Edição 07 Revista Espaço Acadêmico Janeiro a Junho de 2013
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Edição 07 Revista Espaço Acadêmico Janeiro a Junho de 2013
1 2 ISSN 2178-3829 3 ESPAÇO ACADÊMICO Faculdade Capixaba da Serra - Multivix v. 04 n. 07 - Janeiro a Junho de 2013- Semestral Diretor Executivo Tadeu Antônio de Oliveira Penina Diretora Acadêmica Eliene Maria Gava Ferrão Penina Coordenadora Acadêmica Carina Sabadim Veloso Coordenador Administrativo Álvaro Junior Oliveira Milleri Coordenador Financeiro Cantídia Jadjesk Montebele Coordenadores de Curso Administração; Ciências Contábeis Géssica Germana Fonseca Pedagogia; Letras Angela Maria Neves Roriz Engenharia Civil; Poline Fernandes Fialho Engenharia de Controle e Automação Teresa Cristina Maté Calvo Serviço Social Flaviane Cristina de Oliveira Ferreira Delanos Bibliotecária Luciana Henrique Fernandes Presidente da Comissão Editorial Eliene Maria Gava Ferrão Comissão Editorial Eliene Maria Gava Ferrão Carina Sabadim Veloso Oscar Omar Carrasco Delgado Endereço para correspondência Coordenação Acadêmica Rua Barão do Rio Branco, nº 120, Colina de Laranjeiras 29.167-172 – Serra – ES e-mail: [email protected] Capa Romulo Santos de Castro Espaço Acadêmico / Faculdade Capixaba da Serra / – Serra: (jan/jun. 2013). Semestral ISSN 2178-3829 1. Produção científica – Faculdade Capixaba da Serra. II. Título 4 ESPAÇO ACADÊMICO SUMÁRIO ARTIGOS A Relevância da EJA como Processo de Inclusão Social.....................................................05 Flávia Castanho de Jesus Souza Yaralice Fabri Pereira Castanhi A Importância da Atuação do Supervisor Escolar na Organização e Gestão da Escola........................................................................................................................................19 Jeanine Maria Dagostini Valentim Rachel Curto Machado Vieira Dificuldades de Aprendizagem no Processo de Alfabetização.......................................... 37 Bruna Silveira Schultz Letícia Santolin Frisso Ensino Religioso na Formação Básica do Cidadão..............................................................54 Marisa Horta Chagas Stellitano Lira Sônia Maria Dias Metodologia de Prática dos Gêneros Orais no Ensino Fundamental ...............................65 Renan Mendonça Ferreira 5 A Influência da Família nos Papéis Sociais Desenvolvidos pelas Crianças e as Consequências disto no Desempenho Escolar......................................................................78 Graciella Leão do Nascimento Terra Ivana de Oliveira Nascimento Ludmila Lusa Lorenzoni Vaccari Integração das Tecnologias da Informação e Comunicação no Currículo Básico Estadual do Espírito Santo.....................................................................................................................90 Gildásio Macedo de Oliveira Leoneida Ladeira Rodrigues Macedo Percepção Ambiental em Área de Proteção Ambiental – Um Estudo do Bairro Recanto da Sereia, Guarapari - ES....................................................................................................105 Nívea Farias de Freitas Corleto Érika Fernandes Silva Lima Mensuração do Montante das Doações para as Instituições Denominadas Terceiro Setor sob o Aspecto Perceptivo e Econômico dos Pais e das Mães que tem seus Filhos Atendidos por estas Entidades.............................................................................................125 Sebastião Francisco Loss Franzini A Idéia da Escola Sustentável..............................................................................................156 Fernanda Freitas Rezende Rodrigues ISSN 2178-3829 6 A RELEVÂNCIA DA EJA COMO PROCESSO DE INCLUSÃO SOCIAL Yaralice Fabri Pereira Castanhi1 Flávia Trancoso de Jesus Souza2 RESUMO O presente artigo tem como objetivo contribuir para o desenvolvimento do aluno levando em consideração sua realidade de vida e viabilizar de forma fácil e agradável o seu crescimento pessoal, profissional e social. A sua realização deu-se a partir de dados coletados nos acervos das bibliotecas, de artigos científicos de revistas especializadas, no banco de dados da Internet e também a partir de reflexões, indagações e convivência na EJA. Assim, foi usada uma gama de material bibliográfico disponível, uma vez que era necessário entender a atividade do professor da EJA, caracterizá-la como função social e especializada cuja particularidade o situa como ser social que promove interações culturais, sociais e de saberes na contribuição da construção da cidadania do educando. Palavras-chave: transformação; inclusão; reflexão; cidadania; educação de jovens e adultos. ABSTRACT This article aims to contribute to the development of the student taking into account their reality of life and enable an easy and enjoyable way your personal, professional and social growth. Their achievement was given from data collected in the collections of libraries, scientific journal articles in the database of the Internet and also from reflections, questions and coexistence in the EJA. Thus, we used a range of publications available, since it was 1 Graduada em Licenciatura Plena em Língua Portuguesa e Literatura Portuguesa e estudante do curso de Pedagogia pela Multivix Serra 2 Graduada em Licenciatura Plena em Geografia e estudante do curso de Pedagogia pela Multivix Serra 7 necessary to understand the activity of professor of EJA, characterize it as a social function and specialist whose particularity the situation as a social being which promotes cultural, social interactions and knowledge contribution in construction of citizenship of the student. Keywords: processing, inclusion, reflection, citizenship, youth and adult education. 1 INTRODUÇÃO Reflete-se neste artigo sobre os pares educativos (professores-alunos) da Educação de Jovens e Adultos (EJA) realçando-os como contextos significativos e sociais embasados em teorias e práticas inovadoras de um pensar reflexivo e consciente. Compreender a necessidade e o direito à educação para todas as pessoas como aponta a Constituição Federal de 1988, no artigo 26, parágrafo 1º. a educação sendo a única forma de inserir verdadeiramente o indivíduo à sociedade. Prentende-se com esse artigo entender a evolução do ensino para os jovens e adultos até os dias atuais através da história, bem como caracterizar a EJA como espaço de inclusão social para todos aqueles que não tiveram a oportunidade de estudar no período regular, em decorrência de diversos fatores como, por exemplo, social, econômico e cultural. O interesse pelo tema surgiu a partir do constante trabalho com a EJA, essa modalidade de ensino tão relevante nos dias atuais, complexa e repleta de desafios; e da vivência com os alunos. Conforme a observação e as experiências vivenciadas em sala de aula, houve a necessidade de responder a seguinte indagação: Será que a modalidade EJA funciona como ferramenta de inclusão social? Para respondê-la foi utilizada como metodologia a bibliográfica: pesquisa em livros que tratam do tema, em artigos científicos de revistas especializadas, em bancos de dados da Internet e na própria com os alunos no cotidiano escolar. Vale ressaltar que no processo de evolução da EJA observa-se as características de seus educadores e como esses profissionais podem colaborar com a formação pessoal e social dos 8 educandos que em sua maioria não tiveram a oportunidade de ingressar nas instituições de ensino regulares e hoje estão diante do grande desafio de voltar ou iniciar sua caminhada dentro de uma sala de aula. Os professores podem colaborar para que se rompam as barreiras do tempo e devolva a esses jovens e adultos a oportunidade de um novo despertar, para que novos conhecimentos sejam agregados à sua experiência de vida. Portanto, cabe a cada profissional da EJA ser mediador de um novo tempo e de novas oportunidades com o objetivo de trabalhar cada indivíduo de forma particular e com respeito às suas origem, idade, histórico de vida, crenças, perspectivas e objetivos. Além de ter a missão de ajudar para que este tempo em sala de aula e o processo de aquisição de novos conhecimentos não se tornem conflitos e frustrações, mas sim novos valores à sua vida, os quais contribuem com uma maior integração na sociedade. Assim, busca-se compreender toda a relevância da EJA para a vida desses jovens e adultos, e na construção de uma sociedade mais justa e igualitária formada de pessoas capazes de promover o seu bem-estar e o de todos. 2. DESENVOLVIMENTO 2.1 O CONCEITO DE EDUCAÇÃO A educação numa pespectiva de transcendência requer uma releitura do que se entende sobre ensinar, aprender e apreender. Ressalta-se que o processo de ensinar parafraseando Freire (2001) é possibilitar a oportunidade de aprendizagem. Aprender é construir significados. Apreender é assimilar, internalizar o que é mais significativo com perspectivas de mudanças pessoal, social e cultural. 9 Nesta visão, compreende-se que o sujeito está em constante construção, pois ele em seu processo de ensino aprendizagem sempre se encontrará “inacabado”. Portanto, ensinar exige, a partir desta consciência do “ser inacabado” (Freire, 2001), ou seja, em constante processo de construção em todos os âmbitos, a transformação do ser. Desta forma, o indivíduo, diante do aprendizado adquirido, pode ou não abrir sua mente às novas possibilidades, uma vez que o conhecer lhe permite escolher o que melhor lhe possibilitará novas oportunidades para a vida. Brandão (1995), afima que a educação assim como a saúde, a segurança e todos outros serviços de ordem pública que tem como objetivo garantir os direitos dos cidadãos é de por ordem social com caráter de desenvolver e formar a pessoa de acordo com as necessidades e exigências da sociedade na qual se encontra, e também para as suas próprias necessidades. Entende-se que o processo educacional também precisa ser e ter uma constância que não se encerra com a conclusão de um grau de escolaridade, uma vez que deve ser buscada e aprimorada a cada dia em um processo de construção continuada, almejando sempre ao aprimoramente das habilidades individuais e gerando competências que possibilitem uma inserção social mais dinâmcia e contextualizada. 2.2 O QUE DIZ A LDB A Lei de Diretrizes e Bases (Lei 9.394/96) - LDB – é responsável pelas diretrizes e organização da educação brasileira, o Artigo 2º diz que a “educação, é dever da família e do Estado, inspirada nos princípios de liberdade e nos ideais de solidariedade humana(...)”, ou seja, todo indíviduo tem direito à educação básica e fundamental, cabendo ao Estado e à família trabalharem em conjunto para garantir que todos, sem exceção, tenha direito à educação, partindo de um princípio básico da liberdade, sendo que no artigo 4º indica que o ensino fundamental é obrigatório para todos e deve ser gratuito. 10 O mesmo artigo 2º diz que a educação “(...)tem por finalidade o pleno desenvolvimento do educando, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho”. Muitas são as políticas sobre desenvolvimento econômico do país e por consequência dos cidadãos, ou o contrário que também é verdadeiro, como previsto nesta lei a educação é um direito que tem por objetivo contribuir com a qualificação do trabalhador, consequentemente melhor remuneração e com isso o desenvolvimento econômico do trabalhador. E por que não falar também sobre a necessidade da capacitação para que este possa exercer suas obrigações e usufruir dos seus direitos como cidadão no meio da sociedade em que vive. Tão importante como facilitar o acesso às instituições de ensino para os alunos, a EJA deve possibilitar aos jovens e adultos a oportunidade de estudar, outrora impossibilitada por diversos fatores; neste sentido o artigo 37 em seu parágrafo 1º da Lei 9.394/96 garante o ensino gratuito as essas pessoas, considerando suas características, interesses e condições de vida e de trabalho. 2.3 A TRAJETÓRIA DA EJA A modalidade EJA nasceu da necessidade política para elevar o número de eleitores, mesmo que disfarçada de projetos de governo. Na época, os analfabetos não podiam votar, conforme afirma Vieira (2004), estas iniciativas ganharam força e características próprias até a criação de seu estatuto legal através da Lei nº 5.692 de 1971 e posterior a LDB – Lei das Diretrizes e Bases, lei 9.394/1996. A Constituição Federal Brasileira de 1988 em seu artigo 26, parágrafo 1º diz que “Toda pessoa tem direito à educação.” Direito que deve ser usufruído por todos, independente de raça, sexo, credo, idade, diferenças sociais, etc. Dentro deste plano intedende-se que muito 11 mais que um direito de todos o ensino é uma necessidade de cada indivíduo como forma de integração com a sociedade. No Brasil, segundo Ribeiro (2001) a EJA, apesar de haver alguns textos normativos sobre o assunto na Constituição de 1934, passou a ser vista mais atentamente a partir da década de 40, quando ela começou a se incorporar com o intuito de inserir nas escolas os jovens e adultos que até o momento eram de alguma forma impossibilitados de estar nas salas de aula. Ribeiro (2001), diz que, a partir dessa data, muitos foram os programas governamentais com iniciativas em âmbito federal, estadual e municipal, as quais dentre elas destaca-se a criação dos seguintes planos: em 1942, o Fundo Nacional de Ensino Primário; em 1947, o Serviço de Educação de Adultos e a Campanha de Educação de Adultos; em 1952, a Campanha de Educação Rural; em 1958, a Campanha Nacional de Erradicação do Analfabetismo - CNEA. Para Vieira (2004), apesar da alfabetização dos jovens e adultos ter um cunho eleitoreiro, uma vez que analfabeto não podia votar, e com isto aumentava os números de eleitores, não se pode negar que a Campanha de Educação de Adolescentes e Adultos – CEAA, contribuiu consideravelmente com a diminuição das taxas de analfabetismo no Brasil. A Campanha Nacional de Educação, segundo destaca Ribeiro (Ribeiro apud Beisiegel,1997), foi uma política de governo que tinha como entendimento a educação de jovens e adultos como peça fundamental para diminuir o índice de analfabetismo do país e aumentar o nível cultural. Contudo, a percepção desta necessidade e as ações direcionadas para esta necessidade assumida pela União provocaram uma ação em cadeia das unidades federativas e a regulamentação da distribuição do fundo destinado à educação de jovens e adultos visando à estruturação dos programas e à criação de supletivos integrados as redes estaduais. Segundo Vieira (2004), em 1961, devido às dificuldades financeiras precisou diminuir suas ações de erradicação da analfabetização e em 1963, juntamente com outros programas, foram 12 extintas. Sendo que, em 1967, foi criada a Fundação MOBRAL, Movimento Brasileiro de Alfabetização, de acordo com Bello (1993), surgiu como uma grande iniciativa dando seguimento às campanhas de educação de Jovens e Adultos. O MOBRAL tinha como cunho principal que os alunos aprendessem a ler e a escrever sem a preocupação com a formação do indivíduo. Em 1967, foi criada a lei 5.379/67, o qual propunha a alfabetização funcional de jovens e adultos, onde diz em seu Art. 1º “Constituem atividades prioritárias permanentes, no Ministério da Educação e Cultura, a alfabetização funcional e, principalmente, a educação continuada de adolescentes e adultos”. Assim, o MOBRAL ganharia um cunho mais aprofundado garantido pela lei não somente a limitação à leitura e à escrita, mas a educação continuada. Depois de longos caminhos percorridos com a criação e extinção de programas para alfabetização de jovens e adultos, a EJA começa ganhar na sua história um estatuto legal, que se torna grande ferramenta de educação e formação dos indivíduos para a sociedade, como relata Vieira: “Durante o período militar, a educação de adultos adquiriu pela primeira vez na sua história um estatuto legal, sendo organizado em capítulo exclusivo da Lei nº 5.692/71, intitulado ensino supletivo. O artigo 24 desta legislação estabelecia com função do supletivo suprir a escolarização regular para adolescentes e adultos que não a tenham conseguido ou concluído na idade própria”. (Vieira, 2004). De acordo com Ribeiro (2001), depois da diminuição dos recursos financeiros, a falta de credibilidade nos meios políticos e educacionais o MOBRAL foi extinto em 1985. O que restara de sua estrutura foi absorvido pela Fundação Educar que passou a dar apoio aos projetos governamentais ou de entidades civis, “abrindo mão do controle político pedagógico que caracterizara até então a ação do Mobral.”(Ribeiro 2001). 13 Ainda segundo Ribeiro (2001), nesse período, muitos educadores com experiência na educação popular foram absorvidos pelos programas do governo com o intuito de promover a formação de jovens e adultos por meio de programas extensivos à educação básica de ensino. Com a Constituição de 1988 e o direito à educação para todos, abriu-se novas possibilidades de estudos para estes jovens e adultos, no entanto, na visão de (Haddad, 1991) os Centros de Estudos Supletivos não alcançaram seus objetivos por não receber apoio político e financeiro. Esse apoio era mais voltado para as escolas privadas de educação. Somente em 2003, que voltam a receber apoio, com o Programa Brasil Alfabetizado - PBA, criado com o objetivo de: “Promover a superação do analfabetismo entre jovens com 15 anos ou mais, adultos e idosos e contribuir para a universalização do ensino fundamental no Brasil. Sua concepção reconhece a educação como direito humano e a oferta pública da alfabetização como porta de entrada para a educação e a escolarização das pessoas ao longo de toda a vida.” (PBA, 2003). Com o PBA, novas oportunidades e investimentos surgem a cada dia com o intuito de beneficiar jovens e adultos que não tiveram oportunidade de estudar nas escolas regulares. 2.4 EDUCADOR DA EJA E SEUS DESAFIOS Segundo Arroyo (2006), um dos problemas da EJA e, consequentemente, para seus educadores é que a EJA foi se construindo às margens da educação regular, diante de uma necessidade existente. Com isto, não há um plano de política educacional construída para este método de ensino e muito menos uma formação diferenciada e informações para seus educadores que contribuem para elaboração de planos e métodos de ensino mais eficazes. 14 Muitos são os desafios dos professores para exercer sua prática docente na EJA, desde os conflitos que precisam ser administrados em sala de aula, até a sua própria atuação profissional. Estes profissionais estão diante de alunos que além vencer os desafios próprios de sala de aula, ainda se deparam com as obrigações e as pressões do meio externo: eles em sua maioria precisam trabalhar e estudar ao mesmo tempo. Todas essas adversidades devem ser levadas em consideração como desafios dos professores da EJA que precisam administrar e que por sua vez não recebem formação diferenciada do educador do estudo regular. Soares (2003) diz que precisa melhor avaliar as condições onde atuam e como são preparados os profissionais da EJA. Neste sentido, Arroyo (2006) apresenta o questionamento onde os educadores que atuam no ensino regular são os mesmos da EJA, sendo que os métodos de ensinar se diferenciam pelas necessidades e particularidades dos alunos. A formação pedagógica destes educadores deve ser pautada na arte de ensinar jovens e adultos como pessoas verdadeiramente livres e responsáveis. E hoje precisam desta formação para agregar novos e básicos conhecimentos para a sua vida diária e profissional. Como relatado por Oliveira (1999), a maioria destes adultos são migrantes provenientes dos interiores do país e/ou pessoas de classe baixa que não tiveram oportunidade de estudar pela necessidade de ajudar no sustento da família. Cabe assim, ao professor ser um motivador para que estes jovens e adultos iniciem e concluem sua formação, não bastando para isso uma formação acadêmica, mas também que os educadores tenham uma leitura da vida social de cada indivíduo e os auxiliem nos novos desafios do mundo globalizado. Para Freire, o professor precisa compreender sua missão junto ao discente e “saber que ensinar não é transferir conhecimento, mas criar as possibilidades para a sua própria produção e construção” (FREIRE, 2001). Assim, este professor precisa ser dinâmico no ensino ao interagir unindo conhecimento acadêmico com a experiência de vida de cada aluno, já que busca novo conhecimento para uni-lo às suas experiências externas a escolas. E o construir deste novo saber deve passar pelas práticas pedagógicas que podem ser reordenadas ou dinamizadas de acordo com as necessidades. 15 O corpo docente das instituições de ensino voltadas para a EJA deve ter a sensibilidade de reconhecer o perfil de cada aluno como: origem, idade, histórico de vida, crenças, perspectivas, objetivos; e a partir destas informações ser possível traçar um plano de ensino mais eficaz e ainda se necessário, mediar conflitos e restaurar a autoestima. Todavia, é bom entender que pelo simples fato de buscar novos conhecimentos, ao ingressar na EJA, o aluno já está aberto a novas descobertas e orientações estando disposto a receber nova carga de conhecimento e cheio de expectativas positivas, para um novo tempo que irá se iniciar. Esta pré-disposição dos alunos deve ser utilizada pelo educador como ferramenta para incentivar e extrair dos adultos e dos jovens todo seu potencial ainda não descoberto, unindo as experiências vivenciadas. Por isso, é tão importante que os professores tenham a sensibilidade para entender as expectativas e as motivações de cada aluno. O grande e talvez maior desafio seja unir a experiência concreta com o conhecimento pedagógico, cabendo ao educador proporcionar momentos e formas para que as barreiras existentes sejam rompidas de forma proporcionar as manifestações de conhecimento, amizade e reconhecimento do outro. Para Freire (2002), a relação entre educando e educador dever ser de diálogo verdadeiro e confiável, uma vez que de forma diferente buscam o mesmo objetivo o qual é a formação de um indivíduo crítico as novas oportunidades de processo da vida, não um ser que apenas aprende a ler e a escrever, mas que reflete “criticamente sobre o próprio processo de ler e escrever e sobre o profundo significado da linguagem” (Freire, 2002). 2.5 O SUJEITO DA EJA NO SÉCULO XXI De acordo com a LDB 9394/96, a EJA tem por objetivo atender as necessidade de educação básica as pessoas que por diversos fatores como condições sócio- econômicas, pessoais ou 16 pelas ineficiências do sistema de ensino, não tiveram oportunidade de ingressar nas escolas para a educação regular . O aluno da EJA é um ser com saberes e experiências por já ter frequentado a “escola da vida”. Ele demonstra uma grande expectativa ao querer aprender e uma impaciência ao se deparar com conhecimentos inaplicáveis. Parafraseando Freire (2001), este jovem adulto apresenta uma “leitura de mundo que precede a leitura escrita”. Aqui, não se trata mais de contar o que ele está esperando lá fora porque é justamente lá que ele se encontra, e é de lá que ele vem parar aqui dentro. O desafio pedagógico é contribuir para a inclusão do sujeito da EJA numa sociedade exigente e competitiva. É torná-lo capaz de refletir, agir sobre decisões e tomar posturas sociais transformadoras da sua realidade. Muito mais do que notas, o aluno da EJA anseia ver como a realidade acadêmica concorrerá de fato para que a sua realidade pessoal seja dinâmica e produtiva. 3 CONSIDERAÇÕES FINAIS A educação é primordial para o resgate da cidadania. É através dela que conseguimos realmente descortinar o mundo real e perceber suas respectivas exclusões. Nesse contexto, entende-se que a negação desse direito social conquistado aos alunos da Educação de Jovens e Adultos não pode ser mais mascarada ou ignorada. Esses sujeitos de direitos e deveres ocupam lugares na sociedade e participam de diferentes grupos sociais, como trabalhadores rurais, domésticas, negros, indígenas, desempregados, jovens e adultos populares que carregam histórias, expectativas e incertezas. Portanto, não devem ser, mais uma vez, marcados por trajetórias de negação de direitos, de exclusão e de marginalização. 17 Falar em inclusão na Educação de Jovens e Adultos perpassa pelo questionamento do papel da escola na promoção da educação no que tange à superação das desigualdades sociais, no comprometimento de uma educação de qualidade, no oferecimento de acesso à escolarização aos vários grupos que compõem a sociedade brasileira para assim poderem exercer de fato uma cidadania autêntica. 4 REFERÊNCIAS ARROYO, Miguel. Formação de Educadores de Jovens e Adultos. Belo Horizonte: Secretaria da Educação, 2006. BELLO, José Luiz de Paiva. Movimento Brasileiro de Alfabetização - MOBRAL. História da Educação no Brasil. Período do Regime Militar. Pedagogia em Foco, Vitória, 1993; Disponível em: <http://www.pedagogiaemfoco.pro.br/heb10a.htm>. Acesso em: Nov. 2013. BRANDÃO, Carlos Rodrigues. O Que é Educação. Editora Brasiliense. São Paulo, 1995, Coleção Primeiros Passos. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988; Disponível em <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm> Acesso em: Nov. 2013. FREIRE, Paulo. Pedagogia da Autonomia: saberes necessários à prática educativa. São Paulo: Paz e Terra, 2001. 18 FREIRE, Paulo. Ação Cultural Para a Liberdade e Outros Escritos. São Paulo. Paz e Terra. 2002. HADDAD, Sérgio. Estado e Educação de Adultos (1964-1985). 1991. Tese (Doutorado) – Faculdade de Educação, Universidade de São Paulo. São Paulo, 1991. OLIVEIRA, Marta Kohl de. Revista Brasileira de Educação. Jovens e Adultos Como Sujeitos de Conhecimento e Aprendizagem. Caxambu: Trabalho apresentado na XXII Reunião Anual da ANPED, 1999. Presidência da República; Casa Civil Subchefia para Assuntos Jurídicos; Disponível em <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9394.htm> Acesso em: Nov. 2013. RIBEIRO, Vera Masagão (ORG.); DI PIERRO, Maria Clara; JOIA, Orlando. Visões da EJA no Brasil. Cadernos Cedes, ano XXI, nº 55, novembro/2001. Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização, Diversidade e Inclusão; Programa Brasil Alfabetizado, 2003; Disponível em <http://portal.mec.gov.br/index.php?option=com_content&view=article&id=17457&Itemid= 817> Acesso em: Nov. 2013. Senado Federal; Subsecretaria de Informações; Disponível em <http://legis.senado.gov.br/legislacao/ListaPublicacoes.action?id=117865> Acesso em: Nov. 2013. 19 SOARES, Leôncio José Gomes. Aprendendo com a Diferença: estudos e pesquisas em Educação de Jovens e Adultos. Belo Horizonte: Autêntica, 2003. VIEIRA, Maria Clarisse. Fundamentos Históricos, Políticos e Sociais da Educação de Jovens e Adultos – Volume I: aspectos históricos da educação de jovens e adultos no Brasil. Universidade de Brasília, Brasília, 2004. A IMPORTÂNCIA DA ATUAÇÃO DO SUPERVISOR ESCOLAR NA ORGANIZAÇÃO E GESTÃO DA ESCOLA Jeanine Maria Dagostini Valentim3 Rachel Curto Machado Moreira4 RESUMO 3 Graduada em Ed. Física e Mestre em Educação pela Universidade Federal do Espírito Santo. Aluna do Curso Pedagogia da Faculdade Multivix Serra. 4 Graduada em Letras/Português e Mestre em Educação pela Universidade Federal do Espírito Santo. Aluna do Curso de Pedagogia da Faculdade Multivix Serra. 20 Este artigo tem por objetivo abordar a importância da atuação do pedagogo na organização e gestão da escola e analisa, para isso, práticas pedagógicas. Levanta questões sobre as potencialidades e dificuldades da articulação do trabalho da Supervisão Escolar com os demais profissionais da escola. Adota-se como metodologia a pesquisa exploratória, utilizando-se de análise e discussão dos dados coletados. As discussões dialogam com os estudos de autores como Lück (2007), Libâneo (2001, 2002, 2008), Paro (2001, 2011), que direcionam a algumas considerações. PALAVRAS-CHAVE: Organização e gestão escolar. Supervisão Escolar. Equipe técnicopedagógica. ABSTRACT This article aims to assess the importance of the role of educator in the organization and management of the school and analyzes for this, pedagogical practices. Raises questions about the possibilities and difficulties of joint supervision of school work with other school professionals. The adopted methodology exploratory research, using analysis and discussion of the data collected. Discussions dialogue with studies of authors such as Lück (2007), Libâneo (2001, 2002, 2008), Paro (2001, 2011), which direct some considerations. KEYWORDS: School Organization and Management. School supervision. Technical and pedagogical staff. 1 INTRODUÇÃO Este trabalho foi inspirado nas experiências e observações vivenciadas durante o Estágio Supervisionado em Administração e Supervisão Escolar, do curso de pedagogia, em escolas públicas da grande Vitória, ES. A aproximação da gestão escolar e particularmente dos papéis do Diretor e do Supervisor Escolar, provocou indagações e reflexões acerca da importância deste na gestão e como sua atuação reverbera nas diferentes áreas de atuação dos demais 21 sujeitos que compõem a comunidade escolar bem como na qualificação do processo ensino/aprendizagem. O Estágio Supervisionado consiste em “teoria e prática tendo em vista uma busca constante da realidade para uma elaboração conjunta do programa de trabalho na formação [do pedagogo]” (GUERRA,1995). É o estágio que possibilita ao graduando desenvolver “a postura de pesquisador, despertar a observação, ter uma boa reflexão crítica, facilidade de reorganizar as ações para poder reorientar a prática quando necessário” (KENSKI, 1994, p.11, apud LOMBARDI, 2005). Assim, entende-se que o acompanhamento das atividades e cotidiano dos pedagogos no período do estágio, proporcionou a possibilidade de se realizar a pesquisa e levantar questões em relação à importância da atuação do supervisor escolar enquanto mediador, que exerce “funções de assessoria, apoio e aperfeiçoamento da prática docente nas escolas” (PARO, 2011, p.696) e que considera sempre a especificidade educativa da escola. O desenvolvimento da pesquisa foi pautado em abordagem qualitativa, que coloca a importância no escutar a voz dos profissionais da escola, considerando-os como profissionais que têm a contribuir com o entendimento da relevância do trabalho do Supervisor Escolar na escola. Nesse sentido, classifica-se como pesquisa exploratória, pois tem como objetivo principal “proporcionar maior familiaridade com o tema [...] o aprimoramento de ideias ou a descoberta de intuições” (GIL, 1991, p. 45). Como instrumento de coleta de dados, optou-se pela análise dos diários de bordo, escritos durante o estágio supervisionado em Supervisão Escolar, e pela entrevista estruturada a três pedagogas e dois diretores que atuam em duas escolas públicas da região metropolitana de Vitória – uma do município de Vitória e outra de Vila Velha. Paralelamente a esse processo, realiza-se uma investigação bibliográfica sobre o papel da Supervisão Escolar. Como referencial de análise recorreu-se aos estudos de Libâneo (2001) sobre a organização e gestão da escola, em especial à concepção democrático-participativa, que defende uma forma coletiva de tomada de decisões sem desobrigar das responsabilidades individuais, que compreende a importância do Supervisor Escolar na qualificação do processo 22 ensino/aprendizagem e que não abandona a relevância dos demais sujeitos componentes da comunidade escolar envolvidos na gestão e das “práticas administrativas compartilhadas” (BASTOS, 1999), nas quais evidencia as relações de poder presentes e materializadas nas relações escolares. Como afirma Libâneo (2001), as concepções de organização e gestão escolar refletem posições políticas e visão de homem e sociedade. O modo como a escola vai estabelecendo suas intersubjetividades revela a correlação de forças e poder instituída e instituinte de um determinado grupo social, as relações socioculturais e políticas e também as demandas de cada seguimento que compõe a comunidade escolar. Para o autor citado acima (2008, p.121), O estudo da escola como organização de trabalho remonta aos pioneiros da educação nova, na década de 30. Eles seguiram basicamente ora um enfoque científico-racional – a escola é tomada como uma realidade objetiva, neutra, técnica, hierarquizada, centralizada, que funciona racionalmente, baseada em índices de eficácia e eficiência e ora um enfoque crítico, de cunho sociopolítico – a organização escolar é vista como uma construção social levada a efeito pela comunidade escolar (pais, professores, alunos, etc) e resulta em diferentes formas de viabilização da gestão democrática. Ainda segundo Libâneo (2008, p. 122), no Brasil, os estudos dos últimos anos possibilitam apresentar quatro concepções de organização e gestão: a técnico-científica (ou funcionalista), a autogestionária, interpretativa e a democrático-participativa a qual se aproxima esta pesquisa. A concepção técnico-científica, também denominada funcionalista, tende a seguir princípios e métodos da administração empresarial, com orientação detalhada de funções, tem o poder centralizado no diretor, enfatiza a administração, as regras e normas, nas tarefas, preocupando-se com uma gestão da qualidade total. A segunda concepção apontada por Libâneo (2008) – a interpretativa – foca em suas análises os significados subjetivos, as intenções e as interações entre as pessoas. Entende que as práticas organizativas são socialmente construídas. Privilegia menos o ato de organizar e mais a “ação organizadora” com valores e práticas compartilhados. A concepção autogestionária se baseia na responsabilidade e decisão coletiva por meio de assembleias e reuniões, dá ênfase nas inter- 23 relações mais do que nas tarefas, preocupa-se com a auto-organização do grupo, promovendo eleições e alternância nas funções, recusa a normas e sistemas de controle e crença no poder instituinte. Já a concepção democrático-participativa é baseada na relação orgânica entre a direção e a participação do pessoal da escola e busca alcançar os objetivos comuns traçados e assumidos por todos. Para tal, valoriza o diálogo, busca o consenso, enfatiza decisões coletivas, discutidas publicamente, nas quais cada membro do grupo assume sua parte no trabalho, admitindo-se coordenação e avaliação sistemática de sua atuação. Essa concepção tem sido atualmente influenciada por uma corrente teórica que compreende a organização escolar como cultura. Assim, uma visão sócio crítica propõe considerar dois aspectos interligados: por um lado, compreende que a organização é uma construção social, a partir da inteligência subjetiva e cultural das pessoas, por outro, que essa construção não é um processo livre e voluntário, mas mediatizado pela realidade sociocultural e política mais ampla, incluindo a influência de forças externas e internas marcadas por interesses de grupos sociais, sempre contraditórios e às vezes conflitivos. Nesse sentido, a gestão democrática, reivindicada pelos movimentos sociais durante a ditadura militar, preconizada como um dos princípios da educação na Constituição Brasileira de 1988 e reafirmada na LDB 9394/96, reacende nas décadas de 80 e 90 as discussões sobre a participação popular nas decisões da coisa pública, pois mesmo com a transição para o restabelecimento da democracia política no Brasil, evidenciava-se a correlação de forças desiguais, presentes entre os diferentes segmentos do sistema de ensino, que instigaram a criação de um novo senso comum na gestão da escola pública. Destarte, faz-se necessário considerar o que Bastos (1999) coloca em relação ao cotidiano da escola, que é um lugar de inúmeras e diversificadas práticas que [...] não se sustentam sem uma concepção de sociedade ou de mundo. Portanto esta diversidade de práticas está em permanente movimento no cotidiano da escola, seja para seu êxito seja para seu fracasso. As práticas de gestão fazem parte deste cotidiano, e historicamente têm servido mais para controlar do que para estimular novos conhecimentos. Elas procuram materializar as relações de poder na esfera administrativa – organização do trabalho, burocracia e pessoal. Mas as relações de poder vão para além desse “administrativo”. Estão presentes no pedagógico, materializam-se nas relações profissionais do professor com os alunos e a 24 comunidade, permeiam o currículo, mediante seleção de conteúdos e atividades extraclasse, o sistema de avaliação e o planejamento pedagógico (p.22). À vista do que foi posto, ressalta-se que, “assim como a administração atinge a totalidade da escola, a gestão democrática não pode ser uma proposta de democratizar apenas a esfera da administração da escola” (idem, ibidem). Por isso, é interessante a tese defendida por Paro (2011, p. 7), quando propõe que o Objeto de estudo da administração escolar é a própria escola em sua multiplicidade de problemas e potencialidades. Isso, que deveria ser um truísmo, é continuamente negado por aqueles que insistem em acreditar que conceber a escola do ponto de vista de sua administração (ou de sua gestão, tomadas aqui como sinônimos) consiste apenas em aplicar na instituição educacional os princípios e métodos das empresas de negócios em geral, sem nenhuma consideração para com a especificidade do objeto administrado, ou seja, de uma instituição provedora de educação. De modo geral, no discurso dos tomadores de decisões e formuladores de políticas públicas para a escola básica está presente a suposição de que administrar bem o ensino escolar é apenas fazer na escola aquilo que se faz com sucesso numa empresa qualquer do sistema de produção capitalista. Considerar as ações, a direção e a estrutura organizacional de uma escola como dependentes das relações e correlações que se apresentam é necessário, uma vez que variam e se diferenciam de acordo com as concepções de organização e gestão adotadas. ALGUMAS TECITURAS Ninguém ignora tudo. Ninguém sabe tudo. Todos nós sabemos alguma coisa.Todos nós ignoramos alguma coisa. Por isso aprendemos sempre. Paulo Freire Refletir sobre os sujeitos que atuam na escola requer pensar também sobre a educação e, especialmente, a escola e suas implicações diante à complexidade da sociedade contemporânea. 