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"CULTURA POPULAR":
revisitando um conceito
historiográfico
Roger Chartier
mais difícil de
1.
ser
pensada que a dos
mundos "exóticos".
cultura popular é uma calegoria
erudita. Por que enunciar, no ro­
meço de uma conferência, .00 abrupta
proposição? Ela pretende somente re­
lembrar que os debates em tomo da
própria definição de cultura popular fo­
ram (e são) tc:\Y.ldos a propósito de um
conceito que quer delimitar, cacaoecizar
e nomC:Jr prátiCls que nunca são desig­
nadas pelos seus atores como pectcn cen­
do il "culruca popular". Prodllzido como
uma calegoria erudim destinada a ru­
cunscreveJ' e descre>er produções e con­
dutas siruadas foca da culwca erudita, o
Ass umindo o risco de simplificar ao
extcerno, é possível red1lzir as inúmer.lS
definições dacultuca popular. dois gran­
des modelos de descrição e intecpccm­
ção. O primeiro, no intuito de abolir toda
forma de emocenlCismo culrural, conce­
cultura popuJac como um sis tema
simbólico coerente e aUlônomo, que
be
a
funciona segundo uma lógica abSOIUL�­
mente alheia e irccduúveJ il da culruca
le lrada. O segundo, preocupado em Icrn­
bcac a exislência das relações de domina­
ção que organizam o mundo social, per­
cebe a cuhura popuJac em suas depen­
dências e cacên cias em relação à culrura
conceilO de culwca popuL11" tem lC3d ••zi.
dos dominantes. Temos, então, de um
do, nas suas múltiplas e conlrndilÓrias
lado, uma cultura popular que constitui
acepções, as relações m:lIJtidas peJos in­
um mundo à pane, encerrado em si mes­
mo, independente, c, de outro, uma cul­
ruca popular inteiramente definida pela
leCtu aisocidenl;tls
(e, enue eles, osscho­
lars) com uma .llcridade cultural ainda
NoJo: Esu� ICJJO foi apresc:nlado
00
DO semin:icio
Popular Culttlre, Df! Interdlsclpllnary Conlercnce. re31iZ2do
"bsnchuscus Wlilllle ofTechnology de. 16 a 17 de oUlubro de 1992
A lt'adução é de Aone-N:uie Mia0
Olivein.
ESllfdol HlslÓt'kos, Ilio deJanciro, voI. 8, D° 16, 1995, p. 179-192.
180
sua distância da legitimid'lde cultural da
qual ela é privada.
Estes dois moddos de inteligibilidade,
portadores de estratégias de pesquisa, de
estilos de descrição e de propostas IeÓri­
ClS completamente opostas, atravessa­
ram todas as disciplinas que pesquisam a
cultura popular, seja a história, a antro­
pologia ou a sociologia. Recentemente,
Jean-Claude Passeron mostrou os peri­
gos metodológicos de ambos: "Da mes­
ma forma que as cegueiras sociológicas
do relativismo cultural, quando apliCldo
às culruras popubres, encorajam opopu­
lIsmo, para quem o sentido das práticas
populares cumpre-se integralmente na
felicidade monádica da auto-suficiência
simbólica, assim também a teoria da legi­
timidade cultural corre sempre O risco
( ... ] de levar ao legitún {smo , que, sob a
fonna extrema do m/serab//lsmo, niio fiz
seniio descontar, com um ar compungi­
do, as diferenças como se fossem carên­
cias, ou as alterid�des como se fossem
Un) menos.ser. J
..
A oposição se fiz termo a termo: a
celebração de uma cultura popular em
sua majestade se inverte em uma descri­
ção "em negativo"; o reconhecimento da
igual dignidade de todos os universos
simbólicos dá lugar à lembranÇ1 das Im­
placiveis hierarquias do mundo social.
Pode-se acompanharJean-Claude Pas­
seron quando de noL� que, mesmo sen­
do lógica e metodologicamen te contradi­
tórias, estas definições da cultura popu­
lar não são por isso fundadoras de um
princípio cômodo de classificação das
pesquisas e dos pesqui,sadores: "a oscila­
ção entre as duas formas de descrever
uma cultura popular pode ser observada
numa mesma obra, num mesmo aUlOr',
e a fronteira entre amb:Is "atravessa si­
nuosamente toda descrição das culturas
populares, dividindo-a quase sempre em
movimentos alternativos de interpreta­
çio".2
Como historiador, pode·se acrescefi­
tar que o contraste entre estas duas pers­
pectivas - a que enf"iZ3 a autonomia
simbólica da L"Ulrura popular e a que
insiste na sua dependência da culrura
dominante - tem servido de hase para
todos os modelos cronológioos que opõ­
em uma suposta idade de ouro da culrura
popular, onde esta aparece como matri­
cial e independente, a épocas onde vigo­
ram censura e coação, quando ela é des­
qualificada e desmantelada.
Não é possível aceitar sem numa:5 a
periodização dássica que >ê na primeira
metade do século XVII um momento de
corte m:úor, de contraste muito forte entre
uma idade de ouro, onde a cultura popu­
lar teria sido viva, livre, profusa, e urna
époCl regida pela disciplina edesial e es­
taral, onde ela teria sido reprimida e sub­
jugada Este esquenta p31eceu pertinente
quando se tratava de dar conta da trajelÓ­
ria cultural da Europa ocidenraI: após
1600 ou 1650, as ações conjugadas dos
ESL�dos absolutistas, centralizado res e
uniHcadores, e das Igrejas das Reformas
protestante e Cltólica, repN'SSivas e acuI­
tur.1l1tes, teriam abafudo ou recJado a
exuberância in"enLiw. de lima antiga cuJ..
rum do povo. Ao impor disciplinas inéditas
e novas submissões, ao inculcar novos
modelos de comportamento, os Estados e
as Igrejas leriam destruído eOl S"35 raízes
e seus antigos equilíbrios um modo tradi­
cional de ver e de viver o mundo.
liA cultura popular, tanao rural como
urbana, sofreu um eclipse quase total na
época do Rej.SoI. Sua coerência interna
desapareceu definitivamente. Nunca
mais poderia constiwir um sistema de
sobrevida, uma filosofia da existência",'
escreve Robert Muchcmbled, descreven­
do a "repress5.o da cultura popular" na
FranÇ1 dos séculos XVII e XVID. De forma
O\!lis sutil, Peaer Bude assim descreve OS
dois movimentos que desenraiZ3r:lm a
culrura popular tradicional: de um bdo,
o esforço sistemático das elites, e particu-
"QJLTUll POP\J..Jr
dos cleros protestan te e alÓÜ00, "para mudar as atitudes e valOles do
(csto da população" e i'para suprimir, ou
ao menos purificar, vários dementos da
cultura popular tradicional"; de outro. o
abandono, pelas dasses superiores, de
uma cullura até en rão comum a IOdos. O
resultado é claro: "Em 1500. a cultura
popular era a cultura de IOdo mundo;
uma segunda cultura para os insuuídos
e a única cultura para os demais. Por volla
de 1800, contudo, em muiaas panes da
Europa, o dero, a nobl<111, os romenian·
1eS, os homens de oficio - e suas mulhe­
res -haviam abandonado a cultura popu­
lar, da qual estavam agora separados,
como nunt;a_anleS, por p�fndas dife­
renças de VISaO de mundo.
