GT2_ RAN1_Draft1_ Cap9.1

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Capítulo
9
Título
Impactos, Vulnerabilidade e Adaptação na Esfera Regional
(Sub)Seção:
9.1 Região Norte
Autores
Autor Principal:
Saulo Rodrigues Filho
Autores Colaboradores:
Diego Lindoso
1
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Nathan Debortoli
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Draft
Primeiro Draft
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Versão
01
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Nome do
Arquivo
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Data
19/08/2011 / hora
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Painel Brasileiro de Mudanças Climáticas
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Capitulo 9
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Região Norte
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Impactos Regionais, Adaptação e Vulnerabilidade ao Clima e suas implicações para
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a Sustentabilidade Regional
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Saulo Rodrigues Filho
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Professor e diretor do CDS-UnB
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Diego Lindoso e Nathan Debortoli
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Pesquisadores do CDS/UnB
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9.1 A Região Norte do Brasil (a completar)
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9.1.1 Características peculiares da região (mudanças de uso da terra)
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Apesar de seu vasto território, a região Norte abriga 9% (413.101) dos estabelecimentos
agropecuários brasileiros (4.367.902). No contexto regional, três estados abrangem mais de 70%
desses estabelecimentos: o Pará cerca de 50% (196.150), seguido pelo estado do Amazonas e
Tocantins, que respondem, respectivamente, por 15% (61.843) e 10% (42.899) dos
estabelecimentos agropecuários de agricultura familiar do Norte (BRASIL, 2006).
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A partir das profundas mudanças de uso da terra observadas na região Norte, principalmente a partir
de meados do século XX, sua função reguladora do clima global, regional e local encontra-se
ameaçada. Portanto, as florestas tropicais têm sido objeto de inúmeros estudos que contemplam o
ciclo do carbono e suas relações com o homem e a biosfera (FEARNSIDE, 2004; MALHI et al,
2004; MOUTINHO & SCHWARTZMAN, 2005, FEARNSIDE, 1999), com destaque para o
programa LBA (Programa de Grande Escala da Biosfera-Atmosfera na Amazônia), coordenado
pelo MCT/INPA.
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As áreas desprovidas de cobertura vegetal apresentam valores altos para o albedo, o que implica em
maior reflexão da energia incidente quando comparado à mesma área caso fosse florestada
(MARENGO, 2006). Porém, a baixa umidade estocada no sistema resulta em perdas modestas de
energia na forma de calor latente (evapotranspiração) e grande na forma de calor sensível (aumento
das temperaturas), ao contrário da floresta, o que explica o aquecimento relevante do ar próximo à
superfície do solo em pastagens e campos agrícolas (aumentando a dessecação da lavoura e
pastagem).
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Portanto, o desmatamento tem implicações diretas sobre a manutenção dos sistemas
agroprodutivos. Expõe a superfície, resultando em erosão e a compactação do solo. Paralelamente,
pode implicar na redução da água infiltrada nos solos e no incremento do escoamento superficial,
alterando assim a hidrologia local, contribuindo para o assoreamento dos lagos e lagoas, assim
como reduzindo, no médio longo prazo, o volume de água de nascentes e pequenos corpos de água.
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Simultaneamente, a supressão da cobertura vegetal afeta processos ecológicos críticos para
manutenção da agricultura e ecossistemas locais, tornando-os mais instáveis e reduzindo a
capacidade de resposta e recuperação a distúrbios ambientais (EISENHAUER & SCHÄDLER,
2010). Um deles é a ciclagem de nutrientes, cuja regulação depende do balanço entre absorção pela
vegetação, formação de serrapilheira e taxa de decomposição (MILTON & KASPARI, 2007). O
uso do fogo - forma tradicionais de manejo de pastagens e roçados - potencializam a sensibilidade
da produção familiar e dos ecossistemas locais, tanto à impactos devido a estiagem quanto à
impactos devido à desregulação da ciclagem de nutrientes (BUSTAMANTE et al, 2006).
