Relatório Técnico CNPq 2014 - PEEP
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Relatório Técnico CNPq 2014 - PEEP
CIDADANIA E DISCRIMINAÇÃO COMO CRITÉRIOS DE ANÁLISE DA POLÍTICA PÚBLICA RELATÓRIO DE ATIVIDADES 2011-2013 CNPq Processo 474066/2011-8 Coordenação: Profa. Dra. Sonia Fleury Programa de Estudos sobre a Esfera Pública – PEEP EBAPE/FGV Financiadores dessa Linha de Investigação: CNPq – Área de conhecimento em Administração Pública (AE), Processo 474066/2011-8, Período de 2011-2013. FAPERJ - Auxílio à Pesquisa na modalidade APQ-1, Processo E-26/110.607/2011, Período de 2010-2012. PROPESQUISA-EBAPE/FGV – Linha de Pesquisa em Instituições, políticas e governo (Macro): Foco no nível institucional e no processo de formulação de políticas, Período de 2010-2013. 1 ÍNDICE OBJETIVOS E METAS 1. Objetivos 6 1.1 Objetivo Geral 6 1.2 Objetivos Específicos 2. Metas 6 7 3. Comentários 6 PRODUÇÃO ACADÊMICA 1. Monografias, Dissertações e Teses 10 1.1 Defendidas na EBAPE 10 1.2 Defendidas em outras Instituições Acadêmicas 2. Artigos Científicos 16 2.1 Artigos em Livros 16 12 2.2 Artigos em Periódicos 19 3. Artigos no PRELO 23 3.1 Aceitos para publicação 23 3.2 Submetidos à avaliação 24 4. Congressos Científicos 24 4.1 Apresentação de Trabalhos em Congressos Internacionais 24 4.2 Apresentação de Trabalhos em Congressos Nacionais 24 5. Participação em Seminários e Mesas Redondas 6. Prêmios e Distinções 25 32 PRODUÇÃO ESPECIAL 1. Produção de número temático – Le Monde Diplomatique 35 2. Organização de Seminários, articulação de redes de pesquisadores e lideranças de favelas e produção de vídeos 38 Vídeo “Favela é Cidade” 3. Publicações: mídias diversas 52 3.1 Artigos em Jornais/Revistas 52 3.2 Entrevistas 3.3 Vídeos 53 55 MARCO CONCEITUAL E METODOLOGIA DA PESQUISA 1. Introdução 56 2 2. Objeto da Investigação 3. Hipóteses 61 80 3.1 Seleção dos sujeitos da pesquisa 81 3.2 Categorias analíticas e técnicas de análise dos dados 4. Pressupostos Metodológicos 91 5. Referências Bibliográficas 94 6. Instrumentos e Técnicas de Pesquisa 6.1 Dados Secundários 105 6.2 Observação Participante 107 89 105 6.3 Observação com Filmagem 108 6.4 Iniciativas de Organização da Sociedade Civil nas Favelas 6.5 Acompanhamento dos Discursos das Autoridades 6.6 Relatos de Mídias Alternativas 108 108 110 6.7 Catálogo de Reportagens na Mídia 118 6.8 Roteiros de Entrevistas 119 6.9 Resenhas de Artigos 121 6.10 Atas de Reuniões e Seminários da Equipe 6.11 Relatos e Transcrições de Entrevistas 6.12 Mapa de Atores 141 156 6.13 Organização do discurso dos Atores 6.14 Anexos 139 166 166 TRABALHO DE CAMPO 1. Banco de Entrevistas e Observações 179 2. Banco de Dados de Políticas Públicas 192 2.1 Habitação 193 2.2 Pacificação 200 2.3 Segurança 207 2.4 Demais Políticas Sociais 210 3. Diagnósticos Socioeconômicos e Comportamentais 1. Dados Socioeconômicos 1.1 Introdução 218 218 1.2 População e Domicílios 224 1.3 Renda e Educação 227 1.4 Desigualdade de Renda 229 3 1.5 Cor/Raça 230 1.6 Energia Elétrica 231 1.7 Ocupação do Domicílio 232 2. Diagnóstico Comportamental 235 2.1 Dados de Criminalidade 235 2.1.1 AISP 02 – Botafogo, Humaitá e Urca 236 2.1.2 AISP 05 – Centro, Gamboa, Santa Teresa, Saúde, Santo Cristo 237 2.1.3 AISP 19 – Copacabana (parte), Leme 239 2.1.4 Capital 241 2.1.5 Análise dos Dados 242 2.2 Comportamento dos Eleitores 4. Campo Chapéu-Mangueira e Babilônia 258 4.1 Contextualização histórica das comunidades Chapéu Mangueira e Babilônia 258 4.2 Redes 287 5. Campo Santa Marta 302 5.1 Introdução 302 5.2 Redes 322 6. Campo Providência 335 6.1 Redes e Análise de Redes 7. Estudos Temáticos 335 352 7.1 A Militarização do Social: UPP no Santa Marta 7.2 Expansão do Mercado Local 365 7.3 Metonímias da Participação 397 7.4 A Fabricação da Classe Média 432 7.5 Do Welfare ao Warfare State no Brasil 352 445 COMPOSIÇÃO E FORMAÇÃO DA EQUIPE DE PESQUISA 1. Composição da Equipe 1.1 Coordenação Geral 452 452 1.2 Pesquisadores Assistentes 452 1.3 Pesquisadores estrangeiros em intercâmbio com a EBAPE 1.4 Pesquisadores alunos da EBAPE 453 453 1.5 Pesquisadores Colaboradores com outros vínculos 454 4 1.6 Bolsistas PIBIC/CNPq ou PROPESQUISA/EBAPE 2. Formação Acadêmica da Equipe e alunos da EBAPE CONCLUSÃO 454 476 LISTAGEM BIBLIOGRÁFICA ANEXOS 454 479 495 peep.ebape.fgv.br facebook.com/Peep.Estudos 5 OBJETIVOS E METAS Para o projeto submetido e aprovado pelo CNPq foram elaborados os seguintes objetivos e metas: 1. Objetivos 1.1 Objetivo Geral Analisar a implantação do Programa de Aceleração do Crescimento e implantação das Unidades de Polícia Pacificadora (UPP) e UPP Social em três comunidades do Rio de Janeiro, a partir da perspectiva de promoção da cidadania e redução de estigmas que discriminam a população destas comunidades, comparativamente aos dados e estudos sobre a implementação do Programa Favela Bairro e Morar Legal. 1.2 Objetivos Específicos a) Consolidar um modelo de análise de políticas públicas capaz de compatibilizar aspectos relativos à construção de uma sociedade democrática e a inclusão na comunidade de cidadãos, tratados no âmbito das ciências políticas, com aspectos relativos ao desenho, implementação e gestão de políticas, matéria afeita ao campo da administração pública. b) Aprofundar a discussão teórica de forma a permitir compatibilizar o desenvolvimento mais recente da teoria política da cidadania com a literatura sociológica existente sobre estigma e discriminação. c) Compatibilização da metodologia utilizada na pesquisa anterior com as investigações atuais, de forma a permitir a comparabilidade dos dados. 6 d) Contextualizar as mudanças ocorridas nas políticas sociais de enfrentamento da pobreza e o crescimento de manifestações socioculturais das comunidades em estudo, entre a época da pesquisa anterior e a implementação das UPPs. e) Identificar fatores que no desenho e implementação das políticas públicas favorecem ou obstaculizam o exercício da cidadania. f) Estabelecer redes de pesquisadores de forma a apoiar outras instituições acadêmicas. 2. Metas a) Consolidar do Banco de Dados do PEEP sobre Políticas Públicas e Cidadania. b) Favorecer o acesso à literatura mais recente sobre os temas da cidadania, discriminações e exclusão. c) Aumentar a produção acadêmica nesta área de investigação com a publicação de artigos científicos e o desenvolvimento de monografias e teses. d) Criar mecanismos de cooperação e apoio acadêmico entre a EBAPE/FGV e a Faculdade Salesiana Maria Auxiliadora de Macaé. e) Produzir material didático por meio da confecção de vídeos. f) Elaboração de documento com recomendações sobre o combate à exclusão nas políticas públicas. 3. Comentários Como se poderá observar na apresentação dos resultados da pesquisa os objetivos foram plenamente atingidos e as metas de produção propostas foram amplamente superadas em vários pontos que serão ressaltados ao longo desse relatório. No entanto, foram assinalados em vermelho os dois pontos que não foram realizados e merecem uma explicação. 7 No objetivo geral formulado, pretendia-se comparar os dados da pesquisa atual com os estudos já realizados no PEEP que tiveram como objeto os Programas Favela Bairro e Morar Legal. No entanto, essa comparação não se demonstrou factível e mesmo necessária. Em primeiro lugar, porque a política de segurança representada pela UPP tornou-se dominante em relação às demais políticas, inclusive a política habitacional e urbana, o que tornava desnecessária a comparação com políticas urbanas anteriormente implantadas em favelas. Além disso, tornou-se inviável dado o volume de trabalho realizado em três comunidades, abrangendo observações e entrevistas com moradores, lideranças, ONG, gestores locais e gestores responsáveis pela direção de programas, empresários e outros stakeholders. Mais do que a intensidade do trabalho em função da dinâmica da política pública estudada, importa lembrar que trata-se de um política singular, dado a convergência de várias ações e políticas setoriais em cada território, incluindo segurança pública, reforma urbana, remoções, política habitacional, políticas sociais e mecanismos de participação social. Assim sendo, mostrou-se desnecessária a comparação com programas habitacionais anteriores, já que aqueles foram de escopo muito mais limitado e não seriam, por conseguinte, comparáveis. Mesmo assim, as experiências anteriores nas políticas urbanas e de segurança, foram fundamentais para o aprendizado institucional, inclusive em relação às ineficiências e limitações quanto à sustentabilidade e ausência de coordenação interinstitucional. Portanto, elas serão mencionadas e analisadas por vários atores e farão parte da nossa análise, ainda que não seja objeto de comparação sistemática. Na proposta original previa-se uma associação com a Faculdade Salesiana de Macaé, por meio do envolvimento do Prof. Dr. Renato Moller na investigação. No entanto, como o professor afastou-se dessa Faculdade e assumiu funções em outra instituição, incompatíveis com o amplo trabalho de campo, não foi possível sua participação na investigação. A proposta de associação com outros grupos de investigação, no entanto, foi mantida por meio da nossa associação aos pesquisadores do Instituto de Estudos Sociais e políticos da UERJ- IESP, aos membros do Coletivo de Estudos sobre sociabilidade e Violência CEVIS-UERJ e ao IBASE. 8 Frutos dessa associação foram, por exemplo, a produção de um número temático do Le Monde Diplomatique e o Seminário FAVELA É CIDADE. Ocorreram várias outras associações menos sistemáticas, tais como a com o Grupo Piratininga de Formação de Comunicadores Comunitários, com o Grupo de Produção Áudio Visual.Paêbiru, com a Rede de Moradores de Favelas em defesa da Segurança e Cidadania, criada a partir do Seminário que promovemos, com o Ministério Público Estadual. Todas elas cumpriram tanto funções de apoio a grupos emergentes como a de articulação em rede de pesquisadores, profissionais e lideranças das favelas, na discussão de alternativas para melhor eficácia da política pública. A produção de um documentário e material educativo em vídeo, abordando os eixos tratados na pesquisa permitiu ampla divulgação dos resultados da pesquisa, pois sua linguagem possibilita a apreensão por diferentes públicos, podendo subsidiar a discussão sobre cidadania tanto ao nível científico quanto popular. PRODUÇÃO ACADÊMICA Os eixos da produção acadêmica foram direcionados para a os seguintes temas: a) compreensão dos efeitos das políticas públicas sobre a sociabilidade dos cidadãos, em especial enfocando o associativismo e a participação social; b) a construção do Estado de Bem Estar social em Democracias recentes, com ênfase na universalidade dos direitos sociais; c) a gestão de políticas públicas, em especial as redes de políticas; d) os impactos das políticas públicas na construção dos sujeitos e na produção da nova classe média; e) relações Estado, mercado e comunidade. Essa produção será apresentada em itens que tratam de: PRODUÇÃO ACADÊMICA 1. Monografias, Dissertações e Teses 1.1 Defendidas na EBAPE 1.2 Defendidas em outras Instituições Acadêmicas 9 2. Artigos Científicos 2.1 Artigos em Livros 2.2 Artigos em Periódicos 3. Artigos no PRELO 3.1 Aceitos para publicação 3.2 Submetidos à avaliação 4. Congressos Científicos 4.1 Apresentação de Trabalhos em Congressos Internacionais 4.2 Apresentação de Trabalhos em Congressos Nacionais 5. Participação em Seminários e Mesas Redondas 6. Prêmios e Distinções 1. Monografias, Dissertações e Teses 1.1 Defendidas na EBAPE Dissertação de Mestrado em Administração Pública Aluna: Sabrina Ost. Instituição: EBAPE/FGV. Título: “O mercado sobe a favela: Um estudo sobre o Santa Marta Pós UPP” Orientadora: Sonia Fleury Defendida em 2012. Resumo: O estudo teve por objetivo identificar como a implantação da Unidade de Polícia Pacificadora na favela Santa Marta alterou a dinâmica da comunidade com o mercado e como isso afetou as relações sociais. O intuito era perceber como o mercado interno de forma geral, seja ele formal ou informal, tem respondido à nova conjuntura e como atores do mercado externo, como Firjan, Light, entre outros, vêm atuando no local. Para tal, foi realizada uma pesquisa de campo com representantes de empresas que atuam na comunidade, moradores e empreendedores locais. Além disso, buscou-se analisar como essa nova dinâmica do mercado, viabilizada pela maior 10 presença do Estado no Santa Marta, influenciou a sociabilidade. Concluiu-se que com a expansão do mercado interno e da atuação do mercado externo na comunidade, alguns terão condições de aproveitar a oportunidade e até se desenvolver; contudo, provavelmente outros não terão condições e sofrerão uma nova exclusão. _______________________________________________________________ Dissertação de Mestrado Acadêmico em Administração Aluna: Luiza Moreira Arantes de Castro Instituição: EBAPE/FGV Título: “Os Determinantes da Violência Policial: uma análise dos homicídios causados por policiais no Brasil”. Orientador: Octavio Amorim Neto Defendida em 2013. Resumo: O presente trabalho visa discutir os fatores que determinam a violência policial. Para tanto, são estudos os homicídios causados por policiais. A hipótese colocada é a de que há uma relação entre a orientação política do governador de Estado e a qualidade institucional das polícias e o número de homicídios causados anualmente por policiais em cada Estado. A base teórica visa definir um ciclo esquemático onde se relacionam os conceitos do monopólio do uso da força e a violência policial. A ideia é a de que esses dois conceitos são mantém uma relação de gênese e fonte de sustentação. No entanto, de forma a se aprofundar a discussão, são trabalhados conceitos intermediários que irão influir nessa relação, quais sejam, abordagem histórica, militarismo, direitos humanos, mandato policial, poder de polícia, relação entre polícia e sociedade e questões sociais. Como o estudo se foca em homicídios causados por policiais, é colocada como base do trabalho as polícias militares, por assumir-se que esse tipo de violência seja mais típico dessas corporações. Conforme é demonstrado na base teórica, as polícias civis tendem a recorrer à tortura quando extrapolam seus deveres legais. Para a pesquisa empírica são elaborados modelos estatísticos aos quais é aplicada a 11 metodologia de dados em painel. Nos modelos são colocadas como variáveis independentes medidas de orientação política dos governadores de 20 Estados brasileiros e é analisado o período de 2003 a 2010. Para completar os modelos são controladas variáveis de sociodemográficas e são criadas duas variáveis para expressar a qualidade institucional das Polícias militares, sendo elas os anos de existência dos Cursos de Formação de Oficiais e anos médios de escolaridade das tropas. Como achado de pesquisa resta comprovado que são determinantes da violência policial: a orientação política do governador de Estado, a desigualdade de renda, o número de homicídios registrados e a escolaridade média da tropa da PM. Em seguida, para aprimorar a ideia da qualidade institucional, é elaborada uma comparação entre as Polícias Militares do Rio de Janeiro e de Minas Gerais, onde é aprofundado o tema levando-se em conta outras questões institucionais que vão além da formação dos policiais. 1.2 Defendidas em outras Instituições Acadêmicas Monografia de Conclusão de Curso em Administração Aluno: Markus Dammann Quintero Instituição: HWR Berlin School of Economics and Law. Vínculo de intercâmbio com a EBAPE/FGV, curso de graduação em Administração. Title: "Governance in the pacified favelas of Rio de Janeiro – an exemplary analysis of the coordinated development of public, private and civil society services in Santa Marta" Orientadores: Bruggemeier e Kmappe Defendida em 2012. Abstract: The UPP Social tries to coordinate a variety of different actors of all sectors in order to coordinate the development of services in the pacified Favelas of Rio de Janeiro. Thus it acts in some aspects as a central governance entity, and itclaims to do thisin a democratic andnon-hierarchical manner. This thesis analyses their work and organisational environment on the 12 example of St. Marta, a Favela which has a high level of community organization. I assume that big parts of their community organizations are important and potential actors in implementing a legitimate social order. Thus I will analyse how far the UPP Social contributes to their involvement in developing services in Santa Marta. Also I assume that normal governance concepts, as they usually are developed in and for countries with a consolidated internal sovereignty, cannot be applied in the case of St. Marta (Dilemma of Euro Centrism). Instead, I examine whether St. Marta is an area of limited statehood according to criteria of the research centre 700 “Governance in Areas of Limited Statehood” at the Freie Universität Berlin. Then I will investigate to what extent their governance concepts can be applied in this case. This serves to propose solutions that are applicable to the peculiarities of St. Marta. Finally these proposals will be compared with the way the UPP Social works to evaluate whether they can contribute to a more effective development of services in St. Marta. The developed suggestions can also serve as a reference model for further pacified Favelas. Since each Favela has its own profile, these samples can not be transferred generally to all. Tese de doutorado em Administração Pública – Projeto. Aluno: Charles Heck Instituição: Florida International University e EBAPE/FGV Títle: “The Role of Sustainability in the Urbanization Process and the Public Participation in Policy Making – The Case of Favela Santa Marta” Abstract: Informal settlements in Brazil have historically been areas of societal neglect. Since 2008, the Brazilian government has developed policies based on community policing and conservation protection to address these settlements in a significant shift from past policy. Techniques of conservation management and urban governance have merged into green governance for urban informal settlements in Rio de Janeiro, RJ, Brazil. The informal settlement Santa Marta in Rio de Janeiro,Brazil was been occupied by a new form of Military Police and 13 subsequently a containment wall was built to separate it from state conservation areas. Santa Marta is now subject to a series of newurban regulations that include environmental rules regarding trash disposal and pollution. The practices in Santa Marta have since been implemented in other settlements. The proposed research will examine the relationship between conservation practices and urban governance using qualitative and historical methods. Policing the Environment The proposed dissertation research seeks to understand how recent changes in urban governance strategies for informal settlements and tropical forest conservation policies represent a significant historical departure for both Rio de Janeiro and Brazil. Due to rapidly increasing rates of urbanization, informal habitation is now a prolific phenomenon throughout the world, to the extent that a majority of the world‟s residents will live in informal settlements by 2050. As a result, problems inherent to informal settlements are now a primary focus of the United Nations (UN) via the agency UN-HABITAT. Although informal settlement expansion in Rio has been addressed as a public security issue ahead of the games, it has also been framed as a problem related to tropical forest conservation. Eco-tourism is a major source of revenue for a city surrounded by tropical forests like Rio de Janeiro. Home destruction, relocation, and dislocation have been carried out in Rio de Janeiro ahead of the 2014 World Cup and 2016 Olympics, justified in part through forest conservation and „areas of risk‟ for residents. In response, organizations have mobilized human rights and social justice discourse up to the international level and sought increased political participation by residents of informal settlements. Currently, rapid transformations affecting informal settlements are taking place, including the installation of the Community Police program, investment in infrastructure and public transportation. These transformations are designed to „urbanize‟ informal settlements so that the terrain they occupy is made part of the market and the residents can be policed and charged for utilities. Sustainability and environmental protection have become focal points of urbanization. The proposed research is especially timely and salient in view of the current debates about the compatibility of different forms of urban development 14 and sustainability. The researcher will document and analyze the material effects of these policies in terms of spatial transformation, as well as the means by which the residents of informal settlements in Rio participate in policy formation and mobilize their own agendas in reaction to said transformations. The Community Police program used by the Brazilian state for urban governance in these settlements is rapidly becoming a standardized practice for informal settlement management throughout Rio de Janeiro. This program will have major social consequences that will be intensely scrutinized by domestic and international groups in the years to come. Public security and human rights has recently been the agenda of UN meetings on human rights, which a representative from Rio de Janeiro attended. The existent literatures on informal settlements and tropical forest conservation have not been addressed in relation to each other through qualitative research, nor has any researcher examined the geographical impact of their confluence in an urban context. As such, research findings will make an important contribution to both the literatures on informal settlements and tropical forest conservation, as well as extend the sparse literature on Community Policing in the South American context. This research will involve interviews with residents of the informal settlement Santa Marta in Rio de Janeiro, Brazil. In addition to the primary research site located adjacent to the neighborhood of Botafogo in Rio de Janeiro, the research sites will include public forums in the city center of Rio de Janeiro and government offices. Community Police representatives will be interviewed on the primary site whenever possible, but may also occur in the headquarters located in the city center. Representatives of NGOs, e.g. Global Justice and the Favela Observatory, will be interviewed at the primary site and their headquarters, which are also located in the city center. The research plan involves interviews with subjects that participate in resident association meetings and public forums (30), public figures in the Community Police (10), and representatives of nongovernmental organizations and favela advocacy groups (15). The proposed research will pursue four objectives: 1. Document the changes in government policy toward favela settlement and expansion from 1965-2010. 2. Document the sources and types of funding available for 15 administration and control of favela settlements. 3. Trace the social and political effects of the introduction of the Community Police and the resident responses in Santa Marta. 4. Identify the key activists in Santa Marta and document their positions on the new green governance initiatives. For the four research objectives, I will use ethno-historical research methods to collect the necessary data through archival research, institutional document collection, participant observation and interviews. State policies will be traced through historical and current government documents and newspaper archives. Institutional documents will be gathered to assess the techniques of management from specific organizations and institutions. Oral histories will be consulted for further historical perspective on the Santa Marta case study. Ethnography will be used to trace the social and political effects of the introduction of the Community Police and the resident responses in Santa Marta. I will also document the role that favela advocacy groups play in representing the interests of favela inhabitants. _______________________________________________________________ 2 Artigos Científicos 2.1 Artigos em Livros Título: A FABRICAÇÃO DA CLASSE MÉDIA: PROJETO POLÍTICO PARA NOVA SOCIABILIDADE Autora: Sonia Fleury In.: "A 'Nova Classe Média' no Brasil como conceito e projeto político", Organização Dawid Danilo Bartel - Rio de Janeiro, Fundação Heinrich Böll, 2013. 69 - 83 pp. Disponível em < http://www.br.boell.org/downloads/NCMlivroHBS.pdf > Título: CUIDADO: NOVOS DESAFIOS PARA A POLÍTICA PÚBLICA Autora: Sonia Fleury 16 In.: "Cuidado e saúde: práticas e sentidos em construção", Organização de Ana Cleide Guedes Moreira; Paulo de Tarso Ribeiro de Oliveira; Pedro Paulo Freire Piani, 350p., Editora Pakatatu, 2013 Título: BUILDING DEMOCRACY IN AN EMERGING SOCIETY – CHALLENGER OF THE WELFARE STATE IN BRASIL Autora: Sonia Fleury In: "Brazil Emerging - Inequality and Emancipation", edited by Jan Nederveen Pieterse and Adalberto Cardoso, Routledge, New York and London, 2013, p. 11-31 Disponível em <http://peep.ebape.fgv.br/sites/peep.ebape.fgv.br/files/file/Brazil%20Emerging_I nequality%20and%20Emancipation.pdf> Título: REFORMA PREVIDENCIÁRIA Autora: Sonia Fleury In.: Marco Aurélio Nogueira; Geraldo Di Giovanni (Org). Dicionário de Políticas Públicas, v.1, p. 249-254. FUNDAP, 2013 Disponível em <> Título: DEMOCRACIA DELIBERATIVA Autora: Sonia Fleury In.: Marco Aurélio Nogueira; Geraldo Di Giovanni (Org). Dicionário de Políticas Públicas, v.1, p. 249-254. FUNDAP, 2013 Disponível em <> Título: POLÍTICAS SOCIAIS Autora: Sonia Fleury In: Dalila Andrade Oliveira; Adriana Cancella Duarte; Lívia Fraga Vieira. (Org.). Dicionário de Trabalho, Profissão e Condição Docente. 1 ed. Belo Horizonte: UFMG, 2011, v. 1, p. 21-21. Disponível em <> Título: EL ESTADO DE BIENESTAR OCULTO EN BRASIL 17 Autora: Sonia Fleury In: Latinoamérica, laboratorio mundial. Madrid: Oficina de Arte y Ediciones S.L. / Antonio G. González, 2011, p. 137-172. Disponível em <> Título: PSICOLOGIA E SAÚDE: FORTALECER A CONSTRUÇÃO DE SUJEITOS E ELIMINAR DESIGUALDADES INJUSTAS Autora: Sonia Fleury In: Sonia Maria Guedes Gondim; Antônio Marcos Chaves. (Org.). Práticas e Saberes Psicológicos e suas Conexões. Salvador: UFBA/Salvador, 2011, p. 267-299. Disponível em <> Título: DEMOCRACIA Y SOCIALISMO: EL LUGAR DEL SUJEITO Autora: Sonia Fleury In: FLEURY, S ; LOBATO, L. V. C.. (Org.). Participación, democracia y salud. 1 ed. Buenos Aires: Lugar Editorial, 2011, p. 31-61. Disponível em <> Título: A DIMENSÃO PÚBLICA DA GESTÃO: LIÇÕES DE UMA VIDA Autora: Sonia Fleury In: O SUS que Eu Vivi - Parte 1: De clínico a sanitarista. Rio de Janeiro: Cebes, 2010, p. 5-10. Disponível em <> Título: A PROTEÇÃO SOCIAL COMO PERSPECTIVA DE TRANSFORMAÇÃO DO ESTADO E DA SOCIEDADE Autora: Sonia Fleury In: Ladislau Dowbor, Ignacy Sachs, Carlos Lopes. (Org.). Riscos e Oportunidades: em tempos de mudanças. São Paulo / Ceará: Editora e Livraria Instituto Paulo Freire / Banco do Nordeste do Brasil, 2010, p. 209-216. Disponível em <> 18 2.2 Artigos em Periódicos Título: O MERCADO SOBE O MORRO. A CIDADANIA DESCE? ESTUDO SOBRE OS EFEITOS DA PACIFICAÇÃO NO SANTA MARTA. Autoras: Sonia Fleury e Sabrina Ost Dados – Revista de Ciências Sociais – Vol. 56, nº3, 2013, pp 635 - 671 Disponível em < http://www.scielo.br/pdf/dados/v56n3/06.pdf > Título: MILITARIZAÇÃO DO SOCIAL COMO ESTRATÉGIA DE INTEGRAÇÃO Autora: Sonia Fleury Sociologias, Porto Alegre, ano 14, nº30, mai./ago., 2012, p 194 – 222. Disponível em < http://www.scielo.br/pdf/soc/v14n30/07.pdf> Título: DO WELFARE AO WARFARE STATE Atora: Sonia Fleury Le Monde Diplomatic Brasil – Edição 67 – Fevereiro/2013 Disponível em <http://www.diplomatique.org.br/artigo.php?id=1347> Título: RIO: MARCA REGISTRADA DA PARTICIPAÇÃO PACIFICADA Autores: Sonia Fleury, Julio Borges, Frederico Bertholini, Sabrina Guerghe Le Monde Diplomatic Brasil - Edição 67 – Fevereiro/2013 Disponível em > http://www.diplomatique.org.br/artigo.php?id=1352< Título: ASSOCIAÇÕES DE MORADORES PRECISAM REPENSAR SEU PAPEL NAS FAVELAS Autores: Sonia Fleury, Sabrina Guerghe e Juliana Kabad Le Monde Diplomatic Brasil - Edição 67 – Fevereiro/2013 Disponível em > http://www.diplomatique.org.br/artigo.php?id=1354< Título: THE “AREA OF RISK” JUSTIFICATION FOR FAVELA REMOVALS: THE CASE OF SANTA MARTA. Autor: Charles Heck Rio On Watch - Outubro/2013 Disponível em < http://rioonwatch.org/?p=11410 > 19 Título: REACCIONES A LA VIOLENCIA INSTITUCIONAL: ESTRATEGIAS DE LOS PACIENTES FRENTE AL CONTRADERECHO A LA SALUD EN BRASIL Autora: Sonia Fleury, Valéria Bicudo e Gabriela Rangel Salud Colectiva, v. 9, p. 11-25, 2013. Disponível em <http://peep.ebape.fgv.br/sites/peep.ebape.fgv.br/files/file/FLEURY,%20S__%2 0BICUDO,%20V_%20RANGEL,%20G_%20Reacciones%20a%20la%20violenc ia.pdf > Título: LAS REFORMAS PENDIENTES: DESAFÍOS PARA LA GOVERNABILIDAD EN BRASIL Autora: Sonia Fleury Revista CIDOB d'Afers Internacionals (1985), v. 97-98, p. 33-54, 2012. Disponível em < http://peep.ebape.fgv.br/sites/peep.ebape.fgv.br/files/Las_Reformas_Pendiente s_desafios_para_la_gobernabilidad_en_Brasil.pdf > Título: NUEVAS MIRADAS SOBRE VIEJOS PROBLEMAS: PERIFERIAS URBANAS Y TRANSFORMACIÓN SOCIAL Autora: Sonia Fleury, Ismael Blanco, Joan Subirats Gestión y Política Pública, Volume Temático, p. 3-40, 2012. Disponível em < http://peep.ebape.fgv.br/sites/peep.ebape.fgv.br/files/nuevas_miradas_sobre_vi ejos_problemas_periferias_urbanas_y_transformacion_social.pdf > Título: CUSTEIO DO DIREITO À SAÚDE: EM BUSCA DE UMA PROTEÇÃO CONSTITUCIONAL CONQUISTADA PELO DIREITO À EDUCAÇÃO Autora: Sonia Fleury, Élida Pinto Revista de Direito Sanitário, v. 13, p. 54-80, 2012. Disponível em < http://www.revistas.usp.br/rdisan/article/view/55693/59109 > Título: O SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE BRASILEIRO: DESAFIOS DA GESTÃO EM REDE 20 Autora: Sonia Fleury e Assis Mafort Ouverney Revista Portuguesa e Brasileira de Gestão (Rio de Janeiro), v. 11, p. 74, 2012. Disponível em < http://www.scielo.oces.mctes.pt/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S164544642012000200007 > Título: JUDICIALIZAÇÃO PODE SALVAR O SUS Autora: Sonia Fleury Saúde em Debate, v. 36, p. 159-161, 2012 Disponível em < http://peep.ebape.fgv.br/sites/peep.ebape.fgv.br/files/A_judicializacao_pode_sal var_o_SUS_Saude_em_Debate.pdf > Título: BRAZIL‟S HEALTH-CARE REFORM: SOCIAL MOVIMENTS AND CIVIL SOCIETY Autora: Sonia Fleury The Lancet (North American edition), v. 377, p. 1724-1725, 2011. Disponível em < http://www.researchgate.net/publication/236735447_FLEURY_Sonia._Brazils_h ealthcare_reform_social_movements_and_civil_society/file/5046351927a8d550f6.pd f> Título: GOVERNANÇA LOCAL NO SISTEMA DESCENTRALIZADO DE SAÚDE NO BRASIL Autora: Sonia Fleury, Assis Mafort Ouverney, Thaís Kronemberger e Felipe Barbosa Zani Revista Panamericana de Salud Pública (Impresa) / Pan American Journal of Public Health (Impresa), v. 28, p. 446-455, 2011. 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Título: ¿ES POSIBLE LA CONSTRUCCIÓN DE ESTADOS DE BIENESTAR TARDÍOS? PACTO SOCIAL Y GOVERNABILIDAD DEMOCRÁTICA Autora: Sonia Fleury CEPAL, Dez/2013. Título: ELOS QUE LIBERTAM. Autora: Sonia Fleury e Lilian Alfaia. Organização&Sociedade/BA, 2013. Título: EDUCAÇÃO POPULAR E QUESTÕES DE PODER Autora: Sonia Fleury Revista Interface, 2013. 23 3.2 Submetidos à avaliação Título: METONÍMIAS DA PARTICIPAÇÃO PACIFICADA. Autora: Sonia Fleury e Juliana Kabad. Submetido à Scripta Nova, 2013. 4. Congressos Científicos 4.1 Apresentação de trabalhos em Congressos Internacionais Título: “Metonímias da Participação Pacificada” Autor: Sonia Fleury e Juliana Kabad Trabalho apresentado no 29º Congresso Latino-americano de Sociologia/ALAS, Santiago/Chile, 2013. Título: “Do Welfare State ao Warfare State no Brasil” Autor: Sonia Fleury Trabalho apresentado no VI Congresso Latinoamericano de Ciencia Política da Associação Latinoamericana de Ciência Política – ALACIP, Quito/Equador, 2012 4.2 Apresentação de trabalhos em Congressos Nacionais Título: “UPP Social e Territórios da Paz: um estudo sobre as políticas públicas sociais nas favelas do Rio de Janeiro e sua estruturação em redes” Autor: Clara Polycarpo e Isadora Araújo Trabalho apresentado no XVI Congresso Brasileiro de Sociologia/SBS, Bahia/Salvador, 2013. Título: “As Redes e a Difusão de Inovações” Autor: Sonia Fleury 24 Trabalho apresentado no I CIC Saúde Brasil 2013 - Seminário de Conhecimento, Inovação e Comunicação em Serviços de Saúde, 2013, Salvador/BA. Título: “O Mercado Sobe o Morro. A Cidadania Desce? Estudo Sobre os Efeitos da Pacificação no Santa Marta” Autor: Sabrina Ost. Trabalho apresentado no EnANPAD 2012, Rio de Janeiro/RJ, a partir da dissertação de mesmo título e de mesma autora. 5. Participação em Mesas-Redondas e Palestras em Seminários e Congressos 5º CONGRESSO NACIONAL DO PARTIDO DOS TRABALHADORES Forma de participação: Convidada/Conferencista Classificação do evento: Nacional Título da conferência: "Legado e Futuro do Projeto Democrático e Popular" Autor: Sonia Fleury Data e local: Brasília – Brasil, 2013. II CONGRESSO Brasileiro de Política, Planejamento e Gestão em Saúde ABRASCO Forma de participação: Convidada/Conferencista Classificação do evento: Nacional Título da conferência: A crise do capitalismo: limites e possibilidades de reformas estruturais e dos sistemas de proteção social Autor: Sonia Fleury Data e local: Minas Gerais – Brasil, 2013. I SEMINÁRIO Conhecimento, Inovação e Comunicação em Serviços de Saúde - I CIC-SAÚDE BRASIL Forma de participação: Convidada/Conferencista 25 Classificação do evento: Nacional Título da conferência: As Redes e a Difusão de Inovações Autor: Sonia Fleury Data e local: Salvador – Brasil, 2013. WORKSHOP “Democracia, Redistribuição e Investimento” Forma de participação: Convidada/Simposista Classificação do evento: Nacional Título da conferência: Democracia e Redistribuição Autor: Sonia Fleury Data e local: Rio de Janeiro, RJ – Brasil, 2013. SEMINÁRIO “Promoção de Cidadania nas Favelas” Forma de participação: Convidada/Moderadora Classificação do evento: Nacional Título da conferência: Desafios e Propostas para a Promoção e Ampliação de Cidadania nas Favelas Autor: Sonia Fleury Data e local: Rio de Janeiro, RJ – Brasil, 2013. XXIX Congreso Latinoamericano de Sociología – ALAS Forma de participação: Participante/Apresentação Classificação do evento: Internacional Título da conferência: Metonímias da Participação Pacificada Autor: Sonia Fleury Data e local: Santiago – Chile, 2013. I SEMINÁRIO Conhecimento, Inovação e Comunicação em Serviços de Saúde – I CIC-SAÚDE Forma de participação: Convidada/Conferencista Classificação do evento: Nacional Título da conferência: As Redes e a Difusão de Inovações Autor: Sonia Fleury Data e local: Salvador –Brasil, 2013. 26 SEMINÁRIO CEPAL - Pactos sociales para una protección social más inclusiva: experiencias, obstáculos y posibilidades en América Latina y Europa Forma de participação: Convidada/Conferencista Classificação do evento: Internacional Título da conferência: Pacto social y gobernabilidad democrática Autor: Sonia Fleury Data e local: Santiago – Chile, 2013. SEMINÁRIO “5 anos de pacificação no Rio de Janeiro: reflexões sobre Segurança Pública, processos de militarização e controle das cidades” Forma de participação: Convidada/Conferencista Classificação do evento: Nacional Título da conferência: 5 anos de Pacificação Carioca: A produção da Violência e Estratégias de Controle Autor: Sonia Fleury Data e local: Rio de Janeiro, RJ – Brasil, 2013. The Special Lancet: Hidden and distinctive knowledge on Universal Health Coverage from Latin America: Implications for developing countries around the globe Forma de participação: Convidada/Simposista Classificação do evento: Internacional Título da conferência: Brasil: Right to Health - Beyond Universalization Autor: Sonia Fleury Data e local: Havana – Cuba, 2013. CONGRESSO “Debates y Combates: Múltiples Modernidades en un Mundo Multipolar” Forma de participação: Convidada/Conferencista Classificação do evento: Internacional Título da conferência: Brasil: Límites y potencialidades de una democracia no radical 27 Autor: Sonia Fleury Data e local: Buenos Aires – Argentina, 2012. II Congreso Internacional de Sistemas de Salud: Ciudadanía y Financiamiento Forma de participação: Participante/Apresentação Classificação do evento: Internacional Título da conferência: Derechos sociales universales y restricciones del financiamiento en los sistemas de salud Autor: Sonia Fleury Data e local: Bogotá – Colômbia, 2012. Reunião de Trabalho do Instituto Sul-Americano de Governo em Saúde (ISAGS) Forma de participação: Participante/Apresentação Classificação do evento: Nacional Título da conferência: Desafíos para la Governabilidad y Governanza en Brasil Autor: Sonia Fleury Data e local: Rio de Janeiro – Brasil, 2012. Roda de Conversa: Sistemas Universais Sociais. Arena Socioambiental – Rio+20 Forma de participação: Convidada/Conferencista Classificação do evento: Nacional Título da conferência: Dilemas da Seguridade Social no mundo contemporâneo Autor: Sonia Fleury Data e local: Rio de Janeiro – Brasil , 2012. VI Congresso Latinoamericano de Ciencia Política Forma de participação: Participante/Apresentação Classificação do evento: Internacional Título da conferência: Do Welfare State ao Warfare State no Brasil 28 Autor: Sonia Fleury Data e local: Quito – Equador, 2012. II ISA Forum of Sociology - Social Justice and Democratization Forma de participação: Participante/Apresentação Classificação do evento: Internacional Título da conferência: Military Strategy and Urban Governance Autor: Sonia Fleury Data e local: Buenos Aires – Argentina, 2012. II Congreso Internacional de Sistemas de Salud: Ciudadanía y Financiamiento Forma de participação: Participante/Apresentação Classificação do evento: Internacional Título da conferência: Derechos sociales universales y restricciones del financiamiento en los sistemas de salud Autor: Sonia Fleury Data e local: Bogotá – Colômbia, 2012. Congresso “Whatever happened to North-South?” Forma de participação: Participante/Apresentação Classificação do evento: Internacional Título da conferência: The Hiden Welfare State in Brazil Autor: Sonia Fleury Data e local: São Paulo – Brasil, 2011 IV Seminario Atlántico de Pensamiento. Lo Publico: Educación/Salud/Empleo Forma de participação: Participante/Apresentação Classificação do evento: Internacional Título da conferência: The Laggard Welfare State in Brazil Autor: Sonia Fleury Data e local: León y Castillo – Espanha, 2011 29 Fourth Annual Global Studies Conference - Emerging Societies and Emancipation Forma de participação: Participante/Apresentação Classificação do evento: Internacional Título da conferência: Building Democracy in a Emerging Society: The Chalenge of the Welfare State in Brazil Autor: Sonia Fleury Data e local: Rio de Janeiro, RJ – Brasil, 2011. SEMINÁRIO “El Brasil despues de Lula: Éxitos y desafíos en la reducción de la pobreza y el liderazgo regional” Forma de participação: Convidada/Conferencista Classificação do evento: Internacional Título da conferência: Las relaciones de Brasil con la Unión Europea y con España: hasta donde llega la relación estratégica Autor: Sonia Fleury Data e local: Barcelona – Espanha, 2011. Relatório Anual das Desigualdades Raciais no Brasil - 2009/2010 Forma de participação: Participante/Apresentação Classificação do evento: Internacional Título da conferência: Mesa de Debate: Relatório Anual das Desigualdades Raciais no Brasil Autor: Sonia Fleury Data e local: Brasília – Brasil, 2011. SEMINÁRIO “Periferias Urbanas y Tranformación Comunitaria. Diálogo México-España” Forma de participação: Convidada/Moderadora Classificação do evento: Internacional Título da conferência: Nueavas políticas urbanas, nueva institucionalidad Autor: Sonia Fleury Data e local: Buenos Aires – Argentina, 2011. 30 International Political Science Association IPSA-ECPR Joint Conference Forma de participação: Participante/Apresentação Classificação do evento: Internacional Título da conferência: The Hidden Welfare State in Brazil Autor: Sonia Fleury Data e local: São Paulo, SP – Brasil, 2011. I Conferência Mundial sobre o Desenvolvimento de Sistemas Universais de Seguridade Social Forma de participação: Convidada/Conferencista Classificação do evento: Internacional Título da conferência: As razões e oportunidades para a construção dos Sistemas Universais em seus imperativos democráticos e éticos Autor: Sonia Fleury Data e local: Brasília – Brasil, 2010. SEMINÁRIO “Derecho a la salud, políticas públicas y justicia” Forma de participação: Convidada/Conferencista Classificação do evento: Internacional Título da conferência: Ciudadanía, derechos y políticas públicas de salud Autor: Sonia Fleury Data e local: Buenos Aires – Argentina, 2010. SEMINÁRIO “VI Semana de Gestão de Políticas Públicas” Forma de participação: Convidada/Conferencista Classificação do evento: Nacional Título da conferência: Como construir a democracia em um dos países mais desiguais do mundo? Autor: Sonia Fleury Data e local: São Paulo, SP – Brasil, 2010. SEMINÁRIO “Direitos Sociais: Avanços e Perspectivas” Forma de participação: Convidada/Conferencista Classificação do evento: Nacional 31 Título da conferência: Política Social - Estado e Democracia Autor: Sonia Fleury Data e local: Brasília – Brasil, 2010. 6. Prêmios e Distinções Menção Honrosa na Categoria “Sociólogos do Futuro” do XVI Congresso Brasileiro de Sociologia, realizado de 10 a 13 de setembro de 2013, em Salvador (BA). Título do trabalho: “UPP Social e Territórios da Paz: um estudo sobre as políticas públicas sociais nas favelas do Rio de Janeiro e sua estruturação em redes” Autoras: Isadora Silva de Araujo (bolsista do Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica (PIBIC) e aluna da Universidade Federal do Rio de Janeiro - UFRJ), e Clara Gomes Polycarpo Peres (bolsista do Programa de Apoio à Pesquisa e Produção Acadêmica Docente – ProPesquisa da FGV/EBAPE e aluna da Universidade Federal Fluminense - UFF) Disponível em < http://ebape.fgv.br/noticias-destaques/trabalho-pesquisadoraspeep-recebe-mencao-honrosa-congresso > Anexo: 32 33 PRODUÇÃO ESPECIAL Consideramos como produção especial um conjunto de atividades direcionadas para criar um canal de comunicação entre a produção acadêmica de alto nível e sua divulgação e apropriação pela sociedade. Essa produção visou organizar eventos como seminários e participar em eventos nos quais fosse possível agregar e articular redes de pesquisadores com lideranças e moradores de favelas, gestores públicos, organizações internacionais, especialistas e meios de difusão da informação. Grande ênfase foi dada à produção e circulação de documentários e material audiovisual que expressasse a realidade e depoimentos dos atores envolvidos na política pública de implantação da UPP. Além da produção de seis vídeos do seminário Favela é Cidade, construímos um bando de dados audiovisual que está sendo disponibilizado ao público interessado. Essa produção será apresentada em itens que tratam de: 1. Produção de número temático – Le Monde Diplomatique 2. Organização de Seminários, articulação de redes de pesquisadores e lideranças de favelas e produção de vídeos Vídeo “Favela é Cidade” 3. Publicações: mídias diversas 3.1 Artigos em Jornais/Revistas 3.2 Entrevistas 3.3 Vídeos 34 1. Produção de número temático – Le Monde Diplomatique Por iniciativa do PEEP buscamos dar maior divulgação aos resultados das pesquisas acadêmicas por meio de um veículo como o Le Monde Diplomatique, que se situa nessa fronteira entre a divulgação de temas sociais para o grande público, preservadas a profundidade e seriedade, ainda que em uma forma e linguagem distintas das publicações acadêmicas. A consciência de que trabalhamos sobre temas que envolvem a rediscussão da sociabilidade nas grandes metrópoles a partir de políticas públicas e a necessidade de enfocá-las desde o ponto de vista da ampliação da cidadania e dos direitos humanos nos levou a buscar esse tipo de divulgação para os resultados de nossas investigações. Sob a coordenação do PEEP, em interação com os editores da revista mensal, foram selecionadas as temáticas de Proteção Social, Políticas de Segurança, Associativismo, Violência e Crime Organizado, Sociabilidade e Participação em Territórios Pacificados, Homicídios e Questão Racial, Resistências Populares. A existência da rede de investigadores que estabelecemos por oportunidade da realização do seminário FAVELA É CIDADE nos permitiu mobilizar esforços coletivos, assim como envolver outros investigadores nesse esforços de divulgação que se constituiu na temática central do LE MONDE DIPLOMATIQUE, Ano 6, Número 67, Fevereiro de 2013. Compuseram esse núcleo temático os seguintes artigos: a) Sob o domínio do medo - Editorial de Silvio Caccia Bava b) O controle do crime violento no Rio de Janeiro por Luiz Antonio Machado da Silva A compreensão coletiva dos conflitos sociais ficou cada vez mais reduzida à esfera cotidiana imediata, e os alvos das atividades de manutenção da ordem pública tornaram-se cada vez mais territorializados: não se trata mais de coibir atividades proibidas, mas de controlar áreas tidas como perigosas 35 c) Território e ocupação: afinal, de quem regime se trata? por Márcia Pereira Leite A proposta do movimento Ocupa Borel às Nove foi ocupar as ruas das localidades, recuperar o espaço público pelos e para os moradores, exercer livremente sua sociabilidade e praticar sua cultura, desafiar a disciplinarização pretendida pelas UPPs e protestar contra o controle social a que os moradores estão submetidos. d) Vinte anos de PCC em São Paulo: o espaço entre governo e crime por Gabriel Santis Feltran Só em São Paulo há uma política de encarceramento tão agressiva; só no estado há uma única facção na regulação tanto de condutas criminais quanto dos preços nos mercados ilegais; só em SP isso redundou na redução de 70% dos homicídios; só no estado a “guerra” entre crime e governo pode ter a magnitude vista em 2012 e) Rio: marca registrada da participação pacificada por Sonia Fleury, Julio C. Borges, Sabrina Guerghe Ao contrário da política de segurança, cujo comando e missão estão definidos, a parte social da pacificação sofre de várias debilidades. As mais evidentes são a desarticulação com as políticas universais de saúde e educação e a falta de coordenação entre os vários agentes que promovem o desenvolvimento urbano e social f) Associações de moradores precisam repensar seu papel nas favelas por Sonia Fleury, Sabrina Guerghe e Juliana Kabad Em entrevista, o jornalista Itamar Silva, diretor do Ibase e presidente do Grupo ECO do Santa Marta, comenta avanços e retrocessos da organização dos habitantes das favelas. Para ele, as associações de moradores, que já vinham experimentando uma crise de identidade, precisam rediscutir seu papel após a chegada das UPPs g) A cor dos homicídios no Brasil por Julio Jacobo Waiselfisz 36 Entre 2002 e 2010, o país apresentou uma inquietante tendência de aumento da distinção entre negros e brancos nos índices de mortalidade. Se os dados globais de homicídio mudaram pouco nesse período, em torno de 27 para cada 100 mil habitantes, foi em razão da queda dos homicídios brancos e crescimento dos negros. h) Do welfare ao warfare state por Sonia Fleury Está havendo uma transmutação regressiva do social, com a presença de valores conservadores, uma articulação nefasta entre política e moralismo religioso, além do incentivo ao empreendedorismo individual e ao consumismo em detrimento de formas solidárias de sociabilidade e da existência de mecanismos de proteção social 37 2. Organização de Seminários, articulação de redes de pesquisadores e lideranças de favelas e produção de vídeos O seminário FAVELA É CIDADE foi realizado em Novembro de 2012, na Favela Santa Marta, por ocasião da celebração dos três anos de implantação da primeira UPP nessa localidade. O seminário foi um dos mais importantes produtos dessa pesquisa devido a ter sido concebido e realizado visando: a) Dar visibilidade à discussão sobre a implantação dessa política pública; b) Dar voz prioritariamente aos moradores e secundariamente aos pesquisadores para que pudessem expressar seus pontos de vista; c) Fazer um contraponto com a visão veiculada pela mídia e propaganda governamental, chamando atenção para os impactos positivos e negativos sobre a vida da população em favelas onde foram ou não implantadas UPP; d) Chamar atenção das autoridades para problemas e possíveis rumos a serem corrigidos para dar maior eficácia à política pública; e) Gerar uma rede de pesquisadores, gestores e moradores que possa agir de forma articulada na promoção e defesa da cidadania e da segurança nas favelas; f) Criar canais de comunicação mais fluidos entre os diferentes atores envolvidos nessa política pública; g) Permitir uma ampla divulgação dos resultados dos debates. Os grupos de pesquisadores envolvidos na organização do Seminário foram oriundos do IBASE, do CEVIS e IESP da UERJ e do PEEP/EBAPE/FGV. Foram identificadas temáticas e lideranças locais expressivas, para compor mesas redondas onde predominavam lideres comunitários, tendo em cada uma delas a presença de um pesquisador dos grupos acima mencionados. A última sessão foi destinada a uma Roda de Conversas com a participação exclusiva de moradores de favelas, com a observação dos demais participantes, de forma a dar espaço para uma reflexão coletiva dos problemas comuns 38 vivenciados nas favelas e o debate sobre formas de organização que permitissem maior incidência dos moradores sobre a política pública. Programação 26 de novembro Sessão 1 – 9h às 12h UPPs, direitos e serviços públicos – cidadania e mercado. Participantes: Sonia Fleury (FGV), L. A. Machado da Silva (CEVIS), Alam Brum (Raízes em Movimento) e Mônica Francisco (Favela do Borel) Sessão 2 –14h às 18h Sociabilidade juvenil e polícia Participantes: Rapper Fiell (Santa Marta), Lia Rocha (CEVIS), Lula (Chapéu Mangueira) e Arley Macedo (Rocinha). 27 de novembro Sessão 3 – 9h às 12h O debate público, a prática das UPPs e avida associativa local. Participantes: Cleonice Dias (Cidade de Deus), Luiz Carlos Fridman (CEVIS), Dejanira Deise (Favela Batan) e Deise Carvalho (Morro do Cantagalo). Sessão 4 – 14h às 18h Roda de Conversa entre as Redes. Coordenação: Itamar Silva (IBASE). Presença A presença foi ampla e diversificada, como pretendíamos, envolvendo: moradores de inúmeras comunidades, autoridades responsáveis pela segurança pública, pesquisadores de várias universidades, gestores locais de programas sociais, gestores de organismos internacionais e acadêmicos de outros países, membros de ONGs, repórteres da grande imprensa e da mídia alternativa, profissionais liberais que prestam serviços em favelas, etc. 39 Após a realização do seminário foram realizadas diferentes iniciativas de discussão a partir da convocação de Rede de Defesa da Segurança e Cidadania, criada no seminário. Essas iniciativas visaram discutir o andamento da política, divulgar iniciativas locais e coletivas de interlocução com os poderes públicos, favorecer o trabalho coletivo e o intercâmbio entre academia, mídia e moradores de favelas, divulgar o resultado do seminário como forma de mobilização coletiva. A lista de presença demonstra essa riqueza e diversidade. Nome Entidade ou comunidade A. Hemerijck Vu UniversityAmsterdan Adair Rocha PUC/UERJ Adria Bella IETS Adriana Facina UFF Adriana Pereira do Fonseca UFRJ AgustinZanotti Morador Alan Barcelos da Silva Morador Alba Zaluar IESP/UERJ AlbanDrouvet Botafogo Alexandre Lima Baião PEEP Alexandre Magalhães IESP/UERJ Alexandre Mendes PUC-RJ Alice De Marini Justiça Global Aline Lorenzon UERJ Anderson Ribeiro Dar Seu Papo André Aranha PUC-RJ/IETS André Luiz Abreu de Souza Favela não Se Cala Andreia Chagas CAPSI – Complexo da Maré 40 Andrea Gill PUC-Rio Anelise Fróes SEASDH Antônio Guedes Viva Rio Antônio Guedes Viva Rio Arthur L. C. Mattos UFRJ Beatriz Brandão UERJ Beatriz C. Ribeiro UERJ Beatriz Watanabe COPPE-UFRJ Breno P. Câmara IPPUR/UERJ Bruna M. Dourado UFPE/PCR Bruno Coutinho SEPLAG-RJ Caio Cesar Wellmann Scaffer CF Zilda Arns Carla dos Santos Mattos IESP/CEVIS Carmen Opipari UFRJ Carolina Mazzi Jornal do Brasil Carolina P. dos Santos Observatório das Metrópoles Carolina Pereira UFRJ Celina Sorboe Universidade de Oslo, Noruega Christina Vital UFF/CEVIS Clarisse Ramalho SEASDH – Territórios da Paz - Borel Claudia Antunes Revista Piauí Cláudia Trindade UERJ Cláudio Teixeira Gabriel PMERJ ClaudiusCeccon CECIP Cleonice Dias Cidade de Deus Dafne J. A. Velazco UFF Daniella Fichino Débora Louzano UFRJ 41 Deborah Unbach Malheiro Deley de Acari Acari Deschamps Madelaine FGV/CPDOC Diana H. Zanoa UFRJ Diego Baronio Cantagalo Diva Duda Mattak Tudo de Cor Ebenezer S. Leite Providência Edson Diniz Redes da Maré Eliane dos Santos Souza ACS Santa Marta Ellen A. D‟Belo Moradora Ellen Lameck Silva Residência Multiprofissional – UFRJ – Saúde da Família Emerson RepperFieel Érica Dutra Gomes Residência - UFRJ Eunice Muniet UERJ Fabiana Melo Souza LTM/FIOCRUZ Fabio Costa PMERJ Fabio da Silva Siqueira SEPLAG-RJ Fabio do Amaral Comunidade Fabio Leon SEASDH / Territórios da Paz Fatima Pivetta ENSP/FIOCRUZ Fernanda Caixeta UFRJ Fernanda Pernasetti UPP Social / IPP Fernando Luta Popular - SP Fernando Pinheiro Flávio Mazzaro (Fafá) Fallet - AMAVALE Flora Daemon SEASDH/Babilônia Mangueira – Chapéu 42 Francisco Xavier Uberaba-MG Georgina Damasio Moradora Gilda Maria dos Santos moradora Gilson Fumaça Morador / Guia de Turismo Glaucia Marinho Justiça Global Gorete moradora Helcimar Lopes Raízes em Movimento Hugo Parra F. Morador Il Cheong Yi UNRISD Inalva Mendes Brito Vila Autódromo Ingrid Nery Rocha Isabel Kopschitz Governo do Estado Isabel Lima Justiça Global Isabela Fraga Radio Tupi Itamar Silva IBASE Izabel Cristina Reis Mendes FAU/USP Izabel Nunez FGV-RJ Jaciana Abreu NBS Jacques Schwarzstein Assoc. Moradores Sta Tereza Jader Moraes SEASDH João Batista Morador José Accacio Morador José Carlos P. Duarte Turismo/morador José Mario AMMSM Josefa Vasconcelos Moradora Josiane do Vale UFRJ Juan de Souza SIlva Grupo Eco Juliana Blasi Cunha USP 43 Juliana Correa Fiocruz Juliana Demartini PROUBB/UFRJ Juliana F. Kabad PEEP Juliana Farias CEVIS Juliana Gonçalves Equipe de rádio do Governo Julião do Jorge Turco Bonde da Cultura Júlio Cesar Borges dos Santos PEEP Justine Ninnin Vidigal / UERJ KalinkaIaquinto Conjuntura Econômica Karina F. Rodrigues PEEP Karina Lopes Padilha SEASDH Kleber Merlim Moreira Ramos Larissa Oliveira IFRJ Laura Marques Alves IPPUR Leandro Silva SEPLAG-RJ Leonardo Gomes Fróes UPP Social Leonidas Cardoso IETS Liane Abreu Atitude Social Lilian Hilário da Silva Grupo ECO Luciana Sucupira UAB Luciane Rocha CRIOLA Luigi Spera Jornalista Luiz Antonio da Silva Mendonça Missão Batista Jr. Luiz Antonio Machado Luiza Louzada Advogada/BSGI Luiza Viana Radio Santa Marta - Biblioteca Maciel Pinheiro Morro do Borel Maciel Silva dos Santos MNPR/CNDDM-RJ 44 Manoel Ezidoro Ferreira Morador Manuela Giácomo Botafogo (vizinha) Marcella Carvalho UFRJ Marcia Barros UNAPE/ASIA Marcia Leite UERJ Marcia Regina I. S. da Silva moradora Marcio Darck M. Couto FDUP Margarida Prado IAB / Comissão Direitos Humanos Maria Cristina Costa Agencia Local Maria Isabel Macdowell IESP/UERJ Maria José Luzuriaga FGV/UFRJ Mariah de O. Lins UFRJ Mariana Adão da Silva SEASDH Mariana Dantas CECIP Mariana Dias KAL Mariana do Carmo Lins UFRJ Marielle Franco ALERJ / UFF Marijo de Theye Vu University of Amsterdan Marília Gonçalves IBASE Marina Liberatori UNC (Argentina) UFRJ Marisa Feffermann IUST de Saúde/SES/SP Matteo L. R. Meirelles estudante Matthew Richmond King‟s College London Maurício Campos dos Santos Rede Contra a Violência Maycon Brum de Almeida Raízes em Movimento Miramar P. Castilho Radio Borel Miriam Abramovay FLACSO Monica Santos Francisco Borel CDD de Desenvolvimento 45 Monique Bier Freitas SEASDH-RJ/UFRJ Nandson C. Ribeiro UNAPE/ASIA Natalia Urbina C. Visão da Favela Brasil Natane Santos UFRJ Nicholas Barnes Universidade de Wisc Nildo Figueiredo Morador Nilo Duplat Pâmella Santos dos Passos IFRJ Patrícia Andreia Maciel UFF Patrícia Novaes IPPUR/UFRJ Paula Granada UPP Social Pedro ZaidanDuplat da Silva Pierre Avila Atitude Social Priscila Lorethh Tavares UERJ Priscilla de o. Azevedo SESEG Raiany Peres Radio Tupi Raphael C. de Souza UFRJ/APAFUNK Raquel de Melo Rosa Museu Casa de Be. Constant Regis Carmo dos Santos Morador Renata Paes SEPLAG-RJ Roberto Marinho Providência Rodrigo Costa Observatório de Favelas Rogerio Daflon O Globo Romulo T. B. Nunes UFF Rute Imanishi IPEA Sabrina Guerghe PEEP Sabrina Ost FGV/EBAPE Salete Martins Turismo - moradora 46 Samuel Araújo Escola de Música/UFRJ Sebastião C. Belo PSTM Sheila Souza Brazilidade- Turismo (moradora STM) Sidney Silva (Tartaruga) MUF (Cantagalo) Sidney Suzano de F. M. Neto ONG Esmeralda Silvana Bagno SEASDH Silvana F. Moreira Moradora Silvia Pinheiro FGV Simone Rezende Moradora Sonia Maria de Oliveira Costurando Ideias Sonia Fleury Peep Suellen F. Guariento ISER / UFRJ Susan C. Buranelo IPP SylvieTimbert UFRJ Tadeu Moraes SEASDH Tatiana Bastos Territórios da Paz Thaisa Ausier Residência - UFRJ Thaynara Souza RMPSF-UFRJ Valdeci Pereira Missão Batista Dona Marta Valdinir P. Topanotti UFMT/UFRJ Vitor Lira Adão Pico Santa Marta Vitor Silva Jornal do Brasil Weder Ferreira da Silva SEASDH Wellington da Silva Conceição UERJ Wesley Wellington S. Passos UERJ Woney Lopes Grupo ECO ZohraAbaakouk OPAS e Experiência 47 VIDEO FAVELA É CIDADE A filmagem de todo o seminário nos serviu de material primário para a elaboração de um vídeo de divulgação que permitisse que os resultados do seminário ultrapassassem a barreira do tempo e espaço e pudessem ser amplamente debatidos e utilizados como material didático e de debate político. Inúmeras foram as dificuldades a serem superadas, destacando-se problemas decorrentes do formato e da qualidade da filmagem, além do fato de ser um material com muito conteúdo, porém exageradamente extenso para os propósitos enunciados. O PEEP enfrentou os desafios de realizar a edição e divulgação do vídeo, em proveito de todos os organizadores e participantes, além daqueles que passaram a ter acesso ao material que foi amplamente divulgado com legendas em inglês, no youtube. Foram definidos eixos temáticos, que são os eixos de nossa investigação e dos debates realizados no seminário e selecionadas as falas – minutagem – para cada tema. Os temas selecionados foram: Cidadania; Estado, Mercado e Sociedade; Direito à Moradia; Controle Social; Juventude e Participação e Resistência. Posteriormente, em articulação com o Grupo Paêbirú que vinha trabalhando a filmagem do processo de transformação no Morro da Providência (Domínio Público), estabelecemos uma dinâmica de seleção mais refinada do material e de criação artística e seleção de imagens adicionais, a fim de tornar o produto mais atraente e sintético. O resultado final foi separado em seis capítulos, correspondentes a cada um dos eixos temáticos, de forma que sua divulgação em conjunto e em capítulos isolados permitisse o mais amplo uso. Finalmente foi realizada a tradução das falas e a colocação de legendas, também com o objetivo de poder usar e divulgar o material para pesquisadores e interessados de outros países. Divulgação do Vídeo FAVELA É CIDADE 48 Para divulgar o material produzido forma utilizadas todas as redes de contatos dos pesquisadores e participantes, aos quais foi enviada a seguinte nota: O Seminário "FAVELA é CIDADE" reuniu lideranças e moradores de várias favelas do Rio de Janeiro para discutir a política das UPPs. Neste debate você poderá conhecer o ponto de vista dos moradores, que quase nunca está presente nos meios de comunicação. Aproveite a oportunidade para conhecer essa realidade vista pelos olhos e pela voz daqueles que a vivem, refletem sobre ela e resistem. Ajude-nos a divulgar este trabalho em suas redes sociais. Os temas debatidos foram: Cidadania; Estado, Mercado e Sociedade; Direito à Moradia; Controle Social; Juventude e Participação e Resistência. Você poderá ver cada um deles separadamente aqui: CIDADANIA - Capítulo 1: http://www.youtube.com/watch?v=Oc5XxHcx_zU ESTADO - Capítulo 2: http://www.youtube.com/watch?v=fPDuuwO0ak4 MERCADO - Capítulo 3: http://www.youtube.com/watch?v=0o-lrnossjM MORADIA - Capítulo 4: http://www.youtube.com/watch?v=Qbdt8oDnM_s CONTROLE - Capítulo 5: http://www.youtube.com/watch?v=eJVkdEq9rP4 PARTICIPAÇÃO - Capítulo 6: http://www.youtube.com/watch?v=zejxaoJ1Uh4 Ou o vídeo completo FAVELA É CIDADE: http://www.youtube.com/watch?v=uKYULpmrRaI Acompanhe-nos: peep.ebape.fgv.br ou facebook.com/Peep.Estudos ___________________ The Seminar "THE FAVELA is THE CITY" gathered leaders and residents of various favelas in Rio de Janeiro to discuss politics regarding the UPPs. In this debate, you will have a chance to observe the residents' perspectives, an angle which is very rarely portrayed in the mass media. 49 Take this opportunity to witness this reality through the eyes and voices of those that are living, thinking about, and resisting it. Help us divulge this work by promoting it on your social networks. The topics that were discussed are: Citizenship; State, market and society; Right to housing; Social control; The youth; and Participation and resistance. You can watch each chapter separately: Chapter 1: http://www.youtube.com/watch?v=Oc5XxHcx_zU Chapter 2: http://www.youtube.com/watch?v=fPDuuwO0ak4 Chapter 3: http://www.youtube.com/watch?v=0o-lrnossjM Chapter 4: http://www.youtube.com/watch?v=Qbdt8oDnM_s Chapter 5: http://www.youtube.com/watch?v=eJVkdEq9rP4 Chapter 6: http://www.youtube.com/watch?v=zejxaoJ1Uh4 Or in continuously through the link: http://www.youtube.com/watch?v=uKYULpmrRaI Join us: peep.ebape.fgv.br facebook.com/Peep.Estudos 3. Publicações: mídias diversas 3.1 Artigos em Jornais/Revistas Título: Manifestações e vandalismo desafiam a democracia Autora: Sonia Fleury Mídia: Fundação Heinrich Böll, Heinrich Böll Stiftung Brasil, Rio de Janeiro/RJ, 31 de julho de 2013. Disponível em < http://www.br.boell.org/web/51-1527.html >; < http://www.boell.de/de/node/277686 > Título: Não é só reforma política, são direitos sociais! Autora: Sonia Fleury 50 Mídia: Plataforma Política Social [online], Julho/2013. Disponível em < http://www.politicasocial.net.br/index.php/opiniao/236- opisfleuryjunho2.html > Título: Diez días que sacudieron Brasil Autora: Sonia Fleury Mídia: La Vanguardia, 11 de julho de 2013, pp. 21. Disponível em <http://peep.ebape.fgv.br/sites/peep.ebape.fgv.br/files/file/diez_dias_que_sacud ieron_brasil.pdf > Título: A vitória foi além dos 0,20: aumentou a qualidade da democracia Autora: Sonia Fleury Mídia: Plataforma Direitos Sociais, Junho/2013. Disponível em <http://www.direitosociais.org.br/article/a-vitoria-foi-alem-dos- 020-aumentou-a-qualidade-da/> 3.2 Entrevistas Título: “A sociedade está se apropriando do poder. Temos que revitalizar a democracia”. Entrevistada: Sonia Fleury Mídia: Revista Adusp - Associação dos Docentes da USP – Outubro/2013, pp. 6-15. Disponível em < http://adusp.org.br/files/revistas/55/mat01.pdf> Título: Moradores têm medo porque sabem que tráfico continua, diz especialista sobre UPPs. Entrevistada: Sonia Fleury Mídia: Jornal Online UOL, Rio de Janeiro, 25 de outubro de 2013. Disponível em < http://noticias.bol.uol.com.br/ultimas- noticias/brasil/2013/10/25/moradores-tem-medo-porque-sabem-que-traficocontinua-diz-especialista-sobre-upps.htm> 51 Título: O sono do Gigante – como fica a democracia no Brasil após as manifestações de junho? Entrevistada: Sonia Fleury Mídia: Revista ALSHOP, nº 217, Outubro/2013, pp. 52-54. Disponível em < http://www.alshop.com.br/pageflip/revistaalshopn217/#/52/> Título: Instantâneos de um espaço político: ocupando a cidade Entrevistada: Sonia Fleury Mídia: Revista V!RUS, nº 9 [online], 2013. Disponível em <http://www.nomads.usp.br/virus/virus09/?sec=2&item=1&lang=pt> Título: “O Gigante nunca Dormiu” Entrevistada: Sonia Fleury Mídia: Revista Cidade Nova - Fraternidade em Revista, nº 8, Agosto/2013, pp. 7-9. Disponível em <http://peep.ebape.fgv.br/sites/peep.ebape.fgv.br/files/file/Cidade%20Nova_O %20gigante%20nunca%20dormiu.pdf> Título: Manifestações mostram insatisfação popular Entrevistada: Sonia Fleury Mídia: Jornal “Vozes das Comunidades”, ano VIII, nº 9, Setembro/2013, pp. 910. Disponível em < http://issuu.com/npc_/docs/vozes_das_comunidades_09> Título: Brasilien, Land des schönen Scheins" - Südwind-Magazin Entrevistada: Sonia Fleury Mídia: Revista Südwind-Magazin, nº 9, Julho/2013. Disponível em < http://www.philipp-lichterbeck.com/interviews/die-pt-bekommtdie-quittung-sonia-fleury > Título: Megaeventos e "uma limpeza urbana injustificada'' 52 Entrevistada: Sonia Fleury Mídia: Instituto HUMANITAS UNISINOS, 28 de maio de 2013. Disponível em < http://www.ihu.unisinos.br/entrevistas/520433-entrevista- especial-com-sonia-fleury > Título: UPP exatamente para quê? Entrevistada: Sonia Fleury Mídia: Jornal REDES – Redes de Desenvolvimento da Maré, 24 de maio de 2013. Disponível em < http://redesdamare.org.br/?p=7623 > Título: "O que está acontecendo é um tipo de remoção branca. Os turistas estão invadindo a favela. A favela virou uma mercadoria". Entrevistada: Sonia Fleury Mídia: Jornal PCO – Causa Operária, 03 de março de 2013. Disponível em < http://www.pco.org.br/entrevista-da-semana/o-que-esta- acontecendo-e-um-tipo-de-remocao-branca-os-turistas-estao-invadindo-afavela-a-favela-virou-uma-mercadoria/epbj,z.html > 3.3 Vídeos Vídeo: Sonia Fleury no Jornal GloboNews - Em entrevista ao Jornal da GloboNews do dia 19 de junho de 2013., Professora da EBAPE-FGV, onde coordena o Programa de Estudos da Esfera Pública (PEEP), e Doutora em Ciência Política, Sonia Fleury, fala sobre as manifestações do Rio de Janeiro e a crise de democracia no país. Edição da entrevista, com imagens do documentário "Domínio Público" e Seminário "Favela é Cidade". Disponível em <http://www.youtube.com/watch?v=C81nmE- lTuo&feature=youtu.be> - Primeira parte: http://www.info4.com.br/ver/ver.asp?cod=713776&nome=1432&cliente=1432&ti po=2 53 Segunda - parte: http://www.info4.com.br/ver/ver.asp?cod=713783&nome=1432&cliente=1432&ti po=2 Vídeo: Reforma Política - Plebiscito e Referendo Vídeo produzido pela Plataforma dos Movimentos Sociais pela Reforma Política, em 2012, onde a Professora da EBAPE/FGV e Doutora em Ciência Política, Sonia Fleury, mostra, em entrevista, a sua posição sobre plebiscito, referendo e reforma política. Disponível em < http://www.reformapolitica.org.br/reforma-politica-em-tv/670plebiscito-e-referendo-assista-ao-video-da-reforma-politica.html > MARCO CONCEITUAL E METODOLOGIA DA PESQUISA 1. Introdução Em 2009 o governo do Rio de Janeiro deu início a uma nova política em relação às favelas, até o momento, dominadas por grupos fortemente armados de traficantes. Ao invés dos confrontos recorrentes, com a entrada da polícia nos territórios das favelas e sua posterior retirada retornando à “normalidade” do convívio dos moradores com domínio dos traficantes, optou-se por uma estratégia de ocupação policial permanente, assegurando desta forma o monopólio da coerção ao Estado. A ocupação militar, com ou sem confronto, seguida de instalação permanente de uma unidade policial foi considerada como condição imprescindível para a integração destes territórios à cidade formal, por meio da expansão da cidadania aos seus cidadãos. A primeira favela ocupada pela UPP – Unidade de Polícia Pacificadora foi o Santa Marta, sendo a última a receber o componente social representado pela instalação do Fórum da UPP Social, três anos depois. Neste texto apresentaremos os resultados de estudos de caso realizado em 2012 e 2013 sobre as percepções dos diferentes atores em relação ao processo vivido neste período. Em especial, pretende-se discutir contradições e 54 limitações inerentes a um modelo de expansão da cidadania por meio de forte componente coercitivo, expressão da principal relação entre Estado e população favelada. A relação do poder estatal com as favelas foi estabelecida a partir da ausência de bens e serviços públicos nestes territórios, e da invisibilidade social construída por meio da denegação de sua existência. Esta construção social deveu-se à restrição do voto do analfabeto (Burgos, 1998), ao preconceito contra negros e imigrantes, e de sua identificação com a marginalidade (Perlman,1977). A incapacidade de esta situação ser absorvida pelo ideário desenvolvimentista respaldou políticas de remoção das favelas e de criminalização de seus moradores. No entanto, as manifestações culturais oriundas das favelas cariocas, como o samba, o candomblé e, mais recentemente o funk, sempre atravessaram a cidade, tendo seus conteúdos apropriados pela civilidade urbana. A expansão crescente das favelas e de seus moradores, em número muito superior ao da cidade formal (Cezar, 2002), provocou a auto-organização das comunidades em busca de melhorias sociais e reconhecimento de suas demandas, na tentativa de romper os estereótipos impostos pela segregação territorial, amparadas em muitos casos por grupos religiosos, voluntários e partidos políticos de esquerda. Na adaptação ao sistema político vigente, as associações de moradores tornaram-se interlocutores das demandas sociais da comunidade junto ao poder público. O descompasso entre os direitos sociais e civis negados aos favelados, e seu direito político de expressão eleitoral, fomentou o clientelismo político intermediado pelas organizações comunitárias, barganhando a provisão de serviços públicos básicos em troca de votos (Diniz, 1982). Com a democratização houve a redução do fantasma da remoção, concomitantemente ao aumento do poder bélico dos narcotraficantes, o que significou seu domínio de fato sobre os territórios marginalizados. O crescimento da violência urbana ultrapassou as barreiras das favelas tornandose um sintoma agudo de ameaça à integridade física, à coesão social e ao poder estatal, indicados pelos confrontos entre facções de traficantes, incursões militares às favelas, chacinas realizadas por militares corruptos, 55 emergência de milícias policiais competindo pelo domínio territorial e econômico dos territórios da informalidade. A partir de 1992, o governo de Leonel Brizola operou uma mudança no tratamento das favelas, com redução das incursões policiais violentas e melhorias na infraestrutura nestes territórios. Muitas ONG passaram a atuar na prestação de serviços nestes territórios, com especial ênfase na inovação cultural como forma de integração social e a temática da segurança consolidaram-se no meio acadêmico. As melhorias nos territórios informais alcançaram maior ênfase na agenda pública a partir do Plano Diretor da Cidade em 1992, em consonância com as linhas de reforma urbana dispostas na Constituição. Na década de 90 ocorreu o Programa municipal Favela-Bairro, com financiamento do BID, destinando mais de US$ 626 milhões para investimentos em infraestrutura urbana. O objetivo expresso no nome do programa foi integrar as favelas à cidade como bairros formais por meio de investimentos públicos em serviços básicos, utilização de mão de obra local, regularização urbana e fundiária. Nossas pesquisas em três comunidades– as favelas de Vigário Geral e Rio das Pedras, dominadas por, respectivamente, traficantes e milicianos, e o Loteamento Ana Gonzaga – demonstraram que esta política pública trouxe ganhos materiais com melhorias significativas na infraestrutura. No entanto, fracassou no seu intento de integração social destas populações e territórios à cidade. Estes resultados se explicavam por fatores como a “guetização” das intervenções, que não ultrapassavam o interior destes territórios, deixando intocado o imaginário coletivo citadino dos territórios segregados. Outro fator foi a fragmentação desta intervenção, concentrada em melhorias urbanas, porém com baixo investimento em programas sociais. Um terceiro fator decorreu do não enfrentamento da questão da violência e do domínio territorial por parte de narcotraficantes ou milicianos, como se a condição de cidadania pudesse prosperar sob a barbárie (Fleury et al. 2004). Desde a década de 90, a questão da pobreza passou a ocupar lugar central na agenda internacional e nacional, com diferentes estratégias de enfrentamento, algumas oriundas dos direitos sociais inclusos na Seguridade Social na Constituição de 1988, outras, políticas focalizadas de transferência 56 condicionadas de renda. A recente retomada do crescimento econômico com aumento do emprego formal, do valor real do salário mínimo, do crédito popular e com a consolidação das transferências de renda propiciou uma reestratificação da sociedade brasileira, reduzindo a pobreza e aumentando o número de consumidores (Castro, 2009). No entanto, o aumento das expectativas por parte da população mais pobre não encontrou correspondência em outras políticas públicas, capaz de lhes assegurar serviços de qualidade nos sistemas universais de educação e saúde, ou em uma política habitacional efetiva. Nas favelas, começa a haver uma produção cultural local fruto dos esforços coletivos dos próprios de moradores, artistas, acadêmicos, associações civis, propiciaram o início de uma fase recente de importante produção cultural. Politicamente, o fenômeno é inverso, com a redução do papel das associações de moradores, debilitado em sua capacidade de representação tanto pelas práticas clientelistas como pelo controle que passa a ser nelas exercido por traficantes, milicianos e policiais corruptos. A necessidade de enfrentar a corrupção policial ganha importância na agenda pública por meio de iniciativas intergovernamentais de criação do sistema único de segurança pública, desenvolvendo políticas de valorização e formação de uma nova geração de policiais, voltadas para a promoção da cidadania. Ambas as linhas apontam para uma estratégia correta de enfrentamento de problemas cruciais no campo da segurança pública, embora, na maioria das vezes sua execução sofreu problemas de eficácia e continuidade (Soares, 2007). Por outro lado, a repressão policial também se aparelhou para o confronto com os traficantes, por meio de armamento bélico mais pesado e com a formação de uma polícia de choque. O fato da cidade do Rio de Janeiro ter sido escolhida para sediar, proximamente, megaeventos como as Olimpíadas e a Copa do Mundo colocou em questão a capacidade governamental de reduzir a violência e exercer o controle efetivo sobre seu território. Fruto deste contexto e da aprendizagem e inspirada em experiências internacionais de ocupação territorial e integração como de Medellín, surge a primeira UPP, depois da ocupação militar no Santa Marta em 2009. Sem uma estratégia inicial claramente delineada, esta primeira experiência foi considerada emblemática para construção e posterior aplicação 57 deste modelo de pacificação, caracterizado pela ocupação territorial, existência de fortes vínculos entre agentes governamentais e empresariais, desenvolvimento de programas de formalização do mercado e promoção social. A última fase, denominada UPP Social, só foi iniciada no Santa Marta três anos depois da sua pacificação, processo que acompanhamos no campo em 2011, em pesquisa de que revelou toda complexidade desta política pública. Nela, a intervenção social assume a mesma marca da política de segurança – UPP – o que, para além do caráter simbólico, indica a hierarquização das prioridades nas políticas públicas aplicadas às favelas. Isto se manifesta na desigual capacidade de mobilização e distribuição de recursos, poder de formulação, coordenação e execução. Enquanto a UPP tem um mandato claro em relação à ocupação policial para enfrentar problemas de segurança, com recursos colocados a sua disposição pelo poder público e empresariado, a UPP Social revela flagrante debilidade institucional. Além de ter sido deslocada da secretaria de governo de assistência social para um órgão de planejamento urbano municipal, apresenta um tipo de ação personalizada que carece de recursos de poder institucional. Sua missão de promoção do diálogo entre os vários atores - governamentais, empresariais, voluntários e comunitários- não indica quais capacidades serão acionadas para permitir a solução de conflitos e a coordenação das interdependências entre tantos e diversificados interesses envolvidos. A estreita ligação entre a UPP Social e a unidade policial, além das fortes relações com o setor empresarial, desenham um modelo novo de definição do social que se afasta das políticas e instituições tradicionalmente responsáveis pela garantia dos direitos sociais da cidadania. Isto nos leva a perguntar em que medida esta política social é capaz de promover a inclusão dos excluídos, gerar novas práticas participativas, assegurar os direitos de cidadania e regular a ambição mercantil frente aos interesses coletivos e comunitários. 2. Objeto da investigação 58 Em nossa análise privilegiamos a questão da participação da população em quatro favelas da cidade do Rio de Janeiro, onde foram implantadas as Unidades de Polícia Pacificadora - UPP1, como parte da política pública denominada como Política de Pacificação que teve início em 2008 na favela do Santa Marta, localizada no bairro de Botafogo. A UPP está vinculada à Polícia Militar do Estado do Rio de Janeiro PMERJ, corporação responsável pelo policiamento ostensivo na preservação da ordem, destacando essa nova unidade para a “execução de ações especiais concernentes à pacificação e manutenção da ordem pública nas comunidades carentes” 2. Em 2011, foi adicionada a essa missão a aplicação da “filosofia de polícia de proximidade nas áreas designadas para sua atuação” 3 , diferenciando-a desse modo, da filosofia de combate bélico da PMERJ. Essa progressiva e inacabada regulamentação – já que as unidades não constam ainda com regimento próprio – indica claramente que se trata de um processo incremental em construção (LINDBLOM, 2009), que se beneficiou de experiências anteriores de políticas de segurança e urbanização nas favelas, mas que representou uma inovação institucional em uma conjuntura particular. As principais lições aprendidas advieram de experiências relativamente recentes nas áreas de urbanização e de segurança, tais como os programas Favela-Bairro e o Bairrinho, a Delegacia Legal e o Programa Nacional de Segurança Pública com Cidadania - PRONASCI. Em todos eles buscou-se a promoção da cidadania, seja com melhorias na infraestrutura das favelas seja com a formação de policiais comprometidos com a preservação dos direitos humanos e sociais. Forte ênfase era colocada na integração dessas áreas e populações ao conjunto da cidade e da comunidade de cidadãos. No entanto, produziram resultados limitados e lições importantes em parte atribuídos a fatores como descontinuidades, focalizações que terminaram reforçando estereótipos, ausência de políticas sociais complementares, baixa participação comunitária, limitações de recursos, convivência de políticas públicas com o Essa análise se insere no projeto do PEEP: “Cidadania e Exclusão como Critérios de Avaliação de Política Pública”. 1 2 3 ESTADO DO RIO DE JANEIRO, Decreto Lei nº 41.650, de 21 de janeiro de 2009. ESTADO DO RIO DE JANEIRO, Decreto Lei nº 42.787, de 06 de janeiro de 2011. 59 domínio territorial por parte de narcotraficantes e reações corporativas à mudança nas polícias. A inovação na política atual fica por conta da conjunção, em um mesmo território, entre políticas que haviam sido experimentadas isoladamente, a saber, políticas de segurança, melhorias urbanas e programas sociais. A possibilidade desta compatibilização decorreu de fatores que distinguem a conjuntura atual das anteriores, nas quais tais programas foram executados. Primeiramente, pelo acirramento da violência urbana, que passou a estruturar um conjunto de práticas sociais em torno de um padrão de sociabilidade que foi denominado sociabilidade violenta (MACHADO DA SILVA, 2010), para indicar que a força física, com ou sem instrumentos e tecnologias, deixa de ser um meio para se transformar em um regime de ação. Nesse contexto, a exacerbação da violência passa a ser socialmente autorizada, terminando por debilitar tanto a cidadania quanto o Estado e o mercado no Rio de Janeiro. A busca da recuperação material e simbólica da cidade do Rio de Janeiro, em uma etapa do desenvolvimento nacional na qual o país se projetou internacionalmente como economia emergente, convergiu para a conquista da realização de uma série de megaeventos esportivos, festivos e religiosos, como forma de reinserção da cidade no contexto internacional. Uma articulação anteriormente inexistente entre as três esferas de governo – nacional, estadual e municipal – foi capaz de impulsionar esse projeto, com excepcional apoio de empresários. A redução da violência e da criminalidade, com a eliminação do domínio territorial armado de narcotraficantes em favelas situadas na linha de realização dos megaeventos passou a ser um requisito essencial para a viabilização exitosa deste projeto que pretende conjugar expansão da cidadania com o desenvolvimento econômico. Já foram instaladas 33 unidades da UPP e a previsão é que existam 40 até 2014, com o intuito de “recuperar áreas de comunidades pobres, com baixa institucionalidade, em que a instalação oportunista de grupos criminosos ostensivamente armados afronta o Estado Democrático de Direito, visando consolidar o controle estatal e devolver a paz e tranquilidade pública, necessárias ao exercício da cidadania e ao desenvolvimento social e 60 econômico” 4. A escolha das regiões priorizou as áreas mais valorizadas na cidade em termos socioeconômicos, imobiliários e turísticos, assim como, as que atendem ao fluxo e a previsão de realização de diversos megaeventos sediados pela cidade, tais como a Copa do Mundo em 2014 e os Jogos Olímpicos em 2016. Identificamos dois fatores que estiveram na raiz dessa mudança na política pública, viabilizando tanto seu desenho inovador como sua execução. Por um lado, a autonomia operacional que o governador concedeu à Secretaria Estadual de Segurança Pública - SESEG a partir de 2007, em consonância com a pressão do governo federal pela qualificação profissional dessa função e, por outro lado, a abertura de um canal direto do governo estadual com os empresários e acadêmicos reunidos em Thinks Tanks onde essa política foi formulada (FERREIRA, 2011). É também inovador o tipo de articulação desta ação governamental com a atuação de grupos empresariais que participam diretamente no planejamento e execução desta política. A afirmação de que as políticas determinam a política (LOWI, 1992), nesse caso mostra-se exemplar, já que as relações de poder entre os atores, a estabilidade de sua configuração, as possíveis confrontação de interesses e negociações de conflitos, vão ocorrer no âmbito da política governamental de pacificação das favelas. As rearticulações entre Estado, Mercado e Comunidade se dão, pois, nesse espaço de disputa e negociação que é a política de pacificação. Um terceiro fator que singulariza essa política traz o componente da participação social para o cerne da proposta, ao buscar a articulação de diferentes atores, públicos e privados, atuantes no território, com vistas a aumentar a sinergia e a eficácia da ação coletiva, inserindo-a na mencionada conjunção de políticas de segurança com programas de melhorias urbanas e de gestão social, Portanto, a política de pacificação envolve um componente de articulação interinstitucional com ativação de distintos atores governamentais e não governamentais, e outro que se refere à mobilização da comunidade, cuja participação é destacada como prioritária para o sucesso do programa. 4 ESTADO DO RIO DE JANEIRO, Decreto Lei nº 42.787, de 06 de janeiro de 2011. 61 Para efetuar a gestão dos programas sociais foi criada, em 2010, a UPP Social, vinculada à Secretaria Estadual de Assistência Social e Direitos Humanos - SEASDH. A adoção da mesma marca UPP para a área de gestão social não pareceu causar incômodo, posto que a da política de segurança contasse com grande aceitação social e patrocínio na mídia. Posteriormente, houve o intento de criar algum tipo de identidade própria para a gestão social, mas a transformação da sigla para “Unidade de Política Pública Social” não conseguiu desfazer a marca UPP, ficando a gestão social como um “apêndice” da ocupação militar. Para acomodar aliados políticos em um contexto eleitoral, a UPP Social foi transferida, no ano seguinte, para um órgão municipal, o Instituto Municipal de Urbanismo Pereira Passos - IPP com vistas a mediar demandas da população e ações do Estado e na incumbência de “coordenar, supervisionar, articular e integrar todas as ações sociais a serem desenvolvidas e os serviços públicos locais a serem prestados pelo Município do Rio de Janeiro no âmbito das Unidades de Polícia Pacificadora sediadas nesta Cidade” (grifo nosso) 5. O vazio deixado pela saída da UPP Social da estrutura do governo do Estado foi preenchido, inicialmente, com a criação de um Comitê Executivo de Políticas Sociais nos Territórios Pacificados – CEPS, com o objetivo de articular todas as secretarias estaduais, e assim “contribuir para a superação da fragmentação das políticas sociais visando à efetividade e à eficiência das ações, ampliando a sustentabilidade e o alinhamento estratégico das ações sociais do Governo do Estado, além de promover a articulação com as políticas públicas das demais esferas de governo e iniciativas da sociedade civil” 6. Para operacionalizar suas ações na promoção do desenvolvimento local, redução das desigualdades sociais e ampliação dos direitos da cidadania, foi criado o Programa de gestão social denominado Territórios da Paz (MISSE, 2013). Além dos dois programas de gestão social mencionados, outros inseridos no projeto de pacificação também procuram estabelecer o diálogo da população com o Estado no contexto de execução de políticas urbanas e habitacionais, como é o caso do Plano Municipal de Integração de 5 6 ESTADO DO RIO DE JANEIRO. Decreto lei nº 33.347, de 03 de janeiro de 2011. ESTADO DO RIO DE JANEIRO. Decreto lei nº 42.909, de 01 de abril de 2011. 