livro essas criancas
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livro essas criancas
Osvaldo Reis ESSAS CRIANÇAS Para adultos que permanecem meninos EDITORA HUMANITAS VIVENS O conhecimento a serviço da vida MARINGÁ - PR - 2011 Osvaldo Reis ESSAS CRIANÇAS Para adultos que permanecem meninos EDITORA HUMANITAS VIVENS O conhecimento a serviço da vida MARINGÁ - PR - 2011 Essas crianças... Osvaldo Reis Art. 4º. - Fica decretado que o homem não precisará nunca mais duvidar do homem. Que o homem confiará no homem como a palmeira confia no vento, como o vento confia no ar, como o ar confia no Essas crianças... Osvaldo Reis Copyright ©2008 by Osvaldo Reis Texto, edição e capa: Osvaldo Reis Fotos das crianças: fornecidas pelos familiares, com autorização formal para publicação. Foto do autor: Edson Burzega Guitti A violação de Direitos Autorais é crime (Art. 184 do Código Penal Brasileiro) Dados Internacionais de Catalogação-na-Publicação (CIP) (Sistema de Bibliotecas Públicas Municipais de Maringá – PR, Brasil) Antônio Facci R3753e Reis, Osvaldo Essas crianças: para adultos que permanecem meninos / Osvaldo Reis - Maringá : Edição do Autor, 2008. 209 p. ISBN 978-85-907906-0-0 1. Crianças - Linguagem. 2. Crianças – Humor. 3. Folclore. I. Título. CDD 21. ed. B869.7 Só será permitida a reprodução de parte da obra, com a autorização expressa do autor e o comprometimento de citação da fonte. Contatos com o autor Rua Tabaetê, 131 – Jd. Novo Horizonte – CEP 87005-140 – Maringá -Pr Telefones: (44) 3227-6594/ 9962-5994 Essas crianças... Osvaldo Reis SUMÁRIO PROTAGONISTA (S) / FAMÍLIAS PÁG. Apresentação................................................................................................................................... Prefácio........................................................................................................................................... Ode à Criança.................................................................................................................................. Gabriela e Gustavo / Norma e Cláudio Saldan............................................................................... Flávia, Cláudia e primos / Maysa Facci e Eliel Diniz.................................................................... Marília e Pedro / Regina Daefiol e Dirceu Herrero Gomes............................................................ Sofia, Manoel / Janete e Paulo Pupim............................................................................................ Isabela e Melina / Leila Figueiredo e Paulo Lee............................................................................ Maysa, Lara e Serginho / Tânia e Sergio Alvares da Silva............................................................. Marcelo, Raphael e Henrique / Noth Camarão / Domingos Trevizan Filho.................................. Ana e Alexandre / Maria Rosa e Alberto Rocha............................................................................. Eduarda / Heloísa e Renato Pereira Lopes...................................................................................... Guilherme / Ana Cláudia e José Mário Cassiolato......................................................................... Naira / Cris e Edson Burzega Guitti............................................................................................... Juninho / Isabel e Umberto Crispim............................................................................................... José Francisco e Maria Alice / Mirlei e Atílio Sanches.................................................................. Sandro, Guilherme e Gustavo / Beth, Sandro; Geny e Jaime Bedin.............................................. Gisele / Vitória e Durvalino Bedin................................................................................................. Josiane / Ofélia e Antônio Fávero.................................................................................................. Josiane, Vinícius, Jônia / Clarice e Tadeu França........................................................................... Vinicinho / Alline e Vinicíus França............................................................................................... Amadeu Júnior / Elza e Amadeu da Silva Félix............................................................................. Thaís e Rodrigo / Lia e José Renato Pereira................................................................................... Cristiano / Iara Bolsoni e Fernando Souza..................................................................................... Sérgio Augusto / Célia A. Rosa e Domingos F. Souza................................................................... Lucas / Marcela Alarcon e Lúcio Borges....................................................................................... Didi /Anna e Job Ribeiro Borges.................................................................................................... Luana / Liliana e Henrique Magalhães........................................................................................... Fatinha e Kildare / Doralice e José Zito Magalhães....................................................................... Murilinho / Luzia e Murilo Filho................................................................................................... Balissa / Nilcéia e Orlei dos Santos................................................................................................ Rebeca / Maria Helena e Teodoro Alencar..................................................................................... Ana Paula e Carolina / Ione e Paulo Fernandes Reis...................................................................... Lorena, Fabrícia e Beto / Rosana e Luiz Jorge............................................................................... Cláudinha / Ieda e Paulo Bacchi..................................................................................................... Juliana / Cláudia e Milton José Ferri............................................................................................... Victor Hugo / Márcia e Klybson Oliveira....................................................................................... Silvia, César e Débora / Isabel e Mauro Fernandes Reis................................................................ Victor Enzo / Juliana e Rodrigo Germani....................................................................................... Bruno / Vera e Valdir Semensato.................................................................................................... Débora e Moisés / Josefa e José Barros de Souza.......................................................................... Cinthia, Claciele e Gláucia / Claudete e Antônio Schiavon........................................................... Pedro / Dalva Caetano.................................................................................................................... Vinícius e Carla / Luzia e Edson Lima........................................................................................... Mario Prata e António Araujo Costa / os mesmos.......................................................................... Priscila e Maurício / Arlene Lima e Ayrton Justus......................................................................... Reginaldo / Justino Farias............................................................................................................... Elton e César / Nina e Luiz Bassoli................................................................................................ Roberto, Ricardo, Rafael e Renato / Astrid e Amélio Ruy.............................................................. Paola, Étore e Isabela / Majô Baptistoni e Altamir Cardoso............................................................. Ana Carla e Isabela / Olga Agulhon............................................................................................... Camila / Maria de Lourdes e Paulo Sérgio..................................................................................... Ayres Augusto / Mara Rolim e Aires Gonçalves............................................................................ Renan / Mara Rolim e Aires Gonçalves......................................................................................... Larissa / Janete e Antônio Rolim Borges....................................................................................... Thiago / Lucilene Alexandra e Leiva Gonzaga............................................................................................ João Victor e Grazielle / Laide e Altair Andrade............................................................................ 09 11 13 17 19 26 31 36 40 44 46 48 50 54 56 58 59 62 63 65 68 71 73 74 75 76 77 78 79 81 82 86 91 92 93 94 95 97 99 100 101 102 103 104 105 107 108 110 112 113 114 115 116 117 118 119 Essas crianças... Osvaldo Reis PROTAGONISTA (S) / FAMÍLIAS PÁG. Elton, Wanessa e Márcia / Dalva e Manoel Paruche.......................................................................... 120 Augusto / Ediclei e Valter A. Oliveira................................................................................................ 121 Sofia / Maria Luiza e Célio Costa...................................................................................................... 122 Raquel / Neusa e Massaiko Tanahara................................................................................................. 123 Yumi / Juliana e Henrique Sérgio de Oliveira................................................................................................. 124 Bárbara / Marta Medeiros e Agnaldo Darcis...................................................................................... 126 Robertinho / Eolinda Moraes e Roberto Silva.................................................................................... 127 Roberto Silva / Messias e Antônio J. Silva......................................................................................... 128 Bárbara e Maria Eugênia / Mônica Ganen e Beto Fráguas................................................................ 129 Júlia / Maria Montserrat e Luiz Antônio Furlan................................................................................................130 Eduardo / Maria Emília e José Manoel.............................................................................................. 132 André Eduardo / Lúcia Rosa e Darci Romoaldo da Silva............................................................................. 133 Yandre, Daryne, Andrey e Luciano / Lucia e Sebastião Gomes da Costa......................................... 134 Fernando e Paulo César / Dulce e Mauro Bianchi............................................................................. 137 Lara, Lúcia e Beatris / Laura e Reynaldo Costa................................................................................ 138 Marcelo e Alexandre / Maria Luzia e Humberto Raposo.................................................................. 139 Athaybel / Leomara Cristina Tezin.................................................................................................... 140 Guilherme e Gustavo / Beatriz e Francisco Carlos Barbosa..........................................................................141 Bruna e Bia / Rose e Pedro Mariano Pereira...................................................................................... 143 Max e Rafael / Beth e Eduardo Hase.................................................................................................. 147 Gianna / Fátima e Carlos Furlan......................................................................................................... 148 Davi / Maria Paula e Daniel Bemon................................................................................................... 149 Luciano e Luciene / Angelita e Adailton Almeida.............................................................................. 150 Samira, Samantha e Sabrina / Ivanilde e Milton Rui.................................................................................... 151 Aline / Eliane e Anízio Costa Carvalho...............................................................................................152 Gabriel / Andréa Barud e Cláudio Maciel...........................................................................................153 Norma e Douglas / Maria Helena e Osmar Galdini............................................................................ 154 João / Sara e Reinaldo Maia............................................................................................................... 158 Fernando, Leandro e Rafael / Marinalda e Aparecido Baptista.......................................................... 159 Paulo Popovick / o mesmo..................................................................................................................161 Jayanna e Nadyanna / Joanaina e José Luiz Silva...............................................................................162 Jarmiram / Marly e José Edwirges Cardoso........................................................................................163 Hélinton / Jassanan e Tom Gomes.......................................................................................................164 Eduardo, Ricardo e Mayra / Rose e Ricardo Plépis Filho...................................................................165 Diego / Dina e José Donizete da Silva................................................................................................ 167 Nando, César, Fabiola e Jayminho / Marilene e Jayme Rodrigues Carvalho............................................169 Júlia / Edna e Marcos Roberto Meneghin........................................................................................... 171 Edgar, Erick e Pâmela / Ângela e Edgar Tibúrcio...............................................................................173 Felipe e Ana Luísa / Cláudia e Denerval Batista.................................................................................175 Michel e irmãos / Mônica e Euclides Cotrim..................................................................................... 177 Felipe e primos / Yara e César Santos................................................................................................. 178 Fabrício / Florisbela e Francisco Durante........................................................................................... 179 Léo / Elizabete e Paulo Bezerra...........................................................................................................181 Isadora / Eliana Patrícia e Rubens Silva..............................................................................................183 Poliana e Carlos / Odézia e Fortunato Bergamo................................................................................. 185 Elora / Cristina e Marcos Corrêa.........................................................................................................187 Juliane / Aparecida e Edmar Isolani....................................................................................................189 Rogério, Carolina e Rosana / Cleufe, Nair e Francisco Dantas.......................................................... 190 Gabriela, Geórgia e Camila / Néia e Roberto Galante........................................................................ 191 Guilherme e Isadora / Margareth e Aires Pelegrin Melon.................................................................. 193 José Atílio / Nilce e José Sanches Filho............................................................................................. 195 Luíza / Clarisse e Lélis Vieira dos Santos........................................................................................... 196 Landinho e Fernando / Leonor e Orlando Manin............................................................................... 197 Paula / Ivone e Paulo Monteiro..........................................................................................................198 Beto / Rosana e Luiz Jorge................................................................................................................. 199 Lorena / Rosana e Luiz Jorge............................................................................................................. 200 10 Essas crianças... Osvaldo Reis Apresentação Osvaldo Reis mais uma vez surpreende o público leitor com uma obra fascinante; desta vez reúne mais de duas centenas de fatos inusitados vividos por crianças na plenitude da pureza, da inocência, ingenuidade e sinceridade. Dotado de rara sensibilidade e de um profundo amor pelas crianças, Osvaldo Reis, por mais de dez anos, foi coletando junto a casais amigos os fatos engraçados apresentados por seus filhos. A coletânea traz as fotos e os dados dos personagens que vivem essa fase esplêndida de suas vidas. Segundo o autor, o objetivo do livro é mostrar a sinceridade da criança, o que em muitos casos faz o adulto pensar e refletir sobre as simples observações que demonstram verdades. “Busco preservar esse tempo de inocência das crianças que, com o passar dos anos, vão perdendo essa ingenuidade, essa espontaneidade de expresssar o que pensam. Tenho certeza, quando estiverem na fase adulta, ESSAS CRIANÇAS terão bons motivos para rirem dos casos engraçados que viveram junto aos familiares e amigos”, enfatizou Osvaldo. O livro não é direcionado apenas aos pais das crianças apresentadas em suas páginas, é colocado à disposição dos pais e familiares, que por intermédio da leitura se lembrarão de fatos similares vividos pelos filhos como doces lembranças e muita risada. Com ESSAS CRIANÇAS, uma pequena e modesta lição sobre a difícil arte de manter sempre viva a criança que habita dentro de nós. Boa leitura! Antonio Padilha Alonso Escritor / Historiador Os folguedos das crianças não são folguedos; pelo contrário, é preciso julgá-los como suas ações mais sérias. Montaigne 11 Essas crianças... Osvaldo Reis Prefácio Plural. Singular. Antíteses que dão a verdadeira dimensão da versatilidade do escritor Osvaldo Reis. Plural, porque apresenta múltiplas faces de criatividade. Anteriormente nos brindou com um livro - “A história em conta-gotas” - em que se revela estudioso pesquisador e profundo conhecedor da história de Maringá. Escreve com nuances de rara beleza poemas e trovas; conta e escreve “causos”, textos religionalistas em que assume seu verdadeiro “ eu”; o homem sertanejo, singular, porque a cada nova obra uma nova face do escritor surge, com um toque de seu individual talento. Uma das provas disso é esta fascinante obra: “Essas Crianças", em que deixa vir à tona o menino travesso e a alma de criança que há em cada um de nós. Ele transforma os textos dando-lhes riqueza de detalhes, colocando senso de humor, leveza, sutilezas e ironias que permeiam palavras e entrelinhas, abordando com maestria o mundo e o vocabulário; aliás, o “zecabulário” infantil. Fica bem patente neste livro, que, apesar das dificuldades da vida, Osvaldo Reis não se deixa massificar pelo cotidiano, muitas vezes adverso; ao contrário, aflora mais do que nunca esse seu lado criança. Foi preciso mergulhar no universo infantil, achar-se um igual, para dele retirar preciosidades que, ao longo do tempo, deixaram marcas. Aos familiares cabe grande parcela por essa riqueza, porque eles retiveram na memória e podem agora ver imortalizados fatos, palavras e histórias que vivenciaram. O livro “Essas Crianças” revela, muito, quem e como é o homem Osvaldo Reis: sensível, engraçado, brinca com o inusitado, ri, faz piadas até de si mesmo, encara a vida com um humor invejável, como se o tempo estivesse aprisionado na criança que povoa seu universo. Florisbela Margonar Durante Professora e poeta Membro da Academia de Letras de Maringá 13 Essas crianças... Osvaldo Reis A todos os “inhos” e “inhas” que alegram e enfeitam a vida da gente... 15 Essas crianças... Osvaldo Reis Ode à Criança O balbuciar da primeira palavra (foi mamãe ou foi papai?) O primeiro gracejo, De quem foi seu primeiro beijo? E o primeiro palavrão? Que papelão...! Ah... Crianças, quantas lembranças... A infância sem maldade, quanta saudade, O Ataulfo já dizia, com muita propriedade, sem nenhuma fantasia, que quando era criança, foi feliz e não sabia... Tem coisas que o tempo não apaga coisas de que não se esquece... Então fico meditando, tristonho me perguntando: Por que é que criança cresce? Se um dia eu tiver mandato, senador ou deputado, apresento no Congresso, e sei que vou ter sucesso, um projeto diferente, que vai alegrar muito a gente: imagine, de repente, um mundo sorridente, sem maldade, nem malícia, nem polícia, de paz e sinceridade, de sonhos e de esperanças, um mundo só de crianças... Estes são os meus planos: congelar por uns bons anos, sem direito de crescer, não chorar, não sofrer; não ter fome, nem doenças e nem vacinas com dor, quero tudo congelado; eu quero um mundo de amor, de boquinhas sem dentes, sorrindo alegremente, ensinando-nos a viver, puxando-nos pelas mãos, mostrando-nos o caminho, com seu amor e carinho, e com aquele jeitinho... Agora pense comigo, minha amiga, meu amigo, que tal se fosse assim: num prazo bem dilatado, todo o amor congelado, pra nós, pra você, pra mim? Osvaldo Reis 17 Essas crianças... Osvaldo Reis A TV VIRTUAL Uma dúvida atroz está me atormentando... Tenho certeza que uma dessas “figuras” - Gustavo, Rebeca, Guilherme, Marcelo, Yumi, Manoel, Sofia, Cláudia, Pedro, Marília, Carolina, Maysa, Naira, Juninho, Lucas, Josiane, Bia - foi quem ensinou o rato a subir em lata de banha. Bem... Comecemos pelo Gustavo. Gustavo, o irmão predileto da Gabriela (depois do temporão Pedro), tem sempre perguntas e respostas na ponta da língua; parece adulto, mas só tem quatro anos. Dia desses, ele se aproximou de sua avó Helena e mostrou a ela um desenho - um quadro com alguns pontos em círculos nos cantos e o meio vazio. A avó examinou o dito cujo e, sem nada dizer, devolveu-o ao neto. Gustavo não aceitou a aparente indiferença e indagou: – Ô, VÓ, VOCÊ NÃO SABE O QUE É ISTO? – Eu não... – VOCÊ NÃO TÁ VENDO QUE É UMA TELEVISÃO? – Claro que não é uma televisão. Cadê a imagem? A resposta veio na bucha, silenciando a sabidona da vovó: – Ê, VÓ, VOCÊ NÃO TÁ VENDO QUE TÁ DESLIGADA?!... CRUELDADE... O Gustavo, dias passados, conversava com a mãe e a irmã a respeito de carne, mais precisamente de salsicha, que ele queria saber como era feita. Explica pra lá, explica pra cá, o sujeitinho acabou entendendo. Mas apesar de ser “atirado na nuca” o jovenzinho mostrou ao final da conversa que seu coração é bom... Ocorre que ele soube uma coisa incrível, uma descoberta que o deixou muito chateado, triste mesmo, é que pra fazer a salsicha que ele tanto gosta, que ele acha uma delícia... O boi... A avó que acabou por receber a grande reclamação do neto, que muito triste, chateado, preocupado, constatou: – Ô VÓ, ELES ESTÃO MATANDO BOI VIVO... 19 Essas crianças... Osvaldo Reis MOTEL MIRIM... O Gustavo era bem miudinho, estava por volta de três a quatro anos de idade e adorava brincar com uma garotinha da mesma faixa etária, da qual, certamente, ele deve ter saudades mil. Brincavam de tudo, de médico, professor, professora, aluno e tudo o mais que suas férteis imaginações criavam. Na casa onde morava Gustavo, havia uma bela árvore, – uma goiabeira –, e os dois imaginaram construir em seu topo uma casa. Pelo tamanho dos dois, claro que não ia dar certo. Ainda bem que os dois, por um detalhe levantado por Gustavo, desistiram do empreendimento. Certa tarde a amiguinha de Gu convidou o carinha pra brincar de hotel, com o que ele não concordou. E sua explicação é repleta de lógica e a amiguinha é que acabou também discordando e a goiabeira, ainda bem, acabou se livrando dos Tarzans... – EU BRINCO DE HOTEL, VOCÊ BRINCA DE MOTEL... EU SOU HOMEM; HOMEM É HOTEL. MOLHER É MOTEL; E VOCÊ É MOLHER. E fim de papo!!! UM PROBLEMA INTERNACIONAL... De tanto ouvir falar que tal coisa é do Paraguai, esse “treco” veio do Paraguai, esse rádio com liquidificador veio do Paraguai, essa escova de cabelos que também tira retrato veio do Paraguai e mais um monte de outras tantas baboseiras que os adultos “babam”, imagine uma criança... Gustavo sente-se atraído pelo tal Paraguai. Pergunta se é longe, se não tem jeito dele ir lá e coisa e tal. A mãe promete, o pai idem, a avó avaliza... O garotão fica então pentelhando querendo saber a data da viagem, quando seria realizado seu grande sonho... Algum tempo depois, juntando tudo o que tinham direito, incluindo a sogra, se mandam para o vizinho país. Gustavo está ansiosíssimo, elétrico, a todo instante perguntando. A partir de Floresta, uns 20 quilômetros viajados, tava lá o sujeitinho: – JÁ TÁ PERTO? O pai responde que não... Logo à frente, ali por perto de Campo Mourão, Gu ataca novamente: – JÁ TÁ CHEGANDO? Ainda não, Gustavo - e quando pai ou mãe fala o nome inteiro é que a paciência está se despedindo). A viagem prossegue e a ansiedade do garotão aumenta... Mas o cansaço da viagem e da aventura o faz dormir. Chegam em Foz do Iguaçu o pai acorda o filhote, avisando-lhe que estava quase chegando, que "tava" pertinho... Gu acorda, arregala os olhos, espreme o nariz no vidro, nem pisca. Com o coração a mil, atravessam a ponte. O pai anuncia: – Chegamos. Aqui é o Paraguai... Gustavo, antes demasiadamente ansioso, não se sabe por que, parece ter perdido o interesse. Disse uma única palavrinha de duas sílabas: – CREDO!!! virou e dormiu novamente. 20 Essas crianças... Osvaldo Reis SE MANDA, GABRIELA... Gustavo está hoje com seus seis, sete anos, mas continua a fera de sempre. A irmãzinha Gabriela tem entre quatorze, quinze anos, e também continua sendo uma de suas vítimas preferidas e como (nem sempre) maior bate no menor, Gabriela vai levando a vida. A avó materna mora pertinho da casa dos pais de Gustavo. Gu e Gabi vivem ao lado da casa dos avós paternos, Delvi e Henrique, e os jovenzinhos vivem a pentelhar ambos. Dia desses, vão visitar a avó Helena... Os dois caminham pela calçada tranqüilamente quando surge na frente deles um cidadão puxando um baita cachorro, “marca” Rotivailer, por uma corrente, grossinha, é verdade... E todo dono de cachorro acha seu bichinho mansinho que só, mas esqueceram de convencer a Gabriela, que fica apavorada. Gustavo nem aí... O condutor do animal percebe a tremedeira de Gabriela e, galanteador, tenta acalmar a mocinha avisando-lhe: – Não se preocupe, ele não morde moça bonita... Não dá outra, Gustavo entra em cena alfinetando: – ENTÃO, CORRE GABRIELA!!! PRESENTE BOBO... Dar presente é uma coisa deliciosa, talvez mais até que ganhar, mas de vez em quando a coisa degringola e pode não agradar a quem recebe. Toda mãe acha que criança é bobona, e só porque ganhou um presente tem de mudar a personalidade e se “abrir” mais que sanfona de italiano, “e isto” somente para agradar quem lhe deu um mimo(...). Gabriela não pensava assim... Um dia, recebe um presente qualquer e não gostou do “trem”; fez aquela carinha de desaprovação própria de criança. A mãe endoidou e deu uma bronca terrível na ingrata da filha: – ÊÊÊ, Gabi, você ganha um presente e fica com essa cara de bunda...??!! Gustavo que está por perto corre em direção da irmã, fixa seu rosto e corrige a mãe: – NÃO É BUNDA, NÃO... NÃO TEM AQUELE PARTIDINHO NO MEIO... COLOCA OUTRA VEIZ... O pai de Gustavo, aquele, é São-paulino doente e faz questão de espalhar pra todo mundo. Um dia, tá lá o cara com uma camisa, mais velha que o rascunho da Bíblia, de seu time do coração. A camisa do São Paulo Futebol Clube é branca, preta e 21 Essas crianças... Osvaldo Reis vermelha. Tricolor, portanto... Gustavo, pra variar um pouco, está fazendo perguntas para o pai. O sujeitinho aponta o dedo para um lugar da surrada camisa e quer saber: – PAI, PORQUE AQUI NÃO É PRETO? Didático, o pai explica: – É porque desbotou... Ato contínuo Gustavo volta a atacar: – ENTÃO BOTA DE NOVO... O UGO E A UGA Um criminalista ambiental deu a Gustavo um casal de tartarugas, cuja guarda cabia à irmã mais velha Gabriela, que, um pouco distraída, deixou escapar o tartarugo. Os bichinhos, no início, fizeram a alegria do garotão, tanto é que ele, orgulhoso, mostrava-os a todo mundo. Era um tal de põe na bacia, tira da bacia que a região escrotal de um deles estava prestes a explodir. Numa dessas amostragens, talvez pela forma de tratamento empregada pelo “dono”, o enfezado “tartarugo” tacou o “dente” no dedo de Gustavo e, por bom tempo, lá ficou pendurado... Gustavo deve ter ofendido a masculinidade, ou sei lá o quê de um de seus bichinhos de estimação, quando explicou: – ESSA AQUI É A UGA, ELA É FÊMEA. ESSE É O UGO, ELE É MAIÚSCULO.... O MACACO TÁ CERTO... Criança faz as mais diversas associações: coisas, nomes, masculino, feminino etc. E, como afirmava um bordão de antigo programa de televisão, onde um símio dava um monte de “bola fora” – em verdade, “dentro” – ele mesmo concluía: o macaco tá certo... ... É o seguinte. Gustavo era um tanto quanto precoce e, em razão de o pai ser professor, embora de matemática, o sujeitinho aprendeu a ler bem pequeno, só não aprendeu a fazer contas, o que seria mais lógico. E criança aprendendo a ler é um “barato”... Fala mexendo os lábios, soletra, tudo ao mesmo tempo: pa = pá, nó = nó, aí despacha os acentos e conclui: pano... Gustavo deve ter imaginado o óbvio, se da chaleira vem o chá; da leiteira, o leite; do orfanato, o órfão... Um dia, Gustavo, em companhia do pai, está passeando nas proximidades da Universidade Estadual de Maringá, onde “tá assim” de repúblicas. O garoto vai lendo o 22 Essas crianças... Osvaldo Reis que aparece pela frente. O paciencioso paizão, dá a maior força... Numa casa, onde funcionava uma das tantas repúblicas, tá lá uma baita placona: PENSIONATO PARA RAPAZES. Gustavo demora um pouquinho, mas acaba lendo. Aí faz ao pai uma filosófica pergunta: – PAI, É AQUI QUE OS RAPAZES VEM PENSAR?!... VERBO “BINOCULAR” Gustavo encheu o saco da mãe para que ela lhe desse um “trem” que ele dizia ser um “espiadô”... A sabidona da mãe (e também pão-duro) foi numa loja de um-e-noventa-e-nove (deu um “trabalhão” pra achar...) e lá, após perguntar o preço (?), comprou um belo binóculo “made in proximidades de Ciudad de Leste” achando que teria matado a charada... Era o tal objeto muito bem falsificado, com alça, botões de aproximar, enfim, dava para se enxergar uma pulga com até trezentos metros de distância, já que o dito cujo, com seus recursos, fazia os alvos se aproximarem, dando, de vez em quando, um susto nos “miradores” ... A mãe, toda orgulhosa, com aquela cara de vitória estampada no semblante, entregou o “bicho” ao filhote, que, curiosamente, continuou chiando e esclarecendo (?) de vez a genitora: – MÃE ISSU NUM É ESPIADÔ... ISSU É BINÓCULO... EU NÃO VÔ BINOCULAR, EU VÔ ESPIAR... CRESCENDO... Quase toda criança adora crescer. As garotas brincam com suas bonecas e as tratam de filhas, são mães miudinhas, cuidando de sua “família”. Os garotos, sem o instinto maternal, são práticos e “insensíveis” já que entendem, por exemplo, que crescer é ter barba e pronto... Gustavo não era diferente dos outros meninos, era só ver o pai entrar no banheiro pra “fazer” a barba que o sujeitinho ia atrás para fazer a sua também... Cortava a penugem facial, perguntava ao pai se estava bom, se não “tava” grande e outras tantas perguntas nesse sentido... Um dia, no entanto (ou no banheiro...), exagerou na dose e sua pergunta, um tanto quanto pornográfica e pornofônica, deixou o pai encabulado e rindo: – PAI, QUANDO É QUE O MEU PILILICO VAI FICÁ BAIBUDO??? 23 Essas crianças... Osvaldo Reis O “CÃOPAGAIO”... Gustavo, que se o pai não fosse professor de Matemática, faria um livro só dele, tinha um medo terrível do Urso, um enorme animal da raça canina, paradoxalmente sem raça, isto é, o famoso SRD, ou sem raça definida, com seus quase trinta centímetros de altura, por uns 15 de comprimento, lembrando um gato (e dos pequenos). Mas sempre que Gustavo passava por perto da fera, reparava se o dito cujo estava bem amarrado e se a corrente era forte. A dona de Urso, a avó Helena, onde, quase sempre, aos domingos, a família se reúne, tinha no quintal uma baita “arvona” onde o Urso “tava” amarrado, por causa do neto Gustavo... Atrás da árvore (se é que árvore tem frente), está a prima Ana Paula, encoberta por seu tronco, o que impedia que Gustavo a enxergasse. E lá vem o ressabiado garotão que teria de passar por perto do objeto de seu terrível medo... Ana Paula puxa conversa com Gu: – Oi, Gustavo... Gustavo pára, desconfiado, examina bem a corrente que segurava Urso, pensa um pouco, nota que não corre nenhum perigo, e não querendo, de jeito algum, aproximação com o “inimigo”, encara-o e desafia: – O QUE VOCÊ QUÉ, MEU? QUÉ ENCARÁ?... A GRANA SANTIFICADA... Gustavo, quando bem pequeno, não sei a quem puxou, era pão-duro que só vendo. Foi matriculado na escolinha. Lá provavelmente o pessoal da cantina nunca deve tê-lo visto de perto. Gustavo não se arriscava, pois se olhasse de perto a vitrine poderia sofrer alguma recaída, assim não passava por perto dos salgadinhos, doces, refrigerantes, sorvetes e outras tantas guloseimas. Os pais achavam estranho o fato de o garotão não comer nenhum lanche na escolinha, já que chegava em casa devorando tudo o que via pela frente, demonstrando um apetite de leão... A mãe, que sempre dava um “troco” pro filhão, quer saber por que é que ele não comprava o que comer na escolinha. Gustavo sabiamente esclarece: – É QUE EU GOSTO DE CANONIZAR MEU DINHEIRO... “GOLADONA”... Outra de restaurante (só não sei se do mesmo...). O Gustavo “tá” aparentemente (mas só aparentemente mesmo...) morto, nem aí com a prosa dos outros, mas ligado, antenado, como quase toda criança... Vem o pedido das bebidas. Cláudio, o pai, adora açúcar. Se nascesse meia hora 24 Essas crianças... Osvaldo Reis depois, na certa teria nascido formiga. Pede um suco de frutas, já devida e generosamente adoçado pela natureza, mesmo assim, acrescenta umas “trocentas”colheradas de açúcar e a coisa vira um melado. Gustavo caladão. A mãe do jovenzinho, vaidosa, “tá” sempre fazendo dieta, de regime e coisas do gênero. Gustavo deve ter se lembrado das ordens da mãe na hora da comida e, principalmente, dos remédios, com aqueles tradicionais “come tudo”, “bebe tudo” e, incentivando, “duma vez”... Cláudio, cavalheiresca e “sacaneosamente”, dá uma chacoalhada no copo e oferece à esposa, que recusa terminantemente e explica: – Você “tá” doido. Isso aí, superdoce, engorda demais. Deve ter umas mil calorias cada gole... Aí é a vez de Gustavo aconselhar: – ENTÃO BEBE NUM GOLE SÓ !!! ABSTÊMIO... Domingão bonito que só. Gustavo, aquele, acompanha a família para um almoço num restaurante da cidade. Chegam, escolhem a mesa, lavam as mãos, ritual de sempre. Os garçons, competentes profissionais, escancaram suas bocas dando as boas vindas etc. e tal. Aí, com todo mundo já à mesa, o garçom, simpático, começa a fazer as tradicionais perguntas pela mãe, junto com um baita sorrisão: – A senhora quer tormar o quê? Norma pede um suco qualquer, a mesma pergunta para a irmãzinha Gabriela, que pede um refrigerante, depois ao pai que por sua vez pede também um suco. Aí o garçom se aproxima de Gustavo e, simpaticamente, puxando brincadeira, dá um tapinha nas costas do garotão e manda ver: – E para você, uma “pinga” ? A resposta de Gustavo deixou o sujeito com cara de “dois de paus” : – NÃO, OBRIGADO, PAREI DE BEBER. GABRIELA SALDAN GUSTAVO SALDAN PEDRO SALDAN PAIS Norma / Cláudio Saldan AVÓS PATERNOS Delvi / Henrique Saldan AVÓS MATERNOS Maria Helena / Osmar Galdini 25 Essas crianças... Osvaldo Reis SERVIÇO INCOMPLETO A mãe do Márcio Júnior tinha o belo hábito de lavar o traseiro do filhote após o tradicional cocô. Um dia, o tio Eliel leva o sobrinho até o clube. Assim que chegaram o garotão disse que precisava ir até o banheiro. O tio mandou que fosse. Ele obedeceu, mas voltou logo em seguida, sem deixar a “coisa” lá no devido lugar, explicando ao tio que o banheiro não estava limpo... Eliel disse ao sobrinho que o seguisse, que ele limparia o vaso pra ele... Mas não deu tempo... Aconteceu o imprevisto... Eliel ensinoulhe o que fazer para disfarçar: amarre a toalha na cintura e caminhe normalmente até o banheiro... Márcio obedeceu (como sempre!), só que o “normalmente” não foi assim tão normal: uma perna caminhava pelo sul e outra, pelo norte, lembrando uma forquilha. Nada de excepcional para a situação. Lá chegando Márcio completou o “trabalho” enquanto o tio lavou seu calção. Deixando o trono, Eliel limpou-lhe também o traseiro... O tempo passou, um ano, dois. Belo dia Márcio resolve encarar Eliel, e o tio exigindo respeito, lembrou-lhe: – Qual é a tua, rapaz, eu já limpei o seu traseiro... Márcio não discutiu com o tio; apenas lembrou-o, com a maior naturalidade: – LIMPOU, MAS NÃO LAVOU... SEM LENÇO E SEM DOCUMENTO... O Márcio, sabe-se lá por que, tinha um medo terrível daquele treco de lavar carros, aquelas buchonas redondas que espirram água e a gente fica dentro do veículo, sem saber direito se é o carro ou o “bicho” que tá andando. E não é só o Márcio que tem medo daquilo, não. Tem mais gente. Acontece que o Júnior gostava de sair muito com o tio, que gostava de manter o carro limpo e, para ser rápido, sem perder muito tempo, lavava sempre por este método. O Júnior sempre chorava. Eliel resolveu colocar um basta no berreiro que se avizinhava sempre que ia lavar o possante e, um dia, ameaçou o 26 Essas crianças... Osvaldo Reis sobrinho: – Se você chorar eu vou cortar o seu documento! Júnior retruca: – TIO, MAS, EU NÃO TENHO DOCUMENTO... Eliel explica: – Seu documento é o seu pipi... O carro foi lavado, Júnior não chorou. Em casa delatou para a mãe, mas apenas trocou alguma coisa: – Ô MÃE, O TIO FALOU QUE SE EU CHORASSE ELE IA CORTAR MEU CARTÃO DE CRÉDITO!!! O CARRO “DESCOBERTO”... Cláudia, a caçulinha da Maysa e do Eliel, foi passear no carro novo do pai. Olha pra lá, olha pra cá, nota aquele buraco na capota do veiculo. Em razão da liberdade que a coisa propicia, do vento que assopra os cabelos da baixinha, entre tantas outras novidades, faz com a pequena Cláudia goste do “treco”. E ela gostou tanto que danou a contar, a espalhar pra Deus e o mundo o que vira. Só não se sabe se suas “escutantes” estavam entendendo o que a gatinha afirmava, toda orgulhosa e cheia de razão sobre o teto solar do veículo: – O CARRO DO MEU PAI É SEM TELHADO... ELA BATEU NA MINHA FILHA... Um belo dia a “violenta” Flavinha pega a irmãzinha Cláudia dando uma surra em sua boneca... Uma surra braba, a pobrezinha da boneca tava jogada no chão, olhos cheios de poeira, braços quase arrancados, pernas idem, pescoço soltando a cabeça, uma tragédia... Não deu outra: Flavinha vingou-se da maninha aplicando-lhe também uma surra, só não tão violenta, não aconteceu nenhuma quebra de dentes, braços ou qualquer outro órgão... Mas surra é surra... É uma coisa humilhante, a “apanhada” chora (e dá-lhe choro), de todos os modos e tipos, vai do “coennnnnn” ao “buááááá” em segundos e corre contar pra mãe... Mãe é pra essas coisas (também!). Flávia vai, meio ressabiada, atrás da irmã que a “entrega” para a genitora: – MÃE, A FLÁVIA BATEU NI MIM... Maysa quer saber por que, onde já se viu uma violência dessas? Flávia, a “agressora” explica e justifica: – ELA BATEU NA MINHA BONECA... E MINHA BONECA É COMO UMA FILHA PRA MIM... 27 Essas crianças... Osvaldo Reis QUE BICHO É ESSE????? Eliel tinha por volta de três anos. Morava com a família em Iguatemi, casa de madeira, na verdade num “pedaço” do grupo escolar onde o pai trabalhava, água de poço, “casinha” lá nos fundos e, de vez em quando, tinha de imitar nosso maratonista Vanderlei Cordeiro de Lima, se era coisa mais urgente, era longe, enfim... Surge em Maringá o primeiro conjunto habitacional (não posso falar o ano para não entregar a idade do Eliel) que ficava nas proximidades do (hoje) Country Club. Seu José se inscreve e consegue uma casa. Casa novinha em folha, ou melhor, de material, como eram chamadas na época as casas de alvenaria... Eliel estranhou uma casa sem as tradicionais tábuas... O pai começa a explicar ao filho a nova técnica de construção e também a mostrar os compartimentos da nova casa, aqui é isso, aqui aquilo, e vem o banheiro. Banheiro com vaso sanitário e tudo. Um luxo, Eliel ressabiado, desconfiado. O pai explica pra que serve e mostra a “cordinha” - no caso uma correntinha com uma argola na ponta - que deveria ser puxada. O garoto tenta, pula, esperneia, mas não consegue, não alcança... O pai o coloca sobre o vaso, aí ficou fácil... Eliel enfia o dedo na argola e manda a corrente pra baixo, a água descamba da caixa, enchendo o vaso, barulho terrível. Eliel salta do vaso e sai em desabalada carreira e, se não fosse contido três quarteirões adiante, hoje, alguns janeiros depois, certamente estaria ali por perto de Sena Madureira, no “vizinho” Acre... Tadinho do Vanderlei, nessa manhã teria fatalmente perdido pro mocinho que veio de Iguatemi... SEIS POR MEIA DÚZIA... Claudinha é do tipo contestadora. E o que é pior, vez por outra, não é que ela tem razão? Seguinte: tanto o pai, quanto a mãe, corrige, sempre que percebem, as filhas naqueles tradicionais “subi pra cima”, “desci pra baixo” etc. Tem gente que basta ouvir batida na porta ou a campainha, que “manda entrar para dentro”, como se alguém pudesse entrar para fora. É comum também se ouvir de profissionais da “latinha”, quando em apresentação de algum evento, após o discurso, principalmente em comícios, o locutor anunciar: acabamos de ouvir as palavras do (a)... Como se no microfone, num discurso, pudesse ser ouvida qualquer outra coisa que não fosse palavra... Assim, o casal “tá” sempre corrigindo as gatinhas... Mas... Maysa precisava sair e Cláudia não estava querendo ir, e não se concebia deixá-la sozinha... Maysa convence a filha a ir junto. “Enfia” a criança no carro e se manda. Aí percebe a chegada da avó das meninas. Dá marcha à ré e deixa a filhota em casa. O pai chega e pergunta o porquê dela não ter ido e o que a mãe fez para deixá-la 28 Essas crianças... Osvaldo Reis voltar. Cláudia explica: – A GENTE IA SAINDO AÍ A MÃE VIU A VÓ E VOLTOU PARA TRÁS... Atento, Eliel corrige a filha, dizendo que não se volta para trás. A explicação de Cláudia é lógica e convincente: – OLHA EU VOU PA TRÁS DE VOCÊ, VOU PA SUA FRENTE E DEPOIS EU VOLTO PRA ONDE EU TAVA. VOLTEI OU NUM VOLTEI PA TRÁS???? EU COMO DE TODO JEITO... Claudinha não gostava muito de comer. Tem criança que é assim mesmo. O pai apela, promete mundos e fundos, ameaça, e nada. A mãe faz a mesma coisa e tudo do mesmo jeito, nada da filhota se alimentar bem, só belisca... E todo dia à hora da refeição a história se repete: come filha, come filha... Vendo que a menina não queria mesmo saber de comida, o pai resolve puxar a faca: encara Claudinha, com cara fechada, de poucos amigos, resolve mostrar quem manda e ordena: – Come direito, filha!!!! Aí, a fêmea do gado vacum encaminhou-se para o alagadiço... Claudinha encara o pai, mexe com a boca, com os dois cantos, pra lá e pra cá, faz um “bico” e tasca: – EU COMO DIREITO, ESQUERDO E PELO MEIO... PATO PEQUENO MOÍDO... A Camila é um “grude” com tio Eliel. Quando tem oportunidade ela acompanha o tiozão onde quer que ele vá, jornal, farmácia, quitanda, hospital... Dia desses, a esposa Maysa resolve botar pra fora seus dotes culinários, uma receita que usaria “boi ralado”... Maysa “despacha” o marido para o açougue, a sobrinha se manda junto. Lá chegando, Eliel vai direto ao balcão e pede ao atendente: – Por favor, eu quero um quilo de carne de boi, moída, de primeira... A sobrinha presta atenção no pedido achando-o muito estranho. Carne de boi moída? Esquisito, pensou Camila, que, curiosa, pergunta a Eliel: – TIO, VOCÊ COMPRA CARNE DE BOI MOÍDA? Eliel diz que sim. Aí a garota explica: – A MINHA MÃE SÓ COMPRA PATO... CARNE DE PATO MOÍDA... O açougueiro ajudou a “traduzir”: a mãe de Camila só usava “patinho”, em vez de alcatra, coxão mole, filé, ou qualquer outra carne... 