Edição nº 101 - Escola FORTEC-Ed. infantil, fundamental, médio
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Edição nº 101 - Escola FORTEC-Ed. infantil, fundamental, médio
Caro leitor, EDITORIAL Direcional Educador chega à edição 101 ISSN 1982-2898 com duas novas séries especiais. Reinventando Diretores Sônia Inakake Almir C. Almeida Paulo Freire trará autores convidados pelo Instituto Paulo Freire durante 12 edições. O primeiro artigo da série é assinado por Ladislau EDITORA Luiza Oliva Dowbor, conselheiro do Instituto Paulo Freire, que traz uma discussão essencial sobre Cultura, COLUNISTAS Cassiano Zeferino de Carvalho Neto Claudio Castro Sanches Emilia Cipriano Maria Irene de Matos Maluf Nílson José Machado COLABORARAM NESTA EDIÇÃO Francisco B. Assumpção Jr. Gustavo Teixeira Hamilton Werneck Heloísa Lück Heloisa Monte Serrat Barbosa Ladislau Dowbor Laerte Fonseca Laura Monte Serrat Barbosa Maria Ambrosina da Costa Maria Helena Negreiros Maria Irene Maluf Rogerio Neiva Pinheiro Simone Aparecida Capellini tecnologias e acesso ao conhecimento. “Paulo Freire nos trouxe, muito além da alfabetização, o conceito da cultura como forma de apropriação do mundo, acesso à cidadania. Ele (...) tinha a visão da centralidade transformadora dos processos culturais. Hoje, à medida que evoluímos para a economia do conhecimento, sentimos a força destas ideias. Não há mais economia de um lado, cultura de outro”, aponta Dowbor logo no início do texto, que começa na página 22. Hamilton Werneck, que foi nosso entrevistado de capa da edição nº 98, de março passado, assina a série Opinião do Pedagogo, sempre abordando assuntos para que nossos leitores se mantenham atualizados com as discussões pedagógicas mais importantes. No Direção de Arte Jonas Coronado texto de estreia, Werneck situa a questão do ensino integral no tempo e no espaço. “Sem ASSISTENTE DE ARTE Cristiane Lima Sergio Willian o desenvolvimento da pessoa humana, não recuperaremos os atrasos de nossa educação”, uma educação em tempo integral e, ao mesmo tempo, integral enquanto preocupada com aponta Werneck em um trecho do texto. Atendimento ao leitor e circulação Claudiney Fernandes Além das novidades, trazemos como tema de capa deste mês a Neuroaprendizagem, com seis consistentes artigos, mostrando visões diferentes e complementares dessa ciência, que a cada dia ganha mais espaço como aliada dos educadores. Os textos são Jornalista Responsável Luiza Oliva MTB 16.935 [email protected] assinados por Francisco B. Assumpção Jr., Laerte Fonseca, Maria Ambrosina da Costa, Maria Irene Maluf, Rogerio Neiva Pinheiro, Simone Aparecida Capellini. Fechamos essa edição recheada de ótimo conteúdo com o artigo de nosso colunista Impressão Prol gráfica Cassiano Zeferino de Carvalho Neto, Políticas públicas em educação: você conhece o PNE (2011/2020)? Vale a pena se informar. Filiada à Desejamos uma ótima leitura a todos, nesta reta final do primeiro semestre. Um abraço, Apoio O Grupo Direcional apóia: Luiza Oliva Revista Direcional Educador Editora Direcional Educador é uma publicação mensal do Grupo Direcional, com circulação nacional. Dirigida a diretores, educadores, coordenadores e todos os profissionais que atuam na área da educação. Não é permitida a reprodução total ou parcial das matérias, sujeitando os infratores às penalidades legais. As matérias assinadas são de inteira responsabilidade de seus autores e não expressam, necessariamente, a opinião da revista Direcional Educador. 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Direcional Educador, Junho 13 SEJA COLABORADOR DA DIRECIONAL EDUCADOR 3 SUMÁRIO SUMÁRIO Junho 13 06 18 CAPA CAPA 34 A Neuromatemática como um CAPA menta para o sucesso escolar novo paradigma para a Educa- Um encontro marcado entre a Por Maria Irene Maluf ção Matemática Neurociência e o Direito Por Laerte Fonseca Por Rogério Neiva Pinheiro ferra- 09 TETRAEDRO Otimização Por Nílson José Machado 10 to-família-escola Por Francisco B. Assumpção Jr. 15 CAPA A percepção e a aprendizagem: “a cegueira dos sentidos” 22 36 REINVENTANDO PAULO OPINIÃO DO PEDAGOGO FREIRE Escola integral atende ao dis- Cultura, tecnologias e acesso positivo constitucional ao conhecimento Por Hamilton Werneck Por Ladislau Dowbor 25 Direcional Educador, Junho 13 GEM NA SALA DE AULA nos, a serem atendidas na sala de aula pelo professor (8) Por Heloísa Lück 46 E AGORA, PROFESSOR? 38 NOSSOS ALUNOS E AS CURSO DROGAS Educar a Infância – Desafios Esteróides anabolizantes constantes Por Gustavo Teixeira Políticas públicas em educação: você conhece o PNE (2011-2020)? Por Cassiano Zeferino de Carvalho Neto Módulo V – Sobre a Arte Por Laura Monte Serrat Barbosa e Heloísa Monte Serrat 40 Barbosa EDUCAÇÃO INTEGRAL 49 LIVROS Desafios e Perspectivas da Edu- Por Maria Ambrosina da Costa 4 GESTÃO DA APRENDIZANecessidades básicas dos alu- CAPA A importância da relação sujei- 42 cação Integral: a formação in- 30 tegral CAPA Por Maria Helena Negreiros Aspectos neurobiológicos da 50 aprendizagem e dos transtor- AGENDA nos da aprendizagem Por Simone Aparecida Capellini Direcional Educador, Junho 13 Neuroaprendizagem: 5 CAPA CAPA ferramenta para o sucesso escolar Por Maria Irene Maluf Direcional Educador, Junho 13 6 Aprendizagem é um processo cognitivo complexo que, apesar de exaustivamente estudado, tem ainda muito a ser pesquisado. O estudo da aprendizagem envolve várias áreas do conhecimento humano e não é possível afastar esta ou aquela vertente do saber quando se trata de um assunto tão importante, já que é essa capacidade que nos distingue das demais espécies e nos permite a sobrevivência, a manutenção da cultura e é fundamental para melhorar a nossa qualidade de vida em diversos campos como, por exemplo, a educação e a saúde. Engatinhamos no conhecimento tanto a respeito do cérebro quanto dos processos cognitivos, os quais fazem do Homem o animal mentalmente mais sofisticado sobre a face da Terra. Mas, o domínio científico que temos na atualidade a respeito do funcionamento desse órgão, já nos permite prever um grande número de © Can Stock Photo Inc. / huhulin “A inteligência é bioantropológica na sua origem, mas psicossocial no seu desenvolvimento, respeitando a heterogeneidade e diferença cultural.” (Vitor da Fonseca) novas e assertivas possibilidades para elucidar, avaliar e intervir nos processos de aprendizagem, aprimorando nossa prática profissional como psicopedagogos e professores e melhorar a qualidade da aprendizagem de nossas crianças, com ou sem problemas de aprendizagem. A cognição é um processo mental que não depende da hereditariedade ou idade, é extremante flexível e tem por base os processos envolvidos na atenção e memória, processos perceptivos, simbólicos e conceptuais que nos permitem formar conceitos, resolver problemas, raciocinar, expressar pensamentos, de maior ou menor complexidade e ainda criar, entre outras habilidades que só o Homem é capaz, já que é dotado de um sistema nervoso passível de captar, extrair, integrar, armazenar, combinar, elaborar, planificar e comunicar a informação e ainda revelar tudo isso na forma de novos comportamentos. Entretanto, para se desenvolver, a cognição não prescinde das experiências constantes da criança com o meio que a cerca. E quanto mais cedo e melhor for a qualidade dessas trocas ambientais, melhor será a cognição e portanto, a aprendizagem. A falta de estimulação das funções cognitivas nos primeiros anos de vida determina inúmeros e comprovados prejuízos no aprender. Praticamente quatro bilhões de anos se seguiram, a partir do aparecimento da ação e da motricidade ideacional inerentes do Homem, até que surgisse a cognição, que conferiu ao Homem habilidades como a planificação, a precisão de efeitos e regulação intencional dos movimentos, quer com objetivos ligados às questões da sobre- vivência, de prazer ou utilidade social. Para desenvolver pouco a pouco uma maior capacidade de adaptação ao meio e portanto garantir a sobrevivência da espécie, não bastava ao Homem o aprimoramento biológico, promovido especialmente por fatores como clima e alimentação diferenciada. Dessa demanda, surgiram os processos cognitivos, que primeiramente ocorreram através das combinações sistemáticas de ações e ideias. Dito de outra forma, deve-se à sintaxe motora e depois à sintaxe cultural, que a espécie humana tenha suplantado seus ancestrais, e tal processo atingiu seu ápice com o aparecimento da linguagem falada (Fonseca,2008). Com o passar dos séculos, o corpo e o cérebro foram gradativamente se especializando, de modo que, a partir das primeiras vocalizações de nossos antepassados, chegássemos às mais sofisticadas expressões sequencializadas do pensamento simbólico, em suas formas mais abstratas, e posteriormente à capacidade de decisão de sua execução ou inibição, como hoje conhecemos. As funções executivas do cérebro constituem “um conjunto dinâmico de funções cognitivas integradas que nos permitem pensar com objetivos, mantê-los na memória de trabalho, dar sequência prática a sua execução, supervisiona-los e os controlar para alcança-los” (Luria,1990). São as deficiências no desenvolvimento das funções executivas que, muitas vezes, determinam as dificuldades de aprendizagem de nossas crianças, já que o aprender exige um importante aporte de condições neurobiológicas, cognitivas e emocionais. É importante lembrar também Direcional Educador, Junho 13 Neuroaprendizagem: 7 TETRAEDRO CAPA OTIMIZAÇÃO Por Nílson José Machado Fonseca, V. Cognição, neuropsicologia e aprendizagem: abordagem neuropsicológica e psicopedagógica.2.ed. Petrópolis:Vozes,2008. _________Aprender a Aprender: A educabilidade cognitiva. Porto Alegre: Artes Médicas Sul, 1998 Luria, A. R. Desenvolvimento Cognitivo. São Pau- Direcional Educador, Junho 13 lo: Ícone, 1990. 8 Maria Irene Maluf é Especialista em Psicopedagogia, Educação Especial e Neuroaprendizagem. É editora da revista Psicopedagogia da ABPp, Coordenadora do Núcleo Sul/Sudeste do Curso de Especialização em Neuroaprendizagem, Transtornos do Aprender e Psicopedagogia - Instituto Saber/Núcleo de Estudos em Psicopedagogia e Neuroaprendizagem/FTP. Site: www.irenemaluf.com.br E-mail: [email protected] avaliação da aprendizagem, assim como uma nova intervenção psicopedagógica, mais enriquecedora e que atinja de forma global a cada criança na sua individualidade, ajudando-a a aprender mais e melhor, a partir de seu potencial cognitivo. Operacionalizando a ideia, trata-se de priorizar a maximização dos processos cognitivos, dentro de uma concepção dinâmica do potencial de aprendizagem de cada criança, levando a educação e a psicopedagogia a abrangerem na sua prática avaliativa e interventiva, o domínio da Neuroaprendizagem, além dos demais que já lhe são próprios. Na avaliação, o objetivo delineia-se como uma aproximação da “arquitetura cognitiva” da criança. Na intervenção, clínica ou escolar, o objetivo é potencializar e otimizar a competência da criança e do jovem de processar informações, desenvolver novos conhecimentos, novos conceitos e ser capaz de operacionaliza-los, em um processo contínuo de relação consigo mesmo e com o meio. Não se trata de mais um modismo, nem ao menos de novidade, já que a história da educação cognitiva tem mais de um século. O que ocorre é que a aplicação de seus princípios nas escolas e na psicopedagogia ainda não é tão comum como poderia e deveria ser, já que o domínio do conhecimento sobre os processos cognitivos envolvidos na aprendizagem promove uma maior assertividade pedagógica, muito especialmente no caso de crianças com dificuldades no aprender. 2 - A ideia de perfectibilidade Em seu uso comum, a palavra “perfeito” indica um superlativo: dizse de algo que foi feito da melhor maneira possível. Referida a aspectos parciais da vida humana, sobretudo técnicos, não causa estranheza: falamos de um relatório perfeito, uma jogada perfeita, um diagnóstico perfeito etc. Mas quando entra em cena a totalidade do ser humano, a perfeição cede lugar à ideia de perfectibilidade. Cada pessoa atua e deve ser avaliada pela totalidade do espectro de competências e valores que a constitui. Enquanto vivemos, permanece aberta a possibilidade de crescimento em todas as dimensões. Ter dado o melhor de si não é suficiente para justificar nossas ações, mas nenhum comportamento é eticamente aceitável se não fazemos o melhor possível, em cada situação. Quando se trata de valores, a fé na perfectibilidade é crucial no caminho para nos tornarmos uma pessoa melhor. Não importa que a perfeição não exista: as utopias também não existem, mas são imprescindíveis para alimentar nossos projetos. 3 - Bestismo e perfectibilidade Não importa em que, ser o melhor é o que importa: eis a essência do bestismo. O desempenho ótimo pode realizarse em circunstâncias absolutamente irrelevantes; o Guiness registra e amplifica o fato e um espetáculo de luzes saúda the best. A profecia de Warhol (No futuro, todos serão famosos durante 15 minutos) em vez de atenuar, parece estimular a busca ansiosa pelo espetáculo de máximos e mínimos. A popularidade dos extremos rivaliza, no entanto, com sua crescente efemeridade: um pequeno movimento e eles já não mais são ou estão... Coisa distinta é o ideal da perfectibilidade humana. O contínuo crescimento pessoal é condição de possibilidade de uma ética humanista. Uma ação eticamente defensável pressupõe que cada um dá o máximo de si em busca de uma minimização do sofrimento sem sentido. Aqui, no entanto, máximos e mínimos são balizas utópicas. Em oposição a bestismos de diversos matizes, no aperfeiçoamento humano, nunca nos satisfazemos com um mínimo, nem atingimos um máximo. 4 – A vida é ótima Ao refletir-se no espelho ou refratar-se entre dois meios, a luz escolhe o caminho mínimo. Uma máxima latina estabelece: a natureza nada faz de inútil. Em 1744, Maupertuis enunciou o Princípio da Ação Mínima: em cada situação, os fenômenos ocorrem de modo a minimizar uma grandeza chamada ação. Euler e Lagrange partiram de tal princípio para criar a Mecânica Analítica. Nela, as leis básicas, inclusive as de Newton, são deduzidas a partir da minimização do valor do Lagrangeano. Tiveram ainda outro insight vital: mínimos e máximos andam sempre de mãos dadas. O máximo lucro alimenta-se do mínimo custo; o aproveitamento máximo do mínimo desperdício. Nas ações humanas, mínimos ou máximos sempre estão presentes e a busca da otimização é instigante. A própria Ética somente se constitui se cada um, ao agir, dá sempre o melhor de si. A corrupção de tal ideia é a prática de o máximo para si, o mínimo para o outro. A vida é ótima quando nos dedicamos ao máximo para minimizar o sofrimento no mundo. Nílson José Machado é professor titular da Faculdade de Educação da USP, onde também coordena dois grupos de estudo de frequência livre: os Seminários de Estudo em Epistemologia e Didática - SEED, e os Seminários de Ensino de Matemática – SEMA. É autor de diversos livros, entre eles Educação – Microensaios em mil toques (volumes I, II e lll, pela Editora Escrituras). www.nilsonjosemachado.net Direcional Educador, Junho 13 Referências bibliográficas que o desenvolvimento físico, emocional, mental, cognitivo e social do Homem durante a sua primeira infância, como apontam inúmeros estudiosos, está interligado diretamente ao estabelecimento fundante dos vínculos afetivos com seus pais, responsáveis maiores por fazer que o filhote mais frágil e que mais tarda a se tornar independente, amadureça em segurança. A família, núcleo que desempenha o papel de mediadora entre a criança e a sociedade, é essencial para sua adequada socialização, que constitui um outro elemento indispensável para o desenvolvimento cognitivo infantil. Pesquisas científicas também confirmam a importância da qualidade do estímulo familiar: a relação mãe e filho, quando adequada e rica em experiências motoras e sensoriais, prepara a criança para novas e sequentes trocas e desafios com o meio social. Assim, também, constatou-se que o nível de escolaridade da mãe é diretamente proporcional à qualidade da estimulação ambiental recebida pela criança e decorrentemente disso, com o seu desenvolvimento cognitivo, devido à melhor organização e estimulação diária do ambiente, pela compreensão da importância em oferecer estimulação material através de brinquedos apropriados para a idade da criança e maior envolvimento emocional e verbal da mãe com seu filho. Tendo como ponto de partida conhecimentos mais aprofundados sobre a cognição, é possível desenvolver um novo e assertivo modelo de 1 – A ideia de otimização Otimizar um processo não é apenas atingir o objetivo fixado, mas fazê-lo da melhor maneira possível. É encontrar o mínimo ou o máximo valor desejável para alguma grandeza. Dadas duas cidades, é descobrir o caminho mais curto, ou menos dispendioso, ou mais seguro, ou menos íngreme, ou mais livre de tráfego... Maximizações e minimizações alimentam-se mutuamente: máximo lucro, mínimo custo, mínimo risco, máximo valor do seguro... A Matemática é ótima na otimização de processos técnicos, que não envolvem a complexidade humana. Quando o ser humano está no centro das atenções, o ótimo pode se tornar inefável e dois desvios podem ocorrer. Em primeiro lugar, o ótimo pode ser inimigo do bom. A busca insensata de uma inacessível otimização pessoal pode levar ao menosprezo de otimizações parciais, palpáveis e desejáveis. Outro desvio é o fato de que, às vezes, na busca sôfrega do ótimo, os valores esmaecem e minam a integridade. Como nos lembra a máxima latina, a corrupção do ótimo é o péssimo. 