MÃOS AO ALTO - WordPress.com

Transcrição

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MÃOS
AO
ALTO
Texto de Paulo Goulart
PERSONAGENS
MULHER
EMPREGADA
TIA
MARIDO
BRANCO
PRETO
PRIMEIRO ATO
Living de uma casa. Hall de entrada. Saídas para os
interiores dos quartos. Copa e jardim de inverno. Mulher
elegantemente vestida, cruza a cena em direção à copa.
Empregada saindo da copa em direção dos quartos.
MULHER - Tia Reni está reclamando seu chá. E não
esqueça, nada de açúcar.
EMPREGADA - Sim senhora... Uma com açúcar... Outra
sem açúcar. Uma come carne, outra num
come. Gente fina tem o que comê... e vive
passando fome.
TIA (Vinda do jardim, vai até o bar e se serve de licor) Vai ser hoje, ou nunca. Aos meus nenéns.
(Sorve um gole).
MULHER (Vinda da copa) - Dina já está trazendo o seu
chazinho. Ah... Meu Deus. Nove horas e a
Bia não chega. Como é que estou?
TIA - Linda. Maravilhosa... (Outro tom) Só que eu acho
que você, devia pensar melhor...
MULHER (Cortando) - As crianças ligaram do Guarujá,
voltam domingo à noite. Você devia ter
ido com elas.
TIA - Elas estão muito bem, com o lado árabe da família,
esfiha, kibe, tabule, tio, tia, praia, areia,
calor... Muito obrigado, minha querida...
Eu estou otimamente bem, aqui... Depois,
você iria ficar sozinha.
MULHER - Eu sei muito bem o que estou fazendo, minha
querida. Pela primeira vez, eu sei.
TIA - Mulher separada do marido, quando dá o primeiro
passo...
MULHER - Ah!... Meu Deus. Vamos começar tudo de
novo? (Indo ao telefone) Eu estou viva,
tia. Viva. E não se preocupe, eu sei cuidar
de mim.
EMPREGADA (Entrando) - Seu chazinho sem açúcar,
Dona Reni...
TIA - Ah... Meu chazinho. Deixe aí.
MULHER - Ocupado. Sempre ocupado. A Bia não larga
esse telefone.
EMPREGADA - Dona Flora, será que eu podia dá uma
saidinha de meia hora? Sabe, minha tia
tá doente, e eu queria ir na casa dela...
TIA - Pode ir... Eu fico muito bem sozinha.
MULHER - Nada disso... Já dispensei os caseiros, que
também estão com uma "tia doente". Você
vai ficar fazendo companhia pra Reni.
Que programão! Mas em compensação eu
deixo você ver o Chacrinha na televisão.
No lugar do sambão, televisão... No lugar
do Amauri, a Reni. Verifique se as portas
e janelas estão bem fechadas. Você não
me saia daqui. Nada de rua, ouviu?
TIA - Nada de rua, ouviu?
EMPREGADA - Sim senhora... Mas que a minha tia tá
doente, tá. A senhora num acredita. Mas
ela tá muito doente, e se acontecê alguma
coisa cum ela a senhora é que é culpada.
(Sai).
MULHER - Está vendo o que você faz? Chantagem...
Todos nesta casa, fazem chantagem... Os
empregados... meus filhos... meu marido.
Todos.
Será
que
eu
nasci
em
lugar
errado? Eu só quero aquilo que eu acho
que é certo.
TIA - O que é certo pra você, pode não ser pro outro.
MULHER - Eu sei... Eu sei. Você está assim, só porque eu
vou sair com o Reinaldo, não é? Mas eu
tenho esse direito. Não estou escondendo
nada de ninguém. Eu sou o que sou.
Assumo aquilo que faço.
TIA - Eu te conheço muito bem, minha filha. Você é uma
criatura, que tem tudo pra ser feliz. Mas
não é. Sabe por quê? Essa sua teimosia.
Quando põe uma coisa na cabeça, você
radicaliza. Fica burra. É isso que você é:
uma burra.
MULHER - Você está a fim de estragar a minha noite,
não é? Mas não vai conseguir. Eu não
vou deixar. Vou sair, me divertir. Nada
neste mundo vai mudar o que eu quero.
Hoje será uma noite decisiva para mim.
Será que você não entende, que eu posso
amar outro homem e que outro homem
possa me amar, como eu sou?
TIA - Claro que pode. O amor pode tudo. É justamente
por isso que você deve pensar no Rafy.
MULHER - Não me fale nesse nome, tia. Me dá alergia.
Fico toda empolada.
TIA - Não sei porque essa frescura de alergia. Vocês
viveram quinze anos
amaram,
tiveram
muito bem. Se
seus
filhos,
se
ajudaram... E agora, que vocês têm tudo,
que poderiam gozar a vida e ser felizes...
Estão com alergia mútua. Vocês estão é
com alergia de cuca. Põe essa cabeça no
lugar.
MULHER (Hesita) - Eu já disse que sei o que quero. E
não é mais o Rafy.
TIA - Você tem mesmo certeza que não quer mais o
Rafy? Vocês estão apenas separados.
MULHER - Há nove meses e dezoito dias. Quanto tempo
perdido. Eu já devia ter feito isso há
muito mais tempo. (Indo pro telefone) A
Bia já deveria ter chegado.
TIA - Bia e Geraldo, Flora e Dr. Reinaldo. Os dois
casaizinhos, na Paulicéia Desvairada.
Somando todos dá quase duzentos anos.
Vai fundir o motor do carro.
MULHER (Desligando o telefone) - Não responde...
Devem estar chegando.
TIA - É... devem estar chegando. Você está nervosa, não
é minha filha? Sabe o que é isso? É a
dúvida. Vou ou não vou? Dou ou não
dou? Você sabe como o Rafy é ciumento.
MULHER - Chega de falar no Rafy, tia. Chega. Você
sabe tão bem quanto eu, que o nosso
relacionamento atingiu o limite máximo
que eu podia suportar. Seus números, seus
remédios, suas manias. Aquele ciúme
doentio,
aquele
servilismo
da
mulher
árabe. Eu não agüento mais. Me sufoca.
TIA - É... amor com sufoco, não dá.
MULHER - Você sabe que nós estávamos nos sufocando.
Nos separamos por isso. Eu precisava de
um tempo... Precisava conhecer outras
pessoas.
valores...
Reinaldo.
Reciclar
E
foi
Ele
minha
tão
é
bom
tão
vida,
meus
conhecer
diferente...
o
Tão
simples... Tão humano.
TIA (Insinua) - Mas... vocês... Já?
MULHER - Ora, tia... pra mim isso não é o fundamental.
TIA - Só é... Tem que ser na vertical e na horizontal.
Senão, não dá certo.
MULHER - Não... Não acho. Pra mim, o horizontal é
apenas uma extensão da vertical.
TIA - E já houve essa extensão?
MULHER - Não... Ainda não.
TIA - Está marcado pra hoje, não está?
MULHER - Não... Nós vamos sair para jantar, depois,
possivelmente, uma boate e nada mais.
TIA - Nada mais?
MULHER - Nada mais.
TIA - E você não acha que esse Dr. Reinaldo tá meio
velho, não? Tem mais de sessenta, não
tem? Tá mais pra lá do que pra cá. Se
você está querendo mesmo fazer novas
experiências, escolhe gente mais jovem,
minha querida. Troque o seu carro usado
por uma máquina nova.
MULHER - Você é impossível, Tia Reni. Mas eu te amo
muito, sabe? (Toque de campainha da
rua) São eles.
TIA - É... pode ser.
EMPREGADA (Entrando) - Eu atendo... Eu atendo. É
pra mim... Deve ser o Amauri.
MULHER - Eu estou bem? Deseje-me sorte, Tia Reni.
TIA - Boa sorte, doçura...
MARIDO (Entrando possesso) - Onde a senhora pensa
que vai?
MULHER - Rafy?
TIA - Meu querido... Que surpresa!
MARIDO - Onde a senhora pensa que vai?
MULHER - Onde eu quiser. Com licença?
MARIDO - Licença, coisa nenhuma.
TIA - Meu sobrinho nem me deu um beijo. Vem aqui.
Vem.
MARIDO - Essa mulher tá ficando louca. Só porque está
separada, pensa que tem dezoito anos?
Que pode fazer tudo o que dá na cabeça?
Num pode, está me ouvindo? Num pode.
Eu num deixa. Ai... Meu cabeça. Está
estourando de dor de cabeça.
TIA - Menina. Não fica parada aí. Traga água pro Dr.
Rafy. Você e suas homeopatias... Vai
tomar tudo isso? Piorou, hein?
MARIDO - Ah... Se você soubesse o que tem sido a minha
vida. Eu está mal... muito mal. Doente.
Cansada. Está ouvindo, Flora? Eu me
matando
de
trabalho
e
você
aí,
se
divertindo. Você pensa que eu num sei?
Eu sabe tudo. Toda seu vida. Tudo. Eu
nem tem mais casa... Nem mulher... Nem
filhos... Onde está Rafynha? Onde está
Munira? Na Guarujá. E você? Onde você
pensa que vai? Pra rua... Passear cum
outra. Eu sabe tudo... Mas, no meu
cabeça, ninguém põe chifre. Ninguém.
Ninguém.
MULHER - Eu não estou disposta, a ouvir insultos. Com
licença?
MARIDO - No meu cabeça ninguém põe chifre, ouviu?
Senta... Eu mandou você sentá... Senta.
TIA - Venha cá, minha filha... Sente. Se ele mandou
sentar, nós sentamos. (Pequena pausa).
