Avaliação Hemodinâmica da Hipertensão Arterial Pulmonar

Transcrição

Avaliação Hemodinâmica da Hipertensão Arterial Pulmonar
Rev Bras Cardiol Invas 2005; 13(3): 231-239.
Pedra CAC, et al. Avaliação Hemodinâmica da Hipertensão Arterial Pulmonar Secundária a Cardiopatias Congênitas. Rev Bras
Cardiol Invas 2005; 13(3): 231-239.
Artigo de Revisão
Avaliação Hemodinâmica da Hipertensão Arterial
Pulmonar Secundária a Cardiopatias Congênitas
Carlos A. C. Pedra1, Juliana Neves1, S. Raul Arrieta1, Justo Santiago1, Daniel Arnoni1,
Fabio Figueiredo1, Sérgio L. N. Braga1, César A. Esteves1, Valmir F. Fontes1
RESUMO
SUMMARY
A hipertensão arterial pulmonar (HAP) secundária a cardiopatias congênitas é uma enfermidade comum em nosso
meio devido a referências tardias para tratamento. Nos
pacientes com HAP, a avaliação hemodinâmica é um método
importante para definir a reversibilidade do quadro e a
indicação operatória. Neste artigo, revisamos os principais
aspectos sobre a avaliação hemodinâmica da HAP na sala
de cateterismo, discutindo conceitos importantes para o
cardiologista (pediátrico e de adultos), intensivista, ecocardiografista, cirurgião cardíaco e, principalmente, para o cardiologista invasivo (hemodinamicista).
Hemodynamic Assessment of Pulmonary Arterial
Hypertension (PAH) Secondary to Congenital
Heart Diseases
Pulmonary arterial hypertension (PAH) secondary to congenital heart disease is a common condition in our environment
due to late referrals for treatment. In patients with PAH, the
hemodynamic assessment is an important tool to define the
reversibility of the disease and suitability for surgery. In this
paper, we review major aspects of PAH hemodynamic
assessment in the catheterization laboratory, discussing important concepts for the cardiologist (pediatric and adult),
intensivist, echocardiographer, cardiac surgeon and, mainly,
for the invasive cardiologist.
DESCRITORES: Hipertensão pulmonar. Cardiopatias congênitas. Óxido nítrico.
DESCRIPTORS: Pulmonary hypertension. Heart defects,
congenital. Nitric oxide.
A
lidade do atendimento médico, são comuns as referências tardias, gerando dúvidas em relação à indicação de fechamento do defeito. Por isto, é fundamental
que o cardiologista pediátrico, o ecocardiografista, o
intensivista, o cirurgião cardíaco e, principalmente, o
hemodinamicista tenham um mínimo de conhecimento para a correta interpretação da avaliação
hemodinâmica da HAP na sala de cateterismo.
hipertensão arterial pulmonar (HAP) é uma condição definida pela presença de pressão arterial
pulmonar média > 25 mmHg em repouso ou
> 30 mmHg em exercício1,2. Tais valores são aplicados
principalmente na população adulta e com HAP idiopática. Independente de sua etiologia, a HAP caracteriza-se por aumento progressivo da resistência vascular
pulmonar (RVP), culminando em falência ventricular
direita e óbito se não for tratada precoce e adequadamente. Nos casos de HAP associada às cardiopatias
congênitas, a correção oportuna do defeito, invariavelmente, previne o desenvolvimento das alterações histológicas graves e supostamente irreversíveis que caracterizam a doença vascular pulmonar vaso-oclusiva.
Entretanto, como vivemos em um país de dimensões
continentais e com grande heterogeneidade na qua-
1
Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia, São Paulo, SP.
Correspondência: Dr. Carlos A. C. Pedra. Instituto Dante Pazzanese
de Cardiologia. Av. Dr. Dante Pazzanese, 500 - São Paulo, SP.
CEP 04012-180 - Tel.: (11) 5085-4114 - Fax: (11) 5085-4196
E-mail: [email protected]
Recebido: 11/05/2006 • Aceito em: 15/05/2006
O objetivo deste artigo é revisar, sucintamente, os
principais aspectos do estudo hemodinâmico nesta
condição. Não serão abordados a classificação da
HAP e seus aspectos clínicos, fisiopatológicos e terapêuticos. Apesar do diagnóstico da HAP poder ser realizado de forma não-invasiva, o cateterismo é geralmente
empregado para avaliação mais precisa dos níveis
pressóricos na artéria pulmonar (AP) e para caracterização do débito (ou índice) cardíaco sistêmico (Qp) e
pulmonar (Qs) e das resistências pulmonar e sistêmica
(RVS). Além disto, realiza-se o teste com um vasodilatador pulmonar seletivo, que tem grande importância
para se estimar o grau de reatividade da vasculatura
pulmonar. Tais dados têm implicações prognósticas e
terapêuticas, como veremos adiante.
