O Cervantes de Goiás

Transcrição

O Cervantes de Goiás
ïÇ
r//
jenaif,aÂrneco
t'^l
4zlotlo
O Cervantes
de Goiás
L'ri r:Lelcl;^r=ntij aLl-cra, eil ii'e,;isiadro
r1
iiitstu:",-,,-i
a P.,tvcila
dc Fcrnrosocoin aS
âveÌ^r:ì,,ias
de Doi-nQr-ii:<cre
de !aI'i\ancha.
lia,-cncluici-iec:ei-i infc'r'nranie
é rlm
grandet^nentiicsc,
que a
i-nas
a'Cmife
ii^naginaçãc
iai-nbemiaz pai'reda historia
No aito:
Miguel de Cervanres
c riou um a h i s t ó r i aq u e
'
e eu tivesseestudado mais, eu mesmo ia
escrever a história dessa revolta. Como
não
estudei,vou contar a história pra vo..
influenciaria,
mais
cie300 anosCepois,
leitoresdo oulro lacio
do Atlântico
Perspectivade Vila
Boade Coias,1801:
O rnteriordo Brasil
coloniaiíoi palcooara
a recriaçãociaviciade
Dom Quixote de la
Manchapor um
sertanero
mais importante era que Fernandes(pseudônimo do
entrevistado, que preferiu o anonimato) se mostrava
disposto a falar. Ele participara da Revolta do Formoso, irnportante movimento social de disputa de terras ocorrido naquele município do Estado de Goiiís,
duranteas décadasde 1950e Ì960, estabelecendo
relaçõescom posseiros,grileiros,advogados,políticos,co=
merciantes,policiú e membros do Partido Comunista, da Igreja Católica e da populafo local.
Ì.íascidono início da décadade 1920,na iírea rural de Uruaçu, em Goiás, onde passara infância e
adoÌescência,membro de uma família de certo prestígio local, Fernandes mudara-se para Goiânia na
década de 1940, com o intuito de cursar o ginásio.
Abandonara os estudos para filiar-se, em 1945, ao
Partido Comunista, onde permanecera durante décadas, sempre em Goiás, como modesto militante,
participando, de um modo ou de outro, de todas as
fasesdo conflito.
Seu depoimento oral apresentavaas aventuras e
desventuras de um personagem central, JoséPorftrio
de Souza, líder da Reyolta do Formoso, ressaltando
uma caracteústica que se revelaria fundarnentaÌ no
desenroÌarda história: "uma coisa esquisitaque dava
nele, uma espéciede loucura'l como Fernandesúamava a inconformidade do lawador JoséPorffrio ante
a injustiça socialda árearural brasileira.Com humor,
ele descreüa a "iniciação", ou melhor, a cooptação de
Porfirio pelo Partido Comunista, confundido, por ele,
com um tal de Partido da Igreja Católica Renovada:
"O Porfirio achou aquilo muito bom, ele queria
participar mais da luta das terras, mas não sabia se
devia, se [rindo muito] Deus ia achar bom! Âí, através do Geraldão [Geraldo Ìvlarques,membro do Partido Comunista, encarregadode cooptar para o par-
Õ
É
o
a
-a
ã
j
I
:
È
ã
s
õ
5
I
o
ó
o
tido JoséPortìrio, que já se destacavanos primeiros
embatesda região entre grileiros e posseiros]e do
Partido da Igreja Cristã Renovada [morrendo de
rir], ele viu que Deus concordal'acom aquilo, siml"
Esse rito de iniciação - não confirmado por
qualquer outro depoimento - antecipava,na visão
de Fernandes,o papei a ser desempenhadopor
Porfírio, cujos nobres ideais,mal adaptadosà realidade, contrastavam com o formidável senso comum e o chamamentoaos sentidosdo mascateTosé
Ribeiro, membro do Partido Comunista com atuação importante na organizaçãodos posseiros,mas
que nunca fora, segundo outros depoimentos,"o
companheiro inseparáveido Porfírio", ao contrário
do que relatou Fernandes:
"O fubeiro, que era um homem pacato,dessesde
faia mansa,que falavabairo [...] que gostade resolver
tudo na calma, mas resolve, sabe resolver [...], o
Ribeiro foi o melhor companheiro que
o Porfirio teve,o companheiro inseparável do Porfirio [...]. O Porfuio ficava
lá com as idéias bonita dele, aquela liderança toda junto da mulherada e
coisae tal, o Ribeiro trabalhava,trabalhava,fazia ata,reunião, coisade horário, compra de arma, e tal. Porffrio,
sem o Ribeiro, era enxadasem cabo."
