O Cervantes de Goiás
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O Cervantes de Goiás
ïÇ r// jenaif,aÂrneco t'^l 4zlotlo O Cervantes de Goiás L'ri r:Lelcl;^r=ntij aLl-cra, eil ii'e,;isiadro r1 iiitstu:",-,,-i a P.,tvcila dc Fcrnrosocoin aS âveÌ^r:ì,,ias de Doi-nQr-ii:<cre de !aI'i\ancha. lia,-cncluici-iec:ei-i infc'r'nranie é rlm grandet^nentiicsc, que a i-nas a'Cmife ii^naginaçãc iai-nbemiaz pai'reda historia No aito: Miguel de Cervanres c riou um a h i s t ó r i aq u e ' e eu tivesseestudado mais, eu mesmo ia escrever a história dessa revolta. Como não estudei,vou contar a história pra vo.. influenciaria, mais cie300 anosCepois, leitoresdo oulro lacio do Atlântico Perspectivade Vila Boade Coias,1801: O rnteriordo Brasil coloniaiíoi palcooara a recriaçãociaviciade Dom Quixote de la Manchapor um sertanero mais importante era que Fernandes(pseudônimo do entrevistado, que preferiu o anonimato) se mostrava disposto a falar. Ele participara da Revolta do Formoso, irnportante movimento social de disputa de terras ocorrido naquele município do Estado de Goiiís, duranteas décadasde 1950e Ì960, estabelecendo relaçõescom posseiros,grileiros,advogados,políticos,co= merciantes,policiú e membros do Partido Comunista, da Igreja Católica e da populafo local. Ì.íascidono início da décadade 1920,na iírea rural de Uruaçu, em Goiás, onde passara infância e adoÌescência,membro de uma família de certo prestígio local, Fernandes mudara-se para Goiânia na década de 1940, com o intuito de cursar o ginásio. Abandonara os estudos para filiar-se, em 1945, ao Partido Comunista, onde permanecera durante décadas, sempre em Goiás, como modesto militante, participando, de um modo ou de outro, de todas as fasesdo conflito. Seu depoimento oral apresentavaas aventuras e desventuras de um personagem central, JoséPorftrio de Souza, líder da Reyolta do Formoso, ressaltando uma caracteústica que se revelaria fundarnentaÌ no desenroÌarda história: "uma coisa esquisitaque dava nele, uma espéciede loucura'l como Fernandesúamava a inconformidade do lawador JoséPorffrio ante a injustiça socialda árearural brasileira.Com humor, ele descreüa a "iniciação", ou melhor, a cooptação de Porfirio pelo Partido Comunista, confundido, por ele, com um tal de Partido da Igreja Católica Renovada: "O Porfirio achou aquilo muito bom, ele queria participar mais da luta das terras, mas não sabia se devia, se [rindo muito] Deus ia achar bom! Âí, através do Geraldão [Geraldo Ìvlarques,membro do Partido Comunista, encarregadode cooptar para o par- Õ É o a -a ã j I : È ã s õ 5 I o ó o tido JoséPortìrio, que já se destacavanos primeiros embatesda região entre grileiros e posseiros]e do Partido da Igreja Cristã Renovada [morrendo de rir], ele viu que Deus concordal'acom aquilo, siml" Esse rito de iniciação - não confirmado por qualquer outro depoimento - antecipava,na visão de Fernandes,o papei a ser desempenhadopor Porfírio, cujos nobres ideais,mal adaptadosà realidade, contrastavam com o formidável senso comum e o chamamentoaos sentidosdo mascateTosé Ribeiro, membro do Partido Comunista com atuação importante na organizaçãodos posseiros,mas que nunca fora, segundo outros depoimentos,"o companheiro inseparáveido Porfírio", ao contrário do que relatou Fernandes: "O fubeiro, que era um homem pacato,dessesde faia mansa,que falavabairo [...] que gostade resolver tudo na calma, mas resolve, sabe resolver [...], o Ribeiro foi o melhor companheiro que o Porfirio teve,o companheiro inseparável do Porfirio [...]