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INDICAÇÕES DO ESTUDO HEMODINÂMICO
O cateterismo está indicado toda vez que houver
dúvidas em relação à reversibilidade do quadro de
HAP e à indicação operatória nos pacientes com cardiopatias congênitas, geralmente com hiperfluxo pulmonar. Tais indicações devem ser sempre individualizadas, podendo variar significativamente em diferentes
instituições. Como hoje em dia operam-se os pacientes
com cardiopatias congênitas em idade mais precoce
baseando-se apenas nos dados obtidos pela ecocardiografia, as indicações de cateterismo vêm se tornando mais restritas. Para exemplificar esta situação, devemos lembrar que em pacientes de baixa faixa etária
(< 6-9 meses), com quadro clínico florido de insuficiência cardíaca (ICC) e com grandes comunicações nãorestritivas entre os ventrículos (ex: comunicação interventricular e defeito do septo atrioventricular em sua forma
total) ou entre as grandes artérias (ex: persistência do
canal arterial), a pressão sistólica na artéria pulmonar
é sempre muito semelhante à pressão arterial sistêmica
(princípio físico dos vasos comunicantes). Isto pode
ser evidenciado pela ecocardiografia, utilizando-se o
Doppler e a equação de Bernoulli para se estimar as
diferenças pressóricas entre as câmaras cardíacas. Apesar
do diagnóstico bem estabelecido de HAP, estes pacientes
são raramente submetidos a cateterismo cardíaco antes
da correção cirúrgica do defeito.
CONCEITOS HEMODINÂMICOS BÁSICOS3-6
Os cálculos do débito (ou índice cardíaco, quando
indexado para a superfície corpórea; o que é mais
apropriado para crianças) e das RVP e RVS podem ser
realizados de duas formas. Na primeira, utiliza-se o
cateter de Swan-Ganz para obtenção das pressões e
do débito cardíaco por termodiluição. Esta técnica é
mais aplicada à beira do leito em unidades de terapia
intensiva, em adultos, possuindo algumas limitações
em crianças devido à presença de shunts intra ou
extracardíacos e/ou ao perfil dos cateteres. No laboratório de cateterismo, o método empregado para os
cálculos é o de Fick7, o qual leva em conta o consumo
de oxigênio (VO2) do paciente e a diferença do conteúdo arterial de oxigênio nos dois circuitos: sistêmico
e pulmonar. As fórmulas e conceitos que se seguem
serão expostos de forma resumida. O leitor que quiser
aprofundamento e detalhamento é encorajado a procurar leitura específica.
A pressão arterial na AP é definida pela seguinte
equação:
Pressão = Fluxo X Resistência. Portanto, a HAP
pode ser causada por aumento excessivo do fluxo
pulmonar e/ou elevação da resistência.
O conteúdo arterial de oxigênio em ml/100 ml de
sangue é dado pela seguinte fórmula: CaO2 = O2 ligado à hemoglobina + O2 dissolvido no plasma, ou seja:
CaO2 = (1,36 X Hb X SatO2) + (0,003 X PaO2). Em
situações habituais, nas quais os pacientes estão em
ar ambiente (ou FiO2 < 30 - 40%), o valor do O2
dissolvido no plasma é irrisório e, por isto, é comumente
desprezado nos cálculos basais no laboratório de hemodinâmica.
O cálculo do índice cardíaco (IC) é realizado pela
seguinte fórmula:
IC = VO2/ diferença artério-venosa do conteúdo
arterial de O2.
Apesar dos valores do conteúdo arterial de O2
serem expressos em ml por 100 ml de sangue, o IC
é expresso em litros por minuto. Portanto, deve-se
multiplicar o denominador por 10. Em situações onde
não há curto-circuito intracardíaco, considera-se saturação venosa mista aquela obtida na AP. Com isto, teríamos a seguinte fórmula para o cálculo do índice cardíaco:
IC = VO2 (em litros/min/m2)/ (Sat aorta – Sat AP) X
(Hb) X (1,36) X (10).
Entretanto, devido à presença de shunts intra ou
extracardíacos em pacientes com cardiopatias congênitas, considera-se a saturação venosa mista aquela obtida
na veia cava superior (VCS)8. Com isto, pode-se calcular o índice pulmonar e o sistêmico, segundo as equações apresentadas a seguir:
Índice pulmonar, também chamado de fluxo pulmonar ou Qp:
Qp = VO2/ (Sat VPu – Sat AP) X (Hb) X (1,36) X (10)
Índice sistêmico, também chamado de fluxo sistêmico ou Qs:
Qs = VO2/ (Sat Ao – Sat VCS) X (Hb) X (1,36) X (10)
O cálculo das resistências é dado pelas seguintes
fórmulas:
RVS = Pressão média Ao – Pressão média no AD/ Qs
RVP = Pressão média na AP – pressão média do
capilar pulmonar ou pressão média no átrio esquerdo
(se não houver estenose de veia pulmonar) ou pressão
diastólica final do ventrículo esquerdo (se não houver
estenose mitral ou de veia pulmonar)/índice pulmonar
(Qp). O numerador desta equação (APm – PCPm) é
também chamado de gradiente transpulmonar.