25 Nesse sentido, assim como Paro (2011), compreende-se educação “como formação da personalidade humano-histórica do educando, pela apropriação da cultura em seu sentido pleno, que inclui conhecimentos, informações, valores, arte, tecnologia, crenças, filosofia, direito, costumes” (p. 695), ou seja, tudo o que é produzido historicamente pelo ser humano e que, em um sistema de governo democrático, “o cidadão deve ter o direito de acesso e apropriação”. Para Saviani (2012, p.2), “a educação é sempre um ato político”, uma vez que ela está sempre posicionada no âmbito da correlação de forças da sociedade em que se insere e, então, está sempre servindo às forças que lutam para perpetuar ou transformar a sociedade. Dessa maneira, a educação, além da função especificamente política, desempenha também uma função técnica. Essas funções são “distintas, porém inseparáveis, o que significa dizer que a função técnica da educação é sempre subsumida pela função política”. O antropólogo Carlos R. Brandão, em 2001, no seu livro “O que é educação” destaca que Ninguém escapa da educação. Em casa, na rua ou na escola, de um modo ou de muitos todos nós envolvemos pedaços da vida com ela: para aprender, para ensinar, para aprender-e-ensinar. Para saber, para fazer, para ser ou para conviver, todos os dias misturamos a vida com a educação. Com uma ou com várias: educação? Educações. [...] Não há uma forma única nem um único modelo de educação; a escola não é o único lugar onde ela acontece e talvez nem seja o melhor; o ensino escolar não é a única prática e o professor profissional não é o único praticante (p.7). Evidencia-se que as transformações da sociedade contemporânea contribuíram para reforçar a concepção da educação como um fenômeno plurifacetado, o que exige saberes e ações que demandam conhecimentos especializados e precisos, levando a uma prática pedagógica materializada através de agentes educativos em espaços diversificados em múltiplas instituições formais e informais, escolares e não escolares, que conceba o educando como um “sujeito (autor), que constrói sua personalidade viva à medida que se apropria dos elementos culturais apresentados pelo educador, o que é possibilitado pela prática pedagógica exercida por este, que se faz mediador, não mero transmissor de saberes” (PARO, 2011, p. 696). 26 Seguindo essa linha de pensamento, considera-se que a era das novas tecnologias e avanços científicos trazem mudanças importantes no mundo do trabalho. Sobre isso Libâneo (2002) declara que as Transformações tecnológicas e científicas levam à introdução, no processo produtivo, de novos sistemas de organização do trabalho, mudança no perfil profissional e novas exigências de qualificação dos trabalhadores, que acabam afetando os sistemas de ensino (p.20). Portanto, essas transformações não poderiam deixar de afetar a Pedagogia, quando concebida como teoria e prática da educação, e, assim, consequentemente afetar o profissional pedagogo. Referindo-se à evolução histórica da supervisão, Medina (2002, p.36) explica que “a cada momento vivido pela sociedade, em consequência da evolução econômica, social, cultural, política, surge um tipo de mentalidade dominante que se reflete no trabalho do supervisor”. 2 ALGUMAS CONSIDERAÇÕES ACERCA DO PEDAGOGO E DA SUPERVISÃO ESCOLAR Apesar de maneiras diversas, a supervisão sempre se fez presente no âmbito educacional, desde as sociedades mais primitivas até os dias atuais. Para Saviani (2003), a educação nas sociedades primitivas era uma ação espontânea, que não se diferenciava das outras ações desenvolvidas pelo homem. Assim, os adultos educavam as crianças indiretamente, vigiando discretamente, protegendo e orientando-as ora pelo exemplo, ora por palavras, supervisionando-as (idem, ibidem, p.15). No Brasil, a história da educação se inicia em 1549, com a vinda dos jesuítas e a instituição da Companhia de Jesus, que administrou o ensino público brasileiro por mais de duzentos anos, incorporando à cultura características marcantes que permanecem até hoje (OLIVERA, 2006). Segundo Saviani (2003), a ideia de Supervisão Escolar está explícita no Ratio Studiorum, publicado em 1599 e que se baseava em elementos da cultura europeia. Como o surgimento 27 do pedagogo5 passa pelo desenvolvimento histórico e do curso de Pedagogia, a definição da figura do supervisor somente ocorreu ao longo da história, com reformulações do curso de Pedagogia. Em 1939, pelo Decreto-Lei 1.190, institui-se a Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras, que reformula currículo do curso de Pedagogia com formação geral, fazendo distinção entre bacharéis e licenciados, sem funções definidas, os “quais apresentam os elementos que acompanhariam as discussões sobre o papel do pedagogo e sua formação até os dias de hoje” (OLIVEIRA, 2006, p.22). Essa formação de pedagogo, que era o técnico ou o especialista em educação, é denominada por Saviani (2003) de “pedagogo generalista” e permaneceu até a década de 1970. Depois dessa reformulação, de acordo com Oliveira (2006), o curso de Pedagogia passou por mais outras três: Parecer 251/62 do Conselho Federal de Educação; Parecer 252/69 e as Diretrizes Curriculares Nacionais do Curso de Graduação em Pedagogia (Resolução CNE/CP nº 1/2006). O Parecer 251/62, com ideologia tecnocrática, fixa um currículo mínimo e a duração do curso de Pedagogia, mas não especifica a função de supervisor de ensino, continuando trabalhar com a concepção de pedagogo generalista, o que gera constantes e crescentes insatisfações, conduzindo à reformulação vista no Parecer 252/69. Este, marcado por uma concepção tecnicista de educação vigente em todo período militar, fixa o currículo mínimo, a duração e as habilitações técnicas dos especialistas, destinados ao trabalho de planejamento, supervisão, administração e orientação escolares, que fragmentaram a formação do pedagogo. Para Saviani (2003), é por meio deste Parecer que se dá a tentativa mais consistente de profissionalizar a função do supervisor educacional, uma vez que transferia para o interior da escola a divisão técnica do trabalho pedagógico e que se consubstanciava na atuação dos especialistas de ensino. No entanto, as diretrizes vigentes no Parecer 252/69 geraram muitas críticas e um grande movimento de debates e discussões entre profissionais e pesquisadores da educação, liderados pela Associação Nacional pela Formação dos Profissionais da Educação (ANFOPE). Assim, após a aprovação da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – LDB 9394/96, intensificaram as discussões sobre a identidade do pedagogo e criação dos Institutos 3 A nomenclatura “pedagogo” será utilizada nesse trabalho referindo-se a supervisor escolar. 28 Superiores de Educação e, em 2006, foram então promulgadas as Diretrizes Curriculares Nacionais do Curso de Graduação em Pedagogia (Resolução CNE/CP nº 1/2006), que centralizam a formação do pedagogo na docência dos anos iniciais da educação básica (licenciatura), conforme consta no artigo 2º e é reiterado no artigo 4º. O curso de Licenciatura em Pedagogia destina-se à formação de professores para exercer funções de magistério na Educação Infantil e nos anos iniciais do Ensino Fundamental, nos cursos de Ensino Médio, na modalidade Normal, de Educação Profissional na área de serviços e apoio escolar e em outras áreas nas quais sejam previstos conhecimentos pedagógicos. Parágrafo único. As atividades docentes também compreendem participação na organização e gestão de sistemas e instituições de ensino, englobando: I - planejamento, execução, coordenação, acompanhamento e avaliação de tarefas próprias do setor da Educação; II - planejamento, execução, coordenação, acompanhamento e avaliação de projetos e experiências educativas não escolares; III - produção e difusão do conhecimento científico-tecnológico do campo educacional, em contextos escolares e não escolares. Destaca-se que as novas diretrizes concebem o Supervisor Escolar como aquele que desempenha funções que são essenciais para o bom andamento de uma instituição escolar. É claro que junto a ele devem a coordenação e a direção realizar suas devidas tarefas. No entanto, é importante que o pedagogo planeje coletivamente as ações realizadas na escola, ou seja, pense o antes, o durante e o depois, no sentido de melhorar o fazer pedagógico, dando todo o suporte necessário para o professor exercer seu papel de ensinar. Assim, organizar reuniões de estudos, em que se aprofundam teorias que dão luz às práticas desenvolvidas é uma das tarefas da supervisão. Acompanhar o professor no seu planejamento, desde os projetos de ação junto às suas turmas até suas aulas, também faz parte do trabalho do supervisor como um apoio, indicando caminhos propícios à ação-reflexão-ação do docente, mas para isso é importante que o Supervisor Escolar crie espaços de fala para o professor com o objetivo de que esse possa pensar sua ação pedagógica, na perspectiva de buscar sempre melhores condições de aprendizagem para todos os alunos (LÜCK, 2007, p. 18). 29 Outra atuação importante do Supervisor Escolar é seu envolvimento nas reuniões de pais, nos Conselhos de Classe e na articulação junto à direção no que tange às questões pedagógicas (LIBÂNEO, 2001). Nesse sentido, o pedagogo possui o compromisso de fazer acontecer a integração entre diferentes segmentos e setores, assessorando o trabalho para a efetivação do Projeto Político Pedagógico da escola (LÜCK, 2007). De acordo com Losso (2008, p. 49), a Supervisão Escolar também possui a atribuição de coordenar, junto aos demais agentes educativos, professores, supervisores e coordenadores pedagógicos, o processo de identificação e análise das causas e acompanhamento dos alunos que apresentam dificuldade de aprendizagem. Portanto, é importante evidenciar o que se entende por pedagogo. De acordo com Libâneo (2002), é um profissional qualificado para atuar em vários campos educativos para atender demandas sócio-educativas de tipo formal e não-formal e informal, decorrentes de novas realidades [...] não apenas na gestão, supervisão e coordenação pedagógicas de escolas, como também na pesquisa, na administração dos sistemas de ensino, no planejamento educacional, nos programas sociais, nas empresas, nas várias instâncias de educação de adultos, nos serviços de psicopedagogia e orientação educacional [...] (p. 31). O referido autor enfatiza que a Pedagogia é um campo de estudos com identidade e problemáticas próprias, compreendendo os elementos da ação educativa e sua contextualização, ou seja, o objetivo do pedagógico se configura na relação entre os elementos da prática educativa: o sujeito que educa (o educador), o saber e os contextos em que ocorrem. Paro (2011) corrobora com essa perspectiva seguida nesse artigo ao colocar que o pedagogo precisa atuar entrosado com a coordenação pedagógica interna à unidade escolar, buscando realizar um trabalho de assessoria e apoio ao professor para que este tenha todas as condições necessárias de realizar bem suas práticas pedagógicas e, assim, alcançar resultados exitosos com os alunos. Nessa perspectiva, em se tratando de contexto escolar, não tem como não definir a escola como uma organização, por ser uma unidade social que existe para alcançar determinados objetivos (LIBÂNEO, 2001). Isso posto, entende-se que a “organização escolar é o conjunto de disposições, fatores e meios de ação que regulam a obra da educação ou um aspecto ou 30 grau da mesma” (idem, ibidem, p.77). As disposições que esse autor menciona podem ser de ordem administrativa ou pedagógica, assim ele propõe o uso das nomenclaturas organização e gestão da escola para caracterizar o trabalho na escola. Nesse sentido, concorda-se com Libâneo (2001) quando diz que a organização e a gestão da escola devem ser um trabalho coletivo, que mobilize os indivíduos em uma atuação conjunta em torno das metas traçadas. Logo, a escola envolve diferentes segmentos de sujeitos que fazem a sua história, tecendo seu processo educativo (LÜCK, 2007, p. 19). Desta maneira, considerando que um trabalho em equipe pode favorecer a atuação de professores, julga-se ser pertinente uma discussão sobre o importante papel da Supervisão Escolar junto à gestão na articulação com o trabalho do professor, uma vez que uma escola bem organizada e bem gerida cria e assegura as melhores condições organizacionais, operacionais e pedagógicodidáticas de desempenho profissional dos professores, de modo que seus alunos tenham efetivas possibilidades de serem bem-sucedidos em suas aprendizagens (LIBÂNEO, 2002). 2.1 A EQUIPE TÉCNICO-PEDAGÓGICA Como já mencionado anteriormente, a estrutura organizacional de uma escola depende de elementos legais e concepções de gestão. Nesta pesquisa, defende-se na gestão da escola a constituição da equipe técnico-pedagógica, composta pela Direção – que, além das atribuições administrativas, apresenta-se sob um caráter social, político e pedagógico; pelo pedagogo em função de supervisor escolar – entendendo como aquele que supervisiona, acompanha, assessora, apoia, avalia as atividades pedagógico-curriculares e pela orientação educacional – que cuida do atendimento e do acompanhamento dos alunos e também do relacionamento escola-pais-comunidade. Essas funções, juntas e organicamente, trabalham com os demais segmentos (pais, professores, funcionários, alunos, comunidade externa), conselho de escola, grêmio estudantil e outros, que compõem a comunidade escolar, visando a busca de objetivos comuns assumidos por todos. As denominações usadas acima para cada função se aproximam da compreensão de Libâneo (2008) no que refere ao organograma básico da escola: Direção, coordenação pedagógica e orientação educacional, respectivamente. 31 Nesse sentido, é possível afirmar que uma escola sem equipe técnico-pedagógica ou com equipe, mas que não atua adequadamente, apresentará uma série de problemas de ordem organizacional, pois compreende-se a equipe técnico-pedagógica como a responsável pela mediação e suporte no andamento pedagógico de uma escola, cabendo a referida equipe as funções de supervisionar, assessorar, articular, orientar, avaliar junto aos professores seu trabalho e o rendimento dos alunos. Assim, entende-se que a equipe técnico-pedagógica é responsável pela coordenação e articulação das ações didático-pedagógicas que acontecem na escola. Ela une as partes envolvidas no processo de ensino/aprendizagem dos alunos, estabelecendo uma ponte entre direção, professores, alunos e pais, formando uma rede interligada por interesses comuns. É um trabalho de liderança que ajuda a escola a desempenhar com êxito tanto o ensino quanto a aprendizagem, favorecendo, assim, o crescimento e a promoção dos discentes, que deve ser o alvo de toda instituição escolar. Nessa perspectiva, compreende-se que cabe à Supervisão Escolar organizar, orientar e assessorar o corpo docente a fim de que planeje a ação pedagógica a ser desenvolvida com os alunos em busca da construção das condições necessárias para que o processo de ensinar e aprender aconteça de forma satisfatória (LIBÂNEO, 2001, p. 104). Somente dessa maneira, os docentes se sentirão amparados e com condições necessárias para desempenhar exclusivamente suas funções, sem a preocupação de, além de realizar suas atribuições, ter que investir tempo e desgaste emocional com questões que não lhe cabem resolver. De acordo com Medina (1997), o objeto de trabalho do supervisor é a aprendizagem do aluno através do professor. Portanto, considera-se relevante o papel do supervisor, que é o de ser o grande harmonizador do ambiente da escola, ou seja, o encarregado de promover a interação entre teoria e prática, entre pensamento e ação. O trabalho do supervisor precisa ser centrado na ação do professor, o que requer envolvimento e comprometimento para se obter resultados satisfatórios de aprendizagem. Porém, para que se possa alcançar esse objetivo, é necessário que a supervisão seja baseada na participação, cooperação, integração e flexibilidade. Nesse sentido, compreende-se a 32 necessidade de que o supervisor e o professor estabeleçam parceria, dialoguem e assumam posições e interlocuções definidas e garantidas na escola. Segundo Saviani (2012), o papel do pedagogo será um se ele se colocar a favor do desenvolvimento do capital e, consequentemente, a serviço dos interesses da classe dominante, porém será outro se ele se posicionar a favor dos interesses dos trabalhadores. Portanto, não pode ser neutro uma vez que a educação é um ato político. Para Villas Boas (2003), a prática da supervisão exige do supervisor constante avaliação crítica do seu próprio desempenho e esforço continuado de aperfeiçoamento como técnico e como sujeito. Quando a Supervisão Escolar não desempenha seu papel e não tem uma postura democráticoparticipativa e, por conseguinte, não pensa na forma coletiva de tomada de decisões sem desobrigar das responsabilidades individuais ou quando o trabalho de apoio ao professor não é realizado pela equipe técnico-pedagógica ou essa equipe atua, mas nem todos os membros realizam suas respectivas funções adequadamente, a tendência é sobrecarregar o outro, desarticular as ações, promovendo desgastes, ingerência, desarticulação do grupo e outras manifestações que refletirão no desempenho dos alunos uma vez que toda a organização da escola fica desarticulada. Para suprir as necessidades, muitas vezes os professores assumem forçosamente outras atribuições, como enviar bilhetes para os pais, entrar em contato com o Conselho Tutelar, preencher fichas e formulários desnecessários etc, e deixam de investir tempo e qualidade no ato de ensinar. Entende-se que o mais agravante nesse processo é o fato de que a desarticulação ocasiona problemas interpessoais entre os professores, entre professores e pedagogos, entre professores e demais membros da equipe-pedagógica e deixa a escola com ares de bagunçada, tumultuada. Esse processo de desorganização e os desgastes são refletidos na sala de aula, tendo em vista que os alunos percebem os desmandos, a falta de profissionalismo, a desarticulação, agindo muitas vezes como se pudessem fazer o que desejam, comportando-se sem limites e, então, ocasionando problemas disciplinares e baixo rendimento escolar. Assim, a supervisão exerce a coordenação do trabalho pedagógico, articulando, acompanhando e orientando as atividades educativas integrantes da equipe técnicopedagógica, além de atuar no processo ensino/aprendizagem escolar específico e também na rede escolar, articulada a um sistema de ensino. 33 Outro problema observado nas escolas que geram animosidades e desarticulação das atividades é o fato de os profissionais não realizarem as atribuições que lhes competem. Durante o estágio supervisionado em uma escola da rede municipal de ensino de Vila Velha, uma pedagoga revelou suas angústias e impedimentos de exercer sua função adequada e satisfatoriamente porque se sentia sobrecarregada com tarefas alheias a sua função. Essa pedagoga demonstrou-se muito atuante, atenta ao processo educativo (LÜCK, 2007, p. 18) e a todos os acontecimentos da escola, mas, por ser atenciosa com professores, coordenação e alunos, é constantemente procurada por eles para orientações, resolução de problemas e atendimentos diversos. Pôde-se perceber que a profissional se encontra assoberbada e angustiada realizando atividades que deveriam ser executadas por outros setores, como coordenação e secretaria. Por conseguinte, muitas de suas atribuições ficam para serem realizadas posteriormente, encontrando-se sempre com acúmulo de serviço e não conseguindo harmonizar o ambiente da escola e promover a interação entre teoria e prática, entre pensamento e ação, o que gera alto índice de reclamações por parte de professores e diretora e, como consequência, conflitos entre os profissionais mencionados. Em outra escola de Vitória, foi difícil realizar a entrevista com as pedagogas, pois elas vivem num “corre-corre” e quase não puderam parar para responder. Percebe-se que elas passam um tempo significativo resolvendo problemas imediatos e “apagando incêndio”. Segundo seus relatos, o fato da não efetiva atuação do Diretor em situações que lhe diz respeito especificamente, acaba por fragmentar o funcionamento da escola e em especial sobrecarregar o pedagógico. Assim, a gestão não é sistêmica, com divergências e ausência de objetivos comuns, dificultando uma linha integrada de ações e fazeres, o que gera conflitos e muita reclamação pelos diferentes segmentos da comunidade escolar. Por isso, entende-se que o modelo de gestão adotado e a operacionalização da ação do Diretor também são elementos decisivos na atuação qualificada do supervisor pedagógico, pois o gestor escolar, “auxiliado pelos demais componentes do corpo de especialistas e de técnicoadministrativos, atendendo às leis, regulamentos e determinações dos órgãos superiores do sistema de ensino e às decisões no âmbito da escola e pela comunidade” (LIBÂNEO, 2001), coordena, organiza, gerencia e acompanha o trabalho de todos os sujeitos que atuam na escola, as atribuições de cada membro da equipe, a realização do trabalho de forma coletiva, a manutenção do clima e avaliação do desempenho. O Diretor pode criar, permitir ou tolerar a 34 abertura de novos espaços necessários à transformação do cotidiano escolar, pois sua ação é fundamental na constituição da rede de relações e ações que constitui o tecido sócio institucional no qual o aluno se insere. Dirigir e coordenar significa assumir no grupo a responsabilidade por fazer a escola funcionar mediante o trabalho conjunto. Para isso, compete a quem dirige assegurar a execução coordenada e integral de atividades dos setores e dos indivíduos da escola, o processo participativo de tomada de decisões e a articulação das relações interpessoais na instituição escolar (LIBÂNEO, 2001). Em relação às responsabilidades compartilhadas, Lück et. al. (2001) esclarece: Aos responsáveis pela gestão escolar compete, portanto, promover a criação e a sustentação de um ambiente propício à participação plena, no processo social escolar, dos seus profissionais, de alunos e de seus pais, uma vez que se entende que é por essa participação que os mesmos desenvolvem consciência social crítica e sentido de cidadania (LÜCK et. al., 2001, p. 18). Neste caso, ressalta-se a importância do Diretor na atuação do supervisor escolar, tendo em vista o papel decisivo que o gestor tem no processo educativo devido sua posição de influência e liderança sobre todas as atividades desenvolvidas na escola. Apesar de se concordar com Lück (2007), quando coloca que a escola deve ser vista como um sistema social, pois se compõe “de um conjunto de funções, todas elas mais ou menos interrelacionadas e todas elas interinfluentes, de sorte que a maneira como são conduzidas as ações em uma determinada área afetam de alguma forma, as ações de outra área” (p. 7, 8), entendese que a Supervisão Escolar deve enfatizar em seu trabalho cotidiano a dinamização e assistência à operacionalização do sentido do processo educativo na escola (idem, p. 19) e não realizar atividades que competem a outras áreas. 3 CONSIDERAÇÕES FINAIS Traçadas algumas linhas sobre o Supervisor Escolar e seu importante papel na equipe técnicopedagógica, pode-se perceber que as práticas desse profissional tanto podem estar a serviço da 35 promoção de um espaço-tempo pedagógico crítico, participativo, colaborativo, político, emancipatório quanto contribuir para se ter um ambiente escolar desorganizado, com as relações interpessoais conflituosas e a não emancipação dos sujeitos. Durante o Estágio Supervisionado em Supervisão e Administração escolar, pôde-se constatar que o Supervisor Escolar exerce um papel fundamental na constituição da equipe técnicopedagógica quando da articulação das ações da escola e do apoio às práticas pedagógicas dos professores. Assim, ratifica-se a ideia de que o Supervisor Escolar é aquele que articula e assessora a rede de fazeres saberes, sendo essencial na harmonização do ambiente escolar e na constituição da rede de ações e de relacionamentos de uma escola, proporcionando condições necessárias para que o processo ensino/aprendizado seja realizado da melhor forma possível e, por conseguinte, obtenham-se resultados exitosos. Por outro lado, quando não se observa uma atuação do Supervisor Escolar baseada na concepção democrático-participativa, defendida neste trabalho como a que deve ser tomada como base para as ações na escola, é possível verificar problemas sérios de ordem administrativa, pedagógica e social que repercutem na aprendizagem dos alunos. Portanto, o Supervisor Escolar pode, conforme Saviani (2012), contribuir para o deslanchar da história, para a formação de sujeitos emancipados e, assim, para a transformação estrutural da sociedade. 4 REFERÊNCIAS BASTOS, João Baptista (org.). Gestão democrática. Rio de Janeiro: DP&A: SEPE, 1999. BRANDÃO, Carlos Rodrigues. O que é Educação? 40. reimpressão. São Paulo: Brasiliense, 2001. BRASIL. Diretrizes Curriculares Nacionais para o curso de graduação em pedagogia, licenciatura. Resolução CNE/CP 1/2006. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 16 mai. 2006. Disponível em: < http://portal.mec.gov.br/cne/arquivos/pdf/rcp01_06.pdf>. 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Sendo atuante na área docente a 06 anos. 38 RESUMO Este artigo tem por objetivo abordar um entendimento sobre a dificuldade de aprendizagem na alfabetização tendo em vista as dificuldades da escrita; que será abordado sob dois enfoques: à dificuldade no processo de alfabetização e o diagnóstico de crianças com problemas educacionais no qual se observa as trocas de fonemas ou inversões, junções de palavras e omissões de sílabas ou palavras; Para saber lidar com esse tipo de problema é importante que o professor, a família e demais profissionais da educação estejam aptos para a intervenção dos distúrbios de aprendizagem, podendo trabalhar em parceria com outros profissionais. Ressalta-se que a família e a escola desempenham papéis importantes no processo de ensino aprendizagem devendo manter contato periódico ou constante. Palavras-chave: Família; Dificuldade de Aprendizagem; Distúrbio de Aprendizagem; Escola. ABSTRACT This article aims to approach an understanding of learning difficulties in literacy in view of the difficulties of writing, which will be approached from two perspectives: the difficulty in the literacy process and diagnosis of children with educational problems in we can observe the exchange of phonemes or inversions, joints and omissions of words or syllables, to know how to deal with this kind of problem is important for teachers, family and other education professionals are eligible for the intervention of learning disabilities, can work in partnership with other professionals. It is noteworthy that the family and school play important roles in the teaching and learning process should maintain regular contact or constant. Keywords: Family, Learning Difficulty, Learning Disabilities; School. 7 Professora Graduada em Ciências-habilitação em Biologia pela Faculdade São Camilo e Pós graduada em Gestão Educacional pela Cesap.Sendo atuante na área docente a 10 anos. 39 1 INTRODUÇÃO Ao abordar esse tema levamos em consideração o problema da educação em nosso país: o alto índice de analfabetismo. Uma das manifestações mais evidentes das dificuldades de aprendizagem é o baixo rendimento escolar tanto do aluno que possui dificuldades psicológicas quanto do aluno que por falta de interesse/preguiça não quer aprender e que poderá ser classificado como uma criança com dificuldade de aprendizagem. Observa-se que as excessivas generalizações acarretam falsos entendimentos conceituais, e que acabam por atrapalhar o diagnóstico das possíveis causas de problemas de aprendizagem para alunos que realmente apresentam dificuldades. No Brasil, a cada ano crianças são reprovadas ou retidas nas séries iniciais do ensino fundamental, ficando anos nesta série porque não dão conta de aprender a ler e escrever com um ano de escolarização. Essas crianças são consideradas incapazes, doentes, deficientes. Torna-se importante abordar o conceito e diagnósticos da questão, tendo em vista as variadas concepções negativas sobre o desenvolvimento da criança e as práticas de educação que desconsideram a política educacional. 2 ALFABETIZAÇÃO: ABORDAGEM GERAL O entendimento sobre a terminologia “alfabetização” foi se alterando no decorrer dos tempos. A palavra analfabetismo é utilizada no português para designar a condição daqueles que não sabem ler e escrever. Por sua vez, o alfabetismo, que é o seu antônimo afirmativo, sendo dicionarizado, ainda de forma “estranha” para àqueles que falam o idioma (ARROYO, 2005). Até a década de 40, segundo Morais e Albuquerque (2004), eram consideradas alfabetizadas as pessoas que sabiam ler e escrever, e para comprovar essa questão, escreviam seus próprios nomes. A partir da década de 50 os instrumentos de avaliação passaram por transformações sendo considerados como alfabetizados todos àqueles que se diziam capazes de ler e/ou escrever um bilhete simples. Acrescentam os autores que: “[...] Essa mudança resultou na ampliação do conceito de alfabetização que passou a envolver o uso da leitura e da escrita inserida e uma prática específica de escrita” (ARROYO, 2005, p. 61). 40 Soares (2003) menciona que nas últimas décadas se descobriu que mesmo nos países ricos, que apresentam índice de analfabetismo zero, muitos indivíduos, ao concluírem a educação básica, são ainda incapazes de usar a leitura e a escrita para finalidades corriqueiras. Divulgou-se o conceito de analfabetismo funcional: [...], segundo as quais pessoas podem saber ler e escrever palavras e frases, embora isso não lhes assegure o exercício de práticas de leitura e escrita, de modo a alcançar propósitos numa sociedade em que aquelas práticas se fazem essenciais para o exercício da cidadania (MORAIS; ALBUQUERQUE, 2004, p.63). Segundo Ribeiro (2003) no Brasil, o analfabetismo ainda se faz muito presente e associa-se a práticas discriminatórias e preconceituosas, o uso dessa terminologia resultou na ampliação das taxas de analfabetismo, que passaram a englobar não só as pessoas que não dominam o sistema alfabético, mas também todos aqueles que tiveram acesso limitado à escolarização ou que têm domínio limitado das habilidades de leitura e escrita. Logo foi necessária uma redefinição nas concepções de alfabetização, utilizando-se um novo conceito: o de letramento; que segundo o Dicionário Houaiss (2001, p. 98): “[...] é um conjunto de práticas que denotam a capacidade de uso de diferentes tipos de material escrito”. De acordo com Soares (2003), a alfabetização corresponde ao processo pelo qual se adquire uma tecnologia, a escrita alfabética e as habilidades de utilizá-la para ler e para escrever por sua vez o letramento relaciona-se ao exercício efetivo e competente da tecnologia da escrita. [...] alfabetizar e letrar são duas ações distintas, mas não inseparáveis, ao contrário: o ideal seria alfabetizar letrando, ou seja: ensinar a ler e escrever no contexto das práticas sociais da leitura e da escrita, de modo que o indivíduo se tornasse, ao mesmo tempo, alfabetizado e letrado (SOARES, 2003, p. 47). Para Ferreiro (2003) muitos pesquisadores defendem a utilização de um único termo – alfabetização – para englobar os processos de aprendizagem e uso da leitura e da escrita. Há de se considerar que no Brasil, o termo alfabetização está diretamente associado a seu oposto – analfabetismo –, portanto, acha-se necessário a utilização das duas palavras – letramento e alfabetização – para designar pessoas distintas mais indissociáveis. 