Existem várias razões para só se reto-­
mar com muita prudência esta pericx1i7!1·
ção e este dbgnóstico que concluem pda
desqualificação da cultura popular ou
pelo seu desaparecimento. Em primeiro
lugar, está daro que o esquema que
opõe, em tomo de um momen to<have
(1600 ou 1650), o esplendor e a miséria
da cultura da maioria, reitera para a itbde
moderna um contraste que outros hislO­
rodores es tlbe.leceram para outros tem­
pos. É o que ocolle. por exemplo, com
o anleS e O depois de 1200, quando a
imposição de uma ordem aeológia, cien­
tifia e filosófia isola a cultura erudita
das tradições folclóricas, censurando as
práticas dornvante tidas como supersti­
ciosas ou heterodoxas, e constituindo
como objeto posto à distância, sedutor
ou teuúvel, a cultura dos humlldes. Se
Jacques Le Golf reconhece anleS de 1200
o " ar§cimento de uma wltura popular
leiga que vai aproveitar o espaço criado,
nos séculos XI e XI1, pela cultura da
aristocracia leiga, da mesma lOda im­
pregnada do único sistema cultural então
disponível fora do sis tema cleriml, preci­
samente o das tradições folclóricas",' se­
gundo Jean-CIaude Schmin, o século X111
inaugura a époa de uma verdadeira
larmente
181
"acu1 ruração": Ué preciso indagar se a
suspeição Cf""-"COte que pesou sobre as
práticas folclóricas do cOIpO (a dança,
por exemplo), a pefSOl)ali>ação cada .ez
maior da pastoral. com o uso cada ;;ez
maIs generali>ado do saCIamen to da pe­
nitência 1 ...1, a instituição, no sécul o XV,
de uma educação religiosa para as crian­
ças (ver GelSon), não contribuiram con­
juntunente para interiorizar o sentido de
p<:'jjdo e para 'culpab ili>ar' IOdos aque­
les homens, para mascarar aos seus olhos
a 'aculturação' de que eram vitimas, con­
vencendo-os da imoralidade da sua pró­
pria cultura. ,.6
Semelhan te rcvertério parece ler
ocorrido na França (e em outros lugares
da Europa) durante os cinco decênios
que separam a guelT:l de 1870 da de
1914. Considera-se que, naquda fasc, as
culturas tradicionais, amponl'sas ou p0pulares, s:úram do isolamento, e ponan­
to se desenraizaram. em proveito de uma
cultura nacional e republiana? Outra
transformação radicaI situa-se antes e de­
pois do surgimento de uma cultura de
massa: supõe-se que os novos instru­
mentos da núdia lenham destruído uma
cultura antiga, oral e comunilária, festiva
e folclória, que era, ao mesmo tempo,
criadora, plural e livre. O destino hislO­
riográfico da cultura popular é portanto
ser sempre .bafuda, remlcada, arrasada,
e, ao mesmo tempo, sempre renascer das
cinzas. Isto indica, sem dúvida, que o
v erdadeiro problema não é tanto datar
seu desaparecimento, supostamente ir­
remediável, e sim ronsiderar, para cada
época, como se elaboram as relações
compleos entre formas impostas, mais
ou menos constrangedoras e imperati­
vas, e identidades aGrmadas, mais ou me·
nos desenvolvidas ou reprimidas.
Daí dccolle mais uma razão para não
se 01g"0i23r toda a descrição das culturas
do Antigo Regime a partir do corte iden­
tificado no século xvn. pois a força com
a qual os moddos culturais impõem sen-
182
IITUOOI HISTÓ�(O\ -1995/16
tido não anula o espaço próprio da sua
recepção, que pode ser resistente, ma·
treira ou rebelde. A descrição das nonnas
e das disciplinas, dos textoS ou das pala­
vras com os quais a cultura reformada
(ou contra-reformada) e absolutista pre­
IeIldia submeter os povos não significa
que estes foram real, lOtai e universal­
mente submetidos. É preciso, ao contrá­
rio, postubr que existe um espaço entre
a norma e o vivido, entre a injunção e a
prática, entre o sentido visado e o sentido
produzido, um espaço onde podem insi­
nuar-se reformulações e deturpações.
Nem a cultura de rn."1.SS3 do nosso tempo,
nem a cultura imposta pelos antigos p0deres foram capazes de redllzir as identi·
dades singulares ou as práticas enraiza­
das que lhes resis.bm. O que mudou,
evidentemente, foi a maneira peb qual
essas identidades puderam se enunciar e
se afirmar, fa-rendo uso inclusive dos pró­
prios meios destinados a aniquilá-ruo Re­
conhecer eSL'l mumção incontesláve1 não
significa romper as continuidades cultu­
rais que atravessam OS três séculos da
icL-ule moderna, nem tampouco decidir
que, após o corte da metade do século
xvn, não há mais lugar para gestos e
pensamentos diferentes daqueles que os
homens da Igreja, os servidores do Esta­
do ou as elites letracL"lS prelelldiarn incul­
car em todos.
2.
AcreclilO que Lawrence W. Levine m­
loca questões da mesma ordem ao desen­
volver a tese da "cultural bifurcatkm"
para caracteri:mr a trajetória cultural
americana no século XIX. Esta tese se
baseia num contraste cronológico maior,
que opõe um tempo antigo - caracteriza­
do pela partilha, pela mistura e pela exu­
beráncia cultural - a um tempo moderno
- caracterizado pela separação entre os
públicos, os espaços, os gêneros, os esti-
los etc. "Por toda parte, na sociedade da
segunda metade do século XIX, a cultura
americana eslava passando por um pl&'
cesso de fragmentação [ ... ) . Ele se mani­
festava no declinio relativo de uma cultu­
ra pública compartilhada que, na segun­
da metade do século XIX, se estilhaçou
numa série de culturas especificas que
cada vez tinham menos a ver umas com
as outraS. Os le3lJ"OS, os museus, os audi­
tórios, que antes abrigavam um público
misturado que consumia uma mistura
eclética de cultura expressiva, estavam
cada vez mais filtrando sua clientela e
seus progrnrnas, de maneira que carla vez
menos se podia encontrar públicos que
atravessasm
se
o espectro social e econô­
mico consumindo uma cultura expressi­
va que unisse elementos hibridos do que
hoje chamaríamos de cultura erucliaa e
cultura poPular'.s Uma dupb evolução
leva da "cultura pública compartilhada"
à "cultura bifurcada": de um bdo, um
p=sso de retraimento e de subtração
que atribui às práticas culturais um valor
distintivo tanto mais forte quanto menos
elas são compartilh adas; de Outro lado,
um processo de desquaIifição e de exclu­
s50 que lança para fora da cultura consa­
grada e canônica as obras, os objetos, as
fonnas daí em di:ulte relegadas ao diver­
timento popular.
