DIÁLOGO ENTRE SUJEITOS: LUZIA

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DIÁLOGO ENTRE SUJEITOS: LUZIA
DIÁLOGO ENTRE SUJEITOS: LUZIA-HOMEM, UMA QUESTÃO DE GÊNERO
Francisca Vânia Rocha Nóbrega
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RESUMO
Tendo consciência de que é através das relações sociais, das suas representações
e das suas práticas vivenciadas no dia a dia que os sujeitos vão se constituindo
enquanto cidadão, homem, profissional, pai, mãe, ou seja, sujeitos do mundo é que
trago o romance Luzia-Homem, de Domingos Olímpio, para dialogar com os sujeitos
educandos do ensino médio, do Lyceu Paraibano, haja vista que o espaço escolar
se apresenta como ambiente extremamente importante nessa constituição, e mais,
na construção, desconstrução e reconstrução desses sujeitos e dos valores sociais e
culturais. Desse modo, tomo a leitura e a análise do romance Luzia-Homem como
meio eficaz para uma formação sem preconceitos e sem comportamentos
excludentes dos nossos alunos em sala de aula, objetivando assim, a construção de
uma sociedade nova, caracterizada pelo respeito ao outro e às diferenças.
PALAVRAS
-
CHAVE:
EDUCAÇÃO,
LEITURA,
RELAÇÕES
SOCIAS,
PRECONCEITOS E GÊNERO.
Penso ser interessante tomar a fala de Lukács (1968) para dialogar com
sujeitos de tempos passados e do presente, relacionando-os à questão de gênero,
do preconceito e das diferenças, tendo como objeto de estudo relacionado à
temática, Luzia-Homem, de Domingos Olímpio, uma mulher marginalizada,
hostilizada por possuir uma força máscula, incomum às mulheres, uma vez que este
autor afirma que o social antecede a obra de arte, seja ela a literatura ou qualquer
outra, já que o artista, o literário, o autor existe a partir da sociedade, e que,
portanto, não só o meio social, o lugar de onde ele fala que determina sua produção,
mas que a arte em si, portanto a literatura também influencia consideravelmente o
produtor, o autor, que nos retrata através da mirada do seu olhar.
Lukács (1968) diz ainda que o produtor literário vive uma relação de mútuo
poder relacional, visto que a literatura, seja ela, a poesia, o romance, a novela, o
conto, a crônica, a fábula, o drama, entre outros está impregnadade valores e de
representações de uma determinada sociedade, adquire, consequentemente, seus
valores, suas crenças e suas representações, indo mais além, questionando-os,
valendo-se da própria estrutura social, através da sua fala poética. Assim, a
literatura nas suas mais variadas formas tem força de denúncia, de libertação, de
inclusão, consequentemente, força de transformação, de construção de novos
valores sociais, religiosos, culturais, familiares.
Ainda de acordo com Lukács (1968), a literatura possibilita um diálogo entre
um sujeito presente e um discurso de sujeitos que viveram em sociedades
passadas, com o objetivo de conhecer, analisar, desconstruir e reconstruir velhas e
novas filosofias de vida, que muitas vezes marginalizaram nossos semelhantes, o
outro, ressaltando, ainda, que analisar a questão de gênero, considerando a
diversidade de seus aspectos é uma tarefa muito difícil, escorregadia mesmo, uma
vez que, como afirmou Scott (1995), codificar os sentidos das palavras é causa
perdida, pois como as pessoas e as coisas que elas significam, as palavras têm uma
história, e a história dos indivíduos do passado nos ajudam a compreender como as
identidades e os estereótipos vão se construindo ao longo da história da
humanidade:
[...] Luzia viera na enxurrada, marchando, lentamente, a curtas
jornadas e fora forçada a esbarrar na cidade, por já não poder
conduzir a mãe doente. Do capitão Francisco Marçal, o homem mais
popular da terra, tão procurado padrinho, que contratara com o
vigário pagar-lhe uma quantia certa, todos os anos, por espórtulas
dos batizados, obtivera, por felicidade, uma casinha velha e
desaprumada, onde se aboletou com relativo conforto. A vida lhe
correu bem durante seis meses. Havia trabalho e ela ganhara o
suficiente para se prover quase com fartura. Mas o coração
pressentia, então, com vago terror, o perigo das pretensões de
Crapiúna...(LUZIA-HOMEM, p. 4).
