certo ou errado - uma introdução prática à ética

Transcrição

certo ou errado - uma introdução prática à ética
Certo ou Errado?
uma introdução prática à ética
Lincoln Frias
Entrevistador: Por que você pode ter várias mulheres, mas suas mulheres não podem ter outros homens?
Mr. Catra: Você já viu uma vaca com dois touros ou uma leoa com dois leões? Todo animal mamífero
que vive em bando, a formação social é essa. Porque as mulheres podem se relacionar sexualmente com
vários homens, mas amor você só terá de um. E o homem consegue amar várias mulheres com a mesma
intensidade. Senão Deus não faria o mundo assim. Deus é exato. Por que nasce mais mulher e morre
mais homem? Vocês me expliquem a prostituição então se cada homem tem que ter uma mulher só.
Tem muito mais mulher e muito menos homem. Tem alguma coisa errada então no planeta. Se homem
e mulher são iguais, então por que existe a prostituição? É raciocínio lógico.
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Índice
Apresentação ...................................................................................................... 03
Capítulo 1- Ética e moralidade ......................................................................... 05
1.1.
1.2.
1.3.
1.4.
1.5.
Existem regras morais absolutas? ......................................................................... 07
A ética é um assunto muito subjetivo? ................................................................... 08
Existe apenas uma moral ou há várias? .................................................................. 10
Moralidade como moralização e desmoralização ..................................................... 12
O que são a ética e a moralidade? ......................................................................... 14
Capítulo 2- Argumentação moral .................................................................... 22
2.1. A estrutura básica dos argumentos ...................................................................................... 24
2.2. Reconhecendo argumentos .................................................................................................. 27
2.3. Dedução e indução .............................................................................................................. 30
2.4. Premissas implícitas ............................................................................................................ 31
2.5. A argumentação moral ........................................................................................................ 32
2.6. Como identificar premissas implícitas em argumentos morais ........................................... 34
2.7. Avaliando argumento morais: o método de contraexemplos............................................... 35
2.8. Guia das falácias morais ...................................................................................................... 37
a) O apelo ao medo ............................................................................................................ 39
b) O apelo à tradição .......................................................................................................... 40
c) Falácias ad hominem ..................................................................................................... 41
d) Argumentos de autoridade ............................................................................................. 43
e) Apelo à popularidade ..................................................................................................... 44
f) Falácia do legalismo moral ............................................................................................ 46
g) Falácia da petição de princípios ..................................................................................... 48
h) Falácia naturalista .......................................................................................................... 48
i) Argumento do efeito dominó ......................................................................................... 49
j) Falácia da amostra enviesada ........................................................................................ 50
k) Falácia um erro justifica o outro .................................................................................... 51
l) Apelo à ignorância ......................................................................................................... 52
m) Falso dilema ................................................................................................................... 53
n) Falácia genética e culpa por associação ......................................................................... 54
m) Outras falácias e estratégias retóricas .............................................................................. 55
2.9. Como justificar uma regra moral ......................................................................................... 55
2.10. Três tipos de argumento morais: dedutivos, indutivos e inferência para a melhor
explicação ................................................................................................................................... 58
2.11. Como avaliar teorias éticas e Cardápio de teorias éticas.................................................... 60
2.12. Como escrever textos argumentativos ............................................................................... 67
2.13. Cardápio de temas ................................................................................................. 68
Capítulo 3- Psicologia moral [ainda não disponível]
Capítulo 4- Uma ética mínima [ainda não disponível]
Exercícios ...................................................................................................................... 70
Gabarito ........................................................................................................................ 81
Referências .................................................................................................................... 81
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Apresentação
Caso seja entendida como análise e elaboração de argumentos, a ética é não
apenas útil, como também essencial para muitos debates públicos. Certos livros de ética
dão a impressão de que é impossível construir prédios sem resolver todos os problemas
da física, de que se não for possível descobrir qual a menor partícula e o que aconteceu
antes do Big Bang é melhor não construir viadutos porque isso seria arriscado demais.
Bom, se é isso que eles estão dizendo, eles estão errados. Nossos viadutos e prédios
funcionam muito bem. Por isso, este é um livro de engenharia.
A ética costuma ser apresentada ou como uma série de obrigações conservadoras
ou como um conjunto de teorias muito abstratas. O objetivo deste livro é evitar esses
defeitos e ajudar a pensar sobre questões morais concretas de uma maneira clara,
cientificamente atualizada e o mais neutra possível. A ética não-religiosa é uma ciência
jovem, que só começou a ser estudada de maneira sistemática e por muitas pessoas nos
anos 60, por isso, há muito progresso a ser feito (PARFIT, 1984, p. 452).
O primeiro capítulo apresenta o que são a ética e a moralidade e algumas das
principais dificuldades ao se pensar essas questões (relativismo, subjetivismo etc.). O
segundo capítulo é o núcleo do livro, onde se explica como construir e criticar
argumentos morais, incluindo uma lista dos erros mais comuns (falácias). Entretanto, as
decisões morais na vida cotidiana não costumam ser baseadas em raciocínios, por isso,
o capítulo seguinte [NÃO ESTÁ DISPONÍVEL AINDA] apresenta um panorama do
que já se sabe sobre psicologia moral, incluindo as principais teorias sobre a evolução
da moralidade, sobre o desenvolvimento moral desde a infância e sobre as diferenças
culturais em relação à moralidade – além de uma lista de vieses ou ilusões morais (erros
comuns causados pela maneira como o cérebro funciona). O quarto capítulo [NÃO
ESTÁ DISPONÍVEL AINDA] apresenta a hipótese de quais são as regras morais mais
básicas, tomando o respeito à autonomia como a ideia principal. As ideias desse
capítulo são apresentadas mais como um alvo a ser batido, um parâmetro provisório, do
que como uma resposta final. O quinto capítulo é um conjunto de casos cujo objetivo é
servir como laboratório para você testar suas habilidades morais [NÃO ESTÁ
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DISPONÍVEL AINDA]. Ao final, a parte mais divertida e importante, uma série de
exercícios sobre argumentação moral.
A moralidade é o elemento que tornou possível que fôssemos os únicos animais
a viverem em grupos tão grandes e interligados de indivíduos. Mas também é ela quem
justifica boa parte dos assassinatos (por vingança, pela honra, pela defesa da pátria etc.)
e preconceitos (por causa da preferência pelo próprio grupo). O desafio é aprender como
aproveitar seus benefícios, mas evitar seus efeitos ruins.
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Capítulo 1 – Ética e moralidade
Em 03 de dezembro de 2012, o fotógrafo R. Abbasi estava esperando o trem em
uma estação de metrô de Nova York quando viu que, no meio de uma discussão, um
homem havia sido derrubado nos trilhos por um mendigo. Enquanto o homem tentava
sair dos trilhos, Abbasi começou a tirar a fotos. O homem (Ki-Suck Han de 58 anos)
não conseguiu se salvar e morreu atropelado. A foto de Abbasi foi publicada na capa do
New York Post no dia seguinte, com a manchete: “este homem está prestes a morrer”
(SINGER, 2012).
Compare esse acontecimento com o que aconteceu em 26 de março de 2012. O
tibetano Jampa Yeshi, de 27 anos, colocou fogo no próprio corpo como uma forma de
protesto contra o domínio do governo chinês sobre o Tibet (DAIGLE, 2012). Ao
contrário dos homens-bomba muçulmanos, ele não fez isso para matar ninguém, apenas
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para chamar a atenção para uma injustiça contra seu povo. Também ao contrário dos
homens-bomba, ele não acreditava que receberia 40 virgens no paraíso. Na verdade,
como provavelmente era budista, ele nem mesmo acreditava em vida após a morte. O
resultado foi que Jampa Yeshi morreu naquele mesmo dia e a China continua
dominando o Tibet.
“Ética” é uma palavra que costuma ser usada por senhores bem barbeados, que
vestem a camisa por dentro da calça e vão à missa todo domingo. Costuma aparecer no
meio de conselhos sobre não usar roupas curtas, não transar antes do casamento e não
mentir para os pais. Aparece durante monólogos sobre como a juventude está perdida,
como a violência tem crescido e como os políticos de hoje são desonestos. Enfim, há
bons motivos para pensar que ética é uma coisa bastante inútil e chata.
Um dos objetivos deste livro é mostrar que essa conclusão está errada. Na
verdade, temos muita disposição – e até mesmo prazer – em discutir questões morais,
inclusive na mesa do bar e na hora da novela. Levantamos a voz furiosamente para
defender o direito que a fulana de tal tinha de trair o fulano depois do que ele fez com
ela. Apontamos o dedo na cara de quem quer que seja que não ache um absurdo a mãe
largar o filho na lata do lixo. Temos taquicardia, ficamos com a mão suando se alguém
diz que fomos covardes por não ter dado um murro em quem disse isso ou aquilo.
Falamos palavrões, criamos mal-estar, estragamos amizades para defender nossa
opinião sobre o que é certo e o que é errado.
Somos animais morais. Durante grande parte de nosso tempo nos dedicamos a
avaliar as ações de outras pessoas. Temos a expectativa de que elas digam a verdade,
criticamos comportamentos com os quais não concordamos, distinguimos entre ações
melhores e piores, nos sentimos ofendidos, temos opiniões sobre assuntos controversos,
temos orgulho de nossos méritos, condenamos injustiças, evitamos quem consideramos
mau-caráter e incentivamos outras pessoas a evita-los também etc. O fotógrafo deveria
ter salvado o homem caído nos trilhos, foi um absurdo ele ter sido tão egoísta, você
deve ter pensado. Por outro lado, o gesto do tibetano parece incompreensível, estamos
tão acostumados a colocar nosso interesse em primeiro lugar que é difícil acreditar que
alguém tenha se sacrificado sem esperar nada em troca (por isso você deve ter pensado
que ele, no fundo, acreditava na vida após a morte ou que pelo menos estava interessado
em entrar para a história como um herói).
E porque somos animais morais, temos tanto ódio dos criminosos. Mais do que
isso, odiamos (e temos medo) principalmente dos psicopatas. Imagine alguém que não
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se importe com o sofrimento de nenhuma outra pessoa, que não cumpra promessas, que
nunca diga a verdade e que não respeite a propriedade de ninguém. É assustador que
possa existir alguém assim, mas eles existem. E o que assusta neles é a falta de qualquer
moralidade. Imagine que você esqueceu seu celular na mesa do bar. Quando percebe
que está sem ele, você liga para ele para ver se quem encontrou pode te devolver. Do
outro lado da linha alguém atende. Alegria. Mas logo te responde “peguei mesmo seu
celular, mas na verdade ele não me interessa, é um modelo fuleiro, só que mesmo assim
não vou te devolver, só de sacanagem”. Se você acha que ética é uma bobagem, você
está defendendo um mundo habitado apenas por psicopatas, por pessoas incapazes de se
colocar no lugar do outro, de se preocupar com a dor do outro.
Mas se você aceita que há ações em relação a outras pessoas que são
inaceitáveis, você não é um psicopata e você tem uma moralidade. Pode ser, porém, que
suas opiniões sobre questões morais não sejam muito bem fundamentadas, não sejam
coerentes entre si e talvez você nem mesmo concorde com algumas delas depois que
analisá-las com calma. Diversas pesquisas científicas mostram que todos estamos nessa
situação durante boa parte do tempo, obedecendo regras que não sabemos defender ou
que nem mesmo aceitamos quando paramos para pensar (HAIDT, 2001; 2007; 2012;
HAIDT; KESEBIR, 2010). O objetivo principal deste livro então é observar melhor
como tomamos decisões morais e aprender a justificá-las de maneira mais consistente.
Em resumo, o objetivo é descobrir como decidir se uma ação é certa ou errada.
1.1.
Existem regras morais absolutas?
Normalmente as pessoas esperam regras morais absolutas, isto é, que valham
sempre, para todos, por todo o tempo e que não aceitem exceções, como os dez
mandamentos. Contudo, as coisas são muito mais complicadas do que isso. A regra de
não matar outros seres humanos parece ser o mínimo que devemos a outras pessoas e é
uma regra defendida por todas as sociedades (MIKHAIL, 2009). Mas até mesmo ela
aceita exceções, pois, no mínimo, é aceitável matar em legítima defesa e matar soldados
em uma guerra justa. Da mesma maneira, em algumas situações pode ser justificado
mentir, roubar, trair etc.
Embora tantas estórias que ouvimos quando crianças enfatizem que mentir é
errado e que os dez mandamentos digam que é pecado “levantar falso testemunho”,
mentimos diariamente. Se nos perguntam “tudo bem?” respondemos que sim mesmo
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quando tudo vai muito mal. Se a amiga pergunta, não dizemos que ela engordou.
Elogiamos nossa vó mesmo quando a lasanha ficou muito salgada. Não consideramos
essas mentiras imorais, chamamos isso de polidez, de educação. Na verdade,
consideramos imoral quem não mente dessa maneira. E nos justificamos dizendo que
mentir é diferente de omitir, que mentir pelo bem é uma coisa boa e outras desculpas
esfarrapadas.
Isso não quer dizer que a honestidade não tenha valor, mas sim que ela não é o
único valor. O fato de que as regras morais tenham valor relativo, isto é, que sua
importância dependa do contexto e do confronto com outras regras, torna a tarefa de
pensar questões morais ainda mais difícil. Ao analisar um problema ético, a primeira
coisa a fazer é identificar as melhores razões a favor de cada uma das alternativas.
Essa é uma tarefa complicada e imprecisa, mas não há outra estratégia aceitável. Mais
adiante veremos algumas candidatas a regras morais absolutas cujo objetivo é resolver
essa tarefa, mas é você quem vai julgar se elas são bem sucedidas ou não.
1.2.
A ética é um assunto muito subjetivo?
É comum ouvir que a ética é um assunto muito subjetivo, a definição do que é
certo e errado é uma questão de opinião, que sobre questões morais cada um tem sua
opinião etc. Defender isso é o oposto de acreditar em regras morais absolutas. Uma
coisa é subjetiva se (1) a avaliação sobre ela variar de pessoa para pessoa, (2) se não
houver como decidir quem está certo ou (3) se apenas a pessoa que faz a afirmação
puder se corrigir (na verdade, esses três pontos são apenas maneiras diferentes de dizer
mais ou menos a mesma coisa). O melhor exemplo de algo subjetivo é a dor. Se você
me disser que está com dor de estômago, como eu poderia questionar isso? Não há
como mostrar que você está errada, que na verdade o que você está sentido é só um leve
incômodo. Exemplos menos perfeitos de avaliações subjetivas são afirmações do tipo
“não gosto de café”, “acho quiabo nojento”, “São Paulo é uma cidade que faz a gente se
sentir mal” ou “o Tiago Lacerda é o homem mais lindo do mundo”. Como discutir sobre
esses assuntos com as outras pessoas? Normalmente, a gente dá de ombros e diz que
gosto não se discute porque cada um tem o seu. No final das contas, na maior parte
desses casos não faz mesmo diferença se cada um pensa de um jeito diferente. O
subjetivista moral defende que o mesmo vale para regras morais: uns acham aborto
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errado, outros não e não há como resolver a questão. Essa posição é conhecida como
relativismo subjetivista.
Como será visto adiante, há alguma verdade no subjetivismo na medida em que
considerar algo moral ou imoral realmente depende dos nossos sentimentos de
aprovação e reprovação. Contudo, a ética não está no mesmo nível de subjetividade da
dor ou do gosto. Dizer que é errado matar alguém, que a escravidão é inaceitável, que
temos a obrigação de cumprir nossas promessas, que a homofobia é imoral etc. não é
apenas expressar seu gosto. Não são questões sobre as quais tanto faz se você pensa
assim ou assado. Se outra pessoa acha estuprar aceitável, isso deixa aberta a
possibilidade de que ela possa te estuprar em algum momento. Portanto, isso é diferente
de gostar ou não de quiabo, nesse caso faz diferença se as pessoas têm opiniões
diferentes. Embora em certo sentido, achar o aborto imoral é realmente uma resposta
subjetiva, também faz sentido alguém criticar essa sua resposta, dizendo que você
deveria tentar mudá-la. E as críticas mais poderosas são aquelas que apontam para como
sua opinião afeta outras pessoas.
O contrário de uma afirmação subjetiva é uma afirmação objetiva. Para ser
objetiva a afirmação deve poder ser verificada por outras pessoas, é preciso que alguém
possa mostrar que ela está errada. Por exemplo, “hoje é quarta feira”, “se te dei R$10,00
e o chocolate custava R$3,00 você deveria me devolver R$7,00”, “o Cruzeiro tem mais
títulos importantes do que o Atlético”, “sob condições ideais de temperatura, pressão e
pureza, a água ferve a 100º C” etc. Em especial, a ciência experimental é a tentativa
mais bem sucedida de fazer afirmações objetivas, pois os experimentos são justamente
maneiras de testar aos olhos de todo mundo as hipóteses (afirmações) que foram feitas.
Há várias questões morais sobre as quais ainda não podemos fazer afirmações
objetivas. Quanto mais complexos são os assuntos, mais difícil é pisar em terreno firme.
Compare a lista 1 à lista 2:
Lista 1
•
as cotas raciais em universidades são sempre justas
•
todo aborto é imoral
•
dedurar seu gerente para o diretor é sempre antiético etc.
Lista 2
•
é errado estuprar sua priminha de 5 anos
•
é errado roubar dinheiro de um mendigo cego
9
•
temos a obrigação de devolver o dinheiro que pegamos emprestado
•
as mulheres devem poder andar na rua
A comparação entre essas duas listas revela algo impressionante. Quem duvida
da objetividade da ética normalmente está pensando em questões do tipo da lista 1 e
simplesmente nem considera que questões do tipo da lista 2 sejam questões éticas. Elas
são consideradas tão óbvias, que nem merecem ser discutidas. Mas essa obviedade é
justamente o principal sintoma da objetividade. E isso mascara o fato de que foi preciso
desenvolver respostas a essas questões. Alguns psicopatas não veem problemas em
estuprar suas priminhas de cinco anos e em alguns países árabes as mulheres só podem
andar na rua em companhia de seus maridos ou familiares.
As principais teorias objetivistas são aquelas que dizem que as regras morais são
expressões da vontade Deus (teoria do comando divino), são direitos naturais, são
exigências da racionalidade (deontologia kantiana), são maneiras de aumentar o bemestar geral (utilitarismo) ou resultados de um contrato hipotético (contratualismo).
Como já foi dito acima, o critério que defenderei para dizer que uma afirmação moral
objetiva é que ela tem as razões mais fortes a seu favor. Infelizmente, não é fácil aplicar
esse critério, pois em várias situações é difícil decidir o peso de uma razão. Para
adiantar um pouco, podemos dizer que algumas das características que fazem com que
uma razão seja forte ou não são: simplicidade, coerência com outras crenças que já
possuímos e o fato de ela poder ser aceita por todas as pessoas em questão - ou pelas
pessoas que são razoáveis. Muitas vezes é difícil estabelecer o que é uma boa razão ou
quem são as pessoas razoáveis, por exemplo, no caso do aborto. Mas esses problemas
não são frequentes na maior parte dos casos cotidianos. Essa posição é compatível na
maior parte dos casos com todas as teorias citadas acima, mas talvez seja mais próxima
do contratualismo porque dá valor especial ao que pode ser aceito por outras pessoas.
Deve ficar claro, porém, que o contratualismo tem sérias limitações, que serão
discutidas adiante. Por isso, o objetivo aqui não é defender uma teoria, mas sim
apresentar os problemas, deixando para você a tarefa de escolher por si mesmo quais os
tipos de razão são mais fortes.
1.3.
Existe apenas uma moral ou há várias?
Há um segundo tipo de relativismo que ameaça as teorias objetivistas, o
relativismo cultural. Segundo essa posição, o que é certo para uma cultura pode ser
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errado para outra. Pode ser certo cortar a mão de um ladrão no Irã e errado fazer isso no
Brasil. Na verdade, nem é preciso nos comparar a outros países para constatar que
grupos muitas vezes têm regras morais diferentes e, nesse sentido, existem várias
moralidades: os traficantes têm regras próprias sobre como eles devem tratar
subordinados, concorrentes, policiais e membros da comunidade; os católicos têm suas
regras, que são diferentes das dos membros da Igreja Universal do Reino de Deus; e até
as famílias têm regras diferentes umas das outras, alguns pais proíbem os filhos de
dormir fora de casa, outros fumam maconha com os filhos e alguns obrigam as filhas a
casar com alguém que ela não quer. O adolescente que foge de casa pode estar
recusando as regras de sua família e o menino que entra para o tráfico também.
Entretanto, como os indivíduos normalmente participam de mais de um grupo,
às vezes regras de diferentes moralidades entram em conflito. Uma das funções da ética
(entendida como uma área de estudo) é solucionar ou apaziguar esses conflitos. Ela faz
isso tentando descobrir quais regras são justificadas e quais não são. Muitos
pesquisadores supõem que exista apenas uma ética, um conjunto de regras que valha
para todos. Essa questão é especialmente difícil. É aceitável que os índios matem um
dos filhos gêmeos por que acreditam que eles são espíritos maus? E que os muçulmanos
obriguem as mulheres a usarem véus? E a mutilação genital feminina (a retirada do
clitóris) no Senegal? Faz sentido dizer que isso é errado aqui, mas pode ser certo lá?
Minha proposta é que essa resposta é aceitável em alguns casos, mas não em
outros. Há regras que realmente dependem do contexto. Apesar de eu ser vegetariano,
acho justificável que um ribeirinho sem acesso a uma dieta equilibrada cace animais
para comer. Seria errado para alguém que vive na cidade e tem dinheiro para conseguir
nutrientes de outra maneira, mas não é para ele que só tem essa opção. Por outro lado,
muitas regras morais derivam não de restrições factuais, mas de crenças erradas. Por
exemplo, a crença dos índios de que o nascimento de gêmeos, albinos ou de bebês com
lábio leporino significa uma maldição. Nesses casos, como a crença que justifica a regra
é errada, a regra também é errada. O problema é que nem sempre é fácil determinar se
uma regra é falsa ou não. Os católicos acham que zigotos têm almas e que Deus é contra
a homossexualidade. Muita gente acha rodeios divertidos e que comer animais não é
imoral. Para mim essas crenças são tão absurdas quanto os outros exemplos desse
parágrafo, mas se você é um brasileiro típico, você provavelmente acredita nelas.
Mesmo concordando com o relativista que muitas regras realmente dependem do
contexto e que por isso o que é aceitável em uma cultura pode ser inaceitável em outra,
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há a possibilidade de que certas regras morais sejam universais (quer dizer, valham para
todos e em todos os tempos). Alguns exemplos talvez sejam “não torture crianças
inocentes apenas por diversão”, “não estupre sua mãe”, “não arranque os olhos de
alguém apenas porque ele chegou atrasado na sala de aula” etc. Contudo, há alguns
autores que diriam que nem mesmo esse tipo de regra é universal (PRINZ, 2008). E, por
outro lado, há autores que defendem que até mesmo regras mais gerais são universais.
P. ex., os utilitaristas acreditam que todos têm a obrigação de seguir a regra conhecida
como princípio da maximização, “escolha sempre a ação que gerar a maior quantidade
de bem-estar para todos os envolvidos”.
1.4.
Moralidade como moralização e desmoralização
A moralidade muda não apenas entre pessoas e culturas, mas também com o
tempo. Algo que era aceitável pode se tornar inaceitável. Há algumas décadas, jogar
lixo na rua não era visto como um problema moral. Há alguns anos, fumar perto de um
não-fumante em um lugar fechado também não era visto como uma questão moral. O
mesmo aconteceu com o bullying (humilhar e intimidar colegas), o assédio sexual (usar
uma posição de poder para conseguir favores sexuais, p. ex., o chefe dar em cima da
secretária ou o professor paquerar a aluna) e o assédio moral (humilhar e intimidar
subordinados). Até o século XIX, a palmatória era considerada um bom método
pedagógico e bastante usada nas escolas. Hoje, a palmada educativa é uma ação que está
quase se tornando algo considerado imoral no Brasil – nos EUA, p. ex., ela já é vista
como imoral.
As questões se tornam morais principalmente quando percebemos que nossa
ação interfere na vida de outras pessoas de uma maneira que deveria levar em conta as
preferências delas. E essa percepção leva a uma série de sentimentos, conhecidos como
sentimentos morais, tais como culpa, vergonha, desprezo, indignação, empatia etc.
Antes, não se considerava que o não-fumante tinha direito de reclamar do fumante,
agora isso mudou. E isso mudou principalmente porque se descobriu que o fumo
passivo realmente é prejudicial à saúde. Agora, muitos fumantes sentem vergonha de
fumar perto de não-fumantes e sentiriam culpa se um filho começar a fumar por sua
causa, enquanto que os não-fumantes sentem indignação quando veem alguém fumando
perto de não-fumantes (mesmo que não sejam eles) e desprezo ao saber que um pai
incentivou o filho a fumar.
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A moralização consiste nesse processo de começar a ter sentimentos morais em
relação a certa ação e, para alguns autores, também inclui um segundo processo que
consiste em defender uma regra sobre essa ação que deveria ser seguida por todos. Quer
dizer, para alguns autores (HUME, 1739/2009; PRINZ, 2008), basta haver sentimentos
morais em relação a uma ação para que ela seja moral, enquanto que para outros é
preciso que elas sejam também sejam universalizáveis (KANT, 1785/1986; RAWLS,
1971/2008; SCANLON, 1998; TOMASELLO; VAISH, 2013; BAUMARD; ANDRÉ;
SPERBER, 2013). Portanto, nessa segunda perspectiva, a moralização é composta por
(1) sentimentos morais e (2) universalização.
Compare o caso do tabagismo com o do escapamento das motos no Brasil. Nos
últimos anos, se tornou um símbolo de status para os jovens brasileiros ter motos com
escapamentos que fazem muito barulho. Ao invés de modificar suas motos para que
façam menos barulho, eles pagam centenas de reais para que suas motos façam mais
barulho, porque isso é considerado másculo, bonito e arrojado. Eles desconsideram
completamente o fato de que o barulho vai incomodar outras pessoas. O quadro ainda
piora se levarmos em conta de barulho é realmente muito alto, que os motoqueiros
aceleram a moto para fazer ainda mais barulho e, pior, que eles costumam usar as motos
de madrugada. Em um passeio pelo centro de madrugada, imagine quantos recémnascidos, quantos idosos com problemas de insônia e quantas pessoas que precisam
trabalhar logo de madrugada são acordados por causa de uma preferência
completamente arbitrária como a desses motoqueiros. Mas eles simplesmente não se
sentem interferindo na vida de outras pessoas de uma maneira que deveria levar em
consideração as preferências delas. Eles não se sentem culpados, não se colocam no
lugar das vítimas e não se incomodam quando ouvem o barulho de outras motos. Enfim,
o escapamento de motos não foi moralizado.
