cooperação e conflito no ciberespaço

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cooperação e conflito no ciberespaço
COOPERAÇÃO E CONFLITO NO CIBERESPAÇO:
CONSIDERANDO AS PERCEPÇÕES DE
PRIMO, O’REILLY E OUTROS PENSADORES
Cleon Gostinski
Bacharel em Comunicação Social, Mestre em Administração de Empresas pela UFRGS;
Docente da Faculdade de Biblioteconomia e Comunicação da UFRGS.
E-mail: [email protected]
www.cleongostinski.com
RESUMO
Buscando considerar as questões contingenciais de cooperação e conflito no ciberespaço, este artigo se
propõe a questionar as possibilidades evolutivas das ações de interagentes, administradores e
desenvolvedores no meio virtual. Neste sentido, procura-se considerar a visão de diversos autores e
indicar as influências de princípios dominantes da web 2.0 na futura identidade relacional dos envolvidos.
Palavras-chave: cooperação e conflito no ciberespaço; identidade relacional; princípios dominantes da
web 2.0.
____________________________________________________________________________________
Ao fazer citações deste artigo, utilize esta referência bibliográfica:
GOSTINSKI, Cleon. Cooperação e conflito no ciberespaço: considerando as percepções de O’Reilly. Intelecto C. n.
3, jul-set 2008 – Novo Hamburgo: Catânia. p. 20-43. Disponível em:
<http://www.intelectoc.com.br/artigos/Cooperacao_e_Conflito_no_Ciberespaco_Considerando_as_Percepcoes_de_P
rimo_ OReilly_E_Outros_Pensadores_Intelecto_C.pdf>
ABSTRACT
Seeking to consider the contingent issues of cooperation and conflict on cyberspace, this article aims to
question the evolutionary possibilities of the inter-agents actions, administrators and developers in the
virtual environment. In this sense, it is tried to consider the view of many authors and indicate the
influences of the dominant principles of the Web 2.0. in the future relational identity of those involved.
Key words: cooperation and conflict on cyberspace; relational identity; dominant principles of Web 2.0.
20
COOPERAÇÃO E CONFLITO
O ciberespaço tem revelado ser um ambiente1 particular, regulado por
condições espaço-temporais exclusivas, não de simples exposição de idéias, mas, pelo
contrário, até de um compartilhamento visceral. É através das condições ambientais da
rede, que as pessoas passam a assumir níveis de expressividade e interatividade
únicos.
Toda esta “nova” carga de exposição suscita novos patamares de
relacionamento onde a cooperação e o conflito podem se instalar e serem percebidos,
diferentemente da esfera presencial, em evolutivas potencialidades sustentadas pelo
algoritmo e em arranjos paradoxais.
Partindo das percepções de Primo2 (2007) e considerando a visão de
O’Reilly3 (2006) sobre a evolução do ciberespaço, mais precisamente a Web 2.0, é
possível enxergar a existência de 11 paradoxos inerentes à cooperação e ao conflito no
ciberespaço.
1
GOSTINSKI, Cleon. Evoluindo de uma perspectiva sistêmica de comunicação para uma visão de
comunicação mediada por computador. In: Anais do Intercom – XXXI Congresso Brasileiro de
Ciências da Comunicação. Natal, 2008.
2
PRIMO, Alex. Interação mediada por computador. Porto Alegre: Sulina, 2007.
3
O’REILLY, Tim. What is web 2.0: design patterns and business models for the next generation of
software. In: O’Reilly Publishing. 2005. Disponível em:
http://www.oreillynet.com/pub/a/oreilly/tim/news/2005/09/30/what-is-web-20.html. Acesso em: 20/04/2008.
21
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Figura 1 – Os 11 paradoxos de cooperação e conflito no ciberespaço
A visão de Web 2.0 nasceu a partir de discussões, envolvendo a MediaLive
International e O’Reilly. De uma confluência de idéias foi identificada uma série de
redimensionamentos vinculados a condições de interatividade e principalmente da
evolução das redes sociais no ciberespaço.
De acordo com O'
Reilly (2005) o fenômeno Web 2.0 possui características
inovadoras e evolutivas, que implicam não somente na perspectiva de aperfeiçoamento
da acessibilidade dos usuários e possibilidades de registro de dados, mas passa a
reconfigurar substancialmente as possibilidades de ação dos agentes fomentadores das
configurações da rede.
22
Figura 2 – As questões intervenientes da Web 2.0, adaptado de O’Reilly4 (2005)
Procurando entender então, as implicações destas percepções para o
escopo da cooperação e conflito no ciberespaço, extraem-se 15 princípios dominantes
que atuam na potencialização da interatividade no meio virtual, correlacionáveis aos
paradoxos:
4
O’REILLY, Tim. What is web 2.0: design patterns and business models for the next generation of
software. In: O’Reilly Publishing. 2005. Disponível em:
http://www.oreillynet.com/pub/a/oreilly/tim/news/2005/09/30/what-is-web-20.html. Acesso em: 20/04/2008.
(traduzido pelo autor)
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Figura 2 – Os 15 princípios dominantes da web 2.0, baseados na percepção de
O’Reilly5 (2005)
Considerando a influência destes pressupostos passa-se a discutir cada um
dos paradoxos de cooperação e conflito.