EMPREGADA - Prontinho, aqui a sua água, Dr. Rafy.
MARIDO - Gelada? Água gelada? Você sabe que eu num
toma água gelada. Num sabe mais?
EMPREGADA - Desculpe... Eu esqueci... Vou buscar
outra.
MARIDO - Água tem que ser natural, que nem Deus
fez... Tudo na vida tem que ser natural.
Que nem eu. Eu é como eu é.
MULHER - Não... Você não é como era... Você piorou
muito. Cada dia que passa, você fica pior.
MARIDO - Olha quem fala? Como se ela fosse o mulher
perfeita. Ela sabe tudo. Eu nada. Eu só
sabe ganhar dinheiro. Eu ganha... Ela
gasta. Eu sabe ganhar e ela pensa que
sabe gastar. Mas num sabe. Num sabe...
está me ouvindo? Eu dá casa, roupa,
comida, dinheiro. Tudo eu dá pra você. E
o que é que eu recebe em troca? Água
gelada, pontapé no bunda e chifre no
cabeça.
EMPREGADA - Prontinho... Dr. Rafy... Água natural,
do jeito que o senhor gosta. (Campainha
da porta) É pra mim. (Tropeça e derruba
água em cima de Rafy).
MARIDO - Menina estabanada... Num vê onde pisa?
EMPREGADA
-
Desculpa...
Doutor,
desculpa...
Eu
enxugo.
TIA - Venha trocar essa camisa, Rafy.
MARIDO - Vai atender essa porta, menina... Eu vai
trocar de camisa... água, ni corpo quente,
dá resfriado...
TIA - Venha comigo, Rafy... Ainda tem roupa sua aqui...
E, depois, você não pode se resfriar.
MULHER (Para a Empregada que ficou recolhendo o
copo) - Avise a Bia, que não posso mais
sair. (Campainha da porta).
EMPREGADA - Sim, senhora... Mas deve ser o Amauri.
MULHER - Vai logo, menina... Mas como é que o Rafy
foi me aparecer a esta hora. (Falando pra
fora) Então? Quem é?
EMPREGADA (Fora) - É pra mim... É o Amauri... Eu já
tô entrando, Dona Flora.
MULHER - Não é possível, já deveriam estar aqui. (Indo
pro telefone) Iam pra casa da Bia, depois
viriam pra cá. (Falando baixinho) Alô...
Alô... Bia? Saiu? Há quanto tempo? (Rafy
voltando
com
Reni.
Flora
desliga
o
telefone rapidamente, mas Rafy vê).
MARIDO - Telefonando pra quem? Pra aquela outra
perdida? É essa Bia que está botando
coisa no seu cabeça. Troca de homem que
nem eu troca de camisa. Traz água pra
eu tomá homopatia.
TIA - Eu vou buscar água pra você, Rafy.
MULHER - Tia Reni...
TIA - Não me peça para ficar, minha querida... (Sai
para a copa. Pausa).
MARIDO - Então, meu mulherzinha, estava pensando
em sair? Beleza. Toda bonita, perfumada.
Quem está esperando você?
MULHER
-
Ninguém...
E não
adianta
ficar
com
ameaças... Eu não tenho mais medo de
você.
MARIDO - Flora, num tem mais medo? Flora num tem
mais é vergonha... Vergonha... Sabe o que
é isso? Ah? Relatório... Relatório. (Mostra
envelope) Tudo sobre você... Está tudo aí...
Eu botou detetive atrás de você... Uma
semana. Num precisou mais que uma
semana. Eu sabe tudo. Meu mulher está
visitando
muito
essa
médica,
Dr.
Reinaldo. Está esperando por ele, não é?
Como pode você fazer isso comigo? Cala a
boca. Num responde... Eu num merece
isso que você está fazendo. Eu sempre deu
tudo pra você... Tudo. Só num dá uma
coisa. Liberdade. Você casou com eu...
Tem
dois
filhos,
com
eu...
Tem
que
agüentar eu, até o fim. Eu agüenta você,
você agüenta eu... Separada ou junto...
Tem que agüentar. Nem que eu precisa
amarrar você no pé da mesa. Você hoje
num sai de casa.
MULHER - Não me faça perder o respeito que ainda
temos um pelo outro.
MARIDO - Respeito?... Teu respeito está aqui... (Tira um
revólver 22) Mete uma bala ni você... e
outra nesse Dr. Reinaldo.
MULHER (Apavorada) - Pelo amor de Deus, Rafy... Eu
juro que não houve nada entre nós...
Somos apenas bons amigos.
MARIDO - Eu num quero que meu mulher tem amigo.
Eu está esperando ele... Quando chegar
aqui, vai ver com quem vai sair.
MULHER
-
Você
está
revólver...
louco,
Não
Rafy...
faça
Guarde
uma
esse
besteira...
(Chamando) Tia Reni...
MARIDO - Besteira ia fazer você... Eu mostra pra você,
pra ele, pra todo o mundo quem é o
homem dessa casa... Eu queria que ele
entrasse agora aqui... Dava um tiro na
cara dele.
TIA (Entrando) - Rafy... Rafy... Vira isso pra lá... Trouxe
um
calmante
pra
você...
homeopatia...
mas
trocar?
(Chamando)
Ah...
é
Não
ótimo...
é
Vamos
Oswaldina...
Traz, traz um copo de água natural pro
Dr. Rafy.
MARIDO (Ainda com revólver) - Olha pra ela, Reni...
Fica com essa cara de quem sabe tudo...
Com esse ar de superioridade... Como se
eu que tivesse fazendo coisa errada...
Cala a boca... E num fica me olhando
assim... que eu dá um tiro ni você.
EMPREGADA - Prontinho... Água pro Dr. Rafy... Ai
meu Deus.
TIA - Não é nada, não, menina... Vamos, Rafy... Tome
isso...
MARIDO - Não... Eu só toma homopatia. Está no meu
paletó... Vai buscar...
EMPREGADA - Sim, senhor... Qual delas que é?
MARIDO - É o vidro número... 3 o 7 e o 15... Não... Não...
deixa
eu
vai
buscar.
Você
é
muito
estabanada... Eu vai... E vocês ficam
sabendo de uma vez pra sempre... Quem é
o dono dessa casa... Quem é o homem
aqui... Eu... Eu é o único que pode falar
alto aqui. Num esquece. (Rafy sai para o
quarto, como machão).
MULHER - O que é que eu faço? Bia e Reinaldo, estão
chegando... Vai ser o maior escândalo.
TIA (Calma) - É... Rafy está indo além do que eu
imaginava.
MULHER - Vai lá tia, conversa com ele e tire aquele
revólver.
EMPREGADA - Num vai tirá não... Home da raça dele,
quando tem ciúme, é fogo. (Campainha da
porta).
MULHER - São eles... Oswaldina... Avisa que meu
marido está aqui... Que eu não posso sair.
EMPREGADA (Saindo) - Sim, senhora.
TIA (Intrigada) - Não podem ser eles...
MULHER - Só podem ser eles.
TIA - É que eu...
MULHER - Você o quê?
TIA - Nada... Nada... Então, o Rafy já sabe do seu caso
com o Dr. Reinaldo?
MULHER - Não é um caso. É uma amizade sincera.
Minha vontade é ir lá fora, embarcar
nesse carro e sumir.
TIA - Agora, minha querida, você tem que enfrentar...
Talvez seja até bom... Quem sabe esta
noite você define, de uma vez por todas a
sua vida com o Rafy.
MULHER - Por que a Oswaldina está demorando tanto?
(Indo até a saída para os quartos) Ainda
bem que o Rafy foi ao banheiro. Deus
está nesta casa. (Entram dois assaltantes,
trazendo a Empregada como escudo. Um
é preto, outro branco).
PRETO - É um assalto...
BRANCO - Assalto... Nada de gritaria.
PRETO - Vocês duas pra cá.
BRANCO - Vocês duas pra cá. (Tudo muito rápido.
Situação de pânico. Empregada lívida,
perdeu a voz. Olhos esbugalhados. Não
emite som nenhum. Só mais tarde irá
gritar).
PRETO - Vê se num tem mais ninguém na casa. Eu
güento as pontas aqui.
BRANCO - Deixa comigo. (Sai em direção dos quartos
onde está Rafy. As mulheres se olham,
esperando o pior).
TIA - Será que eu...
PRETO (Ríspido) - Fecha a matraca, coroa.
TIA - Mas é que...
PRETO - Cala a boca, porra. (Pausa. O Preto acua as
mulheres num canto da cena e examina o
ambiente com cautela).
BRANCO (Fora) - Ah... Ah... Tá aqui no quarto... No
quarto do casal, dentro do guarda-roupa.
PRETO - Que é que tu achô aí?
BRANCO - O barrigudinho... Tá escondido. No guardaroupa. (Entrando) Num disse que ia sê
sopa... Só tem as muié... E já descolei o
cofre...
Tá
escondidinho
no
guarda-
roupa...
PRETO
-
Então
vamo
trabaiá.
assaltantes
e
Começa
operação
a
(Descontração
apreensão
das
assalto)
dos
vítimas.
Se
oceis
colaborá direitinho, ninguém se machuca.
Voceis faz a parte de voceis, que nós faz
a nossa. Jogo rápido... Nóis só qué as jóia,
o dinheiro e mais umas coisinhas aí.
BRANCO - Num te falei que ia sê moleza... Lá no quarto
tem cofre e muito mais.
PRETO - Nóis já chegamo lá.
TIA (Controlando-se) - Posso falar? Vocês podem levar
tudo... Mas sejam rápidos...
