para língua estrangeira

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para língua estrangeira
TRANSFERÊNCIA DE LÍNGUA NATIVA (PORTUGUÊS) PARA
LÍNGUA ESTRANGEIRA (INGLÊS) EM PRODUÇÃO ESCRITA
DE ESTUDANTES DE ESCOLA PÚBLICA
Regiane Bellay*
RESUMO
Trata-se de uma pesquisa sobre transferência de uma primeira língua (Português) para
uma língua estrangeira (Inglês) em produções escritas de estudantes de uma escola
pública, conforme a análise contrastiva. Brown (1994), Corder (1982), Ellis (1998), James (1981) e Quaresma (1997) são autores consultados. Através da teoria da interlinguagem, as transferências (erros) da primeira língua para uma língua estrangeira, no
caso inglês, são analisadas após a leitura de comics, nas produções escritas de alunos
de escola pública. Contribui para o ensino e aprendizagem de Inglês como língua
estrangeira. Os resultados mostram que é possível trabalhar os erros que são cometidos pelos alunos na transferência de uma língua para outra durante as produções
textuais e conseguir uma aprendizagem melhor da língua estrangeira.
Palavras-chave: Análise contrastiva. Interlinguagem. Transferência. Produção escrita.
Sala de aula.
Introdução
A transferência da língua nativa (L1 - Português) para uma língua estrangeira
(LE -lí) é tema desta pesquisa. Toda pesquisa nessa área parte da hipótese da transferência da L1 para a LE feita no processo da interlinguagem quando o aluno produz
texto ou frases na LE.
Objetiva-se questionar as marcas da L1 presentes em produções de LE para
detectá-las e, mais especificamente, analisá-las em turma de ensino fundamental quanto às suas classificações tipológicas, segundo as teorias da análise contrastiva, abrangendo: as visões; as formas de estudo da língua; a linguística aplicada; a interlinguagem; o erro; bases da análise contrastiva; os focos de análise e a análise contrastiva.
Para tanto, utilizam-se, no desenvolvimento desta pesquisa, as teorias de Brown (1994),
Corder (1982), Ellis (1998), James (1981) e Figueiredo (1997) como principais fontes
bibliográficas para a análise das transferências presentes nos textos.
Da produção escrita solicitada em forma de texto ou de frases, partindo de
leitura de comics, para alunos de uma sétima série do ensino fundamental, a análise foi
* Mestranda em Letras – Estudos Linguísticos (UEM, Maringá - Paraná), especialista em Língua Portuguesa
e em Literatura Brasileira, professora de Língua Portuguesa da rede municipal de ensino de Maringá e
Professora de Língua Inglesa da rede estadual de ensino do Paraná. E-mail: [email protected].
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embasada segundo os autores da abordagem da análise contrastiva. Apresentaremos
os resultados dessa pesquisa, para que possamos entender melhor alguns erros dos
alunos nas produções escritas.
Análise contrastiva
Segundo James (1981), desde os fins do século XIX, há a necessidade de
definir-se linguística aplicada, persistindo até hoje a dificuldade de defini-la. A análise
contrastiva faz parte dessa área dinâmica que se subdivide em versão fraca e em
versão forte como formulações teóricas e metodológicas. Genericamente, pode-se definir a contribuição da análise contrastiva para com o estudo comparativo das diferentes formas de produção da língua. Desse modo, tem-se a análise contrastiva como:
linguística pura ou aplicada, bilinguismo e estudo da interlinguagem.
A análise contrastiva, relacionada com as propriedades formais da língua e não
diretamente com a aprendizagem, remete suas bases psicológicas. Por outro lado, têmse as bases pedagógicas da análise contrastiva que são voltadas para o ensino. Há a
microlinguística na análise contrastiva e a macrolinguística na linguística pura, sendo
a primeira voltada para o estudo da fonologia, do léxico e da gramática, e a segunda
voltada para situar o que é comunicado.