Este modelo de compreensão impres­
siona pela sua homologia com aquele
proposlO para descrever a trajetória cul­
turai das socieebdes ocidentais entre os
séculos XVI e xvrn. Também nessa épo­
ca, já nessa época, uma bifurcação cultu­
ral, originada no retraimento das elites e
no içoIamenlO da cultura populor, teria
ocasionado a destruição de uma base
ancestral comum - a cultura "bakh tinia­
na" da praça pública, folclórica, festiva,
carnavalesca. Nos dois casos, as mesmas
questões podem ser colocadas. Será que
a cultura compartilh ada, dada como pri­
meira, era t50 homogênea como parece?
E quando ocone a separação, será que a
"GJLTIJl.\ IIlPUUr
fronteira entre cultura legítima e cultura
desqualillCld. era tão marcada e estan­
que como ap:lH:nta? Para a América do
século XIX, David D. Hall responde ne­
gativamenle às duas perguntaS. Segundo
ele, de um Lwo, a "cultura pública com­
pacti1hada" do início do século XIX não
era isenta de exclusões, clivagens inter­
nas e concorrências externas; de outro
lado, a "mercadorização" dos bens sim­
b6Ucos aparentemente mais es lr.lO.bos
ao mercado e • captura pela cultura c0merciai de massa dos signos e valores da
legitimidade cultural preservaram um
forte inlercimbio entre cultura letrada e
9
cultura popular.
Ou tra questão é • da articulação cr0-
183
prendimento e na absoluta liberdade de
criação são fatos diretamenIe ligados à
rejeição das servidões da "lileratura in­
dustrial" e das preferências populares
que garan tem seu sucesso: uAs relações
que os escntores e os artlSW man tem
.
.
-
com o mercado, cuja sanção anônima
pode criar entre eles disparidades seUl
precedenteS, contrwuem, sem dúvida,
para orientar a representação ambivalen­
te que eles têm do 'grande público', ao
mesmo lempo fuscin anle e desplczí.eI,
no qual eles confundem o 'burguês', ...b­
jugado pelas precupaçôes vulgares dos
negócios, co 'povo', entregue ao embru­
to
tecimento das atividades produtivas."
nológica entre as duas II:ljet6rias, a euro­
péia e a ameriCln•. Devemos supor que
a cultura americana percolle, com um Ou
dois séculos de atraso, o caminho das
sociedades do Antigo Regime da Europ.
Ocidental? Ou, ao contrário, devemos
considcr.lr que as evoluções culturais da
segunda meL..de do século XIX, que le­
VJ.m as elites a desprezar uma cultura
popular identificada com uma cultura
industrial, são idênticas no conjunto de
3.
Durante muito lempo, a concepção
clássica e dominaole da cultura popular
teVe por base, na Europa e, talvez, nos
Est ados-Unidos, três idéias: que a cultura
popul"lr podia ser definida por contrasle
com o que ela não era, a saber, a cuhura
letrada e domina0 Ie; que era possível
caracterÍZlr como "popular" O público
de certas produçôes culturais; que as
um mundo ocidental unificado pelas mi­
grações transatl.'intiClS?
expressôe s culturais podem ser tidas
da, um f Orle laço entre, de um lado, a
como sociaImenle puras e, algumas de­
reivindicação de uma cultura "pura" (ou
las, como intrinsecamenle popu1ares.
purificl(b), distanciada dos gostos vulga­
Foram estes três postulados que funda­
res, subtraída às leis da produção econô­
mica, sustentada por uma cumplicidade
mentaram os trabalhos clássicos reaJi2:!­
dos na França (e em outros lugares) so­
estética entre os criadores e o público por
bre a "lileratura popular", assimilada ao
eles escolhido e, dc outro lado, as con­
repertório da "/ittéralure de colporltv
quistaS d.. cultur.l comerci.l
l ,
pela empresa capiL1lista e destinada à
maiori.'l. Como o mostrOu rccenlCmente
ge",· e sobre a "religião popular", isto é,
o conjunto d"lS cren ças e dos gestos con­
siderados próprios da religiosidade da
Pierre Bourdleu, a constituição na FranÇl
da segunda meL..de do século XIX de um
campo Iiter:irio definido como um mun­
maJor!.'l.
do à parle e a definição de uma posição
teratura popubr" e a "religião popular"
..da na autonomia, no desestética fund
não são tão radicalmenle diferentes da
•
•
•
Mas ficou claro agora que estas afirnu­
ções devem ser postas em dúvida. A "li­
Nome d:&do ls obr.u popuJ:uc:s difundidas por veodedores 2.Ulbulanle5 do século XVI ao XIX. �u
eQu i�eDlc DO Brasj;J seria a lilcr.uun de cordel.
184
E\T� HISTÓRKIK
literatura da elite ou da religião do clero,
que impõem seus repen6rios e modelos.
Elas sãO compartilhadas por meios sa­
ciais diferentes, e não apenas pelos meios
populares. Elas são, ao mesmo tempo,
aculturadas e acultucuues,
É portanto inútil querer ideo tifocar a
cuhura popular a partir da distrib"içío
suposra!\len te específica de certos objetos
ou modelos culturais. O que importa, de
fato, tanto quanto sua repaniçio, scmpre
mais comple.. do que parece, é sua apro­
priação pelos grupos ou indhiduos. Não
se pode mais aceirar am,i<'aIlKllte uma
sociolngja da distribuição que supõe im­
plicitunente que à hierarquia das dass<•
ou grupos coneSjlOnde uma hierarquia
paralela das produções e dos hábitos cul­
turais. Em toda sociedade, as formas de
apropriação dos textos, dos códigos, dos
modelos comparti1bados são tão ou mais
geradoras de distinção queas pr:íricas pró­
prias de cada grupo social.