62 Assentamentos Precários Informais - Morar Carioca e do PAC Social vinculado ao Programa de Aceleração do Crescimento - PAC do governo federal. Nosso objetivo no estudo de quatro comunidades pacificadas foi identificar os significados atribuídos à participação nas práticas sociais de diferentes atores envolvidos nessa política, bem como os limites e potencialidades da participação para incidir sobre as políticas, em função do desenho e arranjos institucionais encontrados. Por fim, analisar as tensões e contradições apresentadas em relação às políticas e metodologias participativas implementadas, no que concerne ao desenvolvimento e expansão da cidadania e às formas de sociabilidade e arranjos associativos existentes nessas comunidades. Nossas investigações em campo indicam a existência de uma polifonia de significados atribuídos à participação por diferentes atores e organismos, ainda que os arranjos institucionais existentes limitem seu potencial de interferência no processo decisório das políticas públicas. Existem fortes contradições entre o modelo preconizado de governança participativa e sua subordinação a um processo de militarização do controle social, contraface de um processo decisório cada vez mais cerrado com o estreitamento dos interesses de governantes e empresários no exercício do poder público. Finalmente, encontramos que o efeito desse novo arranjo institucional sobre a sociabilidade local variará grandemente em decorrência da existência prévia de laços e vínculos consolidados em formas autóctones de associativismo local. Afirmamos, pois, o truísmo de que é a participação previamente existente na própria comunidade que impõe exigências reais de ampliação da participação nas políticas públicas, sem que com isso se garanta, necessariamente, maior efetividade na sua execução. Participação e Modelos de Democracia Abordar a participação requer, primeiramente, uma definição mínima de um conceito fluido, frequentemente adjetivado como participação social, popular ou cidadã. Ainda que a noção de participação seja constitutiva da teoria democrática, estando implícita na atuação dos sujeitos políticos, seu significado varia grandemente, o que dá lugar a diferentes traduções 63 institucionais. Estas variações, ao longo do tempo e do espaço, dão forma à arquitetura da participação em cada país. Para a análise das políticas públicas assumimos que a participação trata da relação entre Estado e Sociedade Civil, corporificada em estruturas institucionais que permitem a interação entre agentes governamentais e usuários, individualmente ou como membros de organizações da sociedade civil. As instituições participativas são canais institucionais ou espaços criados para esse intuito, sejam eles mobilizados pelo poder público ou mesmo pela sociedade civil, nos quais a participação varia em relação ao grau de institucionalização e vínculo, ao nível de compartilhamento do poder ou capacidade de controle mútuo, à modalidade de recrutamento e de comunicação entre os participantes, ao âmbito particularista ou universalista das agendas (PIRES, 2011). No entanto, em todos os casos estabelece-se um fluxo de informações que permite canalizar demandas sociais para a agenda governamental ao mesmo tempo em que socializa conhecimentos técnicos sobre o funcionamento estatal para a cidadania e assim, permite gerar condições de maior estabilidade e legitimidade no exercício do poder político. Na interação entre Estado e Sociedade Civil deve-se ter em conta que ambos partilham dois atributos comuns: autonomia e inserção. A importância da ação do Estado para o desenvolvimento ser simultaneamente estratégica e autônoma é conhecida (POLANYI, 1980; EVANS, 1995). A sociedade civil é entendida como a multiplicidade de unidades autônomas e auto-organizadas em torno a seus interesses, com identidade própria e disposição para a negociação e contestação de alternativas políticas. Enquanto a pluralidade destas unidades define a inclusividade da esfera pública, sua efetividade pode ser vista como a capacidade de inserção dos interesses societários na agenda pública (OXHORN, 1999). Assim, a participação é vista como uma ampliação da esfera pública, que se dá pela inclusividade (quantidade de pessoas reconhecidas como partícipes), pela efetividade (inserção e inclusão dos interesses de quem está participando) e pela eficácia, no sentido os objetivos da política sejam alcançados. As variedades de interação dão lugar a tipologias distintas, como a proposta por Ramirez (2009) que encontra possibilidades, tais como: sociedade versus estado (movimentos reivindicativos); sociedade e estado (filantropia, 64 observatórios, parcerias), sociedade com estado (mecanismos de cogestão, redes de políticas, planejamento participativo) e sociedade no estado (arranjos corporativos, conselhos setoriais). Em todas elas está presente a ideia de que a política extravasa o Estado, sendo necessário criar instituições que acomodem os conflitos e sejam eficientes na busca dos objetivos comuns, capazes de legitimar o exercício da autoridade pública e tornar efetivas as políticas. Mudanças na relação entre Estado e Sociedade Civil, tais como a crescente fragmentação, complexificação e auto-organização da sociedade concomitantemente à redução do poder dos Estados nacionais são consideradas responsáveis pela demanda por uma nova e radical institucionalidade democrática, capaz de introduzir o direito à participação como parte da condição de cidadania (FLEURY, 2003, 2004). Considerando-se que a política foi descentrada, desloca-se a ênfase dada exclusivamente ao processo decisório estatal, para as práticas do cotidiano, onde o associativismo é visto como meio de socialização e de sociabilidade (CEFAI, 2009), onde o bem público é produzido por meio de ações microcívicas e micropolíticas permeadas por vínculos de afetividade que constroem o tecido social, produzem subjetividades políticas e ações coletivas que refazem as práticas e agendas públicas (SANTOS e AVRITZER, 2002). A busca de uma nova institucionalidade para a democracia, que seja capaz de atender, conjuntamente, aos princípios de reconhecimento, participação e redistribuição (FRASER, 2001), marca o momento atual, por meio da articulação entre inovação social e inovação institucional que permitiria a construção dessa nova institucionalidade. A democracia passa a ser vista, mais do que um procedimento, como uma prática social na qual se constroem as identidades coletivas, ou seja, uma nova gramática de organização da sociedade que permite a redefinição dos vínculos sociais, a inclusão de novos temas e atores, enfim, a ampliação da esfera pública. Neste sentido, a concepção de democracia deliberativa propõe um novo modelo procedimental de tomada de decisões, no qual os afetados pelas decisões participam no processo de discussão e deliberação. Para além das questões do método, retoma-se a discussão da democracia a partir da perspectiva dos sujeitos políticos e são introduzidos critérios normativos de 65 avaliação das deliberações, de acordo com princípios de justiça social. O recente retorno da discussão teórica e das inovações institucionais que propiciam a participação popular nos processos políticos decorre, em grande parte, do crescente descrédito em relação à democracia representativa, em especial dos partidos e da classe política, como mecanismo eficaz de agregação de interesses, representação das diferenças e resolução de conflitos em função do interesse público. Sem pretender substituir o mecanismo da representação pelo processo de participação direta da cidadania nas decisões que lhe afeta, o que se pretende é buscar novos mecanismos que possam oxigenar e radicalizar a democracia representativa, no sentido de preservar a vida pública. A democracia deliberativa é definida como resultante da decisão ampla que emerge de arranjos que agregam escolhas coletivas que são estabelecidas em condições de livre e pública argumentação entre iguais, que são governados por estas decisões (COHEN, 1998). Neste sentido, além da agregação de interesses, o procedimento democrático permitiria a possibilidade de transformação dos interesses por meio da troca de informações e argumentações. Grande ênfase é dada à troca de informações entre os participantes, favorecendo o entendimento das diferenças e a geração de consensos mais amplos. Nessa nova concepção democrática os mecanismos institucionais de participação são introduzidos para alterar a estrutura de poder e criar um espaço de deliberação e cogestão das políticas públicas, que atuem como contrapoderes que relativizam o predomínio dos interesses mercantis sobre o interesse público. O processo decisório não é apenas para eleger entre alternativas, mas para gerar novas alternativas, o que possibilitaria maior inovação social. Finalmente, é esperado que as decisões assim tomadas sejam mais sustentáveis por propiciarem maior justiça social e redistributiva. Portanto, a participação nos marcos da democracia deliberativa envolve tanto um processo de democracia comunicacional quanto a construção de identidades de sujeitos políticos (FLEURY, 2009), o que implica o redesenho das relações de poder no campo das políticas públicas. Estado, Mercado e Cidadania 66 Karl Polanyi (1980) argumenta que o desenvolvimento do Estado moderno se deu de forma paralela e contraditória ao desenvolvimento da sociedade de mercado, porém ao mesmo tempo estiveram intimamente ligados. Esse processo se deu por meio de um duplo movimento: de um lado houve a expansão do mercado; de outro a ampliação do poder estatal no sentido de evitar que a dinâmica do mercado levasse ao desmoronamento da sociedade. Mecanismos de regulação e de proteção social levaram a um reequacionamento da interação do mercado com a sociedade, cujos valores se materializaram em um conjunto de direitos e deveres assegurados por meio de políticas e instituições estatais. Para Charles Lindblom (1982), o equivoco de Polanyi foi não ter percebido até que ponto o sistema de mercado aprisiona ou aleija o processo de formulação de políticas públicas e de fato ter chegado a pensar que a politica pública elaborada de forma inteligente poderia ser bem sucedida onde outras tentativas haviam falhado. De acordo com Lindblom, regulações são frequentemente vistas pelo mercado com um desincentivo para investimentos e geração de renda e trabalho. Inúmeras medidas regulatórias são, portanto, imediatamente seguidas pela punição do desemprego. Esse é o motivo pelo qual, para o autor, o mercado pode ser caracterizado como uma prisão. Para uma ampla gama de relações políticas/econômicas, o sistema de mercado aprisiona o processo de formulação de políticas públicas e aprisiona as tentativas de melhorar as instituições sociais. É um mecanismo altamente seletivo que permite certas mudanças, mas impõe obstáculos poderosos para outras. O autor enfatiza, porém, que o sistema, apesar de aprisionado pelo mercado, não é a prova de fuga, ou seja, não é imutável. Evitar as dualidades perigosas entre sentimento e racionalidade, Estado e mercado é a proposta de Zelizer (2009) que retoma o argumento neoinstitucionalista de que nenhuma relação de mercado existe sem a infraestrutura de instituições ou sem a presença de compreensões compartilhadas. No entanto, a presença reguladora estatal sobre o mercado depende da sua capacidade de manutenção simultânea de autonomia e inserção (embeddedness autonomy), nos ensina Evans (1986). Na ausência dessa simultaneidade, ou o Estado perde autonomia tornando-se prisioneiro 67 dos interesses de mercado, ou perde capacidade de inserção, de formular e implementar um projeto de desenvolvimento. A literatura nos mostra que com a expansão da cidadania, foi possível compatibilizar a coexistência de um status igualitário assegurado pelo Estado, em relação a direitos e deveres, em uma sociedade onde as desigualdades de mercado foram parcialmente limitadas pela regulação estatal e pelas políticas distributivas de proteção social (MARSHALL, 1967). O que interessa é o enriquecimento da vida civilizada, uma redução do risco, da insegurança, uma igualação entre os mais e menos favorecidos em todos os níveis. Assim, conclui em seu ensaio que “a igualdade de status é mais importante do que a igualdade de renda” (MARSHALL, 1967:95). Em outras palavras, a desigualdade inerente ao sistema de classes é passível de aceitação se a igualdade de cidadania for reconhecida como um “status concedido àqueles que são membros integrais de uma comunidade. Todos aqueles que possuem o status são iguais com respeito aos direitos e obrigações pertinentes ao status” (MARSHALL, 1967:76). Essa trajetória da construção da modernidade democrática capitalista foi contraditória, dependendo das relações e instituições sociais existentes em cada contexto histórico. Será mais ainda em sociedades marcadas pela desigualdade e exclusão social, cuja governabilidade democrática dependerá da capacidade estatal de gerar inclusão ativa da cidadania, rompendo barreiras discriminatórias impostas pelo mercado, pela cultura elitista e pela persistência de modalidades de apropriação de bens públicos por alguns poucos (FLEURY, 2004; CALDERÓN, 1995). A busca de um rearranjo destas relações entre Estado, mercado e comunidade é também o desafio da governança necessária à consecução de políticas públicas efetivas em um contexto de marcadas assimetrias. A expansão da cidadania tende a combinar componentes contraditórios, o que permite diferentes leituras e disputa em relação a este conceito, desde uma perspectiva libertária a outra de natureza mais igualitária. Nos seus extremos, a liberdade irrestrita, mesmo favorecendo o mercado, gera ameaças à existência da sociedade, enquanto a igualdade, quando implica em restrição à livre ação dos indivíduos, compromete o princípio básico no qual o mercado se sustenta. Por outro lado, tanto o mercado requer a igualdade formal para o 68 estabelecimento das trocas contratuais e suas garantias legais, quanto a igualdade jurídica pressupõe a autonomia dos sujeitos para que se efetive. Estas tensões inerentes à construção do Estado moderno e de suas interfaces com o mercado e a cidadania tendem a aprofundar-se com a complexificação das sociedades, nas quais as reivindicações de igualdade e liberdade passam a somar-se com as de reconhecimento das diversidades e requisitos de participação cidadã na gestão da coisa pública (FLEURY, 2003; FRASER, 2003; YOUNG, 2000). Para Amartya Sen (2000) a subordinação da igualdade pela liberdade, ou vice-versa, é um falso paradoxo que seria resolvido com sua compatibilização por meio da introdução da noção de capacidade. Só por meio do desenvolvimento de plenamente igualdade capacidades os indivíduos poderiam e liberdade. Assim, enquanto a exercer pobreza é tradicionalmente identificada como um mero baixo nível de renda, para Sen (2000) ela deve ser vista não somente como uma renda baixa, mas principalmente como uma situação de privação de capacidades básicas; capacidades por ele entendidas como possibilidades de ser e de fazer do indivíduo, tais como ser saudável, bem nutrido, ter conhecimento, participar da vida da comunidade. A privação relativa de rendas pode resultar em privação absoluta de capacidades. Essa ideia está associada com o custo de vida de uma dada sociedade e das exigências contextuais para os indivíduos participarem da vida da comunidade, as quais podem ser severas. Sen (2000) aponta a possibilidade de compatibilização entre mercado e sociedade por meio da intervenção governamental, única forma de assegurar oportunidades iguais e respeito à liberdade. O conceito de capacidades, no entanto, não discute a questão da distribuição do poder, tomando-a como reflexo do incremento capacidades, o que tende a obscurecer a discussão sobre modelos alternativos de políticas que se configuram na tensão das alianças entre governantes e empresários na busca da expansão do mercado, em detrimento da comunidade dos cidadãos. Território, Cidadania e Exclusão 69 A construção da modernidade assentou-se nos processos de urbanização e industrialização que propiciaram condições para o surgimento de novas relações entre Estado, mercado e comunidade. Os requisitos de trocas contratadas entre indivíduos livres e iguais levaram à superação das relações tradicionais e personalizadas de intercâmbio de proteção por dependência, característicos de uma sociedade estratificada e um poder político patrimonial. Conceitos como sociedade civil, cidadania, polis, emergem com a vida urbana, vinculados à construção da democracia, entendida como a convivência de diversidades sociais sob um mesmo estatuto político. A igualdade requerida na esfera pública é politicamente construída (Arendt, 1993, 227) e por isto, a cidade, ao implicar a pluralidade dos seus habitantes e sua interconectividade é também a materialização territorial da esfera pública. O espaço onde se encontram os cidadãos, igualados como sujeitos de direitos e deveres, requer a garantia da ação estatal para assegurar sua exigibilidade. O Estado moderno articula-se à comunidade por meio dos referentes da nação e da cidadania, ambos, como o mercado, atinentes à dimensão do território nacional, embora a construção da democracia comporte a perspectiva de construção do associativismo local como parte da dimensão cívica, enfatizada por Tocqueville (1977). A correspondência entre a expansão da democracia e da cidadania se dá tanto pelo grau de inclusividade dos indivíduos na comunidade dos cidadãos, quanto pelo âmbito dos direitos e deveres historicamente incorporados à condição de cidadania. Portanto, a expansão desta última corresponde à transição desde o estado restrito, coercitivo e judicial do liberalismo em direção ao o estado ampliado da socialdemocracia (Fleury, 2003). Em outros termos, a estrutura do aparato estatal predominante tem uma correspondência com a inclusividade da esfera pública e com as dimensões incorporadas na condição de cidadania. De tal maneira que se pode afirmar que a violação desta correspondência deve implicar em consequências restritivas tanto à expansão da cidadania quanto à institucionalização da democracia. Estas transformações políticas e institucionais adquirem uma materialidade na configuração histórica e espacial da esfera pública, já que sua formação supõe uma acumulação de ações localizadas em diferentes 70 momentos, que conforma a pluralidade espacial da cidade dos cidadãos. O desenvolvimento de comunidades e bairros está vinculado a uma combinação de fatores político-econômicos e culturais no que concerne à forma que os habitantes das cidades se envolvem na construção da cidade. Para além da infraestrutura urbana também devem ser considerados os usos e discursos, públicos e privados que se articulam em torno dela, constituindo um imaginário coletivo sobre a urbe. Assim, a urbe é definida pela multiplicidade de experiências presentes, pela confluência de inúmeras relações sociais imprescindíveis em sua complexidade e unicidade, mas por outro lado, parte de um processo social potenciado pela cidade mesma. A cidade interpela a cada um de seus habitantes a partir de uma identidade coletiva, um imaginário social que se constrói sobre ela e que está em processo permanente processo de construção. Esta simbologia sobre o território no qual vivemos é fruto de uma produção coletiva, portanto, parte essencial da coesão social. O compartilhamento de vivências e de uma histórica comum faz com que cada indivíduo isolado se sinta parte de uma coletividade, de um passado e de um devir, de uma comunidade de iguais. Neste sentido, as cidades envolvem tanto a pluralidade de identidades quanto a sua interconectividade, o que, nas metrópoles, vai além de um entremeado de histórias locais. Lefebvre (2004, 144) defende que a sociedade urbana exige uma planificação voltada para as necessidades sociais, o que se corporifica no direito à cidade, para o qual e pelo o qual a cidade e sua própria vida cotidiana na cidade se tornam obra, apropriação, valor de uso. Esta relação entre cidade e cidadania se manifesta com clareza nesta afirmação do direito à cidade, bem como na construção de um modelo cívico de análise do território. A proposta de um modelo cívico recupera a cidadania como a perspectiva político-normativa, definida pelo projeto de civilização, tendo como componentes essenciais a cultura e o território: O componente cívico supõe a definição prévia da civilização... que se quer, o modo de vida que se deseja para todos, uma visão comum do mundo e da sociedade, do indivíduo enquanto ser social e das suas regras de convivência….O componente territorial supõe, de um lado, uma instrumentação do território capaz de atribuir a todos os habitantes aqueles bens e serviços indispensáveis, não importa onde esteja a 71 pessoa; e, de outro lado, uma adequada gestão do território, pela qual a distribuição geral dos bens e serviços públicos seja assegurada (Santos, 1996, 5) O enlace do território com as relações sociais constitui a “sociedade local” quando este território é portador de uma identidade coletiva que se expressa em normas e valores e em um sistema de relações de poder constituído no processo de produção de riquezas Arocena (1995). Essa identidade coletiva fundamenta a compreensão da cidade como o território dos cidadãos, no qual a esfera pública, como ordem simbólica relacional, é o espaço em que os sujeitos assim constituídos afirmam sua identidade e intercambiam significados, o que dá sentido e direção à suas ações. No entanto, a compatibilização do status igualitário da cidadania em uma sociedade baseada na reprodução desigual das classes sociais (Marshall, 1977) se plasma como uma tensão a ser resolvida em cada sociedade, pois no processo da expansão do mercado ocorreu um duplo movimento, com a necessidade da intervenção estatal para a proteção da cidadania e da própria sociedade (Polanyi,1980). A igualação político e jurídica da esfera pública (Fleury, 1997) não deixar de ser uma hipótese, fundamento do dever e da legitimidade da ordem política. No entanto, no subsolo das formas jurídicas abstratas do contrato e da troca entre iguais, Foucault (1977) mostra o desenvolvimento de uma tecnologia ou microfísica do poder, que, por meio das disciplinas, assegura a fabricação de indivíduos e corpos dóceis ao poder. Para compreender esta dinâmica, é preciso ver que a história dos espaços espelha a história dos poderes de forma a identificar no arranjo do espaço os mecanismos de localização-distribuição como parte deste ordenamento territorial (Moreira, 2002). A igualação jurídica também não impede a recomposição de unidades mais homogêneas, do ponto de vista da produção simbólica dos habitus como fruto das relações sociais, reconstruindo assim um espaço geográfico socialmente hierarquizado (Bourdieu, 2006). Se bem as cidades espelham a noção igualitária da cidadania, comportando a dimensão pública dos indivíduos e sua inserção em uma 72 comunidade política, a incapacidade de realização plena da igualdade acarreta conseqüências para a convivência no espaço urbano. A cidade, ao concentrar a população e plasmar em um mesmo espaço suas múltiplas necessidades, passa também a materializar seus múltiplos conflitos. Palco do conflito de classes no capitalismo industrial, a cidade hoje, face aos processos de urbanização massiva, dá lugar à emergência de novos movimentos sociais que desenvolvem mecanismos urbanos de pressão, em uma luta por formar parte do processo de desenvolvimento local e global. Neste sentido, nas cidades materializam-se demandas e conflitos, mas também são geradas soluções inovadoras pois, são espaços socialmente construídos, onde a cultura da rua é fonte permanente de inovação. As cidades requerem esta experiência coletiva, ou solidariedade orgânica, seja pelas necessidades colocadas pela produção social, relativas ao provimento de bens e serviços, seja na construção de instituições e de uma cultura comuns. A existência de uma fratura sócio-espacial e política, no caso das favelas, marca o imaginário de uma sociedade onde são negados os direitos de cidadania. Queiroz e Lago (2001) analisam a divisão favela-bairro como a principal interpretação sócio-espacial das diferenças encontradas na sociedade carioca, representando não apenas as desigualdades materiais e de acesso a bens públicos, mas também a separação e/ou inferioridade que simbolicamente lhes é atribuída. Apesar das diferenciações sociais e econômicas existentes no interior das favelas, esta dicotomia seria tanto legitimada pela aceitação naturalização desta discriminação quanto pela precariedade dos vínculos de seus moradores com o mercado formal. Pesquisando o imaginário social sobre a favela, Sousa e Silva (2002) encontra consistência nos eixos paradigmáticos desta representação que são a noção de ausência (de bens, serviços, etc.) e a sua homogeneização, presentes inclusive em documentos oficiais de políticas e de estatísticas. Já os estudos sobre modernização e industrialização em países em desenvolvimento apontavam características próprias de um tipo de capitalismo, cuja mesma lógica estrutural, produz simultaneamente acumulação e marginalidade, modernização e exclusão (Kowarick, 1981). A consequência política de um processo no qual a unificação do poder burguês se dá no plano 73 do político é o impedimento que o poder estatal atue como equivalente universal (Fernandes, 1976). Sem esta condição, a universalidade requerida na cidadania se esvai em novos modelos de cooptação e apropriação privada do aparato estatal. Em outros termos, a construção do Estado e a consolidação da nacionalidade, da qual o desenvolvimento da cidadania é, ao mesmo tempo, produto e parte essencial do processo de institucionalização do poder político, prescindiu, entre nós, da dimensão republicana da democracia, pela qual entendemos não apenas o estabelecimento de regras abstratas universais como, fundamentalmente, a separação entre o público e o privado. Além da consideração sobre a impossibilidade de funcionar como equivalente universal requerida na cidadania, o capitalismo periférico foi também responsabilizado por uma dinâmica populacional produtora de exclusão, ou massa marginal, incapaz até mesmo de atuar como exército de reserva (Nun, 1969). O impacto destas dinâmicas na reorganização das metrópoles na região aponta para uma lógica de apartação, na qual ricos e pobres se fecham em guetos intransponíveis, em uma cidade que nada guarda do ideal democrático de ser o espaço do encontro dos diferentes, igualados na condição política da cidadania. Ao contrário, a cidade passa a ser a expressão da incapacidade de coesão em sociedades profundamente injustas e excludentes onde a violência urbana aflora como o sintoma da desagregação social. A hipótese determinística da associação entre crescimento da violência e condições estruturais de exploração, dominação e exclusão demonstrou-se simplista diante da complexidade deste fenômeno. No entanto, um padrão pode ser identificado com as seguintes tendências: a) crescimento da delinquência urbana; emergência da criminalidade organizada; c) graves violações de direitos humanos que comprometem a ordem democrática; d) explosão de conflitos nas relações intersubjetivas (Adorno, 2002). O aumento da intolerância com a diferença, a visão do outro como uma potencial ameaça, a ausência de uma ética pública, a visão do governo como corrompido e incapaz de assegurar condições básicas de segurança, reforçam o individualismo e contaminam a dimensão cívica da cidadania. Este fenômeno também tem sido acentuado pelo processo de globalização, cujas características da nova economia são o aumento das disparidades e da 74 desigualdade entre indivíduos e regiões dentro do espaço urbano, expressos como um duplo movimento de “guetização” ou exclusão espacial, por um lado, e a gentrificação ou aburguesamento e insulamento de certos espaços da cidade, por outro lado (Castells,1999). Apesar dos fatores condicionantes da violência urbana decorrerem da crescente globalização com mudanças dos modelos de sociabilidade e da economia, especialmente do mercado da droga, a maioria das suas vítimas são jovens pretos e pardos moradores de favelas e periferias, em uma combinação de segregação espacial com discriminação e desigualdade social (Paixão et al, 2010). Isto nos leva a identificar no centro de nossa questão social a ausência da universalização de um modelo contratual de cidadania, tomando a exclusão e seus efeitos sobre a sociabilidade deteriorada como analisador da inexistência de vínculos sociais capazes de integrar a comunidade nacional (Fleury, 2003). O aumento da discriminação racial associado à segregação espacial indica que o fenômeno da exclusão deve ser compreendido para além da mera negação dos direitos da cidadania. Por uma lado, a exclusão se refere à não incorporação de uma parte significativa da população à comunidade social e política, negando sistematicamente seus direitos de cidadania envolvendo a igualdade de tratamento ante a lei e as instituições públicas - e impedindo seu acesso à riqueza produzida no país (Fleury, 2003). De uma forma mais profunda, a exclusão implica a construção de uma normatividade que separa os indivíduos, impedindo sua participação na esfera pública. Boaventura Santos (1995) sublinha a diferença entre desigualdade e exclusão, já que a desigualdade é um fenômeno socioeconômico, que se assenta na noção de igualdade, enquanto a diferença é o fundamento da do fenômeno de civilização que é a exclusão, sendo, respectivamente, seus extremos a escravidão e o extermínio. Trata-se de um processo relacional e cultural que regula a diferença como condição de não inclusão, plasmando-se espacialmente por meio da segregação e institucionalmente pela existência de uma dupla institucionalidade política (Santos 1993). Porém, estas manifestações do sistema de exclusão não podem eludir seu aspecto mais profundo na construção das identidades sociais, identificado como sendo o processo de despojamento dos indivíduos de sua condição 75 humana, impedindo-lhes que se tornem sujeitos de seu processo social (Fanon, 1979), cujo resgate passa pela ruptura violenta com a ordem colonial que a produz. Já para Arendt (1993) trata-se de um processo de apropriação discursiva, já que a constituição dos sujeitos se dá na relação entre discurso e ação, fundamento da condição humana. É a proibição do discurso o que despoja aos indivíduos de sua condição de atores, da possibilidade de inclusão em uma ordem simbólica relacional, constituída por uma trama de atos e palavras. No entanto, a pratica articulatória pela qual as identidades são modificadas é vista como totalidade discursiva, ou seja, tanto em termos mentais como materiais (Laclau e Mouffe, 1985), incluída toda a sua base institucional. A construção de uma sociedade democrática com ampliação da esfera pública forma parte do processo de expansão da sociedade civil sobre a sociedade política, da civilização sobre a violência, da hegemonia e direção sobre a coerção e dominação (Buci-Glucksman, 1980). No Estado Ampliado de Gramsci desenvolvem-se novas estruturas estatais e múltiplas iniciativas privadas que conformam o aparelho de hegemonia política e cultural, inclusive conjunto de direitos sociais e instituições que caracterizaram a expansão da cidadania moderna. Mas, a possibilidade de restrição do Estado a sua dimensão coercitiva está sempre colocada, pois depende da correlação de forças e do projeto civilizatório construído. Neste sentido civilizatório, a relação entre cidadania e exclusão não pode ser apreendida como mera negação dos direitos, pois implica também em múltiplas formas de desrespeito. A privação de direitos não representa somente a limitação violenta da autonomia pessoal, mas implica sua associação com o sentimento de não possuir o status de um parceiro da interação na sociedade, uma perda de auto-respeito, ou seja, uma perda da capacidade de se referir a si mesmo como parceiro em pé de igualdade na interação com todos os próximos (Honneth, 2003:217). No modelo cívico de integração social e territorial, as cidades adquirem cada vez maior protagonismo como ator político na construção de novas formas de sociabilidade. Carrión (2007) chama atenção para a penetração do grande capital internacional e nacional na disputa deste espaço urbano, o que produz transformações nos marcos institucionais e nas modalidades de gestão 76 pública, com a privatização da cidade e concentração de capitais transnacionais. No projeto de cidade empresarial-privada a urbe é normatizada a partir da perspectiva mercantil, a partir da crítica à gestão pública que vem acompanhada de uma perspectiva de participação da sociedade civil através dos processos de privatização. Com vistas a “despolitizar” as decisões sobre política urbana, este modelo opera um deslocamento desde os conselhos municipais para os diretórios das corporações. Consequentemente, a cidade passa a ser vítima do abandono cívico perdendo sua condição de espaço público e reforçando processos de exclusão social. Outro modelo, que denomina “cidade inclusiva”, pretende resignificar o público frente aos problemas urbanos através da reconstituição estatal e pública do governo, sendo neste caso a participação um elemento chave, reconstruindo o espaço público nas suas dimensões física (organização espacial), social (identidades e integração) e cidadã (direitos sociais) (Carrión, 2007) 3. Hipóteses No projeto nos propusemos a estudar os efeitos das políticas públicas na promoção da integração da favela e de seus moradores na comunidade de cidadãos e em relação à preservação das práticas de discriminação social de agentes dos serviços públicos do Rio de Janeiro. Para tanto, optamos pela utilização de metodologia qualitativa com base em entrevistas com gestores, usuários e beneficiários das políticas e profissionais envolvidos em sua implementação. A pesquisa qualitativa permite a aproximação de um nível de realidade que não pode ser quantificado, pois se concentra, dentre outros aspectos, na análise de sentidos atribuídos pelos sujeitos em contextos particulares e complexos. Além disso, esta abordagem permite que no decorrer da pesquisa sejam incorporados novos insights que sejam relevantes ao trabalho sem que isso diminua a validade e confiabilidade do estudo. No entanto, dados quantitativos foram utilizados para elaborar diagnósticos socioeconômicos e comportamentais assim como recursos como mapas geográficos permitiram a elaboração e/ou revisão das hipóteses. Inicialmente, com base nas pesquisas anteriores nessa linha de investigação, foram formuladas as seguintes hipóteses a serem testadas no trabalho de campo: 77 a) Nas últimas décadas, temos observado o desenvolvimento de diferentes manifestações da violência urbana. Dentre essas, destaca-se o crime organizado e suas formas de apresentação na sociedade, o que têm promovido uma sensação generalizada de insegurança que acomete a todos os cidadãos. No sentido de atuar sobre essa questão, o atual modelo de combate à violência – dado o interesse coletivo pela questão – associado à proliferação de iniciativas de organização e mobilização socioculturais da favela com participação comunitária, tem propiciado mais visibilidade e reconhecimento à população dessas comunidades. Assim, a questão da pobreza se coloca na agenda política de uma maneira que até então ainda não havia acontecido. b) A retomada da questão da violência como um problema da cidade como um todo e não apenas das comunidades, entendidas como um gueto permite uma conexão entre esses dois espaços, a partir de políticas públicas que abordem esse tema pelo viés da construção da cidadania, da redução da discriminação, da integração ao território e aos serviços públicos e não somente por intermédio de uma abordagem policialesca de combate à violência. c) No entanto, as disparidades de poder entre os diferentes atores sociais envolvidos na arena de uma política pública devem ser consideradas, pois demarcarão as condições de possibilidade de construção de cidadania, considerada como uma condição igualitária dos indivíduos diante da lei e do poder público. Os agentes sociais são distribuídos no espaço social geral, na primeira dimensão, de acordo com o volume total de capital que eles possuem e, em segunda dimensão, de acordo com a estrutura de seu capital, isto é, o peso relativo das diferentes espécies de capital, econômico e cultural, no volume total de seus ativos (BOURDIEU, 1989). d) Alguns grupos sociais são mais vulneráveis à discriminação e negação da cidadania, por sua localização no espaço social de poder e por acumular um conjunto de características estigmatizantes. O conceito de Sartre de “serialidade” pode ser útil para teorizar sobre o posicionamento estrutural que condiciona as possibilidades de agentes sociais sem que com isto constitua suas identidades. O posicionamento na estrutura social como classe, gênero, raça e idade condiciona de uma forma sequencial as vidas 78 dos indivíduos por possibilitar e constranger suas possibilidades de ação, e por permitir relações de superioridade e diferença entre as pessoas (YOUNG, 2000). e) A constituição de novos sujeitos políticos é uma forma de resistência à exclusão e pode ser facilitada por meio de políticas públicas que combatam esta condição. A denegação do sujeito se processa como uma falta de reconhecimento, negação de direitos, ausência de participação na distribuição dos recursos de poder e incapacidade de redistribuição dos ativos. Uma política de reconhecimento é parte dos reclamos por inclusão social e extinção de desigualdades estruturais e desvantagens, requerendo novas relações entre Estado e sociedade (FLEURY, 2003; YOUNG, 2000; FRASER, 2003; HONNETH, 2003). 3.1 Seleção dos sujeitos da pesquisa Inicialmente foram identificadas as favelas onde já estavam implantadas UPP, preferencialmente onde também estivesse em funcionamento o Programa da UPP Social (verde para UPP e roxo para UPP Social). Verificou-se que a grande concentração dessas Unidades de Polícia Pacificadora e em menor número da UPP Social encontrava-se em um espaço metropolitano reduzido, envolvendo basicamente a Zona Sul, Centro e Tijuca, com algumas exceções na Zona Norte e Oeste. Essa disposição obedece claramente ao interesse de combinar o processo de implantação das UPP com a geografia dos megaeventos, muito mais do que com a própria geografia da violência. Isso fica claro ao verificarmos que apenas no Batan, onde houve um evento de violência contra jornalista, foi implantada uma UPP em área dominada pelos milicianos. Saiba onde estão as UPPs do Rio de Janeiro até início 1013 Criadas pelo Governo do Rio de Janeiro e Secretaria de Segurança Pública do Estado, as UPPs são 79 Unidades de Polícia Pacificadoras que pretendem tomar territórios dominados por traficantes e levar "paz às comunidades". A primeira UPP foi instalada no Morro Santa Marta, em deZembro de 2008 SANTA MARTA A comunidade Santa Marta, localizada no bairro do Botafogo, foi a primeira a receber uma Unidade da Polícia Pacificadora em 19/02/2008. CIDADE DE DEUS A comunidade Cidade de Deus, no bairro de Jacarepaguá, que ficou famosa após o filme que leva seu nome, foi a segunda a receber uma UPP. A inauguração aconteceu no dia 16 de fevereiro de 2009. BATAN Em 18 de fevereiro de 2009 foi a vez da comunidade do Batan receber sua UPP. Foi a 3ª unidade instalada. CHAPEU MANGUEIRA – BABILÔNIA A UPP Chapéu do Leme - Babilônia foi a quarta a ser inaugurada, em 10 de junho de 2009. A sexta UPP inaugurada foi a das comunidades de Cantagalo - Pavão Pavãozinho, em 23 de dezembro de 2009. PROVIDENCIA A UPP Providência foi inaugurada em 26 de abril de 2010. . FORMIGA A inauguração da UPP Formiga, localizada na Tijuca, aconteceu no dia 1º de julho de 2010. Andaraí foi a 7ª comunidade a receber uma UPP, em 28 de julho de 2010. SALGUEIRO Em 17 de setembro de 2010 foi inaugurada a UPP Salgueiro. 80 TURANO A UPP Turano foi inaugurada em 30 de setembro de 2010 e atende as comunidades urano, Chacrinha, Matinha, 117, Liberdade, Pedacinho do Céu, Paula Ramos, Rodo e Sumaré. MACACOS Em 30 de novembro de 2010 foi inaugurada a UPP Morro dos Macacos. Essa foi a 13ª unidade. TABAJARA E CABRITOS As comunidades Tabajaras e Cabritos recebera a sexta Unidade da Polícia Pacificadora em 14 de janeiro de 2011 COROA/GALLET/FOGUETEIRO A UPP Coroa/Fallet/Fogueteiro foi inaugurada em 25 de fevereiro de 2011. PRAZERES UPP Escondidinho/Prazeres foi inaugurada no dia 25 de fevereiro de 2011 BOREL UPP Borel abrange além do próprio Morro do Borel, mais sete comunidades da região da Tijuca, zona norte do Rio de Janeiro e foi inaugurada no dia 07 de junho de 2010. SÃO CARLOS A UPP São Carlos foi inaugurada no dia 17 de maio de 2011 e atende aos morros do São Carlos, Querosene,Mineira e Zinco. SÃO JOÃO UPP São João/Matriz/Quieto foi inaugurada no dia 31 de janeiro de 2011. A unidade conta com um efetivo de 200 policiais e atende às comunidades do Morro do São João, Morro da Matriz e Morro do Quieto 81 MANGUEIRA/ TUIUTI A UPP Mangueira/Tuiuti foi instalada no dia 31 de novembro de 2011 e atende oito comunidades. Essa foi a 18ª unidade pacificadora instalada no Rio. VIDIGAL A UPP do Vidigal foi instalada no dia 18 de janeiro de 2012, no bairro do Leblon. Foi a primeira do ano de 2012 e a 19ª da cidade. ADEUS E BAIANA A 20ª UPP instalada pelo governo do RJ leva o nome das comunidades do Adeus e da Baiana. Instalada no dia 11 de maio, fica na área que pertence ao Complexo do Alemão. ALEMÃO A UPP Alemão foi instalada em 30 de maio de 2005 e atende ao Morro do Alemão e a comunidade da Pedra do Sapo. A unidade foi a quarta instalada dentro do complexo de favelas e é a 21ª do RJ. A 22ª UPP do Rio foi instalada na região dos morros do Sereno e Fé, no bairro da Penha. A inauguração aconteceu no dia 27 de junho de 2012. CHATUBA A UPP da Chatuba foi instalada em 27 de junho de 2012 e foi a 23ª unidade de polícia pacificadora. NOVA BRASÍLIA A UPP Nova Brasília também fica instalada em uma área que pertence ao Complexo do Alemão e foi inaugurada no dia 09 de julho de 2012. FAZENDINHA A UPP Fazendinha foi inaugurada em 09 de julho de 2012. Essa foi a 25ª unidade. PARQUE PROLETÁRIO 82 A UPP Parque Proletário fica na região da Favela Vila Proletária da Penha. Essa foi a 26ª unidade instalada no RJ. VILA CRUZEIRO A UPP Vila Cruzeiro foi instalada em 28 de agosto de 2012 e, junto com a UPP Parque Proletário, completaram o Processo de pacificação na região da Penha. Essa unidade é a 27ª do estado. Na conhecida favela da Rocinha, a UPP foi instalada no dia 20 de setembro de 2012. Essa foi a 28ª favela pacificada do Rio de Janeiro. MANGUINHOS A favela de Manguinhos foi pacificada no dia 14 de outubro de 2012. Segundo o governo do estado, a instalação da UPP deve acontecer até o final de dezembro deste ano. JACAREZINHO Assim como a comunidade de Manguinhos, a favela do Jacarezinho foi pacificada no dia 14 de outubro de 2102. ROCINHA Na ocasião, o governo do RJ prometeu que a UPP será instalada até o final de janeiro de 2013. Rocinha ©2012 Google - Map data ©2012 Google, MapLink – Public · 2,214 view s Created on Sep 7, 2011 · By · Updated Oct 15 20/1S2a/1ib2a onde estão as UPPs do Rio de Janeiro - Google Maps https://maps.google.com/maps/ms?msa=0&msid=204697794257026268058.00 04ac5c5411b04da4e… 2/ 83 Foram selecionadas as favelas que seriam estudadas tendo como critérios a existência de uma UPP já instalada no local. Assim, foi selecionada a Favela Santa Marta onde foi instalada a primeira UPP. Por se tratar de uma favela pequena, situada em Botafogo na Zona Sul, nos decidimos por duas outras favelas similares, de forma a permitir a comparação entre os dados encontrados. Posteriormente foi selecionada a Favela da Providência, que diferia das anteriores, menores e situadas na Zona sul, por se localizar na região central, onde está havendo uma grande transformação urbana com a implantação do projeto Porto Maravilha. A existência de processos de transformação urbana e habitacional no interior das favelas e no seu entorno foram também critérios importantes na seleção. Nessa seleção, foram também levados em conta dados etnográficos elaborados pela equipe responsável pela UPP Social, que nos permitiram ponderar as similitudes e diferenças que tornaram os casos interessantes para nosso estudo. Assim como nas pesquisas anteriores, para as entrevistas foram considerados sujeitos da pesquisa atores políticos e/ou gestores dos programas estudados e os beneficiários das políticas. Além dos formuladores da política, foram selecionados profissionais que atuam ou atuaram nestas comunidades, na prestação de serviços públicos, sejam eles funcionários governamentais ou não. Com relação às entrevistas com os usuários, mantivemos os mesmos critérios de seleção de lideranças locais e moradores em geral, neste caso em uma seleção estratificada pelos níveis socioeconômicos que se apresentam na própria distribuição espacial dentro do território da comunidade. Especial atenção foi dada nesta fase aos diferentes negócios e empreendimentos que proliferam no interior e nas cercanias destas comunidades. A previsão inicial de realização de grupos focais com grupos mais vulneráveis mostrou-se inviável, dado que a situação de ocupação militar do território criara constrangimentos que dificultavam a discussão livre sobre certos temas. No entanto, a existência de inúmeros Fóruns propiciada pelo trabalho nos programas da UPP Social (Municipal) e dos Territórios da PAZ (Estadual) mostrou-se um local fundamental para observação participante e 84 documentação das interações entre agentes públicos e privados e a comunidade. Foram, pois entrevistados além dos agentes públicos, atores sociais locais organizados, tais como ONGs e associações comunitárias e culturais; profissionais envolvidos na execução dos programas sociais relacionados à UPP e à UPP social e, finalmente, os atores de mercado que também fazem parte do projeto de integração nas comunidades, como, por exemplo, representantes da Light, CEG, Cedae, SEBRAE e Firjan No sentido de apreender o que não pode ser dito, a observação em campo é especialmente interessante quando desejamos obter informações sobre a dinâmica das relações locais que se estabelecem entre os moradores e os diversos atores sociais presentes no mesmo território. Dado que a ação das UPP se propõe a atuar territorialmente e articular sua inserção em sintonia com o andamento próprio da vida comunitária, a observação faz-se relevante para apreender estes aspectos da interação social mediante a implantação das UPPs. NaNa condução dessas atividades utilizamos equipamentos de produção audiovisual: fotografia e vídeo. Durante a observação de campo, particularmente, será utilizada uma câmera fotográfica digital. Ao construir um olhar fotográfico sobre a favela, o pesquisador tende a reorganizar sua visão sobre o objeto de estudo desde outro ponto de vista. Este esforço conceitual de representar em imagem o que o pesquisador observa, ou ao buscar captar a percepção do sujeito da pesquisa sobre sua realidade, cria um “desconforto” do pesquisador em relação ao seu ponto de vista que pode colaborar para a melhor compreensão sobre o que é analisado (BANKS, 2009). As fotografias se destinaram a produzir imagens sobre a favela, ou seja, sobre a paisagem social onde se desenvolve a pesquisa, ressaltando os atores sociais em suas dinâmicas e relações locais; em outras palavras, trata-se de buscar a “sociabilidade como dramaturgia”, entendendo que as pessoas representam-se e representam quando posam para uma foto (MARTINS, 2008). Este material certamente irá aumentar a qualidade dos textos e documentos produzidos ao final do estudo, além de permitir construir outra narrativa sobre os resultados da pesquisa. As atividades coletivas foram filmadas e posteriormente editadas para a produção de um documentário e materiais educativos sobre o tema da 85 pesquisa. A produção deste tipo de material se justifica no sentido de produzir uma narrativa diferenciada (BANKS, 2009) sobre o tema e os resultados da pesquisa, que possa alcançar um público diverso e contribua para a reflexão e o debate sobre cidadania e discriminação. 3.2 Categorias analíticas e técnicas de análise dos dados Para avaliar os programas em questão, partiremos de duas dimensões de análise: institucional e social. 1. A dimensão institucional refere-se aos aspectos gerenciais, sociais e políticos do programa, sendo compreendida como o lócus de materialização das políticas sociais. As condições reais de inclusão e exclusão são criadas através do processo de formulação e desenho das políticas e dos mecanismos gerados para sua implementação, combinados à alocação de recursos e gestão. Essa dimensão se traduz no tipo de mediação entre Estado e sociedade, na configuração organizacional, no modelo de gestão, na capacidade humana e técnica instalada e no aparato burocrático. Incluem-se nesta dimensão, representada pelos gestores e profissionais envolvidos, as análises sobre a sustentabilidade da política e programas. 2. A dimensão social refere-se aos aspectos sociais e individuais dos usuários atingidos pela política a ser avaliada pelo que denominamos de construção do sujeito. A construção do sujeito é o processo pelo qual os indivíduos se autonomizam e adquirem a capacidade de desenvolvimento de projeto próprio e coletivo, notadamente no aspecto emancipatório da produção e das possibilidades de reprodução. A ampliação da esfera pública permite a construção da identidade dos diversos atores, assim como sua incorporação de forma diferenciada. Viabiliza a construção de sujeitos como atores sociais, uma vez que as políticas possuem, além da dimensão material e institucional, uma dimensão simbólica, espaço privilegiado da subjetividade e da formação de identidades coletivas, tais como: trajetórias e identidades pessoais e sociais; respeitabilidade; autoestima; relações familiares; sociabilidade; autonomia; expectativa de futuro; segurança. 86 A imagem gráfica abaixo ilustra o critérios adotados na pesquisa em relação a analisar a política pública de pacificação como parte da expansão da cidadania e segurança da exegibilidade dos direitos sociais universais por meio da provisão de bens públicos e de sua utilização em serviços de boa qualidade e sem discriminação. 4. Pressupostos Metodológicos A pesquisa de trabalho foi realizada nas comunidades Providência, Santa Marta, Chapéu Mangueira e Babilônia7, de agosto de 2011 a março de 2013. Foram realizadas observações participantes e entrevistas semiestruturadas com atores-chave no processo de pacificação8. Selecionamos nas comunidades estudadas os espaços participativos tais como fóruns e reuniões promovidas pelo poder público que pretendiam estabelecer o diálogo com a população, assim como, reuniões políticas e sociais promovidas pelos moradores. Foram entrevistados com gestores e funcionários do governo, moradores, atores do mercado e de organizações não governamentais atuantes nos territórios. Consideramos todas essas manifestações como práticas discursivas, entendendo por discurso qualquer prática significante, compreendendo que não há qualquer separação estrita entre significação e ação, nem ação sem estar 7 As favelas estudadas possuem características e particularidades que conformam diferentes interações entre a população e a gestão pública. As favelas localizadas na zona sul da cidade – região predominantemente de classe média e alta – possuem mais equipamentos públicos em comparação com regiões mais carentes, contudo, apresentam maior desigualdade das condições socioeconômicas internas e com relação ao seu entorno. Esse cenário se observa nas favelas do Chapéu Mangueira e Babilônia, localizadas no bairro do Leme, e Santa Marta, em Botafogo. A favela da Providência, atribuída como a primeira do país, localiza-se na região central, histórica e portuária da cidade que por décadas sofreu intensa desvalorização e sucateamento por falta de investimentos urbanos. Nesta, a discrepância nas condições socioeconômicas é menor em relação ao seu entorno. Contudo, desde 2009, a região portuária vem recebendo uma série de investimentos públicos e privados com o objetivo de reinserir a região portuária da cidade no fluxo de transporte a ser aquecido com a realização dos megaeventos. Fontes: A história das urbanizações das favelas - Parte I e II (http://rioonwatch.org.br/?p=5042); MISSE. Daniel; CARVALHO, Rodrigo. Policiamento comunitário no Rio de Janeiro. (http://www.conpedi.org.br/manaus/arquivos/anais/bh/daniel_ganem_misse.pdf). 8 Realizaram-se um total de 98 entrevistas, sendo que todas foram respectivamente relatadas, gravadas em áudio com consentimento do entrevistado e transcritas. Neste artigo serão preservadas as identidades dos entrevistados, com exceção de personalidades que concederam entrevistas públicas em veículos de comunicação. 87 prenha de significação (LACLAU, 2008). Assim, “o discurso é definido em termos de seu conteúdo como um conjunto de ideias políticas e valores, e em termos de seu uso, como um processo de interação com foco na formulação e comunicação da política” (SCHMIDT e RADAELLI, 2004: 193). Assim a análise do discurso compreende tanto aquele que enuncia a formulação da política quanto sua comunicação e disseminação no processo de execução onde diferentes atores interagem e disputam a resignificação dos seus conteúdos. O discurso serve de ponte entre as perspectivas institucionalistas e a análise centrada em atores, integrando estrutura e agencia (SCHMIDT e RADAELLI, 2004:192). O foco da pesquisa é a análise da participação, tendo como ponto de partida a caracterização de três dimensões propostas no modelo proposto de Fung (2006): quem participa, como participam e decidem as ações, e como estas decisões são implementadas pela política pública. Procuramos analisar os processos participativos destacando a dinâmica de interação entre atores do governo e da comunidade, os conflitos e tensões, as hierarquias de poder e status, os recursos de poder, estratégias de ação coletiva e alianças, as percepções de um ator sobre outro e sobre a política em termos de efetividade e reconhecimento, no sentido de verificar os repertórios de ação dos atores sociais (TABAGIBA, 2011). Apesar de o nosso foco ser voltado para os Programas de Gestão Social – UPP Social e Territórios da Paz – cuja missão institucional e metodologia de trabalho estão ligados à promoção da participação social, entendemos que a análise deve ter em conta as múltiplas formas de participação e associativismo, construídas ao longo da história de cada comunidade, no seu processo de embate e resistências, que definem seus repertórios de ação coletiva. A sociabilidade em cada território foi forjada nos enfrentamentos e negociações face às proibições de edificação, ameaças de remoção, barganhas políticas, alianças e apoios externos, convivência com traficantes e policiais. Portanto, apesar de termos como marco temporal a implantação da política de pacificação, é necessário rejeitar categoricamente a construção social e mediática, simbólica e política, que pretende atribuir todas as atuais características locais à introdução da UPP, evidenciando o caráter de fundamentalismo político que marca essa política. 88 Se bem a participação diga respeito à relação entre os polos do poder público, seus agentes e associados, na interação com o outro polo dos moradores da favela, entendemos que a intervenção socioanalítica deve permitir a elucidação das transversalidades que atravessam qualquer destes coletivos, que a primeira vista se apresentam como opacos e homogêneos (LAPASSADE e LOURAU, 1971). Ao revelar os conflitos e disputas internas e suas articulações externas, tanto a falsa homogeneidade quanto as delimitações que demarcam as fronteiras do interno/externo se desvanecem e dão lugar a novas configurações e representações, tanto em relação à comunidade quanto ao governo. Tal conhecimento analítico será propiciado pela análise de analisadores naturais, que emergem na cena sem que sejam introduzidos com esse propósito específico, mas que permitem revelar a estrutura da instituição, provoca-la e obriga-la a falar (LOURAU, 1975). A análise deve também considerar os catalisadores, ou eventos que permitem agenciar as expectativas coletivas (CEFAÏ, 2011). A análise de ambos nos possibilita formular hipóteses explicativas das ações coletivas e da trama de poder que se apresenta, devendo retornar ao campo para serem testadas e refeitas por meio de entrevistas e outras interações, que são um dos possíveis analisadores experimentais. Embora o analista dificilmente reconheça suas implicações no objeto analisado, ou mesmo as resistências advindas de processos de transferências e contratransferências, este reconhecimento é imprescindível para uma compreensão, inclusive, do nosso lugar nessa interação, pois a nossa mera presença é em si mesma, um analisador experimental, no sentido de que na interação se constrói nosso ponto de vista sobre um ponto de vista (BOURDIEU, 1997). Desta forma podemos buscar estabelecer uma comunicação menos violenta, já que as diferenças sociais e as hierarquias de saber e status socioeconômico estão sempre presentes em situações de copresença. Buscamos a descrição minuciosa das situações de copresença que precisa ser acrescida da sensibilidade e da análise sobre a dimensão simbólica, mítica, ritual e dramática, permitindo assim a reconstrução de estruturas culturais e formas simbólicas no contexto da ação (CEFAÏ, 2011). Entender essa ação em suas várias dimensões, materiais e simbólicas, só 89 pode ser realizado tendo em vista uma dimensão histórica, na qual essa ação ganha sentido e cria novas formas de associação, poder e resistência, transformando os seus próprios sujeitos. 5. Referências Bibliográficas ADORNO, Sergio. Exclusão sócio-econômica e violência urbana. Sociologias, Porto Alegre, n. 8, p. 84-135, jul./dez. 2002, ANEEL. (2008), Manual para elaboração do programa de eficiência energética. Brasília, ANEEL. ARENDT, Hannah. A Condição Humana. São Paulo: Forense Universitária, 1993 AROCENA, José. El Desarrollo Local – Um Desafio Contemporâneo. Caracas: Nueva Sociedad. 1995. AVRITZER, L. A qualidade da democracia e a questão da efetividade da participação: mapeando o debate. In: PIRES, R. R. (Org.) Efetividade das Instituições Participativas no Brasil: Estratégias de Avaliação. Brasília: Ipea, 2011. AZEVEDO, S. 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Instrumentos e Técnicas de Pesquisa Foram utilizados diferentes instrumentos e técnicas de pesquisa de tal forma gerar uma triangulação entre dados secundários, observações e entrevistas e material iconográfico, que nos permitisse revisar a cada momento as hipóteses e análises que emergiram do marco conceitual e/ou do trabalho de campo. A título de exemplo podemos enumerar alguns desses instrumentos e suas aplicações: 6.1 Dados secundários Com vistas à elaboração dos diagnósticos Socioeconômicos e Comportamentais Exemplo – Anexo: Tabelas e Gráficos 100 6.2 Observação Participante Diagrama das Relações de Poder 6.3 Observação com Filmagem Foram feitas observações e produzidos vídeos a partir delas como, por exemplo, a observação do evento Reunião de Jovens Dá Teu Papo no Chapéu Mangueira e Babilônia, em 2013, e a filmagem da Batalha do Passinho, em 2012. Assim como essas, várias outras filmagens foram produzidas, mas ainda não editadas para disponibilização online. 6.4 Iniciativas de Organização da Sociedade Civil nas Favelas Lista de organizações atuantes nas favelas Anexo - “Iniciativas de Organização da Sociedade Civil” (Ver Anexo 1) 6.5 Acompanhamento dos Discursos das Autoridades “Seg, 14 de Março de 2011 11:04 http://www.acrj.org.br/pt/ultimas-noticias/item/379-ricardo-henriques-fala-sobrea-upp-na-acrj.html Ricardo Henriques: "A UPP Social é a República nas favelas" Presidente do Instituto Pereira Passos explicou a importância da reinserção social dos moradores de favelas ocupadas pelas UPPs na reunião do Conselho Diretor da ACRJ desta quarta, dia 16 de março O papel das Unidades de Polícia Pacificadora (UPPs) não é só erradicar a criminalidade em áreas antes consideradas problemáticas e violentas na cidade. Segundo Ricardo Henriques, presidente do Instituto Pereira Passos e ex-secretário estadual de Assistência Social e Direitos Humanos, a UPP também fez com que a cidade fosse conduzida a um novo momento. Para que 101 isso acontecesse, foi criado o projeto UPP Social, que tem como objetivo promover o desenvolvimento social, incentivar o exercício da cidadania, derrubar fronteiras simbólicas e estimular a integração das favelas ao resto da metrópole, "O papel da UPP Social é levar a República à favela", disse Ricardo Henriques, durante sua palestra na reunião do Conselho Diretor da ACRJ, realizada nesta quarta-feira. A UPP Social une esforços das esferas municipal, estadual e federal e também dos setores privado, da educação e da sociedade civil. Projetos e programas são planejados para cada território (já ocupado pelas Unidades Pacificadoras), sempre a partir das demandas da comunidade. "Apesar da questão de a segurança ser a prioridade número um, temos que ter uma agenda social para enfrentar a nova realidade desses territórios, que antes viviam em estado de guerra. Os moradores dessas áreas sofriam diversas privações. Agora, eles têm uma vida nova, totalmente integrada ao ritmo da cidade", falou Ricardo Henriques. De acordo com Henriques, articular ações de desenvolvimento nas comunidades é o melhor caminho para consolidar a paz. "Uma das nossas prioridades é a prevenção da violência entre jovens, oferecendo oportunidades educativas, profissionais e de lazer. Nessas tarefas, queremos envolver aqueles que são mais vulneráveis", afirmou. Outro destaque do programa UPP Social é a construção coletiva, em cada comunidade, de novas regras de convivência. "Antes o que valia era a palavra do traficante ou do miliciano, que eram uma espécie de donos do local. Soubemos de casos que o traficante tinha influência até nas relações sociais e familiares. Houve casos em que mulheres foram hipoteticamente, obrigadas terem a raspar cometido a algum cabeça delito. como Hoje, punição a por, situação é completamente diferente. Os moradores decidem juntos o uso de serviços e podem formalizar negócios, festas e eventos", disse Henriques. José Luiz Alquéres, presidente da ACRJ, comemorou a iniciativa. "Reconquistamos o espaço urbano e o direito de ir e vir. Além disso, retiramos toda a estigmatização dessas comunidades. Sempre ouvimos falar que acabar com a bandidagem no Rio era impossível. Hoje, está provado que é possível", concluiu ” 102 6.6 Relatos de Mídias Alternativas Programa de Estudos sobre a Esfera Pública – EBAPE/FGV Projeto de Pesquisa “Cidadania e Discriminação como critérios de análise da política pública” Coordenação: Prof.ª Dr.ª Sônia Fleury Relato diário sobre as mídias alternativas e redes sociais virtuais Campo: Santa Marta Observador: Monique Bezerra da Silva Estrutura 1. Observação diária Data e horário 2012-09-09 15h21 Mídia site rap nacional Endereço virtual http://www.rapnacional.com.br/portal/filme-produzido-por- moradores-do-morro-santa-marta-fatura-premio-em-festivais-no-brasil-e-na-holanda/ Relato, observações e impressões: Curta produzido pelo Fiell e moradores do Santa Marta foi premiado na Holanda 2. Anexos referentes às observações diárias (conversas, fotos, textos, entre outros) Anexo 1 http://www.youtube.com/watch?feature=player_embedded&v=HaPu2yRSF4A Data: 03/01/2011 Definição e referência: vídeo do filme no youtube - curta metragem “788″( porque para chegar ao topo do morro é preciso enfrentar 788 degraus) Comentários: o Cria Filme é um Núcleo de cinema do Visão da favela Brasil, coletivo de hip-hop, que atua no morro Santa Marta. Contato:Blog: www.visaodafavelabr.blogspot.com Skype: visaodafavela Email: [email protected] 103 Relato diário sobre as mídias alternativas e redes sociais virtuais Campo: Santa Marta Observador: Monique Bezerra da Silva Estrutura 1. Observação diária Data e horário 2012-09-09 15h26 Mídia Internet - site globo universidade Endereço virtual http://redeglobo.globo.com/globouniversidade/videos/t/edicoes/v/cidade-partidaintegra/1637350/ Relato, observações e impressões: Favelas e condomínios residenciais fechados. A coexistência destas duas realidades e os trabalhos de pesquisa e extensão desenvolvidos a partir e dentro delas. 2. Anexos referentes às observações diárias (conversas, fotos, textos, entre outros) Anexo 1 http://www.uff.br/arqviol/textos_repercussoes/040709_Programa%20Globo%20Univ ersidade.html Data: 04 de julho de 2009 Definição e referência: site da UFF Comentários: A favela Santa Marta encontra-se ocupada pela Polícia Militar desde o final de 2008, como experiência de uma ação-modelo que expulsou traficantes de drogas e tem permitido a realização de obras de infraestrutura. Para conhecer essa realidade, as expectativas dos moradores e as possibilidades reais de ganho em qualidade de vida por meio da relação da escola pública com sua comunidade de referência, o repórter conversou com os professores Marcelo Burgos e Ângela Paiva, da PUC-Rio, autores da pesquisa Escola e Favela, que aponta a relação entre escolaridade e possibilidade de ascensão social. Ângela também fala sobre projetos de extensão que desenvolve com seus alunos no morro. Na associação de moradores local, Curvello mostra a história de um personagem que serve de exemplo à comunidade: Itamar Silva, que cresceu na favela e, graças à 104 educação, tornou-se coordenador da organização não-governamental Ibase, fundada pelo sociólogo Herbert de Souza, o Betinho. Relato diário sobre as mídias alternativas e redes sociais virtuais Campo: Santa Marta Observador: Monique Bezerra da Silva Estrutura 1. Observação diária Data e horário 2012-09-09 15h37 Mídia Internet - youtube Endereço virtual http://www.youtube.com/watch?v=8vI34j19lA8 Relato, observações e impressões: trabalho de documentação (2009/2010) sobre a construção do muro de 1km de extensão na Favela Santa Marta. Parte de um projeto maior, que inclui a ocupação policial e urbanização da favela, este muro é foco de grandes debates. O argumento oficial, que justifica-o como "ecolimites", é questionado pelo seu simbolismo segregacionista. Este projeto será implementado em outras favelas da cidade e a reflexão sobre seus efeitos é de extrema importância. www.izp.art.br Anexos referentes às observações diárias (conversas, fotos, textos, entre outros) Anexo 1 Canal SantaMartaGrupoEco Data: 15/11/2011 Relato diário sobre as mídias alternativas e redes sociais virtuais Campo: Santa Marta Observador: Monique Bezerra da Silva Estrutura 1. Observação diária Data e horário 2012-09-09 15h40 Mídia Internet – site SBT 105 Endereço virtual http://www.sbt.com.br/jornalismo/noticias/?c=5383&t=Nem+todos+os+moradores+d o+morro+Santa+Marta+recebem+beneficios Relato, observações e impressões Alguns moradores do morro Santa Marta, no Rio de Janeiro, dizem ter sido esquecidos. A comunidade foi a primeira a receber uma Unidade Pacificadora da Polícia (UPP), mas as melhorias realizadas não chegaram aos 52 moradores que vivem na área mais alta do morro, considerada de risco pela prefeitura. Relato diário sobre as mídias alternativas e redes sociais virtuais Campo: Santa Marta Observador: Monique Bezerra da Silva Estrutura 1. Observação diária Data e horário 2012-09-09 15h44 Mídia internet – youtube - Papo de Improviso com Vitor Lira. Endereço virtual http://www.youtube.com/watch?v=WDxWHA1QJpk Relato, observações e impressões: Anexos referentes às observações diárias (conversas, fotos, textos, entre outros) Anexo 1 Canal golparaoplaneta Data: 21/11/2011 Definição e referência: Morador do Santa Marta, Vitor Lira, guia do turismo no Rio de Janeiro, fala sobre essa nova realidade em comunidades pacificadas. Se é importante e sustentável, o projeto Dell Delambre vai papear. Relato diário sobre as mídias alternativas e redes sociais virtuais Campo: Santa Marta Observador: Monique Bezerra da Silva Estrutura 1. Observação diária Data e horário 2012-09-09 15h48 106 Mídia internet – youtube - Deputado Marcelo Freixo visita o morro Santa Marta. Rio, 12/ 03/ 2012 Endereço virtual http://www.youtube.com/watch?v=F84SRCHYoWY Relato, observações e impressões: Anexos referentes às observações diárias (conversas, fotos, textos, entre outros) Anexo 1 Canal fiellateamorte Data: 12/ 03/ 2012 Definição e referência: Deputado e Presidente da Comissão de Defesa dos Direitos Humanos e Cidadania da Alerj Marcelo Freixo, visitou o morro Santa Marta. Rio, Segunda Feira, 12/03/2012. Relato diário sobre as mídias alternativas e redes sociais virtuais Campo: Santa Marta Observador: Monique Bezerra da Silva Estrutura 1. Observação diária Data e horário 2012-09-09 17h00 Mídia internet – 2 ANOS DA UPP SANTA MARTA Endereço virtual http://www.youtube.com/watch?v=3ns87E6Df6s Relato, observações e impressões: A festa de aniversário da primeira Unidade de Polícia Pacificadora no morro Santa Marta em Botafogo, Zona Sul da cidade, comemora também o sucesso da tática de prevenção e de inclusão social da Polícia Militar lideradas pela major Pricilla. Anexos referentes às observações diárias (conversas, fotos, textos, entre outros) Anexo 1 Canal SCabralFilho Data: 21/12/2010 Relato diário sobre as mídias alternativas e redes sociais virtuais Campo: Santa Marta Observador: Monique Bezerra da Silva Estrutura 107 1. Observação diária Data e horário 2012-09-09 17h05 Mídia internet – youtube - UPP Santa Marta comemora dois anos Endereço virtual http://www.youtube.com/watch?v=ecQfUretoSQ Relato, observações e impressões: Major Pricilla Azevedo fala ao Blog da Pacificação sobre o aniversário de dois anos da UPP no Morro Santa Marta e muito mais. Anexos referentes às observações diárias (conversas, fotos, textos, entre outros) Anexo 1 Canal BlogdaPacificacao Data: 18/12/2010 Relato diário sobre as mídias alternativas e redes sociais virtuais Campo: Santa Marta Observador: Monique Bezerra da Silva Estrutura 1. Observação diária Data e horário 2012-09-09 17h05 Mídia internet – youtube - Casa desaba no morro Santa Marta. 24/03/2010. Endereço virtual http://www.youtube.com/watch?v=vfQfhn7DFLo&feature=bf_prev&list=UU ZVlCnRzU2VI1FG8YyYRKYw&lf=plcp Relato, observações e impressões: O pessoal da Ass. Visão da Favela Brasil, em 24/03/2010, estavam distribuindo a CARTILHA POPULAR DO MORRO SANTA MARTA ABORDAGEM POLICIAL, e se depararam com essa situação. Anexos referentes às observações diárias (conversas, fotos, textos, entre outros) Anexo 1 Canal rapperfiell Data: 10/04/2010 Relato diário sobre as mídias alternativas e redes sociais virtuais 108 Campo: Santa Marta Observador: Monique Bezerra da Silva Estrutura 1. Observação diária Data e horário 2012-09-09 17h13 Mídia internet – youtube - 4 noticario latino americano no santa marta Endereço virtual http://www.youtube.com/watch?v=JIKwdiXxhjA&feature=relmfu Relato, observações e impressões: Quarto noticiario latinoamericano no santa marta, dedicado ao setor Pico do morro e ao pais de Mexico. Anexos referentes às observações diárias (conversas, fotos, textos, entre outros) Anexo 1 Canal radiosmarta Data: 24/09/2010 Relato diário sobre as mídias alternativas e redes sociais virtuais Campo: Santa Marta Observador: Monique Bezerra da Silva Estrutura 1. Observação diária Data e horário 2012-09-09 17h13 Mídia internet – site RJTV 1ª edição endereço virtual http://globotv.globo.com/rede-globo/rjtv-1a- edicao/v/moradores-do-santa-marta-continua-sem-rede-deesgoto/1796698/ Relato, observações e impressões: primeira comunidade a ser pacificada, e ainda aguarda a chegada dos serviços públicos, como o saneamento básico. Em muitos pontos, há esgoto a céu aberto e mau cheiro. Relato diário sobre as mídias alternativas e redes sociais virtuais Campo: Santa Marta Observador: Monique Bezerra da Silva Estrutura 109 1. Observação diária Data e horário 2012-09-09 17h21 Mídia internet – youtube - ARQUITETURA DA EXCLUSÃO Endereço virtual http://youtu.be/nUZBkMDm8zU Relato, observações e impressões: "Arquitetura da Exclusão" propõe um questionamento sobre os muros, visíveis e invisíveis, que permeiam os centros urbanos. Nesta proposição, o Morro Santa Marta, primeira favela a ser cercada por muros construidos pelo Estado do Rio de Janeiro, e o carnaval carioca apresentam-se como situações potentes da nossa realidade e imaginário. Anexos referentes às observações diárias (conversas, fotos, textos, entre outros) Anexo 1 Canal DanielLimaBR1 Data: 06/12/2010 6.7 Catálogo de Reportagens na Mídia Organização dos discursos sobre UPP na mídia 6.8 Roteiros de Entrevistas PROJETO CIDADANIA E EXCLUSÃO COMO CRITÉRIOS DE ANÁLISE DE POLÍTICA PÚBLICA Roteiro de entrevista Entrevistada: Frida (Urbaniza) / Bruna (Casa Civil) Bloco 1 - Institucional 1. Fale um pouco da sua inserção institucional... 2. Vocês já realizaram trabalhos em favelas antes? Quais trabalhos? Quais favelas? 3. Como souberam da licitação do PAC Social no Santa Marta? 4. Tem gente do governo trabalhando na Urbaniza? Tem pessoas da comunidade? (esposa do Robertinho) Bloco 2 - Participação 110 5. Todos os comitês previstos foram formados? Como são organizados (quando, onde se reúnem)? Quais são os critérios para participar? 6. Como é a dinâmica deles? (quem entrou? convidaram alguém? Houve rotatividade de membros?) a. A associação está presente (quem da associação? Zé Mario, irmão do Zé Mario -Tião)? b. Alguém dos moradores que serão reassentados? 7. Como as reuniões gerais com a comunidade são divulgadas? Geralmente acontecem quando e onde? Quem coordena? Bloco 3 - Atividades no Santa Marta 8. Vocês agora vão começar a trabalhar a abertura de frente de obras? Como é feito? 9. O que fizeram antes? Chegaram a fazer a Oficina do Imaginário? 10. E depois da frente de obras, qual é o próximo passo? 11. Na última reunião com a comunidade vocês propuseram um projeto sobre a questão do lixo na comunidade... Como será feito? Qual será a atuação da Urbaniza? (igual a da UPP Social e TP?) 12. Como foi a coleta de dados com a comunidade? Quais foram as dificuldades? 13. Vocês recebem demandas dos moradores? Como? Que tipo de demandas? Como elas são tratadas? 14. Como vocês lidam quando encontram resistência ao trabalho de vocês? c. Associação dos Moradores? d. Mobilização do Pico? e. Rádio Santa Marta? (deve entrar aqui?) Bloco 4 - Parceiros 15. Vocês possuem parcerias? 16. Vocês conversam com outras secretarias/órgãos governamentais além da Casa Civil? (EMOP, Conlurb) 17. Há alguma articulação com a UPP Social, Territórios da Paz e UPP? 18. Vocês chegaram a entrar em contato com as empresas que atuaram em outras favelas pelo PAC Social, para trocar informações? 19. Para o reconhecimento do campo de atuação onde vocês buscaram informações? Como foi a entrada na comunidade? A quem vocês procuraram primeiro? (reconhecimento de status público) 111 a. Lista de atores da Casa Civil: incluíram mais atores? 20. O que seria o “social” do tra alho feito por vocês ROTEIRO DE ENTREVISTAS – GESTORES UPP 1. Origem: Interna ou externa. Você conhecia a comunidade antes de vir trabalhar aqui? O que é o Santa Marta pra você? É favela, é comunidade? 2. Trajetória: Como foi o seu caminho até ocupar este cargo? Há capacitação para quem vai exercer estes cargos? 3. Ação/ Atividade: E desde então, como tem sido o trabalho? Descreva como é o seu dia a dia de trabalho. Onde você fica? 4. Estratégia, onde, com quem? Relação com os atores, (Com a UPP) 5. Relação com a comunidade: que demandas chagam? Quem chega e quem não chega? Tem algum tipo de rejeição ao trabalho? 6. O que você faz com a demanda? Por tipo de demanda e por grupos particulares (serviços e atores diferentes) 7. Criação: pode criar algo para suprir a demanda, como com quem e de que forma 8. Avaliação: O que facilita/dificulta os resultados? O que poderia melhorar? 9. Como você acha que a comunidade avalia seu trabalho? 10. Mudanças (Comunidade, mercado, cidade) Sustentabilidade das mudanças (questão do tráfico) 6.9 Resenhas de Artigos Modelos de resenhas Apresento abaixo dois modelos de resenha para os textos. Ambos aproximam-se do que se costuma classificar como resumo crítico: um “trabalho de síntese, (…) tendo por objetivo servir como veículo de crítica e avaliação” de 112 uma obra9. Assim, as resenhas devem cumprir o objetivo de apresentar de forma concisa e seletiva a natureza de um trabalho e sua originalidade. Contudo, enquanto o resumo crítico faz alusões e avaliações tentando compreender a intertextualidade de uma obra (o estado-da-arte de um campo de pesquisa), as nossas resenhas buscarão a aproximação com o que observamos em campo e com as nossas discussões. Terão como norte a apropriação de temas, problemas e conceitos que orientam (ou orientarão) a nossa análise. A grande diferença entre um tipo de resenha e outra é a abrangência. Enquanto o modelo 1 circunscreve a resenha em um livro, artigo ou capítulo, o modelo 2 busca a transversalidade dos temas e conceitos em várias obras, compondo um mapa da noção a ser apropriada na pesquisa. Modelo 1 (Ver Anexo I) Referência da obra resenhada SOBRENOME, Nome do autor. Título. Local de edição: Editora, Ano. Apresentação - Apresentar a obra, indicando o objetivo principal e a originalidade do autor. - Apontar em que sentido a obra pode ser aproveitada no projeto. Realizar uma avaliação pessoal a partir das experiências de campo e das discussões travadas no grupo de pesquisa. Noções e conceitos - Reconstruir noções e conceitos que podem ser apropriados para a pesquisa, indicando de forma clara, com subtítulos, a noção que pretende levantar do texto. - Usar citações indicando as páginas e buscando mapear as palavras dos autores do texto para se referir as noções que consideramos importantes. Modelo 2 (Ver Anexo II) Titulo Indicação das noções que serão apropriadas Apresentação - Indicar a noção, tema ou conceito que será apropriado VASCONCELLOS, Ana Cristina, FRANÇA, Junia Lessa. Manual para Normalização. 8ª 9 ed. - BH: Ed.UFMG, 2007.p.92 113 - Realizar uma pequena exposição sobre o porquê da apropriação das noções selecionadas. Noções e conceitos - Estruturar o texto em subtítulos que apreendem a rede conceitual que se pretende abordar; - Redigir um texto de forma cursiva, contrapondo as várias interpretações divergentes ou complementares sobre uma noção ou problema; - Buscar ser conciso, usando no máximo um ou dos parágrafos para apresentar a relevância de uma obra ou subtema de um trabalho acadêmico; - Usar citações indicando as páginas e buscando mapear as palavras dos autores do texto para se referir as noções que consideramos importantes. Normatizar citações com ABNT. Referências bibliográficas - Indicar a lista de textos usados na resenha, com as normas da ABNT. Anexo I FLEURY, Sônia, OVERNEY, Assis M. Gestão de redes: a estratégia de regionalização da política de saúde. RJ: FGV, 2007. Os autores buscam a conceituação de rede no campo das Ciências Sociais na contemporaneidade. Concomitante a este movimento analítico, faz uma reflexão sobre o Estado, a administração pública e sua gestão. Este é o centro do debate que o livro propõe fazer analisando as políticas de saúde pública. A categoria rede tornou-se central nos debates contemporâneos. A noção tem sido replicada em diferentes campos do social e gerencial: “redes empresariais, redes de política, redes de movimentos sociais e redes de apoio sócio-psicológico”, etc. Nesse sentido, os autores procuram uma conceituação que leve em conta a transversalidade do conhecimento sobre o termo. Por outro lado, existe uma preocupação em afirmar o modo como práticas e teorias da administração observaram tal construção conceitual e teórica. No estrangeiro, policy network foi vocábulo corrente para se referir as transformações contemporâneas e a modernização da administração pública e 114 do Estado. No Brasil, os autores propõe o termo “política de rede” ou “redes de política”. Ainda que o enfoque seja a área da saúde, existe possibilidade de usar o aparato teórico para refletir sobre outras políticas públicas. No nosso caso, pode-se tomar a “pacificação” como uma política de rede. Tendo em vista esta hipótese de uso, selecionamos três tópicos do texto que são interessantes para refletirmos sobre a política de rede da “pacificação”. 1. História do conceito no campo administrativo. O conceito “rede” surgiu da valoração na segunda década de 1980 da relação do Estado com terceiros – terceiro setor. Ou seja, foi a partir da Administração Intergovernamental (Intergovernamental Management) que o conceito surgiu para multijurisdicionais”; decentralizdas”; se “varias “relações referir misturas aos seguinte entre interpessoais”; pontos: autoridades “alianças entre “decisões centrais e governos e organizações não governamentais”. Nos anos 1980, surgem perspectivas de análise “microeconômica”, avaliando a eficácia do processo de rede. Outra perspectiva, inspirada na teoria dos jogos, avalia os aspectos qualitativos de dinâmicas complexas de decisão. O foco principal de análise está no setor de saúde. Nos anos 1990, há uma expansão do estudos de gestão de redes ultrapassando a área de saúde para abarcar vários campos, mostrando a consolidação e expansão da abordagem. Além disso surgem perspectivas comparativas e multidisciplinares. O conceito é usado na administração para se referir a áreas de difícil equacionamento político, por envolver valores e pressões distintas. Problemas relacionados a segregação urbana, violência e outras questões sociais ganham destaque no uso da categoria rede. 2. O conceito de rede e sua conexão com debates gerais e contextuais dos Anos 70 e 80 115 A globalização Na década de 1970, a globalização alterou os termos da produção, administração e organização do trabalho. Ainda que não seja o centro da análise da autora, acho improvável que essas noções não se relacionem com o clássico de Castells, “Sociedade de Rede”. Este atenta para uma transformação no processo produtivo, sugerindo uma terceira revolução das bases econômicas do capitalismo. A tecnologia da informação, internet, engenharia genética e integração entre campos da biologia e tecnologia, estão em termos teóricos e práticos alterando a percepção do mundo e a sociabilidade. As tecnologias e os processos produtivos são constantemente desterritorializados, construídos em níveis de integração mais complexos, num contínuo espaço-tempo não concebido anteriormente. Desterritorialização deve ser compreendido como requalificação do território e das relações nele construídas, ultrapassando “as fronteiras tradicionalmente fixadas, redimencionando os territórios e a influencia da ação” (p.6). Na crise do fordismo-toyotismo, duas características são importantes na administração e na organização do processo produtivo. Estes passaram a serem caracterizados não pela hierarquia, mas pela descentralização em rede: 1 – As redes são “estruturas policêntricas, envolvendo diferentes atores, organizações ou nódulos, vinculados entre si a partir do estabelecimento e manutenção de objetivos comuns e de uma dinâmica gerencial” (p.4) 2 – “A proliferação de redes de gestão é explicada por uma multiplicidade de fatores que incidem, simultaneamente, conformando uma nova realidade administrativa. A globalização econômica alterou os processos produtivos e adminstrativos em direaçaõ à maior flexibilidzação integração e interdependência.” 