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9.1.2 Variabilidade climática e as mudanças antropogênicas
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As florestas são responsáveis pelo equilíbrio climático em escala global, prestando inúmeros
serviços ambientais. A partir das profundas mudanças de uso da terra observadas nessas regiões,
principalmente a partir de meados do século XX, sua função reguladora do clima global, regional e
local encontra-se ameaçada. O fator clima é determinante para o crescimento e a conservação das
florestas tropicais, enquanto que as zonas climáticas refletem o balanço de energia sobre a
superfície da terra em diferentes latitudes. Nas zonas equatoriais a duração do dia altera-se pouco ao
longo do ano, e a variação térmica maior ocorre durante o dia. Uma comunidade vegetal densa
influencia de maneira considerável a distribuição das precipitações que atingem o solo.
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Em massa, as plantas ultrapassam todos os organismos do planeta, perfazendo 99% de toda massa
viva (biomassa) sobre a terra. Por isso, a vegetação é fator estabilizador na circulação da matéria e
influencia sobremaneira os sistemas climático e hidrológico. As regiões cobertas por florestas
tropicais evoluíram durante milhares de anos propiciando a reflexão da massa foliar IAF (índice de
área foliar), de forma a interagir com os raios infravermelhos para o processo e a ciclagem do gás
carbônico na atmosfera. Essas condições permitiram a evolução das comunidades vegetais. O
aporte sistemático de correlação entre ventos, umidade, pressão, intensidade da luz (equador e
pólos), e os estômatos das folhas, criaram características ecofisiológicas bastante complexas e
delicadas, especialmente no que tange às interações entre a biomassa e o clima, nas quais as
atividades humanas têm causado distúrbios significativos (LARCHER, 2000; BARRETO et al.,
2006, LAURENCE et al., 2009; FEARNSIDE 2008b).).
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9.1.3 Cenários Climáticos
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Nas projeções climáticas realizadas por Marengo (2007) para o período 2071-2100, a região
Amazônica está compreendida entre as latitudes 4,5° N e 12° S. Os vários modelos globais
utilizados no IPCC TAR (3º relatório IPCC, 2001) e AR4 (4º relatório IPCC, 2007) divergem sobre
tendências de precipitação na Amazônia. Alguns projetam redução da pluviosidade, outros apontam
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um aumentto, mas a média
m
dos mo
odelos indicca maior po
ossibilidade de reduçãoo nas precipiitações
(figura 7).
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Figura 7. A
Anomalias anuais da precipitação (mm/dia) na
n Amazôniia brasileiraa consideran
ndo os
cenários A
A2 (esquerdaa) e B2 (direeita) do TA
AR obtido a partir
p
da méédia dos trêês modelos regionais
r
do Inpe (Eta/CPTEC/C
CPTEC, ReegCM3 e HaadRM3P) para
p o períod
do de 2071--2100 em reelação a
média de 11961-1990. Observar a tendência dde redução das
d chuvas no oeste doo Pará (inserrido dentro
do contornno em verdee). As projeçções represeentam a med
dia aritmética dos cenáários produzzidos pelos
modelos reegionais Etaa/CPTEC/CPTEC. ReggCM3 e Had
dRM3P (50 km de resoolução). Fon
nte:
Marengo, 22007.
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A média (eensemble) dos
d modeloss regionais ddo INPE ap
presentados por Marenggo (2007),
consideranndo o cenáriio A2 (pessiimista) do T
TAR, prevê uma reduçãão de 365m
mm a 730mm
m nas
médias anuuais das preecipitações do
d oeste parraense. Resu
ultado semeelhante conffigura-se paara o
cenário B22 (figura 7). Já, quanto às temperatturas, todos os modeloss projetam uuma tendên
ncia de
aquecimennto conspícuuo para o Brrasil (figuraa 8).