41 Precisa-se pensar na alfabetização como um processo dinâmico de circularidade, processo este que se dá a todo o momento e não pode ser restringido a/na escola. A alfabetização é um processo de criação, de invenção onde os sujeitos encarnados a todo o momento levantam hipóteses, propõe caminhos e desvelam mistérios no ato de ler e escrever. Zaccur (2001, p. 45) explica essa relação do processo de alfabetização com a criação: Inclusive, a linguagem escrita, como representação de segunda ordem, implica refletir sobre algo já apropriado. Não se trata de fazer mecanicamente a escrita, de copiar, mas de produzir um saber sobre um fazer. A criança naturaliza a arbitrariedade do signo. Não perguntará, por exemplo: por que eu chamo casa de casa, e não moradeira? Mas muito provavelmente irá ensaiar escrever a palavra casa de outra forma. Alguns chegam mesmo a indagar: por que não posso escrever casa com z? A criança pensa a alfabetização muito antes de aprender a ler e escrever e até antes de ter contato com materiais didáticos de leitura e escrita na escola. O processo ensino aprendizagem não é linear, a reflexão sobre a escrita acontece o tempo todo e de varias formas através dos inúmeros e variados contatos que a criança tem com o mundo da leitura e escrita. Como nos diria Freire (1990), a leitura de mundo precede a leitura da palavra e dessa forma a alfabetização passa a ser um ato criativo onde o sujeito se alfabe-cria (ZACCUR, 2001). Pensando o processo de alfabetização como um ato criativo e mais que isso de autopoiesis8 onde o sujeito cria seus mecanismos de aprendizagem ligados a diferentes fios e experiências cotidianas, pretendemos conduzir nosso olhar para o sucesso e não para o fracasso dos sujeitos criadores. Ao longo do tempo o conceito de alfabetização mudou, para responder as necessidades da sociedade, muitos métodos e processos de alfabetização foram criados, modificados e adaptados tentando aperfeiçoar ao máximo o processo de ensino da escrita e leitura. 3 DIFICULDADE DE APRENDIZAGEM As ideias em vigor hoje no Brasil sobre as dificuldades de aprendizagem escolar possuem uma história que para ser compreendida precisamos resgatar fatos da história mundial do capitalismo. 8 Maturama usa o termo autopoiesis para designar a organização do vivo. Autopoiesis tornou-se conceito chave sintetizando a autonomia do ser vivo, em processo permanente de trocas em favor da manutenção da vida. 42 A grande revolução de 1789-1848 foi triunfo não da “indústria” como tal, mas da indústria capitalista; não da liberdade e da igualdade em geral, mas da classe média ou da sociedade “burguesa” liberal; não da “economia moderna” ou do Estado moderno, mas das economias e estados em uma determinada região geográfica no mundo (parte da Europa e alguns trechos da América do Norte), cujo centro eram os estados rivais e vizinhos da Grã-Bretanha e França. A passagem do modo de produção feudal para o modo capitalista exigiu grandes transformações sociais, que culminaram no período de 1789-1848 (HOBSBAWM, 1982, p. 17). O entendimento sobre o desenvolvimento humano está baseado em “como” e “por que” o organismo humano cresce e se modifica no decorrer da vida. Entende-se por desenvolvimento as mudanças que ocorrem ao longo do tempo de maneira ordenada e relativamente duradoura e afetam as estruturas físicas e neurológicas, os processos de pensamento, as emoções, as formas de interação social e muitos outros comportamentos (NEWCOMBE, 1999). Os humanos desenvolvem uma grande variedade de sistemas criativos e poderosos de representação. Notadamente, os humanos podem desenvolver uma grande variedade de sistemas criativos e de representação que através da educação, perpassa o desenvolvimento humano. Para Vygotsky (1994), citado por Luz Júnior (1995), o desenvolvimento humano, o aprendizado e as relações entre eles são temas centrais de seu trabalho. Vygotsky busca a compreensão da origem e do desenvolvimento dos processos psicológicos ao longo da história da espécie humana e de sua história individual. Ele diz que a criança desde o nascimento, tem o seu aprendizado relacionado ao seu desenvolvimento, que é um aspecto necessário e universal do processo de desenvolvimento das funções psicológicas culturalmente organizadas e especificamente humanas. É por meio do aprendizado que se possibilita o despertar de processos internos de desenvolvimento, que, se não fosse o contato do indivíduo com certo ambiente cultural, não ocorreriam (Apud LUZ JÚNIOR, 1995). 43 Jean Piaget9 foi um grande pesquisador que contribuiu significativamente para a história da educação, através do desenvolvimento do estudo do homem como construtor do conhecimento. De acordo com Kastrup (2000), Piaget em vez de enumerar as deficiências do raciocínio infantil, comparando-se com o adulto, concentrou-se nas características distintivas do pensamento das crianças, para aquilo que elas têm e não naquilo que lhes falta. Na concepção de Piaget, a criança não nasce inteligente, ou seja, sua inteligência é desenvolvida e é definida pela relação com a interação e reorganização, que se forma através de novas estratégias de ação. No modelo de desenvolvimento cognitivo construtivista, sustentado por dados empíricos, apresentava o sujeito como artífice principal, através da sua ação no mundo, de suas próprias estruturas cognitivas. Para Piaget são dois dos conceitos principais que esclarecem a forma como explicava o processo de construção do conhecimento por parte do indivíduo, que são os conceitos de assimilação e acomodação. Castañon (2005) propõe, que quando uma criança ou qualquer pessoa tem uma experiência que não se adequou com seus esquemas e teorias, ela tenta primeiramente assimilar essa experiência em seus esquemas existentes. E, se a pessoa vê que suas explicações e predições são repetidamente desmentidas, prevalece à tendência no sentido de o esquema se modificar de modo a acomodar-se a esta nova informação. É por isso que a magia que envolve o ambiente infantil é fundamental para a formação da criança e sua relação com os outros à sua volta, consigo e com o mundo. O estímulo do meio é importante para a criança despertar o interesse, a curiosidade e entendimento. A escola, por ser o primeiro agente socializador fora do círculo familiar da criança, torna-se a base da aprendizagem se oferecer todas as condições necessárias para que ela se sinta segura e protegida. [...], não nos resta dúvidas de que se torna imprescindível a presença de um educador que tenha consciência de sua 9 Jean Piaget foi o primeiro pesquisador a estudar sistematicamente a percepção e a lógica infantis. Além de evidenciar sua concepção educacional, procurou descobrir a gênese, a origem da história do comportamento do ser humano para que o homem possa utilizar e conhecer a realidade (HEIL, 2004). 44 importância não apenas como um mero produtor da realidade vigente, mas sim como um agente transformador, com uma visão sócio-crítica da realidade (HEIL, 2004, p. 6). E é por meio da percepção e da compreensão da complementaridade presente nos atos e papéis envolvidos nas interações sociais, que se constitui um aspecto importante do processo de diferenciação entre o eu e o outro da criança. Com o estudo do desenvolvimento cognitivo, que Piaget dedicou-se à gênese da inteligência e da lógica, que foi concluída por meio dos quatro estágios ou fases de desenvolvimento cognitivo infantil. Pois, assim entende-se que cada criança possui seu estágio psicológico, que deve ser respeitado, uma vez que elas apresentam diferentes limites e fatores que influenciarão no seu desenvolvimento. Em geral, pessoas com dificuldades de aprendizagem são representadas no imaginário social por suas ‘marcas’, tomando-se a parte pelo todo. Valoriza-se a dificuldade e perde-se a Pessoa em sua dimensão de integralidade. Criam-se os preconceitos e os estereótipos que desencadeiam discriminações, alicerçadas em juízos de valor, geralmente dicotômicos e que inscrevem as pessoas nas categorias de boas ou más, de melhores e piores, de contributivas ou dependentes e assim por diante (CARVALHO, 2006, p. 18). As baixas expectativas em relação à dificuldade de aprendizagem desses sujeitos também refletem o imaginário coletivo inspirado, erradamente, na ideia da dificuldade de aprendizagem como característica definitiva que os colocará, quando se tornarem adultos, como cidadãos de segunda classe. Para a Organização Mundial de Saúde (OMS) citado por Deuschle, Donicht e Paula (2006) os transtornos de aprendizagem são grupos manifestados por comprometimentos específicos e significativos na aprendizagem escolares; sendo que tais comprometimentos não são resultados diretos de outros transtornos, como o retardo mental, déficits neurológicos grosseiros, problemas visuais ou auditivos não corrigidos ou perturbações emocionais, mesmo que eles possam ocorrer simultaneamente em tais condições. 45 Os transtornos de aprendizagem são diagnosticados quando os resultados do indivíduo em testes padronizados e individualmente administrados de leitura, matemática ou expressão escrita estão substancialmente abaixo do esperado para sua idade, escolarização ou nível de inteligência...Os transtornos de aprendizagem podem persistir até a idade adulta (ASSOCIAÇÃO PSIQUIÁTRICA AMERICANA, 1995 apud DEUSCHLE; DONICHT; PAULA, 2006, p.09-10). Explicam Deuschle, Donicht e Paula (2006) que os manuais da OMS e da Associação Psiquiátrica Americana, consideram três tipos de transtornos: leitura (dislexia), escrita (disgrafia e disortografia) e habilidades matemáticas (discalculia). Acrescentam que em qualquer um dos casos, há alguns requisitos para o diagnóstico de transtorno: Ausência de comprometimento intelectual, neurológico evidente ou sensorial; Adequadas condições de escolarização; e Início situado obrigatoriamente na primeira ou segunda infância. Em situações em que a criança não alcança o desenvolvimento em conformidade com seu estágio, à escola e a família, devem atentar-se para o problema do distúrbio de aprendizagem. Para Tuleski e Eidt (2007, p. 36), a definição mais aceita na atualidade do distúrbio de aprendizagem é: [...] um termo genérico que se refere a um grupo heterogêneo de desordens, manifestadas por dificuldades na aquisição e no uso da audição, fala, escrita e raciocínio matemático. Essas desordens são intrínsecas ao indivíduo e presume-se serem uma disfunção de sistema nervoso central. Entretanto, o distúrbio de aprendizagem pode ocorrer concomitantemente com outras desordens como distúrbio sensorial, retardo mental, distúrbio emocional e social, ou sofrer influências ambientais como diferenças culturais, instrucionais inapropriadas ou insuficientes, ou fatores psicogênicos. Porém, não são resultado direto destas condições ou influências (grifos nossos). Verifica-se, na atualidade, uma massificação do ensino, o que acaba por contribuir para o aumento dos distúrbios/dificuldade de aprendizagem, caracterizada pelo não desenvolvimento do aluno conforme o esperado. Para que o problema não torne algo mais sério, é necessária a identificação imediata do problema em conjunto com a colaboração e esforço do aluno, pais, orientadores e professores. 46 3.1 TIPOS DE DIFICULDADES DE APRENDIZAGEM Um aluno com dificuldade de aprendizagem certamente irá manifestá-la desde as etapas iniciais de seu desenvolvimento; mesmo que pais e especialistas nem sempre reconhecem o problema de imediato. [...] a criança com dificuldade de aprendizagem não deve ser “classificada” como deficiente. Trata-se de uma criança normal que aprende de uma forma diferente, a qual apresenta uma discrepância entre o potencial atual e o potencial esperado. Não pertence a nenhuma categoria de deficiência, não sendo sequer uma deficiência mental, pois possui um potencial cognitivo que não é realizado em termos de aproveitamento educacional. O risco está em não se detectar esses casos, não se proporcionando no momento propício às intervenções pedagógicas preventivas nos períodos de maturação mais plásticos. Se não se detectarem esses casos, a escola com o seu critério seletivo de rendimento pode influenciar e reforçar a inadaptação, culminando, muitas vezes, mais tarde, no atraso mental, na delinqüência ou em sociopatias (DEUSCHLE; DONICHT; PAULA, 2006, p.11). Explica Correia (2006) que o primeiro passo para reconhecer em um aluno a dificuldade de aprendizagem, é saber os fatores que interferem em seu processo de educação. De acordo com Rosa (1991, p. 12), os fatores cruciais para que a aprendizagem ocorra de maneira efetiva, compreendem: saúde física e mental; prontidão física e mental; maturação; inteligência; motivação; concentração e atenção ou memória. Na falta de qualquer desses fatores pode ser a causa de problemas na educação, mas, sem que necessariamente o aluno possua um distúrbio de aprendizagem. São inúmeros fatores que desencadeiam o distúrbio de aprendizagem, dentre os mais comuns são: os distúrbios articulação como o sigmatismo ou gagueira; e os distúrbios na aprendizagem como a disortografia, dislexia, disgrafia e disfonia. Dos distúrbios de articulação, a dislexia consiste na troca fonêmica na fala ou omissão, que de acordo com Pironatto (2008) as mais comuns são: /r/ /l/ = barata/balata claro/craro /b/ /p/ = bola/póla /f/ /v/ = faca/ vaca /t/ /d/ = tapete / dapede /k/ /t/ = (som de ca) casa / tasa /z/ /s/ = som (za) casa / cassa /g/ /k/ = gato / kato 47 O sigmatismo, também chamado de ceceio anterior, que se caracteriza pela língua entre os dentes – para fora – podendo levar a problemas na arcada dentária; é quando a criança produz o som do “S”. A gagueira caracteriza-se na alteração na fluência da fala, e repetições das palavras. Na maioria das vezes está relacionada a fator emocional. Nos distúrbios de leitura e escrita, a disortografia caracteriza-se pela dificuldade de orientação no tempo e no espaço; a criança apresenta falhas de coordenação motora e como resultado, aglutina palavras ou comete omissões; durante o processo de alfabetização, comumente inverte sílabas (per-pre) ou algarismos (32-23) ou troca letras (f-v / p-b) (PIRONATTO, 2008). A dislexia muitas vezes passa despercebida pelos pais e professores; e só aparecem na alfabetização. Conforme a International Dislexia Association (AID) citado por Deuschle, Donicht e Paula (2006, p. 12): [...], a dislexia é um distúrbio de linguagem, de origem constitucional, caracterizado pela dificuldade em decodificar palavras simples. Mostra uma insuficiência no processo fonológico, sendo que essas dificuldades em decodificar palavras simples não são esperadas para a idade. Apesar da instrução convencional, adequada inteligência, oportunidade sócio-cultural e ausência de distúrbios cognitivos e sensoriais fundamentais, a criança falha no processo de aquisição da linguagem com freqüência, incluídos aí os problemas de leitura, aquisição e capacidade de soletrar. Nesse caso, pode ser qualquer dificuldade na articulação ou troca, ou até mesmo uma falha na discriminação auditiva, como a vibração dos sons ou uma anomalia congênita que causará um distúrbio articulatório e uma inabilidade dos órgãos fonoarticulatórios. Ocorre quando a criança confunde letras semelhantes na forma (p-q) ou no som (j-g) e também troca sílabas (telefone-tefelone) lê de modo monótono, pouco inteligível, silabando, não entende o que lê. 48 A dislexia é uma dificuldade acentuada que ocorre no processo da leitura, escrita e ortografia. Não é uma doença, mas um distúrbio com uma série de características. Ela torna-se evidente na época da alfabetização, embora alguns sintomas já estejam presentes em fases anteriores. A disgrafia é a falta de senso de direção, a letra é ruim e a força muscular é irregular, ora muito fraco, ora muito forte; os principais erros disgráfica são (NET, 2007, p. 06): Apresentação desordenada do texto; Margens malfeitas ou inexistentes; Traçado de má qualidade: tamanho pequeno ou grande, pressão leve ou forte, letras irregulares ou retocadas; Distorção da forma das letras o e a; Movimentos contrários ao da escrita convencional; Ligações defeituosas de letras na palavra; Irregularidades no espaçamento das letras na palavra; Direção da escrita oscilando para cima ou para baixo; Dificuldade na escrita e no alinhamento dos números na página. E a disfonia que é quando a criança que fica rouca freqüentemente, fala e lê alto. 4 DIFICULDADE DE APRENDIZAGEM X FRACASSO ESCOLAR A educação é tema das mais acaloradas discussões na contemporaneidade, em suas dimensões político, filosófico e social. A sociedade se debruça em busca de respostas para a compreensão dos dilemas que nos impingem um padrão de educação aquém de nossas expectativas. 49 A maior parte da aprendizagem de um indivíduo ocorre na instituição escolar, na relação, com o professor, o conteúdo e grupo social escolar. É também na escola que ocorrer grandes prejuízos à vida do ser humano, como ressalta Mannoni e Dolto, Apud Bossa (2000, p. 90): A escola, depois da família, converteu-se no lugar escolhido para fabricar neuroses – que são tratadas posteriormente em escolas paralelas chamadas hospitais de dia. É necessário dizer que a adaptação escolar – [...] – é agora, salvo raras exceções, um sistema importante de neurose. Conforme Bossa (2000, p. 91), a escola, diante da questão da aprendizagem, preocupa-se principalmente com o seu meio; mais especificamente com o problema de aprendizagem e fracasso escolar: como se aprende, como se produzem as alterações no meio escolar, como reconhecê-las, trata-las e preveni-las. A psicopedagogia, a partir de uma visão interdisciplinar, é capaz de observar a dificuldade de aprendizagem como fracasso escolar, ou seja, deixa de caracterizar como algo patológico para isso ela conta com o apoio de outras áreas do conhecimento, como a psicologia, a sociologia, a antropologia, a lingüística dentre outras. O psicopedagogo assume o papel desmistificador do fracasso escolar, entendendo o erro apresentado pelo indivíduo como um processo de construção do seu conhecimento e as interações sociais como fator preponderante no desenvolvimento das habilidades cognitivas (PIRONATTO, 2008). Segundo Cypel (1986) citado por Pironatto (2008, p. 21): [...] a impressão que causava ao atender crianças com dificuldade de aprendizagem, na época em que havia a crença de que o fracasso estava associado a problemas genéticos e físicos, era a de que convivíamos em nossas salas de aulas com uma população de anormais, visto que, ao serem avaliados pelos médicos em análises clínicas, o diagnóstico de Disfunção Cerebral chegava a índices de 40%. Percebe-se do ponto de vista médico que as crianças não possuíam um problema patológico de aprendizagem, mas problemas cotidianos da vida doméstica como: relacionamento entre 50 pais, crises afetivas e emocionais. Com isso surge a figura do professor diante desses conflitos com a aprendizagem, das possíveis barreiras e angustias dos pais e medo das crianças, criando assim uma parceria de fundamental importância que poderá acarretar em bons frutos na conjugação que irá influenciar no desenvolvimento da criança. Em alguns casos existem pais e mães que dificultam a vida escolar dos filhos em relação a adaptação. Mas tudo isso é natural, às vezes a angustia dos pais e mães atrapalham essa relação por terem dificuldade de se separar da mãe. A segurança dos pais ajuda nessa separação transitória, portanto deve ser a chave principal na decisão correta. É importante o apoio pedagógico e do professor trazendo conforto, segurança e afeto, os pais devem prepara-se para a ida da criança para a escola dizendo palavras de carinho e incentivo. Mesmo com dificuldades, cabe a equipe pedagógica orientar os professores e mesmo os familiares na importância do papel de todos na vida escolar da criança. A afetividade pedagógica deve ser a base do trabalho, assim tanto os pais quanto os alunos sentiram-se seguros na escola e não criaram bloqueios na aprendizagem. Os pais devem incentivar seus filhos a permanecerem na escola, mostrando que este ambiente é seguro e que ele o propiciará novas descobertas e sensações, é necessário que os pais transmitam tranqüilidade aos filhos mesmo não estando com eles nesse processo educacional. A escola deve ser vista como um lugar privilegiado para o desenvolvimento cognitivo da criança sendo um instrumento que o tornará um adulto mais seguro e confiante. Aos pais cabe o apoio e a confiança de que seus filhos estão num ambiente seguro e eficaz em seu desenvolvimento para que as crianças não gerem bloqueios ou transtornos de aprendizagem. 5 CONSIDERAÇÕES FINAIS 51 É importante, portanto, saber diferenciar bem os conceitos de dificuldade e distúrbios de aprendizagem uma vez que “a dificuldade” está relacionada a problemas de ordem pedagógica e/ou sócio-culturais não sendo assim um ponto centralizado no aluno já o “distúrbio”, por sua vez está relacionado ao aluno que sugere a existência de comprometimentos neurológicos ligados a patologias. A questão sobre o sucesso do aluno na escola passa por uma postura pedagógica nova diante da relação desenvolvimento e a aprendizagem. A pedagogia pressupõe uma visão sóciohistórica, sem retirar o foco dos problemas sociais. As relações sociais dão significados aos fatos, todo indivíduo se desenvolve, com ou sem adversividades; sendo que, para impulsionar o desenvolvimento humano garantindo o direito de apropriação do conhecimento, e contribuir com a ruptura dos estigmas de fracasso e de incapacidade de aprendizagem, é importante saber se as instituições escolares estão preparadas a lidar com essa problematização. Por isso há de se refletir que a escola não está preparada para lidar com crianças que não se encaixam no padrão considerado “normal” frente ao processo de aprendizagem. O professor, a família e demais profissionais da educação devem estar aptos para a intervenção dos distúrbios de aprendizagem, podendo trabalhar em parceria com outros profissionais (Psicólogos, fonoaudiólogos, psiquiatras). É necessário investir em cursos e extensões curriculares para que os profissionais saibam atuar com esses alunos. Diante de questões como essa se deve atentar pela necessidade de profissionais das mais diversas áreas, que buscam explicações teóricas em prol da intervenção com alunos que possam apresentar dificuldade no processo de ensino aprendizagem. A busca por explicações teóricas acaba por levar a desenvolver uma formação que possibilite articular outras áreas de conhecimento, podendo assim, criar uma nova área de atuação para saber lidar com mais direcionamento ao problema evitando-se o fracasso escolar do aluno. A escola diante das dificuldades é uma situação essencial de socialização, pois é uma fase especial na vida da criança, por isso que os educadores têm um papel decisivo, uma vez que a 52 sua atitude poderá ser determinante para que o jovem vivencie de forma menos ansiogénica as suas dificuldades no futuro. 6 REFERÊNCIAS ARROYO, Miguel González. Educação de jovens-adultos: um campo de direitos e de responsabilidade pública. In. 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ABSTRACT The current context of the Religious Education and also the legislation for such procedure, explaining the difficulties to the Religious Education in school Education in public schools and that the teachers training process needs, as an emergency, to be feasible and/or made available to professionals who want to work in this discipline. Keywords: Religious education. Legislation. Training of teacher. Curriculum. 10 11 Graduanda do Curso de Pedagogia. Graduanda do Curso de Pedagogia. 55 1 INTRODUÇÃO O Ensino Religioso sempre foi visto como um problema nos currículos escolares. Por um período, foi considerado como um componente curricular de apadrinhamento e de cunho eclesiástico. Depois, foi visto como disciplina pouco importante para a matriz curricular de ensino. Neste contexto, a disciplina é questionada de um extremo a outro quanto a fazer parte ou não do quadro curricular como qualquer outra disciplina. Em 1997, o ano em que foi dada nova redação ao artigo 33 da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN), o ensino público assume uma nova postura e tem como objetivo um ensino gratuito e laico. Pensava-se que a Igreja e o Ensino Religioso iriam se desvincular, deixando até mesmo de existir nas escolas. Entretanto, não foi o que aconteceu ao longo dos anos. O Ensino Religioso ficou nessa de ir e vir e até hoje continua fazendo parte da componente curricular das escolas, trazendo ainda grandes desafios para a comunidade escolar com questionamentos pertinentes: Qual é a importância da disciplina para a formação básica de um cidadão? Qual é o conteúdo básico a ser trabalhado na disciplina? Os professores de Ensino Religioso devem ser habilitados? Em que? É preciso colocar de lado a ideia de Ensino Religioso como catequese ou atividade confessional, para assumir essa nova concepção que vem surgindo com tantos desafios e também conquistas. É visível que ainda há muitos passos a serem dados, mas só será possível “desbravar” esse novo caminho com muitos estudos, debates e pesquisas para formar um jeito novo de pensar e agir no processo de valorização do Ensino Religioso em todo território brasileiro. 56 2 ENSINO RELIGIOSO NA FORMAÇÃO BÁSICA DO CIDADÃO Com a alteração da LDB, Lei nº 9.394/96, no seu artigo 33, o Ensino Religioso passou a ser uma disciplina integrante do currículo das escolas de ensino fundamental como qualquer outra disciplina. E passou a ser considerada como elemento essencial para a formação do cidadão, facultativa a matrícula para o aluno, levando em consideração os princípios de liberdade religiosa, respeitando a diversidade cultural-religiosa do Brasil e vedando qualquer forma de proselitismo. A nova redação passou a responsabilidade para os sistemas de ensino de regulamentação dos procedimentos como: a) A definição dos conteúdos de ensino religioso. b) As normas para a habilitação de professores, segundo os Estatutos do magistério, com ônus ao cofre público. A matrícula do aluno na disciplina de ensino religioso passou a ser a critério do aluno ou de seus pais, podendo fazer opção de frequentar as aulas ou não. O ensino religioso é parte integrante da formação básica, contribuindo na formação dos cidadãos, sendo capaz de conhecer e respeitar as práticas religiosas do outro e ainda de viver de forma solidária com o diferente. No art. 33, pode-se entender que a fundamentação e o conteúdo do Ensino Religioso não contemplam mais o saber teológico, mas sim o saber antropológico e as expressões culturais contendo religiosidade. Deixou de ser formação de adeptos de determinada denominação religiosa e passa a ser um elemento indispensável na formação básica e integral dos alunos. O Ensino Religioso é oferecido a todos de forma igualitária sem discriminação de qualquer natureza. O relator da Lei n. 9.475/97, Roque Zimmermann, aponta novidade para o Ensino Religioso: Pela primeira vez no Brasil se criam oportunidades de sistematizar o Ensino Religioso como disciplina escolar que não seja doutrinação religiosa e nem se confunda com o ensino de uma ou mais religiões. Tem como objeto a compreensão da busca do transcendente e do sentido da vida, que dão critérios e segurança ao 57 exercício responsável de valores universais, base da cidadania. Este processo antecede qualquer opção por uma religião.12 Para compreender a nova proposta do Ensino Religioso, é preciso conhecer a nova lei, saber de fato quais são as inovações, o que significa colocar-se de fora das crenças, dos preconceitos adquiridos e assumir uma postura de respeito, aceitação das manifestações culturais religiosas. Com o parecer CEB n. 04, de abril de 1998, homologado pelo ministro da Educação e do Desporto em março, e a resolução n. 02 de abril do mesmo ano, da CEB/CNE, publicada em 15 de abril do mesmo ano, a Câmara de Educação Básica do Conselho Nacional de Educação (CEB/CNE) instituiu as Diretrizes Curriculares para o Ensino Fundamental. E o Ensino Religioso se constituiu como área de conhecimento, disciplina escolar e também campo de pesquisa nas instituições de ensino superior. A CEB/CNE reconheceu o Ensino Religioso como área de conhecimento e passou a constar nos planos de estudos da educação básica. O mesmo não aconteceu na Câmara de Educação Superior (CES/CNE), que não concordou que a formação do docente dessa área fosse via curso de licenciatura com reconhecimento nacional. Diante da contradição, configurou-se o Fórum Nacional Permanente de Ensino Religioso (FONAPER), que elaborou em parceria com especialistas os Parâmetros Curriculares Nacionais para o Ensino Religioso (PCNER). Estes trazem como proposta a capacitação profissional para o Ensino Religioso. Com intuito de contribuir nesse processo, são organizados, desde então, anualmente, seminários e congressos nacionais. Estes eventos culturais contribuíram significativamente para a efetivação desta disciplina em salas de aula e, de modo em especial para a preparação de professores. Com o esforço conjugado de muitos, foram elaboradas as “Diretrizes Curriculares dos Cursos Superiores na Área do Ensino Religioso”. Nesta perspectiva, foram definidas as cinco Áreas de conhecimentos: fundamentos epistemológicos do Ensino 12 ZIMMERMANN, Roque. Ensino Religioso: uma grande mudança. Brasília, Câmara dos Deputados, Centro de Documentação e Informação, 1998. p. 9 58 Religioso; cultura e tradições religiosas; teologias; textos sagrados, orais e escritos; e ethos. 13 O Ensino Religioso apresenta uma nova roupagem. Deixou o cunho catequético para trás, assumiu uma nova postura onde o aluno não será contemplado dentro da sua denominação religiosa. Com todas essas mudanças, os professores que assumirão essa disciplina precisam passar por uma formação multicultural e multiconfessional, respeitando as diferenças culturais, incluindo as afro-brasileiras e as indígenas. O professor de ensino religioso precisa estar apto para assumir uma sala de aula que atenda as novas exigências da lei; um professor que saiba conviver e respeitar a diversidade cultural e religiosa do Brasil. Caron fez um apontamento na formação de professores: A necessidade de profissionais qualificados para o desempenho da função no ensino religioso levou o sistema de ensino, algumas universidades, bem como entidades religiosas, a implementação e implantação de cursos de formação 14 Pela primeira vez o ensino religioso foi sistematizado como disciplina e não como doutrina religiosa de uma religião especifica ou de mais religiões, que tem como meta a busca do transcendente e do sentido da vida. O ensino não pode ser transmissão de conduta e muito menos de doutrina religiosa ou catequese. Deve contribuir na busca do sentido da existência. Assim como o Ensino Religioso, a formação de professores também tem estado em pauta de muitas conferências e debates. No momento, é um dos maiores desafios do sistema educacional do Brasil. Toda nova proposta de mudança educacional passa pelo viés da valorização e da formação do professor. Esse é o primeiro passo para dar continuidade no processo de mudança ou implantação de uma nova modalidade, seja ela qual for. A contribuição das aulas no processo formativo do aluno passa via formação do professor e do seu compromisso com a formação integral do educando. Sendo assim, é indispensável investimento na formação do profissional que vai assumir uma sala de aula para ministrar o 13 14 RUEDELL, Pedro. Educação Religiosa: fundamentação antropológico-cultural da religião segundo Paul Tillich. São Paulo: Paulinas, 2007. p. 37. CARON, Lurdes; GRUPO DE REFLEXÃO SOBRE ENSINO RELIGIOSO. O Ensino Religioso na nova LDB: histórico, exigência, documentários. Petrópolis: Vozes, 1998. p. 35. 59 ensino religioso. O processo formativo de um professor não ocorre em um único momento, por isso, a importância da formação continuada, trazendo sempre em pauta as condições históricas e tendo sempre em mente que tipo de cidadão pretende formar. A competência dos docentes envolvidos com a Educação Religiosa Escolar está muito ligada à compreensão da proposta deste componente curricular e tem haver com a própria formação básica que o professor recebe e que nunca está completa. A auto-formação é uma ação continuada e exige uma constante atualização por parte de quem promove curso de formação, mas acima de tudo por parte do próprio professor. 15 Há algumas áreas do conhecimento exigidas para a capacitação do professor de Ensino Religioso. O professor de Ensino Religioso encontra se em um contexto que exige uma constante busca do conhecimento religioso, partindo do princípio de que todo ser humano traz em si uma experiência pessoal. Também é preciso ser conhecedor da sistematização das outras experiências que perpassam a diversidade cultural e que estão presentes no convívio diário de uma sala de aula. O Ensino Religioso não pode ser catequético e muito menos contemplar só o cristianismo. O professor deve conhecer e respeitar as diferentes religiões e manifestações religiosas para conduzir o aluno na busca do transcendente. A comunidade em geral e, em especial, a comunidade escolar devem favorecer o diálogo inter-religioso e contribuir para que ocorra o respeito entre as religiões. Com a alteração da LDB, Lei nº 9.394/96, no seu artigo 33, os educadores de Ensino Religioso sentiram a necessidade de efetivar um componente curricular como parte integrante da formação básica do cidadão: os Parâmetros Curriculares Nacionais do Ensino Religioso (PCNER)16. Foram elaborados por pessoas de várias tradições religiosas, em parceria com educadores, que elaboraram uma proposta pedagógica, tendo como objeto de estudo o fenômeno religioso, sem proselitismo, explicitando seus objetivos, seus eixos organizadores e seu tratamento didático. 15 CARON, Lurdes. Entre Conquistas e Concessões: uma experiência ecumênica em educação religiosa escolar. São Leopoldo: Sinodal, 1997. p. 100. 16 FONAPER. Parâmetros Curriculares do Ensino Religioso. 9 ed. São Paulo: Mundo Mirim, 2009.P.50. 