O "popular" não está con lido till con­
juntos de elementos que hastaria idenU­
flcar, repenoriar e descrc:>er. Ele qualifi­
ca, antes de mais nada, um tipo de rela­
ção, um modo de utilizar objetos ou
normas que circulam na socied1de, mas
que são iecebidos, compreendidos e ma­
nipulados de diversas maneir.ls. Tal cons­
tat:lção desloca necessariamente o tr:Iba­
Ibo do historiador, já que o obriga a
caracteÚz;u, não conjuntos culturais da·
dos como "populares" em si, mas as mo­
dalidades diferenciacl:Js peL-ts quais eles
são apropriados.
É por isso que esta noção parece cen­
tr.lI para toda história cultural - com a
condição, tal.ex, de ser reformulada. EsJa
reformulação, que enfuin a pluralidade
dos usos e dos entendimentos, se afasla,
de saída, do senlido dado ao conceito por
Michel FoucauJt quando coloca "a apro­
priação social dos di,scursos" como um
dos mais importantes procedimentos
por meio dos quais OS discursos são do­
minados e confiscados pelas instituições
-
199\/11
ou pelos grupos que se arrogam o direito
de exercer um controle exclusim sobre
elesl1
FJa se afasla, também, do sentido que
a hermenêutica dá à apropriação, quan­
do a represen ta como o momento em
que a "aplicação" de uma configuração
narratiVol particular à situação do sujeilO
transforma, pela interpretação, a com­
preensão que este tenl de si mesmo e do
mundo, transformando assim, também,
sua experiência fenomenológica tida
12
como universal.
A apropriação tal como a entendemos
visa a elaboração de uma história social
dos usos e das interpretações, relacjona­
dos às suas determin ações funcl:Jmentais
e inscritos nas prátõcas espeáficas que os
constroem Prestar, assim, atenção às
condições e aos processos que muito
concrelamente são portadores das ope­
rações de produção de sentido, significa
reconhecer, em oposição à anliga histó­
ria intelectual, que nem a idéi."\S nem as
interpretações são desencarnad."\S, e que,
con lrariamente ao que colocam os pen­
samentos universa1izan tes, as categorias
dadas como in varian tes, sejam elas fen�
menológicas ou filosóficas, devem ser
pensadas em função da descontinuidade
das· trajetórias históricas.
Se permite romper com uma defini­
ção ilusória da cultura popuL-tr, a noção
de apropriação, Ulilizada como instru·
menlO de conhecimento, pode lamhém
reintroclllzir urna nova ilusão: a que leva.
a considerar o leque das práticas cultu­
rais como um sistema neutro de difelen­
ças, como um conjunto de práticas diver­
S!lS, porém eq,livaientes. Adotar tal pers­
pectiVol significaria esquecer que tanto os
bens simbólicos como as práticas cultu­
rais continuam sendo objeto de lutlS
sociais onde estão em jogo sua dassifica­
ção, sua hierarquização, sua conS!lgração
(ou, ao contrário, sua desqualificação).
Compreender a "cultura popular" sig­
niflC'l, então, siruat neste espaço de en-
"(lJLTW fOPlllr
flentlmentos as relações que unem dois
conjuntos de dispositims: de um lado, os
mecanismos da dominação simbó lica,
cujo objetim é tomar aceitáveis, pelos
próprios dominados, as reprcsen raçãoes
e os modos de consumo que, pw:jsa­
mente, qualifl('3m (ou antes desqu alif
..
caro) sua culrura como inferior e ilegíti­
ma, e, deoutro lado, as lógicas específ)cas
em funcionamento nos usos e nos mo­
dos de apropriação do que é imposto.
A distinção estabelecida por Michel de
Ceneau entre estratégias e táticas consti-rut• um recu rso preaoso para se pensar
esta tensio (e evitar a oscilação entre as
abordagens que insistem no caráter de­
pendente da culrura popular e aquelas
que exaltam sua autonomia). As estraté­
gias supõem a existéncia de lugares e
instituições, prodllum objetos, normas
e m<Xldos, acumulam e Clp Ílalizam. &i
táticas, desprovidas de lugar próprio e de
domínio do tempo, são "m<Xlos de f:17er"
ou, melhor dito, de ufazer com".
•
As formas "popuL"\tcS" da culrura, des­
de as práticas do quotidiano até às formas
de consumo cultural, podem ser pensa­
das como tálicas produtoras de sentido,
embora de um sentido possivelmente
es tranho àquele visado pelos produlO­
res: liA uma produção rncio nalizada, ex·
pansionista e centraliZlda, baculhentl e
espetacular, corresponde uma outra
produção, chamada 'consumo'. Ela é ma­
lrCira e dispersa, mas se insinua em todos
OS lugares, silendosa e quase invisível,
pois não se manifesta através de produ­
tos próprios e sim através de modos de
usar os produtos imposlOS pela ordem
- .
'
13
econorruca donunante.
..
4.
Este tipo de modelo de inte1lgibilida­
de permite transformar profundamente
a compreensão que se tem de uma práti­
ca ao mesmo tempo exemplar e central:
185
a leitura Aparentemente passi va e su�
missa, a leitura é, na realidade, e à sua
maneira, inicntiw e abdora. Falando da
sociC"dade contemporânea, Michel de
Certeau sublinha magroilicamente este
paradoxo: "A leitura (da imagem ou do
1C<1O) parcce consLirulr o ponto m:!ximo
da passividade que supostamente carac­
teriza o consumidor, instituído em
tJOyeUr (troglodita ou Itinerante) numa
'sociedade do espetáculo'. Na realidade,
a atividade de leirura apresenta, ao con­
trário, todos OS traÇOS de uma produção
silendosa: é uma deriva ao longo das
páginas, uma metamorfose do lC<1O pelo
olho viajante, uma improvisação e uma
espera de signilicações ind.tzidas a panir
de algumas palavras, um prolongamento
de espaços escritos, uma daoça efêmera
( ... J. (O IcirorJ insinua as manh as do
prazer e de uma .capropriação no texto
do outro: invade a propriedade alheia,
transpona-se para ela, toma-se nela plu­
,,
ral como os barulhos do corpo. 14
Esla imagem do leitor, invadindo uma
terra que não lhe pertence, evidencia
uma qucslão fun,bment:J.I para todo tra­
balho de hislÓria ou de sociologia culru­
raI: a da variação, em função dos tempos
e dos lugares, dos gupos sociais e das
"/nIerprettve communltles", das condi­
ções de possibilidade, das modalidades e
dos efeitos dessa invasão. Na Inglatetla
dos anOS 50, segundo a descrição de
Richard Hoggart, a lcirura (ou a escuta)
popular dos jornais de grande tiragem,
das canções, dos anúndos publidtários,
das fotonovelas, dos horóscopos, se ca­
raclerizava por uma atenção "obliqua"
ou distr.úda por uma "a,ks:ío entre·
co nada de eclipses" que levava a crer ou
a descrer, a aderir � verdade do que se lia
(ou ouvia) sem que jamais desaparecesse
a desconOança, a dúvida sobre sua auten­
Liddade.15 A noção de atenção "obliqua"
permite assim entender como a culrura
da maioria fuz para manter à dislftncia, ou
então para se apropriar, inscrevendo ne"
",
mulXK HI\TO�(OS -199\/16
186
les sua própria coerência, dos modelos
que os poderes ou os grupos domina0 teS
lhe impõem pela autoridade ou pelo
merC:ldo. Esla perspec1ÍY.l con trabalança
valiosamenle aquelas que acentuam, de
uma forma por dem.1is exclusiva, os dis-­
positivos discursivos e institucionais que,
numa dada sociedade, visam a disciplinar
os corpos e as práticas ou a modelar as
condulaS e os pensamentos. A mídia mo­
derna não impõe, como se acreditou
ap ressadamente, um condicionamento
homogeneizan te, destruidor de uma
identidade popular, que seria preciso
buscar no mundo que perdemos. A von­
tade de inculcação de modelos culturais
nunca anula o espaço próprio da sua
recepção, do seu uso e da sua inaerprela-
çao.