As visões da análise contrastiva
A versão fraca e a versão forte da análise contrastiva, conforme Figueiredo
(1997), se preocupa com a qualidade do ensino das línguas estrangeiras. Embora estejam cientificamente opostas, ambas trazem suas contribuições. A versão fraca é a
formulação teórica e metodológica também conhecida como análise dos erros. Essa
análise tem como objeto de pesquisa, dados constantes em fitas gravadas e/ou textos
escritos pelos aprendizes de LE, língua em estudo pelos alunos que não a têm como
língua nativa, L1. A partir desses dados, faz-se listagem dos erros, passando-se a
estabelecer: classificação, uma tipologia; o tratamento estatístico, determinando a frequência com que ocorrem; as causas prováveis dos erros; o grau de distúrbio que os
erros causam na veiculação da mensagem; as estratégias pedagógicas para superar os
erros. A versão forte exige muita repetição de exercícios estruturais, enquanto a fraca
recomenda práticas para aprendizado global, através de formulação de regras que
produzam as sentenças gramaticais da LE, língua estrangeira, sendo menos utilizada a
prática de padrões.
Para Corder (1982), três fatores são os principais para a interpretação das causas do erro: a interferência da língua materna ou de outras línguas; a generalização
intralinguística feita por generalização de regras já dominadas, mas que tiveram suas
restrições como desconhecidas ou esquecidas; erros causais devidos a esquecimentos e falta de estudo etc. Além disso, há vários fatores que devem ser considerados na
avaliação dos erros: idade do aluno, tensão nervosa, metodologia do ensino e motivação para a língua estrangeira.
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Formas de estudo da língua: linguística pura ou aplicada, bilinguismo e
interlinguagem
A linguística pura difere-se da linguística aplicada, segundo James (1981), porque a primeira não se dirige às outras disciplinas, o que ocorre com a linguística
aplicada. Os interesses da linguística pura não são comparativos, contrastivos ou
tipológicos, tratando apenas da linguagem universal. Dessa forma, a linguística aplicada contém a linguística pura, pois a aplicada estende-se mais do que a pura, o que é
argumento deste trabalho. Quanto ao bilinguismo, este trata do estudo de indivíduos
ou de sociedades monolíngues que se tornam bilíngues.
O estudo da interlinguagem é um campo da análise contrastiva, sendo predominante a diacronia, o estudo da língua no passar do tempo. Para James (1981), Saussure
refere-se à diacronia histórica, de séculos, de gerações, enquanto que ele trata a diacronia de maneira individualizada, ou seja, no processo de aquisição da L2 em cada
indivíduo. Outro campo da linguística nessa área do estudo da interlinguagem é a
teoria da tradução. Desse modo, há três campos que enfocam a interlinguagem segundo a L1 e a L2: teoria da tradução, análise do erro e análise contrastiva. A teoria da
tradução focaliza a tradução de textos de uma língua para outra. Os dois últimos
campos enfocam o processo L1 para L2/LE, objeto de pesquisa deste trabalho.
Segundo a análise contrastiva, no estudo da interlinguagem, Selinker (1972,
apud CORDER, 1982) define interlíngua como um sistema intermediário entre a língua
nativa ou materna e a língua dois ou segunda língua e a língua estrangeira a ser
aprendida. Corder (1973 apud BROWN, 1994) propõe quatro estágios de desenvolvimento da interlinguagem segundo a análise de erros. O primeiro estágio é chamado
pré-sistemático, onde o conhecimento da ordem sistemática para a classe particular
dos itens da L2 e/ou LE é vago, sendo um estágio de experimentação da língua. O
segundo estágio ou emergente é o estágio em que o aluno começa discernir o sistema
e internalizar as regras da L2 e/ou LE. O terceiro, estágio sistemático, é caracterizado
pela habilidade do aprendiz em manifestar mais consistência na produção da segunda
língua, sendo hábil para corrigir seus erros. O estágio final, estágio da estabilização, é
marcado por poucos erros e pela autocorreção sem a necessidade de feedback. É neste
estágio que pode ocorrer também a fossilização, ou seja, o estacionamento do aprendiz
no nível de proficiência em que se encontra.
James (1981), na exploração pedagógica da análise contrastiva, afirma que existe uma elaboração da interlinguagem, a qual denomina: naturalização da interlíngua.