9 CAPA A IMPORTÂNCIA DA RELAÇÃO SUJEITO-FAMÍLIA-ESCOLA Direcional Educador, Junho 13 © Can Stock Photo Inc. / itkach Por Francisco B. Assumpção Jr. 10 ensar o homem significa partir, habitualmente, de um paradigma no qual ele se apresenta como totalmente à parte das demais espécies e, muitas vezes, à parte inclusive do próprio ambiente natural. Assim, pensar a interrelação do indivíduo com seu primeiro núcleo social, a família, e posteriormente com os dois grupos mais amplos que o caracterizam hoje, a escola e a própria sociedade, torna-se, muitas vezes, extremamente difícil. É exatamente isso que, aqui, tentaremos pensar, uma vez que essas são as mais importantes estruturas relacionadas ao seu desenvolvimento, em função de aspectos tanto biológicos como evolutivos. Iniciamos então partindo da premissa de que há aproximadamente dois milhões de anos, um grande antropoide, em função de mudanças climáticas extremamente importantes e radicais, passou a apresentar diferentes alterações anatômicas que o permitiram andar ereto, e assim aumentar sua velocidade de deslocamento em relação aos outros antropoides visando a busca de alimentos destinados à sua sobrevivência. Ao deslocar os olhos para a face mais anterior da cabeça, passou a poder avaliar melhor distâncias, fundamental para um predador de seu porte que, mudando das florestas tropicais para a planície tinha, enquanto necessidade de sobrevivência, que detectar presas ou predadores próximos. Alterando seu sistema pilífero, foi-lhe permitido controlar melhor a temperatura corporal e assim, suportar melhor grandes deslocamentos, inclusive à procura de água. Finalmente, talvez concomitantemente a uma alteração de hábitos que lhe levou a buscar na carne sua fonte mais importante de proteínas, alterou sua estrutura cerebral o que lhe permitiu processar símbolos de maneiras a que pudesse resolver problemas na sua ausência física, executando todos os passos para essas soluções a partir de imagens mentais e, consequentemente, poupando tempo e aumentando sua eficácia de sobrevivência uma vez que respostas rápidas são muito mais eficazes quando consideramos a questão sobrevivência. Como a maior parte dos antropoides, por ser um animal eminentemente gregário, dado esse de fundamental importância para sua sobrevivência em um mundo hostil, ao desenvolver meios cada vez mais eficazes, possibilitou agrupamentos cada vez maiores que, se por um lado lhe facilitavam a especialização de funções e a eficiência, por outro demandavam que estabelecesse regras (explícitas e implícitas) para convívio nesses grandes grupos e, principalmente e de maneira um pouco diversa dos demais mamíferos, estabeleceu cada vez mais uma divisão de papeis e funções que lhe permitiram aumentar cada vez mais a especialização e, em decorrência, facilitou sua adaptabilidade. Todas essas mudanças permitiram-lhe subsistir de maneira bastante eficiente aumentando seu número de indivíduos uma vez que passou, gradualmente, a controlar a produção de alimentos, a evitar doenças, a eliminar predadores e eventuais competidores. Entretanto essas mudanças adaptativas ocasionaram que tudo o que ganhou em plasticidade (passou a ser o único animal que altera o ambiente e é alterado por ele, onto e filogenéticamente) perdeu em estabilidade uma vez que passou a ser mais frágil a medida que precisava nascer “menos pronto”, e portanto mais vulnerável, para que pudesse ser mais maleável. Passou então a depender de um maior tempo de maturação, comparativamente a outras espécies, até que, em seu desenvolvimento rumo à idade adulta, ganhasse sua própria independência e autonomia. . Sua prole tornou-se, consequentemente, extremamente frágil. Assim, enquanto outros mamíferos andam logo após o nascimento e são adultos um ou dois anos após isso, o homem necessita de muito tempo para que seu crescimento se processe adquirindo autonomia e assim, durante todo esse período, é um animal extremamente frágil que necessita proteção biológica e psicológica, essa última representada pelos sentimentos de proteção e segurança. Caracteriza-se assim como um animal gregário para o qual a família é de extrema importância, pois vai se constituir em um grupo que, independentemente de suas características culturais, persistirá, ainda que com diferentes apresentações, com o passar dos séculos uma vez que corresponde a um sistema de suporte que lhe permite o crescimento em direção à autonomia. Essa estrutura familiar é necessária devido ao grande período de dependência dos filhotes da espécie, dependência essa aguda durante, pelo menos, os primeiros dois anos de vida nos quais os cuidados são necessários para a preservação desse recém-nascido frágil, e, em consequência, da espécie em questão. Assim, as características do recém-nascido humano desencadeiam, no adulto de sua espécie, reações de cuidado e proteção corporal expressos através de comportamentos de maternagem como mensagens sonoras, gestos, sorrisos e cuidados corporais que proporcionam a sensação de segurança. O pai, como em outros mamíferos, embora participe desse processo de cuidado, tem um papel mais ligado à segurança e à subsistência uma vez que é, habitualmente, o principal responsável pela manutenção e pela segurança física ao passo que o cuidado afetivo torna-se mais diretamente ligado à figura da mãe. Com o crescimento e a gradual conquista de uma maior autonomia, o papel parental passa a ser cada vez mais educativo pois, considerando-se a maleabilidade da espécie, seu genoma não permite que se estabeleçam cuidados pré-estabelecidos, diferentemente de outras espécies nas quais, por exemplo, o medo de um predador parece já vir inscrito no próprio código genético, dispensando-se assim a importância educativa. Esse processo educativo passa então de informal para um modelo formal, mais eficaz que possibilita ao indivíduo, através do aprendizado e da manipulação de símbolos, principalmente escritos, a entrada no ambiente da cultura e da civilização. Dessa forma no homem, pela sua capacidade de alterar o ambiente físico, o aprendizado através da educação passa a se revestir de uma importância tão fundamental que o faz passar, juntamente com a família, a ser o principal modelo educativo. Isso porque em um agrupamento que se torna, conforme o passar do tempo, cada vez mais amplo e complexo, a necessidade de uma educação que lhe permita acessar experiências e conhecimentos prévios torna-se cada vez mais fundamental. Assim, a adaptabilidade e o desempenho nesse processo passam a ser extremamente importantes para o filhote da espécie. Ao redor dos sete anos de idade, com essa maior independência, o filhote humano afasta-se mais dos pais em um período “Quando falamos da instituição família, falamos de um processo histórico que garante um passado bem como uma projeção no futuro.” Direcional Educador, Junho 13 CAPA 11 CAPA Direcional Educador, Junho 13 “No homem, o aprendizado através da educação passa a se revestir de uma importância tão fundamental que o faz passar, juntamente com a família, a ser o principal modelo educativo.” 12 de maior socialização, período esse representado pela escola e por seus parceiros de mesma idade, começando então a se estabelecer um modelo padronizado de instrução formal acompanhado do aprendizado de papeis sociais fornecidos pela família e pelo ambiente. Aproveitam-se assim conhecimentos adquiridos no decorrer de todo o processo civilizatório (ampliando-se o antigo aprendizado humano, passado exclusivamente de uma geração à outra) e, fundamental para um animal gregário, aprendem-se as regras que possibilitam a vida grupal e a divisão de funções (isso se constituindo em um aprendizado heurístico e implícito nos próprios modelos de relacionamento), fundamentais para o desenvolvimento dessa espécie gregária. Com a adolescência, esse indivíduo se emancipa a partir de uma maturação cognitiva que lhe permite alcançar as operações formais e, com isso, compreender e escolher padrões sociais observando-se ritos de passagem marcando-se assim sua entrada em um grupo adulto onde junto com a independência pessoal, estabelecem-se mecanismos de coesão com modelos de aproximação, demarcação de território, convivência específica, cortesia, negociação, acordos e participação bem como de modelos de comportamentos fortuitos e de transmissão cultural. Todos esses aspectos podem ser visualizados como melhoramentos, em termos adaptativos, de comportamentos padronizados geneticamente para convivência em bandos visando a sobrevivência do indivíduo e da espécie. Assim, a questão da família, aparentemente simples, deve ser pensada não somente no contexto social tendo-se em vista um momento histórico, mas também pode ser considerada a partir de condutas animais primitivas que são elaboradas e significadas pelo animal humano. Sai-se então de um modelo estático e absoluto do homem enquanto animal paradigmático para se pensá-lo como um animal característico que, a partir de determinadas estruturas cerebrais, constrói uma série de significados que, mesmo considerando-se sua mutabili- dade, definirão seu próprio existir. Quando falamos da instituição família, falamos de um processo histórico que garante um passado bem como uma projeção no futuro. Cabe lembrar que, mesmo embasada em características biológicas expressas através da proteção da prole, delimitação de território e expressão da própria sexualidade, é uma instituição fundamental à vida social uma vez que, além da proteção e da subsistência, define valores enquanto instância na qual se articulam o individual e o coletivo, o público e o privado. Pensar o homem significa então pensá-lo enquanto expressão do biológico e enquanto expressão significativa do social. Engels (1974), ao descrever os processos evolutivos da família em um contexto privilegiado pela cultura, refere que primitivamente os seres humanos viveram em promiscuidade sexual, de forma similar a outras espécies animais, sendo que isso excluía qualquer possibilidade de certeza da paternidade e, por isso, a filiação somente podia ser contada a partir da linhagem feminina ou o direito materno. A passagem à monogamia teria origem em novas concepções religiosas, com a introdução de novas divindades representativas de ideias que determinaram mudanças históricas na situação homem e mulher. Com isso, o significado da família está, hoje, vinculado a outros significados que constituem um todo mais ou menos sistemático, embora não necessariamente ajustado e harmonioso. Assim pensar a família, destinada a facilitar a subsistência dos filhotes humanos, é uma questão básica, pois não podemos pensar o homem nem como um robot, programado e comandado por um determinismo biológico e genético, nem como o indivíduo romântico que molda e faz sua vida sem limitações, no reino total da liberdade. Devido sua adaptabilidade e capacidade de alteração do próprio ambiente, a espécie humana teve condições de aumentar populacionalmente, uma vez que implementou a produção de alimentos, combateu as pragas e, mais que tudo, eliminou gradualmente todos os demais predadores e competidores. Ao se deslocar geograficamente, favoreceu a exogamia, a recombinação genética e a seleção gênica. Privilegiar-se o valor da estabilidade familiar, alicerçada no modelo de casamento, ocasiona assim, um fator de estabilidade em grandes bandos animais, evitando-se as lutas pelas diferentes fêmeas. Garante-se o espaço, se reduz a parentela, enfatiza-se a individualidade e preserva-se o espaço territorial demarcado. Todas essas considerações justificam o nosso privilegiar a família nuclear que, pela maleabilidade da espécie, vai deixando cada vez mais de funcionar a partir de regras dadas, passando a ser "negociada" continuamente, com pseudoescolhas individuais. Essa capacidade de negociação pode ser visualizada como decorrente da maleabilidade adaptativa da espécie que, por poder alterar continuamente seu ambiente, é capaz de criar possibilidades infinitas de subsistência embora continue guardando em seu íntimo as mesmas características animais de seus ancestrais. Continuando a pensar o filhote humano, temos que considerar outra estrutura criada mais recentemente: a escola, e aqui somos obrigados a focar a questão natureza-ambiente colocando-nos no cerne da questão inteligência-hereditariedade. Quando se pensa exclusivamente a questão ambiental, negam-se as influências da hereditariedade ao passo que, quando se valoriza a questão genética, pensa-se somente na biologia ligada à expressão das características intelectuais. Entretanto, o desenvolvimento da criança só pode ser pensado a partir de estruturas anatômicas e de organizações psicológicas já presentes ao nascimento. A partir dessas estruturas é que vai se processando uma organização morfológica e funcional mais sofisticada. Consequentemente, o aprendizado passa a ser uma mudança no próprio cérebro, ocorrendo assim em uma matriz biológica, geneticamente estruturada com pequenas diferenças entre genes, porém ocasionando grandes diferenças comportamentais. Portanto, a partir de um padrão de herança, mecanismos neurológicos seriam desencadeados e acelerados e/ou alterados pelo padrão de estímulos ambien- tais (educação). Esses estímulos ambientais embora não tenham o poder de alterar as capacidades e potencialidades inscritas no genoma modelam o comportamento desse indivíduo em função de sua plasticidade. Dessa maneira, o cérebro pode ser visto como um conjunto dinâmico que é, continuamente modelado, a partir das experiências sensoriais e da aprendizagem, o que lhe leva a se adaptar continuamente às modificações ambientais, espontâneas ou provocadas, armazenando as novas experiências de maneira a utilizá-las em outros momentos, sempre de forma adaptativa e seletiva. Tem a educação, portanto, um papel fundamental na questão evolutiva e, principalmente, de desenvolvimento de mecanismos de adaptação e sobrevivência. Essa adaptação, pensada no sentido biológico, é diferente do adaptativo cotidiano uma vez que aquele não tem aspectos morais ou éticos mas favorece os indivíduos mais eficazes que, assim, se reproduzem mais, o que facilita a permanência de um caráter adaptado. A educação torna-se assim um dos pilares no processo de desenvolvimento, não só como um algo decorrente da industrialização como também pelo aspecto humano nela envolvido, com questões culturais e intelectuais, vinculadas à concepção do que é humano. Esse aprendizado formal, decorrente do processo civilizatório, não é o único responsável pela questão do aprendizado, que em si é mais antiga, envolvendo características próprias da espécie pois envolve então a questão dos inputs, da dinâmica interna das redes neurais envolvidas e a avaliação dos resultados. O processo de aprendizado informal envolve também os dois primeiros aspectos porém, se produz enquanto representação de algo no sentido de que, ao ser ativado por input, produz uma resposta considerada correta naquela situação. Nele, sem feedback externo, as redes neurais o representam de maneira sistemática sem um padrão de correção o que pode propiciar processos tanto criativos como processos não adaptados, quer sob o ponto de vista biológico quer sob o ponto de vista social, o que gera novos mundos “Pensar o homem significa então pensálo enquanto expressão do biológico e enquanto expressão significativa do social.” Direcional Educador, Junho 13 CAPA 13 CAPA Assumpção Jr. F.B. Psicopatologia Evolutiva. Porto Alegre; ARTMED; 2008. Engels, F. A Origem da Família, da Propriedade Privada e do Estado. Rio de Janeiro; Civilização Brasileira; 1974. Mithen, W.S. A Pré História da Mente. São Paulo; UNESP; 1998. Pinker,S. Tabula Rasa. São Paulo; Companhia das Direcional Educador, Junho 13 Letras; 2002. 14 Francisco B. Assumpção Jr. é Professor associado do Instituto de Psicologia da USP, professor livre docente pela Faculdade de Medicina da USP, membro das Academias Paulista de Medicina (cad. 103) e Psicologia (cad. 16) E-mail: [email protected] Site: www.psiquiatriainfantil.com.br mentais, decorrentes do significado que o organismo atribuiu a cada fato. Baseia-se assim em um conhecimento prévio e numa construção pessoal. Assim, poderíamos pensar em sistemas de processamento mental especializados, e próprios da espécie, que permitiriam que, auxiliados pelos processos de aprendizado, o ser humano construísse seu próprio mundo enquanto uma rede de informações com significados próprios e pessoais. Dentro dessa perspectiva dinâmica, esse processo tem um caráter deliberado e intencional na busca de um conhecimento que permite a solução adaptada de um novo problema, contribuindo para a sobrevivência do indivíduo e da espécie. Deve se considerar que esse aprendizado se produz de maneira implícita ou explícita, a primeira parecendo se constituir em um sistema prévio da aprendizagem explícita tanto sob o ponto de vista filogenético como ontogenético uma vez que, nos animais, a identificação de variações ambientais (irregularidades) assim como suas regularidades permitem que ocorra um aprendizado associativo ou por condicionamento. Isso ocorre também no bebê humano. Como correspondem a um sistema mais primitivo, são mais estáveis e econômicas e, dessa forma, este sistema deve, provavelmente, se relacionar com estruturas cerebrais mais primitivas e antigas embora essas, também provavelmente, passem a ser integradas com outras informações de maneira a poderem criar novas representações mentais a partir de conexões com o córtex cerebral, mais desenvolvido e evoluído filogeneticamente. Isso permite que as representações sejam estáveis, duradouras e generalizáveis, com pequeno dispêndio de energia e com novos significados sendo atribuídos às representações que assim, adquirem novos atributos conceituais. Todas essas possibilidades otimizam a adaptação e, consequentemente, as possibilidades de sobrevivência. Isso porque cada conhecimento adquirido pela espécie, em função do aprendizado explí- cito, torna-se base para um conhecimento seguinte que, então, se amplifica. Com isso, gera-se um novo mundo que gera novos estados mentais que constituem um novo ser. Essa é uma das bases de todo o desenvolvimento humano. Assim, é exatamente o aprendizado explícito predominantemente educativo, com visão psicopedagógica, baseada no aspecto referente a consideração das diferenças, que se preocupa especificamente com aqueles que não apresentam o sucesso esperado, que vai caracterizar mais ainda a espécie, uma vez que, mesmo ela se desenvolvendo de maneira eminentemente antiseletiva, enfatiza o desenvolvimento de seus aspectos éticos e morais. Embora isso fuja da questão absoluta e passe a estabelecer um caráter ideológico e moral, não deixa de perceber e tentar compreender para auxiliar todas essas questões de base eminentemente biológica. Assim evolui a espécie, não de forma absoluta, porém com a plasticidade e a riqueza que a caracterizam pois por sua capacidade de autoprogramação e autoconstrução ela se define com maior liberdade e com maiores possibilidades que as outras. Cabe, porém, lembrarmos que dois milhões de anos é muito pouco tempo para considerarmos sua estabilidade uma vez que outras espécies também bem adaptadas ao seu ambiente de origem conseguiram sobreviver por um período de tempo mais longo e, mesmo assim, a partir de determinados fenômenos naturais, não conseguiram permanecer no planeta. O bicho homem, a partir dessa sua plasticidade no processamento de informações, ao se valer dos modelos de aprendizado implícito e explícito tão importantes deve, ao estudá-los, procurar corrigir as eventuais dificuldades adaptativas que se apresentam levando em consideração, inclusive, suas questões éticas. As neurociências talvez sejam uma das ferramentas acessíveis a essa construção que, caso não ocorra,, nos possibilitará ser somente mais uma experiência que a Natureza tentou e que talvez seja estudada por outras espécies num futuro próximo. A PERCEPÇÃO E A APRENDIZAGEM: “A CEGUEIRA DOS SENTIDOS” O homem é igualmente capaz de ver o nada que emerge e o infinito em que é engolfado. Blaise Pascal Por Maria Ambrosina da Costa s melhores observadores do mundo percebido – os homens –, que têm consigo a maquinaria mais elaborada já conhecida – o cérebro –, têm na percepção sua aliada mais importante e talvez sua maior traidora. O aprender elaborado pelo cérebro é um intrincado conjunto de informações eletroquímicas que constroem algo, aparentemente simples e efêmero como uma resposta de um movimento da mão na construção de uma letra, mas como Sherrington (neurocientista inglês, criador do termo sinapse), inferiu: “a experiência de mover a mão, era um ponto mental (...) derivado de elementos que não são vividos como tais e, no entanto, (...) a mente os usa na produção da percepção”. A ilusão de de “ver” A compreensão do produto, a resposta – o movimento do braço, a construção da letra – é o resultado de um grupo de infinitas possibilidades apresentadas pela percepção que, coordenada por uma série de “truques” e “táticas”, se constitui no modelo social solicitado. Essas possibilidades, hipoteticamente, seriam de tal grandeza que o fato dessa construção limitada pelo contexto cultural, torna por si só essa maquinaria cerebral algo que percebido na sua forma mais simples, em função da sua perfeita estruturação. Perceber algo em si é a superfície da estrutura da percepção - o que pode ser percebido e o que de fato se percebe, é a grande diferença que o homem constitui naquilo chamado “realidade” e no seu pressuposto – em função de um campo visual limitado frente à todas as possibilidades, o homem enxerga o que aprende e só aprende aquilo que de alguma forma conseguiu enxergar, pois: “ver é mais do que olhar, isso explica, por exemplo por que, provavelmente não foi percebido Direcional Educador, Junho 13 Referências bibliográficas CAPA 15 CAPA 16 que a palavra “de” está escrita duas vezes no triângulo