A unidade de resistência mais utilizada em cardiologia pediátrica é a unidade Wood (mmHg X min/l). Se
multiplicarmos a unidade Wood por 80, obteremos a
unidade mais utilizada em adultos, ou seja: dyne seg
cm -5. É importante enfatizar que, nas fórmulas acima,
tanto o Qp quanto o Qs foram indexados para superfície corpórea, já que esta variável sofre uma grande
oscilação em crianças. Portanto, os cálculos das resistências já incluem esta indexação, tão importante para
comparações.
Os valores normais dos parâmetros hemodinâmicos
encontrados em crianças estão expostos na Tabela 1.
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TABELA 1
Valores normais do consumo de oxigênio, índice
cardíaco, resistências vasculares, pressões e
saturações nas câmaras cardíacas em crianças
Consumo de oxigênio (VO2)
(ml O2/min/m2)
5-15 anos
110-160
0-5 anos
140-200
Índice cardíaco (l/min/m2)
4-5
Qp/Qs
1
RVS (U Wood X m- 2) (indexada)
9-20
RVP (U Word X m -2) (indexada)
<2
RVP/RVS
< 0,15
Pressões (mmHg)
ADm
3 (0-10)
VD
24/5 (20/2 - 30/10)
TP
24/10 (20/8 - 30/15)
TPm
13 (10-20)
Capilar m
8 (5-12)
VE
96/5 (60/4 - 120/12)
Aorta
96/60 (60/25 - 120/80)
Saturações (%)
VCS
74 (67-83)
AD
75 (65-87)
VD
75 (67-84)
TP
75 (67-84)
Ao
95 (93-98)
AE
95 (93-98)
INTERPRETAÇÃO DOS RESULTADOS
Classicamente, os pacientes com relações Qp/Qs
≥ 2, RVP/RVS ≤ 0,4-0,5 aliados à RVP ≤ 5 U Wood X
m-2 são considerados como portadores de HAP reversível e, portanto, operáveis3. Aqueles com Qp/Qs ≤ 1,5,
RVP/RVS ≥ 0,7 aliados à RVP ≥ 8-10 U Wood X m-2
apresentam mortalidade cirúrgica muito elevada e, geralmente, não evoluem com queda da pressão pulmonar e da RVP, após a oclusão do defeito3. Daí o termo
hipertensão pulmonar “irreversível”. Estes pacientes
são portadores de lesão histológica pulmonar de grau
avançado, com obstrução do lúmen arterial9 e relação
alvéolo-arterial alta nos vasos mais periféricos10, caracterizando doença vascular pulmonar vaso-oclusiva.
Aqueles portadores de valores intermediários entre estes
dois extremos são considerados duvidosos, tornandose candidatos à realização de biópsia pulmonar para
definição da estratégia terapêutica.
É importante lembrar que estes números definidos
acima foram baseados em estudos da década de 60 e
70, realizados em diferentes centros, com metodologias
variadas, em cardiopatias distintas, com protocolos
diversos de sedação e tempo de cateterismo e uso de
parâmetros não-uniformes para definição de “irreversi-
bilidade”11-15. Além disto, as técnicas de circulação
extracorpórea e ventilação mecânica, manejo do baixo
débito cardíaco e da HAP na unidade de terapia intensiva eram muito mais limitadas naquela época. Por
isto, estudos mais recentes parecem apontar para melhores prognósticos, mesmo nos pacientes com parâmetros hemodinâmicos menos favoráveis. Em um estudo
do final da década de 8016, pacientes com RVP < 7 U
Wood (indexada) após uso de vasodilatador (isoproterenol) apresentaram boa evolução operatória, independente dos parâmetros hemodinâmicos basais. Nesta
série, o encontro da relação RVP/RVS > 0,75 foi indicativo de RVP muito elevada, estando associado à
evolução operatória desfavorável. Em outro estudo mais
recente17, resultados cirúrgicos encorajadores de longo
prazo foram relatados em pacientes operados de comunicação interventricular não-restritiva, com RVP elevada (> 6 U Wood indexada). Nesta série, a mediana de
idade dos pacientes foi de 7,5 anos, a RVP foi 7,6 ±
1,8 U Wood, o Qp/Qs foi 1,9 ± 0,5 e a relação RVP/
RVS foi 0,41 ± 0,12. Quase 80% dos pacientes apresentaram desfechos favoráveis em um seguimento médio
de 8,7 anos, apresentando-se assintomáticos e com
redução significativa das pressões na artéria pulmonar.