3 – Existe uma reconfiguração da relação entre Estado, sociedade e mercado criando “novos conflitos relacionados aos campos social, econômico e político, expandindo e potencializando a problemática da eficácia e deficiencia do Estado” 116 A democratização Na década de 1970 e 1980, a América Latina viveu um processo de redemocratização de sua sociedade. Os “processos simultâneos de crise fiscal e democratização conduziram as reformas políticas e administrativas nos estados, abrindo espaços para a profusão de novas formas de relação entre Estado e sociedade” (p.6). Ou seja, é enfrentando uma crise de governabilidade com forte participação social, que as práticas estatais brasileiras e latino-americanas foram reconfiguradas. A autora salienta aqui o papel dos “novos movimentos sociais”: 1 – Esses denunciam “formas de opressão distintas da exploração nas relações de produção, com uma radicalidade sem precedente, os excessos de regulação da modernidade”. Assim, criam novas formas de organização para interferir nas políticas públicas (p.7) - Os atores criam novas formas de conflitos. “A crescente diferenciação social e a expressão de novas utopias políticas reduzem a legitimidade da regulação burocrática e da centralidade do estado na mediação dos conflitos sociais, ao mesmo tempo em que denunciam a predominância dos interesses mercantis” (p.7) - Por último, há uma crítica ao esgotamento das instituições representativas tradicionais (os partidos políticos). A reconstrução das bases da cidadania confronta “a redefinição dos sistemas políticos em busca de formatos mais horizontalizados e fragmentados de governança, a necessidade de reformular as bases da democracia liberal representativa” (p.38). Neoliberalismo O terceiro elemento na constituição do conceito de rede é a crise financeira do Estado, motivando estratégias de restrição dos dispêndios públicos e, consequentemente, a redução da ação estatal. Tal processo ficou balizado pelo New Public Management, com as seguintes características: - Composição de uma elite profissional de gerentes com liberdade de ação e responsabilidade de seus atos; 117 - Utilização explícita de padrões e medidas de performances (definição de metas e indicadores) - Maior ênfase no controle de resultados do que de procedimentos, alocação de recursos com a mensuração da performance; - Transformação visando a desagregação das unidades que compõe o setor público, na tentativa de romper com a estrutura monolítica e centralizada de provisão de serviços, decentralizando-a, separando as funções de produção e provisão e buscando ganhos de eficiência por meios de instrumentos de contratualização; - transformação visando a ampliação da competição no setor público, inserindo a concorrência como forma de redução dos custos e de obtenção de melhores padrões de qualidade; - ênfase no estilo privado de práticas de gestão por meio do emprego de práticas e ferramentas de mercado; - disciplina maximizadora de utilização constante dos recursos públicos, envolvendo desenvolvimento de sistemas de custos e de ferramentas que possibilitem a realização de “mais com menos”. (p.40) A categoria está constituída num campo de disputa, tencionando a noção da reforma do Estado em foco. Para Fleury, o conceito de rede emerge a partir das insuficiências do modelo administrativo que guia a agenda de reforma do Estado. Esta é criticada pela insuficiência de suas posições, visto que o Estado interfere na economia independente de sua vontade; além disso, há a questão da proteção social que no New Public Managemet é deixada de lado. Para a autora, a rede é, ao mesmo tempo, contrária ao Estado centralizado e ao mercado como meio de eficácia: Nesse sentido, a emergência do conceito de rede no contexto da administração pública nos anos noventa indica a insuficiência de uma série de abordagens teóricas tradicionais, que aplicadas às diversas dimensões de atuação do Estado buscavam explicar e inferir padrões de comportamento dos atores envolvidos. Na medida em que tais paradigmas não mais suportam explicações convincentes frente a emergência de padrões de organização 118 marcados por crescente fragmentação e interdependência dos formatos organizacionais e interrelacionais, o conceito de rede surge como a abordagem mais promissora”. (p.42). 3. Administração e rede Na administração, a construção da noção de rede organiza-se a partir da interdisciplinaridade com a Sociologia e a Ciência Política. “Na gestão intergovernamental é vista como um tópico emergente de junção das disciplinas de política e administração, como um modelo estratégico de gestão de políticas ou ainda como um novo modelo de governança que envolve níveis local e global” (p.9). São os postulados da teoria da administração que são questionados na teoria das “redes de política”: 1 – O “pressuposto da separação entre política e administração” Para além dos movimentos sociais, a autora cita os neocorporativistas, identificando como interesses sociais ganham concretude na formação de estruturas burocráticas; 2 – “A teoria da escolha racional pressupõe que toda ação é motivada por uma decisão racional que maximiza os interesses pessoais”; as teorias de rede para além dos interesses coloca em cena a solidariedade, o afeto, a lealdade, concedendo a estes termos capacidade explicativa. 3 – A teoria que pressupõe o Estado, sua hierarquia e burocracia como o centro da administração sofre um abalo. As transformações dos arranjos estatais na globalização e democratização da sociedade confluem para revisão desse pressuposto da teoria e prática administrativa(p.10). De acordo com estes autores, o desenvolvimento das políticas públicas ocorre não mais por fases predeterminadas, mas fundamentalmente por meio de rounds entre diversos atores que se encontram em arenas decisórias. Debate-se incertezas substantivas, incertezas estratégicas, incertezas constitucionais do processo de administração pública. 119 4. Conceitos e categorias de análise na gestão de redes As diferentes concepções que se tem sobre a teoria de redes conferem possibilidades diversas de aplicação no campo da gestão. Ao passo que constitui um tópico recente de junção entre as disciplinas de política e administração, a gestão de redes pode ser compreendida como estratégia de gestão de políticas, ou significando um novo modelo de governança que envolve os níveis local e global. Na ciência política e disciplinas afins, a teoria de redes pode ser apropriada como forma de representação e análise das múltiplas relações entre atores, instituições e poder público, ou como método de análise da estrutura social. As diversas concepções têm em comum o entendimento de que a gestão de redes compreende um conjunto de atores diversos e independentes, mas que mantêm relações entre si; demanda algum nível de flexibilização da coordenação e controle; ocorre a troca ou negociação de recursos; existe interesse, valores ou metas em comum. Em termos de redes de políticas, a teoria proposta pela escola norteamericana de “intermediação de interesses” analisa a relação entre os grupos de interesse e o Estado propondo que sua organização e competição não são exteriores ao Estado. Outra concepção, cuja origem encontra-se nos estudos de relações intergovernamentais, propõe que uma rede de políticas, ou uma comunidade política, delimita a agenda e dá forma aos resultados das políticas públicas. A abordagem de redes rompe com o paradigma de gestão intragovernamental, do tipo top-down, cuja hierarquia e normas antecedentes configuram os padrões de relação, na media em que se aproxima da gestão intergovernamental, que considera a multiplicidade de atores e suas relações. Esta é marcada pela relação entre autoridade central e local, as relações interpessoais e organizacionais, os setores governamental e não- governamental. Em ambos os casos, o enfoque analítico está na relação entre os agentes/indivíduos e suas ligações em rede, onde a relação entre agentes públicos e privados se faz por meio da negociação e mobilização de recursos 120 para alcançar o melhor desenho da política. Nestes casos, “as tipologias propõem a descrição das redes de acordo com certos atributos, como o nível de institucionalização (estável/instável), o número de participantes (restrito/ aberto), a configuração das políticas (setorial/ transetorial) ou ainda o tipo de atores sociais envolvidos e a função principal da rede (por exemplo, redes de problemas, redes profissionais, redes intergovernamentais, redes de produtores) e o equilíbrio de poder (redes heterogêneas e redes homogêneas) (BÖRZEL, 1977)”. A estrutura da rede vai depender da natureza e distribuições dos recursos, que irá definir as posições de poder e as ligações que formam a rede. Os recursos podem ser legais, envolvendo distribuição formal de funções e competências; políticos, referindo às estratégias, interesses e setor de atuação dos participantes; organizacionais; ou financeiros. Na rede intra-organizacional a posição de poder é determinada pela hierarquia, com controle centralizado das decisões e funções dos integrantes; enquanto na rede inter-organizacional a posição de poder está relacionada à influência que cada membro tem na viabilidade mesmo da rede, cabendo ao gestor a habilidade de somar forças e de estabelecer metas comuns. A autora conclui que ambos os modelos consideram que a estrutura das redes demonstra a lógica de interação de seus membros e irá afetar o processo político, ou ainda, que há uma vinculação sistemática entre a natureza da rede e o resultado do processo político. A abordagem societária, por outro lado, tem como ponto forte de análise as relações entre as pessoas e suas conexões solidárias, ao invés dos atributos de grupos ou indivíduos, cargos ou instituições consideradas pelos modelos inter e intra-organizacionais. Assim, busca-se compreender o sentido das ações sociais, que passa a ser o pressuposto da análise das redes sociais; enquanto os atributos dizem respeito apenas às características de seus agentes. A autora define algumas variáveis para analisar as características de cada tipo de rede: o compatibilidade dos membros: nível de congruência de valores e compartilhamento de objetivos; o ambiente de mobilização de recursos: disponibilidade de fundos e tipo de 121 controle sobre estes recursos; o ambiente social e político: corresponde às bases de poder e ao padrão de conflitos. De modo geral, alguns fatores devem ser considerados na análise das redes: as relações de poder dos membros dependem tanto dos recursos que possuem quanto das relações externas que estabelecem; o padrão de interação dos atores vai definir as regras formais e informações da rede; o conflito entre as organizações é visto como inevitável e intrínseco à rede. Do ponto de vista da gestão, o foco está colocado no processo de interação entre os diferentes atores e os meios pelos quais estes processos podem ser estimulados, mantidos ou mudados, quando necessários; enquanto os instrumentos usados que favorecem a gestão podem ser do tipo regulatório, financeiro ou comunicacional. Anexo II Associativismo, movimentos sociais, “novo movimento” e comunidade Os associativismos civis são tratados como um tópico da bibliografia dos movimentos sociais no Brasil. De maneira geral, a expressão “movimento social” ou “movimento” aplica-se às práticas que tem como objetivo influenciar o destino de uma coletividade. Essa vaga noção permeia tanto o senso comum como a academia, podendo ser considerada uma categoria nativa para identificar, nomear e julgar uma prática em relação a um contexto social mais amplo. Contudo, esta noção está longe de ser neutra. Sendo uma construção transversal, ligando tanto intelectuais quanto atores, a historicidade dos debates em torno da categoria “movimento” é um problema e uma necessidade. Se entendermos associativismo como um desdobramento do campo de discussão dos movimentos sociais, devemos compreender que “por mais inovador que seja, todo debate parte de ideias anteriores, mesmo quando vem a ser formuladas ou rejeitadas. Falar de um campo de discussão é necessariamente falar de sua construção e, portanto, de sua historicidade (MACHADO DA SILVA, 1993, p.39). Assim, existe uma trajetória de termos e 122 conceitos que devem serem reconstruídos para que compreendamos o que está em jogo nas análises e nos discursos e ações de um associativismo. O retorno a bibliografia não visa encontrar categorias de análise que serão diretamente aplicadas na pesquisa, mas discutir a historicidade das noções que usamos na descrição do trabalho de campo e nas práticas e representações dos atores. Como observou Cefaï, Motta e Veiga, ainda que possamos reconstruir as estruturas culturais ou as formas simbólicas através da sua História, “não podemos perder de vista que os sentidos e significados se constituem no contexto da ação e da situação social. Não podemos, assim, reduzir os contextos de sentido que se constituem no exercício da vida associativa a uma espécie de sombra generalizante e portadora de culturas ou de tradições nacionais” (CEFAÏ, MOTTA, VEIGA, 2011, p.13). A análise bibliográfica nos serve para elencar a construção de conceitos, expressões e problemas de um código cultural que será tratado in situ, a partir do trabalho de campo, numa etnografia do associativismo. Nessa perspectiva, este resumo crítico não oferece chaves de análise, mas procura reconstruir e recuperar estruturas culturais e formas simbólicas, para dar densidade a algumas categorias usadas por intelectuais e atores engajados na compreensão ou ação do movimento social. Enfocaremos a noção de “novos movimentos sociais” e “comunidade” por entendermos que elas são centrais na pesquisa. Das ações coletivas aos “novos” movimentos sociais: a formação de um campo de estudos nas Ciência Social brasileira A expressão ação coletiva é um termo geral, usado para se referir a “qualquer forma de ação reinvidicativa ou de protesto realizada através de grupos sociais” (SCHERER-WARREN, p.1). Esta é uma criação das Ciências Sociais, uma noção para se referir a prática de formação de agrupamentos com interesse comum, expressando um conflito. Assim, o termo ação coletiva é ao mesmo tempo um substantivo e um símbolo. De um lado ela nomeia um conjunto de fenômenos, de outro ela aponta para uma rede de significados maior na teoria social. 123 São inúmeras as teorias e as tradições culturais e políticas que investiram no termo ação coletiva para construir um campo especializado da sociologia política. Os textos de Glória Maria Gohn, principalmente Teoria dos movimentos sociais (2001), são importantes para analisar a conformação desta especialização. A autora faz uma sociologia crítica do que se entende por ação coletiva, construindo um mapa da questão. De um lado, Gohn situa os paradigmas da ação coletiva nas divisões disciplinares da psicologia social e da sociologia marxista, durkheimiana e weberiana. Por outro, ela busca observar a institucionalização de modelos de análise em cada país ou região, mostrando a conformação de paradigmas de movimentos sociais nos Estados Unidos, na Europa e na América Latina. O mapa de Gohn é uma importante contribuição para o debate sobre movimento social, por mostrar como os textos fundadores da Ciência Social conformaram leituras que foram seguidas posteriormente. Assim, ela mostra como a institucionalização da Sociologia enquanto disciplina conformou teorias sobre movimentos sociais, sinalizando para as diferenças e aproximações dos paradigmas norte-americano, europeu e latino-americano. O problema de como se instituiu as análises da ação coletiva recebeu outro tratamento por Tarrow, Tilly e MacAdam, em Dinamic of contention action (2004). Para eles, a discussão sobre as políticas de confronto ou políticas contenciosas (“contentious politics”) tende a fragmentação: a cada novo conflito, novas teorias e perspectivas são abertas para explicar um fenômeno que não está institucionalizado no sistema político. Assim, tanto os intelectuais quanto os atores ligados ao conflito colaboram para a fragmentação e constituição de problemas na teoria das ações coletivas. Os “estudos sobre conflitos políticos têm crescido, tornando-se bastante amplos, espalhando-se por uma gama distinta de tópicos da literatura, tratando de um fenômeno similar com diferentes vocabulários, métodos e modelos” (MACADAM, TARROW, TILLY, 2004, p.6). Assim, os autores sinalizam para as múltiplas dimensões e fronteiras com o debate social na conformação das teorias da ação coletiva. Mais do que a institucionalização das Ciências Sociais, interessa compreender as trocas entre intelectuais e grupos que se mobilizam em diferentes sociedades, mostrando como as teorias que orientam e representam a conformação de um problema da teoria da ação coletiva são construídas. 124 No Brasil, a especialização do campo de estudo dos movimentos sociais ocorreu na década de 1970. Nesse momento, sob influxo da abertura do regime militar (1964-1985) e dos debates em torno das identidades e das mobilizações que foram constitutivas de maio de 1968, investiu-se na categoria “novos movimentos sociais” para apontar e analisar um conjunto de ações coletivas que se constituíram naquele contexto. Novos movimentos sociais e classes populares A forma como aparece a noção de movimento social articula participação, sociedade e política na modernidade e tem sido vista com bastante parcimônia quando aplicada o Brasil. Válido para o Ocidente desenvolvido, essa visão careceria de lastro social na realidade brasileira. A pergunta que se faz é: essa sociedade desigual e fragmentada foi (e é) capaz de produzir tal tipo de participação? A questão foi clássica no pensamento social e herdada, por vias tortas e nem sempre muito claras, ao debate das Ciências Humanas. Na formação do Estado brasileiro, na imaginação da comunidade política, foi corrente a percepção das classes populares e dos grupos subalternos como alteridade negativa do Estado e da sociedade brasileira. “Articulada pela visão de uma sociedade fragmentada e tendo a decomposição diante dos imperativos históricos de mudança social, esta representação do „povo‟ e do „caráter popular‟ brasileiro inventou sua fórmula que fez eco por todo pensamento intelectual do século XX, apesar da crítica que se fez aos seus termos” (SADER & PAOLI, 1986, p.46). Paoli e Sader (1986) identifcam três postulados que marcaram essa visão: primeiro, a heterogeneidade da composição dos grupos populares impediria qualquer construção ordenada sobre sua identidade como povo; segundo, essa heterogeneidade provocaria incapacidade de ação coletiva organizada, portanto, exigindo uma intervenção de fora que incorporasse e organizasse este povo disperso; terceiro, a falta crônica de aptidão para a coletivização que este povo sofreria, pois os grupos que o compõe seriam carentes de integração entre si e com o resto da sociedade. 125 De formas diversificadas, essa “formula” para se referir à sociedade brasileira tem sido reiterada no pensamento social, através das imagens das classes perigosas atribuída aos espaços da pobreza e dos trabalhadores subalternos. Como notou Zaluar, em A máquina e a revolta (2000), as formas de organização populares são muitas vezes vistas de forma etnocêntricas, acusadas de populistas, clientelistas e pré-políticas, como se apenas estes grupos realizassem as práticas deesignadas como atrasadas e antidemocráticas. No debate dos novos movimentos sociais, nos anos 1970 e 1980, a percepção das classes populares como sujeitos da História se reconstituiu. A institucionalização do estudo dos Movimentos Sociais nas Ciências Sociais e Humanas ocorreu nos anos 1960 e 1970. Esses estudos foram considerados a vanguarda da renovação do conhecimento social no momento de reestruturação da pós-graduação no Brasil. A formação do campo temático dos movimentos sociais revisava o lugar das classes populares no capitalismo; se nas teorias da modernização e da marginalidade os pobres permaneciam vítimas do sistema, nas análises dos movimentos sociais procurava-se rever essa dinâmica; de espectadores e pacientes do processo macroeconômico, tornavam-se sujeitos. Uma das teorias chave para essa renovação do pensamento social foi a noção de movimento social urbano, de Castells e Lojkine. Para eles, o que explicava a mobilização das classes populares era a politização da cidade, das formas de distribuição dos bens de consumo coletivo (transporte, escolas, e outros tipos de infra-estrutura (MACHADO DA SILVA, 1993, p. 43). “Novos” e “Velhos”: uma construção temporal e uma teleologia Os estudos estiveram fortemente associados ao contexto político e social que o país vivia: na ditadura, os pesquisadores estavam “ávidos por entender os processos sociais que estavam ocorrendo e desejosos de participar de alguma forma da luta contra o regime militar, tendo em vista o controle social e a ausência de espaço para debates”; de forma que “a produção latino-americana sobre movimentos sociais muitas vezes esteve bastante permeada por pressupostos ideológicos que as derivavam de 126 matrizes político-pragmáticas” (GOHN, 2006, p.215). Na ânsia de participação, as categorias constitutivas do senso comum foram muitas vezes replicadas na esfera acadêmica. Vários autores apontam para essa duplicação da realidade e para a interpenetração entre produção acadêmica e o senso comum como um ponto cego dos debates intelectuais dos movimentos sociais. Os estudiosos participam do processo de enquadramento de um conflito de forma direta ou indireta, mas, muitas vezes, optam por naturalizar uma concepção de movimento, militância e realidade, transformando um viés político numa posição “científica” (GONH, 2006; MACHADO DA SILVA, 1993; BOSCHI, 1984). Nessa dinâmica, os intelectuais e os atores sociais construíram uma noção e uma temporalidade bastante cara à bibliografia e a estruturação dos estudos dos Movimentos Sociais: a distinção entre o “velho” e o “novo”. Algo que perpassa a diferença geracional entre participantes de práticas de protesto, visto que nos anos 1970 renovava-se o quadro de militantes nos associativismos, mas que também decorria das diferenças de contexto na democratização. Pondo em evidencia a pressão por participação no regime ditatorial, vislumbravam-se os novos personagens em cena. Os intelectuais incorporavam a bibliografia da nova esquerda e evidenciavam os conflitos do cotidiano e a pluralidade de identidades sociais. A terminologia servia para dar evidência a um amplo escopo de articulações do período, apresentando desde reivindicações de melhorias urbanas às demandas de gênero, etnia, etc. Essas manifestações rejeitavam formas tradicionais de atuação política, criavam alternativas para as instituições autoritárias ao nível das relações pessoais e buscavam a autonomia da representação de interesses numa participação “de baixo para cima” (GONH, 2006, p.215; BOSCHI, 1987, p.17). Essas análises e estruturas temporais “superestimam os movimentos sociais contemporâneos, vistos como um corte radical com a esfera das instituições democráticas liberais. A ênfase na inovação e na descontinuidade, por sua vez, pressupõe um tal grau de autonomia dessas práticas coletivas que a mudança ocorreria sem reproduzir nenhumas das condições existentes” (BOSCHI, 1987, p.16). Ao estruturar um tempo histórico, essa construção conceitual e temporal delineou aspectos importantes da cultura democrática que se desenvolvia no Brasil, mostrando os caminhos que questionavam o 127 autoritarismo social. Contudo, ela fundou marcos mitológicos opondo o velho ao novo, desconsiderando as experiências sociais e políticas que informaram o longo processo de ampliação da participação do cidadão na conformação da sociedade brasileira do século XX (SADER, 1992, p.8). Novos movimentos sociais: a construção da esfera pública na redemocratização. Movimentos de favelas f) Comunidade: associativismo, protesto e controle negociado. Associativismo: comunidade ou arenas públicas Anticomunismo e democracia cristã Movimento comunitário no governo Lacerda e nos programas de desenvolvimento da comunidade Teologia da libertação, Cebs, e cultura popular nos anos 1970 Favela-Bairro e comunidade: reedição do controle negociado? Referências Bibliográficas DOIMO, Ana Maria. A vez e a voz popular: movimentos sociais e participação política no Brasil Pós-70. RJ: Relumé Dumara, 1995. SADER, Eder. Quando novos atores entram em cena: experiências, falas e lutas dos trabalhadores da Grande São Paulo. SP: Paz e Terra, 1988. BOSCHI, Renato Raul. A arte da associação: política de base e democracia no Brasil. RJ/SP: Vértice/IUPERJ, 1987. SINGER, Paul, BRANT, Vinícius C. (org.). São Paulo: o povo em movimento. Petrópolis: Vozes, 1980. 128 COUTINHO, Nelson Ferreira dos Santos. Movimentos Urbanos no Rio de Janeiro. RJ: Zahar, 1981. BOSCHI, Renato Raul. Movimentos coletivos no brasil Urbano. RJ: Zahar, 1982. CEFAI, Daniel, MOTTA, Fábio, BEROCAN, Felipe (org.). Arenas públicas: por uma etnografia da vida associativa. RJ: Ed.UFF, 2011. CARDOSO, Ruth. Movimentos Sociais na América Latina. Revista Brasileira de Ciências Sociais, v.1, n.3, p.27-37. DAGNINO, Evelina. Os Movimentos Sociais e a Emergência de uma Nova Noção de Cidadania. In: Evelina Dagnino. (Org.). Os Anos 90: Política e Sociedade no Brasil. S. Paulo: Brasiliense, 1994, v. , p. 103-115. WARREN-SCHARREN, Ilse. Das ações coletivas às redes de movimentos sociais. MACHADO DA SILVA, Luiz Antonio. Desdobramentos do campo temático dos movimentos sociais. Caderno CEAS, 1993, nº144, p.39-51. KOWARICK, Lúcio. Movimentos Urbanos no Brasil contemporâneo. Revista Brasileira de Ciências Sociais, V.1, n.3, p.38-48. PANDOLFI, Dulce, GRYNZPAN, Mário. Poder público e as favelas: uma relação delicada. IN: OLIVEIRA, Lúcia Lippi de (org.). Cidades: História e desafios. RJ: FGV, 2002.p.228-248. GOHN, Maria da Glória. Teoria dos Movimentos sociais. Petrópolis: Vozes, 2006. TILLY, Charles, TARROW, Sidney, MACADAM, Adam. Dynamics of contentious. New York: Cabridged University Press, 2001. 6.10 Atas de Reuniões e Seminários da Equipe Ata da Reunião do dia 17/11/11 FGV Participantes: Sonia Fleury, Carol, Sabrina, Markus, Gabriela A, Gabriela R, Claudia, Dulcinea, Julio e Charles Sonia ressaltou a importância da discussão entre as categorias “exclusão x marginalização” depois comentou brevemente sobre sua exposição na UBA 129 onde apresentou três modelos de políticas sociais em curso na América Latina (1°: Neo clientelismo – Políticas condicionadas e emergenciais ligadas ao Estado. 2°: A relação entre a democracia social e as condições do Wealfare State e explicou as diferença entre a formação deste na Ásia e na América Latina. 3°:Militarização da política social modelo no qual a política social começa a juntar-se ao poder coercitivo resultando em menos direitos e mais tutela Como será a construção desse novo poder democrático? Como se dará essa transição e qual (is) serão seus possíveis resultados? Alba: Empoderamento da sociedade local Saulo UFF: Através da gestão capacitada que vá além da segurança pública Fiell: Através de uma cidadania de exceção Tarefas: Marco Conceitual Agendar entrevistas Contextualização (Cláudia) Rede de Pol. Pub. Transcrições Atualizar mapas Jornais (Carol) Coisas a perseguir: Funk (parada funk x proibição), uso da quadra Tarefa fundamental: Concluir o Campo Hipótese provisória sobre os agentes do Estado que já estavam antes da UPP: A omissão talvez seja o mais relevante: não se expressam como lideranças e nem como formas de atuação do Estado antes da UPP. Na etnografia se constata a “invisi ilidade” do Estado mesmo que este estivesse anteriormente presente, os agentes comportam-se como “invisíveis”: É uma alienação na técnica? Entrevistar Médico 130 Diretora/Professora da Escola México Fábio do Sesi cidadania CRAS (as. Soc. Moradora) – Sabrina Zequinha – Sabrina Aline – (barraca) – Sabrina Entrevista a gestores Cnel. Andrada (UPP) Ricardo Henriques Entrevista a moradores Sheila Moana/Henrique (UPP local) Externos Sergio Bessa Edson Dorlene Louras da Franja Parar na escada as 18hs e fazer observação participante Para depois Rede de pol. Pub Textos de favela para fichar Terceira parte do Vigiar e Punir Reunião: Próxima quinta 6.11 Relatos e Transcrições de Entrevistas Reunião com a prof. Silvia Ramos (CESEC) – 26/09/2011 Júlio e Dulcinéa Presentes: Sonia, Dulciea, Júlio César, Caroline. Sobre as etnografias: 131 As 12 etnografias (trabalho etnográfico coordenado por Silvia Ramos) surgiram da necessidade de produzir algum conhecimento inicial sobre os diversos territórios ocupados pelas UPP , então foram pagos R$ 3 mil para cada pesquisador - A "ir pesquisa morar" em realizada pelo cada IETS favela em durante parceira com um a mês. FIRJAN (http://www.iets.org.br/article.php3?id_article=1554) produziu indicadores que para quem conhece a realidade de algumas favelas são estranhos, por exemplo, o Chapéu Mangueira ocupa um dos últimos lugares nos níveis de escolaridade. - O Instituto Pereira Passos (IPP) dispõe de uma base de dados sobre favelas (http://www.armazemdedados.rio.rj.gov.br/) construídos a partir dos dados do censo. Entretanto, não há como verificar todas as favelas, visto que apresentam os resultados por bairros, como no caso da região de botafogo. Situações observadas nas favelas com UPP: Há favelas que estão passando por um vazio de representação. Com a entrada das UPPs e UPPs Sociais, algumas Associações de Moradores perderam o poder/ação de representação dos moradores como ponte entre a comunidade e outras instâncias. Até mesmo a entrada de serviços públicos e privados teria contribuído para essa situação, dado que as demandas acabam sendo direcionadas a outras instâncias, seja de mercado, seja diretamente com o poder público. “ UPP desmo iliza ou não a ação coletiva na favela? Eu não sei dizer, o que o servo é que há uma mudança” Quais serão as novas ases para a associação de moradores neste contexto de crise financeira e de poder, notase uma fragilidade das associações para dialogar com o poder público. Sobre a concepção e implantação das UPP Sociais: 132 A concepção inicial da UPP Social pensada por Silvia era algo como as casas de justiça na Colômbia (exemplos de Medellín e Bogotá), buscando diminuir a distância entre as pessoas das comunidades e policiais, com policiamento ostensivo e o sistema jurídico. No entanto, quando ela cheguou à reunião para pensar a UPP social viu que cada um dos convidados tinha um projeto diferente. O Ricardo Paes de Barros fez um levantamento e concluiu que, naquele momento, havia 307 programas sociais sendo desenvolvidos nas favelas e que se sobrepunham, portanto não era uma questão de falta de projetos sociais e sim de gerenciamento e coordenação para que as iniciativas fossem mais eficazes. A UPP social surgiu com este objetivo de coordenar, articular, e produzir diagnósticos constantemente. Seu propósito se resumia emblematicamente nas palavras: diálogo e resultado. Alguém do território apresentaria as demandas (diálogo) e a Gestão encaminharia o melhor caminho para resolvê-las (resultado). Contudo, esta estratégias se justificava pragmaticamente como forma de viabilizar e tornar sustentável a própria UPP. Duas situações foram citadas: 1) quando os traficantes foram expulsos, a população que antes era assistida por eles começou a encaminhar suas demandas para os coronéis das UPPs, como recebimento de cestas básicas e outras questões; 2) a Light pediu à prefeitura para aumentar a cobertura do CAD único no Santa Marta para poder oferecer o benefício da tarifa social, reduzindo os custos de formalização do serviço para a comunidade. Em resumo, a política de UPP e UPP Social, principalmente, não foi possui um planejamento estratégico claro; as ações foram se consolidando na medida do andamento do processo de sua implantação. Não há nem clareza sobre o que se pretende alcançar com a UPP e UPP Social, nem expectativa de sua saída das áreas. Sobre a administração das UPPs: - A retirada da UPP SOCIAL da secretaria de desenvolvimento social ocorreu por acordos políticos que justificavam a transferência desta secretaria para o PT (que já comandava antes antes da entrada do Ricardo Henriques). Ao demitir o Ricardo Henriques, o governador teria proposto que ele levasse a 133 UPP Social para o IPP, coordenando as ações somente ao nível municipal; o que já ocorria na prática, pois a maior parte das articulações e ações ocorriam ao nível municipal. - A UPP social neste formato é muito econômica, o seu custo se concentra o pagamento dos profissionais que executam o trabalho de gestão e administração do programa “Eu fiz um levantamento dos gastos do município nas favelas que tem UPP posso mandar para vcs” - O PRONASCI não repassa nenhum recurso para a UPP; avaliação negativa do programa. Questões atuais levantadas sobre a política de UPP: - Há três observações que eu gostaria de compartilhar com vocês sobre esse tema: 1) O controle armado (do Estado ou do tráfico) parece que ainda permanecerá por muito tempo como uma das características marcantes das favelas. O que ocorrerá quando a UPP sair? No Santa Marta, por exemplo, existe uma avaliação de uma liderança que diz que o tráfico não voltaria porque a favela está "consolidada". Que tipo de capital social é necessário aos moradores das favelas para que possam ter acesso a esse círculos das políticas públicas, de segurança inclusive, para a comunidade se manter sustentável? A UPP social não é um programa social, é um programa para dar sustentabilidade à própria UPP “ UPP Social vai sair no dia que a UPP sair” 2) Em relação à juventude e as demandas por cursos de capacitação é necessário fazer algo mais que responder à demanda, é necessário estimular os jovens, ajudá-los a formular uma espécie de plano de carreira buscando ativar seus interesses, como um coaching. O prolema que tem sido observado é o de tratar a juventude como uma massa homogênea, cujos interesses identificados correspondem aos dos jovens, nem reconhece a diversidade de sujeitos. 134 3) A tensão ente polícia e juventude na favela é pessoal, é uma "guerra particular". O policiamento ostensivo é muito doloroso para a juventude, os jovens que antes eram revistados quando estavam pelos bairros agora são revistados ao voltarem para casa, é humilhante. E em relação à revista não há muito que fazer, que outro mecanismo controlaria a entrada de armas e drogas nas comunidades pacificadas? “outras soluções seriam muito complicadas” o … talvez o autocontrole organizado ou planejado pela comunidade possa dar esta resposta. Proposta: - Convite para compor um grupo de monitoramento da UPP Social Observações da Sonia Fleury 1 - Não se evidencia um planejamento nem na entrada das UPPs – vide etnografias – e nem sua articulação com UPP social. Também com outros programas, como o morar Carioca (continuação do Favela-Bairro em suas palavras), ou o PAC das Favelas. Ou seja, há favelas com PAC e UPP como o Cantagalo, com UPP sem PAC ou Morar Carioca, como o Santa Marta, com Morar Carioca, UPP e UPP social como o chapéu Mangueira. Qual é a lógica que preside a intervenção via uma ou outra política pública? A situação bélica e a necessidade de coerção? O mercado e os mega eventos? O acesso à comunidade e suas lideranças? São 3 linhas – políticas de segurança, políticas habitacionais e urbanas, política social, mas não se entende a lógica e as combinatórias. SUGESTÃO - entrevistar o Sergio Ruy, que foi meu aluno e é o secretário de Planejamento nestes dois governos. Depois entrevistar os secretários ou gestores de cada uma destas áreas ou dos programas no Estado e Município. 2- o que é a UPP social? o que pretende? Articular? Dialogar? Dar sustentabilidade à UPP (sua fala). Como? Através do aumento da presença 135 social do estado para reduzir a presença coercitiva? Não. São simultâneas, vão sair juntas. A sustentabilidade através do diálogo e resultados. Muito bem, o diálogo para gerar consensos e reduzir reações? A sustentabilidade para gerar uma sociabilidade que valorize a ordem e rechace a volta do tráfico? Quais ao os resultados? Não fica claro, já que o IPP não tem nem dinheiro nem poder de articular os outros agentes públicos no território. Seria um mero canal de encaminhamento das demandas? Que resultados pode gerar esta estratégia? Frustração? SUGESTÃO – algumas destas questões deverão ser discutidas com o Ricardo Henriques. 3- O grupo que pensou a UPP social prescindiu de pesquisadores e ativistas das favelas. A Silvia Ramos e o Jailton seriam as possíveis exceções. O grupo incluiu economistas como o Ricardo Paes e Barros, o pessoal da Casa das Garças, o IETS. Todos pertencentes a think tanks da elite econômica de centro à direita, porém muito preocupados com a deterioração da cidade. O livro em que Silvia e Ricardo publicam o que é a UPP social foi feito pela Casa das Garças (fica na Gávea), coordenado pelo maior expoente do pensamento conservador Giambianni. O texto sobre saúde é absolutamente contrário ao SUS, acho que é do Simon Shwartzman. Previdência Pública é vista como desequilíbrio fiscal, etc. A Seguridade social foi um erro, cheio de boas intenções, mas inviável. O livro se intitula Está na Hora da Virada, nome bem panfletário, que se associa a outros movimentos de intelectuais, ONGs e empresários, tipo o Rio que queremos. Uma clara mobilização das elites. SUGESTÃO: entrevistar o Jailson, que vem de outra tribo, para saber sua versão. 4- os jovens como o grande problema ou como analisador. Programa de estudos sobre a esfera pública – EBAPE/FGV 136 Projeto de Pesquisa “Cidadania e Discriminação como critérios de análise da política pú lica” Coordenação: Prof.ª Dr.ª Sônia Fleury Entrevista Título: 2013-01-30_Entrevista_Maria Lucia Pontes_Defensora Pública Descrição: Entrevista com Maria Lucia Pontes, Defensora Pública, Nucleo de Terras Observadores(s): Sonia e Sabrina Data e horário: 30/01/2013, 14:00 ás ... horas. Local: Defensoria Pública, Rua São José, 65. Centro . INTROITO TODO O 13º ANDAR DO Edifício Menezes Cortes é ocupado pela Defensoria Pública, com um elevador exclusivo para esse andar. O saguão de atendimento é enorme, com duas recepções especializadas por assunto, embora seja difícil encontrar a identificação dos assuntos. Nós mesmas ficamos na fila errada. Nesse enorme salão, além das recepções há espaços quadrados com cadeiras, em frente a cada ala de defensores, ou seja, especializados. O ar refrigerado é bom, as cadeiras também, a TV não tem som. Tem muita, muita gente mesmo. Depois da recepção as pessoas são chamadas pelo nome, sem qualquer recurso técnico nesse imenso salão. Mas, apesar disso, parece que tudo funciona. Minha impressão é que seria impossível atender a todo mundo em uma tarde, mas parece que conseguem. Ou seja, por dentro das alas há muita gente e muito trabalho também. 137 Sentamos-nos, e a Sabrina reclama da TV que não tem som. A senhora da fila lateral engrena no papo e diz que muito pior era quando, no prédio antigo, havia uma lanchonete no meio do salão de espera. Ou seja, mesmo que você não tivesse dinheiro tinha que “sa orear” o cheiro do ham urguês Pergunto a ela se ela utiliza muito a defensoria, ela parece saber tudo, até o nome do desembargador que demoliu o prédio antigo para construir o Fórum. Ou seja, é escolada. Ela diz que usa para tudo, imóvel, família, etc. Só reclama que misturam as pessoas, apesar da aparente especialização da disposição das cadeiras. Conta que reclamou uma vez de marginais e outra que estava ao seu lado disse que seu filho estava preso, mas não era marginal. Quando nos chama e a outro grupo, vejo que o Senhor cumprimenta funcionários, já dentro do corredor interno. Também era escolado. OBSERVAÇÃO - Me deu a maior vontade de fazer uma pesquisa naquele salão, centenas de pessoas disponíveis para passar o tempo, aguardando para exercer sua cidadania. Qual seu perfil? Como chegam lá? Qual sua motivação? Quais as expectativas, aprendizagens e resultados? PODE SER A PRÓXIMA SOBRE A EXEGIBILIDADE DOS DIREITOS. Também me sinto emocionada por ver tanta gente simples e arrumada em busca de seus direitos. Entramos na ala da Defensoria do Núcleo de Terras. Uma ante sala pequena de recepção e ali ficamos porque a Maria Lucia está atrasada (meia Hora) porque teve uma reunião na SPU (Secretaria de Patrimônio da União – quando o litígio envolve terras públicas ou imóveis da União). As recepcionistas e várias moças que passam por lá chegam e uma delas atende um telefonema e passa à outra dizendo que é mais uma pessoa da Providência, que ligam todo dia, que não veem em grupo. A outra atende com um pouco de má vontade, mas aos poucos começa a se envolver com a reclamação e marca para a senhora vir procurá-la diretamente na terça. Ou seja, há um canal direto com a comunidade, já estabelecido. 138 Enquanto esperamos entram grupos para a sala de reunião de grupos. As pessoas estão vestidas nos trinques! MARIA LÚCIA Chega apurada, não deu tempo de almoçar, mas é muito amigável conosco. Comentamos do seminário, ela fala que a estagiária dela esteve lá e gostou muito. Falo do vídeo e ela se interessa. Começou a trabalhar com N. Terras em 2007, antes estava no de Loteamentos, trabalhando também com grupos quilombolas. Menciona as pessoas com quem trabalhava – Daniel Sarmento e Miguel Baldes. Também uma instituição de uma religião - COINONIA - que apoiou muito esse trabalho, que era consequência da Constituição que assegurou o dieito dos quilombolas. Com os Jogos Panamericanos ela é deslocada, por solicitação do Miguel Baldes, de ser titulr de São Gonçalo, para vir se juntar ao grupo que inicia um trabalho sobre a questão urbana: Miguel Baldes, Leonardo Chaves pelo MP e Pe. Luiz Antonio. O N. de Terras trata da questão urbana – FAVELAS – inicialmente em Jacarepaguá, Recreio, Barra. Depois também Arroio Pavuna, Canal Anil, Vila Recreio. A dinâmica de trabalho se dá da seguinte forma. O contato era feito pela Pastoral de Favelas, com quem trabalham intimamente, através dos Conselhos Populares. A Defensoria ia à comunidade, atuavam in loco, ao invés do contrário, de vir a demanda até eles. Menciona Alexandre Mendes que se junta ao grupo e o Núcelo ganha corpo, desde 89. 2010 – até aí era principalmente trabalho com a região Oeste, mas com a chuva eles passaram a atuar também na Zona Sul. Babilônia, Prazeres, Providência, Pavão/Pavãozinho, Cantagalo, Alemão. 139 Depois passam a autuar onde entra o PAC. Comenta o paradoxo de que atuem justamente quando entra a política pública, quando deveria ser o contrário. Com o PAC aumenta a demanda porque os moradores ficam apavorados. Distingue a atuação do Estado, onde há mais diálogo, ainda que tenha problemas, como a do Município, onde não há diálogo. Exemplo Cantagalo com Estado e Pavão/Pavãozinho com o Município. Pergunto por que atribui essa importância às chuvas. Ela diz que a partir delas mudou a intervenção do município. Passa a impactar as comunidades Repete sempre: “Nunca imaginei que ia tra alhar na Providência” Município aproveitou a chuva, a comoção com os desabamentos no Bumba, etc, para colocar em ação o plano que já tinha antes, Menciona entrevista do Paes em 2009 na qual ee dizia que tínhamos que desmistificar as remoções. Trata-se de desconstruir o bloqueio que as remoções ganharam desde os 70, com a organização da comunidade, a própria Lei Orgânica no artigo 429 proíbe a remoção, salvo em áreas de risco. Então, com as chuvas, volta a questão do risco e o município soube aproveitar e usar o momento para por em ação, ardilosamente, seu plano, um projeto que não foi do momento, já estava sendo construído há tempos. As comunidades haviam conquistado a Lei Orgânica, a constituição e tinha a organização da FAFERJ. Mas depois disso, elas se desmobilizaram Estão muito desmobilizadas. Atribui isso ao fato de que achavam que nunca mais iam sofrer remoção. Município está fazendo a remoção branca, de uma forma tão sutil que é difícil denunciar, Como ser contrário às melhorias, ao PAC, ao Morar Carioca? Atribui a diferença de atuação do Estado e Município ao fato de que o Município é mais fechado ao diálogo porque é o responsável pelo projeto. Sobre Judicialização 140 Fala do caso da Babilônia, intervenção do Morar Carioca. A Associação é ligada ao Município. Grupo teme alguma intervenção judicial. Falamos do caso da Fernanda. Ela estava tratando da Babilônia como um todo, projeto de registro de posse com a associação. Oficia, não judicializa inicialmente. Pergunto se o canal da população é o Legislativo. Diz que o mais comum é a pastoral. Também a informação de uma comunidade para outra. Volta ao tema da acomodação da Zona Sul. Não se prepararam para remoções, não imaginavam. Sutileza desse projeto. Tentam sempre ações administrativas, junto à secretarias de Direitos Humanos do Estado , que vê como parceira. Tentam negociar uma saída. Toma o exemplo de sua forma de trabalho, como foi em Indiana, em frente ao Borel, no Rio Maracanã. Procuraram via Pastoral, Buscou informação e tentou uma reunião com a Secretaria de Habitação – Bittar – que havia ido lá oferecer Minha Casa Minha Vida. Município cadastra interessados e fala que estão em área de risco. Primeiro alguns, depois oferece a toso para saírem, não só os que estão na beira do rio. Ofício. Intervenção na área. Reunião com a Comunidade. Uma assembleia com muita tensão porque a comunidade estava muito dividida, Uns já tinham negociado, reclamam da Defensoria só chegar tarde. Ela diz que não sabia antes. Ofícios Reunião com secretário e subprefeito. Defende que não podem demolir casas geminadas, afetará a outra. Pararam um pouco, mas já tinha muita casa demolida. Voltaram a tentar demolir. Aí entrou com ação judicial contra demolição. Ganha liminar. Sobre efetividade da ação da Defensoria – Depende se a Comissão de Moradores é muito ativa como foi esse caso, mas também se a Prefeitura tem um projeto turístico. Não tinha para esse caso e tem para a Zona Sul. Aí fica muito mais difícil, como no caso da Providência. 141 Lá se mobilizaram junto com o Fórum do Porto. Entrou com uma cautelar para suspender a obra. Recurso do município derruba cautelar. Acordo no processo de voltar as obras mas sem remoção forçada. Eles não aproveitaram esse ponto do acordo. Fala que o Município foi esperto pois entrou com ação de desapropriação dos imóveis. Pergunto se têm propriedade e ela diz que não. Porpositura de ação principal – liminar, mas derrubam sob alegação que ele já está quase todo construído. Sobre a mobilização das comunidades da Zona sul. Ela sai dessa ação e só volta em 2012. Aí já tem o Morara Carioca e a atuação mais forte dos movimentos sociais, Sabrina comenta que falam muito dela na Providência. Ela responde que todo mundo fala dela na Providência, Arroio Pavuna e Vila autódromo, onde atua. Comenta que perderam o Conselho Popular da Pastoral, lamenta muito a perda desse espaço de articulação. Foi esvaziado por questões da Igreja e outras. Perderam esse lugar tão importante. Outros apoiadores: menciona o IPPUR, o comitê da Copa, o Forum do Porto. Fala no Arroio Pavuna em Jacarepaguá, na liderança de Dona Zélia. Desde 2006 resistem à remoção, vivem em área da União. Oficia ao SPU para regularizar. Mas depois faz um acordo porque estão muito próximos da via, negociam para alguns saírem Indenização para a remoção. Pergunto por titularidade. Ela diz que agora é evitar as remoções, ou ter uma indenização condizente. Depois seria a titularidade. Mas, o objetivo principal é o direito do morador a participar do projeto de cidade. Poder falar sobre o Morar carioca, a UPP. Comento que toda a sociedade está anestesiada. 142 Discussão da cidade, questão democrática: precisa chegar à população. Cita o Santa Marta, a liderança do Itamar, mas não vê resistência, nem mesmo reclamação formalizada, apesar das lideranças. A questão urbana fica uma discussão intelectualizada. IOnclui aí também os lídres das favelas. Volta a discussão com a Vila autódromo, que resiste desde a década de 1990, lá sim, a população está toda envolvida na discussão. Quando eles produzem contra laudos, se mobilizam é importante, porque Defensoria não tem como produzir outro estudo. Mas, crê que começam a surgir movimentos interessantes, Comenta de uma reunião na Prefeitura que queriam indenizar alguém na Zona sul por 30 mil, valor irrisório, não dá para comprar nada por ali. Pergunto sobre o papel do tráfico na desmobilização. Primeiro diz que não sabe, depois diz que no Alemão o PAC foi todo negociado com o tráfico. Isso também dificulta a mobilização e resistência da comunidade. Pergunto se usam também exigir Audiências Públicas; Diz que sim, cumprir o Estatuto das Cidades em obras grandes como o Porto. Fizeram uma , mas não nos moldes previstos. Tem diálogo com a SDH do Estado, Fernando, mas não com o Município. Sobre o Maurício, seu ex. Eles levaram para o Núcleo um grupo técnico, o Maurício, o Marcos a Fátima Tardim que atuaram na Vila autódromo e Providência. Encostas. Nos Prazeres não teve ação judicial, assembleia com a comunidade foi capaz de reverter remoção. Associação forte, concorda com a Sabrina. Outros Contatos internacionais? Fla que no caso da Vila autódromo foi fundamental o contato com o Comitê Olímpico e com a Anistia onde esteve em 2011. UM Habitat, tem 143 contato. Serve para denunciar. Menciona a importância da Raquel Ronick estar na O?NU e dar todo apoio. Cartilha que fizeram e o Núcleo distribuiu. Menciona o Favela não se cala do André. Telefone do Maurício – 99774916. Tem críticas fortes às lideranças comunitárias como o Itamar que não falam nada. Estava na mesa com ela e ela foi quem falou. Também ao Bitar, ou seja, gente que lutou do nosso lado e que agora estão no governo e acha que a indenização irrisória está ótima. Ela se diz ligada aos movimentos sociais, é uma ativista. Me leva ao seu chefe – FRANCISCO HORTA que lidou com a questão do PICO. Entrevista Francisco Horta com Sonia Fleury Diz que o problema do PICO é a falta de informação. Expediu um of´cio solicitando. Não responderam Pessoal não sabe o que vão fazer ali. É risco? É especulação. Ele é muito jovem, no início fico com a impressão que ele está culpando os moradores de não saberem qual sua demanda por falta de informação. É mais técnico e menos ativista que a Maria Lúcia. Não responderam – Secretaria de Obras e Habitação do Estado e Município – Eles não sabiam nem a quem se dirigir. Pergunto se não há uma pessoa da secretaria de obras lá. Ele diz que o POUSO não dá informação alguma, não cumpre o papel para o qual foi criado. Usa o termo pacificado e fala que nem sabe se é isso. Mas fala da ocupação urbanística de estrangeiros, na Rocinha, em especial no Labouriaux. Pergunto se lá não tem riscos, pois foi a mais afetada pelas chuvas. Fizeram obras, cercou tudo, está seguro, por isso e pela vista espetacular, proximidade 144 Gávea há a invasão de estrangeiros. Me mostra foto da vista que tirou no seu celular. É deslumbrante mesmo. Lado oposto à minha janela. Reitera ofício – Se não responderem fará uma busca e apreensão da informação nas secretarias. Depois pode pedir uma cautelar. Ele não é técnico, não sabe se tem risco. Acha que tem no PICO, pelo menos no final para algumas casas, uma pedra grande. Não sabe se podem fazer ou não obras. Fala que os moradores, esteve lá há um ano, estão muito ressentidos. Principalmente porque não sabem nada, não participam. A favela começou lá, diferentemente das demais que começam em baixo. Podem ser realocados no próprio Santa Marta. Conjunto Habitacional. O problema é que contam por casa e não por núcleo familiar para realocar. Mas também tem que conscientizar a população, é outra forma de moradia, formal, não dá para fazer um puxadinho. Comento que há projetos para novos conjuntos que já incluem a possibilidade do puxadinho. Se mostra surpreso. Ressentidos por não serem chamados para debater a solução. Digo que são muito chamados a participar mas é só debate, a decisão já foi tomada. Ele diz que nem debates são, meras apresentações nas que ele foi. Como instituição não tomo partido, não tenho partido, para ter mais liberdade. Mas, quando tiro o terno eu vejo que a Prefeitura exerce um poder verticalizado. As pessoas estão favoráveis. No G1 uma pessoa postou que nossas ações querem manter o país no Terceiro Mundo. As pessoas voltaram a ver o Estado como inimigo, como na ditadura, que eu não vivi. A diferença é só a tortura, não o autoritarismo. 145 Quando chego em uma repartição pública vou logo me identificando para ser bem tratado (Mencio Roberto Da Mata). O Estado destrata os beneficiários, trata-os como inimigos. Fala que a Prefeitura conseguiu isolar o Judiciário, com o clima de Olimpíadas, tudo tem que ser feito ás pressas. Judiciário já não tem ressonância. Tantos bilhões para esporte, a escola vai mal, o Lourenço Jorge caindo aos pedaços. Não sou contra esportes, não fui criado nessa cultura, mas jogo tênis todos os dias. Mas acha um desperdício. 6.12 Mapa de Atores Campo Chapéu-Mangueira/Babilônia Sociedade Civil Atores Comunidade Referência Descrição José Roberto (Zé) Chapéu Mangueira Lideranças Jovens Liderança Jovem. Um dos fundados do grupo de jovens Dá seu Papo André Chapéu Mangueira e Babilônia Lideranças Jovens Oposição à atual direção da Associação de Moradores da Babilônia. Um dos fundadores do Fórum Lúcio Bispo e do movimento Favela não se cala. Ele fala que “formou” os jovens Lula, Zé e Dudu. Valdinei (Dinei) Chapéu Mangueira Ex-presidente da Associação de Moradores do Chapéu Mangueira Ùltimo presidente da Associação de Moradores do Chapéu Mangueira. Se candidatou a vereador pelo PSOL, mas teve a candidatura impugnada pela ficha limpa (preso por tráfico). Tem um hostel. Percília Babilônia Presidente da Associação de Moradores da Babilônia/Creche comunitária Referência história. Proprietária da “Escolinha da Tia Percília”, primeira escola da Babilônia. Mãe do Palô. Paulo (Palô) Babilônia Vice-presidente da Associação de Moradores da Babilônia Filho de Percília. Possui um hostel na Babilônia Afonso Chapéu Mangueira Diretor das relações comunitárias/Chapéu Mangueira Atualmente mora no ES pois passou num concurso para serviço social. É cofundador do Fórum Lúcio Bispo e apoia o Favela não se Cala. Primo de André. Os jovens Zé e Lula nutrem respeito por ele devido sua participação na comunidade. Gibeon Chapéu Mangueira Morador/Referência histórica/ Expresidente da associação de Já foi presidente da Associação do Chapéu Mangueira. Nascido na Paraíba, chegou com 4 meses no 146 moradores do Chapéu Mangueira Chapéu e detem certo grau de legitimidade entre os moradores e jovens líderes devido sua história comunitária. Participou da fundação do PT no Rio de Janeiro. Dudu (Eduardo) Babilônia Lideranças Jovens e produtor cultural do projeto Redes da Juventude/Babilônia Parceiro do Zé e do Lula em seus projetos. Além do mais, é co-fundador do Dá seu papo. Trabalha com produção cultural e audiovisual. Claudio Babilônia Morador/ Professor/Expresidente da associação de moradores do Chapéu Mangueira Cláudio é professor de Filosofia e Sociologia, e uma pessoa atuante nos assuntos da comunidade. Moradora/Projeto Favela Orgânica (A completar) Regina Coeli Augostinha Chapéu Mangueira Moradora/Galpão das Artes Nasceu em João Pessoa e veio para o Rio com pouco menos de 18 anos, onde passou a viver no Chapéu. Começou a trabalhar com Celeida Tostes como artesã e hoje é uma das pessoas que guardam o Galpão de Artes da comunidade. Fernanda e Cristiano Babilônia Moradores/caso emblemático da remoção Fernanda e Cristiano descobriram que iam ser removidos mas com o apoio de André e alguns líderes e da Flora e Natália, conseguiram ter um diálogo dentro da secretaria de direitos humanos, e, por enquanto, têm conseguido se manter na casa. No início, foram mal-vistos por resistir à política da prefeitura, mas atualmente são vistos como exemplos. David Chapéu Mangueira Empreendedor local/Bar do David David é um entre os mais de 10 filhos de Seu Lucio. Teve vontade de ser seu próprio patrão e abriu um bar, sem esperar a projeção que iria ganhar. Hoje, é considerado um empreendedor de sucesso e espera expandir seu bar para atender melhor os clientes, especialmente turistas. Mary Lane Babilônia Cozinheira da creche Babylonia/ Babilônia Nascida em Minas, sempre teve vontade de conhecer o Rio, o que fêz assim que conseguiu um emprego na cidade. É bastante envolvida nas atividades da Igreja Batista. Abílio Externo (Botafogo) Organização de moradores da Lauro Muller (A completar) João Guerra Externo Ator histórico É um dentista que atuou durante muitos anos na comunidade, foi um dos fundadores do Grupo da Saúde e esteve diretamente ligado a organização da Associação de Moradores do Chapéu Mangueira. Conviveu 147 diretamente com Lúcio Bispo. Isaías Bruno Ferreira (A completar) Ex- presidente da Associação de Moradores da Babilônia Foi o segundo presidente da Associação de Moradores da Babilônia, após Seu Sebastião e anterior à Dona Percília Guanair Babilônia Morador antigo Morador antigo da Babilônia. Altair Babilônia Morador antigo Morador antigo da Babilônia. Letícia Babilônia Moradora da Babilônia que entrou na justiça contra prefeitura. Machucou o pé em obra do Morar Carioca e entrou na justiça contra a Prefeitura com uma ação civil pública e já coletou mais de 300 assinaturas da população. É jovem e estuda Direito. Florisvaldo Babilônia (A completar) Morador antigo Arlete Chapéu Mangueira Moradora sempre presente nas reuniões Moradora muito atuante em todas reuniões, seja de associação seja as convocadas pelo governo. Se destaca pela atitude “pé na porta”. É membro da comissão de obras do Morar Carioca Luiz Alberto Chapéu Mangueira Moradora sempre presente nas reuniões /Junta governativa e comissão eleitoral È organizador do último terreiro de umbanda do Chapéu Mangueira/Babilônia. Sempre participa das reuniões da associação e atualmente faz parte da junta governativa e comissão eleitoral. Álvaro Maciel Junior Babilônia Liderança jovem/Coordenador do Ponto de Cultura e participante do Número ICA Jovem, assume postura voltada a elaboração e excecução de projetos na comunidade. É Jornista pela Facha, coordena o Ponto de Cultura Ary Barroso e coordena a ONG Núcleo de Informação, Conhecimento e Atitude (ICA). Álvaro Maciel Babilônia Tem a função de secretário de cultura da Associação de Moradores da Babilônia (A completar) Conceição Ferreira da Silva liderança histórica no ChapéuMangueira É uma das rezadeiras do morro e é irmã de Dona Marcela Regina Maria Riboredo liderança histórica no ChapéuMangueira Ex-presidente da associação de moradores do Chapéu-Mangueira. Já trabalhou na chapa do Seu Lúcio. Maria da Conceição Mendes Alves (A completar) Artesã moradora há 30 anos (Artesanato) Flávia Eloá (A completar) Teatro (A completar) Robson Rocha (A completar) projetos culturais (A completar) Mestre Marror (A completar) Capoeira (A completar) 148 Raquel (A completar) (A completar) Dissertação Celeida Tostes Mariana Cavalcanti Externo Pesquisadora CPDOC/FGV Desenvolveu trabalhos acadêmicos no Chapéu Mangueira/Babilônia Sebastian Leme Presidente do SOS Leme (A completar) Cláudia Chapéu Mangueira Coordenadora da Faetec e moradora do Chapéu Mangueira (A completar) Damiana Chapéu Mangueira Trabalha no Sesi cidadania (A completar) Estado Nome Referência Descrição Benedita da Silva Deputada federal/Nascida no Rio e ex-moradora do Chapéu Mangueira Flora e Natália Estado/Secretaria de Assistência Social/ Programa Territórios da Paz/Gestora social Felipe Estado/ Secretaria de Segurança Pública/UPP/ Comandante local Flora Moana Estado/Secretaria de Segurança Pública/UPP Social/Gestora Local Daniel Misse Estado/Secretaria de Assistência Social/ Programa Territórios da Paz/Gestor Estadual Superintendência de Territórios Jorge Bittar / Ana Reis Prefeitura/Secretaria de Urbanização/Gestor Municipal (Morar Carioca) (A completar) Ana Reis Assistente Social do Morar Carioca (A completar) Andréia Sepúlveda Secretaria de Assistência Social e Direitos Humanos (A completar) Eduarda La Rocque Nova diretora da upp social (A completar) Fábio upp social (A completar) Ricardo Henrique Ex-presidente do Instituto Pereira Passos e ex-diretor (A completar) Participam dos encontros da Memória e do Dá seu Papo. Pretendem organizar uma comemoração de 100 anos das favelas no Chapéu Mangueira/Babilônia. Elas têm o reconhecimento de lideranças jovens, como André, Lula, Zé e Dudu. 149 da UPP social Maria Lúcia Núcleo de Regularização de Territórios/Defensoria Pública (A completar) Raimundo Educação (gestor representante do município) (A completar) Rodrigo Subprefeitura Leme/Copacabana (A completar) Eduardo professor do projeto Bairro Educador (funcionário do Estado) (A completar) Bárbara diretora da escola São Tomás de Aquino (A completar) Roberta coordenadora do projeto Ponte para o Futuro no Chapéu-Mangueira e Babilônia na escola São Tomás de Aquino (A completar) Aritéia Educação (funcionário do Estado) (A completar) Cláudia Chapéu Mangueira Coordenadora da Faetec e moradora do Chapéu Mangueira Damiana Chapéu Mangueira Trabalha no Sesi cidadania Vânia PSF Babilônia/Chapéu Coordenadora do PSF Empreendedores Nome Empreendimento Descrição do empreendedor Marina Grossi Presidente do CEBDS (Conselho Empresarial para o Desenvolvimento Sustentável) (A completar). Programa de rádio MPB FM. 90,3 Ricky Lisentonga Hostel Ricky é um americano que ainda não fala bem português. Formado em relações internacionais, trabalha como recepcionista. Ana Chill Hostel Nascida em Portugal, trabalha desde o início do ano, atuando como recepcionista. 150 David Empreendedor local/Bar do David David é um entre os mais de 10 filhos de Seu Lucio. Teve vontade de ser seu próprio patrão e abriu um bar, sem esperar a projeção que iria ganhar. Hoje, é considerado um empreendedor de sucesso e espera expandir seu bar para atender melhor os clientes, especialmente turistas. George ICQS (Babilônia) (A completar) Luciana Axia (Babilônia) (A completar) Campo Providência Ator Descrição Contato Situação de Entrevista Ligia Moradora da Vila Portuária, amiga da Neti 2213-3882/ 6806-4697 (claro) Entrevista realizada 29/09/2012 Neti Moradora e parente de um dos meninos mortos no Morro da Mineira, e também sogra do organizador do pagode que acontecia na comunidade Entrevista realizada 29/09/2012 Fátima Moradora removida do AP, atualmente reside na comunidade complementando o aluguel social que recebe da Prefeitura. Via facebook/ blackmambarj @gmail.com Entrevista realizada 02/02/2013 Alexandr Moradora jovem da Providência, no local desde 2008. a Participou da visita guiada realizada pelo Colóquio Internacional da ESS\UFRJ. alexandrafausti [email protected] m Não retornou o contato feito por email solicitando entrevista. Roteiro já foi elaborado. Vanda Silva - - Saiu da sua casa e alega que foi retirada porque disseram que ela e outros moradores deveriam sair de lá, em contrapartida eles dariam um apartamento para os moradores. Aparece no vídeo da Globo.com mostrando que ainda está na comunidade vivendo de forma muito precária, em meio aos destroços e casas demolidas. Comissão de Moradores Roberto Marinho Integrante da Comissão de Moradores, faz parte da Família 8193-9584 Leite, ameaçada de remoção por estar no caminho do plano inclinado, responsável pelo perfil do facebook “Ideais Entrevista realizada em 04/10/2012 151 de Uma Luta Morro da Providência” - Desde a intervenção da polícia no mês de março, o contato está difícil, sendo realizado através do Fórum do Porto. Benésio Integrante da Comissão de Moradores, integrante da (tio do Família Leite. A Família Leite está no caminho do plano Roberto) inclinado, com sua casa de 3 pavimentos, ameaçada de remoção, onde moram 4 gerações da família. Representada pela figura do Bené, tio do Roberto Marinho. A casa não foi medida, pois eles não permitiram. Desde a intervenção da polícia no mês de março, o contato está difícil, sendo realizado através do Fórum do Porto. Márcia Integrante da Comissão de Moradores. Moradora 2516-3899/ Regina ameaçada de remoção por estar no caminho do teleférico. 7227-6737 de Deus Resiste num imóvel que moravam 9 famílias, saíram 5 para o aluguel social e restaram apenas 4 na resistência. A Prefeitura alega ter interesse em construir um prédio no local, mas não garante a permanência de Márcia no novo prédio. Derrubaram a casa e o bar que ficava ao lado e agora Márcia convive com ratos e baratas. “A prefeitura me colocou em situação de risco”. Nos guiou na visita realizada pelo Colóquio Internacional da ESS\UFRJ Entrevista marcada em 14/03/2013. Não concedeu a entrevista por motivos pessoais. Desde a intervenção da polícia no mês de março, o contato está difícil, sendo realizado através do Fórum do Porto. Alessan Integrante da Comissão de Moradores, esposa de Roberto dra Marinho (esposa de Roberto) Em março, foi feito contato para neuzimaraguia entrevista, mas não pode ser [email protected] realizada pois está com problemas m pessoais. Desde a intervenção da polícia no mês de março, o contato está difícil, sendo realizado através do Fórum do Porto. Neuzima Integrante da Comissão de Moradores. Tem cerca de 55 r Aguiar anos e estava afastada da comissão por ser candidata a vereadora do PRB, partido do Crivella, teve apenas 239 votos. Divorciada, tem o segundo grau incompleto. Segundo seu perfil no facebook (www.facebook.com/neuzimar.aguiar) terminou o ensino médio em 2011, no Colégio Pedro II, já foi vendedora, cabeleireira, maquiladora e depiladora. 8151-2526; 9208-6600; Sidney Ferreira 2233-9782 / 8028-4072 Zeneide Morador do Setenta, Sidney Ferreira denunciou que funcionários da prefeitura constantemente tentam subornar os moradores da Comissão de resistência à remoção. Um desses aliciadores, segundo Sidney, é um morador, recrutado pela prefeitura para minar a resistência à remoção Moradora da Pedra Lisa. Segundo Bené ela é a maior liderança local na resistência às remoções ney.ferreira74 @hotmail.com Contatado para realização da entrevista entre 01-04 e 06-04 Entrevistada 04/03/2013 152 Maria Antônia Moradora da Pedra Lisa, faz parte da Comissão de Moradores. Entrevistada em 04/03/2013 Nélio de Participou da elaboração de texto histórico do Morro da 2213-3200 / Oliveira Providência, publicado no mapa cultural da localidade 8505-9420 desenvolvido por jovens moradores.É uma referência na comunidade por sua atuação em defesa dos direitos da comunidade e pela coordenação do projeto Escola de Percussão da Providência.Em entrevista, em novembro de 2011, relatou o esvaziamento do projeto por conta já do processo remocional. - Associação de Moradores Vera Lúcia Melo Em junho de 2008, com a paralisação do programa Cimento Social, a presidente da Associação de Moradores do Morro da Providência foi a Brasília pedir ao ministro das Cidades, Márcio Fortes, a liberação dos recursos para pagar os operários e fazer um apelo pela continuidade da obra sem a presença do Exército (http://www.estadao.com.br/noticias/cidades,mutirao- - acaba-com-disputa-entre-prefeitura-e-estado-emobras,196423,0.htm). A então presidente da Associação de Moradores se negou a participar da solenidade de inauguração da UPP (Jornal Fazendo Media, 30/04/2010 Manuel Gama As moradoras Neti, Ligia e Vera (do armazém) citaram o nome dele como alguém influente na Associação. Nenhuma delas conseguiu precisar se ele está atualmente atuando na instituição. Em novembro de 2010 era o presidente da Associação de Moradores do Morro da Providência e em abril de 2011 ainda era. - - Marlene Aparece no site da UPP Social como vice-presidente da Associação 7511-3706 Entrevistada em 25/01/2013 Empreendedores/projetos Carlinho Dono do bar localizado próximo ao Largo do Cruzeiro, na s 70 descida para o Santo Cristo. Fora do circuito de remoções, apesar da casa em frente ao seu bar e várias ao redor estarem marcadas Entrevista marcada para 28/02/2013. Não concedeu a entrevista por não se sentir seguro. Dona Jura Entrevistada em 26/01/2013 Montou um restaurante na laje da sua casa e conquistou o 2253-5486/ premio de melhor prato no concurso de Gastronomia 9683-3171 realizado em 2012. Fora do circuito de remoções apesar de estar muito próxima do local onde já foram e ainda serão removidos moradores para a abertura de uma rua. 153 Vera Lúcia Dona do armazém localizado no largo da Igreja N. S. da Penha. Tem 43 ou 44 anos e herdou o estabelecimento da sua mãe. Fora do circuito de remoções Erón César Santos Nascido e criado no morro, é considerado um profundo 2516-0239 ou Entrevistado em 02-02-2013 conhecedor da história da Providência. Professor de 8862-6352 Ciências, formado em Biologia pela UFRJ,tem 45 anos, é capoeirista e zelador da Igreja de N. S. da Penha. Filho dos antigos zeladores da Igreja. Segundo Vera do armazém, seus pais eram católicos de fato, o Eron não. Tem um grupo de capoeira que treina toda quinta-feira às 19h num espaço anexo à Igreja. Ainda segundo Vera, Eron aluga o espaço para festas e eventos e já foi denunciado ao padre por utilização inadequada do espaço Janice Moradora, tem 28 anos, é uma das sócias no Bar Favela Point. 9335-5945 Entrevistada em 05/03/2013 Lidiane Sena Mendes Moradora de 20 anos e é sócia do Bar Favela Point, no final da escadaria 9175-0547 Entrevista marcada em 19/03/2013, mas não ocorreu devido a intervenções policiais na comunidade. O roteiro está pronto. Há tentativas de agendamento para a entrevista entre 01 e 15-04 9287-5041 Entrevistado em 26/03/2013. Maurício Morador nascido na comunidade e fotógrafo da Casa Hora Amarela – Ladeira do Barroso, 226 - Largo da Igreja, ao lado de um destacamento da UPP, onde fora o GPAE. Atua ao lado dos moradores que resistem. Promove eventos e participa de vídeos e reportagens sobre as remoções da Providência. Defende a ideia de que o maior legado da favela são as pessoas e não a vista. - Entrevistada em 25/02/2013 Luiz Torres Morador, coordenador da Casa Amarela e diretor de escola 9937-0913 na Providência. Entrevista agendada em 06/02/2013 Rosieti Coordenadora da Casa Amarela. 7113-7273 - Damião Mobilizou para o reconhecimento da Providência e da região do Porto como área quilombola. 9937-0913 - Sparta Clube de futebol que realiza atividades culturais na Providência 3087-9773 Contato para agendamento de entrevista entre 01 e 06/04 Instituto Central Oferece projetos culturais e está ligado a associação de 3907-4141 Contato para agendamento de 154 do Povo moradores - ICP 2516-9208 entrevista entre 01 e 14/04 Gestores Jocelene Coordenadora do Território da Paz Ignácio joceleneignaci Entrevistada em o.socialrj@gm 25/01/2013 ail.com Jorge Bittar Secretário Municipal de Habitação - - Marcelo Crivella Senador, implementou o Cimento Social - - Atores externos Orlando Santos Professor e pesquisador do IPPUR/UFRJ, pesquisador de megaeventos e relator da plataforma DHESCA, de direitos humanos 8111 4363 Isabel Assistente Social, professora da Faculdade de Serviço 8869-1601 Cardoso Social da UERJ, membro da Comissão de Direito à Cidade do CRESS-RJ Entrevistado em 24/08/2012 - [email protected] Já foi contactado para ser om.br Carlos Vainer Professor e pesquisador do IPPUR/UFRJ. Carlos Machad o Ex-presidente da Associação de Moradores da Saúde e presidente da Associação Recreativa Afoxé Filhos de Gandhi. Fez o guiamento do entorno realizado pelo Colóquio Internacional da ESS\UFRJ. 2253-4157 (ligar antes das 10h ou depois das 20h) 69586115 (TIM) Maria Lúcia Defensora Pública maludefensori Entrevista [email protected]/ realizada em 30- entrevistado, entretanto, se esquivou oferecendo aproximação com seu grupo de pesquisa. 7177-5576, 7923-0102 / trabalho: 2868 2100 (Ramal 253) Eliomar Vereador pelo PSOL. Procurado pela Comissão de Moradores para auxiliar na luta contra as remoções. Assessora – Andrea Cassa 01-2013 Roteiro já elaborado. 155 Coelho Segundo Roberto Marinho, foi o único parlamentar a recebê-los 7842-4185 (Contato Ulysses Silva) Raquel Rolnik Relatora especial da ONU para o direito à moradia adequada - - Mulhere Ong que oferecia educação a jovens egressos do tráfico s da Paz - Morro da Providên cia - - Vila Educação, esporte. Olímpica da Gamboa - - Centro Orgão Municipal, assistência social. de Referênc ia de Assistên cia Social (CRAS) 8410-6670 2213-2531 - 6.13 Organização do discurso dos Atores 6.14 Anexos Anexo 1 INICIATIVAS DE ORGANIZAÇÃO DA SOCIEDADE CIVIVL. Todos os textos foram acessados em julho de 2011. Grifos meus. 1) Movimento Popular de Favelas: organizado em 2000, reuniu por mais de 2 anos cerca de 60 lideranças de favelas – dirigentes de associações de moradores e outras organizações comunitárias - , além de ONGs e representantes de diversas instituições, para reivindicar cidadania plena para 156 a população residente nesses territórios. Referencia: Machado da Silva, Luiz Antônio & Leite, Márcia Pereira. Favelas e democracia: temas e problemas da ação coletiva nas favelas cariocas. In: Rio A democracia vista de baixo, s/d, p.61-78. 2) REDES – Redes de Desenvolvimento da Maré: <http://www.redesdamare.org.br> “Quem Somos: A Redes de Desenvolvimento da Maré (Redes) é uma organização da sociedade civil [formato] que se dedica a promover a construção de uma rede de desenvolvimento sustentável, voltada para a transformação estrutural do conjunto de favelas da Maré [propósito]. A Redes busca produzir conhecimento referente aos espaços populares e realizar ações com o intuito de interferir na lógica de organização da cidade e contribuir para a superação das desigualdades [objetivo]. A Redes tem sua origem em um longo processo de lutas, ações e pesquisas desenvolvidas nas comunidades da Maré por um grupo de pessoas que, historicamente, atuam em organizações comunitárias e em outros espaços de mobilização [histórico]. A trajetória desse coletivo é caracterizada por sua inserção nos diferentes campos das políticas sociais e isso foi determinante na constituição da instituição. A Redes foi fundada e é composta até os dias atuais por profissionais engajados nas lutas sociais e oriundos de espaços populares [atores]. O surgimento da Redes está ligado à constatação da necessidade de se criar uma alternativa que alie mobilização à elaboração de propostas para modificar a condição de vida nas comunidades da Maré [objetivo]. É em torno desta premissa que a Redes se organiza, fortalecendo o potencial profissional e intelectual existente na comunidade, a fim de elaborar um projeto integrado e duradouro de desenvolvimento. No entanto, um processo de mudança global não pode se concretizar por meio de ações isoladas. É por isso que a Redes busca agregar experiências, mobilizar outras organizações, movimentos e instâncias do poder público [ações]. Pensar em rede é pensar os diversos atores que 157 atuam na Maré, moradores, outras instituições e poder público, integrados em prol de um projeto para a comunidade. Foi a partir da realidade da Maré e tendo como horizonte a transformação deste cenário que a Redes identificou cinco eixos de atuação: Desenvolvimento local Educação Comunicação Segurança Pública Arte e Cultura Estes são os cinco temas em torno dos quais se articulam os projetos da Redes. Eles foram pensados a partir das demandas da Maré, território de atuação da instituição. Esta escolha por uma atuação local não foi feita ao acaso. A opção pelo território da Maré deve-se não só a sua visibilidade, mas também a sua relevância estratégica e simbólica no contexto da cidade. Trata-se de uma das maiores comunidades do Rio de Janeiro, que agrega variadas possibilidades de experiências de mudança. Uma transformação na Maré pode ser, portanto, uma experiência exemplar para se pensar as favelas cariocas e de outras cidades brasileiras. É nessa perspectiva, que por meio de projetos e programas, a Redes de Desenvolvimento da Maré persegue os seguintes objetivos: Fomentar a mobilização comunitária a partir da construção de uma rede de articulação social; Desenvolver projetos na área de educação, arte e cultura que promovam a autonomia dos atores sociais; Enfrentar as diferentes formas de violência que atingem a população, em particular a dos espaços populares; Produzir e difundir conhecimentos sobre os espaços populares que contribuam para a superação dos discursos e práticas que reforçam visões preconceituosas e estereótipos sobre esses espaços. 3) Agência Nacional das Favelas (ANF): <http://www.anf.org.br/> 158 “ NF ( GÊNCI DE NOTÍCI S D S F VEL S) foi lançada pela ONG Casa da Cidadania, para atender a demanda da imprensa e da sociedade que precisavam obter informações acerca do que acontecia nas favelas e comunidades carentes do Rio de Janeiro. Lançada em janeiro de 2001 como um projeto, foi logo reconhecida pela REUTERS como a primeira agência de notícias de favelas do mundo! Posteriormente, a ANF (AGÊNCIA DE NOTÍCIAS DAS FAVELAS) deixou de ser um mero projeto e foi instituida como uma ONG para dar continuidade a um sonho coletivo. Nosso objetivo é democratizar a informação de modo geral, não apenas veiculando notícias das favelas para o mundo, mas também estimular a integração e a troca de informações entre as favelas com a finalidade de melhorar a qualidade de vida [objetivo], acreditando que UM MUNDO ELHOR É POSSÍVEL!” “Unir e resistir para crescer e prosperar Levando em conta que (1) a luta autêntica é a luta de classes, travada entre a elite e as classes populares e que, justamente por este motivo, (2) convém à elite estimular a multiplicação de grupos que lutam desarticuladamente por direitos de minorias, muitas das quais comprometidas apenas com pequenas liberdades de comportamento ou consumo, faz-se necessário somar a luta pelos direitos dos moradores de comunidades carentes a uma luta revolucionária de caráter mais amplo [visão]. Não há dúvidas de que as antigas máximas latinas divide ut regnes ou divide et impera, isto é, dividir e conquistar, estão na base mesma desta estratégia de enfraquecimento do poder popular colocada em prática pelas classes dominantes. Afinal, evitar a mobilização e a união das massas por meio da sua divisão em inúmeros grupos desarticulados, independentes e, em muitos casos, antagônicos no jogo social, sempre foi um recurso largamente utilizado ao longo da história [visão]. Deste modo, ainda que nosso foco seja as favelas e comunidades carentes da América Latina, nossa política editorial é bastante ampla, pois entendemos que a luta das favelas e das comunidades carentes não pode ser desvinculada da luta global contra o capitalismo. Deste 159 modo, em nossa organização, o termo favela adquire conotações bem mais amplas do que uma mera designação pejorativa para comunidades carentes, passando a representar todo aquele que não possui os direitos básicos da cidadania ou mesmo os que se identificam e apóiam a luta internacional dos povos pelos direitos e pela cidadania [visão]. Sendo assim, o principal objetivo da Agência de Notícias das Favelas (ANF) é democratizar a informação de modo geral, não apenas veiculando notícias das favelas para o mundo, mas sobretudo estimulando a integração e a troca de informações entre as favelas, sempre com a finalidade de melhorar, por meio da formação de uma ampla frente popular, a qualidade de vida do povo, pois acreditamos que um mundo melhor é possível ” 4) AfroReggae: <http://www.afroreggae.org/> “Quem somos: Fundado em 21 de janeiro de 1993, o Grupo Cultural AfroReggae foi criado para transformar a realidade de jovens moradores de favelas utilizando a educação, a arte e a cultura como instrumentos de inserção social [objetivo]. O embrião do projeto foi o jornal AfroReggae Notícias, cuja primeira edição circulou em agosto de 1992. O informativo – distribuído gratuitamente e sem anunciantes – logo se tornou um canal aberto para o debate de ideias e de problemas que afetam a vida de negros e pobres. Em 29 de agosto daquele mesmo ano ocorreu a Chacina de Vigário Geral, na qual 21 moradores inocentes foram assassinados. Um mês depois, os produtores do AfroReggae Notícias chegaram à favela de Vigário Geral oferecendo oficinas de percussão, capoeira, reciclagem de lixo e dança afro para os moradores dali [histórico]. Desde então, o Grupo Cultural AfroReggae investe no potencial de jovens favelados, levando educação, cultura e arte a territórios marcados pela violência policial e pelo narcotráfico [visão]. Ao longo de seus 18 anos (completados no dia 21 de janeiro de 2011), o AfroReggae vem utilizando atividades artísticas, como percussão, circo, grafite, teatro e dança para tentar diminuir os abismos que separam negros e brancos, ricos e pobres, a favela e o asfalto, a fim de criar pontes de união entre os diferentes segmentos da sociedade [atividades, visão]. 160 Hoje o AfroReggae conta com mais de 50 projetos que levam arte, cultura, esporte e educação não apenas às favelas cariocas, mas realizando outras iniciativas de inclusão, elevação da auto-estima, reinserção no mercado de trabalho (moradores de comunidades e também ex-detentos e/ou pessoas que passaram pela criminalidade e ganham uma oportunidade de trabalhar e mudar de vida) e promoção de cidadania [visão] Veja mais neste site ” “MISSÃO Promover a inclusão e a justiça social, utilizando a arte, a cultura afrobrasileira e a educação como ferramentas para a criação de pontes que unam as diferenças e sirvam como alicerces para a sustentabilidade e o exercício da cidadania [objetivos]. VISÃO O Grupo Cultural AfroReggae é uma organização que luta pela transformação social e, através da cultura e da arte, desperta potencialidades artísticas que elevam a auto-estima de jovens das camadas populares ” 5) Observatório de favelas: <http://www.observatoriodefavelas.org.br/observatoriodefavelas/quem_somos/e quipe.php> “Sobre o Observatório. O Observatório de Favelas é uma organização social de pesquisa, consultoria e ação pública dedicada à produção do conhecimento e de proposições políticas sobre as favelas e fenômenos urbanos [propósito]. O Observatório busca afirmar uma agenda de Direitos à Cidade, fundamentada na ressignificação das favelas, também no âmbito das políticas públicas. Criado em 2001, o Observatório de Favelas é desde 2003 uma organização da sociedade civil de interesse público (OSCIP). O Observatório tem sede na Maré, no Rio de Janeiro, mas sua atuação é nacional. Foi fundado e é composto por pesquisadores e profissionais oriundos de espaços populares [histórico, atores]. O Observatório tem como missão a elaboração de conceitos, projetos, programas e práticas que contribuam na formulação e avaliação de políticas públicas voltadas para a superação das desigualdades sociais. 161 Para serem efetivas, tais políticas têm de se pautar pela expansão dos direitos, por uma cidadania plena e pela garantia dos direitos humanos nos espaços populares. O Observatório tem três vertentes institucionais, ou seja, atua em três áreas distintas: 3. Comunicação e Cultura 4. Desenvolvimento Territorial 5. Direitos Humanos Os Projetos e Ações do Observatório são divididos pelas vertentes. Nesses projetos, o Observatório de Favelas persegue os seguintes objetivos: Formar uma ampla rede sociopedagógica para influenciar nas políticas públicas, torná-las efetivas, criar práticas horizontais de intervenção social nos espaços populares Avaliar políticas públicas destinadas aos espaços populares, a partir da produção de instrumentos conceituais e metodológicos plurais Elaborar conceitos e informações que rivalizem com as visões criminalizantes e homogeneizantes sobre os espaços populares Formular e implantar práticas exemplares em educação, geração de trabalho e renda, moradia e regularização fundiária urbana, cultura, comunicação e segurança cidadã Constituir referências inovadoras de produção do conhecimento, na nossa rede social e política, para viabilizar propostas de Direito à Cidade [ações] Para produções do Observatório e sobre o Observatório, vá a Acervo ” 6) Viva Favela: <http://www.vivafavela.com.br/> “Criado em julho de 2001 pelo Viva Rio o projeto Viva Favela tem como metas a inclusão digital, a democratização da informação e a redução da desigualdade social. Como uma ponte virtual entre o "asfalto" e a favela, conta com uma equipe de jornalistas e correspondentes comunitários [atores, visão, objetivos]. 162 Os correspondentes são moradores de favelas que atuam como repórteres, fotógrafos e produtores de conteúdo multimídia. O trabalho é feito em parceria, e o resultado mostra que há muito mais para se contar sobre as favelas do que histórias de violência e narcotráfico [visão, atores]. Com um olhar "de dentro", o site mostra a cultura, a criatividade das estratégias para vencer os desafios diários, o potencial para propor e operar mudanças sociais positivas. A violência também aparece, mas pela perspectiva do morador, que raramente é ouvido pela mídia tradicional [ações, visão]. Ao estimular que moradores de favelas e periferias se tornem comunicadores e produzam conteúdo retratando essas regiões de forma não estigmatizada, o Viva Favela provoca uma visão crítica sobre a realidade vivenciada por cada um [visão]. Ao participar da reunião de pauta, o correspondente passa a se perguntar o que existe na sua comunidade para ser valorizado e o que deve ser denunciado, como isso pode ser feito, a quem esta informação deveria ser direcionada, que impacto ela pode ter e que desdobramentos podem ser esperados. O Viva Favela é tema do livro “Notícias da Favela” de Cristiane Ramalho, (Editora Aeroplano 2007), e possui um livro de fotografias homônimo lançado em 2009 em parceria com a Editora Olhares. Os prêmios do Viva Favela: 2001 - Melhor projeto de inclusão digital, International Wireless Communication Association. 2004 - Prêmio Telemar de Inclusão Digital. 2005 - Documentary Photography Distribution Grant, da Open Society Institute (Fundação George Soros, NY); Menção honrosa no prêmio Vladimir Herzog de Anistia e Direitos Humanos. 2007 - Finalista do prêmio internacional Stokholm GKP, de projetos de Tecnologia da Informação para o Desenvolvimento (ICT4D). Participou da cerimônia de premiação na Malásia. 163 2008 - Finalista do Stokholm Challenge Award, recebeu o Diploma por Excelência no uso da Tecnologia da Informação (participou da cerimônia em Estocolmo). 2009 - Prêmio Ponto de Mídia Livre, do Ministério da Cultura, Governo Federal (Brasil). 