República da Guiné-Bissau - SRSG on Violence Against Children
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República da Guiné-Bissau - SRSG on Violence Against Children
República da Guiné-Bissau Ministério da Solidariedade Social e Luta contra a Pobreza Secretariado Nacional de Luta contra o Sida Análise da Situação das Crianças Orfãs e Vulneraveis na Guiné-Bissau Elementos para uma Estrategia Nacional de Proteccao Social Para Orfaos e Criancas Vulneraveis Lidia Germain Alfredo Handem Bissau, 1 Outubro de 2008 Elementos para uma Estrategia Nacional de Proteccao Social Para Orfaos e Criancas Vulneraveis Page 1 sur 102 « Nous realisons ce que nous voulons realiser. Si nous ne realisons pas quelque chose, c’est parce que nous n’y avons pas applique toutes nos facultes.» Muhammad Yunus, Premio Nobel da Paz, 2006 Elementos para uma Estrategia Nacional de Proteccao Social Para Orfaos e Criancas Vulneraveis Page 2 sur 102 Sumario 1. INTRODUCAO 1.1. Antecedentes 1.2. O compromisso com a crianca 1.3. Quadro analitico: quem sao as criancas vulneraveis 1.4. Vulnerabilidade e politicas publicas 1.5. O que e proteccao social 1.6. Contexto geral 2. ANALISE DA SITUACAO 2.1. Vulnerabilidade estrutural Pobreza da crianca Ma nutricao Trabalho infantil Acesso aos servicos basicos 2.2. Vulnerabilidade aguda Criancas privadas de meio familiar Criancas expostas a violacao de sua integridade psico-fisico 3. ANALISE DA RESPOSTA 3.1. Mecanismos destinados a criar um ambiente favoravel aos grupos vulneraveis Luta contra a pobreza Proteccao do estatuto juridico da crianca Campanha de sensibilizacao 3.2. Politicas sociais basicas inclusivas e mecanismos de apoio a demanda Registo de nascimento Elementos para uma Estrategia Nacional de Proteccao Social Para Orfaos e Criancas Vulneraveis Page 3 sur 102 Acesso a saude A luta contra o HIV/SIDA Acesso a educacao 3.3. Mecanismos de apoio aos rendimentos 3.4. Mecanismos de proteccao social com base contributiva 3.5. Mecanismos de assistencia de base nao contributiva 3.6. Sistemas de proteccao da crianca Accoes transversais/tematicas 4. ESTUDOS DE CASO: SECTOR AUTONOMO BISSAU (SAB), BAFATA E CACHEU 4.1. Introducao 4.2. Constatacoes gerais 4.3. Principais constatacoes e conclusoes dos estudos de caso: Sector Autonomo Bissau (SAB) 4.4. Principais constatacoes e conclusoes dos estudos de caso: Regiao de Bafata 4.5. Principais constatacoes e conclusoes dos estudos de caso: Regiao de Cacheu 4.6. Conclusoes gerais dos estudos de caso 5. CONCLUSOES E RECOMENDACOES 5.1. Objectivos do estudo 5.2. Dificuldades e limitacoes 5.3. A abordagem da problematica 5.4. Analise da situacao 5.5. Analise da resposta 6. PROPOSTA DE ESTRATEGIA NACIONAL DE PROTECCAO SOCIAL PARA ORFAOS E CRIANCAS VULNERAVEIS 6.1. Eixos estrategicos das intervencoes 6.2. Meios Elementos para uma Estrategia Nacional de Proteccao Social Para Orfaos e Criancas Vulneraveis Page 4 sur 102 Anexo I – Lista das pessoas encontradas Anexo II – Bibliografia Anexo III – Lista das actividades desenvolvidas por zona geograficas para os estudos de caso Anexo IV – Lista de pessoas encontradas para os estudos de caso Anexo V – Inquiridores para os estudos de caso Elementos para uma Estrategia Nacional de Proteccao Social Para Orfaos e Criancas Vulneraveis Page 5 sur 102 1. INTRODUCAO “As criancas guineense estao sendo prejudicadas pela politica dos adultos”. A afirmacao deste juiz e confirmada pela situacao de grande vulnerabilidade das criancas guineenses, expostas a riscos que ameaçam gravemente a sua saúde e o seu desenvolvimento: a mortalidade infantil no pais permanece entre as mais elevadas do continente; apesar de avanços importantes na educação, o analfabetismo e uma ameaca concreta; as crianças são ainda expostas a a trabalho precoce, a exploração e discriminacao. O fraco desenvolvimento dos indicadores sociais da Guine Bissau é preocupante e se medidas importantes a curto e médio prazo não forem implementadas a presente geração de criancas risca de ser perdida e o futuro do país de estar ainda mais comprometido. A realização dos direitos básicos das crianças guineenses a vida e ao desenvolvimento, a uma educação de qualidade e a protecção contra toda forma de violência e uma tarefa urgente que necessita de uma intensificação e conjugação de esforcos e uma organizacao mais rigorosa. A pedido do Governo do Guine Bissau, e em particular do Ministério da Solidariedade, este documento apresenta uma analise rapida da situacao das criancas mais vulneraveis e propoe linhas estratégicas para reduzir sua vulnerabilidade. Este trabalho situa-se no contexto de elaboraçao de uma Politica nacional de protecçao social a ser implementada em concertação entre todos os actores e visa clarificar os desafios e os objectivos relativamente à protecçao do grupo mais vulneravel da populaçao – as crianças. A proteccao social é vista como um mecanismo de reforço do conjunto das politicas sociais basicas destinadas a realizar os direitos fundamentais da crianca. Como tal, a proteccao social não pode dar respostas globais que dependem das politicas de desenvolvimento e de reducao da pobreza. A proteccao social e concebida como o complemento necessario com vistas a nao deixar para tras os grupos mais vulneraveis, por definicao excluidos dos servicos basicos. Uma atenção especial é acordada à análise do impacto do HIV/SIDA nas famílias e nas crianças, tendo em conta as gravissimas consequencias causadas pela epidemia sobre o bem estar da crianca em outros países: altos números de crianças órfãs de pai e mãe, incapacidade das famílias alargadas a acolherem todos os orfaos, crianças nos cuidados dos avos, famílias a sofrer problemas de estigmatização nas comunidades e de discriminação em relação ao acesso aos serviços básicos. 1.1. Antecedentes Este trabalho tem lugar num momento em a luta contra o HIV/SIDA é considerada um dos maiores desafios da actualidade. A recente conferência de México sobre o Sida revelou dados verdadeiramente espantosos. Só em 2007, houve 2,7 milhões de novos casos da doença no mundo, elevando o número de infectados para cerca de 33 milhões. As Nações Unidas estimam que 7.400 pessoas sejam infectadas diariamente pelo Sida no mundo, 45% delas têm entre 15 e 24 anos. De entre as pessoas infectadas 67% residem na região sul de África, o que equivale a cerca de 22 milhões de infectados. Elementos para uma Estrategia Nacional de Proteccao Social Para Orfaos e Criancas Vulneraveis Page 6 sur 102 Segundo o relatório das Nações Unidas apresentado na referida conferência, cerca de 370 mil crianças foram afectadas pelo VIH em 2007 e, mais de 270 mil dessas crianças acabaram por morrer. Entre 2001 e 2007, o número de crianças com Sida no mundo passou de 1,6 milhão para 2 milhões1. Esses dados são extremamente importantes na medida em que nos remete a todos (intelectuais, camponeses, estudantes, políticos e homens de negócio) a uma auto-reflexão sobre as nossas acções, atitudes e comportamento face a essa doença do século. Na Guiné-Bissau, a situação em relação a evolução da taxa do HIV/SIDA é cada vez mais preocupante. De acordo com a projecção nacional (MINSAP/DHE – estudo sentinela, 2006), a Guiné-Bissau poderá até o fim de 2008 contar com cerca de 100.000 pessoas infectadas pelo Sida, o que equivale dizer que 7 em cada 100 pessoas poderão provavelmente ficar infectados até esse período. Em todos os paises atingidos pelo HIV/SIDA , a resposta à vulnerabilidade social provocada pela doença nas familias e nas criancas atingidas é parte integrante dos esforcos nacionais de luta contra a epidemia. Em particular, o fenómeno inedito de aumento exponencial do numeros de orfaos devido ao SIDA tem necessitado de respostas de grande alcance para assegurar os direitos basicos destas criancas. Na Guine Bissau, a crise dos orfaos que tem atingido outros paises nao esta ainda presente. Porem, existe a preocupacao que isto possa vir a acontcer nos proximos anos. De qualquer modo, a resposta ao impacto do HIV/SIDA nas familias e nas criancas e uma componente da luta contra a SIDA no pais. Desde a elaboracao do primeiro Plano Nacional de luta contra a HIV/SIDA (2003-2005), os actores da area social guineense tem se confrontado com o desafio de elaborar uma estrategia nacional multidisciplinar nesta area.Varios passos foram dados nesta direcção, em particular com uma missão em 2003, apoiada pelo Banco Mundial, que teve o objectivo de desenvolver a componente Orfaos e Criancas Vulneraveis do MAP (Multisectoral AIDS Project). Face aos desafios lancados por este estudo preliminar2, os actores – engajados em algumas acções isoladas - optaram pela coordenação como condição de partida para a busca de soluções. Decidiu-se assim pela criação de uma comissão multidisciplinar que coordenasse os actores da luta contra a SIDA e os actores da area social em torno de iniciativas e solucoes articuladas entre elas. A Comissao OVC (Orfaos e Criancas Vulneraveis) foi criada por decisão conjunta do Ministerio da Solidariedade Social, Familia e Luta contra a Pobreza (MSSFLP) e do Secretariado Nacional de Luta contra a SIDA (SNLS), e com o apoio do UNICEF. Esta Comissão OVC é coordenada pela Directora da Solidariedade e da Familia, Dr. Inacia Mendes, com o apoio do SNLS, Dr. Magda Lopes, e do UNICEF, seccao de HIV/SIDA e de Proteccao. Ela integra as seguintes organizacoes: AIDA Aldeia SOS AMIC Casa Emanuel Ceu e Terra IMC 1 Jornal “Última Hora”. 1 Agosto 2008, Rapport de fin de mission - Composante appui aux orphelins et groupes vulnerables, Projet d’appui de la Banque Mondiale a la lutte contre le SIDA en Guine Bissua, Janeiro 2004 2 Elementos para uma Estrategia Nacional de Proteccao Social Para Orfaos e Criancas Vulneraveis Page 7 sur 102 INDE Tribunal Regional de Bissau O objectivo da Comissao OVC é portanto de coordenar a intervenção dos diversos actores em torno do reforco da resposta ao impacto social ao HIV/SIDA. Face a amplitude da vulnerabilidade no pais, os actores adoptaram a postura de abordar a problematica dos orfaos e das criancas vulneraveis como um todo, seja qual for a fonte de vulnerabilidade. Para tal, foi decidida a elaboração de uma estrategia para orfaos e criancas vulneraveis na Guine Bissau no contexto mais amplo de elaboração da Politica Nacional de Proteccao Social. Apos multiplas discussões, a Comissão decidiu que o primeiro passo deveria ser a elaboracao de um estudo que analisasse o impacto do HIV/SIDA e de outros factores de vulnerabilidade sobre as criancas guineenses. Um conhecimento mais apurado da realidade social das familias e das criancas atingidas pela epidemia, das diferentes facetas do impacto da doenca e dos obitos devidos ao HIV e das dimensoes da discriminacao ligada ao HIV/SIDA nas comunidades guineenses poderia fornecer as orientacoes necessarias para desenhar a resposta social mais adequada as necessidades destas familias e de suas criancas. Com base no estudo, seria elaborada uma estrategia nacional, partilhada pelo Estado e pelas organizacoes nao governamentais, que orientasse as respostas, fazendo convergir os esforcos de todos para os mesmos objectivos prioritarios. O presente relatorio e a estrategia apresentada é o fruto deste trabalho. O presente trabalho foi realizado numa perspectiva participativa, isto é o relatorio é concebido como uma mise en forme dos conhecimentos, experiencias e solucoes perspectivadas pelos diferentes actores atraves de suas experiencias de terreno. Ele foi tambem levado a frente como um processo ao longo do qual, os diferentes parceiros partilham uns com os outros seus conhecimentos e suas experiencias e melhoram as suas praticas. Foram tambem organizadas pelos consultores duas sessoes de trabalho para partilhar a abordagem analitica do estudo em termos de vulnerabilidade e de proteccao social. O estudo foi elaborado com base na seguinte metodologia: - um etat des lieux baseado na documentacao existente e em consultas intensas com os diversos actores da area governamental e nao governamental; a lista das pessoas encontradas esta em anexo. - tres estudos de caso regionais (SAB, Bafata e Cacheu) para um aprofundamento dos temas do estudo atraves da proximacao das realidades locais. A metodologia especifica utilizada para os estudos de caso esta referida no capitulo correspondente. A estrategia proposta resulta do conjunto das analises contidas no estudo. 1.2. O compromisso com as criancas vulneraveis A Guine Bissau é Estado-parte de alguns dos instrumentos fundamentais da normativa internacional destinados a proteger os direitos da crianca no geral e das mais vulneraveis em particular. O pais ratificou a Convenção sobre os direitos da criança em 1990. Em 2001 o país ratificou os dois protocolos facultativos da Convenção. Em 200_ ratificou a Carta Africana dos Direitos e Bem Estar da Criança. A Guine Bissau tambem e parte das Convencoes da OIT 138 de 1973 sobre a idade mínima para o trabalho, nº 182 de sobre a erradicação das piores formas de trabalho das crianças. A Convenção sobre a Eliminação de todas as formas de discriminação e a Carta Africana dos direitos e bem-estar da criança foi ratificada em 2007. Elementos para uma Estrategia Nacional de Proteccao Social Para Orfaos e Criancas Vulneraveis Page 8 sur 102 O país registou varios progressos ao nivel de implementacao dos direitos da crianca no geral porem a consenso de que « o pais deve aumentar significativamente o grau de aplicaçao dos direitos consagrados na Convençao »3. Outros parametros sobre os quais o Estado engajou-se e que constituem metas imprescendiveis para o bem estar da populaçao em geral e das crianças em particular sao os Objectivos do Milenio (ODM) e a Declaracao para o Um mundo para a Crianca. O acompanhamento dos ODM4 mostra uma situaçao muito desafiadora nos sectores da saude e da educaçao. No sector da saude, as metas para a mortalidade infantil e materna estao longe de serem atingidas. Em particular a situaçao da mortalidade infantil demora extremamente preocupante com o incremento registado entre 2000 e 2006. No sector da educaçao, o objectivo de escolarizaçao primaria universal para 2015 e considerado de dificil realizaçao, uma vez que o abandon escolar faz com que apenas 42% das crianças atinjam o ultimo ano do ciclo primario. O IDH (Indice de Desenvolvimento Humano) permite estabelecer algumas comparaçoes entre paises quanto aos indicadores basicos. Baseado em dados de 2005 que constam do relatório de 2007-2008 do PNUD sobre desenvolvimento humano, o índice de desenvolvimento humano da Guiné-Bissau é entre os mais baixos do mundo: 0,374 (175esimo lugar entre 177 paises, só seguindo pelo Burkina Faso e a Serra Leoa). A esperança de vida ao nascer é de 45 anos e a taxa de analfabetismo 63%. O PIB per capita e de 827 USD. Isto significa que sem uma vontade politica forte de reverter este quadro, “as criancas guineenses serap realmente prejudicadas pela politica dos adultos”. Seja qual for o parâmetro, o dado fundamental da realidade politico-institucional guineense permanece o impacto negativo do conflito de 1998 e a instabilidade politico-institucional que dele resultou sobre o desempenho económico do pais e a sua governação. A rotatividade incessante dos cargos executivos, em particular nos sectores chave das políticas sociais, tem um impacto incalculável no bem-estar da criança, comprometendo o futuro.5 As recomendações contidas neste estudo exigem para sua implementação um cenário marcado por uma forte vontade política para priorizar a criança, bem como um bem colectivo inestimável do pais e promessa de bem estar futuro, uma orientação forte em direcção a redução da pobreza, um cenário de estabilização progressiva mas irreversível do pais em termos políticos e institucionais e um desempenho económico favorável. Estes elementos constituiriam o pano de fundo imprescindivel sobre o qual poderia assentar uma politica social do Estado capaz de garantir a populacao seu bem estar e sua contribuicao aos processos politicos e economicos nacionais. 1.3. Quadro analitico: quem sao as criancas vulneraveis? O objectivo central deste estudo é identificar estratégias de acção de proteccao social das criancas vulneraveis em particular a serem implementados de uma forma coordenada entre os actores e em relação aos quais o Estado preencha seu papel de orientação (fixação dos objectivos), de coordenação, de execucao (nao obrigatoriamente) e de supervisão e controlo. A primeira tarefa e 3 Republica da Guine Bissau, Relatorio sobre aplicabilidade da Convencao dos direitos da crianca, 2008 4 5 De 2000 a 2007, anos chave para o atingimento da ETP em 2015, onze ministros da educacao foram nomeados, o que impediu a relaizacao de progressos consistentes. Elementos para uma Estrategia Nacional de Proteccao Social Para Orfaos e Criancas Vulneraveis Page 9 sur 102 portanto aquela de esclarecer qual e o grupo alvo deste estudo, a quem nos referimos quando falamos de criancas vulneraveis. Uma observacao preliminar e a de que a crianca a crianca e vista prioritariamente como integrante de um nucleo familiar, o qual sera alvo das principais intervencoes. Com efeito, toda familia deveria estar em condicoes de promover ao bem estar de suas criancas de maneira autonoma. Isto nao impede que haja intervencoes de proteccao social que visem directamente as criancas, porem sem perder de vista a sua pertenca familiar e o reforco desta mesma pertenca. Tendo em conta as diferentes situacoes de vulnerabilidade as quais as criancas se encontram confrontadas e a realidade das estruturas familiares na Guine Bissau, optou-se por nao utilizar o acrónimo OVC (orfaos e criancas vulneraveis)6. Em Africa, a orfandade biologica, conceito herdado da historia da assistencia social nos paises occidentais, nao e sistematica e necessariamente um factor de vulnerabilidade. Pode-se dizer sem muito receio de se enganar que o nível de vulnerabilidade da criança órfã depende do nível de vulnerabilidade do agregado familiar onde ela se encontra. Por esta razao optou-se por estudar o universo das criancas vulneraveis como um todo, qual que seja a causa desta vulnerabilidade. Niveis/ degraus de vulnerabilidade A vulnerabilidade é um fenomeno social complexo que assenta na interacçao de factores economicos, sociais e culturais, a nivel individual, comunitario e global. De uma forma geral, a vulnerabilidade indica um degrau elevado de esposiçao a situaçoes adversas para o bem estar conjuntamente a uma limitada capacidade de reagir e de se proteger contra os efeitos destas adversidades. A vulnerabilidade economica refere-se à ausencia ou precariedade subita ou cronica dos rendimentos familiares, e às consequencias que esta acareta em termos de consumo de bens e servicos. A vulnerabilidade social, que pode ser relacionada ou nao à vulnerabilidade economica, refere-se à exposiçao condiçoes sociais de vida adversas e/ou à sua deterioraçao. Para os fins de elaboraçao de politicas publicas voltadas especificamente para a criança, a abordagem mais productiva da vulnerabilidade parece ser aquela que define os diferentes tipos de vulnerabilidade tendo em conta os dominios de politica social a esta relacionado. Neste sentido parece util distinguir entre varios degraus de vulnerabilidade. As criancas sao o grupo vulnerável por excelência em qualquer sociedade, junto com os idosos e as pessoas portadoras de deficiência, devido a sua condicao de pessoas em desenvolvimento. Esta vulnerabilidade ontológica assenta na dependencia da crianca dos adultos para satisfacao de suas necessidades basiicas que garantam sobreviviencia e bem estar. Quanto mais nova a crianca maior a sua vulnerabilidade ontologica. A vulnerabilidade ontologica da crianca constitui a razao fundamental que deveria empurrar os governos para uma priorizacao da crianca em todos os dominios das politicas publicas. Com efeito, as crianças sao um bem colectivo inestimavel, 6 Este acronimo identifica os orfaos como um grupo particular dentro do universo das criancas vulneraveis. Se em alguns países, em particular aqueles duramente atingidos pelas epidemia de HIV/SIDA, os orfaos constituem efectivamente um grupo importante dentro do universo das criancas vulneraveis, em outros países nem todas as criancas vulneraveis sao orfas nem todas aquelas que sao orfas sao vulneraveis. Isto tem causado algumas dificuldade na identificação dos OVC e ate criado alguns equívocos e mesmo distorções nas metodologias de identificação dos grupos alvos de certos programas e intervenções. Elementos para uma Estrategia Nacional de Proteccao Social Para Orfaos e Criancas Vulneraveis Page 10 sur 102 representam a parte mais consistente do capital humano de um país e como tal tem um papel fundamental em assegurar o desenvolvimento futuro, inclusive o bem estar económico. Os indicadores sociais básicos da Guine Bissau apontam também para um alto nível de vulnerabilidade estrutural da populacao: os indicadores como o IDH, compósito de esperança de vida, taxa de alfabetização e de mortalidade infantil, são entre os mais baixos do mundo. Outros indicadores da vulnerabilidade estrutural são os níveis de pobreza, o nível de acesso aos serviços sociais básicos e o nível de participação cidadã na vida política e civica. O conceito de vulnerabilidade aguda diz respeito especificamente à criança: encontra-se em situação de vulnerabilidade aguda a criança privada de meio familiar e exposta à violação da sua integridade física, psicológica e social. Para cada realidade nacional ou regional, o conceito de vulnerabilidade aguda deve ser especificado tendo em conta os riscos específicos ao contexto. Para terminar, utiliza-se também o conceito de vulnerabilidade legal. As crianças que se encontram nesta situação são aquelas cuja situação (colocação familiar, protecção jurídica, devido processo para os infractores) deveria ser resolvida pelos órgãos judiciais e que correm o risco de um tratamento inapropriado ou inexistente por parte destes orgaos. A vulnerabilidade devido ao HIV/SIDA é de tipo transversal e sera mais grave quanto maior for a vulnerabilidade estrutural. Numa situacao em que a maioria da populacao infanto-juvenil se encontra em situacao de vulnerabilidade estrutural, pode provocar a exposicao das criancas tornadas orfas a situacoes de vulnerabilidade aguda, com perda dos pais e responsaveis e exposicao a situacoes de violacao da integridade pessoal e ate de vulnerabilidade legal. O esquema abaixo sintetiza os efeitos graduais do impacto do HIV/SIDA sobre o nucleo familiar e as criancas : Infecção pelo VIH Doenças na família A criança na família afectada pelo VIH Crianças prestadoras de cuidados Degradação estado psico-social Morte dos pais Problemas económicos Problemas de herança Crianças sem os cuidados de adultos Abandono escolar Discriminação Malnutrição Trabalho infantil Problemas sociais Exploração sexual Acesso à serviços de saúde Vida na rua Vulnerabilidade ao VIH 15 Source: Williamson March 2000 Elementos para uma Estrategia Nacional de Proteccao Social Para Orfaos e Criancas Vulneraveis Page 11 sur 102 O quadro a seguir resume os diferentes niveis/tipos de vulnerabilidade e identificar para cada um categorias de criancas : Nivel/tipo Vulnerabilidade ontologica Vulnerabilidade estrutural Factores Dependencia para satisfacao das necessidades basicas Pobreza Acesso limitado aos servicos basicos Vulnerabilidade aguda Precariedade/dissolução do núcleo familiar e de suas funções de protecção da criança Vulnerabilidade legal Disfuncoes no funcionamento dos orgaos de justica Discriminacao Doenca e obito dos pais Vulnerabilidade devido ao HIV/SIDA Categorias Todas as criancas Criancas de agregados familiares em situacao de pobreza extrema Criancas excluidas: nao registadas, sem acesso aos servicos de saude, fora da escola Criancas em situacao de malnutricao Criancas trabalhadores precoce Crianças privadas do meio familiar: Orfaos sem possibilidade de acomodação dentro da família alargada, criancas institucionalizadas, crianças de rua Criança vitima de violação de sua integridade fisica e psiquica: criancas vitimas de trafico, vitimas de abuso e exploração, vitimas de praticas nefastas Adolescentes autores de infraccao penal Crianças vivendo num contexto familiar atingido pelo HIV/SIDA Orfaos de sem possibilidade de acomodação dentro da família alargada Crianças chefes de familia Crianças no cuidado dos avos em situação de pobreza Crianças seropositiva e doentes de SIDA 1.4. Vulnerabilidade e politicas publicas Esta abordagem da vulnerabilidade por degraus tem a vantagem de permitir identificar domínios de politicas publicas diferenciados e complementares para cada nível de vulnerabilidade. A cada nível de vulnerabilidade corresponde grosso modo um sector de politicas públicas. As políticas de desenvolvimento, de reducao da pobreza e as politicas sociais basicas destinamse a reduzir o degrau de vulnerabilidade estrutural da populacao como um todo, incluindo a crianca e o seu ambito familiar e tem como alvo toda a populaçao infanto-juvenil. Uma cobertura universal das politicas sociais basicas de registo civl, saude e educacao e o instrumento primordial para prevenir situacoes de vulnerabilidade mais grave e mais onerosas de se aliviar. A politica de protecçao social visa garantir o bem estar dos segmentos mais vulneraveis da populacao e tem como alvo as crianças pertencentes a familias em situaçao de vulnerabilidade economica e social, inclusive aquela devido ao HIV/SIDA. Tambem contribuir para prevenir situacoes de vulnerabilidade mais grave. A politica de protecção da criança visa assegurar os direitos basicos das crianças em situacao de vulnerabilidade aguda: privadas de meio familiar e vitimas de violaçao dos seus direitos humanos fundamentais à integridade psico-fisica (abuso e exploraçao). Elementos para uma Estrategia Nacional de Proteccao Social Para Orfaos e Criancas Vulneraveis Page 12 sur 102 Uma política de garantias legais e necessaria para assegurar que as crianças que infringem a lei penal sejam atendidas adequadamente. A vulnerabilidade devido ao HIV/SIDA, por sua natureza transversal, deve ser atacada conjuntamente pela politica de luta contra o HIV/SIDA e a proteccao social dos grupos atingidos. A politica de registo civil de garantir à criança o reconhecimento oficial da sua existencia enquanto cidadao do Estado guineense ; A politica de saude de garantir a sobreviviencia e um estado de saude aceitavel da criança; A politica de educaçao de garantir à criança o desenvolvimento das capacidades cognitivas e sociais que lhe permitirao de tornar-se um adulto responsavel e produtivo ; A politica de protecçao social de proteger as populacoes mais vulneraveis contra os riscos (malnutriçao, doença, trabalho infantil) e sustentar seu acesso ao serviços basicos; A politica de protecçao da criança, de intervir nas situaçoes em que a crianca e privada de meio familiar e nos casos em que a integridade psico-fisica da criança é violada; A politica de garantias legais de assegurar que a criança autora de infracçoes descritas na lei beneficie da aplicaçao de uma lei especifica e de medidas adequadas de atendimento socio-educativo; A Luta contra o HIV/SIDA de prevenir as situacoes de vulnerabilidade acarretadas pelo impacto da epidemia nas familias e nas criancas. 1.5. O que e a proteccao social Como mencionado, a protecçao social destina-se a proteger os cidadaos em estado de vulnerabilidade e a assegurar seus direitos sociais basicos e um nivel de vida suficiente e digno. Estas politicas incluem todos os mecanismos que visam proporcionais meios de subsistencia (rendas ou bens) para os pobres, os serviços destinados a proteger os vulneraveis contra os riscos sociais e as accoes que melhoram as condiçoes sociais e os direitos dos grupos pobres, vulneraveis e marginalizados. Existem muitas definiçoes de protecçao social, mas de uma forma geral todas elas fazem referencia à necessidade de proteger os cidadaos contra os riscos economicos (insuficiencia ou perda de rendimentos) e sociais (degradaçao do bem estar), em particular dos grupos mais vulneraveis, os quais tem menos capacidade de reagir e se proteger contra estes riscos de uma forma autonoma. PROTECCAO SOCIAL Un conjunto de mecanismos (prestacoes financeiras, materiais e servicos) destinados a assegurar a proteccao das pessoas, em particular dos grupos mais vulneraveis frente aos riscos economicos et sociais Existem por conseguinte muitas formas de abordar a proteccao social. Aqui propoe-se abordar a proteccao social a partir dos tipos de intervencoes que podem ser consideradas como integrantes deste sector. O esquema proposto a seguir va do mais geral ao mais particular, das intervencoes mais abrangentes destinadas aos grupos vulneraveis aquelas mais especializadas, conforme o grafico seguinte : Elementos para uma Estrategia Nacional de Proteccao Social Para Orfaos e Criancas Vulneraveis Page 13 sur 102 Proteccao Social Mecanismos de Criacao de um Ambiente Favoral Aos grupos vulneraveis - Politicas Pro-poor (Empregos, Salario Minimo) - Protecca Juridica - Campanhas de sensibilizacao Politicas sociais Basicas Inclusivas - Registo civil - Saude - Nutricao - Atencao a Pequena Infancia - Educacao - Educacao Informal Mecanismos de Apoio a demanda Para o acesso Aos servicos Sociais de base - Carta de Acesso Gratuito a Consultas, medicamentos - Restaurante, Transporto, Material Escolar Mecanismos de Apoio aos rendimentos - Formacao - Microcredito - Empregos Subvencionados, - AGR, ect Mecanismos de Proteccao social No sentido stricto -Base contributiva formal ou informal -Base nao contributiva =Proteccao social da cidadania: Subsidios Financeiros Servicos Sociais Proteccao Especial Da crianca Vtima de Abuso e exploracao - Proteccao Juridica - Servicos Sociais 1. Mecanismos que visam uma transformaçao global favoravel aos grupos vulneraveis do ambiente socio-economico (por exemplo politicas de crescimento economico que visam explicitamente integrar os mais pobres), das politicas sociais (priorizaçao dos grupos mais fracos), das leis (estatutos, direitos e protecçao de certos grupos vulneraveis e marginalizados) e dos comportamentos e atitudes da populaçao (por exemplo campanhas de comunicaçao social para mudanças de comportamentos em relaçao a certos grupos). 2. Politicas sociais basicas inclusivas com mecanismos de apoio directo a demanda, destinados a garantir o acesso das populacoes vulneraveis aos servicos basicos ; 3. Mecanismos de apoio aos rendimentos, incluem as accoes que visam manter ou gerar rendimentos para os grupos vulneraveis (formacao, micro-credito, empregos subvencionados, etc.) A seguir, encontramos os mecanismos da proteccao social no sentido mais restrito, tradicionalmente divididos entre mecanismos de base contributiva, formal ou informal, e mecanismos de base nao contributiva financiado pelas financas publicas, conforme o grafico em baixo : Elementos para uma Estrategia Nacional de Proteccao Social Para Orfaos e Criancas Vulneraveis Page 14 sur 102 Os mecanismos da Proteccao social No sentido mais restrito Mecanismos com Base nao Contributiva Financiados pelo Orcamento publico Mecanismos com Base contributiva Financiados pelas partes Seguros Publicos/privados Mecanismos Comunitarios/ Informais (mutualidades=caixas poupanca e credito) Prestacoes financeiras a Categorias Especificas da Popu;acao Assistencia social Com base em Criterios de seleccao Servicos Sociais Especializados Às pessoas 4. Mecanismos de base contributiva, sendo os seguros obrigatorios a forma mais classica. Este tipo abrange tambem os mecanismos informais e comunitarios, como as mututalidades e as caixas de poupanca e credito. 5. Mecanismos de assistencia de base nao contributiva, sao financiado pelo orcamento publico ou por outras fontes, e destinam-se a assegurar aos grupos mais vulneraveis, particularmente aqueles com capacidade reduzida para o trabalho, um minimo de capacidade de sobrevivencia. 6. Servicos sociais especializados as pessoas, nao implicam em transferencia de subsidios mas visam oferecer as pessoas com necessidades especiais uma assistencia individualizada pelos profissionais como assistente sociais, psicologos, terapeutas, etc. O sistema formal de proteccao da crianca em situacao de risco pessoal e social constitui o conjunto de servicos mais relevantes nesta area. Ele articula o sector judiciario, responsavel pela proteccao judicial da crianca e, se tiver crime, pelo sancionamento de seu autor, e o sector social (autoridade administrativa), para o atendimento social especializado da crianca, conforme o grafico abaixo: Elementos para uma Estrategia Nacional de Proteccao Social Para Orfaos e Criancas Vulneraveis Page 15 sur 102 Notificação Polícia Indivíduos, vitima MCS Resposta judicial Autoridade judiciaria Atendimento policial de emergência Aplicação medida Protecção da criança Averiguação, julgamento e sancionamento do autor do crime Resposta social Autoridade administrativa Requisição de Tratamento médico Reabilitação psicosocial Localização dos pais Reintegração e Acomp. familiar Acolhimento provisório Atendimento social de emergência Apoio social à criança e à família Apoio acesso serviços básicos Apoio colocação família substituta registo, educação, saúde Em conclusao, quanto mais os serviços basicos universais de registo civil, de saude e de educaçao serao disponiveis para todo o universo infanto- juvenil e quanto mais eles forem de boa qualidade, tanto mais a protecçao social podera ter uma funçao complementar e supletiva, podera ser verdadeiramente selectiva e virada para as camadas mais vulneraveis. Na ausencia de politicas sociais basicas eficazes, a protecçao social torna-se principalmente uma tentativa de corrigir as carencias destas politicas basicas e portanto insustentavel. A piramide das politicas para a crianca apresenta os diversos tipos de politicas publicas: Elementos para uma Estrategia Nacional de Proteccao Social Para Orfaos e Criancas Vulneraveis Page 16 sur 102 Elementos para uma Estrategia Nacional de Proteccao Social Para Orfaos e Criancas Vulneraveis Page 17 sur 102 1. 