Segundo a teoria de Hymes (1972 apud JAMES, 1981) marca: o setor da gramática; a
performance, segundo a teoria behaviorista do estímulo e da resposta; a capacidade
de aprendizado (memória e fatores cognitivos por exemplo); a relação com o processo
do contexto informação e registro; e as probabilidades de ocorrência de certos aspectos do uso da língua como partes compositórias da naturalização da interlíngua. Podese perceber o posicionamento da interlíngua no início do ensino, o qual caminha para
a naturalização ou internalização da L2 e /ou LE, quando o aprendiz caminha para o
ensino avançado. Todo o processo possui dois focos: foco na forma e foco na função
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da língua, ambos marcando a existência da produção e da compreensão. O processo de
ensino progride para o ensino avançado, quando o foco na forma e na função, bem
como na produção e na compreensão, ocorrem em conjunto.
Para Ellis (1998), quanto à aquisição da L2 e /ou LE, a interlinguagem envolve:
sistema de regras gramaticais, influência externa através do input, reestruturação do
sistema de regras, competência no uso das regras (realça-se a competência do ser
humano em adquirir uma língua, dentro da teoria mentalista da análise contrastiva),
estratégias de aprendizado e níveis de aprendizado envolvendo produção de erros e
estágio final avançado ou fossilizado.
Além disso, Corder (1982), quanto à análise de erros, coloca a coleta de dados
sobre interlinguagem como difícil de ser realizada. O primeiro tipo de investigação é
chamado “análise do erro” - entre aspas, conforme o autor indica, para explicar a
análise e o erro como formas não radicalizadas da expressão - pedindo-se para o
aprendiz fazer uma produção de qualquer tipo, quando o investigador apenas quer
começar a pesquisa, sem ter uma hipótese bem formada do que procura. O segundo, ao
contrário do primeiro, ocorre quando o investigador sabe aonde quer chegar, tendo
bem delimitado o seu objeto de estudo, limitando o pedido de atividade de produção
do aprendiz. Os dois métodos são respectivamente: clínico e experimental, ambos
utilizados na pesquisa de manifestações particulares da linguagem – linguagem da
criança, interlinguagem ou linguagem institucionalizada.
Na qualificação dos dados coletados, para Corder (1982), é necessário especificá-los de acordo com a variabilidade da interlinguagem quanto: à igualdade da
estrutura das duas línguas (L1 e L2/LE), à semelhança entre a interlinguagem dos
aprendizes e às propriedades universais das línguas. A transferência de dados de
uma língua para a outra, a interferência e a ação de uma língua sobre a outra são
consideradas relevantes, bem como em que parte da língua (fonética, fonologia,
sintaxe) isto ocorre.
O erro: teoria behaviorista X Chomsky
A teoria behaviorista, segundo James (1981), afirma a substituição do hábito
formado na L1 por novos na L2 e /ou LE, através de exaustivos exercícios de repetição e identificando-se pontos semelhantes e diferentes entre elas para facilitar o
aprendizado e reduzir os erros. Assim, tem-se a análise contrastiva prevendo erros
produzidos através da ação negativa da L1 sobre a L2/LE (interferência), correspondendo à versão forte ou preventiva, e tem-se a versão fraca ou explicativa, explicando tais erros.
Quanto à teoria de Chomsky, Figueiredo (1997) parte desta e afirma que a língua
não é adquirida pela formação de hábitos, mas pela internalização de regras. Assim, a
maioria dos erros produzidos não ocorre devido à interferência da L1, mas devido à
formação de hipóteses adequadas ou não adequadas (erros) sobre a língua-alvo. Isso
pode ser comprovado pela análise de erros que considera o aprendiz da L2/LE como
um ser ativo que gera hipóteses sobre a língua alvo, testa-as e aprimora-as. Os tipos de
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erros encontrados são: interlinguais (erros de transferência ou de interferência de uma
L1 para uma L2/LE); intralinguais (erros cometidos através da influência da própria L1
para ela mesma); ambíguos (erros semelhantes aos interlinguais ou erros desenvolvimentais, apresentando formas semelhantes às produzidas por crianças, pertencendo
ao desenvolvimento do aprendiz); induzidos (erros causados por forma inadequada
de se ensinar a L2/LE).