164 “Como funciona Cadastre-se e seja um correspondente comunitário. No novo Viva Favela, você pode colaborar publicando textos, fotografias, vídeos e áudios, além de divulgar eventos e serviços. Você pode informar sobre pessoas, lugares, eventos, arte, cultura, esporte, cidadania, meio ambiente, economia e tudo o que achar interessante na sua comunidade. Para ser um colaborador, o primeiro passo é se tornar um correspondente comunitário. Como? Basta se cadastrar! O cadastro no Viva Favela pode ser feito clicando aqui e preenchendo os campos do formulário. Quer saber mais sobre o que é um correspondente? Veja este vídeo. Publique, vote E comente. Agora que você já se tornou um correspondente, publique seu conteúdo, navegue pelo site, vote nos conteúdos que você mais gosta e faça comentários. Para publicar, clique em Publicar Conteúdo, na página principal, e siga as instruções. Atenção: todo material publicado deve estar de acordo com a Política Editorial do Viva Favela. Como funciona o sistema de votação e publicação na página principal do site? A capa do Viva Favela sempre mostra uma matéria, um vídeo, uma galeria de imagens e um áudio. Eles são selecionados eletronicamente com base no número de votos que receberam nos últimos dois dias. Por isso, um conteúdo pode estar na capa mesmo tendo um número relativamente pequeno de votos, pois ele foi o mais votado daquela seção nos últimos dois dias. Dentro de cada seção, os conteúdos são exibidos por ordem de publicação. No espaço "Mais votados", que aparece na lateral esquerda do site, os conteúdos aparecem por ordem de mais votados independente da seção. PARTICIPE DAS REVISTAS MULTIMÍDIA VIVA FAVELA 165 As revistas são publicações virtuais colaborativas que unem textos, galerias de imagens, vídeos e áudios abordando temas propostos por editores convidados, que orientam os correspondentes por meio de reunião virtual. A cada dois meses elas são publicadas no site e enviadas a mais de 12 mil e-mails. Se a sua matéria for selecionada para uma revista, nós te remuneramos no valor de R$ 170,00 + impostos ” 7) Central Única das favelas (CUFA): <http://www.cufa.org.br> Surgiu no fim da década de 1990, pelo movimento hip hop, liderança mais expressiva MV Bill. “A CUFA – Central Única das Favelas – é uma organização sólida, reconhecida nacionalmente pelas esferas políticas, sociais, esportivas e culturais. Foi criada a partir da união entre jovens de várias favelas do Rio de Janeiro – principalmente negros – que buscavam espaços para expressarem suas atitudes, questionamentos ou simplesmente sua vontade de viver. [histórico] A organização tem o rapper MV Bill como um de seus fundadores, este que já recebeu diversos prêmios devido à sua ativa participação no movimento Hip Hop. Em 2004, a UNESCO o premiou como uma das dez pessoas mais militantes no mundo na última década. Além dele, a CUFA conta com Nega Gizza, uma forte referência feminina no mundo do Rap, conhecida e respeitada por seu empenho e dedicação às causas sociais. Nega Gizza é também diretora do HUTÚZ, o maior festival de Rap da América Latina, que é produzido pela CUFA. O Hip Hop é a principal forma de expressão da CUFA e serve como ferramenta de integração e inclusão social. Por ser um movimento que, há 20 anos, sobrevive se delineando nos guetos brasileiros, mesmo sem o apoio da mídia, cresce e se fortalece a cada dia, arrebatando admiradores de todas as camadas sócio-econômicas e deixando para trás o rótulo de “cultura do excluído”. Ao longo de sua existência, o Hip Hop vem criando um movimento forte, atraente, com grande potencial, e segue abrindo portas para novos nichos comerciais ainda não explorados. 166 Através de uma linguagem própria, a CUFA pretende ampliar suas formas e possibilidades de expressão e alcance. Assim, vai difundindo a conscientização das camadas desprivilegiadas da população com oficinas de capacitação profissional, entre outras atividades, que elevam a auto-estima da periferia quando levam conhecimento a ela, oferecendo-lhe novas perspectivas. Agindo como um pólo de produção cultural desde 1999, por meio de parcerias, apoios e patrocínios, a CUFA forma e informa os cidadãos do Rio de Janeiro e dos outros 25 Estados brasileiros, além do Distrito Federal. Dentre as atividades desenvolvidas pela CUFA, há cursos e oficinas de DJ; Break, Graffiti, Escolinha de Basquete de Rua, Skate,Informática, Gastronomia, Audiovisual e muitas outras. São diversas ações promovidas nos campos da educação, esporte, cultura e cidadania, com mão-de-obra própria. A equipe CUFA é composta, em grande parte, por jovens formados nas oficinas de capacitação e profissionalização das bases da instituição e oriundos das camadas menos favorecidas da sociedade; em sua maioria, moradores de favelas. Dentre as ações que imprimem legitimidade ao trabalho desenvolvido pela CUFA, vale a pena lembrar o já citado HUTÚZ – único evento de grande porte e expressão focado exclusivamente no Hip Hop, sendo um marco, um referencial para esta cultura. Além dele, existe a LIIBRA – Liga Internacional de Basquete de Rua, que surgiu através de uma atitude orgânica dentro do HUTÚZ 2003, quando jovens improvisaram jogadas de basquete com uma cesta de lixo, o que fez com que esta modalidade esportiva ganhasse espaço no HUTÚZ 2004 e um campeonato nacional em 2005. Atualmente CUFA, HUTÚZ e LIIBRA são marcas de identidade singular, iniciativas sem precedentes que fidelizaram seu próprio público. Pois, ainda que este não seja necessariamente ligado às áreas de atuação de cada um dos eventos, a própria CUFA, enquanto instituição, faz a diferença ” 8) Nós do Morro: < www.nosdomorro.com.br> 167 “Institucional - O Nós do Morro foi fundado em 1986, com o objetivo de criar acesso à arte e à cultura para as crianças, jovens e adultos do Morro do Vidigal [objetivo]. Hoje, o projeto se consolidou e oferece cursos de formação nas áreas de teatro (atores e técnicos) e cinema (roteiristas, diretores e técnicos) [aç, abrindo e ampliando os horizontes para um sem-número de crianças, jovens e adultos moradores, ou não, do Vidigal. O Nós do Morro é fruto da idéia do jornalista e ator Guti Fraga. Fraga e um Grupo de jovens moradores locais se uniram para dar início ao então chamado Projeto Teatro-Comunidade: uma idéia inovadora, já que, até então, a maioria dos projetos culturais voltados para as comunidades carentes no Rio de Janeiro vinham de fora e nem sempre se adaptavam à realidade do público a que se destinavam. 20 Anos de História 1986 / 1991 – Começa a viagem do Nós do Morro, no Centro Comunitário do Padre austríaco-alemão Hubert Leeb. Ali, o Grupo começou a se reunir e a produzir seus primeiros espetáculos, que falavam do cotidiano do Vidigal e eram entremeados por montagens de textos clássicos da dramaturgia nacional. 1991 / 2001 – Depois de sair do Centro Comunitário do padre Leeb, o Grupo perambulou por vários espaços até conseguir se instalar nos fundos da Escola Municipal Almirante Tamandaré, em 1995. Estava iniciada uma nova fase para o Nós do Morro. O Grupo alcançou o reconhecimento da sociedade, recebeu prêmios e homenagens pela relevância do trabalho realizado. 2001 / 2007 – O patrocínio da Petrobrás, a partir de 2001, a consolidação administrativa e da metodologia pedagógica, com a criação de turmas divididas por faixa etária e de uma grade curricular, aliadas à conquista do Casarão – onde funcionam a administração e os cursos de formação – possibilitaram a expansão da marca Nós do Morro nacional e internacionalmente. 2007 – O infinito é o limite! Hoje, o Nós do Morro se prepara para o amanhã: teatro, cinema, canto, dança, música, multiplicações para outros lugares. Integração com a nossa comunidade e outras nos 168 lugares onde foram instalados núcleos de produção com a filosofia do Nós do Morro: tudo é real e tudo funciona ao mesmo tempo. Uma verdadeira ciranda que não pode parar! ” TRABALHO DE CAMPO 1. Banco de Entrevistas e Observações Foram realizadas entrevistas com gestores das políticas de segurança pública e políticas sociais envolvidos na política pública de pacificação, tanto aqueles executores no campo quanto os formuladores da política. Além disso, foram entrevistados intelectuais especialistas nessas áreas. No trabalho de campo foram realizadas entrevistas com moradores, lideranças, empreendedores, locais e externos, porém com atuação nas favelas, membros de ONG e coordenadores de projetos de desenvolvimento local. Foram feitas inúmeras observações em eventos formais e informais nas três favelas que também foram incorporados a este banco. Os atores entrevistados foram: 169 Entrevistas Políticas Públicas Especialistas e Gestores de Políticas Públicas Nome Instituição Entrevistadores Data Profª Silvia Ramos CESEC Sonia, Dulciea, Júlio César, Caroline. 26/09/2011 Camila Coordenadora do Núcleo de Justiça comunitária no Polo Padre Veloso. Santa Marta. Júlio César Borges e Gabriela Rangel 08/11/2011 Coordenadora do CRAS Santa Marta, alocado no Polo Padre Veloso. Júlio César Borges e Gabriela Rangel Letícia Pedagoga e diretora do Cetep/Faetec Santa Marta. Júlio César Borges e Gabriela Rangel 08/11/2011 Zé Luiz Atua com programas sociais do Sebrae desenvolvidos em áreas pacificadas. Sabrina Ost 10/10/2011 Flávia Siqueira Atua na Firjan Sabrina Ost 11/11/2011 Glória Pedro 08/11/2011 Médico da Clínica Gabriela Rangel, da Família; trabalha MarkusD. e Charles no Polo Padre H. Veloso. Santa Marta. 17/11/2011 Capitão Rodrigo Francisco Andrada Capitão da UPP no Santa Marta após a saída da Major Priscila de Oliveira Azevedo. Em 2012 deixou o posto de capitação da UPP e retornou ao batalhão da PM. Sonia Fleury, Gabriela Rangel, Júlio César Borges. 23/11/2011 Flora Moana Gestora do programa UPP Social, nos territórios Santa Sonia Fleury, Júlio César Borges, Markus D. 28/11/2011 170 Marta e Chapéu Mangueira e Babilônia. Henrique Assistente de gestor do programa UPP Social, nos territórios Santa Marta e Chapéu Mangueira e Babilônia. Sonia Fleury, Júlio César Borges, Markus D. 28/11/2011 Luiz Eduardo Soares Pesquisador e professor. Atua na área de segurança pública. Foi secretário estadual de segurança pública no governo Garotinho, Rio de Janeiro, e secretário Federal, no Governo Lula. Sonia Fleury, Júlio César Borges, Luiza M.A. de Castro, Dulcinéia Medeiros 15/03/2012 Joana Fontoura Setor de mobilização e parcerias da UPP social. Trabalha no nível institucional do programa, no IPP. Markus D. e Charles H. 02/2012 Raissa Gestora territorial da UPP Social. Trabalha no IPP. Markus D. e Charles H. 02/2012 Patino UN-HABITAT Sonia F. e Samuel 09/2012 Sabira Alencar Gestora do programa estadual Gestão Social em Territórios Pacificados – Territórios da Paz. Júlio César Borges e Karina Furtado. 31/05/2012 Mariana Assistente de gestão do programa estadual Gestão Social em Territórios Pacificados – Territórios da Paz. Júlio César Borges e Karina Furtado. 31/05/2012 Fábio Amaral Trabalha no projeto Sesi Cidadania no Polo Padre Veloso. Dulcinéia Medeiros, Sabrina Ost e 18/11/2011 171 Santa Marta. Charles H. Capitão Rodrigo Francisco Andrada Capitão da UPP no Santa Marta após a saída da Major Priscila. Sonia Fleury, Gabriela Rangel e Júlio César Borges 23/11/2011 Raimundo Gestor social do programa de comunidades da Light. Santa Marta. Sabrina Ost e Júlio César Borges 06/10/2011 Cláudia Trabalhou na urbaniza na parte social de cadastro de moradores. Júlio César Borges, Dulcineia Medeiros, Bruno. 08/03/2012 Ruth Juberg Gestora da Casa Civil. Sonia e Júlio 25/03/2012 Bruna É da Casa Civil e responsável pela gerência e interface com as empresas contratadas para atuarem no Santa Marta pelo PAC Social. Júlio César Borges e Karina Furtado 04/09/2012 Frida Gerente de projetos da Urbaniza. Júlio César Borges e Karina Furtado 04/09/2012 Paulo Diz ser gerente geral dos projetos da Urbaniza no Rio de Janeiro. Júlio César Borges e Karina Furtado 04/09/2012 Major Priscila Major da Polícia Militar RJ. Assumiu comando da primeira UPP na favela Santa Marta. Luiza Castro 31/05/2012 Fabio Amaral É do programa sesi-cidadania, no polo padre Júlio César Borges, Dulcineia Medeiros, Bruno. 08/03/2012 Veloso. Verônica Participa do projeto Rio Tour na Favela Santa Marta. Dulcinéia Medeiros e Caroline Mendonça 27/10/2011 Orlando Santos Professor do IPPUR/ UFRJ, pesquisador dos megaeventos Sabrina Guergue e Luiza Castro 24/08/2012 172 desde 2007. Jocelene Ignácio Gestora local do Programa Territórios da Paz na Providência. Frederico Bertholini 25/01/2013 Maria Lucia Pontes Defensora publica do Núcleo de Terras. Morro da Providência. Sonia Fleury e Sabrina Guerghe 30/01/2013 Regina Representante do Instituto Central do Povo. Morro da Providência. Samuel Oliveira e Sabrina Guerghe 07/04/2013 Carol Assistente social e integrante do Fórum Comunitário do Porto do Morro da Providência. Sabrina Guerghe e Samuel Oliveira 14/05/2013 Bruno Coordenador da ONG Rota 66 que realiza projetos de esportes para crianças nas duas comunidades – Chapéu Mangueira e Babilônia. Juliana 26/09/2012 Cláudia Gestora local da Faetec, moradora do Chapéu Mangueira. Juliana 11/10/2012 Felipe Primeiro comandante local da UPP Chapéu Mangueira e Babilônia. Juliana e Vanessa 26/08/2013 João Guerra Dentista. Atuou no Chapéu Mangueira e Babilônia nas décadas de 1990 e Frederico, Juliana e Sônia 17/04/2012 Juliana e Samuel 06/03/2013 2000 no Grupo de Saúde. Joel Coronel do Exército do Forte do Leme. Morro Chapéu Mangueira e Babilônia. 173 Natália Assistente da Coordenação do Programa Territórios da Paz nas favelas Chapéu Mangueira e Babilônia. Julio e Karina 05/06/2012 Lia Coordenadora executiva da Organização CEBDS que realiza projetos de sustentabilidade na Babilônia e Chapéu Mangueira. Juliana 12/03/2013 174 Entrevistas Campo Santa Marta Entrevistado Função Entrevistador Data Pescada Professor de jiu-jitsu em projeto social comunitário no Santa Marta. Charles H. 01/2011 Itamar Silva Pesquisador do Ibase, morador, foi presidente da Associação Santa Marta e fundador do Grupo Eco. Sonia Fleury, Júlio César Borges, Sabrina Ost, Caroline 08/2011 Vitor Lira Morador do Pico Karina Furtado e Júlio César 14/08/2011 Thiago Firmino Empreendedor local, morador do Santa Marta. Júlio César Borges e Sabrina Ost 07/10/2011 Gilson Fumaça Morador. Trabalha como guia de turismo, participa do projeto Rio Tour. Sabrina Ost 11/10/2011 Andréia Presidente da Associação Comercial do Santa Marta. Sabrina Ost 17/10/2011 Eliane (Naná) Moradora e Agente Comunitária de Saúde Júlio César e Gabriela Rangel 27/10/2011 José Mário Presidente da Associação de Moradores do Santa Marta. Sonia Fleury; Júlio César Borges; Cláudia Pressoto; Caroline 27/10/2011 Oliveira, Cláudia Pressoto, DulcinéaMedeiros Mendonça; Dulcinéa Medeiros; Gabriela Rangel Verônica Participa do projeto Rio Tour na Favela Santa Marta. Dulcinéia Medeiros e Caroline Mendonça 27/10/2011 Anderson Trabalha no projeto Casa de Convivência da Secretaria Estadual de Saúde e Qualidade de Vida e mora no Santa Marta. Júlio César Borges e Gabriela Rangel 03/11/2011 Tião Trabalha no projeto Casa de Convivência da Secretaria Estadual de Saúde e Qualidade de Vida e morador. Júlio César Borges e Gabriela Rangel 03/11/2011 Zequinha do Bar Dono do bar e restaurante do Zequinha. Sabrina Ost e Charles H. 08/11/2011 175 Sonia Maria Oliveira Moradora, Agente Comunitária de Saúde no Polo Padre Veloso, ex-presidente da Associação de Júlio César Borges e Gabriela Rangel 08/11/2011 Moradores e participa do projeto Corte e Costura. Pastor Waldecir Pastor evangélico no Santa Marta Sonia Fleury; Júlio César; Gabriela Alves; Caroline M. 12/11/2011 Rapper Fiel Morador, presidente da Rádio Santa Marta e do grupo Visão da Favela que atua com comunicação comunitária. Sonia Fleury 16/11/2011 Gisele Moradora da Maré e atua com comunicação comunitária produzindo o jornal O Cidadão, no Complexo da Maré Sonia Fleury 16/11/2011 Haroldo Presidente da Escola de Samba do Santa Marta Sabrina Ost 17/11/2011 Luiza Coordenadora da Creche Júlio César e Gabriela Alves 17/11/2011 Renata Trabalha como secretária do projeto Sesi Cidadania no Santa Marta e moradora. Dulcinéia Medeiros, Sabrina Ost, Charles H. 18/11/2011 Aline Ambulante e moradora Sabrina Ost 23/11/2011 Sheila Formada em turismo, moradora e atua na área de comunicação e direitos humanos. Cláudia Prezzoto, MarkusD.,Caroline, Charles H. 25/11/2011 Woney Morador, segundo secretário do Grupo Eco. Dulcinéia Medeiros e Caroline Mendonça 25/11/2011 Jocimara Moradora do Pico. Júlio César Borges e Dulcinéia Medeiros 27/11/2011 Sheila Formada em turismo, moradora e atua na área de comunicação e direitos humanos. Júlio César Borges, Dulcineia Medeiros, Bruno 08/03/2012 Sonia Maria de Oliveira Moradora, Agente Comunitária de Saúde no Polo Padre Veloso, ex-presidente da Júlio César Borges e Dulcinéia Medeiros 09/12/2012 176 Associação de Moradores. Participa do projeto Corte e Costura. Woney Morador, Direção do grupo Eco. Júlio César Boges 15/03/2013 177 Entrevistas Campo Providência Entrevistado Função Entrevistador Data Ligia É moradora da Vila Portuária. Sabrina e Alexandre 29/09/2012 Luzinete Teixeira de Abreu Sogra de um dos organizadores do pagode do Buzuca e parente de um dos meninos mortos no morro da Mineira, entregues pelo Exército ao comando rival. Sabrina Guerghe e Alexandre 29/09/2012 Roberto Marinho Morador ameaçado de remoção, Criador do perfil do facebook “Ideais de Uma Luta Morro da Providência”. Sabrina Guerghe e Frederico Bertholini. 04/10/2012 Maria Helena ( Marlene) Vicepresidente da Associação de Moradores do Mor ro da Providência (AMMP) Sabrina Guerghe e Samuel Oliveira 24/01/2013 Dona Jura Dona de restaurante e vencedora do concursode gastronomia da Providência. Roberto Greenhalg, Sabrina Guerghe e Samuel Oliveira 26/01/2013 Francisco Horta Completar Completar Completar Thiago Completar Completar Completar Eron Morador e zelador da Igreja, biólogo e mestre de capoeira. Roberto Greenhalgh, Sabrina Guerghe e Samuel Oliveira 02/02/2013 Fátima Lima Completar Sabrina Guerghe 22/02/2013 Vera Ferreira Completar Sabrina Guerghe 25/02/2013 Zeneide Moradora Pedra Lisa Samuel Oliveira e Sabrina Guerghe 04/03/2013 Maria Antonia Moradora Pedra Lisa Samuel Oliveira e Sabrina Guerghe 04/03/2013 Janice Favela Point Samuel Oliveira e Sabrina Guerghe 05/03/2013 Maurício Hora Morador e fotografo, coordenador da Casa Amarela. Sabrina Guerghe e Samuel Oliveira 26/03/2013 Regina Representante do Instituto Central do Povo Samuel Oliveira e Sabrina Guerghe 07/04/2013 Carol Casa Amarela Sabrina Guerghe e Samuel Oliveira 13/04/2013 Edilson (“Pelé”) Morador do Barão e coordenador do Sparta na Samuel Oliveira e 17/04/2013 178 Pedra Lisa Sabrina Guerghe Carol Assistente social e integrante do Fórum Comunitário do Porto Sabrina Guerghe e Samuel Oliveira 14/05/2013 Luiz Torres Completar Samuel Oliveira 18/05/2013 Rosiete Moradora, presidente da Liga deBlocos e Bandas da Região Portuária e do Bloco Coração das Meninas. Sabrina Guerghe e Samuel Oliveira 22/05/2013 Neuzimar Única a permanecer na resistência do AP da Ladeira do Faria, candidata à vereadora/2012. Sabrina Guerghe e Samuel Oliveira 23/05/2013 179 Entrevistas do Campo Chapéu Mangueira e Babilônia Entrevistado Abílio Função Organização de moradores da Lauro Muller Entrevistador Juliana Data 13/04/201 3 Afonso Liderança jovem, morador do Chapéu Mangueira, co-fundador do Fórum Favela Não se Cala Liderança, morador da Babilônia e diretor dos assuntos culturais da Associação de Moradores da Babilônia. Liderança jovem, morador da Babilônia, coordenador do Ponto de Cultura do Chapéu Mangueira/Babilônia e diretor da ONG Núcleo ICA Moradora do Chapéu Mangueira Juliana e Alexandre 14/10/201 2 Juliana, Júlio e Consuelo 05/02/201 3 Juliana e Consuelo 20/02/201 3 Juliana, Alexandre e Emília Juliana e Alexandre 11/10/201 2 Juliana 26/09/201 2 18/04/201 3 Álvaro Alvaro Filho Ana Anderson (Lula) Liderança jovem, morador da Babilônia, um dos fundadores do Fórum Lucio Bispo André Liderança jovem, morador da Babilônia. Coordena o Fórum Favela Não se Cala Presidente da Associação de Moradores do Chapéu Mangueira Arlete Augustinha Liderança e referência histórica coordena a casa de artes fundada por Celeida Tostes Bruno Coordenador da ONG Rota 66 que realiza projetos de esportes para crianças nas duas comunidades Carlos Morador da Babilônia, sambista e (Malhadão) proprietário de uma barraca na praia do Leme Cláudia Gestora local da Faetec, moradora do Chapéu Mangueira. David Dono do “Bar do David”, morador do Chapéu Mangueira e filho do Lúcio Bispo. Eduardo (Dudu) Morador e produtor de eventos no Chapéu Mangueira e Babilônia, dono da Maneh Produções e funcionário da Agência Redes da Juventude. Felipe Primeiro comandante local da UPP Juliana 25/10/201 2 Fred 12/06/201 2 Juliana 26/09/201 2 Juliana 26/09/201 2 Juliana 11/10/201 2 10/10/201 2 Juliana e Alexandre Juliana 26/01/201 3 Juliana e Vanessa 26/08/201 3 180 Fernanda Moradora da Babilônia. Caso emblemático da remoção. Juliana e Julio 25/04/201 4 Flora Coordenadora local do Programa Territórios da Paz Presidente da associação de moradores do Leme (AMA Leme) Julio e Karina 05/06/201 2 23/01/201 3 Francisco Nunes (Chicão) Gibeon Isabel Liderança, ex-presidente da associação de moradores do Chapéu Mangueira. Referência histórica. Moradora do Chapéu Mangueira Juliana e Emília Juliana e Julio 07/02/201 3 Juliana e Alexandre Frederico, Juliana e Sônia 09/08/201 2 17/04/201 2 João Guerra Dentista, atuou no Chapéu Mangueira e Babilônia nas décadas de 1990 e 2000 no Grupo de Saúde Joel Coronel do Exército do Forte do Leme José Roberto (Zé) Liderança jovem, morador do Chapéu Mangueira. Coordena um grupo de jovens chamado “Dá seu papo”. Coordenadora executiva da Organização CEBDS que realiza projetos de sustentabilidade na Babilônia e Chapéu Mangueira Morador do Chapéu Mangueira, articulador comunitário de assuntos sociais, faz parte da diretoria da associação de moradores Bruno e Juliana 28/08/201 2 Juliana 12/03/201 3 Juliana 13/04/201 3 Luis Augusto Morador do Chapéu Mangueira 11/10/12 Luiz Alberto (Beto) Morador do Chapéu Mangueira e trabalha na junta governativa da Associação e na comissão eleitoral. Fundador da Organização Agência de Redes para a Juventude Juliana e Alexandre Juliana Lia Luis Antônio (Dunga) Marcus Faustini Mary Natália Paulo (Palô) Moradora da Babilônia, trabalha na creche Babylônia e participa da cooperativa das “Mulheres Guerreiras da Babilônia” Assistente da Coordenação do Programa Territórios da Paz Vice-presidente da Associação de Moradores da Babilônia. Filho de Percília. Possui um hostel na Babilônia Juliana e Samuel 06/03/201 3 11/10/201 2 Juliana e Julio 27/02/201 3 Juliana, Alexandre e Emília Julio e Karina 10/10/201 2 Juliana e Consuelo 05/06/201 2 02/04/201 3 181 Regina Tchelly Moradora da Babilônia, fundadora e coordenadora do projeto “Favela Orgânica” Juliana e Consuelo 19/02/201 3 Rick Morador do Chapéu Mangueira 11/10/201 2 Rosângela (Danda) Moradora do Chapéu Mangueira e trabalha no Sesi Cidadania Juliana, Alexandre e Emília Juliana e Alexandre Sebastian Archer Membro diretor do movimento de moradores do Leme, chamado SOS Leme. Último presidente da Associação de Moradores do Chapéu Mangueira. Candidatou-se a vereador, mas teve a candidatura impugnada pela ficha limpa. Proprietário do Hostel Favela Inn Juliana e Júlio 01/02/201 3 Juliana e Consuelo 20/02/201 3 Valdinei (Dinei) 09/08/201 2 2. Banco de Dados de Políticas Públicas Apresentamos a seguir apenas algumas das informações que compõem esse Banco de Dados: 182 a) Habitação Programa Morar Carioca Orçamento Objetivos e metas Localidade e Abrangência Secretaria Municipal de Moradia digna para Morros da Coroa (Santa Habitação a população de Teresa) A previsão de baixa renda da conclusão das obras é de O programa Morar Carioca 18 meses e São José tem como objetivo urbanizar Cidade do Rio de todas as comunidades do Rio Janeiro, pois prevê a até urbanização de prevê a urbanização de todas as favelas até todas as favelas da cidade 2020 até 2020 2020, com um investimento total de R$ 8 bilhões, em parceria com os governos estadual e federal. Operário(Jacarepaguá 183 PP Administração Recursos Objetivos, Metas Local PAC Governo federal – investimentos feitos Nacional: Acelerar o crescimento economico do Brasil. Crescimento do PIB 2007 – 2010 de ca. 5% por ano. Todo o país (-> olha administração). Medidas chegaram até as comunidades, incluindo Santa Marta e ChapéuMangueira (-> 6 recursos) . (lançado 28.01.2007) diretamente e em parceria com estados, municípios, bancos públicos e o setor privado. A parte dos estados e os municípios aumentou (->diagrama 1). R$ 219,20 bilhões por empresas estatais, (R$ 148,7 bilhões Petrobras), R$ 67,80 do orçamento fiscal da União e da seguridade, R$ 216,9 bilhões pela iniciativa privada. 6 Estado Rio PAC : INVESTIMENTO TOTAL: R$ 484,4 bilhões 1 5 blocos de medidas : 1. Infraestrutura (= Prioridade), tem 3 eixos: Inf. logística Inf. Energética Inf. Social e Urbana (afeita ás comunidades da pesquisa) Até 2010 R$ 125,7 bilhões Orgãos: - Comitê gestor do PAC (CGPAC) : composto pelos ministros da Casa Civil, Fazenda e Planejamento, para coordenar e implementar 1 o programa . - Grupo Executivo do PAC (GEPAC), integrado pela Subchefia de Articulação e Monitoramento (Casa Civil), Secretaria de De isso Investimentos no eixo “social e urbana”: 2007-2010 28.777,0 milhões 2. medidas de estímulo ao crédito e ao financiamento [exemplo: “ampliação estimada em R$ 6 bilhões, nos primeiros dois anos, do limite específico para operações de crédito do setor 1 público ” (entre outros)] Outras comunidades no Rio (entre 6 outras) : Pós 2010 29,6 milhões (diminuiu) 3. desoneração dos impostos Comunidade Santa Marta 4. melhoria do ambiente do investimento (“entre outros: regulamentar o artigo 23 da Constituição para definir, "claramente", a competência de Estados, municípios e União 1 sobre proteção ao meio-ambiente ”) Rocinha, Alemão, Manguinhos, Santa Marta, Cantagalo e Pós 2010 R$ 358,7 bilhões (janeiro-abril!) Proponente: Estado Urbanização Data de seleção: nov/09 Investimento previsto até e pós 2010 (R$ 5. Medidas fiscais de longo prazo do PAC (-> administração) (Entre outros: criação do Fórum Nacional da PavãoPavãozinho, Maciço da Tijuca.. 184 Orçamento Federal e Secretaria de Planejamento e Investimentos Estratégicos (Planejamento), além da Secretaria Nacional do Tesouro (Fazenda). Estabelece metas, acompanha a implementação do 3 Programa . milhares) Previdência Social) 18.708,4 Estágio: Ação Preparatória Morro da Babilônia e Chapéu Mangueira Proponente: Município Urbanização Data de seleção: dez/09 Investimento previsto até e pós 2010 (R$ milhares) 41.920,0 RS Estágio: Ação Preparatória* PAC II Lançado 29.03.2010 sem concluir a metade do PAC 1. Execução entre 2011 e 2020 Mesmos orgãos como PAC I. Cidade melhor, comunidade cidadã, água e luz para todos: “obras são realizadas em parceria entre estados e municípios. O governo federal disponibiliza recursos, enquanto os Total (nacional): 1590,5 bil. 6 áreas de investimentos: Entre outras executadas entre 2011 e 2014: PAC Cidade Melhor4: Enfrentar os principais desafios dos grandes centros urbanos para melhorar a qualidade de vida das pessoas. PAC Comunidade Cidadã7: Aumentar a oferta de serviços públicos à população de bairros populares nas áreas de cultura, educação, lazer e saúde e garantir a presença do Estado. Construção de: - UPAs Unidades de Pronto Atendimento - UBS, as Unidades Básicas de Saúde - Creches e pré-escola (maior investimento) - Quadras esportivas nas escolas Habitação “minha casa, minha vida”: 278,2 bi (R$ 30,5 bilhões para urbanização de 5 assentamentos precários ) Cidade Melhor: 57,1 bi Comunidade Cidadã: 23 bi Ha uma lista do governo do estado enviado á Caixa Econômica Federal com presupostos de projetos em 11 8 Favelas . Apenas 5 tem sido selecionadas até hj: 185 (maioria até 2014). demais entes federados apresentam projetos, fazem licitações e 4 executam as obras. ” Àgua e Luz para todos: 30,6 bi Resto em transportes e energia. - Praças dos Esportes e da Cultura PAC Minha Casa, Minha Vida5: Reduzir o déficit habitacional, dinamizar o setor de construção civil e gerar trabalho e renda. Prevê transformar favelas em bairro populares5. PAC Água e Luz para Todos: Universalizar o acesso à água e à energia elétrica no país. PAC Transportes: Consolidar e ampliar a rede logística, interligando diversos modais (rodoviário, ferroviário e hidroviário) para garantir qualidade e segurança. PAC Energia: Garantir a segurança do suprimento a partir de uma matriz energética baseada em fontes renováveis e limpas. Desenvolver as descobertas no PréSal, ampliando a produção de petróleo no país. Mangueira (instalação de uma UPP),Complexo da Tijuca, Providência, Chapadão, Jardim Batan. 186 O Programa de Aceleração do Crescimento no Município do Rio de Janeiro: Foi feito um investimento total de R$ 484,4 bilhões. Até 2010 R$ 125,7 bilhões, pós 2010 R$ 358,7 bilhões. Seguido tem os dados detalhados por programa, não consegui entender qual a diferença entre “empreendimentos exclusivos” e “empreendimentos de caráter regional”, mas o eixo “Social e Urbana” somente fica nos exclusivos. Só o eixo Social e Urbana afeta diretamente as comunidades, os outros dois são de investimentos em projetos de infraestrutura maiores. Favelas em quais foram feitas obras (“Urbanização e reassentamento de famílias localizadas em beiras de córregos e áreas de risco”): St. Marta, Chapéu Mangueira\Babilônia, Rocinha, Alemão, Manguinhos, Santa Marta, Cantagalo, Campo Grande, Complexo da Tijuca, Vila Catiri, Favela Areal, Catiri, Fernão Cardin, Guarabu, Parque Alegria, São Carlos, Vila Esperança, Vila João Lopes, Vila Rica de Irajá, Nova Divinéia, Borda do Mato, Parque JK, João Paulo II, Cidade de Deus, Loteamento Piaí, Coroa, Pavão-Pavãozinho, Maciço da Tijuca 187 b) Pacificação Quem administra (entes, órgãos) Orçamento Objetivos e Metas Localidade Prevê o planejamento e a estruturação de métodos e rotinas de gestão para a integração e coordenação de agendas de órgãos públicos e privados nos territórios pacificados, assim como a produção de bases de informações territoriais e a gestão local em todos os territórios pacificados da cidade, visando a promoção da cidadania e o desenvolvimento econômico, social e urbano nos territórios de UPP, efetivando a integração destas áreas ao conjunto da cidade. Comunidades com UPP. - Tentar igualar a sociedade, através da identificação das demandas de cada região. Comunidades com UPP. (de onde vem, qnto) UPP Social Fica o Presidente do Instituto Municipal de Urbanismo Pereira Passos incumbido de coordenar, supervisionar, articular e integrar todas as ações sociais a serem desenvolvidas e os serviços públicos locais a serem prestados pelo Município do Rio de Janeiro no âmbito das Unidades de Polícia Pacificadora sediadas nesta Cidade. O escritório da ONU-HABITAT apoia o Instituto Pereira Passos no gerenciamento do programa; na produção de dados, análises e monitoramento de cada território, e na gestão local das UPPs Sociais. SESI Cidadania O projeto é implantado pelo Sistema Firjan e coordenado pela Secretaria de Estado de Assistência Social e R$ 5.006.861,60 – segundo D.O. Rio de 10/05/11 (Convênio de Implantação do Programa UPP Social nas comunidades Pacificadas.) 188 Direitos Humanos, que gerencia as atividades sociais das comunidades pacificadas. (Fonte: Site UPP Social) SEBRAE Empresa Bacana SEBRAE Coordenado pelo IPP. Parceiros: Sebrae, o Sindicato de Empresas de Serviços Contábeis (Secon). As secretarias municipais da Fazenda, Desenvolvimento Econômico Solidário, Trabalho e Emprego, Ordem Pública, Saúde e Defesa Civil, Urbanismo e Ciência e Tecnologia também participam da ação. - Resgatar a cidadania por meio de ações sociais. - Oferecer cursos de capacitação. Incrementar as atividades empreendedoras para que produzam produtos e serviços Formalizar empreendimentos sob a figura jurídica do MEI (Microempreendedor Individual) “O objetivo do programa é permitir que o empreendedor local esteja apto a realizar contratações com carteira assinada, ter acesso a créditos e a benefícios da Previdência, além de ter a possibilidade de vender para empresas de grande porte”, explica Mario Borghini, diretor de Desenvolvimento Econômico Estratégico do IPP e coordenador do Empresa Bacana Cidade do Rio de Janeiro. Curso oferecido pelo SEBRAE Me formalizei, e 189 agora? Orienta o Empreendedor Individual sobre as obrigações da nova figura jurídica. 190 Unidades de Polícia Pacificadora (UPP) 1. Antecedentes da UPP a. No âmbito do policiamento comunitário: i. Posto de Policiamento Comunitário (PPC) ii. Destacamento do Policiamento Ostensivo (DPO) iii. Grupamento de Policiamento em Áreas Especiais (GPAE). => Segundo reportagem do IBAS, as experiências de policiamento comunitário do passado não retomaram o território, passando a conviver com o domínio de bandidos em regiões conflagradas, sem ter poder para controlar o local e impor a lei. 2. Desenho da Política Pública + diferencial a. Policiamento comunitário: o ponto de partida para o policiamento comunitário é o trabalho compartilhado entre Estado e sociedade para a manutenção da paz. O objetivo principal da polícia deve ser a proteção e a redução da sensação de insegurança e não a simples repressão. Policiamento comunitário depende de confiança. Mas, no caso das UPPs, trata-se de confiar em instituições que já decepcionaram a sociedade incontáveis vezes. b. só são implantadas após a retomada do território pelo estado (por meio do Bope) c. policiais recém-formados, livres dos chamados “vícios da corporação”. d. desmistificar a desumanização da polícia: participando de eventos comunitários, como entrega de donativos, apresentação de banda evangélica formada por membros do Bope, o “Tropa de Louvor”. e. comando descentralizado dos batalhões, com a presença constante de capitães jovens e carismáticos responsáveis por aquela unidade específica. Num batalhão normal, cada dia um oficial comanda um local. f. Objetivo é o fim das armas; não é objetivo fim acabar com o tráfico de drogas, mas reduzi-lo a níveis civilizados. g. Retomada do controle territorial autoriza a entrada de outros órgãos estatais e outros programas sociais. 3. Como é implementada a. Roteiro da instalação de UPP: 1. Retomada: O Bope entra na comunidade. É o momento em que a inteligência da polícia é fortemente utilizada e pode haver repressão. As prisões não são, necessariamente, o objetivo. A entrada é efetiva e dura 191 de acordo com características locais. 2. Estabilização: Etapa de manutenção do controle, eliminação de focos de resistência e de “entrega do espaço pelo Bope à UPP. 3. Ocupação definitiva: Um efetivo novo, recém-formado e especializado, vinculado ao batalhão e subordinado a um comando de polícia comunitária, passa a fazer parte do cenário da comunidade. É o momento do foco preventivo. 4. Pós-ocupação: Essa etapa é baseada no acompanhamento dos resultados com padrões e objetivos medidos pelo ISP. Faz-se monitoramento e pesquisa. Aprofunda-se o vínculo com a comunidade e busca-se estabelecer articulações institucionais. Unidades de Política Pública Social Formulado e lançado em 2010 no âmbito do governo do Estado, com a parceria da Prefeitura, o programa UPP Social passou à liderança do Município em janeiro de 2011, quando o Instituto Municipal de Urbanismo Pereira Passos (IPP) tornou-se responsável por coordenar políticas e serviços nos territórios pacificados. Um modelo inovador de gestão pública, a UPP Social integra ações municipais e dos governos estadual e federal, comunidades, sociedade civil e setor privado para a promoção da cidadania e o desenvolvimento econômico, social e urbano nos territórios de UPP, efetivando a integração destas áreas ao conjunto da cidade. Morar Carioca na Babilônia e no Chapéu Mangueira, a Secretaria Municipal de Habitação está investindo R$ 43,4 milhões. (Só para mostrar como o orçamento é disperso.) SESI Cidadania Fonte: http://www.uppsocial.com.br/projeto-sesi-cidadania-uneseguranca-e-resgate-social-nas-upps 192 O Sesi Cidadania vem sendo desenvolvido desde abril e leva educação, qualidade de vida, esporte, lazer e cultura às comunidades com UPPs. Com o projeto, o presidente do Sistema Firjan, Eduardo Eugênio Vieira, afirmou que está apostando numa longa caminhada rumo a um processo de se tentar igualar a sociedade, através da identificação das demandas de cada região. “Temos 4 mil voluntários e um grupo de 10 coordenadores em cada comunidade, integrado com os comandantes das UPPs e das associações de moradores, para assegurar a realização de um levantamento detalhado das características locais e suas necessidades”, explicou o presidente. O SESI Cidadania atua em 5 frentes: Atleta do Futuro – Promove atividades esportivas para crianças e adolescentes, de 7 a 17 anos, incentivando a formação de futuros atletas de futebol, futsal, vôlei, basquete, judô, dança, atletismo, natação e ginástica artística. A meta é beneficiar 300 jovens atletas anualmente. Os alunos recebem uniforme e lanche. Sesi Terceira Idade – Oferece a pessoas com idade a partir de 50 anos a possibilidade de praticar atividades físicas, socioculturais, ter orientação nutricional e psicológica, acompanhamento médico e avaliação física, favorecendo um estilo de vida ativo e saudável. Também são distribuídos uniformes. Beneficiar 1.200 pessoas por ano é a expectativa do projeto. Cultura – São realizadas caravanas culturais, peças teatrais nas comunidades pacificadas e programação cultural nos principais teatros da cidade. Serão 2 mil crianças, jovens e adultos anualmente com acesso à cultura. Sesi/Senai Educa Mais – Oferece reforço escolar para crianças e jovens do ensino fundamental e médio, formação profissional, cursos básicos de Inglês e Espanhol, programas de educação alimentar, instalação da indústria do conhecimento, com biblioteca e espaço para inclusão digital. A ideia é beneficiar 4.400 alunos por ano. Mapeamento Socioeconômico – Está em curso um levantamento das necessidades dos moradores das comunidades pacificadas nas áreas de educação, trabalho e renda, segurança, saúde, cultura, esporte e lazer. São 6.577 entrevistas para mapear número de moradores, acesso aos serviços 193 públicos, frequencia escolar, nível de escolaridade, atividade econômica, jornada de trabalho, acesso a crédito, programas sociais e serviços de saúde, disponibilidade de equipamentos públicos de lazer e de programas culturais. Para chamar a atenção desses jovens para a educação profissional e para a variedade de cursos oferecidos pelo SENAI-RJ serão realizadas novas edições da Feira das Profissões ao longo do ano. O lema diz tudo: Sua Porta de Entrada para o Mercado de Trabalho. A Feira das Profissões é uma iniciativa pioneira do Sistema FIRJAN, que oferece inscrições gratuitas para vários cursos profissionalizantes do SENAI-RJ aos jovens das comunidades pacificadas, além de palestras de orientação profissional. SEBRAE Programa Sebrae nas Comunidades Pacificadas - O programa, que já começou a ser desenvolvido no Santa Marta, na Cidade de Deus, no PavãoPavãozinho e Cantagalo, no Chapéu Mangueira e Babilônia, e no Borel, inclui: (site do SEBRAE: 09/2010) - diagnóstico em cada comunidade, para identificar as potencialidades – ou seja, os segmentos que podem ser trabalhados, a fim de gerar renda para a população; um levantamento do perfil dos empreendimentos já existentes; a realização de cursos e palestras sobre gestão empresarial, de acordo com o perfil e necessidades de cada comunidade; além de incentivo à formalização dos empreendedores locais. No Santa Marta, por exemplo, primeira a receber uma UPP, a entidade está trabalhando, principalmente, com o turismo, que é a principal vocação local. Também será trabalhado com os moradores o segmento de artesanato na moda, com capacitação e consultoria em design, para garantir inovação nas peças. Todo o trabalho e a definição das ações a serem implementadas são realizados em parceria com as lideranças e associações presentes na comunidade. Projeto Empresa Bacana A iniciativa – que é uma ação conjunta das secretarias municipais de 194 Trabalho e Emprego, de Ordem Pública, Assistência Social, de Desenvolvimento Econômico Solidário, subprefeituras, Instituto Pereira Passos, Coppe/UFRJ e Sebrae/RJ - prepara o município para a figura jurídica do Microempreendedor Individual (MEI), que entra em vigor no país a partir do dia 1º de julho. O MEI é direcionado àqueles pequenos negócios que têm receita bruta de até R$ 36 mil ao ano, como costureiras, sapateiros, manicures, encanadores, mecânicos e pintores de parede. Empresa Bacana – realizado no Santa Marta nos dias 07 e 08/04/2011. Todos os que se legalizarem no evento receberam uma bolsa para participação no curso “Me formalizei, e agora?”. A capacitação orienta o Empreendedor Individual sobre as obrigações da nova figura jurídica. c) Segurança Pronasci Foi desenvolvido pelo Ministério da Justiça Nacional de Segurança Pública com Cidadania (Pronasci) com o intuito de enfrentar a criminalidade no país. O Pronasci tem como objetivo unir políticas de segurança com ações sociais. O governo federal disponibilizará até o final de 2012 R$ 6,707 bilhões. Até o momento, o Pronasci chegou a 150 municípios, ao Distrito Federal e a 22 Estados. Tem como metas gerais beneficiar – direta ou indiretamente – 3,5 milhões de pessoas entre profissionais de segurança pública, jovens e suas famílias. E busca a redução da criminalidade com a redução do número de homicídios, dos atuais 29 por 100 mil habitantes para 12 homicídios por 100 mil habitantes, nos próximos quatro anos. Investimento 195 R$ 483 milhões do orçamento do MJ/2007 (descontigenciados) R$ 1,406 bilhões em 2008 R$ 1,406 bilhões em 2009 R$ 1,406 bilhões em 2010 R$ 1,406 bilhões em 2011 Referência: http://portal.mj.gov.br/pronasci/data/Pages/MJ3FD1029CITEMID5837101183B8 484AA6679447697514C4PTBRNN.htm d) Demais Políticas Sociais Bolsa Família O Bolsa Família é um programa de transferência direta de renda, no qual beneficia famílias em situação de pobreza e extrema pobreza. O Programa é integrado com o Fome Zero, com o objetivo de garantir o direito humano à alimentação adequada. Referência: http://www.mds.gov.br/ Programa Bolsa Família (PBF) - Número de benefícios em dezembro Sigl a Região 2004 2005 2006 2007 2008 Região CentroCO oeste 292405 444786 596620 583672 545818 N Região Norte 527652 697644 1023507 1081636 1075885 332044 424557 6 4 5442567 5573605 5445428 NE Região Nordeste 196 S SE Região Sul Região Sudeste BR Brasil RJ Rio de Janeiro 700661 987062 1027439 956129 853526 173067 232537 5 9 2875677 2848034 2637339 657183 870044 1096581 1104307 1055799 9 5 0 6 6 196330 302733 441667 494051 498378 Fonte: Ipeadata Saúde da Família A Saúde da Família é entendida como uma estratégia de reorientação do modelo assistencial, operacionalizada mediante a implantação de equipes multiprofissionais em unidades básicas de saúde. Estas equipes são responsáveis pelo acompanhamento de um número definido de famílias, localizadas em uma área geográfica delimitada. As equipes atuam com ações de promoção da saúde, prevenção, recuperação, reabilitação de doenças e agravos mais freqüentes, e na manutenção da saúde desta comunidade. A responsabilidade pelo acompanhamento das famílias coloca para as equipes saúde da família a necessidade de ultrapassar os limites classicamente definidos para a atenção básica no Brasil, especialmente no contexto do SUS. A estratégia de Saúde da Família é um projeto dinamizador do SUS, condicionada pela evolução histórica e organização do sistema de saúde no Brasil. A velocidade de expansão da Saúde da Família comprova a adesão de gestores estaduais e municipais aos seus princípios. Iniciado em 1994, apresentou um crescimento expressivo nos últimos anos. A consolidação dessa estratégia precisa, entretanto, ser sustentada por um processo que permita a real substituição da rede básica de serviços tradicionais no âmbito 197 dos municípios e pela capacidade de produção de resultados positivos nos indicadores de saúde e de qualidade de vida da população assistida. A Saúde da Família como estratégia estruturante dos sistemas municipais de saúde tem provocado um importante movimento com o intuito de reordenar o modelo de atenção no SUS. Busca maior racionalidade na utilização dos demais níveis assistenciais e tem produzido resultados positivos nos principais indicadores de saúde das populações assistidas às equipes saúde da família. - http://dab.saude.gov.br/ Meta e Evolução do Número de Equipes de Saúde da Família Implantadas BRASIL - 1994 – ABRIL 2011 Evolução da População Coberta por Equipes de Saúde da Família Implantadas BRASIL - 1994 – ABRIL 2011 Fonte: http://dab.saude.gov.br/ 198 DIAGNÓSTICOS SOCIOECONÔMICOS E COMPORTAMENTAIS Com o objetivo de conhecer melhor as semelhanças e diferenças entre as comunidades estudadas foram levantados dados secundários que nos permitiram identificar características peculiares em termos das condições socioeconômicas e comportamentais das populações residentes. Os indicadores socioeconômicos das favelas foram cotejados com seus entornos, a fim de verificar o grau de discrepância entre esses dados relativos à população residente nas favelas e seus vizinhos no perímetro onde circulam, evitando, portanto a definição censitária de áreas geograficamente contíguas. Dessa forma buscou-se compreender a condição socioeconômica a partir da estratificação interna de cada favela bem como entender que essa posição é relacional, sendo necessariamente confrontada com os habitantes do entorno onde circulam ambas as populações (local e vizinhança). Com relação aos dados comportamentais foram selecionados indicadores de violência, já que esse é o principal foco da política da UPP. Também foram discutidos artigos que investigaram o comportamento eleitoral de populações ou grupos de moradores de favelas com o objetivo de nos permitir levantar algumas hipóteses sobre as favelas em nosso estudo. Como não foi possível isolar dados relativos ao comportamento desse eleitorado nas eleições, buscou-se realizar uma análise qualitativa, com dados coletados na imprensa e em entrevistas que realizamos. 1. Dados Socioeconômicos 1.1 Introdução Este trabalho apresenta a descrição das principais características socioeconômicas das três favelas estudadas, seus entornos e restante da cidade. Utilizaram-se dois níveis de agregação geográficos para possibilitar a análise com diferentes níveis de detalhamento e profundidade. Os dados foram extraídos do XII Recenseamento Geral do Brasil (Censo Demográfico 2010) realizado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). A 199 classificação sintética e a desagregada são apresentadas nas tabelas 1 e 2, respectivamente. Tabela 1 – Classificação sintética Área Providência Providência Entorno Restante da cidade - favelas Restante da cidade - não favela Santa Marta Número de domicílios particulares permanentes 1834 2887 422828 1708915 1176 Santa Marta entorno Chapéu Mangueira/Babilônia entorno 2280 Chapéu Mangueira/Babi 1178 3347 200 Tabela 2 – Classificação desagregada Área Número de domicílios particulares permanentes Babilônia 777 Chapéu Mangueira 401 Providência 593 Providência - Cruzeiro e motovia Providência - Igreja e plano inclinado 266 Providência - Ladeira Favela Bairro 117 Providência - Pedra Lisa Providência - Vila Portuária Providência Entorno Restante da cidade - favelas Restante da cidade - não favela 261 60 537 2887 422828 1708915 Santa Marta 1054 Santa Marta entorno 2028 Santa Marta (PICO) 122 Santa Marta entorno especial Chapéu Mangueira/Babilônia entorno Chapéu Mangueira/Babilônia entorno (ladeira) 252 3297 50 201 Para a coleta e análise dos dados qualitativos, cada favela foi dividida em áreas segundo os dados coletados de entrevistas e observações em campo, priorizando mais a percepção e interpretações dos moradores sobre as divisões geográficas do que a classificação censitária. Da mesma forma, adotamos a mesma perspectiva sociológica em relação à definição de “entorno” das favelas. Diferentemente dos dados do IBGE nos quais o entorno significa a contiguidade geográfica, caracterizamos como entorno as localidades pelas quais a população circula cotidianamente. A metodolodia do trabalho, portanto, se aproxima da concepção de Lefebvre (1974), em que a produção do espaço se dá a partir da prática social, que é o espaço percebido pelos indivíduos, das representações do espaço, que é o espaço concebido por cientistas, engenheiros, planejadores e do espaço representacional, que é o espaço diretamente vivido pelos indivíduos. Contudo, os resultados foram extraídos do Censo Demográfico de 2010 e, portanto, cada região consiste na agregação dos setores censitários, a unidade espacial mínima disponibilizada pelos dados agredados do IBGE. As áreas de ambas classificações e os setores censitários correspondentes são apresentados nas tabelas 3, 4 e 5. 202 Mapa das áreas do Chapéu Mangueira/Babilônia Tabela 3 – Classificação dos setores censitários para Chapéu/Mangueira Babilônia e Entorno Código do setor 330455705100003 330455705100018 330455705100415 330455705100007 -- Área na classificação sintética Chapéu Mangueira/Babi Chapéu Mangueira/Babi Chapéu Mangueira/Babi Chapéu Mangueira/Babilônia entorno Chapéu Mangueira/Babilônia entorno Área na classificação desagregada Chapéu Mangueira Babilônia Babilônia Letra no mapa A B C Chapéu Mangueira/Babilônia entorno (ladeira) D Chapéu Mangueira/Babilônia entorno Demais letras em azul Mapa das áreas da favela Santa Marta 203 Tabela 4 - Classificação dos setores censitários para Santa Marta e Entorno Código do setor Área na classificação sintética Área na classificação desagregada Letra no mapa 330455705090120 Santa Marta Santa Marta A 330455705090121 Santa Marta Santa Marta (PICO) B 330455705090119 Santa Marta Santa Marta C 330455705090118 Santa Marta Santa Marta D 330455705090117 Santa Marta 330455705090123 Santa Marta entorno Santa Marta E Santa Marta entorno especial F Todas demais Santa Marta entorno letras em azul -- Santa Marta entorno Mapa das áreas da favela Providência 204 Tabela 5 - Classificação dos setores censitários para Providência e Entorno Código do setor 330455705060041 330455705060044 330455705060042 330455705060043 330455705060040 Área na classificação sintética Providência Providência Providência Providência Providência Área na classificação desagregada Providência Providência - Cruzeiro e motovia Providência Providência - Igreja e plano inclinado Providência - Ladeira Favela Bairro Providência - Pedra Lisa Letra no mapa A B C D E 330455705060039 Providência 330455705060034 Providência 330455705060035 Providência M Providência - Vila Portuária P Providência - Vila Portuária Q 330455705060063 Providência Providência Providência Entorno Providência Entorno 330455705060038 F (Letras em azul) 1.2 População e domicílios Analisando os resultados da tabela 6, percebe-que as favelas apresentam mais residentes por domicílio do que seus respectivos entornos. A favela com maior proporção de moradores por domicílio, segundo o IBGE, é Santa Marta, enquanto Providência e Chapéu/Mangueira apresentam valores quase equivalentes. Com exceção do Santa Marta, as favelas estudadam apresentam valores de habitante/domicílio inferiores à média do restante das favelas. Contudo, existem diferenças internas dentro de cada favela, que passam a ser analisadas na tabela 7. 205 Tabela 6 – Residentes por domicílio na classificação sintética Área Número de domicílios particulares permanentes Número de Residentes pessoas por residentes domicílio Providência 1834 5844 3,186478 Providência Entorno 2887 8870 3,072393 Restante da cidade - favelas 422828 1379952 3,263625 1708915 4868118 2,84866 Santa Marta 1176 3908 3,323129 Santa Marta entorno Chapéu Mangueira/Babilônia entorno 2280 5552 2,435088 3347 7503 2,241709 Chapéu Mangueira/Babi 1178 3739 3,174024 Restante da cidade - não favela 206 Tabela 7 – Residentes por domicílio na classificação desagregada Área Número de domicílios particulares permanentes Número de pessoas residentes Babilônia 777 2451 3,15444 Chapéu Mangueira 401 1288 3,21197 Providência 593 1950 3,288364 Providência - Cruzeiro e motovia 266 762 2,864662 Providência - Igreja e plano inclinado 261 990 3,793103 Providência - Ladeira Favela Bairro 117 392 3,350427 60 260 4,333333 537 1490 2,774674 Providência - Pedra Lisa Providência - Vila Portuária Providência Entorno 2887 8870 3,072393 422828 1379952 3,263625 1708915 4868118 2,84866 Santa Marta 1054 3477 3,298861 Santa Marta entorno 2028 4904 2,418146 Santa Marta (PICO) 122 431 3,532787 Santa Marta entorno especial 252 648 2,571429 3297 7368 2,234759 50 135 2,7 Restante da cidade - favelas Restante da cidade - não favela Chapéu Mangueira/Babilônia entorno Chapéu Mangueira/Babilônia entorno (ladeira) Na tabela 7, percebe que as duas regiões com maior índice de residente/domicílio se situam na Providência, com valores médios de 4,33 na “Pedra Lisa”; 3,79 na “Igreja e Plano Inclinado” e 3,35 na “Ladeira Favela Bairro”. Em quarto lugar, aparece o “Santa Marta Pico”, com o valor de 3,53. Quanto ao campo Chapéu Mangueira/Babilônia, percebe-se que a comunidade do Chapéu tem maior número de pessoas por domicílio do que a Babilônia. 207 1.3 Renda e educação Tabela 8 – Alfabetização e renda na classificação sintética Área Providência Providência Entorno Restante da cidade – favelas Restante da cidade - não favela Santa Marta Santa Marta entorno Chapéu Mangueira/Babilônia entorno Chapéu Mangueira/Babi % alfabetizados acima de 11 94% 96% 94% 98% 92% % alfabetizados acima de 15 94% 95% 93% 98% 92% 99% 99% 100% 89% 100% 88% Renda per capita 347,04 517,70 382,99 1378,92 434,13 2656,90 4083,18 482,25 Conforme a tabela 8, percebe-se que a comunidade Chapéu Mangueira/Babilônia é a que sofre mais com o analfabetismo. Conforme é indicado na tabela 9, este resultado deriva dos baixos índices da Babilônia, que afeta negativamente a média da área Chapéu Mangueira/Babilônia. Como era de se esperar, não há significativas diferenças entre favela e entorno no caso da Providência, apesar de que a favela é ligeiramente menos alfabetizada. Comparando com o restante das favelas do Rio, percebe-se que Providência e Santa Marta se encontram próximas da média de alfabetização das demais favelas. Apenas o Chapéu Mangueira/Babilônia que se diferencia de forma significativa, devido aos piores índices da população da Babilônia. Quanto à renda, os resultados mostram que as favelas do Santa Marta e do Chapéu Mangueira têm renda per capita superior a das demais favelas da cidade. Estes valores acompanham seu entorno, uma vez que o entorno dessas favelas, na Zona Sul, também apresenta elevada renda per capita. Na média, Chapéu/Mangueira representa o campo da pesquisa com maior valor de renda per capita, da mesma forma que seu entorno é o que apresenta maior índice. Apenas a Providência apresentou o valor deste indicador inferior à média do restante das favelas cariocas. A maior diferença entorno-favela para a renda per capita ocorre no Chapéu Mangueira/Babilônia, e a menor diferença na Providência. 208 Tabela 9 – Alfabetização e renda Área Babilônia Chapéu Mangueira Chapéu Mangueira/Babilônia entorno Chapéu Mangueira/Babilônia entorno (ladeira) Providência Providência - Cruzeiro e motovia Providência - Igreja e plano inclinado Providência - Ladeira Favela Bairro Providência - Pedra Lisa Providência - Vila Portuária Providência Entorno Santa Marta Santa Marta (Pico) Santa Marta entorno (Entrada) Santa Marta entorno Restante da cidade – favelas Restante da cidade - não favela % alfabetizados acima de 11 % alfabetizados acima de 15 85% 96% 84% 96% R$ R$ 490,30 466,94 100% 100% R$ 4.126,29 98% 96% 94% 98% 95% 95% R$ R$ R$ 1.730,34 314,82 327,59 84% 82% R$ 304,07 92% 99% 98% 96% 92% 90% 98% 99% 94% 98% 91% 99% 98% 96% 92% 90% 97% 99% 93% 98% R$ R$ R$ R$ R$ R$ R$ R$ R$ R$ 188,21 294,58 478,65 517,70 455,21 264,09 1.169,28 2.853,47 382,99 1.378,92 Renda per capita Desagregando espacialmente os resultados de renda e alfabetização, conforme a tabela 9, percebe-se que a renda per capita da Babilônia é ligeiramente superior à do Chapéu. Desta forma, a Babilônia tem, percentualmente, mais analfabetos, porém apresenta maior renda per capita. Pode-se atribuir esta diferença no índice analfabetismo à tradição do Chapéu Mangueira na área de educação, representada pela, hoje municipalizada, escola da tia Marcela. Em contraposição, na Babilônia havia apenas a creche da Percília, ou seja, uma ONG de menor porte financiada por instituições internacionais. Além do mais, a região da ladeira apresenta uma renda significativamente mais elevada do que as áreas da favela da Providência. Este dado corrobora os dados das entrevistas com moradores, que não consideram a região da ladeira como parte integrante da comunidade. A providência é a favela com menor renda per capita, principalmente as regiões da Pedra Lisa e da ladeira do Favela Bairro, com renda per capita, respectivamente, de R$ 294,58 e R$ 188,21. As demais áreas dessa favela 209 não chegam a apresentar valores altos, uma vez que todas, com exceção da Vila Portuária, apresentam renda per capita menores do que a média das favelas do restante da cidade. A Vila Portuária é a área com maior índice, alcançado o valor de R$ 478,65. O Entorno da Providência, além de ser ligeiramente melhor no índice de analfabetismo, também tem renda, em termos per capita, um pouco maior do que a favela, ainda que seja a menor diferença favela-entorno observada nos campos da pesquisa. Quanto ao Santa Marta, o quadro das rendas per capita é heterogêneo, variando desde R$ 1.169,28 na região da entrada, até R$ 264,09 na área do Pico. A área da entrada tem efeito positivo na média, porém, desconsiderando esta região, sua renda per capita permanece um pouco superior à média das demais favelas cariocas. 1.4 Desigualdade de Renda Tabela 10 - Coeficiente de variação das áreas na classificação sintética Área Índice Providência 0,869192 Providência Entorno 1,397526 Santa Marta 1,698091 Santa Marta entorno Chapéu Mangueira/Babilônia entorno 1,506803 Chapéu Mangueira/Babi 1,635341 1,99327 Restante da cidade - favelas 1,255716 Restante da cidade - não favela 2,108045 A tabela 10 permite perceber o coeficiente de variação da renda em cada local, que equivale a uma proxy da distribuição de renda. O indicador utilizado varia entre x e y, quanto mais próximo de y, maior a variação de renda. Percebe-se que das três favelas, Chapéu Mangueira/Babilônia apresenta a maior variação da renda. Provalmente porque agrega duas comunidades com trajetórias históricas próximas e relacionadas, porém, não completamente compartilhadas. O mesmo vale para a institucionalidade e a inserção de atores externos como o Estado e o Mercado em ambas localidades. 210 Entre todas as áreas, a maior desigualdade de renda aparece no restante da cidade não compreendido por favelas. Este resultado é esperado, uma vez que esta área engloba a maior parcela da cidade, contemplando uma ampla diversidade de regiões. Tanto para Chapéu Mangueira/Babilônia, quanto para Santa Marta, as áreas de favela apresentam uma variação de renda maior do que a de seu entorno. Na Providência, esta relação se inverte. 1.5 Cor/raça Geral - cor 100% 90% 80% 70% 60% 50% 40% 30% 20% 10% 0% amarelo preto pardo indígena branco A figura mostra que a maior diferença entorno-favela, em proporção de negros e pardos, também reside no Chapéu Mangueira/Babilônia. A favela com maior participação de negros e pardos também é a comunidade Chapéu Mangueira/Babilônia. As favelas estudadas se aproximam do padrão médio do restante das favelas cariocas. 211 1.6 Energia elétrica Tabela 11 – Tipo de medidor de energia elétrica Santa Marta Santa Marta entorno Chapéu Mangueira/Ba bilônia entorno Babilônia Restante da cidade - não favela Domicílios particulares permanentes com energia elétrica de companhia distribuidora e com medidor de uso exclusivo * 64% 81% 97% 93% 99% 66% 100% 71% 93% Domicílios particulares permanentes com energia elétrica de companhia distribuidora e com medidor comum a mais de um domicílio* 8% 9% 2% 6% 1% 24% 0% 10% 4% 1% 0% 10% 0% 19% 3% Domicílios particulares permanentes com 28% 10% 2% energia elétrica de companhia distribuidora e sem medidor * *(% sobre domicílios c energia elétrica de distribuidora) Chapéu Mangueira Restante da cidade favelas Providência Providência Entorno Os dados apresentados na tabela 11 indicam que a maior proporção de domicílios sem medidor está na Providência. Já o Chapéu Mangueira é a favela com maior percentual de domílios com medidor de uso exclusivo (100%), o que pode ser explicada pela história de reivindicação dos moradores do Chapéu ao acesso a energia elétrica. 212 1.7 Ocupação do domicílio Tabela 12 – Tipo de ocupação do domicílio na classificação sintética Domicílios particulares permanentes alugados Área Domicílios particulares permanentes cedidos de outra forma Domicílios particulares permanentes em outra condição de ocupação (não são próprios, alugados, nem cedidos) Domicílios particulares permanentes cedidos por empregador Domicílios particulares próprios Providência 18,05% 3,22% 0,33% 0,05% 78,35% Providência Entorno Restante da cidade favelas Restante da cidade - não favela 39,42% 5,68% 10,29% 0,45% 44,16% 20,82% 2,12% 0,77% 0,11% 76,18% 22,64% 3,18% 0,65% 1,11% 72,42% Santa Marta 18,62% 2,21% 0,17% 0,09% 78,91% Santa Marta entorno Chapéu Mangueira/Babilônia entorno 28,03% 3,38% 0,26% 1,84% 66,49% 28,77% 3,41% 0,36% 3,02% 64,45% Chapéu Mangueira/Babi 23,94% 0,17% 0,25% 0,17% 75,47% (% sobre domicílios permanentes) Os resultados de ocupação do domicílio devem ser entendidos à luz da definição fornecida pelo IBGE: “Quanto à condição de ocupação, classificou-se o domicílio particular permanente como: · Próprio já quitado - quando o domicílio era de propriedade, total ou parcial, de um ou mais moradores, estando integralmente pago; · Próprio em aquisição - quando o domicílio era de propriedade, total ou parcial, de um ou mais moradores e ainda não estava integralmente pago; · Alugado - quando o domicílio era alugado e o aluguel era pago por um ou mais moradores. Considerou-se também como alugado o domicílio em que o empregador (de qualquer um dos moradores) pagava, como parte integrante do salário, uma parcela em dinheiro para o pagamento do aluguel; · Cedido por empregador - quando o domicílio era cedido por empregador (público ou privado) de qualquer um dos moradores, ainda que mediante uma taxa de ocupação ou conservação (condomínio, gás, luz, etc.). Incluiu- se, neste caso, o domicílio cujo aluguel era pago diretamente pelo empregador de um dos moradores do domicílio; 213 · Cedido de outra forma - quando o domicílio era cedido gratuitamente por pessoa que não era moradora ou por instituição que não era empregadora de algum dos moradores, ainda que mediante uma taxa de ocupação (impostos, condomínio etc.) ou de conservação. Incluiu se, neste caso, o domicílio cujo aluguel integral era pago, direta ou indiretamente, por não morador ou por instituição que não era empregadora de algum morador; ou · Outra condição - quando o domicílio era ocupado de forma diferente das anteriormente relacionadas. Incluíram-se neste caso: o domicílio cujo aluguel, pago por morador, referia-se à unidade domiciliar em conjunto com unidade não residencial (oficina, loja, etc.); o domicílio localizado em estabelecimento agropecuário arrendado; e, também, o domicílio ocupado por invasão.” A tabela 12 apresenta situação de ocupação do domicílio na classificação sintética. Os resultados revelam que a maior proporção de imóveis alugados é no entorno da Providência. Nesta área, apenas 44,16% dos domicílios são próprios. Em média, 20,82% dos domílios das demais favelas do Rio são alugados. Santa Marta e Providência têm valores próximos à esta média. Um padrão perceptível em todos três campo e no restante da cidade é que a proporção de domicílios próprios é maior dentro da favela do que em seu entorno. Porém, devido à falta de regularização fundiária, são “proprietários” que não apresentam título de posse. Um valor que se afasta da média dos demais setores é o entorno da providência, com 10,29% de “domicílios particulares permanentes em outra condição de ocupação” (cedidos por terceiros que não são nem empregadores nem moradores) e 5,68% cedidos de outra forma (que no caso da favela, analisando a descrição do IBGE, só podem se referir a domicílios ocupados por invasão). 214 Tabela 13 – Tipo de ocupação do domicílio na classificação desagregada Favelas Babilônia Chapéu Mangueira Providência Providência Cruzeiro e motovia Providência Igreja e plano inclinado Providência Ladeira Favela Bairro Providência Pedra Lisa Providência - Vila Portuária Providência Entorno Restante da cidade - favelas Restante da cidade - não favela Santa Marta Santa Marta entorno Santa Marta (PICO) Santa Marta entorno especial Chapéu Mangueira/Babilôn ia entorno Chapéu Mangueira/Babilôn ia entorno (ladeira) Domicílios particulares permanentes em outra condição de ocupação (não são próprios, alugados, nem cedidos) (% sobre domicílios permanentes) Domicílios particulares permanentes alugados (% sobre domicílios permanentes) Domicílios particulares permanentes cedidos por empregador (% sobre domicílios permanentes) 23,68% 24,44% 14,84% 0,26% 0,00% 0,00% 0,00% 0,00% 0,17% 0,39% 0,00% 0,17% 75,68% 75,56% 84,82% 13,91% 0,38% 0,00% 0,00% 85,71% 19,54% 0,00% 1,15% 1,15% 78,16% 6,84% 0,00% 0,85% 0,85% 91,45% 10,00% 0,00% 0,00% 0,00% 90,00% 26,26% 0,00% 0,19% 0,19% 73,37% 39,42% 0,45% 10,29% 10,29% 39,56% 20,82% 0,11% 0,77% 0,77% 77,53% 22,64% 20,11% 1,11% 0,09% 0,65% 0,19% 0,65% 0,19% 74,96% 79,41% 27,66% 1,92% 0,30% 0,30% 69,82% 5,74% 0,00% 0,00% 0,00% 94,26% 30,95% 1,19% 0,00% 0,00% 67,86% 28,60% 3,06% 0,36% 0,36% 67,61% 40,00% 0,00% 0,00% 0,00% 60,00% Domicílios particulares permanentes cedidos de outra forma (% sobre domicílios permanentes) Domicílios particulares próprios Os dados desagregados, apresentados na tabela 13, mostram que a área da Providência com maior proporção de domicílios alugados é a Pedra Lisa. No Santa Marta é o “Santa Marta entorno especial”. No Santa Marta, um número que chama atenção é a proporção de 94,26% de domicílios próprios na região do pico. No caso do Chapéu Mangueira/Babilônia, ambas comunidades 215 apresentam valores muito próximos, variando em torno de 24% para domicílios alugados e 75,5% para municípios próprios. 2. Diagnóstico Comportamental 2.1 Dados de Criminalidade A análise colocada neste trabalho se fixou na categoria de crimes violentas colocada pelo ISP 0 Instituto de Segurança Pública. Os dados analisados estão disponíveis no site do ISP. A única diferença teórica entre os crimes de lesão corporal dolosa e tentativa de homicídio é o componente volitivo do agente, ou seja, a intenção. Assim, enquanto na tentativa de homicídio a intenção é de fato matar (e a realização do crime se dá por uma frustração do homicídio, propriamente dito), na lesão corporal a intenção é ofender a integridade física da vítima. Desta forma, o registro desses crimes pode gerar uma confusão por parte do agente público (policial). Confusão esta que pode ser utilizada para ocultar tentativas de homicídio a partir de seu cadastro por lesão corporal, o que é produto de um registro enganoso dos crimes praticados. Este tipo de registro pode estar ocorrendo para que os dados mostrados possam ser mais reconfortantes do que a própria realidade. 216 2.1.1 AISP 02 – Botafogo, Humaitá e Urca Comparação de trimestres móveis – Crimes Violentos Títulos Trimestre móvel - abr/mai/jun Vítimas de crimes violentos 2011 2012 Dif. Abs. Homicídio doloso 2 2 0 Lesão corporal seguida de morte 0 0 0 0 0 0 Latrocínio Tentativa de homicídio 2 1 -1 Lesão corporal dolosa 177 251 74 Estupro 5 9 4 Acumulado - jan a jun 2011 2012 Dif. Abs. 9 3 -6 0 0 0 0 0 0 10 7 -3 397 463 66 17 14 -3 Observações Gerais Na AISP 02, comparando o trimestre de abril, maio e junho de 2012 com o mesmo período de 2011, os delitos que tiveram maior redução absoluta foram: roubo a transeunte (com menos 122 casos ou 37,3%), lesão culposa de trânsito (com menos 63 vítimas ou 35,4%) e roubo de aparelho celular (com menos 43 casos). Entre os delitos que registraram maior aumento absoluto no período de abril, maio e junho de 2012 quando comparados ao mesmo período de 2011, estão: lesão corporal dolosa (com mais 74 vítimas ou 41,8%), furto de veículo (com mais 8 casos ou 7,8%) e extorsão (com mais 8 casos). 217 Em abril, maio e junho de 2012 o total de roubos reduziu em 37,22% ou menos 222 delitos se comparado com o mesmo período do ano anterior. Os furtos aumentaram em 8,5% ou mais 121 delitos. O número de registros reduziu em 239 ocorrências. Informações UPP Santa Marta 2008 VÍTIMAS DE CRIMES VIOLENTOS Homicídio Doloso Lesão Corporal Seguida de Morte Latrocínio (Roubo seguido de morte) Tentativa de Homicídio Lesão Corporal Dolosa Estupro 2009 3 9 30 1 2010 2011 1 35 3 1 35 4 2.1.2 AISP 05 – Centro, Gamboa, Santa Teresa, Saúde, Santo Cristo 218 Comparação de trimestres móveis – Crimes Violentos Títulos Trimestre móvel - abr/mai/jun Vítimas de crimes violentos 2011 2012 Dif. Abs. Homicídio doloso 5 7 2 Lesão corporal seguida de morte 0 0 0 Latrocínio 0 1 1 11 7 18 Tentativa de homicídio Lesão corporal dolosa 429 378 -51 8 Estupro 7 15 Acumulado - jan a jun 2011 2012 Dif. Abs. 16 17 1 0 1 1 1 1 0 19 36 17 892 832 -60 23 36 13 Observações Gerais Na AISP 05, comparando o trimestre de abril, maio e junho de 2012 com o mesmo período de 2011, os delitos que tiveram maior redução absoluta foram: roubo a transeunte (com menos 198 casos ou 23,7%), estelionato (com menos 99 casos ou 15,2%) e lesão corporal dolosa (com menos 51 vítimas ou 11,9%). Entre os delitos que registraram maior aumento absoluto no período de abril, maio e junho de 2012 quando comparados ao mesmo período de 2011, estão: tentativa de homicídio (com mais 11 vítimas), estupro (com mais 8 vítimas) e lesão culposa de trânsito (com mais 5 vítimas ou 1,6%). Em abril, maio e junho de 2012 o total de roubos reduziu em 24,3% ou menos 305 delitos se comparado com o mesmo período do ano anterior. Os furtos reduziram 1,7% ou menos 58 delitos. O número de registros reduziu em 795 ocorrências. 219 Informações UPP Providência 2.1.3 AISP 19 – Copacabana (parte), Leme Comparação de trimestres móveis – Crimes Violentos 220 Observações Gerais Na AISP 19, comparando o trimestre de abril, maio e junho de 2012 com o mesmo período de 2011, os delitos que tiveram maior redução absoluta foram: lesão culposa de trânsito (com menos 28 vítimas ou 26,7%), ameaça (com menos 12 vítimas ou 4,7%), roubo a estabelecimento comercial (com menos 9 casos) e roubo em coletivo (com menos 9 casos). Entre os delitos que registraram maior aumento absoluto no período de abril, maio e junho de 2012 quando comparados ao mesmo período de 2011, estão: lesão corporal dolosa (com mais 32 vítimas ou 15,2%), extorsão (com mais 15 casos), furto de veículos (com mais 4 casos) e estupro (com mais 4 vítimas). Em abril, maio e junho de 2012 o total de roubos reduziu em 10,4% ou menos 24 delitos se comparado com o mesmo período do ano anterior. Os furtos reduziram em 0,9% ou menos 12 delitos. O número total de registros reduziu em 78 ocorrências. Informações UPP Chapéu Mangueira/Babilônia 2008 VÍTIMAS DE CRIMES VIOLENTOS Homicídio Doloso Lesão Corporal Seguida de Morte Latrocínio (Roubo seguido de morte) Tentativa de Homicídio Lesão Corporal Dolosa Estupro 2009 2010 2011 1 5 15 1 31 1 3 30 3 31 1 221 2.1.4 Capital Comparação de trimestres móveis – Crimes Violentos – Capital Títulos Trimestre móvel - abr/mai/jun Vítimas de crimes violentos 2011 2012 Dif. Abs. Homicídio doloso 358 283 -75 Lesão corporal seguida de morte 5 4 -1 13 -3 Latrocínio 16 Tentativa de homicídio 342 384 42 Lesão corporal dolosa 7819 8464 645 Estupro 374 458 84 Acumulado - jan a jun 2011 2012 Dif. Abs. 755 655 -100 12 8 -4 27 28 1 751 863 112 17230 17545 315 766 1003 237 Observações Gerais – Capital O total de registros da Capital representou, no trimestre de abril, maio e junho de 2012, cerca de 48,3% das ocorrências do Estado. Entre os delitos que tiveram maior redução percentual no trimestre de abril, maio e junho de 2012 em relação ao mesmo período do ano anterior, encontram-se: roubo de aparelho celular (com menos 36,0% ou 356 casos), roubo em coletivo (com menos 21,5% ou 201 casos) e homicídio doloso (com menos 20,9% ou 75 vítimas). Entre os delitos que registraram maior aumento percentual, no período de abril, maio e junho de 2012 quando comparados ao mesmo período de 2011, estão: roubo de veículo (com mais 33,2% ou 744 casos), roubo a residência (com mais 29,4% ou 32 casos) e roubo de carga (com mais 26,5% ou 93 casos). Em abril, maio e junho de 2012 o total de roubos reduziu em 2,6% ou menos 393 delitos se comparado com o mesmo período do ano anterior. Os furtos reduziram em 0,02% ou menos 5 delitos. O número de registros reduziu em 346 ocorrências, ou menos 0,4%. 222 2.1.5 Análise dos Dados Na prática, pode-se perceber que, nos três campos analisados houve um aumento do registro de lesão corporal dolosa, bem como na capital como um todo. Pela nossa análise, mostramos que a redução expressiva da criminalidade violenta na capital como um todo não foi reproduzida nos campos em que trabalhamos. Assim, pode-se formular uma hipótese de que a redução da criminalidade não aconteceu, necessariamente, nas áreas de UPP, o que é curioso. Deve-se atentar para os registros de desaparecimento e encontro de cadáver e ossada. A redução da criminalidade violenta não deve implicar num aumento dos registros acima especificados. Estes registros estão nas tabelas construídas para a pesquisa. Um dado curioso que foi demonstrado pelas análises foi o expressivo aumento do número de estupros. Uma pergunta de pesquisa relevante seria: “a presença de policiais militares nas comunidades incentiva o registro de crimes sexuais?”. No momento da análise específica para cada campo, deve-se atentar para a data de implantação da UPP. Excetuando-se o Santa Marta, parece-me que os registros aumentaram após a implantação da UPP. Estudos mais recentes, desenvolvidos pelo pesquisador Ignácio Cano), do Laboratório de Análise da Violência (LAV), da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (Uerj), chegam a resultados um pouco distintos (dados e entrevistas consultados em 20/12/2013 no site do INCT/InEAC – Instituto de Estudos Comparados em Administração Institucional de Conflitos). As estatísticas divulgadas pelo Instituto de Segurança Pública do Rio de Janeiro (ISP) em setembro apontam para uma queda de 18,4% nos casos de 223 homicídios no estado em julho de 2010, em comparação ao mesmo mês de 2009. O Rio de Janeiro teve, em junho, o menor número de homicídios desde 1991, quando os dados começaram a ser monitorados pelo ISP. De acordo com o instituto, que compila os dados a partir dos registros da Polícia Civil, houve uma redução de quase 30% nos homicídios dolosos entre 2005 e 2010, levando-se em conta os primeiros semestres de cada ano. Cano comprovou a veracidade dos dados cruzando-os com o Banco de Dados do SUS. Os autos de resistência também apresentaram queda. Entre janeiro e julho deste ano, a diminuição foi de 13,3%, em relação ao mesmo período do ano passado. O LAV analisou este indicador para o acumulado dos meses de janeiro a julho e verificou uma redução em 2010 em comparação aos cinco anos anteriores. Nos anos de 2007 e 2008, foram registrados os maiores índices de mortes de civis pela polícia no primeiro semestre de toda a série histórica (conforme gráfico abaixo). 224 Para Ignácio Cano, cabe à sociedade cobrar que os autos de resistência e outros crimes letais intencionais sejam incluídos nas metas de redução de homicídio e estar ciente que o patamar de impunidade em casos de homicídio supera os 90%. A antropóloga Ana Paula Miranda, que já foi diretora do ISP, afirmou que a categoria "auto de resistência" não existe legalmente. Na opinião dela, a categoria foi criada pela polícia para justificar a eliminação de "seres matáveis". "É preciso olhar para os mortos. Quem são eles? Quais as suas trajetórias e de seus familiares? As elites morais constróem cidades de acordo com aquilo que desejam", afirmou. Para ela, existem cidadãos de duas categorias, os "matáveis" e os "não-matáveis". é preciso mais esforço para alcançar níveis aceitáveis de resolução desses crimes. Nossas análises indicavam que a falta de homogeneidade e o subjetivismo implícito nas categorias para classificação dos crimes podem explicar algumas das divergências entre dados nesse campo. Em primeiro lugar, como apontamos a subjetividade implícita em dados baseados em conceitos como intencionalidade permite ocultar muitas questões. Em segundo lugar, ao não considerar dados como os que tomamos em relação ao aparecimento de ossadas, pode reduzir artificialmente a violência nas áreas de UPP. Por fim, a aceitação sem discussão de que o crescimento de registros de crimes como estupro e violência doméstica deve-se ao fenômeno de confiança da população em fazer a denúncia merece ser mais bem estudado. Dados qualitativos revelam que podem também ser consequência da insegurança 225 gerada com a ausência do poder do tráfico na repressão e coibição de tais delitos. Finalmente, nossos dados já apontavam que o fator tempo de implantação e consolidação da presença policial no território, como no caso do Santa Marta, pode ser uma variável crítica para explicar o comportamento em relação à incidência de violência. Outro fator crítico diz respeito à mobilidade da criminalidade, desde as áreas com UPP para outras favelas. Estatísticas de março de 2013 da Secretaria de Segurança do Rio corroboram a hipótese de mudança da criminalidade. Elas mostram queda nos principais indicadores de delitos no Rio e aumento na Baixada em comparação com março de 2012. De 23 tipos de crimes, 11 registraram diminuição na capital - só três subiram e os demais ficaram estáveis. Caíram homicídios (-11,3%), estupros (38,2%), assaltos (-4,9%) e furtos (-8,7%). Já os 12 municípios da Baixada Fluminense registraram aumento em 14 indicadores e redução em apenas quatro. Sem contar com UPPs (Unidades de Polícia Pacificadora), 26 bairros da zona norte da cidade do Rio de Janeiro, onde vivem mais de 850 mil pessoas, concentram a maior parte dos principais crimes cometidos na capital. A área, que conta com o policiamento dos Batalhões de Rocha Miranda (9º BPM) e Irajá (41º BPM), registrou o maior número de homicídios entre janeiro e dezembro de 2010 - 437 casos, o que corresponde a 26,8% do total da capital (1.628). 226 De acordo com o ISP (Instituto de Segurança Pública), a região também concentrou casos de roubo seguido de morte (20,5% ou 14 casos), tentativa de homicídio (18,3% ou 285 casos) e estupro (15,2% ou 220 casos) durante todo o ano passado. Os roubos também são mais frequentes nessa parte da cidade, onde aconteceram 9,5% dos roubos a casas (53), 26,9% dos roubos de veículos (3.175), 20,1% dos roubos de cargas (281), 19,6% dos roubos a pedestres (7.128), 26,6% dos roubos ocorridos dentro de ônibus (1.273) e 18,5% dos furtos de veículos (1.654). A ausência de políticas de segurança que contemplem áreas com e sem UPP tem sido vista por especialistas como um dos fatores que explicam a migração da violência e criminalidade no território dentro e fora do Estado do Rio de Janeir0, bem como o crescimento de delitos como furtos e roubos com o declínio de homicídios, por exemplo. A nosso ver, faz-se necessário um estudo mais detalhado da economia política do crime, que vá além das estatísticas apresentadas. 227 Além disso, confrontos recentes em áreas de UPP demonstram que a estratégia de mobilidade da criminalidade pode estar sendo combinada com tentativas de retorno do controle do território por facções criminosas, o que já havia sido identificado em nossas entrevistas. 2.2 Comportamento dos Eleitores O comportamento político dos moradores de favelas e suas relações com outros agentes políticos têm sido estudados pela historiografia das favelas cariocas. Destacam nesse sentido a relação com os políticos reformadores que assumiram papeis importantes na construção do Estado moderno, tendo como marco no Rio de Janeiro a figura de Pedro Ernesto, responsável pela transformação urbana e política da cidade. Apesar de o modelo Varguista privilegiar a incorporação dos trabalhadores formais por meio do sindicalismo corporativista e da Previdência Social, e mesmo tendo em conta a barreira imposta pela proibição de votos de analfabetos, a busca por apoio político entre favelados também teve lugar. O patrocínio inaugurado por Pedro Ernesto a competições de samba e o registro de eleitores foram identificados por Fischer10, como parte dessa nova atitude de transformação urbana e social. Se bem a mescla de repressão, clientelismo e patronagem tenha persistido ao longo de toda a trajetória política das favelas, outras formas de participação política também se fizeram presentes. O investimento político de atores externos nas favelas – sejam eles religiosos, profissionais liberais, estrangeiros membros do Peace Corps, ou militantes de Partidos Comunistas na clandestinidade11 – demonstra a importância das populações faveladas na disputa de poder. Com relação ao envolvimento político dos moradores, foram, identificadas no estudo de Perlman que as participações política como eleitores ou como cabos eleitorais eram menos expressivas que a ação política direta na busca de defesa de melhorias e na intermediação de seus interesses junto à política administrativa. O estudo diferencia também os líderes da favela dos 10 FISHCER, B. A Poverty of Rights, Stanford University Press, California, 2008, p. 57. 11 Valladares, Licia – A Invenção da Favela, Editora FGV, Rio de Janeiro, 2005, cap. 2. 228 demais moradores, já que constatou uma grande diferença entre os comportamentos políticos de ambos os grupos12. Considerando o período atual de vigência ininterrupta da democracia eleitoral desde a Constituição Federal de 1988 com a extensão do direito de voto aos analfabetos, seria esperada uma maior aproximação entre os votos dos eleitores de favelas com os votos dos demais eleitores da cidade. Coerentemente, estudo sobre votos de moradores da favela Brasília Teimosa em Recife concluem que o uso indiscriminado da noção de clientelismo obscurece a compreensão do comportamento dos eleitores a invés de explicála. A perda da eficácia das práticas clientelistas é explicada por seis fatores identificados: o descrédito em relação aos políticos; abundância das ofertas de transação; impossibilidade certeza sobre a lealdade do eleitor; multiplicação dos atores políticos com a descentralização administrativa; aumento dos custos das práticas clientelistas; evocação dos direitos dos cidadãos13. Apesar de identificar que a democracia não aproximou o mundo da política da população, a autora do estudo sobre Brasília Teimosa encontra que os moradores têm uma noção clara da função dos políticos analisados a partir dos seus deveres e obrigações, concepções chave para compreensão da constante imbricação entre o social e o político. No entanto, as obrigações morais dos eleitores são percebidas diferentemente de acordo com a faixa etária, o que acarretaria diferentes escolhas eleitorais, a depender do vínculo moral de gratidão que persiste entre os mais idosos com relação a suas obrigações em relação aos candidatos que lhes prestaram algum favor. No entanto, essas diferenças entre grupos etários se diluem quando os candidatos são considerados a partir do critério moral da experiência, ou seja, do que já fez. Em estudo sobre a orientação do voto de jovens em favelas de Belo 12 PERLMAN, Janice – O Mito da Marginalidade, Editora Paz e Terra, Rio de Janeiro, 1997, p. VIDAL, Dominique – Categorias Morais e política – uma abordagem etnográfica do voto em uma favela do Recife, Ver. Mediações, Londrina, vol.3 no.1, p 53-60, jan-jun 1988. 13 229 Horizonte foi encontrado que se trata fundamentalmente de um voto ideológico, embora o voto pragmático também se apresente com expressiva força14. Esses estudos de casos têm grande importância ao apontar o decréscimo da importância do clientelismo como categoria explicativa do comportamento eleitoral de favelados, além de identificar diferenças da relação de moradores e lideranças com os políticos, demonstrando que a juventude se distancia cada vez mais do modelo tradicional de voto de clientela. No entanto, limitam-se a casos particulares, o que não permite sua generalização imediata a outros contextos, mas que mostra tendências bastante claras nesse movimento de mudanças comportamentais durante o período de consolidação da democracia eleitoral. O estudo quantitativo do comportamento eleitoral dos moradores de favelas não é facilmente realizado visto que os dados eleitorais se baseiam em Zonas eleitorais que não diferenciam as favelas dos seus entornos. O exemplo do estudo sobre a influencia das milícias nas eleições em uma favela do Rio de Janeiro teve que enfrentar esses problemas. Em estudo sobre a votação de um deputado, membro da ALERJ citado na CPI das Milícias, foi encontrado que em áreas de domínio das milícias, esse pode ser um fator crucial para determinar o comportamento dos eleitores dessa comunidade, embora sua força eleitoral varie ao longo das eleições, de acordo com seu domínio e poder sobre o território15. Em algumas seções mais próximas do domínio territorial da milícia, a votação do candidato chegou a alcançar 70%, decrescendo para 24% em seções que se encontravam na fronteira desse território, o que ainda é um índice muito elevado. 14 Martins, Daniel - ORIENTAÇÃO DO VOTO DE JOVENS MORADORES DE VILAS E FAVELAS DA CIDADE DE BELO HORIZONTE. 15 Ventura, Vinicius e Silva, Juwer, GEOGRAFIA E VOTO: COMPORTAMENTO ELEITORAL EM ESPAÇOS DE CONTROLE CRIMINOSO NA CIDADE DO RIO DE JANEIRO – BRASIL , trabalho apresentado no Congresso de geógrafos do Peru 2013. 