Há quatro tipos de processos de moralização/desmoralização. Além dos casos
em que algo que era aceitável se torna moralmente proibido, pode acontecer o inverso,
algo que era proibido pode se tornar aceitável, permitido. Foi o que aconteceu com o
sexo antes do casamento, com o uso de preservativos e com o divórcio. A
homossexualidade é algo que já foi muito condenado, mas que está próxima de ser
considerada aceitável. Outro tipo de mudança que pode acontecer é algo que era apenas
elogiável se tornar obrigatório. Isso aconteceu com o respeito ao bem-estar dos animais
durante o abate e nas pesquisas científicas e parece estar acontecendo com a ajuda que
os países ricos devem dar aos países pobres. Além disso, algo que era obrigatório pode
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se tornar apenas elogiável, como é o caso de casais que ficam juntos a vida inteira. E a
necessidade de novas regras morais também aparece, como aquelas sobre como tratar os
amigos e conhecidos no MSN, Facebook etc.
Isso faz com que existam quatro categorias morais. A função da moralidade
então é definir a qual categoria pertence determinada ação: se ela é permitida,
obrigatória, proibida ou elogiável. Uma ação que é permitida é aquela que você pode ou
não fazer, você tem o direito de decidir. Já as ações obrigatórias são aquelas em relação
às quais você não tem opção, há a obrigação de realizá-las. As ações proibidas são as
imorais, aquelas em relação às quais também não há opção, mas nesse caso sua
obrigação é não realizá-las. As ações elogiáveis são aquelas ações boas mas que não são
obrigatórias, você tem a opção de realizá-las ou não. Por exemplo, abraçar seus amigos
é algo permitido (não é proibido, mas também não é obrigatório). Cumprir suas
promessas é algo obrigatório. Matar outras pessoas é algo proibido. Arriscar sua vida
para salvar alguém é algo elogiável (é permitido, mas não é obrigatório).
Em resumo, tudo que é permitido não é proibido. Tudo que é obrigatório ou
elogiável é permitido, mas nem tudo que é permitido é obrigatório ou elogiável. O que é
proibido não é permitido, nem obrigatório, nem elogiável.
1.5.
O que são a ética e a moralidade?
A ética pode ser entendida como (a) sinônimo de moral, outro nome para a
mesma coisa, ou como (b) o estudo da moral, da mesma maneira que a linguística é o
estudo da linguagem. Nesse segundo sentido, a ética tenta avaliar quais posições morais
são mais justificadas, em especial, ela tenta definir quando o altruísmo é obrigatório. Na
linguagem cotidiana do Brasil, “ética” costuma se referir mais a questões profissionais,
especialmente honestidade (p. ex. “falta ética na política”), enquanto que “moral”
costuma ser usada mais em assuntos pessoais (p. ex., “depois do que você fez, você não
tem moral nenhuma para falar assim comigo”). Aqui, para evitar confusões, ética será
entendida apenas no segundo sentido, como o estudo da moralidade. A tarefa mais
difícil é definir o que é moralidade.
A definição simples é que a moralidade é conjunto de regras sobre o que é certo
e o que é errado, bom ou mal. Contudo, essa definição não ajuda muito a definir o que é
certo e errado, a tarefa mais difícil. Por isso, em geral é interessante, ser um pouco mais
específico, e a definição funcional cumpre essa tarefa: a moralidade é um conjunto de
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padrões informais (valores, regras, sentimentos, instituições etc.) sobre como se
comportar, especialmente sobre quando o egoísmo é inaceitável, cujo objetivo é tornar
a sociedade possível ao incentivar o altruísmo e a cooperação (modificado a partir de
HAIDT; KESEBIR, 2010).
A abordagem funcional define a moralidade por seus resultados, principalmente
pelos comportamentos altruístas e cooperativos. Nessa perspectiva, ela é considerada
como um resultado da seleção natural, assim como alguns animais têm asas e outros
não, alguns têm moralidade e outros não. E assim como os estômagos e as asas
sobreviveram à seleção natural porque deram vantagens aos organismos que os
possuíam, a moralidade foi sendo selecionada durante a história evolutiva de algumas
espécies porque ela tinha um resultado que era vantajoso para os organismos que a
possuíam. Esse resultado vantajoso é tornar a sociedade possível. A moralidade torna a
sociedade possível tentando estabelecer a cooperação e limitar a competição. Há
cooperação quando dois indivíduos agem de acordo com interesses comuns ou quando
um indivíduo sacrifica seu interesse em favor do interesse de outro indivíduo.
O problema é que os organismos tendem a sempre promover seus interesses. O
objetivo biológico de todas as formas de vida é transmitir os genes às próximas
gerações. Isso porque, no final das contas, os organismos se desenvolveram como
formas dos genes sobreviverem (DAWKINS, 1976/2007). O
egoísmo
consiste
em
indivíduo se preocupar apenas com seu interesse. O altruísmo é quando ele leva em
conta também os interesses de outros, é a decisão de considerar os interesses de outra
pessoa como mais importantes que os seus. A moralidade surgiu durante a seleção
natural quando dar preferência ao interesse de outros indivíduos começou a ser
vantajoso porque permitia viver em grandes grupos – e assim conseguir mais comida,
melhores abrigos, se proteger melhor dos predadores e se defender de grupos rivais.
A moralidade então é sempre uma tentativa de equilibrar egoísmo e altruísmo.
“Interesse” aqui é entendido não no sentido negativo, de algum ruim, escuso, mas sim
como tudo aquilo que é bom para a própria pessoa. Se eu prefiro água ao invés de
suco, então tenho interesse em água. Se para mim é melhor ser contador do que
astronauta, então tenho interesse em ser contador. Todos nós temos vários interesses:
não sentir dor, ser feliz, ter amigos, ganhar dinheiro, ter boa saúde. E o egoísmo é a
tentativa de garantir a realização deles.
Um exemplo muito claro de altruísmo (e, segundo a hipótese do círculo em
expansão, de onde surgiu todo altruísmo e toda moralidade) é o da mãe que se prejudica
15
para cuidar de seu filho. Quando fica acordada durante a noite, ela abre mão de seu
interesse de descansar para satisfazer o interesse em carinho e atenção que o filho tem.
Quando damos esmola também estamos sendo altruístas. Ao invés de gastar nosso
dinheiro satisfazendo nossos desejos, preferimos ajudar o pedinte a realizar os dele. Há
muitos casos menos contundentes de altruísmo. Na verdade, ao viver em sociedade,
somos altruístas cotidianamente. Quando cumprimos a promessa de ajudar ao colega no
trabalho da faculdade, quando damos carona para um conhecido, quando fazemos uma
visita àquele parente chato, quando aturamos os amigos de nossa namorada, quando
ajudamos uma velhinha a atravessar o sinal, quando não xingamos a moça do
telemarketing etc. Em todos esses casos seria melhor para nós passar por cima do
interesse dos outros, tornaria nossa vida mais fácil, mais cômoda ou ganharíamos tempo
para fazer outra coisa que nos daria mais prazer. Mas não, preferimos levar o interesse
dos outros em consideração. Isso é ser altruísta.
Esses padrões surgiram e continuam a surgir para permitir que consigamos lidar
com situações em que nossos interesses são diferentes dos de outras pessoas. Como foi
dito, a moralidade trata da definição do que é certo e errado em relação ao tratamento
dado a outras pessoas, quer dizer, o que devemos uns aos outros. Portanto, seus
principais objetos são ações ou atos, coisas que fazemos. Em certos contextos,
entretanto, ela pode tratar de intenções, atitudes ou emoções. Ela é um conjunto de
padrões informais porque não há regras escritas, autoridades oficiais para definir quem
está certo e quem está errado nem há punições controladas, diferentemente do Direito
(que também é um conjunto de padrões sobre como se comportar, especialmente em
relação a outras pessoas).
Um dos principais mecanismos da moralidade para garantir a cooperação é a
confiança. Confiar em alguém é acreditar que ele será altruísta nas situações em que se
espera isso dele. Confiar em um médico é acreditar que ele vai cuidar bem da sua saúde,
que ele dará preferência aos interesses do paciente mesmo que isso signifique lucrar
menos, por exemplo. Boa parte da nossa vida social consiste em tentar descobrir quem
merece nossa confiança: o vendedor de carros pode estar mentindo, a namorada pode
estar nos traindo, o amigo pode estar me agradando apenas para se aproximar da minha
irmã, o colega me trata bem mas fala mal de mim pelas costas etc. Por outro lado,
também gastamos boa parte de nossas energias tentando convencer as outras pessoas de
que somos confiáveis, isto é, queremos ter uma boa reputação: não nos atrasamos para
16
o cinema, devolvemos o livro que pegamos emprestado, não cobiçamos as mulheres (os
maridos) dos(as) amigos(as) etc.
Para pode conviver com outras pessoas, é preciso saber o que se deve esperar
delas. A confiança e a reputação são mecanismos sociais que ao que tudo indica se
desenvolveram para tornar as pessoas mais previsíveis. E a fofoca é justamente a troca
de informações que parece ter como objetivo identificar em quem se deve confiar e em
quais situações. É ela que constrói as reputações. O interessante é que isso não pode ser
feito de maneira muito explícita, pois pareceria uma desconfiança exagerada.
Escolhemos muito bem para quem contamos fofocas, pois não queremos que pensem
que somos fofoqueiros. É muito comum as pessoas defenderem em público “que não
devemos julgar os outros”. Mas estamos sozinhos com pessoas em quem confiamos, um
dos principais tópicos de conversa é “falar da vida dos outros”.
A moralidade, portanto, é o conjunto de regras, práticas e sentimentos que os
indivíduos seguem cotidianamente. Mas algumas vezes os indivíduos começam a pensar
sobre essas regras, práticas e sentimentos. Eles podem começar a questioná-los e
investigar se haveria maneiras melhores de organizar a vida em sociedade. A ética,
entendida como o estudo da moralidade, é justamente essa atividade. Suas principais
tarefas são explicar como a moralidade funciona e identificar quais regras morais (ou
sentimentos, práticas etc.) são mais justificadas. Ela procura responder se o roubo é
sempre errado, se há justificativas aceitáveis para a tortura, se o aborto deve ser
permitido, se deve haver cotas para negros, portadores de deficiência ou pobres nas
empresas, nas câmaras e nas universidades, se o cliente tem sempre razão, se há alguma
situação em que o profissional pode enganar o cliente etc. O que faz com que o
assassinato, o roubo, o estupro, a crueldade e a escravidão sejam errados? É sempre
errado descumprir uma promessa? É certo baixar músicas da internet sem pagar?
Devemos dar esmolas? Temos o direito de recusar a doar um rim para um amigo? O
MST está errado quando invade terras improdutivas? Devemos permitir que as pessoas
se prostituam? É justo que pessoas saudáveis de 60 anos não paguem passagens de
ônibus? É imoral conversar no celular enquanto dirigimos? E jogar papel de bala no
chão? Um médico deve esconder informações de seu paciente para evitar sofrimento?
Um advogado tem a obrigação de usar as falhas da lei para ajudar seu cliente? É sempre
errado trair a namorada? Temos a obrigação de dar a outra face?
Entretanto, há outra maneira de definir a moralidade, a abordagem de
mecanismos, focada nos mecanismos biológico e psicológicos que tornaram a
17
moralidade possível. E há dois níveis desses mecanismos, aqueles que tornam possível a
moralidade pessoal (ou em primeira pessoa) e aqueles que tornam possível a moralidade
impessoal (em terceira pessoa) (TOMASELLO; VAISH, 2013; BAUMARD; ANDRÉ;
SPERBER, 2013).
Segundo a abordagem de mecanismos, a moralidade é uma capacidade mental
que alguns animais possuem e outros não. Quase todos os seres humanos a possuem,
com exceção das crianças com menos de três anos, os psicopatas e os deficientes
mentais graves. Os mecanismos da moralidade de primeira pessoa incluem sentimentos
como a empatia, a vergonha, a culpa, gratidão e a indignação moral. Os mecanismos da
moralidade de terceira pessoa adicionam a esses sentimentos morais a capacidade de
reconhecer e se preocupar com regras culturais. A principal diferença é que na
moralidade pessoal você sente raiva apenas de seu agressor, enquanto que na
moralidade impessoal ou de terceira pessoa você sente raiva também de quem agride
outra pessoa que não você – p. ex., o fotógrafo que não salvou o homem nos trilhos – e
sente admiração por quem beneficia outras pessoas, mesmo que você não ganhe nada
com isso – como no caso do jovem tibetano.
Atualmente há muitas evidências de moralidade de primeira pessoa em outros
animais (ROWLANDS, 2012), mas pelo menos até o momento ainda não há evidências
contundentes de que animais não-humanos possuam moralidade de terceira pessoa
(RIEDL et al. 2012; mas veja VON ROHR, 2012). A suposição dominante é a de que é
preciso possuir razoável capacidade de abstração para adotar a perspectiva de terceira
pessoa.
Uma maneira muito utilizada pelos cientistas para definir o que é a moralidade
de terceira pessoa e quem a possui é por meio da distinção moral-convencional. Uma
regra convencional é aquela que depende da vontade de uma autoridade, não vale para
todos e em todos os tempos (quer dizer, não é universal) e não é considerada muito
séria. P. ex., comer salada com as mãos, usar pijamas na escola, assistir TV sentado no
chão. Por sua vez, regras morais são aquelas que independem da vontade de uma
autoridade, são universais e consideradas muito sérias. Seres humanos em geral são
capazes de diferenciar esses dois tipos de regras, mas alguns não (crianças de menos de
3 anos, psicopatas etc.). Portanto, para a abordagem dos mecanismos, no nível pessoal,
a moralidade é a capacidade de ter sentimentos tais como empatia, culpa, indignação,
gratidão etc. E a moralidade impessoal consiste na capacidade de ter esses sentimentos
18
mesmo quando não foi você quem sofreu essas ações, o que significa que você é capaz
de tratar certas regras como universais e independentes de autoridade.
Na maior parte dos casos, a abordagem de mecanismos e a abordagem funcional
coincidem, entretanto, é muito importante identificar as situações em que elas se
diferenciam. Isso acontece naquelas situações em que as emoções morais nos levam a
agir de maneira egoísta ou não-cooperativa, o que acontece principalmente quando
lidamos com indivíduos que não pertencem a nosso grupo. O caso mais evidente é
quando nossos sentimentos de afiliação nos levam a dar preferência desmedida aos
interesses de nossos familiares. Se sua mãe estivesse doente e você fosse o diretor de
um hospital público e tivesse que escolher entre usar a única UTI para salvá-la ou para
revezar os aparelhos entre cinco pacientes mais jovens do que ela, o que você
escolheria? Esse é um caso extremo, mas é o mesmo tipo de escolha que fazemos
quando decidimos dar presentes de natal para nossos amigos ou para crianças
miseráveis. Isso mostra que as emoções morais tendem a ser muito grupais (isto é, a dar
preferência para os membros de nosso grupo), fazendo com que tomemos decisões que
não são as melhores do ponto de vista imparcial (mais cooperativas, mais altruístas
etc.).
Outra discordância entre as duas abordagens, é que a abordagem funcional
tradicionalmente inclui apenas ações que podem prejudicar ou ajudar outros indivíduos,
relacionadas ao altruísmo e à cooperação. Todavia, há pesquisadores que defendem que
os mecanismos psicológicos que levam à moralidade de terceira pessoa incluem
também ações relacionadas à pureza, respeito à hierarquia e lealdade ao grupo (HAIDT,
2007; HAIDT, 2012). Vamos chamar a abordagem que inclui esses outros fatores de
abordagem expandida da moralidade, em contraste com abordagem restrita, que se
limita a regras sobre altruísmo e cooperação. Como será visto quando discutirmos
questões como direitos homossexuais e eutanásia, há pessoas que adotam a moralidade
expandida e outras que adotam a moralidade restrita. Por isso, é importante ter essa
diferença em mente.
Contudo, há um razoável consenso entre os pesquisadores da área de que as
regras sobre altruísmo e cooperação formam o núcleo da moralidade, sua parte mais
significativa, pois sem ela a sociedade não seria possível. Portanto, embora a definição
baseada em mecanismos seja importante por suas advertências, a definição funcional é
aquela que capta o que é mais significativo na moralidade. Então, na maior parte das
vezes, moralidade deve ser entendida como um conjunto de padrões informais (valores,
19
regras, sentimentos, instituições etc.) sobre quando o egoísmo é inaceitável, isto é,
quando o altruísmo é obrigatório. Essa é a definição da moralidade vista de fora, visto
de dentro, o núcleo da moralidade é o que costuma ser chamado de “motivação moral”:
o interesse em dar preferência para o interesse de outro indivíduo.
É importante notar que nem todo egoísmo e nem toda competição são ruins. Para
sobreviver, é preciso que os indivíduos deem certa prioridade a seus interesses. A
questão decisiva é quando e quanta prioridade dar a esses interesses. A regra cristã de
tratar o próximo como a si mesmo é justamente uma tentativa de acabar com todo o
egoísmo. Mas ela é exigente demais, ninguém consegue seguir essa regra o tempo todo.
Por isso, na prática, há um consenso tácito de que nem sempre é errado ser egoísta. Na
realidade, consideramos justificado dar mais valor aos nossos interesses em uma grande
quantidade de situações. É justo que eu fique com a maior parte do meu salário para
mim, ao invés de doar tudo para a caridade. É compreensível que eu não ajude meu
colega de faculdade com seu trabalho se isso for me atrapalhar a estudar para a prova.
Dá para entender se eu disser não à moça do telemarketing que me liga no meio da tarde
oferecendo um serviço que não vale a pena do meu ponto de vista, mesmo que para ela
fosse melhor se eu aceitasse. Não tenho a obrigação de dar carona para todo mundo que
me pede etc. Faz parte da vida social que cada um esteja mais preocupado em defender
seus interesses primeiro e isso significa deixar de lado os interesses dos outros. O difícil
é saber quando é errado ser egoísta, em outras palavras, quando temos a obrigação de
ser altruístas. A linha que separa o que é certo e errado, moral e imoral, ético e antiético
é muito nítida a maior parte do tempo, mas há situações em que é difícil identificá-la. E
a principal tarefa aqui é aprender a identificar as melhores decisões nessas situações.
O primeiro passo é perceber que o que torna uma ação moral ou imoral, certa ou
errada, que faz com que o egoísmo seja ou não aceitável em determinada situação, é o
fato de termos ou não boas razões para fazermos o que fizemos. Devemos ser capazes
de convencer as outras pessoas que temos bons motivos para fazer o que fizemos. É
preciso justificar o que foi feito. E dar justificativa é dar razões, dizer por que você fez o
que fez. Até mesmo algo tão grave quanto matar alguém pode ser justificado em
determinada situação, se houver uma boa justificativa, se você der uma boa razão para
ter feito o que fez. Para saber se uma ação foi correta ou não é preciso saber quais as
razões que levaram o agente a realizá-la. O roubo em geral é errado, mas não se foi um
pai que roubou a pedra de crack do filho para tentar tirá-lo do vício. Nesse caso, ele está
justificado. É justamente essa capacidade de oferecer razões que faz a passagem da
20
moralidade pessoal para a moralidade impessoal porque na maior parte das vezes as
razões mais fortes são justamente aquelas que apelam para regras culturais. Isso
acontece porque um dos principais fatores que fazem com uma regra se transforme em
uma tradição ou hábito é sua capacidade de evitar ou solucionar conflitos.
Como foi dito no início, há muitos estudos científicos mostrando que nossas
posições morais são baseadas mais em sentimentos inconscientes do que raciocínios
conscientes (HAIDT; KESEBIR, 2010). É como se a moralidade tivesse duas partes, a
parte privada da moralidade (a moralidade pessoal) consiste simplesmente em ser capaz
de ter sentimentos morais, enquanto que a parte pública da moralidade consiste em ser
capaz de justificar suas ações (a moralidade impessoal). Duas das questões mais
acaloradas entre os especialistas em ética são (1) saber qual delas merece o nome de
moralidade, a parte privada ou a parte pública, e (2) saber se a argumentação (a parte
pública) é capaz de modificar os sentimentos morais (a parte privada). Minha resposta à
primeira questão é que a moralidade é composta por essas duas partes, pois embora a
moralidade impessoal precise da moralidade pessoal para existir e esta seja mais
determinante, a sofisticação da vida social humana só existe por causa da moralidade
impessoal. Nossa capacidade de passar de uma moralidade pessoal a uma moralidade
impessoal depende muito de instituições como o sistema judiciário, a polícia, processos
democráticos, imprensa, religiões, acordos comerciais etc. O fato de estarmos
vinculados a essas instituições nos força a adotar o ponto de vista de outras pessoas,
misturando o conjunto informal de regras que é a moralidade com sistemas mais
formais de regras como são os que sustentam essas instituições.
Quanto à questão de se a argumentação é capaz de modificar os sentimentos
morais, minha resposta é que sim. Por exemplo, eu parei de comer carne e de ser
homofóbico por causa de raciocínios morais. Contudo, esse processo é muito mais
complicado do que os pesquisadores supunham até há poucos anos. Em resumo, não
mudamos nossos sentimentos morais logo depois que somos convencidos em uma
argumentação, mas sim aos poucos, passando por diferentes experiências (filmes,
reportagens, conversas, lendo relatos etc.), prestando atenção a detalhes que não víamos
etc. É preciso que haja um tempo para reorganizar nossa rede de crenças. Mas esse
processo ainda é muito pouco conhecido. Os cientistas estão debruçados sobre esse
problema nesse exato momento (HAIDT, 2012; PRINZ, 2008).
21
A maneira mais fácil de tornar a ética um assunto chato é agir como se as
respostas fossem fáceis ou como se tivéssemos todas as respostas. Não estou aqui para
impor minha opinião a você. Por isso, é melhor não esconder que sou ateu, considero a
ciência nossa forma mais confiável de conhecimento, não acredito em almas, espíritos
ou vida após a morte, defendo a legalização do aborto, acho que a eutanásia pode ser
justificada em alguns casos, que as cotas sociais são melhores que as raciais, que o bolsa
família é um bom programa apesar dos defeitos, que matar animais não-humanos para
comer é errado, que casais homossexuais devem ter os mesmos direitos que casais
heterossexuais e mais uma série de posições que você talvez considere incrivelmente
erradas. Mas meu objetivo aqui não é te convencer, mas sim te dar algumas ferramentas
para pensar por si mesmo.
Para isso, o próximo capítulo é dedicado a entender como funciona a
argumentação moral, como reconhecer argumentos morais, quais os principais tipos de
falácias que acontecem em discussões morais e como montar seus próprios argumentos.
Se o primeiro capítulo é dedicado à parte racional da moralidade, o capítulo seguinte se
debruça sobre como funciona nossa psicologia moral, como ela surgiu, o papel dos
sentimentos morais e quais os principais vieses a que estamos sujeitos.
Como eu disse acima, o objetivo aqui não é te convencer de nenhuma posição
moral, mas te ajudar a pensar por si mesmo. Observe então que no primeiro capítulo
serão estudadas as falácias (erros de raciocínio) e no segundo capítulo serão estudados
os vieses (erros sistemáticos provocados pela maneira nossa mente funciona). Se
conseguirmos evitar esses dois tipos de erro, mesmo que discordemos, nossos
argumentos serão melhores. O que é bom não apenas para quem está discutindo, mas
também para quem está observando o debate.
22
Capítulo 2- A Argumentação Moral
Imagine que você está andando na rua quando, de repente, vem um sujeito e te
dá um murro na orelha. Você cai no chão, sentindo uma dor absurda. Assim que se
recupera, vai se levantando, o camarada ainda está parado ali te olhando, você nunca o
tinha visto. “Por que você fez isso?”, você pergunta. Ele responde displicentemente,
“não sei”.
É para evitar situações malucas como essa que existe a argumentação. Meu pai
dizia que “porque sim” não é resposta. E ele tinha razão, para vivermos juntos é preciso
oferecer boas razões. Boa parte de nossas conversas na vida cotidiana consiste em expor
as justificativas para as coisas em que acreditamos e que fazemos ou avaliar as coisas
em que outras pessoas acreditam e o que elas fazem. Qual o melhor restaurante da
cidade? Vale a pena comprar um IPhone? Por que a gasolina aumentou de novo? E
muito mais frequentemente do que você imagina, essas são discussões éticas, isto é,
sobre qual a justificativa para suas ações. Por que os filhos devem ir dormir na hora em
que os pais determinam? Por que a multa de trânsito do fulano de tal foi injusta? A
namorada tem direito de exigir que o namorado não saia sozinho com os amigos? Há
debates éticos nos bares, onde os homens defendem que eles podem trair, mas suas
mulheres não; nas delegacias, onde os pivetes justificam seus roubos e os policiais o
espancamento de torcedores; nas padarias e filas de ônibus às sete da manhã, onde os
eleitores criticam os políticos etc.
E os debates éticos acontecem por causa das discordâncias morais, o fato de que
as pessoas discordam sobre qual é a resposta certa para muitas questões morais. Uma
mulher deve ter o direito de se prostituir? As pessoas devem ter o direito de se drogar?
Deve ser proibido abortar? Os pedófilos devem ser castrados? Você tem a obrigação de
dar esmola? Você deveria doar seu rim para o seu vizinho?
É comum definir o ser humano como o “animal racional” (ARISTÓTELES,
2002). Embora não sejamos tão racionais quanto se supôs por boa parte da história, de
fato, somos capazes de ser racionais em várias situações e nenhum animal tem essa
capacidade tão desenvolvida quanto nós. Racionalidade significa justamente ser capaz
de identificar razões e apresentá-las aos outros, em outras palavras, significa ser capaz
23
de argumentar, de estabelecer raciocínios. Um chimpanzé nunca se justifica diante de
outro, nunca diz "eu só bati em você porque você me provocou antes".
A vantagem da argumentação é que ela substitui a violência. Se não fosse
possível dialogar, convencer e estabelecer consenso, a única maneira de resolver os
conflitos seria através do suborno, da força e da ameaça. Venceria sempre quem tivesse
mais poder, não quem tivesse mais razão.
A vida social é permeada por conflitos entre os indivíduos e não apenas em
relação a questões morais. Pare para pensar: discordamos sobre qual o melhor programa
de televisão, sobre qual é a alimentação adequada, qual o melhor candidato a deputado,
quais as mudanças que o técnico deve fazer no time, qual é a atriz mais bonita etc.
Nossa vida seria horrível se tivéssemos que resolver tudo com base na violência. Para
nossa sorte, somos capazes de expor nossas razões, justificar nossas opiniões e
convencer as outras pessoas. Mas também de ouvir as razões alheias e mudar nossas
opiniões quando elas não estão bem fundamentadas.
Por isso, é importante ser capaz de avaliar e construir argumentos, são eles que
justificam nossas crenças, atitudes e comportamentos. Todavia, como existem bons e
maus argumentos, é preciso saber distingui-los. Não existe maneira simples de fazer
isso, pois existem vários tipos de razões e o valor delas é bastante sensível ao contexto.
