À D E R I V E
Transcrição
À D E R I V E
fernando flores moleta D À E R I V E sobre Fernando Flores Moleta, brasileiro, 22 anos. É estudante de Arquitetura e Urbanismo na Universidade Federal do Paraná e também atua como fotógrafo e artista, já tendo realizado exposições coletivas em Paraty, no “Festival Internacional de Fotografia Paraty em Foco”, no Rio de Janeiro, na exposição coletiva “A Deriva”, e em Roma, na exposição “Roma 20/25” no Museu MAXXI. Também teve seu ensaio “Zonzo” publicado na revista OLD. Fernando estudou em Roma, na Università Degli Studi Roma Tre onde conheceu a Toeria da Deriva através do contato com o professor Francesco Careri do grupo Stalker. E este é o tema deste zine: A deriva; O caminhar como prática estética. Em 2015 Fernando integrou um grupo de exploradores do espaço urbano, através do laboratório de Arti Civiche do grupo Stalker. Todos as quintas-feiras o grupo reunia-se para explorar Roma Oeste, caminhando a tarde toda, em média 7km... Nestes 7km eram encontrados as mais diversas coisas, desde senhores simpáticos até objetos perdidos no tempo. Caminhar por o que antes era um espaço irreconhecível transforma-o de vazio urbano a um lugar da esperança, do possível. Este zine tem como objetivo compartilhar os produtos fotográficos gerados a partir do contato com a experiência do perder-se. "Perder-se significa que entre nós e o espaço não existe somente uma relação de domínio, de controle por parte do sujeito, mas também a possibilidade do espaço nos dominar". (CARERI, Francesco. Walkscapes, O caminhar como prática estética). 1 índice Introdução p. 3 Ensaios Deriva Zonzo p. 7 p.12 2 nós Entre março e junho de 2015, o curso de “Arti Civiche” percorreu um total de 74,590 km. O percurso foi eito inteiramente a pé, em 9 etapas e em grande parte fora da pista, procurando não caminhar sobre o asfalto ou sobre as calçadas, foi procurado explorar as margens entre o construído e o não construído, de caminhar ao longo dos rastros e de deixar novos, atravessando estradas, binários e propriedades privadas. Corpo a corpo com a cidade para medir fisicamente a permeabilidade, o grau de acessibilidade e verificar atalhos, barreiras e impedimentos úteis para entender a viabilidade das pontes por trás do projeto. Encontramos muitas cidades e muitos habitantes, latifundiários, agricultores, etomologistas, pastores, ciclistas, enfermeiras, hippies, garis zelosos, vigilantes armados, amoras sem espinhos, espinhos de porcos-espinhos, cães sem donos e cães com donos. Muitos edifícios e muitas casas, áreas cercadas, aldeias fascistas, casas antigas com piscina e novas casas para qualquer um, abusos impedido e abusos realizados, estações fantasma, fortes militares, antigas aldeias, naves espaciais, modas improváveis, velhinhas devotas, arqueologia do passado e arqueologia do futuro. Nós: Marina Amaral, Lorenzo Annibale, Lorenzo Balestra, Julia Bieler, Daniele Bobbio, Lucia Bordone, Luca Camello, Emanuele Caporrella, Francesco Careri, Micaela Costa, Francesca Duca, Ane Elizegi, Stefania Falso, Elisa Garrafa, Matteo Giammuso, Ludovico Grantaliano, Gloria Lapeña, Giovanni Longobardi, Giulia Losito, Leticia Lyra, Cristina Marguerita, Camilla Martino, Fernando Moleta, Coste Montenegro, Enzo Nico, Gina Oňa, Giacomo Orondini, Fernanda Pacheco, Lorenzo Pagliara, Camila Pagnoncelli, Giulia Panadisi, Marilisa Parrella, Rodrigo Pereira, Enrico Perini, Elia Torrecilla, Patricia Torres, Benedetta Vittozzi. 3 caminhar o é um instrumento artístico de produção do espaço público. As trocas sensitivas entre paisagem e ser possibilitam o conhecimento do espaço através de uma construção coletiva. 