Análise de erros
Há um vasto campo de estudos sobre os erros a ser ressaltado, além da coleta
e da qualificação de dados para pesquisa, bem como da definição de erro, teorias
necessárias para esta pesquisa. Segundo Brown (1994), coletado o material de pesquisa, este é classificado segundo erro, significando dificuldade no processo de aprendizagem, ou segundo lapso, significando processo de aprendizagem, o que pode apontar para o estágio de desenvolvimento em que o aprendiz se encontra, mas é preciso
também classificá-los conforme causa interlinguística ou intralinguística. A causa interlinguística é foco deste trabalho, pois trata da transferência de conhecimentos linguísticos da L1 para a L2/LE, objeto de nossa pesquisa. A causa intralinguística remete
a uma transferência de dados da própria L1 para a L1 ou da própria LE (língua estrangeira) para ela mesma.
Para Corder (1982), a seguinte classificação de erros seria superficial: erros de
omissão, erros de adição, erros de seleção e erros de ordem. Faz-se necessária a categorização destes erros em: gráficos, fonológicos, gramaticais e léxico-semânticos.
Por conseguinte, têm-se as seguintes considerações para a sentença produzida:
aceitável, apropriada e livre de erro; e inaceitável, inapropriada e errônea. Os erros
de omissão são erros constituídos da ausência de certos elementos quando estes
deveriam estar presentes. Os erros de adição, pelo contrário dos erros de omissão,
apresentam algum elemento que não deveria estar presente. Os erros de seleção
apresentam, no lugar de um item adequado, um item mal escolhido. Por fim, os erros
de ordem apresentam o elemento correto, mas na ordem errada. Esses erros precisam
ser considerados: gráficos – referentes à escrita, à ortografia; fonológicos – relativos
aos sons das palavras; gramaticais – quanto às regras que regem a língua escrita e
falada; e léxico-semânticos – relacionado com os vocábulos de um idioma e com seus
respectivos significados, sentidos.
Desse modo, a sentença linguística produzida será considerada livre de erro se
for aceitável e apropriada segundo os esquemas de classificação apresentados, envolvendo a classificação superficial e a mais específica dividida em áreas explicitadas por
Corder (1982). Contudo, a sentença será classificada como errônea se for considerada
inaceitável e inapropriada.
Corder (1982) também afirma que os testes para a identificação de erros são
muitas vezes restritivos, porque se mantêm no processo quantitativo, não analisando
o qualitativo. Na sequência, tem-se a tentativa, também errônea, de muitos professores que buscam solucionar o problema detectado com as mesmas aulas dadas, ensiDiálogos & Saberes, Mandaguari, v. 6, n. 1, p. 9-20, 2010
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nando novamente, da mesma forma, o mesmo conteúdo. Há algo errado com o sistema
de ensino e não com o aluno. O autor propõe a seguinte solução em duas direções:
levantar o conhecimento do aluno acima do que foi requerido; demandar a situação de
teste segundo as habilidades dos alunos.
Bases da análise contrastiva: psicológicas e pedagógicas
A teoria da transferência é segundo James (1981), a fundação das bases psicológicas na análise contrastiva. Para Ellis (1998), a transferência da L1 é feita para a L2/
LE, por influência dessa língua. O efeito é positivo, sendo a transferência positiva se
a L1 contribui para a facilitação da aquisição da L2/LE, caso ocorra o contrário, a
transferência é negativa, ou seja, há interferência da L1 para a L2/LE. A capacidade de
o aluno fazer transferências negativas ou positivas está ligada ao estágio em que este
se encontra. Em ambos os casos, os erros causados por transferência são considerados minoria entre outros tipos. Através da transferência, o aluno poderá notar também
a semelhança universal entre a L1 e a L2/LE ou poderá notar suas diferenças.