5
O’REILLY, Tim. What is web 2.0: design patterns and business models for the next generation of
software. In: O’Reilly Publishing. 2005. Disponível em:
http://www.oreillynet.com/pub/a/oreilly/tim/news/2005/09/30/what-is-web-20.html. Acesso em: 20/04/2008.
24
RELAÇÃO SOCIÁVEL E RELEVÂNCIA DE CONTEÚDO
Como seria possível a existência de uma real cooperação na rede, através
de conteúdo objetivo, se também se identifica a construção de um universo dialógico
vazio, construído através de interações que não passam de exercícios de
sociabilidade?
Para Simmel6 (2006, p.75) “na conversa puramente sociável o assunto é
somente o suporte indispensável do estímulo desenvolvido pelo intercâmbio vivo do
discurso enquanto tal. (...) Logo que a discussão se torna objetiva, não é mais sociável”.
Já Mabry7 (1988) afirma existir uma coerência discursiva, gerando conteúdo
argumentativo quando os indivíduos dentro de comunidades demonstram a utilização
profusa de citações de seus interlocutores.
Em outra frente, Friedman e Curral8 (2003) apontam que os e-mails
proporcionam trocas de grande relevância entre os interlocutores como a possibilidade
de se revisar mensagens, melhorando a sua qualificação e ainda considerar
mensagens anteriores, promovendo uma contínua evolução nos relacionamentos.
Maturana9 (2001) percebe, por sua vez, que
“... todo domínio racional se funda em premissas básicas aceitas a priori, isto é,
em bases emocionais, e que são nossas emoções que determinam o domínio
racional em que operamos como seres racionais a cada instante. Da mesma
maneira, usamos diferentes tecnologias como diferentes domínios de
coerências operacionais conforme o que queremos obter com nosso agir, isto é,
usamos diferentes tecnologias de acordo com nossas preferências ou desejos”.
6
SIMMEL, Georg. Questões fundamentais da sociologia: indivíduo e sociedade. Rio de Janeiro:
Zahar, 2006, p. 75.
7
MABRY, Edward A. Frames and flames: the structure of argumentative messages on the net. In:
SUDWEEKS, F. et al. Network and netplay: virtual groups in the internet. Menlo Park: MIT Press, 1998,
p. 15.
8
FRIEDMAN, Raymond A.; CURRAL, Steven C. Conflict escalation: dispute exacerbating elements of
e-mail communication. 2003. Disponível em:
http://www2.owen.vanderbilt.edu/ray.friedman/pdf/emailescalation.pdf. Acesso em: 20/04/2008, p. 5, 7.
9
MATURANA, Humberto. Cognição, ciência e vida cotidiana. Belo Horizonte: UFMG, 2001, p. 182.
25
Então, a questão que norteia relação e conteúdo é a necessidade dos
interagentes em atingir suas necessidades intelectuais e emocionais: na medida em
que a interação acontece o verdadeiro conteúdo gerado é, em grande parte, aquele
fruto da satisfação no processo dialógico.
Um princípio dominante da web 2.0 que se destaca para esta discussão é o
de proporcionar que os usuários contribuam para a construção de suas escolhas.
Ele demonstra que as questões intervenientes a este paradoxo suscitam a que o
internauta esta a priorizar os processos dialógicos, através de crescente acessibilidade
a toda sorte de conteúdos por um lado e a instauração de evolutivas interfaces de
conversação, por outro. O fundamental, contudo, são as possibilidades que permitem
ao usuário aflorar sua identidade no ambiente virtual.
MOVIMENTOS ATIVISTAS E AUTOMATISMO, BANALIZAÇÃO E TRIVIALIDADE
Como podem conviver os movimentos ativistas que congregam grupos em
torno de objetivos construtivos com a frutificação de legiões de interagentes que
usufruem da rede, “remoendo” o cotidiano, através da banalização e trivialização ou,
ainda, se associam aos automatismos de um grande número de programas?
Teria o ciberespaço a capacidade de proporcionar uma expressividade ativa
para o desenvolvimento de novas idéias, para o florescimento de ações criativas e,
ainda, se estabelecer a dominância de uma nova ordem cooperativa, transcendente de
qualquer forma de interação tradicional?
Bauman10 (2003), avaliando as condições em que se dão as relações em
comunidades assinala: “Mais do que como uma ilha de ‘entendimento natural’, ou um
‘círculo aconchegante’ onde se pode depor as armas e parar de lutar, a comunidade
realmente existente se parece com uma fortaleza sitiada, continuamente bombardeada
10
BAUMAN, Zygmunt. Comunidade: a busca por segurança no mundo atual. Rio de Janeiro: Zahar,
2003, p. 19.
26
por inimigos (muitas vezes invisíveis) de fora e freqüentemente assolada pela discórdia
interna”.
Se for assim, seria melhor admitir que as pressões de relacionamento
acabam por corroer toda e qualquer possibilidade de superação e que os interagentes
acabam por se moldar ao automatismo estrutural, absorvidos por diálogos e conclusões
cercados de banalizações e trivialidades, para assim, ser reconhecidos e aceitos dentro
e diante das ideologias das comunidades.