É na perspectiva freireana de que não basta saber ler que Eva viu a uva, de
que é preciso compreender qual é a posição que Evaocupa no seu contexto social,
de quem trabalha para produzir a uva, e de quem lucra com esse trabalho, que trago
o romance Luzia-Homem, de Domingos Olímpio relacionado à questão de gênero,
do preconceito e da exclusão para dialogar com os sujeitos da sociedade atual, do
nosso presente, que sofrem os mesmos preconceitos, as mesmas discriminações e
as exclusões sofridas por Luzia-Homem no passado, como um exemplo espetacular
da construção das identidades ao longo da história da humanidade, ressaltando que
na análise de um determinado aspecto de uma obra de arte, seja ela a música, a
pintura, a escultura, a literatura ou qualquer outra forma de expressão artística,
vários são os caminhos que podem nos aproximar de um determinado artista ou
escultor, uma vez que todos eles são homens que fixam seus olhares
questionadores na vida presente, na sociedade na qual estão inseridos como meio
eficaz de reflexão e transformação:
Passou por mim uma mulher extraordinária carregando uma parede
na cabeça. Era Luzia, conduzindo para a obra, arrumados sobre a
tábua, cinquenta tijolos. Viram-na outros levar, firme sobre a cabeça,
uma enorme jarra d’água, que valia por três potes, de peso calculado
para a força normal de um homem robusto. De outra feita, removera
e assentara no lugar próprio a soleira de granito da porta principal da
prisão, causando pasmo aos mais valentes operários que haviam
tentado em vão a façanha. (LUZIA-HOMEM, p. 2)
Assim, fixo os meus olhares de educadora, e os olhares de jovens
aprendizes, futuros cidadãos do mundo, olhares dos meus alunos do ensino médio
do Lyceu Paraibano na extraordinária figura feminina de Luzia, denominada
socialmente de Luzia-Homem, buscando, através dessas miradas demoradas,
reflexivas e críticas, compreender como os preconceitos se perpetuam, como
nascem e como se espalham, criando estereótipos, marginalizando e excluindo
pessoas ao longo da história da humanidade, portanto, da sociedade atual, porque
educar requer prática, requer vivência. Porque educar é como disse o grande Paulo
Freire: “Ninguém educa ninguém, ninguém educa a si mesmo, os homens se
educam entre si, mediatizados pelo mundo.”
A relação de gênero é dada pelos estudiosos e pelas estudiosas do assunto
de uma maneira bem diferente do que a encontrada no Aurélio, uma vez que este
diz que gênero é o grupo de seres que se assemelham por seus caracteres
essenciais, ou que é uma união de corpos orgânicos que constituem espécie, raça,
raça, família, casta, entre outras distinções, enquanto que para os estudiosos e as
estudiosas da questão de gênero, este se constitui na relação cotidiana da vida dos
homens e das mulheres, ressaltando que esta relação é dada pela maneira de se
olhar, primeiro, as relações sociais entre mulheres e homens, em segundo, as
relações de poder entre mulheres e homens, mulheres e mulheres, homens e
homens, como podemos perceber em Luzia-Homem:
[...] Em plena florescência de mocidade e saúde, a extraordinária
mulher que tanto impressionara o francês Paul encobria os músculos
de aço sob as formas esbeltas e graciosas das morenas moças do
sertão. Trazia a cabeça semprevelada por um manto de
algodãozinho, cujas curelas prendia aos alvos dentes, como se por
um requinte de casquilhice, cuidasse com meticuloso interesse de
preservar o rosto dos raios do sol e da poeira corrosiva, a evolar em
nuvens espessas do solo adusto, donde ao tênue borrifo de chuvas
fecundas, surgiam como por encanto, alfombras de relva vivente e
flores odorosas. Pouco expansiva, sempre em tímido recato, vivia só,
afastada dos grupos de consortes de infortúnio, e quase não
conversava com as companheiras de trabalho, cumprindo com
inalterável calma, a sua tarefa diária, que excedia à vulgar, para fazer
jus a dobrada ração.
- É de uma soberbia desmascarada – diziam as moças da mesma
idade, na grande maioria desenvoltas ou deprimidas e infamadas
pela miséria.