da figura anterior”. (Eagleman, 2012). Partindo do exposto acima, a preocupação com o aprender escolar torna-se uma progressão geométrica, constituir conteúdos que não estão adequados ao construto da percepção, colocada como possibilidade dessa apreensão individual, promovida pelo coletivo, cria o alerta para a elaboração de uma formação de professores que permita e reconheça esses construtos e os seus próprios, ou seja, a maneira como cada um promove e constrói sua própria percepção daquilo que, institucionalizado se torna referência, e possam trabalhar com isso; mais ainda, compreender que o cérebro precisa ter mecanismos de localização e possibilidades de elaboração do que é pedido, compreendendo o que é necessário em dado momento. A percepção vai além, rastreia tudo que é possível e vai se ajustando ao que for importante para a resolução de um conflito, ou a possibilidade de resposta. Nesse intrincado caminho tudo que puder ser observado, dentro do esperado formalmente, é apenas parte da composição envolvida nesse ainda pouco explicado mecanismo de repetição com significado; são necessárias construções mnemônicas, registros atencionais e estratégias cognitivas. A percepção é algo relacionado ao conceito de uma mecânica estabelecida culturalmente, reproduzida pelo cérebro, tendo em vista que a maquinaria cerebral se vale desses movimentos sócio-culturais estabelecidos, em uma organização circular que possibilita que o que for necessário para o or- ganismo que seja percebido (dentro do exposto anteriormente), possa ser formalizado em sucessivas tentativas até aquilo que pode tornar-se o domínio do outro. Partindo dessa análise pode-se colocar como ponto de partida para a compreensão de qualquer conceito a capacidade neural do construto da percepção, ou daquilo que é chamado de percepção que constrói o relato social do que pode ser apreendido, ou do que é necessário de fato, para a constituição do, ou de um mundo, compartilhado, que pode ser analisado e organizado de forma coerente com a elaboração histórica, ou o que o homem percebe de si, na concepção do outro e da factualidade da observação em conjunto, onde há um “acordo”. Pode-se afirmar, dessa forma, que a percepção humana é uma forma conjuntural de um acordo, onde a estrutura neural, com base na organização mnemônica onde se consolidam “pressupostos” sobre as informações recebidas – tornam-se conceitos frente ao que já foi experienciado; sendo assim, a percepção é sempre a reconstrução do já vivido que em si é a possibilidade da experimentação da percepção, esse processo se dando de maneira infinita. Aprender trataria, no âmbito escolar na (re)construção, (re)elaboração, (re)vivescência, do que já foi constituído no estar no mundo, cada indivíduo na construção dessa percepção coletiva, que se estabelece nos seus construtos pessoais, contribuindo para a possibilidade de uma formação perceptual coletiva, estabelecida pela linguagem e pela resolução dos conflitos que (re)estruturam o homem na sua essência e na sua compreensão em se perceber, perceber o fato e ser percebido. Perceber significa, em síntese, ser capaz de compartilhar as impressões do construto neural que é chamado de mundo. O incógnito que é o mundo das redes neurais leva à constatação de que, além da dificuldade do organismo perceber o fenômeno, como o ser em si, mas sim como a elaboração simbólica do que pode ser em alguns momentos, transformam os registros naqueles em que já existe um acordo entre a “realidade simbólica” e a “realidade social”, nas palavras de Birman (1991), citado por Sarti (2001): “o real não existe fora do registro simbólico. Assim, percebe-se a realidade através das redes de sentido inscritas na ordem simbólica, de forma que os diferentes objetos constitutivos da realidade se ordenam enquanto tal pela operação da simbolização, instaurando, então, a experiência do mundo como consubstancial ao registro da significação”. O mundo dos sentidos estabelecidos socialmente deixa de lado, por uma necessidade de ordenação, uma série de dados que interferem na percepção do que, simbolicamente, se inscreve no modelo do que deve ser parte do percebido “consciente”. Essa chamada “consciência da percepção” instala no indivíduo uma leitura, que só pode se dar no coletivo do que o homem percebe, dentro das funções neurais, como uma representação do real. De fato, pode-se dizer que o homem percebe o que já foi construído para ser percebido no contexto social, onde essa percepção dada é necessária para a compreensão dos construtos que o contexto cultural pressupõe ao longo de uma civilização, como modelo de explicação necessária de sua existência. Em suma, a percepção em si é algo que tem infinitas possibilidades pois se dá no contexto dos fenômenos (aquilo que existe e, em recortes específicos se mostram e podem ser compreendidos), mas o que pode ser percebido e portanto, aprendido se inscreve no que construído socialmente, gera simbolicamente, um modelo que dá sentido ao que dada civilização necessita para compreensão de si mesma. Estabelecendo essas questões sobre como a percepção se dá no contexto do humano, fica esclarecido que, na escola, o educador deve, partindo dessa compreensão, organizar a maneira de trabalhar os conceitos e, mais ainda, ser um observador importante no modelo da aprendizagem e de seu aprendente. A Neuroaprendizagem surge nesse momento não só como instrumento ou recurso, mas como substrato de tudo que é possível apresentar como mecanismo do conhecer, propiciando mais recursos para a Psicopedagogia, na possibilidade de reconhecer não só o que serve de modelo para o que deve ser compreendido na escola, mas também que tipo de intervenção pode ser feita, utilizando esses recursos e esse aporte para o melhor desempenho do profissional e, portanto, da pessoa que está passando por tal processo, tanto como a Neuroaprendizagem coloca daquele que é mediador (o educador) - pois ocorre também aí uma transformação - quanto de quem é “alvo” dessa mediação, o que está construindo as bases de seus conceitos. Referências bibliográficas Eagleman, David. Incógnito: as vidas secretas do cérebro, Editora Rocco, Rio de Janeiro/RJ, 2011. Sarti, Cynthia. A Dor, o Indivíduo e a Cultura. Revista Saúde e Sociedade 10(1): 3-13, São Paulo/ SP. 2001 Maria Ambrosina da Costa é psicóloga, psicanalista, neuropsicóloga, especialista em psicologia clínica e psicodiagnóstico - teste de RORSCHACH, doutora em neurociência, professora universitária em cursos de graduação e pós em licenciaturas, pedagogia, administração e curso médico. Faz parte do corpo permanente de professores dos cursos de Neuroaprendizagem e Transtornos do Aprender e Psicopedagogia, coordenados pela professora Maria Irene Maluf em São Paulo – SP. E-mail: marianina59@yahoo. com.br Direcional Educador, Junho 13 Direcional Educador, Junho 13 “Perceber significa, em síntese, ser capaz de compartilhar as impressões do construto neural que é chamado de mundo.” CAPA 17 CAPA A NEUROMATEMÁTICA COMO UM NOVO PARADIGMA PARA A EDUCAÇÃO MATEMÁTICA Direcional Educador, Junho 13 18 emos observado que a capacidade de absorver e apropriar-se de adequado conhecimento matemático tem se tornado, ao longo dos anos, mais um dentre tantos outros mitos do processo de aprendizagem. Seja pelos meios de seleção profissional, acadêmica ou até mesmo social, a maioria das pessoas do planeta julga-se incapaz de resolver uma determinada situação problema que sugira a necessidade de raciocínio lógico do tipo dedutivo. Na maioria dos casos, o dilema da dificuldade de aprender matemática é inicialmente e culturalmente institucionalizado na família. Levando em consideração as escolhas dos candidatos nos cursos universitários mais elitizados, em que ter amplo domínio sobre a matemática é uma das estratégias para conquistar o espaço pleiteado pelo aluno, verifica-se o quão © Can Stock Photo Inc. / iDesign Por Laerte Fonseca suas famílias mobilizam e reforçam a necessidade da apropriação robusta dessa disciplina. Do contrário, a medida é diretamente proporcional, ou seja, o baixo nível cultural não estimula o completo interesse pela área. Tendo sido, esse último contexto, desenvolvido em função da massificação de mão de obra de baixo custo, uma quantidade significativa de pesquisadores da área de Educação Matemática – preocupados com a ameaça que pode vitimar a sociedade: o retrocesso à plena escravidão – têm apontado motivos e alternativas para o incremento de diferentes perspectivas de aprendizagem, onde respeitá-las dentro de um modelo democrático contribuiria para minimizar as frustrações escolares relacionadas ao campo em tela. Neste sentido, o ato de aprender deveria ser, em todas as instâncias, um desejo mobilizado por uma necessidade ou curiosidade. Diferentemente, a aprendizagem escolarizada obriga, por meio de uma velada violência simbólica, os seus sujeitos a se interessarem por situações ou objetos distantes, a nível de maturidade, de suas escolhas. Parece ser uma opinião coletiva que até o final do Ensino Fundamental I (EF), o processo de aprendizagem escolar deve estar imerso em ambientes lúdicos, contextualizados e desafiadores, conduzindo, de forma menos agressiva, o modelo de um determinado sistema político. Como num parto a fórceps, tal ponto de vista alimenta apenas as matrizes curriculares dos cursos de Pedagogia, excluindo-se significativamente, a formação inicial do professor de matemática nos cursos de Licenciatura. Grosso modo, pode-se conjecturar que reside nessa lacuna uma das causas para a manutenção do marketing negativo do mito da matemática escolar, onde ter que aprender fórmulas que surgem como se fossem mágicas e desconectadas do cotidiano discente representam um completo desestímulo. Segundo o pesquisador francês Guy Brousseau, são as Situações Didáticas que mobilizam os elementos res- ponsáveis pelo desenvolvimento da aprendizagem matemática. Nestas situações, todos os estilos de aprendizagem aparecem de forma espontânea, potencializando a curiosidade e criatividade dos alunos. Implementar os resultados das pesquisas de Brousseau ao longo da formação inicial do professor de matemática possibilitaria uma alternativa para a continuação do EF. No entanto, seria insensato tornar invisíveis as contribuições das Neurociências que, ao meu ver, alicerçam a teoria das Situações Didáticas. A falta de comunicação entre as “caixas pretas” dos vários centros de pesquisa que disputam suas verdades para além de uma hegemonia acadêmica tem aumentado a inércia no que se refere aos índices de reprovação, evasão e frustração escolar. É no mínimo ululante, mas faz-se necessário exemplificar, a situação em que um pesquisador da área de Educação Matemática – cético das investigações em Neurociências – é vítima da perda de memória decorrente de uma lesão cerebral traumática e, por ironia do seu próprio ceticismo, é ajudado a partir da plasticidade neuronal a recuperar a capacidade de memorizar, bem como de evocar cenas do seu passado. Curiosamente, vale ressaltar que a mesma base neurocientífica utilizada para reativar a capacidade mnemônica do cético pesquisador equivale aos avanços das pesquisas em Neuroaprendizagem, por exemplo. Sendo assim, inicia-se uma articulação entre a teoria das Situações Didáticas e as Neurociências, cujo intuito é compreender como o cérebro aprende matemática e como essa aprendizagem pode ser mobilizada fora dele pelos professores. Esse novo cruzamento, inusitado campo do saber, será compreendido como Neuromatemática. Para aprender, principalmen- “Para aprender, principalmente matemática, o cérebro precisa ser treinado.” Direcional Educador, Junho 13 CAPA 19 20 te matemática, o cérebro precisa ser treinado. Neste sentido, todos os profissionais que objetivam alguma mudança de comportamento de um indivíduo – por meio de um novo conjunto de teorias – necessitam compreender sobre as estruturas e funcionamentos neurocerebrais para viabilizá-los de forma eficaz. Nos mais diversos cotidianos das salas de aula, provavelmente, sem algum conhecimento de neurociências, o professor de matemática solicita dos seus alunos a atenção durante suas explicações, que resolvam os exercícios em casa, que evoquem os conhecimentos “aprendidos” nas séries anteriores, julgando serem esses os elementos imprescindíveis para eles aprenderem matemática. Para as neurociências, esses professores estão utilizando o primeiro tripé neuropsicológico para alicerçar o desenvolvimento da aprendizagem matemática: atenção, percepção e memória, respectivamente. Como em uma orquestra, a sinfonia fica completa quando são a eles somadas outras funções cognitivas como, por exemplo, a emoção, a sensação, a linguagem e as funções executivas. Existem milhares de neurotransmissores que se responsabilizam para acionar cada uma dessas funções cognitivas. Por conta da sobrevivência, o cérebro humano foi aperfeiçoando cada uma delas ao ponto dessas se alimentarem de situações “reais”: atividades em grupos, laboratoriais, resolução de problemas. A isso, busco conexão com a perspectiva de Brousseau quando divide a teoria das Situações Didáticas em quatro etapas: ação, formulação, validação e institucionalização. O momento da ação é a primeira fase de uma situação real, onde o cérebro se organiza para tomar uma decisão e se posicionar diante do fato. Neste momento, todo o sistema nervoso central interage instantaneamente por meio de um sistema de comunicação denominado de sinapses. CAPA Para Luria e outras lentes da Neuropsicologia, a quantidade de sinapses determina o desenvolvimento da capacidade neuronal em responder de forma criativa ao estímulo dado (situação real), propiciando, dessa forma, a aprendizagem ou mudança de comportamento. Nas outras três fases, outros sistemas cerebrais se encarregaram, no exercício de suas funções, na ativação de outros neurotransmissores responsáveis pelo planejamento, antecipação, julgamento, decisão, memória e, por fim, aprendizagem. Outro importante ponto de vista repousa sobre a teoria do psicólogo norte-americano David Ausubel, quando postula que, para uma aprendizagem tornar-se significativa, deve-se permitir que o aluno faça parte do contexto de uma situação real, possibilitando-o a percepção do sentido e significado nela envolvidos. Do ponto de vista das neurociências, esse princípio equivale a dizer que se faz necessário a ativação do sistema límbico responsável pela função da emoção. Um sujeito emocionado permite-se envolver em uma dada situação, concentrando-se no foco, evocando “flashes” semelhantes e, ao mesmo tempo, armazenando esse novo contexto de forma sólida. Desta forma, penso não ser impossível aos professores de matemática se interessarem pelas investigações das neurociências, sobretudo da Neurociência Cognitiva, levando em consideração os resultados amplamente utilizados pela área da Medicina que, municiando-se dos mesmos princípios e conceitos, luta para manter vivas muitas pessoas, inclusive professores de matemática. Por isso, convido o leitor a refletir sobre uma questão recentemente apresentada por mim num congresso internacional: A que se deve o fato das teorias em neurociência não participarem dos currículos dos cursos de Licenciatura em Matemática no Brasil? Venho observando que, paradoxalmente, existe uma forte oposição à inserção dessa nova área em campos mais cristalizados. No entanto, se por um lado a Educação Matemática vem combatendo o ensino conservador, onde métodos obsoletos ainda são utilizados por muitos de seus seguidores, penso que não poderia apresentar resistência a articulações entre Matemática, Aprendizagem e Neurociência, como forma de considerar essa tríade um novo paradigma para a formação dos futuros professores de matemática. Até porque, se são sugeridos a utilização metodológica de jogos, laboratórios, modelagem, teatralização, softwares e tantas outras formas de permitir a interação com objetos e entre pares, seria no, mínimo, contraditório não admitir que todos esses recursos estão direta ou indiretamente estimulando o completo funcionamento do principal órgão do corpo humano: o cérebro. Laerte Fonseca é Doutorando em Educação Matemática pela Universidade Bandeirante de São Paulo – UNIBAN com sandwiche na Université Claude Bernard Lyon 1 (França). Mestre em Ensino de Ciências e Matemática e Mestre em Educação, ambos pela Universidade Federal de Sergipe, Especialista em Neuroaprendizagem, Transtorno do Aprender e Psicanálise pelo INSTITUTO SABER/DF, Especialista em Neuropsicologia – UNIFESP/CDN/ SP, Especialista em Educação Matemática e em Psicopedagogia Clínica e Institucional. É consultor de cursos de pós-graduação em Educação Matemática, Psicopedagogia e Metodologia do Ensino de Matemática eProfessor do Curso de Licenciatura em Matemática do Instituto Federal de Sergipe – IFS. E-mail: [email protected] Direcional Educador, Junho 13 Direcional Educador, Junho 13 CAPA 21 REINVENTANDO PAULO FREIRE Cultura, tecnologias e acesso ao conhecimento1 Direcional Educador, Junho 13 Por Ladislau Dowbor 22 Paulo Freire nos trouxe, muito além da alfabetização, o conceito da cultura como forma de apropriação do mundo, acesso à cidadania. Ele que escrevia com aquela caneta tinteiro tradicional dele, tinha a visão da centralidade transformadora dos processos culturais. Hoje, à medida que evoluímos para a economia do conhecimento, sentimos a força destas ideias. Não há mais economia de um lado, cultura de outro. A cultura faz parte dos bens imateriais. A indústria cultural, da velha tecnologia, envolve sim grandes emissoras, equipamentos pesados e um sistema de transmissão de quem “produz” para quem “consome” cultura. Emissores de um lado, recipien- tes passivos do outro. Hoje, cada vez mais, na linha dos estudos de Alvin Toffler, na área da cultura somos todos “prosumidores”, produtores e consumidores ao mesmo tempo2. A mudança nas tecnologias da informação e da comunicação que abre estas novas opções está articulada com mudanças tecnológicas mais amplas, que estão elevando o conteúdo de conhecimento de todos os processos produtivos, e reduzindo o peso relativo dos insumos materiais que outrora constituíam o fator principal de produção. A globalização traz a ameaça da pasteurização cultural planetária. Mas as mesmas tecnologias abrem novas oportunidades para o protagonismo local e a colaboração em rede, uma reconstrução da cidadania. Convergem assim mudanças profundas. A economia evolui para a economia do conhecimento, onde o valor resulta menos dos fatores físicos de produção do que do conhecimento incorporado. A conectividade planetária da internet permite processos colaborativos extremamente descentralizados. A cultura deixa assim de ser um verniz chique para famílias ricas, ou indústria do lugar comum nos meios de comunicação de massa, para se transformar em vetor chave da apropriação não só de bens culturais produzidos pelas próprias comunidades com toda a sua diversidade, como vetor de apropriação de novas dinâmicas econômicas e de novas identidades no processo de desenvolvimento. Revolução tecnológica, economia do conhecimento, conectividade planetária e apropriação cultural estão densamente articuladas neste processo. O deslocamento do eixo principal de formação do valor das mercadorias do capital fixo para o conhecimento nos obriga a uma revisão em profundidade do próprio conceito de modo de produção. André Gorz coloca o dedo no ponto preciso ao considerar que “os meios de produção se tornaram apropriáveis e suscetíveis de serem partilhados. O computador aparece como o instrumento universal, universalmente acessível, por meio do qual todos os saberes e todas as atividades podem, em princípio, ser partilhados”. 