estratégia saúde da família
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estratégia saúde da família
Fundação Educacional de Divinópolis - FUNEDI Universidade do Estado de Minas Gerais - UEMG Mestrado em Educação, Cultura e Organizações Sociais ESTRATÉGIA SAÚDE DA FAMÍLIA: QUALIDADE DA ASSISTÊNCIA SOB A PERSPECTIVA DA SATISFAÇÃO DO USUÁRIO Simone Maria Silva Santos Divinópolis Junho 2008 Simone Maria Silva Santos ESTRATÉGIA SAÚDE DA FAMÍLIA: QUALIDADE DA ASSISTÊNCIA SOB A PERSPECTIVA DA SATISFAÇÃO DO USUÁRIO Dissertação apresentada ao Curso de Mestrado em Educação, Cultura e Organizações Sociais, da Universidade do Estado de Minas Gerais, Campus Fundação Educacional de Divinópolis, como requisito parcial para obtenção do título de mestre. Área de concentração: Estudos Contemporâneos Linha de pesquisa: Saúde Coletiva Orientador: Prof. Dr. Paulo Sérgio Carneiro Miranda Co-orientadora: Profª. Ms. Eliete Albano Azevedo Guimarães Divinópolis Junho 2008 S237e Santos, Simone Maria Silva Estratégia saúde da família: qualidade da assistência sob a perspectiva da satisfação do usuário [manuscrito] / Simone Maria Silva Santos - 2008. 141 f., enc. il. Orientador : Paulo Sérgio Carneiro Miranda Co-Orientador: Eliete Albano Azevedo Guimarães Dissertação (mestrado) - Universidade do Estado de Minas Gerais, Fundação Educacional de Divinópolis. Bibliografia: f. 127-134 1. Saúde da família. 2. Satisfação do usuário. 3. Qualidade da assistência. I. Miranda, Paulo Sérgio Carneiro. II. Guimarães, Eliete Albano Azevedo. III. Universidade do Estado de Minas Gerais. Fundação Educacional de Divinópolis. IV. Título. CDD: 362.14 Dissertação intitulada “Estratégia Saúde da Família: qualidade da assistência sob a perspectiva da satisfação do usuário”, de autoria da mestranda Simone Maria Silva Santos, aprovada pela banca examinadora constituída pelos seguintes professores: _____________________________________________________ Prof. Dr. Paulo Sérgio Carneiro Miranda (Orientador) UFMG ____________________________________________________ Prof. Dr. Alysson Rodrigo Fonseca FUNEDI/UEMG ____________________________________________________ Prof. Dr. Eduardo Sérgio da Silva UFSJ Mestrado em Educação, Cultura e Organizações Sociais Fundação Educacional de Divinópolis Universidade do Estado de Minas Gerais Divinópolis, 27 de Junho de 2008. AUTORIZAÇÃO PARA A REPRODUÇÃO E DIVULGAÇÃO CIENTÍFICA DA DISSERTAÇÃO Autorizo, exclusivamente para fins acadêmicos e científicos, a reprodução total ou parcial desta dissertação por processos de fotocopiadoras e eletrônicos. Igualmente, autorizo sua exposição integral nas bibliotecas e no banco virtual de dissertações da FUNEDI/UEMG. Simone Maria Silva Santos Santo Antônio do Monte, Julho de 2008. Dedico este trabalho aos meus pais, exemplo de determinação, coragem, fé e humildade. Apoio certo em meio às tribulações da vida e razão do meu caminhar. AGRADECIMENTOS A Deus que me concedeu o dom da vida e me deu força e resignação para chegar ao fim de mais uma jornada. Aos meus amados pais por estarem ao meu lado nos momentos mais difíceis de minha vida, me incentivando, me rodeando de carinho e sempre apostando em mim. Agradeço pelo suporte, educação e confiança. Tudo começou pelas mãos de vocês. Ao Marcinho pelo amor, pela compreensão em relação as minhas intolerâncias, ansiedades e ausências e por acreditar em mim como pessoa e profissional. Ao Rique pela atenção e disponibilidade. Ao meu orientador Dr. Paulo Sérgio Carneiro de Miranda e minha co-orientadora Ms. Eliete Albano Azevedo Guimarães que me acompanharam desde a graduação, agradeço pela formação e contribuição no meu crescimento enquanto ser humano. Especialmente nesta última etapa de minha trajetória acadêmica agradeço por acreditarem em minha idéia e estarem ao meu lado compartilhando conhecimentos, carinho, amizade e alegria. Aos Prof. Dr. Eduardo Sergio Silva e Prof. Dr. Gil Sevalho por suas contribuições na elaboração do presente trabalho. Ao Prof. Dr. Alysson Rodrigo Fonseca pelas importantes sugestões concedidas no exame de qualificação. A Secretaria Municipal de Saúde na pessoa do Secretário Municipal de Saúde Sr. Martim Rodrigues Santos e da Coordenadora da Saúde da Família no município Srta. Amélia Bueno Fernandes, pelo apoio. Aos usuários que aceitaram participar do trabalho, disponibilizaram seu tempo e me receberam com tanto carinho. Às Equipes Saúde da Família do município, especialmente às enfermeiras e aos ACS, pelo acolhimento e contribuição na concretização deste trabalho. A Raquel e Michele pelo auxílio na coleta de dados. Aos amigos e colegas da UNIPAC – Campus Bom Despacho, especialmente a Vânia, Carla, Elaine e Eduardo pelo companheirismo, incentivo e apoio. Aos meus alunos do Curso de Graduação em Enfermagem pela compreensão e carinho. A amiga Thaty pelos momentos de distração e alegria, imprescindíveis à renovação da alma. RESUMO A Estratégia Saúde da Família foi implantada no Brasil há duas décadas com o objetivo de reorganizar a Atenção Primária em Saúde, levando em consideração os mais diversos fatores que influenciam no modo como as pessoas adoecem ou permanecem saudáveis, propiciando uma nova forma de cuidado em saúde. Frente à reestruturação da Atenção Primária em Saúde o Ministério da Saúde coloca a necessidade de avaliar a qualidade da assistência, principalmente sob a ótica da satisfação do usuário, uma vez que este tipo de avaliação viabiliza diretrizes para o processo de planejamento e possibilita um controle técnico e social dos serviços oferecidos a população. Assim sendo, o objetivo geral este estudo é avaliar a qualidade da assistência à saúde oferecida pela Estratégia Saúde da Família no município de Santo Antônio do Monte – MG, segundo a perspectiva da satisfação dos usuários. Trata-se de um estudo de caráter exploratório- descritivo, com abordagem quali-quantitativa. A população alvo foi composta por 188 usuários das seis Unidades Saúde da Família da zona urbana do município. Os dados foram coletados no domicílio do usuário por intermédio de entrevista semi-estruturada. Utilizou-se como dimensões analíticas a infra-estrutura, a acessibilidade, a relação equipe-usuário, a resolutividade e as ações promocionais em saúde. Realizou-se a análise dos dados qualitativos e quantitativos simultaneamente, sendo os dados quantitativos processados e descritos de acordo com sua freqüência e os dados qualitativos analisados segundo a análise temática, sendo identificados quatro temas para indexação de conteúdos: caracterização da acessibilidade na Saúde da Família; humanização da assistência: diferencial do cuidado em saúde; A qualidade da assistência; promoção da saúde: entre a teoria e a prática. Identificou-se, de modo geral, elevado grau de satisfação por parte dos usuários em relação à Saúde da Família, contudo, ao aprofundar nas narrativas percebeuse contraditoriamente, insatisfação em relação a algumas variáveis analisadas. Os usuários apontaram como pontos de grande satisfação a infra-estrutura e aparência das Unidades Saúde da Família, espaços privilegiados para a promoção da ambiência, relações equipeusuário humanizadas e afetivas que fazem a diferença no cuidado em saúde. As insatisfações decorreram da ausência do profissional médico em algumas Equipes Saúde da Família, fator que dificultou a acessibilidade organizacional, a coordenação e a integralidade da assistência. Evidenciou-se, também a dificuldade dos usuários em conceituar promoção da saúde e a desvalorização em relação às ações desenvolvidas pela Equipe Saúde da Família, inerentes a este campo. Estudos envolvendo a qualidade da assistência sob a perspectiva do usuário são peças chave para o processo decisório e propiciam melhor adequação dos serviços de saúde. Assim sendo, é reconhecida a importância de se estender esses estudos para além do âmbito acadêmico com o objetivo de auxiliar no cotidiano e na gestão dos serviços de saúde, visando o aperfeiçoamento e qualidade da assistência. Palavras-chave: Saúde da Família, Satisfação do usuário. ABSTRACT The Family’s Health strategy was installed in Brazil two decades ago with the purpose of reorganizing the Primary Attention in Health, taking under consideration the many factors which influence the way people get sick or stay healthy, propitiating a new way of health care. Facing the new reestablishment in the Primary Attention in Health, the Health Department sees the necessity of an evaluation the assistance quality, mainly under the vision of the on who uses the system, since this kind of evaluation provides guidelines to the planning process it also makes it possible a technical and social control of the services offered to the population. Thus, the main purpose of this study is to evaluate the health assistance quality performed by the Family’s Health strategy in the city of Santo Antônio do Monte, Minas Gerais, according to the satisfaction of the people who uses it. This study has an exploratory and descriptive character, with a quantity and qualitative approach. The target population was composed by 188 users from all the six Family’s Health Unities from the city. The data was gathered in the dwelling place of each person through a semi-structured interview. We have utilized as analytical dimensions the infrastructure, the accessibility, the staff-user relationship, the resolution and the actions towards the health. It was performed an analysis of all the data both quantitative and qualitative simultaneously, when the quantitative data was processed and described according to its frequency and the qualitative data according to a thematic analysis, being identified four themes for the summarization of the content: characterization the accessibility in the Family’s Health; assistance humanization: a health differential in action; the quality in assistance; health promotion: between the theory and exercise. We have identified, in a general way, a high level of satisfaction by the people who uses the Family’s Health, however, looking deep in the interviews we have perceived a contradictory dissatisfaction towards some points that were analyzed. The users showed as satisfactory points the infrastructure and appearance of the Family’s Health Unities, privileged spaces to the promotion of the environment, the humanized and affective staff-user relationship which made a huge difference in the health care. The dissatisfaction elapsed from the lack of medical professional in some Family’s Health Staffs, which made even more difficult the organizational accessibility, the coordination and integrity of the assistance. It was clear, as well, the users’ difficulty of forming an opinion about the health promotion and depreciation towards the actions performed by the Family’s Health Staff, in relation to this area. Studies involving the quality of the assistance under the users’ point of view are very important to this process and make it possible to adequate the health services. Therefore, we acknowledge the importance of broaden this studies beyond the academic extent, having as the main purpose the assistance in the everyday life and management of the health services, aiming the improvement and quality in assistance. Key words: Family’s Health, Users’ satisfaction. LISTA DE TABELAS 1Distribuição numérica e percentual dos usuários participantes da pesquisa, segundo sexo masculino e idade, município de Santo Antônio do Monte, MG, 2008........................ 73 2Distribuição numérica e percentual dos usuários participantes da pesquisa, segundo sexo feminino e idade, município de Santo Antônio do Monte, MG, 2008.......................... 74 3Distribuição numérica e percentual dos usuários participantes da pesquisa segundo tempo de residência na área, município de Santo Antônio do Monte, MG, 2008................. 75 4Distribuição numérica e percentual dos usuários participantes da pesquisa segundo grau de escolaridade, município de Santo Antônio do Monte, MG, 2008 ............................ 76 5Distribuição numérica e percentual dos usuários participantes da pesquisa segundo a renda familiar, município de Santo Antônio do Monte, MG, 2008....................................... 77 6Distribuição numérica e percentual dos usuários participantes da pesquisa segundo posse de plano de saúde, município de Santo Antônio do Monte, MG, 2008....................... 77 7Distribuição numérica e percentual dos usuários participantes da pesquisa segundo serviços públicos de saúde utilizados, município de Santo Antônio do Monte, MG, 2008 .. 78 8Distribuição numérica e percentual dos usuários participantes da pesquisa segundo serviços utilizados na Unidade Saúde da Família, município de Santo Antônio do Monte, MG, 2008 ....................................................................................................................................... 79 9Distribuição numérica e percentual dos usuários participantes da pesquisa segundo a satisfação com a distância entre a Unidade Saúde da Família e o domicílio do usuário, município de Santo Antônio do Monte, MG, 2008 ............................................................... 82 10Distribuição numérica e percentual dos usuários participantes da pesquisa segundo a satisfação com o horário de funcionamento da Unidade Saúde da Família, município de Santo Antônio do Monte, MG, 2008 ............................................................................................... 84 11Distribuição numérica e percentual dos usuários participantes da pesquisa segundo a satisfação em relação à consulta médica agendada, na Unidade Saúde da Família, município de Santo Antônio do Monte, MG, 2008 ................................................................................ 86 12Distribuição numérica e percentual dos usuários participantes da pesquisa segundo a satisfação em relação à consulta médica eventual, na Unidade Saúde da Família, município de Santo Antônio do Monte, MG, 2008 ..................................................................................... 87 13Distribuição numérica e percentual dos usuários participantes da pesquisa segundo a satisfação em relação ao tempo de espera para consulta médica agendada, na Unidade Saúde da Família, município de Santo Antônio do Monte, MG, 2008 ............................................ 91 14Distribuição numérica e percentual dos usuários participantes da pesquisa segundo a satisfação em relação ao tempo de espera para consulta médica eventual, na Unidade Saúde da Família, município de Santo Antônio do Monte, MG, 2008................................................. 91 15Distribuição numérica e percentual dos usuários participantes da pesquisa segundo a satisfação em relação à disponibilidade para procedimentos, na Unidade Saúde da Família, município de Santo Antônio do Monte, MG, 2008 ............................................................... 94 16Distribuição numérica e percentual dos usuários participantes da pesquisa segundo a satisfação em relação à disponibilidade de medicações, na Unidade Saúde da Família, município de Santo Antônio do Monte, MG, 2008 ............................................................... 94 17Distribuição numérica e percentual dos usuários participantes da pesquisa segundo a satisfação em relação ao acesso à consulta especializada, município de Santo Antônio do Monte, MG, 2008 .................................................................................................................. 97 18Distribuição numérica e percentual dos usuários participantes da pesquisa segundo a satisfação em relação ao acesso à exames complementares, município de Santo Antônio do Monte, MG, 2008 .................................................................................................................. 97 19Distribuição numérica e percentual dos usuários participantes da pesquisa segundo a satisfação em relação à capacidade de comunicação com a Equipe Saúde da Família, município de Santo Antônio do Monte, MG, 2008 ............................................................... 99 20Distribuição numérica e percentual dos usuários participantes da pesquisa segundo a satisfação em relação às explicações oferecidas pelos profissionais da Equipe Saúde da Família, município de Santo Antônio do Monte, MG, 2008................................................. 102 21Distribuição numérica e percentual dos usuários participantes da pesquisa segundo a satisfação em relação ao atendimento por parte do médico da Equipe Saúde da Família, município de Santo Antônio do Monte, MG, 2008 ............................................................... 104 22Distribuição numérica e percentual dos usuários participantes da pesquisa segundo a satisfação em relação ao atendimento por parte do enfermeiro da Equipe Saúde da Família, município de Santo Antônio do Monte, MG, 2008 ............................................................... 106 23Distribuição numérica e percentual dos usuários participantes da pesquisa segundo a satisfação em relação ao atendimento por parte dos técnicos e auxiliares de enfermagem, da Equipe Saúde da Família, município de Santo Antônio do Monte, MG, 2008 ..................... 107 24Distribuição numérica e percentual dos usuários participantes da pesquisa segundo a satisfação em relação ao atendimento trabalho exercido pelos Agentes Comunitários de Saúde, da Equipe Saúde da Família, município de Santo Antônio do Monte, MG, 2008 .... 108 25Distribuição numérica e percentual dos usuários participantes da pesquisa segundo a satisfação em relação à aparência física da Unidade Saúde da Família, município de Santo Antônio do Monte, MG, 2008 ............................................................................................... 110 26Distribuição numérica e percentual dos usuários participantes da pesquisa segundo a satisfação em relação à competência e qualidade técnica da Equipe Saúde da Família, município de Santo Antônio do Monte, MG, 2008 ............................................................... 113 27Distribuição numérica e percentual dos usuários participantes da pesquisa segundo a satisfação em relação ao tempo gasto na consulta médica, na Unidade Saúde da Família município de Santo Antônio do Monte, MG, 2008 ............................................................... 115 28Distribuição numérica e percentual dos usuários participantes da pesquisa segundo a satisfação em relação ao tempo gasto na consulta de enfermagem, na Unidade Saúde da Família município de Santo Antônio do Monte, MG, 2008.................................................. 116 29Distribuição numérica e percentual dos usuários participantes da pesquisa segundo a satisfação em relação qualidade e quantidade de equipamentos, na Unidade Saúde da Família, município de Santo Antônio do Monte, MG, 2008 ............................................................... 118 30Distribuição numérica e percentual dos usuários participantes da pesquisa segundo participação nas ações de promoção da saúde desenvolvidas pela Equipe Saúde da Família, município de Santo Antônio do Monte, MG, 2008 ............................................................... 123 LISTA DE SIGLAS E ABREVEATURAS AIDS- Síndrome da Imunodeficiência Adquirida AIS - Ações Integradas de Saúde APS - Atenção Primária em Saúde CAP - Caixa de Aposentadoria e Pensão CONASP - Conselho Consultivo da Administração Previdenciária DAB - Departamento da Atenção Básica DST- Doença Sexualmente Transmissível ESF - Estratégia Saúde da Família ESF1 - Equipe Saúde da Família IAP- Instituto de Aposentadoria e Pensão IBGE - Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística INAMPS - Instituto de Nacional de Assistência Médica da Previdência Social INPS - Instituto Nacional da Previdência Social OMS - Organização Mundial de Saúde OPAS - Organização Pan-americana da Saúde MS - Ministério da Saúde NOAS - Norma Operacional de Assistência à Saúde OPAS - Organização Pan-Americana de Saúde PACS - Programa Agente Comunitário de Saúde PAP - Programação de Ações Prioritárias PIASS - Programa de Interiorização das Ações de Saúde e Saneamento do Nordeste PNAD- Pesquisa Nacional por Amostras de Domicílios PSF - Programa Saúde da Família SF - Saúde da Família SIAB - Sistema de Informação da Atenção Básica SMS - Secretaria Municipal de Saúde SUDS - Sistema Unificado e Descentralizado de Saúde SUS - Sistema Único de Saúde TFD - Tratamento Fora domicílio USF - Unidade Saúde da Família SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................... 15 2 OBJETIVOS .......................................................................................................... 17 2.1 Objetivo geral .......................................................................................................... 17 2.2 Objetivo específico.................................................................................................. 17 3 REFERENCIAL TEÓRICO ................................................................................ 18 3.1 Saúde-doença: conceitos e contextos ...................................................................... 18 3.1.1 A Antiguidade ......................................................................................................... 18 3.1.2 A Cultura Grega e a Medicina Ocidental ................................................................ 20 3.1.3 A Idade Média ......................................................................................................... 21 3.1.4 A Idade Moderna..................................................................................................... 22 3.1.5 Idade Contemporânea.............................................................................................. 24 3.2 Raízes da Estratégia Saúde da Família: resgate histórico a partir da construção do sistema público de saúde no Brasil.......................................................................... 29 3.3 Caracterizando a Atenção Primária em Saúde: atributos para a organização da Saúde da Família o Brasil .................................................................................................. 37 3.4 A promoção da saúde na conjuntura da Estratégia Saúde da Família .................... 46 3.5 Avaliação em Saúde ................................................................................................ 53 3.5.1 A qualidade na concepção do processo avaliativo .................................................. 55 3.5.2 Satisfação dos usuários: traçando uma proposta de avaliação para a Estratégia Saúde da Família ................................................................................................................ 58 4 TRAJETÓRIA METODOLÓGICA ................................................................... 63 4.1 Referencial teórico-metodológico ........................................................................... 63 4.2 Cenário do estudo.................................................................................................... 65 4.3 Técnica e instrumento para coleta de dados............................................................ 67 4.4 Sujeitos da pesquisa................................................................................................. 68 4.5 Procedimentos éticos e legais.................................................................................. 70 4.6 Análise dos dados.................................................................................................... 71 5 ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS .............................................. 73 5.1 Sujeitos da pesquisa: perfil socioeconômico e utilização dos serviços de saúde.... 73 5.2 Caracterização da acessibilidade na Saúde da Família ........................................... 81 5.3 Humanização da assistência: diferencial do cuidado em saúde .............................. 100 5.4 A qualidade da assistência....................................................................................... 112 5.5 Promoção da saúde: entre a teoria e a prática ......................................................... 121 6 CONSIDERAÇÕES FINAIS................................................................................ 125 REFERENCIAS .................................................................................................... 127 APÊNDICE A ........................................................................................................ 135 APÊNDICE B ........................................................................................................ 139 APÊNDICE C ........................................................................................................ 140 ANEXO................................................................................................................... 141 15 1 INTRODUÇÃO O desafio crucial que se coloca na contemporaneidade para a saúde pública consiste em propor medidas intervencionistas culturalmente acessíveis e compatíveis ao contexto da população a que se destinam. Na tentativa de abarcar os pressupostos supracitados o Ministério da Saúde (MS) apresenta como proposta viável a reestruturação da Atenção Primária em Saúde (APS) através da Estratégia Saúde da Família (ESF). A ESF como elemento estruturante do Sistema Único de Saúde (SUS), visa superar os importantes desafios referentes ao conteúdo das políticas públicas, através da garantia do acesso universal, igualitário, integral e eqüitativo, mediante adequada utilização dos recursos, aumento da eficiência e melhor gerenciamento dos serviços. Em contrapartida, destaca-se a crescente consciência do direito à saúde, acompanhada de um aumento das expectativas e exigências por parte dos usuários, de forma a assegurar que suas necessidades em saúde sejam atendidas com presteza. Neste contexto surge o conceito de qualidade dos serviços de saúde como tema central das políticas públicas, sendo esta, considerada uma característica essencial quando se almeja a excelência do serviço. A avaliação de qualidade permeia elementos estruturais e organizacionais do serviço, assim como a competência técnica daqueles que desempenham as ações assistenciais, tornando-se elemento significativo para adequação dos serviços, especialmente daqueles considerados dispositivos para mudança, como é o caso da Saúde da Família (SF). Tomando como premissa que a ESF encontra-se em fase de implantação e com tendência à universalização surge a seguinte indagação: as novas práticas garantem uma assistência à saúde de qualidade, voltada para a real necessidade da população, com considerável grau de aceitação e satisfação por parte dos usuários? A partir dessa indagação surgem os seguintes pressupostos: com a implantação da SF ocorreu uma modificação estrutural, organizacional e assistencial dos serviços de APS, fato considerado pelos usuários como potencializador da qualidade da assistência à saúde, a ausência de familiaridade dos usuários com o conceito de promoção da saúde converge para uma reduzida valorização das atividades desenvolvidas pela SF neste campo de atuação. Evidencia-se, portanto, a necessidade de se desenvolver metodologias para avaliação da ESF, de maneira a fornecer subsídios para planejamento e implementação das ações. No caso específico da SF – de evidente relevância no contexto político-institucional de fortalecimento da APS e de reorganização do sistema de saúde – a avaliação assume papel de 16 destaque, na medida em que permite problematizar desde questões elementares até as mais complexas, subsidiando o processo de gestão e gerência do sistema de saúde. A avaliação de qualidade é um processo dinâmico que pressupõe uma dialética entre serviço e usuário. No processo avaliativo deve-se levar em consideração que nenhum serviço existe desvinculado do seu meio social, econômico e cultural, sendo este contexto responsável pela modelagem do serviço, daqueles que o planejam e executam e, também, daqueles que o utilizam. Desta forma o produto dos serviços de saúde é determinado por uma interação entre o meio e os diferentes atores sociais envolvidos no processo, como gestores, profissionais e usuários. Neste sentido a opinião dos usuários a respeito dos serviços de saúde é de extrema relevância quando se busca a qualidade do serviço. Desta forma não se pode desconsiderar a percepção e as necessidades do usuário acerca da assistência à saúde ao se planejar, implementar e avaliar as ações de saúde. No entanto, mensurar a satisfação do usuário não é tarefa fácil, principalmente devido à diversidade de métodos e ausência de instrumentos padronizados para a coleta de dados. Os estudos referentes à satisfação dos usuários, em geral, apontam um alto nível de aprovação do usuário em relação aos serviços de saúde, no entanto, quando os diferentes fatores que influenciam essa satisfação são analisados, verifica-se a presença de descontentamentos que comprometem a qualidade da atenção à saúde. Outra dificuldade encontrada é a obscuridade que a dimensão subjetiva da avaliação em saúde nos remete. Deparamo-nos com um campo pouco explorado, que guarda em seus meandros muitos aspectos a serem revelados. O desafio é buscar uma reflexão que seja capaz de transpassar as fronteiras do saber institucionalizado, imbricando o conhecimento científico ao campo das práticas e do senso comum. Diante dessas colocações reforça-se a necessidade em avaliar a SF perante a ótica da satisfação dos usuários. O estabelecimento de diálogo entre usuário e serviço implica em reconhecimento das reais necessidades e fragilidades apresentadas, propiciando alternativas cabíveis a melhor adequação do serviço, e, consequentemente, maior aceitabilidade e aprovação do mesmo por parte do usuário. 17 2 OBJETIVOS 2.1 Objetivo geral • Avaliar a qualidade da assistência à saúde oferecida pela ESF no município de Santo Antônio do Monte – MG, segundo a perspectiva da satisfação dos usuários. 2.2 Objetivos específicos • Analisar a qualidade de assistência à saúde segundo as seguintes dimensões: acessibilidade, infra-estrutura, resolutividade e relação profissional-usuário; • Analisar a qualidade das ações promocionais de saúde desenvolvidas pela SF mediante o conceito de promoção da saúde atribuído pelos usuários. 18 3 REFERENCIAL TEÓRICO 3.1 Saúde-doença: conceitos e contextos Impregnadas pelo construtivismo histórico e pelo determinismo cultural, as representações de saúde e doença sofreram transformações no decorrer do tempo, sendo marcadas pela inter-relação entre os seres humanos e o ambiente que os circunscreve. A saúde é um bem simbólico, fruto de uma construção histórica e social, das vivências próprias de cada pessoa, constituindo nas relações sociais do cotidiano diferentes concepções do que é saúde e doença, do que é um viver saudável, a partir das condições de vida de seu grupo social. Expressa também representações das instituições e do modo de organização da sociedade (MINAYO, 2004, p.189). As práticas assistenciais em saúde são circunstâncias da mediação entre indivíduo e meio socioeconômico-cultural, expressas pelas forças dominantes vigentes – em algumas situações o sobrenatural em outras a Igreja ou Estado – alterando da mesma forma que a concepção de saúde-doença, de acordo com o momento histórico vivenciado. 3.1.1 A Antiguidade De acordo com Gutierrez e Oberdiek (2001) desde os primórdios da humanidade existia a preocupação com o processo saúde-doença, embora de forma rudimentar e pouco elaborada. Estes mesmos autores afirmam que inicialmente os homens viviam em grupos, geralmente nômades, sendo a luta pela sobrevivência a justificativa pelos constantes deslocamentos. A doença, nesta época, foi atribuída à sobrevivência, ou seja, a escassez de alimentos, a desordens ambientais – alterações climáticas, ataques de animais ferozes, acidentes geográficos – o que ocasionava a ameaça à segurança e a defesa do indivíduo, resultando muitas vezes no adoecimento e morte. As primeiras representações de saúde e doença foram mágicas, ligadas a elementos naturais e sobrenaturais, contra os quais o ser humano pouco, ou em nada, podia intervir, pois era a vontade dos deuses que se cumpria. 19 No decorrer dos séculos os agrupamentos humanos foram se espalhando por várias regiões do mundo, dando origens às grandes civilizações – Egito, Mesopotâmia, Índia e China – que se estabeleceram às margens dos rios e exerciam atividades como agricultura, pesca e pecuária. Em cada região foram criadas culturas e tradições diversificadas, inclusive para tratar a questão da saúde e da doença. Os chineses já desenvolviam atividades preventivas em relação às doenças, embora o conceito de prevenção ainda não estivesse determinado. Era realizada a aromoterapia, a hidroterapia, a acumputura, e outras. Algumas civilizações atribuíam causas externas – elementos da natureza e/ou espíritos sobrenaturais – à doença, sem a participação direta do organismo humano no processo. O conceito místico, religioso e sobrenatural ainda perdura, sendo o tratamento fundamentado em rituais mágicos (GUTIERREZ; OBERDIEK, 2001). Em representação seguinte, a doença foi concebida mediante crenças religiosas, onde duas correntes se faziam presentes. A primeira referia-se as “interpretações religiosas da doença como conseqüência da fatalidade [...] doença-maldição” (LAPLANTINE, 1991 apud SEVALHO 1993, p. 352) e a segunda mencionava a doença como “uma conseqüência necessária provocada pelo indivíduo ou pelo grupo [...] doença-punição” (LAPLANTINE, 1991 apud SEVALHO 1993, p. 352)1. Com o advento do Cristianismo2 tornou-se causa principal da doença o pecado, sendo esta, um castigo divino, uma punição, ou resultado de possessão demoníaca sobre a alma de um corpo doente. Houve, então, uma remodelação do caráter místico-religioso em torno do conceito de doença (GUTIERREZ; OBERDIEK, 2001). Chineses e hindus se contrapuseram ao Cristianismo na medida em que defenderam a naturalização da saúde e da doença. Através de práticas empíricas desenvolviam teorias que afirmavam ser a doença conseqüência de fatores externos que provocavam no organismo um desequilíbrio. A saúde é um estado de isotonia, ou seja, de harmonia perfeita entre os quatro elementos que compõem o corpo humano: terra, ar, água e fogo. A doença aparece como conseqüência da ação de fatores externos que provocam, no organismo, uma distonia entre os elementos (GUTIERREZ; OBERDIEK, 2001, p. 4). ___________ 1 LAPLANTINE, F. Antropologia da Doença. São Paulo: Minas Fontes, 1991. O Cristianismo foi um movimento religioso que pregou a vinda do messias esperado, Jesus Cristo. Esta ideologia se difundiu rapidamente, sendo associada à salvação das almas, a igualdade entre os homens, a caridade, a justiça divina, a condenação da riqueza e a proteção aos pobres e desprotegidos. Tal movimento culminou, em 392, no surgimento da Igreja Católica Apostólica Romana, que gradativamente passou a concentrar em suas mãos o saber e o poder (MORAES, 2003). 