Não seria correto questionar, ainda, que um movimento ativista se constrói
através de uma dinâmica consciente, pautada pela consciência da intercambialidade
interativa e pelo reconhecimento dos dispositivos de regulação? E isto que todo
interagente deve pretender?
A internet da mesma forma que congrega intelectuais e pessoas
politicamente engajadas também absorvem interagentes despretensiosos, ávidos por
entretenimento e até mesmo por uma simples experiência de reconhecimento: isto lhes
basta. Então, a diversidade de prioridades conduz os interagentes a enxergar o
ciberespaço dentro de inúmeras possibilidades e não de condicionamentos ativistas ou
de qualquer ordem.
Relacionando estas questões ao princípio dominante da web 2.0 que afirma
que os programas deverão estar aptos a proporcionar experiências que
transcendam as expectativas dos usuários, percebe-se que este paradoxo indica
que os interagentes estão a reconhecer espaços adequados para realizar suas
necessidades comunicacionais específicas. Exemplificando: em determinado momento
ele pode querer opinar e contribuir para que se evite a destruição de um prédio de valor
histórico; em outra instância, decidir qual a atração artística que deverá ser contratada
para as comemorações de final de ano em sua localidade e/ou, ainda, envolver-se em
um movimento para depor um político corrupto. A internet é lugar da próspera
universalidade comportamental de indivíduos e de grupos.
27
COMUNIDADES CONGREGADORAS E ISOLACIONISTAS DE “VERDADES”
Até que ponto os grupos que se formam e conduzem “conteúdos”
representam as realidades do coletivo social, congregando-o, e também estaríamos
assistindo e participando de grupos que pregam e perpetuam verdades na “clausura de
suas convicções”?
Ao cogitar-se a interação em comunidades vislumbram-se inúmeras
possibilidades de congregação, tanto para a simples troca de informações como para o
estabelecimento de laços de relevância. As pessoas passam a reconhecer na rede um
novo espaço para a ampliação de seus relacionamentos, integrando-se culturalmente
e/ou simplesmente ampliando a freqüência de contatos.
Em outra frente, encontram-se comunidades isolacionistas de “verdades”:
grupos de discussão que, em torno de interesses comuns, formulam um discurso
constantemente retroalimentado pelas suas necessidades de reconhecimento. Janis
apud Griffin11 (1997) define o “Pensamento de Grupo” como sendo “um modo de pensar
em que pessoas se engajam quando estão profundamente envolvidas com um grupo
muito coeso, quando os membros buscando unanimidade passam por cima de sua
motivação de avaliar realisticamente alternativas de cursos de ação.”
Kollock12 (1999) afirma categoricamente que “até mesmo uma viagem casual
pelo ciberespaço revelará evidências de hostilidade, egoísmo, e simples falta de
sentido. Mesmo assim, o impressionante na internet não é que tenha tanto ruído, mas
que exista qualquer cooperação significativa”.
O ambiente do ciberespaço é um espaço democrático, onde diferentes
formas de relacionamento florescem. Os interagentes circulam livremente por diferentes
espaços, por vezes se aliando ou observando grupos de idéias radicais, por vezes
assumindo identidades por conveniência, por vezes buscando o enriquecimento de
11
GRIFFIN, Em. A first look at communication theory. Nova Iorque: McGraw Hill, 1997, p. 237.
KOLLOCK, Peter. The economies of online cooperation: gifts and public goods in cyberspace. In:
KOLLOCK, Peter; SMITH, M. Communities in cyberspace. Londres: Routledge, 1999, p. 220.
12
28
suas relações. O próprio interagente é paradoxal no seu modo de agir e o ciberespaço
está de braços abertos para absorver todas as suas facetas. E na mesma velocidade
que grupos se criam, propósitos se dissolvem e os extingue, imprimindo sínteses de
alto sentido para os envolvidos.
Dilthey13 pode contribuir quando afirma: “viver neste mundo multifacetado
significa fazer experiência da liberdade como oscilação contínua entre pertença e
desenraizamento”. Assim, isolacionistas de verdades e congregadores exercerão
livremente seus arbítrios, agregando simpatizantes de acordo com sua capacidade de
persuasão e até os seus discursos se esgotarem.
Considerando estas questões ao princípio dominante da web 2.0 que indica
a necessidade de se criar interfaces de contato minimamente intrusivas, sensíveis
aos contextos onde pretendem se inserir e extremamente amigáveis para os
usuários, constata-se que os fatores referentes a este paradoxo revelam que os
interagentes passam a exercer maior liberdade de ação no ambiente virtual, sejam eles
congregadores ou isolacionistas.
INTERCÂMBIO CONSENSUAL E TRANSMISSÃO INQUESTIONÁVEL
Até que ponto o material disponibilizado no ciberespaço possibilita um
intercâmbio consensual entre os interagentes integrados em comunidades, e também
não estaríamos assistindo a meros debates em torno de questões que servem aos
interesses exclusivos de um grupo transmissionista, que “comanda” a rede?
Primo14 (2007) posiciona-se declarando que “os slogans cativantes de
construção de um mundo “mais humano” a partir de mais comunicação também
ignoram que o conflito é próprio do humano e que comunicação não é sinônimo de
transmissão inquestionável nem de intercâmbio consensual”.