6 Contexto geral Demografia A população guineense esta estimada a 1.320.595 pessoas7, com uma taxa de crescimento anual em torno de 2.2% nos últimos anos. A taxa de fertilidade total estima-se a 7,1 . A população é jovem. Mais de 50% da população são crianças com menos de 17 anos de idade. A população é maioritariamente rural. A população urbana, que era 18% em 1991, esta estimada hoje em 30 %. Bissau concentra 30% da população. A população apresenta uma densidade de 30 habitantes por km2 porem a população é distribuída de maneira não uniforme no território, sendo que as áreas do litoral são as mais densamente povoadas. Estes dados apresentam dois desafios fundamentais : uma pressao demografica crescente sobre os servicos basicos e a cobertura pelos servicos nas regioes mais afastadas do pais. Contexto politico institucional Nos últimos dez anos o contexto político institucional tem sido marcado por uma grande instabilidade, por mudancas incessantes nas esferas do poder executivo, marcado por divisoes internas nos partidos e tensoes entre os militares e o Governo. O impacto do conflito armado de 1998-1999 foi reforçado pela crise politica de 2003. Espera-se que as proxima eleicoes legislativas de novembro 2008 poderao reforcar a ordem constitucional, garantir maiores condicoes de governabilidade do pais e reforcar a capacidade das instituicoes do Estado de promover os servicos basicos a populacao. Contexto económico A economia da Guine Bissau situa-se entre as mais fracas de Africa, tendo sido afectada severamente pelo conflito armado de 1998-1999, que ocasionou um retrocesso do PNB igual a 28%. A partir daquela data, o crescimento económico tem sido extremamente difícil e em 2001 e 2003 tem sido registadas taxa negativas. O PNB per capita é estimado a USD 180 em 2006. Em 2007, o crescimento do PNB foi estimado a 2,7% (exportacoes da castanha de caju e contribuicoes estrangeiras) e existe a expectativa de que o crescimento em 2008 sera de 3.3%. Porem as receitas fiscais, apesar das medidas tomadas neste dominio, nao permitem cobrir os gastos necessarios para que o sector publico possa funcionar adequadamente. O aumento dos precos do bruto incide tambem negativamente sobre a balanca de pagamentos. A economia continua marcada por uma fraca diversificação. Ela está centrada na agricultura (60% do PNB e 90% das exportações) e é dominada pela rizicultura e a plantação de caju para exportacao. As famílias praticam também uma agricultura de subsistência baseada no arroz, outros cereais, frutas. A pesca artesanal, a pecuária, a silvicultura são outras fontes de rendimentos para as famílias rurais. Os empregos formais são raros e concentram-se na administração do Estado. As taxas de desemprego sao altas, em particular entre os jovens. Contexto sócio-cultural 7 Relatorio nacional sobre Desenvolvimento Humano na Guine Bissau, PNUD, 2006. Elementos para uma Estrategia Nacional de Proteccao Social Para Orfaos e Criancas Vulneraveis Page 18 sur 102 A Guine Bissau é um mosaico de diversas etnias (mais de 30), com predominancia dos Fula (1/4 da populacao) e Balanta (1/4). Os três grupos religiosos –musulmanos, animistas e cristao convivem pacificamente. A estrutura patriarcal é prevalecente em todas as etnias, sem consideração para a religião. O homem é o chefe da família e a nível comunitário predomina o poder regulador dos mais velhos, sendo que as mulheres e as crianças não tem direito à palavra e ainda menos à decisão, incluindo nos assuntos que lhes dizem respeito directamente8. Quanto às estruturas familiares, o modelo preponderante e a familia alargada. As mulheres chefes de familia representam …. O casamento precoce/forçado, as uniões informais, a poligamia e a assimetria entre as idades do homem e da mulher casados ou em união são extremamente recorrentes, em particular em certos grupos étnicos. O relatorio sobre a Convencao dos direitos da crianca poe em realce algumas praticas socioculturais especificas da Guine Bissau que sao contrarias aos direitos da crianca. Em particular, o casamento forcado/precoce, as mutilacoes genitais femininas, o fenomeno das criancas talibe. 8 E referida a exepcao notavel de uma etnia das Ilhas Bijagos. Elementos para uma Estrategia Nacional de Proteccao Social Para Orfaos e Criancas Vulneraveis Page 19 sur 102 2. ANALISE DA SITUACAO 2.1. Vulnerabilidade estrutural Pobreza da criança A pobreza é o factor e o efeito de vulnerabilidade mais difundido no pais. Uma analise completa da pobreza da criança nao esta ainda disponivel, porem sabemos que as crianças são mais pobres do que os outros grupos etarios, uma vez que elas se encontram nos agregados familiares mais numerosos que sao de regra os mais pobres. Dados do MICSIII, confirmam que as criancas de menos de 5 anos na (quintilha) mais pobre e na (quintilha) pobre sao mais numerosas (respectivamente 21.8% e 22.6%) do que nas outras (quintilhas) (por ex. 14,2% na (quintilha) mais rica). Embora a análise da pobreza monetária não seja suficiente para estabelecer o nível de vulnerabilidade dos agregados familiares guineense, ela é sem dúvida seu indicador principal, uma vez que a capacidade económica das famílias constitui um elemento fundamental na prevenção e gestão dos riscos. A grande maioria da população guineense e vulnerável devido a pobreza. A incidência da pobreza é muito elevada: 64,7% dos agregados familiares estão na pobreza – vivem com menos de 2 USD por dia por pessoa – e 20,8% deles estão em pobreza absoluta e vive com menos de um USD por dia9. Uma especificidade é de que as mulheres na faixa etária dos 31 aos 65 anos apresentam taxas de pobreza inferiores àquelas dos homens, devido ao facto de que as mulheres são mais reactivas, dominam o mercado de trabalho informal e recorrem simultaneamente a várias formas de geração de rendimentos enquanto os homens são mais propensos ao trabalho formal, claramente em crise. Nas áreas rurais, as mulheres chefes de família são mais eficazes em prover às necessidades alimentares da família e com efeito apresentam níveis de consumo mais elevados do que aqueles dos homens. Porém as mulheres mais jovens ou mais idosas que aquelas neste grupo etário e as mulheres viúvas ou divorciadas são mais pobres que os homens do mesmo grupo etário. Outra característica da pobreza na Guine Bissau é a vulnerabilidade das famílias que vivem no meio urbano: se por um lado as populações rurais são mais pobres, elas estão menos expostas a choques de tipo económico ou politico uma vez que elas vivem de uma agricultura de subsistência. Os choques de tipo económico mais frequentes sao as flutuações nos preços por ex. dos alimentos e das matérias primas, perda da colheita devido a seca, pragas de insectos ou infiltrações de água salgada, óbito ou doença cronica ou grave do provedor principal da família com os acréscimos de despesas em tratamentos médicos e medicamentos, funerais, ou riscos de acidentes, como nos casos dos incêndios. A ausência de mecanismos privados - como poupanças, disponibilidade de bens para a venda, - e públicos – indemnizações, subsídios, crédito - para fazer face a estas situacoes, faz com que os 9 Inquerito ligeiro para avaliacao da pobreza (ILAP), 2002 Elementos para uma Estrategia Nacional de Proteccao Social Para Orfaos e Criancas Vulneraveis Page 20 sur 102 únicos recursos em caso de dificuldades sejam os familiares e amigos e eventualmente as obras sociais das Igrejas ou alguma forma de apoio à geração de rendimentos oferecida por ONGs. Quando os agregados familiares enfrentam dificuldades de tipo economico, existe o risco que as criancas carreguem o peso destas dificuldades, porque a família pode decidir ou encontrar-se encurralada a recorrer a medidas altamente prejudiciais para as crianças: diminuicao na alimentacao das criancas, retirada da escola, intensificacao do trabalho infantil, casamento forçado/precoce, exploração sexual, migracao temporaria ou nao para a cidade a busca de meios de sobrevivencia, institucionalizacao. Entre as consequencias da pobreza, e embora numa relacao complexa e multidimensional, a situacao nutricional das maes e das criancas e o trabalho infantil. Malnutrição A malnutricao e responsavel de uma serie de risco graves para a saude e o desenvolvimento da crianca, sendo um dos factores preponderantes das taxas de mortalidade e morbilidade das criancas. A malnutricao nao e determinada apenas pelo nivel de rendimentos, que determina em grande parte a insuficiência de alimentos consumidos; mas tambem pela falta de diversificao dos cultivos e fraca diversidade da dieta, a indisponibildade de alimentos no mercado, o nivel de educacao, as preferencias e escolhas em termos de consumo, a capacidade de utilisar os produtos disponiveis de uma forma balanceada. Porem, a capacidade economica de adquirir alimentos resta o factor individual mais importante da situacao nutricional. Existem quatro perfis da população face à segurança alimentar: 34% das famílias são consideradas muito vulneráveis à insegurança alimentar; 28% são vulneráveis; 11% são potencialmente vulneráveis e somente 27% das famílias se encontram numa situação de segurança alimentar10. No que diz respeito as práticas de amamentação, somente 16% das crianças são aleitadas exclusivamente até aos 6 meses de idade. As crianças são geralmente amamentadas até aos dois anos. A amamentação é geralmente interrompida logo que a mãe retoma a actividade sexual ou quando ela fica grávida. Como consequencia, na Guine Bissau, uma em cinco criancas de menos de 5 anos de idade tem baixo peso, enquanto 4% tem uma insuficiencia ponderal severa. As criancas que sofrem de atrasos no crescimentos sao muito numerosas (40,9%), e 19,5% sao muito baixas pela sua idade. Cerca de 7,2% de criancas e magra de forma moderada e 1,7% e magra demais para o seu tamanho. Conforme os dados do MICSIII, um dos factores a nivel do agregado que mais influenciam a situacao nutricional da crianca na Guine Bissau e o nivel de educacao das maes. Quanto mais as maes sao educadas, tanto menos a crianca tem hipotese de estar desnutrida. Isto nao nos surpreende, uma vez que nos sabemos que a educacao das maes e a melhor garantia do bem estar das criancas. 10 PNDSII 2008-2017 Elementos para uma Estrategia Nacional de Proteccao Social Para Orfaos e Criancas Vulneraveis Page 21 sur 102 Trabalho infantil O trabalho infantil está também relacionado com a pobreza: o trabalho infantil é mais frequente nos agregados familiares mais pobres. Na Guiné Bissau, como em outros paises da regiao, o trabalho infantil esta estritamente relacionado com a estrutura economica do pais, baseada na agricultura de subsistencia e na cultura da castanha de caju. As taxas de trabalho infantil são extremamente elevadas: 39,2% raparigas (37,0%) e atinge mais as crianças que vivem no meio rural (47,7%) do que no meio urbano (22,0%), e no SAB (14,2 para as crianças de 5 a 14 anos de idade, é mais alta para os rapazes (41,1%) do que para as %). O trabalho das crianças realiza-se no ambiente familiar, uma vez que apenas 5,2% das crianças trabalha fora da família e so 2,1% das criancas trabalhadoras executam um trabalho remunerado. As crianças começam a ajudar muito cedo e executam tarefas conforme a sua idade. O trabalho de colheita da castanha de caju é uma actividade que mobiliza toda a família, mais em particular as mulheres e as crianças. O transporte de cargas pesadas de frutos por parte das criancas deve ser considerado uma das piores formas de trabalho. 37% das crianças que vao a escola dizem que também trabalham e das crianças trabalhadoras 53.7% dizem que também vao a escola. Embora seja dificil estabelecer o nivel de interferencia deste trabalho na frequencia escolar, nao ha duvidas de que varias horas de trabalho por dia interferem pesadamente no sucesso escolar destas criancas. Por outro lado, e evidente que a frequência escolar protege as crianças contra o trabalho precoce e prolongado. Acesso aos serviços basicos Registo de nascimento Uma criança nao registada esta exposta a negacao de seus direitos fundamentais e a varias formas de abuso e exploracao. Em primeiro lugar, o registo permite a fixacao dos elementos constitutivos da identidade (nome, nacionalidade, filiação). Ele garante o acesso aos servicos sociais basicos de saude e educacao. Nos dominios publicos definidos pela faixa etaria como o trabalho (idade minima fixada por lei 14 anos), imputabilidade penal (16 anos), o casamento, o recrutamento – o registo de nascimento representa uma forma de proteccao legal contra toda forma de abuso (obito prematuro, casamento forcado, detencao ilegal). A maioria das criancas guineenses estao exposta a este risco. Em 2006 ainda apenas 38,9% das crianças de menos de 5 anos de idade eram registadas (MICS 2006). Os rapazes são ligeiramente mais favorecidos que as meninas. As desigualdades manifestam-se mais no que diz respeito o lugar de residência – sendo que as zonas rurais são menos favorecidas, e a região, sendo que a capital goza de uma situação mais favorável (57 % de crianças 0-59 meses registadas) em relação as regiões mais afastadas do sul do pais onde apenas 20 % das crianças são registadas. As criancas mais velhas sao mais registadas que as mais novas, indicando o facto de que o registo ao nascimento nao e praticado. Outros factores que influenciam o registo sao o nível de vida do Elementos para uma Estrategia Nacional de Proteccao Social Para Orfaos e Criancas Vulneraveis Page 22 sur 102 agregado familiar, sendo que as criancas pobres sao muito menos registadas que as criancas mais ricas (21,1% entre os agregados mais pobres e 61,2% entre os mais ricos). O nível de instrução da mãe e tambem importante: quanto mais as maes sao instruidas tanto mais elas estao propensas ao registo de nascimento (33,4% para as mães não instruídas e 60,0% para aquelas com nível secundário ou superior). A incapacidade economica da familia pode atrapalhar o registo da crianca. Com efeito os custos11 sao evocado como o motivo principal (34,2%) pelo qual as maes nao registam as suas criancas. Por entre as razoes evocadas pelas mães para a falta de registo das suas crianças encontra-se tambem a distancia a percorrer para fazer o registo (25,7%) e o desconhecimento do lugar onde funciona o registo (18,9%). Os usos locais de dar o nome a crianca apos um certo periodo ou segundo certas circunstancias e a falta de documentos de identidade dos pais podem tambem ser factores de nao registo. Saúde A situação de saúde da população guineense no geral e das crianças em particular é extremamente crítica. Conforme os dados do MICS a mortalidade infantil acusou um aumento passando de 124 a 138 mortes por mil nascidos vivos entre 2000 e 2006 e a mortalidade das crianças de menos de cinco anos tem passado de 203 a 223 por mil nascidos vivos, situando-se entre as piores do mundo. A principal causa de morte para os menos de cinco anos é o paludismo. O risco de mortalidade é mais elevado para os rapazes, sendo que não há no momento explicações para este fenómeno. Nota-se também uma grande desigualdade entre as diferentes províncias do país. O risco de mortalidade é mais elevado nas zonas rurais, onde a vulnerabilidade é mais intensa, e nas famílias mais pobres. Os riscos ligados ao período da gestação dependem em primeiro lugar as taxas de ma nutrição e anemia das mães, determinando baixo peso das crianças ao nascer. No momento do nascimento, as crianças guineenses estão expostas a riscos peri-natais uma vez que apenas 39 % das mulheres dão a luz com alguma assistência ou numa estrutura sanitária, e 41% são estimadas nao estar vacinadas contra o tétano. Os riscos de saúde reprodutiva para as mulheres são muito elevados, tendo em conta as taxas de mortalidade materna (entre 800 e 1100 por 100,000 partos de crianças nascidas vivas) e o impacto de algumas doenças tais como o paludismo. A gravidez precoce é a principal causa de morte para as raparigas no grupo etário de 15 a 19 anos, solteiras ou casadas. Quadro 1. Principais problemas de Saúde por grupos-alvo Grupos vulneráveis: Crianças <5 anos 11 Causas de morbilidade/mortalidade: Paludismo Infecções respiratórias agudas Diarreias Má nutrição Depois dos cinco anos de idade, o custo do registo e de 3,500 XOF. Elementos para uma Estrategia Nacional de Proteccao Social Para Orfaos e Criancas Vulneraveis Page 23 sur 102 Anemia Paludismo Complicações ligadas à gravidez e ao parto (hemorragias, anemias, rupturas uterinas, complicações de aborto, fístulas, etc.) Má nutrição Problemas dos recém-nascidos (nados mortos, prematuridade, baixo peso à nascença, etc.) VIH Paludismo IST HIV/SIDA (impacto potencial) Paludismo Tuberculose (aumento ligado ao VIH) IST HIV/SIDA (impacto actual) Mulheres grávidas e Recém-nascidos Adolescentes Adultos Fonte: PNDSII, 2008-2017 Por entre os factores que influenciam o estado de saude da população, o acesso a agua potavel de boa qualidade e muito baixo nas zonas rurais. Segundo o MICS, 60% da população guineense, (82% urbano e 48% rural), utilizam fontes ditas melhoradas de água para beber, tais como água canalizada (dentro e fora de casa), furos, poços e nascentes protegidos. No entanto, cerca de 95% da população precisa deslocar cerca de 30 minutos para poder obter a água de beber. Isto significa que apenas 5% têm água canalizada em suas casas (DENARP, 2006). Acesso O acesso económico e geográfico aos serviços de saúde é problemático para uma grande parte da população, em particular da populaçao pobre, população das zonas rurais e dos bairros periféricos das cidades. As populações que vivem em áreas distantes dos centros, não tem acesso aos serviços de saúde principalmente por causa da distancia a percorrer. Em média 40% da população vive para além dos 5 km da estrutura de prestação de cuidados primários de saúde mais próxima, mas na Região de Oio, cerca de 65% da população vive a mais de 5km dos serviços de saúde mais próximos. Existem áreas sanitárias com localidades populacionais a mais de 30 km. Também, a qualidade insatisfatória dos serviços existentes faz com que a população não recorra aos serviços de saúde. Os servicos privados, acessiveis apenas a uma parte limitada da população, são também de fraca qualidade. A infra-estrutura sanitária permanece pouco desenvolvida. Dos onze hospitais regionais existentes, sete permanecem fechados. O Hospital nacional de Bissau foi totalmente rehabilitado, mas a qualidade dos cuidados e os problemas de gestão dos recursos humanos, financeiros e materiais estão longe de serem resolvidos. A qualidade dos serviços de saúde e um factor que influencia a sua procura e utilização da parte da população. Com efeito, as taxas de utilização dos serviços de saúde por parte da população sao baixas no geral, porem mais baixas para a população pobre (9%) do que para população mais abastada (19%). Um outro problema de grande importância é a disponibilidade de recursos humanos de qualidade para os ector saude, sendo que o ratio geral de populacao por numero de profissionais de saude e inferior aos standard internacionais e sua distribuicao no territorio desigual. Elementos para uma Estrategia Nacional de Proteccao Social Para Orfaos e Criancas Vulneraveis Page 24 sur 102 Em suma, o acesso aos serviços de saúde é muito limitado devido a infraestrutura deficiente, a baixa operatividade dos centros de saude existentes, a dispersão da população sobretudo nas zonas rurais e a fraca capacidade das famílias para se deslocarem. Também, a fraca qualidade do atendimento, a não disponibilidade dos medicamentos ou a incapacidade financeira de adquirilos, as exigências de comparticipação (todos os instrumentos e medicamentos necessarios a uma prestacao sanitaria sao a cargo das familias) têm como consequência de desincentivar a utilização dos serviços de saúde por parte da população, em particular da população pobre. Em 2002, apenas 37% das famílias mais pobres tinha acesso a saude. A epidemia de HIV/SIDA A situação epidemiológica da Guine Bissau e difícil de se avaliar, sendo que há discrepâncias importantes entre diversas estimações e projecções da incidência da doença. Há entretanto consenso de que a situação seria mais grave dos que os seus vizinhos (Senegal e Guine Conacry) e existem receios de que a epidemia possa se alastrar ulteriormente nos próximos anos. Segundo o estudo sentinela de 2005, a prevalência do HIV-1 seria 2.5/3.0%. Segundo as estimativas da OMS, em 2005 haveria 32,000 pessoas vivendo com VIH, dos quais 10% com menos de 15 anos. A prevalência entre mulheres grávidas e estimada a 7.9%. Este resultado foi obtido por um estudo levado a cabo pela ONG Ceu e Terra. O estudo testou cerca de 27,000 mulheres grávidas entre 2001-2006. Todos os anos cerca de 4,000 mulheres seropositivas dão a luz, sendo que a percentagem estimada daquelas que tiveram acesso a prevenção da transmissão de mae para filho e ínfima12 (1% em 2007). Embora estes dados deveriam ser de fácil recolha, ha dificuldades em se conhecer o numero total de crianças de menos de 15 anos actualmente em terapia ARV. As causas principais das infecções de HIV/SIDA sao as relacoes sexuais precoces, a alta incidência das DST e o uso restrito do preservativo. Quanto aos conhecimentos, baixo nível de conhecimento da população das modalidades de infecção e dos meios de prevenção. Com efeito, as percentagens de pessoas capazes de identificar correctamente duas modalidades de transmissão e baixa nas cidades (12.7 %) e muito baixas nas áreas rurais (3.4%).13 Quadro resumo: Indicador Estimação do numero de pessoas vivendo com HIV/SIDA Estimação do numero de pessoas de menos de 15 anos vivendo com HIV/SIDA Prevalência estimada HIV-1 % Prevalência em adultos % Estimativa de óbitos de adultos 12 13 Ano 2005 2005 Fonte OMS OMS Valor 32,000 3,200 2005 2005 2006 SNLS UNAIDS UNAIDS 2,5/3.0 2/6 2,700 Destaca-se aqui tambem a ONG Ceu e Terra, que inicou-se o CTV. Estudo CAP, 2006 Elementos para uma Estrategia Nacional de Proteccao Social Para Orfaos e Criancas Vulneraveis Page 25 sur 102 Impacto nas familias e nas criancas - Estimativas criancas infectadas e afectadas pelo HIV/SIDA Como mencionado acima, haveria um total de 3,200 crianças de menos de 15 anos vivendo com HIV/SIDA. De facto, são conhecidas dos serviços apenas as crianças seropositivas nascidas de mãe seropositiva, ou ainda as crianças em terapia ARV. Os orfaos seropositivos conhecidos são apenas aqueles que se encontram na Casa Emanuel (nove crianças). Devido às limitações das estatísticas sociais gerais no país e dos dados da seroprevalência, tornase particularmente difícil avaliar o impacto do HIV/SIDA em termos de mortalidade dos adultos e, portanto, de orfandade das crianças. Os dados existentes são estimativas pouco fiáveis. Haveria no pais um total de 100,00 orfaos dos quais 11,000 devidos ao SIDA. Segundo os dados do MICSII, uma crianca em cada dez de 0 a 17 anos e vulneravel, uma em cada dez tem um ou os dois pais falecidos e uma em cada cinco e orfa e vulneravel14. Quanto a identificação a nivel das comunidades das crianças infectadas ou afectadas pelo HIV/SIDA, a pesquisa de terreno confirmou aquilo que se passa em muitos países: esta identificação e extremamente difícil. Em primeiro lugar, o estado de seropositividade pode nao ser conhecido. Com efeito, na maioria das vezes, o teste e feito so em circunstancias particulares, isto e quando o estado de saúde se torna muito critico e passa a exigir cuidados médicos. Nestes casos porem, pode haver recursos a medicina tradicional, impedindo toda possibilidade de despistagem e tratamento. Em outros casos, a pessoa vivendo com HIV/SIDA pode ja ter falecido sem que se tivesse conhecimento da causa da morte. Finalmente, se o estado seropositivo e conhecido, ele e escondido, por receio do estigma associado a doença. - Estigma e discriminação Muitas vezes considerada um castigo divino, a informação sobre um estado seropositivo fica uma informação extremamente confidencial, que não sai do âmbito do casal. Um teste positivo da mulher pode ocasionar ruptura da relação marital, expulsão de casa, uma estigmatização violenta por parte dos próprios familiares e dos vizinhos. Estas informações recolhidas durante o trabalho de campo são confirmadas pelos dados do MICSII, que analisou as atitudes discriminatórias em relação as pessoas vivendo com HIV/SIDA. Uma grande parte das mulheres inquiridas esta contra o acesso a sala de aula por parte de uma professora portadora do VIH e 20% não cuidaria de um membro do agregado doente de SIDA. 15 Quanto aos arranjos familiares relativos as crianças de pais falecido de SIDA e órfãos seropositivos, o factor não material principal e a discriminação e o ostracismo em relação a 14 Uma crianca e orfa e vulneravel se um dos seus pais faleceu, se um dos seus pais e atingido por uma odenca cronica, ou se um adulto com idade entre 18 e 59 anos, membro do agregado que a acolhe, faleceu devido a uma doenca cronica, ou fora atingido por uma doenca cronica no decurso do ano que precedeu o inquerito. Como se ve esta definicao apresenta varios problema de inteligibilidade e de operacionalidade. 15 MICSIIII, 2006 Elementos para uma Estrategia Nacional de Proteccao Social Para Orfaos e Criancas Vulneraveis Page 26 sur 102 doença. Por outro lado, as necessidades das crianças seropositivas em termos de cuidados e tratamento médico, faz com que alguns deles são entregues as instituições. Os orfaos duplos sao também discriminados em relação a frequência escolar, que e mais baix em relacao as criancas que nao sao orfaos duplos. Também , as crianças orfas e vulneráveis apresentam taxas de ma nutrição mais altas que as crianças não órfãs e vulneráveis. - HIV/SIDA e género Como demonstrado pelas pesquisas, as adolescentes estão mais expostas a infecção pelo HIV/SIDA em razão de sua imaturidade fisiológica, pela prática do sexo precoce16, e pela prática de sexo com homens mais velhos contra diversas formas de remuneração ou manutenção. Meninas e adolescentes estão ainda expostas ao risco de contrair HIV/SIDA no caso de abuso sexual perpetrado por adultos. Por seu lado, as praticas ligadas a tradição sociocultural guineense demonstram que as mulheres são muito mais discriminadas no caso das heranças quando é o marido que morre. Ela não tem direito aos bens do marido e quando não pretende ser “herdada” é simplesmente expulsa da casa.Porem, o debate relativo ao género e HIV/SIDA está ainda pouco desenvolvido nas estratégias de luta contra o HIV/SIDA. - Impacto sobre a saúde e a nutrição da criança A família atingida pelo HIV/SIDA pode ter menos disponibilidade de meios e tempo para a prestação de cuidados de saude e para a alimentação das crianças. Com efeito, o MICSIII refere que as criancas orfas e vulneraveis, como referido acima, apresentam taxas de ma nutrição mais altas que as crianças não órfãs e vulneráveis. O acesso a alimentação tem sido uma das razões porque as comunidades dependem cada vez mais das missões católicas nas zonas rurais. - Impacto sobre o estado psicossocial A degradação do estado psicossocial dos pais e das crianças é devida, por um lado, à vivência de uma doença fatal e, por outro lado, ao estigma associado com a doença e as práticas discriminatórias que dele derivam. A equipa constatou que as famílias atingidas sao levadas a enclausuramento social, uma vez que o estado de seropositividade não sai do circulo do casal. Desta forma, as pessoas atingidas e suas crianças passam a privar-se do apoio psicológico e social da própria família e da vizinhança, com consequente sofrimento psicológico e moral. - Impacto sobre a escolarização das crianças Nas famílias atingidas pelo HIV/SIDA podem verificar-se situações de abandono prematuro do sistema de ensino ou diminuição das possibilidades de integrar a primeira série, para as crianças mais novas, devido à menor disponibilidade financeira e à necessidade de envolver as crianças nas estratégias de geração de rendimento familiar e nos afazeres domésticos, no cuidado dos doentes e dos irmãos mais novos, especialmente no caso de óbito da mãe. Os dados do MICSIII são relativos so aos orfaos duplos. Eles revelam, como ja referido, que os órfãos duplos apresentam taxa de frequência escolar mais baixas relativamente as outras crianças. 16 O MICSIII também refere que as raparigas orfas e vulneráveis estao mais expostas do que as outras a relações sexuais precoces, com consequentes riscos de gravidez precoce e infecção pelo HIV/SIDA e outra DST. Elementos para uma Estrategia Nacional de Proteccao Social Para Orfaos e Criancas Vulneraveis Page 27 sur 102 - Impacto socio-económico Quando os pais adoecem com SIDA, a sua capacidade de trabalho fica grandemente comprometida. No caso de famílias vulneráveis, o impacto socio-economico é muito forte e a perda de emprego ou a incapacidade dos pais para o trabalho pode ter consequências nefastas para as crianças: reduções drásticas em termos de alimentação, maior pressão para as crianças trabalharem e assumirem cargas mais pesadas de trabalho agrícola, recurso a estratégias de geração de rendimento altamente prejudiciais, como a prostituição das meninas. - Impacto sobre os direitos de sucessão Um aspecto do impacto do HIV/SIDA diz respeito ao destino da viúva, a manutenção dos filhos e a herança. Existem padrões tradicionais diferentes segundo as etnias, porem de uma forma geral a mulher pode escolher ou e atribuída a um dos irmãos do marido. As crianças podem ser marginalizadas por estes arranjos e serem afastadas do convívio com a mãe. Neste caso tambem, inicia uma cadeia de infecções no âmbito familiar a termos vai privar as criancas de todos os seus familiares proximos, a não ser os avos. O direito positivo à herança da parte da mulher não é conhecido nem praticado pela maioria da população. Segundo as praticas costumeiras, os bens do agregado são herdados pela família do marido, deixando a mulher totalmente destituída de seus direitos. Deste quadro, pode-se concluir que o HIV/SIDA representa uma ameaca muito seria para o as criancas. Em primeiro lugar, os recem nascidos e os jovens adolescentes estao a risco de contrair a doenca, haja vista a limitacoes em servicos de PTMF e a pratica das relacoes sexuais precoces nao protegidas. Em segundo lugar, um aumento da mortalidade devido ao SIDA pode aumentar consideravelmente os numeros de orfaos duplos, os mais vulneraveis de todos os orfaos. Em terceiro lugar, as criancas de familias afectadas, com adultos doentes e falecidos, estao expostas ao risco de estigma e de discriminacao e a degradacao de seu nivel de vida. Educação A educacao é um direito fundamental da crianca e uma porta para uma vida melhor. Ela dota a crianca dos conhecimentos e competencias necessarias para o exercicio da cidadania e para a sua participacao activa e frutuosa no mercado do trabalho. Uma crianca fora da escola e sem educacao é uma crianca em estado de vulnerabilidade. Ela fica exposta ao risco grave de analfabetismo, casamento precoce, trabalho precoce e nao qualificado, todos estes sendo elementos predictores de pobreza futura. Na Guine Bissau, estima-se que 100,000 criancas entre 6 e 11 anos estao fora da escola, sendo que uma metade nunca foi matriculada e a outra abandonou a escola pour uma razao ou outra.17 A maioria das criancas fora da escola sao rapazes.18 Além disso, calacula-se que 60% da populacao guineense e analfabeta, com alta inequidade de genero: 50% dos homens sao analfabetos e 80% são mulheres, o que e altamente prejudicial a sobrevivencia e ao desenvolvimento da crianca. - Pre-escolar 17 EPT, draft 2, Junho 2007 Seis em cada sete, ou 80-85% das raparigas em idade escolar frequentam um estabelcimento de ensino. EPT, draft2, Junho 2007 18 Elementos para uma Estrategia Nacional de Proteccao Social Para Orfaos e Criancas Vulneraveis Page 28 sur 102 A educacao pre-escolar é uma forma precoce de prevenir a exposicao da crianca a situacoes de vulnerabilidade. Ela assegura a crianca um acompanhamento do crescimento psico- fisico e social e um ambiente propicio ao deselvolvimento de capacidades cognitivas e emocionais que facilitarao, entre outros, a integracao e o sucesso escolar. No que diz respeito as familias vulneraveis, ela permite as maes ter tempo para as actividades produtivas. O acesso a edução pré-escolar é extremamente limitado, sendo que a oferta limita-se a escolinhas privadas, principalmente na capital do pais, acessiveis apenas aos grupos mais favorecidos e algumas escolas comunitarias, com custos compartidos entre os pais e entidades comunitarias, como organizacoes religiosas, que recebem apoios de organizacoes internacionais. Apenas 2 a 3% do grupo alvo frequenta um jardim de infancia, sendo um total de 7,500 crianças. Os preçoos que os pais pagam variam de 30,000 FCFA em Bissau a 1,000 FCFA no interior. E’ de se notar tambem que a qualidade da educacao pre-escolar nao e sempre satisfatoria, sendo que aproximadamente 40% do pessoal das escolinhas nao tem qualificacao. O sector publico que deveria regular este sector, que esta em crescimento, deveria editar normas, parametros e orientacoes e fiscalizar o seu cumprimento. - Escolarização primaria Apesar de avancos espectaculares no sector da educacao primaria, quase metade das criancas em idade escolar permanecem fora da escola. Acesso Taxas de inscrição. Na ultima década, graças aos esforços de expansao da infraestrutura escolar, de recrutamento de professores e de estimulaçao da demanda para a educaçao, o acesso à educaçao tem registado grandes progressos, refletidos pelo aumento do numeros totais de alunos e pelo incremento na taxa bruta de inscripçao, que passou de 53% em 1995 a 110% em 2005200619. Estas taxas porem sao influenciadas pela defasagem da idade de inscripçao ao ciclo primario, devida a multiplas repetencias e entrada tardia na escola. As taxas liquidas de inscripçao sao muito baixa e continuam em torno de 45%- 50%. Escolarizacao das raparigas. Naquilo que diz respeito à equidade de acesso, é importante sublihnhar os avanços obtidos em termos de educaçao das raparigas no ciclo basico. Em Bissau as raparigas no ensino primario sao hoje mais numerosas (52%) do que os rapazes. Em outra regioes balanco de genero no primario e mais dificil de se obter, como em Oio, onde elas sao ainda apenas 40%. As raparigas apresentam taxas de evasao escolar mais altas e taxas de completamento do primario mais altas do que os rapazes. No que diz respeito ao secundario e terciario as taxas são mais baixas do que dos rapazes. Estas diferenças sao devidos ao casamento precoce (27% das raparigas casam antes dos 18 anos), gravidez precoce, inadequacao das instalacoes sanitarias escolares, grande distancia entre o domicilio e a escola, os trabalhos domesticos, resistencia dos pais por motivos de ordem cultural. Acesso geografico. Apesar dos esforcos de expansao da infraestrutura escolar, o acesso à escola nas zonas rurais apresenta-se ainda problematico. As criancas mais desfavorecidas sao aquelas 19 EPT, draft 2, Junho 2007 Elementos para uma Estrategia Nacional de Proteccao Social Para Orfaos e Criancas Vulneraveis Page 29 sur 102 que vivem no Sul e nas ilhas Bijagos. 