29 Essas crianças... Osvaldo Reis LEITE MUSICAL... O casal Maysa/Eliel Diniz tem duas filhotas, a Cláudia, mais nova e a Flávia, a maiorzinha, já começando a ler, apesar de ter apenas quatro anos incompletos. Eliel sempre compra para a filha aqueles livrinhos infantis que traz aquele mundaréu de perguntas... Aquele negócio de o que é? O que é? Que não acaba mais... E quando ela não sabe, o pai, lógico, sabe, a mãe idem. Dia desses, a garota acha num desses livrinhos uma perguntinha, uma charadinha, bem marota, não conseguindo saber, vai ter com Eliel: – PAI, QUANDO É QUE O LEITE VIRA MÚSICA? E mostra o livro ao velho. Eliel procura a página que tem a resposta e, sabidão, responde: – Quando é sonata. Uma mistura de cacófato com trocadilho que para entender é preciso acentuar a letra "o" e separar as duas sílabas iniciais. A gatinha entendeu. Entendeu tanto, que dias depois Eliel vai tomar leite, coloca a vasilha naquele televisor, também parecido com computador, mas que na verdade é fogão e muita gente chama de microondas para esquentar. Após o aquecimento, Eliel apanha a vasilha notando que a parte superior tinha virado nata, em razão da gordura. Aí o “guloso” do paizão “agarra” com os dedos aquela coisa que lembra um espaguete mostra e diz à filha: – É nata e é uma delícia... E mandou para baixo. Flávia lembrou da pergunta e, mais que depressa, encostou o ouvido no copo para ouvir a música que deveria sair de dentro do dito cujo... CLAUDIA FACCI DINIZ FLÁVIA FACCI DINIZ PAIS Maysa Facci / Eliel Diniz AVÓS MATERNOS Guiomar / Antenor Facci AVÓS PATERNOS Clara / José Pereira Diniz Fico com a pureza das respostas das crianças... Gonzaguinha 30 Essas crianças... Osvaldo Reis SENSIBILIDADE!!! Marília, musa de um Dirceu contemporâneo, seu pai, é tema e inspiração do livro “Cartas para Marília - de Pai para Filha: Uma Declaração de Amor”, aliás, belíssimo, digno do outro Dirceu e com uma diferença, lá a Marília só tinha o Dirceu, aqui, no caso, ela tem também a “babona” mãe Regina. Regina Célia. É mole ser Marília, ter um pai Dirceu e a mãe, Rainha do Céu? A gatinha, com razão, tá com tudo e não tá prosa... Os pais colecionam suas pérolas para, provavelmente, fazerem um outro livro falando de suas “bolas foras”, suas “tiradas”, já que ambos são jornalistas (e dos bons!). Mas algumas dessas pérolas “consegui arrancar” do casal.Uma delas é a seguinte: Um dia, “tá” lá a mãe e a filhota brincando, de repente Marília, que ainda não havia completado três anos, quase nocauteia a mãe acertando-lhe um direto, soco mesmo, no abdômen. Regina reclama e ensina ao mesmo tempo: – Ai, filha, a barriga da mamãe é sensível... O cérebro da gatinha entra em ação e vem, na bucha, a pergunta: – E QUANDO É QUE VAI SER COM SÍVEL????? O FRIO TÁ LÁ FORA... A Marília começou a freqüentar a escolinha. A tarefa de levá-la e buscá-la era “fraternalmente” dividida entre o pai e a mãe. A fraterna divisão é mais ou menos assim: Regina a leva e busca, dia sim e outro também. Dirceu, só de vez em quando cumpre o prazeroso dever de carregar a filhota para estudar. Num desses raros dias, o sol “tá” estalando mamona e assim que a garota entrou no carro, começou a abrir os vidros. O pai quer saber o motivo: – TÁ MUITO QUENTE AQUI... TÔ ABRINDO O VIDRO PRA ENTRAR O FRIO! No dia seguinte, mais uma vez coube a Dirceu deixá-la na escolinha. Assim que parou o veículo pra filha descer, lembrando o dia anterior, Marília dá uma dura no velho, que, mais uma vez, danou a rir da rabugice da filhota: – PAI, VÊ SE HOJE VOCÊ NÃO DEIXA O CARRO NO SOL, TÁ??? 31 Essas crianças... Osvaldo Reis ADVOGANDO EM CAUSA PRÓPRIA! A Marília, pequena ainda, tem personalidade forte. Na saída da escolinha, sempre cansada e esfomeada, gosta que a mãe leve a mamadeira para ela e mama que é uma grandeza. Depois, se entrega ao sono no carro mesmo; nem dá tempo de chegar em casa. Quando o paizão tem de apanhá-la, não tem mamadeira: é que o pai vai do trabalho para a escola e lá no trabalho não tem fogão, leite e, principalmente, a mamãe; assim, não é possível preparar a mamadeira. Papai explica isso pra filhota, que não tá nem aí com a argumentação; pra ela tudo é papo furado e ela quer mesmo é saber: – PAI, PORQUE CÊ NÃO TROUXE MEU MAMÁ? O pai tenta repetir a “desconvincente” explicação. Marília vai direto ao assunto, isto é, à parte que lhe interessa: – PAI, SE VOCÊ NÃO PODE TRAZER MAMADEIRA, ENTÃO POR QUE VOCÊ NÃO DEIXA A MAMÃE VIR ME BUSCAR??? VELHO E USADO! Os avós nem sempre gostam de ser chamados de velhos. Acho que no fundo, no fundo, ninguém gosta, principalmente pelo sentido que a coisa simboliza, velho não serve mais, é “gagá”, trapo ou coisa que o valha. O vovô Luiz, de Marília, não foge à regra. Numa bela manhã, manhã mesmo, cedinho, os pais estão ainda dormindo e a gatinha, num rompante, “xinga” o avô de velho. O avô, bem humorado, disse que não era velho, mas sim usado. Usado? Marília não entendeu bulhufas, não soube exatamente o que o avô quis dizer e pede explicação. Esclarece o vovô: – Sou usado pela vovó, pela mamãe... Marília aceitou, entendeu a explicação e completou: – USADO PELO PAPAI... O avô percebeu a escorregadela e protestou: – Ooôpa pelo papai, não senhora!!! FUTURÓLOGA... O avô tava deitadão no chão, sem camisa, à vontade mesmo. Marília está brincando por perto. De repente se aproxima e “garra” nos cabelos do peito dele. Cabelos nevados, branquinhos da silva... Sem mais, nem menos, Marília, que não obteve nenhuma resposta, indaga: – VÔ, QUANDO MEU PAI VIRAR VELHO, O CABELO DO PEITO DELE VAI CRESCER IGUAL O SEU??? 32 Essas crianças... Osvaldo Reis MUDA O DISCO! Marilia está na escolinha. Por lá, tem um montão de amigas e também amigos. Dentre esses tantos amigos, Aninha, que acaba de ganhar um irmãozinho... Marília chega da escola, indignada e conta pra mãe: – MAMÃE, A MINHA AMIGA ANINHA SÓ FALA NO IRMÃOZINHO NOVO DELA, O MATEUS... FALA O TEMPO TODO DELE... NÃO PODE SÓ FALAR DISSO, MAS TAMBÉM DE OUTRAS COISAS, NÉ, MÃE??? MAL COMPARANDO... O irmão da Marília, Pedro, está na escolinha. O sujeitinho tem uma professora que além de muito simpática é também muito bonita e se destaca por sua estatura. O Pedro, aparentemente, nada tinha a ver com o peixe. Ou tinha? A bela professora está tentando fazer um coleguinha de Pedro comer, tarefa, aliás, nada fácil. Seus argumentos já estavam se dissipando, desaparecendo, escafedendo, aí vem a professora com uma “tirada” irresistível, infalível... E teria dado certo se não fosse a espirituosidade de Pedro... A “tia” manda ver, orgulhosa: – Se você comer tudo, vai ficar grande como eu... Pedro desconcerta a professora: – MAS PROFESSORA, A SENHORA É PEQUENININHA!!! FICA NA “SUA” MEU! O autor é uma das maiores feras de nossa literatura, Pedro não tem ainda a menor idéia de quem é Mário Prata, que, entre outras coisas, escreve crônicas como ninguém... Pedro sabe, no entanto, que o pai prefere um livro do que dar a atenção devida ao filho... Resumindo: o pai tá lendo Mário Prata, e Pedro, deitado no chão, ao lado, brinca com um carrinho em miniatura. O pai, devorando o livro, quase nem percebe a presença do garotão... Pedro resolve conversar sozinho. Bater um papo com ele mesmo... O pai não consegue saber o que o filhote está falando... Pedro parece estar desabafando... O pai, desatento, querendo saber o que o filho dizia, vem com aquele jeito tradicional de perguntar, sem saber o quê: – Hããã??? Hãããã????? Pedro se vinga. Levanta-se, incluindo a voz e indignado, mostra o brinquedo e tasca: – EU NÃO TÔ FALANDO COM VOCÊ... EU TÔ FALANDO COM O MEU CARRINHO!!!! VRUUUUMMMM!!!! 33 Essas crianças... Osvaldo Reis OUVINDO COM OS OLHOS... Naquela noite o Pedro resolve fazer uma birrazinha antes de pegar no sono. O pai, já um pouco impaciente, tenta fazer o filhão entregar-se a Morfeu... Mas Pedro prefere continuar conversando, tava com a pilha toda, isto é, com a corda toda e pilha nova... O pai não teve outro jeito deu-lhe uma sonora bronca... Pedro chantageia: encolhe-se todo, cara de anjo, pede a mamadeira, o pai resmunga, ou melhor, responde: – Tá bom. Vou fazer a mamadeira, mas fecha os olhos e dorme! O pai sai para preparar a mamadeira. Pedro “reacorda” e começa a conversar com Marília (a quem, vez por outra, chama Lila): – LILA, CONTA UMA HISTORINHA! Marília lembra-o da recomendação do pai: – Pedro, o papai mandou você ficar de olho fechado... Pedro não pestaneja: – ENTÃO CONTA A HISTORINHA QUE EU ESCUTO DE OLHO FECHADO!!! VOCÊ NÃO PAGA A LUZ QUE APAGA! O Pedro desde bem miudinho, é muito responsável, e põe responsável nisso! Pra se ter uma idéia dessa boa mania do garoto, basta dizer que, com um ano e meio de vida, já acertava, colocava no devido lugar, os tapetes que encontrava fora, chutados por pés distraídos. Luz acesa, então, nem pensar, bastava ver que saía apagando. Se alguma coisa caía no chão, tá o Pedro catando. Tem mais um punhado de outras tantas coisas que o jovenzinho “conserta”... Ultimamente “tá” com mania de limpeza, quer por que quer lavar tudo o que vê pela frente, só tem um detalhe: sua cabeça ainda nem alcança a pia e ele acaba se valendo de um banquinho... Mas naquela madrugada Pedro se excedeu... Cinco horas da manhã e o carinha começa a resmungar... Balbuciando alguma coisa, morrendo de sono, com um olho fechado e o outro idem. O pai se aproxima do berço pra “descobrir” o que estava se passando e consegue “traduzir” uma palavrinha de duas sílabas, cuja pronúncia saía bem separada: – XI...... XI....! Em razão de tanto sono, não consegue sequer emendar. O pai pega o filhote no colo e se manda para o banheiro. Acende a luz da luminária e o coloca no trono. Pedro cumpre rigorosamente o anunciado... O xixi é “escrito” com uns trocentos e tantos is, tal a intensidade. Terminada a coisa, o pai levanta a calça do filhote que ainda meio dormindo, é levado de volta ao berço... Mas mesmo dormitando, Pedro não perde o senso de responsabilidade, e enquanto o pai o ajeita no ninho, com os olhos bem fechados, lembra a distração do velho: – CÊ ESQUECEU DE APAGAR A LUZ DO BANHEIRO!!! Vá ter responsabilidade assim lá na... Casa do Dirceu, da Regina, da Marília... 34 Essas crianças... Osvaldo Reis DÁ LICENÇA!!! Essa do Pedro, aparentemente, não tem nenhuma graça. Ninguém, com certeza, vai morrer de rir quando ler ou ouvir essa história... Mas entre no clima. O carinha não tem ainda dois anos, mas já é motoqueiro, um tanto quanto precoce, é verdade... Um belo dia, tá lá o Pedro com sua “Harley Davidson” de plástico, incansavelmente, dando voltas em volta da casa da vovó... Adultos “mal educados” adoram estragar brincadeiras de criança... Com Pedro e sua moto não foi diferente... Avô, avó, pai, mãe resolvem ficar parados na frente do viajante atrapalhando sua passagem... Se você acha que Pedro danou chorar, fez birra ou coisa do gênero, enganou-se redondamente: Pedro ignorou a presença daquela “gente” no meio de seu caminho, sequer levantou os olhos pra ela, deu meia-volta e continuou sua “pedalante” trajetória, imaginando, certamente, que aqueles “babacas” não iriam interromper seu passeio. Pedroca não deu a mínima e deixou todo mundo com cara de tacho. MARÍLIA DAEFIOL HERRERO GOMES PEDRO DAEFIOL HERRERO GOMES PAIS Regina Daefiol / Dirceu Herrero Gomes AVÓS MATERNOS Maria da Conceição / Luiz Daefiol AVÓS PATERNOS Dolores / Dorival de Assis Gomes O encontro Eis que encontro um retrato meu aos 10 anos. Escondo, súbito, o retrato. Sei lá o que estará pensando de mim aquele guri. Mário Quintana 35 Essas crianças... Osvaldo Reis NÃO “TÔ” DESCALÇO... Noth resolve, antes de buscar os filhotes na escola, passar na casa de Janete e Paulo Pupim e convidar a Sofia para ir junto. Feito o convite, a gatinha, com dois anos e alguns meses, topa sem pestanejar. A mãe da garota também não colocou nenhuma objeção. Noth, cuidadosa, ajeita a pequena no banco do carro, com cadeirinha e tudo, aperta o cinto e quer saber da filhinha da amiga como ela estava se sentindo, se estava tudo bem, tudo normal, saber, enfim, da vida dela e, sem mais delongas, vai direto ao assunto e indaga: – E aí, Sofia, como é que você está? A resposta da garota também direta e objetiva, esclarece, clareia, tirando qualquer dúvida que por acaso a amiga adulta pudesse ter: – EU TÔ DE SANDÁLIA!!!!!!!!! QUEM SOU EU???!!!! Manoel tinha por volta de dois anos. A mãe e a tia Claudete davam ao garoto tanto dengo (e põe dengo nisso!) que sequer percebiam o exagero. Eram tantos os nomes, que, em bom Mandarim, significaria, mais ou menos, o trem que sai às sete, vai desfilando suavemente pelas curvas da estrada, até chegar ao seu destino (ou seja, chi, cham, chung, pong, bloong, e por aí afora). Ao Manoel, em bom português (?) chamavam-no Chu, chuchu, tchuco, thuthuco e mais um montão de outros tantos adjetivos. Adulto é um barato... Resolveram então ensinar o seu nome correto. Tia e mãe “babonas”, algum tempo depois, certíssimas de que o garoto tinha memorizado o nome, resolvem indagálo, começando pela mãe: – Como é o seu nome, filho? Fale filho, responde pra mamãe que é Manoel... Vou perguntar de novo... – Como é o seu nome? Manoel dá uma pensadinha e manda ver: – É TCHUCA!!! 36 Essas crianças... Osvaldo Reis QUAL DELAS??? Manoel, filho de Paulo Pupim e Janete de Carvalho, sempre foi uma criança muito gentil, daquelas crianças que parecem ter nascido sorrindo e continuaram vida afora, apesar de “mensalão”, “malas”, “cuecas” e tantas outras melecas que os chamados adultos produzem, aliás, em demasia, quase que “Rondoniana”, nos últimos tempos. O sujeitinho, com três anos aproximadamente, saía do prédio em que morava em companhia da mãe, quando “trombaram” com a zeladora, uma senhora negra, que acompanhada por uma ajudante, lavava o corredor. A mãe de Manoel ao passar por elas cumprimentou-as sorridente, com aquele tradicional (e gostoso, diga-se) Bom Dia... Não deu outra: Manoel, atento à cena, também decidiu fazer a mesma coisa e olhando, como a mãe, para as duas, mandou o seu sonoro: – BOM DIA! A zeladora observou: – Que graça! Tão pequeno e tão educado... Até hoje ninguém sabe por que é que o Manoel olhando para trás, perguntou: – QUEM FALOU, MÃE... A BRANCA OU A PRETA??? ENDOIDANDO... Manoel tinha três anos e meio. A mãe sempre cantava, dançava e fazia caretas pra ele. Uma verdadeira “palhaça”, fazia de tudo para divertir o menino. Um dia, lanchando à mesa, a mãe resolveu tornar ainda mais agradável a refeição do filho. Começou, como sempre, a cantar e a dançar animadamente, convicta de que estava abafando... Mas criança é criança... De repente o lado artístico maternal veio abaixo quando Manoel, aparentemente irritado, perguntou: – O QUE CÊ TÁ, MÃE? TÁ DOIDA? CAINDO DO CÉU... Manoel ia completar seis anos. Mas a festa não seria tão animada, tão alegre: sua tia Claudete não estaria presente: a morte a levara meses antes. E era difícil esquecer, passar um mata-borrão numa tia tão querida, tão atenciosa, tão carinhosa e que o enchia de presentes, mesmo sem ser aniversário. E naquele dia era seu aniversário e a tia não estava lá... Seus amiguinhos estavam. Festinha de criança, balões, pipoca, brigadeiro, aquelas coisinhas, sem falar claro, no bolo, que criança nunca esquece. Tudo estava indo muito bem. Lá pelo meio da festa, Manoel olha pra cima e pergunta: – MÃE, SERÁ QUE A TIA VAI JOGAR PRESENTES LÁ DO CÉU??? 37 Essas crianças... Osvaldo Reis DESAFINADO... A tia Claudete em companhia do sobrinho Manoel adorava ouvir música, ambos curtiam de montão. A tia, mais ainda, vendo o interesse de Manoel pela arte. Mas... Manoel estava com seis anos e a tia veio a falecer. No velório Manoel quer saber da mãe: – MÃE, SERÁ QUE DEUS NÃO DEIXA EU FALAR COM ELA SÓ UM POUQUINHO? O pai, tentando dizer ao filho que era impossível, se propõe a conversar com ele. O filho não aceita e esclarece: – VOCÊ NÃO ENTENDE NADA DE MÚSICA!!!! O BANGUELA... Aos quatro anos e meio Melina queria porque queria andar de ônibus circular em Maringá, coisa que ainda não tinha feito. Queria, decerto, conhecer não só o ônibus, mas também sua cidade. A mãe sabe-se lá o porquê, nunca atendia ao pedido da filha. Mas, sempre nessas horas, surge alguém de coração “mais mole” que acaba tendo sensibilidade suficiente para atender desejo tão simples. No caso de Melina, a salvadora foi a tia Janete a levar a pequena para a grande aventura. As duas entraram no ônibus. Melina, miúda, ajoelhou-se no banco e em vez de observar a paisagem, as árvores floridas, enfim, a cidade, achou mais interessante olhar um senhor que cochilava (e alguém ronca cochilando?) num banco logo atrás... Em determinado momento, o homem acordou e deu de cara com aquela carinha linda de olho nele. Resolveu, então, oferecer-lhe um baita sorrisão, simpático deveras, daqueles que mostravam a famosa abóbada palatina, também conhecida como “céu da boca”. Melina deve ter se assustado diante da inusitada cena e imediatamente, com voz estridente e ardida, gritou para todos ouvirem: – TIA JANE, POR QUE ELE NÃO TEM DENTES??? QUESTÃO DE ORDEM Melina, filhota de Leila e Paulo, nasceu em Maringá e vive hoje em Curitiba. Quando morava na Cidade Canção, no prédio em que viviam havia um morador que era muito querido das crianças, em razão do carinho que a elas dedicava. Este senhor, conhecido pelo seu sobrenome, tratava a todos com muita atenção. Melina, então com três anos e poucos meses, estava na garagem para sair com a mãe. De repente, avista seu amigo e querendo puxar uma prosa, começou a chamá-lo: – SEO NOGUEIRO! SEO NOGUEIRO! 38 Essas crianças... Osvaldo Reis A mãe interfere e corrige a filha: – Melina, não é seo Nogueiro, é seo Nogueira (o sobrenome correto daquele senhor). Ninguém mandou nossa língua ser tão complicada... Em vez de corrigir, a mãe é que acabou sendo ensinada: – MAS, MÃE, ELE NÃO É MULHER!!! DUELO À BALA A Sofia adora doce (será só ela?) e, particularmente, tem uma queda por bala, indiferentemente do sabor. Pode ser canela, beterraba, chuchu, abobrinha, melancia, menta, não importa, a gatinha “tá” sempre com um punhado nas mãos e as devora com certa volúpia. Sofia é muito prática e objetiva, parece não ter (nem completou!) dois anos. Num domingo desses, quando se faz macarronada em casa e a mãe, em razão de tantos afazeres, “esquece” um pouco os pequenos, está acontecendo uma ferrenha competição entre a favorita Sofia e algumas outras crianças, mais ou menos da mesma faixa etária. Sofia dispara: está, no mínimo, quinze balas à frente. As adversárias, sem a mínima chance. Dayane, um pouco mais velha, (está com seus quatro anos e poucos) experiente, catimbeira, arranca, na “manha”, o segredo de Sofia que acabou por entregar o ouro na próxima disputa, fatalmente, não vão perder tão feio. Com todo mundo já “baleado”, Dayane como quem não quer nada, pergunta: – SOFIA COMO É QUE VOCÊ FAZ PRA CHUPAR TANTA BALA? A pequena Sofia, sem pestanejar, “descasca” velozmente uma bala e, no mesmo ritmo, enfia na boca e esclarece: – ASSIM Ó!!!!!!!!!! MANOEL PUPIM SOFIA PUPIM MELINA FIGUEIREDO LEE ISABELLA FIGUEIREDO LEE PAIS Janete / Paulo Cesar Pupim Leila / Paulo Lee AVÓS MATERNOS Carma / João Julio Carvalho Maria / José Figueiredo AVÓS PATERNOS Iraci / Manoel Hermes Alba / Lee Pao Sen 39 Essas crianças... Osvaldo Reis A COROA DIVIDIDA Maysa, morena de cabelos negros é mais bonita do que laranja de amostra, com seus bem vividos (quase) dois anos, reinava sozinha no lar de Tânia e Sérgio. Era a única filha do casal e uma das netas prediletas do “avô Paceco” e, do mesmo modo dos outros avós, igualmente “babões”... O casal vivia num apartamento confortável, onde Maysa “deitava e rolava”, dava cartas e jogava de mão... Aí, Tânia engravida. Um barrigão daqueles... Inicialmente as esquinas dos braços de Maysa têm cócegas, depois vira, de verdade, uma baita dor de cotovelo; afinal, seu reino estava sendo ameaçado com a chegada de um intruso... O pior se deu, não foi apenas um intruso: foram dois, os gêmeos Serginho e Lara. Maysa roía as unhas, inclusive as dos pés... Com tanta gente, o apartamento acabou ficando pequeno e, para dar maior conforto e liberdade para as crianças, mudam-se para uma casa. Casa gostosa, com quintal... Mas Maysa anda macambúzia, cabisbaixa, triste mesmo. Tânia vendo a filhota naquele deprimente estado, tenta resolver o problema, achando que a menina não estava gostando do novo lar, resolve propor à mais velha da prole o retorno à casa antiga, achando que com isso a questão estaria resolvida. Propõe, então à filha: – Maysa, você quer voltar para o apartamento? Maysa abre um sorrisão do tamanho do mundo, de orelha a orelha, e com o dedo indicador da mão direita apontando para seus concorrentes, os irmãos Lara e Serginho, tasca uma pérola: – TUDO BEM, MAS A GENTE NÃO VAI LEVÁ ELES NÃO, NÉ, MÃE??? PAI ANTIGO O Serginho brincava com a carteira do pai Sergio - coisa de que criança quase não gosta. Examina um documento, confere, olha outro, depara com a carteira de reservista, documento emitido quando portador (ou cidadão) tem por volta de 18 anos. Para o filhote, com seus três/quatro anos, uma coisa já bastante velha. Com o mencionado documento nas mãos, mostra-o ao pai e, curioso, quer 40 Essas crianças... Osvaldo Reis saber: – PAI, ESSA FOTO É DO TEMPO QUE VOCÊ ERA EM PRETO E BRANCO ??? (?) RUIVA DE CABELO PRETO... Lara, uma das bonecas da casa de Tânia e Sérgio, é ruiva, simpática e também muito bonita (e tem boneca feia?), mas curiosamente “não se gosta” ou gosta muito da irmãzinha mais coroa, Maysa. Maysa tem os olhos de jabuticaba, o cabelo é liso, bem cuidado e preto. Maysa é a “ídala” da menorzinha Lara. Dia desses, Mari, madrinha de Lara, que lida com pincéis e tinta, resolve fazer um retrato da afilhada. Até aí, nada demais. Vem o ritual que antecipa a cena, vira pra lá, mais pra cá, sorria etc. e tal. Lara, parecendo gente grande, participa, aliás, protagoniza a coisa. Mari inicia uma espécie de aquecimento, de teste com seu material. Lara tá paradinha, nem pisca e Mari olha pra modelo, olha pros pincéis, pra tinta e por aí afora... Larinha, até então quieta, resolve “abrir o bico” e, se a madrinha a tivesse atendido, em razão do já mencionado puxa-saquismo explícito de sua irmã mais velha, teria se transformado em LARYSA ou MALARA, em razão do pedido, no mínimo estranho, que fez à madrinha pintora: – VOCÊ PODE PINTAR... SÓ QUE VOCÊ PINTA OS ZÓIO E O CABELO DE PRETO, TÁ??? OS PODERES DO LEITE Sérgio (também conhecido por Serginho, ou Raulzinho, já que é o tio em forma menor), que, junto com Lara ajudou a desbancar Maysa de seu reinado absoluto, vive hoje de dengo com a mais velha, a quem a mãe atribui algumas tarefas, aliás, sempre cumpridas a contento. Maysa tem pelos irmãos verdadeira paixão (nem quer mais abandoná-los, deixá-los na casa de onde se mudaram, logo após o nascimento da dupla)... Sabe-se lá por que, Serginho não gosta de tomar leite, embora o suco de vaca não lhe faça mal, pelo contrário... Os pais do trio são professores e vivem em perfeita harmonia, com sorrisos e mais sorrisos, é bom dia, boa tarde, boa noite, olá, tudo bem, tem também aquele tradicional “saúde”! quando alguém espirra. Lá é assim: espirrou - saúde, tropeçou, desculpa... As crianças ouvem e aprendem... Uma das tarefas confiadas a Maysa era convencer o irmãozinho a tomar leite... “Tá” lá a gatinha explicando que leite é bom pra isso, bom pra aquilo, que faz ficar forte, que muda até a cor dos olhos, mas nada de o sujeitinho concordar... Serginho não tá nem aí com o falatório de Maysa... A mocinha não quer desapontar a mãe e vem com um argumento infalível, convincente: – TOMA LEITE, SERGINHO... BEBE... LEITE É BOM PRA ESPIRRO !!!!!! 41 Essas crianças... Osvaldo Reis O “DEUS” XAROPE... Maysa, já apresentada, se entende muito bem com a mãe a quem ouve e atentamente atende, sem nunca pestanejar. A mãe falou, tá falado. O mínimo desejo materno é para ela a mais importante das ordens... Sabe-se lá por que Maysa detesta tosse, para ela, uma das piores coisas do mundo... Essa história de “cof cof” não é com ela. O pai é professor, a mãe também, só que o pai trabalha fora o que o faz viajar mais do que o anjo Gabriel. É um sem-fim de idas e vindas, motivo de muita preocupação para a mãe... A mãe se preocupa com acidente, assalto, comer “porcaria”, comer fora de hora, e outros tantos motivos. A filhota nem sabe o que é isso ainda. Todas as noites, antes de dormir, a mãe reza com a filhota e, com tanta preocupação pede a solidariedade da filha em relação ao pai e, com maternal afeto pede a Maysa que reze pelo papai. Maysa obedece fielmente e em voz alta, devidamente ajoelhada, manda ver: – PAPAI DO CÉU PROTEGE O PAPAI PRA ELE NUNCA FICÁ CUM TOSSE!!!!!!! FELINO COM PENAS... A Professora Maria Augusta Bolsanello, da Universidade Federal do Paraná, especialista em Educação Infantil, no dia 19 de abril, considerado o “Dia do Índio” está visitando uma escola, onde os alunos, com idade entre dois a quatro anos, estão caracterizados, com suas cabecinhas enfeitadas com penas de diversas cores. A visitante começa a conversar com a criançada perguntando pelas roupas e pelos ornamentos de suas cabeças. As perguntas são sempre as mesmas: qual é a cor dessa pena em sua cabeça? As respostas só se diferenciam em termos de tonalidade. Uma é verde, outra azul, amarela, vermelha e por aí afora... Mas um garotinho tinha uma pena diferente: a de uma galinha carijó... A “tia” pergunta ao garoto, o mesmo que fez a outras tantas crianças: – E essa pena que você tem na sua cabeça, é de que? O garotinho não titubeia e sua resposta é uma verdadeira obra de arte: – É PENA DE TIGRE !!!!! CONFERINDO... As crianças (que novidade!) fazem associações das mais diversas, que os adultos, às vezes, com muita dificuldade, acabam sempre imaginando, traduzindo ou, de fato, entendendo. Nenhuma criança, que se tenha conhecimento, disse até hoje que aquele objetozinho que usamos para cortar outros objetos, como tecidos, por exemplo, é a fêmea do tesouro... As crianças normalmente aprendem a usar esta invenção, das mais úteis, vale frisar, nas escolinhas cortando bichinhos de papel, flores e outras coisas, assim. Para Maysa, aquela famosa faca de duas pernas que se abrem e ao fechar é 42 Essas crianças... Osvaldo Reis que corta, conhecida por tesoura, nada mais é que recorteira... Um dia, ela pediu ao pai que a levasse ao estádio já que queria assistir a um jogo de futebol. O paizão atende ao seu pedido. Esperou que acontecesse um jogo amistoso ou inexpressivo pra levá-la com tranqüilidade. Assim fez. Era um joguinho bem mequetrefe, e eles se mandam para o “campo” do “Grêmio” - nome popular do Estádio Willie Davids, em Maringá. Maysa nunca tinha ido, tampouco visto um jogo de bola... Novidade das grandes, portanto. Entram no estádio, Maysa olha tudo, bota reparo no que vê. Acham um lugar (nesse joguinho não foi difícil...). Sentam. Algum tempo depois surge o extinto Grêmio. Jogadores correndo enfileirados, aceno para a torcida, repórteres, corridas, aquecimento etc, Maysa olha tudo muito atenta para logo em seguida perder o interesse ao afirmar: – PAI, É BEM IGUAL NOSSA TELEVISÃO... IRMÃO ENTULHO Domingo à tarde, sem ter muito que fazer, o pai Sergio resolve passar uma água no “possante”. A filharada, liderada pela Maysa, quer ajudar. A mãe Tânia pra não ficar sozinha, também entra na dança. O serviço acontece lá na frente da casa, pertinho da rua e, com tanta gente trabalhando, acaba logo. Aí, Serginho sai do quintal e vai pra rua, e quer porque quer ficar por lá. Inadmissível, nem pensar, pensa o pai. A mãe vai direto ao assunto avisa ao filho que ele não pode ficar lá, sozinho, na rua, que é perigoso, que pode passar um “ladrão de criança”, lobisomem, mula sem cabeça... Mas nada disso convence o irmãozinho gêmeo da Lara a deixar a rua. A líder Maysa desiste, o pai idem. A mãe também tá quase desistindo... Lara, objetiva e direta, encontra a solução, Serginho não gostou nada do que ouviu, fez um bicão daqueles, mas em dúvida, acatou a “sugestão” de Lara, que cheia de razão, tascou: – FICA AÍ... SE O LIXEIRO PASSAR E PENSAR QUE VOCÊ É LIXO, ELE LEVA VOCÊ... FICA... E Serginho não ficou! LARA PACHECO ALVAREZ DA SILVA SÉRGIO ALVAREZ DA SILVA JUNIOR MAYSA PACHECO ALVAREZ DA SILVA PAIS Tânia / Sergio Alvarez da Silva AVÓS PATERNOS Basília / Manoel Tomé da Silva AVÓS MATERNOS Mílcia / José Pacheco dos Santos 43 Essas crianças... Osvaldo Reis EU QUERO SANGUE!!!!! O pai, Domingos Trevizan, leva seus três “anjos” - Raphael, o mais velho e os gêmeos Marcelo e Henrique a um circo. A mãe, Noth, solta fogos de artifício, conseguiu se livrar dos três ao mesmo tempo. Era um baita circo e estava montado no Ginásio de Esportes “Chico Neto”, em Maringá. O mais velho é o mais comportado do “bando”, tá tranqüilão e prestando atenção em tudo, principalmente nos palhaços. Henrique deixou toda sua cota de malandragem para o irmão Marcelo, sem dúvida o mais atirado da trinca, mas por motivos desconhecidos, está com o bico maior que de pelicano. Mas só com bico, não reclamava nem aplaudia, tava nem aí... O pai começa a se preocupar com o filhote, achando até que os tinha levado em lugar errado já que, aparentemente, não estavam se divertindo, principalmente o anjo Marcelo, que em casa é chamado de Celo e até Celinho. Indiferente a eles, o espetáculo seguia seu roteiro, com o locutor - sempre falando em peculiar espanhol - anunciava suas “internacionales atraciones”: Era fulano de tal, directamente de Praga, Beltrano de Hannover (só de Jussara é que não tinha ninguém...) e por aí afora. Em determinado momento os tambores rufam com mais entusiasmo, o locutor idem, com seu tradicional “respeitávelll públicooo” o Gran sei lá o que Circus orgujosamente apresienta su major atración: los trapezistas voladores... E lá vem os caras, parecendo guarda-roupas, músculos dos pés à cabeça e só o aquecimento já é um espetáculo, era vôo pra todo lado... Aí se posicionam para o “show” – dois de um lado, dois do outro. Voam de um trapézio para o outro, um segurando a mão do outro, e o outro a mão do um, se penduram em três, trocam de trapézio – tudo a uns doze metros de altura. – o público delira! O pequeno Marcelo continuava do mesmo jeito que entrou, ou seja, desligado... O locutor anuncia: agora eles vão hacer lo mismo número com los ojos cerrados... Os olhos dos artistas foram vendados; o pano era preto e, certamente, não dava para enxergar nadica de nada... O espetáculo prossegue... Um deles despenca no ar e só pára na proteção. Marcelo até então calado embora bicudo, para o deleite das pessoas próximas, dispara: – COM REDE NÃO TEM GRAÇA NENHUMA !!!!!!! 44 Essas crianças... Osvaldo Reis TESOURA SEM CORTE... Marcelo, o “anjo atentado” do casal Noth/Domingos Travizan, lá com seus seis, sete anos, já sabe ler, escrever e aprontar... Um belo dia tá lá o carinha enchendo o saco da mãe, pentelhando mesmo e, a mãe precisava de paz; pelo menos por um momento, “despacha” o filhote para o quintal e, pede-lhe que corte a grama (e que de preferência demorasse o dia inteiro). Marcelo junta sua ferramenta de trabalho e se manda para efetuar a tarefa que a mãe lhe atribuiu. Só que para tristeza da genitora, logo em seguida tava de volta... A mãe quer saber o porquê de o filhote não estar fazendo o trabalho a ele confiado e, entre uma pequena bronca e muito desapontamento, quer saber o motivo da desistência. Chama-o pelo nome inteiro, e quando mãe fala o nome inteiro a coisa começa a se complicar. O diálogo: – MARCELO TREVIZAN, por que você não está cortando a grama??? O garotão, coberto de razão, diga-se de passagem, com o excesso de sinônimos de nossa língua, palavras quase iguais, significados diferentes, solta uma pequena pérola: – É QUE O TESOURÃO DESAFIOU !!!! JURISCONSULTO MIRIM O pai é jornalista, a mãe idem. Raphael, o coroa da casa, está com seus sete, oito anos. Numa reunião de jornalistas, Rafa está lá dando “segurança” à genitora. O colega Roberto Silva gosta de brincar com criança e leva jeito pra coisa... Roberto se aproxima de Raphael e “gruda” em seu punho, apertando-o e, logicamente, dificultando a circulação... Rafa, sério e compenetrado apenas encara o brincalhão... Alguns instantes depois, Roberto solta seu braço e quer saber do garotão: – E daí, Raphael, gostou? Pela resposta do jovenzinho, entende-se que não, mas o que deixou Roberto boquiaberto (com rima e tudo) foi a reação do precoce advogado, que continuou a fixálo, olhos nos olhos, e mandou ver: – VOCÊ SABIA QUE EU POSSO PROCESSÁ-LO POR LESÃO CORPORAL??? RAPHAEL CAMARÃO TREVIZAN (Rafa) HENRIQUE CAMARÃO TREVIZAN (Rique) MARCELO CAMARÃO TREVIZAN (Celo/Celinho) PAIS Noth Camarão / Domingos Trevizan Filho AVÓS PATERNOS Maria / Domingos Trevizan AVÓS MATERNOS Cleonice / Luis Cavalcanti Camarão 45 Essas crianças... Osvaldo Reis O PRÓXIMO ERA O GATO... Da união de Alberto e Maria Rosa nasceram Alexandre e Ana Carolina. O Alexandre era o terror da rua, era mais de ação que fala, Ana, ao contrário, filosofava mais, apesar de bem mais novinha. Nesta história a protagonista foi Ana, mas todos tiveram participação decisiva... Num daqueles dias em que o cara se sente como se tivesse brigado com Myke Tysson e Evander Holleyfield juntos e, de sobra, descarregado um caminhão de lajotas sozinho, Alberto chegou ao lar-doce-lar, atirou-se no sofá, ao lado da mulher, louco para receber uma mordomiazinha, pediu a Maria Rosa que apanhasse sua chinela. Maria Rosa ouve atentamente e passa para Alexandre: – Filho, vá lá no quarto e traga a chinela do papai... Alexandre, mais que depressa, transfere a responsabilidade para a irmã Ana Carolina: – ANA, VÁ LÁ QUARTO BUSCAR O CHINELO DO PAPAI... A resposta de Ana Carolina, no alto de seus quatro anos, é digna de José Maria Alckmim e Tancredo Neves juntos: – E EU, VOU PEDIR PRA QUEM? PRO GATO???? ALUNA ERUDITA Ana Carolina, já devidamente apresentada, está no pré sei lá o quê, dois, três, por aí... A tia passa uma tarefa pra casa (não pra casa fazer, mas pra ela fazer em casa, mas se fala assim mesmo...) o que, aliás, criança “adora”. A tarefa consistia numa pergunta que era saber da meninazinha qual seria o seu nome, caso fosse um menino... Pra variar, só um pouquinho, Ana esqueceu de fazer o exercício. O que fazer? A tia, na certa iria ficar fula da vida com ela, iria contar pra mãe, pro pai, pra torcida do Santos e ela não queria levar pito, nem da tia, nem dos pais... Seu cérebro de cinco anos, quase sem uso, 46 Essas crianças... Osvaldo Reis portanto, entrou em funcionamento e começaram aquelas propaladas associações: João - Joana, Mário - Maria, Paulo - Paula etc. Então, com essas “coisinhas” povoando seu pensamento, antes um pouco de começar a aula, sacou o caderno, onde gastou parte de seu latim, escreveu: – ANUS CAROLINUS... ALEXANDRE MARCOS MARIN ROCHA ANA CAROLINA MARIN ROCHA PAIS Maria Rosa / Alberto Abraão Vagner da Rocha AVÓS MATERNOS Aparecida / Rubens Marin AVÓS PATERNOS Adalgisa / Antônio Cândido Pedido de criança Se tivesse mais de dois anos, chamá-lo-ia mentiroso. No seu verdor, é apenas um ser a quem a imaginação comanda, e que com isso, dispõe de todos os filtros da poesia. Ama as coisas pelo prazer abstrato da posse, menos pelas coisas em si, ou pelo seu uso vuluptuoso. Há um lápis. – Me dá esse lápis prá mim? – Não posso. – Me empresta? – Não posso, preciso dele. – Ah, me empresta... – Está bem, empresto. – Agora ele é meu? – Seu não. Emprestado. – Eu queria tanto um lápis pra mim... Me dá, anda. – Está bem, pode ficar com ele. – É meu? Oba ! E joga fora, imediatamente. Carlos Drummond de Andrade (“Netinho”, de “Fala, amendoeira”) 47 Essas crianças... Osvaldo Reis DAQUILO QUE O MEU PAI TEM... A Maria Eduarda tem quatro anos incompletos, bem incompletos mesmo, passou só um pouquinho dos três, mas já faz das suas. Os pais, Heloísa e Renato possuem uma chácara no Distrito de Iguatemi, no Município de Maringá. Era uma época de Exposição-feira, anualmente realizada na cidade, onde tem de tudo, de algodão-doce até a mais moderna colheitadeira. Tem gente caindo de cavalo, de boi e um mundaréu de outras tantas atrações artísticas. Pra se visitar a feira, chamada EXPOINGÁ, paga-se ingresso. Então os organizadores fazem todo tipo de propaganda para atrair o público, não só para os espetáculos artísticos, mas principalmente pelos negócios. A pequena Maria Eduarda vê um desses anúncios na televisão. Coisa bem feita, imagens atraentes, redação perfeita, enfim, convincente. E quando é convincente, acaba convencendo (?). Primeiro convenceu a gatinha, que convenceu os pais que a levassem à feira. E o fizeram. Na volta da visita e da grande aventura, na chácara, a garota explica que “lá tem aquilo que o pai tem”. Ninguém entendeu nada, ninguém descobriu, nem traduziu o que a menina quis dizer. Com tantas indagações ela explicou: – É AQUILO QUE CHEIRA. Todos pensaram que era um nariz. Nariz na feira? O pai tem nariz, seria o nariz do pai? Algum tempo depois, com mais gente envolvida na discussão, incluindo a avó Maria Aparecida, é que o mistério foi desvendado: O “aquilo que cheira” nada mais é do que um suíno macho, também conhecido como (e como!) porco. E a gatinha tá certa: Na feira tem porco, o pai tem porco e ambos cheiram.. JOÃO COPO QUEBRADO... Em Iguatemi, como em toda Maringá, tem um grande número de famílias descendentes de italianos, dentre essas, está a família Trintin, muito conhecida, já que por lá vive há muitos anos. Um belo dia na casa de Maria Eduarda o assunto versava sobre a tal família... 48 Essas crianças... Osvaldo Reis Aquele assunto que o nome servia de referência, como por exemplo “é aquela casa perto de onde moram os Trintin”, “os Trintin moram naquela casa azul em tal rua, depois de tal coisa, tal bar” etc. E o nome foi repetido algumas vezes. Maria Eduarda está ouvindo a conversa, aparentemente “desligada”, mas só aparentemente... É que a garotinha resolveu explicar que o nome não era daquele jeito, que não era João Trintin, mas sim João-Quebra-Copo e explicou: – TODO COPO QUI CAI, QUEBRA, I QUANDO QUEBRA FAZ TRIN-TRIN ENTÃO NÃO É JOÃO TRINTRIN, É JOÃO QUEBRA-COPO !!! MARIA EDUARDA SILVA PEREIRA PAIS Heloisa / Renato Pereira Lopes AVÓS MATERNOS Maria Aparecida / Antônio Ribeiro da Silva AVÓS PATERNOS Lourdes / Otaviano Pereira Impossível... O telefone toca e Juquinha, com 2 anos de idade, atende. – Alô! – diz Juquinha A pessoa do outro lado percebe que é uma criança e fala: – Tem outra pessoa em casa? – Tem. – Dá pra você chamá-la pra atender o telefone? – Dá. Espera aí um instantinho. Pouco depois, Juquinha fala: – A Mariazinha não pode vir não. É que eu não consegui tirar ela do berço. 