É
com uma conslalação semelhanle
que Janice A. Radway condui seu minu­
cioso estudo sobre a aproprbção, por
uma deae rmin ada "/n/erprellve comlllU­
n//y" (no caso, uma comunid,de de lei­
toras), de um gênero maior do "mas/Y
marke/pub/tsbing", ou seja, os "roman­
ces": "MefC'!1dorias como textos lheMOS
prodll7jdos em massa são selecionadas,
compradas, construídas e usadas por
pessoas reais com necessidades, desejos,
inlenções e estratégias interprelativas
pré-exisleOteS. Ao readmítirmos esses in­
divíduos ativos e suas atividades criativas
e construtivas no cen tro de nosso esforço
inlerprelativo, evilamos nos cegar diante
do fato de que a prática esscncialmenle
humana de crbr sentido pressegue mes­
mo num mundo cresc entemente domi·
nado pebs coiS:Js e pelo consumo. Lem­
brando assim o car:íler interativo de ati­
vidades como a leitura ( . ( aumenlarnOS
. .
nossos chances de resolver ou de articu­
br a diferença entre a imposição repres­
siY.l de uma ideologia e as práticas de
Se "ainda existem no processo de co­
municação de massas oprllJnidades para
os indivíduos resistirem, aI lerarem e se
reaproprbrem de bens destinados, em
outras esferas, a ser comprados por
,, temos que adffi.1l.J.r que, afiorl�
eIes ,,17
ri, semelhanteS possibiliclades eram ofe­
.
recidas
aos
.
leitores das sociedades do
Antigo Regime, num tempo em que a
inlIuência dos modelos transmitidos
pelo material impresso era menor (a não
ser em situações peculbre s) que 00 nos­
so
século xx. Devemos, pois, recusar
toda abordagem que considere o reper­
!Ório das I/llératures de co/por/age como
expressão da "mentalid'lde" ou da "visão
de mundo" dos seus supostos leitores
pop ulares. Tal l�ção, comum nos traba­
lhos sobre aBib/lo/beque 8leue francesa,
os cbapbooks ing)ese� ou os p/Iegos de
cordel castelhanos e calalães, não é mais
ad missível por várbs razões: porque os
textos publicados em livros ou folhelOs
pertencem a gêneros, épocas e tradições
múhipbs e fragmenladas; porque exisle,
freqüentemente, uma disL'incia (crono­
lógica e social) considerável entre o con­
texto da sua produção e os da sua recep­
ção ao longo dos séculos; porque há
sempre um espaço entre o que o texto
propõe e o que o leitor faz dele. A proY.l
disso são os textos que, num dado me>
mento de sua existência impressa, entra­
ram para o repertório da Blb/Io/beque
81eue. De origem letrada, perlencendo a
gêneros muito diversos, eles consegui­
ram atingir, graças à sua noY.l forma im­
pressa (a das edições baratlS) e ao seu
modo de distribuição (a venda ambulan­
te), públicos muito diferenaes daqueles
que garantiram seu sucesso inicial, reves­
tindo-se assim de significações baslante
afasL,das do objetivo inicial.
Para analisar a relação entre os textos
oposição que, embora lirrúladas em seu
da I/ltérature de colportage e o mundo
alcance e efeito, pelo menos dispuIam ou
social das sociedades do Antigo Regime
contesL,m o contrale das fo rmas ideoló­
s,io pr ..."Cisos dois tipos complemenL"CS
gicas. 16
..
de procedimentos. O primeiro deles, in-
187
""rtendo o sentido das causalidwes ba­
bitualmente reconhecidas, sugere que se
leia a "literatura popuLu" como um re­
pertóriode modelos de comportamento,
como um conjunto de representações
que siio igualmente normas imitáveis (e
possi\'elmente imiLwas). O segundo fo­
cali"" a pluralidade e a mobilidade das
significações que públicos diferenlCS atri­
buem ao mesmo texto . Mais do que uma
suposta adequação entre o repertório da
IittératUre de rolportage e a "mentalida­
de popular", que corre O risco de ser
apenas uma tautologia (já que o sucesso
da "literatura popular" costuma ser ex­
plicado pela sua bomologia com uma
mentalidade que é na ""rdade deduzida
da temática livresca), o que importa é
uma bistória social das formas pelas quais
as diferentes comunidades de leitores
que succs.sivamente se apoderam desses
texto s os usam e compreendem. Nume­
rosas e complexas são as mediações entre
t",,:tos que se tornam "steady sellers"
graças às edições de rolportage e os in­
vestimentos de sentido de que s50 objeto
em diferentes situações bislÓricas e para
mtlnces publicados
nos p/iegos Clstelha­
nos. Mas na sua recepção (evidentemen­
te mais dificil de ser dec ifrada pelo histo­
riador), estes conjuntos de te>.1Os eram
úeqüentemente apreendidos e manipu­
lados pelos seus leitores "populares"
scm o menor respeito pelas intenções
que direcionaram sua produção e distri­
buição. Ora os leitores transpunham
para o registro do im.�ginário o que lhes
era dado no registro utilitário, ora, inver­
samente, tomavam como descrições do
cc:l1 as ficções que lhes eram proposL�.