Isso, porém, não impede que haja alguns conselhos gerais capazes de ajudar muito nessa
tarefa. É esse o propósito deste capítulo. O objetivo é entender melhor os argumentos
morais, mas para facilitar essa tarefa, começaremos com observações sobre argumentos
em geral. Antes de começar, é importante observar que há dois tipos de argumentos
morais, os argumentos a partir de regras morais e os argumentos a favor de regras
morais. Os argumentos do primeiro tipo decidem o que é certo baseando-se em uma
regra já aceita e são os mais comuns nos debates cotidianos. Por outro lado, os
argumentos do segundo tipo defendem qual é a melhor regra para decidir entre certo e
errado e eles são os mais complicados. Por isso, começaremos pelos argumentos mais
simples.
2.1. A estrutura básica dos argumentos
O objetivo principal de um debate ou de uma argumentação é apresentar e
identificar razões. Elas são afirmações apresentadas em favor de outra afirmação
(VAUGHN, 2008, p. 10-11). Isso significa que um argumento é um conjunto de
24
afirmações em que algumas afirmações (as premissas) são apresentadas como base para
se acreditar em outra afirmação (conclusão). O que é mesmo que dizer que as premissas
são as afirmações (razões) dadas em favor de outra (conclusão) e a conclusão é a
afirmação que se pretende que seja baseada nas premissas.
Todo argumento é composto de uma ou mais premissas e uma conclusão. Como
afirmações são indicações de fatos, uma premissa (ou razão ou afirmação) é a
apresentação de um fato já aceito para que se acredite em outro fato (conclusão).
Portanto, uma boa razão é um fato capaz de mostrar que outro fato é verdadeiro – dito
de outra forma, uma afirmação capaz de mostrar que outra afirmação é verdadeira.
Há argumentos com apenas uma premissa e outros com várias conclusões, mas
eles são a exceção, o mais comum é que haja duas ou mais premissas e uma conclusão.
Os casos fáceis são aqueles em que quem está falando diz coisas como "minha opinião
é...", "por isso, penso que..." etc. Ou em que podemos considerar que isso está dito de
maneira implícita. Considere os seguintes exemplos:
•
•
•
•
•
•
Eu considero a escravidão um absurdo, não importa em qual situação, nenhum ser humano
deve ser tratado como uma coisa.
Podem me criticar à vontade, mas eu acho é bom quando um estuprador ou pedófilo é
estuprado na cadeia, o que eles fizeram é horroroso, só a cadeia é pouco!
O Direito Civil é a parte mais apaixonante do Direito, é ela que ensina como resolver os
conflitos cotidianos entre os interesses das pessoas.
É melhor prevenir do que remediar, depois que o mal está feito, não há o que fazer
O Direito Civil é a parte mais apaixonante do Direito!
A água é composta de moléculas formadas por átomos de hidrogênio ligadas a um átomo de
oxigênio
Nos dois primeiros exemplos há expressões indicando que se trata de alguém
defendendo seu ponto de vista. Nos dois exemplos seguintes, também há a apresentação
de uma opinião e a apresentação de uma razão a seu favor. Embora nesses casos não
haja expressões avisando que se trata da opinião de alguém, podemos considerá-las
implícitas: "(eu acho) o Direito Civil a parte....", "(minha opinião é que) é melhor
prevenir...". Nos dois últimos exemplos, entretanto, não há razões que apoiam
afirmações, a pessoa apenas expressa sua opinião, mas não a defende.
Para ficar claro, considere a seguinte lista de frases:
•
•
•
•
•
Quando cheguei em casa, passei rapidinho no banheiro, peguei alguma coisa na geladeira,
comi e cochilei.
A máquina de lavar está ligada, mas você pode desligar se quiser.
Ela já não me ama mais. Mas eu também não estou triste, pensei que seria pior.
Você já foi à Bahia?
Primeiro você pica a cebola e põe na panela já quente, só depois é que os legumes são
colocados.
25
Nenhuma dessas frases é um argumento. Elas são explicações, descrições e tem
até uma pergunta. Elas não são defesas de um ponto de vista. Entretanto, o interessante
é que todas elas, como quase todas as frases, podem se transformar em um argumento,
basta que sejam usadas para fundamentar outra afirmação. Veja:
•
•
Não fui eu quem usou o computador por último. Quando cheguei em casa, passei rapidinho
no banheiro, peguei alguma coisa na geladeira, comi e cochilei, pode perguntar para o
Cléber.
Amigo, você está dizendo que Florianópolis é o lugar mais bonito do Brasil, mas você já foi
à Bahia?
Então, como já foi dito, um argumento (ou silogismo) é uma sequência de
raciocínio feita para provar algo. É uma tentativa de fornecer evidências ou motivos
para sustentar uma determinada afirmação. As premissas podem conter razões,
evidências, fatos, dados, informações etc. Por exemplo:
P1- Toda cidade brasileira tem uma praça com Igreja.
P2- Ouro Preto é uma cidade brasileira.
C- Logo, Ouro Preto tem uma praça com Igreja.
Nesse exemplo há duas premissas (P1 e P2) e uma conclusão (C). Além disso, a
conclusão segue-se logicamente das premissas. Infelizmente, nem sempre as coisas são
tão claras assim. Veja os dois exemplos seguintes:
P1- Toda cidade tem mais de 10 habitantes.
P2- Ouro Preto fica em Minas Gerais.
C- Logo, Ouro Preto tem uma vida noturna agitada.
P1- Toda cidade paulista é cortada por setes rios.
P2- Ouro Preto é uma cidade paulista.
C- Logo, Ouro Preto é cortada por sete rios.
O que há de estranho nesses argumentos? No primeiro caso, as premissas e a
conclusão são verdadeiras, mas a conclusão não se segue delas. No segundo caso
acontece o contrário, embora tanto as premissas quanto a conclusão sejam falsas, a
conclusão se segue daquelas premissas. Para registrar essas diferenças, os argumentos
são chamados de válidos ou inválidos e sólidos ou infundados. Um argumento cuja
conclusão se segue das premissas é válido. Porém, para ser sólido um argumento precisa
de algo mais além da validade, é preciso também que suas premissas sejam verdadeiras.
A regra é: todo argumento sólido é válido, mas nem todo argumento válido é sólido.
26
O que significa dizer que o argumento é válido ou, em outras palavras, que a
conclusão “se segue” das premissas? Em lógica, essa não é uma expressão vaga, ela tem
um significado bastante preciso. Ela significa que seria impossível que as premissas
fossem verdadeiras e que, ao mesmo tempo, a conclusão fosse falsa. Se é verdade que
toda cidade brasileira tem uma praça com uma Igreja e que Ouro Preto é uma cidade, é
impossível que Ouro Preto não tenha uma praça com Igreja.
Em resumo, ao analisar um argumento é preciso fazer três coisas:
1- Identificar as premissas e a conclusão.
2- Verificar se as premissas são verdadeiras.
3- Verificar se a conclusão se segue das premissas.
2.2. Reconhecendo argumentos
Reconhecer argumentos é mais difícil do que pode parecer. Eles aparecem em
textos, conversas e até mesmo em imagens. Mas nem todo texto ou fala é
argumentativo. Há casos em que as pessoas estão apenas descrevendo algo que
aconteceu, fazendo perguntas ou dando ordens. A diferença entre os argumentos e esses
outros tipos de frase é que a argumentação procura convencer alguém de alguma coisa.
Portanto, argumentar é oferecer razões, isto é, oferecer afirmações em favor de outras
afirmações. São os argumentos sólidos ou convincentes que fazem o conhecimento
avançar, partindo de afirmações conhecidas (isto é, que sabíamos que eram verdadeiras)
para afirmações que ainda não conhecíamos (isto é. que não sabíamos se eram ou não
verdadeiras).
Uma afirmação (ou crença) é uma indicação de que algo é ou não verdadeiro.
Por exemplo:
•
•
•
•
Minha mulher está me traindo.
O homem foi à lua.
O Barcelona é melhor do que o Cruzeiro.
Mentir é errado.
Exemplos de enunciados que não são afirmações, pois não indicam que algo seja
ou não verdadeiro:
•
•
•
•
Você está doente? (interrogação)
Oi! (cumprimento)
Cale a boca! (imperativo)
Santa paciência! (exclamação)
Observe a seguinte descrição:
27
•
A Silvia ama o João desde que se conheceram em Goiânia. Ela morava com seus pais,
Dona Célia e Seu Tião. O bairro deles eram muito calmo e bonito.
Não há argumento nesse trecho, ele apenas descreve alguns fatos do passado de
Sílvia. No entanto, basta uma frase para que isso se torne um argumento.
•
A Silvia ama o João desde que se conheceram em Goiânia. Ela morava com seus pais,
Dona Célia e Seu Tião. O bairro deles era muito calmo e bonito. E Joana largou tudo isso
para se mudar com João para Manaus, onde ele havia conseguido um emprego, que nem era
tão bom assim. Uma dessas coisas que só o amor pode explicar.
As duas novas frases são oferecidas como razões para acreditarmos que Sílvia
ama João. O fato de que ela deixou a vida confortável em Goiânia para se arriscar em
Manaus é um sinal de que ela o ama, pois se ela não o amasse ela não teria feito isso.
Ou você consegue pensar em outros motivos? Se você disser que, mesmo que não o
amasse, ela poderia ter engravidado sem querer ou que poderia estar querendo fugir do
pai porque ele a maltratava, você estará justamente oferecendo novas razões, afirmações
das quais poderíamos inferir que ela estaria disposta a ir embora de Goiânia.
É importante notar que determinada afirmação pode ser uma boa razão para se
acreditar em X, mas não para se acreditar em Y. P. ex., a mesma afirmação é uma boa
razão no primeiro argumento abaixo e uma péssima razão no argumento seguinte:
•
•
Joel não é um bom marido. Basta dizer que ele já bateu em sua esposa duas vezes.
Joel não é bom de truco. Basta dizer que ele já bateu em sua esposa duas vezes.
Por serem tentativas de oferecer evidência ou apoio a determinada afirmação, os
argumentos normalmente contêm expressões que indicam uma conclusão, tais como:
•
•
•
•
•
•
logo, ...
portanto, ...
consequentemente, ...
então, ...
dessa maneira, ...
isso mostra/leva/indica/sugere que ...
Por sua vez, as premissas normalmente estão em frases que contenham
expressões como
•
•
•
•
porque ...
visto que ...
dado que ...
como tal e tal coisa é dessa maneira ...
Essas expressões são indicadores, sua presença é um indício de que estamos
diante de uma conclusão ou de uma premissa. Infelizmente, nem sempre há indicadores.
É preciso muita atenção porque muitas vezes tanto as premissas quanto a conclusão
28
podem estar em frases sem indicadores. Veja os exemplos e suas reformulações com as
premissas e as expressões indicadoras explicitadas:
•
Termine com ele. Aquilo não é jeito de tratar uma mulher.
Você deve terminar com ele porque ele te tratou de uma maneira que mulheres não devem ser
tratadas e você não pode aceitar ser tratada assim.
•
O azul está na moda. Compre!
Como o azul está na moda e é bom estar na moda, então você deve comprar a blusinha.
Outro fato que dificulta o reconhecimento de argumentos é que a conclusão nem
sempre vem depois das premissas, ela pode vir antes e até mesmo no meio de duas ou
mais premissas. A melhor estratégia nesses casos é tentar descobrir (1) qual afirmação
seu interlocutor está querendo defender ou (2) quais afirmações fazem mais sentido
como premissas e qual (ou quais) fica melhor como conclusão, isto, é qual serve para
estabelecer a verdade de outra e qual precisa ser fundamentada por outras afirmações.
Nos exemplos a seguir há indicações do que é premissa e o que é conclusão:
•
•
(C) O Tião é o melhor candidato a deputado porque (P1) é o mais simpático, (P2) o que se
dá melhor com os outros partidos e (P3) aquele que sabe lidar melhor com os mais carentes.
(P2) O Felipe Melo não sabe se controlar. (C) Ele não deve estar na seleção, (P1) um
jogador de seleção tem que saber se controlar.
A ordem das premissas não altera a conclusão. Porém, para dar mais clareza,
normalmente se começa pela premissa mais geral. Em relação à conclusão, a clareza é
mantida tanto com ela ao final quanto com ela ao começo, desde que seja bem
explicitada. O que deve ser evitado a todo custo é que a conclusão esteja entre as
premissas, pois isso dificulta a compreensão. Textos argumentativos bem escritos são
aqueles em que a conclusão é ou a primeira ou a última frase do parágrafo, há sempre
expressões indicativas de premissas e conclusões e todas as premissas relevantes foram
explicitadas. Isso ajuda o leitor a reconhecer melhor o argumento.
Ao procurar argumentos, é preciso estar atento à dificuldade de diferenciar
argumentos de explicações. Essa distinção é bastante sutil e consiste em que, no caso
dos argumentos, aquele com quem se está falando ainda não acredita no que você está
defendendo:
•
Explicação: procura convencer alguém sobre porque ou como algo é
verdadeiro (o interlocutor não discorda de que X seja verdadeiro). Ex.:
Ele a matou porque a pegou com outro na cama.
É uma explicação de por que ele a matou. O interlocutor não está
questionando se foi ele ou não quem a matou.
29
•
Argumento (ou justificação): procura convencer algo de que algo é
verdadeiro (o interlocutor discorda de que X seja verdadeiro, ainda não
decidiu). Nesse caso, o interlocutor ainda está em dúvida sobre quem matou
a mulher e então um argumento é oferecido:
Foi ele quem a matou. Ela a pegou com outro na cama e ninguém mais tinha motivo para
matá-la.
2.3. Dedução e Indução
O grau em que as premissas apoiam a conclusão pode variar. Em alguns casos as
premissas não provam absolutamente que a conclusão seja verdadeira, mas fornecem
dados que tornam isso muito provável:
P1- Chico foi visto discutindo com Sílvia alguns minutos antes de ela ter sido
morta com uma faca.
P2- A faca encontrada no local tem as impressões digitais de Chico.
C- Logo, Chico matou Sílvia.
Mesmo que se tenha a garantia de que as premissas sejam verdadeiras, apenas a
partir dessas informações não é possível afirmar com certeza que a conclusão é
verdadeira. É possível que essas premissas sejam verdadeiras e a conclusão seja falsa.
Fernando, seu amante, que não aparecera ainda na história, pode tê-la matado com outra
faca, ter sido esfaqueado por Chico, mas mesmo assim conseguiu fugir levando Chico
como refém. Contudo, na ausência de novos indícios (novas premissas) que sugiram
uma história diferente, é provável que tenha mesmo sido Chico quem matou Sílvia.
Nesse tipo de situação, os dados aumentam a probabilidade de a conclusão ser
verdadeira.
A passagem de uma afirmação à outra, das premissas à conclusão, é o processo
conhecido como raciocínio – que pode ser dividido em dois tipos principais. A dedução
é o tipo de raciocínio em que a conclusão segue-se com certeza a partir das premissas. A
indução (ou inferência) é o raciocínio no qual as premissas apenas aumentam a
probabilidade de que a conclusão seja verdadeira. Por exemplo:
•
•
•
Se A é maior do que B e B maior é maior do que C, então deduz-se que A é maior do C.
Se a esmola é demais, o santo desconfia. (indução)
Se a esposa encontra marcas de batom na gola da camisa do marido e elas são de uma cor
diferente das de seus batons, então ela infere que ele está tendo um caso. (indução)
30
Alguns argumentos, mesmo sendo inválidos do ponto de vista da dedução (isto
é, suas premissas não garantem a verdade da conclusão), fornecem alguma base para a
conclusão. P. ex., do fato de que o sol tenha nascido ontem e anteontem e
anteanteontem etc. não podemos concluir com certeza que ele nascerá amanhã. Mas,
como isso se repetiu tantas vezes no passado, é provável que isso aconteça no futuro, se
tudo mais permanecer igual. Para dar valor a esse tipo de argumentação, é preciso usar
outro padrão de avaliação: o raciocínio indutivo. Seu critério é a força. Um argumento
indutivo convincente mostra que a conclusão é altamente provável caso as premissas
sejam verdadeiras. Embora os argumentos dedutivos admitam apenas duas avaliações,
válido ou inválido, os argumentos indutivos se distribuem em uma gradação, eles
podem ser mais ou menos convincentes.
Recapitulando: uma afirmação ou proposição é uma sentença que pode ser
verdadeira ou falsa, um argumento é conjunto de afirmações com pelo menos uma
premissa e uma conclusão (as premissas são as afirmações que fornecem razões ou
evidências da verdade da conclusão). Argumentos dedutivos são aqueles em que a
premissa garante a verdade da conclusão e argumentos indutivos são aqueles em que as
premissas fornecem razões para que a conclusão seja provavelmente verdadeira. Um
argumento é dedutivamente válido quando é impossível que sua conclusão seja falsa e
suas premissas sejam verdadeiras. Um argumento sólido é aquele que é dedutivamente
válido e que possui premissas verdadeiras (o argumento infundado é aquele que é
inválido ou que possui alguma premissa falsa). Um argumento forte é um argumento
indutivo cujas premissas apoiam suficientemente que a conclusão seja provavelmente
verdadeira. Essa força é uma questão de grau, ele pode ser mais ou menos forte ou
fraco. Um argumento convincente é um argumento forte cujas premissas são todas
verdadeiras (e um argumento não-convincente é aquele que possui pelo menos uma
premissa falsa, seja ele forte ou fraco) (BRUCE; BARBONNE, 2011).
2.4. Premissas Implícitas
Às vezes, nem todos os passos de um argumento são ditos, o argumentador pode
dar por certo que seu interlocutor já sabe certas coisas. Não temos dificuldade em
entender alguém que diz "você deve diminuir a velocidade, o limite de velocidade aqui
é 110 km/h", mas, para fazer sentido é preciso que esse argumento inclua como
31
premissas algo como "as leis de trânsito devem ser respeitadas", "o limite de velocidade
é uma lei de trânsito" etc. A mesma coisa acontece em vários argumentos:
•
É melhor você parar de beber, sua mãe não iria gostar de te ver nesse estado.
•
Se ele disse que torce para um time grande do sudeste e que é rubro-negro, então ele é
flamenguista.
•
Se ele disse que torce para um time grande de Minas, então ele só pode ser cruzeirense.
•
Ju malha há 2 anos, o marido dela não. Ju corre 20 minutos todos os dias. Ju faz sexo 3
vezes por semana, o marido dela não.
As premissas ocultas nesses casos são tão óbvias que nem percebemos que está
faltando algo. Já no penúltimo exemplo, o fato de que a premissa oculta é falsa, chama
nossa atenção rapidamente – o que pode ter sido um simples erro ou uma ironia.
Um argumento forte é aquele em que todas as premissas são aceitas e em que a
conclusão se segue delas. Muitas vezes uma pessoa não aceita determinado argumento
porque não consegue reconhecer quais premissas ocultas que ele possui. Por isso, ao
montar seus argumentos, procure explicitar todas as premissas que sustentam seu
raciocínio.
2.5. A argumentação moral
O que diferencia os argumentos morais de outros argumentos é que suas
conclusões são afirmações morais (VAUGHN, 2008, p.444). Em geral, uma afirmação
moral é uma afirmação de que uma ação é certa ou errada ou de que algo (uma pessoa,
uma intenção etc.) é bom ou mal. A afirmação também pode se dar em termos de
moral/imoral, ético/anti-ético, justo/injusto, virtuoso/perverso etc. Ou ainda, a afirmação
pode ser feita usando a linguagem dos direitos, de maneira que ao dizer “você não tem o
direito de falar assim comigo” a pessoa tem a intenção de dizer que “é errado falar dessa
maneira comigo” – mas não “o art. X do Código Civil diz...”, pois caso contrário, isso
seria um argumento jurídico e não um argumento moral. Veja alguns argumentos
morais e os compare com os argumentos não-morais:
•
Moral: Toda pessoa merece respeito. Queimar alguém de propósito é um desrespeito
imenso. Portanto, os adolescentes que queimaram o mendigo estão errados.
32
•
•
•
•
•
Não-moral: O fogo queima. Se colocaram fogo no mendigo, então ele se queimou.
Moral: É imoral comer carne de boi, eles sentem dor e é sempre errado provocar dor por
motivos fúteis.
Não-moral: Todo organismo que possui consciência e nociceptores sente dor. Como os bois
possuem as duas coisas, então eles sentem dor.
Moral: Eu estava certo em não contar sobre o câncer para minha vó porque não havia mais
nada a fazer e devemos sempre que possível evitar causar sofrimento.
Não-moral: Quando diversos sistemas biológicos começam a falhar, não nada a fazer. Esse
foi o caso da minha avó.
Há dois níveis de análise moral sobre os comportamentos, as pessoas e as
intenções: quando os vemos de fora e quando estamos nós mesmos moralizando. O
primeiro caso é o nível descritivo (ou não-moral), quando indica-se apenas como
alguém se comporta, pensa etc. Já no nível normativo (ou prescritivo ou moral) a
indicação é de que como alguém deveria se comportar, pensar etc. Em uma se diz como
as coisas são, em outra, como elas deveriam ser. Compare as seguintes afirmações:
•
•
•
•
Descrição: Em países muçulmanos as mulheres são submissas a seus maridos.
Descrição: O Brasil é um país machista.
Prescrição: Toda mulher deve ser submissa ao marido.
Prescrição: A mulher que não se submete ao marido está errada.
A análise descritiva faz apenas um relato, ela é sobre a moralidade, ela própria
não faz afirmações morais. Por sua vez, a análise normativa diz o que é certo ou errado,
e por isso, faz afirmações morais. Eis mais alguns exemplos:
Afirmações normativas (ou prescritivas)
•
•
•
•
A Paula deveria ter cumprido a promessa que te fez.
Mesmo depois do que ele fez, é errado maltratar o Ricardo.
O aborto é imoral em qualquer situação.
Meu pai é uma boa pessoa, apesar de tudo.
Afirmações descritivas
•
•
•
•
A Paula não cumpriu a promessa que fez.
Ricardo foi maltratado.
Há quem pense que o aborto é imoral em qualquer situação.
Meu pai tentou ser uma boa pessoa.
A estrutura básica de um argumento moral é semelhante à dos argumentos nãomorais, com a diferença de que ele precisa ter ao menos uma premissa moral e a
conclusão precisa ser uma afirmação moral. Eis sua estrutura básica:
PM- Toda a ação que possui a característica X é errada (certa)
PNM- Essa ação possui a característica X.
CM- Logo, está ação é errada (certa).
33
PM- premissa moral: pelo menos uma premissa é uma afirmação moral que contém um princípio
ou padrão moral, isto é, uma afirmação geral sobre o que é certo ou errado.
PNM- premissa não-moral: pelo menos uma premissa que faz uma afirmação não-moral.
CM- conclusão moral: uma conclusão que faz uma afirmação moral sobre um caso específico
(isto é, uma afirmação particular).
Por exemplo:
PM- É errado causar sofrimento desnecessário em uma criança.
PNM- Uma surra de cinto causa sofrimento desnecessário em uma criança.
CM- Logo, surras de cinto são imorais.
Um ponto muito importante a ser notado é que para chegar a uma conclusão
moral é preciso que haja uma premissa moral (VAUGHN, 2008, p. 445-446). A não ser
em argumentações muito teóricas, é simplesmente impossível estabelecer uma
conclusão moral sem uma premissa moral. Veja os argumentos abaixo e suponha que
eles não possuem premissas implícitas:
•
•
Uma surra de cinto causa sofrimento desnecessário em uma criança. Logo, surras de cinto
são imorais.
Torturar criminosos é um tipo de agressão. Criminosos não devem ser torturados.
Nos dois casos, a premissa não diz nada sobre como definir certo e errado; ela
apenas faz uma afirmação descritiva, mas a conclusão afirma que algo é errado.
Portanto, em ambos os casos a conclusão é insustentável, pois ela não se segue da
premissa. Seria preciso acrescentar no primeiro caso uma premissa que afirmasse que é
errado causar sofrimento desnecessário e no segundo caso uma premissa que dissesse
que nenhum criminoso deve ser agredido.
Além disso, um argumento moral também precisa de uma premissa não moral,
pois é ela que permite ir da afirmação geral feita pela regra moral contida na premissa
moral e a afirmação moral específica contida na conclusão. P. ex., do princípio moral
geral de que “nenhum criminoso deve ser agredido” não se pode concluir que “nenhum
preso deve ser torturado” sem que haja a informação de que a tortura é um tipo de
agressão.
Essa é apenas a estrutura básica dos argumentos morais, em debates morais reais
eles são muito mais complexos: mais de uma premissa moral pode ser apresentada, de
uma premissa moral se deriva outra, as premissas não-morais podem fazer afirmações
que envolvam assuntos muito difíceis ou impossíveis de se verificar etc. Além disso, a
linguagem em que o argumento é apresentado pode ser pouco precisa, muito floreada,
com mais adjetivos do que o necessário, são feitos diversos apelos às emoções,
afirmações são feitas em forma de perguntas etc.
34
Discussões morais em geral são chatas e frustrantes porque é difícil encontrar
onde realmente estão os argumentos em meio a frases de efeitos, xingamentos e
conselhos hipócritas. Por isso, é imprescindível que ao discutir questões morais
tenhamos o máximo de clareza possível. O restante deste capítulo tenta mostrar como
lidar com alguns desses problemas.
2.6. Como identificar premissas implícitas em argumentos morais
Uma das grandes dificuldades em discussões morais é o problema das premissas
implícitas. Isso é muito comum nas discussões morais, talvez porque as pessoas tenham
tanta certeza de suas opiniões sobre certo e errado que elas as considerarem óbvias
demais para precisarem ser ditas. Mas o mais provável (como será estudado no próximo
capítulo) é que as opiniões morais não sejam baseadas em argumentos, mas sim em
intuições, sentimentos e práticas repetidas sem reflexão. Por um motivo ou por outro, os
argumentos morais costumam aparecer de forma abreviada, faltando um dos três
elementos, principalmente a premissa moral:
•
•
É errado bater de cinto no seu filho porque surras de cinto causam sofrimentos imensos nas
crianças
Ninguém tem o direito de torturar um criminoso, isso é um tipo de agressão.
Para garantir a qualidade do debate, é preciso que as premissas implícitas sejam
explicitadas para evitar confusões e conflitos desnecessários. O ouvinte pode ser levado
a supor que a premissa moral é Y quando na verdade o falante não está supondo Y, mas
sim X. P. ex., alguém pode considerar que bater no filho com um cinto é errado não por
causa da regra muito rigorosa de que “causar sofrimento é sempre errado” mas devido a
uma regra moral mais liberal segundo a qual “sofrimentos grandes e inúteis são
errados”. E esse tipo de confusão pode atrapalhar toda a discussão, porque o interlocutor
pode discordar da regra mais rigorosa, mas concordar com a mais liberal. Além disso,
princípios morais que ficam implícitos e são tidos como sólidos, podem na verdade ser
infundados ou incompletos. Para se beneficiar da crítica é preciso expor seus
argumentos de maneira clara.