49 Essas crianças... Osvaldo Reis VOCÊ SABE COM QUEM TÁ FALANDO? Guilherme é o neto predileto dos avôs Cleusa e José (só têm ele) e, filho de Ana Cláudia e José Mário. Em companhia da avó Cleusa, Gui vai até Porto Alegre a fim de visitar o tio Celso. Era a primeira viagem interestadual do garotão. Guilherme, como toda criança de sua idade (3, 4 anos), nem pisca, olha tudo com a costumeira ansiedade que ocorre nessas aventuras. Tempos depois eles chegam à capital gaúcha, onde um digno comitê de recepção os aguarda – Celso tem por lá muitos amigos que foram ver de perto o sobrinhão vindo de Maringá (PR). Só não tinha banda de música; tudo o mais havia. Celso ria à toa na expectativa de ver o simpático Guilherme. Na descida do ônibus, Gui se desmancha em gentilezas, abraça e beija os amigos do tio. Uma moça, Maria Amélia, parece ter contagiado o jovenzinho; foram beijos, abraços e mais beijos, pareciam apaixonados... E para frustração de Celso, que promovera aquele belo evento, Guilherme nem olhou na cara. O tio tentou se conformar e entender a situação, creditando a frieza do sobrinho em razão da distância, pouca convivência e coisa e tal. Avó Cleusa, atenta, não gostou nem um pouco da atitude do neto em relação ao tio. À noite, antes de Guilherme pegar no sono, resolve tirar tudo a limpo... Onde já se viu uma coisa dessas? Coisa feia... E pensando assim, de cara amarrada, vai ter com o neto: – O tio Celso adora você, leva um montão de gente para receber você, você abraça e beija todo mundo, gente que você nunca viu... E para o tio Celso você nem tchum? E para o tio Celso, nenhum abraço, nenhum beijo, nenhum sorriso... Por que isso Guilherme? Guilherme, com o prelado de sua idade, dá à avó uma resposta que o compara, no mínimo, a Frank Sinatra: – EU AMO O TIO CELSO, VÓ... SÓ NÃO DEI ABRAÇO NEM BEIJO NELE PRA ELE NÃO FICÁ SE ACHANDO !!!!! 01 50 Essas crianças... Osvaldo Reis “SUBORNOLACHA” Guilherme tinha um ano, no máximo. Cabia a avó Cleusa e a mãe traduzir sua “fala”, mas, como sempre, elas acabavam entendendo o que o carinha queria dizer. A família tinha uma cachorra que era braba que só a peste. Siri na lata era pouco. Era feroz mesmo, além do mais não gostava, como quase todo cachorro, de moleque, sabe-se lá por que e ainda por cima tava grávida o que aumentava ainda mais sua bravura. O nome da fera (sem brincadeira) era Lilica - Guilherme chamava-a de Líli. Ela lhe mostrava os dentes e como se sabe, cachorro não ri, era ameaça mesmo. Aí, Lilica deu cria. Um filhote somente. Criança, como também se sabe, é doida por cachorrinho, ou animais pequenos. A zelosa mãe mantinha sua cria dentro de uma caixa de papelão da qual não saía de perto por nada no mundo. E Guilherme doido pra brincar com seu filhote. O diabo é que assim que ele aparecia a cachorra se aproximava, ficava por perto do sujeitinho. Aí o Guilherme achou uma maneira de fazer amizade com o animal. A cada, no máximo, cinco minutos tava o rapazinho lá no pé da avó: – VÓ DÁ BOLACHA... A derretida avó o atendia pensando que ele ia comer. O engenhoso Guilherme chamava a inimiga e, quebrando em pedaços miúdos a bolacha, também ia caminhando em direção à caixa onde estava o filhote da cadela, que vinha logo atrás devorando o petisco. E assim foi. Quando perceberam o que Guilherme estava fazendo, todo mundo se apavorou. Ele, no entanto, continuou oferecendo à cachorra as bolachas que a avó lhe dera. Um dia, como por encanto, tá lá o Guilherme dividindo com o filhote de Lilica sua casa, e a cuidadosa mãe, ali por perto, já não oferecendo ameaça... Dias depois o mais incrível aconteceu: Guilherme, o filhote e a mãe dividiam fraternalmente a residência canina. Pra completar a história, até o nome do filhote foi ele quem colocou: Bam-bam, a quem Guilherme continua amigo e oferecendo guloseimas, sempre com a supervisão da antes enciumada Lilica, sabiamente subornada pelas bolachas da avó. O FILÓSOFO TRAVESSO... O Guilherme, como quase toda, ou boa parte das crianças de sua idade, tem lá seus antídotos contra broncas, pitos, surras e coisas do gênero. Uns apelam para o tradicional “eu te amo” e, em vez de broncas, acabam ganhando beijos, principalmente das avós... Guilherme tem seu jeito próprio, provavelmente exclusivo: basta tomar um chega pra lá que o sujeitinho apela (lógico, com aquela cara de cachorro pidão e lágrimas prestes a eclodir): você não é mais meu amigo... A avó Cleusa é uma de suas principais vítimas, além das tias e tios... Dia desses, a coisa aconteceu com sua mãe, que não é muito de alisar. O “santinho” aprontou mais uma das suas e a mãe tascou-lhe uma bronca daquelas, puxou a faca mesmo, pois era uma arte das grandes. O sujeitinho, chantagista de carteirinha, 51 01 Essas crianças... Osvaldo Reis com seu malabarismo verbal passa de réu à vítima, manda ver: – VOCÊ NÃO É MAIS MINHA AMIGA... A mãe, pensando ser, na condição de mãe, mais que amiga, retrucou: – EU NÃO SOU SUA AMIGA, SOU SUA MÃE... Aí Guilherme deitou e rolou. Parecia um advogado defendendo alguém que matou, cortou o corpo em pedaços, escondeu e jura inocência. Sua outra pergunta deixou a mãe calada, pensativa e rindo por dentro: – VOCÊ NÃO PODE SER MINHA MÃE E MINHA AMIGA? E A VÓ CLEUSA, NÃO É SUA AMIGA????? DESENHO BIRRENTO Guilherme tá com três anos e poucos meses e como toda criança dessa idade, adora pintar (incluindo o sete...), Gui é igual todo mundo e a avó Cleusa o “libera” para que a deixe, de vez em quando, em paz. Guilherme é jeitoso, habilidoso, combina bem as cores, lógico, na sua imaginação, fertilíssima, diga-se. Compenetrado demora um bom tempo para fazer um desenho. Mas o tempo não foi perdido. O quadro ficou lindo, fantástico, maravilhoso. Esse tal de Van Gogh, se vivo, morreria de inveja. A avó adorou... Era um menino alto, magro, bem vestido e com lindos olhos azuis... A avó rasga seda, afirmando que o neto será um novo Portinari, e por aí afora. Guilherme estufa o peito. Junta sua obra e volta a mexer na coisa. Algum tempo depois volta a mostrar o desenho para a derretida avó, com uma pequena alteração do original: os olhos agora eram vermelhos, a avó acha estranho, Guilherme esclarece: – É QUI A MÃE DELE BRIGOU COM ELE E ELE CHOROU... RECEITA PARA NÃO FICAR ENRUGADO... Guilherme, vez por outra, se “desentende” com sua bisavó materna, e sua vingança, é chamar sua “bisa” de murcha... Mas como ele fala e dá risada, dona Hilda tá sempre perdoando. Segundo o doutorzinho e sua filosofia própria, a avó é “murcha” porque não estudou. E vai dando explicações mil: a avó tava ficando velha, aí ela começou a estudar e agora ela não é mais velha... Embora com seus quatro anos de “tiradas e aprontações”, Guilherme tem um medo terrível de ficar velho, chega a chorar se alguém toca nesse assunto (dele ficar velho). Sujeitinho tinhoso. Sabe das coisas esse Gui... E continua seu rosário de explicações: a tia Claudenice não é velha, ela estuda, tio Celso não é velho, tio Fábio, não é velho... O final é sempre o mesmo - não são velhos porque estudam - Se o carinha soubesse que velhice é uma coisa democrática, talvez não teria “peito” pra, categoricamente, afirmar, de olho no futuro, sem rugas, claro: – EU VOU ESTUDAR MUITO. MUITO, MUITO, PRA NÃO FICAR VELHO!... 01 52 Essas crianças... Osvaldo Reis MÉDICO DE ARMÁRIO... Guilherme adora “trabalhar” com a avó, de vez em quando, também “trabalha” com a tia. Gui além de simpático, só não fala quando tá dormindo ou com sono... O sujeitinho tá naquela fase dos “porquês”. E criança tem fase, dos “porquês”, do “di novo” e um punhado de outras tantas... E tem também os adultos que querem saber o que a criança vai ser quando crescer, pergunta quase que inevitável, ou por falta de assunto. Ao Guilherme, não é preciso perguntar nada, o carinha quer ser médico. Dia desses, “tá” lá o Guilherme “trabalhando” com a avó. Ao passar por uma das salas, percebe Lucila, funcionária da repartição, tentando abrir um armário. E a coisa tava mais difícil que abrir cofre de mineiro. Guilherme se interessa (lembra dos porquês?) e dispara apontando para o objeto: – POR QUE ELE NÃO QUER ABRIR? Lucila explica que o tal armário “tá” enguiçado, estragado... Aí, tentando obter a solidariedade do amigo, ela pede a Guilherme: – Quando você crescer você conserta ele pra nós? Guilherme faz um bico razoável e dá uma resposta que faz todos caírem na gargalhada: – QUANDO EU CRESCER EU VOU SER MÉDICO DE CONSERTAR GENTE, NÃO MÉDICO DE CONSERTAR ARMÁRIO!!!!!! O “ACADÊMICO” DA ACADEMIA... DE GINÁSTICA Coisa linda. Família unida. Sala repleta. Todo mundo de olho na televisão. Devia ser, em razão de tanto interesse, final de novela. Só se ouvia o som que vinha da telinha... Só Guilherme não participava de tão comovente momento... De repente, o ambiente televisivo é abruptamente invadido pelo único familiar ausente, o que, logicamente desagradou a todos... Aí a coisa desandou quando ele solenemente anunciou: – EU VOU FICAR FORTÃO, VOU MALHAR MUITO... VOU ENTRAR NESSA ACADEMIA AÍ DA ESQUINA.. Até aí nada de excepcional se o sujeito não tivesse apenas três anos e alguns meses... GUILHERME COSTA CASSIOLATO PAIS Ana Cláudia / José Mário Cassiolato AVÓS PATERNOS Tereza / Natal Cassiolato AVÓS MATERNOS Cleuza / José Amado da Costa 53 01 Essas crianças... Osvaldo Reis MEDITAÇÃO FORÇADA... Criança é doida para atender telefone, abrir porta e coisas assim, e algumas, gostam também de ir pra escola. Naira juntava tudo isso. As escolinhas de hoje são mais modernas que as de antigamente, pelo menos no que se refere à “tortura” - antes quem saísse dos trilhos recebia palmatórias, reguadas, quilométricos sermões, iam pra secretaria, ajoelhavam no milho, eram colocadas em quartos escuros e mais um montão de outras coisas. Hoje a “tortura” é mais psicológica (e deve funcionar melhor): colocase, ou manda a criança sentar numa cadeira e pensar no que ela fez... É mais ou menos como na igreja quando o padre pede que as pessoas (em pensamento) confessem seus pecados, ou pelo menos, pensem no que fazem ou fizeram de errado - só falta lá a cadeira... Um belo dia, o pai se desentendeu com a mãe e ela o deixou na sala falando sozinho e se mandou pro quarto - o pai pinoteou para a rua. Naira foi até a mãe e a viu sentada numa poltrona ao lado da cama, esperando, certamente, passar a raiva... A secretária doméstica chega para o trabalho e pergunta por Cris, mãe de Naira. Naira em sua ótica de quase cinco anos, explica: – A MINHA MÃE BRIGOU COM O MEU PAI E AGORA ELA TÁ LÁ, NO QUARTO, NA CADEIRA DO PENSAMENTO!!!!!!!! SE FOR AQUELA MULHER... Eu costumo dizer que criança é igual à torcida de futebol: é igual em Belém, no Pará e até em Quinta do Sol, no Paraná. E esta história deve ter acontecido, no mínimo em trocentos lugares, somente nesse espaço geográfico, mas essa tem uma picada de inteligência (ou inocência) a mais... A Naira não tinha ainda quatro anos... Não posso dar maiores detalhes, ou todos os pormenores, em razão de morarem ainda na mesma casa, com a tal mulher ainda rondando por lá... Naira é muito “viva” (desde pequena!). A mãe pediu a Naira que se alguém tocasse a campainha que ela fosse atender, 54 Essas crianças... Osvaldo Reis mas se fosse “aquela mulher que vende (?)”, era pra dizer que a mãe não estava... Naira cumpre fielmente a vontade da mãe. Terminada a explicação, parecia até coisa ensaiada, a campainha dispara... Naira também dispara em direção à porta... “Tá” lá uma mulher com uma sacola na mão esperando ser atendida... Não dá outra... Naira não diz nem o tradicional “bom dia”: olha pra senhora e obediente, manda bala: – SE A SENHORA FOR AQUELA MULHER CHATA QUE VENDE... A MINHA MÃE MANDOU EU DIZER QUE ELA NÃO ESTÁ... NAIRA BANNO GUITTI PAIS Cris / Edson Burzega Guitti AVÓS MATERNOS Mieko / Jorge Banno AVÓS PATERNOS Benedita / João Guitti Ó Deus que nos deste a flor e as crianças e as estrelas, dá-nos agora, Senhor, a graça de merecê-las! A. A. de Assis 55 Essas crianças... Osvaldo Reis PACIÊNCIA IMPACIENTE O Luiz Carlos “tá” com trinta e oito anos, seu amigo Umberto Júnior só tem seis, não manja muito de computador, tampouco jogo de cartas. No computador da prima Larissa (não só no dela) tem lá um jogo chamado paciência... Luiz Carlos convida Juninho pra jogar. Juninho topa. No começo até que a coisa tava indo bem, mas o Juninho, uma espécie de “Joãozinho”, começa, mesmo sem saber, a dar pitacos no jogo do adversário. Aperta ali, mexe aqui, aí não, e coisas do gênero... O marmanjão do Luiz Carlos dá um chega pra lá no Juninho: – Juninho, senta aí e fica quieto... Pára de dar palpites... Aí a cabecinha, muito ativa, diga-se de passagem, de Juninho, na certa nocauteou o adversário com uma pergunta cheia de lógica e razão. Sentenciou: – ME DIZ, COMO É QUE VOCÊ QUER JOGAR PACIÊNCIA, SE NEM COM CRIANÇA VOCÊ TEM PACIÊNCIA??? CABELO BRANCO DERRUBA DENTES... A casa do primo Ademir, pai da também prima Larissa, é a extensão da casa de Juninho, já que lá todo mundo, incluindo o papagaio, gato e cachorro, trata bem o carinha e com isso ele, sempre que pode, “tá” por lá... Em junho último, Preta, a dona da casa, também prima, resolveu promover uma festa movida a pipoca, quentão, pé-demoleque, pinhão, paçoca, enfim, festão digno da comemoração dos Santos... Ademir estava se empanturrando com as guloseimas e, ao passar pelo pequeno primo, em tom de ironia, disse: – Juninho, eu perdi dois dentes... (brincadeira, claro). Juninho entrou no clima e mandou bala: 56 Essas crianças... Osvaldo Reis – EU TAMBÉM! O papo continua. Ademir consola-o: – Isso acontece, Juninho... Pior fui eu que quebrei a minha dentadura, brincou Ademir. Juninho ouviu, entendeu, baseado na precoce e esbranquiçada cabeleira de Ademir, cheio de razão, sentenciou: – É ISSO MESMO... TODO MUNDO QUE TEM CABELO BRANCO É VELHO... E TODO VELHO USA DENTADURA!! UMBERTO CRISPIM DE ARAÚJO JÚNIOR (Juninho) PAIS Isabel / Umberto Crispim de Araújo AVÓS MATERNOS Argentina / Egídio Fiori AVÓS PATERNOS Raimunda / Miguel Crispim de Araújo A mão que puxa o gatilho difere em número e grau da mão que protege o filho para subir um degrau. José Bidóia 57 Essas crianças... Osvaldo Reis A QUÍMICA NA TV... Essa mistura de piada e realidade deve ter sido criada pelos concorrentes. Existia (não sei se ainda "tá" no ar...) um programa mais comprido que esperança de pobre: começava por volta de dez da manhã e terminava lá pela meia noite e vinte e cinco.. E todo mundo dizia que o apresentador de tal programa era, muito provavelmente, o maior químico do Brasil, já que conseguia, em razão da boa audiência, transformar o domingo de muita gente numa... (glup!). Na casa do Atílio e da Mirlei existem dois artistas, o José Francisco e a Maria Alice, que começou sua carreira com menos de dois anos, na televisão, ou melhor no televisor da sala... É o seguinte, indiferentemente do que estava sendo mostrado, podia ser o homem pisando na Lua, o Papa falando, americanos invadindo o Iraque ou o São Paulo Futebol Clube decidindo contra sei lá quem o campeonato mundial de futebol, que Maria Alice desligava o televisor e ficava dançando e fazendo gestos e caretas na frente do dito cujo - e não era de parar tão cedo - só parava quando acabasse de dar o seu espetáculo, seu "show" particular, imitando os cantores que se apresentam na televisão, fazendo de conta que estão cantando. Lá estava, bastava que tivesse bom público, a Maria Alice em suas quase diárias apresentações... E sabe o nome da arte da gatinha? Ela, sempre ao final, explicava que estava FAZENDO QUÍMICA, já que em razão de sua pouca idade não conseguia falar mímica... A sua, de Maria Alice, era infinitamente superior a do tal apresentador (quase) citado no início, já que suas inesquecíveis apresentações acabavam se transformando em risos e, hoje, doces lembranças... JOSÉ ATÍLIO SANCHES MARIA ALICE FERREIRA JOSÉ FRANCISCO FERREIRA SANCHES PAIS Mirlei / José Atílio Sanches Nilce / José Sanches Filho AVÓS PATERNOS Rosa / José Sanches Nilce / José Sanches Filho AVÓS MATERNOS Margarida / Francisco Ana / Atílio Ferrari 58 Essas crianças... Osvaldo Reis A PRIMEIRA VEZ A GENTE NÃO ESQUECE! O Sandro tinha por volta de cinco anos e nunca tinha ido num restaurante. Um belo dia, tio Lino resolve satisfazer o garoto e o leva a uma churrascaria, daquelas que servem o famoso espeto corrido e, em algumas, é corrido mesmo. O garçom chega, diz alguma coisa que você nunca entende direito, e o “espeto sai corrido” ou correndo, daí espeto corrido, corre da gente, ou será por que “tá” sempre um garçom correndo atrás do outro, com carnes de tipos diferentes? Sei lá... Só sei que o Sandro nunca tinha ido numa churrascaria... Aí vem um garçom e oferece tal carne, outro oferece outra, e dá-lhe espeto corrido... Aí um garçom, com sotaque não tão normal para um ouvido infantil e sem conhecer absolutamente nada de carne, chega à mesa e indaga, em altos brados, como sempre, aliás: – CUPIM DE BOI???? Sandro não entendeu, e sua resposta deve ter feito o tal garçom pensar um pouco mais antes de falar para ouvidos tão delicados: – NÃO... EU NÃO QUERO PINTO DE BOI... MIL UTILIDADES... Um conhecidíssimo produto brasileiro é famoso por suas mil e uma utilidades, todo mundo sabe o que é, e as donas de casa adoram este objeto. Aqui, no caso, seu uso é no mínimo, inadequado. E a comparação serve também pra descobrir uma outra utilidade do famoso amido de milho... O Guilherme tinha por volta de quatro anos, e pelo excesso de energia, própria da idade, vez por outra, “pintava” uma assadurazinha no seu bumbum, que a cuidadosa mãe tratava com maisena e uma pomada de uso específico... Até aí, nada de excepcional. Mas “vó” adora passear com neto. Um dia a avó Geni levou Guilherme até o mercado e o sujeitinho, folgado que só, embarcou no carrinho com ela de “motorista”. Compra isso, olha o preço daquilo, de outro aquilo também, e por aí afora. Até que a avó resolveu pegar na prateleira uma embalagem de maisena... Guilherme ainda não sabia ler, mas reconheceu a embalagem, memorização que nenhuma criança tem dificuldade, somente a indagação do neto é que deixou a avó Geni um tanto quanto embaraçada. Guilherme apanha a caixa dentro do carrinho, mostra para avó e tasca: – VÓ, É PRA PASSAR NA BUNDA???? 59 Essas crianças... Osvaldo Reis DANÇA COM PENAS... Lembra aquela velha piada do alemão que chegou ao Brasil e a primeira palavra que aprendeu foi feijoada e durante uns quinze dias ficou comendo a mesma coisa? Claro que lembra... Depois ele tentou trocar por um sanduíche e, vem aquela história do quente e frio e o coitado voltou a comer feijoada... O mesmo, ou quase, se deu com o Gustavo, com seus três anos e uma fala ainda muito enrolada. No parque do Ingá, em Maringá, o garoto se encantou com um ganso. Chamou a atenção da mãe para a empenada ave e mandou ver: – MÃE, OLHA O DANÇO... A mãe, que tenta ensinar, corrigir, pergunta o nome do bicho. Gu volta, da mesma maneira, a responder que era “danço”, e ficam os dois naquela (também quase) infindável disputa, a mãe perguntando e ele respondendo: – É DANÇO... Lá pela décima oitava vez, Gustavo já tava mais brabo que gago em briga... É “danço”... – É o quê? – quer saber a “chata” da mãe. Gustavo põe fim à leréia: – OLHA LÁ O PAAAAATO !!!!!!!!! DEPOIS EU “VÔ”... Quase toda criança tenta falar, ou seguir, em sua ótica o que os adultos estão dizendo e tem também vocabulário exclusivo. Dia desses, por exemplo, naquela tradicional troca de letras ("c" pelo "t", principalmente), o pai Sandro “atropelou” um piolho de cobra e o pobre bichinho acabou por falecer... Gustavo explica pra todo mundo que o pai matou um piolho de “toba”. Noutro dia, Gu estava jantando (ele adora macarrão!) e sua mãe achando que já “tava” na hora de parar, perguntou ao filhão: – Gu, você quer mais ou chega? Só a mãe deve ter entendido o que o filhote respondeu: – EU QUERO MAIS DEPOIS EU “VÔ” CHEGÁ!!! CLARO QUE VOCÊ “PÓDA”... Gustavo está com dois anos e pouco, é o irmão mais querido do Guilherme, filhote da Bete e do Sandro. Gustavo não é gordo, aliás, muito boa pinta esse sujeitinho, mas parece ter o traseiro muito pesado e o carinha não gosta muito de movê-lo, isto é, é mais folgado que colarinho de palhaço. A mãe corta um doze para atender todas as solicitações do jovem, mas de vez em quando, em razão de trabalhar fora, ter outros 60 Essas crianças... Osvaldo Reis afazeres, não é possível resolver os “problemas” do filhão. E, como toda a criança de sua idade, ele tem também seu vocabulário próprio, que a mãe, quase sempre, acaba “traduzindo”. Criança tem aquela coisa de crescer de vez em quando, e também ser pequeno quando é conveniente... Basta a mãe atravessar a soleira da porta que Gustavo a quer com exclusividade, para atender todos os seus desejos, suas vontades... O diálogo entre mãe e filho aconteceu recentemente. Gustavo “tá” ali grudado na mãe, parecendo até um centroavante marcado por um zagueiro, sabe aquele cara que vai atrás do outro até pra fora do campo? Gustavo é assim. E ainda tem a pachorra de discordar da mãe, principalmente quando o assunto é do interesse dele. Dia desses, por exemplo, a mãe super ocupada e ele pentelhando, aí Gustavo pede pra mãe apanhar alguma coisa pra ele, a mãe responde: – Agora eu não posso... Gustavo não quer nem saber por que e volta a afirmar: – POSSA SIM... GUILHERME DA SILVA BEDIN SANDRO BEDIN GUSTAVO DA SILVA BEDIN PAIS Bete / Sandro Bedin (Gui e Gu) Geny / Jaime Bedin AVÓS MATERNOS Mercedes / Bruno Nanuzzi Julieta / Antônio Lopes da Silva (Gui e Gu) AVÓS PATERNOS Dolores (Dona Lola) / Mário Bedin Geny / Jaime Bedin (Gui e Gu) Desconhecido... A família está reunida vendo os álbuns de fotografias. Lá esta a foto de um jovem elegante, porte atlético, ar simpático. A Mariazinha vira-se para a mãe e pergunta: – Quem é esse homem tão bonito, mãe? – Esse aí é o seu pai, Mariazinha. Mariazinha chega perto do ouvido da mãe e pergunta bem baixinho: – E quem é aquele gordo, feio e chato que mora com a gente? 61 Essas crianças... Osvaldo Reis PARABÉNS PRO DEFUNTO... Giseli não tinha completado dois anos quando, num dia de finados, os avós Nair e Shigeo resolveram levar a gatinha até o cemitério, coisa que ela, até então, não tinha feito. Uma aventura a mais nas tantas que viriam pela frente. Criança observa tudo e tem o cérebro privilegiado (o dela, então, quase sem uso) e uma precocidade incrível de tanto ver televisão, ouvir outras pessoas, conviver com crianças da mesma idade, acaba virando “fera”, mesmo sem ter ainda dois anos, caso da enfocada. Giseli não era diferente... No cemitério, ela deve ter achado que era uma festa coletiva, já que tinha lá um montão de gente, com as mãos cheias de flores, andando pra todo lado. Outra coisa que ela deve ter achado estranho eram as alturas das mesas, muito baixinhas, mesmo pra ela... É o seguinte, quando seus avós se ajoelharam diante do túmulo que foram visitar, assim que acenderam as tradicionais velas, não deu outra: Embora solitária, sem ninguém a acompanhando, Giseli, feliz da vida, batendo palmas, mandou ver: – PARABÉNS PRA VOCÊ !!!!!! GISELI YAMAGUCHI BEDIN PAIS Vitória / Durvalino Bedin AVÓS PATERNOS Nair / Shigueo Yamaguchi AVÓS MATERNOS Dolores (Dona Lola) / Mário Bedin 62 Essas crianças... Osvaldo Reis NÃO COMERA, POR QUE DEIXARA? A gatinha Josiane, em companhia dos pais, como quase em todos os domingos, vai almoçar na casa da “vó Lola”. Além de “leonística” fome e “camelídea” sede, mais papagaio, gato, cachorro, uns animais de estimação e outros nem tanto, levaram também um frango assado e duas garrafas (daquelas grandonas) de refrigerante. Comeram, beberam, sujaram pratos, garfos, facas, travessas, toalhas de mesa, banho e rosto, enfim, mordomia total; coisa de avó. A comida era tanta (coisa típica de italianos) que o galináceo que levaram sequer foi desempacotado. Após o lauto banquete, depois de colocarem a conversa em dia, chegou a hora de voltar para casa. Na despedida, recomendações, beijos, abraços, essas coisas bonitas que acontecem e envolvem as dominicais visitas. Por falar em envolver, os adultos envolvidos com a cerimônia da despedida, não perceberam que Josiane tinha desaparecido. Logo em seguida, vem a garotinha se aproximando dos demais, carregando o tal pacote com o filho da galinha, também conhecido por frango, gesto que o pai tenta impedir, achando-o, no mínimo, indelicado: – Não, filha, leva o frango de volta pra geladeira.... Pode deixar ele lá. Josiane, discordando do pai, justifica: – NÓIS COMPRARA, NÓIS LEVARA!!! O MESTRE BEBUM... Em Jandaia do Sul havia um professor que todo mundo gostava. Gostava é pouco; adorava seria mais coerente. Era um sujeito que além de competente, era também muito sério, daqueles professores que os colegas e os alunos nunca esquecem. Mas, como ninguém é eterno, o grande mestre acabou falecendo. Comoção geral. A cidade, literalmente, parou no seu sepultamento. O professor Antônio Fávero era amigo do ilustre professor, mas viajando, não conseguiu chegar a tempo para as exéquias do colega. Poucos dias depois do sepultamento, Fávero, 63 Essas crianças... Osvaldo Reis acompanhado da filha Josiane, de aproximadamente cinco anos de idade com uma imaginação fertilíssima, vai até o túmulo do professor de Jandaia... Demonstrando o carinho que a cidade tinha com o falecido, seu túmulo ainda estava coberto de flores, com as mais diferentes homenagens: da Prefeitura, Câmara, Lions, Rotary, Maçonaria, dos colegas professores e também de diversos estabelecimentos de ensino, não só da cidade, mas de outras, da vizinhança. No entanto, uma coroa, faltando uma letra, no final, chamou, particularmente, a atenção de Josiane. A letra que caiu, diga-se de passagem, forma o nome de duas cidades do Paraná: uma, Santo Antônio a outra, São João do Caiuá (um trocadilho infame), só pra comparar. Josiane só viu aquela coroa com a vogal “a” caída, às outras, nem notou e fez a seguinte observação e ao mesmo tempo mudar o tom triste de seu velho: – NOSSA, PAI, ELE DEVIA BEBER MUITO... ATÉ A ESCOL MANDOU FLORES PRA ELE!!!!!!! JOSIANE FÁVERO PAIS Ofélia / Antônio Fávero AVÓS PATERNOS Dolores (Dona Lola) / Mário Bedin AVÓS MATERNOS Mercedes / Bruno Nanuzzi Talento A garotinha exibicionista, mostra suas habilidades na bicicleta. Vai lá, volta e grita para o pai: – Olha, pai: sem as mãos. Dá outra volta. – Olha, pai: sem os pés. Mais outra volta e ...capummm! Uma bela queda! – Olha, pai: sem os dentes. 64 Essas crianças... Osvaldo Reis A IRMÃ É MINHA E NINGUÉM TASCA... A Josiane é a mais velha (nem tanto!), Vinícius, do meio, e a caçulinha é Jônia. Este belo trio forma a família de Clarice e Tadeu. Jônia é a própria ternura, não briga, não xinga... Josiane é muito bem comportada e também muito educada e, como os demais, inteligente que só... O Vinícius... Bem o Vinícius é moleque. E moleque é moleque, e de vez em sempre, apronta das suas. Uma das coisas que o sujeitinho, talvez pra provar que é macho, adorava fazer era bater (bater mesmo!) na irmã mais velha, Josiane, que não reagia. Mas, como ninguém é de ferro, vez por outra, reclamava com a mãe, que resolveu mostrar ao filhote quem é que manda, impondo-lhe a autoridade e também limites... Após mais uma das tantas investidas contra a irmã, Clarice aplica-lhe uma correção “federal”, bronca pesada. Sabe aquele negócio de “se você fizer isso de novo” vai acontecer aquilo, e por aí adiante... Vinícius, com uma das orelhas entre o polegar e o indicador da mão da mãe, ouviu em silêncio... Mas assim que se livrou dos dedos, com uma certa distância, onde não corria tanto “perigo”, desafiante, mandou ver: – A IRMÃ É MINHA E EU BATO NELA QUANDO QUISER!!!!! JOSIANE BEDIN FRANÇA VINÍCIUS TADEU BEDIN FRANÇA JÔNIA BEDIN FRANÇA PAIS Clarice / Tadeu França AVÓS MATERNOS Dolores (Dona Lola) / Mário Bedin AVÓS PATERNOS Maria / Militão Bento França 65 Essas crianças... Osvaldo Reis PALAVRÃO “IDOSO”... Vinícius, em razão de o pai, por inveja pura (?) ter também o mesmo nome, é mais conhecido, principalmente no meio familiar, como Vinicinho... O irmão do Pietro já tá meio “coroa” - com quase sete anos e estuda numa escola da área central de Maringá. Sabe-se lá por que cargas d'água o sujeito quer trocar de escola, mudando para uma outra que fica num bairro muito distante... A avó Clarice que sempre o leva e busca na escola, chia barbaridade, não concorda com o neto e pede uma explicação plausível: – Vinicinho, por que é que você quer estudar lá na puta que pariu? Aí a coisa engrossa, fica feia, mas pro lado da avó. Só faltou o carinha tirar o chinelo ou o cinto, mas a bronca foi pra valer e, provavelmente, a mãe de seu pai, não vai cometer jamais tal desatino, já que a censura do pequeno Vinícius é pra nunca mais esquecer: – NOSSA, VÓ, EU NÃO SABIA QUE GENTE DA TERCEIRA IDADE FALAVA ESSAS COISAS!!!!! BONÉ PROTETOR Vinícius é o primeiro filhão do casal Aline e Vinícius França. O carinha ainda nem fala, mas engatinha e faz outras coisitas mais. Uma delas é subir num sofá que fica encostado na janela. Subir no sofá parece óbvio, só que o enfocado subia mesmo é no encosto do sofá, onde ficava sentado, cheio de pose, até que alguém o retirasse... Quanto mais se dizia que aquilo era perigoso, mais ele teimava. Um belo (?) dia, não deu outra, sujeitinho se despencou do tal sofá e ainda bem que bateu a parte mais dura do corpo, isto é, a cabeça. Foi um tombo e tanto, e de pontacabeça, o que provocou um corre-corre danado. Depois de médico, benzedeira, rezadeira, e mais um montão de outras eiras e 66 Essas crianças... Osvaldo Reis eiros, sobraram alguns pontos e curativos na cabeça do descabeçado. Onde é que já se viu subir no encosto do sofá, sem sequer saber andar direito? A avó Clarice deu uma baita bronca no neto, que por motivos também óbvios, não respondeu (o carinha nem falava...) A didática avó explicava ao netão: – Você não pode subir aqui, é perigoso, você pode cair, e se cair vai machucar a cabecinha de novo, e coisas do gênero. Vinicinho parece ter entendido tudo. Mas no dia seguinte, por sua atitude, “disse” aos pais e à preocupada avó, com um gesto desafiante que, a seu ver, aquilo de subir no sofá não tinha mais nenhum perigo, e para desespero de todos, tava lá, cheio de razão, novamente no mesmíssimo lugar, com um boné na cabeça. Se caísse, só “machucaria” o boné... Adultos não entendem nada de criança! VINÍCIUS TADEU BATISTUSSI FRANÇA PAIS Alline / Vinícius Tadeu Bedin França AVÓS PATERNOS Clarice / Tadeu França AVÓS MATERNOS Berenice / Alan Kardec Batistussi Mascote A família toda reunida janta, e depois de pagar a conta o pai diz ao garçom: – Embrulhe essa carne que sobrou que vamos levar pro cachorro. – Obá! – gritam em coro as crianças. – Papai vai comprar um cachorro pra gente! 67 Essas crianças... Osvaldo Reis 68 Essas crianças... Osvaldo Reis DEMISSÃO PROMOVIDA Amadeu da Silva Félix Júnior, também conhecido como Júnior, é filho da Elza e do, lógico, Amadeu. Júnior está no prézinho (na Escola Adventista, em Cianorte - PR), não conhece, portanto, o significado de muita coisa, mas tem suas “tiradas” como toda criança de sua idade. Nem sempre fala, mas adora ouvir os adultos, com aquele “aparente desinteresse”... Amadeu pai, funcionário da Receita Federal, após anos e anos de trabalho, um dia chega em casa feliz da vida; recebera um reconhecimento por sua lealdade e dedicação. Na hora do jantar, família reunida, anuncia a boa notícia: – Fui promovido! Como os demais, Júnior também escutou. Aconteceram parabéns, brindes etc. No dia seguinte Júnior, logo cedo, vai para sua escolinha e, todo “metido”, em todas as rodinhas, dá, do seu jeito, a notícia que tanto alegrara a família, mas, pouca coisa diferente. Dizia o sujeitinho, cheio de razão: – MEU PAI FOI DEMITIDO... Como é que pode uma coisa dessas?! Afinal Amadeu muito conhecido e competente ser vítima de tamanha sacanagem, sacanagem mesmo, injustiça era pouco. A “tia” Onide Carraro ficou indignada e também intrigada em razão do contentamento de seu aluninho. Além de amiga da família, morava na mesma rua. Não deu outra: logo após o expediente, foi conferir com Elza o que realmente havia acontecido, e até hoje dão risada da demissão promovida, claro, pelo Júnior e seu famoso “zecabulário”... LOBISOMEM DESDENTADO... O Júnior, com mais ou menos, dois anos, talvez, por ouvir outros falarem, mesmo sem “conhecer”, falou pra mãe que tinha medo de lobisomem. O pai, pra 69 Essas crianças... Osvaldo Reis sacanear o filhote, quando ele estava por perto, fazia de conta que não o estava vendo e dizia que estava acontecendo, principalmente em noites de lua cheia, coisas estranhas com ele, que suas unhas estavam crescendo, os dentes idem, enfim, “pintava-se” do bicho... As unhas crescidas talvez não tenham assustado tanto o garoto (que também fazia de conta que nunca tinha escutado a conversa do pai - um não sabia do outro e o outro não sabia de um...) mas os dentes... Numa certa manhã, o filho chega apressado e nervoso pra mãe e faz-lhe uma proposta, pra ele, decente: – MÃE, O PAI TÁ LÁ NO BANHEIRO... EU VÔ PEGAR UMA CORDA E VOCÊ VAI ME AJUDAR A AMARRAR ELE... VOCÊ SEGURA EU AMARRO... A mãe, intrigada, não entendeu o que o filhote exatamente quis dizer, e pergunta: – Amarrar o pai pra quê? A resposta veio rápida, desvendando a preocupação do garoto: – A GENTE AMARRA ELE E LEVA NUM DENTISTA E MANDA ARRANCAR TODOS OS DENTES... AMADEU DA SILVA FÉLIX JÚNIOR PAIS Maria Elza / Amadeu da Silva Félix AVÓS PATERNOS Lázara / Joaquim da Silva Félix AVÓS MATERNOS Ana / Geraldo Fernandes Reis O gênio O pai, orgulhoso do rebento, exibe-o aos amigos. – Ele já conhece as letras do alfabeto, não é Joaquinzinho? – É. – responde Joaquinzinho. – Diga pra eles qual é a primeira letra do alfabeto, Joaquinzinho. – É a letra A. – Viram? Esse garoto é um gênio! Agora, diga o que vem depois da letra A. – Depois do A vem as outras... 70 Essas crianças... Osvaldo Reis XIXI QUASE NOBRE... A Thaís era mais arteira que filósofa, ou seja, aprontava mais que falava. Dizem que o apressado come cru. Um outro ditado, no mesmo sentido, ensina, que o ansioso nem espera a batata assar... A Thaís não tinha ainda dois anos, era comilona e gostava muito de coisas doces (baita novidade essa!), principalmente bolo de chocolate, não dando muita bola pra receita ou quem fizesse. Um belo dia, como tantos outros, a mocinha pediu à mãe que fizesse um bolo pra ela. A mãe “obedeceu” preparou a massa, enfiou na assadeira e tacou no forno. O “bicho” cresceu, ficou lindão. Thaís adorou o visual. A mãe deixou-o no forno para esfriar e foi cuidar de outros afazeres. Thaís ficou “cuidando” do bolo. Algum tempo depois uma vozinha, quase desesperada, chama a atenção de Lia, a mãe, que de onde estava quase não ouvia: era a filhota dizendo apenas MÃE... MÃE... É que num pequeno acidente a filhota, tentando agarrar o bolo, tombou com fogão e tudo, e a voz saía baixinha, já que sua posição era não muito cômoda; afinal, estava dentro do fogão, com a cara enfiada no bolo e de cabeça para baixo... Thaís também tinha medo de tudo que fizesse barulho: trovão, foguete, moto e, por incrível que pareça, de descarga de banheiro. Em determinado dia, Rose, a secretária, que praticamente a conheceu dias depois de nascer, resolveu tirar o medo da gatinha e a levou até o banheiro e, com jeito, apertando a descarga, disse a ela que não precisava ter medo, que não era perigoso... Mesmo assim, a mocinha deu no pé. Rose continuou seu trabalho, limpou o vaso e desinfetou com aquele “treco” colorido. Passado o barulho e o susto, Thaís volta e, admirada, diz pra sua amiga (até hoje) algo que a fez rir e muito; se fosse azul, seria nobre. É que a miudinha, de olhos arregalados olhou para Rose e constatou: – EU NÃO SABIA QUE O SEU XIXI ERA COR DE ROSA !!! 71 Essas crianças... Osvaldo Reis AMEAÇA... Rodrigo, o irmão predileto de Thaís, com cinco, seis anos, entrou para a escola, onde não era nenhuma “Brastemp”, depois ficou bom... Mas o começo foi um tanto quanto complicado. A mãe Rosely é tranqüilona, leva a coisa na “maciota”. Já o pai Renato, muito atencioso com os filhos, é enérgico, sabe cobrar, sabe exigir... Se a mãe não “assustava” os filhos, com o pai a conversa era diferente... Um belo dia, Rodrigo tirou uma nota menor que o salário mínimo, baixinha, baixinha... O que fazer? A mãe não era tanto problema, mas o pai... E o pior, um dos dois tinha de assinar o fatídico boletim. Ao pai não teve nem coragem pra falar, também com a mãe não quis arriscar. Assim pensando, resolveu “falsificar” a assinatura da genitora em tal documento. A professora duvidou da assinatura da mãe e ligou pra ela... Bronca feia... Renato deu um chega pra lá no filhão. Bronca pra mais de metro... No dia seguinte, ao voltar da aula, com a poeira aparentemente já assentada, Rodrigo conversa com a mãe: – MÃE, HOJE EU PASSEI EM FRENTE UMA CASA QUE TAVA ESCRITO CONSELHO TUTELAR... A mãe não entendeu o porquê da estranha afirmação... Com tanta coisa pra ver... Intrigada, quer saber do filho: – E o que é que tem isso? Aí Rodrigo, como não quem quer nada, confessou à mãe o verdadeiro motivo: – É QUE EU TÔ PENSANDO EM LEVAR O PAI LÁ POR CAUSA DE ONTEM!!! RODRIGO SOARES FREITAS (Digão) THAÍS SOARES FREITAS PAIS Rosely (Lia) / José Renato Freitas AVÓS PATERNOS Lídia / Benjamim Freitas AVÓS MATERNOS Aurora / Jairo Campos Soares Observação do garotinho ao ver um senhor passar com uma bengala: – PAI, OLHA LÁ UM HOMEM COM UM GUARDA-CHUVA PELADO! 72 Essas crianças... Osvaldo Reis EU SAÍ SOZINHO... O Cristiano com três anos, acompanhou os pais que saíram de Maringá e foram para Cuiabá. O garotão arrumou por lá, logo de cara, um punhado de amigos com os quais ele e também o irmão Athos brincavam o dia inteiro. Num belo dia, estão brincando num terreno baldio e lá encontram uma cisterna, baixa, sem tampa, e água até quase a boca, da qual era tirada água para os animais. E qual é o garoto que não tem a curiosidade de olhar pra baixo? Cristiano, com um bichinho de pano a tiracolo, debruçou-se para ver o que tinha dentro e despencou poço a dentro. Foram instantes de muita apreensão, mas logo em seguida o garotão veio à tona, sem se desgrudar de seu bichinho de estimação. Dois anos depois, relembrando o fato, avó Célia, com fé e gratidão, comentou: – Foi Deus que tirou você do poço! Cristiano, cheio de orgulho pelo feito, emendou: – NÃO VÓ, FUI EU QUE SAÍ SOZINHO... CRISTIANO BOLSONI DE SOUZA (Nano) PAIS Iara / Fernando Tadeu de Souza AVÓS MATERNOS Ester / Aureo Bolsoni AVÓS PATERNOS Célia Alcântara Rosa / Domingos Fernandes de Souza 73 Essas crianças... Osvaldo Reis LIVRE DA PROFESSORA... Sérgio Augusto, com oito anos, estudava no Instituto de Educação, em Maringá, e cursava a terceira série. Na época, estava estreando no cinema nacional um filme que, aliás, fez muito sucesso; o clássico “Independência ou Morte”. Um belo dia, assim que a professora deixou a sala, Sérgio subiu à mesa, sacou de sua espada, representada por uma régua e, com exagerado entusiasmo, tascou o célebre grito de independência... O pior é que sua independência durou muito pouco: a professora supreendeu-o e não deu outra; – foi parar na diretoria... E a coisa não engrossou mais, nem teve maiores conseqüências porque a diretora, Professora Iara Barnabé, que um dia também foi criança, (tem muita gente que esquece...), entendeu perfeitamente o gesto do pequeno aluno que, apenas repetiu a cena histórica do filme nacional, tornando-se o Tarcísio Meira da escola. SÉRGIO AUGUSTO ROSA DE SOUZA (Sanhaço) PAIS Célia Alcântara Rosa / Domingos Fernandes de Souza AVÓS PATERNOS Anésia / Teodorico de Souza AVÓS MATERNOS Maria José / Joaquim P. Souza 74 Essas crianças... Osvaldo Reis EU ESTOU AQUI, TIA!!! Lembra aquele antigo jogador de futebol apelidado Viola? Lembrou? Viola tinha mania de falar as coisas na terceira pessoa, isto é, em vez de falar eu fui, dizia o Viola foi... O Viola vai marcar um gol no jogo de hoje etc. e tal. Esse polêmico boleiro que passou pelo Corinthians, Palmeiras, Santos, Brumarim da Serra, entre tantas outras equipes (só não jogou em Jussara e Marialva...), acabou fazendo escola, deixando seguidores, como o Lucas, de dois anos e meio, um dos sobrinhos prediletos da tia Silvana, que se derrete em gentilezas para agradar os filhotes de seus irmãos, além dos “agregados”. Quando está falando com Lucas, Silvana acompanha até o modo de falar... Um belo dia, “tá” lá a tia passeando com o sobrinhão. Silvana, querendo saber como está o aprendizado de Lucas, pergunta: – Fale pra titia: o que o Lucas está fazendo na escola? Lucas, sentadinho no banco traseiro, de acordo com o figurino e a Lei, estica-se todo para responder: – TITIA, O LUCAS NÃO ESTÁ NA ESCOLA, AGORA! O LUCAS ESTÁ PASSEANDO DE CARRO COM A TIA SIL! LUCAS FLAUBERT ALARCON BORGES PAIS Marcela / Lúcio Flaubert Alarcon Borges AVÓS MATERNOS Anna / Jair Alarcon AVÓS PATERNOS Anna / Job Ribeiro Borges Todos nós somos crianças, mesmo fingindo que não: brincamos com esperanças, nossas bolhas de sabão... Maria Thereza Cavalheiro 75 Essas crianças... Osvaldo Reis DÚVIDA EXISTENCIAL A tia pediu ao Job Diógenes, mais conhecido por Didi, sua certidão de nascimento, sabe lá Deus por quê. Didi chega da escolinha e fala com sua mãe a respeito da solicitação da professora. O carinha só tinha três anos, mas o documento, raramente usado nessa idade, escafedeu-se. A mãe, nem por decreto, conseguia achá-lo. É um tal de mexe no armário, revira gaveta, fala com São Longuinho (dá uns 14 pulinhos...) e nada do “bicho” aparecer. O filhote, de camarote, acompanhava o já quase desespero da mãe, sem nenhuma preocupação aparente. Afinal, o problema não era dele. Nessa altura do campeonato, depois de tanta procura, a mãe, entre irritada e intrigada, deixa escapar: – Eu não acho a certidão de nascimento desse menino! Didi, que ouviu atentamente o desabafo da mãe, mais assustado que indignado, quer saber: – MÃE, ENTÃO, EU NÃO NASCI??? JOB DIÓGENES RIBEIRO BORGES (Didi) PAIS Anna / Job Ribeiro Borges AVÓS MATERNOS Divina / José Anacleto Garcia AVÓS PATERNOS Rita / Braz Ribeiro 76 Essas crianças... Osvaldo Reis COVARDE, EU????? Luana tem cinco anos, sua irmãzinha Letícia, somente dois. Luana é filha de Henrique e Liliane. Um belo (?) dia, ela deu umas porradas na coitadinha da Letícia; não chegou a ser uma surra de matar, mas a mais novinha apanhou. A avó Maria do Carmo mostrando sua autoridade e também fazendo justiça, deu-lhe uma tremenda bronca: – Você não tem vergonha de bater numa criança menor que você? Isso é covardia, sabia? A resposta de Luana fez a sabidona da vovó pensar um pouco... Se ela, quase do tamanho da irmã, era covarde, imagine a “outra”. Luana deu de ombros e tascou: – EU NÃO! COVARDIA É DA MINHA MÃE, DAQUELE TAMANHO E AINDA BATE EM MIM!... PAIS Liliane / Henrique Jorge AVÓS PATERNOS Maria do Carmo / Sebastião Magalhães Mesmo fim... – Seu Joaquim, me dê um rolo de papel de limpar bunda. – Não fale assim, garoto. Diga somente ‘um rolo de papel higiênico’. – Certo. Me dê um rolo de papel higiênico. – Aqui está. É pra botar na conta? – Não. É pra limpar a bunda. 