4 entre o homem e a paisagem não deve haver somente uma relação de domínio, mas também há a possibilidade da paisagem nos dominar. deriva a de Debord, é um instrumento feito para gerar uma situação lúdico-construtiva que deverá materializar-se unicamente em forma de labirinto dinâmico. desenho do traçado de todas as caminhadas feitas em Roma 5 fotografias de registro 6 deriva Trabalho fotográfico elaborado para o Laboratório di Arti Civiche na Università degli Studi Roma Tre. O trabalho consiste de retratos em dupla exposição de personagens e texturas encontradas nas caminhadas pela Roma Oeste durante o segundo semestre de 2015. "Perder-se significa que entre nós e o espaço não existe somente uma relação de domínio, de controle por parte do sujeito, mas também a possibilidade do espaço nos dominar". (CARERI, Francesco. Walkscapes, O caminhar como prática estética). Para este ensaio eu fotografei personagens que contavam a história do nosso percurso. E esta é a minha narração, uma história dos personagens da Roma Oeste através das fotos. Porém, devo dizer que quando se trabalha com uma câmera analógica deve-se levar em conta que ela tem uma vida própria. Ela faz as suas próprias escolhas, como se pudesse opinar e atuar de maneira ativa no processo fotográfico. Lhes conto o porquê; Como já disse, a idéia era de retratar os personagens com os quais nos encontramos durante o nosso percurso e, junto a isto, produzir duplas exposições sobre o retrato. A idéia era de trazer junto com o retrato as texturas do percurso, como pedras, folhas, grama, etc… Mas a minha Zenit, filha da URSS e assim rebelde, fez duplas exposições como bem quis, ou seja: produziu imagens que eu jamais esperava (provavelmente tudo fruto de algum travamento no processo de rodagem interna da película). Ou seja, o fato de não saber o que esperar da sua foto e ser surpreendido com o resultado é um fato extremamente belo que somente a fotografia analógica pode produzir. É como se entre o fotógrafo e a câmera não existisse somente uma relação de domínio, mas também a possibilidade da câmera dominar a foto em uma clara ilusão a definição do “perder-se” escrita no livro “Walkscapes O caminhar como prática estética” de Francesco Careri. Ou seja, isso tudo faz sentindo quando o processo do caminhar a deriva condiz com a produção destes “erros fotográficos” dentro do imaginário das errâncias situacionistas. 7 6 8 9 9 veja mais fotos em: https://articiviche2015.wordpress.com/2015/07/01/deriva-fotografica/ 10 zonzo Estas fotos compõem a experiência em retratar o corpo humano como paisagem, não como alusão a simples bodyscapes, mas sim como paisagem envolvente, onde se permite devanear através das linhas orgânicas, como "andare a zonzo". Nesse sentido podemos dizer que existe um perder-se por estas curvas, o que significa que não existe controle por parte do sujeito, mas também a possibilidade do corpo nos dominar. Ou seja, estar a deriva. O conceito de deriva foi utilizado desta forma pela primeira vez em 1953 por Ivan Chtcheglov no ensaio "Formulaire pour un Urbanisme Nouveau", posteriormente na "Théorie de la dérive" da Internacional Situacionista ele seria definido basicamente como o "deixar-se ir". “Modo de comportamento experimental ligado as condições da sociedade urbana: técnica de passagem apressada por vários ambientes. Mais particularmente, também designa a duração de um exercício contínuo desta experiência. (Anonimo. “Définitions”, Internationale Situationniste, n.1, 1958). Assim percebe-se o foco da Internacional Situacionista na exploração da cidade através da Teoria da deriva, ao invés disso, eu transmudo esta experiência para o corpo humano através da fotografia. A partir disso, eu tive a ideia de retratar o caminho que o olhar perfaz pelo corpo como que se este fosse uma paisagem a ser percorrida através de suas linhas orgânicas. Por fim utilizo esta frase retirada do livro citado acima para exemplificar, com palavras, o que seria esta prática: "A deambulação é caminhar em um estado de hipnose, em uma desorientadora perda do controle, é um meio através do qual se entra em contato com a parte inconsciente da paisagem". Mas sobretudo o que importa é a amplidão do termo e as suas consequentes novas interpretações contemporâneas, que sem as quais eu não teria dado prosseguimento a este projeto. Posto isso vos convido a observar estas fotografias permitindo que a vossa percepção esteja a deriva e assim imaginar-vos de frente aos prazeres tátil, olfativo, gustativo e visual dos caminhos orgânicos do corpo humano. 12 11 13 14 14 veja mais fotos em: http://cargocollective.com/fernandomoleta/zonzo 15 zine à derive veja mais em: https://www.behance.net/fernandomoleta http://cargocollective.com/fernandomoleta https://www.flickr.com/photos/fernandomoleta/ contato: [email protected]