De acordo com James (1981), existem dois tipos de análise contrastiva: a teórica
e a aplicada. A teórica é estática, pois não estuda como uma categoria de uma língua A
é representada em uma língua B. Por outro lado, a aplicada é definida como unidirecional, pois se preocupa com a realização da categoria universal (X) em ambas as línguas
A e B. As bases pedagógicas de acordo com a análise contrastiva aplicada desenvolvem noções linguísticas do entendimento e da natureza de uma língua e guias sobre
materiais afins. Então, as bases pedagógicas estão relacionadas com predições e diagnósticos, bem como o desenvolvimento de testes para os alunos. As predições e os
diagnósticos podem ser sobre as causas de erros, dificuldades, tipos de erros e frequência de erros. O desenvolvimento de testes envolve o que, como e quem testar,
apoiando-se no nível de aprendizado dos alunos. No último século, foram três os
métodos mais usados para o ensino de L2/LE: gramática da tradução, diretivo e audiolingual. O primeiro e o terceiro são chamados artificiais, enquanto que o segundo é
chamado de natural (o processo de aprendizagem da L2/LE dá-se como o da L1). Os
audiolinguistas adotaram instruções artificiais para o ensino da L2/LE, considerando
o processo de aprendizado diferente da L1. A gramática da tradução, considerando o
processo de aprendizado como os audiolinguístas, fixou a correspondência L1 para
L2/LE no aprendizado da L2/LE.
Focos de análise contrastiva
A análise contrastiva que corresponde ao nível fonológico, lexical e gramatical
é a microlinguística. Segundo Corder (1982), essa análise contrastiva é feita através de
descrição da língua pesquisada e através de comparação dos elementos fonológicos,
lexicais e gramaticais da L1 com os da L2. Tratando-se da macrolinguística, esta é outro
foco da linguística, pertencendo à linguística pura e tratando da situacionalidade da
produção da língua.
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Metodologia
Para a obtenção de dados concretos e atuais sobre as hipóteses elaboradas
pelos aprendizes de LE, no último bimestre do ano escolar de 2009, foi solicitada uma
produção escrita após a leitura e interpretação de um comics, encontrado no livro
didático de Liberato (1998). O comics apresenta um personagem que se encontra surpreso ao receber sua carteira com dinheiro e cartões devolvidos por alguém, que os
encontrou e avisou ter utilizado apenas alguns centavos da carteira perdida, para
pagar pela postagem. Feito o comentário e a leitura, pede-se para que os alunos produzam frases sobre reflexões que o personagem daquele comics poderia fazer sobre o que
estava ocorrendo na história, sendo permitido o uso de dicionários.
Isso é feito para identificar o nível de transferência da L1 para a LE. Após a análise
dos dados, que destaca e qualifica as transferências ocorridas, discutiu-se sobre essas
produções, conscientizando os alunos sobre as semelhanças e diferenças entre L1 e LE.
Análise dos dados
Quatorze produções foram analisadas quanto à transferência da L1 na escrita
da LE. Apresentam-se, abaixo, algumas transferências feitas pelos alunos nas suas
produções.
Produção 1
1. Like of what know you.
2. I like of thank you here house
3. Im on your hands.
4. Want my money by wall
5. You owe 59 cents
Põe o verbo like como em L1 (gostaria), sem o auxiliar de língua inglesa para a
conjugação e usa of como se fosse em L1 (gostaria de). Como faz em L1, não usa Eu,
diferente do que se pede na língua inglesa. O what não apresenta função adequada.
Em 2, usa o I, mas permanece com like of como em 1. Em 3, usa a preposição on no lugar
de in e não põe o apóstrofo pedido pelo pronome e pelo verbo como se fosse em L1, em
que não se tem esse tipo de uso para o apóstrofo. Em 4, não usa I novamente e usa a
preposição by no lugar de from the ou invés de utilizar o caso genitivo wallet’s money.
Em 5, usa owe no lugar de have.
Produção 2
1. I’am stayed nervous
2. I’am want know you
3. You a lot of pretty
Usa apóstrofo onde não há necessidade, pois não há abreviação, o que demonstra transferência da própria inglesa, o que não é o foco desta pesquisa. Além do
que, põe stayed sem necessidade na frase, o que demonstra um esquecimento de que
o verbo to be está ao lado do pronome I colocado, remetendo a uma transferência da
L1, por não constar casos do pronome unido ao verbo, sendo considerado pelo aluno
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como um pronome; não como pronome e verbo no caso da Língua inglesa. Em 2,
permanece com o uso de I’am como em 1 e ocorre a falta de to entre want e know,
semelhante ao Português que não tem uma parte separada do verbo para indicar infinitivo (to). Em 3, não usa o verbo are e usa a expressão a lot of em vez de so, não
conseguindo o tempo adequado, correspondente em língua inglesa.