13
14
DILTHEY, Wilhelm. Crítica della ragione storica. Turim: Einaudi, 1954.
PRIMO, Alex. Interação mediada por computador. Porto Alegre: Sulina, 2007, p. 198.
29
Para procurar equacionar estes pólos, parte-se da crença de Bauman na
clássica oposição de Ferdinand Tönnies entre sociedade e comunidade. Tönnies,
segundo Bauman15 (2003), afirma que a comunidade parte de um “entendimento
compartilhado por todos os seus membros”. Esclarecendo: “um acordo alcançado por
pessoas com opiniões essencialmente diferentes, um produto de negociações e
compromissos difíceis, de muita disputa e contrariedade, e murros ocasionais”.
De forma mais contundente podería-se questionar: há uma corrente de
dominação que permeia todos os processos comunicativos no ciberespaço, permitindo
a expressão de relativo intercâmbio consensual frente à rarefeitas possibilidades de
ação? Anderson16 (2006) entende que a condição rarefeita do ciberespaço é inerente a
sua configuração e "ambiental".
A dinamicidade evolutiva das interações e dos frames que as sustentam
dificulta o condicionamento do interagente por grupos transmissionistas. Na medida em
que as possibilidades virtuais se transmutam e evoluem, novos protagonistas buscam
determinar e delimitar espaços de transmissão. Assim, posições absolutas ou propõese a redimensionar-se ou acabam fadadas ao desgaste e abandono. O próprio jogo de
reconstrução, remodelação e da oferta do “novo” cria uma variedade de possibilidades,
longe da simples e sistêmica transmissão.
Nesta esfera, o princípio dominante da web 2.0: a competição na web não
se dará com entidades claramente reconhecíveis, mas se fará com a blogosfera
em sua totalidade, relacionado a este paradoxo, indica que o internauta passa a ter a
sua disposição tanto os referenciais tradicionais, como uma crescente blogosfera que
garante intercâmbios claramente consensuais.
15
BAUMAN, Zygmunt. Comunidade: a busca por segurança no mundo atual. Rio de Janeiro: Zahar,
2003, p. 15.
16
ANDERSON, Chris. A cauda longa. Rio de Janeiro: Elsevier, 2006, p. 165.
30
APERFEIÇOAMENTO E SUPERFICIALIDADE
Até que ponto a dialógica no ciberespaço contribui decisivamente para o
aperfeiçoamento das relações entre os interagentes, mas também não estaríamos a
presenciar uma superficialidade de relacionamentos pela inadequada administração
das “cargas emocionais” nos processos de interatividade?
Para entender este paradoxo é importante citar Simmel17 (1967), que define
“simultaneamente, como conteúdo e matéria da sociação, tudo que existe nos
indivíduos e nos lugares concretos de toda realidade histórica como impulso, interesse,
finalidade, tendência, condicionamento psíquico e movimento nos indivíduos – tudo que
está presente nele de modo a engendrar ou mediatizar os efeitos sobre os outros, ou a
receber estes efeitos dos outros”.
Mendonça e Feitosa18 (2007) após estudo realizado declaram que a
efemeridade das relações na internet, evidenciada pela falta de identidade dos
interlocutores, é credenciada pelas ferramentas de interação. Elas “trazem consigo
simultaneidade e, ao mesmo tempo, superficialidade para as relações sociais, dada a
facilidade com que são construídos e destruídos os relacionamentos.” Assim,
questiona-se se a internet tem a capacidade de aperfeiçoar as relações: construir e
solidificar compartilhamentos de idéias, interesses e vivências? Ao mesmo tempo, a
dificuldade em se administrar emocionalmente as ações dentro do espaço virtual não
estaria levando as pessoas a admitir e a adotar apenas diálogos superficiais, evasivos
de suas legítimas prioridades?
Fundamental neste ínterim é
o
princípio
dominante
da
web 2.0,
proporcionar que os usuários contribuam para a construção de suas escolhas,
que confrontado com este paradoxo suscita que as propriedades do ambiente virtual
17
SIMMEL, Georg. Questões fundamentais da sociologia: indivíduo e sociedade. Rio de Janeiro:
Zahar, 2006, p.60.
18
MENDONÇA, Marina Alves de; FEITOSA, Luiz Tadeu. Interação e mudanças na comunicação: o papel
da internet na sociedade. In: Biblionline. v. 3, n. 1, João Pessoa, 2007. Disponível em:
http://www.ies.ufpb.br/ojs2/index.php/biblio/article/viewFile/1494/1155. Acesso em: 20/04/2008, p. 8.
31
possibilitam não uma instância de superficialidade, mas operam de modo a dissipar a
carga emocional, gerada pelas tensões do mundo físico. São através destas
performances que se aperfeiçoam as interações e é gerado valor nos relacionamentos.
COMPETIÇÃO SAUDÁVEL E RIVALIDADE
Até que ponto as relações mútuas, que evidenciam oposições ideológicas no
ciberespaço, resultam em crescimento dos interagentes, mas também não estaríamos
assistindo e/ou nos engajando em processos interativos que substancialmente acirram
posições contrárias?
