela Política Agrícola Européia, girava em torno de US$ 750 a US$ 850/t e a taxação sobre as importações em torno de US$ 550 por tonelada. O volume de subsídios que foi estimado em US$ 26 milhões em 1985, aumentou para US$ 74 milhões em 1986, para US$ 105 milhões em 1987 e para US$ 150 milhões em 1988 (revista Broiler Industry, Cullman, set. 1988, pp. 20-30, citado por Rizzi, 1993, p. 161). 285 maior consumo de alimentos pelas classes pobres. Com isto, o consumo interno de frango passou de 18 para 23 kg/hab/ano322 entre 1994 e 1995. O segundo fator que levou a diminuir as exportações foi a concorrência internacional, em parte, fruto da globalização da economia e, em parte, pela continuação do protecionismo comercial dos Estados Unidos e da França, que continuam subsidiando suas exportações323. Além dos subsídios existem outros fatores que explicam a perda de competitividade das exportações brasileiras. Mesmo que o país tenha um custo de produção mais barato, « os custos operacionais dos portos são pelo menos 30% mais caros que os dos nossos concorrentes. Além disso, o Brasil exporta cerca de 6% de impostos imbutidos na cadeia produtiva do frango »324. A somatória destes elementos prejudica a competitividade do Brasil a nível internacional325. 6. Principais países compradores As vendas de frangos do Brasil destinam-se para mais de 40 países compradores. Entre estes, um pequeno número compra a grande parte, havendo uma forte diferença entre as exportações de frangos inteiros e de cortes. No segmento de frangos inteiros, os três principais compradores eram, em 1995, a Arábia Saudita, o Kweit e a Argentina que foram responsáveis por 61,5, 8,0 e 6,8% respectivamente, somando 76,3% do volume exportado. Quanto ao segmento de partes de frango, Japão, Hong Kong e Espanha foram os principais compradores, com 45,5, 20,6 e 5,5% do volume, respectivamente, o que dá 71,6% do total. Observe-se que 322 O maior consumo de carne de frango em relação às demais carnes é uma tendência mundial, embora seja mais forte no Brasil, devido sobretudo ao preço. Na Europa, com a crise da « vache fole », a tendência é de haver maior consumo de frango, em detrimento da carne bovina, embora não possamos fazer uma relação direta entre a diminuição do consumo de bovinos e o aumento do consumo de frango. 323 Uma das decisões da Rodada do Uruguai do GATT de dezembro de 1994, prevê a possibilidade dos países que tinham política de subsídios, de terem recursos oficiais alocados para estes programas, durante um período de cinco anos. Os países em desenvolvimento teriam também política de apoio às suas exportações, durante um período de dez anos. O problema é que o Brasil não tem dinheiro para subsidiar suas exportações, por isso sempre defendeu a tese de seu fim. Como resultado destes acordos, a França tinha direito, em 1995, a 137,8 milhões de ECUS de subsídios, o que correspondia a US$ 179 milhões, sobre um volume de exportação de 440 mil toneladas, o que correspondia a US$ 406,82 a tonelada, ou cerca de 37% do preço do produto a nível internacional (uma t. de frango inteiro = US$ 1.095,50). Os Estados Unidos tinham alocado US$ 21.337.402 para um volume de 34.196 toneladas, o que dava um valor de US$ 623,97 por tonelada. O Brasil também tinha, teoricamente, direito a subsidiar suas exportações, dispondo de US$ 4.805.171 para um volume de 96.566 toneladas, o que daria US$ 49,76 a tonelada. O problema é que não tem dinheiro para isto (entrevista com o Diretor Executivo da ABEF, Rio de Janeiro, 7 de março de 1996). 324 Entrevista com Diretor Executivo da ABEF, Rio de Janeiro, 7 de março de 1996. 325 Para uma análise da diferença de custos de produção entre os países desenvolvidos e os do Terceiro Mundo, assim como a influência das instituições sociais na produção e circulação das mercadorias, ver Douglas North (1993, pp. 90-95). 286 a Argentina é um parceiro recente na importação de aves, cujo comércio desenvolveu-se a partir da abertura do Mercosul, no início dos anos 90. Na Europa, destacam-se a Alemanha, a Itália e a Espanha. TABELA 38 - DESTINO DA EXPORTAÇÃO BRASILEIRA DE FRANGOS INTEIROS E EM CORTES, SEGUNDO OS PRINCIPAIS PAÍSES IMPORTADORES : 1990 e 1995 (em %) FRANGO INTEIRO PAISES CORTES 1990 1995 1990 46,5 61,5 - Kwait - 8,0 - Cuba 12,6 - - Arábia Saudita 1995 Bahreim 3,4 3,0 - Emirados Arabes 6,7 3,4 - Angola 5,5 - - URSS 10,5 - - 1,8 Argentina - 6,8 Japão - - 40,2 45,5 Hong Kong - - 14,0 20,6 Suiça - - 12,3 - Espanha - - - 5,5 Itália - - 6,7 2,2 Alemanha - - 10,3 4,7 14,8 17,3 16,5 19,7 100,0 100,0 100,0 100,0 Demais Países TOTAL Fonte: ABEF - Associação Brasileira dos Produtores e Exportadores de Frango. Como os países do Oriente Médio estão entre os principais compradores nacionais de frango, uma série de medidas, sobretudo de cunho religioso, foram colocadas em prática para atender tal mercado. « Nós temos inspetores islâmicos dentro dos abatedouros que exportam para o Oriente Médio, indicados e controlados por órgãos islâmicos no Brasil. Quando vem um comprador daquela região, ele quer ver onde produzimos, em que condições, como é feita a matança, quer ver a higiene dos estabelecimentos. Para poder exportar temos que ter um controle da produção, de ponta a ponta e, neste caso, a integração vertical ajuda muito, pois 287 controlamos todas as etapas do processo »326. Além disso, para poder exportar para a Europa e o Japão, « tivemos que melhorar a nossa produtividade, fazendo com que nossa competitividade alcançasse níveis internacionais »327. 7. Internacionalização das empresas avícolas « Bon nombre des grandes firmes industrielles intégrées sont devenues aussi les premières multinationales américaines. Ici encore, le facteur décisif a été la création d’un réseau commercial. Les premières firmes que créèrent des réseaux de vente à l’étranger ont été aussi les premières à y exploiter des usines et d’autres installations de production qui leur appartenaient en propre » (Chandler, 1988, p. 408). No caso das empresas avícolas brasileiras, o processo foi semelhante. As que primeiro instalaram uma rede de escritórios e de filiais comerciais no exterior, foram também as primeiras a se instalarem com plantas industriais próprias fora do país. Sadia e sua presença internacional A maior empresa avícola nacional começou a deslanchar nas exportações com o surgimento da Sadia Trading em 1980 e com a estruturação da área de commodities, em 1988. Foi também no final desta década que suas exportações atingiram o ponto mais elevado, tanto em volumes quanto em valores. Depois de uma experiência de duas décadas de contato com clientes, de conhecimento de mercados e de capacitação técnica e profissional dos managers responsáveis pelas exportações, chegou o momento da instalação das filiais da Sadia Trading no exterior. Estas filiais tinham o objetivo de atender melhor os clientes tradicionais, de conquistar novas fatias de mercado, aumentando o volume das vendas. Além disso, eram verdadeiras « escolas » de formação de dirigentes e serviam para que a firma tivesse um conhecimento mais aprimorado sobre os mercados locais. A primeira foi aberta em Tóquio em maio de 1991, para atender o exigente e grande mercado japonês328. Neste mesmo ano, outra filial foi aberta em Milão, para atender os pedidos e conquistar novos clientes da Comunidade Européia (Teixeira, 1994, p. 326 Entrevista com o presidente da UBA e diretor da Frangosul, Montenegro-RS, 27 de abril de 1995. 327 Entrevista com o presidente da UBA e diretor da Frangosul, Montenegro-RS, 27 de abril de 1995. 328 Sadia, Relatório Anual, 1991/1992, p. 18. 288 119). Um outro escritório comercial foi aberto em Dubai, para atender o mercado dos Emirados Árabes, grandes importadores de frango brasileiro329. No início da década de 90 entrou em operação o Mercosul e a Sadia esteve atenta para aumentar o intercâmbio com estes países, sobretudo com a Argentina. Para melhor conhecer os gostos e estabelecer uma relação duradoura com este país vizinho, abriu um escritório comercial em Buenos Aires, em abril de 1992. Com isto, conseguiu registrar, neste ano, vendas no valor de US$ 22 milhões330. O ano de 1994 marcou o reposicionamento estratégico da Sadia no « Negócio internacional », fruto da reestruturação geral colocada em prática. O objetivo era « dotar a Companhia de maior agilidade e competitividade no atual cenário de globalização da economia. Dentro do novo modelo de gestão da empresa, foi criada a unidade de negócios Internacional, que passou a concentrar sob um único comando todas as operações de exportação, importação e investimentos no exterior em distribuição e produção »331. Com a área do Negócio Internacional, a Sadia buscou sua internacionalização. Começou pelo Mercosul e, a partir daí deve estender-se para outras regiões e outros blocos econômicos. « Instalando fábricas, por exemplo, na Argentina, talvez no Paraguai, China ou em país europeu, ela estará atendendo o mercado desses países, ou da região, respondendo às exigências de competitividade e acompanhando de perto seus negócios »332. É na Argentina que o processo de internacionalização da Sadia está mais avançado. Em 1993 a empresa formou uma joint-venture com a Tres Arroyos, da qual surgiu a Sadia Trading Sur. Dando continuidade a este processo, em 1995 a Sadia iniciou obras para instalação de fatiamento e embalagem de produtos como salame e mortadela, com câmaras frias, ampliando o sistema próprio de distribuição em Buenos Aires. O passo seguinte, segundo o diretor internacional, será a implantação da fábrica de processamento de carnes. Outro aspecto que passa a ganhar importância é a utilização da infra estrutura montada para importações e exportações. Segundo o diretor da área, até há pouco a Trading resumia-se a trazer umas poucas máquinas, peças e aparelhos do exterior para as fábricas, laboratórios e área de informática da Sadia. Dentro da nova estratégia de internacionalização isso mudou. 329 Dados da matéria « Só tem futuro quem pensa o futuro », entrevista com o diretor do Negócio Internacional da Sadia, publicada na revista Integração, órgão interno da FAF, São Paulo, n° 141, março/abril 1995, p. 23. 330 Sadia, Relatório Anual, 1992/1993, p. 13. 331 Sadia, Relatório Anual, 1994, p. 25. 332 Dados da matéria « Só tem futuro quem pensa o futuro », entrevista com o diretor do Negócio Internacional da Sadia, publicada na revista Integração, órgão interno da FAF, São Paulo, n° 141, março/abril 1995, p. 22. 289 Servindo-se dos canais de exportações, agora mão dupla, a empresa importa produtos compatíveis com seu ramo de negócios, infraestrutura e capacidade de distribuição333. Por fim, o mesmo diretor fala sobre o objetivo de formar alianças com empresas internacionais, fabricantes de produtos sinergéticos com os elaborados pela Sadia. Com isto, poderá intermediar exportações de diversos produtos que serão distribuídos através dos escritórios comerciais estrategicamente localizados, tanto nos Estados Unidos, como na Argentina, Japão, China, Europa e Extremo Oriente. Os resultados da nova reestruturação da Sadia começaram a se manifestar, quando ela inaugurou um restaurante e uma boutique de carnes em Pequim e ampliou as atividades do escritórios de Tóquio e de Milão. A churrascaria Beijing-Brasil foi inaugurada no dia 25 de julho de 1994, sendo uma joint-venture entre a Sadia e o Ministério da Agricultura da China334. O objetivo da empresa, com tal empreendimento, é divulgar seus produtos e conhecer melhor o mercado daquele país e região, visando futuros negócios. Ainda neste ano a Sadia decidiu abrir um escritório comercial nos Estados Unidos, onde seus interesses vão além das exportações de corned-beef e de carnes congeladas. « O objetivo é servir-se do crédito oferecido pelo governo americano para a exportação de grãos e do apoio financeiro para exportação de aves. Utilizando seus canais de distribuição em via de mão dupla, a Sadia pode trazer produtos americanos para o Brasil e deste, levar produtos para os EUA »335. Em 1995 a área Internacional passou por uma redefinição com o objetivo de buscar o equilíbrio entre as operações externas e os custos locais dos processos produtivos. Com a alteração, a área Negócio Internacional passou para uma Diretoria de Comércio Exterior, visando minimizar gastos diretos e maximizar resultados comerciais e financeiros. « Em 1995 a Sadia consolidou sua presença nos mercados externos a partir das subsidiárias instaladas nos Emirados Árabes, Japão, Itália, Estados Unidos, Argentina e China. As atividades externas mantiveram-se estáveis em relação aos 43 países compradores »336. 