60 3 EIXOS ORGANIZADORES DO CONTEÚDO DO ENSINO RELIGIOSO DA NOVA LDB Cultura e tradições religiosas O fenômeno religioso à luz da razão humana, analisando: a) função e valores da tradição religiosa. b) relação entre tradição religiosa e ética. c) teodiceia. d) tradição religiosa natural e revelada e) existência e destino do ser humano nas diferentes culturas. Conteúdos Conteúdos estabelecidos a partir de: a) Filosofia da tradição religiosa. b) História e tradição religiosa. c) Sociologia e tradição religiosa. d) Psicologia e tradição religiosa. Escrituras Sagradas e/ou Tradições Orais São textos que transmitem uma mensagem do Transcendente, pela revelação, dando origens às tradições. Estão ligados ao ensino, à pregação, à exortação e aos estudos eruditos. Nas tradições religiosas que não possuem o texto sagrado escrito, a transmissão é feita na tradição oral. Conteúdos Conteúdos estabelecidos a partir de: a) Revelação. b) História das narrativas sagradas. c) Contexto cultural. d) Exegese. 61 Teologias Conjunto de afirmações e conhecimentos elaborados pela religião e repassados para os afins sobre o Transcendente, de um modo organizado ou sistematizado. Conteúdos Conteúdo estabelecido a partir de: a) Divindade. b) Verdades de fé. c) Vida além da morte. Ritos Uma série de práticas celebrativas das tradições religiosas que formam um conjunto de: a) Rituais. ● propiciatórios. ● divinatório. ● de mistério. b) símbolos. c) espiritualidades. Conteúdos Conteúdos estabelecidos a partir de: a) Rituais. b) Símbolos. c) Espiritualidades. d) Ethos Forma interior da moral humana em que se realiza o próprio sentido do ser. 62 Conteúdos Conteúdos estabelecidos a partir de: 4 a) Alteridade. b) Valores. c) Limites. 17 CONSIDERAÇÕES FINAIS A implementação do Ensino Religioso no ensino básico nas escolas públicas é um grande desafio. Considerando o processo histórico é quase impossível negar que há um interesse político ou até mesmo das instituições religiosas, como foi ao longo da história. É o caminho mais fácil de desmistificar esse conceito e conhecer todo o processo que o Ensino Religioso percorreu ao longo da história brasileira, pois é o único jeito de ser conhecedor dos avanços e conquistas dessa modalidade ao longo do processo educacional. Torna-se imprescindível o constante estudo dos aspectos históricos e legais da implantação dessa política pública, bem como seus antecedentes, com intuito de dar continuidade à discussão compreendendo as bases que a sustentam numa perspectiva social, ideológica, política e cultural. Os municípios enfrentam muitos desafios para concretizar o ensino religioso nas escolas da rede como o professor capacitado para que possa atender todas as exigências legais, o valorização da disciplina como as demais que fazem parte da base curricular. o Falta em toda comunidade escolar a compreensão da nova proposta do Ensino Religioso. Por conta disso, surge a dificuldade tanto da instituição de ensino, como também das famílias e dos alunos em respeitar o profissional que atua nessa disciplina. 17 FONAPER. Parâmetros curriculares Nacionais do Ensino Religioso. 9.ed. São Paulo: Mundo Mirim, 2009.P.55. 63 A resistência por falta de esclarecimento do que se propõe o Ensino Religioso é um dos maiores desafios das Secretarias de Educação, inclusive a baixa frequência dos alunos. As famílias, por não terem conhecimento da atual conjuntura e do conteúdo da disciplina em questão ou até mesmo por preconceito, fazem opção para que seu filho não frequente as aulas. Além disso, há questionamentos junto aos profissionais e à direção da escola, alegando que não querem que a escola ensine outra religião ao seu filho e que, muito menos, o deixe em dúvida acerca da religião deve seguir. É perceptivo o esforço das Secretarias Educação em oferecer condições para que os professores que querem atuar na disciplina de Ensino Religioso tenham uma capacitação adequada e material didático adequado à nova realidade educacional. O papel do professor de Ensino Religioso não é muito claro na comunidade escolar. É, muitas vezes, confundido com um agente de pastoral. Para toda abertura de evento ou algo parecido, o professor de Ensino Religioso é convidado a fazer um momento de reflexão ou celebração. Ele é automaticamente designado para tal função. Esquecem que qualquer um pode ser designado para preparar este evento, desde que se sinta à vontade para tal, não necessariamente o professor de Ensino Religioso. A universalidade, abordando o respeito à pluralidade religiosa, é o que viabiliza o Ensino Religioso. Até há pouco tempo, esse conceito era formado no leito familiar e só nas igrejas era possível fazer reflexões a respeito, hoje essa situação foi modificada, as escolas se tornaram um espaço privilegiado para realizar tais discussões. A denominação religiosa, com um novo olhar, juntamente com outras entidades civis, quer dar oportunidade a todo indivíduo de refletir sobre as questões fundamentais da existência humana, sem qualquer forma de proselitismo. O Ensino Religioso nos propõe reflexões, incluindo os que optam para uma negação de sua religiosidade, ajuda no esclarecimento de posições, autenticidade na busca da integridade humana, para assumir uma postura de colaboração na construção de uma sociedade melhor. 5 REFERÊNCIAS BRASIL. Lei nº 9.475, de 22 de julho de 1997. Dá nova redação ao art. 33 da Lei n° 9.394, de 20 de dezembro de 1996, que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L9475.htm>. Acesso em: 10 SET. 2011. CARON, Lurdes. Entre Conquistas e Concessões: uma experiência ecumênica em educação religiosa escolar. São Leopoldo: Sinodal, 1997. CARON, Lurdes; GRUPO DE REFLEXÃO SOBRE ENSINO RELIGIOSO. O Ensino Religioso na nova LDB: histórico, exigência, documentários. Petrópolis: Vozes, 1998. FONAPER. Parâmetros Curriculares Nacionais do Ensino Religioso. 9. ed. São Paulo: Mundo Mirim, 2009. JUNGUEIRA, Sérgio Rogério Azevedo. História, legislação e fundamentos do Ensino Religioso. Curitiba: IBPEX, 2008. JUNQUEIRA, Sérgio Rogério Azevedo; WAGNER, Raul. Ensino religioso no Brasil. Curitiba: Champagnat, 2004. RUEDELL. Pedro. Educação Religiosa: fundamentação antropológico-cultural da religião segundo Paul Tillich. São Paulo: Paulinas, 2007. SANTOS, Lucíola Licínio de Castro Paixão. O Ensino Religioso no currículo escolar. Belo Horizonte: Editora Autêntica, 2010. ZIMMERMANN, Roque. Ensino Religioso: uma grande mudança. Brasília, Câmara dos Deputados, Centro de Documentação e Informação, 1998. METODOLOGIA DE PRÁTICA DOS GÊNEROS ORAIS NO ENSINO FUNDAMENTAL Renan Mendonça Ferreira18 RESUMO Este artigo propõe-se a examinar o método de prática e ensino dos gêneros orais em sala de aula por meio da análise de uma atividade descrita em livro didático. O objetivo aqui é promover o resgate da oratória, do debate crítico e saudável, valorizando o estudo da modalidade oral da língua de forma dialética. Palavras-chave: livro didático, oralidade, PCN, dialética. ABSTRACT This article proposes to examine the method of practice and teaching of oral genres in the classroom through the analysis of a lesson described in a schoolbook. The goal is to promote the rescue of oratory and the critical debate, emphasizing the study of the oral language in a dialectical way. Keywords: schoolbook, orality, PCN, dialectic. 18 . ¹ Mestre em Letras, graduado em Comunicação Social e Professor da MULTIVIX -SERRA 1. INTRODUÇÃO A retórica e a oratória sempre foram ferramentas historicamente importantes para o exercício da cidadania, da justiça e da democracia. Na contemporaneidade não poderia ser diferente. A linguagem na sua modalidade oral ainda desempenha um papel de suma relevância nas relações interpessoais, nos meios de comunicação de massa, nas áreas da docência, nos ramos jurídicos, na política, no comércio e em tantos outros. Então por que a oralidade ainda não é trabalhada em sala de aula com o mesmo rigor com que se ensina a construir um texto dissertativo? Os Parâmetros Curriculares Nacionais – doravante PCNs – contemplam em vários momentos de sua redação a importância da linguagem oral e de seu estudo em sala de aula. Apesar disso, é possível averiguar que nas escolas os educadores raramente se lembram de propor estudos da linguagem oral, preferindo trabalhar com a modalidade escrita da linguagem e sempre na sua forma mais tradicional: a gramática normativa. Tal preferência dos professores pode ser talvez uma consequência de fenômenos apontados pelo sociolinguista Marcos Bagno em seus livros “Nada na língua é por acaso: por uma pedagogia da variação linguística” e “Preconceito linguístico: o que é, como se faz”. O preconceito linguístico alimentou o mito de que a fala seria caótica. Com efeito, no senso comum a linguagem oral ainda é vista como se fosse uma modalidade de comunicação inferior à escrita. Por isso se faz necessário lembrar que a modalidade escrita foi, originariamente, uma consequência da modalidade oral, e não o oposto. Também é relevante lembrar que o estudo da oralidade pode auxiliar na melhora da escrita dos alunos, além é claro, de auxiliar no desenvolvimento do raciocínio e promover práticas pedagógicas cognitivistas e principalmente sócio-interacionistas, ambas necessárias para a transmissão de diversos valores humanos, tais como a cidadania. Desde o início da vida escolar, o aluno já manifesta seus anseios por meio da fala. A oralidade, além de ser uma forma de expressão que surge antes da escrita, é também determinante para o sucesso na vida de qualquer indivíduo, seja no exercício de sua identidade, em vida privada, seja no exercício de uma profissão ou de sua cidadania. Os estudantes agraciados com capacidade da fala devem ser capazes de articular discursos adequados às diversas situações do cotidiano. Nesse sentido, cabe aos professores de língua orientar o estudo não só da escrita, como também da língua falada. Por essa razão, a oralidade deve ser exercitada na vida escolar, não apenas informalmente, mas com os devidos critérios que fomentem o desenvolvimento de uma boa oratória, assim como a escrita é exercitada para desenvolver uma boa redação. Um dos fatores decisivos para o desenvolvimento de uma boa expressão oral é conhecer os gêneros orais. Estudá-los e praticá-los com o mesmo rigor aplicado aos gêneros escritos é, contudo, uma prática ainda pouco valorizada nas salas de aula e nos livros didáticos. Todavia é possível encontrar alguns exemplos de exercícios em livros didáticos que trazem essa proposta. Por essas razões, este artigo acadêmico propõe analisar como a modalidade oral da língua portuguesa é trabalhada em livros didáticos e verificar as possibilidades de exercício da oralidade em sala de aula. A análise se fixará no ensino fundamental, que é a fase da vida escolar em que a modalidade oral da língua começa a ganhar nuances de texto formal, e se dará por meio do exame crítico de uma atividade retirada de livro didático. O livro escolhido é “Entre palavras”, de Mauro Ferreira, obra voltada para alunos da 7ª série. O exercício em questão, a ser examinado neste artigo, está presente nas páginas 114 e 115 do referido livro. Ele propõe uma apresentação oral, em grupo, de uma análise de um programa de televisão. Essa proposta de atividade em sala de aula parece remeter ao gênero textual que Bernard Schneuwly e Joaquim Dolz definem como exposição oral. Devido a essa constatação, a obra “Gêneros orais e escritos na escola”, de Bernard Schneuwly, Joaquim Dolz servirá como fundamentação teórica necessária para a redação deste artigo, visto que essa obra propõe métodos para o estudo dos gêneros orais, meios práticos de se trabalhar a oralidade em sala de aula e parâmetros de como o professor pode avaliar a exposição oral feita por seus alunos. 2 ANÁLISE DA TEMÁTICA Os Parâmetros Curriculares Nacionais – PCNs – orientam os professores sobre as necessidades curriculares básicas dos estudantes, as quais devem estar de acordo com as expectativas da sociedade e do estudante. Assim, o estudo de Língua Portuguesa deve promover, dentre outras coisas, a inclusão social e o pleno exercício da cidadania. Para tanto, os PCNs contemplam a diversidade linguística e a multiplicidade de situações e gêneros textuais que ocorrem no meio social. Dentre os seus objetivos gerais, os PCNs voltados para o ensino de Língua Portuguesa no ensino fundamental destacam a importância da divulgação e produção de textos orais e escritos, sem destacar a importância de um sobre o outro, de modo que ambas modalidades são tratadas com igual relevância. Logo, a escola é responsável por promover atividades que possibilitem aos estudantes, segundo os PCNs (BRASIL, 1998, p. 32): [...] utilizar a linguagem na escuta e produção de textos orais e na leitura e produção de textos escritos de modo a atender a múltiplas demandas sociais, responder a diferentes propósitos comunicativos e expressivos, e considerar as diferentes condições de produção do discurso [...]. Além disso, os PCNs destacam a contextualização das atividades escolares. Em outras palavras, elas devem simular situações reais do cotidiano do aluno a fim de prepará-lo para a comunicação em qualquer conjuntura de sua vida, seja como indivíduo ou como membro da sociedade. De acordo com os PCNs (BRASIL, 1998, p. 25): [...] cabe à escola ensinar o aluno a utilizar a linguagem oral no planejamento e realização de apresentações públicas: realização de entrevistas, debates, seminários, apresentações teatrais etc. Trata-se de propor situações didáticas nas quais essas atividades façam sentido de fato [...]. Propor uma atividade didática que faça sentido de fato significa fazer com que ela incida o mais próximo possível de uma situação real. Não basta propor uma atividade oral, é necessário também criar o ambiente para que ela ocorra, além de definir previamente o gênero oral a ser tratado, o público alvo e a situação de comunicação. A proposta de atividade didática constante nas páginas 114 e 115 do livro “Entre palavras”, de Mauro Ferreira, é um bom um exemplo disso. A atividade proposta é um exercício em grupo. Trata-se de uma análise crítica de um programa sensacionalista de TV. Por se tratar de uma análise crítica, a atividade tem por objetivo desenvolver no estudante o senso crítico sobre a língua. Isso requer uma atenção especial do professor, pois será ele quem definirá como a crítica deverá ser conduzida. Todavia, a atividade em questão faz parte de um capítulo no qual a TV já vinha sendo tratada como tema. Nesse capítulo, os alunos viram e debateram sobre os pontos positivos e negativos da televisão e de sua linguagem. De modo que a atividade já aparece contextualizada por intermédio do capítulo no qual ela se insere. O autor do livro didático também tratou de delimitar o gênero oral em questão: exposição oral. A partir dessa delimitação, a atividade começa a ganhar proporções curriculares. O estudo ou prática de um gênero oral está em questão. Contudo, não basta delimitar o gênero, ele precisa ser conhecido pelos alunos. Logo, para que a atividade ganhe de fato essa proporção curricular, o professor deve antes apresentar o gênero a ser trabalhado em sala. Além disso, o professor pode ainda monitorar cada grupo para que as apresentações saiam de acordo com o gênero oral que foi predefinido no enunciado da atividade. Mauro Ferreira ainda sugere vários critérios para a análise de um programa sensacionalista. Tais critérios aparecem listados na página 115. É importante observar que a atividade possui um direcionamento certeiro, logo, cabe ao professor adotar as sugestões ou adaptá-las. Além disso, o autor recomenda que todos os integrantes do grupo participem da apresentação. Permite-se que a exposição oral seja acompanhada de cartazes, mas que as apresentações sejam feitas por meio de fala livre, ou seja, sem leitura de textos. Assim o autor começou a expor o que vem a ser na prática o gênero exposição oral, isto é: falar para um público, no caso a turma; planejar a apresentação, como na sugestão dos cartazes; e usar a modalidade oral da língua, o que difere em muito de uma leitura de um texto escrito. A análise crítica de um programa de televisão é um tipo de atividade que se insere nas propostas dos PCNs, quando eles falam em “... analisar criticamente os diferentes discursos, inclusive o próprio...” (BRASIL, 1998, p. 33). É importante ressaltar a importância de se analisar diferentes discursos, e não apenas aqueles consagrados pela tradição. Os discursos televisivos, publicitários, jornalísticos, entre outros também são relevantes no meio social e devem ser analisados em sala de aula. Além da diversidade de discursos, os PCNs também recomendam que o aluno seja capaz de analisar criticamente o seu próprio discurso. Analisar criticamente o próprio discurso significa ter capacidade de autocrítica. Isso se dará, como sugerem os PCNs na página 33, por meio do desenvolvimento da capacidade de avaliação de textos. Para isso, muito contribuirá, no caso do texto oral, o exercício da exposição oral. Se o professor conseguir conduzir bem essa atividade, ela auxiliará os alunos a desenvolverem essa capacidade de autocrítica não apenas neles mesmos enquanto falantes e expositores, como também nos demais alunos, no papel de interlocutores. É efetivamente essa troca entre locutores e interlocutores, avaliando a oralidade uns dos outros, que desenvolverá nos alunos essa capacidade de analisar criticamente os discursos, inclusive o próprio, pois cada aluno que participa da atividade como expositor, também será em outro momento um interlocutor. Essa troca de papéis ainda contribui para o amadurecimento crítico, a capacidade de abstração e a solidariedade para com o colega que expõe, uma vez que o aluno enquanto parte do auditório pode se imaginar posteriormente como falante, o que restringirá sua crítica para algo construtivo. A crítica construtiva, e não a depreciativa, deve ser o objetivo fundamental da atividade escolar de modo geral. No caso da atividade proposta – a análise de um programa sensacionalista de TV – a crítica poderá apresentar aspectos positivos e negativos da TV, entretanto, a crítica dos alunos enquanto interlocutores dos alunos expositores deve se limitar à crítica construtiva e nunca depreciativa. Cabe ao professor a explanação desses termos. A audição de textos orais é outro tema abordado pelos PCNs. Durante a exposição do texto oral, o professor deve cuidar para que os alunos na função de auditório – e de interlocutores – possam desenvolver a “... identificação de marcas discursivas para o reconhecimento de intenções, valores, preconceitos veiculados no discurso” (BRASIL, 1998, p. 55). A Produção de textos orais, tais como os escritos, requer planejamento prévio, produção sistemática e revisão. O discurso oral ensinado e realizado no espaço da escola, em apresentações de grupo, seminários ou outras atividades curriculares deve seguir critérios e não apenas acontecer acidentalmente. Os PCNs destacam que a produção de textos orais devem contar com o “... planejamento prévio da fala em função da intencionalidade do locutor, das características do receptor, das exigências da situação e dos objetivos estabelecidos” (BRASIL, 1998, p. 58). Tal proposta faz parte da atividade aqui descrita. Quando Mauro Ferreira sugeriu critérios para a análise do programa televisivo e propostas para a apresentação, ele possibilitou que a atividade oral tivesse, como recomendam os PCNs, a “elaboração de esquemas para planejar previamente a exposição” (BRASIL 1998, p. 74). 3 A ORALIDADE O estudo da oralidade implica o estudo dos gêneros orais e sua prática. Conhecer o gênero é conhecer sua finalidade social. Os gêneros orais, tais como os gêneros escritos, possuem finalidades sociais convencionadas. Os PCNs citam gêneros que podem ser trabalhados em sala de aula. Alguns se encontram na literatura, como por exemplo o teatro e a canção; outros na imprensa, como a notícia e a entrevista, outros no campo das ciências, como o seminário; e há ainda a publicidade e propaganda. Mas entre tantas opções, o que o professor deve priorizar? Scheneuwly e Dolz defendem que “Já que o papel da escola é sobretudo o de instruir, mais do que o de educar, em vez de abordarmos os gêneros da vida privada cotidiana, é preciso que nos concentremos no ensino dos gêneros da comunicação pública formal”. (2004, p. 174). De fato, é o que procede também nos PCNs. Todos esses gêneros citados são considerados formais, ou seja, afastados da vida privada e mais voltados para uma função pública, de caráter artístico, científico ou político-econômico. Similarmente ao que acontece numa aula de redação, o professor deve, antes de propor a atividade, explanar sobre o gênero a ser trabalhado e orientar a produção do texto. Para isso, o professor deve contextualizar a atividade, criando uma situação de verossimilhança com a realidade do aluno e da sociedade; além de definir o objeto de estudo, exemplificá-lo e descrever suas características. No caso do gênero exposição oral, o professor deverá explicar as partes constituintes do texto: introdução, justificativa, desenvolvimento dos tópicos e conclusão; para que deste modo o texto oral seja também formal. É aconselhável apresentar um enunciado que defina o gênero a ser estudado. O enunciado pode ser elaborado pelo próprio professor ou ser retirado de um livro. Scheneuwly e Dolz assim definem exposição oral: “A exposição é um discurso que se realiza numa situação de comunicação específica que poderíamos chamar de bipolar, reunindo o orador ou expositor e seu auditório” (2004, p. 217). Todavia, pode ser interessante que a definição não seja dada, e sim que seja elaborada pelos próprios alunos após o final das apresentações de todos os grupos. Essa é uma oportunidade que o professor tem de avaliar a capacidade dos alunos de elaborar um enunciado a partir de uma experiência que eles vivenciaram. Também é uma oportunidade que os alunos têm de participar efetivamente da construção de conhecimento, eliminando assim a relação vertical entre mestre e estudante. Durante as apresentações, o professor provavelmente notará problemas nas exposições de alguns seus alunos, como descrevem Scheneuwly e Dolz (2004, p. 239): A observação das exposições produzidas pelos alunos que não seguiram um ensino específico mostra numerosas dificuldades bem conhecidas pelos professores: ausência de apresentação da situação, de justificativa do tema escolhido e de captação do auditório, ausência de anúncio do plano da exposição. Cabe ao professor dar outra oportunidade para os alunos refazerem sua exposição. Analogamente à confecção de uma redação – na qual se exige o ato de rascunhar, redigir e reescrever – a modalidade oral, quando estudada, também requer esse mesmo compromisso. O professor deve fazer o aluno entender que reapresentar o trabalho não é uma punição e sim um método de aprendizagem. Mas é importante que o professor fique atento. Antes de pedir para o aluno refazer sua apresentação, ele deve justificar as razões para tal e ajudá-lo no aprimoramento de sua explanação. O aluno deve saber que pode contar com a orientação do professor. Aluno e professor devem ver o estudo da modalidade oral como um ensaio, semelhantemente a uma peça de teatro que deve ser ensaiada várias vezes antes de ir ao palco. Analogamente, a explanação oral também requer o mesmo método. Tal esforço será recompensado na avaliação, pois ela não acontecerá necessariamente ao final da atividade, mas durante o seu ensaio. “Essa avaliação deve, assim, servir, como seu nome indica, para colocar em prática um projeto de aprendizagem que permita resolver as dificuldades encontradas pelos alunos” (2004, p. 243). 4 A DIALÉTICA Por se tratar de uma análise crítica de um programa sensacionalista de TV, a atividade proposta possibilita o exercício em sala de aula da consciência crítica dos alunos. E por ser um exercício de natureza oral, ele promoverá o diálogo pedagógico não só entre professor e aluno, mas também entre alunos. Nesse diálogo é importante o professor trabalhar como mediador. Ele não deve tentar conduzir os alunos para certezas, mas levá-los a questionar uns aos outros e questionarem-se a si mesmos. O maniqueísmo, a certeza arrogante, a fala sem disposição de ouvir e compreender o ponto de vista alheio sempre foram a ruína de qualquer debate, tornando o diálogo impossível. O professor deve estar pautado pelo princípio da dialética: tese, antítese e síntese. Isto é, não valorizar apenas os argumentos favoráveis ou apenas os argumentos desfavoráveis, mas ouvir e incentivar todo tipo de argumento desde que sustentados e justificados com racionalidade. A dialética promove uma síntese entre opiniões e formas de pensar, conduzindo os indivíduos à autoreflexão. Portanto, o debate sadio entre alunos que se apresentam e alunos que assistem à apresentação deve ser estimulado nesses termos. Assim, a atividade que inicialmente parece simples, torna-se ainda mais enriquecedora. Não se trata apenas de despertar os alunos para a consciência crítica ao analisar um programa de TV, mas também aprender a argumentar racionalmente expondo e justificando pontos de vista. Com esse critério, a atividade contribuirá muito mais para a formação cívica dos estudantes. Ao praticar a dialética, os jovens estarão mais bem preparados para no futuro exporem suas opiniões, ouvirem e debaterem, evitando a arrogância da certeza maniqueísta. 5 O VALOR DA EDUCAÇÃO E O PAPEL DA LÍNGUA NA FORMAÇÃO CÍVICA Sempre desejamos para a sociedade políticos mais compromissados com o povo, eleitores mais ativos, empresários e sindicatos mais abertos ao diálogo, meios de comunicação mais educativos e democráticos, policiais melhor preparados para ouvir, uma Justiça mais eficaz na mediação de conflitos, enfim, uma sociedade mais solidária e fraternal, uma nação mais unida e inclusiva, um país onde cada um poderá exercer de forma igual a liberdade, sem ferir o direito do próximo. Estes são anseios que jamais poderão ser estabelecidos como ideiais sem que se estabeleça antes uma Educação de qualidade. Esta formará o político, o eleitor, o empresário, o sindicalista, o profissional de comunicação social, o policial e o juiz. Em suma, todos os cargos e profissões – incluindo a de professor – e o exercício da cidadania serão mais bem desempenhados se a Educação de qualidade for a meta principal da sociedade. A família, o meio político e os meios de comunicação de massa devem ter a consciência de que a Educação é o ponto inicial e imprescindível no desenvolvimento do ser humano como sujeito socialmente ativo. A qualidade da Educação o principal quesito a julgar o desenvolvimento de um país. Todos os indivíduos integram a vida política de um país, quer tenham consciência disso ou não. A política acontece ao participar do processo eleitoral, ao ocupar cargos públicos, ao desenvolver atividades no setor privado ou autônomo, ao participar de reuniões de condômino ou centro comunitário, ao tomar parte em movimentos sociais como ONGs, cooperativas etc. Ou seja, toda atividade social é essencialmente política. Todavia, para exercer sua cidadania plena o sujeito socialmente ativo deve estar não apenas presente na política de seu país, mas também consciente dela. Para tanto, é na Educação que ele encontrará as ferramentas para tal exercício de consciência. Vale destacar aqui a importância – muitas vezes menosprezada por uma parte da sociedade – das aulas de História, Geografia, Sociologia, Filosofia, Artes e Literatura, pois são estas as disciplinas que encaminham o indivíduo ao despertar de sua consciência crítica e seu espírito de cidadania. Dado o tema deste artigo, faz-se mister enfatizar neste momento as aulas de Língua Portuguesa e Literatura. Isso porque, além dos estudos gramaticais, elas têm como foco a leitura, compreensão e produção de textos, orais e escritos, de variados gêneros e sobre diversos assuntos. Sendo assim, a comunicação, reflexão e debate são intrínsecos nessas disciplinas e este fato não pode passar despercebido pelo professor em seu planejamento. Nessas disciplinas o estudante terá acesso não só aos aspectos normativos, científicos e filosóficos próprios do estudo da linguagem, mas também a textos diversos que muitas vezes abordam temas de caráter cultural e cívico. Logo, a aula é também um exercício político, uma vez que toda atividade social é uma atividade política. Isto ainda é mais evidente quando o aluno trava contato com textos que abordam problemas sociais como a fome, o racismo, o êxodo rural etc. O professor deve estar atento ao fato de que todo o saber humano é construído pela linguagem, logo, a língua é ferramenta essencial de toda ciência, toda filosofia, toda cultura e toda manifestação política. A língua insere o indivíduo no mundo humanizado e é a partir dela que o sujeito se constrói. Daí a importância imprescindível dessas disciplinas, e no caso da Literatura, sobretudo por esta se relacionar diretamente com a tradição artística e linguística brasileira, contribui profundamente para a formação da consciência cívica. 6 CONSIDERAÇÕES FINAIS Toda a sociedade deveria estar compromissada com os valores que humanidade almeja e expressa, por exemplo, na Declaração Universal dos Direitos Humanos. Mas todos os ideais escritos são distantes na prática quando a capacidade de diálogo é comprometida, isto é, quando as pessoas são incapazes de entender e compreender o ponto de vista alheio, sendo também incapazes de expressar suas opiniões de forma racional. Ideais como a harmonia entre os povos, o respeito à diversidade cultural, a mediação pacífica de conflitos e até a busca da felicidade dependem do diálogo. Por isso, atividades que permitem ao aluno desenvolver-se como orador consciente e interlocutor crítico deveriam cada vez mais ser valorizadas. A atividade proposta por Mauro Ferreira em seu livro está de acordo com os PCNs e pode, se bem trabalhada, produzir ótimos resultados. Para se trabalhar bem uma atividade como essa, é preciso persistência dos alunos e do professor. A exposição oral é um gênero que requer muita prática, portanto, uma única apresentação não bastaria para atender a um padrão elevado de aprendizagem. A repetição da atividade, no entanto, pode produzir além da aquisição de conhecimentos sobre o gênero, muitos outros frutos, como argumentam Scheneuwly e Dolz (2004, p. 243): Ao longo das diferentes oficinas, professores e alunos podem, pois, praticar avaliações reguladoras interativas que permitam valorizar as aquisições dos alunos ou remodelar, em função das constatações feitas, a continuidade do projeto didático. À medida que os alunos são levados frequentemente a trabalhar em grupos, eles também têm a possibilidade de interagir, de se corrigir mutuamente ou de se autocriticar, apoiando-se na observação crítica de um colega. E como já foi apontado pelos PCNs, a análise crítica do próprio discurso é um dos atributos que a escola deve, progressivamente, proporcionar por meio de suas atividades pedagógicas. A autocrítica construtiva e bem intencionada é uma das virtudes que pode levar o aluno ao autoconhecimento, uma vez que o conhecimento não está pronto, ele precisa ser construído dialeticamente a cada dia. 7 REFERÊNCIAS BRASIL. Ministério da Educação e do Desporto. Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs). Brasília, 1998. Disponível em: http://portal.mec.gov.br/seb/arquivos/pdf/portugues.pdf Acesso em: 12 de maio de 2009. FERREIRA, Mauro. Entre palavras. São Paulo: FTD, 1999. SCHENEUWLY, Bernard; DOLZ, Joaquim et all. Gêneros Orais e Escritos na Escola. Tradução e organização de Roxane Rojo e Glaís Sales Cordeiro. Campinas - SP: Mercado de Letras, 2004. A INFLUÊNCIA DA FAMÍLIA NOS PAPÉIS SOCIAIS DESENVOLVIDOS PELAS CRIANÇAS E AS CONSEQUÊNCIAS DISTO NO DESEMPENHO ESCOLAR Graciella Leão do Nascimento Terra¹ Ivana de Oliveira Nascimento¹ Ludmila Lessa Lorenzoni Vaccari¹ RESUMO O trabalho desenvolvido, neste artigo, mostra como a família contribui para o desenvolvimento e desempenho escolar da criança. A psicanálise² e a teoria sóciointeracionista³, puderam elucidar o problema do fracasso escolar sob a ótica da afetividade e da relevante interação entre pais e filhos. A pesquisa revelou que os muitos caminhos percorridos sem sucesso pela família e escola, com o intuito de sanar problemas de dificuldades do aluno poderiam ser resolvidos a partir de uma interação mais afetuosa e respeitosa, entre pais e filhos, alunos e professores. Palavras-Chave: Família, desenvolvimento emocional, desempenho escolar. ABCSTRAT The work developed in this paper shows how the family helps positively or negatively on their children’s schools performance. The psychoanalytic and social interaction theory could elucidate the problem of school failure from the perspective of affectivity and relevant interaction between parents and children. The search revealed that many unsuccessfully wacked paths for the family and school with the intention of solve the problems of the student’s difficulties could be solved; facing made respectful interaction more affectionate between parents and children and teachers. Keywords: Family, emotional development, school performance. ¹ Graduandas em Titulação em Pedagogia – Faculdade Multivix. ² Teoria da personalidade humana, fundamentada no inconsciente e técnicas terapêuticas. ³ A situação do contato entre os elementos do meio não é constrangida e imóvel, mas mutável, e nela as formas e contornos do meio facilmente se modificam. 