Primo19 (2007) afirma que "o conflito não pode ser pensado apenas em
termos de diferenças radicais. Em muitas situações, questões compartilhadas podem
ser a base de antagonismos intensos. Simmel apud Primo19 (2007) pondera, de
antemão, que "muitas vezes aquelas pessoas que têm mais em comum podem se
prejudicar mais do que se fossem estranhos um ao outro. Mesmo em grupos, em que
os participantes compartilhem um sentimento de pertença e unidade, fortes
antagonismos podem emergir. Ora, tais sentimentos compartilhados no grupo não
apagam as diferenças entre os participantes."
Já Axelrod20 (1984) que promoveu experimentos envolvendo estas questões
concluiu que, para serem bem-sucedidos em uma proposta de interação, os envolvidos
necessitam seguir condicionantes regras de conduta21, tanto positivas como negativas
com vistas a tornar a relação produtiva. Nesta perspectiva, podería-se afirmar que certa
dose de rivalidade é ingrediente fundamental para a competição saudável.
Primo22 (2007) acredita que a premissa de Axelrod20 (1984) no que diz
respeito à obsessiva comparação de desempenho dos interagentes é uma
19
PRIMO, Alex. Interação mediada por computador. Porto Alegre: Sulina, 2007, p. 201.
AXELROD, Robert. The evolution of cooperation. Nova Iorque: Penguin Books, 1984.
21
“1) não seja invejoso; 2) não seja o primeiro a trair; 3) retribua tanto cooperação quanto traição; 4) não
tente ser esperto.”
22
PRIMO, Alex. Interação mediada por computador. Porto Alegre: Sulina, 2007, p. 205-207.
20
32
“generalização perigosa que leva a conclusões moralistas”. Ele ainda avalia Rogers 23
(1998), afirmando que as respostas imediatistas condicionadas pelo jogo não refletem
uma interação legítima dos participantes, pois as abrangentes “interações interpessoais
são recursivas, em virtude da historicidade da relação construída pelos envolvidos.”
Refere-se também a Bauman24,25 (2003), ao revelar que numa legítima relação de
interatividade humana, considerando a complexidade dos problemas relacionados e “a
decorrente impossibilidade de conhecer-se e medir-se todas as variáveis”, as ações
humanas “jamais podem ser previstas”.
Contudo, Primo26 (2007) argumenta que “as disputas conflituosas podem
fazer emergir, a partir da discussão de diferentes perspectivas, outras soluções”.
Através do princípio dominante proporcionar que os usuários contribuam
para a construção de suas escolhas, estabelecido por O’Reilly27 (2005), pode-se
entender este paradoxo como um reflexo do histórico comportamento humano. A rede,
a partir do seu patamar atual, proporcionará com mais veemência as posições
antagônicas, mas, mais que isso, proporcionará a explicitação de muitos conflitos que
costumam ficar em nível subjacente nas relações do mundo físico.
AUTO-REGULAÇÃO E AUTORIDADE
Até que ponto é válido que a amplitude das relações em comunidades seja
estabelecida pela auto-regulação criada pelos membros através da experenciação, mas
também não estaríamos sendo mais sensatos em admitir que sem autoridade o
ciberespaço seria um ambiente predominantemente caótico?
23
ROGERS, L. Edna. The meaning of relationship in relational communication. In: CONVILLE, R. L.;
ROGERS, L. E. The meaning of “relationship” in interpersonal communication. Westport: Praeger,
1998.
24
“O balanço do passado, a avaliação do presente e a previsão dos futuros são atravessados pelo
conflito e eivados de ambivalência.”
25
BAUMAN, Zygmunt. Comunidade: a busca por segurança no mundo atual. Rio de Janeiro: Zahar,
2003, p. 23.
26
PRIMO, Alex. Interação mediada por computador. Porto Alegre: Sulina, 2007, p. 210.
27
O’REILLY, Tim. What is web 2.0: design patterns and business models for the next generation of
software. In: O’Reilly Publishing. 2005. Disponível em:
http://www.oreillynet.com/pub/a/oreilly/tim/news/2005/09/30/what-is-web-20.html. Acesso em: 20/04/2008.
33
Primo28 (2007) pondera sobre como se estabelecem alguns aspectos que,
normalmente,
regram os
processos
interativos
em comunidades
virtuais: “A
necessidade de aprovação de novos membros, o fechamento de certos conteúdos ou
áreas da comunidade e até mesmo barreiras para a postagem de mensagens podem
servir também como fronteiras virtuais. Barreiras pessoais podem também ser criadas,
como filtros que automaticamente apagam mensagens indesejadas de certos
membros”. O autor discute ainda a questão revelando a posição de Hardin29 (1968): “a
cooperação só pode ser garantida com a força de uma autoridade externa”.
Já Lessig30 (2002) afirma que não há como generalizar esta afirmativa para
tudo que é comunal e, neste sentido, Primo31 (2007) considera que o espaço virtual não
pode ser comparado com as regras do espaço físico, uma vez que o espaço que as
pessoas ocupam no meio virtual não tem capacidade destituinte. Acredita-se,
contudo, que a questão aqui, não diz respeito apenas à permissão de presença em
uma dada comunidade, mas sim à necessária civilidade que é fundamental para se
estabelecer relações “produtivas”.