A melhor maneira de identificar premissas implícitas em argumentos morais é
tratar argumentos morais como deduções (VAUGHN, 2008, p. 448; a dedução é o tipo
de argumento em que se as premissas são verdadeiras, a conclusão necessariamente é
35
verdadeira). A tarefa então é ir de trás para frente, imaginando quais as premissas mais
plausíveis que tornariam o argumento válido. Considere o seguinte argumento:
•
Fertilização in vitro em humanos é anti-natural. Por isso, fertilização in vitro em
humanos é imoral.
•
A Marcela mentiu para sua irmã sem ter um bom motivo. Portanto, a Marcela não
deveria ter mentido para a irmã dela.
Da maneira que estão estes argumentos não são válidos e é fácil de perceber que
o que está faltando é o princípio moral. Premissas plausíveis nesses casos seriam:
•
Qualquer coisa anti-natural é imoral. Fertilização in vitro humanos é anti-natural. Por
isso, fertilização in vitro humanos é imoral.
•
Não se deve mentir sem ter um bom motivo. A Marcela mentiu para sua irmã sem ter
um bom motivo. Portanto, a Marcela não deveria ter mentido para a irmã dela.
2.7. Avaliando argumento morais: o método de contra-exemplos
Depois que você identificou a conclusão e as premissas e checou a qualidade do
raciocínio que leva das premissas à conclusão, é hora de avaliar a verdade das
premissas. Discordâncias acerca de argumentos morais podem ser de três tipos: (1)
sobre verdade das premissas não-morais (discordância factual), (2) sobre a validade do
raciocínio que leva das premissas à conclusão (discordância lógica) ou (3) sobre a
verdade das premissas morais (a discordância moral propriamente dita).
As discordâncias lógicas são mais simples de resolver, basta que as premissas e
a conclusão sejam estabelecidas de maneira clara, que os debatedores queiram
sinceramente identificar a melhor posição e que sejam minimamente racionais.
Considere o seguinte raciocínio:
P1- Atividades que aumentem a violência devem ser proibidas.
P2- Jogos de videogame que simulam violência aumentam a violência.
C- Logo, todos os jogos de videogame devem ser proibidos.
A discussão sobre se P2 justifica C ou se justifica apenas uma conclusão mais
restrita como “logo, todos os jogos de videogame que simulam violência devem ser
proibidos” seria uma discordância lógica. Por sua vez, a discussão sobre o mérito de P2,
isto é, se jogos de videogame que simulam a violência realmente aumentam a violência
seria uma discordância factual, que só pode ser resolvida através de estudos empíricos.
É impressionante como tantas discussões morais giram em torno da validade de certas
premissas não-morais e não de regras morais:
•
O debate sobre a proibição da pornografia depende da afirmação de que ela gera violência
contra as mulheres;
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•
•
•
•
•
•
boa parte do debate sobre abordo depende da afirmação de que fetos têm consciência;
O debate sobre desligar ou não os aparelhos que mantém vivos pacientes em coma
depende da afirmação de que eles sempre têm chances de se recuperar;
A oposição aos direitos dos homossexuais muitas vezes depende da afirmação de que eles
podem se tornar heterossexuais caso se esforcem;
A defesa das cotas raciais muitas vezes depende da afirmação de que elas promovem a
igualdade de oportunidades;
A crítica ao uso não-terapêutico de Ritalina depende da crença de que ela dá vantagens
aos mais ricos;
A crítica à legalização das drogas em geral depende da afirmação de que isso aumentaria
o consumo abusivo.
Em geral, é uma boa notícia quando se percebe que uma discussão moral é
motivada por discordâncias factuais, pois isso sugere que com o avanço das pesquisas
há mais chances de se chegar a um consenso. Entretanto, infelizmente, há certas
premissas factuais que são muito difíceis de verificar:
•
•
•
•
•
•
•
•
A alma já está presente desde a fertilização;
Quem receber transfusão de sangue não será aceito no paraíso;
Gêmeos são sinais de há um espírito mal na comunidade;
Quem morrer pelo seu povo terá direito a quarenta virgens no paraíso;
Existe um ser superior que deixa que as pessoas sofram para ajudá-las a se desenvolver;
O sofrimento de um animal não-humano tem a mesma intensidade que o de um humano;
Psicopatas não têm controle sobre o seu caráter;
Certos dependentes químicos perderam a capacidade de avaliar quais são suas
preferências.
Esse tipo de incerteza sobre os fatos faz com que existam diversas tensões nos
debates públicos porque os debatedores possuem crenças factuais diferentes. Pense, por
exemplo, nas discussões morais entre índios e brancos, gays e héteros, traficantes e nãotraficantes, cristãos e evangélicos, judeus e muçulmanos, psiquiatras e psicólogos e,
principalmente, entre cientistas e religiosos. A ciência costuma ter mais autoridade em
diversos debates justamente porque suas afirmações em geral são baseadas em
experimentos que todos podem verificar, diferentemente das afirmações que são
baseadas em revelações divinas, textos sagrados, experiências pessoais, tradições etc.
Pois bem, as premissas não-morais de argumentos morais podem ser avaliadas
por métodos empíricos. Mas como avaliar a premissa moral, aquela que expressa uma
regra moral? O principal teste é tentar pensar em contraexemplos (VAUGHN, 2008, p.
449). Na verdade, é isso que se faz com toda generalização. E princípios morais são
sempre generalizações. Considere o seguinte argumento:
P1- É sempre errado matar um ser humano.
P2- Todo aborto provocado mata um ser humano
C- Por isso, o aborto provocado é sempre errado.
37
O princípio moral geral aqui é P1 e ela é no mínimo questionável, porque
podemos facilmente pensar em contraexemplos, situações em que é aceitável matar um
ser humano, como a legítima defesa ou durante uma guerra justa. Portanto, P1 precisa
ser mudada, talvez para algo como “é sempre errado matar um ser humano inocente” –
ajustando também P2.
2.8. Guia das falácias morais
Como acontece em todo tipo de engenharia, a melhor maneira de entender como
funcionam os raciocínios é observar suas falhas e como resolvê-las. Um argumento
pode estar errado por dois motivos. Um erro factual é quando uma das premissas é falsa,
afirma fatos que não são verdadeiros. No caso dos argumentos morais, como visto
acima, isso acontece quando há algum problema com uma das premissas não-morais.
Diferentemente dos erros factuais, uma falácia é um erro de raciocínio, isto é, quando as
premissas não são suficientes para estabelecer a conclusão. Dependendo do tipo de
raciocínio, as falácias podem ser dedutivas ou indutivas. Uma falácia dedutiva é aquela
em que o argumento é dedutivo e inválido, pois todas as suas premissas podem ser
verdadeiras e mesmo assim a conclusão ser falsa. De maneira correspondente, em uma
falácia indutiva, as premissas não fornecem evidência suficiente, elas podem ser
verdadeiras e a conclusão não ter mais probabilidade de ser verdadeira, é quando o
argumento não é convincente.
As falácias são erros de raciocínios que em boa parte das vezes as pessoas
cometem sem a intenção de enganar. Contudo, muitas vezes alguém utiliza estratégias
enganosas de maneira intencional, para convencer alguém mesmo sem ter razão. A
retórica é a arte de falar bem, ela inclui sugestões sobre como usar melhor sua voz,
indicações sobre a clareza das expressões e sobre como organizar melhor suas ideias.
Entretanto, há estratégias retóricas cujo objetivo é apenas fazer parecer que o
argumentador tem razão ou simplesmente convencer o interlocutor por caminhos não
racionais, isto é, sem oferecer as melhores razões. Veja a seguinte lista com estratégias
retóricas mais simples:
Apelo a elogios
“Essa é a melhor aula que já tive, será que você poderia me dar dois pontos?”
“Novo Vectra, você merece”.
Apelo à piedade
38
“Se você me reprovar, vou perder a bolsa”.
Apelo ao medo
“Se você não der o dízimo, vai para o inferno”.
“Seguro Allianz, você não sabe quando vai precisar”.
Apelo à inveja
“Se você der o emprego para ela, você vai deixar de ser a mais bonita da empresa”.
“Compre, suas amigas vão te odiar”.
Apelo à novidade: consiste em supor que o que é mais novo é melhor.
“Compre DVDs na minha banca, só sucessos e lançamentos!”.
Apelo ao Povo (ad populum): consiste em fazer alguma afirmação popular, porém irrelevante,
apenas para facilitar a aceitação da conclusão.
“O povo brasileiro é alegre e trabalhador, não devemos ser tímidos com o crime”.
Apelo ao ridículo: consiste em apresentar a posição adversária como ridícula.
“Já pensou mulheres dirigindo caminhão, que ridículo seria! Lógico que isso não é certo”.
Muitos destes casos são falácias porque a conclusão simplesmente não se segue
das premissas (p.ex., nem tudo que é novo é bom). Mas o mais distintivo dessas
estratégias é que em grande parte das vezes elas funcionam, pois despertam certas
emoções nos interlocutores. Portanto, elas são estratégias argumentativas não-racionais.
E, infelizmente, são as mais utilizadas na política e na publicidade, para te convencer a
dar poder a certas pessoas e a gastar seu dinheiro com certas coisas.
Políticos, publicitários, técnicos de futebol, pais etc. frequentemente tentam
convencer os outros de alguma coisa manipulando as emoções deles para que sintam
esperança, amor, alegria, culpa, medo, coragem etc. Nem sempre esse tipo de estratégia
é imoral e pode até mesmo ser importante como uma forma de incentivar as pessoas a
prestar atenção ao que está sendo dito. Mas esse tipo de apelo é falacioso porque a
emoção que você está sentindo não torna as afirmações descritivas verdadeiras. Os
publicitários tentam fazer você acreditar que a cerveja Skol é boa tentando te fazer dar
risada vendo o comercial em que um grupo de amigos fazem piadas, para que você
associe alegria à marca da cerveja.
A discussão sobre o papel das emoções nas afirmações morais é muito
complexa. A deontologia kantiana considera que nenhuma emoção deve servir de
premissa a raciocínios morais. Já os utilitaristas usam dor, prazer, sofrimento ou
felicidade como critérios para avaliar as ações, mas o cálculo para saber como
maximizar esses elementos deve ser completamente racional, sem a interferência de
emoções. Entretanto, para os subjetivistas não há afirmações morais sem emoções e
basta haver emoções como culpa ou indignação para que exista uma avaliação moral, o
39
que faz com que para um subjetivista o apelo às emoções não seja uma estratégia a ser
evitada.
De fato, experimentos em psicologia moral descobriram que as avaliações
morais se tornam mais rigorosas se as pessoas sentirem mais nojo (p. ex., em uma sala
suja, SCHNALL et al. 2008). Além disso, os psicopatas, as pessoas mais cruéis, não
têm problemas de raciocínio, mas em sentir emoções como empatia e culpa (BLAIR;
MITCHELL; BLAIR 2005). Contudo, contra os subjetivistas, há quem defenda que as
emoções são necessárias, mas não suficientes, para a avaliação moral. Um fato a favor
dessa posição é que alguém pode sentir as emoções erradas em determinada situação (p.
ex., desprezo ao invés de compaixão pela mulher que aborta interrompe uma gestação
fruto de estupro) – algumas versões do subjetivismo tentam incorporar esse fato
(PRINZ, 2008). E, portanto, de acordo com isso, uma argumentação é falaciosa se
apelar para emoções que não seria adequado sentir na situação em questão.
a) O apelo ao medo: a heurística do medo e o princípio da precaução
Em debates morais, o medo é provavelmente a emoção à qual mais se apela, pois
muitas vezes não se sabe exatamente quais serão as consequências de permitir alguma
coisa. Então se apela para o medo das consequências ruins. Esse apelo é muito efetivo
porque, para adiantar um tema do próximo capítulo, nós temos um viés da negatividade.
Em vários contextos, damos mais valor à possibilidade de coisas ruins acontecerem do
que à possibilidade de coisas boas. Isso acontece provavelmente porque durante a
seleção natural foi melhor errar por excesso de precaução do que por excesso de
confiança (ROZIN; ROYZMAN; 2001; BAUMEISTER et al. 2001), o que fica
explícito em ditados como “não adianta chorar o leite derramado”, “better safe than
sorry” e “melhor prevenir do que remediar”. George W. Bush justificou as invasões do
Iraque e do Afeganistão tentando despertar o medo diante do que ele chamou de “eixo
do mal”. Na campanha presidencial brasileira de 2002, durante a propaganda eleitoral
do PSDB a atriz Regina aparecia dizendo que tinha medo de Lula – ao que o PT
respondeu também apelando para as emoções dizendo “a esperança vai vencer o medo”.
O apelo ao medo aparece em tantos debates morais, que ele tem até um nome especial, a
“heurística do medo” (uma heurística é um atalho mental):
•
•
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Se os direitos homossexuais forem garantidos, a espécie humana vai acabar.
Crianças adotadas por homossexuais poderão ter problemas mentais.
Se o aborto for legalizado, ele será utilizado como contraceptivo.
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Se a prostituição for regulamentada, todas as mulheres se prostituirão.
Se as drogas foram legalizadas, todos os jovens se tornarão viciados e criminosos.
A juventude está perdida, por isso está pouca vergonha de “ficar” ao invés de namorar.
O mundo está perdido, precisamos diminuir a maioridade penal.
Alguns autores veem o medo como realmente importante para os debates
morais, argumentando que os liberais muitas vezes são confiantes demais,
especialmente em relação às novas tecnologias. Por isso, esses autores propõem o
Princípio da Precaução, segundo o qual é melhor não permitir o uso de uma nova
tecnologia até que haja certeza sobre quais serão seus efeitos secundários (JONAS,
1979/2006). A isso os liberais respondem dizendo que na maior parte das vezes não há
como ter certeza sobre os efeitos secundários e, portanto, os conservadores estão sendo
exigentes demais. No final das contas, uma posição que pode agradar aos dois lados é
decidir caso a caso, pois se em algumas situações o apelo ao medo seja apenas um
artifício de retórica, em algumas situações realmente é melhor pecar por precaução.
b) O apelo à tradição
Embora muitos argumentos apelem para a ideia de que o que é novo é sempre
melhor, também é comum ouvir argumentos supondo a ideia de que o que é mais antigo
é melhor ou mais verdadeiro:
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•
Há milênios as pessoas acreditam na vida após a morte, isso tem que ser verdade.
Padaria Pão Kent, desde 1978.
É errado transar antes de casar, na nossa família sempre foi assim.
Casamento é entre homem e mulher, sempre foi assim.
Em relação a afirmações descritivas, esse tipo de argumento pode fornecer um
indício (indução), mas não uma certeza (dedução). Por exemplo, o fato de que a padaria
Pão Kent é antiga pode ser um indício de que ela é confiável e de qualidade, entretanto,
também é possível que os pães dela sejam muito ruins e ela só sobrevive porque é bem
localizada e vende muitos cigarros. Além disso, embora o fato de que uma crença
passou pelo teste do tempo seja um ponto a seu favor, também é óbvio que as pessoas
podem acreditar em coisas erradas durante muito tempo, afinal de contas durante
milênios se acreditou que o sol girava em torno da terra.
Em relação a afirmações morais, no entanto, algumas teorias (p. ex., o
comunitarismo, talvez a ética das virtudes) consideram que o teste do tempo é
importante para princípios morais, porque princípios antigos têm a vantagem de ter se
mostrado capazes de regular a vida social, mesmo que imperfeitamente. Ao passo que
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ainda não sabemos exatamente quais serão as consequências de regras novas. É
justamente por isso que essas teorias são chamadas de “conservadoras”. Elas se baseiam
na ideia de que é melhor não modificar as regras que se mostraram bem sucedidas no
passado e consideram que há autoconfiança exagerada nas propostas de introduzir novas
regras (BURKE, 1790/1697). Por outro lado, esse tipo de raciocínio é chamado de “viés
do status quo” por seus críticos (BOSTROM; ORD, 2006), que insistem que nem
sempre o estado atual de coisas é melhor e que esse tipo de posição gera uma grande
inércia e atrapalha o avanço moral. Segundo eles, se pensássemos dessa maneira, a
monarquia nunca teria acabado (aliás, ela ainda existe em alguns países), a escravidão
ainda existiria e as mulheres não teriam direito de votar. Mais uma vez, portanto, é
preciso decidir caso a caso quando para saber se o apelo à tradição é uma premissa
relevante ou não.
c) Falácias ad hominem (contra a pessoa)
Os argumentos ad hominem são muito comuns em discussões morais. O erro
desse tipo de raciocínio é rejeitar uma afirmação não por causa de seu conteúdo, mas
sim com base em um fato irrelevante sobre que a fez (caráter, circunstância etc.). Veja
sua estrutura básica e alguns exemplos:
A pessoa B faz a afirmação X.
A pessoa C ataca a pessoa B.
Logo, a afirmação X é falsa.
• André: Acho que o aborto é errado.
Fernando: Claro que sim, você é padre!
André: Mas e aquela lista de argumentos que te dei?
Fernando: Aquilo não conta. Você é um padre, é só uma marionente do Papa, não compensa
discutir isso com você.
• Ontem, no programa da Luciana Gimenez, defenderam o direito de ter pitbulls. Isso é uma
bobagem, aquele programa é um lixo.
Nos argumentos ad hominem primeiro há um ataque a quem fez a afirmação e
depois o ataque é tomado como evidência contra a afirmação. Isso é uma falácia porque
o caráter, as circunstâncias etc. da pessoa normalmente não influenciam a verdade da
afirmação ou argumento – um mentiroso pode ter feito uma afirmação verdadeira.
Contudo, nem todo argumento ad hominem é irrelevante, por exemplo, pode ser
que seja relevante saber que alguém tem conflitos de interesse (como no caso em que o
42
médico indica o remédio X apenas por ter recebido propina do fabricante). Mas isso
seria apenas um alerta, não significa necessariamente que a afirmação feita por ele é
falsa.
Alguns argumentos ad hominem se transformam em simples ataques pessoais
com o objetivo de desqualificar o interlocutor – “essa anta não sabe o que está falando”.
Procure por “mentiroso e caluniador” no Youtube e você verá o ex-governador de São
Paulo Orestes Quércia metralhando um entrevistador do programa Roda Viva com uma
série de argumentos ad hominem. É importante notar que alguns ataques são mais sutis
e vêm na forma de informações (verdadeiras ou não) que servem para desqualificar o
interlocutor diante de quem está ouvindo. Essa estratégia é conhecida como envenenar o
poço:
•
•
•
Alguém que discorde de mim, não pode estar defendendo os interesses do país.
Como dizem que ele é racista, aquela brincadeira sobre capoeira só pode ter sido para me
ofender.
Não acredite em nada do que ele disser, ouvi dizer que ele iria tentar te enganar.
A falácia conhecida como argumento ad hominem tu quoque (ou argumento
você também) é cometida quando se conclui que a afirmação de alguém é falsa porque
ela é inconsistente com algo que a pessoa disse ou fez. Isso é uma falácia porque o fato
de que uma pessoa está sendo inconsistente não faz com que a afirmação seja falsa,
apenas mostra que a pessoa é hipócrita. E pessoas hipócritas também são capazes de
falar verdades. Veja a estrutura desse argumento e alguns exemplos:
A pessoa B faz a afirmação X.
A pessoa C defende que a verdade de X é inconsistente com ações ou afirmações
passadas de B.
Logo, X é falsa.
•
D. Dalva: Juliano, meu filho, você precisa parar de fumar, isso faz mal.
Juliano: Deixa de bobagem, mãe, você também já fumou.
•
Carol: É errado usar animais para nosso benefício.
Tati: Aff, e esse cinto de couro que você está usando, é feito de alface?
d) Argumentos de autoridade
O apelo à autoridade é uma estratégia argumentativa que consistente em
apresentar a opinião de alguém que entende do assunto como evidência da verdade de
uma afirmação. Esse pode ser realmente um bom argumento quando se tratar de um
assunto muito complicado e quando a autoridade citada é realmente um especialista no
43
assunto. Essa estratégia é falaciosa somente quando a pessoa apresentada como
autoridade não entende do assunto. O fato de que alguém não qualificado afirma alguma
coisa não a torna verdadeira. Na verdade, o fato de que alguém qualificado afirma
alguma coisa também não é suficiente para tornar a afirmação verdadeira, é apenas um
indício que pode ser importante na falta de outros tipos de evidência. Veja a estrutura
básica da versão falaciosa do argumento e alguns exemplos de bons e maus argumentos
de autoridade:
A pessoa B é apresentada como uma autoridade no assunto Y (mas na verdade
não é).
A pessoa B fez a afirmação X sobre Y.
Logo, é verdade que X.
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Ela não fez medicina, mas é casada com um cardiologista, se ela te disse que é melhor
tomar analgésico, pode tomar sem medo. (mau argumento)
Os EUA são uma droga, pode acreditar em mim, entendo do assunto, já conversei com
muita gente que morou lá. (mau argumento)
Vou comprar esse celular porque o Ronaldo aparece na propaganda dele. (mau argumento)
Colgate, a marca recomendada por 80% dos dentistas. (bom argumento)
Até Einstein dizia que não devemos perder a esperança. (mau argumento)
O melhor partido é o PMDB, 90% dos dentistas votam nele. (mau argumento)
Provavelmente não encontraremos uma teoria de tudo, até Einstein achava que não era
possível conciliar a física subatômica e a astrofísica. (bom argumento)
A homossexualidade é uma abominação, está na Bíblia (bom argumento para quem
considera que a Bíblia é a palavra de Deus e mau argumento para quem discorda disso).
A ciência diz fumar causa câncer (bom argumento para quem considera que a ciência é
capaz de identificar esse tipo de causalidade e mau argumento para quem discorda disso).
A ciência diz que não há evidências de que almas existem (bom argumento para quem
considera que a ciência é capaz de identificar esse tipo de evidência e mau argumento para
quem discorda disso).
Em uma discussão sobre como lidar com a gripe, faz sentido dar mais valor à
opinião de um médico experiente. Contudo, a opinião dele sobre o melhor trompetista
de jazz não é mais confiável do que a de outras pessoas. A não ser que tenhamos
evidências de que ele entende muito de jazz.
O fato de que alguém entenda de F não o faz um especialista em G (a menos que
os assuntos sejam relacionados). O fato de que o Ronaldo Fenômeno tenha sido um
grande jogador não torna sua opinião sobre celulares melhor do que a da minha mãe.
Para o apelo à autoridade não ser falacioso, é preciso que haja evidências (diplomas,
certificados, prêmios, desempenho passado, empregos, currículo, registros profissionais
como CRM, OAB, CREA etc.) de que a pessoa à qual se recorre realmente seja um
especialista no assunto. Na verdade, esse é o principal motivo para que existam registros
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profissionais, diplomas, certificados, currículos e prêmios. Eles ajudam a identificar em
quem se pode confiar em relação aos temas em questão.
Um apelo relevante à autoridade é aquele em que há bons motivos para acreditar
que a fonte indicada é uma autoridade legítima no assunto. Como nem toda fonte é
confiável, não basta dizer coisas como “li em um livro que...”, “todo mundo está
falando que...”, " vi na TV que...” etc. Além disso, é preciso levar em conta que algumas
fontes são tendenciosas, enviesadas. Por exemplo, ao ler uma reportagem sobre aumento
de impostos, bolsa-família ou greve de servidores, é importante saber que a revista Veja
geralmente defende a não interferência do governo no mercado (liberalismo
econômico), enquanto que a Caros Amigos costuma defender maior controle do estado
sobre a economia para garantir uma melhor distribuição dos recursos (socialismo).
e) Apelo à popularidade
A falácia do apelo à popularidade consiste em concluir que algo é certo tomando
como evidência apenas o fato de que isso é uma prática comum. Veja abaixo a estrutura
básica do argumento e alguns exemplos:
Muita gente aprova/pensa que/faz X.
Então X é verdadeiro (certo/aceitável/moral).
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Quem nunca saiu no braço com uma mulher? (Goleiro Bruno)
Eu já traí, mas quem não trai?
Sandália gladiador é show, está todo mundo usando.
É claro que Deus existe, ou você acha que 95% da população brasileira está errada?
O Flamengo é o melhor time do Brasil, basta ver o tamanho da torcida.
Mãe: Filho, é um absurdo mentir para a própria mãe.
Filho: Todo mundo mente!
Colar não é errado, todo mundo cola.
Embora em algumas situações seja relevante saber o que as outras pessoas
pensam (p. ex., para saber como se portar à mesa), isso é uma falácia porque as pessoas
podem simplesmente estar erradas. P. ex., durante quase todos os cerca de 200.000 anos
da espécie humana, a grande maioria das pessoas pensava que as mulheres eram
inferiores aos homens (inclusive a maior parte das próprias mulheres pensava isso).
Segundo quase todas as teorias morais, o fato de que “todo mundo trai” não é
suficiente para tornar a traição algo aceitável, pois essas teorias consideram que a
moralidade de uma ação é determinada por outros fatores (presença de sofrimento,
universalizabilidade etc.). Em outras palavras, o fato de que algo é aceito pela maioria,
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não o torna moralmente aceitável. A maioria das pessoas pode simplesmente estar
errada.
A exceção dentre as teorias morais é o relativismo cultural, pois ele considera
que o certo é aquilo que é mais comumente aceito dentro de uma cultura, não importa
que seja a escravidão, a pedofilia ou o estupro (cf. Prinz, 2008). Portanto, para o
relativista, dizer que algo é certo “porque todo mundo faz” não é uma falácia.
Entretanto, o relativismo cultural tem que enfrentar algumas objeções. Para ficar em
apenas uma, imagine que em uma tribo há 1000 pessoas, sendo dentre elas, 800
consideram o roubo imoral e 200 consideram o roubo aceitável. Simplificando, isso
significa que essa tribo considera o roubo como algo imoral. Mas se um terremoto
atingir essa tribo, matando exatamente todas aquelas 800 pessoas, mas deixando o as
restante vivas, de acordo com o relativista cultural isso quer dizer que roubar vai deixar
de ser imoral. Embora muitos autores não vejam problemas nesse resultado, há quem
considere isso inaceitável, pois consideram que a moralidade não pode ser tão instável.
A discussão ainda está em aberto. Portanto, embora o apelo à popularidade
normalmente seja uma falácia, certos autores consideram que ele seja um bom
argumento em alguns casos.
f) Falácia do legalismo moral
Esse é um erro muito comum, que consiste em confundir argumentação moral e
argumentação jurídica, isto é, dizer que algo é moralmente inaceitável porque é proibido
por determinada lei:
•
•
O aborto é imoral porque o art. 2º do Código Civil diz que, apesar da personalidade civil
começar no nascimento com vida, os direitos do nascituro estão assegurados desde a
fertilização.
Não é imoral trair minha mulher, a legislação brasileira não criminaliza o adultério.