1 INTRODUÇÃO A pesquisa que envolve este artigo tem como tema a influência da familiar no desenvolvimento emocional e desempenho escolar da criança. O presente estudo considera a criança um ser múltiplo com suas carências e necessidades, que são supridas no decorrer de sua existência, na experimentação e vivencia de diversos ambientes, tendo a família como primeiro referencial. Verificamos na prática escolar que o nível de desenvolvimento do indivíduo se evidencia na maioria das vezes por um único fator, o cognitivo. Diferentes teóricos afirmam que o desenvolvimento da criança deve ser avaliado de maneira mais abrangente. A pesquisa investiga a importância do desenvolvimento emocional dos indivíduos desde sua concepção, passando pelo dia a dia da criança e a forte influência do meio familiar para aquisição de outros saberes relacionados também à vida escolar da criança. Vivemos numa década em que os problemas de aprendizagem não podem ser considerados a partir de uma simples causa. A crença de que muitas crianças não aprendiam porque eram oriundas de famílias pobres ficou para trás. Hoje, isso não justifica a demanda de alunos com problemas de aprendizagem, em escolas públicas e particulares. O número de alunos com dificuldades de aprendizagem cresce de forma alarmante. Verificase que a maioria desses alunos não apresenta nenhum problema passível de tratamento médico ou psicológico diante desta realidade, onde estará o problema? O problema tratado neste artigo enfatiza a seguinte questão: como a família influencia as crianças e as consequências disto no desempenho escolar? Percebe-se então que o desempenho escolar é o resultado de um problema que se vê enraizado em outros territórios que vem sendo estudado por muitos teóricos. A afetividade, a família e a autoestima passaram a ser discutidos como fatores necessários ao bem estar das crianças e serão utilizados para fundamentar a presente pesquisa. Sabemos que a origem social não pode ser descartada como um dos fatores que interferem no desempenho escolar, mas determiná-la como única responsável seria desconsiderar o histórico que hoje se apresenta nas unidades particulares de ensino. O presente trabalho propõe um estudo de caso em instituições privadas, com alunos que apresentam problemas de aprendizagem e que não necessitam de nenhuma outra intervenção, seja médica ou de um atendimento educacional especializado. Considerando que o aluno é parte do processo ensino-aprendizagem, a família e a escola constituem-se como os primeiros canais de socialização da criança, por ser sua primeira referência no início de sua vida. A pesquisa exploratória terá como objetivo o mapeamento e a classificação inicial de fenômenos e eventos, por meio do estudo de caso. Este estudo realizou-se com quatro alunos, que são orientados em aulas particulares e apresentam dificuldades de aprendizagem, como também, com seus respectivos pais e professores. As entrevistas, observações e questionários foram coletados e analisados para que as conclusões sejam realizadas em relação ao problema destacado pela pesquisa. 2 DESENVOLVIMENTO 2.1 FAMÍLIA: O ALICERCE PARA O DESENVOLVIMENTO EMOCIONAL DA CRIANÇA Todos sabem que a primeira estrutura social em que a criança nasce chama-se família, já constituída de valores e formas diferenciadas de relacionamentos. A interação com esse universo acontece nos primeiros anos de vida, inicialmente com o vínculo materno. É a mãe que por meio de seus cuidados ajuda a criança a se formar, delineando sua personalidade a partir das interações que realiza. Porém, com o passar dos anos, a estrutura familiar se modifica, mas muito mais do que a nomenclatura que damos aos novos membros desta nova família, verificamos que o mais relevante nesta mudança está no modo como as pessoas interagem entre si. A intensidade e o significado destas interações nos darão indícios de como essa criança está se formando. Para John Bowlby (2006, p.11) “são inúmeras as fontes que nos dão provas de que a privação do amor materno, na primeira infância, pode ter efeitos duradouros sobre a saúde mental e o desenvolvimento da personalidade nos seres humanos”. O estudo de caso, apresentado neste artigo, retrata uma realidade, a de crianças, que mesmo talentosas e bastante expressivas demonstram apatia e desinteresse no trato escolar. O relacionamento entre pais e filhos acaba se caracterizando pelo distanciamento e cobranças mútuas. No outro extremo teremos a criança com um intelecto excepcional que, apesar de possivelmente talentosa e de grande valor, pode estar extremamente doente, se seu desenvolvimento emocional foi perturbado, estando sujeita a crises psicóticas, apresentando um caráter indigno de confiança, e com poucas probabilidades de vir um dia a cuidar de si mesmo. (WINNICOTT, 1990, p31) A família hoje não é mais vista apenas como uma instituição desintegrada da sociedade. As relações de trabalho se modificaram, levando a mulher a se profissionalizar e buscar o seu reconhecimento profissional e não apenas o ofício materno. Essas mudanças geraram descompassos na educação dos filhos. Quem assumiu a educação das crianças, antes delegada à figura materna, foram as babás, avós e professoras particulares. Esta realidade foi evidenciada em todas as famílias pesquisadas. Segundo Winnicott (2006) as figuras parentais exercem grande influência na construção dos vínculos afetivos, da autoestima, autoconceito e também constroem modelos de relações que são transferidos para outros contextos e momentos de interação social. Por outro lado, se essa formação não for construída com base no afeto, confiança e apego, comportamentos como insegurança, dificuldades de estabelecer e manter vínculos com outras crianças surgirão na vida escolar, gerando situações de desconforto social, além do baixo desempenho escolar. Quando a aprendizagem não se desenvolve conforme o esperado para as crianças, pais e escola definem esse quadro como “dificuldade de aprendizagem”. Crescem as dúvidas quando várias sugestões são dadas e nenhum resultado é alcançado. Inúmeras vezes não encontramos causas fisiológicas para os problemas de aprendizagem, como é o caso de todas as crianças estudadas, entretanto fatores sociais e afetivos exercem influência direta no processo escolar. Um deles estaria diretamente ligado ao desenvolvimento emocional destas crianças no seio familiar. Tais necessidades incluem tanto a dependência como o caminhar do indivíduo em direção à independência. A tarefa consiste em fazer face às necessidades mutantes do indivíduo que cresce, não apenas no sentido de satisfazer a impulsos instintivos, mas também de estar presente para receber as contribuições que são características essenciais da vida humana. (WINNICOTT, 2005, p131) É comum crianças apresentarem problemas de aprendizagem associados às desordens emocionais, como insegurança, baixa autoestima e autoconceito distorcido. A investigação mais abrangente, incluindo núcleo familiar e práticas pedagógicas podem revelar caminhos mais efetivos na reversão do fracasso escolar em busca do desenvolvimento integral do indivíduo. 2. 2. ESTUDO DE CASO O estudo de caso proposto neste trabalho tem um enfoque investigativo, com o propósito de entender a contribuição da afetividade e os laços familiares e sua relevância na formação e no desenvolvimento intelectual da criança. A questão investiga uma professora particular e um grupo de 04 crianças na faixa etária de 08 a 11 anos da rede particular de ensino que foram encaminhadas a um reforço extraescolar, com o intuito de ajudá-los em seu desempenho escolar. A professora particular percebeu no comportamento desses alunos indícios de rebeldia e ao mesmo tempo o descompromisso e apatia com os estudos , contribuindo para investigação do problema. Os depoimentos dos pais, por meio questionários e diálogos indicam uma ausência de cumplicidade com questões que envolvam o desenvolvimento cognitivo das crianças, uma vez que após testarem seus filhos em exames clínicos e psiquiátricos e não sendo detectado nenhum problema de ordem física ou mental, continuam a considerar as causas do baixo desempenho escolar como doença inerente aos seus filhos. As perguntas desta pesquisa, dirigida aos pais, envolviam questões do planejamento da gravidez, passando por renda familiar, convívio social, relações e papeis de cada um em suas famílias e seu relacionamento com a escola. Por meio das respostas obtidas pudemos tecer diferentes comentários acerca do que essas famílias pensam sobre o seu papel e a função da escola na educação de seus filhos. O grupo pesquisado, incluindo pais, crianças e escola se assemelham em grande parte das afirmações. Durante a pesquisa, a figura masculina (pais) demonstrou ausência em relação à vida escolar de seus filhos, exercendo o papel de “autoridade” no lar, e despreocupação com a aprendizagem dos filhos; já as mães, mais presentes na educação de seus filhos, desejavam que esses permanecessem centrados, e capazes de conquistar um bom desempenho escolar. As relações familiares são destoantes, enquanto crianças buscam em seus pais afetividade e carinho, os pais por sua vez, buscam despertar em seus filhos a autonomia, que resulta em a falta de atenção e diálogo. A paternidade e a maternidade são percebidas por práticas de cuidado e zelo. O tempo destinado aos filhos é distante e impessoal. A escola torna-se palco dessas distorções. As crianças, que nesta faixa etária, já deveriam ter conquistado, no seio das relações familiares, segurança e independência, segue sua vida escolar sem ter tido o apoio do elo primário, que deveria ter sido constituído por seus pais ou substitutos. A necessidade vital que tem cada bebê de que alguém facilite os estágios iniciais dos processos de desenvolvimento psicológico, ou desenvolvimento psicossomático, ou, talvez eu deva dizer do desenvolvimento da personalidade mais imatura e absolutamente dependente, depende primordialmente da família. (WINNICOTT, 2006, p 7) As conversas informais, o carinho gratuito, o aconchego do lar parece não ser tão atrativo para pais e filhos quanto a uma ida ao shopping para comprar o último lançamento de um brinquedo, ou ir ao restaurante para comer o prato que o pai ou mãe estavam muito querendo comer. Nas famílias pesquisadas, esta dívida tem gerado angústia, sofrimento, carências que jamais serão pagas sem a efetiva ligação afetiva que deveriam unir os membros de uma família. A criança em seu estágio de desenvolvimento individual quer e precisa de um cuidador. Os pais são os cuidadores à medida que ela cresce. Nos estágios posteriores, compartilhar e cooperar, a criança não quer um cuidador, mas um companheiro. No início ela quer alguém para estar para elas e depois estar com elas. (KELEMAN, 1996, p18) As crianças passavam a maior parte do dia sob os cuidados da empregada ou da avó. Era notória a alegria das crianças quando relatavam que naquele dia teriam alguma atividade mais interativa com seus pais, tornando-se, nesses momentos, mais falantes e solícitos ao estudo proposto. Em nenhum momento da pesquisa as crianças demonstraram descontentamento em ir à escola e sempre apresentaram apreço e respeito por suas professoras. O relacionamento com os colegas era ótimo. Tinham muitos amigos. A escola parecia oportunizá-los a vivência de interações mais estáveis e saudáveis, não encontradas em seus lares. Ao entrevistar a escola, a professora particular dirige a seguinte questão: de que maneira a Instituição de Ensino e seus profissionais poderiam desenvolver habilidades primordiais para o desenvolvimento cognitivo e emocional de seus alunos? O retorno obtido dos dirigentes escolares - pedagogos e professores - indica a falta de compromisso de alguns profissionais com desenvolvimento cognitivo e emocional de seus alunos, seja por não entenderem como responsabilidade da escola o fracasso dos alunos, ou por alegarem falta de estrutura e tempo. Portanto, a orientação dada às famílias dos alunos ditos problemáticos é a de buscarem ajuda extraescolar. Percebemos então, quão contraditórios são os objetivos das famílias e profissionais das instituições escolares, em relação ao grupo de alunos trabalhado. Por um lado, a escola vivendo preocupada em desenvolver o conteúdo programático e as famílias, por sua vez, delegando à escola o desenvolvimento emocional de seus filhos e a formação de valores como, socialização, independência e autonomia. Inúmeros são os indícios de como as funções parentais estão sendo arduamente construídas na rotina familiar, atribulada de afazeres. Filhos pedem atenção, pais sofrem e se culpam por não terem “tempo” de darem esta atenção. A escola também apresenta sua demanda. Querem que os alunos se desenvolvam com autonomia e atinjam as metas esperadas. Se os pais são omissos em suas funções parentais a escola não se considera competente para desenvolver algumas habilidades que promovam a socialização, autonomia, afetividade e respeito, por outro lado, pais que ignoram o acompanhamento sistemático de seus filhos, quando entram no ensino fundamental, consideram que cabe apenas a escola desenvolver as atividades cognitivas ligadas à leitura, escrita, linguagem e cálculos. Segundo Stanley Keleman (1996, p. 20) “É fundamental que as crianças tenham uma mãe ou um pai que se interessem por elas. Na situação fraca, os pais protegem seus próprios interesses na criança” não posso ser forte, determinado ,doador, mas espero que meu filho me preencha nessas qualidades...”. No caso das crianças que estão sendo observadas, a escola tem um papel fundamental, intervindo no tempo e espaço escolar, disparando movimentos que valorizem as diferentes produções, que potencializem as pessoas, que resgatem os talentos e habilidades presentes nela e que contribuam para que alunos e professores se apropriem do espaço escolar, se colocando como atores do processo de produção, conduzindo a escola para um lugar de experiência de aprendizagens, e não apenas de uma única verdade. De acordo com Vigotsky: “Desse ponto de vista toda aprendizagem só é possível na medida em que se baseia no próprio interesse da criança. Outra aprendizagem não existe. Toda a questão consiste no quanto o interesse está orientado na linha do próprio objeto de estudo e não relacionado a influências externas a eles como prêmios, castigos, medos, desejo de agradar, etc.” A afetividade proporciona estímulos positivos em qualquer indivíduo, dando-lhe motivação e confiança na realização de todas as suas tarefas. Os laços afetivos construídos entre professor e aluno são facilitadores de aprendizagens. Pesquisas e estudos científicos já nos forneceram dados de que crianças que apresentam constantes fracassos em sua vida escolar geralmente vêem a escola como um ambiente negativo, que não lhe propicia nenhuma alegria e satisfação, além de se considerarem inferiores aos seus colegas de turma, revelando uma baixa autoestima. A consequência são os fracassos ininterruptos. Permitir que este aluno saia deste círculo vicioso, com inúmeras tentativas mal sucedidas é uma das formas possíveis de contribuir para que a autoconfiança volte a emergir na vida dessas crianças. Vigotsky (2010, p. 146), afirma que: “O aspecto emocional do indivíduo não tem menos importância do que outros aspectos e é objeto de preocupação da educação nas mesmas proporções em que são a inteligência e a vontade de amor pode vir a ser um talento tanto quanto a genialidade, quanto a descoberta do cálculo diferencial. Em ambos os casos o comportamento humano assume formas exclusivas e grandiosas”. 3. CONSIDERAÇÕES FINAIS As famílias e crianças formaram o núcleo e a motivação principal do estudo realizado neste artigo. Referenciais teóricos e experiências anteriores foram utilizadas como suporte para a elucidação do problema, entretanto, a experiência, por meio das relações interpessoais, sentidas e vividas no núcleo familiar foram as mais pertinentes para o desenvolvimento, além das considerações feitas durante todo o processo que ocorreu a mediação entre a professora particular e os alunos envolvidos. Ficou evidenciado, por meio da apreensão de dados, como que o aluno descrente de suas potencialidades, apresenta um quadro de distração, apatia e desinteresse na aquisição de conceitos sistematizados que envolvam resolução de cálculos e problemas. O rótulo de fracassado colocado na criança com dificuldades de aprendizagem, por pais, professores e sociedade, fortalece a crença das crianças não poderem se desenvolver pelas vias “normais“, buscando um diagnóstico médico e retardando ainda mais as estratégias psicopedagógicas que poderiam ser dirigidas a elas. Pelas contingências da vida moderna a independência dos filhos não vem sendo construída com ternura e a segurança advinda dos pais. A independência infantil é o desejo da maioria das famílias modernas, em que pai e mãe estão inseridos no mercado de trabalho e não podem cuidar dos interesses dos filhos. Quando esse processo de independência é precocemente antecipado, crianças se sentem fragilizadas e inseguras, podendo desencadear inúmeros transtornos afetivos e cognitivos, conforme os apresentados na presente pesquisa. Podemos dizer que toda aprendizagem esconde em si aspectos emocionais. A interação entre pais e filhos proporciona relações de confiança e respeito mútuo, condições necessárias ao bom desenvolvimento emocional das crianças e participação saudável frente ao outros convívios sociais, incluindo a escola. As famílias culpam as crianças. A escola culpa a família. O círculo vicioso está formado. Pais culpando seus filhos por serem responsáveis pelos problemas que causaram, em decorrência da falta de interesse, por preguiça ou por menosprezarem os esforços que são neles depositados. Tal constatação prejudica ainda mais a autoestima da criança, resultando em tristeza, irritabilidade e cansaço e, com frequência, desinteresse pelo estudo. Portanto, as emoções que o indivíduo expressa em toda sua vida afetiva, como: medo, raiva, amor, alegria e ciúme e tantas outras experimentadas, são construídas primeiramente por vínculos familiares e posteriormente por outros grupos sociais. O reflexo de como é sentida essa vida afetiva no âmbito familiar torna-se presente no contexto escolar. A escola poderá potencializar os sentimentos negativos ou fortalecer as sensações que dão prazer e satisfação ao indivíduo. O elo entre família e escola se constitui quando as duas passam a construir juntas as estratégias de aceitação, apoio e segurança à criança. Conclue-se então que a família constitui o ambiente social e emocional propício ao desenvolvimento de uma conduta afetiva positiva, tendo por via condutora a interação pais e filhos. Assim, a criança satisfazendo suas necessidades adquire um controle emocional para encarar seus sentimentos e aceitar os demais, em sua convivência fora do núcleo familiar. 4 REFERÊNCIAS BOWLBY l John. Cuidados maternos e saúde mental. Ed. Wmf, 1ª edição, 2006 FRIEDMAN, Howard, e SCHUSTACK, Miriam. Teorias da personalidade: da teoria clássica à moderna. São Paulo: Prentice Hall, 2004 FURTADO, Ana Maria Ribeiro e BORGES, Mariazinha Coqueiro. Dificuldades de aprendizagem. 2007. KELEMAN, Stanley. Amor e vínculos. Uma visão somático-emocional. SP: summus, 1996 VIGOTSKY, L. S. Psicologia pedagógica. 3ª ed. SP: editora Wmf, 2010. WINNICOTT, Donald. A família e o desenvolvimento individual. 3ª ed. São Paulo: Martins Fontes, 2005 ______. Natureza humana. RJ: Imago Ed.,1990 ______. O ambiente e os processos de maturação. Estudos Sobre A Teoria Do Desenvolvimento Emocional. Porto Alegre, Artmed, 1983 ______. Os bebês e suas mães. 3ª ed. São Paulo: Martins Fontes, 2006 KLEIN, Melanie. A Psicanálise De Crianças, RJ: Imago Ed., 1997. Martins Fontes, 2010 PÁDUA, Ivone. Pedagogia do afeto: A Pedagogia Logosófica na sala de aula. RJ: Wak. Ed. 2010 INTEGRAÇÃO DAS TECNOLOGIAS DA INFORMAÇÃO E COMUNICAÇÃO NO CURRÍCULO BÁSICO ESTADUAL DO ESPÍRITO SANTO: DIÁLOGOS COM A PRÁTICA. Gildásio Macedo de Oliveira19 Leoneida Ladeira Rodrigues Macedo20 RESUMO Integração das Tecnologias da Informação e Comunicação no Currículo Básico Estadual do Espírito Santo: diálogos com a prática, apresenta com fulcro no Plano de Desenvolvimento do Espírito Santo 2025 e seus desdobramentos, a política de governo no que tange a educação e a integração da tecnologia para a expansão e melhoria do ensino e aprendizagem, perpassando encaminhamentos e documentos oficiais até chegar ao Currículo Básico das Escolas Estaduais do Espírito Santo implementado em 2009. A pesquisa de cunho bibliográfico tem objetivo de avançar nas discussões/provocações dos documentos normatizadores e levar esse debate para dentro do universo da escola que ainda não conseguiu alcançar e/ou avançou pouco na integração das TICs para potencializar o currículo. Com essa finalidade a pesquisa se ancora nas proposições das Diretrizes Governamentais Educacionais do Estado do Espírito Santo; Ministério da Educação (MEC); Papert (1993); Freire (1996); Delors (2005); Almeida (2005); Prado (2005); Demo (2008); Quartiero (2007); Mori (2011). Palavras-chave: Currículo, integração, TIC, intervenção. ABSTRACT 19 20 Graduando do curso Titulação em Pedagogia da Faculdade Capixaba da Serra - Serravix. Graduanda do curso Titulação em Pedagogia da Faculdade Capixaba da Serra - Serravix. Integration of Information Technology and Communication in the Basic Curriculum State of the Holy Spirit: dialogues with practical features with the fulcrum in the Development Plan of the Holy Spirit 2025 and its aftermath, the government policy regarding education and technology integration for expansion and improvement of teaching and learning, passing referrals and official documents until the Curriculum of Basic Schools State of Espírito Santo implemented in 2009. The research literature has to die in order to advance discussions / provocations of documents and standard-setters bring this debate into the universe of a specific school that has not yet achieved and / or made little progress in the integration of ICT to enhance the curriculum. For this purpose the research is grounded in the propositions of the Government Educational Guidelines of Espirito Santo; Ministry of Education (MEC), Papert (1993), Freire (1996); Delors (2005), Almeida (2005), Prado (2005) , Demo (2008); Quartiero (2007), Mori (2011). Keywords: Curriculum integration, ICT intervention. 1 INTRODUÇÃO Com um mundo conectado, interativo e dinâmico alavancado pela globalização e pelo mercado, as novas tecnologias da informação (TIC) estão cada vez mais presentes e em crescimento exponencial. O que infere ser um fenômeno irreversível. A cada dia novos modos de viver e produzir, nos lançam novos desafios, exacerbados, entre outras coisas, pela pressa das inovações tecnológicas. (DEMO, 2008) Nesse cenário de inovações aceleradas e urgentes, é prioritário ampliar o entendimento sobre a apropriação dessas tecnologias, a partir da perspectiva das suas potencialidades e restrições e do seu uso nos diversos contextos sociais. Com efeito, o Espírito Santo institui em 2006, o desenvolvimento do capital humano como um dos quatro grandes pilares de sustentação para a construção de uma realidade com democratização das oportunidades de crescimento individual e coletivo. (PDES2025, 2006) Em razão da importância do papel da escola na formação dos cidadãos, pensar democratização das oportunidades de crescimento é pensar na escola como mola propulsora do desenvolvimento. Escola essa, que assim como a sociedade inteira, precisa de passar por releituras e resignificados no que tange o aspecto tecnológico. Novas ferramentas tecnológicas adentram o espaço físico e ampliam os limites da escola e por consequência transversaliza suas ações. De tal modo que em 2007 com sanção do decreto 6.300, a presidência da república difunde o Programa Nacional de Tecnologia Educacional (PROINFO) com a incumbência de promover o uso pedagógico das tecnologias de informação e comunicação nas redes públicas de educação básica. Sendo descritos os objetivos bem claros, no parágrafo único do artigo 1º, da presente lei: I - promover o uso pedagógico das tecnologias de informação e comunicação nas escolas de educação básica das redes públicas de ensino urbanas e rurais; II - fomentar a melhoria do processo de ensino e aprendizagem com o uso das tecnologias de informação e comunicação; III - promover a capacitação dos agentes educacionais envolvidos nas ações do Programa; IV - contribuir com a inclusão digital por meio da ampliação do acesso a computadores, da conexão à rede mundial de computadores e de outras tecnologias digitais, beneficiando a comunidade escolar e a população próxima às escolas; V contribuir para a preparação dos jovens e adultos para o mercado de trabalho por meio do uso das tecnologias de informação e comunicação; VI - fomentar a produção nacional de conteúdos digitais educacionais. (BRASIL, MEC, 2007) Além disso, para que o uso das TIC possa contribuir para a educação, se faz necessário compreender o modo como elas são incorporadas à prática pedagógica e identificar se são utilizadas apenas para facilitar um trabalho que poderia ser realizado sem elas ou se o seu uso reflete alterações na própria atividade e na aprendizagem. Essa ação tem como objetivo principal ser um instrumento teórico-metodológico de orientação, intervenção e mudança da realidade, servindo como um elemento integrador e organizador das TIC. 2 DESENVOLVIMENTO 2.1 TEXTO E CONTEXTO Um dos condicionantes mundiais que está acelerando o processo de mudança no mundo em detrimento à globalização e que tende a influenciar diretamente o Espírito Santo em um espaço tempo de 2006-2025, que está destacado no Plano de Desenvolvimento do Espírito Santo (PDES21) 2025 são as emergência e convergência das novas tecnologias: biotecnologia, nanotecnologia, ciências cognitivas e tecnologia da informação. (p.27, grifos meus). Essa mudança, segundo o próprio documento, oferecerá ao Espírito Santo uma enorme possibilidade de trabalho e de inserção externa. Atrelado a esse condicionante mundial, o documento também destaca um importante condicionante nacional que é a universalização das telecomunicações e massificação dos computadores e da Internet, com fortes repercussões sobre a formação do capital humano e o processo produtivo. (ESPÍRITO SANTO, Plano de Desenvolvimento 2025, p.29, grifos meus) O documento vislumbra que em 2025 o sistema educacional capixaba estará entre os mais bem posicionados nos principais sistemas de avaliação educacional do país ganhando destaque crescente em eventos e premiações internacionais. O documento é promissor quando ressalta que, Neste horizonte, o sistema educacional capixaba congregará uma rede de entidades públicas e privadas que experimentam mudanças significativas de estrutura, projetos e sistemas de ensino-aprendizagem, incorporando as mais novas tecnologias sob a orientação de um corpo docente 21 A Sigla PDES não é utilizada e conhecida, ela se faz presente apenas para dar fluidez ao texto. qualificado. (ESPÍRITO SANTO, Plano de Desenvolvimento 2025, grifos meus) Ainda fazendo alusão ao PDES (2025), ele tem como um dos projetos ancoras estruturantes para o desenvolvimento do capital humano e que visa operacionalizar toda a estratégia de transformação da realidade no sentido de visão de futuro, o projeto 1, Gestão e inovação do Sistema Educacional e das escolas. (p.91) No desdobramento do Plano, em 2008, o Governo Estadual apresenta o Plano Estratégico Nova Escola (PENE)22, que em consonância com o PDES 2025, propõe ações e projetos que reafirma a prioridade absoluta à Educação. O secretário de Educação, nesse contexto, era o Sr. Haroldo Côrrea Rocha que já na apresentação do plano deixava evidente em sua fala a inserção e constituição de uma nova escola no Espírito Santo e que, O objetivo maior da proposta é o alcance de “escolas vivas”, com capacidade criativa e inovadora, modernas e atrativas, que na essência tenham como resultado de suas ações a aprendizagem dos alunos. (ESPÍRITO SANTO, Plano Estratégico: Nova Escola, 2008, p.06. grifos meus) Com base na análise do discurso, podemos afirmar que ele ressalta a garantia e inserção das Tecnologias da Informação e da Comunicação nas escolas do Espírito Santo que nos remete a visão de futuro do PDES 2025, já supracitado e que também está em conformidade com Programa Nacional de Tecnologia Educacional (Proinfo)23 do Ministério da Educação (MEC) que ressalta que É, portanto, vital para a sociedade brasileira que a maioria dos indivíduos saiba operar com as novas tecnologias da informação e valer-se destas para resolver problemas, tomar iniciativas e se comunicar. Uma boa forma de se conseguir isto, é usar o computador como prótese da inteligência e ferramenta de investigação, comunicação, construção, representação, verificação, análise, divulgação e produção do conhecimento. E o locus ideal 22 A Sigla PENE não é utilizada e conhecida, ela se faz presente apenas para dar fluidez ao texto A partir de 12 de dezembro de 2007, mediante a criação do decreto n° 6.300, o ProInfo passou a ser Programa Nacional de Tecnologia Educacional, tendo como principal objetivo promover o uso pedagógico das tecnologias de informação e comunicação nas redes públicas de educação básica. 23 para deflagrar um processo dessa natureza é o sistema educacional. (BRASIL, MEC, Diretrizes, 1997, p. 2) Corroborando com os documentos oficiais, o PENE 2008-2011 também estabelecia sua própria meta e visão de futuro mais audaciosa, que era “Em 2011, a educação pública no Espírito Santo será referência nacional em qualidade de ensino e oportunidades de aprendizagem, figurando entre as melhores colocadas do país nas avaliações de resultados.” (p.30) Entretanto, conforme notícia vinculada no dia 14 de agosto de 2012, em um dos maiores portais de notícias do mundo, o G1 da Globo, não foi isso que ocorreu: Segundo os dados, o estado alcançou a nota 4,2, quando a projeção era de 4,3. No último Ideb, em 2009, o índice foi de 4,1. Apesar da melhora, a situação educacional do estado é grave, segundo o cientista político Roberto Simões. “Esses dados do Ideb revelam que o Espírito Santo anda a passos muito lentos com relação a educação, ao contrário do crescimento econômico que é muito veloz. Quando se fala em educação no estado, a lentidão é a tônica, tanto é que nem a meta base é atingida. Sem falar que esse dado avalia os estudantes que estão na escola, ainda temos mais de 35 mil jovens fora delas, a situação é ainda pior”, explica o especialista. (NOSSA, 2012, internet) Validamente, o aspecto de investimento tecnológico nas escolas com o objetivo de impulsionar e potencializar o currículo ainda não surtiu o efeito desejado, e elucidar a discrepância entre o visionário e o real que o Estado do Espírito Santo se encontra é um primeiro passo a seguir para garantir o acesso e integração tecnológica curricular. Segundo Delors (2005 p.162), para falar de "qualidade do ensino" é necessário focar em cinco principais fatores que influenciam na qualidade da escola: a qualidade dos professores, o número de alunos por sala, os materiais de didáticos, a língua de ensino e a reforma dos programas. Em consonância com Delors, focalizamos nos materiais didáticos que são todos os instrumentos necessários para a aprendizagem do aluno, dando ênfase na tecnologia na educação. Entendemos que a Tecnologia da Informação e da Comunicação é um importante fator para consolidação da garantia do direito de aprender dos estudantes. O PENE 2008-2011 trouxe como um dos projetos e ações prioritárias o Sala de Aula Digital com objetivo de melhorar a qualidade do ensino público estadual e das oportunidades de aprendizagem oferecidas aos alunos. No documento diz que o projeto se destina para o, uso de ferramentas tecnológicas digitais visando à melhoria da qualidade da aprendizagem dos alunos. Ações de aquisição e distribuição de equipamentos, uso da internet, formação continuada de professores e pedagogos, realização de pesquisa de campo e publicação de volumes impressos, abordando aspectos teóricos e práticos da utilização de recursos tecnológicos digitais na educação. (ESPÍRITO SANTO, 2008, p.39) Durante todo esse percurso de elaboração do PDES 2025, o seu desdobramento no PENE 2008-2011, paralelamente e já previsto no documento, já havia uma discussão para a Reestruturação Curricular: definição do Currículo básico Comum para o Ensino Fundamental e Médio que, juntamente com projeto Sala de Aula Digital, se consolidava como estratégia para promoção da aprendizagem. Em 2009, após muitos debates e construção coletiva, o Currículo Básico das Escolas do Espírito Santo (CBEE) é exposto à rede estadual para atendimento de aproximadamente 307 mil alunos de todas as instituições de ensino, garantindo que o conteúdo de cada matéria siga uma mesma diretriz. O CBEE garante que 30% do conteúdo sejam para a parte diversificada, o que contempla a identidade local da escola. Importa destacar que foi elaborado tendo como categorias norteadoras do currículo ciência, cultura e trabalho. O documento apresenta a continuidade de uma política governamental traçada e planejada no PDES 2025 e, por consequência, traz no seu texto alguns instrumentos dinamizadores do currículo, dentre ele: Sala de Aula Digital que dispõe de várias ações nele já detalhadas, tais como: ... estagiários, professor dinamizador, capacitação, pesquisa, transdisciplinaridade, PC do professor, TV Multimídia, pendrives, quadro digital interativo e UCA - um computador por aluno. Os professores receberão formação pela importância da aproximação do mundo informatizado com o trabalho escolar remetendo à aplicação de instrumentos diversificados para fins didático-pedagógicos e, com isso, resultando em acréscimos no êxito da prática docente de interação com os alunos durante o processo de construção do conhecimento. (ESPÍRITO SANTO, 2009, p.16) Para que o uso das TIC possa contribuir para a educação é importante compreender o modo como elas são incorporadas à prática pedagógica e identificar se são utilizadas apenas para facilitar um trabalho que poderia ser realizado sem elas ou se o seu uso provoca alterações na própria atividade e na aprendizagem. Para que o professor possa criar situações relevantes com o uso das TIC que proporcionem condições de aprendizagem é necessário tanto levar em conta as necessidades pessoais dos alunos e as características de sua realidade quanto considerar as TIC como instrumentos para pensar e aprender com elas (Papert, 1993) e não centrar as atividades no aprendizado sobre as TIC. No guia de Implementação do Currículo a Subsecretária de Educação Básica e Profissional, coordenadora geral do documento, a Srª Adriana Sperandio se dirige aos educadores de forma coesa e clara: Adequar a escola a seu público atual é torná-la capaz de promover a realização pessoal, a qualificação para um trabalho digno, para a participação social e política, enfim, para uma cidadania plena da totalidade de seus alunos e alunas. Isso indica a necessidade de revisão do projeto pedagógico de muitas escolas que não se renovam há décadas, criadas em outras circunstâncias, para um outro público e para um mundo diferente deste dos nossos dias. (ESPÍRITO SANTO, Guia de implementação, 2009, p.06) Corroborando com essa constatação Demo (2008) completa: Por conta também da pedagogia tradicional, em cujo discurso monótono de inovação não se inclui a própria renovação, os docentes não possuem formação mínima para dar conta das habilidades do século XXI e não recebem, em exercício, formação continuada adequada, a não ser “semanas pedagógicas” repetitivas. No entanto, se fôssemos corretos com as crianças, elas teriam que ser alfabetizadas com computador, pela razão simples de que essa máquina (ou algo similar) vai ser parceira delas pela vida afora, inevitavelmente. Alfabetizar sem computador significa, falando cruamente, atrasar a vida da criança. (DEMO, 2008, p.08) 2.2 FORMAÇÃO CONTINUADA EM SERVIÇO Com efeito, após o Decreto 6.300 o governo federal lança o Programa Nacional de Formação Continuada em Tecnologia Educacional (ProInfo Integrado): é um programa de formação voltada para o uso didático-pedagógico das TIC no cotidiano escolar, articulado à distribuição dos equipamentos tecnológicos nas escolas e à oferta de conteúdos e recursos multimídia e digitais oferecido pelo Portal do Professor, pela TV Escola e DVD Escola, pelo Domínio Público e pelo Banco Internacional de Objetos Educacionais. (SEED/MEC, 2011) As formações oferecidas são: Introdução a Educação Digital (40h); Tecnologias na Educação: ensinando e aprendendo com as TIC (100h), Elaboração de Projetos (40h) e Curso de Especialização de Tecnologias em Educação (400h). Tendo como público alvo os professores e gestores das escolas públicas contempladas ou não com laboratórios de informática, além de técnicos e outros agentes educacionais dos sistemas de ensino responsáveis pelas escolas. Formações todas oferecidas pela Secretaria Estadual de Educação (SEDU) desde 2008. Cabe ressaltar, que na rede estadual de ensino a seleção para as devidas formações ocorreu de forma descentralizada atendendo um universo de professores das mais diversas escolas do estado, inclusive atendendo professores de escolas rurais. 