2 20 3.1.2 A Cultura Grega e a Medicina Ocidental A civilização grega teve influência marcante em todo o ocidente, sendo que sua cultura se espalhou por toda a Europa. Os gregos procuravam uma explicação racional para as doenças, descartando os elementos mágicos, religiosos e sobrenaturais. Relevância significativa foi atribuída a fatores de ordem ambiental, sazonal, trabalhista, social e outros (GUTIERREZ; OBERDIEK, 2001). Entre os pensadores da época destacou-se Hipócrates que foi considerado o pai da medicina científica. Hipócrates defendia a prática clínica através da exploração sensorial, da comunicação oral e do raciocínio, processo semelhante ao que se desenvolve atualmente, através do exame físico, anamnese e diagnóstico. Hipocrátes foi responsável, também, pela Teoria dos Humores. (GUTIERREZ; OBERDIEK, 2001). Segundo a Teoria dos humores “o corpo humano é formado por um número variável de líquidos, e a saúde é o equilíbrio entre os humores, enquanto a doença é o desequilíbrio, o predomínio de algum dos humores sobre os demais” (SEVALHO, 1993, p. 353). Assim como os chineses e hindus os gregos hipocráticos também enfatizavam a correlação entre elementos do corpo e da natureza, embora em conjunturas distintas. Os gregos assinalavam a existência de quatro humores corporais e estabeleceram sua correspondência com elementos da natureza: coração (fogo), pituíta do cérebro (ar), bile amarela (terra) e bile negra do estômago (água). O equilíbrio do sistema representava a saúde, sendo este adquirido através dos hábitos alimentares saudáveis, atividade física, cuidados com o corpo, ambiente de trabalho, habitação, tudo em consonância com o meio natural. A escola hipocrática estudou estratégias para recuperação da saúde, mas, sobretudo de prevenção das doenças (BARROS, 2002; GUTIERREZ; OBERDIEK, 2001; SEVALHO, 1993). Seqüencialmente a Hipócrates encontrou-se Galeno, médico grego, que deu seguimento aos propósitos de seu antecessor (SEVALHO, 1993). Barros (2002) expõe que as contribuições de Paracelso representaram a transição entre a escola galênica e o modelo biomédico. Paracelso se opôs a teoria dos humores e acreditava que cada doença, relacionada a um complexo sistema – constituído pela alquimia, astrologia, medicina popular – representava uma entidade independente que deveria ser tratada com remédios específicos, freqüentemente de origem química, “pois acreditava que a vida era um processo químico e que a doença era um desequilíbrio na química do corpo” (SEVALHO, 1993, p. 356). 21 3.1.3 A Idade Média A invasão do Império Romano pelos bárbaros marca o início da Idade Média, período em que ocorreu uma reestruturação social e política, através do surgimento do Feudalismo. Este sistema baseou-se em relações servo-contratuais (servis), onde a sociedade foi organizada por dois extratos, os proprietários ou senhores e os servos. Os servos eram aqueles que obrigatoriamente deveriam prestar serviços aos seus senhores, seja por meio da agricultura ou artesanato, e em troca lhes era permitido desfrutar da terra para subsistência própria e de sua família. Os servos também recebiam proteção militar por parte de seus senhores. A terra era propriedade dos senhores feudais, do clero ou da nobreza (GUTIERREZ; OBERDIEK, 2001). Neste período, a Igreja católica, através de seu monopólio, garantiu o domínio ideológico, inclusive nas representações de saúde e doença. Fé e religiosidade são retomadas como fundamentos imprescindíveis para o tratamento e a cura. A ocorrência de doenças tinha duas interpretações. Segundo os pagãos, eram devidas à possessão do diabo ou a conseqüência de feitiçarias. Para os cristãos as doenças eram sinais de purificação e de expiação dos pecados. Nessa época, as doenças atacavam indiscriminadamente os senhores e os servos, e a terapêutica estava baseada em milagres obtidos através da súplica, da mortificação e do arrependimento dos pecados (GUTIERREZ; OBERDIEK, 2001, p. 7). Os hospitais existentes nesta época não eram locais para prestação de cuidados terapêuticos, mas sim, casas de assistência aos pobres, abrigos a viajantes e instrumentos para isolamento de doentes. As pessoas que através de um ato de caridade cuidavam dos doentes, ou ofereciam ajuda financeira aos hospitais, eram retribuídas com a salvação de suas almas (SEVALHO, 1993). Na Idade Média, várias epidemias assolaram a população, como é o caso da lepra, da peste bubônica, da difteria, da varíola, da tuberculose, dentre outras. Retomou-se, então, a idéia de contágio, através da tradição hipocrática, reforçando a importância do ambiente nas causas das doenças (GUTIERREZ; OBERDIEK, 2001). Segundo Rosen (1994) a sociedade medieval se organizava no sentido de prevenir enfermidades através de medidas sanitárias que promoveriam a proteção da saúde comunitária. 22 Com as Cruzadas3 se restabeleceu o comércio entre Ocidente e Oriente, ocorrendo a ascensão da burguesia, fato que propiciou o surgimento das vilas e cidades, com conseqüente deslocamento da população para estes locais, com intuito de desempenhar atividades comerciais e artesanais. A princípio a economia era auto-suficiente, baseada no sistema de troca. Com o passar do tempo esta economia auto-suficiente foi substituída por uma economia comercial, que após várias revoluções, culminou em uma nova forma de produzir e viver em sociedade – o Mercantilismo4 (GUTIERREZ; OBERDIEK, 2001). 3.1.4 A Idade Moderna A nova estrutura econômica repercutiu na organização social e política, na ciência e na arte, resultando no movimento chamado Renascimento5 – que se opunha às forças dominantes da época: senhores feudais e reis e Igreja Católica (GUTIERREZ; OBERDIEK, 2001). A efervescência cultural da renascença propiciou a cisão entre homem e natureza. O individualismo, a criatividade, a laicização do saber forjaram a ambientação cultural de onde emergiu o racionalismo científico, base da ciência moderna, modelado no empirismo indutivo e no racionalismo dedutivo mecanicista (SEVALHO, 1993, p. 355). Vários pensadores da época foram presos, condenados e mortos por propagarem idéias contrárias às das classes hegemônicas. Contudo, alguns pesquisadores se destacaram e contribuíram para o progresso da ciência e da medicina. Dentre estes são citados os seguintes: Miguel Servet (1511-1553) e Willian Harey (1578-1657), que descobriram o mecanismo da circulação sanguínea – a circulação pulmonar pelas artérias e o retorno do sangue ao coração pelas veias – André Vesálio (1514-1590), que se transformou no pai da moderna anatomia, e Ambroise Pare (1509-1564) que defendeu a laqueação das artérias em lugar da tradicional cauterização (GUTIERREZ; OBERDIEK, 2001, p. 11). ____________ 3 As cruzadas foram movimentos militares legitimados pela Igreja Católica com o objetivo de lutar contra os que propagavam idéias contrárias a sua doutrina (MORAES, 2003). 4 O Mercantilismo consistiu-se em um conjunto de práticas e idéias econômicas adotadas por governantes, administradores e comerciantes de diversos países, entre o século XV e XVIII (MOARES, 2003). 5 O Renascimento caracterizou-se pela valorização do homem (Humanismo) e da natureza, em oposição ao divino e ao sobrenatural, conceitos que haviam impregnado a cultura da Idade Média (MORAES, 2003). 23 Neste momento concepção teocêntrica do mundo, até então vigente, passou a ser substituída por uma representação antropocêntrica. Segundo Rosen (1994) neste período houve a necessidade de se estudar e estabelecer possíveis causas para as epidemias devido ao alto grau de acometimento populacional. Várias teorias explicativas foram propostas. Dentre as quais pode se citar o postulado de Sydenham. Este cientista associou as epidemias a um determinado estado atmosférico, embora não tivesse convicção sobre a natureza desse estado o atribuía a um miasma que se elevava da terra, e pensou, também, em uma origem astrológica para as epidemias. Fracastoro elaborou uma outra teoria que afirmava ser as epidemias resultantes de diminutos agentes infecciosos (seminaria) que eram específicas para cada doença, se reproduziam por si só e eram transmitidas por contato direto ou através de fômites. Como seus antecessores, ele também acreditava em uma associação epidemia-astralogia (ROSEN, 1994). Dessas elaborações resultou a teoria miasmática que perdurou até a era bacteriológica, na metade do século XIX. Segundo esta teoria, condições sanitárias ruins criavam um estado atmosférico que propiciava o aparecimento de doenças infecciosas e surtos epidêmicos (GUTIERREZ; OBERDIEK, 2001). De acordo com Rosen (1994) foram instituídas medidas de urbanização como a derrubada de prédios deteriorados, alargamento das ruas, destruição dos cortiços, suprimento e água e esgoto, dentre outras, como forma de combater as ameaças à saúde. As transformações decorrentes do Renascimento acabaram por reestruturar a ideologia política européia, justificando um Estado Moderno, forte, capaz de atender as necessidades nacionais, instaurou-se, então, o Absolutismo6. O Estado Absolutista vivenciou forças ambíguas. De um lado a nobreza tentando manter sua posição social através de suas propriedades e de outro, a burguesia, que mesmo obtendo êxito nos negócios, não conseguiu a hegemonia como classe dominante. Destacou-se, também, a influência negativa da Igreja Católica no progresso mercantil, pois esta preconizou o ‘justo preço’ e condenou a usura. (GUTIERREZ; OBERDIEK, 2001). _____________ 6 O absolutismo foi um sistema político que vigorou nas monarquias européias durante os séculos XVI e XVII. Suas características básicas eram a concentração de poder nas mãos dos reis, uso da violência pelo governo, falta de liberdade e total controle social (MORAES, 2003). 24 Na ineficiência do Estado Absolutista, intelectuais como René Descartes, Isaac Newton, John Locke e Adam Smith – considerados fundadores do Iluminismo7 – passaram a propor um Estado condizente com os novos valores. Surge, então, o Estado Liberal8, comprometido com o modo capitalista de produção, pautado no trabalho e não mais na terra (GUTIERREZ; OBERDIEK, 2001). O fim da Idade Média foi marcado por várias revoluções que se estenderam até meados do século XIX – Independência dos Estados Unidos, Revolução Industrial na Inglaterra e Revolução Francesa (GUTIERREZ; OBERDIEK, 2001). 3.1.5 Idade Contemporânea Neste período o capitalismo se expandiu consideravelmente, ocorreu crescente urbanização nos países europeus e a consolidação do sistema fabril. No entanto, surgiram sérios problemas sociais decorrentes dos fenômenos supracitados, instalou-se uma degradação significativa das condições de vida e trabalho (GUTIERREZ; OBERDIEK, 2001; SEVALHO, 1993). De acordo com Sevalho (1993) a população socialmente excluída se rebelou contra as condições adversas a que estava exposta. Tal revolução instigou em intelectuais da época a incorporação das proposições relativas à saúde, doença e meio social. Na França Villermé iniciou estudos que investigavam a influência de fatores como pobreza e profissão no estado de saúde (ROSEN, 1994). “O ambiente, origem de todas as causas de doenças, deixa momentaneamente, de ser natural para revestir-se do social. É nas condições de vida e trabalho do homem que as causas das doenças deverão ser buscadas” (GUTIERREZ; OBERDIEK, 2001, p. 20). Surge a medicina social. Marx, defensor da doutrina socialista, no contexto da economia política, já mencionava que as doenças eram conseqüências do processo produtivo, incluindo a relação empregado/empregador, resultando no determinismo social da doença. _____________ 7 O Iluminismo foi um movimento intelectual que se desenvolveu no século XVIII e atribuiu à razão a possibilidade do progresso, da liberdade, e felicidade (MORAES, 2003). 8 O estado liberal diz respeito a uma situação de laissez faire, ou seja, de liberdade econômica, onde cada indivíduo deveria fazer a sua parte que o mercado em seu conjunto faria a sua, sem prejudicar a quem quer que seja (MORAES, 2003). 25 Estudiosos do período chegaram à conclusão que as doenças eram resultantes de lugares insalubres, ou seja, com remoção deficiente de lixo e excreções, com superpopulação das habitações e dos processos fabris, com alimentação inadequada ou insuficiente, através de hábitos sedentários, ausência de estímulos físicos e mentais, monotonia de muitas profissões e preocupações e ansiedade da vida (ROSEN, 1994). Autoridades inglesas como Chadwick defendiam a necessidade de ações sociais preventivas sobre os problemas gerados pela pobreza e pelas doenças. Na Alemanha Virchow, Neumann e Leubuscher afirmavam que a saúde pública deveria promover o desenvolvimento sadio do cidadão, a prevenção de riscos à saúde e controle de doenças, sendo a saúde um direito de cidadania e dever do Estado mantê-la e promove-la (ROSEN, 1994; SILVA JÚNIOR, 2006). Neste momento houve necessidade de melhor coordenação e direcionamento das ações de Saúde Pública. Investigações sobre as condições de saúde da população foram realizadas e intensificaram-se ações em áreas prioritárias, a saber: saneamento básico, controle das epidemias e assistência médica, especialmente às classes menos favorecidas (SILVA JÚNIOR, 2006). Além das medidas sanitárias e assistenciais, também foi instituída a legislação trabalhista, com intuito de garantir melhores condições de trabalho à população, especialmente às mulheres e às crianças (ROSEN, 1994). Silva Júnior (2006) expõe que nos séculos XVIII e XIX, o aperfeiçoamento do microscópio propiciou a descoberta dos microrganismos e sua associação com as doenças, através das contribuições de Louis Pasteur e Robert koch. Barros (2002) relata que o primeiro evidenciou o papel das bactérias, tanto no processo de fermentação como na produção de doenças, chegando à produção da vacina anti-rábica e contra o Anthrax e o segundo descobriu o agente etiológico da tuberculose e afirmou que em todo caso de doença o microrganismo está presente e deve ser detectado. Tais descobertas contrapuseram-se a teria miasmática e ao determinismo social da doença. Foi instituída a Era Bacteriológica, que iria “liberar a medicina dos complexos determinantes econômicos, sociais e políticos que a ‘impediam de desenvolver cientificamente’ “(GUTIERREZ; OBERDIEK, 2001, p. 21). Em meados do século XIX, configurava-se, então, o Modelo Unicausal para explicação das doenças, ou seja, cada processo patológico era determinado por um microrganismo específico, sendo competência das práticas médicas identificarem o agente etiológico responsável pela doença em questão e combatê-lo através de vacinas ou produtos químicos (GUTIERREZ; OBERDIEK, 2001). 26 No século XX surgiu a medicina científica, cujo marco foi o Relatório Flexner, de 1910, onde Abraham Flexner propunha uma reestruturação das escolas médicas através da ampliação na duração dos cursos de medicina, introdução do ensino laboratorial, expansão do ensino clínico, vinculação às Universidades, estímulo à pesquisa e especialização, controle do exercício profissional pela profissão organizada (MENDES, 1999a). O Relatório Flexner marca o surgimento do Modelo Biomédico ou Flexneriano, que se configurou uma prática assistencial individualista, com base clínica, centrada na figura do médico e dependente de aparatos tecnológicos e de suporte especialista, ficando definido como conceito de saúde a ausência de doenças (MENDES, 1999a). Após a II Guerra Mundial ocorreu uma reestruturação produtiva nos países industrializados. “As novas tecnologias começam a ocupar todos os setores da economia e as políticas sociais contemplam mais as áreas de saúde e educação” (GUTIERREZ; OBERDIEK, 2001, p. 22). Neste contexto ocorre um processo de transição epidemiológica, com [...] evolução gradual dos problemas de saúde caracterizados pela alta prevalência de mortalidade por doenças infecciosas, para um estado em que passam a predominar doenças não-infecciosas (ou também crônico-degenerativas); por tratar-se de enfermidades de longa duração, acumulam-se na população, ocorrendo uma combinação paradoxal de declínio da mortalidade com aumento da morbidade (PATARRA, 1995, p.77). A insuficiência do paradigma Unicausal se mostrou representativa mediante esta nova ordem, pois, tornou-se insustentável e limitante explicar a doença meramente como efeito de um agente causal. Configura-se, neste momento, o Modelo da Multicausalidade Moderna, que visava estabelecer relações causais entre fatores de risco e doenças. A multicausalidade evoluiu desde o inicio do século XX por intermédio de três modelos, proposto por Gordon, MacMahom e Leavell e Clarck. Segundo Gutierrez e Oberdiek (2001) o primeiro modelo foi denominado Modelo da Balança, onde a saúde foi representada pelo equilíbrio de uma balança. O fulcro da balança foi representado pelos fatores do meio ambiente, um de seus pratos pelo agente e o outro pelo hospedeiro. Este modelo, embora utilize outros fatores para a determinação da doença, além do agente causal, pode ser considerado uma reinterpretação do Modelo Unicausal, pois toma os fatores isoladamente como se não houvesse uma interação entre eles. 27 De acordo com os mesmos autores, o segundo modelo, designado de Rede de Causalidade, defendia que para atuar sobre as doenças seria necessário identificar as causas das mesmas e atuar naquela mais frágil, sem obrigatoriamente, alterar todo o conjunto de fatores envolvidos. O terceiro modelo propõe o estudo da História Natural da Doença onde se “estabelecia uma abordagem causal em que o meio ambiente agrupava o conjunto de fatores relacionados ao espaço, os quais, em interação com o hospedeiro e o agente etiológico, levavam ao surgimento, ou não das doenças” (DANTAS, et al., 2004, p. 96). Embora os autores dos três modelos considerassem importantes as contribuições sociais ao processo saúde-doença, sua concepção termina por “biologizar a sociedade, uma vez que a qualifica por seus efeitos biológicos e não por suas características próprias” (LAURELL, 1983, p. 155). O Modelo de Determinação Social da Doença ressurge e contrapõe-se ao Modelo Multicausal na medida em que procura relacionar a organização social ao aparecimento de riscos ou potencialidades que determinam o processo saúde-doença. De acordo com a Teoria da Ecologia da Saúde, a saúde é “compreendida e entendida como uma resposta adaptativa do homem ao meio ambiente que o circunda, e a doença como um desequilíbrio desta adaptação, resultante de complexa interação de múltiplos fatores” (PEREIRA, 2006, p. 11). Segundo a concepção de Laurell (1983) o processo saúde-doença possui determinismo duplo, em seu caráter biológico e social, sendo necessário reconhecer a especificidade de cada um e ao mesmo tempo analisar a reciprocidade relacional de ambos. Em termos muito gerais, o processo saúde-doença é determinado pelo modo como o homem se apropria da natureza em um dado momento, apropriação que se realiza por meio de processo baseado em determinado desenvolvimento das forças produtivas e relações sociais de produção (LAURELL, 1983, p. 157). No terceiro milênio o fenômeno da globalização, fundamentado na concepção política do neoliberalismo e no âmbito econômico do capitalismo, induz a sociedade a competitividade e a produtividade (CORREA, 2000). Tal fenômeno, associado ao avanço tecnológico traz riscos adicionais ao homem moderno relacionados ao ambiente, trabalho, saúde, gerando, também, desigualdade, exclusão e dificuldade de acesso a bens e serviços indispensáveis. 28 As concepções modernas de saúde implicam considera-la em sua positividade, muito além, portanto, de suas conseqüências imediatas, indicadas negativamente, como doença, seqüela ou morte. Saúde é, então, resultado de um processo de produção social que expressa a qualidade de vida de uma população, entendendo-se qualidade de vida como uma condição de existência dos homens no seu viver cotidiano, ‘um viver desimpedido’, um modo de ‘andar a vida’ prazeroso, seja individual, seja coletivamente (MENDES, 1999a, p. 237). Esse olhar sobre o processo saúde-doença evidencia que o modelo tecnicista/hospitalocêntrico não condiz com as necessidades de saúde do mundo moderno, pois este atua sobre supostas soluções, às vezes paliativas, e não nas causas propriamente ditas, sendo necessário estruturar uma nova forma para enfrentamento dos problemas de saúde (BARROS, 2002; ROSA; LABATE, 2005). 29 3.2 Raízes da Estratégia Saúde da Família: resgate histórico a partir da construção do sistema público de saúde no Brasil As políticas de saúde e as formas como se organizam os serviços não são decorrentes apenas do momento atual, mas de uma longa trajetória de formulações e embates, resultante de lutas políticas e ideológicas, travadas por diferentes atores sociais ao longo do tempo (CUNHA; CUNHA, 1998). Mendes (1999a) afirma que a configuração do sistema de saúde tem como eixos orientadores a economia e a concepção de saúde vigente na sociedade em determinado momento. Segundo Cunha e Cunha (1998), a busca por referências históricas do processo de formulação das políticas públicas de saúde, e a associação da saúde com o contexto político geral do país, pode contribuir para o entendimento da presente conjuntura. Mendes (1999a, b) descreve que no século passado o sistema de saúde brasileiro evoluiu do sanitarismo campanhista, passando pelo modelo médico-assistencial privatista, até chegar em 1980 ao projeto neoliberal hoje vigente. O mesmo autor enfatiza, ainda, que foi instituído um paradigma organizacional correspondente a cada modelo sanitário supracitado. Risi Júnior e Nogueira (2002) relatam que no início do século passado a economia brasileira esteve dominada por um modelo agroexportador, determinado pela monocultura cafeeira, o que exigia do setor saúde a melhoria das condições sanitárias através do saneamento dos portos e erradicação ou controle de doenças que poderiam comprometer a exportação. Tais ações configuraram o modelo denominado sanitarismo campanhista. Derivado do modelo sanitarista emergiu o paradigma organizacional centralverticalista, que se estruturou segundo forte centralização administrativa, estrutura departamental rígida e tematizada, ações verticalizadas, executadas através de campanhas ou por unidades de saúde especializadas (sanatórios de lepra e tuberculose, hospitais psiquiátricos, etc.) e isolamento institucional marcado pela divisão do trabalho, onde os órgãos estatais tinham como objeto apenas a ‘saúde pública’ (MENDES, 1999a). Com o processo de industrialização vivenciado pelo Brasil a partir de 1950 o pólo econômico foi deslocado para os centros urbanos, gerando uma massa operária, a qual deveria ser mantida em plena capacidade produtiva. Esta situação ocasionou o surgimento de um sistema de saúde vinculado a um sistema típico de proteção social. Presenciou-se, então, um crescimento da atenção médica da Previdência Social paralelamente ao declínio das ações 30 campanhistas, resultando na conformação e hegemonização, na metade da década de 1960, do modelo médico-assistencial privatista (RISI JÚNIOR, NOGUEIRA, 2002; MENDES, 2001a). Mendes (2001a) afirma que o modelo médico assistencial privatista foi gestado simultaneamente a crescente integração da Previdência Social: das Caixas de Aposentadorias e Pensões (CAP’s) de 1920, dos Institutos de Aposentadoria e Pensões (IAP’s) dos anos de 1930 a 1960, até o Instituto Nacional da Previdência Social (INPS) em 1966. A criação do INPS foi o momento institucional de consolidação do modelo médico-assitencial privatista, caracterizado pela ampliação da cobertura previdenciária no meio urbano e rural, pela prática curativa, individualizada, assistencialista e especializada, pela intervenção estatal e pela organização da prática médica orientada segundo a lucratividade, através da capitalização da medicina e do privilégio dos prestadores de serviços privados (MENDES, 2001a). Neste momento a saúde foi concebida ou representada como ausência de doenças e a organização dos serviços foi medicamente definida, tendo como objetivo colocar à disposição da população ações individualizadas e curativo-reabilitadoras, em consonância com os elementos ideológicos do flexnerianismo (MENDES, 1999a). Com a criação do Instituto de Nacional de Assistência Médica da Previdência Social (INAMPS), em 1977, instituiu-se o órgão símbolo do modelo flexneriano, consolidando um sistema de alto custo, que excluía de seus benefícios grande parcela da população (MENDES, 2001a). A hegemonia do modelo médico-assistencial privatista resultou no paradigma organizacional horizontal desconcentrado, caracterizado pela centralização normativa, desconcentração de órgãos regionais de atividades predefinidas, eliminação ou diminuição do poder decisório dos departamentos e programas no nível central, execução desconcentrada das ações normalizadas centralmente por meio de unidades organizadas por programas e dirigidas a grupos em situação de exclusão, permanência de ações campanhistas (imunização e endemias), controle baseado no processo e não nos resultados, isolamento institucional – o MS, Secretarias Estaduais e Municipais executavam ações de atenção primária seletiva e campanhas de saúde pública e a Previdência Social, via INAMPS, oferecia assistencial individualizada através de prestadores privados contratados (MENDES, 1999a). A partir dos anos 80 o país vivenciou um quadro político e econômico marcado por dificuldades em âmbito nacional e internacional, caracterizado por um processo inflacionário e por uma acentuada crise fiscal, associada ao crescimento de movimentos oposicionistas ao regime militar (CUNHA; CUNHA, 1998). 31 As transformações políticas e econômicas ocorridas determinaram a crise do modelo médico-assistencial privatista e re-nortearam os rumos das políticas de saúde através do aparecimento de novos sujeitos sociais, portadores de interesses e visões de mundo que moldariam o projeto sanitário brasileiro (MENDES, 1999a). Mendes (1999a) relata que a crise da saúde foi determinada pelas dimensões da ineficiência – revelada pela incoerência entre os recursos financeiros aplicados no setor saúde e os impactos nos padrões sanitários da população – da ineficácia – inerente a crise do financiamento, marcada pelo crescimento dos custos da atenção médica e pela irracionalidade na alocação de recursos – da iniqüidade – associada à relação inversa entre serviços médicos e necessidades da população – e insatisfação da opinião pública – determinada pela insatisfação generalizada da população em relação aos serviços de saúde. Mendes (1999a) cita, ainda, que os sistemas de saúde passaram a ser questionados também pelo fato de não corresponderem às novas concepções de saúde, que em âmbito mais globalizante passaram a articular saúde com condições de vida, cujo marco inicial substanciou-se no Relatório Lalonde9, em 1974. Vale ressaltar que este panorama de crise da saúde não foi privilégio apenas do Brasil ou dos países em desenvolvimento, mas contextualizou-se em âmbito mundial (MENDES, 1999b). Frente ao cenário internacional de instabilidade social e econômica e as recentes concepções de saúde, que culminaram na crise do setor, a Organização Mundial de Saúde (OMS) realizou em 1978 a Conferência Internacional em Alma Ata (URSS), tendo como tema central os ‘Cuidados Primários em Saúde’. A Declaração de Alma Ata propôs os cuidados primários de saúde como a grande saída para os problemas do setor, entendendo-os como essenciais, fundados sobre os métodos e uma tecnologia prática, cientificamente viável e socialmente aceitável, universalmente acessíveis aos indivíduos e às famílias da comunidade (OMS, 1978, p.1). ____________ 9 Informações a respeito do Informe Lalonde podem ser obtidas no cap.3, pág. 48 deste trabalho. 32 E ainda determinou que os cuidados primários de saúde compreendem no mínimo: uma educação concernente com os problemas de saúde que se colocam, assim como os métodos de prevenção e de luta que lhes são aplicáveis, a promoção de boas condições alimentares e nutricionais, um abastecimento suficiente de água saudável, medidas de saneamento básico, a proteção materna e infantil, incluído o planejamento familiar, a vacinação contra as grandes doenças infecciosas, a prevenção e o controle das endemias locais, o tratamento das doenças e lesões comuns e o fornecimento de medicamentos essenciais (OMS, 1978, p.1). Coincidentemente com a proposta internacional da APS, surgem as primeiras experiências de medicina comunitária no Brasil. Como ponto de partida foi proposto o Programa de Interiorização das Ações de Saúde e Saneamento do Nordeste (PIASS), cujo objetivo pautou-se na ampliação da cobertura dos serviços públicos de saúde. Sequencialmente foi elaborado o PREV-SAÚDE, projeto que incorporou os pressupostos de hierarquização, participação comunitária, integração de serviços, regionalização e extensão de cobertura, que, no entanto, não chegou a ser colocado em prática (CUNHA; CUNHA, 1998; MENDES, 2001a). De acordo com Cunha e Cunha (1998) e Mendes (1999a), uma das formas de solucionar a crise financeira instalada foi a criação do Conselho Consultivo da Administração Previdenciária (CONASP), em 1981, que propôs a reorganização da assistência médica, a elaboração de critérios para alocação de recursos previdenciários, o estabelecimento de mecanismos de controle de custos e reavaliação do financiamento da assistência médicohospitalar. A proposta operacional do CONASP foi concretizada, em 1983, através das Ações Integradas de Saúde (AIS) que representaram um movimento fundamental para início do processo de mudança. As políticas de saúde seriam descentralizadas, universalizadas e hierarquizadas, com incorporação do setor público e privado nas atividades de planejamento em saúde, o que possibilitaria o rompimento com a concepção dominante da dicotomia entre serviços/ações preventivas e curativas, ainda que o enfoque do planejamento se vinculasse unicamente a assistência individual (ROSA; LABATE, 2005). Embora o movimento de expansão das AIS seja visto como alternativa de ampliação da capacidade instalada da rede pública, as ações permaneceram centradas no nível 33 federal e estadual, representadas pelas Superintendências Regionais do INAMPS, fato que levou a manutenção do monopólio do setor privado (REZENDE, 2007). Paralelamente a estes acontecimentos ocorreu o evento político-sanitário que revolucionou o país na década de 1980 – a VIII Conferência Nacional de Saúde – para o qual confluiu o momento máximo do projeto da Reforma Sanitária Brasileira (CUNHA; CUNHA, 1998). Mendes define a VIII Conferência Nacional de Saúde como um processo modernizador e democratizante de transformação nos âmbitos político-jurídico, político-institucional e político operativo, para dar conta da saúde dos cidadãos, entendida como um direito universal e suportada por um Sistema Único de Saúde, constituído sob regulação do Estado, que objetive a eficiência, eficácia e eqüidade e que se construa permanentemente através do incremento de sua base social, da implantação de um novo paradigma assistencial, do desenvolvimento de uma nova ética profissional e da criação de mecanismos de gestão e controle popular sobre o sistema (MENDES 1991, p. 42). O relatório final desta conferência também sistematizou o modelo reformador para a saúde, onde esta passa a ser definida como [...] resultante das condições de alimentação, habitação, educação, renda, meio ambiente, trabalho, transporte, emprego, lazer, liberdade, acesso e posse de terra e acesso a serviços de saúde. É assim, antes de tudo, o resultado das formas de organização social da produção, as quais podem gerar desigualdades nos níveis de vida (BRASIL10, 1986 apud CUNHA; CUNHA, 1988). A VIII Conferência Nacional de Saúde foi instrumento determinante de dois processos que se desenvolveram mutuamente. A implantação do Sistema Unificado e Descentralizado de Saúde (SUDS) que propunha a transferência dos serviços do INAMPS para os Estados e municípios e a elaboração da nova Constituição Federal (MENDES, 2001a). Bertolli Filho (2004) enfatiza que o SUDS baseado na integração dos serviços de saúde público e privado, deveria constituir uma rede hierarquizada, regionalizada e com a participação comunitária local, porém encontrou os mesmos obstáculos que os outros projetos descentralizadores, culminando em seu fracasso. _______________________ 10 BRASIL. Relatório Final da VIII Conferência Nacional de Saúde. Brasília: Ministério da Saúde, 1986. 34 A Constituição Federal de 1988 foi o marco determinante das intensas transformações ocorridas no Sistema de Saúde do Brasil nas últimas duas décadas, pois consolidou mudanças importantes no modelo político-institucional, principalmente ao definir em seu artigo 196, a saúde como um [...] direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação (BRASIL, 1991, p.11). A Constituição Federal de 1988 não só reconheceu a saúde como um direito a ser assegurado pelo Estado, mas também aprovou a criação do SUS, o qual se fundamentou nos princípios da universalidade, da eqüidade, da integralidade e se organizou de maneira descentralizada, hierarquizada e com participação comunitária, cujo propósito basilar constituiu-se em reverter a situação de desigualdade na assistência à saúde que afligia a população. A partir de então o acesso ao atendimento à saúde tornou-se obrigatório e gratuito a toda população brasileira (BRASIL, 2001; MENDES, 1999a). Importantes conquistas e decisões políticas vão de tornando marcos históricos visando a mudança do modelo assistencial. A concepção de saúde como um direito de cidadania ganha, então, o cenário nacional, em um país que migrou do regime militar para a gestão democrática. De acordo com Mendes (1999a), no contexto vivenciado, torna-se indispensável uma mudança paradigmática que permita evoluir do paradigma flexneriano, moldado pelo conceito de saúde em sua negatividade – ausência de doenças, para o paradigma da produção social da doença, idealizado através do conceito de saúde em sua positividade. Este novo paradigma organizacional seria o paradigma estratégico-descentralizado, o qual deve evoluir segundo os seguintes movimentos: da desconcentração para a descentralização, da decisão institucional para a decisão colegiada baseada na administração de conflitos e na formação de consensos, da prestação de serviços para a regulação, do planejamento normativo para o planejamento estratégico, do controle e avaliação de processos para o controle de resultados e qualidade da atenção, do controle burocrático para o controle social, da estrutura rígida para a estrutura adaptativa, da rigidez dos modelos da administração para a autonomia de gestão e co-gestão participativa, do modelo dual de atenção médica e programas de saúde pública para uma organização orientada por problemas e organizada em uma base territorial, do 35 insulamento institucional para as parcerias com diferentes atores governamentais, da focalização intestinal para a focalização no cidadão-cliente que passa a ser sujeito da instituição. Nesta perspectiva, em 1991 o MS cria o Programa Agente Comunitário de Saúde (PACS). Através desse programa o enfoque da APS passou a ser a família e não mais o indivíduo. Foram introduzidas concepções de integração com a comunidade e, também, a visão ativa de intervenção em saúde, agindo preventivamente sobre a demanda e não simplesmente aguardando sua chegada para agir (BRASIL, 2002a; VIANA; DAL POZ, 2005). No final de 1993 surgiu a discussão de que o PACS, apesar de todo êxito obtido, ainda era um instrumento insuficiente para provocar mudanças significativas na APS, impossibilitando a consolidação do SUS (BRASIL, 2002a). Frente a este fato, em 1994, o MS propõe como alternativa viável para a reorganização da APS o Programa Saúde da Família (PSF), uma estratégia pautada na vigilância da saúde, ou seja, uma resposta social organizada aos problemas de saúde, com enfoque nas ações de promoção da saúde, prevenção de enfermidades e acidentes e atenção curativa, em âmbito individual e coletivo (MENDES, 1999a). Inicialmente a implantação do PSF ocorreu, em áreas de risco, sendo utilizado o Mapa da Fome, do Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas (IPEA), como critério para seleção destas áreas (VIANA; DAL POZ, 2005). Neste momento fica clara a intencionalidade de voltar o atendimento primário a populações mais carentes e excluídas do sistema de saúde. O PSF apresenta, então, caráter focalizador, ferindo um dos princípios do SUS, o da universalidade da atenção, constituindose em uma estratégia de atenção primária como programa seletivo (FRANCO; MERHY, 1999; MENDES, 1999b). Somente em 1996 o governo federal reconhece que o PSF não se constituía em um modelo simplificado, de pobre para pobre, ou que recorta a população em fatias (mulher e criança), nem a atenção em níveis, mas o concebe como uma estratégia prioritária para a substituição ao modelo tradicional de assistência, e como uma ação dinamizadora do SUS, fundamentada nos eixos da universalidade, integralidade e eqüidade, em um contexto de descentralização e controle social da gestão (BRASIL, 2002b; 2004a; FRANCO; MERHY, 1999). Neste momento o PSF revela-se como estratégia descentralizadora das políticas públicas de saúde, sendo estruturada, gradualmente, em todo território nacional. 