Tributação da exploração internacional de satélites e do

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Tributação da exploração internacional de satélites e do
TRIBUTAÇÃO
DA EXPLORAÇÃO INTERNACIONAL
DE SATÉLITES E DO PROVIMENTO
DE CAPACIDADE ESPACIAL
Heleno Taveira Tôrres1
1.
SATÉLITES - ASPECTOS TÉCNICOS E FUNCIONAIS
Visando a melhor explicitação do que significa a atividade de locação de
capacidade satelital, faz-se necessário esclarecer previamente sobre o funcionamento técnico dos equipamentos utilizados, bem como sobre as modalidades existentes.
Para seu funcionamento, o satélite requer estações terrenas, formando um
conjunto indissociável,2 sendo as plataformas espaciais (busses) geralmente dotadas, a depender do modelo ou finalidade, de equipamentos de medidas, observações ou telecomunicações propriamente ditos, com transceptores de rádio e antenas de alto ganho, amplificadores de alta potência e téc1
2
Professor e Livre-Docente de Direito Tributário do Departamento de Direito Econômico
e Financeiro da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (Graduação e PósGraduação). Doutor, pela PUC/SP. Mestre em Direito Tributário (UFPE). Especializado em Direito Tributário Internacional, pela I Universidade de Roma “La Sapienza”.
Membro Honorário do Colegio de Abogados de Lima. Ganhador do “16º Prêmio Tributarista IOB - Thomson” (biênio 2002 a 2003) e do Prêmio Amílcar de Araújo Falcão
(Autor do Ano - 2004), pela Academia Brasileira de Direito Tributário. Advogado.
Como assinala a Lei nº 9.691, de 22 de julho de 1998, por exemplo, há diversos equipamentos vinculados à atividade satelital, como: a) terminal de sistema de comunicação global por satélite; b) estação terrena de pequeno porte com capacidade de transmissão e diâmetro de antena inferior a 2,4m, controlada por estação central; c) estação
terrena central controladora de aplicações de redes de dados e outras; d) estação terrena
de grande porte com capacidade de transmissão, utilizada para sinais de áudio, vídeo,
dados ou telefonia e outras aplicações; e) estação terrena móvel com capacidade de
transmissão; f) estação espacial geoestacionária (por satélite), g) estação espacial nãogeoestacionária (por sistema).
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nicas de modulação à prova de ruídos.
O “sistema satélite” não se reduz unicamente ao aparato espacial, sendo
imprescindível a presença de outros meios. Segundo o Decreto nº 1.332,
de 8 de dezembro de 1994, que versara sobre a atualização da Política Nacional de Desenvolvimento das Atividades Espaciais, a expressão sistemas
espaciais deve ser usada para indicar “engenhos destinados a operar no
espaço ou a viabilizar a operação no espaço de equipamentos destinados a
permitir ao homem acesso a informações ou serviços. E daí referir-se à
infra-estrutura espacial como o “conjunto de instalações, sistemas ou equipamentos de superfície, bem como serviços associados, que proporcionam o apoio necessário à efetiva operação e utilização dos sistemas espaciais. Incluem-se nesta categoria os centros de lançamento de foguetes, de
veículos lançadores de satélites e de balões estratosféricos; os laboratórios
especializados de fabricação, testes e integração; as estações e os centros de
rastreio e controle, bem como os de recepção, tratamento e disseminação
de dados de satélites”.
Estação Terrena pode ser definida como “a estação localizada sobre a superfície da Terra ou dentro da atmosfera terrestre que se comunica com
uma ou mais estações espaciais ou, ainda, com uma ou mais estações do
mesmo tipo, por meio de um ou mais satélites refletores ou outros objetos
no espaço”.3 Trata-se, portanto, de instrumento indispensável para o aperfeiçoamento das atividades espaciais.
Destarte, por “sistema satélite”, como usa referir-se a ANATEL, no mínimo, devemos reconhecer o conjunto formado pelo(s) satélite(s) brasileiro(s) e pela(s) estação(ões) de controle, organizado para a exploração comercial. E estes convivem ao lado daqueles chamados de “satélite(s) estrangeiro(s)”, distinção acolhida pela art. 171, 2º, da Lei nº 9.472/97
(LGT).4 A atividade satelital não pode prescindir das bases terrestres
3
4
Decreto nº 5.118, de 28.06.2004, que promulgou o Acordo entre o Brasil e a Argentina
para o Provimento de Capacidade Espacial, celebrado em 8 de maio de 2001.
O art. 9º do Anexo à Resolução nº 220/2000 (Regulamento sobre o Direito de Exploração de Satélite para Transporte de Sinais de Telecomunicações) define Satélite Estrangeiro, por oposição a satélites brasileiros, no seguinte modo: “XV - é aquele que utiliza
recursos de órbita e espectro radioelétrico coordenados ou notificados por outros países”. Apenas para conferência, segundo o mesmo artigo, “satélite brasileiro é o que
utiliza recursos de órbita e espectro radioelétrico notificados pelo País, ou a ele dis-
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(transmissão ou recepção), que podem ser de distintos tipos, como as redes
por pontos ou do tipo VSAT, ponto-multiponto, com estações espalhadas
em grandes áreas e todas interligadas via satélite, como são as redes bancárias de agências, para o processamento de dados, dentre outros, ou multiponto-multiponto, como veremos.
O satélite5 (artificial) é meio a ser empregado nas mais diversas aplicações,
especialmente para as telecomunicações, constituindo-se em instrumento
técnico de grande importância na atualidade pela capacidade que possui de
situar-se em posições espaciais previamente delimitadas, aqueles de órbitas
fixas (geoestacionários), com altitude e velocidade constantes, ou mesmo
em movimento em torno da terra, na busca do melhor desempenho (nãogeoestacionários), reduzindo duplicidade de meios ou permitindo soluções
mais eficientes para as prestações de serviços de longa distância.
E todo esse sistema deve permitir o melhor êxito de eficiência e confiabilidade das atividades desempenhadas pelo satélite mediante a capacidade
satelital, para os fins de prestações de serviços veiculados por esta via. A
eficiência oferecida pelo explorador de satélite consiste na garantia de manutenção da órbita e reconhecimento das freqüências atribuídas, com ausência ou nível mínimo de ruídos ou interferências, além da adequada conversão e amplificação de sinais compatíveis, para satisfação da chegada dos
sinais aos destinatários pretendidos. E isso só é possível pela confiabilidade no equipamento, na provisão de capacidade satelital, pela durabilidade,
autonomia, manutenção, e correções oportunas de desvios de órbita.
A duração física do satélite não se confunde com a duração das suas atividades operacionais, conforme sua posição na órbita6 indicada e dentro do
5
6
tribuídos ou consignados, e cuja estação de controle e monitoração seja instalada no
território brasileiro”.
KERREST, Armel. Les Systemes Global de satellites pour les recherches et sauvetage. t.
93, n. 4, Paris: Revue Général de Droit International Public., 1989, p. 831-856. QUEIROZ, Carlos A. P. “Introdução às Comunicações por Satélites”. In: OLIVEIRA, Celso de.
Tópicos Especiais em Comunicações. 2005. <http://www.lcs.poli.usp.br/~celso/
PTC_2459/Documents/09_Sat.pdf> acessado em 05.08.2005. ANEFALOS, L C. “Análise da utilização de sistemas de rastreamento por satélite em empresas de transporte rodoviário de cargas”. In: CAIXETA FILHO, José Vicente. Transportes terrestres (aspectos
econômicos). São Paulo: Atlas, 2001, p. 194-218.
O uso de órbita terrestre, para fins de comunicações, foi defendido em 1945, por Artur
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período acordado entre as partes. O não atingimento da órbita ou mesmo
seu eventual deslocamento, por término de combustível ou qualquer outra
razão, simplesmente inutiliza o satélite para seu uso. O mesmo não se diga
com a capacidade satelital, que se mantém, independentemente do equipamento utilizado.
1.1. Satélites geoestacionários e não-geoestacionários
Cumpre, desde logo, distinguir os satélites geossincrônicos ou geoestacionários (i), que são aqueles carentes da possibilidade de mudança autônoma
da posição geográfica (geralmente situados na órbita geoestacionária), por
vir programado pela operadora para atuar na posição alcançada desde o seu
lançamento (configuração fixa); daqueles não-geoestacionários (ii), por
disporem de equipamentos de propulsão que lhes permitem deslocamentos
e mudanças de órbitas.
O Regulamento da UIT define o satélite geossincrônico como “o satélite da
Terra cujo período de revolução é (quase) igual ao período de rotação terrestre em torno do próprio eixo”. Na posição que lhe for atribuída, há de
permanecer. E aí remanesce para cobrir determinada área geográfica fixa,
com a finalidade de permitir que outros sujeitos possam prestar serviços de
telecomunicação, localização, identificação ou mesmo de navegação. Cabe, portanto, à operadora de satélite monitorar tal posicionamento, efetuando ajustes, se necessário, usando dos motores de combustível propelente
que permite efetuar a correção de órbita ou de posicionamento em relação à
órbita originária (estacionária).
Essa possibilidade somente pode ser alcançada pelos aparatos situados na
chamada Órbita Geoestacionária,7 que é a faixa espacial circular, situada na
linha do Equador, com aproximadamente 35.800 km de altura, cujas dimensões alcançam 150 km de largura (norte-sul) e 30 km de altura da faixa em
7
C. Clarke, mas somente com o “INTELSAT I”, o primeiro satélite comercial (1965)
foi posto em órbita.
“Why is the Geostationary Orbit so important? The GSO is generally recognized as a
limited national resource which is the best place for some satellite activities. Communications satellites in geostationary orbit have the capability to exchange information across
very large distance. Certain parts of the geostationary orbit are more in demand than others”. DIEDERIKS-VERSCHOOR. “Telecomunications satellites and international law”. In:
Telecomunications satellites and international law. Bruxelles: Bruylant, 1989, p. 14.
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torno da Terra, o que permite ao satélite mover-se na mesma direção e com
a mesma velocidade de rotação terrestre, perfazendo uma volta completa em
24 horas, mantendo posição fixa (estacionada) em relação à terra. Satélite
geoestacionário, portanto, é todo aquele que atua como estação repetidora
em órbita circular da terra, permitindo o contato entre estações separadas
por longas distâncias, a partir de freqüências previamente designadas.8
Além destes, existem os satélites não-geoestacionários, de baixa altitude,9
para atender à telefonia móvel, sensoriamento e outras finalidades que exigem deslocamentos ou mudanças de órbitas. Neste caso, o satélite movimenta-se segundo o interesse das atividades realizadas, como é o caso do
sensoriamento geográfico, mediante comutação dinâmica, ou mesmo por
controle remoto. Nos geoestacionários, diversamente, não há qualquer
possibilidade para ajustar o transponder às posições desejadas, salvo os
ajustes visando a garantir posição de órbita, pela característica de fixidez de
órbita, preestabelecida como medida para atender a uma determinada atividade ou área de cobertura.
Em ambas as modalidades, a depender das funções exercidas pelos satélites,
estes podem realizar atividades típicas de prestações de serviços (i), como é
o caso do sensoriamento remoto ou levantamentos aerofotogramétricos, ou
limitar-se à disponibilidade da capacidade espacial (ii). Neste caso, eles
funcionam como uma espécie de “espelho”, a refletir os feixes de ondas
enviados, com simples ampliação de sinal,10 segundo as funções desempenhadas pelo transponder,11 ao receber e transmitir sinais radioelétricos, a
8
9
10
11
A Lei nº 9.472/97 dispõe os requisitos e critérios específicos para execução de serviço
de telecomunicações que utilize satélite, geoestacionário ou não, independentemente
de o acesso a ele ocorrer a partir do território nacional ou do exterior (vide art. 170 e
seguintes).
Cfr. OHMORI, Shingo, Hiromitsu WAKANA, Seiichiro KAWASE. Mobile satellite communications. Boston: Artech House, 1998, 466 p.; JAMALIPOUR, Abbas. Low earth orbital
satellites for personal communication networks. Boston: Artech House, 1998, 273 p.
Nesse mesmo sentido: “Los satélites no son sino repetidores, esto es, simples reflectores de las ondas radioeléctricas colocados en el espacio. En un caso -los satélites pasivos- reciben las ondas de una estación emisora situada en la tierra y las reemiten a una
gran antena, también situada en la tierra, que, a su vez, las transmite hasta los receptores individuales”. CHINCHILLA MARÍN, Carmen. La radio-televisión como servicio público esencial. Madrid: Tecnos, 1988, p. 112.
O termo transponder decorre da combinação entre as palavras transmitter e responder.
121
partir de distintas faixas de freqüência. Nesses casos, a estação terrestre,
pelas atribuições prévias de posições orbitais e freqüências, remete um sinal
(com conteúdo de dados, imagem ou voz), numa dada freqüência (freqüência de transmissão) com capacidade radioelelétrica suficiente para alcançar
o satélite (uplink); e este, por sua vez, capta o sinal pelo transponder (i) que
o amplia, haja vista toda a perda de intensidade sofrida no percurso, (ii)
opera sua modificação para a “freqüência de recepção” (batimento de freqüência), necessário para que os sinais de transmissão e de recepção não se
confundam, e transfere o mesmo sinal, agora em nova freqüência, para alcançar a área de sua cobertura (downlink). Desse modo, qualquer estação
que estiver situada no campo de cobertura do satélite poderá captar o sinal,
sem interferência do operador de satélite sobre seu conteúdo ou identificação do efetivo emitente ou destinatário do conteúdo do sinal.
2.
EMPREGO DOS SATÉLITES
Como dito acima, as atividades espaciais contemplam soluções para os
mais diversos problemas, a exigir uma adequada análise das atividades
concretizadas, quando teremos obrigatoriamente que diferençar as funções
desempenhadas pelos satélites envolvidos, pois em alguns casos teremos
funções passivas de simples provisão da capacidade satelital, como é o
caso das telecomunicações ou da radiodifusão em geral (salvo alguns casos
específicos); bem como típicas prestações de serviços diretamente por satélite, como no caso do monitoramento ambiental, vigilância, inventário e
monitoramento de recursos naturais ou previsão do tempo e do clima,
quando informações são colhidas, analisadas pelo próprio satélite e transmitidas na condição de dados prontos para as bases terrestres.
O satélite, como veículo de sinais telecomunicações, é equipamento que
funciona sempre pela capacidade espacial atribuída, definida pela manutenção da posição orbital (i) e configuração dos canais nas radiofreqüências
designadas (ii), operado por uma estação de controle terrestre da empresa
que explora o provimento de capacidade satelital, em favor dos prestadores
de serviços de telecomunicações (a). Contudo, há diversos outros fins nos
quais o satélite pode ser empregado, como, por exemplo: (b) satélite de coleta de dados, que permite obter dados sobre geologia, hidrografia, meio ambiente e outros, para serem coletados por bases terrestres (ex. satélites SCD-1,
SCD-2 e CBERS-1); (c) Satélite de Sensoriamento Remoto, destinado à teledetecção ou percepção remota, a permitir o monitoramento dos recursos
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naturais, como, por exemplo, queimadas, desmatamentos e similares, a operar com sistemas de detecção das ondas eletromagnéticas emitidas ou refletidas pela superfície; E, por fim, o (d) satélite meteorológico, cujo objetivo é
monitorar a atmosfera e a superfície terrestre, fornecendo dados para a elaboração das previsões do tempo. Nestes casos, as funções dos satélites podem
ser ampliadas ou completamente modificadas, com efetivos serviços prestados (fotografia etc) ou simples medidas de batimento de ondas.
Deveras que o regime tributário aplicável aos casos de funções ativas,
quando há efetiva prestação de serviços por meio do satélite, não se pode
confundir com a atribuição de capacidade satelital, quando verifica-se
simples posição passiva, de refração de ondas acompanhada de ampliação
das freqüências. Nesta hipótese, o satélite não atua, posto ser simples meio, como instrumento de prestação de serviços. Na sua condição de fornecedor de capacidade de satélite, o proprietário ou explorador da capacidade de satélite limita-se a garantir àqueles (contratantes) a manutenção da
órbita ou da posição geoestacionária (i) e das freqüências contratadas (ii), a
serem reconhecidas pelo transponder, bem como a manutenção e funcionamento do equipamento, para que tais finalidades possam ser atingidas e
os serviços fornecidos pelos contratantes da capacidade satelital efetivamente prestados aos seus usuários.
Fundamental, pois, analisar as atividades executadas, pois poderemos ter
casos típicos de telecomunicações via satélite, com o uso desses equipamentos integrando a rede de telecomunicações de uma dada concessionária,
permissionária ou autorizatária, como no caso de serviço de radiocomunicação12 por satélite prestado pela própria exploradora de satélite; mas também casos de simples disponibilidade de capacidade satelital, como recurso
que permite acesso da contratante às redes alheias, ao permitir que prestadores de serviços de telecomunicações possa facilitar a um dado usuário o
acesso às redes de outros prestadores de serviços, para alcançar algum dos
seus pontos de recepção, na longa distância nacional ou internacional.
Além das telecomunicações, temos ainda a radiodifusão via satélite, que
consiste em emitir ou retransmitir sinais abertos ao público ou dirigidos a
certos e determinados sujeitos (radiodistribuição de sinais). Ademais, tem12
Cf. Lei nº 9.472, art. 162, § 1° “Radiocomunicação é a telecomunicação que utiliza
freqüências radioelétricas não confinadas a fios, cabos ou outros meios físicos”.
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se a simples radiodeterminação, para assinalar posições, velocidades e outros de um determinado objeto, bem como obtenção de informações sobre
ele (radiotelecomunicação), o que pode ser feito por radiogonometria, que
usa de recepção de ondas eletromagnéticas para determinar a direção de um
objeto. Em cada caso, contudo, urge conhecer as peculiaridades apresentadas e as características técnicas que envolvem cada ato de disponibilidade
de capacidade satelital para tais prestações de serviços por terceiros.
Passemos a descrever algumas dessas possibilidades de emprego dos satélites.
2.1. Telecomunicações por satélites
Os satélites, por serem sistemas radioelétricos de alta eficiência, quando
empregados nas telecomunicações, operam em conjunto com estações terrenas para garantir o máximo de universalização, princípio fundamental
das telecomunicações. Contudo, fundamental separar a relação entre a
prestadora de serviços de telecomunicações e a exploradora dos serviços de
satélites daquelas outras firmadas entre usuários e operadoras ou mesmo
entre distintas operadoras, porquanto nessas hipóteses geralmente tem-se
típicos serviços de telecomunicações e naquel’outra provisão de capacidade satelital, que com estes não se confunde.
A vantagem do sistema satelital, para as telecomunicações, é aquela de
consentir a multiplicação e otimização da distribuição de sinais, na medida
que permite a difusão do sinal pelas distintas estações terrestres,13 as quais,
por meio de redes, cabos e outros meios, pode transmitir a comunicação a
quem interessa, caso o sistema usado não o permita diretamente. Contudo,
para que isso se verifique, as prestações de serviços de comunicação requerem, como meio de propagação, o recurso à capacidade espacial, para
obter acesso a redes alheias ou alcançar o destinatário dos dados, sons ou
imagens. Distintos que são, as remunerações pagas não se confundem e
sequer se comunicam entre si.
A Lei nº 9.295, de 19 de julho de 1996, por sua vez, já dispunha sobre os
serviços de telecomunicações e sua organização, e distinguia, de modo
13
Cf. VALASTRO, Alessandra. Liberta di comunicazione e nuove tecnologie - inquadramento costituzionale e prospettive di tutela delle nuove forme di comunicazione interprersonale. Milano: Giuffrè, 2001, pp. 13 e ss.
124
claro, no art. 1º, a organização dos serviços de telecomunicações (i), a exploração de Serviço Móvel Celular (ii), de Serviço Limitado e de Serviço
de Transporte de Sinais de Telecomunicações por Satélite (iii), bem como a
utilização da rede pública de telecomunicações para a prestação de Serviço
de Valor Adicionado (iv), para, em seguida, definir, no art. 2º, § 3º, o Serviço de Transporte de Sinais de Telecomunicações por Satélites como o
“serviço de telecomunicações que, mediante o uso de satélites, realiza a
recepção e emissão de sinais de telecomunicações, utilizando radiofreqüências predeterminadas”.
Como já antecipado, em um sistema de comunicações por satélite, são
necessários, como infra-estrutura mínima, os seguintes equipamentos: o
satélite, o centro de controle (de propriedade da empresa detentora do satélite e que realiza todas as operações necessárias à manutenção em órbita e
operações às quais se propõe: TT&C - Telemetry Tracking and Control) e a
estação terrena (que permite a conexão com a rede de comunicação). E
somente na análise das funções desempenhadas pelas estações terrenas, na
respectiva prestação de serviços, é que se pode qualificar adequadamente o
tipo dos serviços prestados. Os Regulamentos da UIT, por exemplo, permitem verificar a existência de dezessete modalidades diferentes serviços
telecomunicações por satélite.
Quanto à estação espacial propriamente dita, um satélite pode ter vários
canais de operação no seu transponder, logo, com capacidade para receber
e transmitir dezenas de sinais recebidos ao mesmo tempo, com freqüências
diferentes ou operando em distintas faixas de transmissão. Além disso, os
satélites podem possuir mais de um transponder, cada um com pares de
receptores e transmissores de rádio, para permitir o uso por terceiros interessados na posição de órbita do satélite e freqüências atribuídas, a capacidade satelital, que não é mais do que o recurso que permite aos prestadores
de telecomunicações usarem dessa “estrada” de ondas hertzianas, para o
que o satélite presta-se como meio de simples facilitação, sem qualquer
gerência sobre os dados trafegados.
Quanto aos sistemas adotados, os satélites de comunicação atuais operam
com diversos modelos de acesso aos canais de transponder, a exemplo do
FDMA, SCPC e TDMA, o que permite simultâneas operações com as esta-
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ções terrenas.14 Nestes casos, tanto nas operações de uplink quanto de downlink, que devem possuir sempre freqüências autônomas, para evitar confusão
ou interferências, na necessária conversão efetuada pelo transponder, as
freqüências são agrupadas em bandas denominadas “L” (0,5 a 1,5 GHZ),
“C” (4 a 8 GHZ), “Ku” (10,9 a 17 GHZ) e “Ka” (18 a 31 GHZ). Para os
encaminhamentos de ondas ao satélite (uplink), usa-se de freqüências entre
faixas de 3700 a 4200 MHz; enquanto que do satélite às bases terrestres
(downlink), opera-se com faixas de freqüência entre 5925 a 6425 MHz, todas
divididas em 12 canais por transponder e necessariamente conversíveis.
Segundo a possibilidade de “acesso”, as telecomunicações por satélite podem ocorrer “ponto-a-ponto” ou por “radiodifusão por satélite” (multiponto). O Serviço fixo de satélite (fixed satellite service - FSS), em particular,
por meio do serviço ponto-a-ponto (point-to-point service), é geralmente
executado, na sua ampla maioria, por satélites geoestacionários. O sistema
“ponto-a-ponto” consiste nas transmissões fixas ou móveis entre uma estação terrena e o satélite, onde são amplificados e logo retransmitidos a um
destinatário específico, segundo o prévio acordo entre transmissor e receptor, sem qualquer interferência do satélite sobre as atividades ou conteúdos
veiculados por estes. Este é o caso de serviços de telefonia fixa ou móvel.
14
Como descreve Adalton Toledo, os mecanismos de acesso a redes de telecomunicações via satélite podem ter os seguintes padrões: “FDMA - No Acesso Múltiplo por Divisão de Freqüência (FDMA) a faixa de freqüência de um transponder é subdividida
em partições menores de tamanho variável, em função do número de canais de voz
transmitidos em cada uma das partições. Os canais de voz (1) são multiplexados em
freqüência, aplicados em um modulado r FM (2) e, em seguida, convertidos para a
freqüência do enlace de subida (uplink) transmitida até o satélite (7). No sentido oposto (downlink) a freqüência RX (9) é convertida e demodulada (12) até gerar novamente os canais de voz (13). SCPC - O acesso SCPC (Single Channel per Carrier) permite
a transmissão da voz digitalizada a 64 kbps ou dados com velocidade de 2048 kbps
(2Mbps) em modo duplex. A capacidade de transmissão é de 800 canais de voz dentro
da faixa de 36 MHz do transponder, com modulação QDPSK. Este tipo de modulação
transmite 2 bits de cada vez a uma taxa de 32 kbaud. Assim, cada canal ocupa uma
banda em 45 kHz, ou seja, 36 MHz/800 canais. TDMA - O acesso TDMA é baseado na
multiplexação por divisão de tempo, usada nos sistemas móveis. A diferença é que cada intervalo de tempo(partição) é, em geral, endereçado a uma estação terrena distinta. Cada quadro formado por um número n de partições é dividido em três partes”.