Direito e moral não são a mesma coisa. Já existiram e ainda existem muitas leis
imorais. P. ex., a escravidão já foi prevista em lei e o voto já foi restrito apenas aos
proprietários de terras. Até hoje há lugares no mundo em que as mulheres são proibidas
de dirigir. Até hoje, os cubanos muito qualificados são proibidos de mudar para outro
país. No Brasil, antes da lei da Ficha Limpa, indivíduos condenados pela justiça podiam
assumir cargos políticos. E até hoje são os próprios deputados e senadores que definem
qual será seu salário. Todas essas são leis claramente injustas e, portanto, imorais. Se
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Direito e ética fossem a mesma coisa não haveria leis injustas. E esse é justamente o
ponto das discussões sobre desobediência civil, a ideia de que não é imoral desobedecer
leis injustas e que temos até mesmo a obrigação moral de desobedecê-las. Portanto, nem
tudo que é imoral é ilegal.
Na direção inversa, também é verdade que nem tudo que é ilegal é considerado
imoral. Pense na questão de dirigir alcoolizado. Esse é um comportamento claramente
ilegal no Brasil e há bastante tempo. Milhares de mortes por ano são causadas por
pessoas que dirigem bêbadas. Mesmo assim, muitas pessoas não consideram imoral
dirigir depois de ter bebido. Na maior parte das vezes, quem evita beber faz isso apenas
porque não quer ser punido, não porque realmente ache errado. O mais grave é que não
são apenas os motoristas que não têm vergonha de fazer isso, mas sim que as namoradas
não se recusem a entrar no carro com o rapaz que acabou de beber algumas cervejas.
Nem as mães e as tias se recusam a entrar no carro de quem vai dirigir depois de ter
bebido no churrasco. Mesmo que essas pessoas digam “acho errado fazer isso”, elas
claramente não possuem os sentimentos morais que indicariam que elas moralizaram a
questão.
Então, dado que nem tudo que é imoral é ilegal e nem tudo que é ilegal é imoral,
quando o objetivo for argumentar que é moralmente errado matar alguém, não basta
dizer que o Código Penal proíbe o homicídio. Discussões jurídicas se baseiam em
regulamentos jurídicos e, normalmente, argumentos morais são irrelevantes para elas
porque seu foco é o direito positivado, escrito. Ao passo que discussões morais se
baseiam em regras morais e, normalmente, argumentos jurídicos são irrelevantes para
definir quais as melhores regras morais.
Outro indício dessa diferença é o fato de que o Direito (entendido como o
conjunto das leis) pode mudar da noite para o dia, bastando que uma lei seja aprovada
pelos membros do poder legislativo. O Direito é composto principalmente pelo poder
legislativo (que faz as leis), a polícia (que fiscaliza seu cumprimento), o poder judiciário
(que julga quando houve descumprimento) e o sistema penitenciário (que pune o
descumprimento da lei). Durante esse processo, pode ser que leis imorais sejam criadas
ou aplicadas. Por sua vez, a ética não está sujeita a mudanças tão repentinas e
controladas. As mudanças morais são difusas, imprecisas e bastante estendidas no
tempo, como podemos ver pela forma como tem ocorrido a mudança de opinião das
pessoas sobre o divórcio, o sexo pré-marital, o casamento interracial, a
homossexualidade, o aborto, a eutanásia e o direitos dos animais. Mudanças morais (isto
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é, sobre os padrões sobre o que se considera certo e errado, quando é obrigatório ser
altruísta etc.) acontecem por causa de mudanças nos sentimentos morais das pessoas,
não por causa de assinaturas oficiais nos parlamentos (embora estas possam levar
indiretamente àquelas). Mudanças éticas (a consideração sobre quais afirmações morais
são mais justificadas) se devem ao aparecimento de novas evidências ou novas
avaliações sobre as mesmas evidências, o que também não depende diretamente de
assinaturas parlamentares.
Além disso, é aconselhável que o direito interfira o mínimo possível na
moralidade para que não se intrometa demais na vida das pessoas, não apenas porque a
fiscalização ofenderia a privacidade delas, mas porque as pessoas devem ter o direito de
tomar suas próprias decisões morais. Por isso, há quem afirme que o direito é um
mínimo moral – deixando subentendido que a moralidade é mais ampla do que o
Direito.
Portanto, em uma discussão para saber se uma ação é certa ou errada, não basta
indicar uma lei ou o código de ética da sua profissão, pois eles podem simplesmente
estar errados. É preciso investigar as razões para proibir, permitir, obrigar ou elogiar a
ação.
g) Falácia da petição de princípios (petitio principii ou argumento circular)
O erro nesse raciocínio é que as premissas já incluem a conclusão e, portanto,
não cumprem o principal objetivo de um argumento: oferecer novas evidências para
aceitar a conclusão. O raciocínio é feito para provar a conclusão, mas, ao usá-la em uma
premissa, já se supõe que a conclusão seja verdadeira:
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Todo sofrimento é ruim porque é ruim sofrer.
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João: Ateus são muito burros, óbvio que Deus existe.
Zé: Como você sabe?
João: Porque está na Bíblia, para todo mundo ver, não há como duvidar.
Zé: Mas por que você acredita em tudo o que está Bíblia?
João: Porque ela foi escrita por Deus, ora bolas, o que mais você quer?
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Drica: Meu trabalho está ótimo. Pode perguntar para Maria.
Patrícia: Mas como vou saber se posso confiar nela?
Drica: Eu garanto.
h) Falácia naturalista
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Esse é um dos principais erros em discussões éticas e mesmo assim ele é muito
cometido. A falácia naturalista consiste em retirar conclusões normativas a partir de
premissas descritivas. Em oferecer um argumento moral apenas com premissas nãomorais.
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Monogamia é você ir contra sua própria natureza, porque na natureza a formação social dos
animais mamíferos que vivem em bando é o macho e várias fêmeas, tanto que na natureza
você vê um garanhão e várias éguas, um touro e várias vacas, um gorila e várias gorilas. O
homem é o mais idiota de todos porque tem uma mulher só em casa (Mr. Catra).
Todo macho mamífero é um animal com várias fêmeas (Mr. Catra).
Sexo anal é imoral porque a função do ânus é a excreção, não a penetração.
O sexo anal é imoral porque dói.
Não temos a obrigação de ser vegetarianos porque temos dentes adaptados para comer
carne e um intestino eficiente em digeri-la.
Se há o macho e a fêmea e eles se encaixam tão perfeitamente, a homossexualidade é
imoral.
A homossexualidade é imoral porque não leva à reprodução.
A homossexualidade deve ser respeitada, é uma coisa natural, acontece em várias espécies
animais.
Os homens têm direito a trair porque seu desejo sexual é maior.
Devemos deixar as crianças brigar um pouco, elas têm muita agressividade para extravasar.
O que há de errado com essas afirmações é que o fato de que algo é natural não
significa que ele seja aceitável. Da mesma maneira, o fato de que algo foi desenvolvido
pela seleção natural para desempenhar certa função também não significa que utilizá-lo
para outra função é inaceitável, nem que temos a obrigação de utilizar algo que tem
certa capacidade. Essas afirmações dependem de premissas morais implícitas tais como
“o que é natural é bom e o que é anti-natural é ruim” ou “temos a obrigação de apenas
utilizar nosso organismo para as funções que foram decisivas na seleção natural”. O
principal problema com essas premissas é que elas são extremamente vulneráveis a
contra-exemplos. Há diversas ações anti-naturais que consideramos perfeitamente
aceitáveis (tomar antibióticos, voar de avião, usar computadores etc.) e também diversos
usos de nossos corpos que não se limitam a suas funções originais (bocas não foram
feitas para ser beijadas, pernas não foram feitas para jogar futebol etc.).
Outro aspecto dessa falácia é bastante claro na discussão sobre aborto (FIELD,
1999). Considere os seguintes argumentos:
• Favorável à legalização: a ciência diz que fetos no primeiro trimestre de gestação não têm as
características x, y e z. Logo, é aceitável abortá-lo.
• Contrário à legalização: a ciência diz que fetos no primeiro trimestre de gestação têm as
características k, w e q. Logo, é inaceitável abortá-lo.
Nenhum desses argumentos é sólido, porque lhes falta uma premissa que afirme
que é errado matar os organismos que possuem as características k, w e q ou que é
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aceitável matar os organismos que não possuem as características x, y e z. A principal
dificuldade nas discussões sobre aborto é expor de maneira clara essas premissas e
defendê-las adequadamente – o que normalmente é feito discutindo-se o que é
necessário para ser algo considerado uma pessoa. O que mais interessa à presente
discussão, é que a falácia naturalista muitas vezes pode ser cometida por considerar que
não é preciso defender o valor moral de determinada característica natural.
Outro exemplo dessa dificuldade é o embate entre utilitaristas e católicos sobre o
sofrimento. Os utilitaristas consideram que o sofrimento é sempre moralmente ruim,
enquanto que os católicos tendem a considerar que em algumas situações o sofrimento
engrandece. Imagine que uma moça chamada Fernanda foi reprovada em várias
entrevistas até finalmente conseguir o emprego. Um utilitarista diria que mesmo que a
felicidade final tivesse compensado o sofrimento, o sofrimento havia sido ruim, pois
seria melhor ter conseguido o emprego sem sofrer. Um católico discordaria, ele diria
que o sofrimento foi bom, pois testou a perseverança dela – e então seria pior se não
tivesse havido sofrimento.
i) Argumento do efeito dominó
Esse é um argumento extremamente comum nas discussões morais difíceis. Em
inglês ele é chamado de ladeira escorregadia (slippery slope) e, em alemão, de bola de
neve (Dammbruch). Mas a ideia é a mesma em todos as expressões: depois de um
primeiro evento, os acontecimentos seguintes são inevitáveis e catastróficos. Ele
consiste em afirmar que apesar de determinada ação poder até ser aceitável, ela
inevitavelmente terá consequências inaceitáveis. Portanto, mesmo que a ação em
questão não seja ela mesma errada, ela deve ser proibida porque supostamente levará a
outras ações, e estas sim são inaceitáveis. Veja a estrutura básica desse argumento e
alguns exemplos:
A ação X não é errada.
As ações Y e Z são erradas.
Se X for permitida, isso fará com que Y e Z também sejam.
Logo, X não deve ser permitida.
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Se permitirmos que um humorista seja proibido de fazer uma piada, isso abrirá as portas
para volta da censura. E a censura é o primeiro ato da ditadura.
50
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•
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Se legalizarmos o aborto de fetos anencéfalos, depois vão querer permitir o aborto de fetos
com síndrome de Down, depois porque a mãe é pobre, no fim, teremos legalizado até
mesmo o infanticídio!
Se legalizarmos o casamento gay, daqui a pouco vão querer permitir que casais formados
por três pessoas, que alguém se case com seu cachorro e até mesmo o casamento entre
irmãos!
Se legalizarmos a eutanásia voluntária, isso pode abrir um precedente para os filhos
pressionarem os pais para morrer para que eles fiquem com a herança, ou evitem gastos
“inúteis”, não sejam obrigados a cuidar dos pais doentes que olharam por eles a vida inteira,
e, dadas as condições dos nossos asilos, vamos acabar chegando até à morte de idosos
saudáveis e com vontade de viver!
É importante notar que o Argumento do Efeito Dominó se torna falacioso apenas
quando as consequências indesejáveis são evitáveis. Quer dizer, nas situações em que
as consequências realmente forem indesejáveis e inevitáveis, ele é um argumento
sólido. Contudo, esse argumento é muitas vezes utilizado apenas como uma maneira de
causar medo, de simplesmente associar o mal-estar das consequências indesejáveis ao
que realmente está sendo discutido. Ele serve para tingir de medo o que não é
amedrontador. Por isso, esse é um argumento muito utilizado por quem não tem outros
argumentos.
j) Falácia da amostra enviesada
Esse erro é a origem de muitos estereótipos, preconceitos e discriminações
contra vários grupos. A falácia da amostra enviesada acontece quando se infere algo
sobre uma população ou grupo baseando-se em uma parte de seus elementos que não
representa o todo, isto é, que contém um viés (um erro repetido). Isso faz com que nesse
caso a inferência seja uma generalização indevida. Veja os argumentos abaixo:
•
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Perguntamos a 3000 pessoas na Praça Sete qual é seu time favorito e 1500 responderam
“Atlético Mineiro”, isso permite concluir que metade dos brasileiros torce para o Atlético
Mineiro.
Todo gay é exagerado, exibido e promíscuo, basta ver as Paradas do Orgulho Gay.
Maconheiros são todos vagabundos, você já viu algum empresário fumando maconha em
alguma praça?
A religião católica é podre, todo dia a gente vê um caso de pedofilia no jornal.
O principal problema desses argumentos é que eles retiram uma conclusão sobre
o grupo baseando-se em elementos que não necessariamente representam todo o grupo.
Muitos gays casados, avessos a festas e mais reservados provavelmente não vão à
Parada Gay. Ou talvez os gays modifiquem seu comportamento durante a parada, assim
como muitos héteros modificam seu comportamento durante o Carnaval. Em relação ao
argumento sobre a maconha, os empresários normalmente têm dinheiro suficiente para
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ter sua própria casa, então não precisam usar praças caso queiram fumar maconha. E,
por fim, os padres acusados de pedofilia que aparecem nos jornais são uma parte ínfima
do grupo de todos os padres e mais ainda de todos os católicos. E mesmo que muitos
padres fossem pedófilos, isso não seria suficiente para justificar afirmar que a religião
católica é podre, afinal de contas, há professores pedófilos, treinadores pedófilos, babás
pedófilas etc.
Boa parte da força psicológica dessa falácia vem do viés da disponibilidade (a
tendência a tirar conclusões baseadas nas memórias que estão mais vivas). Toda travesti
se prostitui, menos as que você não conhece. Por isso, há as campanhas LGBTT em prol
da visibilidade: não apenas para conscientizar a população sobre os problemas dessa
minoria excluída, mas também para eliminar os estereótipos, que geram preconceitos e
discriminação.
k) Falácia um erro justifica o outro
Essa é outra falácia muito comum nos debates morais. Ela consiste em
apresentar como justificativa a favor da moralidade de uma ação o fato de que outra
ação semelhante foi aceita. Isso é uma falácia porque é possível que as duas ações
estejam erradas.
•
Você vai me multar por quê? Tanta gente dirige bêbada e não é multada!
•
Eu realmente bati nela, bati mesmo, mas não foi a primeira vez, não sei porque ela me
denunciou dessa vez.
Para evitar essa falácia, é preciso oferecer uma evidência independente,
mostrando que as duas ações devem ser consideradas aceitáveis. Nos argumentos acima,
as premissas morais poderiam ser “as pessoas devem ter o direito de dirigirem bêbadas
se não atropelarem ninguém” e “mulheres merecem apanhar na terça-feira”,
respectivamente.
Há duas situações em que esse tipo de argumento não é falacioso. A primeira é
quando o objetivo não é justificar o que foi feito como algo aceitável, mas simplesmente
exigir justiça, isto é, tratamento semelhante ao que foi dado a outras pessoas que
fizeram o mesmo. No caso da multa, ele poderia argumentar que pessoas famosas em
situação semelhante não foram multadas. A segunda situação é quando um erro anterior
é apresentado como justificativa para uma retribuição: eu trai porque ela me traiu; matei
ele porque ele matou meu irmão etc. O objetivo nesses casos não é simplesmente
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defender que sua ação não é imoral, mas sim que apesar de imoral à primeira vista, ela é
aceitável porque responde a uma imoralidade anterior.
Um tipo de argumento semelhante a esse é aquele em que se diz algo como “fiz
X a ele porque no meu lugar ele teria feito X comigo”. Algumas teorias morais não
considerariam esse argumento uma falácia, especialmente algumas versões do
contratualismo, por tomarem a reciprocidade como o principal critério da moralidade de
uma ação. Mas teorias como a deontologia kantiana ou o utilitarismo tendem a tratar
esse raciocínio como inaceitável, por considerarem que a reciprocidade na maior parte
das vezes é irrelevante para decidir se algo é imoral.
l) Apelo à ignorância (ônus da prova)
Essa estratégia argumentativa consiste em transferir o ônus da prova para o lado
errado do debate: exigir que a pessoa B prove sua posição quando quem tem o dever de
apresentar uma defesa é a pessoa C. Por exemplo, se você desconfia que sua namorada
está te traindo, é você quem deve provar que ela é culpada, não ela provar que é
inocente. Veja abaixo a estrutura do argumento e alguns exemplos:
A afirmação X é apresentada pelo lado B e o ônus da prova está com o lado C.
O lado C afirma que X é falsa porque não há provas de X.
•
•
Duvido que você prove que é impossível ter telepatia. Acho que as pessoas têm poderes de
telepatia, elas só não sabem usá-la.
Se não conseguimos detectar nenhum submarino russo, então eles devem ter construído um
submarino indetectável. A menos que você prove que eles não têm um submarino
indetectável.
Uma estratégia argumentativa próxima a essa é aquela em que a pessoa C toma a
ausência de evidências em favor da afirmação X feita pela pessoa B como um elemento
a seu favor, quando na verdade o ônus da prova estava com C, isto é, quando ele é que
deveria provar que X é falso. O ônus da prova normalmente está com quem está
defendendo algo diferente do que já se sabe. Por isso, a regra de que as pessoas devem
ser consideradas inocentes até que se prove o contrário. Além disso, para evitar casos
esdrúxulos como os exemplos acima, normalmente se supõe que quem está defendendo
a existência de algo é que deve prová-la (fantasmas, mula sem cabeça, leis morais
universais etc.).
A colônia de férias Camp Quest nos EUA tem como uma de suas principais
atividades a tarefa de tentar provar que unicórnios invisíveis não existem. O fato de que
53
ninguém consegue realizar a tarefa é tomado como uma evidência a favor da ideia de
que muito provavelmente Deus não existe. Em resposta, os teístas podem reivindicar a
regra lógica que diz que a ausência de evidência não é evidência da ausência. A
tréplica dos ateus consiste em concordar, mas provocá-los dizendo que muitos
religiosos tomam a ausência de evidência como evidência de uma inteligência superior
– o que seria tão falacioso quando o argumento sobre os submarinos indectáveis.
m) Falso dilema
Esse erro consiste em apresentar um problema ignorando algumas das soluções
possíveis. Ele pode ser um simples equívoco de quem o cometeu ou pode ser uma
estratégia retórica para encurralar o interlocutor. Veja a estrutura básica dos falsos
dilemas e alguns exemplos:
Ou X é verdadeiro ou Y é verdadeiro (os dois não podem ser falsos ou
verdadeiros ao mesmo tempo).
Y é falso.
Logo, X é verdadeiro.
•
•
•
•
Devemos cortar o orçamento da educação esse ano, porque se não cortarmos vamos ter que
conviver com um grande déficit e não podemos viver com um grande déficit.
Você é a favor de proibir o casamento gay não é? Ou você é gay?
Não vale a pena discutir os direitos dos animais. Há muita criança morrendo de fome.
Não devemos legalizar o aborto. A corrupção é um problema muito maior do que a
legalização do aborto.
n) Falácia Genética e Culpa por Associação
Esse é o tipo de raciocínio em que a existência de algo considerado ruim no
passado, especialmente na origem de alguma coisa ou afirmação, é tomada como
evidência de que a própria coisa ou afirmação é ruim ou errada. Ou, em sentido
positivo, quando a origem de algo é tomado como evidência de sua verdade.
•
•
Se foi Hitler quem disse isso, então é falso.
Se foi Einstein quem disse isso, então só pode ser verdadeiro.
Uma falácia associada a essa é a culpa por associação, na qual se conclui que X
é falso porque alguém de quem você não gosta disse X. Esse é um erro porque
obviamente, por pior que uma pessoa seja, nem todas as afirmações que ela fizer serão
falsas. Vários assassinos acreditavam que 2+2 = 4 ou que devemos respeitar nossas
54
mães, e isso não tornou essas afirmações falsas. Apesar de tão primário, esse tipo de
argumento é usado em muitos debates morais:
•
•
•
O comunismo foi defendido por Stalin, Pol Pot e outros genocidas. Não acredito que você
concorde com eles.
Você está defendendo a eugenia? Sabia que isso foi posto em prática pelos nazistas?
Você acha que deve ser permitido alterar o cérebro? Isso é o que pensavam as pessoas que
defendiam a lobotomia.
No entanto, esses argumentos podem conter implicitamente premissas um pouco
mais fortes, tais como “o comunismo necessariamente leva ao genocídio”, “a eugenia
necessariamente leva ao extermínio de pessoas com características indesejáveis” etc.
m) Outras falácias e estratégias retóricas
Há ainda algumas outras falácias e estratégias retóricas que aparecem nos
debates morais:
Incredulidade pessoal: consiste em apresentar como evidência a favor de uma afirmação o fato
de que você não consegue pensar/acreditar/imaginar/fazer alguma coisa.
Prostituição é um absurdo, não consigo aceitar que alguém aceite viver daquela maneira.
Estratégia anedótica: uma experiência pessoal ou exemplo isolado é apresentado como
evidência suficiente a favor de uma afirmação. Essa estratégia é eficiente porque as pessoas
tendem a dar mais credibilidade a um caso concreto do que a dados abstratos, porque os casos
concretos geralmente despertam mais emoções no interlocutor.
Não há nenhum problema em beber e dirigir, já voltei da balada dirigindo trêbado várias vezes.
Estratégia do Espantalho (strawman): consiste em intencionalmente substituir a posição
contrária por outra mais frágil, distorcida ou exagerada.
O governo disse que é preciso cortar gastos com saúde. É inaceitável que ele decida se recusar
a tratar os doentes.
Estratégia da Distração (red herring): um assunto irrelevante é apresentado como se fosse
relevante para tirar a atenção do assunto principal. É caso de um governador que responde à uma
pergunta sobre porque extinguiu programas de distribuição de renda da seguinte maneira: “A
distribuição de renda é realmente um grande problema do país, assim como a criminalidade que
aumentou 20% no último ano”.
Generalização apressada: tirar uma conclusão a população a partir de uma amostra muito
pequena.
Toda feminista odeia homem, já tive duas colegas de sala que mal conversavam com os homens.
Falácia da composição: se uma das partes tem a característica X, então o todo também a tem.
Se só tem craque no time, o time é ótimo.
Falácia da divisão: se o todo tem a característica X, então todas as partes também a têm.
Se os homens são mais ricos que as mulheres, então o Zeca, catador de papel, com certeza é
mais rico do que a rainha da Inglaterra.
Confusão de causa e efeito: supor que algo é a causa, quando na verdade ele é o efeito.
A violência na TV e nos videogames é causa ou efeito da violência no mundo real?
A pornografia é causa ou efeito da objetificação das mulheres?
Ignorar uma causa comum: supor que se dois fenômenos acontecem juntos, então um causa o
outro. Parece que A causa B, mas na verdade C causa os dois.
O funk causa conflito com os policiais, uso de drogas e a objetificação das mulheres, todos esses
fatores aumentaram depois do aparecimento do funk. Pode ser que as condições sociais
causaram tanto a piora desses fatores quanto esse tipo de letra.
Falácia Post Hoc: depois disso, então por causa disso.
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Minha cueca verde dá sorte para o Corinthians. Sempre que a uso, ele ganha.
2.9. Como justificar uma regra moral?
Uma afirmação moral é uma indicação sobre quais ações (leis, políticas públicas
etc.) são certas ou erradas ou quais pessoas (intenções, instituições etc.) são boas ou
más. Ela é o produto final de nossa deliberação, a conclusão dos argumentos morais, e
normalmente é justificada apelando para regras ou princípios morais. A diferença entre
regras e princípios é que os princípios são mais gerais dos que as regras, mas essa
diferença quase nunca é relevante. Ambos são padrões sobre o que deve ser feito. Como
foi dito no início deste capítulo há dois tipos de argumentos morais, aqueles feitos a
partir de regras morais (argumentos derivados) e aqueles feitos em favor de regras
morais (argumentos fundamentais). Nos argumentos derivados, supõe-se que a regra já
é aceita, enquanto que os argumentos fundamentais são feitos justamente para
convencer alguém a aceitar regra.
Em última análise, regras morais de verdade não são letras em um papel ou
proposições no mundo das ideias. Para que elas realmente funcionem como regras de
tomada de decisão sobre o que fazer, elas devem ser modificações de nosso cérebro,
elas são maneiras pelas quais nossas sinapses lidam com os estímulos vindos do
ambiente, de nosso corpo e de outras sinapses e gerem uma resposta. E é esse resultado
que nos faz tomar a decisão de revidar o murro ou não, de contar uma mentira ou não
etc. Porque elas são algo que precisa estar assim tão incrustrado, as regras morais
normalmente são aprendidas inconscientemente, através do hábito, durante os
relacionamentos cotidianos, com os pais, os amigos, os pastores, na TV, vendo um
filme, em uma piada, em uma experiência ruim, ouvindo alguém contar uma história
etc. E por isso elas passam, na maior parte das vezes, a ser repetidas de maneira
irrefletida.
Algumas regras são fáceis de justificar. Não devo roubar seu notebook porque
ele é seu. Mas por que devemos respeitar a propriedade dos outros? Não devo te matar
porque eu não gostaria que fizessem isso comigo? Mas porque não devo fazer com os
outros o que não quero que façam comigo? Essas regras mais gerais são muito difíceis
de se justificar, elas parecem óbvias. Na verdade, quando alguém nos pede uma
justificativa para elas, essa exigência parece descabida e soa até ridícula – “coisa de
filósofo”.
56
Entretanto, em grande parte das vezes, não há nada de especial com o conteúdo
das regras, mas sim com a forma como as aprendemos e com o lugar que elas ocupam
em nossa psicologia. Essas são as regras fundamentais (PRINZ, 2008), e elas parecem
óbvias porque normalmente as aprendemos na prática, não através de uma palestra ou
de uma reflexão. Nós simplesmente as seguimos e todos a nossa volta concordam com
elas, nunca precisamos justificá-las. A melhor evidência de que a obviedade não vem do
conteúdo mas sim da maneira como ela foi adquirida é que várias regras que hoje
consideramos absurdamente imorais, já foram consideradas óbvias: estrangeiros não
merecem respeito, mulheres não merecem respeito, negros não merecem respeito, é
aceitável cortar as mãos de ladrões etc. Quando essas regras começaram a ser
questionadas, os questionadores eram ridicularizados da mesma maneira que hoje se
ridiculariza os defensores dos direitos dos animais, da legalização do aborto, dos
direitos homossexuais etc.
Essa sensação de que uma regra nos parece óbvia, de que ela simplesmente
parece certa (ou errada) atualmente é chamada de “intuição”. Uma afirmação é intuitiva
quando ela nos parece imediatamente certa (ou errada), é uma sensação e um raciocínio
que nos faz acreditar nela. Imagine que você acorda e vê que alguém sujou suas mãos
de cocô. Para sentir nojo (provavelmente você está sentindo só de imaginar) não é
preciso fazer um raciocínio sobre doenças infecciosas etc. Isso é uma intuição. E
normalmente é o mesmo tipo de processo mental que faz as pessoas considerarem que é
errado cortar a cabeça de alguém.