40% das escolas primarias nao oferecem o ciclo de seis anos (escolas completas) e limitam-se a dois, tres ou quatro anos. Para poder continuar a escolarizacao, as criancas tem que se deslocar sobre longas distancias, o que e um factor de bandono escolar20. 1/3 da oferta de educacao primaria e de tipo comunitario (19.4%) concentrado no interior, ou privado, concentrado em Bissau. Os custos relativos a educação, como materiais e fardamento, podem constituir um obstáculo ao acesso. A falta de instalações sanitarias e um obstáculo especifico para o acesso das raparigas. A lingua do ensino, o portugues, tambem constitui uma barreira, porque via de regra as crianças escutam o português pela primeira vez , quando ingressam ao primario se o professor o domina. O dialecto do professor e do aluno também podem ser diferente, dificultando a comunicação. Eficiencia O sistema escolar apresenta altas taxas de repetencia, de evasao e baixas taxas de conclusao do ciclo basico. Os alunos do primario repetem em media duas vezes. Em 2001 a repetencia na primeira classe era de 20-25%. A média das taxas de evasão escolar no primário situa em torno de 7%. Porem se olharmos de mais perto vemos que o abandono escolar e mais acentuado logo no inicio da escolarização primaria: 20% das crianças que entram para o primeiro ano abandonam no curso deste primeiro ano. No segundo ano o abandono e de 2% e cresce ate 9% no sexto ano. Isto resulta num efeito cumulativo que interessa os dois terços dos efectivos: a taxa completa do ciclo escolar primário,é muito preocupante, situa-se a 42%. Menos de metade das crianças que entram no ciclo primario o completam e apenas 30% o completam em seis anos. Mesmo as criancas que completam o ciclo primário, correm o risco do analfabetismo . A percepção geral e de que estas criancas apresentam serias dificuldades no uso de calculo e da lingua portuguesa, seja na escrita, leitura e conversação. Qualidade A baixíssima qualidade do ensino básico na Guine Bissau e devido ao deficit de formação dos professores, a um curriculo inadequado e a ausência de material pedagógico. inadequação do curriculo. Existem fortes preocupações quanto a qualificação dos professores. Metade do corpo professoral e leigo (nao detem as qualificacoes minimas estabelecidas pelo MENES). Aqueles que detem o diploma do normal superior nao dominam o conjunto de competencias necessarias. O curriculo tem baixa relevância, concentra-se nos conteúdos, em vez de conteúdos e competências, e rígido. Não há material pedagogico para os professores e para os alunos. A isto acrescenta-se que a carga horaria e mais baixa em relacao aos padroes internacionais e seu cumprimento e compremetido por frequentes perdas de dias letivos, pela pratica de 3 turnos diarios em muitas escolas e pelo absenteismo dos professores. 21 As escolas comunitarias 20 As criancas que estudam na escola primaria do Sector Cacine, seccao Cassaca, Tombai, uma boa percentagem de criancas que ali estudam provem de localidades com distancia entre 10 e 20 km, razao de inscripcao tardia. 21 Em 2006-2007 as escolas publicas perderam um terco do ano letivo, devido a greve ocasionada pelos atrasos no pagamento dos salarios dos professores. Elementos para uma Estrategia Nacional de Proteccao Social Para Orfaos e Criancas Vulneraveis Page 30 sur 102 Um quinto das escolas primarias no pais sao escolas comunitarias. Sao escolas criadas por ONGs, Igrejas, associacoes comunitarias , para responder as necessidades de areas nao servidas pelo sistema. 2.2. Vulnerabilidade aguda Toda criança tem o direito de viver no seu meio familiar (CDC art.20) de ser protegida contra todas as formas de violência (art 19), de exploração económica e trabalho prejudicial (art. 32), exploração e abuso sexual (art. 34) sequestro, venda e tráfico (art. 35) e o direito à reabilitação psico-física e social art.39). O Estado deve tomar todas as medidas legislativas, administrativas, sociais e educacionais para proporcionar esta protecção e a assistência necessária sob forma de programas de prevenção, notificação, transferência, investigação, tratamento, acompanhamento, intervenção judiciária. Crianças privadas do meio familiar Todas as criancas tem o direito de crescer no meio familiar e de serem criadas por seus pais. A familia tem o direito e a responsabilidade fundamental dos cuidados e a proteccao da crianca e o Estado tem o dever de apoiar as familias para que elas possam cumprir da forma melhor possivel as suas responsabilidades. Na sociedade guineense, quando os pais se deparam com dificuldade, os pais morrem ou nao tem mais condicoes de garantir os cuidados das criancas, os familiares proximos passam a se ocupar da crianca, em particular dos orfaos. Porem, um numero reduzido de criancas, que se encontram em situacoes extremas de pobreza e abuso, estes arranjos familiares nao sao possiveis e o direito a viver na familia de origem e na comunidade de origem na continuidade religiosa, cultural e linguistica e interrompido. Sao as criancas privadas de meio familiar, abandonadas ou que vivem nas instituicoes. Assim como acontece em vários países africanos, as percentagens de crianças que não vivem com os seus pais biológicos são elevadas. Se no total 18,9% das crianças não vivem com os pais biológicos, este percentagem aumenta consideravelmente para 30,2 % para os 15-17 anos e 24 % para os 10-14 anos. Os percentagens sao mais altas para para a qmais rica (28%) para a capital (25,4%) e para o meio urbano. Entre as hipoteses de explicacao deste fato, talvez a mobilidade destas criancas mais abastadas para fins de frequencia escolar. Isto parece ser relacionado com o costume de enviar as crianças para serem criadas por familiares mais ou menos próximos ou famílias sem laços biológicos com as crianças, seguindo uma ordem de atribuição onde os tios paternos e maternos constam nas primeiras posições. Os meninos de criação gozam de mais ou menos boas condições de crescimento e desenvolvimento em suas famílias substitutas. Se em grande parte dos casos a criação por uma outra pessoa que não os pais biológicos pode se revelar favorável e proporcionar às crianças condições mais aptas do que em seus próprios lares de origem, em outros casos os meninos de criação enfrentam riscos de exploração, negligência, maus tratos. Elementos para uma Estrategia Nacional de Proteccao Social Para Orfaos e Criancas Vulneraveis Page 31 sur 102 A comunidade dos pais revela-se fragil, sendo que apenas 60% das criancas vivem com pai e mae. 15,2% das criancas vivem so com a mae, mas na grande maioria dos casos a pai vive. A “orfandade social” de pai e mais do que o dobro do que a orfandade biologica. Quanto aos orfaos, baseado nos dados do MICS de 2006, 11,3 % das crianças 0-17 anos são órfãs de pai ou de mãe, sendo em termos absolutos cerca de 11,000 crianças. Esta percentagem é de 5,4% para as crianças de 0 a 4 anos de idade e aumenta com a idade da criança, sendo que 22% das crianças de 15 a 17 anos são órfãs. 1,8% das crianças são órfãos duplos. Baseado nos dados estatisticos disponiveis, as crianças tornadas órfãs estao muito levemente a risco de discriminacao. A probabilidade de estar na escola é quase igual para órfãos duplos e não órfãos (respectivamente 69,3 e 71,3), indicando que o factor de risco principal da não escolarização não esta na orfandade, mas em outros factores como a quintilha de riqueza, o meio de residência e a região. Este resultado é confirmado pelos dados relativos ao estado nutricional e ao comportamento sexual das raparigas. Os diferencas entre crianças tornadas órfãs e vulneráveis pelo HIV/SIDA e as outras são quase insignificantes, 1 ponto nos dois casos. MICS indagou também o estado das famílias, sendo que 7,1% dos agregados familiares tem um adulto doente crónico e 19,3% - cerca de 21,000 crianças de 0 a 17 dos dois sexos - são considerados crianças órfãs e vulneráveis22, 26,6% no SAB e e 25,9% na mais rica. - Crianças que vivem nas instituições A institucionalizacção constitui uma violaçãoao do direito da crianca a ser criado na familia de origem e de gozar da integração comunitaria, a menos que ela nao seja provisoria, de curta duracao e de qualidade e seja constitua uma verdadeira proteccao do melhor interesse da crianca. A criança que vive numa instituicao de maneira prolongada e privada de uma socialização normal, fonte de bem estar e necessaria ao seu desenvolvimento. Na Guine Bissau existem duas organizações que dirigem instituições que praticam o regime de internato para crianças: a Casa Emanuel, dirigida por uma congregacao religiosa, com sede na cidade de Bissau, a as Aldeia SOS crianças, instituição filantrópica internacional que acolhe crianças órfãs, activa em Bissau desde 1996, abriu em Gabu e Canchungo em 2006. Crianças expostas à violação de sua integridade psico-física - Criancas vitima de violência e maus tratos A violência doméstica nao so constitui uma infraccao a lei mas tem consequências pesadas não só para a família mas também para a comunidade e a sociedade como um todo. A casa deveria ser o lugar mais seguro para as crianças. A presença da violência dentro de casa representa um risco e um perigo para as crianças, porque as crianças que crescem numa família violenta podem desenvolver problemas emocionais e comportamentais, mesmo se eles não experimentam a violência directamente. Eles também aprendem que a violência é uma maneira de resolver os conflitos, e isso aumenta o nível de violência geral na sociedade. 22 A definicao do MICSIIII de crianca orfa e vulneravel e “se um dos seus pais faleceu, se um dos seus pais e atingido por uma doenca cronica, ou se um adulto entre os 18 e 59 anos, membro do agregado familiar que a acolhe, faleceu (devido a uma doenca cronica) ou fora atingido por uma doençca cronica no decurso do ano que precedeu o inquerito”. Elementos para uma Estrategia Nacional de Proteccao Social Para Orfaos e Criancas Vulneraveis Page 32 sur 102 De uma forma geral, existe a percepcao pelos profissionais da area social que a violencia contra a crianca cometida por um familiar proximo e abafada, em particular a violencia sexual. Alguns casos chegam a policia por via dos meios de comunicacao por parte de vizinhos. Um facto preocupante registado pelo MICSIII e as mulheres têm um alto nível de aceitação da violência praticada pelo cônjuge: mais do que metade (51,5%) das mulheres guineenses acham que o marido pode bater nelas23, sobretudo no contexto do casamento. Quando o autor da violencia contra a criança e uma pessoa mais afastada do circulo familiar ha mais hipotese que haja denuncia na policia (ou directamente ao Tribunal). Em 2005, o Comissariado Geral da Policia de Ordem Publica registou 34 casos de violencia e abuso sexual de menores (33 meninas e 1 menino). Em 2006, foram registados 65 casos de violencia contra a crianca, sendo a maioria abuso sexual (53), violencia fisica (6), rapto (2) e abandono (2)24. - Criancas vitimas de mutilações genitais femininas A mutilação genital constitui uma violação grave do direito da criança à integridade física e do direito da mulher à integridade sexual. Que seja praticada por razões sociológicas, higiénicas, sanitárias ou religiosas, a excisão não deixa de ser uma violação dos direitos fundamentais das crianças de sexo feminino. Na Guiné Bissau, como em outros países da sub-região, as MGF são praticadas geralmente nas raparigas com idade entre 4 e 14 anos, mas podem ser também praticadas em crianças mais novas, nas mulheres prestes a ser casadas, na mulher grávida do primeiro filho ou antes do parto. A prática mais usual é a retirada da pele (?) porém quase 3 % das mulheres experimentaram a forma extrema de MGF, a isto é a infibulação. O fanado é uma cerimónia de iniciação tradicional durante a qual faz-se a ablação do clítoris e dos pequenos lábios do sexo das meninas. A idade das crianças pode variar entre 6 e 14 anos. Os acampamentos de fanados apresentam condições deshumanas. A maior parte dos grupos étnicos do país praticam o fanado, em particular todas as comunidades muçulmanas, isto é cerca de 46 % da população, em particular as das regiões de Gabu e Bafata. 44,5 % das mulheres com idades entre 15-49 anos são excisadas. A prevalência da excisão varia muito em função da pertença étnica e a zona de residência, ela é mais forte entre as Fula/Mandinga (95,2%) e no Leste (92,7%). As MGF são também mais frequentes entre as mulheres sem instrução (54,4%) e no meio rural (48,2%). Mais recentemente, assiste-se a um aumento das praticas de fanado nos centros urbanos (barracas de fanado). Dentre os elementos que contribuem para a perpetuação do fanado, factores culturais e religiosos por um lado e economicos por outro lado. Nas comunidades onde as MGF sao praticadas, ser “cortada” representa para a menina uma condição de estar “limpa” e portanto de nao ser discriminada, poder aceder ao casamento e a outras tarefas como preparação de pratos para os anciãos em ocasião do Ramadan e outras festividades. A pratica constitui por outro lado uma fonte de rendimentos para a fanatecas, as mulheres que o praticam, podendo o seu custo chegar a 30,000 XFO por cada intervencção. 23 As razões são as seguintes (em ordem de importância): quando ela discute com o marido, quando ela recusa ter relações sexuais, quando ela negligencia as crianças, quando ela sai sem avisar, quando ela deixa queimar a refeição. 24 INEP – Abuso e exploracao sexual de menores na Guine Bissau, 2006 Elementos para uma Estrategia Nacional de Proteccao Social Para Orfaos e Criancas Vulneraveis Page 33 sur 102 Os riscos implícitos nesta prática são numerosos. Riscos relativos à integridade psicológica, como consequência da dor física aguda, traumatismo e estado de choque, bloqueios e incapacidade de ter prazer sexual. São muito graves também os riscos para a saúde física: lesões e infecções do aparato reprodutivo e urinário, esterilidade, complicações durante o parto, morte. Também aumentam os riscos de contrair doenças contagiosas como o HIV/SIDA. - Criancas vitimas de casamento forçado/precoce Conforme o relatório global da OMS sobre violência (2002) o casamento precoce/forçado é uma forma de violência sexual, uma vez que as raparigas não estão em condições de dar o seu consentimento esclarecido, não tendo maturidade para tal, sendo em seguida obrigadas a ter relações sexuais regulares com os maridos e expostas à gravidez precoce, com consequências graves para o desenvolvimento das raparigas. O Fórum pan-africano contra a exploração sexual da criança (data???) identificou ainda o casamento precoce como uma forma de exploração sexual da criança para fins comerciais. Uma menina casada, apesar dela ser ainda uma criança, será considerada socialmente como uma adulta, com todas as responsabilidades que decorrem deste status. O casamento precoce implica no abandono escolar, baixo nível de educação e formação profissional, excesso de trabalho domestico, perpetuação da pobreza, violencia fisica e psicologica, isolamento social e em riscos sérios para a saúde, ligados à gravidez precoce e repetida, que por sua vez expõe a rapariga ao risco elevado de mortalidade, e à infecção pelo HIV/SIDA. 7,3 % das raparigas guineenses casam antes dos 15 anos de idade, em particular na zona norte do pais (10,1%) seguido por Bissau (5,8%), o leste (5,7%) e o Sul do pais (4,8%) e em particular aquelas que pertencem aos grupos economicamente mais fracos (8,5%). A percentagem daquelas que casam antes dos 18 anos de idade é de 27,3%. A província, o meio de residência, o nível de instrução, o nível de vida e a pertença étnica são os factores principais que aumentam a probabilidade para as raparigas de 15 a 19 anos de serem casadas ou em união. Com efeito, o casamento precoce é mais frequente na zona Leste do pais, no meio rural, entre as mulheres sem instrução, e entre as Fula/Mandinga. Existem casos de meninas que recusaram-se a casar conforme a decisao dos pais e fogem, ou qye abandonam o novo lar nao aguentando a sua nova condicao de esposa. Em 2005 a Missao Catolica acolheu 40 meninas que escaparam a casamento forcado ou outras praticas nocivas. - Crianças talibés vitimas de tráfico Um grande número de crianças muçulmanas frequenta estudos religiosos. Uma parte destas crianças desloca-se de seu domicílio habitual para frequentar o ensino do alcorão em escolas corânicas dirigidas por imams. É costume que estas crianças passem uma parte do dia a trabalhar para o seu sustento (em particular na agricultura) ou a pedir esmola para a alma dos defuntos. As entradas sao entregues ao mestre corânico. Elementos para uma Estrategia Nacional de Proteccao Social Para Orfaos e Criancas Vulneraveis Page 34 sur 102 Esta pratica tem aberto caminho para o estabelecimento de uma rede de trafico de criancas enviadas para o Senegal, que tem a reputacao de ter melhores escolas coranicas do que a Guine Bissau, a pretexto de receberem a educacao religiosa, para serem exploradas por pessoas que se disfarcam de mestres coranicos. As regioes mais afectadas por este fenomeno sao as de Gabu e Bafata. Um estudo realizado pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas (INEP) tem recenseado 22,831 criancas talibe em algumans regioes do Senegal. Uma parte destas criancas sao guineenses. No geral, os intermediarios recutram as criancas nas tabancas mais desfavorecidas por meio de tecnicas sofisticadas de aliciamento. O recrutamento das crianças e facilitado pela miragem do acesso a uma educacao religiosa de qualidade, pela precariedade de vida das famílias e pelas dificuldades em assegurar as crianças uma educação qualquer. As crianças sao exploradas no trabalho agricola (cajueiro, algodao, ginguba) e pela mendicidade. Muitas delas rompem com os “mestres” e os centros e passam a viver na rua, numa situacao de vulnerabilidade extrema. O numero de criancas identificadas como vitimas de trafico pela Policia e pelas autoridade locais e muito baixo: apenas 5 casos em 2005. - Criancas vitimas de discriminação As crianças de uniões adulterinas, as criancas portadoras de deficiencias, como tambem os gemeos, podem ser alvo de praticas discriminatorias muito nocivas, como o abandono, que podem ate causar a morte (como no caso das criancas iras, reputadas trazer o azar sobre todo o nucleo familiar). Elementos para uma Estrategia Nacional de Proteccao Social Para Orfaos e Criancas Vulneraveis Page 35 sur 102 3. ANALISE DA RESPOSTA Nesta parte do relatorio sao apresentadas as politicas, programas e accoes viradas para os grupos vulneraveis em geral e as criancas em particular levadas a cabo pelo Estado e por seus parceiros nao governamentais. De uma forma geral a formulação, execução e avaliação da politica social do Estado guineense tem sido afectada por um i) contexto politico-institucional adverso, a instabilidade das lideranças e falta de continuidade das políticas ; ii)orcamentos insuficientes, discrepancias profundas entre os orcamentos anunciados na Lei de OGE e os desembolsos, dependencia dos doadores iii) capacidade de gestão reduzida, devido a quadros de pessoal reduzido e sem as competencias sificientes em materia de planeamento, implementação, monitoria, avaliação e coordenação das acções. Como resultado, os esforços de redução da pobreza e as acções de expansão e melhoria da qualidade das políticas sociais básicas, que constituem a base da politica social, tem sido insuficientes e falham em assegurar a melhoria das condições de vida dos segmentos mais vulneráveis da população. Isto significa que não há pelo momento avanços na redução do contingente de cidadãos em geral e de crianças, em particular, que deveriam ser os principais destinatários de acções de protecção social. As acções de protecção social da cidadania são levadas a cabo em sua maioria pelos parceiros sociais, ONGs e missões. A actuação do poder publico nesta área ainda continua fraca. 3.1. Mecanismos destinados a criar um ambiente geral favoravel aos grupos vulneraveis Luta contra a pobreza A Estrategia Nacional de Redução da Pobreza (2006) tem dado resultados mitigados. A Estrategia foi elaborada com base base no Inquerito ligeiro para avaliaçao da pobreza (ILAP) de 2002, e esta coloca prioridade nos eixos de i) governaçao ii) crescimento economico iii) acesso aos serviços basicos e iv) protecçao dos grupos vulneraveis. A implementação desta estratégia tem acelerado o reordenamento de algumans instituiçoes e a redefiniçao dos seus mandatos, como também o lançamento de uma importante reforma da administração publica, porém estas medidas têm sido atropeladas pela persistente instabilidade politico-institucional e as dificuldades de financiamento. No que diz respeito ao eixo ligado aos grupos vulneráveis, as intervenções têm sido fragmentadas e levadas a cabo por organizacoes nao governamentais e Igrejas com fraca coordenação por parte do Estado. Também, apesar de varios esforços neste sentido, nao existe ainda uma Politica nacional de Protecçao social clara e partilhada por todos os intervenientes. Por exemplo, a luta contra o trabalho infantil ainda não está ainda organizada. Existe uma perspectiva da parte da OIT de apoiar a elaboracao de um Plano nacional de combate ao trabalho infantil no ambito do programa mundial IPEC (International Program for the Eradication of Child Labor), porem ainda as negociacoes nao tem comecado. Em relação a resposta à nutricao, as intervenções são mais de tipo curativas, levadas a cabo pelos 22 Centros de Recuperacao Nutricional (CRN) geridos pela CARITAS. Entre 2007 e 2008, os Elementos para uma Estrategia Nacional de Proteccao Social Para Orfaos e Criancas Vulneraveis Page 36 sur 102 Centros receberem um total de 3,490 criancas. Uma avaliacao destes centros conduzida em 200825 concluiu que, para alem do reforco das capacidades dos Centros e uma maior implicacao dos centros de saude nas prestacoes relativas a nutricao, e necessario desenvolver accoes de educacao nutricional junto das comunidades e, paralelamente, diminuir a inseguranca alimentar e melhorar a dieta das comunidades atraves da estimulacao de hortas comunitarias. Proteccao do estatuto juridico da crianca O Estatuto juridico da crianca é definido pelos instrumentos da normativa internacional dos quais o pais é parte e pela legislacao nacional. A Guine Bissau faz parte dos países que ractificaram a Convenção sobre os Direitos da Criança (1990), dos dois protocolos facultativos da Convenção contra a utilização de criancas nos conflitos armados e contra o trafico e a exploracao sexual (2001), da Carta Africana dos Direitos e Bem Estar da Criança (2007). A Guine Bissau tambem ratificou as Convencoes da OIT 138 de 1973 sobre a idade mínima para o trabalho, nº 182 de sobre a erradicação das piores formas de trabalho das crianças e a Convenção sobre a Eliminação de todas as formas de discriminacao. No que diz respeito ao quadro juridico nacional de proteccao dos direitos da crianca, a harmonizacao da Legislação Nacional com a Convenção e demais diplomas internacionais ainda não está completao. Na legislatura de 2000 a 2003 foi criada na Assembleia Nacional Popular uma Comissão para os assuntos da mulher e da criança. Na legislatura 2004-2008 esta Comissão foi reestruturada e reforcada e coordenou a elaboracao de um estudo sobre a legislacao nacional no dominio da crianca e a elaboracao de propostas de actualizacao das leis nas diferentes areas, em particular26 : - Estatuto da Assistência Jurisdicional do Menor (Idade de inimputabilidade 16 anos). - Código civil e Código de processo civil - Código penal e Código de processo penal - Lei geral do trabalho. A idade mínima para o emprego é de 14 anos. Não há alusão ao trabalho realizado no âmbito familiar. - Código de registo civil - Lei orgânica do Tribunal do sector. Estas propostas de lei têm ainda que ser analisadas e aprovadas pela Assembleia. Tambem, uma lei específica é exigida para tornar ilegal e sancionar as mutilações genitais femininas, para garantir o direito da criança à integridade física e os direitos da mulher à integridade sexual, em conformidade com o Protocolo de Maputo27 . Uma lei de repressao do trafico de seres humanos, em particular de criancas, deveria tambem ser prevista como resposta ao problema das criancas talibes e outros movimentos ilegais de criancas e mulheres. No que diz respeito àproteccao das pessoas portadoras de HIV/SIDA, uma nova Lei, nº 5/2007 de 10 Septembro de 2007, aprovada gracas a mobilizacao dos actores nao governamentais (Action Aid, FACOL-SIDA, outros) garante o acesso ao diagnostico, ao tratamento e aos cuidados necessarios e protege as pessoas portadoras de HIV/SIDA e seus familiares contra toda forma de discriminacao nos diversos ambitos da vida publica, e principalmente no mundo do trabalho. 25 Ministerio da Saude, Nucleo de Nutricao – Relatorio de supervisao Centro de Recuperacao Nutricional, Agosto 2008 26 Centros de Estudos e apoio as reformas legislativas da Faculdade de direito de Bissau 27 Protocolo à Carta Africana dos direitos humanos e dos povos relativo aos direitos da mulher em Africa, adoptado pela União Africana em 2003 Elementos para uma Estrategia Nacional de Proteccao Social Para Orfaos e Criancas Vulneraveis Page 37 sur 102 Como todo instrumento legal novo, esta Lei precisa ser divulgada nos ambitos judiciario, do trabalho e no geral junto a populacao. Importa aqui sublinhar dois aspectos importantes da proteccao juridica da crianca. Por um lado, o direito positivo sofre de uma forma geral de conhecimento, interiorizacao e aplicacao limitada pelas instancias judiciarias, por causa das fraquezas institucionais neste dominio. Por outro lado, o direito positivo acima analisado tem uma vigencia limitada nas mentalidades e praticas da maioria da populacao da Guine Bissau. Apesar das diversidades culturais que distinguem as diversas etnias do pais, todos os grupos sociais sao regidos maioritariamente pelo conjunto de regras comportamentais que podemos reunir sob o termo de direito costumeiro. Se por um lado esta situacao e garante de maior coesao social, as praticas conflitam em varios ambitos com a nocao de proteccao da crianca tal como estabelecido pela normativa internacional e o direito nacional nesta area. Exemplos desta situacao, o proprio lugar atribuido a crianca na sociedade, as praticas de socializacao atraves do trabalho, as praticas tradicionais de iniciacao, algumas praticas de resolucao de conflitos. Neste sentido, parece necessario desenvolver acções de proximidade baseadas em metodologias genuinamente participativas e sustentadas no tempo para se obter progressivamente junto das comunidades a eradicacao das praticas nocivas e uma maior adesao aos valores universais da proteccao da crianca tais que preconizados pela Convencao Internacional sobre os direitos da crianca. Campanhas de sensibilizacao para as mudancas comportamentais favoraveis aos grupos vulneraveis e a sua proteccao Varias organizacoes da sociedade civil sao activas na divulgacao dos direitos da crianca como estrategia de mobilizacao das liderancas politicas e da sociedade em geral. A AMIC, criada em 1984, tem como missao central a promocao dos direitos da crianca. A RENLUV, rede de 40 Ongs e associacoes, actua na sensibilizacao e reducao da violencia contra a mulher e a crianca atraves de campanhas de informacao e sensibilizacao, marchas e advocacia junto das autoriades. O CIOJ (Centro de Informação e Orientação Jurídica) criada em em 1993 é uma instituição de aconselhamento e orientação das mulheres e jovens adolescentes em matéria de violação dos seus direitos que trabalha em parceria com a Polícica de Ordem Pública. A REJE (Rede de Jovens Educadores) criado nos anos 2000 intervém no dominio da sensibilização contra a a violação dos direitos da criança e favor da escolarização das raparigas. É de salientar igualmente as contribuicoes das Rádios Comunitarias, de grande penetração e eficacia comunicativa junto as colectividades, para a criacao de uma mentalidade e comportamentos favoraveis aos direitos da crianca e a sua proteccao. As campanhas de sensibilizacao relativamente ao HIV/SIDA visam contribuir para mudancas de atitudes e comportamentos para favorecer a prevencao, a despistagem, o tratamento e corrigir os comportamentos discriminatorios relativamente as pessoas atingidas. As abordagens mais eficazes sao as abordagens comunitarias levadas a cabo pelas organizacoes presentes no terreno. 3.2. Políticas sociais básicas inclusivas: registo civil, saúde e educação e mecanismos de apoio a demanda Registo de nascimento Elementos para uma Estrategia Nacional de Proteccao Social Para Orfaos e Criancas Vulneraveis Page 38 sur 102 O registo de nascimento destina-se a implementar o direito da criança a um nome e uma nacionalidade (CDC, art. 7) e portanto à sua existência oficial como cidadão do Estado. Do ponto de vista legislativo, o Codigo de Registo Civil é considerado de dificil aplicaçao em razao de sua complexidade e obsoleto. Como referido anteriormente, foram propostas alteraçoes profundas ao Codigo, porém estas nao foram ainda aprovadas. A instituição responsavel pelo registo civil é o Ministério da Justiça através da Direcçao dos Serviços de Indetificaçao Civil, Registos e do Notariado. Existem 47 postos de registo civil no país. Sua distribuiçao geografica nao permite cobrir as tabancas mais isoladas. O quadro de pessoal dos registos carece de qualificacoes e sua pratica deixa a desejar. Enquanto no país nao se estabelecer uma cultura e uma pratica rotineira do registo de nascimento assim como a rede de servicos necessarios, as estrategias chave para sustentar o acesso ao registo de nascimento continuarão a ser a realização de campanhas incluindo a eliminação dos custos de registo. O Ministério da Justiça, com a cooperaçao do UNICEF e de PLAN/GB, realiza campanhas de registo de nascimento que visam abranger prioritariamente a população de 0 a 10 anos de idade. A campanha de 2005 conseguiu-se registar 53,000 criancas. Por outro lado, a concessão de gratuidade para os actos relativos ao registo e ao bilhete de identidade tem sido progressiva. A partir de 2002, o registo tornou-se gratuito até 30 dias depois do nascimento, a partir de 2004 até aos três anos de idade da criança e à partir de 2006 até aos 5 anos de idade28. As campanhas de registo apoiadas por Plan International na regiao de Bafata propuseram 50% de desconto dos custos do registo para as criancas maiores de 12 anos, o que permitiu alcancar bons resultados. A realizacao de um encontro nacional visando a elaboracao uma Estrategia Nacional para o registo de nascimento poderá constituir um passo importante para a definicao dos objectivos e dos meios necessarios com vista ao reforco do registo civil no pais. A estrategia deveria privilegiar o registo sistematico a nascenca e condicoes para a sua sustentabilidade, reforcado por campanhas pontuais para o registo retroactivo. As boas praticas, como o pre-registo a nivel de tabanca implementado pela PLAN Internacional, deveriam ser analisadas e introduzidas na estrategia com base numa avalicao de sua eficacia. Acesso a saúde O desafio fundamental para o Estado guineense é garantir à criança o direito fundamental à vida e à sobrevivencia através de uma reduçao drastica das causas da elevadissima mortalidade infantil e o funcionamento de um sistema de saude capaz de distribuir as prestaçoes fundamentais (assistencia ao parto, imunizacao, tratamento das doenças infantis) para o conjunto da populacao. A Politica do Estado guineense na área de saúde foi fixada pelo primeiro Plano nacional de desenvolvimento sanitário (1998-2002), cuja execução foi comprometida pelo conflito armado. O conflito destruiu infra-estruturas, provocou uma progressiva carência de profissionais de saúde, instalou no país uma instabilidade administrativa muito grande, responsavel pela falta de 28 Despacho n° 06/06. Elementos para uma Estrategia Nacional de Proteccao Social Para Orfaos e Criancas Vulneraveis Page 39 sur 102 continuidade na implementacao do plano e ocasionou uma diminuição da ajuda externa da qual dependia a saúde em mais de 90% do seu orçamento de funcionamento29. No intuito de dar continuidade ao DENARP, o segundo Plano Nacional de Desenvolvimento Sanitario (PNDSII), finalizado em 2008, fixa os objectivos e as estrategias para a decada 20082017. Os pontos principais da política nacional de Saúde são a) a saúde como “bem-estar”, b) o acesso universal a cuidados primários de Saúde de qualidade e com equidade, c) a descentralização progressiva das estruturas de tomada de decisões, d) a autonomização das estruturas e a contratualização dos prestadores de cuidados com vista a garantir melhor qualidade na prestação de cuidados de saúde, e) a participação comunitária no financiamento e gestão dos serviços de Saúde (IB), f) o desenvolvimento de uma política de recursos humanos, g) o desenvolvimento de parcerias e de colaboração intersectorial, h) e a valorização da medicina tradicional30. O PNDSII esta baseado em oito eixos estrategicos reunidos em dois objectivos: o período de 2008 - 2012, concentrado essencialmente no reforço de capacidade de intervenção do Serviço Nacional de Saúde (eixos 1 a 4) e o período 2013 - 2017 orientado no sentido de obter mais ganhos em saúde melhorando significativamente os indicadores do estado de saúde da população (eixos 5 a 8). Resultados obtidos Os principais resultados registados dizem respeito à reduçao da incidencia da malaria continua a ser a principal causa da mortalidade infantil e das consultas nos hospitais. O país elaborou uma Estrategia de luta contra a malaria baseado na introduçao de ACT, treinamento de pesssoal, distribuiçao de mosquiteiros e campanhas de impregnaçao que foi aprovado pelo Fundo Global e deveria receber financiamentos calaculados a volta de USD 12 milhoes para o periodo de 2008 a 2012. Os resultados obtidos sao atribuido principalmente à maior disponibilidade e uso pelas populaçoes de mosquiteiros. Aproximadamente 60% das crianças dormem sob o mosquiteiro impregnado e 46% das familias dispõem de pelo menos um mosquiteiro. Porem, o acesso aos medicamentos no caso de febre mala rica demora problemático, sendo que apenas 45.7% das crianças vitimas de malária tiveram acesso ao tratamento. Com respeito à imunização, o Estado colabora com parceiros como a OMS e o UNICEF para a implementação do Plano Nacional de Imunização (2005-2009) através principalmente da realização de campanhas. Estas campanhas tem mostrado alguma eficiência porem os resultados não são ainda satisfatórios, devido aos limites da estrutura de saúde a nível do território nacional, da sua reduzida capacidade e eficiência, das dificuldades de financiamento para estratégias avançadas, problema de gestão da cadeia do frio e problemas a nível dos recursos humanos. Acesso dos grupos vulneráveis à saúde Em termos de acesso geográfico, a infra-estrutura sanitária, particularmente afectada pelo conflito armado de 1998-1999 e suas consequências económicas e organizacionais, tem sido alvo de accoes de expansão e a reabilitação física por parte do Estado e de seus parceiros internacionais como a UE, a AFD e o Banco mundial, porem ela permanece subdesenvolvida, deixando numa situação de grande vulnerabilidade as populações rurais. 