Essase outras incoerências me fi.zeram suspeitar do dêpoimento.
Consultando documentos escritos e
entrevistando outras pessoas,tive uma grande surpresa: a maioria das informações prestadÍrs por
Fernandes não se confirmava! Seqüênciasde acontecimentos, nomes de pessoasenvolvidas na revolta,
descriçõesdos participantes, datas, quase nada, enfim, do que meu primeiro informante contara podia ser comprovado; ao contrário, quasetudo podia
ser posto em dúvida ou, simplesmente, negado.
Íi
:q
, . 1il
c
<:;
:fd
c
l
a
3
c
A ìguns epi sódi os ci tados por
Fernandesreaimentehaviam acontecido, porém em outros contextos
e épocas.Muitas das pessoasreferidas por ele eram reais;as descrições
de suascaracterísticas
fisicase morais,porém, assim
como dos papéis que haviam desempenhado,não
coincidiam com os fornecidos por outros informantese documentos.Fernandesmisturara acontecimentos e personagens,entre si e com outros, fìctícios ou inexistentesna Revoitado Formosol ernbaralhara tempos e espaços,numa formidável demonstraçãode desprezopela história e pela geogra-
.
'il ì
'i' iì i::i-.ir rr jì1.-,
à
iì-r;,:Ìi,tll
):0oì
30
fia; criara trechos iongos, aparentementesem reiacão com o movimenio sociaÌ, ou com quaìquer
eventohistórico.
Não havia ouiÍa conclusãopossivel:Fernandes
inventara seu depoimentol A Revolta do Formoso
foi uma coisa; outra, as memórias que Fernandes
construiu a respeito da revolta. ìvlas história e memória mantêm tantas relaçÕesentre Ì
si, que é até dificil pensá-lasseparadamente:"recordar é viver", como ensina o antigo samba.lvlemórias reelahpram .a história, relacionando-a a
outros elementos e emprestando-Ìhe
significados tão novos que, das lem-,
branças,brota uma outra história.
O c o n i u n to d e me mó ri a s d e
fernandes, aí incluídas as recordações do Formoso,-íoi plqlfundamente influenciado pela sociedadee época em que Ylveu: sao memonas soria, semeáreaspróximas. Entretanto,o coniunto das memóetepentos, relaçÕese siÈ- se_us
fias de Fernande_q
rrificados - foi diferente das demais, assim como o
Literaturapopular:
j.-. ,.. . , "
"'i
próprio Fernandes:nenhum informante possuía
exatamenteo mesmo físico,humor e imaginaçao.
A narratrva de fernandes constltÌuu uma versão.
;entre muitas, da Revoita do Formoso; ate hoje ela
disputa, com outras, espaços,audiências e adesÕes,
em buscade tegi
,aversão,não o fato": o antigo ditado popular já chamava a atençãopara a lmpe4âng3 3
autonomia das interpretações.& mefo ó-riaçem espeqial quando organizada em narrativa, possui uma dimenqtu simbólica que a leva rapidamente
g desprender:s€'â descolar-se do
Foncreto,para alçar vôos próprios.
Todos os seres vivos conhecem
essadimensão simbólica da memória, que a literatura sabe tão bem
apreender:um simples sabor - como o da madeleine,o doce cujo sabor remeteu o escritor Marcel
Proust à própria infância, e também à escrita dos
sete volumes do seu magistral Em busca do tempo
perdìdo - ê capazde despertar as mais longínquas
lembranças.O caláter simbólico marca profundamente a narrativa de Fernandes. Marca os vários
tempos oue ela contém, assimcomo as relacõesentre eles:os temposdu histó.i" d
venttffi,as
as aventurasde
D. Quixore e seu fiel
escudeiro,Sancho
Pança,inspirarama
imaginaçãode aduicos
e cnanças,que vrrâm a
realidadearravésda
fìcção.Aqrri, uma
edição porruguesa
dedicada
exclusivamente
aos
pequenosleitores
o
o
5
o
o
o
Mas não era só: eu tinha a impressão,que se transforma'aem.erteza@
do depoimento, datado
qquela história. Finalmente, percebi ser a ngqaliva
de Fernandesuma recriação do Dom Quixote de Ia
Mancha, de Mieuel de Cervantes!