. O Porfuio ficava lá com as idéias bonita dele, aquela liderança toda junto da mulherada e coisae tal, o Ribeiro trabalhava,trabalhava,fazia ata,reunião, coisade horário, compra de arma, e tal. Porffrio, sem o Ribeiro, era enxadasem cabo." Essase outras incoerências me fi.zeram suspeitar do dêpoimento. Consultando documentos escritos e entrevistando outras pessoas,tive uma grande surpresa: a maioria das informações prestadÍrs por Fernandes não se confirmava! Seqüênciasde acontecimentos, nomes de pessoasenvolvidas na revolta, descriçõesdos participantes, datas, quase nada, enfim, do que meu primeiro informante contara podia ser comprovado; ao contrário, quasetudo podia ser posto em dúvida ou, simplesmente, negado. Íi :q , . 1il c <:; :fd c l a 3 c A ìguns epi sódi os ci tados por Fernandesreaimentehaviam acontecido, porém em outros contextos e épocas.Muitas das pessoasreferidas por ele eram reais;as descrições de suascaracterísticas fisicase morais,porém, assim como dos papéis que haviam desempenhado,não coincidiam com os fornecidos por outros informantese documentos.Fernandesmisturara acontecimentos e personagens,entre si e com outros, fìctícios ou inexistentesna Revoitado Formosol ernbaralhara tempos e espaços,numa formidável demonstraçãode desprezopela história e pela geogra- . 'il ì 'i' iì i::i-.ir rr jì1.-, à iì-r;,:Ìi,tll ):0oì 30 fia; criara trechos iongos, aparentementesem reiacão com o movimenio sociaÌ, ou com quaìquer eventohistórico. Não havia ouiÍa conclusãopossivel:Fernandes inventara seu depoimentol A Revolta do Formoso foi uma coisa; outra, as memórias que Fernandes construiu a respeito da revolta. ìvlas história e memória mantêm tantas relaçÕesentre Ì si, que é até dificil pensá-lasseparadamente:"recordar é viver", como ensina o antigo samba.lvlemórias reelahpram .a história, relacionando-a a outros elementos e emprestando-Ìhe significados tão novos que, das lem-, branças,brota uma outra história. O c o n i u n to d e me mó ri a s d e fernandes, aí incluídas as recordações do Formoso,-íoi plqlfundamente influenciado pela sociedadee época em que Ylveu: sao memonas soria, semeáreaspróximas. Entretanto,o coniunto das memóetepentos, relaçÕese siÈ- se_us fias de Fernande_q rrificados - foi diferente das demais, assim como o Literaturapopular: j.-. ,.. . , " "'i próprio Fernandes:nenhum informante possuía exatamenteo mesmo físico,humor e imaginaçao. A narratrva de fernandes constltÌuu uma versão. ;entre muitas, da Revoita do Formoso; ate hoje ela disputa, com outras, espaços,audiências e adesÕes, em buscade tegi ,aversão,não o fato": o antigo ditado popular já chamava a atençãopara a lmpe4âng3 3 autonomia das interpretações.