A CRIAÇÃO DO SUPREMO TRIBUNAL IRAQUIANO

Transcrição

A CRIAÇÃO DO SUPREMO TRIBUNAL IRAQUIANO
DIREITO,
SEGURANÇA E
DEMOCRACIA
Nº 28
MAIO
2016
A CRIAÇÃO DO SUPREMO TRIBUNAL
IRAQUIANO
MARIA JOÃO DIAS CARAPÊTO
Mestre em Direito e Segurança
RESUMO
Após a ocupação do Iraque em 2003 coube às forças da Coligação e ao novo
Conselho Interino de Governação adotar a solução para o julgamento de crimes
praticados durante o regime de Saddam Hussein. A opção por um tribunal interno, em vez
de um tribunal internacional, resultou num grande debate sobre a legitimidade deste,
sobre as responsabilidades e limites das potências ocupantes e a falta de preparação dos
juízes iraquianos para julgar crimes de guerra, genocídio e crimes contra a Humanidade.
As críticas e a sua tentativa de superação levaram à substituição do Tribunal
Especial Iraquiano para Crimes contra a Humanidade pelo recém-criado Supremo
Tribunal Iraquiano que veio a julgar Saddam Hussein e os altos membros do partido
Ba’ath no caso Dujail.
ABSTRACT
After the occupation of Iraq in 2003, both Coalition and the new Interim Governing
Council had to find a solution to trial the crimes committed during Saddam Hussein
regime. The solution of creating an Iraqi Tribunal instead of an international tribunal raised
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the debate about its legitimacy, the main responsibilities and limits of the occupation
powers and the lack of preparation of the Iraqi judges to trial War Crimes, Genocide and
Crimes against Humanity.
The criticism and the need of a final solution resulted on the replacement of the
Iraqi Special Tribunal for Crimes Against Humanity Statute for the new Iraqi High Tribunal
that trial and convicted Saddam Hussein and the high members of the Ba’ath party in the
Dujail case.
PALAVRAS-CHAVE
Iraque. Saddam Hussein. Tribunais Internacionais. Crimes contra a Humanidade.
Supremo Tribunal Iraquiano. Direito Internacional Humanitário. Dujail
KEYWORDS
Iraq. Saddam Hussein. International Courts. Crimes against Humanity. Iraqi High Tribunal.
International Humanitarian Law. Dujail
LISTA DE ABREVIATURAS,SIGLAS E ACRÓNIMOS
AI –
APC –
Amnistia Internacional
Autoridade Provisória da Coligação
CETC –
CS –
CV –
ESTI –
ETEICH –
ETESL –
ETPI –
ETPIJ –
ETPIR –
HRW –
Câmara Extraordinária dos Tribunais do Camboja
Conselho de Segurança
Convenção
Estatutos do Supremo Tribunal Iraquiano
Estatutos do Tribunal Especial Iraquiano para Crimes contra a Humanidade
Estatutos do Tribunal Especial para a Serra Leoa
Estatutos do Tribunal Penal Internacional
Estatutos do Tribunal penal Internacional para a antiga Jugoslávia
Estatutos do Tribunal Penal Internacional para o Ruanda
Human Rights Watch
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JIC –
ONU –
TEICH –
TESL –
TPI –
TPIJ –
TPIR –
STI –
Juiz de Instrução Criminal
Organização das Nações Unidas
Tribunal Especial Iraquiano para Crimes contra a Humanidade
Tribunal Especial para a Serra Leoa
Tribunal Penal Internacional
Tribunal Penal Internacional para a antiga Jugoslávia
Tribunal Penal Internacional para o Ruanda
Supremo Tribunal Iraquiano
INTRODUÇÃO
Doze anos decorridos sobre a invasão do Iraque e quase dez do julgamento do
Caso Dujail importa trazer à discussão o tema do julgamento de crimes de guerra, de
genocídio e de violação de Direito Humanos, na perspetiva da análise da discussão
inerente à criação do Tribunal que julgou Saddam Hussein e os altos membros do partido
Ba’ath.
A criação daquele que é hoje o STI trouxe um intenso debate sobre os limites
impostos à Coligação pela Convenção de Genebra, em matéria de responsabilidade das
potências ocupantes e a opção da criação de um tribunal interno em vez de um tribunal
especial como o TESL, o TPIR ou TPIJ.
Como opção metodológica e pelo interesse no debate, o presente trabalho
debruça-se sobre as principais questões que estiveram na base da criação dos ETEICH e
o resumo das principais alterações que ficaram consagradas definitivamente nos ESTI.
Os temas da problemática posterior e que respeitam à matéria da prova e violação
dos princípios de direito penal e do direito penal internacional não fazem parte da opção
metodológica que norteia as reflexões que se seguem.
Por fim, não sendo um tema novo na comunidade jurídica internacional, entre nós o
debate destas matérias em torno da justiça de transição tem sido pouco expressivo.
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CAPÍTULO I – O IRAQUE ANTERIOR À OCUPAÇÃO PELA
COLIGAÇÃO – SÚMULA HISTÓRICA
Após a independência do Reino Unido em 1932, o panorama social e político
iraquiano sofreu inúmeras mutações e o país passou por intensos conflitos armados,
golpes de estado, violência e graves violações de Direitos Humanos.
Em Julho de 1968, um grupo de militares Ba’ath tomou o governo do país e durante
mais de 35 anos Saddam Hussein liderou a criação de um Estado violento e responsável
por graves violações de Direitos Humanos. Durante os anos 90, as organizações e grupos
internacionais de defesa dos Direitos Humanos procuraram recolher a prova da
perpetração dos crimes que levaram à elaboração de detalhados relatórios,
nomeadamente os da Comissão de Direitos Humanos da ONU (1991) e da HRW (1990)
que apontaram ao regime a prática dos seguintes crimes:
Entre 1977 e 1987 a destruição de 5.000 aldeias curdas com expulsão dos seus
habitantes;
O Massacre de Dujail no seguimento de um atentado executado contra Saddam
Hussein na cidade de Dujail em 8 de Julho de 1982;
A morte de milhares de civis curdos com recurso a bombardeamentos e armas
químicas;
Deslocação forçada da população da cidade de Kirkuk (cerca de 120.000 civis
curdos, sírios e turcomanos) entre 1989 e 2003 e a sua substituição por civis árabes do
Sul do Iraque;
A execução de cerca de 100.000 homens e rapazes curdos (e outros não-árabes)
durante a Campanha al-Anfal entre 1986 e 1989;
Múltiplas violações do Direito Internacional Humanitário durante a Guerra IrãoIraque entre 1980 e 1988 e a ocupação do Kuwait em 1990 (uso de armas químicas,
ataques indiscriminados, execuções sumárias, tortura, violações, desaparecimentos).
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Atendendo à publicidade internacional do conjunto de violações de Direito
Humanos, a ocupação pela APC motivou a necessidade da investigação e acusação dos
crimes praticado pelos líderes governamentais e militares. O problema que foi levantado
nesta altura, foi o da melhor solução para a aplicação da justiça internacional, de modo a
que não existissem dúvidas quanto à sua firmeza, independência e eficácia, mas também
para que contribuísse para que os iraquianos voltassem a confiar no seu sistema judicial
e para que se afastasse a ideia do sentimento de impunidade.
Em Março de 2003 e apesar das inúmeras alegações de ilegalidade, os EUA e as forças
da Coligação invadiram o Iraque 1.
CAPÍTULO II – AUTORIDADE PROVISÓRIA DE COLIGAÇÃO
A APC foi criada como governo de transição após a invasão do Iraque e era
formada pelos Estados Unidos, Reino Unido e pelos seus aliados com legitimação
legitimada pela Resolução n.º 1483/2003 do CS da ONU adoptada em 22 de Maio de
1
De acordo com a perspetiva das forças da Coligação, a intervenção era legitimada pelas seguintes Resoluções do
CS: (Foreign and Commonwealth Office, 2003)

Resolução n.º 660 de 2 de Agosto de 1990 – O CS ordenava ao Iraque que retirasse as suas tropas de
ocupação do Kuwait;

Resolução n.º 678 de 29 de Novembro de 1990 – Autoriza todos os Estados membros a auxiliar o Governo do
Kuwait para implementar a Resolução n.º 660 com vista a assegurar a paz e a segurança na região;

Resolução n.º 687 de 3 de Abril de 1991 – O CS decide que o Iraque deve destruir as armas químicas,
nucleares e biológicas e limitar o alcance dos seus mísseis em 150km. Para fiscalizar o cumprimento deste
desarmamento foi instalada uma comissão da ONU para o efeito (a UNSCOM, substituída em 1999 pela
UNMOVIC);

Resolução n.º 1441 de 8 de Novembro de 2002 – Decisão do CS de oferecer ao Iraque uma «última
oportunidade de cumprir com as suas obrigações de desarmamento segundo as resoluções relevantes do
Conselho» e «instaurar um regime reforçado de inspeção com o objetivo de realizar total e comprovadamente o
processo de desarmamento previsto pela Resolução n.º 687 de 1991 e resoluções subsequentes do Conselho».