29 Nos últimos dez anos, a fracção do OGE que é atribuída à Saúde nunca chega a 10% e representa menos de 15% das necessidades financeiras do funcionamento do sector, implicando que o orçamento ordinário do Ministério da Saúde esteja totalmente dependente do apoio dos parceiros de desenvolvimento. 30 PNDSII, 2008-2017 Elementos para uma Estrategia Nacional de Proteccao Social Para Orfaos e Criancas Vulneraveis Page 40 sur 102 Em termos de acesso económico, a política vigente e de comparticipação. Esta politica porem não esta baseada em orientações claras e sofre de desvios ao nível das práticas. A abordagem, conforme a Iniciativa de Bamako, de recuperação de custos, que previa a disponibilização de uma serie de medicamentos essenciais a custo subvencionado a nível dos centros de saúde, tem apresentado problemas grave de gestão e tem resultado na ausência de disponibilidade de medicamentos a preço mais baixo do que no mercado por um lado e em nenhuma acumulação de fundos para financiamento dos serviços de saúde, pelo outro. Neste contexto, parece promissora a experiencia das mutualidades de saúde, apoiada pelo FNUAP e algumas ONGs no contexto de uma política de maternidade segura e resposta aos problemas sanitários das comunidades. A Luta contra o HIV/SIDA O Conselho nacional de luta contra a SIDA é o orgao multisectorial presidido pelo Primeiro Ministro responsavel por liderar a luta contra a SIDA no pais. Varios ministerios estao envolvidos e lideram a luta contra a SIDA nos seus sectores respectivos (educacao, militares, policias,etc). O Conselho apoia-se operativamente no Secretariado Nacional de Luta contra a SIDA (SNLS), criado em 2005 e responsavel pela coordenacao tecnica de todas as actividades de prevencao e tratamento. A nivel regional existem coordenadores regionais. Depois do Plano relativo ao periodo 2003-2005, a Guine Bissau elaborou um novo Plano nacional de luta contra o HIV/SIDA que cobre o periodo 2007-2011. O Plano esta articulado em torno das estrategias de i)acesso universal a prevencao das IST/HIV/SIDA ii)reducao do impacto do HIV/SIDA iii)reforco da vigilancia da epidemia, seguimento, avaliacao e iv) reforco da coordenacao das parceria e mobilizacao dos recursos. Quanto aos resultados obtidos, de uma forma geral, a cobertura das campanhas de comunicacao social e ainda baixa e irregular, persiste a dificuldade de cobertura das areas rurais e as mensagens veiculadas nem sempre sao intelegiveis e capazes de provocar mudancas de comportamentos e atitudes para maioria da populacao. Os anuncios radiofonicos nao sao regulares. As accoes mais eficazes sao aquelas de proximidade conduzidas pelas ONGs e pelas igrejas, porem limitadas as suas areas de intervencao. O impacto destas accoes parece mais forte nas areas urbanas. Campanhas de sensibilizacao e despistagem voluntaria sao organizadas pelos estudantes da capital. Algumas Ongs como Caritas e a Cruz Vermelha, colaboram com o Ministerio da Educacao para a introducao progressiva de modulos de educacao sobre o HIV/SIDA. A ONG AGMS forma jovens para a educacao de pares (160 educadores foram ja formados). Quanto ao impacto destas campanhas, o estudo nacional CAP de 2006 e o recente estudo de casos sobre as Crianças Orfãs e vulneraveis revelaram que apenas 6,9% dos jovens de 15 a 24 anos identificaram correctamente pelo menos duas formas de contaminacao pelo VIH e 8,1% ja ouviram falar de ARV. O estudo CAP actualmente em curso vai dar uma ideia do impacto das accoes mais recentes. Ha de se referir porem, que apesar dos esforcos, existem muitas comunidades, como aquelas visitadas no curso da nossa pesquisa de terreno, onde nunca se ouviu falar do HIV/SIDA. Elementos para uma Estrategia Nacional de Proteccao Social Para Orfaos e Criancas Vulneraveis Page 41 sur 102 No que diz respeito a cobertura dos servicos de testagem, prevencao da transmissao vertical e de tratamento ARV, metade da oferta esta concentrado no SAB. Quinara, Bolama e Tombali so tem um servico de luta contra o HIV/SIDA, como pode se observar no seguinte quadro. Quadro 1. Servicos de luta contra a SIDA disponiveis em Abril 2008 Regioes Atendimento Centros de Prevencao da Centros para o Centros de medico e testagem trasmissao acompanhamento transfusao de psicosocial voluntaria mae-filho biologico sangue SAB 7 15 10 1 1 Bafata 1 4 1 0 1 Bolama 0 1 0 0 0 Cacheu 1 5 1 0 1 Gabu 1 4 1 0 1 Biombo 1 1 1 1 0 Oio 1 4 1 0 0 Quinara 0 0 0 0 0 Tombali 0 0* 0 0 1 Total 12 35 15 2 5 Fonte : CNLS/SNLS – Abril 2008 * em curso de abertura Se por um lado, a oferta é ainda insuficiente, por outro lado, a demanda e baixa, sendo que existe falta de informação, reticência e desconfiança das populações em utilizar os servicos. O numero de pessoas seropositivas aumentou de 3.861 en 2006 a 11.734 en 2007. Na base dos dados de 2007, cerca de 10% das mulheres gravidas seropositivas receberam tratamento ARV para corte da transmissao vertical. O numero de pessoas em tratamento ARV tambem aumentou de 65 em 2005, a 349 em 2006 e 890 en 2007 e , na base de projections SPECTRUM, chegaria a cobrir 28,1% das pessoas vivendo com HIV/SIDA. Os ARV e o tratamento das DST sao gratuitos, porem pode haver falta de medicamentos e reagentes, como em 2007, quando houve uma ruptura do stock de ARV durante tres meses, com repercussoes graves nos tratamentos em curso. Respostas a vulnerabilidade social devido ao SIDA Os serviços de saúde que identificam famílias atingidas pelo HIV/SIDA numa situação de vulnerabilidade económica não dispõem de opções de encaminhamento dos pacientes para mecanismos de apoio social. As poucas acções implementadas dizem respeito as pessoas portadoras em terapia ARV e apoiam-se nos serviços existentes, como os Centros de Recuperação Nutricional que acolhem mães seropositivas ou a Casa Emanuel, que tem nove crianças orfãs e seropositivas, encaminhadas na sua maioria pela ONG Céu e Terra. Quanto as crianças de famílias afectadas pelo HIV/SIDA, em primeiro lugar a dificuldades em identificar as crianças que se tornaram órfãos devido ao SIDA, uma vez que a causa de morte do(s) pai (s) não é normalmente conhecida, pois os casos não são divulgados. Por outro lado, não existe no momento um mecanismo institucional de apoio social para assegurar que estas crianças sejam mantidas na família alargada ou colocadas numa família de substituição. A gestao dos orfaos Elementos para uma Estrategia Nacional de Proteccao Social Para Orfaos e Criancas Vulneraveis Page 42 sur 102 Conforme a cultura vigente, as praticas relativas as crianças orfas seguem padroes tradicionais. No caso de obito da mae, a crianca é no geral acolhida por uma tia materna ou paterna, ou por outro familiar. Os principios que regem esta colocacao sao os de parentesco (primazia ao lado materno, “a crianca é da mae”), de recursos materiais (rendimentos, espaco), de proximidade geografica. A pratica dos filhos de criacao, pode em alguns casos abrir porta para situacoes de exploracao e maus tratos, ainda assim tem sido um instrumento eficaz para assegurar cuidados e proteccao a criancas orfas. Cobertura Devido a falta de dados quanto aos numeros de criancas afectadas pelo HIV/SIDA, é difícil estimar a cobertura das acções em curso. O MICSIII inquiriu-se sobre os apoios recebidos pelas crianças tornadas órfãs e vulneráveis (total de 4,051 crianças)31. A percentagem de crianças cujo agregado recebeu apoio é muito baixa: 4,4% recebeu apoio médico, 1,3 % recebeu apoio psicológico ou emocional, 1,2% apoio material, 3,2% apoio à escolarização, ao passo que 92,5% não recebeu nenhum tipo de apoio. A resposta ao impacto do HIV/SIDA necessita de uma abordagem hierarquizada e integrada, que corresponde aos diversos níveis de vulnerabilidade e aos diversos domínios de políticas públicas. A redução da pobreza e a garantia de acesso aos serviços de saúde, educação, água e saneamento, são a primeira resposta à grande vulnerabilidade estrutural que determina a intensidade e gravidade do impacto do HIV/SIDA. Quanto aos grupos mais vulneráveis responsáveis por crianças, sejam elas órfãs ou não, e que não tenham capacidade para o trabalho (doentes, pessoas idosas, crianças chefes de família) e necessário encontrar soluções apropriadas para, em particular para preservar e fortalecer os sistemas de gestão das crises e integração dos órfãos. Acesso a Educação Apesar de vários esforços desenvolvidos em matéria de educação, o país ainda tem pela frente enormes desafios com vista a alcançar os Objectivos de Desenvolvimento de Milénio na sua vertente nº 2, ou seja, “garantir que todas as crianças, de ambos os sexos, terminem um ciclo completo do ensino primário”. Varios programas de desenvolvimento do sector da educacao tem sido desenvolvidos com apoio de organismos internacionais, porém de uma forma geral todos eles tem sido afectados pela instabilidade governamental e das frequentes mudanças na lideranca do Ministerio da Educacao Nacional e do Ensino Superior (MENES). No quadro do Programa de Apoio a Educação de Base financiado pelo Banco Mundial e apoiado tecnicamente pelo Pólo de Dakar, o pais engajou-se em 2002 em proceder a reforma do sistema educativo virado para o soluçao de alguns problemas estruturais da oferta de educaçao. A partir de 2006, com o apoio da UNESCO-Polo de Dakar, foi inciada a preparaçao de um Plano Estrategico que entre outros possibilite o acesso da Guine Bissau aos fundos da Fast Track Initiative, indispensaveis tendo em conta a incapacidade financeira do país em assegurar os recursos necessarios para o sector da educacao. O Plano Sectorial em prol da Educacao para Todos nao foi ainda finalizado. 31 Definicao do MICSII de criancas orfas e vulneraveis: Elementos para uma Estrategia Nacional de Proteccao Social Para Orfaos e Criancas Vulneraveis Page 43 sur 102 Resultados alcancados Graças aos esforcos destinados a ampliar a oferta escolar, o numero de salas de aula cresceu, porém esta ampliação a todo o territorio nacional não responde as demandas do crescimento populacional. Por outro lado, apenas 60% das salas de aula são construções definitivas, as demais são barracas, inadequadas a função escolar. Também, em certas localidades vigoram tres turnos diarios, factor que ameaça o cumprimento de quatro horas diarias, dada a falta generalizada de luz eletrica. Uma mudanca estrutural verificou-se com a unificação dos dois ciclos da educação primaria num ciclo único, dito ensino básico, que passa a ter uma duração de seis anos. A reforma porém não foi ainda aplicada em varias zonas do pais, em particular nas zonas rurais, onde a persistencia dos dois ciclos, com consequentes problemas de oferta para o ciclo complementar, não permite que as crianças completem a educação básica. Para melhorar a eficiência dos recursos humanos e diminuir os gastos em salários, foi realizada uma reforma importante do quadro de professores titulares do ensino publico em 2007. Uma nova carga horária (dois turnos de quatro horas) acompanhou o aumentode 60% sobre o salário base para os professores dos quatro primeiros anos e uma carga horaria de 30-32 horas semanais e 40% de aumento salarial para os professores da 5ª e 6ª classe. O numero total de professores passou de 7,400 para 3,000, com importantes poupanças na folha de pagamento. Várias acções destinam-se a melhoria da qualidade do ensino. A principal delas por abrangencia e o Programa de Formação dos Educadores em exercício do Ensino Básico da Guiné-Bissau foi inciado em 2006 atraves de uma parceria do Ministério da Educação e Ensino Superior, com UNICEF, UNESCO, PAM, UNFPA, PLAN Internacional, Serviço Holandês de Cooperação (SNV) e Banco Mundial. O programa termina no fim de 2008. Ele proporcinou formação contínua e qualificação profissional a 2,378 Formadores e Professores não diplomados32 do ensino básico. A formacao foi dispensada em quatro Centros de Formação Intensiva de Professores (SAB, Bula, Buba e Gabú). A reestruturação curricular do ensino básico e outra condição indispensavel para a melhoria de qualidade da educação na Guiné-Bissau. A conclusão da revisão do curriculo para o ciclo unificado da 1ª a 6ª classe esta prevista para 2011. Quanto ao material escolar, apos o fim do projecto BESP, que apoiava a grafica escolar e a publicação e distribuição de livros, não existe um programa permanente de distribuição de material escolar nas escolas públicas, apenas doações esporádicas. Os desafios da EPT Os grandes desafios da Educação na Guine Bissau são o financiamento e a gestão da educação. O sector da educação sofre de insuficiência de financiamento: Por exemplo, a educação recebe 1215% dos recursos do Orçamento Geral do Estado que representa 2,5-3% do PNB. Estes valores deveriam ser respectivamente de 25% e 4,5-5%. A parte do ensino básico e de 40% mas deveria passar para 50%. Quanto ao planeamento e gestão educacional, é necessário melhorar, paulatinamente o sistema de colheita e tratamento de dados, promover uma verdadeira descentralização da gestão ao nível das regiões, e uma gestão financeira capaz de resolver os problemas ligados ao pagamento dos salários. 32 As escolas comunitarias Sendo 142 professores das escolas comunitarias apoiadas por Plan internacional na regiao de Befata. Elementos para uma Estrategia Nacional de Proteccao Social Para Orfaos e Criancas Vulneraveis Page 44 sur 102 Na Guine Bissau, embora não existirem dados definitivos sobre as escolas comunitárias, as previsões indicam que cerca de um quinto da oferta escolar é providenciado por escolas comunitarias. As escolas comunitarias são escolas construídas eme special em zonas não cobertas pelo sistema nacional do ensino, geralmente com o apoio de financiamento internacional. A comunidade contribui na fase de construção, no pagamento do salario dos professores (em dinheiro ou espécie, por exemplo em Quitafine, as populações pagam as mensalidade das crianças com arroz ou ôleo de palma). Um factor importante na dinamica das escolas comunitarias, é existencia de Associações de Pais e Encarregados de Educacao (APEE), que asseguram a gestão da escola e supervisionam a atuação do professor e a aprendizagem dos alunos. Não se requer uma cédula de identidade para a inscrição da criançaa. A principal instituição de apoio as escolas comunitarias é a PLAN Internacional, que ajudou a construir inúmeras escolas na região de Bafatá contribuindo significativamente para o aumento da escolarização das crianças. Outras escolas comunitarias foram estimuladas pela SNVCooperacao Holandesa no Sul nos anos 90. Estas passaram a ser geridas autonomamente e contam agora com o apoio da Estrutura para o Desenvolvimento do Ensino Comunitario (EDEC) para o planeamento, a formação, o reforco das capacidades de gestao, etc. A organizacao Tiniguena apoia o ensino comunitario nas ilhas. Um leque importante de professores de escolas comunitarias (142)participam no Programa Nacional de formação de professores. A participação efectiva dos pais e da comunidade nas escolas comunitarias tem dado resultados positivos, revelando-se uma estratégia bem sucedida em manter as criancas na escola e em assegurar a presença e o bom desempenho do professor. Apoios a demanda Da parte das famiíias (demanda), os factores que influenciam a matrícula e a frequência das crianças são ligados ao acesso geográfico, aos custos implicados (material, uniforme) e as necessidades dos trabalhos agricolas em certa êpocas do ano e finalmente as percepções que as famílias têm quanto a qualidade da educação e quanto as vantagens da escolarização comparativamente ao trabalho. Os avanços registados nas inscrições têm sido possiveis também graças a eliminação das taxas de inscrição, decidido pelo Ministerio de Educacao em 2001. Esta medida tem certamente reduzido os custos da educação para as familias, possibilitando a inscrição de crianças que teriam sido excluidas, porem outros custos permanecem. Em particular, desde 2004, os livros não são mais distribuidos aos alunos. Existem algumas acções de apoio atraves de material escolar a escolarização das crianças das comunidades mais vulneraveis, levadas a cabo por certas ONGs e Igrejas, porem estas acções são pontuais e nao perenes. A cantina escolar Se a eliminação das taxas de inscrição constitui um mecanismo de apoio a demanda eficiente, a merenda escolar por sua vez representa uma estrategia de atração de criancas para a escola, de contribuição ao seu estado nutricional e por consequente de suas capacidades de aprendizagem e de apoio indirecto aos rendimentos familiares. Em certos contexto, ela pode ser tambem uma estrategia eficiente para motivar a criação de hortas escolares ou utilizar os produtos agricolas da area, favorecendo o mercado local. O Programa de Alimentacao Mundial (PAM) atende atraves do Programa de Cantinas Escolares cerca de 86,000 crianças do primario, ou cerca de um terco do total, em 533 escolas localizadas Elementos para uma Estrategia Nacional de Proteccao Social Para Orfaos e Criancas Vulneraveis Page 45 sur 102 nas quatro regioes mais vulneraveis do pais: Bafata, Biombo, Gabu e Oio. 70% destas escolas sao públicas. O custo por aluno e de cerca de 20USD por ano33. O programa de cantinas escolares IPHD/AMIC, “Estrategia de reforco a inscrição e retenção das crianças na escola”, financiado pelo Departamento de Agricultura dos Estados Unidos, é activo nas regioes não cobertas pelo PAM, sendo 7 regioes (Biombo, Cacheu, Oio, Quinara, Tambali, Bolama Bijagos e SAB). O programa beneficia 58,000 crianças enquadradas em 246 escolas e 32 jardins infantis34. O programa distribui trimestralmente arroz, feijao e oleo vegetal. As refeições sao preparadas na escola. Um comite de gestao lacal é responsavel pelo programa. Para além da alimentação, o programa distribui tendas impregnadas, desparasitantes, apoia na construção e reparação de cozinha e estimula a actividades das APEE. Uma avaliação do impacto constatou uma redução da taxa de abandono nas 246 escolas em media de 20.2% no ano anterior ao inicio do programa para 14.3%, sendo 5.22% para os rapazes e 9.08%para as raparigas. 35 Na ausencia de perspectivas que o Ministerio da Educacao possa assumir o programa e universaliza-lo é urgente elaborar uma estrategia de sustentabilidadedo programa na perspectiva do desengajamento do doador. As propostas ja em curso sobre a reabilitação das bolanhas e criação de hortas escolares é promissora. 60 escolas do programa IPDH/AMIC tem propostas concretas para criação de horta escolares. 3.3. Mecanismos de apoio aos rendimentos Garantir as familias vulneraveis um ambiente propicio e oportunidades para geração de rendimentos36 constitui uma das estrategias-chave de redução da pobreza e garantia que as familias possam viver de uma forma autonoma e digna (não dependente) e garantir o bem-estar de suas criancas. Em particular, a experiencia regional demonstra que o apoio as mulheres é o mais eficaz, uma vez que as mães utilizam os seus rendimentos para o bem estar das crianças. O organismo público nesta area é a Fundaçao para a Acçao Social, que tem como missão apoiar associações que trabalham na área de geração de renda para grupos vulneraveis e prestação de serviços sociais. De uma forma geral, mais do que a actuação do FAS, sao as diversas intervenções levadas a cabo pela cooperacao internacional, atraves de ONG (Divutec, Aprodel, Adim, Nadel, ADS, Adic Na Faye, Edec, Nantinyan e outros) , que tem assegurado o acesso das populações vulneraveis a projetos de geracao de rendimentos. Experiências interessantes a mencionar são as desenvolvidas 33 Estes dados constam do relatorio EPT, segundo draft, Julho de 2007. IPHD/AMIC – Programa de apoio as escolas publicas – cantinas escolares – sintese analitica dos resultos alcancados, fev.2007-fev 2008 35 As razoes levantadas por este estudo para o abandono escolar foram: - grande distancia da escola do domicilio - ma condicao das estruturas escolares - baixo nivel de instrucao dos professores - ataques frequentes de malaria e outras doencas - fome - analfabetismo na familia e na comunidade - abandono por parte dos professores devido a isolamento e falta de condicoes de sobrevivencia. 36 Incluem-se aqui as accoes que visam manter ou gerar rendimentos para os grupos vulneraveis (formacao, micro-credito, empregos subvencionados, etc.) 34 Elementos para uma Estrategia Nacional de Proteccao Social Para Orfaos e Criancas Vulneraveis Page 46 sur 102 por algumas ONGs de desenvolvimento comunitário sobretudo no dominio da Criação de Bancos de Cereias junto das comunidads rurais que têm se revelado importantes para a segurança alimentar, em especial no perído de maior rutptura de stock alimentar (Junho a Setembro). Os programas de microcrédito têm sido igualmente relevantes para a sobrevivencia familiar na medida em que permitem as mulheres arrecadar rendimanetos para investir na alimentação dos filhos e na sua escolarização e saúde. Por exemplo, a ONG “RENLUV” durante um período de tempo actuava através de microcréditos na formação das mães de criancas vitimas de violencia no dominio de pequenos negócios. Isto constitui um bom exemplo de articulação entre o apoio à resposta judicial e apoio social. 3.4. Mecanismos de proteccao social com base contributiva A nova lei guineense sobre a protecçao social de 2007 define como protecçao social com base contributiva, os seguros sociais obrigatorios e complementares (protecçao social obrigatoria) bem como os diferentes tipos de seguro privado. No sector contributivo, o Instituto de Previdencia Social (IPS), sob a alçada do Ministério da Reforma Administrativa, Função Publica e Trabalho, gere os tres regimes de Previdência social em vigor (regime geral, regime facultativo, seguro obrigatorio de acidentes de trabalho e doenças profissionais). Registam-se várias dificuldades no funcionamento e gestão do Instituto: mudanças incessantes ao nível da direcção, ausências e atrasos nas contribuições por parte das empresas, com consequente ausência de fundos para os pagamentos, não uniformidade e lentidão nos pagamentos. A cobertura do seguro obrigatório para os trabalhadores do sector privado é baixa. Estão recenseados apenas 6,400 trabalhadores e 1,622 empresas. As empresas que efectivamente contribuem para o seguro são muito menos numerosas (2-3%). Os 12,500 trabalhadores publicos contribuem com cerca de 18% de seus salarios para o seguro de saude, porem o acesso ao tratamento e aos medicamentos nao é regular para todos. Eles tem tambem acesso a reforma, aos 60 anos e depois de 40 anos de servicos ou 15 anos em caso de invalidade. As contribuicoes dos trabalhadores publicos para a reforma não são geridos por um fundo autonomo, mas vão para orçamento geral. Desta forma, os pagamentos aos trabalhadores reformados sofrem atrasos. De qualquer modo, o sector dos seguros sociais permanece muito pouco desenvolvido, em parte em razao das limitaçoes do sector privado, da ausencia de uma politicas de seguros para os trabalhodores do sector informal (que sao a maioria - cerca de 80% da populaçao activa) e da reduzida porçao da populaçao com confiança e capacidade economica para eventualmente contribuir, e finalmente devido a ausencia de agencias para os seguros privados. O instituto beneficia do apoio da Cooperaçao Portuguesa que tem como objectivo a modernizaçao do sector e de suas instituiçoes como também a ampliaçao da cobertura dos seguros. A experiencias das Caixas de Poupanca e Crédito Devido a fraqueza do sector publico para os seguros, iniciaram no pais experiencias de caixas de poupanca e credito. Estas experiencias sao estimuladas por ONGs e organismos de cooperacao como a SNV, que apoiou a criacao de mais de 20 destes grupos em diferentes partes do pais. Estes organismos de microfinancas sao integrados sobretudo por mulheres. Elementos para uma Estrategia Nacional de Proteccao Social Para Orfaos e Criancas Vulneraveis Page 47 sur 102 O projecto PAED do PNUD, iniciado no Ano Internacional das Microfinancas (2005) tem estimulado a criacao de organismos de microfinancas atraves da concessao de linhas de credito, capacitacao e apoio material. Estes organismos engajaram-se para em 5 anos tornar-se instituicoes performantes. Actualmente, algumas destas instituicoes de microfinancas apresentam bons resultados. A DIVUTEC, a NO PEGA, a AMID e a ADIM, com uma media de 4 a 5 caixas cada uma, tem sido bem sucedidas em garantir a sustentabilidade de suas operacoes. O projecto PAED tem tambem contribuido para redinamizacao da CADESP (Celula de Apoio ao Desenvolvimento da Economia Solidaria), junto ao Ministerio da Economia. A CADESP tem o objectivo de formalizar este sector e desenvolver funções de supervisao e seguimento dos organismos de microfinancas. As instituicoes mutualistas registadas sao isentas de impostos. Actualmente, estao registadas cerca de 18 institutições mutualistas e de credito, das quais algumas ja inactivas. As capacidades da CADESP de implementar suas funcoes sao limitadas. De uma forma geral, o desenvolvimento destes mecanismos privados de proteccao social se confronta com algumas dificuldades. A motivação para participação nas caixas está baseada sobretudo no acesso ao credito. A mentalidade de seguro não esta ainda desenvolvida. Os creditos obtidos podem ser desviados para gastos directos, ligados a tradição (por ex. Pagamento de uma cerimonia), deixando o devedor numa situacao dificil. Para superar estas dificuldades, seria necessario melhorar a gestao das caixas de maneira a estimular a confianca dos participantes potenciais. 3.5. Mecanismos de assistencia de base nao contributiva Quadro juridico-institucional A Lei sobre a protecção social define a protecçao social da cidadania como todos aqueles mecanismos com base nao contributiva que sao os subsidios financeiros e os serviços sociais para os grupos vulneraveis. A Lei menciona explicitamente como fundamento da proteccao social da cidadania a solidariedade nacional e a redistribuiçao. A proteccao social da cidadania deve ser financiada pelo imposto e outros eventuais recursos procendentes de donativos e participaçoes internacionais. O Ministério da Solidariedade Social Familia e Luta contra a probreza (MSSFLP) foi criado em 2004, apos uma serie de mudanças na denominaçao e missão das instituições na area social e no quadro da implementação do Programa de Reforma e Modernização da Administração Pública. O Ministério é responsável pela “definição e execução da política que tem por missão principal, desenvolver a solidariedade social, proteger a família, promover a integração social, reduzir a pobreza, e assegurar a paz social através do desenvolvimento de acções multidisciplinares”. Ele tem portanto a responsabilidade geral da protecçao social de tipo nao contributivo devendo para tal “organizar, promover, enquadrar e coordenar com as ONGs vocacionadas, nacionais e internacionais, todas as iniciativas sócio-economicas em beneficio das populações em geral, privilegiando as camadas mais desfavorecidas”. O Ministério está organizado operativamente em duas Direcções gerais, Direcção Geral da Solidariedade Social (DGSS) e Direcção Geral da Luta Contra a Pobreza (DGLCP). Ele e o orgao de tutela do Fundo para a Acção Social (FAS) e do Instituto da Mulher e da Criança (IMC). O sector da assistencia aos grupos vulneraveis (orfaos, pessoas portadoras de deficiencias, idosos) é coordenado pela Direcçao Geral da Solidariedade Social. Esta direcçao nao tem representaçoes nas regioes. Resultados Elementos para uma Estrategia Nacional de Proteccao Social Para Orfaos e Criancas Vulneraveis Page 48 sur 102 A missão principal da DGSSF é a coordenação das acções. Neste sentido tem havido várias tentativas de criar um mecanismo eficaz de coordenação das ONGs. Uma Comissão Técnica sobre OVC liderada pela DGSSF tem trabalhado e está na origem deste estudo. A DGSSF gere directamente o fundo de solidariedade. Trata-se de um pequeno programa de pensoes sociais para populaçoes particularmente vulneraveis, sendo as categorias eligiveis as pessoas portadoras de deficiencias, as viuvas, os gemeos, os orfaos e os idosos37. O fundo tenta responder também a evacuações para o exterior de urgências sanitárias (pagamento da passagem) e acidentes como incêndios. O programa é financiado pela venda de selos. Actualmente, estao inscritas no programa cerca de 2,500 pessoas, das quais a maioria sao pessoas portadoras de deficiencias. Os inscritos recebem em principio uma contribuiçao trimestral de 10,000 CFA. O programa funciona baseado na demanda (pedido escrito) e a atribuiçao do subsidio depende dos resultados do estudo social, da disponibilidade dos recursos e, em ultima instancia, de uma decisao directa do Ministro. A irregularidade dos fundos disponiveis e sua utilização ponctual para outros fins fazem com que o programa siga um andamento irregular. Apoio às populações de refugiados- A Guiné-Bissau tem sido refúgio para as populações a fugir conflitos na Libéria, Serra Leoa e Sul do Senegal (Casamança). O país dispõe de uma Comissão nacional de refugiados e de apoios vindos das agências especializadas nas Nações unidas. Em 2006 o Ministério disponibilizou meios aos deslocados do Sector de São Miguel afectados pelo conflito transfronteiriço de Casamança, Sul do Senegal e Norte da Guiné-Bissau. De uma forma geral porem, o principal recurso para as familias em situacao de grande vulnerabilidade nao tem sido o Estado mas as organizacoes privadas. Neste sentido, o Projecto integrado de desenvolvimento de uma rede de protecçao social baseado em acordo entre o MSSFLP e Cooperaçao portuguesa apoia financeiramente 16 entidades publicas e privadas que actuam na area social – Rede Protecção Social - GB tem como objectivo fundamental de assegurar a coordenaçao e a sinergizaçao das acçoes de protecçao social face a limitaçao dos recursos financeiros e humanos disponiveis e às grandes necessidades da populaçao em situaçao de pobreza. As entidades participantes proporcionam apoios directos às populaçoes carenciadas, desenvolvem actividades de sensibilizaçao, conduzem acçoes educativas e de formaçao para crianças e jovens e acçoes de apoio à criaçao de micro-empresas. Em particular, as missoes catolicas e evangelicas, apoiadas por fundos estrangeiros e pela CARITAS, actuam de maneira eficaz nas areas de saude preventiva e curativa, em particular das maes, recuperacao nutricional e melhoria da dieta alimentar, jardins e escolas privadas e comunitarias, com uma atencao especial para as familias afectadas pelo HIV/SIDA. Algumas ONGs internacionais sao tambem presentes, como a PLAN internacional que cobre na regiao de Bafata 16,000 criancas vulneraveis com servicos sociais e colabora tambem com ONGs nacionais (como SOS Criancas Talibes). No ambito ainda da Rede de Proteccao Social, o Ministério tem procurado estabelecer parcerias com as organizações que actuam na área dos servicos a Pessoas portadoras de deficiências em 37 Em 2007, o Fundo assistiu cerca de 2206 pessoas repartidas da seguinte forma- 1,500 pensionistas- 386 órfãos e pessoas vulneráveis- 236 casos de assistência medica e medicamentosa- 58 gémeos, trigémeos e quadrigémeos- 26 evacuações Elementos para uma Estrategia Nacional de Proteccao Social Para Orfaos e Criancas Vulneraveis Page 49 sur 102 particular a União nacional dos deficientes menores (UNDM) e a Associação Bengala Branca, que têm funcionado em infra-estruturas do Estado. 