36 Fundamentada na territorialização e na adscrição da clientela a ESF deve centrar sua atenção na família, percebida em seu ambiente físico e social, o que possibilita a compreensão ampliada do processo saúde-doença e a necessidade de práticas assistenciais que vão além das ações curativas. A territorialização e a adscrição de clientela possibilita a Equipe Saúde da Família (ESF1)11 estabelecer vínculo com a população, permitindo o compromisso e a co-responsabilidade e estimulando a organização da comunidade para o exercício do controle social (BRASIL, 2002b; MERHY; MALTA; SANTOS, 2004). A operacionalização da Saúde da Família deverá ser realizada mediante implantação de equipes multiprofissionais que prestam assistência integral na Unidade Saúde da Família (USF) e na comunidade. O MS enfatiza que o processo de trabalho em equipe deve ser concretizado mediante atuação de profissionais com visão sistêmica e integral do indivíduo, família e comunidade, atuando com criatividade e senso crítico, através de uma prática competente e resolutiva. Para tanto, a ESF1 deve estar capacitada para planejar, organizar, desenvolver e avaliar ações que respondam as reais necessidades da população através da permanente interação com a mesma no sentido de mobilizá-la e envolvê-la no processo de trabalho (BRASIL, 2000; 2004a). Nesse contexto, o PSF propõe nova dinâmica para a estruturação dos serviços de saúde, promovendo uma relação dos profissionais mais próximos do seu objeto de trabalho, ou seja, mais próximos das pessoas, famílias e comunidades, assumindo compromisso de prestar assistência integral e resolutiva a toda população, a qual tem seu acesso garantido através de uma equipe multiprofissional e interdisciplinar que presta assistência de acordo com as reais necessidades dessa população, identificando os fatores de risco aos quais ela está exposta e neles intervindo de forma apropriada. Portanto, o PSF torna-se estratégia significativa para mudança do modelo assistencial visando a qualidade de vida da comunidade (ROSA; LABATE, 2005, p. 1.032). ____________ 11 No texto constam duas abreviaturas idênticas com significados diferentes, para maior entendimento por parte do leitor atribuímos ESF a Estratégia Saúde da Família e ESF1 a Equipe Saúde da Família. 37 3.3 Caracterizando a Atenção Primária em Saúde: atributos para a organização da Saúde da Família no Brasil De acordo com Mendes (1999a) a estratégia da APS tem sido adotada por vários países com intuito de reorganizar os sistemas de saúde, porém constatam-se diversas interpretações de seu significado através do processo de instrumentalização, acarretando implicações concretas em seus aspectos organizacionais. Segundo o mesmo autor esta pluralidade conceitual esta diretamente relacionada à história em que se gestou e evoluiu tal conceito, e também, pela ambigüidade de algumas definições formais estabelecidas internacionalmente. Frente a esta diversidade de conceitos Mendes (1999a; 2001b) aponta as interpretações mais comuns para a atenção primária: atenção primária como programa seletivo, atenção primária como estratégia de organização do primeiro nível de atenção do sistema de saúde e atenção primária como estratégia para reordenamento do setor saúde. Na primeira interpretação a APS concebe-se como um programa específico, direcionado a grupos sociais em situação de pobreza, com intervenções simples e de baixo custo, providas por pessoal com baixa qualificação e sem possibilidade de referência a pontos de atenção com maior grau de complexidade (MENDES, 2001b). Mendes (1999a) afirma que esta interpretação tem sido utilizada em muitos países em desenvolvimento, como política compensatória, visando cristalizar as desigualdades pessoais e regionais presentes, diante da impossibilidade de superar tais desigualdades. O autor já citado destaca uma segunda interpretação para APS, a qual se refere à forma de organização do primeiro nível de atenção, com o objetivo de minimizar os custos econômico e social e satisfazer os problemas de saúde da população, porém em âmbito restrito ao primeiro nível de atenção. Uma interpretação mais globalizante da APS implica em classificá-la como estratégia, compreendida como forma de apropriar, recombinar, reorganizar e reordenar todos os recursos do sistema de saúde para satisfazer as necessidades da população, implica, portanto, na articulação da APS dentro de um sistema integrado de serviços de saúde (MENDES, 1999a; 2001b). Este entendimento de APS como estratégia é fundamental para organizar uma atenção primária resolutiva e de qualidade, pois esta se constitui, dentro da rede integrada de serviços, naquela de maior importância relativa, pois é a partir dela e em função dela que se organizam os demais pontos da assistência em saúde (MENDES, 2001b). 38 A Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS, 2005) define que a APS promove uma abordagem operacional abrangente dos sistemas de saúde, ao definir como meta principal elevar a saúde ao mais alto nível, enquanto maximiza a eqüidade e a solidariedade, tendo como princípios básicos a receptividade, a orientação de qualidade, a responsabilização governamental, a justiça social, a sustentabilidade, a participação e a intersetorialidade. E complementa, ainda que [...] um sistema de saúde com base na APS é composto por um conjunto central de elementos funcionais e estruturais que garantem a cobertura e o acesso universal a serviços aceitáveis à população que aumentam a eqüidade. Oferece cuidados abrangentes, integrados e apropriados com o tempo, enfatiza a prevenção e a promoção e assegura o cuidado no primeiro atendimento. As famílias e as comunidades são suas bases de planejamento e ação. [...] Adota práticas de gerenciamento otimizado em todos os níveis para alcançar qualidade, eficiência e eficácia, e desenvolve mecanismos ativos para maximizar a participação individual e coletiva em saúde (OPAS, 2005, p. 6). Ao conceituar a APS Starfield (2002) a descreve como o nível do sistema de saúde que permite a entrada no sistema para todas as novas necessidades e problemas. A abordagem na APS é direcionada para os problemas mais comuns da comunidade, com enfoque voltado para o usuário (não exclusivamente centrado na doença), oferecendo serviços de prevenção, cura e reabilitação para maximizar a saúde e o bem estar. A APS também tem como objetivo integrar e coordenar a atenção fornecida nos demais pontos do sistema, facilitando o acesso, aumentando a qualidade, reduzindo custos e promovendo o trabalho em equipe. O Ministério da Saúde caracteriza a APS [...] por um conjunto de ações de saúde, no âmbito individual e coletivo, que abrangem a promoção e a proteção da saúde, a prevenção de agravos, o diagnóstico, o tratamento, a reabilitação e a manutenção da saúde. É desenvolvida por meio do exercício de práticas gerenciais e sanitárias democráticas e participativas, sob forma de trabalho em equipe, dirigidas a populações de territórios bem delimitados, pelas quais assume a responsabilidade sanitária, considerando a dinamicidade existente no território em que vivem essas populações. Utiliza tecnologias de elevada complexidade e baixa densidade, que devem resolver os problemas de saúde de maior freqüência e relevância em seu território. É o contato preferencial dos usuários com os sistemas de saúde. Orienta-se pelos princípios da universalidade, da acessibilidade e da coordenação do cuidado, do vínculo e da continuidade, da integralidade, da responsabilização, da humanização, da eqüidade e da participação social (BRASIL, 2006a, p. 10). 39 Segundo Starfield (2002) a APS deve ser organizada segundo os seguintes atributos: o primeiro contato, a longitudinalidade, a integralidade e a coordenação da atenção. A atenção ao primeiro contato é inerente à existência de um serviço como ponto de entrada para o sistema de saúde. O fator que propicia este tipo de atenção é uma característica estrutural do serviço: a acessibilidade, a qual está diretamente relacionada à possibilidade dos usuários chegarem ao serviço de saúde, a cada novo problema ou novo episódio de um problema (STARFIELD, 2002). Starfield (2002, p.225) relata que a acessibilidade, em definição mais ampliada, constitui-se no “uso oportuno dos serviços de saúde para alcançar os melhores resultados possíveis de saúde”. E complementa ainda, que a acessibilidade esta relacionada à capacidade dos serviços de serem acessíveis e disponíveis, fatores que são determinados pela distância do serviço em relação ao domicílio do usuário, pela disponibilidade de transporte, pela adequação de dias e horários para atendimento, pelo grau de tolerância para consultas eventuais/urgência, pela ausência de barreiras lingüísticas e culturais e por quanto o usuário está satisfeito em relação a este atributo. Neste sentido a acessibilidade pode ser concebida como processo de buscar e receber assistência à saúde, representado em um extremo pela disponibilidade (presença de recursos e capacidade para reproduzir serviços) e no outro extremo pela utilização (consumo real dos serviços) (FEKETE, 1997). Starfield (2002) ressalta que o acesso inclui a maneira como os usuários experimentam o atributo acessibilidade, e Pinheiro et al., (2002), embasado em vários autores, afirmam que o conceito de acesso é complexo e está relacionado à percepção das necessidades de saúde e da conversão destas necessidades em demanda e destas em uso. Segundo Santos et al., (2002) o acesso dos usuários aos serviços de saúde pode ser ampliado através do acolhimento, implicando na humanização da relação profissionalusuário e na responsabilidade para com a vida das pessoas. O acolhimento é “compreendido como um processo, uma prática de trabalho que busca garantir a escuta, o estabelecimento de uma relação vincular, responsabilização, atenção resolutiva, promoção da cidadania e autonomização do usuário” (OLIVEIRA, et al., p. 112). O acolhimento pressupõe a criação de espaços de encontro entre os sujeitos que propiciem a interação entre usuários e profissionais através da escuta e da receptividade (BRASIL, 2006b). 40 O acolhimento adquire expressão significativa nos processos de produção da saúde, visto que [...] em todo lugar em que ocorre um encontro – encontro trabalho de saúde – entre um trabalhador e um usuário, operam-se processos tecnológicos (trabalho vivo em ato) que visam à produção de relações de escutas e responsabilizações, as quais se articulam com a constituição dos vínculos e dos compromissos em projetos de intervenção. Estes, por sua vez, objetivam atuar sobre as necessidades em busca da produção de algo que possa representar à conquista de controle de sofrimento (enquanto doença) e/ou a produção da saúde (FRANCO; BUENO; MERHY, 1999, p. 346). Desta forma o acolhimento [...] se põe enquanto uma estratégia de reformulação no modo como têm se dado às relações interpessoais no processo de trabalho em saúde, implicando em uma nova organização desse processo [...] o acolhimento busca: uma maior humanização do atendimento nas unidades de saúde, uma ampliação da garantia de acesso a todos os sujeitos que demandam algo dos serviços de saúde, uma efetiva responsabilização dos profissionais com a saúde desses cidadãos e a conseqüente constituição de vínculos; assim como visa imprimir uma maior resolutividade às ações desenvolvidas (REIS12, 1997 apud SANTOS et al., 2002). Para atender às expectativas Oliveira et al., (2006) propõem que o serviço de saúde se reorganize tendo como eixo central o usuário. A reorientação dos serviços perpassa por uma interação profissional-usuário pautada na “escuta qualificada das necessidades e expectativas de quem procura o serviço público de saúde” (SANTOS et al., 2002, p. 37). Santos et al., (2002) adverte que o acolhimento é um princípio que deve se concretizar através das ações cotidianas, incorporado na assistência através da sensibilidade, sutileza e subjetividade no fazer do profissional de saúde. Isso implica na tolerância à diferença, na inclusão social, na escuta responsável e comprometida. ____________ 12 REIS, A. T. Acolhimento: um novo trabalho em equipe. Brasília: 1997. Mimeografado. 41 Franco, Bueno e Merhy (1999) afirmam que os serviços de saúde ao escutar, acolher e dar uma resposta positiva, capaz de resolver os problemas de saúde da população, garante o princípio da acessibilidade e promovem a responsabilização clínica e sanitária e a intervenção resolutiva como caminho para defesa da vida. No ‘fazer saúde’ o acolhimento contribui para transformar a forma como ocorre o acesso da população desde a ‘porta de entrada’, significa transformações no primeiro contato. O acolhimento “além de contribuir para a humanização e melhoria da qualidade da atenção, é uma estratégia de reorientação dos profissionais e nas relações desses com os usuários na melhoria de seu bem estar” (SANTOS et al., 2002, p. 39). Um segundo atributo da APS é a longitudinalidade. A longitudinalidade pressupõe uma relação pessoal de longa duração entre os profissionais e os usuários em sua unidade de saúde, independente da presença ou ausência de problemas específicos relacionados à saúde. A longitudinalidade seria propiciada pelo cadastrado dos usuários, com adscrição de uma população eletiva. A assistência seria marcada pelo vínculo entre população e fonte de serviços, através de fortes laços interpessoais, de maneira a refletir a cooperação mútua entre usuários e profissionais de saúde (STARFIELD, 2002). Silveira et al., (2004) relatam que a criação de vínculos, princípio constante na longitudinalidade, é propiciada através da humanização da assistência por intermédio do acolhimento. O acolhimento além de propiciar o acesso também permite o estabelecimento de relações humanas e duradouras entre profissionais e usuários. Deslandes (2004) afirma que a humanização, e consequentemente o vínculo deveriam abranger iniciativas que apontam para a democratização das relações que envolvem o atendimento, o maior diálogo e melhoria da comunicação entre profissional e usuário, o reconhecimento dos direitos dos usuários, de sua subjetividade e referências culturais, ou ainda o reconhecimento das expectativas de profissionais e usuários como sujeitos do processo terapêutico. O vínculo é a expressão-síntese da humanização da relação com o usuário e sua construção requer a definição das responsabilidades de cada membro da equipe pelas tarefas necessárias ao atendimento nas situações de rotina ou imprevistas. O vínculo é o resultado das ações do acolhimento e, principalmente, da qualidade da resposta (clínica ou não) recebida pelo usuário (BRASIL, 2004b, p.6). 42 Starfield (2002) comprova a supremacia dos serviços que valorizam a longitudinalidade ao citar vários estudos que relacionam este atributo a melhor aderência às orientações recebidas, seja em âmbito terapêutico ou preventivo, melhor utilização dos serviços de saúde, com redução das internações hospitalares e custos globais, maior efetivação do sistema de referência e contra-referência e maior satisfação do usuário com a assistência prestada. A medição do atributo longitudinalidade pode ser realizada através da avaliação da força da relação interpessoal entre o profissional e o usuário. As características desta relação seriam marcadas pela extensão do entendimento entre profissional-usuário, pela confiança e tranqüilidade para exposição de problemas por parte do usuário e pelo quanto o profissional se interessa pelo reconhecimento dos problemas do usuário, sejam estes referentes à saúde ou não (STARFIELD, 2002). De acordo com a mesma autora a integralidade corresponderia a um outro atributo da APS, que se refere à capacidade organizacional do serviço no sentido de garantir assistência a saúde mediante a totalidade da demanda. Moraes (2006) afirma que abranger essa demanda total implica em ir além do cuidado individual integrador para estabelecer uma rede organizada de serviços, construída de maneira equilibrada, ou seja, com ampla cobertura da APS bem como a adequação da oferta de procedimentos de média e alta complexidade mediante um sistema de referência e contrareferência eficaz. Na conformação da atenção à saúde integral torna-se necessária uma cooperação regional, que extrapola os contornos do município. A noção de integralidade, associada à organização dos serviços e práticas assistenciais, relaciona-se a necessidade de horizontalização dos programas de saúde, o que implica no ‘fazer saúde’ segundo problemas identificados, em contrapartida a ações verticalizadas caracterizadas por respostas governamentais às doenças. Desta forma a integralidade, pautada no princípio da horizontalização, constitui-se em mecanismo importante na APS devido a sua flexibilidade, o que permite que os serviços sejam ajustados as reais necessidades de saúde dos usuários (ALVES, 2005; STARFIELD, 2002). A integralidade é uma proposta que visa, também, romper com o cuidado fragmentado e reducionista imposto pelo modelo flexneriano (MORAES, 2006). O olhar do profissional, neste sentido, deve ser totalizante, com apreensão do sujeito biopsicossocial. Assim, seria caracterizada pela assistência que procura ir além da doença e do sofrimento manifesto, buscando apreender necessidades mais abrangentes do sujeito (ALVES, 2005, p. 42). 43 A integralidade assistencial exige que a APS reconheça e interprete os diversos problemas de saúde apresentados pelos usuários, no contexto histórico, social e econômico, e disponibilize os recursos necessários para abordá-los. A equipe deve estar apta a reconhecer adequadamente todos os tipos de problemas de saúde – funcionais, orgânicos e sociais – e oferecer serviços preventivos, promocionais, terapêuticos e reabilitadores, quebrando a dicotomia até então existente entre serviços preventivos e curativos (ALVES, 2005; MENDES, 2001b; STARFIELD, 2002). Pensar a integralidade implica em refletir sobre as modificações na forma de produzir saúde, incluindo a relação com os usuários, composição das equipes de saúde e gerenciamento dos serviços (MORAES, 2006). A assimilação da integralidade sugere integrar ações preventivas, promocionais e assistenciais; integrar profissionais em equipe interdisciplinar e multiprofissional para uma compreensão mais abrangente dos problemas de saúde e intervenções mais efetivas; integrar partes de um organismo vivo, dilacerado e objetivado pelo olhar reducionista da biomedicina, e reconhecer nele um sujeito ativo nas intervenções em saúde (ALVES, 2005). Starfield (2002) enfatiza que a avaliação da integralidade pode ser orientada para o nível populacional e para o nível institucional. No nível populacional os serviços são definidos pelas necessidades dos usuários e avaliação da integralidade realizada mediante a disponibilidade dos serviços para a população. No nível institucional a variedade de serviços é estabelecida de acordo com as diretrizes do programa ou recomendações para procedimentos, e a avaliação da integralidade pode ser realizada mediante auditoria ou formulários de queixas. A coordenação (integração) da atenção estaria relacionada à disponibilidade de informações de problemas ou serviços anteriores que influenciariam nos atendimentos subseqüentes. O elemento estrutural essencial para a coordenação é a continuidade da atenção, que seria possibilitada através de atendimentos seqüenciais por um mesmo profissional de saúde ou por um sistema de informação eficaz entre os diferentes níveis de atenção do sistema (STARFIELD, 2002). De acordo com Campos (2005) a coordenação da assistência se processa em dois níveis: na dimensão da equipe de atenção primária e na interação do paciente com demais níveis de atenção e especialidades. No âmbito da equipe de atenção primária a coordenação acontece quando os problemas referentes à saúde e a ações implementadas são compartilhadas pela equipe. Em um segundo nível a coordenação ocorre quando a equipe de saúde, ao não 44 dispor de subsídios para o acompanhamento do paciente o encaminha para serviços afins e tem a possibilidade de manter o contato com este paciente. O quarto atributo da APS, a coordenação, é essencial para a obtenção dos demais atributos. Visto que “sem ela, a longitudinalidade perderia muito seu potencial, a integralidade seria dificultada e a função de primeiro contato tornar-se-ia uma função puramente administrativa” (STARFIELD, 2002, p.365). Starfield (2002) incorpora aos atributos supracitados dois aspectos adicionais da APS que são denominados aspectos derivativos. Estes aspectos contemplam a centralização na família e a orientação para a comunidade. Segundo Mendes (2001b) o aspecto centralização na família implicaria na concepção da família, em sua singularidade, como sujeito da atenção, através de uma interação entre equipe de saúde e família, o que propiciaria o reconhecimento dos seus principais problemas. A família e comunidade são fontes de informações que permitem avaliar riscos e priorizar intervenções, e são vistas como foco primário do planejamento e da intervenção (OAPS, 2005). A orientação comunitária promoveria o reconhecimento das necessidades familiares através do ambiente social, econômico e cultural em que estão inseridas. Assim, na perspectiva da saúde coletiva, as demandas em saúde seriam concebidas mediante as representações familiares e individuais sobre saúde e doença, e também dos sistemas de apoio comunitários (MENDES, 2001b). De acordo com Azevedo et al., (2007) a saúde é contextualizada e produzida em um espaço físico, social e relacional, o que leva a múltiplas dimensões do processo saúde doença. Portanto ao abordá-la torna-se necessário considerar o meio no qual os indivíduos e as famílias estão inseridos, conhecendo melhor as variáveis que direta ou indiretamente interferem na qualidade de vida da população. Mendes (1999a) afirma que somente ao se identificar um problema, na concretude de um território de abrangência, é que se pode atuar sobre suas causas e, consequentemente, impactar nos níveis de saúde. A APS organizada mediante os atributos supracitados implicaria em “menores custos, maior satisfação dos usuários, maior impacto sobre os níveis sanitários” (STARFIELD13, apud Mendes, 2001b, p. 116). ____________ 13 STARFIELD, B. Is primary care essential? Lacent, 344: 1129-1133, 1994. 45 Mendes (2001b) ainda afirma que a APS quando bem organizada é capaz de resolver, de forma eficaz e humanizada, em torno de 90% dos problemas de saúde dos usuários, através da integração com outros pontos de atenção do sistema e do exercício da advocacia da saúde da população adscrita. 46 3.4 A promoção da saúde na conjuntura da Estratégia Saúde da Família Ao entrar no século XXI, o mundo moderno vivencia uma crise que se caracteriza pelo não cumprimento das promessas de igualdade, liberdade, solidariedade e paz. Frente a este quadro a humanidade busca redirecionar o conhecimento e o desenvolvimento para rediscutir valores e princípios que façam frente ao predomínio da intolerância na convivência ao aumento das guerras, ao acirramento das desigualdades econômicas e sociais e ao desenvolvimento desvinculado das reais necessidades dos povos (BRASIL, 2002c). Nas últimas duas décadas, o Brasil mostrou avanços nos indicadores de saúde, com significativa redução da mortalidade infantil e aumento da expectativa de vida, com sensível envelhecimento da população (NORONHA et al., 2005). O Brasil, a semelhança dos países em desenvolvimento, vive a polarização epidemiológica, fenômeno marcado pela coexistência de doenças crônico-degenerativas e infecciosas/parasitárias, com predomínio das primeiras em relação às segundas. Os indicadores também demonstram o recrudescimento de endemias como a dengue, a dificuldade em controlar a tuberculose e malária e erradicar a hanseníase (BRASIL, 2002c). Noronha et al., (2005) relatam um aumento das mortes por causas externas, principalmente nos extratos populacionais em idade produtiva, com predomínio das doenças crônico-degenerativas na mortalidade total. A sociedade moderna também se caracteriza pela urbanização, o que acarretou um rearranjo populacional, social e cultural. No caso do Brasil mais de 80% de brasileiros vivem em territórios cada vez mais concentrados, sendo a parcela mais carente marginalizada (NORONHA et al., 2005). De acordo com o MS convive-se com a persistência de desigualdades históricas com relação à renda, acesso a educação e saúde. Na década de 1990, os 10% mais ricos no Brasil, tinham renda 22 vezes maior do que os 40% mais pobre. Além disso, entre os 105 mais ricos, 80% possuem domicílio com saneamento básico, enquanto só 32% mais pobres têm esse benefício. Ao tomar com referência a educação, entre os estudantes de 20 a 24 anos, dos 10% mais ricos 21% são e nível superior, sendo que nos 40% mais pobres somente 2,6% o são (BRASIL, 2002c). Evidências mostram que a saúde está mais relacionada ao modo de viver que a determinação genética ou biológica. O sedentarismo e alimentação não saudável, o consumo de álcool, tabaco e outras drogas, o stress do dia-a-dia, a competitividade, o isolamento social são condicionantes diretos das doenças modernas (BRASIL, 2002c). 47 Todo esse debate coloca a necessidade de se delinear estratégias e ações no campo da saúde capazes de apontar para a construção de soluções dos problemas complexos que se vive. A promoção da saúde como campo conceitual, metodológico e instrumental ainda em desenvolvimento, traz, em seus pilares e estratégias, potenciais de abordagem dos problemas de saúde: assume a saúde em seu conceito amplo, pauta a discussão sobre qualidade de vida, pressupõe que a solução dos problemas está no potencial de contar com parceiros e a mobilização da sociedade. Trabalha com o princípio da autonomia dos indivíduos e das comunidades, reforça o planejamento e poder local (BRASIL, 2002c, p. 9). A ESF ao orientar-se através da territorialização, da vinculação, da responsabilização e do olhar integral sobre o ambiente em suas dimensões sociais e culturais, onde estão inseridas as famílias e os indivíduos, torna-se um importante espaço para o desenvolvimento das ações de promoção da saúde. No entanto, a elaboração de estratégias de promoção da saúde deve incorporar as formulações pregressas, as considerações efetuadas nos acordos internacionais e cartas e basear-se nas especificidades da realidade brasileira (BRASIL, 2002c). Sigerist14 (1946, apud BUSS, 2003) foi um dos primeiros autores a fazer referência ao termo promoção da saúde, ao afirmar que saúde se faz através de condições de vida decentes, boas condições de trabalho, educação, cultura e formas de lazer e descanso. Leavell & Clarck, em 1965, utilizaram, também o conceito de promoção da saúde ao desenvolverem o modelo da história natural da doença, como um dos elementos que caracterizava o nível primário de prevenção de doenças. Este modelo considerou três níveis de prevenção, e, pelo menos, cinco componentes, os quais propiciariam aplicar medidas preventivas, dependendo do grau de conhecimento da história natural da doença (BUSS, 2000). Em 1974, surge no Canadá, o moderno movimento de promoção da saúde, com a divulgação do documento ‘A new perspective on the helth of canadians’, também conhecido como Informe Lalonde, cuja materialização foi intermediada por interesses políticos, econômicos e técnicos, mediante aumento dos gastos com a assistência médica e sua incapacidade em lidar com as doenças crônicas (BUSS, 2000; 2003). ____________ 14 SIGERIST, H. The social sciences in the medical school. In: SIGERIST, H. (ed.) The University at the Crossroad. Nova Iorque: Henry Schumann Publisher, 1946. 48 O eixo estratégico do Informe Lalonde baseou-se em um conjunto de intervenções que buscaram transformar os comportamentos individuais não-saudáveis, cujos fundamentos se pautaram no ‘campo da saúde’ que reúne os chamados ‘determinantes de saúde’, a saber: biologia humana (genética e função humana), ambiente (natural e social), estilo de vida (comportamento individual que afeta a saúde) e organização da assistência à saúde (consiste na quantidade, qualidade, ordem, relação profissional-usuário e disponibilidade de recursos da assistência à saúde) (BUSS, 2003; RESENDE, 2005). Cerqueira15 (1997, apud SÍCOLI; NASCIMENTO, 2003) afirma que o Informe Lalonde apontou para um alcance limitado, pois considerou os indivíduos como únicos responsáveis pela saúde, desresponsabilizando completamente os governos e formuladores de políticas públicas. Perante este fato, e em resposta as crescentes expectativas por uma nova saúde pública, é que foi realizada em Ottawa, Canadá, a Primeira Conferência Internacional sobre Promoção da Saúde, cujas discussões basearam-se nos progressos da Declaração de Alma Ata (BRASIL, 2002d). A Carta de Ottawa define a promoção da saúde como o [...] processo de capacitação da comunidade para atuar na melhoria e qualidade de vida da sua saúde, incluindo uma maior participação no controle desse processo. Para atingir um estado de completo bem-estar físico, mental e social os indivíduos e grupos devem saber identificar aspirações, satisfazer necessidades e modificar favoravelmente o meio ambiente. A saúde deve ser vista como um recurso para a vida, e não como objetivo de viver. Nesse sentido, a saúde é um conceito positivo, que enfatiza os recursos sociais e pessoais, bem como as capacidades físicas. Assim, a promoção da saúde não é responsabilidade exclusiva do setor saúde, e vai para além de um estilo de vida saudável, na direção de um bem-estar mais global (BRASIL, 2002d, p. 19). A Carta de Ottawa preconiza, também, cinco campos para a ação de promoção da saúde, que incluem a elaboração e implementação de políticas saudáveis, a criação de ambientes favoráveis, o reforço da ação comunitária, o desenvolvimento de habilidades pessoais e a reorientação do sistema de saúde (BUSS, 2002). ____________ 15 CERQUEIRA, M T. Promoción de la salud y educación para la salud: retos y perspectivas. In: ORGANIZACIÓN MUNDIAL DE LA SALUD. La promoción de la salud y la educación para la salud en América Latina: un análisis sectorial. Genebra: Editorial de La Universidad de Puerto Rico, 1997. p.7-48. 49 Buss (2003) enfatiza que a promoção da saúde tem como objetivo assegurar a igualdade de oportunidades e proporcionar meios de capacitação, aos quais se incluem ambientes favoráveis, acesso à informação, habilidades para viver melhor, bem como habilidades para fazer escolhas mais saudáveis. E o MS complementa afirmando que “fatores políticos, econômicos, sociais, culturais, ambientais, comportamentais e biológicos podem tanto favorecer como prejudicar a saúde” (BRASIL, 2002d, p. 20). A Conferência de Adelaide, na Austrália, realizada em 1988, apresentou como tema central as políticas públicas saudáveis que “caracterizam-se pelo interesse e preocupação explícitos de todas as áreas das políticas públicas, em relação à saúde e à eqüidade, e pelos compromissos com o impacto de tais políticas sobre a saúde da população” (BRASIL, 2002d, p.35). Nesta Conferência fica assegurado que as iniqüidades no campo da saúde têm raízes na desigualdade social e educacional existente entre as pessoas, colocando como principal propósito para superar essas iniqüidades a criação de ambientes favoráveis ao desenvolvimento de vidas saudáveis através de um sólido investimento social por parte dos governos (BUSS, 2000; BRASIL, 2002d). Segundo Buss (2003) e Brasil (2002d) a Declaração de Sundsval, Suécia, que aconteceu em 1991, foi a primeira a indicar a interdependência entre saúde e ambiente em todas as suas dimensões (física, social, espiritual, econômica e política), não ficando restrita unicamente a aspectos físicos. Enfatizou que a injustiça social se manifesta pela pobreza e privação, decorrentes de conflitos armados, do rápido crescimento populacional, do êxodo rural, favorecendo o aparecimento de favelas, nas quais está ausente a água potável, o saneamento básico, a alimentação adequada, o abrigo e o acesso a cuidados de saúde. A Conferência Internacional de Promoção da Saúde que ocorreu em 1992, em Santa Fé de Bogotá, Colômbia, tratou da promoção da saúde na América Latina, enfatizando a necessidade de criação de condições que assegurem o bem-estar geral como propósito fundamental do desenvolvimento, assumindo a relação mútua entre saúde e desenvolvimento (BRASIL, 2002d). De acordo com o MS esta Conferência reitera a necessidade da saúde pública combater o sofrimento causado pelas enfermidades decorrentes do atraso e da pobreza, através do repasse de informações à população, o que levaria a mudança nos estilos de vida da comunidade (BRASIL, 2002d). A Conferência de Jacarta, realizada em 1997, na Indonésia, vem a reafirmar os vínculos entre saúde e desenvolvimento, sendo a primeira a incluir o setor privado na 50 promoção da saúde. Seu objetivo final é prolongar as expectativas de saúde através da redução das iniqüidades inerentes a este campo, e afirma que a saúde é um direito humano fundamental e essencial para o desenvolvimento social e econômico (BRASIL, 2002d). A Declaração de Jacarta indica como ameaças à saúde a pobreza, a urbanização, o envelhecimento populacional, a prevalência de doenças crônicas, as doenças infecciosas e reemergentes, os problemas de saúde mental, o sedentarismo, a resistência a antibióticos, o uso de drogas e a violência (BRASIL, 2002d). A quinta Conferência Global sobre Promoção da Saúde ocorreu na Cidade do México, em 2000, e também reconhece e reforça que a promoção da saúde e o desenvolvimento social é dever e responsabilidade dos governos, sendo tal responsabilidade compartilhada com os demais setores da sociedade (BRASIL, 2002d). Tomando como referência as diversas conceituações e práticas de promoção em saúde disponíveis, pode-se reuni-las em dois grandes grupos. No primeiro a promoção da saúde estaria relacionada “atividades dirigidas centralmente à transformação dos comportamentos dos indivíduos, focando nos seus estilos de vida e localizando-os nos seio das famílias [...] Neste caso, as atividades tendem a concentrar-se em componentes educativos” (BUSS, 2002, p.51). O segundo grupo define modernamente a saúde como “produto e um amplo espectro de fatores relacionados com a qualidade de vida” (BUSS, 2002, p. 52) As atividades de promoção da saúde estariam voltadas para o coletivo e ambiente, num sentido amplo, de ambiente físico, social, político, econômico e cultural (BUSS, 2002). No contexto da SF, Buss (2002) transcorre sobre os cinco campos de atuação da promoção da saúde propostos pela carta de Ottawa, agrupando-os em duas dimensões, dimensão dos estilos de vida e dimensão das condições de vida, sendo a última dimensão subdividida em políticas saudáveis e intersetoriais, ambientes favoráveis à saúde e desenvolvimento local integrado e sustentável, agenda 21 local e municípios/comunidades saudáveis. O componente estilo de vida engloba o desenvolvimento de habilidades pessoais, sendo o espaço familiar um meio propício para o seu desenvolvimento, através de ações educativas, informativas e de comunicação para a saúde. A ESF possui amplo campo de atuação nesta dimensão, a exemplo pode-se citar as ações promocionais de incentivo ao aleitamento materno, controle do tabagismo, atenção à hipertensão e ao diabetes, estímulo à atividade física, dentre outras (BUSS, 2002). 