Olson32 (1965) contribui afirmando que quanto maior é o grupo, menor será a
cooperação e Wei33 (2004) aconselha que “normas em uma blog community podem ser
formadas a partir de seus membros, através da experenciação.” Deste modo, a
predisposição em reconhecer as comunidades virtuais como fonte de liberação de
"amarras", espaço de livre expressividade e como meio para a emergência da
criatividade interativa, não deveria ser questionada?
28
PRIMO, Alex. Interação mediada por computador. Porto Alegre: Sulina, 2007, p. 215.
HARDIN, Garret. The tragedy of the commons. Science. n. 162, 1968.
30
LESSIG, Lawrence. The future of ideas: the fate of the commons in a connected world. Nova Iorque:
Vintage Books, 2002, p. 22.
31
PRIMO, Alex. Interação mediada por computador. Porto Alegre: Sulina, 2007, p. 211.
32
OLSON, Mancur. The logic of collective action: public goods and the theory of groups. Cambridge:
Harvard University Press, 1965, p. 36.
33
WEI, Carolyn. Formation of norms in a blog community. In: Into the blogosphere: (rhetoric, community,
and culture of weblogs). Disponível em: http://blog.lib.umn.edu/blogosphere/formation_of_norms.html.
Acesso em: 20/04/2008, p. 1.
29
34
O princípio dominante da web 2.0 pensar em comunitarismo e não em
coordenação evoca as condições deste paradoxo. Em verdade, a evolução das
interações dentro do meio virtual conduz a formação de “regulações” de consenso,
visando que se alcance a necessária objetividade definida pelos coletivos, mas,
certamente o estabelecimento de espaços livres, onde não está presente um
compromisso de formação de identidade grupal.
PARTICIPAÇÃO ATIVA E PASSIVIDADE OU INUTILIDADE
Até que ponto o ciberespaço deve exigir um comportamento produtivo de
indivíduos que preferem manter-se em quase total anonimato e restringindo sua ação a
relações pontuais de interesse, mas também não estaríamos presenciando a “exclusão”
daqueles que não se submetem às “normas” ou não tem interesse em interagir nos
ambientes condicionados das comunidades virtuais?
Kollock e Smith34 (1996) afirmam que o problema da cooperação incide na
tensão entre o individual e o coletivo. Em outras palavras, o que parece certo,
justificável e razoável para um indivíduo, pode indicar prejuízos para um grupo
relacionado.
Já para Primo35 (2007) “as disputas conflituosas podem fazer emergir, a
partir da discussão de diferentes perspectivas, outras soluções”. Kollock e Smith 36
(1996) indicam, contudo, a existência dos free-riders , que são os indivíduos
usurpadores dos benefícios das comunidades (utilizam todos os bens de valor das
comunidades, mas nada dão em troca, quebrando, ainda, as normas de conduta).
34
KOLLOCK, Peter. The economies of online cooperation: gifts and public goods in cyberspace. In:
KOLLOCK, Peter; SMITH, M. Communities in cyberspace. Londres: Routledge, 1999, p. 109.
35
PRIMO, Alex. Interação mediada por computador. Porto Alegre: Sulina, 2007, p. 210.
36
KOLLOCK, Peter. The economies of online cooperation: gifts and public goods in cyberspace. In:
KOLLOCK, Peter; SMITH, M. Communities in cyberspace. Londres: Routledge, 1999, p. 109.
35
Ostrom37 (1990, p. 90), após uma ampla pesquisa em comunidades virtuais,
concluiu que comunidades de sucesso, que conseguem obter sucesso no ciberespaço
são aquelas que têm bem claras as suas atuações38 na rede. Desta forma, pode-se
perceber que determinada comunidade terá reais chances de cumprir seus objetivos se
houver participação ativa de seus membros. Mas por que, então, tantas comunidades
repletas de membros inativos ou quase na totalidade compostas por participantes que
apenas transmitem uma enorme quantidade de "inutilidades" se estabelecem, crescem
e se agigantam no ciberespaço? Não estaria em jogo aqui, primeiramente, discutir as
finalidades de tais grupos: os aspectos subjacentes de seus interesses, situações de
vida, necessidades comunicativas e de reconhecimento nos grupos sociais? A
passividade não significaria colocar-se em uma perspectiva de aprendizagem
relacional, da necessidade de absorver conteúdos necessários ao crescimento
intelectual dos indivíduos? Quem, ainda, pode julgar que determinada manifestação é
uma "inutilidade", sem ter condições de avaliar a relação de interação que a
desencadeou e sob o ponto de vista de quem a produziu?
Chanlat39 (1996a) argumenta que é através das relações que o indivíduo
"mantém com o outro pelo jogo de identificações - introspecção, projeção, transferência,
etc. - que ele vê seu desejo e sua existência reconhecidos ou não. A realidade social
transforma-se em suporte da realidade psíquica". Nesta instância, não podería-se
considerar as comunidades virtuais também dentro da visão de Laing40 (1999), que
afirma que o ser humano sempre se constrói em sua relação com o outro? Através, do
que argumenta, ainda, Chanlat (1996b, p. 154), ao dizer que a "identidade pessoal e as
identidades coletivas resultam, assim, da relação que um indivíduo ou um grupo
mantém com o que se chama alteridade? Se todas estas questões forem
37
OSTROM, Elinor. Governing the commons: the evolution of institutions for collective action. Nova
Iorque: Cambridge University Press, 1990, p. 90.