MULHER - Sim... Rápidos... Daqui a pouco vai chegar
gente.
BRANCO - Num fica nervosa, gostosa. Nóis sabemo o
que temo que fazê.
PRETO - A chave do carro que tá aí fora... Onde qui tá?
EMPREGADA
(Só
agora
consegue
gritar)
-
Aiiii!
(Branco avança pra ela).
TIA - Não machuque a menina. (A Empregada continua
gritando. Branco dá-lhe um tapa. A
Empregada emudece) Remédio eficiente o
seu: rápido e rasteiro.
BRANCO - FEBEM, Dona... Uma dose de FEBEM por
dia, ninguém chia. Escreveu, num leu,
pau comeu.
PRETO - Tá falando muito, Branco. A chave do carro,
vovó? Onde tá?
BRANCO (Para Flora) - É... Onde tá a chave, gostosa?
MULHER - Do Galaxie? Eu não sei... Só tenho a chave do
meu...
TIA (Interferindo) - Estava comigo. Eu é que estava com
ele... Agora a chave... Onde eu deixei a
chave? Aqui em casa um usa o carro do
outro. Eu não entreguei pra você?
MULHER (Não entendendo) - Não, pra mim, não... Eu só
guio carro pequeno.
TIA - Ah... Sim... Claro... Onde eu deixei essa chave?
BRANCO - Na bolsa?
TIA - Não.
PRETO - No quarto?
TIA e MULHER (Assustadas) - Não.
PRETO - Tá no quarto.
BRANCO (Pegando Flora) - Vamo lá buscá.
PRETO - Pega umas malas... Tem muita coisa aqui, pra
gente levá.
BRANCO - Vem comigo, gostosa. Vamo pegá a chave, as
mala.
TIA - Não está no quarto.
BRANCO - Vem, gostosa... Que ainda temo que abri
aquele cofre... Depois, ocê abre as perna,
que nóis vamo dá um tempo na cama.
PRETO - Nada disso... Oh, meu. Primeiro o serviço. Nada
de fodeção.
TIA (Alto) - Ah... Lembrei.
PRETO - Da chave?
TIA - Da gasolina... O Galaxie está sem gasolina. Mas o
tanque do Volks está cheio.
MULHER - Tem razão... Leva o meu Volks, é melhor... O
tanque está cheio e a chave está aqui. É
só procurar... Onde está a chave?
TIA - Onde está?
MULHER - Onde está? Oswaldina, onde eu deixei a
chave do carro?
EMPREGADA (Arregala os olhos e grita) - Aiiii.
TIA - Lá vem FEBEM... Cala a boca... Levanta daí e fala.
EMPREGADA (Fio de voz) - Eu não posso levantar.
TIA - Onde está essa chave? Vamos procurar na bolsa.
MULHER - Não está... Eu mudei de bolsa. (Nervosa)
Mas eu acho. Deve estar aqui... Vamos
procurar,
tia.
Daqui
a
pouco
chega
gente... E seria muito desagradável nos
encontrarem nessa situação. Aliás, já
deveriam ter chegado. Vocês precisam
acreditar em mim. Daqui a pouco chega
gente.
PRETO - Para de falá, e vê se encontra logo essa chave.
BRANCO (Para Flora) - Vamo adiantá o serviço... Vamo
procurá no quarto. Vem comigo, gostosa.
(Mulher
corre,
Branco.
Tia
para
se
intervém.
esconder
Se
do
estabelece
pequena confusão, de modo que o grupo
fique no extremo oposto da entrada dos
quartos, por onde deverá surgir Rafy,
revólver em punho. Não se sabe, se ele
vai
enfrentar
os
ladrões
Empregada vê Rafy e grita).
EMPREGADA - Aiiii.
ou
fugir.
MARIDO (Surpreendido pelo grito, ergue os braços) Num atira... Num atira. Eu me entrega...
(Movimentação geral. Preto parte pra
cima de Rafy. Toma o revólver dele).
PRETO (Agarrando-o pelo paletó) - O que é que tu ia
fazê, oh... meu... Ia atirá em nóis ou fugi?
MARIDO - Não... Não... Ni uma coisa, ni outra.
BRANCO - Onde é que tu tava escondido?
MARIDO - No guarda-roupa. Pertinho do cofre.
BRANCO - Como é que eu num vi?
PRETO - Vistoria de merda, que ocê feiz, hein? Trabalhá,
com amador, dá nisso. (Empurra Rafy
para o grupo das mulheres).
MARIDO (Entre dentes, para a Empregada) - Que tinha
que gritá, você?
TIA - Você esteve ótimo, Rafy. Parecia John Wayne.
MARIDO (Para a Empregada) - Burra... Num tinha que
gritá. Burra. Burra.
TIA - Calma, Rafy... Calma.
BRANCO - Chega de bochicho. (Grita) Cala a boca.
PRETO - Vê se num grita ocê também!
BRANCO - Ocê qué que a gente faiz o serviço a seco. Dá
nisso. Eu num sei trabaiá sem baseado.
PRETO - Fecha o bico. (Pequena pausa. Momento de
tensão) Bão... Agora que chegô o dono da
casa, vai sê mais faci. Ocê é o dono da
casa, num é?
MARIDO - É... Eu é o dono da casa.
PRETO - O macho? O home da casa?
MARIDO - É... o macho. O homem da casa.
PRETO - Então o meu considerado aí vai colaborá cum a
gente, num vai? Onde tá a chave do
carro?
MARIDO - Está aqui... Eu estava ouvindo tudo... quando
pediram a chave: eu veio entregar ela.
PRETO - E o berro aqui, era o quê? Chavero?
MARIDO - Não... Não... Isso é assunto nosso. Entre eu e
ela.
PRETO - Ocêis já tão que nem nóis? Na base do berro?
BRANCO - Deixa a gostosa comigo. Eu senti, que ela
tava a perigo. Que nem nóis na FEBEM.
Na base da mão. Tá em jejum, num é
gostosa? Deixa comigo que eu vô apagá
essa brasa.
MARIDO (Negociando e defendendo a Mulher. Para
Preto) - Você é o chefe, num é? Eu faz
acordo. Pega tudo o que quiser... Ah? Tá
aqui, meu carteira, meu relógio, meu
anel... Tudo o que é meu, pode levá.
Pronto, tá tudo aí. Pode levar. Eu num
tem mais nada.
PRETO - Mais nada?
MARIDO - Nada... Hoje é sábado... Num adianta fazê
cheque. Banco está fechada. Vão tê que
levar o que está aqui... Leva tudo... Eu só
pédi uma coisa. (Outro tom) Num toca no
meu mulher.
PRETO - Nóis num tâmo atraiz de muié. Querêmo é
grana. Ocêis pensa que nóis, bandido,
quando vê muié, qué logo comê!... Num é
nada disso, não... Tem uns bunda mole,
que apronta mesmo. Tudo na base da
droga (intencional para Branco). E nóis
que leva a fama, né Branco? Vê se
manera, tá bem?... E ocê, turquinho...
num vem com grupo... Isso aí é só o
aperitivo... O filé, tá lá em cima, no cofre.
Vamo lá abrir ele, pegá as jóia e tudo o
que tivé valô. E num tente me engrupi,
que aí ocê se fode... Ocê e a sua muié, vão
comigo... Ocê Branco, fica aqui com a
coroa e com a mina e manera, viu? Vê se
num apronta. (Saem os três em direção
dos quartos).
TIA (Que esteve o tempo todo observando Branco) Vocês são bem distintos, não?
BRANCO - Tá me gozando, Dona?
TIA - Não estou, não... Eu quis dizer que vocês são
distintos, diferentes. Ele é mais velho...
Você é moço... Ele é preto... Você é
branco... Você é mais... fogoso... Deve ser
a juventude, não?
BRANCO - Eu peguei FEBEM... Ele, detenção.
TIA (Batendo papo) - É? E como se conheceram?
BRANCO - Malandro sempre saca malandro.
TIA - Vocês trabalham juntos há muito tempo? (Branco
não responde. Passa a mão na boca, louco
para dar uma fumadinha) Posso tomar
um licorzinho? Você quer?
BRANCO - Tô quereno é outra coisa.
TIA - Fique à vontade. Eu vou de licorzinho. (Preto,
Marido e Mulher entram, carregando
duas malas vazias).
PRETO - Vai enchendo essas mala. Põe essas duas pra
trabaiá. Nada de moleza. Agora, vamo
abri
aquele
cofre.
Vamo...
Vamo...
(Voltam para os quartos).
BRANCO - Bão... Vamo escolhê o que nóis vai levá...
Pega uma mala aí... Ocê pega a outra.
EMPREGADA - Eu não posso me levantá.
BRANCO - Dexa de onda e levanta daí.
EMPREGADA - Mas eu não posso.
BRANCO - Ocê vai vê, se pode ou num pode. (Avança em
direção dela, que rapidamente se levanta
e corre de maneira cômica).
TIA - Posso propor uma coisa?
BRANCO - O que é?
TIA - Antes de encher as malas, o meu considerado, não
gostaria de queimar o seu fuminho?
Enquanto isso, ela vai à cozinha trocar a
calcinha,
e
eu
vou
tomar
o
meu
licorzinho.
BRANCO - Oh... Coroa... Essa é boa... Vai... Vai pra
cozinha e tira a calcinha.
TIA - Vai menina... Vai... (Empregada sai lentamente,
como se fosse fugir. Branco fica na porta
com visão para os dois lados, de olho na
Empregada. Tia toma o seu licor. Branco
acende o seu cigarro).