TOLEDO, Adalton P. Redes de acesso em telecomunicações. SP: Makron Books, 2001,
p. 161-3; ver ainda: NASCIMENTO, Marcelo B. do; TAVARES, Alexei C. Tecnologia de
acesso em telecomunicações. SP: Berkeley, 2002, p. 71-82; FERRARI, Antonio Martins.
Telecomunicações - evolução e revolução. SP: Erica, 1998, pp. 99 e ss.
126
Fundamental adicionar que esses mecanismos de comunicação “ponto-aponto”, na atualidade, evoluíram para a tecnologia multipontos a multipontos, usando de satélites geoestacionários ou não-geoestacionários, que permite reutilizar freqüências de subida ou de descida para que o satélite possa
comunicar-se, ao mesmo tempo, com várias estações terrenas usando a
mesma freqüência, ao transmitir beams dirigidos a distintas estações. Com
isso, verifica-se uma otimização da capacidade satelital.
Usando de satélites de órbita baixa (não-geoestacionários), o serviço de
telefonia móvel (mobile satellite service - MSS) consiste em transmitir
sinais entre estações terrenas móveis usando de uma ou mais estações espaciais, por meio da provisão de capacidade espacial. O sistema da constelação INMARSAT é o mais empregado para esse propósito, contudo, atualmente existem satélites de órbita baixa, como os da constelação GLOBALSTAR, e que se prestam às comunicações por aparelhos celulares, que
podem operar em single-mode (apenas por satélite) ou em dual-mode (de
acesso consentido à rede satelital ou àquelas de celulares terrestres).15
Seja qual for a modalidade, na atividade de telecomunicações por meio de
satélites, tem-se, na sua ampla maioria, o seu uso como instrumento de
reflexão entre as duas estações terrestres, a de transmissão ou “freqüência
de subida” (uplink) e, após a amplificação operacional dos sinais recebidos,
pela retransmissão efetuada, a recepção dos sinais “freqüência de descida”
(downlink). Nestas hipóteses, em si mesmo, o satélite não interfere na comunicação, não efetua qualquer gerência sobre as informações veiculadas
ou agrega qualquer vantagem especial.
E não se diga que o fato de haver “retransmissão” ou “amplificação” dos
sinais possa justificar a qualificação de qualquer modalidade de serviço de
“comunicação”. Indubitavelmente, não se pode atribuir tais papéis, porque
são efetuados como simples recurso operacional, sem o qual nada teria a
fazer, pois, a agir diversamente nunca atingiria sua finalidade, a manter o
sinal na freqüência recebida (amplificação); ou por não ter qualquer participação no tratamento das informações recebidas ou transmitidas (retransmissão). Tampouco vê-se remunerado por tais atos, isoladamente, a justi15
NUZZO, Enrico. “L’interpretazione della legge nella definizione del regime impositivo
del servizio di telefonia satellitare”. In: Rassegna Tributaria. Roma: ETI, 1999, a. XLII, nº 5, set.-out., p. 1309-27.
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ficar a existência autônoma do serviço.
O que empresas de telecomunicações contratam com as operadoras de
satélite é unicamente a capacidade de recepção e de transferências de seus
dados, voz ou imagens, a partir do acesso à órbita ou da posição orbital e
freqüências atribuídas. A relação comunicacional que eventualmente trafegue por essa via não é resultado dos labores da operadora de satélite. Seu
atuar é outro. Consiste em permitir àquelas empresas de telecomunicações
interessadas acessarem outras redes, a partir do acesso à órbita do satélite,
seguindo a freqüência da capacidade oferecida.
Apenas como exemplo, no Brasil, para que alguém possa operar com satélites, após a competente licitação e adjudicação de freqüências, firma-se o
Termo de Direito de Exploração de Satélite, entre a ANATEL e a operadora, com o objetivo de permitir a Exploração de Satélite para Transporte de
Sinais de Telecomunicações, na órbita designada e pelo prazo indicado,
que geralmente é de quinze anos. A partir desse momento, passa-se a falar
em direito de exploração de satélite, o que, conforme o art. 172, da Lei nº
9.472/97 (LGT), corresponde a um conteúdo bem demarcado:
“O direito de exploração de satélite brasileiro para transporte
de sinais de telecomunicações assegura a ocupação da órbita
e o uso das radiofreqüências destinadas ao controle e monitoração do satélite e à telecomunicação via satélite, por prazo
de até quinze anos, podendo esse prazo ser prorrogado, uma
única vez, nos termos da regulamentação” (g.n.).
Como é possível verifica-se, o direito de exploração de satélite assegura
dois direitos bem definidos:
i) a ocupação da órbita ou de posição de órbita (nos geoestacionários) e
ii) o uso das radiofreqüências destinadas ao controle e monitoração do
satélite (a) e à telecomunicação via satélite (b).
É certo que o “caput” do artigo fala em “transporte de sinais de telecomunicações”, mas o faz para designar o que opera o satélite, ou seja, o que
permite o “transporte” da telecomunicação, como meio, com ela não se
confundindo. O conteúdo do direito de exploração de satélite está bem
marcado, a partir da ocupação da órbita (i) e o uso das radiofreqüências
128
(ii), sendo que esta em dúplice função, ou seja: monitoração do satélite (a),
o que é feito em favor unicamente do operador, e da telecomunicação via
satélite (b), por este transportada.
Quando falamos em capacidade satelital necessariamente precisamos distinguir a separação necessária entre o provimento desta e as múltiplas possibilidades de serviços (de telecomunicação) que podem ser prestados por
meio dos satélites, quando os pagamentos são efetuados unicamente pelo
direito ao uso do satélite, para disponibilizar tais serviços em favor do interessado. Parte-se, assim, da distinção entre a exploração dos satélites (i) e
o uso de capacidade satelital (por operadoras de telecomunicações).
A relação jurídica existente entre a operadora de telecomunicações e a exploradora do satélite diz respeito não a uma relação de comunicação, mas a
algo distinto, a contratação de capacidade satelital para prover o alcance
do sinal, com rapidez e eficiência, à outra rede que pretende vir acessada,
visando a atender aos seus usuários nas suas eventuais solicitações. Somente a estação terrena (a) tem acesso à rede de telecomunicações de origem dos sinais (a1). Desta, os sinais partem em direção ao satélite (b),
conforme a localização em órbita certa e previamente contratada; o que,
após decodificação do sinal recebido pelo satélite e necessária amplificação, permite a transmissão dos mesmos dados, voz ou imagem, para que
este possa chegar ao ponto de estação terrena (c) situado no campo de cobertura designado, com acesso a outra determinada “rede” de telecomunicações (c1), para entrega do “tráfego entrante”. Desse modo, serviço de
telecomunicação realiza-se, concretamente, entre “a1” e “c1”, entre ambas
as redes, portanto, a partir das estações terrestres de contato com o satélite,
geralmente administradas pela operadora de satélites, mas nunca entre operadoras de satélites e usuários diretos, salvo nos casos em que o satélite
pertence à rede da empresa de telecomunicações.
2.2. Radiodifusão - ausência de destinatário certo
A radiodifusão por satélite (a exemplo do broadcasting satellite service BSS) é aquela atividade cujos sons ou imagens podem ser enviados por
uma determinada estação, com utilização de provisão de capacidade satelital, para serem recebidos por múltiplos usuários. A televisão Direta via
Satélite é o melhor exemplo desse tipo, onde o satélite permite a conexão
entre a estação geradora ou repetidora de televisão, que é a estação radioelétrica geradora de sinais de televisão para ulterior recepção pelo público
129
em geral. Nesta modalidade, os sujeitos habilitados para receber os sinais,
mediante sintonia nas faixas de freqüência designadas (downlink), podem
estar atrelados a uma base fixa terrestre ou ter recepção direta.16
A Constituição da UIT define radiodifusão como sendo o “serviço de radiocomunicações cujas emissões destinam-se a ser recebidas diretamente
pelo público em geral. Este serviço pode compreender emissões sonoras,
emissões de televisão ou outros gêneros de emissões”. Importante recordar
que o mesmo anexo de definições, qualifica radiocomunicação como aquela modalidade de “telecomunicação por meio de ondas radioelétricas”.
Neste caso, o meio de telecomunicação usa de ondas hertzianas, sem qualquer confusão com o conceito de radiodifusão ou mesmo com a forma de
operar com satélites. Porém, é imperioso destacar que para a UIT o que é
relevante para qualificar a radiodifusão é que “emissões sonoras, emissões
de televisão ou outros gêneros de emissões” (objeto) possam ser recebidos
“diretamente pelo público em geral” (destinatários) através de “ondas radioelétricas” (meio). Agora, que isso passe ou não por satélite, como visto,
em nada modifica ou desqualifica sua natureza, pois será sempre por meio
de ondas radioelétricas que as emissões sonoras, emissões de televisão ou
outros gêneros de emissões chegarão diretamente ao público em geral.
Nessa ocasião, é relevante conceber as diferenças de tratamento verificadas
entre os distintos tipos de radiodifusão, como, por exemplo, a radiochamada,17 que se caracteriza pela transmissão de mensagens a uma estação receptora móvel,18 perfeitamente tributável por ICMS, e os serviços de tele16
17
18
Nesta oportunidade, cumpre-nos recordar o seguinte esclarecimento: “Tras las referencias a la radio y televisión por ondas y cable convendría hacer un brevísima alusión al satélite, a fin de que quede claro que no hay una televisión por satélite distinta a
las anteriores, sino que ésta es sólo una modalidad, más avanzada y perfecta, de la
radio y televisión por ondas hertzianas”. E complementa: “En otro, el satélite está
formado por equipos receptores-amplificadores y reemisores que envían la señal tratada y amplificada por lo que ya es innecesaria la antena mediadora entre el satélite y
las receptores individuales de televisión, y las particulares pueden recibir las ondas
directamente del satélite con tal de tener instalada en su casa una antena parabólica
de dimensiones y coste aceptables. Este es el caso de los satélites activos o la llamada
televisión directa por satélite”. CHINCHILLA M ARÍN, Carmen. La radio-televisión como
servicio público esencial. Madrid: Tecnos, 1988, p. 112.
Cf. o Decreto nº 2.196, de 08 de abril de 1997, a Norma nº 15/97 e a Norma nº 17/96,
da Anatel.
Apenas para melhor esclarecimento, seguem os conceitos, para os fins da Norma nº
130
visão aberta, hoje imunes, e aquele de TV por assinatura, que ainda está a
merecer reflexões, tanto mais após a decisão do STF.19
19
15/97:
“b) Área de cobertura: área geográfica em que um receptor de radiochamada pode
ser atendido por uma estação de base;
c) Área de prestação de serviço: área geográfica definida pelo Ministério das Comunicações na qual a permissionária explora o SER, conforme condições preestabelecidas pelo Ministério das Comunicações; (...)
e) Estação de Base: estação fixa do Serviço Especial de Radiochamada - SER;
f) Exploração Industrial de Serviços de Telecomunicações: forma particular de exploração em que uma entidade exploradora de serviços de telecomunicações fornece seus serviços à outra entidade exploradora, mediante remuneração preestabelecida para prestação, por esta última, de serviço a terceiros; (...)
k) Receptor de radiochamada: receptor de rádio portátil destinado a fornecer indicação aural, visual ou tátil, quando ativado pela recepção de um sinal de radiofreqüência contendo seu código específico; (...)
m) Serviço Especial de Radiochamada - SER: serviço especial de telecomunicações,
não aberto à correspondência pública, com características específicas, destinado a
transmitir, por qualquer forma de telecomunicação, informações unidirecionais originadas em uma estação de base e endereçadas a receptores móveis, utilizandose das faixas de radiofreqüências de 929 MHz e 931 MHz”.
DIREITO CONSTITUCIONAL E TRIBUTÁRIO. ICMS SOBRE SERVIÇOS DE COMUNICAÇÃO:
RADIODIFUSÃO SONORA E DE SONS E DE IMAGENS (ALÍNEA “A” DO INCISO XII DO ART. 21
DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. ARTIGO 132, I, “B”, DA LEI ORGÂNICA DO DISTRITO FEDERAL. AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. 1. O art. 132, I, ‘b’, da Lei Orgânica
do Distrito Federal, ao admitir a incidência do ICMS apenas sobre os serviços de comunicação, referidos no inciso XI do art. 21 da C.F., vedou sua incidência sobre os
mencionados no inciso XII, ‘a’, do mesmo artigo, ou seja, sobre ‘os serviços de
radiodifusão sonora e de sons e imagens’ (art. 21, XII, ‘a’, da C.F., com a redação dada pela E.C. nº 8, de 15.08.1995). 2. Com isso, estabeleceu, no Distrito Federal, tratamento diferenciado dessa questão, em face do que ocorre nas demais unidades da Federação e do disposto no art. 155, inc. II, da C.F., pelos quais o ICMS pode incidir sobre todo e qualquer serviço de comunicação. 3. Assim, ainda que indiretamente, concedeu imunidade, quanto ao ICMS, aos prestadores de serviços de radiodifusão sonora e de sons e de imagens, sem que essa imunidade estivesse prevista na Constituição
Federal (art. 155, II), que, ademais, não admite que os Estados e o Distrito Federal
concedam, com relação ao ICMS, nem mesmo simples isenções, incentivos e benefícios fiscais, senão com observância da Lei Complementar a que aludem o art. 155, §
2º, inciso XII, letra ‘g’. 4. Lei Complementar, a de nº 24, de 07.01.1975, já existia,
com essa finalidade, antes, portanto, da Constituição de 05.10.1988. 5. E, a esta altura,
já está em vigor a Lei Complementar nº 87, de 13.09.1996, cujo art. 1º reitera a incidência do ICMS sobre todo e qualquer serviço de comunicação, regulando também a
forma pela qual os Estados e o Distrito Federal concederão isenções, incentivos e benefícios fiscais. 6. Caracterizada a concessão de imunidade não prevista na Constitui-
131
2.3. Rastreamento por satélite
Os sistemas de rastreamento de objetos por satélite têm sido muito usados,
especialmente por empresas de transporte rodoviário de cargas, ao menos
no nosso país, pela forte utilização de transportes terrestres, em face das
vastas extensões territoriais que possuímos, bem como pelas precárias garantias de segurança nas estradas e reduzida qualidade da malha viária.
Dentre outras, as principais funções de rastreamento por satélite20 podem
consistir na localização de objetos, a partir de sinais de GPS21 ou similar,
como pode vir compartilhado com medidas de comunicação entre pessoas
e a estação de controle, mediante envio e recebimento de mensagens ou
dados, localização, controle ou monitoramento do bem e consulta remota a
banco de dados, visando ao controle on-line de frota ou de pessoas, relativamente ao posicionamento, nível de consumo de combustível, velocidade
do veículo, tempo de deslocamento ou percurso realizado.
Nestes casos, para que os dados sejam recebidos pelo usuário, este necessita de um instrumento de recepção e transmissão. Em veículos, verifica-se
a instalação de equipamento composto por antena, terminal de mensagens,
transmissor e receptor de sinais22 (transceiver). Para seu funcionamento,
ou seja, para que o objeto designado possa ser localizado, é preciso inicialmente que o satélite possa coletar as informações necessárias ao seu posi-
20
21
22
ção Federal, ou, ao menos, a concessão de benefício fiscal não autorizado pela Lei
Complementar a que aquela se refere, julga-se procedente a Ação Direta, declarandose a inconstitucionalidade da expressão ‘de que trata o art. 21, XI, da Constituição Federal’, constante da alínea ‘b’ do inciso I do art. 132 da Lei Orgânica do Distrito Federal. 7. Plenário: decisão unânime. (ADI 1467/DF - STF. Pleno, Relator: Min. Sydney
Sanches. Julgamento: 12/02/2003, Publicação: DJ 11-04-2003, p. 26).
ANEFALOS, Lilian Cristina, José Vicente CAIXETA FILHO. “Análise da utilização de
sistemas de rastreamento por satélite em empresas de transporte rodoviário de cargas”.
In: CAIXETA FILHO, GAMEIRO José Vicente, A H. Transporte e logística em sistemas
agroindustriais. São Paulo: Atlas, 2001, cap. 5.3, p. 195.
O GPS é composto por uma constelação de 24 satélites que efetuam percurso na órbita
da terra em 12 horas, com o fim de determinar a localização de objetos em três dimensões. Atualmente, com o sistema Wide Área DGPS (WADGPS), as correções tornaram-se pouco necessárias, a garantir melhor qualidade de informações. No Brasil, geralmente, as empresas que se dedicam a esta atividade usam dos satélites INMARSAT,
BRASILSAT B2 e GLOBOSAT.
Ibidem, p. 196.
132
cionamento, pelo sistema GPS (Global Position System). Logo, que opere
na freqüência do satélite. Este é um sistema baseado em simples cruzamentos de coordenadas de longitude e de latitude, a partir dos sinais emitidos pelo equipamento. Em seguida, essas coordenadas são transferidas
para um satélite de comunicação e depois dirigidas a uma dada estação
terrena, que se encarrega de distribuir a informação ao usuário ou interessado que detenha instrumento apto ao recebimento do sinal.
Em outros sistemas de rastreamento, entre a estação e o usuário, a prestadora de serviços poderá, mediante emprego de software apropriado, consolidar os dados recebidos e eventualmente atribui novas utilidades, para conferir, então, aos interessados, os dados requisitados. Como visto, a principal diferença entre os sistemas usados concentra-se na presença ou não de
estações intermediárias, entre a estação terrena e o usuário, utilizando-se de
programas habilitados para propiciar tratamento ao emprego dos dados.
Contudo, em um ou no outro, a comunicação com os veículos pode ser
feita por rádios convencionais ou troncalizados, com dados ou mesmo voz,
entre a operadora e a central do cliente ou os veículos controlados.23
Como visto, excetuada a hipótese dos pagamentos da empresa pela utilização da capacidade satelital, todos os serviços oferecidos podem vir qualificados como típicos serviços de telecomunicação, salvo o fornecimento de
posição pelo GPS, isoladamente, sem qualquer tratamento das informações.
2.4. Sensoriamento remoto da Terra por Satélite
O sensoriamento remoto da Terra por Satélite consiste na produção de
imagens da superfície terrestre usando sensores de satélites. Este é o resumo da Resolução 41/65 da Assembléia Geral da ONU que trata dos Princípios sobre o Sensoriamento Remoto desde o Espaço Exterior, ao referir-se
ao “sensoriamento da superfície da Terra a partir do espaço, utilizando as
propriedades das ondas magnéticas emitidas, refletidas ou difracionadas
pelos objetos sensoriados”, mediante atividades efetuadas pelas “estações
de coleta e armazenamento dos dados primários e dos centros de processamento, tratamento e difusão dos dados processados”.
23
ANEFALOS, Lilian Cristina. Gerenciamento de frotas do transporte rodoviário de cargas
utilizando sistemas de rastreamento por satélite. SP: USP, Dissertação (mestrado),
1999. 143 p.
133
Como se pode dessumir, trata-se de típica prestação de serviço exclusivamente efetuada pelo próprio satélite, sem qualquer prejuízo à necessária
obtenção de capacidade espacial, que será útil para as comunicações entre
as estações terrestres e o satélite.
Fundamental pontuar que a produção e análise dos dados não são efetuados
unicamente no satélite. Daí a citada Resolução citar a necessária distinção
entre os dados primários, os dados processados e a informação analisada,
assim definidos no próprio Princípio I: os dados primários são “as informações brutas colhidas pelos sensores remotos transportados por um objeto
espacial e transmitidos ou enviados do espaço à Terra por telemetria na forma de sinais eletromagnéticos, filmes fotográficos, fita magnética ou qualquer outro meio”; os dados processados são os “resultados obtidos com o
processamento dos dados primários, necessário para torná-los utilizáveis”; e
a informação analisada é “a informação resultante do tratamento dos dados
processados, relacionados com dados e conhecimentos de outras fontes”.
Estes trabalhos, concluídos em terra, pelas estações de coleta e centros de
processamento, tem como objetivo “melhor administrar os recursos naturais, usar a Terra e proteger o meio ambiente”, mesmo que se possa servir a
múltiplas aplicações, como meteorologia, oceanografia, cartografia e outros. Mesmo que, de acordo com a ONU, todos os países tenham direito de
explorar este serviço, pelo princípio da liberdade de uso e exploração do
espaço exterior, atualmente, apenas seis países operam estas espécies de
satélites de sensoriamento remoto, que são os EUA, Rússia, Índia, França,
Japão e Canadá, sob a coordenação da Agência Espacial Européia e da
Eumetsat (European Organization for Meteorogical Satellites). Quanto às
estações terrestres receptoras, somente 24 países, dentre estes, o Brasil,
encontram-se contemplados. De qualquer modo, por força do princípio de
cooperação mútua, os interesses devem coincidir num esforço comum,
mesmo que isso não se encontre de todo afirmado.
É bom lembrar que não existe ainda um tratamento jurídico completo sobre
a matéria, que os princípios referidos consistem em simples “recomendações” e que, portanto, todos os valores e regras do Direito Internacional
aplicam-se à matéria, para evitar uso indevido ou mesmo resistência à cooperação.24 Daí a defesa dos princípios do acesso prioritário e do acesso em
24
“PRINCÍPIO II - As atividades de sensoriamento remoto deverão ter em mira o bem e
134
base não discriminatória do país sensoriado aos dados obtidos a seu respeito pelo país sensoriador, mas que ainda não obteve a adesão esperada por
todos os envolvidos.
3.
O DIREITO ESPACIAL E A REGULAÇÃO ECONÔMICA DO
APROVEITAMENTO COMERCIAL DO ESPAÇO E DO ESPECTRO RADIOELÉTRICO
O Direito Espacial25 atualmente encontra-se sobremaneira desenvolvido,
com diversas instituições e veículos normativos predispostos para regrar as
condutas que direta ou indiretamente digam respeito à utilização do seg-
25
o interesse de todos os Estados, qualquer que seja o estágio de seu desenvolvimento
econômico, social, científico e tecnológico, levando em especial consideração as necessidades dos países em desenvolvimento. PRINCÍPIO III - As atividades de sensoriamento remoto deverão efetuar-se em conformidade com o Direito Internacional, inclusive com a Carta das Nações Unidas, o Tratado sobre Princípios Reguladores das
Atividades dos Estados na Exploração e Uso do Espaço Cósmico, inclusive a Lua e
demais Corpos Celestes, e os documentos pertinentes da União Internacional de Telecomunicações. “PRINCÍPIO V - Os Estados que realizam atividades de sensoriamento
remoto deverão promover a cooperação internacional nestas atividades. Para isso,
deverão possibilitar a participação nelas de outros Estados. Tal participação será
sempre baseada em condições eqüitativas e mutuamente aceitáveis. PRINCÍPIO VI Para permitir o máximo acesso aos benefícios das atividades de sensoriamento remoto, os Estados deverão ser estimulados, sempre que viável, a estabelecer e operar, através de acordos e outros entendimentos, estações de coleta e armazenamento de dados, bem como centros de processamento e tratamento de dados, especialmente no
marco de acordos ou entendimentos regionais”.
São exemplos de recentes publicações: I.H.P. DIEDERIKS-VERSCHOOR. An Introduction
to Space Law. Deventer: Kluwer, 1993, 252 p.; PEYREFITTE, Léopold. Droit de l'Espace, Paris: Dalloz, 1993; MATTE, Nicolas Mateesco. Droit aérospatial. Paris: Pedone,
1994, 472 p.; WILLIAMS, Silvia Maureen. Telecomunicaciones por satelites. Buenos
Aires: Abeledo-Perrot, 1981; LACHS, Manfred. El derecho del espacio ultraterrestre.