Seutempo, portanto, também era o da criação do
Dom Quìxote,o da Espanhamedieval, o de antigas
tradiçóes,yelhas de muitos séculos....Adimensão
simbólica unificqu, na narrativa de Fernandes,histó ria, me+ó ria ejlggglatg4o _histg.ri-g. d g tal99 - 1
de um eixo cgndutor e de uma lógica. Não a lósica
histórica tradicional, coìadaaos eventos,mas a lggiSa qiinbólilq. Âs semelhanças encontradas entre os
dois relatos,desdea loucura e o idealismo dos protagonistas, não deixavam dúvida: Fernandes realmente inspirara-se no Dom Qukote de Ia Mancha
para compor seu depoimento.
Ora. se ele não_inven!.argseg. rgljrlo,-se nã-g*9
compusera a partfu unicamente dg_prqpr1qilnjrgi-__
nação, se não era apenasum grande mentiroso, um
farsante,como, a princípio, eu pensara,como entender a entrevista?Coqto co-pt.-e"d"r
r.l1çõ9s"s
poss-eiros
uma
revolta
de
qc_o.rridq
çntre
lo interior
,.ì
iH
31
Doiscavaleirospassoa passo
A comparação
sistemática
entreasaventuras
de Ze Porfírioe asde Dom Quixore,protagonisras
do depoimenroorat
de Fernandes
e do livro A Engenhoso
Fidalgo
DomQuixote
dela Mancha,de Miguelde Cervanres
Saavedra,
respectivamente,apontaparanumerosas
semelhanças.
Alémdo recursoa um "fìelescudeiro"
e a um cavalocom o mesmonome - Rocinante(emboraZé Porfirio,ao queconsta,jamaispossuíra
cavalo)- , ambasasnarrarivas
urilizam-se
com
freqüênciado humore dosrecursos
da Íarsa,assimcomode subtítuloslongos,pan inroduzir assubdivisôes
oa
ação.Éo casodo CapÍtuloXV,do livrode Cervantes,
'Em queserelataa desgraçada
queenfrenrouclom
avencura
iangüeses
de
Yanguas,
na
regiào
de
Quixoceao toparcom unsdesalmados
Castilha]",
e o nechodo relatode
[narurais
"Voucontarprbcèsasmuitasavenrurasdo7ê Porfirioe seucompanheiroZé Ribeiro,nasmaas do São
Fernandes,
Patrício,quandoelesdeu(src)de caracom um inimigodesconhecido
e malvado".
No relatooralhá passagens
diretamenteretiradasdo livrode Cervantes,
adaptadasa Coiáse à Revoltado
Formoso,
comoo "Epirafio"de Dulcinéia.
Osversosdo livro ("Descansa
aquiDulcineia,/Que,
sendogordae rosada,/
Emcinzae pó foi mudada/Pelamorte,honendae feia')reapareciam
no relatode Fernandes
comode autoriados
membrosda Associação
dos Lawadores
do Formosoe Trombas,fundadaem 1954:"Descansa
aquia polícia/Que
sendogordae rosada,/Emcinzae pó foi mudada/Pelamorte,horrendae feia."
Ouro exemploenvolveSanchoPançae o "escudeiro"
de Porfirio,Ze Ribeiro.No liwo,"sanchosacoude seuíardel
pão
um nacode
e um pedaçode queijo,e dando-osao moço lhedisse - ïoma, irmãoAndre a ruadesgraça
rocanosa todosj'No relarode Fernandes,
"Ze Ribeirosacoude seuÉrnel um nacode pãoe um pedaçode queijo,e dando-osao moço [o jovemCosmelino,
posseirorecém-chegado
ao Formoso],lhedisse- Toma,irmãoCosme,a rua
desgraça
toca-nosa rodosl'Ecervances
por aívão,p;rssoa passocom Rocinante.
e Femandes
o
!