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Observa-see que as anoomalias de temperatura
t
a no Pará irãão variar en
ntre 4-5 °C ((2071-2100) em
relação às médias de 1961-1990,
1
tendo comoo parâmetro
o o cenário A2
A do TAR
R, enquanto nas
condições do cenário B2 o aumen
nto foi estim
mado entre 3-4°C.
3
É certo que exisstem incerteezas quanto
ônia, princip
palmente deevido à faltaa de dados
à essas tenndências de extremos cllimáticos paara a Amazô
RENGO,
confiáveis de longo prrazo e acessso restrito a informaçõees para regiões tão exteensas (MAR
2007).
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Figura 8. Anomalias anuais de temperatura (para América do Sul, período 2071-2100 em relação a
1961-90, para os cenários IPCC A2 (pessimista) e IPCC B2 (Otimista)). As projeções representam a
media aritmética dos cenários produzidos pelos modelos regionais Eta/CPTEC/CPTEC. RegCM3 e
HadRM3P (50 km de resolução). Fonte: Marengo, 2007.
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9.1.4 Políticas públicas e acordos internacionais
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A Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (UNFCCC) foi
oficialmente instaurada durante a Conferência de Cúpula da Terra no Rio de Janeiro, conhecida
como Rio-92, com o objetivo de estabelecer as diretrizes e condições para estabilizar os níveis dos
gases de efeito estufa na atmosfera. A Convenção do Clima foi aberta a assinaturas durante a Rio92 e entrou em vigor em 21 de março de 1994. Em 1997, 165 países já haviam ratificado a
Convenção, comprometendo-se com os termos nela contidos.
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Reconhecendo a mudança do clima como “uma preocupação comum da humanidade”, os
governos que a assinaram tornaram-se Partes da Convenção, propondo-se a elaborar uma estratégia
global “para proteger o sistema climático para gerações presentes e futuras”. Até fevereiro de 2004,
a Convenção havia sido assinada por 188 “Partes” (países), das quais somente as Partes
pertencentes ao chamado Anexo I (países industrializados), têm compromisso de reduzir suas
emissões de gases de efeito estufa (NAE 04, 2005).
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Segundo Muylaert (2000), muitos foram os conflitos entre os países desenvolvidos e em
desenvolvimento, antes mesmo da Convenção. Os países desenvolvidos queriam que os países em
desenvolvimento assumissem o compromisso de limitação ou mesmo redução de emissões, e os
países em desenvolvimento, liderados por Brasil, China e Índia, manifestaram posição contrária a
imposições em termos de redução de suas emissões.
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O Protocolo de Quioto, criado em 1997, durante a Terceira Conferência das Partes (COP-3)
da Convenção do Clima, realizada no Japão, estabeleceu que países industrializados deveriam
reduzir as suas emissões de gases de efeito estufa (GEE) em 5,2%, em média, em relação a 1990, no
período de 2008 a 2012, sendo este conhecido como primeiro período de compromisso. Entretanto,
o Protocolo entrou em vigor somente em 2005, após a ratificação da Rússia, evento que propiciou o
alcance dos níveis de emissão mínimos exigidos para que o instrumento entrasse em vigor.
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Um novo Protocolo, ou um segundo período de compromisso a partir de 2013, depende do
sucesso das próximas Conferências das Partes, a serem realizadas em 2011 e 2012 (COP´s 17 ou
18). Para esse período, espera-se que sejam estabelecidas metas de redução de emissões de gases de
efeito estufa mais ousadas, entre 25% e 40% em relação aos níveis de 1990 até 2020 para os países
industrializados, conforme recomendações do IPCC.
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Entretanto, obstáculos de natureza política precisam ser superados. A não adoção de metas e
compromissos pelas maiores economias dos países em desenvolvimento, como China, Brasil e
Índia, tem sido utilizada como argumento dos países desenvolvidos para justificar as principais
dificuldades em torno de um acordo mais ousado.