333 A Sadia é a maior distribuidora de frios do país. Tem 20 filiais regionais e os serviços de 150 mil pontos de vendas, espalhados pelo Brasil. Por que não aproveitar essa infraestrutura importando derivados de leite, pescado, legumes congelados e comercializá-los ou reexportá-los? Como efetivação desta nova política, a Sadia importou, em março de 1995, queijo da Argentina, Uruguai, Alemanha e Holanda. Com padrão definido pela Sadia, foi distribuído pelas filiais e pontos de vendas. Do Canadá, desde fevereiro, importou pato, testando sua aceitação em restaurantes de São Paulo (revista Integração, órgão interno da FAF, São Paulo, n° 141, março/abril 1995, p. 22). 334 Revista Integração, órgão interno da FAF, São Paulo, julho/agosto 1994, p. 25. 335 Entrevista com o diretor dos Negócios Internacionais da Sadia, publicada na revista Integração, órgão interno da FAF, São Paulo, n° 141, março/abril 1995, p. 23. 336 Sadia, Relatório Anual, 1995, p. 18. 290 O organograma abaixo nos ajuda a compreender a atual presença da Sadia no mercado internacional que, por enquanto, está mais baseada na comercialização que na industrialização. 291 ORGANOGRAMA 4 - SADIA E SUA ESTRUTURA DE COMÉRCIO INTERNACIONAL - 1995 G R U P O S A D I A Matrizeiros Incubatórios - pintos de um dia Fábricas de ração Agricultores integrados Abatedor Abatedor Abatedor Abatedor Abatedor SC SC PR PR PR Concórdia Chapecó Toledo Abatedor SP Abatedor MT D. Vizinhos Fco.Beltrão A.Brasiliense V.Grande 20 filiais comerciais no Brasil Exportação Portos : ITAJAÍ-SC Caminhão PARANAGUÁ-PR N a v Argentina Itália Japão China Buenos Aires Milão Tóquio Pequim MERCOSUL EUROPA JAPÃO CHINA SANTOS-SP i o Emirados Arabes Dubai ORIENTE EstadosUnidos A. do NORTE A Sadia exporta Em 1995 exportou 93.915 toneladas de frango inteiro para 43 países mais 30.692 toneladas de cortes de frango Fonte: Elaboração própria a partir dos dados da Sadia. 292 Ceval torna-se multinacional a partir da soja Na hora de internacionalizarem suas atividades, as empresas fazem uso de seu principal savor-faire, acumulado ao londo da própria história. A Sadia começou se implantando no exterior através da industrialização de carnes, enquanto a Ceval fez uso de seu conhecimento acumulado no ramo da soja. Um dirigente da Ceval resumiu bem esta situação, com a seguinte afirmação: « A Sadia pensa carnes, a Ceval pensa soja »337. Como vimos acima, a Ceval nasceu voltada para as exportações, mas só nos anos 90 é que pensou mais seriamente na possibilidade de tornar-se multinacional. Em 1995 isto já estava bem definido. « A internacionalização da Ceval é um caminho irreversível e um instrumento de suporte fundamental para o desenvolvimento de suas atividades »338. Com a aquisição da Guipeba S.A., na Argentina, a Ceval deu início à internacionalização de suas operações industriais. A compra foi efetivada em março de 1995, quando foi quitada a primeira das três parcelas do total de US$ 30 milhões pagos pela empresa. A Ceval comprou da Guipeba uma indústria em Tancacha, na Província de Córdoba e outra em San Jeronimo, onde está também uma refinaria com capacidade de 150 ton/dia. Também fazem parte do negócio dois silos na Província de Tucuman e um outro na localidade de Manfredi, em Córdoba. Além disso a Ceval ficou com 21,12% do Terminal 6, em Santa Fé e com 50% do terminal Guide, em Rosário, facilitando assim suas exportações a partir da Argentina339. Se o caminho da internacionalização começou pelo Mercosul, outros mercados estão nos objetivos da empresa. « Além da subsidiária Food Supply International, constituída recentemente na Holanda, encontram-se em fase adiantada de estudos a abertura de um escritório comercial no Extremo Oriente, bem como a realização de uma joint-venture, na Índia, para a industrialização e comercialização de derivados de soja »340. A Perdigão, terceira das empresas líderes do setor avícola, também desenvolveu uma política de internacionalização. Em 1989 fez uma joint-venture com o grupo Mitsubishi, para 337 Entrevista com o gerente do setor de produção de aves da Ceval, Gaspar-SC, 4 de maio de 1995. 338 Ceval, Relatório Anual, 1995, p. 10. 339 Revista Ceval Notícias, órgão de divulgação dos empregados da Ceval, Gaspar-SC, ano 12, n° 104, abril/95, p. 13. Já em 1996 a Ceval iniciou a construção de três silos na localidade de Piquete Cabado, Província de Salta, com capacidade para armazenar 100 mil toneladas de soja, com conclusão prevista para abril do próximo ano. Numa segunda etapa, a empresa construirá outros três silos com as mesmas dimensões (revista Ceval Notícias, órgão interno dos empregados da Ceval, Gaspar-SC, ano 12, n° 113, janeiro/96, p. 12). 340 Ceval, Relatório Anual, 1995, p. 10. 293 comercializar seus produtos no mercado japonês341. Em 1990 associou-se com um frigorífico portugês, visando produzir, industrializar e comercializar embutidos de carne de aves e de bovinos no Mercado Comum Europeu a partir de Portugal. Esta unidade foi inaugurada em meados de 1990 e tem uma capacidade produtiva de 250 mil toneladas por ano342. Se existe uma forte diferença entre as três empresas no que se refere ao valor total das exportações, os valores monetários se aproximam muito quando se trata das vendas externas de frango. Em 1995, a Ceval exportou por um valor de 1,1 bilhão, a Sadia 396,7 milhões e a Perdigão 219,5 milhões de dólares. No que se refere às vendas de frango, a ordem passa a ser Sadia, com 257,9, Ceval com 156,2 e Perdigão, com 137,3 milhões de dólares343. Neste caso, as empresas que dominam o mercado interno são exatamente também as maiores exportadoras e as mais avançadas no processo de internacionalização com implantação de unidades industriais. 341 O mercado japonês era o mais importante para as exportações da Perdigão em 1989, representando 55,5% do total. Considerando que o valor exportado pela empresa foi de US$ 135 milhões, nada menos que US$ 79 milhões destinaram-se àquele país (Jornal Folha de S. Paulo, 14/05/90, citado por Mior, 1992, p. 138). 342 Jornal Folha de S. Paulo, 14/05/90, citado por Mior (1992, p. 140). Infelizmente não temos dados mais atualizados sobre a presença da Perdigão a nível internacional, pois quando de nossa pesquisa de campo (abril e maio de 1995) a empresa estava sendo reestruturada pelos novos donos e, devido a este fato, não pudemos entrevistar nenhum de seus diretores e nem tivemos acesso a material atualizado. 294 CONCLUSÃO << Homem, Terra e Técnica >>, lema de Attilio Fontana, fundador da Sadia e um dos percussores da agroindústria brasileira, acabou sendo no decorrer da história, a prática de desenvolvimento também adotada nas outras principais empresas do setor: Ceval, Perdigão, Avipal, Frangosul, Chapecó, Pena Branca, Da Granja, Batavo, Aurora... Desde o financiamento de viagens ao exterior para seus principais dirigentes, que pesquisaram o que havia de mais avançado nos respectivos ramos de atuação, até a formação interna de seus profissionais, estas empresas sempre se preocuparam com a capacitação de seus funcionários, considerando o homem, fundamental para o futuro de suas atividades. A terra, lugar de produção de aves, suínos e grãos, principais matérias-primas destas empresas, tornou-se, através do fomento agropecuário e dos contratos de parceria avícola, um dos pilares da competitividade do setor. Aliado a estes dois elementos de primordial importância na história das agroindústrias, as inovações organizacionais e tecnológicas, representaram a ponta de lança de seu desenvolvimento nas últimas três décadas. A técnica foi um dos itens que recebeu mais atenção neste processo, através de investimentos e atualização permanente, sempre sintonizados com que havia de mais avançado nos países desenvolvidos. As inovações organizacionais e administrativas constituíram um fio condutor ao longo da história destes industriais, como mostramos no decorrer deste trabalho. Os investimentos no homem tiveram origem antes mesmo da atuação destas empresas na avicultura. Em 1951, quando Attilio Fontana fez sua primeira viagem à Europa convenceuse de que seus funcionários deveriam viajar e conhecer o que se passava nos países desenvolvidos. << Fiquei tão impressionado com o que me foi dado ver, observar, estudar que cheguei a uma conclusão: para desenvolvermos e aperfeiçoarmos as nossas atividades industriais aqui no Brasil precisávamos mandar os nossos diretores e técnicos viajarem para o exterior>> (Fontana, 1980, p. 179). Daquele momento em diante, funcionários especializados e diretores passaram a fazer estágios em firmas congêneres, realizar viagens de estudos <<previamente preparadas através de indústrias que nos vendiam equipamentos >> (Fontana, 1980, p. 140) e participar de congressos internacionais. Em nossa pesquisa de campo, ao entrevistar os dirigentes pudemos perceber a validade deste princípio pois constatamos que conhecem muito bem a Europa, os 343 Dados dos relatórios anuais das empresas, sendo que no caso da Perdigão, os dados são de 1994. 295 Estados Unidos e países da Ásia, assim como suas empresas e as políticas agroalimentares adotadas pelos seus respectivos governos. Cursos específicos de capacitação interna foram realizados para preparar os funcionários dos vários setores destas empresas, a fim de adaptar as tecnologias que foram sendo implantadas gradativamente, bem como as novas formas de organização de trabalho. Sempre buscando aumentar a produtividade, sobretudo a partir dos anos 90, as empresas líderes e <<imitadoras>> iniciaram a implantação dos programas de qualidade total, aumentando seus investimentos na área de recursos humanos. Depois de garantir a formação permanente de seus profissionais, os grupos agroindustriais procuram garantir o fornecimento de matéria-prima, adotando medidas em relação à terra. Assinaram contratos de parceria avícola com pequenos agricultores, estabelecendo os princípios da relação entre as empresas e os produtores. As primeiras encarregavam-se de fornecer pintos de um dia, ração, medicamentos e assistência técnica, enquanto os agricultores encarregavam-se de construir e equipar os aviários e de garantir a mão-de-obra necessária para o manejo dos frangos. Através destes contratos as agroindústrias garantiram o fornecimento de matéria-prima na qualidade, na quantidade e hora necessárias para expandirem sua produção. Para assegurar o funcionamento deste sistema, cada grupo implantou um setor de Fomento Agropecuário, encarregado de dar assistência técnica aos agricultores integrados. Estes setores de fomento iniciaram nos anos 50, antes portanto da diversificação avícola, mas ganharam força no final dos anos 80 e início da década de 90. Atualmente a matéria-prima torna-se cada vez mais a << galinha dos ovos de ouro >> na disputa entre grandes grupos pelo mercado nacional e pelas exportações, o que os leva investir sempre mais neste setor. A técnica foi utilizada com mais intensidade a partir do final dos anos 50 quando a atividade industrializou-se. O estado de São Paulo nesta época era o maior produtor nacional e que possuía a avicultura mais avançada. Tanto ali como no Rio de Janeiro e em Minas Gerais a estratégia utilizada foi a de implementar uma produção avícola articulada verticalmente, com pequenas empresas independentes participando em cada uma das atividades do processo de produção, com avicultores independentes. Sendo a maior região consumidora do país, os abatedouros destinavam toda sua produção para o mercado local e regional, trabalhando com pequenas unidades de abate, sem condições de atingir nem o mercado nacional e nem as exportações. Os grupos agroindustriais do Sul que entraram