:
o
5
)
o
õ
:
I
Estado de Goiás, €m meados do século XX. e
uma novela erudita, publicada na
trezentos e cinqüenta anos antes?
O-o* O"i*t" a" U Uo"clrq,
.wo de cabeceirade Fernandes.Ele possuíao volume
desde 1942, ano em que o herdara do avô que, por
sua vez, o encomendara a um mascatede viagem ao
Rio de Janeiro, onde o comprara. Não apenas
Fernandes,mas boa parte da população do município de Uruaçu nascida antes de 1950 conhecii o
.Qri*ot";*uiioi
:.|ll:3i
tÉtia.gggrte dçta,cgqlq4tprt 4lguiqlnaqvlto.
Se alfabetizado,o "contador de histórias",senta4o sobre um banco, na calçadaou na praça,lia o liwo para uma roda de atentos ouvintes, gente variada: crianças e adultos, homens e mulheres, lawadores,comerciantes,vaqueiros...Se analfabeto,o "contlrdor" narrava o qpe sua memó_ria_guar4ara
e selecionara do que ouvira da história original. Nos dois
casos,a platéia participava atiyamente, tecendo comentáriôs, divertindo-se, indignando-se, emocionando-i e, o que era freqüente - e, pÍìra nosso es-
O Cavr.jeirctja ïr::re
Fi E rr :,nç nr:nc i c
R cci nan:.::
mts mo
iion e .iacO:O cavalO
dc lícierda Revolrado
Formoso,emboraeste
nunca tenha possuído
um cavalo
! | , :; ' Í f { . ) i o o J
ì
-
r:-^ l--' r ç,e í,
LJHd
--* ^
32
á^
q4
Í){rN 'rr-t\iinÍ':
:dicio barcelonesa
l)Jr 1,.\ \tiNíjt.\
:e i 879 do c lâ s s i c c
f'1{
:e Mìguel de
.lervantes,ircf nrêìte
!!ir
rì
j,l
.l::{\'_\:ilÌr
ì L i ï t t r{ i _
crn ament ac a3 0 r
RicardoBalace
a
A esquerda,
fronrispícioda edição
madrrlensede 1798.
:
de que
Há referências
a vida do engenhoso
l
fidalgo en apreciaCa
em Coìásno século
o
o
o
I
,{Vlll,quando foi
encenadauma ópera
sobreo tema
tìrliçitr crrrrrgirla Ja s(sundr pàÍli' Jrì 4r,,1"/c.le ii.
r\otorrío ìteiliccr, th lìcrl
-lrrn
.\carlumia Jc l{isrirü, \Íarìn. QLì&t? | t-r)9.
a crr{o
o
o
:
tudo, particularmente signifi cativo -, relacionando
as passagensàs próprias histórias de vida'
Não apenas Fernandes e os uruaçuensesde sua
geraçãoconh€ciam a história do Quixote. O liwo e a
história circulavam pelos povoados mais antigos de
Goirís havia mais de duzentos anos, desde o século
XVIII, quando a região receberaos primeiros contingentesbrancos, em decorrência da
descobertade ouro. Correspondência
do governador da Capitania, datada
de 1774, referiu-se à encenação de
uma ópera no povoado de Pilar, baseada na história do... Dom Quixote
de la Mancha! Referênciashistóricas
esParsas'porém confi.áveis,atestaram
a permanência em Goiás da narrativa
do Quixote e, provavelmente, também do liwo, ao longo do século XIX.
A tradição medieval ibérica (que
Cervantesincorporara e retrabalhara
em seu texto), introduzida durante o período colonial em território goiano, deve ter-se fortalecido
com o isolamento da região, a partir do terceiro
quartel do séculoXVIII, em conseqüênciada derrocadada mineração.Ainda hoje, elem€ntosdessatradição, reinventados e atualizados pela população'
estão presentesem Goiás; é o caso das festasanuais
do Divino Espírito Santo, que incluem as Cava-
lhadas, uma luta ritual entre cristãos e mouros' cuja origem provável remonta às investidas de Carlos
Magno contra os árabes, ao norte da Península
Ibérica, no ano 800.