3.6. Sistemas de protecçao da crianca A protecçao da crianca é um dominio especializado da protecçao social . A sua missao é de assegurar proteccao judicial e atendimento psico-social as crianças que se encontram em uma situaçao de vulnerabilidade aguda, a dizer as situaçoes em que: -a criança é privada de agentes cuidados primarios (nos casos de abandono, criança traficado, abandonada a si mesma, crianças a viver na rua, crianca institucionalizada, etc.) -a criança é vitima de violação da sua integridade psico fisica (violencia, maus tratos, abuso, exploraçao, etc.). Portanto, a politica de protecçao da criança, embora seja um sector da protecçao social, merece uma analise separada e aprofundada em termos das leis que a definem , das instituiçoes que a implementam e do impacto das acçoes realizadas. Com efeito, esta politica é de responsabilidade especifica do Estado e de suas instituiçoes especializadas, unicas detentora de legitimidade governamental. Cabe ao Estado (e nao as ONGs) garantir os direitos humanos basicos das crianças nos casos que implicam mudanças na responsabilidade parental e nos casos de violaçao. Esta politica de proteccao da crianca implica em intervençoes especializadas e individualizadas para a criança vitima : Intervenção das forças de segurança (policia d eordem publica epolicia judiciaria) nas situaçoes de crise em que seja envolvida a criança, para apreensao do agressor e protecçao da vitima ; Intervenção da autoridade judiciaria do Estado, Curador de menores, Juiz para aplicaçao de medidas de protecçao à criança por um lado, e sancionamento do autor da infracçao contra a criança pelo outro; Intervençao da autoridade administrativa de protecçao da criança para a implementaçao de medidas de protecçao da criança (abrigo provisorio, atendimento psico-social, acompanhamento etc.). Quadro legislativo Para a protecção da criança, a Lei vigente é o Estatuto da Assistência Jurisdicional do Menor, herdado do período colonial. Como referido, existe uma nova proposta de lei para a protecçao da criança a risco, que faz parte do conjunto de leis a serem reformadas para assegurar a harmonização da legislação nacional com a normativa internacional neste dominio. O pacote deveria ser aprovado, apos actualizacao, no curso da proxima legislatura. Convem que esta lei diferencie paulatinamente, atraves de duas leis diferentes: - Os procedimentos aplicaveis nos casos em que a criança é vitima (de negligência, de agressoes fisicas e psicologicas, de exploraçao sexual ou no trabalho por parte de outrem) ; Elementos para uma Estrategia Nacional de Proteccao Social Para Orfaos e Criancas Vulneraveis Page 50 sur 102 - Os procedimentos aplicaveis nos casos em que a propria criança infringe a lei – isto é é autor de uma acçao descrita na lei como infraçcao, exigindo a aplicaçao de uma legislaçao especifica de responsabilizaçao penal para jovens infractores e a aplicaçao de medidas socio-educativas conforme a gravidade da infracçao. Instituiçoes responsaveis pela proteção da crianca - Comissariado Geral da Policia da Ordem Publica, Direcçao de Serviços de Direitos Humanos, Promoçao e Protecçao da Mulher e Criança - Ministerio do Interior, Direcção Geral da Polícia judiciária, Gabinete de Protecção do Menor e Adolescente - Direcção Geral da Solidariedade Social (MSSLP) - Instituto da Mulher e da Criança (IMC) , Secretariado executivo da crianca - Curadoria de Menor junto da Secção da Família do Tribunal Regional. - Núcleo Nacional de Técnicos de Intervenção Social (NUNATIS) trabalha em parceria com o MSSFLP e com a Curadoria de menores Estes serviços colaboram com algumas organizações privadas e com algumas famílias. Politica No momento não existe nenhum documento oficial programático do Governo sobre a Politica de protecção da criança. Os documentos de referência nesta matéria sao constituidos pelos acordos de cooperação com organizações que operam nesta area, quer sejam acordos individuais (UNICEF, ONGs) ou colectivos (Rede de Protecçao Social). Resultados obtidos A notificação dos casos Os professionais da área estimam que apenas um número limitado de casos de violação dos direitos da criança a integridade psico-fisica chegam as autoridades. Alguns casos de violência contra a criança são notificados ao radio, à Policia, ao IMC ou diretamente ao Tribunal (este ultimo, e solicitado sobretudo elas ONGs). Porém, e reconhecido que existe uma grande reticencia da parte da população em recorrer as instituições, de um lado para preservar a honra da familia bem como relações e equilbrios familiares e de vizinhanca, en negação do interesse superior da crianca, do outro lado tambem devido a um deficit de confiança no funcionamento das instituições e na sua capacidade de resposta. A ausência de um mecanismo de notificação que permita preservar o anonimato (como uma linha telefónica SOS) faz com que não há denúncia de muitos casos que são portanto conhecidos das comunidades. O rádio constitui o único recurso. O rádios porém, viola duplamente os direitos da criança com o anúncio público do caso. Outra desvantagem, o rádio não tem mecanismo de articulação com a Policia ou o Tribunal, deixando o caso ao grau das circunstâncias. Resposta judicial Policia da Ordem Publica e Policia Judiciaria No Ministerio do Interior, existe um departamento especializado nos assuntos da mulher e da crianca junto do Comissariado Central da Policia de Ordem Publica. A Policia da Ordem Publica e encarregue da manutencao da ordem e da tranquilidade publica e da proteccao da seguranca dos Elementos para uma Estrategia Nacional de Proteccao Social Para Orfaos e Criancas Vulneraveis Page 51 sur 102 cidadaos, em particular das mulheres e criancas. Ela desempenha uma funcao prioritariamente preventiva e intervem nos casos de infracoes em flagrante e/ou a pedido da populacao. Quanto a policia judiciaria, que tem a funcao de investigar os casos (constatar as infracoes a lei penal, reunir as provas e procurar os autores). O Ministerio do Interior criou na Direcção de Servico de Direitos Humanos, um servico especializado de promocao e proteccao da mulher e da crianca em 2008. Este Departamento elaborou um Plano de trabalho para o periodo 2008-2009. Um programa de formacao dos agentes policiais em policiamento comunitario preventivo e apoiado actualmente pelo UNOGBIS. Varias outras actividades previstas ficam letra morta devido a inexistencia de financiamentos. Nem todos os casos de violencia contra a crianca que chegam a Policia sao investigados e transmitidos ao Tribunal. Os profissionais do sector, admitem que a pratica deixa muito a desejar. Da parte das famílias, há abandono dos procedimentos sobretudo devido a incapacidade financeira de pagar os exames médicos necessários para averiguação das lesões físicas. 38 Da parte da policia, as mas condições de trabalho, os baixos salários, a falta de supervisão, abrem aporta para a corrupção e afectam fortemente a actuação. Nos casos de violação sexual de crianças, se o autor do crime conhecido tem capacidade para pagar um suborno, o caso pode ser abafado. Se as pessoas notificadas não comparecerem, a Policia não tem meios de terreno para ir impor a lei (viaturas). Também e ressentida a necessidade de uma casa de passagem para albergar as vitimas em condições de segurança. De uma forma geral, é necessária uma vontade política de facto e investimentos para assegurar que a actuação das polícias seja condizente com o Estado de Direito. Curadoria de menores A Curadoria de Menor existe so na Capital, junto da Secção da Família do Tribunal Regional. Este serviço é encarregue de acompanhar os casos envolvendo crianças, quer na fase de desenvolvimento dos actos processuais dentro do Tribunal como também nos contextos familiares de colocação, assegurando o respeito do princípio do interesse superior da criança. A Procuradoria geral da República tem procurado colocar nestes serviços magistrados com alguma preparação especial, sensibilidade e interesse para os assuntos da criança. A Curadoria de Menores de Bissau trata na maioria casos de separação de pais e de sucessão. Trata também de casos de violência doméstica e de abandono de criança. Os profissionais da área consideram que uma grande parte dos casos não chega ao Curador de menores, devido a fraca capacidade de resposta da parte do poder judiciário. Com efeito, a capacidade de resposta da Curadoria e diminuta enquanto a Curadoria i) não dispõe de assistentes sociais que possam levar a cabo os estudos necessários a tomada de decisão do Curador e ii) carece de ligado funcional estabelecida e regular com uma autoridade administrativa bem definida, que seria encarregues de tratar do caso socialmente (acompanhamento a visitas medicas, estudos psico-social, analise das possibilidades de reintegração familiar ou colocação alternativa, etc.). Tribunal de Menores O Tribunal de menores existe apenas na capital. O Juiz de Menores tem uma formação geral e especializa-se no decurso da sua actuação profissional. Nas outras regiões, os casos são tratados 38 Estes exames estão a cargo da vítima e serão reembolsados pelo autor só após julgamento. Elementos para uma Estrategia Nacional de Proteccao Social Para Orfaos e Criancas Vulneraveis Page 52 sur 102 pelos Tribunais regionais que não disporem de pessoal especializado. O Juiz de menores trata casos cíveis. Vara Criminal Os casos de violência contra a criança acabam por serem tratados pela Vara criminal, no que diz respeito as sanções aplicadas ao autor. Nos casos de violência familiar, a criança é entregue ao Curador de menores, que decide da colocação da criança. Nos outros casos, a criança não e alvo de nenhuma medida de protecção. Resposta social Não existe no momento, uma politica de protecção da criança que explicite o papel da autoridade administrativa nesta área. No momento, a instituição que tem legitimidade administrativa na defesa das crianças vitimas e que e portanto e responsável pelo atendimento social aos casos tratados pelo Tribunal e o IMC. O IMC realiza uma média de 70 atendimentos anuais. Devido a pessoal reduzido e falta de representações nas regiões, este não vem assegurar paulatinamente uma assistencial adequada as vitimas. Os serviços de “retaguarda”, que deveriam colaborar com a autoridade administrativa para proporcionar o atendimento social mais adequado a cada caso, não estão organizados em rede. Nos casos em que ha necessidade de retirar a crianca do seu ambiente familiar ou de providenciar um abrigo provisorio, ate se encontrar a solucao definitiva (reintegracao na familia, colocacao na familia alargada ou em familia de acolhimento) nao existe um centro que possa desempenhar esta funcao. Os centros de internamento de crianças existentes sao por vezes solicitados39, porem eles nao dispoem das competencias necessarias para tratar com criancas vitimas. A ONG RENLUV, na sua actuação contra a violência, recebe crianças a procura de um abrigo provisório e tenta dar alguma resposta, porem de forma precária. Por entre os serviços que fazem mais falta neste momento, uma prioridade partilhada pelos actores, seria um centro para o acolhimento provisório de crianças na capital40. Centros de internamento Os orfanato funcionam portanto como meio de substituicao a familia, podendo a crianca permanecer por periodo longos. Na sua maioria, as crianças sao entregues aos orfanatos pelos proprios familiares, que afirmam a crianca ser orfa para responder aos criterios de admissao. Todas as criancas tem um ato de entrega, porem os seus casos nao sao levados ao conhecimento do Tribunal, como deveria ser. Apenas os casos inviados pelo Tribunal tem um ato de confianca judicial. 3.6.1. Accoes transversais/tematicas Luta contra o casamento precoce e as mutilacoes genitais femininas 39 Por exempo, pela Curadoria de Menores do Tribunal de Bissau. Um centro de acolhimento para mulheres e criancas vitimas esta em construcao em Bula, com apoio da RENLUV. 40 Elementos para uma Estrategia Nacional de Proteccao Social Para Orfaos e Criancas Vulneraveis Page 53 sur 102 Nao existe no momento uma Politica nacional de erradicacao do casamento precoce/forcado. A legislacao admite diversas formas de unioes matrimoniais (civil, religioso, costumeira e de facto) e diferentes tipos (monogamico epoligamico). Ela ainda autoriza o casamento de menores de 16 anos de idade a casarem desde que tenham consentimento dos pais, sem que seja necessario o consentimento esclarecido do menor. Os casos esporadicos de meninas que fogem de situacoes de casamento forcado e recorrem a instituicoes de proteccao da crianca sao resolvido de maneira ponctual. No que diz respeito as mutilacoes genitais femininas, antes do conflito de 1998-1999 o Comite nacional contra praticas nefastas iniciou capanhas de sensibilizacao no pais com a colaboracao de ONGs e com a participacao do governo. Contudo, o Comite parou de funcionar em 2000. O aumento das cerimonias de fanado nas areas urbanas e o contexto regional de luta contra as MGF, ajudou a retomada das actividades. Mais recentemente, a lideranca da luta legislativa foi assumida pela Comissãoo sobre os assuntos da mulher. Um estudo regional da OMS (2006)41 provou que as MGF sao responsaveis por complicacoes de parto e aumentam a mortalidade e morbilidade materna e neonatal. A PLAN Internacional levou a cabo um estudo nacional em 2007. No mesmo ano, o debate nacional foi redinamizado com o encontro nacional de lideres religiosos. O resultdado e de que existe hoje no pais uma massa critica formada por alguns lideres politicos e religiosos, profissionais da area social, activistas, membros das comunidades capaz de levar a termo esta luta. Um dos pontos-chave demora a aprovacao de uma lei criminalizando as MGF. A instalação da nova ANP no fim do ano deveria colocar as condicoes para a retomada das mobilizacoes em torno da repressao legal das MGF, conforme preconizado pelo Protocolo de Maputo. A nivel da prevencao, as boas praticas de fanado alternativo (simbolico, preserva o ritual mas nao pratica mutilacao fisica) da ONGs Sinimira e o inicio das actividades da ONG TOSTAN no pais, que elaboru uma metodologia comunitaria para a eradicacao da pratica, deveria permitir a difusao das boas praticas e ajudar na diminuicao progressiva das MGF. Luta contra o trafico de criancas talibes A ONG AMIC, o IMC e a OIM integram desde 2005 um programa transnacional contra o trafico de seres humanos em sete paises da subregiao, com o apoio da Fundacao Suica do Servico Social Internacional. O programa tem organizado o rapatriamento de um total de 176 criancas vitimas no Senegal. As criancas sao identificadas por uma ONG senegalesa, Enda Tiers Monde, como criancas que vivem na rua porque romperam com seus mestres por causa principalmente dos maus tratos. O repatriamento passa pelas fases de identificao, acolhimento provisorio42, localizacao da familia e preparacao a reintegracao da crianca e reinsercao na comunidade. A pratica tem mostrado que as accoes de prevencao e eradicacao do trafico de crianca sob pretexto de ensino coranico precisam de um apoio mais amplo da parte da sociedade guineense para reforcar as accoes de prevencao por um lado, evitar a suspensao dos regressos e os malentendidos sobre as finalidades do repatriamento junto dos pais, das comunidades e das autoridades religiosas, por outro lado e para favorecer um efectivo seguimento das criancas reintegradas. Uma concertação promissora dos actores tem sido iniciada sob a lideranca do 41 OMS- Mutilations Genitales Feminies et devenir obstetrical: etude prospective concertee dans six pays africains, 2006 42 Em Gabu existe um centro de acolhimento provisorio gerido pela organizacao SOS Criancas Talibes, onde as criancas rapatriadas podem albergar ate a identificacao das familias e em preparacao da reintegracao. Elementos para uma Estrategia Nacional de Proteccao Social Para Orfaos e Criancas Vulneraveis Page 54 sur 102 Ministro da Solidariedade, permitindo o dialogo das diversas partes e a busca de solucoes conjuntas. Esta concertacao tem aberto o caminho para a elaboracao de um plano de accao partilhado pelos varios actores. Uma Comissao tecnica e encarregada de dar seguimento as diversas recomendacoes. Elementos para uma Estrategia Nacional de Proteccao Social Para Orfaos e Criancas Vulneraveis Page 55 sur 102 Bomba manual de água em Caió, região de Cachéu. As dificuldades de acesso a água potável têm sido uma das causas da alta taxa de mortalidade infantil e materna na GB. ESTUDOS DE CASO: SECTOR AUTONOMO DE BISSAU (SAB), BAFATA E CACHEU 4. 4.1. Introdução Estes estudos de caso pretendem analisar o contexto social em que vivem as crianças vulneráveis, em especial as crianças órfãs e afectadas pelo HIV/SIDA na Guiné-Bissau. O estudo realizou-se no sector autónomo de Bissau e nas regiões de Bafatá e Cachéu, regiões que apresentam uma taxa de prevalência do HIV/SIDA um pouco superior ao resto do país. Objectivos e problemática dos estudos de casos O objectivo dos estudos é investigar o contexto social e económico no qual vivem as crianças vulneráveis, em especial as crianças órfãs e afectadas pelo HIV/SIDA na Guiné-Bissau. A questão central da investigação é compreender em que medida o processo de transformação social que ocorre presentemente na Guiné-Bissau face ao alastramento da pobreza e as diferentes estratégias de sobrevivência interfere com os mecanismos tradicionais comunitárias de coesão social e protecção social às crianças em situação de vulnerabilidade, em especial as crianças órfãs e afectadas pelo HIV/SIDA. Importa sublinhar que as transformações (sociais, políticas e económicas) que se ocorrem actualmente no país têm interferido com a estrutura de família tanto nas comunidades rurais como urbanas conduzindo à uma rápida autonomização dos indivíduos face as normas tradicionais de controle social tradicionalmente exercido pelos pais, velhos e chefes tradicionais/religiosos. Elementos para uma Estrategia Nacional de Proteccao Social Para Orfaos e Criancas Vulneraveis Page 56 sur 102 Metodologia e abordagem da investigação de terreno O desenvolvimento deste trabalho obedeceu aos critérios definidos nos termos de referência elaborados pela consultora internacional Lídia Germain em concertação com o UNICEF. Ao longo do processo, a missão foi obrigada algumas vezes a reorientar os trabalhos devido as dificuldades de ordem infraestrutural (i.e. falta de jangada na travessia para São Domingos) ou institucional (i.e. ausência de pessoas responsáveis/protectoras das crianças órfãs e afectadas pelo HIV/SIDA na altura da missão), entre outros. Todo o trabalho foi suportado por uma conduta ética e moral irrepreensível por parte dos inquiridores e coordenador (i.e. respeito pelos mais velhos, respeito pela privacidade das pessoas, visita aos chefes tradicionais e autoridades administrativos em primeiro lugar para explicação sobre os objectivos da missão, isenção e neutralidade politica, etc). Os métodos e abordagens utilizados nos contactos com as instituições sociais (públicas e privadas) assim como com os grupos focais (mulheres, jovens e homens nas duas regiões visitadas), chefes religiosos e tradicionais, responsáveis e agentes de saúde foram bastante participativos e inclusivos de forma a garantir a representatividade étnica, religiosa, cultural, de género e institucional. A metodologia foi completada pela revisão bibliográfica e documental sobre o HIV/SIDA, histórias de vida (12 histórias em lugar de 20, porque os inquiridores não conseguiram falar com as educadoras/responsáveis das outras 8 crianças, mesmo depois de várias tentativas), entrevistas semi-dirigidas e/ou directas com informantes-chave, questionários abertos, fichas de identificação de crianças nas instituições (SOS, Casa Emanuel), reuniões de djumbai43 com grupos focais (homens, mulheres, jovens), visita de terreno, observação participante. Vários encontros e entrevistas foram combinados (arranjados) previamente com o apoio do SNLS nacional e local, dos governadores e os administradores locais e pelo régulo de Bafatá. Outras entrevistas foram arranjadas no local, muitas vezes, em horas impróprias, embora a reacção dos entrevistados tenha sido quase sempre positiva. Encontro de com grupo de jovens na região de Cachéu 43 Método participativo de recolha de informações baseado em conversas informais com grupo-alvo identificado a volta do tema em investigação. O encontro pode por vezes ser animado com bebida ou chá para criar um ambiente mais flexível e menos pesado a volta dos temas em discussão. Elementos para uma Estrategia Nacional de Proteccao Social Para Orfaos e Criancas Vulneraveis Page 57 sur 102 O trabalho de terreno foi complementado com entrevistas nas rádios comunitárias de Bafatá e Canchungo que se revelaram de enorme utilidade visto a importância das rádios na sensibilização e comunicação junto das comunidades rurais. As entrevistas tiveram como pano de fundo o objectivo e finalidade da missão, os grupos-alvo, localidades incluídas, responsável pelo estudo e pedido de colaboração e apoio por parte das instituições públicas e privadas. A equipe que desenvolveu o trabalho foi constituída de um coordenador e seis (6) assistentes sociais provenientes do Ministério da Solidariedade Social (4 pessoas, das quais 2 mulheres) e do Instituto de Mulher e Criança (1 homem e 1 mulher). O grupo desenvolveu um espírito de trabalho verdadeiramente de equipe. Depois de cada fase de trabalho a equipe reunia-se para fazer um balanço rápido da actividade, analisar os pontos fortes e fracos, e definir novas orientações. Assim foi em Bissau e nas regiões. Depois dos trabalhos em cada região, fez-se uma restituição geral, no qual cada elemento emitiu o seu parecer sobre o que correu bem e o que correu menos bem. A representatividade e heterogeneidade dos actores e instituições sociais que lidam com as crianças foram critérios respeitados ao longo de todo o processo de investigação. Zonas geográficas abrangidas pela investigação Os trabalhos desenrolaram-se nas regiões de Bafatá e Cachéu e no sector autónomo de Bissau, a escolha das regiões baseou-se na progressão do índice de prevalência do HIV/SIDA. Em Bissau, a missão teve encontros com os responsáveis das instituições que prestam serviços e apoios as crianças vulneráveis e seropositivas (i.e. Casa Emanuel, Céu e Terra, Pediatria do Hospital Simão Mendes, Sida Alternag, SOS). Vários bairros foram igualmente visitados na sequência das histórias de vida. Na região de Bafatá, a missão trabalhou em diversos bairros da cidade de Bafatá, no sector de Contubuel e de Bambadinca. Na região de Cachéu, a missão visitou os sectores de Canchungo, Caio, Bula e Cachéu. Inicialmente estava prevista a visita ao sector de São Domingos que fica perto da fronteira com o Senegal, mas problemas relacionados com a avaria da jangada que garante a travessia fez com a missão escolhesse um outro sector (Bula) para completar o quadro. A escolha da cidade de Cachéu foi uma opção da missão em concertação com o responsável do SRLS em Canchungo, por ser a sede do governador regional. 4.2. Constatacoes gerais A análise dos dados e das informações recolhidas no terreno revela situações complexas e por vezes ambíguas referentes a situação das crianças vulneráveis e a atitude e comportamento das instituições e das famílias em relação a esse grupo social. Em termos genéricos, diz-nos a teoria que as sociedades tradicionais africanas (sociedade “mecânica” na óptica de Max Weber) regemse por normas e mecanismos próprios que fazem com que a família não abandone as suas crianças, salvo casos muito excepcionais (i.e. emigração, morte, invalidez dos pais, etc), dado o grau de solidariedade horizontal existente entre os membros da comunidade. É importante sublinhar que as estratégias de sobrevivência das comunidades e famílias africanas repousam, entre outros, na reprodução social com vista a manutenção, renovação e transmissão dos diferentes tipos de capital (económico, simbólico e social) entre as diferentes gerações.44 Ter 44 Bourdieu, 1994 Elementos para uma Estrategia Nacional de Proteccao Social Para Orfaos e Criancas Vulneraveis Page 58 sur 102 muitas crianças em casa ou morança (aldeia) significa ter mão-de-obra disponível para o difícil e árduo trabalho de campo. Entretanto, a investigação empírica constatou que as comunidades tradicionais africanas passam por processos de transformação social importantes. O alastrar da pobreza e a influência da sociedade moderna com todo o seu encanto e desencanto têm trazido muitas mudanças no modus vivendi das comunidades influenciando o comportamento das instituições e famílias (vide o “sistema” de herança tratado mais adiante45). Face a esta dinâmica de recriação de novas formas de sobrevivência, na qual a dispersão familiar (por vezes temporal) dos membros da família através da “migração circular”46 entre o campo e a cidade e vice-versa ocupa um lugar importante, a coesão social que caracteriza a família africana tem estado a ser afectada fazendo com que cada vez mais dependam das instituições de protecção social (SOS, Casa Emanuel, Missão Católica) para busca de apoios, em especial alimentos (i.e. farinha, leite, óleo, arroz), mas também roupas, medicamentos inclusive estadias prolongadas das suas crianças. Encontro com grupo de Mulheres em Caió, região de Cachéu. Tanto em Bissau, como nas regiões de Bafatá e Cachéu existem muitas crianças órfãs e vulneráveis. Entretanto, visto o Sida ser ainda considerado em muitos círculos sociais como uma doença “terrível e carregado de simbolismos”, não é fácil saber se uma criança está ou não infectada porque a doença não é divulgada nem no seio de familiares mais próximos. Assim sendo, captar as formas como se expressam os comportamentos e as atitudes torna-se uma tarefa bastante difícil. Em geral, a situação em que vivem essas crianças e as causas que as empurram para estados de vulnerabilidade dependem do contexto sociocultural e económico de região para região. Porém, e como foi atrás referido, dado o grau da coesão social e dos mecanismos de protecção social comunitária é difícil encontrar uma criança fora do ambiente familiar. A prática de apadrinhamento e de herança faz com que haja sempre algum familiar que tome conta de uma criança órfã. Em Bissau, as crianças que mais sofrem são as que vêm do mundo rural para a capital a procura de emprego ou meios de subsistência. Muitas dessas crianças são órfãs (e possivelmente algumas 45 46 Cada vez mais os interesses económicos sobrepõem-se aos aspectos éticos e morais da coesão social Ana Bénard da Costa. O Preço da Sombra. Pg, 28 Elementos para uma Estrategia Nacional de Proteccao Social Para Orfaos e Criancas Vulneraveis Page 59 sur 102 afectadas por HIV/SIDA). As crianças seropositivas identificadas e com idade compreendida entre os 0 e 36 meses (ou mais) são, normalmente institucionalizadas a pedido dos próprios familiares (i.e. Casa Emanuel, Céu e Terra, SOS). Porém, como a doença é tratada com muito “secretismo”, a população tem vergonha de a revelar, por isso, raras vezes se sabe se a criança é afectada ou não pelo HIV/SIDA. Nesse fluxo de movimento migratório tem participado cada vez mais raparigas, o que deixa entender que a dispersão geográfica dos membros da família e a existência de uma migração circular entre o campo e a cidade constituem algumas características de estratégia de sobrevivência que envolve tanto o rapaz como a menina. Em Bissau, enquanto não sucedem com os seus objectivos, essas crianças ficam em casas de tios, irmãos ou conhecidos até conseguirem algum emprego para depois alugarem apartamentos que chegam a albergar até 5/7 pessoas. No seu processo de socialização com a nova realidade, muitas dessas crianças passam por inúmeros problemas (prostituição e delinquência infantil, trabalho forçado, assaltos pontuais, etc). É frequente assistir-se a cenas horríveis de maus tratos perpetuadas por familiares (tias, avós) contra essas crianças (i.e. queimaduras nos pés e nas mãos, cortes com armas brancas, castigos severos, etc). Na região de Bafatá, onde existe uma nítida estratificação social, assiste-se a uma espécie de mercantilização das relações, expressas em formas de tráfico de crianças (talibés) para o Senegal, mas também na mutilação genital feminina, casamento precoce (esta pratica também acontece na região de Cachéu e em Bissau). As razões que se prendem com a manutenção e desenvolvimento destas práticas são tanto culturais ou religiosas como também económicas e políticas (i.e. seguir a pratica ancestral, perpetuar a descriminação de género e os mecanismos de manutenção do poder do homem sobre a mulher, etc). As crianças expostas a maiores riscos nesta região são as crianças “talibés”. Sob pretexto de irem apreender o Alcorão (no Senegal), essas crianças são envolvidas numa larga rede de tráfico que inclui os mestres, os intermediários e por vezes os próprios pais ou encarregados de educação. Apesar dos esforços desenvolvidos por algumas organizações (i.e. SOS Criança Talibés em Bafatá, UNICEF, AMIC) e pelas autoridades locais para diminuir essa pratica, o fenómeno continua bem vivo. O nível de informação e conhecimento sobre a prevenção e formas de transmissão do HIV/SIDA é bastante limitado. As comunidades em geral afirmam ter ouvido falar de Sida, mas não sabem como a doença se contrai ou transmite. As crianças afectadas passam despercebidas na comunidade, mesmo quando apresentam sintomas ligados ao HIV/SIDA, porque os familiares ou não sabem ou não acreditam ou sabem, mas procuram não divulgar a doença. Na região de Cachéu, é igualmente notório o aumento do número de crianças que vivem em situação de vulnerabilidade. A pobreza e a dependência das famílias das remessas de familiares emigrantes (do Senegal ou França) acabam por empurrar uma grande parte das crianças em idade escolar para fora do sistema de educação. Muitas dessas crianças dedicam-se as actividades informais (i.e. venda de alimento, transporte de produtos) ou a prostituição infantil. Segundo o relato das missionárias católicas, algumas grávidas que visitam a Missão são adolescentes (15-17 anos), e algumas delas vêm infectadas pelo Sida. Recebem conselhos sobre como lidar com a doença para evitar a transmissão para o filho, mas devido ao baixo nível de escolaridade e a complexidade dos usos e costumes locais, algumas não levam a sério os conselhos dos agentes de saúde ou das irmãs. Elementos para uma Estrategia Nacional de Proteccao Social Para Orfaos e Criancas Vulneraveis Page 60 sur 102 O movimento migratório que é extremamente alto na região de Cachéu, facto que tem contribuído para o aumento da prevalência do HIV/SIDA nessa região. Apesar da sociedade tradicional Manjaca repousar numa estrutura social do tipo horizontal, onde a diferença de classes é ditada mais por factores como idade, sexo ou ainda posse de poderes sobrenaturais e menos pela acumulação de bens ou nível de escolaridade, facto que deixa entender uma certa homogeneidade social, a região é uma das mais afectadas pelo HIV/SIDA no país. A promiscuidade social alimentada pelo movimento de emigrantes que chegam com o seu dinheiro e excedem-se em comportamentos desviantes tem sido uma das causas do aumento da transmissão do HIV/SIDA. Nesta região, regista-se igualmente uma forte tendência para casamentos arranjados ou forçados de adolescentes, mesmo que isso seja contra a vontade das raparigas. A força dos costumes e da tradição obriga a mulher a aceitar ser “comercializado”, a troco de bens, terra ou dinheiro. Um exemplo que ilustra a descriminação de género e sinais claros de perpetuação de poder do homem nas comunidades rurais ocorreu numa pequena tabanca (UCO) do sector de Calequisse, região de Cachéu. Eis a história: “As comunidades locais decidiram num só dia celebrar 11 casamentos forçados de jovens raparigas com homens daquela localidade contra a vontade de algumas delas. Em pleno acto (cerimónia) aconteceu algo inédito. Uma das raparigas rompendo as normas e procedimentos tradicionais declara publicamente que estava apaixonada por uma outra pessoa que por sinal estava presente a assistir impávido ao acto. A rapariga foi punida pelo pai após o acto, originando depois a sua fuga para junto as Missionária do Espírito Santo a busca de refúgio e apoio”. Volvidas quase duas décadas desde que o HIV/SIDA foi declarado publicamente na GuinéBissau, a doença ainda continua envolta num grande tabu. As pessoas e as comunidades em geral têm receio (ou complexo) de falar abertamente da doença mesmo quando alguém da família padece de Sida. A doença e as suas vítimas encontram sempre um outro nome que não o Sida, “ … coitade, es doença kansal ba tchiu” (coitado, já não conseguia resistir a doença), dizem os familiares ou amigos mais próximos, para não dizer que morreu de Sida. A resistência em aceitar a doença tem muito a ver com argumentos culturais (tradicionais), o Sida é considerado por muitos grupos sociais como uma maldição do espírito (ou Irã)47, por isso, os doentes e os familiares recorrem, em primeiro lugar, aos métodos tradicionais da cura em detrimento do hospital e cura moderna, b) a comunidade acredita que a doença é uma fatalidade do destino, e que as pessoas já morriam antes do Sida e continuarão a morrer curando ou não a doença, c) a proximidade física, social e psicológica das instituições tradicionais dos cidadãos faz com que a família tenha vergonha em revelar o segredo por causa de possível perda de estatuto social. 