3 Tomemos como ponto de partida o fato que hoje, quando pagamos um produto, 25% do que pagamos é para pagar o produto, e 75% para pagar a pesquisa, o design, as estratégias de marketing, a publicidade, os advogados, os contadores, as relações públicas, os chamados “intangíveis”, e que Gorz chama de ‘o imaterial’. É uma cifra vaga mas razoável, e não é a precisão que nos interessa aqui. Interessa-nos o fato do valor agregado de um produto residir cada vez mais no conhecimento incorporado. Ou seja, o conhecimento, a informação organizada, a atividade cultural, representam um fator de produção, um capital econômico de primeira linha. A lógica econômica do conhecimento, no entanto, é diferente da que rege a produção física. O produto físico entregue por uma pessoa deixa Direcional Educador, Junho 13 Foto: Arquivo Instituto Paulo Freire REINVENTANDO PAULO FREIRE 23 24 de lhe pertencer, enquanto um conhecimento passado a outra pessoa continua com ela, e pode estimular na outra pessoa visões que irão gerar mais conhecimentos e inovações. Em termos sociais, portanto, a sociedade do conhecimento acomoda-se mal da apropriação privada: envolve um produto que, quando socializado, se multiplica. Abre-se uma imensa oportunidade de inclusão produtiva através do conhecimento livremente acessível. De certa maneira, temos aqui uma grande tensão, de uma sociedade que evolui para o conhecimento, a densidade cultural, mas regendo-se por leis da era industrial. O essencial aqui, é que o conhecimento é indefinidamente reproduzível, e por tanto só se transforma em valor monetário quando apropriado por alguém, e quando quem dele se apropria coloca um pedágio, “direitos”, para se ter acesso. Para os que tentam controlar o acesso ao conhecimento, este só tem valor ao criar artificialmente, por meio de leis e repressão e não por mecanismos econômicos, a escassez. Por simples natureza do processo, a aplicação à era do conhecimento das leis da reprodução da era industrial trava o acesso. Curiosamente, impedir a livre circulação de ideias e de criação artística tornou-se um fator, por parte das corporações, de pedidos de maior intervenção do Estado. Os mesmos interesses que levaram a corporação a globalizar o território para facilitar a circulação de bens, levam-na a fragmentar e a dificultar a circulação do conhecimento. A questão central de como produzimos, utilizamos e divulgamos o conhecimento envolve portanto um dilema: por um lado, é justo que quem se esforçou para desenvolver conhecimento novo seja remunerado pelo seu esforço. Por outro lado, apropriar-se de uma ideia como se fosse um produto material termina por matar o esforço de inovação. A propriedade intelectual não tem limites? Numa universidade americana, com a compra das revistas científicas por grandes grupos econômicos, um professor que distribuiu aos seus alunos cópias do seu próprio artigo foi considerado culpado de pirataria. Poderia quando muito exigir dos seus alunos que comprem a revista onde está o seu artigo. Todos conhecem o absurdo de patentes sobre segmentos de DNA, de bactérias, sementes e outras formas de vida, copyrights sobre criação intelectual que se estendem até 70 ou mais anos depois da morte do autor e semelhantes. Pela lei vigente no Brasil, os textos de Paulo Freire estarão livremente disponíveis apenas a partir de 2050! Estamos na realidade travando a difusão do progresso, em vez de facilitá-la. Lessig parte da visão – explícita na Constituição americana – de que o esforço de desenvolvimento do conhecimento deve ser remunerado, mas o conhecimento em si não constitui uma “propriedade” no sentido comum. Por exemplo, numerosos copyrights são propriedade de empresas que por alguma razão não têm interesse em utilizar ou desenvolver o conhecimento correspondente, ficando assim uma área congelada. Em outros países, prevalece o princípio de “use it or lose it”, de que uma pessoa ou empresa não pode paralisar, através de patentes ou de copyrights, uma área de conhecimento. O conhecimento tem uma função social. O meu carro não deixa de ser meu se eu o esqueço na garagem. Mas ideias são diferentes, não devem ser trancadas, o seu desenvolvimento por outros não deve ser impedido. Um texto de 1813 de Thomas Jefferson, citado no texto de Lessig, é neste sentido muito eloquente: “Se há uma coisa que a natureza fez que é menos suscetível que todas as outras de propriedade exclusiva, esta coisa é a ação do poder de pensamen- to que chamamos de ideia... Que as ideias devam se expandir livremente de uma pessoa para outra, por todo o globo, para a instrução moral e mútua do homem, e o avanço de sua condição, parece ter sido particularmente e de maneira benevolente desenhado pela natureza, quando ela as tornou, como o fogo, passíveis de expansão por todo o espaço, sem reduzir a sua densidade em nenhum ponto, e como o ar no qual respiramos, nos movemos e existimos fisicamente, incapazes de confinamento, ou de apropriação exclusiva. Invenções não podem, por natureza, ser objeto de propriedade.” 1. A presente nota se apoia no capítulo Economia do Conhecimento, do ensaio Democracia Econômica, http://dowbor.org , edição revista e atualizada, 2012 2. Alvin & Heidi Toffler, Revolutionary Wealth, Doubleday, New York 2006 3. André Gorz – O Imaterial: conhecimento, valor e capital – Ed. Annablume, São Paulo, 2005, p. 21. O original francés, L’immatériel, foi publicado em 2003 Ladislau Dowbor, formado em economia política pela Universidade de Lausanne, Suiça. Doutor em Ciências Econômicas pela Escola Central de Planejamento e Estatística de Varsóvia, Polônia (1976). Atualmente é professor titular no departamento de pós-graduação da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, nas áreas de economia e administração. Continua com o trabalho de consultoria para diversas agências das Nações Unidas, governos e municípios, além de várias organizações do sistema “S” (Sebrae e outros). Atua como Conselheiro no Instituto Polis, CENPEC, IDEC, Instituto Paulo Freire e outras instituições. www.dowbor.org Direcional Educador, Junho 13 Direcional Educador, Junho 13 REINVENTANDO PAULO FREIRE 25 CURSO CURSO MÓDULO V SOBRE A ARTE A ARTE E A INFÂNCIA iver, observar, captar o momento, registrar a vivência, transformando-a por meio do sentimento, do significado que o instante pode trazer para aquele que vive. Viver a natureza, a música, a cor, o poema, o impacto, o trauma, a alegria. Não importa o quê, mas viver, perceber e perceber-se, deixar-se tocar e traduzir em uma linguagem artística, registrar e expressar a fugacidade do que se experimenta. Assim é o artista; assim se faz Arte! Uma obra de arte apura os sentidos e harmoniza o mundo interno de quem a produz e de quem a aprecia. E como levar esta profundidade para a Escola de Educação Infantil? Em muitos livros de arte, encontramos uma palavra que é fundamental para respondermos a essa pergunta: laboratório. Fala-se em laboratório da alma, laboratório de contemplação, laboratório de experimentação, laboratório de interpretações e assim por diante. Com essa palavra, podemos imaginar crianças muito pequenas aprendendo a olhar, observar, experimentar e, a partir disso, expressando-se de alguma forma. Se elas contarem com um mediador sensível, capaz de dar significado às suas expressões, seu olhar pode ir se apurando, harmonizando, transformando-se em um olhar mais curioso, mais ousado e mais apurado. É exatamente assim que experiência e arte combinam-se para que seja possível outra combinação encantadora: aquela da criança com a arte. Conhecendo escolas do Brasil, especialmente as que trabalham fundamentadas em Freinet, trabalhando em uma escola na qual a arte é um saber importante, conhecendo as escolas para a infância em Reggio Emilia (na Itália), podemos afirmar que é possível desenvolver um trabalho com artes e experimentação, capaz de aproximar crianças pequenas da Arte, oportunizar espaços de experimentação e expressão artística. São os laboratórios ou os ateliês que vão possibilitar essa magia. O ATELIÊ DE ARTE NA ESCOLA Um ateliê, ou atelier, é um lugar onde trabalham artesãos ou artistas; pessoas que se dedicam à criação artística. No Brasil, na maioria das escolas, as aulas de artes são ministradas pela professora de classe, sem um espaço especial para desenvolver as tarefas por ela propostas. Não raras vezes, nos murais de exposição, vemos expostas obras realizadas pelas crianças, fazendo releituras de obras de artistas, interpretando obras específicas, mas criando pouco. Nas exposições, vemos, por exemplo, repetições dos Girassóis, de Van Gogh, ou de obras de Tarsila do Amaral, tantas vezes quantos forem os alunos da classe. Todas usando tons parecidos, tentando reproduzir a obra original. Será que essa forma de trabalho, tão difundida nas escolas e, principalmente, nas de Educação Infantil, é de fato uma forma de trabalhar a sensibilidade necessária para a expressão artística? Propõe a observação, a contemplação, a experimentação? 1 8 As escolas que fundamentam sua ação educativa e pedagógica na obra de Célestin Freinet utilizam-se de aulas práticas em ateliês, como dança, música, teatro, artes plásticas, origami e outras. Freinet acreditava que, a partir de uma aula-passeio, por exemplo, era possível existirem diferentes formas de relato, de pesquisa e de expressão. Nas escolas da Reggio Emília, esse pensamento relacionado à expressão artística das crianças revela uma forma autêntica de trabalhar este binômio criança/arte. Vimos que arte é fruto de uma capacidade sensível de captar o momento, de senti-lo, de emocionar-se com ele e, por isso, expressar-se. Então, precisamos de aulas de artes muito mais complexas, para além das releituras ou das aprendizagens de técnicas. Conhecer a obra de Tarsila do Amaral, por exemplo, vivenciar uma exposição, quando isso é possível, manuseá-la em livros de Arte ou catálogos de exposições; conhecê-la em um vídeo, saber da vida dela por meio de histórias que a professora pode contar, em pequenas sessões de contação de histórias. Isso tudo pode fazer com que as crianças mergulhem num universo específico, colorido, com predomínio de determinadas cores e formas; percebam um estilo; conheçam o momento em que eles foram produzidos. Porém e principalmente, pode fazer com que identifiquem o que sentem ao adentrar esse universo, o que lhes emociona... Assim, podem manipular materiais semelhantes ao que a artista utilizou e, então, criar, produzir a sua forma de expressar-se sem, necessariamente, tentar reler uma obra. Parece-nos mais autêntico lidar com a arte como as crianças italianas fazem desde muito cedo; algumas, ainda engatinhando. Apreciamos lá um trabalho que nasceu de uma exposição denominada Murchidas, de uma artista plástica que expôs, na cidade, esculturas com panos enrugados, dando formas arredondadas, que ficavam penduradas, lembrando partes do corpo humano. Sua intenção era fazer pensar sobre as coisas murchas, enrugadas pelo tempo... O Instituto Malaguzzi, responsável pela documentação da metodologia utilizada no sistema de ensino de Reggio Emilia, levou parte dessa exposição para suas dependências, promoveu uma exposição para que as crianças da Educação Infantil pudessem visitá-la. Ao final da exposição, à espera das crianças... um ateliê! Mesas baixas, juntas, formando uma longa mesa; sobre elas, cestas pequenas. Algumas, contendo frutas em vários momentos de decomposição até a sua versão murcha, seca. Em outras, sementes, folhas em vários estágios do verde até sua forma outonal, avermelhada. No início do caminho delineado pela mesa, no chão, havia uma grande cesta, com panos de diferentes texturas. No final da grande pequena mesa, uma mesa um pouco mais alta, perpendicular à anterior, onde se encontravam papéis de várias texturas, de diferentes cores e materiais para a execução, tais como: lápis pretos, brancos, coloridos, colas, tesouras e outros. Nesse caso, o ateliê propunha uma autoria a respeito de coisas murchas, inspiradas nas obras da exposição pela qual passearam e puderam observar, perguntar, tocar, admirar... A proximidade da arte não visa à reprodução, mas ao exercício da sensibilidade e da expressão. A partir de experiências como essas, na Itália e em outros países, resolveu-se desenvolver projetos de escolas de Educação Infantil nas quais exista um espaço especial para o desenvolvimento da expressão artística e um profissional artista para desenvolver esse trabalho. A esse profissional deu-se o nome de “atelierista”, responsável por desenvolver, no corpo docente, um olhar diferente para a arte na escola. Sabemos que estamos no Brasil e que aqui é diferente de lá e de qualquer outro país, mas sabemos também que podemos nos inspirar nessas vivências para modificarmos a nossa. Para que as crianças possam experimentar, um ateliê deve ser um espaço no qual existem muitos materiais. Embora oferecendo muitas possibilidades, um ateliê deve ser organizado e oferecer condições de trabalho às crianças: mesas de sua altura, espaço no chão, armários organizadores com coleções de materiais ao alcance das crianças, além do que for necessário em determinada escola, cidade e cultura. Em algumas escolas, também existem retroprojetor, computador, multimídia, máquina fotográfica e outros instrumentos que auxiliam no desenvolvimento artístico e de várias linguagens expressivas. Ao contar nossas histórias e refletir sobre elas juntos, encontramos linhas comuns. [...] reconhecemos a importância da beleza e ordem na vida das crianças – e em nossas vidas. O belo nos inspira a manter a ordem. O belo nos inspira a arranjar e rearranjar os materiais e espaços. O belo nos inspira a aperfeiçoar nossas ideias e nossos ambientes. O belo nos inspira a olhar as coisas mais de perto. Os ateliês são espaços de aprendizagem inspiradores para todos nós. Também reconhecemos que, à medida que trabalhávamos para efetuar mudanças em nossos diversos ambientes, também éramos transformados como indivíduos e como grupo. [...] É a história de aprender a ouvir e desafiar uns aos outros, de respeitar o trabalho uns dos outros e de estar disposto a aprender juntos; finalmente, é a história de “ser e pertencer” (GALARDINI; GIOVANI apud BAKER et al., in GANDINI et al., p. 150). No livro Bambini Arte Artisti (REGGIO, 2003), podemos ver crianças de dois anos explorando a cor preta e a cor branca em diversos materiais. Deixam marcas nos materiais, como amassados, rasgos, enrolados, e o atelierista, ou o professor, registra com fotos, com desenhos, acomoda as produções das crianças em bases e, com a produção de mais de uma criança, propõe composições que ficam muito belas. Juntamente 1 9 CURSO com isso, registra as falas das crianças, suas perguntas, seus diálogos. No momento de expor, muitas vezes, essas falas são expostas, acompanhando a obra de arte que resultou da experiência. Em outro grupo, o experimento é diferente: luzes e plásticos de diversas espessuras e texturas. Muitas possibilidades, movimentos, riscos efêmeros que, com o movimento da fonte de luz, deixam-se existir; registros de diversas formas e o surgimento da poesia. O papel do professor de Educação Infantil, nesse sentido, não é ensinar, e sim preparar o ambiente, os materiais, registrar o que observa e pensar novas possibilidades de linguagem expressiva, a fim de oferecer novas possibilidades de experimentação aos alunos. Na escola em que trabalhamos, apesar de existir um predomínio da releitura nas artes plásticas, em diversas classes, já podemos ver a existência de outras linguagens, as quais permitem a invenção de máquinas, a instalação de algumas invenções, a construção de móbiles e outras produções que expressam as ideias e os sentimentos das crianças. Toda escola poderia encontrar um espaço que esteja pouco explorado e possa transformar-se em um ateliê; aí, nesse espaço, pode-se iniciar um trabalho de equipe e de criação do corpo docente da Educação Infantil. Então, com a orientação de um artista ou atelierista, terá potencial para se tornar uma fábrica de pessoas observadoras, sensíveis ao seu contexto, expressivas e criativas. ARTISTAS E PROFESSORES – QUANTAS POSSIBILIDADES! Poetas, escultores, pintores, dançarinos, músicos, atores são pessoas bem vindas às escolas de Educação Infantil, pois eles podem alimentar o repertório dos professores e, com isso, ampliar as possibilidades de aumento das linguagens expressivas das crianças. 20 Loris Malaguzzi, criador da metodologia utilizada nas escolas de Reggio Emília, previa para o professor: Para nós, o ateliê tinha que se tornar parte de um projeto complexo e, ao mesmo tempo, um espaço adicional para procurar, ou melhor, escavar com as próprias mãos e a própria mente, e para refinar com os próprios olhos, pela prática das artes visuais. Ele tinha que ser um lugar para sensibilizar o gosto e o sentido estético da pessoa, um lugar para exploração individual de projetos conectados com experiências planejadas nas diferentes salas de aula da escola. O ateliê tinha que ser um lugar para pesquisar motivações e teorias das crianças a partir de suas garatujas, um lugar para explorar variações em instrumentos, técnicas e materiais que usamos para trabalhar. [...] Estamos convencidos de que, no caso de crianças e adultos, era válido usar a regra de David Hawkins, que disse que era necessário familiarizar-se primeiro com o usar diretamente o que se sabe, o que se aprendeu, para aprender mais e adquirir mais conhecimento (GANDINI in GANDINI et. al. 2012, p. 22-23). Dessa forma, podemos dizer que, ao professor, cabe disponibilizar-se para experimentar, para viver a estética, para criar, conhecer possibilidades e, assim, transformar-se para permitir às crianças o desenvolvimento de muitas e muitas linguagens expressivas existentes em nosso mundo. Se o adulto não conseguir deixar-se tocar pela arte, não conseguirá permitir que as crianças refinem seu olhar para seu contexto, busquem ver o que não é visível e tentem deixar visível aquilo que apreenderam no instante em que encontraram o significado de um olhar, de uma ação, de um movimento, de uma palavra, de uma cor... Se você, professor, quiser mais informações sobre escolas diferentes, busque o site: www.reggiochildren.it. Referências bibliográficas BAKER, P. M. et al. Vozes do ateliê. Histórias de transformação. In: GANDINI L. et. al. O papel do ateliê na educação infantil. A inspiração de Reggio Emilia. 2012. GANDINI, L. Do começo do ateliê aos materiais como linguagem. Conversas a partir de Reggio Emilia. In: GANDINI L. et al. O papel do ateliê na educação infantil. A inspiração de Reggio Emilia. 