çgltglg-gl"dita (D om Quixote) ç-culuraiglglel
(tradições goianas) associaram-se'assim, influen-.
ciando-se mutuamente e promoy!:ndo uma circula-
ridade de culturas,tal como definida
por Mikhail Bakhünem seusestudos
sobrea narrativamedievale renastambém,9I
centista.AlgqcllqeÍrq:se,
escrito
texto
um
crita e oralidade
alimentou, durante séculos, uma !radição mista, escrita e oral, em Goiás.
Parte desta tradição me foi transmiüda, oralmente, por Femandes, reaparecendoagora neste texto escrito.
A dimensão simbólica das entrebre os fatos, mas penmte compreensignifiJados que iqdivídugs el{lgpos
os
diversos
der
sociais conferem às exPeriênciasque têm. Entrevistas
reaÌizadasposteriormente Por mim' em áreaspróximas - nos atuais municípios de Porangatu, Minaçu e
Santa ïbresinha, cujos habitantes não haviam vivenciado a Revolta do Formoso' mas nela se inspiraram
para deflagrar movimentos de posseiros-, registram
versÕes muito semelhantes à apresentada por
-]
JJ
Fernandes:lá estavamasquadrinhasadaptadasdo livro de Cervantes,os diiílogos literais, as referênciasa
personagense episódios da obra.
Na região de Uruaçu já existia, portanto, uma
forte tradição de origem ibérica, da qual o Ìivro
Dom Qukote de Ia NÍancha fazia parÍe, expressando-a e reforçando-a; esta tradição era constantemente reelaboradapeia população local, por meio
de rituais e da memória coletiva. Foi a ela que
Fernandesrecorreu,para construir seu depoimento
sobre a Revolta do Formoso. Lq3gg-p"rt""t",d*_
um grande mentiroso, Fernandesverbalizara, em
seu depoi
cínios e sentimentos profundamente enraizados na
memória coletiva de sua região e grupo social de
origem.
revolta, ele construiu uma narrativa original, mes-
de antieastradicÕes,assimiladaslocalmente.
No relato de Fernandes, a "memória herdada"
-
a"i
A históriafalada...e gravada
Nosanos50do secuioXX apósa invençãodo
gravadora fita,iniciou-se
nosEsadosUnidos,Europa
quesebaseia
de pesquisa
e Méxicoumametodologia
nagravaçâo
de tesÊemunhos
sobreacontecimentos,
instituições,
modosde vidae ouçros
conjunruras,
da históriacontemporânea:
a hiscória
onl.
aspectos
difundidanasduasdkadasseguintes,
Bastante
a
oanir de 1980elaconsolidouum Dermanente
entreosquea praricam:nãoso
intercàmbio
historiadores
e anropólogos,comocientistas
políticos,pedagogos,
teóricosda Iiteratura,psicólogos.
No Brasil,
a metodologiafoi insroduzidanosanos
7Ocom a criaçãodo Programa
de HistóriaOnl do
difundindo-se
CPDOC,da Fundaçâo
Geúlio Vargas,
a panir dosanos90,quandofoi criada
especialmente
Brasileira
de HistóriaOral,em 1994,com
a Associação
membrosde todo o paísquesereúnem
periodicamente
regionais
e nacionais,
emencontros
editamumarevistae contamcom um porËl:
www.cpdocfuv/abho.
]l1
g:-
esquemas inconscientes de percepção, representa-
çãilãçãõÉEícritos no@
:
=
o
o
I
;
o
ABREU,
Sebastião.
A guenilha do Zé Pcrfrio.
3rasilia:
Coeihe,1985.
AMÀDO, Janaína.
" Euquero ser uma
pessoa:
revolracamponesae polítìcano
e .t1 <tl "
Do<ÌArô
^o
<
1993,çp. 17-69.