BRANCO - Não... Não... Num vai se escondê... Fica aí,
que eu quero te vê.
EMPREGADA (Fora) - Mas eu só tiro a calcinha, se eu
ficá sozinha.
BRANCO - Então, vai ficá molhadinha.
TIA - Eu vou aí... te dar uma mãozinha.
BRANCO - Fica aí... Coroa... que eu tô numa boa. Como é
que é? Vai tirá ou num vai? Agora tô
loco pra vê!
TIA - Pra quê?
BRANCO - Tô afim de comê.
EMPREGADA (Fora) - Ai... Ai... Ai... Ai.
TIA (Entrando no jogo, como se fora repentista) - Você
vai se enrascá.
BRANCO (Aceitando o desafio) - Quem sai na chuva, é
pra se molhá.
TIA - Você vai se encharcá.
BRANCO - Tanto se me dá. O que eu quero é gozá.
EMPREGADA (Fora) - Ai... Ai... Ai... Ai.
TIA - Ganhou... Um a zero pra você... Sabe que você é um
poeta, rapaz? Um repentista puro.
BRANCO - Manda outra.
TIA (Pensando ardilosamente) - Adivinhação... O que
é?... O que é? Tem perna pra corrê... Todo
mundo pode vê... É só se escafedê?
BRANCO (Sério) - Escafedê? Deixa eu vê. (Sorri) Preciso
de um fuminho. Pra pensá mais um
pouquinho.
TIA (Insinuando para que a Empregada fuja) - Vai
devagarinho... pezinho por pezinho... Vai
achar
o
caminho...
e
tudo
vai
dar
certinho.
EMPREGADA (Entrando) - O que é escafedê?
TIA (Nervosa) - É correr... Escapar... Se mandar...
Entendeu?
BRANCO - Qual é? Num vem cum essas palavra difíci,
não. Qué jogá, vamo jogá limpo.
TIA - Realmente, escafeder é difícil... Muito difícil.
BRANCO - Tem que sê coisa fáci... assim na base do: o
pavão, tem o coringão, no coração.
TIA (Sorri) - Claro... É por isso que vive de ilusão.
BRANCO - Nóis é o cão: se num ganha no pé, nóis ganha
na mão.
TIA - É só armar confusão que, pro povão, tá tudo bão.
BRANCO - Deixa de sê fulera... Senão, vai marcá
bobera.
TIA - Eu não sou rameira... mas te passo uma rasteira.
BRANCO - A bala do meu revólver não tem açúcar.
TIA - Quem chupar... Vai se engasgar.
BRANCO - O cano da minha espingarda não tem
torneira.
TIA - Então vê se não faz besteira.
BRANCO - Oh... Coroa... Ocê é das minhas... Dá um tapa
aí.
TIA (Dando um tapa nas costas dele) - Dou...
BRANCO - Não... Não é aí... é aqui. Dá um tapinha, ocê
vai vê qui barato.
TIA - Eu sempre tive vontade de experimentar isso. Não
nestas circunstâncias. Em todo o caso,
vamos lá.
BRANCO - Puxa mais forte... Assim... Olha...
TIA - Pode deixar que eu chego lá.
BRANCO - Você também, mina. Você também tem que
entrá. (Encosta o revólver nela) Vai
fumá... e sem gritá. (Empregada fuma e
ri. Começa a ser criado um clima de festa
de embalo) E a calcinha? Já tirô a
calcinha?
EMPREGADA - Ainda não...
BRANCO - Mas vai tirá... Dá mais uma fumadinha... e
depois tira a calcinha. Vamo vê... Um...
dois... três... Tirou.
EMPREGADA - Até que tá legal...
BRANCO - Ocê ainda num viu nada, mina... Tia... Põe
uma música aí, que eu vou dançá com a
Maria sem calça.
EMPREGADA - Sem calça e descalça...
BRANCO - Vamo botá pra quebrá.
EMPREGADA - Uma música da pesada... (A Empregada
coloca
música
no
toca-fitas.
Os
dois
dançam. A Tia está lúcida, sem perder
sua dignidade, até interessada na nova
experiência.
Serve-se
de
mais
licor.
Branco assumindo sua liderança. Preto,
vindo
dos
quartos
acompanhado
do
Marido e da Mulher, traz uma caixa de
jóias. O Marido, outra caixa daquelas de
cofre,
onde
são
guardados
papéis,
dinheiro ou documentos. A Mulher traz
uma estola de pele).
PRETO (Desligando o som, louco de raiva) - Tu tá pirado,
diabo? Qué enchê a cavera de fumo,
enche. Mas não aqui. Panaca. Burro. Qué
estragá tudo? Qué estragá tudo? Qué?
BRANCO - Num grita comigo, que eu num sô moleque.
Num grita comigo.
EMPREGADA - Ah... Vamo dançá... Agora eu quero
dançá.
PRETO - Chega de bagunça... E ocê, Branco... fica na
tua... que eu fico na minha... Mas quem
dá as órde aqui sô eu. Tá entendido?
MULHER (Pegando copo com água) - O que é que ele fez
com você, Oswaldina? Tome um pouco de
água. Tome.
EMPREGADA - Eu num quero água... Agora eu tô
quereno é ele... (Referindo-se ao Branco)
A água é do seu marido... Eu num vô com
a cara dele... Eu trouxe água e o senhor
num tomou... Então vai tomar agora.
(Joga o copo de água no rosto dele).
MARIDO - Oh... Sua... (Preto dá um toco no pescoço de
Oswaldina, que cai no sofá).
PRETO - Todo mundo quieto, porra.
TIA - Na FEBEM é tapa. Na detenção, pescoção.
PRETO - Se alguém apronta mais alguma, eu prendo no
banheiro.
MULHER - Será que ela está bem?
PRETO - Só desmaiada, daqui a cinco minuto acorda e
nem sabe o que aconteceu.
TIA - Então... Vamos trabalhar. O que nós vamos levar?
Quadros? Pratarias?
MULHER - Tia... O que a senhora está fazendo?
TIA - Deixa de ser boba, menina. Não está vendo que
agora estou enturmada?
MARIDO - Tia Reni, eu acho que...
TIA - Rafy... Coitadinho, está todo molhadinho. Você não
pode se molhar... Vou buscar uma toalha
pra você. (Sai em direção dos quartos.
Branco vai atrás).
PRETO - Essa tua tia é meio matusquela, hein?
MARIDO - Ela está doente... Num diz coisa com coisa...
Está ficando esclerosada.
PRETO - Abre essa caixa aí.
MARIDO - Eu já disse que num tem nada... É só papel...
PRETO - Abre.
MARIDO (Abre a caixa, tomando cuidado de esconder o
fundo dela)
-
Olha aí. É só papel...
Documentos. Coisa que só tem valor pra
mim.
PRETO (Desconfiado) - Ah... Abre a outra... A de jóia.
MARIDO - Já vai... Já vai... Pronto. Está vendo? Eu
ajuda o senhor a escolher... Eu sabe o que
é bom... Eu mostra... Beleza de colar...
Compro no México... Vale uma fortuna...
Pode levar. Esse coisa rara... Esse outro
aqui, porcaria. Num vale nada. Este obra
de
arte.
Esse
aqui,
bijuteria...
Este
também... Tudo misturado. Eu separa o
que
tem
de
bom.
(Tudo
é
feito
rapidamente, como se fora um vendedor,
e procura esconder as jóias de mais valor.
Há
uma
considerável
quantidade
de
jóias. Algumas, ele joga em baixo do sofá.
Outras esconde no bolso, etc.) Este beleza.
Este droga. Este droga... este também.
PRETO - Para. Para de falá. Tu tá quereno levá uma
bolacha, num tá? Bota tudo aí dentro
outra veiz... Esse também... O outro que
ocê
escondeu...
Tudo
aí
dentro.
Tá
quereno me fazê de besta? Num apronta,
que eu faço, ocê dançá, um tango com
uma perna só. Tu tá pensando que eu sô o
quê?
TIA
(Entrando
acompanhada
embalada,
na
base
de
da
Branco.
Mais
esclerosada)
-
Toalha pra você, Rafy. Bem... Agora
vamos escolher o que vamos levar. Deixa
comigo. Eu sei as coisas de valor, nesta
casa. Isso fica... Ah, esse vaso é um
horror.
PRETO (Se referindo a Flora) - Num fica aí parada, vai
ajudá ela.
TIA - O que você acha disto aqui? Eu detesto... Você
gosta? Se gostar, pode levar... Tudo é de
vocês... Tudo. Que sensação gostosa, a
gente poder escolher o que quiser. É
ótimo. Estou adorando. Levamos bebidas
também?
PRETO - Alguma coisa é bom.
TIA - Mas podemos consumir um pouco agora, não
podemos... Esse pra você... Esse pra mim...
Ah... Estou tão contente com a visita de
vocês. Nem imaginam como estou feliz.
Sentem aqui, vamos conversar. Quero
saber a vida de vocês, Tim-Tim por TimTim.
BRANCO - Essa tia é um barato. Senta aí.
PRETO - Num tô aqui pra batê papo. Ocêis dois aí, acaba
de enchê essas mala. (Marido e Mulher
acabando de encher as malas. A caixa de
jóias e a de documentos ficam de posse do
Preto. Tudo simultâneo ao diálogo da Tia
e Branco).
TIA - E você, meu querido? Me conta a sua vida. Eu
quero saber tudo. Como vai sua carreira?
BRANCO - Num posso me queixá.
TIA - Está contente com o seu trabalho?