Ciudad de Mexico: FCE, 1977, 266 p.; BOURELY, Michel, Jacqueline Dutheil de La
ROCHÈRE. Droit de l'espace. Paris: Pedone, 1994, 370 p.; MARCHISIO, S. Lezioni Di Diritto Aerospaziale. Milano: D'anselmi, 2000; SPADA, M. Diritto della Navigazione Aerea e Spaziale. Milano: Giuffre, 1999; DURANTE F. Lezioni di Diritto Aerospaziale.
Roma: La Sapienza, 1997. RAVILLON, Laurence. Droit des activités spatiales - Adaptation aux phénomènes de commercialisation et de privatisation. Paris: LITEC, 2003,
600 p.; COUSTON, Mireille. Droit spatial économique: Régimes applicables à l'exploitation de l'espace. Paris: Sides, 1993, 282 p.; Cf. ainda as Revistas: Air and Space Law,
Revue Française de Droit Aérien et Spatial, Journal of Air Law and Commerce e Revista Europea de Derecho de la Navegación Marítima y Aeronáutica.
135
mento espacial.
Com a privatização dos principais sistemas de satélite (INTELSAT, INMARSAT etc), além da crescente entrada de satélites privados, ampliou-se
a exigência de regulação do setor, mediante controles do Estado sobre todas as atividades inerentes à exploração e uso da capacidade satelital, cujo
estudo reserva-se ao chamado Direito Espacial Econômico. E assim passase ao estudo dos controles e da intervenção do Estado na admissão de agentes e atribuição de freqüências, que já não se confunde com o Direito Espacial propriamente dito.
Para regular todos os aspectos intervenientes do Direito Espacial, diversos
tratados internacionais foram utilizados para ordenar o regime jurídico, até
atingir relativa uniformidade, numa espécie de lex mercatoria spatialis, o
que levou a alguns autores concluírem por ter-se uma regulação privada
típica do negócio espacial.26
Por isso, em segmento distinto do Direito Econômico Espacial, tem-se também o Direito Espacial Comercial, que é o sub-ramo do Direito Espacial que
se ocupa do tratamento jurídico aplicável às operações com bens ou serviços
economicamente apreciáveis do mercado espacial, ou seja, com atividades de
cunho comercial realizadas para permitir exploração do espaço exterior,
como as telecomunicações, a teledetecção, transmissão de dados, teleobservação, dentre outros. E exatamente os atos entre “exploradores” (aqueles
que possuem o Direito de Exploração de Satélite Brasileiro para Transporte
de Sinais de Telecomunicações) e os “prestadores de serviços”,27 segundo os
contratos que possam ser firmados entre estes, é parte do seu conteúdo, para
um estudo das cláusulas contratuais e outros aspectos relevantes.
26
27
Cf. HERMIDA, Julian. Derecho Espacial Comercial. Aspectos Internacionales, Nacionales y Contractuales. Buenos Aires: Depalma, 1997, p. 18.
“Les entreprises qui exploitent les satellites (opérateurs de satellites) louent en général
ou vendent les transpondeurs à des fournisseurs de services de télécommunications (opérateurs de services de télécommunications, exemple: TPS, Canal Satellite, ...), lesquels
proposent des services de télécommunications aux éditeurs de contenu (chaines de télévision, AFP, ...), à destination de l'utilisateur final. Certaines entreprises jouent le rôle
d'intermédiaires (brokers, resellers) entre les opérateurs de satellites et les fournisseurs
de services”. RAVILLON, Laurence. Droit des activités spatiales - Adaptation aux
phénomènes de commercialisation et de privatisation. Paris: LITEC, 2003, p. 527.
136
Passemos agora a uma análise de cada um dos domínios referidos.
3.1. Princípios jurídicos reguladores das atividades de exploração e
uso do espaço cósmico
Os estudos do Direito Espacial consistem em típicos estudos de Direito
Internacional, pela constante presença de normas de direito interno dotadas
de elementos de estraneidade (direito privado) ou de convenções internacionais na regulação das distintas matérias. É, pois, absolutamente impossível
introduzir-se na análise dos efeitos dos negócios praticados nestes domínios
sem uma adequada compreensão de como relacionam-se as entidades participantes e quais são as fontes de regulação jurídica do fenômeno.
Na atualidade, os principais instrumentos normativos do Direito Espacial
vigentes são os seguintes:
I. Tratado sobre os Princípios Reguladores das Atividades dos Estados na
Exploração e Uso do Espaço Exterior, inclusive a Lua e demais Corpos
Celestes, aprovado pela Assembléia Geral da ONU em 19/12/1966.
II. Acordo sobre Salvamento de Astronautas e Restituição de Astronautas
e Objetos lançados ao Espaço Cósmico, aprovado pela Assembléia Geral da ONU, em 19/12/1967.
III. Convenção sobre Responsabilidade Internacional por Danos Causados
por Objetos Espaciais, aprovada pela Assembléia Geral da ONU, em
29/12/1971.
IV. enção sobre Registro de Objetos lançados ao Espaço Cósmico, aprovada pela Assembléia Geral da ONU em 12/11/1974.
V. Acordo sobre as Atividades dos Estados na Lua e nos Corpos Celestes,
aprovado pela Assembléia geral da ONU, em 5/12/1979.
Como fica bem evidenciado, a atividade espacial sempre esteve regulada
por princípios de direito internacional, o que é perfeitamente compreensível, pela forma de desempenho das suas funções alhearem-se aos limites
espaciais das fronteiras dos Estados. E foi a partir de tais princípios e regras de direito consuetudinário que surgiram as resoluções da ONU em
matéria espacial, acompanhando a exploração do espaço levada a cabo
137
especialmente pelos Estados Unidos e União Soviética.
São disposições, aquelas das resoluções, desprovidas de efeitos vinculantes, posto servirem unicamente como “recomendações”, mas por versarem
sobre aspectos delimitados dos acordos acima listados, geralmente vistos
como atos complementares àqueles, e que são os abaixo citados:
1. Declaração dos Princípios Jurídicos Reguladores das Atividades Espaciais dos Estados na Exploração e Uso do Espaço Cósmico, de 1963;
2. Declaração sobre Princípios Orientadores do Uso da Radiodifusão por
Satélites para a Livre Circulação de Informação, a Difusão da Educação e o Desenvolvimento dos Intercâmbios Culturais, aprovada pela
Unesco em 12 de novembro de 1972.
3. Princípios Reguladores do Uso pelos Estados de Satélites Artificiais da
Terra para Transmissão Direta Internacional de Televisão, de 1982;
4. Princípios sobre Sensoriamento Remoto, de 1986;
5. Princípios sobre o Uso de Fontes de Energia Nuclear no Espaço Cósmico, de 1992.
6. Declaração sobre a Cooperação Internacional nas Exploração e Uso do
Espaço Exterior em benefício e no interesse de todos os estados, levando em especial consideração as necessidades dos países em Desenvolvimento, de 1986.
Também é fundamental recordar a constituição formal das instituições
responsáveis pelo lançamento e gestão dos satélites, por fazerem parte dos
estudos do Direito Espacial e serem de capital importância para o deslinde
das questões aqui colimadas, a saber:
● Intersputnik - International System and Organization of Space Communications, vigente desde 12/07/1972.
● Intelsat - International Telecommunications Satellite Organization, em
vigor a partir de 12/01/1973.
● Inmarsat - Convention on the International Maritime Satellite Organi138
zation, em vigência desde 16/07/1976.
● Arabsat - Arab Corporation for Space Communications, com vigência
a partir de 16/07/1976.
● Intercosmos - Acordo de Cooperação na Exploração e Uso do Espaço
Cósmico para Fins Pacíficos, em vigor desde 25/03/1977.
● ESA - Agência Espacial Européia, em vigor a partir de 30/10/1980.
● Eutelsat - Convention Establishing the European Telecommunications
Satellite Organization, em vigor desde 01/09/1985.
● Eumetsat - Convention for the Establishment of a European Organization for the Exploration of Meteorological Satellites, vigente a partir de
19/07/1986.
Passemos a uma análise dos princípios fundamentais da regulação do Direito Espacial (Corpus iuris spatialis), com a finalidade de compreender os
limites de atuação das instituições e particulares no aproveitamento dos
recursos de órbitas e freqüências de rádio.
Pela Resolução da Assembléia Geral da ONU, de 13 de dezembro de 1963,
que veiculou a Declaração dos Princípios Jurídicos Reguladores das Atividades dos Estados na Exploração e Uso do Espaço Cósmico, quedou-se
assentado que, na exploração e uso do espaço cósmico, os Estados regerse-ão pelos seguintes princípios:
“1 - A exploração e o uso do espaço cósmico serão realizados
em benefício e no interesse de toda a humanidade.
2 - O espaço cósmico e os corpos celestes estão abertos à exploração e uso por todos os Estados, na base da igualdade e
de acordo com o Direito Internacional.
3 - O espaço cósmico e os corpos celestes não poderão ser
objeto de apropriação nacional por proclamação de soberania, por uso ou ocupação, nem por qualquer outro meio.
4 - As atividades dos Estados relativas à exploração e uso do
139
espaço cósmico deverão efetuar-se em conformidade com o
Direito Internacional, inclusive a Carta da Organização das
Nações Unidas, com a finalidade de manter a paz e a segurança internacionais e de favorecer a cooperação e a compreensão internacionais.
5 - Os Estados têm a responsabilidade internacional sobre as
atividades nacionais realizadas no espaço cósmico, sejam elas exercidas por organismos governamentais ou por entidades não- governamentais, e de zelar para que as atividades
nacionais sejam efetuadas de acordo com as disposições enunciadas na presente Declaração. As atividades das entidades não-governamentais no espaço cósmico devem ser objeto
de autorização e de vigilância permanente do respectivo Estado. Em caso de atividades realizadas no espaço cósmico
por uma organização internacional, a responsabilidade pelo
cumprimento dos princípios expressos nesta Declaração caberá a esta organização internacional e aos Estados que dela
participem.
6 - Na exploração e uso do espaço cósmico, os Estados deverão guiar-se pelo princípio da cooperação e da assistência
mútua e exercerão todas as suas atividades no espaço cósmico, levando devidamente em conta os interesses correspondentes dos demais Estados. Se um Estado tiver razões para
crer que uma atividade ou experiência espacial, planejada
por ele ou por seus nacionais, possa provocar interferência
prejudicial às atividades de outros Estados na exploração e
uso pacífico do espaço cósmico, deverá promover as consultas internacionais adequadas antes de empreender a referida
atividade ou experiência. Qualquer Estado que tenha razões
para crer que uma atividade ou experiência espacial, planejada por outro Estado, possa provocar interferência potencialmente prejudicial às atividades de exploração e uso pacífico do espaço cósmico, pode exigir a realização de consultas
sobre tal atividade ou experiência.
7 - O Estado, em cujo registro figure o objeto lançado ao espaço cósmico, conservará sob sua jurisdição e controle o referido objeto e todo o pessoal do mesmo objeto, enquanto se
140
encontrarem no espaço cósmico. A propriedade dos objetos
lançados ao espaço cósmico e de seus componentes não é afetada por sua passagem pelo espaço cósmico ou seu retorno à
Terra. Estes objetos e suas partes componentes encontrados
além dos limites do Estado, em cujo registro estão inscritos,
deverão ser restituídos a tal Estado, que, a pedido, fornecerá
seus dados de identificação antes da restituição.
8 - Cada Estado que realize ou mande realizar o lançamento
de um objeto ao espaço cósmico, e cada Estado, de cujo território ou base é realizado o lançamento do objeto, é responsável internacionalmente pelos danos causados por tal objeto a
outro Estado ou a suas pessoas físicas ou jurídicas, na Terra
ou no espaço cósmico.
9 - Os Estados considerarão os astronautas como enviados
da humanidade ao espaço cósmico e lhes prestarão toda assistência possível em caso de acidente, perigo ou aterrisagem forçada no território de outro Estado ou em alto-mar.
Os astronautas que fizerem tal aterrisagem serão devolvidos
com segurança e sem demora ao Estado de registro de seu
veículo espacial”.
Em seguida, a partir desses enunciados, foram proclamados pela ONU os
“Princípios Reguladores das Atividades dos Estados na Exploração e Uso
do Espaço Cósmico, inclusive a Lua e demais Corpos Celestes”,28 de 27 de
janeiro de 1967, Aprovado, no Brasil, pelo Decreto Legislativo nº 41, de 10
de outubro de 1968 e confirmada a ratificação pelo Decreto nº 64.362, de
17 de abril de 1969. Por sua própria condição, converteu-se no tratado de
maior importância e hierarquia dentre os demais, de tal sorte que todas as
leis ou contratos devem observância ao seu conteúdo.
Na sua redação, confirma-se que o espaço cósmico, inclusive a Lua e demais corpos celestes, poderá ser explorado e utilizado livremente por todos
os Estados sem qualquer discriminação, em condições de igualdade e em
28
Para uma análise destes princípios nas telecomunicações por satélites, veja-se: WILLIAMS, Silvia Maureen. Telecomunicaciones por satelites. Buenos Aires: Abeledo-Perrot,
1981, p. 21 e ss.
141
conformidade com o direito internacional, cabendo a liberdade de acesso a
todas as regiões dos corpos celestes. Por esse motivo, no exercício dessas
atividades, o espaço, a Lua e demais corpos celestes não poderá ser objeto
de apropriação nacional por proclamação de soberania, por uso ou ocupação, nem por qualquer outro meio (art. 2º), devendo observar o direito internacional (art. 3º). O reconhecimento de direito ao “uso” de uma posição
orbital determinada não prejudica tal reconhecimento, desde que atendidos
os critérios de atribuição. Firma-se, no seu conteúdo, o direito de uso econômico do espaço, livre utilização ou exploração.
O dever dos estados de controlarem as atividades dos seus particulares
encontra-se afirmado no art. 6º, que lhes atribui responsabilidade objetiva
por tais atos de controle, a saber:
“ARTIGO 6º - Os Estados-Partes do Tratado têm a responsabilidade internacional das atividades nacionais realizadas no
espaço cósmico, inclusive na Lua e demais corpos celestes,
quer sejam elas exercidas por organismos governamentais ou
por entidades não-governamentais, e de velar para que as atividades nacionais sejam efetuadas de acordo com as disposições anunciadas no presente Tratado. As atividades das entidades não-governamentais no espaço cósmico, inclusive na
Lua e demais corpos celestes, devem ser objeto de uma autorização e de uma vigilância contínua pelo componente Estado-Parte do Tratado. Em caso de atividades realizadas por
uma organização internacional no espaço cósmico, inclusive
na Lua e demais corpos celestes, a responsabilidade no que
se refere às disposições do presente Tratado caberá a esta
organização internacional e aos Estados-Partes do Tratado
que fazem parte da referida organização”.
No que concerne à propriedade dos objetos lançados ao espaço, acompanhando a mesma regra assinalada quanto à relação com os domínios de
órbitas, veda-se a apropriação dos objetos lançados. Entende-se, assim,
que do mesmo modo que nenhum estado pode alegar soberania para reclamar posições de órbita ou o tratamento aplicável aos objetos situados no
âmbito do seu território espacial, o mesmo estende-se aos objetos lançados
ao espaço, que conservam a propriedade de quem os tenha lançado. Esse é
o princípio estabelecido no art. 8º, a saber:
142
“ARTIGO 8º - O Estado-Parte do Tratado em cujo registro figure o objeto lançado ao espaço cósmico conservará sob sua
jurisdição e controle o referido objeto e todo o pessoal do
mesmo objeto, enquanto se encontrarem no espaço cósmico ou
em um corpo celeste. Os direitos de propriedade sobre os objetos lançados no espaço cósmico, inclusive os objetos levados
ou construídos num corpo celeste, assim como seus elementos
constitutivos, permanecerão inalteráveis enquanto estes objetos
ou elementos se encontrarem no espaço cósmico ou em um
corpo celeste e durante seu retorno à Terra. Tais objetos ou elementos constitutivos de objetos encontrados além dos limites
do Estado-Parte do Tratado em cujo registro estão inscritos
deverão ser restituídos a este Estado, devendo este fornecer,
sob solicitação os dados de identificação antes da restituição”.
Em apertada síntese, os princípios fundamentais do Tratado sobre os “Princípios Reguladores das Atividades dos Estados na Exploração e Uso do
Espaço Cósmico, inclusive a Lua e demais Corpos Celestes”, podem ser
condensados no seguinte: a) uso do espaço cósmico, inclusive da Lua e
demais corpos celestes, deve ser feito em proveito do bem comum e no
interesse de todos os países, independentemente do seu desenvolvimento
econômico e científico; b) reconhece-se a liberdade de exploração e uso do
espaço cósmico e dos corpos celestes; c) O espaço exterior não é apropriável, passível de reivindicação ou de soberania ou de qualquer direito de
exclusiva pelos estados, por qualquer meio; d) promoção da cooperação e
do entendimento; e) uso da Lua e demais corpos celestes exclusivamente
para fins pacíficos e proibição de colocar em órbita armas nucleares e de
destruição em massa; f) exploração e uso do espaço de acordo com os princípios fundamentais do Direito Internacional; g) assistência aos astronautas
em caso de avaria, desastre e aterrissagem forçada e restituição do objeto
espacial, em virtude da conservação dos direitos sobre os objetos lançados
ao espaço; h) responsabilidade internacional objetiva dos Estados pelas
atividades espaciais de suas organizações nacionais, públicas ou privadas.
Veio, então, após outros instrumentos,29 a Convenção Relativa ao Registro
29
Como a Convenção Sobre Responsabilidade Internacional Por Danos Causados Por
Objetos Espaciais. Concluída em Londres, Washington e Moscou, em 29 de março de
1972. Aprovada pelo Decreto Legislativo nº 77, de 1º de dezembro de 1972. Ratificada
143
de Objetos Lançados no Espaço Cósmico, adotada pela Assembléia Geral
da ONU, de 12 de novembro de 1974 (Resolução nº 3.235/XXIX), em
vigor a partir de 15 de setembro de 1976, mas que não foi ratificada pelo
Brasil. Esta Resolução propunha-se instituir o registro central obrigatório
dos objetos lançados ao espaço cósmico, a ser mantido pelo SecretárioGeral da Organização das Nações Unidas. Conforme o art. 2º desta regra,
quando um objeto espacial for lançado em órbita em torno da Terra ou
mais além, o Estado lançador deverá inscrevê-lo num registro adequado
que ele próprio manterá. Em seguida, conforme o art. 4º, Cada Estado de
registro deverá fornecer ao Secretário-Geral da Organização das Nações
Unidas, no mais breve prazo possível, as seguintes informações sobre cada
objeto espacial, inscrito em seu registro: Nome do Estado ou Estados lançadores, Uma designação apropriada do objeto espacial ou seu número de
registro, Data e território ou local de lançamento, função geral do objeto
espacial e Parâmetros orbitais básicos, incluindo: Período nodal, Inclinação, Apogeu e Perigeu. O acesso às informações contidas neste registro
será pleno e livre aos interessados.
A preocupação com o controle das órbitas é fundamental. Por isso, no item
3, encontra-se previsto que cada Estado de registro deverá notificar o Secretário-Geral da Organização das Nações Unidas, na maior medida possível e no prazo mais rápido que puder, sobre os objetos espaciais, a respeito
dos quais ele tenha, antes, prestado informações, e que, tendo sido colocados em órbita, já não se encontram nesta órbita.
E temos ainda a Resolução 51/122, adotada pela Assembléia Geral da
ONU, em 13 de dezembro de 1996: Declaração sobre a Cooperação Internacional na Exploração e Uso do Espaço Exterior em Benefício e no Interesse de todos os Estados Levando em Especial Consideração as Necessidades dos Países em Desenvolvimento. Neste, dentre as demais regras,
sobressai o item 2, segundo o qual: “Os Estados têm liberdade para definir
todos os aspectos de sua participação na cooperação para a exploração e
uso do espaço exterior, em bases eqüitativas e mutuamente aceitáveis. Os
termos contratuais destes empreendimentos cooperativos devem ser justos
e razoáveis e estar em plena conformidade com os direitos e interesses
legítimos das partes concernentes, como, por exemplo, com os direitos de
pelo Brasil em 31 de janeiro de 1973. Entrou em vigor no Brasil em 9 de março de
1973 (art. 24, § 4º), pelo Decreto nº 71.981, de 22 de março de 1973.
144
propriedade intelectual”.
3.2. Instituições intervenientes - das convenções internacionais institutivas da INTELSAT e INMARSAT à criação das entidades internacionais, regionais e locais administradoras dos satélites
As atividades internacionais de satélites, apesar da abertura para exploração
regional e local, ainda encontra-se vinculados aos compromissos internacionais mais importantes, como INTELSAT, INTERSPUTNIK e INMARSAT. A privatização das entidades responsáveis pela comercialização por
serviços ou mesmo pea capacidade satelital dos canais dos transponders,
permitiu-lhes melhor atuação operacional, pela mutação nos centros decisórios,30 ao mesmo tempo em que promoveram considerável ampliação das
ofertas e possibilidade de aplicação. Contudo, seguem como entidades internacionais, mesmo que esta função seja hoje ofuscado pela privatização.
O Acordo institutivo da Organização Internacional de Telecomunicações
por Satélites31 - INTELSAT, assinado em 1971, tinha por finalidade continuar e aperfeiçoar o desenvolvimento e exploração do segmento espacial
de telecomunicações por satélites, mediante atividades de alta qualidade e
de grande confiabilidade, sem discriminação e com alcance sobre todas as
regiões do Mundo. Esta entidade, dotada de personalidade jurídica autônoma, fora constituída mediante tratados internacionais, sendo um de or30
31
Veja-se: PANELLA, Lina. La privatizzazione delle organizzazioni internazionali via
satellite. Milano: Giuffrè, 2003, 260 p.
Apenas para conhecimento, o Acordo INTELSAT foi Aberto à assinatura em Washington, em 20 de agosto de 1971, aprovado pelo Decreto Legislativo nº 87 de 05 de
dezembro de 1972, ratificado em 20 de dezembro de 1972, cuja publicação deu-se pelo
Decreto nº 74.130 de 28 de maio de 1974. Em seguida, após a privatização, foram feitas diversas emendas, todas já publicadas no Brasil. Veja-se o Decreto nº 5.496, de 21
de julho de 2005. Emendas aos Artigos I, II, VIII, IX e XVI, aprovado pela XX Reunião da Assembléia das Partes em Copenhague, em 31 de agosto de 1995. Decreto no
3.429, de 20 de abril de 2000. Promulga as Emendas para Implementar o Regime de
Múltiplos Signatários, aprovadas pela XXVI Reunião dos Signatários, em Washington,
em 16 de abril de 1996. Decreto nº 2.738, de 20 de agosto de 1998. Promulga a Emenda aos Artigos 6 e 22, aprovada pelo XXV Encontro dos Signatários, em Cingapura,
em 4 de abril de 1995. Decreto nº 2.724, de 10 de agosto de 1998. Promulga a Emenda
ao Artigo XVII (f) da INTELSAT. Decreto nº 85.306, de 30 de outubro de 1980. Promulga o Protocolo sobre Privilégios, Isenções e Imunidades da INTELSAT, assinado
em Washington, no dia 19 de maio de 1978, pelo Governo brasileiro.
145
dem intergovernamental e outro de natureza operativa, com participação
das empresas de telecomunicações públicas ou privadas indicadas (como
encontrava-se previsto: Cada Estado Parte assinará ou designará uma
entidade de telecomunicações, pública ou privada, para o efeito de assinar
o Acordo de Exploração).