A Resolução referiu ainda que «o Conselho alertou repetidamente o Iraque »que, caso continue a infringir as
suas obrigações, enfrentará consequências graves”.
De referir ainda, que o CS não previa expressamente a utilização da força contra o Iraque na Resolução n.º 1441 de
8 de Novembro de 2002. Esta Resolução seria um aviso ou uma última oportunidade. Para que esta invasão
estivesse legitimada na decisão do CS este órgão teria de autorizar expressamente o uso da força utilizando uma
nova Resolução.
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2003. Foram investidos na APC poderes executivos, legislativos e judiciais sobre o
Governo iraquiano desde 21 de Janeiro de 2003, até à sua dissolução em 28 de Junho de
2004 sob o lema da «Segurança, Liberdade, Igualdade e Justiça».
Em Julho de 2003 foi formado o Conselho de Governação Iraquiano, composto
largamente por iraquianos expatriados durante o período ditatorial. Era subordinado à
APC e tinha como responsabilidades a indicação de membros representantes na ONU, a
indicação de ministros interinos para o Governo iraquiano e a elaboração de uma
Constituição temporária até à adoção de uma nova de carácter permanente.
Seis meses após a captura de Saddam Hussein, a APC transferiu os poderes que
lhe foram conferidos para o novo Governo Interino do Iraque, que se manteve em funções
até à realização de eleições.
Durante o período da ocupação urgia discutir as soluções para o julgamento dos
crimes cometidos durante a ditadura e a necessária reforma judicial, e que foram foco da
atenção das organizações de defesa dos Direitos Humanos. As preocupações visavam a
necessidade da realização da justiça penal e a defesa dos arguidos, garantindo a
independência e imparcialidade dos tribunais face à autoridade executiva governamental.
De outra maneira, seria posta em causa a obtenção de prova e a realização de um
julgamento justo, equitativo e fundado nas normas de direito internacional (AI, 2003).
O sistema penal iraquiano existente não era compatível com a defesa dos Direitos
Humanos, nem com as normas internacionais (existiam julgamentos injustos, os juízes
não eram independentes, era frequente o recurso à tortura, à pena de morte e às penas
infames e degradantes) o que punha em causa o julgamento dos arguidos de forma justa
e imparcial. Como solução, a AI (idem) propôs a criação de um Tribunal Internacional (à
semelhança da ex-Jugoslávia ou do Ruanda) criado pelo CS ou pela Assembleia-geral da
ONU, composto por juízes internacionais e por juízes iraquianos como forma de garantia
de justiça e conformidade com as regras internacionais.
As obrigações da potência ocupante no Direito Internacional
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As obrigações das potências ocupantes encontram-se previstas em vários
instrumentos de Direito Internacional, nomeadamente a II CV relativa às Leis e Costumes
das Guerras Terrestres, adoptada em Haia em 29 de Julho de 1899 e o respetivo
Regulamento de 18 de Outubro de 1907, a IV CV de Genebra de 12 de Agosto de 1949
relativa à proteção devida às Pessoas Civis em Tempo de Guerra, o art. 75.º do Protocolo
Adicional das CV de Genebra relativo à Proteção das Vítimas dos Conflitos Armados
Internacionais de 8 de Junho de 1977, as normas do Direito Internacional
Consuetudinário, os manuais das Forças Armadas do direito aplicável à guerra terrestre
(britânicos e americanos) 2 e as disposições dos Tratados de Direitos Humanos.
O art. 42.º do Regulamento de Haia de 1907 define que se «considera um território
como ocupado quando se encontra colocado de facto sob a autoridade do exército
inimigo. A ocupação estende-se apenas aos territórios onde essa autoridade esteja
estabelecida e em condições de exercê-la». Esta definição estabelece dois requisitos
cumulativos para aplicação do direito de ocupação beligerante: por um lado, o controlo
efetivo de facto do território pelas forçadas armadas estrangeiras, munidas da
possibilidade de execução de decisões e a ausência de facto de uma autoridade
governamental com controlo efetivo. A cumulação destes requisitos imputa a
responsabilidade à potência ocupante por zelar por uma população desprovida de um
Governo e que não tem condições de desempenhar as suas funções com normalidade.
A potência ocupante só pode exercer a autoridade necessária para administrar o
território sob uma lógica de intervenção mínima (Deyra, 2001) e em estrita obediência ao
art. 64.º da IV CV de Genebra, do qual derivam as obrigações das potências em matéria
de ocupação, nomeadamente: a necessidade de aliviar o sofrimento da população civil
das consequências da ocupação militar, a intervenção para assegurar o bem-estar da
população e o direito do ocupante a garantir a segurança das suas forças e por fim, a
necessária intervenção e autorização explícita para fazer alterações às leis internas
dentro de circunstâncias limitadas.
2
The Law of War on Land, 1998 (UK); The Law of Land Warfare, department of the army field manual,
1956 (USA)
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A APC era dotada de uma autoridade de caráter provisório que se limitava à
prestação de assistência e proteção de emergência e à prioridade de restabelecimento da
vida normal dos iraquianos. Esta substituição do governo compreendia a responsabilidade
de execução de funções ligadas à administração do território e podia estabelecer uma
administração civil provisória, mas sem modificar as estruturas estatais já existentes,
nomeadamente a realização uma reforma substancial da justiça penal.
Esta capacidade limitada para alterar a justiça penal decorre diretamente do art.
64.º da IV CV de Genebra e do art. 31.º da CV de Viena sobre o Direito dos Tratados, de
23 de Maio de 1969 e estabelece o princípio de continuidade do ordenamento jurídico,
quer em matéria civil, quer em matéria penal. Apesar destas disposições, o direito
internacional confere algumas faculdades de modificação, suspensão ou substituição da
lei penal existente no território ocupado, com vista a restabelecer o domínio da lei e do
Direito até que a ocupação cesse.
CAPÍTULO III – OS ESTATUTOS DO TRIBUNAL ESPECIAL
IRAQUIANO PARA CRIMES CONTRA A HUMANIDADE
Na elaboração dos ETEICH existiu o objetivo da construção de um sistema judicial
justo e efetivo, a garantia do respeito dos direitos dos cidadãos, independentemente das
suas convicções religiosas, origem étnica ou género a par da necessidade do povo
iraquiano dirigir todo o processo de transição da justiça.
O TEICH foi criado através de uma delegação de competências da CPA no
Conselho Interino de Governação, com o objetivo de julgar os «Crimes e atrocidades
cometidos pelo antigo regime Iraquiano (…) e para prevenir toda e qualquer ameaça à
ordem pública por ações de vingança e para promover o domínio do Direito de acordo
com o direito internacional aplicável». 3
3
Ordem n.º 48 da CPA de 12 de Outubro de 2013 “DELEGATION OF AUTHORITY REGARDING AN
IRAQI SPECIAL TRIBUNAL“ - secção 1.º. (tradução nossa).
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Os ETEICH definiram que o Tribunal se designaria de Tribunal Especial Iraquiano
para Crimes Contra a Humanidade, firmando com ele o Princípio da Independência, numa
tentativa de rutura com o regime anterior que controlava de perto os juízes e as decisões
dos tribunais. O TEICH teria sede na cidade de Bagdade, ou em qualquer outra em
território iraquiano desde que tivesse sido feita proposta pelo Presidente do Tribunal ao
Conselho de Governação ou ao governo que lhe sucedesse. 4
A secção n.º 2 da Ordem n.º 48 da CPA de 12 de Outubro de 2013 sobre a
delegação de competências no Conselho Interino de Governação elencou a missão e
objetivos do Tribunal e previu como requisito a descrição completa dos elementos
constitutivos aplicáveis aos crimes previstos nos ETEICH e que deveriam ser compatíveis
com a lei iraquiana, com as ordens da CPA e com o Direito Internacional. Era exigido ao
tribunal que cumprisse os requisitos dos padrões internacionais de justiça, mas no caso
de conflitos futuros (por ocasião da transferência da autoridade de transição) entre a
promulgação de ordens da CPA e as regras do Tribunal, as ordens da CPA
prevaleceriam. Por fim, a ordem previu que pudessem ser indicados juízes estrangeiros
para o Tribunal.
O âmbito jurisdicional dos crimes cometidos nos artº. 11.º a 14.º 5 compreendia
cidadãos nacionais iraquianos ou residentes no Iraque e no âmbito temporal eram
compreendidos os crimes cometidos entre 17 de Julho de 1968 e 1 de Maio de 2003. Por
sua vez, eram compreendidos no âmbito territorial os crimes que tivessem sido cometidos
no território da República do Iraque ou noutro lugar, incluindo os crimes cometidos em
conexão com as guerras do Iraque contra a República Islâmica do Irão e o Estado do
Kuwait e a jurisdição dos crimes previstos nos arts. 12.º e 13.º 6 cometidos contra o povo
iraquiano (incluindo árabes, curdos, turcomanos, sírios, xiitas e sunitas) e que tivessem
sido cometidos ou não, em conflito armado.