na avicultura diversificando suas atividades fizeram-no implantando a integração vertical. Como o consumo local era fraco, 296 passaram a disputar, desde o início, o mercado de São Paulo, Rio de Janeiro e, logo em seguida, graças à produção em escala atingiram as demais regiões do país. Combinando as vantagens inerentes à integração vertical, à economia de escala e à diversificação de setores e de produtos, aumentaram o volume de produção a tal ponto que superaram, na década de 70, os tradicionais grupos multinacionais de carnes, instalados no país desde os anos 20. Outra estratégia seguida pelas líderes Sadia, Ceval e Perdigão, foi a de diversificar seus ramos de atuação. A Sadia é a que abrange um leque maior de carnes atuando em aves, suínos e bovinos, enquanto as outras duas só trabalham com aves e suínos. No setor de grãos as três trabalham com soja e milho, tendo implantado a integração vertical em ambas as filières. Disputam espaço no mercado de maior consumo popular (frango inteiro) e nos novos nichos de mercado, com produtos semi-prontos, de maior valor agregado, oferecendo alternativas para festas e fim de ano, da páscoa, do dia dos pais e das mães (peru e frango da linha fiesta da Sadia, frangos Classy e Chester, da Ceval e da Perdigão). Com o objetivo de aproveitar dos incentivos fiscais, de diminuir custos de transporte e de atender as diversas regiões, as líderes instalaram-se com abatedouros em vários estados. Através de filiais comerciais próprias e de representantes exclusivos, distribuem sua produção em todas as regiões. A partir de 1975 começaram a disputar o mercado internacional via exportações e ultimamente, através de joint-ventures com empresas estrangeiras e com implantação de unidades no estrangeiro. Esta internacionalização além de significar cerca de 20% do faturamento bruto, permite-lhes o acesso ao crédito internacional, com juros mais vantajosos que os internos. A estratégia das << imitadoras >> (Avipal, Frangosul, Chapecó, Pena Branca, Da Granja, Minuano e Aurora) é de seguir os passos das líderes. Mesmo tendo sua formação do faturamento bruto centrada na avicultura, todas buscam diversificar seus ramos de atuação, sobre tudo em suínos e grãos, algumas atuando em outros setores (Frangosul em ovinos; Avipal na produção de ovos comerciais; Aurora na produção de suco de laranja, de uva e tangerina). Estes grupos seguiram os passos das líderes também na diversificação de produtos, investindo nos de maior valor agregado e disputando espaço com o peru, o classy e o chester daquelas. Sobretudo nos últimos anos buscaram comprar ou construir novos abatedouros em outras regiões e estados, para facilitar a disputa do mercado nacional. Agregada a esta estratégia está a de instalar outras filiais comerciais nos pontos de maior consumo do país, assim como de trabalhar com distribuidores exclusivos nas regiões onde não compensa a presença de uma filial própria. Assim como as líderes, todas as imitadoras exportam frangos 297 inteiros e em cortes para diversos países, no entanto, diferente daquelas ainda não têm estrutura para começar uma implantação industrial no estrangeiro. Nos anos 90, líderes e << imitadoras >> adotaram a estratégia de vender os setores não ligados diretamente à produção, de terceirizar o que não podia ser vendido ou de buscar uma << colaboração >> mais estreita com outras empresas, concentrando seu savoir-faire na produção e distribuição de alimentos. Este fator, junto com a implementação dos processos de qualidade total ajudou a aumentar a produtividade e competitividade destes grupos. Uma das características da avicultura nacional foi o constante contato com as inovações tecnológicas e organizacionais dos países desenvolvidos. Notamos sua importância na passagem da avicultura artesanal para a industrial. Notamos sua importância na passagem da avicultura artesanal para a industrial, quando determinadas pessoas, grupos ou empresas, à partir dos conhecimentos adquiridos no estrangeiro implantaram firmas responsáveis pelo avanço das diversas etapas produtivas, como o das matrizes, de pintos de um dia, de rações, de produção de equipamentos, sobre tudo na região Sudeste. Este contato também serviu para que a Sadia conhecesse e pudesse implantar a integração vertical. Atualmente serve para que grupos agroindustriais apresentem seus novos produtos nos salões e nas exposições internacionais, assim como permite a presença de pesquisadores estrangeiros nos principais eventos promovidos pela avicultura nacional. Manisfesta-se também na contratação de consultores estrangeiros na hora de preparar os planos estratégicos dos maiores grupos e na implementação de novas formas de organização de trabalho, quando técnicos europeus, norteamericanos e japoneses ajudam a implantar os processos de << qualidade total >>. Outra grande transformação que a avicultura industrial conseguiu foi a de provocar uma mudança nos hábitos alimentares da população brasileira. Através da combinação de produção de massa com outros avanços conseguidos ao longo de toda cadeia produtiva, as indústrias conseguiram reduzir o preço do frango ao consumidor, fator essencial no seu aumento de consumo. Com a diversificação de produtos em busca de uma alimentação mais saudável, novos consumidores foram atraídos para a carne branca em detrimento da vermelha. Por causa destes fatores, conforme projeções de técnicos ligados à avicultura, na virada do século o frango será a proteína mais consumida do povo brasileiro, superando a tradicional carne bovina. A avicultura industrial, na medida em que ganhou importância econômica constituiu instituições representativas fortes, dentre as quais destacamos a UBÁ, a ABEF, a ANAB e a APINCO, além das associações estaduais. Uma de sua principais tarefas é articular e defender os interesses dos diversos setores empresariais da cadeia produtiva diante do governo, 298 promovendo pesquisas, apresentando projetos-lei na Câmara, no Senado ou nas Assembléias estaduais. Outra atividade é a formação de um banco de dados que fez deste um dos setores mais organizados das atividades econômicas nacionais, pois tais entidades elaboram um levantamento completo e atualizado (com projeções para o futuro próximo) da produção de pintos de um dia, de frango inteiro e em cortes, das exportações e da paticipação da empresa. Estes dados são fundamentais para planejar a produção e prever os setores que necessitam de investimentos objetivando atender a demanda. Os eventos de caráter internacional promovidos por estas entidades, são pontos de referência para lançamento de novas pesquisas e de outros sub-produtos assim como para a realização de negócios. O lema << homem, terra e técnica>> foi introduzido e adotado pela Sadia, mas as mairoes concorrentes seguiram seus passos, adaptando-o às exigências econômicas de cada momento histórico. Como estabeleceu-se uma forte disputa na avicultura nacional, sobreviveram as empresas que souberam melhor fazer os investimentos necessários, lançaram novos produtos e descobriram novos mercados, valendo-se do seu savoir-faire acumulado nestas três décadas de avicultura industrial. Para finalizar, ressaltamos que a avicultura brasileira é competitiva, não só porque implantou a integração vertical, mas também porque atrai empresas estrangeiras dos setores de genética e veterinária; porque os empresários do setor estão organizados em instituições fortes e dinâmicas; porque estas instituições promovem eventos de caráter internacional; porque conta com boa formação de mão-de-obra, tanto interna às empresas quanto àquela feita pelas universidades e outras instituições de ensino; porque as principais empresas trabalham com o maquinário mais moderno e acompanham as inovações organizacionais do trabalho que lhes permitem maior competitividade; porque dispõe de um grande mercado interno com imenso potencial de expansão; porque exporta seus produtos para mais de 40 países, há 20 anos, consolidando sua experiência internacional. 299 FONTES E BIBLIOGRAFIA I. F O N T E S 1. DOCUMENTOS DAS EMPRESAS E DAS ASSOCIAÇÕES PROFISSIONAIS 1. Sadia Concórdia S.A. 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Data Função Tema Local 1 01.06.93 Directeur Projet Sadia 50 ans São Paulo-SP 2 14.07.93 Directeur Projet Sadia 50 ans São Paulo-SP Source: K7 enregistrés par Sadia, Alphaville, São Paulo, SP, 1993. 303 2. Entrevistas com diretores de empresas Abril, Maio de 1995 e março de 1996 Entrevista Data Empresa Função Local 1 18.04.95 Sadia Diretor Agropecuário Concórdia-SC 2 18.04.95 Sadia Diretor de Abate Concórdia-SC 3 27.04.95 Frangosul Présidente da UBA Montenegro-RS Diretor da Frangosul 4 27.04.95 Frangosul Diretor de Abate Montenegro-RS 5 27.04.95 Frangosul Diretor de Relações com o Montenegro-RS Mercado 6 28.04.95 Avipal Director de Produção Porto Alegre-RS 7 28.04.95 Avipal Instrutor de Produção Porto Alegre-RS 8 04.05.95 Ceval Diretor Agropecuário Gaspar-SC 9 12.05.95 Ceval Diretor de Comercialização São Paulo-SP 10 19.05.95 Batavo Diretor de Exportação Curitiba-PR 11 27.03.96 Ceval Diretor de vendas São Paulo-SP 3. Entrevistas com técnicos e pesquisadores Abril e Maio de 1995 e Março de 1996 Entrevista Data Instituição Função Local 1 04.04.95 IEA - Sec.Agric. SP Pesquisador São Paulo-SP 2 04.04.95 IEA - Sec.Agric. SP Méd. Veterinário São Paulo-SP 3 18.04.95 CNPSA - EMBRAPA Pesquisador Concórdia-SC 4 18.04.95 CNPSA - EMBRAPA Pesquisador Concórdia-SC 5 25.04.95 FEE - Sec.Agric. RS Pesquisador Porto Alegre-RS 6 04.05.95 Escola Sul - CUT Coordenador Florianópolis-SC 7 03.05.95 Univ. Federal do PR Professor Curitiba-PR 8 04.05.95 SEAB/Deral - PR Técnico Curitiba-PR 9 05.05.95 Epagri-SC Técnico Florianópolis-SC 10 05.05.95 CEPA-SC Técnico Florianópolis-SC 11 10.05.95 ANAB - Assot. Nat. des Conselheiro da São Paulo-SP Abat. Avicoles presidência APA - Assocition Pauliste Diretor d’Aviculture Superintendente 12 12.05.95 São Paulo-SP 304 13 05.03.96 Service Sanitaire Animal Diretor Belo Horizonte- MAARA-MG DF/MAARA/MG MG 14 06.03.96 AVIMIG Secretária Belo Horizonte 15 07.03.96 ABEF Diretor Executivo Rio de Janeiro 16 14.03.96 DERAL Diretor Curitiba-PR 17 20.03.96 UFPR Coord. Mestrado em Curitiba-PR Economia 18 22.03.96 EMBRAPA Diretor adjunto Concórdia-SC 19 23.03.96 UFPR Coord Mestrado. em Curitiba-PR Sociologia 20 27.03.96 ANAB Superintendente São Paulo-SP 305 BIBLIOGRAFIA 1. BIBLIOGRAFIA GERAL DE HISTÓRIA ECONÔMICA E DE ORGANIZAÇÃO DO TRABALHO LIVROS ADEFI - Association pour le Développement des Etudes sur la Firme et l’Industrie (1985), L’Analyse de Filière, Economica, Paris, 147 p. AMADIEU Jean-François (1993), Organisation et travail. Coopération, conflit et marchandage, Vuibert, Paris, 226 p. AOKI Masahiko (1988), Economie Japonaise. Information, motivations et marchandage, Economica, Paris, 349 p. 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Gessulli, dez’95, ano 85, n° 1028, pp. 12-57. BATAVO, revista mensal da CCLP - Cooperativa Central de Laticínios do Paraná, Castro, PR, ano 3, n° 33, julho de 1994. Industria Avicola, revista mensal, edition lationamericana de Poultry International, avril de 1986 a enero de 1995 (incompleta). 319 Mercosul, revista mensal de negócios, ano IV, n° 35, abril de 1995. Notas de Imprensa. Empresas líderes no setor agro-alimentar brasileiro, Revista da UFPR/GEAS, Curitiba, PR, n° 2 (Jan e Fev/1989) a n° 23 (Jul e Ago/1992) Revista nacional da Carne, ano XIX, n° 216, fevereiro de 1995. São Paulo Avícola, revista mensal, órgão oficial da Associação Paulista de Avicultura, São Paulo, SP, setembro de 1953 a dezembro de 1960. 