2.3 A ESCOLA FRENTE ÀS TIC’S Seguindo a linha de pensamento, adentramos o universo único e particular, a escola, que é direcionada por seu Projeto Político Pedagógico (PPP), elaborado coletivamente e que deve contemplar as necessidades pessoais dos alunos quanto à realidade local. Nesse espaço é que, verdadeiramente, deve acontecer o direcionamento da integração das TIC para potencializar o currículo. Com base nos resultados das avaliações sistêmicas, podemos mensurar que integração curricular prevista pelo decreto 6.300/2007, desejado no PDES-2025 e contemplado através do programa Sala de aula digital previsto no CBEE não está acontecendo conforme as diretrizes. Nesse sentido, as formas de conceber a articulação entre a tecnologia e a educação devem priorizar os contextos sócio-históricos, buscando-se uma coerência entre as ações planejadas e as escolhas tecnológicas envolvidas, incluindo-se a premissa de entender a educação como um processo tecnológico, permeado de decisões políticas. Com efeito, Quartiero (2007) apresenta algumas constatações sobre como a educação e as novas tecnologias interagem Podemos afirmar, a partir das atuais perspectivas presentes nos estudos sobre a relação entre tecnologia e educação, que, apesar de ser necessário, não se trata tão somente de equipar as escolas com equipamentos e proporcionar a alfabetização tecnológica dos professores e alunos, nem de conectar as escolas às redes telemáticas, mas, sim, de construir projetos pertinentes que atendam às particularidades de cada cultura, aos estilos pedagógicos dos professores reais e não-ideais e que respeitem as especificidades dos campos de conhecimento. (QUARTIERO, 2007, p.10) 3 CONSIDERAÇÕES FINAIS O referencial teórico abordado tem mostrado que as tecnologias podem trazer contribuições significativas ao desenvolvimento do currículo se houver clareza da intencionalidade pedagógica, isto é, se o uso das tecnologias ocorrer integrado a um projeto curricular que se proponha a desenvolver a capacidade de pensar e aprender com tecnologias. Com esse intuito, constata-se que o Espírito Santo possui uma política educacional estratégica e com projeções animadoras. Todavia, atualmente o que foi projetado não se traduz em realidade. O Plano de Desenvolvimento do Espírito Santo 2025 acredita no investimento no potencial humano para alcançar as metas estabelecidas. Em atendimento a essa premissa a SEDU constrói sua própria orientação curricular, o CBEE, que concordamos ser uma significativa conquista para Educação Capixaba. CBEE aguçou enormes expectativas e possibilidades. Dentre essas destacamos o investimento em tecnologia educacional. É fato que o investimento está acontecendo, porém, ainda não se traduziu em resultados esperados por diversos fatores entre os quais podemos destacar as condições de trabalho, infraestrutura e acesso às tecnologias, boa remuneração, gestão de democrática, autonomia e abertura para trabalhar. Entendemos que dentro das ambições do governo existe uma dicotomia enorme entre o projetado e o estabelecido quanto ao aspecto da valorização real do professor. Portanto, não bastam apenas disponibilizar computadores, quadros digitais e demais recursos tecnológicos à escola. Os recursos colaboram, todavia, o uso pedagógico para potencializar o currículo e beneficiar a construção do conhecimento do aluno acontece pelo intermédio do professor, os recursos por si só não produzem conhecimento. Acreditamos que a partir do momento que o professor tiver condições para participar efetivamente das políticas públicas educacionais, talvez, consigamos alcançar o futuro promissor que o Plano de Desenvolvimento do Espirito Santo 2025 sinaliza. Provocando discussões teóricas mais próximas à realidade da escola (professor e aluno) onde todas as discussões deveriam acontecer e por algum motivo ou força misteriosa não acontecem. 4 REFERÊNCIAS ALMEIDA, Maria Elizabeth Bianconcini de. Prática e formação de professores na integração de mídias. Prática pedagógica e formação de professores com projetos: articulação entre conhecimentos, tecnologias e mídias. In: ALMEIDA, Maria Elizabeth B. de & MORAN, José Manuel (orgs). Integração das Tecnologias na Educação. Salto para o Futuro. Secretaria de Educação a Distância: Brasília, Seed, 2005a. p.38-45. Disponível em:http://www.tvebrasil.com.br/salto. Acesso em mar/2012. BRASIL. Decreto n° 6.300, de 12 de Dezembro de 2007. Decreto on-line. Disponível em : http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2007-2010/2007/Decreto/D6300.htm Acesso em: 26 de junho de 2011. BRASIL, Ministério da Educação. Programa de Informática na Educação. ProInfo: Diretrizes. Documento, 1997 Disponível em: http://www.gestaoescolar.diaadia.pr.gov.br/arquivos/File/pdf/proinfo_diretrizes1.pdf Acesso em: 14 nov 2012. __________. Programa Nacional de Tecnologia Educacional - ProInfo. Publicado em 12 dez 2007. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2007-2010/2007/Decreto/D6300.htm Acesso em: 10 dez 2012 DELORS. A educação para o século XXI questões e perspectivas. Trad. Fátima Murad. Porto Alegre: Artmed, 2005. DEMO, Pedro, Habilidades do Século XXI, Boletim Técnico do SENAC, Rio de Janeiro, v. 34, n.2, maio/ago. 2008 ESPÍRITO SANTO (estado). Secretaria da Educação. Plano estratégico: nova escola. Vitória-ES, 2008. Disponível em: http://www.sedu.es.gov.br/download/0505_livro_plano_estrategico.pdf Acesso em: 10 dez 2012. _____________. Secretaria de Estado de Economia e Santo 2025: Plano de desenvolvimento. Vitória-ES, 2006. Planejamento. Espírito Disponível em: http://www.planejamento.es.gov.br/DEFAULT.ASP?ARQ=PLANO_2025 Acesso em: 10 dez 2012. ___________. Espírito Santo (Estado). Secretaria da Educação. Currículo Básico Escola Estadual. Vitória : SEDU, 2009. Disponível em: http://www.educacao.es.gov.br/download/SEDU_Curriculo_Basico_Escola_Estadual.p df Acesso em: 10 dez 2012. ___________. Espírito Santo (Estado). Secretaria da Educação. Guia de implementação. Vitória : SEDU, 2009. (Currículo Básico Escola Estadual) Disponível em: http://www.educacao.es.gov.br/download/SEDU_Curriculo_Basico_Escola_Estadual.p df Acesso em: 10 dez 2012. FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia: Saberes necessários à prática educativa. São Paulo: Paz e terra, 1996.148p MORI, Katia Gonçalves. O currículo social como rede de aprendizagem: educação, redes de aprendizagem e cidadania. In. Tecnologias e currículos: a serviço de quem? 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Para o desenvolvimento deste trabalho foi adotada como metodologia a pesquisa qualitativa, tendo como técnicas de coleta de dados, a observação em campo, o questionário, e a pesquisa documental e bibliográfica. A partir desta, verificou-se que há a necessidade de desenvolver a educação ambiental na comunidade, no sentido de sensibilizar os moradores sobre a importância dos recursos naturais da região. Ressalta-se por fim que os resultados obtidos neste diagnóstico de percepção ambiental, assim como os impactos observados poderiam ser diferentes, caso o bairro fosse dotado de serviços públicos básicos. Graduada em Geografia pela Universidade Federal do Espírito Santo – UFES, pós-graduada em Arte Educação pela Universidade Castelo Branco, pós-graduada em Educação Ambiental pela Faculdade Integrada de Jacarepaguá. 25 Graduada em Geografia pela Universidade Federal do Espírito Santo – UFES. 24 Palavras-chave: Área de Proteção Ambiental, percepção ambiental, educação ambiental. ABSTRACT This research was developed in the Recanto da Sereia quarter, Guarapari city, Espírito Santo State, to diagnosis the community environmental perception in relation to the Environmental Protection Area of Setiba. Although to be inside the limits of this Conservation Area, the quarter suffers with some environmental impacts in disagreement with the category proposes. To the development of this study it was adopted as methodology the qualitative research, data collection techniques, field observation, questionnaire application and documentary and bibliographical research. The research concludes the necessity to increase a community environmental education to sensitize the inhabitants on the importance of the region natural resources. It enhanced out that the diagnosis results of environmental perception and the observed impacts could be different if the quarter were endowed with basic public services. Kay-words: Environmental Protection Area, environmental perception, environmental education. 1. INTRODUÇÃO Desde o aparecimento da espécie humana neste planeta, existe a interação entre homem e meio. O homem sempre modificou o meio natural para satisfazer suas necessidades. No entanto, a revolução cientifica e tecnológica, colaboraram para a rapidez das modificações do meio, e para a universalidade de suas conseqüências. Ao insistir em seu poder de conquista, apoiado no mito de seu domínio sobre a natureza, o homem contribuiu para criar a situação crítica que se apresenta atualmente. As alterações ambientais têm assumido proporções cada vez maiores, repercutindo assim numa crise ambiental de dimensão global. Assim, estudos sobre as relações ser humano e natureza são fundamentais na busca de soluções para a problemática ambiental. Dentre muitas medidas tomadas no sentido de garantir a preservação, melhoria e recuperação do meio ambiente, foi definida pela política Nacional de Meio Ambiente, áreas representativas dos ecossistemas brasileiros para proteção. Desta maneira, uma das formas de minimizar a perda dos ambientes naturais tem sido o estabelecimento de Unidades de Conservação. As Unidades de Conservação são áreas protegidas legalmente, que possuem características naturais consideradas relevantes. Dentre os objetivos das Unidades de Conservação podemos citar: a preservação da biodiversidade; proteção, dos recursos naturais, de espécies raras, vulneráveis e em perigo de extinção; preservação e restauração da diversidade dos ecossistemas naturais, preservação de bancos genéticos e, incentivo ao uso sustentável dos recursos naturais. As Áreas de Proteção Ambiental (APA) são categorias de Unidades de Conservação que possuem atributos naturais importantes para a qualidade de vida da população e restrições quanto ao uso dos seus recursos naturais no intuito de assegurar a sua sustentabilidade. Apesar das imposições legais, as atitudes desenvolvidas por comunidades residentes em APAs muitas vezes trazem consigo implicações ambientais bastante significativas. Dessa forma, escolheu-se trabalhar com o bairro Recanto da Sereia que se encontra totalmente inserido na APA de Setiba – Guarapari - ES, pois é constatada, por vivência pessoal, uma série de problemas ambientais em dissonância com as diretrizes propostas para a categoria desta Unidade de Conservação. Assim, seguindo o pressuposto adotado por Guimarães (2005), de que “a educação ambiental se realizará de forma diferenciada em cada meio para que se adapte às respectivas realidades, trabalhando com seus problemas específicos e soluções próprias em respeito à cultura, aos hábitos, aos aspectos psicológicos, às características biofísicas e socioeconômicas de cada localidade”, pretende-se estudar a relação existente entre a comunidade e o meio. O estudo da percepção ambiental é fundamental para que se possam compreender melhor as inter-relações entre o homem e o ambiente: seus anseios, satisfações, insatisfações, julgamentos e conduta. Na perspectiva de compreender as relações entre o ser humano e a Área de Proteção Ambiental de Setiba, esta pesquisa teve como foco o estudo sobre a percepção ambiental dos moradores do bairro Recanto da Sereia. O objetivo geral do presente trabalho é fazer um diagnóstico de percepção ambiental com os moradores do Bairro Recanto da Sereia. A hipótese formulada nesta pesquisa é a de que as pessoas que residem no local não tem conhecimento sobre a existência da APA e de sua importância ambiental, e por isso, há os agravamentos dos problemas ambientais. 2 DESENVOLVIMENTO 2.1 METODOLOGIA Para o desenvolvimento deste trabalho foi adotada como metodologia a pesquisa qualitativa, tendo como técnicas de coleta de dados, a observação em campo, o questionário, e a pesquisa documental e bibliográfica. A técnica de observação busca conseguir informações e utiliza os sentidos na obtenção de determinados aspectos da realidade. Essa técnica pode ser estruturada e não estruturada, no caso específico deste estudo foram utilizadas as duas. Adotou-se a pesquisa participante, pois houve a real participação do pesquisador com a comunidade, uma vez que o observador pertence à mesma comunidade que investiga. A outra técnica utilizada foi o questionário com questões abertas, fechadas e de múltiplas escolhas. Serviu-se também da pesquisa bibliográfica e documental, o pesquisador fez um levantamento, seleção e leitura apurada do material bibliográfico e documental disponível sobre as pesquisas referentes à educação ambiental, percepção ambiental e unidades de conservação. Em relação à aplicação do questionário foi feita em vários dias, e sempre buscando alcançar moradores de toda a extensão do bairro. A priori pensou-se em aplicar 50 questionários, no entanto, houve a dificuldade de encontrar moradores nas residências deste bairro, uma vez que se observa que a grande maioria dos imóveis são residências de veraneio. Dessa forma, foram aplicados 26 questionários. O questionário abordou assuntos concernentes à percepção, valores e expectativas em relação ao bairro. Foram elaboradas questões sobre a limpeza pública, iluminação, segurança, abastecimento de água, poluição, etc. A Educação Ambiental, segundo DIAS (2004) é considerada um processo permanente pelo quais os indivíduos e a comunidade tomam consciência do seu meio ambiente e adquirem o conhecimento, os valores, as habilidades, as experiências e a determinação que os tornam aptos a agir – individual e coletivamente – e resolver problemas ambientais presentes e futuros. O Tratado de Educação Ambiental para sociedades sustentáveis e responsabilidade global (Rio 92, apud GUIMARÃES, 2005, p.28), que reafirma princípios, planos de ação e diretrizes para a Educação Ambiental, considera-a como: “Um processo de aprendizagem permanente, baseado no respeito a todas as formas de vida. Tal educação afirma valores e ações que contribuem para a transformação humana e social e para a preservação ecológica. Ela estimula a formação de sociedades socialmente justas e ecologicamente equilibradas, que conservam entre si relação de interdependência e diversidade. Isto requer responsabilidade individual e coletiva em níveis local, nacional e planetário.” Dessa forma, a educação ambiental tem a capacidade de propiciar a transformação humana com base na mudança de valores e permite a mudança de hábitos para um agir local a fim de solucionar os problemas concretos do meio humano. A Educação Ambiental dita não-formal está voltada para “a sensibilização da coletividade sobre as questões ambientais e à sua organização e participação na defesa da qualidade do meio ambiente”. (MMA) Em seu parágrafo único, o artigo define que o Poder Público, em níveis federal, estadual e municipal, incentivará dentre outras ações a “sensibilização da sociedade para a importância das unidades de conservação” (inciso IV). De acordo com MILARÉ (2001) a Educação Ambiental não deve estar dissociada do envolvimento democrático das comunidades, cuja proposta deve resultar de um trabalho conjunto em busca da solução das problemáticas sócio-ambientais locais. “A educação ambiental deve realizar-se com a participação democrática da população. A questão ambiental é altamente política, e seu equacionamento exige a interferência de cada cidadão no debate e nas decisões. Não se trata, portanto, de impor modelos aos cidadãos, como em uma prática de cooptação da sociedade para que se adapte à vontade dos órgãos do Estado ou do poder econômico, mas de conclamá-los à participação consciente, no gerenciamento de questões que lhes dizem respeito, individual e coletivamente. Trata-se, conseqüentemente, de um processo educativo a ser realizado com a comunidade, e não para a comunidade, até porque na situação ensino-aprendizagem adequadamente estruturada a pessoa é sujeito e não objeto da ação educativa.” É importante que a educação ambiental busque desenvolver nas pessoas o sentido de responsabilidade e solidariedade para com meio ambiente. Despertando nos indivíduos o interesse em participar de um processo ativo no sentido de resolver os problemas dentro de um contexto de realidades específicas, e dessa forma, contribuir para a construção de um futuro melhor. A solução de problemas concretos do meio ambiente requer da educação ambiental não só o desenvolvimento de conhecimentos e técnicas, mas também de uma prática comunitária, pois é na vida diária da coletividade, e em face aos problemas, que os indivíduos e grupos sociais se interessam pela qualidade do meio ambiente, procurando conservá-la e melhorá-la. Para o IBAMA (2002, p.44), uma vez resolvidos problemas próprios de uma comunidade, conseguiríamos alcançar a melhoria do meio ambiente de unidades mais amplas, como um país ou uma região, ou seja, os problemas globais nada mais são do que a soma de problemas particulares. Nesse sentido, a educação ambiental, na comunidade, tem por finalidade “formar cidadãos capazes de compreender e assumir suas responsabilidades com relação ao meio ambiente, e por outro lado, despertar a sensibilidade dos diversos grupos da população para os problemas que permeiam os ecossistemas e o meio sociocultural em que vivem” (IBAMA, 2002, p.64). LIMA, em 1999, já ressaltava a importância de se desenvolver a relação entre o meio ambiente e a cidadania, fortalecendo-se a consciência de que o ambiente é um patrimônio público comum e sua defesa um dever político de todos os cidadãos. O Artigo 225 da Constituição Federal de 1988 (BRASIL, 1988) define que todos têm direito ao meio ambiente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações. Entende-se dessa forma, que sendo o meio ambiente um patrimônio público, é uma questão de cidadania que as pessoas o defendam e preservem para as gerações seguintes. Além do dever de defender e preservar o meio ambiente, as pessoas têm o direito de usufruir de um ambiente saudável e equilibrado, e para que esse direito seja garantido, é necessário que as pessoas tenham espírito crítico para que possam avaliar a qualidade do meio ambiente e exigir do poder público e da sociedade a melhoria contínua dessa qualidade. Conforme IBAMA (2002, p.65), a educação ambiental deve contribuir para a formação de cidadãos capazes de julgar a qualidade dos serviços públicos como: saneamento, segurança, habitação, educação, locais de recreação, saúde etc. “Em resumo, trata-se de dotar os cidadãos de espírito critico e, ao mesmo tempo, faze-los apoiar as medidas ambientais que realmente atendam às suas necessidades e aos desejos de melhorar a qualidade do meio ambiente e da sua própria existência”. Dessa forma, a educação ambiental deve estar na comunidade, pois é na vida diária da coletividade e em face de seus problemas que os indivíduos e grupos sociais se interessam pela qualidade do meio ambiente, procurando conservá-la e melhorá-la. “Assim, esse tipo de educação poderá desempenhar um papel essencial na prevenção e solução dos problemas ambientais. Mas é evidente que o esforço educativo não surtirá todos os seus efeitos se não forem também considerados vários fatores importantes como, por exemplo, uma legislação adequada, medidas para zelar pela plena aplicação das leis, a ação dos meios de comunicação social etc. esse conjunto de fatores deve agir no mesmo sentido, e de forma coerente, de modo a contribuir eficazmente para a melhoria do meio ambiente” (IBAMA, 2002, p. 31). No entanto, é necessário diagnosticar que leitura a comunidade faz do ambiente onde ela vivi, ou seja, qual é a percepção ambiental dessa comunidade, como ela interage com o meio ambiente. De acordo Paulo Freire apud OLIVEIRA (2006, p. 86) “a leitura do mundo precede a leitura da palavra, daí que a posterior leitura desta não possa prescindir da continuidade da leitura daquele”. Antes mesmo de aprendermos as primeiras letras, nossa primeira leitura é a do ambiente. A percepção ambiental é uma atividade mental de interação do indivíduo com o meio ambiente, que ocorre através de mecanismos perceptivos propriamente ditos e, principalmente, cognitivos. Os mecanismos perceptivos são dirigidos por estímulos externos captados pelos cinco sentidos. Os cognitivos são aqueles que compreendem a contribuição da inteligência, pois a mente não funciona apenas a partir dos sentidos e nem recebe as sensações passivamente. Existem contribuições do homem ao processo perceptivo, que são os mecanismos cognitivos, incluindo motivações, humores, necessidades, conhecimentos, valores, julgamentos e expectativas. Assim, a mente organiza e representa a realidade percebida através de esquemas perceptivos e imagens mentais, com atributos específicos (UFSCAR, 2000). O espaço percebido está relacionado com o espaço vivido, e ambos são fases do espaço mental, produzido, portanto, a partir de uma experiência vivida e percebida ao longo do tempo e do espaço. Segundo Lefebvre (apud NOGUEIRA, 1994, p.62), “o espaço mental é percebido, concebido e representado”. Este percebido é concebido no dia a dia, na produção da vida material a partir das experiências e histórias da vida e conhecimento adquirido. TUAN (1980) considera que o espaço pode ser percebido pelas suas características visuais, sonoras e táteis e que o pensamento humano é um elemento importantíssimo a ser considerado. Este mesmo espaço pode ser sentido quando há a possibilidade de tocálo, aspirar a sua fragrância, descriminar seus elementos, assim como pode ser concebido através desta experiência e de seus símbolos e mitos, por meio de uma generalização da mente. Os homens que produzem o espaço não são todos iguais, são únicos, e cada um se relaciona de maneira diferente com o espaço, pois o percebem distintamente, e é por esse motivo que alguns pesquisadores passaram a valorizar cada vez mais os sentimentos e as idéias das pessoas acerca do espaço experenciado, direta ou indiretamente. Desta forma, indagam-se sobre os sentimentos, as aspirações e valores criados a partir da relação homem-natureza. A percepção é uma comunicação entre o “(...) nosso corpo, o corpo dos outros sujeitos e os corpos das coisas (...)” (CHAUÍ, 1995, p.123). Trata-se de uma compreensão holística da relação ser humano-ambiente, onde “(...) todo o ambiente que envolve o ser humano, seja físico, social, psicológico ou até mesmo imaginário, influencia a percepção e a conduta” (DEL RIO & OLIVEIRA, 1996). As interações entre ser humano e ambiente estão diretamente relacionadas às percepções, aos processos cognitivos, julgamentos e expectativas de cada indivíduo. Desse modo, o estudo da percepção ambiental é fundamental para compreensão das inter-relações entre ser humano e meio ambiente, suas expectativas e condutas. Segundo a recomendação n° 21 da Conferencia de Tbilisi, em relação à pesquisa, é recomendada a todos os estados-membros que realizem pesquisas sobre: III) “conhecimentos e atitudes dos indivíduos, com o objetivo de estabelecer, com mais exatidão, as condições pedagógicas mais eficazes, os tipos de ação a serem desenvolvidos pelos professores e os processos de assimilação do conhecimento por parte dos educandos, bem como os obstáculos que se opõem à mudança dos conceitos, valores e atitudes das pessoas, inerentes ao comportamento ambiental.” (IBAMA, 2002, p.125). Vale ressaltar que o Bairro Recanto da Sereia tem uma especificidade importante, pois está totalmente inserido numa Área de Proteção Ambiental (APA) que é uma categoria de Unidade de Conservação. Em seu artigo 2º, o Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza (SNUC) define oficialmente as Unidades de Conservação como: “Espaço territorial e seus recursos ambientais, incluindo as águas jurisdicionais, com características naturais relevantes, legalmente instituído pelo Poder Público, com objetivos de conservação e limites definidos, sob regime especial de administração, ao qual se aplicam garantias adequadas de proteção.” A categoria de APA está inserida na Unidade de Uso Sustentável, que objetiva compatibilizar a conservação da natureza com o uso sustentável de parcela dos seus recursos naturais, e conforme o SNUC, a APA “é uma área em geral extensa, com certo grau de ocupação humana, dotada de atributos abióticos, bióticos, estéticos ou culturais especialmente importantes para a qualidade de vida e o bem-estar das populações humanas, e tem como objetivos básicos proteger a diversidade biológica, disciplinar o processo de ocupação e assegurar a sustentabilidade do uso dos recursos naturais. Pode ser constituídas por terras públicas e privadas”. Nesse sentido, a partir da percepção ambiental busca-se entender a lógica que rege as relações estabelecidas pela comunidade do Recanto da Sereia com o bairro e a unidade de conservação para dessa forma, desenvolver atividades educativas condizentes com a realidade local. 2.3 RESULTADOS E DISCUSSÃO A maior parte dos moradores abordados nesta pesquisa 38% mora no bairro de 0 a 5 anos, 33% mora de 5 a 10 anos, 25% mora no bairro de 10 a 20 anos e 4% mora no bairro a mais de 30 anos. Interpelados sobre a poluição do ar, o abastecimento de água e a iluminação pública, a maior parte dos moradores pesquisados (96%) considera que no bairro não existe poluição do ar e nem falta de água (69%). No que se refere à iluminação pública (73%) considera suficiente. No entanto, observa-se in loco que vários postes estão com lâmpadas queimadas, e há relato de um morador pesquisado de que existe muita demora na reposição destas. Grande parte das pessoas pesquisadas (62%) está insatisfeita com a coleta de lixo. Dentre os motivos para a insatisfação está na irregularidade dos dias e horários da coleta. Devido a essa irregularidade, muito lixo fica exposto vários dias na rua a espera da coleta, propiciando a geração de pontos viciados de lixo e a proliferação de roedores e insetos. Alguns moradores tomam a iniciativa de incinerar os seus resíduos sólidos. A maioria dos pesquisados (34%) considera que a responsabilidade por zelar pelo bairro é dos moradores e do poder público, enquanto (30%) diz que a responsabilidade é exclusiva dos moradores. A praia é o que a maioria dos pesquisados mais gosta no bairro (39%), ficando em segundo lugar (35%) a tranqüilidade. Dentre os problemas do bairro citados, a ausência de pavimentação é o principal (22%), seguido da falta de saneamento básico (18%), falta de escolas (9%) e outros. Outros problemas foram mencionados, porém com menor freqüência, como: calha na divisa do PEPCV com o bairro, infra-estrutura, falta de drenagem, ausência de médico no posto de saúde, ausência de segurança pública, falta de comércio, pernilongo e caramujo africano, falta de serviços públicos (correio, agência bancária etc.), disposição inadequada de lixo (ruas, praia), degradação ambiental, queima de lixo nas ruas, dificuldade de manutenção nos postes de energia, muito cachorro solto nas ruas, lama nas ruas, terrenos abandonados, falta de interesse dos governantes, sistema de transporte precário. A precária organização do poder público, ausência de infraestrutura básica ou a insuficiente prestação destes serviços no bairro percebidos e denunciados pelos moradores, pode ser uma das causas de alguns dos impactos observados no bairro. Na tentativa de suprir a ausência do poder público, os moradores tentam alternativas próprias para a solução das carências. Justificando assim, a queima do lixo, o acúmulo de lixo em locais inapropriados, a utilização de fossas sépticas, abertura de valetas nas ruas para escoamento de águas pluviais. Questionados de que forma poderiam colaborar para a conservação do bairro, 9 pessoas responderam depositando o lixo em locais próprios, 3 pessoas responderam que colaborariam fazendo parte da Associação de moradores, 2 não poluindo a praia, 2 economizando água e energia, 2 participando de reuniões, 2 evitando colocar o lixo na rua nos dias que o caminhão não passa, 1 vistoriando o bairro, 1 realizando a limpeza da praia, 1 não destruindo as árvores, 2 não sabem. Embora alguns dos pesquisados tenham respondido com iniciativas de cunho pessoal (economia de água e energia, não poluir a praia), observa-se também, que outros moradores dão indícios do inicio de uma organização mais atenta à coletividade (participação em reuniões, vistoria do bairro, participação da associação de moradores, realização da limpeza da praia). Quando perguntados o que precisaria mudar no bairro para melhorar a qualidade de vida dos moradores, 16 pessoas responderam que seria necessária a pavimentação das ruas, 11 ter escolas públicas, 7 ter segurança pública, 5 ter posto de saúde com médicos, 4 ter mais comércio, 4 ter Área de lazer, 3 ter praças, 3 melhorar o sistema de transporte, 3 ter um correio, 3 ter saneamento básico, 3 ter rede de esgoto e 2 pessoas responderam ter coleta de lixo mais frequente. Nesta questão, verifica-se que a maioria dos moradores se refere à necessidade de infraestrutura. Isso talvez aconteça pelo fato do bairro ser carente em serviços públicos, ficando dessa forma, as questões ambientais relegadas a segundo plano. No entanto, observa-se também, que outros pesquisados dão indícios do inicio de uma atenção às questões voltadas à preservação, educação ambiental e à organização comunitária. Questionados se sabem o que é uma Área de Proteção Ambiental (APA), 62% responderam que sim e 38% responderam que não. Em relação ao conhecimento da importância da criação e implantação da Unidade de Conservação, observa-se que a maioria dos pesquisados (10) não sabe qual é a importância de uma APA, enquanto os demais pesquisados têm conhecimento de alguns dos escopos desta Unidade de Conservação. Em algumas respostas fica evidente a fragilidade do entendimento que os moradores tem em relação ao que é meio ambiente. Ao dizer que “a APA é importante, pois preserva muitas espécies como plantas e animais”, os pesquisados não estão se considerando como parte integrante do meio ambiente. Ao dizer que “APA é importante para a conservação da natureza e dos animais”, o morador está entendendo a natureza como composta exclusivamente da flora, excluindo a fauna, os seres humanos, os recursos naturais, etc. Ele não considerou o sentido amplo do termo natureza. Ao responder que “a APA é um complemento para a vida saudável da sociedade”, o morador não dá a devida importância à questão ambiental como primordial à sobrevivência da espécie humana. Ainda em relação ao contexto do Bairro Recanto da Sereia em função da APA, mesmo não sendo assimilada a importância desta categoria de Unidade de Conservação, a maioria dos pesquisados (65%), respondeu que a localidade se insere em uma Área de Proteção Ambiental, sendo que a minoria (12%) não tem este conhecimento. No entanto, o pesquisador observou em campo que as pessoas confundem a APA de Setiba com o Parque Estadual Paulo César Vinha, acreditando corresponder à mesma categoria de unidade de conservação. Dessa forma, as respostas acima podem não estar condizendo com a realidade. Os pesquisados demonstraram interesse em fazer um curso de Meio Ambiente se fosse ofertado no bairro. A maioria dos pesquisados (68%) tem interesse em fazer qualquer curso na área ambiental, (12%) se interessa por curso sobre proteção da natureza, (2%) gostaria de fazer curso de artesanato e (12%) se interessa por outros cursos como: “equilíbrio do meio ambiente”, “preservação e recuperação de restinga” e sobre “biologia marinha”. É relevante destacar a fragilidade do conhecimento que os moradores desta comunidade têm acerca das questões ambientais. 3 CONSIDERAÇÕES FINAIS A rigor partindo dos objetivos deste trabalho e da definição do instrumento investigativo, chegou-se a várias conclusões que farão parte destas considerações finais. É notório diante das respostas obtidas no questionário, como também da observação em campo, que há a necessidade de educação ambiental com os moradores. Diante disto, ressalta-se a existência de uma grande lacuna dos órgãos responsáveis, no sentido de fomentar ações educativas que visem à sensibilização da sociedade para a importância das unidades de conservação, para uma convivência mais harmônica do homem em seu meio. É interessante também ressaltar que os resultados obtidos neste diagnóstico de percepção ambiental, assim como os impactos observados poderiam ser diferentes, caso o bairro fosse dotado de serviços públicos básicos. Ou seja, muitos dos impactos hoje existentes nesta comunidade são causados pela falta de infraestrutura básica e não somente pela ausência de educação ambiental. Os moradores foram capazes de julgar a qualidade dos serviços públicos como: saneamento, segurança, educação, locais de recreação, saúde etc. Há uma forte reivindicação por parte dos pesquisados por uma melhor infraestrutura e serviços básicos de atendimento à população. É extremamente positivo o fato dos pesquisados se sentirem responsáveis pela conservação do bairro, pois é um passo para a participação comunitária, no sentido de buscar soluções para os problemas de sua realidade, para a melhoria da qualidade do meio ambiente e para a construção de um futuro melhor. Sugere-se o uso de entrevista como instrumento de pesquisa nos trabalhos de percepção ambiental, pois através dela é possível obter informações sobre aspectos do imaginário individual que por outros métodos, como por exemplo, os questionários são mais difíceis de serem atingidos. Se por um lado a percepção limitada dos pesquisados pode trazer enquanto conseqüências a deflagração de impactos negativos na APA, a falta de infraestrutura também pode está corroborando esses impactos. Desta forma a hipótese inicial não pode ser confirmada e nem negada. Assim, futuramente esse trabalho poderá contribuir para uma proposta de educação ambiental voltada para as especificidades do bairro diagnosticadas através das percepções dos moradores, como também fornecer subsídios para a tomada de decisão pública ante aos problemas ambientais verificados. 