38
a- Limites claramente definidos; b-. Congruência entre a apropriação, as regras de provisão e as
condições locais; c- Definição coletiva das regras de conduta; d- Monitoramento; e- Sanções
gradativas; f- Mecanismos para resolução de conflitos; g- Organização autônoma e independente.
39
CHANLAT, Jean-François. Por uma antropologia da condição humana nas organizações. In:
CHANLAT, Jean-François (org.). O indivíduo na organização: dimensões esquecidas - volume I. São
Paulo: Atlas, 1996ª, p. 30.
40
LAING, R. D. Self and others. Londres: Routledge, 1999, p. 66.
36
adequadamente equacionadas não podería-se entender as comunidades virtuais de
forma mais transparente e legítima, onde a participação ativa, a "passividade" ou
"inutilidade" fariam parte de uma complexidade inerente às potencialidades interativas
dos grupos?
Nestas condições evidencia-se o princípio dominante da web 2.0: os
programas deverão estar aptos a proporcionar experiências que transcendam as
expectativas dos usuários. Singularidade é a palavra-chave no contexto de um
ciberespaço que passa a emitir diferentes pulsões de possibilidades interativas. Os
interagentes transitam e “zapeiam” de acordo com as últimas tônicas de sites, blogs e
comunidades, criando ou ensaiando a criação de ambientes a partir de seu perfil,
através
de
softwares
necessariamente
padronizados.
em participação
e
A
questão
passividade,
então,
mas,
não
acima
está
de
centrada
tudo,
em
experenciação.
AMBIENTE LIVRE E AMBIENTE CONTROLADO
Até que ponto o ciberespaço se tornará uma arena de ampla sociabilização
de recursos, configurando-se em um ambiente de livre expressividade e evolutivas
possibilidades de interatividade, mas também não estaríamos no limiar de que se
estabeleça o recrudescimento do controle e da limitação de recursos a fim de que
sejam preservados os interesses de grupos econômicos dominantes ou da manutenção
da humanidade?
O controle, segundo O’Reilly41 (2005) pode se configurar de forma
minimamente instrusiva, sensível ao contexto e até amigáveis ao consumidor
(interposição na experiência online). Por isso, acaba se revestindo com uma fachada de
respeito ao interagente, mas não pode nunca deixar de ser interpretado como forma de
controle. Estas questões, contudo, parecem contradizer as regras da economia
41
O’REILLY, Tim. What is web 2.0: design patterns and business models for the next generation of
software. In: O’Reilly Publishing. 2005. Disponível em:
http://www.oreillynet.com/pub/a/oreilly/tim/news/2005/09/30/what-is-web-20.html. Acesso em: 20/04/2008,
p. 3.
37
dominante em termos globais. Seria a internet o agente propulsor do estabelecimento
de uma nova ordem econômico-social?
Lessig42 (2002) afirma que o caráter da internet irá mudar43, através de duas
configurações: a primeira, associada ao fortalecimento44 das comunidades45, que a
partir do uso livre de recursos “não esgotáveis” e de outros46, adequadamente47
controlados48 para evitar o seu esgotamento49, promoverá uma remodelagem das
ações a favor das inovações e da criatividade50 em prol da evolução da humanidade. A
segunda diz respeito ao crescente desenvolvimento das possibilidades instrumentais 51
na internet 52. Esta realidade irá revolucionar a comunicação53, promovendo a inclusão
e o estabelecimento de amplos processos de interatividade54, que, por sua vez, se
reverterão em evolutivos benefícios para o coletivo.
42
LESSIG, Lawrence. The future of ideas: the fate of the commons in a connected world. Nova Iorque:
Vintage Books, 2002.
43
“The internet is with us forever, even if the character of the internet will change.” (p. 5)
44
“What has determined the commons is the character of the resources and how it relates to a
community . (…) the question a society must ask is which resources should be , and for those resources,
how.” (p. 21)
45
“Groups form easily to discuss any issue imaginable; public debate is enable by removing perhaps the
most significant cost of human interaction – synchronicity.” (p. 10);
46
“If a resource is nonrivalrous, then the problem is whether there is enough incentive to produce it, not
whether there is too much demand to consume it. A nonrivalrous resource can’t be exhausted.” (p. 21)
47
“(…) norms adequately limit the problem of overconsumption.” (p. 22)
48
“The question for us comes before: not whether the market or the state but, for any given resource,
whether that resource should be controlled or free .” (p. 12)
49
“If a rivalrous resource is open to all, there is a risk that it will be depleted by the consumption of all.” (p.
21)
50
“Though most distinguish innovation from creativity, or creativity from commerce, I do not. The network
that I am describing enables both forms of creativity. (p. 10)
51
“The layers that I mean here are the different layers within a communications system that together make
communications possible.” (p. 23)
52
Lessig cita Benkler (2000) indicando que “Benkler suggests that we understand a communications
system dividing it into three distinct “layers”. At the bottom is a “physical” layer, across which
communication travels. (…) a “logical” or “code” layer – the code that makes the hardware run. (…) At the
top is a “content” layer – the actual stuff that gets said or transmitted across these wires. (…) These three
layers function together to define any particular communication system.” (p. 23)
53
“To the extent that we want a decentralized system of communications, unowned layers will help.” (p.