51 Como afirmado anteriormente, saúde não é uma conquista única do setor saúde, mas resultado de um conjunto de fatores sociais, econômicos, políticos e culturais, sendo necessário para garantir saúde uma ação intersetorial, as chamadas políticas públicas saudáveis, que em âmbito social inclui políticas de saneamento e meio ambiente, educação, habitação, alimentação e nutrição e de assistência social. No aspecto econômico encontrar-seiam a política de geração de empregos e melhor distribuição de renda, sendo a articulação da SF com os demais segmentos governamentais fundamental para implementar políticas públicas saudáveis (BUSS, 2002). Schaffer16 (1994, apud BUSS, 2002, p. 59) relata que a saúde não pode separar-se de inúmeros elementos ambientais tão diversos como ar e água potável, a pobreza e as aglomerações urbanas, os produtos químicos e os vetores das enfermidades, o excesso de consumo e o subdesenvolvimento, a tecnologia e o comércio. Neste sentido, como estratégia da promoção da saúde, entra em cena a criação de ambientes favoráveis, podendo muitas vezes, as iniciativas da área ambiental ser organizadas pela comunidade com o apoio da ESF1 (BUSS, 2002). Buss (2002) defende o desenvolvimento sustentável, onde o ambiente atenda as demandas da população, sem que ocorra a destruição deste, mas sim a preservação para as gerações futuras. Com o objetivo de alcançar o desenvolvimento sustentável são apresentadas as propostas de desenvolvimento local integrado e sustentável, a agenda 21 e municípios/comunidades saudáveis. Na perspectiva destes movimentos torna-se importante a participação da SF, uma vez que eles trabalham de forma a integrar poder público e comunidade com o intuito de garantir a qualidade de vida, o que coincide com os objetivos da ESF. ____________ 16 SCHAEFER, M. Salud, médio ambiente y desarrollo. Washington: OPS, WHO/EHE/1994, 93.1, 49p. 52 A ESF já desenvolve diversas ações de promoção da saúde, mas ainda existem áreas infecundas a serem trabalhadas (BUSS, 2002). Com o objetivo de tentar incluir todas as dimensões propostas para a promoção da saúde deve-se levar em consideração [...] que a saúde é um conceito em construção, em movimento, dependendo de valores sociais, culturais, subjetivos e históricos. Pode-se dizer que é a busca de uma relação harmoniosa que nos permita viver com qualidade, que depende de um melhor conhecimento e aceitação de nós mesmos, de relações mais solidárias, tolerantes com os outros, relações cidadãs com o Estado e relação de extremo respeito à natureza, em uma atitude de responsabilidade ecológica com a vida sobre a terra e com o futuro. Estas relações significam construir saúde em seu sentido mais amplo, radicalizar na luta contra as desigualdades e participar na construção de cidadania e da constituição de sujeitos. Sujeitos que amam, sofrem, adoecem, buscam suas curas, necessitam de cuidados, lutam por seus direitos e desejos (BRASIL, 2002c, p. 12). 53 3.5 Avaliação em saúde A análise da literatura sobre avaliação em saúde demonstra que desde os primórdios da história da humanidade esta se encontrava presente, representando uma atividade bastante antiga, que, no entanto, se desenvolveu muito lentamente, por não ser considerada uma prática essencial à medicina (CONTANDRIOPOULOS et al., 1997; REIS et al., 1990). Reis et al., (1990), enfatizam que a primeira sistematização contemporânea de um mecanismo de avaliação em saúde constituiu-se no relatório Flexner, onde Abraham Flexner atentou para a necessidade de controle do exercício profissional ao avaliar a educação médica. Já o conceito de avaliação de programas públicos surgiu no cenário mundial após a Segunda Guerra frente à necessidade de melhoria da eficácia da aplicação dos recursos pelo Estado. Neste sentido foram desenvolvidos vários métodos que objetivavam possibilitar a análise das vantagens e dos custos dos programas (UCHIMURA; BOSI, 2004). No Brasil, a pesquisa de avaliação de políticas públicas de saúde se desenvolveu apenas a partir da década de 1980, atingindo maior expansão em 1988 com a criação do SUS. Através da reestruturação das políticas públicas de saúde – cujo objetivo fundamentava-se no aumento da eficiência e da eficácia das ações de saúde, com intuito de garantir equidade e acesso a toda população – surge a necessidade de adotar processos avaliativos, sendo estes progressivamente valorizados pela lógica gerencial como perspectiva contemporânea e politicamente coerente com o contexto vigente. (CORDEIRO et al., 2001; GOMES; HARTZ, 2001; UCHIMURA; BOSI, 2004). Sob a concepção de Deslandes, (1997), a avaliação de programas e serviços é de suma relevância, seja na área da saúde pública ou nas demais áreas a que se aplica – educação, administração, economia, serviço social, dentre outras – sendo que em cada campo temático ganha contornos próprios, o que possibilita a compatibilidade segundo a natureza específica do objeto em estudo. A avaliação em saúde, de acordo com vários autores, é encontrada de forma muito diversificada na literatura, justamente por ser uma área ainda em construção conceitual e metodológica. Embora exista uma polissemia de conceitos a respeito de avaliação, o sentido fundamental em teorizar sobre o assunto é o de buscar converter conceitos em estratégias, propiciando aperfeiçoamentos no âmbito da assistência à saúde (CONTANDRIOPOULOS et al., 1997; ESPERIDIÃO; TRAD, 2006). 54 Silva e Formigli (1994) relatam que devido à variabilidade terminológica e metodológica torna-se obrigatório ao pesquisador explicitar suas opções teóricas e técnicas referentes ao processo avaliativo, especialmente ao se avaliar serviços de saúde, pois estes demonstram grande complexidade, associada às várias concepções sobre saúde, e, consequentemente, sobre as práticas assistenciais. O termo avaliação, em concepção mais ampla, refere-se ao ato ou efeito de avaliar (FERREIRA, 1986), ou seja, “conferir valor, manifestar-se em relação a alguma coisa, sem compromisso, no entanto, com o fundamento desse juízo com um método específico” (UCHIMURA; BOSI, 2004, p. 76). De acordo com Uchimura e Bosi (2004), em se tratando de avaliação de serviços ou programas de saúde o ato de avaliar é deslocado ao campo das ciências sociais, e compreende a utilização de “procedimentos que, apoiados no uso do método científico, servem para identificar, obter e proporcionar a informação pertinente e julgar o mérito e o valor de maneira justificável” Aguilar e Ander-Egg17 (1994, apud UCHIMURA; BOSI, 2004, p. 77). Nesse sentido a avaliação de serviços pressupõe uma avaliação sistemática com a utilização de métodos, diferente de uma avaliação cotidiana. A avaliação, segundo Contandripoulos et al., (1997), consiste fundamentalmente em fazer um julgamento de valor sobre uma intervenção ou sobre qualquer um dos seus componentes, com o objetivo de auxiliar na tomada de decisões. Fekete (1997) estima que a avaliação constitui-se em instrumento fundamental para a gerência quando utilizada sistematicamente pelos serviços, pois propicia mudanças com facilidade e agilidade ao revelar se as atividades desenvolvidas são adequadas e compatíveis com realidade sanitária local, podendo também indicar o impacto sobre o nível de saúde da população. Neste contexto julga-se que a avaliação de serviços públicos de saúde é de grande relevância, especialmente a avaliação da ESF, pois se trata de uma estratégia que se encontra em fase de implantação e com tendência a universalização, sendo os produtos desta avaliação importantes subsídios para o planejamento e implementação das ações de saúde. _______________________ 17 AGUILAR, M.J. & ANDER-EGG, E. Avaliação de serviços e programas sociais. Petrópolis, 1994. 55 O processo avaliativo, sobre a concepção de Contandripoulos et al., (1997), pode ser resultado da aplicação de critérios e normas (avaliação normativa) ou se configurar segundo análise científica (pesquisa avaliativa) Contandripoulos et al., (1997, p. 34) ressalta que a pesquisa normativa “é a atividade que consiste em fazer julgamento sobre uma intervenção, comparando os recursos empregados e sua organização (estrutura), os serviços ou bens produzidos (processo), e os resultados obtidos, com critérios e normas”. A pesquisa avaliativa [...] consiste em fazer julgamento ex-post de uma intervenção usando métodos científicos. [...] trata-se de analisar a pertinência, os fundamentos teóricos, a produtividade, os efeitos e o rendimento de uma intervenção, e o contexto no qual ela se situa, geralmente com o objetivo de ajudar na tomada de decisões (CONTANDRIPOULOS et al., 1997, p. 37). Ainda sobre a perspectiva de Contandripoulos et al., (1997) a pesquisa avaliativa pode ser decomposta em seis tipos de análise, análise estratégica, análise da intervenção, análise da produtividade, análise dos efeitos, análise do rendimento e análise da implementação, cabendo ao pesquisador optar por uma ou mais destas análises para abordagem do objeto de estudo18. No presente estudo utilizou-se a pesquisa avaliativa na análise dos efeitos, que de acordo com Contandripoulos et al., (1997, p. 42), “[...] consistirá em determinar a eficácia dos serviços para modificar os estados de saúde”, mais precisamente fundamentaremos nosso estudo na eficácia de utilização dos serviços através de variáveis relativas aos usuários, que revelem a aceitabilidade e a aprovação que estes atribuem a ESF. 3.5.1 A qualidade na concepção do processo avaliativo Tendo-se em vista que um dos objetivos dos serviços de saúde é a assistência de qualidade torna-se viável a discussão acerca das dimensões do atributo qualidade. _____________ 18 Para maiores esclarecimentos em relação aos tipos de análise propostas por Contandripoulos consultar CONTANDRIPOULOS, A.P.; CHAMPAGNE, F.; DENIS, J.L.; PINEAULT, R. A Avaliação na Área da Saúde: conceitos e métodos. In: Hartz, Z.M.A. (org.). Avaliação em Saúde: dos modelos conceituais à prática na análise da implantação de programas. Rio de Janeiro: Fiocruz, 1997, cap. 2, p. 37-45. 56 Segundo Vuori19 (1989, apud AKERMAN; NADANOVSKY, 1992) o termo qualidade está relacionado a diversas características desejáveis na prestação da assistência à saúde, tais como a efetividade, a eficiência, a equidade, a aceitabilidade, a acessibilidade e a adequabilidade. Vuori (1989, apud AKERMAN; NADANOVSKY, 1992) ainda afirma que é necessário especificar qual aspecto da qualidade se deseja abordar: quem define qualidade ou quem seria o beneficiário desta qualidade. Akerman e Nadanovsky (1992) exemplificam dizendo que planejadores estariam interessados na equidade dos serviços, administradores procurariam formas eficientes de provisão, médicos estariam preocupados com os resultados de suas condutas e os usuários dariam atenção aos aspectos relacionados ao acesso a assistência e ao tratamento dispensado pelos profissionais de saúde, sendo o último aspecto pertinente a esta investigação, onde se propôs analisar a qualidade da assistência prestada pela ESF sobre a ótica dos usuários. Reis et al., (1990) descrevem que o autor que mais se aproxima da proposta de avaliação de qualidade é Donabedian, o qual tem desenvolvido uma discussão sistemática sobre o assunto. Donabedian20 (1980, apud SILVA; FORMIGLI, 1994) inicialmente afirma que a qualidade é uma propriedade do cuidado médico caracterizado pela dimensão técnicocientífica, pela relação profissional-usuário e pelas ‘amenidades’ que incluiria o conforto e adequação das instalações e a provisão e funcionamento dos equipamentos. Em seguida, Donabedian, Wheeler e Wyszewlanski21 (1982, apud SILVA; FORMIGLI, 1994) define a qualidade como a intervenção capaz de alcançar o melhor balanço entre benefícios e riscos. Em artigo publicado posteriormente Donabedian22 (1990, apud SILVA; FORMIGLI, 1994) considera a qualidade como um fenômeno complexo, que envolve os seguintes atributos do cuidado médico: a eficácia, a efetividade, a eficiência, a otimização, a aceitabilidade, a legitimidade e a eqüidade. _______________________ 19 VOURI. H., Research needs in quality assurance. Quality Assurance in Health Care, 1989, 147-159. DONABEDIAN, A. The definition of quality: A conceptual exploration. In: DONABEDIAN, A. Explorations in Quality Assessment and Monitoring. Anm. Arbor. Michigan: Health Administration Press, 1980, p. 3-31. 21 DONABEDIAN, A., WHEELER, J.R.C. & WYSZEWLASKI, L. Quality, cost and health: An integrative model. Medical Care, n. 20, p. 975-992, 1982. 22 DONABEDIAN, A. The seven pillars of quality. Archives of Pathology Laboratory Medicine, n. 114, p. 1115118, 1990. 20 57 Neste momento cabe também analisar as descrições do termo qualidade, ao qual é conferido um caráter multidimensional, englobando aspectos de natureza objetiva e subjetiva. Etimologicamente a palavra avaliar, em sua raiz latina indica medir por padrões quantificáveis (natureza objetiva) e, em grego, o radical axiós induz à noção de construção de juízos, pois lida com valores e, portanto, com medidas qualitativas (natureza subjetiva). (FIGUEIREDO; TANAKA, 1996; UCHIMURA; BOSI, 2004). De acordo com Uchimura e Bosi (2004, p. 89) [...] as análises voltadas ao estudo dos componentes [...] constituiriam estudos de qualidade em sua dimensão objetiva, ou seja, avaliações da qualidade formal de um programa. Já os estudos centrados na análise subjetiva da qualidade, que buscam apreender a experiência vivencial de atores sociais que interagem com o programa ou serviço, sejam eles usuários, técnicos, gestores ou políticos, caracterizariam estudos de avaliação qualitativa de programas. Apesar da avaliação de serviços de saúde constar em enfoques variados, no campo específico da saúde pública, a qualidade dos programas e serviços de saúde é abordada quase que exclusivamente sob o enfoque objetivo, em âmbito técnico e racionalizador, privilegiando dados quantitativos através de medições estatísticas, o que vem a ser justificado pela influência dos pressupostos positivistas hegemônicos (SANTOS et al., 2005; UCHIMURA; BOSI, 2004). Atualmente este paradigma, embasado nos dados quantitativos como suporte ideal para a avaliação, passa a ser questionado por diversos estudiosos, que apontam a subjetividade inerente a qualquer processo avaliativo. Pressupõe-se, então, que a avaliação de qualidade perpassa pela análise crítica de atores sociais que estão inseridos em contextos culturais, sociais e econômicos específicos e diferenciados (DESLANDES, 1997). Conforme afirma Deslandes a abordagem de qualidade utilizada em caráter objetivo, exclusivamente, torna-se criticável: [...] a avaliação de serviços, em sua prática institucional, reifica sua dimensão técnica e de operatividade de tal forma que, apesar de serem etapas fundamentais, obscurecem a discussão teórico-metodológica sobre o assunto. Este movimento não deixa de causar certo empobrecimento e dogmatismo, pois reduz um amplo campo de produção de conhecimento à sua instância técnica. [...] agindo assim, mistificam a técnica, revestindo-a de uma objetividade que se pretende indiscutível (DESLANDES, 1997, p. 104). 58 No entanto torna-se relevante citar que a avaliação em caráter objetivo é imprescindível para o planejamento e organização dos serviços de saúde, pois fornece importantes informações sobre perfil de morbidade e mortalidade, fatores de risco e seus determinantes, características sócio-demográficas e informações sobre serviços, que são indispensáveis para o conhecimento da situação de saúde em uma dada população (MOTA; CARVALHO, 1999). Demo23 (1999, apud UCHIMURA; BOSI, 2004, p. 85), afirma que os termos qualidade e quantidade não apresentam sentidos opostos, mas são faces de uma mesma realidade, pois ‘quantidade, para qualidade, é base e condição’ e a ‘qualidade, por sua vez, aponta para a dimensão da intensidade’. Segundo Donabedian24 (1988, apud Libério 2001, p. 67), [...] “antes de iniciar uma pesquisa de avaliação é necessário definir qual o conceito de qualidade será utilizado”. Assim sendo, no presente estudo optou-se pela qualidade em sua dimensão subjetiva, a qual habita o espaço das vivências dos atores sociais. E concorda-se com Deslandes (1997) quando este afirma que a avaliação de qualidade em saúde deve considerar as análises dos sujeitos sociais envolvidos nos serviços/programas, sendo estas imbuídas de racionalidade e conexões histórico-sociais. De acordo com Santos et al., (2005, p. 694) a metodologia de avaliação qualitativa “possibilita melhor acesso ao fenômeno focalizado e melhor compreensão acerca da complexidade da subjetividade e das expectativas do usuário, entendendo-o como cidadão e principal definidor do que seja qualidade dos serviços de saúde”. 3.5.2 Satisfação dos usuários: traçando uma proposta de avaliação para a Estratégia Saúde da Família Silva e Formigli (1994) relatam que o referencial teórico da avaliação informa o meio pelo qual o avaliador vai descrever e apreender o real. _______________________ 23 DEMO, P. Avaliação Qualitativa. São Paulo: Cortez, 1999. DONABEDIAN, A. The Quality of care. How can it be assessed?, 1988. Disponível em: http://www.nebinlm.nih.gov. Acesso em: 26 jul. 1999. 24 59 De acordo com estas mesmas autoras, a classificação que mais se adapta às possíveis abordagens para avaliação em saúde foi desenvolvida por Donabedian, que articula a tríade estrutura-processo-resultados, com base no referencial teórico sistêmico. Reis et al., (1990) assinalam que nas últimas duas décadas os estudos sobre a qualidade dos serviços de saúde têm-se baseado em uma ou mais das propostas de Donabedian. O estudo da estrutura compreende elementos mais estáveis da assistência à saúde. Fazem parte desta formulação às características referentes à área física, recursos materiais e humanos (relativo à quantidade, perfil profissional, preparação e experiência). Tal estudo visa descobrir em que medida os recursos utilizados são adequados para atingir os objetivos propostos. (CONTANDRIOPOULOS et al., 1997; FONSECA, 2001; GOMES; HARTZ, 2001; REIS et al., 1990). Segundo Motta (2001), a avaliação da estrutura infere à medida de eficiência, que implica no cumprimento de normas e procedimentos internos, e, sobretudo, na redução de custos. Portanto a eficiência corresponde em alcançar os resultados propostos com o mínimo possível de recursos financeiros. Fonseca (2001) adverte que a avaliação de estrutura é essencial para delinear o contexto em que se processa a assistência, porém é uma forma indireta de avaliar a qualidade, na medida em que dispor de condições favoráveis não condiciona, necessariamente, a uma ação satisfatória. A avaliação de processo consiste na vinculação entre as ações exercidas pelos profissionais de saúde e a qualidade da atenção, através da associação de intervenções ou serviços e resultados esperados (FONSECA, 2001). Motta (2001) ressalta que ao utilizar o processo, avalia-se a eficácia da assistência, que se refere ao alcance dos resultados, ou seja, a quantidade e qualidade de produtos e de serviços produzidos. A avaliação do resultado sinaliza as variações no estado de saúde dos indivíduos em conseqüência da assistência prévia, assim como a satisfação dos usuários com o serviço (LIBÉRIO, 2001). Tanaka e Melo (2004) descrevem que ao avaliar um serviço de saúde é importante levar em consideração a percepção dos usuários, uma vez que estes são elementos participantes da organização dos mesmos e beneficiários da assistência prestada. 60 Segundo Donabedian25 (1993, apud JUNQUEIRA; AUGE, 1996) dentre os componentes da qualidade o que diretamente se relaciona com as expectativas dos usuários é o da aceitabilidade, o qual foi tomado como premissa neste estudo. De acordo com Junqueira e Auge (1996, p. 61) “a aceitabilidade refere-se à conformidade dos serviços a aspirações e expectativas dos pacientes e dos membros de sua família”. Donabedian26 (1993, apud JUNQUEIRA; AUGE, 1996) descreve que a aceitabilidade está relacionada a fatores relativos à interação médico-paciente e pacientesistema de saúde. Estes fatores envolvem a acessibilidade, a relação profissional-usuário, as dependências e instalações do serviço de saúde, as preferências do paciente em relação aos efeitos e aos custos do tratamento e tudo mais que o paciente considerar justo e unânime. A perspectiva da aceitabilidade inclui a utilização dos serviços mediante necessidades e expectativas, individuais ou coletivas, relacionadas a problemas de saúde. A partir da utilização dos serviços, os usuários terão ou não suas necessidades ou expectativas satisfeitas, sendo o nível de satisfação uma variável que possibilitará inferir a qualidade da assistência, desde a entrada até a saída da Unidade de Saúde (JUNQUEIRA; AUGE, 1996). Esperidião e Trad (2006, p. 1272) relatam que a [...] “satisfação do usuário constitui-se em um componente da aceitabilidade social, que representa a aceitação e aprovação de um serviço por parte da população”. A aceitação e aprovação de um serviço de saúde são influenciadas por fatores de ordem cultural e reveladas através de uma percepção subjetiva do usuário a respeito da assistência à saúde que lhe é dispensada, sendo o grau de satisfação ou insatisfação decorrente das representações do usuário sobre o processo saúde doença, dentre outros (SILVA; FORMIGLI, 1994). Trad et al., (2002) enfatizam que é importante levar em consideração que uma avaliação dos níveis de satisfação o sujeito contempla uma ou mais combinações dos seguintes elementos: um ideal de serviço, uma noção de serviço merecido, uma média da experiência passada em situações de serviços similares, e um nível subjetivo mínimo da qualidade de serviços a alcançar para ser aceitável. ____________ 25 DONABEDIAN, A. Defining and assessing the quality of health care. São Paulo: Faculdade de Saúde Pública/USP. 1993. Mimeografado. 26 DONABIDIEN, A. Defining and assessing the quality of health care. São Paulo: Faculdade de Saúde Pública – USP, 1993. Mimeografado. 61 De acordo com Stencel, Misoczky e Oliveira (2005, p. 98) la satisfacción de los usuarios puede ser evaluada por un conjunto de factores: las condiciones de acceso; la capacidad de resolución del problema que ocasionó la demanda; la atención en sí (recepción, medico, odontólogo, enfermería); y las condiciones ambientales en que se da la atención (limpieza y conforto de las instalaciones, condiciones del edificio y equipamientos) 27 . A satisfação do usuário, entendida na sua conexão com a percepção, pode ser considerada como um dos componentes da avaliação da qualidade dos serviços de saúde, pois o grau de satisfação determina a adesão ao tratamento medicamentoso, às medidas preventivas e determina o retorno ou não ao referido serviço (BRASIL, 2006c; SILVA; FORMIGLI, 1994). Akerman e Nadanovsky (1992) declaram que não se pode ter um serviço de alta qualidade quando o alvo deste serviço, o usuário, não estiver satisfeito. Vale salientar que ao realizar uma abordagem do grau de satisfação ou insatisfação do usuário não se deve realizá-la de forma dicotômica, pois deixam de ser contempladas considerações como crenças, estilos de vida e concepções sobre o processo saúde-doença, fatores que influenciam diretamente na maneira como se dá utilização dos serviços por parte dos usuários (TRAD et al., 2002). Ao optar pela avaliação em saúde através da natureza subjetiva julga-se conveniente realiza-la sob a proposta de Donabedian, com ênfase nos resultados, através da abordagem da satisfação dos usuários sobre a perspectiva da aceitabilidade. Acredita-se que a satisfação do usuário contemple o objetivo final de todo serviço de saúde, sendo a satisfação expressa pelo usuário um objeto representativo de suas esperanças e desejos, constituindo-se instrumento útil no planejamento e organização da assistência. ____________ 27 A satisfação dos usuários pode ser avaliada por um conjunto de fatores: as condições de acesso; a capacidade de resolução do problema que ocasionou a demanda; o atendimento em si (recepção, médico, dentista, enfermaria); e as condições ambientais nas quais se deu o atendimento (limpeza e conforto das instalações, condições do edifício e equipamentos). 62 Ao considerar que uma das estratégias do governo federal para melhoria da atenção à saúde é o fortalecimento da gestão democrática através do controle social das políticas públicas, conclui-se que a metodologia de avaliação da satisfação dos usuários contempla esta estratégia ao propiciar ao usuário a oportunidade de opinar sobre as políticas públicas e avaliar o atendimento a ele dispensado. Portanto a avaliação de serviços através da satisfação dos usuários facilita o exercício da cidadania e assegura um direito constante na Lei Orgânica da Saúde, Lei 8.142/90 (BRASIL, 1990). 63 4 TRAJETÓRIA METODOLÓGICA 4.1 Referencial teórico-metodológico Encontrou-se no materialismo histórico e dialético a fundamentação teóricometodológica favorável à interpretação do movimento dinâmico da realidade social em estudo – a qualidade da assistência à saúde, concebida sob a perspectiva da satisfação dos usuários. Minayo (2002) descreve que o materialismo histórico e dialético busca apreender a prática social dos indivíduos em sociedade e formalizar críticas ideológicas mediante a imbricamento do sujeito e do objeto, ambos históricos e comprometidos com os interesses e lutas sociais de sua época. No processo de evolução social surgem rupturas de práticas hegemônicas, impondo ao cenário histórico-social novas regras que implicam, consequentemente, em geração de novos conhecimentos acerca das transformações do mundo real. A produção do conhecimento envolve a abstração do mundo material para o mundo teórico, levando a melhor compreensão sobre as concepções cotidianas. Neste sentido a aplicação da lógica dialética permite-nos reconhecer a especificidade histórica e a construção social dos fenômenos existentes, propiciando agir conscientemente para a transformação a partir da nova visão construída da realidade (RICHARDSON, 1999). Rezende (2007, p. 35) afirma que “a dialética materialista compreende os fenômenos como conseqüência de interações constantes entre natureza e sociedade, sendo a ação do ser humano que propicia o desenvolvimento natural”. A lógica dialética, desta maneira, considera que o fenômeno ou processo social tem que ser entendido nas suas determinações e transformações dadas pelos sujeitos. Compreende uma relação intrínseca de oposição e complementaridade entre o mundo natural e social, entre o pensamento e a base material (MINAYO, 2002, p. 25). Egry28 (1998, apud Rezende, 2007) destaca que a dialética significa o modo de pensar as contradições na qual a realidade é essencialmente processo, mudança e dever. É essa contradição que permite a constante transformação da realidade pela ação dos homens. ____________ 28 EGRY, E.Y. Saúde coletiva: construindo um novo método em enfermagem. São Paulo: Ícone, 1996. 144 p. 64 Na perspectiva da avaliação, o serviço pode ser entendido como [...] um processo que possui movimento, uma dinâmica própria. È levada em conta a ação dos atores distintos que se aliam e se contrapõem, trata-se de uma busca hermenêutica por compreender antagonismos e consensos. Desta forma, avaliar é também decodificar conflitos visando ao entendimento da cultura institucional e da prática dos agentes que o serviço envolve. Trata-se também de analisar, dialeticamente, os movimentos sociais e a conjuntura histórica que o serviço participa, seja como porta-voz, interlocutor ou personagem de resistência (DESLANDES, 1997, p.105) Minayo e Sanches (1993) relatam que o método de pesquisa é o fio condutor para se estabelecer a articulação entre uma teoria e a realidade empírica. Mediante esta colocação e a premissa do materialismo histórico e dialético em abarcar condições objetivas e subjetivas como componentes de um todo da realidade social, que se elegeu como método para descrever e analisar o fenômeno em estudo a abordagem quali-quantitativa. Segundo Richardson (1999) a abordagem qualitativa justifica-se, sobretudo, por ser uma forma adequada para entender a natureza de um fenômeno social. Nas ciências sociais a pesquisa qualitativa responde a questões muito particulares. Ela se preocupa com um nível de realidade que não pode ser quantificado. Ou seja, ela trabalha com o universo de significados, motivos, aspirações, crenças, valores e atitudes, o que corresponde a um espaço mais profundo das relações, dos processos e dos fenômenos que não podem ser reduzidos à operacionalização de variáveis (MINAYO, 2004). A abordagem qualitativa parte do fundamento de que há uma relação dinâmica entre o mundo real e o sujeito, uma interdependência viva entre o sujeito e o objeto, um vínculo indissociável entre o mundo objetivo e a subjetividade do sujeito. O conhecimento não se reduz a um rol de dados isolados, conectados por uma teoria explicativa; o sujeito-observador é parte integrante do processo de conhecimento e interpreta os fenômenos, atribuindo-lhes um significado (CHIZZOTTI, 2001, p. 79). Menga e André (1986) descrevem que o estudo qualitativo é aquele que se desenvolve numa situação natural; é rico em dados descritivos, tem um plano aberto e flexível, e focaliza a realidade de forma complexa e contextualizada. Minayo e Sanches (1993) referenciam que a abordagem quantitativa atua em níveis de realidade e tem como campo de práticas e objetivos elucidar dados, indicadores e 65 tendências observáveis, apropriando-se da linguagem de variáveis para especificar atributos e qualidades do objeto de investigação. O método quantitativo representa, também, a intenção de garantir a precisão dos resultados, evitar distorções de análise e interpretação, possibilitando uma margem de segurança em relação às inferências (RICHARDSON, 1999). Minayo e Sanches (1993) comentam que os métodos qualitativo e quantitativo não são opostos nem estaques, mas contínuos, e quando utilizados simultaneamente permitem que fenômenos sociais sejam analisados em seus aspectos mais concretos, e aprofundados em seus significados mais essenciais. Tanaka e Melo (2004) aconselham a utilização da abordagem quali-quantitativa para avaliação de serviços de saúde, visto que estes são alta heterogeneidade e complexidade. A mescla das duas abordagens possibilita avaliar deferentes aspectos do mesmo fenômeno, levando a uma resposta mais fidedigna da pergunta avaliativa. Enquanto o método quantitativo propicia uma visão geral do fenômeno avaliado, o método qualitativo permite encontrar explicações e aprofundar os aspectos globais identificados quantitativamente. 4.2 Cenário do estudo O município de Santo Antônio do Monte situa-se na região centro-oeste do Estado de Minas Gerais e dista da capital Belo Horizonte 180 km. Ocupa uma área de 1136 Km2 e tem como limites ao Norte: Moema, Bom Despacho, Araújos e Perdigão; ao Sul: Arcos, Formiga e Pedra do Indaiá; a Leste: Divinópolis e São Sebastião do Oeste; a Oeste: Lagoa da Prata e Japaraíba (MORAES, 1983). Com base no Censo 2007 a população do município consta de 24.751 habitantes (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, IBGE, 2007). O município encontra-se habilitado na Gestão Plena da Atenção Básica, e conforme recomendação do MS, através da Norma Operacional de Assistência Saúde NOAS/SUS/01/2002, o gestor municipal assume a responsabilidade de organizar e executar as ações do sistema municipal de saúde, buscando garantir a eqüidade no acesso aos serviços em seus diferentes níveis de complexidade (BRASIL, 2002e). O serviço de saúde no município é constituído pela rede pública municipal – própria e contratada – por unidades filantrópicas e particulares. 66 A rede municipal pública é estruturada com sete ESF1’s (100% de cobertura da população), cinco Equipes de Saúde Bucal, dois Hospitais de pequeno porte contratados, um Laboratório de Análises Clínicas, uma Instituição Filantrópica com serviços especializados e de apoio diagnóstico (credenciado ao Programa Estadual Viva Vida), um Centro de Especialidades Médicas, um Centro de Atenção Psicossocial e uma Farmácia Básica. Os serviços que não estão disponíveis no município são pactuados com outros municípios da macroregião através da Programação de Ações Prioritárias (PAP). Dentre os serviços de saúde oferecidos pelo município optou-se por estudar a EFS devido à relevância e ao destaque atribuído à mesma pela gestão municipal, designando-a como área prioritária da assistência à saúde. A ESF foi implantada no município de Santo Antônio do Monte em 1994, e como nos demais municípios brasileiros, se fez jus devido à ineficácia do modelo tradicional, que se apresentava com baixa resolutividade e difícil acesso, gerando insatisfação do usuário e mantendo um quadro nosológico insatisfatório. Acreditava-se que através da abordagem multiprofissional, englobando práticas preventivas e de promoção da saúde, pautadas na vigilância da saúde, fosse possível contribuir positivamente para a qualidade de vida da população. Atualmente a APS do município conta com seis USF’s na zona urbana (USF 1, USF 2, USF 3, USF 4, USF 5 e USF 6 ) e uma na zona rural (USF 7)29. O serviço encontra-se bem estruturado e fundamentado segundo os princípios do SUS, exercendo ações individuais e coletivas, na Unidade e na comunidade, enfatizando a promoção da saúde e prevenção de agravos, além de práticas terapêuticas e reabilitadoras, conforme normalização do MS. O projeto do município é incrementar a APS com mais duas ESF1’s até o final 2008, pois ocorreu um crescimento populacional intenso nos últimos anos, levando algumas ESF1’s a atuar com o limite máximo de habitantes preconizado pelo MS. O presente estudo foi realizado nas seis USF’s da zona urbana. A escolha foi feita levando-se em consideração a dificuldade de acesso à zona rural e também a divergência de realidades vivenciadas entre zona urbana e zona rural – referentes ao aspecto organizacional e assistencial – o que dificultaria a generalização dos resultados para o município como um todo. _____________ 28 Com o objetivo de garantir o sigilo das informações obtidas às ESF foram atribuídos números e não seus nomes verdadeiros. 