BRANCO - No tempo da FEBEM era dureza... agora tô
numa boa... A cana ainda num me
enquadrô.
TIA - E a família? Como vai a sua família?
BRANCO - Família?
TIA - É... Seu pai? Sua mãe?
BRANCO - Meu pai eu nunca vi.
TIA - Por quê?
BRANCO - Minha mãe era puta.
TIA - Puta?
BRANCO - Eu sou filho de puta.
TIA - Ah... Sei... Sei... O que foi feito dela?
BRANCO - Morreu, quando eu tinha deiz ano. Mas eu
ainda me lembro dela... Era bonita...
Faturava uma nota. Até que a gente
vivia bem. Mas, aí, um outro filho da
puta que explorava ela começô a me
enchê o saco. Era cacete, todo o dia.
TIA - E a sua mãe?
BRANCO - Sabe como é. Mãe é mãe... e puta é puta. É
uma dureza...
TIA - Deve ser... Mas aí, o que aconteceu...
BRANCO - O cara continuava explorando ela e me
baixando o cacete... Minha mãe nem
sabia, porque mãe-puta num tem tempo
de vê as sacanage que os outro faz pra
nóis, que é filho da puta. Até que um
dia... peguei ele de jeito e dei umas furada
nele. Foi um salseiro... Baixou a cana... e
num deu outra. FEBEM. Foi lá que eu
aprendi o que é a vida.
PRETO - Cala esse bico... Tá falando demais.
TIA - Ih... Esse teu sócio é tão sério.
BRANCO - Num é meu sócio, não... Qué dizê... Esse é o
primeiro serviço que fazemo junto.
PRETO - Fecha a matraca... Senão vai levá porrada, seu
burro.
TIA - Eu fico fascinada com essas estórias. Aí você foi
pra FEBEM? Pode falar, que eu te dou
cobertura... Somos dois, contra um.
BRANCO (Contra-gosto) - É.
TIA - E sua mãe morreu, enquanto você estava lá?
BRANCO - Foi o que me disseram, Dona.
EMPREGADA (Acordando no sofá, sem saber o que
houve) - Ai... Meu pescoço... ai... ai... Onde
estou? O que eu tenho que fazê? O que
aconteceu? (Olhando) Ah... Ah... Ah...
Assalto...
Assalto...
Estamos
sendo
assaltados... (Ameaça gritar).
BRANCO (Avançando pra ela) - Aprendeu, hein?
PRETO - Vamo dá no pé... Pega a Tereza e amarra eles.
BRANCO - Ela também? (Referindo-se a Reni).
PRETO - Claro... Eles tem de ficá amarrado, mordaçado,
e nóis se manda no carro dele.
MARIDO - Eu pode pedir um favor? Deixa meu caixa
de documentos... Ah? Tudo o que tem aí
só tem valor pra eu... Deixa meu caixa de
documentos? Ah?
PRETO - Eu devia levá, procê deixá de sê muquirana.
Mas procê num dizê que nóis num é
legal... Toma... Fica cum ela. (No que
atira a caixa, ela se abre e, do fundo,
caem
diversas
notas
verdes;
dólares,
dinheiro estrangeiro, letras de câmbio,
enfim, papéis de valores, a melhor parte
do assalto) Turquinho, filho da puta...
MARIDO (Rápido) - O que é isso? O que é isso, Flora?
Onde você arranjou esse dinheiro? Você
tinha tudo isso? Eu num sabia? Eu num
sabia.
PRETO - Tu é muito vivo... Tá quereno salvá a pele...
Mas pra cima de mim num cola.
MARIDO - Eu juro... Eu juro que num sabia que tinha
todo esse dinheiro aí dentro. Fala pra
eles, Flora. Fala...
MULHER (Que não entendeu o jogo) - Eu... Eu...
PRETO - Teu marido tá quereno te entrutá.
MARIDO (Se esforçando para que ela entenda) - Fala
pra eles... Que foi outro que te deu esse
dinheiro... Eu nem sabia... Eu é marido
traído. Eu não sabia.
PRETO - Tu é mesmo filho da puta, hein, turquinho?
BRANCO (Sádico) - Vamo fazê uma roda de fogo cum
ele?
PRETO - É... Ele tá mereceno uma roda de fogo.
MARIDO - Que vai fazer cum eu? Num faz nada cum
eu... Eu já deu tudo o que tinha... Tudo...
As jóias eu compro pra ela... dinheiro...
anel... E leva isso também... Pode levar...
Num é meu... é dela... (Representando o
marido traído, quase chora) Leva tudo...
Eu foi enganado. Eu sabia... sabia que
tinha outro na seu vida... Outro que te
dava dinheiro... Outro que ocupava meu
lugar... Sabe o que você é? Adúltera... Isso
que você é.
TIA (Que percebe tudo) - Você está exagerando, Rafy.
EMPREGADA
-
Num
tá
não,
Dona
Reni...
Tá
mostrando que é.
MULHER - Isso mesmo... Está mostrando quem é... Chega
de mentiras... Eu não quero mais saber de
você... Do seu dinheiro... de nada... Vocês,
me ajudaram a tomar a decisão... Eu não
quero mais saber de você, Rafy.
MARIDO - Num liga, pra ela... Ela está se aproveitando
da situação. Há um ano que a gente está
separado...
BRANCO - Eu num disse que a gostosa tava a perigo?
MULHER - Sempre estive. Meu casamento foi um erro...
Um erro de quinze anos.
MARIDO - Num diz bestera, mulher.
MULHER - Quer saber de uma coisa? Pega seu dinheiro
e enfia... enfia...
PRETO - No cu.
MULHER - Pega a tua vida e enfia...
PRETO - No cu.
MULHER - Enfia tudo dentro de você. Porque você
sozinho se basta... Eu não quero mais
saber de você.
PRETO - Tô doido pra botá ele na roda de fogo.
MARIDO - Espera... Espera... Todo mundo contra eu?
Ninguém vê meu lado? O que eu lutou? O
que eu fez? E tudo sozinho, com meu suor,
com meu cabeça... E tudo pra quem?...
Pra quem? Pra você... Pra nossos filhos.
PRETO - E procê... né, turquinho?... Mais procê.
EMPREGADA - Mais pra ele mesmo. Trabalho aqui há
dois ano. Eu posso dizê da diferença. Toca
ele na roda de fogo.
BRANCO - Ocê sabe o que é roda de fogo?
EMPREGADA - Deve ser gozado, né?
PRETO - É gozado... mas é fogo. Aí pro meio, turquinho...
Agora ocê vai dançá.
BRANCO - Vamo lá, turquinho... Vamo vê se ocê é bom
de pé.
TIA - Vocês não vão machucá-lo, não é?
MULHER - Não façam nada, por favor.
MARIDO - Está pensando que eu tem medo. Eu nem tem
medo... Mas pra fazer roda de fogo com
eu, que vai ganhar com isso? Vamos
conversar, é conversando que a gente se
entende... Vamo fazê roda de papo, ah?
Melhor... Faz roda de jogo... Isso, roda de
jogo... O jogo que quiser, eu topo... Eu
paga dois por um.
PRETO - Num tem mais nada pra pagá... Ou tem? Se ocê
tivé escondendo mais alguma coisa de
nóis, vai sê pió.
MARIDO - Eu faz nota promissória... E no cartera,
ainda tem cartão SOS. Vai lá e saca.
PRETO - Aquele que enfia e sai dinheiro? É uma boa...
Então, ocê vai com nóis. Nóis só vai te
sortá, depois que gastá o cartão. Jogá pra
quê?
MARIDO - Eu vai jogá meu roda... Se eu ganhar, num
entra no roda de fogo... Combinado?
PRETO - Tá legal... Branco, prepara a mesa.
MARIDO - Que vai ser? Pôquer? Pif-paf? Escopa? 21?
Sete e meio?
PRETO - Queda de braço.
MARIDO - O quê?
PRETO - Isso mesmo... Queda de braço.
MARIDO - Mas isso num é jogo.
PRETO - Quem disse que num é? Vai sê queda de braço.
Senta aí... Fui campeão na Detenção.
Vamo vê se ocê é bom de braço, que nem
é de prosa. (Todos cercam os dois. Para
surpresa geral, Rafy é bom de braço).
BRANCO - Num é que o turquinho é bom de braço?
PRETO - Tá suano, turquinho?... Nada de truque... Jogo
limpo.
TIA - Não deixa ele virar o teu pulso, Rafy... Força...
MULHER - Segura, Rafy... Segura...
PRETO (Falando lento, entre dentes) - Depois que ocê
perdê, vai subi nessa mesa... Vai tirá a
roupa... peça por peça... Vai ficá só de
cueca. Pra cada peça, nóis tira uma bala
do revólver... Vai ficá só uma bala... Aí
ocê vai dançá... Pezinho pra cá... pezinho
pra lá... Vai cantá e dançá. Agora, força,
Força. (Preto derruba Rafy. Expectativa
geral).
BRANCO - Põe ele na roda...
MULHER - Não. Não façam isso...
PRETO - Vamo atirá duas veiz... Uma pra Deus... outra
pro diabo... Se ocê escapá... Tá perdoado.
MULHER - Pelo amor de Deus... Não façam isso. Vocês
já têm tudo o que querem. Vão embora.
PRETO - O que se perde, na queda de braço, tem que sê
pago. Ele perdeu, tem que pagá.
MULHER - Isso não faz sentido. Matar uma pessoa só
porque perdeu uma queda de braço?
PRETO - Quem falô em matá?
BRANCO - Nóis atira é no pé.