& mefo ó-riaçem espeqial quando organizada em narrativa, possui uma dimenqtu simbólica que a leva rapidamente g desprender:s€'â descolar-se do Foncreto,para alçar vôos próprios. Todos os seres vivos conhecem essadimensão simbólica da memória, que a literatura sabe tão bem apreender:um simples sabor - como o da madeleine,o doce cujo sabor remeteu o escritor Marcel Proust à própria infância, e também à escrita dos sete volumes do seu magistral Em busca do tempo perdìdo - ê capazde despertar as mais longínquas lembranças.O caláter simbólico marca profundamente a narrativa de Fernandes. Marca os vários tempos oue ela contém, assimcomo as relacõesentre eles:os temposdu histó.i" d venttffi,as as aventurasde D. Quixore e seu fiel escudeiro,Sancho Pança,inspirarama imaginaçãode aduicos e cnanças,que vrrâm a realidadearravésda fìcção.Aqrri, uma edição porruguesa dedicada exclusivamente aos pequenosleitores o o 5 o o o Mas não era só: eu tinha a impressão,que se transforma'aem.erteza@ do depoimento, datado qquela história. Finalmente, percebi ser a ngqaliva de Fernandesuma recriação do Dom Quixote de Ia Mancha, de Mieuel de Cervantes! Seutempo, portanto, também era o da criação do Dom Quìxote,o da Espanhamedieval, o de antigas tradiçóes,yelhas de muitos séculos....Adimensão simbólica unificqu, na narrativa de Fernandes,histó ria, me+ó ria ejlggglatg4o _histg.ri-g. d g tal99 - 1 de um eixo cgndutor e de uma lógica. Não a lósica histórica tradicional, coìadaaos eventos,mas a lggiSa qiinbólilq. Âs semelhanças encontradas entre os dois relatos,desdea loucura e o idealismo dos protagonistas, não deixavam dúvida: Fernandes realmente inspirara-se no Dom Qukote de Ia Mancha para compor seu depoimento. Ora. se ele não_inven!.argseg. rgljrlo,-se nã-g*9 compusera a partfu unicamente dg_prqpr1qilnjrgi-__ nação, se não era apenasum grande mentiroso, um farsante,como, a princípio, eu pensara,como entender a entrevista?Coqto co-pt.-e"d"r r.l1çõ9s"s poss-eiros uma revolta de qc_o.rridq çntre lo interior ,.ì iH 31 Doiscavaleirospassoa passo A comparação sistemática entreasaventuras de Ze Porfírioe asde Dom Quixore,protagonisras do depoimenroorat de Fernandes e do livro A Engenhoso Fidalgo DomQuixote dela Mancha,de Miguelde Cervanres Saavedra, respectivamente,apontaparanumerosas semelhanças. Alémdo recursoa um "fìelescudeiro" e a um cavalocom o mesmonome - Rocinante(emboraZé Porfirio,ao queconsta,jamaispossuíra cavalo)- , ambasasnarrarivas urilizam-se com freqüênciado humore dosrecursos da Íarsa,assimcomode subtítuloslongos,pan inroduzir assubdivisôes oa ação.Éo casodo CapÍtuloXV,do livrode Cervantes, 'Em queserelataa desgraçada queenfrenrouclom avencura iangüeses de Yanguas, na regiào de Quixoceao toparcom unsdesalmados Castilha]", e o nechodo relatode [narurais "Voucontarprbcèsasmuitasavenrurasdo7ê Porfirioe seucompanheiroZé Ribeiro,nasmaas do São Fernandes, Patrício,quandoelesdeu(src)de caracom um inimigodesconhecido e malvado". No relatooralhá passagens diretamenteretiradasdo livrode Cervantes, adaptadasa Coiáse à Revoltado Formoso, comoo "Epirafio"de Dulcinéia. Osversosdo livro ("Descansa aquiDulcineia,/Que, sendogordae rosada,/ Emcinzae pó foi mudada/Pelamorte,honendae feia')reapareciam no relatode Fernandes comode autoriados membrosda Associação dos Lawadores do Formosoe Trombas,fundadaem 1954:"Descansa aquia polícia/Que sendogordae rosada,/Emcinzae pó foi mudada/Pelamorte,horrendae feia." Ouro exemploenvolveSanchoPançae o "escudeiro" de Porfirio,Ze Ribeiro.No