- A modos que despreza de falar com a gente, como se fosse uma
senhora dona – murmuravam os rapazes, remordidos pelo despeito
da invencível recusa, impassível às suas insinuações galantes –
Aquilo nem parece mulher fêmea – observava uma velha alcoveta e
curandeira de profissão. (Luzia-Homem, p. 5)
Fica muito claro, nessas falas das moças e dos rapazes, como se davam as
relações sociais da época, bem como a questão do poder, uma vez que LuziaHomem era hostilizada por eles por possuir um comportamento diferente das demais
moças, mesmo sendo bela, não procurava namoro, mantinha-se sempre distante e
reservada diante das investidas dos rapazes, causando estranheza até mesmo às
velhas senhoras fofoqueiras, que afirmavam que Luzia nem parecia mulher fêmea.
Portanto, necessário é que, enquanto educadora, eu faça com que os alunos
compreendam o que afirmou Paulo Freire: “Não é no silêncio que os homens se
fazem, mas nas palavras, no trabalho, na ação-reflexão.”
O trecho acima também se apresenta como uma afirmação da teoriadas
autoras Scott (1990) e Louro (2003) entre outros autoresestudiosos da temática, de
que o gênero sublinha o aspecto relacional entre as mulheres e os homens, isto é,
que nenhuma compreensão de qualquer um dos dois pode existir através de um
estudo que os considere totalmente separados, uma vez que o gênero indica uma
maneira de como se dar as construções sociais, a criação inteiramente social das
ideias sobre os papeis próprios aos homens e às mulheres.
Dessa forma, a questão de gênero não passa de uma maneira como homens
e mulheres se assumem em determinada sociedade. É o caso de Luzia-Homem,
que estando inserida em um contexto histórico-social adverso às condições
humanas, e de modo especial à sua, já que é responsável pela mãe viúva, uma
velha senhora muito doente, estando impossibilitada até de cumprir as mais simples
tarefas domésticas. Lugar dominado pela extrema miséria causada pela seca
prolongada de muitos anos, no interior do Ceará, onde a fome campeia como um
monstro terrível, a mulher é obrigada a se prostituir para sobreviver, e muitas das
vezes, ajudar na sobrevivência da família, mas Luzia não quer este estereótipo para
si, por isso assume a postura de mulher-macho para impor respeito aos homens e
às mulheres:
A insinuação de Romana ferira certo o alvo e assanhara a secreta
cupidez de Capriúna, que não se conformava com os modos
retraídos e a impassível frieza da mulher-homem, resistência passiva
e calma, ante a qual se amesquinhava a sua fama, e sentia
arranhado o amor próprio de vitorioso em fáceis conquistas. Sempre
que a encontrava, dirigia-lhe, com saudações reverentes, palavras de
ternura e erotismos incontinentes, olhares e gestos de desejos mal
sofreados. E tão frequentes se tornaram esses meios de obsessão,
que um dia a moça os rebateu secamente, com firmeza inelutável:
- Deixa-me sossegada. Não se meta com a minha vida. Eu não sou o
que o senhor supõe...
Deixa-te de luxos, rapariga – respondeu Capriúna, mostrando-lhe um
grosso anel de ouro.
- olha a memória de ouro que tenho pra ti... não te zangues com o
teu mulato....
Desde então entrou a acompanhá-la, a persegui-la por toda a parte,
nas horas de trabalho na penitenciária, nas caminhadas ao rio e a
rondar, durante à noite, pela vizinhança, a casinha velha, lá para as
bandas da Lagoa do Junco, onde ela morava com a mãe velha e
enferma. (Luzia-Homem, p. 10)
Scott (1990) ressalta a perspectiva de que o gênero permite entender as
relações sociais entre homens e mulheres, o que pressupõe mudanças e
permanências; desconstruções, reconstrução de elementos simbólicos, imagens
práticas, comportamento, normas, valores e representações. Esta autora diz ainda
que a categoria gênero reforça o estudo da história social ao mostrar que as
relações afetivas, amorosas e sexuais não constituem realidades naturais. Scott diz
também que as relações de gênero como relações de poder são marcadas por
hierarquias, obediências e desigualdades, onde estão presentes os conflitos, as
tensões, as negociações, as alianças, seja através da manutenção dos poderes
masculinos, seja na luta das mulheres pela ampliação e busca do poder. A autora
argumenta ainda que o conceito de gênero foi criado para opor-se a um
determinismo biológico nas relações entre os sexos, dando-lhes um caráter
fundamentalmente social.