Conceitualmente, devemos diferenciar irreversibilidade da HAP e operabilidade do paciente. A irreversibilidade da HAP é definida pela presença de lesão
histológica pulmonar de grau avançado, com obstrução
do lúmen arterial9 e relação alvéolo-arterial alta nos
vasos mais periféricos10, caracterizando a tão chamada
doença vascular pulmonar vaso-oclusiva. Tais características são, geralmente, encontradas em pacientes com
grau ≥ III na classificação de Heath-Edwards9. Nestes
pacientes, a oclusão do defeito cardíaco não interferiria na evolução do quadro pulmonar em longo prazo.
Entretanto, na prática, observa-se que muitos destes
pacientes com lesões de grau avançado ainda apresentam fluxo pulmonar excessivo, com relação Qp/Qs
> 2 e relação RVP/RVS < 0,5. Nestas condições, o
paciente ainda se beneficiaria agudamente da oclusão
do defeito, com melhora dos sintomas pulmonares e
da insuficiência cardíaca. Nestes casos duvidosos (geralmente com grau III na classificação de Heath-Edwards),
pode-se optar pela indicação cirúrgica, deixando um
pequeno defeito residual (em nível atrial, ventricular
ou arterial) para descompressão do VD em situações
de crises de HP no pós-operatório imediato e durante
o seguimento, se realmente houver progressão dos
níveis da RVP.
Além da análise histológica qualitativa de Heath e
Edwards9, a abordagem quantitativa ou morfométrica
da biópsia pulmonar, proposta por Rabinovitch et al.10,
e a idade do paciente no momento da correção também
apresentaram boa correlação com a evolução hemodinâmica pós-operatória, em um estudo clássico publicado
pelo grupo de Boston18. Pacientes operados com menos
de 9 meses apresentaram ótima evolução, independente
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do padrão histológico inicial, com normalização da
PAPm e/ou da RVP medidos 1 ano após a cirurgia.
Entre aqueles operados com idade > 9 meses, houve
normalização dos dados hemodinâmicos nos portadores de graus I de Heath e Edwards associados a
graus A e B de Rabinovitch. Entretanto, observou-se
manutenção dos dados hemodinâmicos em patamares
elevados em metade dos portadores de grau B de
Rabinovitch associado a grau II de Heath e Edwards
ou naqueles com grau C de Rabinovitch associado a
grau I ou II de Heath e Edwards. A PAPm e a RVP
mantiveram-se elevadas em todos os pacientes com
grau C de Rabinovitch operados após os 2 anos de
idade, com níveis ainda mais altos naqueles associados
a grau III de Heath e Edwards.
É importante lembrar de alguns raros pacientes
com defeitos amplos, não-restritivos (geralmente portadores de CIVs), que jamais cursam com sinais de ICC
devido à persistência do padrão fetal de HAP. Estes
pacientes comportam-se como àqueles que têm hipertensão pulmonar “irreversível”, com Qp/Qs ≤ 1,5, RVP/
RVS ≥ 0,7 e RVP ≥ 8-10 U Wood X m-2. Também são
portadores de lesão histológica pulmonar de grau avançado, com obstrução do lúmen arterial e relação alvéoloarterial alta nos vasos mais periféricos, caracterizando
doença vascular pulmonar vaso-oclusiva. A correção
cirúrgica do defeito está contra-indicada nestes casos.
Baseado nos dados expostos acima, algumas questões ainda permeiam a prática clínica: Pacientes com
lesões histológicas com grau ≥ III de Heath e Edwards,
mas com dados hemodinâmicos favoráveis, teriam evolução inexorável para a Síndrome de Eisenmeiger após
a oclusão do defeito, na qual a RVP seria igual ou
maior que a RVS, causando cianose progressiva? Mesmo
que o quadro histológico não regrida após a correção,
não seria possível uma estabilização do processo com
conseqüente manutenção dos níveis pressóricos na
artéria pulmonar em patamares aceitáveis, compatíveis
com uma boa qualidade de vida e longevidade? Com
o arsenal terapêutico disponível hoje em dia para tratamento da hipertensão pulmonar, tanto na unidade
de terapia intensiva quanto em nível ambulatorial, não
valeria a pena abordar também estes casos limítrofes,
deixando alguma “válvula de escape” para descompressão do VD? Pacientes com padrões hemodinâmicos
e angiográficos semelhantes e limítrofes associados a
grau III na classificação de Heath e Edwards, mas com
idades diferentes (ex: 1 ano e 10 anos), teriam prognóstico semelhante? Fazendo esta questão de outra
forma: não seria possível que o paciente de menor
idade apresentasse maior capacidade de remodelamento
vascular após a oclusão do defeito, evoluindo de forma
mais satisfatória? Esta e outras questões ainda carecem
de respostas mais definitivas, constituindo-se em ótimos
campos para pesquisa clínica futura. Outro aspecto
que merece comentários é que o padrão histológico
obtido em um espécime isolado do parênquima pulmo-
nar, teoricamente, pode não refletir o que acontece no
restante do pulmão; ou seja, estas alterações não seriam
homogêneas e comuns a todos segmentos pulmonares.