47 Figura com poderes sobrenaturais que pode decidir sobre o destino das pessoas Elementos para uma Estrategia Nacional de Proteccao Social Para Orfaos e Criancas Vulneraveis Page 61 sur 102 SNLS (BULA). Informação sobre a dieta alimentar para os seropositivos A revelação da doença muitas vezes representa um castigo duro (i.e. expulsão da casa), sobretudo quando a infectada é uma mulher que em certas sociedades são vistas apenas como agente de reprodução social. Em Bafatá, houve um caso que merece ser relatada: “Uma jovem rapariga grávida faz teste de despistagem que acusa resultado positivo. A mulher quis suicidar-se por desespero, ela não queria viver com a sensação de que o filho nasceria com Sida e que um dia, mais cedo ou mais tarde, viria a morrer por sua causa. Uma animadora da AGUIBEF (Associação Guineense para o Bem Estar Familiar) colocada no local soube da história, passou a visitar com frequência a mulher numa tentativa de persuadi-la em não cometer o suicídio o que veio a lograr mais tarde. Hoje, a rapariga visita o centro de saúde onde recebe o tratamento antiretroviral e conselhos sobre a forma de evitar a transmissão da doença para o filho”. Esta história confirma uma das descobertas da investigação empírica no que se refere ao nível de conhecimentos e informações referentes ao Sida por parte das comunidades rurais. As campanhas de sensibilização sobre a prevenção e transmissão do HIV/SIDA normalmente levadas a cabo pelas associações locais ou Organizações Não-governamentais privilegiam uma abordagem simplista de comunicação e informação acompanhada de música e oferta de preservativos que muitas vezes não ultrapassam os círculos fechados dos bairros ou espaços circunscritos a volta das estradas asfaltadas. As informações não penetram no fundo das aldeias ou quando lá chegam vêm incompletas, por isso não produzem um efeito multiplicador. Isto faz com que uma grande parte da população não tenha informações correctas sobre como e porquê prevenir-se da doença? Como fazer para lidar com a doença? E que oportunidades de tratamento existem e onde? O estudo concluiu que dentre as várias transformações que ocorrem nas comunidades rurais as que se referem ao sistema de herança e casamento forçado são das que interferem de maneira mais violenta com os direitos humanos, em especial das mulheres e crianças. Tradicionalmente, quando uma mulher fica viúva terá que casar com o irmão do marido ainda que contra a sua vontade. Quando é o homem (marido) que morre, os seus familiares querem herdar os seus bens, Elementos para uma Estrategia Nacional de Proteccao Social Para Orfaos e Criancas Vulneraveis Page 62 sur 102 fazendo pressão para que a mulher (viúva) não fique com eles. E quando, essas tradições e usos são contestados, muitas vezes a família ou os interessados directos recorrem a meios coercivos contra a mulher (i.e. violência, ameaça de expulsão, ameaça de recurso ao Irã, etc.) para conseguir os seus objectivos. As histórias de vida revelaram que a responsabilidade pelo cuidado das crianças órfãs afectadas ou não por HIV/SIDA é quase sempre decidida em comum acordo entre os pais ou então é o pai quem decide antes de morrer ou emigrar. Em geral, é a mãe ou algum outro familiar de sexo feminino (i.e. avó, sobrinha ou irmã do pai) que se responsabiliza pelo cuidado da criança. O estado de saúde da criança quase nunca é revelado, por isso não é possível avaliar o alcance das atitudes ou comportamentos de outras crianças em relação as seropositivas. Os relatos das pessoas responsáveis pelo cuidado da criança deixaram entender que elas não levam as crianças com regularidade as consultas (motivos da luta pela sobrevivência, negligência, entre outros), o que deixa antever que o estado de saúde das crianças nessa situação seja bastante débil. Por outro lado, essas histórias demonstraram que um dos maiores problemas que as famílias sofrem não é o facto de terem que receber mais uma criança órfã em sua casa, mas sim a falta de condições económicas para sustentar as crianças. As reuniões com os grupos focais (mulheres, jovens, lideres comunitários) deixaram entender que as mulheres são as que mais sofrem quanto a educação, saúde e alimentação das crianças. Porque os homens passam grande parte do seu tempo fora de casa (por vezes em actividades politicas, agrícolas, outras), as mulheres normalmente circulam em espaços públicos não muito longe das suas casas e quase sempre envolvem as crianças nas suas actividades comerciais. Em relação a situação de descriminação face às crianças portadoras de HIV/SIDA, o estudo verificou que o nível de conhecimento e apropriação da doença pelas comunidades em geral (i.e. formas de transmissão, poder de decisão em relação aos riscos, prevenção, etc.) não é homogéneo. Os jovens são, em geral, mais informados porque participam das campanhas de sensibilização (mas também são os mais expostos a riscos devido aos seus comportamentos), os velhos têm informação, mas também acreditam menos na doença e as mulheres têm alguma informação, mas são mais reactivas do que proactivas. Elas dependem quase totalmente das decisões e vontade dos homens quanto ao uso de preservativo, visita médica, etc. 4.3. Principais constatações e conclusões dos estudos de casos: Sector Autónomo de Bissau Características demográficas, políticas e socioeconómicas A partir dos anos 80, com a liberalização económica assistiu-se a um movimento migratório importante do mundo rural para Bissau. Hoje, a cidade de Bissau concentra mais ou menos um quarto (25%) da população total da Guiné-Bissau, ou seja, cerca 368.435 (200448) das quais cerca de 135.901 têm a idade compreendida entre os 0 e os 14 anos de idade (em 2001). Esta situação só por si deixa entender que há uma enorme pressão social sobre as já frágeis infra-estruturas sociais existentes com consequências pesadas no bem-estar das populações. Se hoje se fala do declínio do controle social por parte da sociedade, ou do enfraquecimento da instituição família, em especial do controle dos pais sobre os filhos, é na cidade de Bissau onde este fenómeno é mais evidente. 48 RNDH. PNUD.2006, tabela 10, pg 21 Elementos para uma Estrategia Nacional de Proteccao Social Para Orfaos e Criancas Vulneraveis Page 63 sur 102 Em Bissau concentra-se a máquina da administração do estado da Guiné-Bissau (Parlamento, Governo, Supremo Tribunal, Tribunal Militar, Tribunal de Contas, Ministério Público), para além das representações diplomáticas, o sistema das Nações Unidas, os bancos comerciais, a maioria das empresas privadas, universidades, centros de formação, organizações não-governamentais, centros de assistência médica, etc. Estas facilidades, por seu lado, estimulam a migração rural para a Bissau fazendo aumentar os riscos da vulnerabilidade. Apesar de contar com um hospital nacional (Hospital Simão Mendes), 3 centros de referência nacional (hospital Raoul Follereau, hospital de Cumura e Centro Saúde Mental), a cidade de não consegue dar resposta a imensa demanda do crescente aumento demográfico. Cerca de 51,6% da população de Bissau vive debaixo do nível de pobreza, 35% das mulheres e 30,6% são considerados pobres em termos monetários. A cobertura em água é igualmente deficitária, apenas 66,3% da população tem acesso a um ponto de água, 5.60% das pessoas com a idade entre 20-24 anos é infectada por VIH, 43,6% de população tem cobertura de água sem poço, e 43,6% de mulheres é escolarizada. Situação da vulnerabilidade das crianças, órfãs e afectadas por HIV/SIDA A cidade de Bissau alberga uma enorme quantidade de crianças vulneráveis (16,3%, contra 7,8% no meio rural e 14,5% nos outros centros urbanos), algumas delas em situação de muita vulnerabilidade49. Nesta categoria as crianças que mais sofrem são as crianças órfãs de mãe ou de ambos os progenitores ou as crianças que vêem do campo para Bissau. Reza a tradição que quando uma criança fica órfã de mãe ela é herdada pela avó ou tia (são raros os casos onde o pai fica com uma criança menor). Visto a maior parte dos agregados familiares guineenses (mais de 64,7%50) vivem em situação de pobreza absoluta, as tias ou as avós não conseguem oferecer a devida protecção as crianças (i.e. alimento, medicamentos, escola, roupa, etc). Por isso as crianças são muito cedo envolvidas em trabalho de subsistência económica, normalmente em pequenos negócios da família chegando a trabalhar mais de 28 horas por semana em certos agregados familiares51. Por passarem grande parte do seu tempo nas ruas das cidades, muitas dessas crianças tornam-se dependentes de grupos organizados de “gangs” que controlam as actividades ilícitas nocturnas (i.e. prostituição infantil, furtos, etc.). Quando se trata de crianças menores que ficam órfãs, sobretudo da mãe, a investigação constatou que os familiares têm recorrido cada vez mais aos centros ou instituições que oferecem protecção social às crianças. Por exemplo, 74% das 102 crianças actualmente institucionalizadas na Casa Emanuel são crianças órfãs de mãe, 7% é órfã de ambos os pais e apenas 2% de pai. A idade das crianças varia entre as 4 semanas a 15 anos de idade. Todas as crianças chegaram ao centro a pedido dos próprios familiares. No centro, as crianças recebem assistência alimentar, médica, pedagógica e material, jurídica, formação, acompanhamento no crescimento, reintegração e lazer. A partilha da visão cristã de vida colaborando na defesa dos direitos fundamentais das crianças é a força que move o centro. O estudo não conseguiu obter dados sobre a situação de crianças órfãs afectadas pelo HIV/SIDA, embora no centro estejam várias crianças nessa situação. O centro tenta ensinar as crianças a 49 MICS. 2006 DENARP. 2005 51 MICS.2006 50 Elementos para uma Estrategia Nacional de Proteccao Social Para Orfaos e Criancas Vulneraveis Page 64 sur 102 viverem uma vida de harmonia, sem descriminação, segundo os valores da família. As crianças interagem-se sem problemas, sem estigmas e procuraram ajudar-se mutuamente. A Casa Emanuel trabalha em parceria institucional com o Secretariado Nacional de luta contra o Sida e o Ministério da Solidariedade Social para além de associações e organizações ligadas a igreja católica. Na Aldeia SOS encontram-se 108 crianças com a idade entre os 0 e 18 anos, mas o número dos beneficiários do centro chega a 257 crianças. 35% das crianças institucionalizadas neste centro são órfãs de mãe, 41% é órfã de ambos os pais e 12% é órfã de pai. A aldeia oferece assistência alimentar, medica, pedagógica, lazer, protecção jurídica, reintegração, acompanhamento e apoio financeiro. Todas as crianças estão institucionalizadas a pedido de familiares e por apresentarem critérios requeridos pelo SOS para serem institucionalizadas. O objectivo da Aldeia é lutar contra a exclusão social, garantindo capacitação e formação das crianças vulneráveis, entre as quais as órfãs e abandonadas. A abordagem da aldeia é desenvolver uma cultura de paz, solidariedade e honestidade entre as crianças, preparando-as para uma vida futura. Neste momento existem cerca de 52 jovens saídos da SOS a estudarem em diferentes universidades nacionais e estrangeiras. Quadro - Proporção das crianças Órfãs por instituição de atendimento Instituição Mãe Órfãs Pai Casa Emanuel Aldeia SOS 74% 2% Ambos (Mãe e Pai) 7% 35% 12% 41% Urbana Não dito Idém Rural Não dito Idém Nível de conhecimento e apropriação da doença O estudo concluiu que uma das causas que tem contribuído para a evolução da taxa de prevalência do HIV/SIDA na Guiné-Bissau é a ignorância das populações sobre a doença. De um lado, o nível de escolaridade bastante baixo (i.e. resistência em usar preservativos) aliado aos aspectos culturais faz com que muitos guineenses recorrem preferencialmente aos poderes espirituais para a cura do Sida em lugar de hospital. A crença no poder dos espíritos (irã, djambacus52, etc) determina o sentido de pertença e a forma como o cidadão concebe a direcção da sua vida na comunidade. 52 Forças sobrenaturais que determinam o sentido de vida dos seres vivos Elementos para uma Estrategia Nacional de Proteccao Social Para Orfaos e Criancas Vulneraveis Page 65 sur 102 Um dos pressupostos mais importantes na luta para a redução da taxa de infecção do HIV/SIDA é um conhecimento preciso sobre a maneira como o Sida é transmitido e as estratégias de prevenção da transmissão53. Uma informação correcta é a primeira etapa em direcção a sensibilização dos jovens sobre como se proteger da doença. Ora neste capítulo, ainda existe um grande défice. Por exemplo, segundo o MICS 200654, o nível de conhecimento das pessoas sobre como prevenir a transmissão do Sida é muito baixo, ou seja, apenas 32,1% das pessoas inquiridas detêm esse conhecimento, 53,1% sabem que é preciso ter um parceiro sexual fiel e não infectado, enquanto apenas 49,4% sabem que é necessário utilizar preservativo no momento das relações sexuais e 58,2% das mulheres sabem que o Sida pode ser transmitido de mãe para o filho. Um dos factores que influencia este tipo de comportamento por parte da população jovem tem a ver com a maneira como o próprio Estado guineense encara a luta contra o HIV/SIDA. Apesar do Parlamento Nacional ter aprovado (em 2007) a lei sobre a Protecção das pessoas portadoras do HIV/SIDA, o governo não tem demonstrado na prática fazer da luta contra o HIV/SIDA uma das prioridades da governação. Os diferentes programas de governação não expressam essa prioridade (i.e. orçamento geral do estado, conteúdos pedagógicos, etc). A luta contra HIV/SIDA na Guiné é quase que totalmente financiada pela comunidade internacional. Ao nível da sociedade civil, várias são as organizações que intervêm no domínio de sensibilização sobre Sida através de programas radiofónicos ou teatro. Essas actividades enquadram-se mais numa perspectiva circunstancial (i.e. enquanto o financiamento externo existir), e menos numa visão sustentável que implica entre outros, voluntarismo, consciencialização e patriotismo. Nível dos apoios e comportamento das comunidades e famílias A complexidade do ambiente social e económico em que vivem as famílias guineenses tem influenciado o comportamento das comunidades guineenses. A enorme mobilidade e dispersão dos membros da família relatada nas inúmeras histórias de vida (i.e. emigração temporária ou prolongada, mudança de residência, mudança de profissão, etc) inserida nas estratégias de sobrevivência das comunidades provocam frequentes mudanças no cuidado e protecção da criança, muitas vezes esta é obrigada a mudar de casa para casa e de mãos para mãos (ora de mãe para tia, mãe para avó, mãe ou tia para a vizinha, etc). Esta acaba por interferir na criação da personalidade (i.e. processo de socialização) da criança. Quando se trata de uma família pobre, o sofrimento é ainda maior, a criança é obrigada a trabalhar mesmo padecendo de alguma doença (i.e. ir ao mercado, buscar água, limpar a casa, cozinhar, fazer recados diversos, etc). A investigação apurou que a comunidade guineense, em geral cuida e protege a criança, mesmo quando esta é deficiente ou órfã. Porém, de uma forma geral, pode-se afirmar que quase todos os grupos sociais e étnicos da Guiné-Bissau educam as suas crianças preparando-as para uma vida de trabalho árduo e de sofrimento. A primazia dos direitos colectivos das comunidades sobre os direitos dos indivíduos é regra a seguir. Garantir a sobrevivência no quotidiano e, simultaneamente no futuro, passa assim pela utilização de toda a mão-de-obra disponível55. 53 MICS, 2006, pg 95 MICS, 2006, pg 24. 55 Mecanismo de Protecção Social e Assistência às Crianças na GB. Cristina Rodrigues, Alfredo Handem e Ana Benard Costa. Novembro 2007 54 Elementos para uma Estrategia Nacional de Proteccao Social Para Orfaos e Criancas Vulneraveis Page 66 sur 102 O tempo que as crianças vulneráveis despendem a executar tarefas, o nível de desgaste físico e psicológico que essas tarefas implicam, varia enormemente. Não só em função da situação económica e social e das características particulares de cada família, como varia de etnia para etnia e em função do sexo e idade da criança. O que é importante reter é que tanto nas comunidades rurais como em certos meios urbanos na Guiné-Bissau as crianças são socializadas e educadas para e no trabalho. Desde muito novas que têm obrigações a cumprir no espaço doméstico ou publico informal (i.e. nas ruas da cidade através de vendas de diversos produtos agrícolas transformados, entre outros) Em Bissau, os chamados “filhos de criação” (que residem por diversas razões, com família que não as dos seus progenitores) trabalham mais que do que os “filhos da casa” nas tarefas domésticas. Alguns destes são efectivamente tratados como “escravos” da casa, mas também há casos (algumas crianças órfãs ou jovens que vêm para a cidade estudar) em que estes têm um tratamento diferenciado das restantes crianças da família que as acolheu e em que esta funciona, efectivamente como uma família protectora da criança56. De uma forma geral, pode-se dizer que as famílias na Guiné-Bissau protegem as crianças no sentido de lhes garantirem abrigo, alimentação e uma educação que lhes permite mais tarde serem adultos úteis e capazes de, com o seu trabalho, cumprirem a sua quota-parte de responsabilidades dentro de um contexto produtivo e cultural com características específicas. Recomendações - Estimular a construção de uma visão nacional partilhada sem matéria de protecção às crianças vulneráveis, envolvendo o conjunto dos actores sociais activos no país (público, privado, parceiros internacionais). Essa visão deve ser traduzida em acções concretas (mecanismos de coordenação, capacidades, orçamento, etc.); - Criar um Observatório Nacional sob a supervisão do governo, incluindo a ANP, Parlamento Infantil, Ministério da Administração Interna, Amic, Aldeia SOS, IMC, Reje e parceiros internacionais com antenas nas regiões (aqui devem fazer parte do ON, a polícia de ordem pública, os chefes religiosos e as associações de jovens) para diagnosticar e tomar medidas sobre os acontecimentos que violam ou põem em perigo os direitos das crianças; - Melhorar as acções de sensibilização a escala nacional, incluindo curriculum escolar sobre o HIV/SIDA; - Estimular e criar programas de desenvolvimento rural dirigidos a garantir a soberania alimentar e criação de rendimentos as comunidades locais de forma a poderem melhor alimentar a família e pagar as despesas da escolarização das crianças; - Criar programas de sensibilização e de apoio as actividades económicas das comunidades em função das realidades socioculturais de cada região; - Melhorar a oferta de serviços socais de base às comunidades (i.e. água potável, centro de saúde, escolas, estradas); 56 Mecanismo de Protecção Social e Assistência às Crianças na GB. Cristina Rodrigues, Alfredo Handem e Ana Benard Costa. Novembro 2007 Elementos para uma Estrategia Nacional de Proteccao Social Para Orfaos e Criancas Vulneraveis Page 67 sur 102 - Melhorar os serviços de registo das crianças; - Reforçar o papel do Instituto de Mulher e Criança e do Ministério das Solidariedade Social no domínio da coordenação e concertação e influência de políticas 4.4. Principais constatacoes e conclusoes dos estudos de caso: Região de Bafatá Características demográficas, políticas e socioeconómicas A região de é uma das mais afectadas pela pobreza (estima-se que cerca de 72,4% da população vive com menos de 2 dólares por dia, o que equivale a 13,6% do total do país). A população local dedica-se essencialmente a actividade agrícola, a criação de gado bovino (de salientar que Bafatá detém a segunda maior reserva de gado bovino do país) e ao comércio em especial o informal. De entre as principais actividades agrícolas desenvolvidas pelas populações encontram-se a produção de arroz no planalto, o milho, o algodão (este produto é exportado para o Senegal, através da Associação Guineense de Algodão), o caju, a horticultura (a região é conhecida por ser grande produtora nacional de tomate, cebola e outros legumes) e batata-doce. A pesca artesanal e a caça completam o quadro das actividades mais relevantes da região que se inserem na dinâmica da luta contra a pobreza. Em termos turísticos, destacam-se a caça desportiva (procurada especialmente pelos portugueses e franceses) e algumas infra-estruturas hoteleiras. O sector privado está em crescimento: a comercialização do algodão, a exportação da castanha de caju, o turismo, e o comércio informal e formal vêm ganhando cada vez mais espaço na vida da região. A região de Bafatá é dividida administrativamente em 6 sectores. Um governador sediado na cidade de Bafatá nomeado pelo governo no poder coordena politica e administrativamente a região, coadjuvado por 6 administradores sectoriais, um secretário regional, um contingente da força da polícia de ordem pública e agentes do serviço de informação do Estado. Na região de Bafatá intervêm várias organizações da sociedade civil, incluindo grupos ligados as igrejas, organizações não-governamentais, associações juvenis e rádios comunitárias. Entre as organizações mais activas destacam-se a Aprodel, Plan GB, a missão católica, a SOS Criança Talibé, ETAD, Associação Guineense de Algodão (AGA), Associação de Pequenos Comerciantes, Associação de Mulheres para a Promoção do Desenvolvimento e Luta contra a Fome (APALCOF), Guiarroz, Centro de Formação Administrativa (Cenfa). A região de Bafatá é conhecida por ser uma região com tradição do movimento associativo e dinâmicas de desenvolvimento participativo. Os projectos “Agro-Silvo-Pastoril”, projecto algodão, Fã-Mandinga, Projecto de micro-realizações desenvolvido pela SNV, Serviço-Quaker, entre outros, realizados nas décadas de 80 e 90 criaram uma cultura de vida associativa importante na região. Hoje, não existe sector em toda a região onde não se assiste a um crescimento gradual de movimento de cidadãos a volta de assuntos ligados a vida da comunidade. As actividades desenvolvidas em prol da comunidade por Aprodel, Plan GB, Apalcof, Guiarroz, Missão Católica, SOS Criança Talibé, etc são exemplos importantes no quadro do desenvolvimento de uma consciência colectiva capaz de estimular um maior envolvimento das comunidades na protecção dos seus membros e na gestão dos riscos de ruptura social e desagregação familiar. Elementos para uma Estrategia Nacional de Proteccao Social Para Orfaos e Criancas Vulneraveis Page 68 sur 102 Por exemplo, as actividades a volta do GITT (gestão integrado do território da tabanca) têm criado na mente das comunidades o senso de pertença através de gestão participativa do espaço social e físico. Em Contubuel, a Apalcof procura através da rádio comunitária e das actividades geradora de rendimento criar espaços de debate sobre os aspectos sociais e comunitários, na qual a situação das crianças vulneráveis merece um destaque especial. Em relação a Missão Católica importa sublinhar que a sua intervenção no quadro dos Centros de Recuperação Nutricional tem permitido salvar a vida de muitas crianças e mulheres grávidas. Breve resumo sobre a situação das crianças vulneráveis A região de Bafatá é das regiões mais afectadas pelo índice de pobreza (72,4% das populações vivem com menos de 2 $ por dia57) na Guiné-Bissau. Esta situação faz com que as famílias recorram a inúmeras e diversas estratégias de sobrevivência de modo a fazer face as crescentes dificuldades impostas pela pobreza (i.e. envio de crianças junto de algum parente nas cidades a procura de melhores condições de vida, envio de crianças para Senegal para irem aprender o alcorão “crianças talibés”, trabalho nos campos da lavoura, venda nas ruas, pedir esmolas, etc). Segundo o relato das instituições e pessoas contactadas na região, as crianças que mais sofrem são as crianças órfãs e as crianças Talibés. As crianças Talibés são crianças mandadas para outros países (geralmente para o Senegal) para poderem estudar o Alcorão, mas segundo alguns estudos58, as crianças são exploradas pelos seus mestres a quem devem entregar diariamente uma determinada soma em dinheiro (entre 500 a 1.000 xof). Muitas dessas crianças (algumas são órfãs) passam a vida nas ruas de Dakar a pedir esmolas, ficando expostas a inúmeros abusos físicos e psicológicos e violações. As crianças órfãs (várias são envolvidas nesse movimento Talibés) são normalmente herdadas por algum familiar (em geral tia, irmão do pai ou avó). Durante um encontro que a missão teve com um grupo de mulheres vendedeiras de óleo de palma e iogurte (extraída do leite de vaca), uma das mulheres contou-nos a seguinte história: “Eu tenho em minha casa sob a minha responsabilidade 9 crianças órfãs filhas da minha irmã mais nova que faleceu depois de passar quase um ano doente. O seu marido já tinha falecido uns tempos atrás, mas ninguém sabe da razão da morte. Quatro delas são gémeas. Trato-as como minhas filhas, mas não tenho condições financeiras suficientes para as sustentar, nem sei o que será delas no futuro”. Casos como essas são muitas na região. As comunidades em geral não sabem se uma criança órfã está afectada ou não por HIV/SIDA, porque, por um lado, não vão ao hospital fazer teste de despistagem, alegando não terem dinheiro para pagar consultas, por outro, as famílias têm vergonha em revelar a causa da doença, quando de Sida se trata, por motivos de estigmatização (a doença por vezes é relacionada com espíritos/irã). No Centro de Saúde de Bambadinca, contou-nos o enfermeiro responsável59 pelo centro, que houve alturas em 2008 (primeiro trimestre que registavam em média cerca de 5 casos positivos de HIV/SIDA por dia nos testes de despistagem em mulheres grávidas. Os resultados dos testes são 57 DENARP. 2005 Vide estudo INEP sobre “Escolas Corânicas, Madrassa e Crianças Talibé” 2006. 59 Sr. Kiaké Djatá, enfermeiro responsável do Centro de Bambadinca 58 Elementos para uma Estrategia Nacional de Proteccao Social Para Orfaos e Criancas Vulneraveis Page 69 sur 102 sigilosos, quando as mulheres não querem receber os resultados não o fazem assim como não regressam ao centro para seguir o tratamento quando não quiserem. Na região existem algumas Unidades de Saúde Base construídas com o apoio da Plan GB e pela missão católica, apesar de muitos deles não estarem operacionais por causa de falta de cuidado e manutenção por parte das comunidades. As matronas (i.e. agentes de saúde formados para atender a aconselhar as comunidades). Nos últimos anos, a comunidade tem recorrido muito a assistência oferecida pela Missão Católica, através dos Centros de Recuperação Nutricional. As famílias procuram sobretudo a alimentação, medicamentos, roupa e materiais escolares. As irmãs oferecem igualmente aconselhamento sobre como as mães devem lidar com as crianças, em especial a alimentação e medicação. Todavia, as mães nem sempre seguem com rigor os conselhos recebidos e quando as crianças começam a ganhar peso e a sentirem-se melhor, já não voltam ao centro e deixam de tomar os medicamentos prescritos pelos agentes de saúde. Várias crianças morrem na região de Bafatá por causa desse tipo de comportamento. Nível de conhecimento e apropriação da doença A investigação constatou que o nível de conhecimento e apropriação da doença por parte da população de Bafatá é bastante fraco. As populações em geral, dizem que ouviram falar da doença, na rádio ou através de campanhas de sensibilização, mas não conhecem como fazer para evitar transmissão vertical (de mãe para filho), ou as formas como o Sida pode ser transmitido para uma outra pessoa, nem mesmo como fazer para garantir a prevenção. O défice de conhecimento sobre o HIV/SIDA (prevenção e transmissão) é aqui relato nesta história: “A Associação para a Luta contra a Fome em Contubuel (APALCOF) é uma associação de mulheres (mais de 3.000 associadas) que promove actividades de captação de rendimento através da produção hortícola e crédito a produção e oferece serviços sociais (alfabetização, educação, capacitação, educação cívica) as suas associadas. Recebe apoios entre outros do VSO (Voluntary Service Oversea, uma ONG da Grã-Bretanha). Numa tentativa de capacitar o staff da Associação sobre o HIV/SIDA para efeitos de disseminação de informação sobre o HIV/SIDA juntos das comunidades rurais, a VSO enviou um formador da organização por sinal um seropositivo, numa clara demonstração de argumentos contra a estigmatização e descriminação. Porém quando o formador chegou ao Contubuel (pequeno centro semi-urbano), o responsável do programa da Apalcof não tinha sido antes informado que o formador era um seropositivo. Este foi acolhido e alojado pelo responsável da Apalcof em sua casa a quem ofereceram comida e roupa de cama. Quando mais tarde o responsável do programa foi informado do estado de saúde do formador fez um grande escândalo e expulsou o formador da sua casa. Mais tarde quando participou da formação e compreendeu como o Sida pode ser transmitido ele acabou por pedir desculpas ao formador e a partir desse momento passou igualmente a sensibilizar e informar as comunidades sobre a prevenção e formas de transmissão” Esta história mostra-nos a complexidade do mundo rural e as dificuldades que as comunidades sentem para lidar com o HIV/SIDA devido a falta de informação suficiente e baixo nível de escolaridade. As campanhas de sensibilização levadas a cabo por associações juvenis e ONGs sobre o HIV/SIDA duram apenas o tempo que o dinheiro que recebem das instituições Elementos para uma Estrategia Nacional de Proteccao Social Para Orfaos e Criancas Vulneraveis Page 70 sur 102 financiadoras durar, isto significa, que essas acções não são contínuas e muitas vezes não chegam ao fundo das tabancas. Um outro factor que pesa no processo de apropriação de informação e conhecimento sobre o HIV/SIDA é a relevância do peso da cultura, ou seja, dos usos e costumes tradicionais. As comunidades em geral, acreditam que o Sida é uma fatalidade dos espíritos, por isso o medo em revelarem a doença ou então o recurso antes a cura tradicional em vez do hospital. Igualmente importante de referir nesse quadro de insuficiência de conhecimento por parte das comunidades rurais é o alto grau de analfabetismo da população. De acordo com o relato de um dos funcionários de uma ONG activa na região, uma mulher cujo teste de despistagem acusara positivo, tinha na sua receita médica um código que indicava a seropositividade, mas ninguém da família sabia ler para compreender a anotação do agente de saúde. Ela veio mais tarde a falecer, porque não contou a ninguém sobre a doença assim como ninguém conseguiu descortinar a informação sobre Sida no papel na receita que recebera do centro de saúde. Nível dos apoios e protecção da criança pelas comunidades e famílias Os relatos sobre as formas de protecção e apoios das comunidades e famílias às crianças vulneráveis e órfãs variam de grupos focais para grupos focais e de instituição para instituição. Em geral, os relatos indicam que as comunidades têm feito muito pouco para ajudar e proteger as crianças, em especial as órfãs e deficientes (poucos conhecem se a criança órfã é afectada ou não por Sida). A razão porque isso acontece esta ligada a situação da pobreza e falta de dinheiro para pagar consultas num centro de saúde e comprar medicamentos ou ainda pagar a matrícula e mensalidade escolar. Por isso, as famílias recorrem com frequência a ajuda da Missão Católica para conseguir os apoios necessários para educar e alimentar as crianças. O envio das crianças ao Senegal (crianças Talibés) para aprender o Alcorão e todas as histórias por detrás desse “tráfico ocultado” é uma das expressões dessa falta de zelo por parte das famílias e comunidades em geral em relação as crianças orfãs. Por outro lado, alguns relatos deixam entender que, em geral, a criança órfã não é abandonada, élhe sempre oferecida alguma protecção (i.e. alojamento, alguma roupa, comida) através do sistema de herança fortemente suportado pela tradição. Quando se trata de uma criança órfã de pai, reza a tradição que a própria mãe é herdada pelo irmão mais novo do marido. Porém, em alguns círculos familiares, a mulher é livre de decidir se aceita ou não a herança, ou seja de ir viver com um outro homem, em caso de não querer ela é expulsa da casa e perde todo o direito sobre os bens do marido. São raros os casos em que a mulher recorre a protecção da justiça (via Ministério publico ou uma ONG) para defender os seus direitos. A mulher na maioria das estruturas dos grupos sociais da Guiné-Bissau é severamente descriminada e punida pela força da tradição e dos costumes sem ser defendida e/ou protegida pelo estado e as suas instituições. As organizações da sociedade civil, neste caso as organizações não-governamentais activas na região oferecem serviços de informação e sensibilização sobre o HIV/SIDA, mas dispõem de poucos recursos financeiros para intervir de forma mais efectiva na luta contra a doença. Entre as ONGs, a Plan Guiné-Bissau é das poucas que estende o seu apoio as comunidades rurais à construção de infra-estruturas sociais (unidades de saúde de base, escolas, bombas manuais de águas, etc). Recomendacoes Elementos para uma Estrategia Nacional de Proteccao Social Para Orfaos e Criancas Vulneraveis Page 71 sur 102 - Definir uma estratégia nacional sobre o fenómeno Talibe que tenha em conta a realidade sociocultural do país e as experiências dos diferentes actores sociais envolvidos nessa matéria; - Envidar esforços para a mobilização de recursos que possam ser usados na construção de escolas corânicas para evitar ou diminuir o tráfico de crianças para o exterior da Guiné, em especial para o Senegal; - Criar espaços de lazer e jardins infantis para as crianças vulneráveis; - Criar centros de acolhimento “temporário” para as crianças órfãs e afectadas por HIV/SIDA; - Criar bolsas para crianças órfãs (matrícula gratuita, isenção de pagamento de propinas, oferta de materiais escolares, entre outros); - Criar a gratuidade para as consultas de mães grávidas; - Criar programas de micro-créditos para bancos de cereais junto das comunidades rurais; -Apoiar as comunidades nas actividades de transformação e comercialização através de microbancos rurais geridos pelas comunidades; - Reforçar as actividades de sensibilização através das estruturas tradicionais das comunidades; - Apoiar os programas das ONGs que intervêm na luta contra a pobreza; - Apoiar programas de cantina escolar que possam adquirir produtos no próprio país; - Reforçar as campanhas de sensibilização sobre a convenção dos Direitos da Criança; - Reforçar as actividades de captação de rendimentos das mulheres no domínio da economia informal; - Incentivar a escolarização das raparigas através de bolsas, programas extra-curricular, etc.; - Reforçar as acções de sensibilização nas zonas rurais sobre o HIV/SIDA; - Criar centros de formação socioprofissional para as crianças e jovens mais pobres; - Estimular e organizar as comunidades no sentido de criação de mutualidades de saúde; - Apoiar na criação de jardins infantis para as mães trabalhadoras; - Estimular a criação de redes regionais de mulheres líderes de opinião (incluindo jovens estudantes, comerciantes, agricultoras, vendeiras, professoras, funcionárias, deputadas, etc) que Elementos para uma Estrategia Nacional de Proteccao Social Para Orfaos e Criancas Vulneraveis Page 72 sur 102 sirvam de activistas e animadoras junto as comunidades para a mudança de mentalidade e de defesa de direitos de mulheres e crianças. 