4 REFERÊNCIAS BRASIL. 1988. Constituição Federal do Brasil de 1988. CEPEMAR – Serviços de Consultoria em Meio Ambiente Ltda. Plano de Manejo do Parque Estadual Paulo César Vinha. 2008. CD-ROM. __________. Plano de Manejo da Área de Proteção Ambiental Paulo César Vinha. 2008. CD-ROM. CHAUÍ, M. Espinosa: Uma filosofia da liberdade. São Paulo. Ed. Moderna,1995. CONAMA - Conselho Nacional do Meio Ambiente. Resolução n° 303/02. Dispõe sobre parâmetros, definições e limites de Áreas de Preservação Permanente. Brasília, SEMA, 2002. DEL RIO, V. “Desenho urbano e revitalização na área portuária do Rio de Janeiro: a contribuição do estudo da Percepção Ambiental”. Tese de Doutorado, Faculdade de Arquitetura e Urbanismo – USP. São Paulo, 1991. DEL RIO, V & OLIVEIRA, L. de (Org.) Percepção ambiental: a experiência brasileira. São Paulo: Studio Nobel; São Carlos, SP: Universidade Federal de São Carlos. 1996. 288p. DIAS, Genebaldo Freire. Educação ambiental: princípios e praticas. 9.ed. São Paulo: Gaia, 2004. ESPÍRITO SANTO (Estado). Instituto Estadual de Meio Ambiente e Recursos Hídricos. 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Brasília: MMA/SBF, 2004. _____ Política Nacional de Educação Ambiental, Lei N° 9.795, de 27 de abril de 1999. Educação Ambiental. 2008. Disponível em: http://www.mma.gov.br. NOGUEIRA, Amélia Regina Batista. Mapa Mental: recurso didático no ensino de geografia no 1 grau. 207p. Dissertação (mestrado) – USP, São Paulo, 1994. OLIVEIRA, Eliísio Márcio de. Educação Ambiental uma possível abordagem. 3. ed. Brasília: Ed. IBAMA, 2006. 143p. SANCHEZ, Sandra. Instrumentos da Pesquisa Qualitativa. Programa de Pósgraduação em Educação Agrícola. Disponível em <http://www.ufrj.br>. Acessado em 20 de setembro de 2008. SANTOS, Flavia Elanea. Percepção ambiental do moradores do entorno e visitantes do Parque municipal Gruta da Onça – Vitória / ES: uma reserva ecológica urbana em foco. Monografia (Curso de pós-graduação em ecologia e recursos naturais). Universidade Federal do Espírito Santo, Vitória, 2001. TUAN, Yi-Fu. Topofilia: um estudo da percepção, atitudes e valores do meio ambiente. 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Quais? ______________________________________________________________________ _____ 4) Em relação ao bairro Recanto da Sereia, responda: a) Há poluição sonora? ( ) sim ( ) não b) Há poluição do ar? ( ) sim ( ) não c) Há freqüente falta de água? ( ) sim ( ) não d) A iluminação pública é: ( ) suficiente ( ) insuficiente e) Há segurança pública? ( ) sim ( )não 5) Sobre o serviço de coleta de lixo em seu bairro, responda: a) A coleta de lixo acontece diariamente? ( ) sim ( ) não b) Você sabe o horário da coleta de lixo? ( ) sim ( ) não c) Você está satisfeito com a coleta de lixo? ( ) sim ( ) não 6) O que precisa mudar no seu bairro para melhorar a qualidade de vida dos moradores? ______________________________________________________________________ _____ 7) De que maneira você poderia colaborar para a conservação do seu bairro? ______________________________________________________________________ _____ 8) Em sua opinião, de quem é a responsabilidade de zelar pelo bairro? ( ) Governo Federal ( ) Governo Estadual ( ) Sociedade e Poder Público ( ) Governo Municipal ( ) Todos os moradores 9) Você sabe o que é uma Área de Proteção Ambiental (APA)? ( ) sim ( ) não 10) Qual é a importância de uma Área de Proteção Ambiental? ______________________________________________________________________ _____ 11) Seu bairro está localizado dentro de uma Área de Proteção Ambiental? ( ) sim ( ) não ( ) não sabe 12) Se fosse ofertado um curso de Meio Ambiente no seu bairro, você teria interesse em participar? ( )Sim ( ) Não. Qual?__________________________________________________________________ ____ SUGESTÕES: ______________________________________________________________________ ______________________________________________________________________ __________ MENSURAÇÃO DO MONTANTE DAS DOAÇÕES PARA AS INSTITUIÇÕES DENOMINADAS TERCEIRO SETOR SOB O ASPECTO PERCEPTIVO E ECONÔMICO DOS PAIS E DAS MÃES QUE TEM SEUS FILHOS ATENDIDOS POR ESTAS ENTIDADES Sebastião Francisco Loss Franzini26 RESUMO 26 Professor da Multivix-Serra . Este estudo verificou as doações para as Instituições denominadas terceiro setor sob o aspecto perceptivo e econômico dos pais e das mães que tem seus filhos assistidos por estas entidades; investigou as ações desenvolvidas pelas APAE’s (Associação de Pais e Amigos dos Exepcionais) nos municípios de Cariacica, Vila Velha e Serra ES, destacando a peculiaridade e a complexidade que assume no contexto de Terceiro Setor. Procurou conhecer os dilemas e desafios enfrentados por estas entidades no dia a dia, e as soluções até hoje por elas encontrada, sobretudo no que se refere à prestação de serviços especiais e assistenciais de forma voluntária. Para finalizar, faz-se uma reflexão sobre a importância e necessidade dessas Entidades para as comunidades carentes, seus valores e a possibilidade de contribuição para o conhecimento sobre serviços especiais e a possível renovação destas organizações no contexto contemporâneo. Palavras-Chave: Terceiro Setor, Doações, Percepção dos membros das Famílias, Serviços Voluntários. ABSTRACT This study examined donations to institutions under the so-called third sector and economic perceptual feature of the fathers and mothers who have their children assisted by these entities; it investigated the actions taken by APAE `S (Association of Parents and Friends of Exceptional Children) in the cities of Cariacica, Vila Velha and Serra ES, highlighting the uniqueness and complexity that they assume in the context of the third sector. We sought to understand the dilemmas and challenges faced by these entities day by day, and the solutions found by them today, especially with regard to the provision of special services and assistance voluntarily. Finally, it is a reflection on the importance and need for these entities to underserved communities, their values and the possibility of contribution to the knowledge of special services and the possible renewal of these organizations in the contemporary context. Keywords: Third sector, Donations, Awareness of family members, Volunteers services. 1 Introdução As Instituições denominadas Terceiro Setor, são compostas por organizações sem fins lucrativos. Criadas e mantidas por doações voluntárias, não dirigidas por órgão governamental, com o objetivo de atender às comunidades carentes com prática tradicional de caridade. (FERNADES, 1997. Fernandes (1997) defende ainda que, estas Instituições sejam formadas por Associações ou Fundações Privadas não governamentais, que surgiram com a promessa de renovar o espaço público, estabelecendo-se junto à sociedade civil organizada, buscando a participação de profissionais voluntários, para atender interesses comuns dentro da sociedade. Para Tenório (2001) embora estas Entidades denominadas Terceiro Setor não sejam Entidades vinculadas ao estado, elas revestem-se de caráter público na medida em que procuram se dedicar a resolver problemas sociais e que, embora sejam sociedades civis privadas, estas organizações não têm por objetivo a lucratividade, pois todo seu serviço prestado às comunidades não têm objetivo de lucro, é um serviço prestado de forma assistencial. O trabalho prestado de forma assistencial vem expandindo seu sentido por diversas áreas sociais, incorporando um conceito de cidadania em diversas partes da sociedade civil organizada, amparando e dando assistência à população carente. (FERNANDES, 1997). A Constituição federal em seu artigo 213 destina recursos para as Instituições sem fins lucrativos, para atenderem as necessidades da sociedade, assim estas Instituições ganharam compreensão e fortalecimento dentro da conjuntura social, econômica e política e puderam assim configurar seu crescimento no cenário atual. Rits (2006) destaca que, o fenômeno de crescimento de serviços prestados de foram assistencial pelas Instituições denominadas Terceiro Setor é mundial, o Terceiro Setor é hoje a oitava força econômica mundial, movimentando 1,1 trilhões de dólares por ano, gerando 10,4 milhões de empregos. Rits (2006) enfatiza ainda que, no Brasil existem 250 mil Entidades que prestam serviços de forma assistencial e, que essas Instituições estão empregando 1,5 milhões pessoas conta ainda com 12 milhões de voluntários e com um movimento de 12 bilhões de reais por ano na economia. Este crescimento é percebido pelos membros da sociedade como uma solução para resolver problemas socias, podendo assim diminuir a exclusão social e construir uma sociedade mais justa. (COELHO, 2000). A percepção dos membros de uma sociedade tem que ser vista com atenção, pois o principal papel destas organizações é gerar aos seus usuários e doadores continuidade de seus serviços. (KHALIFA, 2004). 2 Referencial Teórico 2.1 CONCEITUANDO O TERCEIRO SETOR De acordo com Ferreira et al. (2006), as organizações denominadas Terceiro Setor prestam serviços assistenciais em várias áreas sociais: preservação ambiental, cultura, direitos humanos e cidadania. Este mesmo autor ainda destaca que isto só é possível devido ao grande número de pessoas que se colocam à disposição para trabalhar de forma voluntária e aos doadores, que não medem esforços na hora de contribuir. Segundo Paes (2001), o termo Terceiro Setor possui diversas formas de ser interpretado, no entanto, a principal característica é estar sempre em busca do desenvolvimento econômico da sociedade na prestação de serviços voluntários. Paes (2001) destaca ainda que, as Instituições denominadas Terceiro Setor podem ser consideradas como um conjunto de entidades, organizações ou instituições dotadas de total autonomia e administração própria, apresentando como função e objetivo principal uma atuação voluntária junto aos membros de uma sociedade civil ou de uma comunidade, visando o bem estar social de todos. Para Cardoso (2000), a autonomia a ação voluntária e a administração destas entidades estão diretamente ligadas às seguintes características: Uma nova esfera pública, nem privada nem governamental; Constituídas por pessoas autônomas, formando uma associação em benefício do interesse comum das comunidades; Com grande participação de empresas privadas e órgãos governamentais; Salamon (2000), define tratar-se também de: Um conjunto de valores que privilegia a iniciativa individual, a auto-expressão, a solidariedade e a ajuda mútua; Um conjunto de instituições e entidades organizadas que vêm apresentando uma força econômica mais acentuada e considerável nas últimas duas décadas, abrangendo países industrializados, e também países de economias emergentes. Segundo Salamon (2000), as Instituições denominadas Terceiro Setor são importantes pelos serviços prestados voluntariamente e, no desenvolvimento do progresso econômico e assistencial de uma comunidade. Salamon (2000) enfatiza que, estas entidades constituem-se como alvo de toda uma variedade de mitos, diferenças ideológicas e interpretações muitas vezes errôneas, que ameaçam o processo de atendimento assistencial e limita o papel das Instituições denominadas Terceiro Setor no desenvolvimento de seus serviços junto aos membros de uma comunidade. Fernandes (2000) destaca que, podem-se classificar as entidades denominadas Terceiro Setor como organizações que não são públicas e nem privadas, mas que procuram relacionar-se em parceria com os demais setores. primeiro (Estado); e segundo (Iniciativa Privada), sendo que o principal objetivo são ações de cunho social em caráter coletivo. Ainda segundo Fernandes (2000), solidariedade compaixão amor ao próximo e compromisso são expressões das pessoas por meio de serviços voluntários, ou mesmo remuneradas. Estas ações são desenvolvidas pelas entidades denominadas ONG’s, que não visam lucratividade, mas a produção de bens públicos e o bem estar social. 2.1.1 A IMPORTÂNCIA DAS ENTIDADES DO TERCEIRO SETOR PARA A SOCIEDADE Para Offe (1999) as entidades do Terceiro Setor servem de elo para manter a união entre os diferentes interesses de uma comunidade dentro de uma identidade social clara e justa. Camargo (2001) destaca que, as comunidades podem ser consideradas uma das molas que impulsionam as entidades denominadas Terceiro Setor, como um ecletismo do ambiente político-econômico, fazendo a ligação entre o Estado, a iniciativa privada e os cidadãos, no que tange às questões da melhoria social. Desta forma, verifica-se a importância das entidades denominadas Terceiro Setor; sua existência pode ser justificada pela busca na redução dos problemas sociais e ambientais. Em que a sociedade civil reunida é a principal força atuante, suas ações têm efeitos complementares (CAMARGO, 2001). Ainda segundo Camargo (2001), esta força não é de substituição ao Estado, uma vez que sua essência está na construção de parcerias, para criar uma sociedade nova e com força, onde todos os membros são agentes transformadores e atuantes. Cardoso (2000) destaca que é possível que a noção de “Terceiro Setor” venha a seguir o mesmo caminho histórico que um dia foi seguido pela noção de “Terceiro Mundo”. Instituições sem credibilidade e condições de cumprir seus objetivos. Cardoso (2000) enfatiza ainda que, hoje é possível dizer que vivenciamos uma etapa em que estas entidades estão se firmando na sociedade, o que pode-se considerar uma novidade, a qual implica enfatizar sua autonomia, força e relevância dentro das comunidades. 2.1.2 COMO FUNCIONAM AS ORGANIZAÇÕES DO TERCEIRO SETOR De acordo com Kisil (2000), as organizações denominadas Terceiro Setor desempenham um papel intermediário, ligando o cidadão comum às entidades e organizações que podem participar da solução de problemas identificados pela sociedade. Kisil (2000) observa ainda que, se por um lado tais entidades procuram fornecer algum tipo de serviço aos membros da comunidade, por outro, têm que procurar fundos para patrocinar seus programas em diferentes fontes de financiamento, na comunidade, na iniciativa privada e no governo. Corulloón (2002) assinala que, mesmo com poucos investimentos por parte do Estado e da iniciativa privada, as Instituições denominadas Terceiro Setor, a partir da década de 1990, têm crescido de forma visível, tanto em estrutura, participação de pessoas, prestando serviços voluntários, e também em doações. Para Drucker (2001), além do crescimento estrutural, incluindo-se doadores e pessoas voluntárias, cresceu também o espaço destas entidades na mídia. A sociedade está reorganizando sua visão de mundo, sua forma de pensar e agir, exigindo seus valores básicos e fazendo com que sua estrutura social e política, suas artes e suas principais instituições evoluam. As organizações denominadas Terceiro Setor estão sendo cada vez mais importantes e exigidas, conforme cresce a necessidade dos cidadãos. No dizer de Franco (2000) o crescimento das necessidades em serviços especiais faz com que as instituições do Terceiro Setor venham desenvolver as seguintes características: Maior aproximação entre Entidade e cidadão, melhor chances de oferecer serviços que a população necessita e não somente aqueles oferecidos pelo Estado; Melhoria na agilidade, ainda que haja estruturas funcionando de forma reduzida, elas continuam ágeis e não submetidas aos rigores legais que o Estado apresenta; As ações autossustentáveis podem, ao mesmo tempo, minimizar os impactos dos processos de exclusão social e permitir o desenvolvimento de novas formas de sociabilidade, contrapondo-se a uma dinâmica social geralmente guiada por um regime econômico capitalista. (CARCANHOLO, 1997) e (DOWBER, 1997). Mintzberg (1996) defende que, além de serem guiadas por um regime econômico capitalista e impulsionadas pelas comunidades, as instituições denominadas Terceiro Setor também são vistas pela sociedade como a constituição de um espaço que pode requalificar o cidadão de forma relevante, na medida em que as atividades comunitárias crescem e permitem que o trabalhador possa desenvolver suas habilidades relevantes para o trabalho nos setores privado e público estatal. De acordo com Borger (2001), as organizações denominadas Terceiro Setor têm, em sua engrenagem as peças fundamentais para um bom desempenho funcional, entre os quais está o amor ao próximo, a caridade e o compromisso. Esta forma de solidariedade pode desenvolver diferentes papéis em sua relação com o primeiro setor (Estado) e o segundo setor (Iniciativa Privada), perante os membros da sociedade. Para Neto (2001), estas entidades formam entre si uma extensa rede de solidariedade social. É onde o cidadão pode encontrar a solidariedade sem interesse. Por exemplo, o cidadão desempregado pode receber cursos promovidos por Instituições que estão buscando a recondução das pessoas ao mercado de trabalho, podendo encontrar também assistência médica, odontológica e escola. 3 Metodologia 3.1 CLASSIFICAÇÕES DA PESQUISA E INSTRUMENTOS DE COLETA DE DADOS Esta pesquisa foi dividida em duas fases, a primeira fase tem características qualitativas. De acordo com Creswell (2007), para uma pesquisa qualitativa é necessário conhecer a população dentro de um cenário natural. Desta forma, o pesquisador qualitativo vai ao encontro (na casa, no escritório ou em uma entidade) do participante para que possa ser conduzida a pesquisa. Esta forma permite ao pesquisador desenvolver um nível detalhado sobre a pessoa pesquisada. Assim, o primeiro passo desta pesquisa foi a identificação do público. Após a identificação foram elaboradas entrevistas com oito Pais e oito Mães que têm seus filhos assistidos pela APAE de Cariacica, oito Pais e oito Mães que têm seus filhos assistidos pela APAE da Serra e oito Pais e oito Mães que tem seus filhos assistidos pela APAE de Vila Velha. Esta amostra corresponde a aproximadamente 10% (dez por cento) dos pais e das mães que tem seus filhos assistidos pelas APAE’s nestes municípios e, foram elaboradas nos meses de julho, agosto e setembro de 2009 pelo próprio entrevistador na residência dos 24 pais e 24 mães entrevistados. A escolha das famílias entrevistadas foi feita de forma aleatória. As entrevistas seguiram um roteiro semi-estruturado com a finalidade de identificar atributos relevantes na percepção dos pais e das mães quanto à qualidade dos serviços prestados e a imagem das APAE’s nos municípios de Cariacica, Serra e Vila Velha. Os atributos identificados foram listados para posterior mensuração. O roteiro desta entrevista foi adaptado à realidade das APAE’s está inserido nesta pesquisa, e apresentado no quadro 2: When you think of (inductor term), how important do you consider these itens are: 1 Personal well being in the workplace Not A little More or less Quite Very 2 Personal Professional and Acceptance suggestions, Important Important Important Important 1 2 3 4 5 Not A little More or less Quite Very Important Important Important Important Important 1 2 3 4 Not A little More or less Quite Very Important Important Important Important Important 1 2 3 4 5 valorization of employees 3 Important ideas, of and criticisms When you think of (inductor term), how satisfied are you with: 1 Personal wellbeing in Not A little More or less Quite Very Important Important Important Important Important 1 2 3 4 5 Not A little More or less Quite Very Important Important Important Important Important 1 2 3 4 5 Not A little More or less Quite Very Important Important Important Important Important 1 2 3 4 5 the workplace 2 Personal Professional and valorization of employees 3 Acceptance suggestions, criticisms ideas, of and Quadro 1: Trabalho original SHULLER M. (2004, pg. 47) GERAL: 1 – Quando eu digo APAE, qual a primeira coisa que lhe vem à mente? 2 – Existem outras idéias que lhe vem à mente quando você ouve a palavra APAE? 2.1 – Outras idéias à mente que te caracterize APAE? COGNITIVA: as características, os serviços, sua importância para a comunidade. 3 – Como você descreve a APAE? 4 – Quais os benefícios que você obteve até hoje com a APAE? SENSORIAL: sensações que permanecem na 5 – Quais as sensações que a APAE lembra você? memória, de contatos anteriores com a Entidade. SIMBÓLICA: que relaciona os serviços com 6 – O que significa a APAE para você? a imagem e outras idéias, que possam se aproximar. EMOCIONAL: impressões emocionais que 7 – Quais os sentimentos que lhe vem à mente quando permanecem eu digo APAE? na memória, de contatos anteriores com a Entidade. 8 – Onde você buscou informação sobre a APAE? Quadro 2: Roteiro de entrevistas. Fonte: Schuler (2004, p. 47). Nota: Adaptado pelo autor. O roteiro desta primeira fase teve por objetivo conhecer, identificar e listar, os principais atributos em comum com todos os pais e as mães que têm seus filhos assistidos pelas APAE’s nos municípios de Cariacica, Serra e Vila Velha. A segunda fase desta pesquisa teve características quantitativas. De acordo com Minayo (1993), pesquisa quantitativa geralmente é elaborada por meio de um roteiro ou questionário. As respostas devem ser registradas para posteriormente serem analisadas e mensuradas. Seguindo esta orientação e com os atributos identificados na primeira etapa da pesquisa, elaborou-se um questionário para coleta dos dados quantitativos. O questionário foi aplicado aos 244 pais e 244 mães que tinham seus filhos assistidos pelas APAE’s nos meses de junho de 2009 a janeiro de 2010 nos municípios de Cariacica, Serra e Vila Velha. Foram escolhidos estes municípios, onde as APAE’s têm as mesmas estruturas físicas e atendem basicamente o mesmo número de usuários. Contando com 5 (cinco) possíveis notas alternativas, onde os 244 Pais e as 244 Mães que tem seus filhos assistidos pelas APAE’s nos municípios de Cariacica, Serra e Vila Velha, puderam avaliar estas Instituições dando notas que variavam de 1 a 5 a cada atributo identificado na fase das entrevistas. As respostas foram construídas na forma de anonimato onde os 244 pais e as 244 mães não tinham a necessidade de se identificar. Todo o processo das entrevistas e os questionários foram acompanhados pelas assistentes social voluntárias das APAE’s em cada município, para garantir a qualidade de toda coleta de dados. Esta coleta foi realizada nos meses de outubro, novembro e dezembro de 2009 e janeiro de 2010. A supervisão foi realizada pelo pesquisador juntamente com as assistentes sociais voluntárias para evitar respostas tendenciosas. Os 244 pais e as 244 mães puderam responder os questionários nas dependências da própria APAE ou em suas residências. O questionário encontra-se em anexo neste trabalho, todas as respostas foram registradas em uma tabela para mensuração, conforme planejamento desta coleta de dados. 4 APRESENTAÇÃO DOS DADOS Os atributos a seguir são provenientes da pesquisa documental que foi realizada junto às APAE’s nos municípios de Cariacica, Serra e Vila Velha, das entrevistas realizadas com 24 pais e 24 mães que tem seus filhos atendidos por estas entidades, e estão apresentados no quadro 3. Números Atributos Freqüência 1 Ajuda 12,71 % 2 Carinho 12,28 % 3 Amor 11,93 % 4 Dedicação 9,16 % 5 Sentimento ao próximo 8,30 % 6 Informação 7,09 % 7 Compromisso 7,09 % 8 Bom trabalho / Atendimento 6,40 % 9 Amizade 4,84 % 10 Família 3,46 % 11 Confiança 2,94 % 12 Apoio 1,90 % 13 Religião 1,55 % 14 Compreensão 1,55 % 15 União 1,55 % 16 Alegria 1,38 % 17 Paz 1,21 % 18 Sinceridade 1,21 % 19 Felicidade 1,21 % 20 Fidelidade 1,21 % 21 Bons profissionais 1,03 % Quadro 3: Lista de Atributos comuns entre os pais e as mães entrevistados, e a freqüência de citações em que eles se destacaram. Fonte: Dados das entrevistas. Amizade, Família, Confiança, Religião, Alegria. Geral: Cognitiva: as características, os Informação, Compromisso, Bom trabalho/atendimento, serviços, sua importância para a Apoio, Fidelidade, Bons profissionais. comunidade. Sensorial: sensações que Sentimento ao próximo, União, Felicidade. permanecem na memória, de contatos anteriores com a Entidade. Simbólica: que relaciona os Dedicação, Sinceridade. serviços com a imagem e outras idéias, que possam se aproximar. Emocional: impressões Ajuda, Carinho, Amor, Compreensão, Paz. emocionais que permanecem na memória, de contatos anteriores com a Entidade. Quadro 4: Conciliação dos Atributos referentes ao Quadro 1. Fonte: Dados das entrevistas. Após as entrevistas, encontraram-se vinte e um atributos relacionados no Quadro 3. Esses atributos foram levados em consideração no roteiro das entrevistas do Quadro 2, conforme descritos no Quadro 4: De acordo com Godoy (2006), cognição é o ato ou processo de conhecimento, que pode envolver atenção, percepção, memória, raciocínio, juízo, imaginação, pensamento e linguagem, é uma forma pela qual pode haver uma visão única por um grupo de indivíduos, e o aprendizado pode, assim dar-se pelo conhecimento rápido de um serviço ou objeto. De acordo com Baddini (2004), a análise sensorial é um meio que se destina a avaliar a aceitação de um produto ou serviço, pela preferência de seus consumidores ou usuários. Com base na análise sensorial de cada indivíduo, a Instituição pode medir sua aceitação na comunidade onde está inserida. Para Duran (1988), simbologia é a forma de se interpretar, é a arte de criar símbolos, em todas as sociedades os seres humanos podem expressar seus sentimentos, mitos, crenças, fatos, situações ou idéias através de símbolos, é uma forma de representar a realidade. É através da representação simbólica que os seres humanos podem se apropriar do mundo. Ekman (1988), afirma que, a emoção é uma experiência subjetiva, que pode estar associada ao comportamento, temperamento, personalidade, emoção e motivação de cada pessoa. 4.1 ANÁLISE DOS RELATÓRIOS 4.1.1 RELATÓRIOS ESTATÍSTICOS Após a coleta dos dados, qualitativos e quantitativos, foram formados dois grupos, sendo o primeiro grupo com as variáveis da estratificação das famílias encontradas na fase das entrevistas, e o segundo grupo formado pelos atributos em comum entre as famílias pesquisadas. O presente estudo teve como objetivo identificar os fatores que influenciam no valor das doações destinadas as APAE’s. Para realização do mesmo foram coletados dados das famílias dos usuários de seus serviços por meio de um questionário estruturado. Foram aplicados 488 questionários no período de outubro, novembro e dezembro de 2009 e janeiro de 2010. Como se trata de um questionário extenso, com 21 (vinte e uma) perguntas, pode-se dividir em dois grupos: (i) Atributos e (ii) Não Atributos. Esta divisão facilitará a interpretação dos resultados obtidos. De acordo com Hair (2005) a divisão dos grupos pode tornar a estatística mais simples, no entanto seus resultados tornam-se mais consistentes para análise. 4.2 ESTATÍSTICAS DESCRITIVAS De acordo com Silva et. al. (1999) a estatística descritiva tem por objetivo principal descrever uma coleta de dados, apresentando informações sobre média, proporções, tendências, taxas e Coeficientes, podendo assim, facilitar a descrição dos fenômenos observados. Ainda segundo Silva et. al. (1999) enfatiza que, as informações sendo bem apresentadas através de tabelas ou gráficos podem ser mais facilmente compreendidas pelos leitores. Tabela 1 – Estatísticas Descritivas das Variáveis Não-Atributos Desvio Descrição N Média Padrão Mínimo Máximo Q1 Q2 Q3 Idade 488 36,97 8,94 20 80 29 37 42 488 2.752,89 1.586,09 780,00 12.400,00 1.832,50 2.000,00 3.737,50 doação 488 121,72 64,12 50,00 500,00 50,00 120,00 150,00 Eventos 488 3,22 1,81 1 10 2 3 4 Renda dos doadores Valor Fonte: Dados da Pesquisa. Conforme Tabela 1, dos 244 pais e 244 mães que tem seus filhos assistidos pelas APAE’s em Cariacica, Serra e Vila Velha tem média de idade de 36,97 anos com um desvio padrão de 8,94, sendo o mais novo (a) com 20 anos de idade e o mais velho (a) com 80 anos, a Renda destes doadores é em média R$ 2.752,89 com um desvio padrão de R$ 1.586,09 destes doadores a renda mínima é de R$ 780,00 por mês e o doador mais bem remunerado recebe R$ 12.400,00 por mês, as doações tem média de R$ 121,72 com desvio padrão de R$ 64,12 sendo a doação mínima de R$ 50,00 e a Máxima de R$ 500,00, a elaboração de eventos tem média de 3,22, desvio padrão de 1,81 sendo que o menor evento é 1 e o máximo 10. Tabela 2 – Estatísticas Descritivas de Variáveis Atributos Desvio Descrição N Ajuda Média Padrão Mínimo Máximo Q1 Q2 Q3 488 4,93 0,29 3 5 5 5 5 Carinho 488 4,97 0,22 3 5 5 5 5 Amor 488 4,97 0,22 3 5 5 5 5 Dedicação 488 4,95 0,27 3 5 5 5 5 Sentimento ao Próximo 488 4,91 0,37 3 5 5 5 5 Informação 488 4,89 0,40 3 5 5 5 5 Compromisso 488 4,93 0,31 3 5 5 5 5 Bom Trabalho/Atendimento 488 4,93 0,32 3 5 5 5 5 Amizade 488 4,89 0,39 3 5 5 5 5 Família 488 4,93 0,32 3 5 5 5 5 Confiança 488 4,94 0,31 3 5 5 5 5 Apoio 488 4,94 0,29 3 5 5 5 5 Religião 488 4,92 0,34 3 5 5 5 5 Compreensão 488 4,96 0,26 3 5 5 5 5 União 488 4,95 0,28 3 5 5 5 5 Alegria 488 4,94 0,31 3 5 5 5 5 Paz 488 4,96 0,24 3 5 5 5 5 Sinceridade 488 4,93 0,30 3 5 5 5 5 Felicidade 488 4,95 0,28 3 5 5 5 5 Fidelidade 488 4,92 0,33 3 5 5 5 5 Bons Profissionais 488 4,94 0,28 3 5 5 5 5 Fonte: Dados da Pesquisa. Na Tabela 2 estão descritos os atributos em comum entre as famílias entrevistas, estes atributos estão relacionados pela ordem de freqüência que cada um foi citado no momento das entrevistas. As variáveis para percepção dos atributos foram mensuradas por notas que variavam de 1 a 5, para a interpretação dos resultados foram utilizadas estatísticas descritivas, pois neste caso esta variável é quantitativa discreta, e também tabelas de freqüências para complementação do estudo da distribuição das respostas registradas no questionário. 4.3 TESTE DO ALFA DE CRONBACH Foi elaborado o teste do Alfa de Cronbach para verificar a confiabilidade do questionário, de acordo com Hair (2005) o Alfa de Cronbach assume um valor de no máximo 1.0, sendo que este valor se aproximar muito de zero o questionário perde o efeito, como o resultado foi de 0,555 pode-se afirmar que o questionário está em um excelente nível de confiabilidade. Resumo de Processamento de Caso N % Casos Válidos 487 99,8 1 ,2 488 100,0 Excluídos Total Confiabilidade Estatística Cronbach’s Alpha Número de Termos ,555 21 Quadro 5: Teste do Alfa de Crombach Tabela 3 – Tabela de Freqüência Moradia das Famílias Moradia Freqüência % Não própria 20 8,19 Própria 224 91,81 Total 244 100,00 Fonte: Dados da Pesquisa. A Tabela 3 apresenta como estão morando os doadores destas Instituições, observou-se que das 244 famílias de doadores 20 não moram em casa própria (8,19%) enquanto que 224 têm residência própria (91,81%), como moradia foi significante para as doações pode-se observar que quem mora em casa própria tem melhores condições de doação. Tabela 4 – Tabela de Freqüência de moradia por Município Município Freqüência % Não Cariacica 161 65,98 Cariacica 83 34,02 Total 244 100,00 Fonte: Dados da Pesquisa. Na Tabela 4, mostra que das 244 famílias que tem seus filhos assistidos por estas Instituições 161 (65,98%) não estão residindo no município de Cariacica, neste município reside apenas 83 família de doadores correspondendo a (34,02%) Tabela 5 – Freqüência de Formação dos maridos Formação Freqüência % Fundamental 23 9,43 Ensino Médio 102 41,80 Ensino Superior 119 48,77 Total 244 100,00 Fonte: Dados da Pesquisa. Na Tabela 5, está demonstrada a formação dos maridos doadores sendo que apenas 23 maridos (9,43%) têm apenas o ensino fundamental, a freqüência com ensino médio é 102 maridos (41,80%) e com ensino superior 119 maridos (48,77%), formação foi item significante para as doações conforme Tabela 9, como está destacado que a formação está de ensino médio para superior caracteriza que quem tem melhor formação tem também melhor percepção pelos serviços prestados por estas entidades. Tabela 6 – Tabela de Número de Filhos por Famílias N. Filhos Freqüência % 1 192 78,69 2 37 15,37 3 11 4,30 4 6 1,23 5 1 0,41 Total 244 100,00 Fonte: Dados da pesquisa. De acordo com a Tabela 6, das 244 famílias que tem seus filhos assistidos por estas Instituições 192 tem apenas um filho (78,69%), 37 com dois filhos (15,37%), 11 com três filhos (4,30%), 3com quatro filhos (1,23%) e 1 com cinco filhos (0,41%), foi percebido nesta pesquisa que as famílias quando tem o primeiro filho com necessidades especiais ficam com medo de ter um segundo filho o que demonstra o motivo pelo qual 78,69% dos entrevistados e questionados possuírem apenas um filho Tabela 7 - Elaboração de Eventos Eventos Freqüência % Não 167 34,22 Sim 321 65,78 Total 488 100,00 Fonte: Dados da Pesquisa. A Tabela 7 demonstra a freqüência da elaboração de eventos sendo que 167 (34,22%) responderam não à elaboração de eventos para angariar recursos para a Instituição e 321 (65,78%) pessoas responderam sim elaboram algum tipo de evento com a finalidade de angariar recursos para a Instituição. O item eventos foi significante no momento de doar, as pessoas que por algum motivo não conseguem elaborar eventos para a instituição, de alguma forma tem a preocupação de fazerem melhores doações para a mesma, como forma de retribuir a atenção que recebe de seus colaborares para atender suas necessidades. Tabela 8 – Tabela de Freqüência Formação das Esposas Formação da Esposa Freqüência % Fundamental 20 8,19 Ensino Médio 155 63,54 Ensino Superior 69 28,27 Total 244 100,00 Fonte: Dados da Pesquisa. A Tabela 8 demonstra a formação das esposas que tem seus filhos assistidos nestas Instituições, 20 esposas (8,19%) possuem apenas o ensino fundamental, 155 esposas (63,54%) possuem o ensino médio e 69 esposas (28,27%) possuem o ensino superior. 