CARNEIROMaria
A revolra
Esperança.
campanesade Formoso
e Trombas.Coiània:
te o "homem de onte
das tradições ibéricas para as tradições goianas - e
g_o*tatfofçaeniq49?4
Parasabermais
Cegraí1981.
lata de lixo, ou o fundo de gaveta,onde, desde1979,a
deixei. fulassegundoa concepçãoaqui adotada- que
relaciona a vivência e as memórias de un ser hugtano com seu tempo, com o a4lerior e çgJS!_futulgsociando,em vários níveis e de vários modos, real e
simbólico, história e memória, memória e imaginação,tradição e invenção,fi.cçãoe história -, é possível
oferecer uma resposta para o enigma de como g
nos gestos,no riso de Fernandes.Por essalinha de
interpretação, Fernandes não apenas não mentiu,
em seu relato, como se mostrou profundamente
verdadeiro, ao recorrer a códigos mentais, psicológicos e corporais inscritos no seÌl íntimo.
em seu cavalo
Relegar a plano secundário as relações entre me@ontado
mória e vivência, entre indivíduos e grupos sociais, Rocinante, atravessouoceÍÌnospara lutar contra moientre tempos e entre culturas é imobilizar o passado nhos de vento nos longínquos sertõesde Goirís.n
nas cadeias cronológicas de um "real" onde residiria
sua "verdadeira naturezao,a ser "resgatada" pelos hisJ,c.Ì.reÍN,f Âu.roo é prof*mra tinlar aposetttada
toriadores.De acordo com essaconcq:ção,a entrevis-. do Departamento ìle História ila Universidade de Brasíliata de Fernandes não serve para nada; seu destino é a No momento, além dahistória, dedica-seà fiqÀo.
Paisagem
do cerrado
goiano,para onde
FernandesrÍansportou
as andançasde Dom
Quixote de la Mancha,
projetando as
peripéciasdeste na
vida do líder da
Revoltado Formoso,
JoséPorfírio
t17
Ja n e ín aA madc - ü Gr andeM entii' os+
" N e s t ec a s o,rn e re fi roa u m i mp o r tantemovimentosocialpr ovocadopelaocupaç ãode
q ue teve lr .r gar
er n ur na pr ovínciado inter lordo Br as íl
t e r r a s p o r pa rte d e ca mp e si n o s,
- G o i a s- e ntre o s a n o s 5 0 e 5 0 , e que é conhecidocomo Revoitacio For moso.M ai s
q u * ü m o vi me n toe m sí me smo, no momento nos inter essao r elato de um dos
!n l e g r a n t e scj o g ru p o q u e fo i l ar gamente entr evistadopela histor iador aJa naína
A m a d o l l *j .I n i ci a l me n teco
o r elatocje Fer nandes- a infor m ante, n ta a h istor iacior a,
não pocie ser aproveìtaciopara a reccnstrução histórica porque parecia rnuito
fa n t a s i o s o ,€ ffi a l g u n s a sp e cto s,se desviavadenr aisdos r elatos dos dem ais . M as
p a s s e c c su n s q L j a n to sa n o s, a h istcr iadcr adecidiu r evisar as entr el,istase se deu
c *= l * d e q ue a ve rsã o d e F e rn a ndescombinavafatos histór icoseom r em inisc ênc ías
t;+ rii-?:!
-i úl -: iü5,
--
íf o s e u i n f crme , * mo vi me n to de um m cdo ger ai apr esentavauma tr ama bem
artlculadeentre + eipicoe a farsa. O Êíderda revolta - JoséForfíricde Souza- aparecia
co m o a e n c â rn a çã o
d e D a n Qu i xo tee a íoucur aeiocavaleir ose manifestavana r e v ol ta
cj o c a m p c n ê sp e ra n te a s tre me n dasinjustiçasna ár ea r ur al br asileir a"O r itual de
i n ì c i = ç ã cd e i o sé P o rfi ri an a mi i ítançase asser nelhava
a um a par odiado batism ode
D *; ";Ç ' ; i x o teco mo ca va i e i ro C
. o n tava,além ciísso,com a pr esençaconstantede um
co i "n p a n h ei ro
e m to d a s su a s a çõ es políticasao estilo de um Sancho Panzae ti nha
t a m b é m u m ca va i o ch a ma d * R ocinante,quando në ver dade, segundo dizem os
entr e
d e m a í si n f o rma n te s,Jcsé P o rfíri oRer nsequerteve um cavaio.As coinciciênci as
o i - e l a t od e Fe rn a n d e se ã o b ra d e Cer vaniessão vár iasej ccm c dissea histar ï ador e,
n ê o c a b i a md ú vi d a sd e q u e o i n fer m antehavia se inspir aejo
no Quixoiepar a com por
n * s l r = i m a gi n a çã ou ma ve rsã oq uixoiescada Revolta,Mas como explicara pr es enç a
d e u : r i a o b ra d e tra d i çã o e ru d i ta em ur n povo que, além de viver er n condi ç ões
b;tsïarit*precérías,eonta corr!um çrande número de analfabetos?