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Por outro lado, o Artigo 4 da Convenção especifica as obrigações de todas as Partes da
Convenção, levando em conta suas “responsabilidades comuns porém diferenciadas”, as quais são
justificadas especialmente pelas diferentes contribuições históricas para ao agravamento do efeito
estufa, consideravelmente menores por parte dos países em desenvolvimento.
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9.2 Aspectos-chave da vulnerabilidade regional
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Existem fortes evidências que processos climáticos de mesoescala, cujas variações são interanuais
(e.g. El Niño e La Niña) e interdecadais (e.g. Oscilação do Atlântico Norte, Oscilação Decadal do
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Pacífico), iinfluenciam
m sobremaneeira a circullação atmossférica globaal (GODDIN
N, 2003; LA
ATIF &
KEENLYS
SIDE, 2009; MARENG
GO, 2007; IN
INPE, 2010)), refletindo
o nas oscilaçções de tem
mperatura e
precipitaçõões do contiinente sul-am
mericano aoo longo do século
s
XX (MARENG
(
GO, 2007). Estas
E
variações ssão mais complicadas de
d serem peercebidas peelo homem, pois abranggem período
os longos
de tempo, especialmennte os ciclos decenais.
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Ao se analisar a série histórica dee precipitaçãão dos últim
mos 100 ano
os para a Am
mazônia, nãão foram
observadass tendênciass unívocas de
d diminuiçção ou de au
umento das chuvas, maas sim períodos de
pluviosidadde mais inteensa intercaalados com ooutros maiss brandos, reelacionadoss a oscilaçõees
periódicas interdecadaais na dinâm
mica atmosffera-oceano (figura 6).
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Figura 6. Anomalias norm
malizadas das chuvas
c
para o Norte (gráfic
co superior) e para o Sul (grráfico inferior) da Amazônia
a
as apontam as
s mudanças d
de fase ou clim
mate shifts. Fo
onte: adaptadoo de Marengo, 2007.
entre 1929 e 1997. As seta
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O sul e o nnorte da Am
mazônia apreesentaram, eentre 1929 e 1997, com
mportamentoos simétrico
os, porém
opostos noo que tange a variação da
d pluviosiddade. As décadas de 19
940 e 1970 ddestacam-see por serem
m
períodos nos quais ocoorreram mu
udanças de ffase ou clim
mate shifts. A partir de m
meados de 1940 o
Amazônia appresentou um
ma tendênciia positiva nas
n chuvas em
e relação à normal, enquanto
e
o
norte da A
sul da Amaazônia apresentou umaa tendência nnegativa. Jáá no final daa década de 1970 e iníccio de 1980
estas tendêências se invverteram (fiigura 6) Esttas oscilaçõees provavelmente estãoo relacionad
das à
mudança nnos campos de circulação atmosférrica e oceân
nica no Pacíífico Centraal entre 1975
5-1976
(Marengo, 2007).
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m curta, variações
v
naa pluviometrria também estão assocciadas às vaariações nas
Em escala temporal mais
temperaturras do Pacíffico Tropicaal e do Atlânntico Tropiccal. Entre 19
903-2005, eeventos extrremos de
seca associiados ao El Niño foram
m observadoos nos anos 1925-26, 19
963-64, 19779-1980, 19
982-1983,
1990-1991, 1997-98 (MARENGO
(
O, 2007). Jáá as secas de
d 2005 e 20
010, as quaiis causaram grandes
impactos nno sul e oestte da Amazô
ônia, foram
m influenciad
das pelo aqu
uecimento ddas águas do
o Atlântico
Tropical deesde 2004, cujo increm
mento superoou 0,5ºC accima da méd
dia normalm
mente registrada
(Marengo, 2007). O aquecimento
o global podde intensificcar esse fenô
ômeno à meedida que o oceano
absorve grande parte do
d excedentte de energiia armazenaado na terra pelo efeito estufa.