77 Essas crianças... Osvaldo Reis UM “MATADOR” BONZINHO... Fátima Selma, a Fatinha, tem quatro anos, seu sobrinho Kildare, três. Os dois resolvem “criar” um estranho bicho de estimação: uma lagarta que eles chamavam de boizinho. Os dois estão brincando na casa dos avós de Kildare, Doralice e José Zito. Brinca pra lá, brinca pra cá, de repente, bem à tardinha, um grito de choro rompe o quase silêncio deles. Um corre-corre daqueles pra ver o que estava acontecendo lá nos fundos. Kildare chorava em todos os tons e sons: buááááá.... coeeeeennnnn... Lágrimas sentidas molhavam seu rosto. Fatinha, em pé, ao lado, parecia não ter nada com o peixe, “tava” nem aí. Mas o dedo indicador da mão direita de Kildare apontava para ela e soluçando dizia: – A FATINHA MATOU A LAGARTA... Ao mesmo tempo em que aumentava o choro e seu volume. A avó do garoto viu no “pestinha” um “santo”, e admirada com a atitude do neto afirmava, orgulhosa: – Olha gente, que menino bom! Que coração lindo! Que coisa linda... Chorando porque “essa menina” matou a lagartinha. Na hora do “essa menina”, pra evitar ciúmes e também choro da filhota, a avó, sem que o neto percebesse, piscou para Fatinha. O indignado Kildare contou para avó como é que a tia havia matado o boizinho e o real motivo de sua revolta: – VÓ, ELA PISOU DEVAGARINHO... Uma morte lenta, sob tortura, inadmissível, lamentável mesmo, quanta crueldade. Um pecado e tanto cometera a maldosa gatinha, pensava dona Doralice. Mas Kildare estava mesmo era frustrado, quando para gargalhada geral e ainda soluçando, afirmou batendo o pé no chão sem retirá-lo, com uma volta completa sobre o calcanhar: – EU QUERIA PISAR ASSIM Ó... FÁTIMA SELMA MAGALHÃES (Fatinha) PAIS Doralice / José Zito Magalhães AVÓS MATERNOS Maria / Antônio Nobre AVÓS PATERNOS Cristina / Teodulfo Magalhães KILDARE MAGALHÃES CRUZ (Kikil) PAIS Maria Auxiliadora / Kleber Cruz 78 Essas crianças... Osvaldo Reis MEDO ATÉ DO NOME... Murilo Filho estava com três anos, e com a mãe Luzia e Murilo pai foram visitar os avós em Fortaleza. Você sabe como é que ficam os avós com visita de neto, com Murilinho foi uma festa. Era mordomia que não acabava mais. Não só dos avós, mas também das tias e tios. É novidade de ambos os lados e todos acabam gostando, criança ainda mais. Nesse clima, o tio Francisco resolve levar todo mundo pra um pedaço de paraíso chamado Prainha, em Aquiraz, ali por perto. O carinha todo feliz no colo da mãe, “tá” adorando a viagem e a paparicação da família. Chegando à praia, ao passar na vila, mais precisamente na aldeia dos pescadores, um baita porcão (e põe baita nisso!), devagarinho, atravessa na frente do carro. Murilo nunca tinha visto um bichão daqueles, nem pequeno, a bem da verdade. O sujeitinho ficou apavorado, arregalou os olhos e quis saber: – O QUE É ISSO? – É um porco, responde a mãe. Murilo, entre surpreso e aliviado, encerrou a conversa: – EU PENSIA QUE ERA UMA ONÇA!... FOI ELE, MÃE... O Murilo Filho, já apresentado, não tinha ainda completado quatro anos. A mãe resolve levar o filhote numa igreja. E o fez. Era uma igreja católica. Lá chegando, para ele, tudo era novo, Murilo fica indignado quando vê uma imagem de Jesus Cristo, todo ensangüentado, nos braços da mãe, Maria. Indignado é pouco, Murilo ficou horrorizado, chocado, e botando pra fora seu espírito de justiça quis saber: – MÃE, QUEM FEZ ISSO COM ELE? A mãe ficou pasma, quieta, calada, sem voz, sem ação, mudinha da silva. O filhote que gostava de assistir na tevê um desenho chamado Cavaleiros do Zodíaco, assimilando a fala de tal desenho, com a inusitada visão, diante de tamanha 79 Essas crianças... Osvaldo Reis crueldade, fez suas deduções e voltou a falar: – JÁ SEI, FOI O INIMIGO... A mãe senta-se e começa a prestar atenção na missa que estava começando. O curioso e indignado Murilo vai lá pra frente. Algum tempo depois, ele vê uma imagem de São Judas Tadeu com sua lança. Boa parte das pessoas presentes, mesmo sem entender o que estava se dando, já que não ouviram a conversa de mãe e filho, não deixaram de cair na risada, quando o “detetive” Murilo gritou para a genitora: – MÃE! E apontando a imagem, completou: – OLHA O INIMIGO!!!!! MURILO MACEDO FILHO (Murilinho) PAIS Luzia / Murilo Macedo AVÓS MATERNOS Doralice / José Zito Magalhães AVÓS PATERNOS Oyara / Luiz Augusto Macedo Da terra ao céu - que distância ! Tão grande, mas, mesmo assim, pude vencê-la na infância, quando o Céu morava em mim !! Otávio Babo Filho 80 Essas crianças... Osvaldo Reis UM “BICHÃO” DE GUARDAR LÍQUIDO Bárbara Larissa - Balissa -, com dois anos recentemente completados, é a simpatia em pessoa. Vive sorrindo, e em razão da idade “come” uma letra e outra quando fala. Em se tratando de homem, ela chama de migo, mulher é miga, assim todo mundo é migo e miga da gatinha. Balissa, em companhia da tia Léia, vai quase todos os dias na casa do Paulo e Ione visitar suas amigas Carol e Paula, assim como os pais delas. Sua conversa gira sempre em torno do que aprende na escolinha. Um dia contou que estava aprendendo os nomes dos bichos: cachorro, gato, cavalo, etc. Paulo, a quem considerava migo querido, quis participar da conversa, entra no papo e quer saber: – Como é o nome daquele bichão de pescoço comprido? A resposta vem na bucha com toda certeza e a maior segurança do mundo: – É GARRAFA !!!! BÁRBARA LARISSA SANTOS (Balissa) PAIS Nilcéia / Orlei Jesuino dos Santos AVÓS MATERNOS Maria Aparecida / Antônio Jesuino dos Santos 81 AVÓS PATERNOS Neuza / Valdevino de Matos Essas crianças... Osvaldo Reis A TIA NÃO DEU: COMPROU PRA MIM... Rebeca está com seis anos e está na pré-escola e quer porque quer um caderno de dez matérias usado pelos universitários. Pela contradição e bom senso, sua mãe jamais compraria um “trem” desses... Mas Rebeca tem lá seus métodos de obter o que quer... A tia Ione e o tio Paulo têm um mercado onde começou o “namoro” com tal caderno... Mas sua mãe a proibiu terminantemente de comprar qualquer coisa dos dois, já que a mocinha é consumista que só, compra até capim pegando fogo, e dos tios então... Aí é só festa... A mãe também pediu aos tios que não vendessem nada pra ela... Esse “vender” não tá muito claro... Rebeca é muito simpática, jeitosa, e repito, tem sua própria metodologia, aliás, infalível de alcançar seus objetivos, mas não podia comprar (nem levar na “flauta” já que a proibição valia também para os tios)... E o cadernão??? Rebeca está apaixonada pelo dito cujo... Anda pra lá, anda pra cá e seus olhos de jabuticaba não desgrudam dele... A tia Ione começa a se preocupar com aquele jeitão de Rebeca e pergunta o que está acontecendo. Rê aponta o caderno, “entregando” a mãe: – SABE, TIA IONE, A MINHA MÃE FALA QUE VAI COMPRAR UM CADERNO DESSES PRA MIM, MAS NUNCA COMPRA... O coração da tia, que é professora, balançou e aí começou entre as duas um diálogo quase que infindável: – Então, Rê, pode pegar o caderno, a tia dá de presente pra você.... – A MINHA MÃE NÃO DEIXA... – Mas é a tia que está dando... Rebeca dramatiza: – NÃO TIA, NÃO POSSO... Será que ela abriu mão da conquista? – Então, “tá” bom, se você não quer... Claro que ela queria, ela não se “entregaria” tão fácil assim... Rebeca continua com seu vai e vem, sempre de olho no tal caderno... Aí sua cabecinha começa a encontrar meios de obtê-lo, já que não podia comprar nem ganhar de presente, achou a 82 Essas crianças... Osvaldo Reis solução e acabou conseguindo, mais uma vez, o objeto de seu momentâneo desejo: – ENTÃO, TIA IONE, VOCÊ FALA PRA MÃE QUE VOCÊ NÃO ME DEU... VOCÊ FALA QUE COMPROU NA LIVRARIA... E, com aquela carinha sapeca, olhos brilhando concluiu: – E DEU PRA MIM, TÁ??? E foi embora com seu “universitário” de prezinho... INTERESSEIRA... Rebeca vê em sua prima Cláudia, a quem chama de tia, já que Claudinha tem alguns aninhos a mais que ela, a sua “ídala”. Cláudia realmente é muito bonita, se veste bem, tá sempre de sapatos altos, muito bem maquiada, usa jóias de verdade, é linda, enfim, uma Ana Hickman em carne e osso ou como dizem os gaúchos, ela é uma gota de orvalho numa folha de inhame numa manhã ensolarada. Rebeca acha bonito até o seu rastro, sua roupa, suas coisas, tudo... E tenta imitar a prima Curitibana. Num natal em casa dos avós Olga e José Bordin, em Jussara, Rebeca “fuça” na bagagem de Cláudia e depois vem falar com a prima: – TIA CLÁUDIA, O TEU PAI DEIXA VOCÊ DAR TUAS COISAS VELHAS PARA OS OUTROS? Cláudia fica intrigada. Ela não iria carregar coisas velhas, e “beirando” os trinta janeiros, não é e nem tem coisas assim... Estranha a pergunta, pensa um pouco e responde: – Olha Rebeca, eu acho que sim!... A resposta de Cláudia revela o motivo real de a priminha ter mexido em suas coisas... – A SUA MAQUIAGEM JÁ TÁ VELHA, ENTÃO, VOCÊ DÁ ELA PRA MIM? MISERÊ... Rebeca está com cinco anos, a filha do Teodoro e da Maria Helena vive com os pais num amplo e confortável apartamento em Ibaiti, onde tem muitos amigos. Freqüenta o clube que tem parquinho, uma baita piscina e tantas outras mordomias que ela desfruta sem nenhuma modéstia... A mãe de Rebeca é professora, o pai lida com madeira. Teodoro vai para Rondônia montar um fábrica de móveis. A mãe recebe uma licença (3 meses) no colégio onde trabalha e, com a filhota a tiracolo se manda pra Rondônia a fim passar a temporada com o maridão... Lá, a coisa é um pouco diferente de sua casa no Paraná... O pai se “esconde” na 83 Essas crianças... Osvaldo Reis própria fábrica, tudo é improvisado, menos a preocupação do pai em dar um certo conforto para a filhota... Teodoro usa uma caminhoneta para os afazeres da indústria, pois em Rondônia não é só a corrupção que é grande, o calor é maior ainda... É um sol para cada pessoa, sol de estalar mamona... O dedicado pai coloca uma lona na carroceria do veículo e enche o “bicho” d'água, o que seria a piscina da filha... Rebeca se molha, se refresca, mas “tá” bastante intrigada... Lá pelas tantas, numa distração do pai, Rebeca chama a mãe, e tristemente, constata: – COMO NÓS FICAMOS POBRINHAS, NÉ MÃE??? A FALSA Após três meses no sol de Rondônia, Rebeca e a mãe precisam voltar para Ibaiti. Rebeca tá triste, macambúzia, pensativa... Mas... E chega o dia da partida... O pai as leva até o aeroporto... Rebeca tem adoração pelo pai, paixão seria mais correto... O som anuncia a hora do embarque... Rebeca “tarraca”, gruda, “se enrola” no pescoço do velho, não quer ir embora, não quer deixálo, cena triste e por demais emocionante. Rê chora copiosamente, e põe choro nisso... As pessoas próximas se comovem, o pai engole seco, aperta o peito, avermelha os olhos, a mãe, com muito custo tira-a dos braços, ou melhor dizendo, do pescoço do pai. O avião decola. O pai fica só naquele mundão... O avião ainda nem tinha deixado direito o aeroporto, Rebeca abre um sorrisão, de orelha a orelha, passa as costas das mãos nos olhos e manda ver: – AGORA NÓS VAMOS VOLTAR PRA NOSSA VIDA DE RIQUINHA, NÉ MÃE? REBECA BORDIN DE ALENCAR PAIS Maria Helena / Teodoro Alencar AVÓS PATERNOS Maria / Alonso Moreira de Alencar AVÓS MATERNOS Anna Olga / José Bordin 84 Essas crianças... Osvaldo Reis 85 Essas crianças... Osvaldo Reis “BRINCADEIRA” CHATA... Na casa de Carol todo mundo é católico. Católico mesmo, não só de fachada... A avó é católica, o avô, as tias, tios, primos, mãe, pai, a irmãzinha Ana Paula... Até seu ursinho de pelúcia... Todos, enfim... A mãe começa a mostrar o caminho à filhota ensinando-lhe como rezar o terço, explicando-lhe pra que é que serviam as contas, as maiores, as menores etc. e tal... Um belo ritual que consiste em perguntas e respostas... Mas criança gosta só de perguntar, responder; nem sempre... Ione reza: – Ave Maria... Carol responde: – SANTA MARIA... E a coisa continua...! Lá pelo terceiro mistério, Carol perde a paciência e sentencia: – MÃE, VAMOS MUDAR DE REZA, PORQUE SEMPRE É A MESMA COISA... SEMPRE A MESMA COISA... VOCÊ TEM ALGO CONTRA MINHA MÃE??? A Carol, em companhia da mãe Ione e da avó Olga, vai à missa... Ana Carolina, Carolzinha para a “vó Olga” tem quatro anos, um montão de tias, uma delas de nome Rosana. Todo mundo adora a companhia da gatinha para os passeios, não apenas para ir à igreja... Naquele domingo não foi diferente... As três; mãe, avó e a enfocada chegam à igreja, aliás, próxima, em todos os sentidos, de sua casa... Carol senta, olha pra todos os lados, confere, e acha tudo de acordo. Começa a missa com o padre solenemente anunciando: – Essa missa foi encomendada por Olga Bordin... Carol observa calada a cerimônia e capta tudo... Logo em seguida, durante a celebração, todos começam a cantar o hino HOSANA NAS ALTURAS... Carol não se conteve e fez com que a mãe e a avó desviassem um pouco a atenção da missa para rirem 86 Essas crianças... Osvaldo Reis por dentro. É que, a seu ver, sua mãe estava sendo vítima de uma grande injustiça e a gatinha quis saber: – MÃE, JÁ FALOU O NOME DA VÓ OLGA, JÁ FALOU O NOME DA TIA ROSANA, QUE HORA O PADRE VAI FALAR O TEU NOME??? O LUGAR É O MESMO... Ione, a mãe de Carol e Paula, estudou, lecionou e foi diretora do Colégio Estadual Senador Morais de Barros, em Jussara, que tempo desses pegou fogo, arrancando-lhe sentidas e saudosas lágrimas, já que sua história de amor pela escola começara tão cedo, um amor que nenhum incendiozinho besta vai interromper... Ione, um belo dia, ouve uma professora contar na sala onde se reúnem, as peripécias de um aluninho de apenas sete anos, mas por seu apelido, a maneira como era tratado (por todos) dá pra se ter uma idéia do “anjo” que era o sujeitinho: ele era conhecido (e como!...) por “Capetinha”... Um dia “Capetinha” se excedeu... Pouca coisa... Desentendeu-se com um coleguinha e a coisa não teve proporções maiores graças à intervenção da experiente educadora... No auge da raiva, do ódio e sei mais o quê, “Capetinha”, aos “berros”, manda o coleguinha tomar... Não era café nem água, é exatamente o que você pensou... – VÁ TOMAR NO... – bradou Capetinha... A professora, didática, explica ao jovenzinho que era feio dizer palavrões, que era feio brigar e aproveitou também pra explicar ao “descomportado” aluno, o nome do “trem”... Contou pra “Capetinha” que “aquilo” não era “aquilo”, que o nome correto era (e continua) ânus... “Capetinha” ouve, paradoxalmente, muito atento e ainda muito nervoso. Baixando (só um pouquinho) o volume, concluiu: – ENTÃO ELE QUE VÁ TOMÁ NO ANUS MESMO...... ONTEM É HOJE? Ana Carolina, com seus quatro anos, “adorava” ir à escola. Certo dia, chega pra mãe e afirma, feliz da vida: – AMANHÃ NÃO TEM AULA PRA MIM... À noite entregou-se aos braços de morfeu e dormiu que só uma pedra... Acordou com a energia de sempre, e de novo, pega a mãe pra Cristo e quer saber? – HOJE É AMANHÃ??? A mãe, lembrando a afirmação do dia anterior, intrigada responde: – É, Carol... Carolina abre um sorrisão e conclui o diálogo: – ÔBAAA, ENTÃO HOJE NÃO TEM AULA PRA MIM... 87 Essas crianças... Osvaldo Reis FILOSOFIA CAROLINIANA... O quadro é um desenho daquela história do cupido, lembra? É aquele coração atravessado por uma flecha, a flecha do amor, dizem os românticos. Para Carol, com seus quatro anos, era outra coisa: – É UM CORAÇÃO MATADO. Mais ou menos com a mesma idade, no jantar, após o mesmo, afirma orgulhosa: – PRATEI UMA PRATADA DE FEIJÃO... No Natal de 1991, Carolina está com cinco anos. A irmã predileta de Ana Paula tratava-a carinhosamente por maninha (ainda é assim), e toda invocada, fala pra enciumada Ana Paula: – SOU PRESENTÁVEL.... PAPAI NOEL TRAZEU UM MONTÃO DE PRESENTE PRA MIM. Família toda reunida vendo televisão. Aí a caçula da prole, Carolina, com seus quase cinco anos reclama: – EU NÃO TÔ ESCUTANDO NADA. QUEM DESAUMENTOU A TELEVISÃO????? Um outro filósofo, então com cinco anos, o poeta Paulo Assis, irmão, um pouco mais novo, do também poeta A.A. de Assis (poesia é dom e bem de família), ajuda a esclarecer a história da página anterior, com sua pergunta cheia de sabedoria e sagacidade: – HOJE É QUE É O AMANHÃ DE ONTEM? “CAMISINHA” PRA ANIMAR Era época de carnaval. O Governo fazia aquela propaganda contra a DST, ou as doenças sexualmente transmissíveis, com enfoque para a AIDS, cuja pronúncia, de acordo com o significado, deveria ser SIDA, a Síndrome da Imunodeficiência Adquirida. Deixando de lado o pormenor de nossa alienação com o imperialismo americano, inclusive lingüístico, uma campanha meritória, embora muitos entendam que a mencionada campanha incentiva o sexo fora do casamento... Mas qualquer coisa 88 Essas crianças... Osvaldo Reis pra se evitar uma doença dessas é bem-vinda... Ana Carolina, no alto de seus cinco anos, assistia a todo instante, na televisão, a dita propaganda. A coisa era mais ou menos assim: um monte de gente pulando carnaval e uma voz no fundo apregoava: “NESSE CARNAVAL USE CAMISINHA”... Carol gostou de ver uma festa tão animada, com aquela alegria toda, e quer saber do pai: – PAI, AMANHÃ VOCÊ VAI PRA MARINGÁ? O pai diz que sim. Ato contínuo, a filhota revela ao pai o interesse por sua viagem: – ENTÃO VOCÊ TRAZ UM MONTÃO DE CAMISINHA PRA MIM PULÁ CARNAVAL? TRAZ COLORIDA, TÁ PAI? ERA UM ESTOURO Ana Carolina, a Carol, com seus dois anos já filosofava, cabendo à mãe, professora, a tradução do que dizia a filhota. Mãe sempre sabe das coisas, e também é pra essas coisas... Na comemoração dos dois anos da gatinha, tá lá um montão de crianças em sua casa para o tradicional parabéns pra você. Festona e tanto, com bolo, brigadeiro, sorvete, refrigerante e um punhado de balões, popularmente chamados de bexiga, decorava o ambiente... A criançada estava se divertindo à beça, mas de vez em quando... Pummmmmmmm (calma, não é o que você pensou!). O som misturava-se à algazarra e a aniversariante fazia explodir mais um balão dos tantos que ela já havia pipocado. A mãe jura que Carol dizia: “não enche a bexiga que eu estouro”. E, assim, ela ia “desenchendo” balões e mais balões e, como dona da festa, a rainha do pedaço, desafiante tascava: – NÃO FUA QUI EU DISSÓPRO!!! LÓGICA INFANTIL... Ana Paula está aprendendo a falar. Os pais moram ao lado dos avós maternos da mocinha. Os paternos são falecidos. Paula conhecia, portanto, os pais de sua mãe. E, como se sabe, criança é danada pra fazer associações... A curiosidade em torno da avó de Ana Paula é que em razão de sua bondade e paciência, todo mundo, não só os netos, a tratam por “vó Olga”, até os marmanjões o fazem, por carinho e também pra imitar as crianças, netas de verdade. Entretanto o avô de Ana Paula é só “vô”, nem avô, nem vovô, como é natural. Como ela só tem ele, é “vô” e fim de papo... Um belo dia, um abestado de um tio “espreme” Ana Paula querendo saber por que era "vó Olga", e porque “vô” era só “vô”, “vô” o quê? – É VÔ, UÉ. – Responde Ana Paula. A resposta não agrada o insistente tio... – Mas por que é vó Olga? Repete tudo, começa tudo de novo, as mesmas perguntas. Ana Paula fica braba, acaba com a conversa dando sua lógica explicação: 89 Essas crianças... Osvaldo Reis DOENÇA ESTRANGEIRA... Ana Paula tinha lá seus quatro anos. Está cursando o pré não sei o quê, tá, enfim, na escolinha - acho que escola de criança só devia se chamar escolinha, é muito complicado esse negócio de prezinho, pré-um, pré-dois etc. Só escolinha e pronto... Assim, na escolinha de Ana Paula ocorreu um surto de, sabe aquele “treco” que deixa os olhos vermelhos e doendo pra burro? Sabe, né? Lá na escolinha tava quase todo mundo com isso, menos algumas poucas crianças, dentre elas, a enfocada Ana Paula. Paula chega em casa e faz um desenho lindão. E põe lindo nisso. Era uma criança igual a ela, só que os olhos não eram iguais aos seus, da mesma cor, eram vermelhos... Paula mostra à mãe seu trabalho. A mãe rasgou elogios e deixou pra, no final, fazer a tal pergunta sobre os olhos vermelhos da obra de arte da filha: – Por que é que os olhos são vermelhos? A resposta esclarece tudo, inclusive o nome da doença: – É QUE ELE TÁ COM CONVIQUIVIQUI... EU SOU A QUE NÃO TÁ DENTRO... Ana Carolina é a irmãzinha mais nova da Ana Paula, com quem, aliás, é muito carinhosa e a chama de maninha. É um tal de maninha pra lá, maninha pra cá... Carinhosa mesmo... Um dia, Carol tá mostrando uma foto de quando elas ainda eram bem novinhas. O retrato mostrava as duas crianças. Uma em pé e a outra sentada, calçando uma meia. Carolina explica: – ESSA QUE TA DENTRO DA MEIA É A MANINHA E A QUE TÁ FORA DA MEIA É EU... ANA PAULA BORDIN FERNANDES REIS (Paula) ANA CAROLINA BORDIN FERNANDES REIS (Carol) PAIS Ione / Paulo Fernandes Reis AVÓS MATERNOS Anna Olga / José Bordin AVÓS PATERNOS Ana / Geraldo Fernandes Reis 90 Essas crianças... Osvaldo Reis APENAS UM SAPATO GRANDE… Do casal Rosana/Luiz Jorge, depois da Fabrícia “surge” uma loirinha, loirinha mesmo, a Lorena, que, com aproximadamente cinco anos, falava não só pelos cotovelos, pelos poros, seria mais coerente. A mocinha era (e continua) simpaticíssima e também muito sabida... Num certo dia, numa rodinha de crianças, com quase a mesma idade, Lorena se desentende com o amiguinho Luciano e xinga-o: – LUCIANO, VOCÊ É UM GUEI... A prima Ana Paula, pouco mais velha, quer saber se Lorena sabia o que estava dizendo. E não é que ela sabia mesmo? Lorena, sem meias palavras, responde: – SEI... GUEI É UM HOMEM QUE NAMORA COM HOMEM... Ana Paula, certamente querendo acabar com a “briga”, muda o rumo da conversa e pergunta: – E você sabe o que é mulher que namora com mulher? Lorena, sem pestanejar: – EU SEI. É GUEIA... A sabidona da Ana Paula explica-lhe que não é gueia e sim sapatão... Algum tempo depois, já sem briga, Ana Paula, pra saber se a “aluna” havia aprendido, repete a pergunta: – Lorena, o que é mesmo mulher que namora com mulher? A loira Lorena pensa um pouco, faz suas deduções e manda ver: – É... É... É BOTA !!! LORENA JORGE FABRÍCIA JORGE LUIZ ALBERTO (BETO) PAIS Rosana / Luiz Jorge AVÓS MATERNOS Anna Olga / José Bordin AVÓS PATERNOS Bealina / Pedro Jorge 91 Essas crianças... Osvaldo Reis EU “FALI” TÁ FALADO... Quase toda criança tem seu vocabulário, ou jeito próprio de falar. Claudinha, uma das filhotas do Paulo e da Ieda não fugia à regra. Assim que começou a falar, de verdade, com seus dois, três anos, em vez de falar pegar ela dizia “pegui”, brincar era “brinqui”, gritei, “griti” e um montão de outras tantas palavras... A dedicada tia Ione, que é professora, “acorrege” a sobrinha: – Claudinha, não é brinqui, é brinquei... Não é pegui, é pegue,i etc e tal. O tempo passa, o tempo voa, a poupança não continua numa boa, eis que um belo dia “tá” lá a Claudinha almoçando, e criança gosta de mostrar o prato limpinho, parecendo “lambido”. Cláudia olha para a tia professora, orgulhosa de seu feito, cheia de razão, afirma: – TIA IONE, EU COMI TUDO!!!!! Aí a garota, lembrando o ensinamento, encara com pesado sentimento de culpa a tia, e muda tudo: – TIA, EU COMEI TUDO... CLÁUDIA BORDIN BACCHI (Claudinha) PAIS Ieda / Paulo Bacchi AVÓS MATERNOS Anna Olga / José Bordin Na infância, o sumo interesse – calças longas, sem demora (Ah! se a vida devolvesse as calças curtas de outrora) Waldir Neves 92 Essas crianças... Osvaldo Reis NÃO QUERO SER QUE NEM ELE... O tio Paulo está hospedado na casa da Juliana, que tem cinco anos e é filha da Cláudia e do Milton, em Curitiba. Mesmo sendo bem tratado, Paulo adora aporrinhar a paciência da gatinha, que por seu lado, não gosta nem um pouquinho da brincadeira do tio. É o seguinte: Juliana, recentemente freqüentando a escolinha, se “apaixonou” por uma das “tias” e gostava de imitá-la. A tia dava aulas batendo palmas, contando coisas, cantando aquelas musiquinhas que criança tanto gosta. Em casa a gatinha imita a professora e seu “aluno”, único, por sinal, é o tio Paulo. A garota explica a coisa e pede ao aluno que repita e ele faz tudo ao contrário. Diz a “professora” Juliana, por exemplo, o sapo... Paulo responde “o passo”; ela, o gato; ele, “o toga”; Ju, o passarinho; ele, o “saparinho”; e o bateboca demora horas e horas até um dos dois desistir, ou jogar a toalha, o que, quase sempre acontecia com a professorinha Juliana, que não tinha a devida paciência com aluno tão desligado. Um bom tempo se passou. Tio Paulo já tinha ido embora... Sabe um dia daqueles? Garoava, fazia frio, chovia, ventava... A mãe, com medo de a filhota ficar dodói, resolve não mandá-la pra escola. Juliana, desesperada, com infalível argumento, fala: – Ô MÃE, QUANDO EU CRESCER VOCÊ QUER QUE EU FIQUE BURRA IGUAL O TIO PAULO???? ÓRFÃO CONTRABANDEADO... Mariana tem cinco anos, filha do casal Cláudia/Milton. Um dia, toda garbosa, chega em casa e conta pra mãe que em sua escola tinha um menino órfão. A mãe, lógico, em razão de sua pouca idade, quer saber da filhota se ela realmente sabe o que é órfão. E não é que ela sabia mesmo? Veja a resposta: – É QUANDO A MÃE DA BARRIGA MORRE E DAÍ TEM OUTRA MÃE FALSA COMPRADA NO PARAGUAI... JULIANA FERRI PAIS Cláudia / Milton José Ferri AVÓS PATERNOS Benvenuta / João Ferri AVÓS MATERNOS Ieda / Paulo Bacchi 93 Essas crianças... Osvaldo Reis LUZ SEM RISCO !!!. O Victor Hugo, no alto de seus quatro anos, não deve ter lido Gênesis, onde Deus, após ter criado o céu e a terra, então sem forma e vazia e também em trevas, entre tantas coisas disse: HAJA LUZ. E houve luz. Tempos depois um tal de Thomas Edison é que artificiou a coisa, inventou a energia e democratizou seu uso. E, em Maringá, onde nasceu nosso enfocado, foi montado o 1º escritório da Cia. Paranaense de Energia Elétrica - COPEL, da qual Victor é tiete a não mais poder. Victor Hugo, por muito tempo, ficando no lugar comum, e por ser o primeiro neto, foi literalmente “o xodó” não só dos avós Lucia e Oscar, mas principalmente dos pais Márcia e Klibson... Depois veio o Heitor e seu reinado foi dividido, mas não perdeu o título de primeiro neto. Um belo dia, melhor numa bela noite, a luz da casa de “vó” Lucia se escafedeu, tomou doril, “viajou” ... A avó Lúcia achou por bem dar a notícia ao neto, cuja conversa, mesmo no escuro, é sempre gratificante. Dois tipos de pessoas têm solução para tudo: mãe e criança. “Vó” Lúcia, liga então para Victor e , após os cumprimentos de sempre, informa-o: – Victor acabou a luz aqui em casa... A “vó” “tá” sozinha e no escuro, lamentou. Doutro lado da linha, Victor, precoce e prático, ensina a avó a resolver o problema: – VÓ LÚCIA, NÃO FIQUE COM MEDO, ORE PRO PAPAI DO CÉU... ORE BASTANTE, BASTANTE MESMO. A conclusão do conselho, sábio, diga-se, mostrou que Victor, no caso, tem a fé dividida, isto é, não sabe em quem acredita mais (ou sabe?) ... – VÓ LÚCIA, DEPOIS QUE VOCÊ ORAR BASTANTE PRO PAPAI DO CÉU, SE A LUZ NÃO VOLTAR, AÍ VOCÊ LIGA PARA A COPEL... VICTOR HUGO TORRES DE OLIVEIRA PAIS Márcia / Klibson Wesley de Oliveira AVÓS PATERNOS Lúcia / Oscar Batista de Oliveira AVÓS MATERNOS Aparecida / José Torres 94 Essas crianças... Osvaldo Reis SAINDO PELA TANGENTE Sílvia, a Silvinha, irmã mais velha da Débora, (que uma vez ganhou do pai um cachorro “botininho”), filha do Mauro e da Isabel, com seus três anos de idade, como quase toda criança nessa faixa etária, fala pelos cotovelos, e o que é pior, “brigava” muito com a mãe a quem xingava (coisa feia!) de boba, embora não soubesse direito o que estava falando, mais ou menos como faz o papagaio. A mãe, sempre insultada injustamente, quer cortar o barato da filha e resolve dar um basta no impróprio palavreado da gatinha. Com a bronca, Silvia deve ter aprendido uma outra palavra. É que certo dia quando iniciava o xingamento, deu de cara com a mão da mãe contendo uma chinela numa das pontas, levantada, prontinha para entrar em ação, lógico, na região glútea de Silvinha... E o diálogo (?) fica assim: – MÃE, BO... A “enchinelada” mãe interrompe-a perguntando, brava que só: – O quê? A gatinha dá um nó na língua e conclui, entre apavorada e sorridente: – BOOOOOO... NIIIIIIIIITTTA!... VÓ EXCLUSIVA... Silvia nasceu em Maringá mas é descendente de japoneses, os japoneses do Japão mesmo, não de japoneses de Assaí, Osvaldo Cruz, Cotia e tantos outros “japões” do Brasil. Os avós maternos da gatinha de quatro anos vieram do país do sol nascente, onde nasceram. Os paternos são falecidos; assim, ela só conhece o dityan e a batyan, por quem morre de amores. Afinal a batyan faz tudo que a mocinha quer (será que é só ela?), daí o xodó, de ambos os lados. Silvia, em razão da idade, não sabe direito o significado da palavra batyan, sabe no entanto, que a batyan é dela e fim de papo, nem por decreto poderia ser de mais alguém... Um belo dia, em companhia da mãe e da batyan, Silvia, pela primeira vez, vai até a ACEMA, clube que congrega a comunidade nipo-brasileira. Era “Dia da Criança”, uma festa, algum motivo especial, gente que não acabava mais. Tomam lugar na arquibancada e “tão” lá participando do evento. Atrás delas, tá lá uma outra batyan, a batyan de outra garota, mais ou menos da idade da Silvia. Festona aquela, agradava a 95 Essas crianças... Osvaldo Reis todos, principalmente as crianças. De repente aparece lá embaixo a tal garota da outra batyan e querendo falar-lhe, começa a gritar: – BATYAN, BATYAN... Foi um Deus nos acuda... Silvinha levantou-se de dedo em riste, mandou a “adversária” calar a boca, puxou a faca... Ninguém entendeu nada até que a mãe explicou a ciumeira da filha. Depois de muito agarra, escapa, segura, separa, a gatinha foi finalmente contida, mas mesmo assim, continuava gritando para a quase usurpadora: – A BATYAN É MINHA.... SÓ MINHA.... SUA FEIA, SUA BOBA... SUA CHATA... SUA ... BENZIMENTO VAGABUNDO... O César, então com três anos, tinha medo de cobra cega, cabo de vassoura, piolho-de-cobra, queda de rede e tantas outras fobias. Mas medão mesmo ele tinha de assombração... A mãe, o pai e a vó Ana começaram a se preocupar com o garotão. Conversa pra lá, pergunta pra cá, descobrem uma benzedeira perita em espantar “coisas”. Sua perícia era tanto que bastava uma rezada que a coisa se escafedia, era fim de papo, isto é, do medo... A mãe e a avó levaram o sujeitinho na tal benzedeira, só com um detalhe, o “benzido” não podia saber que o motivo do benzimento era pra curar medo, se não, não valia, pra ele tinha de ser segredo. E lá vem a bondosa velhinha com seu ritual e instrumentos de trabalho, são galhos de arruda, réstias de alho, mãos na cabeça do carinha, palavras ininteligíveis, que ela nem sabia - aqueles tradicionais mmmmmmmmmbbbbbbbbbbbtttttttttttsssssss entendeu? Tudo bem. César, compenetrado, se deixa levar ou seja, benzer.... À noite César vai dormir. Algum tempo depois, assusta todo mundo com seus gritos: – Ô MÃE, VÓ, CORRE AQUI! ESSA PORCARIA DE BENZIMENTO NÃO VALEU NADA... EU TÔ MORRENDO DE MEDO!... MARA SILVIA REIS CEZAR HENRIQUE REIS DÉBORA CRISTIANE REIS PAIS Isabel / Mauro Fernandes Reis AVÓS PATERNOS Ana/ Geraldo Fernandes Reis AVÓS MATERNOS Mineta Ada / Noi Ada 96 Essas crianças... Osvaldo Reis EXCESSO DE TRABALHO... Victor Enzo é, segundo o próprio, o neto preferido da Dora e Décio, do Erasmo e Hercília. É um sujeitinho levado da breca e “tá” sempre a tiracolo de um dos avós, principalmente Décio, com quem gosta de “jogá bola”... Victor tem tênis, meião, camisa, bola e o avô de parceiro. Todo dia, no mínimo por duas vezes, Victor queria “jogá bola”... Naquele dia o avô Décio não podia atender o neto, já que estava enrolado com algumas outras coisas. Logo de manhã, “tá” lá o Victor, todo paramentado, chamando o avô para fazer o que ele mais gostava: – VAMO JOGÁ BOLA, VÔ? O avô, pacientemente, responde: – Não, o “vô” vai “tabaiá”. Tudo bem... “tabaiá” pode. Senão não tem doce, presente, Natal, bicicleta etc. A “inocente” criança sempre “engole” a tal desculpa... Na hora do almoço a coisa se repete, igualzinho de manhã: – VAMO JOGÁ BOLA, VÔ? A resposta também é a mesma: – O vô vai “tabaiá”... Victor aceita, mas já de nariz um pouco torcido. À noite (o “estádio” deles, proximidades da Catedral, em Maringá, era iluminado...), não dá outra, lá vem o pentelho do neto com a mesma proposta: – VAMO JOGÁ BOLA, VÔ? Décio volta a falar que novamente vai trabalhar... Victor endoida, coloca um pé sobre a bola, a outra mão na cintura e a uma levantada, mais enfezado que siri na lata, com três dedinhos apontados em direção ao nariz do avô, desafia: – MAIS TREIS VEIZ???!!! 97 Essas crianças... Osvaldo Reis ZELOSO... Victor é “colocado” na escolinha. Não tem ainda quatro anos. Entre as tarefas da vó Dora em relação a ele, era a de levá-lo, e lógico, apanhá-lo na tal escolinha. Um dia, em razão de outros tantos afazeres no corre-corre do dia-a-dia, literalmente, Dora esquece o neto na escola. Naqueles tempos, ainda não existia telefone celular. Dora estava fora de casa cuidando da vida... É banco, armazém, compra isso, paga aquilo... E o pobre do neto “abandonado” na porta da escolinha... Aí, Dora se lembra de alguma coisa... Do neto... Se manda para a escola, toda preocupada... Lá chegando em vez de encontrar o neto aos prantos, apavorado, tá lá o carinha no maior papo, falando pelos cotovelos, joelhos e até pela boca com uma professora que o acompanhava... A avó nem teve tempo para pedir as tradicionais desculpas, já que com sua chegada a autoridade do neto aumentou muito, e sem mais delongas e nenhuma pergunta, com a maior cara de pau, cheio de razão, Victor explicou: – OLHA VÓ, EU QUERIA IR EMBORA, MAS TIVE QUE FICAR PRA CUIDAR DA TIA... VICTOR ENZO FERNANDES GERMANI PAIS Juliana / Rodrigo Germani AVÓS PATERNOS Hercília / Erasmo Germani AVÓS MATERNOS Dora / Décio Fernandes Reis Corações – Juquinha – pergunta a professora –, quantos corações nós temos? – Dois, professora: o seu e o meu. 98 Essas crianças... Osvaldo Reis PAI VIGARISTA Pertinho de Maringá, em Mandaguari, vivia o casal Vera e Valdir, de cuja união nasceu Bruno, com cinco anos de idade, o carinha, pela historia a seguir, de bobo não tem nem o jeito de andar... Seguinte, tempo desses, o pai precisava fazer alguma coisa: reforma, sabe-se lá o quê na casa. O pessoal deixou próximo à entrada um monte de lajotas. Reforma que nunca iniciava e a mãe do jovem sempre cutucando o pai para que fizesse logo o serviço ou no mínimo, tirasse aqueles “troços” da frente da casa. O pai viu a solução no filho: – Filhão, se colocar essas lajotas lá no fundo, eu te dou cinco reais... O garotão topou. O pai vai trabalhar e ele também. Levou tudo pro fundo, uma pilha bonitona. Noitezinha, o pai tá no boteco perto de casa. O filho vai ter com ele: – PAI EU JÁ COLOQUEI AS LAJOTA LÁ NO FUNDO. CADÊ O MEU DINHEIRO? O pai, talvez não acreditando no filho e querendo conferir o serviço contratado, disse a ele: – Em casa eu te dou os “cincão” combinados... O filho de imediato volta pra casa. O pai ao retornar encontra as lajotas no mesmo lugar, e o filho morto de cansado. Ele quer saber o que estava acontecendo: – Ué, filho, você voltou as lajotas pro mesmo lugar? A resposta, na lata, deixa o velho numa baita sinuca de bico: – CLARO, VOCÊ NÃO ME PAGOU... BRUNO SEMENSATO PAIS Vera / Valdir Semensato PATERNOS Aparecida / Valdemar Semensato AVÓS MATERNOS Mercedes / Bruno Manuzzi 99 Essas crianças... Osvaldo Reis A ENSINAGEM... Débora está no prézinho e tem entre três e quatro anos de idade. Com a mãe Josefa fora de casa, Moisés, um pouco mais velho, se sente o rei da cocada e quer porque quer dar ordens para a irmãzinha. Débora está compenetrada fazendo a tarefa que a tia passou. Moisés ensinando, isto é, perturbando: isso não é assim, é assim, e dá-lhe encher os picuás da pobrezinha. Débora está prestes a explodir com a sacanagem do irmão. Reclamou umas trocentas vezes: – PÁRA, MOISÉS! EU VOU CONTÁ PRA MÃE E A MÃE VAI TE BATER... e patati, patatá... Moisés, nem aí, apesar da ameaça de a mãe lhe dar um chega pra lá, continuava a perturbar Débora. Aí a gatinha tem uma tirada genial, e aos berros, silencia o irmão-professor: – PÁRA MOISÉS!!! PÁRA QUE EU NÃO PRECISO DE SUA ENSINANÇA!!! DÉBORA BARROS DE SOUZA PAIS Josefa / José de Souza AVÓS MATERNOS Clarice / Antônio Damásio Pereira AVÓS PATERNOS Maria / José Barros de Souza 100 Essas crianças... Osvaldo Reis QUE SACO DE MENINA!!! O casal Claudete/Antônio Schiavon tem três filhas: Clacieli, a mais velha; Gláucia, a do meio e a caçula Cinthia, conseqüentemente o xodó da casa, isto é, dos pais. Já as duas maiores morrem de inveja da menorzinha. E pra piorar ainda mais a coisa, Cinthia ganhou um “trenzinho” daqueles em que se coloca na cintura e o “bicho” toca uma fita cassete, nome pomposo, americano, walkmen, ou coisa parecida. O ódio ficou ainda maior. E a caçulinha contribuía decisivamente para isso já que desfilava na frente das duas com tal aparelho grudado na cintura como se fosse a Gisele Bündchen, toda “inzibida”, fazendo os cotovelos das duas aumentarem a olhos vistos, não cabendo mais de tanto inchaço... Mas as duas acabaram encontrando um jeito de se vingarem da irmã “metida”: cada vez que Cinthia passava por perto, elas aumentavam o volume da coisa, o que fazia a gatinha endoidar, ficar maluca de raiva, e quem “tá” por perto vira o muro de lamentações da egoísta “escutante”, que, com fone nos ouvidos, não dividia com ninguém o som emitido pelo mencionado aparelho... Um belo dia a história se repetiu, só que em proporções alarmantes, o som foi aumentado em demasia ferindo as “oreia” de Cinthia, fazendo-a apelar para a genitora em altos brados: – Ô MÃE, A GLÁUCIA VAI ACABAR ARREBENTANDO MEUS TESTÍCULOS!!!! CLACIELI SIMÕES SCHIAVON GLÁUCIA SIMÕES SCHIAVON CINTHIA PRISCILA SCHIAVON PAIS Claudete / Antônio Schiavon AVÓS MATERNOS Maria Augusta / José Miguel Simões PATERNOS Irene / Izaltino Schiavon 101 Essas crianças... Osvaldo Reis NÃO ERA PA COMÊ... Dalva é confeiteira de mão cheia e esse tipo de profissional adora trocar receita. Um dia, não trocou, recebeu de uma freguesa da loja onde trabalhava na época. Dalva endoida e quer fazer logo o doce para o filhote Pedro, então com sete anos. Ela se manda pra casa, onde além dela e Pedro, também morava sua mãe. Lá chegando nem troca roupa e começa a preparar a guloseima. Pedro quer saber: – MÃE, O QUE É ISTO? Dalva, sem maiores detalhes, responde: – É pavê. Pedro se cala e fica por ali vendo a mãe trabalhando. Dia seguinte, Pedro vai para a escola e Dalva ao trabalho. A mãe de Dalva, a avó Maria, não era muito chegada em doce... Após o expediente, como de costume, Dalva volta pra casa. Abre a geladeira e tá lá o doce inteirinho, de tão bonito parecia até estar olhando pra ela... Dalva fica intrigada e quer saber do obediente Pedro: – Por que você não comeu do doce que a mamãe fez pra você e pra vovó? A resposta vem na bucha: – A SENHORA DISSE QUE ERA PA VÊ!!! PEDRO CAETANO MÃE Dalva Caetano AVÓS MATERNOS Maria / Francisco Caetano 102 Essas crianças... Osvaldo Reis O CAMINHÃO DE CONSERTAR ESCURO... Tempos atrás em Maringá, bastava trovejar que a energia pifava, escafedia. E dá-lhe breu. Era um problema bem democrático, atingia ricos e pobres, sobrava pra todo mundo. No bairro Aeroporto, no esplendor de seus cinco anos, o irmão da Vanessa, Vinícius, vivia com os pais Luzia e Edson Lima, onde a coisa não era diferente. Era um tal de apaga e acende que se repetia, no mínimo, duas vezes por semana. Com o natural interesse de uma criança de sua idade, Vinícius acompanhava o drama observando atentamente a movimentação ocorrida logo após a energia “tomar doril” isto é, o correcorre do pessoal da Companhia Paranaense de Energia Elétrica (COPEL), para resolver, mesmo que momentaneamente, o crucial problema... Num determinado dia, com Vinícius já especialista em apagão, após mais uma queda de energia, o garoto corre pra fora e na volta tranqüiliza todo mundo: – PAI, JÁ TÁ CHEGANDO O CAMINHÃO DE CONSERTAR ESCURO!!! MARCOS VINÍCIUS LANDI DE LIMA VANESSA KARLA LIMA PAIS Luzia / Edson Lima AVÓ MATERNA Hélcia Oliveira AVÓS PATERNOS Antônia / Menezes Lima 103 Essas crianças... Osvaldo Reis VÁ PRA... Perto de criança é complicado falar certas coisas, mas de vez em quando, escapa. Em briga, como ensinava Dolores Duran, a gente diz coisas que não quer dizer, coisas impensadas. Criança “pesca”, já que apesar de aparentemente não estar nem aí, suas antenas estão sempre ligadas. A história contada pelo escritor MÁRIO PRATA, no Programa do Jô, tempo desses, confirma a afirmação. É o seguinte, diz Mário ao robusto e criativo Jô: Minha irmã precisava ir a um lugar muito longe do centro de São Paulo, e com ela a tiracolo, foi sua filha de quatro anos. O ônibus, em razão da estrada em grande parte não ser asfaltada, não era nenhuma “Brastemp”; estava caindo aos pedaços. Depois de marchas e contramarchas, finalmente chegam ao lugar. Era um lugarzinho feio. E põe feio nisso! Era esgoto a céu aberto, animais mortos em plena rua, gente brigando, “peixeira” comendo e a garota observando tudo no maior silêncio, até que em dado momento esse silêncio foi rompido com uma pergunta que, em sua inocência, representava o quadro: – MÃE, É AQUI QUE É A PUTA QUE PARIU??? SE A VIDA LHE DER UM LIMÃO... I Esta história é oriunda de correspondência recebida de ANTÔNIO ARAÚJO COSTA, residente em Paiçandu (PR), cujo conteúdo transcrevemos “ipsis literis”: “Sou deficiente físico, não tenho nem mãos nem pés. Meus braços vão até o cotovelo e minhas pernas até o joelho. Sou baixinho...” Certa vez, eu e minha irmã estávamos caminhando na cidade de Tapejara quando encontramos uma garotinha que tinha lá por volta de quatro anos, que ficou me olhando e depois perguntou: – VOCÊ NASCEU ASSIM? A minha resposta: – Sim, eu nasci assim... A outra pergunta da garota me deixou dando risada: – MAS DE BOTINHA TAMBÉM ??? SE A VIDA LHE DER UM LIMÃO... II Eu passeava pela cidade de Paiçandu, onde moro. De repente encontrei um garoto, de lá dos seus cinco anos, que eu nunca tinha visto antes, que parou, ficou me olhando e disse: – EU CONHEÇO VOCÊ! Surpreso eu quis saber: – Quem sou eu então? Aí eu descobri que era famoso, só que não sabia, o garoto é que me explicou: – VOCÊ É UM ANÃOZINHO DO FILME “BRANCA DE NEVE E OS SETE ANÕES”!!! 