Considerando as diferenças normais de ventilação e
perfusão dos diferentes segmentos pulmonares (também
chamadas de zonas de West), tal hipótese não é de
todo descabida. Entretanto, do ponto de vista prático,
tendemos a considerar que as alterações histológicas
sejam homogêneas e representativas de todo o pulmão.
TESTE DA VASODILATAÇÃO PULMONAR
O teste da vasodilatação pulmonar em pacientes
com cardiopatias congênitas foi por muito tempo realizado com drogas vasodilatadoras não seletivas, como
a tolazolina, o nitroprussiato e o isoproterenol3. Além
de seus efeitos sistêmicos indesejáveis causando hipotensão arterial, estas drogas podiam levar à dilatação
vascular pulmonar em áreas mal ventiladas, acarretando desequilíbrios entre a perfusão e a ventilação pulmonar, com conseqüente hipoxemia. Por outro lado,
é sabido que os vasodilatadores pulmonares seletivos
evitam os efeitos colaterais sistêmicos. Além disto, os
agentes inalatórios, como o óxido nítrico (NO), atingem
os locais bem ventilados, minimizando a ocorrência
de hipoxemia secundária a desequilíbrios entre a ventilação e perfusão pulmonar.
Muitos centros utilizaram apenas o oxigênio como
droga vasodilatadora pulmonar3. Entretanto, alguns autores questionaram a validade desta prática. Para uns, o
oxigênio parece reduzir a pressão na AP apenas nos
pacientes que já apresentam diminuição da saturação
nas veias pulmonares, ou seja: naqueles que apresentam um shunt pulmonar (ex: atelectasias) e não-cardíaco5.
Para outros, a resposta hemodinâmica ao oxigênio
não tem valor preditivo para identificar os pacientes
de alto risco cirúrgico ou aqueles que apresentarão
queda da RVP após a oclusão do defeito19. Talvez, os
pacientes que vivem em altitudes elevadas sejam mais
sensíveis à administração deste agente e apresentem
quedas mais significativas da pressão na AP.
A disponibilidade do uso clínico do NO mudou
a forma de realização do teste de vasodilatação pulmonar, em pacientes com cardiopatias congênitas. Vários
estudos demonstraram que o uso do NO nestes pacientes reduz as pressões na artéria pulmonar e a RVP e
aumenta a relação Qp/Qs, principalmente quando administrado em conjunto com altas concentrações de oxigênio20-23. Apesar das concentrações de NO utilizadas
na literatura serem muito variadas, parece que o uso
de concentrações mais elevadas (80 ppm), por um
período de exposição limitado (15-30 minutos), produz
efeitos de vasodilatação seletiva mais significativos, sem
afetar a circulação sistêmica ou produzir efeitos colaterais
ou aumentar a concentração de metahemoglobina20-23.
Recentemente, demonstrou-se que o iloprost inalatório
apresenta efeitos semelhantes ao NO em pacientes com
HAP secundária a cardiopatias congênitas24.
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Na prática, o teste da vasodilatação pulmonar em
pacientes com cardiopatias congênitas se assemelha
àquele empregado para avaliação da HAP idiopática.
Entretanto, como estes pacientes geralmente estão intubados, sob ventilação mecânica, utiliza-se uma traquéia
de cerca de 30 cm entre o ventilador e o paciente. O
NO é administrado na porção proximal da traquéia
(distante do tubo endotraqueal) e sua concentração é
mensurada na porção distal (próxima ao paciente).
Após obtenção dos dados em condições basais, inicia-se a administração de NO em concentrações de
10-80 ppm, por cerca de 10-20 minutos, mantendose a FiO2 < 30-40%. Devido à presença da traquéia,
deve-se ficar atento para que não haja um incremento
excessivo do espaço morto ventilatório, com conseqüente
aumento do pCO2 e piora dos níveis pressóricos na
AP. Para evitar tal ocorrência, muitas vezes, é necessário aumentar o volume corrente no ventilador. Obtidos
novamente os dados nestas condições, aumenta-se a
FiO2 para > 80%, por mais cerca de 10-20 minutos.
Novos dados são então coletados. Em muitos centros,
o NO é administrado somente com altas concentrações
de oxigênio (FiO2 > 80%). É fundamental lembrar que
nestas situações com FiO2 elevada, a paO2 na veia
pulmonar e na aorta podem aumentar significativamente.
Portanto, nestas condições, o oxigênio dissolvido no
plasma (0,003 X PaO2) deverá ser incluído nos cálculos do conteúdo arterial de oxigênio, segundo as fórmulas descritas acima.
em um ramo intermédio do lobo médio ou inferior.