2012. REGGIO CHILDREN. Centro internazionale per la difesa e la promozione dei diritti e delle potenzialità dei bambini e delle bambine. Bambibi arte artisti. I linguaggi espressivi dei bambini, il linguaggio artístico di Alberto Burri. Reggio Emilia, IT: Reggio Children srl, 2003. Leitura Habilidades ASPECTOS NEUROBIOLÓGICOS DA APRENDIZAGEM E DOS TRANSTORNOS DA APRENDIZAGEM Direcional Educador, Junho 13 ASPECTOS NEUROBIOLÓGICOS DA APRENDIZAGEM 30 Na perspectiva neurológica e neuropsicológica, a linguagem e a aprendizagem constituem formas complexas de comportamento que exigem integridade de áreas cerebrais consideradas necessárias para a sua aquisição e o seu desenvolvimento. Para a ocorrência do processamento das habilidades da leitura, da escrita e do cálculo-matemático é necessária a interação entre várias áreas do Sistema Nervoso Central – SNC, conforme apresentado no quadro 1. Área Cerebral Função Lobo Frontal Discriminação visual complexa (fechamento visual da palavra escrita). Decodificação fonológica. Execução da palavra falada. Lobo Occipital Visualização da palavra escrita. Áreas de Associação do Hemisfério Esquerdo Leitura e compreensão do material lido. Compreensão do vocabulário. Lobo Temporal Análise fonológica da palavra (segmentação das unidades que a compõem) Junção do Lobo Temporal Análise visual da palavra – interpretação direta da palavra, e Lobo Occipital ou seja, transferência direta da análise ortográfica para o significado. Cálculo-Matemático Por Simone Aparecida Capellini uitas condições de origem genético-neurológicas contribuem desfavoravelmente para que os escolares em fase de alfabetização apresentem dificuldades específicas para ler e escrever, que incluem desde a falta de atenção, a alteração de memória, as falhas na discriminação e percepção auditiva e visual que podem de forma direta ou indireta ocasionarem dificuldades de aprendizagem acadêmica. Entre estas condições determinadas genética e neurologicamente encontram-se a dislexia do desenvolvimento e o transtorno de aprendizagem. Apesar destas condições serem distintas, elas acarretam prejuízos acadêmicos que comprometem o uso de habilidades cognitivas e linguísticas que merecem ser identificadas e tratadas precocemente tanto no contexto clínico e educacional. Desta forma, compreender os chamados transtornos de aprendizagem, específico, como a dislexia, e global, como o transtorno de aprendizagem, também conhecido como distúrbio de aprendizagem, que envolvem crianças que não aprendem ou que não realizam tarefas acadêmicas de forma satisfatória, vai além da compreensão do professor, do fonoaudiólogo, psicólogo ou psicopedagogo. Essa compreensão abrange o entendimento, por parte destes profissionais, de que fatores neurológicos, neuropsicológicos, cognitivos e linguísticos estão inter-relacionados e susceptíveis à interferência sociocultural e pedagógica (no caso específico da metodologia de alfabetização) para a determinação do sucesso ou do fracasso escolar. Diante do exposto acima, este artigo tem por objetivo discorrer sobre os fatores neurobiológicos da aprendizagem e dos transtornos da aprendizagem. CAPA Lobo Frontal Decodificação fonológica. Programação motora Lobo Occipital Discriminação visual dos símbolos gráficos Lobo Parietal Habilidade de sequencialização dos símbolos gráficos. Áreas de Associação do Hemisfério Esquerdo Leitura e compreensão de problemas verbais. Compreensão de conceitos e procedimentos matemáticos. Lobo Frontal Cálculos mentais rápidos, conceitualização abstrata, habilidades de solução de problemas, execução oral e escrita de cálculos. Lobo Parietal Habilidade de sequencialização numérica. Lobo Occipital Discriminação visual dos símbolos matemáticos escritos. Lobo Temporal Percepção auditiva, memória verbal de longo prazo. Memória de séries, realizações matemáticas básicas. Subvocalização durante a solução de problemas. Quadro 1 – Áreas do SNC envolvidas no processamento das habilidades de leitura, de escrita e do cálculo matemático ASPECTOS NEUROBIOLÓGICOS DOS TRANSTORNOS DE APRENDIZAGEM Quando é evidenciada a presença de dislexia do desenvolvimento e do transtorno de aprendizagem, deve ser considerada a presença de disfunções neuropsicológicas que acometem as áreas do SNC que ocasionam falhas na decodificação, processamento, programação e execução da leitura, da escrita e do cálculo-matemático (CAPELLINI, 2006; CAPELLINI, 2007). O quadro 2 apresenta as áreas do SNC, as suas respectivas funções e as principais manifestações presentes tanto na dislexia como no transtorno de aprendizagem na presença de disfunções. Direcional Educador, Junho 13 CAPA 31 CAPA CAPA Função Disfunção Occipital Processar memória visual e viso-motora. Discriminação visual. Memória visual. Integração viso-construtiva e espacial. Dificuldade na visualização da letra e do número. Velocidade de leitura lenta. Temporal Processar memória auditiva. Transtorno fonológico. Alterações fonológicas na fala, leitura e escrita. Dificuldades em nomeação (vocabulário receptivo e expressivo). Dificuldade no acesso semântico. Dificuldade na estruturação da sentença. Perietal Integrar imagens espaciais com experiências sensoriais. Sequencializar informações auditivas, visuais e motoras (linguagem oral e escrita). Comprometimento sensorial e cognitivo. Escrita com erros de reversão/rotação (p-q; b-d) e erros de inversão (p-b; u-n; w-m) na escrita e nos números (6-9). Dificuldade com fórmulas matemáticas. Alteração na fluência e velocidade da leitura (erros de decodificação). Frontal Abstração. Discriminação visual complexa (fechamento visual). Tarefas viso-posturais. Julgamento social. Controle emocional Diminuição da abstração sem comprometimento intelectual. Dificuldade na atenção seletiva e sustentada. Dificuldade para focalizar a letra e o número. Dificuldade para completar série de problemas ou fórmulas. Alteração na velocidade e exatidão da leitura e escrita. Direcional Educador, Junho 13 Quadro 2 – Áreas do SNC, suas respectivas funções e as principais manifestações na presença de disfunções 32 A dislexia é considerada um transtorno específico de aprendizagem, de origem genética e neurológica, caracterizada pela dificuldade com a fluência correta na leitura e dificuldade na habilidade de decodificação e soletração, resultantes de um déficit no componente fonológico da linguagem. Ainda sobre a definição, é importante ressaltar que há escolares com dislexia que apresentam déficits cognitivos e acadêmicos em outras áreas, como a atenção, matemática e/ou soletração e expressão escrita ou ainda a habilidade de usar informações suprasegmental (rima e prosódia) na generalização da soletração de sons na correspondência de palavras (DESROCHES, JOANISSE, ROBERTSON, 2004). Diferentemente da dislexia, o transtorno de aprendizagem é uma expressão genérica que se refere a um grupo heterogêneo de alterações manifestadas por dificuldades significativas na aquisição e no uso da audição, fala, leitura, escrita, raciocínio ou habilidades matemáticas. Tanto a dislexia como o transtorno de aprendizagem apresentam como manifestações alterações intrínsecas ao indivíduo e presumivelmente devidas à disfunção do SNC. Jamais estas condições genético-neurológicas podem ser confundidas com as chamadas dificuldades de aprendizagem, pois estas, apesar de apresentarem alterações de leitura, de escrita e de cálculo-matemático similares, não possuem caráter intrínsecos ao indivíduo (CAPELLINI, 2012), como é possível verificar no quadro 3. Problemas de Aprendizagem Dificuldades de Aprendizagem Transtornos de Aprendizagem (Dislexia e Distúrbio de Aprendizagem) Fatores desencadeantes Fatores agravantes - Fatores relacionados à metodologia de alfabetização - Fatores Emocionais - Fatores sócio-econômico-cultural - Fatores relacionados à metodologia de alfabetização - Fatores Emocionais - Fatores sócio-econômico-cultural - Fatores genéticos - Fatores neurológicos - Fatores relacionados à metodologia de alfabetização - Fatores Emocionais - Fatores sócio-econômico-cultural Quadro 3 – Fatores agravantes e desencadeantes dos problemas de aprendizagem (CAPELLINI, 2010) CONSIDERAÇÕES FINAIS Referências bibliográficas Compreender a correlação neurobiológica e educacional envolvida tanto na dislexia como no transtorno de aprendizagem tem sido o desafio de pesquisadores da área da medicina, fonoaudiologia, psicologia e psicopedagogia interessados no maior entendimento das alterações estruturais que estes escolares apresentam e que comprometem de uma forma significativa o processamento de sons verbais (fonemas, palavras), não-verbais e tarefas visuais. Todavia, uma das maiores contribuições dos estudos realizados nas áreas acima citadas foi o entendimento de que a dislexia e o transtorno de aprendizagem têm sua origem determinada biologicamente, significando que os mesmos não são consequência de um problema ambiental ou social, e que, portanto, não podem ser confundidos com as chamadas dificuldades de aprendizagem. Infelizmente, ainda é comum no contexto clínico e educacional a confusão terminológica entre os transtornos de aprendizagem e as dificuldades de aprendizagem e isto ainda ocorre por um desconhecimento das implicações da neurobiologia no processo de ensino-aprendizagem dos escolares em situação de sala de aula. Somente a partir da compreensão das áreas corticais envolvidas na aprendizagem do escolar se poderá possibilitar o conhecimento dos diferentes perfis de leitura, escrita e cálculo-matemático destes escolares, o que evitará a confusão diagnóstica e suas consequências, que geralmente afetam a qualidade de vida das crianças no contexto familiar, social e educacional. BREIER, J.I., SIMOS, P.G., FLETCHER, J.M., CASTILHO, E.M., ZHANG, W., PAPANICOLAU, A.C. Abnormal activation of temporoparietal language areas during phonetic analysis in children with dyslexia. Neuropsychol., v. 17, 610-621. 2003 CAPELLINI, S.A. Dificuldades de Aprendizagem. In: GERMANO, G.D.; PINHEIRO, F.H.; CAPELLINI, S.A. (Org.). Dificuldades de Aprendizagem: olhar multidisciplinar. Dificuldades de Aprendizagem: olhar multidisciplinar. 1ed. Curitiba-PR: Editora CRV, 2012, p. 9-18. CAPELLINI, S.A. Aspectos cognitivo-linguísticos e sua relação com os transtornos de aprendizagem. In: RIBEIRO DO VALLE, L.E.L.; ASSUMPÇÃO Jr., F.; WAJNSZTEJN, R.; MALLOY-DINIZ, L.F. (Org.). Aprendizagem na atualidade, neuropsicologia e desenvolvimento na inclusão. Ribeirão Preto - SP: Editora Novo Conceito, 2010, p. 155-171. CAPELLINI, S.A. Diagnostic criteria in learning disabilities. In: CAPELLINI, S.A. (Org.). Neuropsycholinguistic Perspectives on Dyslexia and other Learning Disabilities. Neuropsycholinguistic Perspectives on Dyslexia and other Learning Disabilities. 1ed.New York: Nova Science Publisher, 2007, p. 45-54. CAPELLINI, S A. Abordagem neuropsicológica da dislexia. In: MELLO, C.B.; MIRANDA, M.C.; MUSZKAT, M. (Org.). Neuropsicologia do desenvolvimento: conceitos e abordagens. São Paulo: Mennon Edições Científicas, 2006, p. 162-179. LURIA, A.R. Neuropsychology of memory. Moscow: Pedagogika Publishing House; 1973. HAMMILL, D.D.; LEIGH, J.; McNUTT, G.; LARSEN, S.C. A new definition of learning disabilities. J. Learn. Disab., v. 20, p. 109-113, 1987. Simone Aparecida Capellini é fonoaudióloga. Professora Livre-Docente em Linguagem Escrita. Docente do Departamento de Fonoaudiologia da Faculdade de Filosofia e Ciências da Universidade Estadual Paulista- FFC/ UNESP (Marília – SP). Docente do Programa de Pós-Graduação em Educação e do Programa de Pós-Graduação em Fonoaudiologia da Faculdade de Filosofia e Ciências da Universidade Estadual Paulista- FFC/ UNESP (Marília – SP). Coordenadora do Laboratório de Investigação dos Desvios da Aprendizagem – LIDA/FFC/UNESP (Marília – SP). Bolsista de Produtividade em Pesquisa do CNPq. E-mail: [email protected] Direcional Educador, Junho 13 Áreas Cerebrais 33 CAPA CAPA entre a Neurociência e o Direito Direcional Educador, Junho 13 Por Rogerio Neiva Pinheiro 34 ão é preciso fazer um intenso esforço intelectual para concluir que a Neurociência e o Direito estão com um encontro marcado. A influência que vários conceitos e construções neurocientíficas podem exercer nas ciências jurídicas é capaz de provocar uma verdadeira revolução em vários campos do Direito. E alguns fundamentos apontam que este caminho é mais do que natural. Primeiramente, não se pode negar que a neurociência trata-se de um campo do saber em franca e intensa expansão. Há um enorme consenso nos segmentos científicos de que as últimas décadas estão sendo chamadas de décadas do cérebro. Vários fatores contribuem para isto, merecendo destaque os avanços proporcionados por pesquisas relevantes viabilizadas pelos exames de imagem. Décadas atrás as pesquisas sobre o funcionamento cerebral eram desenvolvidas a partir de procedimentos totalmente invasivos e agressivos, sendo que “... novas formas não invasivas de visualização do cérebro humano em atividade ajudaram os neurocientistas a analisar a anatomia do pensamento e do comportamento.” (JONES, Allan R. e OVERLT, Caroline C.. Mapeando o Cérebro. MsCIENTIFIC American/Mente e Cérebro, Dueto, No. 34, pág. 32). Assim, atualmente, os exames de imagem praticamente proporcionaram o estabelecimento de novos paradigmas. Por outro lado, cada vez mais caminhamos no sentido da interdisciplinariedade. A realização de audiências públicas pelo Supremo Tribunal Federal para ouvir e colher informações de cientistas e pesquisadores de diversas áreas, como nos casos do julgamento envolvendo as pesquisas com células-tronco e sobre as cotas raciais em universidades públicas, trata-se de exemplos emblemáticos da importância da interdisciplinariedade. Mas pensando especificamente no impacto que a Neurociência pode provocar no Direito, sem prejuízo de outros, há dois aspectos merecedores de destaque. O primeiro consiste na compreensão neurocientífica dos comportamentos. O segundo corresponde às perspectivas e possibilidades de leituras de pensamento e memórias episódicas. Quanto à compreensão do comportamento, a Neurociência vem nos proporcionando uma compreensão nunca antes imaginada. Até mesmo a psicanálise, que tem como pretensão compreender os elementos inconscientes que carregamos e os quais influenciam nossos comportamentos, está em processo de reflexão, de modo a promover, por exemplo, uma releitura de Freud a partir da Neurociência (O Mestre dos sonhos à casa torna: revisitando Freud. RIBEIRO, Sidarta. in Neurociências, Volume 07, no. 04, out/dez de 2011, pg. 237). Mas o fato é que as construções neurocientíficas nos permitem entender nossas atitudes e vontades sob outro prisma. Conforme sustenta o festejado neurocientista e neurologista português Antonio Damásio, “...a vontade de viver oculta nas células corpo pôde um dia traduzir-se em uma vontade consciente surgida na mente. As vontades ocultas, celulares, passaram a ser ilimitadas por circuitos cerebrais... O fato de que o corpo é o tema dos neurônios e do cérebro também sugere o modo como o mundo externo poderia ser mapeado no cérebro e na mente....” (E o cérebro criou o homem. São Paulo: Companhia das Letras, 2011,p. 57). Isto é, nossas ações, nossas manifestações de vontade, nossas condutas passíveis de serem enquadradas nas normas penais, são resultados de interações entre neurônios e determinados neurotransmissores, bem como fruto da ação de determinadas áreas do cérebro. Olhando por outro ângulo, também são frutos de equilíbrios e desequilíbrios bioquímicos. Assim, por trás de uma conduta juridicamente geradora de repercussões, de imagens, e deveriam atribuir notas. Ao se analisar as notas atribuídas aos programas, estas foram elevadas para o programa instrutivo e contidas para o reality show. Porém, ao se analisar as imagens, o que se constatou foi o contrário, ou seja, no momento do reality show as pessoas ativavam áreas do cérebro responsáveis pela satisfação, comparativamente com o que ocorria quanto ao outro programa. Assim, a conclusão foi de que as pessoas passavam uma mensagem, mas o cérebro passava outra divergente (MARTIN, Lindstrom. A lógica do consumo. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2009, p. 150). Outra contribuição importante envolve a possibilidade de leitura dos pensamentos. E nisto não se pode ignorar os grandes avanços que estão em andamento por parte da neurociência. Conforme notícia publicada na revista Mente e Cérebro, “...em um futuro próximo, pessoas que perderam a fala poderão se comunicar através da mente; técnicas sofisticadas devem ajudar a descobrir se pacientes em estado vegetativo estão conscientes, reconstruir sonhos e até revelar o que se passa na cabeça dos animais.” (A ciência que lê pensamentos. Ano XIX, No. 236, p. 25). Outro dado indicativo dos avanços neste campo consiste nas pesquisas lideradas pelo referenciado neurocientista brasileiro Miguel Nicolelis, responsável pelo projeto “Walk Again”, o qual tem como base a conversão de impulsos neuroelétricos em comandos motores para equipamentos capazes de movimentar o corpo. Segundo sustenta Nicolelis em seu livro, “...nas próximas décadas, ao combinar essa visão relativística do cérebro com nossa crescente capacidade tecnológica de ouvir e decodificar sinfonias neuronais cada vez mais complexas, a neurociência acabará expandindo a limites quase inimagináveis a capacidade humana...” (Muito além do nosso Eu. São Paulo: Compa- nhia das Letras, 2011, p. 22). Saliento que as pesquisas mencionadas não envolvem os antigos polígrafos, polêmicos, precários e dotados de duvidosa precisão científica. Trata-se de uma conversão de impulsos neurais em outra modalidade de linguagem, de modo a identificar a mensagem neuroelétrica. Portanto, o encontro do Direito com a Neurociência trata-se de um evento natural, contra o qual não há como se opor. Como Juiz, estou aguardando o dia em que terei um equipamento à minha disposição na sala de audiências, para utilizar durante interrogatórios, com a intenção de ler os impulsos neurais produzidos na mente das testemunhas, de modo a captar as suas memórias episódicas relacionadas aos fatos controvertidos no processo judicial. Não tenho dúvida de que isto contribuiria com a busca da verdade real e com o fim da prática do crime de falso testemunho, além de otimizar a colheita da prova. Ou seja, estou aguardando o dia do encontro entre o Direito e a Neurociência! Rogerio Neiva Pinheiro é Juiz do Trabalho, ex-procurador de Estado, ex-advogado da União. É pós-graduado em Direito Público, Administração Financeira, Psicopedagogia Clínica e Institucional e em Neuroaprendizagem e Distúrbios do Aprender pelo Instituto Saber. Editor do blog www.concursospublicos.pro.br E-mail: [email protected] Direcional Educador, Junho 13 Um encontro marcado como por exemplo a assinatura de um contrato que materializa uma manifestação de vontade, há uma complexa estrutura neural, fruto da ação integrada de várias partes funcionais do cérebro e atuação das células neurais. Por conseguinte, entender o que está por trás das ações em termos neurocientíficos, pode facilitar a real compreensão da verdadeira, em termos neurais, intenção do agente, o que é fundamental para áreas como o âmbito do Direito Penal. Partindo da premissa de que há crimes nos quais a intenção do agente é determinante para o reconhecimento da conduta criminosa, compreender neurocientificamente o verdadeiro fim da conduta é crucial para o reconhecimento ou não da existência de ato criminoso. Em outra direção, pensando na resolução de conflitos levados ao Poder Judiciário em busca da pacificação social, saber quais são as verdadeiras causas do litígio judicializado, em termos neurocientíficos, pode ajudar significativamente na busca da conciliação entre as partes. Há um campo do conhecimento denominado Resolução Alternativa de Disputas, o qual guarda relação com o Direito Processual, que enxerga na mediação judicial um relevante mecanismo para a solução dos conflitos judicializados. E neste sentido, a compreensão das verdadeiras razões que levaram ao surgimento do litígio pode contribuir significativamente com a sua pacificação. Até porque nem sempre aquilo que é exteriorizado é a realidade do que está ocorrendo em termos mentais. Em pesquisa recente realizada na Inglaterra, um grupo de pessoas havia sido colocado para assistir dois programas de TV, um mais sério e instrutivo e outro no estilo de reality show, menos valoroso intelectualmente. As pessoas estavam com o cérebro sendo mapeado por meio de equipamentos de geração 35 OPINIÃO DO PEDAGOGO ESCOLA INTEGRAL ATENDE AO DISPOSITIVO CONSTITUCIONAL Direcional Educador, Junho 13 Por Hamilton Werneck 36 uando o II PNE (Plano Nacional de Educação) propõe a organização escolar pública em sistema integral, atingindo 50% das escolas até 2020, está atendendo à emenda constitucional número 20, votada e promulgada em relação à Constituição