4
Arts. 1.º e 2.º dos ETEICH
5
Crime de genocídio, crimes contra a Humanidade, crimes de guerra e violação de certas leis iraquianas
6
Crimes contra a Humanidade e crimes de guerra
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No que respeita à organização, o tribunal judicial era composto por uma ou mais
Câmaras de Julgamento e uma Câmara de Recurso (com poderes de revisão das
decisões da Câmara anterior). Existiam JIC, uma Procuradoria e um Departamento de
Administração encarregue dos serviços administrativos do tribunal judicial e da
Procuradoria.
As Câmaras de Julgamento eram compostas por juízes independentes
permanentes e juízes independentes de reserva, sendo cada Câmara composta por cinco
juízes permanentes. A Câmara de Recurso era composta por nove membros e logo que
designada, a própria Câmara escolhia de entre os seus membros o que ocuparia o cargo
de Presidente. Nenhum membro das Câmaras de Julgamento podia ser simultaneamente,
membro da Câmara de Recurso ou JIC. O Presidente da Câmara de Recurso era também
o Presidente do Tribunal e competia-lhe a supervisão dos aspetos administrativos e
financeiros da instituição.
O Conselho de Governação, no caso de considerar necessário, podia indicar para
qualquer uma das Câmaras, juízes estrangeiros com experiência em crimes previstos nos
ETEICH com a exigência de um elevado carácter moral, imparcialidade e integridade. A
composição das Câmaras era assegurada pela experiência em Direito penal de cada um
e os candidatos iraquianos às Câmaras de Julgamento não tinham de ser juízes em
exercício de funções, bastando que fossem advogados ou juristas (com a necessária
experiência e qualificação) mas na Câmara de Recurso não existia essa possibilidade.
A nomeação e designação dos juízes eram feitas pelo Conselho de Governação, após
consulta do Conselho Judicial e eram excluídos os juízes que tivesse registo criminal,
exceto se a condenação fosse política por falsa acusação feita pelo regime Ba’ath, que
tivessem prestado falsas declarações ou que não tivessem cumprido os seus deveres
sem razão atendível.
Cabia ao Presidente do Tribunal nomear conselheiros ou observadores
estrangeiros para as Câmaras de Julgamento e de Recurso que tinham a tarefa de
prestar auxílio aos juízes em matéria de Direito Internacional e partilhar a sua experiência
em tribunais semelhantes. Na escolha destes peritos não-iraquianos o Presidente do
Tribunal tinha o direito de requerer assistência da comunidade internacional, incluindo da
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ONU. Ao conselheiro ou observador era-lhe exigido que tenha tivesse intervenção judicial
ou de procuradoria no seu país de origem e que tivesse experiência em julgamentos de
crimes de guerra ou em tribunais internacionais.
Os JIC eram designados para investigação de crimes previstos nos arts. 11.º a 14.º
e eram designados e nomeados pelo Conselho de Governação, após consulta do
Conselho Judicial. Tinham o poder de emitir mandados de comparência e de detenção
sobre os indivíduos sob investigação e competência para recolher prova de todas as
fontes que considerassem adequadas ao processo. Eram independentes e atuavam como
órgão autónomo do Tribunal sem que pudessem procurar ou receber instruções de
qualquer departamento governamental ou de outra origem, incluindo o Conselho de
Governação, mas as suas decisões eram sindicáveis perante a Câmara de Recurso.
Cabia ao Juiz Chefe do Tribunal de Instrução nomear conselheiros ou observadores
estrangeiros para as Câmaras de Julgamento e de Recurso com o papel de prestar
assistência aos juízes em matéria de direito internacional e partilhar a experiência em
tribunais semelhantes. Na escolha destes peritos, o Presidente do Tribunal tinha o direito
de requerer assistência da comunidade internacional, incluindo da ONU. Ao conselheiro
ou observador era-lhe exigido que tivesse intervenção judicial ou de procuradoria no seu
país de origem e que tivesse experiência em julgamentos de crimes de guerra
internacionais ou tribunais internacionais.
No art. 10º. Parte I Secção 3 são elencados os crimes sob jurisdição do TEICH:
a)
Crime de genocídio;
b)
Crimes contra a Humanidade
c)
Crimes de guerra ou
d)
Violações de determinadas leis iraquianas elencadas no art.º 14.º.
As definições destes crimes percorrem os artº. 11.º a 14.º e fundamentam-se nos
instrumentos de Direito Internacional: o conceito de genocídio manteve-se na definição
prevista na CV para a Prevenção e Punição do Crime de Genocídio de 9 de Dezembro de
1948 7, os crimes contra a Humanidade foram definidos como os atos cometidos como
7
Ratificada pelo Iraque em 20 de Janeiro de 1959
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parte de um evento ou ataque sistemático dirigido contra qualquer população civil e a
definição de crimes de guerra era a prevista nas CV de Genebra de 12 de Agosto de
1949. Eram igualmente punidas as violações de determinadas leis iraquianas, como a
tentativa de manipulação por parte de pessoas exteriores ao sistema judiciário, das
pessoas que nele exerçam funções 8, o desperdício de recursos naturais e de fundos
públicos em violação do art. 2.º da Lei n.º 7 de 1958 e o abuso de posição e prossecução
de condutas que pudessem conduzir a uma ameaça de guerra ou uso das forças
armadas contra qualquer país árabe. 9
O art. 17.º previa a aplicabilidade dos princípios gerais do processo penal em
conexão com a acusação e julgamento de qualquer pessoa acusada e que derivavam
diretamente do Código Penal de 17 de Julho de 1968 (para os crimes que sejam
cometidos ente 17 de Julho de 1968 e 14 de Dezembro de 1969), da Lei n.º 111 de 1969
que promulgou o Código Penal Iraquiano para os crimes cometidos entre 15 de
Dezembro de 1969 e 1 de Maio de 2003 e os princípios previstos na Lei n.º 23 de 1971
que contém o Código Processual Penal Iraquiano. Na interpretação dos artº. 11.º a 13.º
as Câmaras de Julgamento e de Recurso podiam socorrer-se das decisões relevantes
dos tribunais internacionais para fundamentar as suas decisões. As causas de exclusão
da responsabilidade penal previstas no Código Penal Iraquiano deveriam ser
interpretadas de maneira consistente com os Estatutos e com as obrigações
internacionais dos crimes que se encontram na jurisdição do tribunal. Por fim, os crimes
11.º a 14.º não teriam qualquer limitação imposta pelos Estatutos 10.
CAPÍTULO IV – A OPÇÃO POR UM TRIBUNAL INTERNO
A discussão em torno criação do Tribunal visou a necessidade de garantir um
julgamento justo, independente e com a observância das garantias dos arguidos e da
8
Em estrita violação do previsto na Constituição iraquiana de 1970
9
Nos termos do art. 1.º da Lei n.º 7 de 1958
10
Nos termos do Secção 6.º art. 17.º dos ETEICH
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proteção das testemunhas, mas também cumprir os objetivos da punição de crimes de
enorme gravidade, como os princípios da justiça retributiva, da prevenção, da
reconciliação e o dominio da Lei e do Direito (Drumblr, 2006).
A opção por um tribunal interno, fundado no direito iraquiano mas com obediência
aos princípios do Direito internacional, contrariou a tendência do recurso à justiça penal
internacional. A não utilização de um modelo de tribunal já existente para crimes
semelhantes, a falta de preparação dos juízes para julgar crimes complexos e os
constantes argumentos de falta de legitimidade do tribunal contribuíram para a
generalização do sentimento de «Justiça dos Vencedores» na opinião pública. 11
4.1 O argumento dos modelos de tribunais internacionais já existentes (TPI, TPIJ,
TPIR, TESL)
O recurso ao TPI ficou resolvido com o argumento de os EUA não serem EstadoParte dos Estatutos de Roma, mas mesmo que o CS da ONU denunciasse a situação ao
Procurador 12, era garantido o veto dos EUA (até porque o âmbito de jurisdição do TPI
poderia atingir os crimes de guerra cometidos pelas tropas americanas, à semelhança do
que está a acontecer atualmente com as tropas britânicas 13) e mesmo que assim não
fosse, a Rússia a França e a China vetariam o recurso por considerarem ocupação ilegal.
11
http://www.publico.pt/espaco-publico/jornal/a-justica-dos-vencedores-200461 [consultado em 09/01/2015]
http://www.telegraph.co.uk/news/yourview/1538161/Was-Saddam-Hussein-a-victim-of-victors-justice.html
[consultado em 09/01/2015]
http://www.atimes.com/atimes/Middle_East/HK08Ak02.html
[consultado
em
09/01/2015);
http://www.globalresearch.ca/war-crimes-and-the-trial-of-saddam-hussein-to-the-victor-belongs-thejudge-s-gavel/3741 [consultado em 09/01/2015]
12
Nos termos do art. 13.º alínea c) do Estatuto de Roma do TPI.