Cerca de 3-8 ml de contraste são injetados com o
balão insuflado, o que leva à opacificação da rede
arterial. O balão é, então, esvaziado, o que permite a
lavagem do contraste que, assim, opacifica a rede
capilar e a venosa. A injeção deve ser realizada, de
preferência, nas bases de ambos os pulmões. O padrão
normal é caracterizado por uma rede arterial com
vasos de paredes regulares, com redução progressiva
do seu diâmetro e que atingem a periferia pulmonar
(Figura 1). A fase capilar é homogênea e há rápido
retorno de contrate para o AE. Nos pacientes com
HAP associada à doença pulmonar vaso-oclusiva em
fase terminal, a fase arterial é caracterizada pela presença
de vasos com paredes irregulares, apresentando tortuosidades e interrupções abruptas proximais, com redução inequívoca do número dos vasos que atingem a
periferia (Figura 2). Este aspecto, muitas vezes, é referido como em “árvore de ameixeira”. Muitas vezes, a
tortuosidade vascular é tão intensa que apresenta aspecto
em “saca-rolha”. A fase capilar é heterogênea, com
áreas pulmonares que permanecem “borradas”, devido
à retenção distal do contraste, que demora significativamente para voltar ao AE. Entre estes dois extremos, há
casos com aspecto intermediário, o que dificulta o diagnóstico angiográfico preciso do grau evolutivo da HAP.
Apesar de ter um caráter subjetivo em sua apreciação, a angiografia capilar pulmonar apresenta uma
boa correlação com os dados hemodinâmicos25-27. For-
Considera-se um teste positivo aquele no qual
houve uma queda significativa na pressão na AP e/ou
na RVP de pelo menos 20%, sem modificação ou com
incremento do índice cardíaco (Qs). Em nossa experiência, no Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia (dados não publicados), temos a impressão que um teste
de vasodilatação positivo só ocorra em alguns poucos
pacientes que já apresentam dados basais favoráveis,
ou seja, com Qp/Qs > 2, RVP/RVS < 0,5 e RVP < 5 U
Wood X m-2. Portanto, o valor do teste de vasodilatação
para diferenciar os pacientes com HAP fixa daqueles
com HAP reversível seria questionável. Estes pacientes, provavelmente, não apresentam uma redução do
lúmen arterial decorrente de proliferação intimal, mas
sim uma hipertrofia da camada média e, por isto,
seriam suscetíveis aos efeitos relaxantes do NO. Por
isto, temos a impressão que estes pacientes portadores
de HAP grave, mas com cálculos basais favoráveis e
que demonstraram uma resposta positiva ao teste com
NO, podem se beneficiar da administração de vasodilatadores pulmonares seletivos (NO, sildenafil) para
o manejo das crises de HAP, no período peri-operatório, reduzindo os riscos cirúrgicos ou intervencionistas.
ANGIOGRAFIA CAPILAR PULMONAR
A angiografia capilar pulmonar também é utilizada
na avaliação da gravidade da HAP25,26. Um cateter
balonado de furo terminal é avançado à AP e impactado
Figura 1 - Injeção de contraste na rede arterial pulmonar em espécime post-mortem. Nota-se padrão normal de ramificação pulmonar,
com as artérias apresentando redução progressiva de calibre até a
periferia, com rede periférica abundante.
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Figura 2 - Injeção de contraste por cateter balonado impactado em artéria pulmonar distal, em um paciente de 2 anos de idade, com defeito
do septo atrioventricular em sua forma completa. No painel esquerdo, durante a fase arterial, nota-se tortuosidade intensa das artérias pulmonares
mais distais, com várias amputações abruptas. A circulação periférica é pobre. No painel direito, já na transição entre a fase capilar e a levofase,
nota-se heterogeneidade na retenção de contraste nos capilares, com retorno retardado ao átrio esquerdo. O Qp/Qs deste paciente foi 1,3, a
RVP foi 10,5 U Wood (indexada) e a RVP/RVS foi 0,8. A biópsia revelou grau IV de Heath-Edwards. Ficou mantido em evolução clínica.
mas mais objetivas de avaliação, que incluíram a contagem do número dos vasos periféricos, foram propostas na literatura com boa correlação clínica26.
ULTRA-SOM INTRAVASCULAR
Em um estudo recente27, o ultra-som intravascular
revelou espessamento das camadas íntima e média da
parede das artérias pulmonares de 2,5 a 5 mm e
redução da pulsatilidade destes vasos nos pacientes
com HAP, quando comparado a controles. Tais achados tiveram boa correlação com os padrões encontrados na angiografia capilar, mas não apresentaram boa
correlação com os padrões de resposta do teste de
vasoreatividade ao NO e ao oxigênio. O papel desta
modalidade diagnóstica na estratificação dos pacientes
com HAP ainda está para ser estabelecido, principalmente em relação à sua capacidade de substituir a
biópsia pulmonar.