de 1988. “Até os dezesseis anos os jovens não podem trabalhar porque estão na escola”, assim reza o texto. Na verdade, até o momento, eles encontram-se na escola em um turno e, em seguida, desenvolvem várias atividades, inclusive degradantes, como o tráfico de drogas e a prostituição. Portanto, para que se cumpra o texto da Constituição de 1988 as crianças e jovens precisam estar em tempo integral nas escolas, seja como um meio de retirá-las da rua, seja para que, de fato, consigam aprender. Diante desta proposta do MEC em relação ao percentual de escolas funcionando em tempo integral e da preocupação com a despesa gerada pela medida, os deputados federais propuseram um percentual mais modesto, de 25% até 2020. Isto significa que se seguirmos este critério percentual a cada plano decenal, atingiremos a totalidade somente em 2050. Tal constatação é muito grave porque necessitamos corrigir rumos da educação e capacitar a população den- tro dos próximos 25 anos, tendo em vista a evolução da distribuição demográfica da população brasileira. Se em décadas passadas a distribuição populacional assemelhava-se a uma pirâmide de base larga e topo muito estreito, indicando natalidade elevada, aliada à mortalidade infantil e poucos idosos, no momento, esta distribuição aproxima-se do desenho de uma gota de água, onde os indicadores são claros em relação à diminuição da mortalidade infantil, do índice de natalidade e do crescimento da população adulta e idosa. Dentro de 25 anos, assim pensam os demógrafos, precisamos ter uma população ativa com grande força de trabalho, conforme o conceito de Samuelson, para dar conta das grandes despesas provocadas pelo envelhecimento da população. Tal força só será possível se a educação representar um diferencial em relação a esta geração. Eis a razão de minha preocupação quando constato que o ano de 2050 está além desses 25 anos fatais para a educação de uma geração que não podemos perder. Isto justifica, inclusive, mesmo que seja por um tempo determinado, a aplicação dos lucros do pré-sal em educação. Quando se apresenta este tipo de planejamento escolar tem-se em vista uma grande transformação de toda a sociedade, inclusive de sua distribuição etária e suas consequências sobre a economia e o PIB nacionais. Olhando o panorama histórico em relação ao trabalho e à permanência das crianças e jovens nas escolas, encontramos o Decreto 1313 de 1891 em seu parágrafo segundo, que proíbe o emprego de crianças a não ser como aprendiz. Daí em diante o embate seguiu a relação histórica de conflito entre o mundo agrário aliado a pouca tecnologia e a indústria incipiente dependente da importação de muitos componentes. Ao final da República Velha, em 1927, o país definia que “as crianças não poderiam trabalhar até os 12 anos de idade”. Nessa época nem a obrigatoriedade de quatro anos escolares existia, de modo que era possível conciliar a escola com o trabalho, embora muitos pelas necessidades das famílias organizadas em colonato deixassem as escolas tão logo aprendessem a assinar o nome. Esta é a razão de termos enfrentado um índice de 60% da população em estado de analfabetismo puro na década de 50. A revolução de 1930, refletindo, em princípio, o conjunto de ideais contrários ao coronelismo agrário, modificou um pouco a educação e o Ministério Capanema acabou trazendo à baila a obrigatoriedade do ensino de quatro séries. Assim, o antigo curso primário tornava-se obrigatório. Aliando-se essa medida ao que dispõe a Constituição de 1934, tínhamos a “proibição do trabalho para crianças e adolescentes até os 14 anos de idade”. As crianças que não aprendiam tornavam-se repetentes até desistir da escola. Se essa idade ultrapassasse o dispositivo constitucional estava liberada a mão de obra para o campo e a indústria. Nem se falava em escola de tempo integral a não ser para famílias de renda elevada, senhores de engenho ou capitães de indústria que colocavam seus filhos e filhas em internatos, muitos deles confessionais e seminarísticos. Muitos profissionais, hoje aposentados, passaram por este tipo de escola que, na sua realidade desenvolvia uma pedagogia simples e aliava aos estudos propedêuticos uma série de práticas tendo em vista o futuro da criança e do adolescente. Estes seminários cuidavam da formação intelectual e humana, quanto possível desenvolviam uma educação em tempo integral e, ao mesmo tempo, integral, ou seja, voltada para o desenvolvimento da pessoa humana. Há poucos anos, conversando com o Professor Gaudêncio Frigotto, concluímos que um estudante daquelas escolas – e esta foi a nossa experiência comum – desenvolviam as letras e as artes, aprendiam um ofício, entravam em contato com a cultura musical, tinham experiência no campo agrícola e esportivo. E concluímos: se houvesse bom desempenho em, pelo menos, duas áreas, haveria êxito na vida! As escolas de tempo integral eram, à época, preocupadas com a formação integral da pessoa. Portanto, fique claro que há uma diferença entre educação em tempo integral e educação integral. Para que esta geração do início do século XXI logre êxito com as propostas do MEC, através do II PNE, os gestores precisam entender que não se cria este tipo de escola por decreto. Torna-se necessário investimento em espaço físico, preparação do corpo docente para desenvolver ativi- dades de cunho artístico e cultural e, além disso, rever os planos de cargos e salários para que não tenham dissabores jurídicos diante das novas contratações, concursos e ordenações de despesas. Trata-se de uma nova concepção de escola que, segundo a emenda 20 à Constituição de 1988, obriga a sociedade brasileira a retirar as crianças da rua e colocar todos os pobres nas escolas. Os menos pobres e os mais bem abastados sempre estudaram em tempo integral. Quando alguém reclama deste modelo, mesmo que questione a prática em função de alguma ideologia política, precisaria pensar bem antes de propalar suas ideias, dado que este modelo pode resgatar valores e direitos de uma população afastada da escola pelas condições sociais, mas que abriga em seu meio gênios da sociedade. O estudo em tempo integral para crianças e adolescentes de famílias mais ricas envolve um período na escola e outro período nos cursos de línguas estrangeiras, música, lutas marciais, computação, esportes e recuperação acadêmica. A maioria dos países desenvolvidos atua através de escolas de tempo integral. Assim descobrem seus gênios. Não é sem esforço que China e Índia reúnem cada um 200 milhões de pessoas com inteligência de alto nível. Sem uma educação em tempo integral e, ao mesmo tempo, integral enquanto preocupada com o desenvolvimento da pessoa humana, não recuperaremos os atrasos de nossa educação, não formaremos uma geração com o diferencial necessário dentro dos próximos 25 anos, nem atenderemos ao dispositivo constitucional, conforme a Emenda 20 da Constituição de 1988. Hamilton Werneck é pedagogo, escritor e palestrante. É autor de, entre outros livros, Ensinamos demais, aprendemos de menos e Se você finge que ensina, eu finjo que aprendo (ambos pela Editora Vozes). www.hamiltonwerneck.com.br Direcional Educador, Junho 13 OPINIÃO DO PEDAGOGO 37 Nossos alunos e as drogas Esteróides anabolizantes Direcional Educador, Junho 13 Por Gustavo Teixeira 38 tema me faz recordar dos treinos de jiu-jitsu e musculação em Copacabana há mais de dez anos quando colegas de treinamento adentravam a academia portando ampolas de medicamentos controlados, mas que eram facilmente adquiridos sem receitas médicas nas farmácias do bairro. Na época, estudante de medicina, era frequentemente questionado sobre tais medicamentos e apesar do discurso contra a utilização dessas substâncias, pude observar alguns colegas se perdendo no uso indiscriminado de esteróides anabolizantes. Acompanhado do rápido e acentuado ganho muscular, tais colegas passaram a se apresentar estranhamente agitados, agressivos, com seus rostos completamente inchados, desfigurados, cobertos por espinhas e alguns deles evidenciavam ainda ginecomastia, o crescimento exagerado das mamas. Surpreendentemente, seis anos após essa época reencontrei um desses colegas de treino, para ironia do destino, na porta de meu consultório médico. Desta vez apresentava-se não como atleta e sim como paciente e com o triste diagnóstico de uso abusivo de esteróides anabolizantes. Os esteróides anabolizantes são um grupo de substâncias em que se inclui a testosterona, o hormônio natural masculino, além de dezenas de hormônios sintéticos derivados da própria testosterona, que foram desenvolvidos nos últimos 50 anos. Essas substâncias são responsáveis pelo aparecimento das características sexuais masculinas e são capazes de produzir um efeito anabólico, isto é, produzem um aumento na síntese de proteínas para desenvolvimento de músculos e assim provocam um aumento significativo da massa muscular, da força, de explosão e do volume da musculatura corporal. Atualmente essas substâncias são legalmente produzidas para utilização médica em pacientes com doenças que causam perda e atrofia muscular ou doenças relacionadas com perda hormonal, sendo vendidos com receita médica sob a forma de comprimidos e ampolas injetáveis. Nas últimas décadas o uso dessas substâncias se popularizaram entre os jovens e apesar dos prejuízos médicos e psiquiátricos envolvidos, convivemos hoje com um grande número de adolescentes que inadvertidamente buscam nos esteróides anabolizantes uma maneira rápida e fácil de ganhar músculos. O hormônio testosterona é responsável pelos traços masculinizantes como crescimento de barba, força e desenvolvimento muscular. Eles também podem causar mudanças no cérebro e no corpo de quem se utiliza dele e aumentar as chances de desenvolver problemas graves de saúde. Uma grande ironia é que enquanto a grande maioria dos jovens procura nos esteróides uma maneira rápida de desenvolver músculos e melhorar sua aparência “externa”, internamente esse jovem está destruindo seu organismo. Essas drogas são capazes de enfraquecer o sistema imunológico, responsável pelas defesas naturais do organismo contra doenças e infecções. Lesões no fígado e até câncer hepático podem ser causados nesses jovens usuários. Os ossos podem ter seu crescimento interrompido em crianças e adolescentes, devido ao fechamento prematuro das epífises ósseas (regiões responsáveis pelo crescimento ósseo). O cérebro é outra região afetada pelos esteróides anabolizantes. Dentro do cérebro possuímos uma região chamada sistema límbico, ela está envolvida no controle das emoções, além de participar de importantes etapas da aprendizagem e da memória. Essas drogas são capazes de alterar o humor de quem as usa, logo sintomas depressivos, irritabilidade, nervosismo e agressividade são comuns entre usuários de esteróides anabolizantes. O hipotálamo é uma região localizada na base do cérebro responsável pela produção natural de testosterona. Quando inadvertidamente uma pessoa administra essa substância no organismo, o hipotálamo deixa de enviar corretamente ao resto do corpo informações importantes relacionadas com controle da pressão arterial, humor e funções reprodutivas, como produção de espermatozóides e libi- do. Nas mulheres os esteróides anabolizantes causam a interrupção da menstruação, perda de cabelo, crescimento de pelos no rosto e corpo e a voz torna-se grave. O uso desse tipo de droga é mais comum entre adolescentes, principalmente do sexo masculino, iniciando por volta dos 14 anos de idade, entre praticantes de musculação ou esportes de luta. Consideram-se adeptos da “geração saúde”, estão interessados na boa aparência física, entretanto por desinformação ou por simplesmente não acreditarem nos efeitos deletérios desse tipo de droga, estas pessoas sucumbem ao uso indiscriminado dessas substâncias. Alguns sinais físicos do uso de esteróides anabolizantes podem ser facilmente observados. Normalmente há uma hipertrofia muscular generalizada, com um aumento desproporcional do tórax, aumento da musculatura do pescoço e ombros. A pele pode apresentar-se com acne (espinhas), principalmente no rosto, ombros e costas. Uma alteração comum é a presença de ginecomastia, um aumento das glândulas mamárias devido à conversão metabólica do excesso de testosterona em estrogênio, o hormônio feminino. Outra alteração comum é a atrofia dos testículos, devido à diminuição da produção de testosterona pelo organismo, com redução da contagem de espermatozóides e de sua mobilidade e alteração de sua morfologia. Hipertrofia prostática, hipertensão arterial, hepatomegalia (aumento do tamanho do fígado), calvície e hirsutismo (aumento da quantidade de pelos pelo corpo) também são frequentes. Algumas alterações psíquicas também podem ser identificadas entre os usuários de esteróides anabolizantes. Muitos deles podem apresentar-se preocupados de que não estão “fortes o suficiente”, irritabilidade, agitação e pensamentos grandiosos também podem ocorrer. Alterações laboratoriais, como aumento das enzimas hepáticas, aumento dos níveis de testosterona e aumento do número de hemácias sanguíneas são encontrados no hemograma e no exame bioquímico do sangue. A síndrome de abstinência causada pelos esteróides anabolizantes é caracterizada por sintomas depressivos como tristeza, falta de motivação, cansaço, insônia, diminuição da libido, pensamentos e ideações suicidas, além do desejo pela droga. Quando cessam o uso, muitos jovens experimentam a perda de alguns quilos de massa muscular e podem apresentar um medo exagerado de estar ficando muito magro, fenômeno denominado megarexia ou dismorfia muscular. Trata-se de uma síndrome frequentemente associada a jovens que fazem uso de esteróides anabolizantes, um tipo de transtorno dismórfico corporal em que a pessoa se sente fraca e pequena, mesmo apresentando-se forte e musculosa. Esses jovens praticam musculação de maneira exagerada, compulsiva e evitam situações de exposição de seus corpos, como praias, piscinas, churrascos, sempre devido ao medo de se sentir fraco, magro e ser ridicularizado pelas outras pessoas. O tratamento da dismorfia muscular envolve, além da interrupção do uso de esteróides anabolizantes, intervenções semelhantes às utilizadas no tratamento dos transtornos alimentares, utilizando a psicoterapia segundo técnicas cognitivo-comportamentais e medicamentos. Gustavo Teixeira é Médico Psiquiatra Infantil, Professor Visitante do Department of Special Education - Bridgewater State University e Mestre em Educação - Framingham State University Contato: www.comportamentoinfantil.com Direcional Educador, Junho 13 Nossos alunos e as drogas 39 EDUCAÇÃO INTEGRAL EDUCAÇÃO INTEGRAL A Formação Integral Direcional Educador, Junho 13 o pensar na escolha pelos caminhos da educação nos idos dos anos 90, procuro avaliar as oportunidades experimentadas e o que elas têm em comum. Experimentei ainda antes de concluir meu processo formativo inicial – na época, o magistério – a atuação em escolas de Educação Infantil privadas, geralmente estruturadas em casas adaptadas, com pessoas como eu, com pouca formação, em estrutura pouco adequada, mas com alto nível de exigência dos mantenedores e das famílias. Deveria ter sido uma experiência altamente formativa. E foi, pois pude aprender como não deve ser a escola, como não deve ser a orientação pedagógica para pessoas em início de carreira, entre outras aprendizagens. Neste mesmo período, a experiência em escolas particulares maiores, de Ensino Fundamental, que estruturavam um plano de carreira desafiador, já que na minha condição, poderia ser uma assistente de sala e, com muito esforço e simpatia, quem sabe experimentaria o lugar de professora nos anos vindouros. O nível de exigência não era menor. Concluindo o processo formativo inicial, simultaneamente, já que a lei na época permitia, já iniciei o curso de pedagogia, com duração de três anos. Ao concluí-lo, encontrei uma possibilidade de docência em escola particular de Ensino Fundamental. Para debutar com ‘chave de ouro’, assumi duas turmas de Ensino Fundamental, uma delas com dois alunos com deficiência. Foi um exercício de coragem e essa mesma coragem de me lançar aos novos desafios, nunca mais deixou de passear comigo pelas vielas da Educação. Alguns anos se passaram e eu mantinha um profundo desejo de ingressar no serviço público. Em 1992, esse desejo se concretizou e um novo mundo se abriu. Nesse contexto, acessei inúmeras experiências conceituais e formativas. Nas remoções tão comuns nas redes públicas de ensino, pude integrar os coletivos de inúmeras escolas e confirmei que não somos ‘árvores’, logo, nossas raízes são asas. Com essa condição da mudança, olhando pelo lado positivo, podemos contatar outras ‘gentes’, outras formas de organização dos espaços, outras comunidades com suas histórias, outros temperos - mesmo quando os gêneros se repetem - outros sotaques, outros materiais, outros cheiros, outras distâncias, outras tentativas de fazer a diferença. Tomei gosto pela chance de mudar e renovar experiências. Mudar de lugar pareceu pouco. Passei a buscar outras modalidades de ensino, com isso, pude transitar na Educação Infantil, pelo Ensino Fundamental, algum tempo com Educação de Jovens 40 ideia de que é fundante revisitar as próprias histórias de vida, como elemento especial para a formação de professores. Nossas memórias como alunos, como professores e sujeitos da história fazem diferença nos processos. Não somos aquilo que estudamos e lemos nas salas de aula do magistério ou da pedagogia. Seria reducionista acreditarmos nisso. Somos muito mais. Outro desafio e ingrediente necessário para melhor entendermos escolhas e processos, é conhecer a história da educação, seus altos e baixos, sua ausência de linearidade, suas marcas, suas forças e fragilidades, suas relações com outros aspectos da vida, sua abrangência e poder. Tudo isso me inspira a chamar atenção dos alunos e alunas, no pouco tempo que nos cabe partilhar, para as questões históricas, políticas, sociológicas, filosóficas da educação, para a melhor compreensão do que se pode esperar desse complexo conjunto. Ao trabalhar na gestão pública na Secretaria de Educação sou a somatória de todas essas experiências com uma mala que conta com alguns itens e um profundo desejo de somar a ela outras tantas experiências que me servirão na tomada de decisão cotidiana. Não estamos prontos, nunca estaremos, e isso me felicita. Ainda que estejamos por ser feitos, como diria Cortella, há muito do nosso aprendizado que se coloca à nossa disposição como possibilidade de resposta. É confortável pensar que envelhecer traz esses predicados. Esse passeio breve pela trajetória formativa de uma professora, pretende dar luz à relevância da formação obtida nas próprias trajetórias, não como algo que existe para preparar um profissional para uma responsabilidade nova, mas como algo que se faz todos os dias, no contato com escolas, alunos, pessoas que nela transitam e com a possibilidade de refletir coletiva ou individualmente sobre essas experiências. Essa formação, generosa em seus cenários diversos, quero chamar de integral, um processo que se dá levando em conta o conjunto de experiências dos profissionais, que não descarta as histórias de vida, nem as contribuições teóricas, mas que faz uma costura de ambas, amalgamando, criando intersecções, reorganizando as memórias e as interpretações que conseguimos fazer delas. Se conseguirmos considerar na relação com nossos alunos e alunas, independente de suas faixas etárias e modalidades de ensino, todos esses fatores aqui mencionados, teremos uma leitura muito mais respeitosa de suas trajetórias, de suas possibilidades, de suas afinidades e com isso, ampliaremos nosso campo de