13
http://www.theguardian.com/uk-news/2014/dec/17/al-sweady-michael-fallon-rejects-comparison-bahamousa-abu-ghraib [consultado em 8 de Maio de 2015]
http://www.independent.co.uk/news/uk/politics/exclusive-devastating-dossier-on-abuse-by-ukforces-in-iraq-goes-to-international-criminal-court-9053735.html consultado em 8 de Maio de
2015
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Acresce a estes motivos, o princípio da não-retroatividade da Lei penal, atendendo a que
o TPI só seria competente para julgar os crimes cometidos após 1 de Julho de 2001.
Já o recurso a um tribunal híbrido, como o TESL ou a um tribunal ad-hoc como o
TPIJ ou o TPIR implicaria a intervenção da ONU 14 e, consequentemente uma reduzida
intervenção dos EUA no processo de criação do tribunal. Bassiouni (2004) defendeu que
o recurso a um tribunal internacional faria com que todo o processo fosse caro e moroso
15, e que esses fatores eram contrários à necessidade de recuperação da confiança no
14
Os Tribunais híbridos surgem em contextos próprios de recuperação pós-conflito ou crise interna e onde o Estado
não pode responsabilizar os autores dos crimes por violações do Direito Internacional Humanitário (Sorel, 2006).
Este tipo de tribunal assenta no pressuposto da destruição do sistema judicial e resulta de um acordo entre o
Governo nacional e a ONU (nos termos do preâmbulo do Estatuto do Tribunal). Os tribunais ad-hoc são criados por
Resolução do CS cuja menção está presente no preâmbulo dos Estatutos do TPIR e do TPIJ
15
Dados Estatísticos sobre os custos dos tribunais e casos julgados:
Dados do TPIR:
Genéricos:
Data de início:
Data de Fim:
Número de Pessoas acusadas:
Número de Pessoas que receberam uma sentença:
1994
Ainda em curso
93
61
Orçamentos anuais (em dólares americanos)
2010-2011: $257.000.000
2012-2013- $174.318.200
Dados disponíveis em http://www.unictr.org/en/tribunal [consultado em 7 de Maio de 2015]
Dados do TPIJ
Genéricos:
Data de início:
Data de Fim:
Número de Pessoas acusadas:
Número de Pessoas que receberam uma sentença:
1993
Ainda em curso
161
(Estão a correr 4 julgamentos de 4 pessoas, alguns com
datas marcadas para 2016; estão a correr 5 recursos
envolvendo 16 pessoas; foram encerrados processos
envolvendo 141 dos 161 arguidos)
Orçamentos anuais (em dólares americanos)
2014-2015: $ 179.998.600
2012-2013: $ 250.814.000
2010-2011: $ 286.012.600
Fonte: http://www.icty.org/sid/325 [consultado em 7 de Maio de 2015]
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14
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sistema judicial, mas também o envolvimento nacional no julgamento de crimes contra
iraquianos, reconciliando-se com o «Domínio da Lei».
Apesar de se tratar de um tribunal interno, o carácter internacional dos tribunais
parecia estar presente nos ETEICH, atendendo às semelhanças entre os arts. 11.º a 13.º
dos ETEICH e os arts. 6.º a 8.º dos ETPI e o TPI também prevê as fases de préjulgamento (o inquérito), o julgamento e o recurso, complementados pelas secções de
Acusação e Administração (Yuval Shani, 2004).
Já na comparação com os outros tribunais, as diferenças entre os Estatutos são
substanciais. O âmbito temporal dos crimes previstos nos ETEICH contempla os crimes
cometidos entre 17 de Julho de 196816 até 1 de Maio de 2003 e é superior ao dos outros
tribunais internacionais 17 . Nestes tribunais, é sempre possível a opção pela Lei
internacional e o corpo de normas apresenta um carácter sólido e coeso para o
julgamento de crimes graves, nos ETEICH isso não acontece porque o catálogo de crimes
deriva diretamente dos Estatutos e do Código Penal Iraquiano. Acresce ainda que a
composição internacional vertida nos outros tribunais é rejeitada no ETEICH, que prevê
apenas a intervenção de peritos internacionais na qualidade de observadores ou para
prestar aconselhamento.
Zappalà (2004, 856) afirma que o STI não é um tribunal internacional nem um tribunal
iraquiano stricto senso «porque é uma instituição híbrida com um sistema processual
híbrido» 18 porque não obedece ao sistema processual de outros tribunais internacionais,
nem é baseado no sistema processual iraquiano de civil law. A formação do TEICH tinha
Fonte:http://www.un.org/en/ga/fifth/66/Statements/144%20145%20International%20criminal%20tribunal
%20for%20Rwanda%20and%20International%20tribunal%20for%20the/C5_66_0m_ST_2011_12_13_Ite
ms%20144_145_ICTR_ITY_ASG_Controller.pdf [consultado em 7 de Maio de 2015]
16
17
18
Data do Golpe de Estado que consolidou o partido Ba’ath no Governo
Âmbito temporal dos principais tribunais internacionais:
CETC – Crimes cometidos entre 1975-1979 – Art. 1.º dos ESETC
TESL – Crimes cometidos desde 1996 – Art. 1.º dos ESTL
TPIJ – Crimes cometidos desde 1991 – Art. 1.º dos ETPIJ
TPIR – Crimes cometidos em 1994 – Art. 1.º dos ETPIR
O sentido que o autor procura dar a esta expressão é o da mistura entre sistemas e que não está
relacionado com o carácter híbrido de outros tribunais como o TESL.
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como fundamento a maior proximidade com o direito interno e a procura de um novo
sistema judicial, mas foi criado um organismo paralelo com regras e personalidade
próprias 19.
4.2 A falta de preparação dos juízes iraquianos
Os EUA sempre defenderam a ideia de um tribunal iraquiano e dissociado da ONU
e os ETEICH refletem essa opção porque os juízes iraquianos são selecionados por um
Conselho de Governação escolhido pela CPA, com a assistência de peritos internacionais
e com o financiamento americano 20.
Newton (2005, 35) considerou que após a queda do regime de Saddam Hussein,
quer o sistema legislativo, quer o sistema judicial «estavam corrompidos e tinham caído
sob o peso da tirania». A existência de juízes iraquianos, como manifestação da
independência dos tribunais, foi posta em causa porque a Constituição Iraquiana de 1968,
que vigorou durante a ditadura, enfraqueceu e abalou todo o sistema judicial iraquiano. O
isolamento destes juízes durante o regime fez com que o acesso à jurisprudência
internacional fosse restrito e consequentemente, originou a falta de preparação em
matéria de direito internacional e a experiência em casos de maior gravidade, problema
que Scharf (2004) propunha que se resolvesse com a utilização de um modelo
semelhante ao utilizado no TESL, composto por juízes iraquianos e juízes nomeados pelo
Secretário-Geral da ONU.
Zappalá (2005) levantou dúvidas quanto à verdadeira matriz de direito do tribunal,
atendendo a que este reuniria o melhor de dois mundos: a matriz civilística e a de
common law. O direito iraquiano é fundado no Direito Civil e no «Domínio da Lei» que
remonta a Hammurabi 21 e o processo penal é baseado na existência de um JIC que
19
E cuja expressão disto mesmo é a previsão dos Estatutos de pessoal não iraquiano.
20
http://www.judicialmonitor.org/archive_0306/spotlight.html [consultado em 9 de Maio de 2015]
21
Hammurabi nasceu na Babilónia, atual Iraque e morreu em 1750 a.C. Foi o sexto governante da I
dinastia da Babilonia (os Amoritas) e reinou de 1792 a 1750 a.C. Concebeu o Código de Hammurabi que
não é mais do que um Código sobre a governação justa, sendo considerado uma das leis escritas mais
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16
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dirige toda a instrução do processo e recolhe tanto a prova da culpa, como da inocência
que culmina no julgamento em que se decide da culpa ou absolvição do arguido. Nos
Estatutos, o papel do JIC não é claro e mistura-se a estrutura acusatória com a
possibilidade deste poder prender o suspeito, faculdade que é uma das principais críticas
ao sistema inquisitório. 22
Scharf (2004) salientou o facto de os crimes cometidos serem dotados de uma
especial exigência de perceção de imparcialidade, atendendo ao seu carácter grave e
complexo, e que os julgamentos justos e à luz do direito internacional constituíam uma
verdadeira transição para a democracia. O expoente desta perceção seria a
responsabilização de Saddam Hussein e dos membros do regime, facilitando a integração
e participação de um Governo composto por curdos, sunitas e xiitas e uma verdadeira
viragem na escolha dos novos líderes.