Uma operação mental de certa maneira próxima da intuição, mas um pouco mais
intelectual, são as avaliações ponderadas (considered judgments, RAWLS; 1971/2008).
Essas são as afirmações que fazemos sobre uma questão quando temos tempo para
pensar, temos uma quantidade razoável de informações relevantes, não estamos sob
fortes emoções etc. Enfim, são aquelas opiniões que realmente refletem o que pensamos
sobre o assunto. O contrário de uma avaliação ponderada são aquelas afirmações que
fazemos quando estamos com raiva ou quando não entendemos bem a pergunta. Um
ponto importante é que essas avaliações ponderadas nem sempre são bem justificadas,
nem sempre estão baseadas em argumentos fortes, pois na maior parte das vezes elas
são baseadas em intuições, no que se aprendeu durante sua experiência de vida.
Pois bem, então as regras morais em que acreditamos normalmente estão
baseadas mais em intuições do que raciocínios. Mas também é possível chegar a regras
morais por meio do raciocínio. Isso pode ser feito para um assunto específico (p. ex.,
57
qual é a regra que devo seguir para saber quando devo mentir), mas normalmente isso
foi feito pelos pesquisadores através da escolha ou construção de uma teoria ética.
Normalmente se passa da reflexão sobre um caso específico a uma teoria ética, porque,
como veremos a seguir, uma das principais estratégias para saber o que é certo fazer em
uma determinada situação é compará-la com situações semelhantes. E uma teoria ética
nada mais é do que uma tentativa de explicar o que torna algo errado (certo) ou bom
(mau), tentando especificar o que todas as ações erradas (certas) ou todas as pessoas
boas (más) têm em comum.
2.10. Três tipos de argumento morais: dedutivos, indutivos e inferência para
a melhor explicação
A maneira mais simples de se construir uma teoria ética é fazer deduções a partir
de alguma intuição. O primeiro passo é escolher uma intuição que se considere
inegável, algo que seria absurdo negar. Os utilitaristas se baseiam na intuição de que
“prazer é bom e sofrimento é ruim”. A partir disso, eles criaram o princípio da
maximização da utilidade: todas as nossas ações devem causar o máximo de prazer e o
mínimo de sofrimento. Já o egoísta moral escolhe como intuição fundamental a busca
do interesse próprio, tomando como principal moral fundamental que “certo é aquilo
que melhor promove meu interesse”.
Uma segunda maneira de se defender um princípio moral é indutivamente. Isso
normalmente é feito por meio de um raciocínio indutivo conhecido como argumento
por analogia. Em contextos não-morais, sua estrutura é a seguinte:
X tem as características P, Q e R.
Y tem as características P e Q.
Logo, Y provavelmente tem a característica R.
•
Não temos dados sobre o consumo de crack em BH, mas sabemos que em São Paulo, os
usuários normalmente morrem aos 24 anos. Como BH e SP têm o mesmo perfil demográfico, os
usuários de crack em BH provavelmente também morrem aos 24 anos.
•
Ratos com tumores no intestino melhoraram depois de ingerir o medicamento GTR.
Esperamos encontrar resultados semelhantes em seres humanos.
58
Nos argumentos morais por analogia, a comparação acontece entre casos
considerados semelhantes sob os aspectos relevantes. Se um caso é aceito, o outro
também deve ser:
O caso Y possui as características Q e W e é aceito.
O caso X possui as características Q e W.
Logo, o caso X provavelmente também deve ser aceito.
•
•
Como aceitamos que se mate alguém em legítima defesa, então a pena de morte também é
aceitável, já ela é como se fosse a sociedade matando alguém em legítima defesa.
Se você ama cachorrinhos, então por que come vaquinhas?
Esse tipo de argumento utiliza a resposta a um caso consensual como trampolim
para se chegar à resposta a um caso muito controverso. A discussão então normalmente
se concentra em identificar se os casos são realmente semelhantes nos pontos
relevantes, quais são os pontos realmente relevantes e se não há dessemelhanças
relevantes. Entretanto, há risco de cometer a falácia um erro justifica o outro, pois
alguém pode simplesmente recusar a primeira premissa, por exemplo, dizendo que
matar em legítima defesa é inaceitável ou que ela não ama cachorrinhos. Portanto, o
primeiro passo para construir um argumento por analogia sólido é verificar se seu
interlocutor realmente aceita a afirmação moral da qual se parte.
Na verdade, durante a construção de teorias éticas, os argumentos por analogia
servem não apenas para convencer outras pessoas, mas também para testar as regras
morais que já se adotou. Esse é o núcleo do equilíbrio reflexivo (RAWLS, 1971, p. 2021, 48-51), a proposta de que o raciocínio moral seja um processo de revisão constante
tanto dos princípios quantos das intuições morais através da comparação entre os dois.
Em algumas situações é melhor ajustar o princípio à intuição e em outras será melhor
fazer o contrário, até que se encontre o equilíbrio entre eles. Mas esse equilíbrio pode
ser perdido quando um novo caso for encontrado e a regra der uma resposta contraintuitiva (ou o contrário). Partindo-se então para uma nova revisão.
Portanto, no raciocínio moral indutivo usando argumentos por analogia sempre
se parte de um caso aceitável para tentar encontrar a resposta a um caso cuja solução
ainda não está clara. Esse tipo de estratégia é muito empregado pela ética das virtudes e
é o núcleo da regra de ouro, na qual sempre se faz uma analogia entre o que eu gostaria
que fosse feito em relação a mim e o que deve ser feito em relação ao outro.
O terceiro método para se justificar princípios morais é inferência para a melhor
explicação ou raciocínio abdutivo (ou abdução). Em contextos não-morais, esse
59
raciocínio parte de alguns dados não explicados e, quando há mais de uma explicação
possível para eles, conclui que a explicação verdadeira é aquela que explica mais dados
ou explica de maneira mais adequada ou detalhada a mesma quantidade de dados. Veja
a estrutura básica do raciocínio e alguns exemplos:
A explicação X explica os dados R, S, T e U.
A explicação Y explica os dados R, S e T.
Logo, a explicação provavelmente X é verdadeira.
•
•
A seleção natural é verdadeira porque o criacionismo não explica os mamilos masculinos.
O materialismo é verdadeiro porque a crença em almas não explica as perdas cognitivas do
mal de Alzheimer.
Embora muitas vezes a conclusão do raciocínio abdutivo seja apresentada como
uma certeza, ela é apenas provável. Do fato de que uma explicação dá conta de mais
dados, não se pode concluir com certeza que ela é verdadeira, pois pode ser haja outra
teoria ainda melhor ou que os dados sejam tão dessemelhantes que duas teorias sejam
necessárias para explicá-los. Por exemplo, pode ser que tenhamos almas, mas a
percamos logo que o mal de Alzheimer comece e uma segunda alma idêntica à nossa
entra em seu lugar.
Na construção de teorias éticas, a principal tarefa da inferência à melhor
explicação é encontrar uma regra moral capaz de justificar a maior quantidade de
intuições morais e avaliações ponderadas:
A regra X justifica as intuições R, S, T e U.
A regra Y justifica as intuições R, S e T.
Logo, a explicação provavelmente X é melhor.
• A regra de ouro é melhor do que o egoísmo moral porque não tenho coragem de estuprar
alguém.
• O utilitarismo é melhor do que a deontologia porque às vezes é preciso mentir.
Esse método pode ser utilizado não apenas para encontrar as regras morais que
melhor justifiquem nossas intuições, mas também para encontrar as regras morais que
melhor justificam o que está de acordo com certos a requisitos que se considera
importantes: tudo o que a Bíblia diz, a universalizabilidade, o progresso social, a
felicidade de todos etc. Nesses casos a estrutura é a seguinte:
• Devemos sempre obedecer a Bíblia. A Bíblia diz R, S, T e U. A regra X justifica R, S, T e U.
A regra Y justifica R e S. Logo, a regra X é melhor do que a regra Y e deve ser adotada.
• Devemos sempre promover a felicidade de todos os envolvidos. A felicidade de todos é
promovida por R, S, T e U. A regra X justifica R, S, T e U. A regra Y justifica R e S. Logo, a
regra X é melhor do que a regra Y e deve ser adotada.
60
Infelizmente, nem sempre é fácil saber qual método os principais teóricos da
ética utilizaram para construir suas teorias. O mais comum é que uma combinação
desses tenha sido empregada. O mesmo vale para as discussões cotidianas, na mesa do
bar, assistindo a novela, na padaria etc.
2.11. Como avaliar teorias éticas
Durante a história da humanidade, diversas teorias éticas foram desenvolvidas. E
até hoje não há consenso entre os especialistas sobre qual delas é a melhor. O foco aqui
não é explicar detalhadamente cada uma delas, mas sim ir diretamente a seu núcleo e
oferecer alguns critérios para compará-las – os interessados nos detalhes das teorias
podem consultar livros que resumem as principais teorias (RACHELS, 2004; SMITH,
2007/2008), que contenham seleções dos principais textos (BONJOUR; BAKER, 2010;
MARCONDES, 2009) ou ir diretamente aos textos dos autores indicados no cardápio
abaixo.
O núcleo de toda teoria ética é encontrar o que há de comum em todas as ações
corretas (erradas), ou seja, qual é o critério para definir que uma ação é correta (errada).
Veja abaixo uma versão simplificada das respostas dadas pelas principais teorias.
CARDÁPIO DE TEORIAS ÉTICAS
Qual o critério para decidir se uma ação é correta?
Egoísmo ético: a satisfação dos melhores interesses do agente (não necessariamente a curto prazo). Uma
ação é certa se ela é a melhor maneira de satisfazer os desejos do agente.
Subjetivismo: o sentimento de aprovação do agente. Uma ação é certa se é a que melhor desperta um
sentimento de aprovação no agente (HUME, 1739/2009; PRINZ, 2008).
Relativismo cultural: a opinião que prevalece na cultura do agente. Uma ação é certa se a cultura do
agente diz que ela é certa (cf. PRINZ, 2008).
Teoria do comando divino: a vontade de Deus. Uma ação é certa se Deus diz que ela é certa (TOMÁS
DE AQUINO, 1947; QUINN, 2006).
Existencialismo: a expressão da autenticidade do agente. Uma ação é certa se ela é uma expressão da
autenticidade do agente (NIETZSCHE, 1887/1998; SARTRE, 1946/1989; CAMUS, 1942/1989,
1951/1996).
Perfeccionismo: a promoção das qualidades do agente. Uma ação é correta se ela promove ao máximo as
qualidades do agente.
Teoria das virtudes: o tipo de pessoa que você quer ser. A ação correta é aquela que está mais de acordo
com o ideal de pessoa que você tem para si mesmo (ARISTÓTELES, 2002; MACINTYRE, 1981,
ANNAS, 2006).
Utilitarismo de atos: a maximização da felicidade (ou bem-estar etc.) considerando todos os afetados
pela ação. Uma ação é correta se ela maximiza a felicidade geral (BENTHAM, 1781/1988, MILL,
1859/2000).
61
Utilitarismo de regras: a compatibilidade com regras que geram a maximização da felicidade (ou bemestar etc.) considerando todos os afetados pela ação. Uma ação é correta se ela está de acordo com regras
que maximizam a felicidade geral (HARE, 1997; PARFIT, 2011).
Deontologia kantiana: a universalizabilidade. Uma ação é correta se ela poderia se tornar uma lei
universal ou se ela trata as pessoas como fins, não apenas como meios (KANT, 1785/1986).
Contratualismo da vantagem mútua: a vantagem mútua. Uma ação é correta na medida em que ela
´vantajosa para todas as partes envolvidas (HOBBES, 1651/2008; GAUTHIER, 1986).
Contratualismo rawlsiano: a escolha na posição original sob um véu de ignorância. Uma ação é certa se
ela seria a escolhida pelas partes na posição original sob um véu de ignorância (RAWLS, 1971/2002).
Contratualismo scanloniano: a não-rejeitabilidade por agentes racionais. Uma ação certa é aquela que
não poderia ser rejeitada por um agente racional (SCANLON, 1998).
Libertarianismo: o respeito à posse dos agentes sobre si mesmos. A ação correta é aquela que respeita o
direito natural dos agentes à posse de si mesmos (LOCKE, 1694/1975; NOZICK, 1974).
Liberalismo clássico: não prejudicar outras pessoas. A ação correta é aquela que não prejudica outras
pessoas (MILL, 1859/2000).
Principialismo: a compatibilidade com os quatro princípios (devidamente balanceados). Uma ação é
correta se ela é compatível com os quatro princípios: respeito à autonomia, não-maleficência,
beneficência e justiça (BEAUCHAMP; CHILDRESS, 1994/2002).
Comunitarismo: a valorização dos laços comunitários ou do bem comum. A ação correta é aquela que
valoriza os laços comunitários ou o bem comum (SANDEL, 2007, 2012; MACINTYRE, 1981, 1988).
Regra de ouro: a intercambiabilidade de perspectivas. A ação correta é aquela em que o agente (não) faz
com os outros o que gostaria que (não) fizessem com ele (PINKER, 2011; NAGEL, 1970; SINGER,
1981/2011).
Mas como decidir entre essas teorias? Como compará-las? Qual deve ser o
critério para decidir se uma teoria é boa ou ruim? A principal dificuldade dessa tarefa
está no fato de que é impossível avaliarmos as teorias éticas sem fazermos avaliações
morais. Ao dizer que a teoria X é injusta porque ela justificaria fazer Y, já estamos
empregando uma teoria ética. Não há saída, é preciso reformar o barco sem sair do mar.
Há critérios que supostamente são não-morais: consistência, amplitude,
fertilidade, universalizabilidade, funcionalidade etc. Entretanto, já há algo de moral
nesses critérios, pois alguém pode fazer perguntas do tipo: que mal há em ser
inconsistente? Por que querer sempre ter uma resposta certa? Essas perguntas fazem
parte daquela categoria de perguntas estranhas, cujas respostas parecem óbvias. Mas
não são. O problema de ser inconsistente é que é difícil conviver com pessoas das quais
não se sabe o que esperar. E essa crítica já supõe que é preciso ser uma pessoa com que
seja possível conviver, o que é uma afirmação moral (isto é, sobre certo e errado na
maneira de tratar os outros).
Nesse ponto, muitos autores entregam os pontos e dizem que a moralidade é
uma ilusão (JOYCE, 2006), que avaliações morais não fazem sentido (STEVENSON,
1937), que é impossível construir teorias éticas (MACKIE, 1977) e que devemos nos
calar sobre esse assunto (WITTGENSTEIN, 1921/1999).
Não é possível dar uma resposta satisfatória a essas críticas sem nos distanciar
dos objetivos deste livro, mas o que essas críticas parecem esquecer é que é
62
simplesmente impossível fugir à questão de como organizar o convívio entre os sete
bilhões de seres humanos e que há regras de convívio que acabam gerando mais
conflitos ao invés de reduzi-los.
Se a moralidade for entendida como as regras de convívio que tornam a
sociedade possível, não há nada de ilusório na moralidade e não há nenhum
impedimento instransponível para a construção de teorias sobre as melhores formas de
organização. Quanto ao fato de toda avaliação das teorias éticas ser ela mesma
permeada de suposições éticas, devemos vestir a carapuça e nos satisfazer em promover
ajustes internos e provisórios como propõe o equilíbrio reflexivo. Na verdade, sem
perceber, é isso que a humanidade tem feito durante sua história moral e há bons
motivos para acreditar que foi uma história de progresso moral (PINKER, 2011). E é
também por meio desse tipo de ajuste interno e provisório que as ciências naturais
avançam, apesar de muitos ainda olharem para elas como se estivessem descobrindo
verdades neutras e eternas.
Voltemos então à avaliação das teorias sobre como decidir o que é certo e
errado. A proposta a ser defendida aqui é que os critérios de avaliação das teorias éticas
são semelhantes aos utilizados para avaliar teorias científicas. Os critérios normalmente
apresentados para testar teorias científicas são:
Consistência: quanto menos afirmações que se contradigam ela tiver, melhor a teoria.
Testabilidade (falsificabilidade): quanto mais fácil for testar se suas hipóteses são verdadeiras,
melhor a teoria.
Exatidão: quanto mais precisas forem suas previsões, melhor a teoria.
Alcance: quanto mais fenômenos diferentes ela puder explicar, melhor a teoria.
Fertilidade: uma teoria é melhor quanto mais previsões até então desconhecidas ela fizer.
Simplicidade: uma teoria é melhor quanto menos suposições ela fizer.
Conservadorismo: uma teoria é melhor quanto mais se adequar ao conhecimento pré-existente
(inclusive de outras áreas).
É possível adaptar esses critérios para avaliar teorias morais. O primeiro critério
de uma teoria moral é sua consistência interna. Há inconsistência interna em uma teoria
quando há contradições entre as afirmações que ela faz, quando nem todas as suas
afirmações podem ser verdadeiras ao mesmo tempo. Uma teoria inconsistente não
cumpre sua principal função, dizer o que há de comum entre todas as ações imorais.
Porém, assim como as teorias científicas procuram explicar as causas de eventos
e tentam ser consistentes com todos os dados relevantes, as teorias éticas procuram
explicar o que torna as ações certas ou erradas (e as pessoas boas ou más) e tentam ser
consistentes com dados morais, uma consistência externa. Os dados morais são nossas
intuições e avaliações ponderadas. Se determinada teoria ética implica que coisas que
63
julgamos obviamente imorais (escravidão, tortura de crianças inocentes por diversão
etc.) como aceitáveis e considera imorais coisas que julgamos aceitáveis, esse é um
ponto negativo ao compará-la com outra teoria. Por exemplo, uma crítica que
normalmente se faz ao utilitarismo em geral é que ele é muito exigente, pois exigiria de
nós muito mais altruísmo do que estamos acostumados a aceitar – ao passo que o
egoísmo moral exigira muito menos altruísmo do que consideramos adequado. Nesse
sentido, é melhor que a teoria ética seja conservadora ao invés de revisionista. Portanto,
o segundo critério de adequação de uma teoria ética é o conservadorismo ou
intuitividade: a consistência com nossas intuições e avaliações ponderadas.
Assim como uma teoria científica adquire credibilidade à medida que consegue
solucionar mais problemas (fertilidade) e em diferentes áreas (alcance), uma teoria ética
se torna melhor à medida que ajuda a tomar decisões morais em uma maior quantidade
de situações diferentes e chama a atenção para questões morais que antes não
percebíamos – mas que deveríamos ter percebido dadas as nossas crenças morais. P. ex.,
se os mesmos princípios ajudam a explicar porque é errado mentir, matar e roubar, mas
ajudam também a explicar em quais situações seria aceitável desrespeitar essas regras;
ou se os mesmos princípios esclarecem a moralidade das cotas raciais, as intervenções
diretas no cérebro e o problema da desobediência civil. Além disso, conta a favor das
teorias se elas são úteis especialmente em dilemas morais, aquelas situações em que há
conflito entre regras morais que aceitamos. Portanto, o fato de uma teoria ética ser
aplicável em diversas áreas, identificar novos problemas e conciliar crenças morais
conflitantes é um sinal de qualidade dessa teoria. Quanto maior o alcance (incluindo a
fertilidade) de uma teoria ética, melhor ela é.
O quarto critério de avaliação de uma teoria moral é sua capacidade de gerar
estabilidade social. Muitos teóricos da ética recusam completamente esse tipo de
critério, dizendo que ele já é uma avaliação moral explícita. Por exemplo, os
existencialistas poderiam dizer que devemos buscar a autenticidade mesmo que isso
signifique prejudicar a vida social. Os críticos estão certos ao dizer que apontar a
estabilidade social como critério é já fazer uma avaliação moral, mas apenas em certo
sentido. Em um sentido mais profundo, a existência de uma vida social minimamente
estável é uma precondição para a nossa vida porque somos um tipo de animal muito
dependente de outros membros da nossa espécie, da nossa fragilidade ao nascer à nossa
dependência da divisão social do trabalho.
64
A essas observações os críticos podem responder com a acusação de falácia
naturalista. Não é porque somos animais sociais que devemos usar a estabilidade social
como critério. A tréplica a essa objeção é que um mundo humano de instabilidade social
seria muito esvaziado, uma sociedade de psicopatas é um oxímoro. Basta pensar em
como é a vida durante uma guerra civil. O ponto não é que seja moralmente certo
incentivar a sociabilidade, mas sim que sem a estabilidade social inaceitável a vida
humana não existira, ela “solitária, pobre, desagradável, bruta e curta” (HOBBES,
1651/2008). Portanto, uma teoria ética deve ser capaz de garantir um mínimo de
estabilidade social (vale notar que isso é muito diferente de dizer que os interesses da
sociedade devem sempre prevalecer sobre os interesses do indivíduo).
O critério da testabilidade normalmente é considerado inaplicável às teorias
morais. Contudo, ele pode se tornar pertinente em um sentido um pouco mais
específico, muito importante para a aplicação da teoria. O teste de teorias éticas que
mais se aproxima dos experimentos científicos é pensar em contra-exemplos, reais ou
imaginários. Porém, há um segundo sentido em que é possível exigir que as bases das
teorias éticas sejam testáveis. Há teorias cujos critérios são fáceis de utilizar e outras
que propõem critérios quase impossíveis de verificar em casos concretos. Pelo menos
até certo ponto, é possível verificar o sofrimento, a racionalidade, os sentimentos e as
preferências dos indivíduos ou as opiniões e tradições de uma cultura, mas não é
possível verificar a vontade de Deus (mesmo a análise de textos sagrados é muito
controversa), o que um homem virtuoso faria, as preferências das gerações de um futuro
distante ou os detalhes da maximização de utilidades.
Portanto, a possibilidade de se verificar as variáveis determinantes das
avaliações pode ser um critério de adequação das teorias éticas. Algumas teorias
indicam mais precisamente qual é a resposta correta, enquanto outras ou não dão
resposta alguma ou dão apenas indicações muito gerais. Essa verificabilidade inclui a
simplicidade, pois quanto mais simples a teoria, tudo o mais permanecendo igual, mais
fácil é identificar o que se deve fazer. Esses fatores (verificabilidade, precisão e
simplicidade) podem ser agrupados em um só ideia, a funcionalidade de uma teoria
ética, sua capacidade de identificar qual é a resposta mais adequada em uma situação
específica. Portanto, quanto maior a funcionalidade de uma teoria ética, melhor ela é.
Portanto, os critérios de adequação das teorias éticas são: (1) consistência, (2)
intuitividade, (3) alcance, (4) estabilidade e (5) funcionalidade. O que há de mais
controverso nesses critérios é que muitos pesquisadores (e também as pessoas em geral)
65
não estão acostumados a ver a moralidade como um tipo de construção imperfeita e
provisória, mas sim como um tipo de descrição definitiva de estruturas eternas da
realidade que são independentes da mente humana. Essa visão é o realismo moral
tradicional. Eles podem reclamar que os critérios de avaliação de teorias éticas que
foram propostos aqui, são muito partidários de uma forma de realismo chamada
construtivismo moral, a ideia de que a moralidade é algo que é construído pela mente
humana, que não existe sem ela. Talvez eles tenham razão. Por isso, é melhor usar os
critérios apresentados com cautela, pois eles podem atrapalhar ao invés de ajudar na
busca por consenso.
Eis um exercício fadado ao fracasso, mas que pode ajudar a pensar. Atribuindo
valores de 0 a 3 em cada um dos critérios, podemos montar a seguinte tabela
comparativa entre os méritos das principais teorias morais:
Teorias
Egoísmo
Subjetivismo
Relativismo
C. Divino
Existencialismo
Perfeccionismo
T. das virtudes
Util. de atos
Util. de regras
Deontologia
Cont. rawls.
Cont. scanl.
Libertarianismo
Lib. clássico
Comunitarismo
Principialismo
Regra de ouro
Intuitividade
2
3
1
2
2
1
2
0
2
2
2
2
3
3
1
2
3
Alcance
2
2
0
1
0
0
2
3
3
3
2
2
2
2
1
2
2
Estabilidade
0
0
2
1
0
2
2
0
2
3
3
3
3
3
3
2
3
Funcionalidade
3
3
1
2
0
2
0
2
3
3
3
3
3
3
3
2
3
Resultado
7
8
4
6
2
5
6
5
10
11
10
10
11
11
8
8
11
[a conclusão do capítulo será escrita depois das discussões em sala de aula]
66
Resumo:
•
Um argumento moral é um argumento em que a conclusão é uma afirmação moral.
•
Uma afirmação moral é uma afirmação de que algo é certo ou errado, bom ou mau.
•
Argumento moral padrão é composto de: premissa moral (expressando uma regra
moral geral); premissa não-moral; uma conclusão que é uma afirmação moral.
•
Alguns dos elementos podem estar implícitos, geralmente a premissa moral.
•
Uma falácia é um erro em um raciocínio.
•
Para identificar a premissa moral implícita basta tratar o argumento como dedutivo
e fornecer a premissa que tornaria o argumento válido.
•
O melhor teste da verdade de princípios morais é procurar contra-exemplos.
•
Teorias éticas são tentativas de encontrar o que torna algo certo ou errado, o que há
de comum em tudo o que é errado.
•
Os critérios de adequação das teorias éticas são: (1) consistência, (2) intuitividade,
(3) alcance, (4) estabilidade e (5) funcionalidade.
2.12. Como escrever textos argumentativos
•
•
•
•
•
•
•
•
•
•
•
•
Escolha uma pergunta (objeto de estudo) que seja possível responder.
Defina os termos importantes.
Evite linguagem apelativa ou emotiva, ataques pessoais e adjetivos em geral.
Seja claro, evite palavras difíceis, evite ambiguidade e dupla negação.
Dê exemplo (mais de um).
Procure e discuta contra-exemplos
Indique as fontes (e use fontes confiáveis e imparciais).
Tente antecipar as objeções/críticas do interlocutor.
Guarde os melhores argumentos para o final.
Evite argumentos fracos.
Evite discordâncias.
Lembre-se: a ética é composta por problemas a resolver, não uma competição a
ganhar.
Modelo de texto argumentativo
Introdução: o que quero provar?
Desenvolvimento: o que posso apresentar a favor dessa posição?
Conclusão: por que os argumentos provam a afirmação?
- Introdução: o parágrafo inicial sucinto em que sua posição (tese) é apresentada em
forma de uma afirmação clara e precisa. Pode também incluir algum comentário sobre a
posição contrária.
67
- Desenvolvimento: apresentação dos argumentos que comprovam sua afirmação,
podem ser fatos, exemplos, citações, testemunhos, dados estatísticos etc. Essas partes
pode conter um, dois ou vários parágrafos. Pode também incluir alguma comparação
com a posição contrária.
- Conclusão: parágrafo final no qual a posição é reafirmada, fazendo-se referência ao
que foi dito no desenvolvimento. Pode também incluir algum comentário sobre a
posição contrária.
Modelo de introdução
Comece com um princípio moral amplamente aceito e indique a conclusão que você vai
defender.