É nessa perspectiva que faço minhas as palavras de Paulo Freire, quando
este dizia que era professor a favor da docência contra o despudor, a favor da
liberdade contra o autoritarismo, da autoridade contra a licenciosidade, da
democracia contra a ditadura de direita ou de esquerda. Ele afirmava que era
professor a favor da luta contra qualquer forma de discriminação, contra a
dominação econômica dos indivíduos ou das classes sociais.
Também se declarava professor contra a ordem capitalista vigente, que
inventou esta aberração: a miséria na fartura. Dizendo, sobre sua prática docente:
“Sou professor a favor da boniteza de minha própria prática, boniteza essa, que dela
some se não cuido do que devo ensinar.”
Podemos destacar, ainda, no romance, o determinismo biológico, o
preconceito e a exclusão social, representados pelos estereótipos e pelas
identidades pré-estabelecidas socialmente enquanto simbologia legitimada, vigente
e predominante:
As moças da mesma idade, ainda não contaminadas pelos vírus
pecaminoso que empestava o ambiente, evitavam-na com maneiras
tímidas, discreto acanhamento, como não fossem iguais na condição
e no infortúnio. Muitas se afastavam dela, da orgulhosa e seca Luziahomem com secreto terror, e lhe faziam a furto, figas e cruzes.
Mulher que tinha buço de rapaz, pernas e braços forrados de pelúcia
crespa e entonos de força, com ares varonis, uma virago, avessa a
homens, deveria ser um desses erros da natureza, marcados com o
estigma dos desvios monstruosos do ventre maldito que os
concebera. Desgraça que lhe acontecesse não seria lamentada,
ninguém se apiedaria dela, que mais se diria em réprobo,
abandonada, separada pela cerca de espinhos da ironia
malquerente, em redor da qual girava o povilheu feroz a lapidá-la
com chacotas, dictérios e remoques. (Luzia-Homem, p. 10).
Desse modo, percebemos claramente todas as implicações das questões de
gênero apresentadas por Scott (1995), de como se dão os preconceitos e os
estereótipos marginalizados no seio da nossa sociedade, bem como as exclusões,
que vão surgindo das relações sociais, que preservam um determinado poder
político, social, cultural e religioso, haja vista existirem três crenças fundamentais
relativas a homens e mulheres. A primeira, de que homens e mulheres têm
naturezas psicológicas e sexuais distintas; a segunda, de que os homens são
inerentemente superiores ou dominantes; e a terceira, de que a natureza quer a
superioridade masculina como algo natural.
Diante do exposto, fica claro que a literatura dialoga com os sujeitos
presentes na sociedade atual, servindo-nos como ferramenta pedagógica para uma
educação inovadora, inclusiva. Que respeita as diferenças e o outro, enquanto
pessoa, gente, ser humano.
Nesse contexto, Paulo Freire compreendia o ser humano como inacabado,
portanto, aberto, como um ser de desejo, quer busca ser mais: mais gente, mais
solidário, mais amoroso, mais esperançoso; um ser social e político que se constrói
nas relações com os outros seres; como um ser singular que cria sua peculiaridade,
sua maneira de ser e estar no mundo. E mais, um ser que tem uma história, se
constrói e constrói história; como um ser que interpreta o mundo, que se empenha
em atribuir sentidos às experiências que vive; um ser que age no mundo.
Nessa análise do discurso social no que se refere à questão de gênero em
Luzia-Homem podemos trazer o pensamento de Foucault (1998), afirmando que o
discurso da sexualidade é organizado para definir os desejos de poder de um
gênero sobre o outro. Desse modo, o discurso a respeito da sexualidade não se
caracteriza como uma ala neutra, porque os interditos que estão no discurso sobre
sexualidade supõem a luta pelo desejo e pelo poder. Nesse sentido, a formação do
masculino e do feminino obedece à ordem discursiva legitimada pela sociedade, na
qual os gêneros obedecem ao que é previamente definido como verdadeiro e
correto, portanto, autorizada a transmitir seu discurso socialmente.