Produção 3
1. I to thank you
2. he spent 59 cent
Em 1, apresenta to desnecessariamente, sem função. Em 2, coloca letra minúscula no início da frase, provavelmente, como faz em L1 e não coloca o s em cent, não
marcando o plural da palavra, o que pode ser também influência da L1, pois é prática
comum de muitas pessoas o corte do plural no fim das palavras.
Produção 4
1. Alotof what-you
2. You Inglush man or woman
3. Whow spend
4. Where do you live
5. That quik.ness thank
O aluno não conseguiu formular a frase com os temas colocados e demonstrou
trocas gráficas como lotof (lot of) e em what-you (what you). Na segunda frase, não
colocou o verbo are e nem o ponto de interrogação no final para formular a pergunta.
Escreveu Inglush em vez de English com base na pronúncia que percebe em L1. Além
disso, usa Whow em vez de How com uma letra sobrando, podendo ser transferência
da língua inglesa para a própria, devido ao vasto número de pronomes interrogativos
que começam com W, em Língua Inglesa, ou à simples confusão entre o começo e o fim
da palavra. Usa spend, no tempo presente, em vez de spent, no passado, conforme
pede a frase. Formulou a frase com base no uso da L1 (- Como gastou?). Há ausência
de pontuação nas outras frases. Expressou That quk.ness thank, ao tentar expressar
Pela agilidade, valeu!, como faria em L1. Talvez, por influência da L1, que não apresenta s em final de obrigado ou de obrigada, grafa thank sem s.
Produção 5
1. You is most honest.
2. You is a woman?
3. thnks.
Apresenta is como are e most inadequadamente, qualificando o adjetivo honest. O is também não aparece na posição de pergunta em que foi empregado. Coloca
thnks em vez de thanks, o que parece ser distração do estudante.
Produção 6
1. Which the his name?
2. Next you can to give back the money.
3. Who man honest.
4. Glory who you found my wallet.
5. Go to my House.
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Usa which no lugar de what, não usa o verbo is, e escreve the his name como
o nome dele, transferência da L1, pois não se faz em língua inglesa a mesma pergunta
com os mesmos termos. Na segunda frase, apresenta Next em vez de Next time e to sem
necessidade, influenciado pelo sentido da palavra em L1 apresentado no dicionário.
Coloca who e não what para expressar surpresa e escreve Who man honest. e não What
an honest man.; na frase 4, o who não apresenta necessidade na língua inglesa, com
base na L1 que usa que para enfatizar emoções. Há a escrita de House, que apresenta
letra maiúscula no final da frase, sem necessidade, o que, provavelmente, faz por
descuido em L1. Outro aluno entregou as mesmas frases, pois copiou do colega.
Assim, grafa giveblack e mon-iy, além das grafias que o colega fez.
Produção 7
1. I like much of your attitude
2. I wish thank you
3. I wish retribute the her favor
4. You could consume how much you wish
5. What is your name?
A expressão much of foi utilizada com base na L1 para caracterizar muito de,
o que não encontraria em língua inglesa. Na segunda e na terceira frase, ocorre a
ausência de to após wish. Na terceira frase, o uso de retribute com base no que se
tem foneticamente e funcionalmente em L1, mas em língua inglesa o verbo seria
outro. O uso de the em língua inglesa também é dispensável. Na frase número 4, na
L1, usa-se quanto em perguntas e em respostas, o que não ocorre com how much em
língua inglesa.
Produção 8
1. Want to thank in preference.
2. You ar a lot of kind
3. Want to know you
4. You ar a lot special
5. Hi! Yor letter ar beaultiful
Ocorre ausência de I como em L1, em que não se exige a presença do pronome
Eu. Não complementa thank, baseando-se na L1 que não se exige o complemento e
usa in preference próximo do que expressa em L1, mas diferente do que significa em
língua inglesa, sendo que seria exigida a continuação da frase com o que descartaria
da escolha expressada (thank). Na segunda frase, há a grafia de are por ar, próxima da
pronúncia do verbo e o uso de a lot of, para expressar algo como really ou so. Em 3,
novamente, há ausência de I. Em 4, ar e a lot aparecem novamente com os mesmos
problemas anteriores. Em 5, yor expressa your, com base na pronúncia, ar é usado,
mais uma vez, para are, e beaultiful para beautiful marca a grafia no u longo da pronúncia em língua inglesa.