LIMITAÇÕES MAIS COMUNS NA OBTENÇÃO
DOS DADOS E INTERPRETAÇÃO DOS
RESULTADOS3-6
1. Os cálculos das resistência são matematicamente
derivados da lei de Poiseulle, definidas pela equação:
R = 8 n l/p R4, onde n é a constante da viscosidade
do fluído, l é o comprimento do sistema e R é o raio
do vaso. Entretanto, esta lei assume que a viscosidade
do fluído, o raio do vaso e o comprimento do sistema
sejam constantes; que as pressões e o fluxo sejam não
pulsáteis e que a quantidade de fluxo que entra e sai
do sistema seja igual. Na prática, nenhuma destas
prerrogativas ocorre no sistema cardiovascular. Portanto, o que se faz é obter uma mera estimativa da
RVP. Pela equação, percebe-se que o principal determinante da resistência ao fluxo é o raio do vaso em
questão. Portanto, em última análise, poderíamos dizer
que o cálculo da RVP estima o grau de obstrução do
lúmen vascular, acarretando redução de seu raio15.
2. Condições gerais: Geralmente, as crianças com
cardiopatias congênitas e HAP são submetidas ao estudo
hemodinâmico sob anestesia geral ou sedação profunda.
É necessário que haja uma ventilação adequada para
não ocorrer hipercapnia com conseqüente vasoconstrição e hipertensão pulmonar. O controle da temperatura também é fundamental para que não ocorra acidose
metabólica secundária à hipotermia ou aumento do
consumo de oxigênio devido à hipertermia. Além disto,
os níveis de Hb e Ht devem estar adequados para a
cardiopatia de base, acianogênica ou cianogênica.
3. O consumo de O2 (VO2) pode ser medido com
o paciente acordado, em ventilação espontânea, utilizando-se aparelhos especiais, geralmente não disponíveis nos laboratórios de cateterismo no Brasil. Na prática,
o que se faz é assumir o VO2 baseado em valores já
anteriormente estabelecidos para sexo, diferentes idades
e freqüências cardíacas28-30. Tais valores, apesar de
estarem facilmente disponíveis em livros textos, apresentam grande variação de seu desvio-padrão e podem
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não refletir os valores reais referentes àquele paciente
específico estudado e induzir a possíveis erros de
interpretação. Além disto, o paciente que está anestesiado ou sedado apresenta redução dos valores de
VO2, quando comparados aos níveis normais.
4. A mensuração da saturação nas diferentes câmaras cardíacas deve ser preferencialmente realizada por
aparelhos de espectrofotometria, que fazem uma leitura direta da saturação da hemoglobina, baseada em
níveis de absorção de luz. Os níveis de saturação
derivados da gasometria são menos acurados, já que
sua medida é indireta, feita por um normograma dependente do pH e da paO2.
5. Pacientes que apresentam baixo débito cardíaco
em condições basais (saturação venosa mista na VCS
baixa, com uma diferença artério-venosa na saturação
de mais de 30%) devem ser investigados para tal.
Podem estar submedicados para ICC, hipovolêmicos,
acidóticos, mal ventilados, tamponados, entre outros.
Nesta situação, o método de Fick torna-se muito sensível para detecção de shunts intracardíacos, o que pode
levar a uma superestimativa do salto oximétrico entre
VCS e a AP e, conseqüentemente, do Qp, com redução do cálculo da RVP. Por outro lado, pacientes com
diferença artério-venosa de saturação muito pequena
podem estar recebendo oxigênio em altas concentrações inadvertidamente ou, mais raramente, estar em
vigência de uma síndrome de resposta inflamatória
sistêmica, principalmente decorrente de processo infeccioso. Nesta condição, a detecção de shunts intracardíacos pelo método de Fick fica prejudicada.
6. A presença de shunts obrigatórios, definidos
por aqueles que ocorrem independente dos níveis de
RVP ou RVS, pode falsear o cálculo do Qp e do Qs
e, conseqüentemente, da RVP e RVS. Um exemplo
clássico desta situação é o paciente com defeito do
septo atrioventricular (DSAV) em sua forma total, que
apresenta shunt obrigatório do ventrículo esquerdo
para o átrio direito pelo cleft da valva atrioventricular
única. Mesmo na presença de hipertensão pulmonar
grave com aspecto histológico irreversível, ocorrerá
sempre um incremento da saturação de O2 da VCS
para o AD, com conseqüente contaminação da APu.
7. A presença de dupla fonte de fluxo pulmonar
dificulta a correta estimativa dos níveis de saturação
na artéria pulmonar. Exemplos clássicos desta situação
são a persistência do canal arterial, a presença de
colaterais sistêmico-pulmonares e a anastomose de
Glenn em pacientes que permanecem com a via de
saída pulmonar do coração univentricular aberta. Nesta
situação, faz-se uma média entre os valores de saturação obtidos nas 2 artérias pulmonares e no TP.