Ainda nessa perspectiva, Foucault (1998) se refere ao poder como resultado
das relações e práticas sociais historicamente criadas e tidas como verdadeiras, que
vão se fortalecendo através dos discursos. Discursos esses que servem para criar
verdades sobre comportamentos e modos de ser estar no mundo, ou seja, verdades
sobre os indivíduos. O discurso circula em cadeia, ou melhor, como algo que só
funciona em cadeia. Desse modo, ele exerce a dominaçãoatravés dos exercícios de
adestramento que impõem uma forma correta de ser e de se comportar. E é
justamente isso que encontramos no romance Luzia-Homem:
Entre essa gente maligna que faz pouco de mim, essa gente
desalmada que me persegue, como se eu fora uma excomungada ou
um bicho brabo, encontrei nele um amigo, um irmão; e hoje, abaixo
de Deus, é ele quem me ajuda a sustentar os dias de minha mãe,
entrevada dentro de uma rede. Estas noites temos passado juntos
fazendo quarto à pobre velha que gemia com dores de fazer cortar
coração. Hoje, de manhãzinha, esteve lá em casa e pedi-lhe que
fosse procurar o doutor... Ah! meus senhores, até os bichos são
agradecidos, quanto mais criaturas cristãs. E aqui está, em pura
verdade, porque eu puno por ele e juro que está inocente... (LUZIAHOMEM, p.30).
Portanto, trabalhei a leitura e a análise de Luzia-Homem, com meus alunos do
ensino médio do Lyceu Paraibano na perspectiva freireana de que “A leitura do
mundo precede a leitura da palavra”, de que ler é um ato político, uma vez que,
como ele mesmo dizia,abrir o texto, fundar o sistema de leitura, não é, pois, apenas
pedir e mostrar que é possível interpretá-lo livremente; o jogo da leitura não deve ser
compreendido como uma distração, mas como um trabalho, porque
ler é fazer
trabalhar o nosso corpo ao apelo dos signos do texto, de todas as linguagens que o
atravessam e que formam como que a profundidade cambiante das frases.
Para Paulo Freire, o ato de ler poderia ser traduzido como o ato mesmo de
viver ou mesmo de respiração-ação que não se esgota na descodificação pura da
escrita ou da linguagem escrita, mas que se antecipa e se alonga na inteligência do
mundo, nas relações sociais. Nesse sentido, a leitura é um processo dinâmico e
dialógico que se reconfigura constantemente e se alicerça em uma interação
homem-mundo-homem. Justamente por isso,na escolarização é imprescindível que
trabalhemos a realidade e seu contexto, pois somente assim formaremos cidadãos
críticos e reflexivos, sujeitos ativos, que fazem a sua própria história e a história da
humanidade. Em sendo assim, urge que nós, educadores, meditemos o pensamento
de Paulo Freire:
A educação que se impõe aos que verdadeiramente se
comprometem com a libertação não pode fundar-se numa
compreensão dos homens como seres 'vazios' a quem o mundo
'encha' de conteúdos; não pode basear-se numa consciência
espacializada, mecanicistamente compartimentada, mas nós homens
[e mulheres] como 'corpos conscientes' e na consciência como
consciência intencionada ao mundo. Não pode ser a do depósito de
conteúdos, mas a da problematização dos homens em suas relações
com o mundo. (FREIRE, 1982: 77)
Portanto, a nossa prática diária em salas de aulas deve ser voltada para a
formação integral do homem, para a sua incompletude, para a sua cidadania, para o
seu papel de sujeito ativo, transformador da sua própria história e da história da
humanidade. O papel principal do educador deve ser embasado na teoria freireana
do Ser mais; mais gente, mais humano, mais solidário. Um ser consciente do mundo
e do seu papel neste.
REFERÊNCIAS
ARENDT, Hannah. A condição humana. RJ: MARCO ZERO, 1978.
FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia: Saberes necessários à prática
educativa, 4 ed. São Paulo: Paz e Terra, 1997.
___________Pedagogia do Oprimido, 11ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1982.
___________ A importância do ato de ler: em três artigos que se completam.
São Paulo: Cortez, 2003.
________. Pedagogia da esperança: Um reencontro com a pedagogia do oprimido, ª
ed., Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1992.
FOUCAULT, Michel. Microfísica do poder, 4ª ed. Rio de Janeiro: Graal, 1998.
LOURO, Guacira Lopes. Uma perspectiva pós-estruturalista.Petrópolis RJ:
VOZES, 1997.
LUKÁCS, Georg. Ensaios sobre literatura. Coord. Leandro Konder, SP: Civilização
Brasileira. 1968.
OLÍMPIO, Domingos. Luzia-Homem. Texto integral estabelecido por Afrânio
Coutinho e Maria Filgueiras. 9 ed., Ática, 1983 (Série Bom Livro).
SCOTT, Joan W. Gênero: uma categoria útil de análise histórica. Educação e
Realidade, V. 16, nº 2, Porto Alegre, jul/dez, 1990.

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