atuação, extrapolaremos o aspecto cognitivo e intelectual e teremos outros sentidos implicados nas histórias que contamos e escrevemos. Ao refletir sobre quais as novas perspectivas formativas e profissionais pretendo percorrer, olho para trás e decido deixar todas as malas abertas. Elas não são iguais, sequer parecidas e têm tamanhos variados, cores diversas, umas mais organizadas, outras nem tanto, umas mais conservadas e conservadoras, outras contemporâneas e ousadas. Por serem minhas, me sinto autorizada a tirar e colocar novos itens, pois elas representam a minha história, um percurso singular. Nessa trajetória pude contar com muita contribuição de outras histórias tão singulares quanto a minha e para cada uma dessas contribuições, que tornaram a minha construção esse processo integral, deixo aqui o meu agradecimento, a todos vocês, de diferentes lugares, tamanhos e com diferentes sonhos, o meu muito obrigada! Maria Helena Negreiros é Mestre em Educação pela Universidade Metodista de São Paulo. Mestranda em Ciências Humanas e Sociais pela UFABC. Possui graduação em Pedagogia, com especialização em Psicopedagogia, Educação Especial e Gestão Pública. Professora nos cursos de graduação e pós-graduação . Autora do livro Leitura e Lazer: uma alquimia possível, foi eleita personalidade do ano 2011, pelo Prêmio João Ferrador, do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC. Tem experiência na área de Educação, com ênfase em Educação Inclusiva, Diversidade e Gestão de Políticas Públicas. E-mail: [email protected] Direcional Educador, Junho 13 Desafios e Perspectivas da Educação Integral: e Adultos e na creche, aprendi que o choro dos pequeninos no período de adaptação pode ser amenizado com um colo acolhedor, histórias coloridas, cantigas simples e bonecos de pano que conversam informando que mais tarde a mamãe vai voltar. Em cada lugar levei uma mala cheia de possibilidades, registros, livros, imagens e sonhos. Ali deixava o máximo que conseguia, mas sempre que saí daquela experiência, levava outras tantas para novos lugares. Os recomeços sempre me trouxeram aquele ‘friozinho na barriga’, mas sempre me inspiraram a escrever novos e importantes capítulos da minha história. Durante todo esse tempo, me mantive muito atenta aos cursos disponibilizados, aos livros lançados, às contribuições teóricas, às discussões políticas, às construções dos projetos político-pedagógicos, pois sabia que todas essas coisas tinham um sentido para as minhas escolhas pedagógicas. Minhas derrotas nos ciclos de aprendizagem com meninos e meninas que avançavam pouco em seu desenvolvimento me devolviam para minhas leituras, pesquisas e principalmente, para a necessidade de continuar trocando com meus pares, as experiências exitosas que poderiam ser enriquecedoras para a minha trajetória. Com o passar dos anos, os desafios foram se apresentando, entre eles o trabalho de assessoria à educação inclusiva, a atuação na gestão pública no acompanhamento aos projetos e programas da secretaria de educação e ao abraçar essas oportunidades fui selecionando o que, de toda aquela bagagem, seria imprescindível carregar e muito do que selecionei foi extremamente útil para tomar decisões e quem sabe, qualificar os processos sempre tão complexos da educação básica. Observei que não seria possível parar de estudar, ler, pesquisar e trocar. Cada papel assumido trazia em si especificidades de conhecimentos e informações tão peculiares que se tornou imprescindível continuar procurando maneiras de tornar a educação maior e melhor. A base para organizar pensamentos e reflexões não poderia deixar de ser a ação pedagógica, as unidades escolares e os humanos que nela coabitam. Atuar como professora em cursos de pós-graduação tem me levado a reforçar a 41 NECESSIDADES BÁSICAS DOS ALUNOS, A SEREM ATENDIDAS NA SALA DE AULA PELO PROFESSOR Por Heloísa Lück aluno se apresenta na sala de aula como um ser humano dotado de possibilidades de aprendizagem que podem ser ativadas mediante as intervenções interpessoais de natureza pedagógica, que venham ao encontro de suas necessidades humanas/educacionais. Considerar essas necessidades corresponde a considerar o aluno como pessoa e relacionar-se com ele a partir dessa consideração, apresentando-lhes estimulações e atenção correspondentes. Fazê-lo é condição básica para a mobilização de sua motivação focada na aprendizagem e demanda a compreensão pelo professor de seu significado e reconhecimento de atendê-los no cotidiano da sala de aula. Essas necessidades se apresentam de maneira hierárquica, conforme estudo de Abraham Maslow (1962), de modo que, na medida em que venham sendo satisfeitas e atendidas, dão origem a outras necessidades mais complexas e abrangentes, caracterizando o desenvolvimento humano, vindo a culminar, no topo da hierarquia, com a autorrealização pessoal como pessoa, necessidade que alcança sua plenitude na idade adulta (embora grande parte das pessoas não alcance esse estágio de desenvolvimento e se sintam pessoas frustradas e infelizes). Sob pena de cercear o desenvolvimento gradual do aluno como ser humano que aprende, cabe aos gestores escolares e ao professor na sala de aula estarem atentos ao atendimento às necessidades educacionais e humanas dos alunos, mediante cuidados adequados. Direcional Educador, Junho 13 Necessidade de segurança 42 A primeira necessidade dessa hierarquia se constitui na necessidade fisiológica e de segurança, tanto física, como psicológica. Trata-se de uma necessidade básica que, uma vez atendida, possibilita a emergência à necessidade de pertencer, de natureza social. Neste artigo estas duas necessidades serão analisadas, ficando as restantes para o próximo número desta revista. Na base da hierarquia das necessidades humanas toda pessoa depende para sua sobrevivência e desenvolvimento da mais básica necessidade fisiológica e de segurança tanto física como psicológica. Toda pessoa necessita, por exemplo, de ar puro, alimentação adequada, abrigo seguro e livre de riscos, para poder interessar-se por outras dimensões da escala de necessidades humanas, de caráter mais subjetivo. Segundo a escala hierárquica proposta por Maslow, essa necessidade é garantida por alimentação saudável e nutritiva, pelo apoio físico e material que protege o ser humano de adversidades e ameaças à sua integridade física e psicológica. A escola atende a essa necessidade, por exemplo, mediante o programa da merenda escolar, que absorve grande parte dos esforços de gestores escolares, além do tempo dedicado diretamente à qualidade do ensino; a orientação ao recreio escolar; o cuidado com o 8 GESTÃO DA APRENDIZAGEM NA SALA DE AULA mobiliário e ambiente escolar livre de risco de os alunos se machucarem, assim como limpo, organizado, bem arejado, com temperatura agradável e saudável. O cuidado com a organização do espaço, a ventilação, a higiene, o controle de ruídos fazem parte dessa atenção. Porém, a necessidade de segurança é também atendida pelas características do ambiente psicossocial, livre de agressões por palavras e atitudes, que enfraquecem ou até mesmo destroem tanto quanto as agressões físicas. O abandono, o descuido, a desconsideração, o preconceito, a omissão, as discriminações e favoritismos, as arbitrariedades, o tratamento impessoal e burocrático, o autoritarismo, a privação de atenção, podem funcionar como agressões aos alunos, produzindo sentimentos de insegurança que destroem sua autoimagem. Verifica-se que muitas vezes essa falta de segurança é a condição natural em que muitas crianças vivem, cabendo à escola estar atenta para compensar os efeitos adversos do lar sobre a capacidade e predisposição dos alunos para aprender. Acrescente-se ainda o cuidado que se deve ter na escola, por não replicar essas condições em seu ambiente, o que, no entanto, também se observa em muitos ambientes escolares e na sala de aula, onde muitos alunos se sentem humilhados, perseguidos e desconsiderados, tanto por colegas, como por professores. O bullying, que corresponde a comportamentos de molestação e provocação que ocorre entre colegas na escola, tem sido identificado pelos alunos como falta de garantia de segurança no interior da escola. Em pesquisa entre alunos que abandonam os estudos, essa condição foi apontada como a segunda causa mais importante para deixarem a escola, por se sentirem inseguros e ameaçados. Um aluno se manifestou a respeito, indicando que “eu gostaria de prestar atenção na aula, mas não consigo, é uma zoada só, os alunos não se respeitam e ficam pegando no meu pé, e os professores não fazem nada, porque não conseguem ser respeitados. Já falei com a diretora da escola e também não adiantou nada. Acho que vou desistir de vir pra escola”. Cabe destacar que o sentimento de medo gerado pela insegurança, mesmo que de uma ameaça de natureza psicossocial, pode por em risco não apenas o desenvolvimento normal de pessoas, mas até a qualidade de sua vida, criando condições de doenças psicossomáticas (de fundo emocional) de natureza até mesmo graves. Além, é claro, de servirem como inibidoras da aprendizagem e do desenvolvimento social. O que observar para garantir as necessidades de segurança na escola e na sala de aula? É importante que se tenha um olhar atento para todas e as mínimas ações que possam prejudicar esse atendimento, algumas das quais passam despercebidas e são expressas inadvertidamente. Ao mesmo tempo, é necessário ter a atenção voltada para garantir as condições psicológicas, sociais e físicas necessárias ao desenvolvimento do sentido de segurança. Faz parte desse processo a observação dos professores e gestores ao seu comportamento, sua comunicação e relacionamento com os alunos. Dessa forma, é importante orientar-se por questões como: • Como se sentem os alunos individualmente e em grupo em relação ao ambiente físico da escola e da sala de aula? • Como são as relações interpessoais dos alunos entre si e dos professores, funcionários e gestores com os alunos? • Que expressões de comunicação e de relacionamento interpessoal os professores adotam com os alunos que porventura possam ser percebidos por eles como ameaça, desconsideração ou agressão? • Que expressões de comunicação e de relacionamento interpessoal os professores adotam com os alunos que servem como reforço positivo? • Que providências os professores e gestores adotam para evitar o bullying entre os alunos? • Que medidas são adotadas em cada sala de aula e na escola tendo como foco a preocupação com a segurança dos alunos? • As carteiras escolares e móveis Direcional Educador, Junho 13 GESTÃO DA APRENDIZAGEM NA SALA DE AULA 43 GESTÃO DA APRENDIZAGEM NA SALA DE AULA são bem preservados e livres de riscos de alguém se machucar? • São feitas orientações a respeito da importância de manutenção, conservação e cuidado com o ambiente escolar? • O espaço é adequado para o número de alunos e a sua organização é confortável? • Os professores prestam atenção continuamente ao comportamento de todos os alunos e a relação de uns com os outros, de maneira a prevenir atritos ou desatenção? • São feitas orientações a respeito da merenda escolar e o seu consumo de forma segura e adequada? • O recreio e suas brincadeiras são supervisionados e orientados por adultos? • Como é feita a orientação do recreio escolar? • Os ambientes escolar e da sala de aula são desprovidos de objetos inseguros e são bem arejados? • Os gestores e professores prestam atenção aos seus comportamentos, atitudes e comunicação verbal e não verbal, de maneira a controlar aqueles que possam afetar a segurança psicossocial dos alunos? • Adota-se na escola a orientação para o respeito humano recíproco? • Os alunos são orientados na observação e reflexão sobre o seu comportamento em relação a questões de segurança física e psicológica? Direcional Educador, Junho 13 Necessidade de pertencer 44 Uma vez garantida a necessidade de segurança, mediante ambiente seguro, organizado e caracterizado por comportamentos equilibrados e respeitosos de adultos e crianças, manifesta-se uma necessidade de natureza social, que corresponde à necessidade de pertencer, de sentir-se parte de um grupo. Ela constituiu uma necessidade típica do ser humano, como ser social, sem a qual não desenvolve adequadamente sua identidade pessoal, que emerge no convívio e interação dinâmica com seus semelhantes em grupos sociais. A fim de sentir-se pertencendo a um grupo social, o ser humano desenvolve os comportamentos nele adotados, de modo a sentir-se parte dele e a ser acolhido pelo mesmo, já que o grupo força a expressão de determinados comportamentos e coíbe outros, a fim de garantir o acolhimento. A necessidade de pertencer é, pois, decorrente da natureza social do ser humano e fundamental para o seu desenvolvimento, uma vez que não pode se desenvolver como tal sozinho, à margem de grupos sociais e sem integrar-se neles. Sua aprendizagem se processa interagindo com os semelhantes e com eles compartilhando experiências, impressões e conhecimentos (Prieto C., sd). Essa necessidade explica, por exemplo, porque as crianças, mas, sobretudo, os adolescentes, querem ter certos calçados, vestimentas e objetos “porque todo mundo tem”. Desejam identificar-se com o grupo, para poder pertencer a ele. Penteados, piercings e tatuagens passam, por exemplo, a ser sinais de pertencimento a um grupo diferenciado de pessoas. Quando comportamentos exóticos e objetos que a pessoa ostenta são a porta de entrada e de acolhimento para pertencer a grupos, é porque os participantes desses grupos não aprenderam a cultivar valores voltados para a realização humana, atendo-se a valores menores, que não agregam significados humanos autênticos, criando a cultura do ter e aparentar, em vez da cultura de ser, focada no seu desenvolvimento como pessoa. Portanto, essa necessidade, como todas as demais, demanda orientação para a aprendizagem a respeito dos significados atribuídos a objetos, comportamentos e ações que são tomados para representá-los. Para o atendimento a essa necessida- de, é importante que a escola ofereça aos alunos atividades de grupo, em clubes de interesse, como esportes, teatro, canto, jogos intelectuais, nos quais os alunos poderão desenvolver a sua identidade pessoal, habilidades de relacionamento interpessoal e comunicação, capacidade de atuação construtiva em equipe, valores de cooperação e responsabilidade, dentre outros aspectos. É importante ter em mente que os alunos devem ser orientados não apenas em relação às habilidades específicas necessárias ao objeto das atividades, mas também no desenvolvimento de habilidades e atitudes sociais e da interação humana em grupos. Verifica-se, no entanto, que comumente estas competências são desconsideradas como objeto de aprendizagem. Ao entrar para a escola, o aluno passa a pertencer a um grupo diferenciado de pessoas, com objetivo de aprendizagem e formação humana, passando a conviver com grupos de colegas, organizados em turma, o que demanda envolver-se colegiadamente. Verifica-se, no entanto, a falta de atenção pelos professores e pelos gestores escolares, sobre essa questão. No espaço de sala de aula, em geral, os alunos são enfileirados, de maneira a poder se relacionar apenas com alguns poucos colegas próximos, o que, no entanto, é cerceado pelo professor, criando-se um ambiente de massificação, que elimina a riqueza da interação como processo de aprendizagem e de atendimento à necessidade de pertencer. Compete pois aos gestores escolares e professores adotarem medidas para que seja organizado o espaço e o ambiente das salas de aula para que sejam marcados por experiências de troca e interação entre todos os colegas, que se conhecem e se respeitam e desenvolvem um código de ética comum entre si, em relação aos objetivos de aprendizagem. O desenvolvimento de valores elevados para nortear a dinâmica de grupos e a interação entre seus membros não ocorre naturalmente, apesar de a necessidade de pertencer ser natural a todos – eles precisam ser orientados, sendo interessante criar símbolos, sinais, músicas para a sua representação, de forma a se tornar evidente a unidade do grupo em torno de uma questão. Pertencer a uma escola, com uma marca particular e diferenciada, sentir-se parte de uma entidade que tem identidade própria, cria um sentimento de orgulho e satisfação muitíssimo importante, que contribui para a construção da identidade pessoal do aluno, assim como estabelece condicionamentos favoráveis à aprendizagem. O mesmo acontece em pertencer a uma determinada turma que cultiva características comuns elevadas, que tem sinais comuns de identificação desses valores (slogans, bandeira, logomarca, símbolo, etc.) e reforço ao cultivo e expressão dos mesmos em seu comportamento. Verifica-se que essa necessidade é atendida na sociedade pela filiação a clubes de fãs, torcidas organizadas de futebol, que tanta energia drena em desatenção ao desenvolvimento humano. Observa-se muitas vezes haver em sala de aula um aluno isolado em sua turma e que “fica no seu canto sem incomodar”. É muito provável que o mesmo não esteja aprendendo tanto quanto deveria e poderia, e que até mesmo se sinta infeliz e tenha uma baixa autoestima. Cabe ao professor dar-lhe a atenção necessária e adotar medidas para fazê-lo sentir-se parte da turma como um todo. Verifica-se que quanto mais diversificado é o conjunto de grupos e das experiências sociais vivenciadas nos grupos, mais consistente é a formação da pessoa que deles participa, emergindo então a necessidade de autoestima, de valor próprio, independente do reconhecimento de outras pessoas. Portanto, organizar atividades em grupo e orientar a sua atuação, de forma a garantir a aprendizagem social dos alunos, consiste em elemento fundamental do processo educacional. O atendimento a essa necessidade é observado em vários países cuja educação é reconhecida internacionalmente como de qualidade, onde a formação de grupos de estudo e a aprendizagem de forma colegiada são uma prática regular e metodologia inerente ao processo educacional. Nesses sistemas, as salas de aula e as carteiras dos alunos são organizadas em formato que facilite essa atividade e aproveita-se a dinâmica social dos alunos para a promoção da aprendizagem coope- rativa, o que resulta na aprendizagem de habilidades de comunicação e interação interpessoal, na diminuição de situações consideradas como indisciplina, na maior motivação pelo processo educacional e em melhores resultados acadêmicos. A consideração por gestores e professores à questões para orientar o atendimento à necessidade educacional de pertencer passa pela observação e reflexão de questões como: • Que projetos e atividades são realizados na escola como um todo e nas salas de aula, para promover a socialização e interação entre os alunos? • Quais os objetivos, resultados e regularidade desses projetos e atividades? • Como é orientado o desempenho dos alunos nesses projetos e atividades, em relação à formação de competências sociais e desenvolvimento do sentido de unidade social? • Como é promovida na escola e na sala de aula a integração dos alunos em seus grupos, de forma a evitar a criação de isolamento de alunos? • Que dificuldades são observadas a respeito do atendimento às necessidades de pertencer dos alunos e como são orientadas para a sua superação? • Que projetos a escola promove para oportunizar e orientar o desenvolvimento de habilidades de atuação em grupo, de espírito de equipe e sentimento de fazer parte integrante da escola e de sua turma? • Como e com que frequência os professores promovem em cada uma de suas aulas atividades interativas entre os alunos? • O que é feito em cada turma de alunos para desenvolver o sentido de unidade e identidade própria