67 4.3 Técnica e instrumento para coleta de dados Minayo (2004, p. 107) afirma que “não se pode pensar um trabalho de campo neutro. A forma de realizá-lo revela as preocupações científicas dos pesquisadores que selecionam tanto os fatos a serem coletados como o modo de recolhê-los”. Neste sentido, determinou-se que o foco da abordagem seriam os eventos que permitissem elucidar a satisfação dos usuários em relação à oferta e a prestação da assistência pelas ESF1, optou-se por utilizar como técnica para coleta de dados a entrevista semiestruturada, onde se buscou obter as falas dos atores sociais, levando em consideração a singuralidade imbuída em cada um dos entrevistados. Minayo afirma que a entrevista é instrumento privilegiado de coleta de informações, e complementa que o fato que garante caracteriza-la de tal forma [...] é a possibilidade de a fala ser reveladora de condições estruturais, de sistemas de valores, normas e símbolos (sendo ela mesma um deles) e ao mesmo tempo ter a magia de transmitir, através de um porta-voz, as representações de grupos determinados, em condições históricas, sócio-econômicas e culturais específicas (MINAYO, 2004, p. 109-110). No estudo em questão as entrevistas foram realizadas no domicílio do entrevistado. Inicialmente as entrevistas foram aplicadas por completo, gravadas em aparelho digital, de forma a preservar a totalidade e a fidedignidade das informações obtidas e posteriormente transcritas, propiciando a ordenação dos dados, ficando sob posse da pesquisa as gravações contendo as falas dos entrevistados. A partir do momento em que as falas dos entrevistados apresentaram certa semelhança, ou seja, ocorreu a saturação das falas, optou-se por continuar as entrevistas apenas com as questões fechadas. As entrevistas foram aplicadas pela pesquisadora (questões abertas e fechadas) e por duas entrevistadoras (apenas questões fechadas), sendo estas previamente treinadas pela pesquisadora. Durante o treinamento foram abordados itens relativos aos objetivos da pesquisa, a técnica para coleta dos dados e a discussão de cada questão do instrumento isoladamente. O ponto de partida para a coleta dos dados foi a realização de um projeto piloto constando de quatro entrevistas, cujo objetivo foi verificar a necessidade de adequação do instrumento e estimar o tempo médio de duração de cada entrevista. Neste processo verificou- 68 se a necessidade de reformular o questionamento referente à promoção da saúde, no sentido de tornar a linguagem mais acessível, facilitando o entendimento do usuário. Em relação ao tempo de duração das entrevistas contabilizou-se uma variação de 16 a 37 minutos. O instrumento para coleta de dados (APÊNDICE A) foi adaptado a partir de um estudo realizado por Gaioso (2007) que por sua vez teve como referencial teórico Donabedian e a Pesquisa Nacional de Avaliação da Satisfação dos Usuários do SUS. O referido instrumento consta inicialmente de questões gerais que possibilitam a caracterização do entrevistado através do sexo, idade, tempo de residência na área, escolaridade, renda familiar, plano de saúde, utilização de serviços públicos de saúde e serviços utilizados na USF. A segunda parte do instrumento é constituída por questões relativas à satisfação dos usuários em relação à APS, abordando as seguintes dimensões: aspecto promocional, infra-estrutura, acessibilidade, relação equipe-usuário e resolutividade. Em relação às dimensões infra-estrutura, acessibilidade e relação equipe-usuário formulou-se questões fechadas em forma de escala (excelente, bom, regular, ruim, péssimo, não sei informar) e uma questão aberta norteadora do relato a ser desenvolvido para cada dimensão. Em relação à dimensão aspecto promocional formulou-se uma questão fechada em forma de escala (sim, não, não sei informar) e questões abertas, e no que se refere ao aspecto resolutividade elaborou-se apenas uma questão aberta. 4.4 Sujeitos da pesquisa Inicialmente realizou-se uma busca do número de famílias cadastradas pela ESF do município através do Sistema de Informação da Atenção Básica (SIAB). De acordo com o relatório do SIAB em 16 de abril de 2008 o município possuía 6460 famílias cadastradas. De posse deste relatório do SIAB visitou-se cada USF com o objetivo de identificar aquelas famílias que são usuárias da SF e que tiveram ao menos uma experiência de atendimento a partir do último semestre do ano de 2007. Foram enquadradas nestes critérios 4520 famílias, distribuídas da seguinte forma: USF 1 – 881 famílias, USF 2 – 658 famílias, USF 3 – 799 famílias, USF 4 – 621 famílias, USF 5 – 743 famílias e USF 6 – 818 famílias. Para identificação dessas famílias foram utilizados registros realizados pela ESF, como o prontuário do paciente, e também informações verbais concedidas pelos membros de cada ESF1. Após demarcar no relatório do SIAB o número do cadastro de cada família que se enquadrou nos critérios para participação na pesquisa procedeu-se a seleção da amostra 69 utilizando a técnica de amostragem sistemática, que de acordo com Gil (1999), é um método satisfatório quando se dispõe de uma listagem que propicia a identificação de cada elemento da população. O primeiro passo foi a realização de um sorteio entre as vinte primeiras famílias listadas no relatório para identificar a família com a qual se iniciaria as entrevistas. A família sorteada foi a família de número 16, sendo esta família a primeira a fazer parte da amostra. Posteriormente selecionou-se as próximas famílias seguindo um intervalo de vinte em vinte, contando horizontalmente na planilha. Foi considerado 5% do total de famílias usuárias da SF e com ao menos uma experiência de atendimento a partir do último semestre do ano de 2007, ou seja, das 4520 famílias fizeram parte da amostra 226 famílias. A seleção dos entrevistados foi realizada proporcionalmente ao número de famílias de cada UFS e em cada microárea. Por exemplo, a USF 1 possuía no momento da seleção 881 famílias usuárias e com ao menos uma experiência de atendimento a partir do último semestre do ano de 2007, 5% desse valor corresponderia a 44 entrevistas. A microárea 01 desta USF possuía 168 famílias, que representava 19% do total de famílias dessa USF, percentual equivalente a 8,3 famílias nessa microárea, logo deveriam ser realizadas 8 entrevistas na microárea 01. O número foi aproximado de acordo com o decimal após a vírgula, sendo arredondado para mais o decimal igual ou maior que 5 e para menos o decimal menor que 5. Procedeu-se desta maneira até a última microárea da USF 6. Ao final do procedimento ficou estabelecido que na USF 1 deveriam ser entrevistadas 44 famílias, na USF 2 – 33 famílias, na USF 3 – 40 famílias, na USF 4 – 31 famílias, na USF 5 – 37 famílias e na USF 6 – 41 famílias, totalizando 226 famílias no município. Após a seleção das famílias participantes da pesquisa os ACS’s foram conectados, sendo solicitado que estes atribuíssem o endereço correspondente a cada família selecionada em sua microárea. Foram sujeitos da pesquisa indivíduos cadastrados e usuários da ESF do município, sendo considerado como respondente apenas um membro de cada família. Considerou-se como critérios para inclusão dos sujeitos da pesquisa: a) indivíduos com idade superior a 18 anos que estivessem presentes no momento da entrevista, de preferência o responsável pela família, b) ter tido ao menos uma experiência de atendimento na USF a partir do último semestre do ano de 2007, o que garantiu entrevistar não só indivíduos cadastrados pela SF, mas usuários do serviço com contato recente. Como critérios de exclusão de sujeitos e famílias, utilizou-se: a) domicílios fechados por mudança ou falecimento, b) 70 domicílios vazios no momento da visita, sendo que neste caso foram realizadas até duas visitas em horários distintos, e se ainda nenhum membro da família estivesse presente a referida família foi excluída; c) sujeitos que se recusassem em participar da pesquisa; d) sujeitos que não se encontrassem em plenas condições mentais para responder satisfatoriamente a entrevista. A coleta de dados ocorreu nos meses de abril e maio de 2008 no período da manhã e tarde. Das 226 famílias selecionadas foi possível entrevistar 188, pois 37 usuários, se recusaram em participar do estudo sendo, seis na USF1, sete na USF 2, seis na USF 3, seis na USF 4, sete na USF 5 e cinco na USF 6, e também foi exclusa da pesquisa uma usuária da USF 3 que apresentava alteração da função mental. Frente ao ocorrido a distribuição das entrevistas por USF passou a ser a seguinte: USF 1 – 38 entrevistas, representando 20,2% das 188 entrevistas, USF 2 – 26 entrevistas (13,8%), USF 3 – 33 entrevistas (17,6%), USF 4 – 25 entrevistas (13,3%), USF 5 – 30 entrevistas (16,0%) e USF 6 – 36 entrevistas (19,1). 4.5 Procedimentos éticos e legais Solicitou-se à Secretaria Municipal de Saúde (SMS), na pessoa do Sr. Secretário Municipal de Saúde autorização para desenvolvimento do projeto de pesquisa (APÊNDICE B), o qual concedeu um parecer favorável. A pesquisa foi desenvolvida e fundamentada segundo os princípios éticos da Resolução número 196/96 do Conselho Nacional de Saúde sobre pesquisa envolvendo seres humanos, cumprindo todas as exigências e regulamentações específicas contidas nesta Resolução. Todos os indivíduos selecionados foram previamente informados de forma completa e pormenorizada sobre a natureza e os objetivos da pesquisa. Aos sujeitos envolvidos foi garantido sigilo absoluto de sua identidade e das informações fornecidas, sendo os mesmos informados sobre a posterior publicação dos resultados da pesquisa para fins científicos. Foram incluídos na pesquisa apenas aqueles sujeitos que concordaram em participar do estudo assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (APÊNDICE C). O projeto de pesquisa foi enviado ao Comitê de Ética em Pesquisa da FUNEDI/UEMG o qual foi avaliado e aprovado sobre o parecer número 17/2006 em 20/12/2006 (ANEXO A). 71 4.6 Análise dos dados A análise dos dados quantitativos e qualitativos foi realizada simultaneamente, visando proporcionar uma relação de complementaridade entre os mesmos. No tratamento dos dados quantitativos utilizou-se o software do programa Microsoft Office Excel 2003 para digitação e, posteriormente processou-se estes dados, propiciando, desta forma, a classificação, mensuração e análise, buscando propor uma explicação para a realidade percebida e observada a partir do conjunto de dados reunidos. Para a análise dos dados qualitativos utilizou-se a análise de conteúdo, que segundo Bardin pode ser definida como [...] um conjunto de técnicas de análise de comunicação visando obter, por procedimentos sistemáticos e objetivos de descrição do conteúdo das mensagens, indicadores (quantitativos ou não) que permitam a inferência de conhecimentos relativos às condições de produção/recepção das mensagens (BARDIN, 1979, p. 42). Chizzotti (2001) relata que o objetivo da análise de conteúdo é compreender criticamente o sentido das comunicações, seu conteúdo manifesto ou latente, as significações explícitas ou ocultas. Minayo (2004) descreve que a análise de conteúdo pode ser realizada mediante diversas técnicas: análise de expressão, análise de relações, análise de avaliação ou representacional, análise de enunciação e análise temática30. No presente estudo adotou-se como técnica de análise de conteúdo a análise temática que segundo Minayo (2004) consiste em descobrir os núcleos de sentido que compõem uma comunicação, cuja presença ou freqüência, tenham significância para o objetivo analítico proposto. Ou seja, utiliza-se da contagem de freqüência das unidades de significação como definitórias do caráter discursivo. Realizou-se a operacionalização da análise temática mediante o cumprimento das três etapas propostas por Minayo (2004), a pré-análise, a exploração do material e o tratamento dos resultados obtidos e interpretação. _____________ 30 Para maior aprofundamento nestes conceitos consultar MINAYO, M.C.S. O Desafio do Conhecimento: Pesquisa Qualitativa em Saúde. São Paulo: Hucitec, 2004. 269p. 72 A primeira etapa, a pré-análise, consiste na escolha dos documentos a serem analisados, na retomada das hipóteses e objetivos, reformulando-os segundo o material coletado e na definição de indicadores que orientem a interpretação final (MINAYO, 2004). Assim sendo, de posse do material coletado, realizou-se a transcrição das entrevistas e leituras exaustivas e repetidas do material empírico, procurando ordená-lo e agrupa-lo em conteúdos semelhantes de forma a atender os objetivos propostos. A exploração do material consiste na operação de codificação a fim de alcançar o núcleo de compreensão do texto (MINAYO, 2004). Nesta segunda fase aplicaram-se os resultados obtidos na pré-análise, classificando os dados em estruturas de relevância e conformando temas para indexação de conteúdos. Desta maneira conformaram-se quatro temas para a indexação dos conteúdos: 9 Caracterização da acessibilidade na Saúde da Família; 9 Humanização da assistência: diferencial do cuidado em saúde; 9 A qualidade da assistência; 9 Promoção da saúde: entre a teoria e a prática. Estes temas são constituídos por itens que se convencionou chamar de aspectos de análise, sendo os seguintes: a integralidade e a coordenação da assistência compondo o acesso a APS, acolhimento e humanização, espaços de ambiência que garantem a longitudinalidade do cuidado em saúde, a qualidade da assistência caracterizada pelo desempenho profissional, infra-estrutura e resolutividade e a promoção da saúde como dispositivo para mudanças no modelo assistencial. Na última etapa, o tratamento dos resultados obtidos e interpretação, os resultados brutos são submetidos a operações estatísticas simples ou complexas, evidenciando as informações obtidas. Neste ponto o pesquisador propõe inferências, realiza interpretações com vistas ao quadro teórico e abre novas perspectivas em torno de dimensões teóricas sugeridas pela leitura do material (MINAYO, 2004). Neste momento realizou-se interpretações acerca das dimensões teóricas originárias da exploração dos dados coletados e articulou-se o material empírico, ultrapassando a simples descrição dos dados, buscando estabelecer relações que possibilitassem novas explicações e interpretações. 73 5 ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS Neste capítulo buscou-se apresentar e discutir os resultados trazendo em primeiro plano o perfil dos sujeitos da pesquisa e posteriormente a análise dos temas identificados: caracterização da acessibilidade na Saúde da Família, humanização da assistência: diferencial do cuidado em saúde, a qualidade da assistência e promoção da saúde: entre a teoria e a prática. 5.1 Sujeitos da pesquisa: perfil socioeconômico e utilização dos serviços de saúde Antes de apresentar a visão do usuário, suas expectativas e satisfação em relação aos serviços de saúde, julga-se importante traçar o perfil socioeconômico dessa clientela, visto que a população possui características próprias que determinam a maneira de procurar e utilizar os serviços de saúde. Os sujeitos da pesquisa foram caracterizados mediante a avaliação das seguintes variáveis: sexo, idade, escolaridade, renda familiar, tempo de residência na área e o fato de possuir ou não plano de saúde. Foram analisadas, também, as variáveis relativas à utilização dos serviços de saúde, incluindo: serviços públicos de saúde utilizados e serviços utilizados na USF. TABELA 1 Distribuição numérica e percentual dos usuários participantes da pesquisa, segundo sexo masculino e idade, município de Santo Antônio do Monte, MG, 2008 Variável Idade 18 - 30 31 - 40 41 - 50 51 - 60 60 + TOTAL Masculino UFS 1 nº % 2 5,8 1 2,6 UFS 2 nº % 1 3,8 2 7,7 UFS 3 nº % 1 3,0 UFS 4 nº % 1 4,0 UFS 5 nº % - UFS 6 nº % 1 2,8 1 2,8 1 2,8 nº 1 1 3 6 3 3 1 1 - 3 11 27,3 27,3 9,1 9,1 - 27,3 Total % 9,1 9,1 27,2 54,6 100,0 74 TABELA 2 Distribuição numérica e percentual dos usuários participantes da pesquisa, segundo sexo feminino e idade, município de Santo Antônio do Monte, MG, 2008. Variável Idade 18 - 30 31 - 40 41 - 50 51 - 60 60 + TOTAL UFS 1 nº % 6 15,8 5 13,2 10 26,3 6 15,8 8 21,1 35 19,8 UFS 2 nº % 4 15,4 3 11,5 5 19,3 3 11,5 8 30,8 23 13,0 UFS 3 nº % 7 21,2 15 45,5 7 21,2 2 6,1 1 3,0 32 18,1 Feminino UFS 4 UFS 5 nº % nº % 8 32,0 11 36,6 5 20,0 8 26,7 6 24,0 6 20,0 4 16,0 5 16,7 1 4,0 24 13,6 30 16,9 UFS 6 Total nº % nº % 2 6,1 38 21,4 7 21,2 43 24,3 11 33,3 45 25,4 5 15,1 25 14,2 8 24,2 26 14,7 33 18,6 177 100,0 A TAB. 1 e 2 demonstram que entre os usuários participantes do estudo 177 (94,1%) são do sexo feminino e apenas 11 (5,85%) são do sexo masculino. Pesquisas realizadas no domicílio para levantamento da utilização dos serviços de saúde revelam uma predominância do sexo feminino, acontecimento que vem a ser corroborado no estudo em questão (PINHEIRO et al., 2002; RIBEIRO et al., 2006). Este evento justifica-se pelo fato da mulher exercer o papel de cuidadora da família e do lar, permanecendo a maior parte do tempo circunscrita ao ambiente domiciliar, local onde foram realizadas as entrevistas. Ao analisar a distribuição geral por idade verifica-se que a faixa etária de 41 a 50 anos foi a que abarcou maior de número de usuários 46, o que equivale a 24,5% do total de entrevistados, seguida pela faixa etária de 31 a 40 anos com 44 (23,4%) usuários. Entre o sexo feminino também prevaleceu a faixa etária de 41 a 50 anos com 45 (25,4%) usuários e no sexo masculino houve uma maior concentração de usuários na faixa etária 60 anos ou mais, ou seja, 6 usuários, o que corresponde a 54,6% dos entrevistados, fatos que podem ser observados na TAB. 1 e 2. A USF 5 foi a que apresentou população mais jovem, totalizando 11 pessoas ou 28,9% dos entrevistados com idade entre 18 e 30 anos, seguida da USF 4 com 8 (21,0%), USF 3 com 7 (18,4%), USF 1 com 6 (15,8%), USF 2 com 4 (10,6%) e finalmente a USF 6 com 2 (5,2%) dos pesquisados. A USF 2 apresentou o maior percentual de idosos, com 10 entrevistados com idade superior a 60 anos, o que corresponde a 33,3% da população nesta faixa etária. Sequencialmente vieram as USF 1 e 6 com 9 (27,2%) idosos cada uma, as USF 3 e 4 com 2 (6,1%) idosos cada e por último a USF 5 onde não foi entrevistado nenhum idoso. 75 Conhecer a idade e o gênero da maior parte dos usuários do serviço de saúde torna-se relevante para adequação do mesmo, uma vez que a população apresenta demanda variável no decorrer do ciclo evolutivo, estando a demanda diretamente relacionada ao gênero. Macintyre et al.,31 (1999, apud Pinheiro et al., 2002) descrevem que embora as mulheres vivam mais que os homens, elas apresentam maior morbidade e problemas psicológicos e utilizam com mais freqüência os serviços de saúde. TABELA 3 Distribuição numérica e percentual dos usuários participantes da pesquisa segundo tempo de residência na área, município de Santo Antônio do Monte, MG, 2008 Tempo de Residência Menos de 1 ano 1 a 5 anos 6 a 10 anos 11 a 15 16 a 20 21 a 25 26 a 30 Mais de 30 anos TOTAL NFS 1 NFS 2 NFS 3 NFS 4 nº % nº % nº % nº % 1 3,8 2 8,0 6 15,8 4 15,4 12 36,4 7 28,0 5 13,1 10 30,3 4 16,0 8 21,1 6 23,0 8 24,2 5 20,0 6 15,8 7 27,0 3 9,1 1 4,0 6 15,8 3 11,5 3 12,0 4 10,5 3 12,0 3 7,9 5 19,3 38 20,2 26 13,8 33 17,6 25 13,3 NFS 5 nº % 1 3,3 5 16,7 10 33,3 10 33,3 4 13,4 30 16,0 NFS 6 nº % 1 2,8 9 25,0 6 16,7 5 13,9 3 8,3 5 13,9 3 8,3 4 11,1 36 19,1 Total nº % 5 2,7 43 22,9 35 18,6 42 22,3 24 12,8 17 9,0 10 5,3 12 6,4 188 100,0 O tempo de residência na área propicia definir a existência de contato precoce ou duradouro com o serviço de saúde, o que leva a maior fidedignidade da resposta avaliativa. A TAB 3 revela que a maioria dos usuários, 43 ou 22,9% dos entrevistados residem na área entre 1 a 5 anos. Dos entrevistados 5 (2,7%) residem na área a menos de um ano e 12 (6,4%) residem na área a mais de 30 anos, sendo a maioria destes pertencentes a USF 2, a qual comporta, também, maior percentual de idosos. Assim sendo, observa-se que pequena parcela dos entrevistados apresenta tempo de residência inferior a um ano, e, consequentemente, contato menor com a USF. ______________ 31 MACINTYRE, S.; FORD, G.; HUND, K. Do women “over-report” morbidity? Men’s and women’s responses to structured prompting on a standard question on long standing illness. Social Science and Medicine 48, p. 8998, 1999. 76 TABELA 4 Distribuição numérica e percentual dos usuários participantes da pesquisa segundo grau de escolaridade, município de Santo Antônio do Monte, MG, 2008 Escolaridade Analfabeto Fundamental Incompleto Fundamental Completo Médio Incompleto Médio Completo Superior Incompleto Superior Completo Pós Graduação Incompleto Pós Graduação Completa TOTAL UFS 1 nº % - UFS 2 nº % 2 7,6 UFS 3 nº % 1 3,0 UFS 4 nº % 1 4,0 UFS 5 nº % 1 3,3 UFS 6 nº % - Total nº % 5 2,7 16 42,1 18 69,6 15 45,5 11 44,0 14 46,7 20 55,5 94 50,0 5 4 2 10 13,2 10,6 5,2 26,3 1 2 1 2 3,8 7,6 3,8 7,6 7 2 7 1 21,2 6,1 21,2 3 2 1 7 1 2 8,0 4,0 28,0 4,0 8 7 5 3 - 23,3 16,7 10,0 - 7 2 5 2 19,4 5,6 13,9 5,6 28 11 28 4 17 14,9 5,9 14,9 2,1 9 - - - - - - - - - - - - - - 1 2,6 - - - - - - - - - - 1 0,5 38 20,2 26 13,8 33 17,6 25 13,3 30 16,0 36 19,1 188 100,0 Em relação ao grau de escolaridade verificou-se que 94 usuários (50%) apresentam ensino fundamental incompleto, seguidos pelos usuários com ensino fundamental completo e ensino médio completo, ambos os níveis de escolaridade representado 28 (14,0%) entrevistados. Sequencialmente surgiram os entrevistados com superior completo 17 (9%), ensino médio incompleto 11 (5,9%), analfabetos 5 (2,7%), superior incompleto 4 (2,1%) e pós-graduação completa 1 (0,5) usuário, de acordo com a TAB.4. Segundo Ribeiro et al., (2006) a baixa escolaridade pode levar à exclusão social, pois nega ao homem o direito à cidadania, mantendo o ciclo da pobreza e da marginalidade, além de aliená-lo para as perspectivas de futuro. Assim sendo, o grau de escolaridade dos usuários reflete a situação social da família, melhor contextualizada quando associada à renda familiar. 77 TABELA 5 Distribuição numérica e percentual dos usuários participantes da pesquisa segundo a renda familiar, município de Santo Antônio do Monte, MG, 2008 Renda Mensal Familiar Nenhuma Menos de 415,00 415,00 a 829,00 830,00 a 1.244,00 1.245 a 1.659,00 1.660,00 a 2.074,00 2.075,00 a 4.114,00 Mais de 4.150,00 TOTAL UFS 1 nº % 11 29,0 12 31,6 8 21,0 3 7,9 4 10,5 38 20,2 UFS 2 nº % 6 23,0 14 54,2 2 7,6 2 7,6 1 3,8 1 3,8 26 13,8 UFS 3 nº % 4 12,2 8 24,2 15 45,5 3 9,1 1 3,0 1 3,0 1 3,0 33 17,6 UFS 4 nº % 2 8,0 4 16,0 12 48,0 2 8,0 3 12,0 1 4,0 1 4,0 25 13,3 UFS 5 nº % 22 73,3 7 23,4 1 3,3 30 16,0 UFS 6 Total nº % nº % 4 11,1 6 3,2 2 5,6 16 8,5 23 63,8 90 47,9 3 8,3 41 21,8 2 5,6 18 9,6 4 2,1 1 2,8 7 3,7 1 2,8 6 3,2 36 19,1 188 100,0 A maioria dos entrevistados 90 (47,9%) apresentaram renda familiar entre 1 a 2 salários mínimos, sendo que a maior parte destes se encontrava na USF 6. O segundo maior nível de concentração de renda ficou entre 3 a 4 salários mínimos, com 41 (21,8%) dos usuários. Vale ressaltar que 6 usuários referiram não possuir renda alguma, estando a maior parte destes (4 usuários) presentes na USF 6. Destaca-se que a USF 2 foi a que apresentou maior número de usuários 6 (3,2%) com renda inferior a um salário mínimo, e a USF 1 concentrou a maior renda mensal, com 4 (2,2%) usuários com renda superior a 10 salários mínimos. Ramos e Lima (2003) referem à condição econômica como fator determinante da escolha do serviço público de saúde em relação ao serviço privado, visto que ocorre uma semelhança no cuidado médico entre ambos, sendo um benefício do serviço público a possibilidade de aquisição de medicamento gratuitamente. Desta forma populações com renda menor são usuárias mais assíduas do serviço público de saúde, como fica evidenciado no presente estudo. TABELA 6 Distribuição numérica e percentual dos usuários participantes da pesquisa segundo posse de plano de saúde, município de Santo Antônio do Monte, MG, 2008 Plano de Saúde Sim Não TOTAL UFS 1 nº % 16 42,1 22 57,9 38 20,2 UFS 2 nº % 7 27,0 19 73,0 26 13,8 UFS 3 nº % 33 100,0 33 17,6 UFS 4 nº % 8 32,0 17 68,0 25 13,3 UFS 5 nº % 7 23,3 23 76,7 30 16,0 UFS 6 Total nº % nº % 6 16,7 44 23,4 30 83,3 144 76,6 36 19,1 188 100,0 78 Ao analisar a TAB. 6 verifica-se que dos 188 entrevistados apenas 23,4% possuíam plano de saúde (UNIMED), estando a maioria destes concentrados na USF 1, onde encontrava-se presente, também, o maior número de usuários com renda familiar superior a 10 salários mínimos. Entre os usuários que não possuíam plano de saúde, a maioria se concentrava na USF 2, a qual possui maior número de usuários com renda familiar inferior a um salário mínimo. De acordo com a Pesquisa Nacional por Amostras de Domicílios (PNAD) realizada em 1998 pelo IBGE, o número de brasileiros cobertos por pelo menos um plano de saúde é 38,7 milhões, o que equivale a 24,5% da população do país. Destes, 29 milhões (75%) estão vinculados a planos de saúde privados (operadoras comerciais e empresas com plano de auto-gestão) e 9,7 milhões (25%) estão vinculados a planos de instituto ou instituição patronal de assistência ao servidor público civil e militar. Entre os pesquisados observa-se uma associação positiva entre cobertura por plano de saúde e renda familiar, sendo a cobertura de 2,6% na classe de renda familiar inferior a um salário mínimo, 34,7% (5 a 10 salários mínimos) e 76% (20 salários mínimos ou mais) (IBGE, 2000). Percebe-se que entre entrevistados que possuem plano de saúde apenas 7 (15,9%) têm cobertura de todos os membros da família, seguidos por 21 (47,7%) entrevistados com cobertura de dois membros da família e por último, 16 (36,4%) famílias onde apenas um usuário é beneficiário do plano de saúde. Portanto a maioria dos entrevistados que possuem plano de saúde, não têm cobertura de todos os membros da família, fato que pode justificar a utilização dos serviços públicos de saúde. TABELA 7 Distribuição numérica e percentual dos usuários participantes da pesquisa segundo serviços públicos de saúde utilizados, município de Santo Antônio do Monte, MG, 2008 Serviços Públicos Utilizados USF Centro de Especialidades Fundação Dr. José Maria Mares Guia Laboratório Municipal Farmácia Municipal PA Municipal UFS 1 UFS 2 UFS 3 UFS 4 UFS 5 UFS 6 Total nº % nº % nº % nº % nº % nº % nº % 38 100,0 26 100,0 33 100,0 25 100,0 30 100,0 36 100,0 188 100,0 12 31,6 19 73,0 19 57,6 7 28,0 24 80,0 29 80,6 110 58,5 8 21,1 17 65,4 23 69,7 7 28,0 17 56,7 6 16,7 78 41,5 11 29,0 18 69,2 21 63,7 20 80,0 18 60,0 23 63,9 111 59,0 12 5 31,6 13,1 17 4 65,4 15,2 30 5 90,1 15,2 18 18 72,0 72,0 22 2 73,3 6,7 21 5 58,3 13,9 120 39 63,8 20,7 79 Todos os entrevistados relataram ser usuários do serviço público de saúde, sendo que 100% afirmaram ser usuários da USF. Os outros serviços de saúde citados foram: Centro de Especialidades Médicas 110 (58,5%), Fundação Dr. José Maria dos Mares Guia – Serviço de Apoio e Diagnóstico – 78 (41,5%), Laboratório Municipal 111 (59,0), Farmácia Municipal 120 (63,8) e Pronto Atendimento Municipal 39 (20,9), conforme a TAB. 7. Ao analisar o item serviços utilizados na USF, que incluiu consulta médica agendada, consulta médica eventual, consulta de enfermagem, preventivo, puericultura, grupo/palestra, procedimentos (como exemplos PA, vacinas, curativos) e outros com um campo para especificar, obteve-se as freqüências descritas na TAB. 8, lembrando que cada usuário poderia mencionar mais de um componente. TABELA 8 Distribuição numérica e percentual dos usuários participantes da pesquisa segundo serviços utilizados na Unidade Saúde da Família, município de Santo Antônio do Monte, MG, 2008 Serviços utilizados na USF Consulta Médica Agendada Consulta Médica Eventual Consulta de Enfermagem Preventivo Puericultura Grupo/Palestra Procedimentos Nutrição Odontologia UFS 1 nº % UFS 2 nº % UFS 3 nº % 28 73,7 24 92,4 26 20 52,6 11 Total nº % UFS 4 nº % UFS 5 nº % UFS 6 nº % 78,8 23 92,0 - - - - 101 53,7 23 88,4 18 69,2 16 64,0 - - - - 77 41,0 29,0 10 38,5 22 66,7 18 72,0 20 66,7 18 50,0 99 52,6 3 2 7,9 5,2 13 4 4 20 - 52,0 16,0 16,0 80,0 - 36,7 23,3 71,0 7,9 5,2 57,6 30,4 9,1 75,8 9,1 27,3 11 7 27 3 2 5 19,3 19 2 7,6 10 4 15,2 3 19 73,0 25 1 3,8 3 2 7,6 9 12 1 2 100,0 30 8,7 30,0 - 33,3 2,8 5,6 83,3 - 63 26 13 152 9 22 33,5 13,8 6,9 80,8 4,8 11,7 30 2 9 O serviço mais utilizado foi procedimentos com 152 (80,8%) citações, sendo que na USF 5 100% dos entrevistados relataram utilizar este serviço. Sequencialmente surgiu a consulta médica agendada, onde 101 (53,7%) dos entrevistados relataram utilizar o serviço. O maior percentual de utilização da consulta médica agendada foi alçando na USF 2 onde 92,4% dos entrevistados relataram utilizar o serviço. Nenhum dos entrevistados das USF 5 e 6 referiram utilizar a consulta médica, pois ambas as Unidades se encontravam sem o profissional médico no momento da coleta dos dados, evento que levou a uma queda no percentual geral de utilização deste serviço, porém a média de utilização do serviço entre as Unidades onde o médico estava presente foi de 84,2%, percentual superior ao item 80 procedimentos. Ao comparar os percentuais consulta médica agendada e procedimentos verifica-se que a procura por consulta médica é sempre superior a procedimentos e demais itens avaliados, conforme indica a TAB. 8. Dos entrevistados 77 (41,0%) descreveram utilizar com freqüência a consulta médica eventual32, sendo que a maioria das citações (29,9%) concentrou-se na USF 2. Ribeiro et al., (2003) realizaram um estudo para estabelecimento do padrão de utilização dos serviços de saúde pelos usuários dos SUS, o qual revela que a maior demanda os usuários é por consulta médica, motivadas por doenças ou por atividades de prevenção. A consulta de enfermagem foi citada como serviço utilizado por 52,6% dos usuários. Dentre as famílias entrevistadas 63 (33,5%) relataram utilizar o preventivo, sendo que a maior parte destes 19 (30,2%) pertenciam a USF 3. A puericultura foi citada por 26 (13,8%) dos entrevistados como procedimento utilizado, e novamente a maior parte dos usuários 10 (38,5%) pertenciam a área de abrangência da USF 3. As atividades educativas como grupos para educação em saúde e palestras são serviços utilizados por apenas 6,9% dos usuários, sendo que na USF 1 e 5 nenhum dos entrevistados relataram utilizar este serviço. Ribeiro et al., (2003) enfatizam que a reduzida procura pelas atividades preventivas esta diretamente relacionada ao nível de escolaridade e inserção social da população, que priorizam o atendimento médico-curativo em detrimento as atividades relacionadas à qualidade de vida. Ao questionar os usuários sobre outros serviços utilizados foram relatados a nutrição e a odontologia. Dos entrevistados 9 (4,8%) disseram utilizar a nutrição e 22 (11,71%) a odontologia, estando a maior parte dos usuários destes serviços concentrados nas USF 3 e 5. De acordo com Fekete (1997) ao se organizar os serviços de saúde deve levar em consideração a situação atual de saúde observada, sem perder de vista o fato de que tal situação é resultante das condições gerais de vida da população, fato que justifica a caracterização dos sujeitos participantes do estudo. ______________ 32 No presente estudo conceitua-se consulta médica eventual aquela decorrente uma intercorrência aguda, que exige atendimento rápido, impossibilitando agendamento prévio da consulta. 81 5.2 Caracterização da acessibilidade na Saúde da Família Através da Constituição Federal Brasileira de 1988, a saúde passa a ser um direito de cidadania, que deve ser garantido a todos os brasileiros mediante políticas sociais e econômicas que viabilizem acesso igualitário aos mais diversos serviços, incluindo ações direcionadas à prevenção de agravos, à promoção da saúde, e também, ações terapêuticas e reabilitadoras. O princípio do SUS que garante a acessibilidade aos serviços de saúde é o da universalidade, o qual traz em seu conceito o “acesso garantido aos serviços de saúde para toda a população, em todos os níveis de assistência, sem preconceitos ou privilégio de qualquer espécie” (BRASIL, 1994, p. 75). A SF, ao ser considerada como instrumento estrurante do SUS, deve obedecer aos princípios doutrinários contidos em sua legislação, incluindo o princípio da universalidade. No presente estudo o princípio da universalidade, no contexto da SF, foi analisado através da acessibilidade ao serviço, que de acordo com Fekete (1997, p.116) “permite apreender a relação existente entre as necessidades e aspirações da população em termos de ‘ações de saúde’, e a oferta de recursos para satisfazê-la”. Para fins didáticos utilizou-se a classificação de acessibilidade segundo Fekete (1997) que resulta da combinação de fatores de ordem geográfica, organizacional e sócio cultural. Nessas subcategorias foram encontrados elementos geradores de facilidades e dificuldades, sendo encontrado maior número de elementos dificultadores no tocante a acessibilidade organizacional. A acessibilidade geográfica, no conceito de Fekete (1997), envolve as características relacionadas à distância e ao tempo necessário para obter a assistência à saúde. A mensuração desse atributo pode ser realizada em função do tempo desprendido para alcançar a assistência à saúde, através dos meios habituais de transporte, e também pelas características físicas da área que impeçam ou dificultem o acesso ao serviço. A TAB. 9 revela a satisfação dos usuários com a distância entre a USF e seu domicílio, componente da acessibilidade geográfica investigado no presente estudo. 