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9.2.1 Atributos da vulnerabilidade: sensibilidade e capacidade adaptativa
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O conceito de sensibilidade vem sendo amplamente trabalhado na literatura. Füssel (2007) define
sensibilidade como “o grau com que um sistema é instantaneamente afetado por uma perturbação” e
a associa a fatores internos biofísicos. Já Kaperson et al (2005) conceitua sensibilidade como o grau
de dano que um sistema socioecológico experencia quando sujeito a uma determinada exposição.
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Por sua vez, Turner et al (2003) apresenta sensibilidade como uma grandeza que reflete a
magnitude da reação do sistema socioecológico a um fator de exposição. Segundo os autores,
condições humanas e ambientais do sistema definem a sensibilidade. De forma semelhante, Smit &
Wandel (2006) afirmam que exposição e sensibilidade “são propriedades praticamente inseparáveis
de um sistema e são dependentes da interação entre características do sistema e de atributos do
estímulo climático”. De acordo com eles, a sensibilidade de uma comunidade é determinada pelas
características da ocupação e subsistência (local do assentamento, tipo de moradia, atividades
produtivas, formas de uso da terra).
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Do ponto de vista social, a demografia é um fator que influencia a sensibilidade. O crescimento da
população aumenta o número de pessoas expostas aos distúrbios e podem, eventualmente, criar
tensões sociais. A proporção de idosos e crianças, por sua vez, reflete a sensibilidade do sistema
vulnerável (i.e. família e comunidade) à doenças. Conflitos sociais também podem emergir da
disputa por recursos naturais de uso coletivo, como os recursos pesqueiros, podendo levar ao que
Hardin chamou de Tragédia dos Comuns (HARDIN, 1968).
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Já na perspectiva institucional, a regularização fundiária é um fator de sensibilidade chave.
Produtores rurais desprovidos de documentos de posse ou de propriedade da terra são mais
sensíveis, pois não conseguem viabilizar outros documentos, como o CAR (Cadastro Rural) e o
LAR (Licença Ambiental Rural). De forma semelhante, a inserção de forma competitiva no
mercado demanda a regularização da terra. É interessante observar que esta é uma sensibilidade
relativamente recente e que há algumas décadas era inexistente ou insignificante, pois em um
contexto desconectado dos mercados regionais e no qual o Estado era ausente ou fraco, a produção
e relações de troca independiam da existência de um documento que comprovasse a posse ou
propriedade da terra.
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Capacidade adaptativa, por sua vez, refere-se à capacidade de reação e prevenção dos sistemas
socioecológicos antes, durante e após um distúrbio. Está associada à capacidade de inovação,
aprendizado e auto-organização do sistema. Depende da disponibilidade de opções de adaptação e
a capacidade de transitar entre estas opções que um sistema (e.g. comunidade, ecossistema)
apresenta. As diversas conceituações apresentadas na literatura estão relacionadas à diversidade
(e.g. genética, fenotípica, cultural, tecnológica) e a aspectos de governança (aspectos políticoinstitucionais):
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“(diversidade) pode ser equiparada à manutenção de uma série de opções que são postas
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pelo ambiente. Estas opções, associadas a possibilidade de transitar entre elas, provêm a
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capacidade adaptativa que caracterizam os sistemas complexos adaptativos” (NORBERG
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et al., 2008, tradução dos autores)
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“Capacidade adaptativa: refere-se à flexibilidade de um ecossistema e a habilidade de um
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sistema social em aprender em resposta a distúrbios” (TURNER et al, 2003, tradução dos
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autores)
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“Independentemente da natureza e magnitude do impacto, a capacidade adaptativa é
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fortemente moldada pela governança e por mecanismos socioeconômicos, políticos e
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institucionais que viabilizam a resposta.” (EAKIN & LEMOS, 2010, tradução dos autores)
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Assim, o fortalecimento de instituições e paisagens organizacionais – capital social,
legislação, fluxos de informação, disponibilidade de fundos, capacidade de aprendizado e
conhecimento acumulados – é fundamental para adaptação, reduzindo vulnerabilidades e
preparando os sistemas humanos para lidar com variações ambientais (EAKIN & LEMOS, 2010).