230 Em estudo sobre a implantação do Programa Favela-Bairro em três localidades distintas – uma delas sendo Rio das Pedras, controlada pela milícia, a outra Vigário Geral, controlada por uma facção de traficantes e um Loteamento onde não havia controle armado – apontamos que a milícia procurava estabelecer o poder e controle sobre os comportamentos da população de forma muito mais sistemática e enraizada do que os traficantes, nesse estudo de caso16. No entanto, a tentativa de captura dos eleitores por grupos de traficantes também está presente no cotidiano das favelas, onde a pressão ou repressão aos presidentes de associações de moradores tem sido noticiada pela mídia. O que se pode afirmar é que não existe uma relação única entre ocupação territorial por grupos armados e captura dos eleitores. Em nossa pesquisa atual não fizemos um estudo detalhado sobre o comportamento eleitoral dos moradores das favelas que estudamos. Em primeiro lugar porque esse não era nosso objetivo principal. No entanto, é necessário ter em conta a importância da atividade política nessas 16 FLEURY et all – Programa Favela Bairro em três localidades do Rio de Janeiro – Relatório de Pesquisa. PEEP/EBAPE, 2000 231 comunidades, que se expressará mais claramente na análise qualitativa onde as três localidades assumem configurações políticas bastante marcadas. O Chapéu Mangueira/Babilônia apresenta uma importante tradição política desde a atuação de atores externos como os Padres Dominicanos, voluntários e profissionais liberais vinculados à Igreja Católica, quanto a organização de uma base do PCB – Partido Comunista do Brasil, onde militaram os líderes mais reconhecidos pela população, as saber, Sr. Lúcio e o Bola. Ambos foram responsáveis pela organização da associação e a luta por melhorias, junto a outros líderes, como será apresentado no capítulo sobre a história da favela. As memórias sobre a resistência tanto às remoções quanto à ditadura são muito presentes, inclusive entre os jovens ativistas locais, que se orgulham do fato do Sr. Lúcio haver abrigado vários militantes de partidos clandestinos durante a ditadura e até mesmo de que Che Guevara haver pernoitado ali por uma noite, também na clandestinidade. Posteriormente, parte das lideranças locais se filiou ao Partido dos Trabalhadores e teve início uma carreira política ascendente de uma de suas moradoras, Benedita da Silva, viúva do líder “Bola”. TRAJETÓRIA POLÍTICA DE BENEDITA DA SILVA Benedita foi eleita sucessivamente vereadora do Rio de Janeiro em 1982, após militância na Associação de Favelas do Estado do Rio de Janeiro. Em 1986 foi eleita deputada federal, e se reelegeu para este cargo em 1990. Na Legislatura de 1987-1991, Benedita participou da Assembleia Nacional Constituinte, onde atuou como titular da Subcomissão dos Negros, das Populações Indígenas e Minorias. Em seguida, passou à Comissão de Ordem Social e da Comissão dos Direitos e Garantias do Homem e da Mulher. Em 1992, foi candidata do PT a prefeitura do Rio de Janeiro. Terminou o primeiro turno em 1º lugar, mas foi derrotada no segundo turno por César Maia, candidato do PMDB. Em 1994, elegeu-se senadora, tornando-se a primeira mulher negra a ocupar uma vaga no Senado. Foi eleita vice-governadora do Rio de Janeiro em 1998 na chapa de Anthony Garotinho. Para assumir o cargo, renunciou ao mandato de Senadora, que só terminaria em 2002 - assumiu o suplente Geraldo Cândido.Com a renúncia de Anthony Garotinho para 232 concorrer à Presidência da República em abril de 2002, assumiu o governo do estado do Rio de Janeiro. Foi candidata a reeleição ao governo do Rio de Janeiro nas eleições de 2002. Com grande rejeição junto a população foi derrotada por Rosinha Garotinho, ex-primeira-dama do estado (mulher de Anthony Garotinho). Com a eleição de Lula para a Presidência da República, assumiu a Secretaria Especial da Assistência e Promoção Social, com status ministerial. Assumiu em janeiro de 2007, a Secretaria de Estado de Assistência Social e Direitos Humanos, no Governo Sérgio Cabral Filho. Foi em 2010 eleita deputada federal pelo Rio de Janeiro com 71.036 votos. A trajetória de sua mais ilustre moradora não é espontaneamente mencionada pelos moradores durante as entrevistas. Diferentemente da liderança do Sr. Lucio e do Bola, que são amplamente reconhecidas como defensores da comunidade, a exponencial projeção política de Benedita é vista com reservas pois desvinculou-se da população local, ainda que todos tenham o cuidado de preservar sua imagem por ter se projetado politicamente sendo mulher, negra e favelada. A forte tradição política no Chapéu Mangueira contrasta com o grande controle social exercido sobre a população local pela principal liderança histórica da Babilônia, o que será explorado na discussão sobre associativismo. Mesmo assim, a identificação das lideranças com partidos políticos é maior que nas outras favelas estudadas, com predomínio para a militância no PT. Algumas lideranças jovens chegam a expressar a vontade de ter uma carreira política. Já o caso do Santa Marta tem alguns pontos similares como o papel de apoiadores externos pertencentes à Igreja Católica, no caso da Congregação dos Jesuitas, que tiveram uma enorme influência na trajetória da comunidade. Nesse caso, com uma presença mais direta e marcante de um representando da Congregação Jesuíta que ali residiu por alguns anos. Também foram 233 marcantes a presença de profissionais liberais ligados à PUC e ao Colégio Santo Inácio no apoio aos moradores em diferentes situações. O engajamento de algumas lideranças locais, como Itamar Silva na disputa de poder na Associação de Moradores e na FAFERJ marcaram a trajetória política dessa comunidade. A militancia dessa liderança no PT e sua permanencia na comunidade mesmo depois de formado na Universidade e de obter projeção política e profissional também é um fator importante na visibilidade alcançada pelo Santa Marta e na construção da identidade dos seus moradores. Frequentemente visitada por políticos locais, naiconais e internacionais, foi a primeira favela a receber a UPP, em 2009, recebendo também a visita do então Presidente Lula junto com outras autoridades em 2010. O evento no Dona Marta teve também a entrega dos dois primeiros cheques de um programa de financiamento ao empreendedorismo promovido pela agência estadual de fomento, a Investe Rio. “Isso aqui é um empréstimo. Não é dinheiro dado, não”, brincou Lula, dirigindo-se aos moradores. O presidente destacou também o fato de as UPPs permitirem que a favela fosse visitada por pessoas da comitiva presidencial que nunca tinham pensado em subir o morro. Lula estava acompanhado dos ministros Márcio Fortes, das Cidades, Luiz Paulo Barreto, da Justiça, Nilcéa Freire, da Secretaria Especial de Política para as Mulheres, e do presidente do Sebrae, Paulo Okamoto. O morro da Providência tem uma situação social bastante distinta das outras duas localidades estudadas, como vimos no diagnóstico socioeconômico. Situado no centro da cidade, na degradada região entre a Central do Brasil e a Zona Portuária, a comunidade se ressente de ter sido, até agora relegada por todos os agentes políticos externos. Só a partir da renovação urbana na Zona Portuária é que o ritmo de transformações se intensificou, com as obras do teleférico, remoções, visitas de políticos e empresários. 234 Nas eleições para a Prefeitura Municipal em 2004 o candidato Marcelo Crivella do PRB obtém seus melhores percentuais em Bairros como Zona Oeste, Central do Brasil e Leopoldina, sendo que o mesmo desempenho se repete em 2008, onde nessas áreas supera sua posição de terceiro colocado para alçar-se ao segundo posto, ocupado por Gabeira no computo geral. Esse resultado é explicado pela forte presença de evangélicos é considerada mais expressiva, como demonstrado no estudo de Jacob et alli sobre a geografia do voto nas eleições municipais.17 17 Cesar Romero Jacob; Dora Rodrigues Hees; Philippe Waniez; Violette Brustlein - A geografia do voto nas eleições para prefeito e presidente nas cidades do Rio de Janeiro e São Paulo: 1996-2010, PUC, RJ, e_book 235 236 A existência na região da Providência de um programa de melhoria habitacional de moradias “Cimento Social” pessoalmente vinculado ao político Crivella poderia ser uma explicação para sua expressiva votação nessa zona eleitoral, já que mesmo mais recentemente, como Ministro da Pesca, ele continua a se identificar como patrocinador do programa, como pode ser visto em sua divulgação abaixo: “Ministro Crivella contempla mais uma família com o Programa Cimento Social” “Esse menino lindo dá para todos nós uma lição de vida”, disse emocionado o ministro Marcelo Crivella, da Pesca e Aquicutlura, ao entregar a 27ª casa do Programa Cimento Social à família do cadeirante, Rafael dos Santos, de apenas dez anos, portador de distrofia muscular espinhal. O menino, morador do Morro do Salgueiro, comoveu a todos com a sua superação e generosidade. “Pedi essa casa ao ministro Crivella para ajudar a minha avó. Antes, tinha mofo em todo lugar e eu tinha medo da casa desabar. Queria que meus avós pudessem viver bem e graças a Deus e ao ministro, a partir de hoje, eles estarão seguros aqui”, afirmou Rafael. ============================================================ Podemos considerar esse tipo de postura como um incentivo ao voto clientelista ou pragmático. No entanto, mesmo com a expressiva votação na Zona da Providência obtida pelo candidato Crivella, chama a atenção o fato de que em 2008, Alexandre Molon do PT tenha obtido, na disputa das eleições para prefeito, seus melhores resultados nas mesmas áreas populares da Zona Oeste, Central do Brasil e Leopoldina, diferenciando-se do candidato do PT nas eleições anteriores (Bittar, em 2004) que obteve seus votos predominantemente em bairro de classe média. 237 O apoio ao candidato Molon, um crítico da intervenção governamental nas favelas e das remoções para urbanização dessas localidades, mostra também um voto no qual pragmatismo e ideologia se somam. Em resumo, podemos afirmar que não existe um padrão único de comportamento eleitoral das populações residentes nas favelas, e que as diferenças podem ser explicadas por trajetórias políticas distintas, papel das lideranças locais, domínio armado associado a expectativas eleitorais, papel de atores políticos externos, existências de programas sociais identificados com políticos profissionais, assim como a perda de influencia do clientelismo no voto dos jovens. No entanto, é evidente que a favela é um espaço de disputa de poder e de articulação com a política eleitoral e partidária. Seus moradores reconhecem o papel do Governador Brizola na origem do processo de mudança de posição da política pública no tratamento da questão da segurança, bem como são capazes de identificar o político responsável por melhorias urbanas em sua comunidade ou por remoções forças. Assim, além do Brizola, são mencionados o Programa Favela Bairro e Bairrinho nos governos estaduais de Conde e Cesar Maia, o Morar Carioca e as remoções na gestão municipal de Eduardo Paes e na secretaria de Habitação do Bittar, o PAC e o Minha Casa, Minha Vida do governo de Dilma Rousseff. A mescla das noções de obrigações e direitos com a expectativa pessoal de melhoria de sua situação pessoal em função da ação dos governantes, aos quais tratam em seus discursos com extremada intimidade, não tornam menos político, homogêneo ou previsível o comportamento eleitoral dos moradores. 238 4. Campo Chapéu-Mangueira e Babilônia 4.1 Contextualização histórica das comunidades Chapéu Mangueira e Babilônia Introdução Este trabalho é resultado da pesquisa em fontes documentais e investigação de campo nas comunidades do Chapéu Mangueira e Babilônia no período de abril de 2012 a agosto de 2013, conforme os objetivos do projeto de pesquisa como um todo, que pretende analisar as condições de cidadania e discriminação em contextos de implantação da política de pacificação em favelas cariocas. A contextualização se pautou pela questão “de quais maneiras, ao longo do tempo e de suas constituições enquanto favelas, as lutas por direitos e de melhores condições de vida realizadas por parte da população mobilizaram e tensionaram transformações sociais, culturais e políticas, bem como as relações que esta eleceram com o seu entorno”? Dessa maneira, pretende-se apresentar tanto dados documentais quanto memórias da população entrevistada em sua multiplicidade de percepções e versões sobre a história, entendendo as diferentes fontes como discursos a serem analisados qualitativamente do ponto de vista sociológico. De princípio, Chapéu Mangueira e Babilônia não possuem a mesma história e nem as mesmas características atuais na versão unanime de seus moradores, apesar de pertencerem ao mesmo espaço geofísico. O que há de semelhança entre os diferentes discursos é exatamente a afirmação constante de que, pelo fato de cada uma das comunidades terem tido histórias distintas, suas condições atuais também serem particulares, que se traduz na relação direta e determinante entre passado e presente. Essa dualidade marca não somente o discurso sobre o passado, mas também, as explicações sobre as relações estabelecidas atualmente com o poder público, o mercado e o entorno. 239 No imaginário comum a favela da Babilônia é a mais antiga e traços rurais, que é marcada por uma população oriunda especialmente do Norte e Nordeste do país, que tem uma condição socioeconômica mais pobre e que está associada a uma memória de afinidade política com o exército e o período da ditadura militar brasileira. Chapéu Mangueira é representada coletivamente como o extremo oposto: representa uma favela moderna, de ocupação mais recente por trabalhadores urbanos, de resistência política frente à ditadura e às constantes ameaças de remoções, construção de associação de moradores ligados à partidos políticos comunistas e construção de bens públicos sobreviventes até os dias atuais. Mitos de origem Entre fatos, documentos e memórias, há uma disputa de versões discursivas sobre o surgimento das favelas da Babilônia e do Chapéu Mangueira, situadas no Morro da Babilônia, bairro do Leme, região nobre do município do Rio de Janeiro. Fontes bibliográficas indicam que as primeiras moradias no Morro da Babilônia surgiram ainda no período colonial, em 1776, com a chegada dos militares e a instalação do Forte Duque de Caxias, mais conhecido como Forte do Leme, antigo Forte do Vigia. Até final do século XIX, o Leme abrigava apenas algumas instalações militares que visavam a proteção da costa brasileira, acessados pela Ladeira do Leme, que foi durante muito tempo uma das únicas ligações diretas entre Botafogo e Copacabana. De acordo com os moradores mais antigos de ambas as comunidades, os primeiros habitantes ocuparam o morro a partir da segunda metade do século XIX, na parte onde é atualmente a área da Babilônia, em sua parte mais alta. Assim como constam nos registros documentais, que indicam concessões de títulos a militares, tal como o decreto de 1934: [...] a existência de 240 documentos que comprovam a concessão, a título precário, em 1872 e 1889, a ex-praças do exercito, de tratos de terras, na zona em questão, demostra que, sempre que se tornou opportuno, fez o Ministério da Guerra valer os seus direitos (Decreto Nº 24.515 de 30 de Junho de 1934) . Até o início do século XX, o bairros de Copacabana e do Leme eram conhecidos como um recanto de pescadores. Copacabana se beneficiou dos investimentos realizados durante a Reforma Passos, que transformou o centro da cidade entre 1904 e 1908. Os novos bairros se consolidaram, ajudados por investimentos da prefeitura dentro da política de embelezamento e melhorias das áreas nobres. A abertura da Avenida Beira Mar facilitou a ligação com o centro e, em 1906, as aberturas do Túnel do Leme (atual Túnel Novo), pela Companhia Jardim Botânico, e da Avenida Atlântica, completaram a integração do bairro com a cidade. Em 1907 a imprensa carioca denunciava a existência de diversas habitações irregulares no Morro da Babilônia. A ocupação vizinha, do Chapéu Mangueira, estaria ligada a esta nova demanda de trabalho, tendo, portanto, uma origem mais recente, se desenvolvendo desde o início na parte mais baixa do morro, voltada aos fundos dos lotes da Rua Gustavo Sampaio, por estar mais ligada a estas novas famílias do que ao exército. Com a abertura dos túneis que transformaram o acesso aos novos bairros, a consequente ligação por bondes e o crescimento de construções, a presença de moradas provisórias dos trabalhadores foi estimulada, enquanto durassem as obras. No entanto, no século XX, com a evolução do bairro tais instalações se tornaram permanentes, entre outros motivos, pela necessidade de serviços domésticos nas casas das famílias abastadas que foram pouco a pouco substituindo o trabalho nas obras. Na década de 1910 a ocupação populacional dos morros ganhou força, e em 1907, há notícias na imprensa carioca da existência de moradias no morro da Babilônia. O Censo populacional de 1920 constata a existência de seis favelas no Rio de Janeiro. Contabilizava-se à época, 839 domicílios e seis casas de negócios no Morro da Providência, 190 casebres no Morro do Salgueiro, seis no Morro da Arrelia, 16 no Morro do Cantagalo, 59 no Morro da 241 Babilônia e 63 no Morro de São João. Ainda na década de 1920, a expansão das favelas tornou-se um fenômeno incontrolável. Mesmo sem uma sistematização confiável de dados, é possível estimar, de acordo com Goulart (1957), que na Babilônia houve um crescimento de 59 casas em 1920 para 73 em 1933. Até meados do século XX a ocupação avançou basicamente através de três acessos, que se tornaram condutores de seu desenvolvimento. O primeiro pela Ladeira do Leme e o acesso ao posto dos telégrafos. O segundo, através do qual a favela Babilônia se expandiu pela encosta oeste, voltada para a Avenida Princesa Isabel, o acesso era feito a partir de uma escadaria de serviço, que existiu até a década de 1940 na entrada do Túnel Novo. E o terceiro se formou a partir de caminhos provenientes da área do Forte, que possuíam ramificações em direção às instalações militares na Praia Vermelha e a pequenos núcleos de ocupação no topo da Pedra do Urubu e no caminho da Pescaria. A ocupação, portanto, se organizava a partir da sua localidade mais alta, se estendendo pelos caminhos oriundos dos extremos opostos do morro. Foi apenas em meados do século XX que a ocupação se deslocou em direção a Ladeira Ary Barroso, que atualmente consiste no principal acesso utilizado pelos moradores, mas não o único como se observou no trabalho de campo. Junto ao Morro da Babilônia ficava a Chácara de Torquato Couto, na qual residiu a família de Wilhelm Marx, pai do paisagista Roberto Burle Marx, que adquiriu uma casa no sopé do Morro. Naquela época, “o airro era um recanto bucólico entre o mar e a encosta do morro, ainda totalmente coberto pela mata de vegetação nativa”. Embaixo se ligava à antiga Rua Araújo Gondim, atual General Ribeiro da Costa, onde os padres dominicanos fundaram a Igreja Nossa Senhora do Rosário, construída entre 1927 e 1931, sendo inaugurada em 1939. Na década de 1930, apesar do pequeno número de casebres, a Babilônia já era considerada uma favela consolidada considerada pela imprensa da época entre as maiores da cidade. A partir de 1934, a ocupação das encostas do Morro da Babilônia aumentou consideravelmente, dando 242 origem às Comunidades da Babilônia e do Chapéu Mangueira. A ocupação experimentou um grande desenvolvimento a partir de meados da década de1930, atingindo 200 moradias em 1948. Com o novo afluxo e respaldada pela visibilidade agora encoberta pelos edifícios de apartamentos reduzidos, conjugados e quitinetes voltados a uma classe menos abastada, que surgiam na Avenida Princesa Isabel, a encosta oeste voltou a ser ocupada. Na memória da população existe um discurso predominante sobre a origem do nome “Babilônia”, que é a de que, como a ocupação se deu na parte mais alta do morro e que tem uma vista muito bonita para a orla da praia e o morro do pão de açúcar, o local foi apelidado primeiramente pelos primeiros moradores militares como uma alusão aos Jardins Suspensos da Babilônia. Não foram encontradas outras histórias, apenas indicações de que essa é a versão mais contada. Com relação ao nome “Chapéu Mangueira”, ocorre o mesmo, em se conta que a origem do nome se deu porque no local seria construída uma fábrica de chapéu, do tipo mangueira, e, portanto, lá havia uma placa “ reve neste local Fá rica de Chapéus angueira”. A fábrica não foi construída e no local a comunidade se fundou. Essa memória é reafirmada também pelo poder público atualmente quando tratam da história de ambas as comunidades, como se verifica, por exemplo, na página virtual da Unidade de Polícia Pacificadora. Com a intensificação do controle realizado pelo exército, em meados de 1950 a população da Babilônia parou de crescer, exatamente em um período de grande expansão nas outras favelas da cidade, e, a partir da década de 1970, após a drástica retirada ocorrida em 1968 que atingiu a parte oeste e a superior do morro, a ocupação se consolida nas áreas intermediárias da encosta, parcialmente encoberta pelos prédios da Avenida Princesa Isabel e da Rua Gustavo Sampaio. Os caminhos pelo alto são abandonados, permanecendo como único acesso ativo a escadaria no topo da Ladeira Ary Barroso. Em meados da década de 1980, a ocupação se distancia do controle do Exército, transformando a relação da comunidade com o espaço construído. Se o novo período significava maior liberdade, esta transformação ocorreu em um 243 momento que a organização política do morro já estava bastante desenvolvida e consolidada. Esta constatação levou a uma valorização do espaço existente e ao desenvolvimento de um movimento de resistência ao processo de transformação e crescimento que ambas as favelas nitidamente vivenciavam. Identidades, sociabilidades e associativismo A descrição analítica apresentada nesta contextualização parte do pressuposto de que as particularidades encontradas nos movimentos associativos locais de cada uma das comunidades estão intimamente relacionadas às suas fundações. A Babilônia, tal como exposto anteriormente, foi onde se construíram as primeiras habitações em um período em que a área era dominada pelo Exército Brasileiro. Inclusive, seus primeiros moradores foram militares recéminstalados, para depois receber trabalhadores que viriam trabalhar nas obras de urbanização da cidade no início do século. Por um longo período, o exército teve tutela do espaço e controle da construção e expansão das moradias, com o apoio da Associação de Moradores da Babilônia. As características urbanísticas da favela são diferentes das do Chapéu Mangueira: muitas casas são de madeira, possuem quintal, plantações e animais de criação, áreas livres de floresta, com menor densidade populacional se comparada com favelas da mesma região da cidade, por exemplo. As mudanças que se verifica no momento atual são recentes, em função de obras de urbanização realizada pelo poder público. Tais particularidades devem-se ao controle territorial do exército – afirmação reiterada frequentemente pelos moradores. No trabalho de campo observou-se que dois fluxos migratórios marcaram a ocupação nas comunidades: uma entre as décadas de 1930 e 1950, que se deslocou mais para o Chapéu Mangueira e a segunda entre 1980 e 1990, que se espalhou entre ambas, em um período em que direitos de 244 habitação haviam sido conquistados. Tais fluxos advieram de regiões distintas do país, e ganharam força na medida em que as famílias se consolidaram nas comunidades. Na Babilônia há uma predominância de família que possuem suas origens na Paraíba, Ceará, Pernambuco, Pará, Maranhão e Bahia, entre outros estados do nordeste e norte. Já no Chapéu, existe uma predominância de mineiros, capixabas e de pessoas advindas de municípios do Estado do Rio. No plano político e associativo, as diferenças entre as ambas as favelas são claramente marcadas por seus moradores, no passado e no presente, tanto como forma de afirmação identitária, quanto de delimitação de fronteiras de pertencimento e de comportamento e convívio social. Nesse sentido, presuma-se nesse contexto que a formação da identidade e o sentido de pertencimento estejam profundamente relacionados com os modos pelos quais esses moradores vivenciaram ou herdaram memórias de vivências associadas a esses territórios – seja na Babilônia vinculadas ao controle e obediência, seja no Chapéu associadas à resistência e a subversão. Os comportamentos individuais e coletivos são frequentemente associados a tais estereótipos, por moradores de uma favela quando visam se referir à outra, ou quando se referem a si mesmo. Além disso, marcações temporais importantes da relação entre o Estado e as favelas redefinem os papéis das associações ao longo do tempo, apesar das particularidades de cada comunidade. Antes da década de 1980, as favelas que possuíam energia, luz ou outro serviço básico ocorreu por meios alheios ao poder público. A partir de então, serviços básicos foram consentidos pelo Estado, mas as associações que passaram a ser responsáveis pela distribuição dos mesmos. Após os anos de 1990 que se iniciam as intervenções urbanísticas em favelas e no período mais recente que o Estado assume a administração e o controle da distribuição dos serviços básicos. Na Babilônia, existe a Associação de Moradores que foi criada por volta de 1960 (não se sabe ao certo a data), por Sebastião dos Santos, conhecido como uma personalidade emblemática. Há relatos de que essa entidade foi criada para que as lideranças da forte, expoente e vizinha Associação do Chapéu Mangueira não entrassem politicamente na Babilônia. 245 Nascido na comunidade Sebastião era tido como braço direito do exército para a defesa dos interesses militares, inclusive para o cumprimento de remoções e perseguição de moradores que desobedeciam a ordens. Existem histórias que o remetem como “capitão do mato”, em referência a negros que serviam aos senhores de escravos no período colonial brasileiro. Conforme as entrevistas realizadas, a associação foi repassada entre famílias e gerações afins, sem disputas e rivalidades. A única eleição em que houve uma oposição evidente foi realizada no último ano de 2012, através uma chapa montada pelos jovens que pretendiam retirar a diretoria que está há 20 anos a frente da associação, do grupo da Tia Percília, contudo, a tentativa se frustrou. Sebastião esteve à frente da Associação por 24 anos, até ser assassinado em 1984 por um traficante que pretendia dominar o morro, já que ele era considerado o principal empecilho, devido sua relação com o exército. Conforme alguns relatos, até esse período, existiam o que os moradores chamam de “malandragem”, que era o traficante que usava e vendia maconha, que ajudava a comunidade, considerado “cria” (nascido e criado na favela) e que não amedrontava os moradores. Contudo, a morte de Sebastião é considerada um fator que facilitou a instalação do Comando Vermelho na Babilônia, que trazia traficantes de outras regiões e uma lógica de comercialização de drogas e de armas, diferente dos hábitos dos antigos malandros. Do ponto de vista daqueles que vivenciaram esse período de transição, o fato de muitos “meninos” entrarem para o Comando, como são até hoje chamados os traficantes que são crias da favela, facilitava o relacionamento e o vínculo dos chefes com os moradores. Com isso, o Comando Vermelho se instalou primeiro na Babilônia, e posteriormente, a facção Amigos dos Amigos entrou no Chapéu Mangueira, com a morte de outra liderança – Lafayete José Medina. Apesar das divergências políticas e associativas entre ambas as favelas, um discurso comum observa-se nas lideranças e personalidades políticas e nos moradores como um todo: política e tráfico sempre foram atividades separadas nas comunidades, em grande parte atribuída à influência da personalidade de Lúcio Bispo, sobre o qual será tratado adiante. 246 Desde a década de 1990 foi a Tia Percília, como sempre fora conhecida por todos na comunidade, que esteve à frente da Associação, com variações na diretoria, entre ela, seu filho e alguns parentes e aliados políticos. Ela faleceu em abril de 2013. Todos, mesmo quem se opuseram politicamente a ela, possuem extremo respeito à sua importância, especialmente no que se refere à educação. Percília, que desde nova se associou a Sebastião, foi a primeira educadora na Babilônia e quem alfabetizou basicamente todas as crianças. Além disso, viabilizava arrecadações de roupas e alimentos dos moradores do entorno para a favela, vínculo filantrópico com as igrejas do Leme e de Copacabana e apesar das rivalidades procurava se aproximar da Associação do Chapéu. Desde a entrada de Percília Silva, a Associação da Babilônia passou a realizar parcerias com entidades externas, especialmente ligados a igreja e ao terceiro setor, nacionais e internacionais. A Associação dos Moradores da Lauro Muller representa a parceria de longa data aliados pela causa ambiental na proteção do cume do morro da Babilônia e da área de proteção ambiental decretada legalmente. Já no Chapéu Mangueira, a construção da vida associativa se deu de modo particular do da Babilônia. Antes da fundação da Associação de Amigos do Chapéu Mangueira, a comunidade era praticamente administrada pelo Exército. Segundo os antigos moradores, qualquer problema que acontecia na área era resolvido através de uma escolta enviada pelo Comando do Posto de Observação, no alto do Morro da Babilônia. Algumas construções de barracos eram permitidas, como também eram destruídas, de acordo com a sua conveniência. A Lei Leão XIII era rigorosamente exigida pelo Tenente, autoridade maior do PO. Alguns atores externos à comunidade atuaram no apoio à fundação da Associação do Chapéu. Dentre eles, a Associação de Amigos do Leme e a Igreja, que, através da Ação Social Dominicana, assistia a Comunidade. Constituída de Padres da ala progressiva da Igreja, a Ação Social encarregou a francesa Renèe de Lòrme de ajudar na organização do Chapéu Mangueira. Outros nomes da Igreja, porém, foram juntamente com Dona Renèe, decisivos 247 na organização da comunidade. Entre eles figuram Dom Helder Barros Câmara, Frei João Cherry e Frei Marcos. Nos anos de 1950, a missionária Renée de Lorne, que era enfermeira, passou a ser voluntária junto à população do Chapéu Mangueira e liderou grandes mutirões de urbanização no morro, logo, formaram o comitê do Chapéu Mangueira, em 1957, que viabilizou as reivindicações dos moradores, como a chegada da água encanada, luz e esgoto. Além disso, comandou a construção do primeiro Posto Médico e ajudou a organizar os moradores e a fundar, no dia 6 de junho de 1960, a Associação dos Amigos do Chapéu Mangueira. Segundo o morador e ex-presidente da Associação de Moradores, Gibeon , o posto médico foi o balizador das lutas, pois era o referencial daquilo que era necessário à população. De um ponto de vista higienista, era o posto médico que determinava o que era prioritário para a Associação, independente da principal luta dos moradores, a luta por moradia no contexto das remoções lacerdistas. A representação institucional beneficiou a comunidade com melhorias urbanísticas, instalações elétricas e hidráulicas. No entanto, apesar da atuação da Associação de Moradores, foram os dominicanos, com a prática dos mutirões e a organização comunitária, os responsáveis pelas melhorias na favela. Dona Marcela, junto com Renée se destacaram no processo urbanístico e principalmente social da comunidade. Contribuiu para a construção da creche que hoje carrega seu nome em homenagem. Foi professora da escolinha que, atualmente, é do município e ocupa o prédio da Associação de Moradores. Antes das grandes construções, já lecionava em pequenos barracos e alfabetizou muitas pessoas na favela. Foi fundamental sua participação na criação do posto de saúde. Ela e a dona Renée “não deixavam ninguém dentro de casa, botavam todo mundo para trabalhar”. As duas cuidavam e levavam remédios às pessoas, fizeram diversos partos, além de muitas outras contribuições no convívio do morro. 248 Sobre a presença da Igreja, o dominicano frei Marcos de Mendes Farias “até hoje é lembrado pelo seu trabalho”: “Ele ajudava católicos, crentes, evangélicos, ricos, pobres. Lembro que uma vez ele deixou uma embaixatriz no fim da fila junto com os moradores da favela. Ele não fazia distinção, conta Lia Darcy de Oliveira, braço direito do frei de 1972 até sua morte, há dois anos. Ele criou um fundo para urbanização das duas favelas e ajudou a construir as primeiras casas de alvenaria nos anos 70. Tudo era feito com doações de amigos ricos, diz Lia, coordenadora da obra social da Igreja Dominicana do Leme. O líder comunitário Lúcio Bispo, primeiro presidente da associação de moradores do Chapéu Mangueira, confirma a atuação do frei Marcos na urbanização da favela. Sempre trabalhamos junto com os dominicanos. O frei foi uma figura bastante atuante na comunidade. E quando acontecia qualquer arbitrariedade no morro a gente logo entrava em contato. Ele fazia um tipo de mediação com o asfalto, completa.” Na década de 1940, Seu Lucio de Paula e Bispo conheceu a Babilônia e o Chapéu Mangueira, frequentando os forrós a convite dos seus companheiros de trabalho. Antes de morar no Chapéu Mangueira já havia vivido uma experiência de remoção. Em 1946, construiu casas com seus amigos utilizando a madeira que tinham acesso em seu trabalho na construção civil, num lugarejo atrás do Pinel. No ano seguinte, a favela foi removida pelas Forças Armadas. Caso a pessoa desmanchasse seu próprio barracão, eles davam as condições adequadas para o desapropriado voltar ao seu terreno e, caso não o tivesse, era paga sua passagem de volta ao seu local de origem. Seu Lúcio tinha comprado em 1947 um terreno em Vilar dos Telles, mas, naquele momento foi despejado perto de onde hoje é a refinaria de Petróleo. Construíram e sanearam o local tornando-o um anexo à favela da Alegria. Em 1949, fez um acordo com a Polícia Especial, que, em contrato, lhe permitia morar no terreno de Vilar dos Telles onde ficou até o fim do ano, quando foi morar definitivamente no Chapéu Mangueira, em 1950. Mudou-se com toda a família para a casa cujas paredes eram feitas de caixotes de bacalhau, enquanto o telhado era revestido com pedaços de latas de 20 litros. A luz era 249 apenas com lampiões e apenas para quem os podia pagar. Houve um período em que a organização procedia informalmente até que, em 1960, resolveram fundar a Associação dos Moradores da comunidade e em 1966, Lúcio se tornou o primeiro presidente dela, legalmente eleito e registrado. Ele é lembrado com frequência em situações emblemáticas, quando, por exemplo, o exército iria remover uma família e então ele se colocou à frente e disse que só se passasse por cima dele. Foi levado à prisão, e então, uma multidão clamou pela sua liberdade até ser solto. Sua secretária era a Benedita da Silva, que dava assistência às mulheres. O tesoureiro era o Bola. A partir de então começou toda a organização necessária para se comunicarem com as autoridades políticas e institucionais. Lúcio permaneceu à frente da Associação por 10 anos, mas sempre esteve na vida associativa. Muitas chapas e grupos diversos ocuparam a associação, o que marca a intensidade da vida política no Chapéu Mangueira. Ele se declarava ligado ao Partido Comunista Brasileiro e adepto ao Brizola, mas sua chapa era formada por pessoas que viriam a ser conhecidas personalidades no Partido dos Trabalhadores. O grande rival de Lúcio, constantemente lembrado pelos moradores, era Lafayette José Medina, que era um defensor do Exército e da ditadura militar, mas que sempre foi minoria nos votos para pleitear a diretoria da associação. Com a entrada da facção Amigos dos Amigos, em meados da década de 1990 após a morte de Lafayette, Lúcio sempre defendeu a posição de separação entre política e tráfico, para a Associação não perdesse sua função de diálogo entre os interesses da comunidade e do Estado que serviria de interesse de todos, independente se forem ou não traficantes. Lúcio Bispo faleceu há 5 anos e até hoje é lembrado com muita reverência por todos, como memória viva de resistência e luta por direitos, especialmente pelos mais jovens. Existe inclusive a criação de um fórum que leva seu nome, em sua homenagem. Sua família é considerada influente no comércio e na política local, e habita áreas privilegiadas na favela. Benedita da Silva, atualmente deputada federal, nasceu na favela da praia do Pinto, no bairro do Leblon. Ainda criança, sua família mudou-se para o 250 morro do Chapéu Mangueira, no Leme. Começou a trabalhar na infância, tendo sido, entre outras atividades, professora da escola comunitária no Chapéu Mangueira. Foi eleita em 1976 presidente da Associação, onde participou também do movimento de mulheres. Foi fundadora do departamento feminino da Federação das Associações de Favelas do Estado do Rio de Janeiro (FAFERJ) e do Centro de Mulheres de Favelas e Periferia (CEMUF). Em 1980 participou da fundação do Partido dos Trabalhadores (PT), sendo eleita vereadora por esta legenda, no Rio de Janeiro em 1982. Marcou sua campanha eleitoral com o slogan “negra, mulher e favelada”, afirmando suas origens populares e levantando a bandeira de luta contra as discriminações racial, de gênero e social. Casou-se em 1983 com Aguinaldo Bezerra dos Santos, conhecido como Bola, também líder comunitário no morro do Chapéu Mangueira, fundador da FAFERJ e militante do PT. A Associação dos Amigos do Chapéu Mangueira era composta por uma diretoria de 12 membros, todos eleitos democraticamente, sendo uma das primeiras entidades a se associar à Associação de Favelas do Estado da Guanabara (FAFEG). Os cargos eram divididos em Administração, Controle de Luz, Posto Médico, Escola Maternal e Jardim, Departamento Feminino, Setor de Obras, Relações Públicas e Divulgação, Departamento Jurídico, Urbanização, Contato Interior e Exterior, Água e Esgoto e [posteriormente] Galpão de Arte. No inicio da década de 60, também é fundada a Federação das Associações de Favelas do Estado da Guanabara (FAFEG) hoje Federação das Associações de Favelas do Estado do Rio de Janeiro (FAFERJ). Por estímulo do Governo Militar, para manter os moradores sob controle, muitas outras associações de favelas foram criadas. Durante a primeira eleição, em 1966, havia uma D.P.O do Exército supervisionando as movimentações no morro, e quando eram feitos os pleitos, o tenente junto com a assistente social e o administrador regional apuravam os resultados, marcando a posse da nova diretoria. Para consolidar as organizações, eles entravam em contato com as outras comunidades, através da FAFEG, no intuito de evitar qualquer tipo de remoção dando 251 reconhecimento às áreas. O apoio da Igreja Católica e de advogados, como Sobral Pinto e Bento Pires Rubião, foram muito importantes frente às autoridades. No período entre a fundação e regulamentação da Associação, foi instalada a canalização de água com auxílio da Mercedes Bens e Cruzada São Sebastião, em 1962, no governo de Lacerda. Até então, buscavam água nas minas, inclusive no bicão que ficava ao fundo do edifício Montese. Além desses movimentos associativistas, encontramos na história e memória das comunidades a presença de movimentos culturais, esportivos e pedagógicos. No morro Chapéu Mangueira, a presença da artista plástica Celeida Tostes foi decisiva na vida de muitos moradores, inclusive, da comunidade como um todo, ao reunir um grupo de mulheres em prol da favela. O encontro entre duas mulheres: a artista plástica Celeida Tostes, uma das mais importantes ceramistas brasileiras, falecida em 1995, e Maria Augusta do Nascimento Silva, Dona Augustinha, nordestina, migrante, moradora da comunidade desde 1955, uma importante liderança comunitária. No início da década de 1960, Celeida Tostes já era uma artista consagrada e desenvolvia um trabalho reconhecido na Escola de Artes Visuais do Parque Lage, inicialmente ligada à “Oficina de Artes do Fogo e Transformação de Materiais”, sob direção do artista plástico Rubens Gerchman, quando a Escola era vinculada ao Departamento de Cultura da Secretaria de Ciência e Cultura do Estado do Rio de Janeiro/FUNARJ. Dona Augustinha, por sua vez, era empregada doméstica e fazia cerâmica nos momentos de lazer reunindo-se com mulheres nordestinas e migrantes como ela, recordando técnicas aprendidas em suas famílias de origem rural. Casada com Seu Coracir, mudou-se para o Chapéu Mangueira numa época em que as casas eram de madeira ou pau-a-pique e muito distantes uma das outras. Os caminhos não existiam, era mato e trilha, com luz de lamparina, lampião. Ao falar de sua vida, sua história “esbarra” em sua relação com Celeida: “eu só me descobri nos anos 1980. Foi aí que eu descobri o que era lazer e o que era viver. Eu descobri que eu tinha valor através da Celeida Tostes”. 252 Também existiu o jornal O Chapéu, criado pelo Grupo Jovem, cujo objetivo era relatar periodicamente a vida política, social e cultural do local. E, ainda, existiam os times de futebol: o Flamenguinho, o Unidos do Leme, Cruzada, Triunfo, Nacional, Eco, Embalo (o único existente até os dias atuais) e seu rival Cacto. Em 1978, Bola constata a falta de espaços de lazer nas comunidades e funda com Gibeon, o Aventureiros do Leme, uma agremiação para oferecer opções de lazer dentro da comunidade. Gibeon, em entrevista, recorda dos saraus e encontros musicais na Casa Amarela, que era o encontro da juventude da favela na época, para ouvir o que havia de novidade no jazz, rock, blues e soul. Ele atribui essa influencia ao surgimento do funk na favela. Além desses encontros, havia um intenso encontro de rodas de samba e de organização comunitária em prol do carnaval. O Bloco Aventureiros do Leme se tornou durante décadas um importante bloco que desfilou nas ruas do Leme, mas que se encerrou por problemas financeiros. O samba e o futebol são retratados como elementos fundamentais para a união dos moradores, especialmente dos jovens, do Chapéu Mangueira e Babilônia e com o entorno. Através das rodas de samba, dos blocos de carnaval e das peladas de sábado as rivalidades políticas eram colocadas em segundo plano. A praia é eventualmente colocada como um fator que aproximou favela e bairro, desde sempre, por parte dos moradores mais antigos aos mais jovens. Em ambas as comunidades as associações, tanto da Babilônia quanto do Chapéu são retratadas como apoiadoras das iniciativas e projetos culturais e de lazer ao longo do tempo. • Intervenções urbanísticas Em 1964, com o golpe militar, o Marechal Castelo Branco assumiu o poder. A partir de articulações do governo Lacerda, o novo presidente criou, ainda em 1964, o Sistema Financeiro da Habitação e o Banco Nacional de Habitação (BNH). Tal instituição tornou-se uma peça fundamental na 253 engrenagem montada pelo novo governo, que tinha na questão da habitação o instrumento para impulsionar a economia, gerar empregos, e estimular a indústria e o mercado financeiro. Nas eleições de 1965, o candidato de Lacerda foi derrotado pelo voto popular, assumindo o governo do estado da Guanabara, o candidato da oposição, Negrão de Lima. Durante seu mandato, a Comissão Estadual de Energia ampliou sua atuação, através da implantação das Comissões de Luz. Criadas no ano anterior, tais comissões não obtiveram êxito àquela época, pois foram vistas com certa desconfiança pelas lideranças comunitárias, já que eram constituídas de forma autônoma, podendo ser usadas como instrumentos de controle e de intervenção política para enfraquecer as associações locais. A exploração dos moradores de favela, quando se tratava do fornecimento de energia elétrica, era uma questão antiga, geralmente caracterizada por irregularidades. No Chapéu Mangueira, a cobrança era ligada diretamente à Associação, através das referidas Comissões de Luz, responsáveis pela cobrança de cada morador e sócio proprietário (pessoas que contribuíam para Associação e eram detentoras de uma carteirinha). A Light fazia a cobrança num medidor único para toda a comunidade, sendo a Associação responsável pelos relógios dos moradores. Apenas o detinha quem possuía, entre os sócios, permissão da Associação ou comprasse uma posse na comunidade. Primeiramente, a luz foi disponibilizada para cem moradores pela Comissão tendo como critério quem detinha maior poder aquisitivo. Agindo de forma paralela à Associação, projetos sociais tinham investimentos oriundos da porcentagem arrecadada a partir do excesso da taxa cobrada pela Light. O morador da favela sempre pagou mais caro pela energia elétrica e esta situação não foi resolvida com as comissões de luz. Sobre esse fornecimento incidiam, além da conta comum que era dividida entres os moradores, taxas de manutenção e cobranças por serviços, como a colocação de postes e transformadores, o que não era cobrado aos moradores de outras áreas da cidade. 254 As estratégias para o fornecimento e obtenção de energia iam desde o furto por meio de ligações clandestinas, realizadas diretamente na rede elétrica, até a exploração por particulares – chamados de “cabineiros”, que eram titulares de relógios da Light instalados em uma cabine, de onde era fornecida a energia para os moradores, que ficavam à mercê do cabineiro pagando valores que o mesmo estipulava. Algumas pessoas pagavam suas contas de luz com seu próprio trabalho. Em 1966, o sistema elétrico foi ampliado a ponto de atender toda a comunidade. No entanto, somente em 1982, durante o governo Brizola, foi instalado o sistema sanitário e o elétrico que se encontram em vigor. O governo de Negrão de Lima foi caracterizado ainda pela tentativa de controle sobre as associações de moradores, o que se expressou por meio de um ato administrativo, o Decreto nº 870, no qual o governo estabeleceu as condições para o reconhecimento e a representatividade de tais entidades, inclusive ditando princípios e objetivos que deveriam constar de seus estatutos. Esse foi um período em que as associações começaram a ser atreladas à máquina administrativa do Estado, no intuito de cooptar as lideranças e esvaziar o papel político e organizativo de tais entidades. Assim, o governo transferiu para as associações funções de prestação de serviços, identificação de moradores e controle das moradias: Art. 2º. À associação devidamente autorizada e registrada compete: a) trabalhar pela comunidade no sentido de prestar assistência e benefícios de caráter coletivo, apresentando perante o Serviço Social Regional da Secretaria de Serviços Sociais o programa de ação; (...) d) não permitir a construção de novas moradias; comunicar ao serviço Social Regional da Secretaria de Serviços Sociais as moradias desocupadas (ESTADO DA GUANABARA, 1967, p. 37). No ano de 1968, o governo federal criou a Coordenação de Habitação de Interesse Social da Área Metropolitana do Grande Rio de Janeiro (CHISAM) 255 cuja atuação era norteada pelo princípio de que “os favelados são seres humanos integrados na comunidade, mas vistos por esta última como alienados por causa de sua habitação” (CHISAM apud LEEDS, 1978, p. 237). A partir dessa visão ideológica, teve início uma nova fase de remoções das favelas, numa mesma linha de continuidade da política desenvolvida por Lacerda. Realizou-se uma verdadeira campanha contra as favelas, numa prática recorrente, recuperando discursos que as colocavam em contraposição à “cidade formal”, como manchas na paisagem urbana e/ou lugares de desagregação social. Houve, porém outro aspecto. Era necessário “reabilitar” o favelado através de ações que os promovessem moral, social, sanitária e economicamente. Nessa campanha, a CHISAM e a Fundação Leão XIII, utilizaram relatórios que superestimavam dados negativos sobre as favelas e omitiam seus aspectos positivos. Dessa forma, estava em curso um processo intenso de remoções. Nesse processo, foram removidas fundamentalmente favelas localizadas em áreas nobres da Zona Sul da cidade e, portanto, de interesse para o mercado imobiliário. Na lista de favelas que seriam removidas, estavam a da Praia do Pinto, a Ilha das Dragas, o Morro da Babilônia, Catacumba, Parque Proletário da Gávea, e Macedo Sobrinho. Tais remoções contaram com a resistência dos moradores e se efetivaram através de episódios marcados por atos de violência. Um destes momentos de confronto foi relatado pelo morador Gibeon, do Chapéu Mangueira. No início da década de 1970, uma moradora construiu um banheiro de alvenaria que deveria ser derrubado por ordem do tenente da área, já que construções de alvenaria estavam proibidas. A alegação da moradora, além do óbvio motivo para a construção de um banheiro, era o fato de possuir uma “autorização” do então presidente da Associação de Moradores, Seu Lucio. Este, por sua vez, respaldou a moradora ao ponto de receber voz de prisão, sendo libertado por forte pressão popular enquanto era levado pelo tenente. 256 O episódio gerou confusão, entretanto o tal banheiro fora derrubado, assim como outras casas construídas com paredes de tijolos. As consequências da resistência puderam ser verificadas num momento depois, após a união entre a Pastoral das Favelas, em específico a Pastoral Sul (que englobava também as comunidades do Morro Azul, Cantagalo, Rocinha etc), com lideranças locais como Lucio, Bola e Benedita. Em documento enviado para o comandante da Praia Vermelha conquistaram a transferência do suprarreferido tenente. Em concomitância, uma representante de poder judiciário, Eliana, elucida aos moradores que eles poderiam construir, pois o poder publico, caso viesse a derrubar, deveria indenizar. O somatório destes eventos contribuiu para um aumento considerável de construções de alvenaria durante a década de 1980. Em 1982, Benedita da Silva é eleita vereadora e cria, em sua gestão, uma Secretaria de Favelas cujo secretário era seu companheiro Bola. O último ano da década de 1980 trouxe uma grande conquista, a construção da creche. Com o auxilio da Benedita, que levou o cônsul do Canadá até a comunidade, a comunidade escreveu um projeto enviado para “Pequenos Eventos”, no Canadá. Através de mutirão, com a verba em mãos, perceberam que muitas outras melhorias poderiam ser feitas. Inclusive, o que era para ser apenas uma sala, terminou sendo um prédio. Além destes atores, Dona Naná Sete Câmara, moradora do bairro do Leme, contribuiu para o acabamento e a comunidade, em mais um projeto, conseguiu que a ONG Viva Rio aparelhasse o espaço. A partir da segunda metade da década de 1980 começa a ser percebida a ampliação das posturas municipais, mesmo que tímidas, em relação ao atendimento da população favelada, que se encontrava em uma situação de elevado déficit de direitos sociais, referentes à infraestrutura, mas também a direitos civis e políticos. Este movimento tem maior visibilidade a partir de 1992, com a aprovação do Plano Diretor da Cidade do Rio de Janeiro, reforçando a ideia de integração das favelas à cidade formal, através da ação urbanizadora e de regularização fundiária, mas também, buscando a construção de uma nova identidade para estes aglomerados, a de bairros populares, um caminho 257 para a construção de uma representação da favela compatível com a efetiva integração à vida social e política da cidade formal. Em 1993, através do recém-criado Grupo Executivo de Programas Especiais para Assentamentos Populares (GEAP), que reuniu as secretarias e empresas municipais atuantes no setor, a política habitacional do município se organiza através de seis programas habitacionais, entre os quais, o FavelaBairro. Seu objetivo era construir ou complementar a estrutura urbana, promovendo a melhoria das condições de saneamento e de acessos, além de oferecer as condições de percepção da favela como um bairro da cidade. Neste sentido, o Favela Bairro se aproxima da política da CODESCO, realizada no Governo Negrão de Lima. A intervenção que dizia buscar produzir, entre as favelas e as áreas ao redor, o que o próprio projeto chamou de uma “costura urbana”. Os projetos específicos seriam elaborados de modo a produzir um número mínimo de reassentamentos e deveriam introduzir os valores urbanísticos da cidade formal como signos de sua identificação como bairro (GEAP, 1993; PCRJ, 1999). Na primeira fase, entre 1994 e 1996, foram selecionadas, dentro do escopo delimitado, 40 favelas segundo condições técnicas, incluindo a existência, ou não, de ações anteriormente executadas, que classificaram as favelas segundo o grau de dificuldade para se concluir um processo de urbanização. Neste ponto os critérios técnicos cedem ao político e, ao prefeito, coube a decisão sobre as 16 favelas que seriam objeto da intervenção inicial. Os projetos foram elaborados segundo as propostas urbanísticas selecionadas através de concurso público e contando com financiamento do BID, produzidas, entretanto, sem uma mediação pública adequada, partindo quase em linha reta das pranchetas dos arquitetos para as favelas. Ainda que a mediação pública tenha sido limitada, este programa foi um dos primeiros projetos de habitação popular a abrir espaço para a opinião da população afetada, e, as Associações de Moradores, que por muito tempo foram alvos da repressão estatal, percebendo as possibilidades de articulação envolvidas no programa, se organizam através do “Grupo dos 16”, composto 258 pelos presidentes das associações de moradores das 16 áreas atendidas na primeira fase do programa, para trocar informações e exercer algum poder de barganha junto à Prefeitura e à SMH (CORREIA, 2006, p.39). Derivado do Favela-Bairro, o Bairrinho surgiu em 1997, visando o atendimento às favelas de pequeno porte, que não foram incluídas no escopo de trabalho do programa original. Estas deveriam ter entre 400 e 2.000 moradores, constarem do cadastro de favelas do IplanRio e serem anteriores ao Plano Diretor da Cidade. Para a seleção das favelas, que seriam atendidas, foram privilegiadas as que exigiriam o menor esforço para a concretização da urbanização, dadas as condições existentes de atendimento de infraestrutura e acesso. Outro critério utilizado foi a estabilidade em relação à expansão da malha urbana, que se mostrou um parâmetro, de certa forma, ambíguo, visto que, por mais que a estabilidade da ocupação significasse a existência de uma maior coesão social, foram igualmente privilegiadas as favelas localizadas em áreas que ainda permitiam a expansão da ocupação em direção às áreas circundantes, que apresentavam certa disponibilidade espacial (PCRJ, 1999). Demonstrando que, mais do que a manutenção de um tecido social estabelecido se buscava a manutenção das manchas ocupadas, devido ao maior controle urbano, no qual o processo de urbanização deveria agir como forma de limitação ao crescimento das favelas atendidas. O projeto de reurbanização da Babilônia foi iniciado dentro do programa Bairrinho, com uma proposta do escritório Archi 5 - Arquitetos Associados. A intervenção inicial teve, entretanto, as obras interrompidas ainda no início da execução, resultando apenas em melhorias incompletas de acessibilidade e novas unidades de moradia, que acabaram sendo invadidas pelos moradores das partes altas do morro após a interrupção das obras. Quanto a programas de urbanização do poder público, entre 2003 e 2005 ambas as favelas passaram pela intervenção do projeto Bairrinho da prefeitura do Rio de Janeiro, com projetos de infraestrutura, visando aperfeiçoar o sistema de saneamento, drenagem e viário além de projetos voltados à promoção social, através de creches e equipamentos para esporte e 259 lazer. Nesta intervenção, as vielas e escadas foram refeitas em concreto e algumas vias rampadas foram abertas para facilitar o tráfego pedestre, mas parte do projeto, que contava também com várias praças, quadra esportiva, canalização de esgoto, novas unidades habitacionais e uma nova caixa d'água, nunca foi concluída, tendo o projeto sido paralisado em 2004. O programa Bairrinho previa também reassentar algumas casas, situadas em área de risco ou dentro da área da APA, mas os dois blocos de apartamentos tiveram suas obras interrompidas e acabaram sendo invadidos. Após diversas etapas, os programas Favela-Bairro, Bairrinho e Grandes Favelas somaram intervenções em quase 160 favelas, reunindo intervenções concluídas, inacabadas e em projeto. Entretanto, em Julho de 2010, na esteira do projeto Olímpico da cidade do Rio de Janeiro, para os jogos de 2016, buscando a incorporação de projetos que se revestem da “legitimidade” assumida como legado social dos vultosos investimentos realizados, a prefeitura municipal lança o Morar Carioca, reunindo em um único programa as três dimensões de favelas e assumindo a publicizada meta de urbanizar todas as favelas cariocas até 2020. O projeto faz parte do Plano Municipal de Integração de Assentamentos Precários Informais e, segundo a Prefeitura, tem como critérios fundamentais: i. Garantir o direito à habitação - aliada à conscientização das questões ambientais e adequação à regulação urbana; ii. Priorizar as características físicas e ambientais de cada localidade; iii. Reconhecimento oficial das áreas revitalizadas como integrantes da cidade formal; iv. Redução da densidade em áreas críticas e eliminação dos riscos ambientais - com o reassentamento no interior da própria ocupação e a recuperação de áreas degradadas (PCRJ, 2010a). Ainda segundo a Prefeitura, através da figura do Secretário de Habitação, Pierre Batista, depois de urbanizadas, todas as favelas terão gabarito fixado e limites demarcados: “esse tipo de delimitação trará uma 260 mensagem clara: a partir daqueles pontos, as comunidades nãopoderão mais crescer e a fiscalização será rigorosa”. A proposta, a partir de agora, é não se preocupar apenas com a realização das obras, como acontecia com o Favela-Bairro, mas com a manutenção da infraestrutura implantada e a contenção do crescimento, fixando regras para cada comunidade. As ações do programa se estruturam segundo diversas linhas: 1 Urbanização: Melhorar a acessibilidade e promover a qualidade do espaço requalificando o espaço público e promovendo melhorias habitacionais nas casas existentes; 2 - Desenvolvimento Social e Econômico; 3 - Regularização fundiária; 4 - Manutenção: Conservação do tecido urbano revitalizado no padrão esperado para a cidade formal; 5 - Monitoramento: Controle do crescimento das favelas e imposição da legislação urbanística, através da criação de Postos de Orientação Urbanística e Social - POUSO e o reassentamento de moradores que se encontram em áreas sujeitas a riscos geológicos ou de preservação ambiental (SMH, 2010; CASTRO, 2010; PCRJ, 2010a). A intervenção na Babilônia foi retomada no contexto do Morar Carioca para complementação das obras realizadas, com projeto realizado pelo escritório Arquitraço. Nenhuma intervenção está sendo realizada no Chapéu Mangueira, para a indignação dos moradores. Além de ajustes técnicos, o novo projeto prevê a produção de um maior número de novas unidades habitacionais, que, por apresentarem interferências, exigem remoções mais numerosas, além de prever a implementação de becos-limite no perímetro da ocupação, como ferramenta de controle da mancha urbana informal. Estes dois procedimentos de controle da expansão da ocupação e de preservação da mata no entorno se associam para atender às demandas de controle urbano que ressurgem muitas vezes associadas ou travestidas uma na outra, sem se atentar para o fato de que a ocupação do Morro da Babilônia apresenta um movimento histórico e constante de redução de sua mancha ocupada, logo, reduzindo também a pressão sobre a APA. O próprio Tribunal de Contas do Município explicita sua preocupação em controlar o “avanço” da 261 ocupação frente às matas: “A presença de populações urbanas nesta área, representada pelas Comunidades Babilônia e Chapéu Mangueira, é uma forte ameaça à sua sobrevivência” (TCMRJ, 2010, p.28). Elemento de demarcação física e simbólica dos limites da favela – e devido à grande repercussão negativa que marcou o projeto de construção de muros, cercando algumas favelas da Zona Sul do Rio de Janeiro, no projeto de reurbanização do Morro da Babilônia, esta proposta foi transformada em “becos-limite”, que mantêm a restrição física perimétrica buscando o controle da expansão da ocupação informal, resgatando o projeto dos muros com uma aparência menos agressiva ambiental e simbolicamente. Outro elemento marcante no projeto analisado é a existência de muros, nos trechos onde não estão previstos os becos-limite, formando barreiras, principalmente nas áreas onde a ocupação da Babilônia se aproxima da ladeira Ary Barroso. Ainda que sejam elementos constantes de um projeto em andamento, a mera existência destes demonstra a nítida preocupação dos poderes público sem limitar e controlar a mancha ocupada por favelas na cidade, através de barreiras físicas e simbólicas, que legitimem remoções de ocupações que venham a desrespeitar o perímetro especificado, mas também como resposta às demandas de diversos setores da sociedade que criticam o descontrole e a “degradação espacial” provocado pelas favelas do Rio de Janeiro, ou mesmo de grupos ambientalistas, que criticam que a expansão destas favelas produzem em direção as matas urbanas. Atualmente os limites da ocupação se fazem majoritariamente com as matas da área de preservação, e em muitos trechos se encontra bastante próxima dos fundos dos prédios do Leme, permitindo significativo contato visual com os apartamentos das Ruas General Ribeiro da Costa e Gustavo Sampaio. Entretanto, sua continuidade direta com a cidade se faz apenas pela Ladeira Ary Barroso, pela qual também se pode acessar o Chapéu Mangueira. • Questões e controvérsias atuais - considerações finais 262 As associações de moradores no Chapéu Mangueira e Babilônia, apesar de suas histórias, trajetórias e vertentes de atuação distintas, marcaram um tipo de atuação política centralizada no poder e na figura de alguns personagens que permanecem na memória dos moradores de ambas as comunidades. As distribuições de recursos e benfeitorias eram centralizados e definidos pelas associações que detinham o poder das decisões sobre as comunidades. Na associação da Babilônia, apesar de algumas reconfigurações em sua estrutura de gestão com a mudança de diretorias e a descentralização de algumas decisões, como é o caso da cultura por exemplo, o poder de decisão fica centralizado na figura do filho de Percília, o Palô – apesar de ela ter sido a presidente da associação até há poucos meses. Moradores dizem que sua permanência na presidência se dava mais por ser um “mito” na comunidade do que por administrar a associação, porque “quem faz mesmo é o filho dela”. Nesse caso, a configuração do passado se atualiza nas características politicas atuais. Situação oposta se encontra o caso da associação do Chapéu Mangueira, que se apresenta como uma controvérsia atual entre o legado histórico e as problemáticas atuais na configuração do papel de sua associação de moradores. A associação do Chapéu Mangueira, que através dos seus principais personagens possui um histórico de resistência à ditadura militar e afiliação ideológica com comunistas conhecidos no cenário nacional, carrega até hoje um forte legado de influência na organização comunitária das favelas do Rio de Janeiro, quiçá do Brasil – como reivindica alguns moradores. A partir dos grupos que estiveram à frente da associação, podemos compreender que houve até então três gerações de comando; a primeira liderada por Seu Lúcio Bispo e que contava com figuras como o Bola e Benedita; a segunda liderada por Gibeon Brito e a terceira por jovens em as sua grande maioria egressos do tráfico de drogas. Muitos problemas foram registrados durante a gestão dos jovens até que sua direção foi destituída, inserida no lugar uma comissão especial e abertas novas eleições. 263 O grupo dos “jovens” como são autodenominados e nominados pelos demais moradores é formado predominantemente por rapazes de 25 a 40 anos, que possuem ou possuíam alguma vinculação com o tráfico de drogas (mesmo que não declarada para os entrevistadores mas confirmado com outras pessoas), e que atualmente possuem alguma fonte de renda a partir de trabalhos que realizam localmente, como com moto-taxi, locação de casa, produção cultural, professor, agente de saúde, entre outros, o que facilita a atuação comunitária. A partir do diálogo com esses jovens, observou-se que acessar questões associadas ao tráfico permanece sendo um tabu, especialmente quando implica as suas próprias participações no processo. Quando contam algum fato, se limitam a situações do passado em que seus personagens já estão mortos e que não haverá comprometimento legal. Quando esse grupo assumiu a associação logo surgiram uma série de denúncias de desvios de recursos e houve uma divisão no grupo. A partir de então, o grupo que permaneceu na associação se enfraqueceu e perdeu a diretoria para uma comissão temporária organizada por Gibeon que pretendia retomar a presidência. O grupo que saiu continuou se articulando politicamente através de fóruns de resistência e que possuem grande poder de mobilização internamente e externamente no contexto da pacificação. Os principais articuladores desses fóruns é André, que é da Babilônia e após perder a última eleição para a associação da Babilônia por uma dúzia de votos, organizou o Fórum Favela Não se Cala que pretende fazer ponte com favelas do município e Estado do Rio a princípio para se posicionar contrários às remoções mas que com o tempo passou a ampliar outras causas e questões, especialmente contrários a UPP. Lula (Anderson), Roberto e Dudu (Eduardo) são outros articuladores do Chapéu Mangueira e concentraram suas ações através da criação do Fórum Lúcio Bispo que tem por intuito fortalecer o interesse e envolvimento político dos jovens nas questões comunitárias locais. Os três realizam ainda o coletivo “Dá Teu Papo”, que também funciona como um fórum, que pretende reunir jovens adolescentes para discutir e promover atividades educativas a respeito das suas realidades pessoais e coletivas. A atuação dos fóruns não se restringem a uma ou outra comunidade, e sim abrange ambas e funcionam por meio de redes de articulação com outras 264 favelas, através das redes sociais e uso de tecnologias digitais. Nesse sentido, podemos compreender que o surgimento e fortalecimento dos fóruns ocorreu em função do enfraquecimento e perda de legitimidade representativa por parte das associações ao longo do tempo. A associação do Chapéu é presidida por Arlete, que antes de ser presidente não fazia parte de nenhum desses grupos mas que possuía um envolvimento comunitário a partir da fiscalização das obras do Morar Carioca, o que demonstra o quanto as políticas públicas favoreceu o surgimento de novos atores locais mesmo que com baixa efetividade de participação. Ela se elegeu com uma chapa formada somente por mulheres, a chapa rosa, considerado um fato inédito no Chapéu Mangueira. Com relação a articulação que as associações mantém com o Estado e as políticas públicas que surgiram com a política de pacificação, a da Babilônia possui mais aproximação o que garante maiores investimentos públicos nesta comunidade em detrimento do Chapéu Mangueira que no momento da instalação da UPP estava passando por reestruturação associativa. Isso também se deve a fatores políticos partidários já que na Babilônia a diretoria é vinculada aos mesmos partidos da chapa do prefeito e governador, tendo apoiado a eleição de ambos, ao contrário do Chapéu que não possui a mesma aliança. Conforme muitos moradores, esse fator influenciou o fato de grande parte das ações associadas a política de pacificação, ligadas a urbanização, saúde, a área social, aos projetos de geração de renda, entre outros, terem se concentrado na Babilônia. Em décadas anteriores, o Chapéu Mangueira construiu um legado vinculado a resistência política e edificação de bens públicos para a comunidade, como o Posto de Saúde, a Escola, a Associação de Moradores, o Centro Cultural, distribuição de água e energia, entre outros bens e serviços, advindos das mobilizações por recursos internos e externos, parcerias, mutirões dos moradores, articulações, entre outras estratégias que tornou possível que a própria comunidade empreendesse suas obras de urbanização e benfeitorias antes mesmo que o Estado fizesse esse tipo de intervenção. Atualmente, quando o Estado se propõe a realizar uma série de intervenções 265 articulando a área de segurança com as demais áreas de assistência social, observa-se tanto a criação de novos programas sem de fato articular com as redes de serviço integradas já existentes quanto uma disposição de espaços e recursos para novas unidades sem considerar os bens públicos locais já existentes, o que gera um esvaziamento dos bens construídos pela população e consequentemente do legado histórico deixado pelas lutas comunitárias anteriores. Em função da localização privilegiada, em ambas as comunidades o turismo consiste atualmente em uma das principais atividades de geração de renda de forma direta ou indireta – seja no comércio, hospedagem, transporte, visitação, entre outras opções. Mas há relatos de moradores que retratam que desde o surgimento da comunidade existe esse intercâmbio de pessoas interessadas em visitar e conhecer as comunidades, atraídos especialmente pelo visual do cume dos morros. Há também a questão ambiental que atrai pessoas interessadas pela temática ecológica, e que através dela mobilizou a criação de uma Área de Proteção Ambiental a partir de redes de articulação organizadas por moradores de bairros do entorno e de organizações ambientalistas. Apesar do turismo ser visto como um fator positivo que gera crescimento financeiro e intercâmbios, é também visto pelos moradores como uma controvérsia com a entrada frequente de novos moradores, que antes foram turistas (geralmente estrangeiros com intuito de explorar o potencial turistico da região), em um processo de gentrificação, que tende a aumentar o custo de vista a tal ponto que o antigo morador não tenha mais condições de se manter na favela. Em ambas as comunidades, apesar das suas particularidades, suas histórias foram construídas a partir de um associativismo ligado a articulações com atores externos da sociedade civil, que mobilizou inclusive movimentos culturais, artísticos e sociais locais e no entorno. Enquanto no Chapéu Mangueira o leque de atores foi bastante variado ao longo do tempo, desde partidos políticos, associações regiliosas, de moradores dos bairros do entorno, universidades, artistas, organizaçoes não governamentais, na Babilônia as articulações passaram a se consolidar em um primeiro momento com os 266 militares e mais recentemente com organizações filantrópicas e religiosas, turísticas e ecológicas. De um modo geral, observa-se uma intensa quantidade de organizações não-governamentais nacionais e internacionais de temáticas variadas, que estão aumentando em função da pacificação, mas que giram em torno da geração de renda, turismo ecológico, cursos profissionalizantes, entre outros. Preocupações como as remoções dos moradores em função das obras de urbanização, o aumento sucessivo do custo de vista e o intenso processo de gentrificação, a precaridade dos serviços públicos e das condições de participação e canais de diálogo entre a população e os agentes públicos do Estado, o aumento da demanda do mercado turístico da região, as tensões em torno das repressões vivenciadas com a presença policial constante, entre outros fatores, impõe mudanças no padrão de vida que promovem transformações que atualizam, evidenciam ou modificam controvérsias latentes na sociabilidade dessas comunidades que foram consolidadas historicamente. 267 4.2 Redes Análise de Redes Sociais Descrição de estruturas relacionais Dígrafos da Rede Babilônia/Chapéu Mangueira Rede de Associações Rede de Políticas Públicas 268 Rede de Mercado Rede de ONGs 269 Rede Total com os principais atores ( os com os maiores numero de relações no centro) Rede Total 270 Legenda: Mercado Estado Associacoes ONgs Densidade da rede: Sociometria rede Densidade No. de relacionamentos 271 0.086 480 A densidade de uma rede nada mais é que a medição da quantidade de ligações existentes podendo se classificar em densas, aquelas nas quais há uma grande quantidade de ligações e redes esparsas, poucas ligações. A medida da densidade de uma rede não-direcional é definida pela quantidade de ligações L dessa rede dividida pelo número máximo lmáx de ligações. Como apontado pela tabela acima, existem na rede da Babilonia/Chapeu Mangueira apenas 480 relacionamentos dos 6.400 possíveis, ou seja, apenas 8,6% de todos os relacionamentos é aproveitado. Isso indica um baixo grau de interação entre os alunos da matéria, talvez justificado pela grande diversidade de alunos de anos diferenciados. Matriz de geodésicas: O atalho mais curto entre dois nós é chamado de geodésico, e o comprimento desse atalho, em quantidade de ligações intermediárias, é chamado de distância geodésica. Essa mínima distância é muito interessante, pois permite verificar quantas ligações e quantos nós são intermediários numa relação entre dois atores de uma rede. Para uma rede direcional, o geodésico é considerado como o atalho direcionado mais curto entre dois nós. Considerando que em um atalho direcionado todas as setas devem estar no mesmo sentido, nem sempre o geodésico de ni para nj será o mesmo geodésico de nj para ni. As duas tabelas abaixo demonstram que no estudo das interações entre os indivíduos da sala, a distancia média entre os membro é de 2,7 passos, ou seja, para se alcançar qualquer individuo da rede, a média de instituicoes que se deve alcançar são de aproximadamente 3. 272 Average distance (among reachable pairs) 2,7 Distance-based cohesion ("Compactness") 0,35 Distance-weighted fragmentation ("Breadth") 0,65 Frequencies of Geodesic Distances Frequência Proporção 1 480 8,6% 2 1766 31,8% 3 1219 22,0% 4 384 6,9% Grau de centralidade absoluta, total e padronizado, dos nodos. Grau de centralidade da rede inteira: Centralidade de grau ("degree centrality") se refere à centralidade do nó na rede. Esta métrica foca na visibilidade do nó na rede sendo que o nó mais central é aquele que possui o maior grau. Assim, ele está em contato direto com muito outros nós e acaba ocupando um lugar central na rede. Em contrapartida, nós com grau pequeno ocupam uma posição periférica na rede. Através da tabela apresentada acima é possível concluir que o ator mais central em relação ao recebimento de interações (InDegree) é a Associacao Babilonia com um grau igual a 35, quase seis vezes a média (6.4). Este também é responsável pela maior centralidade da emissão de relações 37, mais que seis vezes o valor da média. O ator com o menor grau de centralidade é a ONG Arte de Viver. Para justificar tais dados são necessários mais dados referentes ao perfil de cada ator, não sendo possível alcançar maiores conclusões neste trabalho. È importante destacar que dentre o grupo de 75 atores, a media indica que o numero médio de pessoas com as quais cada ator se relaciona são 6,4. 273 Centralidade de proximidade para todos os nodos (Closeness): Esta métrica é baseada na distância e foca em quão próximo um ator se encontra em relação aos demais atores da rede. A idéia é que um ator é central se ele pode interagir rapidamente com os demais. No contexto de uma rede de comunicação, por exemplo, os atores centrais podem ser muito produtivos no compartilhamento de informações com o resto do grupo, pois possuem um caminho de comunicação rápido com os demais. Neste caso, a centralidade está inversamente relacionada com a distância. Assim, quanto mais aumenta a distância de um vértice para o restante da rede, mais diminui a sua centralidade de proximidade. O ranking abaixo indica aqueles que chegam mais rápidos a todos da rede. È possível concluir que a Associacao Babilonia é o ator que consegue atingir mais rapidamente a todos os outros membros da sala. Seguido temos a Associacao Chapeu Mangueira, depois a UPP Social. Clusters Foram encontrados 43 sub grupos. Elas se apresentam a seguir em ordem crescente de “closness”, ou seja, o 1 grupo é o mais fechado de todos. 1: Associacao Babilonia Bar do David Favela Organica Hostel Hostel Chill Hostel Favela Inn 2: Associacao Babilonia Bar do David CEBDS Favela Organica 3: Associacao Babilonia Bar do David Favela Organica Quadra FAETEC 4: Associacao Babilonia Coperativa de turismo Favela Organica Hostel Favela Inn 274 5: Agencia de Redes Associacao Babilonia Favela Organica Territ�rios da paz 6: Associacao Babilonia Favela Organica Quadra FAETEC Sistema Firjan Territ�rios da paz UPP social 7: Associacao Babilonia CEBDS Favela Organica Sistema Firjan Territ�rios da paz UPP social 8: Associacao Babilonia Associacao Chapeu Mangueira Quadra FAETEC Sistema Firjan Territ�rios da paz UPP social 9: Associacao Babilonia Associacao Chapeu Mangueira Light Territ�rios da paz UPP social 10: Associacao Babilonia Associacao Chapeu Mangueira Galpao das Artes Territ�rios da paz UPP social 11: Associacao Babilonia Associacao Chapeu Mangueira Comlurb Light UPP social 12: Associacao Babilonia Associacao Chapeu Mangueira Bar do David Quadra FAETEC 13: Associacao Babilonia Brinquedoteca Escola Tia Perc�lia 14: Associacao Babilonia Clube Copaleme Quadra FAETEC 15: Associacao Babilonia Comlurb Light Morar Carioca UPP social 275 16: Associacao Babilonia Cooperativa de hortas comunitarias Cooperativa de Reflorestamento Coperativa de turismo 17: Associacao Babilonia Cooperativa de hortas comunitarias Cooperativa de Reflorestamento Ponto de Cultura 18: Associacao Babilonia Correios UPP social 19: Associacao Babilonia Escola Tia Perc�lia Sistema Firjan 20: Associacao Babilonia Feijoada do Bene Ponto de Cultura Roda de Samba 21: Associacao Babilonia Galpao das Artes Ponto de Cultura 22: Associacao Babilonia Light Morar Carioca Territ�rios da paz UPP social 23: Associacao Babilonia Quadra FAETEC Roda de Samba 24: Associacao Alma Cooperativa de hortas comunitarias Cooperativa de Reflorestamento Coperativa de turismo 25: Banco Bradesco Hostel Chill Hostel Favela Inn 26: Bar do David Boteco da Amizade Hostel Hostel Chill 27: Bar do David Boteco da Amizade Boteco do Luiz 28: Capoeira Clube Copaleme Futebol Jiu Jitsu Quadra FAETEC 276 29: Associacao Chapeu Mangueira CC Lafayete Galpao das Artes 30: Associacao Chapeu Mangueira CC Lafayete ONG Casa da Arvore 31: Creche Babilonia Creche Tia Marcela Escola S�o Thomas de Aquino Escola Tia Perc�lia 32: Associacao Chapeu Mangueira Creche Tia Marcela Escola S�o Thomas de Aquino 33: Associacao Chapeu Mangueira Da Teu Papo Forum Lucio Bispo Territ�rios da paz 34: Associacao Chapeu Mangueira Da Teu Papo Favela N�o Se Cala 35: Associacao Chapeu Mangueira Escola S�o Thomas de Aquino Quadra FAETEC UPP social 36: Associacao Chapeu Mangueira Forum Lucio Bispo Quadra FAETEC Territ�rios da paz 37: Mercearia Padaria Sorveteria 38: Morar Carioca POUSO SMH SMU UPP social 39: Agencia de Redes Produtora Maneh Produ��es Territ�rios da paz 40: Morar Carioca Regulariza��o Fundi�ria SMH SMU 277 41: Morar Carioca Regulariza��o Fundi�ria Territ�rios da paz 42: Hostel Hostel Chill Hostel Favela Inn Moto Taxi O gráfico a seguir demonstra a probabilidade de cada ator de estar participando de uma panelinha. O ator que tiver a maior coluna (UPP Social), tem a maior probabilidade de participar de grupos fechados. Coesão de subgrupos baseada na completa mutualidade :– clique-: Uma dimensão importante de análise de rede consiste na identificação de níveis de coesão diferenciados que conduzem à formação de subgrupos. Quatro são as propriedades básicas de um subgrupo dentro de um domínio em rede, segundo Wassermann e Faust (1998): a) b) c) d) Mutualidade dos laços, A proximidade ou atingibilidade dos membros do subgrupo, A freqüência dos laços entre os membros, A freqüência relativa de laços entre membros e não membros. Essas são as famosas e bem identificadas “panelinhas” dentro dos grupos, sendo definidas como um subgrupo de, no mínimo, 3 pessoas adjacentes entre si. A partir do gráfico a seguir, é possível dizer que foram encontrados 38 cliques “panelinhas”, dentro da sala. A Viviane, o Methus de Sa, o Bruno Arcas e a Cintia são as pessoas com as maiores adjacências nos subgrupos. Coesão de subgrupos baseada na atingibilidade e diámetro:– 2 clique- : Coesão de subgrupos baseada na atingibilidade e diámetro:-2 clã- : 278 Coesão de subgrupos baseada em grau nodal: 2k plexo: 5. Campo Santa Marta Este trabalho tem como objetivo analisar as interações entre a política de pacificação e a sociabilidade e associativismo na favela Santa Marta, Rio de Janeiro. O objetivo é analisar a Consiste em resultados parciais de pesquisa que utilizou da triangulação de técnicas quali-quanti na produção dos dados: entrevistas semi-estruturadas, observação participante, análise estatística, análise de notícias de jornais e outros. A narrativa dos moradores é explorada aqui com vistas a recuperar a memória associada a formação política e cultural, associativismo e sociabilidade na favela. Estes resultados são descritos e analisados frente ao contexto da pacificação e as redes de interação capturadas durante a pesquisa de campo, classificadas como redes de ação coletiva (associativismo), mercado e Estado (políticas públicas). 5.1. Introdução O primeiro aspecto a ser levantado em relação ao presente artigo é o desafio de estabelecer conexões analíticas entre campos disciplinares - dos quais destacamos as ciências sociais e a administração pública - cujo referencial conceitual e metodológico nem sempre apresentam a mesma sintonia. Neste caso, particularmente, o enfoque analítico está na relação entre as políticas públicas de pacificação e a sociabilidade e associativismo na favela Santa Marta. Embora possamos considerar tratar-se da relação entre Estado e sociedade civil, a entrada das Unidades de Polícia Pacificadora (UPP) tem proporcionado um investimento maior do Estado sobre estes territórios tanto na aplicação de recursos financeiros quanto na maneira de interpelar os sujeitos “alvo” destas políticas - ao menos no que tange seu desenho. 