liwo,"sanchosacoude seuíardel pão um nacode e um pedaçode queijo,e dando-osao moço lhedisse - ïoma, irmãoAndre a ruadesgraça rocanosa todosj'No relarode Fernandes, "Ze Ribeirosacoude seuÉrnel um nacode pãoe um pedaçode queijo,e dando-osao moço [o jovemCosmelino, posseirorecém-chegado ao Formoso],lhedisse- Toma,irmãoCosme,a rua desgraça toca-nosa rodosl'Ecervances por aívão,p;rssoa passocom Rocinante. e Femandes o ! : o 5 ) o õ : I Estado de Goiás, €m meados do século XX. e uma novela erudita, publicada na trezentos e cinqüenta anos antes? O-o* O"i*t" a" U Uo"clrq, .wo de cabeceirade Fernandes.Ele possuíao volume desde 1942, ano em que o herdara do avô que, por sua vez, o encomendara a um mascatede viagem ao Rio de Janeiro, onde o comprara. Não apenas Fernandes,mas boa parte da população do município de Uruaçu nascida antes de 1950 conhecii o .Qri*ot";*uiioi :.|ll:3i tÉtia.gggrte dçta,cgqlq4tprt 4lguiqlnaqvlto. Se alfabetizado,o "contador de histórias",senta4o sobre um banco, na calçadaou na praça,lia o liwo para uma roda de atentos ouvintes, gente variada: crianças e adultos, homens e mulheres, lawadores,comerciantes,vaqueiros...Se analfabeto,o "contlrdor" narrava o qpe sua memó_ria_guar4ara e selecionara do que ouvira da história original. Nos dois casos,a platéia participava atiyamente, tecendo comentáriôs, divertindo-se, indignando-se, emocionando-i e, o que era freqüente - e, pÍìra nosso es- O Cavr.jeirctja ïr::re Fi E rr :,nç nr:nc i c R cci nan:.:: mts mo iion e .iacO:O cavalO dc lícierda Revolrado Formoso,emboraeste nunca tenha possuído um cavalo ! | , :; ' Í f { . ) i o o J ì - r:-^ l--' r ç,e í, LJHd --* ^ 32 á^ q4 Í){rN 'rr-t\iinÍ': :dicio barcelonesa l)Jr 1,.\ \tiNíjt.\ :e i 879 do c lâ s s i c c f'1{ :e Mìguel de .lervantes,ircf nrêìte !!ir rì j,l .l::{\'_\:ilÌr ì L i ï t t r{ i _ crn ament ac a3 0 r RicardoBalace a A esquerda, fronrispícioda edição madrrlensede 1798. : de que Há referências a vida do engenhoso l fidalgo en apreciaCa em Coìásno século o o o I ,{Vlll,quando foi encenadauma ópera sobreo tema tìrliçitr crrrrrgirla Ja s(sundr pàÍli' Jrì 4r,,1"/c.le ii. r\otorrío ìteiliccr, th lìcrl -lrrn .\carlumia Jc l{isrirü, \Íarìn. QLì&t? | t-r)9. a crr{o o o : tudo, particularmente signifi cativo -, relacionando as passagensàs próprias histórias de vida' Não apenas Fernandes e os uruaçuensesde sua geraçãoconh€ciam a história do Quixote. O liwo e a história circulavam pelos povoados mais antigos de Goirís havia mais de duzentos anos, desde o século XVIII, quando a região receberaos primeiros contingentesbrancos, em decorrência da descobertade ouro. Correspondência do governador da Capitania, datada de 1774, referiu-se à encenação de uma ópera no povoado de Pilar, baseada na história do... Dom Quixote de la Mancha! Referênciashistóricas esParsas'porém confi.