As coletâneas de modelos epistolares da
Blbllotbeque Bleue, todos oriundas da
literatura cortesã do início do século xvn
e reedj'adas para um público maior no
periodo compreendido entre a meL�de
do século xvn e o início do XIX, ilustram
o primeiro caso: já que não tinham ne­
nhuma utilidade para leitores que nunca
se encontravam na situac;:ío de ter que
usar os modelos que lhes eram propos­
tos, elas provavelcmente eram lidas
como bislÓri.� fictícias, oferecidas sob a
forma de esboços rudimentares d� no­
vel:'as epislObres,18 No mesmo acervo, os
textos que compõem O repertório da
diferentes leitores.
É preciso portanto reconhecer uma
.
tensao unpoctanle entre as Ullençoes,
literatura picaresca apresenL�m uma si·
tuação inversa: brincando com as con­
por um texto a leitores numerosos e as
cas,
.
.
explicitas ou implícitas, que leY.lm a pro­
formas de recepção deste texto, que se
estendem, úcqüentemente, a registros
completamente diferenteS. Na Europa
dos séculos XVI a XVIII, os impressos
destinados ao público "popular" tinham
uma ampla gama de intenções, que ma­
nifestaVJ.m diversas vonLadcs: cris1ianiz:l­
dora, com os textos de devoção da Con­
tra-Reforma que en traram para o reper­
tório da Blbl/lbeque BIeue francesa; re­
fo rmad ora, com os alman aques do D/u­
mln/smo italian o ou da Volksaufliirung
alemã; didática, com os impressos de uso
venções e com as referencias carn avales­
parodísticas e burleSCls, foram, pos­
sivelmente, compreendidos como uma
descrição verdadeira da realidade inquie­
tante e estranha dos L'IIsos mendigos e
verdadeiros vagabundos.19
Diferenlemcnte d'lS IcilOrdS de rOlnan·
ces de Smilhton que responderam à pcr­
gunL� deJ:U1icc A. Radway, ou dos leitores
e leitoras de New Soulh Wales en trevista­
dos por Martyo Lyons e Lucy Taksa,20 os
da Blb/iatbeque BIeue e d� outras "litera­
turas de ro/portage" européias (a n50 ser
com raras exceções) não disseram nada
acerca das SIlas lei lUr'aS - ou, pelo menos,
escolar ou os livros de prática; parodisti­
não disseram nada que tenha sido conser­
ou burlesca; poética, com os TO-
diferença, uma prática popuLu dos lC>.1OS
ca, com todos os lexlOS da tradiçdo pica­
resca
vado pelo bitoriador. Caracterizar, em sua
IllIIIOS IUSTÓRlCOS -1195/11
183
e dos livros não é, portan lO, coisa flol A
oper:lçio supõe a Uli1i:z;u;iio criúca de fon­
tes que não podem se,. majs que repre­
selllaçóes da leitura: rep'rsen l3çóes ico­
n�ror""s de situações de leitur:l e dos
objetos lidos pelo maior núm ero de leito­
iCS;21 repn=scn taçôes nOilualÍY.lS das prá·
ticas de leitura e de escrila conticbs em
narraçócs, maD11ais, calendários ou alma·
naquesdestinados ao iuCiCado "popular";
represen 1:lÇÕCS implíd'a5 das rompelên­
das e das exp<."<lativas dos leilOles nIChOS
habilidosos, mis como transparecem da
o malerial das edições de aof,
o
portage; repiCSeJllaÇÕ<:s das suas pró­
prias leilUtaS por leilOres plebeus ou cam­
prodl'zem textos auto­
poneses
ou quando wna aulOridade
(por (,empl o eclesiástica ou inquisilOriaI)
os ob� a IndiCJr os livros que leram - e
a dizer o que acharam e emender:un.24
Ficn te a esses h ""os ea CSS3S imagens, que
põem CiD cena as Icil1J.(aS popllla.es, �
indispensável uma p re,,·allçio. Quaisquer
que sejam, essas lepresentações nunca
mantêm uma reL-.çiio imedi:ua e ttanspa­
lente com as pcátiClS que permitem ver.
Todas remelCm às moo:dicbdes espeáfi­
C\S da sua:produçiio, e, ponanlO, às inten­
ções e interesses que levaram :\ sua eJabo.
r:lç'io, aos gêneros onde se inscre>em e
aos destinatários visados. Reconslruir as
regras e os limites que COO'<lnd1ffi as pd­
tic3sda replCseutação learada, ou pop'alar ,
do pop1daré, pocconseqüêntil, umapre­
condiçio necessária para decifrar roerela­
mente o Iaço fOrle, polém sutil, que une
essas tepiCSCil tações e as prá'ÍCls sociais
que ronstiruem seu objelO.Mantida esta
prudência, as lei turas populares oas socie­
dades do Ar. ligo Regime podem ser rom­
preendidos a partir das grandes oposições
morfológiCls que comandomas formas de
por exemplo,
\iansmissio
i dos texIDS
entre a leirura em voz alta e a leirura
saenciosa, ou entre a leilui3 e a decI:una­
ç'io. Este último contraSte tem uma perti­
para sociedades onde a
nência
�
-
oralidade ocupa um lugar essencial. De­
signa, de um lado, a possÍ>cl sub missão
dos JeXIOS impressos aos procedimen lOS
peculiares da "performance" oral No caso
da França.. a Jeinua eu. MlZ alra, nas teu·
niões noturnas em mlla da 1areira, dos
JeXIOS difundidos pela littbature de coIsó nranv11 te é ateStMb antes da
segunda me.adc: do século XIX. Mas a
dedwtaçio destes JeXIOS o que implica­
va que fossem ronheddos de coe e iesti­
ruídos por ..nra pala"", viva, livre da leilura
do texIO e próxima da recitação dos coo tos
era wna das mais imponan tesformas de
ttansmifi.los, e uma dasfontes das varian­
tes que mod ifnm a sua \'t:rsãn imprcssa
-
-
de umaediçio popularpara outra. Mas de
outro lado ocnlleu, tunbérn, o in....CiSO: a
circuIaçio do iepenório impresso "ão
dejxoOJ de ter efeiros sobre as trailiçõcs
orais, que foram profuodaIllCnte ron tlmi­
nadas e transfonmllbs (rumo o mostra o
eU'mplo dos COlUOS de fuda) pelas versões
letrados e erudilaS das narrativas tradicio­
nais, f3isromoforam maàçamente difun­
S
.
/portage
2
ao
didas pela /Iltérature de
AlCibuir a CltegOrla de "popular" a
modos de ler, e oão a classes de textos,
é, ao mesmo tempo, essencial e arrisCl­
do. Após o esrudo exemplar de Cario
Ginzburg, tem sido muilO grande a fen­
taçio de caraeteriZIt a leirura popular a
partir da de Mcooccbio - ou seja, romo
uma leitura descootinuaque desm..mbra
os tCXlOS, descoo "<lualº'" as palavras e
as
i li teralidade do sen ti­
do.2 Este tipo de diagnóstico enrontrou
confirmação 03 análise das eslCUruras
ao mesmo tempo textuais e matemis
dos impressos destinados ao grande pú­
blico, cuja organi2ação em seqüências
breves e desconjuotadas, encerradas em
si mesmas, repetitivas, parece adequar·se
a uma leitura picorada, sem men16ria,
susfenlada por frngmeolOS do texto.