104 Essas crianças... Osvaldo Reis VINGANÇA... Arlene Lima por muitos anos dirigiu o Lar Betânia, uma instituição que acolhe meninos e meninas de rua e além de lhes oferecer teto e comida, ajuda a mostrar-lhes o caminho. Arlene tratava as crianças como se fossem filhos, brincava, jogava futebol, ensinava a trabalhar, estudar, puxava as orelhas. Mãe de verdade. É Arlene quem faz as campanhas que mantém a entidade, cujos resultados ajudam a não faltar quase nada, em termos materiais. Entre as tantas tarefas de Arlene junto ao Lar, a que mais a preocupava, certamente, era a falta do pão nosso de cada dia... Justificando isso, num terreno perto da casa juntou a meninada e lá plantou uma roça de feijão. E até que colheram bastante, mas a chuva em excesso impedia que o produto fosse descascado, o que só pode ser feito com o cereal muito seco. Era um sem-fim de colocar o feijão no sol e tirar por causa da chuva... E o tal feijão não podia nunca ser debulhado. Até que um belo dia sai um solzão. Arlene reúne seu exército e dá a cada um deles um pedaço de pau, lembrando um cabo de vassoura e explica que devem bater no monte de feijão para que os grãos se soltem da casca. O trabalho começa, só que a criançada estava muito desanimada. Arlene usa a cabeça, chama seus filhos e orienta: – Vocês vão bater como se estivessem batendo numa pessoa que vocês odeiam. Dito e feito. Cada um tinha lá seus motivos. E o pau corria solto... Todo mundo botando pra fora seus tantos “ódios”. Um garoto (Maurício) se excedia na força e na rapidez com que descia a madeira no pobre do feijão. Arlene quis saber o motivo pelo qual ele batia com tanta violência, e chegou a pensar que o garotão estava batendo nas pessoas que o abandonaram. Coisa absolutamente normal, mas em verdade, o motivo era outro: – EU TÔ BATENDO NA SENHORA... EU NÃO GOSTEI DESSE NEGÓCIO DE COLHER FEIJÃO, NÃO... 105 Essas crianças... Osvaldo Reis ESSA É DAQUELAS, MÃE??? Arlene Lima, com a filha a tiracolo, está fazendo visitas. Chegam numa casa muito humilde e as pessoas quanto mais humildes mais generosas são. A filhota de Arlene, Priscila, entre seus três a quatro anos, observa tudo, como faz toda criança. Lá pelas tantas a dona de casa oferece às visitantes café e pão. Arlene não teve tempo nem de piscar quando viu a filhota pedir à bondosa senhora: – EU QUERO MANTEIGA... – Não tem. Responde a senhora. – ENTÃO ME DÁ MEL. Repete a garota. – Também não tem... – PODE SER GELÉIA. Insiste a gatinha. A dona da casa volta a repetir o de sempre: não tem. Arlene fica vermelha de vergonha da atitude da filha. Ao saírem daquela casa, mais que depressa, Arlene orienta a filhota: - Filha, quando alguém te oferecer apenas café e pão, é porque só tem café e pão, se tivesse outras coisas, ela trazia junto. É gente pobre, gente que não tem nada em casa... A garotinha ouviu tudo com muita atenção, nem perguntas fez. Alguns dias depois Arlene e a filhota estão visitando outras casas, e, como de costume, são muito bem recebidas. Numa dessas casas, lhes é oferecido café. Somente café. A garotinha, lembrando o pito anterior, evita o desconforto da mãe sofrido na outra casa. Não pede nada para a moradora, mas pergunta para a mãe em alto e bom tom: – MÃE, ESSA AQUI TAMBÉM É DAQUELAS PESSOAS BEM POBRINHAS QUE NÃO TEM NADA EM CASA?????? PRISCILIA JUSTUS PAIS Arlene / Airton Justus AVÓS MATERNOS Helena / Ary de Lima AVÓS PATERNOS Emília / Otto Justus Alguma dúvida? A professora para o Juquinha: – Juquinha, diga cinco alimentos que contém leite. – Cinco vacas, professora. 106 Essas crianças... Osvaldo Reis A TRAVESSIA DO MAR VERMELHO Justino Farias é membro da Igreja Evangélica Testemunhas de Jeová, em Brasília, onde ensina, com fervor, lições bíblicas aos filhos menores: Quésia, Ricardo e Reginaldo; além, claro, dos outros meninos e meninas da igreja. Reginaldo está com quatro anos. O professor-pai fala sobre a passagem do mar Vermelho. Falou, ilustrou, esclareceu e todo mundo (ou quase...) aprendeu. O dedicado mestre quer então saber dos “afiados” alunos: – O que é que aconteceu quando Moisés bateu com a vara nas águas do mar? Ninguém se coçou. Aí Reginaldo mandou ver: – OLHA PAI, QUANDO MOISÉS VIU QUE OS ISRAELITAS NÃO TINHAM POR ONDE PASSAR, ENCURRALADOS, BATEU COM A VARA NA ÁGUA E O MAR SE ABRIU... Mas, segundo o raciocínio do garoto a batida foi muito forte e acabou acordando um bichinho, que descansando, não gostou de ser incomodado... Se não fosse a surra inesquecível que levou, sua conclusão teria sido deveras sábia: – AÍ SAIU UM JACAREZÃO DESSE TAMANHO E COMEU TODO MUNDO! O retrato Dele Uma garotinha, na creche, estava compenetrada desenhando. A professora passa por perto e quer saber: – Carol, o que é que você está desenhando? – Estou desenhando Deus, responde Carol. A professora parou e disse: – Mas ninguém sabe como é Deus... Sem tirar os olhos do desenho, nem piscar a garotinha mandou ver: – DENTRO DE UM MINUTO SABERÃO... 107 Essas crianças... Osvaldo Reis BAILE DA INJEÇÃO Os pais Nina e Luiz gostavam muito de passear e nessas horas “abandonavam” o filhote Elton Luiz, então com quatro anos, deixando-o com a vovó, e “enrolavam” o sujeitinho dizendo que iam à farmácia tomar injeção. De tanta injeção, o filhote começou a desconfiar e também a se preocupar com a saúde dos pais; afinal era muito médico, muita farmácia, injeção quase todos os dias. Criança, quase sempre, se finge de morto... Um dia, acometida pela doença de sempre, a mãe conversa com o filhão e explica-lhe do constante problema e as tradicionais desculpas, aliás, esfarrapadas. O diálogo deixa a mãe na maior saia justa e o pai com um risinho “besta” nos lábios: – Filho, você fica com a vovó que o papai e a mamãe vão... A mãe não teve nem tempo de concluir a frase. Elton, muito sério, a interrompeu e afirmou: – JÁ SEI, JÁ SEI, VOCÊ VAI TOMÁ INJEÇÃO LÁ NO CLUBE!!! INGRATIDÃO... César, com seus três anos de idade anda fazendo birra do tamanho do mundo. Nada dá jeito na “bravura” do meninão. A mãe tenta de toda maneira dar um jeito no berreiro do filhote (o pai, como sempre, quando acontecem essas coisas, está fora). É um tal de toma isso, olha aquilo, olha que bonitinho, toma o apito, a bola, e nada de o menino se acalmar. A mãe, como sempre, “descobre” uma solução: entregou ao “chorante incontido” o álbum de casamento - e não é que a coisa deu certo? O garoto parou de 108 Essas crianças... Osvaldo Reis chorar na hora. A mãe, aliviada, continuou com seus afazeres. Mas de repente, a todo vapor, choro estridente, o filho ataca novamente e com razão, diga-se de passagem: na foto, pai e mãe sorrindo felizes, como se estivessem ganho (sozinhos) na loteria esportiva... César fica indignado com a cena. A mãe quer saber: – O que foi que aconteceu, meu filho? – VOCÊ E PAPAI NESSA FESTONA E NÃO ME LEVARAM... E aumentou o volume... ELTON LUIZ BASSOLI CÉSAR RICARDO BASSOLI PAIS Nina / Luiz Bassoli AVÓS MATERNOS Maria Penha / Jazão Silva AVÓS PATERNOS Maria da Glória / Mário Orlando Bassoli – Zezinho, seja específico e me diga o que é molécula... E ele, com ar científico: – É uma guria “sapécula”... Joaquim Carlos 109 Essas crianças... Osvaldo Reis O “DESCONHECIDO” PAPAI NOEL... Não gosto, repito, de me incluir nas histórias que conto. Mas que fazer, se esta aconteceu comigo? A metade dos nomes masculinos iniciados pela letra R (Ricardo, Renato, Roberto...) está na família da Astrid e do Amélio. Rafael, um dos “erres” era o mais novinho de todos, tava começando a falar, e uma particularidade: era mais folgado que pente de careca, isto é, não saía do colo da mãe. O abestado aqui se fantasiava de Papai Noel, que os “sabidões” dos adultos falam para as “bobonas” das crianças que vem da Lapônia (fica logo depois de Marialva, entrando à esquerda), e as pobrezinhas e inocentes acreditam (ou quase...). A história a seguir, sem os tantos “quases”, que no mínimo, significa não sei direito, não confirma tal teoria. Esclareço (ou tento; cansei do “quase”). Era época de Natal, lá por 22, 23 de dezembro, o ano só Deus sabe. Só sei que o enfocado Rafael apenas balbuciava algumas palavras... Chego à casa da Dora e do Décio, lógico, sem a vestimenta vermelha e aquela barba branca (que coça pra burro) do bom velhinho. Astrid, com o filhote no colo, desce para abrir a porta pro imbecil já citado. O caçulinha dorme à sono solto. Após os cumprimentos de praxe, começa o papo. Conversa vai, conversa vem, uma risada um pouco mais alta, desperta (mais ou menos) o dorminhoco Rafael. O sujeitinho, com um olho aberto e outro meio fechado (?), dá uma olhada na minha cara e manda ver: – ÔI, PAPAI NOEL... MACHISMO OCULTO ! O casal Astrid e Amélio tem quatro garotos, aqueles dos erres: Ricardo, Renato, Roberto e Rafael. O “coroa” é Ricardo, Renato e Roberto, no meio, Rafael, o caçula. O casal recebe a visita de um amigo. Conversa vai, conversa vem, garotada brincando, estudando, sem participar efetivamente do bate-papo. Sabe aquela hora em que o 110 Essas crianças... Osvaldo Reis assunto desaparece? Aí, vem aquele tradicional vai chover, tá frio e coisa e tal... Criançada nem aí com a prosa dos velhos... Rafael, o mais novinho, num desses momentos que o assunto tinha se escafedido, é questionado pelo visitante, que quer saber do xodó da mãe (depois dos outros três...): – Escuta, Rafael, quer dizer que na sua casa são quatro homens? O espírito de justiça mistura-se com o dever de defender a honra da casa, e principalmente do genitor quase ofendido embora não intencionalmente. Rafael estufa o peito, cheio de orgulho, e só com uma pequena dose de machismo responde, na bucha: – NÃO, É CINCO... O MEU PAI TAMBÉM É!!! RICARDO TUPAN RUY RENATO TUPAN RUY ROBERTO TUPAN RUY RAFAEL TUPAN RUY PAIS Astrid / Amélio Ruy AVÓS MATERNOS Levi / Icléia Aguiar Tupan AVÓS PATERNOS Fiorentina (Dona Nêga) / Rui Cesare Fuga Com três anos já sabia reagir como homem ao impacto das grandes injustiças paternas. Não estava fazendo barulho: estava só empurrando uma cadeira. – Pois então pára de empurrar a cadeira. – Eu vou embora. Foi a resposta. Distraído, o pai não reparou que juntava ação às palavras, no ato de juntar do chão suas coisinhas, enrolando-as num pedaço de pano. Era a sua bagagem: um caminhão de madeira com apenas três rodas, um resto de biscoito, uma chave (onde diabo meteram a chave da dispensa? – a mãe mais tarde irá dizer), metade de uma tesourinha enferrujada, sua única arma para a grande aventura, um botão amarrado num barbante. A calma que baixou então na sala era vagamente inquietante. De repente o pai olhou ao redor e não viu o menino. .......................................................................................................................... Correu até a esquina e teve tempo de vê-lo ao longe, caminhando cabisbaixo ao longo do muro. A trouxa, arrastada ao chão, ia deixando pelo caminho alguns de seus pertences: o botão, o pedaço de biscoito e – saíra de casa prevenido – uma moeda de 1 cruzeiro. Fernando Sabino (”Fuga”, de “Quadrante”) 111 Essas crianças... Osvaldo Reis SEM JANTAR... A irmã do Éttore, a Isabela, estava na escolinha e eram convites e mais convites para festinhas em casas de coleguinhas. As mães, nem sempre se conhecem; assim, a mãe de Isabela levava os filhotes e depois ia buscá-los. Um dia recebe um convite para uma festa que seria num domingo... A vizinha Rosemeire Pastor pede para que sua gatinha, amiga dos filhos de Majô, fique com ela, já que iria sair. Assim sendo, Paola deveria ir também à festinha. Majô estava enjoada de ver os filhos irem a um montão de festas e chegarem em casa e pedir pra mãe fazer janta... Naquele domingo a mãe resolve dar um basta na situação. Onde é que já se viu ir numa festa e voltar pra casa, encontrando a mãe cansada do dia-a-dia de tantas preocupações e afazeres, e ter ainda que fazer comida para quem chegou de uma festa? Assim pensando, Majô, antes de sair de casa, reuniu a prole mais Paola e recomendou: – Crianças, toda vez que vocês vão a alguma festa, ficam só correndo, pulando, brincando e não comem nada e quando chegam em casa eu tenho de fazer comida pra vocês. Podem brincar, pular, mas tratem de comer... Todo mundo entendeu o recado, inclusive Paola. Como era domingo e a festa era numa chácara que ficava longe, Majô também ficou por lá. Procurou uma mesa, sentou-se, sozinha, já que não conhecia ninguém. Em seguida, vem sentar-se com ela uma senhora que se apresentou como mãe da aniversariante. Era uma pessoa muito elegante e também muito simpática o que propiciou que Majô ficasse (quase) à vontade. As duas estão ali na maior prosa, conversavam sobre tudo, estavam realmente se entendendo... A criançada brincando, se divertindo, pulando, correndo... Aí Paola, com um punhado de salgadinhos nas mãos, mostra a guloseima para Majô, que pela fala da menina deve ter se transformado num arcoíris, ficando vermelha, azul, roxa, tal foi a saia justa em que a gatinha a deixou quando, bem alto, anunciou: – TIA, VOCÊ FALOU QUE ERA PRA APROVEITAR E COMER, QUE NÃO IA TER JANTA... Ó, EU TÔ COMENDO BASTANTE, VIU???????? ISABELA GIOVANA ÉTTORE TIAGO PAIS Majô Baptistoni / Altamir Cardoso AVÓS MATERNOS Elizabeth / Ângelo Baptistoni AVÓS PATERNOS Diva / Erato Cardoso 112 Essas crianças... Osvaldo Reis “VIDENTES” Mamãe Olga passava pelo Rio de Janeiro acompanhada de seus pais Dimaura e João e as filhotas Ana Carla de oito, e Isabela com dois anos. Olga mostrava a cidade e fazia também comentários: aqui é isso, ali aquilo, lá a praia tal, o Maracanã e coisas do gênero. Aí passam em frente ao mais belo cartão-postal da (ainda) Cidade Maravilhosa: o Cristo Redentor. A mãe, que já o conhecia de longa data, diminui a velocidade, e, didática, aponta o belíssimo monumento e informa às gatinhas: – Aqui está o Cristo Redentor... Os olhos das meninas enchem-se de brilho em razão da beleza da estátua, um conjunto maravilhoso, onde arte e fé misturam-se na mais perfeita harmonia. Uma obra realmente encantadora. A viagem prossegue. Dias depois retornam. Uma garoa daquelas (daquelas mesmo!) envolve a cidade. Não dava pra enxergar absolutamente (quase) nada – a velocidade era de, no máximo, 5 km por hora – coisa feia de verdade. Passando pelo local em que suas gatinhas mais gostaram, Olga, tristemente, lamenta: – Que pena, filhas, não dá pra gente ver o Cristo Redentor... Pena pra ela, pras filhas nem tanto. Ato contínuo, Ana Carla, a maior, encosta os olhos no vidro lateral do carro e tasca: – EU TÔ VENDO O CRISTO... Isabela, a miudinha, como de costume, não quer, de jeito nenhum, “perder” pra outra: encosta o nariz no vidro, estica os olhos, “presta mais atenção” que a irmã e manda ver: – EU TÔ VENDO O CRISTO... A MARIA E O JOSÉ!!! ANA CARLA AGULHON ISABELA AGULHON MÃE Olga Agulhon AVÓS MATERNOS Dimaura / João Agulhon 113 Essas crianças... Osvaldo Reis OBEDIÊNCIA CEGA... Essa aqui é bem recente. A protagonista Camila está (ainda) com quatro anos, vive com os pais numa casa térrea, onde é mais fácil para os transeuntes conversarem com os moradores. Nos apartamentos é bem mais difícil já que nos prédios, quase sempre, têm vigias, porteiros, guardas, é complicado chegar, no máximo se consegue falar via interfone... É o seguinte, assim que surgiram os tais produtos de R$ 1,99, uma senhora, provavelmente moradora da região onde vivia Camila, pelo menos uma vez por semana, visitava sua casa oferecendo tais produtos. E não vinha sozinha, estavam sempre em sua companhia, alguns cachorros que acabavam por sujar a área da casa, pois não tinham “nenhuma educação”... A mãe da Camila (e até ela) conhecia a dita vendedora.... Um belo dia, a mãe, com serviço até o pescoço, ouve, lá do portão, palmas... A mãe fala com seus botões e também com Camila: – Vender essas porcarias, tudo bem, mas trazer essa cachorrada sarnenta, isso não... Camila vai atender até o portão e repete para a atônita vendedora de R$ 1,99 tudo o que a mãe havia dito, e pra complicar (só um pouquinho) mais a situação, lá do portão, com a tal senhora ainda por ali, grita para a genitora: – MÃE, EU FALEI, VIU?????????? CAMILA DE OLIVEIRA PAIS Maria de Lourdes / Paulo Sérgio de Oliveira AVÓS MATERNOS Maria Conceição / Valdemar Marinho Gonçalves 114 AVÓS PATERNOS Elvira / Severino de Oliveira Essas crianças... Osvaldo Reis CANIBALISMO MATERNO... Essa aqui é famosa, já saiu até na televisão, embora com final diferente. A piada foi contada e interpretada no Programa Zorra Total, da Globo. Seguinte... Ayres Júnior, o primeiro filhote do casal Mara e Ayres, ainda nem fala direito. Incrível, deve ser coisa “patológica” - o sujeitinho gostava de água - de tomar banho, um montão de criança com a mesma idade, nem tanto. Já fazia um tempão que a mãe dava banho no rebento e a temperatura da água, sais, carinho de mãe e coisa e tal, não deixava Juninho, por nada no mundo, sair da banheirinha. A mãe pensa pra lá, pensa pra cá, promete uma coisa, oferece outra e nada, o jovenzinho continuava firme em seu “aquático” deleite. Aí a mãe, após ter recorrido a tantos truques e argumentos vãos, lembrou-se de um objeto “secante”, presente da avó, que ele não conhecia. A mãe bateu um papo com seus botões: “agora ele não resiste, vai ser tiro e queda”. Avó é coisa envolvente, é mãe com açúcar... A mãe mostra o citado objeto ao filhote e tenta convencê-lo: – Filhinho, tá vendo essa toalha de cachorrinho? É um presente da vovó pra você. Mamãe quer enxugar você com ela. O garotão não conhecia, não lembrava, não havia sido apresentado a tal toalha achou até que a mãe estava pregando uma peça nele, quer conhecer maiores detalhes e pergunta-lhe: – QUANDO FOI? A mãe, orgulhosa, aponta para a barriga e diz: – Você ainda estava aqui... A pergunta do filhote deixa a mãe numa baita saia justa: – NOSSA, MÃE, VOCÊ MI INGULIU???? AYRES AUGUSTO GONÇALVES JÚNIOR (Juninho) PAIS Mara Rolim / Ayres Augusto Gonçalves AVÓS PATERNOS Margarida / Antônio Gonçalves AVÓS MATERNOS Janet / Hamilton Rolim 115 Essas crianças... Osvaldo Reis SE O SANTO FALHAR... Renan Felipe, três anos, paranaense e bom de papo, é primo de Larissa, e como sua priminha, até seu dedão do pé esquerdo é católico. Felipe adorava dormir sempre por perto da avó, cujo colo todo mundo diz ser muito macio e sua bisa não era diferente das outras, nem no carinho, nem no colinho... O garotão acreditava muito no “pessoal lá de cima” mas também botava fé em alguém como ele, de carne e osso... É o seguinte: toda noite o menino rezava pra dormir, aquela oração que todo mundo conhece e a criançada adora. É uma palavra que rima com a outra e fica fácil decorar e também aprender. A dele, no entanto, tinha uma linhazinha a mais, mas não alterava nada seu conteúdo, e com certeza, Deus e os demais espíritos citados não ficavam bravos nem um pouquinho... Sem mais delongas, eis a reza do Renan Felipe, repetida todas as noites: – “COM DEUS ME DEITO, COM DEUS ME LEVANTO, COM A VIRGEM MARIA E O ESPÍRITO SANTO... E A VÓ SANTANA LÁ NO CANTO”... RENAN FELIPE GONÇALVES PAIS Mara Rolim / Ayres Augusto Gonçalves AVÓS PATERNOS Margarida / Antônio Gonçalves AVÓS MATERNOS Janet / Hamilton Rolim 116 Essas crianças... Osvaldo Reis DÚVIDA CELESTIAL... Essa mocinha tem dois anos e oito meses. É de Laguna, Santa Catarina, e como sua família, é católica até a medula. Toda noite, sempre com a mãe do lado, reza para dormir. Mas naquela noite, alguma coisa estava acontecendo em sua cabecinha... As rezas eram as de sempre: “Santo anjo do Senhor, meu zeloso guardador”... “Com Deus me deito, com Deus me levanto”... Mas tão novinha, inocente, sem pecado e por conta própria resolveu economizar, afinal; a seu ver, não precisa tanta reza. Aí, antes de deitar-se, Larissa resolve, com seu sotaque característico e pronúncia correta, deixar a mãe numa baita saia justa quando pergunta a ela: – MAMÃE, O QUE É QUE TU ACHAS? COM DEUS ME DEITO, OU COM SANTO ANJO????? LARISSA ROLIM BORGES PAIS Janete / Antônio Rogério Rolim Borges AVÓS MATERNOS Janet / Hamilton Sem combustível Dois garotinhos estão juntos. Um pára, aponta o alto e mostra ao outro o que vira: Um helicóptero totalmente parado no ar. O outro olha e pergunta: – Ué, porque será que ele tá parado no ar? – Deve ter acabado a gasolina... 117 Essas crianças... Osvaldo Reis A SERPENTE ENCEGUECIDA... Thiago estudava numa escolinha em Maringá e como era época de aniversário da cidade, sua professora mandou que ele fizesse um desenho mostrando, na sua ótica, a cidade. Com seus quatro anos incompletos, resolveu pedir ajuda à mãe. A mãe do jovenzinho explicou-lhe que em Maringá tem a catedral, o Parque do Ingá, muitas árvores, flores, etc. Thiago entendeu tudo direitinho e mandou bala. Fez o desenho. Fizera seu trabalho como lhe dissera a mãe: catedral, Parque do Ingá, árvores, flores e uma cobra... Uma cobra-cega. A mãe pergunta o que o filhote havia desenhado e o garoto explica: – AQUI É A CATEDRAL, AQUI O PARQUE DO INGÁ, ESTAS SÃO ÁRVORES, AQUI SÃO FLORES E AQUI UMA COBRA-CEGA... A mãe, achando que alguma coisa estava destoando, que seu Portinari não havia feito um desenho perfeito, pergunta: – Thiago, “isso” aqui você falou que era uma cobra; mas cadê os olhos? A mãe deve ter se arrependido de ter feito tal pergunta: – Ê, MÃE, EU NÃO TÔ FALANDO QUE É UMA COBRA-CEGA!!!! THIAGO DA SILVA CONZAGA PAIS Lucilene Alexandra / Leiva Aparecido Gonzaga AVÓS PATERNOS Terezinha / Luiz Gonzaga AVÓS MATERNOS Orides / Nelson Lopes da Silva 118 Essas crianças... Osvaldo Reis SUOR DUVIDOSO... João Victor, filhote mais velho da Laide e do Altair, está beirando os quatro anos, tá na escolinha, é muito ativo e não menos sapeca. Está naquela idade em que a criança, principalmente, caso dele, do sexo masculino, já tem uma certa vergonha de “desaguar” na cama. Com o irmão mais velho da Graziele, dia, ou melhor, noite dessas, a coisa aconteceu e, lençol, cama, colchão, cobertores, tudo virou uma sopa só. Na manhã seguinte a mãe, ao acordá-lo, censura o filhote: – Nossa, filho, você fez xixi na cama? João Victor jurou inocência e acabou “convencendo” a mãe com um argumento irrefutável: – NÃO FOI XIXI, NÃO, MAMÃE... EU É QUE SUEI NA PARTE DE BAIXO... SUEI MUITO!!!! JOÃO VICTOR DE SOUZA ANDRADE GRAZIELE DE SOUZA ANDRADE PAIS Laide / Altair Andrade AVÓS PATERNOS Arelina / José Eufrásio AVÓS MATERNOS Maria de Souza / José Miguel Ligeirinho... Na sala de espera da clínica pediátrica: – Esses filhos da senhora formam um belo par de gêmeos! – É não, minha senhora. É só um filho que eu tenho. Mas muito inquieto. 119 Essas crianças... Osvaldo Reis “VIAJANDO”... O Manoel e a Dalva têm três filhotes: o Elton, a Wanessa e a Márcia. A Márcia tem por volta de três anos, a mesma idade da prima Camila com quem adora brincar... Brincam de tudo. Brinquedo pra lá, brinquedo pra cá, amarelinha, boneca etc. Como elas brincam muito, um dia o estoque de brinquedo acabou. Pensam que pensam e nada de “achar” um brinquedo. Aí, a cabecinha da Márcia resolveu funcionar e a criar uma “combona”, lógico, imaginária, com a qual resolveu dar uma “carona” para Camila, e pergunta-lhe: – VAMOS BRINCAR DE ÓPTIO? Que diabo será isso? Pensa Camila e pede que Márcia esclareça. Márcia contou direitinho o que era. Camila compreendeu tudo e esclareceu, para risada geral dos pais e tios: – NÃO É OPTIO... É ÔMBIS!!! E as duas “viajaram”... ELTON SILVA WANESSA SILVA MÁRCIA SILVA PAIS Dalva / Manoel Alves da Silva A vida é alegria pura, desde que assim se inicie: - vicie seu filho em leitura, antes que a droga o vicie ! Osvaldo Reis 120 Essas crianças... Osvaldo Reis ANJO VAIDOSO O Augusto, com dois anos de idade, um dia resolveu tomar um chá de sumiço, misturado com doril, isto é, desapareceu mesmo. A mãe, já quase desesperada, acabou, muito tempo depois, encontrando o filhote escondido entre a máquina de lavar e a parede. Lembrando, quem sabe, os tempos da brilhantina, o garotão trazia nas mãos um pote de gel, já quase vazio e o mais interessante, ele não usava tal produto só no cabelo, seu corpo inteiro estava lambuzado. A mãe, já meio esquentada com o desaparecimento momentâneo, mas preocupante, resolve dar uma dura no filhão e quer saber: – Filho, por que é que você usou quase todo o pote de gel? A resposta imediata de Augusto mostrou que seu anjo da guarda devia achá-lo “feio”, ou sua mãe não iria bater em seu protetor: – FOI UM ANJINHO QUE MANDOU EU PASSAR BASTANTE PARA FICAR BONITO... AUGUSTO SIQUEIRA DE OLIVEIRA PAIS Ediclei / Valter Augusto de Oliveira AVÓS PATERNOS Mariana / Natalino Augusto de Oliveira AVÓS MATERNOS Maura / Enedino Leôncio Siqueira Lembrança escolar A professora está estimulando os alunos a comprar aquela tradicional fotografia da turma – inclusive com ela junto – e vem com um argumento irresistível: – Olha, daqui a vinte anos vocês vão olhar a foto e observar: A Catarina é médica, a Paula, professora, o Luiz Cláudio, jornalista... Lá do fundo da sala, uma vozinha joga um balde de água fria no negócio: – Ali está a professora... Coitada, já morreu... 121 Essas crianças... Osvaldo Reis UM LANCHE MUITO PESADO... O nome da gatinha é Sofia, linda que só, não tem ainda três anos... Um belo dia, a mocinha em companhia da mãe, voltava da escolinha pra casa, no caminho, sempre no mesmo lugar, um carrinho de lanches, aqui em Maringá, popularmente chamado de “carrinho de cachorrão”. Sofia quer saber da mãe o que é que tinha naquele “treco”. A mãe explica que era lanche e isto, aparentemente, satisfazia a curiosidade da filhota. A tarefa de levar e trazer Sofia à escolinha sempre coube à mãe, mas um dia ela teve de viajar e a coisa ficou por conta do pai. Passando em frente ao dito carrinho, a menina perguntou ao pai se podia comer um daqueles lanches. O atencioso pai disse que o lanche era muito pesado para ela. A resposta também parece ter agradado a pequena, já que naquele dia não perguntou mais nada. Dia seguinte com a mãe ainda viajando, novamente o pai foi buscar a filha na escola, e de novo passam em frente ao tal carrinho. De novo Sofia quer conhecer o tal lanche, mas praticamente não pediu, determinou ao “velho” que comprasse um lanche: – COMPRA UM LANCHE VOCÊ, PAI... VOCÊ É GRANDE E CONSEGUE LEVAR PRA CASA... O pai, intrigado, quer saber: – Mas por que é que eu posso levar o lanche pra casa? Sofia, lembrando o ensinamento de dias anteriores, esclareceu: – PORQUE É UM LANCHE MUITO PESADO!!! SOFIA FURLAN COSTA PAIS Maria Luiza / Célio Costa AVÓS PATERNOS Iolanda / Lourival Costa AVÓS MATERNOS Valdomira (Mira) / José Furlan 122 Essas crianças... Osvaldo Reis TEMPO PRA TUDO... A Raquel, uma garotinha linda e também muito simpática, nasceu no Japão, mas os avós vivem em Maringá, onde a garota há bem pouco tempo veio parar. Os japoneses, ao contrário de nós outros, levam muito a sério a questão da disciplina, e como diz ditado antigo: “é de pequenino que se desentorta o pepino” (ou é de menino?). Enfim, Raquel só tem cinco anos e o avô quer que a neta, desde cedo, aprenda a ter limites, a ter respeito por horário, disciplina em outras palavras. É hora de acordar, de almoçar, de ir pra escola, jantar, tomar café, banho, etc. Raquel, atenta, ouve o avô (que ela fala na língua japonesa: Ojii-Sam)... Raquel ainda não domina completamente a língua portuguesa, e de vez em quando mistura a com o, o com a, masculino com feminino, o que a faz ainda mais engraçada. Um belo dia, a gatinha quer saber do avô: – OJII-SAM, BICHO TAMBÉM TEM QUE FAZER TUDO NO HORA CERTA? O paciente e zeloso avô explica: – Não, bicho não precisa... Por falar em bicho, o avô de Raquel deve ter ficado com a pulga atrás da orelha com a próxima fala da gatinha, que pôs fim ao diálogo: – A OBA-SAM SILVIA DISSE QUE TÁ NA HORA DO ONÇA BEBER ÁGUA!!!!!! RAQUEL KAORI TANAHARA PAIS Neusa / Massaiko Tanahara AVÓS MATERNOS Shikeko / Hazime Yamamoto 123 Essas crianças... Osvaldo Reis TODA GATINHA TEM UM PAI QUE É UMA FERA... A Yumi, filhota do casal Juliana e Henrique, uma das nestas prediletas da avó Satico, tem por volta de três anos, mas escutando e prestando atenção em suas “tiradas” parece que a jovenzinha tem muito mais idade. Dias desses, por exemplo, Yumi está no elevador “assustando” todo mundo, quando, por repetidas vezes, anunciava em alto e bom tom: – O MEU PAI É MUITO BRAVO... Os presentes começaram a se perguntar o porquê dessas afirmações com tanta ênfase e também tantas vezes. Será que alguém ali teria feito alguma coisa que Yumi não gostou? Seria um recado? Seria um aviso? E assim, com todos intrigados, e pior, sob suspeita, a viagem prosseguia. Yumi contou também que tinha dois cachorros Poodol, a Vitória, com quase 10 centímetros de comprimento e o mesmo tanto em largura, e o Yuri, um pouco menor, mas mesmo assim assustador... Depois dos humanos da casa, esses dois são os xodós da menina... E com a tecla já um tanto quanto amassada de tanta repetição, tá lá a gatinha: – O MEU PAI É MUITO BRAVO... E o suspense continua... Termina a viagem, o elevador pára, todo mundo desce, uns saem apavorados sem sequer olhar para trás, mas nem todos têm o mesmo comportamento: um senhor aparentando demasiada valentia, vai ter com Yumi e, desafiante, indaga: – Que história é essa que seu pai é muito bravo??? Yumi, sem perder a pose, com aquela cara enfezada, põe fim ao mistério, esclarecendo a bravura do genitor: – A VITÓRIA LATE MUITO... O YURI TAMBÉM... É SÓ UM LATIR QUE O OUTRO LATE... E O MEU PAI FICA BRAVO! E, no mesmo tom inicial, volta a atacar: – O MEU PAI É MUITO BRAVO!... 124 Essas crianças... Osvaldo Reis EU NÃO SOU SUA ESCRAVA... A Yumi brinca com um copo de água que está sobre a mesa e a mãe pegando em seu pé, deixa a garota ainda mais à vontade para continuar com a brincadeira. Você sabe como é criança quando invoca com alguma coisa, quando é contrariada... Yumi continua brincando e a mãe ameaçando: – Você vai derrubar esse copo, vai derramar a água e daí... A bronca vai aumentando de acordo com a brincadeira, isto é, quanto mais bronca levava, mais “aprontava”... Até que não deu outra... A previsão de sua mãe se confirmou: o copo caiu e foi água pra todo lado, molhando mesa, pé de cadeira, chão e até seus cachorros que estavam por perto. A mãe, com sua incontestável autoridade, lembrando a filha de seus constantes avisos, cheia de razão mandou ver: – Eu não disse que você ia derramar essa água? Eu não disse.... Agora você vá lá pegue um pano e limpe tudo... Yumi não dá muita “bola”. A mãe insiste: – Limpe tudo e já... Yumi sentindo que a coisa ia engrossar, resolve, muito a contragosto, atender à mãe, antes retrucando: – VOCÊ NÃO TÁ VENDO QUE EU SOU CRIANÇA? Mesmo assim, sai em direção do armário a fim de apanhar o tal pano, pára no meio do caminho, vira-se para mamãe Juliana, e desafiante pergunta: – VOCÊ TÁ PENSANDO QUE SOU SUA EMPREGADA????????????? LUISA YUMI IKEDA OLIVEIRA PAIS Juliana / Henrique Sérgio de Oliveira AVÓS PATERNOS Raimunda / José Pedro de Oliveira AVÓS MATERNOS Satico / Mario Shin Iti Ikeda Ganhei, fessora! A professora fala sobre higiene, limpeza, banhos e essa coisas nem sempre muito apreciadas pelas crianças. Ela chama o Juquinha e pede para ele mostrar as mãos. Ele mostra a mão esquerda que está sujíssima. A professora aproveita a oportundade para uma lição. – Aposto que é essa é a mão mais suja da escola. – Perdeu, professora. Veja só a direita como está. 125 Essas crianças... Osvaldo Reis “IMPRENDÍVEL”... Marta está passeando de carro com a filhota Bárbara que tem entre quatro e cinco anos. A mãe notou que a filha não estava usando cinto de segurança... Criança tem um medo terrível de polícia, de guarda, enfim... Marta ao pedir à filha que coloque tal objeto, vale-se da figura policial para ajudá-la, e “ameaça” a filha: – Bárbara, coloque o cinto se não o guarda vai te prender. A resposta de Bárbara, com astúcia e conhecimento, fez a mãe descobrir a vocação da menina, que sem dúvida, vai ser advogada “grande”: – NÃO, MÃE, ISSO NÃO É DE PRENDER... ISSO SÓ É DE MULTAR!!! BÁRBARA MEDEIROS DARCIS PAIS Marta Medeiros / Agnaldo Darcis AVÓS MATERNOS Clarinda / Luiz Antônio Fanha AVÓS PATERNOS Antônia / Alcebíades Darcis O avô é o animal que o filho amansa para o neto montar. Felizardo Meneguetti (11 filhos, 25 netos e 03 bisnetos). 126 Essas crianças... Osvaldo Reis PERDEU O FREIO! O mestre Pedro Bloch, festejado autor de mais de uma centena de obras, com destaque para “As mãos de Eurídice”, “Dona Xepa”, “Criança diz Cada Uma...”, que ajudou a inspirar essas mal traçadas, ensinava que a criança normal quase sempre quebra o brinquedo. E é fácil entender, gosta tanto, brinca tanto, que acaba quebrando. Existem outros que quebram de “bravos” mesmo... Parece ser o caso de Roberto, que, com seus quatro anos, adorava quebrar seus brinquedos... Um belo dia, Robertinho ganhou de Roberto pai, um brinquedo eletrônico, provavelmente “made in Paraguai”, um carrinho, que o garotão subiu na mesa pra brincar. Lá pela segunda, terceira volta, o “bicho” despencou lá de cima da mesa e ficou paradinho, quietinho... Roberto pai não gostou nem um pouco e foi tirar satisfações com o filhote: – Filho, você já quebrou o carrinho??? A resposta de Robertinho fez o pai dar risada e esquecer a bronca: – NÃO PAI, NÃO QUEBROU NÃO... FOI O MOTORISTA QUE MORREU!!! ROBERTO MORAES SILVA (Robertinho) PAIS Eolinda / Roberto Silva AVÓS MATERNOS Messias / Antônio Joaquim da Silva AVÓS PATERNOS Maria / José de Moraes 127 Essas crianças... Osvaldo Reis PAUSA PRO BERREIRO... Roberto está com cinco anos. Sabe-se lá o motivo (de vez em quando nem precisa...) está chorando. Chorando à cântaros, isto é, uma verdadeira chuva de lágrimas. Lágrimas sentidas e barulhentas, choro pra ninguém botar defeito. O garotão chorava tanto, de literalmente fazer dó, tanto é, que um cidadão que passava por perto, com pena, se aproximou do jovenzinho, admoestando-o e também consolando: – Pare de chorar... Chorando você fica feio... É feio chorar... – e dá-lhe conselho e também (só um pouquinho) bronca. Parece que a coisa deu certo, tão certo que o garotão logo parou com a choradeira. O cidadão sentiu-se importante, um mestre, suas sábias palavras foram capazes de conter aquela cachoeira lacrimal... Assim pensando, em vez de ficar calado e dar no pé, já que entendia ter cumprido a missão, em condição professoral, volta a conversar com o chorão: – Tá vendo só, agora você tá mais bonito... Foi só parar de chorar... E coisa e tal... Como criança nem sempre concorda com os adultos, Roberto, sem mesmo ter enxugado os olhos, com força total diz, desafiante ao cidadão: – EU NÃO PAREI DE CHORAR NÃO... SÓ ESTOU DESCANSANDO... EU VOU CHORAR DE NOVO... E começou tudo outra vez. ROBERTO SILVA PAIS Messias / Antônio Joaquim da Silva 128 Essas crianças... Osvaldo Reis COM O MEU PAI, NÃO!!! João Roberto Fráguas é o Professor Beto. Beto e Mônica são os pais de Bárbara, a Babí, e de sua irmã gêmea Maria Eugênia.. No final de 2004, aniversário de Beto, uma aluna envia-lhe um cartão e também um presente. Tempos depois, a casa quase caiu. É que Babí achou o cartão, e teve um chilique daqueles... Seus cotovelos encheram-se de edemas em face de tanto ciúme. Nada de excepcional se Babí não tivesse apenas quatro anos e a concorrente mais ou menos a sua idade. Babí pensou em queimar o cartão, arrancar os cabelos da menina... Onde já se viu uma coisas dessas? Que garota desaforada! E por aí afora. Mas, de acordo com ditado popular, aquela história do filho de peixe... Babí resolve ensinar a chata da menina como deveria se comportar num caso desses e envia-lhe uma carta, manuscrita, com letra grandona e bem legível, para que a “outra” não tivesse nenhuma dúvida: – “onde já se viu saber que meu pai já é casado e escrever uma carta dessa pode é parando por aí porque isso é coisa de namorada e não de aluna. Pelamor de Deus não é para você escrever isso de novo se for para escrever uma carta de aniversário para o meu pais escreva assim de alsione para Beto. Feliz aniversário que Deus o proteja e te dê paz de sua amiga e aluna Alsione” É MOLE??? MARIA EUGÊNIA GANEN FRÁGUAS BÁRBARA GANEN FRÁGUAS (Babi) PAIS Mônica / João Roberto Fráguas AVÓS MATERNOS Mary / João Ganen AVÓS PATERNOS Gemma / João Batista Fráguas 129 Essas crianças... Osvaldo Reis MISSA OU “AMARELINHA”??? Júlia não era lá muito “católica”, isto é, não manjava muito os rituais, aquela história de sentar, rezar, ajoelhar, pegar na mão do vizinho, também não sabia, não conhecia muitas rezas... Em companhia de sua amiga Gabriela, que também tinha praticamente sua idade, (seis, sete anos), vão assistir a um terço. Do mesmo modo, que a pequena Júlia, Gabi também não entendia bulhufas do assunto. Mas Gabriela dá uma de professora: de terço na mão, dizendo que “sabia tudo e mais um pouco”. – Julinha, você reza nessas dez bolinhas pequenas (também conhecidas por contas...). A hora que chegar nessa grande, é o “Pai Nosso” e “Pai Nosso” é muito difícil, você pula... Júlia entendeu tudo direitinho e também fez tudo certinho. Os demais freqüentadores é que não devem ter entendido o motivo de tanto pulo. Júlia deve ter ficado com as pernas cansadas... O terço foi tão demorado, comprido... O CLÁSSICO BIOLÓGICO... Júlia, então com seis anos, está visitando os avós Mira e José Furlan. Resolve mudar o programa. Quer ir ao cinema. Quer porque quer assistir ao filme “Anastácia”. E ninguém (que falta de sensibilidade!) quer levar a pobrezinha no cinema. Aí, Júlia, sem ter praticamente com quem contar, tenta convencer tia Luísa de sua necessidade em assistir a tal filme: – TIA, TENHO QUE ASSISTIR ANASTÁCIA, POIS É UM CLÁSSICO. Clássico?... A tia, em razão da pouca idade de Júlia, fica intrigada, será que elazinha sabia o que estava falando? Como diz o ditado popular: “quem tem boca vai a Roma”, tia Luísa quer saber: 130 Essas crianças... Osvaldo Reis – Você sabe o que é clássico, Júlia? Júlia responde cheia de razão: – EU NÃO, PERGUNTA PRA MINHA MÃE, ELA É BIÓLOGA... (?????) A FILOSOFIA DA FILÓSOFA Júlia, a filhota da Monse e do Luiz Furlan tem cinco anos e está cursando o Jardim-III. Júlia está na casa da tia Luisa e tio Célio, ambos professores. Papo pra lá, papo pra cá, a curiosa Júlia quer saber do tio: – VOCÊ DÁ AULA DO QUE MESMO? – De Filosofia. Responde Célio. A gatinha gostou dessa tal de filosofia e, solenemente, afirmou: – EU TAMBÉM TENHO AULA DE FILOSOFIA. Aí tia Luisa entra na conversa: – Imagine, Júlia, se você tem aula de Filosofia... Júlia, talvez arrependida do “campo queimado”, volta a brincar, antes afirmando: – FILOSOFIA É AQUELA COISA QUE FAZ A GENTE PENSAR POR DENTRO ANTES DE FALAR... JÚLIA PEDROSA FURLAN PAIS Maria / Luiz Antônio Furlan AVÓS PATERNOS Valdomira (Mira) / José Furlan AVÓS MATERNOS Leonor / Ivan Neves Pedrosa Sexo???? A garotinha, lá com seus seis, sete anos, pergunta ao pai: – PAI, O QUE É SEXO? O pai endoida com a pergunta: fica azul, vermelho, roxo, conversa com seus botões, indaga para si, que diabo de menina precoce... A garotinha percebe o desconforto do pai e o salva mostrando-lhe um papel que a “tia” lá na escolinha, lhe dera para preencher: – NÃO É POR NADA NÃO, PAI, É SÓ PRA COLOCAR AQUI AQUI NA FICHA... 