“Se o sofrimento desnecessário de milhões de pessoas é algo ruim e que deve ser
evitado tanto quanto possível, não é difícil mostrar que nosso mundo é muito injusto. As
evidências falam por si mesmas. Enquanto a fome é a maior causa de mortes no mundo
(ZIEGLER, 2006), todos os anos os europeus e estadunidenses gastam em perfumes e
comida para cachorros o dobro do que seria necessário para suprir as necessidades
nutricionais e de saúde no mundo inteiro (VERDÚ, 2003). Por isso, diminuir a pobreza
global é uma das questões mais urgentes que o mundo enfrenta” (VÉLIZ, 2012).
Modelo de desenvolvimento
Apresente os argumentos em disputa de maneira clara.
“Dois tipos de argumento são normalmente usados entre os filósofos para tentar
convencer as pessoas a cumprir seus deveres morais em relação aos que estão em pior
situação. O primeiro tipo apela a deveres positivos. Peter Singer é famoso por defender
que se está em nossas mãos evitar que algo de ruim aconteça, sem com isso sacrificar
nada que tenha a mesma importância moral, então temos a obrigação de fazê-lo
(SINGER, 1972). O segundo tipo apela a deveres negativos. Thomas Pogge tem
defendido que os países ricos têm o dever negativo de reparar os prejuízos feitos aos
países pobres por causa de uma história de violência, por impedirem que usufruíssem
dos recursos globais e por se aproveitarem de uma ordem institucional injusta (POGGE
2001)” (VÉLIZ, 2012).
Conjunções:
Adversativas (oposição): mas porém, todavia, contudo, entretanto, apesar disso, ainda
assim, no entanto
Conclusivas: logo, portanto, por isso
Explicativas: pois, porque, dado que, como, visto que, pois que, já que
Comparativas: assim como, ao passo que, enquanto que
2.13. Cardápio de temas
Obs.: essas são apenas sugestões para os trabalhos, você pode pensar em outros.
Direitos dos homossexuais
- A homofobia deve ser criminalizada?
- Homossexuais devem ter direitos iguais de casamento?
- Casais homossexuais devem poder adotar crianças?
- Casais homossexuais devem poder fazer inseminação artificial?
- É aceitável recusar doação de sangue de homens que transaram com homens no último ano?
Legalização das drogas
- As drogas recreativas devem continuar sendo proibidas? Todas?
68
- O tratamento compulsório de dependentes de crack é imoral?
- Os dependentes devem ser tratados como doentes ou a pessoa é responsável pelo vício?
Ética no início da vida (aborto, células-tronco embrionárias etc.)
- Quais os melhores argumentos contrários à legalização do aborto?
- É aceitável destruir embriões para produzir células tronco?
- O argumento da potencialidade é convincente?
Ética e genética
- Deve ser permitido selecionar embriões geneticamente? Nunca? Sempre?
- Toda seleção para melhoramento é inaceitável?
- Toda seleção para terapia é aceitável?
- Os indivíduos devem ter o direito de saber se possuem propensão a alguma doença genética?
- Devemos procurar saber se temos propensão a alguma doença genética, mesmo que não haja tratamento?
- Os governos devem ter o direito de criar bancos de informação genética de seus cidadãos? Nunca? Sempre?
- Se o governo pode exigir as digitais de um suspeito, também pode exigir exames genéticos dele?
Neuroética
- No caso de criminosos sexuais, a castração química voluntária/involuntária deve poder substituir a detenção?
- No caso de criminosos dependentes químicos, os bloqueadores dos receptores de opióides voluntária/involuntária
deve poder substituir a detenção?
- Deve ser permitido o uso de exames de ressonância magnética funcional nos tribunais? Pela defesa e pela acusação?
Os tribunais podem requerer esses exames?
- Deve ser permitido o uso de supostos “detectores de mentiras” nos tribunais? Nas áreas criminais e também nas
cíveis? Pela defesa e pela acusação? Os tribunais podem requerer esses exames?
- Deve ser permitido apagar memórias em alguma situação? É justificável fazer isso em casos de transtorno do stress
pós-traumático (p. ex., depois de estupros ou em veteranos de guerra)?
- A vontade quem quer se amputar deve ser respeitada? Mesmo que isso seja causado por anomalias cerebrais?
- Obesidade: guloso e preguiçoso ou doente?
- Alcoolismo: vagabundo ou doente? A pressão social para o alcoolismo (festas, propagandas etc.) deve ser
desestimulada?
- O uso de metilfenitado (Ritalina) para melhoramento deve ser permitido?
Paternalismo libertário
- Em quais situações é aceitável que o estado direcione as escolhas dos cidadãos?
Ética das máquinas
- quais as regras éticas que devem ser seguidas no desenvolvimento de softwares?
- quais as regras éticas que devem ser seguidas no desenvolvimento de robôs (agentes artificiais)?
- as três leis da robótica são necessárias e suficientes?
Pobreza e desigualdade
- Políticas de transferência de renda (p. ex., bolsa família) são imorais?
- Temos a obrigação de acabar com a pobreza?
Não, libertarismo.
Não, conservadorismos.
Sim, maximização (Singer, 2010).
Sim, contratualismo (Pogge, 2001).
Feminismos
- O estado deve criar políticas para desestimular a objetificação das mulheres ou deve respeitar a ordem natural das
coisas?
- Há alguma contradição em mulheres defenderem o feminismo protestando nuas?
Ética dos videogames
- Os videogames devem ser ser proibidos/regulados porque causam violência?
http://www.nytimes.com/2013/02/12/science/studying-the-effects-of-playing-violent-video-games.html?hp&_r=1&
- Há videogames imorais (estupros, perspectiva do mal)?
Os jogos mais imorais: http://www.youtube.com/watch?feature=endscreen&NR=1&v=sCqKVpDz7oI
Os jogos mais violentos: http://www.youtube.com/watch?v=uUtN1aojey8
Os fatalities mais violentos:
http://www.youtube.com/watch?annotation_id=annotation_983964&feature=iv&src_vid=uUtN1aojey8&v=9uL2FQ
DVWgE
Eutanásia
- Há casos em que é aceitável ajudar alguém a morrer?
69
- A eutanásia deve ser legalizada?
- A distinção entre eutanásia e ortotanásia é justificada?
Direitos dos animais
- Protecionismo (Garner) vs. abolicionismo (Francione)
- Temos a obrigação de nos tornarmos vegetarianos?
- Deve ser proibido comer carne de outros animais? De todos?
A religião na esfera pública
- Qual deve ser o papel de dogmas religiosos nos debates públicos e na definição de políticas públicas?
- O ensino religioso nas escolas deve ser obrigatório?
- O ensino de criacionismo deve ser permitido nas escolas privadas? E nas escolas públicas? Ele deve ser obrigatório?
Quais os limites morais da publicidade? Há limites para a mentira? Objetificar mulheres, de bebidas, de
medicamentos, infantil
Quais os limites da liberdade de expressão?
Ética do futebol
Ética na criação de filhos
Justiça global
Quais devem ser os limites da liberdade religiosa?
Critérios de distribuição de recursos
Cotas raciais e sociais nas universidades
Copyrights são imorais? Quando? Sempre?
Ética e internet: - democracia sem fronteiras
Ética na guerra
Problemas morais na indústria farmacêutica.
Doenças negligenciadas e abismo 10/90: apenas 10% das pesquisas médicas é direcionada às doenças que mais
afetam os 90% mais pobres (malária, dengue, hanseníase, tuberculose etc.).
Tratamento ouro vs placebo em experimentação
A pirataria de textos, filmes, videogames etc. é moralmente justificada?
Deve ser permitido vender seus órgãos para transplante?
O MMA deve ser proibido?
O doping deve ser flexibilizado? Quais substâncias devem ser proibidas?
Há problema morais nos tratamentos de beleza (cirurgias plásticas, botox)?
Pitbulls devem ser proibidos?
Deve ser proibido fabricar carros que andem acima do limite de velocidade?
Justificativas da punição
O infanticídio indígena deve ser permitido?
A transfusão de sangue deve ser feita em filhos de Testemunhas de Jeová mesmo contra a vontade dos pais?
Ética e envelhecimento
Quais melhoramentos devem ser permitidos?
Quais tipos de impostos são mais justos? Justiça tributária
Exercícios
1.
Indique se os argumentos são válidos (V) ou inválidos (I).
Dicas: 1. Transforme os argumentos em esquemas do tipo: se A é B e B é C. Logo, A é C. O item (a) abaixo
fornece um exemplo.
2. Faça diagramas com círculos para pensar argumentos que tenham quantificadores (todos, nenhum, algum).
( ) a- Todo desempregado passa fome. João está desempregado. Logo, João passa fome.
Todo D é F. J é D. Logo, J é F
( ) b- Errar é humano. Wesley é humano. Portanto, Wesley pode errar.
( ) c- Todo menor de 16 anos é incapaz. Fran tem 15 anos. Por isso, Fran deve ser considerada incapaz.
( ) d- Supondo que toda cidade tenha prefeito e sabendo que Alfenas tem prefeito, podemos ter certeza
de que Alfenas é uma cidade.
( ) e- Toda cidade tem mais de 1000 habitantes. Nova Lima fica em MG. Logo, Nova Lima tem uma
vida noturna calma.
( ) f- Toda modelo é magra. Maria é magra. Logo, Maria é modelo.
( ) g- Se todo gay é homem e se Pedro é homem, então, Pedro é gay.
70
( ) h- Como todo flamenguista é brasileiro e como Dilermano é brasileiro, portanto, Dilermano é
flamenguista
( ) i- Todo aluno de Direito tem aula de Filosofia. Rafaela faz direito. Então, Rafaela tem aula de
Filosofia.
( ) j- Todo desempregado passa fome. João passa fome. Portanto, João está desempregado.
( ) k- Todo aluno de Direito tem aula de Filosofia. Rafaela tem aula de Filosofia. Então, Rafaela faz
Direito.
( ) l- Todo cavalo é mamífero. O cavalo tem quatro patas. Logo, todo mamífero tem quatro patas.
( ) m- Todo político brasileiro é corrupto. Manoel é um político brasileiro. Logo, Manoel é corrupto.
( ) n- Se para ser advogado tem que passar na prova da OAB, se Renato for advogado, então ele passou
na prova da OAB.
( ) o- Todo baiano é preguiçoso. Bruna é baiana. Logo, Bruna é preguiçosa.
( ) p- Todo corintiano é marginal. Bruzulato é corintiano. Logo, Bruzulato é marginal.
( ) q- Todo universitário é baladeiro. Alex é universitário. Logo, Alex é baladeiro.
( ) r- Todo universitário fuma maconha. Ivan fuma maconha. Logo, Ivan é universitário.
( ) s- Todo mineiro gosta de pão-de-queijo. João tem 19 anos. Logo, Maradona é pior do que Pelé.
( ) t- Todo perfume importado é caro. Perfumes da Dior são importados. Logo, perfumes da Dior são
caros.
( ) u- Toda borracha apaga. Eu tenho uma borracha, isso quer dizer que minha borracha apaga.
( ) v- Se tudo que é um parque de diversões, tem brinquedos, e o Hopi Hari é um parque de diversões,
então ele deve ter brinquedos.
( ) w- Toda modelo de passarela é alta. Gisele Bündchen é modelo de passarela. Logo, Gisele é alta.
( ) x- Todo presidente é inteligente. Giovanni é aluno. Logo, Giovanni é presidente.
( ) y- Todo professor de Filosofia é lindo. A Nivalda dá aula de sociologia. Logo, a aula da Nivalda é
legal.
2.
Indique se o argumento é inválido (I), válido mas infundado (D) ou se além de válido também é
sólido (S).
( ) a- Digamos que nenhum homem seja solteiro e que João seja solteiro, então podemos concluir que
João não é homem.
( ) b- Alguns homens são solteiros. João é homem. Portanto, é possível que João seja solteiro.
( ) c- Nem todo mineiro é atleticano. André é paulista. Isso quer dizer que ele não é atleticano.
( ) d- Todo quadrado tem quatro lados. Todo triângulo tem três lados. Então, nenhum triângulo é um
quadrado.
( ) e- Todo presidente é inteligente. Giovanni é aluno. Logo, Giovanni é presidente.
( ) f- Se é verdade que alguns homens são simpáticos, então devemos concluir que Camila é um homem,
pois ela é simpática.
( ) g- Nenhum ser humano tem asas. Os pássaros têm asas. Logo, os pássaros não são seres humanos.
3.
Indique quais argumentos são dedutivos (D) e quais são indutivos (I):
( ) a- Joana é minha filhinha de quatro anos, então ela não pode ser minha mãe.
( ) b- Carol, a filha da vizinha, com certeza tem mais de 16 anos, porque sei que ela votou e para votar é
preciso ter mais de 16 anos.
( ) c- Todos os dias da semana passada ele chegou atrasado, então é provável que hoje ele também se
atrasará.
( ) d- Acho que vai chover, quando venta assim costuma chover.
( ) e- Nem sempre as pessoas falam a verdade, mas pelo que conheço dele, acredito no que ele está
dizendo.
( ) f- Temos que respeitar os emos.Todos os seres humanos merecem respeito e os emos são seres
humanos.
4. Descubra quais são as premissas implícitas nos argumentos abaixo (anote as respostas em outra folha).
a) Parece que estou apaixonado, mas devo estar errado. Se fosse amor o que estou sentindo, ela também
sentiria o mesmo.
b) Ele está mentindo, repare: ele não consegue olhar nos olhos dela.
c) Não tenho dúvidas de que ela seja europeia, vi em seu passaporte que ela é dinamarquesa.
d) Vote no Ciclano, ele construiu o Hospital Tal.
71
e) Pai, perdoai-os, eles não sabem o que fazem.
f) Com certeza ele é mineiro, ele nasceu em João Monlevade.
g) Sou brasileiro, não desisto nunca.
h) Não podemos permitir o aborto porque ele é o assassinato de um inocente.
i) Não vote no fulano de tal, ele rouba.
j) Todo perfume importado é caro. Por isso que os perfumes da Dior são caros.
k) Se ele não te liga, você tem que partir para outra.
l) Toda criança gosta de chupeta, por isso que a Júlia não larga a dela.
5. Qual dos argumentos abaixo é válido, mas falso?
( a ) Por mais que sejam necessitados, os sem-teto não têm o direito de invadir prédios desocupados sem
autorização do proprietário. Isso prova que a pesquisa com células-tronco embrionárias deve ser feita com
cautela.
( b ) Todo criminoso é paulista. Se João já cometeu vários crimes, então não há dúvidas de que ele seja
paulista.
( c ) Toda mentira é imoral. Não importa se foi para salvar sua mãe, não é certo matar alguém.
( d ) Já que todo solteiro não é casado e Carlos está solteiro, então ele não é casado.
6. Qual dos argumentos abaixo é inválido?
( a ) Se nenhum brasileiro é atleta e todo atleta é bonito, então nenhum brasileiro é bonito.
( b ) Brasileiros não desistem nunca. Já que sou brasileiro, não desisto nunca.
( c ) Tudo que não me mata, me fortalece. Perder o emprego não vai me matar. Então, se eu perder o
emprego, isso vai me fortalecer.
( d ) É preciso fazer revisão no carro anualmente. Já faz um ano que fiz a última revisão. Isso quer dizer
que preciso levar o carro para a revisão.
7. Qual dos argumentos abaixo é indutivo?
( a ) Todo mundo que recebe o Bolsa-Família tem a obrigação de manter a frequência escolar dos filhos.
Se Joana tem filhos em idade escolar e recebe o Bolsa-Família, ela tem a obrigação de cuidar para que seu
filho frequente a escola.
( b ) Todo mundo que entra na universidade tem a possibilidade de melhorar de vida ao ampliar seus
horizontes e não deve desperdiçá-la. Se você está na universidade, você não deve desperdiçar essa chance
de melhorar de vida ao ampliar seus horizontes.
( c ) Já conheci mais de dez cariocas e todos eles eram flamenguistas, então eu acho que todo carioca é
flamenguista.
( d ) Ninguém tem o direito de matar um inocente. A maioria dos moradores das comunidades dominadas
pelo tráfico de drogas é inocente. Logo, a polícia não tem o direito de matá-los.
8. Qual dos argumentos abaixo é indutivo?
( a ) Todos os seres humanos merecem respeito e os emos são seres humanos. Temos que respeitá-los.
( b ) Segundo a Constituição de 88, “ninguém será submetido a tortura nem a tratamento desumano ou
degradante”. Juliano foi torturado pelos policiais para confessar o crime. Logo, supondo que não haja
exceção àquele preceito constitucional, os policiais desrespeitaram a Constituição.
( c ) Os fetos têm almas, já que todo ser humano tem alma e eles são seres humanos.
( d ) De acordo com Juliano, ele foi torturado pelos policiais. Foram encontrados hematomas em seu
corpo os quais ele não possuía antes do interrogatório e, além disso, os policiais que o interrogaram já
foram acusados de torturar suspeitos. Tais indícios levam a crer que é possível que Juliano tenha sido
torturado.
9.
“Já que a pílula do dia seguinte é permitida e já que ela impede que o zigoto (o que surge da
união entre óvulo e espermatozóide) se implante, então, ou ela deve ser proibida ou os outros abortos
também devem ser permitidos”. Qual das alternativas abaixo se encaixa melhor como premissa implícita
desse argumento?
( a ) Impedir a implantação do zigoto é um tipo de aborto.
( b ) O aborto é um assassinato.
72
( c ) A pílula do dia seguinte não deve ser ingerida sem orientação médica.
( d ) Abortos feitos no início da gestação são significativamente diferentes de abortos feitos no final da
gestação.
10. Qual dos argumentos abaixo é válido?
( a ) Se todo brasileiro sabe voar e Joana é brasileira, então ela sabe voar.
( b ) Se nenhum ser humano pode voar e Dedé tem coração, então ele não pode voar.
( c ) Se alguns brasileiros são corintianos e todo corintiano é paulista, então existem brasileiros que são
flamenguistas.
( d ) Mesmo sem conhecê-la, posso dizer que ela é bonita, pois ela nasceu em Buenos Aires e todo
europeu é bonito.
11. Qual dos argumentos abaixo é válido?
( a ) Como todo flamenguista é brasileiro e como Dilermano é brasileiro, portanto, Dilermano é
flamenguista.
( b ) Como todo homem safado mente e como Tiago mentiu, isso mostra que Tiago é um homem safado.
( c ) Como todo feriado João bebe até cair e como sexta passada ele bebeu até cair, podemos concluir que
sexta passada foi feriado.
( d ) Como todo alfenense gosta de axé e como Cláudia é alfenense, logo, podemos concluir que ela gosta
de axé.
12. Qual dos argumentos abaixo é inválido?
( a ) Todo mundo que quer ter uma profissão precisa estudar e todo universitário quer ter uma profissão.
Logo, todo universitário precisa estudar.
( b ) Todo universitário quer ter uma profissão e todo universitário precisa estudar. Logo, algumas
pessoas que querem ter uma profissão precisam estudar.
( c ) Todo universitário quer ter uma profissão e todo universitário precisa estudar. Logo, todo mundo que
quer ter uma profissão precisa estudar.
( d ) Nem todo universitário quer ter uma profissão e todo universitário precisa estudar. Logo, algumas
pessoas que não querem ter uma profissão precisam estudar.
13. Qual dos argumentos abaixo é dedutivo?
( a ) Carol, a filha da vizinha, com certeza tem mais de 16 anos, porque sei que ela votou e para votar é
preciso ter mais de 16 anos.
( b ) Se todos os dias da semana passada ele chegou atrasado, então é provável que hoje ele também se
atrasará.
( c ) Ano passado choveu nessa época do ano e no ano retrasado também, por isso, talvez chova esse ano.
( d ) O deputado Bituquinha foi muito bom em todos os seus mandatos, então é provável que ele será
muito bom se for eleito novamente.
14. Qual dos argumentos abaixo é indutivo?
( a ) Geraldo está sujeito a cometer erros, pois ele é humano e nós, seres humanos, cometemos erros.
( b ) Todo perfume importado é caro. Como os perfumes da Dior são importados, eles são caros.
( c ) Todo gato é mamífero. Se Tom for um gato, então ele também é mamífero.
( d ) Quase todas as vezes que fui no Carnalfenas teve briga, então, é provável que tenha alguma briga
esse ano também.
15.
“A pena de morte é inaceitável. Ela só se justificaria se servisse para evitar assassinatos. Mas
isso aconteceria somente se os assassinos pensassem antes de agir, que dizer, se eles considerassem as
consequências de suas ações. Mas não é isso o que acontece, eles não pensam antes de matar”. Qual é a
conclusão desse argumento?
( a ) A pena de morte só é aceitável para evitar assassinatos.
( b ) Os assassinos não pensam antes de matar.
( c ) A pena de morte é inaceitável.
73
( d ) É preciso pensar nas consequências de nossas ações.
16. Quais são as premissas do argumento citado na questão anterior?
( a ) A pena de morte é inaceitável; assassinatos só seriam evitados pela punição se os criminosos
pensassem nas consequências de suas ações; e os assassinos não pensam antes de matar.
( b ) É preciso punir severamente os assassinos; nenhuma punição é maior que a morte; e eles fizeram por
merecer.
( c ) A pena de morte só é aceitável para evitar assassinatos; assassinatos só seriam evitados pela punição
se os criminosos pensassem nas consequências de suas ações; e os assassinos não pensam antes de matar.
( d ) A pena precisa ser proporcional ao crime; assassinatos só seriam evitados pela punição se os
criminosos pensassem nas consequências de suas ações; e os assassinos pensam antes de matar.
17.
“No Brasil, as mulheres ricas fazem abortos clandestinos com atenção médica adequada. As
mulheres pobres fazem abortos clandestinos arriscados, até mesmo usando métodos rudimentares como
chás e introduzindo agulhas em suas vaginas. Se o aborto deixar de ser crime, ele poderá ser
disponibilizado no serviço público de saúde, o que permitirá que as mulheres pobres tenham o mesmo
tratamento que as mulheres ricas. Logo, o aborto deve ser descriminalizado”. Qual das alternativas abaixo
se encaixa melhor como premissa implícita desse argumento?
( a ) É injusto que o poder econômico seja o que vai determinar se a mulher vai ou não arriscar sua saúde.
( b ) Todo ser humano é digno.
( c ) As religiões têm posições diferentes em relação ao aborto.
( d ) As legislações sobre o aborto variam muito entre os países.
18.
“É permitido comer animais mesmo que isso implique causar-lhes muito sofrimento durante o
confinamento, o transporte e o abate porque, como diz a Bíblia, Deus disse: ‘Faça-se o ser humano à
minha imagem e semelhança. Que ele tenha poder sobre os peixes do mar e as aves do céu; sobre os
animais domésticos e selvagens e sobre todos os bichos que andam sobre a Terra’ (Gênesis, 1, 26)”. Qual
das alternativas abaixo se encaixa melhor como premissa oculta desse argumento?
( a ) Devemos tratar os animais com respeito.
( b ) Tudo o que a Bíblia diz é verdade.
( c ) Devemos evitar o sofrimento dos animais.
( d ) É preciso
19. Qual das sentenças abaixo é um argumento de autoridade?
( a ) Sempre que vejo um especialista falando eu dou crédito, principalmente se for um cientista, pois eles
estudam a fundo o assunto, conhecem melhor do que ninguém. Semana passada, vi na Ana Maria Braga
uma nutricionista falando que beber vinho de vez em quando faz bem para o coração. Eu acho isso muito
estranho, mas se ela falou então é verdade.
( b ) Todo policial é treinado para ser rigoroso. Conheço vários policiais e eles são muito rígidos. Se você
entrar para a polícia, você também vai ser assim.
( c ) É preciso ver para crer. Como eu já vi espíritos, então posso dizer que eles existem.
( d ) Se todos os mineiros moram em BH e Sandro mora em BH, então Sandro é mineiro.
20.
Em uma folha separada, identifique as premissas e conclusões dos seguintes argumentos, e,
quando for o caso, explicite as premissas ocultas:
a) O centro administrativo de MG foi feito por Niemeyer. Por isso é bonito, já que tudo o que é
desenhado por Niemeyer é bonito.
b) Dercy Gonçalves era de direita, pois não combateu a ditadura e quem não combateu a ditadura era de
direita.
c) Gosto muito de futebol, uma vez que vou frequentemente ao Mineirão.
d) O Aguiar foi multado porque foi apanhado sem os documentos do carro.
e) O Pavarotti é italiano, portanto é latino.
f) Você não pode ser um bom advogado se não souber argumentar. Ora, você sabe argumentar, portanto,
você pode ser um bom advogado.
74
g) Ou a minha posição não é a certa ou a sua posição não é a certa, pois se a minha posição é certa, o
aborto é errado. Mas se a sua posição é a certa, o aborto não é errado.
21. Faça você mesmo:
a) Construa um argumento válido com premissas e conclusão falsas.
b) Construa um argumento inválido com premissas e conclusão verdadeiras.
c) Construa um argumento sólido.
22.
Avalie os seguintes argumentos, diga se os considera bons ou ruins e explique porquê. Inclua em
sua resposta a indicação de se eles são dedutivos ou indutivos e também indique quais deles são
analógicos e quais são argumentos de autoridade.
a) Os ingleses são violentos, basta olhar para os hooligans.
b) Os grandes criadores musicais permitem certas dissonâncias nas suas sinfonias com a finalidade de
realçar as partes harmoniosas. Ora, o mundo é como uma sinfonia. Daí que o criador do mundo permita a
existência do mal com a finalidade de realçar o bem.
c) Impedir alguém que não é cristão de fazer aborto em nome da santidade da vida é como impedir os
cristãos de comer carne de vaca em nome da divindade das vacas para os hindus. Ora, é errado impedir os
católicos de comer carne de vaca porque os hindus consideram que as vacas são sagradas. Logo, é errado
impedir os que não são cristãos de fazer aborto em nome da santidade da vida.
d) O Papa diz que as relações sexuais antes do casamento estão na origem de muitos conflitos familiares.
Logo, as relações sexuais antes do casamento conduzem a muitos conflitos familiares.
e) Sartre afirma que o homem está condenado a ser livre, portanto o homem não pode deixar de ser livre.
f) Vários estudos mostram que sempre que baixam as taxas de juro aumenta o preço das casas. Logo, a
baixa das taxas de juro provoca o aumento do preço das casas.
g) Nenhuma pessoa até hoje viveu mais de 150 anos. Logo, nenhuma pessoa viverá mais de 150 anos.
23.
Identifique quais dos trechos abaixo contêm um argumento. Identifique também se eles possuem
alguns tipos de discurso não argumentativo, tais como explicação, descrição ou simples afirmações.