Produção 9
1. he taste of the card.
2. he stay surprising with the card.
3. Card’s Beoutiful.
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4. I’ love you much.
5. You is perfect and fabulous.
Cinco alunos produziram frases idênticas, com exceção de Card’s Beoutiful
que apresenta grafias como is, Bioutiful, bioutjul e bioutful. O que demonstra cópia
entre esses alunos, sendo que quem fez o trabalho e passou para os outros copiarem
fez menos transferências do que os que copiaram, conforme foi observado na aplicação da pesquisa. No ato da cópia, a pronúncia do que estava sendo copiado influenciou a escrita de i no lugar de e como a troca de f por j, que pode ser justificada pelo
não entendimento da letra do estudante que fez as frases. A dificuldade de grafar
essa palavra foi visível, porque em L1 não há estrutura como essa para a produção
da primeira parte de beautiful. Na primeira frase, há taste com sentido que não se
emprega em L2. O uso de of também se coloca por influência do sentido do que a L1
pediria na frase correspondente: do, cria-se de+o em língua inglesa (of the). As
frases número 1 e número 2 começam com letra minúscula e em 3 é utilizada letra
maiúscula para o suposto adjetivo beautiful. A frase 4 apresenta um apóstrofo sobrando por influência da própria língua inglesa. A 5ª frase apresenta is em vez de are
por descuido ou transferência da L1 para a língua inglesa, pois em L1 é não apresenta escrita diferente como em língua inglesa (is/are).
Após a análise do material recolhido, discutiu-se com os alunos sobre as transferências encontradas e sobre estruturas da Língua Inglesa que seriam utilizadas de
forma adequada. Destacou-se que o aprendizado é um processo contínuo, em que a
leitura e a escrita são necessárias para que esse ocorra.
Uma análise das transferências da L1 para a língua inglesa de todas as
produções demonstra a existência de transferências baseadas na gramática do
Português, quanto ao som da palavra, quanto a sua grafia, quanto a sua posição,
quanto a sua função e quanto ao seu nível léxico-semântico, segundo a gramática normativa de ambas as línguas, sendo transferências que poderiam ser literais
do vocábulo português para o texto em inglês, mas que se apresentam como
transferências da L1 para a LE, não feitas literalmente. Seguem as transferências
que não foram produzidas literalmente e que foram encontradas nas produções
pesquisadas:
Nível fonético: Inglish, retribute, ar, beaultiful, yor, bioutful, Bioutijul.
Nível funcional: ausência de would, of, ausência de I, what, ausência de in my,
on, ausência de apóstrofo, by, stayed, ausência de to, ausência de are, a lot of, owe, to,
cent, Alotof, what-you, ausência de Are e de ?, spend, is, most, ausência de pontuação
e de estrutura frasal completa, which, the, his, next, who, ausência de a, much of,
ausência de to, retribute, how much, in preference, a lot of, taste.
Nível posicional: is, man honest.
Nível gráfico: he, Alotof, what-you, Inglish, whow, thank, quik.ness, thnks,
House, giveblack, mon-iy, ar, beautiful, yor, Beoutiful, bioutful, Bioutijul.
Nível léxico-semântico: taste.
A análise das produções da 7ª EF dá-se quanto à análise contrastiva no foco
microlinguístico, pois se tem analisado fonologicamente, lexicalmente e gramaticalDiálogos & Saberes, Mandaguari, v. 6, n. 1, p. 9-20, 2010
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mente os exemplos de transferência da L1 para a LE segundo a base psicológica da
análise contrastiva.
A base pedagógica da análise contrastiva é trabalhada, segundo o projeto de
se predizer e diagnosticar as transferências encontradas da L1 para a LE. Esta pesquisa
tem suas bases teóricas na versão fraca da análise contrastiva, pois se trabalha com a
produção textual que abrange uma produção global e não limitada da LE, pois não se
trata de exercícios mecânicos de diagnóstico.