MULHER - Isso é uma crueldade... Eu é que sou
culpada... Eu não devia ter dito o que
disse. Não façam isso com ele.
TIA - Eu estou vendo que é um código de honra... Mas a
gente podia dar um jeitinho, não podia?
PRETO - Não... A senhora disse tudo. É uma questão de
honra...
começa
tirando...
Sobe...
a
subir
Vamo...
na
Primeira
Sobe.
mesa)
bala...
O
E
(Rafy
vamo
paletó...
Segunda... a camisa... Tercera... a calça...
Quarta... o sapato... Quinta... As meia... Só
ficô a cueca... Tá aqui... Agora roda...
Roda...
BRANCO - Roda... Roda... e canta... Canta, Turquinho...
(Rafy começa a cantar uma música
ritmada... Vai cantando... O tambor do
revólver girando).
PRETO - Agora... ocê vai dançá... Dança... Turquinho...
Dança...
BRANCO - Roda... Roda... (Preto fecha o tambor do
revólver. Aponta para os pés de Rafy,
que pula de pé em pé como se estivesse
desviando de um tiro. Música cantada
por ele funde com música de sonoplastia,
aumentando
cada
vez
mais
e
Rafy
dançando alucinadamente, à medida que
o pano vai se fechando para o final do
Primeiro Ato).
FIM DO PRIMEIRO ATO
SEGUNDO ATO
Ao abrir o pano, mesmo clima de onde terminou. Música
de sonoplastia funde com som de campainha da rua...
Vai baixando o som... Campainha cada vez mais forte.
Para tudo. Batidas na porta de entrada.
BIA (Voz fora, distante) - Tia Reni... É a Bia... Está me
ouvindo? (Pausa, tensão) Tia Reni... Abre
a porta... O que está acontecendo aí?
Abre
a
porta...
(Rapidamente
encosta o
Preto
cano do
Sou
segura
eu...
a
Bia.
Tia
e
revólver em sua
cabeça).
PRETO (Baixo) - Despache ela... Diz que tá tudo bem e
despache ela.
TIA - Oh... Bia... Você chegou em má hora... Já estou de
camisola.
BIA - Está tudo bem?
TIA - Está... Está...
BIA - A Oswaldina está aí com você?
TIA - Está... Está.
BIA - Você não precisa de nada?
TIA - Nada... Nada...
BIA - Então eu já vou indo... Diz pra Flora que o
Reinaldo
ficou
muito
triste
com
o
desencontro. E que estima as melhoras do
Rafynho.
TIA - Digo... Digo...
BIA - Já que você não quer mesmo abrir essa porta, eu
vou embora... Durma bem... Tchau. Bye.
Bye.
TIA - Tchau... Tchau. Bye, bye. (Movimento coletivo).
PRETO - Todo mundo quieto.
TIA - Eu fiz a minha parte direitinho, não fiz?
PRETO - Pega tudo aí, que nóis vai se mandá.
BRANCO - E num vamo acabá o que nóis começô?
PRETO - Pintô gente no pedaço. Vamo se mandá.
MULHER - Graça a Deus.
PRETO - Mas vamo levá ele de refém...
MARIDO - Pra que levá eu?
BRANCO - Procê continuá a dançá.
PRETO - Amarra as duas na cadeira... Bunda cum
bunda...
TIA (Dando uma de esclerosada) - Deixa que eu
amarro... Eu estou integrada na turma e
tenho que fazer alguma coisa, não tenho?
PRETO (Ríspido) - Amarra as duas. A coroa cum ela.
TIA - Eu me recuso...
BRANCO - Vem tia... Eu num queria te amarrá... Mas
num tem outro jeito.
PRETO - Ocê vai fechando as mala. (Referindo-se à
Empregada. Rafy começa a vestir as
calças) Tu vai é assim...
MARIDO - Assim como?
PRETO - De cuecas. Nóis ainda temo que acertá nossas
conta.
MARIDO - Sem camisa eu num vai. Eu num pode andar
sem camisa...
PRETO - Num reclama... Num me enche o saco... que tu
vai é em pelo...
MARIDO - Pelada? Nunca... Eu num pode... Num pode
tomá vento... Fica resfriada... Mamãe
criou eu assim... Com camisa de baixo...
Num pode tomá vento.
PRETO - Se ocê num pará de falá... Nóis te leva pro
Embu.
BRANCO - Te mete chumbo no...
MARIDO - Eu vai... Eu vai...
TIA - Não vai... Eu é que vou em seu lugar.
MARIDO - Tá ficando louca, Reni? Eu é que vai.
TIA (Meio esclerosada) - Eu já disse que vou... Não
discuta comigo... Eu sou a matriarca da
família... Sou eu quem decide... Quero
viver a aventura desta noite... Envolta
nas sombras... Vivendo os perigos, numa
corrida louca... Perseguida pelos desígnios
da vida ou da morte... Eu nasci assim...
Vou morrer assim.
MARIDO - Eu é que vai... Lugar de mulher é no casa...
Isso é assunto de homem. Num discute
mais...
Acabou.
Com
camisa
ou
sem
camisa. Eu é que vai.
MULHER - Deixa ao menos ele vestir uma camisa?
PRETO - Você é que vai, turquinho. Eu quero distância
dessa louca... Veste logo essa camisa e
vem comigo. Vamo dá uma geral na casa.
Ainda tem umas coisinha aí pra levá...
Ocê também vem, pra ajudá carregá...
Amarra as duas... Branco. (Saem para os
quartos, Preto, Rafy e a Empregada.
Pausa).
BRANCO - Coroa... Ocê é um barato... Tava quereno... í
cum a gente?... É uma barra.
TIA (Virando o jogo para o Branco. Não se sabe se ela
diz a verdade ou não) - Nasci, para viver
perigosamente.
BRANCO - Por mim, eu te levava.
TIA - Como é o seu nome?
BRANCO (Hesitante) - José.
TIA - José? José... Bonito nome... você é muito parecido
com uma pessoa que eu amei... Muito. Os
mesmos olhos... O mesmo cabelo. A mesma
boca.
BRANCO - Ele era legal?
TIA - Muito... Muito legal. Era jovem e forte, assim como
você. Achava que a vida devia ser vivida
intensamente, a cada dia, a cada hora, a
cada minuto.
BRANCO - Que nem eu.
TIA - Detestava dormir... Era tanta energia... Tanta
vontade de viver que só dormia, quando
não agüentava mais...
BRANCO - Que nem eu...
TIA - Tempos maravilhosos, em que estivemos juntos...
Uma só cabeça... Um só corpo... Um só
vida.
MULHER (Enternecida, emocionada) - Eu nunca soube
desse seu amor...
TIA - Ele foi meu... Só meu. Meu grande amor.
BRANCO - Num existe amor.
TIA - Tudo é amor. As pessoas, os objetos, a alegria, a
dor... Tudo é amor. (Olha fixo para
Branco.
com
Branco,
muito
fascinado,
amor)
Me
dá
olhando-a
um
beijo.
(Branco, lentamente, se aproxima e a
beija como filho, depois como homem,
como gente - beijo na boca) Isso é amor...
(Pausa. Clima bonito. Branco se aninha
no colo de Reni. Telefone toca. Branco
pula. Não sabe o que fazer. Telefone
continua tocando. Preto volta com Rafy e
a Empregada. Ela vem carregada de
roupas, chapéu na cabeça).
PRETO - Dexa tocá...
TIA - Deve ser a Bia... (Preto deixa tocar).
PRETO - Dexa... tocá...
TIA - Eu estou dizendo que deve ser a Bia... Será que ela
desconfiou
de
alguma
coisa?...
Posso
atender?
PRETO - Atende... Faz voz de sono... E diz que tá tudo
em orde.
TIA (Atendendo) - Alô... Alô... É Reni. Ah... É você?
PRETO - Quem é?
TIA - Munira... Filhinha deles... Tudo bem, Munira... O
que você quer?
MULHER - Munira... Aconteceu alguma coisa?
TIA - Não... Tudo bem... Quer falar com você...
MARIDO - Ela pode falar?
PRETO - Fala rápido.
MULHER (Nervosa) - Oh... Meu Deus... Eu não posso.
MARIDO - Fica calma... Eu pode falar ni lugar dela?
PRETO - Acaba cum isso logo de uma veiz...
MARIDO (No telefone) - Alô... filhinha... Papai... é papai,
veio
conversar
um
pouquinho
com
mamãe... Está tudo em paz... Está... Está...
Eu num está brigando cum mamãe... Por
que mamãe num fala? Ela vai falar. Vai
dizer alô pra você... (Para Preto) Só vai
dizer alô.
MULHER (Controlando-se) - Alô, filhinha... Está tudo
bem... Papai e mamãe estão conversando
calmamente, sem problemas. O que? Sim...
Sim... Tudo vai terminar bem... se Deus
quiser. Volta amanhã, sim... Outro pra
você. (Desliga. Começa a chorar).
MARIDO - Num chora... Tudo vai acabar bem, eu sei.
PRETO - Vamo pará cum isso... Branco, amarra as muié
e taca esparadrapo nas boca dela.
BRANCO (Olha para a tia, sem saber o que fazer) - Eu
vô amarrá as duas primeiro.
MARIDO - Olha... Num dá pra nóis fazer composição?
Eu promete, não chama a polícia... Eu
num chama. Nós fica aqui quietinho,
deixa vocês ir embora. Vocês leva tudo e
deixa nós.
PRETO - Tu tá pensando que eu sô otário? É só virá as
costa, qui ocê sai gritando qui nem louco.