6. ARTIGOS SOBRE AVICULTURA 1. Temas gerais « A grande sacada do frango », in: revista Aves e Ovos, APA, São Paulo, SP, setembro de 1993, pp. 5-15. ANDRADE Alfredo N. (1990), « Avicultura do futuro: uma perspectiva para o século 21 », in: Sociedade Brasileira de Zootecnia, Avicultura, FEALQ, Piracicaba, SP, pp.31-36. « APA. Jovem aos 50 anos », in: revista Aves e Ovos, APA, São Paulo, SP, novembro de 1994, pp. 10-19. BACOCCINA Denize (1995), « Cinco redes de supermercados preparam-se para entrar no Brasil », in: Jornal O Estado de São Paulo, São Paulo, SP, 11/05/1995, caderno B, Economia, p. 10. « CHESTER, Classy e Bruster batem recorde », in: Revista Nacional da Carne, ano XIX, n° 216, São Paulo, fevereiro/95, p. 66. « CHESTER. Consumidor aceita o superfrango », in: revista A Granja Avícola, Porto Alegre, RS, setembro de 1982, pp. 18-19. COPACOL - Cooperativa Agrícola Consolata Ltda, « Pascoali reeleito presidente na Copacol », in: Estado. A revista do Paraná, revista mensal de informação, Curitiba, PR, ano III, n° 35, abril de 1995, pp. 32-33. CULLEN NETO João A. (1973), « A evolução avícola em meio século », in: revista Avicultura Industrial, ed. Chácaras e Quintais, São Paulo, SP, outubro de 1973, ano 64, n° 766, pp. 18-21. « DE Nes Filho substitui o pai na Chapecó », in: Revista Nacional da Carne, ano XIX, n° 216, São Paulo, fevereiro/95, p. 13. « EMPRESAS produtoras de pintos de corte afiliadas à Apinco », in: ANAIS (1990), Conferência APINCO de Ciência e Tecnologia Avícolas, Campinas, SP, pp.7-12. 320 FERREIRA FILHO Rino (1994), « O frango de corte em busca de novos índices de consumo », in: revista Aves e Ovos, APA, São Paulo, SP, setembro de 1994, pp. 6-10. « FRANGO vence o boi e quem sai ganhando é o país e o consumidor », in: revista Aves e Ovos, APA, São Paulo, SP, maio de 1994, pp. 7-18. « FRANGOS e abatedouros », in: revista Avicultura Industrial, ed. Chácaras e Quintais, São Paulo, SP, julho de 1972, ano 63, n° 751, pp. 58-62. « GUIA Aves e Ovos para a avicultura », in: revista Aves e Ovos, APA, São Paulo, SP, fevereiro de 1995, pp. 4-82. MÜLLER Heitor (1994), « Avicultura, um agribusiness que deu certo », in: revista Agroanalysis, vol. 14, n° 4, 15/12/94, pp. 1-5. MÜLLER Heitor (1994), « Somos os mais competentes », in: revista Amanhã, maio de 1994, pp. 6-8. « NORDESTE implanta projeto de franquia para frangos », in: Revista Nacional da Carne, ano XIX, n° 216, São Paulo, fevereiro/95, p. 65. « NÚMEROS consolidados da avicultura entre 1983 e 1994 », in: revista Avicultura e Suinocultura Industrial, Gessulli Editores Ltda, São Paulo, SP, março de 1995, p. 52. NUNES Romão da Cunha (1993), « O apoio financeiro oficial: metas e perspectivas », in: ANAIS (1993), Conferência APINCO de Ciência e Tecnologia Avícolas, Campinas, SP, pp.17-19. OCEPAR - Organização das Cooperativas do Estado do Paraná, « Capacidade de abate das empresas paranaenses », Informe Agroeconômico, Curitiba, PR, n° 225/93, 30/11/93, p. 11. « O frango é uma moeda forte », in: revista Aves e Ovos, APA, São Paulo, SP, janeiro de 1993, pp. 5-13. PRIOR João (1991), « A industrialização da carne de aves como fator de desenvolvimento do consumo », in: ANAIS (1991), Conferência APINCO de Ciência e Tecnologia Avícolas, Campinas, SP, pp.15-24. « PERUS. Consolidando o mercado », in: revista A Granja Avícola, Porto Alegre, RS, fevereiro de 1981, pp. 4-6. SANDOLI José M. (1983), « Produto do sul é mais barato », in: revista A Granja Avícola, Porto Alegre, RS, janeiro de 1983, p. 13. WRIGHT Chris (1995), « Empresas líderes em 1995 », in: revista Industria Avicola, edition latinoamericana de Poultry International, enero 1995, volumen 42, numero 1, pp. 8-36. 2. Artigos sobre Qualidade, Produtividade e Tecnologia 321 « ALTA tecnologia na linha de produção industrial », in: revista Aves e Ovos, APA, São Paulo, SP, agosto de 1994, pp. 12-15. « A saúde de nossa avicultura », in: revista Aves e Ovos, APA, São Paulo, SP, junho de 1994, pp. 11-15. « AVISUL. Objetivo é a modernidade », in: revista Avicultura Ciência e Tecnologia, ano 2, n° 8, p. 7. BRANDÃO FALCÃO Luiz C. (1988), « Perspectivas na industrialização de carne de aves », in: ANAIS (1988), Conferência APINCO de Ciência e Tecnologia Avícolas, Campinas, SP, pp. 23-30. « INDÚSTRIA de equipamentos assegura a boa produtividade da avicultura », in: revista Aves e Ovos, APA, São Paulo, SP, julho de 1994, pp. 12-13. MULDER R.W. (1994), « Tecnologia do abate de aves: passado, presente e futuro », in: ANAIS (1994), Conferência APINCO de Ciência e Tecnologia Avícolas, Campinas, São Paulo, SP, pp. 145-150. « QUALIDADE com sabor de Brasil (ISO 2000) », in: revista Aves e Ovos, APA, São Paulo, SP, maio de 1994, pp. 7-18. « Q&P ». Afinal, o que é isso? », in: revista Avicultura Ciência e Tecnologia, ano 2, n° 8, p. 4-11. 3. Artigos sobre Genética BEHAGHEL Olivier (1994), « Genética Avícola », in: PINHEIRO Marcos Roberto (org.), (1994), Manejo de frangos, Campinas, SP, Fundação Apinco de Ciência e Tecnologia Avícolas, pp. 15-20. CARTE Ira (1993), « Evolução genética dos frangos até o século XXI », in: Anais da UBA (1993), XIII Congresso Brasileiro de Avicultura. XIII Exposição Nacional de Avicultura, Brasília, DF, pp. 34-37. « DISPUTA de gente grande », in: revista Avicultura Industrial, ed. Chácaras e Quintais, São Paulo, SP, março de 1995, ano 85, n° 1019, pp. 43-44. « GENÉTICA. A produção de avós », in: revista A Granja Avícola, Porto Alegre, RS, novembro de 1983, pp. 10-11. SCHMIDT Gilberto Silber; AVILA Valdir Silveira (1990), « Linhagens avícolas brasileiras », in: Sociedade Brasileira de Zootecnia (1990), Avicultura, Fealq, Piracicaba, SP, pp. 31-36. 322 SCHMIDT Gilberto S.; LEDUR Mônica C.; FIGUEIREDO Élcio A.P. (1993), « Melhoramento genético de aves no Brasil: resultados obtidos nas instituições oficiais de pesquisa », in: ANAIS (1993), Conferência APINCO de Ciência e Tecnologia Avícolas, Campinas, SP, pp. 9-16. 4. Artigos sobre Alimentação, Exportações, Integração e Aspectos Fiscais GAUER Ronei V. (1992), « Pontos críticos no processo produtivo de frangos de corte Rações », in: ANAIS (1992), Conferência APINCO de Ciência e Tecnologia Avícolas, Campinas, SP, pp. 1-13. « LA evolución de la industria del alimento » in: revista Industria Avicola, edition latinoamericana de Poultry International, abril 1993, pp. 7-14. « RAÇÕES avícolas: passado e presente », in: revista Avicultura Industrial, ed. Chácaras e Quintais, São Paulo, SP, abril de 1971, ano 62, n° 736, pp. 6-12. « DECOLAGEM autorizada », in: revista Aves e Ovos, APA, São Paulo, SP, dezembro de 1994, pp. 12-18. DESOUZART Osler (1994), « O Quo Vadis da indústria avícola para o ano 2000: avanço no consumo de carnes e a perspectiva do mercado internacional », in: ANAIS (1994), Conferência APINCO de Ciência e Tecnologia Avícolas, Campinas, SP, pp. 151-157. « EXPORTAÇÃO. Criada entidade internacional », in: revista A Granja Avícola, Porto Alegre, RS, março de 1981, pp. 4-5. « EXPORTAÇÃO. Movimento de 1980 cresceu 155% », in: revista A Granja Avícola, Porto Alegre, RS, junho de 1981, pp. 10-11. « EXPORTAÇÃO. Pool da Avesp entra em ação », in: revista A Granja Avícola, Porto Alegre, RS, abril de 1981, pp. 5-6. FACCHINI DE CESARE Cláudia (1995), « Europa cancela importações de carne de frango do Paraná », in jornal Gazeta Mercantil, São Paulo, SP, 04/05/95, Agribusiness, Caderno B, p. 14. « FRANGO brasileiro entra na guerra do Oriente », in: revista Avicultura Industrial, ed; Chácaras e Quintais, São Paulo, SP, agosto de 1975, ano 66, n° 788, pp. 38-54. « MERCADO abatido », in: revista de negócios Mercosul, ano IV, n° 35, abril de 1995, pp. 41-43. 323 « INTEGRAÇÃO avícola completa 32 anos de vida e de alta tecnologia », in: revista Aves e Ovos, APA, São Paulo, SP, agosto de 1993, pp. 6-28. « INTEGRAÇÃO. Segurança na crise », in: revista A Granja Avícola, Porto Alegre, RS, fevereiro de 1983, pp. 4-10. SOUZA Arnaldo (1995), « Quem ganha com a integração? », in: revista Avicultura Industrial, ed. Chácaras e Quintais, São Paulo, SP, março de 1995, ano 85, n° 1019, pp. 12-26. « MENU indigesto: recheio de 43 tributos », in: revista Aves e Ovos, APA, São Paulo, SP, outubro de 1994, pp. 6-12. 324 Contratos padrão da Sadia, Perdigão e Ceval 1. SADIA CONCÓRDIA S.A. INDÚSTRIA E COMÉRCIO CONTRATO DE PARCERIA AVÍCOLA Pelo presente instrumento particular, de um lado Sadia Concórdia S.A. Indústria e Comércio, empresa industrial com personalidade jurídica de direito privado, com sede na Rua Senador Attilio Fontana, 66/86, cidade de Concórdia, Estado de Santa Catarina, CGC-MF n° .........., proprietária das aves (pintos de um dia), das rações e dos medicamentos e insumos, doravante denominada PARCEIRA PROPRIETÁRIA, neste ato representada por seu Diretor ..........., brasileiro, (estado civil), (profissão), residente e domiciliado na rua ........., cidade de Concórdia, Estado de Santa Catarina, portador da Cédula de Identidade n° ........... e do CIC n° .......... e de outro lado (nome do avicultor) e seu conjunto familiar, agricultores, conhecedores dos procedimentos técnicos para criação de aves, estabelecidos na localidade de .........., Município de .......... Estado (UF), ele inscrito no CIC n° .......... e Cédula de Identidade n° .........., proprietário do imóvel rural matriculado sob n° .........., livro (livro e folhas) do Ofício de Imóveis da comarca de .........., cadastrado no INCRA sob n° .........., com (número de aviários), com capacidade para .......... cabeças de aves, edificado(s) sobre este imóvel, onde trabalha com sua família, composta de (número de pessoas) membros, e com (número de empregados) seus, registrados de acordo com a legislação trabalhista em vigor, doravante denominado PARCEIRO CRIADOR, tem justo e contratado a presente Parceria Avícola que se regerá pela Legislação Agrária, Código Civil e Cláusulas seguintes: Cláusula 1 a A PARCEIRA PROPRIETÁRIA se obriga a entregar ao PARCEIRO CRIADOR, na sua propriedade, pintos de um dia para serem criados e terminados até a idade de 32 a 62 dias, terminação essa que poderá variar de acordo com as necessidades de demanda do mercado nacional e ou internacional. Cláusula 2 a A PARCEIRA PROPRIETÁRIA, para fim de criação e terminação das aves, fornecerá as rações e medicamentos necessários para a criação e engorda das mesmas. 325 Cláusula 3 a Após a entrega das aves terminadas, a reposição para cada aviário de pintos de um dia e da ração inicial será efetuada no prazo de 03 a 20 dias, podendo o mesmo ser dilatado mediante a cientificação do PARCEIRO CRIADOR ou havendo superveniência de motivo de força maior que impeça o cumprimento do aqui exposto. Cláusula 4 a O PARCEIRO CRIADOR dispensará os cuidados necessários e indispensáveis para a criação e terminação das aves, adotando, para tanto, os procedimentos técnicos que melhor se recomenda, facultando-se-lhe uma busca sem qualquer ônus, junto ao departamento de fomento da PARCEIRA PROPRIETÁRIA, de orientação técnica que esta dispensa à sua própria criação. Parágrafo único - O não atendimento da parte inicial desta cláusula por parte do PARCEIRO CRIADOR, facultará à PARCEIRA PROPRIETÁRIA o direito de rescidnir com justa causa o presente contrato, respondendo aquele pelas perdas e danos que causar. Cláusula 5 a Uma vez completado o período de criação e engorda das aves, respeitada a partilha prevista na cláusula 6a, a parte que pertence à PARCEIRA PROPRIETÁRIA lhe será entregue pelo PARCEIRO CRIADOR, cujo transporte correrá por conta daquela. Cláusula 6 a Do resultado obtido na criação e engorda das aves, até a idade retro referida, o PARCEIRO CRIADOR terá direito a título de participação na Parceria, a uma percentagem das aves vivas produzidas sobre o total em quilos do lote, a qual poderá dispor como melhor lhe aprouver, percentual este que variará conforme fórmula e tabela para este fim existente e que integram o presente contrato, das quais ambos os PARCEIROS declaram expressamente terem pleno conhecimento e onde serão observados os critérios de cálculo da eficiência da produção. Cláusula 7 a As despesas relacionadas com os serviços de tratamento, aquecimento e cuidados com as aves, correrão por conta exclusiva do PARCEIRO CRIADOR, que se obriga fornecer toda a mão-de-obra necessária, sua, de sua família ou de terceiros, respondendo pelos encargos sociais e ou trabalhistas previstos em lei. Cláusula 8 a É facultado à PARCEIRA PROPRIETÁRIA, acompanhar a criação e engorda das aves, para o que lhe é assegurado livre e permanente acesso às instalações nas quais o plantel está sendo terminado. Cláusula 9 a O prazo de duração do presente contrato é indeterminado, podendo o mesmo ser rescindido por qualquer das partes mediante notificação por escrito com antecedência mínima de 60 (sessenta) dias, não gerando esta medida qualquer direito a indenização para qualquer das partes. 