82 TABELA 9 Distribuição numérica e percentual dos usuários participantes da pesquisa segundo a satisfação com a distância entre a Unidade Saúde da Família e o domicílio do usuário, município de Santo Antônio do Monte, MG, 2008 Variável Escala Excelente Bom Regular Ruim Péssimo Não Sei TOTAL Distância da Unidade Saúde da Família e Domicílio do Usuário UFS 1 UFS 2 UFS 3 UFS 4 UFS 5 UFS 6 Total nº % nº % nº % nº % nº % nº % nº % 17 44,7 6 23 5 15,2 16 64 4 13,3 24 66,6 72 38,3 14 36,8 11 42,6 27 81,8 9 36 24 80 11 30,6 96 51,1 7 18,5 2 7,6 1 3 2 6,7 1 2,8 13 6,9 6 23 6 3,2 1 3,8 1 0,5 38 20,2 26 13,8 33 17,6 25 13,3 30 16 36 19,1 188 100 Ao analisar a TAB. 9 percebe-se que a classificação dos usuários em relação a acessibilidade geográfica se concentrou entre excelente e bom em 89,4% dos casos, apresentando o melhor índice de satisfação na USF 4. Vale ressaltar que apesar do município apresentar um revelo montanhoso, este fator não foi considerado pelos usuários como comprometedor da acessibilidade geográfica. Apenas 10,6% dos entrevistados classificaram o serviço como regular, ruim ou péssimo, sendo que a USF 2 concentrou o maior número destas respostas. Frente ao material empírico das entrevistas referente à acessibilidade geográfica verifica-se relato de satisfação da maior parte dos usuários, como a boa localização da USF, pequena distância da USF até seu domicílio, curto intervalo de tempo gasto no percurso até a USF e a possibilidade de não utilizar meio de transporte, fatores estes que facilitam chegar ao serviço de saúde. “A distancia é excelente. Eu vou a pé. É rapidinho, excelente mesmo!” (usuário USF 1) “Nossa! É pertinho, um pulo, é excelente!” (usuário USF 3) É pertinho. O Posto fica bem localizado para todo mundo. Eu acho ótimo, fica bem perto para mim. É na rua de cima da minha casa.” (usuário USF 4) “É bem próximo, não gasto 10 minutos. Dá para ir a pé” (usuário USF 5) 83 Alguns usuários, mais especificamente aqueles pertencentes à área de abrangência da USF 2 relataram certa insatisfação no que diz respeito a este quesito, fator que compromete, em algumas situações, a assistência à saúde. “Eu acho que poderia ser um pouquinho mais perto. Está mais próximo do centro que aqui do bairro. Para ir a pé quando está passando mal fica bem longe” (usuário USF 2) “Fica um pouco longe. Às vezes eles me pedem para eu ir lá três vezes na semana para fazer acompanhamento, mas eu não vou não, é longe” (usuário USF 2) “Se fosse mais perto seria mais fácil. Acho que é regular” (usuário USF 1) Ao investigar o meio de transporte utilizado e o tempo gasto por estes usuários verifica-se que eles não utilizam meio de transporte para chegar a USF e chegam ao seu destino em tempo razoavelmente curto. A insatisfação pode estar relacionada à proximidade maior da USF de outros domicílios, fato que está intimamente relacionado à localização da USF. “Eu vou a pé, levo 20 minutos para chegar lá” (usuário USF 2) “Em 20-30 minutos eu chego ao Posto. Não há necessidade de ir de carro não, só vou de carro se tiver disponível mesmo. Mas ônibus não vale a pena pegar, a pé eu chego mais rápido” (usuário USF 2) A acessibilidade organizacional, outro aspecto analisado na presente investigação, segundo Fekete (1997) reflete os obstáculos que se originam da organização dos recursos de assistência à saúde. Os obstáculos podem ser anteriores ao contato inicial ou se originar do mesmo. No primeiro caso estão inseridos fatores como a demora em obter uma consulta, a inadequação de horários e o tipo de agendamento. No segundo caso pode ser citado o tempo de espera para consulta médica e demais procedimentos, bem como obstáculos que surgem na continuidade da assistência, como nos mecanismos de referência e contra-referência. A acessibilidade organizacional aparece como questão relevante entre as falas dos usuários, sendo encontrados obstáculos que dificultam tanto o contato inicial, como no interior da USF. Uma característica do contato inicial que merece avaliação é o horário de funcionamento da USF. Estabelecer o nível de satisfação dos usuários em relação a este item 84 é de suma importância, uma vez que a ESF emerge como proposta de reorganização da APS, sendo classificada como porta de entrada do sistema. Apresenta-se na TAB. 10 a classificação dos usuários em relação ao horário de funcionamento da USF. TABELA 10 Distribuição numérica e percentual dos usuários participantes da pesquisa segundo a satisfação com o horário de funcionamento da Unidade Saúde da Família, município de Santo Antônio do Monte, MG, 2008 Variável Escala Excelente Bom Regular Ruim Péssimo Não Sei TOTAL UFS 1 nº % 5 13,1 33 86,9 38 20,2 Horário de Funcionamento da Unidade Saúde da Família UFS 2 UFS 3 UFS 4 UFS 5 UFS 6 Total nº % nº % nº % nº % nº % nº % 8 30,9 5 15,2 7 28 2 6,7 4 11,1 31 16,5 15 57,7 21 63,5 15 60 22 73,3 31 86,1 137 72,9 2 7,6 2 6,1 3 12 5 16,6 1 2,8 13 6,9 1 3,8 3 9,1 4 2,1 2 6,1 1 3,4 3 1,6 26 13,8 33 17,6 25 13,3 30 16 36 19,1 188 100 A TAB. 10 revela que 168 (89,4%) dos entrevistados classificaram o horário de funcionamento da USF como excelente e bom, e 20 (10,6%) classificaram este horário como regular, ruim ou péssimo, sendo que a USF 3 comporta maior número de usuários insatisfeitos com relação ao horário de atendimento. As narrativas dos usuários que correspondem ao horário de funcionamento da Unidade revelam elevado grau de satisfação. A maior parte dos entrevistados declarou que o horário de funcionamento atende bem a demanda e deixaram explícito o fato de saber diferenciar a proposta de atendimento da ESF e de um serviço que atende 24 horas, como é o caso do pronto atendimento. “O horário de atendimento é muito bom. Abre cedinho e vai o dia todo, até às cinco da tarde. [...] não fecha para almoço não, isso é excelente. A auxiliar de enfermagem está lá neste horário para atender. Faz uma vacina, um curativo, olha uma pressão...” (usuário USF4) “Por ser Posto está atendendo em um horário muito bom. Se a pessoa precisar mais tarde tem o Pronto Socorro disponível” (usuário USF6) “O horário é excelente, atende muito bem a demanda” (usuário USF 1) 85 De acordo com Pinheiro et al., (2002) os motivos da não utilização dos serviços públicos de saúde incluem a oferta insuficiente, demora no atendimento e inadequação de horários de atendimento. Frente a esta colocação cabe ressaltar que o município adotou um horário diferenciado de funcionamento para as USF’s. Na segunda, terça e quinta-feira a Unidade funciona de 7 às 17 horas, na quarta-feira a Unidade inicia suas atividades às 12 horas e encerra às 19 horas. Esta conduta se justifica porque grande número de usuários faz parte do operariado das indústrias pirotécnicas e exercem suas atividades diárias na zona rural do município, de 7 às 17 horas, sendo a alteração do horário de funcionamento uma alternativa viável para contemplar estes usuários. Na sexta-feira a equipe encontra-se presente na Unidade a partir das 7 horas, porém o atendimento ao público acontece de 8 às 17 horas. No período de 7 às 8 horas são realizadas reuniões de equipe. Percebe-se que este horário diferenciado de atendimento é entendido por alguns usuários como necessário, e por outros como causa de insatisfação, o que vem a ser comprovado nas falas que se seguem. “O horário é de sete da manhã às cinco da tarde, só na quarta-feira que começa atender meio dia. Eu acho um horário bom, porque o pessoal que trabalha na fábrica chega e consegue atendimento ainda” (usuário USF 4) “Eu acho o horário ruim, porque na quarta-feira só abre meio dia, ai a gente tem que esperar abrir para consultar (usuário USF 3) Em relação ao horário de atendimento da USF deve-se levar em consideração a preconização do MS, ou seja, os membros da ESF1 devem residir no município onde atuam e cumprir uma jornada de trabalho de 40 horas semanais (BRASIL, 2000; 2002a). A insatisfação em relação ao horário de atendimento esteve relacionada também ao fato da USF iniciar suas atividades na sexta-feira após as 8 horas, como se evidencia nas citações abaixo. “Na sexta-feira eles fazem uma reunião de sete às oito horas, eu fico me perguntado se isso é realmente necessário” (usuário USF 5) “Em relação ao horário de atendimento eu acho regular porque na sexta-feira só abre oito horas, eles ficam em reunião, ai tumultua tudo, acho que seria melhor começar às sete horas e eles se reunirem depois do expediente” (usuário USF 3) 86 “Ás vezes a gente chega na sexta-feira às sete horas passando mal querendo consultar, mas o Posto está fechado, tem uma plaquinha visando que está em reunião, ai a gente tem que esperar ou voltar mais tarde, acho que isso não poderia acontecer. Acho esse horário regular” (usuário USF 4) Cabe esclarecer que as reuniões em equipe constituem momentos em que os profissionais discutem situações vivenciadas pelas famílias que não requerem apenas o cuidado médico, mas que necessitam de intervenções mais amplas, incluindo a participação de outros segmentos públicos. Essas reuniões constituem, também, espaços para discussão de assuntos gerenciais e burocráticos. Cientes que realização das reuniões é essencial para o bom desenvolvimento do trabalho em equipe, julga-se necessário esclarecer de forma objetiva e permanente a finalidade dessas reuniões aos usuários, conscientizando-os que durante este momento o que se propõe é a melhor maneira de intervir sobre os problemas de saúde mais complexos apresentados pela população. Outro aspecto inerente ao contato inicial nas USF’s é o acesso à consulta médica agendada ou eventual. A avaliação dos usuários em relação a estes itens está descrita na TAB. 11 e na TAB. 12. TABELA 11 Distribuição numérica e percentual dos usuários participantes da pesquisa segundo a satisfação em relação à consulta médica agendada, na Unidade Saúde da Família, município de Santo Antônio do Monte, MG, 2008 Variável Escala Excelente Bom Regular Ruim Péssimo Não Sei TOTAL UFS 1 nº % 10 26,3 16 42,1 4 10,5 8 21,1 38 20,2 Acesso à Consulta Médica Agendada UFS 2 UFS 3 UFS 4 UFS 5 UFS 6 Total nº % nº % nº % nº % nº % nº % 15 57,7 1 3,0 7 28,0 33 17,6 4 15,4 5 15,2 11 44,0 36 19,1 5 19,3 10 30,4 4 16,0 23 12,2 9 27,1 1 4,0 10 33,3 20 55,5 40 21,3 3 9,1 20 66,7 14 38,9 37 19,7 2 7,6 5 15,2 2 8,0 2 5,6 19 10,1 26 13,8 33 17,6 25 13,3 30 16,0 36 19,1 188 100,0 87 TABELA 12 Distribuição numérica e percentual dos usuários participantes da pesquisa segundo a satisfação em relação à consulta médica eventual, na Unidade Saúde da Família município de Santo Antônio do Monte, MG, 2008 Variável Escala Excelente Bom Regular Ruim Péssimo Não Sei TOTAL UFS 1 nº % 6 15,8 13 34,2 3 7,9 16 42,1 38 20,2 UFS 2 nº % 16 61,6 3 11,5 4 15,4 3 11,5 26 13,8 Acesso à Consulta Médica Eventual UFS 3 UFS 4 UFS 5 UFS 6 Total nº % nº % nº % nº % nº % 3 9,1 7 28,0 32 17,0 9 27,1 6 24,0 31 16,5 5 15,2 3 12,0 15 8,0 3 9,1 10 33,3 20 55,5 33 17,6 1 3,0 20 66,7 14 38,9 35 18,6 12 36,5 9 36,0 2 5,6 42 22,3 33 17,6 25 13,3 30 16,0 36 19,1 188 100,0 Como se verifica na TAB. 11 e 12 a avaliação geral em relação ao acesso a consulta médica agenda e eventual não foi positiva. Dos entrevistados 53,2% classificaram o acesso à consulta agendada como regular, ruim ou péssimo. Em relação ao acesso a consulta eventual 44,2% dos usuários também se mostraram insatisfeitos. Este índice avaliativo justifica-se pelo fato de que no momento da coleta dos dados o profissional médico encontrava-se ausente na USF 5 e 6, onde prevaleceu o maior grau de insatisfação. “Ah, isso [consulta médica agendada e eventual] é péssimo, né? Não tem médico” (usuário USF5) “O Posto não pode ficar sem médico não. A agente adoece e ai? Como é que fica? Não tem como marcar consulta” (usuário USF 5) “Lá no Posto eles fazem o que podem para a gente, mas consulta a gente não consegue, porque não tem médico, só vez ou outra. É muito difícil, eu acho que neste ponto está ruim, precisa melhorar” (usuário USF 6) De acordo com o MS a SF deve realizar uma assistência integral, contínua e de qualidade, desenvolvida por uma equipe multiprofissional, composta minimamente por um médico, uma enfermeira, um técnico ou auxiliar de enfermagem e até 12 ACS’s (BRASIL, 2000). Julga-se que a equipe formada por profissionais de áreas diferentes, além de cumprir uma exigência do MS, tem maior probabilidade de atender a diferentes demandas, possibilitando lidar com a dinâmica da vida social das famílias assistidas, incorporando 88 procedimentos tecnológicos específicos e diversos saberes e práticas que são imprescindíveis a uma abordagem integral e resolutiva. Com o intuito de tentar minimizar a ausência do médico o município adotou o sistema de rodízio para garantir atendimento semanal nas Unidades onde o profissional está ausente, porém esta conduta não é aprovada pelos usuários, como se percebe através das narrativas que seguem. “Tem dia na semana que tem médico aqui, mas é médico de outro Posto que vem atender aqui e vai embora, acho que isso não resolve não, porque lá nesse dia fica sem médico e alguém pode precisar” (usuário USF 6) “Isso é regular [consulta eventual] porque às vezes a gente está com um problema que precisa ser atendido mais rápido e o médico está atendendo em outra Unidade, cobrindo lugar de outro médico. Aconteceu isso comigo ontem e eles pediram para voltar hoje” (usuário USF 1) Através das falas dos usuários é notória a ausência de um atributo da APS, a coordenação da atenção, que é decorrente do sistema de rodízio adotado pelo município. “Um tempo atrás o Dr. Fulano veio atender aqui e eu consegui consultar. Eu estava passando muito mal com uma infecção de urina. Ele passou o medicamento e pediu exames, e pediu para eu voltar depois para mostrar os exames e falou também que eu deveria voltar em três meses para fazer acompanhamento. Já passou três meses e eu não voltei, porque não tem médico ainda, né? E também consultar com outro médico não vai resolver, ele não vai saber do caso, fica tudo muito difícil” (usuário USF 5) “Eu estava fazendo exames com o Dr. Fulano ai quando eu pensei em entregar para ele, ele já não estava mais lá, entendeu?” (usuário USF 5) Mesmo expressando insatisfação em relação à ausência do médico, os usuários deixam claro que nos casos de urgência eles conseguem a consulta fora da Unidade. “Toda vez que eu chego no Posto e preciso consultar, eles arrumam logo. [...] se não tem médico no Posto eles mandam para outro Posto. Eles ligam antes e vê se pode mandar. Eles sempre dão um jeitinho” (usuário USF 6) 89 “Se for um caso de urgência mesmo eles encaminham para o Centro de Especialidades, lá tem médico” (usuário USF 5) Na realidade o Centro de Especialidades que deveria atender apenas os casos mais complexos, passou a ser referência para os usuários em caso de consulta médica eventual, como nota-se nos trechos abaixo. “Se for caso de urgência, se você quiser mesmo consultar é só ir no Centro de Especialidades. Ai, lá, é só chegar e consultar” (usuário USF 5) “Se precisar pode procurar o Centro de Especialidades, fica aberto até 9 da noite, né? E atende todo mundo” (usuário USF3) Franco e Merhy (1999) enfatizam que a população continua recorrendo ao serviço de saúde frente a situações de angústia e sofrimento, não havendo um esquema para atendêlas e dar uma resposta satisfatória a seus problemas no nível da APS elas acabam desembocando em nível mais complexo do sistema, sendo este um erro estratégico da SF, o que enfraquece em demasia seus propósitos, uma vez que a população acaba por forçar a organização dos serviços com modelagem comprometida com o modelo médico hegemônico, para responder às necessidades imediatas em saúde. Ao contrário do exposto anteriormente, nas USF onde o médico integrava a equipe de saúde os usuários se mostraram satisfeitos tanto em relação ao acesso a consulta médica agendada, com 56,6% de excelente e bom, quanto com o acesso à consulta médica eventual com 51,6% de aprovação. “Eu pedi para ir lá no Posto saber se tinha vaga para mim para a semana que vem, tem vaga para mim depois de amanhã, na parte da manhã” (usuário USF 2) “Eu acho excelente, porque toda vez que você precisa tem [consulta agendada]” (usuário USF 4) “Sempre que eu precisei, igual assim, com criança com febre, sem consulta marcada, o médico olha” (usuário USF 1) “Às vezes eu chego lá, eles olham a pressão e vê que está muito alta. Ai já vai logo passando para o médico” (usuário USF 4) 90 “Não é difícil não. Eu peço consulta em oito dias sai, no máximo em 15, depende da necessidade. [...] Eles atendem também [consulta eventual], é rapidinho, na hora. É só chegar e eles colocam boa vontade pra atender” (usuário USF 2) Os usuários da USF 3 mostraram maior insatisfação em relação ao acesso à consulta médica, alegando demora no agendamento, porém têm consciência de que a demanda por este serviço é grande, fato que justifica a espera. “Neste ponto é regular, porque a pessoa fica na espera, né? [...] A consulta agendada demora três semanas ou mais, mas é pelo número de pessoas que fica acumulado esperando. [...] Na urgência eu já procurei, mas nunca fui atendida. Já aconteceu de levar meu filho lá, a enfermeira olhou e falou que a médica não podia atender, estava muito cheio. Eu fui embora, a tarde complicou e eu tive que procurar o hospital. Ai é ruim, porque o atendimento que você foi procurar não conseguiu” (usuário USF 3) “Aqui fica muita gente esperando consulta, demora muito. Ás vezes você está doente, pede uma consulta, a moça [ACS] fala que vai demorar um pouquinho. A gente começa a tomar chá em casa e remédio por conta própria, ai, quando a moça vem trazer o papelzinho da consulta, você já sarou” (usuário USF 3) A utilização dos serviços de saúde é um comportamento complexo que resulta de um amplo conjunto de determinantes como características de organização da oferta, as características sociodemográficas dos usuários, perfil epidemiológico e aspectos relacionados aos prestadores de serviços (TRAVASSOS; MARTINS, 2004). Segundo Pinheiro et al., (2002) as escolhas individuais também são cruciais, visto que nem todas as necessidades se convertem em demandas e nem todas as demandas são atendidas. Assim sendo desigualdades no uso dos serviços de saúde refletem desigualdades individuais ao risco de adoecer e morrer. A SF, orientada pelo atributo da orientação comunitária, com adscrição da clientela, cria espaço privilegiado para reconhecimento dos fatores que originam a demanda do serviço, gerando a possibilidade de atuar efetivamente sobre essa demanda, uma vez que em algumas situações há necessidade de intervenções que extrapolam as possibilidades do setor saúde, o que requer maior grau de complexidade através de ações intersetoriais. Vale enfatizar que do total de entrevistados, 61 (32,4%) não souberam classificar o acesso à consulta médica ou eventual, alegando nunca terem procurado o serviço com o 91 objetivo de serem atendidos pelo médico. Esta situação difere da realidade da maior parte dos serviços públicos de saúde. Gaioso (2007) em seu estudo sobre serviços mais utilizados na USF, encontrou como serviço mais procurado a consulta médica, com 90,1% de utilização. O fato do médico não fazer parte de duas ESF1’s gerou dificuldade na avaliação não só no acesso à consulta médica, mas também de outros itens que se seguem, como pode ser percebido no decorrer da análise dos dados. Um outro obstáculo que se origina da acessibilidade organizacional inerente ao interior das USF’s que merece investigação é o tempo que os usuários aguardam na sala de espera pela consulta médica agendada ou eventual. A TAB. 13 e 14 demonstram os dados relativos ao tempo de espera pelos usuários para consulta médica. TABELA 13 Distribuição numérica e percentual dos usuários participantes da pesquisa segundo a satisfação em relação ao tempo de espera para consulta médica agendada, na Unidade Saúde da Família, município de Santo Antônio do Monte, MG, 2008 Variável Escala Excelente Bom Regular Ruim Péssimo Não Sei TOTAL UFS 1 nº % 12 31,6 14 36,8 4 10,5 8 21,1 38 20,2 Tempo na Sala de Espera para Consulta Médica Agendada UFS 2 UFS 3 UFS 4 UFS 5 UFS 6 Total nº % nº % nº % nº % nº % nº % 8 30,8 3 9,1 2 8,0 25 13,3 13 50,2 13 39,4 14 56,0 54 28,7 2 7,6 9 27,1 5 20,0 20 10,6 1 3,8 1 3,0 1 4,0 3 1,6 2 6,1 1 4,0 3 1,6 2 7,6 5 15,3 2 8,0 30 100,0 36 100,0 83 44,2 26 13,8 33 17,6 25 13,3 30 16,0 36 19,1 188 100,0 TABELA 14 Distribuição numérica e percentual dos usuários participantes da pesquisa segundo a satisfação em relação ao tempo de espera para consulta médica eventual, na Unidade Saúde da Família, município de Santo Antônio do Monte, MG, 2008 Variável Escala Excelente Bom Regular Ruim Péssimo Não Sei TOTAL UFS 1 nº % 7 18,4 11 29,0 4 10,5 16 42,1 38 20,2 Tempo na Sala de Espera para Consulta Médica Eventual UFS 2 UFS 3 UFS 4 UFS 5 UFS 6 nº % nº % nº % nº % nº % 7 27,0 2 6,1 3 12,0 12 46,3 9 27,1 7 28,0 2 7,6 8 24,2 6 24,0 2 7,6 2 6,1 3 11,5 12 36,5 9 36,0 30 100,0 36 100,0 26 13,8 33 17,6 25 13,3 30 16,0 36 19,1 Total nº % 19 10,1 39 20,7 20 10,7 2 1,1 2 1,1 106 56,3 188 100,0 92 Ao analisar os dados da TAB. 13 e TAB. 14 verifica-se que 42,0% dos entrevistados estão satisfeitos em relação ao tempo que aguardam na sala de espera para a consulta médica agendada. Ao investigar o índice de satisfação para a consulta médica eventual observa-se que 30,8% dos usuários consideraram o tempo como excelente ou bom. “A gente não fica aguardando muito tempo não, no máximo em meia hora já é atendido, eu acho que é bom, né?” (usuário USF 2) “Segue a ordem direitinho, não demora muito não, é rápido, classifico como excelente” (usuário USF 1) “Eu acho o tempo normal de esperar, é o mesmo tempo que em qualquer outro consultório” (usuário USF 4) “Quando é urgência mesmo o tempo que a gente aguarda é menor que na consulta agendada, é excelente. Com toda pessoa é assim, dependendo do problema eles vão passando na frente” (usuário USF 2) “É um tempo bom, porque varia de 10 a 15 minutos, como está tudo agendado não tem complicação não. Quanto a isso sai na hora certa” (usuário USF 1) A maioria dos entrevistados não soube classificar este tempo tanto para a consulta agendada (44,2%), quanto para a consulta eventual (56,3%), sendo a maioria destes entrevistados pertencentes à área de abrangência da USF 5 e 6 . Neste caso, os usuários atribuíram como causa o fato de no momento da coleta de dados não haver médico na Unidade, o que implicou na dificuldade de quantificação deste tempo. Outra causa possível para o fato de não saber opinar sobre o assunto pode ter sido ocasionado pela não utilização do atendimento médico na Unidade. “Em relação a isso não posso responder, como vou falar o tempo que eu aguardo para a consulta médica sendo que ali no Posto não tem médico?” (usuário USF 6) “Não sei como te falar, porque como já te falei ali não tem médico fixo, né? (usuário USF 5) Mediante os dados supracitados nota-se que não houve diferença significativa entre a satisfação com o tempo de espera para a consulta agendada e eventual, porém, vale ressaltar que o maior grau de insatisfação para ambas as classes de consulta se fez presente na 93 USF 3, Unidade esta, que segundo a narrativa dos entrevistados, possui uma grande demanda por serviços, inclusive por atendimento médico, o geraria certo descontentamento por parte dos usuários, em relação ao tempo que aguardam até consultar. “Lá tem muita gente para consultar, ai demora, mesmo” (usuário USF 3) O tempo que a gente aguarda depende muito da quantidade de gente que tem lá para consultar. Geralmente é muita gente, ai demora, porque tem os casos de urgência que tem que atender (usuário USF3) Acredita-se que propiciar um tempo de espera para atendimento dentro dos limites toleráveis não é tarefa fácil, mas importante, pois a espera longa pode ser interpretada como atitude de descaso dos profissionais para com os usuários, ferindo a dignidade dos mesmos bem como seus direitos como cidadãos. Contraditoriamente, os usuários que se mostraram insatisfeitos em relação ao tempo que aguardam na sala de espera para consulta médica relatam certa satisfação, pois o fato de conseguir a consulta sobressai ao tempo aguardado. Existe, também, uma comparação entre serviço público e privado, onde é relatada certa semelhança entre ambos, especificamente quando se trata de tempo de espera para a consulta médica. Demora, né? Tem que esperar. Depois que você chega lá até ser atendida tem dia de esperar duas horas. Mas eu não importo não, porque eu estou lá por essa conta mesmo. É bom, sendo atendido é o que importa (usuário USF 3) “Demora muito para atender. A gente fica lá três horas de prazo esperando. Mas é bom porque é atendido. E mesmo se fosse particular tem que esperar também” (usuário USF 4) Outros obstáculos que podem surgir dos modos de organização dos recursos de assistência à saúde, que se enquadram na acessibilidade organizacional e foram analisados neste estudo são a disponibilidade para realização de procedimentos e a disponibilidade de medicamentos. A classificação dos entrevistados para estes itens está contida na TAB. 15 e 16. 94 TABELA 15 Distribuição numérica e percentual dos usuários participantes da pesquisa segundo a satisfação em relação à disponibilidade para procedimentos, na Unidade Saúde da Família, município de Santo Antônio do Monte, MG, 2008 Variável Escala Excelente Bom Regular Ruim Péssimo Não Sei TOTAL UFS 1 nº % 9 23,7 27 71,1 2 5,2 38 20,2 Disponibilidade para Procedimentos UFS 2 UFS 3 UFS 4 UFS 5 UFS 6 Total nº % nº % nº % nº % nº % nº % 18 69,2 6 18,2 14 56,0 3 10,0 13 36,1 63 33,5 8 30,8 21 63,6 8 32,0 25 83,3 15 41,6 104 55,3 2 6,0 3 12,0 2 6,7 2 5,6 11 5,9 - 4 12,2 6 16,7 10 5,3 26 13,8 33 17,6 25 13,3 30 16,0 36 19,1 188 100,0 TABELA 16 Distribuição numérica e percentual dos usuários participantes da pesquisa segundo a satisfação em relação à disponibilidade de medicações, na Unidade Saúde da Família, município de Santo Antônio do Monte, MG, 2008 Variável Escala Excelente Bom Regular Ruim Péssimo Não Sei TOTAL UFS 1 nº % 6 15,8 2 5,2 30 79,0 38 20,2 UFS 2 nº % 1 3,8 25 96,2 26 13,8 Disponibilidade de Medicações UFS 3 UFS 4 UFS 5 nº % nº % nº % 2 8,0 1 3,3 8 24,2 6 24,0 2 10,0 25 75,8 17 68,0 27 90,0 33 17,6 25 13,3 30 16,0 UFS 6 Total nº % nº % 4 2,1 5 13,9 27 14,3 2 1,1 31 86,1 155 82,5 36 19,1 188 100,0 Os dados quantitativos presentes na TAB. 15 e TAB. 16 revelam que 88,8% dos entrevistados estavam satisfeitos em relação à disponibilidade de procedimentos, ao passo que 5,9% classificaram este item como regular. Em relação à disponibilidade de medicações a maioria dos usuários (82,5%) não soube informar sobre este item, 15,3% classificaram o serviço como regular ou ruim e apenas 2,1% informaram estar satisfeitos em relação à dispensa de medicamentos, classificando-a como excelente ou boa. Através das falas dos usuários percebe-se que existe uma gama variada de procedimentos que são disponibilizados na USF, o que facilita o acesso do usuário, garantindo a integralidade da atenção no âmbito da APS. 95 “Aqui eles fazem de tudo: vacina, nebulização, medicamento, curativo, olha a pressão, faz o teste do pezinho, acho que tem tudo que a gente precisa, né? Até soro na veia, se precisar eles ligam, em relação a isso não tenho nada que reclamar não, é excelente” (usuário USF 3) “É muito bom neste ponto porque a gente sai do consultório, se for para aplicar uma injeção as meninas [auxiliares de enfermagem] já fazem, ou então uma nebulização, tudo tem lá mesmo” (usuário USF 4) Segundo Starfield (2002) a integralidade da assistência se faz presente quando são desenvolvidas atividades relacionadas ao atendimento das necessidades da população, incluindo imunização, procedimentos e exames indicados, além de atividades direcionadas para detecção e manejo dos problemas de saúde da comunidade. Os usuários também se mostraram satisfeitos por existir a possibilidade de realizar os procedimentos no domicílio. Este é um indicativo da qualidade do serviço, uma vez que existe maior preocupação e cuidado com aqueles que se encontram mais fragilizados, como se percebe nas colocações abaixo. “Meu filho fez uma cirurgia no joelho e o ortopedista pediu para fazer curativo de dois em dois dias, como meu filho não podia andar e a gente não tem carro eu fui no Posto e conversei com a enfermeira, ela veio aqui em casa e fez o curativo direitinho, foi muito bom, muito bom mesmo” (usuário USF 2) “Em época de campanha de vacina da gripe eles vem nas casas e vacinam os velhinhos que não conseguem ir no Posto, eu acho isso muito importante, esse cuidado, essa atenção, é excelente” (usuário USF6) Em relação à disponibilidade de medicação percebe-se através do relato dos usuários a dificuldade de acesso na própria Unidade, o que os obriga a procurar um outro serviço, a Farmácia Municipal. Evidencia-se o anseio por parte dos usuários de adquirir o medicamento na USF de forma permanente e regular, e também, é notória a insatisfação em relação à distância da farmácia municipal do domicílio de alguns usuários. Em relação àqueles usuários que não souberam opinar, evidencia-se como motivo a não disponibilidade do medicamento. 96 “Medicamento eu não pego ali não, porque não tem, só na farmacinha” (usuário USF 2) “Lá às vezes tem medicamento, quando tem elas avisam, mas eu quase não pego lá, eu pego mais é na farmacinha, porque eu preciso do medicamento todo mês. Seria bom se ali tivesse para dar para gente todo mês facilitaria bastante” (usuário USF 2) “Eu já pequei só o sulfato ferroso para os meninos, a não ser este acho que não tem. Por exemplo, quando minha filha adoeceu e a Dra. passava uma amoxicilina, eu perguntava se tinha e eles falavam que não, só na farmacinha, ai nesse ponto eu acho que todo Posto deveria ter o medicamento, porque aqui fica longe do centro que é onde fica a farmacinha. Ai é regular, falta o medicamento. Para sair e deixar as crianças aqui dificulta, eu acho que a gente deveria sair com o medicamento” (usuário USF 3) “Não sei te falar, porque nunca pequei, acho que lá não tem medicamento não” (usuário USF 4) “Não pego lá não, lá não tem. Pelo menos até hoje não fiquei sabendo que tivesse, nunca me ofereceram medicamento lá, só pego ma farmácia municipal” (usuário USF 1) “Eu não pego medicamento lá não, só na farmacinha. Que eu saiba lá só tem sulfato ferroso, anticoncepcional e preservativo” (usuário USF 5) Através das falas dos usuários percebe-se que os medicamentos que estão disponíveis de forma regular na USF são aqueles preconizados pelos programas do MS, como Saúde de Ferro, Prevenção das Doenças Sexualmente Transmissíveis (DST)/ Síndrome da Imunodeficiência Adquirida (AIDS) e Saúde da Mulher, sendo que apenas os usuários que recebem esses medicamentos na USF estão satisfeitos com o serviço. Fekete (1997) afirma que a acessibilidade organizacional está na dependência de obstáculos que surgem na continuidade da assistência (sistema de referência e contrareferência), o que implica em dizer que os obstáculos podem seguir-se dentro do próprio serviço e por todo o sistema. Neste âmbito da acessibilidade organizacional foi avaliado o acesso à consulta médica especializada e a exames complementares, sendo os resultados apresentados na TAB. 17 e TAB 18, respectivamente. 