279 Primeiramente, são apresentados os aspectos metodológicos que orientaram a realização da pesquisa desde sua elaboração, atuação em campo e análise. Em seguida, os resultados são apresentados no sentido de produzir análise da linha do tempo na qual reconstituímos os elementos que conferem a favela Santa Marta seu caráter particular de organização cultural, política e formas de associativismos locais. A formação cultural, o mito de fundação, a disputa em torno do nome da favela, e os atores locais, externos e apoiadores que, por sua importância, permanecem na memória dos moradores e emergem das narrativas dos atores sociais que interagem a partir do campo dessa pesquisa. Tais aspectos são apresentados de maneira transversal. Não se trata de uma reconstrução da história, mas, sim, de apresentar as diferentes narrativas locais sobre a organização política e associativismo, de modo a evidenciar redes de interação entre diferentes agentes humanos e não-humanos (Latour). Com isso, buscamos elementos que nos permitam analisar o contexto atual da política de pacificação sem incorrer no risco de descaracterizar estes processos em relação à história pregressa da favela. Este primeiro processo será em seguida analisado, considerando as atuais redes de interação [1] que se constituíram em torno da política de pacificação, quais sejam: as redes de associativismo, de políticas públicas e de mercado - trata-se, no entanto, de uma fotografia do que capturamos durante a pesquisa de campo, o que nos permite analisar as relações entre o associativismo local, o mercado e a atual política de pacificação. O objetivo deste artigo é recuperar os aspectos associativos, políticos e culturais que remontam ao processo de formação histórica da favela Santa Marta, em sua dimensão territorial e de sociabilidade. Simultaneamente, procuramos reconhecer e analisar as atuais redes de interação social, organizadas em três grupos: ação coletiva, estado e mercado. Por fim, a descrição e análise de dados permitem estabelecer alguns aspectos da política de “pacificação” e seus efeitos na sociabilidade dessa favela. A história de resistência e disputa política por melhores condições de vida são discutidas a partir de narrativas dos moradores entrevistados e outras 280 fontes secundárias, destacando o associativismo local e as interações com atores externos diversos - estado, ong‟s, organizações religiosas, organizações empresariais, dentre outras. Desse modo, estabelecemos uma relação entre a linha do tempo (passado) e aspectos observados atualmente, como as tradições festivas e religiosas e a identidade comunitária, reafirmando uma dinâmica sociocultural quase sempre menosprezada pelas políticas públicas. Consideramos para tanto, os discursos e narrativas sobre os mais variados assuntos que atravessam o cotidiano histórico da Santa Marta, como o papel da Associação de Moradores, as festas e tradições da localidade, os terreiros de Umbanda, como a ^Maria batuca^, presença e colaboração da Igrejas Católica no associativismo, a igreja evangélica; o tráfico de drogas; o policiamento de proximidade e outras políticas públicas Metodologia Para dar conta da reconstituição de uma linha do tempo do Santa Marta reuniu-se uma diversidade de materiais a respeito dessa comunidade. Além disso, foi realizado intenso trabalho de campo, que contou com entrevistas dos principais atores desse cenário. Posteriormente, foi realizada a analise do discurso dos entrevistados, afim de retirarmos implicações e contribuições que nos ajudasse a pensar o campo dessa pesquisa. Caracterização socio-demográfica da favela Santa Marta A categoria favela[2] traduz uma determinada forma de aglomerado habitacional, como também exprime uma configuração ecológica particular, definida segundo um padrão específico de relacionamento com a cidade. Para Burgos um aglomerado habitacional transforma-se em “favela” à medida que desenvolve um microssistema sociocultural próprio, organizado a partir de uma identidade territorial, fonte de um complexo de instituições locais que 281 estabelecem interações particularizadas com as instituições da cidade (Burgos: 2005:p.190). Dessa forma, a favela aparece, frequentemente, demarcada por sua contraposição em relação à estrutura urbana da cidade formal equipamentos e serviços - que proporcionam o uso privilegiado das populações do “asfalto”, seja porque estas podem pagar por tais serviços ou por ser este território privilegiado quanto ao investimento público e garantia de direitos sociais. A marcante contradição entre estrutura urbana e equipamentos públicos leva a considerações sobre a ausência do Estado na favela, o que é recusado por Luis Antonio Machado que afirmou em diversas oportunidades não se tratar de ausência do estado, mas de uma interação e intervenção diferenciadas de acordo com a localidade. Seguindo a partir desta consideração, trata-se de compreender como se estabelecem as formas de interação e, particularmente, o que há de comum e inovador no atual contexto da política de pacificação. Dados sobre o STM. Na favela Santa Marta tem sido pioneira na implementação de diversas ações decorrentes de iniciativas locais ou externas - através de políticas públicas, ação da sociedade civil ou da iniciativa privada. Entretanto, durante muito tempo sua imagem esteve desvinculada do cartão postal da cidade. Essa invisibilidade mudou radicalmente ao receber a primeira Unidade de Polícia Pacificadora, em 19 de dezembro de 2008; de repente, todos os olhares se voltaram para a Santa Marta, apresentada como vitrine das iniciativas de sucesso, como dizem os próprios moradores. O mesmo processo tem ocorrido nas demais áreas pacificadas que se tornaram não somente referência no roteiro turístico, como também laboratório de diversas pesquisas acadêmicas, piloto para implementação de políticas públicas do governo e objeto de interesse do mercado, particularmente, de empreendimentos imobiliários. Para contextualizar o cenário político no tempo presente, foi necessário realizar uma retrospectiva que restabeleça o processo histórico que culminou 282 na configuração atual da conjuntura cultural, política e econômica, ao que tange a impactos sobre o cotidiano dos atores sociais que compõem o cenário analisado, para que possamos finalmente tecer uma avaliação mais analítica a respeito de conquistas em termos de direitos de cidadania e nos processos de mobilização de esferas públicas na luta contra a discriminação e a violência que incidem sobre essa população favelada. O Mito Fundador da FSM (Favela Santa Marta) Há indícios de que a favela Santa Marta tenha surgido entre as décadas de 1920 e 1930, formada por trabalhadores urbanos e rurais migrantes do norte fluminense e dos estados de Minas Gerais e, seguidamente, da região Nordeste do país, em decorrência das crises econômicas na economia rural, principalmente devido à crise da cana e do café. Após a migração de descendentes de agricultores oriundos do Vale do Paraíba devido à crise cafeeira de 1929, o morro Dona Marta recebeu migrantes nordestinos, que contribuíram como força de trabalho para a formação do bairro de Botafogo e Copacabana. Além disso, a migração nordestina representava o aumento do número de moradores e intensificava a presença de aspectos culturais do nordeste brasileiro na vida social da favela. Eu nasci no morro. Minha mãe veio da Paraíba e meu pai do Ceará (...) ele diz que chegou aqui ele diz que estava entre 10 a 12 anos, (...) vai fazer 80 anos e está aqui. (...) Se conheceram aqui no Rio. Minha mãe chegou aqui com vinte e poucos anos, já veio formada. (Eliane, moradora) 283 Um aspecto peculiar na constituição da Favela Santa Marta (FSM) é que as primeiras ocupações do morro ocorreram em um sentido contrário ao que se costuma observar, desde a parte alta do morro até o meio, vindo a confluir com a parte baixa depois de já se ter consolidado a ocupação na parte alta. Meu pai conta que era muito bom, existiam poucas casas. Os cearense e paraíbas chegaram por baixo, pela Mareshal Bento de Moura que era só mato. Os baianos e mineiros, vinham por cima (Eliane, moradora). A presença de missionários católicos, especialmente os jesuítas, contribuía para a permanência da população naquela região, atuando na construção de bens comuns, ações de caridade e apoio aos moradores na construção de suas casas e contra as tentativas de remoção. Os primeiros moradores chegaram ainda na metade do século XX, quando a área ocupada atualmente pela Santa Marta pertencia ao Colégio Santo Inácio, que se encontra a poucas quadras do sopé do morro, de frente para a Rua São Clemente. Uma das versões dos moradores afirma que o padre José Maria Natuzzi, junto com outros padres jesuítas, permitiu que os operários que trabalhavam na obra de expansão do colégio se instalassem no terreno da Igreja juntamente com suas famílias. Todas igrejas, eu ia para todas as igrejas [durante sua gestão na Associação de Moradores]: Adventista, Assembléia, Universal. Não é a igreja em si, mas alguém de dentro da igreja (...). A adventista dava e dá até hoje? Mantém 150 bolsas anuais (cesta básica). (...) Eu acho assim, é fazer a ponte com os órgão públicos, com as pessoas que podem. Hoje a Igreja Batista é a que faz mais 284 trabalho assim, com esse foco. Pastor Waldecir está em todas, conversa com todo mundo. (Eliane, moradora) Quando eu entrei na associação eu falei “o que nós fazemos?”, a maioria era da área da saúde, vamos oferecer o que a gente tem. (...) Na salinha que eu falo no autofalante [da Associação de Moradores], tinham 3 coisas de ferro de remédio de A à Z, pessoal muito viciado em Diclofenaco de Potássio, Protovide para criança e antibiótico (amoxilina) – [passam crianças] “minhas netas emprestadas”. Tínhamos parceria com colégio corcovado que eu pedia amostra grátis, a igreja adventista que eu tenho amizade até hoje, eu freqüento lá também. (...) colégio Santo Inácio dava a medicação, a igreja Adventista e o colégio Corcovado e foi assim que descobrimos muitos diabéticos e o remédio da diabetes é caro. a Igreja Adventista está até hoje me ajudando a construir o centro social. (Eliane, moradora) Apesar das várias investidas em vários governos em prol da erradicação das favelas, por várias décadas, a favela Santa Marta permaneceu salvaguardada da prática recorrente de demolir os casebres nos morros pela proteção dos jesuítas. Em 1937, foi criado Instituto de Educação Social e Familiar, que juntamente com as faculdades de Direito e filosofia, da atual Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, voltado para a formação de mulheres cristãs, passou a atuar nos órgãos municipais de assistência, especialmente no atendimento de moradores de favela14. Também graças à ação dos jesuítas, a partir de 1941, a Pequena Obra Nossa Senhora Auxiliadora (PONSA), ação social filantrópica de ex-alunas do Colégio Sacre Coeur, fundada em 1925, segundo os princípios da caridade católica, passou a atuar na comunidade, e lá 285 permanece até hoje, com atendimento de creche, ações de atenção em saúde, complementação escolar e curso profissionalizante. Em 1946, foi criada a Fundação Leão XIII, uma parceria entre a Prefeitura Municipal e a Arquidiocese do Rio de Janeiro, com a finalidade de dar assistência “moral e material” aos moradores de favelas, sua intenção também continha um aspecto político cujo sentido está evidente numa frase atribuída a este processo: “subir os morros antes que deles descessem os comunistas”. A operacionalização das atividades da Fundação se dava essencialmente através dos Centros de Ação Social (CAS) para evangelização, tendo como foco principal as áreas de educação, saúde e habitação. Embora tenha atuado também em ações de remoção, especialmente em seus primeiros 15 anos de existência, sua presença foi muito mais forte nas ações de saneamento, o que despertava nos partidários das remoções a crítica de que assim se cristalizaria o problema das favelas. Entre 1947 e 1954, a Fundação Leão XIII atuou em 34 favelas, contribuindo para prover saúde, educação, saneamento básico, energia elétrica. Na Santa Marta, aparentemente, associou-se ao trabalho que vinha sendo desenvolvido pela PONSA. A Fundação também teve uma atuação marcante no fomento ao associativismo comunitário, estando por trás da formação de várias Associações de Moradores e das Comissões de Luz, que emergem, a partir desse momento, como porta vozes de uma nova demanda constituída, qual seja, a defesa da extensão dos serviços públicos até às favelas, em contraposição à política de remoções. Consta que, já em 1948, Santa Marta contava com um comitê de antigos moradores, vinculados aos jesuítas e as damas de caridade da PONSA, que tomou para si a tarefa de regular a higiene e limpeza, bem como manter a ordem e o respeito entre os vizinhos. Do Processo de Gentrificação e Remoção Branca no Pico de Santa Marta 286 Localizado em um dos cenários mais exuberantes da zona sul da cidade; o morro Dona Marta, assim como outras favelas, passou a fazer parte do itinerário turístico do Rio de Janeiro. Do alto do morro, pode-se admirar o espelho da lagoa Rodrigo de Freitas, cercada de edifícios luxuosos; atrás, o mar da baía de Guanabara; à esquerda, a montanha banhada pelo mar, que forma uma das imagens mais conhecidas no mundo, o Pão de Açúcar; e à direita, o corcovado. Não só o forte atrativo turístico está em questão nesse território, mas também a especulação imobiliária. O encarecimento dos preços de produtos e serviços na zona sul da cidade, considerando em particular o bairro de Botafogo, contribuiu também para elevação do preço dos imóveis na favela, tanto em termos de aluguel, como para o caso de vendas de casas. Além disso, o fantasma da remoção das favelas voltou à baila e ao imaginário popular através dos discursos dos operadores do estado. Para os moradores do Pico, como Victor Lira, a bela paisagem da cidade vista do alto do morro explica, em grande parte, as investidas dos governos estadual e municipal na remoção de casas do Pico18. Como justificativa, os técnicos do governo produzem laudos atestando a localização de casas em áreas de risco. Tal atitude é vista pelos moradores mais engajados politicamente ou atuantes em movimentos sociais, militantes e/ou ativistas, como processo de “expulsão branca” ou gentrificação19 de moradores localizados principalmente na parte mais alta do morro. Para contraporem-se ao laudo técnico do governo, os moradores buscaram a colaboração de membros de universidades através de seus programas de extensão e outros agentes não-estatais, mobilizando, desta forma, meios políticos para contestar 18 O Pico é a parte mais alta da favela, no qual foram construídas as primeiras casas ainda na década de 1930. 19 Termo provavelmente cunhado a partir das interações de alguns moradores com intelectuais orgânicos que freqüentam a favela para realização de suas pesquisas. O termo vem sendo amplamente utilizado em analises acadêmicas para se referir ao processo que transforma as cidades em meros commodities a serem comercializados por grandes empresários, desconsiderando os direitos de cidadania, anteriormente conquistados e quem vem sendo desrespeitados, tanto por agentes econômicos, como agentes estatais. 287 o laudo governamental e fazer frente a decisão que compromete diretamente seu modo de existir na cidade. Além disso, os moradores apontam para a transformação do mercado local, que volta-se principalmente, no caso do morro Santa Marta, para “os de fora” em oposição “aos de dentro”. Observamos, varias disputas em torno das classificações que legitimam direitos e privilégios na hierarquia da favela. Um deles é o fato de ser ou não “cria” do morro. Uma vez, nascido e criado, o morador poderia usufruir de certas regalias. Teria direito a voz dentro de uma deliberação em termos de decisões políticas. Assim como, o presidente de associação que reivindica a representatividade do coletivo favelado. Com a especulação imobiliária que vem ocorrendo em todas as grandes cidades-globais, principalmente, as cidades eleitas para sediar jogos Olímpicos, as favelas também foram afetadas. Um dos principais impactos que buscamos elucidar foram as políticas de segurança implementadas em áreaschaves da cidade. Regiões que são particularmente convenientes do ponto de vista turístico e para a produção do espetáculo dos mega-eventos. Segundo o relato dos agentes do governo, como a gestora da Casa Civil, o fato da favela ser mais politizada implica em um empecilho para os projetos e implementação de programas do governo. Fica evidente, em seu discurso, que em comparação com outras favelas, o <<caso Santa Marta>> aparece como sendo mais complicado, justamente pela mobilização dos atores, que buscam associar-se, reivindicar direitos e contrapor a visão governamental „a sua visão de mundo. Pico do Morro Foto Pricila Loretti 288 Por volta de 1680, o padre Clemente adquiriu as terras do atual bairro de Botafogo e em homenagem a sua mãe batizou um dos morros que circundavam as suas terras de “Dona Marta”. Já no início do século XX, uma moradora devota de Santa Marta teria levado uma imagem da santa para a parte mais alta do morro, localidade que ficou conhecida como “Campinho do Pico”, tornando-se lócus de celebração religiosa à Santa Marta. Na década de 1930, foi construída pelo padre Velloso uma capela para abrigar a imagem. As disputas em torno do nome da favela começaram quando, na década de 1980, a mídia passou a se referir a ela como Dona Marta, homônimo do morro em que está localizada e do mirante nele construído a 360 metros de altitude, ao qual se tem acesso pela estrada das Paineiras. De acordo com história contada por seus moradores, tal denominação acabou sendo apropriada pelos evangélicos, marcando uma disputa simbólica dentro da favela[3]. Esta disputa simbólica acerca da classificação que dá nome a localidade pode ser encontrada não só na mídia, como também, e ainda mais freqüentemente em documentos produzidos por órgãos públicos[4]. Já para o historiador Milton Teixeira, não há distinção entre morro e favela no que tange à denominação. Ambos teriam começado se chamando Dona Marta e, por iniciativa dos próprios moradores, foram rebatizados de Santa Marta, na década de 1980.Oficialmente, um decreto municipal do Prefeito Cesar Maia, em 2007, “em respeito à tradição e à história local”, estabeleceu o nome Dona Marta para o acidente geográfico e Santa Marta para a Comunidade. Isso, contudo, não foi suficiente para eliminar a confusão que os jornais e outros meios de comunicação fazem quando se referem à favela como Dona Marta. Pra mim é Santa Marta, comunidade Santa Marta. Porque eu nasci, cresci e estou envelhecendo na comunidade e sempre ouvi meu pai e minha mãe falar Santa Marta, então eu não vou deixar de falar Santa Marta e eu não era evangélica, (...) eu era espírita e eu brigava muito com os crentes, principalmente pastor Waldecir (...). Me disseram, eu não tenho certeza, que os 289 evangélicos que impuseram isso para ser Dona Marta, então eu não sei se é verdade. (...) Então quando eu me tornei evangélica fui primeiro para Igreja Batista, lá é missão Batista Dona Marta. Mas o tempo todo que eu estava lá fiquei brigando para falar Santa Marta. Porque se for assim, eu sou evangélica e não vou no morro do São Carlos, na rua são Francisco Xavier, não vou passar na São Clemente. Depois eu fui ver que cada um tem a sua e ponto final. (Eliane, moradora) Dona Marta é o nome do que a gente chama de chão. A história do Santa Marta surgiu há mais de 70 anos atrás. O Santa Marta começou no pico do morro e quem era dona do espaço, que era um casarão era uma Marta. (...) Botafogo foi crescendo e a dona Marta deixou alguns operários construirem suas casas de madeira bem lá no pico do morro e passado os anos, essa Dona Marta era mãe de um padre São Clementino. Por isso a rua São Clemente e aqui ficou Dona Marta porque ela era dona desse espaço, do casarão que tinha aqui por isso é o mirante do Dona Marta. Porque o morro, chão é Dona Marta. Surgiu então a favela e as pessoas diziam “nossa, essa mulher é uma santa, deixou a gente morar aqui”. Existe uma santa marta, ficou Santa Marta. A favela/comunidade é Santa Marta, o chão é Dona Marta. Na prefeitura é mirante do Dona Marta, no morro é Dona Marta mas a favela é Santa Marta. (Verônia, moradora) É, o Santa Marta é ocupado na década de 30, o primeiro registro que a gente tem é de 38/39, mas eu suponho que já tinha gente antes e na verdade ele é descoberto, ele é apresentado para fora pelos jesuítas, eles são os primeiros a irem nesse espaço. O Santo Inácio, você tem p colégio, a igreja, aquela esquina da São Clemente com a Eduardo Guinle é um terreno que é também dos jesuítas , onde você tinha um trabalho social cê tinha os bandeirantes que ocupavam parte do trabalho deles e você tinha um ambulatório já para atender as pessoas pobres, (...) aí começou o trabalho deles no SANTA MARTA, a primeira capela 290 do morro é feita lá em cima, lá no alto do morro. (...) A capela tá lá, ela tinha primeiro um embrião de capela depois ela foi destruída para construir a caixa d'água e em cima da caixa d'água é feita a capela, então o chão da capela é o teto da caixa d'água, é a partir de 59 foi construída lá. Tem um registro, o padre Veloso conta isso, que foi um dos primeiros jesuítas a chegar lá e ele diz que o pessoal falou bom, aqui tem uma passagem bíblica que conta que Jesus foi à casa de Marta e Maria e elas o trataram bem e o puseram para descansar, então ele diz como Marta tratou bem o Cristo, aqui vai ser também um lugar para as pessoas descansarem. (...) você vai encontrar na internet algumas referências ao Santa Marta assinadas por historiadores que eu discordo radicalmente, uma quer dizer por exemplo que os moradores ficaram ali por concessão dos jesuítas, que ligados ao Santo Inácio o padre fulano de tal deixou morar lá, na verdade isso não tem possibilidade, porque primeiro o próprio padre Veloso que foi reitor da PUC duas vezes, morou ali não tem conhecimento disso, (...) o padre Agustinho (Cassiron) morou no Santa Marta de 78 a 81 e essa história nunca apareceu e trabalhador no colégio é coisa recente, é dos anos 90 que você vai encontrar gente do morro trabalhando no colégio. (Itamar, morador) Por volta de 1977, a favela constituía-se em um aglomerado de aproximadamente 1.100 barracos, cerca de 7.000 habitantes, ocupando no morro uma área relativamente pequena e adensada de aproximadamente 50.000 m2, área contida em termos de expansão horizontal. Segundo o Armazém de Dados, no ano de 2004, a área ocupada pela favela era de 54.991 m2; com a implantação da UPP, a área ocupada passou para 54.788m2 em 2009, 54.706 m2 em 2010 e 2011[5], tendo sido reduzida a área ocupada por moradias populares[6]. O impacto deve-se as remoções de casas para construção do plano inclinado, como também poucos desabamentos de casas em encostas, consideradas áreas de risco. Em substituição às casas que foram demolidas, 291 foi construído um prédio de apartamentos apelidado pelos moradores de “Jambalaya”[7], para qual os moradores removidos foram transferidos. Além disso, foi construído um muro de contenção de moradias, com o objetivo de frear o crescimento da favela para área de Mata Atlântica. Um projeto muito parecido está em processo, porém em relação à área mais alta do morro, conhecida como Pico. Entretanto, o argumento que está sendo mobilizado pelas autoridades é o de que o Pico foi decretado por laudo pericial como área de risco. Através de duas pequenas bifurcações, ladeadas por antigos prédios residenciais, tem-se acesso a duas entradas da favela, a entrada principal da Escadaria e a do Cantão, onde funcionava a “boca de fumo” quando do domínio do narcotráfico na favela. E ainda por Laranjeiras subindo pela Ladeira Mundo Novo, pela qual se tem acesso à Rua Oswaldo Seabra. No topo da subida está localizada a primeira unidade de Polícia Pacificadora do Estado do Rio de Janeiro, a UPP Santa Marta. Em 2008 foi construído o plano inclinado pela Empresa de Obras Públicas (EMOP). Durante o evento de inauguração, o governador afirmou que seu vice, Luiz Fernando Pezão, se comprometeria a encaminhar ao Departamento de Estradas de Rodagem (DER) autorização para inicio das obras de pavimentação da Rua Mundo Novo, que dá acesso a favela Santa Marta pelo Bairro de Laranjeiras. A creche, inaugurada no mesmo evento, porém, nunca foi ativada, tornando-se sede da Unidade de Polícia Pacificadora, em 2009. Para o ano de 2009 seriam substituídas 65 casas de madeira e alvenaria, incluindo a urbanização do entorno, a recuperação de fachadas, telhados, e pintura e reforma de outras 618 casas. No entanto, a entrada da UPP paralisou o processo de intervenção que veio a ser retomado apenas em 2012. A primeira etapa (plano inclinado, ligação de aproximadamente 1,5 mil casas à rede de esgoto e água, construção de escadarias e vias de acesso, entre outros serviços) 292 do projeto Seobras/Emop custou R$ 24 milhões e a segunda etapa (40 casas e 38 unidades habitacionais, reforma de um prédio com 26 unidades habitacionais, a expansão da creche na Rua da Matriz com capacidade para mais de 100 crianças, e a colocação da grama sintética e alambrado no campinho de futebol no alto do morro) custaria R$ 34,1 milhões, a serem entregues no fim do ano. Neste ano, no entanto, já com a UPP implantada, o que se concluiu foi a edificação de um muro (eco-limite) com a justificativa de delimitar e conter a expansão da comunidade, protegendo a mata adjacente, mas o qual os moradores encaram com desconfiança, sentindo-se vigiados e “presos” neste território, como se fossem os muros ou o cerco de uma prisão. Ainda em 2009 o prefeito Eduardo Paes e o governador Sergio Cabral, em parceria com o governo federal, lançaram um convênio na área de segurança pública e promoção social na favela Santa Marta. Participaram da solenidade, entre outras autoridades e convidados, o presidente da Associação de Moradores do Morro Santa Marta, Zé Mario. - Formas de associativismo e contextos históricos - formas de ação (cultural, política, etc) - atores e sujeitos políticos Antes do Polo havia um ambulatório na sala de cultura Dedé, mantido por ex-alunos do Colégio Santo Inácio e pelo Grupo ECO, através do Itamar, com médicos e agentes, que realizavam tratamento de tuberculose, vacinas, pericultura. Lembram-se do nome do médico – Dr. Zé Luiz. Relatam que os moradores de cima eram os que mais usavam, por causa dos tiros, embora houvesse atividades realizadas na parte de baixo, como a pericultura na Igreja Católica, ou o atendimento clínico domiciliar. Nanan, por exemplo, que morava embaixo, frequentava o Rocha Maia. O ambulatório terminou fechando devido à violência 293 (conflitos, tiros) e a comunidade ficou sem atendimento a saúde por mais de 6 anos. (Sonia, moradora) [sobre seu envolvimento com projetos comunitários e sociais]. Me considero agente comunitária desde os sete anos de idade, minha avó era caseira da Igreja dos padres do Santo Ignácio, e naquela época só eles faziam trabalhos sociais na favela, aprendi com eles. (Sonia, moradora) Conclusão No caso da favela Santa Marta, os gestores de campo da UPP Social, por exemplo, estabeleceram vínculo diretamente com o Presidente da Associação dos Moradores, menos pelo fato de que desconheçam outras lideranças ou referências locais, porém mais por buscar a centralização das informações sobre a comunidade a partir do vinculo direto com o presidente Zé Mario. Para esses gestores, o presidente da associação, enquanto mediador funcionaria como um ponto de convergência para as demandas dos moradores da favela em questão, uma vez que o presidente representaria, em tese, o pleito de forma generalizada da comunidade. Tal conduta é bastante criticada pelos próprios moradores, uma vez que nem todos se sentem representados pela figura do presidente da Associação dos Moradores de Santa Marta. Como anteriormente observado, as divergências políticas internas à localidade restringem o diálogo entre moradores, dificultando a discussão e a participação nos processos decisórios. Por outro lado, os gestores do Programa Territórios da Paz, do governo do Estado, buscaram estabelecer aproximações com os moradores da comunidade através do apoio e participação em fóruns de discussão 294 organizados pelos próprios moradores e outras lideranças espontâneas, que vem surgindo no contexto da “pacificação” de territórios favelados. A pesquisa de campo realizada entre 2011 a 2013 também revelou a ausência de reuniões ou assembléias na AMMSM para discussões dos problemas internos a comunidade, sem a interferência de agentes externos. Ao invés do espaço da Associação de Moradores, UM DOS espaços de deliberação interno que pode ser apontado seria a sede da ONG ECO, que apresenta em sua diretoria Itamar Silva e outros moradores da Santa Marta; outro espaço identificado consiste em uma sala da igreja Assembléia de Deus cedida, durante a realização da pesquisa de campo, para realização de uma reunião que precedeu a concentração dos moradores, gestores e pesquisadores, às vésperas da manifestação dos moradores de favela, em respostas aos protestos generalizados ocorridos entre os meses de junho e julho em todo o país, que não contou com a participação do presidente de Associação. A ausência do presidente de Associação, apesar do convite ter sido estendido a todos os moradores do morro Santa Marta, foi explicada, pelo fato de que Zé Mario estivesse “capturado” pelo governador e seu partido, logo, não poderia ter prestado apoio a manifestações de moradores contra o governo. Ou seja, a falta de participação do presidente da Associação junto a manifestação espontânea dos moradores do Santa Marta se deve ao estrito vínculo estabelecido com autoridades políticas do governo de Sergio Cabral (PMDB). Além disso, a ocupação em um cargo de assessor de um deputado federal do mesmo partido do governador, o teria impedido de participar das manifestações cujas criticas destinavam-se ao próprio governo. A manifestação foi organizada por Thiago Firmino e Sheila, moradores da FSM que tem se destacado na luta política contra o governo e a favor das reivindicações de moradores do Santa Marta, que encontram-se em condições de pobreza e vulnerabilidade no que concerne a necessidades vitais, como no caso de moradores do Pico, que estão sem luz, água e esgoto. Neste sentido, constatamos novas formas de associativismo e mobilização dentro da favela através da ação coletiva de novos atores políticos locais. 295 Apesar da concentração dos diálogos entre agentes do poder público ocorrer prioritariamente a partir do contato com o presidente da associação de moradores, não podemos ignorar o discurso de outras personalidades locais, que questionam a visão hegemônica imposta pela concepção de Políticas Públicas, que quando implementadas, fazem crer que a participação social restringe-se à adoção dos programas e projetos pré-concebidos por gestores governamentais através de colaboração. Em as “Metonímias de Participação Pacificada”, artigo publicado com resultados parciais desta pesquisa, Fleury e Kabbad (2013) categorizaram diferentes formas de participação no contexto político das pacificações. (e a conclusão do artigo) Contudo, nota-se que no caso especifico da participação dos moradores da favela Santa Marta, por todo seu histórico de luta e resistência a possibilidade de empregar, além de todas as categorias analíticas sugeridas no artigo, aquilo que denominamos participação por resistência[8]. Contrapor-se ao modelo vigente pré-concebido por uma política pública de governo é também uma forma de participar dos processos decisórios. Tanto é que a responsável pela empresa Urbaniza…. reconhece que os questionamentos de uma favela “politizada” atrapalha a implementação das políticas públicas, como por exemplo, a remoção das casas dos moradores do Pico. Identifica-se, por outro lado, que outras arenas de debate, e novas formas de associativismo local tem se organizado para fazer frente às políticas públicas que não foram discutidas e, nem concebidas, através da participação dos moradores. Tal fato corrobora para o reconhecimento da falta de efetividade e eficiência das políticas públicas. Santa Marta é, portanto, um caso paradigmático de mobilização política. Desde sua fundação, o desenho político da FMS configura-se a partir de conflitos e tensões entre distintos sujeitos que participam intensamente da vida pública desta comunidade. Assim, a configuração atual, no contexto da pacificação, é resultado da dinâmica de interação conflituosa e repleta de 296 visões de mundo divergentes que constituem um emaranhado de relações políticas que atravessa a falácia da dicotomia “favela-cidade”, “morro-asfalto”, ou o par de representações sociais que evidenciam ora a “cidade partida” em oposição ao modelo de “cidade integrada”. Por conseguinte, a participação destes atores no processo de integrar-segregar as favelas à cidade tem sido problematizada por todos os atores que vivenciam a experiência da “pacificação”. [1] explicar o que são redes, conceito de Castells e outros autores. [2] Historicamente, a categoria “favela” foi consagrada para nomear a forma de habitação popular construída nas encostas do Rio de Janeiro, ainda no final do século XIX, por uma população majoritariamente composta, principalmente, de ex-escravos e migrantes de áreas rurais que viviam nos cortiços existentes em áreas do entorno do centro da cidade.O termo pode ser compreendido também como exemplo de localidades urbanas nas quais predominam a precariedade ou ausência de serviços públicos básicos - concepção predominate nas interpretações por parte do Estado. Por outro lado, um olhar mais antropológico e sociológico procura compreender a favela como território singular, cuja construção social do espaço é resultado de alternativas encontradas pelos pobres para moradia na cidade e, cuja composição socio-cultural determina um modo de vida também marcado por peculiaridades em relação à cidade formal. A ausência de um Estado de Direitos e leis universais nas favelas as colocaram, senso comum, como “territórios abandonados pelo poder público”, e no cenário atual em que estão sendo implantadas as UPPs, a crença genericamente compartilhada e reforçada pelo Estado junto com a mídia é a de que o Estado voltou a assumir o controle destes territórios de favela, e que elas passam hoje por um processo de regularização e legalização de serviços urbanos, apontados antes como informais e ilegais. [3] Para informações sobre a história das favelas do Rio de Janeiro, ver: www.favelatemmemoria.com.br. 297 [4] No Sistema de Assentamentos de Baixa Renda/SABREN, disponível no site do Instituto Pereira Passos/IPP, por exemplo, a localidade é referida em alguns lugares como Morro Santa Marta, em outros como Morro Dona Marta e em outros ainda como Morro Dona Marta/Santa Marta. 7http://www.armazemdedados.rio.rj.gov.br/arquivos/3256_nt13_favelas%20cari ocas%20em%20%c3%a1rea%20de%20upp%20compara%c3%a7%c3%a3o% 20das%20%c3%a1reas%20ocupadas%202004-2011.pdf [6] a favela teria atualmente cerca de 6 mil moradores. [7] Nome dado em referencia ao programa “Toma lá, dá cá” transmitido pela emissora globo de Televisão, em que o prédio era uma especie de balança mais não cai, e no qual habitavam uma diversidade de tipos urbanos. [8] Refere-se a mais um sentido para as diferentes formas de participação na esfera pública de atuação política. 5.2 Redes Gráfico e Desenho de Redes 298 299 300 Desenho, Descrição e Análise das Redes. As relações e o nível de interações na rede comunitária se orientam por valores de solidariedade e cooperação em torno de um interesse comum que mobiliza os grupos e indivíduos para a mudança das políticas públicas e gestão governamental. A rede comunitária procura horizontalizar a articulação de demandas e se servem das modernas tecnologias de informação para disseminar seus posicionamentos. Portanto, há distinções de valores e princípios que mobilizam os atores comunitários e governamentais e criam incompatibilidades de valores e interesses entre os membros. Ainda que a rede social organizada pelo governo se proponha a definir um novo padrão de gestão e interação com a comunidade, sua prática está delimitada pelos cerceamentos institucionais e burocráticos. Ressalta-se também que a centralidade da coordenação da rede pelo governo determina certo reconhecimento de status público a alguns representantes da comunidade e isolamento ou negação de outros. Recursos Os gestores carecem de recursos materiais para a realização do trabalho. A falta de equipamento, como telefone, material de escritório, meios de locomoção, e de uma sede fixa que funcione como local de encontro e de “abrigo” são limitações consideráveis para a consecução do trabalho frente a amplitude do território e tamanho da população com a qual devem se comunicar e constituir a rede. Estes elementos são apresentados pelas gestoras como fatores desmotivadores do trabalho e representativos da pouca importância dada ao programa social frente ao que se observa em outros setores como urbanização e segurança (coerção). Processo de formação da rede 301 Os dois programas se propõem a atuar sobre o mesmo território, conformado pelo mesmo grupo social, as mesmas instituições sociais, o mesmo padrão de sociabilidade. Isto permite que a comparação entre os programas valorize os aspectos internos que configuram a forma e o conteúdo da atuação de cada programa, sua institucionalidade, sua arquitetura e dinâmica. Desse modo, a forma e o conteúdo de cada programa poderá conformar redes sociais distintas, isto é, podemos relacionar a morfologia da rede com o desenho e a dinâmica do programa. O papel da UPP Social é de articular os projetos e políticas no território e constituir uma sintonia fina com as necessidades da população. Os gestores devem seguir um fluxo de ações: ouvir as demandas; encaminhar para o nível central do programa que irá acionar outras secretarias; receber a resposta e colocá-la em prática no território. Todo este movimento pressupõe, segundo sua diretriz, o dialogando com a comunidade. A metodologia de trabalho dos gestores locais é dividida em duas fases: pré implantação e gestão continuada. Na primeira fase os gestores começam a circular pelo território e estabelecer a comunicação com a comunidade, se apresentado e apresentando o programa. Em seguida é organizado um fórum de apresentação oficial do programa, quando gestores do nível central, outros personagens de governo, atores diversos ligados à política de pacificação (policiais, empresários, ONGs) e lideranças locais são convidadas a se apresentarem. Neste momento a mídia geralmente se faz presente e a divulgação da ação é ampla. Ao final da apresentação das figuras centrais, se abre um momento para os moradores se expressarem, fazerem perguntas e, frequentemente, contestarem o que foi dito. O Fórum define a abertura da segunda fase, a gestão continuada. Na segunda fase, com o programa já estabelecido no território, os gestores locais procuram desenvolver maior contato e diálogo com os atores e instituições acionados na fase de “pré-implantação”. Nesse momento é enfatizado os processos de “escuta forte”, no qual os gestores realizam reuniões e conversas individuais para identificar as demandas da comunidade, 302 que, em seguida, são conduzidas para outro espaço de encontro caracterizado como grupos de trabalho. A partir disso, os gestores encaminham as demandas aos níveis centrais, ou procuram estabelecer uma relação entre projetos de modo a solucionar as demandas locais. A segunda fase não tem definido o momento de sua conclusão. Segundo os gestores, isso ocorre porque o programa não está fechado, se desenvolve no andar da carruagem. O programa Territórios da Paz, embora tenha objetivos similares aos da UPP Social, apresenta um desenho diferenciado. A começar por estar alocada na Secretaria de Direitos Humanos e Assistência Social e por ter uma forma de contratação diferenciada, que garante um pouco mais de estabilidade ao gestor. Por outro lado, a origem comum das duas políticas também contribui para que elas mantenham similaridades, o que se observa na missão dos programas, seus objetivos, desenho e as diretrizes de trabalho. O programa é dividido em dois níveis, central e local. O nível local atua no território através de dois gestores. Uma diferença em relação à UPP Social é que nesta os gestores cobrem geralmente dois territórios, enquanto nos Territórios da Paz há uma dupla de gestores por território. O nível local encaminha as demandas que não lhes competem para o nível central, que fica alocado na SEASDH. O método de trabalho no território é similar ao da UPP Social, porém com uma diretriz menos definida. Mas, de modo geral, espera-se que os gestores atuem no território por meio de fóruns, reuniões e outros espaços de participação ao partir dos quais se estabele o diálo com a comunidade, o levantamento das demandas e o direcionamento das ações de coordenação dos projetos e políticas locais. Desenho e dinâmica da rede A separação entre desenho e dinâmica da rede é meramente instrumental. As duas coisas se influenciam mutuamente e ocorrem ao mesmo 303 tempo. No entanto, o desenho da rede permite visualizar a dinâmica destas relações. Os gestores da UPP Social... O primeiro interlocutor que procuraram no Santa Marta foi o Zé Mário, presidente da Associação de Moradores; a partir dele foram estabelecendo outras conexões pela estratégia de “bola de neve”, cada entrevistado indicava outro ator de referência. Mencionou livremente que procuraram também o Tião Belo (da escola de samba e do peladão – futebol), o Pastor Valdecir e a diretora da creche UNAP. Outros atores surgiram após nosso apontamento: Fiell, embora tentando desassociar com a rádio, e ressaltando sua inserção em diversos grupos, como o Grupo Eco e o grupo Visão da Favela. Considera que “as pessoas que são lideranças geralmente não estão em um só lugar, participam de muitas coisas”. Procuraram também os profissionais do Polo Padre Veloso. Atores da rede A partir da compreensão de que essa política pública pretende ser gerida a partir de uma concepção de política de redes, é importante tentar identificar quais são os atores que constituem essa rede. Dessa forma, o programa UPP Social representa um ponto (ou política, não sei bem se a definição ponto seria correta ou mais adequada) que é atravessado por uma série de outras relações, na forma de parcerias, representando elementos que vão compor essa rede. Dentro dessas parcerias, as secretarias municipais ganham destaque na medida em que recebem as demandas coletadas nos territórios. Não significando porém, que essas demandas serão englobadas dentro do plano de ação dessas secretarias. De qualquer maneira, elas tem, dentro do desenho institucional da política um papel importante. Os moradores também fazem parte dessa rede, na medida em que a UPP Social como política pública, pretende ser participativa. As associações de moradores, lideranças locais e todas as relações sociais ás quais esses atores implicam deve ser compreendida. Ainda dentro do próprio território, as ONGs e 304 os projetos sociais representam coletivos de resistência e também devem ter atuação dentro dessas redes. Também são observadas parcerias com empresas privadas, principalmente do que diz respeito a questão de financiamento para projetos e ações. Nesse ponto, é importante observar a questão da política social como uma forma de ampliação de mercado, pois, através de parcerias com projetos sociais, o capital privado acaba sendo inserido em novos contextos de acumulação. O programa atua dentro da esfera municipal e pretende agir no território por meio de uma política de redes que é observada desde a sua forma de contratação. Os gestores, as pessoas que são contratadas para trabalhar e atuar diretamente no território, no caso, nas favelas pacificadas, apesar de estarem prestando serviço diretamente para o município, não são funcionários públicos. Não possuem cargo dentro do governo municipal por meio do processo de concurso público. A contratação desses agentes, se dá através do Programa das Nações Unidas para os Assentamentos Humanos, a ONUHABITAT, que é um programa da ONU que tem como finalidade promover qualidade de moradia. A ONU-HABITAT, portanto, em parceria com a Prefeitura do Rio de Janeiro, através do Instituto Municipal de Urbanismo Pereira Passos, faz a contratação desses agentes que por sua vez se tornam funcionários da ONU-HABITAT. Nesse caso, podemos observar claramente a como se pretende realizar essa política de redes, por meio de parcerias, a fim de facilitar o processo burocrático, antes necessário. O que acontece, é um tipo de terceirização dentro desse processo de contratação, que vai se refletir na insegurança do gestor contratado, que por sua vez constitui uma situação de precarização nas relações de trabalho. Dentro de um contexto de política de rede, na qual o gestor tem como finalidade construir essa rede através de uma aproximação cada vez maior com os diversos tipos de atores e lideranças envolvidos no dado território, essa insegurança e esse tipo “terceirizado” de contratação se mostram contraditórios à própria institucionalidade da política. É importante chamar atenção para o tipo de perfil procurado. São exigidos qualificação técnico acadêmica nas áreas humanas: Graduação completa em 305 ciências políticas, ciências sociais, assistência social, administração pública ou sociologia. O que já delimita de forma bastante forte o tipo de pessoa que se pretende contratar, que vai ter ligação direta com a prática da política. Também é exigido experiência na realização de trabalho de campo e pesquisa na área de intervenção comunitária. É exigido, portanto, do agente, que ele já tenha uma trajetória e um interesse dentro do assunto a ser trabalhado. O contrato tem duração de 3 meses, podendo ou não ser renovado. Identidades territoriais Diferenciação ou associação de acordo com o objetivo da rede; Núcleos de atuação - nós das redes. Apresentamos como redes comunitárias o conjunto de atores e instituições situadas no território tendo como principal função a atividade política em suas diversas formas. Para começar a descrição desta rede destacamos a Associação de Moradores, o Grupo Contra a Remoção dos Moradores do Pico, a Rádio Santa Marta e o Grupo Eco. Estas instituições são colocadas como nódulos das redes, ou seja, pontos de cruzamento e articulação de diferentes atores sociais internos e/ou externos à comunidade. Cada nódulo surge a partir da colocação “institucional” dos atores entrevistados; os nódulos que compõem instituições com objetivos semelhantes são associados em grupos; as relações de vínculo (ligações, bonding) ou de afastamento e alteridade que restringem a aproximação dos atores (fronteiras, bounding) definem o alcance da rede no território. Além disso, as associações que se configuram com atores ou instituições fora do território são definidas como pontes (bridging), segundo uma apropriação das noções definidas por Marques (2007). A rede comunitária do Santa Marta demonstra uma grande proximidade entre os atores e as instituições, cuja trama constituí uma rede coesa onde os 306 nós estão baste próximo e interligados. Isto pode vir a determinar uma rede mais fechada, composta por grupos já instituídos, sem muita abertura para a inserção de novos atores ou constituição de redes fora do território. Somente com a construção da rede completa podemos avaliar com o rigor necessário a forma e o conteúdo das redes sociais da favela Santa Marta. 1. Redes de políticas públicas sociais A política de pacificação tem como característica a intersetorialidade (área de segurança, social, urbanização) e a multiplicidade de atores (governamentais, empresários, ONGs, moradores) configurando diversas redes paralelas, redes de governo, empreendedores, sociedade civil. Contudo, o componente social será o nosso foco de análise a partir dos objetivos colocados pelos seus dois principais programas, os Territórios da Paz e a UPP Social. A UPP Social e a Territórios da Paz se propõem a articular as políticas no território, posteriormente à entrada da UPP (parte coercitiva), envolvendo participantes de várias áreas setoriais, atores. Ao entrar em vigor estas políticas desenvolvem certas dinâmicas de atuação em campo como a identificação de atores-chave, metodologias de identificação de demandas, padrões de relacionamento com os atores comunitários e outros agentes do governo, do mercado e da sociedade civil, dentro ou fora do território de atuação. O conjunto destas ações definem o desenho e o conteúdo da rede da política real, isto é, a que ocorre na prática. Por outro lado, há também o planejamento oficial dos programas que prevê determinado desenho, que certamente não poderá ser idêntico ao que se observa na prática, entretanto aponta para diretrizes de avaliação das ações. Inicialmente vamos identificar quais os atores compreendem cada rede, seus limites e composição. Em seguida, procuraremos qualificar mais profundamente a analise da composição e dinâmica dessas redes. E, por fim, compreender a efetividade e eficácia das ações com base na percepção dos diferentes atores envolvidos. 307 Os dois programas se propõem a atuar sobre o mesmo território de modo que analisaremos dois programas distintos atuando sob um mesmo conjunto de variáveis: o mesmo grupo social, as mesmas instituições sociais, o mesmo padrão de sociabilidade. Isto favorece que na comparação tenhamos possamos observar os fatores externos à comunidade de maneira mais independente para o desenho diferente das redes e sua dinâmica no território. O papel da UPP Social é de articular os projetos e políticas no território e constituir uma sintonia fina com as necessidades da população. Os gestores devem seguir um fluxo de ações: ouvir as demandas; encaminhar para o nível central do programa que irá acionar outras secretarias; receber a resposta e colocá-la em prática no território. Todo este movimento pressupõe, segundo sua diretriz, o dialogo constante com a comunidade. A metodologia de trabalho dos gestores locais é dividida em duas fases: pré-implantação e gestão continuada. Na primeira fase os gestores começam a circular pelo território e a fim de estabelecer a comunicação com a comunidade, se apresentado e apresentando o programa. Em seguida é organizado um fórum de apresentação oficial do programa, quando gestores do nível central, outros personagens de governo, atores diversos ligados à política de pacificação (policiais, empresários, ONGs) e lideranças locais são convidadas a se apresentarem. Neste momento a mídia geralmente se faz presente e a divulgação da ação é ampla. Ao final da apresentação das personalidades políticas principais, se abre um momento para os moradores se expressarem, fazerem perguntas e, frequentemente, contestarem o que foi dito. A realização desse Fórum define a abertura da segunda fase, a gestão continuada. Na segunda fase o programa já está estabelecido no território, os gestores locais procuram desenvolver maior contato e diálogo com os atores e instituições acionados na fase de “pré-implantação”. Nesse momento é enfatizado o processo de “escuta forte”, no qual os gestores realizam reuniões abertas e conversas pontuais para identificar as demandas da comunidade que, em seguida, são dividias em temáticas e conduzidas para outro espaço de encontro caracterizado como grupos de trabalho. A partir disso, os gestores 308 encaminham as demandas aos níveis centrais de governo, ou procuram estabelecer uma relação entre outros atores e projetos de modo a solucionar as demandas locais. A rede pode ser apreendida tanto em forma quanto conteúdo nesta segunda fase do trabalho. Quando os gestores se propõem a realizar fóruns comunitários, estes se apresentam com certa variabilidade de socialização, tendo em vista que os vínculos com os moradores são traçados pelos gestores tendo à frente a imagem da Prefeitura e por trás a imagem da Unidade de Política Pacificadora (UPP). Esse paradoxo cria uma situação em que, por um lado o programa passa a não ser bem aceito por parte da comunidade que enxerga com desconfiança essa política “desconhecida”, e por outro lado, é bem recebido por outra parte da população que possui mais alinhamento com a proposta da UPP. Geralmente os gestores se relacionam com as redes de política comunitária através de “lideranças” – vistas como forças ativas e atuantes em vários projetos comunitários a que devem ser associados para o fortalecimento o programa. O programa Territórios da Paz embora tenha objetivos similares aos da UPP Social, apresenta um desenho diferenciado. A começar por estar alocada na Secretaria de Direitos Humanos e Assistência Social e por ter uma forma de contratação diferenciada, que garante uma estabilidade relativamente maior ao gestor. Por outro lado, a origem comum das duas políticas também contribui para que elas mantenham similaridades, o que se observa na missão dos programas, seus objetivos, desenho e as diretrizes de trabalho. O programa é dividido em dois níveis, central e local. O nível local atua no território através de dois gestores[1]. O nível local encaminha as demandas para o nível central (alocado na SEASDH) quando não pode solucioná-las com os recursos pessoais e locais. O método de trabalho no território é similar ao da UPP Social, porém com uma diretriz menos definida. Mas, de modo geral, espera-se que os gestores atuem no território a partir de fóruns, reuniões e outros espaços de participação, estabelecendo o diálogo com a comunidade, o levantamento das 309 demandas e o direcionamento das ações de coordenação dos projetos e políticas locais. No caso do programa Territórios da Paz, a proposta de “ouvir a comunidade e aproximá-la do estado, na coordenação de políticas e projetos locais”, ocorre de maneira mais explícita e atuante. O que é apresentado nos discursos dos gestores é o interesse de luta e integração do estado com a comunidade, o que representa a criação de vínculos entre as diferentes esferas da rede comunitárias. Os gestores se relacionam com os atores de maneira pessoal, com base no vínculo afetivo e na confiança, caracterizada pelo alto localismo e sociabilidade, denotando a personificação da política em curso. [1] Uma diferença em relação às duas políticas é a abrangência de atuação dos gestores. Enquanto a UPP Social conta com uma dupla de gestores atuando em dois territórios, os Territórios da Paz possuem uma dupla atuando em apenas um território. A dupla responsável pela favela Santa Marta também precisa cobrir a área de abrangência de outra unidade da UPP correspondente ao Chapéu Mangueira e a Babilônia, no bairro do Leme. 310 6. Campo Providência 6.1 Redes e Análise de Redes O exercício de refletir sobre a bibliografia de redes para pensar os atores da Providencia levou-nos a composição abaixo. Nela apresentamos, na primeira parte, uma apropriação da bibliografia sobre o tema referido a uma empiria, e, na segunda parte, um desenho das redes sociais da Providência. Entendemos que a discussão dos limites do território e o estigma da favela, da política pública da UPP, da violência urbana e das reformas urbanas visando os megaeventos são transversalidades que perpassam toda a 311 topografia do social na Providencia. Através das redes abaixo desenhadas, podemos perceber a forma como cada personagem constrói um engajamento social e moral distinto, reivindicando o reconhecimento de direitos específicos. É através da inserção no quadro de redes abaixo que o morador vai politizar o seu cotidiano e buscar o reconhecimento de direitos. 1. A teoria ator-rede e a topografia do social na Providência A noção de rede é usada aqui como uma forma de reagregar o social a partir da fala dos entrevistados na Providência. Tentamos rastrear o social através do ator, para fugir a determinação das estruturas e contextos. Seguindo a sugestão de Latour (2012), deixaremos “os atores arrumarem, por assim dizer, sua própria bagunça”, pois através deles “pode-se restaurar uma ordem que é totalmente distinta das próprias tentativas dos investigadores de limitar de antemão as controvérsias” (LATOUR, 2012: 4). Num viés crítico ao estruturalismo, Latour enfatizou a importância de se perceber a forma como os atores constroem a abstração do sistema, como eles se inserem numa rede e como redefinem essa topografia do social em suas práticas. Através de nossas entrevistas e das categorias nativas dos personagens, delineamos três espaços associativos que são caracterizados por controvérsias: a “associação de moradores”, os “projetos/empreendedores” e a “comissão de moradores”. Dependendo da posição relativa dentro de uma dessas redes, o ator fará uso de certas abstrações, terá alguns problemas em comum e formulará um repertório de respostas que lhes são próprios. Esses espaços de controvérsias sociais não são estanques, nem imóveis; os atores se movimentam neles. Dependendo de sua biografia, da situação que vivenciam ou do contexto das entrevistas semi-estruturadas que realizamos, eles aproximam-se ou criam distâncias entre estas topografias do social na Providência. Compreendemos cada personagem como um mediador completo das abstrações que definem sua prática e ação. 312 A topografia do social e a noção de capital social na modernidade capitalista Como Latour, Marques também considera o indivíduo um mediador de redes e sistemas em sua trajetória, porém ele não se preocupa com as abstrações do social e as formas de reagregá-lo através da visão dos atores. Para ele, “os fenômenos sociais têm como suas unidades básicas as relações sociais, e não os atributos dos indivíduos” (MARQUES, 2009: 35). Por tanto, o sociólogo não tem problema em teorizar sobre o contexto e a estrutura de uma interação, sem se referir às abstrações dos sujeitos. Marques contextualiza as redes como um traço da modernidade. Na vida urbana contemporânea, a noção de “comunidade de vizinhança” perde o sentido forte que adquiriu em sociedades tradicionais. A sociabilidade passou a ser constituída por inúmeras conexões secundárias e por contatos que os indivíduos constroem em sua trajetória de vida. O fenômeno da internet, no final do século XX, acentua esse aspecto da modernidade, do “urbano como um meio de vida”. Nesse sentido, a “vizinhança física” pode não corresponder ao espaço social cognitivamente compreendido, mobilizado e organizado pelo indivíduo. A pobreza e a segregação urbana ganham uma complexidade própria nesse paradigma de análise que supera a noção de “vizinhança” para a localização da pobreza. Apesar da estrutura social-econômica capitalista restringir a gama de oportunidades dos indivíduos, que não podem ser responsabilizados pela condição social adquirida, em suas trajetórias os atores podem construir redes que lhes garantam mobilidade e uma postura cívica distinta. Marques vai acentuar como a “densidade” dos contatos que as pessoas constroem numa vida permitem-lhes construir círculos sociais distintos. Essas conexões são percebidas como capital social e podem gerar mobilidade de status, formas de organização diferenciadas e posturas cívicas diferenciadas. A noção de capital social vulgarizou-se no cotidiano e nas práticas estatais, requerendo certo cuidado em nossa apropriação. De forma genérica, 313 o conceito enfatiza que a sociabilidade constituída numa organização ou trajetória de vida engendra formas de poder. Logo, a posição adquirida por uma pessoa numa relação social não está associada somente ao valor monetário acumulado, aos bens físicos adquiridos (moradia, salário, emprego, capacidade de poupança, etc.). Isso não significa desconsiderar a economia como geradora de desigualdade, mas representa a possibilidade de um enfoque que potencialize a sociabilidade como capaz de produzir recursos à serem mobilizados em diferentes contextos. De forma restrita, originalmente usado por Bourdieu, o conceito de capital social servia para observar como as relações sociais constituídas num campo geravam um benefício agregado aos indivíduos que investem e participam de um certo conjunto de trocas materiais e simbólicas. A noção tinha um viés crítico à “ideologia burguesa” que restringe a posse e o acumulo de bens materiais como fonte única de poder. Ademais, mostrava como o pertencimento a alguns grupos podia gerar capital e ser convertido em uma posição sócio-política importante em outras relações. Por tanto, o conceito estava distante de sua vulgarização como panaceia da questão social em programas de governo, agências financiadoras internacionais e intelectuais engajados em atividades de desenvolvimento social. Marques é atento a esse debate pela sua preocupação com o caráter “multidimencional da pobreza”. Para ele, a pobreza não deve ser explicada somente pela teoria da vizinhança e da desorganização social. Devemos antes buscar as redes que estruturam o pertencimento das pessoas e as oportunidades de acesso à ativos econômicos e sociais que poderiam ser mobilizados em contextos públicos e privados, visando a mobilidade de status, o desenvolvimento de formas organizacionais e a constituição de posturas cívicas. O caminho sugerido pelo autor é a caracterização das redes sociais e pessoais quanto à densidade dos contatos e sua “abertura” ou “fechamento” à possibilidade de mobilização de tipos de capital social distintos, num certo contexto de pobreza. Por estarmos lidando com uma “favela”, um espaço de pobreza estigmatizado e segregado do território urbano, a noção de capital social, 314 através de contatos adquiridos em trajetórias pessoais e de conexões articuladas em grupos, permite sondar como as biografias individuais e as formas associativas impactam comportamentos e práticas coletivas. Destarte, entendemos que as pessoas de uma mesma “comunidade de vizinhança” podem possuir capital social diferenciados, a partir dos contatos e círculos sociais identificados pelos indivíduos nas entrevistas semi-estruturadas. Na topografia do social traçada pelos personagens da Providência desenvolve-se tipos de capital social distintos. A rede da “associação da Providencia”, dos “projetos” e da “comissão de moradores” são constituídas por diferentes contatos e por perspectivas de ascensão e atuação sócio-política para os moradores. o O desenho das redes Nessa seção, realizaremos uma conceituação mínima do que estamos construindo como unidade de análise e apresentaremos um esquema da rede apreendida empiricamente. Rede de “projetos/empreendedores” Os “projetos” são considerados uma unidade de ação coordenada por uma Organização Não-Governamental, uma pareceria público-privado ou uma pessoa que visa solucionar problemas localizados no espaço urbano. A educação das crianças e da juventude, a transmissão de tradições culturais, o desenvolvimento do empreendedorismo e diferentes formas de atuação que tentam transformar a vida dos moradores da Providência são tratadas aqui como projetos. 315 Nesse viés, cruzam-se as trajetórias de Maurício Hora, Janice, Dona Jura e Eron. Esses diferentes indivíduos constroem a si e o espaço em que vivem a partir dos projetos em que estão engajados. É interessante observar que o nódulo central da rede, a Casa Amarela, estrutura-se fundamentalmente na parte da escadaria e no largo da Igreja Nossa Senhora da Penha, espaços que, antes da pacificação, era dominado por traficantes. Esta região tem sido foco de ação do poder público desde de 2006, com o “Favela-Bairro”, e, atualmente, com o “Morar Carioca”. Nesse sentido, eles se movimentam numa faixa de aproximação do Estado e das políticas públicas, mas também constroem críticas a atuação do Estado. Os projetos e os empreendedores são reunidos em proximidade, pois percebe-se como estes indivíduos constroem possibilidades para a mercantilização da “favela pacificada”. Cada personagem tem aflições e desejos em relação aos “turistas”, a “valorização imobiliária” e a conquista de ganhos pessoais. Contudo, há diferenças significativas entre os empreendedores, no sentido puro do termo, e os atores dos “projetos”, principalmente, quanto ao desejo destes últimos em transformar a realidade através de uma prática. Existe uma gradação construída e vivenciada por cada ator dessa rede, que pode passar de membro de um projeto que visa mudar a realidade à empreendedor de um negócio individual. Essa rede de “projetos/empreendedores” cria proximidades com a rede de Comissões de Moradores, mas é construída em forte oposição à Associação de Moradores. Abaixo, segue um esquema dos nódulos da rede de “projetos/empreendedores”, e as experiências que os atores utilizam para explicar a inserção na Providência. Rede da “Comissão de oradores” 316 A Comissão de Moradores constituiu-se contra as remoções promovidas pelo Secretaria Municipal de Habitação, através do Morar Carioca. Ela promove diversas performances de resistência às reformas urbanas em curso em diferentes lugares da Providência. Nela, observa-se, principalmente, o engajamento das pessoas ameaçadas de perda de moradia na Escadaria, no AP, na Praça Américo Brum, na Pedra Lisa e na Rua da Grota. Cada pedaço da Providência pensa a “remoção” e as opções de ressarcimento pela Prefeitura de forma distinta. Os moradores dessas diferentes áreas fazem esse calculo e se engajam a partir desse princípio. O núcleo central dessa rede é a “Família Leite” na Escadaria. Através dela, opera-se os contatos externos com intelectuais do Fórum Comunitário do Porto e as principais mobilizações. Zeneide e Maria Antônia formam um subgrupo na mobilização da Pedra Lisa. Na Praça Américo Brum, há Marcia, moradora que pintou sua casa como uma forma de protesto, mas que ainda não conseguimos conversar. No AP, há Rosietti. Em cada lugar, os moradores constroem um sentido para a moradia e para a própria história que é mobilizado na luta contra a remoção. A Casa Amarela já compôs parte dessa rede, havendo solidariedades e intercessões com a Comissão de Moradores. Contudo, à medida em que ela não foi mais ameaçada, afastou-se dessa rede. Esse é o dilema vivenciado pela comissão: a fragmentação dos interesses de acordo com a resolução, ou não, da própria situação. Cada ator, vai resolver e observar este dilema de forma particular, realizando diferenciações entre o “self ” (me) e o “outro”. O Fórum Comunitário do Porto aparece como mediação externa mais ativa dessa rede. Além disso, é importante notar como Eron e Maurício Hora também se envolvem como mediadores externos nessa rede, mesmo morando dentro da Providência. De maneira geral, há uma oposição a atuação da Secretaria Municipal de Habitação e a figura de Jorge Bittar. Esta figura é retratada de forma 317 caricatural e pejorativa em diversos contextos. Outro pólo de oposição, identificado com o poder público e o tráfico, é a Associação de Moradores. Rede da “ ssociação” A Associação de Moradores da Providência é o pólo de oposição de todos componentes de outras redes. Eles a veem como parte do tráfico, próxima do Estado e sem utilidade direta para a comunidade. As lideranças das associações, por outro lado, afirmam e definem sua função como um “trabalho comunitário”. Discutir essa categoria através das falas dos diferentes líderes é o principal foco dessa rede. Ademais, a associação vai construir uma visão e perspectiva sobre o que é o “poder público” e as recentes intervenções na Providência. Através dela, podemos perceber como um parceiro do Estado vê a “pacificação”. A rede da associação é a que menos contatos tivemos. Conseguimos apenas a entrevista de 2.1. Desenho do quadro das “redes” da Providência O quadro abaixo apresenta a proposta para as redes sociais do território da Providência. Nele identificamos o “nódulo”, a caracterização da inserção na topografia do social construída pelo ator na localidade e o capital social. Para qualificar a densidade e a abertura da rede constituída pelos atores em suas associações, dividimos os contatos em três níveis: os laços localizados pelos atores na Providência, os limites identificados à atuação do personagem, e as pontes que constroem com as instituições que tem como escopo uma intervenção que extrapola a Providência. 318 Nódulo/Gr Caracterização Ator Capital Social upo Laços Centro Situa-se Social “projeto/empreended Capoeira or” no Largo da Igreja Ventre Livre da como um Eron Penha, desenvolvendo a (capoeirista professor) e - Igreja Limites Nossa - Senhora da Penha Associação Pontes de - Moradores - Família que mora - Tráfico de Drogas (“poder-parelelo) na Igreja da Penha educação de crianças - Espaço localizado - Vila Olímpica da e jovens com foco na entre a escadaria e o Gamboa difusão da capoeira. largo da igreja Comissão Federal do Rio de Janeiro – curso de biologia - Secretaria de Assistência Social e projetos realizados em favelas - Casa Amarela - Universidade - O seu mestre de de Moradores capoeira - Morar Carioca - - Aulas de reforço Reformas urbanas da escolar escadaria Providência - Jovens e crianças na e expectativa de turismo 319 Casa Situa-se como um Maurício Hora (fotógrafo) Amarela “projeto/empreended or” no Largo da Igreja da Penha, desenvolvendo - Família com pai - Polícia “traficante/malandro” - Morador da Gamboa - Espaço localizado da no alto da Escadaria entre crianças e ensino de e fotografia. Nossa largo da Igreja Senhora da Penha Comissão de Moradores - Associação de Moradores (atuou em algumas com - a Associação -Centro de parcerias associação, apesar de ver ela como um limite de de Cultura José Bonifácio -Movimento negro e - Secretaria Municipal de Habitação (por um transformação da Providência em certo momento foi o - Ourivesaria espaço de confronto da - Jovens e crianças - - Tráfico de Drogas Moradores trabalho de difusão leitura - Revista Black Casa que ameaçada remoção) Amarela, esteve de -Intelectuais, arquitetos, estudantes e professores universitários engajados na luta pelo “direito à cidade” - “JR” – artista francês - Estúdio de 320 sua atuação). fotografia - Secretaria Municipal de Habitação, lugar de confronto negociação e com Jorge Bittar para a permanência da Casa Amarela; - Pedro Lessa, fotografo que lhe ensinou técnicas em seu ofício; - Marcos Faustini - Morar Carioca - Reformas urbanas da escadaria e expectativa de turismo 321 Favela Situa-se como Point “projeto- centralidade da avó Moradores empreendedor”, na educação; localizado um Janice na escadaria. É um bar que foi elaborado por sete mulheres, - Família do norte e - Associação de - Instituto Elas - localidade a Rua da Grota; - Amigas de governo “Mulheres da - Polícia - Identifica como sua Programa que separaram, principalmente se Paz” e “Protejo” e a sua chefe; - Morar Carioca - - Casada com um Carolina Reformas urbanas da Instituto Elas e pela morador do Alto da escadaria Chevron. Escadaria; expectativa auxiliadas pelo Amigas que organizaram de turismo - Casa Amarela; - e - se “JR” – artista “– artista francês para fazer o projeto do bar. “Restaurant e” Jura Situa-se como um D.Jura - Família do norte e - um educação (o restaurante para cozinhar, desenvolvido no GT costurar Dona projeto de e Associação dom Moradores a - Tráfico de - “JR francês; - Política Pública do 322 empreendedorismo. personalidade O decidida); empreendimento está localizado na Rua da Grota, local a ser atingido com as obras Carioca. do Morar - Polícia Pró-Sanear; - Rosietti e Comissão - “Patroa”, sua chefe - Família construída de Moradores no trabalho em casa na Providência com o de primeiro marido; também - Constureira da região; - “Sindica” da Rua da Grota, no Programa Pro-Sanear; família que atuou Providência, fazendo serviço social ; - Morar Carioca Reformas GT da Rua da Grota e de turismo; Empreendedorismo - Igreja e comemoração 100 anos a dos da Providência - Vendedora - Urbanas expectativa - na de 323 Quentinhas; - Casa Amarela Bar da Vera Birosca localizada no Vera Ferreira - Largo da Igreja da migrantes, com mãe Moradores Família Penha, pernambucana ponte para ela que sendo um empreendimento Família de que lhe ensinou trabalhar; impactado pelo Morar Carioca. - A birosca como uma Associação de - - Tráfico Programa Saúde (principal tem doença e cuida - Polícia de um irmão doente) herança da mãe - Morar Carioca - Reformas Urbanas e - Casa Amarela expectativa de turismo; Comissão Comissão formada Zeneide de na Pedra Lisa que Moradores tem como pano de fundo a reação ao Programa Carioca” “Morar e as - Família de - Secretaria Municipal - Fórum Comunitário migrantes do Norte; - de Habitação; Reconhecimento - como líder Associação do Porto de e Moradores autoridade na Pedra 324 reforças urbanísticas Lisa - Tráfico em curso. - Doença, câncer na cabeça Comissão Comissão formada Maria Antônia de na Pedra Lisa que migrantes do Norte e de Habitação; Moradores tem como pano de conflito com pai/mãe; fundo a reação ao Programa Carioca” “Morar e as - Família -Emancipação de - Secretaria Municipal - Fórum Comunitário - Associação de - Cursos de do(s) Moradores da Pedra artesanato e outros marido(s); Lisa Reconhecimento - voltados a idosos na reforças urbanísticas - em curso. como liderança, pela assassinado Tráfico, facilidade de falar e confusão se expressar; - do Porto; Habilidade artesanatos com filho UPP-SOCIAL; e - Escola de Educação as Infantil, localizada no mulheres dos donos Sessenta; com de costura; das bocas - Enfrentamento da justiça para defesa dos filhos; - Dona de Bar na Central do Brasil; 325 -Aposentada como professora; - Facilidade de apreender e de se educar; - Professora no berçário; formada Família Leite – Roberto Comissão Comissão de na Pedra Lisa que Moradores tem como pano de - Secretaria Municipal - Fórum Comunitário de Habitação; - fundo a reação ao Programa Carioca” de Moradores “Morar e Associação do Porto as reforças urbanísticas em curso. Associação A associação de Marlene de moradores qualifica- - Família nortista e moradora Famílias que - Centro de no “resistem” a remoção Referência a 326 Moradores se na realização do “trabalho comunitário” e nas parcerias com o Estado em Cruzeiro; - e a indenização do Assistência Organização de festas; - Salão de Beleza em específicos, Casa. comunidade. na - na com UPP- Social; - e programa “Mediação - As “juninas”: grupos de festas juninas que realizam festas em Trabalho excursão Pacificadora de Conflitos” Trabalho crianças (CRAS); - Unidade de Política programas realizados governo. Social de com crianças. de férias diversas regiões; - “Eike Batista”: expectativa de valorização dos terrenos e compra de casas 327 7. Estudos Temáticos 7.1 A Militarização do Social: UPP no Santa Marta Durante dois meses nossa equipe de pesquisadores do Programa de Estudos da Esfera Pública –PEEP da EBAPE/FGV freqüentou diferentes espaços do morro Santa Marta, fazendo observação participante de reuniões comunitárias, festividades, entrevistando moradores, lideranças comunitárias, religiosas, culturais, profissionais e gestores locais, empreendedores locais, autoridades governamentais, policiais e empresariais envolvidas no processo de pacificação neste território. A maioria das entrevistas não pode ser gravada, sendo feitas em duplas de pesquisadores que anotavam o depoimento. Já assembléias e eventos foram filmados e/ou gravados, bem como algumas das entrevistas. O objetivo da investigação foi analisar em que medida o processo de pacificação contribui para construção de uma esfera pública democrática, com o a expansão da cidadania aos moradores deste território a partir de um projeto de cidade inclusiva. Isto implica no reconhecimento das identidades sociais e das expectativas dos atores, sua participação na definição das políticas que os afetem e na redistribuição do acesso aos bens públicos com garantia de direitos de cidadania, no patamar civilizatório já alcançado pela sociedade. Neste artigo vamos tratar especificamente das tensões relativas à construção da cidadania a partir do processo de ocupação territorial de caráter militar e policial, sem tratar da caracterização socioeconômica da comunidade ou da análise da rede de políticas. Um breve relato da construção social desta comunidade será necessário para permitir a análise dos conflitos recorrentes. A comunidade do Santa Marta fica localizada na zona sul do Rio de Janeiro, no bairro de Botafogo. Uma das versões de sua origem seria a imigração de trabalhadores do norte fluminense, no início dos anos 40, em decorrência da decadência econômica da produção canavieira. Estes imigrantes teriam trabalhado na construção civil do Colégio Santo Inácio, dando origem a urbanização do morro Dona Marta. Independentemente da veracidade 328 desta versão, certo é que a comunidade manteve uma forte relação com a congregação dos Jesuítas, sendo também apoiada por voluntárias católicas. Alguns serviços como a creche ainda são mantidos por ex-alunos do colégio Santo Inácio. Com uma rica história cultural e política, essa comunidade manteve tradições rurais como a Folia de Reis, organizou junto com a Igreja Católica círculos operários, teve militantes do Partido Comunista, e no final dos anos 50 organizou-se na luta pela construção de uma caixa d‟água, contanto com apoios importantes de personalidades como Dom Helder Câmara. Outras mobilizações pela conquista de bens como a iluminação, com base em um projeto feito pelos alunos de engenharia da PUC, e melhoria do sistema de água foram marcantes nesta trajetória. A organização da Associação de Moradores ocorreu só na década de 70, onde se destacaram lideranças e houve intensa luta política, sendo depois criado o grupo ECO, que mantém forte presença local. Durante certo período a comunidade contou com um Posto de Saúde, fruto de trabalho voluntário, posteriormente fechado. A partir dos anos 80 ocorreram lutas entre facções rivais de traficantes, que dominaram o território até a ocupação militar. A comunidade tem 54.692 metros quadrados e seis mil moradores, mais quatro mil em seu entorno. Até a chegada da UPP todos os bens públicos estatais estavam localizados fora da favela, até a área limítrofe. Os bens e serviços localizados no interior da favela – grupo cultural, jornal, associação, creche, rádio, cooperativa, etc. - foram criados ou conquistados pelos próprios moradores, alguns dos quais por meio de convênios da associação com o poder público ou organizações sociais. Durante a gestão do Prefeito Conde foi definido, com a participação de uma comissão de obras da comunidade junto à Secretária de Obras, um plano de urbanização, completado na gestão do Prefeito Cesar Maia. Depois da ocupação militar do morro, foi inaugurada a UPP no dia 19 de dezembro de 2008. Por ter sido a primeira experiência, nem os comandantes responsáveis sabiam inicialmente que permaneceriam no local. Esta experiência pioneira inaugurou a nova estratégia de ocupação permanente do 329 território, estabelecendo o domínio policial do Estado com a expulsão do tráfico armado por uma tropa militar, seguido da instalação da UPP permanente. Porém, só em outubro de 2011, foi convocada a primeira assembléia da UPP Social na comunidade atualmente abrigada no Instituto Pereira Passos da Prefeitura sob a direção do anterior Secretário Estadual de Assistência Social onde este projeto teve origem. Antes da UPP Social outras iniciativas sociais já tinham sido iniciadas, impulsionadas pela FIRJAN para treinamento em conjunto com o Sistema S, além de programas como o CRAS, o Núcleo Justiça Comunitária, o Programa de Saúde da Família. Todas estas atividades e programas ocupam um prédio do POLO, recuperado pela prefeitura e situado na franja do morro. Em outro edifício mais próximo da entrada do morro funciona a FAETEC, onde são realizados cursos técnicos oferecidos à comunidade, além da creche. Algumas atividades esportivas e culturais para crianças são desenvolvidas dentro da favela, inclusive no prédio da UPP. A justificativa apresentada para a assembléia da UPP Social ter sido convocada depois de três anos da pacificação foi que esta comunidade apresentava mais recursos que as demais, além de possuir uma experiência política e organizativa mais consolidada. Desta forma, optou-se por esperar que a organização da área social se desse de maneira espontânea, sem utilizar os recursos mencionados para elaborar um modelo para coordenação da política social. Os resultados encontrados indicam que a existência de vários pontos de conflitos e tensão entre os diferentes atores, em relação ao campo social e ao significado atribuído a suas dimensões é, em parte, consequência desta trajetória de construção da política pública. Destacamos os seguintes pontos: ORDEM E DESORDEM A política de segurança de ocupação militar e policial, resgatando o território do poder dos traficantes armados, continua sendo a principal marca desta estratégia. Apesar das variações de posturas e personalidades dos dois 330 militares que comandaram a UPP até agora, trata-se da imposição de uma ordem ostensivamente armada, com vistas a intimidar qualquer possibilidade de retorno à desordem anterior, na vigência do domínio dos traficantes. Para isso foram instaladas câmaras de vigilância em vários pontos da favela, o que contou com forte resistência inicial dos moradores à invasão de sua privacidade. Apesar da simpatia da primeira comandante se sua proximidade com os moradores o comando policial tem uma missão disciplinadora que transcende a defesa do território do poder dos traficantes, evidenciando elevado poder discricionário do comando coercitivo na definição deste ordenamento social. Esta atribuição de intervenção na sociabilidade e nos comportamentos em função da construção de um novo ordenamento, parte da consideração da favela como território onde predominam a informalidade e a desordem. Esta postura fortalece estereótipos dos favelados como avessos à ordem civilizada, ignorando os esforços da comunidade por construção de atores, instituições e redes de relações, na ausência do poder público e de serviços essenciais. Os eventos que são percebidos pelos policiais como geradores de “tumulto” ou desordem são proibidos ou coibidos por meio de repressão física. Eventos em áreas públicas devem ser autorizados, sendo sua liberalização feita a critério da autoridade policial. Como em outras comunidades pacificadas, o baile funk, foi inicialmente proibido, por ser identificado com o domínio do trafico e com comportamentos inadequados, tendo que ser negociado pelos líderes culturais com o comandante. Enquanto ele se encontrava proibido na favela, o legislativo e a própria prefeitura envidaram esforços para promoção desta manifestação cultural na cidade. Grande parte dos esforços desenvolvidos por atores fora da polícia estão voltados para a formalização do mercado, embora envolvam também medidas coercitivas como a proibição de gatos de luz e TV a cabo, gerando muita insegurança e tensão. A ausência de controle do consumo de alguns destes serviços é denunciada pelos moradores como expressão da imposição de uma ordem arbitrária de mercado, como cobrança de taxas de iluminação pública onde o serviço inexiste. 331 Alguns profissionais de órgãos do governo buscam disciplinar o comportamento dos moradores, em especial em relação á coleta do lixo, enquanto a empresa de luz, a Light, procurar atuar por meio de incentivos financeiros para coleta seletiva. Tendo para isso sido beneficiada com um espaço cedido pela prefeitura. A luta dos moradores por obtenção de tarifas sociais que viabilizem sua capacidade de honrar estes novos compromissos tem sido difícil, embora nas comunidades recentemente pacificadas esta questão já tenha sido objeto de negociação entre o poder público e as empresas. A promoção da formalização dos negócios e o incentivo ao empreendedorismo tem sido objeto de cursos e treinamentos oferecidos em parceria da prefeitura com o SENAC/FIRJAN. Moradores denunciam a falta de serviços básicos de esgoto e coleta efetiva do lixo, gerando a ameaça constante dos ratos, como ausência de uma verdadeira ordem que os iguale aos demais moradores da cidade. Lideranças locais reclamam da não correspondência entre os deveres que tiveram que assumir abruptamente com a entrada da polícia seguida pelo mercado e a ausência de bens públicos que resguarde os direitos da cidadania. Por exemplo, consideram a invasão dos turistas com postura desrespeitosa de sua privacidade uma situação para a qual não existe ordenamento previsto. A imposição de uma ordem coercitiva e mercantil em substituição ao domínio do tráfico é denunciada como uma escolha trágica que não abre espaço para construção da democracia. RECONHECIMENTO E PARTICIPAÇÃO O nome Santa Marta é objeto de uma disputa de significados que se processa em vários níveis. Para a comunidade sua identidade foi construída em torno do nome Santa Marta, sendo Dona Marta apenas um acidente geográfico. Evangélicos, vários veículos da mídia e pessoas de fora da favela 332 seguem falando Dona Marta, o que e é visto pelos moradores como um desrespeito à sua trajetória. A história da comunidade, suas lutas, suas formas de organização e convivência, suas conquistas ao longo do tempo, suas maiores lideranças, seus piores momentos, desde a falta de bens básicos como água, luz, comida, até as melhorias conquistadas são um tema recorrente entre os moradores, em especial suas lideranças. Existe o temor de que esta nova estratégia política de pacificação seja acompanhada pela perda da identidade e do reconhecimento da comunidade, como se ela estivesse sendo inaugurada pela UPP, desconsiderando a teia de relações sociais, as instituições e normas que ordenaram a sociabilidade durante toda sua existência anterior. O sentimento de ausência de reconhecimento se acentua com a falta de participação da comunidade no processo decisório sobre o atual plano urbanístico, as remoções e as novas construções, gerando preocupações sobre os interesses comerciais envolvidos. Há um sentimento que estão sendo engolidos pelo processo, ao invés de serem seus protagonistas. O tema atual da remoção da população do PICO está gerando alguma mobilização. No entanto, a comunidade não é homogênea, havendo muitos que discriminam os moradores das partes mais altas e outros que pretendem lucrar com a nova realidade de forma individual, abandonando uma perspectiva coletivista. A estratégia da UPP social é um convite ao diálogo, ou escuta forte, mas poucos acreditam que seja para uma participação efetiva no processo decisório sobre aquilo que afeta suas vidas. DISCIPLINAR E CAPACITAR A existência de uma série de programas de capacitação seja por meio de música, lutas, cursos técnicos, cursos de idiomas, etc. pretende ocupar as crianças e os jovens de forma a afastá-los da atração exercida pelo poder do tráfico, forma uma nova geração com valores que deem sustentabilidade à 333 pacificação. Esta modalidade de ocupação do tempo e adestramento tem sido muito mais eficaz com as crianças do que entre os jovens, havendo um vazio de propostas em relação ao grupo que esteve mais vinculado ao tráfico. Já a participação em organizações culturais autóctones, que fogem ao controle do processo de pacificação, não é valorizada pelas autoridades policiais como promotora de desenvolvimento endógeno, sendo vistas mais como polos de resistência. Os moradores temem que o programa de pacificação só dure até a realização dos megaeventos na cidade, o que aumenta as incertezas sobre o futuro. Este sentimento de insegurança em relação à realização de suas expectativas por parte do poder público mina as bases do desenvolvimento da condição de cidadania, fundada nas garantias explícitas e exigíveis na com o estado. A certeza de que o mercado avança sobre o território enquanto o Estado se apresenta fundamentalmente como coerção, retira a possibilidade de que esta proposta se torne hegemônica, malgrado o grande investimento da mídia em tratar a pacificação como uma solução mágica. É nítido o deslocamento da resistência desde a forma de políticoassociativa para o campo cultural, permitindo que estas lideranças conectemse a outras redes de apoio fora da favela, o que se explica pelo esvaziamento das associações pelo clientelismo e pelo tráfico. A pronta adesão da associação à UPP a distancia dos moradores que seguem vendo a polícia com desconfiança, apontando sinais de práticas corruptas e/ou ostentação de poder armado. A principal forma de comunicação na comunidade vinha sendo a Rádio Santa Marta, capaz de socializar vivências, divulgar temas de interesse público, gerar um sentimento de pertencimento. Por não estar legalizada, a rádio foi fechada depois da UPP gerando sentimento de profunda perda na comunidade. Diante da tolerância com outros empreendimentos não formalizados é vista como restrição à liberdade de expressão. DIREITOS E DEVERES 334 Indubitavelmente a população sente que ganhou visibilidade na mídia e no imaginário da cidade, além de não ter que conviver com o conflito bélico entre traficantes e policiais. Apesar da insegurança em relação à sustentabilidade deste direito à vida e à paz, os moradores sentem-se mais seguros na fase atual. Mas, denunciam que perderam direitos de cidadania, como o direito do proprietário de edificar e melhorar suas casas, proibidas no decreto municipal, desde a entrada da UPP, o que gerou desorganização e falta de em suas vidas. O rigor desta medida justificada para coibir abusos nas construções é denunciado por ser usado apenas nas favelas, não havendo punição semelhante aplicável aos infratores do asfalto. Esta excepcionalidade denuncia uma condição de cidadania de exceção, como denominada pelo líder cultural Fiell, do Santa Marta. Da mesma forma, sentem que os direitos sociais não lhes são assegurados por serviços de qualidade. Em especial reclamam das escolas públicas onde estudam as crianças e jovens da comunidade, incapazes de fornecer uma instrução adequada que permita aos jovens concorrer em um mercado competitivo. O baixo envolvimento das unidades educativas com a comunidade se manifesta na ausência destes profissionais nos principais momentos de debates. A ausência de controle sobre a arbitrariedade da polícia, em especial na questão da abordagem, terminou por levar alguns grupos locais a elaborarem uma cartilha de direitos humanos, alertando a população para seus direitos. Esta iniciativa foi percebida pela polícia como resistência, já que a lógica de confronto identifica aliados entre os que apoiam a UPP e consideram manifestações de resistência como oposição ou identificação com traficantes. O tênue limite entre resistência e desacato na forma policial tem gerado vários episódios de tensão. A liberdade de expressão fica ameaçada por esta postura e pela ausência, até recentemente, de uma ouvidoria, que permitisse à população reclamar do abuso policial. 