131 Essas crianças... Osvaldo Reis MÃE FRAQUINHA! O filhote da Maria Emília e José Manoel, Eduardo, está entre três e quatro anos, e, como toda criança dessa idade, é extremamente falante, curioso e também faz suas associações, enfim, um sujeitinho igual aos outros. Um belo dia Edu, sabe-se lá o porquê, quer conversar, ou aporrinhar a mãe e desafia: – MÃE, VOCÊ NÃO É MAIS FORTE QUE UMA GALINHA... A mãe, sem titubear, responde ao aparente insulto, apenas afirmando: – Claro que sou... Aí o garotão solta uma tirada que faz a mãe rir até hoje: – CLARO QUE NÃO... VOCÊ NÃO BOTA OVO. EDUARDO SEBRIAN (Edu) PAIS Maria Emília Sebrian / José Manoel Dorminhoco O paciente-mirim acorda chorando depois da cirurgia e chama a enfermeira. – Enfermeira, eu quero ir pra minha casa. – Que história é essa de ir pra casa? Você já é um homem. O pacientezinho toma um susto, pensa um pouco e pergunta: – Quanto tempo passei dormindo? 132 Essas crianças... Osvaldo Reis AGORA ELE ME CONHECE... Darci e Lúcia moravam em Campo Mourão. Ao lado da casa deles viviam os músicos de um grupo chamado Minuano. Em razão de suas constantes viagens, com todo mundo saindo de casa, só deixavam o cão, um baita pitibul, literalmente uma fera. Era um guarda que não dava moleza, o bicho era brabo que só vendo e seus latidos faziam a terra tremer. Exageros à parte, o cachorro era deveras assustador... E não é que um dia Darci vê o filhote brincando com o animal? Darci fica apavorado. Não interrompe o diálogo para não assustar nenhum dos dois e o final não se complicar, lógico, para o lado do filho, então com quatro anos. O pai vai ter com a mãe e explica a situação, alertando-a para o risco que o garoto estava correndo: – Eu vi o André brincando com o cachorro do vizinho. Fale pra ele que é perigoso, que o cachorro não o conhece e por aí afora. A mãe treme na base só de pensar e misturando suas palavras com as do marido vai conversar com o filhote: – Olha filho, você tava lá na cerca brincando com aquele cachorrão, isso é muito perigoso... Ele não conhece você, por Deus, não faça mais isso, você é estranho pra ele, ele não sabe quem você é, e um monte de coisas do gênero. O filho ouve tudo atentamente e entende o recado. Em seguida sai da cozinha, a mãe vai atrás, e para seu desespero, vê André dirigir-se para a tal cerca a fim de “conversar” com o guarda da casa vizinha. A inusitada cena, desfeito o medo, faz o casal até o dia de hoje cair na gargalhada: o garoto chega à beira da cerca e vem o cachorro. Não dá outra: a mãe dissera que o cão não o conhecia, daí... O final é cinematográfico: – MUITO PRAZER, MEU NOME É ANDRÉ EDUARDO DA SILVA... ANDRÉ EDUARDO DA SILVA PAIS Lúcia Rosa / Darci Romoaldo da Silva AVÓS PATERNOS Margarida / José Romoaldo da Silva AVÓS MATERNOS Nair / Bonifácio Rosa 133 Essas crianças... Osvaldo Reis AMIZADE NÃO TEM COR... Andrey é o filho mais velho do casal Lucia/Sebastião. Yandre é o do meio e a caçula é Daryne. Andrey tem entre quatro e seis anos, por aí, toma suas primeiras lições no Núcleo Social, em Maringá (ao lado do Colégio Vital Brasil). O garotão tinha um amigo inseparável e era comum, quase que diariamente, os pais ouvirem o filhote, com brilho nos olhos, falar do Lincoln, das aventuras dos dois, dos jogos de futebol, das brincadeiras, enfim, Andrey “tava” sempre falando no amigo. Um dia, os pais acompanharam o jovenzinho para assistir uma competição esportiva, um campeonato de futebol de salão. Andrey e um garotinho negro pareciam “cano de garrucha”, não se separam nunca. Mesmo com o jogo correndo solto, os dois estavam “desligados” batendo o maior papo. A grande alegria dos pais foi quando no intervalo do jogo, o filhote, em companhia do amigo, se aproxima dos dois e orgulhosamente, apresenta aos pais seu querido companheiro: – PAI, MÃE, ESSE É O MEU AMIGO LINCOLN... Os olhos dos dois brilharam de contentamento e também de orgulho, já que Andrey sempre falava de seu amiguinho Lincoln nunca se referindo a ele como “negrinho”, “polaquinho” ou “japonesinho”. Andrey, de pouca idade e tamanho, carregava um enorme coração, coração de criança, coração grande, coração que não sabe discriminar... EDUCAÇÃO MOLHADA... Daryne, a caçulinha de Lucia e Sebastião é a "responsável" pela saia justa dos velhos. Os pais têm um casal de amigos, hoje falecidos, na vizinha Cambé: Leopoldino que é médico e a esposa Irene que toma conta da casa. Todas as crianças são ainda, muito pequenas, Daryne, para se ter uma idéia, só tem três anos... Para que o comportamento de seus “anjos” não os envergonhe, aconteciam broncas, recomendações, preleções, e coisas do gênero. Numa dessas tantas viagens, Tião instrui a filharada: – Pessoal, cuidado com a compostura... Ninguém vai chegando lá e cumprimentando, bom dia doutor Leopoldino, bom dia dona Irene e tchibummmmm na piscina, heinnnn? Chegaram. 134 Essas crianças... Osvaldo Reis Mesa posta, todo mundo reunido em volta, criançada calada, até que a pequena Daryne rompe o silêncio fazendo todos caírem na gargalhada, quando caprichosamente, lembrou as palavras do pai e em alto e bom tom, sapecou: – DONA IRENE, MEU PAI AVISOU PRA TODO MUNDO QUANDO A GENTE TAVA VINDO PRA CÁ QUE NÃO ERA PRA GENTE DIZER BOM DIA DONA IRENE, BOM DIA DOUTOR LEOPOLDINO E, TCHIBUMMMMM NA PISCINA!!! GOL CONTRA... Yandre tinha dois anos, em companhia do pai, está no Estádio Willie Davids em Maringá, para assistirem ao time local: o Grêmio, que naquela tarde enfrentava o Criciúma, de Santa Catarina. Era o campeonato nacional. O contraste do amarelo e preto da camisa do visitante, um colorido bem chamativo, deve ter empolgado Yandre... Joguinho besta, morno, chutão pra lá, chutão pra cá, a torcida quase dormindo não é preciso dizer que o placar era de zero a zero - lembrando mais uma apresentação de balé do que o famoso esporte bretão, onde até mães são “homenageadas”, mormente as do juiz e dos bandeirinhas... Nesse clima Yandre abre o peito e manda um grito, grito de acordar bêbado, gritão mesmo: – VAI CRICIÚMA... VAI... O pai censura o filhote dando-lhe uma olhadela de canto de olho... O pessoal em volta também olha, nem é preciso dizer que com cara fechada pro pequeno torcedor. Onde já se viu uma cria nossa, de Maringá, torcendo pro adversário? Aí, o pai aperta o filho e quer saber: – Filhão, que história é essa de torcer pro outro time? Nosso time é o Grêmio! Yandre consertou tudo, quando, mais alto ainda repetiu (em parte, aumentou só um pouquinho...) o grito: – VAI... VAI PERDER CRICIÚMA!!!!!!! JOGUINHO CHATO... Em companhia do irmão mais velho Andrey, Yandre, filho do meio do Sebastião e da Lucia, capitaneados pelo pai, lá pelos idos de 77, 78, iam sempre ao estádio para assistir aos jogos do Grêmio, de saudosa memória (e põe saudosa nisso!). O garotão “adorava” futebol, principalmente o primeiro tempo quando se empanturrava de tudo o que tinha direito: pipoca, amendoim, sorvete, churrasquinho, refrigerante e os infindáveis passeios que fazia da arquibancada ao banheiro. Já no segundo tempo, com o “bucho” explodindo, o sujeitinho virava as costas pro jogo. O pai fingia que não estava vendo e Yandre, cheio de autoridade, repetia o de sempre (pra ele, no segundo tempo não tinha jogo bom...) para o pai, que realmente gostava de futebol: – PAI, ANDREY, VAMOS PRA CASA... ESSE JOGO TÁ MUITO CHATO... 135 Essas crianças... Osvaldo Reis E NO CONFESSIONÁRIO... Andrey e Yandre, mais o primo Luciano, iam fazer a primeira comunhão. Os meninos contavam com oito, dez e onze anos, respectivamente. Aí a coisa começou a engrossar: vão ter de confessar seus pecados para o padre. Foi um verdadeiro Deus-nosacuda. O trio se reúne e centram suas atenções no dia-a-dia vivido no mesmo quintal, onde tia Laura, volta e meia, aplicava-lhes sonoras broncas, quase sempre por causa de Benji, cachorrinho da prima Beatriz que em razão de caninos ameaçadores, lembrando pontas de anzóis, apavoravam os meninos. Benji, a fera, era um Pequinês “meio sangue” e a molecada o “adorava”... Chega a hora de irem para o confessionário... Os mais velhos (como sempre!) empurram o mais novo, depois obedecem a ordem de idade. O menorzinho, Yandre, de acordo com o combinado, “abre a mala”, dizendo ao padre: – EU BRIGUEI COM A MINHA PRIMA, CHUTEI O CACHORRINHO DELA E XINGUEI A MINHA TIA. É a vez de Andrey que manda ver: – CHUTEI O CACHORRINHO DA MINHA PRIMA, BRIGUEI COM ELA E XINGUEI A MINHA TIA. Luciano, o coroa do trio, indagado, não titubeia: – XINGUEI A MINHA TIA, BRIGUEI COM MINHA PRIMA E CHUTEI O CACHORRINHO DELA... O padre, “meio quase tudo” velho, surdo, enxergando pouco, dana a tossir, e encabuladíssimo, sentencia: – Meu filho, o pecado não é tão grave assim. Não era preciso você ter entrado na fila três vezes. Eu te perdôo... Reze 150 vezes o “Pai Nosso” e pronto!... ANDREY MALDONADO GOMES DA COSTA DARYNE LU MALDONADO GOMES DA COSTA YANDRE MALDONADO E GOMES DA COSTA LUCIANO DA COSTA TORTORELLI (Primo) PAIS Lucia / Sebastião Gomes da Costa Alice / Dario Tortorelli AVÓS MATERNOS Carmem / Evilásio João Maldonado Dolores / Alfredo José da Costa AVÓS PATERNOS Dolores / Alfredo José da Costa Rosa / Salvador Tortorelli 136 Essas crianças... Osvaldo Reis MEIÃO DO PALMEIRAS, “PERNA DE PAU...” Fernando (irmão do Paulo), um dos sobrinhos preferidos do Tião, é filho de sua irmã Dulce e do Mauro. O sujeitinho tinha lá seus dez, doze anos e uma vontade louca de vestir a camisa (titular, claro) do “aguerrido esquadrão” da incipiente Vila Esperança... Um timaço. Acontece que os “Parreiras” de plantão começaram a botar defeito no jovem “felômeno” que poderia ter mudado o resultado da Copa do Mundo de 1982. Se fosse ele a cobrar aquele pênalti contra a França, certamente, a história seria outra... Mas sua carreira sofria terríveis ameaças dos invejosos que não queriam vê-lo encantar a todos com seu futebol. Diziam a Fernando que suas pernas eram finas (onde já se viu: as do Garrincha não eram tortas?), que ele era muito franzino e por aí afora. Mas Fernando, que de bobo não tem nada, achou um jeito de resolver o problema de suas “afinadas canetas”: o garotão havia ganho um par de meias do Palmeiras... Mas o time de seu pai, Mauro (já falecido), era o São Paulo... O astuto Fernando pegou então o meião do Palmeiras e enrolou nas pernas, colocou por cima a do São Paulo, com isso agradou ao pai, enganou a torcida, o “treneiro”, a imprensa, enfim, todo mundo. Eram pernas de um “puro sangue”: grossas que só vendo... O duro é que a “bola” de Fernando imitava as pernas... E, com essa horrível perseguição, não se tem conhecimento de que Fernando tenha sido escalado em algum jogo, dessa forma, nem Vila Esperança, nem o mundo puderam conhecer o talento desse ex-quase futuro ídolo do esporte bretão.... FERNANDO LUIZ BIANCHI PAULO CÉSAR BIANCHI PAIS Dulce / Mauro Bianchi AVÓS PATERNOS Pierina / Stéphano Bianchi AVÓS MATERNOS Dolores / Alfredo José da Costa 137 Essas crianças... Osvaldo Reis CHEGOU DA “GUERRA”... Lara e a irmã Lúcia (ainda não tinha “surgido” a Beatriz), filhas de Laura e Reynaldo (o Dade), adoravam jogar-se na rede para ouvir as estórias que o tio Tião (para elas era “Tão”) inventava para alegrar e “enrolar” a garotada. Era só chegar da aula que seus olhinhos buscavam a boa e aconchegante rede, que também servia para depositar as roupas a serem passadas... Um belo dia, Larinha chega em casa depois de atividades mil na aula de Educação Física, mortinha da silva, e, para sua total frustração, a mesa não estava posta, e ainda por cima, a rede cheia de roupas. A gatinha se desespera diante do “dantesco” quadro, e seu apelo fez os corações se derramarem de emoções, misturadas com gargalhadas. Afinal nunca se viu tanta carência de uma só vez: – MAMÃE: VOCÊ NÃO TÁ VENDO QUE SUA POBRE FILHINHA CHEGOU CANSADA, COM SEDE, COM FOME E COM FRIO? LARA SYLVIA BIANCHI COSTA LÚCIA BIANCHI COSTA BEATRIZ BIANCHI COSTA PAIS Laura / Reynaldo Costa AVÓS MATERNOS Pierina / Stéphano Bianchi AVÓS PATERNOS Dolores / Alfredo José da Costa Confuso... Mãe (apavorada): Por que você engoliu o dinheiro que eu lhe dei? Filho: Quando a senhora me deu, a senhora me disse que era o meu lanche. 138 Essas crianças... Osvaldo Reis EU QUERO SER GARI... Início da década de 1970, Tião e Lucia passam férias em Santos. Filam “bóias” e pousos no apartamento da irmã Luzia e do cunhado Humberto. Os finais de tarde eram alegrados com a passagem do caminhão coletor de lixo, pela contagiante algazarra e animação promovida pelos garis. O pessoal trabalhava cantando, batucando nas latas, caixas de madeira, papelão; enfim, no que aparecia pela frente. Para eles tudo era motivo para samba e alegria. Além da música, também contavam piadas, lógico, com o som “lá em cima”. Todo mundo se acotovelava nas janelas para não perder o inusitado espetáculo proporcionado por aqueles humildes profissionais. Alexandre e Marcelo, os filhotes de Luzia e Humberto, se deliciavam agarrados na grade da janela e imitavam os assessores ecológicos gritando como eles. Em determinado momento, o mais novinho, Marcelo, empolgou-se tanto que saltou sobre o sofá e daí para o chão, e com os olhinhos faiscantes, como se tivesse descoberto naqueles modestos prestadores de serviços a fórmula mágica da felicidade, cheio de razão, a todo vapor, afirmou: – MÃE, PAI, TIO TÃO, TIA LU, QUANDO EU CRESCER EU QUERO SER GARI... ALEXANDRE DA COSTA RAPOSO MARCELO DA COSTA RAPOSO PAIS Maria Luzia / Humberto José Soares da Costa AVÓS PATERNOS Dinorah / José Soares Raposo AVÓS MATERNOS Dolores / Alfredo José da Costa 139 Essas crianças... Osvaldo Reis IMPORTANTE SEM IMPORTÂNCIA... Essa aqui lembra aquela manjada de “você sabia que o sabiá sabia “sobiar”?” Quem não se lembra? O Athaybel estava na segunda série do pré-primário, não sabia ainda um montão de coisas, mas sabia “assoviar”, o que o tornava diferente dos demais já que criança (quase sempre) não consegue emitir qualquer outro som (via boca) além do choro e da fala. Athaybel sabia “assoviar” e se sentia o rei da cocada preta por isso. O professor, seu avô, o ensinou quase a trinar quando colocava a língua entre os dentes e soprava, era coisa linda os sons que ele emitia.O garotão era o alvo das gatinhas, assunto de todas as rodas... E quando se é líder, admiração, inveja e ódio se misturam. Assim foi com o epigrafado Athaybel, quando um garoto bem mais velho que ele (já com aproximadamente cinco anos), quase alfabetizado, aproximou-se de nosso herói e entre satírico e irônico mandou ver: – ASSOVIAR NÃO TORNA NINGUÉM IMPORTANTE. O IMPORTANTE MESMO É SABER LER, SEU TONTO... O estraga-prazeres e chato do menino fez o jovenzinho ficar triste e decepcionado, frustrado, quase deprimido... Nesse dia, à saída, não falou com ninguém (imagine ele que já quase dava autógrafos...) e foi pra casa a passo acelerado. Lá a avó Maria foi seu ombro amigo, seu silencioso muro de lamentações, quando, tristemente, constatou: – VÓ, EU AINDA NÃO SOU IMPORTANTE PORQUE LÁ NA ESCOLA UM MULEQUE ME DISSE QUE IMPORTANTE É SABER LER E EU SÓ SEI ASSOVIAR!!!!! ATHAYBEL TEZIN NETO MÃE Leomara Cristina Tezin AVÓS MATERNOS Maria Josefina / Athaybel Tezin 140 Essas crianças... Osvaldo Reis PAIS "NOVOS"... O título, aparentemente, dá a entender que os filhos são vítimas de maus tratos. Mas não é nada disso. Guilherme e Gustavo são os filhotes de casal Bia e Kiko, que dos dois são tietes a não mais poder, assim como todos os demais parentes: avós, tias, tios, primos... É "paparicação", chamego e dengos que não acabam mais. Em resumo, todo mundo trata Gui e Gu como merecem. Bia e Kiko são vizinhos, há muitos anos, do Tião e da Lucia. Vivem próximos não apenas na geografia, mas fraternal e carinhosamente; são amigos de fato e de direito, amigos de verdade. Em relação aos meninos alguma coisa parece estar errada. É que Guilherme resolveu "adotar" os vizinhos queridos como seus pais, mas também não quer "abandonar" os pais biológicos, misturando-se aí, afeto, ternura, pureza e inocência. E a cabecinha de Guilherme, ativa que só, acha a solução para o caso, colocando, de vez, um ponto final nessa controvertida história de paternidade dupla, ou desejo de. E a solução até que é simples, de acordo com Gui: iriam ao Programa do Ratinho fazer um tal de DNA e aí sim ficaria provada, com real originalidade, a vontade de Guilherme. Sem mais delongas, com o resultado do exame, sem medo de errar, Guilherme vai poder afirmar que: – É FILHO DO TIÃO E DA LUCIA... O VOCABULÁRIO DO GUSTAVO O casal Lucia/Sebastião Gomes da Costa, tem ótimos vizinhos, já que também promovem, em razão comportamental, um tratamento fraterno. Mas os filhos do Kiko e da Bia, Guilherme e Gustavo, são especiais. Tião é bem crianção, apesar de já estar beirando os sessenta, mas permanece com sua alma de criança, e assim se relaciona com seus amiguinhos. Alma boa à parte, Tião tem um “defeito” muito grande: uma sede 141 Essas crianças... Osvaldo Reis insaciável, chegando a levantar, segundo Lucia, “trocentas” vezes à noite, para degustar o precioso líquido... Água mesmo! Pra se ter uma idéia das idas e vindas de Tião até a geladeira, pode se comparar à pequena área de um campo de futebol onde nem com reza braba nasce grama. O “caminho” da geladeira do Tião é lisinho da silva. Os irmãos Guilherme e Gustavo acompanham todos os passos de Tião, cuja casa é como se fosse o quintal da deles, aonde só vão para brincar. Um dia, “tá” lá o trio mais a meninada dos donos da casa. Curiosamente Tião demorou um pouco mais para tomar o famosíssimo “suco sanepariano” ou de torneira. Aí Gustavo, com sua inocente pureza, criou um termo que os seguidores de Buarque e Houais fatalmente vão inserir em nossos dicionários. Gu, vendo que amigo não estava tomando tanta água, resolve ajudá-lo, lembrando-o de seu “vício”: – TIÃO, TÁ NA HORA, VAMOS LÁ SEO REPETIDOR DE ÁGUA... GUILHERME AUGUSTO DE OLIVEIRA BARBOSA GUSTAVO DE OLIVEIRA BARBOSA PAIS Beatriz / Francisco Carlos Barbosa AVÓS PATERNOS Graciema / Alfredo Alves Barbosa AVÓS MATERNOS Débora / Francisco Alves “Meliantes” Um senhor muito bem vestido, muito elegante vai andando pela calçada quando vê um garoto tentando tocar a campainha de uma casa, mas o botão da campainha fica muito alto e o garoto não alcança. O senhor se aproxima e pergunta: – Posso ajudá-lo? – Pode, sim. O senhor me ajuda a tocar a campainha? – Claro. O senhor levanta o garoto nos braços e o garoto toca a campainha. Aí o garoto diz: – Agora, vamos correr. 142 Essas crianças... Osvaldo Reis “ISSO” NÃO ERA “AQUILO”... A Bruninha contava com um ano e poucos meses, aquela fase em que a criança começa a falar, e o faz tudo errado, troca letras - principalmente o “c” pelo “t” - entre outras tantas e os adultos adoram “sacanear”, e estão sempre fazendo perguntas só para ouvir” as bolas fora”. Bruna nasceu em Assis Chateaubriand, no Paraná. Um belo dia, no colo da mãe, o pai ao volante, a gatinha “está mostrando” a cidade aos dois. Mostrando mesmo, pois tudo que avistavam, acabavam por perguntar à filhota o que era, e ela, pacientemente, ia respondendo: é uma “tasa”, um “talo”, uma “aive”, e por aí a fora, até que se cansou e se “desligou” um pouco, mas a mãe, nem aí, queria continuar com aquela infindável seção de perguntas e respostas... Aí passam em frente ao hospital onde nasceu a garota. A mãe, com o dedo indicador apontado para a direção do dito cujo, pergunta à filha: – O que é isso? Como seu dedo estava encostado no pára-brisa, não deu outra, a resposta de Bruna foi lógica, clara e objetiva: – É VIDO!!!!!! Só faltou completar “te ela o vido da flente do talo”... E TEM GARANTIA??? Bruna estava prestes a completar quatro anos, queria fazer uma festona e comprar para si um presente, para tanto juntava todos os trocados que conseguia, principalmente moedas, que criança adora e adultos nem tanto. Seu aniversário, tão esperado, “chega”. Os pais dão à filha uma linda bicicleta. Bruninha fica feliz da vida... Até conversava com seus botões: “isso é que é pais”, “os meus são os melhores pais do mundo” e coisas assim, afinal ganhara uma bicicleta e 143 Essas crianças... Osvaldo Reis nem precisou usar seu próprio dinheiro. Era um presente perfeito se não tivesse vindo sem bomba, aquele “treco” que se usa para encher pneu. Poderosa e cheia da “bufunfa”, em companhia do avô Sérgio, vai até uma bicicletaria próxima com a finalidade de comprar uma... Onde já se viu uma bicicleta novinha mas sem bomba? Chegam à loja, vão direto ao balcão. Bruna pede ao atendente uma bomba... O rapaz apanha o tal objeto. Era azulzinha, lindona, de plástico, uma beleza mesmo... Bruna adora a danada, namora, troca carícias, empurra, puxa, empurra de novo etc. e tal... De repente... Silêncio... Silêncio total... Bruna fica com o complemento de seu desejo nas mãos apenas olhando, misteriosamente... O atencioso balconista quer saber: – Você não gostou da bomba? A resposta da garotinha, seguida de uma indagação, deixam boquiabertos o avô Sérgio e o vendedor : – E QUANDO ACABAR O AR, VOCÊ DÁ OUTRO???!!! INOCENTE CONCLUSÃO! Transar, de acordo com o “pai” Aurélio Buarque de Holanda, quer dizer: fazer uma transa a respeito de; combinar, ajustar, maquinar, pactuar, tramar... Mas os dicionaristas de hoje, dão um outro significado à palavra, mais ou menos como “ficar” que ninguém sabe realmente o que quer dizer... Bruna, tem uma rara particularidade, em razão de ter somente cinco anos, fala tudo corretamente, embora não saiba direito o que os adultos falam, e por viver na era da Internet e da televisão, ouve muita coisa. Dia desses, “espreme” a mãe querendo saber de sua boca, para que a cruel dúvida não persistisse, o significado de certa palavra e manda ver: – MAMÃE O QUE É TRANSAR? A mãe titubeia um pouco, pensa e responde: – Transar ééééé... Conversar... Namorar... O interrogatório prossegue: – E VOCÊ NAMORA COM O PAPAI? Aí a mãe não tem nenhuma dúvida e responde na bucha: – Claro filha... Dias depois, a avó, que mora na casa ao lado, entra em casa de Bruna e pergunta à neta: – Bruninha, onde é que “tá” sua mãe? A resposta de Bruna deixa a avó pensativa, intrigada, achando a neta um tanto quanto precoce, quando de olhos arregalados ouve a criança responder: – ESTÁ LÁ NO QUARTO TRANSANDO COM O PAPAI... 144 Essas crianças... Osvaldo Reis SE É TÃO BOM ASSIM... Depois de Bruna, "surge" Beatriz, a Bia, a mais novinha da casa, está começando a descobrir o mundo, ainda não fala direito (nem esquerdo!), mas de boba não tem nem o jeito de andar... Toda mãe, sabidona, em vez de dizer que remédio cura, fica com aquela história de que o danado é bom... Dia desses, Bia apanhou um baita cof, cof... Era cof a não mais poder, o que debilitava a irmãzinha da Bruna. A mãe prepara um remédio e tenta, em vão, convencer Bia a mandá-lo pra baixo: – Toma filha, é bom... Bia nem bola dá... A tosse continua firme e forte.... E a mãe insistindo: – Toma filha... toma filha... Até que... É o seguinte, de acordo com o ditado popular “água mole em pedra dura, bate, bate até que molha”, a mãe conseguiu fazer a filhota se interessar pelo remédio... Acertou “na veia”... Seus argumentos foram realmente convincentes: – Toma, filha, é gostoso... Palavrinha mágica essa. É o mesmo que ler “promoção” numa loja qualquer... Bia olhou para a mãe com raro interesse e esticando a mãozinha, pegou o copo que continha o tal remédio “bom”... A mãe sorriu por dentro... Ôbaaaa, pensou.... Aí a gatinha, no seu enrolado português, pergunta à mãe: – É TOTOSO, MÃE? A mãe, feliz da vida, confirma. Bia devolve-lhe o copo e tasca, na bucha: – ENTÃO BEBE!!!!! FUGINDO DO FLAGRANTE... Depois de um churrasco familiar, sabe-se lá por que, o banheiro do quarto do casal entupiu... No mesmo dia a mãe da Bruna, a mais velha, e da Bia, a caçulinha, teve de ser internada (meio às pressas) num hospital, onde passou por uma pequena cirurgia e o banheiro entupido, lógico, ficou em segundo plano. Dias depois, a mãe retorna ao lar-doce-lar. As filhas, saudosas, cheias de dengo, sentam-se na cama, uma de cada lado onde está a mãe. Aí, o chato do pai querendo esclarecer o entupimento do vaso sanitário, pergunta às duas: – Quem foi que jogou coisas no banheiro? Bia, mais que depressa se defende atacando a irmã maior e aplicando-lhe sonoro pé-do-ouvido, explica: – FOI A TATA... Por sua reação, o pai detetive acabou “desconfiando” da menorzinha e continuou a seção de “tortura”. E depois de um infindável interrogatório acabou obtendo a confissão de Bia (a razão: dois pedaços de costela com osso e tudo), que acabou por botar um ponto final no caso do vaso (bela rima), sendo antes alertado pela filhota sobre seus direitos: – MAS NÃO FOI HOJE !!! 145 Essas crianças... Osvaldo Reis CHIFRE EM CABEÇA DE CAVALO... Bruna não tinha ainda dois anos, tampouco tinha saído de seu Estado, mas um “dodói” dos grandes fez com que a menina fosse levada até Campo Grande para tratamento, e a jovenzinha, por nada no mundo, deixou de curtir as aventuras de sua primeira viagem. Bem no meio da estrada (em Mato Grosso é comum isso), uma boiada. O pai teve de parar o carro para os “bichão” passarem... Bruninha presta atenção em tudo e tem medo danado dos dentes daqueles monstrengos que sua mãe lhe explicou serem bois. A garota ficava apavorada quando via o pai passar as mãos nas cabeças dos mansos animais e não deixava de alertar ao pai do perigo que ele estava correndo diante dos ameaçadores dentes, certamente pensando que boi era um baita cachorro com aquele ornamento na cabeça. Bruna não dormiu, aliás, nem piscou, com tanta atividade. Chegando ao final da viagem, vão direto ao hospital. Aconteceu entre Bruna e o médico uma enorme empatia, em razão da simpatia e atenção que o competente profissional lhe dedicara. Pra se ter uma idéia, a conversa entre os dois, assistidos pelos pais, durou umas duas horas... Num trecho da prosa, Bruna começa a contar ao doutor o encontro com a boiada, mas de maneira alguma ela se lembrava o nome dos “bichão” por ela pronunciado com dois esses ou seja “bissão”... Saía de tudo, palavras muito mais difíceis, mas boi, nem com reza braba. E, sem dar o nome, não tinha como seu novo amigo entender sua história... Bruna começa a ficar nervosa, inquieta, aí, como por encanto, Bruna bate os olhos numa estatueta de um cavalo sobre a estante do médico que, comparando, a fez lembrar-se de tudo e do seu jeito, explicou o nome dos “bissão”: – É UM BÚIO... UM BÚIO DI SIFRI... BRUNA GARBULHA PEREIRA (Bruninha) BEATRIZ GARBULHA PEREIRA (Bia) PAIS Rose / Pedro Mariano Pereira AVÓS MATERNOS Cezarina / Sérgio Garbulha AVÓS PATERNOS Terezinha / Benedito Mariano Pereira Manoplas – Na minha mão direita eu tenho 8 laranjas e na mão esquerda eu tenho 10 laranjas. O que temos então? – Mãos enormes, professora. 146 Essas crianças... Osvaldo Reis CADÊ O MEU NARIZ???? Max é o irmão mais velho da Érica e da Cinthia, tio do Rafael, filhos da Bete e do Eduardo. Lá por volta de seus quatro, cinco anos, um bichinho malvado, certamente procurando sobrinhas de doces, faz um baita buraco num de seus dentes. Max resmunga, chia, choraminga, esperneia, sapateia, e por aí afora, aquela tradicional mistura de dor e birra. Os pais levam o filhote à dentista, doutora Edna Tokunaga, que o examina a manda o diagnóstico: – É uma cárie e já está, digamos, em estado avançado; tem de ser restaurada imediatamente. Os pais concordam com a competente profissional e também amiga. Para a execução do serviço era preciso, claro, de anestesia. E lá vem a doutora Edna com aquele papo de dentista: “é só uma picadinha, uma abelhinha bem pequena, não vai doer nadica”... E a pobre criança quase hipnotizada pela “lábia” da especialista nem percebe a agulhada... Aí vem o efeito que é chato pra burro. Com Max não foi diferente. O carinha nem sentia a “cara”. E doutora Edna tá mexendo e remexendo, acompanhada pelo delicioso barulho do motorzinho e coisa e tal. Num determinado momento tem de abrir um pouco mais a boca do pequeno paciente e precisa apoiar sua mão no nariz do doentinho... Aí desespero geral, Max dana a chorar: buáááááááá... buáááááááááá... E a coisa vai aumentando. A dentista achou que havia passado o efeito da anestesia e ficou preocupada, mas logo sua suspeita foi desfeita quando Max, aos prantos, afirmava e perguntava, quase que ao mesmo tempo: – EU QUERO O MEU NARIZ... ONDE ESTÁ O MEU NARIZ??? Foi preciso usar um espelho para mostrar ao “desnarizado” que seu “cheirador” continuava lá, inteirinho, e pendurado no mesmo lugar... MAX HIDEKI HASE RAFAEL HASE PAIS Beth / Eduardo Hase AVÓS MATERNOS Sunao / Natsuno Sakaguchi AVÓS PATERNOS Tomoji / Kazuko Hase 147 Essas crianças... Osvaldo Reis MAS É SÓ ISSO ????? Depois desse episódio, “vó” Mira passou a chamá-la de legista mirim... A Gianna tinha por volta de cinco a seis anos e aparentemente, uma curiosidade mórbida, pavorosa, de terror mesmo. A gatinha queria porque queria saber o que era exumação que ela dizia “insumação”. E, o que é pior, ninguém conseguia tirar da cabecinha dela essa vontade. Os adultos da casa explicaram, mas ela queria mesmo era ver de perto, com seus olhos. Um determinado dia, faleceu alguém da família e deveria ser sepultado no mesmo túmulo de outro parente, já enterrado havia muito tempo... Gianna foi também ao cemitério, e como por encanto “desapareceu” de perto de seu pessoal. A gatinha foi assistir os funcionários do cemitério remover o cadáver antigo, enfiou-se no meio daquela floresta de pernas e foi parar lá onde tal serviço estava sendo feito e nem deu tempo de ser retirada: assistiu a tudo, matou a curiosidade e voltou frustradíssima desabafando: – INSUMAÇÃO NÃO TEM GRAÇA NENHUMA... É SÓ UNS OSSINHOS CABELUDOS!!! GIANNA CARLA FURLAN PAIS Fátima / Carlos Furlan AVÓS PATERNOS Valdomira (Mira) / José Furlan 148 Essas crianças... Osvaldo Reis BARREIRA TRANSPONÍVEL... Davi, irmão da Ana Clara, filho da Maria Paula e do Daniel, tinha cinco anos de idade, uma fera, não só na escola... Com raro brilhantismo (de verdade!), Davi cursava o pré-primário, onde era o terror na prática do esporte bretão, também conhecido por futebol. Escolheu, no entanto, uma das posições mais ingratas: aquela em que não se pode falhar nunca; era goleiro. Um Gilmar da nova era... Davi nunca falhava... Um goleiraço o sujeitinho... Duvida? Veja, então, o diálogo do promissor atleta com o avô Antônio Augusto de Assis, o poeta A.A. de Assis, após chegar todo eufórico e suado ao final de uma disputadíssima partida de futebol: – VÔ, HOJE EU PEGUEI TODAS AS BOLAS... SÓ DEIXEI PASSAR CINCO!... DAVI JOSÉ DE ASSIS BEMOM PAIS Maria Paula / Daniel Bemom AVÓS MATERNOS Lucila / Antônio Augusto de Assis AVÓS PATERNOS Mabel / Heber Bemom Naquela criança linda, que brinca cheia de pressa, o meu mundo, que se finda, fita um mundo que começa ! Galdino Andrade 149 Essas crianças... Osvaldo Reis O “SEQÜELADO” SAFADINHO Luciano – o irmão da Lucilene – tem hoje sete anos. Quando bem miudinho sofreu meningite, mas foi muito bem tratado e a atenção da mãe Angelita e do pai Adailton ajudaram (e muito) a dar sumiço na doença do filhão. Em outras palavras, a meningite do Luciano “tomou doril”, escafedeu, sumiu, não ficou nem um sinalzinho. Só que, moleque é moleque... O rapazinho é mais folgado que azeitona em boca de banguela. Um tremendo cara de pau, mexe com todo mundo; enfim, é um “anjo” o nosso enfocado, mas também muito simpático. O curioso em Luciano é sua reação quando alguém tenta lhe passar um pito ou dar-lhe uma bronca: Lu (só ele), se lembra da doença acometida no passado, aí, com um baita sorrisão pra lá de maroto, acaba com a reação do eventual e momentâneo “inimigo” que quase sempre se desconcerta, em razão dos motivos que levaram o “pestinha” a cometer tais desatinos, quando ele com cara bem triste, de cachorro caído de mudança, sempre que apronta, afirma: – É SEQÜELA !!! LUCIANO GONÇALVES DE MATOS LUCIENE GONÇALVES DE MATOS PAIS Angelita / Adailton Araújo de Almeida AVÓS MATERNOS Maria / Ponciano Gonçalves de Matos AVÓS PATERNOS Maria José / Arlindo Pedroso de Almeida 150 Essas crianças... Osvaldo Reis BANANA PRO “MACACO” Milton estreava um velho carro novo: um Galáxie, uma de suas paixões, depois, claro, da esposa Ivanilde e das filhotas: Sabrina, Samantha e Samira. Numa bela manhã de domingo, se deliciando em sua “banheira” – apelido que os “invejosos” dão ao “possante” que marcou época, não só no Brasil, mas em boa parte do mundo – lá estão Milton e prole, incluindo gato, cachorro e papagaio, “navegando” em seu carrão. E lá vão eles... Sobe, desce, Milton elogia alguma coisa no carro, fala do freio, do rádio – que é original – mostra árvores, praças, ruas, igrejas, monumentos, e pra variar, fala um pouco mais do carro... Um passeio maravilhoso, as crianças estão adorando a inesquecível aventura daquele dia... Tudo está indo muito bem. Mas de repente... pufffffffff. Fura um pneu. Pneu dianteiro... Para as crianças, um pouco mais de pimenta na aventura, uma baita novidade. Todo mundo desce pra ver o pneu arriado, murchinho da silva. As crianças se divertem, participam da cena, para elas inédita, e querem, lógico, também ajudar... Após aquela tradicional coçadinha de cabeça que antecede a troca de pneus, Milton comenta com a esposa: – Vou pegar o macaco... Ato contínuo Samira oferece-lhe concreta solidariedade: estende a mão direita que contém na ponta uma doce e inocente banana e completa: – TÓ, PAI... SABRINA MARCOLLI RUI SAMANTHA MARCOLLI RUI SAMIRA MARCOLLI RUI PAIS Ivanilde / Milton Rui AVÓS MATERNOS Jorgina / Antonio Marcolli AVÓS PATERNOS Fiorentina (Dona Nêga) / Rui Cesare 151 Essas crianças... Osvaldo Reis O OVO OVALADO Embora maringaenses natos, Eliane e Anízio, por questões profissionais, vivem na vizinha Cambé. Os pais de Aline, que além de gostar muito de sua cidade natal, a filha, idem, mas também adoram os avós, o que proporciona um gostoso e infindável vaivém de viagens entre as duas cidades, em parte para agradar a filhota e eles também, claro. Aline tem três anos e, logicamente, não sabe ainda o que é terça-feira, outras tantas feiras e também outras tantas palavras... Só sabe que todo final de semana, mesmo sem saber direito o que está acontecendo, ou que dia é, Aline fica inquieta, doidinha pra viajar. A mãe tem de “se virar” pra não desagradar a filhota... Num desses tantos finais de semana, Aline “tá” acesa, com muita energia, pilha sempre nova, a mãe sente o “drama” e tenta acalmá-la explicando: – Amanhã a gente vai pra Maringá... Aline escuta, pensa um pouco e dispara: – ENTÃO DEPOIS DE HOJE A GENTE VAI PRA MARINGÁ... E, momentaneamente, deixou a mãe em “paz”. ALINE SATO CARVALHO PAIS Eliane / Anízio Costa Carvalho AVÓS MATERNOS Márcia / Macoto Sato AVÓS PATERNOS Cleusa / Nivaldo Costa Carvalho 152 Essas crianças... Osvaldo Reis AGENTE SECRETO... Gabriel é um sujeitinho extremamente ativo. Quando bem miudinho era tratado como “candidato”, já que saía, principalmente no restaurante, cumprimentando todo mundo, pegando nas mãos, batendo nas costas, como fazem os políticos (em época de campanha, claro...). Mas por Gabriel ser uma figurinha de 50/60 centímetros de altura e ainda nem falar direito, era uma festa vê-lo, de mesa em mesa, cumprindo seu ritual. Numa das suas primeiras viagens Gabriel, em companhia da mãe Andréa, avô Nailor, avó Nilza, primo Paulinho, gato, maritaca, papagaio e também uma tartaruga, o jovenzinho vai conhecer aquele “riozão” com sal dentro que os adultos chamam de mar. O avô materno de sua mãe (Nilo, pai da “vó” Nilza) estava internado numa casa de saúde em Curitiba. Gabriel gostava muito dele, a quem chamava de “biso”, e queria visitá-lo, mas seu “biso” não podia receber visitas em razão da precariedade de seu estado de saúde. Os marmanjões explicaram a Gabriel que ele estava num lugar de nome bem pequeno e terminava com a letra “i”. Ficaram na praia alguns dias. Na volta, Gabriel continuava querendo ver seu amigo e insiste com a mãe, em seu particular “zecabulário”: – MÃE, VAMOS LÁ NO FBI VISITAR O BISO??? GABRIEL BARUD MACIEL PAIS Andréa / Cláudio Maciel AVÓS MATERNOS Nilza / Nailor Marques AVÓS PATERNOS Elza / Názio Souza Maciel 153 Essas crianças... Osvaldo Reis O COCÔ MOUCO... Norma tinha um nojo terrível de fazer cocô, ficava segurando, se apertando, dando uma bronca nas fezes: – VOLTA PRA SUA CASA SUA CACA NOJENTA... Mas um dia a “coisa” aconteceu... Algumas bolinhas da dita cuja acabou por sujar-lhe as fraldas: eram brancas, mudaram pra, mais ou menos, marrom escuro. A garotinha também mudou a cor, ficou vermelha, numa mistura de nojo, raiva e ódio e se seu desabafo tivesse saído antes com a intensidade do grito final, talvez tivesse evitado a “tragédia”: – EU FALEI PRA ELA VOLTÁ, MAS ELA NÃO ESCUTOU... MAS EU FALEI !!! COM MEDO DO PRÓPRIO VENENO... A Norma era ainda bem miudinha, mal falava, mas curiosamente cantava, vivia cantando, músicas, claro, que ela mesma compunha. E o repertório era grande, não se sabendo se era melhor cantando ou compondo, só se sabe que ela “tava” sempre se “esgoelando”... Um belo dia, tá lá a Norminha cantando um de seus inúmeros sucessos, distraída, desligada do mundo, soltando a voz: – BUNDA É BUNDA, PÉ É PÉ... PÉ NA BUNDA... Aí a cantora/compositora, achando que podia chutar a si mesma, levou um baita susto e encostou o traseiro na parede, lá ficando por um bom tempo (até mudar de música...). GRAVIDEZ GATUNA... Douglas tem por volta de dois a três anos e está assistindo na TV um desenho animado (e tem desanimado?). A cena: mamãe gata, toda melosa, falava com seu filhote: – Meu bebê... Logo em seguida, a outra mãe, a de Douglas, chama sua cria para alimentá-la e como mãe, tio, tia, avô, avó e um mundaréu de adultos, com a intenção de agradar, fala 154 Essas crianças... Osvaldo Reis mais ou menos do jeito das crianças. A pronúncia da mãe, “misturou” a cabecinha do garoto: – Douglas, vem bebê leite... Douglas não topou o convite da mãe, ameaçou ir embora de casa, chorou, e não quis tomar, nem por decreto, o tal produto extraído da vaca, e retrucou: – EU NÃO VÔ TOMÁ, NÃO!!! EU NUM QUERO FICÁ CUM UM GATINHO NA BARRIGA!!!!! CAMPEÃO DE AFOGAMENTO... Douglas tinha lá por volta de quatro, cinco anos e foi “colocado” numa escola de natação. Até aí nada (?) de mais a não ser a vontade e necessidade que o sujeito tinha de contar, repetidas vezes, e pra todo mundo, a sua mais recente novidade. Não gosto (pior que é verdade!) de me incluir nas histórias, mas nessa não tive jeito de escapar já que sua vítima foi o babaca do tio aqui. É o seguinte: os pais viajaram e me deixaram na casa pra cuidar dos “anjinhos” Norma e o enfocado Douglas. Eu me encontrava “atolado” na leitura de um jornal, e o sujeito no meu pé querendo contar que estava numa escola de natação, embora já soubesse da própria boca umas trocentas vezes, mas ele insistia me puxando pela barra da calça, manga da camisa etc. e tal, e a fala era sempre a mesma: – TIO, EU TÔ NUMA ESCOLA DE NATAÇÃO... E eu continuava “enfiado” no jornal, já sem conseguir me compenetrar na leitura, pois toda hora, de tempo em tempo, tava lá o carinha: – TIO, EU TÔ NUMA ESCOLA DE NATAÇÃO... Aí “comigo” já quase explodindo, parei de ler, virei-me pra ele, dei-lhe toda a atenção do mundo e “pacientemente” perguntei: – “Tá”, você entrou numa escola de natação... E daí?... Daí é que descobri o motivo de tanto orgulho... Fazia pouco mais de uma semana que ele freqüentava a escola e seu progresso era espantoso, um Einstein da braçada, uma fera... Em tão pouco tempo... Douglas, de peito estufado, explica: – É QUE EU JÁ SEI ME AFOGAR SOZINHO... EX-INDIANA JONES... Tem criança medrosa e tem criança valente. Poderosas todas são, mudam montanhas de lugar, mudam a cor do mar, aumentam e secam suas águas de acordo com a conveniência e imaginação... A mãe do Gustavo e da Gabriela, quando criança, não fugia à regra. Norminha tem esse apelido em razão, lógico, no início por ser criança, depois a alcunha permaneceu em razão de sua altura, podendo ser comparada à do Atchim, do Zangado, ou seja, pouco menos de um metro e quarenta e cinco, no máximo... Em sua meninice, claro, um pouco menor, mas muito “macha”, valente como o diabo, tanto é que deixava sempre em polvorosa as pobres serpentes do passeio “cúbico”, em Curitiba, que, quando sentiam a presença da garotinha, tentavam, em vão 155 Essas crianças... Osvaldo Reis se esconder. Mas como fazê-lo se estavam dentro de uma vitrina de vidro? Mas as coitadinhas ficavam realmente apavoradas com a Norminha por perto... As lagartixas, que ela chamava “pegatixa”, então, chegavam a voar, mudar de cidade, bairro, país até. Um de seus prazeres era dar nós nas pobres e indefesas jibóias.... Mas o tempo passa... Hoje, a “Indiana Jones” de saias tem medo até do “jacaré de parede”, suas famosas “pegatixas” da infância... “VÃOCABULÁRIO” Sabe aquele negócio que dá na gente de ficar repetindo a mesma coisa o tempo todo? Principalmente quando se trata de música... Isto já deve ter acontecido com todo mundo... Quando a gente, sem perceber, tá cantarolando somente um trecho, sempre muito curto, de uma mesma melodia: “Quando olhei a terra ardendo”... Um minuto depois, começa tudo de novo: “Quando...” E assim vai até deixar repleta a região testicular dos infelizes “escutantes”. Um belo dia, voltando de uma viagem, a mãe Helena e este mentecapto, tio do dito cujo, ouvem Douglas se “desgüelando” a todo vapor mesmo, uma musiquinha. Acho que ele não decorou a letra por ter somente uns três ou quatro anos que falava de uma tal galinha de cor amarela, e, de minuto a minuto, tá lá o cantor Douglas, soltando a voz: – A GALINHA AMARELINHA... E pouquíssimo tempo depois a história se repetia e assim foi um punhado de vezes, a mãe já estava vermelha de raiva e o imbecil aqui, roxo de ódio. Douglas, nem aí: – A GALINHA AMARELINHA...A GALINHA AMARELINHA... Aí, a mãe (se é que alguma vez teve) perdeu de vez a paciência, fez o sujeitinho “fechar a matraca” e, virando-se para o banco traseiro, onde estava o seu Nelson Gonçalves, mandou bala: – Que diabo, Douglas, você não tira essa galinha da boca... Douglas entrou num acordo com a genitora e fechou o bico... Silêncio total por um bom tempo... Mas era muito silêncio e isso também incomoda. Douglas tá lá quietinho, mudinho, parecia até sem respirar... A mãe resolve pôr fim na situação: – Douglas, também não é preciso ficar tão quieto assim... Aí o garoto dá uma lição na indecisa mãe: – Ô MÃE, O QUE VOCÊ QUERISSE QUE EU FAZISSE? EU CANTO, VOCÊ DÁ BRONCA, EU FICO QUIETO, VOCÊ DÁ BRONCA????????? LUZ DESACESA... Uma particularidade no já apresentado Douglas: quando bem miudinho gostava de ver televisão... Calma, essa ainda não é a particularidade, aliás, nem tão particular 156 Essas crianças... Osvaldo Reis assim... Direto ao assunto, ele gostava de assistir no escuro. Tem gente que acha que no escuro a imagem fica melhor. Acho que Douglas também achava... Mas criança sozinha no escuro, é complicado, moleque mais ainda... Assim, todos os marmanjos que estavam por perto, para tê-lo sob controle, pelo menos de vista, acendiam a luz, o que deixava o carinha bravo que só, e cada vez que a luz era acesa, ouvia-se (até no próximo quarteirão) os berros do garotão: – PODE DISACENDER ESSA LUIZ !!! “VALENTE” E “TRABALHADOR” Douglas era miudinho de tudo e tinha um medo terrível de assombração. Bastava ele ver alguém rezando que ele achava que a reza era para espantar a “coisa” que estaria por ali... A mãe vai com Douglas visitar o túmulo de seus pais no cemitério de Maringá. Além de visitar, aproveitaria também para dar uma limpada na moradia dos avós de seu filhote. Helena vai à frente e Douglas, literalmente, arrastando um balde com objetos de limpeza incluindo uma vassoura, caminha bem atrás. Chegando ao túmulo a mãe se ajoelha e começa a rezar... Douglas imagina que tem alguma “coisa” por ali, abandona a vassoura e o balde no caminho, corre em direção à mãe e quer saber: – MAE, ONDE “ELA” TÁ? A mãe interrompe a prece e explica ao garoto que não havia ali nenhuma assombração e que ela estava rezando para Deus ajudar o avô e a avó. A reação de Douglas fez a mãe se desconcentrar: – MÃE, SE REZAR DEUS AJUDA? A mãe responde que sim. Douglas fica feliz da vida, esquece até da assombração, e pede para a mãe: – MÃE, ENTÃO, REZA PRA DEUS E PEDE PRA ELE ME AJUDAR A CARREGAR ESSA VASSOURA... NORMA HELEN GALDINI DOUGLAS ALEXANDRE GALDINI PAIS Maria Helena / Osmar Galdini AVÓS MATERNOS Ana / Geraldo Fernandes Reis AVÓS PATERNOS Norma / Luiz Galdini Evitando bronca... Paula: Papai, você sabe escrever no escuro? Papai: Acho que sim. O que é que você quer que eu escreva? Paula: Seu nome no meu boletim. 