�,Iimi1a-se
-
-
Esla COOSlalaçio é seUl dúvida perti­
nente, mas deve ser matizada Será que
as pdtiCls de leirui3 que ela considera
189
como especificamen te pop ulares, enrai­
zadas numa antiga cultura oral e campo­
nesa, são (elas e outraS modalidades)
diferentes das que, na mesma época, ca­
racterizam a leitura dos letrados? Os dois
objetos emblemáticos da leitura erudita
nO Ren ascimento - a roda de livros, que
permite man ter vários livros abenos ao
mesmo tempo e, em conseqüência. coo·
fron LV e extr.úr os trechos tidos como
essen ciais, e o caderno de lu �res c0muns, que reúne em suas rubricas cita·
ções. exemplos, sentenças e experiências
- L1.IDbém f3Z-t:m supor e inferir uma
leitura que recorta, fragmenta, descon­
textualiza, e que investe de uma absoluta
aUlOridade o sentido literal do textO.27 A
idcn tillcação dos traços morfológicos
que organizam as práticas é, por conse­
guinte, uma condiçío necess.ária, porém
nio suficiente, para designar adequada­
men te as diferenças culturais. As formas
populares das prátiClS nunca se desen­
volvem num universo simbólico separa­
do e especifico; sua diferença é sempre
construída através das medL1ÇÕes e das
dependêncL1S que as unem aos modelos
e às normas dominantes.
5.
Na conjuntura intelectual atual, dois
obstáculos ameaçam a abordagem que
estamos defendendo aqui e que define as
configurações culturais ("populares" ou
não) a partir das práticas e, conseQÜente­
mente, dos modos de aproprL�ção que
llies são peculiares. O primeiro é consti­
tuído pelo "lingulst/c tum" ou o "semlo­
t/c cballenge" proposto à critica textual e
às ciências sociais. São conhecidos seus
três fundamen tos: considerar a lingua­
gem como um sistema fechado de signos
cujas relações prodll:rem sentido aulO­
m:uic:Jmente; considerar esta construção
da signifiClção como isenta de qu.'Ilquer
intenção ou controle subjetivos; pensar
a ""lidade como constituída pela pro.
pria linguagem, independentemente de
toda referên cia objetiva. ]ohn E. Toews
fez um resumo doro desta posição radi­
cai que, a partir da constatação de que "a
linguagem é pensada como um sist<111.0
autocontido de 'signos' cujos significa­
dos s.'io determinados por S1!3S reIações
uns com os outros, muito mais do que
por suas relações com algum objeto ou
sujeito 'transcendental' ou extt3Aingüís­
tico", postula que "a criação do sentido é
impessoal e opera 'pelas costas' dos
usuários da linguagem, cujas ações lin­
güístiCls podem apenas exemplificar as
regras e os procedimen lOS das lingua­
gens �e eles habitam, mas não contro­
lam",
Contra essas formulações rac!iClis,
acredito ser preciso relembrar que não é
lícito restringir as prátiClS constitutivas
do mundo social à lógica que govema a
produção dos discursos. Afirmar que a
realidade só é acesslvel através dos dis­
cursos que querem o�nizá-la, submetê­
la, ou represen tá-Ia (e, para o historiador,
discursos que são sempre textos escri·
lOS) , não significa postular a identidwe
entre a lógica logocêntrica e hermenêu­
tica que comanda a produção desses dis­
cursos e a t6gica prática, o "sentidp prá­
tico" que regula as condutas cuja trama
define as identidades e as relações s0ciais. Toda análise cultural deve levar em
conta esta illedutibilidade da experiên­
cia ao discurso, resguardando-se de um
uso incontroIado da categoria de texto,
indevidamente apUcada a práticas (ordi­
nárias ou rituais) cujas táticas e p rocedi­
mentos não são, em nada, scmelhan tes
às estratégias produtoras dos discursos.
Man ter esta distinção é essencial, como
assinala Bourdieu, para que se evite "pos­
tular como principio da prát.ica dos agen­
tes a teoria que se deve construir para dar
conta dela" ou, ainda, projetar "nas prá­
tiClS o que é função das práticas (não
ISTUOOI HllTÓRKo\ - 1991nl
190
-
para os alOres mas) para alguém uc as
�
estuda como algo a ser decifrado". 9
Por outro lado, o objclO fundamental
de uma história ou de uma sociologia
cultural compreen dida como uma história
da construção da slgnillcaçío reside na
tens:io que aIticula as cap acicbdes in"",­
meiro lugar, por aquilo a que renuncia,
enquanto os dominados sempre se con­
frontam com aquilo que lhcs é recusado
pelos dominantes - qualquer seja sua
�to, con­
atitude depois: resignação, nega
testação, imiL,ção ou recalquc".
poderosamente segundo sua posiçío nas
Iw nos afustafmos do implícito espon­
tâneo que babita o conceito de cultura
popuhr somos leY.ldos dc volta à nossa
pergunta inici.-.J: como articular (e não SÓ
utili:cJf de fonna altemad,) esses dois
pensar, enunci.v, fazer. Esta COnSI:lt'lÇão
popuhr que são, de um lado, a descrição
tivas doo; indivíduoo; ou das comunidades
com os constranguncntos, as no rmas e as
•
convenções que limitam
-
m:ljs ou
menos
relações de dominaçío - o que lhes é lícilO
vale para uma história das obras letradas,
pois elas se inscrevem sempre no campo
dos possíveis que as IOmam pensáveis.
Vale para uma história d"lS pr:íticas que
são, clas L,mbém, in""'çõcs de sentido
limiIadas pelas múltipL"lS dcterminaçõcs
(sociais, religiosas, institucionais etc.) que
definem, para Clda comunkbcle, os com·
port:lmenlOs legítimos e as norm."lS incor­
poradas. Ao caráter aUIOm.ítico e impcs­
sool da produçío de sentido L-.J como
poo;rula o "Iingu/sllc tum", é preciso opor
outra pcrspectiY.l que enEuQe as diferen­
ças, as liberdades cultural c soci.-.Jmente
detcnn.inadas, que os " interstícios ineren ­
tes aos
si<tem."lS gerais de normas lou as
contradições e:xistentcscntre elesl derom
par� 00; alOres". 30
modelos de in teligíbilidadc da cultura
dos mecanismos que ICY.lm os domina­
dos a interiorizar sua própria ilcgilimida­
de cultural e, de outro lado, o reconhcci­
mcn 10 d"lS expressões pelas quais uma
ar,
cultura dominad.. "consegue organiz
Inuma) coerência simbólica cujo princi­
pio lhe é próprio, as expcriências da sua
condição,,�l A resposta nio é fácil e he­
sita entre duas alternativas: operar uma
trj.,gem entre as priticas rmis submcti­
das à dominação e aqucL"lS quc usam de
astúcia com ela ou a gn
i oram; ou, então,
considerar que cada prática ou discurso
"popular" podc ser objeto dc duas an,Ui­
ses que mosu-cm, alternadamente, sua
autonomia e sua hetcronoml.'l. O cami�
nho é cstreito, dificil, instável nL"lS acredi10 que seja, hojc em dia, o único possível.