Neste contexto, pesam a favor também a existência de outros elementos característicos da boa
governança, como a responsabilização (accountability) (BURSZTYN, 2008). Dietz et al (2003)
sugerem uma governança adaptativa que leve em consideração os seguintes elementos: (i) aporte
adequado de informações à compreensão do tomador de decisão; (ii) gestão de conflitos e
cumprimento de regras e normas legitimadas pelos atores envolvidos na gestão dos recursos
(inclusive o uso de instrumentos econômicos complementares aos de comando e controle); (iii)
disponibilidade de infra-estrutura física, social, institucional e tecnológica; e (iv) flexibilidade
institucional, associada à capacidade de aprender e repensar regras e normas de acordo com as
mudanças ambientais.
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Portanto, primeiramente, cabe destacar o caráter multiescalar da capacidade adaptativa,
perpassando escalas que vão da local até a global, dependendo do estudo de caso. Este é um caráter
que o diferencia do conceito de sensibilidade (caráter interno ao sistema vulnerável) e exposição
(caráter externo ao sistema vulnerável).
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O segundo ponto que merece ser destacado refere-se às nuances que diferenciam capacidade
adaptativa de sensibilidade, uma vez que, frequentemente, os dois conceitos se confundem.
Enquanto sensibilidade diz respeito às características do sistema que potencializam ou minimizam o
impacto causado pela exposição, a capacidade adaptativa diz respeito às características que
potencializam ou minimizam tais sensibilidades (KAPERSON et al, 2005; TURNER et al, 2003).
Portanto, sensibilidade refere-se a condições ambientais e humanas que aumentam a exposição ao
distúrbio, enquanto capacidade adaptativa refere-se à capacidade de resposta e prevenção por meio
de alterações ou ajustes nestas condições, processo que , quando se efetiva, é chamado adaptação.
Obviamente, há feedbacks entre ambos, e certos aspectos da sensibilidade constrangem a
capacidade adaptativa.
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A fragmentação dos habitats resultante do desmatamento tem consequências negativas tanto
para a conservação da biodiversidade regional quanto para manutenção dos processos ecológicos
(MACHADO, 2009). Sabe-se que o tamanho de fragmentos e a conectividade entre eles são
aspectos fundamentais para a manutenção do fluxo gênico, o qual é condição necessária para que a
criatividade natural (i.e. combinação gênica e combinação cromossômica) possa atuar e produzir
nas populações naturais variações potencialmente adaptativas a um ambiente em constante mudança
(TURNER et al, 2001).
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9.2.2 Floresta Tropical Úmida
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As florestas são objeto de intenso debate político e científico sobre mitigação das mudanças
climáticas, dado o seu papel como reservatório natural de carbono, assim como devido às atuais
pressões antrópicas sobre os ambientes florestais. Os maiores estoques de carbono nos ambientes
terrestres concentram-se em áreas florestais, que, por unidade de área, são capazes de comportar de
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20 a 50 vezes mais carbono que as formas simplificadas de cobertura do solo, como pastos e
agricultura (Moutinho & Schwartzman, 2005).
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As florestas tropicais, que compreendem aproximadamente metade das áreas florestais do
globo. Em conseqüência, o desmatamento e a modificação dos habitats biodiversos das florestas
tropicais têm contribuído de forma significativa com o aquecimento global, além de comprometer a
disponibilização de serviços ambientais, ameaçar a biodiversidade e prejudicar a sobrevivência de
povos tradicionais que dependem diretamente da floresta (RODRIGUES-FILHO et al, 2008). No
contexto das mudanças climáticas, a floresta Amazônica é foco de preocupação, tanto pelas
projeções dos impactos severos sobre a região, como por sua importância para a mitigação do
fenômeno, haja vista ser a maior floresta tropical remanescente no mundo.