MARIDO - Eu jura que num grita.
PRETO - Ocê vai cum nóis... Ainda tem o cartão pra tirá
dinheiro... Quero vê como isso funciona.
Cartão SOS. Vamo vê se ele vem socorrê
nóis.
MARIDO - Está bem... Está bem. Eu vai. Mas num faz
nada com Mulher, está bem? Eu está
vendo que o senhor é um ladrão direito.
Que faz tudo organizado. Eu gosta de
gente organizado.
PRETO - E nóis é mesmo. Tudo organizado. Tem muito
amador aí, que bagunça o coreto. Eu não.
Eu sou um profissional. (Branco terminou
de colar os esparadrapos. Fica olhando
para a Tia) Já acabou? Agora ela.
BRANCO - Ela não.
PRETO - Como não? Tem que amarrá e mordaçá.
BRANCO - Ela não... Ela não.
PRETO - Deixa de sê besta. Tô mandando, amarra, tem
que amarrá.
BRANCO - Ninguém amarra ela.
PRETO - Tô dando uma órde, tem que obedecê. Tá
querendo levá umas porrada, moleque?
BRANCO - Eu num sô moleque.
PRETO - Amarra.
BRANCO - Num amarro. (Telefone toca).
PRETO - Tô dizendo que nóis temo que se mandá e ocê
fica aí enchendo saco.
TIA - Atendo ou não atendo?
PRETO - Deixa tocá...
TIA - Agora deve ser a Bia.
PRETO - Deixa tocá.
MARIDO - Eu acha melhor atender...
PRETO - Deixa tocá...
TIA - Olha, eu atendo e despisto a Bia... Ela é muito
burra.
Se
eu
não
atender
ela
vai
desconfiar de alguma coisa. Ela é burra,
mas não é tapada... Fofoqueira como
ninguém... Depois...
PRETO - Atende logo de uma veiz... E despacha ela.
TIA - Alô... Alô... Bia... Não, minha querida... Não me
acordou, não... Você sabe que eu não
durmo cedo. Estava vendo televisão. Um
filme chatíssimo... sobre guerra...
PRETO - Despacha logo, saco.
TIA - O quê? Como se chama? É... Are been roubed
(Estamos Sendo Assaltados)... Entendeu?
Desculpe, mas tenho que desligar. Meu
dia hoje foi muito cansativo... Ah, o autor
é: Help... Help. Boa noite. (Desliga).
PRETO - Que é que tava falando em língua estrangêra?
TIA - O nome de um livro, que ela está querendo
comprar: Are been roubed.
PRETO - Se ocê tá aprontando alguma, vai levá porrada.
BRANCO - Se encostá a mão nela... Vai tê comigo.
PRETO - Ocê num viu que ela dedou nóis? Vai levá
porrada.
BRANCO - Num encosta nela.
PRETO - Qual é garotão? Ficou amarrado na coroa?
Resolveu dá uma de bãozinho?
BRANCO - Ela é minha amiga... Me tratou como gente.
PRETO - E eu vô te tratá do jeito que ocê tá acostumado:
na porrada.
BRANCO - Vem... Vem... Que eu te apago. (Preto avança.
Branco aponta o revólver pra ele, e
segura Rafy como escudo. Preto faz o
mesmo com Reni. Frases soltas).
TIA - Cuidado.
MARIDO - Me solta.
PRETO - Eu te pego.
BRANCO - Eu te apago, criolo.
MULHER - Não atirem... Pelo amor de Deus... Não
atirem...
EMPREGADA - Ai... Ai... Ai... Ai.
MARIDO - Espera... Espera... Eu dá a solução... Eu tem
solução... Quer ouvir? Ah? Eu amarra Tia
Reni... está bem? Eu amarra Tia Reni...
Você
amarra
eu...
Pronto.
Ninguém
briga. Ninguém sai ferido... Está bom?
Daqui a pouco chega gente. Toca telefone.
Ah?... Quando sócio começa a brigar o
melhor é separar. E num precisa levá eu
cum vocês... Só vai atrapalhar... Então?
Pode amarrar ela?
PRETO - Pode... Amarra logo de uma veiz... E vamo se
mandá.
TIA - Por favor, meu rapaz... Eu quero ficar amarrada...
Eu lhe peço. É melhor para todos nós.
BRANCO - Tá bom... Se a senhora pede. Tá bom.
MARIDO - E eu? Eu também fica amarrada, num fica?
Assim vocês têm tempo de fugir e tudo
acaba bem.
PRETO - Vamo amarrá eles e dá no pé. (Em duas
cadeiras separadas são amarrados Reni e
Rafy. Preto termina primeiro e coloca
esparadrapo na boca de Reni) Lá fora
nóis acerta nossa diferença... Vô encostá
o carro aqui perto... Vamo carregá o que
pudé.
(Branco
também
coloca
esparadrapo na boca de Rafy. Volta-se
para a Tia e tira o seu esparadrapo).
BRANCO - Eu quero dizê... que nunca vô esquecê de
você.
TIA - Cuide-se, meu rapaz. Quem sabe um dia, você
encontre o seu caminho.
BRANCO - Antes de i... eu tinha uma coisa pra pedi.
TIA (Suave e fazendo o jogo das palavras) - Se eu puder
atender... Com muito prazer.
BRANCO (Com um sorriso, quase garoto) - Eu tô cum
desejo... de te dá mais um beijo.
TIA - Com muita alegria... te dou um beijo de tia.
BRANCO - Adeus, tia... Até um dia. (Dá um beijo suave,
que vai ficando mais forte) Adeus, tia...
Até um dia. (Entra Preto. Ação rápida.
Carregam tudo o que podem. Desligam
telefone,
enfim
tomam
todas
as
providências nestes casos).
PRETO (Ameaçador) - Se um de ocêis dedá nóis... Um
dia... eu volto aqui. Volto aqui e acabo
cum um... Acabo cum um. (Percebe que a
Tia está sem esparadrapo. Coloca de novo
nela. Ao sair apaga a luz. Silêncio. Surge
Branco devagar e tira o esparadrapo da
boca
da
Tia.
Sorri
e
sai
correndo.
Gemidos coletivos).
TIA - Calma... Calma... Deus queira que a Bia tenha
entendido
o
meu
recado.
(Música.
Passagem de tempo. Quase um balé das
cadeiras e seus ocupantes. Grunhidos.
Gemidos. Deve-se sentir o passar das
horas. Luz voltando com o amanhecer.
Rafy está se libertando de suas amarras).
MARIDO (Exausto) - Consegui... Pronto... Eu consegui...
Eu livra você... Espera... Espera... (Vai
desamarrando Tia e Flora. Empregada
não. Estão exaustos. Tensos. Cada um, de
acordo
com
seu
temperamento,
vai
botando pra fora o que sente).
TIA - Graças a Deus. (Mulher levanta, vai falar, olha
tudo e desmaia).
MARIDO - Flora... Que tem você? (A Empregada fica
gemendo, amarrada, enquanto Rafy leva
Flora para o sofá)
Num fica assim
Flora... O pior já passou... Que tem ela,
Reni? Está desmaiada?
TIA - Não deve ser nada... Traga um pouco de água... (A
Empregada geme).
MARIDO - Já vai... Eu vai buscar água... Já solta você...
TIA
(Chamando)
-
Flora...
Flora...
Acorde...
(A
Empregada geme).
MARIDO (Voltando) - Pronto... Dá água pra ela... Eu já
solta você... Pronto... Pronto... Já vai ficar
livre...
EMPREGADA (Quando se vê livre, ataca Rafy) - Por
que o senhor fez isso comigo? Eu também
sou gente... Desgraçado... Eu te mato...
Desgraçado. Desgraçado... Eu sou gente...
Num sou animal.
TIA (Que estava tentando dar água para Flora, levanta
e joga água no rosto da Empregada) Toma... Um pouco de água fria, acalma.
(A Empregada com o susto, para de
gritar, olha para um, para outro e vai se
sentando, choramingando baixinho).
MARIDO - Que noite... Que noite... Como é que ela está?
Ainda desmaiada? Flora... Acorda... É
eu... Rafy.
TIA - Vou buscar um pouco de amônia... E uma boa dose
de
calmante
pra
cada
um.
(Sai
em
direção dos quartos).
MARIDO - Flora... Florinha... Num fica assim... Fala
cum eu... Fala. E você aí para de chorar.
(A
Empregada
chora
mais
alto)
Florinha... fala cum eu... Eu mandou
parar de chorar... (A Empregada chora
altíssimo) Quer chorar... Vai chorar lá na
cozinha... E vê se chora mais baixo. (A
Empregada sai, chorando cada vez mais
alto, em direção da cozinha) Ai... Deus...
Eu está tonta... e sem calça. Eu ainda está
sem calça... Onde está meu calça? Onde
está? (Encontra, começa a vestir) Roda de
fogo... Nunca mais vai esquecer isso...
Roda de fogo...
TIA - Dá pra ela cheirar...
MARIDO - Me dá aqui...
TIA - Oswaldina? Onde está a Oswaldina?
MARIDO - Foi chorar lá na cozinha...
TIA (Indo em direção da cozinha e saindo) - Oswaldina,
menina...
Me
calmantes...
ajude
Está
a
uma
procurar
bagunça
os
nos
quartos, não acho nada.
MARIDO - Cheira, Florinha... Cheira... Num acorda... Ai
Deus. Ela num acorda? Precisa chamar
um
médico...
Levaram
Num
carro...
tem
Ai,
telefone...
Deus.
(Flora
acordando).
MULHER - O que aconteceu?