97 TABELA 17 Distribuição numérica e percentual dos usuários participantes da pesquisa segundo a satisfação em relação ao acesso à consulta médica especializada, município de Santo Antônio do Monte, MG, 2008 Variável Escala Excelente Bom Regular Ruim Péssimo Não Sei TOTAL UFS 1 nº % 4 10,5 20 52,7 5 13,1 9 23,7 38 20,2 Acesso à Consulta Médica Especializada UFS 2 UFS 3 UFS 4 UFS 5 UFS 6 Total nº % nº % nº % nº % nº % nº % 17 65,4 4 12,1 4 16,0 29 15,3 7 27,0 3 9,1 10 40,0 6 20,0 14 38,9 60 32,0 1 3,8 4 12,1 3 10,0 9 25,0 22 11,6 5 15,1 1 3,3 2 5,6 8 4,3 5 15,1 3 8,3 8 4,3 1 3,8 12 36,5 11 44,0 20 66,7 8 22,2 61 32,5 26 13,8 33 17,6 25 13,3 30 16,0 36 19,1 188 100,0 TABELA 18 Distribuição numérica e percentual dos usuários participantes da pesquisa segundo a satisfação em relação ao acesso a exames complementares, município de Santo Antônio do Monte, MG, 2008 Variável Escala Excelente Bom Regular Ruim Péssimo Não Sei TOTAL UFS 1 nº % 15 39,5 13 34,2 10 26,3 38 20,2 UFS 2 nº % 17 65,4 5 19,3 1 3,8 3 11,5 26 13,8 Acesso a Exames Complementares UFS 3 UFS 4 UFS 5 nº % nº % nº % 6 18,2 3 12,0 2 6,7 7 21,3 12 48,0 8 26,7 9 27,1 4 16,0 13 43,3 5 15,2 1 4,0 3 10,0 1 3,0 5 15,2 5 20,0 4 13,3 33 17,6 25 13,3 30 16,0 UFS 6 Total nº % nº % 1 2,8 29 15,4 13 36,1 60 31,9 14 38,8 53 28,2 5 13,9 15 8,0 2 5,6 3 1,6 1 2,8 28 14,9 36 19,1 188 100,0 Ao analisar os dados da TAB. 17 verifica-se que 47,3% dos entrevistados classificaram o acesso à consulta médica especializada como excelente ou bom, 20,2% como regular, ruim ou péssimo. Em relação ao acesso aos exames complementares 47,3% dos entrevistados mostraram-se satisfeitos, enquanto 37,8% apontaram este item como sendo um obstáculo encontrado no sistema, como mostra a TAB. 18. Ressalta-se que 32,5% dos entrevistados não souberam opinar quanto ao acesso à consulta especializada e 14,9% dos usuários também respondeu que não sabiam avaliar o acesso a exames complementares, o motivo alegado foi a ausência de utilização desses serviços. Os maiores índices de insatisfação para ambos os itens avaliados foram encontrados na USF 3 e 6. Através das 98 narrativas que se seguem evidencia-se obstáculos que comprometem a integralidade e a continuidade da assistência. “Eles encaminham, mas é difícil para conseguir consultar com especialista, principalmente com ginecologista, a gente fica esperando meses, às vezes até desiste e procura outros meios, porque igual aconteceu comigo, eu estava sentido, né? Não podia esperar, então tive que pagar” (usuário USF 06) “Costuma demorar. Até pegar o encaminhamento e marcar, tem que esperar a vaga. Lá demora muito até você conseguir, teria que ter mais médico para atender todo mundo que precisasse” (usuário USF 2) “Com facilidade não consegue não [exame complementar]. Tem a demora porque ai você pega o pedido ai você vai na Secretaria para marcar. Igual eu estou com um pedido de ultra-som da mama tem meses. Todo mês eu vou lá, todo começo de mês eles falam que vão marcar e nada, fica para voltar no próximo mês, e assim vai” (usuário USF 1) Acredita-se que o acesso a tecnologias de saúde representa aspecto importante a ser considerado pelo setor, visto que a APS por si só não tem sido suficiente para atender as necessidades da população em sua totalidade. De acordo com Franco e Merhy (1999) a SF deve ser explorada dentro de seus limites e incorporada como uma modalidade tecnológica integrante da complexa rede de atenção, antes de ser considerada suficiente para a resolução de todos os problemas. A dificuldade de acesso a consultas especializadas e exames complementares fere direitos constitucionais quando se considera saúde como direito de cidadania e também corrompe princípios regulamentares do SUS, como a integralidade, a equidade e a universalidade da assistência. As falas dos usuários revelam, ainda, barreiras na forma de agendamento para exames, o que os tornam insatisfeitos com o serviço. “Pediu raio x, eletro, mamografia, tudo isso. Isso daí demora, isso daí não é tão simples não. Igual o último que pediu eu nem fiz ainda, porque eu tinha que marcar, eu estava indisposta, deslocar da minha casa até o Posto é perto, mas para eu ir na Secretaria marcar é difícil. Você ainda tem que esperar liberar, muitas vezes a pessoa que libera não está lá, você tem que deixar lá, depois pegar, é demorado. Essa é uma situação que eu consideraria como regular, porque existe o atendimento, mas demora para marcar” (usuário USF 1) 99 “Para fazer exame de glicose do meu filho tem que ir lá [laboratório municipal] marcar de madrugada, quatro horas da madrugada, ai tem a quantidade de exame que marca, às vezes você vai, fica na fila e não consegue marcar. Ai tem que ir na Santa Casa para fazer, mas quando a gente não tem dinheiro fica sem fazer, né, porque lá faz, mas paga” (usuário USF 6) A dificuldade de agendar consultas ou exames, conforme descrito pelos usuários, revela uma lacuna na atenção secundária, e, em decorrência do fato os usuários ficam expostos a agravamentos da condição de saúde. Além disso, tal aspecto gera desconforto para a ESF1 a quem cabe dar respaldo para a situação de demora. Uma outra subclasse da acessibilidade, segundo Fekete (1997), seria a acessibilidade sócio-cultural que remete à análise dos acontecimentos que determinaram a procura pelo serviço de saúde. Nesta dimensão da acessibilidade estão presentes obstáculos referentes aos usuários e ao sistema. Quanto aos usuários destaca-se: medo do diagnóstico e das intervenções, crenças e hábitos em relação aos cuidados com a saúde, dificuldades de comunicação, vergonha. No tocante ao sistema enfatiza-se a formação profissional, desvinculada das reais condições de vida dos usuários. A investigação da acessibilidade sócio-cultural foi realizada mediante obstáculos referentes aos usuários e os resultados são apresentados na TAB. 19. TABELA 19 Distribuição numérica e percentual dos usuários participantes da pesquisa segundo a satisfação em relação à capacidade de comunicação com a Equipe Saúde da Família, município de Santo Antônio do Monte, MG, 2008 Variável Escala Excelente Bom Regular Ruim Péssimo Não Sei TOTAL UFS 1 nº % 11 29,0 23 60,5 4 10,5 38 20,2 Capacidade de Comunicação com a Equipe Saúde da Família UFS 2 UFS 3 UFS 4 UFS 5 UFS 6 Total nº % nº % nº % nº % nº % nº % 15 57,7 7 21,2 13 52,0 6 20,0 17 47,2 69 36,7 11 42,3 17 51,4 11 44,0 19 63,4 18 50,0 99 52,7 5 15,2 1 4,0 5 16,6 15 8,0 4 12,2 4 2,1 1 2,8 1 0,5 26 13,8 33 17,6 25 13,3 30 16,0 36 19,1 188 100,0 100 Dos entrevistados 89,4% se mostraram satisfeitos em relação à capacidade de comunicação com a equipe. Através dos relatos nota-se que existe respeito, consideração e valorização em relação aos problemas apresentados pelos usuários. “Sempre que eu chego eles perguntam o que eu preciso, me ouvem com atenção, me respeitam, é excelente” (usuário USF 4) “Eu nunca tive problema em relação a isso não, eles lá respeitam muito a gente, a gente fala, eles ouvem, pode pergunta tudo, tudo do seu jeito e eles entendem e conversam com a gente, é muito bom” (usuário USF 5) 5.3 Humanização da assistência: diferencial do cuidado em saúde Com a finalidade de romper com a fragmentação e a verticalização nos processos de trabalho que permeiam as relações usuário- profissional, o MS cria a Política Nacional de Humanização – Humaniza SUS – idealizando uma assistência à saúde mais humana e integral. A Política Nacional de Humanização deriva da valorização dos diferentes atores envolvidos no processo de produção de saúde, através do estabelecimento de redes, vínculos e de co-responsabilidade entre usuário-profissional, imbricando diferentes ações, saberes e práticas, buscando a garantia de uma atenção integral, resolutiva e humanizada (BRASIL, 2006b). No presente estudo a reflexão acerca da humanização da assistência permeia as relações existentes entre equipe e usuários e a ambiência vivenciada nos espaços onde ocorrem estas relações, aspectos estes, diretamente relacionados com o processo de construção do cuidado integral em saúde. Ao abordar aspectos relacionados à interação profissional-usuário percebe-se um relacionamento diferenciado, marcado pelo interesse, atenção, cortesia, respeito, através de uma escuta qualificada e responsabilização pelas queixas apresentadas, atendimento este que resulta na integralidade e na longitudinalidade da assistência. “O atendimento é excelente, elas são atenciosas, corteses, é excelente mesmo” (usuário USF 1) “Elas atendem a gente tão bem. Às vezes nem é visita, nem nada, elas vêm a gente na rua e perguntam como é que você está, seus meninos, tem interesse sabe? Igual meu marido tem problema de pressão e ele 101 viaja, sempre elas tão me perguntando se ele está cuidando da pressão” (usuário USF 2) “As meninas lá são muito atenciosas se você chega para conversar elas conversam, pode ser a enfermeira, pode ser aquelas assistentes que vêm na casa da gente [ACS], pergunta o que você deseja, elas tentam ser o mais educadas possível” (usuário USF ) “A Fulana é muito atenciosa, ela percebe tudo. Outro dia ela falou que eu estava triste, perguntou o que estava acontecendo comigo, eu falei que não era nada não, mas ela falou que tinha alguma coisa sim, me chamou na sala dela e conversou comigo mais de uma hora, foi bom, às vezes a gente precisa é de atenção, e isso a gente tem lá” (usuário USF 3) Segundo Franco e Merhy (1999) é importante considerar que a prática multiprofissional, a territorialização e o vínculo operam nos microprocessos do trabalho em saúde, sendo necessário penetrar nos valores e comportamentos dos profissionais de saúde, constituindo uma nova ética, presidida de valores humanitários e de solidariedade, modificando suas referências epistemológicas e incorporando ao arsenal tecnológico a produção do acolhimento, do vínculo, da autonomização e da resolutividade. Relatos dos usuários demonstram um atendimento acolhedor, com acesso facilitado aos profissionais, permeado pelo vínculo e pela familiaridade, o que remete novamente à longitudinalidade da atenção. “Isso é excelente. Lá as meninas me tratam super-bem. Eu chego elas vão logo perguntando o que eu estou precisando, já se colocam prontas, elas ficam disponíveis mesmo, para qualquer coisa que precisar” (usuário USF 3) “Todas as vezes que eu chego lá elas me dão oportunidade para falar. Eu chego lá é a mesma coisa de estar em casa, elas me tratam muito bem, é excelente” (usuário USF 2) “Eu sinto um interesse muito grande pelos profissionais daqui. Inclusive a médica vem aqui, eu vou lá consulto ela passa medicamento ela vem aqui saber se o medicamento deu certo, se eu estou passando bem. E como minha mãe é a mesma coisa” (usuário USF 4) “O atendimento lá muito bom porque eles conhecem a gente, sabe tudo, né? Eu classifico até como maternal” (usuário USF 1) 102 Franco et al., (1999) acreditam que sem acolher e vincular não responsabilização clínica e sanitária, nem otimização tecnológica das resolutividades que efetivamente impactam os processos sociais de produção da saúde e da doença. Outro aspecto inerente à humanização da assistência que foi analisado no estudo foi a grau de satisfação dos usuários em relação às explicações oferecidas pelos profissionais que compõe as ESF1’s, sendo os dados descritos na TAB. 20. TABELA 20 Distribuição numérica e percentual dos usuários participantes da pesquisa segundo a satisfação em relação às explicações oferecidas pelos profissionais da Equipe Saúde da Família, município de Santo Antônio do Monte, MG, 2008 Variável Escala Excelente Bom Regular Ruim Péssimo Não Sei TOTAL Explicações oferecidas pelos Profissionais da Equipe Saúde da Família UFS 1 UFS 2 UFS 3 UFS 4 UFS 5 UFS 6 Total nº % nº % nº % nº % nº % nº % nº % 11 29,0 15 57,7 7 21,2 13 52,0 6 20,0 17 47,2 69 36,7 23 60,5 11 42,3 17 51,4 11 44,0 19 63,4 18 50,0 99 52,7 4 10,5 5 15,2 1 4,0 5 16,6 15 8,0 4 12,2 4 2,1 2,8 1 0,5 38 20,2 26 13,8 33 17,6 25 13,3 30 16,0 36 19,1 188 100,0 Dos entrevistados 89,4% classificaram as explicações oferecidas como excelentes ou boas e 10,6% como regulares, ruins ou péssimas. Tona-se relevante enfatizar que na USF 2 e 6 todos os entrevistados julgam ser estas explicações excelentes ou boas. Por intermédio da fala dos usuários percebe-se que estes são esclarecidos em relação ao diagnóstico e tratamento, têm liberdade para questionar, são informados em relação a serviços que são oferecidos fora da USF, tem acesso à leitura dos impressos que lhes são repassados, através da letra legível, fatores estes que estão ligados a melhor adesão ao tratamento e maior resolutividade dos problemas. “É bom sabe? Tudo que você pergunta eles te explicam, onde tem que levar, sabe, por exemplo, encaminhamento, nunca faltou informação” (usuário USF 5) “Eu tenho veia arrebentada nas pernas e dói muito, eu fui consultar e a Dra. explico tudo, sabe? Ela falou que a circulação está ruim, por isso dói, me passou remédio para melhorar a dor, mas falou que para resolver de vez o problema eu tenho que fazer cirurgia, ela falou que 103 pode piorar, até, abrir ferida, tem que ter cuidado. Ai ela me encaminhou para o especialista” (usuário USF 3) “O Dra. explica tudo certinho, fala da doença, fala como a gente tem que tomar o remédio, pergunta se tem dúvida, a gente pode perguntar o que quiser e dá a receita, a letra dela não é igual desses médicos não, a gente consegue lê tudo, isso facilita para gente também” (usuário USF 5) “Eu nunca tive nenhum problema em relação a isso, é muito bom. Sempre que eu precisei eles me aconselharam. Os encaminhamentos indicam quem procurar, vai em tal lugar, faz isso, explica como tomar remédio (usuário USF 2) “A enfermeira passou sulfato ferroso para minha filha, ai ela me explicou tudo direitinho. Falou que nessa idade que ela está ela precisa de mais ferro porque senão pode ter anemia. Falou também como tem que dá o remédio, né? Que é meia hora antes do almoço, falou que não pode da junto senão não aproveita o remédio, eu acho isso muito importante, desse jeito não tem problema, não tem dúvida (usuário USF4) Entre os usuários que se encontraram insatisfeitos em relação às explicações oferecidas pela ESF1, nota-se que a maioria pertencia a área de abrangência da USF 3, sendo relatada como principal causa da avaliação negativa a falta de tempo dos funcionários. “Lá é muito corre-corre às vezes falta tempo para informar melhor sobre uma reação de vacina, como colher um exame de urina, por exemplo, em alguns casos eu acho que poderia melhorar” (usuário USF 3) “Eu acho péssimo porque só duas funcionárias lá dão mais abertura, conversam e explicam diretinho, as outras não” (usuário USF 6) Na investigação foi analisado o atendimento por parte da ESF1, sendo o grau de satisfação dos usuários em relação ao atendimento por parte do médico, evidenciado na TAB. 21. 104 TABELA 21 Distribuição numérica e percentual dos usuários participantes da pesquisa segundo a satisfação em relação ao atendimento por parte do médico da Equipe Saúde da Família, município de Santo Antônio do Monte, MG, 2008 Variável Escala Excelente Bom Regular Ruim Péssimo Não Sei TOTAL UFS 1 UFS 2 nº % nº % 15 39,4 5 19,3 11 29,0 5 19,3 2 5,2 3 11,5 1 3,8 11 42,3 10 26,4 1 3,8 38 20,2 26 13,8 Atendimento por parte do Médico UFS 3 UFS 4 UFS 5 UFS 6 nº % nº % nº % nº % 8 24,2 10 40,0 17 51,3 13 52,0 4 12,4 1 4,0 1 3,0 3 9,1 1 4,0 30 100,0 36 100,0 33 17,6 25 13,3 30 16,0 36 19,1 Total nº % 38 20,2 46 24,5 10 5,3 1 0,5 12 6,4 81 43,1 188 100,0 A maioria usuários está satisfeita em relação ao trabalho exercido pelo médico, sendo percentual de aprovação de 44,6%. Dos entrevistados 12,2% classificaram o trabalho do médico como regular ruim ou péssimo e 43,1% não opinaram porque nunca utilizaram o serviço, ou então pela ausência do profissional médico no momento da coleta de dados. Os usuários revelaram em suas falas um relacionamento médico-cliente humanizado, acolhedor, pautado na informalidade, na eficiência das ações e na competência técnica. “O médico é excelente, ele é muito atencioso, ele verifica tudo, ele apalpa, ele faz exame da pressão, conversa orienta, se você queixa por exemplo, um problema na coluna ele examina direitinho, ele apalpa a barriga, ausculta o pulmão, é exigente com o controle da pressão, tem o cartão que a gente faz o controle. Ele é muito bom, muito atencioso mesmo, até melhor que o médico particular. Já me aconteceu de pagar e o médico só conversou, nem me pôs a mão. É importante esse toque para ele ver se tem dor, se não tem, então eu considero como necessário, e isso ele faz muito bem, apesar de ser uma coisa pública ele faz melhor que o particular” (usuário USF 1) “A Dra. Fulana, eu gosto dela, sabe, eu gosta bastante dela, ela tem paciência com criança, ela brinca, sabe? É excelente o atendimento do médico” (usuário USF 4) “A médica que atende lá, é a Dra. Fulana, é muito boa, ela examina diretinho, conversa, explica, pede para voltar depois se precisar, acompanha a gente até a porta, essa atenção, esse cuidado é importante, ainda mais para quem está doente, né?. Eu acho excelente” (usuário USF 3) 105 Especificamente na USF 2 houve um grande número de usuários (57,6%) insatisfeitos com o trabalho desempenhado pelo médico. Através da fala dos usuários evidencia-se a ausência da atenção, do interesse, da escuta qualificada, fatores estes imprescindíveis à assistência em um serviço que é pautado na humanização, no vínculo e no acolhimento. “O Dr. lá, esqueci o nome dele, já consultei com ele, só uma vez mas não gostei não, ele não conversa, sabe? Não da atenção não, é rapidinho, ele te olha ai já passa a receita e pronto” (usuário USF) “[...] Eu não sei se ele trabalha muito, eu acho que sim, isso deve acabar atrapalhando o atendimento dele, parece que ele está sempre cansado, aí ele não da atenção. Antes tinha um médico lá, o Dr. Fulano, ele era muito bom, era diferente, ele perguntava tudo, vinha na casa do povo, era muito bom mesmo. Hoje precisa melhorar” (usuário USF 2) O fato supracitado pode ser entendido como conseqüência da formação acadêmica do profissional médico e do modelo de atenção à saúde hegemônico, que prioriza a prática individual e curativa, orientada pela fragmentação dos procedimentos, tecnificação da assistência e pela mecanização do ato em saúde, em detrimento a utilização das tecnologias leves32. De acordo com Franco e Merhy (1999) a SF visa romper com essa forma de agir em saúde, operando de modo amplo nos microprocessos do trabalho em saúde, nos fazeres cotidianos do profissional, que em última instância define o perfil da assistência. Vincula-se, também, uma nova relação, que foge do padrão tradicional onde um é sujeito e outro objeto. Na nova relação deve se dar entre sujeitos, onde profissional e usuário são produtores de saúde. ______________ 32 A tecnologia é concebida como um conjunto de conhecimentos e agires aplicados à produção de algo. Esse conhecimento pode ser materializado em máquinas e instrumentos (tecnologias duras), saberes e práticas estruturadas (tecnologias leves-duras) e as tecnologias leves: trabalho vivo/produção de serviços/abordagem assistencial – modos de produção de acolhimento, vínculo e responsabilização (FRANCO; MERHY, 1999). 106 Koster (2006) afirma que encontrar ferramentas que viabilizem a reestruturação do processo de trabalho não é tarefa fácil, uma vez que exige que sejam agregados ao conhecimento técnico outros conhecimentos e habilidades, relacionados com a dinâmica social e o trabalho em equipe, visando a transdisciplinaridade e a integralidade. A autora enfatiza que é responsabilidade do profissional encontrar tais ferramentas e ressalta algumas propostas viáveis como a educação permanente, onde se busca identificar lacunas de conhecimentos e atitudes inerentes ao cotidiano dos serviços e o Planejamento Estratégico Situacional, que enfoca os problemas com resolução participativa. Quando abordados sobre o atendimento pela equipe de enfermagem, inicialmente os usuários tiveram dificuldade em identificar as diferentes categorias profissionais dentro da enfermagem, o que pode ser percebido nas narrativas abaixo. “Você quer que eu fale é sobre a enfermeira chefe, né?” (usuário da USF 2) “Enfermeira, qual enfermeira, lá tem várias” (usuário USF 5) “O que é mesmo técnico de enfermagem”? (usuário USF 6) Após diferenciação das categorias profissionais pelas entrevistadoras conseguiram classificar o atendimento de cada profissional devidamente, conforme está descrito na TAB. 22 e 23. TABELA 22 Distribuição numérica e percentual dos usuários participantes da pesquisa segundo a satisfação em relação ao atendimento por parte do enfermeiro da Equipe Saúde da Família, município de Santo Antônio do Monte, MG, 2008 Variável Escala Excelente Bom Regular Ruim Péssimo Não Sei TOTAL UFS 1 nº % 12 31,6 15 39,4 3 7,9 8 21,1 38 20,2 Atendimento por parte do Enfermeiro UFS 2 UFS 3 UFS 4 UFS 5 UFS 6 Total nº % nº % nº % nº % nº % nº % 16 61,5 10 30,3 12 48,0 5 16,7 12 33,4 67 35,6 7 27,0 15 45,4 10 40,0 10 33,3 24 66,6 81 43,1 1 3,0 1 4,0 3 10,0 8 4,3 2 6,1 2 6,7 4 2,1 2 11,5 5 15,2 2 8,0 10 33,3 28 14,9 26 13,8 33 17,6 25 13,3 30 16,0 36 19,1 188 100,0 107 TABELA 23 Distribuição numérica e percentual dos usuários participantes da pesquisa segundo a satisfação em relação ao atendimento por parte dos técnicos ou auxiliares de enfermagem da Equipe Saúde da Família, município de Santo Antônio do Monte, MG, 2008 Variável Escala Excelente Bom Regular Ruim Péssimo Não Sei TOTAL Atendimento por parte dos Técnicos ou Auxiliares de Enfermagem UFS 1 UFS 2 UFS 3 UFS 4 UFS 5 UFS 6 Total nº % nº % nº % nº % nº % nº % nº % 11 29,0 17 65,4 6 18,3 9 36,0 4 13,3 10 27,8 57 30,3 22 57,9 9 34,6 21 63,5 14 56,0 20 66,8 26 72,2 112 59,6 5 13,1 2 6,1 2 8,0 4 13,3 13 6,9 1 3,0 1 3,3 2 1,1 1 3,3 1 0,5 3 9,1 3 1,6 38 20,2 26 13,8 33 17,6 25 13,3 30 16,0 36 19,1 188 100,0 Os entrevistados se mostraram bastante satisfeitos em relação ao atendimento por parte da equipe de enfermagem. Em relação ao desempenho da enfermeira 78,7% dos usuários o classificaram como excelente ou bom, 6,4% como regular, ruim ou péssimo e 14,9% não souberam informar, sendo que as enfermeiras da USF 2 e 6 só obtiveram classificação excelente e bom. Números semelhantes foram obtidos pelos técnicos ou auxiliares de enfermagem, visto que, 89,9% classificaram o atendimento como excelente ou bom, 8,5% como regular, ruim ou péssimo e 1,6% não souberam informar, conforme descrito na TAB. 17. As falas dos usuários revelam disponibilidade, interesse, atenção, carinho, cortesia no atendimento por parte da equipe de enfermagem. “Na hora que você chega já atende com jeitinho, conversa, pergunta o que você precisa, elas [auxiliares de enfermagem] tem toda atenção, leva até a sala, faz o procedimento, é muito bom” (usuário USF 5) “Você chega, te recebe bem, te trata bem, faz tudo com amor, com carinho. Assim que a gente chega elas se colocam prontas para fazer as coisas, uma vacina, olha uma pressão, é excelente” (usuário USF 3) “O atendimento dela [enfermeira} é dez! Ela é alegre, atenciosa, preocupada com as pessoas. Um ouro de pessoa” (usuário USF 2) “Eu acho a boa vontade da equipe uma coisa muito boa, sempre prontos pra atender, sempre de carinha boa, não tem uma hora que você chega e elas falam não, não posso. Se está apertado elas falam senta, espera um pouquinho, já volto, vou dar um jeitinho” (usuário USF 5) 108 “Ela [enfermeira] é muito boa, presta atenção nas pessoas, vê no que pode ajudar, ela conserva muito comigo, coisas que não tem nada a ver, se ela for embora vou sentir muita falta dela” (usuário USF 6) “Elas [auxiliares de enfermagem] são muito prestativas, te dão muita atenção, explicam tudo que você perguntar” (usuário USF2) O município recebe acadêmicos do curso de graduação em enfermagem, sendo este fato motivo de insatisfação por parte de alguns dos usuários. A equipe deve estar mais atenta e acompanhar de perto o desempenho destes futuros profissionais em relação a aspectos técnicos e éticos que envolvem o cuidado em saúde. “Eu levo minha filha para fazer puericultura, mas cada vez é uma diferente que está lá atendendo, eu não gosto não. Às vezes olha o peitinho, às vezes não, a gente tem que fica pedindo pra olhar. Só coloca o peso no cartão não coloca os centímetros” (usuário USF 4) “Eu foi uma vez para fazer preventivo e era estagiária, não gostei do jeito que ela me tratou, já avisei, se for estagiária não faço mais (usuário USF 3) A variável satisfação dos usuários em relação ao trabalho exercido pelos ACS está descrita na TAB. 24. TABELA 24 Distribuição numérica e percentual dos usuários participantes da pesquisa segundo a satisfação em relação ao atendimento trabalho exercido pelos Agentes Comunitários de Saúde, da Equipe Saúde da Família, município de Santo Antônio do Monte, MG, 2008 Variável Escala Excelente Bom Regular Ruim Péssimo Não Sei TOTAL UFS 1 nº 13 19 4 2 38 % 34,3 50 10,5 5,2 20,2 Trabalho exercido pelos Agentes Comunitários de Saúde UFS 2 UFS 3 UFS 4 UFS 5 UFS 6 nº 15 9 2 26 % 57,7 34,7 7,6 13,8 nº 5 15 6 1 6 33 % 15,2 45,4 18,2 3 18,2 17,6 nº 10 8 6 1 25 % 40 32 24 4 13,3 nº 3 21 4 2 30 % 10 70 13,3 6,7 16 nº 17 13 4 2 36 Total % nº % 47,2 63 33,5 36,1 85 45,2 11,1 24 12,7 5,6 5 2,7 11 5,9 19,1 188 100 109 De acordo com a TAB. 24 o maior percentual dos usuários (78,7%) classificam o trabalho do ACS como excelente ou bom e 21,3% atribuem a esta variável a classificação regular, ruim ou péssimo, sendo que o maior índice de insatisfação está novamente presente na USF 3. Dentre os usuários que fizeram avaliação negativa do trabalho do ACS, foram apontados motivos inerentes à conduta particular do ACS, como o não pegar uma receita ou a demora para agendar uma consulta. Foi demonstrada insatisfação, também, devido o desconhecimento do modelo assistencial vigente. “O trabalho deles é péssimo, acho um desperdício de dinheiro este monte de mulher andando pela rua, a gente não precisa disso não, a gente precisa é de mais médico para atender. Tem só um médico e é muito pouco” (usuário USF 3) “A agente passa na minha porta e não pergunta se preciso de alguma coisa, a gente que tem que ficar correndo atrás das coisas, eu preciso de receita e tenho que ir no Posto, eu acho que isso é trabalho da agente” (usuário USF 6) “Eu acho que ela demora muito para marcar as consultas, acho que é ruim o trabalho dela” (usuário USF 3) Através das falas dos usuários que avaliaram satisfatoriamente o trabalho do ACS percebe-se uma relação de amizade, vínculo, responsabilidade, com privilégio das ações preventivas e promocionais. Os ACS’s são valorizados também pelo fácil trânsito que dispõe no sistema formal de atenção à saúde, o que torna facilitado o acesso ao cuidado. “Eu acho muito importante o trabalho de agente, porque elas vêem em casa, traz a enfermeira para olhar pressão, está sempre acompanhando as famílias, orientando, sabendo se pode ajudar em alguma coisa, é muito bom” (usuário USF 3) “A Fulana faz tudo para mim, ela traz receita, marca tudo que eu preciso. Eu acho muito importante o trabalho delas, é uma coisa muito boa. Na área de saúde os governos tem melhorado muito, a gente tem tudo na porta” (usuário USF2) “[...] E acho muito importante porque às vezes a gente não está nem lembrando de saúde e ela chega, conversa, pergunta se está precisando de alguma coisa. E a visita para quem é idoso, que fica mais dentro de casa é importante, a conversa, a atenção que elas dão faz bem pra gente” (usuário USF 1) 110 “Muito bom, ela vem, vê se você está precisando de alguma coisa, pergunta se precisa de consulta, se quer um preventivo, é muito bom, às vezes, assim, pergunta se eu quero soro para dar para minha filha quando eu falo que ela está com diarréia, olha os cartões de vacina para ver se está tudo em dia realmente, é excelente” (usuário USF 5) “Ela pergunta por toda a família, se a gente precisa de alguma coisa a mais, é excelente” (usuário USF 2) Dentro da humanização da assistência na SF emergiu como aspecto para se alcançar um cuidado mais humano o elemento da ambiência. Segundo o MS a ambiência na saúde está relacionada ao tratamento do espaço físico, espaço este entendido como social, profissional e de relações interpessoais, que visa proporcionar atenção acolhedora, resolutiva e humana (BRASIL, 2006b). O conceito de ambiência segue três eixos: a) espaço que visa a confortabilidade focada na privacidade e individualidade dos sujeitos, valorizando elementos ambientais que interagem com as pessoas – cor, cheiro, som, etc. – garantindo conforto aos profissionais e usuários; b) espaço que possibilita a produção de subjetividades – encontro de sujeitos – por intermédio da ação e reflexão sobre os processos de trabalho; c) espaço usado como ferramenta facilitadora do processo de trabalho, favorecendo a otimização de recursos, o atendimento humanizado, acolhedor e resolutivo (BRASIL, 2006b). A TAB. 25 revela a avaliação dos usuários em relação à aparência física da USF. TABELA 25 Distribuição numérica e percentual dos usuários participantes da pesquisa segundo a satisfação em relação à aparência física da Unidade Saúde da Família, município de Santo Antônio do Monte, MG, 2008 Variável Escala Excelente Bom Regular Ruim Péssimo Não Sei TOTAL Aparência Física da Unidade Saúde da Família UFS 1 UFS 2 UFS 3 UFS 4 UFS 5 UFS 6 nº % nº % nº % nº % nº % nº % 14 36,8 10 38,8 5 15,2 10 40,0 2 6,7 10 27,8 23 60,6 15 57,4 28 84,8 12 48,0 28 93,3 24 66,6 1 2,6 1 3,8 3 12,0 2 5,6 38 20,2 26 13,8 33 17,6 25 13,3 30 16,0 36 19,1 Total nº % 51 27,2 130 69,1 7 3,7 188 100,0 111 Ao analisar a TAB. 25 percebe-se que 96,3% dos usuários classificaram a aparência da USF como excelente ou bom e 3,7% a classificaram como regular, sendo o maior nível de satisfação obtido na USF 3 e 4. Através das falas dos entrevistados fica evidenciado que as USF constituem espaços privilegiados para ambiência no que se refere confortabilidade, privacidade e organização. “O visual é muito bem cuidado, não tem ruído, é muito silencioso, é confortável, não tem mau cheiro, é excelente” (usuário USF 1) “O prédio é novinho, pintadinho, tudo branquinho, os móveis novinhos também, tem muito espaço, é excelente. Tem bastante sala lá, as salas são de um tamanho bom, fica tudo organizado dividido [...] a gente tem privacidade, toda vez que eu precisei conversar eu tive” (usuário USF 3) “Lá era uma casa antes, mas eles arrumaram tudo e ficou muito bom. Trocou o piso, colocou pia nas salas, lá tem espaço suficiente, então dá para organizar” (usuário USF 4) “Eu acho que é bom. Em relação a limpeza, a organização é bom. Lá até é muito bem organizado pelo movimento que tem” (usuário USF 3) “Quando eu chego para olhar pressão elas pedem para descansar um pouquinho. Tem bastante cadeira lá, o pessoal fica a vontade, tem espaço para todo mundo sentar e ficar confortável” (usuário USF 2) “Eu sempre faço preventivo lá, tem uma sala reservada, com banheiro grande, eu gosto muito de lá. Tem uma sala para a enfermeira, uma para o médico, tem a anti-sala, a sala de vacina, de curativo, tudo bem repartido. Eu acho bonitinho, que tem uns detalhes, uns enfeitinhos, elas preocupam com tudo, é excelente” (usuário USF 2) A classificação da aparência da USF como regular ou ruim esteve diretamente relacionada ao tamanho das salas, como se percebe adiante. “Lá tem sala separada para tudo, mas acho que as salas poderiam ser um pouquinho maior” (usuário USF 5) “Eu acho o Posto pequeno, as salas poderiam ser maiores, como a recepção, por exemplo, é pequena, se chega muita gente não cabe, tem que esperar do lado de fora, mas tem cobertura lá e tem cadeira para todo mundo também” (usuário USF 6) 112 Beck et al., (2007) assinalam que o ambiente de trabalho bem organizado favorece o equilíbrio físico e emocional dos usuários, assim como representa um espaço que contribui para a prestação de uma assistência de qualidade. A Política Nacional de Humanização preconiza, também, que os serviços de saúde devem facilitar o acesso físico a pessoas com necessidades especiais, como aquelas com deficiência visual, ou que usem cadeiras de rodas ou muletas, ou que ainda não sabem ler, que tenham linguagem clara e representativa, identificando os espaços e funções (BRASIL, 2006c). Frente a esta colocação verifica-se através das falas dos usuários que existem algumas Unidades que oferecem obstáculos em relação ao acesso, interferindo diretamente na ambiência. “Eu fiz uma cirurgia e fui no Posto para vê a pressão, porque eu não estava passando bem, quando cheguei lá dei de cara com uma escada, como eu não podia subir chamei a enfermeira e ela olhou a pressão para mim na rua. Acho que isso não pode acontecer, não pode ter escada pra entrar em Posto, porque chega todo tipo de gente, né?” (usuário USF 4) “Lá tem escada, mas tem rampa também, mas a rampa é muito íngreme, não é qualquer pessoa que consegue subir, nisso precisa melhorar” (usuário USF 6) 5.4 A qualidade da assistência A qualidade da assistência esta relacionada ao quanto à demanda em saúde está sendo atendida de forma otimizada pelo serviço de saúde. O termo qualidade quando definido em sentido mais amplo também se relaciona à satisfação dos usuários com os serviços, os custos da atenção, a qualificação do pessoal dos serviços de saúde, a segurança e aparência agradável das unidades de saúde em que os serviços são fornecidos e a adequação dos equipamentos que contribuem para a prestação da assistência (STARFIELD, 2002). Na perspectiva da qualidade, emergiram neste estudo os seguintes temas: competência e qualidade técnica da equipe, tempo gasto na consulta médica e de enfermagem, quantidade e qualidade de equipamentos, resolutividade do serviço e descrição da assistência à saúde antes e após a implantação da SF. Na TAB. 26 fica explicitada a satisfação dos usuários em relação à competência e qualidade técnica dos profissionais que compõem as ESF1’s. 113 TABELA 26 Distribuição numérica e percentual dos usuários participantes da pesquisa segundo a satisfação em relação à competência e qualidade técnica da Equipe Saúde da Família, município de Santo Antônio do Monte, MG, 2008 Variável Escala Excelente Bom Regular Ruim Péssimo Não Sei TOTAL Competência e Qualidade Técnica da Equipe Saúde da Família UFS 1 UFS 2 UFS 3 UFS 4 UFS 5 UFS 6 Total nº % nº % nº % nº % nº % nº % nº % 8 21,1 17 65,4 7 21,2 11 44,0 5 16,7 7 19,4 55 29,2 28 73,7 9 34,6 21 63,7 12 48,0 22 73,3 23 63,9 115 61,2 2 5,2 5 15,1 2 8,0 3 10,0 6 16,7 18 9,6 38 20,2 26 13,8 33 17,6 25 13,3 30 16,0 36 19,1 188 100,0 Dos entrevistados 90,4% dos usuários se mostraram satisfeitos em relação à competência da ESF1, e 9,6% classificaram este item como regular, não foram obtidas respostas como ruim ou péssimo. Quando interrogados sobre a competência e qualidade técnica da ESF1 os usuários revelaram através de suas falas terem recebido diagnóstico, tratamento e orientações adequadas. Enfatizam, também, supremacia do serviço público em relação ao privado. È importante ressaltar que os usuários não centraram suas falas em um ou outro profissional, mas caracterizaram o desempenho de toda a equipe, como se observa nas narrativas abaixo. “Eles têm conhecimento sim. Tem o doutor, tem a enfermeira chefe, tem as outras enfermeiras [auxiliares de enfermagem] que são muito de confiança” (usuário USF 2) “É excelente, eu tenho muito confiança neles, como eu já de falei, eu até prefiro o Posto que o serviço particular, porque eles são mais atenciosos, olham melhor, e orientam tudo direitinho” (usuário USF 1) “Porque, assim, às vezes eu tenho alguma dúvida de remédio, de receita, ou qualquer coisa, ai eu vou lá e elas [auxiliares de enfermagem] me esclarecem diretinho. Às vezes depois eu até vou no médico e pergunto e ele me fala a mesma coisa que elas já me falaram” (usuário USF 5) “Todas as vezes que eu procurei, levei minhas meninas deu certo, assim, o doutor passa o remédio certinho, dá certo, resolve o problema, eu nunca tive problema com remédio lá não, pode confiar” (usuário USF 6) 114 Franco e Merhy (1999) descrevem que a produção do cuidado em saúde requer a utilização de tecnologias duras, leveduras e leves, comandadas pelas leves. Pressupõe, também, o uso da totalidade dos conhecimentos detidos por cada profissional, articulando de forma exata os núcleos de competência específica à dimensão que cada cuidador em saúde possui. A confiança aparece, também, como tema central nas citações dos usuários. Ter confiança se traduz em se colocar à disposição para que o outro cuide de um bem preciso – a saúde – ou como fala Merhy (1994) um bem simbólico para o usuário, algo que considera como indispensável e único à sua vida. Starfield (2002) relata que o senso de confiança no profissional pode deixar os usuários mais confortáveis para relatar informações relevantes e responder melhor às suas recomendações. Cabe enfatizar que os usuários reconhecem que em algumas situações os profissionais não estão aptos a lidar com a totalidade e a complexidade das demandas apresentadas, mas este fato não gera insatisfação ao usuário, pois este reconhece a impossibilidade de abranger todo o conhecimento existente, e alegam o interesse do profissional em aprimorar seu nível de conhecimento, possibilitando ao usuário a informação em momento posterior. “Ela [enfermeira] procura informar sobre alguma coisa que às vezes ela tem dificuldade de entender, para depois estar te falando, sabe? Então nesse ponto é excelente” (usuário USF 3) “Sempre que eu tive alguma dúvida eu procurei as enfermeiras [auxiliares de enfermagem] acho que tem algumas coisas, assim, que vamos supor vacina particular elas não sabem te informar, alguma outra coisa já ocorreu de não saber, mas eu acho que é difícil saber sempre tudo né? Mas elas sempre falam assim vou procurar saber depois te falo, acontece muito com a Fulana [ACS]. Então eu acho que é bom, né? A gente não fica sem resposta, não” (usuário USF 4) Anteriormente já foi citado que os usuários se sentem insatisfeitos com o atendimento oferecido pelos acadêmicos de enfermagem, e neste momento reiteram suas afirmações. “[...] Eu gosto mais da fulana [enfermeira] ela sempre faz mais certinho [puericultura], tem umas [acadêmicas de enfermagem] que só faz mais menos e pronto, eu não gosto não, fica muito a desejar” (usuário USF 4) 115 “Quando é estagiário, não é igual a enfermeira, né? Mas todo mundo tem que aprender, e precisa de cobaia” (USF 3) A TAB. 27 e TAB. 28 revelam os níveis de satisfação dos usuários em relação ao tempo gasto na consulta médica e de enfermagem. Ao comparar os percentuais obtidos para cada categoria profissional verifica-se maior satisfação dos entrevistados em relação tempo disponibilizado pela enfermagem. O tempo de consultório médico foi excelente ou bom na opinião de 41,4% dos entrevistados e regular, ruim ou péssimo para 18,7% dos usuários. No que diz respeito à enfermagem o nível de satisfação ficou em 57,5%, sendo que apenas 5,3% dos entrevistados se mostraram insatisfeitos em relação ao tempo gasto na consulta de enfermagem. È importante enfatizar que grande número de entrevistados não soube classificar estas variáveis. No caso do médico 39,9% dos entrevistados não opinaram, alegando nunca ter sido atendido pelo médico ou então ausência de médico na USF. Em relação à consulta de enfermagem 37,2% dos entrevistados nunca utilizaram o serviço, o levou a resposta não sei, conforme pode ser observado através da TAB. 28. TABELA 27 Distribuição numérica e percentual dos usuários participantes da pesquisa segundo a satisfação em relação ao tempo gasto na consulta médica, na Unidade Saúde da Família, município de Santo Antônio do Monte, MG, 2008 Variável Escala Excelente Bom Regular Ruim Péssimo Não Sei TOTAL UFS 1 nº % 10 26,6 27 71,1 1 2,6 38 20,2 UFS 2 nº % 3 11,5 4 15,4 5 19,6 3 11,5 8 30,8 3 11,5 26 13,8 Tempo gasto na Consulta Médica UFS 3 UFS 4 UFS 5 nº % nº % nº % 3 9,1 7 28,0 11 33,4 13 52,0 9 27,1 4 16,0 5 15,2 5 15,2 1 4,0 30 100,0 33 17,6 25 13,3 30 16,0 UFS 6 Total nº % nº % 23 12,2 55 29,2 19 10,1 8 4,3 8 4,3 36 100,0 75 39,9 36 19,1 188 100,0 116 TABELA 28 Distribuição numérica e percentual dos usuários participantes da pesquisa segundo a satisfação em relação ao tempo gasto na consulta de enfermagem, na Unidade Saúde da Família, município de Santo Antônio do Monte, MG, 2008 Variável Escala Excelente Bom Regular Ruim Péssimo Não Sei TOTAL UFS 1 nº % 7 18,4 11 29,0 20 52,6 38 20,2 Tempo gasto na Consulta de Enfermagem UFS 2 UFS 3 UFS 4 UFS 5 UFS 6 Total nº % nº % nº % nº % nº % nº % 14 53,7 3 9,1 3 12,0 8 26,7 2 5,6 37 19,7 5 19,3 20 60,7 9 36,0 11 36,7 15 41,6 71 37,8 1 3,0 6 24,0 1 3,3 1 2,8 9 4,8 1 3,0 1 0,5 7 27,0 8 24,2 7 28,0 10 33,3 18 50,0 70 37,2 26 13,8 33 17,6 25 13,3 30 16,0 36 19,1 188 100,0 Os maiores níveis de satisfação em relação ao tempo gasto na consulta médica foram obtidos na USF 1 e 4, onde os usuários relatam tempo suficiente para expor seu problema, ser examinado adequadamente e receber as orientações necessárias. “O tempo é bom, o médico não apressa a gente, não. Deixa a gente conversar, olha tudo direitinho, fala tudo, ele ainda pergunta se a gente não esqueceu nada. Eu acho que é mais que o tempo necessário” (usuário USF 1) “Eu acho o tempo razoável, porque ela te atende bem, assim, ela te pergunta se você está com dúvida, ela demora uma meia hora, mais de meia hora, tem dia, sabe? Ela te atende bem, não te atende correndo, só se for uma coisa bem simples para ser rápido. O horário que ela de atende é bom, não é mal feito não” (usuário USF 4) “Eu acho o tempo excelente, sabe? Eu falo o que eu quero. Eu consulto com a Fulana ela me explica tudo, pergunta se tem alguma dúvida, igual, assim, eu não saio com dúvida não, ou alguma coisa que eu queria perguntar, dá para entender e perguntar tudo diretinho” (usuário USF 4) Percebe-se através dos relatos dos usuários que o curto tempo disponibilizado para atendimento médico advém da grande demanda da Unidade, e especificamente no caso da USF 2 resultou da dificuldade do profissional em estabelecer um relacionamento mais efetivo com a população, fato que já foi citado anteriormente quando analisou-se o nível de satisfação com o trabalho exercido pelo médico. 