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A floresta Amazônica é responsável por emitir anualmente centenas de milhões de toneladas
de carbono na atmosfera. O desmatamento abre clareiras na floresta, fazendo com que a incidência
de radiação solar penetre diretamente na vegetação, que se torna, então, mais inflamável
(NEPSTAD et al., 1999; 2001). O aquecimento global, por sua vez, contribui com a suscetibilidade
da floresta a incêndios, na medida em que aumenta a intensidade de fenômenos como o El Niño,
que provoca o aumento da temperatura e episódios de seca prolongada na Amazônia. Incêndios
florestais em anos de El Niño podem dobrar as emissões amazônicas de carbono (NOBRE, 2001).
Portanto, as florestas tropicais têm sido objeto de inúmeros estudos que contemplam o ciclo do
carbono e suas relações com a antroposfera e a biosfera, com destaque para o programa LBA
(Programa de Grande Escala da Biosfera-Atmosfera na Amazônia), coordenado pelo MCT/INPA.
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9.2.3 Agricultura Familiar
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A produção agrícola familiar é um setor altamente sensível às mudanças climáticas. Os
elementos que compõem os sistemas produtivos são regulados por parâmetros atmosféricos como
precipitação, temperatura e concentração de CO2. Variações nesses parâmetros possuem reflexos
diretos na produtividade agropecuária e, consequentemente, no cotidiano do produtor e sua família.
Contudo, generalizações dos impactos das mudanças climáticas sobre a produção familiar devem
ser realizadas com ressalvas, uma vez que a vulnerabilidade é determinada pela interação entre
especificidades socioeconômicas, culturais e institucionais de âmbito local, e fatores associados às
variações climáticas em diferentes escalas (MOTON, 2007; EAKIN & LEMOS, 2010; HILHORST
& BANKOFF;DiIETZ et al, 2003).
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Na região Norte, apesar de reunida em uma categoria para fins estatísticos, a produção
familiar é heterogênea, caracterizada por um mosaico de atividades, desafiando tentativas de
categorização do produtor em tipologias estanques (HURTIENNE, 2005). A agropecuária divide
espaço com o extrativismo e caça/pesca na manutenção da subsistência e renda familiar rural das
populações amazônidas (ADAMS et al, 2008).
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Quanto à vulnerabilidade climática, secas severas, como as de 2005 e 1997/98, aumentam a
dessecação de lagoas e reduzem os níveis dos rios, comprometendo a subsistência e isolando
milhares de ribeirinhos (MARENGO et al, 2011, SILVA e BEGOSSI, 2007). Já o aumento das
concentrações atmosféricas de CO2, incremento nas temperaturas e variações nas precipitações
podem afetar negativamente a produtividade de gêneros agrícolas e de espécies usadas na atividade
extrativista (McKEY et al, 2010; PAROLIN et al, 2010). Por outro lado, alguns estudos aventam a
hipótese que índices mais úmidos no noroeste Amazônico limitam a expansão da pecuária e
agricultura (CHOMITZ & THOMAS, 2003).
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No que tange os sistemas produtivos, a proporção entre culturas temporárias e perenes na
agricultura, assim como a proporção entre pecuária e agricultura nos estabelecimentos e
comunidades ribeirinhas da Amazônia modulam (potencializam ou minimizam) os prejuízos que
uma estiagem mais prolongada pode causar nos orçamentos familiares e economia municipal. Outra
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característica que influencia a sensibilidade é a dinâmica do uso da terra. A substituição da
cobertura vegetal por pastagens e campos agrícolas impacta diretamente o clima local, alterando o
balanço de energia e, consequentemente, influenciando o regime de ventos e o ciclo hidrológico
local.