MARIDO - Acordou... Graças a Deus, acordou.
MULHER (Em sobressalto) - Onde estão eles? Polícia...
Chama a Polícia! Eles não estão mais
aqui? Então? Tia Reni? Eles levaram a
Tia Reni?
MARIDO - Não. Não... Tia Reni está aqui... Fica calma...
Fica calma.
MULHER - Chama a Polícia, Rafy. Chama a Polícia... Eu
estou com medo. Não me deixe sozinha.
Eu não posso ficar sozinha.
MARIDO - Eu está aqui, Flora... Fica calma... Se
controla.
MULHER - Eu quero me controlar e não consigo... Está
vendo? Meu queixo não para de tremer...
Está vendo? (Riso descontrolado).
MARIDO
-
Eu
também
está
assim...
meio
descontrolada...
MULHER - Me abrace, Rafy... Me abrace forte.
MARIDO - Sim... Sim... Forte... Bem forte.
TIA (Entrando) - Água com açúcar... Só tem água com
açúcar... Eles levaram tudo... até meus
remédios... Pra você... Pra você e pra
mim... Tim-Tim. (Bebem, se olham, olham
para a sala).
MARIDO - Que noite...
MULHER - Uma noite é uma vida.
MARIDO - Que noite.
MULHER - Que noite.
TIA - Que noite... maravilhosa... não acharam?
MARIDO - Eu num se importa com o que perdeu esta
noite.
TIA - Quem perdeu? Vocês ganharam... Não acham que
ganharam?
MULHER - Não sei... Eu ainda não sei.
MARIDO - Eu nem vai chamar Polícia... Polícia, pra
quê?
TIA - Isso mesmo... Polícia pra quê? Esse é um assunto
doméstico-familiar.
Não
mete
Polícia
nisso... Que tal um licorzinho, hein?
MARIDO -Eu precisa falar pra vocês que depois do que
nós passou esta noite, eu é outro homem.
MULHER - Eu também, nunca mais serei a mesma.
TIA - Tim-Tim. Tim-Tim.
MULHER - Eu ainda estou muito nervosa... Quero me
acalmar e não consigo. Tudo está tão
confuso. É como se eles ainda estivessem
por aqui. Eu não quero mais ficar nesta
casa, Rafy...
TIA - Isso passa... Calma... Toma mais um pouquinho de
água com açúcar.
MULHER - Eu ainda estou vendo aqueles dois ali.
MARIDO - Onde? Onde?
MULHER - Ali... Aqui... Em toda a parte... A casa está
impregnada... Eu sinto até o cheiro deles.
Que sensação horrível... Eu pensei que
fosse morrer.
MARIDO - Eu também... Quando eles estavam aqui... é
como se eu estava sendo julgado... e
condenado pra morrer.
TIA - Que exagero...
MARIDO -Meu vida passou inteira no meu cabeça... Aí,
eu vi que a vida num vale nada. Que
tudo pode acabar de uma hora pra outra.
Que entra ladrão, no seu casa... E muda
tudo... O que é seu... Num é mais seu...
Nem casa, nem mulher, nada... Nada... É
como um revolução.
MULHER - Revolução?
MARIDO - Isto mesmo... Revolução. Onde ninguém tem
mais direito... O direito é de quem tem
arma...
Quem
manda
é
quem
tem
revólver. É quem tem poder. Ganha quem
é mais forte... Quem tem a arma...
TIA - Nem sempre, Rafy. Nem sempre.
MULHER - Eu preciso fazer alguma coisa, senão eu vou
explodir...
TIA - Quebra esse copo.
MULHER (Atirando o copo no chão) - Que raiva... O
culpado de tudo é você.
MARIDO - Eu?
MULHER -
Você sim... Ditador... Fascista... Quem
sempre usou revólver nesta casa, foi
você... Você nunca passou de um ditador
doméstico. De um machista... De um
torturador.
TIA - Agora você também está exagerando.
MARIDO - Deixa ela falar... Que mais? Pode falar... Eu
deixa.
MULHER
-
Ditador...
Unha
(Enfraquecendo)
de
fome...
Machista...
Egoísta...
Jogador...
Comedor de alho... kibe... tabule... Eu
detesto comida árabe. Como é que fui me
casar com você? Seu... Seu... Barrigudo...
Peludo... Macaco... Isso que você é... Um
macaco.
MARIDO - Acabou? Está mais calma?
MULHER - Ditador.
TIA - Flora, você não acha que, agora, a gente pode ir
consertando o que se estragou?
MARIDO - Não... Não é consertando... É mudando...
Mudando. Depois desta noite eu mudou...
Não está vendo que eu mudou?
MULHER - Será?
MARIDO - E você também tem que mudar.
MULHER - Eu?
MARIDO - Você, sim... Num percebe que houve um
revolução na casa? Que a partir de hoje,
de agora, eu vai renunciar? Eu num quer
mais ser ditador de nada... Isso que eu
aprendeu esta noite...
TIA - Bravos... Rafy.
MARIDO - Agora, nós vai viver numa democracia... De
hoje em diante, nesta casa, cada um vai
fazer o que acha que deve fazer. A
democracia começa é dentro da casa da
gente. Isso eu aprendeu... A democracia
começa é na casa.
TIA - Viva a democracia familiar.
MARIDO - Eu está falando coisa séria... Eu, nesta casa,
era quem? O poder. O ditador. Você era
quem? A oposição... Nóis dois briga...
Briga... E você põe pano quente... e num
resolve nada. Quinze anos, nóis viveu
assim...
Agora
chega.
Acabou.
(A
Empregada entrando com malinha na
mão).
EMPREGADA - Eu vim avisá que tô indo embora.
TIA - Pra onde?
EMPREGADA - Pra casa da minha tia.
TIA - A esta hora? Deixa de bobagem, menina... Leva as
suas coisas de volta... Amanhã você está
mais calma e nós conversamos.
EMPREGADA - Não senhora... Eu quero saí.
TIA - Bobagem, menina... Logo agora, que vamos
começar a viver numa democracia?
MARIDO - Isso mesmo, Oswaldina... Eu pédi. Fica, está
bem? Flora, pega a mala dela... Ela vai
ficar...
MULHER - Se ela quiser ficar.
MARIDO - Como se ela quiser? Eu estou mandando ela
ficar... Ela fica.
MULHER - Se ela quiser ficar...
MARIDO - Ah... Sim. Se ela quiser ficar... Eu ainda não
estou acostumado... Eu pédi. Ah? Vai lá
dentro, prepara um cafezinho, que nóis
vai começar vida nova.
MULHER - Vida nova.
EMPREGADA - É verdade mesmo, Dona Reni?
TIA - Não está vendo?... Fica... Vamos fazer mais uma
experiência.
EMPREGADA - O senhor também vai ficar?
MARIDO - Eu?... Não sei... não depende de mim...
EMPREGADA - Fica, Dona Flora?
MULHER - Não sei, não depende só de mim.
TIA - Que tal se fizéssemos uma experiência... gradual?
Anistia também deve começar pela casa,
vocês não acham?
MARIDO - Eu acha.
TIA - Então?
EMPREGADA - Se é assim, eu fico.
TIA - Rafy?
MARIDO - Eu fica.
TIA - Flora?
MULHER - Se ele quiser ficar...
TIA - Unanimidade de votos... Ficamos todos. Agora vai
preparar um cafezinho, pra todos nós...
Vai... Vai... (Empregada sai).
MARIDO - Agora que eu estou pensando melhor. Vocês
num
acha
que
eu
devia
chamar
a
Polícia?
MULHER - Polícia?
TIA - Não, amanhã a gente fala sobre isso... (Espanto)
Bia!
MULHER - O que tem a Bia?
TIA - Será que ela não entendeu o meu recado? Eu fui
bem
clara,
não?
Are
been
roubed...
Estamos sendo assaltados... Help... Help...
Ela é meio burrinha, não?
MULHER - Vai ver ela interpretou de outra forma.
MARIDO (Ciuminho) - Pensou que era recado do Dr.
Reinaldo?
TIA - Olha a anistia, Rafy.
MARIDO - Desculpa... Eu ainda num está acostumada...
MULHER - Rafy... Eu estou com a minha cabeça
estourando...
Procura
nas
suas
homeopatias e vê se tem alguma coisa
pra dor de cabeça.
MARIDO - Tem... Tem... Tem homeopatia que é ótima
pra
enxaqueca...
você... (Sai).
Eu
vai
buscar
pra
MULHER - Posso te perguntar uma coisa?
TIA - O que?
MULHER - Por que beijou aquele rapaz?
TIA - Por quê? Por amor.
MULHER - Eu não consigo entender...
TIA - Nem pode.
MULHER - Ele é parecido com outra pessoa que você
amou?
TIA - Todos os jovens são parecidos.
MULHER - Mas ele existiu, não existiu?
TIA - Aqui dentro, existiu. (Sirene de Polícia. Vozerio.
Batidas na porta).
VOZ (Fora) - É a Polícia... A casa está cercada... Saia de
mãos pra cima...
VOZ DE BIA - A Polícia está aqui...
VOZ 2 - É a Polícia... Se resisti nóis atira...
MARIDO (Vindo, apavorado) - Num atira... Num
atira...
(Todos
apavorados.
Clima
de
assalto. Todos falando ao mesmo tempo).
TODOS - Não atirem. Não atirem... (Em meio à confusão,
a casa é assaltada, nos mesmos moldes do
assalto dos ladrões com os mesmos atores,
que, representaram os papéis de Branco e
Preto, agora vestidos de policiais).
FIM