Uma segunda dificuladade reside nas
definições implíci�LS de uma calCgoria
como a de "cultura popular". Qucira-se
ou não, esta calCgoria leY.l a perceber a
cultura que ela designa como L10 aulÔno­
m., quanlO as culturas longínquas e como
siruad, simetricamcnte em rel,ção à cul­
rura dominante, letrada, elítisL', com a
qual fonna um par.
preciso dissipar
eSSls duas ilusõcs complementares. De
É
um lado, as culturas populares estão
sempre inscritas numa ordem de legíti­
midade cultural que lhes impõe uma rep­
resen tação da sua própria dependência.
De outro, a relação de dominação, sim­
bólica ou não, nunca é simétrica: "Uma
culrura dominante não se define, em pri-
Notas
1. Oaude Grignon e Jcan-Claude I':!ss.,.
ron, Le SQIXlnI el lepoplJafre. Mlsérabilisme
el popu/lsme en 5OCiologle el el/ lilléralure
(P:uis. G:illinurd / Le Scuil, liaUles ElUdcs,
1989), p.36. A tr.lduÇio espanhola inti,ula·se
Lo ai/lo y lo popli/ar. Miserabillsmo e popu­
lismo en 5OCiologla y ,m IIleraJura (I3arcelo­
na. l.:l5 Edicionc:s de la I�queta, 1992).
2. lbid., p. 37.
3. Robcrt Muchcmblcd, Cli//urepopli/alre
oi ai/lure des él/tes dans la France moderne
(.We-X\IIIle �des) Essal (P:uis, Rammarion,
1978), p. 341. No prefácio de uma reedição
"OJLTUlA POPUlAR"
do seu livro (paris, flammarion, 1991), o au­
tor matiza fortemente seu ponto de vist!.
4. Peter Burkc, /'opular cW/ure in early
modem Europe (London, Mawice Temple
Smilh LId, 1968, reed., New York, Barper and
Row, 1978), p. 207-208 e 270. Há traduo;iio
brasileira, A adlura papwar naldat/e Moder·
na: Europa, 1500-1800 (São P-"ulo, Campa·
oh;;' d!lS Letras, 1989).
5. Jacques Le GoO", "CuILure ccdési!lStique
el cuJture folldorique au Moyen-Age: San t
Mareei de Paris et le dragon" (1970), em
Jacques Le GoO", /'oIU Im auJre Moyen-�.
14. Ibid., p. XIlX.
15. Ricbard H� The uses of liIeracy.
aspecls of warking-c/ass life wl/b speckJ ref
erence lo publicallons anti enlerlalnmenls
(London, Cbauo and Windus, 1957). Ver,
1..3.rIlbém. a tradução frances::a deste li ....o
.. e a
apresentaçio de Je:J.n�laude Passeron, La
cWlure du pauvre. ElUde SUT le slyle de vie
des dasses papldaires en Anglelerre (Paris,
Les EdiLions de Minui� 1970).
16. Janice A. Radway, Readú'8 lhe roman­
i
Temps, travaü el cWlllre en Ocddel7l: 18
",Is (p-.uis, Gallimard, 1977), p. 236-279
..
(dução p. 276). Há tradução portuguesa,
Para wn novo concel/o de ldat/e Média: le,,,,
pa, trabalho e aJllIra no Ocid",le (üsboo,
Esumpa, 1979).
6.Jean-Oaude Schmi lt, "'Religion populai­
re'
l ure folkloriquc", AmulIes Es.. C ,
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1976, p. 941-953.
7. Eugen Weber, Peasanl inIOFr., u:bmet<
lhe tnodemlzalkm of rural France, 1870-
1914 (Sunford, Sunford Univcrsity Press,
1976).
8. LaV.Tcnce W. Lcvine, Higbbrow / Iorv-­
brow, lhe emergence ofaJlluw blerarcby n
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America (Cambridge, Mass ., tlarv.J.rd Ulliver­
SiLY Press, 1988), p. 20&209.
9. David D. H:1I1, resenha do livro de law­
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1990, p. 10-14.
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Genese el slrllClIue dll cbamp /üléraire (Pa­
ris, Editions du Scuil, 1992), p. 89.
1 1 . Michel Foucaul� L'ordre du dlscours
(Paris, G:illimard, 1971), p. 54. A tradução
espan.hola se imitul::a F1 orden dei discurso
(Barcelona, TusquclS EdiLores, 1987).
12. Paul Ricoeur, Du lexle à /'action. Es­
sais d'bermélleullqzJe 11 (paris, EdiLions du
Scuil, 1986), p.152-1S3. llá Lr"dução ponu­
&\'esa,no le_'10àt1fM: ensaios de bermeneu­
tica (porlD, Res, 1989).
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lidien, L. Arls de faire, (1980, rced. l"w,
G:illimard, 1990), p. XXXVlI. I·lá tradu,lo bra­
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fa'P1 (pclJ'Ópolis, Vozes, 1994).
191
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18. Roger Charticr, "Ocs 'scaét:tircs' pour
Les modCles épisLolaircs de l'An­
den Régirne entre littérature de cour el livre
de colporlage", em La cofTespondallce. les
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da por Reger CharLier, P:uis, 19') 1). p. 159L
esparlhola: "Los sccret:lJias.
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cxpéricnccs soO:l1cs: la liuér.llurC de 13 gucu­
serie duns la UibüOlbeque nteue", em Roger
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E.S.C , 1989, p. 1505-1520 (este último tem
ttaduç50 em ponuguês: UO mundo como
representaçio", Esludos Allançados, 5/11,
j:ln-abt 1991, p. 17}.191).
31. Je....Oaude \':!'<cron, op. ciL, p. 61.
32. Ibid., p. 92.
(Recebido para pllblicação em
agoslo de 1994)
Roger Cbartler é diretor de esOldos na
EeoIe dc:s Hautes Eludes en Scienees SociaIes.
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