Como garantia de manutenção institucional, foi promulgado o Protocolo
sobre Privilégios, Isenções e Imunidades da INTELSAT, dando aplicação
ao Artigo XV do Acordo, dispondo que cada Parte, inclusive a Parte em
cujo território a Sede da INTELSAT está localizada, deverá conceder privilégios, isenções e imunidades apropriados. E especialmente em matéria
tributária e aduaneira, o artigo 4º prescreve que “dentro da esfera das suas
atividades autorizadas pelos Acordos da INTELSAT, a INTELSAT e sua
propriedade estarão isentas de qualquer imposto nacional e taxação direta
nacional sobre propriedade”. Esta disposição, por força do art. 98, do
CTN, prevalece sobre a legislação tributária vigente. As atividades comerciais, contudo, foram privatizadas no final da última década, a afastar o
emprego dessa regra às atividades da Intelsat.32
As administrações e prestadores de telecomunicações, sob reserva da legislação nacional aplicável, podem negociar e concluir diretamente os acordos
de capacidade satelital com os exploradores de satélites, nos termos do
Acordo de Exploração. E estes, por sua vez, podem contratar diretamente
com a Intelsat, que comparece como “satélite estrangeiro”, para os acordos
e atos operacionais. Na atualidade, esta dinâmica acompanha as regras de
mercado.
Ao lado da INTELSAT, encontramos a Organização Internacional de Telecomunicações Marítimas por Satélites - INMARSAT, também dotada de
personalidade jurídica, cujo ato institutivo foi concluído em Londres,33 em
03 de setembro de 1976, com o objetivo declarado (art. 3º), de prestação
32
33
Veja-se a INTELSAT LLC, empresa constituída segundo as leis do Estado de Delaware, Estados Unidos da América, com sede em Dundonald House, 14 Dundonald Street
West, Hamilton HM 09, Bermuda.
Assinado pelo Brasil em 13 de abril de 1978, aprovado pelo Decreto Legislativo nº 27, de
29 de maio de 1979, com depósito do instrumento de Ratificação pelo Brasil depositado
em Londres em 10 de julho de 1979. Em seguida, entrou em vigor para o Brasil em 16 de
julho de 1979, após publicação do Decreto nº 83.976, de 17 de setembro de 1979.
146
contínua dos serviços globais de comunicações via satélite de socorro e
segurança no mar, (...) relativos ao SGSSM; além de comprometer-se a
fornecer os serviços sem discriminação de nacionalidade; atuar exclusivamente com fins pacíficos; operar de forma compatível com os princípios da
concorrência leal; bem como, pelo princípio de universalidade, procurar
servir todas as regiões onde houver necessidade de comunicações móveis
via satélite, tendo em devida conta as regiões rurais e remotas dos países
em vias de desenvolvimento. Em 1994, mudou de nome e passou a ser a
Organização Internacional Satelital Móvel, mesmo que continue referida
por todos como INMARSAT.
Em seguida, para ampliar suas possibilidades, foi firmado o “Acordo Internacional sobre a Utilização de Estações Terrenas de Bordo da INMARSAT
em Águas Territoriais e em Portos”,34 em Londres, a 16 de outubro de
1985, com o propósito de oferecer uma mais avançada e adequada tecnologia espacial, mediante melhor utilização do espectro de freqüências radioelétricas e do espaço orbital; possibilitando abertura de comunicações aeronáuticas (para gestão de tráfego aéreo e controlo operacional de aeronaves serviços de segurança aeronáutica), e móveis em terra (que presta também
serviços de radiodeterminação) bem como a comunicações em águas que
não façam parte do meio marítimo.
Em vista dessas mudanças e intensificação das prestações de serviços de
localização móvel, com aumento da concorrência no mercado dos serviços
de comunicações móveis via satélite, tornou-se necessário que o sistema de
comercialização de capacidade dos satélites da INMARSAT passasse a ser
operado por intermédio de empresa privada, cabendo a esta observar, dentre outros princípios básicos, a não-discriminação com base na nacionalidade, atuar exclusivamente com fins pacíficos, procurar servir todas as
regiões onde haja necessidade de comunicações móveis via satélite e concorrência leal.
Ao lado destes, temos os sistemas regionais, como a Organização Européia
de Telecomunicações por Satélite - EUTELSAT, criada em 15 de Julho de
34
Mediante o Decreto Legislativo nº 73, de 4 de maio de 1995, o presente ato foi autorizado à sua ratificação e o Governo brasileiro depositou o Instrumento de Ratificação
em 18 de dezembro de 1995, como dá conhecimento o Decreto nº 2.736, de 13 de agosto de 1998.
147
1982, juntamente com a Sociedade Eutelsat, S. A., para explorar um sistema de satélites e fornecer serviços de satélite, sendo, para esse efeito,
transferidos para explorar um sistema de satélites e fornecer serviços, o
que justificou a transferência dos ativos necessários e atividades operacionais a tal fim da EUTELSAT.
Após o processo de privatização das três entidades acima citadas, os acordos institutivos das organizações intergovernativas mantiveram-se inatingíveis, apenas transferindo-se a gestão sobre a capacidade de satélite para a
nova entidade, fincando a administração das estações terrestres disciplinadas pela legislação nacional de localização. O fenômeno de liberalização
ou privatização35 destas prestou-se apenas aos serviços via satélite, com
eliminação de regulamentações restritivas da propriedade das estruturas
satelitais, inclusive com aumento da competitividade sobre a gestão das
estações terrestres, bem como sobre a negociação da capacidade.
E, por fim, existem os sistemas domésticos de satélites. No Brasil, a ANATEL cuida da regulação e provimento de capacidade espacial, que é
oferecida a entidades detentoras do direito de exploração de satélite brasileiro ou estrangeiro para o transporte de sinais de telecomunicações. A Lei
nº 9.472/97 dispõe sobre as condições dessas modalidades e autoriza à
Agência estabelecer “os requisitos e critérios específicos para execução de
serviço de telecomunicações que utilize satélite, geoestacionário ou não,
independentemente de o acesso a ele ocorrer a partir do território nacional ou do exterior” (art. 170). A Resolução nº 220, de 05/04/2000, por sua
vez, aprovou o regulamento que dispõe sobre as condições para conferir o
Direito de Exploração de Satélite, brasileiro ou estrangeiro. E tal como
consta deste, a prestação de serviços de telecomunicações utilizando satéli35
“Lo sfruttamento esclusivo, da parte di un'impresa privata, di una o piu posizioni
orbitali potrebbe tradursi in un'appropriazione di fatto di una porzione di spazio, non
già a vantaggio del servizio pubblico (che le organizzazioni intergovernative sono tenute a garantire) bensì di interessi individuali di indole esclusivamente commerciale;
con la conseguenza di pregiudicare l'attuazione deI principio secondo il quale lo spazio è patrimonio com une dell'umanità e deve essere usato a beneficio di tutti i paesi.
Questo principio, peraltro, ha contenuto alquanto vago, non è mai stato tradotto in
precise norme vincolanti e la sua esecuzione piu soddisfacente, in tema di telecomunicazioni, rimane proprio quella effettuata dall'UIT, tramite la sua prassi volta a realizzare l'equo accesso e l'effettivo utilizzo delle posizioni orbitali”. VENTURINI, Gabriella.
Servizi di telecomunicazione e concorrenza nel diritto internazionale e comunitario. 2ª
ed., Torino: Giappichelli, 1999, p. 154.
148
te somente poderá ser realizada por entidade que detenha, previamente,
concessão, permissão ou autorização para prestação de serviços de telecomunicações (STFC, SRTT, Serviço de Comunicação de Multimídia SCM, Serviço Limitado Especializado - SLE, Serviço Limitado Privado SLP, DTH ou Serviço Móvel Global por Satélite - SMGS). E tanto que,
cessados os efeitos de alguma dessas permissões, o explorador ou mesmo o
usuário que o tenha contratado não poderá prosseguir na atividade.
4.
A UIT E AS ATIVIDADES SATELITAIS
A Constituição da União Internacional de Telecomunicações, instituída
em 1989, nos seus textos, anexos e regulamentos determina os princípios
gerais para nortear a legislação interna dos países membros na matéria, o
que se encontra plenamente em vigor no direito brasileiro.
As tratativas para implementar a Constituição da UIT alcançou êxito na
Conferência de Plenipotenciários da UIT quando foi firmado o Tratado de
Nice, em 30 de junho de 1989. O Brasil, como membro da UIT, firmou o
presente Acordo, cujo texto recebeu referendo do Congresso Nacional mediante o Decreto Legislativo n° 80, em 20 de novembro de 1992. Em seguida, deu-se a ratificação, por depósito efetuado em 15 de janeiro de 1993.
Esse Tratado, todavia, não chegou a entrar em vigor, por não se ter atingido
o quorum mínimo de ratificações. Mas isso não autoriza deixar de admitir
que o Brasil consentiu nos seus termos, ao conhecer do seu inteiro teor, por
ocasião do DL nº 80/92. Em vista disso, a referida Constituição da UIT
voltou a ser deliberada na Conferência de Plenipotenciários da UIT, em
Genebra, Suíça, com aprovação pelo Tratado de Genebra, em 22 de dezembro de 1992. A presente Constituição viria a sofrer mudanças, haja
vista uma série de discussões sobre a liberalização das telecomunicações e
outros. Assim, a 14 de outubro de 1994, foi aprovado o Instrumento de
Emenda à Constituição da UIT de Genebra, na Conferência de Plenipotenciários da UIT, em Quioto, Japão, pelo chamado Tratado de Quioto. No
Brasil, em 15 de outubro de 1.998, mediante o referendo legislativo veiculado pelo Decreto Legislativo nº 67, foram ambos os tratados, de Genebra e
de Quioto, autorizados à ratificação. Em seguida, foram eles ratificados em
19/10/1998 e publicados no País, para os efeitos de execução, mediante o
Decreto nº 2.962, de 23 de fevereiro de 1999.
Para operações com satélites, urge obter freqüências para que estes possam
149
servir de meio às telecomunicações espaciais. E foi a partir da Convenção
da União Internacional de Telecomunicações - UIT, de 1959, firmada em
Genebra, que os “serviços espaciais” receberam freqüências específicas.
Contudo, somente na Conferência Administrativa Extraordinária da UIT,
de 1963, no que concerne à distribuição de freqüências, o planeta foi “repartido” em três regiões, para permitir melhor alocação das freqüências.
Assim, com a finalidade de evitar a interferência prejudicial entre as estações de radiocomunicação dos distintos países e garantir os princípios do
tratado da ONU sobre “Princípios Reguladores das Atividades dos Estados
na Exploração e Uso do Espaço Exterior, inclusive a Lua e demais Corpos
Celestes”, a UIT comparece como a entidade responsável pela distribuição
internacional das freqüências do espectro radioelétrico, além do registro
das que sejam atribuídas.
A Constituição da União Internacional das Telecomunicações, no seu art.
44, dispõe sobre a “Utilização do espectro de freqüências radioelétricas e da
órbita dos satélites geoestacionários”. Nesse particular, prescreve o item 195
(1) que o número de freqüências e a extensão do espectro utilizado devem ser
limitados “ao mínimo indispensável para assegurar, de maneira satisfatória,
o funcionamento dos serviços necessários”. E no item 196 (2), prevê-se que
“na utilização de bandas de freqüência para as radiocomunicações, os
membros terão em atenção o fato de as freqüências e a órbita dos satélites
geo-estacionários serem recursos naturais limitados que devem ser utilizados
de forma racional, eficaz e econômica, em conformidade com as disposições
do Regulamento das Radiocomunicações, a fim de permitir aos diversos
países, ou grupos de países, um acesso eqüitativo a essa órbita e a essas
freqüências, tendo em conta as necessidades particulares dos países em
desenvolvimento e a situação geográfica de certos países”.
Esse procedimento de gestão das freqüências consta de três etapas: atribuição, distribuição e designação.36 A “atribuição” (allocation) é a reserva de
uma certa faixa de freqüências para um certo serviço (televisão, telecomunicação, rádio etc), atribuível a um específico País (Table of Frequency
Allocations). A “distribuição” (allotment), por sua vez, é a outorga de uma
36
LGT, art. 159. “Na destinação de faixas de radiofreqüência serão considerados o
emprego racional e econômico do espectro, bem como as atribuições, distribuições e
consignações existentes, objetivando evitar interferências prejudiciais”.
150
freqüência ou de um canal radioelétrico para ser utilizado por uma ou várias administrações em favor de um dado serviço de radiocomunicação em
um ou vários países ou zonas geográficas determinadas e segundo condições especificadas.37 Por fim, a “designação” (assignment), que é a autorização conferida por uma Administração (Estado) para que uma estação
radioelétrica utilize uma freqüência ou um canal radioelétrico nas condições assinaladas. Após isto, caberá à UIT efetuar os procedimentos de
notificação, publicação e registro de freqüências no Registro Central Internacional de Freqüências (International Master Frequency Register), para
efeito de controle.
Cumpre à UIT, ainda, coordenar medidas para reduzir ou eliminar as interferências prejudiciais entre as estações de radiocomunicação dos diferentes
países, bem como otimizar o uso do espectro de freqüência radioelétricas e
da órbita dos satélites geoestacionários para os serviços de radiocomunicação, mediante a atualização de especificações técnicas, padrões e compatibilidades de instrumentos,38 sempre aplicando “os últimos aperfeiçoamentos da técnica” (item 195.1, da Convenção da UIT).
Vale recordar que essa designação de freqüências é sempre temporária, nos
termos do contrato e nos limites da legislação e suas condições, e não outorga qualquer direito de propriedade sobre a freqüência ou mesmo o espaço exterior, porquanto isso violaria o tratado ONU acima referido. Na
prática, presta-se para proteger o direito de uso sobre específica posição na
órbita geoestacionária ou uma dada freqüência por tempo determinado,
sempre que devidamente registrada, conforme o regime previsto nos tratados e leis vigentes. Assim, corretamente implantada e confirmada, toda
37
38
Cf. HERMIDA, Julian. Derecho Espacial Comercial. Aspectos Internacionales, Nacionales y Contractuales. Buenos Aires: Depalma, 1997, p. 187.
No texto da Constituição da União Internacional das Telecomunicações, encontramos
bem designada sua competência para efetuar “a atribuição das faixas de freqüências do
espectro radioelétrico, a partilha das freqüências radioelétricas e o registro das consignações de freqüências e de qualquer posição orbital associada à órbita dos satélites geoestacionários, a fim de evitar interferências prejudiciais entre as estações de radiocomunicações dos diversos países” (11.a). E além desta, encontra-se ainda o objetivo de
coordenar esforços com vista a “eliminar as interferências prejudiciais entre as estações de radiocomunicações dos diversos países e a melhorar a utilização do espectro
das freqüências radioelétricas, bem como da órbita dos satélites geoestacionários para
os serviços de radiocomunicações” (12.b).
151
homologação de freqüência, nessas condições, gozará de proteção internacional contra interferências prejudiciais39 (vide art. 45).
A designação é feita por meio de autorização administrativa individualizada e acompanhada da cobrança de preço público, pela atribuição de qualquer freqüência. Isso não se confunde com as licenças ou autorizações
para prestar os serviços típicos que possam usar do espectro de radiofreqüência, por ser preciso adquirir licença autônoma de acesso ao segmento
espacial, bem como à propriedade de estação terrestre, à prestação de serviços ou mesmo à comercialização dos terminais. E ainda no capítulo das
remunerações, não há que se confundir a remuneração devida pela locação
de capacidade de satélites com aquelas devidas pelas prestações de serviços
que se utilizam dos satélites como meios de transporte dos sinais.
No momento, a UIT é responsável ademais pelo registro de ameaças a um
sugerido “caos orbital”, haja vista a alta demanda de posições orbitais, aos
fins de atribuição da órbita e espectro, em virtude da escassez de transponders tecnicamente aptos aos serviços propostos, bem como da própria órbita, para efetuar locação de satélites.40 Inusitadamente, pelas próprias limitações técnicas, especialistas opinam que “só dois ou três sistemas de telecomunicações planejados para o Pacífico asiático terão condições de serem rentáveis, e prevêem a saturação do mercado”.41 Vê-se, portanto,
quantos desafios esperam pelo mercado satelital no futuro.
39
40
41
Conforme o Anexo à Constituição da UIT, “Interferência prejudicial” é qualquer interferência que comprometa o funcionamento de um serviço de radionavegação ou de outros serviços de segurança ou que degrade seriamente, interrompa de forma repetida ou
impeça o funcionamento de um serviço de radiocomunicações utilizado de acordo com
o Regulamento das Radiocomunicações.
Tudo isso complementa-se com o teor do Anexo 1B, do GATS, que se ocupa das
telecomunicações, ao prever que este aplicar-se-á a todas as medidas de um Membro
que afetem ao acesso às redes e serviços públicos de transporte de telecomunicações e
à utilização destes. E especialmente ao cuidar da terminologia e definições, prescreve
que: “a) Entende-se por telecomunicações a transmissão e recepção de sinais por
qualquer meio eletromagnético”. Porém, faz questão de ressaltar a separação estrutural
entre estes e aqueles de locação de meios ou mesmo de simples transporte de telecomunicações, in verbis: “b) entende-se por serviço público de transporte de telecomunicações todo serviço de transporte de telecomunicações que um Membro prescreva, expressamente ou de fato, e que se ofereça ao público em geral. Tais serviços podem incluir, entre outros: telégrafo, telefone, telex (…)”.
MONSERRAT FILHO, José. Introdução ao Direito Espacial, p. 37.
152
5.
OS REQUISITOS PARA USO DE SATÉLITES - ATRIBUIÇÃO
DE FREQUÊNCIAS E DE ÓRBITAS. O DOMÍNIO RADIOELÉTRICO
A colocação de um satélite no espaço requer como êxito a combinação de
dois aspectos: que o objeto possa alcançar a órbita indicada (i) e que este
possa operar com uma freqüência designada (ii), tal como atribuídos pela
UIT - União Internacional de Telecomunicações ao país de origem do satélite e pela Administradora de freqüências deste, porque somente assim
poderá cumprir com as funções a ele atribuídas.
Estas exigências são feitas porque as radiocomunicações encontram-se
sujeitas a cinco regimes internacionalmente bem definidos,42 que podem
ser resumidos no seguinte: a) toda emissão radioelétrica está sujeita ao
poder de polícia do Estado, que opera controlando e regulando a vinculação do uso de órbitas, freqüências, sistemas e meios de emissão. Na administração dessas funções, responde o Estado perante outras nações sobre o
uso regular das faixas de freqüência e outros; b) garantia da liberdade de
recepção dos serviços de difusão; c) preservação do sigilo das radiocomunicações privadas; d) manutenção de acesso público aos serviços, em condições de igualdade; e e) livre propagação e trânsito de sinais, o qual supõe
a proibição de interferência prejudicial e de interceptação, em termos de
normalidade internacional.
Como demonstrado acima, em atendimento aos princípios e valores do
direito espacial, as atribuições de posições de órbitas e radiofreqüências são
administradas internacionalmente pela UIT, dando aplicação aos princípios
do tratado da ONU sobre “Atividades dos Estados na Exploração e Uso do
Espaço Exterior, inclusive a Lua e demais Corpos Celestes”. Por conseguinte, nenhuma empresa privada pode pretender exercer direito de uso
exclusivo sobre órbitas geoestacionárias ou freqüências de ondas, porquanto isso poderia traduzir-se em apropriação de fato sobre uma porção do
espaço, em favor de interesses individuais e econômicos, a contrastar com
42
FERNANDO PABLO, Marcos M. Derecho general de las telecomunicaciones. Madrid:
Colex, 1998, p. 118-20. CARUSO, Elisabetta (Org.). Il Diritto Privatto delle Telecomunicazioni. Milano: Giuffrè, 2000, p. 76 e ss.; GÓMEZ-REINO Y CARNOTA, Enrique (Org.).
Telecomunicaciones, infraestructuras y libre competencia. Valencia: Tirant Lo Blanch,
2004, p. 109 e ss.; VENTURINI, Gabriella. Servizi di telecomunicazione e concorrenza nel
diritto internazionale e comunitario. 2ª ed., Torino: Giappichelli, 1999, p. 154.
153
a noção de “patrimônio da humanidade” daquele tratado ONU.
Cabe-nos agora dizer dos limites de atribuição de radiofreqüência, de órbitas ou de posições de órbitas aos exploradores de satélites.
5.1. Posições de órbitas espaciais - a escassez natural das órbitas administrada pela UIT e pelos estados
A órbita consiste em recurso natural do espaço, que se presta como meio
ou suporte pelo qual se propagam as ondas eletromagnéticas ou radioelétricas e, portanto, as telecomunicações que se utilizem de tais tecnologias
acessíveis por tais meios, alcançando os satélites ali posicionados.
Apesar de no início da corrida espacial ter prevalecido o princípio de first
come-first served, o temor de esgotamento da órbita impôs a superação
deste critério, como medida para garantir aos países menos desenvolvidos a
possibilidade de uso do espaço. Por isso, a UIT e os organismos competentes dos distintos países passaram a regular os atos de atribuição de posições
orbitais, mitigando o princípio do first come, first served, para garanti-las
aos países que não dispunham de tecnologia suficiente para lançamento de
satélites. Surgiram em seguida os meios não-geoestacionários, a facilitar as
oportunidades de utilização do espaço, com o uso de órbitas diversas,
As principais configurações de órbitas encontradas para localização de objetos espaciais são as seguintes: i) órbitas elípticas; ii) órbita geoestacionária
circular equatorial, as iii) órbitas polares circulares e iii) as órbitas circulares
inclinadas sobre o plano equatorial.43 Da órbita geoestacionária já falamos.
Além desta, temos órbitas elípticas, que são usadas como uma espécie de
“posição prévia” para o sucessivo estacionamento do satélite na posição
geoestacionária. As polares, que são mais baixas, prestando-se para o emprego de satélites não-geostacionários. E as órbitas circulares inclinadas
sobre o plano equatorial, usadas geralmente para complementar a operatividade dos sistemas de satélites de telecomunicações, visando a garantir maior
cobertura e evitar o congestionamento, para garantir melhor qualidade.
No emprego dos satélites, as posições de órbita geoestacionária ou indica43
Para maiores considerações, veja-se: SPADA, Mariagrazia. Diritto della navigazione
aérea e spaziale. Milano: Giuffrè, 1999, p. 183.
154
ções de órbitas para os não-geoestacionários, e das freqüências que podem
ser “usadas”, por não poderem ser objeto de apropriação por particulares
ou pelos Estados, como estabelece o Tratado do Espaço da ONU, em seu
artigo 2º, dependem de atribuição e controle internacional: “o espaço cósmico (...) não poderá ser objeto de apropriação nacional por proclamação
de soberania, por uso ou ocupação, nem por qualquer outro meio”. Esse é
o fundamento que norteia a administração desses bens escassos. A apropriação do espaço, sob a égide do conceito de soberania, está afastado (veja-se a Conferência de Bogotá, em 1976, quando Equador, Colômbia, Kenia, Uganda, Zaire e Indonésia reclamaram tal interesse). Prevalece o princípio de não apropriação.
Para garantir uso adequado e distribuído de modo igualitário, bem como
para permitir ausência de interferências entre os satélites e evitar riscos de
colisão, as atribuições de órbitas ou ocupações de órbitas são controladas
pela UIT.
Somente após a outorga de direito de ocupação de órbita pela UIT, os Estados podem atribuir a possibilidade de uso de uma dada órbita ou posição
orbital, o que pode vir acompanhado da faculdade de transferência, da possibilidade de recolocar satélite na mesma órbita, bem como de solicitar
mais posições e respectivas radiofreqüências, mas sempre desprovidos de
reserva de domínio, apropriação de bens ou semelhante. Importante recordar que todos esses casos de atribuição de órbita ou de posição de órbita
deverão ser feitos sempre de forma eficiente e econômica, visando a permitir o acesso eqüitativo a todos os interessados.
5.2. Domínio público radioelétrico e a atribuição de radiofreqüência
aos satélites
Uma das características dos satélites é aquela de operar com ondas rádio,
mediante uso do chamado espectro radioelétrico ou espaço radioelétrico,
também conhecido por espectro de freqüência ou de radiofreqüências.
Trata-se, também este, de recurso natural escasso, pelas limitações de faixas, bem como pela reserva de certas faixas para serviços públicos previamente designados, sobre o qual o Estado deve operar adequado poder de
polícia, pelos limites indicados.
Exatamente em virtude desse reconhecimento, ao Estado cabe intervir para
garantir um uso racional e eficaz das atribuições dessas freqüências. Daí a
155
regra do art. 157, da nossa LGT, assim o definir: “O espectro de radiofreqüências é um recurso limitado, constituindo-se em bem público, administrado pela Agência”.