áveis,atestaram a permanência em Goiás da narrativa do Quixote e, provavelmente, também do liwo, ao longo do século XIX. A tradição medieval ibérica (que Cervantesincorporara e retrabalhara em seu texto), introduzida durante o período colonial em território goiano, deve ter-se fortalecido com o isolamento da região, a partir do terceiro quartel do séculoXVIII, em conseqüênciada derrocadada mineração.Ainda hoje, elem€ntosdessatradição, reinventados e atualizados pela população' estão presentesem Goiás; é o caso das festasanuais do Divino Espírito Santo, que incluem as Cava- lhadas, uma luta ritual entre cristãos e mouros' cuja origem provável remonta às investidas de Carlos Magno contra os árabes, ao norte da Península Ibérica, no ano 800. çgltglg-gl"dita (D om Quixote) ç-culuraiglglel (tradições goianas) associaram-se'assim, influen-. ciando-se mutuamente e promoy!:ndo uma circula- ridade de culturas,tal como definida por Mikhail Bakhünem seusestudos sobrea narrativamedievale renastambém,9I centista.AlgqcllqeÍrq:se, escrito texto um crita e oralidade alimentou, durante séculos, uma !radição mista, escrita e oral, em Goiás. Parte desta tradição me foi transmiüda, oralmente, por Femandes, reaparecendoagora neste texto escrito. A dimensão simbólica das entrebre os fatos, mas penmte compreensignifiJados que iqdivídugs el{lgpos os diversos der sociais conferem às exPeriênciasque têm. Entrevistas reaÌizadasposteriormente Por mim' em áreaspróximas - nos atuais municípios de Porangatu, Minaçu e Santa ïbresinha, cujos habitantes não haviam vivenciado a Revolta do Formoso' mas nela se inspiraram para deflagrar movimentos de posseiros-, registram versÕes muito semelhantes à apresentada por -] JJ Fernandes:lá estavamasquadrinhasadaptadasdo livro de Cervantes,os diiílogos literais, as referênciasa personagense episódios da obra. Na região de Uruaçu já existia, portanto, uma forte tradição de origem ibérica, da qual o Ìivro Dom Qukote de Ia NÍancha fazia parÍe, expressando-a e reforçando-a; esta tradição era constantemente reelaboradapeia população local, por meio de rituais e da memória coletiva. Foi a ela que Fernandesrecorreu,para construir seu depoimento sobre a Revolta do Formoso. Lq3gg-p"rt""t",d*_ um grande mentiroso, Fernandesverbalizara, em seu depoi cínios e sentimentos profundamente enraizados na memória coletiva de sua região e grupo social de origem. revolta, ele construiu uma narrativa original, mes- de antieastradicÕes,assimiladaslocalmente. No relato de Fernandes, a "memória herdada" - a"i A históriafalada...e gravada Nosanos50do secuioXX apósa invençãodo gravadora fita,iniciou-se nosEsadosUnidos,Europa quesebaseia de pesquisa e Méxicoumametodologia nagravaçâo de tesÊemunhos sobreacontecimentos, instituições, modosde vidae ouçros conjunruras, da históriacontemporânea: a hiscória onl. aspectos difundidanasduasdkadasseguintes, Bastante a oanir de 1980elaconsolidouum Dermanente entreosquea praricam:nãoso intercàmbio historiadores e anropólogos,comocientistas políticos,pedagogos, teóricosda Iiteratura,psicólogos. No Brasil, a metodologiafoi insroduzidanosanos 7Ocom a criaçãodo Programa de HistóriaOnl do difundindo-se CPDOC,da Fundaçâo Geúlio Vargas, a panir dosanos90,quandofoi criada especialmente Brasileira de HistóriaOral,em 1994,com a Associação membrosde todo o paísquesereúnem periodicamente regionais e nacionais, emencontros editamumarevistae contamcom um porËl: www.cpdocfuv/abho. ]l1 g:- esquemas inconscientes de percepção, representa- çãilãçãõÉEícritos no@ : = o o I ; o ABREU, Sebastião. A guenilha do Zé Pcrfrio. 