A construção dos ETEICH, bem como das regras processuais que os completam
pareceu seguir o caminho das normas internacionais, demonstrou vontade de transição e
a procura de efetividade e credibilidade dos julgamentos. Ainda assim, a independência
dos juízes 23 não foi acautelada porque estava previsto, que quer os JIC, quer os
Procuradores estavam proibidos de receber ordens ou instruções de qualquer membro do
Governo, o que não acontecia com os juízes de Julgamento e de Recurso. Por outro lado,
não estava prevista a possibilidade de escusa ou afastamento, nos casos em que tivesse
existido intervenção ou proximidade com o arguido, nos casos em que o Juiz tivesse um
interesse especial no caso (quer por relações pessoais ou profissionais com as partes em
juízo), ou que sobre ele tenha emitido pareceres ou opiniões e que, razoavelmente,
pudessem afetar a sua imparcialidade.
antigas da história da Humanidade. Fonte: http://www.britannica.com/biography/Hammurabi [consultado
em 9 de Maio de 2015]
Texto
completo
do
Código
de
Hammurabi
disponível
http://eawc.evansville.edu/anthology/hammurabi.htm [consultado em 9 de Maio de 2015]
em
22
Por via da tentação de utilização do poder de prisão como forma de ameaça ou pressão sobre o
suspeito.
23
Art. 14.º do Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e Políticos de 16 de Dezembro de 1966;
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Foi igualmente apontada a falta de preparação dos JIC e dos Procuradores para
lidar com os crimes complexos, atendendo à enorme quantidade de prova, complexidade
das investigações e à necessidade de conhecimentos na análise forense dos crimes. Os
processos desta natureza exigem conhecimentos e experiência internacional que podiam
não estar ao alcance quer dos JIC, Procuradores e até mesmo dos Juízes de Julgamento
e de Recurso pelo que, tentou superar-se essa dificuldade com a previsão nos ETEICH
da possibilidade de recurso a conselheiros e observadores internacionais, como
contributo assegurar o rigor da análise da prova.
No que respeita aos arguidos, o Direito Internacional consagra medidas de
proteção 24 que não ficaram espelhadas nos Estatutos, atendendo a que na fase de
investigação não estava prevista a proibição de prisões ou detenções arbitrárias, a
proibição da auto incriminação ou indução à confissão, proteção contra a coação,
ameaça, tortura ou tratamento cruel e degradante, não estavam previstas regras relativas
à utilização de intérpretes para os casos em que seja necessário comunicar na língua do
arguido e por último, não estava previsto o direito ao silêncio.
No que concerne às penas, os ETEICH previram a aplicação da pena de morte,
que é amplamente criticada e proibida em vários instrumentos do Direito Penal
Internacional 25, pelo que esta previsão veio corroborar a perceção de que tal pena é a
manifestação da vingança e não a verdadeira aplicação da Justiça (HRW, 2003).
Ao nível do direito processual penal, o Código Processual Penal Iraquiano de 1971
prevê a admissibilidade das confissões obtidas por coação física 26 e os julgamentos
24
Nomeadamente na fase de inquérito e todas as fases iniciais do processo. Os ETEICH revelam a
ausência de preceitos da Declaração Universal dos Direitos Humanos, das Regras Mínimas para o
Tratamento de Reclusos adotadas pelo Primeiro Congresso das Nações Unidas para a Prevenção do
Crime e o Tratamento dos Delinquentes, de22 Agosto a 3 Setembro 1955 e adotadas pelo Conselho
Económico-Social da ONU em 31 de Julho de 1957, ou do Conjunto Princípios para a Proteção de
Todas as Pessoas Sujeitas a Qualquer forma de Detenção ou Prisão da Assembleia Geral das Nações
Unidas aprovado em 9 de Dezembro de 1988.
25
Nos Estatutos de Roma, os ETESL, os ETPIR e os ETPIJ
26
Art. 218.º - It is stipulated that an admission must not have been extracted by coercion.
Foi feita uma alteração a este artigo pela CPA que eliminou o seguinte texto:“whether it be physical or
moral, a promise or a threat. Nevertheless, if there is no causal link between the coercion and the
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podem não ser públicos caso o tribunal assim o entenda, por razões relacionadas com a
segurança e a decência, previsões que contrariam os princípios e garantias de defesa
previstos nas normas internacionais.
No âmbito da tipificação dos crimes as críticas apontadas recaíram na jurisdição do
tribunal e nas definições incompletas de crimes que também estão previstos no Direito
Penal Internacional e no Direito Internacional Humanitário. Sendo o TEICH um tribunal
criado com o propósito de julgar crimes com especiais características, não faz sentido
esteja sob sua jurisdição o julgamento de crimes comuns de gravidade inferior aos crimes
de Genocídio ou os Crimes de guerra.
4.3 A falta de legitimidade do Tribunal
Atentos os problemas já elencados, o TEICH padecia de graves problemas de
legitimidade e de conformidade com o Direito Internacional Humanitário porque os seus
Estatutos foram promulgados na vigência da ocupação e não pelo próprio Governo
Iraquiano. Por outro lado, a Lei Penal iraquiana não previa crimes como o Genocídio e os
Crimes contra a Humanidade e os ETEICH previam-nos expressamente, numa efetiva
mudança ao regime de Direito Penal existente (contrariamente ao previsto na IV CV de
Genebra relativa às obrigações das potências ocupantes).
A HRW (2003) criticou o processo da criação dos ETEICH e a falta de intervenção
das organizações de defesa dos Direitos Humanos. Por outro lado, foi legitimado um
órgão desta natureza sob o Direito Internacional quando na verdade se tratou da criação
de um tribunal durante uma ocupação e que punha em causa a condução de julgamentos
justos e credíveis.
Newton (2005) considerou que os ETEICH e as regras de processo penal
revelavam um sistema de proteção compatível com os Princípios Internacionais de
Direitos Humanos e que a CPA estava legitimada para a promulgação dos Estatutos
admission or if the admission is corroborated by other evidence which convinces the court that it is true or
which has led to uncovering a certain truth, then the court may accept it”. A eliminação foi feita pelo
Memorando 3 secção 4 de 18 de Junho de 2003, publicado no Jornal Oficial de 17 de Agosto de 2003
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atendendo a que foi designada pela ONU 27 com o consenso de membros de mais de
vinte Nações. Ora, tal legitimidade foi conferida com o propósito específico de ser um
poder temporário para o restabelecimento da soberania iraquiana e para o exercício das
obrigações que derivavam do direito internacional. O reconhecimento unânime através da
Resolução n.º 1483 tornou a CPA a autoridade responsável pela implementação das
obrigações decorrentes do Direito de Ocupação e acresce que os preceitos do art. 43.º e
do art. 64.º da IV CV de Genebra seriam o fundamento para delegar a autoridade para
promulgação dos ETEICH no Conselho de Governação. O autor defendeu ainda, que nos
termos do art. 47.º da IV CV de Genebra, as medidas tomadas pela potência ocupante
podem prever alterações ao sistema interno e das estruturas governamentais, porque se
trata de um poder implícito, quando as instituições e Governo do território ocupado
atentem contra os direitos e proteção nela previstos (sustentando assim o trabalho
conjunto entre as autoridades Iraquianas e a APC).
As opiniões contrárias à posição de Newton consideraram que o Tribunal
funcionava como um «Tribunal Fantoche» das potências ocupantes. Scharf (2004)
afirmou que Os Estatutos revelam o risco do Tribunal Especial Iraquiano ser visto como
uma marioneta da potência ocupante e uma ferramenta de vingança por parte dos
inimigos de Saddam Hussein e não uma verdadeira mudança no sistema judicial.
As dúvidas relativas à legitimidade do tribunal obrigaram à revisão dos ETEICH e
que culminaram na constituição do STI, cujos Estatutos foram promulgados pelo Governo
de transição em 9 de Outubro de 2005.
A partir deste momento, o STI seria um tribunal interno pautado pelo Direito Processual
Penal de 1971.
As palavras de Sermid Al-Sarraf ao NY Times 28 , um iraquiano exilado e que
participou no planeamento dos Estatutos expressam o sentimento de necessidade e
justiça urgente dos iraquianos:
27
Mission Statement – Coalition Provisional Authority Regulation n.º 1 (CPA/REG/16May2003/1)
28
Peter Landesman, NY Times, 11 de Julho de 2004, “Who V. Saddam?”
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Iraqis don’t want to be imposed upon by a UN Tribunal bureaucracy. The UN had
15 years to call for a tribunal… If the international community had done its job, we wouldn’t
need a tribunal now.
CAPÍTULO V – O SUPREMO TRIBUNAL IRAQUIANO: AS
PRINCIPAIS ALTERAÇÕES DECORRENTES DOS ETEICH
Os ESTI procuraram resolver alguns dos problemas dos ETEICH, nomeadamente,
a questão da falta de legitimidade que lhe era imputada.