157 Essas crianças... Osvaldo Reis A “FERINHA” E O “FERÃO” João tem lá por volta de seus quatro anos, uma cabeleira farta, cacheada, sorriso fácil, muita simpatia e malandragem a não mais poder. É filho da Sara e do Reinaldo. João adora sacanear todo mundo, mas um de seus alvos preferidos é o avô José Maria Barreto (o Barreto), a quem ele chama simplesmente "vô B". No último dia 21 de abril, dia de Tiradentes, Barreto acompanha uma pequena reforma no bar do cunhado Léo e do filho Rogério, que fica nas proximidades do Parque do Ingá (em Maringá), local onde o pessoal pratica caminhada. O pequeno João “tá” por perto e puxa conversa com o avô: – VÔ B, HOJE É FERIADO, NÉ? – É. Responde o avô. João continua: – E VOCÊ GOSTA DE FERIADO... NOS FERIADO TEM BAILÃO LÁ NO CLUBE DO VOVÔ E VOCÊ ADORA IR LÁ PEGÁ AS VÉINHA... Barreto dá uma risadinha daquelas que significa nem sim, nem não, também não diz nada. João fica intrigado... Aí vai passando uma “caminhante” em volta do parque, instintivamente Barreto olha em sua direção... João endoida e volta cutucar o “vô” B que, após o diálogo, lembrou-se de fazer alguma coisa lá dentro e se mandou: – TÁ VENDO? VOCÊ JÁ TÁ DE OLHO NAQUELA LÁ... JOÃO HENRIQUE BARRETO MAIA PAIS Sara Cristina / Reinaldo Maia AVÓS MATERNOS Léa / José Maria Barreto AVÓS PATERNOS Maria / José Maia 158 Essas crianças... Osvaldo Reis ALUNO APLICADO... Fernando, o filho mais velho do casal Marinalda e Aparecido, estava sendo constantemente provocado pelo garoto do vizinho que ganhara do pai uma bicicleta usada. Parece até que o único caminho que o sujeitinho tinha para percorrer era o que passava em frente à casa de Fernando. Fernando conta pro pai as fosquinhas que o menino lhe fazia em suas constantes idas e vindas. Cido toma as dores do filhão e lhe dá de presente uma bicicleta, novinha em folha e faz também uma recomendação: – Cada vez que você passar perto dele, fale que sua bicicleta é nova e não aquela porcaria dele que é usada... O garotão ouve atentamente o conselho paternal. Dias depois, as mães do Fernando e do provocador garoto, estão conversando e o filhote da vizinha está por perto. Fernando sente que o momento da vingança havia chegado. Aproxima-se do concorrente e sua “lacraia” e manda ver: – MINHA BICICLETA É NOVA E NÃO UMA PORCARIA USADA COMO A SUA. A mãe de Fernando dá-lhe uma tremenda bronca e o adverte: – Você nunca mais fale isso... Aí, ficou pior o soneto que a emenda... Fernando, orgulhoso, completou: – MAS MÃE, FOI O PAI QUE MANDOU EU FALÁ... EU TAMBÉM TENHO ! Além do já mencionado Fernando, completam a prole de Marinalda e Aparecido, Leandro o do meio e o caçulinha Rafael. Na época Fernando contava com cinco anos, Leandro dois, e Rafael oito meses. Os pais estão conversando com uma vizinha, o caçula está no colo da mãe, 159 Essas crianças... Osvaldo Reis Fernando, brincando no quintal e Leandro por perto... É muito comum pessoas da mesma família terem lá suas marcas, principalmente pintas, caso dos meninos descritos. E o assunto gira exatamente sobre as famosas pintas dos filhotes. A vizinha fala das pintas de seus pimpolhos, explica onde estão etc. e tal. Leandro está, nem parece, como de costume, ouvindo a conversa, embora aparente o máximo de desinteresse pelo assunto, desligado, nem aí, mas seu nome é lembrado e o carinha sente-se na obrigação de entrar no papo. A mãe está falando mais ou menos igual a vizinha, isto é, das famosas pintas de seus garotões, e exemplifica: – O Fernando tem a pinta na coxa esquerda, perto do joelho, o Rafael, aqui na perninha (mostra o local), mas o Leandro não tem. Só o Leandro não tem pinta. O até então desinteressado na conversa entra em ação... Se o sujeitinho não contasse com dois anos incompletos a coisa teria tido, dimensões muito maiores, seria, no mínimo, violento atentado ao pudor, os bons costumes teriam ido para as cucuias, a vizinha teria tapado os olhos e disparado daquele local, enfim... É que quando Leandro escutou que ele não tinha pinta, seu ouvido de pouca prática entendeu alguma outra coisa e com o “pililico” de fora, agarrado no “bicho”, chamou a atenção de todos e, mostrando seu instrumento, confirmou: – EU TAMBÉM TENHO, OLHA AQUI Ó...Ó... FERNANDO BAPTISTA LEANDRO BAPTISTA RAFAEL BAPTISTA PAIS Marinalda / Aparecido José Dias Baptista AVÓS MATERNOS Diamantina / Manoel Alves do Nascimento AVÓS PATERNOS Nelsina / José Dias Baptista Quando o tempo de criança o meu tempo de hoje invade, eu sinto a mão da lembrança apertar minha saudade ! Amália Max 160 Essas crianças... Osvaldo Reis LÁPIS CORAL Paulo Popovick, com seus três anos de idade, vivia com os pais e os irmãos na zona rural em Apucarana (PR). Um belo, dia o garotão vê, pertinho da casa, uma cobrinha coral. “Tá” certo que era bem pequena, mas era cobra, que faz tremer perna de adulto. Se é grande, treme bastante; pequena, menos, mas que treme, treme. Com Paulo foi diferente: em vez de tomar um susto daqueles e chamar de cara a maior autoridade que é a mãe, depois o pai e em seguida o Exército, Marinha, Aeronáutica, Suat, Corpo de Bombeiros, não fez nada disso. Soltou, sim, uma perolazinha inesquecível: – OLHA LÁ UM LÁPIS ANDANDO... “Mãezona” Sabe a anedota da mãe chata e super protetora? É daquelas mães que ligam do trabalho para casa de cinco em cinco minutos e pergunta à babá: – Deu o leitinho? – Deu a bananinha? – Deu o lanchinho? – Ele fez xixizinho? – Trocou a fraldinha? – Ele fez cocôzinho? – Molinho ou durinho? E vai por aí. A mãe desta anedota também é muito coruja. Ela encontrou uma amiga e foi logo falando. – Meu filinho está andando há mais de três meses. – Chi! – disse a amiga. – A essa altura ele já deve estar bem longe, não? 161 Essas crianças... Osvaldo Reis ASSOMBRAÇÃO DESNUDA... Essa garotona, a Jayanna, está com seis anos, mora e estuda em Londrina e tem uma queda especial para as aulas de ciência, matéria em que sempre tira nota máxima (?). Numa dessas aulas (de sua matéria predileta) a professora está falando sobre o corpo humano e, para dar maior brilho e ilustração à sua fala, chama a atenção de Jayanna e pergunta-lhe, apontando o esqueleto: – Você sabe o que é isto? A gatinha, com toda certeza do mundo, responde, na bucha: – SEI... É UMA ASSOMBRAÇÃO PELADA!!!!!!!!! QUESTIONAMENTO LÓGICO... Nadyanna tem hoje seis anos, e em companhia dos pais e avós também vive em Londrina. Apesar da idade, mas pelo fato de a mãe ser professora, a gatinha já sabe ler. Já leu um montão de livros, e um particularmente lhe chamou a atenção: “Branca de Neve e os Sete Anões” que leu e releu um mundaréu de vezes. Acho que sua inteligência, um tanto quanto aguçada e porque não dizer prematura, deve fazer o autor repensar um pouco a história e mudar alguma coisa quando for lançar uma nova edição... Dia desses, a Nadyanna conversando com a avó materna, Nadir, fez-lhe uma perguntinha, no mínimo curiosa e intrigante: – VÓ, A BRANCA DE NEVE, MORANDO COM OS SETE ANÕES, NÃO É MÃE DE NENHUM ANÃOZINHO????? NADYANNA MATTOS PADILHA JAYANNA MATTOS PADILHA PAIS Joanaina / José Luiz Silva AVÓS PATERNOS Joracy / Pedro Luiz Silva AVÓS MATERNOS Nadir / Antônio Padilha Alonso 162 Essas crianças... Osvaldo Reis PAIS IMENSURÁVEIS... A Jarmiran tem sete anos, vive com os pais Marly e José em Tibagi. Um dia, na hora do recreio, está conversando com a coleguinha Nadiely, que tem mais ou menos a sua idade. Nadiely resolve fazer uma propagandazinha, aparentemente enganosa, a respeito de seu herói, peladeiro contumaz, mas que não chega a ser um Robinho. O diálogo das duas lembra a conversa de antigos “coronéis” do Nordeste falando de suas fazendas... Nadiely diz à amiguinha: – MEU PAI É O MAIOR EM TUDO. QUANDO JOGA BOLA, A MINHA MÃE DIZ QUE ELE SÓ NÃO FAZ CHOVER... Jarmiram não deixa por menos e entrega seu “velho”: – MEU PAI, SIM, É O MAIOR. MINHA MÃE DIZ QUE QUANDO ELE QUER, ELE TAPA O SOL COM A PENEIRA!!! JARMIRAM CARDOSO PAIS Marly / José Edwirges Cardoso AVÓS PATERNOS Maria / José Cardoso AVÓS MATERNOS Eufrázia / João Carotti “Mão de vaca” Professora: Vamos imaginar que você tem um real no bolso e pede ao seu pai mais um real. Com quantos reais você fica? Aluno: Um real. Professora: Você não sabe nada sobre matemática. Aluno: E a senhora não sabe nada sobre o meu pai. 163 Essas crianças... Osvaldo Reis “DENOREX” Lembra aquela propaganda de um xampu que alguns falavam que era remédio, outros não? Ou era um xampu com efeito de remédio, sei lá... Esta historinha aqui é mais ou menos do mesmo jeito: parece piada, mas (os que me contaram juram que é verdade!) outros dizem que não é.... Era uma aula de catecismo. Criançada em torno de cinco, seis anos, dentre elas o Hélinton. Se Jesus gosta de criança, a recíproca é muito verdadeira. E a professora estava falando exatamente sobre o Filho de Deus. A mãe do garotão era (ainda é) um tanto quanto rígida na questão da disciplina do filhote (é também professora). Seguinte, a professora falou tanto em Jesus, que Ele oferece o paraíso a quem o segue, que Ele leva as crianças para junto do Pai e coisas do gênero... A garotada segue no maior respeito e silêncio a aula. O enfocado também. Aí, a professora querendo “medir” o real interesse de seus alunos, vendo se sua aula teve o efeito desejado, pergunta à classe: – Quem aí quer ir pro céu? Hélinton nem pisca, responde na bucha: – EU NÃO POSSO... MINHA MÃE FALOU QUE ERA PRA MIM IR PRA CASA ASSIM QUE ACABASSE A AULA!!!!! HÉLINTON PADILHA PAIS Jassanan / Tom Gomes AVÓS PATERNOS Rosária / Luiz Gomes AVÓS MATERNOS Nadir / Antonio Padilha Alonso Argentino Professor: Júlio, diga o nome de algo importante que temos hoje e que não existia há dez anos. Edu: Eu! 164 Essas crianças... Osvaldo Reis “CÃOPANHEIROS” Ricardo, hoje, é papai de Mayra e Eduardo, mas quando criança também deu umas aprontadinhas... Ricardo, com quatro anos de idade, arrumou um baita de um “dodói”. Pra sarar era preciso tomar um montão de injeções e, como se sabe, criança “adora” tomar injeções. Com o pequeno Ricardo a história não era diferente. Cada vez que o “aplicador” aparecia – era um enfermeiro apelidado Chicão, que trabalhava no hospital de seu pai – o Ricardo desaparecia... O garotão tinha alguns animaizinhos de estimação: dois cachorros com bocas maiores que as de jacaré e tamanho de um bezerro, duas feras, literalmente. Determinado dia, chega lá o Chicão com sua maleta contendo a “deliciosa” injeção de penicilina que curaria o dodói do garotão. Como de costume, Ricardo escafedeu-se, mas deixou rastros: seus amigos cachorros foram com ele pra dentro de casa, mas o profissional precisava fazer o seu trabalho e sabia onde se achava o seu paciente... Pra resumir, Ricardo soltou seus amiguinhos, cujo resultado custou ao pai, médico, um montão de desculpas, linhas, agulhas, bisturis, tesouras etc. já que teve de costurar, quase que por inteiro, o coitado Chicão... Outra do “anjo” – usando ou valendo-se de seus mencionados amigos, – referia-se a um sorveteiro, que pelas ruas tocava aquela buzininha anunciando sua passagem... Era só os três ouvirem a tal buzina que disparavam na direção do portão onde se encontrava o carrinho de sorvetes e, claro, seu condutor. Ricardo tinha um método infalível (e um crédito, “relativamente” forçado) pra se deliciar com os gelados, claro, junto com a molecada da rua inteira: avisava gentilmente ao 165 Essas crianças... Osvaldo Reis sorveteiro: – SE O SENHOR NÃO VENDER FIADO, EU SOLTO OS CACHORROS... MAYRA SOARES PLEPIS RICARDO PLEPIS Fº EDUARDO SOARES PLEPIS PAIS Rose / Ricardo Plepis Fº Célia / Ricardo Plepis AVÓS MATERNOS Mayra / Eduardo: Aurora / Jairo Campos Soares Ricardo Fº: Greta / Martin Plepis AVÓS PATERNOS Mayra / Eduardo: Célia / Ricardo Plepis Ricardo Fº: Araci / Astrogildo Freire Aguiar “A criança que não brinca não é criança...” “Mas o homem que não brinca perdeu para sempre a criança que era, e sentirá saudade”. Da autobiografia de Pablo Neruda. 166 Essas crianças... Osvaldo Reis UM PEIXÃO DE QUATRO RODAS O Diego já “tá” meio “coroa” e vive na zona rural, na estrada Rio da Barra, no município de Roncador. Ele gosta de montar a cavalo, ajudar os pais na lida do gado, mas também manja um pouco de computador e de pescar, já que a poucos metros da casa tem um rio e uma lagoa. Com nove anos, portanto, já é um pescador experiente e pesca peixes dos mais variados tamanhos e espécies... Esta história foi ele mesmo quem contou, o espírito de pescador, sempre acompanhado de pequenos (?) exageros, é dele. Certa época, aconteceu um acidente num rio lá por perto de sua casa: um trator perdeu o freio despencando ladeira abaixo, indo parar dentro do rio. Seu condutor acabou falecendo. Até aqui é verdade... Muito tempo depois, Diego, em companhia do pai, está pescando nas proximidades de onde aconteceu o fatídico acidente... A pescaria até que estava indo bem, mas só estavam pegando peixes pequenos. De repente, Diego fisga um daqueles, tão grande que ele, mesmo com muita força e habilidade, não conseguiu tirar da água. Aí, o pai é colocado na história, mergulha e vai tentar tirar o “bitelo” do rio e percebe que é quase impossível, pois a linha não suportaria: o anzol do filhão estava enroscado no volante do trator acidentado, uma baita coincidência... Mas tem só um detalhe, de acordo com seu pai: quando não está muito seco o tempo, o rio tem, no máximo, um metro de largura e uns 40 centímetros de profundidade... Vai ser um grande... pescador... esse Diego.... GATO ESCALDADO EM CHAPA QUENTE! O Diego, junto com os pais, forma a família DDD, isto é, ele, Diego, o pai, Donizete e a mãe, Dina; DDD, portanto. Nessa aqui, o sujeitinho era bem miúdo, não tinha ainda três anos e acabou por descobrir um meio novo de saber se a chapa do fogão estava quente (não se sabe se o método foi bem aceito pela Sociedade Protetora dos Animais!). Na casa do carinha, além do fogão a gás, tem também um fogão à lenha. Diego, 167 Essas crianças... Osvaldo Reis mesmo com o fogo aceso, queria saber se a chapa estava quente... E a chapa esquentou, só que pro lado do gato... É que o medidor de temperatura usado pelo Diego foi o focinho do bichano e pelo “berrô” que o gato deu, devia estar realmente muito quente e o bichinho, assim que se desvencilhou do garotão, saiu num pique tão grande que no dia seguinte foi localizado nos arredores de Londres e só foi reconhecido por causa da mancha na fuça e estar “miando” em Português... QUATRO “NUM” É FALTA... O Diego voltava à pé da escola onde estuda. Ele e mais três coleguinhas. A disputa era dura, terrível, renhida, era quase impossível saber quem é que “tava” com mais preguiça... Nisso aparece um outro coleguinha montado num baita cavalão. Os três “cansados” resolvem pedir uma carona, que na zona rural nunca é negada, indiferentemente do meio de transporte. A condução, no caso o cavalo, é que não deve ter gostado de ficar com cara de cavalinho de carrossel e os quatro, numa linguagem pouco coloquial, foram literalmente expelidos do dorso eqüino: o animal deu uma parada brusca e todos foram parar no chão, beijando e cheirando a terra. Um tombão que certamente nenhum deles vai esquecer... Aí tiveram de continuar a marcha à pé e o pior, mancando, em relação à mancada que deram ao montar os quatro, sendo que dois em um já é falta, imagine quatro... CAÇADOR ARREPENDIDO Pelo fato de viver na zona rural, Diego também gosta ou gostava de brincar com estilingue, no Nordeste chamado baladeira e até bodoque, embora bodoque seja outra coisa. Nessas suas brincadeiras, o rapazinho, então com cinco anos, acabou acertando um passarinho e ele quase morreu de pena; aqui no caso, de dó. Quem tem penas era o bichinho que recebeu a pelotada... Diego juntou sua caça e foi pedir à mãe que o ressuscitasse. A mãe rezou, colocou água no bico, fez massagem no coração, enfim, acabou salvando a vida do pobrezinho. Diego então, quer saber da mãe a “marca” do passarinho que ele quase matou e nunca mais brincou com aquela arma. Mamãe explicou ao filhote o nome do pássaro: – É uma “andurinha”... Diego discordou e esclareceu: – NÃO MÃE, ELA NÃO TÁ DURINHA NÃO, ELA TÁ É MOLINHA !! DIEGO MONTEIRO DA SILVA PAIS Dina / José Donizete da Silva AVÓS MATERNOS Judite / João Maria Monteiro AVÓS PATERNOS Leonídia / Joaqum Gomes da Silva 168 Essas crianças... Osvaldo Reis DORMINDO COM O INIMIGO As histórias a seguir parecem também de folclore político, já que as pessoas envolvidas são do meio. O casal Marilene/Jayme Rodrigues de Carvalho, tem, pela ordem, quatro filhos, Jayminho, Fabíola, César e Fernando, mais conhecido por Nando. Nem bem haviam chegado à cidade, o doutor Jayme (assim é tratado), bom de fala, ótimo orador, filiou-se ao então MDB, e por este partido candidatou-se a vereador tendo obtido excepcional votação; foi disparado o mais votado naquela eleição, condição que o credenciou aos alçar vôos mais altos: tentou ser prefeito, mas... Talvez nem Freud consiga explicar. Jayme tem um carinho muito especial pela filharada, que com ele vai aos comícios, futebol, trabalho, enfim, eles estão sempre juntos. Um dos adversários de Jayme era Gil Marques de Almeida, que acabou se elegendo e fez da cidade “o melhor lugar do mundo”. Distribuiu placas de Guaíra a Fortaleza, e de Foz do Iguaçu ao Acre (pra não ficar naquela manjada do “Oiapoque ao Chuí”) onde se lia: “Visite Goioerê, o melhor lugar do mundo”. Jayme, mesmo com os dotes já mencionados, perdeu a eleição. Até aí nada de mais. Eleição se perde ou ganha, empatar é muito difícil. O motivo da derrota é que é assustador: seu filho César (por incrível que pareça) trabalhou, fez campanha, comícios, distribuiu santinhos de Gil, o oponente de seu pai... Pra resumir, o sujeito só não fez mais coisas, não teve uma participação mais efetiva (embora tenha sido decisiva) na campanha do adversário, pelo simples fato de contar na época entre três a quatro anos de idade... “VIDINHA & VIDÃO” Persistente, Jayme, em 1974, pelo MDB, candidatou-se a Deputado Estadual e acabou se elegendo. Em Goioerê, Jayme e prole viviam numa casa modesta, era uma espécie de comitê, um entra e sai de gente a todo e qualquer instante, o que contribuía (e muito) para que a casa – principalmente na área de entrada, onde se concentrava Jayme e seus 169 Essas crianças... Osvaldo Reis amigos - nunca permanecesse em perfeita ordem, mesmo sendo a esposa muito dedicada e eficiente. Eleito Jayme, seu companheiro de dobradinha (na época uma coisa que era levada muito a sério), Antônio Anibelli, arranjou uma casa para o novo deputado estadual paranaense - Anibelli era federal. Casa bem localizada, bairro próximo ao centro etc e tal... Jayme e família se mandam para Curitiba, a fim de conhecer a nova moradia. Era uma casa muito confortável, com churrasqueira, uma pequena piscina, um montão de quartos, sala ampla, cozinha idem, além de escola por perto, enfim, quase perfeita. Todos gostaram da casa e fizeram também algum tipo de comentário, menos Nando que naquele dia, parecia mudo. Sua opinião só aconteceu quando já estavam deixando a tal casa a fim de providenciar a mudança. E pela indagação feita pelo sujeitinho, então com idade aproximada entre quatro e cinco anos, parece atestar tudo o que foi dito a respeito do mencionado imóvel. Cara a cara com o “velho”, olhos nos olhos, semblante fechado, o pequeno Nando mandou ver: – QUEM ERA NÓIS, HEIN PAI ???? Serventia paterna – Manhê, que é quem nos dá o pão de cada dia? É Jesus? – É sim, meu filho. – E foi a cegonha que trouxe o meu irmãozinho? – Foi sim, meu filho. – Então o pai, para que é que e ele serve? Só pra dar bronca na gente? 170 Essas crianças... Osvaldo Reis “MAMÃE EU QUERO”... No Natal, o papai Noel recebe, lógico, em troca de um montão de promessas e presentes, um mundaréu de chupetas, cujos usuários prometem deixá-las pelos motivos expostos. E, curiosamente, as crianças largam a chupeta (àquelas que o bom velhinho recolheu...). Não era época de Natal. Edna, a mãe da Júlia (dois anos e oito meses) resolveu ir direto ao assunto, e encheu a filhota de promessas – férias na Disney, almoço no McDonalds, Carnaval no Rio de Janeiro, trinta dias em Cancun, não brigar pelo boletim escolar em vermelho – e mais outras tantas coisas, além dos presentes, alguns já entregues, tudo para tentar fazer a menina deixar a chupeta. Corrupção ativa de um lado, aparentemente passiva do outro. Suborno no duro... Quando a mãe estava quase se convencendo de que a coisa estava dando certo, eis que Júlia, com personalidade, objetiva, direta, exige de volta seu objeto de inenarrável prazer, deixando sem ação a genitora que quase conseguira seu intento... Esbarrou no quase, já que Júlia cheia de razão, sem nenhuma dúvida, sentenciou: – MÃE, EU NÃO QUERO ESSES PRESENTES... DEVOLVO TODOS, O QUE EU QUERO É MINHA CHUPETA DE VOLTA !!! HOMEM É QUE É... Sabe-se lá o porquê, provavelmente (?) por alguma coisa que ela tenha feito de errado, a mãe resolve dar uma bronca do tamanho do mundo em Júlia. A gatinha até que está assimilando bem a tal bronca, afinal, mãe é mãe, sabe das coisas (ou pensa que sabe, na ótica infantil). Quando a mãe já não encontrava mais nada pra dizer, quando sua argumentação tinha ido pro espaço, resolve fechar, com chave de ouro, sua fala e, de 171 Essas crianças... Osvaldo Reis dedo em riste, encara a filhota e tasca: – Isso é coisa de maluco, menina... Júlia ouve atentamente e prova à mãe que, pelo menos neste caso ela estava errada. Na bronca pode ser que não; no vernáculo, a seu ver, não dava pra engolir. Júlia “ensina” a mãe, e sem mortos ou feridos, termina a “briga”: – MALUCO, NÃO... É MALUCA... PORQUE EU SOU MENINA !!! JÚLIA SANTINI MENEGHIN PAIS Edna / Marcos Roberto Meneghin AVÓS PATERNOS Odila / Mário José Meneghin AVÓS MATERNOS Maria Helena / Braz Santini Causa própria Na hora do recreio, dois garotos vão até a enfermaria da escola. – O que houve? – pergunta a enfermeira. – É que eu engoli uma bola de gude. – responde um dos garotos. – E você? – a enfermeira pergunta ao outro garoto. – É que a bola é minha. 172 Essas crianças... Osvaldo Reis "GOLPE " NO MECÂNICO... A Ângela tinha um carrão 1929 (ou quase). E quem tem um carro assim, precisa, no mínimo, ter um amigo mecânico. No caso de Ângela, o "anjo da guarda" era Ângelo, cuja oficina ficava perto de sua casa. Entre outras coisas, Ângela usava seu possante para o transporte escolar de seus filhotes: Edgar, o mais velho, de seis; Erick, quatro; e a caçulinha Pâmela, com dois anos. A oficina de seu quase xará e amigo ficava, mais ou menos, no meio do caminho, nos dois sentidos, entre sua residência e a escola onde estudavam seus dois maiores. Seu carrão falhava mais que isqueiro e gerente de banco, ou seja, pifava na hora em que ela mais precisava... Um belo dia, ela estava levando os garotos para a escola e pra variar, o carro enguiçou. Aos trancos e barrancos conseguiu chegar até a oficina, falou com Ângelo e este deu um jeito, rápido, explicando-lhe não poder atendê-la naquele momento. Ângela, referindo-se aos meninos, disse ao mecânico: – Eu vou levá-los à escola e depois passo por aqui. Os meninos só ouviram esta parte da conversa. Dias depois, o carro voltou a pifar, desta feita na volta da escola. A mãe, mais uma vez, pára na oficina. Seu amigo disse que precisava dar uma olhada mais apurada no veículo, pediu-lhe que o deixasse e ao término do conserto ele levaria a "condução" em sua casa. Ângela concordou. Mas seus "anjos" não estavam a fim de andarem a pé e eles estavam com (só um pouquinho...) preguiça... Erick se lembrou do que a mãe, dias antes, dissera ao mecânico, e em nome de todos sugeriu: – MÃE, POR QUE VOCÊ NÃO DÁ AQUELE GOLPE QUE VOCÊ DEU OUTRO DIA... DIGA A ELE QUE VOCÊ VAI LEVAR A GENTE EM CASA E DEPOIS PASSA AQUI... E DEPOIS VOCÊ NÃO PASSA COISA NENHUMA... 173 Essas crianças... Osvaldo Reis "GOLPE" NO SANTO... Como boa católica, Ângela, todos os domingos, vai à missa, e a tiracolo, seus filhotes. Naquele domingo não foi diferente. Missa das nove, lá está a zelosa mãe e seus pimpolhos. Meninos bem comportados, nenhuma bagunça na igreja, ao contrário, pareciam gente grande... Ângela sempre teve a preocupação de dar a cada um deles R$ 1,00 para, no tempo oportuno, ser dado em oferta. Chega a hora do ofertório. Os três entram na fila acompanhados pela mãe. Ângela vê (que coisa linda!) seus filhotes estenderem os braços até o cesto, um gesto bonito que deixou a mãe orgulhosa. Terminada a missa, na frente da igreja, pertinho da escadaria, está um carrinho de cachorro-quente. A meninada quer. Todos partem para cima da mãe que se esquiva avisando que não deviam comer, que já estavam indo pra casa, que aquilo "estragaria" o almoço... Tudo em vão. Ninguém arreda pé do lugar. A mãe tenta a última e decisiva cartada. Argumento incontestável: – A mãe não tem dinheiro. O dinheiro que tinha dei pra vocês oferecerem à igreja... Ato contínuo, em coro, sincronizados, sacam dos bolsos uma nota de um real, mostram a grana para mamãe "dura" e numa só voz, mandam ver: – EU TENHO !!! EDGAR TIBÚRCIO JÚNIOR PÂMELA MARIA TIBÚRCIO ERICK MATIAS TIBÚRCIO PAIS Ângela / Edgar Tibúrcio AVÓS PATERNOS Maria / José Tibúrcio AVÓS MATERNOS Marta / Mário Nakano Estudioso – Em qual dia da semana você mais gosta da escola? – Domingo. – Por quê? – Porque ela tá fechada. 174 Essas crianças... Osvaldo Reis AULA DE GEOGRAFIA... Felipe está com cinco anos; sua irmã Ana Luísa tem quatro. Esses dois, por enquanto, são a alegria do casal Cláudia e Denerval. Ambos estão na escola e são muito aplicados. Felipe, particularmente, tem uma carinha... Além da carinha sapeca ele também tem uma queda por leitura. Ferinha, o mocinho. Os pais gostam de sua vocação e compra para ambos, os mais variados livros. Dia desses, por exemplo, Felipe "devorava" um livro que falava de Geografia, mais especificamente sobre continentes. E lá vem o sujeitinho com suas explicações: existem cinco continentes que são: Americano, Europeu, Asiático, Africano e a Oceania. Continuando, disse que o Brasil, Argentina e Canadá, entre outros, são países do Continente Americano; já a Alemanha, Espanha e Portugal, ajudam a formar o Continente Europeu. As ilhas, incluindo Japão, Nova Zelândia e Austrália, são da Oceania. E que tinha também (ou será que ainda tem?) o Continente UMA... A mãe não entendeu nada. O pai um pouco menos. Em que parte da terra estaria esse tal de continente UMA? Os dois consultaram a Internet, onze enciclopédias, ciganos e não conseguiram saber a localização do mencionado continente. A alternativa que restava era ler o livro do filhote. Enquanto a mãe "enrola" o garoto, o pai o fez, e aí, com muito custo, acabou descobrindo o tal continente, quando leu que os países do Oriente (alguns), dentre esses a Turquia, é que faziam (ou fazem...) parte do misterioso continente. Esclarecendo: com base na Turquia, a "coisa" começou a ser desvendada. No livro do filhão, com todas as letras, está escrito que "UMA PARTE DA TURQUIA FICA NO CONTINENTE ASIÁTICO E A OUTRA FICA NO CONTINENTE AFRICANO"... O detalhe: a palavra UMA era a última de determinada linha e o final da explicação estava na linha de baixo, onde Felipe encerrou sua leitura. O garotão ficou "paradão" na UMA que nem viu a outra... 175 Essas crianças... Osvaldo Reis O SOM DO "MARRONZINHOS"... Na década de 1980, um grupo musical americano fazia muito sucesso no Brasil, e não se dizia grupo ou conjunto, era apenas BEE GEES. O Felipe, que veio um pouco mais tarde, não sabia, nem sabe ainda a pronúncia.. Como toda criança de sua idade, Felipe adora mexer nas coisas e o faz com democracia: pode ser do pai, mãe, avô, tia, avó; enfim, mexe em tudo e de todos, mas não "bagunça" muito: de vez em quando, some a chave da casa, do carro, tudo normal. Esses dias, o jovenzinho resolveu dar uma mexidazinha básica nos CDs e um lhe chamou a atenção, capa, colorido, letras, sei lá, só sei que Felipe fez ao pai uma perguntazinha aparentemente estranha: – PAI, POR QUE É QUE VOCÊ NÃO TOCA O BÉGES? Béges? Que bicho será isso? E é de tocar? Põe estranho nisso. Noutro dia, o casal com os filhotes passeava de carro quando parte da intrigada trama passou a ser desvendada... No toca-CD do veículo, uma música... Felipe aponta o dedo de onde vinha o som e manda ver: – ESSE É O BÉGES... Em casa mostrou aos pais o CD que lhe chamou a atenção: era um CD do famoso grupo BEE GEES, cuja pronúncia correta é BIDÍS. Felipe só "manja" de Geografia e por enquanto, ainda não fala Inglês... FELIPE STEIMACHER BATISTA ANA LUÍSA STEIMACHER BATISTA PAIS Claudia / Denerval Mendez Batista AVÓS PATERNOS Clarice / Paulo Batista AVÓS MATERNOS Maria / João Steimacher Pouco valor... Joãozinho está chorando e o avô vem consolar. – Por que você está chorando, Joãozinho? – Eu perdi uma cédula de um real. – Não chore mais. Tome aqui duas cédulas de um real. – Buáááááááá´!!! – E agora, por que você está chorando? – Eu devia ter dito que tinha perdido uma de cinco reais... buáááááá... 176 Essas crianças... Osvaldo Reis O MOTIVO ERA JUSTO... O coroa é Marcelo, depois vem Mônica, Michel e o caçulinha Bernardo. A diferença de idade entre eles (e ela...) é de três anos. O pai é advogado e também professor, a mãe deixou de ser comerciante para cuidar dos filhotes e da casa (sobraria tempo para mais alguma coisa ?). Todos levam à sério a questão disciplina: hora de ir para escola, brincar, estudar, fazer tarefa, ler, ver televisão etc. e tal. Esse quesito, com certo rigor, é regido pela mãe, já que mulher, quase sempre, é mais organizada que o homem. Mamãe nunca foi de alisar se alguém foge à regra, e lá todos sabem disso, inclusive o pai... Naquele belo dia, o carro do papai deu um defeitozinho, coisa relacionada à parte elétrica. O possante não conseguiu chegar em casa sem ter os parafusos apertados, fazendo com que papai e Michel, então com quatro anos, chegassem atrasados para o almoço... A mãe ouve o barulho da chegada e vai aguardá-los na porta, um tanto quanto intrigada e também preocupada com o atraso, coisa pouco comum, e olhando para o marido quis saber: – Por que é que vocês estão chegando tão atrasados? O pequeno Michel, antes que o pai esboçasse qualquer reação, sem abrir a boca para as explicações de praxe, como bom filho de peixe, entra em cena e o faz sem deixar margem à dúvida, e ainda por cima, mudou o semblante da mãe, que abriu um sorrisão após a inequívoca explicação do garotão: – É QUE O PAPAI TEVE QUE PASSAR NA CONSERTARIA!!! MARCELO CAETANO COTRIM MÔNICA CAETANO COTRIM MICHEL NAREZZI COTRIM BERNARDO NAREZZI COTRIM PAIS Mônica / Euclides Lopes Cotrim AVÓS PATERNOS Devita / Orlando Cotrim Ribeiro AVÓS MATERNOS Maria Zilda / Paulo Narezzi Você sabe o que é cobra na linguagem de criança? – É um rabo que perdeu o cachorro. 177 Essas crianças... Osvaldo Reis TAMANHO NÃO É DOCUMENTO... O Felipe Henrique, filhote da Yara e do Cesar, nasceu em Maringá. Tem hoje quatro anos, mas aos seis meses de idade, com a família, mudou-se para a "vizinha" Rio Branco, no Acre. A mãe o mantém em "rédeas curtas" já que o sujeitinho, desde pequeno, é, digamos, meio danado, tem personalidade, dá umas aprontadazinhas, coisas normais para um menino de sua idade... Os avós maternos moram ao lado, incluindo os primos Vitor, que conta com seis anos e Bruno, quatro. Os três não se desgrudam por nada nesse mundo. E três moleques juntos, a coisa é braba, na capital acreana ou Itaguajé, é o mesmo, isto é, boa coisa não se pode esperar, e com isso a mãe de Felipe Henrique, do mesmo modo que os sobrinhos, quer sempre tê-los por perto ou saber onde estão e, principalmente, saber o que estão fazendo... Para tanto instalou no portão de casa uma baita duma trava numa altura que os meninos não podiam alcançar, com isso, segurança máxima (ou por aí) para os pequenos, tranqüilidade para os adultos da casa... Mas é direito (quase que sagrado) de todo e qualquer "prisioneiro" tentar fugir... O menor dos três é o enfocado Felipe, então com dois anos, o "grandão" era Vitor e no meio dos dois, Bruno, mesmo assim, bem maior que Felipe (na época chamado de Feijão). Os dois planejaram a fuga, mas nenhum dos três alcançava a tal trava. Os dois pensam daqui, pulam dali, riscam, fazem cálculos e nada. E, como o priminho era bem miúdo, não pediram sequer sua opinião... Felipe Henrique viu o drama dos dois e em vez de usar a força, usou sua cabecinha: entrou em casa e, sorrateiramente, arrastou um banquinho, encostou o "bicho" no portão, subiu, abriu a "cela" e os três ganharam a rua... O final só a mãe sabe. BRUNO (Primo) FELIPE HENRIQUE VIEIRA SANTOS VICTOR HUGO (Primo) PAIS Yara / Cesar Augusto dos Santos AVÓS PATERNOS AVÓS MATERNOS Diola / José Augusto dos Santos Carmem / Edson dos Santos 178 Essas crianças... Osvaldo Reis MÃE DESANTENADA A mãe acha que seu filhote é um Gianechini; a namorada, Tiago Lacerda; o pai, mais modesto e comedido, apenas um Marco Palmeira melhorado, claro. Esse cara aí, é o Fabrício (em casa, Fá), filho mais tudo: mais velho, mais novo, mais bonito e sem segundo. Na infância, então, era no mínimo um “Bebê Johnson”, mas tinha um péssimo defeito: era muito ruim de garfo, ou seja, só gostava das coisas que não dependiam de tal objeto: doces, sorvetes, chocolates, refrigerantes e um montão de outras “porcarias”. Pro sujeitinho comer era um tal de aviãozinho pra lá, trenzinho pra cá, presentes via Papai Noel, um punhado de estimulantes (Sadol, Biotônico, Cluvisol...) que ele mandava no bico da garrafa... Paradoxalmente, sua saúde era ótima. Com quatro anos ele já freqüentava a escolinha. Fez Jardim da Infância, todos os prés: I, II, III, sempre na escola das “enes” Neide, Neiva e Neusa suas tias da Escolinha Feliz, em Umuarama. Fá era bom em desenho e gostava muito das histórias que as tias contavam. Um dia, a tia contou uma que falava de dois anjos: aliás, tema de sua obra de arte. Contou para a mãe. A coruja da mãe querendo esticar o papo pergunta-lhe: – Que bom, meu filho, você está fazendo um desenho bem bonito? Fabrício, com ares de sabe-tudo, mandou ver: – CLARO, MÃE, EU TÔ DESENHANDO O BICHO... Bicho? Que bicho seria esse? Um coelho? Um cachorro? A mãe intrigada quer saber: – EU TÔ DESENHANDO O GARFÃO – disse com naturalidade, o artista. A mãe desmontou: tanta coisa pra desenhar e vai logo ele, ruim de garfo, desenhar um grandão? Um garfão... Não dava pra entender. A zelosa mãe sugere que o filho faça outra coisa: uma árvore, casa, rios, montanhas... A mãe, professora, achou que o desenho seria muito comum e assim seu Renoir, com isso, tiraria uma nota muito baixa. O pai também achou estranho. No dia seguinte, Fabrício chega em casa se abrindo mais que mala de mascate e chama a atenção da mãe para ver seu garfão já pronto e acabado. A mãe, que não conseguiu demovê-lo da idéia, pega o papel com o tal garfão e notou que não era um garfão qualquer: era o Capeta, com rabo, chifres, capa e seu inseparável tridente: pro pequeno, um garfão. Só aí é que a mãe se antenou que garfão, para o filhote, simbolizava o MAL. E a partir dessa data, sempre que alguém, com Fabrício por perto, dizia um palavrão, o garoto ameaçava: – OLHA O GARFÃO! O GARFÃO VAI TE PEGÁ!!! 179 Essas crianças... Osvaldo Reis CERTIFICADO SANTIFICADO... Com seis anos, no final daquele ano, Fá, na escolinha onde começou a estudar, ocorreu a primeira formatura do carinha: Pré-III. Para o grande evento, a professora convoca os pais para o detalhamento da festa. A alegria do jovenzinho era contagiante. Aproxima-se o grande dia. Fabrício conta pra mãe algumas “coisas” que iriam acontecer em sua festa de formatura: – A TIA DISSE QUE VAI TER SALGADOS, DOCES, DANÇAS, CANTOS... Fabrício completou as informações afirmando: – O MAIS IMPORTANTE VAI SER O SANTIFICADO... – Santificado? O que é isso? Quis saber a intrigada mãe. A resposta de Fá foi deveras “esclarecedora”: – SANTIFICADO, UÉ... À noite, a mãe está contando ao marido os detalhes da festa (só esqueceu de um) e o pentelho aparentemente desligado, deitadão no tapete, lembra à genitora: – MÃE, VOCÊ ESQUECEU DE FALÁ DO SANTIFICADO. O pai também não entendeu bulhufas, e igual à mãe, perguntou: – Santificado? O que é isso? Parece até que combinaram as perguntas. A resposta é que mudou (só um pouquinho): – UÉ, O SANTIFICADO, NÃO SABE? A mãe, professora, que sabe tudo e mais um pouco sobre escola, emendou: – Ah! Já sei, deve ser o certificado, algum tipo de diploma que os aluninhos formandos vão receber. – NÃO É NÃO! É O SANTIFICADO! – completou o Fabrício, bravo que só. Chegou o tão esperado dia. A festa, sucesso total. Os “formandinhos” estavam impecáveis em seus trajes: calças compridas, camisas azuis, cheias de rendinhas, tipo beca, com direito a um quepe debruado, tanto na parte superior como na inferior, com pele sintética. Um luxo... As apresentações se sucediam. Em dado momento, a tia pediu a todos que se reunissem e dessem as mãos. Fabrício dispara em direção à mãe e explica: – AGORA É O SANTIFICADO... E voltou para o seu lugar. A mãe ficou na maior expectativa. Afinal iria descobrir o que era o tal santificado. Aí, as crianças e os presentes, todos em pé, lado a lado, com as mãos postas em oração, começaram: – PAI NOSSO QUE ESTAIS NO CÉU, SANTIFICADO... FABRÍCIO MARGONAR DURANTE (Fá) PAIS Florisbela / Francisco Durante AVÓS MATERNOS Florinda / José Margonar AVÓS PATERNOS Inês/ João Durante 180 Essas crianças... Osvaldo Reis O “TREM” ERA SURDO... Sabe aquele sujeito magro, mas tão magro, que consegue se desviar dos pingos de chuva? Esse sujeito é o Leonardo, para a família e amigos, apenas Léo, que nasceu em São Paulo, filho da Beth e do Paulo e miudinho de tudo, foi morar em Patos de Minas, lógico, em Minas Gerais, uai! (ou seria sô?) A magreza de Léo, que tia Bela chama Pentelho, relaciona-se com a dificuldade em comer (deve ter puxado ao primo Fabrício...). A coisa é feia mesmo. É um tal de agradar, prometer mundos e fundos, e nada (não de nadar) de o garoto se alimentar. Quem não come fica anêmico (não só em Minas...) e o remédio foi tomar uma injeção contra a tal anemia. Ao ver a enfermeira se aproximar com aquela seringona na mão, Léo, então com quatro anos incompletos, mostrou que já sabia falar o “mineirês” e mandou uma pérola das Gerais: – MÃE, EU VOU CASCÁ FORA DAQUI! A mãe, paulista de carteirinha, levou um susto e tanto, afinal nunca tinha ouvido aquela expressão, não sabia se ria ou dava uma dura no filhão. Léo é fera em desenho. Parece gente grande. Usa lápis e caneta em seus quadros, borracha nunca. Tem um traço firme. Acha até que ele aprendeu a desenhar mesmo antes de falar. Desenha com quase perfeição aqueles “trécos” que passam na TV, principalmente os robôs que se transformam. Desenha ainda pessoas, animais, rios, montes, paisagens enfim, tudo o que vê pela frente (de lado e por trás). Léo vem até Maringá a fim de visitar tia Bela e tio Frank que moram em apartamento. A tia foi esperá-los na portaria e todos embarcaram naquele “negócio” que leva as pessoas pra cima e pra baixo e tia foi “dirigindo”. Uma baita duma aventura para o garoto. No apartamento, Léo está um tanto quanto impaciente, querendo andar, pisar no chão, conhecer a cidade, o Parque do Ingá, que a tia tanto falara. Tia Bela percebe sua aflição e, enrolada com tanta coisa pra fazer, dá também uma “enrolada” no sobrinho, dizendo a ele: 181 Essas crianças... Osvaldo Reis – Léo, vá adiantando e chamando o elevador pra tia, tá? E lá vai o pequeno Léo em direção do elevador, feliz da vida. Os adultos ouviram quando o obediente Léo, cantando alegre, chamou o dito cujo: – BO RO DOOOR! BO RO DOOOOOORRRRRR! Os familiares do garotão ficaram em silêncio quando ele retornou à porta do apartamento e disse: – TIA, EU CHAMEI, CHAMEI, E O BORODOR NÃO VEIO! Todos ficaram sem ação, tentando segurar o riso. Tia Bela contornou a situação: – Desculpe querido, a tia bocó esqueceu de explicar que é preciso apertar esse botão aqui... Sempre que retornam a Maringá, todos fazem a mesma brincadeira: – BO RO DOOOOOR... BO RO DOOOOOOOORRRRRR!!!!!! LEONARDO MARGONAR BEZERRA (Léo) PAIS Elizabete / Paulo Bezerra AVÓS MATERNOS Florinda / José Margonar AVÓS PATERNOS Nadir / Tibertino Bezerra Filho Gustavo Borges precoce O garotinho passeia com a mãe. Do outro lado da rua, uma senhora grávida. Um baita barrigão. A mãe, didática, explica: – É barriga d´água... O garotinho pergunta: – O FILINHO DELA SABE NADAR, MAMÃE??? 