3rasilia: Coeihe,1985. AMÀDO, Janaína. " Euquero ser uma pessoa: revolracamponesae polítìcano e .t1 <tl " Do<ÌArô ^o < 1993,çp. 17-69. CARNEIROMaria A revolra Esperança. campanesade Formoso e Trombas.Coiània: te o "homem de onte das tradições ibéricas para as tradições goianas - e g_o*tatfofçaeniq49?4 Parasabermais Cegraí1981. lata de lixo, ou o fundo de gaveta,onde, desde1979,a deixei. fulassegundoa concepçãoaqui adotada- que relaciona a vivência e as memórias de un ser hugtano com seu tempo, com o a4lerior e çgJS!_futulgsociando,em vários níveis e de vários modos, real e simbólico, história e memória, memória e imaginação,tradição e invenção,fi.cçãoe história -, é possível oferecer uma resposta para o enigma de como g nos gestos,no riso de Fernandes.Por essalinha de interpretação, Fernandes não apenas não mentiu, em seu relato, como se mostrou profundamente verdadeiro, ao recorrer a códigos mentais, psicológicos e corporais inscritos no seÌl íntimo. em seu cavalo Relegar a plano secundário as relações entre me@ontado mória e vivência, entre indivíduos e grupos sociais, Rocinante, atravessouoceÍÌnospara lutar contra moientre tempos e entre culturas é imobilizar o passado nhos de vento nos longínquos sertõesde Goirís.n nas cadeias cronológicas de um "real" onde residiria sua "verdadeira naturezao,a ser "resgatada" pelos hisJ,c.Ì.reÍN,f Âu.roo é prof*mra tinlar aposetttada toriadores.De acordo com essaconcq:ção,a entrevis-. do Departamento ìle História ila Universidade de Brasíliata de Fernandes não serve para nada; seu destino é a No momento, além dahistória, dedica-seà fiqÀo. Paisagem do cerrado goiano,para onde FernandesrÍansportou as andançasde Dom Quixote de la Mancha, projetando as peripéciasdeste na vida do líder da Revoltado Formoso, JoséPorfírio t17 Ja n e ín aA madc - ü Gr andeM entii' os+ " N e s t ec a s o,rn e re fi roa u m i mp o r tantemovimentosocialpr ovocadopelaocupaç ãode q ue teve lr .r gar er n ur na pr ovínciado inter lordo Br as íl t e r r a s p o r pa rte d e ca mp e si n o s, - G o i a s- e ntre o s a n o s 5 0 e 5 0 , e que é conhecidocomo Revoitacio For moso.M ai s q u * ü m o vi me n toe m sí me smo, no momento nos inter essao r elato de um dos !n l e g r a n t e scj o g ru p o q u e fo i l ar gamente entr evistadopela histor iador aJa naína A m a d o l l *j .I n i ci a l me n teco o r elatocje Fer nandes- a infor m ante, n ta a h istor iacior a, não pocie ser aproveìtaciopara a reccnstrução histórica porque parecia rnuito fa n t a s i o s o ,€ ffi a l g u n s a sp e cto s,se desviavadenr aisdos r elatos dos dem ais . M as p a s s e c c su n s q L j a n to sa n o s, a h istcr iadcr adecidiu r evisar as entr el,istase se deu c *= l * d e q ue a ve rsã o d e F e rn a ndescombinavafatos histór icoseom r em inisc ênc ías t;+ rii-?:! -i úl -: iü5, -- íf o s e u i n f crme , * mo vi me n to de um m cdo ger ai apr esentavauma tr ama bem artlculadeentre + eipicoe a farsa. O Êíderda revolta - JoséForfíricde Souza- aparecia co m o a e n c â rn a çã o d e D a n Qu i xo tee a íoucur aeiocavaleir ose manifestavana r e v ol ta cj o c a m p c n ê sp e ra n te a s tre me n dasinjustiçasna ár ea r ur al br asileir a"O r itual de i n ì c i = ç ã cd e i o sé P o rfi ri an a mi i ítançase asser nelhava a um a par odiado batism ode D *; ";Ç ' ; i x o teco mo ca va i e i ro C . o n tava,além ciísso,com a pr esençaconstantede um co i "n p a n h ei ro e m to d a s su a s a çõ es políticasao estilo de um Sancho Panzae ti nha t a m b é m u m ca va i o ch a ma d * R ocinante,quando në ver dade, segundo dizem os entr e d e m a í si n f o rma n te s,Jcsé P o rfíri oRer nsequerteve um cavaio.As coinciciênci as o i - e l a t od e Fe rn a n d e se ã o b ra d e Cer vaniessão vár iasej ccm c dissea histar ï ador e, n ê o c a b i a md ú vi d a sd e q u e o i n fer m antehavia se inspir aejo no Quixoiepar a com por n * s l r = i m a gi n a çã ou ma ve rsã oq uixoiescada Revolta,Mas como explicara pr es enç a d e u : r i a o b ra d e tra d i çã o e ru d i ta em ur n povo que, além de viver er n condi ç ões b;tsïarit*precérías,eonta corr!um çrande número de analfabetos? O c r - : r ì *s *é q u e d e p o Ìsd e u m i e nço tem pc, passandopor fontes or ais e escri tas ,a n i - *r + r i a c i och ra e g o ua a i g u ma sco nc!i;sões bastantesugestivas.Em pr im eír olug ar s e l-;c*r;r=abenio-cueFernandeslia regularmentea Quíxate e desde 194? tinha uma e *i ç ã * p r e s e n te a i ap cr se u a vô . Logosoubetamb,ér lde que não só Fer nandesc om o g r a n d ep a r te d a s p e sso a sd o p o voado( Ur uaçu) ,nascidaantes dos anos 50, conhec i a a *b r e . M u ito s d e i e s se l e mb ra var nde haver ouvido as histor iasdo cavaleir ode l a se r eunia m na i { a n c h a c o n ta d a sp C Irp e sso a sd e m ais idade que tr adicionalmente p r ã Ç ar n a i ora o e n ta rd e ce re re l a tavamou lÍam as incr íveishistór iasde Don Qu i x ote D ã r ar J r ' ÌE r u p o h e te ro g ê n e od e h om ens,mulher es,cr ianças,camponeses,peq uenos c c m e r c ! a n i -s,n a si :a g ra n d e ma ior iaanalfabetos.Estes,por sua vez, par tici pav am *t!i,'ai-::entedas aventuras carraiheirescasfazendo comentários e especial;'nente relaeì*rrando a historiacorn c!rcunstâncias da vida, A entradado Çuixofe nesta regiãc d c i : r t e r i o rbra síi e i rÕ cco ri e n a se gundametade do séculoXVïiI, quando cheEamos t': prin"leiroshornensbr6pçç5i1' N* easc da Revoita da Formosc, ocorre um perfeito processode'apropriaçãoda obra d e C e r v a n te s,A fi g u ra d o ca va l h eir ose coniundecsm a do lídei-cam ponêsê s e um i u r a *e i o r e sta b e l e ci me n to d a o rcjemda cavalar iaandante,c outr o m ilita a favor da ju s t i ç e s c c i a !.Os ra sg o sd e l o u cur ase confundemcom o her oísnno cavalheir es ceo ã visã* cjc nai'reciorgarante urn ponto de vista instávelque se move entre o sério e c c ô m i c o . t v Ìa sse m d ú vi d a , o mais sur pr eendentedo infor m e de Fer nande sé a !d e a ! i z e ç ã oq u e cri a so b re u m mcvimento social, estabeiecendoum jogo entr e : m *ç i n a ç ã o e ve rcj a d e h i stó ri ca que Í' ecuper a,quixotescamente,a ja anti ga ccr-rt:'cv*rsia das fronteiras e as cÕn€xõesentre literaturae vieia." "Ãc,ir:./esde prornover em tcrnc dela,uma narrativa construiu, o resgatehistórico da ;'evolta, orìçi*ai, rnesclando acontecirneniosverídicos, existentes ilo n'lovimento, com ti'amas, ;io m e n cla turas e simbologias s c a lme n t e {"à MA DO ,1 9 9 5 , p , de antiE a st ra d iç õ e s a, s s imila c ialo 1?1\ aJr l.