Lembre-se que uma passagem pode conter ao mesmo tempo um argumento e uma explicação.
a)
Neymar aproveitou a viagem a Londres com a Seleção para aumentar sua popularidade na
Europa. Na manhã de quinta-feira, um dia após a derrota do Brasil por 2 a 1 para a Inglaterra em
Wembley, o craque do Santos deu entrevista à imprensa alemã, falou sobre sua vontade de jogar no
futebol europeu e não descartou defender o Bayern de Munique, que será treinado a partir de junho por
Pep Guardiola ('Posso me imaginar no Bayern', diz Neymar à imprensa alemã, GloboEsporte.com,
08/02/2013).
b)
Os dinossauros morreram provavelmente porque um meteoro caiu na Terra.
c)
Qualquer lista dos homens mais bonitos do mundo que não inclua o Neymar é furada, ninguém
tem um estilo tão charmoso.
d)
A lista dos homens mais bonitos do mundo em 2012 feita pela Contigo incluiu Neymar,
Chacrinha e Hugo Cabret.
e)
O cinema fecha às 22:00.
f)
Um menininho de apenas 5 meses já é um dos fãs do famoso DVD A Galinha Pintadinha. Tratase de Bruno Lucas, filho do jogador de futebol Dentinho com a ex-panicat Dani Souza. O bebê é capaz de
fizar sua atenção no vídeo por um bom tempo em seu berço e o papai coruja, aproveitou seu Instagram
para publicar a imagem de um dos momentos de diversão do pequeno, com a seguinte legenda: “Olha o
príncipe Bruno Lucas asstindo a Galinha Pintadinha kkkkkk!! Te amooo” (Filho de Dentinho e Dani
Souza é fã da Galinha Pintadinha, oFuxico.com, 21/01/2013).
g)
A mulher foi feita de uma costela retirada do lado de Adão; não feita de sua cabeça para
governá-lo ou de seus pés para ser por ele pisada, mas de seu lado, para ser igual a ele, sob seu braço para
ser protegida e perto de seu coração para ser amada. A “sujeição” em Efésios 5:21 é a mesma palavra em
5:22. Os crentes devem submeter-se uns aos outros na reverência de Cristo. Os versos 19-21 são todos
resultados da plenitude do Espírito Santo (5:18). Os crentes plenos do Espírito Santo devem ser
adoradores (5:19), agradecidos (5:20) e submissos (5:21). Paulo então segue sua linha de pensamento em
relação a uma vida plena do Espírito e aplica isto aos maridos e esposas nos versos 22-33 (A Esposa Deve
Submeter-se a Seu Esposo? MídiaGospel.com.br).
h)
O elevado Costa e Silva não pode e não deve ser considerado uma obra isolada. Ele é parte de
um sistema viário que liga as regiões oeste e leste por cerca de 15 viadutos e passagens de nível. É como
75
se, num relógio de 15 engrenagens, nós tirássemos uma e esperássemos que as outras 14 funcionassem. O
relógio vai parar (Maluf, P. Vamos salvar o elevado. Folha de SP, 08/02/2013).
i)
Com quem você vai para a festa?
j)
O governo reduziu a nota em prova de proficiência em inglês exigida de universitários
interessados em estudar no Reino Unido pelo programa Ciência sem Fronteiras. Em novembro do ano
passado, Capes e CNPq, agências responsáveis pelo programa, publicaram uma retificação diminuindo a
pontuação em exames Toefl e Ielts que era prevista em edital para vagas em instituições britânicas
(Governo reduz nota mínima de inglês para bolsistas no exterior. Folha de SP, 08/02/2013).
k)
Valdivia pode ter de responder a um processo penal por ameaça a um fotógrafo. Em audiência
preliminar do juizado especial no Fórum Criminal da Barra Funda, em São Paulo, na quarta-feira,
Valdivia não aceitou a proposta feita pelo Ministério Público de prestar 28 horas de serviços comunitários
e encerrar o caso. Em outubro de 2011, o fotógrafo Grizar Júnior fez um boletim de ocorrência acusando
Valdivia de ameaçá-lo para não publicar as fotos nas quais ele aparece beijando uma mulher no
estacionamento de uma boate em São Paulo, na madrugada do dia 4 de fevereiro daquele ano. Segundo
Grizar, o meia não queria se comprometer com sua mulher, com quem tem dois filhos, nem com o então
técnico palmeirense, Luiz Felipe Scolari, já que se recuperava de uma lesão muscular naquele período.
Em depoimento à polícia, ele disse que Valdivia estava bêbado e ofereceu R$ 15 mil pelas fotos. No
entanto, segundo Grizar, a quantia paga foi bem inferior e, num encontro numa padaria tempos depois, o
jogador teria ameaçado sua família.Numa única manifestação sobre o assunto, feita em outubro de 2011,
Valdivia disse ter sido vítima de extorsão. Segundo o chileno, Grizar pediu R$ 20 mil para não publicar
as fotos e depois vendeu as imagens para a imprensa. "Lamento que o Valdivia não quis compor com o
Grizar. Se ele tivesse aceitado a proposta não corria o risco de ter de responder um processo penal", disse
Ricardo Martins, advogado do fotógrafo (Valdivia pode responder processo por foto polêmica.
GloboEsporte.com, 08/02/2013).
24. Dê respostas simples às questões de revisão abaixo:
a) O que é uma teoria moral?
b) O que é uma afirmação moral?
c) Qual é a estrutura básica de um argumento moral?
d) Por que não se pode inferir uma afirmação moral apenas de afirmações não-morais?
e) Por que é importante explicitar premissas implícitas em um argumento moral?
f) Qual técnica pode ser utilizada para verificar se uma regra moral geral é verdadeira?
g) O que é uma avaliação (ou juízo) moral?
h) Quais os critérios para se avaliar uma teoria moral?
25.
Avalie quais das ações abaixo são morais e quais são imorais. Se for o caso, explique quais
outras informações seria necessárias para fazer essa avaliação.. Justifique sua resposta elaborando um
argumento moral.
a) Depois do que descobriu, Mariana tem direito de tratar Tatiana mal.
b) A empresa beneficiou todo mundo com o aumento de salários.
c) Bruno tem certeza que foi Macarrão quem matou Elisa.
d) A empresa tem o dever de aumentar os salários.
e) O exército tem o direito de recusar a entrada de homossexuais na corporação.
f) Apesar dos assassinatos, ele é uma pessoa boa.
g) Fernanda tem certeza que Carol está traindo Marcelo.
h) Carol só traiu Marcelo porque ele pulou a cerca primeiro.
i) Maria está preocupada se está fazendo a coisa certa.
j) Policiais devem torturar bandidos.
26.
Acrescente premissas morais nas frases a seguir para que elas se tornem argumentos morais
válidos.
a) Marina prometeu levar Andressa de carro até Contagem, então ela deve parar de enrolar e levar logo.
b) As autoridades deveriam ter feito alguma coisa. Os rebeldes atiraram nos refugiados e não tinham
como se defender.
c) Nunca houve uma ameaça iminente do governo iraquiano, os EUA não deveriam ter começado a
guerra.
d) A pena deve ser longa, o ladrão tinha uma arma durante o roubo.
76
e) Helena sabia que iria acontecer uma morte, ela tinha o dever de tentar impedir.
f) Adriano nunca deveria ter deixado sua filha fazer fertilização in vitro, é algo anti-natural.
g) O que você fez é um absurdo. Você invadiu um arquivo com informações íntimas de milhares de
pessoas.
h) A Carol passou o dia limpando a casa da tia dela, de graça. A tia deveria pelo menos ter oferecido um
café.
i) Claro que deveríamos ter oferecido proteção aos curdos. Eles corriam perigo e pediram nossa ajuda.
j) Os fornecedores daquele agrotóxico sabiam que ele era perigoso, por isso, eles deveriam tê-lo retirado
do mercado.
k) Os deputados da oposição xingaram a presidente. Eles não tinham o direito de ter feito isso.
l) Os Silva eram adultos que estavam fazendo sexo voluntariamente na privacidade de sua casa. Isso é
problema deles, ninguém tem o direito de interferir.
m) Raul matou seu vizinho e não foi em legítima defesa. Ele não deveria ter feito isso.
27. Teste cada uma das regras morais abaixo com um contra-exemplo difícil para ela.
a) Tudo que não é natural é imoral.
b) É sempre errado contar uma mentira.
c) Matar um ser humano é errado em qualquer situação.
d) Devemos sempre ajudar as outras pessoas.
e) Qualquer ação que traga o melhor para você é moralmente aceitável.
f) Qualquer ação que seja aceita pela sociedade em que você vive é moral.
g) Toda ação que não seja aceita pela sociedade em que você vive é imoral.
h) Nunca é aceitável matar um ser vivo.
i) As pessoas têm o direito de fazer o que elas quiserem, desde que elas mesmas tenham um sentimento
de aprovação em relação ao que estão fazendo.
j) Se você promete algo a alguém, você tem a obrigação de cumprir, não importa o que aconteça.
k) Qualquer ação feita por um motivo religioso é aceitável porque motivações religiosas têm mais valor
do que as seculares.
m) As pessoas que cometem crimes não devem ser punidas – elas devem ser ressocializadas.
n) Todos os seres humanos, em qualquer situação, têm todos os direitos morais.
o) A ação correta é aquela que produz a maior felicidade para todos os envolvidos.
p) A ação correta é aquela que está mais de acordo com seus interesses.
q) Devemos defender a vida acima de tudo.
r) Ame ao próximo como a si mesmo.
28.
Identifique os dois argumentos morais no texto abaixo. Especifique as premissas e a conclusão,
explicitando premissas implícitas caso seja necessário.
a)
(Kiok e sua cachorra Sissy. (Foto: Reprodução/ZETA)
A Alemanha aprovou nesta segunda-feira, uma curiosa lei que proíbe zoofilia no país, após polêmicas a
respeito do tema ao longo do ano passado. Entretanto, apesar da multa, estimada em quase 25 mil euros,
diversas pessoas protestaram em frente à Câmara de Berlim contra a decisão.
Representante do grupo zoófilo Zeta (Engajamento Zoófilo para a Tolerância e a Informação, na sigla
em alemão), Michael Kiok afirmou que pretende recorrer à Justiça para anular a decisão. Bibliotecário de
Munique, Kiok mantém relações sexuais com Cissy, sua cachorra da raça pastor alemão, há pelo menos
sete anos. “Nos sentimos como criminosos. Isto é tudo por causa dos fanáticos defensores dos direitos
animais que pensam que nós magoamos os nossos companheiros”, disse, de acordo com o jornal El País.
Kiok, que já foi casado e diz ter percebido seu desejo por animais aos 15 anos, deixou claro que deverá
recorrer à Suprema Corte da Alemanha para reverter a decisão. De acordo com o membro do Zeta, cerca
de 100 mil alemães praticam zoofilia pelo país. “É mais fácil compreender os animais do que uma
mulher, por exemplo”, encerrou o bibliotecário (“Alemanha aprova lei contra zoofilia e gera protestos”.
Yahoo! Notícias, 04/02/2013).
29.
Identifique qual é o argumento moral no trecho abaixo:
77
a)
“[Criar personagens gays não-estereotipados é] a minha maneira de fazer ativismo. Não preciso
sair sacudindo bandeira na Parada Gay. Há outras maneiras de dizer às pessoas que isso tudo [homofobia]
é uma grande bobagem, que todo mundo morre no final. Então, vamos ser felizes com quem a gente
escolhe ser feliz” ( Miguel Falabella).
30.
Identifique a falácia contida em cada um dos trechos abaixo ou se há trechos em que as
premissas são simplesmente irrelevantes.
a)
O que acontece com os conservadores para eles acharem que aquelas opiniões malucas deles têm
algum tipo de relevância? Nenhum jornal deveria publicar esse tipo de opinião.
b)
Pense no seguinte: pessoas de bom coração querem diminuir o consumo de sal, açúcar e gordura.
Ótimo! Aí o governo coloca mais R$2,00 de imposto nas comidas que contém esses elementos. Só que o
que acontece é que vai começar a aparecer comidas contrabandeadas do Paraguai, o que faz gerar um
imenso crime organizado. Esse crime organizado vai começar a corromper policiais e políticos. E no final
das contas, vamos estar com a saúde até pior (porque comida contrabandeada não é fiscalizada), gastando
mais, com mais crime e mais corrupção.
c)
Se o governo criar empresas estatais para gerenciar a extração de petróleo do pré-sal isso é
socialismo e tudo que é socialista é perigoso.
d)
Quando perguntaram ao porta-voz da presidência qual era a posição do governo sobre as
investigações de desvios de verbas no Ministério da Agricultura, ele respondeu que “não há razão para
investigar algo que nunca aconteceu”.
e)
Brasil: ame-o ou deixe-o.
f)
Mônica Serra passou a tarde desta terça-feira (14) em Nova Iguaçu, na Baixada Fluminense,
acompanhada de Índio da Costa (DEM), candidato a vice na chapa encabeçada por seu marido, José
Serra, anunciando a quem passasse.
- Sou a mulher do Serra e vim pedir seu voto.
Na cidade que foi governada pelo candidato ao senado Lindbergh Farias, do PT, nos últimos cinco
anos, a mulher de Serra partiu para o ataque à adversária do marido, a petista Dilma Rousseff. A um
eleitor evangélico, que citava Jesus Cristo como o "único homem que prestou no mundo" e que declarou
voto em Dilma, a professora afirmou que a petista é a favor do aborto. Mônica falou com o vendedor
ambulante Edgar da Silva, de 73 anos:
- Ela é a favor de matar as criancinhas.
(Mulher de José Serra faz campanha no Rio e ataca Dilma, Agência Estado, 14/09/2010).
g)
Se você não se comportar direitinho, não vai ganhar presente.
h)
Tom Brokaw: Premier Gorbachev, o que a União Soviética tem feito para demonstrar sua
preocupação com os descontentes com o regime que resolvem emigrar?
i)
Mikhail Gorbachev: E o que os EUA têm feito para demonstrar sua preocupação com os direitos
do Americanos a segurança econômica?
j)
Deus é amor. O amor é cego. Ray Charles é cego. Logo, Ray Charles é Deus.
k)
O problema se resume no seguinte: ou vamos resolver de uma vez o problema das drogas
melhorando a repressão ou legalizamos de uma vez e deixamos nossos filhos se destruírem.
l)
Como podemos explicar o incrível poder de prever o future?
m)
Todos vocês que se recusam a permitir a pesquisa com células-tronco embrionárias. É por causa
de vocês que milhares de paralíticas nunca voltarão a andar.
n)
Nenhum pai tem orgulho de ter um filho gay (Dep. Jair Bolsonaro).
o)
A Bíblia é homofóbica? E agora, vão rasgar a Bíblia?
p)
Então, na minha casa ou na sua?
q)
Carta de uma garotinha a uma famosa feminista: Eu serei uma ótima presidente dos EUA. Estou
estudando piano, fazendo os deveres de matemática e me chamo Alexandra, que significa “líder dos
homens”.
78
r)
The feminist agenda is not about equal rights for women. It is about a socialist, anti-family
political movement that encourages women to leave their husbands, kill their children, practice
witchcraft, destroy capitalism and become lesbians (Pat Robertson – pastor batista estadunidense).
31.
Leia a seguinte descrição de uma teoria moral e responda às questões que se seguem (VAUGHN,
2008):
A Ética do Amor
De acordo com a Ética do Amor, o que torna uma ação correta é que ela seja baseada no amor
por outras pessoas. O amor é o único bem moral universal. Em qualquer situação em que uma escolha
precise ser feita, essa teoria diz que devemos nos perguntar: qual das ações possíveis demonstraria maior
pelos outros, considerando todos os envolvidos? Portanto, ações que demonstram amor (como respeitar os
outros, contar a verdade, tratar as pessoas de maneira igual, cuidar deles, protegê-los do mal etc.) seriam
sempre preferidas em comparação a ações que não demonstrem amor (discriminar pessoas, mentir para
elas, prejudicá-las, roubá-las, ignorá-las quando pedem ajuda etc.). Além disso, ações que demonstrem
maior amor (como arriscar sua vida para salvá-los) são melhores do que aquelas que demonstrem apenas
um pouco de amor (como ser educado).
a) Essa teoria é consistente com suas avaliações morais ponderadas (incluindo a punição de criminosos, a
preferência por membros da família, as guerras justas etc.)? Discuta.
b) Essa teoria é funcional (ela ajuda a tomar decisões na prática)? Responda considerando as seguintes
situações:
- sua mãe está em estado terminal e implora para que você a mate.
- você promete a seu filho uma viagem para Disney, mas vê um anúncio sobre crianças morrendo de fome
na África.
- você é um médico com vários pacientes precisando de um transplante de coração e só há um disponível
(e é igualmente compatível com todos). Um é idoso, um está com muita dor, um é recém-nascido e um
ganhou o Nobel de medicina.
c) Essa é uma boa teoria? É melhor do que o utilitarismo de atos?
32. Defenda as seguintes ações de acordo com o utilitarismo de atos.
a) A experimentação médica sem o consentimento do paciente.
b) Tomar dinheiro e propriedades dos ricos para distribui-los entre os pobres.
33.
Avalie os seguintes argumentos. Para cada um eles, indique se se trata é um argumento moral,
especifique a conclusão e indique quando possível se o argumento é convincente ou consistente. Além
disso, identifique se alguma falácia cometida foi e, em caso positivo, as nomeie.
a) Nenhuma forma de expressão ou discurso que ofenda as pessoas que têm fé deve ser tolerada. As
danças nos bailes funk com certeza ofendem as pessoas de fé. O funk deve ser proibido!
b) Qualquer um que discorde dos mandamentos morais que prevalecem em uma cultura devem ser
censurados. A Marcha da Maconha e a Parada Gay obviamente devem ser proibidas.
c) Noventa por cento de todos os cientistas famosos não acreditam em Deus, logo, noventa por cento de
todos os cientistas provavelmente não acreditam em Deus. Logo, Deus não existe.
d) Se o Lincoln comprar aquela smart TV, ele vai ficar o tempo inteiro assistindo no sofá. E se ele ficar o
tempo todo no sofá, ele vai engordar. Acontece que o Lincoln realmente comprou a smart TV. Então, ele
vai engordar.
e) Todas as pessoas que fogem depois de causar um acidente de trânsito devem ser presas. Joana deve ser
presa, já que ela fugiu de um acidente de trânsito.
f) Marco é mais alto que João, que é mais alto que André. Isso quer dizer que Marco é mais alto do que
André.
g) Estou escrevendo em resposta ao artigo “Planos para residência terapêutica sofrem oposição do
comércio local”. Como irmã de uma moça com retardo mental grave que vive em uma residência
terapêutica posso dizer às pessoas que foram citadas, dizendo que estavam receosas, que não há motivo
para ter medo. A casa em que minha irmã vive é grande, agradável, bem conservada e os funcionários são
muito atenciosos. Ela só traz benefícios para a comunidade, unindo os vizinhos e criando uma vizinhança
adoravelmente diversificada (carta ao editor, Buffalo News).
79
h) De acordo com o Prof. Leonel de Barros, do Dep. de Comunicação, pichar “estupre todas as piranhas
nordestinas” na parede de uma sala de aula não é um crime de ódio e o grafite deve ser protegido pela
liberdade de expressão. Isso é vergonhoso. Espero que o Prof. Barros esteja analisando a questão do ponto
de vista estritamente legal e é simplesmente cego em relação ao impressionante sofrimento que essa
pichação pode causar, isso sem mencionar o dano adicional que pode acontecer quando um professor
universitário defende esse tipo de comportamento. As palavras podem ser tão destrutivas quanto a
violência física (carta ao editor, Stanford Magazine).
i) Há um princípio inegável: não devemos fazer nada que desrespeite a vida. O uso artificial de células
humanas – como os cientistas estão fazendo agora com as células tronco – é um exemplo perfeito de
completo desrespeito pela vida humana. A pesquisa com células-tronco é inaceitável.
j) Todo mundo que estuda na UFMG é inteligente. Como o Ricardo é muito inteligente, então, ele estuda
na UFMG.
k) O novo Punto combina com seu estilo arrojado e vontade de viver. Procure seu revendedor Fiat hoje
mesmo.
l) Você já viu na natureza um leão com uma leoa só, um garanhão com uma égua só? "Mas o ser humano
é racional", você vai me dizer. Mas ele raciocina pra mudar a natureza de Deus? Pecado não existe. O que
é o certo e o errado? Eu acho incrível numa sociedade poder ter o casamento de dois homens, mas não
poder ter a união de um homem com duas mulheres (Mr. Catra).
m) Você já viu uma vaca com dois touros ou uma leoa com dois leões? Todo animal mamífero que vive
em bando, a formação social é essa. Porque as mulheres podem se relacionar sexualmente com vários
homens, mas amor você só terá de um. E o homem consegue amar várias mulheres com a mesma
intensidade. Senão Deus não faria o mundo assim. Deus é exato. Por que nasce mais mulher e morre mais
homem? Vocês me expliquem a prostituição então se cada homem tem que ter uma mulher só. Tem muito
mais mulher e muito menos homem. Tem alguma coisa errada então no planeta. Se homem e mulher são
iguais, então por que existe a prostituição? É raciocínio lógico (Mr. Catra).
34. Trabalhos de campo.
a) Vá até a parte de editorial/opinião (incluindo cartas dos leitores) de um grande jornal e selecione uma
passagem que contenha um argumento moral. Redija uma pequena avaliação do argumento, identificando
as premissas e a conclusão, adicionando premissas implícitas (para torná-lo válido) e avalie se o
argumento assim revisado é sólido ou falho.
b) Procure em jornais, revistas e blogs três textos que contenham um argumento moral:
- um texto como qual você concorde e que esteja bem escrito
- um texto do qual você discorde, mas que esteja bem escrito
- um texto que esteja mal escrito, confuso etc. (não importando se você concorda ou não).
Para cada um deles, redija uma pequena avaliação do argumento, identificando as premissas e a
conclusão, adicionando premissas implícitas (para torná-lo válido) e avalie se o argumento assim revisado
é sólido ou falho. Inclua a cópia do artigo ou a referência.
35.
Para cada um dos casos a seguir indique qual princípio moral melhor justificaria as opiniões das
pessoas.
a) Fernanda acha que quem matou alguém a sangue frio merece morrer.
b) Carol acha que mesmo que a pessoa queira morrer, demos impedir.
c) Anelisa acha que ninguém tem o direito de abortar nem de solicitar a eutanásia, mas é a favor do direito
de portar armas e da pena de morte para crimes hediondos.
e) Thiago pensa que as vagas nas universidades devem ser ocupadas pelos mais inteligentes, não por
quem é mais pobre ou negro.
f) André acha que a maneira mais justa de decidir quem vai receber um rim primeiro é por meio de
sorteio.
36.
É muito difícil que alguém reconheça que fez algo imoral. Normalmente, elas oferecem alguma
justificativa, racionalizando o que fizeram para preservar uma boa imagem de si mesmos. Identifique as
falhas nas justificativas abaixo, normalmente dadas por quem:
a) Compra produtos piratas sabendo que são piratas.
“Todo mundo compra”
b) Dirige depois de consumir bebida alcoólica.
80
“Foi só um gole”
c) Estaciona em vagas para deficientes e idosos. E até em pontos de ônibus.
“Só cinco minutinhos”
d) Cola na prova.
“Estava muito difícil”
e) Coloca nome em trabalho que não fez.
“Essa semana não tive tempo”.
f) Coloca nome de colega que faltou em lista de presença.
“Depois ele coloca para mim”
g) Paga para alguém fazer seus trabalhos.
“Estou muito apertado”
h) Suborna ou tenta subornar quando é pego cometendo infração.
“Já paguei três multas esse ano”
i) Coloca a multa no nome de outras pessoas.
“Se não eu iria perder a carteira”
j) Troca voto por areia, cimento, tijolo, e até dentadura.
“Tem aproveitar agora, depois a gente não ganha nada”
k) Fala no celular enquanto dirige.
“Eu precisava atender”
l) Usa o telefone da empresa onde trabalha para ligar para os amigos.
“Eles nem vão notar”
m) Trafega pela direita nos acostamentos num congestionamento.
“Eu estava com pressa”
n) Para em filas duplas, triplas, em frente às escolas.
“É rapidinho”
o) Viola a lei do silêncio.
“A música era boa”
p) Fura filas.
“A fila estava enorme”
q) Pega atestado médico sem estar doente, só para faltar ao trabalho.
“Eu não podia ter mais faltas”
r) Faz gato de luz, de água e de tv a cabo.
“É caro demais”
s) Saqueia cargas de veículos acidentados nas estradas.
“Todo mundo estava pegando, não era só eu”
t) Registra imóveis no cartório num valor abaixo do comprado para pagar menos impostos.
“A gente já paga muito imposto. Não vou dar dinheiro para aqueles corruptos”
u) Compra recibo para abater na declaração de renda para pagar menos imposto.
“A gente já paga muito imposto. Não vou dar dinheiro para aqueles corruptos”
v) Quando viaja a serviço pela empresa, se o almoço custou R$10,00, pede nota fiscal de R$20,00.
“Tem que aproveitar, meu salário não dá para nada”
w) Emplaca o carro fora do seu domicílio, compra no nome de parente com deficiência, funcionário
com desconto ou produtor rural para pagar menos impostos.
“Eu também mereço desconto. Preciso pagar muitas contas no fim do mês. Já viu quanto custa
cursinho de inglês para três filhos?”
x) Frequenta os caça-níqueis e faz uma fezinha no jogo de bicho.
“O dinheiro é meu”
y) Fuma um baseadinho.
“Se álcool pode...”
z) Pega clipes, envelopes, canetas, lápis onde trabalha como se isso não fosse furto.
“Não vai fazer diferença para eles”
aa) Comercializa vales -transporte, -refeição e outros que recebe das empresas onde trabalha.
“É meu direito, uai”
bb) Quando volta do exterior, nunca diz a verdade quando o fiscal aduaneiro pergunta o que traz na
bagagem.
“Qual o problema?”
cc) Quando encontra algum objeto perdido, na maioria das vezes não devolve.
“Achado não é roubado”
dd) Joga lixo, ponta de cigarro, papel de bala e chiclete no chão.
“Uma andorinha não faz verão. E é preciso dar emprego para os garis”
81
37.
Resuma o argumento do texto 7 em um 200 caracteres. Não se esqueça de identificar as
premissas e a conclusão.
38.
Identifique a teoria moral que fundamenta o texto 9 e a avalie de acordo com os critérios de
adequação.
39.
Resuma os argumentos dos vídeos
a) “Como ser submissa a uma pessoa omissa?”
www.youtube.com/watch?v=qaW9GzNts-A).
b) “Responsabilidade pelos pobres – por Milton Friedman”
www.youtube.com/watch?v=xHvZYFVeKbk
c) “Dancem, macacos, dancem!” de Ernest Cline
http://www.youtube.com/watch?v=FZzcDru52oM
40.
Resuma o argumento do texto 4 e decida se você concorda com ele. Escreva um texto de 1000
caracteres expondo suas razões.
Gabarito
1.
a- V
b- V
c- V
d- V
e- I
f- I
g- I
h- I
i- V
j- I
k- I
l- I
m- V
n- V
o- V
p- V
q- V
r-I
s- I
t- V
u- V
v- V
w- V
x- I
y- I
2- I I V V I V V
3- F E I E I I E
4- D D I I I D
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