182 Essas crianças... Osvaldo Reis DESBARATOU O BARATO... A Isadora nasceu na era da Internet, é linda que só, saudável e inteligente. Sua cabecinha acompanha o ritmo deste século acelerado pelos computadores e, em seu (ainda) diminuto currículo, já porta um título que ninguém jamais arrebatará: é a primeira neta (o efeito é mais ou menos como o do filho caçula, mas com muito mais açúcar...). Seus avós de primeira viagem são: de um lado Eliana e Divanir, e do outro a também "babona" Ângela, já que o "vô" Vicente é falecido. A mocinha tem personalidade. E quando quer impor sua vontade é um Deusnos-acuda para contê-la. A Isadora, em suas primeiras birras, foi bastante original: quando queria alguma coisa e não era atendida, com muito cuidado deitava-se no chão e ficava sacudindo as pernas. A avó Eliana, querendo mudar o seu comportamento, em vez de bronca resolveu imitá-la, e se as duas fossem flagradas naquela situação, no mínimo iriam pensar que ambas estavam piradas. A gatinha ainda nem falava, mas não gostava, nem um pouquinho, da imitação, já que fazia bico, olhava de rabo-de-olho, fechava a cara, ameaçava ir embora de casa, e a avó, para enfezá-la mais ainda, sendo um verdadeiro espelho da neta, dizia: – Que legal essa brincadeira nova!!! Como é que se chama? O bico de Isadora lembrava um pelicano quando isso acontecia. A avó, no entanto, nem aí, olhava pra neta demonstrando também estar zangada... A coisa só melhorava quando Eliana, sem conseguir se “segurar”, caía na gargalhada e daí a neta também se desmanchava em risos, principalmente quando a avó falava: – Que legal brincar com você, querida! E a birra se escafedia. Passava... Mas não ia muito longe... Um dia, ela estava realmente furiosa. E põe furiosa nisso!. Deitada como de costume, sacudia as pernas com muita intensidade; freneticamente, para ser mais claro. A avó continuou teatralmente a imitá-la. E o pior, para Isadora, uma coisa séria, e a 183 Essas crianças... Osvaldo Reis abusada da vovó resolveu chamar de brincadeira... Onde já se viu? Brincadeira de pernas-de-barata. Como por encanto, a “braveza” da neta desapareceu de vez. E a avó acabou, brincando de barata, por cortar o barato da neta... Hoje, “PERNAS-DE-BARATA” é uma brincadeira coletiva, com direito a risadas e muito humor. ISADORA MAGALHÃES PALMA E SILVA (Isa) PAIS Eliana Patrícia / Rubens Jacinto da Silva AVÓS PATERNOS Ângela / Vicente Jacinto da Silva AVÓS MATERNOS Maria Eliana / Divanir Braz Palma A nota com Z Garotinho chega em casa e vai ter com o pai. Quer contar as aventuras do dia, mês, ano... Ainda de uniforme escolar, conta ao velho: – PAI, A PROFESSORA PEDIU PRA EU FALAR TRÊS COISAS QUE COMEÇAM COM “Z”... – Sim, filho, e o que é que você respondeu? – EU FALEI “ZÓIO”, “ZOREIA” E “ZUVIDO”... – É, filhão, eu acho que você vai tirar uma nota que também começa com “Z”... – Ô, PAI, O SENHOR ACHA QUE EU VOU TIRAR UM “ZOITO”??? 184 Essas crianças... Osvaldo Reis BUGIGANGAS O Carlos é o mais velho, chegou primeiro, seis anos depois foi destronado pela Poliana, a caçulinha e, por conseguinte o xodó da casa de Odésia e Fortunato. E a menorzinha (como sempre) era bem mais “braba” que o maior, tanto é que cada vez que a mãe a ameaçava com uma surra ou coisa que o valha, Poliana, sempre resmungando, alertava a mãe que se vingaria quando crescesse: “se você bater em mim agora, quando eu crescer bato em você”. Pode estar certo de que a mãe da garota nunca levou dela nenhuma piaba: a graciosa Poliana, já adulta, mede, no máximo, com salto e tudo, um metro e sessenta... A família leva os dois para conhecerem aquele riozão onde tombou um baita caminhão carregado de sal e daí passou a chamar-se mar. O mais velho não se assutou muito, tanto é que foi brincar na água, lógico, em companhia do pai. A menorzinha, com a mãe, brincava na areia... E naquele dia, se passasse alguém vendendo um viaduto, disco voador ou a estrada Belém/Brasília, a filhota pedia pra mãe comprar. Era cachorrão, sorvete, pastéis, coco, refrescos mil, refrigerantes, idem, e a mãe sempre se esquivando, e Poliana, sem baixar a guarda, mandando ver: – COMPRA, MÃE... O estoque de “nãos” da genitora, incluindo sua paciência, já estava se esgotando. Aí, passa um cidadão vendendo aquele “trenzinho” que o vento agita e por isso, recebe o nome de cata-vento. Poliana não se descuida e, de novo: – COMPRA, MÃE... A mãe resolve dar um basta naquilo e, com cara de poucos amigos, diz à filhota: – Eu já não falei que não vou comprar essa porcaria? O vendedor (ainda bem) não escutou... Poliana, com a bronca, diminuiu o ímpeto consumista. O tal vendedor foi lá na frente e voltou. Poliana, brigada com a mãe, achou por bem “comprar” sozinha o tal brinquedo. Chamou o vendedor e mandou ver: – MOÇO, QUANTO CUSTA ESSA PORCARIA QUE VOCÊ TÁ VENDENDO????? 185 Essas crianças... Osvaldo Reis EVITANDO O TOMBO... O Carlos vivia com os pais em Lobato e, como todo moleque de sua idade – dois, três anos – dava um trabalho danado pra mãe. Era um tal de não faça isso, não faça aquilo, não suba aí e mais um montão de outras recomendações da preocupada (com motivos de sobra!) mãe. Criança é um barato: se fica quieta demais, o adulto pensa que está doente e, se está aprontando alguma, tem de ser contida, ou avisada, alertada, no mínimo. É uma “guerra” constante. Imagine um carinha super ativo, saúde de ferro, energia a toda prova, sempre de pilha nova. Imaginou? Esse sujeitinho era o Carlos. Pra se ter uma idéia, o enfocado já montava a cavalo logo que aprendeu a falar e não gostava de companhia sobre o lombo do bicho; queria estar sozinho. A família dele, dos avós maternos e paternos, incluindo primos, passando por tias, tios, enfim, todo mundo é católico. Apesar de ser agitadíssimo, em determinados locais, na igreja, por exemplo, Carlos se comportava como gente grande. Naquela semana, o garotão levou um monte de chega pra lá da mãe, já que havia subido em árvores, muros, cavalos, mas sua cabecinha estava sempre alerta com as broncas da mãe. A preocupação da mãe acabou passando para o filhote... Domingo. Missa na matriz. Igreja lotada. Muita gente em pé. Nesse ambiente, chega o Carlos com a família para assistirem a mencionada missa. Com todo mundo em pé, e em sua frente, o garoto não enxergava quase nada, só pertinho. Ele também estava de pé, mas sua altura o impedia, já que ele “ia”, no máximo, até a cintura dos demais. Começa o ritual. O padre manda todo mundo se ajoelhar, Carlos não se incluiu nesse tudo mundo, permaneceu em pé... Pertinho do altar, há uma uma cruz com o Cristo crucificado... O garoto vê o quadro, lembra da mãe e, em alto e bom tom, avisa o Filho de Deus: – Ô JESUIS, DESCE DAÍ, SENÃO VOCÊ VAI CAIR... CARLOS RONALDO MORAES BERGAMO POLIANA MORAES BERGAMO PAIS Odézia / Fortunato Bergamo AVÓS MATERNOS AVÓS PATERNOS Berenice Maria / José Campos Moraes Maria da Conceição / Silvino Fortunato Bergamo – Pai, você faz os meus exercícios de matemática? – Não, meu filho. – Pelo menos tenta, pai. 186 Essas crianças... Osvaldo Reis ERA BANGUELA???? A Elora hoje tem por volta de dez anos, já “tá” meio coroa. Coroa com dez anos? Não, não é maluquice. E se for, a culpa não é minha. Esclarecerei: a gatinha, um pouquinho pra trás, contava com sete anos, e sempre que alguém perguntava sua idade, simpática e graciosamente, ela respondia (passando as mãos pela cintura, como fazem as modelos, lembrando uma famosa, que hoje mora em Nova Iorque, a Tássia, Tássia Chando...). Era um barato a precocidade (ou medo de envelhecer) da filhota da Cristina e do Marquinhos, quando dizia: – EU TENHO SETE ANOS, MAS CORPINHO DE CINCO... Uma baita duma diferença... Com três anos, a mocinha está pentelhando a avó Hely e, como toda criança de sua faixa etária, para desespero de quem está por perto, coloca na boca tudo o que vê: botão, moeda, cabo de guarda-chuva, tampa de caneta e um sem-fim de outros tantos outros objetos (comida, às vezes, precisa de aviãozinho, trenzinho, presentinho...). Devia ser um chiclete imaginário, ou mais uma “pegadinha” que Elora aprontava pra cima da avó. Só sei que a garota estava mastigando alguma coisa, ou movimentando a boca... Aí vem a “vó” com aquela história de “caca”, estende a mão e manda depositar o “trem” ali etc. e tal. A cuidadosa avó Hely não deixou por menos e quis saber: – Elora, o que é que você tem na boca? A resposta da pequena acabou por fazer ver à avó que seria feio falar com a boca cheia, ou com alguma coisa em seu interior, sua resposta foi lógica, clara, objetiva (apesar de todos terem caído na risada), sem piscar ou pestanejar, Elora mandou bala: – A LÍNGUA... 187 Essas crianças... Osvaldo Reis ERRADA É A LÍNGUA... Tem um ditado popular que ensina a pessoa a pescar com batata, usar batata como isca... Você joga o anzol na água com a batata e, quando tira; batata. Se fosse a Elora que quisesse batata frita, tudo bem... Um belo dia, coisa linda, família reunida, bem pertinho um do outro, avó, mãe, pai, e claro, a filha e neta Elora, todos juntos passeando de carro, paizão ao volante... É um tal de sobe, vira à esquerda, dobra à direita, “não mexa aí Elora, não buzine, menina, não vá colocar o braço pra fora de novo, é perigoso, e coisa e tal”. Ótimo passeio. Até que papai resolve parar em frente a uma padaria onde iria comprar alguma coisa. A avó Vita pede ao pai que compre batata frita... E quem é que não gosta de pegar no pé da sogra? Marquinhos não era diferente. Estranhou o pedido e fez uma piada com a mãe de sua esposa... A avó de Elora não gostou da brincadeira e deu-lhe uma baita bronca. Aí, é a vez de Elora participar, decisivamente, diga-se, da contenda, afinal a “vó” falou alto com seu pai... Errado está o verbo. Se a gente entra numa panificadora é para comprar pano? E não é sogro e sogra? Não é “vó” e “vô”? Todos riram da “ensinagem” que Elora deu na avó, para defender seu pai, conseqüentemente genro de “vó” Vita, quando com cara de poucos amigos, encarando a avó, a pequena mandou ver: – VÓ, NÃO É ASSIM QUE SE FALA COM SEU NORO!!!!!! ELORA CRISTINA BLUMATI CORRÊA PAIS Cristina / Marco Antônio Corrêa AVÓS MATERNOS Maria / Luiz Blumati AVÓS PATERNOS Hely / João (Zitão) Antônio Corrêa Júnior Inflação... Todos os dias, ao sair de casa, uma senhora encontrava um garoto vendendo chiclete. Todos os dias ela parava, dava cinqüenta centavos ao garoto, mas nunca levava a caixa de chicletes. Durante vários meses isso se repetiu, mas ela apenas dava o dinheiro ao garoto e não lhe falava nada. Até que um dia, depois de receber a moeda, o garoto falou pra senhora meio encabulado: – Tia, eu gosto muito da senhora porque me dá esse dinheiro e nunca leva os chicletes. Mas é que desde a semana passada o preço subiu pra um real... 188 Essas crianças... Osvaldo Reis A CRÔNICA DE UMA MORTE ANUNCIADA - ANO 2 Existem secretárias domésticas que chegam até a torturar crianças, mas a Judite era diferente: carinhosa, eficiente, dedicada e gozava de total confiança por parte da mãe, em razão, lógico, de seus tantos atributos... Mas a Juliane, que tinha na época somente dois anos de idade, não tinha a mesma opinião a respeito da fiel escudeira de sua genitora. Juliane, desde novinha, tinha forte personalidade. No entanto, sua saúde não era tão forte assim, tanto é que vivia tomando vitaminas, estimulantes para apetite e um montão de outros remédios. Criança, como se sabe, “adora” tomar remédios e cabia à Judite a tarefa de dar os ditos cujos para a gatinha, o que aumentava ainda mais seu “ódio” em relação à secretária. A mãe trabalhava fora, as duas “Jus” ficavam juntas o tempo todo, Juliane sempre “brigando” e a paciente Judite, nem aí com as rusgas da menina. Um dia, a Juliane pegou um dodói dos grandes, e a mãe, mesmo sabendo da atenção que Judite dedicava à filhota, recomendou-lhe que não se esquecesse de dar os remédios na hora em que o pediatra recomendou e também que a fizesse tomar... Chega a hora dos remédios: era xarope pra isso, comprimidos pra aquilo e lá vai Judite tentar convencer sua “inimiga” a engolir os tais remédios. Juliane não aceita de modo algum fazê-lo, e no auge da raiva, encara Judite ameaçadora e manda ver: – UM DIA AINDA VAI TÊ MORTE NESSA CASA!!!!!!!!!! JULIANE ZARA ISOLANI PAIS Aparecida / Edmar Isolani AVÓS MATERNOS Alzira / José Zara AVÓS PATERNOS Amália / Amádio Isolani 189 Essas crianças... Osvaldo Reis O MASCOTE DO BASQUETE... Era uma época de Natal e o “Papai Noel” ainda não tinha comprado os presentes do Rogério, Carolina e Rosana. As meninas nem tanto, mas o Rogério, então com cerca de quatro anos, estava desconfiadíssimo da mãe que precisava sair, "dar umas voltas" e o sujeitinho queria porque queria ir com a mãe, mas se fosse, a surpresa iria pro beleléu. Cabia ao pai a dificílima missão de despistar o filhote a quem já havia oferecido aumento de mesada, carnaval no Rio de Janeiro, um mês sem fazer a tarefa de casa e nada de o carinha aceitar. Ele queria mesmo é sair com a mãe... O pai, peladeiro contumaz, resolveu achar uma posição para o garoto em seu time e seria, claro, titular absoluto e o convida para ir junto ao seu sagrado (ou quase) futebolzinho e, para reforçar, usa de um argumento também quase irredutível, explicando que a mãe iria fazer um montão de coisas chatas, que não teria graça nenhuma sair com ela, aí tira seu ás da manga e diz ao jovenzinho: – Vamos com o papai, você vai ser o mascote do nosso time... Aí a coisa degringolou de vez, e Rogério, não querendo mudar de idéia e também sem saber direito o que iria ser, danou a chorar e a reclamar com a mãe: – MÃE, EU NÃO QUERO SER BASQUETE DO TIME DO PAI!!! ROGÉRIO DE ASSIS POSSANI DANTAS (Cleufe Possani) CAROLINA ZARA DANTAS (Nair Zara) ROSANA PAULA POSSANI DANTAS (Cleufe Possani) PAIS Cleufe / Nair Zara Dantas / Francisco de Assis P. Dantas AVÓS MATERNOS Guilhermina / Luiz Possani Carolina: Alzira Botti Zara / José Zara AVÓS PATERNOS Maria / João Pinheiro Dantas 190 Essas crianças... Osvaldo Reis “CANABIS” DE MILHO Criança vez por outra, prega peças inexplicáveis nos adultos, principalmente nos pais. Imagine uma criança sem ter ainda quatro anos pedir aos pais a famosa Canabis Sativa Lineu, também conhecida por maconha... Foi o que aconteceu com Gabriela, filha da Lucinéia e do Roberto, uma das netas preferidas do José Bidóia e da Dona Antônia, depois, claro, de todas as outras e outros... Num belo dia, com todo mundo em casa, a surpresa muito desagradável, vale frisar. Dizem que mulheres grávidas têm desejos, criança também tem, caso da Gabriela cujo desejo era por, pasmem, maconha. Maconha mesmo, seus olhos não te trairam não! Um corre-corre daqueles. Uns olhando para as caras dos outros e os outros olhando para as caras dos uns. Como poderia ser uma coisas dessas? Era o fim, a gatinha só tinha, na verdade incompletos, quatro anos e já estava viciada?! Deve ter sido algum traficante que visitou a creche. Só pode ser. Ninguém aqui usa tal coisa. Nem primos, nem os pais, nem tios, tias, ninguém mesmo. E dá-lhe pensamentos ruins e buscas inconstantes para o crucial problema. A culpa é sua, pensa o pai; é culpa do pai, pensa a mãe. Nesse semfim de perguntas sem respostas e respostas sem perguntas, uma kombi, caindo aos pedaços, passa em frente à casa. Gabriela chama a atenção dos pais, já quase desesperados, para o carro, e um anúncio emitido por um cidadão que pilotava o veículo e o som se espalhava por meio de duas cornetas de alto-falantes. Correm pra janela, pra porta, pra ouvir o tal anúncio, já que, demasiadamente nervosos, de onde estavam não conseguiam entender. Depois então, mais próximos, e com ouvidos esticados, o estranho pedido de Gabriela acabou sendo entendido e também "gargalhado". A kombi 1974, verde-musgo, acordava (ou despertava) a rua inteira, anunciando: – OLHA A PAMONHA... OLHA A PAMONHA... VENHA PROVAR, MINHA SENHORA, É O VERDADEIRO CREME DE MILHO... PAMONHA DE DOCE E DE SAL... UMA DELÍCIA. VENHA PROVAR, MINHA SENHORA... OLHA A PAMONHA!!! 191 Essas crianças... Osvaldo Reis COISA ESTRANHA... Tá certo que o nome soa bem próximo, e o personagem, durante bom tempo, foi praticamente uma lenda em termos de Brasil. De Rondonópolis em Mato Grosso a Bom Sucesso no Paraná, e de Ribeirão Preto (SP) até Quixeramobim no Ceará, sempre tinha alguém que o tinha visto, que jurava que viu, que o primo também viu, que a sogra viu... Só que ninguém fotografou, nem entrevistou... Era uma espécie de ET de Varginha, só que mais "rodado"... A Geórgia, um belo dia, gostou de uma frutinha. Gostou é pouco, adorou. E em razão de ser ainda miudinha não conseguia falar o que era, nem explicar. Mas, pelo menos onze vezes por dia, “tá” lá a gatinha querendo tal coisa. A avó Antônia, com mais paciência que Jó, e se derrete pra fazer a vontade da neta (e é só ela?), tenta saber, descobrir e, aí, a vaca, o terneiro com corda e tudo foram pro brejo quando a garota claramente explicou o nome da coisa que acabou de lembrar-se e mandou bala: – CHUPÁ CABRA, VÓ... É CHUPÁ CABRA... Dona Antônia se enrolou ainda mais e chegou até a pensar que a neta estava ficando maluca e, com a paciência já apregoada, quer saber: – E onde é que você viu isso, querida? A resposta da neta foi um primor e tirou toda e qualquer dúvida da "vó". – FOI LÁ NAQUELE LUGAR QUE A GENTE ALMOÇOU NAQUELE DIA... Se lá não tivessem sido bem tratados, a família e a "netaiada", incluindo a Camila, fatalmente o mistério teria persistido. Num domingo estavam viajando em direção ao vizinho Mandaguaçu, a gatinha reconheceu o famoso "Porco No Tacho" (um restaurante à beira da estrada) e informou a todos que foi ali, que era ali o lugar... Conversando com o pessoal da casa, até que não foi tão difícil assim descobrir. A tal frutinha, para Geórgia, "Chupá cabra", nada mais era que a fruta que o mineiro mais gosta, ou seja, a famosa JABUTICABA, lá cultivada no fundo do quintal. E de jabuticaba pode até se esquecer do nome, mas é muito difícil se esquecer do sabor. Se consumida em demasia, o efeito também é inesquecível... GABRIELA GALANTE BIDÓIA GEÓRGIA ANTÔNIA BIDÓIA CAMILA BIDÓIA (Prima) PAIS Lucinéia (Néia) / Roberto Galante AVÓS MATERNOS Antônia / José Bidóia 192 Essas crianças... Osvaldo Reis "BRIGADO UMA PINÓIA...” Um filósofo italiano (não lembro o nome) afirma que a velhice é a idade mais bonita da vida e que é uma pena durar tão pouco. Nem italiano, nem filósofo, apenas pegando "carona" coloco a infância no mesmo nível, já que é muito comum ouvir-se dizer que criança "cresce mais que abóbora"... E, como elas crescem rápido, já, já o mercado brasileiro (ou será mundial?) vai ter uma empresa prestadora de serviços com nome pomposo "SEMENSATO & MELON" (pra entender leia a página 99). A mãe do Guilherme é professora, o pai é mecânico, e o casal tem uma tia em Colorado (PR) e a tia tem um "pé-de-bode" que ela teima em chamar de carro... Em "troca" do almoço, tia Janda pede ao sobrinho que examine um pequeno defeito em seu possante. Enquanto isso, mãe Margareth e a tia preparam o regabofe. O pai Aires e Gui vão consertar o veículo... Aires tem uma baita duma caixa de ferramentas que, de acordo com a necessidade, vai pedindo ao filhote que o atende prontamente... Terminam o conserto. Gui e o pai entram pra lavar as mãos e tia Janda aproveita para agradecer ao sobrinho pelo trabalho – trabalho que, aliás, deixou o pequeno Gui de bigode suado – e Janda pensando na economia que fez, diz ao pai do mocinho: – Ô Aires, muito obrigada! Mesmo antes de o pai abrir a boca para o tradicional "de nada", Gui mostra a todos que, mesmo ainda não sabendo trabalhar direito, pra cobrar sabe tudo e mais um pouco, mesmo tendo apenas três anos. Todos cairam na gargalhada, apenas Guilherme ficou sério quando, encarando a tia mandou ver: – BRIGADO NÃO! SÃO TRÊS REAUS... 193 Essas crianças... Osvaldo Reis "PANHA” NELA... A filhota da Margareth e do Aires, em encarnações passadas, deve ter sido mineira (não sei de "sô" ou de "uai") mas fala, desde miudinha, o bom, velho e simpático "mineirês". O mineiro (de Minas Gerais...) é (dizem) muito econômico, não apenas em termos financeiros, mas até em palavras. Mineiro diz, por exemplo, em vez de boa tarde, somente "tarde", bom dia é "dia" e para eles o verbo "panhar" tem dois sentidos: um deles, "panhar" laranja; o outro, "panhar" de alguém – O Divino brigou com o Tião e "panhou" dele... Era uma campanha de vacinação. A mãe leva Isabela pra tomar a tradicional gotinha (ou "mordidinha" de abelhinha que não dói nadinha...). Já na fila, vendo a meninada berrando, Isa começa o seu "mineirês" assistindo a choradeira da garotada, misturando aí sua pronúncia com o Nordeste (ou seria ela do norte de Minas?), vez por outra deixava escapar: – Viiiiiixii... Isabela apenas observava, sem chorar. Aí, bem na frente dela e da mãe, uma garota, de colo ainda, berrava, gritava, esperneava, uma birra pra ninguém botar defeito. Isabela achando aquilo uma aberração (?), coisa feia, comportamento indevido, e por aí afora... A mãe da outra garota, da chorona, referindo-se a Isabela, mostra a gatinha para sua filha e compara: – Olha, filha, que garota boazinha... Ela não chora... A menina "ruim" não deve sequer ter ouvido o que a mãe disse, ao contrário, aumentou ainda mais sua "esgoelação". A psicóloga Isabela encara a mãe "da descomportada" menina e diz, cheia de razão: – PANHA NELA QUE ELA PÁRA!!! GUILHERME CAVALHEIRO MELON ISABELA CAVALHEIRO MELON PAIS Margareth / Aires Pelegrin Melon AVÓS PATERNOS Lurdes / Olívio Pelegrin Melon AVÓS MATERNOS Romilda / Alécio Cavalheiro 194 Essas crianças... Osvaldo Reis QUASE IGUAL... Repetidas vezes tenho afirmado o que todo mundo sabe: criança adora atender telefone, portão, porta etc. Basta se ouvir o dindon da campainha, o trim do telefone ou o plac plac das palmas que, mesmo antes de o som ir embora, "tá" lá a criança apostando corrida pra ver quem chega primeiro... Com o Atilio, o filhote da Nilce e do José Sanches, com três anos de idade, a coisa não podia ser diferente. Numa noitinha, lá por volta de sete horas, o garotão ouve o ruido de palmas e dispara rumo ao portão. Lá chegando, encontra um cidadão que pergunta por seu pai, se o pai estava. O eficiente "secretário" informa que sim, e indaga ao visitante: – E QUEM É QUE QUER FALAR COM MEU PAI? – Diga que é o Itiro? O carinha não entendeu nadica e até pensou: que será que é esse negócio de tiro? Será que o meu pai vai caçar? A dúvida martelando sua cabecinha, pergunta de novo: – QUEM É MESMO O SENHOR? – Fala que é o Itiro... A resposta, deveras esclarecedora, clareou tudo... Atílio continuou a olhar o cidadão com cara de dois paus. O amigo de seu pai percebeu e completou a informação: – Fala pro seu pai que é o Itiro Nishiama... Aí a coisa ficou completa e clara de verdade. O jovenzinho "entendeu" tudinho. Disparou corredor a dentro e foi falar com o avô dos gêmeos Maria Alice e José Francisco: – PAI TÁ LÁ NO PORTÃO UM TAL DE JOAQUIM QUERENDO FALAR COM O VOCÊ... Sanches vai ter com o cidadão. E já chegou dando risada. Aí, explicou ao amigo o motivo do riso. E os dois continuaram rindo... Hoje, com Atílio já "grandinho", com trinta e poucos anos, cada vez que tromba com o amigo Itiro, este lembra do fato, já que para Itiro o nome Atílio pouco significa, ou ele ignora, pois trata o amigo pelo nome "inventado" por ele quando menino, isto é, Joaquim... Joaquim e Itiro, muito "palecido", Atírio também... JOSÉ ATÍLIO SANCHES MARIA ALICE FERREIRA JOSÉ FRANCISCO FERREIRA SANCHES AVÓS MATERNOS Margarida / Francisco Ana / Atílio Ferrari PAIS Mirlei / José Atílio Sanches Nilce / José Sanches Filho 195 AVÓS PATERNOS Rosa / José Sanches Nilce / José Sanches Filho Essas crianças... Osvaldo Reis IGUALDADE... Luíza tem hoje quatro anos e é o único xodó do casal Lélis e Clarisse. É a filha mais nova, mais velha, a mais tudo, singular, única; sua cabecinha não representa, nem de longe, sua idade, parece mais "coroa". O papai – é assim que ela fala – é cúmplice em suas travessuras, parceiro nas brincadeiras e os dois dão um trabalho danado pra mãe, que não dá mole, principalmente pra menorzinha... Foi um dia daqueles, o pai chegou em casa "mortinho da silva"; mesmo assim teve de atender a vontade de Luíza, que queria brincar, e por nada do mundo aceita um um não; desculpa, nem pensar. Quer e pronto. Luíza tem um montão de brinquedos, brincando sabe organizá-los: o carrinho é aqui, o caminhão ali, a ambulância lá, o carro da polícia mais pra cá, e o paizão fielmente obedece, senão... Luíza gosta mais de brincar do que guardar os brinquedos, motivo que a faz, quase sempre, se desentender com a mãe exigente. Naquela noite (como sempre tenta) queria ir dormir sem guardar os brinquedos. A mãe "pega em seu pé": – Luíza, vá guardar os brinquedos... Luíza resmunga. A mãe repete a bronca. Luíza pede à mãe que mande o papai ajudá-la. A mãe retruca: – Vá você e anda logo. Brincou, tem de guardar... O precoce, e quase sem uso cérebro da mocinha, desmonta a mãe quando, cheia de razão, afirma: – ENTÃO O PAPAI TEM QUE AJUDAR... O PAPAI TAMBÉM BRINCOU!!! LUÍZA LÉLIS COPINI VIEIRA SANTOS PAIS Clarisse / Lélis Vieira dos Santos 196 Essas crianças... Osvaldo Reis "TORTURISMO"... Orlando Manin Filho está com (incompletos) cinco anos. Bom aluno, bom filho, bom irmão – que o diga Fernando, um pouco mais novinho. Orlando pai é católico e a mãe Leonor, também. Adulto, puxando ao pai, fatalmente será Landão, mas por enquanto, é Landinho – engrossando a fileira dos "inhos" – em cuja dedicatória nos referimos. O Fernando, uma espécie de repórter, em homenagem à profissão do pai, radialista dos bons e também bons tempos, é daqueles, segundo o "mineiro" – "que não espera a batata assar"; dá logo as notícias e conta as novidades e, como aquela era grandona... O pai chega em casa e o filhote Fernando o está esperando no portão. A informação daquela tarde fez, no começo, o pai arregalar os olhos, e o susto só foi desfeito quando o pai viu a esposa dando risada, coisa que, aliás, até hoje fazem, principalmente nas macarronadas de domingo quando o fato é sempre relembrado, com saudades e gargalhadas... Fernando, ainda embaralhando letras e coisas, doido pra contar pro velho o ocorrido, trocou apenas umas coisinhas quando mandou ver: – Ô PAI, A MÃE FOI NA IGREJA E PONHÔ O LANDINHO NO CACETISMO!!! “In dubio pro reu” – O que fará você meu filho – pergunta o padre ao menino – para entrar no céu? – Bem, eu vou correndo até lá e fico entrando e saindo, entrando e saindo, até que São Pedro, aborrecido, me pergunte: – “Como é, garoto, saia ou entre de uma vez!”. 197 Essas crianças... Osvaldo Reis IRMÃO DE BRINQUEDO A Paula era a primeira filha do casal Ivone e Paulo e, nessa condição, “dava cartas e jogava de mão”, isto é, era a “dona do pedaço” - princesa, rainha e um pouco mais. Aí a mãe engravidou. Com a gravidez pipoca a ciumeira, comum nesses casos. A pequena começa a enjeitar comida, não querer sair, não ter vontade de brincar, enfim, aquelas coisas que os pais conhecem bem e, o que é pior, a coisa aumentava de acordo com o crescimento da barriga da mãe. Já em fase de pré-natal, cuidadosa, a mãe indaga ao médico se é possível mostrar à filhota o “retrato” do irmãozinho que já era tratado pelo nome (menos por Paula, claro!). O médico consente, inclusive recomenda. Chega o dia do exame. Paula aparentemente “nem aí”, mas a didática explicação do médico aguça a curiosidade da gatinha. O doutor, então, passa aquele tradicional gel no abdomen da mãe e começa a ultrassonografia. Paula está petrificada com a cena mostrada no vídeo, aliada aos comentários do médico que lhe explica: – Aqui está o pézinho... Olhe, aqui o outro pézinho, ali a mãozinha, o rostinho, a perninha e um montão de outros tantos “inhos” e “inhas”, bem do jeito que criança entende e gosta. A irmãzinha nem pisca em face do clima criado pelo competente profissional. Termina a “aula”. O médico sai da sala deixando a sós mãe e filha. Era um tal de mãozinha pra lá, pézinho pra cá... Tudo espalhado.... Com essas coisinhas movimentando seu cérebro, Paula quer saber: – Ô MÃE, O MURILO VEM TODO DESMONTADO E DEPOIS VOCÊ MONTA??? PAULA MONTEIRO PAIS Ivone / Paulo Monteiro AVÓS MATERNOS Clossilde / José Antonelli AVÓS PATERNOS Maria do Carmo/ Paulo Monteiro 198 Essas crianças... Osvaldo Reis SUMIRAM CONOSCO... O Luiz Alberto, também conhecido como Beto, um dos homens da família de Rosana e Luiz Jorge, nunca tinha viajado de ônibus. E como da primeira viagem nunca se esquece, dessa, pelo menos os pais, certamente, não vão esquecer. Era um ônibus leito, com bancos reclináveis, travesseiros, cortinas, enfim, uma casa que anda. Se é confortável para um adulto, imagine para alguém de menos de um metro de altura e uns três ou quatro anos de idade. Tudo claro até começar a viagem. Aí vem aquele barulhinho do motor, o balanço e o garotão se entrega aos braços de morfeu. Sono tranquilo e profundo. O paizão fecha as cortinas e o sono vai longe... Um montão de tempo depois o jovenzinho acorda. Era um breu só. Não se enxergava nadica de nada. E Beto, mais perdido que cachorro caido de mudança, descobre mais uma utilidade de genitora e quer saber: – Ô MÃE, CADÊ NÓIS ???!!! Meus sonhos estão murchando, perdendo a cor e a fragrância... - Meus Deus, estou precisando de uma transfusão de infância ! A. A. de Assis 199 Essas crianças... Osvaldo Reis DÚVIDA... Toda criança adora atender telefone. grande novidade. Parece até a descoberta da pólvora tal afirmativa. Com a loira Lorena, já devidamente qualificada, apresentada e mostrada (pag. 91), a coisa não era diferente. A família da gatinha, mais tio Paulo, tia Ione, possuiam, pertinho de Maringá, em Jussara, um armazém que comercializava gêneros de primeira necessidade com o pomposo nome de Mercado Varejo Bom Dia. Lembra aquela manjada da coruja que perguntou ao passarinho qual era seu nome? E o passarinho, tadinho, todo atencioso responde: Tico-tico. E a mal humorada coruja pensando ser ironia do “penoso” coleguinha, retrucava: não precisa repetir que não sou surda... O diálogo com a loirinha era quase o mesmo. Bastava o telefone fazer “trim” que a telefonista mirim, com especial simpatia prontamente atendia, deixando confusa a pessoa que estava do outro lado. Se de manhã, dizia Lorena: – VAREJO BOM DIA. BOM DIA !!! Quando não era sacanagem de alguma tia, tio ou amigo, era realmente complicado. Pensaram até em mudar o nome do mercado, de “telefonista”, nem pensar. À tarde era (pouca coisa!) mais complicado. Como dissemos, já no primeiro toque a baixinha atendia, misturando a cabeça de quem ligava (ou própria?). E o diálogo ficava assim: – VAREJO BOM DIA. BOA TARDE !!! E sempre tinha um(a) engraçadinho(a) que pedia esclarecimento deixando Lorena mais vermelha que um tomate da banca ao lado. E a discussão ia longe, até Lorena “puxar a faca” ou a outra pessoa “afinar”... Hoje não tem nem Bom Dia nem Boa tarde: o mercado foi vendido, trocou de nome e Lorena, lamentavelmente, cresceu... Que pena! 200 Essas crianças... Osvaldo Reis AGRADECIMENTOS A todas as pessoas mencionadas: pais, avós, tios, primos, sobrinhos, cujas “DELAÇÕES” espero sejam “PREMIADAS” com lembranças saudáveis de um tempo que não volta mais, que sejam as mais gratas e ternas recordações. Sincera e modestamente, gostaria de ser o instrumento dessas reflexões, comentários, dúvidas, discussões e, se tiver o privilégio de arrancar pelo menos um pequeno sorriso ou uma lágrima alegre, confesso-me plenamente recompensado. Aos que me incentivaram e aos que me criticaram, o mesmo respeito, já que, de acordo com NELSON RODRIGUES, “toda unanimidade é burra”. Assim pensando e agindo, com a mesma humildade e ternura, aceito as críticas, que findam por me ensinar; do mesmo modo, não gosto do falso elogio nem da bajulação, pois, como diz SANTO AGOSTINHO, acabam por me corromper. Alguém disse que escrever é viver de ilusão. MÁRIO LAGO, um dos maiores brasileiros dos últimos tempos, para o seu coração, queria “nada além” de uma ilusão. Que os tantos amigos e amigas continuem me ajudando a manter a minha alma de poeta, mesmo com mínima escolaridade, tropeçando nas palavras e na emoção, com dicionário diminuto, conhecendo, no entanto, os significados de algumas palavras, doces palavras, como GRATIDÃO, LEALDADE, ÉTICA... OBRIGADO GENTE!!! 201 Essas crianças... Osvaldo Reis Ademir Penha Adriano Valente Alaor Gregório de Oliveira Alberto Paco Aldilene / Milson Vanderlei Rocha Aline Rodrigues da Silva Ana Carolina Gonçalves dos Santos Ana Maria/ Altino Pedroso dos Santos Ana Paula Machado Ana/Maurício Cadamuro Ana/Rogério Barreto Antenor Sanches Antero Rocha Antônio “Nhô Juca” Mário Manicardi Antônio Bárbara Antônio Carlos Moretti Antônio Luiz de Jesus Antônio Molonha Aparecida “Bia” Fabiana Correa Armando Bettinardi Ayako/Tadaci Nishira Bete/ José Silva Camila Kretzmann Camila / Ricardo Tupan Rui Carlos Mariucci Carmen Ribeiro Carmen/Milton Seixas Cibele Santiago Cida/ Ademar Schiavone Cidinha / Nelson “Jaca” Pupim Clara/Mário Mazon Claudenice / Fábio Aparecido Sarge Cônego Benedito Vieira Telles Dalti Tortato Dari Pereira Deroteu Gonçalves da Silva Diniz Neto Dirce/Antônio Alexandre Pereira (em memória) Diudi/Nelson Brito Edalvo Garcia Edson Marassi Elaine / Wal Barrionuevo Elenice / Fernando Ferreira Eliane Feitosa Santos Elidir D´Oliveira (em memória) Elizabeth / José Carlos Goulart Elza/Renato Bernardi (em memória) Emília Santana Emílio Germani Emydio Brito Enedina/Antônio Sena Esmeralda/Walber Guimarães Euclides Brita Euclides Zago Fares Jamil Feres Fátima/Messias Mendes Fernando Vasconcellos Francisco Guazelli Francisco Jorge Ribeiro (em memória) Galdino Andrade (em memória) Genalva/Paulo Bôhm Gentil Guido Demarchi Gilceane / Alcenir Antônio Baretta Gilda/Leonardo Contreras Glória / Orlando Fernandes Dias Hermelindo Aliberti Henri “Francês” Jean Viana Inês/ Ademir Mulon Inês/Ataide Dantas Iolanda Hoff Irene / Jorge Fregadolli Irma/Said Ferreira Itamar Belasma Ivana Martins Jacira / José Roberto Balestra Jaime Ribeiro Jaime Vieira Jair Amim Janete/Dorival Cavalcante João Frigo 202 Essas crianças... Osvaldo Reis João Gualberto de Lima (em memória) João Laércio Lopes Leal Joel Cardoso Jorge “Ploc” Meneguele José “ Tavarico” de Oliveira Tavares José “Bicudo” Antônio da Silva José Barbosa José Cardoso José Carlos de Andrade José Cícero de Oliveira José Hilário José Usan Judite/Elon Bragança Kassiane Sueli de Oliveira Kely Schemberger Laércio Quadros Lázaro Domiciano Léo Jr. Lenir/ Fidelcino Cruz Leonete Bonazio Lídia/ Daniel Zecheto Lidiane / Marcelo Menegassi Lígia Leal Lourdes/Ivo Machado Lucila / Getúlio Vilmar Afonso Lucilene/ Pedro Brambilla Luiz Alexandre Solano Rossi Luiz Bolota Luiz Carlos Kaltoé Luiz Júlio Bertin Márcia/Cesar Castanharo Márcia/ Cláudio Vismara Marco André Lima Maria Antonieta / Valdecir Amorim Maria Aparecida / Valdecir Solomoni Maria da Penha Santana Maria José/Celso Robles Maria José/Lizeu Nora Ribeiro Maria/Matheus Recco Mariane Hoff Marina / João Batista Lima Marizalda/Ademir Tavares Moura Milton Siqueira Moisés Zanardi Nelson Maimone Nelzi / Wilson Bokorny Fernandes Nica/ José Bonifácio Moron Nilsa Melo Nitlon Tuller Odair Mario Bordini Odete Alcântara Rosa Odete Salata Mendes (em memória) Oliveira Reis Orlando Carnelós Osvaldo Chiucheta Paulo Peixoto Paulo Roberto Pereira de Souza Reginaldo Dias Renata / Keith Angel Balestra Roberta/Luiz Carvalho Rogel Martins Barbosa Rogério Recco Rosa/ Mário Yamamoto Rose Leite Rosalino Felícios dos Santos Rosangela / Roberto Plepis Rose/Francisco Alves da Rocha Rosemar Bertequini Sakae Yamao Salim Haddad (em memória) Sandra/ Nélio Sanches Gonzales Sandro Scolari Sebastião Palma Shirlei/José Antônio Moscardi Sidnei Alves Silvana Borges Simone / Alexandre Campos Soares Simone Labegaline / Antônio R. de Paula Sirlei/Izac “Grego” Rodrigues de Lima Suzana Sasaki 203 Essas crianças... Osvaldo Reis Tánia Facci Terezinha/ Sebastião Pitarelli Toninho Mendes Ulisses Maia Ulda Ramos Gabriel Valdecir Brito (em memória) Valdecyr Pozza Valdir Carniel Vera Dias Vera Lúcia / José Carlos Nascimento Victor Hugo Dias Gonçalves Wagner da Silva Walter Alexandrino Walter Poppi Wanderlei Vieira Wilson Costa Wilson Nakashima Zacarias Quintanilha Zélia / Antônio Picoli Sobrinho Zery Monteiro 204 Essas crianças... Osvaldo Reis (Em memória) J B MARIANO 205 Essas crianças... Osvaldo Reis O AUTOR É o caçula de uma família de dez. Filho de mineiros, Ana de Paiva Reis e Geraldo Fernandes Reis, nasceu paranaense na fazenda Santa Helena, município de Bom Sucesso. Autodidata. Foi articulista e colaborador em diversos órgãos da imprensa maringaense. Membro fundador da Academia de Letras de Maringá, tendo sido seu primeiro orador. Na área pública prestou serviços à Assembléia Legislativa do Estado do Paraná (chefe de gabinete do deputado Jayme Rodrigues de Carvalho), Câmara dos Deputados (chefe de gabinete do deputado Renato Bernardi) e Prefeitura do Município de Maringá, onde foi chefe de gabinete (Prefeito Said Ferreira). Osvaldo Reis define-se como um “contador de causos” brinca de fazer trovas, inclusive caipiras. Pretende continuar escrevendo, e, por enquanto, tem os seguintes trabalhos publicados: BOCA MALDITA – Poucas e Boas das Velhas Raposas – Editora Clichetec - 1994 MARINGÁ E SEUS PREFEITOS – Editora Clichetec - 1996 COLETÂNEA DA ACADEMIA DE LETRAS DE MARINGÁ – Editora Gráfica Bertoni - 2000 MARINGÁ 57 ANOS – A HISTÓRIA EM CONTA-GOTAS – Gráfica e Editora Primavera - 2004 COLETÂNEA DOS POETAS DE MARINGÁ III – Editora Gráfica Bertoni - 2006 MARINGÁ – A HISTÓRIA EM CONTA-GOTAS – Gráfica e Editora Primavera - 2ª edição - 2007 NAPOLEÃO MOREIRA DA SILVA - Um Monumento da História - Editora Canadá (Em parceria com Antonio Padilha Alonso) 2008 O PIONEIRO ANÔNIMO (cordel) Edição do Autor - 2008 US MEUS CACHORRU (cordel) Edição do Autor 2008 ESSAS CRIANÇAS – Edição do Autor - 2011 Fotografia: Edson Burzega Guitti – – 206 março / 2011