Para Mettraux (2007) as alterações foram de natureza política, nomeadamente, a
designação do Tribunal que ao ser alterada fez com que se dissipasse a ideia de que se
tratava de um Tribunal de exceção e que os ESTI abandonaram muitas das regras do
Direito Internacional, consagrando-se muitas normas de direito interno iraquiano. Dá como
exemplo, a participação internacional no julgamento: os ETEICH previam a participação
de estrangeiros, se tal fosse necessário e o atual Estatuto só prevê essa participação se o
Estado estrangeiro for parte no processo e a intervenção de peritos e observadores
passou a ser opcional. Ora, uma alteração desta natureza reflete a falta de intervenção
internacional num sistema frágil e do qual se perceciona a falta de segurança jurídica.
No que respeita à independência dos juízes, os ETEICH previam o afastamento de
qualquer juiz por decisão da maioria dos juízes permanentes, ao passo que hoje existem
dois mecanismos alternativos de afastamento: o primeiro consiste numa recomendação
por parte do Conselho de Ministros sob a forma de uma ordem ao Presidente do
Conselho para que afaste o Juiz ou Procurador e o segundo, permite que sob
recomendação do Conselho de Ministros, o Presidente do Conselho possa transferir os
juízes e procuradores por qualquer razão.
No que concerne aos direitos dos arguidos, inicialmente o acesso às testemunhas
e ao arguido era garantido de forma igualitária e nos atuais estatutos, isso já não
acontece. Deixaram de existir comutações das penas, medida que estava prevista nos
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Estatutos anteriores e que é particularmente gravosa pela impossibilidade de comutar a
aplicação da pena de morte
No âmbito da jurisdição, a redação do art. 14.º n.º 4 passou a prever que se o
Tribunal considerar que os elementos constitutivos de crimes não estão previstos nos
Estatutos, mas que constituam crime no âmbito da legislação penal existente, o Tribunal
tem competência para julgar o crime.
As consequências destas alterações revelam a eliminação de Garantias e Direitos
Fundamentais que estavam previstos nos ETEICH e que afetaram a perceção de
transparência, legalidade, imparcialidade e respeito pelas normas internacionais.
CAPÍTULO VI – O JULGAMENTO DO CASO DUJAIL E A
CONDENAÇÃO DE SADDAM HUSSEIN
6.1 Os antecedentes históricos do caso Dujail
De entre todos os crimes praticados por Saddam Hussein e pelos membros do
regime Ba’ath, a decisão foi a de iniciar o julgamento com o massacre de Dujail,
atendendo a que o caso reuniu uma investigação completa concluída e com prova sólida
para a acusação do crime de genocídio.
O caso remonta a 8 de Julho de 1982, data em que Saddam Hussein se deslocou
em visita oficial à cidade xiita de Dujail, localizada a cerca de cinquenta quilómetros de
Bagdade e onde se encontravam aquartelados os membros do partido revolucionário
Dawa, que contava com o apoio iraniano desde a guerra Irão-Iraque. Após a visita e no
regresso a Bagdade, a coluna militar de Saddam Hussein foi atacada com uma ofensiva
vinda dos pomares que rodeavam a cidade. Em retaliação, a 23 de Julho são emitidos
mandados de destruição de todos os pomares e colheitas da cidade (num total de
250.000 hectares) que eram o sustento da população. Em Dezembro do mesmo ano, 393
homens e 394 mulheres e crianças foram detidos numa ação em massa e levados para
Bagdade onde foram fechados nas celas de Abu Graihb e torturados durante
interrogatórios intermináveis. Do cárcere que durou dois anos, resultou a morte de muitas
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pessoas que não resistiram ao sofrimento infligido pela tortura e severas ofensas
corporais. Posteriormente, foram condenadas à morte 148 pessoas, acusados de
atentarem contra a vida do Presidente Saddam Hussein. 29
No seguimento da acusação da prática destes crimes, foram detidos e levados a
julgamento (entre outros arguidos com menor peso mediático) Saddam Hussein al-Tikriti
(ex-presidente do Iraque), Taha Yasin Ramadan (antigo vice-presidente do Iraque),
Barzan Ibrahim al-Tikriti (meio-irmão de Saddam Hussein e chefe da polícia secreta de
Mukhabarat em 1982), Abdullah al-Musheikhi e Mizher al-Musheikhi (ambos oficiais do
partido) e Awad Hamad al-Bandar (antigo presidente do tribunal revolucionário) para que
respondessem sobre a prática dos crimes de genocídio, homicídio, tortura e prisão ilegal
de cidadãos iraquianos
6.2 O julgamento
O julgamento decorreu ao longo de trinta e sete sessões durante nove meses e
teve uma cobertura mediática intensa por todo o mundo, chamaram-lhe até o
«Julgamento do Século» 30. Saddam Hussein contava com uma equipa de vinte e cinco
defensores cuja estratégia passou por tentar descredibilizar o caso, politizando-o, e com o
argumento de que este não se limitava aos crimes cometidos em Dujail, mas a todo um
processo politico relacionado com a falta de independência do Tribunal (a defesa chegou
a alegar que toda a credibilidade do Tribunal estava em causa, porque tinha sido o
primeiro-ministro Laith Kubba a marcar o início das sessões 31).
29
Imagens da visita de Saddam Hussein à cidade de Dujail e depoimentos de familiares das vitimas
disponíveis em https://www.youtube.com/watch?v=2X7VtLvZVhQ [consultado em 16/01/2015]
30
https://www.globalpolicy.org/component/content/article/163/28693.html [consultado em 9 de Maio de
2015]
http://www.theguardian.com/world/2004/jul/02/iraq.rorymccarthy2- [consultado em 9 de Maio de 2015]
http://www.southasiaanalysis.org/paper1046 [consultado em 9 de Maio de 2015]
31
De facto foi o primeiro-ministro quem anunciou o inicio do julgamento na comunicação social
http://www.themoscowtimes.com/news/article/plans-for-husseins-trial-announced/222757.html
[consultado em 2 de Maio de 2015]
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23
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No decorrer do julgamento levantaram-se questões relativas à segurança de todos
os intervenientes (advogados, juízes, testemunhas e funcionários do tribunal) e na
segunda sessão em 28 de Novembro de 2005 é anunciada a substituição de um dos
advogados. Na manhã seguinte ao início das sessões, o advogado de defesa Saadoun
Sughaiyer al-Janabi foi raptado e encontrado morto com um tiro na cabeça. Dias depois,
em 8 de Novembro outro advogado, Abdel Muhammed al-Zubaidi foi morto a tiro
enquanto conduzia. No total, foram mortos três membros da defesa. Relata-nos Scharf
(2008) que foi oferecida segurança a toda a equipa de defensores e respectiva família,
mas que esta foi recusada porque a existência de segurança condicionaria o
desenvolvimento mediático do processo (até porque os advogados deixariam de dar
entrevistas e teriam de deixar de falar publicamente do caso) e caso o tribunal saísse de
Bagdade seria mudado para a Green Zone, um novo argumento de falta de
independência, porque este era território ocupado pelos militares da CPA. Apesar disso,
alguns advogados temendo pela vida das suas famílias aceitaram que o Tribunal
suportasse as despesas com a sua segurança.
Sucederam-se ao longo do julgamento as manifestações da falta de independência
do tribunal e a substituição de três juízes, sem motivo aparente, não ajudou a apaziguar
as críticas 32. Em Janeiro de 2006 o juiz Rizgar Mohammed Amin foi substituído pelo juiz
Ra’ouf Abdul Rahman (de ascendência curda e oriundo da cidade de Halabja 33) mas
ainda antes da nomeação deste ultimo, havia sido anunciado que o juiz sucessor seria
Sa’eed al-Hammashi que foi acusado de pertencer ao partido Ba’ath 34 e que foi afastado
por essa razão.
Foram ouvidas muitas testemunhas, algumas das quais tinham sido sujeitas a
severas torturas e penas de prisão de vários meses sem qualquer acusação. Uma delas,
32
http://www.ft.com/cms/s/0/b528a41e-8d05-11da-9daf-0000779e2340.html#axzz3ZkoTa5iz
[consultado
em 11 de Maio de 2015] e http://www.ekurd.net/mismas/articles/misc2012/2/judgement491.htm
[consultado em 11 de Maio de 2015]
33
Perfil do juiz feito pela BBC. Disponível em http://news.bbc.co.uk/2/hi/middle_east/4659836.stm
[consultado em 03/01/2015]
34
Informação da HRW. Disponível em http://www.hrw.org/news/2006/01/26/iraq-saddam-hussein-trial-risk
[consultado em 3 de Maio de 2015]
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24
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Ahmad Hassan Muhammad al-Haideri tinha catorze anos quando assistiu às prisões em
massa na cidade de Dujail e foi torturado juntamente com outros cidadãos que morreram
durante os interrogatórios 35 . Após o depoimento em tribunal, a sua família sofreu
represálias: dois dos seus primos foram raptados, foi morto um sobrinho e ferido um irmão
que, em consequência de um tiro, sofreu a amputação das duas pernas.