4.5. Principais constatacoes e conclusoes dos estudos de caso: Regiao de Cacheu Características demográficas, políticas e socioeconómicas A região de Cachéu conta com uma população acima de 150.000 pessoas espalhadas por mais de 500 tabancas (censo 1991). O nível de pobreza é igualmente elevado na região. Cerca de 59,1% das mulheres e 42,1% são considerados pobres. A região é habitada maioritariamente por Manjacos, seguidos de Balantas, Felupes, Mandingas e Brames. As principais actividades económicas da região são a agricultura, a pesca e o comércio informal. A região faz fronteira com a Republica do Senegal factor que tem contribuído para aumentar o fluxo migratório entre os dois países e as transacções comerciais. Administrativamente, a região é dividida em 6 sectores (Cachéu, Canchungo, Caió, São Domingos, Bula e Calequisse), sendo a cidade de Cachéu o centro administrativo e a sede do governador. Porém, a cidade de Canchungo é o centro comercial e o lugar onde se concentra a maior parte das organizações da sociedade civil e empresas privadas. A região é confrontada com inúmeros problemas sociais. A taxa de escolarização das raparigas é de 64,2%, enquanto que o analfabetismo situa-se a volta de 82,3 para as mulheres e 45,4% para os homens60. A cobertura em água sem poço é apenas de 38,2% da população o que indica a existência de muitas doenças associadas a falta de higiene. A região possui um hospital de referência em Canchungo, uma maternidade, 10 centros de saúde e 44 unidades de saúde de base. A produção agrícola, em especial a produção e comercialização de caju é a actividade que emprega o grosso da mão-de-obra activa contribuindo ao lado das remessas dos emigrantes para a principal fonte de sobrevivência das populações locais. Na região de Cachéu intervêm muitas das organizações não-governamentais, redes de associações e associações juvenis activas no país. A proximidade com o Senegal faz aumentar os riscos sociais devido ao movimento migratório estimulado não só pela guerra de Casamance, mas também pelas transacções comerciais. Breve resumo sobre a situação das crianças vulneráveis Não obstante, a região de Cachéu apresentar um número considerável de organizações da sociedade civil (SOS, ONGs, redes de associações, associação profissionais de sexo, Projecto de Saúde Bandim, AMIC, associações de mulheres e jovens, incluindo as organizações ligadas a igreja) que intervêm no domínio da sensibilização e informação sobre o HIV/SIDA e prestam serviços diversos a comunidade (i.e. alimentação, assistência escolar e sanitária), a região aparece nos lugares cimeiros em matéria da propagação do HIV/SIDA. 60 Relatório Nacional sobre o Desenvolvimento Humano na Guiné-Bissau. PNUD. 2006 Elementos para uma Estrategia Nacional de Proteccao Social Para Orfaos e Criancas Vulneraveis Page 73 sur 102 Projecto de Saúde Bandim, sector de Caió. Entre as causas apontadas para esta alta prevalência do VIH está o movimento migratório (há muitos emigrantes manjacos a viverem no Senegal ou em França que chegam e partem), mas também a pobreza e o declínio das instituições tradicionais em termos do seu papel de controlo social. Em termos de situação de crianças vulneráveis, a região apresenta características sociais não muito diferentes das da região de Bafatá, apesar do fenómeno criança Talibé não se verificar nesta região, pois ela é habitada por grupos étnicos predominantemente animistas. Na tradição manjaca (i.e. etnia maioritária), quando uma criança fica órfã de pai ela fica com a mãe, mas quando são ambos os pais que morrem, a criança é herdada pela tio/tia ou avó. Se a mulher não quiser ser herdada pela pessoa indigitada, ela é livre de escolher alguém da família com quem queira ficar. Quando a mulher recusa em aceitar alguém ela core o risco de ser expulsa e perder todo o direito e regalias sobre os bens. Quando se trata de homem (por exemplo, um tio da criança) que não estiver interessado em aceitar receber as crianças, pode perder a vida devido a intervenção dos espíritos. A questão da herança é quase que sagrada na tradição Manjaca. A existência da aldeia SOS em Canchungo revela a evolução da taxa de crianças vulneráveis cujos pais morreram (se de Sida ou não, não se sabe devido ao tabu) ou emigraram. A aldeia abriga 60 crianças (entre elas muitas são órfãs), 37 meninas e 23 rapazes, entre 0 a 7 anos de idade, a criança mais nova é um rapaz que tem 9 meses. As vezes as crianças são abandonadas na porta da aldeia SOS. O sistema de funcionamento da aldeia faz com que cada criança internada tenha uma Mãe da Aldeia que cuida ao mesmo tempo de mais 4 outras crianças. As crianças podem igualmente ter padrinhos ou madrinhas com os quais podem passar um tempo de férias. O pessoal da aldeia não sabe (ou não querem dizer) se as crianças órfãs são afectadas ou não por HIV/SIDA. O comportamento das pessoas em relação as crianças é uniforme, sendo ela órfã ou não. O projecto de Saúde de Bandim em Caió intervém mais na área de investigação, pesquisa e sensibilização sobre o HIV/SIDA, mas com indivíduos acima de 15 anos de idade. Neste momento seguem um grupo de 600 indivíduos/amostras a quem deram um cartão verde que os permitem ter acesso grátis a consulta e medicamentos. O projecto segue 18 pessoas em tratamento antiretroviral. Em Bula, a missão católica tem prestado assistência a um número cada vez mais crescente de crianças órfãs. Uma vez por semana (segundas-feiras), a missão recebe crianças em consultas, e Elementos para uma Estrategia Nacional de Proteccao Social Para Orfaos e Criancas Vulneraveis Page 74 sur 102 cada semana aparece uma nova criança órfã. Muitas mães que chegam ao centro são ainda raparigas adolescentes (entre 14 a 17), que apresentam um estado físico bastante anémico e desnutridas. Centro de Nutrição de Caritas de Bula Uma outra característica da tradição local é os homens terem entre 3 a 4 mulheres e muitos filhos, alguns passam o tempo nas hortas e plantações e são muito mal nutridas. Os homens raras vezes ajudam as mulheres com as tarefas domésticas e familiar, ficam sentados a espera das mulheres e da alimentação, não cuidam das crianças que as vezes brincam nos lugares onde os porcos bebem (!!!). Por isso, os maiores problemas dessas crianças relacionam-se com a má nutrição, crescimento lento, perda de peso, entre outros. Nível de conhecimento e apropriação da doença O nível de conhecimento e informação que as comunidades têm em relação ao Sida varia de centros urbanos para aldeias. Em geral e graças as acções de sensibilização com o apoio do STNLS em Canchungo, através das rádios comunitárias, distribuição de preservativos e peças teatrais em lugares públicos, as populações dos centros urbanos (Canchungo, Bula, Caió) têm informações mínimas sobre as formas de prevenção e transmissão do HIV/SIDA. Nos encontros com as autoridades, chefes tradicionais, representantes das organizações da sociedade civil ou grupos de jovens e mulheres todos são peremptório em informar que ouviram falar de Sida e conhecem minimamente como se transmite a doença. No meio rural, a situação é mais grave. As informações e a comunicação entre os centros urbanos e o meio rural são limitadas, muitas vezes resumem-se a missões esporádicas ou visitas de algumas organizações, em especial da missão católica. Por outro lado, os usos e os costumes tradicionais são muito mais enraizados na cultura das comunidades rurais, daí a resistência das comunidades em aceitar a doença e/ou usar meios modernos para evitar a contaminação. Elementos para uma Estrategia Nacional de Proteccao Social Para Orfaos e Criancas Vulneraveis Page 75 sur 102 Segundo as estimativas do estudo sentinela (2003), estima-se que cerca de 10.073 indivíduos vivem com Sida na região, 1.679 nos centros urbanos e 8,394 nas zonas rurais. Calcula-se que mais de 10% dessas pessoas tenham menos de 18 anos de idade. Encontro com Missionárias do Espírito Santo (Caió) O grau de escolaridade baixo das comunidades é outro factor que contribui para perpetuar comportamentos e atitudes discriminatórios contra os direitos das crianças e mulheres (i.e. casamento precoce e forçado das jovens raparigas, trabalho infantil pesado, falta de cuidado com as crianças, sistema de herança, entre outros). Um outro aspecto que a investigação apurou e que tem a ver com o nível de consciência e apropriação da doença por parte das populações é o facto de muita gente decidir de livre vontade fazer teste de despistagem, mas depois recusam-se (ou desinteressam-se) em ir buscar os resultados do teste. Por exemplo em Caió, o Projecto de Saúde de Bandim colabora com cerca de 600 pessoas (possuem um cartão verde que os possibilita acesso grátis as consultas e aquisição de medicamentos no projecto e nos centros de saúde local). Essas amostras são seguidas durante um período de tempo para avaliar a evolução e o comportamento. Muitos fazem teste mas não aparecem para buscar os resultados. Nível de apoios e protecção da criança pelas comunidades e famílias O fraco rendimento das populações rurais na sequência da queda dos preços dos produtos agrícolas e da crise das políticas públicas para o desenvolvimento têm influenciado e muito a maneira como as comunidades e as famílias gerem as suas crianças. Assiste-se nos últimos anos a uma quebra gradual de valores e normas de coesão social tradicionais às famílias africanas. As populações recorrem cada vez mais a terceiros para buscar protecção as suas crianças, não só em termos de alimento, como em medicamentos, roupa ou formação socioprofissional. As irmãs e missionárias da igreja católica têm praticamente substituído o Estado nas tarefas de apoio e prestação de serviços sociais as populações e crianças em especial. Elementos para uma Estrategia Nacional de Proteccao Social Para Orfaos e Criancas Vulneraveis Page 76 sur 102 Entretanto, o estudo deparou com certas situações que não podem ser explicadas apenas do ponto de vista de indicadores de pobreza ou na base das transformações que ocorrem no modo de funcionamento das instituições sociais tradicionais. Eis a história que nos foi contada pelo responsável do Centro de Saúde de Bula: “Um belo dia de sol, uma viatura atropela uma mulher que levava a sua filha de dois anos ao colo. A mulher faleceu no local e a esposa do condutor do carro, ofereceu-se a ficar com a criança sob sua responsabilidade. O pai da criança informado mais tarde do ocorrido aceita sem resistência a proposta da mulher do condutor em ficar com sua filha. O responsável do centro de saúde (que por sinal também tem uma filha órfã sob sua responsabilidade que lhe foi entregue para criação quando era enfermeiro em Bigene há 13 anos atrás) soube através da sua esposa que é amiga (e frequenta a casa) da mulher do condutor do acidente que esta tem tratado a criança da mãe acidentada de forma diferente como trata os próprios filhos (i.e. aplica-lhe castigos mais severos, está sempre a gritar com ela, obriga-a a trabalhos mais pesados em casa, etc).” Ora esta história demonstra a transversalidade da abordagem criança e remete-nos a questionar todo o sistema económico e social do país. A má distribuição de riqueza nacional e a injustiça social que dela advém está paulatinamente a transformar a sociedade (i.e. as normas colectivas e a solidariedade horizontal estão cada vez mais a serem substituídos pelo individualismo e interesses materiais Recomendacoes - Trabalhar na conscientização sobre os problemas de herança com vista a salvaguardar os direitos da mulher; - Apoiar os Centros de Recuperação Nutricional com géneros alimentícios para as crianças e mães pobres; - Construir mais escolas comunitárias e proceder a reciclagem contínua dos professores para facilitar o acesso e uma maior aprendizagem; - Apoiar a escolarização de jovens raparigas órfãs e pobres através de bolsas (i.e. isenção de pagamento de mensalidade, de propinas, programas de corte e costura, etc.); -Reforçar as acções de sensibilização via as estruturas do poder tradicional sobre a prevenção e transmissão; -Estimular uma maior coordenação e concertação entre os diferentes actores que intervêm no domínio da infância; - Realizar estudos sociológicos sobre a real situação sociocultural e económico das crianças vulneráveis na região; - Sensibilizar as comunidades sobre a forma de lidar com crianças seropositivas; Elementos para uma Estrategia Nacional de Proteccao Social Para Orfaos e Criancas Vulneraveis Page 77 sur 102 - Isentar as crianças órfãs e vulneráveis de pagamento de consultas e compra de medicamentos essenciais; - Reforçar o fornecimento de alimentação nas escolas comunitárias; - Criar programas de incentivos à produção e comercialização dirigidos às mulheres; - Apoiar as populações na vedação dos seus campos de cultivo por causa dos animais; - Criar e desenvolver espaços de reflexão comunitária e de troca de experiências; - Apoiar às jovens adolescentes com programas de aprendizagem, consciencialização sobre formas de prevenção, contaminação, transmissão, etc; - Criar projectos virados para o desenvolvimento comunitário com prioridade para a produção alimentar e criação de receitas; - Sensibilizar às comunidades para a criação de abotas (mutualidades de saúde e solidariedade inter-grupo); - Estimular à criação de redes regionais de mulheres líderes de opinião (incluindo jovens estudantes, comerciantes, agricultoras, vendeiras, professoras, funcionárias, deputadas, etc) que sirvam de activistas e animadoras junto as comunidades para a mudança de mentalidade e de defesa de direitos de mulheres e crianças. 4.6. Conclusoes gerais dos estudos de caso A luta contra o HIV/SIDA pressupõe a obtenção de informações claras sobre os factores e as situações que levam milhares de Guineenses, mulheres e homens, a serem primeiro infectados e, depois, a não poderem encarar a doença. A vulnerabilidade não é nenhuma condição divina que advém do sobrenatural. Ela é, antes de mais, a consequência de factores determinantes individuais conjugados com os factores sociais, comunitários e económicos. O conhecimento desses factores determinantes é fundamental para melhor orientar as estratégias da Resposta Nacional que, acima de tudo, tem de estar em condições de encontrar soluções para neutralizar ou reduzir o efeito desses determinantes e o impacto do SIDA sobre a saúde e as condições de vida dos PVVIH e dos seus familiares.61 A investigação empírica constatou que transformações sociais importantes têm vindo a ocorrer no contexto das comunidades e famílias guineenses. Essas mudanças interferem com a forma como as pessoas se relacionam no interior da família e na comunidade e com a maneira como as normas, os símbolos e os costumes são interpretados e recriados ao longo do tempo. 61 PEN 2007 – 2011. Pg 11 Elementos para uma Estrategia Nacional de Proteccao Social Para Orfaos e Criancas Vulneraveis Page 78 sur 102 Os factores estruturais ligados a má governação e, sobretudo ao baixo nível de escolaridade e ao elevado índice de pobreza tanto em Bissau como nas duas regiões visitadas são apontados pela maioria dos nossos entrevistados como as causas principais da vulnerabilidade das crianças. O declínio do preço dos produtos agrícolas no mercado internacional, a ausência de políticas de incentivos à diversificação agrícola e o baixo salário dos funcionários públicos obrigam as comunidades a recorrerem a inúmeras estratégias de sobrevivência, entre as quais, a reprodução social e a utilização da mão-de-obra infantil desempenham um papel vital. A crítica situação da pobreza faz com que muitos jovens e crianças abandonem as suas aldeias para as cidades a procura de melhores oportunidades de vida sobretudo no sector informal da economia. Esse movimento migratório provoca uma ruptura na mão-de-obra activa no campo (a família produz menos), como também remete os jovens e adolescentes vindas do interior a uma vida “quase de escravo” em Bissau, numa tentativa desesperada de obter rendimentos para ajudar a família que ficou no campo. Muitas dessas crianças acabam por tornar-se presa fácil das redes de criminalidade manejadas por adultos (i.e. pequenos grupos de assaltos e furtos nos mercados de Bandim, prostituição infantil, trabalhos forçados, entre outros) aumentando o risco de vulnerabilidade das crianças. A ausência e a fragilidade do Estado, em especial no mundo rural é um outro factor que interfere com o contexto social das crianças. O débil estado das infra-estruturas sociais de base (i.e. bombas de água, escolas, centros de saúde, medicamentos, estradas, etc) deixa as comunidades numa situação bastante vulnerável. Para além da falta de serviços sociais de base, a qualidade e a disponibilidade dos agentes de saúde deixa muito a desejar. Muitas vezes, as comunidades (i.e. mulheres) escusam de levar as crianças aos centros de saúde porque não têm dinheiro para pagar a consulta e comprar medicamentos. Em relação ao HIV/SIDA, o estudo apurou que uma das causas do aumento da taxa de prevalência tanto em Bissau como nas regiões é o desconhecimento e ignorância das populações em relação as medidas de prevenção e de transmissão. De acordo com o PEN (2007-2011), a proporção da população guineense (homens e mulheres), com idade entre 15 e 49 anos, que nunca ouviu falar do HIV/SIDA baixou em 2005 em comparação com 1998. São apenas 18% das mulheres que afirmaram, em 2005, nunca ter ouvido falar de HIV/SIDA contra 40% em 1998. Entre os homens, são 3,4% contra 12%. Os jovens (15 – 24 anos de idade) apontaram o sexo, em 94%, como a principal via de transmissão do HIV/SIDA. Mas as outras formas de transmissão (transfusão sanguínea, seringa multiuso e transmissão vertical) cujo conhecimento é também de extrema importância para a prevenção, não foram identificadas pelos jovens. Somente 7% conseguiram citar, correctamente, duas vias de transmissão do VIH. 36% não sabe do poder infectante de um portador assintomático do VIH (PVVIH). Isto é, não sabem que uma pessoa aparentemente gozadora de boa saúde pode ser portador do vírus e, por isso, poder infectar outrem. A tabela em baixo monstra a tendencia de conhecimentos sobre HIV/SIDA (fonte: PEN 2007 – 2001) Indicadores 1. 2. Proporção da população com idade entre 15 e 49 anos que já ouviram falar do HIV/SIDA (N=4285) Proporção da população com idade entre 15 e 49 anos que já ouviram falar do preservativo Sexo % Mascul. Femin. 96,6 82,4 Residência % Urbana Rural 96,4 85,7 Total % 89,5 94,5 94,2 83,7 72,9 78,0 Elementos para uma Estrategia Nacional de Proteccao Social Para Orfaos e Criancas Vulneraveis Page 79 sur 102 (N=4285) 3. 4. 5. 6. 7. 8. Proporção da população (15 – 49 anos,) que afirmaram ter acesso fácil aos preservativos (N=3550), % Proporção de jovens (15 e 24 anos) que já ouviram falar do HIV/SIDA (N=2377) Proporção de jovens (15 e 24 anos) que já ouviram falar do preservativo (N=2378) Proporção de jovens (15 - 24 anos) que declaram ter conhecimentos sobre a transmissão do HIV/SIDA (N=2160) Proporção de jovens (15-24 anos) que identificam correctamente duas vias de transmissão do VIIH/SIDA (N=2160) Proporção de jovens (15-24 anos) que negam os preconceitos erróneos (rumores) sobre a transmissão do HIV/SIDA (N=2160) 51,9 43,2 48,1 97,0 84,9 98,1 87,0 90,9 95,2 77,8 96,1 81,3 86,5 94,9 78,1 93,1 83,3 87,0 8,0 5,6 12,7 3,4 6,9 14,8 5,1 16,0 6,8 10,3 Fonte: PSB/06 O estudo também constatou que as campanhas de sensibilização levadas a cabo tanto pelas associações juvenis e organizações não-governamentais com o apoio do Secretariado Nacional e Regional de Luta contra o Sida, Action Aid e outras organizações são muitas vezes pouco consistentes em termos do conteúdo das mensagens, da abrangência geográfica e sustentabilidade da sensibilização, uma vez que elas não são contínuas. Muita gente nas aldeias longínquas não têm acesso as informações sobre o HIV/SIDA. Um outro factor que importa sublinhar e que prejudica o contexto social das crianças são os tabus religiosos e culturais. Para muita gente, o Sida é uma doença ligada aos efeitos do irã (espírito) daí o medo e/ou vergonha em revelar a doença, mesmo aos familiares mais directos. Por isso, as comunidades em geral, buscam primeiro a cura tradicional e só depois (muitas vezes já tarde demais) os hospitais. A questão da herança é um outro factor que mexe com as sensibilidades e a estigmatização. Quase em todas as etnias da Guiné, quando uma mulher fica viúva, ela (e mais os filhos) é herdada por familiares da vítima, normalmente pelo irmão mais novo. Quando a viúva recusa é expulsa da casa e perde todas regalias sobre os bens do marido. O estudo constatou que face a esta situação, algumas mulheres da região de Cachéu guardam os seus bens pessoais em “duas malas separadas”, uma que se encontra em casa do marido e outra em casa da sua mãe. Trata-se de estratégias de sobrevivência face aos riscos de que a mulher é exposta devido a prática da herança que é discriminatória e violadora de direitos das mulheres e crianças. As crianças que vivem em agregados familiares similares ficam, naturalmente expostas a maiores riscos (i.e. castigos frequentes, trabalhos mais duros, ficam fora da escola, etc.). O movimento migratório de campo para a cidade e vice-versa na sequência do alastramento da pobreza é outra causa da vulnerabilidade das crianças. As crianças envolvidas nesse movimento são muitas vezes abandonadas ou entregues ao cuidado de vizinhas ou algum outro familiar mesmo que esse não reúna condições suficientes para cuidar da criança. Por fim, importa igualmente referir-se ao comportamento sexual do guineense (i.e. recusa do uso de preservativo, múltiplo parceiro, sexo comercial, inicio prematuro da actividade sexual, etc.) surge como um dos muitos e importantes factores do aumento da prevalência do HIV/SIDA na Guiné-Bissau. Elementos para uma Estrategia Nacional de Proteccao Social Para Orfaos e Criancas Vulneraveis Page 80 sur 102 5. CONCLUSOES/RECOMENDACOES 5.1. Objectivos do estudo Consolidar a informação existente de forma a estabelecer o quadro geral do impacto do HIV/SIDA nas famílias e nas crianças, contextualizando-o no quadro mais amplo da vulnerabilidade da criança; Fazer um balanco rapido das intervencoes existentes viradas para as criancas e as familias vulneraveis a nivel das diversas politicas publicas; Propor uma estrategia de accao que resulte da analise e das trocas com diversos actores a nivel governamental, das organizacoes da sociedade civil e das comunidades das regioes escolhidas para o estudo. 5.2. Dificuldades e limitacoes O processo sofreu de um deficit de leadership, sobretudo durante a segunda fase do trabalho, da parte da Direccao Geral e da Comissao OVC com consequente insuficiencia de debate e reflexão relativamente às conclusões e direcções possíveis para respostas futuras. Tambem houve participacao muito limitada das liderancas do IMC, devido a mudancas na Presidencia e Secretariados executivos. 5.3. A abordagem da problematica A análise da situação do impacto do HIV/SIDA necessita de uma abordagem que permita por um lado, analisar a complexidade dos efeitos da epidemia e por outro lado situar a posição desta problemática relativamente a um contexto social fortemente caracterizado por uma grande vulnerabilidade da população. A vulnerabilidade estrutural (colectiva) abrange grandes segmentos da população infantojuvenil. Ela deriva em grande parte da instabilidade politico-institucional e manifesta-se pelos altos índices de pobreza, pelo reduzido acesso a serviços básicos e pelo fraco funcionamento de um Estado de direito capaz de proteger os direitos básicos da cidadania. A vulnerabilidade aguda da criança decorre principalmente de situações em que a criança seja privada de meio familiar e/ou esteja exposta a situações de violação do direito à integridade psíquica, física e social. A epidemia de HIV/SIDA e uma variável adicional da vulnerabilidade estrutural, pelos efeitos complexos de seu impacto a nível dos indivíduos, das famílias, do funcionamento da sociedade em geral. Por outro lado, os efeitos complexos da vulnerabilidade estrutural e do impacto do HIV/SIDA podem colocar as crianças numa situação definida neste estudo como vulnerabilidade aguda. Isto significa que a resposta a vulnerabilidade devido ao HIV/SIDA deve ser multidimensional e transversal a politica social, implicando desde intervencoes de tipo transformativo ate os sistemas de proteccao da crianca. Elementos para uma Estrategia Nacional de Proteccao Social Para Orfaos e Criancas Vulneraveis Page 81 sur 102 5.4. Analise da situacao Pobreza A populacao da Guine Bissau encontra-se numa situacao de grande vulnerabilidade estrutural. A grande maioria da populacao guineense e vulneravel devido a pobreza: 64,7% dos agregados familiares estão na pobreza e 20,8% deles estão em pobreza absoluta e vivem com menos de um USD por dia. As criancas sao mais pobres do que os outros grupos etarios. Os choques de tipo económico mais frequentes sao as flutuações nos preços por ex. dos alimentos e das matérias primas, perda da colheita devido a seca, pragas de insectos ou infiltrações de água salgada, óbito ou doença cronica ou grave do provedor principal da família com os acréscimos de despesas em tratamentos médicos e medicamentos, funerais, ou riscos de acidentes, como no casos dos incêndios. Quando os agregados familiares enfrentam dificuldades de tipo economico, existe o risco de que eles recorram a estrategias prejudiciais envolvendo suas criancas: diminuicao na alimentacao das criancas, retirada da escola, intensificacao do trabalho infantil, casamento forçado/precoce, exploração sexual, migracao temporaria ou nao para a cidade a busca de meios de sobrevivencia, institucionalizacao. A pobreza influenciam o estado nutricional das criancas. Uma em cinco criancas de menos de 5 anos de idade tem baixo peso, enquanto 4% tem uma insuficiencia ponderal severa. As criancas que sofrem de atrasos no crescimentos sao muito numerosas (40,9%), e 19,5% sao muito baixas pela sua idade. Cerca de 7,2% de criancas e magra de forma moderada e 1,7% e magra demais para o seu tamanho. A pobreza esta tambem entre os determinantes do trabalho infantil, cuja taxas são extremamente elevadas: 39,2% raparigas (37,0%) e atinge mais as crianças que vivem no meio rural (47,7%) do que no meio urbano (22,0%), e no SAB (14,2 para as crianças de 5 a 14 anos de idade, é mais alta para os rapazes (41,1%) do que para as %). Acesso aos servicos basicos As dificuldades de acesso economico e geografico aos servicos de registo de nascimento, juntos com outros factores ligados a baixa qualidade dos servicos e a uma demanda insuficiente, faz com que em 2006 ainda 61.1% das crianças de menos de 5 anos de idade nao eram registadas e portanto expostas a uma serie de risco de exclusao e abuso. O acesso aos serviços de saúde é muito limitado devido a infraestrutura deficiente, a baixa operatividade dos centros de saude existentes, a dispersão da população sobretudo nas zonas rurais e a fraca capacidade das famílias para se deslocarem. Também, a fraca qualidade do atendimento, a não disponibilidade dos medicamentos ou a incapacidade financeira de adquiri-los, as exigências de comparticipação têm como consequência de desincentivar a utilização dos serviços de saúde por parte da população, em particular da população pobre. Em 2002, apenas 37% das famílias mais pobres tinha acesso a saude. Elementos para uma Estrategia Nacional de Proteccao Social Para Orfaos e Criancas Vulneraveis Page 82 sur 102 Quanto a educacao primaria, estima-se que 100,000 criancas entre 6 e 11 anos estao fora da escola, sendo que uma metade nunca foi matriculada e a outra abandonou a escola pour uma razao ou outra (fraco desempenho, trabalho infantil, distancia, baixa qualidade do ensino, entre outros). A maioria das criancas fora da escola sao rapazes. No secundario e no terciario, notam-se taxas de inscripcao de raparigas consideravelmente mais baixas dos rapazes devido ao casamento e gravidez precoce, inadequacao das instalacoes sanitarias escolares, distancia entre o domicilio e a escola, trabalhos domestico, resistencias culturais da parte dos pais. 60% da populacao guineense e analfabeta, com alta inequidade de genero: 50% dos homens sao analfabetos e 80% das mulheres. O impacto do HIV/SIDA A situacao epidemiologica global da Guine Bissau e dificil de se avaliar. Existem porem grandes receios de que a situacao esta a se agravar. Segundo o estudo sentinela de 2005, a prevalencia do HIV-1 seria 2.5/3.0%. Segundo as estimativas da Oms, em 2005 haveria 32,000 pessoas vivendo com VIH. A prevalencia entre mulheres gravidas e estimada a 7.9%. Todos os anos cerca de 4,000 mulheres seropositivas dao a luz, sendo que a porcentagem estimada daquelas que tiveram acesso a prevencao da transmissao de mae para filho e infima (1% em 2007). Estima-se que um total de 3,200 criancas de menos de 15 anos vivem com HIV/SIDA. Sao conhecidas dos servicos apenas as criancas seropositivas nascidas de mae seropositiva, ou ainda as criancas em terapia ARV. Os orfaos seropositivos conhecidos sao apenas aqueles que se encontram na Casa Emanuel (nove criancas). Quanto aos orfaos devido ao HIV/SIDA estima-se que eles sejam 10% dos orfaos em geral, isto e 11,000 orfaos devidos ao SIDA. Conforme os dados do MICSII, uma crianca em cada dez de 0 a 17 anos e vulneravel, uma em cada dez tem um ou os dois pais falecidos e uma em cada cinco e orfa e vulneravel. Quanto a identificacao a nivel das comunidades das criancas infectadas ou afectadas pelo HIV/SIDA, a pesquisa de terreno confirmou que esta identificacao e extremamente dificil. Em primeiro lugar, o estado de seropositividade pode nao ser conhecido, sendo que o teste e feito so quando o estado de saude se torna muito critico e passa a exigir cuidados medicos. Nestes casos porem, pode haver recursos a medicina tradicional, impedindo toda possibilidade de despistagem e tratamento. Em outros casos, a pessoa vivendo com HIV/SIDA pode ja ter falecido sem que se tivesse conhecimento da causa da morte. Finalmente, se o estado seropositivo e conhecido, ele e na maioria das vezes ocultado, por receio do estigma associado a doenca. Baseado nos dados do MICS de 2006, 11,3 % das crianças 0-17 anos são órfãs de pai ou de mãe, sendo em termos absolutos cerca de 110,000 crianças. 1,8% das crianças são órfãos duplos. Baseado nos dados estatisticos disponiveis, as crianças órfãos duplos estao levemente a risco de discriminacao quanto a sua escolarizacao: o factor de risco Elementos para uma Estrategia Nacional de Proteccao Social Para Orfaos e Criancas Vulneraveis Page 83 sur 102 principal da não escolarização não esta na orfandade, mas em outros factores como a quintilha de riqueza, o meio de residência e a região. Vulnerabilidade aguda Quanto as criancas privadas de meio familiar, algumas centenas de criancas vivem em instituicoes que praticam o regime de internato: a Casa Emanuel, dirigida por uma congregacao religiosa, com sede na cidade de Bissau, a as Aldeias SOS crianças, instituição filantrópica internacional que acolhe crianças órfãs, activa em Bissau desde 1996, e em Gabu e Canchungo desde 2006. O criterio principal para que as criancas sejam aceites nestas instituicoes e que elas sejam orfas. Como referido, a Casa Emanuel alberga uma dezena de criancas seropositiva em tratamento ARV. As criancas sao vitimas de varias formas de violencia (maus trato, abuso, exploracao) no ambito domestico e nas comunidades. A maioria dos casos nao chega as autoridades, devido a fraco desempenho destas, arranjos/suborno para casos sobretudo de violencia sexual e desconfianca nos orgaos de justica. Em 2005, o Comissariado Geral da Policia de Ordem Publica registou 34 casos de violencia e abuso sexual de menores (33 meninas e 1 menino). Em 2006, foram registados 65 casos de violencia contra a crianca, sendo a maioria abuso sexual (53), violencia fisica (6), rapto (2) e abandono (2). Menos de metade dos casos denunciados a Policia sao transmitidos ao Tribunal. Uma forma de violencia sexual a qual sao exposta as meninas e raparigas guineense e a mutilacao genital feminina (fanado). 44,5 % das mulheres com idades entre 15-49 anos são excisadas. A prevalência da excisão varia muito em função da pertença étnica e a zona de residência, ela é mais forte entre as Fula/Mandinga (95,2%) e no Leste (92,7%). As MGF são também mais frequentes entre as mulheres sem instrução (54,4%) e no meio rural (48,2%). Mais recentemente, assiste-se a um aumento das praticas de fanado nos centros urbanos (barracas de fanado). Outra forma de violencia sexual que afecta as raparigas e o casamento forcado/precoce.7,3 % das raparigas guineenses casam antes dos 15 anos de idade, em particular na zona norte do pais (10,1%) seguido por Bissau (5,8%), o leste (5,7%) e o Sul do pais (4,8%) e em particular aquelas que pertencem aos grupos economicamente mais fracos (8,5%). A percentagem daquelas que casam antes dos 18 anos de idade é de 27,3%. Os rapazes das comunidades musulmanas por sua vez estao expostos ao trafico de criancas sob pretexto de educacao religiosa, em particular para o Senegal. Uma parte das criancas talibes sao recrutadas para fins de exploracao por intermediarios na maioria dos casos com o consentimento dos pais, sao levadas para os centros coranicos onde passam a ser exploradas atraves do trabalho agricola e da mendicidade. Estima-se que uma parte das 22,831 criancas talibes recenseadas em algumas regioes do Senegal sao guineenses. 