335 A invasão de empresas de TV a cabo e telefonia transformou a favela em um grande mercado. Sem proteção e regulação estatal, a população se vê a mercê da crescente especulação imobiliária e do aumento repentino do custo de vida, temendo que isso acabe em um processo de remoção branca, em especial para grupos vulneráveis como os que pagam aluguel, invisíveis nos mapas das políticas públicas. Por outro lado, jovens empreendedores começam a aproveitar o aumento do turismo e da circulação de pessoas de maior poder aquisitivo para desenvolver iniciativas lucrativas de lazer. Para os moradores o espaço de lazer foi restringido, pois a quadra passou a ser realizar para festas caras, com grande afluxo de moradores da zona sul. Da mesma forma, as escolas públicas onde estudam as crianças e jovens da comunidade continuam a ser vistas como de baixa qualidade, incapazes de fornecer uma instrução adequada para capacitação efetiva, que permita aos jovens concorrer em um mercado competitivo para uma formação que possibilite sua mobilidade social. O baixo envolvimento das unidades educativas com a comunidade se manifesta na ausência destes profissionais nos principais momentos de debates. CONCLUSÃO A introdução abrupta da dinâmica de mercado na ausência de proteção estatal de direitos especiais de cidadania tem demonstrado que a população fica a mercê da insegurança e da especulação. Já as tentativas de autoproteção e organização da sociedade local são vistas como prováveis fontes de resistência à ordem coercitiva. Estes dados nos permitem concluir que o uso da marca policial para identificar o social evidencia que o estado que está chegando a este território é basicamente o aparato coercitivo, não havendo o mesmo empenho na construção institucional dos direitos de cidadania. A desproporcionalidade entre o contingente de 126 policiais e os 27 membros da equipe de saúde da família, com uma disparidade enorme de recurso, demonstra esse argumento. 336 As emblemáticas modificações ocorridas na política de segurança, em pareceria público-privado, não encontram qualquer paralelo no fortalecimento das políticas sociais, de forma a assegurar o patamar civilizatório já alcançado na cidade formal. A fragilidade institucional da UPP Social para alcançar eficácia na coordenação das políticas públicas desenvolvidas por múltiplos atores e programas é percebida por muitos. O resgate do território pelo aparato estatal coercitivo permitiu o avanço do mercado, sendo visto também como condição da expansão da cidadania e da integração urbana. Porém, ao traduzir o social como parte da política de segurança opera um processo de militarização do social, pelo qual se assegura o predomínio do aparato coercitivo sobre a hegemonia, construída em base às relações de sociabilidade, políticas e direitos sociais e as formas de democratização do processo político. Este paradoxo expressa um projeto de cidade que amplia a mercantilização e pretende a integração pelo consumo, mas está longe de assegurar a expansão da cidadania, como reconhecimento de sujeitos e garantia de direito à cidade. Referências Bibliográficas: ADORNO, Sergio. Exclusão sócio-econômica e violência urbana. Sociologias, Porto Alegre, n. 8, p. 84-135, jul./dez. 2002, ARENDT, Hannah. A Condição Humana. São Paulo: Forense Universitária, 1993 AROCENA, José. El Desarrollo Local – Um Desafio Contemporâneo. 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Em setembro de 2010 foi inaugurada, na Praça Cantão, principal espaço comercial da comunidade, uma mini Casa & Vídeo, loja que vende desde eletrodomésticos a pequenos utensílios. O imóvel alugado pela empresa pertence ao empresário local apelidado pela grande imprensa de Eike Batista do Santa Marta. O banco Bradesco instalou, em meados de 2010, no prédio da creche localizada na Rua Jupira, principal rua da favela, um Posto de Atendimento Avançado. Com apenas um funcionário, realiza atividade gerencial relacionada à concessão de crédito e disponibiliza um caixa eletrônico. Há ainda o serviço realizado pelo o que chamam de Bradesco Expresso, o qual pratica a atividade operacional de um banco, ou seja, abre contas, recebe pagamentos, depósitos, abre cartões e faz saques. O Santa Marta possui três comerciantes que operam como Bradesco Expresso. Esses comerciantes locais parceiros do Bradesco recebem por cada transação que realizam e, como ressaltou nosso entrevistado, “recebem bem para isso”. A adaptação às condições locais é patente na redução dos requisitos para abertura de contas e tomada de empréstimos. A expansão do mercado é, pois uma realidade vista como positiva por empresários e moradores. No entanto, a inserção da população se dá fundamentalmente como consumidores, já que não há menção à forte 341 expansão do mercado local de trabalho como parte desse processo, a não ser a incorporação de moradores em serviços pouco qualificados e temporários das obras do PAC. 1.2) DIVERSIFICAÇÃO A grande repercussão da política pública no Santa Marta estimulou o surgimento de um projeto pioneiro, o Rio Top Tour, tornando a comunidade parte do roteiro turístico oficial da cidade. Realizado com o apoio do Ministério do Turismo, da agência de fomento do Governo do Estado e do Sebrae (Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas), sendo este responsável pela capacitação de moradores como guias turísticos, o projeto tem se mostrado uma nova oportunidade de fonte de renda para os moradores, principalmente como guias. Outros guias locais, entretanto, optaram por seguir como guias turísticos autônomos e não se envolveram com o projeto Rio Top Tour, quer por já desenvolverem outros projetos turísticos anteriormente ou por considerarem que podem ganhar mais de forma independente. Há ainda o turismo realizado por empresas de fora da comunidade, que chegam na favela por meio de jeeps. Estes são, com frequência, criticados pelos moradores por não contribuírem com a economia local. A polarização entre empreendedores no ramo do turismo, internos e externos, tem aumentado a cada dia, o que tem levado à organização coletiva dos empreendedores locais em busca da defesa do seu lugar nesse mercado. Enquanto os empreendedores locais baseiam seu negócio no capital cultural que detêm, o desnível em relação aos empreendedores externos que trazem os turistas desde os hotéis com seus meios de transporte, falando inglês e transmitindo maior segurança, favorece enormemente suas atividades. Comerciantes locais se dividem em relação à opinião sobre os benefícios do turismo para seus negócios. Enquanto muitos alegam que os visitantes não compram nem água mineral por receio de algum tipo de 342 contaminação, outros dizem que começam a beneficiar-se com aumento da frequência, em especial nos bares. Eventos festivos nos finais de semana, em especial rodas de samba, têm atraído público de fora da comunidade dispostos a gastar somas altas, para o padrão local, com a entrada nos eventos, além de comes e bebes. Os eventos mais conhecidos são as rodas de samba e outros shows que ocorrem na Quadra de Samba da Mocidade Unidade do Santa Marta, localizada na Praça Cantão. As famosas rodas de samba organizadas pelo grupo do bloco de carnaval da Zona Sul Spanta Neném atraem um público classe média que enche a quadra e seus arredores na Praça Cantão, onde estão localizados diversos bares. O bloco de carnaval custeia outras duas bandas que tocam do lado de fora da quadra, com acesso livre a todos. Assim, a circulação de pessoas e o consumo permanecem intensos quando ocorrem tais rodas, deixando os comerciantes dos bares em constante expectativa para o próximo evento. Além disso, a nova clientela altera a dinâmica do comércio em questão ao exigir produtos, frequentemente de preço mais elevado, com os quais não estavam acostumados a trabalhar, como nos relata uma comerciante local: [...] antigamente, você lidava só com a comunidade; hoje em dia, não, você lida com outro tipo de pessoas [...]. A pessoa ganha confiança de vir pra comunidade, o comércio ganha confiança de atrair a pessoa também pra comunidade. Isso é um ganho muito grande pro comércio; eles ficam contando os dias pro próximo evento. [...] tanto que eu mudei muito o meu jeito de trabalhar. Eu não vendia... não sei, eu não vendia vodka, eu não vendia nada, fui aprendendo com eles. Eu passei a comprar vodka, que eu não comprava, passei a comprar energético, que eu não comprava, passei a comprar whisky, que eu não comprava; uma vodka cara à beça, que uma garrafa, você vai comprar, é R$ 100,00. Que diabo de vodka é essa?! Mas é assim, você acaba se acostumando com a forma das pessoas, com a aproximação da pessoa, 343 entendeu? É totalmente diferente do pessoal aqui, do morro. [...] é muita roda de samba que tem, é muito evento que tem, e é só gente de fora, não é ninguém do morro. Não dizendo que a comunidade não gasta, gasta, mas quando esse pessoal vem, vem com uma disposição de gastar que eu nunca vi na minha vida; não tem dia, nem hora, nem data, entendeu? Todo dia é bom. Pelo menos pra comunidade é no começo do mês; pra eles não, pra eles é no começo, meio e fim, que é bom, entendeu? A fala da comerciante nos mostra que a maioria dos eventos que ocorre na quadra da escola de samba e na Praça Cantão, que fica em frente à quadra, tem sido para pessoas de fora da comunidade. A mudança na dinâmica dessa área comercial do morro leva os comerciantes a buscarem se adaptar ao gosto da nova clientela ao adquirirem produtos diferenciados. O fato de que a maioria dos eventos na quadra são direcionados às pessoas de fora agrada aqueles comerciantes que lucram mais com o público externo. Ademais, a sensação de segurança que a presença permanente da polícia gera, desperta a confiança para que pessoas do asfalto frequentem o morro e, consequentemente, possibilita o comerciante investir ao acreditar que tal movimento da freguesia se sustentará. Assim, por um lado, há aqueles que foram beneficiados pelo aumento da circulação de turistas e de pessoas com maior poder aquisitivo, como os bares e restaurantes localizados em pontos que fazem parte do trajeto turístico e principalmente os empreendimentos localizados na Praça Cantão, como os citados acima. O dono de um bar no meio do morro relata a expansão do empreendimento proporcionada pela retirada do domínio armado do tráfico. Antigo ponto de olheiros do tráfico, a chegada da UPP promoveu uma grande mudança para o bar. Por outro lado, existem aqueles comerciantes que se sentem prejudicados pela maior inserção do Estado, em especial aqueles que não se enquadram no comércio voltado aos turistas ou ao público externo. O aumento 344 dos custos pela regularização dos serviços de luz e água, bem como a coação para formalização dos empreendimentos torna o comércio mais custoso. Ademais, o fato dos moradores terem que arcar com a formalização dos serviços supracitados e da TV a cabo compromete boa parte do orçamento, resultando numa disponibilidade financeira menor para consumir no interior da comunidade. Por fim, o comércio ambulante localizado na entrada do morro se sente inseguro com a entrada do Estado e sua ordem. A Associação Comercial do Santa Marta juntamente com os próprios ambulantes lutam pela sua permanência por meio da legalização das barraquinhas por parte da prefeitura, ainda sem uma efetiva resposta do ente. Em resumo, a diversificação das atividades do comércio local favorece aqueles empreendedores e negócios que se inserem na nova dinâmica de relação com a favela, em especial nos ramos do turismo e do comércio de bares e festas voltados para o público externo. Além da competição entre os negócios locais e externos no mesmo ramo, que favorece grandemente aos agentes externos, a dinâmica do mercado direciona as atividades para o público externo, reestratificando o mercado em detrimento daqueles comerciantes que têm como consumidores a população local, cujo poder aquisitivo vem sendo reduzido com a formalização das relações de consumo. 1.3) FORMALIZAÇÃO Com a maior inserção do Estado nas favelas cariocas, viabilizado pela implantação de UPPs, teve início o processo de regularização de consumo de serviços e de atividades comerciais. De acordo com dados do Sebrae , cerca de 92% dos negócios nas favelas cariocas são informais. O projeto Empresa Bacana, organizado pela Diretoria de Desenvolvimento Econômico do Instituto Pereira Passos e realizado pela prefeitura em parceria com o Sebrae e Sindicato de Empresas de Serviços Contábeis (Sescon), oferece aos que faturam até R$ 36 mil por ano a chance de formalizar o seu negócio pagando 345 mensalidades que variam de R$ 28,25 a R$ 32,25. O mutirão tem sido realizado em cada comunidade pacificada, as quais são o foco atual do projeto. Segundo relatos de alguns entrevistados, o maior atrativo aos olhos do microempreendedor na favela Santa Marta é a possibilidade de, com o número do CNPJ (Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica) em mãos, adquirir o sistema de vendas por cartão de crédito, o que representa maiores possibilidades de vendas para os comerciantes que se beneficiam com a mudança de clientela. De acordo com a Associação Comercial do Santa Marta, hoje são 70 comerciantes formalizados na comunidade. Um segundo aspecto relevante da formalização é o da regularização dos serviços no Santa Marta após a instalação da UPP. Em substituição aos chamados “gatos”, prática até então comum de acesso irregular à luz e TV a cabo, regularizou-se o fornecimento destes serviços, bem como o de água. O fornecimento de energia elétrica foi o primeiro serviço a ser regularizado após a implantação da UPP (CUNHA; MELLO, 2011). Segundo dados da concessionária Light, 90% dos domicílios não possuía fornecimento legal de energia. Hoje, o número de famílias com o fornecimento regularizado saltou de 73, antes da UPP, para 1.594. Essas alterações refletiram outrossim nos rendimentos da empresa. Segundo reportagem veiculada pelo jornal O Globo em 03 de janeiro de 2012, o valor cobrado pela empresa no Santa Marta aumentou em 5.437%, passando de R$ 1.585,64 antes da ocupação para R$ 87.799,04, em dezembro de 2011. Por sua vez, a arrecadação no referido mês ficou em R$ 79.509,12, contra apenas R$ 242,17 do período anterior à UPP, pois, dos 73 consumidores com fornecimento regularizado, somente 15% pagava. Ademais, a arrecadação de ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços) também disparou, passando de R$ 285,42 do mês anterior ao projeto ser implantado para R$ 17.854,80 em dezembro de 2011. O aumento da arrecadação do imposto estadual, dessa e de outras fontes, é visto por alguns como uma compensação bem-vinda para as contas do estado do Rio de Janeiro diante do aumento dos custos com as UPPs. 346 Buscando um maior envolvimento dos moradores no programa de eficiência energética e a redução do impacto da cobrança regular da energia consumida, a Light realizou a troca de antigas geladeiras por novos modelos mais econômicos, fez reformas elétricas em casas, trocou lâmpadas e realizou ações educativas. Tais ações são reflexos de determinações da Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL) que estabelece que empresas concessionárias ou permissionárias de distribuição de energia elétrica devem aplicar um percentual mínimo da receita operacional líquida (ROL) em programas de eficiência energética voltados a comunidades de baixo poder aquisitivo (ANEEL, 2008). Um sistema de telemedição permite que a concessionária realize um controle remoto que a possibilita fazer cortes e ligações diretamente da empresa, sem precisar ir ao local, como fazia anteriormente. Além disso, a Light instalou iluminação pública em diversos becos e vielas da favela, bem como afixou placas com os respectivos nomes e numerações nas edificações, de modo a garantir a entrega da conta de luz diretamente em cada residência, passando os moradores a ter um endereço (CUNHA; MELLO, 2011). Até o presente momento, essa é a única correspondência entregue nas casas, o que é feito pela própria Light. A conta de luz é também um comprovante de residência, importante para a condição de cidadania do indivíduo e que antes era emitido pela própria associação de moradores. Durante o período de transição foi fixado um teto de cobrança do consumo, medido em quilowatts-hora, estabelecido a partir da média do consumo local. Esse teto, revisado e ampliado a cada quatro meses, tinha como objetivo “adaptar” os moradores à nova cobrança, pois, quando retirado o teto estipulado, a tarifa cobrada seria a mesma do asfalto. O desconto é previsto somente para aqueles que possuem Número de Inscrição Social (NIS) por estarem vinculados a programas sociais como o Bolsa-Família ou o Cheque Cidadão ou para aqueles que participam do projeto Light Recicla, que, implantado primeiramente no Santa Marta, prevê a troca de lixo reciclável por desconto na conta de luz. 347 De acordo com o representante da Light entrevistado por nós, a empresa tem a intenção de tratar o morador de favela como um cliente normal. Ele coloca a questão do próprio dilema da compatibilização entre o mecanismo de mercado e a condição de cidadania de como tratar igualmente pessoas tão desiguais: “a gente não quer criar uma „Lightinha‟ separada [...] eu quero tratar esse cliente como cliente da Light, não como coitadinho”. A nova cobrança, mesmo no período em que se encontrava reduzida pelo teto estipulado, tem impactado consideravelmente o orçamento dos moradores e é alvo frequente de reclamações. A queixa esteve presente em todas as entrevistas que realizamos e podemos classificá-las como sendo fundamentalmente de três naturezas: arbitrariedade associada à falta de transparência na medição do consumo; desconfiança da atuação da companhia gerada pela falta de transparência; e insegurança financeira que a cobrança considerada abusiva provoca, como expressa a fala de um dos entrevistados transcrita a seguir: Aumentou muito. Estou pagando R$ 92,00 de luz. Eu acho assim, que é um absurdo. A gente não tem um relógio próprio pra poder a gente estar medindo a nossa luz; esse relógio é fechado numas caixas ali embaixo, então, eles vêm aleatoriamente e colocam. E deu pra ver que está sendo abusivo porque teve uma época que a gente ficou sem chuveiro elétrico e sem máquina de lavar, então, esquentava a água pra tomar banho, e eu descia pra lavar a roupa na minha mãe; a luz continuou vindo no mesmo valor. Quer dizer, máquina de lavar e chuveiro, que são coisas que puxam muito, sem funcionar, e ainda assim vem esse valor todo, então assim, você percebe que é abusivo. Dado que a energia elétrica é um serviço considerado imprescindível, o não pagamento e o consequente corte do fornecimento é evitado com empenho pelos moradores. De fato o percentual anual de adimplência no 348 morro Santa Marta chega a 97%, superior aos 94,34% registrados na rede de baixa tensão (residências e pequeno comércio) da empresa em toda a sua área de concessão. Entretanto, a conta de energia não diferenciada para os moradores de favela é um dos grandes fatores de empobrecimento na comunidade. O fornecimento de água também tem sido alvo de polêmica. Moradores receiam que a conta de água apresente o mesmo aumento gradual que a cobrança da energia elétrica. Segundo relato de moradores, a cobrança iniciou-se com uma taxa considerada baixa por eles, R$ 8,00. Entretanto, com o tempo, passou para R$ 18,00, pois agora inclui a taxa de esgoto no valor de R$ 10,00. Essa é outra reclamação unânime entre os moradores, que argumentam ser descabida a cobrança por um serviço que não é prestado, visto que não possuem saneamento adequado, com valas abertas e a sujeira que as acompanha espalhadas pela comunidade, além da irregularidade no fornecimento de água. Um moradora expressa no trecho a seguir seu descontentamento com a precariedade do serviço prestado pela Companhia Estadual de Águas e Esgotos (CEDAE) e atribui a má qualidade do serviço à discriminação associada ao morador de favela. Apesar de estar sendo cobrada, não se sente tratada como igual, ferindo sua condição de cidadania. Então, estamos pagando água agora, taxa de água, R$ 18,00. Eu acho que todo mundo tem que pagar pelo o que usa. Estamos uns 20 dias sem água. Tem uns 20 dias que a gente está assim: eles fecham a água, porque eles têm que consertar, mas eles não deram prioridade pra vir consertar porque o governo tem que entregar uma [outra] obra, então a equipe da CEDAE está lá pra poder fechar esse local; e aí a gente fica... Porque é favelado. [...] Só água, não, estamos pagando água e esgoto – é pior, né, não existe o esgoto! 349 Outro serviço que foi formalizado e que impactou no orçamento do morador do Santa Marta foi o de TV por assinatura. Moradores relatam que este é mais um custo com o qual não estavam habituados e que afeta as finanças. Assim que a empresa Sky formalizou o fornecimento do sinal da TV por assinatura, logo após a chegada da UPP, os pacotes oferecidos eram os mesmos do asfalto. Muitos moradores aderiram, fazendo dessa despesa mais um fator de empobrecimento. Relatam que tentam cancelar o serviço, mas existe um contrato que prevê alta multa em caso de rescisão contratual. Após experiências como a do Santa Marta e de outras favelas pacificadas mostrarem que a cobrança do valor praticado no asfalto para aquela nova clientela traria problemas, a empresa Sky e o governo do estado do Rio de Janeiro chegaram a anunciar, em setembro de 2010, um termo de cooperação e um pacote desenvolvido pela operadora especialmente para as áreas pacificadas, o SKY UPP (TERRA, 2010), que seria oferecido por uma mensalidade mais baixa, no valor de R$ 44,90. Contudo, os moradores do Santa Marta com os quais conversamos relataram desconhecer o pacote de menor preço. Comunidades pacificadas têm se mostrado um atraente mercado para as empresas de TV por assinatura. A forma abrupta e incisiva como esse novo mercado consumidor foi abordado no início do processo de formalização, gerou estranheza e incômodo. Hoje, “a Sky já vem dentro do caminhão do Bope” é uma piada ouvida com frequência nas favelas de modo geral (BANCO MUNDIAL, 2013). A reclamação mostra o desapontamento dos moradores em relação a um tipo de presença do Estado que de fato regulasse o mercado, protegesse os cidadãos contra abusos e ampliasse a gama de serviços que atendessem a suas necessidades, como saúde, educação e saneamento. Não se trata da ausência do mercado, ou do Estado, mas das relações entre eles e seus impactos sobre a comunidade. As tensões entre diferentes lógicas concernentes à ação do Estado, do Mercado e da Comunidade foi apontada por Offe (1998), para quem há uma incoerência básica entre os princípios que regem a ação coletiva em cada uma destas esferas - respectivamente a razão, o interesse e a (com)paixão – o que 350 gera contradições. A sinergia e o virtuosismo da relação entre princípios de natureza tão dispare não é facilmente encontrada, como constata Lechner (2000) ao estudar os resultados do paradoxal crescimento econômico chileno nas últimas décadas. O desenvolvimento econômico sob a égide dos interesses do mercado, com uma grande retração das garantias sociais do Estado de Bem-Estar, gerou uma sensação de mal estar difuso, uma crescente insegurança entre os cidadãos acerca de como será seu futuro sem garantias legais de direitos asseguradas pelo Estado. No caso estudado na pacificação da favela, o predomínio da lógica do mercado, fortemente amparado pela política pública de segurança, gera na população um sentimento ambíguo de orgulho de poder assumir um lugar formalizado, ao lado de uma grande insegurança em relação às consequências desse processo sobre a vida de cada indivíduo e da comunidade como um todo. 1) RESPONSABILIDADE SOCIAL e CAPACITAÇÃO Além da expansão das atividades típicas do mercado, encontramos um conjunto de ações desenvolvidas por agentes de mercado, apoiadas pelo governo e em apoio às políticas públicas, voltadas para a promoção social junto aos moradores da favela. Elas podem ser englobadas na categoria de responsabilidade social empresarial, estando voltadas para o desenvolvimento da imagem da empresa junto a esse público e ao aumento das capacidades dos moradores. Encontramos ações de diferentes naturezas em termos de responsabilidade social (RODRIGUES, 2004) na favela Santa Marta. Elas visam construir uma boa imagem da empresa ou instituição perante a comunidade e a cidade, mas ao mesmo tempo possuem outras especificidades. A primeira está vinculada ao sistema corporativo, que tem uma relação próxima com o Estado e intensa atuação na comunidade. Fruto de um acordo 351 firmado entre o governo do estado e da prefeitura do Rio de Janeiro com o sistema Firjan (Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro), o programa SESI (Serviço Social da Indústria) Cidadania é realizado especificamente nas comunidades pacificadas do Rio de Janeiro. Lançado em agosto de 2010, o programa leva serviços gratuitos de educação, cultura, saúde, esporte e lazer a moradores de 19 regiões com UPPs. O programa Indústria do Conhecimento, vinculado ao SESI Cidadania, e cujo objetivo é a promoção do acesso à informação e ao conhecimento, teve sua quinta unidade implantada no Santa Marta, em setembro de 2011. Segundo alguns moradores, o fato de tal espaço ter sido instalado no Pólo de Inclusão Social Padre Veloso, unidade do poder público onde estão situados outras instâncias de ação social, localizado na Praça Corumbá, na entrada do morro pela rua São Clemente, trouxe uma nova dinâmica para o Pólo, o qual estava subaproveitado. Para nós, o fato do programa da Firjan no Santa Marta se situar nesse local, deixa clara a articulação existente entre a Federação e o Estado. A segunda diz respeito a responsabilidade social imposta por regulação estatal. Como foi dito no tópico acerca da formalização, as ações de eficiência energética da concessionária Light direcionadas às comunidades de baixo poder aquisitivo estão associadas à determinação da ANEEL. A literatura não é unânime e aponta que essa forma de atuação pode ou não ser vista como ação de responsabilidade social empresarial, visto que não é voluntária. Contudo, essa regulação evidencia a importância da ingerência estatal na compatibilização entre mercado e cidadania. A terceira se refere às atuações esporádicas que visam manter relações com a comunidade e estão, em geral, vinculadas ao objetivo de aumentar a venda de produtos ou atrair mão de obra. Uma delas foi a abertura de vagas para contratação de moradores de comunidades pacificadas para a função de atendente de call center na empresa responsável por esse serviço na Light. Já o banco Bradesco e a Casa & Vídeo buscam apoiar atividades organizadas pela comunidade, como a festa do dia das crianças, além de oferecer vagas de emprego em suas lojas. 352 Por outro lado, a maior presença do Estado na favela também está associada ao empenho de diversos setores em desenvolver ações socais visando ao aumento de oportunidades e capacidades. O indubitável aumento de ofertas de cursos e atividades é contrastado com a situação anterior, cujo único mercado era o do tráfico, mas criticado por outros por sua descontinuidade, ineficácia e inadequação às necessidades. Segundo o comandante da UPP Santa Marta, capitão Andrada, antes as pessoas tinham que conviver com o tráfico, hoje a UPP lhes dá escolha. De acordo com o agente comunitário do programa SESI Cidadania e morador do Santa Marta, as oportunidades aumentaram e muita coisa está chegando: “Onde tem segurança melhora tudo. Oportunidades estão batendo na porta, só não faz quem não quer”. O período pós-UPP permitiu que novas oportunidades chegassem à comunidade, segundo alguns dos entrevistados. Enfatizam o aumento da oferta de trabalho, de projetos e serviços públicos, de cursos profissionalizantes e oportunidades de trabalho. Porque hoje é assim, aqui tem vários projetos, tem projeto do estado, do município, tem um pólo da saúde; então assim, melhorou por isso, porque, se não houvesse a UPP, isso não viria pra comunidade, não teria o pólo aqui, na praça, não teríamos a FAETEC aqui do lado; não teríamos várias coisas aqui dentro, os eventos da quadra... Por outro lado, um morador relata que os cursos que têm chegado ajudam muito sim, mas enfatiza que o estigma de favelado os acompanha, e, para terem capacidade e poderem participar da vida da cidade ainda devem se destacar. Finalmente, há também moradores que acreditam que os cursos oferecidos por instituições como FAETEC e SENAI (Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial) não condizem com os anseios da população e principalmente dos jovens. Para eles, tais cursos não dão oportunidades e 353 capacidades novas para os jovens, mas os limitam aos subempregos que o mercado lhes oferece e nos quais prefere mantê-los. A pobreza para Sen (2000) deveria ser vista não apenas pelo baixo nível de renda, mas principalmente como uma situação de privação de capacidades básicas. A privação relativa das rendas pode resultar em privação absoluta de capacidades. No entanto, essa noção de capacidades está associada com o custo de vida de uma dada sociedade e com as exigências contextuais para os indivíduos participarem da vida da comunidade. Essas exigências não são apenas materiais, podendo ser exclusões decorrentes de estigmas e outros critérios simbólicos. Assim, o investimento em atividades de capacitação deve levar em conta as exigências contextuais, materiais e simbólicas, se pretende contribuir para a redução das desigualdades. A inadequação entre a oferta e as expectativas bem como a ineficácia de muitas das ações, como apontadas pelos moradores, em especial os jovens que deveriam ser o público alvo, mostra uma baixa capacidade de planejamento e execução dessas políticas, nas quais estão envolvidos governantes e representantes empresariais. 2) EFEITOS NA SOCIABILIDADE A nova dinâmica instaurada na favela a partir da pacificação e do processo imediato de expansão do mercado em suas diversas formas tem gerado efeitos desestabilizadores da sociabilidade existente, mostrando que a inclusão pelo mercado produz, paradoxalmente, novas formas de estratificação e exclusão que se evidenciam na privatização dos espaços públicos e nas inseguranças em relação a uma remoção branca que estaria em curso. 3.1) MERCANTILIZAÇÃO DOS ESPAÇOS SOCIAIS 354 Com a sensação de segurança trazida pela política de segurança pública, a favela se mostrou um local lucrativo ao atrair pessoas de fora da comunidade que buscam nos eventos que ali ocorrem algo diferente, em especial aqueles que são realizados na quadra da escola de samba. Dessa forma, os moradores, que tinham como principal espaço para festas a quadra da escola de samba, sentem que perderam espaço em sua própria comunidade para aqueles de fora que agora aproveitam para lá circularem e para os que lucram com a mudança de público, além de sofrerem com a ordem imposta pela UPP para a realização de suas festas. As festas para pessoas de fora da comunidade não ficam restritas à quadra da escola de samba. Uma vez por mês a Laje do Michael Jackson, outro espaço de socialização dos moradores, é ocupada por uma roda de samba organizada por um morador juntamente com outros três músicos do asfalto, que, apesar de ser gratuita e aberta a todos, tem como principais frequentadores cariocas de fora da comunidade e turistas estrangeiros buscando lazer alternativo. Além da perda do espaço para suas próprias festas e eventos de lazer, a intensa movimentação de pessoas motivadas pelas festas ou pelo turismo praticado na favela incomoda os moradores que têm a circulação prejudicada pelo congestionamento de pessoas nas estreitas vielas. Alguns moradores se sentem incomodados com a presença de indivíduos com as quais não se identificam circulando pela comunidade e olhando dentro de suas casas. Muitos se queixam do barulho e da sujeira deixada pelos visitantes nas proximidades dos locais das festas. Outros questionam por que a infraestrutura da comunidade não é beneficiada com a entrada dessa nova renda, e sim apenas aqueles que lucram diretamente com os eventos. Para alguns moradores, o turista é inconveniente quando não respeita a privacidade daqueles que ali habitam. Descrevem situações em que o visitante fotografa pessoas em momentos privados sem pedir autorização: 355 Porque verão, calor, a gente dentro de casa, né, você está de short, você está de top, e já vem pessoas fotografando assim, dentro de casa: “Ah, que interessante!”, como se você fosse assim, um ser esquisito, sabe, não pergunta [...] a pessoa fotografa sem perguntar, sem pedir autorização? Não é assim. Então, houve muito também uma invasão, sabe? Assim, apesar de alguns defenderem que esse movimento de subida do morro por pessoas de fora dele é uma oportunidade de integração morro/asfalto e possibilita a desmistificação do estereótipo do favelado devido a percepção mais próxima daquela realidade por aqueles que não a conheciam, o que predomina é o sentimento de perda de espaço para a exploração mercadológica. Ademais, pouco conseguem interagir com a cidade, que também costuma praticar preços elevados, ou seja, agora ambos fora do alcance do favelado. A integração não ocorre se não acontecer nos dois sentidos: asfalto-morro, morro-asfalto. Portanto, o que tem ocorrido na comunidade Santa Marta é mais uma invasão da classe média e uma mercantilização dos seus espaços sociais, ou seja, um movimento de expansão do mercado com restrições para os moradores locais. A ausência de uma presença pública que resguardasse os espaços públicos da exploração exclusivamente lucrativa, o que representaria o duplo movimento requerido para proteção da cidadania, mostra a capacidade destrutiva do mercado em relação à sociabilidade, apontada por Polanyi (1980). 3.2) INSEGURANÇAS A nova realidade vivida pela favela Santa Marta após a implantação da política pública da UPP e maior inserção do Estado tem trazido diferentes benefícios para aquele território. Por outro lado, são várias as inseguranças causadas pelas recentes mudanças. A primeira que apontamos aqui diz respeito à própria política pública das UPPs. Os moradores de favelas já 356 assistiram algumas iniciativas de policiamento comunitário darem errado, o que gera grande desconfiança e insegurança. Itamar Silva, membro do grupo ECO, comenta a experiência vivida com o Destacamento de Polícia Ostensivo (DPO) no governo Anthony Garotinho: oito meses depois da instalação, a DPO se retirava do morro e, em seguida, aconteceu uma das piores guerras entre quadrilhas (PANDOLFI; GRYNSZPAN, 2003:331). Esse exemplo nos permite entender o sentimento atual da comunidade diante da política pública das UPPs. O receio de que a iniciativa se deva puramente aos interesses associados aos megaeventos que serão sediados pela cidade - alguns jogos da Copa do Mundo de 2014 e as Olimpíadas de 2016 – desperta grande desconfiança nos moradores, além da percepção de que predomina o “interesse deles”, o qual não coincide com o “nosso”, como na fala seguinte: A obra está vindo, essas coisas estão vindo e todo mundo sabe que é por causa da Olimpíada. Ninguém tira isso da minha cabeça nem da cabeça das pessoas que tem um pouquinho mais de conhecimento. Não está vindo porque eles gostam de Santa Marta não, nem da Rocinha, nem do Vidigal, nem Tabajara, nem do morro dos Cabritos. Eles vem por causa da Olimpíada, é interesse dos governantes, tanto federal, municipal, estadual. Não é porque eles gostam da gente, não é porque eles querem dar o melhor para gente não. É interesse deles. Existe ainda a visão de que o Estado não dá segurança para aquela população; diante disso, alguns optam por se resguardar nesse período de mudanças, que para muitos tem o prazo de validade limitado a 2016. Assim, evitam expor opiniões de forma explícita. A insegurança gerada por essa possibilidade leva um dos entrevistados a considerar sair do morro devido ao medo de ser repreendido pelo progresso alcançado fora do crime, caso traficantes voltem a dominar o território: 357 Se a UPP sair... Cara, eu vou ser sincero a você, eu acho que eu saio do Santa Marta. Porque vai acontecer uma série de situações, provavelmente guerras, que vão afetar muitas pessoas, e eu vou ser um desses afetados. Ninguém quer ver você bem, ninguém quer ver você ganhando num trabalho com dignidade; se você está bem, você é mau; eles (se referindo aos bandidos) querem ver você no buraco, afundado lá, no fundo do poço. [...] Eu vou ser bem sincero, o BOPE ficou aqui durante 10 meses; quando a BOPE saiu, foi uma das guerras mais sangrentas do Santa Marta. Segundo Itamar Silva (grupo ECO), “quando a polícia se instala, para impedir [...] atritos, há uma certa paz. Mas quando ela sai – pode ficar até um, dois anos -, há uma cobrança em cima daqueles que, de alguma forma, se protegeram com a intervenção da polícia” (PANDOLFI; GRYNSZPAN, 2003:342). Aqueles que residem no pico do morro, local com moradias mais humildes e com menor infraestrutura, enfrentam outra insegurança: a possibilidade de remoção. A prefeitura argumenta que o motivo para a remoção se deve à situação de risco em que se encontram as casas ali localizadas. Contudo, alguns moradores entrevistados atribuem a possível remoção ao interesse da prefeitura e de empresários de criar um grande ponto turístico no pico do morro. Seja essa crença verídica ou não, o fato é que aqueles moradores se encontram constantemente sob o medo da remoção de suas casas e questionam porque a verba disponível para reassentá-los ou indenizálos não é utilizada para dar-lhes a segurança que as autoridades argumentam faltar. A literatura de política urbana Carrión (2007) chama atenção para a penetração do grande capital nacional e internacional na disputa pelo espaço urbano, o que produz transformações nos marcos institucionais e nas modalidades de gestão pública, com a privatização da cidade e a concentração 358 de capitais. A esse projeto de cidade empresarial privada no qual a urbe é normatizada a partir da perspectiva mercantil, se oporia uma visão crítica da gestão pública, que propõe um modelo de gestão participativa. Entretanto, no lugar do planejamento moderno, fortemente marcado por uma ação diretiva do Estado, predomina um planejamento competitivo, que se pretende flexível, amigável ao mercado (market friendly), orientado pelo e para o mercado (market oriented), que possui como ideário a cidade-empresa (VAINER, 2011). Neste modelo ocorre um deslocamento do processo decisório desde os conselhos participativos para as corporações em relação estreita com os governantes. A remoção dos moradores do Pico demonstra bem esse processo decisório cerrado, o que gera enormes desconfianças da parte dos moradores e resistências a aceitar os argumentos apresentados pela prefeitura. Organizados em defesa da sua permanência, utilizando recursos técnicos como contra-laudo sobre riscos de desabamento e também recursos políticos como mobilização de vereadores e exigência de que sejam ouvidos pelos dirigentes da prefeitura, os moradores denunciam tanto o modelo decisório quanto a vinculação dessas medidas com os interesses empresariais. Outra insegurança que apontaremos aqui está diretamente associada ao custo de vida no morro após a maior inserção do Estado. Conforme destacado na categoria Formalização, o aumento dos custos associado à regularização dos serviços de energia elétrica, água e TV por assinatura sobrecarrega o orçamento do morador da favela. Além disso, alguns moradores do Santa Marta apontam que os preços praticados pelas biroscas e pequenos comércios, como bar, padaria e restaurante também tiveram os preços inflacionados pelos novos custos com os quais devem arcar e pela procura de uma clientela com maior poder aquisitivo que tem frequentado a comunidade. Os preços aumentaram muito, porque como agora eles vão ter que pagar taxas também, agora eles pagam luz e os outros impostos que se tem, tudo está muito mais caro. A comunidade 359 está assim, fora da realidade. Não se vende mais pra pessoas que ganham um salário limitado; as coisas estão bem altas. Estão voltados mais pro pessoal de fora. Com certeza. Com certeza! Antigamente, você descia, pedia uma pizza aí família, R$ 10,00; hoje em dia, é R$ 25,00. A Coca-Cola, que antigamente você comprava por R$ 3,00, R$ 3,50, hoje em dia é R$ 6,00. O açaí, que você comprava por R$ 1,00, hoje em dia é R$ 2,50. Então assim, foi muito... O pãozinho, que era R$ 0,10, hoje em dia é R$ 0,25. Uma caixa de leite, você vai comprar na padaria, é R$ 5,00. Porque o rapaz da pizza continua trabalhando sem os padrões que a Vigilância Sanitária exige, mas ele aumentou porque ele está pagando luz, aumentou porque o turista está subindo, aumentou porque está tendo vários eventos no Cantão, e assim, ele... Está sendo abusivo; está sendo muito abusivo. O aumento do preço dos aluguéis também traz insegurança para aqueles que não possuem casa própria. Na parte alta da comunidade houve uma valorização de 200%, enquanto que na parte baixa a valorização foi de 74%, como mostra a tabela abaixo. Valor do aluguel na comunidade Santa Marta Parte Alta Antes Parte Baixa Depois da UPP da UPP o em % (R$) (R$) Sala 150,00 450,00 2 Quartos 430,00 - Quarto Loja Valorizaçã Antes Depois Valorizaç da UPP da UPP ão em % (R$) (R$) 200 230,00 400,00 74 570,00 32 - - - - - - - - e 360 Comercial Obs 1: Não há lojas comerciais para locação. Obs 2: Não há imóveis de2 quartos para locação na parte baixa. Fonte: Secretaria de Estado de Governo com base nas informações repassadas pelas associações de moradores apud IETS, 2010. Os trechos seguintes expressam a preocupação de alguns moradores entrevistados no que tange o aumento da demanda e consequente valorização das moradias: [...] a gente não está encontrando casa porque você não encontra casa pra alugar no Santa Marta, e, quando você encontra, é R$ 600,00, R$ 500,00, R$ 550,00, e está muito fora da nossa realidade [...]. Por exemplo, hoje em dia quem tem as suas casas, não querem mais alugar pra moradores de Santa Marta, ou pra uma família que vem do nordeste, e que precisa trabalhar aqui; eles querem alugar como se fosse um albergue, que é pra turista, temporada. Assim, mudou muito. Foi uma das coisas que mudaram. Tudo está voltado assim: “Vou vender pros turistas. Eu vou ganhar através dos turistas”. A insegurança maior que tanto preocupa os moradores é o risco de uma remoção camuflada, que vem sendo chamada de “remoção branca”, pois não se daria de forma violenta e impositiva, mas por pressão do mercado. Uma comunidade como o Santa Marta, bem localizada na Zona Sul da cidade, com o plano inclinado que favorece o acesso às partes altas do morro, apesar dos constantes problemas, sem tráfico armado, pode facilmente atrair o interesse de especuladores (MATTAR; CHEQUER; DIAS, 2010). Assim, o 361 aumento dos custos dentro da favela modelo é fator de pressão para a saída dos atuais moradores. Outros entrevistados demonstram inquietude e insegurança ao falar da atuação do Estado e do mercado na comunidade. Para alguns, a favela está sendo oprimida e até expulsa pelas ações do governo, que atuaria somente para construir conjuntos habitacionais distantes da área central, ou seja, o processo de gentrificação. Acreditam que o Santa Marta está sofrendo uma grande exploração econômica, o que agrava a sensação de rivalidade entre morro e asfalto, com este sendo percebido como oportunista ao querer aproveitar economicamente a situação de tranquilidade na favela e ao mesmo tempo desrespeitando aqueles que ali habitam. Eles estão com essa preocupação de tirar a bandidagem, né, o tráfico armado por conta das Olimpíadas e tal, pra estar vindo pra cá com uma espécie de segurança, mas eles estão oprimindo as pessoas dentro da comunidade, porque tem muitas pessoas aqui que estão... Eu acredito que o governo está trabalhando de maneira assim, a expulsá-los, convidá-los a se retirar daqui, porque a gente está com a conta de luz... a gente já é rua; rua, casa paga IPTU e vários outros atributos, tem várias taxas: taxa de incêndio, taxa de limpeza. Quem vem morar na comunidade, veio fugindo desses impostos, veio correndo, se escondendo desses impostos por não ganhar o suficiente pra poder pagar. Se você for botar na ponta do lápis todos esses encargos, quanto que não vai dar? E aí a empregada doméstica, a patroa dela vai aumentar o salário dela porque agora ela paga luz, porque agora ela paga água, porque agora ela vai pagar taxa de iluminação, vai pa...? Não vai, não vai mudar. Então, vai chegar num ponto que essas pessoas não vão conseguir se manter aqui, e vão sair; o governo vai construir conjuntos habitacionais lá, em Saracuruna, lá, em Seropédica, lá, não sei aonde, e vai convidar essas pessoas a irem pra lá, porque elas não vão ter 362 condições de se manter dentro da zona sul. Um aluguel aqui está R$ 600,00. O termo gentrificação tem sido usado correntemente pelas lideranças nas reuniões das favelas do Rio. Um reflexo do ideário cidade-empresa, apesar de não estar restrito a ele, é o processo de gentrificação ou enobrecimento urbano. O termo faz referência ao processo de conversão de áreas habitadas por uma população de menor poder aquisitivo para uma vizinhança com poder aquisitivo maior (SMITH, 1979) por meio de uma estratégia do mercado imobiliário normalmente associado a uma política pública de revitalização dessas áreas degradadas visando torná-las mais atraentes ao grande capital. Segundo Smith (2002), o processo de gentrificação, que inicialmente era esporádico e local, é agora profundamente generalizado em âmbito global. O Estado de tendência neoliberal se torna muito mais um agente do mercado do que um regulador deste, deixando de atuar no sentido da reprodução social e priorizando o capital produtivo. Nesse contexto, a gentrificação pode agravar os já existentes problemas sociais quando a legislação não protege os moradores das áreas afetadas. A cidade comemora a retirada do domínio armado do tráfico na favela, possibilitando a inserção mais efetiva do Estado e da ordem. Contudo, ignorase os problemas causados aos moradores da favela pela exploração econômica que acompanha a nova ordem, como as inseguranças e o medo da remoção branca. Ao contrário, tal exploração é socialmente aceitável e até estimulada ao ser percebida como um processo natural. CONSIDERAÇÕES FINAIS A política pública das UPP no Rio de Janeiro tem sido vista como a possibilidade de devolver à cidade a sensação de segurança que ela carece. 363 Para além dos efeitos pretendidos de resgatar os territórios do domínio do tráfico, devolvendo ao Estado o monopólio da coerção, a política de pacificação tem propiciado uma rearticulação entre Estado, mercado e comunidade que merece ser analisada. Este foi o propósito do estudo de caso realizado na favela Santa Marta, tomando como foco a percepção dos agentes envolvidos tanto do mercado quanto da comunidade. A necessidade de estudar o fenômeno se mostrou evidente, uma vez que há de fato uma nova dinâmica de relações entre agentes políticos, econômicos e sociais, que está sendo desenhada de tal forma que esta nova cartografia indica um direcionamento induzido pela política pública, que transcende os objetivos e metas anunciados. Tal aspecto é de fundamental importância ao se avaliar os efeitos da política pública em questão, tendo em conta a assimetria de poder e recursos entre os três agentes envolvidos. A ocupação policial da favela Santa Marta, antes controlada pelo tráfico, e a maior inserção do Estado significou um importante tônico para os negócios de algumas empresas, bem como para o aumento na arrecadação de impostos. Ao mesmo tempo em que os moradores apreciam a facilidade de acesso a certos produtos e a melhoria na prestação dos serviços de TV por assinatura e luz, veem o orçamento doméstico ser reduzido pelo gasto extra. Corre-se, pois, o risco de que esta política tenha como trade-off o empobrecimento da população, enquanto o governo tem como meta a redução da pobreza. A expansão de mercado, propiciada pela maior inserção do Estado, permite que cheguem alguns benefícios, como serviços de maior qualidade, diversidade na oferta, conhecimento, oportunidades de fontes de renda e de capacitação. Assim, aqueles que têm mais capacidade de aproveitar a oportunidade, de lucrar, são beneficiados pela nova realidade, enquanto outros tantos vivem na insegurança. Nesse sentido, a ideia de uma sociabilidade comunitária é, de certa forma, corroída pelo individualismo que o mercado provoca, cada um tentando garantir o seu. A maior entrada do mercado provoca disputas e prevalência de interesses pessoais, pois ele não atua de forma especificamente solidária. Apesar das ações de responsabilidade social que estão ocorrendo e das muitas ações de diferentes 364 órgãos públicos, o propalado imaginário do jovem empreendedor em substituição ao do traficante poderoso envolve um elevado grau de ilusão, já que poucos possuem habilidades ou terão oportunidades de atingir este ideal. Enquanto alguns empreendedores aproveitam o aumento do turismo e da circulação de pessoas de maior poder aquisitivo para desenvolver iniciativas lucrativas de lazer, muitos moradores sentem que o espaço de lazer foi restringido, pois a quadra da escola de samba passou a abrigar festas caras, a laje do Michael Jackson recebe frequentadores da rua para evento de samba, os preços praticados pelos bares aumentaram, ou seja, há um processo de mercantilização dos espaços sociais que segrega a população favelada dentro da própria comunidade. Indubitavelmente a população que ali reside percebe que a segurança física proporcionada pela presença do policiamento comunitário ostensivo viabiliza a entrada de outras ações de cunho social e de serviços públicos, bem como de novos interesses. Os moradores, em sua maioria, sentem maior segurança e percebem que, por meio dela, o Santa Marta ganhou visibilidade na mídia e perante a cidade. Contudo, nem todos terão condições de arcar com o preço da paz, o que gera insegurança. Aqueles que não conseguirem agarrar as oportunidades que têm surgido e que não têm condições de arcar com o aumento do custo de vida, possivelmente reduzirão o padrão de vida ou terão que sair da comunidade para locais mais afastados. O possível processo de gentrificação das zonas pacificadas adiará a solução dos problemas habitacionais e urbanos ao varrer a pobreza para áreas afastadas da cidade, onde há escassez de transporte público, de hospitais e escolas, além de outros serviços públicos. O aumento do custo de vida na comunidade significa algo além do empobrecimento, pois, a privação relativa de rendas pode resultar em privação absoluta de capacidades. Participar da vida da comunidade, em sentido amplo, está associado às exigências contextuais, que são cada vez mais rigorosas. Apesar da grande maioria dos moradores terem sentido o impacto da cobrança de luz em seus orçamentos e o empobrecimento que o novo custo tem gerado, a política de regulação da ANEEL demonstra a 365 importância que esse tipo de atuação estatal tem quando a questão é proteger os mais vulneráveis. Ademais, os efeitos da regulação não se restringem aos mais pobres, pois promove um bem público ao reduzir o desperdício, as disparidades e a poluição. Há nesse fato, portanto, sinergia entre mercado, Estado e sociedade. A chegada de diferentes projetos de capacitação à comunidade nesse período de rearticulação entre poder público, empresariado e a própria comunidade, é percebido por alguns moradores como uma ampliação das oportunidades. Contudo, outros questionam o fato delas estarem limitadas a subempregos e afirmam que não atendem aos anseios dos moradores, em especial aos dos jovens, grupo que se supõe mais vulnerável à influência dos traficantes. Ademais, há grande preocupação quanto a sustentabilidade do projeto UPP, que, para alguns moradores, tem seu fim marcado para após os jogos olímpicos de 2016, que serão realizados na cidade. Tal preocupação leva-os a agirem com prudência quanto às associações que fazem e quanto ao que falam, pois se sentem em um terreno ainda minado. Chega ao ponto de que aqueles que obtiveram sucesso empresarial com a chegada da UPP pensarem na necessidade de sair do morro caso o projeto chegue ao fim, devido ao medo de represálias pelo seu alinhamento às forças dominantes na situação atual. A história nos mostra que o Estado tem papel primordial na compatibilização entre mercado e a segurança do cidadão visando o enriquecimento da vida civilizada com a redução do risco e da insegurança. Sem proteção e regulação estatal, os moradores da favela veem os direitos de cidadania ameaçados pela crescente especulação mercadológica e imobiliária, além de sofrerem o empobrecimento causado pelo aumento do custo de vida. Temem que isso resulte em um processo de remoção branca e começam a se organizar para fazer frente às políticas urbanas que não foram acordadas com a comunidade. A mobilização em torno da maior transparência das políticas e na regulação do mercado vem sendo demandada pela 366 comunidade, cujo histórico de lutas para conquistar os benefícios mínimos da vida urbana, produziu atores respeitados dentro da favela. Estes realizam trabalho de conscientização quanto à clientela que os empreendedores locais buscam atender, ou seja, moradores ou visitantes; convocam reuniões para discutir com a comunidade preocupações comuns; e reivindicam ativamente maior regulação e proteção do Estado, tendo em conta que a condição de cidadania não pode desconhecer as enormes desigualdades existentes entre a população da favela e os moradores do bairro no seu entorno. Igualar seus deveres de consumidores é visto como uma “cidadania de exceção”, já que não desfrutam no morro dos bens públicos que são oferecidos pelo Estado à população do asfalto. O medo da exclusão, sentimento fortemente presente na favela Santa Marta atualmente, tem a ver, em grande parte, com as demandas de proteção contra os avanços desregulados do mercado. A sensação de que a comunidade está sendo explorada economicamente e que está à mercê da insegurança e da especulação, sem que seus moradores tenham uma proteção estatal eficaz, gera grande insegurança. O risco atrelado a esse movimento está no fato de que tal exploração é socialmente aceita e até estimulada, eclipsando seus efeitos deletérios. A importância destes resultados está em mostrar que há uma demanda cidadã para que o poder público utilize os instrumentos de regulação e de proteção social para evitar que os interesses comerciais se sobreponham aos interesses sociais, defendidos durante toda a história de resistência e construção de uma identidade própria desta comunidade. A disjuntiva entre o domínio do tráfico ou a paz da UPP tende a colocar os moradores da favela sem a liberdade de escolha de suas preferências, desconhecendo ademais as enormes desigualdades existentes na distribuição de recursos e acesso aos bens públicos que persistem na favela e na relação com seu entorno. Preocupante é que a favela tenha se tornado, em si mesma, uma mercadoria, desconhecendo a cidadania e a sociabilidade ali existentes, cuja memória os moradores insistem em preservar para garantir sua identidade e evitar que 367 sejam assimilados como meros consumidores a um tecido urbano revigorado pelo mercado. Na ausência de liberdade e igualdade, que só poderão ser garantidas por uma presença estatal cujas políticas públicas reconheçam a necessidade de equacionar de forma favorável à comunidade sua nova inserção urbana e social, o risco de que sejam tratados como meros consumidores, é iminente. Assim, com o mercado subindo a favela como fruto da ação estatal, o que se coloca no cenário é a demanda de que a cidadania seja também garantida pelas políticas públicas. Se isto não acontecer, a subida do mercado ao morro pode vir a representar a descida da cidadania, com a expulsão da população favelada para novas áreas degradadas da periferia urbana. Se a equação equilibrada entre Estado, Mercado e Comunidade foi historicamente possível, esta questão está hoje na nossa agenda pública e requer uma resposta que preserve todos seus componentes. A condição de cidadania tem como pressuposto a presença do Estado como garantia da ordem policial e jurídica, mas seu exercício só se efetivará em condições de expansão das capacidades de forma a desenvolver as potencialidades individuais. Isto requer o reconhecimento das desigualdades de acesso da população aos bens públicos e proteção diferencial contra uma mera inserção igualitária no mercado de consumo. Se não for assim, o mesmo movimento visto como sucesso da política de pacificação, medida pela subida do mercado ao morro, poderá indicar seu fracasso, com a consequente descida da cidadania. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ANEEL. (2008), Manual para elaboração do programa de eficiência energética. Brasília, ANEEL. BANCO MUNDIAL. (2013), O retorno do Estado às favelas do Rio de Janeiro::Uma análise da transformação do dia a dia das comunidades após o processo de pacificação das UPPs. 368 BARDIN, Laurence. (2006), Análise de conteúdo. 4. ed. Lisboa, Edições 70. BAYLEY, Kenneth. (1994), Methods of social research. 4 ed. New York, The Free Press. BOBBIO, Norberto. (1993), A era dos direitos. Rio de Janeiro, Editora Campus. BURGOS, Marcelo Baumann. (2005), “Cidade, Territórios e Cidadania”. DADOS – Revista de Ciências Sociais, vol. 48, n. 1, pp. 189 a 222. CALDERÓN, Fernando. (1995), “Governance, Competitiveness and Social Integration”. CEPAL Review, Santiago, n. 57, pp. 45-56. 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Interessa-nos mapear as variadas traduções ou deslocamentos às quais se submete a participação nos programas de políticas públicas e praticas discursivas apresentados nos embates nas realidades sociais estudadas. Encontramos diferentes formas de transliteração – metonímias - do conceito de participação, de forma a adequá-lo aos códigos de cada um dos atores que o utiliza. Mesmo guardando relação de semelhança ou de associação com a noção de participação, cada uma dessas formas de significação implica em uma modalidade de interpelação aos participantes que lhes atribui uma identidade e um repertório de ação. Porém, tais deslocamentos no sentido da participação afastam-na da noção de compartilhamento de poder, que aconteceria por meio da troca de informações e da capacidade de incidência das demandas apresentadas pelos usuários na decisão acerca das prioridades e desenho das políticas públicas. Se a metonímia corresponde a uma combinação por similaridade e contiguidade, a metáfora trata da substituição por analogia. Encontramos no discurso da política e dos atores combinações da participação por contiguidade mais que a substituição desse termo por uma analogia. Dentre as metonímias para participação destacamos i) participação como aproximação, ii) participação como convencimento,iii) participação como governança matricial, iv) participação como fortalecimento de capital social. O fato de serem usadas metonímias da participação e não haver uma substituição desse significante por um conceito analógico poderia parecer, à primeira vista, que há um esforço político de preservação do seu significado. No entanto, resta nos perguntarmos se, além da forma retórica, o que mais foi afetado em termos do significado político. Laclau (2008) nos ensina que “é 372 inerente à operação política central do que nós chamamos hegemonia o movimento desde a metonímia até a metáfora, da articulação contingente ao pertencimento essencial” 1 (LACLAU, 2008: 08). Ao contrário de polos opostos, a existência de um contínuo permite, ao longo do tempo, que o efeito de distorção ou deslocamento da metonímia encubra a substituição metafórica que se encontra em processo, em uma disputa ideológica de significados. A proposta de desconstrução de Derrida (2000) também coloca ênfase na proliferação de significados, entendendo a iterabilidade como a capacidade de signos serem repetidamente inseridos em novos contextos produzindo desse modo novos significados, parcialmente diferentes e similares ao entendimento prévio. i) Participação como Aproximação A UPP se propõe a atuar como polícia de proximidade, prevendo espaços de diálogo e de participação comunitária, cujo resultado final poderia inclusive propiciar uma nova estrutura de poder local. Nas palavras do pelo seu atual coordenador “a atuação da polícia pacificadora, pautada pelo diálogo e pelo respeito à cultura e às características de cada comunidade, aumenta a interlocução e favorece o surgimento de lideranças comunitárias” (OLIVEIRA, 2013). A instalação de uma unidade permanente da PM no interior das favelas substituiu a relação anterior entre esses agentes públicos e a população, na medida em que a orientação atual é a de buscar uma aproximação entre ambos, ao invés das tradicionais incursões que caracterizaram os confrontos entre policiais e narcotraficantes, vistas pela população como desorganizadoras de suas rotinas de vida e ameaçadoras de sua integridade. Essa relação de confronto entre a PM e os moradores gerou estereótipos mútuos, e um grande potencial de conflitos que ainda persiste. Enquanto para os policiais, os favelados, em especial os adolescentes são vistos como associados ou próximos dos traficantes, na população predomina a visão de que os policiais são a representação armada da repressão estatal contra 373 populações pobres, negras e faveladas. Essa atitude preconceituosa ainda persiste em muitos comandantes de UPP, que acreditam que as recentes políticas públicas só terão resultado para a nova geração que está podendo se beneficiar dos serviços oferecidos, e assim se distanciar dos adolescentes, que já teriam sido contaminados pela marginalidade e informalidade e para os quais não haveria recuperação. A aproximação recomendada pela PM se expressa na oferta das instalações da UPP para realização de cursos para as crianças, de música e aulas de judô, por exemplo, algumas vezes ministradas pelos próprios agentes policiais. Esta ação é compreendida como uma forma de participação que pretende estreitar laços entre os agentes policiais e moradores, os quais algumas vezes são autorizados a fazer até reuniões comunitárias nas unidades policiais. Alguns comandantes chegam a oferecer um café da manhã para permitir o encontro na UPP com os moradores, como uma forma de aproximação. Lideranças comunitárias veem como positiva a busca de aproximação, especialmente para o aperfeiçoamento da postura dos policiais para com os moradores, contudo, denunciam a inocuidade de muitas dessas medidas, sendo que por vezes nem mesmo o comandante que os convidou está presente aos encontros. Existe descrédito também por parte de alguns comandantes que desacreditam da eficácia da participação, sendo que em entrevista com um comandante de UPP constatamos seu menosprezo acerca da efetividade dos fóruns comunitários convocados pelos programas de gestão social. Observa-se a distância entre o discurso de alguns dos policiais nas UPPs e o do Secretário de Segurança José Mariano Beltrame, que reiteradamente condiciona o êxito do processo de pacificação à efetividade das políticas públicas que se implantam no território das favelas. A UPP é colocada como um meio de viabilizar a ação de outros órgãos responsáveis pela promoção da cidadania, requisito para a sustentabilidade do projeto de pacificação: 374 Embora as UPPs estejam agradando, eu tenho meus temores em relação ao pós-UPP. Aquilo a que efetivamente a UPP se presta nada mais é que proporcionar, viabilizar a chegada da dignidade ao cidadão. Essa é a razão da existência da UPP: criar um terreno fértil para a geração de dignidade. É isso que vai garantir o projeto, e não apenas a presença da polícia (BELTRAME, 2011). Em diversos momentos, Beltrame enfatiza a necessidade de maiores investimentos e participação coordenada de políticas públicas setoriais, como corresponsáveis pelo sucesso da política de segurança. Seu discurso beira a crítica à ausência destas políticas na agenda pública: A segurança pública é responsabilidade de toda a sociedade, de toda a esfera governamental. Polícia só, não resolve. Precisamos valorizar a vida, o homem, a família. Portanto, é necessária uma rede de proteção e de investimentos (...) Nós entramos nessas comunidades, expulsamos os traficantes, os milicianos. As ações sociais e de infraestrutura competem a outras secretarias. Nós estamos nas comunidades para dar a garantia de que esses investimentos serão feitos (BELTRAME, 2010). Entre a formulação da política e a sua execução vão aparecendo as diferentes concepções sobre a relação entre a polícia e a comunidade. Existe no interior da corporação uma postura que entende a aproximação como humanização da relação do policial no trato com a população da favela, como expressa por seu atual comandante, Coronel Caldas, que substitui a defesa da dignidade dos moradores pela sinalização de suas carências: 375 Precisamos avançar nisso: a possibilidade de ter o policial sorrindo para o morador. Quero que meu policial mostre a face humana dele. Isso vai ser conquistado, a partir de um sorriso sincero, de um olhar solidário, porque nessas áreas vivem pessoas absolutamente carentes não só de bens materiais, mas de afeto, carinho, de um olhar, então acho que essa humanização do policial vai ser o desafio maior (OLIVEIRA, 2013). Ao assumir o lugar inédito de autoridade máxima e expressão material da presença do Estado, outra questão que aparece é o fato da polícia aparecer, diante dos moradores, e até mesmo de alguns comandantes, o papel de síndico da favela, para o qual todas as demandas do cotidiano são canalizadas. Ao mesmo tempo, isto é visto como um subproduto da aproximação e da geração da desejada relação de confiança, que alterou a imagem da polícia, trazendo outros encargos para a UPP: Nós conseguimos fazer essa relação, mas com um esforço muito grande. Todos os comandantes de UPP tem esse esforço. As demandas vêm sem fim. Tudo o que a gente imagina. Então a gente pega isso como oportunidade de se aproximar. A visão deles é que a polícia deveria resolver tudo. A polícia virou uma referência de estado ali. (Excomandante da UPP no Santa Marta). Podemos observar que o conceito de aproximação está sendo construído ao longo da prática policial no contexto das UPP, não sendo claro nem mesmo dentro da corporação. Manifestam-se, pois, tendências contraditórias marcadas pelo preconceito em relação a esse outro que é a população favelada, atenuadas pela postura de humanização da relação em busca de conquistar o vínculo e a confiança e melhorar a imagem da polícia perante a população. Mesmo na postura mais humanitária, o favelado é visto como carente e demandante e não como sujeito em busca do exercício de 376 seus direitos diante de uma instituição que se apresenta como o Estado no interior da favela. Entre a população encontramos variadas avaliações, dependendo muito da habilidade do comandante nesse processo de aproximação, o que revela o personalismo e discricionariedade na implementação desta política. No entanto, a consideração de que “polícia é sempre polícia”, ou seja, identificada como o opressor na favela, é mencionada com frequência, em especial quando ao comando da UPP é atribuído, legalmente, o poder de autorizar ou coibir atividades sociais, como festas e bailes.1 A satisfação de parte da população com a coibição de excessos, como ocorria em bailes funks é, no entanto, relativizada e se transforma em crítica quando outras celebrações – sociais, familiares, esportivas e culturais – passam a ser vetadas pelo Comando da UPP. Além de coibir manifestações coletivas, muitos relatos evidenciam práticas policiais abusivas no interior das comunidades e o aumento do controle militar sobre os corpos, os tempos e os espaços nas favelas. Câmeras são instaladas para vigiar os moradores, toque de recolher é decretado, modalidades de danças e músicas consideradas impróprias são proibidas. Lideranças e moradores questionam o fato de que os policiais estejam armados de fuzis em suas tentativas de “aproximação”, em reuniões públicas ou mesmo na rota cotidiana pela comunidade, elementos cuja presença impõe a ordem coercitiva sobre qualquer forma de participação na comunidade. Assim, o exercício da coerção, simbólica ou real, desmistifica a falácia das tentativas de aproximação e humanização da polícia como forma de participação. A inexistência de um canal de comunicação em que a população possa criticar e avaliar a atuação da UPP preservando a sua identidade e segurança é um fator que aumenta as possibilidades de coerção e abusos por parte dos militares e mostra que o controle social sobre os agentes públicos não está assegurado como forma de participação cidadã. ii) Participação como Convencimento 377 A implantação da UPP no território é seguida de um conjunto de transformações urbanas, financiadas em convênios do governo estadual com o governo federal, como o Programa de Aceleração do Crescimento - PAC. Outros programas dos governos regional e local também se dedicam à melhoria da infraestrutura nas favelas, sendo responsáveis pelas melhorias habitacionais, de saneamento básico e da mobilidade, com a abertura de ruas, pavimentação, construção de teleféricos e bondinhos. O PAC das favelas é financiado e concebido pelo governo federal sendo sua metodologia de ação padronizada e implementada por operadores nacionais, como a Caixa Econômica Federal, tendo como requisito a participação da população nesse processo. No governo estadual esse programa é coordenado pela Casa Civil, cujos gestores são responsáveis pela implantar da metodologia de ação, contratações de prestadores, e seguimento do programa de obras. As relações com a Secretarias Municipais de Urbanismo e de Habitação são estreitas, embora a gestão do programa seja atribuição da Casa Civil, o que é justificado pela capacidade de articulação das várias secretarias envolvidas. As decisões sobre a reforma urbana e habitacional são tomadas pelas secretarias, mas a Casa Civil opera o programa de implantação das obras. Para a participação comunitária é contratada uma empresa privada que fica responsável pelo papel de transmitir aos moradores as decisões sobre a reforma, avisá-los e convencê-los a aceitar as mudanças. Em entrevista com a gestora do programa na Casa Civil percebe-se seu orgulho de coordenar um programa tecnicamente mais bem equipado do que outros similares, bem como o domínio da metodologia de diagnóstico e implantação do programa. Esta inclui, por exemplo, a construção de um mapa de atores em cada favela, de forma a identificar possíveis interlocutores. Esse mapa, no entanto, desconhece lideranças locais que não tenham um status legal, embora tenham maior capacidade de influencia e mobilização da ação coletiva. 378 Um problema apontado pela população foi a constante falta de esclarecimentos sobre os projetos das obras, ocorrendo casos nos quais o projeto nem sequer foi apresentado, apesar da constante solicitação dos moradores. Já a responsável por uma das empresas privadas contratadas, afirmou que preferia trabalhar “a participação” em favelas menos politizadas e mobilizadas, pois era “mais fácil”. Reclamou do caso do Santa Marta, onde as lideranças tinham mais acesso a órgãos do governo do que eles, o que se tornava constrangedor, pois sabiam das mudanças antes do que os responsáveis contratados. Resistências às remoções, não aceitação das propostas de negociação apresentadas pelas empresas ou encaminhamento de alterações na proposta original são atitudes vistas como um problema a ser enfrentado com autoridade e coerção. A atitude de enfrentamento é vista pelos moradores como a forma mais eficaz de aumentar sua capacidade de participação, na medida em que buscam ser assim escutados e reverter decisões políticas já tomadas. Já os responsáveis pela participação veem essa atitude como problemáticas e buscam convencer os moradores a aceitarem as decisões, esvaziando lideranças, buscando interlocutores apropriados conforme os seus interesses ou construindo espaços de negociação que desmobilize a população. As organizações comunitárias, por outro lado, utilizam tanto recursos técnicos, como contralaudos para anular diagnósticos de exposição a riscos, quanto recursos políticos, como o apoio de parlamentares e o acionamento da Defensoria Pública e do Ministério Público para se contraporem às mudanças projetadas. Dessa forma, procuram aumentar seu poder de barganha e vencer a fragmentação existente dentro de cada favela, bem como a falta de articulação entre elas, através da construção de redes de resistência que articulam lideranças comunitárias de várias favelas, agentes governamentais, ONGs e intelectuais. Um exemplo é caso do movimento Favela Não de Cala que surgiu tendo como catalisador as remoções, mas que acabou abarcando diferentes insatisfações em relação à precariedade dos serviços públicos e a falta de diálogo com a população nas favelas pacificadas. A reação de confronto também se faz sentir de forma enfática quando a atitude dos profissionais é vista como forma de domesticação. Em um dos 379 Fóruns da UPP Social no qual, para surpresa geral, foi explicitada a remoção iminente de moradores do Pico do Santa Marta, a representante da empresa que realiza as obras - EMOP foi chamada a explicar essa situação. Na oportunidade, aproveitou para também esclarecer aos moradores que com as mudanças urbanas eles precisavam transformar seus comportamentos em padrões mais adequados. Como exemplo, falou que agora que estavam integrados à cidade precisariam parar de jogar lixo nas áreas públicas e limpar as áreas privadas, porque se antes os garis comunitários limpavam as áreas indistintamente, a companhia de lixo limparia apenas áreas públicas. Ao que um dos líderes comunitários interpelou-a a ir com ele ao beco (onde a passagem é insuportavelmente estreita) para que identificasse onde começa o público e termina o privado. A busca do convencimento é também manifestada através da cartilha elaborada para ensinar aos moradores como se comportarem na utilização das novas moradias, já que não estão acostumados a viver em logradouros típicos de classe média, como os apartamentos construídos pelo PAC. Em discursos desses agentes públicos verificam-se estereótipos preconceituosos que identificam os moradores como mal-educados e sujos, acionando o termo “favelado” no seu sentido negativo e estigmatizador. Convencer os moradores a aceitarem as transformações urbanas associa-se a um tipo de “pedagogia da cidadania”, caracterizado pelo disciplinamento e domesticação. ii) Participação como Governança Matricial O Programa UPP Social originalmente foi desenhado e implantado pelo estado para coordenar e integrar ações e serviços públicos nas comunidades que receberam UPP, mas, atualmente se direciona a coleta e análise de informações socioeconômicas e ao encaminhamento das demandas da população para o município. Para 30 complexos de favelas, a UPP Social dispõe de 11 equipes de campo (que variam de 2 a 5 membros) contratadas 380 através do convênio com a UN-Habitat. Foi concebido como uma modalidade matricial de governança, capaz de reunir e articular políticas que já apresentavam, isoladamente, inovações institucionais nas áreas de segurança, urbana e de participação social. O fato de se coordenarem em um mesmo território, em um ambiente participativo e com o envolvimento do setor empresarial, seria a grande novidade da política de pacificação, operada pelos programas de gestão social. Inicialmente a UPP Social ocupou esse papel de articulação intra e intergovernamental, com a promoção da participação comunitária e dos demais stakeholders envolvidos nesse processo, como ONG e empresas atuantes na comunidade como prestadoras de serviços ou em programas filantrópicos e de responsabilidade social. Encontramos, nos discursos dos atores que compõem a estrutura estatal nas três esferas de governo, como gestores e funcionários que prestam serviços públicos, múltiplos significados de participação e articulação com a população. O sentido de participação se constitui e se diferencia de acordo com os programas, as comunidades e os atores sociais. Enquanto os dirigentes apresentam uma visão consistente acerca do programa, observa-se, de uma maneira geral entre os executores locais (street bureaucracy) permanente falta de unidade e intensa flexibilidade na definição de suas ações, caracterizando uma falta de orientação comum. O economista Ricardo Henriques, idealizador da UPP Social que coordenou até junho de 2012, identifica que o principal objetivo do programa frente ao desafio da “pós-pacificação” seria o de conjugar uma política pública de segurança com a construção de uma plataforma “para a realização de uma agenda mais elaborada que enfrentasse a cultura da fragmentação e sobreposições das intervenções pú licas” (HENRIQUES, 2012 a: 148). Para isso, seria preciso olhar para os territórios e suas particularidades com vistas a superar problemas históricos como a setorialização da política pública e a criação de espaços de participação sem resultados concretos. Propõe, pois, um modelo de gestão diferenciado que articularia em formato matricial os três pilares de atuação do programa, que são “Estado democrático e cidadania política de desenvolvimento ur ano e desenvolvimento social”: 381 A UPP Social pretende demonstrar que uma visão matricial que considere a articulação entre territórios e setores, a partir de uma estrutura de governança capaz de promover a coordenação de políticas sociais e urbanas e a participação ativa das comunidades locais – uma ambição longe de ser trivial – pode resultar em benefícios mais profundos e rápidos. (HENRIQUES, 2012 b: 63) Em entrevista, Fernando Patiño, representante da UN-Habitat, utiliza a metáfora do software e do hardware da informática para explicar que a UPP Social funcionaria como software, ou seja, um programa que a partir de um novo modelo de gestão viabilizasse o melhor funcionamento da máquina pública cujo objetivo seria a maior participação da população na governança da cidade. Para ele, há um processo implícito na conformação desta política pública que se dá em quatro níveis (micro, mínimo, médio e macro), que contempla da coleta e análise de informações sobre as populações até uma ação orientada no diálogo intercomunitário e com a cidade como um todo. O projeto ambicioso tratava de reformatar a administração pública, pois há necessidade de superação dos vícios da burocracia pública, em especial os custos da burocratização e da perda de efetividade da ação política para dar respostas ágeis (HENRIQUES, 2012 a). Ricardo Henriques e Silvia Ramos, ambos integrantes da equipe de concepção do programa, explicitam que a UPP Social nasce de um esforço de “promover a cidadania e a sustenta ilidade do processo de pacificação”, a partir da “chegada da Repú lica” (HENRIQUES e RAMOS, 2011: 03), em substituição ao controle exercido por grupos criminosos sobre a vida social nestes territórios. Apresentam as diretrizes de ação do programa que envolve diferentes dimensões em dois planos: consolidação da pacificação – que engloba a) cidadania e convivência, b) legalidade democrática, c) superação da violência juvenil, d) integração territorial e simbólica; e, desenvolvimento social, que se refere a e) redução da pobreza, f) desenvolvimento humano, g) 382 inclusão produtiva e dinamização econômica, h) qualidade de vida, i) diversidade e direitos humanos e j) infraestrutura e meio ambiente. O modelo de atuação da UPP Social envolve a metodologia da escuta sistemática das demandas da população e sua articulação com as diferentes frentes de ofertas de bens pelos poderes público, privado e terceiro setor. Apresentam, por fim, os conceitos-chave da estrutura de gestão: função integradora (articulação entre oferta e demanda), gestão em rede (centro coordenador da gestão sem ascendência hierárquica sobre os atores), caráter intergovernamental (integração entre as três esferas governamentais), gestão participativa (escuta ativa e parceria com as comunidades locais), aprendizado contínuo (diagnósticos locais, monitoramento e avaliação das ações) e transitoriedade (integração plena das comunidades à cidade). Na primeira dimensão da atuação, que versa sobre a cidadania e convivência, o mecanismo operacional é definido como a “a criação de canais de escuta e interlocução social (fóruns, ouvidorias) e apoio a organizações e ações cidadãs desenvolvidas em cada comunidade” (Ibidem, p. 06). Dessa forma, a concepção de participação que se coloca como base da construção desta proposta é sustentada pelo deslocamento desde uma gestão inovadora da cidade para as metonímias da escuta-ativa, escuta-forte, escuta-sistemática e/ou escuta-qualificada e inserida no escopo da assistência social. Nas variações em torno da noção de escuta, que se verificam tanto nos discursos dos gestores centrais como nos que atuam em campo, o programa apresenta a sua proposta de participação restrita ao acolhimento, classificação e qualificação das demandas da população a partir de uma preocupação técnica com a produção e gestão da informação sobre as comunidades pacificadas. Este caráter técnico é também manifesto pelo perfil dos gestores de campo, geralmente jovens profissionais da área de humanidades, com formação pós-graduada, contratados de forma terceirizada, o que é visto como forma de assegurar o necessário entusiasmo, compromisso e ausência dos vícios da burocracia tradicional. Esta opção se tornou uma marca própria do programa, reconhecida por diversos atores sociais envolvidos, gerando tanto simpatia por parte daqueles que se utilizam dos dados por eles produzidos, tais 383 como, representantes de políticas públicas, do mercado e do terceiro setor, como rechaço por parte dos funcionários públicos de carreira. Paradoxalmente, a atuação dos gestores técnicos gera um elevado envolvimento com as comunidades, caracterizada pela hiper politização do diálogo, assumido de forma quase acrítica como resolutivo, desconhecendo a artificialidade dos laços assim gerados e a baixa eficácia deste instrumento na produção das políticas públicas efetivas. Nas quatro comunidades estudadas observamos um número expressivo de moradores que criticava a extrema valorização dada pelos gestores à produção de informações sobre as favelas em detrimento da solução efetiva das suas demandas por parte do Estado. As relações de transferência e contratransferência levam tanto jovens gestores a se tornarem patrocinadores de certas causas e grupos, assim como à complacência da população diante do esforço inócuo dos gestores para efetuar as propaladas funções de conectar demandas com políticas efetivas. A separação entre gestores de campo (responsáveis pela escuta ativa e participação comunitária) e gestores de escritório (responsáveis pelas funções de integração intergovernamental e gestão de redes) termina por ser um incentivo a mais para que os do campo se identifiquem com a população ao não alcançar canalizar suas demandas de forma integrada no interior dos órgãos governamentais responsáveis. Há uma evidente discrepância entre o que está formulado no plano original e o que está sendo efetivado nos campos de atuação da UPP Social, sendo observadas diferenças e contradições entre os posicionamentos dos idealizadores e gestores centrais com as visões dos gestores que atuam nas comunidades. Enquanto para os seus formuladores o programa se constituiria em um modelo inovador de governança matricial, para parte dos gestores locais entrevistados as ações sociais se caracterizariam apenas pela efetividade da participação através da escuta, sem que fosse sequer mencionado a noção de gestão. Desta maneira, a legibilidade do Estado deve considerar não só a formulação da política, mas como ela é traduzida por seus operadores no território (DAS e POOLE, 2004). A promoção da “integração favela-cidade” surge como resultado esperado da política da UPP e UPP Social, com base no diagnóstico da cidade 384 partida e na ausência de Estado por décadas em territórios controlados pelo tráfico de drogas. Esse raciocínio é reproduzido de modo corrente nos discursos de gestores centrais e locais que defendem que a ocupação dos territórios, além de militar, deve propiciar também a ocupação por outros atores, provedores de bens públicos e privados. Para isso, a gestão social da pacificação buscaria articular ações do setor público, do setor privado e da sociedade civil, envolvendo-as no mesmo processo participativo ao qual a comunidade é interpelada a se integrar. Participar é aqui é uma metapolítica de integração da cidade. Como ressalta Beltrame: “... a cidade é partida. E a cada UPP que faço, eu junto essa cidade. Posso até ter políticas diferentes, mas ali na frente é uma coisa só í eu deixo de discriminar ” (BELTRAME, s. d). No primeiro Fórum da UPP Social na favela Santa Marta, em outubro de 2011, Henriques enfatizava essa perspectiva de integração, a partir de dois passos: a efetividade da política de segurança pública em curso e a construção de desenvolvimento social participativo e com compromisso responsável. Quando o “social” é mencionado, a associação direta e estrita que se faz é com a oferta de serviços e o envolvimento da população, demonstrando assim sua adesão ao processo de pacificação. Esta oferta de serviços é uma função não exclusiva do Estado, já que a inserção proposta passa pelo consumo, não pelo direito. Nesse contexto, a integração da favela à cidade se dá pela presença do domínio estatal como condição de expansão do mercado nestes territórios. Da mesma forma, o terceiro setor se apresenta como um importante parceiro na execução das ações sociais, especialmente em iniciativas ligadas à produção cultural, educação, turismo, lazer e esporte. Serviços e ofertas de oportunidades são vistos como pilares do desenvolvimento social, justiçados como parte da mesma lógica de controle dos corpos e ocupação do tempo das pessoas em atividades saudáveis, que possibilitariam a geração de novas perspectivas de vida integradas à nova ordem social. Distinguem-se nos territórios estudados algumas ONGs que têm projetos locais e algumas das organizações comunitárias construídas por moradores, por destoarem dessa lógica e se caracterizarem por uma atuação crítica com vistas à formação e consolidação da consciência cidadã. Sem deixarem de atender à convocatória para participação ou de estarem 385 envolvidas no projeto de pacificação, estas organizações tentam manter uma posição de independência crítica, dando maior atenção às necessidades políticas da população. As discussões e os conflitos sobre que tipo de integração está sendo proposta é um analisador natural dos diferentes projetos políticos que atravessam a comunidade: uma integração subordinada e descaracterizada, uma integração via mercado que seria insustentável e levaria à remoção branca; uma integração que respeitasse a identidade e reconhecesse a existência prévia de vínculos da favela com o “asfalto”, enfim, que respeitasse a identidade e singularidade da sociabilidade construída pelos moradores. A expansão do mercado é parte intrínseca do processo de pacificação, com a formalização das relações de fornecimento de diferentes serviços públicos e dos negócios já existentes, além da expansão de novos negócios por parte de empresas interessadas ou de empreendedores locais. Uma das primeiras atividades da UPP Social nas favelas tem sido a revisão do arruamento existente e a convocação da população para dar novos nomes às ruas, gerando endereços antes inexistentes. Essa demanda cidadã por um endereço reconhecido se soma à necessidade empresarial de cobrança de serviços e instalação de relógios como os de energia elétrica pela Light, empresa responsável pelo seu fornecimento no município. Esta empresa é uma das grandes beneficiárias, junto com as provedoras de TV a cabo, deste processo de formalização das antigas ligações clandestinas. Representantes da Light, de empresários que promovem projetos sustentáveis e empresas pertencentes ao Sistema S (SESC/SENAC, SESI/SENAI, SEST/SENAT) compareceram aos fóruns participativos, estabelecendo assim relações de proximidade com os moradores. A tal ponto que em um Fórum Social no qual se discutia o aumento abusivo das contas de luz foi observado pelos moradores que era necessário distinguir a simpática figura do funcionário da Light do interesse lucrativo da empresa na comunidade. Estas e outras empresas participam do projeto de pacificação como parte da sua “responsabilidade social”, misto de marketing e dispositivo ideológico, visto com grande entusiasmo pelos gestores sociais como patê das iniciativas de superação da partição social e urbana por meio da oferta de 386 oportunidades à população local. A participação das empresas é também concebida pelos gestores públicos como adesão ao projeto de pacificação. Participar significa aderir ao projeto, seja por financiamento direto às UPP, seja gerando ofertas, ainda que esta oferta não tenha sido construída de acordo com as necessidades locais. As resistências dos moradores ou mesmo o esvaziamento de alguns cursos e projetos desenvolvidos pelo mercado são comumente vistos como falta de interesse da população, a serem superados por meio do diálogo, tal como enfatiza uma gestora social: Você vê a experiência da Firjan, que ainda não sai das barbas da UPP. Ela fala que a comunidade é segura, que tem os serviços, mas não são serviços que dialogam com a comunidade (...) Precisaria ser mais dialógico. (Ex-gestora do Programa Territórios da Paz) A ausência quase sistemática da participação nos Fóruns Sociais, de profissionais vinculados aos sistemas públicos de saúde e educação mostra claramente que o social passa a ser significado a partir do modelo de consumo e coerção. O deslocamento do significado da inserção social desde o gozo dos direitos sociais universais para estratégias individualizadas de empreendedorismo por meio da oferta de oportunidades e de consumo se coaduna com a ocupação militar do território, ambas necessárias a repor o controle estatal e mercantil sobre o território e a sociabilidade da população (FLEURY, 2012). Para os moradores e lideranças locais, os fóruns são espaços a serem ocupados, mesmo quando não os veem como forma de participação democrática, por considerarem que não há compartilhamento do poder decisório com os moradores. Enquanto uma das gestoras locais chega a afirmar que a metodologia de escuta-forte é o melhor exemplo de exercício da democracia, os moradores têm consciência de que o poder decisório continua restrito. Os gestores dos Fóruns da UPP Social detêm o controle sobre a agenda e a pauta dos debates, a metodologia de discussão, o horário da 387 reunião, a disposição dos assentos, os convidados que estão autorizados a falar e o tempo de fala. Inicialmente estes fóruns eram marcados em horários de trabalho, convenientes para os gestores, mas que impediam a participação dos moradores que trabalham. Um analisador das relações de poder é visto pela ocupação espacial inicialmente adotada nos fóruns participativos. A disposição das cadeiras teve que ser mudada para um círculo, mais democrático, já que inicialmente eram dispostas como em um palco, no qual tinham assento as autoridades – civis, militares, empresariais e presidentes das associações de moradores – sendo que as lideranças locais e pesquisadores se sentavam no auditório e o resto da população ao fundo ou nas arquibancadas, guardando simétrica relação espacial com sua proximidade com o poder. O uso de burocráticas apresentações de estatísticas em Power Point também foi sendo aos poucos substituído por grupos de discussão, em uma metodologia de dinâmica de grupos, ainda assim resguardando o controle nas mãos dos gestores. Há uma atribuição de status público (OFFE, 1985) por parte das autoridades governamentais a alguns moradores que exercem funções e papeis reconhecidos pelas autoridades, mas que nem sempre coincidem com o respeito e reconhecimento de sua liderança pela população. No entanto, é nítida a atitude dos moradores de preservação destes lugares – como a presidência da associação de moradores – que poderão vir a ser objeto de uma disputa política posterior. Já os moradores, mesmo quando não autorizados a fazer uso da fala, utilizam outros recursos de poder, algumas vezes apenas simbólicos, de forma a reverter esta situação e introduzir suas demandas na agenda dos encontros. Em fóruns realizados no Chapéu Mangueira e Babilônia a presença muda de um casal que estava prestes a ser removido de sua habitação pelo Morar Carioca era suficiente para atuar como analisador gritante das relações de interdição dessa temática no evento, já que com sua força silenciosamente expressiva, conseguiram impor a discussão sobre a remoção. Invariavelmente eles terminavam sendo chamados a falar sobre seu drama por alguns daqueles que haviam sido autorizados a ter acesso ao microfone. 