A sentença foi lida em 5 de Novembro de 2006 36 e resultou na absolvição de um
arguido (Mohammed Azawi Ali) e a condenação de outros três a penas de prisão de
quinze anos (Mizhar Abdullah Ruwayyid, Ali Dayih Ali e Abdallah Kazim Ruwayyid). O
antigo vice-presidente do Iraque foi condenado a prisão perpétua, Saddam Hussein,
Awad Hamad al-Bandar (antigo presidente do Tribunal Revolucionário) e Barzan Ibrahim
al-Tikriti foram condenados a morte por enforcamento pelos crimes de prisão ilegal,
tortura, e homicídio premeditado de cidadãos iraquianos da cidade de Dujail.
6.3 O recurso
O prazo de interposição do recurso da decisão terminou em 5 de Dezembro, não
obstante a sentença só ter sido publicado a 17 de Novembro. Apesar do tempo que
demorou o julgamento, a decisão de recurso 37 foi bastante rápida e ocupou dezoito
páginas. Fazendo jus à celeridade tradicional iraquiana, foi marcada pela oralidade e por
decisões curtas. Apesar destas características, a decisão de recurso foi bem
fundamentada e cada um dos recursos interpostos foi analisado e fundamentado com
jurisprudência internacional (por via do auxílio de peritos internacionais na decisão). Aos
argumentos da defesa, relativos à falta de previsão do crime de genocídio, à falta de
«igualdade de armas» entre arguidos e testemunhas, quanto à questão da imunidade
35
Notícia
da
BBC
News
após
o
depoimento.
http://news.bbc.co.uk/2/hi/middle_east/4500284.stm [consultado em 23/01/2015]
36
Texto
integral
da
sentença
(tradução
da
HRW).
Disponível
em
http://www.hrw.org/legacy/pub/2007/ij/dujail_judgement_web.pdf [consultado em 10 de Maio de 2015]
37
Disponível em http://www.loc.gov/law/help/hussein/appellate.php [consultado em 3 de Maio de
2015]
CEDIS Working Papers | Direito, Segurança e Democracia | Nº 28 | maio de 2016
Disponível
em
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Nº 28
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presidencial e à problemática da aplicação da pena de morte, o tribunal respondeu com a
fundamentação que se segue:
a)
Quanto ao facto de o crime de genocídio não estar previsto na Lei Penal
Iraquiana: apesar de o crime não estar previsto na Lei ordinária, estava previsto na
Convenção para a prevenção e repressão do crime de genocídio (1948) e que foi
ratificada pelo Iraque. Esta ratificação vinculou o Estado iraquiano que aceitou esta
norma de Direito Internacional, no seu ordenamento jurídico e aplicou-a.
b)
Quanto à falta de «igualdade de armas», o Tribunal afirmou que foi dada a
oportunidade aos arguidos de se defenderem, escolherem os seus defensores e de
contradizerem as testemunhas diretamente.
c)
Quanto ao argumento da imunidade presidencial, o tribunal afirmou que o
objetivo da imunidade é proteger uma pessoa que goza de um poder, poder esse
que lhe permite afetar um grande conjunto de pessoas. É o presidente é quem tem a
responsabilidade de sofrer as consequências dos crimes praticados, uma vez que foi
ele quem deu as ordens aos subordinados. Ao dar estas ordens que levam à prática
de crimes, a pessoa não é o líder de um Estado que respeita a lei, mas o líder de um
grupo criminoso.
d)
Quanto ao argumento da lex mitior (aplicação da lei penal mais favorável ao
arguido à data da aplicação da pena), o tribunal respondeu que a ocupação não
implicou a transferência de soberania, porque o poder que foi conferido era
provisório e por isso a suspensão da pena de morte da Ordem n.º 7 da APC não se
aplicava a este caso porque não existiu nenhuma alteração da Lei.
Mantida a sentença de pena de morte, a custódia de Saddam Hussein passou da APC
para o governo iraquiano as 05h30 da manhã do dia 30 de Dezembro de 2006 e foi
enforcado por volta das 06h10 no dia do feriado religioso do Eid.
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CONCLUSÃO
O regime de Saddam Hussein foi um dos mais violentos da História recente e
numa «apressada» demanda para julgar os perpetradores, o STI foi erguido num cenário
de intensa violência, não obstante a declaração do fim da intervenção armada, onde eram
frequentes os relatos noticiosos de bombardeamentos e explosões que ocorriam durante
as sessões de julgamento.
Se o objetivo era a criação de um tribunal inovador e com o estrito respeito pelas
normas do direito internacional, não nos parece que tal meta tenha sido alcançada,
atendendo a que o STI acabou por afastar as cautelas tidas na elaboração dos ETEICH.
A razão de ser de um tribunal interno é a legitimação de um novo regime face ao anterior
e o restabelecimento do respeito pela Lei e pelo Direito, através do julgamento dos
infratores nesse Estado soberano onde ocorreram as violações. A intenção da criação do
STI foi essa, mas a verdade é que as principais críticas que lhe foram apontadas, como a
ilegitimidade e falta de independência dos juízes puseram em causa a sua neutralidade e
racionalidade.
A opção por um tribunal internacional teria sido uma decisão ajustada em matéria
de garantia dos princípios de direito internacional, mas o argumento da necessidade
urgente de justiça e da sua realização pelos próprios nacionais sob alçada do regime
iraquiano amenizaram a desconfiança das populações.
No caso iraquiano, consideramos que os objetivos de imparcialidade não foram
atingidos, atendendo à perceção internacional que designou os julgamentos como
«Justiça dos Vencedores».
Os tribunais internos poderão ser uma solução para julgar determinados crimes
mais graves, se forem superados problemas como os levantados com a criação do STI,
nomeadamente a perceção de imparcialidade e o respeito pelas normas de direito
internacional, contribuindo para a reconciliação e para a implementação de um regime
democrático.
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Legislação da APC
Memorandos
Memorando n.º 3 da APC de 27 de Junho de 2003 (que promulga alterações
ao
processo
penal
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Regulamentos
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Conselho de Governação como Governo interino). Disponível em
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Ordens
Ordem n.º 7 da APC de 09 de Junho de 2003 (que institui suspensões à
aplicação
do
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Penal
Iraquiano).
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Resolução n.º 688 de 5/4/1991. Disponível em http://daccess-ddsny.un.org/doc/RESOLUTION/GEN/NR0/596/24/IMG/NR059624.pdf?OpenElement
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Resolução
n.º
707
de
15/8/1991.
Disponível
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http://fas.org/news/un/iraq/sres/sres0707.htm [consultado em 9 de Maio de 2015]
Resolução
n.º
715
de
11/10/1991.
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http://www.un.org/depts/unmovic/new/documents/resolutions/s-res-715.pdf
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de
17/12/1999.
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http://www.un.org/Depts/unscom/Keyresolutions/sres99-1284.htm [consultado em 9
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1441
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da
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Provisória
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[consultado em 07/01/2015]
Sítio da TRIAL – Track Impunity Always. Disponível em http://trialch.org/fileadmin/user_upload/documents/trialwatch/Documents/ABDUL_GHAFOUR
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08/01/2015]
Sítio oficial do TPIJ. Disponível em http://www.icty.org/ [consultado em 5 de Maio
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Sítio oficial do TPIR. Disponível em http://www.unictr.org/ [consultado em 5 de Maio
de 2015]
Vídeos
Conferência da Prof.ª Beth Dougherty na Tulane University: Transitional Justice in
Iraq. Disponível em https://www.youtube.com/watch?v=YfSK6wXSoD4 [consultado
em 3 de Maio de 2015]
Conferência do Juiz Ra`id Al-Sa`edi (que chefiou a equipa de JIC no julgamento
Dujail) na Cornell Law School: Iraqi High Tribunal: The End of Immunity. Disponível
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em https://www.youtube.com/watch?v=kBbeX5lYDL8 [consultado em 2 de Maio de
2015]
Conferência do Prof. Michael Scharf na Duke University: High Crimes, High Drama:
An Insider's Account of the Saddam Hussein Trial. Disponível em
https://www.youtube.com/watch?v=QDlL9fegZHw [consultado em 2 de Maio de
2015]
Conferência na Universidade Case Western University School of Law, moderada
pelo Prof. Michael Scharf: Lessons from the Saddam Trial. Lessons Learned from
the
Dujail
Trial:
A
Cross-Fire
Panel.
Disponível
em
https://www.youtube.com/channel/UCu9ZMGwUup7i9FCOZU0f9LA [consultado em
7 de Maio de 2015]
Discurso de defesa de Saddam Hussein num programa do MEMRI TV - Middle
East Media Research Institute TV Monitor Project. Disponível em
https://www.youtube.com/watch?v=PCJ8JqtGahQ [consultado em 3 de Maio de
2015]
Documentário do programa America at a Crossroads na PBS - Public Broadcasting
Service:
The
trial
of
Saddam
Hussein.