5.5. Analise da resposta A resposta a vulnerabilidade estrutural Elementos para uma Estrategia Nacional de Proteccao Social Para Orfaos e Criancas Vulneraveis Page 84 sur 102 Nos últimos anos, a formulação, execução e avaliação da politica social do Estado guineense tem sido afectada por um i) contexto politico-institucional adverso, a instabilidade das lideranças e falta de continuidade das políticas ; ii)orcamentos insuficientes, discrepancias profundas entre os orcamentos anunciados na Lei de OGE e os desembolsos, dependencia dos doadores iii) capacidade de gestão reduzida, devido a quadros de pessoal reduzido e sem as competencias necessarias em materia de planeamento, implementação, monitoria, avaliação e coordenação das acções. Como resultado, os esforços de redução da pobreza e as acções de expansão e melhoria da qualidade das políticas sociais básicas, que constituem a base da politica social, tem sido insuficientes e falham em assegurar a melhoria das condições de vida dos segmentos mais vulneráveis da população. Nao existem mecanismos privados - como poupanças, disponibilidade de bens para a venda, - e públicos – indemnizações, subsídios, crédito - para fazer face as situacoes de risco com as quais se deparam as familias. Os únicos recursos em caso de dificuldades sao os familiares e amigos e eventualmente as obras sociais das Igrejas ou alguma forma de apoio à geração de rendimentos oferecida por ONGs. As acções de protecção social da cidadania (nao contributiva) são levadas a cabo em sua maioria pelos parceiros sociais, ONGs e missões. A actuação do poder publico nesta área ainda continua fraca. Apesar de varios esforços neste sentido, nao existe ainda uma Politica nacional de Protecçao social clara e partilhada por todos os intervenientes. A luta contra o trabalho das criancas nao esta ainda organizada e o pais necessita de uma plano nesta area. Quanto a nutricao, a resposta actual e principalmente de tipo curativo. Novos esforcos devem ser feitos para melhorar a educacao alimentar junto das comunidades e para melhorar a seguridade alimentar atraves da diversificacao dos cultivos. Quanto a proteccao juridica dos direitos da crianca, e de se ressaltar que e urgente harmonizar a legislacao nacional com os instrumentos da normativa internacional na area da crianca, acrescentando-se as propostas ja formuladas i)duas leis bem distintas para a proteccao da crianca vitima e a crianca que infringe a lei penal e ii) um diploma legal de repressao do trafico de seres humanos, principalmente de criancas. Uma accao permanente e necessaria para suscitar comportamentos e atitudes condizentes com a proteccao dos direitos da crianca a nivel comunitario, atraves de abordagens participativas. Quanto ao registo civil, uma Estrategia Nacional para o registo de nascimento poderá constituir um passo importante para a definicao dos objectivos e dos meios necessarios com vista ao reforco do registo civil no pais. A estrategia deveria privilegiar o registo sistematico a nascenca e criar condicoes para a sua sustentabilidade, reforcado por campanhas pontuais para o registo retroactivo. Para melhorar o acesso das populacoes vulneraveis a saude, para alem do necessario desenvolvimento do sistema de saude, parece importante levar a cabo um debate claro sobre as praticas actuais da politica de comparticipacao, como tambem uma revisao dos comite de gestao dos centros de saude. Para melhorar a capacidade dos agregados de Elementos para uma Estrategia Nacional de Proteccao Social Para Orfaos e Criancas Vulneraveis Page 85 sur 102 fazer face a despesas de suade, parece promissora a experiencia das mutualidades de saúde, cuja experiencia, apos avaliacao, poderia ser reforcada e multiplicada nas diversas areas do pais. No sector da educacao, e importante finalizar o Plano nacionald e Educacao para Todos, para assegurar o acesso a fundos suficientes para o sector . De fundamental importancia, priorizar as intervencoes de expansao e melhoria da oferta escolar, de formacao de dirigentes e professores, de revisao curricular e de apoio a demanda para educacao. E’ tambem fundamental capitalizar a experiencia das escolas comunitarias no que diz respeito a participacao dos pais e da comunidade na gestao e supervisao da performance dos alunos e dos professores. E fundamental tambem elaborar uma estrategia de universalizacao e perenizacao do programa de merenda escolar, que tem actualmente uma cobertura de cerca de 144,000 estudantes (PAM e AMIC) e que tem contribuido para uma reducao do abandono escolar. A resposta ao HIV/SIDA A eficacia das campanhas de informacao e prevencao parece estar limitada a zonas urbana. A cobertura dos serviços de despistagem e tratamento ainda nao e universal. Algumas regioes nao tem nenhum servico. A frequencia da parte da populacao e limitada, devido a falta de informacao no geral e ao estigma relativo a doenca. A taxa de colecta do resultado da despistagem e baixa. Sao ainda necessarios esforcos serios para aumentar as taxas de prevencao da transmissao vertical e para aumentar a taxa de cobertura em tratamento ARV. Os ARV e o tratamento das DST sao gratuitos, porem persistem problema de abastecimento que devem ser superados para evitar graves repercussoes nos pacientes com tratamentos em curso. Os serviços de saúde que identificam famílias atingidas pelo HIV/SIDA numa situação de vulnerabilidade económica não dispõem de opções de encaminhamento dos pacientes para mecanismos de apoio social. As poucas acções implementadas dizem respeito as pessoas portadoras em terapia ARV e sao apoiadas financeiramente pelo SNLS, como os Centros de Recuperação Nutricional que acolhem mães seropositivas ou a Casa Emanuel, que acolhe crianças orfãs e seropositivas. Quanto as crianças de famílias afectadas pelo HIV/SIDA, porem nao seropositivas, ha serias dificuldades em identifica-la. Alem dos esforcos neste sentido, que devem ser feitos pelos servicos de despistagem e tratamento, ha necessidade de se criar um mecanismo institucional de apoio social para assegurar que estas crianças sejam mantidas na família alargada ou colocadas numa família de substituição. Nao havendo na grande maioria dos casos conhecimento da causa da morte dos pais, os orfaos sao tratados conforme a cultura vigente. A crianca é no geral acolhida por uma tia materna ou paterna, ou por outro familiar. Os principios que regem esta colocacao sao os de parentesco (primazia ao lado materno, “a crianca é da mae”), de recursos materiais (rendimentos, espaco), de proximidade geografica. A pratica dos filhos de criacao, pode em alguns casos abrir porta para situacoes de exploracao e maus tratos, ainda assim tem sido um instrumento eficaz para assegurar cuidados e proteccao a criancas orfas. Elementos para uma Estrategia Nacional de Proteccao Social Para Orfaos e Criancas Vulneraveis Page 86 sur 102 Devido a falta de dados quanto aos numeros de criancas afectadas pelo HIV/SIDA, é difícil estimar a cobertura dos apoios recebidos pelas crianças tornadas órfãs e vulneráveis. Segundo os dados do MICSIII esta cobertura e muito baixa: 4,4% recebeu apoio médico, 1,3 % recebeu apoio psicológico ou emocional, 1,2% apoio material, 3,2% apoio à escolarização, ao passo que 92,5% não recebeu nenhum tipo de apoio. A resposta a vulnerabilidade aguda Quanto a politica de proteccao da crianca em situacao de vulnerabilidade aguda, e fundamental a elaboracao de uma lei especifica de proteccao da crianca contra toda forma de violencia e abuso e de documentos de politica que possam orientar a accao dos principais intervenientes. Apesar da responsabilidade das instituicoes governamentais neste dominio, nao ha no momento modalidades de intervencao concertada entre as autoridades policiais, judiciarias e aquelas da area social. Parece urgente portanto esclarecer os mandatos e as responsabilidades de cada um dos intervenientes para que estes possam trabalhar de uma forma integrada no tratamento dos casos particulares. Existe tambem a necessidade de se criar alguns servicos que neste momentos estao a faltar: programa de alternativas de colocacao familiar, para evitar a institucionalizacao das criancas; mecanismo anonimo de notificacao dos casos, para encorajar as denuncias de violacoes contra a crianca e seu sancionamento; abrigo provisorio, para as situacoes de crise temporanea. A luta contra as MGF deve se apoiar em accoes eficacez a nivel das comunidades, utilizando metodologias promissoras utilizadas pelas ONGs nesta area. A criminalizacao da pratica em conformidade com o protecolo de Maputo deve tambem ser introduzida. A luta contra o trafico de criancas, para alem de um diploma legal apropriado, deve se apoiar numa estrategia concertada entre as diversas partes, como aquela actualmente preconizada pela Comissao ad hoc criada recentemente sob a alcada do Ministro da Solidariedade Social. * * * A analise mostra que a situacao da crianca na Guine Bissua esta longe de ser satisfatoria. Em todos os sectores das politicas sociais, notam-se dificuldades relativamente ao financiamento e disponibilidade na administracao de recursos humanos qualificados para planejar e levar a cabo as intervencoes. Esta situacao, derivada em grande parte das dificuldades politicoinstitucionais importantes que o pais tem sofrido desde o conflito de ha dez anos, sao os factores principais responsaveis pelo fraco desempenho dos indicadores sociais. Ao mesmo tempo, novos planos de accao, novas experiencias e metodologias participativas, novas ideias sao desenvolvidas nos diferentes sectores, com resultados muitas vezes promissores. Estas experiencias devem ser capitalizadas e na medida do possivel, Elementos para uma Estrategia Nacional de Proteccao Social Para Orfaos e Criancas Vulneraveis Page 87 sur 102 perenizadas. Outras accoes devem ser reforcadas, para assegurar um impacto mais incisivo no bem estar das criancas guineenses. Novas iniciativas devem ser levadas a cabo de uma forma concertada entre os actores, para a melhor utilizacao possivel dos recursos disponiveis. Para tal, e como resultado de toda esta analise, apresenta-se a seguir uma proposta de estrategia de proteccao social para a crianca num contexto de HIV/SIDA, que propoe algumas direccoes para que a politica de proteccao social contribua eficzmente com os outros sectores em direccao de objectivos comuns. Acreditamos que as intervencoes propostas na estrategia estao ao alcance dos actores engajados com os direitos da crianca na Guine Bissau. Gostariamos ainda de fechar com as palavras que abriram este trabalho, palavras inspiradoras e convite para cada um de nos a dar o maximo: “Nous realisons ce que nous voulons realiser. Si nous ne realisons pas quelque chose, c’est parce que nous n’y avons pas applique toutes nos facultes.» Bissau, 1 de outubro de 2008 Lidia Germain e Alfredo Handem Elementos para uma Estrategia Nacional de Proteccao Social Para Orfaos e Criancas Vulneraveis Page 88 sur 102 6. PROPOSTA DE ESTRATEGIA NACIONAL DE PROTECCAO SOCIAL PARA ORFAOS E CRIANCAS VULNERAVEIS A) EIXOS ESTRATEGICOS DAS INTERVENCOES 1. Criar um ambiente geral favoravel aos grupos vulneraveis, em particular as criancas vulneraveis, qualquer seja a fonte de vulnerabilidade 2. Implementar politicas sociais basicas inclusivas e reforcar os mecanimos de apoio a demanda para o acesso das populacoes vulneraveis aos servicos basicos 3. Desenvolver accoes destinadas a incrementar os rendimentos das familias vulneraveis 4. Melhorar e ampliar as accoes de proteccao social de base 5. Reforcar os sistemas formais e informais de proteccao da crianca B) MEIOS 6. 7. 8. 9. 10. Reforcar a coordenacao Assegurar os financiamentos necessarios Melhorar a gestao Desenvolver sistemas de monitoramento Melhorar as capacidades de planeamento, execucao e controlo de todos os intervenientes Elementos para uma Estrategia Nacional de Proteccao Social Para Orfaos e Criancas Vulneraveis Page 89 sur 102 Eixo estrategico 1: Criar um ambiente geral favoravel aos grupos vulneraveis, em particular as criancas vulneraveis, qualquer seja a fonte de vulnerabilidade Objectivo geral Objectivos especificos Melhorar a proteccao juridica dos direitos da crianca, em conformidade com os diplomas legais internacionais dos quais a Guine Bissau e parte - Actualizar a revisao feita na passada legislatura das diferentes leis relativas a crianca; - Elaborar novas leis; - Melhorar o nivel de execucao das leis atraves da capacitacao dos diversos intervenientes do aparelho judiciario e administrativo; - Divulgar as leis junto dos demais actores (ONGs, media, entre outros) e da populacao em geral. Provocar mudancas de comportamentos e atitudes em todos os niveis do Estado e da populacao em geral no sentido de um maior respeito dos direitos da crianca - Elaborar uma estrategia conjunta entre os órgãos públicos, o sector não governamental, as Igrejas e os meios de comunicação social, bem como os operadores a nível comunitário para um trabalho de sensibilização em favor dos direitos das criancas em situacao de vulnerabilidade Envolver as comunidades na proteccao activa dos direitos da crianca - Elaboracao de uma abordagem de comunicacao e mobilizacao a nivel comunitario e das liderancas tradicionais para suscitar comportamentos protectivos e prevenir as principais violacoes dos direitos da crianca (Tabanca modelo, tabancas amigas da crianca) Promover uma abordagem de genero no trabalho de promoccao dos direitos dos grupos vulneraveis - Estimular a criação de redes regionais de mulheres líderes de opinião (incluindo jovens estudantes, comerciantes, agricultoras, vendeiras, professoras, funcionárias, deputadas, etc) que sirvam de activistas e animadoras junto as comunidades para a mudança de mentalidade e de defesa de direitos de mulheres e crianças (heranca, escolarizacao das raparigas, prevencao do HIV/SIDA, luta contra as MGF, melhoria dos rendimentos das mulheres, etc.) Elementos para uma Estrategia Nacional de Proteccao Social Para Orfaos e Criancas Vulneraveis Page 90 sur 102 Eixo estrategico 2: Implementar politicas sociais basicas inclusivas e reforcar os mecanimos de apoio a demanda para o acesso das populacoes vulneraveis aos servicos basicos Objectivo geral Objectivos especificos Assegurar o acesso de todas as criancas ao registo de nascimento - Priorizar e reforcar o registo sistematico a nascenca - Conduzir campanhas de registo como estrategia supletiva (complementar) do registo sistematico Apoios a demanda para contribuir a assegurar o acesso a saude e aos medicamentos - Projeto de farmacia social - Editar normas claras sobre a comparticipacao - Revitalisar o debate em torno da Initiativa de Bamako (Comite de gestao dos centros de saude); - Reforcar e expandir as actividades de educacao alimentar baseado na analise da experiencia dos Centros de Recuperacao Nutricional; - Elaborar uma estrategia de apoio a expansao das mutualidades de saude baseado na avalicao das praticas das mutualidades existentes Apoiar a expansao do sector pre-escolar - Estimular a expansao da cobertura do sector prescolar pelas associacoes comunitarias, ONGs, sector privado - Editar regras, standards e realizar a supervisao Apoios a demanda para contribuir a assegurar o acesso, a permanencia e o sucesso na educacao primaria - Documentar a experiencia das escolas comunitarias para extrair as licoes aprendidas quanto a gestao comunitaria Criar associacao de pais e encarregados de educacao em cada escola com participacao activa na gestao e no controlo das actividades educativas - Elaborar uma estrategia de universalizacao e perenizacao da merenda escolar, que privilegie o abastecimento nos mercados locais e o desenvolvimento de hortas comunitarias - Levar a cabo um estudo sobre a viabilidade de um programa de bolsas escolares para a escolarizacao secundaria das raparigas Eixo estrategico 3: Desenvolver accoes destinadas a incrementar os rendimentos das familias vulneraveis Objectivo geral Melhorar a cobertura das accoes destinadas a melhorar os rendimentos das familias, priorizando os jovens e as mulheres Objectivos especificos - Estimular a expansao e a melhoria da performance dos organismos de microcredito - Apoiar e reforcar os Bancos de Cereais Elementos para uma Estrategia Nacional de Proteccao Social Para Orfaos e Criancas Vulneraveis Page 91 sur 102 Eixo estrategico 4: Melhorar e ampliar as accoes de proteccao social de base Objectivo geral Objectivos especificos Finalizar a formulacao da politica de proteccao social com participacao ampla dos parceiros e dos doadores - Revisao e clarificacao da estrutura institucional e das instancias de coordenacao - Reforcar o papel do Estado para as funcoes de orientacao, coordenacao e supervisao das intervencoes Reformar as intervencoes publicas de proteccao social de base - Levar a cabo uma avalicao rapida visando a reforma do Fundo de solidariedade que contenha indicacoes sobre: . desenvolvimento de um conjunto de indicadores de eligibilidade aos beneficios . desenvolvimento de estrategias de identificacao dos beneficiarios . desenvolvimento de estrategia de distribuicao das alocacoes; . elaboracao de uma estrategia de diversificacao das receitas do Fundo de Solidariedade Melhorar e apoiar os mecanismos comunitarios de gestao dos riscos - Apoiar a criacao de grupos de solidariedade a nivel comunitario para favorecer o acesso conjunto a modalidades de microcredito - Apoiar o desenvolvimento de mutualidades de saude - Apoiar o desenvolvimento de caixas de poupanca e credito por categorias de trabalhadores informais nas areas urbana e por colectividades nas zonas rurais Estabelecer modalidades de apoio publico as familias atingidas pelo HIV/SIDA em parceria com os servicos de despistagem e tratamento ARV - Definir e aplicar criterios de eligibilidade coerentes/complementares com os criterios definidos para o Fundo de Solidariedade - Respeitar a politica de colocacao familiar alternativa (ver abaixo) Elementos para uma Estrategia Nacional de Proteccao Social Para Orfaos e Criancas Vulneraveis Page 92 sur 102 Eixo estrategico 5: Reforcar os sistemas formais e informais de proteccao da crianca Objectivo geral Objectivos especificos Reformar a lei existente e criar novos diplomas legais adaptados a situacao actual - Distinguir claramente na lei as finalidades e os procedimentos aplicaveis para: i) criancas privadas de meio familiar vitimas de violacoes de direitos ii) criancas autoras de infraccoes a lei penal atraves de dois diplomas legais distintos - Aprovar a Lei de repressao das MGF - Elaborar uma lei de repressao do trafico de seres humanos, em particular de criancas Criacao de um sistema nacional de recolha e tratamento das informacoes para assegurar uma base solida a fase de planeamento das intervencoes - Elaborar instrumentos de recolha de dados ao nivel de cada interveniente da proteccao da crianca - Estabelecer uma estrutura de recolha e analise dos diferentes bancos de dados (Observatorio dos direitos da crianca) Formular e divulgar amplamente a Politica nacional de proteccao da crianca, articulacao da protecao judicial com a proteccao social Criar o sistema formal de servicos de proteccao da crianca, articulando de maneira clara a resposta judiciaria com a resposta social num sistema integrado Reforcar os sistemas informais de tipo comunitario de proteccao da crianca - Explicitar os mandatos e as responsabilidade de cada um dos intervenientes da proteccao da crianca na gestao dos casos individuais e a cada etapa dos procedimentos; - Estabelecer modalidades de articulacao entre os diversos intervenientes bem como modalidades de circulacao/transmissao da informacao - Criar redes comunitarias de proteccao da crianca com accao preventiva e celulas de alerta precoce Elementos para uma Estrategia Nacional de Proteccao Social Para Orfaos e Criancas Vulneraveis Page 93 sur 102 Assegurar as criancas orfas o direito a convivencia familiar e comunitaria, inclusive para criancas com dificuldades de integracao na familia extensa (portadoras de deficiencias, com doencas cronicas, etc.) -Elaborar uma estrategia de colocacao familiar, incluindo toda a gama das alternativas a institucionalizacao (desde integracao na familia extensa ate familias tutelares) Criar os servicos necessarios para completar o sistema formal de proteccao da crianca - Criar na capital um servico anonimo de notificacao de casos de violacao dos direitos da crianca (tipo hotline ou linha verde), em colaboracao com o sector privado das telecomunicacoes - Criar uma casa de passagem para vitimas de violacoes - Celebrar acordos entre as autoridades judiciairias, os servicos sociais (autoridade administrativa) e os servicos de saude para a gratuidade dos exames medicos de criancas vitimas Elementos para uma Estrategia Nacional de Proteccao Social Para Orfaos e Criancas Vulneraveis Page 94 sur 102 B) MEIOS (accoes transversais) 1. Reforcar a coordenacao 1.1 Criar mecanimos de troca de informações e coordenação no dominio da proteccao social nos seguintes niveis: Nivel nacional: - Comissao interministerial de proteccao social - Comissao mixta governo/parceiros sociais - Redes de organismos nao governamentais com actuacao nacional Nivel regional - Comissao mixta governo/parceiros sociais 5.2 Criar mecanismos de coordenacao a nivel das cidades e dos sectores no que tange a proteccao da crianca (redes de proteccao da crianca) que reunam os intervenientes da area publica (executivo, judiciario) e da area nao governamental e comunitaria 2. Assegurar os financiamentos necessarios 2.1 Dotar as instituicoes de proteccao social de recursos humanos, financeiros e materiais condizentes com seus mandatos 3. Melhorar a gestao 3.1 Melhorar os instrumentos de gestao interna e externa (planos de trabalho, indicadores de performance, prestacao de contas publica, etc.) 3.2 Melhorar a gestao financeira 3.3 Melhorar a gestao dos recursos humanos 4. 4.1 4.2 4.3 4.4 Desenvolver sistemas de monitoramento Producao de conhecimentos quantitativos e qualitativos sobre as populacoes vulneraveis Mapeamento actualizado periodicamente dos intervenientes Sistema de acompanhamento das accoes/intervencoes Desenvovimento de actividades de avaliacao 5. Melhorar as capacidades de planeamento, execucao e controlo de todos os intervenientes 5.1 Elaborar uma politica de formacao inicial e continua, de recrutamento e planos de carreira do pessoal das diferentes instituicoes com actuacao na proteccao social Elementos para uma Estrategia Nacional de Proteccao Social Para Orfaos e Criancas Vulneraveis Page 95 sur 102 Anexo I- Lista das pessoas encontradas Aida Aminata Fadia, Direccao Servicos de direitos humanos, Ministerio do Interior Ansumane Sanha, Juiz da Vara Criminal, Tribunal regional de Bissau Celestino, Gabinete Estudos e Planeamento, MSSFLP Domingos Simoes Pereira, Secretario geral, CARITAS Edson Lopes, CADESP Eliane Rodrigues, CADESP Eugenia Castro, administradora, Casa Emanuel Fantina, Juiz de Menores, Tribunal regional de Bissau Fernando Ca, Administrador, AMIC Fernando Menezes d’Alva, Seccao de saude, UNICEF Filomena Mendes Lopes, Curadora de Menores, Tribunal regional de Bissau Finhamba, Psicologa da CARITAS Gabriel Ca, Secretario Geral, SNLS Hector, AMIC Iaia Ialo, CADESP Inacia Mendes, Directora Geral da Solidarieda Social e da Familia, MSSFLP Johannes, Associacao Social do Hospital Simao Mendes Jolijn van Hagenamm, seccao HIV/SIDA, UNICEF Jose Pedro Sambu, Juiz de Menores, Tribunal regional de Bissau Laniela Lima, Seccao Proteccao da Crianca, UNICEF Laudolino Medinas, Secretario Executivo, AMIC Magda Lopes, Secretario Executivo, SNLS Mamadou Diallo, APRODEL Maria Victoria, Secretaria Executiva da area da crianca, IMC May, Associacao Ceu e Terra Mehoundo Faton, Seccao de Saude, UNICEF Nelvina Barreto, Coordenadora Projeto CDD – Banco Mundial Dr. Nicolau, secretario regional SNLS – regiao de Bafata Noemia, Secretaria Executiva da area da mulher, IMC Oscar, Associao Ceu e Terra Urcelina Soares Gama Gomes, Presidente IMC Simao, Seccao de Monitoria e avaliacao, UNICEF Sonia Polonio, Seccao de Proteccao da Crianca, UNICEF Responsaveis/membros das seguintes instituicoes: - Casa Emanuel - Plan international - SOS crianças talibés - APRODEL - AMIC - SOS Aldeia Crianca - Centro regional de saude, Bafata Victor, AIDA Elementos para uma Estrategia Nacional de Proteccao Social Para Orfaos e Criancas Vulneraveis Page 96 sur 102 Anexo II - Bibliografia 1. 2. 3. 4. 5. 6. 7. 8. 9. 10. 11. 12. 13. 14. 15. Plano Estratégico Nacional de Luta contra Sida. 2007-2011 Relatório Nacional sobre o Desenvolvimento Humano na GB. PNUD. 2006 DENARP. Outubro 2005 Mapping of resources and Gaps for Peacebuilding in Guinea Bissau. PSBO. 2008 Background paper on the situation in Guinea-Bissau for the country specific meeting on Guinea-Bissau. 2008 Associação “Céu e Terra”. Relatório 2007 Plano Desenvolvimento Regional de Bafatá. Outubro 2007 Identificação de actividades para o programa regional norte. Alfredo Handem e Jan Conelis. SNV. 1997 Recenseamento Geral da População e Habitação. 1991. INEC. Apoio Cooperação portuguesa O Preço da Sombra. Ana Benard da Costa. Abril 2007 Estudo sobre Escolas Coránicas, Madrassa e Crianças Talibés na GB. INEP/UNICEF. 2006 MICS. 2006 Analise dos Mecanismos de Protecção Social e Assistência às Crianças na GB. Cristina Rodrigues, Alfredo Handem e Ana Benard Costa Jornal “Ultima Hora”. 1 de Agosto de 2008 Histórias de Vida sobre crianças órfãs e afectadas por HIV/SIDA Elementos para uma Estrategia Nacional de Proteccao Social Para Orfaos e Criancas Vulneraveis Page 97 sur 102 Anexo III - Lista de actividades desenvolvidas por zona geográfica para os estudos de caso Actividades Conduzida por Responsável BISSAU 1. Perfil das crianças Casa Emanuel Eunice, Fernando, Silvino 2.Perfil das crianças SOS 3. Histórias de vida – Crianças em tratamento ARV (20 histórias de vida) 4. Entrevistas com organizações que desenvolvem actividades de apoio às crianças órfãs, afectadas e vulneráveis (Céu e Terra, Cida Alternag, Hospital Simão Mendes, SNLS, Casa Emanuel) 5. Reuniões de coordenação e concertação entre inquiridores e coordenador de estudo Fátima, Cremilde, Feliciano Eunice, Fernando, Silvino, AH, Feliciano, Cremilde, Silvino, Fátima, Fernando, Eunice AH, Feliciano, Cremilde, Silvino, Fátima, Fernando, Eunice REGIÃO DE BAFATÁ Fernando, Silvino, Feliciano 1.Entrevista com responsável de centro de saúde 2.Encontro com responsável adjunto educação 3. Encontro com grupo focal mulheres em Bambadinca 4. Encontro com grupo focal mulheres em Bafatá 5. Encontro com grupo focal mulheres Contubuel 6. Encontro com Aprodel Bafatá 7.Encontro com Plan GB Bafatá 8. Encontro com ONG Guiarroz Contubuel AH, Cremilde, Eunice, Feliciano 9.Encontro com Associação Apalcof 10.Encontro com grupo focal jovens 11. Encontro grupo focal jovens Contubuel AH, Feliciano, Cremilde, Eunice Bafatá Feliciano, Silvino, Fátima Bambadinca AH, Fernando, Feliciano 12.Encontro com grupo focal velhos 13. Encontro com Régulos Bafatá AH, Feliciano Bafatá Fernando, Silvino 14. Encontro com responsável de centro de saúde 15.Encontro com Governador, Director da Polícia, Secretário Regional 16.Encontro Bispo de Bafatá 17.Encontro com Administrador 18. Encontro com representante de régulo Bambadinca AH, Feliciano Bafatá Eunice, Cremilde e Fátima Bafatá Bambadinca Bambadinca Feliciano, Fernando, Silvino AH, Silvino, Fernando, Feliciano Fernando e Silvino Bafatá AH, Cremilde, Feliciano Bambadinca Fátima, Eunice e Cremilde Bafatá Eunice e Cremilde Contubuel AH, Feliciano, Cremilde e Fátima Bafatá AH, Feliciano, Fátima, Silvino, Cremilde, Eunice, Fernando AH, Feliciano, Fernando, Cremilde, Silvino, Fátima, Eunice Elementos para uma Estrategia Nacional de Proteccao Social Para Orfaos e Criancas Vulneraveis Page 98 sur 102 19.Encontro com missão católica 20.Encontro com responsável SRLS 21.Encontro com responsável de saúde da região Contubuel Bafatá 22.Encontro com director de hospital de Bafatá 23.Entrevista na rádio Comunitária Bafatá 1. Encontro com Governador 2.encontro com grupo de mulheres vendedeiras de peixe 3.Encontro com Administrador 4.Encontro com a Aldeia SOS 5.Encontro com grupo focal mulheres 6.Encontro com a associação Profissionais de sexo 7.Encontro com régulo 8.Encontro com a associação de produtoras de Horticultura 9.entrevista da rádio Uller u Band 10.Entrevista na rádio comunitária 11.Encontro com rede de associações CONGAI 12.Encontro com responsável de SNLS 13.Encontro com responsável de saúde 14.encontro com grupo focal mulheres 15.Encontro com grupo focal jovens 16.Encontro com Projecto de Saúde de Bandim 17.Encontro com a missão Católica 18.Encontro com Régulo 19.encontro com Administrador de Bula 20.Encontro com grupo focal jovens 21.Encontro com responsável de centro de saúde 22.Encontro com missão católica Bafatá AH, Cremilde e Eunice AH, Silvino, Fernando, Eunice, Fátima e Cremilde AH, Fernando, Cremilde, Silvino, Fátima, Eunice Fernando e Silvino Bafatá AH REGIÃO DE CACHÉU Cachéu Eunice, Fernando e Silvino Cachéu Eunice, Fernando, silvino Canchungo Canchungo Fernando e Silvino Fernando, Feliciano, Fátima Canchungo Eunice, Fátima, Cremilde Canchungo Eunice, Fátima, Silvino e Fernando Canchungo Canchungo Fernando e Silvino Eunice, Fátima e Cremilde Canchungo Canchungo Silvino AH Fernando, Feliciano e Silvino Canchungo Fernando e Silvino Caió AH e Cremilde Caió Eunice e Fátima Caio Eunice, Feliciano, Fátima Caió AH, Feliciano, Eunice, Fátima e Cremilde Caió AH, Fátima, Eunice Cremilde e Feliciano Caió Bula AH e Feliciano Fernando e Silvino Bula Eunice, Fernando, Silvino, Fátima Bula AH e Feliciano Bula AH, Feliciano, Silvino, Fernando Elementos para uma Estrategia Nacional de Proteccao Social Para Orfaos e Criancas Vulneraveis Page 99 sur 102 Anexo IV - Lista de pessoas encontradas para os estudos de caso Nome 1. Sonia Polónio 2. Magda Quetá 3. Alberto Sanca 4. Nelson Carlos de Medina 5. Dra. Isabel Johanning 6. Mamadu Baldé 7.Carlos Adulai Djaló 8. Alficene Djaló 9. Mamadu Cissé 10. Dr. Nicolau Almeida 11. Aladge Embaló 12. Joaquin Sanhá 13. Carlos Manuel Lucas Pereira Organização UNICEF SNLS Conselheiro Regional do SRLS Cachéu Director da Aldeia SOS GB Casa Emanuel CIDA Alternag Governador da região de Bafatá Administrador do Sector de Bafatá Régulo de Bafatá Conselheiro regional doo SRLS Bafatá Coordenador Interino da Plan GB Bafatá Coordenador para a Área Saúde Plan GB Director Regional adjunto de Saúde de Bafatá 14. Dr. Domingos Soares 15. Amadú Keita 16.Filomeno Barbosa 17. Amadu Uri Canté 18. Saad Baldé 19.Tombom Seidi 20. António Nassalu 21. Adja Djenabu Baldé 22. Maria Jilvanda dos Santos 23. Bernardo António Sanca 24. Kiaké Djatá Delegado Regional de Saúde Chefe de Tabanca Bafatá Secretário Executivo Aprodel ONG Guiarroz. Responsavel Produção ONG Guiarroz. Alfabetização adulto ONG Guiarroz. Conselheiro APALCOF. Coordenador de Programa APALCOF. Presidente da Associação Irmã Missionária Contubuel Assessor do Rirector Regional de Educação Enfermeiro Responsavel do Centro de Saúde de Bambadinca Administrador do Sector de Bambadinca Representante do Régulo Badora Animador Comunitário. Associação AFAS Animador AGUIBEF. Bambadinca CRJ. Presidente Membro CRJ Administrador do Sector de Canchungo Associação de Mulheres Horticultoras de Canchungo Radio Uler Abaand. Director Rádio Babook.Director CONGAI. Presidente Secretário Executivo AMIC. Presidente Associação Professional de Sexo. Canchungo SOS Canchungo. Director Técnico Laboratório Projecto de Saúde de Bandim. Caió Enfermeiro Responsável do Centro Saúde. Caió Missionária do Espírito Santo. Caió Missionária do espírito Santo. Caió Régulo de Caió Homem Grande de tabanca. Caió 25. Aliu Buaró 26. Caba Sanhá 27. Malam Fati 28. Djai Seidi 29. Lassana Corubus 30. Djai Seidi 31. Raimundo Vicente Gomes 32. Avelina Sanca 33.Humberto Tavares 34. Armando Gomes 35. Dulcineia Pereira 36. Augusto Mango 37. Palmira Amelia Cabral 38. Linda Cabato 39. Demba Baldé 40. Joaquim da Silva 41. Augusto Lopes 42. Irmã Margarida 43. Irmã Paula 44. Régulo Quintino 45. Luís Gomes Elementos para uma Estrategia Nacional de Proteccao Social Para Orfaos e Criancas Vulneraveis Page 100 sur 102 46. Roberto Honorio Tamba 47. José Vaz 48. Irmã Elda 49. Irmã Helena 50. Dom Pedro Zilli 51. Celine Marques 52. Serifo Embaló 53. Jecelino Secretyário de Estado de Sector de Bula Enfermeiro Responsável do Centro de Saú de Bula Missionária da Missão Católica de Bula Missionária da Missão Católica de Bula Bispo de Bafaté Voluntária da diocese de Bafatá Coordenador Casa das Mães. Bafatá Sida Service Elementos para uma Estrategia Nacional de Proteccao Social Para Orfaos e Criancas Vulneraveis Page 101 sur 102 Anexo V - Inquiridores para os estudos de caso NOME Silvino N´Dafa Braba Eunice Moreira Instituição Instituto de Mulher e Criança Instituto de Mulher e Criança Filiciano Mendes Fernanado M. Tchuda Maria de Fátima Bolama Ministério da Solidariedade Social, Familia e Luta contra a Pobreza MSSFLP MSSFLP Cremilde Correia MSSFLP Função Assessor para a Área Social Secretaria Executiva para Assuntos da Mulher Director de Servuços de Estudos e planificação Director de Serviços de Protecção Chefe de Departamento de Atendimento e Registo de Utentes Chefe de Departamento de Apoio a Familia Elementos para uma Estrategia Nacional de Proteccao Social Para Orfaos e Criancas Vulneraveis Page 102 sur 102