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Portanto, a avaliação da vulnerabilidade e da adaptação da produção familiar perpassa três
aspectos: (1) identificar as diferentes atividades que compõem os sistemas produtivos familiares e
suas interdependências com a subsistência e renda do produtor e sua família (2) entender como cada
uma das atividades produtivas poderá ser afetada nos cenários climáticos projetados (3) identificar
os aspectos socioeconômicos e institucionais que aumentam a sensibilidade às variações climáticas
e reduzem a capacidade adaptativa dos sistemas produtivos familiares (LINDOSO et al, 2009).
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9.2.4 Agronegócio e floresta plantada (a completar)
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9.2.5 Pecuária (a completar)
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9.2.6 Extrativismo (a completar)
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9.2.7 Mudanças no ciclo hidrológico
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Nas florestas tropicais úmidas, especialmente na Amazônia, a radiação direta é fortemente
absorvida pela vegetação o que mantém a umidade entre a área do solo e a copa das árvores. Nesse
sentido, pode-se afirmar que o bioclima das florestas tropicais é determinado pelo funcionamento
da comunidade vegetal; nela, a radiação incidente é convertida em calor na folha, sendo
transformado em transpiração o que permite a ciclagem da água em áreas de floresta contínua. Em
estresse hídrico os estômatos das folhas se fecham não respondendo a fatores externos prejudicando
absorção de gás carbônico (OZANNE et al., 2003; LARCHER, 2000).
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A evapotranspiração da vegetação é responsável por parte substancial das chuvas locais
(SHEIL & MURDIYARSO, 2009; BONAN, 2008; MOHAMED, 2005; NEPSTAD, 1997). Aguiar
(2006), no âmbito do programa LBA, observou que a evapotranspiração vegetal respondeu pelo
destino de 75- 85% da radiação solar incidente na estação chuvosa em área de floresta no sudeste
amazônico, sobrando apenas 25-15% para aquecer a temperatura do ar e da superfície. Estima-se
que na floresta Amazônica, entre 25%-50% da precipitação em uma determinada localidade provêm
da própria vegetação subjacente (ELTAHIR, 1994). Durante o período de estiagem, este processo
responde por parte majoritária da chuva local, enquanto no período de chuvas, esta participação,
apesar de ainda significativa, tem participação relativa mais modesta.
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Evidências arqueológicas sugerem que catastróficos incêndios têm ocorrido na Amazônia
durante grandes eventos de El Niño quatro vezes ao longo dos últimos 3.500 anos: 1.500, 1.000,
700 e 400 A.C (MEGGERS, 1994). O aumento do início de focos de incêndio, juntamente com
aumento de inflamabilidade florestal madeireira já resultou em substanciais incursões dos incêndios
na floresta em pé, no leste e sul da Amazônia durante anos secos (UHL e BUSCHBACHER, 1985;
UHL e KAUFFMAN, 1990; COCHRANE e SCHULZE, 1999; COCHRANE et al., 1999,
NEPSTAD et al., 1999). Secas conduzirão a um aumento na área e completude de combustão em
clareiras na Amazônia, contribuindo na emissão de fumaça e material particulado funcionando
como fontes de nutrientes de origem eólica para o meio florestal (TALBOT et al., 1990).
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Caso a freqüência de eventos El Niño aumente como conseqüência do aquecimento global
(TIMMERMANN et al., 1999), as florestas libertarão suas grandes reservas de carbono para a
atmosfera. O futuro da acumulação de CO2 na atmosfera, e, conseqüentemente, o momento em que
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a concentração atinja "perigosos" níveis, depende da contínua absorção de carbono pela biosfera,
incluindo uma importante contribuição a partir da Floresta Amazônica. É importante salientar que
cada grau de alteração na temperatura em um ambiente tropical pode ser "percebido" pelas espécies
da floresta como uma maior variação do que em florestas temperadas (JANZEN, 1967).
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9.2.8 Projeções de impactos sobre a saúde humana (a completar)
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9.2.9 Projeções de impactos sobre a produção agrícola e a segurança alimentar (a
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completar)
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Síntese das análises e considerações finais (a completar)
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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS A COMPLETAR