Disponível
em
https://www.youtube.com/watch?v=byzGvm6ILIE [consultado em 04/01/2015]
Leitura da Sentença de Saddam Hussein: Saddam Hussein verdict. Disponível em
https://www.youtube.com/watch?v=cGQaPYzFZ8o [consultado em 30/01/2015]
Vídeo sobre a vida e morte de Saddam Hussein: The Life and Death of CIA Asset
Saddam
Hussein.
Disponível
em
https://www.youtube.com/watch?v=YMY3AR2jCkM [consultado em 30/01/2015]
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Apêndices
Apêndice I: Cronologia dos principais acontecimentos subjacentes ao caso Dujail
1968
17-07-1968 Revolução de 17 de Julho, encabeçada
pelo General Ahmed Hassan al-Bakr, apoiado por Saddam Hussein
e Salah Omar al-Ali
1969
11-1969
Saddam Hussein é nomeado vicepresidente do Conselho do Comando Supremo da Revolução
1979
16-07-1979 Saddam Hussein assume formalmente a
presidência do Iraque e toma o controlo absoluto do país
1980
22-09-1980 Início da Guerra Irão - Iraque
1982
08-07-1982 Atentado contra Saddam Hussein em
Dujail, cuja resposta do Estado deu origem ao chamado Massacre
de Dujail
1988
22-08-1988 Fim da Guerra Irão-Iraque
1990
02-08-1990 O Iraque invade o Kuwait – Início da
Guerra do Golfo
04-08-1990 Anexação do Kuwait pelas tropas iraquianas e
declaração de Saddam Hussein de que este passa a ser a 19ª
província do Iraque
29-11-1990 Resolução n.º 678 do CS da ONU – Autoriza a
utilização de "todos os meios necessários" para cumprir as
resoluções anteriores, se o Iraque não retirar do Kuwait até
15/01/1991
06-12-1990 Desembarcam na Arábia Saudita as primeiras
forças americanas
1991
17-01-1991 Início da Operação Tempestade no
Deserto
25-02-1991 As tropas iraquianas iniciam a retirada do Kuwait
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03-03-1991 É formalmente assinado o acordo de cessar-fogo
com o Iraque
2003
20-03-2003 Os EUA e o Reino Unido invadem o Iraque
– Início da Terceira Guerra do Golfo
10-04-2003 Queda de Bagdad
16-05-2003 Lewis Paul Bremer promulga a ordem n.º 1 da
APC: início do processo de De-Ba’atificação da Sociedade
Iraquiana 38
23-05-2003 Lewis Paul Bremer promulga a ordem n.º 2 da
APC: A dissolução do exército Iraquiano e de outras instituições 39
15-06-2003 Início da Operação Escorpião do Deserto com
vista a localizar a resistência iraquiana e armamento pesado
13-07-2003 É estabelecido o Conselho de Governação
Iraquiano sob a autoridade APC.
22-07-2003 São mortos os 2 filhos de Saddam Hussein 40
02-10-2003 É divulgado o relatório de David Kay onde é
afirmada a existência de provas de armas de destruição maciça no
Iraque
16-10-2003 Resolução n.º 1511 do CS da ONU que cria uma
força multinacional e garante o controlo americano sobre o Iraque
13-12-2003 Captura de Saddam Hussein em Adwar pelas
tropas da Coligação
38
CPA Order N.º 1, De-Ba’athification of Iraqi Society (CPA/ORD/16 May 2003/01), seguida da CPA Order
N.º 5, Establishment of the Iraqi De-Ba’athification Council (CPA/ORD/25 May 2003/05)
Disponível
em
http://www.cfr.org/iraq/iraq-coalition-Provisional-authority-order-number-one-debaathification-iraqi-society/p30235 [consultado em 21/01/2015]
39
CPA Order N.º 2, Dissolution of Entities (CPA/ORD/23 May 2003/02)
Disponível em http://www.cfr.org/iraq/iraq-coalition-Provisional-authority-order-number-two-dissolutionentities/p30236 [consultado em 21/01/2015]
40
Uday Saddam Hussein al-Tikriti e Qusay Saddam Hussein al-Tikrit
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2004
21-01-2004 OS EUA autorizam que a Cruz Vermelha
visite Saddam Hussein pela primeira vez desde a captura
08-03-2004 É assinada a Constituição Provisória do Iraque
18-04-2004 Começam a ser divulgadas as primeiras imagens
da tortura de prisioneiros na prisão de Abu Ghraib
01-06-2004 Assunção de funções do Primeiro-Ministro do
Governo Interino Iraquiano Lyad Allawi
08-06-2004 Resolução 1546 do CS da ONU que transfere a
soberania da APC para o Governo Interino Iraquiano
28-06-2004 Transferência formal da soberania do território
iraquiano
30-06-2004 A custódia judicial de Saddam Hussein e 11
membros do ex-Governo é transferida das tropas da Coligação
para o Governo Interino Iraquiano
01-07-2004 Audiência preliminar de Saddam Hussein
2005
30-01-2005 Eleições legislativas no Iraque
16-03-2005 Primeira reunião da Assembleia Nacional de
Transição
06-04-2005 O curdo Jalal Talabani é eleito presidente do
Iraque
07-04-2005 Ibrahim al-Jaafari é nomeado primeiro-ministro do
Iraque
28-04-2005 O Parlamento aprova o novo Governo
28-08-2005 A nova Constituição Iraquiana é apresentada no
Parlamento
15-10-2005 Após um referendo a nova Constituição Iraquiana
é aprovada
19-10-2005 Início do Julgamento de Saddam Hussein
2006
05-11-2006 Condenação de Saddam Hussein à morte
por enforcamento
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26-12-2006 Confirmação da sentença pela Câmara de
Recurso
30-12-2006 Execução de Saddam Hussein
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Apêndice II: Outros Julgamentos do STI 41
Caso da Campanha al-Anfal
O julgamento da Campanha al-Anfal iniciou em 21 de Agosto de 2006 e terminou em 24
de Junho de 2007 e os factos consistiam na prática de Crimes Contra a Humanidade,
Genocídio e Crimes de guerra entre 1988 e 1989 contra a população curda no Norte do
Iraque, dos quais resultou a morte de 180.000 pessoas, a deslocalização de milhares de
pessoas e a destruição de centenas de aldeias.
Dos 6 arguidos 42, 1 foi absolvido (Thair Tawiq Yousif Ali Ani), 2 condenados a penas de
prisão perpétua por Genocídio e Crimes contra a Humanidade (Farhan Mutlak Salih Al
Jibouri e Sabir Abdul Aziz al-Dori); e 3 condenados à morte pelos crimes de Genocídio,
Crimes contra a Humanidade e Crimes de guerra (Ali Hassan al-Majid, conhecido como
“Ali, o Químico”, Hussein Rashid Mohammed e Sultan Hashim Ahmed al-Taee).
Caso da Revolta Sha’aban de 1991
O julgamento da al-Intifada al-Shaabaniya iniciou em Agosto de 2007 e terminou em 2 de
Dezembro de 2008.
Os factos praticados consistiam na repressão brutal das insurreições de 1991, com a
rebelião Xiita ocorrida de Março a Abril nas províncias de Basra, Imara e al-Nassiriya no
Sul do Iraque e a rebelião curda ocorrida de Março a Outubro no Norte do Iraque.
Dos 15 arguidos 3 foram absolvidos (Ayad Taha Shihab al-Dori, Latif Mahl Hmood alSabawi e Sofian Mahir Hamed); 6 receberam penas de prisão elevadas (Abd Hamid
Mahmood al-Tikreti, Qays Abdul Razzaq al-Adamy, Saadi Tomaa Abbas al-Jibori, Sabawi
Ibrahim al-Hassan al-Tikreti, Sultan Hashim Ahmed al-Taee e Walid Hamid Tofiq al41
Fonte:
http://www.chathamhouse.org/Sítios/files/chathamhouse/field/field_document/Discussion%20Group%20Sum
mary%20The%20Iraqi%20Tribunal.pdf [consultado em 10 de maio de 2015]
42
Saddam Hussein não estava acusado uma vez que a lei iraquiana não permite julgamentos na ausência
do arguido e nesta altura já tinha morrido.
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Naseri); 4 foram condenados a prisão perpétua (Ibrahim Abdul Satar Mohammed alDahan, Iyad Fteh Khalefah al-Rawi, Hussein Rashid Mohammed e Sabir Abdul Aziz alDori); e Ali Hassan al-Mejed (conhecido como “Ali, o Químico”) e Abdul Ghani Abdul-Gafor
al-Ani foram condenados à morte. 43
43
Sentença
disponível
em
http://trialch.org/fileadmin/user_upload/documents/trialwatch/Documents/ABDUL_GHAFOUR_Abdul_G
hani_1991_verdict_summary.pdf [consultado em 15 de Julho de 2015]
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