388 Não foram, porém, essas limitações na participação que comprometeram a efetividade do programa da UPP Social ou foram responsáveis pela sua mudança de rumo nas favelas pesquisadas. Ao contrário, a participação da população terminou por ensinar aos gestores que novos rumos deveriam ser buscados para permitir a interação. Prevaleceu, aos poucos, a percepção dos fóruns como ineficientes, que só aconteciam esporadicamente e que não ultrapassavam o efeito catártico, sem impacto nas políticas públicas. De acordo com os gestores os fóruns foram avaliados como inoperantes e a partir de então eles passaram da escuta-forte a fazer a escutaqualificada, realizando visitas às casas e em conversas diretas com os moradores. No entanto, a mudança de abordagem em campo não alterou a dinâmica política que acabou determinando os rumos do programa. Em função da lógica de ocupação dos cargos públicos por partidos aliados, a UPP Social foi deslocada desde uma secretaria do governo estadual para o Instituto Municipal de Urbanismo - IPP – com clara restrição dos recursos políticos e institucionais disponíveis para o programa. Em outros termos, a própria gestão social da participação sofreu um deslocamento saindo do Estado para o Município, dos Direitos Humanos e Assistência para o Planejamento Urbano. Esta mudança institucional reduziu ainda mais a capacidade do programa de cumprir com a função de integração de uma rede intergovernamental estadual e municipal, cujas secretarias situavam-se hierarquicamente acima e fora da esfera de poder do instituto. As constantes mudanças políticas e institucionais mostram a fragilidade não apenas do programa, mas de toda a concepção acerca do componente social da política de pacificação. Na fase atual, com a mudança de dirigente do programa a associação da pacificação com a entrada do mercado nos territórios das favelas passa a ser a missão da UPP Social tal como expresso por Eduarda de La Roque, atual presidente do IPP e coordenadora da UPP Social, em sua carta de apresentação intitulada “Rumo ao fim da cidade partida”, onde afirma que o principal desafio de sua atuação é o enfrentamento à “desigualdade de oportunidades”. Torna explícita a concepção de que as desigualdades socioeconômicas e de condições de vida das populações das 389 favelas se solucionarão com a inserção do mercado e do terceiro setor em conjunto com o Estado no processo de pacificação. Ao Estado fica reservado um papel limitado na atuação e forte no planejamento, fornecendo infraestrutura para atuação do mercado e definindo regras que permitam a escolha livre e igualitária por parte dos consumidores. “Acredito que a única forma de avançarmos nesse tema de sustentabilidade – desenvolvimento econômico com inclusão social e sem desperdício de recursos naturais – é através do conceito que denomino “PPP3”, Parceria PúblicoPrivada e com o Terceiro Setor. O conceito de PPP3 parte do princípio de que para potencializar o crescimento econômico com eficiência e justiça social, as condições necessárias são: igualdade de oportunidades, com liberdade de escolha; e setor público de tamanho adequado e preocupado com criar um sistema de incentivos para quem administra. Para mim, Estado forte é Estado eficiente”. (LA ROQUE, 2012) Do ponto de vista da população, observamos frequente desconfiança e insatisfação com relação à concepção da política de pacificação, quando considerada libertadora da população local, desconhecendo a história que haviam construído. Em um seminário, uma moradora que participa de grupo comunitário de ação cultural diz que retirou a palavra “agora” do seu dicionário, de tanto ouvi-la de forma inapropriada, como se tudo tivesse começado depois da pacificação: “agora vocês podem se reunir agora vocês participam agora vocês são cidadãos” Observamos que a mesma visão também compartilhada por profissionais que já atuavam nas comunidades antes da UPP, como coloca o médico que trabalhou no Santa Marta: Dizem que é para desenvolver parcerias com as instituições, mas não precisa de UPP Social para estas parcerias, elas já 390 existem. Há anos que os jesuítas fazem isso, a igreja, o grupo Eco, com o Itamar. Aas creches já tem uma parceria com o Colégio Santo Inácio. Não precisa de intermediadora, parcerias históricas já existem no Santa Marta (Médico que atuou no Santa Marta) Nas comunidades estudadas verificou-se a invisibilidade dos programas sociais, como parte da exaltação das personalidades dos gestores, tanto em criticas quanto em elogios. A fragmentação, superposição e ineficiência característica das políticas sociais evidencia-se também na política de pacificação, como aponta uma gestora local do Territórios da Paz: O mapeamento da favela já foi feito várias vezes e refeito por diversos órgãos e programas. Tentaram juntar os dados e fazer isto conjuntamente, o que se mostrou impossível: cada um tem que colocar seu “carimbo” de autoria. (Exgestora do Programa Territórios da Paz) O fato de serem interpelados a participar em inúmeras instâncias, a inocuidade de levantamentos de dados reiteradamente realizados e a incapacidade dos gestores de mobilizar as autoridades responsáveis pelas políticas que realmente são demandadas pelos moradores, foram fatores apontados como críticos na atuação social. A coleta de dados sobre os moradores é percebida como controle social, mas não assegura efetividade das políticas: Chega aqui nas apresentações deles, nas reuniões da UPP Social, cheios de promessas, papos promissores e coisa e tal. De ações realmente para resolver nossas questões, nada. Eu vejo mais neles um processo de coletar informações. Se é pra coletar informações, eu não sou obrigado a dar informações pra ninguém. Pra chegar no gabinete e expor e aí? Vai resolver o quê? Que trabalho 391 social é esse? Tá legal, até respeito os profissionais, em minha opinião ele até se sentem limitados, mas por questões éticas querem ajudar de alguma forma, mas por questões hierárquicas não conseguem ajudar de certa forma. Mais uma vez “enxugando gelo” (Morador do Santa Marta), Em entrevista, Itamar Silva, liderança comunitária do Santa Marta reconhece, no entanto, que apesar das contradições, o programa de pacificação inaugurou um novo marco no qual se impõem atualizações às formas de sociabilidade, organização e participação: Então eu acho que hoje a questão da UPP, e a UPP Social estão entrando com o objetivo de tentar reorganizar o campo ou criar uma nova institucionalidade. Mas, eu acho que meio que se perdeu nessa história. A UPP social não foi capaz de desenhar esse campo. Ela não teve capacidade política para poder chamar para ela essa centralidade e costurar um novo desenho de representação coletiva. E, muitas vezes, essa tentativa em alguns lugares acabou se sobrepondo às dinâmicas que estavam acontecendo nesses territórios. Eu acho que hoje a gente tem um desafio enorme que é pensar qual é o desenho organizativo que vai ser capaz de responder a essa atualidade da favela pacificada. (SILVA, 2012) iv) Participação como Mobilização de Capital Social A existência simultânea de dois programas – um estadual e outro municipal – com a função de intermediar a relação das favelas pacificadas com o governo, a partir da criação dos Territórios da Paz - TP evidencia a manutenção da falta de coordenação, característica da debilidade da gestão 392 das políticas sociais. As diferenças entre os dois programas (UPP Social e TP) localizam-se mais no plano da execução do que na concepção da proposta. Para Daniel Misse, superintendente do Programa até 2012, a criação do TP decorreu das circunstâncias políticas que provocaram o deslocamento da UPP Social para o município. Com a passagem da UPP Social para o Instituto Pereira Passos em 2011 este programa se torna responsável pela interlocução com a prefeitura, enquanto, no governo estadual, os Territórios da Paz se incubem dessa função. A equipe do Programa Territórios da Paz é composta por 16 equipes terceirizadas pela Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ) e a própria SEASDH. Como já existia uma proposta nacional de fortalecimento da área de Segurança e Direitos Humanos, desenvolvida pelo PRONASCI, esta foi incorporada à SEASDH para se conformar em um programa estadual, aproveitando o quadro de funcionários que anteriormente haviam sido contratados para a UPP Social. Apesar de serem observadas diferenças na execução dos dois programas, a base de constituição da proposta é a mesma, o que ocasiona com frequência confusão entre moradores e entre os próprios militares a esse respeito, em uma visão comumente sintetizada na fala: “é tudo UPP”. Porém, para seu ex-dirigente, Daniel Misse, o TP se diferencia da UPP Social por ter construído uma proposta que incorporou aprendizados das experiências dos primeiros gestores sociais e que visa à promoção de “politicas pú licas de forma participativa, sendo o gestor social um mobilizador de redes comunitárias e formador de capital social” (MISSE, 2013: 44). Nessa concepção, o trabalho social ao invés de centrar-se no levantamento de demandas e alocação de ofertas, volta-se para o papel do gestor como articulador de redes comunitárias que desemboquem em políticas públicas: O programa Territórios da Paz tem uma metodologia diferente. As equipes de gestão social são alocadas nos territórios sem trazer qualquer proposta e sem realizar um fórum local. A ideia é observar as reuniões locais e mapear as redes existentes para fortalecê-las. Outro fato relevante se refere à inflação de demandas que se cria quando se 393 propõe um Fórum para a resolução de todos os problemas. Além de repetir a lógica tutelar, propõe algo que o Estado não tem como realizar, seja por motivos de capacidade de governo ou mesmo de governabilidade (Ibid, p. 182). Essa estreita relação dos gestores do TP com as redes comunitárias, é, porém criticada por gestores e funcionários da UPP Social que vêm nessa atuação uma forma “política” ao invés de uma ação governamental. Muito embora, os gestores dos Territórios procurem diferenciar-se dos gestores da UPP social por serem funcionários de carreira, enquanto os últimos são contratados por terceiros, o que acarreta elevada rotatividade das equipes de campo. A tensão entre agir como governo ou tomar partido em favor da população é permanente neste trabalho. Ambas as críticas à forma de atuação do “outro programa de gestão social” manifestam no campo uma clara disputa de espaços e de legitimidade entre os dois programas. Observa-se que quando se trata de problemas bastante pontuais, como por exemplo, alguma deficiência específica em alguma prestação de serviços, os gestores de ambos os programas conversam entre si e juntos encaminham as demandas tanto para a prefeitura como para o estado. Contudo, verifica-se que os programas não atuam de maneira articulada quando se trata de demandas que alteram o planejamento e a execução de políticas públicas, o que colabora para a fragmentação das políticas sociais e para o fortalecimento da concepção setorial que predomina no setor público – aspectos fortemente criticados no projeto dos idealizadores de ambos os programas. Os gestores dos TP acreditam valer-se de sua inserção institucional na Secretaria que abarca Direitos Humanos, para ter uma atuação mais voltada para a defesa dos moradores ameaçados pelas próprias políticas públicas. Para uma das gestoras locais do TP, a especificidade da secretaria de direitos humanos lhes dá legitimidade institucional para se envolverem com os casos de violação, mesmo a contragosto das autoridades que coordenam o programa. Eventos catalisadores da ação coletiva dos moradores como a luta contra as remoções ou pelo melhor funcionamento do bondinho do teleférico têm sido apoiados pelos gestores sociais, dentro desta perspectiva de respeito 394 aos direitos humanos e fortalecimento do capital social. No entanto, a seletividade estrutural do estado (OFFE, 1984) por meio de suas instituições políticas não deixa margem de dúvidas sobre a ineficácia do apoio destes gestores. Se bem a participação dos gestores represente identificação com as demandas dos moradores, fortalecendo sua organização em torno do fato catalisador, ao encaminhar a demanda ao órgão competente os gestores perdem o controle sobre como esta será tratada no interior do governo. Ao colocar a população em contato com o órgão governamental responsável, o gestor social termina propiciando, paradoxalmente, a desmobilização da muitas vezes frágil ação coletiva. Isto porque o governo não aceita negociar a demanda com o coletivo, exigindo a eleição de um representante, ou mesmo indicado diretamente um morador para ser seu interlocutor. Nas quatro favelas estudadas foram ouvidas denúncias acerca da falta de transparência dos projetos de reurbanização, mobilizando a articulação de moradores para exigir explicações sobre as obras ou mesmo exigir a mera apresentação do projeto. Observou-se que os gestores dos Territórios buscaram participar, conjuntamente com lideranças locais e a defensoria pública, de fóruns e reuniões para esclarecimento e encaminhamento de demandas a respeito das remoções e violações denunciadas. Ex-gestora do TP na Providência conta que desde o inicio do seu trabalho passou a apoiar uma comissão de resistência às remoções e observou que esse trabalho estimulou a participação dos moradores e liderança gerando a criação de uma rede interna de atuação política em contraponto às atuais políticas públicas. Apesar da realização desses espaços de participação e articulação, o único resultado concreto dessa ação foi possibilitar a formação de uma rede de apoio aos casos de remoção e, em alguns casos específicos, ajuizar uma ação pública contra a prefeitura. Essa identificação com a comunidade define o ethos dos gestores de campo dos TP Pra mudar essa realidade é preciso uma mudança nos poderes públicos de forma substancial. Porque a gente pensa que a pacificação é só ir lá, tirar o bandido e oferecer oportunidade. Se não colocar a pessoa como sujeito, esse 395 trabalho não vai valer a pena. Se o estado achar que é só oferecer o bolsa família, dar o lanchinho, não vai resolver (Ex-gestora do Programa Territórios da Paz). Acreditam que estar dentro da estrutura é uma forma legítima de luta e militância política: Existem duas formas de trabalhar com políticas públicas e sociais em comunidades: ou você sai da esfera pública e tenta lutar por fora dela sabendo que isso é muito difícil (...) ou você vai fazer o trabalho de formiguinha dentro, mas dentro você tem minimamente algumas condições institucionalizadas (Gestora do Programa Territórios da Paz). A empatia dos gestores dos Territórios com a população encontra, como limite de sua ação, a barreira da política pública que eles não alcançam transformar. Ao contrário, por não se articularem em uma atuação social conjunta, o acirramento da disputa e a sobreposição das ações expõem a fragilidade e debilidade da proposta da articulação interinstitucional de órgãos com a mesma incumbência e baixa capacidade resolutiva, o que ocasiona maior desgaste institucional e um aumento significativo da descrença da população frente aos programas sociais. A ação dos gestores locais ocorre sem diretrizes definidas e com muitos desafios na construção de relações de “vínculo” e “confiança”. A ausência de uma diretriz clara, para além da conquista da confiança, se manifesta em concepções e estratégias distintas de ação por parte dos gestores locais. A exgestora da Providência expõe a dificuldade de uma atuação em que as diretrizes estão sendo construídas com a entrada dos profissionais no campo, o que impõe fortes limitações às suas ações. Já para a gestora do Chapéu Mangueira e da Babilônia a falta de unidade e centralidade do programa é vista como um aspecto positivo, que confere maior autonomia e flexibilidade à 396 atuação em campo, Em sua concepção “não é um projeto de fim, e sim de meio” ou seja, que visa estimular as potencialidades existentes e não implantar um programa pré-determinado. Mesmo buscando se diferenciar por ter um trabalho politizado e com forte empatia com as demandas populares, presenciamos em campo a realização de fóruns pelo TP que reproduziam de modo bastante semelhante à forma de diálogo e de escuta introduzidas pela UPP social, na qual a fala preferencialmente é privilégio dos representantes do Estado e a escuta forte é feita pela população, na busca de entendimento do processo e/ou busca de engajamento e benefícios. Mesmo assim, um discurso crítico em relação à proposta de participação se faz presente em momentos em que a demanda por participação se transforma, ela mesma, em analisador das relações assimétricas entre gestores e população. Em uma reunião convocada pela gestora no Chapéu Mangueira e Babilônia, foi proposto que se criasse um projeto em oito dias para apresentação às autoridades participantes da Conferência Rio + 20. Justificava-se a urgência pela necessidade da população não perder a chance na ocasião privilegiada, já que na Conferência Rio 92 “os canhões estavam voltados para as favelas e agora eles seriam visitados pelos participantes do evento” 1 , de acordo com a gestora. A descrença dos moradores e a desconfiança sobre sua sustentabilidade associou-se à critica em relação à urgência e a veemência no encaminhamento de uma sugestão de como eles deveriam proceder, por parte da gestora. Uma das lideranças locais pediu a palavra e explicou: “já está tudo decidido; não há tempo vai ser uma feira não estamos decidindo nada”. Ao constatar a surpresa da gestora ele explicou condescendente: “mas não importa pois o Estado é assim mesmo e vamos participar fazendo o projeto” 1. A intenção de fortalecer o capital social é traduzida na ação dos TP na concepção do programa como “incu adora de projetos sociais” (MISSE, 2013: 182), resultantes da estreita relação estabelecida entre moradores e gestores. O social aqui se refere muito mais às ações coletivas comunitárias do que a oferta de serviços públicos, muito embora com os gestores públicos assumindo 397 um papel que tradicionalmente fora desenvolvido pelo associativismo local nas favelas. No entanto, os gestores são unânimes em apontar esse aspecto como a marca do seu trabalho, ao qual é atribuída fundamental importância para o processo participativo da população. Em suas percepções, o principal desafio para sua atuação é a construção do vinculo, pois percebem desconfiança generalizada da população a respeito do propósito das suas ações, identificando que há um primeiro momento de desconfiança, depois de teste em que os gestores são colocados em situações em que precisam se posicionar politicamente e, caso conquistem alguma confiança dos moradores, encontram abertura para participar de espaços e mobilizações até então exclusivas dos moradores. Um exemplo da atuação de gestores do TP pode ser encontrado no “Dá Teu Papo”, coletivo associativo de jovens das comunidades do Chapéu Mangueira e Babilônia. Idealizado por jovens envolvidos com produção cultural naquelas comunidades, recebeu o apoio das gestoras locais por possibilitar o fortalecimento de iniciativas locais e da organização política comunitária. De uma iniciativa autóctone se transforma, na linguagem oficial, em um “projeto”, em parceria com gestores dos Territórios. Segundo seus idealizadores, as gestoras locais são vistas como parceiras muito mais devido a características pessoais do que do ponto de vista institucional. Essa percepção é partilhada por muitos moradores para os quais o “apoio” de gestores é visto como um atributo de determinado gestor e não um traço da institucionalidade. Igualmente, outro projeto considerado de destaque para o programa é o Plano Estadual de Memória, oriundo de demandas dos moradores para os quais a recuperação de sua memória reforça e valoriza a identidade coletiva. Porém, estas demandas rapidamente assumiram a feição de proposta do programa e se estenderam para todas as comunidades atendidas pelo TP, independentemente de ter surgido ou não como demanda dos moradores. Atualmente, pretende-se torna-la política pública a ser implantada em todas as comunidades do Estado. Novamente se coloca a seletividade das instituições políticas, que destituem as demandas de seu conteúdo político ao transforma398 las em projetos governamentais. A queixa de lideranças comunitárias sobre o papel dessas iniciativas do TP se refere ao fato de que o associativismo comunitário, tradicional meio de organização e defesa dos interesses dessas populações, passa a ser deslocado para o interior de iniciativas estatais, enfraquecendo o capital social autóctone, cuja confiança foi gerada nas lutas comuns pela melhoria da qualidade de vida. Observamos que enquanto em umas favelas os programas sociais se superpõem, em outras se encontram ausentes, como na Providência, onde está havendo enorme transformação urbana com inúmeras remoções de moradores, que, no entanto, apresentam capacidade de resistência. Ainda que lideranças da Providência participem do Fórum Comunitário do Porto, onde se reúnem com intelectuais e outros atores locais que questionam a reforma urbana da área portuária, isso não tem sido suficiente para retirá-los da invisibilidade e alçá-los ao mesmo status dos moradores das favelas da Zona Sul, nos quais os programas de gestão social foram implementados. No entanto, os moradores das quatro comunidades apontam que gestores sociais não conseguem responder às demandas levantadas por eles, tais como a falta de luz ou de coleta de lixo, seja porque desconhecem a atuação dos órgãos responsáveis, seja porque não há dialogo com eles, o que inviabiliza o trabalho de mediação e consequentemente o alcance de uma resposta concreta. No entanto, essa interação entre os gestores e grupos comunitários não deixa de afetar as formas de organização e as identidades dos sujeitos políticos. Progressivamente observa-se que muitas lideranças locais passam a utilizar a linguagem tecnocrática ao invés do discurso político: falam em projetos ao invés de mobilizações coletivas, de gentrificação ao invés de remoção, memória ao invés de identidade de favelados. Conclusão O desenho institucional das políticas de gestão social nas favelas pacificadas reproduz a desigualdade de recursos entre os atores, conferindo 399 maior poder aos gestores do governo nos espaços participativos. Além disso, assumem como missão a articulação interinstitucional e entre os diferentes atores atuantes nessa arena pública, quando apresentam fraca capacidade de incidência no processo decisório governamental. Os arranjos institucionais destes programas limitam as possibilidades de ação dos gestores pela ausência de recursos de poder para cumprir sua missão de canalização governamental. das demandas e articulação da resposta Esta fragilidade institucional se expressa em contratos temporários, deslocamento de programas e de dirigentes por critérios políticos, superposição de ações, ausência de projetos e estratégias institucionais e sua substituição por iniciativas personalizadas. Assim, os programas exibem baixa efetividade tanto na inclusão das demandas quanto na solução das questões estruturais e conflitos apresentados pelos moradores, apresentando eficácia limitada apenas sobre demandas pontuais. A ineficácia também pode ser atribuída à falta de clareza em relação à ação social, que ora se reduz à legitimação junto à comunidade da estratégia policial, ora se limita a buscar parcerias entre entes públicos e privados, vistos como indispensáveis para gerar melhores oportunidades para os moradores. Nesse sentido, a efetividade dessa política social é também comprometida pelo seu distanciamento em relação ao paradigma das políticas sociais universais, fundadas nos direitos de cidadania – saúde, assistência, educação – que se mantêm, regra geral, alheias a essas iniciativas desenvolvidas nos territórios pacificados. A ênfase na busca de laços de afetividade entre agentes governamentais e moradores termina em uma militância política por parte dos gestores e uma adoção de seus modelos técnicos por parte dos moradores.Essas relações muitas vezes esvaziam o associativismo local, forjado em uma história de resistência, deslocando-o para o interior das políticas públicas, cuja seletividade estrutural destitui as demandas do seu conteúdo político e reformata-os como projetos governamentais. Porém, a própria existência desses espaços, ainda que limitados e controlados, cria uma 400 esfera pública onde identidades prévias são resignificadas e novos sujeitos, práticas, alianças e projetos podem emergir. Depois de analisar as múltiplas metonímias por meio das quais agentes públicos e população se interpelam mutuamente em torno da questão da participação, vemos que os programas vinculados ao processo de pacificação apresentam uma polifonia de significados, cujo uso, simultâneo e contraditório, tanto indica disputas quanto a consolidação de hegemonia, na medida em que trabalham em conjunto para deslocar a participação da disputa de poder. Quanto mais tais programas se distanciam da proposta de controle ostensivo, mais abrem um espaço para construção de arenas públicas, nas quais o significado da participação é disputado. No entanto, também é certo que quanto mais se afastam do controle, apresentam menor efetividade no cumprimento da sua missão institucional e frustram compromissos assumidos com a população nas arenas participativas. O repertório de interações possíveis entre agentes públicos e moradores é variado, incluindo o controle e coerção, convencimento e transmissão de normas de boa conduta, passando por alianças e identificações entre gestores sociais e grupos comunitários, Esses últimos, por sua vez, assumem múltiplas estratégias, que envolvem ações de resistência, adesão, clientela, barganha, legitimação, entre outras formas de adequação ao novo quadro institucional inaugurado pela política de pacificação. Disputas em relação à identidade coletiva revelam diferentes formas ajustamento acerca da interpelação que a política de pacificação direciona aos moradores sob o lema da integração da favela à cidade. Apesar dos programas sociais se fundamentarem na diretriz da participação, podemos constatar que longe de ser é um traço intrínseco ao desenho e implementação da política, a participação só deixa de ser pacificada quando ela expressa a existência prévia do associativismo local, de tal forma a se impor às políticas públicas territoriais, disputando, neste processo, a reversão das múltiplas metonímias e deslocamentos de significados, ao tentar introduzir exigências de poder e emancipação dos cidadãos. 401 Referências AVRITZER, L. A qualidade da democracia e a questão da efetividade da participação: mapeando o debate. In: PIRES, R. R. (Org.) Efetividade das Instituições Participativas no Brasil: Estratégias de Avaliação. Brasília: Ipea, 2011. BELTRAME, J. M. Revista Acija, 26 de julho de 2010. Disponível em: http://concursopmerj2010.forum-livre.com/t115-entrevista-jose-marianobeltrame Acesso em 14 de agosto de 2013. ________________. 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A inclusão social e redução das desigualdades fazem parte da trajetória da construção da democracia, como utopia de uma sociedade mais justa, plural e igualitária. O fato da transição à democracia ter coincidido na América Latina com a transição a uma sociedade de mercado com baixa regulação estatal fornece a moldura na qual tanto a discussão sobre a pobreza quanto as políticas públicas orientadas à questão social devem ser enquadradas. Desde a tentativa de construção de uma sociedade inclusiva, pautada pelos valores de justiça social e redistribuição por meio de políticas públicas de proteção social, até a explosão mediática da Classe C como a nova feição da sociedade brasileira, encontramos a trajetória de enfrentamentos entre distintos projetos políticos de inclusão social. No interior da relação entre Estado e Mercado e nos embates e resistências da sociedade e das instituições sociais, configura-se o projeto atual de sociedade e sociabilidade. Esse, em aspectos essenciais, desfigurou a utopia democrática construída nos anos 70 e 80 a partir da mobilização social, transformando-a em um projeto de mercado: marketing político, consumo e crédito popular. Afastou-se, portanto da noção de inclusão em uma comunidade de cidadãos, para pensá-la como ações individualizadas a partir da integração via consumo. A teoria social na América Latina buscou compreender questões como pobreza e marginalidade, intrínsecas à especificidade dessa forma de capitalismo, caracterizada como uma modernização sem a modernidade, compreendida como secularização com subjetivação centrada na liberdade e integração social (1). Tal fenômeno permitiu ao Brasil chegar a ser uma das principais economias industriais ostentando o maior índice de desigualdade mundial, fruto de um crescimento econômico caracterizado por conjugar o processo de modernização capitalista ao mesmo tempo em que reproduzia 407 estruturas arcaicas de dominação e exploração: agronegócio e trabalho escravo. A discussão sobre marginalidade social dos trabalhadores inseriu-se na análise do processo de exploração capitalista, apontando sua inutilidade para funcionar como exército industrial de reserva e rebaixar salários (2) e desvendando sua inserção precária e instável (3) como parte da incapacidade das relações capitalistas se generalizarem. O apelo nacional desenvolvimentista ao Estado como propulsor do crescimento econômico não levou devidamente em conta as particularidades do poder político, cuja aparente fortaleza e autonomia comportavam imensa fragilidade frente aos interesses empresariais que se constituíam como poder no interior do próprio Estado (4). O Estado foi incapaz de atuar como equivalente geral, contemplando os interesses subalternos na disputa pelos recursos públicos. Entre nós, construíram-se Estados sem Cidadãos (5), onde direitos se transformaram em privilégios de poucos, reduzindo a teia de solidariedades, base constitutiva de uma cultura democrática, a relações pessoais e clientelistas. O apartheid social brasileiro desempenhou um papel decisivo na atrofia da esfera pública, com a dissolução da identidade coletiva entre os setores mais pobres ao isolá-los daqueles que já tinham atingido o status de cidadãos (6). Para as elites a categoria social dos pobres sempre se constituiu em séria ameaça à ordem estabelecida. Vistos pelo prisma do medo das classes perigosas (7), os conflitos de classe tomaram o caráter de violência rural e urbana, demandando uma postura repressiva por parte do Estado para assegurar a ordem e o domínio. A crise do pacto de poder que sustentou o desenvolvimentismo autoritário e excludente permitiu a rearticulação da sociedade a partir das demandas de reformas sob a égide e primado da justiça social, expressa no reconhecimento, na participação e na redistribuição. Para contrapor-se a esse tipo peculiar de capitalismo que prescindiu da democracia, da integração regional e da inclusão social, a Constituição Federal de 1988 foi elaborada tendo como objetivos (Art. 3º.) a construção de uma 408 sociedade livre, justa e solidária, com a erradicação da pobreza e da marginalização, e redução das desigualdades. Para tanto, foram desenhados sistemas universais, descentralizados e participativos de proteção social, que consolidaram a Ordem social como independente da Ordem econômica. Além disso, definiu-se na Seguridade Social um orçamento social com fontes exclusivas e diversificadas, assegurando que nenhum benefício social poderia ser inferior ao salário mínimo. Esses preceitos constitucionais elevaram a renda de milhões de beneficiários da previdência, urbana e em especial rural, e da área assistencial (BPC), com forte impacto distributivo, já que favoreceram grupos marginalizados como negros, mulheres, idosos, etc. No entanto, a incapacidade de construir um novo pacto de poder reeditou a característica modernização conservadora, com a rearticulação das elites de forma a preservar-se no poder, mesmo que tendo que ceder espaço para demandas de antigos opositores, agora transformados em aliados. Em um contexto de liberalização promovido pela globalização, impôs-se uma ordem de flexibilização e mercantilização, subordinando a política à estabilidade econômica, com graves consequências para a arquitetura dos direitos sociais recém-institucionalizada. A fetichização do poder do Estado que correspondeu ao projeto nacional desenvolvimentista ao invés da dar lugar ao Estado democrático fortalecido foi substituída pela fetichização da eficiência do mercado, agora concebido como o que é suficiente para atender de forma satisfatória às necessidades de reprodução social. Em ambos os casos, desconsidera-se a sociedade, as relações e correlações de forças, os valores compartilhados, os conflitos social e o aspecto relacional de classes, que por fim é a essência da relação de poder. A obliteração do debate sobre o poder de classe e sua tradução como poder de consumo é um analisador do projeto político em curso, no qual a questão do conflito inerente às desigualdades de classe é substituída pelo consenso em relação à ascensão social necessária ao consumo na sociedade de mercado. 409 Nesse contexto, os programas de erradicação da pobreza e ascensão ao mercado de consumo por via de transferências públicas de renda ganham o estatuto de projeto de coesão social em sociedades profundamente marcadas pela desigualdade e exclusão social. Para além da mera ideologia, restaria pensar em que medida esse projeto é realizável. I – Condições Materiais de Produção As discussões sobre a reorganização da estrutura produtiva, como consequência das grandes transformações impostas pela liberalização promovida pela globalização, têm apontado tanto as mudanças como as continuidades em relação à inserção produtiva, relações de trabalho e identidades de classe. Na crise das economias desenvolvidas e em consequência da adoção de políticas públicas preconizadas pelos organismos financeiros internacionais, o fenômeno de desemprego e vulnerabilidade de vínculos laborais de jovens bem qualificados tem dado origem a emergência de uma nova classe perigosa, denominada precariato (8). Já as economias emergentes sempre conviveram com a heterogeneidade da classe trabalhadora, porém foram os trabalhadores menos qualificados que incharam o mercado informal de trabalho. Desde a década de 1980, uma nova morfologia do trabalho (9) está sendo desenhada a partir de fortes processos de reestruturação produtiva e organizacional. Essa reestruturação caracteriza-se pelo enxugamento da força de trabalho combinada com mudanças sociotécnicas no processo produtivo e na organização e controle social do trabalho, acarretando flexibilização e desregulação de direitos sociais, terceirização e novas formas de gestão da força de trabalho, embora ainda convivam com a preservação do fordismo em certas áreas. A expansão do trabalho em telemarketing, por exemplo, mostra como a superexploração do trabalho por ritmos intensos em condições precárias convive com o desenvolvimento tecnológico no ramo das telecomunicações. 410 No Brasil, devido ao aumento sustentável do salário mínimo acima da inflação por mais de uma década - valor ao qual está atrelado o piso dos benefícios assistenciais e aposentadorias - à expansão da cobertura e do valor das transferências de renda, somado ao aumento do crédito popular, houve um real aumento da renda e do consumo dos trabalhadores mais pobres. A expansão do consumo e redução da miséria têm demonstrado enorme eficácia comunicacional e política em toda a América Latina, considerando seu baixo custo como porcentagem do orçamento público e seu alto impacto social. Tomando o crescimento da renda como indicador privilegiado da mobilidade social e o crescimento maior da renda entre os mais pobres do que o dos grupos mais ricos, intelectuais orgânicos cunharam o termo Classe C para indicar aquela parcela da população que ultrapassou a linha de pobreza, o que justificaria sua inclusão no vago conceito de classe média. Se há fragilidade conceitual, as derivadas políticas são bem consistentes, o que se manifesta na inserção desta produção no núcleo estratégico do governo. A partir desses dados afirma-se que a classe média já é majoritária no país, assegurando o caráter democrático da sociedade brasileira e permitindo divisar a erradicação da miséria. Mas, esse lado brilhante da reestratificação não é capaz de mitigar o lado obscuro da desigualdade, evidenciado pelos dados do Censo de 2010, onde os 10% dos domicílios mais ricos abocanham 42,85 da renda nacional, ou pelas estatísticas das Nações Unidas, onde o Brasil avança a passos muito lentos na evolução do IDH, situando-se na 84ª. posição entre 187 países. Mesmo que o gasto federal com assistência não ultrapasse 1% do PIB, e que a participação dos salários na renda nacional ainda seja baixa, não alcançando os patamares da década de 1960, a disputa por recursos públicos já ameaça as políticas distributivas. As medidas distributivas começam a ser criticadas por economistas ortodoxos, por serem vistas como possíveis fatores que alimentam o aumento da inflação. Ademais, questiona-se a efetividade da continuidade de aumentos reais do salário mínimo, considerado esgotados os efeitos desse instrumento de redução da pobreza extrema (10). Outros questionam a sustentabilidade da socialdemocracia brasileira, propondo a realocação dos recursos públicos desde o gasto social para o gasto com investimentos necessários para assegurar a competitividade da economia (11). 411 É preciso dizer que as evidências sobre os efeitos distributivos das políticas que elevaram o emprego, o salário mínimo real e, consequentemente os benefícios, além das transferências condicionadas – nessa ordem de impacto – ainda são insuficientes para transformar a estrutura social brasileira. Não só pelo baixo volume de recursos públicos alocados, mas, fundamentalmente, pelos limites decorrentes do modelo de desenvolvimento em curso, que não assegura sustentabilidade ao crescimento econômico com maior igualdade. Ao atuar sobre os efeitos e não sobre as causas das desigualdades estruturais, tais políticas redistributivas têm sua capacidade limitada pela expansão do ciclo econômico na dependência dos preços das commodities nos mercados consumidores. A proposta de uma mudança estrutural defendida pela Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe CEPAL (12) coloca o aumento da produtividade industrial e o emprego formal como eixos centrais do desenvolvimento com igualdade. Só será possível alterar o padrão estrutural de desigualdades com um modelo de desenvolvimento que incorpore produtividade de forma a produzir maior excedente e aumentar a massa salarial de forma sustentável. O caráter pró-cíclico do gasto social –- que aumenta quando a economia cresce e diminui na recessão – - é uma expressão da capacidade de financiamento do Estado. Por outro lado, a capacidade distributiva depende de políticas fiscais e tributárias que sejam efetivamente progressivas – ou seja, quem mais ganha mais paga - o que se distancia da situação atual. A redistribuição por meio de transferências condicionadas não altera a desigualdade do sistema tributário, já que os novos consumidores estarão pagando uma parte significativa do que ganham em impostos sobre os produtos que consomem. Apesar de a carga tributária brasileira ser considerada elevada em relação à média da América Latina, ela não se diferencia do padrão regional por ser extremamente regressiva, sendo aqueles que ganham até dois salários mínimos despendem quase 50% com impostos enquanto para os que ganham mais de 30 salários mínimos a carga tributária não ultrapassa 25% de sua renda. Apesar de dinamizarem a economia, 56% dos recursos despendidos com o Bolsa-Família retornam aos cofres públicos sob a forma de impostos (IPEA fev. 2011) 412 Ao dissociar a análise da ascensão da classe C das condições de emprego e trabalho opera-se uma descontextualização de cunho político e ideológico, que impede a tematização da superexploração e endividamento dessa população. Tal parcela da classe trabalhadora englobada sob esse conceito é identificada por cumprir longas jornadas de trabalho, com ritmos muitas vezes extenuantes, recebendo aquém do mínimo necessário, o que a leva a recorrer a frequentes endividamentos, além de possuir vínculos de trabalho precarizados (13). A reação da mídia e da sociedade à recente equiparação dos direitos das empregadas domésticas aos demais trabalhadores mostra como a superexploração do trabalho, no país com o maior contingente mundial de trabalhadoras domésticas, é banalizada e justificada. O desigual tratamento desta parcela da classe trabalhadora conhecida está demarcado também pelo território, sentido socioespacial atribuído às inchadas periferias urbanas para designar a precariedade de oferta de bens públicos e condições adequadas de vida. Precariedade que inclui moradia, escola, transporte, creches, equipamentos culturais, saneamento, unidades de saúde, áreas de lazer, etc. a A essa ausência ou precariedade da oferta de bens públicos essenciais associa-se, na maioria das vezes, à péssima qualidade e falta de efetividade dos serviços como de educação e saúde. Além disso, a ocupação territorial das periferias e favelas por grupos armados de traficantes ou de milicianos colocou a questão da violência no cotidiano das famílias, e a coerção estatal como a presença mais expressiva da política pública. Diante dessas condições materiais de produção e reprodução a que estão submetidos os trabalhadores da chamada classe C, seja nas periferias urbanas seja no campo, torna-se imprescindível qualificar a melhoria recente da distribuição de renda, para além de um processo político-ideológico de fabricação de um novo imaginário social. A hegemonia de certo discurso econômico que fala da renda e consumo mínimos ignorando as condições econômicas em que se dá a produção e reprodução dessa população, mostra como ele se tornou essencial para construção dessa ordem. O sucesso político dessa disciplina em estabelecer um discurso de verdade (14) – capaz de 413 interditar qualquer discussão mais séria sobre o conceito de classe – - gera condições normativas que definem o bom e o ruim, o normal e o patológico, constituindo-se em importantes instrumentos de poder. Nelas, a manutenção do ordenamento que expurga os conflitos passa a ser essencial para permitir a convivência com uma realidade cada vez mais ameaçada pela precariedade das condições de produção e de exigibilidade dos direitos sociais. Desnecessário dizer que o recente aumento da renda dos trabalhadores é crucial para o desenvolvimento e para a consolidação democrática. No entanto, as condições estruturais de produção e exploração do trabalho, que aumentam a precariedade e reduzem direitos não são questionadas, terminando por substituir cotidianamente uma parte da população que ultrapassou a linha da pobreza por outra que acabou de cruzá-la no sentido inverso. II – Condições de Subjetivação e Reprodução As políticas sociais devem ser vistas tanto como instrumentos na reprodução dos trabalhadores como das subjetividades que são conformadas a partir da interpelação que realizam aos vários agentes sociais, projetando condições de sociabilidade. Ou seja, uma política social não é só um montante de recursos transferidos, ela é parte de um projeto de construção de sociedade. A fabricação da classe média, ao deslocar-se desde a proposição dos sistemas universais de proteção social e inclusão no mercado de trabalho para os programas de transferência de renda, indica a construção social de outro projeto político e uma nova sociabilidade, cujas possíveis consequências merecem ser exploradas em vários aspectos. O sociólogo alemão Max Weber (15) nos ensina que o poder econômico não é idêntico ao poder como tal, porque a ordem social diz respeito à forma pela qual a honra social se distribui numa comunidade. Essa distribuição é fruto do entrelaçamento existente entre a ordem econômica, a ordem social e a ordem política. Mesmo que a ordem social seja condicionada pela ordem 414 econômica, ela produzirá códigos próprios que distinguirão as elites pelos hábitos exclusivos e não apenas pelo poder econômico. Desta forma, apropriação econômica e honra social conjuntamente potencializam o exercício da dominação e a apropriação do excedente e dos fundos públicos. Paradoxalmente, o duplo movimento de expansão da ordem econômica capitalista, baseado em relações de exploração de classe e a reação da sociedade organizada em classes em disputa quanto aos aspectos destrutivos nela embutidos (16), levou à construção de uma ordem política democrática, fundada no status igualitário da cidadania, o que permitiu a reprodução capitalista em uma situação de preservação da comunidade de cidadãos (17). A disputa pelos fundos públicos tem no campo das políticas sociais um lugar privilegiado, pois aí é que se podem inserir os interesses dos setores dominados, dependendo da correlação de forças e da orientação ideológica dos governantes. Através das políticas sociais esses fundos são redistribuídos de acordo com o modelo de proteção social vigente. Um desses modelos, o assistencial, utiliza fundos residuais para focalizar sua ação nos grupos mais pobres e vulneráveis, condicionando as transferências de renda a certos comportamentos coercitivamente induzidos. Outro modelo, o de seguro social, busca, por meio de contribuições pretéritas, assegurar o mesmo status das corporações no mercado formal, terminando por reproduzir via política social a estratificação imposta pelo mercado. Apenas no modelo da Seguridade Social a proteção social organiza-se com base ao princípio de justiça social, pelo qual as necessidades se traduzem em direitos de cidadania e dão lugar aos sistemas universais e igualitários de proteção social. Se todas essas políticas pretendem gerar melhorias sociais por meio de benefícios e serviços que representam alguma forma de apropriação dos fundos públicos pelos trabalhadores, seus objetos, princípios, beneficiários, formas interpelativas e incidência na sociabilidade são muito distintos. As políticas focalizadas, por mais importantes que sejam em relação ao valor dos benefícios e à melhoria da qualidade de vida dos beneficiados, os interpelam a partir do atributo da pobreza, vista como um risco individualizado ou, na melhor das hipóteses, tomando em conta a situação do grupo familiar. A pobreza deixa 415 de ser contextualizada como resultante das relações de produção e exploração para ser cristalizada em ausências: de capacidades, recursos e ativos. As transferências condicionadas visam preencher essas ausências, assegurando melhor nível de vida e quiçá, oportunidade para os mais empreendedores transporem essa linha de dependência. A noção igualitária da cidadania é denegada pela política que separa os pobres da comunidade de cidadãos, gerando assim uma cidadania invertida, que se plasma na existência de benefícios sem direitos, beneficiários sem sujeitos. Porém, produz consumidores. O modelo de seguro social, que esteve na base da construção das políticas do estado nacional-desenvolvimentista, restringiu os benefícios aos trabalhadores organizados e inseridos no mercado formal de trabalho, o que, nas condições de heterogeneidade da classe trabalhadora, gerou o padrão regional de proteção estratificado para os trabalhadores formais e excludente para todos os demais. Neste caso, ao invés da igualdade de direitos, os benefícios se transformaram em privilégios a serem barganhados pelos que tinham maior capacidade de pressão. As lutas sociais pela democratização assumiram a universalização dos direitos sociais de cidadania como uma de suas principais bandeiras, o que terminou por se corporificar no texto constitucional em uma Ordem Social orientada pela primazia do bem–estar do trabalho e da justiça social, assegurando direitos universais por meio da consolidação de sistemas de proteção social universais, descentralizados e participativos. A institucionalidade da Seguridade Social, em especial na saúde com o SUS e na assistência com o SUAS, representou uma inovação importante, cujo maior significado político pode ser atribuído à sua capacidade de interpelação da cidadania ativa, em busca da construção de uma sociedade inclusiva e justa. As necessidades especiais de indivíduos e grupos, assim como as condições sociais dos contribuintes foram desvinculadas dos benefícios, de tal forma que a universalidade dos direitos pudesse reduzir as profundas segmentações sociais existentes. Nesse sentido, a universalidade desenhava um projeto de coesão social a ser alcançado por meio do protagonismo da participação da 416 sociedade na disputa dos fundos públicos e da gestão das políticas sociais, com vistas a fortalecer a autoridade pública. Desta forma, buscava-se a desmercantilização da reprodução social dos trabalhadores colocando o Estado como garantidor do direito e dos sistemas de proteção e retirando direitos e benefícios sociais do circuito de acumulação capitalista. No entanto, esse projeto foi transmutado ao longo de sua implementação, dando lugar a uma remercantilização da proteção social, com a crescente penetração dos interesses empresariais na apropriação dos recursos destinados às políticas sociais, em especial na área de saúde e educação. É patente a subordinação das políticas sociais à lógica da acumulação, favorecendo com subsídios, isenções, contratos e parcerias, tanto o capital financeiro por meio dos seguros privados quanto o consumo de insumos e serviços cuja provisão é cada vez mais reservados às empresas privadas. Que estrutura social tal política, que individualiza riscos e mercantiliza a provisão, está fabricando? A propalada mobilidade social ascendente não tem sido capaz de vincular a ação pública à construção da subjetividade como parte de um projeto coletivo de transformação social, que assegure direitos universais e coesão social dentro da comunidade de cidadãos. Ao esvaziar a política e substituí-la pela economia como o código de ordenamento dos comportamentos e das ações públicas e privadas, os conflitos na distribuição dos fundos públicos são escamoteados. A disputa pela associação da reestratificação social a novos padrões de consumo e sua dissociação dos sistemas universais de proteção conjuga-se com a crescente privatização das políticas sociais, distanciando-se dos ideais igualitários e redistributivos que só podem ser alcançados com o fortalecimento da ordem política. Não resta dúvida que é mais fácil fabricar a classe média que construir uma sociedade solidária, coesa e justa. Bibliografia 417 1– LECHNER, N. El malestar com la política y la reconsctrucción de los mapas políticos. In: Calderón y Lechaner – Más Allá Del Estado, más Allá Del mercado: la democracia. Bolívia, Plural, 1998 2- NUN, J. – Sobrepopulación relativa, ejército de reserva y masa marginal. Revista Latinoamericana de sociologia, v. 5 (2), jul. 1969 3- KOWARICK, L. Capitalismo e Marginalidade na América Latina. Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1981 4- FERNANDES, F. – A Revolução Burguesa no Brasil. Rio de Janeiro. Zahar Editores, 1976 5- FLEURY, S – Estados sem Cidadãos. Rio de Janeiro. FIOCRUZ, 1994 6- REIS, E. – Processo e Escolhas – estudos de sociologia política, Rio de Janeiro, Contra Capa, 1998 7- GUIMARÃES, A. – As Classes Perigosas: banditismo rural e urbano, Rio de Janeiro, Graal, 1981 8 – STANDING, G- Precariato – the new dangerous class. Boletim diplo Outras Palavras; acessado em 29/06/2012 9 – ANTUNES, R. A nova morfologia do trabalho. Nueva Sociedad. Junho 2012. WWW.nuso.org 10 - AFONSO, L. E. et alii- O salário mínimo como instrumento de combate à pobreza extrema: estariam esgotados seus efeitos? In Economia Aplicada, vl. 15, n 4, 2011, PP 559-593 11- FRISCHATK, C. A social democracia brasileira: seu momento de definição. INAE, Rio de Janeiro, 2012. 12- CEPAL – Cambio Estructural para la Igualdad, Chile, 2012 13- LUCE, M. L. Brasil: Nova classe média ou novas formas de superexploração da classe trabalhadora? Trab. Educ. Saúde, Rio de Janeiro, vol 11 n1, p.169-190, jan/abr.2013 418 14- FOUCAULT, M. Microfísica do poder, Rio de Janeiro, Graal, 1979 15- WEBER, M. Classe, Status, Partido. In: Velho, Palmeira e Bertelli (org.) Estrutura de Classes e Estratificação Social, Rio de Janeiro, Zahar, 1976, PP 61-83 16 - POLANYI, K. A grande transformação. Rio de Janeiro, Campus, 1980. 17 - Marshall, TH. Cidadania, classe social e Status, rio de Janeiro, Zahar, 1967 419 7.5 Do Welfare ao Warfare State no Brasil A sociedade brasileira vive nas últimas três décadas o desafio de construir um país democrático, a depender da retomada do desenvolvimento econômico compatibilizada com a efetiva redistribuição social, dentro de um quadro de estabilidade institucional. Recentemente, o debate democrático tem se concentrado no pilar institucional, enfatizando a transparência e o arranjo entre os poderes da República, como se as questões culturais e redistributivas já estivessem equacionadas. Ao contrário, constata-se que está havendo uma transmutação regressiva do social, com a presença de valores conservadores, uma articulação nefasta entre política e moralismo religioso, além do incentivo ao empreendedorismo individual e ao consumismo em detrimento de formas solidárias de sociabilidade e da existência de mecanismos institucionais de proteção social pública. Esse movimento têm nos afastado cada dia mais dos ideais de democracia social que foram corporificados no texto constitucional. Essa transformação vem sendo feita sem alarde, mas com grande impacto, pois tem sido capaz de transformar o projeto original do Estado do Bem-Estar Social (Welfare State) em um estado de gestão empresarial e militarizada (Warfare State), cujas consequências políticas e sociais estão por ser avaliadas. A construção da democracia brasileira tem como marco a Constituição Federal de 1988, onde se corporificou um projeto de democracia social que respondia aos anseios societários de construção de uma nova institucionalidade sob o primado da justiça social. O desafio de promover a inclusão social e a redistribuição de renda em uma das sociedades com maior nível mundial de desigualdade teve de enfrentar vários entraves, mas contou com a organização da sociedade civil em torno da reivindicação de direitos sociais e da construção de sistemas universais de proteção social, estruturados de forma descentralizada e participativa como requisitos fundamentais para universalização da cidadania. Ao criar a Ordem Social, pela primeira vez os direitos sociais deixavam de ser subsumidos no capítulo da Ordem Econômica, onde existiam 420 exclusivamente como direitos do trabalhador, passando à condição de direitos universais da cidadania. No entanto, a institucionalização deste ordenamento constitucional se deu em um novo contexto político e econômico, com o predomínio dos ditames neoliberais de predomino do mercado e das políticas de ajuste fiscal. Tais medidas implicaram na subversão das condições necessárias ao desenvolvimento de políticas públicas que assegurassem a transformação dos direitos-na-lei em direitos-em-exercício. Ademais das condições estruturais que sempre reproduziram a desigualdade e exclusão social de forma persistente, concorreram para contaminar o modelo de Estado do Bem-Estar Social (WS) desenhado para a democracia brasileira, diferentes ordens de limitantes. Dentre eles destacamos fatores tais como: culturais, com o predomínio dos valores individualistas e de consumo; ideológicos, com a valorização da lógica do mercado como melhor provedor de bens coletivos; políticos, fruto de um sistema político organizado como presidencialismo de coalizão, o que terminou por aprisionar os partidos mais modernos na velha dinâmica de barganha de prebendas em troca de lealdade dos setores conservadores e religiosos, majoritários no Congresso; administrativos, em função da deterioração dos salários do funcionalismo público, perda de quadros qualificados e opção pela substituição de prestadores públicos por provedores privados; econômicos, com a subordinação da política econômica à dinâmica especulativa financeira e às necessidades de controle inflacionário, o que se traduziu na adoção de elevadas metas do superávit fiscal ao lado da manutenção de altíssimas taxas de juros. Ambas as medidas foram responsáveis pelo aumento do déficit público e redução do investimento, impacto negativo na atividade industrial, aumento da taxa de desemprego, além da incapacidade estatal de financiamento das políticas sociais. A resultante da busca de construção de uma democracia social em condições tão adversas é hoje não apenas uma questão teórica em aberto, quanto inspira, no Brasil, as lutas políticas de resistência ao desmantelamento da proposta constitucional e a busca de novas estratégias de institucionalização das políticas sociais em situações desfavoráveis. 421 Ainda assim, muitos preceitos já foram des-constitucionalizados, em especial na área dos direitos previdenciários que impõe custos mais elevados ao governo e empresários. O financiamento da Seguridade foi sempre alvo de disputas e de tensão, já que a destinação de fontes específicas para formação de um orçamento completamente separado do orçamento fiscal e integrado apenas pelos gastos com previdência, saúde e assistência nunca foi efetivamente cumprida. Houve também uma reversão das prioridades desde as políticas universais em prol de novas políticas do tipo focalizadas, gerando um híbrido institucional neste campo da Seguridade Social. Enquanto isso, outras diretrizes constitucionais, apesar de mantidas, não foram regulamentados ou suficientemente respeitadas, de forma que deram espaço a novas articulações entre Estado e mercado, em especial no caso da saúde. Ficou assim caracterizada a existência de uma espécie de institucionalidade oculta, já que interesses mercantis passaram a circular no interior dos sistemas públicos universais, cujo desenho original foi orientado pelo princípio da desmercantilização da proteção social. Esta condição de ocultamento da circulação de mercadorias, subsídios, lógica de gestão, compras de serviços e insumos, promiscuidade de inserções profissionais e dupla porta de entrada para usuários, permite que, mesmo estando à margem da lei, ou operando em suas brechas, esta institucionalidade favoreça interesses particulares em detrimento da dimensão pública das políticas sociais. O pior efeito do ocultamento é que este fato não chega a ser tematizado na agenda governamental. Esta prevalência do mercado se mantém e se amplia, mesmo face à crise do neoliberalismo. A reação dos governos progressistas se fez sentir na busca da retomada do desenvolvimento econômico nacional desta vez com ênfase no combate à pobreza, ainda que limitada pelo constante temor de volta do desequilíbrio inflacionário. Recentemente, foram tomadas medidas de políticas públicas voltadas para impulsionar o desenvolvimento, tais como: transferências de renda; distribuição de subsídios a setores industriais, aumento sustentado do salário mínimo e do crédito popular; ampliação do investimento público. Tais medidas expandiram 422 tanto o consumo popular como a capacidade competitiva de alguns grandes grupos nacionais, fortemente apoiados por investimento público, além de seu poder de definição da agenda pública. A redução da pobreza, fruto tanto do crescimento econômico quanto das políticas salariais e de assistência social, contribuiu para o clima de otimismo e de consolidação da institucionalidade democrática no Brasil. Já o impacto na diminuição da desigualdade foi enfraquecido pela constante negação do acesso à população mais pobre a serviços públicos de qualidade em áreas como educação, saúde, transporte, saneamento e moradia. Esta mudança de rumo no contexto pós-neoliberal não se caracterizou pela sua superação ou pela retomada do projeto social democrata. O social fora traduzido constitucionalmente na década de 1980 em termos de direitos universais de cidadania a serem assegurados por um Estado democrático, descentralizado, laico, participativo e com mecanismos solidários que deveriam se traduzir em um sistema tributário progressivo e em contribuições sociais exclusivas. Já a resignificação do social a partir dos anos 1990 afasta-se dos sistemas universais dos direitos sociais, onerosos para um estado endividado e se transmuta em programas e políticas focalizados de combate à pobreza. Políticas sociais já não falam de direitos coletivos, mas de necessidades e riscos familiares que devem ser enfrentadas por meio de transferências condicionadas de rendas mínimas. Esta disputa de significados sobre a qualificação do social é ideológica, mas também político-institucional. Em torno destes dois modelos se articularam duas coalizões com projetos distintos de sociedade. No entanto, esta disputa não é um jogo de soma zero, envolvendo perdedores e ganhadores dos dois lados. Institucionalmente o modelo da Seguridade Social da CF/88 terminou por se impor e as políticas focalizadas deixaram de ser uma alternativa às políticas universais, encontrando sua inserção institucional no interior de sistemas de políticas sociais que têm como referente a cidadania. 423 Já do ponto de vista político-ideológico a disputa foi claramente favorável às políticas focalizadas, que ganham espaço na mídia como as principais responsáveis pela atual reestratificação social que culminou com ampliação da classe média. Ao invés da noção de direitos, como articuladora das relações e das normas que orientam as políticas, o que qualifica o social, neste caso, é a capacidade de consumo desta nova classe emergente. Compatível com uma visão de sociedade que, cada vez mais, valoriza o consumo e a ascensão vista dede a perspectiva de empreendedorismo, a agenda pública passa a ser construída predominantemente por atores poderosos como a mídia e o mercado. A política social adequada é vista como sendo aquela que retira o pobre da situação limite por meio de transferências públicas mínimas, de forma a aumentar seu poder de consumo sem desestimulá-lo ao trabalho. Sem representar também um custo demasiadamente alto para os empregadores ou comprometer o déficit público. Ao contrário, o combate à exclusão por meio de instrumentos de crédito e transferências é associado à capacidade de ampliação do mercado nacional e redução da vulnerabilidade da economia às crises internacionais. Porém, um novo movimento de redefinição do social começa a se configurar a partir da necessidade de enfrentamento da violência urbana e do que se convencionou chamar cidade partida, para designar a fratura social e jurídica entre as populações residentes em diferentes zonas urbanas. Medidas pontuais como programas de urbanização não alcançaram modificar essa situação de apartação e o crescimento do domínio de narcotraficantes sobre os territórios das favelas terminou gerar uma sensação de medo generalizado, aumentado pela sensação de perda de controle estatal sobre a cidade, barbarizada pelas guerras entre facções de traficantes rivais. O investimento da cidade do Rio de Janeiro em uma nova inserção internacional, disputando e vencendo a postulação para sede dos megaeventos terminou por comprometer os três níveis governamentais com a urgência de equacionamento do problema da violência urbana, pelo menos na área mais rica e turística. A ocupação militar permanente de algumas favelas em posições estratégicas passou a ser adotada nos últimos anos, sob o nome de Política de Pacificação (UPP). 424 Esta política de ocupação das favelas foi fortemente ancorada no apoio de grupos empresariais, na sua formulação, financiamento e execução. Ela tem prioritariamente um componente repressivo, militar e policial, que busca garantir a ocupação e domínio estatal destes territórios e o controle sobre suas populações. No entanto, seu direcionamento é para a reforma urbana que se está processando rapidamente, com maciços investimentos públicos e privados, e grandes especulações na área de construção civil e imobiliária. Já o componente social é representado por uma miríade de ações de órgãos, governamentais e não governamentais, que buscam capacitar a população da favela para uma melhor integração à cidade. O foco deixa de ser o pobre e suas necessidades básicas, para se deslocar para o território com sua aglomeração habitacional subnormal e para a população favelada cuja sociabilidade é vista como incompatível com a ordem e a formalização necessárias à vida na cidade. O social é concebido como processo de aquisição de habilidades necessárias ao ordenamento dos comportamentos, das moradias, da sexualidade, dos laços familiares e comunitários, das expressões culturais. Os programas e atividades sociais visam ocupar os jovens e adolescentes para evitar que caiam na criminalidade, vista como fruto do ócio, e educar os demais no papel de consumidores e cidadãos que cumprem seus deveres de formalização e pagamento de impostos e serviços. Além de capacitá-los para que possam desenvolver habilidades empresariais e alguns inserir-se de forma vantajosa no mercado. A integração urbana toma a forma de inserção no mercado, na medida em que a própria cidade passa a ser concebida como mercadoria. O ideário de uma cidade participativa, que era parte do projeto de democracia social cede lugar a um imaginário de cidade que se projeta no cenário internacional como uma mercadoria que poderá ser vendida em proveito de todos seus habitantes. Para isto, é preciso que as políticas públicas estejam estreitamente vinculadas aos interesses dos grupos empresariais que passaram à condição de sócios privilegiados do governo. 425 Os benefícios atribuídos à pacificação das favelas, em relação à presença armada do tráfico, são sentidos pela população da cidade e também pelos moradores das favelas. No entanto, a opinião pública desconhece os conflitos que se apresentam no cotidiano das favelas, onde a ordem repressiva passa a predominar sobre qualquer ordenamento jurídico existente, transformando esta conquista em um tipo de Estado de exceção, cidade de exceção, cidadania de exceção. Mas, é preciso reconhecer que esse modelo decisório sem transparência, participação ou controle social, é um modelo de gestão autoritária, que mina as bases da recente construção democrática brasileira, onde regime de exceção vira regra. Palavras chave: cidade, metrópole, segurança, pacificação, welfare state, política, polícia, conservadorismo, exclusão social, sociedade, desigualdade. 426 COMPOSIÇÃO E FORMAÇÃO DA EQUIPE DE PESQUISA 1. Composição da Equipe 1.1 Coordenação Geral Sonia Maria Fleury Teixeira – Doutora em Ciência Política Professora Titular e Pesquisadora da EBAPE/FGV A equipe de pesquisadores, assistentes, colaboradores e investigadores de campo envolveu um numero significativo de componentes, em geral divididos em equipes constituídas basicamente a partir dos três campos que foram investigados. Também houve casos de participação de pesquisadores dedicados a um tema específico, de seu interesse acadêmico ou de sua especialidade. Um grande número de alunos de cursos de graduação, mestrado e doutorado, de diferentes formações participou da investigação em diferentes momentos do trabalho. Importante ressaltar que a pesquisa atraiu interesse de investigadores de outros países – Estados Unidos, Alemanha, México e Argentina – que participaram em diferentes etapas como colaboradores e foram orientados em suas produções acadêmicas. 1.2 Pesquisadores Assistentes Júlio César Borges dos Santos (Doutorando em Planejamento Urbano, Mestre em Saúde Pública). Juliana Fernandes Kabad (Bacharel em Ciências Sociais, Mestre em Saúde Pública, Doutoranda em Saúde Pública pela Escola Nacional de Saúde Pública – ENSP/Fiocruz). Sabrina Guerghe de Oliveira (Bacharel em Ciências Sociais) Dulcinéia Medeiros (Doutora em Ciência Política pela UERJ, Mestre em Sociologia, Historiadora). Samuel Silva Rodrigues de Oliveira (Doutorando em História do CPDOC/ FGV, historiador) 427 1.3 Pesquisadores estrangeiros em intercâmbio com a EBAPE Chales Heck (Doutorando em Ciência Política na Florida International University). Markus Dammam Quintero, Graduado em Administração Pública, HWR Berlin School of Economics and Law. Alberto de la Rosa Tenorio, Maestría en Políticas Públicas, Universidad Autónoma Metropolitana, Unidad Xochimilco, México. Maria José Luzuriaga, investigadora de la Universidad Nacional de Lanús de Nucleo de Estudios de Derechos Humanos, doutoranda em Saúde Pública pela UFRJ 1.4 Pesquisadores alunos da EBAPE Sabrina Ost (Mestranda em Administração Pública, Cientista Política) Frederico Bertholini Santos Rodrigues (Graduado em Relações Internacionais, Mestre em Estatística, Doutorando em Administração pela EBAPE/FGV). Luiza Moreira Arantes de Castro (Advogada e Administradora, Mestranda em Administração pela EBAPE/FGV). Karina Furtado Rodrigues (Administradora, Mestranda em Administração pela EBAPE/FGV). Alexandre Lima Baião (Mestrando em Administração pela EBAPE/FGV). Roberto Souza Greenhalgh de Oliveira (aluno do Mestrado Executivo em Administração Pública da EBAPE) 1.5 Pesquisadores Colaboradores com outros vínculos Cláudia Prezzoto (Mestre em Administração Pública, Historiadora). Consuelo Silva dos Santos (Mestre em Saúde Pública) Priscila Loretti Tavares (Aluna do Doutorado de Ciências Sociais da UERJ) 428 Gabriela Rangel de Moura Santos (Mestre em Saúde Pública, Psicóloga). Thales Santos (graduado em Ciência Sociais) 1.6 Bolsistas PIBIC/CNPq ou PROPESQUISA/EBAPE Caroline Oliveira de Mendonça (Odontóloga, Especialista em Saúde Pública, Bolsista PROPESQUISA/EBAPE). Aneci Palheta dos Santos (Comunicadora com especialização em Comunicação Comunitária, Bolsista PROPESQUISA/EBAPE). Clara Gomes Polycarpo Peres (Graduanda em Ciências Sociais – UFF, bolsista PROPESQUISA EBAPE - FGV). Isadora Silva de Araujo (Graduanda em Ciências Sociais – UFRJ, bolsista CNPq/ PIBIC). Emilia Dias (Graduanda em Ciências Sociais – UFRJ, bolsista CNPq/ PIBIC). Monique Bezerra de Menezes (Observatório de Favelas, Bolsista PROPESQUISA/EBAPE) 2. Formação Acadêmica da Equipe e alunos da EBAPE Sendo uma pesquisa multidisciplinar, foi necessário um grande empenho na preparação da equipe através de disciplinas acadêmicas e seminários de formação teórico-metodológicos. O maior desafio foi devido ao fato da investigação envolver conhecimentos nas áreas de políticas públicas, administração e gestão em redes, teoria da cidadania e democracia, dentro outros. Ademais, buscou-se conjugar técnicas qualitativas e quantitativas na coleta dos dados, o que requereu a busca de uma formação básica que permitisse a todos os pesquisadores trabalhar a partir de um marco analítico comum, com a permanente interação entre dados quantitativos e qualitativos. O trabalho qualitativo, de observação participante e entrevistas requereu preparação sistemática da equipe, ao longo de todo o processo de investigação, com elaboração conjunta de roteiros de entrevistas, técnicas de 429 simulação (roll play), discussão de relatos de entrevistas e observações, estudos de textos de metodologia de investigação qualitativa. Em relação à formação teórica foram oferecidas duas disciplinas no mestrado acadêmico nos anos de 2011 e 2012, frequentadas por alunos regulares e pelos pesquisadores da equipe. As disciplinas oferecidas foram: Políticas Públicas Políticas Sociais, Cidadania e Exclusão Além disso, em 2012 foi oferecida uma Disciplina Tutorial de Política Social, exclusivamente voltada para a formação da equipe da pesquisa. Finalmente, a formação foi completada com os Seminários de Pesquisa, onde, semanal ou quinzenalmente, a equipe se reunia para discutir coletivamente aspectos teóricos e metodológicos relacionados ao trabalho de campo. Em cada reunião eram apresentados problemas, roteiros, resultados, hipóteses, textos, etc. e as atas dos Seminários de Pesquisa se constituíram em importantes guias para as equipes de campo. Em anexo apresentamos os programas das disciplinas oferecidas no mestrado acadêmico de administração: 430 CONCLUSÃO Depois da apresentação dessa profícua produção fica demonstrado que o projeto foi muito além das expectativas iniciais, cumprindo plenamente seus objetivos e as metas propostas. Assim, fomos exitosos na formação profissional acadêmica em todos os seus níveis, do premiado trabalho de bolsistas de graduação às produções de monografias, dissertações e teses, de profissionais de diferentes instituições nacionais e internacionais. A EBAPE, que não tinha trabalhado esse tema de políticas públicas, em pouco tempo se tornou, através do trabalho do PEEP – Programa de Estudos da Esfera Pública, uma referência no meio acadêmico e para a sociedade em geral. Em termos acadêmicos a demanda de participação de jovens pesquisadores, alunos da EBAPE e de outras prestigiosas instituições, nacionais e internacionais, demonstra que a qualidade do nosso trabalho foi amplamente reconhecida no meio acadêmico. Outro indicador é a própria construção de uma rede de investigares com ampla tradição nesse campo de investigação, da qual o PEEP passou a participar e dinamizar em várias atividades conjuntas. O reconhecimento da sociedade também foi manifesto na crescente demanda por artigos e entrevistas em diferentes mídias nacionais e internacionais, das mais tradicionais às mais alternativas, mostrando que o trabalho acadêmico desenvolvido foi visto como um importante instrumento analítico da dinâmica social que estamos atravessando na cidade e no país. A participação e apresentação de trabalhos em congressos internacionais e nacionais cumpriu a meta de produção acadêmica, superandoa em termos quantitativos e qualitativos, considerando a capacidade de difusão dos resultados da pesquisa e da articulação com outros especialistas, gestores e lideranças de favelas, enfim, do conjunto de atores envolvidos na implementação da política pública estudada. A publicação de artigos em revistas e periódicos acadêmicos de alto nível também contribuiu para atingir e superar as metas propostas, demonstrando não só a importância do objeto de estudo, mas também da 431 metodologia e dos recursos analíticos empregados, que caracterizaram a pesquisa como original. A utilização de imagens e vídeos, em especial a difusão dos produtos da pesquisa em meio audiovisual e em canal aberto – youtube – permitiu que os resultados exitosos do Seminário “Favela é Cidade”, no qual interagiram lideranças populares, moradores, intelectuais e gestores, pudesse ser amplamente difundida nacional e internacionalmente, constituindo-se em material didático de grande utilidade. Em todos os trabalhos divulgados foi empregada a mesma sistemática ao buscar aliar o mais alto rigor acadêmico, respaldado por sólidas análises teóricas dos resultados e dados obtidos, como também o compromisso com a indicação de necessidades e possibilidades de correções dos rumos da política pública em estudo, de forma a torna-la mais efetiva e eficaz, além do objetivo maior de promoção da inclusão social por meio da construção de cidadãos autônomos e emancipados, em uma sociedade menos injustamente estratificada e menos autoritária no seu processo de decisão e implementação de políticas públicas. Os desafios de trabalhar com um objeto interdisciplinar, em um campo para o qual convergiram políticas tão amplas e complexas, tais como de segurança pública, políticas sociais, políticas urbanas foi superado tendo como foco muito claro a promoção da cidadania e a construção do Estado Democrático do Bem-Estar Social. A imbricação de literaturas de campos diversos se deu pela busca da articulação entre o estudo de redes de políticas públicas, redes de associativismo, direitos humanos e militarização do social, rearticulação das relações Estado, mercado e comunidade, mobilidade ascendente dos setores populares e construção de políticas de bem-estar social. Temas inicialmente previstos de serem enfocados como questões relativas à juventude e mulheres, infelizmente não puderam ser abordados, dado a sua especificidade, mas deverão ser objeto de estudos futuros. A construção de vários Bancos de Dados nos permite divisar que temos um material de grande qualidade em várias áreas, que nos permitirá produzir vários artigos, como por exemplo, sobre o papel das mídias na produção social da política, da sociabilidade e das formas de resistência. 432 Também deverão ser melhor exploradas as inúmeras informações sobre as várias políticas públicas, que constituem um Banco de Dados especial, além do papel de alguns atores que se mostraram estratégicos na formulação e implementação da política, assim como na organização e resistência da população ao exercício arbitrário do poder. 433 LISTAGEM BIBLIOGRÁFICA ABRAMO, Pedro. Mercado imobiliário na favela: Características e impacto do programa Favela-Bairro. Relatório parcial. Rio de Janeiro: UFRJ/IPPUR, 1997. ABRIC, J-C. Les représentation sociales: aspects théoriques. In: Abric, J-C. (Org). Pratiques Sociales et Représentations. Paris: P.U.F., 1994a, p. 11-35. ADORNO, Sérgio. 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