Desse dispositivo saltam à vista duas particularidades fundamentais: a qualificação do espectro de radiofreqüências como bem público (i) e que este
será administrado pela Agência (ii). Falemos inicialmente do primeiro,
para ver em que acepção é possível referir-se a “bem público” na espécie.
Como é sabido, as ondas eletromagnéticas propagam-se no espaço sem
necessidade de guia artificial, exatamente porque uma das propriedades da
eletricidade é aquela de não requerer necessariamente um determinado meio
físico para transmitir-se ou difundir-se. Porém, estas não se prestariam a
nada sem um processo de transformação do som ou imagem em eletricidade
para propagar-se desde um ponto emissor a um dado ponto receptor, cuja
função é unicamente a de converter os sinais em eletricidade, para que se
possa recuperar os dados, sons ou imagens enviados, seguindo um procedimento inverso aquele empregado no impulso inicial.44 Perfaz-se, assim, o
emprego de ondas hertzianas como veículo de transmissão de sinais acústicos e visuais.45 Eis o que forma o “espectro radioelétrico”, que é a possibilidade de emissões radioelétricas usando de propagação no espaço.
Certo que este campo de ondas eletromagnéticas sob a forma de freqüências não se confunde com a camada de ar atmosférico no qual se propaga.
Como observa, de modo percuciente, Carmen Chinchilla Marín, em penetrante estudo:
44
45
Com melhor esclarecimento: “En consecuencia, de un lado tenemos esa carga de
electrones (corriente eléctrica) en la que convertimos las señales sonoras y visuales a
transmitir, que al atravesar el oscilador se transforma en radiación electromagnética
de una muy determinada frecuencia (energía radioeléctrica) y, de otro, la cualificación física de esta energía, determinada por la asignación que a la misma se hace de
una particularísima frecuencia. Así pues, las ondas hertzianas son energía radioeléctrica definida por unas cualidades físicas (la longitud y la frecuencia). Las bandas de
frecuencia son, pues, los ‘caminos’ (entendiendo el término desprovisto de sentido físico) por los que discurre la energía radioeléctrica que al final, sometida a un proceso
técnico (el altavoz en la radio y el pincel electrónico en la pantalla del televisor), se
recompone en imágenes y sonidos”. CHINCHILLA MARÍN, Carmen. La radio-televisión
como servicio público esencial. Madrid: Tecnos, 1988, p. 117.
Ibidem, p. 110.
156
“Espacio aéreo y ondas hertzianas son, pues, dos cosas diferentes. Ni la onda es una parte de un todo que seria el espacio
aéreo, ni éste es el soporte físico o conductor material de aquéllas”.46
Essa distinção é fundamental para afirmar a segregação de domínios, entre
o espaço público e o fluxo de propagação das ondas hertzianas. E cumpre
desde logo tal diferenciação vir esclarecida exatamente porque, quando a
UIT atribui faixas de freqüência aos distintos países e estes, quando oportuno, notificam aos utentes emissores que operam no seu território, o que
faz não é permitir o “uso do espaço”, mas sim autorizar o uso de certos e
determinados “caminhos”, para que possa alcançar o satélite e, deste, o
destinatário pretendido.
Daí ser de todo equivocado dizer que as “ondas eletromagnéticas não têm
fronteiras”. Que fisicamente isso seja possível, não discordamos, mas que
juridicamente seja válida a afirmação, isso decerto é infirmado pela realidade jurídica.
Eis porque é relevante discorrer sobre o tratamento jurídico aplicável às
ondas eletromagnéticas, especialmente sobre se é possível qualificá-las
como espécie de “bem” ou de “coisa”. E esta não é uma empreitada fácil,
até pelas próprias qualidades físicas de longitude e freqüência, que permitem a inscrição nos registros da UIT, logo, com características que podem
assemelhar às coisas móveis em dado momento e distanciar-se do conceito
de bem ou coisa em outros.
5.2.1. A natureza do bem jurídico definido como “espectro de radiofreqüências”
Importa isolar no caso em espécie o conceito de “bem jurídico” que deve
ser tutelado e regulado pelo Direito. Discute-se sobre qual seria o conteúdo
das ondas eletromagnéticas. Para uns, seriam estas expressão gráfica do
movimento oscilatório que possuem as emissões radioelétricas.47 A freqüência e a longitude das emissões, quer dizer, as qualidades físicas que as
definem, conformariam o conteúdo desse bem.
46
47
Ibidem, p. 116.
Ibidem, p. 117, 121 e ss.
157
Nesse âmbito, a melhor orientação parece consistir em situar o espectro
radioelétrico na noção de bens móveis. Do mesmo modo como o consumo
de energia elétrica sem registro é ilícito penal, o uso de freqüências não
atribuídas por ato típico é conduta ilegítima e punível, em virtude da apropriação indevida. E isso só é possível porque elas reúnem em si as propriedades de utilidade (foram parte da infra-estrutura de serviços de telecomunicações), individualização (existência própria na natureza) e apropriabilidade (a longitude e a freqüência das emissões permitem a mensurabilidade, a partir das homologações do Registro Internacional de Freqüências),
a justificar a qualificação e atribuição de direitos como objeto negocial.
Quanto ao seu conteúdo econômico, por que as ondas, em si mesmas, não
possuem valor econômico, caberá verificar unicamente o regime do aproveitamento destas para determinar quem, e em virtude de que título, poderá
servir-se da sua utilidade. E somente a partir dessa análise poder-se-á identificar a instrumentalidade típica de tais ondas para o exercício de certos
direitos ou liberdades (i), a escassez apresentada, pois as freqüências são
limitadas, para evitar interferências, (ii) e a relevância internacional da sua
tutela e atribuição48 (iii).
Daí descartar a doutrina qualquer semelhança com as noções de res nullius
ou res communes omnium. São bens móveis, com as notas de inalienabilidade, impenhorabilidade e imprescritibilidade, mas não são coisas abandonadas; e tampouco são de uso comum e geral do povo, ou do espaço dos
bens dominiais do Estado, qualificáveis como típicos bens dominicais,
inclusive o conjunto dos espectros de freqüências mediante as quais os
interessados podem transmitir ondas radioelétricas.49 O velho instituto do
domínio público apresenta aqui sérias dificuldades para sua afirmação,
especialmente por tratar-se de bem imaterial.
Não obstante essas advertências, o art. 157, da Lei nº 9.472/97, prescreve
que o espectro de radiofreqüências constitui-se em “bem público, administrado pela Agência”. Ora, o máximo que pode decorrer dessa disposição, a
título da qualificação jurídica atribuída, é que o regime de utilização das
48
49
Cf. CHINCHILLA MARÍN, Carmen (Coord.) Telecomunicaciones: estudios sobre dominio público y propiedad privada. Madrid: Marcial Pons, 2000, p. 124.
TORRES LÓPEZ, Maria A. Las comunicación móviles y su régimen jurídico. Madrid:
Civitas, 1988, p. 146.
158
ondas é tão-só administrado pelo Estado, e nada mais.
E assim encontra-se assentado no art. 158, da LGT:
“Observadas as atribuições de faixas segundo tratados e acordos internacionais, a Agência manterá plano com a atribuição, distribuição e destinação de radiofreqüências, e detalhamento necessário ao uso das radiofreqüências associadas
aos diversos serviços e atividades de telecomunicações, atendidas suas necessidades específicas e as de suas expansões”.
E complementa-o a disposição integral do art. 160, quando prescreve:
“A Agência regulará a utilização eficiente e adequada do espectro, podendo restringir o emprego de determinadas radiofreqüências ou faixas, considerado o interesse público.
Parágrafo único. O uso da radiofreqüência será condicionado à sua compatibilidade com a atividade ou o serviço a ser
prestado, particularmente no tocante à potência, à faixa de
transmissão e à técnica empregada”. (g.n.)
Como antecipamos, o direito de usar privativamente as ondas eletromagnéticas não é exclusiva para ninguém, remanescendo apenas o direito de uso,
por outorga de concessão, permissão ou autorização administrativa, quando
atendidos os requisitos, na sua atribuição, mediante ato oneroso, por parte
da Administração, e, no caso do Brasil, pela Anatel. De qualquer modo, o
fato de se verificar uma regulação e administração estatal sobre o espectro
eletromagnético não o torna bem dominical, tampouco pode-se falar em
“bem público” a qualquer título, porquanto prevalecerá sempre o princípio
segundo o qual o espaço externo é “patrimônio comum da humanidade”,
tal como versado nos tratados da ONU.
5.2.2. O papel da Agência na administração do “espectro de radiofreqüências”
O planejamento internacional das ondas é da maior importância, para evitar
interferências pelo cúmulo de usos sobre mesma faixa de freqüências. Em
vista disso, os órgãos internos de administração das freqüências encontramse vinculados aos compromissos internacionais assumidos, quanto à atribu159
ição das faixas de freqüência do espectro radioelétrico. Denota-se, assim,
com nítida evidência, que tal espectro não é de domínio privado, e tampouco de propriedade do Estado.
Com isso, a autorização do Estado para o uso de capacidade satelital é fundamental na aplicação dos serviços de telecomunicações, apesar de ser
dotada de simples instrumentalidade para servir à prestação daqueles serviços públicos, como telecomunicações, rádio ou televisão via satélite, aos
quais o uso de tais ondas é essencial, e cujas autorizações ou credenciamentos públicos não se confundem.
Desse modo, o conceito de “domínio público radioelétrico”,50 na ausência
de uma titularidade pública declarada, como ocorre com os bens, as águas
ou fronteiras, remanesce em espaço de simples gestão e administração,
com poderes de fiscalização e controle na atribuição de direitos de uso.
Cumpre assim, ao legislador e à ANATEL, pela delegação patrocinada pela
Lei nº 9.472/97, no seu art. 171, o dever de controle aplicável a esse direito
de uso relativo, atribuindo direitos sobre espectros de radiofreqüências,
como veremos mais adiante.
Confirmando esse entendimento, a LGT, prescreve, no parágrafo único do
seu art. 1°, que, entre outros aspectos, estão sujeitos às suas disposições o
disciplinamento e a fiscalização da execução e comercialização da utilização dos recursos de órbita e espectro de radiofreqüências. E mais adiante,
o art. 158 dispõe que: “observadas as atribuições de faixas segundo tratados e acordos internacionais, a Agência manterá plano com a atribuição,
distribuição e destinação de radiofreqüências, e detalhamento necessário
ao uso das radiofreqüências associadas aos diversos serviços e atividades
de telecomunicações, atendidas suas necessidades específicas e as de suas
expansões”. E essa competência vê-se confirmada, em plenitude, nos art.
160, que estatui: “A Agência regulará a utilização eficiente e adequada do
espectro, podendo restringir o emprego de determinadas radiofreqüências
50
MARZO COSCUELLUELA, Javier. El dominio público radioelétrico. CHINCHILLA MARÍN,
Carmen (Coord.) Telecomunicaciones: estudios sobre dominio público y propiedad
privada. Madri: Marcial Pons, 2000, p. 191 e ss.; GARDETA GONZÁLEZ, Eduardo; LÓPEZ DE HARO, Ramón. Consideraciones fiscales en torno del dominio público en el
sector de las telecomunicaciones. CHINCHILLA MARÍN, Carmen (Coord.) Telecomunicaciones: estudios sobre dominio público y propiedad privada. Madrid: Marcial Pons,
2000, p. 150 e ss.
160
ou faixas, considerado o interesse público” e “o uso da radiofreqüência
será condicionado à sua compatibilidade com a atividade ou o serviço a
ser prestado, particularmente no tocante à potência, à faixa de transmissão
e à técnica empregada” (parágrafo único).
Em definitiva, a Administração apenas realiza atividade de simples gestão,
sem qualquer propriedade sobre tais bens escassos. E nesse particular, a
Administração atua disciplinando as condutas dos agentes interessados e
repartindo os espaços de faixas de freqüência, que se mantém sob sua coordenação e permanente controle. Exerce, assim, uma competência de
poder de polícia, nos limites daquilo que disponham tratados internacionais
aplicáveis à espécie, para evitar interferências e permitir a coordenação
com as demais administrações.
Passemos agora ao estudo dessas atribuições de freqüência para os atos de
exploração de satélites brasileiros, que não se confundem com aqueles atos
contratuais de provisão de capacidade satelital, de natureza inteiramente
privada e que se verifica entre tais exploradores e os prestadores de serviços de telecomunicações.
6.
A EXPLORAÇÃO - OS SATÉLITES BRASILEIROS OU ESTRANGEIROS E O PROVIMENTO DE CAPACIDADE SATELITAL
Para conceder Direito de Exploração de Satélite Brasileiro para Transporte de Sinais de Telecomunicações (objeto do contrato), utilizando satélites
geoestacionários ou não- geoestacionários, conforme o procedimento assumido pela legislação vigente, constitui-se Licitação, a reger-se pela Lei
n° 9.472/97, pelo Regulamento do Serviço de Transporte de Sinais de Telecomunicações por Satélite, aprovado pelo Decreto nº 2.195, de 8 de abril
de 1997, pela Norma nº 003/97 do Serviço de Transporte de Sinais de Telecomunicações por Satélite, aprovada pela Portaria n° 253, de 16 de abril
de 1997, no que couber, além do respectivo Edital e seus Anexos, com a
finalidade de atribuir ao vencedor “posições orbitais notificadas pelo Brasil ou resultantes de processos de notificação a serem iniciados na União
Internacional de Telecomunicações - UIT, e radiofreqüências associadas”,
como geralmente consta dos processos. Esta é a autorização para os atos
de “exploração” de satélite brasileiro.
161
Recorda-se aqui que Direito de Exploração de Satélite Brasileiro para
Transporte de Sinais de Telecomunicações, de acordo com a Lei nº 9.472,
de 16 de julho de 1997, é o que “assegura a ocupação da órbita e o uso das
radiofreqüências destinadas ao controle e monitoração do satélite e à telecomunicação via satélite”.51 Esta atribuição é geralmente feita por prazo
determinado de 15 anos, a contar da data de publicação no Diário Oficial
do Termo que conferirá o Direito de Exploração à entidade vencedora da
licitação.52
51
52
Ou como prescreve o art. 2º do Anexo à Resolução nº 220, de 5 de abril de 2000 Regulamento sobre o Direito de Exploração de Satélite para Transporte de Sinais de
Telecomunicações: “Direito de Exploração de Satélite Brasileiro para transporte de
sinais de telecomunicações é o que assegura a ocupação da órbita e o uso das radiofreqüências destinadas ao controle e monitoração do satélite e à telecomunicação via
satélite”. E no art. 3º, “Direito de Exploração de Satélite Estrangeiro para transporte
de sinais de telecomunicações é o que permite o provimento de capacidade de satélite
estrangeiro no Brasil e o uso das radiofreqüências destinadas à telecomunicação via
satélite e, se for o caso, ao controle e monitoração do satélite”.
Exemplos:
Telecomunicação - “Art. 1º - Conferir à o direito de exploração no Brasil de satélite
estrangeiro com as características do INTELSAT 901, ocupando a posição orbital
18,0ºW e operando na Banda C, através de seu representante legal no Brasil, a INTELSAT BRASIL LTDA., empresa constituída sob as leis brasileiras, com sede e administração no País. (...) Art. 2º - Autorizar, até 31 de dezembro de 2008, o uso das
radiofreqüências associadas ao direito de exploração conferido no Art. 1º, destinadas
à telecomunicação via satélite, nas faixas de freqüências abaixo relacionadas, sem caráter de exclusividade, em todo território nacional. Faixa de freqüências Terraespaço: 5850 - 6425 MHz; Faixa de freqüências espaço-Terra: 3625 - 4200 MHz”.
Rastreamento - “Art.1° Expedir autorização à JABURSAT - JABUR RASTREAMENTO
DE VEÍCULOS LTDA., para exploração do Serviço Limitado Especializado, de interesse restrito, com a finalidade de rastreamento e monitoração de veículos, em âmbito
interior e internacional, por prazo indeterminado, sem caráter de exclusividade tendo
como área de prestação o território nacional”.
Rede de satélites não-geoestacionários - “Art. 1º Reconhecer a empresa Globalstar Limited Partnership, sociedade constituída e existente sob as leis do Estado do Delaware, Estados Unidos da América, como habilitada a operar no Brasil a rede de satélites
não-geoestacionários denominada Sistema Globlastar, através de seu representante
legal, a Globalstar do Brasil. (...) Art. 2 º Autorizar o uso, em território nacional, das
radiofreqüências associadas ao Sistema Globalstar, pelo prazo de 15 (quinze) anos,
nas faixas de freqüências: I. Para comunicação nos enlaces de alimentação (gateways), Faixa de freqüências Terra-Espaço: 5090 MHz a 5250 MHz; Faixa de freqüências Espaço-Terra: 6875,95 MHz a 7052,9 MHz. II. Para comunicação entre estações móveis (portáteis e veiculares) e transportáveis, com capacidade de transmissão e dessas com a rede pública de telecomunicações: Faixa de freqüências Terra-
162
Como consta da legislação, “Satélite Brasileiro é o que utiliza recursos de
órbita e espectro radioelétrico notificados pelo País, ou a ele distribuídos
ou consignados, e cuja estação de controle e monitoração seja instalada
no território brasileiro”. E Provimento de Capacidade Espacial, “o oferecimento de recursos de órbita e espectro radioelétrico em Satélite Brasileiro às entidades que detém concessão, permissão ou autorização para exploração de serviços de telecomunicações”. A prestação de serviço de
telecomunicação é o que faz a Prestadora, que é a “entidade que detém
concessão, permissão ou autorização para exploração de serviço de telecomunicações que contrata o Provimento de Capacidade Espacial”. Desse
contexto é que se extrai a noção de Direito de Exploração de Satélite Brasileiro para Transporte de Sinais de Telecomunicações, que “é o que assegura a ocupação da órbita e o uso das radiofreqüências destinadas ao
controle e monitoração do satélite e à telecomunicação via satélite, pelo
prazo de até quinze anos”.
Assim, como fica demonstrado, para explorar a provisão de capacidade
espacial faz-se necessário obter a devida “Licença”, que é “o direito ou a
autorização para prover capacidade espacial”, como assim dispõe o art.
163, da LGT: “O uso de radiofreqüência, tendo ou não caráter de exclusividade, dependerá de prévia outorga da Agência, mediante autorização,
nos termos da regulamentação”. E esta será atribuída tanto para exploradores de satélite brasileiro quanto para exploradores de satélites estrangeiros, sendo que, neste último, para permitir o provimento de capacidade de
satélite estrangeiro no Brasil e o uso de radiofreqüências, como consta do
art. 3º, do Anexo à Resolução nº 220/2000.
A presente “licença”, na sua configuração básica, não é mais do que ato
administrativo que garante a autorização de uso da radiofreqüência e provimento de capacidade, desde que atendidos os requisitos necessários e
suficientes para esse fim. Daí definir o § 1°, do art. 163, da LGT:
Espaço: 1610 MHz a 1616,5 MHz (banda L); Faixa de freqüências Espaço-Terra:
2483,5 MHz a 2500 MHz (banda S)”.
Serviço de Rede Privado - “Art.1º Expedir autorização à MEDIA MUNDI BRASIL LTDA, para executar, para uso próprio, o Serviço Limitado Privado, submodalidade de
Serviço de Rede Privado, por prazo indeterminado, sem caráter de exclusividade, e tendo como área de exploração do serviço o território nacional. § 1º A autorização de que
trata o caput deste artigo tem como objetivo transmitir sinais de telecomunicações, a
partir da instalação de estações terrenas com capacidade de transmissão (uplink)”.
163
“Autorização de uso de radiofreqüência é o ato administrativo
vinculado, associado à concessão, permissão ou autorização
para prestação de serviço de telecomunicações, que atribui a
interessado, por prazo determinado, o direito de uso de radiofreqüência, nas condições legais e regulamentares”.
Desse modo, o explorador de satélites, para que possa efetuar atos de provisão de capacidade espacial (ou segmento espacial), necessita previamente
de licença do País, a ser expedida pela Anatel, a partir da coordenação e
notificação junto à União Internacional de Telecomunicações. E será tal
notificação de freqüências e de órbita pela Agência que se prestará à qualificação do satélite como “brasileiro”.
6.1. Da exploração de satélite à provisão de capacidade satelital
Como afirmado, explorador ou provedor de facilidades via satélite é o titular da Licença para prover capacidade espacial, na medida que o “satélite”,
no seu contexto funcional, somente pode ser entendido como uma estação
espacial que provê capacidade espacial, que consiste nos “recursos de
órbita e espectro radioelétrico” oferecidos pelo explorador, com as garantias de eficiência e confiabilidade do equipamento na gestão destes.
A Capacidade Espacial ou facilidades via satélite será oferecida pela exploradora de satélite (brasileiro ou estrangeiro), mediante contrato oneroso,
às concessionárias, permissionárias ou autorizadas de telecomunicações
para que estas possam prestar seus serviços diretamente aos seus usuários.
São, portanto, atividades diversas, a merecer tratamento jurídico autônomo.
A entidade Exploradora, seja esta brasileira ou estrangeira, portanto, “é
livre para contratar com terceiros o desenvolvimento de atividades inerentes, acessórias ou complementares ao Direito de Exploração conferido,
bem como a implementação de projetos associados”, tal como consta dos
termos de licitação da Anatel. E essa liberdade de contratação, como não
poderia ser diferente, é feita sem prejuízo da responsabilidade integral pelo
provimento de capacidade espacial, em razão da exploração dos satélites.
Nesse contexto, as relações entre Exploradora e Prestadoras serão regidas
pelo direito privado e deverão ser objeto de contrato entre as partes. E somente poderão ter acesso aos satélites de uma dada Exploradora, no território
nacional, entidades que detenham concessão, permissão ou autorização para
164
exploração de serviços de telecomunicações, como acima adiantamos.
Sendo contratos onerosos, a exploradora fixará os preços para o provimento de capacidade espacial por sua conta e risco e em regime de justa competição. Os preços oferecidos devem ser justos e não discriminatórios,
podendo variar em função de características técnicas e de custos específicos. Esta comercialização, contudo, fica sujeita ao controle da ANATEL,
razão pela qual a Exploradora deverá manter à disposição da Agência cadastro atualizado de todas as Prestadoras que contratem provimento de
capacidade espacial, contendo, pelo menos, o nome ou a razão social da
Prestadora e seu domicílio ou sede.
A partir do contrato, assim constituído entre as partes, as atividades a serem
desempenhadas pelas “exploradoras”, nos limites da administração da capacidade espacial, impõe a estes diversos deveres, e, ao mesmo tempo, direitos
à outra parte da relação jurídica, às “Prestadoras” (dos serviços de telecomunicações que usem da capacidade espacial), a exemplo do que segue:
“I - acesso e fruição do provimento de capacidade espacial
dentro dos padrões de qualidade, regularidade e eficiência
previstos na regulamentação;
II - tratamento não discriminatório quanto às condições de
acesso e fruição do provimento de capacidade espacial;
III - obtenção e utilização de capacidade espacial, com liberdade de escolha, observadas as limitações técnicas, as cláusulas contratuais entre a Exploradora e as Prestadoras e a
regulamentação;
IV - inviolabilidade e o segredo das comunicações, respeitadas as hipóteses e condições constitucionais e legais de quebra de sigilo de telecomunicações;
V - conhecimento prévio de toda e qualquer alteração nas
condições de prestação do provimento de capacidade espacial que lhe atinjam direta ou indiretamente, inclusive e especialmente nas hipóteses de início do provimento de capacidade
espacial, sua suspensão e cessação;
165
VI - privacidade nos documentos de cobrança e na utilização
de seus dados pessoais;
VII - recebimento, em prazos razoáveis, de respostas eficientes às suas reclamações;
VIII - encaminhamento de reclamações ou representações junto à ANATEL ou aos organismos de defesa do consumidor;
IX - reparação pelos danos causados pela violação dos seus
direitos;
X - não ser obrigado a consumir serviços ou a adquirir bens
ou equipamentos que não sejam de seu interesse”.