4.3 ANÁLISE DA REGRESSÃO Tabela 9 -Estatística de Regressão Múltipla – não Atributos Tabela 9 – Estatística de Regressão Múltipla - Não Atributos Doaçãoi = 1 + 2Idadei + 3 Moradiai + 4Município i + 5Formação i + 6RendFamil i + 7Filhos i + 8Eventos i +9FormEsposa i + i Coeficientes VIF Estatística – t P-value 2 Idade 0,0029 1,81 0,01 0,994 3 Moradia 25,7342 1,44 3,08 0,002 4 Município 7,9370 4,40 1,12 0,263 5 Form. Maridos 16,5190 1,40 2,52 0,012 6 Rend. Doadores 0,0009 1,23 0,28 0,778 7 Filhos 1,14 0,92 0,360 Variáveis 6,5704 * ** 8 Eventos -7,8896 1,12 -5,74 0,000 9 Form. Esposas -6,9659 1,10 -1,25 0,212 5,24 0,000 1 95,2637 R2 Ajustado 0,0838 Nº Observações 488 Teste F 7,42 * * * Fonte: Dados da Pesquisa. Onde: *, **, *** Estatisticamente significantes ao nível de 1%, 5% e 10% respectivamente; A Tabela 9 contém a análise de regressão para os dados não-atributos. Os testes de parâmetros foram realizados utilizando a correção robusta para os erros padrões, pois os pressupostos de normalidade de Homocedasticidade dos resíduos foram violados. Esta mesma tabela, ilustra os resultados obtidos na regressão múltipla para o grupo não atributos, idade, moradia, município, formação dos maridos, renda familiar, número de filhos, eventos, formação das esposas. As variáveis moradia, formação e eventos foram consideradas estatisticamente significantes. A moradia possui sinal positivo, como foi atribuído o valor 1 para moradia própria, os entrevistados que possuem este tipo de moradia tendem a contribuir mais com a APAE. A variável formação possui coeficiente positivo, logo quanto maior o grau de instrução maior o valor da doação. A variável eventos possui sinal negativo, como o valor 1 foi atribuído aos entrevistados que ajudam a organizar eventos, logo aqueles que não ajudam nessa organização tendem a contribuir mais. Tabela 10 – Estatística de Regressão Múltipla - Atributos Tabela 10 – Estatística de Regressão Múltipla – Atributos Doaçãoi 1 2Ajudai 3 Alegriai 4Carinho i 5Amor i 6Dedicação i + 7Sentimento i 8Informação i 13Confiança i 17União i 14Apoio i 18Paz i 22BonsProf i+ 9Compromisso i 15Religião i 19Sinceridade i 10BomTrabalho i 16Compreensão i 20Felicidade i 11Amizade i 12Família i + 21Fidelidade i+ i Coeficientes VIF Estatística – t P-value 2 Ajuda 20,5729 1,14 2,08 0,038 3 Alegria 3,7476 1,09 0,47 0,639 4 Carinho 2,3638 1,07 0,20 0,839 5 Amor 11,4534 1,11 1,38 0,168 6 Dedicação 28,4181 1,16 3,22 0,001 7 Sentimento 0,8103 1,14 0,10 0,921 8 Informação 0,8436 1,20 0,12 0,905 9 Compromisso -13,8827 1,18 -0,71 0,475 10 BomTrabalho -2,3485 1,18 -0,26 0,795 11 Amizade 4,0022 1,23 0,46 0,645 12 Família 5,7978 1,09 0,74 0,461 13 Confiança 10,5802 1,14 1,24 0,217 14 Apoio -7,0682 1,08 -0,83 0,410 15 Religião 4,2327 1,10 0,57 0,566 16 Compreensão 4,4132 1,09 0,50 0,619 17 União 1,8637 1,08 0,15 0,878 18 Paz -3,4887 1,08 -0,24 0,812 19 Sinceridade 0,3083 1,06 0,03 0,976 20 Felicidade 16,4217 1,08 1,84 0,067 21 Fidelidade 10,3949 1,06 1,37 0,173 22 BonsProf 12,9600 1,13 1,22 0,225 1 -433,7906 -2,77 0,006 Variáveis R2 Ajustado 0,0545 Nº Observações 487 Teste F 2,12 Fonte: Dados da Pesquisa. ** * *** * * Onde: *, **, *** Estatisticamente significantes ao nível de 1%, 5% e 10% respectivamente; A tabela 10 ilustra os resultados obtidos na regressão múltipla para o grupo Atributos. O atributo ajuda, dedicação e felicidade foram considerados estatisticamente significantes. Todos os três atributos possuem coeficientes positivos, ou seja, quanto maior a percepção desses atributos ao entrevistado, maior o valor de doação. Dentre os três, o atributo Dedicação possui a maior relevância (Coeficientes de 28,41), assim quanto maior for a dedicação destas Instituições com os usuários de seus serviços, mais bem vistas elas serão pelas pessoas que tem necessidade de serem assistidas de forma voluntária. A Tabela 11 ilustra a junção das variáveis significativas dos dois grupos criados. Ao observar o modelo final de regressão percebe-se que todas as variáveis continuam estatisticamente significantes ao mesmo nível das regressões anteriores. Logo as interpretações anteriores permanecem inalteradas. Nos testes elaborados separadamente as variáveis moradia (25,73), formação (16,51), eventos (-7,88), ajuda (20,57), dedicação (28,41), felicidade (16,42) se mostraram assim relevantes, no teste feito em conjunto estas mesmas variáveis continuaram se mostrando relevantes, moradia (23,38), formação (11,28), eventos (-7,15), ajuda (20,04), dedicação (29,84) e felicidade (14,87). Tabela 11 – Estatística de Regressão Múltipla - Final Tabela 11 – Estatística de Regressão Múltipla – Final Doaçãoi 2Moradiai 1 7Felicidadei + i 3Formação i 4Eventos i 5 Ajudai 6 Dedicaçãoi Coeficientes VIF Estatística – t P-value 23,3814 1,09 2,85 0,004 * Maridos 11,2868 1,11 2,16 0,032 ** Variáveis 2 Moradia 3 Form. 4 Eventos -7,1566 1,03 -5,94 0,000 * 5 Ajuda 20,0492 1,01 2,23 0,026 ** 6 Dedicação 29,8261 1,00 4,26 0,000 * 7 Felicidade 14,8755 1,01 1,82 0,070 *** 1 -212,3525 0,002 * -3,08 R2 Ajustado 0,0990 Nº Observações 488 Teste F 13,51 * Fonte: Dados da Pesquisa. Onde: *, **, *** Estatisticamente significantes ao nível de 1%, 5% e 10% respectivamente. 5 CONSIDERAÇÕES FINAIS Nas últimas duas décadas, as Instituições denominadas Terceiro Setor têm sido objeto de várias pesquisas devido a sua importância para as comunidades onde estão estabelecidas, importância desde o nível econômico-social e também no atendimento a serviços essenciais onde o Estado muitas vezes não se faz presente. A pesquisa procurou identificar quais seriam as variáveis que seriam relevantes no momento de uma pessoa fazer suas doações e qual seria o montante para as Instituições. Para isso, foram elaboradas entrevistas com famílias que utilizam os serviços das APAE’s em três diferentes municípios, a fim de identificar e entender o comportamento desses doadores. Foram testadas diversas variáveis no período das entrevistas. Porém, após a apuração dos dados, por meio da regressão múltipla, seis foram às variáveis que apresentaram maior relevância nas doações: Moradia, Formação dos maridos, Eventos, Ajuda, Dedicação e Felicidade. Essas variáveis foram preponderantes para as doações, continuidade e sucesso destas Instituições. Variáveis como Renda, Município onde mora, idade, número de filhos, Alegria, Carinho, Amor, Sentimento, Informação, Compromisso, Bom trabalho, Amizade, Família, Confiança, Apoio, Religião, Compreensão, União, Paz, Sinceridade, Fidelidade e Bons profissionais não se mostraram relevantes na hora da doação. Embora os serviços destas Instituições sejam prestados de forma voluntária, os usuários que se sentem bem atendidos não medem esforços na hora de contribuir para a continuidade da Instituição. A presente pesquisa mostra que o comportamento do doador não consiste em classe social, porém na satisfação ao atendimento. Com base nos resultados obtidos, espera-se ter dado mais um passo para futuras pesquisas, considerando a percepção dos doadores. Como contribuição para futuros trabalhos, fica o desenvolvimento de uma pesquisa adaptada à população de doadores para as Instituições denominadas Terceiro Setor. Esta pesquisa pode ser aplicada em APAE’s de outros Municípios, outras ONG’S que também possam evidenciar novos atributos, e que possam colaborar com novos resultados, contribuindo no aprimoramento desta metodologia e da teoria sobre o assunto. Uma nova pesquisa poderia ser realizada observando as ações desenvolvidas pelas APAE’s para serem aceitas com tanta relevância pelos seus usuários e pelas comunidades de uma forma geral. Para finalizar, espera-se que o resultado desta pesquisa possa contribuir para que as APAE’s continuem desenvolvendo seus trabalhos sem fins lucrativos, atendendo de forma imparcial as pessoas que necessitam de seus serviços, podendo, assim, diminuir as diferenças sociais existentes e promover o bem estar social. 5 REFERÊNCIAS APAE’s Associação de Pais e Amigos dos Exepcionais, Cariacica, serra e Vila Velha. BADDINI, S. Manager of business development. São Paulo área, Brasil 2004. BORGER. F. G. Revista Trevisan, 2001, nº 163, ano XV Estados Unidos. São Paulo. Editora Senac, 2001. CAMARGO, M.F. Gestão do Terceiro Setor no Brasil. São Paulo Futura, 2001. CARCANHOLO. M.D. et al (orgs). A quem Pertence o Amanhã? Neoliberalismo. São Paulo. Edições Loyola, 1997. CARDOSO, R. Fortalecimento da Sociedade Civil. 2. Ed. São Paulo. Gife, 2000. COELHO. S.C.T. Terceiro Setor. 2. Ed. Um Estudo Comparativo entre Brasil e Estados Unidos. 2. Ed. São Paulo. Editora Senac São Paulo, 2000. 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Atlas. 3. Ed. 1999. TENÓRIO. F. Gestão de ONGs. Principais Funções Gerenciais. Rio de Janeiro. Editora da Fundação Getúlio Vargas, 2001. A IDEIA DE ESCOLA SUSTENTÁVEL Fernanda Freitas Rezende Rodrigues27 RESUMO As questões ambientais passaram de bandeira ativista para as principais reuniões de líderes mundiais. Alguns países e governos apostam nas escolas como instituições de mudanças destinando verbas específicas para a pesquisa. Este artigo tem como objetivo realizar uma revisão bibliográfica do termo escola sustentável através de uma 27 Mestre em Educação. Pós-graduada em Ecoturismo pela UFLA (Universidade Federal de Lavras) e Recreação pela FAMATH (Faculdades Maria Thereza do Rio de Janeiro). Professora de Educação Física da Prefeitura Municipal de Vitória. publicação de Henderson e Tilbury (2004), bem como um recorte de algumas produções de autores nacionais que tratam do mesmo tema na tentativa de produção de políticas públicas. A sustentabilidade na escola não deve ser percebida apenas nas mudanças da infra-estrutura e sim validadas na gestão e no currículo pelas relações da comunidade escolar. PALAVRAS-CHAVE: Escola sustentável. Sustentabilidade. Políticas públicas. ABSTRACT Environmental issues became an activist flag for major meetings of world leaders. Some countries and governments are betting in schools as institutions change specific earmarking funds for research. This article aims to review literature the term sustainable school through a publication of Henderson and Tilbury (2004), as well as a cut of some productions of Brazilian authors dealing with the same topic in an attempt to produce public policies. Sustainability in schools should not be seen only on changes in the infrastructure but validated in the management and relationships curriculum by the school community. KEYWORDS: Sustainable school. Sustainability. Public policies. 1 INTRODUÇÃO As questões ambientais passaram de bandeira ativista para as principais reuniões de líderes mundiais. Alguns países e governos apostam na educação como veiculo de mudanças destinando verbas específicas para a pesquisa. A idéia da sustentabilidade nas escolas vem sendo preconizada com freqüência em programas do governo, publicações especializadas em educação e na mídia de uma forma geral. Mas onde está a origem dessas idéias e como o Brasil vem atualizando essa concepção para a tentativa de construção de políticas públicas no que tange a idéia de sustentabilidade ou de escolas sustentáveis? Este artigo trata de realizar uma revisão bibliográfica das idéias de escola sustentável a partir da pesquisa de Henderson e Tilbury (2004), que aborda diferentes escolas com abordagem whole-school para sustentabilidade como as EnviroSchools na Nova Zelândia; Green School Award, na Suécia; Green School Project na China; Foundation for Environmental Educational (FEE), Eco-Schools e Environment and Schools Initiative (ENSI) em outros países da Europa. Além de algumas produções pontuais nacionais de pesquisadores que vem abordando este tema e as tentativas de produção de políticas públicas no Brasil. 2 ABORDAGENS MÚLTIPLAS DAS ESCOLAS SUSTENTÁVEIS Em nível mundial, discussões de uma política em longo prazo estão sendo feitas no que tange a vários planos de governo em especial ao Projeto Milênio das Nações Unidas28. Uma das 10 Forças-Tarefa é justamente sobre Sustentabilidade Ambiental, onde se pretende implementar intervenções específicas na gestão do meio-ambiente, integrando as questões ambientais a todas as políticas setoriais. A Itália é o país que tem a missão de divulgar um documento sobre a educação sustentável. 2.1 SUSTAINABLE SCHOOL (INGLATERRA) Na Inglaterra, documentos estão disponíveis sobre o tema da sustentabilidade na escola nos sites oficiais. Em Sustainable School: a brief introduction (UNITED KINGDON, 2007) a meta é que em 2020 todas as escolas estejam adaptadas a sustentabilidade. Este documento considera três pontos essenciais. O primeiro é o compromisso para o cuidado de si com uma preocupação ética (através das culturas, as distâncias e as gerações), e para o ambiente local e global. As escolas já estão cuidando dos lugares, mas uma escola sustentável estende esse compromisso em novas áreas, se preocupando com a energia e a água que consome, os resíduos que produz, a comida que serve, o tráfego que atrai, e as dificuldades enfrentadas pelas pessoas que vivem em sua comunidade e em outras partes do mundo. O segundo seria pensar numa abordagem 28 Este Projeto contém 10 Forças-Tarefa que congregam 265 especialistas do mundo todo, incluindo parlamentares, pesquisadores e cientistas; formuladores de políticas públicas, representantes da sociedade civil, agências da ONU, o Banco Mundial, o Fundo Monetário Internacional e o setor privado tendo o desfio de diagnóstico de impedimentos para o Projeto Milênio das Nações Unidas, para que as metas possam ser atingidas até 2015. integrada através da oferta de ensino e aprendizagem (currículo), nos seus valores e formas de trabalho (campus), e o envolvimento de seus parceiros locais (comunidade). E o terceiro seria a seleção de temas de sustentabilidade onde as escolas podem estabelecer ou desenvolver suas práticas de sustentabilidade inspiradas em uma série de prioridades nacionais em torno do desenvolvimento sustentável. Esse documento traz algumas recomendações para uma escola se tornar sustentável: 2.2 ABORDAGENS WHOLE- SCHOOL A pesquisa de Henderson e Tilbury (2004), texto-base utilizado para este item traz diferentes escolas com abordagem whole-school para sustentabilidade como as EnviroSchools na Nova Zelândia; Green School Award, na Suécia; Green School Project na China; Foundation for Environmental Educational (FEE), Eco-Schools e Environment and Schools Initiative (ENSI) em outros países da Europa. O termo whole-school pode ser entendido por escola completa, ou escola como organização, ou ainda como escola integral, pois as abordagens para a sustentabilidade incorporam todos os elementos da vida escolar como: escola de governança, abordagens pedagógicas, currículo, gestão de recursos e parcerias com a comunidade local. O setor formal da educação vem sendo foco para mudanças em direção à sustentabilidade desde 1970 e 1980 em escolas que refletem esses novos papéis na sociedade no Reino Unido, América do Norte e Europa como exemplos. Este foco vem sendo dirigido por documentos internacionais e compromissos (pactos) como a Declaração de Tbilisi, Agenda 21, Agenda 21 Local e o Quadro de Ação de Dakar, defendidos para uma reforma ou reorientação educacional e possível reflexão de uma nova agenda da sustentabilidade. A pesquisa elaborada pelo Instituto de Pesquisa Australiano em Educação para a sustentabilidade (ARIES) para o Departamento de Meio Ambiente e Governo do Patrimônio da Austrália, está baseada em programas internacionais e nacionais que adotam abordagens whole school para a sustentabilidade na escola com o objetivo de desenvolvimento da iniciativa de escolas sustentáveis na Austrália. A seguir alguns exemplos de programas em escolas que abordam a sustentabilidade como foco do trabalho. 2.2.1 ENSI ECO-SCHOOLS Environment and Schools Initiative (ENSI) é uma organização internacional do governo baseada numa rede de aprendizagem de Educação Ambiental sob a égide do Centro de Investigação em Educação e Inovação (CERI). Em 2004 a ENSI possuía 13 membros, provenientes principalmente da Europa, incluindo a Australia. O objetivo do projeto Eco-schools é “desenvolver, testar e publicar métodos de ensino e aprendizagem que definem as boas práticas de Educação Ambiental através da criação de parcerias entre escolas internacionais e realização de estudos comparativos. Os programas-piloto das escolas sustentáveis da Australia estavam em seu primeiro ciclo e o interesse no programa por parte dos outros estados e territórios da já crescia substancialmente estando a maioria deles envolvidos no projeto. 2.2.2 FEE ECO-SCHOOL (EUROPA, ÁFRICA, ÁSIA E AMÉRICA DO SUL) Foundation for Environmental Educational (FEE) é uma organização sem fins lucrativos que reúne ONGs nacionais de execução de programas de Educação Ambiental, gestão e certificação. Essas ONGs trabalham em parceria estreita com as respectivas autoridades nacionais de ensino e do Secretariado International da FEE (atualmente com sede em Portugal). Vale a pena ressaltar que subjacente ao quadro internacional da FEE encontram-se os princípios da Agenda 21, incluindo a necessidade de consciência ambiental e habilidades melhoradas dos estudantes para uma participação ativa e tomada de decisão. Os principais temas são água, resíduos e energia. 2.2.3 GREEN SCHOOL (CHINA) É uma iniciativa do Ministério da Educação da China (MOE) e é financiada pelo Estado. O Programa Green School da China, começou em 1996, e é baseado no conceito internacional da ISO 14000 sendo influenciado pelas européias Eco-schools.. O Projeto Green School centra-se na construção de habilidades, conhecimento para a gestão ambiental na escola e benefícios ambientais. As escolas devem realizar uma série de etapas antes de se aplicar o Green School Award, que premia as escolas través de um processo de desenvolvimento de estágios, começando no nível municipal, provincial e nacional. 2.2.4 GREEN SCHOOL AWARD (SUÉCIA) Este programa é apoiado por uma série de "critérios de adjudicação” para as escolas trabalharem para o desenvolvimento sustentável. A Agência Nacional Sueca para Educação fornece apoio às escolas em suas necessidades básicas. Os critérios de adjudicação do Green School Award visam integrar todos os aspectos da vida escolar, incluindo, gestão, atividades de ensino, saúde ocupacional e segurança, bem-estar físico e no ambiente físico. Os critérios foram desenvolvidos através de um processo multidisciplinar e participativo, baseando-se nos currículos e programas nacionais. 2.2.5 ENVIROSCHOOLS (NOVA ZELÂNDIA) O conceito foi desenvolvido em Waikato na década de 1990 (com três escolas-piloto) e desde então têm sido estendido para escolas de toda a Nova Zelândia. A New Zealand Association for Environmental Educational (NZAEE) gerenciou o programa 2001-2003 até a criação da Enviroschools Foundation. Desde então, o papel da Fundação tem sido o de prestar apoio e supervisionar a direção estratégica do programa nacional. Sob essa liderança, os Coordenadores Regionais do Enviroschools apoiam o programa, oferecendo duas opções para envolvimento da escola: três anos um programa facilitado, e / ou esquema de um prêmio para as escolas. 3 ABORDAGENS NACIONAIS A partir desse momento o enfoque passa a ser a identificação de algumas produções nacionais que abordam o tema das escolas sustentáveis. O livro Escola Sustentável: Ecoalfabetizando pelo ambiente, de Legan (2007), orienta o aprendizado de crianças e descreve a permacultura29 como premissa de uma escola sustentável em seu passo a passo. A autora também lançou, em 2009, outra publicação intitulada Criando Habitats30 na Escola Sustentável que trata das ferramentas para se pensar num currículo em meio ambiente. As referencias desse livro mostram uma pesquisa encomendada pelo Departamento de Meio-Ambiente e Patrimônio do Governo Australiano que traz várias referências de escolas sustentáveis ou escolas com foco na sustentabilidade ao redor do mundo. O artigo “Escolas Sustentáveis: Incubadoras de transformações nas comunidades”, de Trajber e Sato (2010), trata da experiência inicial e continuada de um Processo Formativo31 (SATO e OLIVEIRA, 2010) que aconteceu ao longo de 2010 em 180 escolas de ensino médio do Brasil, em parceria com o Ministério da Educação (MEC) à distância e tem o envolvimento de três Universidades Federais. Matérias em revistas de educação de circulação nacional provocam a discussão do tema. Camargo (2008) cita os dez mandamentos para que uma escola seja “sustentável”, entre eles a coerência, a informação, a cultura, a paciência, o realismo, a democracia, o compromisso socioambiental, a criatividade, as metas e a transversalidade. 29 Criada na década de 70 pelo australiano Bill Mollison, a permacultura pode ser compreendida como um sistema de design para a criação de ambientes produtivos, saudáveis e ecológicos com o sentido de habitar a terra sem destruir a vida. Também entendida ao pé da letra por cultura permanente (LEGAN, 2009). 30 Um habitat é simplesmente um local onde seres humanos, animais e plantas podem conviver de forma sustentável. 31 Esse processo de desencadeou a partir do Processo Formador em Educação Ambiental à distância. Milhares de escolas ainda apresentam condições tão adversas para funcionar de forma adequada, contendo problemas estruturais, espaços e materiais, formação de professores/as ainda insuficiente, bem como baixa remuneração, planejamento muito inferior a carga horária, quantidade expressiva de alunos, além das dificuldades aliada a prática pedagógica permeada de teorias funcionando numa lógica mercadológica. Somam-se a isso as dificuldades internas de gestão junto ao corpo docente e sua relação com a comunidade, os conflitos políticos ligados a municípios que insistem em manter gestores com indicação política, tornando o espaço que seria o primeiro a exercer a democracia a reverberar a lógica do sistema. A idéia da sustentabilidade na escola pode vir minimizar algumas das condições citadas acima. A partir de novas concepções de sociedade, é possível pensar a escola como um espaço de convivência onde se consubstancie essas mudanças paradigmáticas. Para Trajber e Sato (2010, p. 71), pensar em uma escola sustentável é criar “espaços educadores sustentáveis” que: [...] têm a intencionalidade pedagógica de se constituir em referências concretas de sustentabilidade socioambiental. Isto é, são espaços que mantêm uma relação equilibrada com o meio ambiente; compensam seus impactos com o desenvolvimento de tecnologias apropriadas, permitindo assim, qualidade de vida para as gerações presentes e futuras. Com a formação de redes, professores/as universitários/as, futuros professores/as e professores/as em serviço poderão criar situações de aprendizado conjunto, oportunizando uma articulação com outros contextos, de acordo com (TRISTÃO, 2004). Em seu cerne, a facilitação do tratamento da dimensão ambiental, no intuito de solucionar questões de ordem pedagógica, educacional, cultural e política vivenciadas nas práticas profissionais, buscaria minimizar a distância entre o conhecimento acadêmico e a vida profissional. 3.1 TENTATIVAS DE PRODUÇÃO DE POLÍTICAS PÚBLICAS NO BRASIL Existem iniciativas do governo brasileiro para o desenvolvimento de projetos de espaços sustentáveis em instituições educacionais. O Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social (CDES), que se estrutura em Grupos de Trabalho (GTs), vem discutindo as variáveis da conjuntura e a oportunidade de consolidação de um modelo de desenvolvimento socialmente inclusivo e ambientalmente sustentável em torno dos temas que considera relevante como “a infraestrutura, a matriz energética, a política tributária e a educação”. Essas discussões foram motivadas pela crise econômica de 200832. Busca-se o repensar do papel do Estado frente às demandas existentes de políticas sociais que possam sustentar a estabilidade social (CONSELHO, 2010). O GT Matriz Energética para o Desenvolvimento com Equidade e Responsabilidade Socioambiental integrado ao Ministério da Educação e ao Meio Ambiente iniciam as discussões sobre a eficiência energética e outras políticas de meio-ambiente, energia, educação ambiental, visando a integração desses temas à educação brasileira. Nesse sentido, realizou-se o Colóquio de Sustentabilidade, Eficiência Energética e Educação Ambiental: um desafio para as instituições de ensino e para a sociedade em 2009 na cidade de Brasília. Foram relatadas as experiências de construções ecologicamente sustentáveis em instituições de ensino brasileiras, entre outras. Na opinião dos conselheiros deste GT “crianças e adolescentes têm grande capacidade de assimilação da importância do tema e de replicar o debate na sociedade (CONSELHO, 2010, p. 32)”. No relatório, o CONSELHO (2010) propõe: 1. Criar espaços educacionais sustentáveis que abordem a interação humana, o uso racional dos recursos e o consumo sustentável, dentre outros aspectos; 2. Introduzir conteúdos programáticos e/ou disciplinas acadêmicas relativos à eficiência energética e construções sustentáveis nos currículos dos cursos de Engenharia e Arquitetura, assim como nos cursos superiores, técnicos e profissionalizantes em áreas correlatas; 3. Incorporar os princípios e conceitos de sustentabilidade, educação ambiental e de eficiência energética no processo de formação discente e docente em todos os níveis de ensino (CONSELHO DE DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO E SOCIAL, 2010). 32 A crise econômica desequilibrou a maior economia do mundo, a dos Estados Unidos, falindo grandes instituições americanas. O relatório ainda sugere incorporar princípios e conceitos da sustentabilidade, da Educação Ambiental e de eficiência energética no processo de formação de alunos/as e professores/as em todos os níveis de ensino. Isto de certa forma está refletido Política Estadual de Educação Ambiental do Espírito Santo, de 2009, que dispõe em seu art.15º artigo: Art. 15. A dimensão ambiental e suas relações com o meio social e o natural devem estar inscritas de forma crítica nos currículos de formação dos profissionais de educação, em todos os níveis e em todas as disciplinas. Parágrafo único. Os profissionais da educação em atividade devem receber formação continuada em educação ambiental, com o propósito de atender adequadamente ao cumprimento dos princípios e objetivos da Política Estadual de educação ambiental. Num cenário de mobilização mundial para redução da emissão de gases de efeito estufa e de mitigação dos efeitos do aquecimento global a sustentabilidade pode preceder e presidir os estudos, análises e recomendações. Segundo o Relatório, para o debate da implantação e disseminação de espaços educadores sustentáveis é necessário a compreensão de que a priorização da eficiência energética, além da introdução de novas fontes limpas e renováveis exigem mudanças culturais profundas no seio da sociedade brasileira, bem como na concepção e formação dos profissionais que gerenciam e executam projetos nessas área. O relatório do CDES indica que as instituições de ensino sejam incubadoras de mudanças concretas na realidade social articulando três eixos: edificações, gestão e currículo. Dentre as recomendações podemos citar: 20. Apoiar e incentivar ações de construção e reforma e a ampliação de edificações de instituições de ensino utilizando critérios sustentáveis e de eficiência energética, em todos os níveis de ensino e em todas as unidades da federação; 21. Apoiar a iniciativa do Ministério da Educação de oferecer a 10 mil escolas de ensino fundamental e outras 300 unidades de ensino médio, em 2010, por meio do Fundo Nacional para o Desenvolvimento da Educação (FNDE), um conjunto de readequações ou reformas dos prédios escolares utilizando critérios de ecoeficiência energética e sustentabilidade; [...] 43. Implementar ações de Certificação de Escolas Sustentáveis, com participação efetiva da comunidade escolar. O Rio de Janeiro é o primeiro estado a possuir uma escola estadual com certificação de sustentabilidade. O Colégio Estadual Erich Walter, conhecido agora como Unidade de Ensino Catavento (o projeto aproveita as correntes de vento para promover a exaustão do ar quente, que sobe, deixando internamente uma agradável sensação térmica, por isso o nome) recebeu o selo Leed Schools concedido pelo Green Building Council (GBC)33 no Brasil. O Leadership in Energy and Environmental Design (LEED) é um sistema de certificação e orientação ambiental de edificações criado pelo U.S. Green Building Council, sendo o selo de maior reconhecimento internacional e o mais utilizado em todo o mundo. Existem selos para diversas construções como unidades de saúde, bairros, lojas de varejo, escolas entre outras. Este selo já faz parte da realidade de cento e dezoito escolas nos EUA, uma em Bali e uma na Noruega. Entre as características para a certificação estão os painéis solares gerando energia limpa, o sistema de reaproveitamento de água da chuva, o bicicletário e vagas para veículos de baixa emissão, área de armazenagem para resíduos recicláveis, pavimentação permeável, além de telhado verde, iluminação com lâmpadas LED, equipamentos de ar condicionado eficientes, revestimento com baixos índices de compostos orgânicos voláteis e acessibilidade a alunos com necessidades especiais, com portas mais largas, pisos táteis, rampas com pouca inclinação e inscrições em braile. Além dessas características, a obra ainda aproveitou 100% de todo material que viraria entulho. O Decreto nº 7.083 dispõe sobre o Programa Mais Educação34 e traz em seu texto: Art. 2o São princípios da educação integral, no âmbito do Programa Mais Educação: [...] 33 O Green Building Council Brasil (GBC Brasil) é uma organização não governamental que visa fomentar a indústria de construção sustentável no país. Para isso, tem uma parceria atuante junto ao governo e empresas; capacitação técnica de profissionais; e disseminação de práticas de processos de certificação de empreendimentos. 34 O Programa Mais Educação foi criado pela Portaria Interministerial nº 17/2007 e aumenta a oferta educativa nas escolas públicas por meio de atividades optativas agrupadas em macrocampos como meio ambiente, esporte e lazer, direitos humanos, cultura e artes, cultura digital, prevenção e promoção da saúde, educomunicação, educação científica e educação econômica. V - o incentivo à criação de espaços educadores sustentáveis com a readequação dos prédios escolares, incluindo a acessibilidade, e à gestão, à formação de professores e à inserção das temáticas de sustentabilidade ambiental nos currículos e no desenvolvimento de materiais didáticos; (BRASIL, 2010). O argumento de que a mudança das estruturas do espaço pode ocasionar a sustentabilidade na escola é ingênuo. Observa-se pelo Relatório do CDES que a proposta no Brasil de formulação de escolas sustentáveis pelas políticas públicas brasileiras ainda é embrionária sendo pautada numa racionalidade cognitiva instrumental. As discussões já representam um começo desta caminhada, mas uma escola não se constrói apenas com paredes e tecnologia, e sim com idéias e afetos. A mais recente tentativa de formulação de políticas públicas no Brasil é o Programa Dinheiro Direto na Escola (PDDE) – Escola Sustentável. A proposta do programa é garantir recursos para que as escolas desenvolvam iniciativas voltadas para a sustentabilidade. As escolas selecionadas estão em áreas de vulnerabilidade ambiental. O programa destinará os recursos para a inclusão da temática socioambiental no projeto político-pedagógico da escola. Pretende ainda apoiar à criação e o fortalecimento de comissões de meio ambiente e qualidade de vida (Com-vida) e incentivar a adequação do espaço físico da escola de maneira a aprimorar a destinação de resíduos na busca de eficiência energética, entre outras iniciativas. 4 CONSIDERAÇÕES FINAIS A idéia de um projeto onde a sustentabilidade seja o coração da escola apresenta-se como uma proposta pedagógica ampla, devendo ser discutida por cada escola, decidindo como formular interesses a rede local. A idéia de sustentabilidade vai muito além de mudanças na sua infra-estrutura física. Será que é possível considerar uma escola sustentável se continua com padrões engessados na sua gestão e currículo onde o poder silencia a cultura, as relações com a comunidade e abafa a vida? É necessária a formação no sentido de levar a comunidade escolar a formular suas próprias idéias no contexto da sustentabilidade articulando a gestão, consolidando o currículo e materializando o espaço construído. A produção de políticas públicas no Brasil está em andamento, mas é preciso considerar o estado da educação pública atualmente com dificuldade de recursos, tensão no pagamento digno a um professor, a pouca ou nenhuma formação de professores, as condições de lecionar, a violência na escola entre muitos fatores que necessitam de uma atenção maior do governo. Editais isolados que visam o atendimento de algumas escolas podem até iniciar a idéia de uma escola sustentável, mas configura-se ainda como uma política de atendimento a uma pequena parcela das escolas brasileiras que sofrem com o descaso do poder público sistematicamente. Aposta-se na sustentabilidade na escola, contudo espera-se uma organização e planejamento por parte do poder público com participação das esferas municipal, estadual e federal na tessitura de uma rede para sustentabilidade com ações integradas que criem novas aberturas e potencializem as ações que já estão em desenvolvimento nas escola. Os projetos e programas de outros países citados anteriormente mostram que é possível gerar sustentabilidade nas escolas com a participação do governo e parcerias da iniciativa privada, mas acima de tudo, com a formulação de princípios pautados numa ética e num compromisso político de melhoria da qualidade de vida do ser humano e sua relação com a natureza e o meio ambiente. 5 REFERENCIAS BRASIL, Decreto nº 7.083, de 27 de janeiro de 2010. Dispõe sobre o Programa Mais Educação. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil03/ato2007- 2010/2007/decreto/d6040.htm>. Acesso em 24 jun. 2013. CAMARGO, Paulo. Os dez mandamentos de uma escola sustentável. Pátio: Revista Pedagógica, Porto Alegre, ano 12, n.46, p. 34-35, maio/jul.2008. CONSELHO DE DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO E SOCIAL (Brasil). Relatório de Atividades. 2009. Brasília, 2010. ESPÍRITO SANTO (Estado). Lei nº 9.265, de 16 de julho de 2009. Institui a Política Estadual de Educação Ambiental. 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