117 “O tempo que a gente fica no consultório com o médico é muito pouco, dez minutos não da para ele olha tudo, a gente também não fala tudo que precisa, precisa de mais tempo para consulta” (usuário USF 2) “O médico só pergunta por que você foi lá, olha rapidinho, e vai logo passando o remédio, não conversa mais nada, ele é seco com a gente” (usuário USF 2) “Eu acho regular [...] atende em dez-quinze minutos, ela faz o que pode, mas tem muita gente para atende, né? Então tem que ser rápido mesmo, senão não dá tempo de olha todo mundo” (usuário USF 3) Os usuários referem maior satisfação com o tempo disponibilizado pelo profissional enfermeiro para atendimento “O tempo que ela tiver, sabe assim, ela conversa, ela te ouve, ela vê seu caso direitinho, todo o tempo que ela puder ela fica com você na sala, ela não tem pressa em atender, ela atende super-bem” (usuário USF 5) “Eu acho excelente, ela te pergunta se tem alguma dúvida, ela responde tudo, eu converso outras coisas com ela, eu gosto muito” (usuário USF 2) “Ela é muito atenciosa, olha tudo, é preocupada, conversa, sempre encontra um tempinho para pergunta se minha mãe está bem, como vão os meninos, às vezes a gente foi por outra coisa, mas ela não esquece dos outros problemas que a gente tem não” (usuário USF 1) Beck et al., (2007) destacam a comunicação e o relacionamento humano como elementos a serem valorizados e empregados no cuidado em saúde, sendo indicativos da qualidade da assistência em uma avaliação de processo e resultado. Merhy (1994) considera o tempo de atendimento dispensado ao usuário e o tempo de espera pela intervenção como componentes da medida de avaliação do acolhimento. Uma outra variável que surgiu neste tema de análise foi o nível de satisfação em relação à qualidade e quantidade de equipamentos disponíveis na USF, sendo a classificação desta variável descrita na TAB. 29. 118 TABELA 29 Distribuição numérica e percentual dos usuários participantes da pesquisa segundo a satisfação em relação qualidade e quantidade de equipamentos, na Unidade Saúde Família, município de Santo Antônio do Monte, MG, 2008 Variável Escala Excelente Bom Regular Ruim Péssimo Não Sei TOTAL UFS 1 nº % 6 15,8 28 73,7 4 10,5 38 20,2 Qualidade e Quantidade de Equipamentos UFS 2 UFS 3 UFS 4 UFS 5 UFS 6 Total nº % nº % nº % nº % nº % nº % 7 27 6 18,2 4 16 4 13,3 26 72,2 53 28,2 19 73 24 72,7 13 52 20 66,7 10 27,8 114 60,6 3 9,1 3 12 6 20 16 8,5 5 20 5 2,7 26 13,8 33 17,6 25 13,3 30 16 36 19,1 188 100 Ao analisar a variável quantitativa nível de satisfação dos usuários em relação à qualidade e quantidade de equipamentos, presente na TAB. 29 verifica-se que 88,8% estão satisfeitos em relação a este quesito, 8,5% o classificação como regular e 2,7% na o se julgam capazes de opinar sobre o assunto. As narrativas dos usuários revelam satisfação, pois existem equipamentos em boa condição de uso e em quantidade satisfatória, embora os usuários tenham relacionado apenas alguns tipos de equipamentos (micronebulizador, esfignomanômetro, estetoscópio e balança), possivelmente por ser aqueles que eles mais utilizam. “Lá tem tudo, para nebulização lá tem, para pressão, eles até fazem muita questão de olhar, olha direitinho” (usuário USF 3) “Tem todo equipamento que a gente precisa, não falta nada não. E está tudo funcionado direitinho, é excelente” (usuário USF 5) “Igual a balança, sempre está certinha para pesar a Fulana, sabe?Está bom, tudo certinho” (usuário USF 5) De acordo com o MS, em termos de equipamentos, uma USF deve incorporar a tecnologia necessária à resolução dos problemas no nível da APS, sendo estabelecida uma lista mínima de equipamentos que devem estar disponíveis para execução das atividades diárias (BRASIL, 2000). Nota-se que foi obstáculo para prestação da assistência à falta de equipamento para a realização da glicemia capilar em pacientes diabéticos. 119 “Minha mãe tem diabetes e todo dia que eu pedia para vir aqui em casa para fazer a glicemia dela não tinha fita para o aparelho, ai eu acabei comprando o aparelho e as fitas, porque não pode ficar sem fazer o controle da glicose, né? Ai nesse ponto eu acho que é regular né? Tem o aparelho mas não tem a fita, ai não adianta” (usuário USF 3) “Eu já vi dois ou três aparelho de pressão, tudo funcionando diretinho, é só chegar e olhar a pressão, mas filho é diabético, ele passou mal esses dias para traz e o médico pediu para fazer aquele exame do dedo, a glicemia, né? Só que lá no Posto não tinha a fita do aparelho, ficou mais de 15 dias sem. Eu acho que isso não pode acontecer, porque se for uma emergência fica difícil” (usuário USF 6) Outra dimensão analítica que se enquadrou na qualidade da assistência foi a resolutividade. Esta variável foi analisada apenas em caráter qualitativo, onde foi solicitado aos usuários para explicarem se ao procurar a USF eles tinham seus problemas resolvidos ou não. Na maioria das vezes os usuários se mostraram satisfeitos em relação à resolutividade, citando bom atendimento do serviço, a possibilidade de encaminhamento a consultas especializadas e a níveis mais complexos da atenção, incluindo o Tratamento Fora Domicílio (TFD). Através das narrativas percebe-se que os usuários declararam satisfação o fato de conseguir o atendimento, independente do tempo transcorrido até obtê-lo. “Quando eles não conseguem resolver o problema eles encaminham a gente para o especialista. A gente não consegue com muita facilidade não, tem a demora como sempre pelo SUS, mas está bom, porque demora, mas no final a gente consegue e dá certo” (usuário USF 4) Tenho [problema resolvido] todas as vezes que eu vou, eu tenho, senão ela [enfermeira] fala assim volta aqui tal dia, eu tenho que mostrar exame e não tem médico e ela não pode passar receita, então você volta o médico olha e já passa a receita. Então se não é no mesmo dia, em outro dia resolve (USF 5) “Eu sou muito bem atendida lá, igual eu tive um problema com a Fulana [filha] ela engoliu uma molinha de cabelo, eu fui para lá, né? Ai eles me encaminharam direto para o Centro de Especialidades e arrumaram carro para me levar, quando eu cheguei lá fui muito bem atendida, foi rapidinho e de lá me mandaram para Belo Horizonte, eu fui na ambulância da Prefeitura direto para o João XXIII, e o médico lá falou que eu quase perdi a menina, graças a Deus que eles me ajudaram” (usuário USF 5) 120 De acordo com o MS o termo resolutividade está relacionado à capacidade de cada nível de atenção, dentro do limiar de sua competência de enfrentar e solucionar os problemas de saúde apresentados pela população (BRSIL, 2001). Através das falas dos usuários é perceptível que a USF, até o nível de sua competência, consegue resolver os problemas de saúde que lhes são apresentados, porém nota-se a existência de obstáculos externos à Unidade que impedem a prestação de um cuidado integral e contínuo. “É resolvido sim, só se não tiver no alcance deles, como alguma coisa que não é feita lá. Mas lá dentro do Posto eu nunca voltei sem uma solução” (usuário USF 2) “Às vezes eles passam a bola para frente, porque eles não conseguem resolver, ai as coisas travam” (usuário USF 3) Merhy (1994) argumenta que a ação resolutiva não deve se ater apenas ao ato, a conduta, mas o profissional deve saber utilizar toda a tecnologia disponível para chegar ao diagnóstico e tratamento do caso, finalizando com a alteração do quadro do usuário e com sua satisfação. Alguns usuários se mostraram insatisfeitos a resolutividade da assistência e apontaram como causa a ausência do médico na Unidade e a não realização de exames laboratoriais mais complexos. “Ultimamente está difícil de resolver tudo porque às vezes a gente vai lá querendo consulta, mas não tem médico, ai tem que procurar outro recurso, isso daí não está bom não” (usuário USF 6) “Assim, tem alguns exames que eu preciso fazer e não faz, como de hormônio. Ai eu tenho que pagar. Acho que resolve em parte, porque eu faço a consulta lá mas o exame não tem” (usuário USF 2) Ao solicitar que os usuários descrevessem como eles percebiam a assistência e a organização dos serviços de saúde antes e após a implantação da SF, muitos afirmaram não saber descrever, pois passaram a utilizar o serviço público de saúde somente após a implantação da ESF, o que induz a idéia de maior acessibilidade atualmente. Entre os que descreveram afirmaram melhora significativa do serviço e associaram essa melhora à 121 presença do médico em horário integral na USF, como se percebe através das falas que se seguem. “Antes era muito difícil, não tinha médico nos Postos, ele ia atendia as consultas e ia embora, se acontecesse qualquer emergência não tinha jeito, e agora não, o médico está no Posto o tempo inteiro de funcionamento para atender a gente, então é uma diferença, uma coisa gritante. Hoje é muito melhor, não tem nem comparação, tem assistência mesmo” (usuário USF 4) “Mudou bastante, né? Antigamente não tinha tanto médico, sabe? Igual eu já trabalhei em fábrica, às vezes você chegava doente e tinha que ir para a Santa Casa e pagar consulta, agora não. Depois foi mudando aos poucos e agora passou a ter nos Postos, nos PSF, né? Ai agora já estás bem melhor, qualquer coisa que a gente precisa a gente vai lá, se não tem médico eles encaminham” (usuário USF 5) “Na minha opinião eu acho que melhorou muito. Eu já precisei antes, assim quando ainda não tinha o PSF, eu tinha problema de gastrite, era um sofrimento até que você conseguia um médico, agora não, é só ir lá eles de atendem na urgência, então melhorou bastante” (usuário USF 2) Ainda hoje, a perspectiva do usuário em relação a um serviço de saúde está muito ligada à assistência curativa, fator que indica a hegemonia do modelo assistencial flexneriano, mesmo quando os usuários caracterizam um serviço que é considerado dispositivo para mudanças e alternativa viável preencher as lacunas do modelo supracitado. 5.5 Promoção da saúde: entre a teoria e a prática A crise institucional ocasionada pela baixa capacidade do modelo assistencial individual-curativista em manejar eficazmente a enorme carga apresentada pelos problemas sanitários do subdesenvolvimento e as doenças crônico-degenerativas, propiciaram a necessidade de se desenvolver novas ferramentas de trabalho, que levassem em consideração as razões pelas quais as pessoas adoecem ou permanecem saudáveis. Nesta perspectiva a promoção da saúde surge como forma de reestruturação da forma de assistir as pessoas em saúde, no sentido de torná-las aptas a enfrentar os problemas advindos da vida cotidiana que possivelmente venham a repercutir no processo saúde-doença. Neste contexto o cuidado em saúde permeia a compreensão dos processos desencadeados nas ações, as relações e os atores sociais envolvidos, as especificidades de 122 cada situação, os diferentes valores presentes nas práticas sociais e de saúde e os distintos significados que as situações adquirem para cada grupo social em seu tempo e lugar (Figueiró et al., 2004). Segundo Figueiró et al., (2004) a proposta de promoção da saúde converge para dois conceitos centrais: a intersetorialidade, visto que sinaliza a necessidade de ação conjunta de vários setores públicos e grupos sociais no estabelecimento das ações que visam a qualidade de vida; e o empowerment ou empoderamento. O empowerment é definido por Buss (2003, p. 27) pela “aquisição de poder técnico e consciência política para lutar em prol da saúde”. Dentro da proposta de promoção da saúde, no presente estudo, buscou-se verificar a qualidade das ações de promoção da saúde desenvolvidas pela SF mediante o conceito de promoção da saúde atribuído pelos usuários, incluindo sua participação nas ações que visam este campo de atuação. Através das falas dos usuários percebe-se que a maioria destes tem dificuldade em conceituar o tema, se expressando em poucas palavras, ou simplesmente falando não sei. Poucos usuários se aproximaram do conceito descrito pela literatura, sendo que a maioria destes se referiu a promoção da saúde no componente estilo de vida. “Promover saúde, não sei, como assim? Explica melhor para eu tentar entender” (usuário USF 4) “Promover saúde é fazer mais as coisas para as pessoas, é ter mais médico, mais exames, essas coisas assim, né?” (usuário USF 2) “Eu acho que promover saúde é praticar exercícios, comer muita fruta, verdura, é isso” (usuário USF 3) “Promover saúde... eu acho que é o mesmo que prevenção, como fazer um preventivo, seguir os conselhos que eles dão” (usuário USF 2) “Promover saúde é promover o bem estar da pessoa através de orientações, por exemplo, a caminhada, a alimentação adequada e isso reduz o uso de medicamentos” (usuário USF 1) Perante o amplo campo de atuação que a Carta de Ottawa propõe para as ações de promoção da saúde, percebe-se que a SF dá maior ênfase ao componente estilo de vida. Figueiró et al., (2004) explicam esta situação afirmando que os profissionais de saúde e 123 gestores apresentam conhecimento restrito sobre as ações orientadas para a promoção da saúde, o que remete a uma obscuridade nas práticas que envolvem este referencial. Ao solicitar-se que os usuários citassem as atividades para a promoção da saúde desenvolvidas pela ESF1 emergiram das falas dos entrevistados as seguintes ações: palestras, grupos de educação em saúde, caminhada, cartazes, alongamento, aconselhamento, campanha contra o tabagismo, câncer de mama, vacinas, controle do peso, o que vem a confirmar o enfoque prioritário nas ações relativas ao componente estilo de vida. A TAB. 30 revela os dados quantitativos que envolvem a participação dos usuários nas ações supracitadas. TABELA 30 Distribuição numérica e percentual dos usuários participantes da pesquisa segundo participação nas ações de promoção da saúde desenvolvidas pela Equipe Saúde da Família, município de Santo Antônio do Monte, MG, 2008 Variável Escala Sim Não Não sei TOTAL UFS 1 nº % 2 5,3 25 65,7 11 29 38 20,2 Participação nas Atividades de Promoção da Saúde UFS 2 UFS 3 UFS 4 UFS 5 UFS 6 Total nº % nº % nº % nº % nº % nº % 1 3 2 8 3 8,3 8 4,3 3 11,5 6 18,2 12 48 10 33,3 4 11,1 60 31,9 23 88,5 26 78,8 11 44 20 66,7 29 80,6 120 63,8 26 13,8 33 17,6 25 13,3 30 16 36 19,1 188 100 Ao analisar a TAB. 30 percebe-se que a maioria dos entrevistados 120 (63,8%) não sabem informar se participam ou não das atividades que envolvem a promoção da saúde, fato relacionado, ao desconhecimento do conceito de promoção da saúde. Dos entrevistados 60 (31,9%) sabem identificar essas ações, mas declaram das participar das mesmas, e apenas 8 (4,3%) são freqüentadores assíduos das atividades de promoção da saúde. A pequena adesão às ações de promoção da saúde pode ser explicada, em parte, através do conceito que os usuários têm a respeito do processo saúde-doença. Para a maioria dos usuários saúde ainda está relacionada à ausência de doenças, fato que leva aos usuários a procurar o serviço com mais freqüência mediante o aparecimento de um evento patológico. “Saúde é tudo, é muito importante. Agora doença é quando você está com a pressão alterada, a glicose aumentada” (usuário USF 2) “Saúde é quando você está passando bem e doença é uma coisa que você está lembrando de repente você começa a lembrar do seu 124 estômago, é porque está te incomodando isso eu acho que é doença” (usuário USF 1) “Saúde é quando a gente está bem, alimenta bem, passa bem. Agora doença são diversas que podem aparecer, né? Como, por exemplo, pressão alta” (usuário USF 3) Doença é igual o meu filho está, ele tem diabetes e faz acompanhamento com neurologista, saúde é não ficar igual ele, eu acho” (usuário USF 6) “Saúde é uma coisa que você só dá valor quando você perde, é quando está tudo bem, seu organismo funciona direitinho, tudo do jeito que tem que ser, sem nenhum sintoma. Doença é quando a gente perde a força, sente dor, não tem aquela vitalidade que você tem quando está com saúde” (usuário USF 4) Através das falas dos usuários evidenciam-se, também, os motivos que os leva a não participar dos eventos, sendo citado a falta de tempo, o fato de ter de cuidar dos filhos, o cansaço após o trabalho e desvalorização desses eventos enquanto espaço resolutivo. “Eu chego em casa tarde, já cansada da fábrica, tenho ainda que arrumar as coisas aqui em casa, então não dá para ir, sempre tem um convitinho em baixo da porta para eu participar da palestra, mas nunca dá para eu ir não, não é que elas não fazem, não convidam, é que não dá mesmo” (usuário USF 5) “Eu fui algumas vezes na reunião para diabético mas sempre estavam falando a mesma coisa, ai desanimei, não fui mais” (usuário USF2) “Para mim fica complicado, porque meu marido viaja a semana toda e eu tenho duas crianças pequenas que não tem com quem deixar, por isso não vou” (USF 3) A baixa adesão às ações promocionais merece reflexão e análise quanto à efetividade das mesmas e adequação as demandas da população. Nota-se a necessidade de ampliação dessas ações, envolvendo a intersetorialidade, visando não só a informação, ocupação e recreação, mas que estes momentos se constituam em espaços de qualificação que possibilitem conquistas e perspectivas de melhoria das condições de vida, ou seja, capacitar os usuários para o exercício do empowerment, para que estes se tornem verdadeiros agentes de transformações em seu ambiente físico, social, político e cultural, em prol da qualidade de vida. 125 6 CONSIDERAÇÕES FINAIS De maneira geral a investigação realizada revelou um elevado índice de satisfação dos usuários em relação à assistência oferecida pela SF, porém, ao se analisar a subjetividade imbuída nas falas dos usuários, percebe-se certa insatisfação relativa a algumas das variáveis estudadas. A queixa de maior destaque apresentada pelos usuários foi a ausência do profissional médico em algumas USF’s, sendo relatada pelos usuários a necessidade de contratar médico com urgência. O fato do médico estar ausente nas USF’s comprometeu a avaliação ao acesso à consulta médica agendada e eventual, levando a ausência da coordenação da atenção, prejudicando, também, a resolutividade de alguns problemas apresentados pela população, a nível da APS. Naquelas Unidades onde o médico estava presente a insatisfação gerou em torno da demora no agendamento de consultas, sendo ressaltada pelos usuários a necessidade de priorizar melhor cada caso e a possibilidade de contratação de um número maior de profissionais para atender à demanda. Outro problema levantado foi em relação à acessibilidade organizacional, no que diz respeito ao horário de funcionamento da USF, onde ficaram como sugestões dos usuários a possibilidade de iniciar o atendimento às sete horas na quarta-feira e a realização das reuniões em equipe após o expediente de trabalho. A indisponibilidade de medicamentos da Unidade foi outro obstáculo que comprometeu a qualidade da assistência segundo os usuários, sendo a possibilidade de dispensar o medicamento na própria Unidade um aspecto que facilitaria o acesso e a resolutividade do serviço. A demora no agendamento e a forma como são agendados exames complementares e consultas médicas especializadas constituíram motivos de insatisfação dos usuários e comprometeram a integralidade da assistência. Em relação a esta variável foram feitas considerações como informatização da APS, alteração do horário para marcação de exames laboratoriais, agendamento destes procedimentos na própria USF e aumento da disponibilidade destes procedimentos, como possíveis alternativas para melhorar a qualidade da assistência. Como aspecto positivo foi considerado a infra-estrutura e a aparência física das USF, e a disponibilidade para realização de procedimentos, fatores que associados à acessibilidade geográfica possibilitaram a constituição de espaços ímpares para o desenvolvimento da ambiência. 126 As relações estabelecidas entre equipe e usuário também foram causa de satisfação dos entrevistados, uma vez que estas permearam o acolhimento, o vínculo e a humanização, propiciando a longitudinalidade do cuidado em saúde. Parece ser motivo de satisfação dos usuários a atual forma de assistir as questões de saúde, advindas do novo modelo assistencial, sendo citada como causa principal da aprovação do serviço a presença do médico em horário integral de funcionamento da USF, situação esta que reflete a hegemonia do modelo flexneriano, com privilégio das ações curativas em detrimento às ações de promoção da saúde. O fato supracitado vem a explicar a baixa adesão dos usuários às atividades desenvolvidas pela SF que são direcionadas a promoção da saúde. Verifica-se, também, que o conceito de ações de promoção da saúde atribuído pelos usuários fica restrito a promoção como sinônimo de prevenção, compactando seu campo de atuação no componente estilo de vida, fato que impede a participação efetiva dos usuários na construção da saúde como qualidade de vida e no exercício da cidadania. Reconhece-se que existe um conjunto de críticas e limites impostos a avaliação da qualidade segundo a satisfação dos usuários, porém acredita-se que a qualidade da assistência depende de uma interação entre aqueles que vivenciam a mesma circunstância social, sendo fundamental analisar a satisfação do usuário, beneficiário direto do serviço e parte integrante do processo organizacional e assistencial em saúde. Percebe-se que os estudos de avaliação são peças chave para o processo decisório e melhor adequação dos serviços de saúde. Assim sendo, é reconhecida a importância de se estender estes estudos para além do âmbito acadêmico, levando os resultados encontrados e as considerações realizadas até as Unidades investigadas, com o objetivo de auxiliar no cotidiano e na gestão dos serviços de saúde, visando o aperfeiçoamento e a qualidade da assistência. 127 REFERÊNCIAS AKERMAN, M.; NADANOVSKY, P. Avaliação dos serviços de saúde – avaliar o que? Cadernos de Saúde Pública, Rio de Janeiro, v.8, n.4, p. 361-365, jan./mar. 1992. Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/csp/v8n4/v8n4a02.pdf. Acesso em: 16 jun. 2007. ALVES, V.S. Um modelo de educação em saúde para o Programa Saúde da Família: pela integralidade da atenção e reorientação do modelo assistencial. Interface – Comunicação, saúde, Educação, v. 9, n. 16, p. 39-52, set. 2004/fev. 2005. 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Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/physis/v15s0/v15s0a11.pdf. Acesso em: 24 nov. 2006. 135 APÊNDICE A INSTRUMNETO PARA COLETA DE DADOS Entrevistador______________________________________________ Entrevista nº ______ AVALIAÇÃO SÓCIO-ECONÔMICO-DEMOGRÁFICO 1 – Endereço ________________________________________________________________ USF___________________________________________________________ MA/F_______ 2 – Tempo de residência na área ________________________ 3 – Sexo ( )F ( )M 4 – Idade _____ anos 5 – Escolaridade ( ) não alfabetizado ( ) fundamental incompleto ( ) fundamental completo ( ) médio incompleto ( ) médio completo ( ( ( ( ) superior incompleto ) superior completo ) PG incompleta ) PG completa 6 – Renda Familiar ___________________ ( ) nenhuma ( ) menos de R$415,00 ( ) R$415,00 à R$829,00 ( ) R$830,00 à R$1244,00 ( ( ( ( ) R$1245,00 à R$1659,00 ) R$1660,00 à R$2074,00 ) R$2075,00 à R$ 4149,00 ) mais de 4150,00 7 – Possui plano/convênio de saúde? ( ) S Qual?_________________________________ Nº de pessoas cobertas_____________ ( )N 8 – Utiliza os serviços públicos de saúde do Município? ( ) S Qual(is)?______________________________________________________________ ( )N 9 – Teve ao menos uma experiência de atendimento na Unidade de Saúde da Família (USF), a partir do último semestre do ano de 2007? ( )S ( )N 10 – Quais serviços utiliza na Unidade Saúde da Família ( ) consulta médica agendada ( ) Grupos educativos ( ) consulta medica eventual/urgência ( ) Visita domiciliar 136 ( ) consulta de enfermagem ( ) Puericultura ( ) Preventivo ( ) Procedimentos (PA, vacinas, curativo) ( ) Outros – Especificar ___________________________________________________________________________ Descreva a assistência à saúde e a organização dos serviços de saúde antes e após a implantação do PSF. INFRA-ESTRUTURA Como você classificaria: 1 – A aparência física da USF? (percepção visual, sonora, olfativa, limpeza, conforto, nº, tamanho e distribuição de salas) ( ) excelente ( ) bom ( ) regular ( ) ruim ( ) péssimo ( ) Não sei 2 – A qualidade e quantidade de equipamentos? (Ex: aparelho para medir PA, aparelho para medir glicose, balança, macas, cadeiras, nebulizador, etc.) ( ) excelente ( ) bom ( ) regular ( ) ruim ( ) péssimo ( ) Não sei 3 – Disponibilidade de medicações? ( ) excelente ( ) bom ( ) regular ( ) ruim ( ) péssimo ( ) Não sei 4 – Disponibilidade para procedimentos (aplicação de medicações, vacinas, curativo,etc.) ( ) excelente ( ) bom ( ) regular ( ) ruim ( ) péssimo ( ) Não sei Como você percebe a infra-estrutura disponível na USF? Você poderia descrever. O que importa saber: Estado de conservação da USF em relação a limpeza, mobília, conforto, organização, espaço físico, presença de escadas e rampas (acesso) e equipamentos (funcionamento e quantidade) Privacidade no atendimento Disponibilidade de procedimentos e espaço físico adequado ACESSIBILIDADE Como você classificaria: 1 – Acesso a consulta agendada? ( ) excelente ( ) bom ( ) regular ( ) ruim ( ) péssimo ( ) Não sei 2 – Acesso a consulta eventual/urgência? ( ) excelente ( ) bom ( ) regular ( ) ruim ( ) péssimo ( ) Não sei 3 – Sobre o tempo que você aguarda na sala de espera para consulta agendada? ( ) excelente ( ) bom ( ) regular ( ) ruim ( ) péssimo ( ) Não sei 137 4 - Sobre o tempo que você aguarda na sala de espera para consulta eventual/urgência? ( ) excelente ( ) bom ( ) regular ( ) ruim ( ) péssimo ( ) Não sei 5 – Tempo gasto na consulta médica? ( ) excelente ( ) bom ( ) regular ( ) ruim ( ) péssimo ( ) Não sei 6 – Tempo gasto na consulta de enfermagem? ( ) excelente ( ) bom ( ) regular ( ) ruim ( ) péssimo ( ) Não sei 7 – Acesso a exames complementares? (Rx, mamografia, eletrocardiograma, etc.) ( ) excelente ( ) bom ( ) regular ( ) ruim ( ) péssimo ( ) Não sei 8 – Acesso a encaminhamentos para consulta especializada? (cardiologia, ortopedia, neurologia, etc.) ( ) excelente ( ) bom ( ) regular ( ) ruim ( ) péssimo ( ) Não sei 9 – O horário de atendimento da USF? ( ) excelente ( ) bom ( ) regular ( ) ruim ( ) péssimo ( ) Não sei 10 – A distância da USF de sua casa? (tempo de deslocamento, meio de transporte utilizado) ( ) excelente ( ) bom ( ) regular ( ) ruim ( ) péssimo ( ) Não sei 11 – Capacidade de comunicação com os membros da equipe? (expor problemas frente a crenças, valores) ( ) excelente ( ) bom ( ) regular ( ) ruim ( ) péssimo ( ) Não sei Como você percebe a acessibilidade dos serviços oferecidos na USF? Você poderia me descrever? O que importa saber: Barreira geográfica: local instalado, distância e tempo da USF de sua moradia, meio de transporte utilizado, presença de barreiras geográficas (ladeiras, morros, rios, etc.). Barreira organizacional: horário de funcionamento da USF, tempo de espera para agendar consulta médica, tempo de espera para atendimento eventual/urgência, tempo de espera para atendimento de especialidades e exames, tempo de espera para realização de procedimentos. Barreira sócio-cultural: dificuldade de comunicação com a ESF, sente vergonha de expor seus problemas, desvalorização de crenças, falta de credibilidade nos serviços. RELAÇÃO USUÁRIO-EQUIPE SAÚDE DA FAMÍLIA Como você classificaria: 1 – A competência qualidade técnica da equipe de saúde? ( ) excelente ( ) bom ( ) regular ( ) ruim ( ) péssimo ( ) Não sei 138 2 – Atendimento por parte dos técnicos ou auxiliares de enfermagem? ( ) excelente ( ) bom ( ) regular ( ) ruim ( ) péssimo ( ) Não sei 3 – Atendimento por parte da enfermeira? ( ) excelente ( ) bom ( ) regular ( ) ruim ( ) péssimo ( ) Não sei 4 – Atendimento por parte do médico? ( ) excelente ( ) bom ( ) regular ( ) péssimo ( ) Não sei 5 – O trabalho exercido pelos Agentes Comunitários de Saúde? ( ) excelente ( ) bom ( ) regular ( ) ruim ( ) péssimo ( ) Não sei ( ) ruim 6 – Explicações oferecidas pelos profissionais da ESF quanto a doença, tratamento, medicações, exames, encaminhamentos? ( ) excelente ( ) bom ( ) regular ( ) ruim ( ) péssimo ( ) Não sei Como você percebe o relacionamento existente entre ESF e você (usuário)? O que importa saber: Relacionamento interpessoal como: cordialidade, gentileza, atenção, preocupação, demonstração de interesse e responsabilidade pelas queixas, respeito, vínculo, amizade, confiança, carinho, liberdade para conversar assuntos íntimos. RESOLUTIVIDADE 1 – Quando você procura a USF e é atendido você consegue ter seu problema resolvido? Explica para mim. ASPECTO PROMOCIONAL 1 – Para você o que é saúde? E doença? 2 – O que significa para você promover saúde? 3 – Cite exemplos de atividades desenvolvidas na comunidade pela USF que visam a promoção da saúde. 4 – Você participa das atividades desenvolvidas pela USF que tem como finalidade a promoção da saúde? ( ) sim ( ) não ( ) não sei informar 139 APÊNDICE B CARTA AO SECRETÁRIO MUNICIPAL DE SAÚDE DO MUNICÍPIO DE SANTO ANTÔNIO DO MONTE - MG Santo Antônio do Monte, Agosto de 2007 Ilm° Sr. Martim Rodrigues Santos D.D. Secretario Municipal de Saúde Prezado Senhor, Para obtenção do titulo de mestre em Educação, Cultura e Organizações Sociais – Linha de Pesquisa Saúde Coletiva da FUNEDI/UEMG é necessário que eu realize uma pesquisa científica na área de saúde, sendo escolhido como campo de estudo a Estratégia Saúde da Família. A pesquisa tem como titulo Estratégia Saúde da Família: qualidade da assistência sob a perspectiva da satisfação do usuário. Para desenvolvimento da pesquisa solicito autorização de V.S. para realizá-la nas seis Unidades Saúde da Família da zona urbana do município. A referida pesquisa será desenvolvida no período de janeiro a julho de 2008 e tem como objetivo geral avaliar a qualidade da assistência à saúde oferecida pela ESF no município de Santo Antônio do Monte – MG, segundo a perspectiva da satisfação dos usuários. O público alvo a ser entrevistado será constituído de 321 famílias selecionadas através de amostragem sistemática. O instrumento para coleta de dados constará em uma entrevista semi-estruturada que será aplicada a usuários das Unidades Saúde da Família que concordarem em participar desta pesquisa. Previamente os entrevistados serão esclarecidos sobre os objetivos da pesquisa e garantido sigilo absoluto quanto a sua identidade. Após atuar na Saúde da Família no município por quase três anos acredito que a pesquisa é de grande importância, pois fornecerá subsídios para a avaliação da atenção primária, propiciando parâmetros para a reorganização dos serviços, caso necessário. Peço a colaboração de V.S., coloco-me a disposição para qualquer esclarecimento e solicito seu acordo neste documento. Atenciosamente, ____________________________________ Simone Maria Silva Santos Tel.: (37) 9984-1753 COREN-MG 114911 Mestranda em Educação, Cultura e Organizações Sociais Linha de Pesquisa Saúde Coletiva – FUNEDI/UEMG Orientador Prof. Dr. Paulo Sérgio Carneiro Miranda Co-orientadora Prof. Ms. Eliete Albano Azevedo Guimarães 140 APÊNDICE C TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO Caro usuário Estamos desenvolvendo a pesquisa Estratégia Saúde da Família: qualidade da assistência sob a perspectiva da satisfação do usuário. A finalidade dessa pesquisa é a obtenção do título de mestre em Educação, Cultura e Organizações Sociais – linha de pesquisa Saúde Coletiva da FUNEDI/UEMG. A pesquisa tem como objetivo geral avaliar a qualidade da assistência à saúde oferecida pela ESF no município de Santo Antônio do Monte – MG, segundo a perspectiva da satisfação dos usuários. Gostaríamos de contar com sua participação através de entrevistas que serão direcionadas aos usuários das Unidades Saúde da Família do município. As entrevistas serão gravadas em por meio digital e após a conclusão do trabalho serão descartadas. As informações por você emitidas não causaram ônus, riscos ou danos a sua pessoa, sendo tratadas anonimamente no conjunto dos demais participantes. Os dados originários dessa pesquisa serão utilizados para fins científicos, divulgados na defesa da dissertação, em eventos científicos e revistas da área de saúde. Você poderá fazer as perguntas que julgar necessárias para esclarecer suas dúvidas em relação aos procedimentos, riscos e benefícios da pesquisa. Caso seja de seu interesse, em qualquer momento da pesquisa, terá total liberdade para retirar este consentimento, não sendo suas informações inclusas nos resultados da pesquisa. Agradecemos sua colaboração. Atenciosamente, Prof. Dr. Paulo Sérgio Carneiro Miranda Orientador Prof. Ms. Eliete Albano Azevedo Guimarães Co-orientadora Simone Maria Silva Santos Pesquisadora (37)9984-1753 Eu,___________________________________________________________ do sexo_____________________, de _____ anos de idade, residente à____________________________________________________________________ concordo em participar voluntariamente desta pesquisa e declaro ter sido informado(a) e estar devidamente esclarecido(a) sobre os objetivos e intenções da mesma e sobre o procedimento a que estarei sendo submetido(a). Santo Antônio do Monte ______ de ____________________ de 2008. ______________________________________ Assinatura do participante 141 ANEXO PARECER DO COMITÊ DE ÉTICA EM PESQUISA DA FUNEDI/UEMG