326 Cláusula 10 a O inadimplemento das obrigações assumidas por qualquer das partes, dará lugar facultativamente à rescisão do contrato. Cláusula 11 a Fica eleito o foro da Comarca de Concórdia-SC para qualquer ação fundada neste contrato. E assim, por estarem justos e contratados, assinam o presente instrumento em três vias de igual teor e forma, na presença das testemunhas abaixo, sendo a terceira via destinada ao Cartório de Registros de Títulos e Documentos para os devidos fins. Concórdia, (data) _________________________________ PARCEIRO PROPRIETÁRIO ___________________________________ PARCEIRO CRIADOR TESTEMUNHAS 1. Nome_____________________________ 2. Nome ______________________________ CIC ______________________________ CIC ________________________________ 3. Nome_____________________________ 4. Nome ______________________________ CIC ______________________________ CIC ________________________________ FÓRMULA PARA CÁLCULO DA PERCENTAGEM QUE CORRESPONDE AO PARCEIRO CRIADOR NA PARCERIA AVÍCOLA DA SADIA CONCÓRDIA S.A. INDÚSTRIA E COMÉRCIO. A fórmula para cálculo do Índice de Eficiência Europeu é expressa da seguinte maneira: PESO MEDIO x SOBREVIVÊNCIA x 100 : IDADE I.E.E. = ---------------------------------------------------------------------CONVERSÃO ALIMENTAR 327 O resultado da aplicação desta fórmula representa o Indice de Eficiência wazzu do lote entregue pelo Parceiro Criador e a cada valor do Indice corresponde uma percentagem do peso vivo do lote que pertencerá ao Parceiro Criador, conforme tabela abaixo: TABELA PARA CÁLCULO DO INDICE DE EFICIÊNCIA EUROPEU - 1984 I.E.E. % I.E.E. % I.E.E. % I.E.E. % 130 3,4 156 5,0 172 6,6 188 8,2 132 3,5 157 5,1 173 6,7 189 8,3 134 3,6 158 5,2 174 6,8 190 8,4 136 3,7 159 5,3 175 6,9 192 8,5 138 3,8 160 5,4 176 7,0 194 8,6 140 3,9 161 5,5 177 7,1 196 8,7 142 4,0 162 5,6 178 7,2 198 8,8 144 4,1 163 5,7 179 7,3 200 8,9 146 4,2 164 5,8 180 7,4 202 9,0 148 4,3 165 5,9 181 7,5 204 9,1 150 4,4 166 6,0 182 7,6 206 9,2 151 4,5 167 6,1 183 7,7 208 9,3 152 4,6 168 6,2 184 7,8 210 9,4 153 4,7 169 6,3 185 7,9 212 9,5 154 4,8 170 6,4 186 8,0 155 4,9 171 6,5 187 8,1 Fonte: Sadia Esta tabela poderá ser mudada, desde que ocorram fatos novos significativos na comercialização de frangos, tanto no mercado interno como externo. Concórdia, 29 de novembro de 1984. 328 2. PERDIGÃO AGROINDUSTRIAL S.A. CONTRATO DE PARCERIA AVÍCOLA Pelo presente instrumento particular, de um lado PERDIGÃO AGROINDUSTRIAL S.A., pessoa jurídica de direito privado, estabelecida na Rua do Comércio, 39, Videira, SC, inscrita no, CGC-MF n° 89.421.903/0001-50, proprietária das aves (pintos de um dia), da rações, dos medicamentos e dos insumos, doravante denominada PARCEIRA PROPRIETÁRIA, neste ato representada pelos seus Diretores no final assinados e de outro lado (nome do agricultor) e seu conjunto familiar, agricultores, conhecedores dos procedimentos técnicos para a criação de aves, estabelecidos na localidade de.........., ele inscrito no CPF/MF n° .......... e Cédula de Identidade n° .........., proprietário do imóvel rural matriculado sob n° .........., livro (livro e folhas) do Ofício de registro de Imóveis da Comarca de .........., cadastrado no INCRA sob n° .........., com (número de aviários), com capacidade para ........... cabeças de aves, edificado(s) sobre este imóvel, onde trabalha com sua família, composta de (número de pessoas) membros, e com (número de empregados) seus, registrados de acordo com a legislação trabalhista em vigor, doravante denominado PARCEIRO CRIADOR, tem justo e contratado a presente PARCERIA AVÍCOLA que se regerá pela Legislação Agrária, Código Civil e Cláusulas seguintes: PRIMEIRA: A Parceira Proprietária se obriga a entregar ao Parceiro Criador, na sua propriedade, pintos de um dia para serem criados e terminados até a idade de .......... a .......... dias, terminação esta que poderá variar de acordo com as necessidades da demanda nacional e/ou internacional. SEGUNDA: A Parceira Proprietária, para fim de criação e terminação de aves, fornecerá as rações e os medicamentos necessários para a criação e engorda das mesmas, devendo o Parceiro Criador solicitar o suprimento e administrar o consumo de acordo com as necessidades ou prescrições. TERCEIRA: Após a entrega das aves terminadas, a reposição para cada aviário de pintos de um dia e da ração inicial será efetuada no prazo máximo de 20 dias, podendo o mesmo ser dilatado mediante a cientificação por escrito do Parceiro Criador, com as razões especificadas, havendo superveniência de motivo de força maior que impeça o cumprimento do aqui exposto, inclusive por problemas de ordem sanitária que vier a ocorrer no aviário, atestado por médico veterinário da Parceira Proprietária. 329 PARÁGRAFO ÚNICO - Poderá a Parceira Proprietária dilatar o prazo a que se refere o caput desta cláusula se: 1) - Após uma primeira advertência por escrito, constatar, através de seus técnicos, que o Parceiro Criador é reincidente na aplicação de manejo contrário a boa técnica e que o resultado obtido com o lote de aves tenha sido prejudicado em virtude do manejo adotado; 2) - Constatar que as instalações do aviário não oferecem condições de alojamento, inclusive por falta de equipamento necessário. QUARTA: O Parceiro Criador, dispensará os cuidados necessários e indispensáveis para a criação e terminação de aves, adotando, para tanto, os procedimentos técnicos que melhor se recomenda, facultando-se-lhe uma busca, sem qualquer ônus, junto ao departamento de fomento da Parceira Proprietária, de orientação técnica e veterinária que esta dispensa à sua criação. QUINTA: Uma vez completado o período de criação e engorda de aves, respeitada a partilha prevista na Cláusula Sexta, a parte que pertence à Parceira Proprietária, lhe será entregue pelo Parceiro Criador, cujo transporte correrá por conta daquela. SEXTA: Do resultado obtido na criação e engorda das aves, até a idade referida, o Parceiro Criador terá direito, à título de participação na Parceria, a uma percentagep das aves vivas de produzidas sobre o total em quilos do lote, percentual este que variará conforme tabela para este fim existente, da qual ambos os Parceiros declaram expressamente terem pleno conhecimento e, onde serão observados os critérios de cálculo da eficiência da produção. PARÁGRAFO ÚNICO - A Parceira Proprietária se compromete a adquirir a parte do Parceiro Criador e este a vender à Parceira Proprietária pelo preço constante da tabela para remuneração de frangos de corte elaborada pela Parceira Proprietária com base no desempenho do lete (conversão alimentar, mortalidade, idade e peso médio), conforme padrões de produtividade constantes na tabela supra mencionada, correndo frete por conta da Parceira Proprietária, tendo esta um prazo de 10 dias para efetuar o pagamento, nas suas sedes de atuação. SÉTIMA: A Parceira Proprietária se obriga a entregar ao Parceiro Criador todos os tiques de pesagem das aves entregues, facultando-lhes o direito de acompanhar as pesagens no estabelecimento de destino das mesmas. OITAVA: Por ocasião da entrega das aves, a sobra da ração que eventualmente ocorrer, que é de propriedade da Parceira Proprietária, será por sua conta, transferido a outro criador, assim como poderá ficar na propriedade do Parceiro Criador, para outro lote, a critério da Parceira Proprietária. 330 NONA: As despesas relacionadas com os serviços de tratamento, apanhe das aves, aquecimento, cuidados com as aves e a cama do aviário, correrão por conta exclusiva do Parceiro Criador, que se obriga a fornecer toda a mão de obra necessária, sua, de sua família ou de terceiros, respondendo pelos encargos sociais e/ou trabalhistas previstos em lei, isentando a Parceira Proprietária de qualquer responsabilidade solidária. DÉCIMA: É facultada à Parceira Proprietária, acompanhar a criação e engorda das aves para o que lhe é assegurado livre e permanente acesso às instalações nas quais o plantel está sendo terminado. DÉCIMA PRIMEIRA: O prazo de duração do presente contrato é indeterminado, podendo o mesmo ser rescindidio por qualquer das partes mediante notificações por escrito com antecedência mínima de 180 (cento e oitenta) dias, não gerando esta medida direito a indenização para qualquer das partes. DÉCIMA SEGUNDA: O inadimplento das obrigações assumidas por qualquer das partes, dará lugar facultativamente à rescisão do contrato, respondendo o inadimplente pelas perdas e danos que causar. DÉCIMA TERCEIRA: Os casos omissos serão resolvidos entre as partes e objeto de aditivo ao presente contrato. DÉCIMA QUARTA: A eventual tolerância de qualquer infração contratual não configura a perda ou renúncia do direito das partes. DÉCIMA QUINTA: Fica eleito o Foro da Comarca de Videira-SC para qualquer ação fundada neste contrato. E assim, por estarem justas e acertadas, as partes assinam o presente contrato em três vias de igual teor e forma, na presença de duas testemunhas. ......................... de ............... de ........... Parceira Proprietária ______________________________________ Parceiro Criador _________________________________________ Anuente ________________________________________________ Anuente ________________________________________________ Testemunhas ____________________________________________ ____________________________________________ 3. CEVAL AGROINDUSTRIAL S.A. 331 CONTRATO DE PARCERIA AVÍCOLA Pelo presente instrumento de Parceria Avícola de um lado a empresa CEVAL AGROINDUSTRIAL S.A., com sede no município de Gaspar, SC, à Rodovia Jorge Lacerda, S/N, inscrita no CGCMF n° 84.046.101/0001-93, inscrição estadual n° 250.212.226, com seus atos constitutivos registrados na Junta Comercial do Estado de Santa Catarina, sob n° 35.435 em data de 25.01.72, sociedade anônima de capital aberto, pessoa jurídica de direito privado, na condição de proprietária das aves em criação, das rações, dos medicamentos e insumos, aqui denominada CEVAL, por seus representantes legais infra firmados, e do outro lado, o Sr. ..............., estado civil ..............., nacionalidade ..............., com endereço ................ inscrito no CPF/CGCMF sob n° ................, infra firmado, doravante denominado PARCEIRO CRIADOR, ficou ajustado o presente CONTRATO DE PARCERIA AVÍCOLA, que se regerá pelo artigo 1.416 e seguintes do código civil brasileiro, mediante as condições e cláusulas seguintes: PRIMEIRA: A CEVAL entregará ao Parceiro Criador, pintos de um dia para serem criados e terminados em propriedade do segundo, concorrendo a Ceval para tal fim com as rações e medicamentos necessários para a criação e engorda das aves. SEGUNDA: O Parceiro Criador dispensará todos os cuidados necessários e indispensáveis para a criação e terminação das aves no que poderá dispor de assistência técnica da Ceval, através de técnicos especializados e habilitados, podendo dispor ainda de orientação quanto à terminação de aves, tanto no que diz respeito às instalações como ao manejo e condições sanitárias a serem observadas objetivando um melhor resultado. TERCEIRA: Uma vez completado o período de criação e engorda das aves e respeitados os critérios de partilha abaixo estabelecidos, a parte que pertence à Ceval lhe será devolvida pelo Parceiro Criador, correndo o transporte por conta daquela. QUARTA: Do resultado obtido na terminação das aves, o Parceiro Criador terá direito, à título de participação na Parceria a uma percentagem sobre o total em quilos das aves vivas produzidas, que variará conforme a tabela para esse fim utilizada e da qual ambos os parceiros declaram expressamente, através deste instrumento, terem pleno conhecimento. QUINTA: Definida a partilha, o Parceiro Criador ficará livre para vender a sua parte à própria Ceval ou a quem mais lhe interessar, dela dispondo da forma que melhor lhe convier. SEXTA: As despesas relacionadas com os serviços de tratamento, aquecimento e criação de aves, correrão por conta exclusiva do Parceiro Criador, que se obriga a fornecer toda a mão- 332 de-obra necessária, sua ou de terceiros, respondendo pelos encargos sociais ou trabalhistas previstos em lei. SÉTIMA: A Ceval poderá acompanhar e fiscalizar sempre que entender necessário, a criação e engorda das aves para o que lhe é assegurado livre e permanente acesso às instalações nas quais o plantel está sendo terminado. OITAVA: Ocorrendo mortalidade das aves em criação, o Parceiro Criador dará ciência do fato à Ceval que poderá proceder ao exame, diagnóstico e providências técnicas que julgar necessárias. NONA: A eventual deficiência no manejo do plantel, o descumprimento das normas técnicas, a utilização indevida das rações e medicamentos fornecidos pela Ceval ou a infrigência de qualquer outra disposição contida nas cláusulas anteriores é motivo bastante para rescisão deste contrato. DÉCIMA: O Parceiro Criador autoriza a parceira Ceval Agro-Industrial S.A. a contrair financiamento bancário com base no MCR 2.1.6, para aquisição dos insumos necessários à manutenção dos plantéis, objeto da cláusula primeira, ficando os referidos financiamentos sob a responsabilidade única e exclusiva da Ceval Agro-Industrial S.A., até sua total liquidação, podendo, nesse período, permanecer na propriedade do parceiro criador os mencionados plantéis. DÉCIMA PRIMEIRA: O presente contrato terá prazo de duração indeterminado, podendo ser rescindido mediante aviso prévio de 60 dias por ambas as partes. DÉCIMA SEGUNDA: Em obediência aos dispositivos legais, fica assegurada a conservação dos recursos naturais e a proteção social e econômica dos Parceiros, de acordo com o artigo 13 do Decreto n° 59.566/66 de 14.11.66. DÉCIMA TERCEIRA: Fica eleito o foro da Comarca de Gaspar-SC para qualquer ação fundada neste contrato. E assim, por estarem justos e contratados, assinam o presente instrumento em três vias de igual teor e forma, na presença de duas testemunhas, sendo a terceira via destinada ao Cartório de Registro de Títulos e Documentos para o devido registro. .............................. de ..................... de ............ Ceval Agro-Industrial S.A. _____________________________________________ Parceiro Criador _____________________________________________________ Testemunhas ________________________________________________________ ________________________________________________________ 333 334 OS CONTRATOS TIPO NA AGRICULTURA FRANCESA I-1 - Decreto de 15 de março de 1988, relativo à homologação de um contrato tipo de integração para a produção de frangos de corte. O Ministro da Agricultura, Conforme a lei n° 64-678 de 6 de julho de 1964, define os princípios e as modalidades do regime contratual na agricultura e, sobretudo seu titulo V; Conforme a lei n° 80-502 de 4 de julho de 1980 de orientação agrícola e sobretudo seu artigo 8; Conforme o decreto n° 88-201 de primeiro de março de 1988, relativo aos contratos tipo de integração no setor de criação; Conforme o visto do Conselho superior de orientação e coordenação da economia agrícola e alimentar de 3 de março de 1988, Decreta Art. 1° - Fica homologado na qualidade de contrato tipo de integração no setor de frangos de corte, o contrato tipo para a produção de carne, cujo texto vai anexo a este decreto. Art. 2° - O diretor da produção e comercialização fica encarregado da execução do presente decreto, que será publicado no Jornal Oficial da República Francesa. Feito à Paris, em 15 de março de 1988 François GUILLAUME CONTRATO TIPO PARA A PRODUÇÃO DE FRANGOS DE CORTE Conforme a lei de 6 de julho de 1964, modificada pela lei de 4 de julho de 1980, e o decreto n° 82-125, de 2 de fevereiro de 1982, relativo aos contratos tipo de integração no setor de criações, entre: Senhor (nome e sobrenome), endereço ........... Grupo de criadores a que pertence .......... Atuando como produtor agrícola, inscrito a este título no seguro social agrícola sob o número ......., aqui denominado integrado, de uma parte e, a empresa: Razão social: ..........., 335 estabelecimento de: ....................., Natureza jurídica (S.A., .....): Atividade (fabricante de alimentos, abatedouro): .....................Sede social: ........................Inscrita no registro de comércio sob o número: .....................representada pelo Sr. ...................., tendo todo poder para este efeito, aqui denominada empresa, de outra parte, foi conveniado e decretado o que segue: Artigo 1 - Objeto do Contrato O contrato tem por objetivo a criação e entrega de frangos de corte, de acordo com o calendário de criação figurando no anexo I. Artigo 2 - Duração do contrato O contrato fica firmado pela duração de ............ (meses ou anos) ou por lote, neste caso, fica prevista a renovação automática do contrato, de acordo com o artigo 20, a seguir. O contrato findará no momento da criação do último lote, durante o período de referência, dentro do aviário ou dos aviários declarados no anexo II, ficando estabelecido que o intervalo de « vazio sanitário » entre dois lotes será de ...... dias, com uma tolerância de ........... dias, mais ou menos, tudo respeitando uma média anual de .............de acordo com as espécies e os tipos de produção. A data de efetivação do contrato fica fixada para .........., dia da chegada do primeiro lote de frangos. No caso onde a empresa conceda um empréstimo ao criador ou seja fiadora deste último junto a um organismo bancário, a duração do contrato é igual à duração do empréstimo ou caução, reservadas as disposições previstas nos artigos 18 e 20 abaixo. Artigo 3 - Lugar da criação O presente contrato se aplica ao(s) aviário(s) de criação de frangos de corte, situado (comunidade, município, estado): ............................................................................................... Artigo 4 - Descrição dos meios de produção a) Terreno e instalações da criação - O integrado declara que é (proprietário, arrendatário) do terreno e das instalações de criação, contratadas com a empresa e que tem o direito de exploração. 336 As características do ou dos aviários e das instalações de criação são designadas e descritas no próprio local, em anexo II do contrato que precisa a situação topográfica e a superfície dos estabelecimentos. b) Alimentos, animais, produtos veterinários - A empresa declara que ela é proprietária dos alimentos e dos pintos colocados em criação, assim como dos meios de produção aqui designados, fornecidos por ela ou sob suas ordens por terceiros. c) Outros meios de produção - O criador declara se ele é proprietário de meios de produção outros que estes designados no parágrafo b) abaixo. Artigo 5 - Escolha dos fornecedores Após acerto com o criador, o fornecimento de alimentos ou de pintos de um dia, poderá, sob ordem da empresa, ser efetuada por terceiros. Artigo 6 - Obrigações recíprocas das partes a) Obrigações da empresa - A empresa se compromete com o seguinte: 1. Fornecer ou fazer fornecer, em tempo hábil ao integrado, os pintos de um dia e a ração dos animais cuja natureza, características, quantidades e modo de utilização serão precisados no anexo III do presente contrato. Em caso de contestação sobre as características, a qualidade ou a quantidade dos pintos entregues ou da ração, o integrado deverá fazer anotar sobre a nota de entrega ou avisar a empresa ou o fornecedor por telegrama, dentro das ......... horas seguintes à entrega. Assim que a reclamação tenha sido feita sobre as características, a qualidade, a quantidade da ração ou dos pintos, a empresa disporá de ........... horas para fazer suas observações. Se ela admitir que a reclamção tem fundamento, ela tomará para si tal reclamação e o eventual prejuízo. Na hipótese contrária, ela fará efetuar os procedimentos necessários por « experts », como está definido no anexo IV. 2. Fornecer ou fazer fornecer ao integrado em tempo hábil os produtos e serviços necessários para a execução do contrato, cuja natureza, características e modo de utilização serão descritos no anexo III do presente contrato. 3. Remeter ou fazer remeter ao integrado, para todos os fornecimentos feitos pela empresa ou por um terceiro designado por ela, uma nota de entrega, contendo a data da entrega, a natureza da mercadoria, o peso e a quantidade, a assinatura do criador ou de seu representante e do entregador. 337 A nota de entrega dos pintos deverá conter além disso: o ou os incubatórios de proveniência, a hora da saída dos incubatórios, o dia do nascimento dos pintos, a raça dos pintos, o número dos animais entregues e a hora da entrega. A nota de entrega dos alimentos deverá conter além disso: o peso líquido entregue (cópia do ticket do peso), as características e a data e o peso encomendados pelo criador. 4. Remeter os documentos técnicos de criação. 5. Recolher ou fazer recolher o total dos frangos de corte estabelecidos pelo contrato. 6. Comunicar ou entregar uma fatura ao criador, em seguida de cada lote, dentro do prazo de .......... dias, salvo reserva se este último, no prazo combinado, não tiver entregue a ficha do lote e todos os documentos devidamente preenchidos que permitam elaborar a fatura. b) Obrigações do integrado 1. Encarregar-se do manejo para a criação dos frangos de corte, objeto do contrato. 2. Receber e garantir a criação dos lotes entregues. 3. Pedir ou encomendar, com ........... dias úteis de antecedência, os alimentos necessários para a execução do contrato junto à empresa ou a um terceiro por esta designado. Salvo acordo prévio das partes, estar presente ou representado na hora da entrega dos alimentos e, eventualmente, ajudar na recepção e na manipulação dos alimentos. 4. Fornecer os meios de produção necessários para a criação além daqueles fornecidos pela empresa ou por um terceiro, sob suas ordens. 5. Preencher diariamente a ficha do lote, conforme as disposições do anexo V do presente contrato. 6. Avisar a empresa, sem demora, por carta registrada ou telegrama ou telex, toda anomalia na conduta da criação e, sobretudo, a aparição de sinais patológicos e/ou toda mortalidade anormal. 7. Entregar ou colocar à disposição da empresa a totalidade de cada lote que tenha sido criado. 8. Remeter à empresa por ocasião do carregamento dos frangos ou dentro de um prazo de .......... dias, a segunda via da ficha de criação e, eventualmente, todos os outros documentos devidamente preenchidos, correspondendo às prestações efetuadas. 9. Após examinar a fatura remetida pela empresa, devolver um exemplar assinado dentro de um prazo de ........... dia(s). Durante este intervalo, o criador terá todo o poder para formular por escrito suas observações. Artigo 7 - Regulamento técnico e sanitário 338 As partes se engajam a respeitar o regulamento técnico e sanitário descrito no anexo V do contrato, que precisará as condições de emprego dos produtos necessários à criação dos animais, assim como às regras técnicas sanitárias às quais devem se conformar as partes. Salvo menção contrária, a empresa fornecerá ao criador a assistência técnica. Artigo 8 - Exclusividade do criador sob contrato O integrado se compromete a só criar, dentro do ou dos aviários fixados no anexo II, os frangos de corte fazendo parte do presente contrato. Eventualmente, após acordo com a empresa, além dos frangos de corte sendo objeto deste contrato, o integrado poderá criar outras aves, sob reserva de aplicar rigorosamente o regulamento técnico e sanitário. Artigo 9 - Direito de visita O criador reconhece, a toda pessoa qualificada ligada à empresa, o direito de visita no ou nos aviários ou nos lotes de frangos que estão sendo criados. Estas visitas se farão dentro das condições de higiene as mais estritas e, salvo acordo contrário, na presença do criador ou de seu representante. Esta pessoa terá notadamente a obrigação de escrever sobre a ficha do lote, por ocasião de cada visita, a data de sua passagem e as intervenções praticadas, em função do regulamento técnico e sanitário. Em caso de urgência e se a empresa está impossibilitada de intervir imediatamente, o criador terá a faculdade, em acordo com esta última, de chamar um dos veterinários profissionais, cujos nomes figurem no anexo V deste contrato. Os gastos das intervenções veterinárias ficarão, neste caso, sob a responsabilidade da empresa. Artigo 10 - Carregamento ou entrega dos frangos de corte 1. Os frangos, objeto deste contrato, serão colocados à disposição da empresa pelo integrado ou entregues em (lugar da entrega) nos dias e horas indicados pela empresa ao criador, com no mínimo .......... de antecedência. 