Como fica evidente, o serviço de telecomunicação executado pelas “prestadoras” em nada confunde-se com aquela atividade realizada pelas “exploradoras”, na provisão da capacidade de satélite usada por aquelas em favor
do cumprimento das suas finalidades específicas, no transporte dos seus
sinais. Comprova-o a obrigação da Exploradora na “manutenção de registros contábeis distintos para o provimento de capacidade espacial”. Isto,
ademais, é reforçado pelo parágrafo único do art. 50, do Regulamento sobre o Direito de Exploração de Satélite para Transporte de Sinais de Telecomunicações, ao enunciar que “quando a exploradora de satélite for também prestadora de serviços de telecomunicações, deverão ser mantidos
registros contábeis separados”.
Trata-se de separação plenamente justificada pela distinção necessária entre
as atividades desenvolvidas, a reclamar adequado tratamento jurídico e
tributário. E corolário do que vimos afirmando, considera-se infração grave o não provimento injustificado de capacidade espacial.
Mas para que se possa isolar com precisão os exatos limites desse negócio
jurídico, passa-se a um estudo das relações entre exploradores e prestadores, a partir dos contratos de capacidade satelital, erigidos em típico regime
de direito privado.
7.
166
PROVIMENTO DE CAPACIDADE ESPACIAL - A RELAÇÃO
ENTRE EXPLORADORES DE SATÉLITES BRASILEIROS
OU ESTRANGEIROS E OS OPERADORES DE SERVIÇOS
QUE SE UTILIZAM DE CAPACIDADE SATELITAL
Como visto acima, as licenças de exploração são conferidas unicamente
para oferecer a capacidade de segmento espacial, aos satélites brasileiros.
Em seguida, cabe a estas, em típico negócio de direito privado, providenciar o fornecimento da capacidade satelital às prestadoras de serviços. E
todos os atos devem ser informado à Agência, para efeitos de controle.53
As possibilidades de contratos nesse domínio são múltiplas. O negócio
jurídico pode dar-se sobre o transponder, entre exploradora e proprietária
do satélite (quando não sejam a mesma pessoa) ou entre estes e prestadores; pode ter-se unicamente negociada a capacidade espacial entre exploradores e prestadores; ou mesmo ter-se contratos mistos, como aquele em
que a exploradora adquire unicamente o direito de determinar as configurações dos canais (transponders) para cobrir determinado espaço geográfico,
mas não assume o efetivo controle destes, fincando controle da posição
orbital e do funcionamento dos equipamentos a cargo da proprietária do
satélite. E a partir deste, entre explorador e usuário, aquele assume responsabilidade apenas pelo funcionamento do satélite.
Desse modo, tanto o satélite quanto a capacidade satelital podem ser objeto de relações negociais de diferentes espécies, não cabendo qualquer confusão entre tais hipóteses.
Sujeitos e objetos desses contratos servirão para distinguir o tratamento
aplicável a cada uma das modalidades de contratos possíveis. Mas seja
como for, encontraremos basicamente as seguintes possibilidades, todas
sujeitas a vários modelos de tratamentos ou regimes de remunerações:
1. Compra e venda do transponder ou dos seus canais;
2. leasing ou locação do transponder ou dos seus canais;
3. Aluguel de capacidade espacial, cujo interesse corresponde a uma dada
53
Veja-se o art. 49 e seguintes, do Anexo à Resolução nº 220, de 5 de abril de 2000 Regulamento sobre o Direito de Exploração de Satélite para Transporte de Sinais de
Telecomunicações.
167
órbita ou freqüência;
4. Uso de tecnologia, mediante licença ou cessão de direitos;54
5. Prestações de serviços, conforme a aplicação (telecomunicações, teleobservação, sensoriamento etc).
6. Pagamentos relativos à construção, lançamento, tecnologias, seguros e
outros.
Estes contratos podem ainda variar pelos sujeitos intervenientes. E, nesse
caso, poderemos verificar negócios jurídicos entre diversos atores, como os
proprietários do satélite (com seus transponders) e os exploradores de capacidade espacial (que pode ser até mesmo um representante da entidade
proprietária dos satélites) ou entre um ou outro destes e os prestadores de
serviços que requerem capacidade espacial. Bancos ou empresas de leasing podem intervir, como adquirentes ou intermediários.
Vejamos algumas destas modalidades de contratação.
7.1. O Contrato de aquisição ou uso de transponder
Como já descrito em páginas anteriores, o transponder é um elemento
fundamental para os satélites de telecomunicações, consistindo em equipamento que se presta a receber sinais de estações terrenas (uplink), amplificar a potência das ondas e dar continuidade à transmissão, mediante retransmissão às estações terrenas de destino (downlink).
Para negociação direta sobre estes, geralmente os usuários utilizam contratos de locação de transponder, apesar de ter-se ainda alternativas de alienação55 ou de leasing.56 E há os contratos de venda com locação posterior
54
55
Para maiores considerações, veja-se o nosso: TAVEIRA, Heleno. “Propriedade industrial e
transferência de tecnologia no direito tributário brasileiro”. In: Repertório de Jurisprudência IOB - Jurisprudência comentada. SP: IOB, 2004, nº 15, 1/19823, p. 569-555.
“Dans les contrats d'achat (purchase agreements), le transfert de propriété du transpondeur s'opere au profit de l'acquéreur. Le propriétaire du satellite transfere à l'acheteur le droit d'utilisation des fréquences associées au transpondeur. Le vendeur
demeure cependant compétent pour exploiter les sous-systemes de télémesure, de téléguidage, de contrôle et pour l'exploitation du satellite en orbite. Dans ce type de con-
168
(sales and lease back), em regra, intermediados por bancos. Todos à disposição dos proprietários de satélites.
Pelo contrato de venda e compra de transponder dá-se acordo entre os
sujeitos mediante transferência o respectivo domínio sobre o bem indicado,
com suas instalações, em pleno funcionamento ou para fins de lançamento,
para permitir o uso de sua capacidade total ou parcial de recepção e transmissão de dados e demais essential facilities. Nesta condição, assume o
explorador ou prestador de serviços os custos fiscais da propriedade. Contudo, poderá locar, dar em garantia ou empregar o equipamento nas funções do seu interesse, como preferir. Evidentemente, na maioria desses
casos, transfere-se, com o transponder, os direitos de acesso e o uso de
freqüências associadas ao bem, na modalidade de capacidade espacial.
O Contrato de locação de transpoders pode ser definido como aquele acordo por meio do qual o operador do satélite compromete-se a prover capacidade no transponder de um satélite de comunicações de forma exclusiva,
permitindo o uso dessa capacidade pelo explorador nos limites do contratado, mediante pagamento periódico do preço, como contraprestação. Neste
caso, o transponder não passa à titularidade do locatário, tampouco o controle das suas atividades. Tudo fica a depender das funções do explorador
e dos contratos entre este e os prestadores de serviços. Geralmente, o contrato de locação vem acompanhado sempre de cláusulas que resguardam a
manutenção de órbita e do equipamento, garantindo, assim, o resultado
56
trat, il est important de savoir quel type de transpondeur on acquiert; ainsi, il est possible d'acquérir un transpondeur protégé, ce qui permet à l'acheteur, en cas de défaillance du transpondeur acquis, de bénéficier du remplacement du transpondeur (spare
transponders). Il est également essentiel de savoir de quelle protection dispose l'acheteur en cas de non-fonctionnement d'un transpondeur ou d'un autre élément”. RAVILLON, Laurence. Droit des activités spatiales - Adaptation aux phénomènes de commercialisation et de privatisation. Paris: LITEC, 2003, p. 532.
“Dans les contrats de ventes leasing (transponder sale and lease back agreements), qui
sont rares contrairement à d'autres domaines, l'opérateur vend plusieurs transpondeurs à des investisseurs (banques ou institutions financieres) qui les lui louent en retour; les fonds obtenus le sont ainsi sans perte de contrôle des transpondeurs. Mais on
parle aussi de contrat de leaseback entre d'autres cocontractants que l'opérateur et
des banques. Par exemple, on a employé le terme de contrat de leaseback, à propos du
satellite Atlantic Bird-l construit par Alénia, Alénia restant propriétaire du satellite et
le louant à Eutelsat”. RAVILLON, Laurence. Droit des activités spatiales - Adaptation
aux phénomènes de commercialisation et de privatisation. Paris: LITEC, 2003, p. 532.
169
pretendido para o serviço que o usuário entende prestar a terceiros ou
mesmo realizar em seu favor.
Importante assinalar que a comercialização do segmento espacial, operada
sempre sobre base não discriminatória, foi muito ampliada a partir da privatização das empresas exploradoras e liberalização das entidades de gestão dos satélites geoestacionários, passando a ter diferentes espécies de
regimes. Em virtude dessas distintas possibilidades, a capacidade espacial
tornou-se commodity das mais valiosas e o direito de colocar satélites de
telecomunicações em posições orbitais definidas, determinadas pela prioridade atribuída às órbitas geoestacionárias sobre uma dada região, alvo de
grandes disputas e interesses vultosos.
7.2. O Contrato de uso da capacidade espacial mediante locação
Igualmente aos contratos sobre transponder, como compra e venda, locação ou leasing (i), os proprietários de satélites ou exploradores de capacidade espacial (ii) podem firmar contratos com os prestadores de serviços
ou mesmo com usuários diretos (iii), caso estes resolvam fazê-lo diretamente. Contudo, para tanto, necessitam obter a autorização pública para o
provimento de capacidade espacial, pois este será o objeto de tais contratos. Descortina-se, assim, a fundamental separação estrutural entre fornecimento do segmento espacial (i) e fornecimento dos serviços de comunicação via satélite e similares (ii), que não se confundem, mesmo que possam vir coincidentes em uma mesma pessoa que tenha autorização e atue
em ambos os segmentos.
Entre exploradores de capacidade espacial e prestadores de serviços de
telecomunicações ou de outra natureza geralmente firma-se “Contrato de
Cessão de Segmento Espacial”, cujo objeto é a cessão de certa e definida
capacidade espacial, quantificada pela freqüência e autorizada. Com este, a
prestadora de serviços passa a ter direito de uso exclusivo (porque protegido pelas regras internas e internacionais contra interferências) da capacidade de segmento espacial no Satélite, com o objetivo de efetuar transmissões
via satélite dos sinais de telecomunicações, por meio das Estações Terrenas
de Transmissão, para a prestação de serviços de telecomunicações.
As designações de posição orbital e faixas de freqüências para operação e
polarização da portadora e demais características técnicas são obtidas pelas
Exploradoras de satélites para que, em seguida, possam vir atribuídas às
170
prestadoras para que suas estações terrenas possam ser habilitadas para o
encaminhamento de ondas ao satélite. Não descaracteriza tal contrato como típico caso de “locação” a adição dos serviços técnicos praticados pelos
satélites, pois, nesse caso, o serviço prestado é acessório àquele propósito
de locação da capacidade espacial.57 Prefere tais serviços a atribuição de
órbita e de freqüências, que é o objeto central da contratação.
Sendo a capacidade espacial modalidade de bem móvel, definida pelas
específicas órbitas e freqüências atribuídas pro tempore, por ato de licença,
aos exploradores para que estes possam “usar” em proveito próprio ou
transferir a terceiros (prestadores de serviços), por contratos distintos. Nessa hipótese, nenhuma utilidade promove o “explorador” sobre essa capacidade espacial, bastando-se unicamente em atos de administração e de eventual transferência do uso, mediante reserva em favor de terceiros, os prestadores de serviços que necessitam de transporte de ondas. Desse modo,
tem-se caso específico de “locação”, como será demonstrado.
7.3. Natureza dos contratos de provimento de capacidade espacial - o
regime de locação
Lembra Pontes de Miranda, “servir é prestar atividade a outrem. Em sentido larguíssimo, serve quem promete e presta atos a outrem, ou quem
promete e presta resultado”.58 Nesses termos, e só em tal sentido, poderse-ia qualificar o ato de os exploradores de capacidade espacial pôr à disposição dos prestadores como modalidade de “serviço”, mas sequer nesses
termos estritos isso seria possível, mesmo que a locação persista, como virá
demonstrado.
Prescreve o Código Civil, no seu art. 565:
“Na locação de coisas, uma das partes se obriga a ceder à
57
58
Como bem define Laurence Ravillon: “Le contrat d'exploitation de satellites de télécommunications et de radiodiffusion directe est un contrat de location de la capacité
disponible sur le satellite. Il existe aussi d'autres formes de contrats d'exploitation de
satellites de télécommunications aux États-Unis”. RAVILLON, Laurence. Droit des activités spatiales - Adaptation aux phénomènes de commercialisation et de privatisation.
Paris: LITEC, 2003, p. 529.
MIRANDA, Pontes de. “Direito das Obrigações. Contrato de locação de serviços. Contrato de trabalho”. In: Tratado de Direito Privado. 3ª ed., SP: RT, t. XLVII, p. 3.
171
outra, por tempo determinado ou não, o uso e gozo de coisa
não fungível, mediante certa retribuição”.59
Vê-se que o Código oferece como limite à locação de coisas que esta se
faça a título de “uso e gozo” e que a “não-fungibilidade” da coisa ou do
serviço seja requisito para sua adequada qualificação. Assim, bens fungíveis não podem ser locados. Ora, na medida que “são fungíveis os móveis
que podem substituir-se por outros da mesma espécie, qualidade e quantidade” (art. 85, do Código Civil), a capacidade satelital queda-se excluída
de tal qualificação, pois as atribuições de freqüência e órbita, por serem
previamente delimitadas e não substituíveis, após o competente registro,
não são modalidades de bens fungíveis, tal como designado pelo Código,
cabendo, assim, seu uso mediante “locação”.
Locação diz respeito a “uso” ou ao “uso e seus frutos”, de alguma espécie
de bem, de qualquer natureza, bastando-se apenas que seja das espécies dos
infungíveis. Versando sobre a locação em geral, diz Pontes de Miranda:
“Quando, por contrato, alguém promete atribuir a outrem o
uso - ou o uso e o fruto - de alguma coisa, ou promete prestação de trabalho, ou resultado de trabalho (obra), e o outro
contraente a contraprestação em dinheiro, desde o direito
romano se diz que se concluiu locatio conductio, - locatio rei,
locatio operarum, locatio operis”.60
59
60
LOPEZ, Teresa Ancona. Comentários ao Código Civil. Parte Especial. Das várias espécies de contratos. SP: Saraiva, 2003, v. 7.
Como arremata Pontes: “O conceito de locação revela a sua formação histórica. Revela, também, que o direito romano soubera colher o elemento comum aos negócios jurídicos em que alguém, contra equivalente em dinheiro, põe a servir a outrém coisas
ou trabalho, isto é, tudo que pode ser útil. (...) Locare significou, posteriormente à
formação da palavra, submeter, pôr, e condu.cere, regrar, ducere-con, à semelhança
do contemporâneo conduta, mas em relação a outrem. (...) Locare conducere é colocar
(co-locar) + conduzir, o que sugeriu que se excluíssem os bens de raiz: bens imóveis
não se conduzem; somente se haviam de conducere bois, cavalos, trens, mobílias, escravos; não, terras e casas. Muito tempo se insistiu nessa identificação entre conducere e guiar, trazer, até que H. DEGENKOLB (Platzrecht und Miete, 136) mostrou que o
conteúdo de conducere era mais vasto, abrangendo a locatio conductio operis e a locatio conductio rei”. PONTES DE MIRANDA, F. Cavalcanti. Tratado de direito privado.
Parte especial - Direito das obrigações: locação das coisas. Locação de uso. Locação
de uso e de fruição. 3ª ed., SP: RT, 1984, tomo XL, p. 10.
172
Neste contexto, fundamental recordar, apesar da errônea aparência, que a
prestação do contrato de locação não promete “direito real”, como demonstra Pontes de Miranda, mas consiste apenas no “direito obrigacional de
usar”.61 Pode ocorrer, como dá-se no caso da exploração de capacidade
espacial, que o detentor do direito não seja o efetivo proprietário, mas isso
em nada compromete a natureza do negócio jurídico de locação. E por não
ser espécie de direito real:
“(...) não importa se o locador, que lha deu, tinha e tem direito de o fazer, isto é, se podia locar, se tinha o usus, que é ‘o
elemento da propriedade indispensável ao locador’, ou se não
o tem. Esse usus que se supõe ser exercido quando alguém se
faz locador, quer dizer - utiliza, juridicamente, a coisa, colocando-a sob o poder de outrem, que lhe pague os alugueres”.62
O prestador de serviço tem a pretensão de que se lhe entregue a coisa, por
prévio contrato, e se lhe assegure o “uso” efetivo (capacidade espacial).
Não há qualquer elemento real, portanto, como pensam alguns, a reclamar
uma suposta “posse indireta” ou outro.
É dizer, o “uso” do bem, independentemente da sua natureza, pode ser
objeto de locação, bastando que presente sua condição de bem infungível,
como é o caso da própria capacidade espacial, bem móvel da espécie dos
incorpóreos, sobre o que confirma Pontes de Miranda, com objetividade:
“Pode parecer que só se admite a locação de bens corpóreos,
coisas stricto sensu, mas os direitos patrimoniais que recaem
em bens incorpóreos, se os bens, a que esses direitos se referem, são usáveis por outrem ou fruíveis por outrem, podem
ser objeto de locação”.63
61
62
63
E assim contesta Pontes de Miranda: “Somente superficial estudo do assunto, ou pendor regressivo, turva a mente de juristas a ponto de pensarem que a resposta à questão da eficácia, erga omnes, pelo menos, do contrato de locação implica qualquer
concepção da natureza real, ou não, da locação”. Ibidem, p. 8.
Ibidem, p. 46.
Ibidem, p. 35; Ressalta Orlando Gomes: “A coisa não precisa ser de propriedade do
locador. As duas posições, de proprietário e senhorio, coincidem quase sempre, mas
173
Assinala Pontes de Miranda que o uso ou do uso e do fruto da coisa é elemento essencial da eficácia do contrato de locação de coisa. De fato, é da
relação jurídica constituída entre as partes que se irradia a eficácia, que
decorre da natureza dos direitos e deveres das partes. Ao locador cumpre
transferir ao locatário a possibilidade de poder usar o bem. E lembra Pontes: “por vezes, basta tornar acessível ao locatário o uso do bem durante
determinado tempo”,64 como o que verificamos no caso em espécie.
A partir dessas considerações, podemos verificar que a locação pode ser de
três tipos: a locação de coisas, a locação de serviços e a locação de obra.
E em qualquer modalidade, sempre a partir de contrato bilateral e consensual, teremos espécie de contrato sobre o “uso e gozo” de coisas, de obras
ou de serviços, mediante contraprestação onerosa, por certo lapso de duração. Dessa relação jurídica da locação, irradiam-se direitos e deveres irreflexivos e assimétricos, conforme a modalidade do bem, obra ou serviço
assumido como objeto.
No contrato de locação há transmissão temporal da posse de objeto para
que o outorgado tenha o uso, ou o uso e a fruição, a gerar direitos e deveres
temporários, nos limites da duração do contrato.
Outrossim, os deveres de manutenção dos equipamentos, atualização de
freqüências, ajustes de órbitas ou qualquer outra modalidade de acréscimo
ao contrato de locação de capacidade espacial em nada altera sua fisionomia. Essa é também a opinião de Pontes de Miranda, para quem “o conceito de locação conserva-se incólume se os contra entes introduzem no contrato cláusulas que não se referem ao usar ou ao fruir, porém de algum
modo se ligam a um ou ao outro: e. g., dever de limpeza dos móveis que
ficaram na casa, aguagem do jardim, poda anual das árvores, dragagem
dos rios, ou abertura de caminhos”.65
64
65
não são necessárias, visto como a locação não implica transferência de domínio”.
GOMES, Orlando. Contratos. 12ª ed., RJ: Forense, 1987, p. 308. Para Carvalho de Mendonça, porque “o fim direto da locação é o uso da coisa, pode ser objeto desse contrato toda a coisa licita, móvel ou imóvel, corpórea ou incorpórea, desde que seu uso seja
possível do ponto de vista físico ou do legal”. CARVALHO DE MENDONÇA, Manoel Inácio. Contratos no Direito Civil Brasileiro. RJ: Forense, 1955, p. 423.
Ibidem, p. 60.
PONTES DE MIRANDA, F. Cavalcanti. Tratado de direito privado. Parte especial - Direito das obrigações: locação das coisas. Locação de uso. Locação de uso e de fruição. 3ª
174
Segundo Eduardo Ramires, na espécie dos contratos sobre capacidade de
satélites ter-se-ia negócio jurídico qualificado como “outorga do ‘direito
irretratável do uso’ da capacidade (Indefeasible Right of Use)”. E explica:
“O termo ‘indefeasible’, nesse sentido estaria a predicar ao
sintagma ‘right of use’ a impossibilidade do cedente do direito
de uso de desfazer-se da obrigação assumida. Tal obrigação
(de ceder o uso) pode, entretanto, ser condicionada ao cumprimento (inclusive periódico) pela outra parte de obrigações.
‘Indefeasible’, portanto, aludiria apenas à impossibilidade daquele que cede o direito de uso de voltar atrás, de desfazer-se
da obrigação assumida por mera manifestação de vontade”.66
Nessa afirmação, evidencia-se o pensamento do Autor, para quem o “outorgante do direito de uso, não pode utilizar-se da resilição para extinguir o
contrato, mas apenas a resolução”. Contudo, esta condição, para nós, só
ressalta a prevalência da atribuição da “órbita” e “freqüências” sobre qualquer serviço técnico do satélite em favor da garantia de atendimento ao cumprimento de transporte dos serviços de telecomunicações. A pensar assim,
extrema-se ainda mais a separação entre o negócio jurídico de uso da capacidade espacial e a prestação de qualquer serviço de telecomunicação que possa utilizar-se daquela capacidade espacial, com os quais não se confundem.
Com a posse67 da capacidade satelital locada, o locatário passa a ter os
66
67
ed., SP: RT, 1984, tomo XL, p. 45 e ss.
RAMIRES, Eduardo A. de Oliveira. Regime jurídico da comercialização de capacidade
de transmissão de telecomunicações. Direito Tributário das Telecomunicações. SP:
Thomson, 2004, p.290.
“A posse é estado de fato, em que acontece poder, e não necessariamente ato de poder: A relação possessória é inter-humana e a posse exerce-se por atos ditos possessórios; mas tem-se de distinguir, ainda no mundo fáctico, o poder e o exercício do poder. A posse é poder, pot-sedere, possibilidade concreta de exercitar algum poder inerente ao domínio ou à propriedade. Não é o poder inerente ao domínio ou à propriedade”. E continua: “Rigorosamente, a.posse é o estado de fato de quem se acha na
possibilidade de exercer poder como o que exerceria quem fosse proprietário ou tivesse, sem ser proprietário, poder que sói ser incluso no direito de propriedade (usus,
fructus, abusus). A relação inter-humana é com exclusão de qualquer outra pessoa;
portanto é relação entre possuidor e o alter, a comunidade. Se bem que no mundo fáctico, é situação erga omnes; ou, melhor, real”. PONTES DE MIRANDA, F. Cavalcanti.
Tratado de direito privado. Parte especial - Direito das coisas. Posse. 4ª ed., SP: RT,
175
direitos de garantia contra interferências, podendo exigir proteção em favor
dos sigilos de dados e todas as demais garantias aplicáveis. As ações possessórias podem nascer-lhe. Segundo Pontes, verifica-se sempre um efeito
possessório no contrato de locação. E assim, “quer no tocante à proteção
possessória em relação com o terceiro, quer no tocante à proteção com
relação ao próprio locador, o locatário é possuidor”.68 Arremata-se, pois,
a dizer que essas modalidades em nada aproximam-se de prestações de
serviços ou similares.
7.4. Cessão de contrato de locação de capacidade satelital
É comum ouvir-se falar de “cessão de capacidade espacial” ou até de “cessão de meios”, mas sempre querendo dizer locação de capacidade espacial, o que geralmente é feito por temor aos efeitos da “posse”, cujo regime
jurídico não pode conduzir o intérprete a solução correta na questão presente, posto não se poder falar em “posse de direito”, como observa Pontes de
Miranda69 e Moreira Alves com precisão e superna acuidade.