Por outro lado, a versão fraca da análise contrastiva afirma-se, aqui, através da
análise de erros quanto à causa interlinguística, focalizando-se a transferência da L1
para a LE no nível gráfico, gramatical, dividido em nível: funcional, posicional, fonológico e léxico-semântico nas produções analisadas, havendo, por consequência, também, erros de omissão, adição, de ordem e de seleção. Tais erros, conforme a versão
forte afirma, são influência negativa da L1 sobre a LE, interferência. Esses erros, segundo a versão fraca da análise contrastiva são explicados como transferência da L1
para a LE no processo que a linguística aplicada abrange: a interlinguagem.
Portanto, o que foi encontrado como transferência da L1 para a LE é considerado indicador do processo de aprendizado da LE, que ainda não chegou ao estágio da
naturalização e progride para o ensino avançado. Com isso, pode-se afirmar o que
James (1981) coloca: no início do aprendizado da LE existe a interlíngua, ou seja, existe
a não internalização da língua, sendo que o aprendiz da LE não expressa ainda esta
língua segundo as características aprendidas desta.
Considerações finais
Assim, as produções escritas da 7ª EF demonstram exemplos de como a transferência da L1 para a LE existe como parte da interlinguagem, do processo de aprendizado dos alunos, os quais estudando inglês fazem transferências da L1 para a LE em
seus textos. As produções recolhidas foram produzidas por alunos de um mesmo nível
de aprendizado e todos fizeram transferência da L1 para a LE, o que autores como Ellis
(1998), James (1981) e Corder (1982) classificam como processo interlingual, sendo a
transferência da L1 para a L2/LE indicadora do processo de aprendizado da L2/LE.
A aprendizagem da LE se dá de maneira semelhante a da L1, o que contribui,
ainda mais, para que o aluno se baseie na L1 quando produz um texto na LE, utilizando
diferentes regras gramaticais da norma padrão da L1. Isso aponta para diferentes tipos
de transferências da L1 para a LE, que aqui são classificados como interferência no
aprendizado da L2/LE, segundo a versão fraca da análise contrastiva.
Assim, de posse de materiais concretos da transferência da L1 para a LE, devese trabalhar em sala de aula a conscientização da existência desta. Esse trabalho deve
ser feito de modo contínuo, pois a interlinguagem acompanha o processo de desenvolvimento do aluno de L2/LE. Através do trabalho em sala de aula com a L2/LE, o
aluno desenvolve mais consciência da língua estrangeira que aprende e ao tornar-se
consciente da existência da transferência da L1, bem como da estrutura própria da LE,
alcança níveis maiores de aprendizado.
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ABSTRACT
TRANSFER OF L1 (PORTUGUESE) TO L2 (ENGLISH) IN WRITTEN PRODUCTION
BY STUDENTS FROM PUBLIC SCHOOL
It is a research is on transfer from native language (Portuguese) to a foreign language
(English) in written production by students of a public school according to a contrastive
analysis. Brown (1994), Corder (1982), Ellis (1998), James (1981) and Quaresma (1997)
are the authors consulted. Through the interlanguage theory, the transfers (in errors)
from native language to a foreign language are analyzed after the reading of comics in
the written production of students from public school. It contributes to the teaching
and learning process of English as a foreign language. The results show that it is
possible to work the errors that are made by the students’ transfer from the native
language to the foreign language during the textual productions and achieve better
learning of a foreign language.
Keywords: Contrastive analysis. Interlanguage. Transfer. Written production. Classroom.
REFERÊNCIAS
BROWN, H. D. Principles of language learning and teaching. New Jersey: Prentice
Hall Regents, 1994.
CORDER, S. Pit. Error analysis and interlanguage. Oxford: Oxford University, 1982.
ELLIS, R. Second language acquisition. Oxford: Oxford University, 1998.
FIGUEIREDO, F. J. Q. de. Aprendendo com os erros: uma perspectiva comunicativa
de ensino de línguas. Goiânia: Ed. da UFG, 1997.
JAMES, C. Contrastive analysis. Great Britain: Longman, 1981.
LIBERATO, W. Compact english book-Inglês: ensino-médio. São Paulo: FTD, 1998.
QUARESMA DE FIGUEIREDO, Francisco José. Aprendendo com os erros: uma
perspectiva comunicativa de ensino de línguas. Goiânia: UFG, 1997.
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