2. O apanhe dos frangos é de responsabilidade de: ............................... 3. A colocação dos frangos nas caixas ou nos contêiners é de responsabilidade de: ....... 4. O carregamento das caixas ou contêiners é de responsabilidade de: ........................... 5. O transporte dos frangos é de responsabilidade de: ..................................................... 339 A parte que fizer a operação, manipulação e/ou transporte, será responsável pelo serviço que está prestando. 6. Uma nota de carregamento deverá obrigatoriamente ser entregue ao integrado e conter as seguintes menções: Data; número de identificação do caminhão e/ou reboque; hora de início e do fim do carregamento; quilometragem do veículo ao chegar no aviário; a título indicativo, número de frangos vivos carregados; nome, assinatura e observações eventuais das partes; toda « sobrecarga » unilateral sobre a nota de carregamento será considerada como nula. 7. Assim que o integrado assume a responsabilidade pela entrega dos frangos, a entrega da nota de recepção, prevista no artigo 11 abaixo, servirá como justificativa. 8. Uma quebra de peso, causada pelo transporte, poderá ser acordada entre as partes. Artigo 11 - Recepção dos frangos 1. O peso do caminhão carregado e do caminhão vazio se efetuará após acordo pré estabelecido entre as partes sob uma mesma balança, pública ou privada. Desde que seja combinado que a pesagem se efetuará no abatedouro, o criador poderá, se desejar, e às suas custas, fazer efetuar uma pesagem de controle numa balança pública escolhida de comum acordo entre as partes. Caso os frangos sejam pesados no abatedouro, a pesagem se fará imediatamente à chegada do caminhão. A empresa se compromete a respeitar a regulamentação em uso em matéria de pesos e medidas, sobretudo no que concerne a determinação do peso bruto, do caminhão vazio e do peso líquido do lote. 2. Um boletim de recepção, ao qual será anexada uma cópia do ticket da pesagem, deverá obrigatoriamente ser entregue ao criador e conter as seguintes menções: Data; número de identificação do caminhão e/ou do reboque; hora da pesagem no abatedouro; peso dos frangos; toda « sobrecarga » unilateral sobre a nota de recepção ou o ticket de pesagem será considerada como nula. 3. Assim que a empresa perceber que os frangos foram « empanturrados » antes de serem entregues, ela notificará imediatamente o criador por telefone e confirmará o fato por telegrama. Ela poderá aplicar uma redução de .....% sobre o peso vivo. 4. O criador terá liberdade para assistir ou se fazer representar, às suas custas, nas operações de abate e pesagem. 340 Artigo 12 - Penhora Quando as quantidades penhoradas forem superiores a ..........% do peso ou do número total dos animais, a empresa deve avisar o integrado, desde sua constatação, por telefone, confirmar por telegrama e, neste caso, remeter ao criador uma cópia do certificado de penhora. Estas penhoras poderão ser conservadas no abatedouro durante um período determinado por um acordo entre as partes, salvo decisão contrária do veterinário. Artigo 13 - Procedimentos para estabelecer os resultados técnicos a) Base de referência - As médias de performances técnicas realizadas pelo conjunto dos integrados ligados a uma empresa pelo mesmo tipo de contrato e por uma produção idêntica e numa mesma região serão estabelecidas e juntadas ao balanço técnico precisando especialmente a repartição das performances, as modificações havidas nos fornecimentos ou nos produtos, os problemas de criação, tais como epizootia, doenças, condições climáticas ou atmosféricas, incidentes materiais (incêndios, cortes no fornecimento de energia elétrica, problemas de aquecimento nos aviários...) de caráter excepcional, decorrentes durante o período de criação. b) Constatação 1. Assim que um criador adere a um grupo de integrados, o balanço técnico estabelecido pela empresa, de acordo com os procedimentos acima mencionados, será constatado pelos representantes dos criadores aderentes do grupo e os representantes da empresa, através de um processo verbal, assinado pelos representantes de cada uma das partes. 2. Quando o criador não fizer parte de nenhum grupo de integrados, o balanço técnico pela empresa, de acordo com o procedimento acima mencionado, será estabelecido da seguinte forma: Seja quando a empresa trabalha numa mesma região, com um grupo de criadores, por produções idênticas e com contratos similares, ela poderá propor, para a execução do contrato, ao criador não aderente de usar o balanço técnico feito no processo verbal e assinado pelos representantes da empresa e do grupo. Ou então a empresa se obriga, dentro de um prazo determinado entre as partes, a estabelecer, de acordo com o procedimento acima mencionado, o balanço técnico e o colocar à disposição de cada integrado, trabalhando com ela com contratos similares e por produções idênticas. O integrado dispõe de um prazo de .......... após a data da expiação desta notificação, para notificar à empresa que tomou conhecimento do balanço técnico. 341 Em caso de desacordo das partes, a parte a mais diligente recorrerá ao procedimento de conciliação, previsto no artigo 21 abaixo. Artigo 14 - Remuneração do integrado a) Remuneração - O contrato deve fixar com precisão a remuneração do integrado, por quilo ou por cabeça, para cada espécie ou tipo de produção, em função dos resultados técnicos obtidos pelo integrado, logo após cada produção, com referência a uma grade de remuneração (tabela de pontuação), figurando no anexo VI do contrato. Esta grade de remuneração será estabelecida em função dos usos da empresa e da região. Ela levará em consideração o peso vivo e o índice de consumo de ração, tendo em conta as performances técnicas realizadas pelo conjunto dos integrados ligados à empresa por uma produção idêntica e um mesmo tipo de contrato e em referência às despesas de criação comunicadas pelos integrados e aquelas constatadas pela empresa, de acordo com a nomenclatura constando do anexo VII. A grade de remuneração conterá um mínimo de flexibilidade para que haja negociação entre as partes, a partir da alínea acima. b) Revisão - A grade de remuneração que determina a remuneração dos integrados será reexaminada pelo menos uma vez por ano. c) Desconto No caso onde os resultados técnicos obtidos pelo integrado forem inferiores de .....% aos resultados técnicos mínimos da grade, a remuneração do integrado poderá eventualmente fazer objeto de um desconto, quando a qualidade dos alimentos ou dos pintos fornecidos pela empresa ou, sob sua ordem, por um terceiro, não apresentarem problemas. Para este efeito, a empresa fornecerá todos os elementos de apreciação e de comparação necessários. Artigo 15 - Modificação das características técnicas e das condições de produção No caso em que a empresa seja conduzida, por razões técnicas, econômicas ou sanitárias, a modificar as características técnicas da produção, dos produtos, meios e serviços a serem colocados em prática e se estas modificações devem ser levadas em conta para o cálculo da remuneração e sobre esta, estas modificações serão objeto de uma notificação ao integrado, em seguida, a uma alteração no contrato assinado entre as partes e aplicável, salvo acordo contrário, a contar a partir do primeiro lote de frangos depois da data da assinatura. Artigo 16 - Condições de pagamento 342 A quantidade de dinheiro que a empresa deve ao integrado será paga por ..........(forma de pagamento) e num prazo máximo de trinta dias depois do carregamento dos frangos. Em caso de atraso do pagamento, a empresa deverá ao integrado, o juro legal aplicado a partir do dia da data do pagamento prevista acima, sem que seja necessário nenhum procedimento por parte do integrado. Artigo 17 - Indenizações 1. Inexecução parcial - Em caso de inexecução parcial do presente contrato, sobretudo no caso de retardo no carregamento dos frangos ou na entrega de rações, causando uma ruptura na alimentação dos frangos, uma multa será devida por uma ou outra das partes cujo montante será determinado por elas ou, em desacordo, pela instituição encarregada da conciliação. 2. Redução do número de frangos entregues a) Por derrogação às disposições do artigo 1°, a empresa terá a faculdade de reduzir o número de frangos por lote durante o tempo que ela julgar necessário, sob reserva de aplicar durante este mesmo período uma redução análoga a todos os integrados sob contrato com ela, pelo mesmo tipo de produção, e de não subscrever novos contratos nem instalar pessoalmente novos aviários. Se esta redução for inferior ou igual a 10% do lote, nenhuma indenização será paga ao integrado. Se esta redução for superior a 10% do lote, o integrado receberá, pela parte excedente, uma indenização proporcional à quantidade devida, calculada sob a base das performances técnicas médias da grade de referência. b) Por derrogação às disposições do artigo 1°, o integrado, sob pedido expresso da empresa, terá a faculdade de reduzir o número de frangos por lote durante uma duração que ele julgar necessária. Se esta redução for inferior ou igual a 10% do lote, nenhuma indenização será paga à empresa. Se esta redução for superior a 10% do lote, a empresa receberá, pela parte excedente, uma indenização calculada segundo as modalidades determinadas de comum acordo, por escrito, entre as partes. 3) Atraso na entrega entre um lote e outro Por derrogação às disposições do artigo 2°, cada uma das partes se reserva a faculdade de retardar o início da criação de um novo lote, durante uma duração máxima de ...... dias, além do tempo de repouso usual, sob reserva para a empresa de aplicar um retardo análogo a todos os integrados sob contrato com ela, salvo acordo escrito entre as partes. 343 A contar deste prazo, o retardo dará lugar ao pagamento de uma indenização à outra parte, convertendo os dias de atraso em redução do número de frangos entregues, segundo a seguinte fórmula: 344 J R= ------ = ..... N expressa em % do número de frangos a ser entregue, prevista no artigo 1° no qual: J representa o número de dias de atraso constatados para entregar os pintos entre um lote e outro; N corresponde à duração do lote, fixado no calendário de criação, no qual está compreendido o tempo de repouso usual. Se o atraso for acompanhado de uma redução do número de frangos no lote considerado, a porcentagem desta redução e o que corresponde ao atraso, totalizam-se pelo cálculo da indenização. Artigo 18 - Condições de financiamento dos meios de produção Se a empresa financia o total ou uma parte dos equipamentos necessários à execução do contrato, ou se ela é fiadora de um contrato bancário, as partes deverão assinar o anexo VIII do presente contrato que precisará as modalidades deste financiamento. Quando o financiamento for concedido pela empresa e se houver ruptura do contrato feito pelo integrado, este se comprometerá a efetuar o pagamento à empresa, conforme as modalidades previstas no anexo VIII. Desde que o financiamento seja concedido pela empresa e se houver ruptura do contrato por parte do integrado, a empresa suspenderá, por um ano, os pagamentos ao integrado. Caso a empresa seja fiadora e houver ruptura do contrato por parte do integrado, este último se compromete seja a reembolsar o empréstimo feito, seja, se ele desejar tratar com outra empresa, a obter de seu novo contratante que ele venha a assinar como fiador, em substituição da primeira, ficando a cargo do integrado, fazer aceitar que a nova empresa seja fiadora diante do organismo que efetuou o empréstimo e de fazer cancelar o presente empréstimo. Toda modificação nas condições de financiamento em curso do contrato deve fazer objeto de uma emenda ao anexo VIII. Artigo 19 - Seguro dos riscos Para os riscos assegurados, as partes deverão assinar o anexo IX do presente contrato. Toda modificação nas condições de seguro deverá fazer objeto de uma emenda ao anexo IX. 345 Artigo 20 - Rescisão - Suspensão 1. Inexecução - O contrato pode ser rescindido após a demora de uma das partes depois do final de um lote, em caso da não execução total pela outra parte de uma ou várias obrigações previstas no contrato. 