Decididamente, no domínio da capacidade de satélite, não cabe falar de
“cessão”, posto não se tratar de tecnologia; nem tampouco há serviço, por
ausência de obrigação de “fazer” que se constitua em utilidade em favor do
utente. Tem-se, na espécie, hipótese de “uso”, a título oneroso (do contrário
68
69
1983, tomo X, p. 7; Para um amplo estudo, seguindo similar posição, veja-se: ALVES,
José Carlos Moreira. Posse - estudo dogmático, 2ª ed. RJ: Forense, 1999, t. I, v. II.
Ibidem, p. 60.
“Quando se pergunta quais os direitos suscetíveis de posse já se inicia o tratamento da
matéria com falsa questão. Não há direitos que sejam suscetíveis de posse. Há direitos
entre cujos poderes há o de possuir e até o direito a possuir; porém é usar de linguagem incorreta falar-se de posse de direitos, direitos suscetíveis de posse, possessio iuris, e quejandas impropriedades”. E a seguir confere maior precisão: “A discussão
entre os que sustentam existir a posse do domínio e a posse dos direitos reais e os que
sustentam existir a posse do domínio, dos direitos reais e dos direitos pessoais origina-se de equívoco imperdoável, no início mesmo da divergência. Equívoco de ambos
os lados. Não há posse de domínio. Nem posse de direito real. Nem, tão-pouco, de direito pessoal. A divergência era entre só existir, de regra, proteção à posse que corresponde a algum dos poderes que sói ter o que tem o domínio, ou existir proteção à
posse que corresponde a algum dos poderes que soem ter os titulares do domínio ou
os de outros direitos reais. Soem ter. A posse é que se estende até onde aqueles poderes se estendem. Não há posse de domínio”. PONTES DE MIRANDA, F. Cavalcanti. Tratado de direito privado. Parte especial - Direito das coisas. Posse. 4ª ed., SP: RT, 1983,
tomo X, P. 7-9.
176
ter-se-ia comodato), como obrigação de “dar” bem não-fungível, o que configura claramente o caso de locação, e não mais do que isso, no provimento
de capacidade espacial. Na análise do direito estrangeiro sobre o tratamento aplicável a essa matéria, igualmente vê-se referência apenas ao contrato
de “locação”, o que não poderia ser diferente, por tudo o que já dissemos
acima, cujo estudo sobre suas peculiaridades impõe-se desde logo.
Como recorda Pontes de Miranda:
“Três conceitos, que se não devem confundir e surgem a propósito de locação, são o de transmissão ou transferência da relação jurídica de locação, o de cessão dos direitos do locatário, com ou sem assunção das obrigações, e o de sublocação”.
E continua Pontes de Miranda:
“Tanto mais quanto, a cada momento, dois deles se confundem e a figura de um tem de predominar. A mudança da figura do locatário (C, em vez de B), que implica ter sido o sujeito da relação jurídica substituído por outro, persistindo essa em sua identidade, é mais do que a cessão do crédito do
locatário (crédito do uso), em que de maneira nenhuma desaparece a figura do locatário cedente. Essa cessão, ou transferência do uso, pode ser gratuita ou onerosa. Quando ela é
gratuita, percebe-se bem a diferença entre ela e a sublocação.
Quando é onerosa, o que as distingue é que, na cessão, o locatário cede direitos, pretensões, ações e exceções contra o
locador, ao passo que, na sublocação, tudo ocorre entre locatário e sublocatário: os direitos desse são contra o locatário,
não, contra o locador. O princípio a priori é o de cedibilidade dos créditos, a par do princípio a priori da incedibilidade
das relações jurídicas, melhor dita intransmissibilidade. Cedem-se, pois, direitos, pretensões, ações e exceções; não relações jurídicas. Não pode B, que comprou a A o prédio, fazer
C comprador do prédio, se bem que possa ceder a C o direito,
a pretensão e a ação para o haver. Para a transferência, seria preciso que A consentisse e a lei reputasse excepcionalmente transferível a posição na relação jurídica”.
Pela “cessão”, também diz Orlando Gomes:
177
“Nem para o locador, nem para o locatário, o contrato é intuitu personae, senão contrato impessoal. Por isso, a morte de
qualquer dos contratantes não o extingue. Admite, ademais,
a cessão”.70
Como se pode verificar, o uso do termo “cessão” geralmente é reservado
para casos típicos de sucessão ou transferência de direitos, ou mesmo para
direitos autorais ou fornecimento de tecnologia ou de marca, como usa
referir-se a Lei nº 10.168/00. Nestes últimos, obtida a patente, o sujeito
passa a dispor de uma espécie de direito subjetivo negativo contra qualquer
ato de produção ou utilização do intangível por outrem que não tenha obtido, previamente, por cessão ou licença. Juridicamente, licença e “cessão”
de patentes não se confundem, porque esta, diferentemente daquela, permite que o titular transfira o direito à propriedade industrial como um todo,
com plenos poderes e exclusividade, e não apenas o seu direito de uso,
simples ou exclusivo, reservando-se, o licenciador, à manutenção da propriedade. Na cessão, dá-se a plena transferência de domínio; licença, por
seu turno, é mera autorização para exploração do direito de uso da tecnologia,71 i.e., contrato em virtude do qual o titular de uma patente (licenciador)
faculta a outrem (licenciatário) o direito de explorar a invenção protegida
em seu benefício.72
70
71
72
PONTES DE MIRANDA, F. Cavalcanti. Tratado de direito privado. Parte especial - Direito das obrigações: locação das coisas. Locação de uso. Locação de uso e de fruição. 3ª
ed., SP: RT, 1984, tomo XL, p. 273.
Cf. PÉREZ DE LA CRUZ, Antonio. “La propiedad industrial e intelectual (II). Invenciones e creaciones técnicas”. In: URÍA, Rodrigo; MENÉNDEZ, Aurelio. Curso de Derecho
Mercantil. Madrid: Civitas, 1999, t. I, p. 413; “Objetivada a invenção industrial, entrada no mundo material, o seu autor é o proprietário e, como tal, pode dispor do conteúdo patrimonial do invento como bem entender”. CARVALHO DE MENDONÇA, J. X.
Tratado de Direito Comercial Brasileiro. Campinas: Russell, 2003, v. III, t. I, p. 144;
GARCÍA-CASTRILLÓN, Carmén Otero. Las patentes en el comercio internacional. Madrid: Dykinson, 1997, p. 38: “El fundamento de la creación de este régimen jurídico
de protecciones encuentra en la conveniencia de establecer un mecanismo que salvaguarde el equilibrio entre los intereses públicos y privados que la invención despierta”. Cf. também: ROSEMBUJ, Tulio. Intangibles - la fiscalidad del capital intelectual.
Barcelona: El Fisco, 2003, p. 227; BARBOSA, Denis Borges. Uma introdução à propriedade intelectual. 2ª ed., RJ: Lumen Juris, 2003, p. 335-648.
Em muito se assemelha a um contrato de locação de coisa não fungível (Código Civil,
art. 565 a 578), até porque a Lei nº 9.279/96, no seu art. 5º, considera os direitos de
propriedade industrial como bens móveis, tal como os direitos autorais.
178
7.5. O preço pelo uso da capacidade espacial - fixação determinada ou
determinável: opção de autonomia privada que deve ser protegida
O preço a ser contratado entre as partes, geralmente devido pelos “prestadores de serviços de telecomunicações” aos “exploradores de capacidade
espacial”, pela locação realizada, não toma como “custo” apenas o valor do
quanto tenha sido fixado pelo ente governamental responsável na atribuição de órbita e freqüências (ex. a Anatel), mas agrega ainda ao custo a
manutenção do satélite, bem como as características tecnológicas típicas do
equipamento e suas funções, sem as quais em nada se aperfeiçoaria o cumprimento do objeto central do contrato,73 que é ter direito ao uso das freqüências contratadas, para permitir o transporte dos sinais de telecomunicações pertinentes com eficiência e confiabilidade. Estes serviços, contudo, não prevalecem sobre o objeto central (capacidade satelital), posto serem acessórios e de impossível separação, não sendo cabível imputar a
condição de “serviço” à atribuição de capacidade satelital a partir do recurso a tais meios, isoladamente.
Pode ocorrer que o satélite sirva à concretização de típicas prestações de
serviços, como no sensoriamento ou no processamento de informações, nos
casos de satélites ativos, mas isso é outra coisa, cabendo o conhecimento
das finalidades desempenhadas por tais equipamentos.
73
Apesar de citar a existência dos serviços, queda-se evidenciado na citação a seguir que
os serviços são sempre inerentes à concretização dos efeitos de uso da capacidade satelital em favor do locatário: “Néanmoins, on peut aussi se demander si le contrat de location de la capacité spatiale n'est pas un contrat d'entreprise, des lors que l'exploitant du satellite, en plus de fournir Ia jouissance d'une chose (canal du satellite), s'engage à faire quelque chose (fourniture de la capacité, surveillance du bon fonctionnement du satellite, repositionnement du satellite...), à l'image de la situation dans les
contrats d'abonnement au téléphone, les contrats d'hôtellerie, de location d'une place
de théâtre, lesquels mettent non seulement une chose à la disposition de leur client
(appareil téléphonique, place de théâtre...), mais lui offrent un service (usage d'une
ligne téléphonique...). Au-delà de la comparaison avec ces contrats dits simples, on
pourrait raisonner a pari avec des contrats complexes, en particulier les contrats informatiques, « dans lesquels Ia mise à disposition d'une chose n'est qu'un élément
parmi un ensemble de prestations dont plusieurs sont des services. Ainsi, la location
d'un équipement informatique comprend, outre la mise à disposition de matériels, l'accomplissement de prestations, études, élaboration de logiciels... )”. RAVILLON, Laurence. Droit des activités spatiales - Adaptation aux phénomènes de commercialisation
et de privatisation. Paris: LITEC, 2003, p. 534.
179
Ao preço da locação de capacidade satelital (órbita e freqüências) incorporam-se os valores relativos às características técnicas do transponder (capacidade, tipo, marca etc) dos riscos assumidos pelos proprietários, além
dos intangíveis envolvidos, como marcas e tecnologias. Porém, a heterogeneidade desses custos demonstra que todos concorrem em favor do uso
da capacidade espacial sem “interferências” e condições adequadas, sendo
meros acessórios, portanto, e não se confundindo com o conceito de “serviço de telecomunicação” em nenhuma hipótese.
Questão também passível de dúvidas diz respeito ao preço fixado entre as
partes, para locação da capacidade espacial de freqüências (em MHz), em
dado transponder, que pode ter, como critérios, diversos métodos, inclusive usando de preços definidos ou preços a definir. Tanto um quanto o
outro são modalidades perfeitamente compatíveis com o ordenamento jurídico e cuja opção remanesce no plano exclusivo da liberdade de contratar
das partes, respeitados os dispositivos do Código Civil vigente.
Certo que, na relação contratual, ao lado do bem ou direito objeto do contrato, também é objeto deste o preço a pagar, do contrário não se teria contrato
de compra e venda ou mesmo de locação, mas outro tipo diverso. Por isso,
o contrato pode ser “presente” ou “a termo”, a depender tanto da entrega
futura do bem, quanto do ulterior pagamento do preço, tudo conforme a
manifestação de vontade das partes objetivada no contrato. E como assinala
Pontes de Miranda, com precisão: “o preço não tem de ser, desde logo,
preço determinado. Basta que, desde logo, seja determinável”.74
Preço determinado é aquele que não requer qualquer critério ou método
para sua determinação; preço determinável, por sua vez, corresponde ao
preço passível de definição objetiva mediante aplicação de critério de fixação previsto no negócio jurídico. Como diz Pontes, “Tem-se o critério de
fixação, não se tem a fixação”.75
Sobre a determinação do critério de definição do preço, esclarece Pontes de
Miranda: “Os contraentes podem estipular o critério que lhes apraza. O
que é preciso é que se faça determinável o preço. Pode ser explícita, im74
75
MIRANDA, Pontes de. Tratado de direito privado. Parte especial - Direito das obrigações:
compra-e-venda. 3.ª ed., SP: Editora Revista dos Tribunais, 1984, v. XXXIX, p. 37.
Ibidem, p. 36.
180
plícita ou tácita a cláusula sôbre o critério que se escolheu, ou desde as
primeiras confabulações ou conforme o uso do tráfico que se adotou. O
preço por medida e o preço por pêso são os mais freqüentes, mas, num e
noutro, se tem de partir da quantia que corresponde à unidade, e essa
determinação é que é o preço. (...) Pode ser, de início, determinado o preço, mas prever-se como terá de variar em função de determinado fato futuro, ou de fato eventual que se precise”.76
Nesse particular, operando sobre os critérios de fixação do preço determinável, nosso Código Civil vigente foi pródigo em tratamento, cuidando em
pormenores do seu reconhecimento, somente admitindo que o legislador ou
o Estado possam intervir na relação negocial quando não houver entre as
partes fixação objetiva dos critérios. Eis o seu texto:
“Art. 486. Também se poderá deixar a fixação do preço à taxa
de mercado ou de bolsa, em certo e determinado dia e lugar.
Art. 487. É lícito às partes fixar o preço em função de índices
ou parâmetros, desde que suscetíveis de objetiva determinação.
Art. 488. Convencionada a venda sem fixação de preço ou de
critérios para a sua determinação, se não houver tabelamento
oficial, entende-se que as partes se sujeitaram ao preço corrente nas vendas habituais do vendedor.
Parágrafo único. Na falta de acordo, por ter havido diversidade de preço, prevalecerá o termo médio”.
Como visto, é plenamente legítimo, em face da Lei brasileira, contratar
preço determinável, no todo ou em parte, sem que a parte variável, quer
seja esta relativa à taxa de mercado ou de bolsa, em certo e determinado
dia e lugar (i); quer seja em função de índices ou parâmetros (ii), desde
que suscetíveis de objetiva determinação (iii). Os três requisitos foram
adequadamente atendidos no caso em espécie.
Não prejudica a locação que esta possa ser efetuada por tempo descontínuo, como pode ocorrer na locação de capacidade espacial. Como diz Pon76
Ibidem, p. 42.
181
tes de Miranda:
“Embora a espécie mais simples e mais freqüente seja a locação em que o dever de prestar é em tempo contínuo, pode ocorrer que a locação seja com intervalos, prefixados periodicamente ou não, até que a relação jurídica temporalmente
termine, por ter expirado o prazo da locação, ou por ter havido denúncia, renúncia ou outro fato extintivo”.
Usa-se na atualidade, em vista da indefinição da quantidade do uso da capacidade espacial, do recurso aos chamados preços determináveis, segundo
critérios de fixação antecipados, geralmente para evitar prejuízos do explorador dos serviços, pelos períodos de ociosidade, e reembolsá-lo dos eventuais custos suportados com outras operações em que possa incorrer para
permitir o atendimento das condições do contrato. Tais critérios de fixação
podem ser índices ou parâmetros determinados, como pode perfeitamente
ser definido mediante tempo prefixado, em minutos ou em horas. São
modos plenamente possíveis de serem aplicados.
Essa é uma forma de remuneração possível e não pode Administração querer obrigar a empresa exploradora de capacidade espacial modificar o contrato para consolidar o preço como débito determinado, unicamente para
atender a seus propósitos formalistas, sem um exame aturado dos elementos de prova sobre a execução do contrato e identificação da causa do negócio jurídico existente entre as partes. Não se pode opor, o Fisco, ao legítimo exercício de autonomia privada das partes na definição do modo de
pactuar o objeto dos contratos sem prova assentada em consistência efetiva
de desvio de finalidade (causa).
8.
CAPACIDADE ESPACIAL E SERVIÇOS DE TELECOMUNICAÇÃO - BASES PARA UMA DISTINÇÃO
Feitas as descrições acima, relativamente ao tratamento jurídico da capacidade espacial, passamos a cuidar do conceito de serviços de telecomunicações, com o propósito de demonstrar a inequívoca distinção entre os dois
conceitos e os regimes jurídicos aplicáveis, a revelar a impossibilidade de
tratamento fiscal por equiparação.
Com os contratos de concessão de serviços públicos, transfere-se aos parti182
culares o direito de explorar o serviço. E só este é contrato administrativo.
Uma vez concretizado o negócio de direito público, os atos entre particulares, dispondo acerca dos serviços prestados, nos limites das leis e dos contratos firmados, passam a ser regidos exclusivamente sob regime de direito
privado.
Doravante, no domínio dos atos praticados pelos concessionários dos serviços públicos de telecomunicações e demais operadores do sistema, o que
se têm são atos contratuais típicos de direito privado, submetidos ao regime
contratual concernente à modalidade de negócio jurídico pretendido, típico
ou atípico. A Lei nº 9.472, de 16 de julho de 1997, bem o demonstra, ao
exigir, no art. 5º, que “na disciplina das relações econômicas no setor de
telecomunicações observar-se-ão, em especial, os princípios constitucionais da soberania nacional, função social da propriedade, liberdade de
iniciativa, livre concorrência,77 defesa do consumidor, redução das desigualdades regionais e sociais, repressão ao abuso do poder econômico e
continuidade do serviço prestado no regime público”.
É fundamental bem identificar a noção de telecomunicação, para demarcar
seus efetivos limites, a partir do conceito de utilidade e obrigação de “fazer”, inconfundível com provimento de capacidade espacial, cuja prestação de uso, em típica obrigação de “dar”, pode prestar-se como “meio”
para o transporte de sinais de telecomunicações.
Em algum caso o uso de satélite pode ser adotado para a complementação
de uma rede de telecomunicação, mas isso não é comum. E mesmo em
caso dessa natureza, constitui obrigação da Exploradora “a manutenção de
registros contábeis distintos para o provimento de capacidade espacial”,
conforme exigência prescrita pelo art. 50, parágrafo único, do Regulamento
sobre o Direito de Exploração de Satélite para Transporte de Sinais de Telecomunicações, ao enunciar que “quando a exploradora de satélite for
também prestadora de serviços de telecomunicações, deverão ser mantidos
registros contábeis separados”. Urge separar o negócio jurídico contemplado nos negócios jurídicos de “exploração de capacidade espacial” (i)
77
Lei nº 9.472/97, art. 6° - “Os serviços de telecomunicações serão organizados com
base no princípio da livre, ampla e justa competição entre todas as prestadoras, devendo o Poder Público atuar para propiciá-la, bem como para corrigir os efeitos da
competição imperfeita e reprimir as infrações da ordem econômica”.
183
daqueles praticados entre os exploradores e os prestadores de serviços de
telecomunicação, de cessão ou locação da capacidade espacial que àquele
tenha sido concedida em licença competente (ii), e bem assim dos serviços
de telecomunicações efetivamente prestados aos seus usuários (iii).
De fato, a forma mais comum de definir a telecomunicação é considerá-la a
partir dos seus meios, entendendo-a como qualquer transmissão, recepção
ou emissão de sinais, escrita, imagens, sons ou informações de qualquer
natureza por fios, sistemas ópticos, meios radioelétricos ou quaisquer outros sistemas eletromagnéticos. A ênfase é dada aos meios. Desse modo,
para que um determinado utente possa alcançar seu destinatário, transmitindo uma mensagem em código comum, à distância, faz-se necessário
providenciar os meios necessários, i.e., um canal de transmissão e que tal
sirva, juridicamente falando, a uma comunicação sem interferência ou ruídos, com preservação dos valores constitucionais que garantam seu conteúdo (difusão ou reserva) e plena eficiência.
E seguindo aparentemente nessa linha, nossa LGT, ao cuidar da Organização dos Serviços de Telecomunicações, os define como sendo “o conjunto
de atividades que possibilita a oferta de telecomunicação”, complementando, no seu § 1°, que “Telecomunicação é a transmissão, emissão ou recepção, por fio, radioeletricidade, meios ópticos ou qualquer outro processo
eletromagnético, de símbolos, caracteres, sinais, escritos, imagens, sons ou
informações de qualquer natureza”.78 Mas isso não se confunde com a
atividade de uso dos satélites, a partir dos contratos de exploração.
Essa menção simples ao alcance de dois pontos não exclui uma análise
mais aturada dos serviços que são efetivamente prestados para que esta
comunicação possa se perfazer, na medida que nenhuma operadora tem
liberdade de acesso às redes públicas de outras, salvo mediante autorização
para tanto, por intermédio de contratos de interconexão firmados com as
operadoras locais, mesmo quando estas são privadas. Como se vê no art.
152: “O provimento da interconexão será realizado em termos não discriminatórios, sob condições técnicas adequadas, garantindo preços isonô78
Ainda conforme a LGT, Art. 60, § 2°: “Estação de telecomunicações é o conjunto de
equipamentos ou aparelhos, dispositivos e demais meios necessários à realização de
telecomunicação, seus acessórios e periféricos, e, quando for o caso, as instalações
que os abrigam e complementam, inclusive terminais portáteis”.
184
micos e justos, atendendo ao estritamente necessário à prestação do serviço”. E isto não é tarefa da capacidade satelital, que é posta à disposição da
rede de acesso do chamador para que possa alcançar a rede de destino,
porém sem manter qualquer confusão com o serviço de telecomunicação.
Como pode-se perceber, tais contratos não se confundem com a capacidade espacial, pois, isoladamente, não permite a comunicação, pela interconexão, entre redes distintas. A capacidade satelital reduz-se ao uso de órbita e freqüência previamente contratados, extremando-se dos atos de comunicação entre usuários e intermediados pelo “prestador de serviços de telecomunicações”, que pode confundir-se com a pessoa do explorador, mas
não necessariamente, configurando, a propósito, excesso evidente.
9.
AFASTAMENTO DA INCIDÊNCIA DO ICMS SOBRE A
PRESTAÇÃO DE CAPACIDADE ESPACIAL DE SATÉLITE
COM REGIME SOMENTE APLICÁVEL AOS SERVIÇOS DE
COMUNICAÇÃO - EQUIPARAÇÃO VEDADA PELA CONSTITUIÇÃO
Demonstramos que a Constituição prescreve limites perante os quais o
legislador tributário não encontra opções para inovar, devendo conter-se
em reenvios, plenos ou parciais, aos conceitos, formas e institutos de outros
ramos jurídicos, mormente ao direito privado. O tratamento de delimitação
dos conceitos é parte do princípio de certeza do direito que se impõe como
medida da tributação e do espaço dos direitos dos contribuintes a uma tributação com base em efetivo princípio de legalidade, como respeito aos
direitos de liberdade e de propriedade dos cidadãos. Neste caso, a aplicação dos princípios gerais que informam o conteúdo do respectivo instituto
ou conceito será de suma importância (art. 109, do CTN,)79 para bem demarcar seu campo semântico de significação. A diferença, portanto, entre
os conceitos de serviços de comunicação e a prestação de capacidade espacial não é uma questão de efeitos, mas de mudança de qualificações. E
como a natureza do instituto ou conceito deve ser mantida na sua acepção
de base, a emergir do negócio promovido entre as partes, pelo dever de
79
“Art. 109. Os princípios gerais de direito privado utilizam-se para pesquisa da definição, do conteúdo e do alcance de seus institutos, conceitos e formas, mas não para definição dos respectivos efeitos tributários”.
185
vínculo com a “verdade material” dos fatos que o direito tributário deve
manter, não se pode chegar a outra conclusão: a capacidade satelital não se
confunde com aqueles qualificados como típicos “serviços de comunicação”. Todas as razões acima coligidas, dizendo da qualificação de cada um
deles, revertem-se aqui para uma confirmação que a própria legislação do
setor confere certeza e coerência.
A Lei nº 9.472, de 16 de julho de 1997, chamada de “Lei Geral de Telecomunicações”, prescreve, já no seu art. 1º, competir à União, por intermédio
do órgão regulador e nos termos das políticas estabelecidas pelos Poderes
Executivo e Legislativo, organizar a exploração dos serviços de telecomunicações. E no seu parágrafo único, assenta essa organização inclui, entre
outros aspectos, o disciplinamento e a fiscalização da execução, comercialização e uso dos serviços e da implantação e funcionamento de redes de
telecomunicações (i), bem como da utilização dos recursos de órbita e
espectro de radiofreqüências (ii). Isso, contudo, não quer dizer que estes
sejam espécies de serviços de telecomunicações. Dista disso. É que sendo
a utilização dos recursos de órbita e espectro de radiofreqüências instrumento fundamental para veicular as telecomunicações, seu tratamento não
se poderia fazer em domínios distintos. Na verdade, o mais relevante dessa
disposição consiste em afastar a capacidade espacial do conceito de “infraestrutura de telecomunicações”, posto não se confundir como parte integrante das redes (públicas ou privadas) ou mesmo da própria definição de
interconexão de redes, como fizemos ver em páginas anteriores.