como um grupo especial, orientado por valores elevados? O atendimento e orientação dos alunos em relação às necessidades examinadas neste artigo contribuem para o seu desenvolvimento e sua maturação, promovendo a manifestação de outras necessidades mais complexas, a serem examinadas na continuidade desta série de artigos. Referências bibliográficas MASLOW, A. Introdução à psicologia do ser. Rio de Janeiro: Eldorado, 1962. PRIETO C, Daniel. El autodiagnostico comunitário. Quito: Centro Internacional de Estudios Superiores de Comunicación para America Latina, sd. Heloísa Lück é doutora em Educação pela Columbia University, em Nova York, com pós-doutorado em Pesquisa e Ensino Superior pela George Washington University, em Washington D.C. É Diretora Educacional do CEDHAP – Centro de Desenvolvimento Humano Aplicado, conferencista e docente em cursos de capacitação de profissionais da educação. E-mail: [email protected] Direcional Educador, Junho 13 GESTÃO DA APRENDIZAGEM NA SALA DE AULA 45 E agora, Professor? PSICOPEDAGOGIA E agora, Professor? São diretrizes do PNE - 2011/2020: você conhece o PNE (2011-2020)? Por Cassiano Zeferino de Carvalho Neto m abril passado foi aprovada pelo Fórum Nacional de Educação (FNE), composto por mais de 30 entidades representantes da sociedade civil e do poder público, a publicação do documento Cenário da Educação Nacional, que servirá de apoio aos debates em todas as conferências preparatórias, municipais e intermunicipais voltadas à CONAE. O documento apresenta dados e diretrizes que servem de complemento ao documento-referência, ‘O Plano Nacional de Educação na Articulação do Sistema Nacional de Educação – Participação Popular, Cooperação Federativa e Regime de Colaboração’, publicado pelo fórum no final do ano passado. O Plano Nacional de Educação, (PNE) vigorando entre 2011 e 2020, apresenta dez diretrizes objetivas e 20 metas, seguidas das estratégias específicas de concretização. O texto prevê formas de a sociedade monitorar e cobrar cada uma das conquistas previstas. As metas seguem o modelo de visão sistêmica da educação estabelecido em 2007 com a criação do Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE). Tanto as metas quanto as estratégias premiam iniciativas para todos os níveis, modalidades e etapas educacionais. Além disso, há estratégias específicas para a inclusão de minorias, como alunos com deficiência, indígenas, quilombolas, estudantes do campo e alunos em regime de liberdade assistida. Direcional Educador, Junho 13 As publicações, assim como as discussões que serão levadas à CONAE, têm como referência o Plano Nacional de Educação (PNE), que direciona as políticas para a área durante dez anos, até 2020. O PNE está atualmente em discussão no Senado Federal. Segundo o coordenador do FNE, Francisco das Chagas Fernandes, 46 O objetivo da Conferência é discutir o PNE, os seus desdobramentos nos estados e municípios, assim como os planos estaduais e municipais. O PNE tem pontos que são difíceis de encaminhar, como, por exemplo, o financiamento da educação. Tanto a CONAE 2010 quanto a Câmara dos Deputados aprovaram a destinação de 10% do PIB [Produto Interno Bruto] para a educação. Agora o que está sendo discutido se refere às fontes que vão garantir que possamos chegar a essa meta. A próxima Conferência Nacional de Educação - CONAE será realizada de 17 e 21 de fevereiro de 2014, em Brasília, com a finalidade de oferecer espaço para deliberações que possam resultar na elaboração de um conjunto de propostas que vai subsidiar a efetivação e a implementação do Plano Nacional de Educação (PNE) pelos municípios, pelos estados e pelo Distrito Federal, no contexto da construção do Sistema Nacional de Educação, abrangendo especialmente a participação popular, a cooperação federativa e o regime de colaboração. Estas diretrizes exigem importantes ações coletivas, na perspectiva de uma ampla política pública voltada para a educação. Além das diretrizes, 20 metas são apresentadas no documento, a saber: Meta 1: Universalizar, até 2016, o atendimento escolar da população de 4 e 5 anos, e ampliar, até 2020, a oferta de Educação Infantil de forma a atender a 50% da população de até 3 anos. Meta 2: Universalizar o Ensino Fundamental de nove anos para toda população de 6 a 14 anos. Meta 3: Universalizar, até 2016, o atendimento escolar para toda a população de 15 a 17 anos e elevar, até 2020, a taxa líquida de matrículas no Ensino Médio para 85%, nesta faixa etária. Meta 4: Universalizar, para a população de 4 a 17 anos, o atendimento escolar aos estudantes com deficiência, transtornos globais do desenvolvimento e altas habilidades ou superdotação na rede regular de ensino. Meta 5: Alfabetizar todas as crianças até, no máximo, os oito anos de idade. Meta 6: Oferecer educação em tempo integral em 50% das escolas públicas de educação básica. Meta 7: Atingir as seguintes médias nacionais para o IDEB: Meta 8: Elevar a escolaridade média da população de 18 a 24 anos de modo a alcançar mínimo de 12 anos de estudo para as populações do campo, da região de menor escolaridade no país e dos 25% mais pobres, bem como igualar a escolaridade média entre negros e não negros, com vistas à redução da desigualdade educacional. Meta 9: Elevar a taxa de alfabetização da população com 15 anos ou mais para 93,5% até 2015 e erradicar, até 2020, o analfabetismo absoluto e reduzir em 50% a taxa de analfabetismo funcional Meta 10: Oferecer, no mínimo, 25% das matrículas de Educação de Jovens e Adultos na forma integrada à educação profissional nos anos finais do Ensino Fundamental e no Ensino Médio. Direcional Educador, Junho 13 Políticas públicas em educação: I - erradicação do analfabetismo; II - universalização do atendimento escolar; III - superação das desigualdades educacionais; IV - melhoria da qualidade do ensino; V - formação para o trabalho; VI - promoção da sustentabilidade socioambiental; VII - promoção humanística, científica e tecnológica do País; VIII - estabelecimento de meta de aplicação de recursos públicos em educação como proporção do Produto Interno Bruto; IX - valorização dos profissionais da educação; e X - difusão dos princípios da equidade, do respeito à diversidade e a gestão democrática da educação. 47 48 Meta 11: Duplicar as matrículas da educação profissional técnica de nível médio, assegurando a qualidade da oferta. Meta 12: Elevar a taxa bruta de matrícula na educação superior para 50% e a taxa líquida para 33% da população de 18 a 24 anos, assegurando a qualidade da oferta. Meta 13: Elevar a qualidade da educação superior pela ampliação da atuação de mestres e doutores nas instituições de educação superior para 75%, no mínimo, do corpo docente em efetivo exercício, sendo, do total, 35% doutores. Meta 14: Elevar gradualmente o número de matrículas na pós-graduação stricto sensu de modo a atingir a titulação anual de 60 mil mestres e 25 mil doutores. Meta 15: Garantir, em regime de colaboração entre a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, que todos os professores da educação básica possuam formação específica de nível superior, obtida em curso de licenciatura na área de conhecimento em que atuam. Meta 16: Formar 50% dos professores da educação básica em nível de pós-graduação lato e stricto sensu, garantir a todos formação continuada em sua área de atuação. Meta 17: Valorizar o magistério público da educação básica a fim de aproximar o rendimento médio do profissional do magistério com mais de 11 anos de escolaridade do rendimento médio dos demais profissionais com escolaridade equivalente. Meta 18: Assegurar, no prazo de dois anos, a existência de planos de carreira para os profissionais do magistério em todos os sistemas de ensino. Meta 19: Garantir, mediante lei específica aprovada no âmbito dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, a nomeação comissionada de diretores de escola vinculada a critérios técnicos de mérito e desempenho e à participação da comunidade escolar. Meta 20: Ampliar progressivamente o investimento público em educação até atingir, no mínimo, o patamar de 7% do Produto Interno Bruto do país. livros O conjunto de metas apresentadas é revelador. A educação no país carece de políticas de ampla envergadura e garantias de que suas implementações não sejam afetadas pela mudança de governo, isto é, almeja-se um plano de Estado com duração coerente com o que se pretende. Além disso, para cada meta o PNE sugere ações que contribuam para a concretização da mesma, de modo que se objetive o alcance esperado. Sabemos que não é simples alcançar de forma plena todas as metas apresentadas, tampouco se pode relegar ao ostracismo o papel das políticas públicas voltadas à educação sem que se pague por isso o preço do comprometimento da própria nação, num futuro próximo. Que a educação carece de profundas mudanças em cenários da atualidade já o sabemos e sentimos, das mais variadas formas em nosso cotidiano, mas o que se espera é que as ações que envolverão as metas previstas respeitem de um modo ainda mais amplo as diretrizes do PNE (2011-2020). A elevação de escolaridade, a formação e qualificação continuada do professor, a valorização do magistério e a elevação das taxas de matrícula, dentre outras metas, carecem de recursos financeiros, não só disponíveis como bem administrados. Os sistemas públicos que contribuem para a transparência das ações são importantes, mas não garantem, de fato, a melhor forma de utilização dos recursos que serão disponibilizados. Por isso se torna de vital importância em primeiro lugar consciência do que está em jogo e, ao mesmo tempo, como serão aplicados os recursos, o que acaba sendo um dever de todo cidadão. Acompanhar o desenrolar dos preparativos para a Conferência Nacional de Educação (CONAE – 2014) é uma forma de se fazer educação, já que ela não se inscreve apenas no restrito foro das paredes de uma sala de aula, ou da sala da coordenação e direção de uma escola, mas como algo muito mais amplo e complexo, no que tange ao domínio das políticas públicas de longo prazo. Confira nossas boas dicas de livros para alunos e professores. Por Luiza Oliva DO VENTRE AO COLO, DO SOM À LITERATURA Documentos sugeridos para leitura e aprofundamento do assunto abordado: Regimento interno da CONAE: Disponível em http://fne.mec.gov.br/images/pdf/ regimentointernoconaeversao29_10_12_formatada.pdf, acesso em 05.05.2013. Plano Nacional de Educação (PNE) - Projeto de Lei: Disponível em http://portal.mec.gov.br/index.php?option=com_docman&task=doc_ download&gid=7244&Itemid=, acesso em 05.05.2013. Planejamento Educacional no Brasil (Fórum Nacional de Educação) Disponível em http://fne.mec.gov.br/images/pdf/ planejamento_educacional_brasil.pdf Acesso em 05.05.2013. Cassiano Zeferino de Carvalho Neto tem Pós-doutorado no Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA); Doutorado em Engenharia e Gestão do Conhecimento (EGC/UFSC); Mestrado em Educação Científica e Tecnológica (ECT/ UFSC); Especialidade em Qualidade na Educação Básica (INEAM/OEA/ USA) e Licenciatura em Pedagogia, com complementação em Física (PUCSP). Fundador da Laborciencia Editora, do Instituto para a Formação Continuada em Educação (IFCE) e do Instituto Galileo Galilei para a Educação (IGGE). www.carvalhonetocz.com E-mail: [email protected] – LIVROS PARA BEBÊS E CRIANÇAS Texto: Ninfa Parreiras 240 páginas R$ 42,00 Editora RHJ www.editorarhj.com.br A produção de livros para bebês e crianças carece de um estudo sobre as publicações, a divulgação e o acesso a essas obras. Que livros chegam aos bebês? Há literatura para bebês? Qual a diferença entre livros e literatura para os pequenos? Essas e outras questões são discutidas no livro de Ninfa Parreiras, colaboradora de Direcional Educador, com exemplos comentados de livros destinados aos bebês. Leitura imperdível para os educadores de crianças pequenas. A BUSCA DE ESMERALDO Texto: Ilan Brenman Ilustrações: Fernando Vilela 32 páginas R$ 22,40 Editora Paulinas www.paulinas.org.br Esmeraldo, de 10 anos, não se conformava com o sofrimento da família no sertão nordestino. Ele ajuda a mãe a criar os irmãos, enquanto o pai tomava o pau-de-arara para ganhar o sustento do dia que, na maior parte das vezes, vinha em forma de arroz e farinha. Toda vez que Esmeraldo perguntava à mãe porque tanta dificuldade, ela respondia: “Porque Deus quis assim, fio”. Esmeraldo, então, decidiu procurar Deus para uma conversinha. Saiu pelo mundão, perguntando às pessoas onde poderia encontrá-lo, até que, depois de muitas andanças, descobriu que Deus está mais perto do que imaginamos: dentro da gente. MEU IRMÃO NÃO ANDA, MAS PODE VOAR Texto: Angel Barcelos Ilustrações: Manoel Veiga 24 páginas R$ 29,00 Editora Autêntica www.autenticaeditora.com.br Com um texto simples e sensível, Angel Barcelos percorre temas como solidão, amizade, família, deficiência, aceitação e imaginação. A garotinha queria muito ter um irmão ou irmã. Afinal, todas as suas amiguinhas tinham. No seu aniversário de sete anos, ganhou o melhor presente do mundo: a mãe lhe disse que logo o irmãozinho iria chegar. Ela achou esquisito, pois a barriga da mãe não tinha crescido. Estranhou ainda mais quando ele chegou: não era um bebê, mas um menino maior que ela e que não podia andar, pois era cadeirante. João seria seu irmão de coração. O VELHO, O MENINO E O BURRO Texto: La Fontaine, recontada por Monica Stahel Ilustrações: Laura Michell 32 páginas R$ 29,80 Editora WMF Martins Fontes www.wmfmartinsfontes.com.br Bastou seu Tonho sair pela estrada com o neto Tonico e o burro Jaca, para todo o mundo começar a dar palpite na vida dos três. Olívia lavadeira, seu Carmélio carreteiro, dona Zefa e seu neto remelento são alguns dos personagens vivos e engraçados criados por Monica Stahel para recontar a conhecida fábula de La Fontaine. E mais uma vez se confirma que quem só vai atrás da conversa dos outros acaba se atrapalhando. O LOBINHO BOM Texto e ilustrações: Nadia Shireen 32 páginas R$ 26,90 Editora Brinque-Book www.brinquebook.com.br Era uma vez um lobinho bom chamado Rolf. Ele era gentil com seus amigos, comia todas as verduras do prato e adorava fazer bolos. Mas lobos de verdade não são bons – lobos de verdade são grandes e maus. Será que Rolf vai conseguir encontrar o grande lobo mau que vive dentro dele? O livro apresenta uma história inteligente e engraçada, que questiona a lógica tradicional dos contos de fada. O final é surpreendente! “NÓS” DO BRASIL – ESTUDO DAS RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS Texto: Rosiane Rodrigues 152 páginas R$ 35,90 Editora Moderna www.modernaliteratura.com.br As leis 10.639/2003 e 11.645/2008 tornaram obrigatório o estudo de história da África, dos africanos, dos negros e indígenas brasileiros e provocaram uma reformulação na Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB). “Nós” do Brasil, escrito pela jornalista Rosiane Rodrigues, foi estruturado para servir como ferramenta pedagógica à aplicação dessa legislação. É um livro multidisciplinar, voltado para os alunos do Ensino Médio. Explicita a construção dos preconceitos que rondam as histórias, as expressões artísticas e culturais presentes nas relações de africanos, afrodescendentes e indígenas no Brasil. Direcional Educador, Junho 13 Direcional Educador, Junho 13 E agora, Professor? 49 AGENDA EVENTOS XXVII ENCONTRO ESTADUAL DE SUPERVISORES DE ENSINO APASE Tema: “Vida e Conhecimento: currículo e herança civilizatória - os desafios aos trabalhadores da educação escolar” Data: 4 a 7 de junho de 2013 Local: Hotel Vacance - Aguas de Lindóia - SP Realização: APASE - Sindicato dos Supervisores de Ensino do Magistério Oficial no Estado de São Paulo Informações: (11) 3337-6895 Site: http://www.sindicatoapase.org.br E-mail: [email protected] VI CONGRESSO DE TRANSTORNOS E DIFICULDADES DE APRENDIZAGEM II COORDENAR - FÓRUM INTERNACIONAL DE COORDENAÇÃO, ORIENTAÇÃO E SUPERVISÃO PEDAGÓGICA I SIMPÓSIO INTERNACIONAL PARA DIRIGENTES DA EDUCAÇÃO PÚBLICA Data: 8 e 9 de junho de 2013 Local: Centro Sul - Florianópolis - SC Realização: Conexa Eventos Informações: (31) 3225-7678 Site: http://www.institutoconexa.com.br Email: [email protected] III JORNADA SOBRE NEUROEDUCAÇÃO - NEUROCIÊNCIAS APRENDIZAGEM E TECNOLOGIA Data: 8 e 15 de junho de 2013 Local: Colégio Pedro II - Auditório Mário Lago Rua Campo de São Cristovão, 177 - São Cristóvão - RJ Realização: Creative Ideias Informações: (21) 2577-8691 – (21) 3246-2904 Site: http://www.creativeideias.com.br E-mail: [email protected] Direcional Educador, Junho 13 12º CONGRESSO INTERNACIONAL DE EDUCAÇÃO DA LBV Tema: “A arte na arte de educar: uma visão além do intelecto” Data: 26 a 28 de junho de 2013 Local: Instituto de Educação José de Paiva Netto Av Rudge, 700 - Bom Retiro - SP Realização: LBV Legião da Boa Vontade e AEBV Associação Educacional da Boa Vontade Informações: (11) 3255-4590 – 3361-6078 Site: http://www.lbv.org/congressoeducacao E-mail: [email protected] - [email protected] 50 9ª JORNADA INTERNACIONAL DE EDUCAÇÃO DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO Data: 28 a 29 de junho de 2013 Local: Centro de Convenções Sul América Av. Paulo de Frontin, 1 - Cidade Nova - Rio de Janeiro - RJ Realização: Futuro Eventos Informações: (41) 3033-8100 Site: http://www.futuroeventos.com.br E-mail: [email protected] - feiras@futuroeventos. com.br IV ENCONTRO BRASILEIRO DE MEDIADORES Tema: “Uma sociedade em transformação” Data: 29 e 30 de junho de 2013 Local: Senac Consolação Rua Dr Vila Nova, 228 - Consolação - SP Informações: (11) 2189-2100 Site: http://www.sp.senac.br/jsp Email: [email protected] SIMPÓSIO DE ARTE-EDUCAÇÃO Tema: “Educar com Arte e a Arte de Educar” Data: 5 de julho de 2013. Local: Colégio Pedro II - Auditório Mário Lago Rua Campo de São Cristovão, 177 - São Cristóvão - RJ Realização: Wak Projetos Culturais Informações: (21) 3208-6113 – 3208-6085 Site: http://www.wakeditora.com.br Email: [email protected] SIMPÓSIO DE ARTETERAPIA Tema: “A construção de caminhos e os campos de atuação” Data: 5 e 6 de julho de 2013 Local: Colégio Pedro II - Auditório Mário Lago Rua Campo de São Cristovão, 177 - São Cristóvão - RJ Realização: Wak Projetos Culturais Informações: (21) 3208-6113 – 3208-6085 Site: http://www.wakeditora.com.br Email: [email protected] 12º CONGRESSO DO ENSINO PRIVADO GAÚCHO Tema: “A maestria do professor na arquitetura da aprendizagem” Data: 17 a 19 de julho de 2013 Local: PUC - Pontifícia Universidade Católica - Porto Alegre - RS Av Ipiranga, 6.681 - Partenon - Porto Alegre - RS Realização: SINEPE - RS - Sindicato do Ensino Privado Informações: (51) 3213-9090 Site: http://www.sinepe-rs.org.br/congresso Email: [email protected] 2º FORÚM INTERNACIONAL DE GESTÃO, LIDERANÇA E COMPETÊNCIAS NA EDUCAÇÃO Data: 18 a 20 de julho de 2013 Local: EXPO UNIMED CURITIBA Rua Prof. Pedro Viriato Parigot de Souza, 5.300 - Campo Comprido Curitiba - PR Realização: Futuro Eventos Informações: (41) 3033-8100 Site: http://www.futuroeventos.com.br E-mail: [email protected] - feiras@futuroeventos. com.br 13ª JORNADA INTERNACIONAL DE EDUCAÇÃO DA BAHIA Data: 25 a 27 de julho de 2013 Local: Centro de Convenções da Bahia Praia da Armação, S/Nº - Jardim Armação - Salvador - BA Realização: Futuro Eventos Informações: (41) 3033-8100 Site: http://www.futuroeventos.com.br E-mail: [email protected] - feiras@futuroeventos. com.br Direcional Educador, Junho 13 VII SEMINÁRIO INTERNACIONAL - AS REDES EDUCATIVAS E AS TECNOLOGIAS Tema: “Transformações e Subversões na atualidade” Data: 3 a 6 de junho de 2013 Local: Faculdade de Educação - UERJ - RJ Realização: Proped - UERJ, Faculdade de Educação - UERJ ANPEd Informações: (21) 2334-0467 Site: http://www.seminarioredes.com.br E-mail: [email protected] 51