2. Doença ou acidente - Em caso de doença ou de acidente acontecidos com o integrado, este deve informar a empresa e tomar todas as disposições para levar a bom termo a criação do lote em curso. No final deste lote, o contrato poderá ser suspenso por uma duração determinada, de comum acordo entre as partes. Passado este prazo ou se o integrado não mais estiver em condições de continuar a executar o contrato, este será rescindido e as obrigações entre as partes cessam nesta data. 3. Morte - Em caso de morte do integrado, o contrato será rescindido e as contas entre as partes cessam em seguida à criação do lote que estiver em curso. Assim que o sucessor do integrado apresentar as qualificações exigidas para continuar a criação, um novo contrato poderá ser estabelecido entre a empresa e o sucessor do integrado falecido. 4. Falência da empresa - Em caso de falência da empresa, o integrado terá garantido lugar na fila dos credores privilegiados em virtude do artigo 2101 do código civil. 5. Problemas com resultados técnicos - Uma ou outra das partes terá faculdade de denunciar unilateralmente o presente contrato quando os resultados de criação fizerem aparecer por .......... lotes consecutivos ou uma duração de .......... dos resultados técnicos inferiores a ......... % aos resultados técnicos mínimos da grade de remuneração. 6. Casos fortuitos ou de força maior - Todos os casos fortuitos ou de força maior tornando imposível a execução do contrato causam, seja a suspensão com exoneração de tudo ou de parte das obrigações, seja a rescisão com acerto de contas na data da rescisão. Artigo 21 - Litígios e procedimentos de reconciliação As partes se comprometem, uma ou outra, em caso de litígio, a recorrer a um procedimento de reconciliação prealável a toda instância judiciária, à exclusão dos procedimentos de apelação. A instância conciliatória compreende um conciliador designado de comum acordo pelas partes e que pode ser assistido, se uma das partes o exigir, por um representante designado por cada uma delas. A instância conciliatória, que compreenda uma ou três pessoas, pode consultar por advertência das organizações profissionais representativas de sua escolha. 346 Dentro de um prazo máximo de um mês a contar da entrada do pedido, salvo acordo expresso das partes por uma eventual prorrogação, um processo verbal de conciliação ou de não conciliação deverá ser comunicado às partes por carta registrada, com aviso de recepção. Artigo 22 - Renovação O presente contrato pode ser renovado por um período de, no máximo, um ano, salvo acordo escrito das partes por uma duração superior. Se uma das partes não desejar deixar que se renove automaticamente o contrato, ela deve prevenir por carta registrada, com aviso de recepção .......... meses de antecedência ao fim do período de referência fixado no artigo 2° do presente contrato ou no momento da entrega do penúltimo lote. Artigo 23 - Modificações do contrato Nenhuma exceção, modificação ou complementação às disposições do presente contrato e de seus anexos não pode ser feita, salvo por escrito e assinado das duas partes envolvidas. Artigo 24 - Unidade do contrato O presente contrato e seus anexos representam a integralidade das convenções entre as partes que reconhecem não ter passado entre elas nenhum acordo verbal ou escrito. Artigo 25 - Notificação do contrato O presente contrato é redigido e assinado em três exemplares, dos quais dois são enviados ao integrado. Artigo 26 - Tomada de conhecimento oficial do contrato Salvo acordo contrário, as partes dispõem de um prazo de ......... dias a contar da data da assinatura do contrato, para tornar oficial o conhecimento do contrato, por carta registrada, com aviso de recepção. Feito em .............., em ........................................................................ ----------------------------------------------------Assinatura 347 ANEXO I - CALENDÁRIO DE CRIAÇÃO O calendário de criação deve ser enviado ao integrado por ocasião da assinatura do contrato e precisar sobretudo o número de pintos por lote, a duração da criação e o intervalo entre os lotes. ANEXO II - SITUAÇÃO DAS INSTALAÇÕES I. Situação da propriedade ou dos aviários - Descrição contendo principalmente: endereço completo, regime das instalações (proprietário, arrendatário...), identificação das construções, referências particulares, área total. Situação atual do ou dos aviários (idade, estado de conservação). II. Situação dos aviários - Descrição contendo sobretudo: sistema de ventilação, de aquecimento, de alimentação, situação dos bebedouros...; Estado das instalações do aviário (idade, estado de conservação). III. Aprovação da empresa e observações emitidas em caso de necessidade. IV. Engajamento de manutenção das instalações por parte do integrado. ANEXO III - CARACTERÍSTICAS DOS MEIOS DE PRODUÇÃO I Características das rações - Natureza (definição das variedades de rações previstas durante o período de criação): início, crescimento e engorda. Características técnicas: garantias legais das rações mencionadas sob as etiquetas conforme a legislação em vigor. Programa de alimentação. As rações acima mencionadas poderão conter uma ou outra das complementações ou suplementações legalmente autorizadas. II. Animais em criação - Características: espécie (frango de corte, galinha d’angola, patos, perus).Raça dos frangos ou cruzamentos, a título indicativo. III. Produtos veterinários Designação dos produtos ...................................................................... Características técnicas ........................................................................ Quantidade (a título indicativo) ........................................................... ANEXO IV - PROCEDIMENTOS DE CONTESTAÇÃO 348 Este procedimento não exclui em nada, de ambas as partes, a possibilidade de ter acesso aos recursos do tribunal. Em caso de contestação pelo integrado da qualidade das entregas feitas pela empresa ou sob sua ordem, por um terceiro, as partes combinam expressamente de respeitar as regras dos experts no assunto, tais como estão definidas nos procedimentos do código civil. ANEXO V - REGULAMENTO TÉCNICO E SANITÁRIO I. Ordens técnicas e sanitárias - 1. Limpeza e preparação dos aviários antes da chegada dos pintos; 2. Recomendações para a chegada dos pintos; 3. Regras de conduta do manejo; 4. Regras de desinfecção e profilaxia; 5. Condições de visitas aos aviários; 6. Registro dos resultados da criação dos lotes; 7. Lista dos veterinários conveniados com a empresa. II. Registro dos resultados do lote - A ficha de criação, que conta com dois exemplares e assinada pelo integrado, deve conter as menções seguintes: espécie, número de pintos entregues, data da entrega, raça ou cruzamento, incubatório de origem, registro das mortalidades, quantidade de ração entregue por categoria e estoque restante. Observações e notas do pessoal qualificado da empresa. Observações eventuais das partes. Menção dos tratamentos veterinários. ANEXO VI - REMUNERAÇÃO I. Balanço técnico - O balanço técnico será estabelecido de acordo com uma periodicidade regular, determinada por um acordo entre as partes para o conjunto dos integrados ligados à empresa por um mesmo tipo de contrato e por uma produção idêntica. O balanço técnico conterá, além dos elementos previstos no artigo 13°, linha a), do contrato, os dados seguintes: O número de integrados O número de frangos produzidos O peso médio de abate, o índice de consumo médio, a taxa de mortalidade e de penhora (dias de demora do pagamento do lote) média. O método de repartição das peformances técnicas aplicadas para seu estabelecimento. 349 Os planos de profilaxia efetuados, assim como todas as informações de características técnicas julgadas necessárias pelas partes, tais como as fontes usadas, características das rações, etc., serão anexadas ao balanço técnico. II. Grade de remuneração - A grade de remuneração conterá: Uma escala de peso vivo médio dos frangos; Uma escala dos índices de consumo; Uma escala de remuneração correspondente. ANEXO VII - ELEMENTOS DE INFORMAÇÃO PARA ESTIMAR OS ENCARGOS DE PRODUÇÃO Encargos variáveis: aquecimento, água, eletricidade, custos veterinários (eventualmente, quando estiverem sob a responsabilidade do integrado), desinfecção, encargos de carregamento do lote. Encargos fixos: seguro, encargos diversos de gestão, reparação e manutenção. Amortização dos encargos financeiros: amortização do aviário e dos equipamentos. Encargos financeiros, incluindo os de curta duração sobre os investimentos. Margem do integrado (remuneração, encargos sociais de exploração) De acordo com as partes, estas informações poderão ser apresentadas por kilograma/vivo, por cabeça ou por metro quadrado. ANEXO VIII - FINANCIAMENTO DOS MEIOS DE PRODUÇÃO 1. Montante do empréstimo; 2. Duração do empréstimo; 3. Taxa anual de juros; 4. Anuidades; 5. Referências bancárias do empréstimo (número); 6. Utilização do empréstimo: construção ou reforma dos aviáiros, situados ..............................., referência cadastral ..............................; 7. Nome do organismo financiador; 8. Informações relativas à caução, sobretudo a natureza, o montante, a duração; 9. Garantias consentidas e contraparte do integrado. ANEXO IX - SEGURO Para os riscos assegurados, as partes deverão completar o anexo abaixo, precisando notadamente: 350 Nome do assegurado; Nome do organismo assegurador; Data e número da pólice do seguro; Riscos cobertos (incêndio, tempestados, acidentes de criação do lote, perdas...); Montante do capital assegurado por risco e rubrica; Montante do prêmio concedido; Nome dos beneficiários em caso de sinistro ou quota-parte dos encargos. Em caso de sinistro, fica expressamente conveniado que a empresa deve se responsabilizar unicamente sob a base dos valores declarados, indenizando o correspondente em pintos, rações e a seus próprios fornecimentos ou àqueles feitos por um terceiro, sob suas ordens. Quando a empresa for a fiadora de algum empréstimo bancário, fica expressamente conveniado que as indenizações serão automaticamente destinadas ao reembolso do empréstimo assim que o integrado não desejar mais reconstruir o aviário. ANEXO X - DISPOSIÇÕES CONCERNENTES AOS INTEGRADOS MEMBROS DE UM GRUPO DE INTEGRADOS Nome do grupo de integrados. Razão social; Endereço; O integrado, Sr. ......................., reconhece a delegação de poder que provém dos estatutos, do regulamento interno ou das decisões adotadas em assembléia geral de seu grupo de integrados. O presente anexo deve ser rubricado pelo presidente do grupo de integrados, pela empresa e pelo integrado. 351 Armando DALLA COSTA 24, Rue Jean Lurçat - A-2 94800 - Villejuif Tel.: 46 78 39 68 Villejuif, le 4 septembre 1996 Mr. Guy MARTINIERE! J’espère que vous avez eu de bonnes vacances ! Je me suis promené, avec ma famille, à l’Italie, Allemagne, République Tchèque et Autriche. Maintenant, je resterai e travaillerai, pour finir ma thèse. Je vous ai envoyé un premier chapitre, sur l’origine des premières entreprises de la branche volailles au Brésil. J’attends toujours votre réponse, mais je sais même pas si vous avez eu le temps de le lire. Alors, peut être que le meilleur soit que vous me fixer un rendezvous où nous pourrons discuter ce texte, pour que je puisse écrire les autres chapitres. Si vous venez à Paris pendant le mois de septembre, j’aimerais bien avoir en rendezvous, puisque je voudrais déposer ma thèse jusqu’à la moitié avril 97, pour faire la soutenance jusqu’à la fin juin. En attendant votre réponse, je vous prie, M. Martinière, d’accepter mes salutations distingués. 352 Armando DALLA COSTA