24)
54
“The open and neutral platform of the Internet has spurred hundreds of companies to develop new
ways for individuals to interact.” (p. 10)
38
O controle, segundo55 O’Reilly (2005) pode se configurar de forma
minimamente instrusiva, sensível ao contexto e até amigáveis ao consumidor
(interposição na experiência on-line). Por isso, acaba se revestindo com uma fachada
de respeito ao interagente, mas não pode nunca deixar de ser interpretado como forma
de controle.
Neste paradoxo, é possível relacionar três princípios dominantes da web 2.0:
a competição na web não se dará com entidades claramente reconhecíveis, mas
se fará com a blogosfera em sua totalidade; usar métodos de inclusão de dados
do usuário e, conseqüentemente, gerar valor como efeito colateral do uso
cotidiano das aplicações disponibilizadas, que, por sua vez, deverão se
aperfeiçoar quanto mais utilizadas; os donos dos dados são aqueles que
licenciam os dados de partida. A competição se centra em possuir certas classes
de dados-chave. O controle deverá existir como forma de institucionalizar as condições
de tráfego, cada vez mais livre de limitações.
INTERESSE DOS INTERAGENTES E IMPOSIÇÃO DE REGIMES MERCADOLÓGICOS
Até que ponto o ciberespaço é um ambiente profícuo para relações de
interesse dos interagentes, mas também não estaríamos prestes a constatar que eles
forçosamente serão conduzidos para atender primordialmente as demandas dos
regimes mercadológicos?
O'
Reilly56 (2005) é enfático em afirmar que o ciberespaço está contribuindo
para a ruptura da ordem mercadológica geral. Assim, é primaz questionar se as novas
ferramentas mercadológicas de acesso aos interagentes do ciberespaço não
representam
uma
forma
de burlar
os
interesses
de auto-preservação
dos
consumidores ou o marketing estaria evoluindo para uma ação menos agressiva e
55
O’REILLY, Tim. What is web 2.0: design patterns and business models for the next generation of
software. In: O’Reilly Publishing. 2005. Disponível em:
http://www.oreillynet.com/pub/a/oreilly/tim/news/2005/09/30/what-is-web-20.html. Acesso em: 20/04/2008,
p. 3.
56
Ibidem.
39
predatória, onde o consumo passaria a ser encarado como uma questão imanente da
condição interativa humana?
Neste escopo estão envolvidos cinco princípios dominantes da web 2.0: a
melhor ação de promoção “comercial” na internet se dá através de marketing
viral, que estimula a propagação de produtos e serviços de um usuário para
outro; a disponibilização crescente de softwares livres; reconhecimento da
superação das regras que definiram a era de utilização de softwares e PCs;
proporcionar que os usuários contribuam para a construção de suas escolhas;
considerando o desenvolvimento crescente dos softwares abertos, os usuários
devem ser tratados como desenvolvedores; os programas deverão estar aptos a
proporcionar experiências que transcendam as expectativas dos usuários. A ação
mercadológica no meio virtual promete refletir-se de modo mais comedido. Isto muito
em função das condições ambientais que autorizam o internauta a “bloquear” as
iniciativas “indesejáveis”. Em outra frente, as possibilidades de consumo colocadas à
disposição estão a proporcionar uma maior aderência ao reconhecimento deste meio
como o mais “confortável” para realizar compras.
SOFTWARES LIVRES BASEADOS EM COOPERAÇÃO E
CONTROLE DE PROGRAMAÇÃO DE SOFTWARES
Até que ponto as grandes empresas que administram o ciberespaço irão
admitir a adoção irrestrita de softwares livres baseados em cooperação, mas também
não estaríamos prestes a constatar o estabelecimento de normas que definam um claro
controle na programação de softwares?
O’Reilly57 (2005) identifica que os administradores do ciberespaço por um
lado mostram-se conscientes que a adoção de sistemas livres é uma realidade
crescente, mas tem dificuldade em renunciar aos ganhos oriundos da venda de
softwares.
57
O’REILLY, Tim. What is web 2.0: design patterns and business models for the next generation of
software. In: O’Reilly Publishing. 2005. Disponível em:
http://www.oreillynet.com/pub/a/oreilly/tim/news/2005/09/30/what-is-web-20.html. Acesso em: 20/04/2008,
p. 5-6.
40
Envolvendo estas questões apresentam-se quatro princípios dominantes da
web 2.0: proporcionar que os usuários contribuam para a construção de suas
escolhas; o software deixa de ser produto e passa a ser serviço, atualizado
diariamente; considerando o desenvolvimento crescente dos softwares abertos,
os usuários devem ser tratados como desenvolvedores; mudar o foco da
programação para: - apoiar os modelos de programação rápida que permitem
condições mínimas de acoplagem do usuário; - pensar em comunitarismo e não
em coordenação; - desenhar para ser hackeado e adaptado. A grande certeza é que
se de um lado os “administradores” da rede procuram tomar medidas de
recrudescimento de acesso aos softwares, de outro, existe uma “legião” de
desenvolvedores afoitos em romper restrições de acesso e demonstrar a sua
capacidade em proporcionar livre ação dos usuários.
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