Confirmando essa opinião, o Anexo à Resolução nº 73, de 25 de novembro
de 1998, que é o “Regulamento dos Serviços de Telecomunicações - RST”,
prescreve:
“Art. 2º Serviço de telecomunicações é o conjunto de atividades que possibilita a oferta de transmissão, emissão ou recepção, por fio, radioeletricidade, meios ópticos ou qualquer outro processo eletromagnético, de símbolos, caracteres, sinais,
escritos, imagens, sons ou informações de qualquer natureza.
Art. 3º Não constituem serviços de telecomunicações:
I - o provimento de capacidade de satélite;
II - a atividade de habilitação ou cadastro de usuário e de e186
quipamento para acesso a serviços de telecomunicações;
III - os serviços de valor adicionado, nos termos do art. 61 da
Lei 9472 de 1997”.
E não se diga que esta, por ser norma regulamentar, não se aplica para os
fins da qualificação reclamada, pois esta é distinção que se dessome da própria LGT. E o art. 1º, do RST especifica: “A prestação e a fruição de serviços de telecomunicações dar-se-á em conformidade com a Lei nº. 9.472, de
16 de julho de 1997, este Regulamento dos Serviços e os Regulamentos,
Planos e Normas aplicáveis a cada serviço”. E não poderia ser distinto,
pois o art. 214, da LGT, prescreve de modo objetivo que “na aplicação
desta Lei, serão observadas as seguintes disposições: I - os regulamentos,
normas e demais regras em vigor serão gradativamente substituídos por
regulamentação a ser editada pela Agência, em cumprimento a esta Lei”.
Na verdade, este é um esforço de precisão que pode ser perfeitamente resolvido no âmbito da própria Lei nº 9.472/97, pois, ao dispor sobre “o espectro de radiofreqüências e da órbita”, e após considerar, no art. 157, que
“o espectro de radiofreqüências é um recurso limitado, constituindo-se em
bem público, administrado pela Agência”, afirma, no seu art. 172, que o
“direito de exploração de satélite”, constitui-se pela “ocupação da órbita e
o uso das radiofreqüências destinadas ao controle e monitoração do satélite e à telecomunicação via satélite”, e presta-se, com tais características, ao
“transporte de sinais de telecomunicações”. Tudo a comprovar a diferenciação técnica entre capacidade espacial e serviço de comunicação.
E como prova do efetivo reconhecimento da distinção de tratamento, a
mesma LGT, no seu art. 183, ao dispor sobre as sanções ao delito de “desenvolver clandestinamente atividades de telecomunicação”, e justamente
por não as conceber como atividades equivalentes, o parágrafo único do art.
184 prescreve regra de equiparação, ao dizer que “considera-se clandestina
a atividade desenvolvida sem a competente concessão, permissão ou autorização de serviço, de uso de radiofreqüência e de exploração de satélite”.
Vê-se, assim, às escâncaras, o quanto essa modalidade distancia-se do conceito de prestação onerosa de serviços de comunicação, cuja incidência
somente pode ser aperfeiçoada em presença de atos de fornecimento, a
título oneroso, de serviços de comunicação, quer dizer, de efetivas operações negociais que tenham “preço” como contraprestação de uma coloca187
ção de meios à disposição dos interessados em promover atos de comunicação, ou como reconhecido pelo STJ, “quando um terceiro, mediante
prestação negocial-onerosa, mantém interlocutores (emissor/receptor) em
contato por qualquer meio”. E para não deixar qualquer sombra de dúvidas a respeito, prescreve o art. 12, da Lei Complementar nº 87/96: “Considera-se ocorrido o fato gerador do imposto no momento: (...) VII - das prestações onerosas de serviços de comunicação, feita por qualquer meio, inclusive a geração, a emissão, a recepção, a transmissão, a retransmissão,
a repetição e a ampliação de comunicação de qualquer natureza”. Ora, a
simples atribuição do direito de usar de “ocupação da órbita” e das “radiofreqüências” em nada aproxima-se daquele conceito.
Tampouco pode-se usar da distinção, tão em voga, entre atividade-fim e
atividade-meio, por ser de todo incabível à espécie. São fenômenos absolutamente distintos e sequer aproximáveis. O provimento de capacidade de
satélite não se confunde com a disponibilidade dos meios para prestação de
serviços de telecomunicações, à exemplo do que ocorre com a interconexão de redes e outros. Limita-se à simples atribuição do direito de usar de
“ocupação da órbita” e das “radiofreqüências”, e só isso. Contudo, estes
somente podem ser a “prestadores” de serviços de telecomunicação, como
requer o § 1º, do art. 163, da LGT, i.e., que o “uso de radiofreqüência”
esteja “associado à concessão, permissão ou autorização para prestação de
serviço de telecomunicações”.
A Lei Complementar nº 87/96, no seu art. 2°, prescreve que o imposto
(ICMS) incide sobre: “III - prestações onerosas de serviços de comunicação, por qualquer meio, inclusive a geração, a emissão, a recepção, a
transmissão, a retransmissão, a repetição e a ampliação de comunicação de
qualquer natureza”. Essa disposição poderia animar um intérprete apressado a pensar que a retransmissão, a repetição e a ampliação, por serem
atividades típicas dos transponders dos satélites, estariam alcançados pela
hipótese de incidência do ICMS. Isto até seria possível, não fosse a exigência complementar (e essencial) de que isso preste-se, de modo apropriado, a concretizar atos de comunicação de qualquer natureza.
Importa lembrar que para o satélite atingir seus objetivos, cumpre à base
emitir sinais na sua direção, os quais serão recebidos pelo receptor do satélite, que os amplifica, converte espectralmente para freqüência de transmissão e os reenvia, como sinais destinados a todas as estações que operarem no mesmo espectro radioeléctrico e encontrem-se na faixa de varredu188
ra (horizonte artificial ou zona iluminada, de cobertura do campo radioelétrico, de sombra ou foot print).
Muitos preferem fixar vistas sobre os transponders, que se prestam unicamente para atingir a finalidade de recepção dos sinais das estações terrestres (uplink) e efetuar a ulterior retransmissão para a zona de cobertura
(downlink), após a imprescindível amplificação (Low Noise Amplifier), o
que não é propriamente um serviço, mas uma necessidade, pois, em virtude
das longas distâncias percorridas pelas ondas (da emissão ao satélite), os
sinais chegam muito fracos80 e, para o retorno à terra, e em nova freqüência, para evitar confusão ou interferências, requerem intensificação elétrica.81 A amplificação aqui, como demonstrado, não tem nada que ver com
serviço de comunicação facilitado pela operadora, como forma de atingir
múltiplos destinatários. Busca, unicamente, permitir seu retorno à terra,
sem qualquer remuneração por este serviço, isoladamente, para os fins de
transferir-se as freqüências de downlink. Destarte, o transponder não é
mais do que um equipamento de recepção, imediata ampliação do sinal
(sem o qual o sinal não teria condições de vir retransmitido em seguida) e
retransmissão dirigida à zona iluminada.
Ora, o prestador de telecomunicações, ao usar do satélite, transmite o conteúdo que ele queira, sem qualquer controle da “exploradora” ou da empresa “proprietária” do satélite. O “uso de radiofreqüência” presta-se ao êxito
dos seus atos de comunicação sem que isso possa confundir-se com a “locação” do direito de exploração da capacidade satelital, obrigação de “dar”
de todo inconfundível com a obrigação de “fazer” que configura o serviço
de telecomunicação “transportado” pelas ondas hertzianas na “freqüência”
e na “órbita” contratadas entre as partes.
80
81
“Devido às enormes distâncias, o sinal que chega aos receptores é bastante fraco (da
ordem de -115 dBW para um sistema operando em banda Ku). Torna-se obrigatório o
uso de LNA (Low Noise Amplifier), que amplificam o sinal de microondas recebido
da antena, logo na entrada do receptor, antes de entregá-lo aos estágios seguintes
(down-converter e demodulador)”. QUEIROZ, Carlos A. P. Introdução às Comunicações por Satélites, p. 8.
Uma onda eletromagnética depende sempre de uma freqüência de transmissão; contudo, o meio livre de propagação opera sobre a onda um efeito atenuador da capacidade
de alcance da potência dos sinais enviados, o que impõe a necessidade de usar repetidores para recuperar a qualidade e a potência original do sinal.
189
A redação do § 1º do art. 158, da LGT não poderia ser mais clara, ao prever
que o “plano destinará faixas de radiofreqüência para: (...) II - serviços de
telecomunicações a serem prestados em regime público e em regime privado; III - serviços de radiodifusão; (...) V - outras atividades de telecomunicações”.
Desse modo, as atividades técnicas do satélite, não só extremam-se do
conceito de serviço de telecomunicação como não prevalecem sobre a própria noção específica de capacidade espacial, por prestar-se a servir de
veículo às prestações de serviços de telecomunicações (i) e vir previamente
garantida contra quaisquer interferências prejudiciais (ii), em cumprimento
aos tratados internacionais da UIT, ao que toda a tecnologia dos satélites
serve, não se configurando, por si só, como qualquer modalidade de serviço de telecomunicação autônomo àqueles que veiculam as faixas de freqüências alocadas nos transponders do satélite. E nossa LGT prescreve,
como medida de garantia e proteção das faixas de radiofreqüência, no art.
159, que na destinação das faixas serão considerados o emprego racional e
econômico do espectro (i) objetivando “evitar interferências prejudiciais”,
ou seja, “qualquer emissão, irradiação ou indução que obstrua, degrade
seriamente ou interrompa repetidamente a telecomunicação” (parágrafo
único ao art. 159).
Conclui-se, desse modo, que a capacidade satelital encontra-se em âmbito
de “não-incidência” em relação à materialidade do ICMS-comunicação;
logo, não cabendo incidência, tampouco poder-se-ia falar de alguma espécie de “isenção”, como pretendeu fazer o Convênio 126/98- CONFAZ, ao
supor a cessão onerosa de meios e infra-estruturas82 como passíveis de
tributação e, mais, como integrante da base de cálculo dos próprios servi82
“Cláusula décima - Na cessão onerosa de meios das redes de telecomunicações a
outras empresas de telecomunicações constantes no Anexo Único, nos casos em que a
cessionária não se constitua usuária final, ou seja, quando utilizar tais meios para
prestar serviços de telecomunicações a seus próprios usuários, o imposto será devido
apenas sobre o preço do serviço cobrado do usuário final.
Parágrafo único. Aplica-se, também, a disposição desta cláusula às empresas de Serviço Limitado Especializado - SLE, Serviço Móvel Especializado - SME e Serviço de
Comunicação Multimídia - SCM, que tenham como tomadoras de serviço as empresas
relacionadas no Anexo Único deste convênio, desde que observado, no que couber, o
disposto na cláusula anterior, e as demais obrigações estabelecidas em cada unidade
federada”.
190
ços de telecomunicações, o que justificara sua “isenção”.
9.1. COFINS. Incidência sobre faturamentos e receitas formadas a
partir de serviços de comunicações e capacidade satelital
Indo ao texto constitucional, diz o § 2º do art. 149-A, da CF: “As contribuições sociais e de intervenção no domínio econômico de que trata o caput
deste artigo: (...) II - incidirão também sobre a importação de produtos
estrangeiros ou serviços”. Ora, temos aqui, com hialina clareza, autorização legislativa que corresponde a dois tipos de contribuições bem definidas, as de Intervenção no Domínio Econômico (CIDE) e aquelas ditas “Sociais”, das quais as previdenciárias são espécies, criando-se, assim, nova
modalidade de contribuição previdenciária, nos moldes do art. 195, IV,
pela EC nº 42/03, ao determinar o financiamento da previdência mediante
contribuição: IV - do importador de bens ou serviços do exterior, ou de
quem a lei a ele equiparar.
Dando aplicação a esta competência, chegamos à Lei nº 10.865, de 30 de
abril de 2004, cujo § 1º, do art. 2º, prescreve que os serviços tributados são
os provenientes do exterior prestados por pessoa física ou pessoa jurídica
residente ou domiciliada no exterior, nas seguintes hipóteses: executados
no País ou executados no exterior, cujo resultado se verifique no País. E
em seguida estabelece como fato gerador, no art. 3º, o pagamento, o crédito, a entrega, o emprego ou a remessa de valores a residentes ou domiciliados no exterior como contraprestação por serviço prestado.
Desde logo, mister afirmar que todas as considerações antes assinaladas
prestam-se à demonstração da unicidade de conceituação do “serviço oneroso de telecomunicação”, tanto no ICMS, que incide sobre tais operações,
isoladamente; como naquelas incidências subjetivas, que se prestam à formação do faturamento da pessoa jurídica, a partir das receitas provenientes
das operações de serviços de telecomunicações internacionais, típicas do
PIS-Cofins. Todavia, em não se tratando, a capacidade satelital, de prestação onerosa de serviço, descabe falar na incidência do PIS-Cofins importação, na medida que as receitas transferidas a título de locação não são alcançadas por sua hipótese de incidência, porquanto a competência constitucional resguarda-se às modalidades de importação de mercadorias e serviços.
No caso da capacidade satelital, a remessa operada por “representantes” é
feita em favor da empresa não-residente a título de locação de capacidade,
191
sem qualquer nexo com os conceitos materiais de “mercadoria” ou “serviço”, a partir dos quais possa formar-se o “faturamento” ou a “receita” justificadores da incidência das citadas contribuições. Desse modo, por tudo o
quanto já dissemos a respeito da caracterização desses contratos, não se
justifica qualquer tributação, a título de aplicação do PIS-Cofins sobre remessas para o exterior a título de locação de capacidade espacial de “satélite
estrangeiro”, posto não se constituir como modalidade típica de “serviço”.
9.2. Imposto sobre a renda na fonte e os pagamentos feitos a residentes
no exterior por capacidade espacial de satélite estrangeiro
Para o estudo do tratamento tributário da provisão de capacidade satelital
por satélite estrangeiro, quanto ao Imposto sobre a Renda, importante empreendermos imediata análise a respeito da autorização expedida em favor
da empresa estrangeira de satélite, que se deve efetuar por meio de representante legal no Brasil.
A Lei n° 9.472/97, no seu art. 171, § 1°, exige a presença de representante
legal do operador estrangeiro, para que se efetue o registro de contratos de
capacidade satelital entre aquele e as prestadoras nacionais, nos seguintes
termos:
“O emprego de satélite estrangeiro somente será admitido
quando sua contratação for feita com empresa constituída segundo as leis brasileiras e com sede e administração no País,
na condição de representante legal do operador estrangeiro”.
Desse modo, tem-se que as exploradoras de satélites estrangeiros, obrigatoriamente, deverão manter no País “representante legal” e que este seja típica modalidade de “sociedade nacional”, na forma de “empresa”, nos termos do art. 1.126 do Código Civil, ou seja, como sociedade organizada de
conformidade com a lei brasileira e que tenha no País a sede de sua administração.
Porém, nesses casos, não se tem de modo algum configurada a presença de
estabelecimento permanente da exploradora não-residente, a justificar
qualquer modalidade de “força de atração” sobre os rendimentos auferidos
no Brasil, porquanto seja simples hipótese de “representação”, exigida para
os efeitos típicos de controles do poder de polícia e, para os efeitos tributários, unicamente com as finalidades do quanto já se encontra exigido para
192
qualquer espécie de sujeito não-residente.
Não se tratando de estabelecimento permanente da empresa não-residente,
na condição de filial, escritório ou similar, a incidência tributária dependerá
apenas da localização, no País, do fato jurídico tributário do imposto sobre
a renda, para justificar sua cobrança internamente, com tributação exclusiva na fonte, mediante alíquota ordinária de 15%, ou unicamente no Estado
de residência, quando em presença de tratado para evitar a dupla tributação,
na ausência de estabelecimento permanente aqui situado; podendo suportar
a alíquota majorada de 25%, caso as exploradoras não-residentes encontrem-se localizadas em países com tributação favorecida – PTF.83
Importante recordar que quanto ao regime tributário aplicável, uma empresa não-residente pode atuar no território nacional mediante uma presença
direta, com seus próprios meios, praticando atos isolados, acompanhada
necessariamente de representante legal (i), ou instalando uma filial, sucursal, agência, conforme exige o art, 147, do RIR (ii), para fins de equiparação. E somente nesse último caso o legislador poderá aplicar às pessoas
jurídicas não-residentes o tratamento tributário típico dos “residentes”, a
justificar o efeito de “força de atração” sobre os rendimentos produzidos.
E como nessa condição a empresa não-residente passa a assumir obrigações tributárias como se fosse qualquer empresa residente, a remessa que
faça para o exterior será sempre a título de distribuição de lucros, por ora
não tributados no País (Lei nº 9.249/95, art. 10). Em todos aqueles outros,
ou seja, na ausência de estabelecimento permanente, o regime será o mesmo que se empregar a qualquer remessa para o exterior, com incidência do
Imposto à alíquota de 15% (ou de 25%, no caso de remessas para PTF).
Desse modo, três situações podem ser assim definidas:
1. Na ausência de residência fiscal, a remessa de receita de locação da
capacidade espacial far-se-á sujeita a retenção na fonte, com a pessoa
83
Cfr. Lei nº 9.779, de 19 de janeiro de 1999, art. 8º - ”Ressalvadas as hipóteses a que
se referem os incisos V, VIII, IX, X e XI do art. 1o da Lei no 9.481, de 1997, os rendimentos decorrentes de qualquer operação, em que o beneficiário seja residente ou
domiciliado em país que não tribute a renda ou que a tribute à alíquota máxima inferior a vinte por cento, a que se refere o art. 24 da Lei no 9.430, de 27 de dezembro de
1996, sujeitam-se à incidência do imposto de renda na fonte à alíquota de vinte e cinco por cento”.
193
jurídica representante na condição de simples “responsável tributário”,
com incidência do Imposto à alíquota de 15% (ou de 25%, no caso de
remessas para PTF).
2. No caso anterior, sendo a exploradora de satélite estrangeiro residente
de país signatário de tratados internacionais para evitar a dupla tributação, seguindo o regime de lucros de empresas (art. 7º), a remessa somente estará sujeita à tributação no Estado de residência.
3. E para aquelas empresas que possuam residência no País, a tributação
sobre as operações com capacidade satelital será feita a título de lucros
da empresa, com ulteriores remessas de lucros para o exterior isentas
de impostos (Lei nº 9.249/95, art. 10).
Passemos a análise das duas primeiras hipóteses, posto serem as de comum
ocorrência, visando a explicitar melhor o regime tributário incidente.
9.2.1. A tributação na fonte da exploradora de satélite estrangeiro
De início, cabe assinalar que todo o regime de tributação territorial de sujeitos não-residentes, quando vinculados ao ordenamento por algum nexo
material, está fundado nos mecanismos de retenção exclusiva na fonte, ao
que, para bem compreender seu alcance, temos que considerar dois conceitos distintos entre si, mas funcionalmente complementares. O primeiro, é o
de “fonte efetiva de rendimento” (i), que é o critério que se presta para os
fins de determinar a conexão material entre o sujeito (contribuinte) e o
território; e o segundo, quanto aos efeitos sobre o sujeito “residente” tomado e qualificado como tal, sob a forma de “fonte de pagamento” (ii), definido como espécie de responsável tributário, deixando bem claro que este
só se aperfeiçoa quando em presença daquela primeira hipótese, qual seja,
a presença da fonte efetiva de rendimento no território nacional.
O vínculo entre o pressuposto material (rendimento) da hipótese de incidência do Imposto sobre a Renda aplicável aos não-residentes e o seu pressuposto espacial, da localização territorial da fonte de produção dos rendimentos (fonte de produção) não se pode confundir com a situação subjetiva, focalizada sobre a responsabilidade pelo pagamento dos tributos, que
decorre da chamada “fonte de pagamento”. Ou seja, não se pode confundir
a regra-matriz de incidência (fato jurídico e obrigação tributários) do Imposto sobre a Renda de não-residentes (como contribuinte) com a norma
194
atributiva de responsabilidade tributária à “fonte de pagamento”, que somente se poderá aperfeiçoar quando aquela esteja constituída, no momento
temporal no qual se aperfeiçoa a disponibilidade econômica ou jurídica
(quando do pagamento, crédito, entrega, emprego ou remessa do rendimento), nos termos do art. 43, do CTN.
Sendo assim, quando os não-residentes i) praticam atos isolados no Brasil,
estes aqui deverão ser tributados, por retenção na fonte, nos termos do art.
685, II, “a”, do RIR/99 (com aplicação de alíquotas de 15% ou de 25%, nos
casos de remessas para PTF); salvo em presença de tratados internacionais
para evitar a dupla tributação, quando dois regimes podem advir, por força
do respectivo art. 7º (lucros de empresas): ii) tributação exclusiva no estado
de residência do não-residente, por atos isolados praticados no Brasil; e iii)
somente quando tais sujeitos não-residentes adquiram residência, mediante
equiparação, no Brasil, que seus rendimentos sejam atribuídos a tais estabelecimentos, para os efeitos de uma tributação exclusiva no estado da fonte.
9.2.2. A aplicação das convenções internacionais para evitar dupla tributação nos pagamentos de capacidades satelitais
Naqueles casos em que as remessas forem efetuadas para países com os
quais o Brasil mantenha convenções para evitar a dupla tributação, cabe
analisar o tratamento aplicável às empresas com presença estável no País e
aquele nos quais os não-residentes não se encontram equiparados a “residentes”, em face da legislação brasileira, para fins de tributação no Estado
da fonte.
Neste caso, é de se entender que a remuneração devida pela locação de
capacidade satelital, na ausência de estabelecimento permanente situado no
Brasil, aplicando-se o art. 7º da Convenção, relativamente aos lucros de
empresas, qualquer remessa somente poderá ser tributada, exclusivamente,
no Estado de residência da sociedade, afastando-se, desse modo, a cobrança do Imposto brasileiro.
10. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Tomando-se em consideração tudo o quanto acima foi argumentado, chega-se à conclusão que somente é devido o Imposto sobre a Renda retido na
fonte (RIR, art. 682 e 685) nas remessas a título de pagamentos por locação de capacidade satelital, destinados a exploradores de satélites estran195
geiros, à base de 15% ou de 25% (nos casos de residentes em PTF). Esta
incidência é afastada, contudo, quando a exploradora não-residente for
domiciliada em país signatário de tratado para evitar a dupla tributação,
hipótese em que a tributação dos lucros de empresa transfere-se ao Estado
da residência, por força do art. 7º destas convenções. Nenhum outro tributo poderá aplicar-se à espécie, como ICMS, PIS/PASEP, Cofins ou CIDEtecnologia, em virtude da carência de elementos que justifiquem a qualificação de prestações de serviços de telecomunicações à atividade de locação
de capacidade satelital.
Desse modo, as atividades técnicas do satélite, não só extremam-se do conceito de serviço de telecomunicação como não prevalecem sobre a própria
noção específica de capacidade espacial, por servir de veículo às prestações
de serviços de telecomunicações (i) e vir previamente garantida contra
quaisquer interferências prejudiciais (ii), em cumprimento aos tratados internacionais da UIT, ao que toda a tecnologia dos satélites serve, não se configurando, por si só, como qualquer modalidade de serviço de telecomunicação autônomo àqueles que veiculam as faixas de freqüências alocadas nos
transponders do satélite. Como prescreve a LGT, como medida de garantia
e proteção das faixas de radiofreqüência, no seu art. 159, que na destinação
das faixas serão considerados o emprego racional e econômico do espectro
(i) objetivando “evitar interferências prejudiciais”, ou seja, “qualquer emissão, irradiação ou indução que obstrua, degrade seriamente ou interrompa
repetidamente a telecomunicação” (parágrafo único ao art. 159).
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