O c r - : r ì *s *é q u e d e p o Ìsd e u m i e nço tem pc, passandopor fontes or ais e escri tas ,a
n i - *r + r i a c i och
ra e g o ua a i g u ma sco nc!i;sões
bastantesugestivas.Em pr im eír olug ar s e
l-;c*r;r=abenio-cueFernandeslia regularmentea Quíxate e desde 194? tinha uma
e *i ç ã * p r e s e n te a i ap cr se u a vô . Logosoubetamb,ér lde que não só Fer nandesc om o
g r a n d ep a r te d a s p e sso a sd o p o voado( Ur uaçu) ,nascidaantes dos anos 50, conhec i a
a *b r e . M u ito s d e i e s se l e mb ra var nde haver ouvido as histor iasdo cavaleir ode l a
se r eunia m na
i { a n c h a c o n ta d a sp C Irp e sso a sd e m ais idade que tr adicionalmente
p r ã Ç ar n a i ora o e n ta rd e ce re re l a tavamou lÍam as incr íveishistór iasde Don Qu i x ote
D ã r ar J r ' ÌE r u p o h e te ro g ê n e od e h om ens,mulher es,cr ianças,camponeses,peq uenos
c c m e r c ! a n i -s,n a si :a g ra n d e ma ior iaanalfabetos.Estes,por sua vez, par tici pav am
*t!i,'ai-::entedas aventuras carraiheirescasfazendo comentários e especial;'nente
relaeì*rrando
a historiacorn c!rcunstâncias
da vida, A entradado Çuixofe nesta regiãc
d c i : r t e r i o rbra síi e i rÕ
cco ri e n a se gundametade do séculoXVïiI, quando cheEamos
t':
prin"leiroshornensbr6pçç5i1'
N* easc da Revoita da Formosc, ocorre um perfeito processode'apropriaçãoda obra
d e C e r v a n te s,A fi g u ra d o ca va l h eir ose coniundecsm a do lídei-cam ponêsê s e um
i u r a *e i o r e sta b e l e ci me n to
d a o rcjemda cavalar iaandante,c outr o m ilita a favor da
ju s t i ç e s c c i a !.Os ra sg o sd e l o u cur ase confundemcom o her oísnno
cavalheir es ceo ã
visã* cjc nai'reciorgarante urn ponto de vista instávelque se move entre o sério e c
c ô m i c o . t v Ìa sse m d ú vi d a , o mais sur pr eendentedo infor m e de Fer nande sé a
!d e a ! i z e ç ã oq u e cri a so b re u m mcvimento social, estabeiecendoum jogo entr e
: m *ç i n a ç ã o e ve rcj a d e h i stó ri ca que Í' ecuper a,quixotescamente,a ja anti ga
ccr-rt:'cv*rsia
das fronteiras e as cÕn€xõesentre literaturae vieia."
"Ãc,ir:./esde prornover
em tcrnc dela,uma narrativa
construiu,
o resgatehistórico
da ;'evolta,
orìçi*ai, rnesclando acontecirneniosverídicos, existentes ilo n'lovimento, com ti'amas,
;io m e n cla turas
e simbologias
s c a lme n t e {"Ã MA DO ,1 9 9 5 , p ,
de antiE a st ra d iç õ e s a, s s imila c ialo
1?1\
aJr
l.

Documentos relacionados