8. As estenoses unilaterais das artérias pulmonares
determinam maior resistência arterial no pulmão acometido, desviando o fluxo para o pulmão contra-lateral.
Nestas situações, torna-se impossível o cálculo da RVP
relativo a ambos os pulmões.
9. A coartação da aorta também determina resistências diferentes nos vasos da porção superior e inferior
do corpo. Portanto, a RVS global não poderá ser calculada.
10. Em pacientes com RVP elevada e shunt direitoesquerdo pelo canal arterial, o débito sistêmico para
a porção inferior do corpo é maior que para a parte
superior do corpo, não havendo como realizar de
forma precisa o cálculo do Qs e, conseqüentemente,
da RVS.
11. Em pacientes com insuficiência pulmonar grave
e redução significativa da pressão diastólica da artéria
pulmonar e, conseqüentemente, da pressão média, o
cálculo da RVP fica prejudicado.
EXEMPLOS DE EVOLUÇÃO DA HAP EM
PACIENTE COM AMPLA COMUNICAÇÃO
INTERATRIAL PERIMEMBRANOSA NÃO
TRATADA
A Figura 3 mostra exemplos de diferentes estágios
na evolução do grau de HAP, em um paciente com
comunicação interventricular ampla, não restritiva. Na
Figura 3A, um paciente hipotético com cerca de 6
meses de idade apresenta HAP grave, com níveis pressóricos sistólicos iguais na AP e na Ao devido à transmissão da pressão do território sistêmico para o pulmonar.
A corrida oximétrica demonstra um salto significativo
da VCS para a AP, denotando alto fluxo pulmonar,
com uma relação Qp/Qs de 3 para 1. A pressão no AE
e a pressão diastólica final no VE são elevadas devido
ao grande retorno venoso pulmonar. Isto causa uma
redução na magnitude do gradiente transpulmonar.
Devido ao hiperfluxo pulmonar maciço e o gradiente
transpulmonar discretamente elevado, a RVP, apesar
de mais alta que níveis normais, se encontra em patamares aceitáveis para cirurgia. Tal exemplo retrata a
importância do cálculo da RVP. A obtenção isolada
dos níveis pressóricos na AP tem pouco valor diagnóstico
e prognóstico nos pacientes com HAP associado a
cardiopatias congênitas. A indicação de tratamento
neste caso é inequívoca.
Com o passar do tempo, as alterações histológicas
evolutivas provocadas pelo hiperfluxo associado ao
aumento de pressão na AP levam à oclusão do lúmen
arterial. Com isto, ocorre uma elevação progressiva da
pressão diastólica e média na artéria pulmonar e redução
do retorno venoso pulmonar e das pressões de enchimento do coração esquerdo, com conseqüente aumento
do gradiente transpulmonar. A obstrução do lúmen
arterial acarreta redução progressiva do fluxo pulmonar.
Os sintomas pulmonares e de ICC melhoram muito
nesta fase (“lua de mel”), apesar de ainda ocorrer
discreto shunt em nível ventricular. Fica fácil perceber
na Figura 3B que, nesta situação, a HAP ocorre predominantemente por elevação da RVP. A reversibilidade
do quadro neste exemplo é duvidosa. Os dados clíni237
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A
B
C
Figura 3 - Diagramas de um paciente hipotético com comunicação interventricular perimembranosa ampla, não restritiva. Nota-se quadro de
hipertensão arterial pulmonar grave em diversos estágios evolutivos. Ver texto para melhor entendimento.
cos devem ser levados em consideração, assim como
o padrão encontrado na angiografia capilar pulmonar.
Nestas situações, discute-se a indicação da biópsia
pulmonar para ajudar na estratificação do paciente
quanto a seu prognóstico em longo prazo.
A Figura 3C retrata o mesmo paciente em uma
situação terminal, na qual a RVP é maior que a RVS
e o Qs é maior que o Qp. Esta situação, também
denominada de Síndrome de Eisenmeiger, é irreversível.
Estes pacientes padecem de cianose crônica progressiva com todas as suas conseqüências sistêmicas (poliglobulia, cefaléia, sangramentos, tromboses, escoliose,
alterações articulares e renais, gota, etc.). A ocorrência
da falência ventricular direita em algum momento da
evolução é a regra.
CONCLUSÕES
A avaliação da HAP por meio do cateterismo em
pacientes com cardiopatias congênitas é fundamental
para determinação da irreversibilidade do quadro e
dos critérios de intervenção. Entretanto, os dados obtidos
por este método invasivo devem ser avaliados a luz de
suas limitações e em conjunto com outros dados clínicos, ecocardiográficos e angiográficos. Algumas vezes,
toda esta informação não é suficiente para uma tomada de decisão, devendo ser considerada a realização
da biópsia pulmonar.
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